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Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Escola de Serviço Social As Representações do Serviço Social e seu impacto na vida dos empregados de três grandes empresas do Estado de Minas Gerais Danielle Teixeira Campos de Carvalho Belo Horizonte 2005

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As Representações Do Serviço Social e Seu Impacto Na Vida Dos Empregados de Três Grandes Empresas de MG

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Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais

Escola de Serviço Social

As Representações do Serviço Social e seu impacto na vida

dos empregados de três grandes empresas do Estado de

Minas Gerais

Danielle Teixeira Campos de Carvalho

Belo Horizonte

2005

8

Danielle Teixeira Campos de Carvalho

As Representações do Serviço Social e seu impacto na vida

dos empregados de três grandes empresas do Estado de

Minas Gerais

Trabalho de conclusão de curso apresentado à

Escola de Serviço Social como requisito à

obtenção do título de bacharel em Serviço Social.

Orientadora: Regina Coeli de Oliveira

Belo Horizonte

2005

9

“Aqui, o Serviço Social é considerado uma especialização do

trabalho coletivo, inserido na divisão social e técnica do

trabalho e, portanto, no topo das práticas sociais. Este fato

nos obriga a recuperar o conceito de profissão no contexto da

sociedade capitalista, apreendendo a dinâmica da construção

de uma prática no interior de uma relação contraditória entre

capital e trabalho.”

Ana Elizabete da Mota (1987)

10

11

Agradecimentos

À professora Regina Coeli, orientadora deste trabalho, agradeço pela disponibilidade,

atenção, carinho e pela confiança que depositou em mim nesta jornada.

Às empresas visitadas agradeço pela receptividade e colaboração.

A todos os entrevistados que se dispuseram e contribuíram para a construção de um

conhecimento sobre a Representação do Serviço Social em empresa.

A todos os professores que colaboraram para minha formação e que, com certeza,

fizeram um bom trabalho.

À minha mãe, ao meu pai e meus irmãos por cuidarem da Agnes com todo carinho

enquanto me dispunha a esse trabalho.

Agradeço, em especial, às colegas Fabiana e Indira, que num momento difícil descobri

serem verdadeiras amigas e que sem elas esse trabalho não seria possível, muito obrigada.

12

Dedicatória

Dedico este trabalho a todos aqueles que de alguma forma contribuíram para a

efetivação de mais esta etapa de minha vida. Em especial, à Agnes, pois é com o pensamento

em você que sonho com uma sociedade mais justa, onde o convívio social seja mais

harmonioso e os dias mais passíveis de serem vividos em sua plenitude.

13

Resumo: O presente trabalho pretende explicitar quais são as Representações do

Serviço Social existente dentro do contexto empresarial e fazer uma análise de como essas

Representações interferem na ação dos empregados. Para isso, foi necessário fazer um

levantamento histórico do Serviço Social a fim de saber como foram construídas essas

Representações. Buscou-se também fazer uma reflexão sobre as mudanças que têm ocorrido

no mundo do trabalho e como elas interferem na vida do empregado dentro de uma empresa.

14

SUMÁRIO:

I. INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 15

II. AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS: CONSTRUÇÃO E TRANSFORMAÇÃO ....... 22

III. SERVIÇO SOCIAL: DA ASSISTÊNCIA À CONSOLIDAÇÃO DOS DIREITOS

SOCIAIS .................................................................................................................................. 30

3.1. A prática da assistência ........................................................................................... 30

3.2. A Assistência Social após a Constituição de 1988 .................................................. 39

IV. O MUNDO DO TRABALHO ......................................................................................... 46

4.1. A Reestruturação Produtiva ..................................................................................... 46

4.2. Impactos das mudanças ocorridas no mundo do trabalho na vida do empregado ... 52

4.3. O eterno conflito entre empregados e empregadores .............................................. 56

4.4. O Serviço Social no contexto empresarial ............................................................... 57

4.4.1. Impactos da Reestruturação Produtiva no Serviço Social ......................... 60

V. AS REPRESENTAÇÕES DO SERVIÇO SOCIAL DENTRO DA EMPRESA ......... 66

5.1. As Representações do Serviço Social explicitadas no discurso dos representantes

dos empregadores – coordenadores do serviço social .................................................... 68

5.2. As Representações do Serviço Social explicitadas no discurso dos empregados ... 71

5.3. As Representações do Serviço Social explicitadas no discurso dos Assistentes

Sociais ............................................................................................................................. 74

CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................. 80

REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 85

15

I. INTRODUÇÃO

Antes mesmo de o Serviço Social ser reconhecido como profissão, sua prática, ainda

que impregnada exclusivamente pela caridade, sempre fez parte da ação humana.

Historicamente, a Assistência Social foi associada a práticas individuais de ajuda e benesse.

Devido a esse traço histórico, atualmente, o senso comum confunde e acaba por fundir dois

conceitos distintos e até mesmo antagônicos: o de Assistência Social e o de Assistencialismo.

A Assistência Social deve ser compreendida como uma prática que visa à promoção da

cidadania. Já o Assistencialismo consiste numa prática marcada pela caridade, onde o sujeito

é recebedor de ajuda e não um portador de direitos. A figura da Assistente Social ainda hoje é

tida como a representação da boa moça, que gosta de ajudar os pobres.

Essas marcas históricas que o Serviço Social carrega e outras associadas a forças

políticas e ideológicas1 criaram certas representações do Serviço Social no imaginário das

pessoas, que atualmente não condizem com a atuação profissional proposta pela Lei nº

8662/93 (BRASIL, 1993. Diário Oficial da União, Seção 1 - 08/06/1993, p. 7613), que

regulamenta a profissão e com o Código de Ética Profissional de 1993, instituído pela

Resolução CFESS nº 273/93 (BRASIL, 1993. Diário Oficial da União, Seção 1 - 30/03/03, p.

4004).

A despeito do reconhecimento da profissão, através da legislação acima referida, como

também da Assistência Social como política pública pela Constituição Federal de 1988,

enquanto dever do Estado e direito de cidadania, o que se observa é que a profissão não

conseguiu modificar as representações construídas no imaginário das pessoas de maneira

1 É fato que, historicamente, a Assistência Social se apresenta sob os interesses da classe dominante,

servindo como um dos mecanismos de estabilização das relações sociais, principalmente nas sociedades

capitalistas. O Serviço Social muitas vezes era utilizado para mediar relações desiguais de poder e dominação.

Com o Movimento de Reconceituação, a profissão passou por um processo de autocrítica e de construção de

alternativas para modificação de suas referências teóricas e de sua prática.

16

geral. Esta ainda é tida como uma forma de ajuda aos pobres, sendo um favor prestado aos

mais necessitados. Vale ressaltar que essas representações não consistem em criações da

imaginação das pessoas, não sendo, assim, totalmente equivocadas. Elas se pautam em fatos

históricos e reais e, até mesmo, em práticas conservadoras existentes até hoje.

Dentro de uma empresa, essa realidade não é diferente. Nesse espaço, pode-se

constatar claramente a contradição existente entre capital-trabalho. A referida contradição, de

alguma forma, expressa-se em todas as instituições da sociedade capitalista, mas no setor

empresarial ela é mais acirrada. De um lado, encontra-se o empregador, visando ao máximo a

obtenção de lucro. Do outro lado está o empregado, mão-de-obra necessária para a obtenção

do lucro do empregador, e que muitas vezes está fora do mercado consumidor das

mercadorias que produz. Mediando este eterno conflito entre empregados e empregadores

encontra-se a figura do Assistente Social (assim como outros profissionais, sobretudo aqueles

da área de Recursos Humanos).

Na empresa, o que se pode observar é que muitas vezes a prática profissional é

condicionada, entre outros fatores, pela representação que o empregador possui sobre a

profissão. Freqüentemente essa prática não responde aos anseios dos empregados, o que pode

ser explicado pelas representações construídas no imaginário desta classe. A ação do

profissional de Serviço Social também está condicionada pela representação que este possui

sobre seu próprio fazer. Entender qual é o trabalho desenvolvido pelo Assistente Social dentro

de uma empresa é de vital importância para se compreender como as representações acerca do

mesmo podem orientar suas ações.

É relevante afirmar que este é um setor que exige profissionais reflexivos2 e

comprometidos com a questão dos direitos e com a promoção da cidadania, ainda que seja um

2 Este setor de trabalho exige a presença de profissionais que tenham uma base teórica consistente, e

que esta teoria seja a responsável pela formação de profissionais mais conscientes e sensíveis à realidade que se

apresenta a ele.

17

setor de trabalho que muito limita a atuação do Assistente Social. Um profissional dessa área

deve estar atento para as mudanças que têm ocorrido no mundo do trabalho e que,

conseqüentemente, afetam diretamente sua atividade.

Observada esta disparidade existente entre a prática proposta pela Lei que regulamenta

a profissão – Lei 8662/93 – e as representações que se apresentam sobre a mesma, fez-se

necessário trilhar um caminho rumo a um conhecimento que perpassasse pela origem dessas

representações e em que elas se fundamentam até a compreensão de como essas

representações podem ou não balizar e condicionar ações de pessoas e até mesmo dos

próprios Assistentes Sociais. Assim, essa monografia tem como objeto de discussão “as

representações do Serviço Social e seu impacto na vida dos empregados de três grandes

empresas do Estado de Minas Gerais”. Ressalta-se que a palavra “empregados” engloba

todos os níveis hierárquicos das empresas – desde de o empregado de “chão de fábrica” até a

chefia, incluindo também os Assistentes Sociais.

Pensar nas representações que o Serviço Social apresenta e em seus impactos na vida

dos empregados suscita a colocação de alguns questionamentos:

O que são representações e como elas são construídas e transformadas?

Como se construíram as representações em relação ao Serviço Social?

O que essas representações podem significar dentro do contexto empresarial3?

Qual o impacto dessas representações na relação entre os empregados das

empresas e o Serviço Social?

Essas representações são ou não condicionadoras das ações dos Assistentes

Sociais?

As respostas para essas questões são de vital importância para a formação de

profissionais mais conscientes de seu papel perante a sociedade e capazes de atuar em um

3 Contexto este em que existe uma relação desigual entre empregados e empregadores e onde o conflito

capital e trabalho está presente de forma acentuada.

18

setor ainda tão pouco discutido dentro da Escola de Serviço Social. A realização de um

estágio dentro de uma empresa foi o incentivo na busca de conhecimentos mais específicos

sobre essa área. Nesse estágio constatou-se o quanto são contraditórias as representações que

os empregados têm do Serviço Social e a prática proposta pela Lei 8662/93 e o Código de

Ética da profissão. Ressalta-se que mesmo tendo uma Lei de regulamentação, ainda existem

profissionais comprometidos com uma prática conservadora e limitada, que acaba por

reafirmar as representações existentes da profissão ao invés de transformá-las.

Esta monografia pretende, além de contribuir para a formação de profissionais mais

comprometidos com a emancipação dos sujeitos no setor empresarial, apresentar elementos da

Teoria das Representações Sociais e sua relação com o Serviço Social.

O estudo das Representações Sociais tem ganhado visibilidade no Brasil e vem

obtendo a adesão de várias disciplinas da área de humanas, como o Serviço Social, Sociologia

e Antropologia. O “estudo em representações sociais tem mostrado o quanto esta noção e

sua correlata base teórica têm permitido uma compreensão e explicação aprofundada dos

fenômenos sociais” (ALMEIDA, 2001, p. 131).

Ressalta-se que a presente monografia tem como base uma pesquisa realizada em dois

semestres, nas disciplinas Oficina de Pesquisa I e II (no período de agosto de 2004 a junho de

2005), do Curso de Serviço Social, pelas alunas Danielle Teixeira Campos de Carvalho,

Fabiana Dias e Indira Trindade. No primeiro semestre foi elaborado o projeto de pesquisa,

baseado no levantamento e em leituras bibliográficas; e no segundo, foi realizado o trabalho

de campo, onde se teve mais contato com o objeto em si. Esta pesquisa produziu um relatório

final e, a partir desse relatório, foram elaboradas duas monografias diferentes.

O referencial teórico utilizado na pesquisa baseou-se especificamente em obras que

contemplavam o trabalho do Assistente Social dentro da empresa. Os autores mais utilizados

foram Ana Elizabete Motta e Maria Elizabete Antunes Lima. Ambas as autoras abordam as

19

mudanças no processo produtivo e como o Serviço Social se apresenta frente a essas

mudanças. Para elaboração do presente trabalho foi necessária a construção de um novo

referencial teórico, pautado especificamente nas representações sociais, ou seja, foi preciso

buscar obras que explicitassem o que são essas representações sociais, como elas são

construídas e o que podem significar perante a ação humana. Consultaram-se autores como

Ângela Maria de Oliveira Almeida, Carmen Lícia Macedo de Almeida, Wilse Arena da Costa

e outros que também trabalham essa questão. Além disso, foi utilizada uma obra de Maria

Lúcia Martinelli, que faz um levantamento histórico sobre o Serviço Social; e também autores

que discutem a Reestruturação Produtiva. Os referidos autores estão indicados nas

Referências desta monografia.

A metodologia utilizada na pesquisa, da qual parte a presente monografia, foi baseada

na via qualitativa, que tem como fundamento a existência de uma relação dinâmica entre o

mundo real e o sujeito, uma interdependência viva entre o sujeito e o objeto. O objeto não é

um dado inerente e neutro, mas está possuído de significados e relações que sujeitos concretos

criam em suas ações.

A fenomenologia foi a principal corrente filosófica utilizada, ao propor que é

necessário ir além das manifestações aparentes para que os fenômenos possam ser captados e

para que seja desvendado o sentido oculto das impressões imediatas. A pesquisa teve uma

natureza teórico-empírica, com a construção inicial de um referencial teórico, como já foi

explicitado, seguida da realização da pesquisa de campo em três empresas do Estado de Minas

Gerais, e posterior análise dos dados obtidos, mediante uma prévia categorização.

Como instrumento de coleta de dados foi utilizada a entrevista, que é a possibilidade

de contato do entrevistador com o tema abordado. Escolheu-se a entrevista semi-estruturada,

que combina perguntas estruturadas com eventuais perguntas que possam surgir durante a

entrevista, onde o entrevistado tem a possibilidade de discorrer sobre o tema proposto, sem

20

repostas ou condições prefixadas. Foram elaborados quatro roteiros de entrevistas: um

destinado às Assistentes Sociais, outro a coordenadores do Serviço Social, ou seja,

representante dos empregadores, outro aos empregados das empresas e outro a membros dos

sindicatos.

Para se resguardar a integridade dos profissionais e não expôr o trabalho executado

pelos mesmos, não foram identificadas as empresas pesquisadas. Elas serão referidas como

empresas A, B e C.

Visando, na monografia, o aprofundamento da análise das entrevistas feitas nas

empresas pesquisadas, na tentativa de apreender as representações acerca do Serviço Social

contidas no discurso do empregados, será necessário

observar como este conjunto de valores, normas sociais e modelos culturais são

pensados e vividos pelos indivíduos de nossa sociedade, estudar como se elabora,

como se estrutura lógica e psicologicamente, a imagem destes objetos sociais.

(ALMEIDA, 2001, p. 141)

Buscar-se-á também “examinar como as representações engendram atitudes e

comportamentos a partir de saberes, de informação que circulam, acerca do objeto”

(ALMEIDA, 2001, p. 141-142)

Esta monografia será composta por quatro capítulos:

O primeiro capítulo explicitará o que são as Representações Sociais e como

elas são construídas e transformadas.

O segundo capítulo fará uma recuperação das várias conotações atribuídas à

Assistência ao longo dos tempos, bem como abordará a história do Serviço

Social neste contexto.

O terceiro capítulo abordará as modificações ocorridas no mundo do trabalho,

tratando sobre a Reestruturação Produtiva, seus impactos na vida dos

21

trabalhadores e a contradição existente entre empregados e empregadores.

Falará também sobre o Serviço Social neste contexto.

O quarto capítulo abordará as Representações do Serviço Social dentro da

empresa e seus impactos na vida dos empregados.

Nas Considerações Finais serão explicitados os aspectos mais relevantes

contidos na pesquisa realizada.

Finalmente, a apresentação da monografia, com a finalidade de se obter o título de

bacharel em Serviço Social, será feita a uma banca, composta por três membros, cuja

composição segue as normas estabelecidas pela Escola de Serviço Social. O primeiro

membro é a professora orientadora desse trabalho Regina Coeli de Oliveira. Os dois outros

membros são professores convidados, que apresentam um vasto conhecimento em relação ao

tema da monografia e que poderão fazer considerações construtivas sobre esse trabalho.

Foram convidadas as Professora Maria Nadir de Sales do Amaral Militão4 e a Professora

Maria Helena Villefort5.

Finalmente, essa monografia representa o término de um caminho percorrido ao longo

de quatro anos e meio de graduação em Serviço Social, caminho esse marcado por muitas

vitórias e aprendizados que, com certeza, serão levados pela vida inteira.

4 Doutora em Serviço Social pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e Professora Adjunta

III da Escola de Serviço Social da PUC Minas. Pesquisadora do NETE/FAE/UFMG – Núcleo de Estudos sobre

Trabalho e Educação. 5 Assistente Social com experiência no setor empresarial por 26 anos. Professora da Escola de Serviço

Social da PUC Minas.

22

II. AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS: construção e transformação

O conceito de Representação Social é um conceito que já foi trabalhado por diversos

autores. Observa-se que cada um deles teve uma particularidade ao trabalhar este assunto:

alguns focaram o aspecto individual, outros o aspecto coletivo, outros enfatizaram a dinâmica

das Representações Sociais. O quadro abaixo explicita o significado de Representação Social

para esses autores:

Autores

Significado de Representação Social

Freud

1856 - 1939

Mostra como as representações passam do coletivo para o individual e

como o social interfere nas representações individuais. Para ele, a

representação é um processo que transforma o resultado coletivo em dado

individual e marca o caráter da pessoa.

Lewy-Bruhl

1857 - 1939

Tenta superar a oposição durkheiniana entre indivíduo e sociedade. Para

ele, Representações Sociais são os sentimentos comuns que influenciam os

indivíduos.

Durkheim

1858 - 1917

Durkheim foi um filósofo que reconheceu a oposição: indivíduo e

sociedade existiam as Representações Individuais e Representações

Coletivas. As primeiras referem-se à consciência própria de cada uma

(subjetiva, flutuante). As segundas referem-se à sociedade em sua

totalidade. São estas que fazem a ligação necessária entre os indivíduos e

mantém a harmonia da sociedade.

Simmel Representação Social era o operador que permitia ações recíprocas entre os

23

1858-1918 indivíduos.

Weber

1864-1920

Representação Social é o vetor da ação dos indivíduos, ou seja, seria um

saber comum com o poder de antecipar e prescrever o comportamento dos

indivíduos.

Piaget

1896 - 1980

Preocupa-se com o desenvolvimento do indivíduo, principalmente das

crianças. Afirma que as diferenças entre adultos e crianças estão na forma

de pensar. Mostra que a estrutura do pensamento e aprendizado infantil se

dá por imagens e também pelo processo de corte e cola, onde se junta

fragmentos que a criança já conhece (o que ela tem como representação)

para formar uma configuração que traduz o que ela desconhece.

Neste sentido, observando que os estudos realizados até então sobre Representação

Social eram fragmentados e não contemplavam a total abrangência deste conceito, Serge

Moscovici6 desenvolve, em 1961, a Teoria das Representações Sociais. Esta Teoria foi

desenvolvida na tentativa de se explicar como se dá a mediação entre o indivíduo e a

sociedade. Ele negou as explicações essencialmente sociais, que visavam apenas a

coletividade, e também as que abarcavam apenas os aspectos cognitivos individuais.

Moscovici estudou as Representações Sociais focando-se nas ações, no momento, nas

interações entre indivíduo e sociedade. Para ele, a sociedade só existe se existir indivíduo e o

indivíduo só existe na sociedade. É na observação desta dialética existente entre indivíduo e

sociedade que surge a Teoria das Representações Sociais.

Segundo Moscovici, citado em COSTA (s/d), Representação é uma construção

individual, mas sua origem é social, assim como seu destino. Neste sentido, ele buscou

compreender como o social interfere na elaboração das Representações dos indivíduos e como

6 Formado em Psicologia - Diretor do Laboratório Europeu de Psicologia Social – Maison / Paris -

FRANÇA

24

estas interferem na elaboração das Representações dos grupos. Moscovici, citado em COSTA

(s/d), define Representação Social como a ação, o movimento de interação entre as pessoas. É

a primeira forma de conhecimento individual que só ocorre na interação com os outros

indivíduos da sociedade. Consiste num movimento coletivo em que se busca dar sentido,

significação às coisas. Nesta perspectiva, observa-se que a Representação Social corresponde

à atribuição de sentido a um determinado objeto/figura, como se pode perceber no esquema

abaixo:

OBJETO/FIGURA ↔ SENTIDO

Ressalta-se que a todo objeto/figura é atribuído um sentido e todo sentido corresponde

a uma figura, sendo a relação entre objeto/figura uma relação de mão dupla. Assim:

...por representações sociais queremos indicar um conjunto de conceitos, explicações

e afirmações interindividuais. São equivalentes, em nossa sociedade, aos mitos e

sistemas de crenças das sociedades tradicionais; poder-se-ia dizer que são a versão

contemporânea do senso comum. (Moscovici. In: COSTA, s/d)

Moscovici chama atenção ainda para o modo pelo qual ocorre o processo de difusão,

propagação e propaganda entre os diferentes segmentos culturais que compõem a sociedade.

Para ele, esses elementos interferem diretamente na forma e no significado do conhecimento

construído por cada grupo. Assim, pode-se dizer que as Representações Sociais variam de

grupo para grupo e dependem diretamente destes, ou seja, cada grupo, ao receber uma

informação, irá decodificá-la de acordo com as referências (Representações) que o grupo já

construiu em seu imaginário. Ressalta-se também que o acesso e o tipo de informação visam,

muitas vezes, confirmar as Representações pré-existentes daquele determinado grupo, sendo

muitas vezes meio de manutenção de poder.

Jodelet (1984), outra autora que trabalha com este conceito e segue a linha de

pensamento de Moscovici, afirma que a Representação Social refere-se à maneira como os

25

sujeitos sociais apreendem os acontecimentos da vida cotidiana, as informações do contexto

em que estão inseridos, os acontecimentos, as pessoas etc.. Representação Social diz respeito

aos conhecimentos acumulados a partir das experiências, informações, saberes e modelos de

pensamentos que cada indivíduo recebe e transmite através da tradição, da educação e da

comunicação. Esta autora formula uma definição clássica de Representação Social, e que

pode ser encontrada na obra de ALMEIDA (2001):

Forma de conhecimento corrente, dito „senso-comum‟, caracterizado pelas seguintes

propriedades: 1. Socialmente elaborado e partilhado; 2. Tem uma orientação prática

de organização, de domínio do meio (material, ideal, social) e de orientação das

condutas e da comunicação; 3. Participa do estabelecimento de uma visão de

realidade comum a um dado conjunto social (grupo, classe, etc) ou cultura.

Após a apreensão dos conceitos supramencionados, destacam-se algumas

características das Representações Sociais:

Forma de conhecimento socialmente elaborada e partilhada;

Expressam valores e ideologias de um determinado grupo e “explicam”

comportamentos sociais, pois dependem da concepção de ser humano e de

sociedade que o indivíduo apresenta;

Têm por função estabelecer a comunicação entre os indivíduos e a orientação

de suas ações;

São teorias do senso-comum de que o ser humano lança mão na vida cotidiana

para interpretar e construir a realidade social.

É um fenômeno psicossocial;

Permitem aos indivíduos compreender e explicar a realidade;

Determinam ações ao mesmo tempo em que explicam e justificam as mesmas;

São construídas e transmitidas historicamente.

26

Para Moscovici existem dois processos maiores que mostram como o social se

transforma em representação e como esta transforma o social. O quadro abaixo explicita

esquematicamente esses dois processos:

1. Processo de Objetivação

Processo pelo qual um indivíduo

reabsorve um excesso de significações,

meterializando-as. É um processo de

construção formal de um

conhecimento. Neste processo, o

indivíduo torna concreto aquilo que é

abstrato.

Orienta as percepções e os julgamentos

do indivíduo em uma realidade

socialmente construída.

1.1. Seleção e descontextualização = fenômeno

que se dá em função de critérios culturais, uma vez

que numa sociedade de classes nem todos os grupos

têm o mesmo acesso às informações. Estas são

apreendidas pelo público de forma fragmentada,

distorcida de sua origem, mas acessível ao

conhecimento popular.

1.2. Núcleo figurativo = é um processo psíquico

interno pelo qual o indivíduo procura tornar um

objeto ou conhecimento novo em algo familiar,

coerente com o referencial que já traz consigo, e

para isso, forja uma visão do objeto que seja

coerente com sua visão de mundo.

1.3. Naturalização = permite ao indivíduo

materializar os elementos da ciência em elementos

da sua realidade, em senso-comum. Dota os

elementos de uma realidade própria e de significado

próprio, coerente com sua capacidade de

compreender, bem como com suas necessidades de

eliminar qualquer contradição que fragilize a base

de suas representações sociais já cristalizadas.

27

2. Ancoragem

Assegura o elo entre a função cognitiva

de base da representação e a sua função

social, bem como fornece à objetivação

os elementos imaginários para servir na

elaboração de novas representações. Dá

sentido ao objeto que se apresenta a

nossa compreensão.

2.1. Ancoragem como consignação de sentido =

está relacionada ao jogo de significações existentes

que incidem sobre as relações estabelecidas entre os

diferentes elementos da representação (como os

diferentes grupos sociais). Daí que, a um mesmo

objeto, inscrevem-se diferentes perspectivas,

encarnando diferentes sistemas de valores.

2.2. Ancoragem como instrumento de saber =

permite compreender como os elementos da

representação não só exprimem relações sociais,

mas também contribuem para construí-las.

Um outro autor importante, que também é discípulo de Moscovici, é Jean-Claude

Abric (1994), Este autor, ao desenvolver o conceito de núcleo ou sistema central e elementos

periféricos das Representações Sociais, permitiu compreender e explicar o processo de

transformação das mesmas. Para ele, o núcleo central refere-se às representações construídas

a partir de condições históricas particulares de um grupo social. Este seria estável, coerente,

consensual. Já os elementos periféricos referir-se-iam às adaptações individuais destas

representações em função da história de vida de cada membro desse mesmo grupo. Neste

sentido, o autor observa que as Representações Sociais têm origem na coletividade, mas isso

não impede que os indivíduos dêem a essas representações um toque singular. Cada indivíduo

pode formar um sistema de pensamento diferenciado e, ao mesmo tempo, coerente com o

pensamento do grupo ao qual está inserido.

No que se refere ao processo de transformação das Representações Sociais, Abric,

citado por COSTA (s/d), considera que quando os indivíduos desenvolvem práticas que

28

contradizem seu sistema de representação podem ocorrer dois tipos de transformação

possíveis nas mesmas:

Tipo de transformação O que se observa

1. Aqueles que consideram que o retorno às

práticas antigas é possível não há

modificação no sistema central.

Nesta transformação os elementos novos e

discordantes vão ser integrados nas

representações por uma transformação do

sistema periférico, enquanto o núcleo central

da representação permanece estável e

insensível a estas modificações.

2. Aqueles que consideram que o retorno às

práticas antigas é impossível

2.1. Transformação resistente = refere-se à

aparição no sistema periférico de esquemas

estranhos que permite mudanças também

periféricas, sem comprometimento do

sistema central. Tais esquemas só permitem

uma transformação mais radical se forem

reincidentes.

2.2. Transformação progressiva = diz

respeito a uma mudança progressiva do

próprio núcleo da representação e, portanto, a

construção de uma nova representação, na

medida em que as práticas novas não sejam

totalmente contraditórias com o núcleo

central já cristalizado.

29

2.3. Transformação brutal = refere-se à

possibilidade de uma mudança por meio de

uma estratégia mais radical, ou seja,

colocando em questão diretamente a

significação central da representação sem

possibilidade de recorrer aos mecanismos

defensivos aos quais o sistema periférico

pode lançar mão mudança brusca no

sistema central.

Tendo como referência os aludidos autores, e conseqüentemente, os conceitos

supramencionados, buscar-se-á, no capítulo seguinte, identificar e fazer emergir os elementos

constitutivos das representações acerca do Serviço Social no setor empresarial. Ressalta-se

que as Representações Sociais não são fenômenos apenas do imaginário das pessoas. São

processos cognitivos que emergem na realidade e nela se pautam. É bem verdade que pode

ocorrer uma deturpação dessa realidade, mas as representações não deixam de conter algo de

verossímil em seu discurso.

30

III. SERVIÇO SOCIAL: DA ASSISTÊNCIA À CONSOLIDAÇÃO DOS DIREITOS

SOCIAIS

Como foi observado no Capítulo anterior, as Representações Sociais são compostas

por um acumulo histórico muito grande. Neste sentido, faz-se necessária uma recuperação do

passado, analisando certas marcas históricas do Serviço Social, para que se possa entender

como foram construídas as Representações Sociais acerca do Serviço Social no setor

empresarial que se apresentam na atualidade.

3.1. A Prática da Assistência

A prática da assistência é uma prática muito antiga e que recebeu várias conotações ao

longo da história. Desde a antiguidade esta prática está presente na vida humana. Há três mil

anos antes de Cristo observa-se a presença desta ação nas Confrarias do Deserto. Estas tinham

o objetivo de facilitar a marcha das caravanas, forneciam repouso e o que fosse necessário

para a melhoria da travessia. A assistência, neste sentido, recebia a conotação de caridade,

onde uns eram benevolentes com os outros. Mais tarde, mas ainda no período pré-cristão,

estas confrarias se adentraram para as cidades com o intuito de ajudar aqueles que sofriam por

causas como doenças, dor, perdas etc.. Esta ajuda consistia em esmolas que eram fornecidas

esporadicamente, em visitas domiciliares, no fornecimento de alimentos, roupas, ou seja,

eram ações desenvolvidas para minimizar o sofrimento das pessoas.

31

Na Grécia, século IV a.C., Platão e Aristóteles fizeram uma reflexão sobre a melhor

forma de se realizar a assistência, principalmente na forma de conceder a esmola. Assim, “o

posicionamento desses filósofos apontava para a necessidade de se racionalizar a prestação

da assistência, eliminando-lhe o caráter de manifestação meramente eventual ou esporádica”

(MARTINELLI, 1986, p. 84).

Com o Cristianismo, a assistência, além se ser uma forma de se fazer a caridade,

passou a ser percebida como uma forma de “justiça social”, onde se enfatizava a dimensão

espiritual e não a noção de direito. Observa-se nos livros cristãos que a realização da

assistência era uma forma de se fazer o bem e de se estar conectado a Deus, principalmente a

assistência prestada aos mais necessitados. Com a institucionalização da Igreja esta tarefa

ficou a cargo de membros da mesma, mas, em seguida, ela se estendeu às confrarias. As

“ações se ampliaram, passando a envolver a realização de inquéritos sociais, além das

visitas domiciliares para a constatação das necessidades dos solicitantes de ajuda”

(MARTINELLI, 1986, p. 85).

Nota-se, no decorrer da história, que várias foram as formas assumidas pela assistência

e também vários foram os instrumentos para concretizá-la. Porém todas essas formas se

pautavam na caridade, ou melhor, muitas vezes o discurso da caridade era um instrumento de

camuflagem de práticas de exploração, repressão e de dominação política e ideológica.

Na época medieval e em períodos mais recentes, como no início do século XIX, a

assistência era um instrumento utilizado para o controle da pobreza, na tentativa de minimizar

o sofrimento daqueles que não detinham posses. Era também utilizada como meio de

convalidar a sujeição dos pobres, ou seja, de um lado tinha-se a assistência, que estava sob

controle da classe dominante, de outro se observava o seu recebedor, que, de certa forma, se

sentia na necessidade de retribuir pelo “favor” recebido. Assim, “seja na assistência prestada

pela burguesia, seja naquela realizada pelas instituições religiosas, havia sempre intenções

32

outras além da prática da caridade. O que se buscava era perpetuar a servidão, ratificar a

submissão”. (MARTINELLI, 1986, p. 85)

Com a maior organização da Igreja Católica, esta foi cada vez mais se distanciando

dos pobres e aliando-se à burguesia. De forma progressiva, a assistência foi sendo usada como

instrumento de poder e de dominação. No século XVI, o que se observava era a Igreja como

uma instituição extremamente mercenária, que se preocupava muito mais com questões

financeiras. Havia venda de indulgência e, inclusive, do perdão de Deus.

Indignado com a postura assumida pela Igreja Católica, Martim Lutero (séc XVI)

funda o protestantismo, conseguindo a adesão de grande parte da massa popular. Para ele, a

responsabilidade pela prática da assistência era do Estado e não mais deveria ser prestada pela

Igreja. Neste sentido, as bases cristãs da assistência ficaram abaladas e necessitaram de uma

nova organização.

No século XVII, São Vicente de Paulo tenta restabelecer as bases cristãs da assistência

e conquista vários adeptos. Mas com a Revolução Francesa (1789), a assistência assume um

outro papel: passa a ser reconhecida como um direito do cidadão, sendo que todos deveriam

prestá-la. Porém, neste contexto, surge um grande problema: a assistência não era assumida

por ninguém. O Estado não cumpria esse papel e transferia para a família a responsabilidade

de manutenção de seus membros. Por outro lado, a classe subalterna não possuía meios de

sobrevivência: trabalho, moradia, saúde, alimentação. Assim, a assistência foi, mais uma vez,

instrumento de dominação e poder da classe dominante, pois esta utilizava-se desta prática

como forma de sujeição dos pobres e da classe trabalhadora.

No século XIX observa-se o desenvolvimento do capital industrial. Neste período

constataram-se várias mudanças no âmbito econômico, político e social. Modificaram-se as

relações sociais e um novo ritmo de vida e de trabalho foram inseridos na sociedade. Tal

cenário é marcado pela desigualdade e pelo antagonismo de classes. Ocorre a exploração da

33

força de trabalho, o que acarreta o surgimento da chamada “questão social”7. Há um

movimento de valorização do capital e um grande poder da burguesia industrial emerge sobre

a exploração da força de trabalho.

A situação da classe operária era caótica. Era grande o número de operários sem

emprego, crescia o desemprego e conseqüentemente a miséria e a crise social. A maioria

absoluta dos trabalhadores vivia em condições sobre-humana. As cidades, que não estavam

preparadas para receber o enorme contingente de pessoas, não possuíam saneamento básico

adequado e nem moradias suficientes, o que agravava ainda mais a situação física dos

trabalhadores. A qualidade de vida, praticamente inexistente, era degradada a cada dia pela

miséria absoluta da classe operária. Era alto o índice de mortalidade e morbidade nas cidades.

Tudo isso gerava uma grande inquietação nos trabalhadores, que não conseguiam mais se

calar diante de sua extrema situação de pobreza. Era preciso fortalecer a consciência de classe

para criar um proletariado capaz de superar a alienação, a exploração, a desigualdade e a

contradição do sistema capitalista. Os trabalhadores queriam condições mais dignas de

trabalho e melhores salários, queriam condições para regerem sua própria vida e serem

sujeitos de sua história.

A burguesia considerava-se extremamente forte e com seu poder hegemônico

intocável. Ela não se preocupava, inicialmente, com a situação operária. Isso porque

acreditava que o modo de produção e o domínio do capital eram irreversíveis. Aos poucos ela

foi sendo abalada pelas crescentes crises que ocorriam na sociedade, porque tais crises eram

empecilho para a expansão do capital. A burguesia acreditava que a pobreza era condição para

a existência do capitalismo. Mas, aos poucos, começou a perceber que a pobreza absoluta que

se mostrava no cenário social impedia o desenvolvimento do capital. Posteriormente, com o

crescimento político da classe operária, a burguesia sentiu-se ameaçada e teve que tomar

7 “Questão Social” pode ser compreendida como os problemas sociais que surgiram com a expansão

capitalista.

34

decisões que garantissem a expansão capitalista e a manutenção de seu poder. Foi necessário

pensar em estratégias para conter essa ameaça crescente. Pode-se dizer que no final do século

XIX a “questão social” era vista como uma “pesada nuvem sobre o horizonte burguês. Seus

efeitos transcendiam os limites das vilas operárias e denunciavam a falência da ordem

burguesa e das formas de assistência por ela engendradas” (MARTINELLI, 1986, p. 73)

Observa-se, então, a união da burguesia com a Igreja Católica e posteriormente com o

Estado na tentativa de minimizar a “questão social”. Essa união surgiu de uma tentativa de se

racionalizar a assistência e torná-la eficiente no controle dos trabalhadores, perpetuando uma

situação de sujeição e submissão da classe operária. O maior objetivo era bloquear o

movimento operário. Para isso, foi necessária a criação de políticas que garantissem o poder e

a hegemonia da burguesia. Assim, a burguesia e a Igreja Católica firmaram uma aliança e

criaram, na Inglaterra, a Sociedade de Organização da Caridade – SOC. Assim,

em seus esforços de racionalizar a assistência a SOC criara a primeira proposta de

prática para o Serviço Social no terço final do século XIX. Entendia a Sociedade que

só coibindo as práticas de classe dos trabalhadores, impedindo suas manifestações

coletivas e mantendo um controle sobre a “questão social” é que se poderia assegurar

o funcionamento social adequado. (MARTINELLI, 1986, p. 87)

Nota-se que a assistência assume três funções principais: função econômica, função

ideológica e função de controle. A primeira refere-se à necessidade de se garantir a expansão

do capital, não sendo a classe subalterna um empecilho a este objetivo. A segunda refere-se ao

uso da assistência como instrumento de dominação, submetendo a classe subalterna à

repressão da burguesia. Já a terceira refere-se à “resposta da burguesia à ameaça social que

decorria da acelerada expansão da pobreza e da generalização da miséria” (MARTINELLI,

1986, p. 87). Assim, a Burguesia utilizava-se da Assistência como forma de controlar a classe

trabalhadora. Nota-se que a SOC tinha a tarefa de racionalizar a Assistência e era também um

instrumento utilizado pela burguesia para desenvolver seu projeto de hegemonia do capital.

35

Não se pode negar que no período que vai do século XIX ao início do século XX

vários foram os nomes que se destacaram na realização de trabalhos voltados especificamente

para os pobres, mas pensando na assistência não como instrumento de poder e sim como

mecanismo de se ajudar ao próximo. Neste contexto destacam-se: John Brunnel Davis, Juan

Luiz Vives, Thomas Chalmers, entre outros.

Ao longo do tempo, a assistência foi integrada a um tripé também composto pela

educação e higiene. Isso se deu pela constatação de que o adoecer, juntamente com os altos

índices de mortalidade, ocorriam nas classes mais pobres e exigiam um trabalho conjunto para

que os efeitos da pobreza não repercutissem tanto na saúde dos indivíduos.

Em 1865, foi iniciado em Londres, por iniciativa de Octavia Hill, um trabalho de

educação familiar. Neste trabalho pode-se ter maior contato com a família dos operários.

Neste período, entendiam-se as reivindicações trabalhistas e os problemas de subsistência

desta classe como “problemas de caráter” (MARTINELLI, 1986, p. 91). Assim, “a Sociedade

de Organização da Caridade adotou e difundiu a idéia de Assistência Social como uma ação

de reforma de caráter” (MARTINELLI, 1986, p. 91). Neste sentido, a prática da assistência

era utilizada como instrumento capaz de modelar o caráter das pessoas.

Em 1884 foi criado o Primeiro Centro de Ação Social em Londres, que se focava no

trabalho domiciliar e preocupava-se com questões relacionadas à saúde e higiene. Após este

período, várias sedes da Sociedade de Organização da Caridade foram fundadas pelo mundo,

principalmente em Nova Iorque e Londres.

No início do século XX, a SOC era a instituição de maior porte no âmbito da

Assistência Social. Com o decorrer dos tempos a SOC sofreu contínua especialização. A

visita domiciliar era um instrumento poderoso na disseminação do “modo capitalista de

pensar” (MARTINELLI, 1986, p. 92). Assim,

Perseverando em sua concepção de pobreza e de contestação à ordem estabelecida

como problemas de caráter, a burguesia assumia com mãos de ferro o controle sobre a

36

situação dos trabalhadores e dos pobres. A visita domiciliar continuava a ser utilizada

com “fins de inspeção”, e as instituições de beneficência previstas em Lei deveriam

educar o trabalhador para que se tornasse dócil relativamente à política e à religião

reinantes. (MARTINELLI, 1986, p. 92)

Pode-se dizer que a burguesia utilizava-se da visita domiciliar, e conseqüentemente da

assistência, como forma de controlar a vida do trabalhador.

Após a Primeira Guerra Mundial, o mundo se via em uma situação de extremo

conflito: grandes problemas econômicos, políticos e principalmente sociais. Este cenário

conturbado exigia medidas urgentes na tentativa de solucionar os problemas existentes. A

pobreza, nesta fase, já havia se alastrado pelo mundo, sendo um fenômeno mundialmente

conhecido. Mais uma vez a burguesia se une à SOC e utilizam da assistência como

instrumento de controle da massa pauperizada.

Nos anos anteriores à Segunda Guerra Mundial e durante sua vigência a prática da

assistência já estava bem mais racionalizada, e materializava-se na atuação de profissionais

que já recebiam formação acadêmica. Em 1898, havia sido criada a primeira Escola de

Filantropia Aplicada, onde já estavam presentes as práticas que deram embasamento à

profissão e à criação das escolas de Serviço Social nos anos posteriores.

Após a Segunda Guerra, a assistência já assumia um novo perfil: sua base religiosa foi

cada vez mais assumindo a forma de conhecimento científico. As escolas de Serviço Social se

espalhavam pelo mundo, principalmente nos Estados Unidos e Europa, e a prática da

assistência foi recebendo, aos poucos e muito lentamente, a conotação de direito. Isso porque

a assistência, enquanto caridade, não mais respondia aos anseios de uma população que havia

passado por várias revoluções (Inglesa, Francesa, Revolução Russa e Mexicana...) e Guerras,

onde os ideais de direitos humanos já eram mundialmente conhecidos. Assim, para a

burguesia “a parceria com a Igreja Católica foi progressivamente substituída pelo Estado,

37

cuja presença tornava-se, a cada momento, mais insinuante, tanto no cenário social como no

econômico” (MARTINELLI, 1986, p. 121).

No Brasil, essa realidade não foi diferente. O Serviço Social surgiu enquanto profissão

na década de 30. Foi uma iniciativa da burguesia que teve como apoio fundamental a Igreja

Católica. Aqui as práticas da assistência foram inicialmente voltadas para a tentativa de se

conter o movimento operário, que crescia e ganhava força política. A assistência neste período

era entendida como uma “força disciplinadora e desmobilizadora do movimento do

proletariado” (MARTINELLI, 1986, p. 122).

Em São Paulo, foi criado o Centro de Estudos e Ação Social – CEAS. Funcionava

como uma escola, no sentido da formação de agentes para se trabalhar com a assistência.

Ressalta-se que inicialmente os cursos de Serviço Social eram destinados especificamente

para moças, na maioria absoluta, católicas e pertencentes à burguesia. Pode-se dizer que o

caráter feminino atribuído ao curso demonstra nitidamente a ligação existente entre a

assistência e a caridade neste período no Brasil8. Dessa forma,

a identidade atribuída ao Serviço Social pela classe dominante era uma síntese de

funções econômicas e ideológicas, o que levava à produção de uma prática que se

expressava fundamentalmente como um mecanismo de reprodução das relações

sociais de produção capitalista, como uma estratégia para garantir a expansão do

capital. (MARTINELLI, 1986, p. 124)

Destarte, observa-se que a prática do Serviço Social era um mecanismo de

manutenção de poder da classe dominante. Visava a expansão capitalista às custas da

submissão da classe trabalhadora, sendo a profissão um dos instrumentos de “amarra”9 dos

trabalhadores.

8 Ressalta-se que o Brasil apresenta um déficit político, cultural e econômico histórico em relação a

países Europeus e Norte-americanos. 9 Isso porque o recebedor dos benefícios, ou seja, a classe trabalhadora, via a Assistência como um

favor prestado pelo patrão. Dessa forma se sentia na obrigação de retribuí-lo, sendo o meio mais viável a

submissão silenciada.

38

No decorrer da história, vários profissionais passaram a questionar essa função de

contribuição para a reprodução do capital. Começaram a perceber a alienação que existia na

prática e no discurso profissional, sendo inclusive utilizados como fantoches na mão da

burguesia. Os profissionais começaram a perceber que

A ausência de movimentos históricos de construção coletiva de um sentido comum

para a profissão havia produzido, portanto, um saldo muito negativo: os assistentes

sociais compunham uma categoria sem identidade profissional própria. De tanto

responderem a pressões externas aos circuitos da profissão, determinadas pelos

interesses hegemônicos da classe dominante, haviam deixado de construir a própria

identidade, a sua consciência coletiva em termos de projeto político e ação

profissional. (MARTINELLI, 1986, p. 128)

Com isso, as décadas de 50/60 foram marcadas por uma tentativa de se concretizar

uma identidade para a profissão. Percebia-se a Assistência não mais como uma forma de se

fazer a caridade, mas como um meio importante de se materializar os direitos do indivíduo.

Vários profissionais passaram a questionar o fazer profissional, o que culminou na década de

60/70 no Movimento de Reconceituação. Este movimento tinha natureza contestatória e

colocava novas exigências para a atuação profissional do Assistente Social. Como explicita

Mota:

O Movimento de Reconceituação se cria e se desenvolve a partir da identificação da

utilização político-ideológica da profissão pelo capital e da negação de uma prática

conservadora do Serviço Social, afirmando um compromisso político com a classe

subalterna. A contestação do conservadorismo da ação profissional, da existência de

projetos sociais antagônicos e, finalmente, da impossibilidade de uma prática

profissional neutra levou o movimento a contestar a organização do Serviço Social

como o capital e a postular a inversão do nexo político no sentido de uma vinculação

com a classe dominada. (MOTA, 1987, p. 16-17)

Com esse Movimento, observa-se uma tentativa de mudança de postura do Assistente

Social perante sua prática profissional, buscando tornar-se um profissional mais questionador

e crítico. Ressalta-se que apesar da importância do movimento ele não conseguiu atingir toda

a categoria profissional, limitando-se a setores profissionais específicos. A partir desse

período, iniciou-se uma busca incessante na tentativa de se legitimar a Assistência enquanto

39

um direito do cidadão. Tal fato concretizou-se apenas com a Constituição de 1988, que elevou

a assistência ao patamar de direito social, fazendo parte do tripé da Seguridade Social:

Previdência, Saúde e Assistência Social.

Vale destacar que apesar do longo processo que elevou a assistência ao patamar de direito,

a prática do Serviço Social ainda é marcada por atuações profissionais conservadoras, que

utilizam-se do discurso da ajuda como meio de manutenção do poder. A associação do Serviço

Social a práticas benevolentes permeia o imaginário das pessoas, sendo esta representação ainda

muito marcante na sociedade brasileira.

3.2. A Assistência Social após a Constituição de 1988

O início da década de 80 foi marcado por grandes complicações no cenário político,

econômico e social. Economicamente, a Ditadura Militar não conseguia mais conter o

descontrole inflacionário que assolava o país, fato este responsável pela falência do modelo

econômico implantado pelos militares. O cenário político já se apresentava conturbado, havia

uma grande mobilização social em busca de liberdade, democracia e eleição direta para

presidente da República. Neste período houve uma emergência dos movimentos sociais, ou

seja, as pessoas mobilizavam-se por idéias em comum, por reconhecerem-se enquanto iguais

e pela experiência que fora compartilhada na Ditadura Militar – experiência de repressão e

medo. Havia um sentimento de integração social. A luta pela democracia foi um fenômeno de

longa duração que contou com a participação voluntária, autoconstituição e principalmente

autonomia de seus participantes. Autonomia essa que vai desde a possibilidade de agir por si

só à execução dessa ação de forma crítica, propositiva, emancipatória e não apenas

contestatória. Ou seja, os movimentos que surgiam nesse período tinham uma natureza

40

propositiva e não apenas iam contra algo que já estava por terminar. Ressalta-se que a

sociedade brasileira neste período teve uma participação popular significativa.

Em 1982, houve eleições para governadores, e, em 1984, a luta pelas eleições diretas

para presidente da República. Essa proposta foi rejeitada e resultou em eleições indiretas. A

respectiva mobilização, no entanto, trouxe ganhos políticos significativos. Este conturbado

canário resultou na convocação da Assembléia Nacional Constituinte, em 1986. A sociedade

emergiu com manifestações de rua, formação de comitês, articulação de organismos políticos,

estruturação de abaixo-assinados etc. A sociedade apareceu com uma característica nunca

antes percebida na história: apresentava-se politicamente organizada. Vários setores

específicos juntaram-se em prol de seus interesses e direitos na Assembléia Nacional

Constituinte, fazendo com que houvesse mais de trezentos e oitenta e três grupos atuantes no

processo.

Cada artigo da Carta Constitucional foi objeto de muita disputa e negociação entre

blocos de força. A Constituição se colocou como liberal-democrata-universalista, sendo

inclusive uma das mais desenvolvidas e bem fundamentadas do mundo, expressando as

contradições da sociedade brasileira e fazendo conviver as políticas estatais com as políticas

de mercado nas áreas da Saúde, da Previdência e da Assistência Social. A mesma incluiu o

conceito de Seguridade Social, que compreende direitos universais à Saúde, à Previdência e à

Assistência Social. Dessa forma, a Saúde e a Assistência Social passam a ser direito do

cidadão e dever do Estado.

Como pode ser observado, a Constituição trouxe novos rumos para a sociedade

brasileira. Ela dispõe sobre direitos e busca construir um conceito de cidadania. Agrega

valores universais e impõe respeito e tolerância a valores diferentes, o que não significa que

seja respeitada.

41

Os anos 90 podem ser analisados como um período de adaptação e reconhecimento

democrático. Um dos principais fatos ocorrido neste período para a Assistência Social foi a

aprovação da Lei 8662/93 que regulamenta a Profissão. Esta Lei explicita as competências do

Assistente Social, que são:

I - elaborar, implementar, executar e avaliar políticas sociais junto a órgãos da

administração pública, direta ou indireta, empresas, entidades e organizações

populares;

II - elaborar, coordenar, executar e avaliar planos, programas e projetos que sejam do

âmbito de atuação do Serviço Social com participação da sociedade civil;

III - encaminhar providências, e prestar orientação social a indivíduos, grupos e à

população;

IV - (Vetado);

V - orientar indivíduos e grupos de diferentes segmentos sociais no sentido de

identificar recursos e de fazer uso dos mesmos no atendimento e na defesa de seus

direitos;

VI - planejar, organizar e administrar benefícios e Serviços Sociais;

VII - planejar, executar e avaliar pesquisas que possam contribuir para a análise da

realidade social e para subsidiar ações profissionais;

VIII - prestar assessoria e consultoria a órgãos da administração pública direta e

indireta, empresas privadas e outras entidades, com relação às matérias relacionadas

no inciso II deste artigo;

IX - prestar assessoria e apoio aos movimentos sociais em matéria relacionada às

políticas sociais, no exercício e na defesa dos direitos civis, políticos e sociais da

coletividade;

X - planejamento, organização e administração de Serviços Sociais e de Unidade de

Serviço Social;

XI - realizar estudos sócio-econômicos com os usuários para fins de benefícios e

serviços sociais junto a órgãos da administração pública direta e indireta, empresas

privadas e outras entidades. (BRASIL. Diário Oficial da União - Lei 8662/93 – Artigo

4°)

Como pode ser observado, a Lei 8662/93 explicita a importância do Serviço Social na

elaboração, efetivação e administração de programas, projetos e benefícios sociais, sendo o

Assistente Social responsável por fazer a mediação entre o cidadão portador de direitos e as

leis que efetivam esses direitos.

A Lei 8662/93 explicita também as atribuições privativas, ou seja, aquelas que

somente o profissional de Serviço Social pode executar e responder por elas:

42

I - coordenar, elaborar, executar, supervisionar e avaliar estudos, pesquisas, planos,

programas e projetos na área de Serviço Social;

II - planejar, organizar e administrar programas e projetos em Unidade de Serviço

Social;

III - assessoria e consultoria e órgãos da Administração Pública direta e indireta,

empresas privadas e outras entidades, em matéria de Serviço Social;

IV - realizar vistorias, perícias técnicas, laudos periciais, informações e pareceres

sobre a matéria de Serviço Social;

V - assumir, no magistério de Serviço Social tanto a nível de graduação como pós-

graduação ,disciplinas e funções que exijam conhecimentos próprios e adquiridos em

curso de formação regular;

VI - treinamento, avaliação e supervisão direta de estagiários de Serviço Social;

VII - dirigir e coordenar Unidades de Ensino e Cursos de Serviço Social, de

graduação e pós-graduação;

VIII - dirigir e coordenar associações, núcleos, centros de estudo e de pesquisa em

Serviço Social;

IX - elaborar provas, presidir e compor bancas de exames e comissões julgadoras de

concursos ou outras formas de seleção para Assistentes Sociais, ou onde sejam

aferidos conhecimentos inerentes ao Serviço Social;

X - coordenar seminários, encontros, congressos e eventos assemelhados sobre

assuntos de Serviço Social;

XI - fiscalizar o exercício profissional através dos Conselhos Federal e Regionais;

XII - dirigir serviços técnicos de Serviço Social em entidades públicas ou privadas;

XIII - ocupar cargos e funções de direção e fiscalização da gestão financeira em

órgãos e entidades representativas da categoria profissional. (BRASIL. Diário Oficial

da União - Lei 8662/93 – Artigo 5°)

Neste sentido, a Lei explicita a particularidade da formação do Assistente Social,

sendo este profissional responsável exclusivamente por atuar com problemas relacionados ao

Serviço Social. Assim, para se exercer a profissão de Assistente Social é necessária uma

formação acadêmica – formação esta repleta por singularidades e particularidades referentes

ao Serviço Social.

Outro fato marcante ocorrido na década de 90 foi a criação do novo Código de Ética

Profissional. Este,

partiu da compreensão de que a ética deve ter como suporte uma ontologia do ser

social: os valores são determinações da prática social, resultantes da atividade

criadora tipificada no processo de trabalho. É mediante o processo de trabalho que o

ser social se constitui, se instaura como distinto do ser natural, dispondo de

capacidade teológica, projetiva, consciente; é por esta socialização que ele se põe

como ser capaz de liberdade. Esta concepção já contém em si mesma uma projeção de

sociedade – aquela em que se propicie aos trabalhadores um pleno desenvolvimento

43

para a invenção e vivência de novos valores, o que evidentemente, supõe a

erradicação de todos os processos de exploração, opressão e alienação. (CONSELHO

FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL. Resolução nº 273 de 30 de março de 1993.

Código de Ética do Serviço Social. Diário Oficial da União, Seção 1 – Brasília)

O Código de Ética regulamenta ainda os direitos do Assistente Social, que são:

I. Garantia e defesa de suas atribuições e prerrogativas, estabelecidas na Lei de

Regulamentação da Profissão e dos princípios firmados neste Código;

II. Livre exercício das atividades inerentes à Profissão;

III. Participação na elaboração e gerenciamento das políticas sociais, e na formulação

e implementação de programas sociais

IV. Inviolabilidade do local de trabalho e respectivos arquivos e documentação,

garantindo o sigilo profissional;

V. Desagravo público por ofensa que atinja a sua honra profissional;

VI. Aprimoramento profissional de forma contínua, colocando-o a serviço dos

princípios deste Código;

VII. Pronunciamento em matéria de sua especialidade, sobretudo quando se tratar de

assuntos de interesse da população;

VIII. Ampla autonomia no exercício da Profissão, não sendo obrigado a prestar

serviços;

IX. Profissionais incompatíveis com as suas atribuições, cargos ou funções

X. Liberdade na realização de seus estudos e pesquisas, resguardados os direitos de

participação de indivíduos ou grupos envolvidos em seus trabalhos. (CONSELHO

FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL. Resolução nº 273 de 30 de março de 1993.

Código de Ética do Serviço Social. Diário Oficial da União, Seção 1 – Brasília)

O Código de Ética de 1993 trouxe para o Assistente Social os princípios fundamentais

que devem guiar suas ações:

I. Reconhecimento da liberdade como valor ético central e das demandas políticas a

ela inerentes - autonomia, emancipação e plena expansão dos indivíduos sociais;

II. Defesa intransigente dos direitos humanos e recusa do arbítrio e do autoritarismo;

III. Ampliação e consolidação da cidadania, considerada tarefa primordial de toda

sociedade, com vistas à garantia dos direitos civis, sociais e políticos das classes

trabalhadoras;

IV. Defesa do aprofundamento da democracia, enquanto socialização da participação

política e da riqueza socialmente produzida;

V. Posicionamento em favor da eqüidade e justiça social, que assegure universalidade

de acesso aos bens e serviços relativos aos programas e políticas sociais, bem como

sua gestão democrática; Empenho na eliminação de todas as formas de preconceito,

incentivando o respeito à diversidade, à participação de grupos socialmente

discriminados e à discussão das diferenças;

44

VI. Garantia do pluralismo, através do respeito às correntes profissionais

democráticas existentes e suas expressões teóricas e compromisso com o constante

aprimoramento intelectual;

VII. Opção por um projeto profissional vinculado ao processo de construção de uma

nova ordem societária, sem dominação e exploração de classe, etnia e gênero;

VIII. Articulação com os movimentos de outras categorias profissionais que partilhem

dos princípios do Código de Ética e com a luta geral dos trabalhadores;

IX. Compromisso com a qualidade dos serviços prestados à população e com o

aprimoramento intelectual, na perspectiva da competência profissional;

X. Exercício do Serviço Social sem ser discriminado, nem discriminar, por questões

de inserção de classe social, gênero, etnia, religião, nacionalidade, opção sexual, idade

e condição física. (CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL. Resolução nº

273 de 30 de março de 1993. Código de Ética do Serviço Social. Diário Oficial da

União, Seção 1 – Brasília)

Observa-se que este Código de Ética trouxe um avanço no campo filosófico para a

profissão. Foi a partir dele que os Assistentes Sociais começaram a discutir os princípios que

regem a prática profissional. O Código de Ética de 1993 consistiu num esforço coletivo que

visava redimensionar o significado dos valores e compromissos ético-profissionais. Foi uma

tentativa de se construir um instrumento político e educativo, sem deixar de contemplar

aspectos normativos e punitivos. Neste prioriza-se o “dever ser”, ou seja, como a prática deve

ser realizada de acordo com princípios éticos definidos pelo projeto profissional. Ele é um

mecanismo de defesa da qualidade dos serviços prestados à população e também uma forma

de legitimação social da categoria profissional. Este Código busca fortalecer uma identidade

profissional articulada com projeto de sociedade mais justa e democrática.

Destarte, pode-se dizer que o Código de Ética de 1993 foi uma tentativa dos

Assistentes Social de qualificar este instrumento normativo como referência ético-política,

explicitando a necessidade de delimitar com clareza os objetivos éticos e profissionais. Foi

também uma tentativa de aprimorar e salientar a dimensão normativa, estabelecendo um

elenco de regras jurídico-legais. Tentou-se efetivar o processo de amadurecimento político da

categoria. Pode-se dizer que o Código de 1993 é um forte aliado na mobilização e

45

qualificação dos Assistentes Sociais diante dos enormes desafios e demandas da sociedade

brasileira.

Observa-se então que os anos noventa foram marcados por muitas conquistas para os

Assistentes Sociais. Esta foi uma categoria que obteve importante êxito na consolidação de

Leis e políticas públicas que lhes proporcionaram um certo respaldo para conseguirem

efetivar uma prática mais comprometida com a emancipação do sujeito.

Como pode ser observado, longa foi a trajetória da Assistência até ser reconhecida

como direito. Neste caminho, várias foram as conotações atribuídas à prática do Serviço

Social. Isso explica, pelo menos minimamente, as várias Representações Sociais que se

apresentam construídas no imaginário das pessoas, especificamente no setor empresarial, que

é o objeto desse trabalho e que será analisado no Capítulo IV.

46

IV. O MUNDO DO TRABALHO

4.1. A Reestruturação Produtiva

No início da década de 70 as sociedades capitalistas se viam atoladas numa crise que

impedia a expansão do capital. O capital não estava preparado para a abertura política e

econômica que decorria do processo de globalização. As multinacionais, além de provocarem

uma desregulamentação da economia, com produtos importados mais baratos, intensificaram

a competição entre as empresas. Estas passam a sofrer uma pressão muito forte do mercado

para conseguirem atender sua nova demanda: preços mais baixos e de melhor qualidade.

O capital sofria uma crise estrutural que exigia medidas urgentes e extremas de

reestruturação, para que pudesse recuperar seu ciclo de produção e lucro. O mecanismo

utilizado pelo capital foi a chamada Reestruturação Produtiva. Esta consistia numa resposta

do capital à crise que o paralisava.

No Brasil, desde o final da década de 70 e início da década de 80 já se observava

técnicas de reestruturação, como práticas de Circulo de Controle de Qualidade (os CCQs)10

e

adoção de novas tecnologias de automação. No final da década de 80 já eram implementados

novos programas de qualidade, que tinham o slogan “qualidade não se controla, se produz”

(MOTA, 1998, p. 47), visando uma transformação no imaginário dos empregados e

responsabilizando cada um pelo nível de qualidade.

10

Esta técnica surge em resposta a uma situação econômica recessiva e ao mesmo tempo em que é uma

estratégia empresarial de resposta à mobilização operária, intra e extrafabril, por maior participação e

democracia. (MOTA, 1998, p. 46)

47

Mas foi na década de 90 que a Reestruturação Produtiva acorreu mais intensamente,

com a abertura de mercado e quando as empresas nacionais lançaram-se no mercado externo

como forma de minimizar os efeitos da recessão. Foi, portanto, “por conta da exigência dos

seus clientes internacionais que as empresas brasileiras passaram a adotar programas de

qualidade e a introduzir inovações tecnológicas e organizacionais no processo produtivo”

(SILVA, 1996). Nesta década foi muito divulgada a “cultura da qualidade” (MOTA, 1998, p.

47), com grande crescimento de empresas especializadas em consultoria nesta área.

Em busca de sobreviverem no mercado, desde o final da década de 70, as empresas

estão realizando reestruturações que têm como base transformar o sistema de produção. Há a

substituição do modelo Fordista/Taylorista pelo modelo Toyotista ou flexível de produção.

Neste novo modelo, as empresas utilizam-se do avanço tecnológico que tem ocorrido nas

últimas décadas. Este propicia maior dinamismo a produção e otimiza tanto o tempo, que se

torna cada vez menor para produzir, quando o processo em si, possibilitando diversificar a

produção, respondendo às rápidas mudanças de demanda dos consumidores.

Amplia-se o uso da informática, dos robôs e das telecomunicações. Há também a

substituição de materiais, sendo os novos mais modernos e de alta tecnologia. A produção

neste novo modelo é horizontalizada, ou seja, a empresa maior (chamada de “mãe”) transfere

a terceiros grande parte do que anteriormente era produzido por ela. Deste modo, observa-se

um crescente número de empresas terceirizadas. Até mesmo o ambiente de trabalho dentro

dessas empresas foram transformados. Estes são mais claros e limpos. O índice de barulho foi

reduzido a mínimo.

Quanto à relação de trabalho também ocorreu mudança significativa. Houve

desregulamentação do emprego formal e conseqüentemente aumento do emprego informal e

precarizado.

As empresas buscam o trabalho informal, sem direitos, sem estabilidade, imaginando

contratos quase diários: se os trabalhadores estão correspondendo, eles se mantêm

48

empregados, se não, são demitidos, sempre seguindo-se os critérios da racionalidade

produtiva das empresas. Se o empregado é desprovido de direitos, se é terceirizado,

precarizado, fica mais fácil desempregar, enxugar a empresa. (MILITÃO, 2000)

As empresas que funcionam sob o modelo flexível visam produzir mais com um

menor número de empregados. Estes devem ser capazes de adaptarem-se às mudanças, assim

como possuir um perfil criativo, cooperativo e ser extremamente competente e ágil na tomada

de decisões.

O horário de trabalho dos empregados também foi flexibilizado, podendo ser

facilmente modelado de acordo com seus interesses. Essa nova política visa metas, trabalha

com objetivos a cumprir, exigindo do trabalhador maior dedicação ao trabalho (mesmo sem

ter o tempo rigidamente controlado). Muitas vezes, para cumprir essas metas o empregado se

sobrecarrega, trabalhando até mesmo em casa, em seu horário de descanso.

O desenvolvimento de políticas de Recursos Humanos também é uma estratégia desse

novo modelo de produção e é utilizado para moldar o empregado ao perfil exigido pela

empresa. Essas políticas valorizam tanto as exigências materiais do empregado – com a

distribuição de benefícios – quanto as de ordem psicológica – ampliação da participação11

.

Prega-se o discursso da gestão participativa, da iniciativa do empregado e da recompensa

quando na realidade visa-se apenas o aumento da produtividade. Os benefícios da empresa se

estendem para a família dos empregados e,

O trabalhador esquece sua condição de explorado, sob o encanto da ajuda, e o capital

se torna humanitário, promotor do desenvolvimento e do bem-estar social,

escondendo sob o manto da ajuda o que, na verdade, unicamente lhe interessa, isto é,

o aumento da produtividade da força de trabalho. (Kamayama, In: MOTA, 1998, p.

12)

11

Ressalta-se que estas políticas permitem a participação apenas no discursso. Na realidade a

participação é apenas simbólica, não se efetivando nem na produção nem na lucratividade da empresa.

49

Técnicas psicológicas e ideológicas são utilizadas para camuflar a realidade de

exploração e submissão. O empregado passa a ser o “colaborador” da empresa, ele “veste a

camisa” da empresa. Essas técnicas,

...determinam novas formas de domínio do capital sobre o trabalhador, realizando

uma verdadeira reforma intelectual e moral, visando à construção de outra cultura do

trabalho e de uma nova racionalidade política e ética compatível com a sociabilidade

requerida pelo atual projeto do capital. (MOTA, 1998, p. 29)

A empresa exige do trabalhador fidelidade e dedicação total, ao mesmo tempo em que

explicita a todo o momento que ele é descartável e facilmente substituído.

Há uma tendência dos trabalhadores procurarem mostrar serviço e dedicação para

garantirem a sua permanência na empresa; é a cooperação forçada obtida sob a

ameaça de serem demitidos ou terceirizados. (Duck, In: MOTA, 1998, p. 55)

Há, também, uma dominação psíquica do trabalhador, que se realiza através da

“socialização de valores políticos, sociais e éticos e a produção de comportamentos

compatíveis com a necessidade de mudança na esfera da produção e na da reprodução

social” (MOTA, 1998, p. 29).

Alguns autores (LIMA, 1995, MOTA, 1998) consideram essas “novas práticas

gerenciais” como totalitárias, controlando os empregados através da interiorização de suas

exigências, agora muito mais abrangentes.

Resumindo, pode-se dizer que a nova política de Recursos Humanos, segundo LIMA

(1995), caracteriza-se por:

Adoção de recompensas econômicas conjugadas com recompensas simbólicas e de

participação. Surgem medalhas, diplomas, viagens...

Possibilidade de carreira apresentada ao trabalhador, porém sem muita concretude.

50

“Estabilidade” de emprego, que agora depende exclusivamente do trabalhador12

.

Descentralização conjugada com técnicas e “governo à distância”, que configura um

sistema sutil de “autonomia controlada”.

Competição muito acentuada no mercado e entre colegas no interior da empresa

(valorização do sucesso individual) e incentivo à auto-superação.

Mudança e renovação constante e grande exigência de flexibilidade e de capacidade

de adaptação.

Controle pela adesão e interiorização das regras, ao invés da imposição concreta de

ordens e proibições (substituídas por normas e princípios).

Tendência a eliminar o papel autoritário da hierarquia, onde o “novo chefe” tem um

papel de aconselhar, motivar e não comandar.

Adoção de dispositivos visando a antecipação do conflito, tentativa de administrar as

contradições, mascará-las.

Os objetivos financeiros são prioritários, mas isso não é declarado e sim camuflado.

Políticas de individualização e tentativa de evitar as reivindicações coletivas.

Investimento na formação profissional.

Tentativa de síntese do modelo japonês de produção (espírito de equipe) e do modelo

americano (esforço individual e sucesso pessoal) de gestão de pessoal.

Exigência da qualidade total (defeito zero) dos produtos e dos serviços.

12

Ressalta-se que há uma falsa estabilidade. Joga-se na mão do empregado a responsabilidade pela

manutenção de seu emprego, sendo que o que a empresa espera com isso é a maior produtividade. Por outro lado

e empregado convive cotidianamente com o medo da demissão, pois a proibição da dispensa imotivada, prevista

no inciso I, do art. 7º da Constituição Federal, não foi regulamentada.

51

Tentativa de se criar uma relação de confiança com o pessoal, com conseqüente

diminuição dos dispositivos tradicionais de controle.

Emergência de uma linguagem particular, que aparece através do espírito familiar,

portas abertas, filosofia da empresa...

Tentativa de criar uma comunidade global e de tornar a empresa algo mais de que um

simples local de trabalho (coral, clubes, organização esportiva...).

Pode-se concluir, então, que essa nova roupagem assumida pelos Recursos Humanos

visa uma transformação no afetivo dos empregados. Objetiva suscitar neles uma paixão pela

empresa e o desenvolvimento de um imaginário da performance e da excelência. Visa

também transformar a empresa (lugar de trabalho, de organização e possíveis conflitos) em

uma comunidade onde deveria reinar o consenso, a harmonia entre os diferentes

componentes, onde as reivindicações sindicais deveriam desaparecer e onde cada um

conheceria o prazer pelo cumprimento do dever profissional e seria capaz de se sacrificar, de

corpo e alma, para a maior glória da organização (LIMA, 1995).

Conclui-se então que neste novo modelo de produção – flexível – os mecanismos de

controle são muito mais sutis e eficazes, sendo o medo da demissão a sombra que acompanha

o trabalhador em seu dia de trabalho. Atualmente diz-se “é melhor perder a vida que perder o

emprego”.

52

4.2. Impactos das mudanças ocorridas no mundo do trabalho na vida do empregado

Atualmente, o homem, dito “pós-moderno”, tem se deparado com questões ético-

morais que até então nunca haviam sido enfrentadas, principalmente no mundo do trabalho.

Hoje o que se pode observar é que tem ocorrido uma minimização do ser humano enquanto

sujeito que quase o transforma, ou pode-se dizer transforma-o, em objeto. Esta transposição

do homem de sujeito a objeto pode ser bem compreendida quando analisamos o caminho

percorrido pelo homem em sua construção social, ou seja, na própria formação da sociedade e

na relação com os outros homens via trabalho.

O homem se constrói historicamente através de seu trabalho. É através deste que o

homem consegue modificar a natureza, extraindo dela todos os mecanismos necessários para

sua sobrevivência, e se diferenciar dela, enquanto ser social. O que pode ser observado é que

ao longo da história o significado do trabalho mudou muito. Nos primórdios, o homem dotado

de necessidades buscava alternativas para saciá-las. Dessa forma, construía em sua

consciência o resultado de cada alternativa para posteriormente escolher a melhor dentre as

várias alternativas possíveis. Após a escolha da opção mais acertada, o homem, através de sua

ação, transformava a natureza e construía algo novo. Esse movimento de transformação da

natureza é que se denominava trabalho. No trabalho, então, o homem modificava a natureza e

também se construía, pois neste processo ele adquiria um aprendizado que ampliaria o leque

de possibilidades de criação, pois ele adquiria conhecimento que seria utilizado

posteriormente.

Porém, desde quando o homem começou a modificar a natureza até os dias atuais, o

trabalho sofreu profundas transformações, e adquiriu novos significados, que alteraram a

forma de relacionamento entre os homens. Trabalho, inicialmente, era uma forma de

53

objetivação do ser humano, ou seja, era através dele que o homem se caracterizava enquanto

tal, diferente da natureza. Trabalho era a expressão da potencialidade criativa do homem. Era

através dele que o homem transformava sua subjetividade em objetividade, ou seja, era

através da potencialidade criativa e produtiva que ele se aperfeiçoava a cada instante.

Neste período (nos primórdios), o homem se reconhecida no produto de seu trabalho,

pois ele era a materialização de sua subjetividade. Dessa forma ele se apropriava do objeto

produzido e conseguia fazer um intercâmbio com outros homens e se relacionar em

sociedade. Com o surgimento das diferentes classes sociais e o próprio desenvolvimento do

capital, a forma do homem lidar com seu trabalho modificou bruscamente.

Nas sociedades capitalistas, ocorre a desvalorização do trabalhador em relação ao à

mercadoria que produz. O homem passa a não se reconhecer no produto de seu trabalho e com

isso não consegue se objetivar enquanto ser humano, pois não consegue efetivar sua

subjetividade via trabalho.

Devido a isso, o trabalho humano na produção capitalista‚ para o trabalhador é

sinônimo de castração, pois ele não se reconhece no produto de sua atividade. A atividade

passa a ser estranha, alienada ao produtor. Nesta posição, o trabalhador fica privado do objeto

produzido por sua atividade e de seu próprio desenvolvimento criativo, não tendo autonomia

no processo produtivo. Portanto a apropriação do objeto se manifesta com estranhamento,

alienação, que quanto mais objetos o trabalhador produz mais ele se submete ao domínio do

capital. O trabalhador desapropria de si enquanto homem ao produzir o mundo e a natureza

com objetos estranhos a ele. Para Marx, a alienação do produto do trabalhador nada mais é do

que a própria alienação de sua atividade, que deveria expressar sua subjetividade. É na

atividade que o trabalhador produz alienação enquanto realidade objetiva. O estranhamento,

então, está presente na atividade e não simplesmente no produto.

54

Nas sociedades capitalistas, o homem passa a trabalhar para produzir sua vida

individual e não coletiva, para se manter vivo e não para se afirmar enquanto homem,

enquanto ser objetivo que é capaz de expressar sua subjetividade através de seu trabalho. O

homem, dentro do capital, trabalha para preservar sua sobrevivência física e a produção

humana passa a ter a finalidade de manter o indivíduo vivo, sem se preocupar com sua

subjetividade.

Nessas sociedades o trabalho passa a ser uma forma de poder e de dominação. As

classes que se apresentam no cenário econômico e social possuem uma relação de

subordinação. Muitos ficam privados dos meios de produção e com isso têm apenas a força de

trabalho para vender. O homem torna-se, então, mercadoria. O homem deixa de se realizar

como homem para realizar o capital. O trabalho virou emprego e o emprego se transformou

em salário, que, minimamente, sacia suas necessidades físicas.

Com a Reestruturação Produtiva a situação do trabalhador se complica ainda mais.

Ocorre também a flexibilização dos direitos, o que torna o trabalho um “fardo”, pois o

trabalhador passa a aceitar qualquer tipo de trabalho, inclusive o informal, para estar dentro

do mercado, pois sem trabalho ele fica à margem da sociedade. O trabalhador não tem direitos

sólidos que garantam benefícios concretos.

Neste cenário, com o desenvolvimento dos recursos humanos, mudam-se os discursos

trabalhistas para se garantir maior produtividade. As empresas capitalistas passam a assumir

um papel de “mãe” na vida dos seus colaboradores. A empresa passa a ser a segunda casa do

empregado e sua família agregada pela empresa. Muitas empresas utilizam-se de estratégias

como viagens, patrocínio de festas de debutantes, empregados do mês, clubes... para

seduzirem o empregado e com isso gerar a produtividade e a lucratividade desejada. O

trabalhador sofre muito mais pressão, pois se sente responsável pela empresa. Porém, o

55

mesmo não participa dos processos decisórios, o que explicita ainda mais as estratégias de

persuasão empresarial.

Nesta busca pela excelência do empregado o que se observa é que a maioria está

sofrendo por doenças adquiridas no desempenho das atividades de trabalho, como doença do

pânico, depressão entre outras. O trabalhador não é mais dono de sua própria vida, virou mera

mercadoria para o empresário. Mercadoria esta totalmente descartável e substituível.

Com isso, podemos observar que a vida do ser humano perdeu o sentido de ser. O

homem se transformou numa máquina produtiva e descartável. Não existe mais subjetividade

em seu trabalho e até mesmo em sua vida. A este homem resta apenas se vender enquanto

indivíduo, o que faz crescer e acirrar o individualismo na sociedade. O que se pode dizer é

que o homem passa a ser imagem. Ele vale muito mais pela aparência do que pela essência. O

homem passa a ser objeto de consumo como outro qualquer.

Concluindo podemos dizer que o homem pós-moderno tem sofrido uma crise de

identidade que começou há muito tempo, quando ele parou de produzir para se aperfeiçoar

enquanto ser humano e passou a produzir para gerar riquezas, não se reconhecendo no

produto de seu trabalho. Esta crise está cada vez mais explícita, pois o individualismo humano

tem se manifestado dia a dia e afetado a todos, manifestações essas que culminam com a

própria destruição do homem (em guerras, assaltos, roubos, doenças, violências em geral...).

Assim, o que se pode concluir é que o modelo adotado até agora não tem garantido um bom

convívio social e nem a objetivação do homem enquanto ser diferente da natureza.

56

4.3. O eterno conflito entre empregados e empregadores

Explicitado o interesse da empresa na produtividade e lucratividade do empregado e os

poucos recursos dos empregados para saírem da situação de explorados, faz-se necessário

abordar o conflito existente entre essas duas classes.

Ao mesmo tempo em que o empregado é o pilar que sustenta a produção capitalista,

este não possui os elementos necessários para superar os mecanismos de dominação. É

verdade que a classe operária muito evoluiu politicamente, adquirindo maior força para

reivindicar seus direitos. Mas, a cada passo dado pelo proletariado, o capital realiza

transformações que bloqueiam o crescimento do movimento.

Desde sua formação enquanto classe, muitas vitórias já forma conquistadas: direitos

(como redução da jornada de trabalho, férias, décimo terceiro salário...) e visibilidade na

arena política. Mas nunca essa classe conseguiu sair da condição de explorada pela classe

dominante. Ao mesmo tempo em que esta é uma classe que possui um enorme poder, pois

sem ela não existiria produção, a mesma não consegue a efetivação desse poder. É claro que

isso é decorrente de toda uma estrutura que fora montada para ratificar essa condição de

submissão. As sociedades capitalistas, como são regidas pelo valor monetário, paralisam o

trabalhador via salário, pois este é necessário, e até mesmo fundamental, para garantir a

sobrevivência do sujeito. Dessa forma, o trabalhador sem emprego está sujeito a viver à

margem da sociedade, não usufruindo os bens nela produzidos, ainda que com seu mísero

salário ele só possa garantir a manutenção de sua vida física.

Se, de um lado, encontra-se a classe trabalhadora que necessita de seu salário para

sobreviver, submetendo-se a cada dia ao domínio do capital, do outro lado, encontra-se a

classe dominante. Esta, servindo-se da exploração da classe trabalhadora, usufrui uma vida

muito diferente. Além de ter acesso à maioria dos bens produzidos, consegue acumular

57

capital. Esta classe pensa exclusivamente no lucro. É claro que este lucro deriva-se da

exploração da força de trabalho do trabalhador, ou seja, da “mais-valia”, que consiste na

diferença entre o valor produzido pela força de trabalho e o custo de manutenção dessa força

(operário, maquinas); a mais-valia é a diferença entre o valor produzido pela força de trabalho

e o custo de sua manutenção.

Assim, pode-se concluir que enquanto as sociedades viverem sob o domínio do capital

a relação entre empregado e empregador será sempre uma relação de dominação e

subordinação. Será sempre uma relação contraditória, pois quem produz as mercadorias não

tem acesso a elas assim como quem não produz, mas possui os meios de produção, usufrui

intensamente do produto produzido.

4.4. O Serviço Social no contexto empresarial

Como foi explicitado no Capítulo II, o Serviço Social é uma profissão que

historicamente foi utilizada como um dos instrumentos de manutenção de poder da classe

dominante. A presença do Assistente Social dentro de uma empresa vem confirmar que para o

capital continuar a se expandir faz-se necessária a administração das novas necessidades

sociais, necessidades estas que já estavam colocadas no cenário social através das greves, do

movimento operário, da pobreza generalizada...

A empresa, enquanto representação institucional do capital, tem como objetivo,

gerenciar capital e trabalho na produção de bens e serviços que se transformam em

mercadorias. Através desse gerenciamento, ela assegura a valorização do capital,

acumulando-o e reproduzindo-o e tendo na produção da mais-valia um instrumento

para obtenção de lucros (MOTA, 1987, p. 39)

58

Dentro da empresa o Assistente Social passa a ser requisitado para desenvolver um

trabalho de cunho assistencial e educativo junto ao empregado e sua família. A assistência é

materializada através dos benefícios fornecidos ao empregado: empréstimos, planos de saúde,

previdência privada etc.. Por isso, para a empresa,

O Assistente Social ajuda a divulga os benefícios oferecidos pela empresa, serve

como "marketing". Ele tem o papel meio que “funcionalista”, ou seja, tenta enquadrar

o empregado dentro da função estabelecida pela empresa, dentro de normas e leis da

empresa. Os benéficos oferecidos servem para que o empregado não perca tempo de

se informar fora da empresa, ou seja, se preocupar com problemas externos (saúde da

família, problemas financeiro etc.), tendo mais tempo disponível para se dedicar a

produção. O Assistente Social é contratado para fazer com que o empregado trabalhe

satisfeito, feliz e sem preocupações para produzir melhor e mais. (Informação

Verbal13

)

Já o trabalho educativo é realizado através de palestras, cursos e oficinas. Muitas vezes

nesses cursos o Assistente Social passa a ideologia da empresa: produtividade e excelência. É

nesses espaços que o Assistente Social “molda” ou “ajusta” o empregado ao trabalho exigido

pela empresa. Ressalta-se que esses espaços também podem ser utilizados para informação e

formação de empregados mais conscientes de seus direitos, dependendo da postura assumida

pelo profissional de Serviço Social, como pode ser percebido na fala de uma Assistente Social

da Empresa A,

Não podemos nos prender apenas nas normas estabelecidas pela empresa nos

atendimentos. Quando nos deparamos com os limites institucionais temos que buscar

soluções fora desses limites, pois precisamos olhar o lado do empregado e não

somente da empresa.

Tanto empregador quanto empregado se beneficiam com a presença do Assistente

Social dentro da empresa. O empregado porque pode receber algum apoio para ter uma vida

sadia e melhoria na qualidade de vida tanto individual quanto familiar. E o empregador

porque viabiliza melhor o processo produtivo, gerando assim o lucro. Destaca-se que muitas

13

Informação cedida em entrevista por uma Assistente Social da Empresa A.

59

vezes a ação do Assistente Social beneficia mais uma parte em detrimento da outra, como

pode ser constatado na fala de uma Assistente Social da Empresa A,

Muitas vezes ficamos um pouco divididas porque o empregado apresenta determinada

demanda que eu poderia atender, mas tendo em vista os benefícios que são limitados

eu não posso atender. Então fico dividida em determinados momentos às vezes até

para saber falar um não. A empresa também tem os interesses dela em estar atendendo

algumas coisas. Às vezes ficamos divididas porque você acha até que é justo o

empregado ter determinada coisa e você tem que seguir os critérios estabelecidos pela

empresa.

Como pode ser observado, o Assistente Social assume, dentro da empresa, o papel de

mediação entre a gerência e o empregado. Destaca-se também que o Assistente Social está a

serviço da empresa e, de certa forma, necessita atender aos interesses da mesma. A empresa

exige do profissional de Serviço Social fidelidade no cumprimento de suas funções: educar e

prestar assistência. Isso pode ser constatado na fala da Assistente Social da Empresa A

concedida em entrevista:

Realizo meu trabalho com transparência, estou aqui para garantir ao empregado

alguns direitos que ele tem e também para garantir que ele usufrua os benefícios que a

empresa oferece. Tem horas que atendemos empregados que precisam entender que a

empresa tem limites, que ela mudou. Então existem horas que tem que ser olhado o

lado da empresa e o empregado precisa entender isso. As vezes é preciso falar para o

empregado que a empresa precisa dele saudável, produtivo, que venha trabalha, que

possa contar com ele, que seja comprometido. Existe empregado que não agrega nada

e às vezes precisamos cobrar dele esse lado.

O Assistente Social é necessário para contribuir na manutenção da força de trabalho e,

conseqüentemente, da própria produção. É um dos mecanismos utilizados pelo capital para

minimizar os conflitos dentro da empresa, servindo como mediador da relação entre o

empregado e o empregador.

O que não se pode negar é que juntamente à prática profissional do Assistente Social

existem interesses materiais, políticos e ideológicos dos empregadores, ou seja, da classe

dominante. Dessa forma, pode-se dizer que a prática do Assistente Social dentro da empresa

não é neutra e culmina por atender interesses antagônicos. O Assistente Social, segundo a

60

empresa, deve mediar o conflito entre empregado e empregador sem gerar mais conflito,

atendendo primeiramente aos interesses da empresa. A fala abaixo é de um coordenador do

Serviço Social da Empresa C concedida em entrevista:

Então, por exemplo, está acontecendo muito acidente de trabalho. O Serviço Social

tem um papel fundamental, ele tem que ir lá, tem que participar muito da fábrica,

conversar com todas as pessoas, tem que andar na fábrica, tem que conversar, não é

só na hora que as pessoas tem que fazer um orçamento familiar, um problema de

falecimento, um problema de assistência médica, no dia-a-dia tem que bater papo,

sentar lá no refeitório, comer com o pião, comer com o cara da administração, por que

nessas conversas você vai, e administra muitas coisas. Consigo manter um clima

muito bom, não vou dizer em clima muito bom, na minha opinião é muito bom dentro

da companhia. Se você for conversar com outro, cada um tem a sua opinião, mas para

os objetivos da empresa a gente tem um clima legal apesar da gente está passando por

reestruturações dentro da empresa, isso conturba um pouco mas de onde eu tiro

muita informação, no refeitório, no ambulatório médico, da segurança patrimonial,

na lanchonete, na própria utilidade do S.S.

Analisando esta fala, pode-se perceber que esse coordenador espera do Assistente

Social uma postura extremamente antiética. O depoimento acima expressa que o Serviço

Social pode ser uma profissão que viabiliza o controle dos empregados. Pode-se dizer, então,

que a empresa busca corporificar os determinantes históricos que pautaram a prática

profissional do Serviço Social. Contudo, estes determinantes não têm o poder de dar

homogeneidade ao discurso do Assistente Social. Este pode servir ora ao capital ora ao

trabalhador, dependendo das condições objetivas e das opções políticas feitas por ele.

Acredita-se que estas opções podem diferenciar a atuação profissional, construindo uma

prática mais próxima dos interesses dos empregados.

4.4.1. Impactos da Reestruturação Produtiva no Serviço Social

O Assistente Social também é um profissional que faz parte do quadro de empregados

da empresa. Por isso, ele também sofreu, e sofre, diretamente os impactos da Reestruturação

Produtiva.

61

Nas entrevistas realizadas foi constatado que o Serviço Social, assim como as demais

profissões, perdeu espaço de atuação dentro da empresa. O número de Assistentes Sociais

dentro da empresa diminuiu drasticamente nos últimos anos.

Nós já fomos um número X14

Assistentes Sociais, hoje somos X-14. Ano que vem

devem X-16, mas o número de empregados também diminuiu. (Informação Verbal15

)

O Assistente Social tem perdido espaço de trabalho, mas isso tem ocorrido com as

outras profissões também, gerando sobrecarga de trabalho. A empresa muitas vezes

não tem substituído os profissionais que se aposentam. (Informação Verbal16

)

O Assistente Social tem perdido espaço de trabalho. Isso acarretou sobrecarga de

trabalho para o profissional. Cada vez mais temos que assumir processos que eram de

outras Assistentes Sociais que se aposentaram e não foram substituídas. (Informação

Verbal17

)

Além do número de Assistentes Sociais ter diminuído, diminuíram-se também as

verbas para a efetivação dos trabalhos. A empresa visa trabalhar com redução de custos, o que

impede muitas vezes o Assistente Social de desenvolver projetos e programas. A

Reestruturação Produtiva gerou ainda muita insegurança no trabalhador, aumentaram-se as

pressões e as tensões dentro do setor empresarial.

...eu já vivi vários momentos em diversas empresas, tem épocas que está mais fácil de

trabalhar, eu acho que esses últimos anos forma muito difíceis, anos de muita redução

de custo, de muito rigor, houve uma depressão muito generalizada, uma falta de

perspectiva de crescimento e desenvolvimento, onde você fica até sem horizontes aí

você deixa até de propor cosas novas. Se você vê que tem um ano onde pode propor

coisas novas, você fica mais animada, o clima geral fica melhor, mais tranqüilo.

(Informação Verbal18

)

Como pode ser observado, o Serviço Social sofreu diretamente os impactos da

Reestruturação Produtiva. Houve diminuição do quadro de Assistentes Sociais, redução de

custos e até mesmo a incorporação do Serviço Social pela área de Recursos Humano, com

grande perda de autonomia na tomada de decisões.

14

O real número foi suprimido para garantir a anonimidade da empresa. 15 Informação cedida em entrevista com uma Assistente Social da Empresa A. 16

Idem 17

Idem 18

Informação cedida em entrevista com uma Assistente Social da Empresa B.

62

Quando o Assistente Social era subordinado diretamente à diretoria a autonomia na

elaboração dos projetos era maior. Quando o Serviço Social passou para a área do

Recursos Humanos, ele perdeu muita autonomia na elaboração e execução dos

projetos. Quando há demanda de um projeto, o Assistente Social necessita de

conhecimentos específicos para fazer a elaboração e de uma boa argumentação para

que seja aceito. Em empresas menores em que o profissional está mais ligado a chefia

ele tem maior autonomia. Em empresas de grande porte a decisão final acaba sendo

do gerente e não do Assistente Social. (Informação Verbal19

)

Verificando a perda de espaço e até mesmo de autonomia por parte de Serviço Social,

pode-se identificar duas explicações divergentes. A primeira refere-se à explicação dada pelo

empregador, de que esta perda de espaço se pauta na Reestruturação Produtiva, na redução do

quadro de funcionários e na redução de custos. A segunda, e bem mais crítica, refere-se às

modificações que ocorreram desde o surgimento da profissão até os dias atuais. O acúmulo

político, social e econômico que o Serviço Social construiu tem sido responsável por formar

profissionais mais críticos e comprometidos com as noções de direito. O Assistente Social não

está mais respondendo tranqüilamente aos anseios do capital. Observa-se que existem muitas

práticas pautadas na emancipação do empregado e na formação de sujeitos mais conscientes

de sua realidade.

Do meu ponto de vista, para a empresa, o Assistente Social é requisitado para

responder às necessidades vinculadas à reprodução material da força de trabalho e ao

controle da relação entre empregado e empresa, contribuindo para o aumento de

produtividade. Por outro lado, como o Assistente Social desenvolve um trabalho que

procura respeitar os direitos dos trabalhadores, tendo para com essa classe o seu

compromisso ético político, acredito que por esse motivo o empregado tem uma

identidade com o assistente social, no sentido de ainda, poder confiar e contar com o

apoio desse profissional, considerando que na relação trabalhador/empresa ele é a

parte frágil da relação e precisa dentro da organização, de um profissional que o

respeite, que o apóie e o oriente de forma estratégica para estar melhor e fortalecido

nessa relação. (Informação Verbal20

)

Dessa forma, no setor empresaria existem espaços de trabalho onde o profissional

pode desenvolver uma prática de emancipação do sujeito, mesmo inserido no contexto da

Reestruturação Produtiva. Mas para que isso ocorra, o Assistente Social tem que se manter

19

Informação cedida em entrevista com uma Assistente Social da Empresa A.

20 Informação cedida em entrevista com uma Assistente Social da Empresa A.

63

informado e ter um ótimo conhecimento sobre a empresa. É através desse conhecimento que o

profissional busca as “brechas” onde pode desenvolver um trabalho mais voltado para o

empregado. É evidente que o Assistente Social dentro da empresa se depara com vários

limites, principalmente porque tem que atender aos imperativos de produção da empresa.

Mas, por outro lado, existem possibilidades de atuação. São estas possibilidades que mantêm

viva a pratica dentro da empresa.

Considerando como limite a questão do assistente social ser também um trabalhador

inserido na divisão sócio-técnica do trabalho, que vende sua força de trabalho por um

salário, sendo requisitado para atender tanto as necessidades do capital como as do

trabalho, visando ao aumento do lucro e da produtividade das organizações, ele

precisa mesclar as demandas tradicionais (ex.: administração de benefícios) com as

novas provenientes das inovações tecnológicas para não perder o seu espaço para

outras profissões. No entanto, acredito que existem possibilidades e brechas para

desenvolver um trabalho que procura respeitar os direitos do trabalhador,

principalmente os direitos sociais, buscando maior humanização das relações sociais

no trabalho, procurando não perder de vista o seu compromisso profissional com a

classe trabalhadora. (Informação Verbal21

)

O maior limite do Serviço Social na atualidade dentro de uma empresa é trabalhar

com a parte operacional dos RH. O Serviço Social não trabalha em nível gerencial

estratégico (visão mais ampla estratégica). O Assistente Social precisa saber lidar com

as respostas negativas dada pela gerencia, ele precisa criar mecanismos para

desenvolver um trabalho estratégico. E importante criar espaços de discussões para

que despertem no público atendido a capacidade de mobilização e organização, se

tornando um espaço político. (Informação Verbal22

)

Ressalta-se que, focar nos limites institucionais restringiria a atuação profissional e a

reduziria a apenas reprodução de um sistema perverso de exploração de mão-de-obra. Pensar

somente nas possibilidades, sem possuir uma análise crítica da estrutura e conjuntura

organizacional, seria exercer uma prática na ilusão de que o sistema capitalista não possui

contradições e realmente quer apenas o bem de seus empregados.

Possibilidades todas nós somos estimuladas, incentivadas a apresentar coisas novas, a

empresa está aberta a receber propostas novas. Eu sou muito otimista. (Informação

Verbal23

)

21

Informação cedida em entrevista com uma Assistente Social da Empresa A. 22

Idem. 23

Idem

64

É evidente, e infelizmente, que o Serviço Social não possui todas essas possibilidades.

A empresa não garante ao profissional um espaço de atuação totalmente aberto e

despolitizado. Para a empresa é ótima a permanência de profissionais acríticos, pois assim ela

pode utilizá-los como mais um instrumento de manutenção de seu poder.

Ressalta-se que o profissional deve pautar-se na Lei 8662/93 que regulamenta a

profissão, assim como no Código de Ética Profissional. O conhecimento desses dois

instrumentos legais pode garantir uma ampliação no campo de visão do profissional dentro da

empresa. Nas entrevistas realizadas, todos os profissionais de Serviço Social disseram

pautarem-se no Código de Ética profissional para realizarem suas ações.

O ponto principal é o Código de Ética, temos todo um trabalho direcionado pelo

Código de Ética. Temos uma dúvida vamos lá e consultamos o Código. (Informação

Verbal24

)

O livro mais importante é o Código de Ética do Assistente Social. (Informação

Verbal25

)

Concluindo, destaca-se que a prática profissional do Serviço Social dentro de

empresas, mesmo no contexto da Reestruturação Produtiva, é marcada por limites e

possibilidades. A linha que separa esses limites e essas possibilidades vai depender da atuação

profissional e de seu posicionamento perante a contradição existente entre capital e trabalho.

A realização de uma prática comprometida com a emancipação do sujeito vai depender da

postura político-ideológica assumida pelo Assistente Social.

O Próximo Capítulo abordará sobre as Representações acerca do Serviço Social

empresarial, bem como os impactos dessas representações na vida dos empregados. Buscar-

se-á também tentar fazer uma reflexão se as representações são ou não condicionadoras das

ações dos Assistentes Sociais.

24

Informação cedida em entrevista com uma Assistente Social da Empresa A. 25

Informação cedida em entrevista com uma Assistente Social da Empresa B.

65

66

V. AS REPRESENTAÇÕES DO SERVIÇO SOCIAL DENTRO DA EMPRESA

No Capítulo II foi abordada a história do Serviço Social. Nesta, pode-se perceber

algumas práticas que foram responsáveis pela construção das Representações Sociais no

imaginário das pessoas. As Representações do Serviço Social que existem atualmente se

ancoraram em processos históricos permeados por relações de poder – relações estas

marcadas pela dominação e subordinação de pessoas vulnerabilizadas. Dessa forma, as

Representações se organizam em torno da prática da Assistência, mas seus elementos

periféricos exprimem relações sociais de desigualdade entre a classe dominante – composta

pelos empregadores – e a classe subalterna – composta pelos trabalhadores que se submetem

todos os dias ao domínio do capital (sem ter outra escolha).

A seguir serão explicitadas algumas conotações atribuídas à pratica da assistência e

que influenciaram diretamente nas Representações Sociais do Serviço Social:

Assistência subordinada ao merecimento;

enquanto direito apenas dos carentes;

como forma de caridade e favor;

como forma de correção do caráter – “educativa”;

como forma de dominação, da subordinação e da exploração – manutenção de

poder;

como direito de cidadania e dever do Estado.

Apesar da Assistência Social já ser reconhecida enquanto direito de cidadania, longo

será o caminho que ela terá que percorrer a fim de se modificar as representações pré-

existentes.

67

Como o Serviço Social é uma profissão que se encontra na articulação entre as

diversas classes sociais e historicamente apresenta as conotações supramencionadas, mesmo

com a elevação da Assistência a direito social, o sujeito não a reconhece enquanto tal. Isso

porque muitas vezes ele não tem clareza sobre o conceito de direito e muito menos sobre sua

abrangência26

. O sujeito não consegue decodificar as informações que recebe, dessa forma,

busca mecanismo para compreender a realidade que o cerca, ainda que esta realidade seja

apreendida de forma incompleta (seleção de descontextualização da informação).

No processo de construção das Representações Sociais, o sujeito tende a tornar

familiar aquilo que lhe é estranho, sendo que muitas vezes ele forja uma compreensão para

que esta seja coerente com sua visão de mundo – núcleo figurativo. Como o Serviço Social

sempre foi visto como uma prática assistencialista, como caridade e favor, o sujeito busca na

prática atual do Serviço Social esses traços históricos, mesmo que para isso ele tenha que

forjar a realidade.

O sujeito ainda tenta eliminar qualquer contradição que seja divergente às

representações já cristalizadas, naturalizando a nova informação recebida para maximizar a

compreensão – processo de naturalização. Dessa forma, ressalta-se que mesmo com a

existência de práticas pautada na emancipação de sujeito, práticas estas que superaram o

patamar da caridade, estas ainda são associadas à noção de ajuda, pois é esta a prática que o

sujeito possui representada em seu imaginário.

Ressalta-se que toda Representação Social possui uma função social (ancoragem): ela

pode impulsionar o sujeito, ou pode paralisá-lo. Elas servem também como instrumentos de

poder, pois estão concretamente embutidas no imaginário das pessoas, sendo afirmadas ou

negadas pelo tipo de informação recebida.

26

No Brasil, observa-se que, apesar das lutas que existiram na tentativa de se efetivarem direitos, a

classe dominante sempre exerceu seu poder de forma autoritária, exterminando qualquer movimento que

contradissesse seus interesses. Isso faz com que os cidadãos não se reconheçam nas leis existentes, o que cria

uma disparidade entre a lei e a realidade.

68

A Representação do Serviço Social no setor empresarial não é diferente. Muitas vezes

a prática recebe sentidos opostos, que incidem sobre as relações estabelecidas entre os

diferentes elementos da Representação – empregado e empregador. Nos tópicos a seguir serão

explicitadas as Representações acerca do Serviço Social apresentadas no discurso dos

empregados e empregadores das empresas pesquisadas.

5.1. As Representações do Serviço Social explicitadas no discurso dos representantes dos

empregadores – coordenadores do Serviço Social

Nas empresas pesquisadas, observou-se uma disparidade existente entre as

representações do Serviço Social para os representantes dos empregadores. De um lado teve-

se uma representação do Serviço Social positiva. A coordenadora do Serviço Social (não

Assistente Social) apresenta uma representação mais próxima da prática proposta pela Lei

8662/93 e até mesmo pelo Código de Ética Profissional. Esta vê a profissão como um dos

mecanismos de manutenção dos direitos dos empregados, não vendo somente o lado da

empresa. Na fala desta profissional, pode-se perceber que ela entende o Serviço Social como

uma profissão fundamental não somente para a administração de benefícios segundo as regras

da empresa, como também ressalta que o Assistente Social consegue uma avaliação mais

adequada dos casos, não somente sendo responsável pelo deferimento ou pelo indeferimento

de benefícios.

Nessa empresa o Assistente Social tem um papel importante e histórico, é uma

empresa que já trabalha com o Serviço Social há muitos anos ligado a área de

benefício. Eu vejo a importância da contratação do Assistente Social e da

permanência dele como uma interface entre o que a Fundação oferece de saúde e

benefício, com suas regras e todos os seus limites e as necessidades e interesse do

empregado e seus dependentes. Sabemos que não podemos trabalhar muitas vezes

com questões fechadas, existe caso que necessita uma avaliação mais ampla ao que

69

simplesmente a regra do benefício que a empresa oferece e aqui o Assistente Social

tem o papel importante para avaliar esses tipos de caso. O papel é tão importante e é

por isso que o Serviço Social se mantém a tantos anos, ele já ocupou muito bem esse

espaço, essa questão das particularidades, de avaliar cada situação sobre todos os

aspectos, ela já ocupa um espaço consolidado dentro da empresa, então ela já é

importante por si só. (Informação Verbal27

)

Esta coordenadora explicita ainda a importância do Serviço Social na prevenção de

problemas e não somente na “solução” dos mesmos.

No momento até pela questão da necessidade a gente fica muito voltado em

solucionar questões urgentes, que são questões que precisam da abordagem social e

que precisam ser resolvidas de forma imediata. Então eu vejo não como potencial não

apenas para resolver essas questões que são urgentes, imediatas do dia-a-dia, mas

também participar das ações que vão antecipar os problemas como é o caso de

promover a saúde ao invés de esperar que a doença aconteça. O Serviço Social tem o

papel importante também nessa visão mais ampla da questão da saúde, ela não passa

só pela questão do tratamento, mas também pela prevenção.

Nesta entrevista pôde-se constatar que a Representação do Serviço Social é voltada

para a valorização da prática profissional. Observa-se que ela tem clareza do papel do Serviço

Social dentro de uma empresa e até mesmo do compromisso ético-político do Assistente

Social de viabilizar a promoção dos direitos da classe trabalhadora. É evidente que, mesmo

com esta visão positiva sobre a profissão, a coordenadora espera do Assistente Social uma

postura que não contradiga os interesses institucionais da empresa.

Já o coordenador entrevistado da Empresa C possui uma Representação acerca do

Serviço Social muito distorcida da prática proposta pela Lei 8662/93 e principalmente pelo

Código de Ética Profissional. Este entende a profissão como um dos mecanismos de controle

sobre os empregados, ou seja, como forma de dominação, de subordinação e de exploração da

classe trabalhadora. A profissão, neste sentido, seria um dos instrumentos de manutenção de

poder do empregador.

Então, por exemplo, está acontecendo muito acidente de trabalho. O Serviço Social

tem um papel fundamental, ele tem que ir lá, tem que participar muito da fábrica,

conversar com todas as pessoas, tem que andar na fábrica, tem que conversar, não é

só na hora que as pessoas tem que fazer um orçamento familiar, um problema de

27

Informação cedida em entrevista com uma Coordenadora do Serviço Social da Empresa B.

70

falecimento, um problema de assistência médica, no dia-a-dia tem que bater papo,

sentar lá no refeitório, comer com o pião, comer com o cara da administração, por que

nessas conversas você vai, e administra muitas coisas. Consigo manter um clima

muito bom, não vou dizer em clima muito bom, na minha opinião é muito bom dentro

da companhia. Se você for conversar com outro, cada um tem a sua opinião, mas para

os objetivos da empresa a gente tem um clima legal apesar da gente está passando por

reestruturações dentro da empresa, isso conturba um pouco mas de onde eu tiro

muita informação, no refeitório, no ambulatório médico, da segurança patrimonial,

na lanchonete, na própria utilidade do Serviço Social. (Informação Verbal28

)

Neste contexto, o Serviço Social é representado como uma profissão que visa o

controle dos empregados. O Assistente Social tem um papel funcionalista, ou seja, tenta

enquadrar os empregados dentro das funções estabelecidas pela empresa, visando uma

correção das condutas desviantes e sendo um mecanismo de correção do caráter dos

empregados. Observa-se, durante a entrevista, que este coordenador apesar de ter

conhecimento sobre a prática do Serviço Social proposta pela Lei 8662/93, busca admitir

Assistentes Sociais que reafirmem sua Representação pré-concebida. Ele nega a prática

emancipatória e reafirma uma prática de dominação e subordinação.

Analisando essas Representações que os coordenadores têm construídas do Serviço

Social em seus imaginários, pode-se dizer que muitas vezes o sujeito atribui sentido a esta

prática de acordo com sua finalidade. No setor empresarial, onde se encontram campos de

forças opostas, as Representações ora são afirmadas, ora são negadas, de acordo com a

intenção que o sujeito possui ao efetivar sua ação. Dessa forma, pode-se dizer que as

Representações exercem uma função condicionante nas ações dos coordenadores do Serviço

Social na contratação dos Assistentes Sociais.

28

Informação cedida em entrevista com um Coordenador do Serviço Social da empresa C.

71

5.2. As Representações do Serviço Social explicitadas no discurso dos empregados

Para os empregados, ressalta-se que aqui será excluído os Assistentes Sociais,

observa-se que a função do Serviço Social dentro de uma empresa não está muito clara. Há

uma disparidade entre a prática profissional proposta pela Lei 8662/93 e a prática, ou melhor,

a postura que o empregado espera do Assistente Social. Observa-se que muitas vezes a

atuação profissional fere os anseios dos empregados. A fala abaixo é de um empregado da

Empresa B quando foi perguntado a ele sobre o papel do Serviço Social dentro da empresa:

Não sei, pois o que eu pensei que fosse, quando eu precisei não fui atendido, nem

auxiliado.

Tal fato pode ser explicado pela representação que o empregado possui acerca da

profissão. Muitas vezes o empregado ainda espera do Assistente Social uma ajuda, espera que

o profissional tenha pena da situação a qual se encontram. Muitas vezes ainda o empregado

espera que o Assistente Social possa ajudá-lo a burlar as normas da empresa na concessão de

benefícios, como pode-se observar na fala de um empregado da Empresa B:

O papel do Serviço Social é ajudar o empregado que necessita de benefício que foge

às regras da empresa. Orienta sobre os benefícios que a empresa tem e quando não

oferece algo eu procuro ajuda com a Assistente Social.

Como foi constatado, os empregados ainda possuem uma Representação do Serviço

Social pautada na ajuda. A figura da Assistente Social ainda é tida como a da boa moça, que

resolverá todos os problemas dos empregados, principalmente quando se trata de problemas

de cunho financeiro. O que se observa é que, com esta visão, o empregado não consegue se

ver enquanto cidadão portador de direitos. Ele não vê a assistência como uma forma de

consolidação dos direitos e sim como uma forma de ajuda e favor prestados pela empresa.

72

Quando a ação do Assistente Social diverge da Representação Social que o empregado

construiu em seu imaginário, este tenta negar à prática do Assistente Social minimizando-a ou

descartando a utilidade da atuação do profissional entro da empresa.

Não percebo nada que o Serviço Social faz aqui dentro. (Informação Verbal29

)

Dessa forma, essa Representação do Serviço Social – enquanto forma de ajuda aos

mais necessitados – é um dos fatores responsáveis pela manutenção da posição subalterna da

classe trabalhadora, pois recebendo a assistência prestada pela empresa o empregado se sente

na obrigação de retribuir pelo “favor” recebido, não vendo a assistência como direito do

trabalhador.

Um outro empregado entrevistado, mas que possui uma visão diferente, foi um

sindicalista. Ressalta-se que este possui uma visão mais crítica das contradições que ocorrem

no mundo do trabalho. Este está atento às novas formas de controle utilizada pelo capital, bem

como as novas técnicas utilizadas para garantir a fidelidade do trabalhador à empresa. Pode-se

perceber que o trabalhador sindicalizado é de diversas maneiras perseguido pela empresa,

ainda que esta perseguição seja camuflada. Este é limitado no recebimento de promoções,

prêmios e sofre muito mais com o medo da demissão.

Para o empregado sindicalizado, o Serviço Social é visto como uma profissão que faz

a mediação capital-trabalho, minimizando os conflitos existentes de tal relação:

Geralmente o funcionário do Serviço Social trabalha para servir os dono do capital,

não vejo nenhum mal em trabalhar para o capital. Aliás, é ali que ele tira seu sustento.

Mas o Assistente Social não vê com bons olhos o trabalho do sindicato. (Informação

Verbal30

)

Dessa forma, a Representação que este empregado possui do Serviço Social

empresarial é a de mecanismo de controle, sendo um dos instrumentos utilizados para garantir

29

Informação cedida em entrevista por um empregado da empresa B. 30

Informação cedida em entrevista por um sindicalista da Empresa A

73

a maior produtividade do empregado. Ressalta-se que, apesar do Assistente Social não ver

com bons olhos o trabalho do sindicato (como foi explicitado na fala acima), este profissional

pode, dependendo de seu compromisso ético-político, auxiliar muito no trabalho desenvolvido

pelo sindicato, como pode-se perceber na fala a segui:

Os Assistentes Sociais em geral têm uma boa avaliação da luta sindical, inclusive

colaborando em diversas vezes com seu trabalho por exemplo, no acompanhamento e

emitindo relatórios de acidente de trabalho para o sindicato. (Informação Verbal31

)

Parece contraditório falar que os Assistentes Sociais não vêem com bons olhos o

trabalho do sindicato e ao mesmo tempo falar que o Assistente Social tem uma boa avaliação

do trabalho do sindicato. Mas, uma explicação possível para isso pode ser encontrada nas

diferentes posturas profissionais adotadas pelo Assistente Social dentro do setor empresarial.

A escolha ético-política do profissional vai ser a grande responsável pela avaliação que este

profissional terá sobre o sindicato.

Como pode ser observado, as representações que os empregados têm do Serviço

Social serão responsáveis pela postura desses empregados perante o Serviço Social. Muitas

vezes os empregados negam o trabalho do Assistente Social, pois possuem uma

Representação que não mais condiz com a prática do profissional – Representação esta

pautada na caridade, na ajuda e na pena. Outras vezes o empregado não utiliza o serviço do

Assistente Social pois vê na figura deste profissional a corporificação de uma mecanismo de

controle muito forte sobre os empregados – Representação pautada na ação profissional

enquanto uma forma de correção do caráter do trabalhador e como forma de manutenção do

poder da classe dominante, que se utiliza de mecanismos como a concessão de benefícios para

dominar, subordinar e explorar a classe trabalhadora.

31

Informação cedida em entrevista por um sindicalista da Empresa A

74

5.3. As Representações do Serviço Social explicitadas no discurso dos Assistentes Sociais

Observa-se, através das entrevistas realizadas com os Assistentes Sociais, que estes

profissionais também não apresentam uma Representação uniforme sobre a profissão. O

conhecimento da Lei 8662/93 e do Código de Ética Profissional não garantem uma prática

pautada na emancipação do sujeito e na consolidação dos direitos. Muitas vezes, apesar do

profissional ter conhecimento desses aparatos legais, sua prática ainda é conservadora e

exprime traços de favor e controle.

O Assistente Social, apesar de ter um compromisso ético-político com a classe

trabalhadora, dentro da empresa ele está a serviço do empregador e visa a manutenção da

força de trabalho e a lucratividade da empresa. Para a realização de uma prática

emancipatória, o Assistente Social deve ter muita clareza de seu compromisso ético-político e

estar atento para as contradições que existem dentro da empresa – contradições estas que se

exprimem diariamente nas relações de poder entre empregados e empregadores.

Existem posturas profissionais que visam garantir o direito do trabalhador. Muitos

profissionais acreditam que uma prática emancipatória dentro da empresa é possível. Estes

realizam seu trabalho buscando priorizar os interesses dos empregados, na tentativa de

garantir sua autonomia.

O Serviço Social contribui para o crescimento do sujeito ajudando-o a refletir sobre os

limites e possibilidades de cada um. O Assistente Social orienta não somente o

empregado, mas também sua família. As Assistentes Sociais contribuem também para

a reflexão do empregado sobre os problemas profissionais e pessoais, auxiliando-o

assim na tomada de decisões, preservando sempre a autonomia do empregado na

escolha de sua decisão. A palavra final sempre é dele. (Informação Verbal32

)

Não podemos nos prender apenas nas normas estabelecidas pela empresa nos

atendimentos. Quando nos deparamos com os limites institucionais temos que buscar

soluções fora desses limites, pois precisamos olhar o lado do empregado e não

somente da empresa. (Informação Verbal33

)

32

Informação cedida em entrevista por uma Assistente Social da Empresa A. 33

Idem.

75

Para esses profissionais, a Representação do Serviço Social é pautada na noção de

direitos. O empregado é um portador de direitos e o Assistente Social é um profissional que

pode auxiliá-lo na consolidação dos mesmos. Para que o profissional tenha a Representação

do Serviço Social enquanto direito de cidadania faz-se necessário um bom conhecimento da

Lei que regulamenta a profissão – Lei 8662/93 – e do Código de Ética Profissional. É nestes

aparatos legais que se encontra a mais clara noção da Assistência enquanto um direito social

(além da Constituição da República de 1988).

Ressalta-se que estes profissionais supramencionados apresentam uma visão mais

reflexiva sobre a profissão, assim como procuram sempre buscar conhecimentos novos. A

prática profissional é muito importante, mas ela deve se pautar em estudos teóricos prévios.

Somente com esses estudos os profissionais são capazes de realizar uma análise de conjuntura

mais verossímil, englobando todas as contradições existentes nas sociedades capitalistas.

Mas existem profissionais do Serviço Social que ainda possuem uma visão

conservadora. A Representação do Serviço Social ainda é aquela que visa a manutenção do

poder da classe dominante, sendo o Assistente Social responsável por modelar o caráter do

trabalhador para aumentar sua produtividade.

Tem horas que atendemos empregados que precisam entender que a empresa tem

limites, que ela mudou. Então existem horas que tem que ser olhado o lado da

empresa e o empregado precisa entender isso. As vezes é preciso falar para o

empregado que a empresa precisa dele saudável, produtivo, que venha trabalha, que

possa contar com ele, que seja comprometido. Existe empregado que não agrega nada

e às vezes precisamos cobrar dele esse lado. (Informação Verbal34

)

Dentro da empresa, o Assistente Social que não se atenta para as contradições

existentes dentro de seu campo de trabalho, acaba por ficar limitado. Este passa apenas a ser

um mero executor de tarefas (tarefas impostas pelo capital).

34

Informação cedida em entrevista por um Assistente Social da Empresa A.

76

Todos os nosso projetos e programas não são novos, mas eles sempre foram

atualizados. Temos total liberdade de apresentar novos projetos para a diretoria, é

tudo que eles querem, mas como o Serviço Social da empresa já é muito antigo nós já

temos projetos que atendem a todas as demandas então não temos muito espaço

real na prática para inventar coisas novas, nós ficamos dando cara nova aos projetos

existentes. (Informação Verbal35

)

Ressalta-se que a presença de práticas conservadoras exprime que existem

Representações do Serviço Social, até mesmo para os Assistentes Sociais, em que a profissão

é tida como mecanismo de manutenção de poder. Esta visão pode ser explicada, talvez, pela

falta de interesse do profissional em buscar um aperfeiçoamento teórico. Nota-se que o

Serviço Social ainda é muito marcado pela prática em si. Na Escola de Serviço Social o que

se observa é que a maioria dos alunos busca a prática muito precocemente – através da

realização de estágios –, o que auxilia na formação de profissionais mais voltados para a

prática, sem terem um respaldo teórico consistente. Isso acaba contribuindo para a construção

de uma Representação muito pobre da profissão: Representação essa pautada na ajuda ao

próximo.

O que foi observado nas empresas pesquisadas é que ainda existe a Representação do

Serviço Social enquanto uma prática voltada para a reprodução tanto da força de trabalho

como no próprio cotidiano do Serviço Social, que acaba se resumindo na distribuição de

benefícios. Mas, vale ressaltar que, a atuação profissional vai depender e muito da postura

ético-política assumida pelo Assistente Social. Neste sentido, a Representação que o

profissional tem sobre a profissão vai influenciar diretamente em sua atuação. Se o

profissional possuir uma Representação do Serviço Social pautada na emancipação do sujeito,

ele desenvolverá seu trabalho buscando mecanismos que aumentem suas possibilidades de

35

Informação cedida em entrevista por um Assistente Social da Empresa A.

77

atuação. Será um profissional que, apesar de se deparar com os limites institucionais, buscará

criar espaços de trabalho onde possam ser disseminados os direitos e a cidadania36

.

Já se o profissional tiver uma Representação do Serviço Social pautada na noção da

caridade e da ajuda, sua atuação profissional se limitará na distribuição de benefícios. O

empregado será apenas o pobre coitado que sofre perante o empregador. A atuação do

Assistente Social que possui essa representação é limitada e inconsistente, pois ele acaba

reafirmando uma situação de exploração e submissão da classe trabalhadora, sem enxergar

nesta relação a possibilidade da busca da autonomia do sujeito. Este seria o Assistente Social

acomodado, que não vê muitas possibilidades de realização da mediação entre empregado-

empregador a não ser a de agir como um agente apaziguador dos conflitos, através da

distribuição dos benefícios fornecidos pela empresa.

Existem ainda posturas dos Assistentes Sociais que ferem o Código de Ética

Profissional. Nas entrevistas foi constatado que existem profissionais que realizam uma

prática voltada para os interesses exclusivamente da empresa, na tentativa de preservação do

emprego.

Qualquer estudante de Serviço Social que tenha uma visão marxista e que diz que

nunca trabalharia em empresa se souber o quanto eu ganho mudaria de idéia.

(Informação Verbal37

)

Observa-se que, esta profissional possui uma visão que contradiz o Código de Ética

Profissional, pois esta postura contraria o compromisso ético-político do Assistente Social de

comprometimento com a classe trabalhadora, pois visa exclusivamente a manutenção do

salário. Ressalta-se que nas sociedades capitalistas qualquer trabalhador necessita de um

salário para garantir a manutenção de sua vida e sua inserção na sociedade (pois sem ele a

36

Em uma simples palestra de orientação financeira o profissional pode utilizar desse espaço como um

espaço de informação e de formação. São nesses pequenos espaços que podem surgir as grandes idéias. 37

Informação cedida em entrevista por uma Assistente Social da Empresa A

78

pessoa fica à margem da mesma). Mas, isso não justifica posturas profissionais

descomprometidas com o trabalhador.

Como pode ser observado, as Representações são condicionantes na atuação do

profissional do Serviço Social, assim como condicionam também as ações dos demais

profissionais da área empresaria. Isso porque as Representações consistem em um movimento

coletivo em que se busca dar sentido, significação às coisas, sendo as ações diretamente

relacionadas ao sentido que se atribui ao elemento da intervenção. Se o elemento da

intervenção, no caso o empregado que procura o Serviço Social, é visto como coitado a ação

do Assistente Social será uma, já se o empregado é visto como sujeito portador de direitos a

ação será outra, pautada muito mais na liberdade e na autonomia.

Como as Representações dizem respeito aos conhecimentos acumulados a partir das

experiências, informações, saberes e modelos de pensamentos que cada indivíduo recebe e

transmite através da tradição, da educação e da comunicação, a transformação das

Representações do Serviço Social dentro da empresa vai depender e muito da prática do

Assistente Social. Somente através de práticas reiteradas comprometidas com o empregado

essas Representações serão modificadas.

Ressalta-se que a modificação das Representações se dará de forma resiste e

progressiva. A modificação começará com práticas emancipatórias pontuais. A medida em

que estas práticas forem freqüentes elas começarão a serem percebidas como uma nova

possibilidade de atuação, inicialmente para os Assistentes Sociais. Posteriormente elas

poderão ganhar força e maior visibilidade, a medida em que outros profissionais forem

reconhecendo e legitimando as novas práticas de atuação do Assistente Social. Na medida em

que estas práticas forem ganhando visibilidade elas modificarão as Representações pré-

existentes do Serviço Social. A nova Representação será aquela construída sobre a noção de

direitos e de cidadania, onde o sujeito é capaz de tomar suas próprias decisões. Esta

79

possibilidade de mudança é possível quando se modificar a própria formação dos Assistentes

Social, e estes entenderem que o Serviço Social possui uma cientificidade que precisa ser

desenvolvida e efetivada em conhecimentos teóricos, que serão utilizados para o

desenvolvimento de práticas mais reflexivas e emancipatórias.

80

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A história do Serviço Social foi marcada por elementos que foram responsáveis pela

construção de Representações do Serviço Social no imaginário das pessoas. Atualmente,

muitas Representações não condizem com a prática profissional proposta pela Lei 8662/93 e

pelo Código de Ética Profissional. O Assistencialismo, as relações desiguais de poder, a

dominação, a subordinação e a exploração fazem parte da formação da profissão e

conseqüentemente de sua história38

. Essas marcas ainda refletem na atuação do profissional na

atualidade, pois a sociedade possui uma Representação da profissão ancorada nos

mecanismos supramencionados, não conseguindo associar a prática profissional à noção de

direitos, não a reconhecendo como um mecanismo de usufruto da cidadania – pois o Serviço

Social propicia a ligação entre o cidadão e o direito.

Especificamente no Brasil, romper com estas Representações, ou transformá-las,

requer transpor um longo e árduo caminho. Caminho este que foi construído, desde o

descobrimento do Brasil passando por sua Independência, com uma história de dominação e

subordinação. Aqui, o que se observa é que há uma particularidade na construção dos

conceitos de direito e cidadania, o que acabou gerando uma deturpação dos mesmos,

principalmente em se tratando de “Cidadania”.

No Brasil, pode-se dizer que a cidadania foi e é tutelada. Sempre houve um

movimento autoritário das elites dominantes na tentativa de paralisar os movimentos

populares de luta por reconhecimento. As lutas existentes aqui foram pontuais, não

conseguindo abranger a totalidade do território brasileiro. Ao mesmo tempo essas lutas foram

38

Ressalta-se que a história do Serviço Social também foi marcada por elementos positivos. A prática

do Serviço Social foi muitas vezes responsáveis por denunciar a situação de vulnerabilidade das pessoas.

Vulnerabilidade esta que ia desde a pobreza absoluta e generalizada até os mais altos índices de exclusão social.

81

abafadas pela elite dominante, ora com a “concessão de alguma autonomia”, ora com a

concessão de algum direito, ora com o extermínio de pessoas e conseqüentemente do

movimento.

Assim, o que se pode constatar é que o Brasil vive sob o domínio autoritário de uma

elite. Isso faz com que as prerrogativas atribuídas aos indivíduos – direitos – sejam facilmente

quebradas e desrespeitadas, apesar de estarem previstas em lei. O que se observa no Brasil é a

cidadania passiva, na qual o cidadão fica muitas vezes inerte diante da forte ideologia

dominante. Esta é disseminada, ainda, através dos meios de comunicação de massa, que são,

em grande parte, responsáveis pela formação da opinião pública.

Diante desse cenário de dominação, subordinação, clientelismo e paternalismo, o

Serviço Social muitas vezes ainda é visto como um dos instrumentos de poder da classe

dominante. Os usuários da Assistência freqüentemente não a vêem como um direito e sim

como um favor prestado pelo governo e que será recompensado na próxima eleição. O usuário

não é tido como cidadão e sim como um mero necessitado de ajuda.

Dentro de uma empresa esta realidade não é diferente. Com as conseqüências da

Reestruturação Produtiva – desemprego, diminuição do quadro de funcionários, redução de

custos etc. – o empregado se vê dominado pelo empregador. Esse se submete a todo um

aparato desumano de trabalho para ter garantido seu emprego. As novas técnicas de

dominação do trabalhador são muito mais eficazes, e estão gerando um adoecer da classe

trabalhadora, que sofre com doenças psicológicas graves. O empregado passa a ser uma

mercadoria totalmente descartável e substituível.

Pensando neste cenário em que a sociedade de encontra, cabem as perguntas: Qual o

novo papel do Serviço Social na sociedade contemporânea? Como se modificar uma

Representação, que acaba condicionando ações, que reafirma o papel do Assistente Social de

instrumento de manutenção de poder da classe dominante?

82

Concorda-se que o Assistente Social inicialmente era um profissional acrítico, que

reproduzia o sistema capitalista. Mas, desde as décadas de 60/70, com o Movimento de

Reconceituação, pensa-se na possibilidade de uma prática mais crítica e comprometida com a

classe trabalhadora. A Constituição Federal de 1988 propiciou ao Assistente Social o

exercício de uma prática de efetivação de direitos. A Assistência foi reconhecida enquanto um

direito social que deveria ser prestada pelo Estado. A Lei 8662/93 trouxe a regulamentação

que a profissão necessitava para garantir ao profissional o exercício de uma prática mais

consistente, amparando a singularidade de sua atuação. O Código de Ética do Serviço Social

pela primeira vez trabalhou os princípios profissionais, trazendo para a profissão discussões

mais filosóficas sobre o “dever ser” do profissional.

Mas, mesmo com toda evolução crítica e reflexiva passada pela profissão, as

Representações do Serviço Social ainda não condizem com a prática proposta pelos

instrumentos legais supramencionados. Como foi constatado durante esse trabalho, dentro da

empresa o Assistente Social ainda não é visto como um profissional que visa o acesso à

direitos. Tal fato pode ser explicado devido à própria atuação do Assistente Social, ou seja,

apenas o conhecimento dos instrumentos legais supramencionados não garante uma prática

profissional emancipatória. É necessária uma mudança de postura perante a contradição

existente entre capital e trabalho.

Muitas vezes o Assistente Social assume uma postura que não condiz com a Lei

8662/93 e acaba por ferir o Código de Ética profissional. Essas posturas assumidas pelo

Assistente Social - posturas que visam a obtenção da lucratividade da empresa via reiteração

da submissão do trabalhador – acabam por reafirmar a Representação de que o Serviço Social

é um dos responsáveis pelo enquadramento do empregado às normas da empresa, que este

profissional exerce uma prática de controle, submissão e dominação da classe trabalhadora.

83

Por outro lado, o trabalhador não se reconhecer enquanto cidadão de direitos, este

espera do Assistente Social uma postura paternalista. O Assistente Social ainda é tido como o

responsável por “ajudá-lo” a conseguir os benefícios da empresa. O empregado não entende

que os benefícios são um direito seu. Até mesmo perante as férias remuneradas – direito que

foi conquistado pelo trabalhador – o empregado age como se fosse um benefício dado pela

empresa.

Muitos Assistentes Sociais também não desenvolvem uma prática pautada na

emancipação do sujeito. Estes ainda vêem na assistência uma prática de ajuda aos mais

necessitados e vinculam à concessão de benefícios - direitos - ao merecimento do trabalhador.

Ressalta-se que somente com uma prática mais comprometida com o cidadão, o Assistente

Social conseguirá transformar a Representação do Serviço Social que ainda vigora. Prática

esta comprometida principalmente com o a classe trabalhadora.

O Serviço Social possui um caráter educativo. A educação ainda é um dos

mecanismos que o Serviço Social pode utilizar para transformar a dura realidade que assola a

sociedade brasileira. O Serviço Social é uma profissão capaz de informar, formar e transmitir

valores fundamentais para a construção de uma sociedade mais igualitária cuja ação coletiva

seja pautada na justiça social. O Assistente Social, ao realizar um simples atendimento, pode

ajudar a formar cidadãos mais críticos, informando sobre direitos e mecanismos de acesso aos

mesmos.

Mas, para se conseguir uma mudança coletiva deve-se começar mudando o individuo,

seu imaginário sobre si mesmo, e isso é possível mediante uma prática profissional

comprometida com o sujeito, cidadão de direitos. A formação de uma rede de trabalho

também pode contribuir para que se consiga a efetivação de uma prática que tenha como

principal foco o bem-estar do trabalhador – as conexões devem acontecer não somente entre

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profissionais do Serviço Social como também devem ser interdisciplinares e com movimentos

da sociedade civil e de da classe trabalhadora (como os sindicatos, por exemplo).

É evidente que isso vai depender da postura profissional do Assistente Social assim

como de sua criatividade em construir estratégias de atuação. Este, para conseguir informar e

formar sujeitos autônomos, deve primeiramente se informar e formar seus próprios valores.

Dentro da empresa o Assistente Social deve buscar os espaços utilizados para informação para

auxiliar na formação de empregados mais reflexivos e atentos às estratégias utilizadas pelo

capital para garantir sua fidelidade.

O comprometimento com uma prática emancipatória é fundamental para que o

profissional exerça um trabalho não somente ético em relação aos limites profissionais, mas

ético a ponto de ser comprometido com uma transformação social pautada em valores de

igualdade e de justiça social. Somente assim o Serviço Social será reconhecido como uma

profissão que viabiliza o acesso aos direitos sociais e não mais como mais um dos

instrumentos de poder da classe dominante.

Todas essas mudanças consistem num grande desafio para o Serviço Social. A

mudança talvez passe por esta via: acreditar que, apesar das forças retrogradas em que se

pautou o Serviço Social, uma nova prática é possível. Pois os mecanismos legais estão postos

para os profissionais. Ilusão é esperar que uma nova Representação seja construída apenas por

instrumentos legais. Uma nova Representação se faz possível na medida em que existam

práticas emancipatórias freqüentes (apesar de saber que mesmo com a modificação das

práticas, longo será o tempo de transformação das Representações). É necessária uma nova

prática, uma nova postura, pois o reconhecimento da profissão enquanto um mecanismo de

acesso a direitos não é algo que será concedido aos Assistentes Sociais e sim conquistado por

eles.

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