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VELHOGENERAL.COM.BR AS CAMPANHAS SUBMARINAS ALEMÃ E NORTE-AMERICANA NA SEGUNDA GUERRA MUNDIAL 1 19/12/2019 | VELHOGENERAL.COM.BR | CATEGORIAS: ANÁLISE, GUERRA NAVAL, SEGUNDA GUERRA MUNDIAL, SUBMARINOS AS CAMPANHAS SUBMARI NAS ALEMÃ E NORTE-AMERICANA NA SEGUNDA GUERRA MUNDIAL Por Carlos Norberto Stumpf Bento* Imagem ilustrativa (Revista de Villegagnon). “A melhor esperança que o inimigo possui para evitar a derrota é a guerra submarina contra uma nação que vive do mar. Este é um fato que não será esquecido no futuro”. (Almirante Cunningham – Primeiro Lorde do Almirantado Britânico – 1945) Decorridos setenta anos do final da Segunda Guerra Mundial (2ª GM), ainda desperta muito fascínio revisitar alguns aspectos da guerra no mar conduzida naquele período. O presente artigo pretende abordar a importância do emprego da arma submarina e da marinha mercante no preparo e emprego das marinhas, a qual parecia relegada a segundo plano no período entre guerras, mas os fatos ocorridos após a invasão alemã da Polônia e o ataque japonês a Pearl Harbor vieram a alterar drasticamente tal concepção. ESTRATÉGIAS NAVAIS NO INÍCIO DO CONFLITO No Atlântico, a estratégia naval alemã consistia em cortar as Linhas de Comunicações Marítimas (LCM) britânicas com as suas fontes de suprimentos e matérias-primas até a exaustão de suas forças. Em 1939, com a ruptura da tendência de uma guerra que, apesar de considerada inevitável pela Alemanha Nazista, era prevista para algo em torno de 1948 e possuindo uma esquadra ainda inferior à britânica, os alemães voltaram a empregá-la nos mesmos moldes da Primeira Guerra Mundial (1ª GM), como uma “esquadra em potência”, exercendo o comando do Mar Báltico, onde contava com o apoio da Força Aérea Alemã (Luftwaffe). Tal concepção permitia fixar uma grande parcela das forças navais britânicas, efetuando eventuais ações de desgaste contra elas e impedindo-as de atuar em outros teatros. Como a geopolítica não favoreceu o desenvolvimento marítimo da Alemanha e a sua marinha não teve tempo de preparar adequadamente sua esquadra, como força naval mais fraca, adotou novamente a guerra de corso, empregando corsários de superfície (que obrigavam os britânicos a distribuir seus meios navais pelos sete mares) e, principalmente, submarinos no ataque ao Tráfego Marítimo (TM) britânico.

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19/12/2019 | VELHOGENERAL.COM.BR | CATEGORIAS: ANÁLISE, GUERRA NAVAL, SEGUNDA GUERRA MUNDIAL, SUBMARINOS

AS CAMPANHAS SUBMARINAS ALEMÃ E NORTE-AMERICANA NA SEGUNDA GUERRA MUNDIAL

PorCarlosNorbertoStumpfBento*

Imagemilustrativa(RevistadeVillegagnon).

“Amelhoresperançaqueoinimigopossuiparaevitaraderrotaéaguerrasubmarinacontraumanaçãoquevivedomar.Esteéumfatoquenãoseráesquecidonofuturo”.

(AlmiranteCunningham–PrimeiroLordedoAlmirantadoBritânico–1945)

Decorridos setenta anos do final da Segunda Guerra Mundial (2ª GM), aindadespertamuito fascínio revisitar alguns aspectos da guerra nomar conduzidanaqueleperíodo.Opresenteartigopretendeabordaraimportânciadoempregodaarmasubmarinaedamarinhamercantenopreparoeempregodasmarinhas,aqualpareciarelegadaasegundoplanonoperíodoentreguerras,masosfatosocorridos após a invasão alemã da Polônia e o ataque japonês a Pearl Harborvieramaalterardrasticamentetalconcepção.

ESTRATÉGIAS NAVAIS NO IN ÍC IO DO CONFLITO No Atlântico, a estratégia naval alemã consistia em cortar as Linhas deComunicaçõesMarítimas(LCM)britânicascomassuasfontesdesuprimentosematérias-primas até a exaustão de suas forças. Em 1939, com a ruptura datendênciadeumaguerraque, apesarde considerada inevitávelpelaAlemanhaNazista, era prevista para algo em torno de 1948 e possuindo uma esquadraaindainferioràbritânica,osalemãesvoltaramaempregá-lanosmesmosmoldesda Primeira Guerra Mundial (1ª GM), como uma “esquadra em potência”,exercendoocomandodoMarBáltico,ondecontavacomoapoiodaForçaAéreaAlemã(Luftwaffe).Talconcepçãopermitia fixarumagrandeparceladas forçasnavais britânicas, efetuando eventuais ações de desgaste contra elas eimpedindo-as de atuar em outros teatros. Como a geopolítica não favoreceu odesenvolvimento marítimo da Alemanha e a sua marinha não teve tempo depreparar adequadamente sua esquadra, como força naval mais fraca, adotounovamente a guerra de corso, empregando corsários de superfície (queobrigavam os britânicos a distribuir seus meios navais pelos sete mares) e,principalmente,submarinosnoataqueaoTráfegoMarítimo(TM)britânico.

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A estratégia naval britânica era fundamentada no bloqueio à distância daesquadraalemã,visandoàmanutençãododomíniodoMardoNorte,ondetinhaforçasnavaissuperioresecontavacomoapoiodesuaforçaaérea(RAF–RoyalAir Force). Para a proteção de sua marinha mercante, vital para o esforço deguerra,devidoaofracassoinicialnatentativadeempreenderacaçaedestruiçãode submarinos, adotou novamente o sistema de comboios, que já havia sidoempregado na 1ª GM, além de perseguir implacavelmente os corsários desuperfíciealemães.

No Pacífico, a estratégia naval norte-americana consistia em retomar,sistematicamente, as ilhas conquistadas pelo Japão por meio de OperaçõesAnfíbias, e cortar as LCMdaquelepaís comas suas fontesdematérias-primas,conduzindo-oàexaustão.Oempregodosubmarinovisava,inicialmente,apenasoataqueàsforçasnavaisjaponesas.

FIGURA1–Submarinonorte-americano(RevistadeVillegagnon).

A estratégia naval japonesa tinha como propósito a obtenção da “batalhadecisiva”juntoàesquadranorte-americana,emcomplementoaoataqueaPearlHarbor, o que permitiria ao Japão obter, como preconizava Alfred Mahan1, odomínio do mar no Pacífico. Os navios e submarinos de sua esquadraconcentravam esforços contra as forças navais do inimigo. O controle do TMjaponês era muito deficiente e a sua proteção efetuada por escoltas malequipadas e mal posicionadas no comboio e que possuíam tripulações maladestradasparaaguerraantissubmarina.

Por ocasião do ataque a PearlHarbour, o fato de a aviação naval japonesa terpoupadoabasedesubmarinosamericana,onde21submarinosencontravam-seatracados2,logoprovariatersidoumgraveerro.

O EMPREGO DA ARMA SUBMARINA Ossubmarinosnorte-americanos(Figura1) foramconstruídosvisandooapoioaos navios da sua esquadra, com ênfase no ataque a navios capitais. No1AlfredThayerMahan(1840-1914).OficialdeMarinhaefamosohistoriadornavalnorte-americano,estrategistaeteórico

2Outros29submarinosnorte-americanosencontravam-seestacionadosnabaíadeManila,nasFilipinas.

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transcorrer da campanha do Pacífico foram utilizados em esclarecimento,minagem,operaçõesespeciaisenoataqueaoTMjaponês,esteiniciadologoapósPearlHarbor.ApósasconquistasdoJapão,atéoutubrode1944,elesimpediramsozinhosodomíniodomarpelosjaponeses.

Ossubmarinosalemães(U-Boats–Figura2),empregadosinicialmentenoapoioàinvasãodaNoruega,visaram,duranteamaiorpartedaguerra,oataqueaoTMbritânico.Aofinaldoconflito,voltaram-separaadefesada“FortalezaEuropa”,culminando com a tentativa, em vão, de corte dos suprimentos das forças deinvasãoaliadas.

O infográfico3apresentaumasíntesedaaçãodos submarinosalemãesenorte-americanossobreoTMinimigoaolongoda2ªGM.

FIGURA2–Submarinoalemão,U-Boat(RevistadeVillegagnon).

Os navios e submarinos da esquadra dos EUA apoiaram-se mutuamente. Osnavios atraiam forças contra si e os submarinos efetuavam ações de desgaste(foram afundados 276 navios de guerra japoneses) e atuavam decisivamentecontra o TM japonês, principalmente no ataque a navios petroleiros, o quechegou a deixar a esquadra inimiga impossibilitada de suspender por falta decombustível (foramafundados1.113NMjaponeses–ver Infográfico [a]).Alémdisso,prestaramapoioasubmarinosavariadoseanáufragos.

Os submarinos japoneses, apesar de terem infligido perdas significativas àesquadra norte-americana (afundaramquatro porta-aviões, um cruzador e umcontratorpedeiro)4,limitaram-seaatacarsomentenaviosdeguerra,deixandooTMinimigolivre.

3OInfográficofoielaboradopeloautor,combasenosgráficosconstantesdaspáginas563e808dareferência5eemdadoscoletadosdasreferências1,2,4e7.Osdemaisgráficosefigurasforamelaboradosouadaptadospeloautor.

4Um feito notável foi o submarino japonês I-168 ter afundado os únicos navios de guerra norte-americanos perdidos naBatalhadeMidway:oporta-aviõesUSSYorktowneocontratorpedeiroUSSHammann.

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OsU-Boats,comexceçãodealgumasaçõesdedesgastecomoadeScapaFlow5edo afundamentode alguns navios de linha, atuaramprimordialmente contra oTM inimigo, em conjunto com navios corsários de superfície6, sem prestar oureceberapoiodiretoda“esquadraempotência”alemã.

FIGURA3–Construçãoeperdasdesubmarinosnorte-americanosealemãesna2ªGM(RevistadeVillegagnon).

ApesardasgrandesperdasinfligidasaoTMaliado,osU-Boatsnãoconseguiramsufocá-loeocortedasLCMalemãs,principalmentecomaItália,afetoumuitooesforçodeguerranazistaquandotallogísticapassouaserfeitaporterra.

Os submarinos norte-americanos foram vetorados por navios de guerra eaeronaves, principalmente as baseadas em navios-aeródromos. O apoio daLuftwaffe aosU-Boats, restrito aoMar doNorte e aoMarBáltico, foi prestadoapenasnoperíodoentreaquedadaFrançaeainvasãodaURSS(Infográfico[a]),apartirdeondeelapassouaconcentrarosseusesforçosemoutrasfrentes.Alémdisso,aAlemanhanãochegouaconstruirnavios-aeródromos.

Osubmarinonorte-americanoeraconsideradoumaarmaeconômica.Paracadasubmarinoperdidoafundou-se102.300toneladasemnaviosmercantese11.100toneladasemnaviosdeguerra (Figura1e Infográfico [b]).A arma submarina,que compunhamenos de 2% dosmeios navais daMarinha dos EUA, afundoumaisde30%daMarinhaImperialdoJapão, incluindooitoporta-aviões,emaisde 60% de suamarinhamercante. Por isso foram investidos muitos recursosnessetipodearma.

Os U-Boats receberam prioridade da Marinha alemã no consumo de óleocombustível,poistambémeramconsideradasarmaseconômicas,atéasituaçãomudardrasticamenteao finaldo conflito, comelevadaperdadeunidadesedevidas (Figura 1 e Infográfico [c]). Para cada U-Boat perdido foram afundadas18.660toneladasemnaviosmercantes.

O esforço na construção de submarinos e suas perdas estão apresentados nográficodaFigura3.5Em14/10/1939, o submarinoalemãoU-47, comandandopelo CapitãoGüntherPrien, penetrounas defesas do porto deScapaFlow(GBR)etorpedeouoencouraçadoHMSRoyalOak,causandoaperdade833vidas.

6Os afundamentos efetuados por corsários de superfície alemães (navios de guerra e mercantes) foram desprezíveis secomparadoscomosresultadosobtidospelosU-Boat.

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No aspecto operacional e tático, os alemães se destacaram pela adoção dosataques emmatilha à noite, do emprego de fogo antiaéreo do submarino e deseus canhões 7 contra petroleiros, além da utilização de submarinosreabastecedores,conhecidoscomo“vacasleiteiras”.

O FATOR TECNOLÓGICO OsU-Boats, já empregados na 1ªGM, foram construídos visando a quantidadeemdetrimentodaqualidade,semostraraminadequadosparaempregoemalto-mardevidoaoseupequenodeslocamentoecomprimento (67m).Os torpedosalemães,apesardeexperimentadosnoconflitoanterioredepossuíremaltoníveltecnológico, apresentaram, inicialmente, falhas em seu funcionamento. Ossubmarinos norte-americanos, apesar de tecnologicamente superiores aos U-Boatsecommaiordeslocamentoecomprimento(95m),tiveramusoinéditoemguerra, sendo empregados inicialmente como uma arma defensiva. As falhasocorridasemseustorpedos,queassombraramossubmarinistasatéaBatalhadeMidway (Infográfico [d]), só foram totalmente corrigidas em julho de 1943,retardandooseuefeitocontraoTMjaponês(Infográfico[e]).

FIGURA4–Submarinosporta-aviõessecretosdoJapão(RevistadeVillegagnon).

Emambasascampanhassubmarinasofatortecnológicopesouacentuadamenteemfavordosaliados.Podemosdestacarapesquisaoperacional;anavegaçãoemcomboio; o emprego de: RADAR; ASDIC;MAD8; geradores de ruído; cargas deprofundidade;redesantitorpedo;reabastecimentodeescoltas;aviõesbaseadosemterraeaviaçãonavaldosnavios-aeródromosdeescolta.Alémdisso,tiveramacapacidadedevetorarsubmarinospornavioseaeronaves,êxitonadecifraçãodecódigosegrandecapacidadedeconstruçãonaval.Do ladoalemãopodemosdestacar, além doMETOX (MAGE9embrionário), a qualidade superior de seustorpedos e a capacidadede construção emmassade submarinos (Figura3).Ainvençãodoesnórquelaofinaldoconflito,apesardediminuiraprobabilidadededetecçãodosU-Boats,limitavaasuavelocidadeaseisnós,impedindoquefosse7Tal procedimento visavaa economiade torpedos e osU-Boat, antes depassarema ser alvejadospor canhõesdenaviosmercantesarmados,aindaconseguiamgraduaroseupoderdedestruição.

8ASDIC–acrônimodeAntiSubmarineDetection InvestigationCommittee–precursordoSONAR(SoundNavigationandRanging).MAD(MagneticAnomalyDetector–DetectordeAnomaliaMagnética).

9MAGE–Detectorpassivodeemissõeseletromagnéticas.

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aplicado o princípio da concentração contra o TM aliado, representado pelatáticadeataqueemmatilha,conformevinhamfazendoduranteamaiorpartedaguerra,comossubmarinosnavegandonasuperfície10.

Do lado japonês, registra-se a descoberta, no final do conflito, de submarinosporta-aviõessecretos(Figura4)quevisavamempreenderataquesaéreoscontraoterritóriocontinentaldosEUA,masquenãolograramsucesso11.Osjaponesestambém se utilizaramde um aparelho de detecção submarina que semostrouineficaz.

FIGURA5–TeatrosdeOperaçõesdesubmarinosalemãesenorte-americanosna2ªGM(RevistadeVillegagnon).

A GEOPOLÍT ICA Osnorte-americanosmantiveramoseuTMlivredoataquejaponêseseuparqueindustrial intactodurante todooconflito.Alémdepossuírembasesavançadas,tão importantes como já previa Mahan12, seus submarinos atuaram em umTeatro de Operações Marítimo (TOM) mais restrito, atacando o TM japonêsintensivamenteemestreitos,oquefacilitouasuaatuação.AAlemanha,alémdeter o seu TM praticamente restrito ao Báltico, sofreu bombardeios de suascidades,indústriasebases,oqueveioasobrecarregarseusestaleiroseafetaraconstrução dos U-Boats. Apesar das conquistas da França e da Noruega, nãopossuíam nenhuma base avançada e atuavam em um TOM de maiores

10Operandonasuperfície,umU-Boat(dotadode14torpedos)atingiaumavelocidadede17,7nóseumraiodeaçãode8.500MilhasNáuticas(MN).Submerso,suavelocidadeeraiodeaçãoeramreduzidospara7,6nóse80MN,respectivamente.

11Documentáriosobreoassuntoestádisponívelem<https://www.youtube.com/watch?v=2siIofUtzUc>

12O geopolítico Mahan via, à sua época, a Guerra de Corso como muito indecisiva e o submarino apenas como umaplataformadedefesadecosta.

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dimensões. Tiveram tambémque atacar o TM aliado na área não coberta pelaaviaçãobaseadaemterra(“black-pit”)enascostasdospaísesaliados(Figura5).

O Japão, sem aliados do eixo que pudessem ajudá-lo efetivamente, recebiaapenas matérias-primas, principalmente o petróleo oriundo dos territóriosconquistados. Já a Grã-Bretanha, com diversos aliados, recebia, além dasmatérias-primas, produtos industrializados, principalmente da “inesgotávelmáquinadeguerraamericana”.

A TEORIA DA GUERRA NO MAR Ao contrário de Mahan, que pregava a indivisibilidade da esquadra e anecessidadedeumabatalhadecisivacontraaesquadraoponenteparaseobtero“domíniodomar”, JulianCorbett13enfatizavaanecessidadedeaproveitamentoda característica de mobilidade das forças navais, que permitiria a suaconcentração no momento e local adequados. Também considerava que oobjetivodaguerranaval,diretaouindiretamente,éobtero“domíniodomar”ouevitar que o inimigo o faça, com a diferença que tal domínio poderiacompreender diferentes graus: total ou parcial, permanente ou temporário, e“domínio em disputa”. O domínio só seria absoluto se o poder naval inimigofosse destruído em uma batalha decisiva, o que era raro. Caso houvessesuperioridadedeumdosoponentes,estedeveriabuscarodomínioprocurandoadecisão pela batalha ou estabelecendo o bloqueio, visando à rendição pelacarência dos materiais necessários à sobrevivência do povo e ao esforço deguerra.Nãohavendosuperioridade,Corbettpreconizavaaçõesdefensivas,comoemprego da “esquadra em potência”, ou por meio de ações de desgaste. Suateoria,quejáhaviasidorespaldadadurantea1ªGM,foiconsagradana2ªGM.

Os EUA só conseguiram o domínio domar no Pacífico, no sentidomahaniano,apósasvitóriasnoMardasFilipinasenoGolfodeLeyte(verInfográfico[f]),pormeiode“batalhadecisiva”,ondeaesquadrainimigafoieliminada.NaBatalhadoMar das Filipinas, três dos cinco porta-aviões da marinha japonesa foramafundados,sendodoisporsubmarinos.Apartirdeentão,ossubmarinosnorte-americanospassaramaatacaroTMjaponêssemnenhumaoposição.

OsaliadosobtiveramcontrolepermanentedomarnoAtlântico,jáemumsentidocorbettiano, por não ter ocorrido a “batalha decisiva” contra a “esquadra empotência”alemã,somenteapósodomíniosobreosU-Boats.

A GUERRA DE CORSO Ossubmarinosnorte-americanosatacaramcomboiosempregadosineditamentenumaguerra,portadoresdasdeficiênciasjácitadasanteriormente.Atacaramumpaís que não percebeu a tempo a importância do desenvolvimento de suamarinhamercantecomatonelagemnecessáriaaoseuesforçodeguerra,nemdo

13Julian StaffordCorbett (1854-1922). Proeminentehistoriadornaval britânico e geoestrategistado final do séculoXIX einíciodoséculoXX,cujasobrasajudaramamoldarasreformasdaMarinhaRealBritânicadaépoca.Umadesuasobrasmaisfamosas–“AlgunsprincípiosdeEstratégiaMarítima”,continuaaserumclássicoentreosestudantesdeguerranaval.

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provimento de seu controle e proteção, além de não possuir uma estruturaadequadaparareparoereposiçãodesuasperdas.

OsU-BoatsatacaramoTMdeumpaísque,apesardejáterempregadoosistemadecomboiosna1ªGM,estavadespreparadoparaaguerrasubmarinanoinícioda 2ª GM. Após a entrada dos EUA no conflito, em dezembro de 1941,enfrentaramaoposiçãodeumTMcrescenteemvolumeeorganização.Dototaldenaviosaliadosafundados,somente28%estavamnavegandoemcomboio.

Ossubmarinosnorte-americanosconseguiramcortarcompletamenteasLCMdeuma nação insular, uma façanha que os submarinos alemães não conseguiramnasduasguerrasmundiais.

A GUERRA IRRESTRITA E A PERDA DE V IDAS HUMANAS NO MAR Tantoosalemãesquantoosnorte-americanosempregaramaguerrasubmarinairrestritacontraseusoponentes,violandooTratadoNavaldeLondresde1930.Ambosalegavamserinconcebíveltalrestriçãoemumaguerraondeasvítimasde

FIGURA6–Japonesesmortosna2ªGM(Elaboraçãodoautor).

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bombardeios aéreos contra populações civis e os ataques aéreos sobre navioseramcomunseinfligiamummaiornúmerodebaixas14.

Porocasiãodeseu julgamentonoTribunaldeNuremberg,oAlmirantealemãoKarlDöenitz15,quandocorriaoriscodesercondenadoàpenademorteporteratacado o tráfego marítimo de países neutros, atuou em sua própria defesalivrando-se da pena ao conseguir obter um documento do AlmiranteNimitz16,que testemunhava que os EUA também haviam empregado técnicasindiscriminadas de guerra como tática no Pacífico, e que submarinos norte-americanosnãoresgataramsobreviventesemsituaçõesemqueasegurançadaprópriaembarcaçãoestavaemjogo.

As mortes decorrentes do ataque ao TM japonês chamam a atenção secomparadasàsocasionadaspelosU-BoatssobreoTMaliado(verInfográfico[c]).No ataque ao TM do Japão, onde os submarinos norte-americanos eram osmaiores protagonistas, foram mortos 71 mil oficiais e marinheiros, 100 milsoldadose105milcivis japoneses.Talquantidadedemortossupera, inclusive,asdecorrentesdeoutras formasdeataqueempreendidaspelosEUAnoTeatrodoPacífico.(Figura6).

UmavisitaaomuseudossubmarinistasalemãesnacidadedeKiel impressionaosvisitantesqueadentramumasala contendoonomede4.474submarinistasalemãesmortosgravadosemsuasparedesdemármore,eondesepodeobservarainscrição“QUEISSONUNCAMAISSEREPITA”emdestaquenoaltodaportadesaída. Impressiona ainda mais constatar que aquela sala é um tributo aossubmarinistas da 1ª GM17e que aquela porta, “violando” a mensagem contidanaquelainscrição,dáacessoàoutrasalaalusivaà2ªGM,cujasparedesregistramamortedemais28.000submarinistas.

OsEUAperderam3.505submarinistas,quecompunhamapenas1,6%doefetivodamarinha,atingindoamaior taxadeperdanassuas forçasarmadas(22%)18.Contudo,aofinaldaguerra,astripulaçõesdeseussubmarinosencontravam-semelhoradestradasecomomoralmaiselevado.

Apesar das significativas perdas, ambas as marinhas nunca se ressentiram dafaltadevoluntáriosparaguarneceraarmasubmarina.

14O naufrágio mais mortal da história foi causado por um ataque de submarino em 30/01/1945, quando o Navio dePassageirosalemãoWilhelmGustloff,quetransportavarefugiadosalemãesnomarBáltico,foiatingidoportrêstorpedosdosubmarinosoviéticoS-13,matandoaproximadamente9.000pessoas.

15KarlDöenitz–ComandantedaMarinhaAlemã(Kriegsmarine)ePresidentedurante23diasapósamortedeAdolfHitler,conhecidoprincipalmentepor terassinadoarendição incondicionaldaAlemanhaNazistana2ªGM.Algunshistoriadoresalegamquequeriamcondená-loapenasporeleterfeitooseutrabalhocomextremaeficiência.

16ChesterWilliamNimitz–ComandanteSupremodasForçasdoPacíficodosEstadosUnidosedasforçasAliadasdurantea2ªGM.Foiaautoridaderesponsávelpelossubmarinosnorte-americanoseChefedoBureaudeNavegaçãodaMarinhaem1939.

17Doladooponente,registra-seamorte,em1915,de1.198pessoasqueestavamabordodoRMSLusitânia,torpedeadoporumsubmarinoalemãonasproximidadesdaIrlanda.Atragédiaperdeemapenas315nonúmerodemortosparaoacidentecomoRMSTitanic(1513)ocorridotrêsanosantes.

18OssubmarinistasdosEUAcontribuíramcom3,5%dototaldevidasdenorte-americanosperdidasnoteatrodoPacífico.

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ENSINAMENTOS OBT IDOS Apesardosdiferentesaspectosdasduascampanhassubmarinas,ambastiveramum mesmo propósito, sendo empreendidas contra nações que dependiam domar, não apenas para o seu esforço de guerra, mas para a sua própriasobrevivência. Foi, essencialmente, uma guerra da arma submarina contra otráfegomercante.

FIGURA7–U-Boatsobataque(RevistadeVillegagnon).

Adespeitodeossubmarinosnorte-americanosterematuadolivrementeeosU-Boatspassaremaserobrigadosaoperarsubmersos,soboterrordascargasdeprofundidade (Figura 7), a teoria corbettiana foi definitivamente consagradapela arma submarina naquele conflito. Tanto pelo fato de o submarino ter

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vulnerabilizadooconceitodedomíniodomarnosentidomahaniano,quantoporter procurado atacar os interesses antes das forças, visando, através de suasações,contribuirparaopropósitodaguerra.

Mesmotendoambosossubmarinossidoconsagradoscomoarmaseconômicas,comumaextraordináriacapacidadedeataqueaoTMeàsforçasnavaisinimigas(noPacífico),somentelograramêxitoaquelessubmarinosquepuderamoperarsobomantodeumformidávelaparatotecnológicoeatuaramemconjuntocomosdemaismeiosdesuaesquadra.

Embora as duas campanhas submarinas tenham causado perdas significativasaos seus oponentes, apenas aquele que percebeu em tempo a importância dovolumeedaorganizaçãodeseuTMeteveacapacidadedereporassuasperdasescapoudaasfixiaedaconsequentederrota.

Naquele conflito o Brasil teve 36 navios afundados, torpedeados por 23submarinos diferentes, com um número de 1.074 mortos, e cujas perdas nãoforammaioresdevidoaoenormeeeficazesforçoempreendidonaproteçãodeseuscomboios.Se levarmosemconsideraçãoque,atualmente,maisde95%denosso comércio exterior é feito por viamarítima e quemais de80%denossaprodução de petróleo é extraído por meio de centenas de “ilhas artificiais”fundeadasemalto-mar,continuasendodevitalimportânciagarantiraproteçãodessepatrimônio.

Aevoluçãodaarmasubmarina,comoadventodaspropulsõesnucleareAIP19,demodernostorpedoseoutrosarmamentosinteligentes,edosrecentesavançosdarobótica, com a concepção de veículos submersíveis não tripulados, hoje lheconfere novas e incríveis capacidades. Tal realidade, associada às novascaracterísticas e complexidades do TM globalizado, não deve permitir que aslições legadas por esses dois elementos – submarinos e marinha mercante –sejamesquecidas,principalmenteportodaanaçãoquedependadoscaminhosedosrecursosdomarparaoseudesenvolvimentoousuasobrevivência.

REFERÊNCIAS B IBL IOGRÁFICAS • BELOT,R.AGuerraAeronavalnoAtlântico.RiodeJaneiro:Record,1949.

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• BRASIL.EscoladeGuerraNaval.EGN-304.GuiadeEstudosdeEstratégia.RiodeJaneiro,1998.

• KUENNE,R.E.TheAttackSubmarine:AStudyinStrategy.CIDADE,EDITORA,1980.

• NATIONALGeographicChannel[NGC]–HD–SubmarinosSecretosdoJapão–Disponívelem:<https://youtu.be/tIqsOkIbPHQ>.Acessoem:23abr.2015.

• POIRIER,M.T.P.ResultsoftheAmericanPacificSubmarineCampaignofWorldWarII.1999.

19AIP(AirIndependentPropulsion)–PropulsãoIndependentedeAr.

Page 12: As Campanhas Submarinas Alemã e Norte-americana na … · do afundamento de alguns navios de linha, atuaram primordialmente contra o TM inimigo, em conjunto com navios corsários

12 ASCAMPANHASSUBMARINASALEMÃENORTE-AMERICANANASEGUNDAGUERRAMUNDIAL VELHOGENERAL.COM.BR

• POTTER,E.B.SeaPower.NewJersey:Prentice-Hall,1960.

• SEMPA,F.P.AvisãogeopolíticadeAlfredThayerMahan.2015.Disponívelem:<http://www.defesanet.com.br/pensamento/noticia/17880/A-visao-geopolitica-de-Alfred-Thayer-Mahan/>.Acessoem:13mai.2015.

• TheFallenofWorldWarII–Disponívelem:<http://www.fallen.io/ww2/>.Acessoem:15jun.2015.

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• UBOAT.NET.Disponívelem:<http://www.uboat.net/>.Acessoem:23jun.2015.

• UnitedStatesHistory–WorldWarIISubmarineWarfare.Disponívelem:<https://www.u-s-history.com/pages/h1710.html>Acessoem:20jun.2015.

• WHITMAN,E.C.RisingtoVictory:ThePacificSubmarineStrategyinWorldWarII.

ANEXO: INFOGRÁFICO

Infográfico(Elaboraçãodoautor).

*Carlos Norberto Stumpf Bentoé Capitão de Mar e Guerra da reserva (RM1) da Marinha doBrasil.Guarda-marinha pelo ColégioNaval e pela EscolaNaval, possui formação comoOficial deEstadoMaioreDoutoradoemPolíticaeEstratégiaMarítimaspelaEscoladeGuerraNavaleMBAemGestãoInternacionalpeloCOPPEAD/UFRJ.EntresuasdiversasfunçõesnaMarinha,foiinstrutorde Navegação no Navio-Escola “Brasil”, vice-diretor da Diretoria de Hidrografia e Navegação eAdidoNavaljuntoàEmbaixadadoBrasilemBuenosAires,Argentina.