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RESUMO

A pedagogia Waldorf surge como pedagogia alternativa ao sistema educativo regular durante a

segunda década do século XX. Rudolf Steiner, o seu autor, procurou desenvolver uma pedagogia que

permitiria ao ser humano voltar a redescobrir-se no mundo admitindo novamente as suas dimensões:

física, anímica e espiritual. Numa época em que a sociedade se encontrava fragilizada pelo pós-guerra,

Rudolf Steiner lançou o seu sistema educativo com esperança de evidenciar um futuro mundo melhor

tendo por base as crianças.

A triangulação na qual se inspirou, colocava as Artes, a Ciência e a Religião como base para o

equilíbrio das forças do ser humano. As artes e manualidades adquiriram assim um papel principal na

pedagogia desenvolvida por Rudolf Steiner; as artes surgem, assim, como forma do ser humano

comunicar com a sua dimensão espiritual.

Como funciona esta relação entre artes e pedagogia Waldorf? Como desenvolve a criança o seu

fazer artístico neste contexto? Podem estas práticas artísticas ser transportadas para contexto de

educação artística não-formal?

Palavras-Chave: Artes Plásticas, Educação, Infância, Pedagogia Waldorf.

ABSTRACT

Waldorf Pedagogy rises as an alternative pedagogy during the second decade of twenty century.

The author of this pedagogy, Rudolf Steiner, tried to develop a pedagogy that allowed the human being

to redefine himself in the world through his three dimensions: physical, animic and spiritual. In a time

when society was struggling with the pain from World War I, Rudolf Steiner, concerned about children,

released this educative system believing in a better future.

Steiner based himself on the Triangle that combines Arts, Science and Religion as a base to

balance human being natural forces. Arts and hand crafts won a powerful role in Steiner's pedagogy. He

believed that arts were the way for the human being to contact with his inner self, with his spiritual

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dimension.

But how does this relation between arts and Waldorf pedagogy works? How do children

develop their hand craft skills in this context? Can we also value this artistic skills as non-formal

education tools?

Key Words: Childhood, Education, Manual Arts, Waldorf Pedagogy.

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«Há escolas que são gaiolas e há escolas que são asas»

Rubem Alves

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Agradecimentos

Aos meus pais, pelo apoio incondicional, pelo amor, pela dedicação!

Aos meus tios, Paula e Francisco, que são parte do motivo de gostar tanto de Artes.

Ao Paulo, pelo apoio e pela orientação em momentos de crise criativa.

Ao professor e orientador Jorge Ramos do Ó pelo apoio, disponibilidade e promoção de

pensamento crítico ao longo de todo o processo.

Á Nina Veiga, por todas as partilhas, momentos e aprendizagens,

Ás Jan, Maria, Elodie, Michaela, Pippa e todos os meninos e meninas do Willow Tree

Kindergarten; obrigada por ajudarem o sonho tornar-se realidade!

Um especial obrigado a todos os restantes que contribuíram para o desenvolvimento da

presente dissertação, nomeadamente, Paula Martinez (educadora e diretora do Jardim de

Infância São Jorge) e Sofia Silva (educadora Casa Verdes Anos).

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ÍNDICE

Introdução ….............................................................................................................. 1

I Capítulo– A Antroposofia, a Educação e as

Artes …...................................................................................................................... 5

1.1 A Antroposofia e o seu autor ….............................................................................................. 5

1.2 A Educação Infantil ….............................................................................................................. 6

1.3 Arte à Luz da Antroposofia …................................................................................................. 7

II Capítulo – A criança no Sistema Educativo

Waldorf ….................................................................................................................. 11

2.1 A Pedagogia Waldorf e a sua origem …............................................................................... 11

2.2 A arte da Educação …............................................................................................................. 13

2.3 A criança na Educação Waldorf …....................................................................................... 15

2.3.1 Como se carateriza …............................................................................................ 17

2.3.1.1 Em relação ao meio …........................................................................... 17

2.3.1.2 Em relação ao temperamento ….......................................................... 18

III Capítulo – As Artes Plásticas no Sistema Educativo

Waldorf …................................................................................................................. 21

3.1 As artes no currículo Waldorf …........................................................................................... 21

3.2 A Cor …..................................................................................................................................... 23

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3.3 A Importância da Imagem …................................................................................................. 25

3.4 Orientações para os educadores …........................................................................................ 27

3.4.1 Jardim de Infância (dos 0 aos 6 anos) ….............................................................. 27

3.4.2 1º ano, 1º Ciclo do Ensino Básico (dos 5 aos 7 anos) …................................... 39

IV Capítulo – O fazer artístico da

criança ….................................................................................................................. 32

4.1 Educação pela Arte …............................................................................................................. 32

4.2 O brincar artístico …............................................................................................................... 34

4.3 Criatividade e atuação …......................................................................................................... 35

4.4 Os mediadores …..................................................................................................................... 37

4.4.1 Pintura ….................................................................................................................. 37

4.4.2 Modelagem ….......................................................................................................... 39

4.4.3 Costura, Tricô e Croché …..................................................................................... 40

4.4.4 Feltragem …............................................................................................................. 42

V Capítulo - Estudo de Caso – Artes e Manualidades no Infantário

Waldorf …................................................................................................................ 44

5. 1 Willow Tree Kindergarten – caraterização da instituição …............................................ 44

5.1.1 Recursos Humanos …............................................................................................. 46

5.1.2 Público Escolar …................................................................................................... 46

5.1.3 Proposta Pedagógica ….......................................................................................... 47

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5.2. Observação Participante ….................................................................................................... 47

5.2.1 Artes, Manualidades e Objetivos …...................................................................... 47

5.2.2 Artes, Manualidades e Métodos de Ensino ….................................................... 48

5.2.3 Artes, Manualidades e Relação aluno-professor …............................................ 49

5.2.4 Artes, Manualidades e Mediadores ….................................................................. 50

Conclusão …............................................................................................................ 53

Bibliografia ….......................................................................................................... 57

Apêndices ….............................................................................................................. 61

1. Estudo de Caso – Observação Participante …...................................................................... 61

1.1 Dia 1 – Lã e Feltro …................................................................................................. 61

1.2 Dia 2 – Feltro, Linha e Agulha …............................................................................. 62

1.3 Dia 3 – Aguarela a Três Cores I ….......................................................................... 63

1.4 Dia 4 – Cometas de Lã ….......................................................................................... 65

1.5 Dia 5 – Aguarela a Duas Cores …............................................................................ 66

1.6 Dia 6 – Festival de Verão …...................................................................................... 68

1.7 Dia 7 – Aguarela a Três Cores II …......................................................................... 69

1.8 Dia 8 – Técnica de Feltragem ….............................................................................. 70

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1.9 Dia 9 – Aniversário …................................................................................................ 71

1.10 Dia 10 – Amassar Massa e Formar Biscoitos ….................................................. 72

1.11 Dia 11 – Piquenique do Último Dia de Aulas …................................................. 74

2. Entrevistas ….............................................................................................................................. 75

2.1 Maria Copleston, educadora no Willow Tree Kindergarten, Inglaterra …...................... 75

2.2 Nina Veiga, educadora Waldorf e artífice no Nina Veiga Atelier, Brasil ......................... 79

2.3 Paula Martinez, educadora e diretora no Jardim de Infância S. Jorge, Portugal …........ 82

2.4 Sofia Silva, educadora na Casa Verdes Anos, Portugal ….................................................. 85

Anexos …................................................................................................................. 89

1. «Creative Development» - Desenvolvimento do Potencial Criativo no Infantário

Waldorf …....................................................................................................................................... 89

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INTRODUÇÃO

Partindo da questão de partida: “Será possível relacionar os trabalhos manuais e a

atuação artística Waldorf com a educação não-formal?” desenvolveu-se a presente

dissertação, dividida em cinco capítulos chave, que pretende demonstrar o caminho

desenvolvido para responder a esse problema inicial. Reconhecendo que a maioria dos pais

não tem condições hoje em dia para poder ter os filhos em casa diariamente,

acompanhando-os no seu dia-a-dia, a Educação não-formal adquiriu um campo de ação

amplo nestas dinâmicas diárias, principalmente nos países anglo-saxónicos; já Portugal,

ganhou, nas ultimas décadas, terreno nesta exploração. Assim, serviços de babysitting,

atividades de acompanhamento de tempos livres – dentro e fora da instituição escolar, são

hoje centros de apoio extraordinários para os pais e filhos. Sendo Animadora Sociocultural

e defendendo a Educação Artística, pretendo explorar as práticas plásticas e manuais e o

brincar artístico da criança de primeiro seténio na Pedagogia Waldorf, absorvendo estas

práticas e procurando entender quais as possibilidades de ampliação das mesmas para a

Educação não-formal.

A educação infantil é um dos temas mais vivamente discutidos atualmente e

encontra-se, por diversas razões, na ordem do dia. Autores como Ken Robinson,

pedagogo britânico, e Germán Doin, autor do documentário Educação Proibida (2012),

defendem o Sistema Educativo atual, colocado em prática um pouco por todas as escolas

de Ensino Público em todo o mundo é inspirado no modelo Prussiano, com origem no

século XVIII, cujo objetivo era geral um ensino massificado, estruturado com base na

sociedade industrial. Este sistema tem por base as normas da sociedade industrial, na qual

toda a estrutura escolar se encontra formatada de acordo com as fábricas da altura: sirene,

alunos ordenados por turmas (secções) e idades (característica base), todos ensinados da

mesma forma, com as mesmas aulas, com os mesmos manuais, com o mesmo tipo de

ensino em nada diferenciado. Os alunos são todos o mesmo produto, os professores a

maquinaria que coloca a fábrica a funcionar e, no caso português, o Ministério de Educação,

o senhor da fábrica, o dono, aquele que estabelece as regras de funcionamento, os horários,

os programas, o modo de avaliação (quantitativa), reestrutura e contabiliza os alunos que

têm aproveitamento para preencher os parâmetros exigidos por uma entidade superior.

Pelo facto desta estrutura ser reconhecida e questionada por diversos autores desde o seu

surgimento, vários foram os Sistemas Educativos alternativos que foram surgindo ao longo

dos anos, principalmente, na primeira metade do século XX, devido às fragilidades sociais

vividas na sociedade devido às duas Grandes Guerras: a Pedagogia Waldorf é exemplo

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disso mesmo.

A Pedagogia Waldorf surge como uma pedagogia de ensino formal no início do

século XX, criada pelo teórico Rudolf Steiner (1861-1925), tendo sido implementado pela

primeira vez em 1919, com a fundação da primeira escola, na Alemanha. Apesar de, na sua

grande maioria, as escolas Waldorf funcionarem como instituições privilegiadas e

dependentes de fundos privados (em Portugal, como Associações sem fins lucrativos),

alguns países europeus adotaram este sistema, adaptando-o à escola pública. A influência

do sistema Waldorf – tanto em escolas públicas, como privadas -, foi adotado

principalmente nos países nórdicos europeus (sendo países como a Alemanha, Suécia,

Reino Unido e Holanda, os principais seguidores) e Estados Unidos da América. Mas o que

difere este sistema educativo de outros?

A Pedagogia Waldorf defende a evolução do ensino mediante o estágio de

desenvolvimento da criança, crendo numa abordagem de acordo com a necessidade de

cada aluno como individuo único; com as expressões artísticas como base de aprendizagem,

a relação entre os alunos e professores revela-se saudável e propícia a aprendizagem

sustentável e autónoma. Cada aspeto do currículo está relacionado com a vida da criança e

a sua etapa de desenvolvimento respeitando-se, deste modo, o ritmo da criança, a

estimulação do pensamento crítico, não defendendo apenas o desenvolvimento do intelecto,

mas também outros níveis do ser humano (nomeadamente, físico, anímico e espiritual).

Deste modo, defende-se a base artística como principal método de ensino, regulando-o

com exigência, valorizando o aluno e a parceria entre escola e família nuclear.

Foram as necessidades sociais que levaram Elisabeth Grunelius com o apoio de

Steiner, a fundar o primeiro jardim de infância Waldorf; embora este tenha sido aberto a

público já após a morte de Steiner, a sua participação foi fundamental para o

desenvolvimento deste projeto. Isto porque no seu contexto inicial, o ensino Waldorf

estava pronto para aceitar crianças a partir do primeiro seténios (logo, aos 7 anos de vida,

para o primeiro ciclo do ensino básico). No entanto, as horas de trabalho a que as famílias

eram (e são hoje em dia) obrigadas, fizeram com que esta ideia inicial fosse questionada, e a

exigência da criação de grupos de jardim de infância submergiu. Para Steiner, os primeiros

ensinamentos e a entrada na pedagogia deveria vir de casa, dos pais, da educação informal.

A Educação pela Arte é promovida na Pedagogia Waldorf como em nenhuma

outra. Desde cedo a criança tem acesso a todos os materiais e tarefas para o

desenvolvimento do seu potencial artístico – são disso exemplo as atividade manuais que

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são introduzidas no currículo do pré-escolar Waldorf, como o fazer o pão, o brincar com o

barro e a aguarela. Steiner via o fazer artístico da criança como promotor da criatividade,

embora igualmente como benéfico para outras abordagens. O autor acreditava que através

da imagem a criança estabelecia uma maior vontade e facilidade de absorção de

conhecimento; é por essa mesma razão, que as artes plásticas e a valorização do sentido

estético são introduzidos desde cedo no currículo de todas as disciplinas (desde o inicio do

1º ciclo do ensino básico).

A presente dissertação encontra-se organizada da seguinte forma: num primeiro

capítulo - “A Antroposofia, a Educação e as Artes”-, pretende-se apresentar ao leitor as bases

teóricas que levaram à criação da Pedagogia Waldorf; no segundo capítulo - “A criança no

Sistema Educativo Waldorf”-, é apresentada a criança à luz deste sistema educativo: como se

caracteriza, como é olhada pelos educadores, como se desenvolve e de que forma esta

relação entre criança e pedagogia é valorizada neste sistema educativo; o capítulo terceiro,

intitulado As Artes Plásticas no Sistema Educativo Waldorf compreende na pesquisa e sucessivo

interesse de Rudolf Steiner para que as artes plásticas se encontrem desenvolvidas com

tamanha intensidade no sistema educativo por si desenvolvido, bem como a atuação dos

educadores a este nível, e não deixando de parte a abordagem à cor – com teoria base de J.

W. Goethe, um dos autores mais abordados por Steiner -, e a valorização da imagem em

contexto de aprendizagem; em O Fazer Artístico da Criança, capítulo quarto, eleva-se o

sentido deste fazer artístico, as práticas, as propostas e os mediadores utilizados; por último,

mas não menos importante, introduzimos no capítulo quinto, Estudo de Caso – Artes e

Manualidades no Infantário Waldorf, as conclusões retiradas da observação (por via

participante) do funcionamento desta pedagogia em contexto de infantário, desenvolvida

em parceria com o Willow Tree Kindergarten, instituição Waldorf localizada em Bristol,

Inglaterra. São igualmente partilhadas, em anexo, entrevistas a quatro educadoras Waldorf,

que transmitem a realidade da pedagogia em Portugal, Inglaterra e Brasil.

Em termos de percurso percorrido, alguns desafios tiveram que ser superados e

ideias colocadas de lado ou adaptadas ao contexto vivenciado. Foram idealizadas mas,

infelizmente, não colocadas em pratica ações de formação para pais interessados na

Pedagogia Waldorf pois não se conseguiram reunir condições temporais, espaciais e

contactos para tal. Também foram idealizadas ações de babysitting ou acompanhamento de

tempos livres, mas foi necessária uma adaptação à realidade das famílias que frequentam a

instituição infantil onde foi realizada a observação, bem como, à realidade da própria

instituição (que oferece alargamento de horário para o período da tarde, de forma a facilitar

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a relação direta entre pais e escola). No entanto, foi possível o contacto direto com as

crianças e com a prática da Pedagogia Waldorf em contexto de infantário resultante de

ações de voluntariado que abriram caminho a um Estudo de Caso e observação

participante. Mais do que qualquer outra experiência, o contacto com diversas educadoras

Waldorf, de três países diferentes (sito, Portugal, Inglaterra e Brasil) e a possibilidade de

participação ativa em atividades plásticas e manuais em contexto de infantário (no Willow

Tree Kindergarten) permitiram um estudo mais coeso e direto de toda uma nova experiência

educacional.

Num momento em que cada vez mais a infância se torna num mundo

desconhecido, em que os pais pouco tempo têm para acompanhar os seus filhos, crendo

que a tecnologia é o melhor recurso para o brincar, esta dissertação é fruto da vivencia das

artes e dos trabalhos manuais na pedagogia Waldorf dirigidos ao primeiro seténio, e aliada à

redescoberta do que é ser criança; traduzindo-se esta experiência, no regresso às origens do

ser.

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I CAPÍTULO – A ANTROPOSOFIA, A EDUCAÇÃO E AS ARTES

A Antroposofia, como disciplina de conhecimento do ser humano, esteve na

origem da criação da Pedagogia Waldorf. Esta disciplina apresenta uma visão aprofundada

sobre o Homem em todas as suas realidades. Assumindo a Antroposofia as Artes como um

dos principais pilares da humanidade (juntamente com a Ciência e a Religião), Rudolf

Steiner, criador da Pedagogia Waldorf destacou-as em todos os seus estudos e propostas

educativas como reveladoras do ser espiritual. A questão que se coloca inicialmente, reside

na relação da Antroposofia com a criação de uma nova pedagogia, em pelno pós-guerra,

que se pretendia ser transformadora da realidade, reformuladora da sociedade, começando

pela base, pelo novo, pelas crianças. Como se deu este percurso? Que caminhos foram

percorridos? Que teorias foram edificadas?

1.1 A Antroposofia e o seu autor

«A Antroposofia, como Ciência Espiritual moderna vem hoje ao encontro dessa nova busca pelo

cerne do ser humano. (…) Rudolf Steiner caracterizou esse problema da seguinte maneira: “o mundo todo,

exceto o ser humano, é um enigma, o verdadeiro enigma cósmico; e o ser humano é a solução» (Cury,

n.d.:3).

A Antroposofia surgiu da necessidade de reconhecer o Homem em todas as suas

vertentes: física, anímica e espiritual. Desta forma, esta ciência procura evidenciar e

explorar na realidade humanística passada, que revelava um equilíbrio entre Ciência, Arte e

Religião, como as principais áreas de atuação humana. Para Rudolf Steiner esta é a

disciplina mais eficaz relacionada com o estudo do Homem, embora acreditasse que a

Antroposofia apenas poderia ser reconhecida por pessoas com uma sensibilidade própria

(sensibilidade que se traduz num superior interesse sobre o ser humano).

Segundo a Antroposofia, o ser humano corpóreo é constituído por três regiões

distintas: cabeça, troco e membros. Sendo que o Homem, como ser, não poderá ser

designado sem qualquer relação com o meio envolvente, também estas três regiões

corpóreas se caraterizam mediante a natureza que as rodeia. Assim sendo, a cabeça

funciona como área neuro-sensorial, a zona do troco como área rítmica, e a zona dos

membros como sistema de ação; por outras palavras, a junção das três zonas distintas do

corpo físico, caracterizam a totalidade das ações básicas do ser humano: pensar, sentir e agir.

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«O ser humano é um subtil equilíbrio de instabilidade potencial. A sua unidade mostra-se em três fases de

desenvolvimento da primeira infância: manter o equilíbrio e andar, assim como posteriormente aprender a

falar e a pensar» (UNESCO, 1994:22).

Para o teórico, o ser humano deveria ser um ser ativo, e não um mero observador

do meio em seu redor. Deveria, por sua natureza, ser agente do seu próprio

desenvolvimento, permitindo o conhecimento de si próprio e do mundo que o rodeia. O

ser humano não deveria, portanto, limitar-se às teorias cientificas pré-definidas sem

qualquer pensamento crítico. Steiner não pretendia que os estudiosos/interessados na

Antroposofia vissem as suas teorias (e a própria Antroposofia) como verdades absolutas;

pelo contrário, deveriam ser questionadas, como forma de amplificação do estudo do

Homem, sem prioridades espirituais, permitindo uma relação e posterior maior

conhecimento da amplitude do Homem corpóreo, nas suas dimensões física, anímica e

espiritual.

1.2 A Educação Infantil

Para a Antroposofia o ser humano divide-se em quatro corpos: físico, etérico,

espiritual e ego. No entanto, estes planos do ser humano não evoluem todos ao mesmo

tempo, tendo os primeiros anos de vida uma extrema importância para o seu positivo

desenvolvimento: «(...) Anthroposophical Science has to speak of three births of the human being.

Until the change of teeth, certain impressions intended for the etheric body can as little reach it as the light

and air of the physical world can reach the physical body so long as this latter is resting in the mother's

womb» (Steiner, 1965:23).

Steiner foi um dos maiores teóricos da sua época, com mais de quarenta livros e

cerca de três centenas de transcrições de conferências publicados. O seu interesse pela

Antroposofia levou-o a criar, em 1919, a primeira escola Waldorf, para a qual criou um

novo sistema educativo com base nos princípios desta ciência filosófica, sendo eles:

conhecimento – dando relevância à Ciência Espiritual e menor objetividade científica, até

então, vivenciada -, liberdade e evolução – liberdade de pensamento que induz ao

pensamento criativo, permitindo a evolução do pensamento individual – e a

responsabilidade cósmica – utilização desta mesma criatividade, em prol do bem comum.

Steiner defendia estes, como os três pilares da teoria que esteve por base a criação da

Pedagogia Waldorf.

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«A Pedagogia Waldorf tenta unir de novo três vertentes básicas da experiência humana: a arte, a

religião e a ciência, visando o seu enriquecimento mútuo através do ensino. Unir a arte, a religião e a ciência

de acordo com a época em que vivemos é um desafio primordial para qualquer sistema educativo (...)»

(UNESCO, 1994:38)

A Pedagogia Waldorf baseia-se no conhecimento da criança, do ponto de vista

físico, anímico e espiritual, dando predominantemente importância à criança como ser

único e determinando as suas atividades e propostas mediante o estágio de

desenvolvimento da criança. Procura-se que exista integração social, respeito mútuo,

valorizando-se e estimulando-se a relação entre escola e família (tão importante para o

desenvolvimento de uma boa vivência da criança em ambiente escolar).

1.3 Arte à Luz da Antroposofia

«One result of anthroposophical spiritual science – once it has been absorbed into civilization – will

be a fructification of the arts. Precisely in our time the human inclination towards the artistic has

diminished to a marked degree. Even in anthroposophical circles not everyone thoroughly comprehends the

fact that Anthroposophy strives to faster, in every possible way, the artistic element» (Steiner, 1964:15).

Na visão da Antroposofia a Arte encontra-se relacionada com o ser humano ainda

antes de o Homem se considerar Homem, relatando as pinturas rupestres do período Pré-

Histórico. Relacionando a Arte com uma necessidade de comunicação aliada à necessidade

de expressão do meio, o ser humano terá iniciado esta capacidade inerente ao seu ser em

tempos em que as necessidades básicas seriam ainda aquelas a que pretendiam dar resposta

(sem qualquer anterior reconhecimento das restantes).

Steiner menciona várias vezes a relação do ser humano e da arte em tempos arcaicos

como a Antiga Grécia referindo como aquela arte, ainda hoje desperta o interesse e intriga

o Homem contemporâneo, levando-o a apreciar esta arte sem grandes questionamentos. O

teórico explica esta relação do homem com a Arte Clássica da seguinte forma: «during earlier

epochs Men had a stronger sense for the Beautiful than at present, but of course, as Beauty was then

conceived; but they had a stronger sense of the Beautiful than is possessed by the modern Man. Now, it is

actually a fact, however, that the human-being cannot be a Man, in the true meaning of the word, if he has

no sense of the Beautiful. For, to have a sense of the Beautiful means to recognize the existence of the

Ether-Body. To have no sense of the Beautiful means disregard, disavowal of the Ether Body» (Steiner,

1935:115), ou seja, o Homem teria desenvolvido uma profunda capacidade de noção do

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Belo, conquistada pela eterna procura da Beleza no meio que partira do conhecimento

desse mesmo meio; desta forma, toda essa expansão do Belo a partir da representação

artística terá levado o Homem Clássico a explorar a arte na sua mais pura condição uma

vez que o próprio Homem se encontrava numa relação mais pura relação com o meio e

com o mundo espiritual. A Arte será portanto, a ponte entre o ser corpóreo e o ser

espiritual, o complemento que o ser Humano necessita para alcançar a totalidade da sua

existência.

No entanto, Steiner afirma que o Homem do século XX já não está relacionado com

a Arte, logo, com o mundo espiritual da mesma forma. Pelo contrário, o Homem virou um

ser materialista, preocupado com a recolha de bens, crendo da sua felicidade através desses

mesmo recursos materiais, esquecendo, de todo, o seu bem mais precioso: o seu eu, a sua

capacidade de ser espiritual. A Arte terá, por isso mesmo, sofrido influências uma vez que o

modo de vida se distanciou da natural essência do Homem1. Seguindo a Antroposofia

como base de vida, Steiner (1964) afirmou: «Art is eternal; its forms change. And if in everything

artistic there is some relationship to the spiritual, you will understand that with the artistic we place

ourselves, creatively or through enjoyment, in the spiritual world. (…) A person may be an artist in

complete loneliness. Yet he cannot become one without bringing, by means of his creation, something

spiritual into the world, so that it lives in the spirituality of the world. If one forgets this basic connections,

art becomes non-art. (…) To create artistically is possible only if the work has a relationship to the world».

No inicio do século XX, Steiner observou uma decadência da capacidade espiritual

do ser humano, condição que originou uma decadência na própria Arte. Surge a seu ver, a

cultura do comercial, do vendível, do material ilusório, a época da Não-Arte. Num mundo

em que a vivência da Arte se resume à Não-Arte, impõe-se a extrema necessidade do

Homem se voltar a reconhecer como ser espiritual, com recurso à auto-analise e

compreensão do meio; o Homem, ser físico, anímico e espiritual não deveria, nunca, perder

a sua capacidade de representação artística, de ser artista. Analisando esta situação do

Homem, Steiner inquietou-se, mencionando a missão das Artes no Mundo Moderno como

de extrema necessidade para a Sociedade; o teórico analisou as Belas-Artes e as Artes

Modernas, uma vez que considerava que a Arte não poderia ser olhada como uma ciência,

mas sim como uma orientação para a compreensão da genuína apreciação estética, do Belo,

e como o caminho para a criação, e fundou uma nova Arte, a Euritmia.

Steiner e autores contemporâneos que seguem a sua teoria, como é disso exemplo

1 Relembro que, segundo a Antroposofia, os pilares da humanidade seriam: Ciência, Arte e Religião.

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Magda Lissau (2013), afirmam que as diferentes Artes possuem diferentes relações com o

ser humano e as suas forças: «In the case of architecture the forces of the physical body are separated

entirely from a person. Thus, architecture stands by itself as a monument of human creativity in the

mineral realm of the earth. Sculpture comes about through the work of the etheric – or life – forces in the

realm of the physical body; painting through astral – or star – forces working into the realm of the etheric;

music through ego forces pushing into the astral realm; poetry through the inspiration of the spirit self –

which is still outside us to a large extent, and has not been brought as yet to individualized expression

except in a few and remarkable individuals, and thus enters from the future – working in the realm of the

ego; and eurythmy – which is still in its very infancy as a particular form of dance – as intuition of the of

the forces of the life spirit working into the spirit self».

A Euritmia surge, assim, como uma nova forma de Arte que relaciona o ser humano

com as suas forças supersensível, permitindo uma expressão altamente vinculada ao seu

corpo espiritual, a partir do seu corpo físico. Hoje em dia, a Euritmia é reconhecida como

Arte Cénica e é praticada por artistas em todo o mundo; nas escolas Waldorf a Euritmia

encontra-se presente desde os primeiros anos de desenvolvimento iniciando-se, obviamente

de forma crescente e regular, no Jardim de Infância. «A euritmia é a arte do movimento, fundada

por Rudolf Steiner no principio do século. Em oposição à ginástica, que trabalhava as forças físicas da

gravidade, a euritmia pretende dar forças às leis da linguagem e da música na sua experiência anímica

através do movimento corporal» (UNESCO, 1994, 54). Com a criação desta nova Arte, Steiner

pretendia que o ser humano, numa época em que preocupações económicas, sociais e

emocionais perturbavam a sociedade devido à proximidade temporal com o fim da

Primeira Grande Guerra, criar uma forma de renovar o conhecimento de cada individuo

dos seus mundos superiores, da sua ligação artística, reabrindo caminho ao Homem como

ser espiritual, isto porque «in all cases where Art derives from origins which are actually artistic, Art

bears testimony to the connection of the human-being with the super-sensible world» (Steiner, 1935:77).

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II CAPÍTULO – A CRIANÇA NO SISTEMA EDUCATIVO WALDORF

Qualquer pedagogia terá na sua origem a preocupação com a criança; com

melhores ou piores resultados, esta preocupação com o público a que se dirige encontra-se

distinguida sempre nas teorias elaboradas para a construção e lançamento de uma nova

pedagogia alternativa. A Pedagogia Waldorf não foi exceção e Rudolf Steiner cuidou de

olhar para a criança de forma ímpar, reveladora de um profundo conhecimento da

realidade infantil. Steiner procurou nas suas diversas conferências sensibilizar o público e os

educadores para uma nova pedagogia que olha-se cada criança como um individuo único,

com a sua própria personalidade e reação ao meio. Com base nos conhecimentos da

Antroposofia, Steiner distingui-se neste percurso, definiu um sistema educativo dividido em

séries de sete anos, tal como a Antroposofia divide a vida do ser humano, e elaborou

cuidadosas recomendações para cada estágio. A Arte de Educar era fundamental para Steiner

e revela-se, ainda hoje, um caminho de descoberta proporcionando aos educadores um

conhecimento aprofundado do que é ser criança.

2.1 A Pedagogia Waldorf e a sua origem

A Pedagogia Waldorf tem origem em Estugarda, Alemanha, em 1919, pelas mãos e

conceção de Rudolf Steiner, e com o apoio Emil Molt, diretor da fábrica de cigarros

Waldorf-Astonia Cigarrette, como escola desenhada para os filhos dos operários da fábrica.

Para o autor, as bases da criação desta nova vertente educacional foram os conhecimentos

base da Antroposofia – ciência que estuda o Ser Humano como ser físico, anímico e

espiritual - e autores como J.W. Goethe (do qual obras como a Teoria da Cor e a

Metamorfose da Natureza revelaram maior inspiração para Steiner), o psicanalista Carl Jung

e Schiller, poeta e filósofo alemão, sendo eles alguns exemplos.

Será importante ter em conta que a sociedade vivia, nesta altura, a ânsia do período

pós-guerra (devido à Primeira Guerra Mundial, que ocorreu entre 1914 e 1918) e se

encontrava fragilizada. Neste aspeto, Steiner teve o cuidado de procurar defender este

sistema educativo como um futuro método que traria ao mundo maior felicidade e

preocupação com o outro, tendo por base o contacto em todas as fases do ensino com a

natureza, com diferentes etnias e com as artes plásticas – que proporcionariam à criança

maior criatividade e maior capacidade de olhar para o mundo entendendo e absorvendo a

sua beleza (em forma de luz e cor). Após conversações com o Ministro da Educação

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alemão à data, Rudolf Steiner abriu a primeira escola Waldorf.

Na sua conceção inicial, Steiner defendia que o ensino Waldorf deveria funcionar

apenas a partir do atual primeiro ciclo do ensino básico, ou seja, as crianças deveriam entrar

em idade escolar apenas no segundo seténio2; sendo que a sua proposta inicial seria os

primeiros sete anos serem passados no seio familiar. No entanto, e durante as suas

conferências de proximidade (ocorridas entre 1919 e 1924), Steiner , que se dedicou ao

desenvolvimento da sua pedagogia durante cinco anos, contactando com pais, professores

e público em geral, percebeu que a sociedade necessitava de um apoio para a educação pré-

escolar. Assim, e apesar de apenas após a sua morte, o Sistema de Ensino Waldorf foi, com

a autorização de Steiner e apoio de Elisabeth Grunelius, expandido ao Jardim de Infância.

Juntos abriram o primeiro jardim de infância em 1920, mas falta de fundos e condições,

encerrou rapidamente. Infelizmente, Steiner faleceu pouco antes da reabertura do

infantário em 1925, tendo Elisabeth Grunelius seguido todas as indicações dadas em vida

pelo teórico para a continuação e coordenação do novo projeto escolar.

«A pedagogia Waldorf coloca especial ênfase na articulação dos pontos de vista científico e estético-

artístico do ensino, assim como os aspetos relativos ao respeito profundo e à admiração pelo mundo. O modo

como se desenvolvem estes diferentes aspetos varia ao longo do percurso escolar, de forma adequada ao

desenvolvimento psicológico e anímico da criança» (UNESCO, 1994:39). A pedagogia Waldorf

segue, como anteriormente mencionado, os princípios da Antroposofia, sendo as

abordagens à criança e às etapas de ensino definidas através das características assumidas de

cada estágio de desenvolvimento.

Abrangendo, hoje em dia, praticamente após um século da sua criação, cerca de

setecentas escolas em todo o mundo seguem esta pedagogia, sendo inclusivamente

reconhecida pela UNESCO. Hoje em dia várias escolas que têm por base esta pedagogia,

fazem parte da Rede Mundial de Escolas da UNESCO (PEA). Irina Bokova, da Direção

Geral da mesma entidade, reconhece atualmente a Pedagogia Waldorf como ensino

humanístico e defende que este tipo de ensino promove a cultura da paz no mundo uma

vez que é promovida a consciencialização do eu, do outro, e do meio.

2 Na Antroposofia e, por adaptação, na Pedagogia Waldorf, os estágios de desenvolvimento da criança dividem-se numa sequência de sete anos. Assim sendo, o primeiro seténio organiza-se nos primeiros sete anos de vida da criança e o segundo seténio dos 7 aos 14 anos, e assim sucessivamente. Abordaremos este tema, com especial cuidado, na página 18.

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2.2 A arte da Educação

«O currículo da Pedagogia Waldorf (…) deve incentivar a criatividade para se ter uma criança

com pensamento livre que se tornará um jovem com maturidade social» (Emanuel, 2002).

Steiner defendeu na sua obra que o educador deve ser um pedagogo por natureza –

justo, amável, atencioso, atento e cuidador – e que de nada servem os ensinamentos

teóricos quando mencionamos a prática do Ensino Waldorf, a nível da atuação com as

crianças. Ao afirmá-lo, Steiner não estava obviamente a colocar de parte a necessidade de

um professor se formar academicamente para a sua prática, mas sim, que certos aspetos da

sua personalidade e certos valores já têm de ser intrínsecos ao individuo que pretenda

educar formalmente uma criança. Dependendo das idades que acompanha, o educador

deverá ter diferentes traços marcantes na sua personalidade, mas acima de tudo está na arte

de educar 3 todo o principio básico para um bom professor e para a vivência de boas

experiências na escola (para professor, alunos e pais).

Na pedagogia Waldorf, o aluno surge como centro de atuação; é nele que reside

todo o espírito da aprendizagem. Todos os ensinamentos de Steiner têm por base uma

profunda observação das crianças e do seu desenvolvimento em termos cognitivo,

emocional e espiritual4. Todo este conhecimento sobre a criança e o seu mundo permitiu a

criação de um sistema educativo, sobre o qual me arrisco a aplicar um novo termo:

educação «pedocentrista»5. Toda a atuação do sistema Waldorf é centralizado na criança; todas

as atividades estão referidas de acordo com a etapa em que a criança se encontra e com

aquilo que se encontra preparada para aprender. Mesmo a forma de aprendizagem é

baseada na forma como a criança absorve naturalmente a informação, consoante a sua

idade.

Para Steiner, o professor deve ser muito mais do que apenas um pedagogo. Isto

porque há muitos exemplos de pedagogos por formação que na prática desconhecem todo

o papel da criança na sociedade e todas as suas caraterísticas fundamentais a um trabalho

feliz no meio da educação. O próprio termo pedagogo tem como significado imediato

3Assim chama Steiner à relação do professor Waldorf com os seus alunos – a forma de educar é uma arte que

se carateriza por olhar o aluno como indivíduo, com suas capacidades e dificuldades, com sentimentos, emoções e valores próprios que o identificam. Olhar cada aluno (numa turma de cerca de 20 alunos) como uno e observar a sua evolução como ser singular é a arte de educar uma criança, um ser humano com valores, de livre pensamento e atuação.

4 Deveremos ter em consideração que Steiner adaptou todos os conhecimentos que possuía como Antropósofo para a criação do sistema educativo Waldorf.

5Do Grego «Paidi [Pedî]», «Pedo + Centro[-ismo]»; significa a criança como centro de determinada realidade.

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«educador de meninos6», algo natural pois deriva de tempos em que a mulher não tinha um

papel igual ao de hoje na sociedade e mesmo o ensino não era concedido às crianças de

género feminino. Obviamente que hoje em dia o termo pedagogo é utilizado de forma mais

ampla, sem distinções de género, mas a evidência do seu significado deve fazer questionar

se é mesmo apenas um pedagogo que se tenciona ter a ensinar e a lidar com as crianças.

Para Steiner, não basta! Para o autor e criador desta pedagogia, o professor tem de

evidenciar certas caraterísticas na sua própria personalidade que permitam uma relação

positiva e feliz com aos seus alunos. Um professor deverá ser um conhecedor do mundo da

criança, deverá ser atento, criativo e, de certo modo, artista. Não artista do ponto de vista

de ser ótimo a artes, mas artista no sentido em que tem um certo gosto pelas manualidades

e saber adaptar-se a certos trabalhos plásticos e manuais que a própria pedagogia exige.

Mais do que ter um amplo conhecimento sobre a infância no geral, o professor deverá ter

em atenção um ponto fulcral na pedagogia Waldorf: cada aluno é um ser uno com

necessidades e capacidades próprias – essa deverá ser a maior arte do professor. Olhar para

as crianças, lembrando-se como foi em criança, deverá ser o seu principal foco no trabalho

pois só desta forma se poderá posicionar na vivência de cada criança e adaptar-se à sua

realidade.

Steiner defendia que um professor que dê espaço para reconhecer e conhecer cada

criança como ser individual, é mais capaz de ser um bom educador, do que o mais

estudioso académico. Por essa razão, esta relação entre aluno-professor deve ser respeitada,

devendo ser promovida a criação de um vínculo; o educador deve ser responsável e

demonstrar-se aberto à relação com cada criança.

Na educação Waldorf o professor acompanha o aluno durante cada seténio na

escola. Na creche podem existir variações, mas muito leves. Com a entrada da criança no 1º

ano do 1º Ciclo do Ensino Básico o professor é apresentado aos alunos e continua com a

turma até ao fim do ciclo (no caso da escolas Waldorf, 1º, 2º e 3º ciclo do ensino básico),

acompanhando a turma no entanto as aulas especificas são dadas por professores

especializados nas disciplinas (exemplos como as artes, as línguas estrangeiras, as ciências e

químicas). No fim do ciclo, que equivale ao inicio do terceiro seténio (relembramos, em

média as crianças têm agora 14 anos e encontram-se num ano escolar equivalente ao 9º

ano do Ensino Básico), o professor não mais acompanha a turma; o contacto mantém-se,

as memórias também, mas com aquela turma o seu trabalho está feito. É agora altura para

as mudanças e as crianças têm de estar aptas à mudança e a viver o fim do ciclo. Daqui para

6 Entenda-se por «meninos», crianças do género masculino.

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a frente todos os professores serão de especialidade, tornando-se o ensino mais semelhante

ao sistema de ensino público que conhecemos e a que nos habituámos. «(...) Steiner said that

the most important task in the kindergarten and in lower school and upper school is to enliven human

thinking. Bringing life into your thoughts, bring them into movement, fill them with life, and bring them

into relation with the powers of imagination, of fantasy» (Almond & Glöcker, 2005, 35).

É importante referir que não existe qualquer diferenciação de género nas atividades,

ou seja, meninos e meninas fazem tricô e brincam com bonecas nos tempos livres; o que

interessa é o que vão poder retirar dessas atividades para o seu desenvolvimento:

motricidade, criatividade e aceitação. No desenvolvimento da criança como aluno, o que é

valorizado no contexto desta pedagogia não são testes e trabalhos de avaliação quantitativa

(que não são de todo aplicáveis), mas sim, uma avaliação qualitativa individual, apresentada

em forma de relatório anual ou no fim de cada período escolar, desse mesmo

desenvolvimento.

Apesar do seu quase um século de existência pretende-se que os educadores

Waldorf estejam em constante formação, e que sejam agentes da própria mudança, para

que, respeitando as ideologias desta pedagogia, possam juntos contribuir para o seu

funcionamento adaptado à realidade contemporânea. Sendo que a relação entre o professor

e a criança é valorizada, é ao professor que cabe a responsabilidade de se desenvolver

dentro da nova fase de compreensão do mundo.

2.3 A criança na Educação Waldorf

Rudolf Steiner defendia que a criança já demonstraria impulsos da vida futura na

fase do nascimento dos dentes de leite. Por este motivo, a sua proposta para os educadores

exigia que a criança não fosse olhada como uma folha em branco, mas sim respeitada e

reconhecida como individuo desde a sua entrada na escola.

Na dinâmica da Antroposofia o desenvolvimento infantil é observado por meio de

características que envolvem uma determinada fase seja ela física, emotiva ou intelectual.

Tal como noutras ciências sociais e humanas, a Antroposofia exprime igualmente uma

definição de estágios de desenvolvimento infantil regendo-se, no entanto, por fases com

uma durabilidade consistente de sete anos cada uma. Apesar de a Antroposofia não resumir

os estágios da vida humana à infância, é com especial cuidado que assume as características

dos três primeiros seténios, ou seja, aqueles que acompanham a criança até à idade adulta,

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isto porque são também estes que trabalham os principais campos de amadurecimento

humano: físico (primeiro), ritmo (segundo) e abstração do pensar (terceiro).

Assim sendo, o primeiro seténio ocorre entre o nascimento e o sétimo ano de vida

da criança. É evidenciado nesta altura todo o processo físico pelo que a criança passa, e

toda a sua envolvência com o meio em redor. Durante este estágio, a criança tem as

maiores e mais rápidas alterações físicas da sua vida, e todo esse processo decorre ainda

antes do seu nascimento, no ventre materno:

«Quando observamos o desenvolvimento físico da criança, vemos que ela cresce “da cabeça para

baixo”: o embrião tem uma cabeça enorme, fazendo com que o resto do corpo se pareça com um apêndice.

Ao nascer, a cabeça, já bem formada, representa ainda ¼ do comprimento total do corpo. Depois, forças

endurecedoras e plasmadoras, que partem da cabeça, descem, dando ao resto do corpo forma e consistência.

A própria cabeça, porém, não cresce na mesma proporção» (Lanz, 1979:36).

Todo o processo de evolução física e de conhecimento do próprio corpo vai se

desenvolvendo, até à fase da queda dos dentes de leite e consequente substituição pelos

definitivos. É nesta fase, desde o nascimento até aos sete anos de idade, que se irá notar

maior desenvolvimento – a todos os níveis – do ser humano, uma vez que é neste período

que o individuo passa de um bebé que apenas evidencia naturalmente as suas necessidades

mais básicas, a uma criança com as suas próprias vontades, forma de pensar e capacidade

de ação.

É este processo que vai abrir caminho a uma nova etapa da vida da criança, que

para a Antroposofia se define como segundo seténio, cujo inicio coincide com a idade

escolar; nesta fase, o corpo da criança já percorreu um longo caminho de desenvolvimento,

mas a sua real relação com o outro surge agora. É nesta fase de intensa interação que a

personalidade da criança se desenvolve e surge como meio de relação com o meio e

consigo própria. A criança torna-se, assim, um ser social, e desenvolve-se como tal, com os

sentimentos à flor da pele, e todo um misto de pensamentos e novas sensações sobre o

mundo até à fase da puberdade. Finda esta fase, surge então o terceiro seténio que decorre,

segundo a Antroposofia, dos 14 aos 21 anos (fase do desenvolvimento do «pensamento

abstrato»7).

7 O terceiro seténio não irá ser abordado ao longo da presente dissertação. No entanto, no seguimento da

abordagem aos seténios, podemos entender que no 3º, que ocupa a fase da adolescência até aos 21 anos de idade, toda a abordagem do jovem é reflexiva do meio. O pensamento abstrato que foi sendo constituído ao longo de todo o seu anterior crescimento transportou-o, agora, para um novo processo de desenvolvimento e reação ao mundo – o pensamento crítico. O jovem estrutura em si o pensamento geral de que o mundo é verdadeiro, procurando a realidade e defendendo as suas crenças e estruturando

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2.3.1 Como se carateriza

Steiner procurou, ao longo de todos os seus estudos e conferências, despertar um

olhar mais atento sobre a criança. O teórico procurou evidenciar outro tipo de

características da criança para além da sua evolução cognitiva, uma vez que Steiner

acreditava que a criança deveria ser olhada tal como o adulto, como ser físico, anímico e

espiritual. Assim, na opinião do teórico, parte da arte da educação encontra-se relacionada

com o conhecimento integral da criança como ser individual, que evoluí sobre

características a si intrínsecas – temperamentos – ou exteriores a si – em relação ao meio

que as rodeia.

2.3.1.1 Caraterização como reação ao meio

Este tipo de caraterização da criança tem por base um desenvolvimento gradual,

mediante as necessidades e capacidades da criança; a sua abertura ao mundo e a forma

como o reconhece é naturalmente alterada consoante a sua idade. Steiner designou estágios

de desenvolvimento que se caraterizam, como observámos anteriormente, pela duração de

sete anos e para cada um dos seténios, o autor descreveu com alguma profundidade na sua

teoria a característica específica pela qual as crianças, dependendo do seu estádio, veem o

mundo.

Ao longo do primeiro seténio, carateriza-se por ver o mundo como bom: A criança

é, nesta fase, como uma esponja que absorve toda a atividade em seu redor; os adultos têm

um papel fundamental nesta etapa do crescimento pois a criança rege-se pela imitação como

meio natural de aprendizagem, ou seja, todos os atos dos adultos em redor serão

devidamente observados e reproduzidos pela criança. Os educadores deverão por essa

razão ter muito cuidado e a maior atenção possível às suas atitudes aquando da presença da

criança e para com a criança, uma vez que todas ações irão afetá-la positiva ou

negativamente: «Everything the child receives from the grown-ups around him which is untrue, or in

other ways a negative soul impression, hinders its development» (Hauck, 2008:13).

Já no segundo seténio, numa fase que decorre entre os 7 e os 14 anos da criança, a

característica é o belo. Nesta fase, a criança apresenta, por norma, características de

ingenuidade, procurando o belo ao seu redor. Todo o sentido estético da criança está

críticas à sociedade e ao meio.

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apurado e deverá ser trabalhado, aproveitando a capacidade criativa da criança, bem como,

a sua sensibilidade para a imagem e todo o ambiente ao seu redor, pois, para ela, o mundo

em si é belo.

2.3.1.2 Caraterização segundo o temperamento

Tendo em conta a personalidade ainda em formação da criança, Rudolf Steiner

estipulou, igualmente, quatro tipos de temperamento: sanguíneo, melancólico, colérico e

fleumático.

A criança com temperamento sanguíneo é a que terá um tipo de temperamento

mais comum; cheia de vida, com muito interesse por novas aprendizagens, é uma criança

extremamente ativa e comunicativa. Por terem muita energia estas crianças tendem a

apreciar qualquer tipo de desporto rítmico, mesmo que nunca o tenham praticado,

experimentam e ensaiam essa realidade como se fosse sua. Toda esta energia e amor pelo

mundo tornam as crianças com este tipo de temperamento um pouco ingénuas e

desastradas. Parte das características deste temperamento são vivenciadas pelas restantes

crianças nos primeiros anos de vida, uma vez que procuram vivenciar tudo o que as rodeia

da melhor forma: «Much of the dancing, smiling, innocent, light filled airy but often irresponsible and

inconsistent way of the sanguine lives in any child in this golden age of childhood» (Lissau, 2013:21). A

criança de temperamento sanguíneo é por natureza ativa, forte e entusiasta.

A criança de temperamento colérico, por sua vez, revela tendência à fúria,

demonstrando várias vezes e das mais variadas formas os seus estados de irritabilidade.

Pouco tímida e com vontade de liderança, procura evidenciar as suas vontades

comparativamente à vontade dos outros, estipulando, muitas vezes, as brincadeiras, as

regras das mesmas e permitindo ou não, certas interações mais espontâneas dos pares.

«Decisive as he is, determined to have his way, practical and often instinctive strategy unless an opposing

will of equal power and determination comes into play» (Lissau, 2013:17).

O temperamento melancólico possui características como tristeza, amargura e

ansiedade; as crianças com este temperamento têm tendência a ser muito ansiosas com a

vida, assustadiças e tímidas. Como menciona Lissau (2013) «Slowness is natural to the

melancholic, for in a world where all consequences are weighed up ponderously, rash, even fast, action,

cannot be endured. This tendency towards immobility and inaction makes her pace too slow, too late

compared to that of most individuals». Não se pretende com isto dizer que as crianças de

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temperamento melancólico sofrem de algum tipo de necessidade educativa especial, mas

sim que estas crianças podem relevar alguns problemas de aprendizagem uma vez que têm

tendência a colocar-se à parte, não colocando questões e não dando a sua opinião. São

crianças silenciosas, que brincam mais facilmente sozinhas do que com alguém, e que se

tornam facilmente inseguras face ao mundo que as rodeia.

Por último, a criança com temperamento fleumático descreve-se como paciente e

pachorrenta, revelando, por vezes, traços de indiferença pelo meio e pelas pessoas em seu

redor. «The phlegmatic likes to conform, to be about average, to go with the crowd. There may be little

brilliant inside, dramatic display of genius, or deep philosophical thought in him, but instead we find a

dependable reliability distinguishing the phlegmatic to make him the backbone of society» (Lissau,

2013:19). A criança com este temperamento tem tendência a absorver toda a informação

rapidamente mas sem demonstrar as suas aprendizagens, preferindo seguir as brincadeiras a

tomar a liberdade de propor alguma. Não tem tendência a isolar-se aquando da presença do

grupo, embora por vezes se possa sentir incompreendida e insatisfeita em relação às

relações com os outros ou com o meio; revela isolamento nos momentos em que se sente

incompreendido nos seus pensamentos e necessidade de exploração do meio. Pensa mais

do que age.

Como qualquer outro traço de personalidade, também o temperamento da criança

não é estaque. É comum que uma criança tenha características de dois ou mais tipos de

temperamento. Este tipo de característica torna-se ainda mais notada a partir dos 9 anos e

durante os primeiros anos da adolescência, altura em que a criança se encontra numa fase

de instabilidade anímica, emocional e espiritual: «The reality of the temperaments cannot be

understood without their relation to time. They are basically rooted in the flow and the rhythm of time.

That which is timing in music is temperament in man. A melody may sound quite different if its rhythm is

changed from quick to slow. Its impression will vary with its tempo. The same sequence of tones when

played at different speeds of rhythms will produced quite diverse reactions» (Steiner, 1980 in Lissau,

2013).

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III CAPÍTULO – AS ARTES PLÁSTICAS NO SISTEMA EDUCATIVO

WALDORF

As artes e o trabalho manual foi promovido por Rudolf Steiner na Pedagogia

Waldorf como em nenhuma outra pedagogia. Steiner defendeu a presença das artes e

manualidades no ensino como naturais à vivência da criança e promoveu estas atividades

como promotoras de desenvolvimento infantil. Várias foram as recomendações de Steiner

em relação à presença das artes no ensino Waldorf, sendo que as atuações por ele propostas

são ainda hoje consideradas por muitos inovadoras. A presença de recursos naturais como

promotores da estética (relacionada com a relação do ser humano com o meio e a natureza)

e a valorização do brincar artístico como promotor da criança como ser espiritual (que cria

e se expande a partir do intimo do seu ser), conferiram à Pedagogia Waldorf um lugar na

Educação pela Arte. Mas como decorreu todo este percurso? Que autores e teorias

estiveram por base destas crenças de Steiner em relação às artes? Qual é, afinal, a

importância da imagem em termos de pedagogia e ensino das mais variadas disciplinas?

Quais são as recomendações propostas pela pedagogia Waldorf aplicadas o trabalho

artístico e manual?

3.1 As artes no currículo Waldorf

«When Rudolf Steiner founded the Independent Waldorf School in 1919 and so initiated

Waldorf education, he strongly empathized how important it was to foster the artistic energy in children

from an early age on “The Artistic Energy has indeed a very especial affection of the will aspect for man”.

This concept in the sculpture-pictorial arts classes for the lower grades included right from the lower grades

included right from the beginning form drawing, watercolour painting and the sculptural modelling of the

pure forms» (Loewe, 2008:11).

Muitos autores exploraram os estágios de desenvolvimento do desenho infantil e a

importância da expressão artística no desenvolvimento infantil e destacaram a sua

pertinência para o desenvolvimento da própria criança. Rudolf Steiner observou com

cuidada atenção as características de cada uma das idades e propôs para cada uma delas

algumas propostas de atuação para o educador Waldorf no âmbito das artes plásticas e

manualidades.

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No primeiro seténio as artes encontram-se destacadas na pedagogia desde a mais

primária expressão plástica do ser humano – as garatujas. Desde cedo, a criança inicia este

percurso de exploração do mundo por via do desenvolvimento da motricidade, criando

diferentes rabiscos na folha de papel ou fora dela; desta forma explora texturas, cores – das

quais o vermelho ou magenta surgem como prediletas por via da rápida distinção das

mesmas – e, no fundo, a sua atuação como individuo no mundo. Durante o período das

garatujas desordenadas8 a criança inicia uma exploração extraordinária da sua motricidade

fina criando, ao mesmo tempo, mecanismos naturais e inconscientes à definição do eu. Na

fase das garatujas controladas (período vivenciado entre os 3 e os 4 anos de idade, em que a

criança controla as suas garatujas e as define, muitas vezes, em forma circular), a criança já

ultrapassou uma nova etapa do seu desenvolvimento, evidenciando-se agora como um

individuo9. Para a Antroposofia, estão ultrapassados os primeiros anos de vida, anos em

que mais nos desenvolvemos repentinamente e com maior velocidade; as artes plásticas são

agora exploradas noutros contextos e de outras formas.

No mundo antroposófico ideal, a criança só iria para a escola na altura do ensino

básico, ou seja, no inicio do segundo seténio; no entanto, e como mencionado

anteriormente, a criação do jardim de infância e do ensino pré-escolar surgem como

resultado de necessidades sociais. Independentemente das vivências de cada família e das

óbvias alterações na sociedade atual que não permitem, na maioria das vezes, tal desfecho,

ainda assim, seria recomendável que a criança só fosse para a escola pelos 4 anos de idade.

Explorando a pertinência do instinto natural com que a criança vem dotada, a imitação, o

educador Waldorf deverá abrir caminho à exploração de diferentes materiais e técnicas por

via desta forma de aprendizagem.

Só a partir do segundo seténio, ou seja, com a entrada da criança no 1º Ciclo do

Ensino Básico, a educação se torna centrada no propósito estético. Sim, a própria educação!

Isto porque na Pedagogia Waldorf o fundamento da Educação pela Arte torna-se muito

mais apelativo e claro; Steiner defendeu que as crianças aprendem melhor através do

visionamento de imagens e propôs, na sua teoria, que estas imagens deveriam apelar ao

sentido estético das crianças. Desta forma, a abordagem a todas as disciplinas escolares têm

como base uma explicação com imagens representativas do tema a aprender (por exemplo,

8 Definição dos estágios do desenvolvimento do desenho infantil, a partir da teoria de Viktor Lowenfeld (1970).

9 O eu é agora assumido pela criança que deixa de se mencionar a si própria na terceira pessoa do singular e

muitas vezes com utilização do seu nome, por exemplo “o João quer!”, para passar a afirmar “Eu quero!”.

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as letras são ensinadas por via do desenho das mesmas. A partir do desenho de uma

borboleta, podemos ensinar às crianças a letra “B”).

«As the growing child applies her or his plastic forces mainly to the forming of the physical body

itself, it would be contrary to an education based on knowledge of the human being to divert too many of

these forces into plastic activity apart from the physical body at too early an age» (Lissau, 2013:66).

A partir do 1º Ciclo do Ensino Básico e até ao fim da sua escolaridade obrigatória,

os manuais são realizados pelos alunos, permitindo uma abordagem às artes plásticas e à

geometria pela necessidade da sua utilização na elaboração dos manuais, por parte das

crianças/jovens. Desta forma, todo o sentido estético é trabalhado, bem como, a

plasticidade e criatividade dos alunos.

3.2 A Cor

A cor tem para Rudolf Steiner características especiais, sendo para si um dos

elementos mais importantes no trabalho manual e artístico; apreciador e seguidor da Teoria

da Cor de Goethe, Steiner acredita na cor como meio de inventar e imaginar vida, logo,

como um instrumento fundamental para o desenvolvimento da criatividade e da

imaginação. «You must make the colors behave like objects and do things, for this has a soul-building

quality» (Hauck, 2008:11). A cor tem por isso um papel fundamental na educação Waldorf,

com grande ênfase, nos primeiros sete anos de vida da criança. Mas porque tem, para

Steiner, a cor tanto significado?

Steiner acreditava que a cor tinha uma ligação fundamental com o mundo dos

sentidos; mundo esse que Steiner olhava com extrema preocupação. O desenvolvimento

dos sentidos, a perceção e a observação são características que o teórico visionava na cor,

muitas vezes, absorvido pela teoria de Goethe, cuja tradução francesa, chegou a introduzir.

Steiner (1986) afirmou «Si nous pouvions suivre la succession entière des processus qui s'effectuent lors

d'unes perception sensible, depuis la terminaison nerveuse périphérique dans l'organe sensoriel jusque dans le

cerveau, nous ne pourrions cependant jamais trouver le point où viennent à cesser les processus mécaniques,

chimiques et organiques, bref ceux qui se déroulent dans le temps et dans l'espace, et où voit paraître ce que

nous appelons proprement la perception, par exemple la sensation de chaleur, de lumière, de son, etc. Le

point ne peut être trouvé là où le mouvement qui est à l'origine de la perception se transforme en son effet: la

perception même» (Steiner, 1986:30). O mundo da perceção é assim desenvolvido e absorvido

através da cor.

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A perceção da cor ajuda a aumentar a capacidade ocular do sentido da visão, a

distinção das diferentes cores e, por sua vez, das diferentes sombras e objetos. Se

desenvolvida de forma ponderada e com a devida atenção, Steiner acreditava que toda a

presença da cor na vida do ser humano o faria desenvolver capacidades relativas à própria

perceção do mundo e de si próprio.

Goethe afirmou na sua teoria (1840) que «from this three, light, shade and colour, we

construct the visible world, and thus, at the same time, make painting possible; an art which has the power

of producing on a flat surface a much more perfect visible world than the actual world can be», e tal

capacidade de representação só poderia ser trabalhada mediante forte capacidade de

observação, uma vez que «painting consists, strictly speaking, in the inter-mixture of such specific

colouring bodies and their infinite possible combinations – combinations which can be appreciated by the

nicest, most practised eye, and only accomplished under its influence» (Goethe, 1840:224).

Steiner teve as considerações de Goethe em máxima atenção, quando propôs todo

um trabalho manual para as escolas Waldorf, promovendo o desenvolvimento da perceção

da cor desde a mais tenra idade. Steiner foi ainda mais longe na interpretação da Teoria da

Cor de Goethe, quando afirmou em diversos escritos e conferências para pais e professores

que a perceção da cor deveria ser trabalhada desde cedo pois, caso contrário, poderia não

mais voltar a ser eficaz. «The world will then become grey» (Hauck, 2008:12), referiu Steiner em

um dos seus discursos, relacionando a falta de treino da perceção de cor com a maior

evidência de casos de daltonismo vivenciados na época pós-guerra, reafirmando que ao

longo do tempo a falta de noção da importância da cor e da sua própria existência iria

originar um desastroso resultado: a cor iria deixar de ser identificada pelo ser humano.

As cores são assim trabalhadas desde a entrada das crianças no jardim de infância

Waldorf, maioritariamente através de utilização da Pintura como mediador artístico. As

crianças aprendem rapidamente que as cores primárias – magenta, amarelo e azul – são as

mais puras, uma vez que é com estas cores que os exercícios têm o seu inicio. Depois, com

as pinceladas e a devida técnica, acabam por perceber que dessas cores ditas puras, quando

misturadas, surgem outras cores, as complementares – laranja, verde e violeta –

compreendendo, assim, toda a base inicial da Teoria da Cor através da prática. No entanto,

para as crianças mais pequenas, será importante a utilização em maior quantidade da cor

magenta/vermelho, isto porque será a cor que mais rapidamente os nossos olhos

identificam. Steiner, mais uma vez influenciado pela teoria de Goethe (1840) que refere «the

French have a happy expression for the less perceptible tendency of yellow and blue towards red: they say the

colour has “un ceil de rouge”, which we might perhaps express by a reddish glance (...)», propõe assim a

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utilização de vermelho aquando do desenvolvimento do trabalho com crianças no decorrer

da primeira infância, ou como potenciador de atenção.

Os exercícios de cor iniciam-se, assim, desde cedo na Pedagogia Waldorf

potenciando a capacidade natural da perceção da cor; os exercícios produzidos vão

evoluindo ao longo do desenvolvimento da criança, educando-a visualmente e

sensibilizando-a para a cor, a sombra, a luz e, por fim, a imagem.

3.3 A Importância da Imagem

As escolas Waldorf apresentam às crianças as mais diversas disciplinas a partir das

artes. Como já observámos, toda a dinâmica formativa tem por base a experiência estética e

visual a partir do segundo seténio. Toda esta experiência apresenta às crianças um falar que

para Steiner era fundamental – a imagem.

Para Steiner a imagem possui um riquíssimo potencial a nível da aprendizagem. A

criança, principalmente a partir do segundo seténio sente-se relacionada com a imagem:

«No segundo seténio, a vivência escolar proporciona a experiência do belo, o cultivo dos sentimentos de

forma vivificada pela arte através da criatividade e inspiração do professor, garantidos pelo sistema social

das escolas Waldorf, aplicadas nas iniciativas sociais antroposóficas, que conferem liberdade ao professor da

escolha e composição dos conteúdos das matérias. (…) a imagem, embutida na experiência estética

pedagógica, preserva a vivacidade da perceção porque possui alto teor de mobilidade e fecundidade, é um

amplificador psíquico, enquanto o conteúdo de ensino abstrato é estilo, não tem princípio auto criativo»

(Júnior, 2007:34).

A imagem é pertinente em termos de observação e focalização através do olhar,

mas não só; a imagem é igualmente fruto da imaginação e é criativamente dinamizada na

mente de cada criança. O educador tem um papel fundamental nesse processo, uma vez

que é a ele que cabe o papel de promover o uso do pensamento criativo em ambiente de

sala de aula. «A imagem do mundo sensorial, uma imagem reprodutora, percebida e formada no encontro

do exterior com o interior, é imaginada na criatividade poética, torna-se criadora, embebe-se de força e

tenacidade no universo interior para expressar-se no exterior. A relação cíclica do exterior/interior passa,

neste, por uma atividade humanizadora e dinamizadora do estanque, para retornar àquele» (Júnior,

2007:42).

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Na sua teoria, Steiner defende que se a imagem for devidamente explorada pelo

educador, principalmente durante o primeiro seténio, abrirá caminho à criação, à fantasia, à

imaginação. A criatividade é uma capacidade intrínseca ao ser humano – todas as crianças

nascem criativas -, no entanto, existe a tendência de perder, com o crescimento, essa

espontaneidade; o individuo torna-se, muitas vezes, cético em relação à sua criatividade e

imaginação, colocando-se numa posição à quem das suas capacidades. Porquê temer a

imagem?

O ser humano vive pela imagem e cria através dela; Steiner questionou-se em

relação a esta problemática propondo um ensino pela imagem, pela construção ativa, pela

partilha da imaginação e da fantasia, pela estética – uma educação do interior para o

exterior, do individuo para o grupo.

«A fantasia tem ramificações e as suas manifestações podem ser: a fantasia lúdica da criança no

primeiro seténio, que determina os mais distintos significados para qualquer objeto; a fantasia criativa do

artista, incluída no espaço pedagógico Waldorf; a fantasia suscitada a partir de um anseio desejoso; a

fantasia que gera o planeamento de atividades humanas, e a fantasia que, segundo Steiner, dá origem às

ideias morais»(Júnior, 2007:70).

Para Steiner, a imagem constitui um meio para o ser humano, como individuo,

expressar e interiorizar os seus sentimentos, um meio físico exterior ao nosso corpo para

entender o eu e as emoções do eu de uma forma distinta, coesa, com vontade. O pensar

criativo é constantemente estimulado na pedagogia Waldorf, para potenciar a base para um

futuro pensamento crítico, atento, sem receio da imagem, do novo, da criação!

Há, inclusive, imagens, a que todas as crianças respondem impulsivamente, e de

modo muito semelhante: o sol, a casa, a árvore, etc.. Mas será importante, igualmente, a

criança poder sair do estigma da imagem comum e partir para o mundo do imaginário,

onde uma casa pode ser tão alta que toque o céu, onde uma árvore pode ser um pé-de-

feijão, e onde o sol possa sorrir. As histórias infantis têm um papel fundamental nesta

construção, evidenciando a imaginação individual e grupal; os contos de fadas possuem

características fundamentais a esta aprendizagem e são aplicados na educação Waldorf

desde o jardim de infância.

A partir da abertura (ou da não fuga) ao mundo da imaginação e da fantasia, , o

mundo da imagem alcança um espetro incalculável; e a partir desse espetro, todas as ideias

expressivas podem surgir agora, como crianças e, de futuro, como jovens e adultos com

forte pensamento crítico e criativo.

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3.4 Orientações para os educadores

Rudolf Steiner procurou durante os últimos anos da sua vida intensificar as

conferências e as relações com educadores de forma a fortalecer as bases da Pedagogia

Waldorf, permitindo um conhecimento mais aprofundado das diferentes práticas. As artes

plásticas não foram exceção e várias foram as propostas apresentadas pelo autor e fundador

da pedagogia relacionadas com o papel do educador Waldorf. Muitos foram os autores e

estudiosos que seguindo os passos de Steiner procuraram propor métodos de mecanismos

de atuação perante o trabalho plástico no decorrer do ensino Waldorf.

3.2.1 Infantário (0 aos 6 anos)

«When it comes to assessment during the preschool years, we have tools available as teachers. We

have our ability to observe with our senses the visible phenomena and then bring what we observe and our

questions before our meditative eye or into our thinking. (…) We can guide our observations towards three

areas: the form (thinking); the way the child related to the world through his lower senses (touch, life, self –

movement and balance) and begins to be involved in a social experience (feeling); and the organizational

development of the body or how the child is growing (willing)» (Murphy-Lang, 2010:61).

No infantário como anteriormente referido é a imitação que deve estar na base de

toda a aprendizagem; mas mais do que a importância de estabelecer um papel de liderança,

o educador no Jardim de Infância Waldorf deverá cuidar de todas as suas ações, estando

atento à sua forma de expressão, tendo em conta que será sempre o modelo para as

crianças presentes em sala de aula. A imitação leva à repetição dos atos do educador que,

como adulto, é o modelo a seguir na sala pelas crianças presentes; sendo que as mais velhas

influenciam as crianças mais novas, esta relação torna-se num ciclo repetitivo. «Creativity in

the classroom depends largely on the teacher. Creativity in the teacher comes through enthusiasm for the

subject, a love for 'hands-on' learning, and a joy of doing things with children» (Auer, 2013:13). Mais

do que depender da ação do educador, Nina Veiga10 defende que a vontade de imitação e

resultante exploração artística por parte das crianças surge por meio da envolvência do

educador ao longo da realização do trabalho plástico ou manual: «não adianta ser uma

atividade do adulto apenas para que seja imitada. A atividade feita deve ser real, necessária. Deve ser parte

da vida viva».

10Ver entrevista completa em Apêndice 2.2.

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O educador em Jardim e Infância Waldorf deverá entregar-se às atividades plásticas

demonstrando gosto e apreciação pelas mesmas; explorando a forma como as cores se

espalham numa pintura a aguarela, essa atenção irá cativar as crianças a interagir com os

mesmos mediadores artísticos e explorá-los de igual forma. O que interessa nessa

exploração não é a técnica, não é a estética do produto final, nem o tempo que a criança

demora a realizar determinada atividade, mas sim a oportunidade de explorar, o acesso aos

mediadores. «Given that we as Waldorf teachers have the nurturing of imagination high on our list of

priorities, it stands to reason that if we are guiding the children in their drawing, we also need to allow for

individual expressions» (Auer, 2013:19». A criança em contexto de infantário deverá ter a

possibilidade de explorar diferentes técnicas, diferentes mediadores e diferentes cores,

texturas e formas, permitindo-lhe um desenvolvimento da motricidade-fina, da criatividade,

e do sentido do tato. Sobre os mediadores é necessário ter em atenção a seguinte

recomendação da educadora Maria Copleston11: «We are always trying to connect the child right

back to the source of things so that they get a picture of the whole of life and understand the origins of all

of our material goods. Steiner said that children should not be allowed to use equipment that they don’t

fully understand and so going right back to source helps children to appreciate this».

O educador de infância tem, igualmente, a necessidade de manter a constante

relação entre temática e ritmo, de forma a que as crianças se habituem facilmente a novos

mediadores, e a presença constante dos mesmos durante a semana. Esta relação constante

com diferentes tipos de mediadores artísticos, vai permitir às crianças menos curiosas uma

observação mais prolongada das ações e explorações de diferentes técnicas e materiais.

Através dessa observação, todas as crianças do infantário acabarão por explorar diferentes

mediadores, experimentá-los e utilizá-los por diversas vezes durante o seu percurso no

infantário. Esta presença de atividades criativas durante a primeira infância permitem a

constituição de um estrutura inicial de profunda relevância para a futura maturação estética

e pensamento crítico e criativo (a serem explorados, pela mesma ordem, nos dois seténios

seguintes).

3.2.2 1º ano, 1ºCiclo do Ensino Básico (5 aos 7 anos)

Com a entrada da criança no 1º Ciclo do Ensino Básico e com a proximidade de

entrada no segundo seténio, a criança fica mais atenta os princípios estéticos e de beleza, e

a comparação entre trabalhos e técnicas começa a evidenciar-se na atuação das crianças.

11Ver entrevista completa em Apêndice 2.1.

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Nesta fase é particularmente importante que o professor tenha o cuidado de orientar cada

criança não comparando trabalhos, permitindo uma articulação natural entre a utilização

dos mediadores artísticos como brincadeira livre ou dirigida e a interação com os mesmos

com objetivos de aprendizagem e de exercício com principio, meio e fim.

A relação entre o temperamento da criança e a sua reação ao trabalho plástico é

nesta fase incrivelmente notada e deverá ser tida em conta ao longo de todo o percurso

escolar inicial; caso o educador não consiga apoiar a criança ou entende-la nas suas

fragilidades, o trabalho artístico pode revelar-se posteriormente uma atividade frustrante

e/ou pouco estimulante para as crianças.

As crianças de tipo sanguíneo tendem a despachar os seus trabalhos plásticos para

poderem ocupar-se rapidamente de outra temática; como crianças agitadas que são não

gostam de dedicar muito tempo à mesma atividade, seja ela qual for. «These are children who

can be greatly challenged to slow down and take better care over their work» (Auer, 2013:28). O

educador deverá ter em atenção esta aparente desatenção por parte das crianças sanguíneas,

isto porque as suas atitudes podem ser facilmente confundidas com hiperatividade, défice

de atenção ou desinteresse por qualquer atividade. Muito pelo contrário, as crianças com

este temperamento têm demasiada energia acumulada e que precisa ser estimulada de

forma positiva para que as mesmas possam ser equilibradas e redigidas a uma só atividade,

ainda que por menos tempo que a turma no geral.

Naturalmente inseguras, as crianças de temperamento melancólico apresentam, por

norma, uma grande frustração em relação ao seu trabalho artístico. No seu estudo sobre o

trabalho criativo, Elizabeth Auer (2013) descreveu o temperamento melancólico, a relação

das crianças com este tipo de temperamento e os trabalhos plásticos e propôs formas de

apoio a estas crianças: «The melancholic temperament manifested itself mostly in the girls. (…) Their

drawings were quite skilfully executed and always had a lot of details. (…) All the melancholic girls

showed sensitivity over their drawings, no matter how sound and good they were, and they were rarely

satisfied with what they had done. They also really enjoyed being praised, and I always found every

opportunity to let them know how wonderful their work was».

As crianças com temperamento colérico tendem a apreciar muito a tarefa plástica,

dedicando tempo ao desenho e preocupando-se em fazer notar todos os pormenores.

Apesar de apreciarem esta tarefa poderão apresentar, em alguns casos, uma certa tendência

para, tal como os sanguíneos, concluírem os seus trabalhos cedo demais. Com o devido

apoio do educador, as crianças com este temperamento poderão aceitar olhar novamente

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para o seu trabalho e terminá-lo ou realizá-lo com mais calma, pois apesar de apressados na

concretização da tarefa, são perfeccionistas e aceitam naturalmente que o seu trabalho

plástico pode ser melhorado com um pouco mais de tempo a ele dedicado. «Cholerics tend to

not over need or want help. They loved to be strong with their colours and were the most part confident that

they were on the right track» (Auer, 2013:28).

Por último, as crianças de tipo fleumático têm a tendência a demorar demasiado

tempo preocupadas com a sua tarefa plástica; tal como as crianças de temperamento

colérico, também as crianças de temperamento fleumático são perfeccionistas; aquilo que

difere a atuação de um temperamento para o outro é que as crianças com características

deste último tendem a levar o perfeccionismo ao extremo. «“But I need more time to finish” this

is the statement the teacher hears most often from the phlegmatic child who never seems to have enough time

to complete their drawings. The phlegmatic tends to plod along slowly, taking lots of care over everything»

(Auer, 2013:28). O educador deverá por isso ter o cuidado de olhar para a criança, entender

a sua demora mas ajudá-la a aceitar o seu trabalho artístico sem que esta fique frustrada

com a não conclusão do mesmo; esta tarefa pode não ser fácil, mas o educador deverá

procurar diferentes formas de estimular a apreciação da criança pelo seu próprio trabalho,

independentemente do seu perfeccionismo.

Só um educador que consiga olhar para cada criança como individuo poderá

realizar um trabalho constante de desenvolvimento pessoal e apoiar cada criança na sua

turma como possuidora de uma personalidade específica e única, na qual poderá

predominar um ou mais temperamentos, e agir em conformidade com a individualidade de

cada um. Um educador que consiga dominar a Arte da Educação poderá facilmente apoiar a

criança no seu trabalho artístico sem que afete o seu gosto, a sua curiosidade e as suas

aprendizagens resultantes destas atividades. «The decorating of objects such as these (…) aims more

at cultivating a sense of beauty in the child than a teaching him skill. (…) Through an experience of

various colour combinations or comparisons of each other's work, the sense for beauty and good taste is

developed. One should try to open the eyes of the child to all that is useful and practical, and also to the

beauty of the things around him. In this way he learns to “look creatively”. “the sense of beauty implies a

capacity to live in imaginative pictures. This is something that the teacher has first to learn for himself»

(Hauck, 2008:20).

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IV CAPÍTULO – O FAZER ARTÍSTICO DA CRIANÇA

O fazer artístico da criança é, como já referido, fundamental na Pedagogia Waldorf.

Sendo vários os mediadores propostos por Steiner e seus seguidores para os trabalhos

manuais na infância, é importante reconhecer na Pedagogia Waldorf a presença das artes

como experiência livre. Durante o primeiro seténio, ou seja, em contexto de infantário, não

existe a exigência de desenvolvimento de qualquer trabalho plástico (ou de outra categoria).

Existe sim, a valorização do ritmo que confere à criança um espaço comum, acolhedor e

organizado, e que a permite adapta-se a esta nova realidade sem grande alterações ao modo

de vida a que estava habituada quando passava todos os dias com os pais, em casa (onde a

rotina, horários e ritmos se mantêm normalmente durante os primeiros meses ou anos de

vida da criança). Desta forma o espaço escolar reside numa continuidade do lar, onde a

criança pode continuar a ser criança, acedendo a novas observações e conhecimento a

partir da imitação. É a partir desta ferramenta natural de aprendizagem que surge,

igualmente, a relação da criança com os trabalhos manuais: observam o educador e, se

tiverem curiosidade, imitam a sua ação até ao ponto em que apreciam aquela atividade e a

fazem com visível motivação e autonomia.

4.1 Educação pela Arte

A Educação pela Arte é promovida desde cedo na Pedagogia Waldorf. Este tipo de

educação visa a introdução das artes no sistema de ensino, em todas ou na maior parte das

disciplinas, de forma a estimular o pensamento criativo, a concentração, e facilitar a

aprendizagem dos alunos em contexto escolar. Vários foram os autores12 que, durante o

século XX, foram apresentando as suas teorias sobre a importância da arte para a criança e,

consequentemente, a importância da sua valorização e presença nas escolas. Steiner, foi um

dos pioneiros a valorizar a arte na escola, para além da ideia inicial de manter as crianças

limpas e organizadas; Steiner acreditava na arte como potencial método de ensino-

aprendizagem:

12 São disto exemplo autores como Lev Vigotsky que viu estudou intensamente a “Imaginação e Criatividade na Infância” (2012), o autor da obra “Educação pela Arte” (1943), Herbert Read, Viktor Lowenfeld que designou, como mencionado anteriormente, os estágios de desenvolvimento do desenho infantil e, em conjunto com W. Lambert Brittain, realizou propostas de introdução da arte nos currículos escolares na obra “Desenvolvimento da Capacidade Criadora” (1970), ou Alberto B. Sousa que, já no século XXI, desenvolveu a coletânea de três obras intituladas “Educação pela Arte e Artes na Educação”(2003).

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«As atividades artesanais têm finalidades particulares. Em primeiro lugar, o contacto com a

matéria: fiando, tecendo, modelando, fazendo trabalhos gráficos ou de ourivesaria, o aluno tem um autêntico

contacto com o mundo real. Ele transforma a matéria, ele produz algo que dura. Por isso, esses trabalhos

devem ser dirigidos por profissionais competentes para que o resultado seja impecável. Uma das

consequências desse ensino é a compreensão pelo trabalho alheio e o respeito ao trabalho manual, além de

um gosto seguro por aquilo que é bem feito e belo. Pois as obras produzidas não devem ser apenas

decorativas e “bonitinhas”, mas integrar-se, pela forma e pela funcionalidade, no mundo real» (Lanz,

1979:122).

A pedagogia Waldorf destaca-se pela Educação pela Arte, vivenciada desde cedo

(ainda nos anos pré-escolares) promovendo o desenvolvimento da motricidade-fina, da

criatividade e da imaginação – também desenvolvida a partir de histórias contadas e contos

de fadas que se baseiam nos valores emocionais, sociais, etc. que saem sempre vencedores).

No entanto, esta pedagogia não poderá ser considerada apenas como Educação pela Arte

pois isso seria reduzi-la a apenas uma das suas bases de atuação, omitindo as restantes:

movimento e espiritualidade.

No infantário Waldorf, «as ocupações, isoladas ou em grupos, nunca devem ser passatempos

improvisados, mas sim obedecer a um plano previamente elaborado e discutido. O importante é combinar

espontaneidade com uma certa orientação. Entre as inúmeras possibilidades, citemos apenas as seguintes:

pintura em aguarela, com tintas e papel de boa qualidade; as crianças devem estar completamente à vontade;

vivência das cores é o único critério, e não a reprodução de um objeto, ou pior (uma coisa proibida em

qualquer escola Waldorf!), a coloração de um desenho pré-impresso. A modelagem de barro ou, de

preferência, com cera de abelha, que exige um certo esforços dos dedos para ser amolecida; jogos com bonecas

e objetos de uso diário; teatrinho de fantoches; jogos ao ar livre, rodas com instrumentos musicais (percussão,

liras, flautas doces), e canto; passeios na redondeza, sempre com indicação do ponto final (“vamos àquela

árvore)» (Lanz, 1979:100).

Para Steiner «each artistic activity has a certain effect in the soul area and from the soul the

essence of humanity is nourished and heated.» (Bruin & Lichthart, 2000:171); o autor acreditava

nas artes e nas atividades manuais como promotoras da auto-confiança, destreza física,

concentração, sensibilidade em relação a si e ao meio, equilíbrio mental e, ainda, como um

caminho para o desenvolvimento de um pensar criativo e de um olhar crítico.

O educador tem um papel fundamental nesta atividade, uma vez que tem o cuidado

de apresentar aos alunos uma arte viva, com propósito, com relação com a vida quotidiana,

com relação com o meio e com a natureza: «A educação estética está nas mãos do artista pedagogo,

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que tem diante de si o próprio ser humano como “material artístico”. A palavra-chave para o professor

artista é vincular a arte ao todo, porque no todo a manifestação artística está viva, o que é integral possui

capacidade auto-reprodutiva pela dinâmica da própria vida, abraça a unidade; enquanto que a arte que

apela às partes, que busca nos fragmentos a sua manifestação, nega [a] sua melhor essência, afasta-se da

fonte de sua vitalidade, apoia-se nas frações da multiplicidade. O ensino vivo é o elemento básico da

Pedagogia Waldorf, é o conteúdo vivificado pelo artista pedagogo, o professor Waldorf que na sua atividade

profissional deve estar protegendo a infância de uma avalanche de estímulos fragmentados aos sentidos,

servindo como um escudo às incessantes exposições do que é sem vida» (Junior, 2007:58).

4.2 O brincar artístico

A realidade da pedagogia Waldorf supera qualquer pseudo entendimento da

Educação pela Arte. Toda a pertinência da arte é reforçada por Rudolf Steiner e toda a

pedagogia por si criada, envolve este elemento como fundamental ao desenvolvimento da

criança. «From Play, through Beauty, to Work: This is a golden path for education» (Hauck, 2008:13).

As manualidades são trabalhadas desde cedo, muitas delas com elementos naturais,

mas sempre com materiais considerados quentes, ou seja, derivados na natureza. Muitos

trabalhos, são elaborados em feltro, em lã ou com tintas extraídas de corantes naturais.

Todos este trabalho envolvendo a natureza, faz com que a criança reconheça as

potencialidades do mundo natural, adquira conhecimentos de como retirar o melhor

partido dele, e interaja com esse mundo da melhor forma – Steiner acreditava que esta

relação entre a criança e o ambiente era fundamental para o equilíbrio entre a criança e o

meio.

«Creative play supports physical, emotional and social development and allows children to learn

through investigation, exploration and discovery» (Steiner Waldorf Schools Fellowship [org.], 2008,

16). Mas no que estamos realmente a falar quando falamos em «brincar artístico»?

Várias são as formas de brincar artístico desenvolvidas no Jardim de Infância

Waldorf. Na verdade, poderemos e deveremos considerar todas as práticas artísticas

desenvolvidas como atividade lúdica, uma vez que todas estas atividades proporcionam à

criança uma exploração do meio e de diferentes mediadores através do seu recurso natural

de aprendizagem – a imitação. No entanto, o que as leva a atuar em conformidade com a

atuação do adulto é a forma de, e como já anteriormente mencionado, atuar perante aquela

atividade por parte do próprio educador. Tendo em conta o ritmo proposto ao longo do

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ano letivo, o educador apresenta várias vezes ao longo do ano atividades artísticas às

crianças realizando-as, sem qualquer exigência de repetição. É a curiosidade inata às

crianças que as leva a querer realizar as atividades artísticas, que serão sempre observadas

como uma brincadeira, como algo divertido, curioso, natural.

O brincar é o pleno devir da criança! A criança não pode ser criança se não brincar;

este principio é básico na pedagogia Waldorf dirigida a infantário. O educador deverá, por

esse motivo, ter principal cuidado em não se deixar influenciar pela intenção de regular a

criação artística da criança, o tempo em que efetua a atividade, a forma como explora os

mediadores ou mesmo a negação da criança a realizar determinada atividade artística em

determinado momento.

4.3 Criatividade e atuação

O fazer artístico da criança confere-lhe métodos e aprendizagens essenciais à vida

futura. O fazer artístico é importante tanto para meninos como para meninas, não

existindo qualquer distinção de género relacionada com as práticas artísticas e pedagógicas

propostas pela Pedagogia Waldorf; pelo contrário, as atividades propostas deverão

promover relações de interajuda, autonomia individual e grupal – aprendizagens tão

importantes ao desenvolvimento atual e futuro da criança.

É importante ter em atenção que cada criança desenvolve competências de forma

evolutiva, respeitando o seu ritmo individual. Steiner defende ainda que as crianças não

deverão ser obrigadas a realizar qualquer exercício sem qualquer utilidade ou fim prático,

uma vez que defende a estética utilitária e não apenas uma estética consumista: o sentido

estético será promovido através da conjugação de elementos e cores. O educador deverá,

por essa razão, procurar evidenciar o olhar da criança para aquilo que útil e naturalmente

belo, promovendo constantemente a relação entre a criança e o meio. «Children's creativity

must be extended by the provision of support for their curiosity, exploration and play. They must be

provided with opportunities to explore and share their thoughts, ideas and feelings, for example, through a

variety of art, music, movement, dance, imaginative and role-play activities, mathematics, and design and

technology» (Steiner Waldorf Schools Fellowship [org.], 2008:31).

Para Steiner o amor deveria estar na base de todas as ações do ser humano, ou seja,

o dever e o amor deveriam desenvolver-se juntos. Como educadores, ao encorajarmos as

crianças a olhar com curiosidade para o mundo, estaremos a orientá-las no

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desenvolvimento dos seus pensamentos crítico e criativo. É a beleza na natureza que, para

Steiner, se encontra na base de todo o conhecimento e desenvolvimento estético, por essa

razão, todo o ensino deveria ser artístico. «Steiner attached great importance to the development of

an aesthetic sense of the sublime and beautiful in Nature. (…) This is how one develops the aesthetic sense.

And this sense of beauty, this aesthetic encounter with the world, is that element which will hold the

experience of puberty within appropriate limits» (Hauck, 2008:25).

A principal preocupação do educador Waldorf no campo da expressão artística,

deverá ser a atividade espiritual da criança; por essa razão, os trabalhos manuais devem ser

avaliados não esteticamente, mas sim, pedagogicamente13. Steiner defendeu uma estética

utilitária e não apenas uma estética consumista, ou seja, «in the first years the children are taught

that everything they make must be not only pleasing to the eye, but perfectly adapted to its use. (…) He

insisted that the children should never be made to do anything that was simply an exercise of no practical

use» (Hauck, 2008:18). Desta forma, a criança desenvolve competências gradualmente,

respeitando o seu próprio ritmo.

4.4 Os mediadores

Steiner procurou estabelecer determinados mediadores para o desenvolvimento de

atividades manuais e artísticas na pedagogia por si fundada. Tendo em conta a sua

preocupação base da criança como individuo relacionado com o seu meio, procurando

potenciar o desenvolvimento estético e criativo das crianças, o autor tomou uma decisão

para muitos, algo radical: os mediadores teriam de ser, na sua grande maioria, de origem

natural. Isto porque os materiais naturais dão conforto, são quentes, completam e

expandem; ao contrário dos materiais originados pela criação humana, como o plástico, por

exemplo, que se representam pelo corpo frio, pela instabilidade, enfim, pela ausência de

vida: «The use of natural materials in play and craft fosters a connection with the natural world; the

foundation of a respect for the environment and all it provides. (…) When children make toys from sheep's

wool, wood, felt, cotton and other natural materials they learn about the origin of these materials» (Steiner

Waldorf Schools Fellowship [org.], 2008:7)

4.4.1 Pintura

13 Ver igualmente anexo 1, “Creative Development - Desenvolvimento do Potencial Criativo no Infantário Waldorf ”.

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Relacionada com a pedagogia Waldorf não será proveitoso falar-se de pintura se

não se mencionar a cor; a cor é o principal foco na experimentação deste mediador

principalmente nos primeiros anos. A aguarela será por isso o material mais indicado no

decorrer das primeiras descobertas e explorações da cor: «For the developing child watercolour

paints are the ideal means for experiencing colour and giving form. The child still has a great deal of

creative imaginative forces and wants to use these. With colour and water we can start to connect theses

creative forces with the fixed, crystallized world. (…) The process of becoming is the most important, in

which the children can experience the working of colour most intensely and give expression to their creative

imagination» (Bruin & Lichthart, 2000:40).

As técnicas utilizadas variam mas em contexto de infantário envolvem a

experimentação da cor através da técnica Wet-on-Wet que pode ser conseguida com a

utilização de papel aguarela húmido, aguarelas ou guaches diluídos em água (cores primárias)

e a utilização de um pincel largo (adequado às mãos das crianças) ou esponja. «The younger

child still, strictly speaking, paints from within» (Bruin & Lichthart, 2000:39): o que a criança

pinta é totalmente livre; o que interessa aquando da realização desta atividade é a

experimentação da cor, a forma como diferentes cores se misturam e criam novas, a

intensidade variada que é possível conseguir no papel, a espontaneidade na ação. O

educador é várias vezes imitado pelas crianças no decorrer desta atividade que as

entusiasma naturalmente e as cativa mais a cada nova experimentação.

«This is how they star working, imitating the teacher. (…) In the kindergarten class we do not

speak of a painting “lesson”. There are many other activities and the preschool child follows the work and

play of the teacher in action, gesture and singing. The children can also be helpful in preparation: mixing

and stirring the paint, filling the water jars, getting chairs and tables ready and so forth. The older children

especially soon learn how everything should be made ready for painting» (Bewin & Lichthart, 2000:50).

A pintura está introduzida no ritmo geral do infantário; como mencionado

anteriormente, a educação Waldorf dirigida aos primeiros anos valoriza intensamente o

ritmo semanal promovendo o desenvolvimento de um calendário de atividades, seguido

cuidadosamente pelos educadores. Este ritmo permite às crianças uma adaptação à

realidade escolar e é cuidadosamente estruturado para que se sintam bem e em harmonia

neste novo ambiente, que pretende ser uma continuidade do “lar”. Ao seguirem ritmos

semanais, as crianças têm o seu tempo individual de adaptação àquela realidade, sem serem

invadidas de imediato por exigências de atividades sem qualquer nexo ou adequação à sua

individualidade como crianças e indivíduos, seres com personalidade e gostos. A pintura e

outras atividades manuais entram desta forma no ritmo das crianças e permite a sua

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adaptação gradual a esta experiência de cores e formas, que se revela, muitas vezes,

espontânea. O educador deverá ter o cuidado de valorizar intensamente o facto de que será

exemplo para as crianças e será imitado por elas também no decorrer desta atividade

plástica; o educador deverá por isso ter o cuidado de cuidar dos materiais com respeito e

utiliza-los de forma adequada. Desta forma, as crianças seguirão os seus passos e a sua

atuação.

A partir da entrada da criança no 1º Ciclo do Ensino Básico, o olhar sobre a pintura

é diferente, uma vez que se inicia o percurso pela estética, pelo conhecimento; ou seja, as

atividades de pintura deixam, de forma gradual, de ser livres, para passarem a ser mais

técnicas e utilizadas em diversas aprendizagens e disciplinas: «Painting as a subject within the

curriculum serves a pedagogical purpose. Together with the other subject in combines to form the complete

person. In school an in class we are concerned with processing the subject matter in a healthy manner; the

healthy incarnation of the young person is our aim» (Bruin & Lichthart, 2000:171).

A pintura é um dos principais mediadores artísticos da Educação Waldorf em todos

os níveis do percurso escolar. O facto desta técnica permitir diversas aprendizagens,

desenvolvimento do sentido da visão, criatividade, entendimento da cor, luz, sombra,

forma e perspetiva, bem como, do meio em redor, permite à criança um entendimento do

meio que a rodeia, um olhar estético que lhe permite encontrar o belo no meio e na natureza

e permite a relação do eu com meio: «In painting, colour is the means for education, but for aesthetic,

functional, and pedagogical reasons it plays an important role in all aspects of education» (Bruin &

Lichthart, 2000:173).

4.4.2 Modelagem

A modelagem revela-se, desde os primeiros anos, uma ótima ferramenta de trabalho

com crianças na Pedagogia Waldorf. Desde a mais tenra idade, a criança interage facilmente

com materiais como o barro, a plasticina, a massa de bolos ou, até mesmo, a areia e a lama.

A curiosidade da criança em originar algo de diferente no meio em seu redor, leva-a a

explorar estes materiais facilmente e com predominante interesse. O tipo de textura dos

materiais moldáveis manualmente, são igualmente geradores de curiosidade infantil, uma

vez que a criança se encontra a desenvolver a sua motricidade e a identificar diferentes tipos

de expressões manuais. «La mano es la única herramienta que necesitas. Las manos son capaces de

completar lo esencial, y necesitan ejercitar su capacidad de inteligencia. Las herramientas nos distancian de

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la experiencia sensorial primaria y no necesarias en los años de escuela elemental. Una atmósfera tranquila

de reverencia y asombro es mejor para absorberse bien el trabajo. La energía de los niños se aplica mejor al

permitir a sus manos que “hablan” activamente su lenguaje especial. La charla de la boca es del cerebro

izquierdo y puede interferir con la verdadera tarea» (Auer, 2008:46).

Steiner realizou diversas propostas sobre o trabalho de modelagem para efeitos da

Educação Waldorf, sendo que a base desta manualidade se encontra relacionada com a

livre-expressão e aprendizagem de formas base, na sua grande maioria, geométricas:

«Working first with pure forms before tacking natural figures is not only a good preparation in learning

artistic fundamentals but also good simulation for creativity and inventiveness. Children at times feel

intimidated by what a naturalistic subject is supposed 'to look like' and even disappointed if their efforts

fall short. Modelling pure forms is less constraining and it lends itself more freely into the discovery of new

forms» (Loewe, 2013:9).

Rudolf Steiner promoveu ainda a modelagem como uma capacidade inerente ao ser

humano que lhe permite a estruturação de um pensamento ativo e estruturado; desta forma,

defendeu esta atividade artística como meio para o desenvolvimento físico e espiritual das

crianças, e como uma ferramenta fundamental à estruturação do pensamento estético.

Mais uma vez, principalmente no Jardim de Infância, o importante é a livre

exploração inicial, relacionada com a atuação focado do educador naquela atividade

específica. A imitação é, igualmente, significativa na criação de vontade de exploração e

aprendizagem da modelagem e das restantes artes plásticas. A criança deverá ter a

possibilidade de explorar sem qualquer receio este mediador, durante todo o primeiro

seténio para que, quando entrar no 1º ciclo, possa iniciar exercícios mais visuais e

exploratórios em termos de estética, de observação e interpretação da natureza, agora que

o interesse da criança se foca na beleza que o mundo tem para oferecer.

4.4.3 Costura, Tricô e Croché

Este trabalho manual com os têxteis utilizando estas técnicas foram defendidas

intensamente por Steiner que observou e indicou a utilização deste tipo de mediadores para

o público infantil independentemente do género uma vez que estas atividades são muito

pertinentes ao desenvolvimento de diversas competências importantes à criança na sua vida

presente e futura sendo disso exemplo a concentração, a motricidade-fina e os sentidos do

tato e da visão.

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É preciso primeiramente ter em atenção que todos os materiais utilizados nestas

técnicas deverão ser de origem natural, permitindo à criança o desenvolvimento estético

que surge da natural relação com o meio. O tato é um dos principais sentidos a ser ativado

pelos materiais naturais uma vez que, com recurso aos mesmos, surgem sensações – na sua

maioria – de temperatura que apelam à vontade da criança (e do próprio adulto), ainda que

inconscientemente, permitindo uma continuidade da atividade.

A costura é uma atividade que acompanha a realidade das crianças em infantário

Waldorf, uma vez que é um mediador utilizado frequentemente pelas educadoras, uma vez

que reproduz de algum modo uma realidade que a criança virá na figura materna (ou

paterna), no seu lar, sempre que é necessário remendar alguma roupa ou brinquedo. As

crianças têm muita curiosidade por esta atividade pois entendem que conseguem intervir

em pedaços de feltro colorido com pequenos ou maiores alinhavos da mesma cor ou de

cor distinta do fundo. A forma como a própria agulha funciona deixando o alinhavo à vista

encontra-se associado a este natural deslumbramento por parte da criança pela costura.

Desenganem-se aqueles que acreditam que apenas as crianças de género feminino aderem a

esta atividade – se é verdade que são elas que tem mais tendência a procurar realizar

atividades manuais, é igualmente verdade que as crianças de género masculino têm interesse

por estas atividades e mostram-se visivelmente encantadas com as suas conquistas.

Tanto o tricô como o croché são atividades vivenciadas mais tardiamente no ensino

Waldorf; a proposta de Steiner para estes mediadores residiu numa importante questão ao

nível da motricidade e funcionamento cerebral. Para o teórico as crianças deveriam

começar a tricotar ainda no primeiro seténio, assim que entrassem no 1º Ciclo do Ensino

Básico; esta atividade irá permitir às crianças o desenvolvimento da motricidade-fina em

ambas as mãos; só depois de dois anos, já no 3º ano do 1º Ciclo de Ensino Básico é que a

criança deveria passar a realizar também atividades croché, assim, a criança aprende a

utilizar as duas mãos para os movimentos exigidos por esta atividade, para depois de dois

anos, sensibilizar apenas uma das mãos (aquela a que melhor se adaptar) ao uso específico.

Desta forma, ambas atividades são desenvolvidas de acordo com a evolução da própria

criança, permitindo uma coordenação manual e o desenvolvimento do sentido estético.

«From a pedagogical point of view, Steiner especially valued the art of knitting, one which he had practiced

himself as a young boy. He insisted that every child should learn to knit. (…) Then one can see that this

activity which exercises both hands in a harmonious way, thus bringing skill in later life, is also one that

works deeply into the organism of the child and awakens his spiritual forces» (Hauck, 2008:17).

Steiner, valorizou igualmente o tricô e o croché como artes terapêuticas, que

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permitiam a crianças com dificuldades ou com atrasos no seu desenvolvimento

físico/mental, uma nova forma de relação com o mundo. Esta atividade foi colocada em

prática terapêutica pelo autor, por diversas vezes, tendo obtido resultados bastante positivos.

Esta característica interventiva deste mediador não será novidade, no entanto, deverá ser

valorizada no campo de ensino Waldorf.

4.4.4 Feltragem

Mais uma vez a presença dos mediadores naturais é valorizada; a lã de ovelha é um

dos principais mediadores utilizado na pedagogia Waldorf, principalmente durante o

primeiro seténio. Facilmente moldável, adapta-se às mãos da criança quase sem esforço,

aquece naturalmente com o toque e provoca na criança sensações propicias à valorização e

experimentação do sentido do tato.

Várias são as técnicas de feltragem que podem ser utilizadas; a técnica Wet Felting

[Feltragem Húmida] é a predileta, uma vez que exige pouca técnica e produz resultados

muito interessantes. Esta técnica passa por moldar a lã com uma mistura de água e sabão

de forma a facilitar a criação da forma pretendida; partindo, normalmente, de formas

básicas como a esfera, o educador Waldorf produz manualmente estas formas sendo,

muitas vezes, seguido pelas crianças que se interessam naturalmente pelo material e pela

forma como facilmente é modelado; mais do que modelado, o material pode ser colorido

com lã natural tingida, exatamente da mesma forma. Com esta simples técnica as crianças

conseguem diversos resultados, divertidos e de simples concretização.

Outra técnica de feltragem, à qual damos o nome de Needle Felting [Feltragem de

Agulha] permite a elaboração de diversas formas e figuras de relevo com lã. Normalmente

produzidas numa base de tecido (linho ou algodão), esta técnica exige apenas alguma

motricidade e adaptação à agulha – normalmente, fina – e um pouco de pressão para que a

lã se una homogeneamente à base de tecido. Esta técnica é menos utilizada em contexto de

infantário, uma vez que, como anteriormente referido, exige uma maior capacidade motora

– tornando a atividade mais complexa para as crianças mais pequenas.

Ambas as técnicas permitem à criança a experimentação de diversos resultados,

nomeadamente, bonecos (em formato de fada, bebé, animal, etc.). Estas atividades

valorizam a criatividade da criança, pois os resultados são pouco baseados em estereótipos

e mais em formas imediatas partindo do material natural. Ou seja, a partir do material,

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elabora-se com a técnica manual, um objeto final que pode, ou não, dar origem a um

brinquedo criado pelas mãos da criança que com ele irá brincar, que muitas vezes não

possuir qualquer feição facial (o que permite que a criança transporte os seus sentimentos

para o boneco ou mesmo brinque livremente idealizando expressões e realidades nesse

boneco)14.

Por último, é possível agrupar neste conjunto de atividades com este mediador

artístico, a feltragem como tratamento da lã natural. Com vários pedaços de lã de cordeiro,

não tratada, as crianças podem penteá-la com as escovas próprias para este processo. As

crianças costumam ter alguma adoração por esta técnica uma vez que ficam muito curiosas

ao ver que com um simples movimento do educador a lã fica mais bonita e brilhante;

agrada-lhes o toque final da lã e o ruído dos pentes em fricção.

A feltragem como mediador artístico, independentemente da técnica utilizada,

permite à criança uma brincadeira de sentidos, através da qual pode ativar a curiosidade

pelos tato, audição e olfato. A motricidade é altamente promovida na atuação com este

mediador, uma vez que as mãos encontram-se constantemente em movimento e em

atividades ligeiras de coordenação motora. É um mediador muito valorizado na Pedagogia

Waldorf dirigida ao primeiro seténio, uma vez que para além de muito apreciada pelas

crianças permite a tão importante relação entre os elementos naturais e o desenvolvimento

estético – a noção do bom e do belo no meio.

14Como educador é importante reconhecer no brinquedo um moderador entre o mundo da criança e o

mundo dos adultos; isto porque a criança pequena transmite o seus sentimentos, muitas vezes, a partir do seu brinquedo favorito: “o urso panda está triste, doí-lhe a barriga” ou “a Matilde (boneca) quer um gelado” são informações que facilmente podem ser transmitidas pela criança aos pais ou educadores utilizando o seu brinquedo como meio de transmissão. É, por esse motivo importante que os bonecos criados pelas crianças (ou pelos pais para as crianças) não possuam características faciais demasiado notadas – para isso, já existem os brinquedos de plásticos, frios ao próprio toque e sempre a sorrir. A criança necessita de criar na sua mente as feições do boneco, permitindo-lhe a expansão dos seus sentimentos, criatividade e imaginação. A Pedagogia Waldorf valoriza esta expansão criativa apresentando diversas propostas de desenvolvimento de bonecos, com materiais naturais (lembrar, a importância do toque, o prazer de sentir o vivo).

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V CAPÍTULO - ESTUDO DE CASO – ARTES E MANUALIDADES NO

INFANTÁRIO WALDORF

As artes plásticas e as manualidades ao olhar da Pedagogia Waldorf foram já

apresentadas sob o ponto de vista teórico. No entanto, coloca-se a questão: como

funcionam estas teorias na prática?

Neste capítulo será apresentada a instituição Willow Tree Kindergarten, a sua

organização, público-alvo e práticas relacionadas com as artes plásticas na primeira infância

Waldorf. Com o objetivo de clarificar este olhar sobre o fazer artístico da criança em

contexto de infantário, a imitação e o papel do educador e da instituição escolar neste

processo natural designado brincar artístico.

5.1 Willow Tree Kindergarten – caraterização da instituição

Instituição de educação pré-escolar The Willow Tree Steiner School Ltd.

Morada Oficial: 27 Hill Grove, Henleaze, Bristol BS9 4RL

Entidade moderadora: Steiner Waldorf Schools Fellowship, sediada em Inglaterra

Registo de Entidade Número: EY 403389

Empresa Número: 7032113

Registo para Doação: 1137361

Baseado na teoria de Rudolf Steiner, o Willow Tree Kindergarten é uma instituição

escolar privada, fundada por um grupo e pais e educadores preocupados com o

desenvolvimento da Educação de Steiner dirigida ao público pré-escolar.

Acolhendo crianças com idades compreendidas entre os 3 e os 6 anos de idade, o

infantário encontra-se aberto a público desde 2009, em St. Werburgs, Bristol. O infantário

encontra-se aberto de segunda a sexta, num horário compreendido entre as 8:30 e as 12:30;

às segundas, quartas e quintas, o infantário oferece um prolongamento horário (às crianças

que requererem este serviço, desde que com um número mínimo de presenças)

funcionando das 12:30 às 15:30.

O edifício possui apenas um piso térreo dividido em cinco espaços: sala ampla onde

decorrem as atividades diárias e as refeições – esta sala é a principal, tem um ambiente

agradável, todos os brinquedos expostos têm por base materiais de origem natural, como é

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o exemplo dos blocos, carros e louça de madeira, bonecos de lã e fantoches em feltro; todo

o material disponível desta sala é de uso coletivo menos o que não se encontra à

acessibilidade das crianças (estes, encontram-se dispostos ou guardados em armários fora

do alcance das crianças, por motivos de segurança e organização) -, duas casas-de-banho,

uma cozinha de pequenas dimensões, um pátio ajardinado onde as crianças realizam as

brincadeiras de exterior, e um pequeno armazém, igualmente exterior, onde alguns

materiais são guardados. O edifício possui duas entradas: a principal, situada na zona do

pátio, e uma secundária, com saída direta para a zona do armazém de arrumos.

A sala principal encontra-se devidamente organizada e com zonas de divisão

percetíveis ao nível do decorrer das atividades: logo à entrada, encontram-se as duas mesas

de madeira onde são realizadas as atividades manuais; logo depois o cadeirão que demarca a

zona da roda das histórias e das canções; e apenas no outro canto da sala, se encontram

dispostos os brinquedos. Desta forma, todo o espaço se encontra organizado e divido em

espaços de atividade distintos, permitindo um acesso facilitado para a aprendizagem e

adaptação ao ritmo do próprio infantário.

A organização semanal pode sofrer pequenas alterações ao longo do ano letivo, no

entanto, a proposta do ano 2013/2014 residiu – de acordo com o Guia para Pais “The

Willow Tree Kindergarten, Parent's Handbook 2013-14” - na seguinte:

Segunda-feira Cortar vegetais, limpar e polir.

Terça-feira Pintura e cortar fruta.

Quarta-feira Modelagem em cera de abelha ou outra atividade manual sazonal e euritmia.

Quinta-feira Pastelaria e atividade manual sazonal.

Sexta-feira Coser ou outra atividade manual sazonal, e Hora do Francês. De forma a envolver uma maior participação da família nuclear na vida escolar das

crianças, o infantário promove ainda diversos festivais sazonais para os quais todas as

famílias são convidadas, estabelecendo-se uma relação de união e permitindo uma

estabilidade na relação entre pais, escola e educando. Existe, igualmente, por parte das

educadoras do Willow Tree Kindergarten de observar o desenvolvimento de cada criança,

cuidando de avaliar qualitativamente a evolução da criança e alguma manifestação fora do

comum que se faça sentir; esta informação recolhida cuidadosamente é prontamente

analisada pelas educadoras e transmitida aos pais nas reuniões privadas (pais ou

encarregado de educação com a educadora).

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Para além das atividades escolares, e tendo em conta preocupações relacionadas

com o desenvolvimento da Pedagogia Waldorf dirigida aos primeiros anos de vida, o

Willow Tree Kindergarten oferece aos pais a possibilidade de frequentarem sessões práticas

com os seus filhos numa faixa etária dos 0 aos 3 anos (período anterior à idade de ingresso

no infantário), ou a frequência de sessões de apoio e esclarecimento durante a gravidez.

5.1.2 Recursos Humanos

Os recursos humanos do infantário organizam-se da seguinte forma:

Professora Coordenadora Jan Coles

Professora Assistente Maria Copleston

Administrador Richard Worsnop

Assistentes/Auxiliares Bella Douglas

Carol McCarthy

Elodie Mae

Michaela Reynolds

Pippa Gibbins

Professora de Euritmia Hannele Greenhalgh

5.1.3 Público Escolar

As escolas de pedagogia Waldorf têm, por norma, inicio por via de interesse de pais

que se unem para criar um espaço de ensino alternativo ao público. Como já referido

anteriormente, o Willow Tree Kindergarten não foi exceção e nasceu da vontade de um grupo

de pais e educadores interessado na pedagogia Waldorf.

Hoje, acolhe crianças de famílias de classe média e média alta, com acesso e

conhecimento cultural; estas famílias fazem-se apresentar como nucleares (pai, mãe e

filho(s)), e a sua grande maioria possui mais do que um filho (uma média de dois a três

crianças por família), e que procura que todos os filhos frequentem a mesma escola. É

comum ter no mesmo ano letivo irmãos a frequentarem o infantário ao mesmo tempo,

embora se procure mediar os dias de ida com os educadores. Alguns irmãos só vão juntos e

outros só se encontram na escola em períodos comemorativos, como os festivais.

Apesar da escola se encontrar a cerca de 15 minutos de distância do centro da

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cidade de Bristol, existem alunos de várias zonas da cidade a frequentá-lo. A opção por

zona/distância não se destaca da mesma forma que numa escola de ensino público, uma

vez que são os pais a optar por um ensino diferenciado e que procuram um infantário que

siga uma pedagogia específica, ao invés, de um infantário nas proximidades da área de

residência ou de emprego de familiares.

5.1.4 Proposta Pedagógica

Tendo como base a pedagogia Waldorf, o Willow Tree Kindergarten propõe uma

educação diferenciada, instruída com base no ritmo da criança, como ser individual.

Seguindo as bases da pedagogia de Rudolf Steiner e as propostas da Steiner Waldorf Schools

Fellowship, a proposta pedagógica do infantário encontra-se relacionada com procurar

oferecer a cada criança um ambiente propicio à aprendizagem com base no brincar. A

oferta de um espaço seguro, onde cada criança se possa sentir confortável, desenvolvendo

as suas capacidades num local que, sendo escola, pretende ser um prolongamento do lar.

Pretende-se que cada criança aprenda brincando e seguindo a capacidade natural de

aprendizagem da primeira infância: a imitação; mantendo esta capacidade ativa e dando

segurança à criança para continuar a realizar as suas aprendizagens a seu próprio ritmo,

independentemente do ritmo dos restantes colegas de turma. Existe, por essa razão, apenas

uma sala onde se encontram todas as crianças que frequentam o infantário, sem distinção

por idade ou aprendizagens adquiridas.

5.2. Observação Participante

5.2.1 Artes, Manualidades e Objetivos

A educação artística na infância promovida pela pedagogia Waldorf compreende,

como já observámos, muito mais o brincar artístico do que propriamente um trabalho que

compreenda a aprendizagem de técnicas plásticas específicas. No Willow Tree Kindergarten as

atividades artísticas estão sempre presentes no ritmo do Jardim de Infância, no entanto, a

realização das mesmas compreende o interesse da criança na atividade e não um acesso

obrigatório, rígido ou de pouca possibilidade exploratória; pelo contrário, o objetivo central

das atividades é que a criança tenha livre acesso a novos materiais, que os possa explorar de

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forma livre ou dirigida (mediante a dificuldade da atividade) os diferentes mediadores e

técnicas, e que possa descobrir as diferentes cores e as diferentes formas, enquanto

desenvolvem as suas capacidades motora e criativa.

Os objetivos que elevam as atividades artísticas ao brincar artístico distinguem-se

pela forma como a criança pode compreender a sua ação nos mediadores que as rodeiam

em determinado momento; as descobertas que uma criança pode fazer ao realizar uma

atividade artística ao nível da cor, por exemplo, são imensas; estas mesmas descobertas

conferem-lhe dois pontos principais a nível de qualquer aprendizagem pedagógica:

curiosidade e livre arbítrio (com relação a ambos, surgem a livre expressão manual, a

criatividade e a capacidade crítica com maior ou menor consistência, consoante a idade e o

desenvolvimento da própria criança, como individuo ativo).

A criança tem igualmente acesso a materiais de origem natural através deste tipo de

atividades; é a partir das atividades plásticas que as crianças acedem com maior frequência a

materiais considerados pela Pedagogia Waldorf como quentes, matérias de origem viva. A

criança acede igualmente a estes materiais em todas as restantes brincadeiras no Jardim de

Infância, uma vez que os brinquedos são elaborados com os mesmos materiais. O sentido

do tato é desenvolvido amplamente nestas atividades relacionadas através dos materiais

utilizados e permitindo uma exploração das texturas, formas, dimensões e sensações

térmicas desses mesmos recursos.

Por ultimo, as atividades plásticas propostas pelo educador podem ter como

objetivo complementar, o de se associarem aos momentos sazonais relacionados com os

ritmos anuais propostos pela pedagogia Waldorf (por exemplo, festivais comemorativos das

estações do ano, etc.).

5.2.2 Artes, Manualidades e Métodos de Ensino

No Willow Tree Kindergarten procura-se evidenciar a exploração natural da criança, a

sua relação natural e espontânea com o meio – o brincar. Esta atividade está na base de

todas as outras e é a responsável pelo ritmo e pelas aprendizagens das crianças; é através

desta atividade que a criança aprende a reagir ao mundo e a integrar-se no meio. É através

do brincar que a criança interage socialmente, é através do brincar que a criança aprende

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regras e segue ritmos, e é a partir do brincar que a criança aprende a intervir no meio

através de diferentes atividades manuais. A criança aprende pelo brincar e é a curiosidade

que facilita toda a aprendizagem que deverá ser estimulada pelo educador da melhor forma

possível.

Todo o ensino de artes e manualidades no Jardim de Infância Waldorf tem por base

o mecanismo natural de aprendizagem das crianças do primeiro seténio, a imitação. Não

existe qualquer exigência à prática de determinada atividade, apenas o papel do educador

como adulto interessado numa tarefa faz com as crianças adquiram curiosidade por essa

mesma tarefa e queiram observá-la, experimentá-la, repeti-la.

O canto é por vezes um recurso utilizado pelo educador para cativar a atenção das

crianças em eu redor. O educador entoa melodias relacionadas com a atividade plástica em

realização e as crianças acabam por focar-se nas suas ações; seja a pintar aguarela, a coser, a

modelar, etc., o canto do educador provoca na criança a curiosidade pela atividade. Esta

curiosidade é fundamental para qualquer aprendizagem durante o primeiro seténio, uma

vez que o seu recurso natural de imitação só ocorre quando essa curiosidade infantil é

despertada, seja ela pela cantiga entoada, pelo mediador utilizado, pelos gestos do adulto ou,

até mesmo, pela participação dos seus pares na realização da mesma. Todas as atuações de

todos os presentes se conjugam no ambiente para provocar na criança a vontade de agir, de

aprender, de conhecer, de reproduzir, de imitar.

5.2.3 Artes, Manualidades e Relação aluno-professor

A relação aluno-professor tem por base a comunicação; esta caraterística

fundamental da interação humana é tida em conta de forma bastante cuidada. Desta forma

a liberdade da criança é respeitada sendo, no entanto, sempre considerada igualmente a

liderança do professor. É importante ter em conta que não nos encontramos perante uma

situação de libertinagem onde as crianças fazem tudo aquilo que bem lhes apetece, mas sim,

de uma relação onde a criança tem espaço para ser criança, para afirmar a sua

personalidade mas para, de igual forma, respeitar o ritmo, o espaço, e os restantes

envolvidos na sua realidade.

Como foi anteriormente referido, na Pedagogia Waldorf o ritmo é considerado um

dos pilares fundamentais para a aprendizagem. Se os ritmos forem respeitados, a criança

entrará num lugar-comum e aceitará mais facilmente que esse lugar existe e que ela faz

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parte dele. Com este dinamismo a criança aprende a estar, a ser e curiosamente desenvolve

o seu pensamento crítico, questionando-se ou questionando o educador sobre esse lugar-

comum.

No Willow Tree Kindergarten a responsabilidade é igualmente promovida com as

atividades de arrumação e de apoio aos educadores. O educador propõe – não ordena – a

cada criança que apoie em determinada situação, como é o exemplo de dispor os

guardanapos/lugares na mesa, ajudar na disposição da sala no momento das histórias,

distribuir água aos colegas no momento do lanche da manhã, etc.. Todas estas atividades

propostas desde cedo, contribuem para que as próprias crianças adquiram interesse em

realizá-las (até por imitação dos mais velhos, que já conhecem o ritmo do infantário e

anseiam colaborar, com visível apreço pelas atividades) permitindo uma dinâmica e um

desenvolvimento na maturidade dos educandos, sendo toda esta relação entre aluno-

professor visivelmente muito positiva.

5.2.4 Artes, Manualidades e Mediadores

As educadoras do Willow Tree Kindergarten procuram realizar diversa atividades

manuais e plásticas ao longo do ano com as crianças; utilizando o ritmo decidido no inicio

do ano-letivo e respeitado (ainda que com possíveis pequenas adaptações) ao longo do ano.

Acreditando nas potencialidades do trabalho manual e artístico na evolução da motricidade

e criatividade da criança, as propostas são variadas e envolvem diversos tipos de atividade e

mediador artístico.

A pintura a aguarela, com técnica Wet-on-Wet, é uma das atividades artísticas com

mais adesão por parte das crianças; a forma como podem interagir com o meio, as cores

que criam com apenas duas ou três cores primárias, a forma fácil e a pouca técnica

requerida para a realização de pinturas faz com que esta técnica seja muito utilizada e

apreciada pelas crianças e educadoras. No inicio da atividade apenas a educadora elabora

pinturas sozinha na mesa, entoando musicas ou apenas mostrando-se focada e dedicada à

sua pintura; no entanto, a mesa encontra-se sempre preparada para as crianças que queiram,

de livre vontade, juntar-se à atividade e pintar. Assim, estão sempre disponíveis alguns

lugares com pincel largo, um recipiente com água, pequenos recipientes de guache diluído

em água (sempre com cores primárias, as crianças podem ter ao seu acesso duas ou três

cores, mediante a proposta diária), uma base de madeira e uma folha de papel aguarela

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previamente humedecida. A utilização de pincel largo adequa-se à atividade uma vez que

facilita a utilização e a mistura das cores (uma vez que a mão da criança, bem como a sua

motricidade, ainda não seriam proporcionais a um pincel fino). Rapidamente algumas

crianças se juntam à atividade e iniciam igualmente uma pintura, algumas, inclusive,

repetem a atividade mais do que uma vez demonstrando-se verdadeiramente interessadas

ou curiosas nos efeitos de cor que produzem nas suas pinturas.

Outra atividade muito apreciada pelas crianças no Willow Tree Kindergarten é a

modelagem em massa de biscoito; esta atividade permite às crianças elaborarem os

biscoitos para o lanche da manhã e esse é, por si só, um incentivo à elaboração da mesma.

As crianças demonstram-se muito interessadas na forma como conseguem através das

formas elaborar os seus próprios biscoitos e apreciam a atividade de amassar e alisar a

massa. Como se de plasticina se trata-se, as crianças elaboram diversas formas e dispõem

com orgulho as mesmas formas na base para o forno. Chegada a hora do lanche da manhã,

as crianças demonstram orgulho nos seus biscoitos e tentam, por vezes e em tom de

brincadeira, encontrar os biscoitos elaborados por cada um.

A costura é igualmente promovida desde cedo no infantário; algumas crianças

demonstram-se mais interessadas que outras nesta atividade, mas por norma demonstram

muito interesse principalmente naquele que pode ser o produto final. Muitas vezes, na

elaboração desta atividade, existem alguns exemplos de possíveis resultados e as crianças

apreciam visualmente esses possíveis resultados. Depois dessa etapa ultrapassada começa a

curiosidade pelas formas de feltro, as cores das linhas e o uso da agulha. As crianças

iniciam esta exploração desde cedo no Willow Tree Kindergarten, razão pela qual as crianças

mais velhas já elaboram os seus trabalhos de costura sem qualquer dificuldade ou

necessidade de apoio – para estas crianças, a tarefa mais complicada está mesmo em

colocar a linha no olho da agulha. Quanto às crianças mais pequenas cabe aos educadores

apoiar nesta tarefa, orientando-as no ato da costura, e demonstrando-lhes onde colocar a

agulha mantendo de algum modo o alinhavo; não existe a exigência de um alinhavo

estruturado ou perfeito, no entanto, procura-se que a criança não fique frustrada com o ato

de costurar motivo, pela qual, é apoiada na forma como deve colocar a agulha na sua base

de feltro. No fim da atividade (que não necessita obrigatoriamente de ser com a conclusão

do trabalho manual – este pode ser continuado em outro dia, desde que se associe ao ritmo

natural do infantário), as crianças demonstram-se felizes com a sua costura e com as

constantes novas descobertas a nível da sua própria motricidade e resultados.

A feltragem é igualmente uma atividade muito apreciada pela criança; embora não

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tão repetida ao longo do ano (sendo que a maioria dos trabalhos realizados têm como

temática base os festivais anuais), as crianças apreciam bastante a forma como podem

massajar a lã e criar formas com as suas próprias mãos. Apenas com a utilização de lã de

ovelha natural e detergente de louça diluído em água quente as crianças criam as formas

que pretendem com a lã, aplicando camada sob camada até ter tamanho e densidade que

permitam à forma uma vida duradoura; depois, com lã natural previamente tingida, as

crianças aplicam as cores à sua vontade, criando, várias vezes, formas muito coloridas e

apelativas ao olhar.

Existem ainda outras atividades como, por exemplo, a utilização de matérias

naturais como pinhas de pequenas dimensões, que são colhidas no jardim pelas próprias

crianças ou educadoras, e que são utilizadas para fazer algumas decorações divertidas aos

trabalhos das crianças ou como bonecos de brincadeiras. São disso exemplo as abelhas

feitas com pinha, lã e linha; estas tarefas são igualmente realizadas pelas crianças mediante

inicial produção do adulto e acompanhamento através do natural recuso à «imitação» por

parte das crianças.

É a meu ver importante reafirmar que nenhuma criança é obrigada a realizar

nenhuma atividade uma vez que o brincar é a base de toda a atuação do infantário Waldorf;

a primeira atuação é sempre do adulto, do educador. É ele que com a sua envolvência pela

atividade atrai as crianças a realizá-la; é o brincar artístico que domina nas temáticas do

Willow Tree Kindergarten que segue cuidadosamente as propostas de Rudolf Steiner para a

educação na primeira infância.

CONCLUSÃO

A Pedagogia Waldorf, como qualquer outra, deverá acompanhar a realidade

vivenciada pela sociedade e não deixar-se ir à deriva, sem perspetivas ou resultados

aparentes. Por essa razão, durante este percurso implicavam-se duas questões: a primeira,

como poderia ser realizado um estudo sobre uma determinada pedagogia apenas com base

em escritos teóricos (na sua grande maioria desenvolvidos pelo autor que criou esta teoria),

e tendo em conta que o ponto inicial da presente dissertação é uma pedagogia educativa

com praticamente um século de existência; a segunda, como funcionaria, do ponto de vista

prático, este sistema educativo alternativo e qual a sua relação com as artes plásticas.

Esta inquietações encaminharam-nos para este resultado: uma vontade maior de

conhecer um Sistema Educativo, o contacto com diversas escolas Waldorf para entrevista a

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educadores e o voluntariado numa das instituições (Willow Tree Kindergarten, Bristol, Reino

Unido) que permitiu uma observação intensiva das práticas educativas desta pedagogia, em

contexto de infantário; todas estas abordagens permitiram o enriquecimento deste estudo.

Mas a que conclusões podemos chegar?

Relembrando a questão de partida, “será possível relacionar os trabalhos manuais e a

atuação artística Waldorf com a educação não-formal?”, várias são as conclusões que poderemos

retirar após este aprofundamento de ideias.

Os primeiros anos de vida da criança são a base para o seu futuro, para a sua

personalidade, auto-confiança e autonomia. Rudolf Steiner valorizou esta preocupação

quando defendeu que a criança deveria, dentro dos possíveis, ficar no seio familiar durante

todo o primeiro seténio, inserindo-se numa instituição escolar apenas aos 7 anos de idade,

com um reconhecimento anterior da bondade, e a genuína preparação para a beleza do

mundo, por meio da estética (que na educação Waldorf é promovida pela natureza e pelos

elementos naturais), naturalmente desenvolvida para a imagem como recurso de

aprendizagem. No entanto, desde cedo, nas suas conferências, o teórico pôde entender,

ainda no inicio dos anos 20, como era necessária na sociedade a presença de instituições

que apoiassem os pais nesta fase inicial de vida dos filhos; surge assim, o primeiro

infantário desenvolvido com base na Pedagogia Waldorf, sob a influência de uma

necessidade social. Assim sendo, a primeira conclusão reside na base das escolas Waldorf:

Rudolf Steiner revelou constantemente uma preocupação com o bem-estar da criança no

espaço escolar. Para o autor, este espaço deveria ser a continuação do lar da criança, onde a

mesma se pudesse sentir livre de exprimir o seu eu, desenvolvendo e sendo respeitada pelo

seu percurso individual. Com o aditivo de que a presença dos pais seria exigida,

constituindo a relação entre pais-escola numa forte relação construtiva e de confiança. Em

contexto de infantário, pelo que pudemos observar, esta relação é, de facto, praticada pelos

intervenientes. Ou seja, surge a conclusão de que numa relação tão sustentável por si só,

na qual a criança é o centro, sendo que escola ou pais se dividem em esforços para

constantemente acompanhá-la, não existe grande espaço para a educação não-formal. É

possível afirmar sem grandes problemas de consciência que se a sociedade for estruturada a

educação-formal não faz sentido. No entanto, a sociedade revela riscos e fragilidades

naturais, o que permite esta maior abrangência educativa. Na sociedade atual é cada vez

mais complexa a presença da criança no mundo; a criança não está mais exigente, mas os

pais veem-se cada vez com menos tempo para poderem olhar pelos filhos, numa situação

de dependência do seu emprego (o que lhes permite sustentabilidade); por sua vez, as

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escolas procuram ter horários cada vez mais alargados e flexíveis, de forma a que possam

manter-se um local de preferência, de continuação do lar. No entanto, a educação não-

formal ganha espaço até mesmo no espaço escolar, com diversas atividades relacionadas às

expressões que ocupam parte dos horários das crianças. Apesar de observada uma relação

intensa entre infantário Waldorf e os pais das crianças que o frequentam, a verdade é que

algumas dessas crianças são, também elas, publico de educação não-formal.

Numa segunda conclusão, é possível valorizar a experiência de aprendizagem

natural da criança, com recurso à imitação. Esta ferramenta natural de aprendizagem é

fundamental no decorrer do primeiro seténio e permite ao educador abrir os horizontes

das crianças que acompanha. Como? Através das suas próprias atitudes. O educador na

Pedagogia Waldorf deverá dominar aquilo a que Rudolf Steiner chamou de Arte da

Educação; ou seja, o educador deverá ser próprio de exemplo para a imitação da criança,

demonstrando interesse pelas diversas atividades que realiza, que poderão ser relacionadas

como dia-a-dia ou com as expressões. Desta forma, as crianças irão observá-lo e aprender

reproduzindo os seus gestos, o seu modo de estar, através da brincadeira. A este brincar

livre, que a partir da espontaneidade da criança e vontade de saber, acrescenta-se o brincar

dirigido (no qual o educador apoia a criança nas suas atividades lúdicas15) e a aprendizagem

surge naturalmente. A criança nunca é obrigada a realizar uma atividade sem qualquer

propósito; essa atividade poderá ser proposta através do ritmo do infantário mas a criança

só participará se tiver essa vontade. O educador deverá, por essa razão, realizar atividades

que lhe proporcionem prazer ou que se encontrem relacionadas com a vida quotidiana;

caso contrário, não trará à criança a mesma vontade pura de aprender. Esta ferramenta

poderá ser utilizada, de igual modo, na educação não-formal.

As atividades manuais e artísticas fazem parte da brincadeira da maioria das crianças;

elas gostam de intervir no meio, explorar novos materiais, improvisar novas utilizações e

brincar artisticamente como forma de conhecimento de si e do mundo. Os mediadores

mais utilizados na pedagogia Waldorf (como pudemos observar, a pintura, a modelagem, a

costura, croché ou tricô, e a feltragem) apresentam à criança várias formas de

conhecimento do meio. O facto de serem utilizados materiais de origem natural nas

atividades, também permite às crianças terem uma maior relação com os materiais e

mediadores plásticos, uma vez que esses materiais lhes proporcionam sensações diversas e

lhes permitem o desenvolvimento dos sentidos. A educação não-formal reconhece,

igualmente, nesses materiais, mediadores e diferentes técnicas de experimentação, um valor 15Estas atividades podem ser jogos grupais, atividades plásticas e manuais ou qualquer outra atividade na qual

o educador necessite de intervir de algum modo para apoiar a criança na realização da mesma.

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para o desenvolvimento da criança e do seu conhecimento sobre o meio que a envolve, ou

seja, sobre a sua localização no mundo.

O fazer artístico da criança na Pedagogia Waldorf revela ainda uma outra mais-valia

para a educação não-formal: o devir da criança é brincar. Tudo o que a criança aprende

nestes primeiros seis anos de vida surge pela brincadeira, pela naturalidade que possui de

conhecer o mundo; esta ingenuidade e vontade de imitar o adulto para que possa crescer mais

depressa, leva-a a desenvolver-se rapidamente, com tal intensidade como em nenhum outro

momento na vida do ser humano. O fazer artístico da criança em âmbito da Pedagogia

Waldorf é puro, naturalmente expressivo, livre de preconceitos; abre, assim, caminho à

aprendizagem, à criatividade, à auto-confiança e à livre-expressão. A criança aprende

práticas plásticas através do brincar artístico e o educador recupera uma peça fundamental

para o desenvolvimento eficaz da sua prática profissional: o educador relembra-se de como

é ser criança. Ao acompanhar as brincadeiras, acompanhar o mundo da fantasia, explorar a

imaginação das crianças que o rodeiam e permitir-se à pratica expressiva livre, o educador

sustenta a ferramenta máxima para a Arte da Educação defendida por Steiner: reconhecer na

criança um ser único, dona de personalidade e temperamento próprio, que descobre o

mundo pela vontade de exploração livre e do brincar puro. Qualquer educador, quer

desenvolva a sua atividade profissional pela via formal ou não-formal, ao olhar para a

criança desta forma, permitir-se-á redescobrir a sua criança interior. E essa, sim, será a

maior aprendizagem.

Porque as artes e as práticas artísticas também têm uma forte componente social

este potencial não deve ser esquecido. Para além de que ao existir um maior conhecimento

sobre diversos sistemas educativos considerados alternativos, se poderá abrir caminho a

uma educação holística, aberta ao mundo e adaptável ao meio e às crianças. Uma próxima

vontade? Valorizar as práticas do Sistema Educativo Waldorf permitindo a sua valorização

no meio social, adaptando-as à realidade de uma instituição de acolhimento infantil; porque

as crianças devem ser o centro da educação, independentemente da estrutura familiar a que

pertencem ou posição sócio-económica. Porque o caminho está em permitir a criança ser

apenas criança!

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APÊNDICES

1. Estudo de Caso – Observação Participante

1.1 Dia 1 – Lã e feltro

Quarta, 21 de maio de 2014

Horário: 8:30 – 13:00

As crianças iniciam a sua chegada pelas 8:30. Os pais entram com as crianças e

assinam um documento confirmando a sua entrada. Até às 9:00 as crianças que vão

chegando brincam no exterior, com o acompanhamento das educadoras. Neste dia

estiveram presentes 15 crianças, com idades compreendidas entre os 3 e os 6 anos –

embora existam mais inscritas, o máximo que a escola pode ter a seu cuidado por dia são

18. Assim, os horários são registados e coordenados com os pais das crianças, indo as

crianças à escola, por norma, 3 vezes por semana; sendo os horários rotativos, também as

crianças vão alterando os dias em que estão no infantário.

Após a chegada de todos e após um pequeno tempo de brincadeira, as crianças vão

para o interior onde fazemos a roda (sentados) com cantigas da manhã. Abre-se, então,

espaço à atividade do dia – às quartas é dia de manualidades (o trabalho em feltro, costura,

pulseiras de lã e brincadeiras em feltro são as atividades propostas neste dia). As crianças

têm momentos de brincadeira dirigida – brincam entre si com a presença do educador em

sala. As crianças decidem entre as manualidades, os brinquedos de madeira, os bonecos de

trapos e as histórias contadas. As manualidades envolvem costura – com maior ou menor

necessidade de auxílio, as crianças produziram os seus elementos; os moldes são elaborados

em feltro, pelo educador, e costurados pelas crianças. As pulseiras consistem em trabalho

de linhas que envolvidas e torcidas entre si, se transformam em “tranças”; este emaranhado

dá origem a pulseiras que as crianças utilizam felizes.

Após esta atividade, foi dado lugar a nova fase de roda de canções seguida do

lanche da manhã, pelas 11 horas. Após a refeição as crianças tiveram a possibilidade de

brincar um pouco no recreio até a hora da aula de euritmia. Após esta pequena aula tiveram

ainda tempo para ir a um dos jardins comunitários nas imediações da escola para brincarem

ao ar livre e de regresso à escola, pelas 12h foi feita uma nova roda, destas vezes, com hora

do conto. Após a história, pelas 12h30, por ser hora de almoço, algumas crianças saem e

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almoçam com os pais, enquanto que outras comem na escola a comida das suas lancheiras

(por a escola ser muito pequena, não existem condições na cozinha para preparar refeições

principais). Após o almoço as crianças fazem a sesta e permanecem na escola até às 15:30.

1.2 Dia 2 – Feltro, linha e agulha

Quinta, 5 de julho 2014

Horário: 8:30 – 13:00

As crianças iniciam a sua chegada à escola entre as 8:30 e as 9:00; durante este

tempo, as crianças que vão chegando entretêm-se brincando livremente no jardim – sempre

com a presença de um educador no espaço que é responsável pelas 15 crianças presentes,

com idades compreendidas entre os 3 e os 6 anos.

Durante a manhã, foi dia de manualidades – que consistiu em coser alinhavos numa

base retangular em feltro, elaborando um marcador de livro (atividade de preparação do

Dia do Pai comemorado, no Reino Unido, a 15 de julho). As crianças têm a liberdade de

optar pela cor da linha que utilizam, bem como pela dimensão e quantidade de alinhavos

que constitui o seu marcador. No entanto, e como seria de esperar, estas atividades não são

desenvolvidas sem acompanhamento, mas sim com orientação constante de, pelo menos,

um educador – isto porque as crianças mais pequenas têm tendência a necessitar de ajuda a

colocar a linha na agulha, a dar o primeiro ponto ou a serem orientadas no seu alinhavo,

uma vez que não têm, ainda, desenvolvida a capacidade de repetir, várias vezes, o mesmo

movimento sem se confundirem. Esta atividade é muito pertinente em termos de

motricidade-fina e desenvolvimento da capacidade concentração.

Pelas 10:30 foi realizada a roda de canções que antecede o lanche da manhã. É

importante ter em atenção que as atividades do infantário estão extremamente bem

organizadas e cronometradas, de forma a que o ritmo diário seja constante e vivenciado

sem grandes alterações.

Após o lanche da manhã, e aproveitando o dia de sol que se fez sentir, as

brincadeiras foram realizadas no jardim comunitário na região envolvente do infantário;

neste local as crianças puderam brincar de forma livre ou dirigida, correr, saltar e conviver

com a natureza. É importante frisar que são tidas em conta diversas medidas de segurança

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nestas saídas: todas as crianças e educadores vestem um colete refletor, as crianças vão

protegidas com chapéu e protetor solar, e seguem a pares, em fila, seguindo uma das

educadoras que faz par com outra criança. A meio do grupo segue outra educadora que faz

par com outra criança, e no fim do grupo segue outra educadora que fecha, por assim dizer,

o grupo. Estas medidas de segurança são extremamente importantes e tidas, religiosamente,

em conta pelas educadoras do infantário.

Pelas 12h00, regressámos ao infantário, de forma a preparar o espaço e as crianças

para a roda do conto. Após a história, fazemos uma ultima roda de musicas, incluindo a

roda da despedida (com a canção “Goodbye, Now”), que define o fim da manhã. As crianças

que ficam no infantário preparam-se para o almoço, recolhendo as suas lancheiras e

sentando-se à mesa com a educadora responsável por coordenar os almoços, enquanto que

as restantes, aguardam no recreio que os pais ou responsáveis as vão buscar. Mais uma vez,

devido a normas de segurança, os pais/responsáveis assinam uma folha antes que seja

permitida a saída da criança do infantário.

1.3 Dia 3 – Aguarela a Três Cores I

Sexta, 13 de junho 2014

Horário: 8:00 – 13:00

A manhã foi iniciada com a preparação da escola para a chegada das crianças (uma

vez que o local onde funciona não é da propriedade do infantário, mas sim a outra entidade

– Jack Brimble Centre), com a preparação e arrumação do espaço; toda a disposição dos

objetos e mobília é cuidadosamente disposta na sala.

À sua chegada, entre as 8:30 e as 9:00, as crianças iniciaram as suas brincadeiras de

jardim; neste dia contamos com 14 crianças, com idades compreendidas entre os 3 e os 5

anos. Pelas 9:00, e à medida que iam entrando na sala, as mesas estavam já prontas para que

pudessem iniciar a(s) sua(s) pintura(s) em aguarela. Utilizámos como materiais três cores de

aguarela (neste caso, as primárias: amarelo, azul e magenta), pequenos recipientes de vidro

para as tintas de cada criança, recipientes de vidro altos para água, também para cada

utilizador, pincéis largos, papel de aguarela escala A3 – ao qual foi cortado as pontas,

arredondando-as, e dando às pinturas um acabamento mais característico, ao mesmo tempo

que as protege de cortes no papel – previamente húmido, bases de madeira para permitir

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que o papel fique sempre liso e para facilitar o transporte para o móvel onde ficam a secar,

e aventais para crianças e educadoras.

Nesta fase, deverá ser tida em conta a importância da imitação, tão caraterística

destas idades (1º seténio), uma vez que a criança não deverá realizar atividades pela vontade

e exigência do adulto, mas porque a atividade ao ser realizada pelo adulto mostra-se tão

envolvente que atraia a criança a realizá-la também. Desta forma, a criança irá desenvolver

uma curiosidade inicial em relação à atividade, criando uma relação espontânea com a

mesma, permitindo-lhe retirar algo muito mais positivo dessa experimentação do que

sendo obrigados a realizá-la. É, por isso, realmente importante que as educadoras realizem

a atividade em conjunto com as crianças, para que as últimas possam observar os adultos e

seguirem os seus movimentos, vivenciando curiosidade pela atividade.

A experiência de aguarela no infantário realiza-se por meio da experimentação da

cor, sem qualquer introdução teórica por parte da educadora. A técnica utilizada - Wet-on-

Wet - baseia-se na utilização da aguarela previamente diluída em água com pincel, em folha

de aguarela igualmente pré-humedecida. Com esta técnica, as crianças têm maior noção das

cores, e no resultado da sua junção, uma vez que as aguarelas se misturam facilmente entre

si. Em conversa informal com a educadora M. pude igualmente observar os desenhos e a

forma de utilização das cores, relacionadas com a personalidade das crianças. Pude

observar que a K., com 4 anos, experimentou as aguarelas repetindo a atividade 3 vezes.

Em cada pintura que fez, utilizou mais cor e menos pincel, bem como menos tempo: o

primeiro desenho com pincel permitiu-lhe um desenho forte nas cores primárias e

pequenas junções das cores complementares; já a segunda pintura, ainda com pincel,

assumiu cores mais fortes e acastanhadas; na terceira experiência, depois de por acidente

enquanto realizava o segundo desenho a K. ter derrubado um dos boiões de tinta no chão,

derrubou intencionalmente o recipiente de tinta magenta no papel criando uma dinâmica

de cores muitos intensas, muitos castanhos e sanguíneos e até alguns verdes acinzentados.

Ao mesmo tempo que algumas crianças realizavam a atividade de aguarela, outras

brincavam no recreio, e outras concluíam a prenda do dia do pai – marcador em feltro.

Após a atividade da manhã foi altura de, pelas 10:00, as crianças fazerem as

dinâmicas associadas à aprendizagem do Francês; em roda foram cantadas várias canções

que correspondiam a determinadas atividades: como dinâmica introdutória foi cantada a

música “Bonjour Tout Le Monde”, onde todos os presentes se cumprimentam; seguidamente,

musicas que se relacionam com ritmo e movimento, outra com contagem até 10 que

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proporciona uma dinâmica relacionada com a motricidade-fina e o desenvolvimento do

sentido lógico e ainda o “Frère Jacques” onde uma das crianças se encontra “adormecida” no

centro da roda enquanto que outra toca um xilofone, pretendendo-se que o “adormecido”,

ao acordar, encontre a origem do som – sendo esta uma atividade visivelmente divertida e

uma mais-valia em termos de desenvolvimento do sentido da audição (revelando-se, assim,

importante em termos rítmicos e de concentração).

Após esta atividade realizámos o lanche da manhã, pelas 11:00, seguido de uma ida

ao jardim comunitário nas imediações da escola onde as crianças puderam brincar. No

regresso, pelas 12:00, realizámos a roda do conto, cuja história se baseou na riqueza

material em oposição às riquezas emocionais.

Chegada a hora de almoço as crianças foram encaminhadas para os pais, uma vez

que às sextas-feiras o infantário fecha mais cedo do que aos restantes dias de semana. Após

a saída de todas as crianças, foi altura de voltar a arrumar toda a sala uma vez que podem

existir outras atividades no espaço que tenham que ver com outras atividades, particulares

ou não, que dele necessitem.

1.4 Dia 4 – Cometas de lã

Quinta, 19 de junho 2014

Horário: 8:30 – 12:45

As atividades do infantário tiveram inicio pelas 9:00, após a receção de todas as

crianças por parte da educadora J. (hoje estiveram presentes 17 crianças, com idades

compreendidas entre os 3 e os 6 anos). Este dia foi o principal na preparação do Festival de

Verão a realizar-se no dia 24 de julho de 2014, tendo como principal tema de

desenvolvimento as manualidades.

A realização de cometas em lã compreendeu a utilização de lã de ovelha, lã tingida,

mistura previamente feita de água quente e detergente de louça, rede nas cores amarelo,

vermelho e laranja, agulha e linha. O primeiro passo para a elaboração dos cometas

corresponde a modelar a lã com as próprias mãos, como se se tratasse de plasticina; com a

lã humedecida com a mistura de água e detergente, as crianças vão modelando a lã,

acrescentando pedaços aos poucos, aumentando o tamanho e a densidade da bola. Quando

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a bola está densa e do tamanho pretendido, começa-se a fase da decoração; agora utilizando

lã tingida, repete-se o processo com diferentes cores, criando um cometa bem colorido.

Enquanto algumas crianças realizam esta atividade no jardim, outras encontram-se na sala

já no processo final para a construção dos cometas: após lavagem e secura das bolas de lã já

produzidas, feitas no dia anterior, as crianças cosem as tiras de rede amarela, laranja e

vermelha ao seu cometa com o apoio das educadoras. Terminado este processo os cometas

estão prontos para o festival.

Após esta atividade, foi tempo de realizar o lanche da manhã que foi seguido do

passeio no jardim comunitário, tendo o grupo regressado à escola pelas 12:00. No

infantário foi dado inicio à roda do conto. Pelas 12:30 deram-se por concluídas as

atividades da manhã, sendo as crianças que não almoçam na escola entregues aos pais,

enquanto que as restantes, acompanhadas pelas educadoras C. e E., abriram as lancheiras e

iniciaram o almoço na sala. As atividades continuaram no seu ritmo natural durante a parte

da tarde, e eu deixei o espaço pelas 12:45.

1.5 Dia 5 – Aguarelas a Duas Cores

Sexta, 20 de junho 2014

Horário: 8:30 – 13:00

Chegada as crianças entre as 8:30 e as 9:00; enquanto a educadora E. recebeu as

crianças, eu e a educadora M. preparámos a sala para a atividade de aguarelas que iria

ocupar parte da manhã. Uma vez que estamos próximos de dar entrada numa nova estação

do ano – o Verão -, e sendo bastante valorizada a questão dos ritmos e tempos na educação

do primeiro seténio Waldorf, foram utilizadas apenas duas cores, as quentes: amarelo e

vermelho.

Quando, pelas 9:00, as crianças entraram na sala, já a mesa e os materiais estavam

prontos e dispostos para iniciarem a atividade. Hoje, estiveram presentes 16 crianças, com

idades compreendidas entre os 3 e os 5 anos). Mais uma vez é de salientar a importância da

ação natural de aprendizagem vivida nesta etapa de desenvolvimento – a imitação -

procurando que as crianças experiência a atividade, apresentando-lhes um meio de

expressão, uma opção, e não como uma obrigação. As crianças entusiasmaram-se, hoje, na

atividade de pintar a aguarelas tendo, muitas delas, realizado mais do que uma pintura; foi

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curioso observar que as próprias crianças acabam por se influenciar entre si.

Após as aguarelas foi altura da roda de francês – tema que define juntamente com a

pintura as atividades de sextas-feiras no infantário Willow Tree -, na qual foram interpretadas

e dançadas musicas com o grupo. As crianças puderam escolher algumas músicas para

interpretar, como foi o caso da “La Flour” e da “La Polca”; a exploração de sons é muito

importante para a concentração das crianças e o seu entusiasmo por novas expressões e

sonoridades, bem como facilidade de aprendizagem de novas palavras (mais uma vez

através do fenómeno da imitação) é evidenciado ao longo do desenvolvimento destes

exercícios.

Pelas 11h00, realizámos o lanche da manhã e logo após esta atividade as crianças

foram brincar no recreio da escola, subindo à árvore, brincando no caixote de areia, ou

criando um veículo de transporte de passageiros com direito a volante, apenas com

cadeiras e pedaços de madeira que se encontram no jardim para que possam ser utilizados

no brincar livre das crianças.

Pelas 12:00 voltámos para dento da sala, para escutar a história – que é repetida da

semana anterior, dia em que a educadora M. coordena as aulas; uma vez que nos restantes

dias, salvo raras exceções, as aulas estão ao comando da educadora J. – revelando-se, este,

um momento de muita concentração e algum entusiasmo por parte dos presentes. Sendo as

histórias contadas muitas vezes com a utilização de diversas rimas, ditos ou sons que se

repetem ao longo da mesma, as crianças têm tendência a repeti-los sempre que os ouvem

novamente.

As atividades terminaram pelas 12:30, com a roda do adeus em francês – com a

música “Au Revois Tout Le Monde”.

1.6 Dia 6 – Festival de Verão

Terça, 24 de junho 2014

Horário: 8:30 – 12:45

Devido à comemoração do Festival de Verão as atividades letivas neste dia foram

iniciadas pelas 9:00, com a receção das crianças e das suas famílias. Pelas 9h30 deixamos a

escola seguindo, todos juntos, até um Parque Comunitário nas imediações da escola.

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À chegada ao parque várias foram preparadas diversas atividades para poderem ser

realizadas com as crianças, tais como, bolas de sabão e lançamento dos cometas realizados

na semana anterior pelas crianças. Das ravinas do jardim, as crianças fizeram escorregas

onde brincaram sem hesitar, ajudando-se mutuamente (os mais velhos apoiaram os mais

novos, uma vez que já possuem outra agilidade física).

Após as brincadeiras, pelas 10h30, foi altura do piquenique, com todos os alimentos

trazidos de casa pelas famílias. A importância de partilhar e o relacionamento de entre-

ajuda é promovido desde cedo pela educação Waldorf proporcionando uma forte relação

de comunicação e confiança entre escola e pais (ou família nuclear).

Para celebrar o verão foi chegado o momento da fogueira; com as devidas medidas

de segurança foi acesa uma fogueira simbólica utilizando um fogareiro, no centro da roda

onde todos os presentes uniram as mãos, depois de colocarem, cada um na sua vez, o papel

que possuíam onde foram convidados a redigir o que “não queriam voltar a ter na vida”, para

se tornar em cinzas abrindo a estação do sol. De mãos dadas, todos cantamos musicas

relacionadas com esta época do ano, inaugurando o verão.

Pelo meio-dia, um pouco mais cedo do que o programado (e que o ritmo que

normalmente se segue no infantário), devido ao calor que se fazia sentir, regressámos à

escola com algumas crianças, enquanto que outras seguiram com as respetivas famílias para

suas casas.

O dia de infantário foi concluído pela hora habitual 12:30, embora não tenham

existido atividades da parte da tarde devido ao festival. Ao invés disso, teve lugar uma

reunião fechada com a presença das educadoras.

1.7 Dia 7 – Aguarelas a Três Cores II

Sexta, 27 de junho 2014

Horário: 8:30 – 13:00

O dia iniciou-se com a chegada dos alunos à escola pelo horário habitual, contando,

no entanto, com um menor número de crianças presentes uma vez que muitas reportaram

doença durante a semana – o grupo de hoje foi constituído por 11 crianças.

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A atividade do dia foram as aguarelas; nesta semana foram utilizadas três cores; as

crianças deixaram-se influenciar pelos adultos e pela forma como as outras crianças

pintavam com alegria (neste caso, as mais velhas, L. e O.), acabando por existir uma maior

adesão posterior, em relação à hora inicial. Como em todos os outros dias em que se

praticam artes plásticas e outros exercícios que podem, por algum motivo, manchar ou

danificar as roupas das crianças, são utilizados aventais tanto pelas crianças, como pelas

educadoras que com elas dinamizam a atividade.

Após as pinturas, e uma vez que muitas crianças iam desenvolvendo ao mesmo

tempo brincadeiras livres no interior da sala, chegou o tempo de colocar tudo no devido

lugar, atividade designada por Tidy Up [arrumar], na qual todas as crianças têm uma tarefa

específica a cumprir, sendo todas ajudantes durante o processo; ao mesmo tempo que as

crianças ajudam, também as educadoras apoiam na reorganização do espaço, ao mesmo

que tempo que é cantada a canção “Tidy Up Time” [tempo de arrumar] estimulando e

orientando o processo.

É, assim, chegada a hora do lanche da manhã, com a mesa disposta com a presença

de todos. Após este momento, pelas 11:00, as crianças tiveram ainda tempo para realizar

algumas brincadeiras no espaço exterior do recinto do infantário, onde puderam andar de

baloiço, subir à árvore, fazer bolos de areia ou andar de autocarro elaborado

cuidadosamente pelas próprias crianças com cadeiras e pedaços de troncos disponíveis no

espaço. Num misto de brincar livre e brincar dirigido, as brincadeiras prosseguiram até ao

momento da roda do conto.

Na hora do conto desta semana, a história foi contada com recurso a teatro de

fantoches (tipo de mediador igualmente valorizado na educação Waldorf de primeiro

seténio, uma vez que as crianças se afeiçoam às imagens e se entusiasmam com maior

capacidade de concentração à história que se encontram a ouvir, sendo que podem

observar as personagens ao mesmo tempo que a história é contada).

O dia foi finalizado pelas 12:30, com as crianças a seguirem para suas casas. Como

já mencionado anteriormente, não existem atividades no infantário durante a parte da tarde

de sextas-feiras.

1.8 Dia 8 – Técnica de Feltragem

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Quinta, 3 de julho 2014

Horário: 8:30 – 12:45

Chegada das crianças à escola entre as 8:30 e as 9:00. Pelas 9:00, inicia-se a manhã

com a roda de boas-vindas. Após esta atividade rítmica, as crianças puderam optar entre

brincar livre ou as manualidades – coser em feltro moldes de formas como casa, sol, lua,

flor, etc.

Esta atividade manual é realizada em duas etapas diferentes e funciona da seguinte

forma: na primeira etapa é realizada a base para o trabalho de costura, a partir da técnica de

feltragem – esta técnica compreende a utilização de uma base em feltro de cor neutra e de

lã natural colorida, que humedecida com uma mistura previamente realizada de água quente

e detergente de louça, adere facilmente ao feltro criando uma base colorida e dinâmica; na

segunda etapa as crianças selecionam as formas em feltro (previamente recortadas pelas

educadoras) e cosem-nas à base, com menor ou maior apoio, e com uma linha da mesma

cor da forma que estão a coser. No fim, o trabalho é cosido a um pequeno ramo de árvore,

com um fio de lã maior que serve para pendurar o resultado numa parede, porta ou outro

local à escolha.

Após esta atividade, foi hora da roda com atividades rítmicas e de motricidade,

coordenadas pela educadora J., seguida do lanche da manhã.

Seguiu-se, então, a ida ao jardim comunitário nas imediações do infantário, onde as

crianças brincaram livremente ou de forma dirigida. Optei por coordenar o baloiço, onde

orientei a utilização do mesmo, para que todas as crianças interessadas em utilizá-lo

pudessem ter a sua vez, ao mesmo tempo que ia interagindo e participando das

brincadeiras das restantes crianças que aguardavam pela sua vez no baloiço ou apenas

aproveitavam aquele mesmo local para descansar da correria do seu jogo de apanhada com

o restante grupo.

Pelas 12:00, regressámos ao infantário e preparámos a sala para a roda do conto que

aconteceu, como habitualmente, pelas 12:15. As atividades da manhã foram concluídas

pelas 12:30, sendo que as crianças que ficaram a almoçar na escola prepararam

imediatamente as suas lancheiras, enquanto que as restantes crianças seguiram para casa

com os seus pais ou outros responsáveis.

Apesar das atividades continuarem até às 15:30, deixei o espaço escolar como

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normalmente, pelas 13:00.

1.9 Dia 9 - Aniversário

Sexta, 11 de julho 2014

Horário: 9:00 – 12:30

Inicio das atividades pelas 9:00. Neste dia a dinâmica foi levemente alterada uma

vez que o aniversário da R. está para se realizar (embora apenas aconteça durante as férias

grandes, será comemorado durante o dia de hoje no Willow Tree Kindergarten, uma vez que a

R. se irá mudar para outra cidade e para uma nova escola). Assim, a pedido dos pais, este

dia foi para celebrar o seu aniversário.

A primeira atividade da manhã baseou-se na realização de desenho livre, a lápis de

cera, no qual cada criança pintava aquilo que gostaria de oferecer à R.; na parte de trás de

cada desenho, as crianças ditavam os seus desejos de parabéns, enquanto que as educadoras

escreviam a lápis de cor as suas mensagens. No fim, com todos os desenhos juntos, a

educadora M. reuniu-os num livro manualmente produzido que foi entregue aos pais da R.

como recordação deste aniversário.

Após a pintura dos desenhos foi chegada a hora do lanche da manhã, com direito a

bolo de aniversário. Terminado o lanche, as crianças puderam brincar no jardim da escola,

enquanto a educadora M. preparava a sala para a roda do conto especial de aniversário. À

hora do conto, pelas 12:15, os pais da R. já se encontravam na escola para poderem assistir

à comemoração. A educadora M. coordenou todo o momento simbólico, contando a

história da pequena R., mencionando pequenos pormenores da sua vida, e apoiando a R. a

acender uma vela por cada aniversário; este pequeno detalhe das velas, permite dar às

crianças a noção de ritmo, tão defendida por Rudolf Steiner nos seus escritos. Após todas

as 5 velas, comemorativas do 5º Aniversário da R., o livro dos desenhos foi entregue aos

pais, e as atividades do dia foram dadas por terminadas.

1.10 Dia 10 – Amassar Massa e Formar Biscoitos

Quinta, 17 de julho 2014

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Horário: 8:30- 15:30

Neste dia estiveram presentes 8 crianças (uma vez que festival comemorativo do

encerramento do ano letivo ocorreu na terça-feira anterior, muitas crianças já foram de

férias com as respetivas famílias).

A atividade de manhã foi de culinária, tendo as crianças modelado massa de

biscoito, que foi cuidadosamente elaborada com a ajuda de todos e a coordenação da

educadora M.. Com os devidos instrumentos (pequenos rolos de madeira e formas) as

crianças recortaram os seus biscoitos, e colocaram-nos cuidadosamente nos tabuleiros para

irem ao forno; isto porque hoje, as crianças são as responsáveis por realizarem o prato

principal do lanche da manhã: os biscoitos de gengibre

Após esta atividade as crianças pintaram com lápis de cor alguns desenhos para

entregarem a educadora J. (que se encontra em fase de recuperação), que foram depois

unidos em formato de livro e entregues, juntamente com alguns biscoitos de gengibre pela

educadora M., à respetiva remetente.

Após esta atividade, foi altura da roda do francês, seguida do lanche da manhã.

Logo após o lanche, as crianças puderam brincar no jardim enquanto a educadora M.

preparava a sala para a hora do conto. Chegadas as 12:15, as crianças entraram para a sala e

puderam assistir, mais uma vez, ao teatro de fantoches já apresentado pela educadora M. na

semana anterior. Foi possível entender, em conversa informal com a educadora M. que o

motivo pela qual a história se repete ao longo de cerca de 2 a 3 semanas (dependendo da

densidade e capacidade de absorção do tema principal) é totalmente intencional, isto

porque, Steiner acreditava e propôs que todo o ensinamento no infantário tivesse por base

as forças etéricas da criança (a seu ver, realmente ativas ao longo do primeiro seténio);

assim, a repetição e a imitação são as principais metodologias do trabalho com as crianças

nesta fase, segundo a Pedagogia Waldorf. As histórias são assim repetidas uma vez que as

crianças entendem melhor o seu seguimento, têm mais tempo para digerir os seus

ensinamentos, imaginar as personagens e até procurarem dinamizar por si próprias as

mesmas histórias nas suas brincadeiras livres.

Após a hora do conto as crianças fizeram, como em todos os restantes dias, a hora

da despedida. As crianças que ficaram para a parte da tarde prepararam as suas lancheiras e

foram acompanhadas pelas educadoras C. e E. durante a hora de almoço, enquanto que as

restantes crianças foram devidamente entregues aos pais e responsáveis pela educadora M.

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No fim da hora de almoço, as seis crianças restantes – ainda sentadas à mesa –

realizam jogos à sua escolha (estes jogos envolvem palavras e sons), seguindo-se o Rest Time

[hora da sesta/repouso] orientado pela educadora M.; durante o Rest Time é cantada uma

canção de embalar e tocado o xilofone – este momento é muito silencioso e as crianças

tendem a manter-se deitadas. As mais agitadas podem ter um livro, previamente

selecionado, a seu lado, para folhear ao mesmo tempo que ouvem as musicas entoadas em

voz baixa e suave. Após algum tempo, e tendo em conta que a maioria das crianças não

demonstrou cansaço ou conseguiu adormecer, o momento de relaxamento foi aproveitado

pela educadora M. para contar mais uma história, desta vez lida de um livro escolhido por

uma das crianças presentes, a E.. A educadora M. eu o livro, ao mesmo tempo que o

folheava e demonstrava as ilustrações ao grupo.

Após o momento da história as crianças podem voltar a brincar livremente, tendo

desta vez optado por brincar na sala, até ao momento da saída, 15:30 – altura em que os

pais ou responsáveis vão buscar as restantes crianças e o infantário encerra funções durante

os dias da semana (excetuando, como já anteriormente mencionado, as sextas-feiras).

1.11 Dia 11 – Piquenique do Último Dia de Aulas

Sexta, 18: de julho 2014

Horário: 8:30 – 13:00

Último dia de aulas do ano letivo 2013/2014 no Willow Tree Kindergarten. Como

comemoração, realizamos um piquenique no jardim comunitário onde foi realizado o

Festival de Verão, tendo contado com a presença de 8 crianças, dos 4 aos 6 anos.

Várias foram as atividades desenvolvidas durante a manhã, nomeadamente, bolas de

sabão, história inventada no momento com a orientação da educadora M. e com os objetos

naturais encontrados no jardim pelas crianças, que deram origem a um lindo conto (com

uma bruxa e um príncipe enfeitiçado que se transformou num dragão e que depois de

ajudado pela bruxa e apesar de ter voltado a ser príncipe, apesar de com um pequeno

problema: por um erro no feitiço, ficou alto de mais. Pediu uma princesa tão alta quanto ele,

mas bateram-lhe à porta três princesas e por uma ele teve optar; optou por levar as três

princesas para o castelo, embora uma delas - a mais alta de todas – tivesse sido aquela que

conquistou o seu coração), jogos com bolas e o brincar livre no qual as crianças tornaram

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um dos caminhos íngremes de terra num escorrega.

Todo este aproveitamento da fantasia e da imaginação das crianças torna-se

proveitoso e revela-se bastante saudável. As crianças no primeiro seténio encontram-se

num momento de imaginação fértil, ao mesmo tempo que ainda vivenciam a criatividade

sem limites pelo “conhecido” e “pouco provável”; sem bloqueios mentais e livres de

preconceitos ou pré-conceções, as crianças imaginam realidade mais ou menos prováveis e

juntas, criam histórias e brincadeiras divertidas para todos.

Pelas 11:00 realizamos o piquenique; seguidamente, pelas 11:45, regressámos ao

infantário, para que pudesse ser preparada a hora do conto. Durante esse tempo de

preparação, as crianças continuaram as suas brincadeiras no recreio da escola; pelas 12:15,

foi então iniciada a hora do conto, com o teatro de fantoches que tem sido representado

nas ultimas três semanas.

As atividades foram concluídas no horário habitual, pelas 12:30. As atividades

letivas encontram-se agora suspensas até a próximo ano letivo, a iniciar-se no mês de

setembro de 2014.

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2. Entrevistas

2.1 Maria Copleston, Educadora Willow Tree Kindergarten, Inglaterra

2.2 Veiga, Educadora Waldorf e Artífice no Atelier Nina Veiga, Brasil

2.3 Paula Martinez, Educadora e Diretora Jardim de Infância S. Jorge, Portugal

2.4 Sofia Silva, Educadora Casa Verdes Anos, Portugal

2.1 Entrevista a Maria Copleston, Educadora no Willow Tree Kindergarten, Inglaterra

1 – How do you consider the importance of Waldorf Kindergarten Education?

A. It is the foundation for the rest of the child’s schooling – extremely important as habits

are set and attitudes to school and learning are established. It is also very important in

terms of development of social skills.

2 – Can you, please, describe the ones your consider the most relevant guide lines in this

teaching phase?

A. Learning through imitation. No intellectual instruction. No rush/pressure – freedom to

be a child and play.

3 – Which ones do you believe to be the principal problems or concerns to consider in

childhood education?

A. I would say that kids, nowadays, do not have time to just be kids. The adults tend to

make them grow to quickly. Technology is one of my biggest concerns because children

stop to play to use this kind of “funny and intriguer objects”. I had my first mobile phone

in my twenties, nowadays kids have them around 9/10 years old. This make kids live their

life through technology and they stop developing like they should – they stop to learn

movement like they should and that is really scary for me. Also the fashionist child is one of

the biggest concerns nowadays because, again, child is not allowed to be child.

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4 – Steiner had always stand up for imitation as a way to children (from birth to seven years

of age) learning. How do you consider this theory looking for the place of children in

nowadays society?

A. It remains as relevant today as 100 years ago – the phases of child development remain

the same as they are related to an archetypal picture of the developing human being.

However, children may be somewhat rushed and pushed forward in modern society but

this does not mean that the phases of development and methods of teaching should not

be adhered to. In fact modern children probably need it more than ever!

5 – How is imitation related to the learning of arts and hand crafts in Waldorf Kindergarten

Education?

A. The joy and enthusiasm of the teacher engaged in hand craft draws the children towards

her and they usually say “Can I do that too?”, then depending on the age of the child, the

activity is tailored to meet their capabilities.

6 – In Waldorf Pedagogy rhythm is extremely relevant in educational manners. How do

you see hand works in childhood related to this statement?

A. Most handwork activities involve some form of rhythmic action – carding wool,

weaving, sewing – this can have a most beneficial, calming effect on the child. eg. it has

been shown to slow breathing and produce an almost meditative state of mind.

7 – Their are lots of artistic materials to use for child handwork. Which are the better ones

to work with early aged children?

A. Wool – it is soft, not rigid, has an unformed quality can be easily manipulated and re-

shaped. And Painting wet on wet – again it has an open-endedness to it and can be shaped

and re-shaped again and again.

8 – Rudolf Steiner stand for four child temperaments types: sanguine, melancholic, choleric

and phlegmatic. As Waldorf educator, have you experienced or do you consider possible

the relation between children art works and their personality?

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A. Yes – eg. a tightly woven piece of work may indicate a certain type of personality in

comparison to a loosely woven piece of work (the child may in this case be more dreamy

than the former and more “relaxed” – though I would say it is certainly not set in stone).

Temperaments are not really used until the children are class one age – (7/8).

9 – Is possible to look at Art as a mediator for human being feelings and action?

A. Yes. If we are creating artistically we are expressing our inner self aren't we?

10 – We know creativity grows throughout knowledge and access. Does Waldorf Pedagogy

allows this access for children creative development?

A. In Steiner education we as educators should let children create freely. This way, children

learn to respect their rhythm to create and explore materials and techniques, and they learn

to respect their inner self; they also learn to respect others expressions.

11 – Handwork in Waldorf Education is produced, every time it is possible, with natural

materials and sometimes some unusual techniques nowadays like, per example, felting.

What made Waldorf practitioners keep this traditional techniques in schools curriculum?

A. We are always trying to connect the child right back to the source of things so that they

get a picture of the whole of life and understand the origins of all of our material goods.

Steiner said that children should not be allowed to use equipment that they don’t fully

understand and so going right back to source helps children to appreciate this.

12 – Steiner's Educational System searches for creative development, learning trough image

as aesthetics principally during first and second setenium – while the child is more vulnerable

to image. Can we consider Waldorf Pedagogy as an Education through Art type of

Pedagogy?

A. Education as an Art yes but not through art – there are many other aspects to Waldorf

pedagogy, children also learn through movement, and eventually through abstract

intellectual understanding. Aesthetics are important but they are not the be all and end all

of Steiner pedagogy.

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13 – Finally, Steiner believed in Religion, Science and Arts as the basis triangle of Humanity.

How do you consider this statement relating it to contemporary society and the artistic

teaching in Waldorf Pedagogy?

A. I don't think I can answer you to this one without a few reading first. I am sorry, I admit:

it's to much for me to answer right now!

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2.2 Entrevista a Nina Veiga, Educadora Waldorf e Artífice no Atelier Nina Veiga,

Brasil

1 – Em que medida considera importante a Educação Waldorf no Infantário (primeiro

seténio)?

R. Muito importante. A criança é respeitada como ser único, como individuo. Esse é um

dos traços mais significativos da Educação Waldorf para o primeiro seténio e para os que

vêm depois. Se olharmos cada criança como ser único vamos permitir-lhe crescer sem

medos, sem receios, com ideia da "bondade" no mundo. A criança pode ser criança.

2 – Enumere os objetivos que considera os mais relevantes nesta fase de ensino por esta

mesma pedagogia.

R. A criança deve brincar livremente; esse é o principal objetivo da Educação Waldorf

dirigida ao primeiro seténio. A criança tem que ser criança e, para isso, tem que brincar. O

espaço escolar deverá ser, por isso, uma continuação do lar.

3 - Quais são, a seu ver, as principais questões ou problemas a ter em conta durante a

educação no primeiro seténio?

R. Se a criança aprende através da imitação, deveremos nós - adultos - ser exemplo que

imitação; o problema está mais em ser um exemplo educativo, do que na forma de

aprender da criança (que por si só é clara e significativa). Por isso Steiner nos fala da "Arte

de Educar"...

4 – Steiner defendeu sempre nas suas teorias que a criança até aos 7 anos de vida aprende

através da imitação. Como considera esta teoria tendo em conta o lugar da criança na

sociedade contemporânea?

R. Continua em atuação; a criança vêm ao mundo dotada dessa capacidade natural de

aprendizagem. A imitação deve ser sempre tida em consideração pelo educador, uma vez

que ele será o exemplo para aquela criança; o mesmo acontece com a atuação dos pais. A

criança age, imitando o que vê.

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5 – Que relação tem a imitação caraterística do primeiro seténio com a aprendizagem das

artes e manualidades na Educação Waldorf?

R. Não se deve “ensinar” artes manuais no primeiro seténio. Nesta fase, o educador deve

fazer artes manuais diante das crianças, em atividades necessárias, como consertar uma

cortina da sala, fazer um casaquinho para uma boneca, construir pantufas para as crianças.

Assim, as crianças convivem com o educador enquanto ele está trabalhando e, podem ou

não querer imitá-lo. Se mostrarem interesse, o educador permite e, só aí, ensina.

6 – A importância do ritmo na educação é extremamente importante no contexto na

Pedagogia Waldorf. Como vê o trabalho manual na primeira infância aliado a esta

afirmação?

R. Não há trabalho manual obrigatório na primeira infância. Só o adulto as realiza diante

das crianças. As crianças só devem aderir às práticas por vontade própria, disparada pela

imitação. A partir daí, a aprendizagem se dá. No entanto, não adianta ser uma atividade do

adulto apenas para que seja imitada. A atividade feita deve ser real, necessária. Deve ser

parte da vida viva.

7 – São inúmeros os mediadores artísticos que podemos utilizar no trabalho manual infantil.

Quais são aqueles que para si são os mais completos no trabalho com a criança do primeiro

seténio?

R. O educador deve permitir e facilitar o acesso da criança a materiais de origem natural,

pois são eles que irão permitir o acesso ao meio. Os materiais naturais permitem uma

relação ética, a construção do valor real que mais tarde, no decorrer do segundo seténio,

permitirá à criança formar com maior autonomia seus valores estéticos.

8 – Rudolf Steiner defendeu a existência de quatro temperamentos da criança: sanguíneo,

melancólico, colérico e fleumático. Como educadora Waldorf, já vivenciou ou considera

possível a relação entre o trabalho da criança e a sua personalidade?

R. Não há trabalho para a criança. A criança somente brinca livremente. Os temperamentos

só são olhados com maior relevância a partir do segundo seténio.

9 - É credível pensar a Arte como mediadora do sentir e agir humano?

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R. Sim. Usando as palavras de Jonas Bach Junior (2007): «O que se reserva à arte é a função

geratriz, o papel de manifestar algo que exprima sua essência na aparência, criar algo que a ciência e a

natureza não contenham, é o espaço para o homem alcançar o auge do ser ser ao conquistar uma

singularização da transformação do mundo em beleza».

10 – Sabemos que a criatividade se desenvolve a partir do conhecimento, do acesso. A

Pedagogia Waldorf permite esse acesso para o desenvolvimento da criatividade da criança?

R. A pedagogia Waldorf deve permitir às crianças o acesso aos elementos da natureza. Eles

sim é que colaboram no desenvolvimento saudável da estética.

11 – O trabalho manual na Pedagogia Waldorf é desenvolvida, na sua grande maioria, com

materiais de origem natural e algumas técnicas pouco usuais nos dias de hoje como, por

exemplo, a técnica de feltragem. O que levou os educadores Waldorf a manterem esse tipo

de técnica mais tradicional no currículo das escolas?

R. São os elementos da natureza que permitem a construção de uma estética ética.

12 - O sistema educativo de Steiner procura o desenvolvimento criativo, a aprendizagem

através da imagem e da estética principalmente no decorrer do segundo seténio – momento

em que a criança se encontra mais vulnerável à imagem. Poderemos considerar a Pedagogia

Waldorf como uma Pedagogia pela Arte?

R. Sim, a Pedagogia Waldorf é uma educação estética.

13 - Por último, Steiner acreditava que a Religião, a Ciência e a Arte deveriam ser o

triângulo base da Humanidade. Como considera esta afirmação relacionando-a com a

sociedade contemporânea e o ensino artístico na Pedagogia Waldorf?

R. Não é só Steiner que considera essa triangulação. Filosofia, ciência e arte é o modo de

expressar do humano. Tudo que fazemos é sempre ou filosofia, ou arte ou ciência. Filosofia

produz conceitos, a arte produz sensações, ciência produz funções. São os âmbitos:

conceitual, atitudinal e procedimental da educação.

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2.3 Paula Martinez, Educadora e Diretora Infantário São Jorge, Portugal

1 – Em que medida considera importante a Educação Waldorf no Infantário (primeiro

seténio)?

R. É muito importante, porque é nesta fase que se está a estruturar o corpo físico da

criança.

2 – Enumere os objetivos que considera os mais relevantes nesta fase de ensino por esta

mesma pedagogia.

R. O objetivo mais importante é permitir que a criança cresça da forma mais saudável

possível.

3 - Quais são, a seu ver, as principais questões ou problemas a ter em conta durante a

educação no primeiro seténio?

R. Todos os que podem impedir o crescimento saudável e que variam em função da

realidade de cada criança.

4 – Steiner defendeu sempre nas suas teorias que a criança até aos 7 anos de vida aprende

através da imitação. Como considera esta teoria tendo em conta o lugar da criança na

sociedade contemporânea?

R. Não é uma teoria. É uma realidade observável por qualquer pessoa em qualquer sitio e

em qualquer época.

5 – Que relação tem a imitação caraterística do primeiro seténio com a aprendizagem das

artes e manualidades na Educação Waldorf?

R. A relação é evidente uma vez que a criança aprende qualquer coisa por imitação.

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6 – A importância do ritmo na educação é extremamente importante no contexto na

Pedagogia Waldorf. Como vê o trabalho manual na primeira infância aliado a esta

afirmação?

R. O trabalho manual enquadra-se no ritmo diário normal do grupo.

7 – São inúmeros os mediadores artísticos que podemos utilizar no trabalho manual infantil.

Quais são aqueles que para si são os mais completos no trabalho com a criança do primeiro

seténio?

R. Todos os trabalhos que tenham a ver com a vida diária de uma casa de família (o

ambiente natural a criança). Por exemplo cozinhar ou lavar roupa.

8 – Rudolf Steiner defendeu a existência de quatro temperamentos da criança: sanguíneo,

melancólico, colérico e fleumático. Como educadora Waldorf, já vivenciou ou considera

possível a relação entre o trabalho da criança e a sua personalidade?

R. A forma como nos relacionamos com cada criança depende da sua personalidade.

9 - É credível pensar a Arte como mediadora do sentir e agir humano?

R. Absolutamente.

10 – Sabemos que a criatividade se desenvolve a partir do conhecimento, do acesso. A

Pedagogia Waldorf permite esse acesso para o desenvolvimento da criatividade da criança?

R. Completamente

11 – O trabalho manual na Pedagogia Waldorf é desenvolvida, na sua grande maioria, com

materiais de origem natural e algumas técnicas pouco usuais nos dias de hoje como, por

exemplo, a técnica de feltragem. O que levou os educadores Waldorf a manterem esse tipo

de técnica mais tradicional no currículo das escolas?

R. Não utilizamos essa técnica com as crianças.

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12 - O sistema educativo de Steiner procura o desenvolvimento criativo, a aprendizagem

através da imagem e da estética principalmente no decorrer do segundo seténio – momento

em que a criança se encontra mais vulnerável à imagem. Poderemos considerar a Pedagogia

Waldorf como uma Pedagogia pela Arte?

R. Evidentemente que sim.

13 - Por último, Steiner acreditava que a Religião, a Ciência e a Arte deveriam ser o

triângulo base da Humanidade. Como considera esta afirmação relacionando-a com a

sociedade contemporânea e o ensino artístico na Pedagogia Waldorf?

R. Continua a fazer todo o sentido na atualidade.

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2.4 Sofia Silva, Educadora Jardim de Infância Verdes Anos, Portugal

1 - Quais são, a seu ver, as principais questões ou problemas a ter em conta durante a

educação no primeiro seténio?

R. Estamos sempre em constante procura na Casa Verdes Anos, sendo esta uma instituição

de inspiração na Pedagogia Waldorf. Uma das questões que se coloca constantemente é “De

que forma vamos atender às crianças com a nossa pedagogia e tendo em conta as necessidades das famílias?”.

Para isso realizamos encontros pedagógicos com os pais para os esclarecermos sobre os

mais variados temas, tais como, a alimentação (ovo-lácteo-vegetariana), a nossa visão sobre

a tecnologia (não existem computadores na nossa escola), que tipo de brinquedos

acompanham por vezes as crianças quando vêm de casa (nós só utilizamos brinquedos de

materiais nobres, naturais, que permitem à criança, a nós educadores, e a quem visita sentir-

se bem neste espaço), ou até mesmo sobre as férias (fechamos nas férias normais [Natal,

Páscoa, etc.] e os pais nem sempre compreendem essa necessidade para nós e para as

crianças). Temos um trabalho de educação parental, no fundo, de tentar desconstruir.

2 – Que relação tem a imitação caraterística do primeiro seténio com a aprendizagem das

artes e manualidades na Educação Waldorf?

R. As crianças observam-nos enquanto estamos a coser ou a realizar ouro tipo de atividade

manual enquanto brincam.

3 – A importância do ritmo na educação é extremamente importante no contexto na

Pedagogia Waldorf. Como vê o trabalho manual na primeira infância aliado a esta

afirmação?

R. O ritmo está presente em tudo e em todas as atividades que fazemos. Existe ritmo diário,

semanal, mensal e anual. O ritmo das atividades é equiparável ao ritmo da natureza; ou seja,

as crianças chegam de manhã e brincam livremente (têm a oportunidade de expirar), depois

vem para a sala e fazem rodas, pintam aguarelas, enfim, têm momentos mais introspetivos

(têm oportunidade de inspirar).

O ritmo está sempre presente em todas as atividades, pois em todas elas se encontra

presente a ideia de processo (principio, meio e fim); por exemplo, as crianças de cinco anos

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81

fazem o seu tear, que depois utilizamos na sala com atividade de tecelagem e resultam num

estojo para levarem para o ciclo (ou seja, um objeto que funciona como objeto de

transição). Assim, as crianças cortam a madeira, montam o tear, lixam, colocam as lãs no

tear devidamente posicionadas, tecem, e por fim cosem o estojo. O ritmo está sempre

presente.

4 – São inúmeros os mediadores artísticos que podemos utilizar no trabalho manual infantil.

Quais são aqueles que para si são os mais completos no trabalho com a criança do primeiro

seténio?

R. A aguarela é uma das práticas artísticas principais pois permite-lhes vivenciar a cor. No

entanto, esta é uma atividade que envolve muita paciência; dependendo da idade, a

exigência é diferente. Com os mais velhos, toda a preparação da atividade é realizada com a

sua ajuda, o que torna este processo num processo moroso; sou mais exigente com a

pintura, por exemplo, se temos duas cores – o azul e o amarelo – o azul será o céu, e o

amarelo o sol, ou seja, terão de elaborar uma pintura mais na horizontal, utilizar o pincel

com maior cuidado e fazer evoluir a pintura com base num objetivo concreto, pré-

elaborado. Já as crianças mais pequenas apenas experimentam a técnica livremente.

Utilizamos também Cera de Abelha pois é um material fácil de modelar e que

estimula o belo.

Outra atividade que temos é a Horti-Carpintaria; através da qual as crianças

elaboram atividades experimentando a madeira e aprendem a relacionar-se com este

material. Fazemos objetivos necessários/uteis ao dia-a-dia como, por exemplo, caixa de

ferramentas, cama para casa de bonecas, enfim, brinquedos e coisas necessárias.

Também utilizamos muita lã de cordeiro, que limpamos, cardamos, penteamos e

depois utilizamos para fazer brinquedos, bonecas, decorações, etc.

5 – Rudolf Steiner defendeu a existência de quatro temperamentos da criança: sanguíneo,

melancólico, colérico e fleumático. Como educadora Waldorf, já vivenciou ou considera

possível a relação entre o trabalho da criança e a sua personalidade?

R. Na experiência da cor, por exemplo, Steiner referiu que as crianças reagiriam de maneira

diferente a cada uma das cores experimentadas. Apesar de só trabalharmos inicialmente

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com cores primárias é muito curioso observar como as crianças de diferentes

temperamentos reagem a diferentes tipos de cor.

6 - É credível pensar a Arte como mediadora do sentir e agir humano?

R. A arte está em tudo; na forma como estamos, nos rituais. As crianças têm muitas

experiências artísticas na Pedagogia Waldorf. Promovemos o viver artístico! Um viver

artístico de forma natural, sem exigências. As crianças podem ser mais livre, não sentem

pressão e criam naturalmente (pois todos vimos ao mundo dotados dessa capacidade).

7 – Sabemos que a criatividade se desenvolve a partir do conhecimento, do acesso. A

Pedagogia Waldorf permite esse acesso para o desenvolvimento da criatividade da criança?

R. Todo o pensar e atuar da Pedagogia Waldorf tem por base o belo, a compreensão

estética a partir da natureza. Por exemplo, a nossa atividade de visita à Floresta é uma

vivência artística, pois permite a vivência do belo; as crianças trazem sempre materiais para

atividades a desenvolver depois em sala de aula.

8 – O trabalho manual na Pedagogia Waldorf é desenvolvida, na sua grande maioria, com

materiais de origem natural e algumas técnicas pouco usuais nos dias de hoje como, por

exemplo, a técnica de feltragem. O que levou os educadores Waldorf a manterem esse tipo

de técnica mais tradicional no currículo das escolas?

R. Utilizamos materiais mais nobres e de mais simples atuação. Estes materiais são mais

bonitos, mais verdadeiros; pretende-se com isto salvaguardar a beleza.

9 - O sistema educativo de Steiner procura o desenvolvimento criativo, a aprendizagem

através da imagem e da estética principalmente no decorrer do segundo seténio – momento

em que a criança se encontra mais vulnerável à imagem. Poderemos considerar a Pedagogia

Waldorf como uma Pedagogia pela Arte?

R. Têm relações sim; mas não são o mesmo, cruzam-se sim numa perspetiva holística. A

Pedagogia Waldorf permite uma consciência anímica e espiritual. Steiner traz à atuação da

Educação uma nova perspetiva: a vertente espiritual.

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ANEXOS

1. «Creative Development» - Desenvolvimento do Potencial Criativo no Infantário Waldorf

(fonte: Steiner Waldorf Schools Fellowship [org.] (2009). Guide to the Early Years Foundation

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East Sussex: White Horse Press – p. 31 e 32)

Page 94: AS ARTES PLÁSTICAS NA PE DAGOGIA WALDORFrepositorio.ul.pt/bitstream/10451/23514/2/ULFBA_TES_838.pdf · Palavras-Chave: Artes Plásticas, Educação, Infância, Pedagogia Waldorf

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