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    As guas da discrdia

    Tomaz Espsito NetoCUFSA e PUC-SP

    Resumo

    O presente artigo tem como objetivo analisar a evoluo das negociaestrilaterais (Argentina, Brasil e Paraguai) sobre a questo de Itaipu-Corpus, das Atas dasCataratas (1966) assinatura do Acordo Tripartite (1979).

    Palavras Chaves: Corpus, Itaipu e Poltica Externa Brasileira.

    Abstract

    This article aim is to analyses Itaipu Corpus Negotiation between Argentina,Brazil and Paraguay.

    Key words: Corpus, Itaipu e Brazilian Foreign Policy

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    Introduo

    Entre 1966 e 1979, a temtica sobre o aproveitamento hdrico, em especial o

    aproveitamento do potencial hidroeltrico, da Bacia do Rio da Prata, tornou-se a

    principal questo do subsistema do Cone Sul (MELLO, 1996).

    No cerne desta disputa estava a construo da usina de Itaipu, empreendimento

    brasileiro-paraguaio, e a sua compatibilizao com a represa de Corpus, obra argentino-

    paraguaia. Por detrs de discusses tcnicas sobre as bases de um regime de cooperao

    energtica, acontecia uma luta pela preponderncia poltica, na regio entre Argentina e

    Brasil, tendo o Paraguai como ator coadjuvante.

    O presente artigo tem como objetivo analisar a evoluo das negociaes

    trilaterais (Argentina, Brasil e Paraguai) sobre a questo de Itaipu-Corpus, das Atas das

    Cataratas (1966) assinatura do Acordo Tripartite (1979).

    Para melhor compreenso, o texto est distribudo em trs segmentos principais.

    O primeiro enfoca as razes da questo de Itaipu-Corpus. A seguir, h uma abordagem

    sucinta do litgio e a evoluo das negociaes entre Assuno, Braslia e Buenos Aires.

    E para finalizar so apresentadas as consideraes finais.

    Este texto foi constitudo a partir de uma pesquisa bibliogrfica sobre o tema, de

    uma analise dos documentos oficiais transcritos na Resenha de Poltica Externa

    Brasileira, de outras fontes.

    As razes da questo de Itaipu-Corpus

    As desconfianas e a rivalidade entre os pases da Bacia do Rio da Prata,

    principalmente Argentina e Brasil, remontam a um passado longnquo. Alguns chegama apontar a disputa entre espanhis e portugueses, pelas terras do Novo Mundo, como

    a origem da discrdia na regio (DORATIOTTO, 2002). Ao longo da histria, diversos

    acontecimentos, como a Guerra do Paraguai (de 1864 a 1870), forjaram percepes que

    influenciaram negativamente as relaes entre os pases da regio. A questo de

    Itaipu-Corpus fez com que aflorassem as rivalidades regionais, mais precisamente entre

    argentinos e brasileiros. Mas como se iniciou esse litgio?

    Em 1962, o governo brasileiro iniciou uma pesquisa, coordenada peloengenheiro Otvio Marcondes Ferraz, para avaliar as possibilidades hidroeltricas do

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    Salto de Sete Quedas, essa regio se encontra muito prximo da fronteira entre Brasil e

    Paraguai, (CAUBET, 1991).

    Uma estranha coincidncia ocorreu em 1963. Aps os resultados preliminares

    da pesquisa brasileira, o ditador paraguaio, general Alfredo Stroessner, iniciou uma

    ofensiva diplomtica, trazendo tona uma pendncia territorial na regio de Guair,

    rea muito prxima ao Salto de Sete Quedas, por meio de uma reinterpretao do

    tratado de fronteira de 1872 (MENEZES, 1987), ou seja, depois de 91 anos de firmado e

    ratificado o tratado de fronteiras entre Brasil e Paraguai. O governo de Assuno decide

    rever o tratado, lastreando a sua posio na afirmao, de que na poca da assinatura do

    tratado os mtodos de cartografia eram imprecisos e que a geografia da regio havia se

    alterado, em razo da eroso (SANCHEZ, 1964).

    No obstante, a diplomacia paraguaia solicitava a participao em eventuais

    projetos ao longo da fronteira brasileiro-paraguaia. Com isso, o Presidente Stroessner

    vislumbrava a possibilidade de criar novo pulmo econmico no leste do pas,

    diminuindo a influncia argentina na poltica interna do Paraguai (MENEZES, 1987).

    O governo brasileiro, ao seu turno, inicialmente baseou a sua postura na defesa

    do acordo de 1872. Ademais, o Presidente Castelo Branco (de 1964 a 1967) enviou a 5.

    Companhia de Fronteira para ocupar a regio em litgio, o que provocou fortes crticas

    da diplomacia paraguaia (MENEZES, 1987).

    O mal-estar nas relaes entre Assuno e Braslia perdurou at junho de

    1966, quando em um encontro entre os ministros das relaes dos dois pases, Juracy

    Magalhes e Sapea Pastor, houve a negociao da Ata das Cataratas, o que distendeu

    as relaes entre os dois pases (MENEZES, 1987). Entretanto, o litgio territorial

    continuava pendente.

    Algumas questes que continuam em aberto, como, por que o Brasil e o

    Paraguai no levaram o assunto para um tribunal internacional de arbitragem? Por que ogoverno brasileiro reconheceu, ao assinar as Atas das Cataratas, a legitimidade das

    demandas paraguaias sem realizar estudos mais profundos sobre o tema? E com isso,

    possibilitou aos paraguaios terem uma participao em possveis projetos de infra-

    estrutura na regio de Sete Quedas. At o presente momento, no foram encontradas

    respostas plausveis.

    Nesta conjuntura, o diplomata Mario Gibson Barboza galgou a posio de

    embaixador brasileiro em Assuno. Sob forte presso das autoridades paraguaias,Gibson Barboza teve a idia de sugerir oficiosamente a construo de Itaipu para

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    submergir o litgio territorial, idia que ganhou fora no bojo do corpo diplomtico

    dos dois pases (BARBOZA,. 1992), o que redundou na criao de uma comisso

    bilateral, em 1967, para dar continuidade nas tratativas sobre Itaipu, cujas negociaes,

    nas palavras de Barboza, foram muito duras.

    Entrementes, em 1967, graas aos esforos da diplomacia argentina, realizou-se

    a Primeira Reunio dos Chanceleres da Bacia do Rio da Prata, em Buenos Aires. A

    Casa Rosada pretendia criar um regime multilateral de cooperao entre os pases da

    regio platina, no qual permitisse a Buenos Aires palpitar, quando no conduzir, os

    debates e as decises sobre infra-estrutura na zona do Rio da Prata (LANUS,1989). A

    posio argentina reafirmada na Segunda Reunio de Chanceleres da Bacia do Rio da

    Prata e nas notas diplomticas entregues embaixada brasileira em 1968 e 1969

    (CAUBET, 1991.).

    Com a conduo do general Emilio Garrastazu Mdici presidncia da

    Repblica Federativa do Brasil, de 1969 a 1974, ao Gibson Barboza nomeado ministro

    das relaes exteriores e impe ao Itamaraty a direo de acelerar os entendimentos

    com o governo paraguaio sobre Itaipu, visto a necessidade premente do pas em obter

    fontes de energia capazes de sustentar o vigoroso crescimento da economia

    (VIZENTINNI, 1998).

    Assim, aps intensas negociaes, os chefes de Estado do Brasil e do Paraguai

    firmaram o tratado de Itaipu em 1973, o qual previa a construo de uma hidroeltrica

    bilateral, tendo ambos os pases a mesma participao acionria. Alm do mais, o Brasil

    emprestaria ao Paraguai o valor necessrio para a constituio da empresa bilateral,

    responsvel por tocar o empreendimento, e para a construo da usina. Por sua vez, o

    Paraguai restituiria o valor emprestado, com a venda de energia produzida por Itaipu, ao

    Brasil (CAUBET, 1991).

    Desde o incio, Buenos Aires se ops fortemente ao projeto brasileiro-paraguaio,pois as autoridades argentinas percebiam o Tratado de Itaipu como uma ameaa ao

    equilbrio de poder no subsistema da regio do Rio da Prata (MELLO,1996), o que

    relegaria um papel menor Argentina na arena internacional (GUGLIAMELLI,

    2007), e era algo impensvel para os argentinos, dando incio a uma controvrsia com o

    Brasil, a qual perdurou por anos.

    O litgio e a evoluo das negociaes

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    Influenciada por uma percepo geopoltica da realidade (GEISEL,1997), as

    diversas autoridades argentinas lanaram-se em uma ofensiva para evitar, o que na viso

    de Buenos Aires, seria uma estratgia brasileira de construo de uma

    predominncia na regio, por meio da conquista do Heartland sul-americano

    (SANTOS, 1987), cuja pedra fundamental seria Itaipu.

    importante destacar que Itaipu era um assunto sensvel sociedade argentina,

    que passava por um momento muito conturbado e instvel da vida poltica, da

    Argentina, tendo reflexos na conduo das relaes exteriores argentina. Em um

    perodo curto a pasta das relaes exteriores foi ocupada por cinco pessoas diferentes

    (BARRETO,2006).

    Apesar de terem existido diversos complicadores, durante o episdio de Itaipu-

    Corpus, o litgio pode ser dividido em duas grandes fazes:

    a) Da tentativa de obstruo a trgua:

    As autoridades argentinas alegavam que construo de Itaipu poderia causar

    impactos desastrosos em diversas reas, como ambiental, social (doenas) e econmica

    (navegao, entre outros) (CAUBET, 1991). Assim, para tentar obstruir as obras, a

    diplomacia argentina utilizou-se do princpio da consulta prvia, ou seja, em um rio

    internacional, os pases a montante devem submeter s obras, que possam influenciar o

    leito do rio a consulta dos pases a jusante, o que daria a esses pases o direito voz e ao

    veto sobre eventuais obras.

    Essa postura foi defendida no mbito bilateral e multilateral (LANUS, 1989),

    cuja expresso mxima foi a Conferncia de Estocolmo em 1972, onde a resoluo no

    foi acatada, pois era necessrio o consenso dos pases (BARBOZA, 1992).

    O Brasil e o Paraguai, ao seu turno, defendiam que os assuntos ligados Itaipueram de interesse bilateral. Ademais, o Itamaraty argumentava que as terras montantes

    eram brasileiras, as jusantes eram paraguaias e somente, depois eram argentinas. Logo,

    no haveria razes de preocupaes, muito menos de reclamaes.

    Um episdio que ocasionou um grande mal-estar entre a Casa Rosada e o

    Palcio do Planalto foi o discurso de improviso do presidente argentino Lanusse, em

    1972, no Rio de Janeiro, durante uma solenidade oficial, em que afirmou ser inaceitvel

    o imperialismo brasileiro na questo de Itaipu (VEGAS, 1995). Houve uma profunda

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    irritao por parte das autoridades brasileiras, que consideraram o fato como uma

    intensa deslealdade.

    A diplomacia brasileira trabalhou com afinco para evitar que a Chancelaria

    argentina colocasse em votao a questo da consulta prvia na Assemblia Geral das

    Organizaes das Naes Unidas, o que redundaria, muito provavelmente, numa

    retumbante derrota brasileira. Para evitar tal acontecimento, Gibson Barboza

    tratou a questo diretamente com MacLaughin, ministro das relaes exteriores

    argentino, redundando no Acordo de Nova York (BARBOZA, 1992), que resultou na

    resoluo 2995 da Assemblia Geral, substituindo o princpio da consulta prvia pelo do

    conhecimento pblico e oficial (VEGAS, 1995).

    b) Da trgua ao tratado

    O Acordo de Nova York foi violentamente atacado pela imprensa e por

    diversos setores da sociedade argentina. Em 1973, esse acordo foi denunciado pelo

    presidente eleito Pern, aps o episdio conhecido como traje de banho, que se refere

    ao enchimento da represa de Ilha Solteira, sem ter sido dado, na viso argentina, o

    devido conhecimento pblico e oficial (LANUS, 1989).

    Na verdade, o governo peronista utilizou-se do episdio para iniciar uma nova

    estratgia para demover paraguaios e brasileiros da determinao de construir Itaipu,

    tentando impor o princpio da consulta prvia na Assemblia Geral das Naes Unidas

    (VEGAS, 1995).

    Outro aspecto desse estratagema argentino era a assinatura entre argentinos e

    paraguaios de tratados para a construo das usinas hidroeltricas de Yaciret, Salto

    Grande e Corpus para contrabalanar a crescente influncia brasileira na regio e

    recuperar o tempo perdido (LANUS, 1989). Embora os acordos entre Assuno eBuenos Aires para a edificao das represas tenham sido feitos muito rapidamente, a

    ausncia de uma grande gama de informaes tcnicas tornava a obra uma realidade

    distante, enquanto o Tratado de Itaipu era uma realidade.

    Apesar de ter sido na administrao Mdici (1969 1974) a negociao de todo

    o acordo de Itaipu, foi no governo Geisel (1974-1979) que as obras se iniciaram. Coube

    ao novo chanceler brasileiro, Azeredo da Silveira, resolver o imbrglio com os

    argentinos.

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    Encontrei o Tratado de Itaipu com o Paraguai concludo em todasas suas formalidades, espera de execuo. Resolvi dar andamento ao

    projeto e assim, finalmente, iniciar as obras de Itaipu. Foi uma grande fontede despesas. Como o Paraguai no tinha recursos financeiros, o capital comque entrou na empresa 100 milhes de dlares , foi financiado pelo Brasil. Oempreendimento foi realizado com financiamentos obtidos no exterior.

    (GEISEL, Ernesto. Ernesto Geisel. DARAUJO, Maria Celina & CASTRO,Celso (org).Rio de Janeiro. Editora FGV-RJ. p. 302).

    Com o incio das obras e a determinao de no interromper os trabalhos de

    construo, o Estado brasileiro passava a negociar a partir de uma posio de fora,

    tendo ao seu lado, o fator tempo, pois os projetos argentinoparaguaios iniciavam a fase

    de estudos tcnicos e de viabilidade econmica.

    A partir da, os esforos argentinos passaram a ser no intuito de harmonizar as

    obras de Itaipu e o projeto de Corpus. (LANUS, 1989) Neste momento entra em cenauma discusso sobre as alturas das lminas de gua das barragens de Itaipu e de Corpus,

    o nmero de turbinas de Itaipu, entre outros detalhes tcnicos de imensa importncia,

    pois definiam a viabilidade econmica e poltica dos projetos de Itaipu e Corpus

    (CAUBET, 1991).

    Iniciaram-se, ento, longas e exaustivas negociaes tripartites (Argentina,

    Brasil e Paraguai) que, por diversas vezes, chegaram prximas a um acordo definitivo,

    porm por circunstncias inusitadas, como no caso das turbinas em 1978, no lograram

    um resultado final satisfatrio.

    ...Silveira, comentou comigo que, em setembro, no Itamaraty doRio, delegaes do Brasil e da Argentina tinham praticamente chegado definio dos termos bsicos de um acordo. Logo em seguida, o governo

    brasileiro decidiu implantar mais duas turbinas em Itaipu, o que,evidentemente, desmontara tudo. O presidente Geisel, Shiegeaki Ueki, , oengenheiro Gelsio, outros elementos da Itaipu, deviam achar bom oacrscimo e entendiam que a Argentina no podia reclamar,porque talacrscimo no causaria prejuzo a jusante... (GUERREIRO, Ramiro Saraiva.Lembranas de um empregado do Itamaraty.So Paulo. Editora Siciliano. p.93).

    As autoridades argentinas, em especial o embaixador da Argentina no Brasil,

    Oscar Camiln, reclamaram, e muito, pelos meios de comunicao de massa, acusando

    o governo brasileiro de desleal e mentiroso (FERRES, 2004.). Paralelamente, as

    discusses polticas entre as autoridades diplomticas dos dois pases e as obras de

    construo de Itaipu seguiam em frente.

    Somente na gesto do presidente brasileiro Figueiredo (1979 1985) que seequacionou o problema com a Argentina sobre Itaipu. O ento ministro das relaes

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    exteriores, Ramiro Saraiva Guerreiro, recebeu ordens expressas da presidncia da

    Repblica para solucionar a questo. Os chanceleres trataram diretamente a questo,

    evitando as embaixadas (ESPOSITO, 2006), e rapidamente encontraram uma soluo

    poltica para questo, tendo o governo brasileiro cedido no que tange ao nmero de

    turbinas (GUERREIRO, 1992).

    Em 1979, poucos meses aps as tratativas iniciais, os chefes de Estado da

    Argentina, Brasil e Paraguai assinavam o Acordo Tripartite (1979), que estabeleceu um

    regime conjunto utilizao dos rios da Bacia do Rio da Prata, colocando um ponto

    final na questo e permitindo a emergncia de uma nova forma de cooperao entre os

    pases (ESPOSITO, 2006).

    No obstante, h quem afirme que um dos motivos para Buenos Aires aceitar as

    negociaes com o Braslia, em termos desfavorveis Argentina, foi a evoluo do

    litgio argentino-chileno sobre a soberania dos territrios de Beagle, e com isso a

    possibilidade da guerra de duas frentes contra brasileiros e chilenos (SELCHER, 1986).

    Contudo, at o momento, no foram encontradas evidncias e provas de tal afirmao.

    H de se destacar que o Brasil e a Argentina se viram obrigados a negociar em

    paralelo com o Paraguai, enquanto transcorriam as tratativas bilaterais. Ao contrrio que

    o senso comum afirma, a diplomacia guaranifoi extremamente hbil, por meio de uma

    poltica externa pendular (MENEZES, 1987).

    O presidente Stroessner alimentava a discrdia entre argentinos e brasileiros

    para conseguir extrair um grande nmero de benefcios da disputa (CAUBET, 1991),

    como a construo de uma ampla infra-estrutura (ferrovias, rodovias, barragens, entre

    outros) no Paraguai, financiamentos a empreendimentos privados entre outros, como no

    caso da ciclagem.

    A questo da ciclagem da energia produzida por Itaipu colocou em lados opostos

    paraguaios e brasileiros. Afinal, o sistema brasileiro de distribuio de energia operacom 60 hertz, ou ciclos, e no restante da Amrica do Sul a distribuio feita com 50

    ciclos, ou hertz; o que na prtica dificultaria a venda de energia paraguaia ao Brasil,

    caso no houvesse um macio investimento na converso da energia paraguaia gerada

    por Itaipu para o padro brasileiro (MENEZES, 1987).

    Por outro lado, caso Assuno adotasse o sistema brasileiro, a energia gerada por

    Itaipu no poderia ser utilizada no mercado interno paraguaio, visto o alto custo de

    converso e o padro energtico paraguaio. Alm do Brasil, nenhum outro Estado daregio adotava a ciclagem de 60 hertz, o que impediria o Paraguai de comercializar a

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    energia produzida por Itaipu a outros pases, ou seja, o Estado paraguaio seria obrigado

    a vender toda energia de Itaipu ao Brasil. (CAUBET, 1991).

    No final, o governo brasileiro acatou a proposta paraguaia de que a metade das

    turbinas produzisse a energia no sistema paraguaio e a outra metade no padro

    brasileiro. Coube ao Estado brasileiro arcar com o pesado fardo dos custos da converso

    do sistema e, poder assim, comprar a energia paraguaia (MENEZES, 1987).

    Consideraes Finais

    Ao longo do texto, foi apresentado a evoluo das disputas envolvendo o

    aproveitamento econmico, em especial hidroeltrico, da bacia do Rio da Prata, que se

    iniciou como uma pendncia fronteiria entre paraguaios e brasileiros por uma diminuta

    faixa de terra, tornou-se uma intensa contenda entre Brasil e a Argentina pela

    preponderncia poltica na regio, transvestida de discusses tcnicas e econmicas,

    transformando as guas da bacia hidrogrfica regional em guas da discrdia.

    Dessa rixa, o maior beneficirio foi o Paraguai que conseguiu por meio de uma

    poltica pendular e ardilosa extrair de brasileiros e argentinos um grande nmero de

    benesses econmicas. Dessa forma, um pas agrrio e pobre conseguiu, em muito pouco

    tempo, tornar-se o corao energtico da regio e atou firmemente a prosperidade de

    argentinos e brasileiros energia gerada pelos rios que percorrem seu territrio, como

    hoje demonstra as discusses sobre o aumento do preo pago por Brasil e Argentina ao

    Paraguai pela energia produzida no pas Guarany.

    Pode-se dizer que o Brasil conseguiu uma vitria parcial desse litgio, pois

    apesar de construir Itaipu, no local e na forma desejados, os custos financeiros e

    polticos foram muito altos, em especial no que tange aos danos nas relaes bilaterais

    com a Argentina. Ademais, deixou-se nas mos do Paraguai, politicamente instvel,uma parcela muito grande da energia consumida pela economia nacional (PERREIRA,

    1972), criando uma tenso permanente nas relaes entre Assuno e Braslia.

    Por sua vez, a Argentina foi a grande perdedora, pois viu enfraquecer a sua

    influncia na regio, em larga medida, graas instabilidade poltica interna e a erros

    estratgicos na conduo da questo, tornando uma potncia secundria

    (GUGLIAMELLI, 2007). A face argentina foi salva pelo Tratado Tripartite, porm o

    contedo desse acordo era amplamente favorvel ao Brasil.

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    Por fim, a problemtica de Itaipu Corpus marcou mais um importante

    episdio, na histria da Amrica do Sul, cujos ecos se encontram presentes at os dias

    atuais.

    Espera-se que, algum dia, as guas da Bacia do Rio da Prata no sirvam mais de

    pretexto para a discrdia e conflitos entre os pases da regio, mas sim para concrdia e

    a cooperao dos mesmos.

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    BIBLIOGRFIA:

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    Artigos

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    FEREES, Virginia Perez .Rivalidade, Tenso, Integrao. Anlise da PolticaExterna Argentino-Brasileira no contexto da Bacia do Prata (1974-1979).Dissertao

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