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DIGESTÃO NAS AVES O processo digestivo nas aves é bastante complexo se formos analisar a grande variedade de espécies de aves existentes em nosso planeta. Entretanto um dos pontos importantes em medicina veterinária é o estudo, basicamente, das aves domésticas e em especial o gênero Gallus ao qual pertencem galos e galinhas domésticas. O fato se reveste de grade importância por ser o Brasil o segundo maior exportador de frangos entre os países produtores. De qualquer forma sempre que houver necessidade de comparações fisiológicas iremos citar aves que não são necessariamente as galinhas domésticas. Inicialmente devemos nos reportar à cavidade bucal das aves e em especial à preensão dos alimentos pelo bico. Ao analisarmos o bico de uma ave já podemos ter em mente que tipo de alimento ela costuma ingerir e de que forma o faz. Comparemos o bico de um TROCHILIDAE (beija-flor), e de uma galinha. Um beija-flor tem seu bico fino e alongado (provavelmente com variações, pois, há 319 espécies) que serve para captar o seu alimento em flores como os hibiscos, o que seria muito difícil para aves com bicos curtos. Uma galinha tem seu bico curto com a valva superior um pouco mais longa do que a inferior e se alimenta tipicamente de grãos (como o milho) e por isso são classificadas como granívoras, embora as galinhas de "terreiro" ou "caipiras" possam até ser onívora pelo fato de se alimentarem de diversos tipos de alimentos que lhes são oferecidos pelo criador. Se estivéssemos falando de um FALCONIFORME que pode predar pintainhos em terreiros, seu principal órgão preensor seria o par de garras que são curvas e pontudas e seu bico apresenta um "dente" que serve para devorar a presa. Pelo exposto podemos, até certo ponto, imaginar o tipo de alimento pela característica do bico e do aparelho digestivo que se segue à cavidade oral. As galinhas, quando se alimentam de grãos, o fazem com rapidez e desta forma o tempo que o alimento permanece na cavidade oral é curto e assim denominamos "tempo bucal zero". A deglutição na galinha é feita com a ajuda de um movimento de cabeça, jogando- a para frente, o que desloca o grão para trás e, a partir daí, o grão segue em direção ao papo por movimentos peristálticos; devemos nos recordar que a tomada de água também é feita de modo especial, pois, a galinha ingere a água com a valva inferior do bico e em seguida "olha" para cima para que a água desça por gravidade (não há ingestão como no homem ou no cão). A cavidade oral das galinhas é muito ampla e não apresenta limites precisos pela ausência do palato mole. Outra característica é o palato duro apresentar uma fenda longitudinal (normal). Talvez tal comunicação esteja relacionada com a ventilação pulmonar forçada para termorregulação (polipneia térmica das aves) que é feita com o bico aberto. O processo digestivo na boca é quase inimaginável, pois, com tempo bucal zero não deve haver digestão como no homem. Há diversos autores que não confirmam a presença de uma a-amilase (ptialina), enquanto outros dizem que sua presença é mínima

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DIGESTÃO NAS AVES

O processo digestivo nas aves é bastante complexo se formos analisar a grande variedade de espécies de aves

existentes em nosso planeta. Entretanto um dos pontos importantes em medicina veterinária é o estudo,

basicamente, das aves domésticas e em especial o gênero Gallus ao qual pertencem galos e galinhas domésticas.

O fato se reveste de grade importância por ser o Brasil o segundo maior exportador de frangos entre os países

produtores. De qualquer forma sempre que houver necessidade de comparações fisiológicas iremos citar aves que

não são necessariamente as galinhas domésticas.

Inicialmente devemos nos reportar à cavidade bucal das aves e em especial à preensão dos alimentos pelo bico. Ao

analisarmos o bico de uma ave já podemos ter em mente que tipo de alimento ela costuma ingerir e de que forma o

faz. Comparemos o bico de um TROCHILIDAE (beija-flor), e de uma galinha. Um beija-flor tem seu bico fino e

alongado (provavelmente com variações, pois, há 319 espécies) que serve para captar o seu alimento em flores

como os hibiscos, o que seria muito difícil para aves com bicos curtos. Uma galinha tem seu bico curto com a valva

superior um pouco mais longa do que a inferior e se alimenta tipicamente de grãos (como o milho) e por isso são

classificadas como granívoras, embora as galinhas de "terreiro" ou "caipiras" possam até ser onívora pelo fato de se

alimentarem de diversos tipos de alimentos que lhes são oferecidos pelo criador. Se estivéssemos falando de um

FALCONIFORME que pode predar pintainhos em terreiros, seu principal órgão preensor seria o par de garras que

são curvas e pontudas e seu bico apresenta um "dente" que serve para devorar a presa. Pelo exposto podemos, até

certo ponto, imaginar o tipo de alimento pela característica do bico e do aparelho digestivo que se segue à cavidade

oral.

As galinhas, quando se alimentam de grãos, o fazem com rapidez e desta forma o tempo que o alimento permanece

na cavidade oral é curto e assim denominamos "tempo bucal zero". A deglutição na galinha é feita com a ajuda de

um movimento de cabeça, jogando-a para frente, o que desloca o grão para trás e, a partir daí, o grão segue em

direção ao papo por movimentos peristálticos; devemos nos recordar que a tomada de água também é feita de modo

especial, pois, a galinha ingere a água com a valva inferior do bico e em seguida "olha" para cima para que a água

desça por gravidade (não há ingestão como no homem ou no cão).

A cavidade oral das galinhas é muito ampla e não apresenta limites precisos pela ausência do palato mole. Outra

característica é o palato duro apresentar uma fenda longitudinal (normal). Talvez tal comunicação esteja relacionada

com a ventilação pulmonar forçada para termorregulação (polipneia térmica das aves) que é feita com o bico aberto.

O processo digestivo na boca é quase inimaginável, pois, com tempo bucal zero não deve haver digestão como no

homem. Há diversos autores que não confirmam a presença de uma a-amilase (ptialina), enquanto outros dizem que

sua presença é mínima e não teria ação, pois, alimentos granulados e revestidos de celulose não poderiam ser

digeridos por uma amilase, além do tempo bucal ser curto. Assim, a saliva teria apenas uma função mecânica, ou

seja, lubrificação da cavidade oral, umectação do alimento, lubrificação do esôfago, eliminação de substâncias

diversas passadas pela corrente sanguínea e outras.

Inglúvio (ou papo) - O papo é um divertículo do esôfago e pode ser considerado um pré-estômago (como em

ruminantes) e serve para receber o material proveniente da cavidade oral. Pode ser bem desenvolvido nas aves

granívoras (como nas galinhas no pato e no pombo), mas, também pode ser rudimentar ou estar ausente em outras

aves (como aves carnívoras), dependendo de sua maior ou menor função, que no caso é armazenamento de grãos

ou folhas (aves folhívoras). No caso do armazenamento de grãos (galinhas) os alimentos sofrem um amolecimento

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durante sua permanência o que facilitará sua digestão posterior. Após um período variável dentro do papo, este

inicia movimentos peristálticos (vagais) dirigindo os grãos para o proventrículo (estômago verdadeiro). No interior do

papo não há nenhuma secreção digestiva própria e qualquer fenômeno bioquímico de desdobramento poderá

ocorrer por conta de enzimas vindas de fora com os alimentos ou de microrganismos ingeridos com alimentos. Há

autores que apontam alguma digestão amilácea por conta da amilase salivar (que é pouca). Quanto à absorção,

durante muito tempo se considerou o papo como incapaz de absorver qualquer substância. Entretanto, hoje se

admite a absorção de substâncias nutritivas e de baixo peso molecular como ácido lático, AGVs, álcool e outras.

Pode haver pequena hidrólise de sacarose com absorção mínima ou duvidosa.

Leite de papo ou "leite de pombo" - Existem aves que produzem uma secreção nutritiva por ocasião da reprodução

com finalidade de alimentar os filhotes. Trata-se de uma descamação da mucosa do órgão e foi denominada leite de

papo. Tal produto é estimulado pela prolactina (hipofisária) e tal produto serve para ser regurgitado no bico dos

filhotes enquanto não podem deixar os ninhos em busca de alimento. O leite de papo apresenta cerca de 12,5% de

proteína ; 8,6% de lipídios; 1,4% de minerais e o restante está representado pela água.

Pró-ventrículo - O pró-ventrículo é o estômago verdadeiro das aves e corresponde ao estômago dos carnívoros. É

controlado pelo nervo vago e secreta o HCl, a pepsina, a gastrina (pouco conhecida sua função nas aves) e o muco

nas aves. Dependendo da ave, o pH pode variar o que também pode afetar a transformação do pepsinogênio em

pepsina. Tendo em vista que as pepsinas não são exatamente iguais, cada ave pode funcionar com sua pepsina em

diferentes valores de pH. Já existem trabalhos mostrando que o pepsinogênio do pato tem 374 aminoácidos e

enquanto que a pepsina tem 324. Seu pH ótimo está em torno de 4.0 e será inativado quando o pH atingir 9.6 .

Normalmente este compartimento está bastante desenvolvido em aves carnívoras e, rudimentar em aves granívoras.

Assim, ele é pequeno no pato, pombo e galinha e grande em albatroz e gaivotas (exemplos). Histologicamente se

diz que o proventrículo só apresenta um tipo celular (oxintico-pépticas) e que seriam responsáveis pelas secreções

gástricas (HCl, pepsina e muco). O pH nas carnívoras tende a ser mais baixo do que nas granívoras. Alguns

exemplos de pH são dados a seguir: galinhas-4.8; faisão-4,7; pombo-1.4; pato-3.4; perus-4.7.

Nas aves carnívoras o pH pode ser mais baixo (3.0) e há citações de até 2.6.

Moela (ou ventrículo) - A moela representa o que se denominou estômago mecânico das aves pelo fato de não

apresentar sucos digestivos próprios e fazer a digestão dos grãos, previamente amolecidos no papo, através da

pressão exercida por seus potentes músculos. A pressão pode atingir entre 100-150 Torr (na galinha) ou 180 Torr

(nos patos) e com isso comprimir os grãos, fazendo uma verdadeira "moagem" dos mesmos; para isso a moela

ainda conta com a presença de "pedriscos" no seu interior o que ajuda a trituração. Tais pedriscos penetram no

aparelho digestivo quando as aves fazem a preensão de seus alimentos e podem chegar a 10 gramas nos patos; só

não se tem ideia formada se a ingestão é voluntária ou acidental. Normalmente a ingestão só é feita por aves em

regime "aberto", ou seja, aves silvestres ou domésticas que estão soltas. Os pintos criados em sistema fechado não

necessitam de tais pedriscos, pois sua ração (inicial) é um farelo e não necessita de trituração. A moela apresenta

contrações musculares rítmicas a cada 2 ou 3 minutos e duram em média 20 a 30 segundos. O pH da moela varia

de 2.0 a 3.5, mas, isto não quer dizer que seja por secreções locais e sim porque o material ácido provém do

proventrículo (que fica situado próximo e antes da moela). Nas aves carnívoras a moela não necessita ser bem

desenvolvida, pois, sua alimentação não é feita à base de grãos.

Intestino delgado - O intestino delgado das aves está dividido em duodeno, íleo superior e íleo inferior. Na realidade

o íleo superior é o jejuno dos carnívoros e tal divisão parece obedecer (nas aves) a uma transição pouco nítida entre

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os dois segmentos. No duodeno desembocam os canais biliares e pancreáticos. Em geral o intestino das aves é

relativamente bem mais curto do que o dos mamíferos e ainda ocorrem diferenças entre aves granívoras e

carnívoras; o intestino das herbívoras e granívoras é mais longo do que o das carnívoras, e pelo que se deduz a

digestão de vegetais (celulose) é mais lenta dos que as proteínas; as vilosidades das carnívoras são mais

desenvolvidas do que as das herbívoras.

Com relação às glândulas anexas há citações de que o suco pancreático só está completo cerca dos sete dias de

nascidos (pintos) e a bile só preenche a vesícula biliar aos 28 dias após o nascimento. Outra citação sobre a bile é a

presença de amilase na mesma (em galinhas) o que não foi descrito em outros animais, como os mamíferos.

Intestino grosso - Este segmento apresenta uma grande variedade entre as aves pelo fato de poder existir um único

ceco, dois cecos, ceco rudimentar ou ausente e ceco bem desenvolvido, de acordo com a espécie. Nas galinhas,

pombos e patos o ceco é duplo e bem desenvolvido, sendo que no gênero Gallus o ceco pode ter em média 15 cm

em aves adultas. No final do intestino delgado há uma entrada para os dois cecos e estão separados por válvulas

que controlam a entrada do alimento para o ceco bem como seu retorno para passar ao segmento posterior que é

colon-reto (lembrar que o ceco é um segmento "cego" - sem saída). O colon-reto é o segmento final do intestino

grosso e desemboca na cloaca, não havendo distinção para dividi-lo em dois segmentos (colon e reto) como nos

mamíferos. Os cecos servem para absorção de água, digestão da fibra bruta (celulose e ainda a lignina que pode

ser utilizada entre 10 e 40% do total) além da síntese de vitaminas do complexo B e vitamina K. Ao final do intestino

grosso ainda encontramos a cloaca que recebe ductos deferentes (macho), oviduto (fêmea em postura), fezes,

ureteres (que podem vir direto dos rins - galinha) ou a partir da bexiga (como na avestruz). Há ainda sobre a cloaca

a bolsa (bursa) de Fabrício, responsável pelos chamados linfócitos B.

FISIOLOGIA DO SISTEMA DIGESTIVO DAS AVES

Anatomia do canal alimentar

O canal alimentar das aves diferencia-se daquele dos mamíferos pela presença de um papo no esôfago e pela existência de um estômago muscular, a moela. A boca e a faringe não são bem delimitadas na ave e, na maioria das espécies, não existe o palato mole. O palato duro comunica-se com as cavidades nasais. Aves não possuem dentes; suas funções são realizadas pelo bico córneo e pela moela, havendo uma grande variedade de adaptações do bico e da língua. As glândulas salivares e papilas gustativas estão presentes em número e localização variáveis. As dimensões do trato digestivo variam consideravelmente entre as espécies, dependendo dos hábitos alimentares. Nas espécies de maior altura, o comprimento do trato pode alcançar 210 cm ou mais. O esôfago das aves é comparativamente longo e de maior diâmetro, sendo mais largo nas espécies que deglutem pedaços maiores de alimento. O papo é uma dilatação do esôfago que está presente na maioria das espécies, com exceção das corujas e das espécies que se alimentam de insetos. O estômago glandular, ou pró-ventrículo, funciona primordialmente como órgão de secreção, embora também possa ter uma ação de armazenamento nas aves que não têm papo e em algumas espécies que se alimentam de

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peixes. O estômago muscular é adaptado para a trituração nas espécies que ingerem alimentos duros, ou para misturar as secreções digestivas com o alimento, nas espécies carnívoras. Na maioria das espécies carnívoras, o estômago muscular compõe-se de dois pares musculares denominados músculos intermediários e músculos laterais ou, para seguir nomenclatura mais recente, músculos pares grosso e fino, Respectivamente. Esses pares de músculos não estão presentes na maioria das aves carnívoras. O intestino delgado das aves tem um duodeno semelhante ao dos mamíferos, mas além do duodeno não existem áreas delimitadas como o jejuno ou o íleo dos mamíferos. O vestígio do saco vitelínico (divertículo de Meckel) pode ser encontrado mais ou menos na metade do intestino delgado. O intestino delgado é muito mais longo nas aves herbívoras do que nas carnívoras, sendo que a sua mucosa é semelhante à dos mamíferos, exceto que as vilosidades são comumente mais altas, mais delgadas e mais numerosas nas aves. As glândulas de Brünner estão ausentes nos galináceos, embora em algumas espécies estejam presentes glândulas tubulares homólogas à glândula de Brünner dos mamíferos. A microscopia eletrônica das vilosidades da galinha revela uma rede bem definida de capilares sanguíneos, mas não de vasos quilíferos. Localizado na junção dos intestinos grosso e delgado estão os cecos que, nas aves, em geral são em número par, ao contrário dos mamíferos. Suas dimensões são influenciadas pelos hábitos alimentares e não estão presentes em todas as espécies. O intestino grosso das aves é relativamente curto e não é bem demarcado em reto e cólon, como nos mamíferos. Outro órgão importante para a digestão é o fígado. Este órgão é bilobado e relativamente grande na maioria das aves. O ducto hepático esquerdo comunica-se diretamente com o duodeno, enquanto o ducto direito envia um ramo para a vesícula biliar, ou pode dilatar-se localmente como uma vesícula biliar. A vesícula biliar está presente na galinha, no pato e no ganso, mas não em todas as espécies de aves. Ela dá origem aos ductos biliares que se esvaziam no duodeno, próximo a alça distal. O pâncreas fica na alça duodenal, consistindo de, no mínimo, três lobos; suas secreções atingem o duodeno através de três ductos.

Regulação da ingestão de alimentos

Nas aves, como nos mamíferos, os centros hipotalâmicos estão envolvidos no controle do apetite. As lesões hipotalâmicas ventro-mediais produzem hiperfagia e as lesões laterais resultam em afagia. Alguns outros fatores afetam a ingestão de alimentos. Altas temperaturas ambientais, altos níveis energéticos ou proteicos na dieta resultam em diminuição no consumo de alimento. Baixas temperaturas ambientais, a muda de penas e a produção de ovos aumentam a ingestão de alimentos. Se uma dieta tem altos níveis proteicos e baixos níveis energéticos, o consumo de alimentos, em volume, aumentará acima dos níveis normais. Aparentemente, o nível energético de uma dieta é um regulador mais importante da ingestão de alimentos do que o seu conteúdo proteico. As galinhas são, entretanto, capazes de escolher entre as dietas isocalóricas com diferentes teores de proteína; elas mostraram preferir uma dieta com 16% de proteína àquelas com 8, 12 ou 23%. Os pintos também são capazes de escolher dietas com teor adequado de metionina em lugar daquelas com deficiência ou excesso da mesma. Injeções de colecistocinina, normalmente encontrada em vísceras e no cérebro, afetam o apetite, causando diminuição na ingestão de alimentos.

Deglutição e motilidade esofagiana e do papo

A extensão do pescoço e o levantamento da cabeça aparentemente desempenham um papel secundário na deglutição em aves. A língua, o aparelho hioide e a laringe deslocam ativamente o alimento ou líquidos para dentro do esôfago. A estimulação da faringe ou da língua pelo alimento resulta no fechamento reflexo da glote e das coanas. O alimento desloca-se através do esôfago pelo peristaltismo. Supõe-se que o estágio do ciclo de contração gástrica, no momento em que uma porção de alimento é deglutida, seja um fator determinante da ida do alimento ingerido para o papo ou para o estômago. O movimento do bolo alimentar do papo para o estômago, posteriormente, parece ser controlado de maneira reflexa pelo estado de

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enchimento do estômago e dos intestinos. O ritmo é dado pelas ondas peristálticas do papo que variam consideravelmente e são influenciadas pelo estado nervoso da ave e por outros fatores.

Motilidade gastroduodenal

Um ciclo de contrações rítmicas pode ser observado no estômago muscular, mesmo na ausência de inervação extrínseca. Essa ritmicidade inata parece ser neurogênica. As contrações do estômago glandular e do duodeno também dependem de conexões neurais intrínsecas com o estômago muscular. Nos estômagos muscular e glandular dos galináceos ocorrem duas a três contrações por minuto. Fome ou jejum diminuem a frequência das contrações gástricas em galináceos, cuja duração tende a aumentar; as últimas diminuem quando são ingeridos alimentos fibrosos ou grosseiros. A presença de grãos de areia na moela aumenta a amplitude das contrações. O esôfago, o papo, o pró-ventrículo e a moela são inervados pelo vago, um nervo parassimpático que é o principal nervo motor para estes órgãos, e pelas fibras simpáticas. A estimulação da terminação periférica do vago aumenta a motilidade e sua ligadura, particularmente a do vago esquerdo, diminui a motilidade. Grãos de areia estão normalmente presentes no estômago muscular da maioria das aves herbívoras e graminívoras. São usados para triturar alimentos duros entre os músculos grossos do estômago muscular. Os grãos não parecem ser essenciais para a digestão normal, mas a digestão de alimentos duros é mais lenta e a digestibilidade total dos alimentos pode estar diminuída sem sua presença. Grãos são ingeridos regularmente, mas se não houver alimento disponível, podem ser retidos mais tempo no estômago muscular.

Motilidade do íleo, cólon e ceco

Pouco é conhecido sobre a motilidade do íleo nas aves. O peristaltismo e as contrações segmentares foram observados por meio de radiografias. A característica mais notável da motilidade do cólon é o antiperistaltismo, que se acredita ocorrer quase continuamente. Essa atividade parece ter duas funções:• movimento da urina da cloaca para o cólon e ceco, para a absorção da água;• enchimento do ceco. As contrações antiperistálticas se originam na cloaca e ocorrem a uma frequência de dez a quatorze por minuto em galinhas e perus. O movimento antiperistáltico cessa imediatamente antes da defecação, durante a qual todo o cólon parece contrair-se simultaneamente. Os bolos fecais do ceco da maioria das espécies de aves podem ser distinguidos facilmente por sua cor marrom achocolatada e textura homogênea. Uma ou duas defecações cecais diárias ocorrem nas espécies de galináceos, enquanto que vinte e cinco a cinquenta defecações intestinais são produzidas. Um ritmo diurno na motilidade do ceco acontece com maior frequência de contrações diárias (cerca de uma contração por minuto), ocorrendo no fim da tarde; a frequência mais baixa (cerca de meia contração por minuto) ocorre logo após o desligamento das luzes no aviário. O tempo necessário para que o alimento passe por todo canal alimentar geralmente é maior nas espécies herbívora e menor nas carnívoras e frugívoras. A velocidade da passagem pode ser influenciada pela resistência, pela consistência, e pelo conteúdo de água dos alimentos, além da quantidade consumida. Aparentemente, a idade da ave também pode influenciar a velocidade da passagem, já que o alimento passa pelo trato digestivo dos pintos e aves jovens mais rápido do que nos adultos. Duas horas e meia após a digestão de um contraste de óxido de cromo pela galinha, este pode ser detectado nas excretas e maior parte pode ser recuperada em aproximadamente vinte e quatro horas. A excreção cecal do marcador pode, entretanto, ser detectada dois a três dias após a ingestão do mesmo.

Secreção e digestão

Trata-se inicialmente dos processos preliminares do processo digestivo, que ocorrem na boca, no papo e no esôfago. O número e a organização das glândulas salivares variam entre as

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espécies. Em geral as espécies que utilizam alimentos úmidos têm menos glândulas que aquelas que ingerem alimentos secos com pouca lubrificação natural. As glândulas salivares da maior parte das aves têm apenas células de secreção mucosa; entretanto, têm sido notificadas células serosas em umas poucas espécies e a amilase foi encontrada na saliva de aves domésticas. Mesmo que a amilase esteja presente na saliva, pouco da digestão ocorrerá na boca. Da mesma forma, o alimento passa rapidamente através do esôfago, cuja principal secreção é o muco para a lubrificação desta passagem. O muco também é secretado pelo papo da galinha, que pode ainda secretar amilase. A amilase encontrada no papo ou na mucosa do mesmo, entretanto, pode ter se originado das glândulas salivares, do alimento ingerido, das bactérias do papo, dos conteúdos duodenais regurgitados ou da própria mucosa do papo. A etapa seguinte da digestão ocorre no estômago. Dois tipos de glândulas predominam no estômago glandular: as mucosas simples, que secretam muco, e as compostas, que secretam, além do muco, ácido clorídrico e pepsinogênio. Embora o suco gástrico seja secretado pelo estômago glandular, a proteólise ácida preliminar ocorre em sua maior parte no estômago muscular. A digestão mecânica também ocorre predominantemente neste órgão na maioria das espécies. O pH do suco gástrico é muito baixo, variando entre 0,5 a 2,5. A acidez é menos pronunciada nas espécies onívoras e herbívoras do que nas carnívoras e é apropriada para uma eficiente atividade péptica. Os valores de pH gástrico também variam consideravelmente, dependendo do método de coleta e análise do suco gástrico e do apetite da ave. A galinha secreta cerca de 8,8 ml de suco gástrico por hora, para cada quilo de peso corporal. A concentração de ácido é mais elevada e o conteúdo de pepsina é mais baixo do que na maioria dos mamíferos. O revestimento do estômago muscular das aves é formado tanto pela atividade secretora das glândulas cilíndricas como pela retenção de células epiteliais descamadas e outros fragmentos. O revestimento é periodicamente substituído na maioria das espécies, sendo mais espesso nas espécies que ingerem alimentos duros do que naquelas que ingerem alimentos macios.A etapa final da digestão ocorre no intestino delgado, que é o local primário da digestão química. Algumas enzimas digestivas são secretadas por suas células. A mucosa intestinal possui atividade proteolítica em galinhas, tendo sido encontradas aminopeptidases e carboxipeptidases na mucosa duodenal. A amilase intestinal foi encontrada em galinhas e a maltase e sacarase de origem intestinal foram encontradas em outras espécies. A atividade da esterase intestinal também foi observada. O pH intestinal varia tipicamente entre 5,6 e 7,2. O pH do trato intestinal das aves aumenta da extremidade oral para a aboral, e o pH de cada porção do trato é regulado pela atividade secretora. Valores de pH entre 6 a 8 são considerados ideais. A produção bacteriana dos metabólitos ácidos diminui o pH no papo, ceco e cólon. A digestão de nutrientes no intestino é resultado da atividade microbiana, das enzimas pancreáticas e das secreções intestinais. O pâncreas secreta enzimas digestivas e uma solução aquosa contendo compostos tamponados. Esta última secreção atua neutralizando o quimo ácido gástrico, assegurando um pH entre 6 e 8. O pâncreas é a fonte principal de amilase e a atividade amilolítica pancreática foi observada em várias espécies de aves. A presença da lípase pancreática foi verificada em galinhas e provavelmente está presente em outras espécies. A secreção de bile no duodeno ajuda na neutralização do quimo. Os sais biliares são necessários para a emulsificação de gorduras. Nas galinhas, como nos mamíferos, os sais biliares são reabsorvidos no íleo inferior e retornam ao fígado, para serem reaproveitados. A amilase está presente na bile de várias espécies.

Funções dos cecos

Apenas cerca de 10% da maioria das dietas ingeridas pelos galiformes recebe ação cecal. Apesar disso, acredita-se que várias funções importantes ocorram no ceco, a mais notável delas sendo a digestão microbiana da celulose. Galiformes silvestres aparentemente obtêm uma proporção significativa de suas necessidades diárias de energia a partir da fermentação bacteriana das fibras, especialmente durante o inverno, quando estão disponíveis apenas alimentos de baixa qualidade. Embora as galinhas domésticas em geral sejam consideradas menos capazes neste aspecto, essa hipótese pode ter surgido principalmente porque, na maioria dos estudos, não

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foram usadas dietas com alto teor em fibras antes do estudo experimental da função cecal em aves domésticas. Tais dietas deveriam estimular o desenvolvimento de uma flora cecal mais capacitada para o desdobramento de fibras. Galos silvestres em cativeiro, alimentados com rações comerciais, são menos capazes de digerir dietas naturais do que outros da mesma espécie em liberdade. A urina vai da cloaca para o cólon, do qual pode passar para o ceco. A absorção de água dos conteúdos cecais parece ser a principal função do ceco. A síntese microbiana de vitaminas também ocorre no ceco, mas as vitaminas aparentemente não são absorvidas pelo hospedeiro. Sintomas de deficiências vitamínicas, entretanto, não foram menos severos nas aves criadas convencionalmente, indicando que elas obtiveram pouco benefício das vitaminas sintetizadas por seus microorganismos cecais.

Absorção de nutrientes

A absorção de nutrientes nos intestinos das galinhas é bem conhecida. O íleo superior é o local mais importante para a absorção de produtos finais dos carboidratos, proteínas e lipídios digeridos. Sais biliares são absorvidos amplamente no íleo inferior e os produtos do metabolismo das proteínas endógenas são absorvidos primordialmente na metade inferior do íleo. A absorção da D-glicose, da D-galactose, da D-xilose, da 3-metilglicose, ∝-metilglicosídico e, possivelmente, da D-frutose, é ativa. Sete outros monossacarídeos são, aparentemente, transportados de forma ativa. As galinhas possuem um sistema transportador móvel dependente de sódio para transporte ativo de açúcares similar ao dos mamíferos. Este sistema torna-se funcional antes da eclosão. A capacidade máxima de absorção de glicose, entretanto, parece ser atingida dentro da primeira semana de vida, decrescendo a partir desta idade. Os aminoácidos também são transportados pelos processos mediados por transportadores em aves. O transporte não parece diminuir com a idade. Em aves, como em mamíferos, a maioria dos produtos proteicos são absorvidos como peptídeos, mas aparecem no sangue mesentérico como aminoácidos. Os aminoácidos neutros são transportados mais rapidamente do que os aminoácidos ácidos ou básicos. Deve haver mais de um sistema de transporte para cada tipo de aminoácido (neutro, básico ou ácido) e um único aminoácido pode usar mais de um sistema de transporte. Por exemplo, o ácido glutâmico pode ser transportado tanto por difusão como por uma via mediada por transportadores; enquanto o transporte intestinal da cistina ocorre apenas por este último processo. Os aminoácidos levados pelo mesmo sistema de transporte, entretanto, contribuem para a inibição do transporte um do outro. A taxa de absorção in vivo de L-aminoácidos não depende do seu peso molecular. Os aminoácidos com grandes cadeias laterais apolares, como a metionina, a valina e a leucina, são absorvidos mais rapidamente do que aqueles com cadeias laterais polares. Através da determinação da concentração de glicose e nitrogênio amino no sangue venoso portal e da veia ilíaca, pode-se verificar que, quinze minutos após a ingestão de alimento, há uma concentração significativamente maior destas substâncias no sangue portal, indicando altas atividades de digestão e de absorção. Aparentemente, a quantidade de gordura digerida e absorvida nas aves e nos mamíferos é semelhante. Os processos de absorção são, entretanto, diferentes entre as duas classes de vertebrados. Nos mamíferos, a gordura é absorvida nos vasos quilíferos das vilosidades, enquanto que nas aves as gorduras são absorvidas diretamente no sangue. Aproximadamente 80 a 95% dos ácidos graxos são absorvidos, mas os pintos recém-nascidos absorvem com menos eficiência.