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As transformações socioespaciais da cultura da soja no Norte do Paraná: o trabalho de campo no ensino da Geografia

SUMIGAWA, Jani Amancio Costa1 CAMPOS, Margarida Cássia2

RESUMO

O objetivo geral deste artigo consiste em apresentar os resultados da intervenção pedagógica realizada em uma instituição da rede pública estadual paranaense no trabalho com a disciplina de Geografia. Enfoca a relevância do trabalho de campo como alternativa metodológica para compreender as transformações socioespaciais da cultura da soja no Norte do Paraná. A metodologia consiste em uma retomada teórica acerca das mudanças provocadas pela soja no espaço rural, bem como da importância do trabalho de campo no desenvolvimento de atividades pedagógicas. Busca ainda refletir sobre o trabalho de campo realizado no Centro Nacional de Pesquisa da Soja (CNPSo) de Londrina, desenvolvido em setembro de 2011 junto a alunos do terceiro ano do Ensino Médio da Escola Estadual “Antônio de Moraes Barros”, situada no município de Londrina, PR. Por fim, ficou comprovada a importância do trabalho de campo na Geografia, como base de pesquisa e da produção do conhecimento geográfico. Palavras-chave: Geografia; soja; impactos socioespaciais

INTRODUÇÃO

Este trabalho foi desenvolvido em atendimento ao Programa de

Desenvolvimento Educacional – PDE, cujo objetivo consiste em proporcionar aos

professores da rede pública estadual subsídios teórico-metodológicos para o

desenvolvimento de ações educacionais sistematizadas, e que resultem em

redimensionamento de sua prática.

Neste estudo, optou-se por trabalhar as transformações sociopespaciais da

cultura da soja no Norte do Paraná.

Dentro desta abordagem, a ênfase foi dada à apropriação do meio natural

pela sociedade, por meio das relações sociais e de trabalho, para a construção de

objetos técnicos que compõem as redes de produção e circulação de mercadorias,

pessoas, informações e capitais, o que tem causado uma intensa mudança na

construção do espaço.

1 Professora de Geografia da rede estadual de Educação do Paraná, participante do PDE/2010. 2 Doutora em Geografia - Professora orientadora da Universidade Estadual de Londrina

2

Nestes termos, os estudos sobre aspectos culturais e demográficos do

espaço geográfico contribuem para a compreensão desse momento de intensa

circulação de informações, mercadorias, dinheiro, pessoas e modos de vida.

Um dos pontos mais discutidos nesta dimensão é a problemática do

êxodo rural, em parte desencadeada pela monocultura da soja, em especial no

Norte do Paraná, cuja mecanização foi responsável pela saída de um grande

contingente de pessoas do campo.

Assim, o estudo deste conteúdo estruturante tem como objetivo

compreender o espaço a partir das relações estabelecidas entre os territórios

institucionais e entre os territórios que a eles se sobrepõem como campos de forças

sociais e políticas. É importante entender as relações de poder que os envolvem e

de alguma forma os determinam.

A metodologia adotada constou, inicialmente, de revisão de literatura, no

intuito de subsidiar o projeto de intervenção didática aplicado em uma turma de

terceiro ano do Ensino Médio. A aplicação da produção didático-pedagógica

elaborada a partir do tema selecionado, em consonância com os conteúdos

estruturantes previstos nas DCE, teve como ponto culminante a realização de um

trabalho de campo junto à Embrapa Soja, localizada no município de Londrina, PR.

Em momento posterior, foram realizadas reflexões sobre a experiência vivenciada e

os alunos elaboraram textos que comprovaram a efetividade deste tipo de

metodologia no ensino de Geografia. Para a elaboração deste artigo, foram

analisados diferentes autores que corroboram a relevância do trabalho de campo

como instrumento de aprendizagem.

A expansão da soja e os impactos socieespaciais no Norte do Paraná

A temática selecionada para a proposição das atividades que deram origem a

este artigo volta-se para o espaço rural, em especial a produção agrícola, tomando-

se como tema a soja, cultura que tem sido amplamente difundida em todas as

regiões brasileiras e que fundou as bases de um Brasil moderno, onde a indústria

expandiu-se para o meio rural, subordinando o campo, modificando um sistema antes de

cunho artesanal para um sistema de base industrial. Nesta dimensão, é importante observar

o que afirma Dall’ Agnol:

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A revolução socioeconômica e tecnológica protagonizada pela Soja no Brasil Moderno pode ser comparada ao fenômeno ocorrido com o ciclo da cana de açúcar, da borracha e do café, que, em distintos períodos dos séculos XVII a XX, comandaram o comércio exterior do país. Avançando sobre novas fronteiras agrícolas na busca de terras abundantes e baratas, milhares de dinâmicos e arrojados produtores de Soja da região sul do Brasil migraram para o despovoado e desvalorizado Cerrado brasileiro, levando desenvolvimento e promovendo a implantação de uma nova cultura na região central do país. Centenas de pequenos povoados nasceram no vazio do Cerrado, transformando-se, ao longo das quatro últimas décadas, em cidades de pequeno, médio e grande porte e valorizando enormemente as terras da região, hoje tão valiosas quanto as da região sul (DALL’ AGNOL,2008, p.10).

Assim, a proposta trazia como escopo desenvolver nos alunos a

compreensão das transformações sócio-espaciais da cultura da soja, por meio de

trabalho integrado entre o estudo do espaço geográfico em sua dimensão

econômica, política, socioambiental e demográfico-cultural, como conteúdos

estruturantes propostos pelas Diretrizes Curriculares do Estado do Paraná.

No que diz respeito à dimensão política, importa considerar a soja como

cultura estratégica para o Estado, como ponto de equilíbrio da balança comercial

brasileira e como instrumento de fomento à industrialização. Da mesma maneira, a

dimensão econômica do espaço geográfico se articula com os demais conteúdos

estruturantes, pois a apropriação da natureza e sua transformação em produtos para

o consumo humano envolvem as sociedades em relações geopolíticas, ambientais e

culturais, fortemente direcionadas por interesses socioeconômicos locais, regionais,

nacionais e globais (PARANÁ, 2008).

Deste modo, o trabalho possibilitou ao aluno a compreensão sócio-histórica

das relações de produção capitalista, para que ele reflita sobre as questões

socioambientais, políticas, econômicas e culturais, materializadas no espaço

geográfico. Ao considerar que o aluno é agente da construção do espaço e,

portanto, é também papel da Geografia subsidiá-lo para interferir conscientemente

na realidade.

A contribuição do estudo da cultura da soja permite desenvolver os conteúdos

estruturantes propostos de maneira integrar as quatro dimensões mencionadas, uma

vez que os impactos sócioambientais decorrentes da inserção desta leguminosa são

perceptíveis em muitas esferas da sociedade.

No cenário agrícola brasileiro desta primeira década do século XXI destaca-se

o emprego da biotecnologia, como ferramenta para a melhoria das variedades das

plantas e o estudo da genética dos mais variados organismos. Os produtos

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transgênicos são resultados da modificação de organismos a partir da engenharia

genética, cujo objetivo é obter características diferentes que as naturais e melhorar

sua resistência a doenças, pragas, herbicidas, aumentando os compostos

nutricionais, dando maior facilidade de processamento, melhor conservação dos

frutos, entre outras (CAMPOS, 2010).

A questão socioambiental permitiu abordagem complexa do temário

geográfico, porque não se restringe aos estudos da flora e da fauna, mas à

interdependência das relações entre sociedade, elementos naturais, aspectos

econômicos, sociais e culturais. Ao entender ambiente pelos aspectos sociais e

econômicos, os problemas socioambientais passam a determinar, também,

questões da pobreza, da fome, do preconceito, das diferenças culturais,

materializadas no espaço geográfico (PARANÁ, 2008).

Por sua vez, a abordagem cultural do espaço geográfico é entendida como

um campo de estudo da Geografia, posto que, sob a égide do pensamento de

Cosgrove e Jackson (2003, p. 136), uma possível definição, dessa ‘nova’ Geografia

cultural seria: contemporânea e histórica [...]; social e espacial [...]; urbana e rural;

atenta à natureza contingente da cultura, às ideologias dominantes e às formas de

resistência. Para essa ‘nova’ Geografia a cultura não é uma categoria residual, mas

o meio pelo qual a mudança social é experienciada, contestada e constituída.

Nestes termos, os estudos sobre aspectos culturais e demográficos do

espaço geográfico contribuem para a compreensão desse momento de intensa

circulação de informações, mercadorias, dinheiro, pessoas e modos de vida. Em

meio a essa circulação está a construção cultural singular e também a coletiva, que

pode caracterizar-se tanto pela massificação da cultura quanto pelas manifestações

culturais de resistência (PARANÁ, 2008).

Um dos pontos mais discutidos nesta dimensão é a problemática do

êxodo rural, em parte desencadeada pela monocultura da soja, em especial no

Norte do Paraná, cuja mecanização foi responsável pela saída de um grande

contingente de pessoas do campo.

Dentre os produtos agrícolas existentes, a soja tem um destaque crescente,

com uma possibilidade de expansão tanto em área de plantio como em termos de

produtividade e no uso na alimentação animal (DALL’ AGNOL, 2007).

Os chineses já conheciam o potencial da soja para uso na alimentação há

milênios, mas somente nos últimos anos, os ocidentais passaram a considerar a

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soja como alimento funcional, aquele que, além das funções nutricionais básicas,

produz efeitos benéficos à saúde (EMBRAPA, 2008).

A soja é uma leguminosa domesticada pelos chineses há cerca de cinco mil

anos. Sua espécie mais antiga, a soja selvagem, crescia principalmente nas terras

baixas e úmidas, nas proximidades dos lagos e rios da China Central. Há três mil

anos a soja se espalhou pela Ásia, onde começou a ser utilizada como alimento. Foi

no início do século XX, que passou a ser cultivada comercialmente nos Estados

Unidos. A partir de então, houve um rápido crescimento na produção, com o

desenvolvimento das primeiras cultivares comerciais (DALL’ AGNOL, 2007).

Chegou ao Brasil via Estados Unidos, em 1882 na Bahia, onde foram

realizados os primeiros estudos, que fracassaram por falta de adaptação climática.

O cultivo começou na região Sul, com os primeiros imigrantes japoneses em 1908,

mas foi introduzido oficialmente no Rio Grande do Sul em 1914. Porém, a expansão

da soja no Brasil aconteceu a partir dos anos 1960, com o interesse crescente da

indústria de óleo e a demanda do mercado internacional. Nesta década, a produção

quintuplicou-se de 206 mil toneladas em 1960 para 1,056 milhão de toneladas em

1969. Desta quantidade, 98 % foram produzidas na região sul, durante o verão, em

rotação com trigo no inverno (DALL’ AGNOL, 2007).

Atualmente o cenário das exportações é muito promissor para o Brasil:

O Brasil é o segundo maior produtor mundial de soja. Na safra 2009/2010, o país produziu 148,8 milhões de toneladas de grãos, um recorde. A CONAB calcula que o Brasil poderá cultuvar entre 47.326 milhões e 47.997 milhões de hectares neste novo ano agrícola, o que representa um cenário entre retração de 0,1% e crescimento de 1,3% na área cultivada, na comparação com os 47.376 milhões de hectares da safra 2009/2010. Os Estados Unidos, maior produtor mundial do grão, responderam pela produção de 91,41 milhões de toneladas de soja (CONAB, 2011, p. 73).

As perspectivas indicam que a soja continuará sendo uma commodity cada

vez mais estratégica para o Brasil, com demanda crescente tanto em nível interno

como no mercado internacional.

A produção de soja no Brasil concentrou-se na região Sul até o início dos

anos 1980. A partir daí, a participação da Região Centro-Oeste aumentou

significativamente. A expansão da área cultivada no Brasil é resultado tanto da

incorporação de novas áreas, nas Regiões Centro Oeste e Norte, quando da

substituição de outras culturas, na região Sul (CANZIANI, 1995).

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Na região sul, conforme Dall’ Agnol (2007, p. 4), as facilidades de

mecanização total da cultura; o estabelecimento de um sistema cooperativista

dinâmico e eficiente; e, a consolidação de uma bem articulada rede de pesquisa de

soja, envolvendo os poderes públicos federal e estadual, apoiada financeiramente

pela iniciativa privada.

Neste ponto, cabe ressaltar em quais condições a soja se expandiu nas

diversas regiões do país, observando que em cada lugar provocou mudanças

socioespaciais diferenciadas.

Até a década de 1980, a cultura da soja esteve presente essencialmente nos

três estados do Sul do Brasil (Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná), sendo

responsáveis por 98% da produção nacional.

No Paraná os primeiros registros históricos da soja no estado são de 1936, quando os agricultores gaúchos e catarinenses começaram se fixar nas regiões oeste e sudeste, na qual a atividade principal era a criação de suínos (BONATO e BONATO, 1987, p. 20).

Mas, como destacam Miyasaka e Medina (1981, p. 22 e seguintes) as

estatísticas indicam que até meados da década de 1960, a colheita de grãos nunca

superou o volume de 60 toneladas. E também utilizada para ração animal. Até início

da década de 1970 o café, o milho e o feijão eram os produtos hegemônicos nesse

Estado, o café no norte e nordeste e os outros produtos nas outras regiões

No Centro-Oeste, a soja ganha espaço após os anos de 1980, por meio da

expansão da fronteira agrícola realizada principalmente por gaúchos, catarinenses e

paranaenses, com a utilização de técnicas modernas na produção.

Na incorporação deste novo espaço pela cultura da soja, estão presentes

alguns fatores destacados por Dall’ Agnol (2008, apud CAMPOS, 2010): os

incentivos fiscais para a abertura de novas áreas de produção agrícola, para a

aquisição de máquinas e para a construção de silos e armazéns; construção da

rodovia Belém-Brasília e da nova capital do país; valor baixo da terra;

desenvolvimento de um bem sucedido conjunto de tecnologias para a produção de

soja em zonas tropicais; topografia plana, o que favorece a mecanização; e o bom

nível econômico e tecnológico dos produtores de soja da região.

Cumpre destacar que nas duas regiões mencionadas, a expansão da soja foi

resultante da conjugação de vários fatores, como os incentivos governamentais, a

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correção de solos antes impróprios para o plantio, a instalação de agroindústrias, a

melhoria em logística territorial, e a aplicação de técnicas modernas de produção

juntamente com a criação da EMBRAPA/CNPSo e de outros institutos estaduais de

pesquisas direcionados a melhora das cultivares para o plantio no Brasil.

Após a última década do século XX, a soja passa a ser, cultivada em alguns

estados da região Norte e Nordeste, a partir da inserção destes novos espaços no

plantio, D’ Agnoll (2008, p. 16, apud CAMPOS, 2010, p. 66) informa que a expansão

da soja no estado do Tocantins, Bahia, Maranhão e Piauí, realiza-se através da

incorporação de novas regiões do cerrado, reproduzindo a trajetória verificada pela

oleaginosa na região Centro-Oeste ao que se refere aos padrões técnicos de

produção; e acrescenta que na porção sul de Rondônia e Amazonas, a soja ganha

espaço em áreas antes cobertas pela floresta Amazônica.

Como vimos, o complexo da soja atualmente é responsável por profundas

modificações no território nacional, sendo um importante elo da economia interna

com a internacional. A safra de grãos no país em 2009/2010 alcançou a marca

histórica de 148,99 milhões de toneladas, das quais a soja contribuiu com cerca de

62,2% do total de grãos. Hoje a referida oleaginosa é o principal produto agrícola na

pauta de exportações brasileiras e o maior responsável pelo aumento da colheita

nacional de grãos. Assim esses dados colocam o Brasil como segundo maior

produtor mundial (CONAB, 2011).

O crescimento da produção de soja, Dall`Agnol pode ser creditado aos

seguintes fatores:

1- Aumento da população humana, que consumirá mais soja, principalmente via consumo de carnes produzidas a partir de farelos, entre eles, de soja;

2- Aumento do poder aquisitivo da população urbana, destacadamente no continente asiático;

3- Substituição do farelo de carne pelo farelo de soja;

4- Potencial de utilização da soja como matéria prima para a indústria do biodiesel, tintas, lubrificantes, plásticos entre outros;

5-Redução do protecionismo e dos subsídios à soja por parte dos países ricos, com elevação dos preços internacionais, os quais estimulam a produção, e a exportação brasileira;

6- Exoneração de parte dos pesados tributos incidentes sobre a cadeia produtiva da soja no Brasil, incrementando a competitividade no mercado externo, elevando com isso a produção (DALL’ AGNOL,2007, p. 10-11).

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Embora o autor tenha mencionado com muita propriedade alguns fatores que

interferiram no crescimento da produção da soja, o mesmo deixou de contemplar um

aspecto de suma importância: a crescente utilização de recursos de Ciência e

Tecnologia (C&T) como ferramenta preponderante deste aumento.

O desenvolvimento de técnica, ciência, informação foi e está sendo

determinante para a expansão da soja no território brasileiro, ao mesmo tempo em

que cria cidades, novos objetos aparecem no espaço, outros mantêm a forma, mas

muda a função, novas relações sociais são originadas, ações das empresas

multinacionais e nacionais se materializam na maioria das vezes expulsando o

pequeno produtor e ressignificando as funções dos fluxos e fixos dos lugares

(CAMPOS, 2010).

Muitos fatores contribuíram para que a soja tivesse destaque no território

brasileiro, primeiramente na Região Sul (anos 1960 e 1970) e depois no Brasil

Central (nas décadas de 1980 e 1990). Parte da incorporação dessas áreas se deve

aos materiais genéticos produzidos em institutos de pesquisas brasileiros, voltados

ao cultivo de soja em áreas tropicais, em especial o CNPSo.

Ao enfatizar as mudanças socioespaciais ocasionadas pela cultura de soja,

Campos reforça que:

As mudanças tecnológicas juntamente com as demais políticas criaram transformações socioespaciais no Paraná e no Centro-Oeste. Os eventos desse processo implantaram um ritmo acelerado onde os fixos e fluxos mudam sua função e forma com uma velocidade nunca vista antes, e assim provoca acentuada desigualdade socioespacial, tanto na cidade como do campo, por outro lado há uma territorialização do capital e oligopolização do espaço rural (CAMPOS, 2010, p.75).

No sul do Paraná, a soja ocupou as áreas antes destinadas ao cultivo do

arroz. Na década de 1970, os gaúchos e catarinenses que introduziram a soja no

Paraná, migram para o sul do Mato Grosso, Goiás e iniciam o plantio de soja no

Centro-Oeste (CAMPOS, 2010).

No norte do Paraná na década de 1950 e 1960 e ainda parte da década de

1970 suas funções e formas espaciais estavam direcionadas para a cultura do café.

Milhares de pessoas ocuparam esse espaço geográfico com atividades relacionadas

a cultura do café. Embora já no início de 1960 o governo interveio na cafeicultura no

sentido de racionalizar o cultivo e/ou substituí-lo por outras culturas, tendo em vista o

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projeto de modernização do setor rural em curso (STOLCKE, 1986, apud CAMPOS,

2010, p.77).

Com a incorporação dessa nova área, juntamente com o norte e a região central ocorre um efetivo impulso na produção total da soja no Paraná, que passou de uma “média de 150 mil toneladas na década de 1960 para 3,5 milhões de toneladas na média dos anos de 1970, para 4,15 milhões de toneladas na década de 1980 e para 6,15 milhões de toneladas na média dos anos 1990 (DALL’ AGNOL, 2008, p.10).

Com a chegada da soja, em especial no norte do Paraná (onde o binômio

soja/trigo substituiu o café) com mais intensidade em meados da década de 1970,

as relações de trabalho sofrem grandes transformações: a meação e parceria

acabam e juntamente com os colonos assalariados estes foram obrigados a deixar

as áreas rurais rumo às grandes cidades. A cultura da soja/trigo era cultivada via

utilização de herbicidas, fertilizantes e máquinas agrícolas que dispensa o trabalho

humano “[...] a mecanização e, depois, a cientificização do mundo rural contribuem

certamente, para a queda da participação da população rural na população total do

Brasil” (SANTOS & SILVEIRA, 2001, apud CAMPOS, 2010, p.77).

É na década de 1970 que ocorre um dos mais intensos êxodos rural/urbano

do Brasil, num rápido e intenso processo de esvaziamento demográfico do campo.

Isto provocou alteração significativa nas paisagens rurais com milhares de casas

abandonadas circundadas por plantio de trigo ou soja. Durante a década de 1980 e

início da década de 1990, parte da população expulsa voltou trabalhar no campo

como volante (o bóia-fria) na cultura de algodão, cana-de-açúcar e café, em especial

no norte e noroeste do Paraná. Em meados da década de 1990, o trabalhador

volante continua a ser ocupado na cana-de-açúcar e café (CAMPOS, 2010, p.77).

Em relação ao êxodo rural ocorrido no Norte do Paraná, vários foram os

fatores, destacando-se a introdução de máquinas agrícolas, o uso intensivo de

insumos e a substituição de culturas, e expansão da pecuária, atrelado ao pacote

tecnológico com um número reduzido de emprego de pessoas, dentre outros.

Campos (2010) observa que a efetiva redução da população rural e os

problemas decorrentes desse processo levaram Graziano da Silva (1982) a

denominá-la de “modernização dolorosa”, pois, com a intensificação das relações

capitalistas na agricultura, o pequeno descapitalizado foi excluído do processo,

privilegiando o capital monopolista, principalmente os Complexos Agroindustriais

10

que canalizam quase todos os subsídios ofertados pelo Estado para se desenvolver

e monopolizar o espaço agrário.

Por outro lado, o governo procurou incentivar a inserção do produtor rural no

sistema integrado de cooperativas, que se constituem num mecanismo de garantia

da permanência do pequeno e médio produtor na zona rural, em especial no Sul do

Brasil.

Neste ponto, cabe ressaltar a importância das cooperativas como elemento

de apoio aos agricultores, uma vez que a força destas instituições vem se avultando

ao longo da história da agropecuária brasileira. Nesta direção, destacam-se ações

como apoio a financiamentos, inserção de C&T na produção agrícola e outras.

Campos (2010) menciona as transformações sofridas pela agricultura ao

longo de várias décadas do século XX, tais como a centralização de capitais,

ocupação de novas áreas, expansão na produção de alimentos para o mercado

interno e externo, a partir de uma inserção competitiva do Brasil no mercado mundial

de alimentos por meio do crescimento e da diversificação dos produtos agrícolas,

êxodo rural, utilização de pouca mão de obra para o trabalho agrícola, intensa

mecanização e utilização de insumos, suporte técnico e cientifico ofertado por

empresas privadas e pelo Estado.

É nesse contexto de transformações que em 1972 foi criada a EMBRAPA

como uma resposta aos anseios por tecnologias que pudessem adequar-se a nova

dinâmica da agricultura, já que quase todas as técnicas agronômicas eram

importadas de países com características pedológicas e climáticas diferentes. O

governo militar criou a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, sendo a

instituição pioneira do Brasil no que se refere à adaptação e geração de tecnologias

modernas de interesse agrícola, com destaque para a biologia celular e molecular,

fundamentais para aplicação de engenharia genética no melhoramento de plantas

(CAMPOS, 2010).

Em relação a pesquisas direcionadas para a cultura da soja, em 1975, foi

criada uma unidade da EMBRAPA em Londrina-PR, denominada Centro Nacional de

Pesquisa da Soja (CNPSo), com o objetivo de desenvolver uma tecnologia

específica para a produção de soja.

A partir da reflexão sobre os fatores que contribuíram para que a soja se

estabelecesse como uma das culturas de maior sucesso no território brasileiro, cabe

acrescentar que parte da incorporação dessas áreas se deve aos materiais

11

genéticos produzidos em institutos de pesquisas brasileiros, voltados ao cultivo de

soja em áreas tropicais, em especial o CNPSo em Londrina, no norte do Paraná.

Deve-se destacar que Londrina não é um município com atividades

direcionadas totalmente para o agronegócio, porém possuem instituições como

IAPAR (Instituto Agronômico do Paraná), CNPSo, SRP (Sociedade Rural do

Paraná), Milênia e outras, direcionadas para atender o agronegócio da soja e de

outros produtos agroalimentícios.

O CNPSo foi criado em 1975. Um ano depois, foi criado o Programa Nacional

de Pesquisa da Soja com o propósito de integrar e potencializar os isolados esforços

de pesquisa da soja pelo Brasil até então realizados (CAMPOS, 2010).

No entanto, explicar o advento da EMBRAPA e em especial a

EMBRAPA/CNPSo como uma consequência da política de modernização da

agricultura, com forte apoio na ciência e tecnologia para responder as necessidades

da agricultura a partir de 1964, pode ser uma visão um pouco restrita se não se

analisar os processos responsáveis por tal ato (CAMPOS, 2010).

O município de Londrina passa a direcionar grande parte de seus serviços

para fornecer ao campo os mais variados elementos constituintes do pacote de

modernização da agricultura, ou seja, técnica, ciência e informação; afirmando como

mais uma cidade do agronegócio.

A finalidade de criação do CNPSo não era somente criar pesquisa e

tecnologia, para o cultivo da soja nas mais diferentes regiões do país, mas também

ser um centro de excelência em materiais relacionados ao assunto.

Sob o ponto de vista de representatividade, Londrina preenche os requisitos necessários, pois se encontra dentro de uma região adequada, em clima e solo, para o cultivo da leguminosa. Representa-se as áreas do norte e oeste do Paraná, São Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso e Goiás. Os resultados ali obtidos seriam extrapoláveis para outras regiões, que poderiam absorver a tecnologia ali gerada, tecnologia está essencial para o desenvolvimento da cultura nesta ampla área do Brasil (EMBRAPA, 1974, p.32)

Reitera-se a importância do CNPSO (Centro Nacional de Pesquisa da Soja)

para a melhora na qualidade da soja produzida nas diversas regiões do país, além

de tornar explícita a importância da inserção de C&T na condução do processo de

modernização da agricultura, em especial na cultura de soja.

12

Da mesma forma, ficam evidentes as transformações sócioespaciais

ocasionadas por esta cultura no Norte do Paraná e a participação do CNPSo neste

processo.

Trabalho de campo: aprender fora dos limites da sala de aula

Dentre as inúmeras ferramentas para o desenvolvimento de métodos de

aprendizagem e de integração professor, aluno e sociedade, o trabalho de campo,

caracterizado sob a ótica geográfica, “[...] busca valorizar os elementos presentes na

paisagem, bem como verificar na história o nosso patrimônio cultural, o que faz dele

um método eficaz de aprendizagem” (URQUIZA e ASARI, 2007, p. 281).

As autoras salientam ainda que o trabalho de campo possibilita a integração

com as demais disciplinas do currículo, além de promover a interação entre o sujeito

e o objeto do conhecimento, colocando a prática dos alunos em evidência e

sensibilizando-o na dimensão escolar e acadêmica, mas sobretudo do ponto de

vista humano (URQUIZA e ASARI, 2007, p. 281).

O cenário educacional contemporâneo permite afirmar que os trabalhos de

campo vêm se multiplicando nas escolas de Ensino Fundamental e Médio, nas

universidades, além de ser tema recorrente em encontros de geógrafos.

Lacoste (2006) enfatiza que a aprendizagem a partir do trabalho de campo

começa a se tornar uma das reivindicações principais dos estudantes de Geografia.

De Marcos afirma que é fato corrente entre os geógrafos de que a ida a

campo se constitui um instrumento didático e de pesquisa de fundamental

importância para o ensino e pesquisa da/na Geografia.

Enquanto recurso didático, o trabalho de campo é o momento em que podemos visualizar tudo o que foi discutido em sala de aula, em que a teoria se torna realidade, se “materializa” diante dos olhos estarrecidos dos estudantes, daí a importância de planejá-lo o máximo possível, de modo a que ele não se transforme numa “excursão recreativa” sobre o território, e possa ser um momento a mais no processo ensino/aprendizagem/produção do conhecimento (DE MARCOS, 2006, p. 106).

Para Urquiza e Asari (2007, p. 285), o trabalho de campo apresenta-se como

uma estratégia “[...] que esclarece de forma significativa os fundamentos teóricos

aplicados dentro da sala de aula, além de transcender os objetivos almejados pelo

professor.

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Quando se aborda esta possibilidade, remete-se à ideia de que o trabalho de

campo possibilita um acompanhamento mais aproximado das transformações que

se sucedem – no meio e no mundo em dimensão mais ampliada – a partir das quais

os alunos podem tirar suas conclusões, estabelecendo ligações entre as aulas

teóricas e a realidade.

Na concepção de Serpa (2006, p. 17) “O espaço é o todo verdadeiro para a

Geografia e para o trabalho de campo necessário à produção do conhecimento

geográfico.”

Deve-se atentar, ainda, que o trabalho de campo representa uma atividade

trabalhosa e desafiadora, que exige do professor um minucioso planejamento.

Urquiza e Asari (2007) referem que o trabalho de campo proposto em Geografia

possui objetivos definidos e visa à observação de aspectos previamente trabalhados

em sala de aula.

No entanto, nem sempre são requeridos vastos recursos para organizar uma

atividade deste tipo, conforme se percebe pelo trecho a seguir: “Mesmo que o aluno

caminhe pela mesma rua todos os dias, muitas informações que o lugar lhe fornece

são assimiladas e passam a ser usadas por ele somente após uma aula prática junto

ao professor no local (URQUIZA e ASARI, 2007, p. 286).”

Desta forma, o professor, ao planejar um trabalho de campo, deve buscar

meios de ampliar as possibilidades de aprendizagem dos conceitos geográficos a

partir da proposição de lançar um olhar diferente para o espaço de vivência do

aluno. Quando bem planejada, uma caminhada pelo quarteirão ao redor da escola

pode despertar o interesse pelos conteúdos geográficos do que uma aula com os

equipamentos tecnológicos mais sofisticados.

Quando se repensa a postura de professores e alunos durante o trabalho de

campo, é importante atentar para a ação do professor, que deve despertar o

interesse dos alunos, discutindo e fazendo perguntas que agucem a curiosidade de

tal forma que eles sintam a importância e a necessidade da atividade em

complementação à aula teórica (TOMITA, 1999).

Tomita (1999) afirma que o trabalho de campo permite ainda estreitar a

relação dos alunos entre si e com os professores. Nesta mesma posição, verifica-se

que longe da sala de aula é possível compreender informações transmitidas não só

no conteúdo do discurso, mas também no tom da voz, na formulação de

questionamentos e nas dúvidas que surgem ao longo do percurso previamente

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traçado, além de tantas outras que podem surgir e para as quais o professor talvez

não tenha respostas, instigando o grupo a construir novos conhecimentos.

Serpa (2006) reafirma a importância do trabalho de campo em Geografia,

quando aponta as diversas possibilidades de recortar, analisar e conceituar o

espaço, de acordo com as questões, metas e objetivos previamente definidos. Para

este autor, o geógrafo deve, pois, aprender a multiplicar seus pontos de vista sobre

as paisagens, ter frente a elas uma postura “ativa”.

Alentejano e Rocha Leão concebem o trabalho de campo como ferramenta

geográfica, e explicitam:

Desde os primórdios da Geografia os trabalhos de campo são parte fundamental do método de trabalho dos geógrafos. Aliás, a sistematização da Geografia enquanto ciência muito deve ao conjunto de pesquisas e relatórios de campo elaborados anteriormente por viajantes, naturalistas e outros, verdadeiro manancial de informações que foram essenciais para a construção das bases para o desenvolvimento da Geografia (ALENTEJANO e ROCHA LEÃO, 2006, p. 53).

Para Urquiza e Asari (2007, p. 284), uma das tarefas preponderantes do

professor é despertar no aluno o prazer de estudar, com vistas a motivar e

sensibilizar os alunos para a “[...] busca de novas informações e verificações de

fatos que na teoria, pro vezes, fiucam muito abstratas.”

De Marcos concebe o trabalho de campo como:

[...] instrumento de pesquisa dos mais importantes, para a produção do conhecimento geográfico, momento em que o tema de estudo se desvenda diante dos olhos e obriga a estarmos atentos, de modo a que nada fuja à investigação. É preciso olhar com profundidade e observar, sobretudo aquilo que não havíamos considerado antes de sair para campo (DE MARCOS, 2006, p. 106).

Nesta direção, ao se enfocar a importância do trabalho de campo, comprova-

se sua eficácia no intuito de despertar novos interesses, tornando as aulas mais

dinâmicas e concretas, na interrelação com outras disciplinas. Na mesma

perspectiva, o trabalho de campo é importante, conforme Urquiza e Asari, porque:

[...] faz a conexão entre a compreensão do meio vivido do aluno e a compreensão de outros ambientes externos ao seu cotidiano, ampliando as fontes de conhecimento que levam à reflexão e à conscientização de cunho geográfico. Por outro lado, o professor deve estar capacitado para realizar este tipo de atividade, uma vez que ele deverá levar o aluno a entender que os textos e as figuras do livro didático registram algo real, mesmo que não envolva os elementos constantes na vida desse aluno (URQUIZA e ASARI (2007, p. 287).

15

Deste modo, a ligação entre a teoria e a prática representa o fundamento para

a proposição de um trabalho de campo, na medida em que pode proporcionar ao

aluno uma nova visão de mundo, permitindo-lhe assimilar os conteúdos presentes

no livro didático, os quais muitas vezes parecem distanciados da realidade vivida,

dificultando a compreensão e subsequente consciência crítica necessária ao

verdadeiro conhecimento.

Oliveira e Lima (2009) pontuam que no trabalho de campo, os alunos

estariam diante de cenários reais e, ao compará-los com as teorias de sala de aula,

seriam levados a refletir sobre os seus papéis na sociedade. Desta forma, a

atividade estimularia os alunos no sentido de mudanças, ao desvendar o entorno e

estabelecer a mediação entre o registro, o conhecimento já sistematizado e

informado e o seu significado.

Lacoste (apud ALENTEJANO e ROCHA LEÃO), por sua vez, define o

trabalho de campo como pesquisa em grande escala que precisa, necessariamente,

ser articulada com outras escalas:

O trabalho de campo para não ser somente um empirismo, deve articular-se à formação teórica que, é ela também, indispensável. Saber pensar o espaço não é colocar somente os problemas no quadro local; é também articulá-los eficazmente aos fenômenos que se desenvolvem sobre extensões muito mais amplas (ALENTEJANO e ROCHA LEÃO, 2006, p. 56).

Para este autor, portanto, o campo só é válido se articulado com sistemas

globais de interpretação da realidade. Somente por meio da articulação das escalas

é que se torna possível construir efetivamente uma interpretação geográfica da

realidade, indo do particular ao geral, e retornando a este, assim como da prática à

teoria e vice-versa.

Para atingir os objetivos pretendidos, reforça-se a importância do

planejamento das atividades que serão desenvolvidas ao longo do trabalho de

campo. Para tanto, o professor, deve planejar e preparar a sequência de ações que

irão constituir o trabalho, instigando os alunos a problematizar o que vão ver, a

preparar o que vão perguntar e refletir acerca do que vão observar. Tomita (1999, p.

14) elenca alguns questionamentos que o professor pode fazer: “Aonde ir? Qual o

conhecimento prévio da área? Quais os objetivos propostos? Quais os conteúdos

16

geográficos? Os alunos estão suficientemente preparados para esta atividade?

Como avaliar a aprendizagem?”

De posse das respostas às indagações sugeridas por Tomita, o professor

deve buscar os meios para a concretização da atividade a ser desenvolvida em

campo.

Lacoste (2006) pondera que a formação do professor mostra-se determinante

para que ele possa desenvolver atividades voltadas ao trabalho de campo, uma vez

que é na universidade que as pesquisas devem ser incentivadas no intuito de que os

estudantes possam conhecer seus resultados e avaliar a necessidade – ou não – de

sua utilização na prática docente.

Alentejano e Rocha Leão complementam reforçando que:

Um outro aspecto a ser considerado é o papel do trabalho de campo como momento de integração entre fenômenos sociais e naturais que se entrecruzam na realidade do campo. Interessante apontar que tanto a produção do conhecimento geográfico, que apresenta limitações advindas da dicotomia sociedade natureza, em função da verticalização dos pesquisadores nas diferentes especialidades que compõem o escopo da Geografia, quanto no campo do ensino, a separação entre sociedade e natureza se constitui num entrave para o desenvolvimento da Geografia. Cabe destacar que tanto na realidade do campo quanto na teoria os aspectos sociais e naturais da realidade são indissociáveis. Nesse sentido, a elaboração de roteiros de campo com a preocupação de evidenciar os fenômenos sociais e naturais (e principalmente a interação entre eles) que modelam a superfície terrestre pode se tornar importante instrumento integrador, na formação de novas gerações de geógrafos mais atentos às relações físico-humanas, sem necessariamente, negligenciar o avanço-verticalização das especialidades (ALENTEJANO e ROCHA LEÃO, 2006, p. 63).

No entanto, Alentejano e Rocha Leão (2006) enfatizam a necessidade de

contornar os riscos da banalização do trabalho de campo. Isto pressupõe,

sobretudo, avançar em duas direções: a articulação teoria- prática e o olhar crítico

sobre a realidade associado à ação transformadora.

Lacoste pontifica:

Certamente, problemas epistemológicos que estão para a Geografia, como para as outras Ciências Sociais, na base de toda operação de produção de um saber; trata-se, primeiramente, de reconhecer e denominar os elementos de um concreto, densamente compacto, mais ou menos opaco e, em seguida, extrair dele ideias, cifras e isto em função de uma problemática mais ou menos explícita e de pressupostos mais ou menos implícitos (LACOSTE, 2006, P. 77).

17

Torna-se, no entanto, importante alertar, conforme Lacoste para o fato de que

o trabalho de campo representa uma prática indispensável, mas não suficiente. Isto

pode ser confirmado quando se verifica que:

O trabalho de pesquisa, propriamente dito, a observação no campo, corresponde à grande escala e, neste nível, é somente uma parte dos fenômenos que pode ser convenientemente apreendido; os outros devem ser antevistos em escala menor e é preciso, para isto, utilizar representações que a pesquisa no terreno não pode fornecer. O trabalho de campo, para não ser somente um empirismo, deve articular- se à formação teórica que é, ela também, indispensável. Saber pensar o espaço não é colocar somente os problemas no quadro local; é também articulá-los eficazmente aos fenômenos que se desenvolvem sobre extensões muito mais amplas. Não é menos verdade que a pesquisa, na medida em que ela corresponde à extração de um abstrato a partir de um concreto, pela pesquisa e pela observação de campo, dá uma grande importância ao nível de conceitualização em grande escala [...] (LACOSTE, 2006, p. 91)

Com base nos pressupostos elencados por Tomita (1999), o professor não

deve ficar ancorado apenas na acumulação de um saber geográfico do livro didático;

é importante sair dos exaustivos discursos, dos questionários sem fundamento,

visando intensificar a comunicação com os alunos, com a preocupação em atualizar

e aperfeiçoar o conhecimento.

Kaiser afirma que:

O espaço não pode ser estudado pelos geógrafos como uma categoria independente de vez que ele nada mais é que um dos elementos do sistema social. São as relações dos homens com o espaço ou a respeito do espaço que preocupam hoje os geógrafos modernos: preocupação ou polarização científica insuficiente, de vez que não se pode compreender estas relações sem conhecer e compreender as relações dos homens entre si, quer dizer, as relações sociais (KAISER, 2006, p. 97).

Por este motivo, pode-se afirmar, sem incorrer em erro, que o trabalho de

campo deve ser visto como um meio e não um objetivo em si mesmo. Nas palavras

de Tomita (1999, p. 14), é importante “[...] levar o aluno diretamente ao campo,

tomando como ponto de partida o conhecimento prévio, alimentado pela teoria e

reforçado com a observação direta da realidade.”

De tudo que foi dito, evidencia-se que o trabalho de campo não deve se

reduzir ao mundo do empírico, mas ser um momento de articulação teoria-prática.

18

Relatos de uma experiência: o trabalho de campo junto à Embrapa Soja / Londrina

A partir dos objetivos estabelecidos para a pesquisa, foi planejada uma visita

ao CNPSo (Centro Nacional de Pesquisa da Soja), localizada na zona Oeste do

município de Londrina, nas proximidades do distrito da Warta, com o intutito de

avaliar sua representatividade no desenvolvimento de C&T para a produção nacional

de soja.

O primeiro passo, em 20 de abril de 2011, foi enviar um ofício à instituição,

com a solicitação da visita. Poucos dias após, um representante da instituição entrou

em contato telefônico com a professora, sugerindo que a data da visita fosse antes

da data solicitada (setembro) e colocando-se à disposição. A data foi agendada para

29 de setembro, e o programa de visita foi enviado à escola, com o seguinte

cronograma:

Tabela 1- Programa de visita

Data da visita: 29 de setembro de 2011 (quinta-feira) Objetivo da visita: realizar visita institucional, com o objetivo de conhecer os trabalhos de

pesquisa que são realizados na Embrapa Soja e conhecer as instalações do Espaço de

Educação Ambiental na Embrapa Soja.

08h30min- 08h50min Recepção e apresentação do vídeo institucional Fábio Rogério Ortiz – Área de Comunicação Empresarial

08h50min- 09h50min Palestra: A Embrapa Soja e a Pesquisa Agropecuária Fábio Rogério Ortiz – Área de Comunicação Empresarial

09h50min- 10h Intervalo e visita ao posto de vendas de publicações da Embrapa

10h- 11h Visita às intalações do Espaço de Educação Ambiental Alan Misael Flausino – Técnico Agrícola

11h Término da visita

Na quinzena anterior ao evento, foram enviadas as autorizações para os pais

ou responsáveis pelos alunos. Para o transporte, foi solicitada uma contribuição no

valor de R$ 5,00. Ao todo, a viagem incluiu 36 alunos do terceiro ano do Ensino

Médio e duas professoras.

Para evidenciar as situações didáticas vivenciadas durante a atividade

programada, são apresentados, na sequência, relatos dos alunos participantes.

Para garantir a privacidade dos alunos, estes, serão identificados pelas iniciais.

Sobre a etapa da recepção e apresentação do vídeo institucional, os alunos

relataram que:

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No dia 29 se setembro fomos à Embrapa Soja para conhecermos o trabalho da empresa. Fomos recepcionados e a Embrapa Soja nos foi apresentada através de um vídeo institucional, mostrando as áreas de atuação da empresa. Ficamos em um auditório por volta de uma hora (F.C.L.)

Na Embrapa fomos recepcionados pelo Geógrafo Fábio Rogério Ortiz, que apresentou uma palestra com o tema: A Embrapa Soja e a Pesquisa Agropecuária. Populações de vários países já visitaram a Embrapa Soja neste ano. Vimos também um vídeo institucional que falava sobre a soja (L.H.F. M.).

É importante ainda acrescentar que os alunos registraram informações

relevantes sobre a Embrapa, conforme se percebe nos trechos a seguir:

Esta empresa gera cultivares de soja em todo o Brasil. Produz transgênicos e não transgênicos (soja). Há monitoramento de grãos para evitar perda de grãos. Com a ajuda de Embrapa o Brasil é o segundo maior produtor mundial de soja. Ela possui pesquisadores em muitos outros lugares, pelo mundo. A soja é usada para muitos outros fins, além do consumo alimentício. A ideia da EMBRAPA era, em 1943 para ajudar o agricultor a produzir mais. No Brasil, há má distribuição dos alimentos e a EMBRAPA tenta melhorar isto. Não falta alimentos porque há pesquisas que ajudam o produtor, com isso se produz muito. Um dos principais desafios da EMBRAPA é produzir alimentos com qualidade (L.H.F. M.).

Em 1975, com o surgimento da Embrapa Soja, o cultivo comercial de soja que antes se restringia a regiões subtropicais, se espalhou desenvolvendo cultivares adaptadas às condições tropicais, permitindo o cultivo da oleaginosa em todo o Brasil. O Brasil é o segundo maior produtor mundial de soja. A soja é muito importante para nossas vidas e tem vários fins como por exemplo: tintas, produtos cosméticos, alimentos em geral etc.(J.F.O.)

A Embrapa é reconhecida internacionalmente sendo também visitada por outras empresas do exterior. A Embrapa Soja, além da soja, trabalha também com outras sementes, mas a sua especificidade é soja geneticamente modificada, sempre tentando um melhoramento da soja, assim distribuindo para o mercado um produto com qualidade (V.C.B.O.).

Pode-se constatar, ao analisar as falas dos alunos, que os mesmos

assimilaram as ideias centrais apresentadas durante a primeria etapa da visita. Os

relatórios produzidos foram aprimorados pela leitura dos materiais recebidos pelos

alunos, como folders, revistas e outros.

Da mesma forma, como os alunos já trabalhavam com a temática em sala de

aula, possuíam subsídios teóricos para atingir uma melhor participação na atividade

de campo.

Isto é confirmado por Alentejano e Rocha Leão (2006, p. 56), quando os

autores afimam que:

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Fazer trabalho de campo representa, portanto, um momento do processo de produção do conhecimento que não pode prescindir da teoria, sob pena de tornar-se vazio de conteúdo, incapaz de contribuir para revelar a essência dos fenômenos geográficos. Neste sentido, trabalho de campo não pode ser mero exercício de observação da paisagem, mas partir desta para compreender a dinâmica do espaço geográfico, num processo mediado pelos conceitos geográficos.

A segunda etapa da visita constou da palestra A Embrapa Soja e a Pesquisa

Agropecuária, proferida pelo geógrafo Fábio Rogério Ortiz e realizada em um

auditório com excelentes condições materiais, como ar condicionado e cadeiras

confortáveis. O palestrante usou microfone para realizar as intervenções durante a

exibição de dois filmes de curta duração. Os trechos a seguir ilustram a boa

receptividade dos alunos durante esta fase.

A Embrapa tem o cuidado com o sol, como no uso de adubos, e no manejo correto do solo, tudo para uma melhor qualidade, por isso a Embrapa faz pesquisas, para melhorar cada vez mais a soja, e assim, colocando a sojacomo base na nossa alimentação, fazendo que ela esteja cada vez mais em nossas mesas, e em nossa vida. Muitas pessoas ainda não consomem soja, pois não conhecemnunca experimentaram e assim desconhecendo seus benefícios. Por isso a Embrapa tem a missão de cada vez mais, colocar no mercado, produtos a base de soja, para que nós consumamos cada vez mais (V.C.B.O.).

O segundo vídeo Em busca da semente roubada foi uma animação que falava sobre alimentos e deixando como exemplos uma melancia sem sementes que no caso foi modificada por pesquisadores (A.P.A.)

O Fábio passou um vídeo que falava sobre a importância da soja para o Paraná, para o Brasil e até mesmo para o mundo. No vídeo ele também falou dos funcionários e da forma na qual a soja é desenvolvida, das técnicas. A Embrapa Soja não para de investir nos projetos ambientais, ela prepara a soja para várias coisas, tipo bactéria, os benefícios no qual a soja pode nos beneficiar não somente com comida, mas também como cosméticos e outros. O êxodo rural foi um dos motivos para a Embrapa vir para o Paraná, pois as pessoas estavam saindo do campo para ir para a cidade atrás de alimento. A Embrapa foi ainda para pesquisa para ajudar o agricultor, hoje em dia não falta alimento, é mal distribuído. Depois de uma conversa no auditório, saímos para conhecer o campo. Adorei a visita (A.C.S.).

Nos relatos transcritos, verifica-se que os alunos assimilaram a essência da

finalidade institucional da Embrapa Soja e as atividades desenvolvidas, bem como

os benefícios para o desenvolvimento da agricultura brasileira.

Na atividade desenvolvida, os alunos puderam aprofundar os conhecimentos

sobre êxodo rural, população urbana e sobre as atividades desenvolvidas pela

Embrapa Soja, antes trabalhadas por meio da leitura de textos informativos e

pesquisas realizadas pelos alunos.

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Cabe, aqui, retomar o que afirma Campos (2010) sobre a empresa visitada,

quando confirma que a criação do sistema EMBRAPA, e posteriormente da

EMBRAPA/CNPSo em 1975, não está relacionada somente com a política de

modernização da agricultura empreendida pelo governo militar pós 1964, mas como

parte de um projeto mais antigo, desde a revolução de 1930, que almejava um país

moderno e autônomo na produção de ciência e tecnologia capaz de igualar-se com

os países industrializados.

Na sequência, os alunos tiveram um intervalo e puderam visitar o posto de

vendas de publicações da Embrapa. O responsável afirmou que os alunos poderiam

pegar o material gratuitamente e houve grande interesse. Uma das alunas

interessou-se por um CD, mas como era em língua inglesa não foi possível o

acesso.

Na etapa seguinte, foi realizada a visita às instalações do Espaço de

Educação Ambiental, sob a orientação do técnico agrícola Alan Misael Flausino.

Para o cumprimento desta atividade, os alunos foram transportados de ônibus até as

proximidades da reserva ambiental da Embrapa Soja. Assessorados pelo técnico

agrícola, pelo geógrafo e pelas duas professoras, os alunos seguiram uma trilha de

aproximadamente mil metros.

São apresentadas, na sequência, imagens da Trilha Ecológica, ressaltando

que se buscou omitir a exposição de imagens dos alunos participantes, bem como

do técnico agrícola que acompanhou o trajeto.

Figura 1- Imagens da Trilha Ecológica

22

Fonte: Arquivo próprio, 2011.

Esta etapa foi muito bem recebida pelos alunos, conforme se pode comprovar

pelos relatos a seguir.

Tivemos uma visita com o Allan em um Espaço de Educação Ambiental. Antes de entrarmos na mata, sentimos a diferença de clima. Como estava muito calor, o ar estava abafado; entrando na mata, notamos que é um ar mais fresquinho... Vimos que a preservação do meio ambiente é muito importante para qualquer ser vivo (J.A.P.) Pegamos uma trilha onde compreendemos a importância das árvores. No momento em que estávamos na trilha, o ar se mostrou mais fresco, pois as árvores podemos dizer que são um “ar condicionado natural”. A pequena trilha que seguimos é uma vegetação secundária, pois a primeira o homem já destruiu, mas a natureza por si conseguiu se reerguer novamente (A.P.A.). Enfim, a melhor parte da visita – o Espaço de Educação Ambiental – onde se aprende os valores ambientais, pois há uma floresta secundária que melhora e muito a facilidade de respirar, aumentando a umidade relativa do ar e diminuindo os graus de calor (L.C.S.). Tivemos uma aula de Educação Ambiental que não esqueceremos mais (W.N.G.).

Percebe-se que esta parte da visita foi muito proveitosa para os alunos e

muitos expuseram ser a atividade mais prazerosa. Da mesma forma, a percepção

dos alunos sobre as mudanças verificadas em termos de clima e qualidade do ar

23

mostraram-se relevantes, ratificando a importância do trabalho de campo como

estratégia didática que atribui maior significado à aprendizagem.

Nesta mesma direção, retomam-se as ideias de Urquiza e Asari reafirmam a

importância do trabalho de campo, ao afirmarem que:

Analisar o trabalho de campo como uma metodologia para desenvolver os aspectos históricos e geográficos é uma forma simples de significativa de integrar os conteúdos ministrados nas salas de aula. Assim, ao estudar uma realidade mais concreta e interativa, usando a associação da teoria com a prática para levar os alunos a conhecerem a importância da relação homem e natureza, o proceso ensino-aprendizagem torna-se mais dinâmico e criativo, o que propicia a participação dos alunos na construção dos conhecimentos (URQUIZA e ASARI, 2007, p. 290).

Observou-se, com bastante clareza, que os alunos mostraram-se

interessados nos aspectos de preservação ambiental do espaço geográfico. Ao

longo da trilha, o técnico agrícola ressaltou os aspectos ambientais necessários à

sobrevivência das espécies e destacou a postura do homem como agente poluidor,

quando solicitou aos alunos que não jogassem papéis de bala ou outros materiais

que poderiam poluir o ambiente. Os alunos foram levados até uma nascente, onde

puderam tomar água e observar sua limpidez e frescor. Mais distante, o grupo

passou pelo lago mantido pela Embrapa Soja, conforme se pode observar na figura

a seguir.

Figura 2- Lago do Espaço de Educação Ambiental

Fonte: Arquivo próprio, 2011.

24

Sobre esta experiência, os alunos se manifestaram da seguinte forma: O geógrafo Allan instruiu a gente na trilha, mostrou várias curiosidades, além de outros espaços visitados. A partir do momento que você entra na Embrapa você já tem uma visão diferente do mundo, que mostra que até o mínimo que você possa fazer para o meio ambiente ajuda. Isso ajuda na conscientização de um mundo melhor (C.C.G.S.). Devemos sempre preservar as florestas e matas ciliares juntamente com os animais que nelasvivem. Também falou sobre o impacto que podemos causar na natureza se jogarmos lixo na mesma de forma discriminatória. Pudemos através de um aparelho medir a temperatura fora e dentro da mata e foi possível notar a diferença. Na mata o ar estava mais fresco e a umidade do ar mais alta. Também foi possível observar a nascente do lago, os sons diferentes dos pássaros etc (W.N.G.). Após as apresentações no auditório, fomos levados até a área de pesquisa de campo; onde fazem as experiências no próprio solo. Fizemos uma trilha por uma mata totalmente preservada e cheia de tipos diferentes de plantas. O guia nos mostrou a importância de cuidarmos da natureza e da água, e também vimos uma nascente que tinha uma água limpa e muito potável (D. P. R).

Percebe-se, pelas falas transcritas, que os alunos comprovaram, de maneira

simples e em uma atividade criativa e diferenciada, inúmeros elementos da questão

ambiental que, trazidos à tona em sala de aula, poderiam não despertar tanto

interesse.

Desta forma, a experiência com o trabalho de campo comprovou o que

autores como Alentejano e Rocha-Leão (2006), De Marcos (2006), Lacoste (2006),

Serpa (2006), Tomita (1999) e Urquiza e Asari (2007) afirmam quando se reportam à

importância deste tipo de atividade como componente essencial para que se possa

estabelecer a conexão entre a teoria e a prática, uma vez que a partir da

compreensão do meio vivido do aluno e de outros ambientes externos ao seu

cotidiano, podem ser ampliadas as fontes de conhecimento que levam à reflexão e à

conscientização de cunho geográfico.

Pode-se afirmar, ainda, que em uma curta visita de menos de três horas os

alunos consolidaram não apenas conhecimentos geográficos, mas também

receberam uma aula completa de Educação Ambiental que dificlmente será

esquecida, conforme se observa nas falas conclusivas de muitos relatórios

produzidos pelos alunos.

Foi um trabalho de campo muito bom, sair dos livros e ir conhecer na prática. Conhecemos a importância da soja para nossas vidas. Foi uma ótima visita (M.V.F.). Eu particularmente adorei a visita. É muito difícil alguma professora dar essa oportunidade para nós, pois assim aprendemos não só na teoria, mas sim, na prática também (A.C. L.).

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Concluindo, a visita foi muito boa para relembrar dos valores que o meio ambiente tem em nossas vidas. Simplificando, foi muito gratificante (L.C.S.). Um passeio com grande quantidade de descoberta, com uma paisagem linda, privilégio de quem está trabalhando na Embrapa Soja (A.P.A.).

Embora a aluna A.P.A. tenha empregado inadequadamente o termo passeio

para se referir à atividade, os comentários feitos deixam entrever a importância do

trabalho de campo, principalmente na trilha realizada. Assim, pode-se afirmar que,

na comparação entre as duas partes da visita, a parte prática despertou maior

interesse e gerou maior volume de informações nos relatórios dos alunos, o que vem

a confirmar a importância de realizar trabalhos de campo como subsído à aquisição

dos conhecimentos geográficos.

Assim, retomam-se as ideias de Urquiza e Asari, quando as autoras enfatizam

a necessidade de o educador:

[...] incorporar na sua prática os princípios básicos da construção do conhecimento, que permitam confrontar a realidade e a teoria, numa sistematização que poermeia a percepção do mundo, entre o agir e o pensar, entre a razão e a reflexão, para a compreensão dos movimentos do ser humano com a natureza (URQUIZA e ASARI, 2007, p. 289).

Para a avaliação dos resultados do trabalho, os alunos, em uma aula

posterior à visita, apresentaram oralmente suas impressões sobre as atividades

realizadas e elaboraram os relatórios finais, dos quais foram extraídos alguns

trechos ao longo deste artigo.

Um ponto negativo levantado pelos alunos foi a curta duração da atividade, o

que impossibilitou a ampliação de debates e uma maior permanência dos alunos no

Espaço de Educação Ambiental. Além disso, poderiam ser melhor exploradas as

informações sobre a cultura da soja.

De forma geral, a atividade mostrou-se muito proveitosa e representou um

momento de grande expressividade para o desenvolvimento do projeto de

intervenção pedagógica realizado no intuito de avaliar as transformações

socioespaciais provocadas pela expansão da soja no Brasil.

26

Considerações finais

Após a análise dos resultados obtidos, que podem ser verificados pelos

relatórios elaborados pelos alunos depois da visita descrita, percebeu-se que a

experiência vivenciada despertou grande interesse nos alunos, ao mesmo tempo em

que aprofundou os conhecimentos antes elaborados pela leitura de textos

informativos e pesquisas realizadas pelos alunos.

A leitura do referencial teórico sobre o trabalho de campo permite ainda

consolidar a importância do trabalho de campo como ferramenta pedagógica

privilegiada para o ensino de Geografia, uma vez que permite a articulação entre a

teoria e a prática.

Nesta via de pensamento, cabe acrescentar que a organização do trabalho de

campo é uma etapa imprescindível para a obtenção de resultados positivos no que

diz respeito à possibilidade de despertar a atenção dos alunos, estreitar sua relação

com os professores, conduzí-los a novas atitudes, além de auxiliar na assimilação e

compreensão de conteúdos específicos, previamente trabalhados em sala de aula.

A este respeito, concorda-se com o posicionamento de Lacoste (2006),

quando afirma que o trabalho de campo representa uma prática indispensável, mas

não suficiente. Isto remete à necessidade de planejar a atividade, de forma que a

teoria possa subsidiar a prática, desmitificando a ideia – presente inclusive na

concepção de muitos professores de Geografia – de que o trabalho de campo

corresponde a um passeio.

De forma ampla, pode-se afirmar, diante da experiência vivenciada, que o

essencial quando se planeja um trabalho de campo, é a organização dos diferentes

momentos em que este será concretizado – desde sua concepção ao momento de

avaliação.

Desta forma, trata-se de buscar, na realidade de cada grupo, de cada escola,

os caminhos que possam tornar mais significativa a aprendizagem de conteúdos

geográficos, enfatizando sempre a necessidade de integração com a realidade

vivenciada pelos alunos em seu meio.

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