aula5 principios infra

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PROF. LUIZ DELLORE MACKENZIE INTRODUÇÃO AO PROCESSO CIVIL Princípios processuais infraconstitucionais (capítulo 8 do Teoria Geral do Processo Civil - Carvalho, Caraciola, Assis e Dellore) * Princípio dispositivo / da inércia / da demanda Em latim, “ne procedat judex ex officio” . Princípio pelo qual o Poder Judiciário é inerte, as partes é que dispõem da possibilidade de ingressar em juízo. Assim, ninguém poderá ser compelido a ingressar em juízo para proteger seus direitos. Se alguém não quiser ingressar em juízo, não pode ser obrigado a fazê-lo ou não pode o juiz fazê-lo de ofício. Em suma, pode a parte dispor de seu direito de ingressar em juízo. O princípio está positivado em dois artigos do CPC: “Art. 2 o Nenhum juiz prestará a tutela jurisdicional senão quando a parte ou o interessado a requerer, nos casos e forma legais”. “Art. 262. O processo civil começa por iniciativa da parte, mas se desenvolve por impulso oficial”. O art. 262 traz também o denominado princípio do impulso oficial : uma vez provocado o Judiciário (retirado da inércia), os demais atos em regra não necessitam de provocação; o processo prossegue de ofício. Exceções: art. 267, II (processo parado por 1 ano) e III (autor abandona a causa por 30 dias). A base do princípio dispositivo é a imparcialidade do juiz. Porém, existem algumas exceções: “CPC, art. 989: O juiz determinará, de ofício, que se inicie o inventário, se nenhuma das pessoas mencionadas nos artigos antecedentes o requerer no prazo legal”. Há autores que separam o princípio dispositivo (possibilidade de produzir prova ou não) do princípio da disponibilidade processual (possibilidade de ingressar ou não em juízo) 1 . 1 ADA, DINAMARCO e CINTRA, Teoria geral do processo. Página 1 de 9

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Aula de princípios infra constitucionais para concursos

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1 SOCIEDADE E DIREITO

Prof. Luiz Dellore

Mackenzie Introduo ao Processo Civil

Princpios processuais infraconstitucionais(captulo 8 do Teoria Geral do Processo Civil - Carvalho, Caraciola, Assis e Dellore)

* Princpio dispositivo / da inrcia / da demanda

Em latim, ne procedat judex ex officio. Princpio pelo qual o Poder Judicirio inerte, as partes que dispem da possibilidade de ingressar em juzo.

Assim, ningum poder ser compelido a ingressar em juzo para proteger seus direitos. Se algum no quiser ingressar em juzo, no pode ser obrigado a faz-lo ou no pode o juiz faz-lo de ofcio. Em suma, pode a parte dispor de seu direito de ingressar em juzo.

O princpio est positivado em dois artigos do CPC:

Art. 2o Nenhum juiz prestar a tutela jurisdicional seno quando a parte ou o interessado a requerer, nos casos e forma legais.

Art. 262. O processo civil comea por iniciativa da parte, mas se desenvolve por impulso oficial.

O art. 262 traz tambm o denominado princpio do impulso oficial: uma vez provocado o Judicirio (retirado da inrcia), os demais atos em regra no necessitam de provocao; o processo prossegue de ofcio. Excees: art. 267, II (processo parado por 1 ano) e III (autor abandona a causa por 30 dias).

A base do princpio dispositivo a imparcialidade do juiz. Porm, existem algumas excees:

CPC, art. 989: O juiz determinar, de ofcio, que se inicie o inventrio, se nenhuma das pessoas mencionadas nos artigos antecedentes o requerer no prazo legal.

H autores que separam o princpio dispositivo (possibilidade de produzir prova ou no) do princpio da disponibilidade processual (possibilidade de ingressar ou no em juzo).

Ligado a este aspecto probatrio h o princpio do livre convencimento motivado (cf. infra), o aumento dos poderes instrutrios do juiz e a dicotomia verdade formal (a verdade constante dos autos) x verdade real (aquilo que efetivamente ocorreu, sendo possvel ao juiz ir atrs de mais fatos alm daqueles constantes dos autos do processo).

Assim, se as partes no requerem a produo de determinada prova, pode o juiz determinar sua produo de ofcio?

Em uma primeira anlise, haveria violao ao princpio dispositivo e, inclusive, o juiz deixaria de lado sua imparcialidade. Porm, em relao produo de provas, verifica-se uma tendncia de se buscar a verdade real (e no apenas a verdade formal), com uma conseqente mitigao do princpio dispositivo e majorao dos poderes instrutrios do magistrado.

Dispe o art. 130 do CPC que:

Art. 130. Caber ao juiz, de ofcio ou a requerimento da parte, determinar as provas necessrias instruo do processo, indeferindo as diligncias inteis ou meramente protelatrias.

Decorre ainda do princpio dispositivo o denominado princpio da congruncia.

Se o Judicirio somente pode se movimentar se provocado pela parte (princpio dispositivo), certo que tal poder tampouco pode conceder algo alm do que foi pleiteado pela parte.

Este o princpio da congruncia ou da adstrio do juiz ao pedido que, portanto, veda a prolao de sentena extra ou ultra petita.

positivado em dois artigos do CPC:

Art. 128. O juiz decidir a lide nos limites em que foi proposta, sendo-lhe defeso conhecer de questes, no suscitadas, a cujo respeito a lei exige a iniciativa da parte.

Art. 460. defeso ao juiz proferir sentena, a favor do autor, de natureza diversa da pedida, bem como condenar o ru em quantidade superior ou em objeto diverso do que Ihe foi demandado.* Princpio do livre convencimento motivado do juiz

Tambm denominado de princpio da livre convico ou da persuaso racional, regula a avaliao das provas existentes nos autos.

A partir deste princpio, o juiz no est vinculado a qualquer prova em especfico, mas ao conjunto probatrio como um todo.

Portanto, no existem as provas tarifadas, em que uma vale mais que a outra (o denominado regime da prova legal). Tanto assim que o juiz no est vinculado concluso do perito no laudo pericial (CPC, art. 436).

Contudo, h hipteses de provas tcnicas de alta confiabilidade em que muito difcil, ao magistrado, afastar-se da prova. Basta imaginar, em uma investigao de paternidade, um exame de DNA.

Porm, o princpio no o do livre convencimento do juiz. O limite exatamente a necessidade de motivao (vale aqui lembrar do constitucional princpio da motivao CF, art. 93, IX).

Assim, deve o juiz motivar na sentena a opo por determinadas provas na formao de sua convico, levando em conta tambm as regras legais e mximas de experincias (CPC, arts. 334 e 335).

O princpio previsto no art. 131 do CPC:

Art. 131. O juiz apreciar livremente a prova, atendendo aos fatos e circunstncias constantes dos autos, ainda que no alegados pelas partes; mas dever indicar, na sentena, os motivos que Ihe formaram o convencimento.* Princpio da oralidade e seus sub-princpios

O conceito de oralidade pode ser entendido como:

(i) modo de realizao dos atos do processo, quando so eles verbalmente concretizados (atos orais no basicamente os realizados em audincia);

(ii) em sentido mais amplo, como princpio processual (o qual, inclusive, acarreta a existncia de outros subprincpios).

A lgica do princpio da oralidade possibilitar e estimular a realizao dos atos processuais de forma verbal, com o desiderato de:

a) aproximar o juiz das partes e das provas (princpio da imediatidade CPC, art. 446, II);b) reduzir a instruo a um nmero mnimo de audincias (audincia uma) e a um pronto julgamento (princpio da concentrao CPC, art. 455 e 456); e

c) determinar que esse juiz que produziu a prova julgue a causa (princpio da identidade fsica do juiz CPC, art. 132).

Em virtude da realidade brasileira, o princpio da oralidade vem perdendo muita fora, na legislao e na jurisprudncia.

Neste sentido, basta verificar a evoluo do art. 132 do CPC (princpio da identidade fsica).

A redao original era a seguinte:

Art. 132. O juiz, titular ou substituto, que iniciar a audincia, concluir a instruo, julgando a lide, salvo se for transferido, promovido ou aposentado; casos em que passar os autos ao seu sucessor. Ao receb-los, o sucessor prosseguir na audincia, mandando repetir, se entender necessrio, as provas j produzidas.

J a atual redao:

Art. 132. O juiz, titular ou substituto, que concluir a audincia julgar a lide, salvo se estiver convocado, licenciado, afastado por qualquer motivo, promovido ou aposentado, casos em que passar os autos ao seu sucessor.

Pargrafo nico. Em qualquer hiptese, o juiz que proferir a sentena, se entender necessrio, poder mandar repetir as provas j produzidas.

* Princpio da economia processual e celeridade

Alguns autores tratam separadamente tais princpios como, mas seus objetivos na verdade so muito prximos.

Quando se fala em princpio da celeridade, a idia um processo que no tenha uma durao prolongada.

Por sua vez, quando se fala em princpio da economia, a idia um processo econmico no s em relao ao tempo, como tambm recursos humanos, recursos materiais, custos etc.

A preocupao maior envolve o tempo, tanto que atualmente h, constitucionalmente, o princpio da razovel durao do processo (CF, art. 5, inciso LXXVIII).

Exemplos da aplicao do princpio: indeferimento liminar na inicial, quando ausente seus requisitos legais; denegao de provas inteis; permisso da conexo de causas anlogas, para julgamento conjunto; saneamento antes da instruo e julgamento antecipado da lide.

A jurisprudncia acaba tratando os dois princpios de forma anloga:

STJ, RGO JULGADOR: 2T, 3T, 4T, CE

Como requisito de admissibilidade do agravo, a necessidade de autenticao das peas trasladadas para a sua formao, no encontra respaldo na legislao processual, nem se ajusta finalidade do processo como instrumento de atuao da funo jurisdicional do Estado, atritando, inclusive, com os princpios da economia e celeridade.* Princpios relacionados s nulidades

O processo est muito ligado observncia das formas (devido processo legal). E importante que assim seja, para garantir segurana aos litigantes. Contudo, a observncia irrestrita das formas engessa o andamento do processo e acaba por possibilitar a utilizao indevida de expedientes procedimentais para tumultuar o feito.

Assim, para evitar a declarao irrestrita de nulidades, existem alguns princpios, dentre os quais um dos mais relevante o da instrumentalidade das formas, previsto no art. 244 do CPC:

Art. 244. Quando a lei prescrever determinada forma, sem cominao de nulidade, o juiz considerar vlido o ato se, realizado de outro modo, lhe alcanar a finalidade.

A instrumentalidade complementada pela regra de que no se repetir o ato se no houver prejuzo parte (CPC, art. 249, 1o). A sntese desta regra a expresso francesa pas de nullit sans grief.

A base para a instrumentalidade o princpio da liberdade das formas, tambm expressamente previsto no CPC:

Art. 154. Os atos e termos processuais no dependem de forma determinada seno quando a lei expressamente a exigir, reputando-se vlidos os que, realizados de outro modo, lhe preencham a finalidade essencial.

Por sua vez, complementando o sistema principiolgico relacionado s nulidades, h ainda os princpios da causalidade e da conservao.

O primeiro preceitua que, decretada a nulidade de um ato, os que dele decorrerem devem ter tambm a nulidade decretada (CPC, art. 248). J o segundo, na mesma lgica, determina que no h nulidade dos atos que sejam independentes daquele que foi anulado (CPC, art. 250):Art. 248. Anulado o ato, reputam-se de nenhum efeito todos os subseqentes, que dele dependam (...).

Art. 250. O erro de forma do processo acarreta unicamente a anulao dos atos que no possam ser aproveitados, devendo praticar-se os que forem necessrios, a fim de se observarem, quanto possvel, as prescries legais.

* Princpio da lealdade processual

O processo, na sua essncia, dialtico (cf. princpio do contraditrio). Assim, sempre haver manifestao de ambas as partes.

certo que o objetivo do processo pacificar o litgio. Porm, tambm busca o processo a pacificao na sociedade.

tambm certo que a ida ao Judicirio j mostra a existncia de conflito entre as partes, o que muitas vezes significa um grau acentuado de animosidade entre os litigantes.

Contudo, isto no significa muito ao contrrio que o litgio e animosidade das partes torne o processo igualmente um campo de batalha entre os advogados.Portanto, altamente reprovvel, do ponto de vista tico, que haja atuao desleal ou fraudulenta das partes e de seus advogados. E no s das partes e advogados, mas tambm de juzes e demais participantes do processo (perito, serventurios, MP etc.)

Porm, no se trata de algo apenas reprovvel do ponto de vista deontolgico. Tambm processualmente tais atitudes so reprovadas. Aqui que se insere o princpio da lealdade processual.

Como maior traduo deste princpio (mas no a nica), verifica-se a figura da litigncia de m-f, com a aplicao de pena parte que agir deslealmente no processo.

Art. 17. Reputa-se litigante de m-f aquele que:

I - deduzir pretenso ou defesa contra texto expresso de lei ou fato incontroverso;

II - alterar a verdade dos fatos;

III - usar do processo para conseguir objetivo ilegal;

IV - opuser resistncia injustificada ao andamento do processo;

V - proceder de modo temerrio em qualquer incidente ou ato do processo;

VI - provocar incidentes manifestamente infundados;

VII - interpuser recurso com intuito manifestamente protelatrio.

Art. 18. O juiz ou tribunal, de ofcio ou a requerimento, condenar o litigante de m-f a pagar multa no excedente a um por cento sobre o valor da causa e a indenizar a parte contrria dos prejuzos que esta sofreu, mais os honorrios advocatcios e todas as despesas que efetuou.

A aplicao do princpio da lealdade encontra limites em outros princpios processuais, principalmente na ampla defesa, contraditrio e devido processo.* Princpio da vedao da reformatio in pejusNo tocante aos recursos, a regra que o tribunal somente conhecer da matria que for impugnada pela parte recorrente (CPC, art. 515, caput.).

Assim, no possvel que, diante de o recurso de uma das partes, sem a interposio de recurso da outra, haja reforma para pior ou seja, ne reformatio in pejus.

Portanto, o recurso interposto somente pode acarretar a melhora ou manuteno da situao do recorrente mas nunca a piora.

Trata-se de uma decorrncia do princpio dispositivo, do ponto de vista recursal. Afinal, se uma parte no recorreu (permaneceu inerte), no pode se beneficiar do recurso da parte contrria.

O princpio tambm busca evitar que a parte fique receosa em interpor seu recurso, com uma possibilidade de piora de sua situao.

* Outros princpios

Ainda conveniente mencionar outras situaes costumeiramente citados nos Tribunais (reitera-se que, considerando a divergncia, h autores que no consideram estas figuras como princpios).

a) vedao ao venire contra factum proprium- no pode a parte alegar a prpria torpeza (REsp 605687)

b) princpio da segurana jurdica

- o processo no pode surpreender as partes (STJ, AgRg no Ag 406473)c) teoria do fato consumado

- para no causar prejuzo parte, situao ftica consolidada pelo tempo (liminar) deve ser respeitada (REsp 510202)MS. LIMINAR. TRATAMENTO MDICO. EXTERIOR. Na espcie, a recorrida sofria de retinose pigmentar (patologia oftalmolgica) e, como vrios outros, buscou o Judicirio, obtendo liminar contra a Unio para que o SUS custeasse o tratamento em Cuba. Para tanto, recebeu R$ 25.443,43. Nessa poca, a posio jurisprudencial concedia o custeio de tais tratamentos, mas alterou-se diante do parecer tcnico do Conselho de Oftalmologia Brasileiro, que levou o Ministrio da Sade a baixar a Portaria n. 763, proibindo o custeio do tratamento dessa doena no exterior pelo SUS. Ento, a recusa do Poder Judicirio em confirmar a deciso liminar ensejou a Unio a mover ao de cobrana, que foi repudiada, nas instncias ordinrias, ao argumento do fato consumado e irreversibilidade do provimento. Isso posto, para o Min. Relator, o ponto central do aresto recorrido o art. 7 da Lei n. 1.533/1951, que trata especialmente da liminar em mandado de segurana (MS). Ressalta que existe a Sm. n. 405-STF, que d eficcia retroativa revogao superveniente de liminar em MS. Entretanto, podem admitir-se, excepcionalmente, como no caso, os conceitos do fato consumado e da boa-f objetiva no recebimento de valores pagos em carter alimentar e essa postura tem sido adotada em julgados do prprio STF (como quando analisa devoluo pecuniria recebida de boa-f por servidores pblicos e posteriormente declarada inconstitucional), tambm h decises deste Superior Tribunal. Ademais, aplica-se ao caso o princpio da confiana assente no Cdigo Civil alemo e constante do ordenamento jurdico brasileiro como clusula geral, que ultrapassa os limites do CC/2002 (arts. 113, 187 e 422), o que influencia a interpretao do Direito Pblico e a ele chegando como subprincpio derivado da moralidade administrativa, o qual serve de fundamento mantena do acrdo recorrido. Precedentes citados: REsp 353.147-DF, DJ 18/8/2003; MS 8.895-DF, DJ 7/6/2004; REsp 697.768-RS, DJ 21/3/2005; REsp 627.808-RS, DJ 14/11/2005; REsp 955.969-DF, DJ 3/9/2008, e REsp 1.031.356-DF, DJ 10/4/2008. REsp 944.325-RS, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 4/11/2008. ADA, DINAMARCO e CINTRA, Teoria geral do processo.

Grande defensor do princpio foi CHIOVENDA.

Os exemplos so de HUMBERTO THEODORO JR (Curso de Direito Processual Civil, v. 1, 44a ed., p. 35).

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