antropologia, história da família e o conceito de … · também não podemos esperar que uma...
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Revista Estudos Amazônicos • vol. VIII, nº 2 (2012), pp. 23-82
Antropologia, História da Família e o
Conceito de Estratégia
Pier Paolo Viazzo*
Katherine A. Lynch**
Tradução de Breno Rodrigo de Oliveira Alencar***
Resumo: É discutido neste ensaio o uso interdisciplinar do conceito de estratégia nos estudos de família, associando sua relevância a contribuição empreendida por antropólogos e historiadores na análise de processos sociais e culturais através do viés histórico. Neste sentido, o trabalho reflete sobre as raízes antropológicas da noção de estratégia familiar tal como antropólogos e historiadores a tem utilizado, num esforço para esclarecer a questão sobre as relações entre os diferentes graus de controle e a possibilidade de estratégia consciente dos atores em suas práticas sociais.
Palavras-Chave: Estudos de Família, Estratégia, História, Cultura. Abstract: It is discussed in this essay the interdisciplinary use of the concept
of strategy in family studies, associating its relevance to the contribution undertaken by anthropologists and historians in the analysis of social and cultural processes through the historical bias. In this sense, the work reflects on the anthropological roots of the notion of family strategy as anthropologists and historians have used in an effort to clarify the question of the relations between the different degrees of control and the possibility of a conscious strategy of the actors in their social practices.
Keywords: Family Studies, Strategy, History, Culture.
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Introdução
Neste ensaio, consideramos a história da família como um
campo comum de interesse substancial e teórico moldado pelo
contato entre várias disciplinas. Estas disciplinas incluem,
obviamente, a história social e a demografia, mas também – e com
bastante destaque – a antropologia social. Um componente
importante do crescimento dos estudos sobre a história da família
tem sido o crescente aumento da atenção que os historiadores têm
dado a temas como o casamento, o parentesco e a família, que
possuem significado central nos estudos antropológicos sobre
estrutura social. Por outro lado, os antropólogos têm consciência
de suas graves limitações no estudo da sincronia, da pesquisa de
campo orientada para o presente, e a maioria deles agora
provavelmente concorda que a análise histórica é essencial para
que possam entender os processos sociais e culturais. Essa
percepção transformou gradualmente muitos antropólogos de
consumidores relutantes do trabalho histórico em produtores
ativos e, muitas vezes bastante entusiasmados1.
A fecundidade desta reaproximação talvez tenha sido melhor
demonstrada no início dos anos 1970 com os avanços
possibilitados pela adoção, por parte da história da família, do
conceito antropológico de ciclo de desenvolvimento do grupo
doméstico. Embora o trabalho de Chayanov já prenunciasse este
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conceito, o mesmo foi formulado de forma mais independente em
1949 por Meyer Fortes, um dos principais antropólogos sociais
britânicos, e aperfeiçoados por ele próprio e por seus colegas e
alunos em Cambridge no decorrer da década de 19502. Quando
suas potencialidades foram reveladas no campo da nascente
história da família, por meio dos trabalhos de antropólogos como
Goody e Hammel e, de forma mais eficiente, através do influente
estudo de Lutz Berkner sobre o sistema de organização familiar
em uma região da Áustria, este conceito foi recebido em muitos
lugares como uma espécie de panaceia. Sabemos agora, no entanto,
que não se tratava de uma panaceia3. Como pesquisas posteriores
demonstraram, em alguns casos, o valor descritivo e preditivo de
modelos baseados no conceito de ciclo de desenvolvimento era
muito limitado, a exemplo de quando o modelo era incapaz de
distinguir entre a situação atual de cortes sucessivos e as
consequências de mudanças seculares.4 No entanto, em geral, os
efeitos da adoção de uma abordagem do “conceito de
desenvolvimento” foram benéficos e influenciaram toda a
disciplina.
À primeira vista parece que podemos dizer o mesmo sobre o
conceito de “estratégia”. Assim como a noção de ciclo de
desenvolvimento, o termo foi emprestado em grande parte da
antropologia, sendo considerado por muitos pesquisadores em
história da família como uma poderosa ferramenta para ir além de
uma abordagem estática e formalista.5 Nos últimos anos, a noção
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de estratégia tem sido amplamente utilizada na literatura, onde é
cada vez mais frequente se falar não apenas de estratégias
familiares, mas também de estratégias matrimoniais, estratégias de
herança, estratégias de fertilidade, estratégias de migração, e assim
por diante – sendo este último conceptualizado como aspecto ou
componente de estratégias familiares mais gerais correspondentes
às várias fases do ciclo de desenvolvimento.
Existe, contudo, uma importante diferença. Quaisquer que
sejam suas limitações, o conceito de ciclo de desenvolvimento foi
formulado de forma clara desde o início e foi razoavelmente
utilizado.6 Todavia, apesar das repetidas tentativas de se estabelecer
como o núcleo de um novo paradigma de pesquisa, a noção de
estratégia parece ser ambígua e indefinida. É legítimo perguntar se
estamos lidando aqui com um conceito bem desenvolvido ou
apenas com um termo da moda e bastante equivocado. Uma certa
quantidade de polissemia pode naturalmente ser esperada quando
um termo é usado – tal como acontece com a “estratégia” – pelas
mais diferentes ciências sociais, da economia à sociobiologia. No
entanto, mesmo se restringirmos nossa atenção à história da
família e a antropologia social, notamos imediatamente um grau
alarmante de tibieza e confusão.
Nossa impressão é que ainda não estamos numa posição segura
para acrescentar casos empíricos a fim de “articular” este
paradigma. Também não podemos esperar que uma simples
acumulação de casos empíricos vagamente encabeçados sob o
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rótulo de “estratégia” termine por esclarecer o conceito. O que é
necessário é uma reavaliação tanto das potencialidades quanto das
limitações desta noção. Já em 1987 Leslie Page Moch comentava:
“é especialmente útil fazê-lo agora, antes da reificação das
estratégias familiares como conjunto de conceitos a serem
utilizados para explicar todas as situações e comportamentos ou
atrelados a explicações de fenômenos que de outra forma seriam
inexplicáveis”. Neste contexto, é importante refletir sobre as raízes
antropológicas da noção de estratégia familiar tal como
antropólogos e historiadores a tem utilizado – tanto mais quando
se considera que os historiadores da família dificilmente
conseguirão deixar de enfrentar um grande problema que há muito
tem desnorteado antropólogos sociais e culturais, ou seja, se as
estratégias familiares “nada mais são do que uma simples invenção
da imaginação do historiador, em vez de uma chave para o
comportamento”.7 Tendo em conta a tendência atual de aplicar
(por vezes indiscriminadamente) a noção de estratégia familiar a
todos os períodos históricos, um esforço para esclarecer a questão
sobre as relações entre os diferentes graus de controle e a
possibilidade de estratégia consciente parece ser uma tarefa
importante, tanto para a História como para a Antropologia.
Antropólogos Pioneiros: Barth e Bourdieu
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Fredrik Barth introduziu o conceito de estratégia na
antropologia social como parte de seu esforço em substituir a
abordagem estruturalista baseada na teoria de grupos de
descendência unilinear que em razão do individualismo
metodológico ficou conhecido como “transacionalismo”.8 A noção
de ciclo de desenvolvimento, de Meyer Fortes, tinha, ela própria,
sido uma tentativa de alterar a abordagem estruturalista, tornando-
a mais dinâmica. Entretanto, o ataque de Barth, lançado pela
primeira vez por meio de seu brilhante estudo acerca do sistema
político dos Swat Pathans, no Paquistão, foi mais radical.9
Seguindo o exemplo de Raymond Firth, Barth argumentou que,
particularmente, no estudo da mudança social, era essencial mudar
o foco de investigação a partir da análise do conjunto de relações
jurídicas obtidas entre diferentes grupos de parentesco – os
clássicos estudos sobre os grupos de descendência unilinear (“as
linhagens”) da África Subsaariana – para o estudo das ações
planejadas, das decisões e das escolhas individuais.10
Embora ele tenha admitido que fatores estruturais definem e
restringem as alternativas enfrentadas por cada ator, ainda assim
ele considerou preferível analisar a organização social em vez da
estrutura social – organização social enquanto o resultado
cumulativo de uma infinidade de escolhas individuais. Para ter
certeza, tanto em seu livro de 1959 sobre Pathans Swat, quanto em
seu Models of Social Organization, que foi publicado sete anos depois,
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a palavra-chave não era “estratégia”. A ênfase estava antes na
“troca” ou, mais ainda, na “transação”, que Barth define como
“uma sequência de interações sistematicamente governadas pela
reciprocidade” 11. No entanto, o que ele tinha em mente era uma
estratégica ou uma teoria-dos-jogos dos modos de interação. 12 Na
verdade, Barth declarou com bastante vigor, e explicitamente, que
as transações devem ser analisadas “por meio de um modelo
estratégico, como um jogo de estratégias”.13
O modelo criado por Barth tem o mérito de ser o pioneiro na
análise do comportamento calculista, na busca de uma abordagem
gerativa e por ser tributário de um movimento que superou outros
modelos que sociólogos e antropólogos haviam apresentado até
aquele momento. Há, em particular, óbvias semelhanças com a
abordagem que Pierre Bourdieu defendeu em dois trabalhos
publicados em 1972 – “Esboço de uma teoria da prática”, onde ele
se baseou principalmente na etnografia que realizou junto aos
Cabilas da Argélia, e o célebre artigo sobre as estratégias de
casamento entre os camponeses do Béarn, na região dos Pirineus
franceses, publicado na edição especial dos Annales dedicado à
história da família.14 Há também algumas diferenças significativas.
A primeira diferença está em que o modelo de Barth, ao focar
nas estratégias que os atores “individuais” perseguem, considera as
instituições sociais como sendo fundadas e mantidas por
indivíduos interessados em satisfazer seus fins conscientemente
elaborados, independentemente das instituições.15 O trabalho de
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Bourdieu, por outro lado, foca nas estratégias que as famílias ou
grupos de parentes perseguem “coletivamente”. Esta é,
particularmente, a impressão que tenho do artigo publicado nos
Annales ESC, onde Bourdieu discute longamente os dispositivos
que os camponeses do Béarn usam para impedir que a propriedade
da família seja dividida. Há poucos vestígios desta característica
entre os agressivos empresários e ambiciosos políticos aldeãos que
foram os protagonistas das análises de Barth e dos antropólogos
transacionalistas.
Os quadros analíticos de Barth e de Bourdieu também são
significativamente diferentes, pois Bourdieu não considera que as
estratégias familiares surgem de tomadas de decisão racional. A
este respeito ele chegou a afirmar que as estratégias podem ser
mais inconscientes do que conscientes.16 Com isto ele procura
demonstrar que as estratégias estão enraizadas em – ou, como ele
diz, “são geradas por” – um número reduzido de princípios
implícitos, “um sistema de predisposições inculcadas pelas
circunstâncias materiais da vida e pela herança familiar”.17 A noção
de estratégia, em sua opinião, muitas das vezes varia de acordo
com as circunstâncias, e depende da mudança no conjunto de
restrições. O que o levava a acreditar que ela era tipicamente um
assunto de curto prazo; e é indiscutível (apesar de algumas
ambiguidades características do texto de Bourdieu) que se a
estratégia não é racional, certamente é intencional18. No Béarn, os
princípios implícitos incluem não somente o imperativo categórico
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de que a propriedade não podia ser dividida, mas também outros
princípios inquestionáveis, auto-evidentes ou óbvios, como o
primado do homem sobre a mulher, e a preferência pelos irmãos
mais velhos em detrimento dos mais novos. Com isso Bourdieu dá
a entender que por causa da “criação” familiar, os pais esperavam
que os irmãos mais moços aceitassem naturalmente o fato de que
os irmãos mais velhos tinham preferência em herdar a terra, assim
como deveriam estar preparados para serem solteiros, a fim de não
ameaçar a integridade da propriedade. Bourdieu leva a pensar que
o que era bom para a família também era bom para todos os seus
membros.
A diferença definitiva e, sem dúvida, mais importante entre
Barth e Bourdieu era de que eles estavam reagindo contra
variedades bastante distintas, e de fato mutuamente hostis, de
estruturalismos existentes na antropologia. Se por um lado Barth
questionava o modelo britânico geralmente associado aos nomes
de Radcliffe-Brown, Evans-Pritchard e Meyer Fortes, Bourdieu,
por sua vez, dirigia suas críticas principalmente contra Lévi-Strauss
e seus discípulos franceses19. É fácil perder este ponto se lermos
somente o artigo publicado no Annales ESC, onde Bourdieu
destaca principalmente as limitações de uma abordagem jurídica no
estudo das práticas de herança em sociedades camponesas. Se, por
outro lado, nos voltamos para o seu “Esboço de uma teoria da
prática”, no entanto, torna-se evidente que ele considerava a
abordagem sobre a estratégia um antídoto muito satisfatório diante
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do triunfo da teoria estruturalista na qual Claude Lévi-Strauss foi o
pioneiro. Bourdieu era particularmente um grande crítico dos
estruturalistas afirmando que eles reduziam o estudo do casamento
à análise sobre as regras que supostamente governavam as relações
de parentesco e de alianças. Baseando-se em seus dados
etnográficos sobre os Cabila, Bourdieu proporcionou uma
impressionante variedade de exemplos que mostram que os
casamentos considerados genealogicamente equivalentes – e que
um antropólogo estruturalista iria interpretar imediatamente como
sendo uma regra estrutural –, poderiam “ser de fato diferentes, e
até mesmo opostos, em seus significados e funções, dependendo
das estratégias nas quais eles estavam envolvidos”20. Para Bourdieu,
a regra e a estrutura por um lado, e a prática e a estratégia por
outro, eram conceitos antitéticos e inconciliáveis.
Dada a difusão de seu trabalho, é importante enfatizar que
Bourdieu foca seus estudos em estratégias “matrimoniais” e não
em estratégias “familiares”. Ele se interessava principalmente em
entender se e como as estratégias matrimoniais afetavam os
casamentos de todos os filhos de uma linhagem. Além disso, sua
noção de estratégias matrimoniais ganhou forma quando ele
realizou trabalho de campo junto a sociedades que lhe forneciam
evidências de que as escolhas matrimoniais da geração mais jovem
eram estratégias impostas pela geração mais velha. Bourdieu
provava, assim, que as “estratégias matrimoniais” realmente
existiam conforme evidenciavam os Cabila do Norte da África,
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onde elas eram um pouco mais agressivas, e a sociedade
camponesa do Béarn, onde elas parecem ter tomado um aspecto
mais defensivo21.
O que exatamente Bourdieu entende por estratégias
matrimoniais nestas duas sociedades?
Evidências coletadas por ele parecem sugerir que em ambas as
sociedades, uma geração mais velha, ou os chefes de família,
pensam e agem de tal maneira que a maioria das pessoas, usando
uma definição de senso comum sobre a estratégia, reconhecem
nela um fenômeno natural, própria daquele grupo. Eles procuram
desde muito cedo parceiros que possuam várias características
desejáveis. No caso da região do Béarn, os chefes de família (e
talvez outros membros também) procuram reproduzir uma
situação familiar em que um herdeiro (ou herdeiros) e seu cônjuge
residam na mesma “casa”, enquanto cumprem suas
responsabilidades de distribuir os bens familiares entre os irmãos
não-herdeiros de forma equitativa e fornecendo solteiros não-
herdeiros, que devem permanecer junto dos pais. As estratégias
matrimoniais nestas duas sociedades parecem ter envolvido uma
consciência generalizada das metas fundamentais de manter ou
expandir a riqueza da linhagem ou casa, bem como certas táticas
familiares que os parentes mais velhos habitualmente utilizam no
mercado de casamentos local para fazer valer suas estratégias.
Os tipos de estratégias que Bourdieu encontrou tanto no Norte
da África quanto nos Pirinéus da França eram, naturalmente, tão
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familiares ao que os historiadores sociais escreviam sobre as
famílias da nobreza ou realeza europeia, que se tornou evidente
que os mais velhos – parentes ou patriarcas da família – não só
faziam valer suas estratégias de casamento, como também
interferiam na própria escolha das profissões de suas filhas e filhos.
Tais estrategistas aparentemente tentavam equilibrar os recursos
financeiros disponíveis do grupo e o número de irmãos de acordo
com ordem de nascimento de cada criança, suas aptidões e
conveniências. Assim, os parentes (ou patriarcas), tentavam ajustar
destinos individuais em algum plano mais amplo ou em estratégias
que atendessem os interesses de sua família nuclear ou linhagem.22
Assim, apesar das declarações de Bourdieu sobre o aspecto
subconsciente das estratégias, sua obra empírica sugere que as
estratégias matrimoniais que ele testemunhou foram bastante
conscientes, manifestando-se por meio de inúmeras decisões
táticas ao longo do tempo e durante o sucessivo casamento dos
filhos. Conforme salientou um comentarista a respeito das
“estratégias familiares”, todas as estratégias requerem “táticas”
específicas – neste caso escolhas sob medida para cada indivíduo,
enquanto forma de controlar as necessidades do grupo conforme o
fabricante das estratégias as concebe.23 Isto sugere algumas
implicações metodológicas importantes. Somos capazes de
observar as estratégias ao longo do tempo, adotando uma
perspectiva “longitudinal”. Historiadores sociais ou antropólogos
podem necessitar manter todos os membros das famílias ou
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linhagens em observação por pelo menos uma geração ou mais
para observar as múltiplas decisões que brotam de estratégias em
ação. Além disso, como Bourdieu, eles devem ter o cuidado de
considerar os matrimônios ou outras estratégias dentro do
contexto do habitus das pessoas que estão estudando – o que
Bourdieu define como a “estratégia geracional que permite aos
agentes lidar com situações imprevisíveis e em constante
mutação”.24
Estratégias Familiares na História Social
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Originalmente publicado em 1972, o artigo de Bourdieu sobre
os camponeses do Béarn foi traduzido para o inglês em 1976 e
publicado em uma seleção de artigos sobre família nos Annlaes
ESC editado por Robert Foster e Orest Ranum.25 Isso explica em
grande parte o seu impacto sobre os historiadores da família, que
foi muito além das fronteiras da França. No entanto, na década de
1970, o conceito de estratégia já tinha surgido de forma totalmente
independente na história da família. Um importante exemplo foi o
artigo de Natalie Zemon Davis publicado na série especial da
revista Daedalus sobre família, onde propõe caracterizar o início da
família moderna em termos de estratégias.26 Segundo ela, as
estratégias familiares podem variar. Algumas famílias
[...] querem apenas passar o patrimônio da família o mais intacto quanto possível às próximas gerações que vão herdar tanto a casa como o nome na linhagem. Outros desejam aumentar esse patrimônio, outros querem criar um patrimônio caso ele ainda não exista.
No entanto, em todos os casos, o historiador pode detectar
algum planejamento – possivelmente um planejamento de longo
prazo – “para uma futura família durante e para além do tempo de
vida dos pais”.27
Embora as observações de Davis apresentem óbvias
semelhanças com a maioria das outras discussões sobre o conceito
de estratégia familiar, ela apresentou uma série de pontos críticos.
O primeiro foi a ênfase no fato de que não é natural ou inevitável
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que as famílias sigam essas estratégias, universais como podem
parecer à primeira vista.28 As estratégias familiares, Davis
argumenta, só se tornaram possíveis ou concebíveis na Europa
ocidental apenas em uma dada etapa de sua evolução histórica,
nomeadamente entre os séculos XVI e XVII, quando, em seu
julgamento, o interesse pela família nuclear tornou-se mais bem
demarcado do que em relação ao grupo de parentesco mais
amplo.29 Para Davis, portanto, não se pode falar de estratégias
familiares na Idade Média. Além disso, uma vez que apenas as
famílias mais ricas poderiam adotar estratégias, há pouco espaço,
em seu argumento, para o conceito de “estratégia de
sobrevivência”.30 Logo, a noção de estratégia pode ser bem
limitada. Davis esteve inclinada a considerar a estratégia menos
como um conceito analítico do que um atributo histórico das
famílias a partir do século XVI – um sintoma da mudança de
mentalidade sobre a família e as relações de parentesco.
Apesar de sua ênfase nas estratégias familiares, o artigo de
Davis não foi um manifesto teórico e metodológico que buscasse
defender uma abordagem estratégica para a história da família.
Para encontrar tal manifesto é preciso retornar ao artigo de Louise
Tilly, de 1979, sobre as “Vidas individuais e estratégias familiares
no proletariado francês”.31 Como o próprio título do artigo sugere,
a noção de estratégia familiar de Tilly é mais ampla do que o usado
por Davis. E o mais importante: Tilly viu a estratégia como um
conceito de valor analítico exclusivo para se examinar “as relações
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entre a vida individual e o comportamento coletivo”,
reintroduzindo a “intencionalidade e a incerteza na história, sem
abandonar a análise sistemática”. Seguindo Bourdieu, ela define o
conceito de estratégia familiar como “uma série de hipóteses sobre
„princípios implícitos‟ [...] menos rígido ou articulado que as regras
jurídicas, pela qual a família, não o indivíduo ou a sociedade como
um todo, atua como unidade de decisão sobre o que fazer”.32 O
uso que Tilly faz do conceito de estratégia se deve, obviamente, ao
que era preconizado por Bourdieu. No entanto, ao empregar o
adjetivo “familiar”, Tilly ampliou e democratizou
consideravelmente o termo, mudando seu foco do papel
desempenhado pelo matrimônio na perpetuação das linhagens para
a sobrevivência dos pobres, isto é, das famílias operárias no
decorrer do processo de industrialização e proletarização.33 Além
disso, a mudança que realizou no emprego do modelo que analisa
um conjunto muito restrito de perguntas acerca do controle sobre
as escolhas matrimoniais ou a transmissão da propriedade ao longo
de sucessivas gerações para uma noção mais geral de “estratégias
familiares”, ao mesmo tempo atraente para muitos, também
evidenciou algumas das ambigüidades em relação ao que Bourdieu
tinha elaborado.
No trabalho de Bourdieu sobre as estratégias matrimoniais,
independentemente das suas ambigüidades noutros domínios,
ficou claro que os mais velhos eram os sujeitos e as escolhas
matrimoniais de uma geração mais jovem, os objetos dessas
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estratégias. Os escritos de Bourdieu nunca foram ambíguos a
respeito de quem eram os principais estrategistas. Por outro lado,
em Tilly o uso da noção de estratégia familiar muitas vezes era
obscuro, pois ela não define se “a família”, enquanto um grupo
coletivo, é objeto, sujeito ou objeto e sujeito da estratégia. Tilly
escreve: “famílias são concebidas como agindo de forma unitária
para tomar decisões”, mas admite que não há realmente nenhuma
maneira de determinar se isso é verdade.34 Como observado
anteriormente, o próprio trabalho de Bourdieu sugeriu que ele
pensou muito pouco sobre a questão do processo de tomada de
decisão nas famílias, aparentemente aceitando o tipo de ficção que
era conveniente ao interesse do grupo, o que Tilly posteriormente
aborda em seu trabalho.35
Em um de seus enunciados teóricos, Tilly busca resolver o
problema, sugerindo explicitamente que os historiadores utilizem
as estratégias familiares de duas maneiras – ou assumindo que as
estratégias realmente existem na mente e nas ações dos atores
históricos, ou que as estratégias existem apenas nas suas cabeças.36
Em seu trabalho empírico, ao utilizar o conceito, ela parece
acreditar que os membros da família estavam “conscientemente”
buscando estratégias compartilhadas e os indivíduos que compõem
essas famílias as aceitavam. Há, no entanto, poucas evidências
diretas de famílias da classe trabalhadora (em contraste com as
cartas ou diários da nobreza europeia) que documentem a
existência de tais estratégias. Assim, o seu trabalho parece ter
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inferido as estratégias principalmente a partir do comportamento.
Ao defender duas abordagens completamente diferentes no uso da
estratégia familiar em suas afirmações mais teóricas sobre o
assunto, o trabalho empírico de Tilly é incerto ao determinar se as
estratégias familiares que ela abordou realmente existiam na mente
daqueles que estudou e que apresentavam tal comportamento, ou
se resultou de um modelo que ela inventou apenas para ajudar a
explicar certos padrões de comportamento que ela tinha notado.
O problema em determinar se as pessoas estavam conscientes
das estratégias que realizavam é, em muitos aspectos, uma variante
do problema de “entrar na cabeça dos nativos”, o que tem sido o
cerne do programa da antropologia cognitiva desde os anos 1960.
Na antropologia, há uma ampla divisão entre os que pensam que
se deve dar primazia ao ponto de vista dos nativos, e aqueles que
sustentam que a tarefa da antropologia é ir além da percepção e
explicação dos atores para trazer à luz as regularidades, tendências
e conexões estruturais as quais os nativos não estão plenamente
conscientes. Os defensores das duas posições já alimentaram por
cerca de trinta anos um debate longo e, por vezes, tenso
(geralmente conhecido no jargão antropológico como antinomia
“êmico” vs “ético”).37 A impressão que temos é que em
antropologia a preferência que um pesquisador atribui a qualquer
abordagem resulta essencialmente de uma escolha epistemológica.
Na história, por outro lado, há razões para suspeitar que a adoção
de um ponto de vista “analítico” é, mais frequentemente, uma
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questão de conveniência. Este nem sempre é o caso, é claro. O
historiador econômico Valerie Oppenheimer, por exemplo,
expressou sua convicção de que um estudo proveitoso sobre as
estratégias familiares deve repousar na avaliação do observador
sobre a eficácia dos padrões de comportamento, sem implicar que
os indivíduos envolvidos percebam isto como estratégia.38 Em
outros casos, os historiadores estão cientes de que um padrão de
resultados comportamentais pode ou não refletir o planejamento
consciente. No entanto, eles preferem ignorar a dificuldade (e
inferir a existência de um comportamento estratégico e os
objetivos a partir desses resultados), simplesmente porque estão
impedidos de falar com as pessoas envolvidas e, portanto, não têm
outra alternativa.39
Estes temas de consciência e consenso em torno das estratégias
familiares também foram de vital importância na obra de Tamara
Hareven sobre a história da família na América do Norte. Aqui, a
autora foi bem além dos limites da escolha matrimonial ou da
sobrevivência familiar – ambos baseados no domínio de uma
geração mais velha – para avaliar o comportamento estratégico dos
parentes de todas as idades e as relações de uns com os outros. Em
contraste com Tilly, que acreditava que os filhos adultos, muitas
vezes escapavam as regras das estratégias familiares, uma vez que
deixavam a casa dos pais, Hareven viu as vidas dos indivíduos
encaixarem essas estratégias bem além deste ponto.40 Não se
tratava mais de um caso onde os pais da classe trabalhadora
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impunham táticas que eles adotavam pensando na próxima
geração, mas de um grupo de parentes afinados com regras
multigeracionais de conduta na busca de uma solidariedade familiar
estendida. Hareven argumenta que os trabalhadores adultos,
tomavam uma série de decisões sobre emigração, emprego e
sobrevivência no novo ambiente, levando em consideração o bem
do grupo de parentesco mais amplo. No trabalho de Hareven,
tanto as estratégias familiares como as individuais, estavam
associadas aos percursos migratórios. Na migração entre Quebec e
Manchester ou New Hampshire, tios e tias levavam sobrinhas e
sobrinhos para suas casas. Em alguns casos, os indivíduos estavam
dispostos a sacrificar seus próprios interesses pelos de outros
membros da família, atrasando ou rejeitando o casamento para si
próprios, a fim de cuidar dos irmãos mais novos ou dos pais
idosos. Eles faziam isso em nome da família. Hareven escreve:
O senso de dever para com a família era uma manifestação da cultura familiar – um conjunto de valores que implicou não só um compromisso com o bem-estar e a auto-suficiência ou a sobrevivência da família, mas que teve prioridade sobre as necessidades individuais e a felicidade pessoal. A preservação da autonomia da família foi avaliada como um objetivo mais importante do que a realização individual.41
Além disso,
[...] [t]anto as escolhas profissionais quanto as decisões econômicas foram feitas no seio da
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família. Famílias podem ser descritas como sendo composto de unidades que foram comutadas em torno de cada necessidade que surgia. Cada uma das unidades era invocada e utilizada quando necessário. Seguindo essas estratégias, as famílias organizavam o movimento dos membros em resposta tanto as agendas individuais quanto as condições externas. As estratégias familiares giravam, assim, em torno de uma série de decisões: quando migrar, quando retornar, quando aqueles que foram deixados para trás deveriam se juntar à família em Manchester, quem deve ser encorajados a explorar outras oportunidades de trabalho, quem deve ser encorajado a se casar, e quem deve ser pressionado a ficar em casa.42
A voz passiva na passagem acima citada, e o sentido da família
como um ator coletivo, sugerem algumas das dificuldades teóricas
com a utilização da categoria estratégia famíliar. Na melhor das
hipóteses, Hareven utiliza a estratégia familiar neste texto como
uma forma abreviada de resumir uma série de decisões,
renunciando, assim, uma microanálise de cada uma das decisões.
Usar a noção de estratégia familiar é mais conveniente do que
responder as perguntas sobre cada ato da migração e determinar
quem são os tomadores de decisão. Infelizmente, no entanto, o
uso do substantivo coletivo pode começar a borrar ou mesmo
remover o sentido de agência humana que a noção de estratégia
originalmente buscava revelar. Aqui, não são indivíduos, mas sim
estratégias sem corpo que correm o risco de ocupar o centro do
palco.
É claro que o ponto principal da discussão empreendida por
Tilly e Hareven, além de outros apontados por historiadores
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sociais que tentaram resolver o problema, está em que, para
compreender o comportamento dos indivíduos de forma
adequada, precisamos saber como os indivíduos são constrangidos
por fatores e variáveis externas a eles – incluindo percepções sobre
o bem-estar de seus parentes. Além disso, Hareven quis mostrar
que as pessoas se conformam a algumas das estratégias mais
complexas da família alargada não somente por ocasião do cálculo
instrumental – como Michael Anderson demonstrou em seu
trabalho sobre os Preston -, mas por nutrir em relação a ela um
sentimento de lealdade, afeto ou preocupação.43
Curiosamente, a obra de Hareven expõe os conflitos que muitas
vezes irrompem entre os desejos dos indivíduos e os ditames das
estratégias familiares. Muito mais do que Bourdieu, historiadores
como Tilly e Hareven apresentaram insights sobre as limitações
das estratégias de parentesco, família ou agregado familiar sobre o
comportamento individual. Como sugerido anteriormente, a
hipótese de Tilly era de que quando os filhos adultos saíam da casa
dos pais, sua migração diminuía a influência que as estratégias do
grupo tinham sobre o seu comportamento. Mesmo Hareven deu
inúmeros exemplos de pessoas que chegaram a um ponto em que
deixaram de lado as necessidades de seus parentes e estavam
determinados a concentrarem-se em si próprios.44 Embora haja
uma tendência reificante da noção de estratégias familiares, isso
demonstra, que esses historiadores sociais usam uma variedade de
material, que permitem que as vozes das pessoas sejam ouvidas, e
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as tensões em torno des estratégias possam ser expostas para o
leitor. É verdade, no entanto, que nem Tilly nem Hareven se
interessaram, ou, em alguns casos, foram incapazes de identificar
exatamente quem era responsável pelas múltiplas decisões sobre
coisas como trabalho e migração que diferentes indivíduos fizeram
ao longo do tempo.45
Estratégias ou Estruturas? A Herança de Lévi-Strauss
A formulação de Tilly parecia fazer a ponte entre a tradição
antropológica representada por Bourdieu e essa nova linha de
pesquisa em história econômica e social, podendo se esperar daí
uma mesma linha de entendimento entre as várias correntes dos
estudos históricos e antropológicos sobre a família. Isso, porém,
não aconteceu. Em particular, durante o uso do termo estratégia de
longa duração, alguns dos trabalhos antropológicos mais
sofisticados sobre parentesco e casamento sofreram a influência de
Lévi-Strauss, e se deslocaram em uma direção que era o oposto do
que Bourdieu tinha previsto. De especial relevância a este respeito
foram os estudos de Pierre Lamaison na área francesa de
Gévaudan, no qual usou evidências históricas para explorar
algumas questões espinhosas levantadas por Lévi-Strauss em seu
famoso livro sobre as estruturas elementares do parentesco, e as
46 • Revista Estudos Amazônicos
teorias mais avançadas de seu sucessor em Paris, Françoise
Héritier.46
Como é sabido, Lévi-Strauss só lidava com os sistemas de
parentesco caracterizados por regras “positivas” de “prescrição” de
casamento com algumas categorias de parentes – sistemas que ele
havia denominado com o termo “estruturas elementares de
parentesco”. Ele deixou para as futuras gerações de antropólogos
o estudo das chamadas estruturas “complexas”, ou seja, sistemas
em que o casamento só é limitado por regras “negativas” que
proíbem o casamento com algumas categorias de parentes. Na
Europa Ocidental, tanto do passado quanto do presente,
observamos vários exemplos de sistemas “complexos” de
casamento, onde é proibido o casamento dentro de um número
limitado de graus de consanguinidade e afinidade. Lévi-Strauss
previu que onde não existiam regras positivas, o leque de
alternativas possíveis seria tão grande que o casamento só poderia
ser estudado por meio de modelos estatísticos que levariam em
conta a demografia, a classe social, a ocupação, e a mobilidade
espacial e social. Ambos, Lamaison e Héritier, procuraram
demonstrar que, mesmo em sistemas “complexos”, o papel da
afinidade era maior do que o esperado por Lévi-Strauss e que as
regularidades nas trocas matrimoniais poderiam ser detectadas e
representadas por modelos que intimamente se assemelhavam
àqueles que Levi-Strauss tinha usado na análise das estruturas
elementares.
Revista Estudos Amazônicos • 47
À primeira vista, a imagem que Lamaison apresenta em um
artigo muito interessante e original, publicado em 1979, Les
Stratégies matrimoniales dans un système complexe de Parenté, lembra em
muitos aspectos o estudo de Bourdieu sobre os camponeses do
Béarn.47 Embora a primazia dos homens sobre as mulheres e dos
irmãos mais velhos sobre os mais novos tenha sido aqui menos
relevante, o imperativo categórico de manter a casa e o patrimônio
intactos foi praticamente o mesmo, resultando na formação do que
Lamaison denominou “linhagens patrimoniais”. Mas Lamaison
também sugeriu, numa linha muito Lévi-Straussiana, que o
funcionamento de todo o sistema dependia de um fluxo de trocas
de cônjuges e de propriedades (sob a forma de dotes), as quais
eram ligadas entre si por várias linhagens. A descoberta mais
intrigante foi a de que havia “ciclos de troca”, na qual os dotes
fluíam através de várias linhagens, mas no final voltavam para as
linhagens originais. A representação esquemática simplificada de
um desses ciclos é dada na Figura 1, que mostra que a troca
poderia estender-se por várias gerações assemelhando-se ao que
Lévi-Strauss chamou, em sua análise das estruturas elementares, de
“troca generalizada”. Como o próprio Lamaison reconheceu, este
ciclo de troca (que começou em 1680 e se encerrou apenas em
1823) era um caso extremo. Mas o mecanismo envolvido, afirmou,
era o mesmo que os encontrados em ciclos mais curtos. Desde que
se percebeu que a direção e a frequência dessas trocas não eram
aleatórias, parecia aconselhável falar de estratégias “cujo objetivo –
48 • Revista Estudos Amazônicos
talvez não de todo consciente – [era] estabelecer redes de relações
e solidariedades, mas também permitir a ocorrência de uma prática
efetiva e contínua de reciprocidade através da transferência de
dotes”.48
Figura 1: “Ciclo de troca” (adaptado de Pierre Lamaison, “Les stratégies matrimoniales dans un système complexe de parenté”, p. 735).
O conceito de “ciclo de troca” de Lamaison pode ser
confundido com o conceito de bouclage, ou o de closure of descent
chains, que Héritier propôs49, mas eles são na verdade bem
Revista Estudos Amazônicos • 49
diferentes. O conceito de “closure of descent chains” repousa
sobre a previsão de Héritier de que nas sociedades “tradicionais”
com sistemas complexos de casamentos (portanto, não se refere às
sociedades urbanas do século XX), preferencialmente, tem lugar
casamentos entre parentes cuja posição genealógica encontra-se
imediatamente fora do núcleo de graus proibidos. Como evidência
transcultural Héritier sugeriu que a proibição era recorrente em
outros lugares se estendendo até o quarto grau (que pode ser
constatado através dos regulamentos cristãos no Ocidente), onde a
frequência de casamentos do tipo representado na Figura 2 (ou
permutações do mesmo) permite constatar que se poderia esperar
algo muito maior, caso todas as uniões fossem realizadas ao
acaso.50
50 • Revista Estudos Amazônicos
Figura 2: “Closure of descent chains” (adaptado de Fraçoise Héritier, L‟exercice de la parenté, p. 153).
Embora as evidências na Europa ocidental sejam bastante
conflitantes51, caso admitirmos que Héritier esteja certo, então
deve haver uma explicação para esse padrão “preferencial”. Tal
como acontece com os “ciclos” de Lamaison, parece lógico
explicá-lo como produto de estratégias. Mas isso é permitido? É
um ponto básico na teoria das trocas que em algum momento do
tempo deve ocorrer a retribuição, tendo sido convincentemente
argumentado que a espera é um componente crucial do
comportamento estratégico humano.52 No entanto, para
interpretar um casamento (e a transferência do dote) como o
resultado consciente de uma estratégia de longo prazo que
Revista Estudos Amazônicos • 51
começou entre 100 e 150 anos antes, deve-se estender essa noção
para além dos limites de plausibilidade. E, de fato, nem Lamaison
nem Héritier a reivindicaram como tal. Pelo contrário, estes
autores entendem a adoção destas estratégias não a partir dos
indivíduos ou das famílias, mas através do “sistema como um
todo” – como arranjos estruturais essenciais para o funcionamento
do sistema.53
Ecoando o que Lévi-Strauss disse certa vez acerca do estudo
estruturalista do mito, podemos dizer que o objetivo desses
antropólogos não era tanto mostrar como (e por que) as pessoas
perseguem as estratégias, mas sim mostrar como as estratégias são
operadas sem que as pessoas estejam conscientes da mesma.54
Como o próprio Héritier reconheceu, isso levanta a questão de
saber se “se deve atribuir um valor sociológico sobre as estruturas
que são descobertas por métodos sofisticados de análise, mas que
não seriam imediatamente reconhecidas como suas próprias
estratégias por parte da população que as praticam”.55 Enquanto
Héritier rejeitou esta questão como sendo, em última análise, algo
sem importância, outros eminentes antropólogos não concordaram
com ele. Em uma discussão bastante crítica a respeito do livro de
Héritier, Emmanuel Terray denunciou o perigo de tratar a
sociedade “como um indivíduo perspicaz e inteligente, capaz de
decidir seus objetivos e desenvolver os meios para alcançá-los”; e
Segalen, também com uma veia crítica, alegou que seria mais
proveitoso e legítimo se concentrar no que ela chamou de alianças
52 • Revista Estudos Amazônicos
“horizontais”, “que operam de forma consciente uma vez que
envolvem menos gerações”. 56 Em seu livro sobre a vida das
famílias na Bretanha, Segalen destacou que as alianças do tipo
analisado por Héritier estavam longe de constituir uma forma de
casamento preferencial, e sustentou que a hipótese a ser testada era
“a de um comportamento consciente, uma preferência para o
casamento com parentes conhecidos”.57
No entanto, a teoria de Héritier teve um impacto considerável
sobre o trabalho de historiadores da família na França e em outros
lugares. De fato, alguns estudos parecem apoiar suas afirmações,
incluindo a análise de Raul Merzario sobre a nupcialidade em
algumas regiões acidentadas ou montanhosas da diocese italiana de
Como, e o trabalho de Delille sobre a família e a propriedade no
Reino de Nápoles.58 Ambos os livros são particularmente
relevantes não só porque explicitam o objetivo de testar as
hipóteses de Héritier, mas também porque revelam de forma mais
clara a ambiguidade da posição que os defensores desta abordagem
possuem.
Por um lado, Merzario considera as regularidades que ele trouxe
à tona em sua investigação como evidências de “estratégias
coletivas”, as quais ele via como a soma das estratégias que as
famílias individuais perseguiam. Para Merzario, o estudo dessas
estratégias coletivas (as quais os atores desconheciam) exigiam os
“sofisticados métodos de análise” que Héritier havia mencionado.
Para ele, o problema fundamental era “identificar uma relação
Revista Estudos Amazônicos • 53
matemática que [lhe] permitisse decifrar a lógica da troca
matrimonial”.59 Por outro lado, o trabalho de Merzario trata
amplamente dos casamentos que pareciam ser o resultado de
cálculos a curto prazo, de táticas. Ele ressaltou, em particular, a alta
frequência de casamentos entre parentes próximos, aparentemente
impostos pela sua pobreza e a necessidade de dispensa por parte
das autoridades eclesiásticas.60 Mas até mesmo os casamentos entre
primos de quarto grau (que em determinados períodos eram tão
numerosos que parece justificável considerá-los como uma forma
de casamento preferencial) houve preocupações bastante
imediatas. Os dados qualitativos de Merzario indicaram que as
pessoas envolvidas nestes matrimônios os viam como uma boa
maneira de reforçar laços de amizade, boa vizinhança e cooperação
econômica entre as famílias que compartilharam um ancestral
comum, mas que, por outro lado, estavam na iminência de não
reconhecer o parceiro como parente.
Isto sugere que as estratégias de curto prazo – que nós
preferimos chamar táticas – e não as estratégias de longo prazo
podem ter determinado o fim dos “ciclos de troca” de longo
prazo. Não podemos considerá-los como estratégias de longo
prazo, já que os últimos casamentos que asseguram o fim das
closure of descent chains certamente não foram planejadas pelos
antepassados dos casais recém-casados. Tendo em vista as muitas
restrições sociais, econômicas, demográficas e espaciais que
afetaram o mercado matrimonial nas diversas comunidades, não é
54 • Revista Estudos Amazônicos
de estranhar que os casamentos tendam a exibir algumas
regularidades. Seria útil se os métodos fossem concebidos a fim de
formalizar essas regularidades com elegância e economia. No
entanto, ao usar o termo “estratégia” para descrever essas
regularidades e seus efeitos sociais e econômicos, tais como a
circulação de bens ou o aumento de solidariedade, se confunde a
questão e introduz-se um elemento teleológico infeliz.
O Modelo de Bourdieu Revisitado
Embora um número significativo de historiadores e
antropólogos tenha abandonado o tipo de análise empreendido
por Bourdieu, é indiscutível que a sua noção de estratégia familiar
tem desfrutado de enorme difusão entre os estudiosos do
campesinato europeu.61 Como o autor de um dos melhores
estudos sobre Bourdieu observou, muitos acolheram a noção de
estratégia, pois “isso forneceu um meio de ligação e mediação
entre os dois níveis de „escolha‟, o „individual‟ e o „estrutural‟, sem
que com isso se colocasse ênfase excessiva num ou noutro”.62 No
Revista Estudos Amazônicos • 55
entanto, além de reagir aos estímulos teóricos de Bourdieu, tanto
os antropólogos quanto historiadores com espírito de
antropólogos também tendem a adotar o “conjunto” de
pressupostos acerca da natureza da família camponesa que
Bourdieu havia estudado em sua etnografia sobre os camponeses
do Béarn. Uma vez que pode representar um perigo a aplicação de
um conceito de estratégia desenvolvido originalmente para
camponeses que vivem em uma área montanhosa da Europa no
início do século XX para outros lugares e outras épocas, é útil
analisar, ainda que brevemente, alguns problemas presentes no
modelo de Bourdieu, que ainda não receberam a atenção que
merecem.
Uma importante questão, muitas vezes negligenciada, é o grau
de compatibilidade entre as várias estratégias que uma família pode
criar a fim de alcançar um determinado objetivo. Um bom
exemplo é a ênfase dada por Bourdieu à relevância do ideal de
“manter o nome da família na propriedade” – um ideal que
sintetiza bem a imagem da sociedade camponesa europeia,
caracterizada por uma forte associação entre uma família e uma
casa ancestral com sua propriedade correspondente. O primeiro
requisito era manter o nome da família na propriedade e fazer com
que a terra não fosse vendida a estranhos ou mesmo dividida entre
os membros da família. O segundo requisito é que a “continuidade
biológica da linhagem”, para usar a frase do próprio Bourdieu,
56 • Revista Estudos Amazônicos
deve ser assegurada.63 Mas seriam esses dois requisitos facilmente
compatíveis?
De acordo com Bourdieu, as razões pelas quais as terras da
família não devem ser subdivididas em parte resultam de uma
questão de apego afetivo e, em parte, devido uma questão de
prestígio, onde a divisão da terra poderia diminuir a posição social
da família. Mas é interessante notar que particularmente os alunos
do campesinato europeu que foram trabalhar ou estudar nas
cidades (incluindo o próprio Bourdieu) consideram a
indivisibilidade como uma espécie de solução ideal para os
problemas enfrentados pelos camponeses em áreas marginais, ou
seja, a necessidade de evitar a fragmentação da terra, a fim para
preservar propriedades economicamente viáveis.64 Deste ponto de
vista, indivisibilidade seria o que os antropólogos ecológicos
chamam de uma “estratégia adaptativa”.65 Existem, portanto, tanto
razões ideológicas quanto ecológicas que favorecem a
indivisibilidade. Em um sistema em que o casamento depende de
uma capacidade de herdar, no entanto, a indivisibilidade muitas
vezes resulta em um celibato generalizado – condição que o
próprio Bourdieu descreveu para o Béarn em outro artigo bem
conhecido. 66 Isto, por sua vez, implica um elevado risco de
extinção da linhagem, especialmente quando o casamento não é só
pouco frequente, mas também tardio, como era o caso do Béarn.67
Como consequência, as estratégias moldados pelo objetivo de
Revista Estudos Amazônicos • 57
manter o patrimônio indiviso tendem simultaneamente a pôr em
risco a continuidade biológica da linhagem.
De fato, uma das principais limitações do modelo de Bourdieu
é que ele assume que as estratégias familiares camponeses são
essencialmente destinadas a conter o perigo resultante de um
“excedente” de potenciais herdeiros, que era visto como óbvio e
representando uma ameaça para a integridade das terras da família.
Uma análise demográfica mais sofisticada teria trazido à tona o
problema levantado pela “escassez” de herdeiros, mostrando que
em cada população imaginável, algumas famílias eram obrigadas a
ter poucos herdeiros e outros muitos, e que as proporções
mudaram com a mudança das condições demográficas. Na
verdade, pode-se argumentar que é precisamente o elevado risco
de extinção da família ou da linhagem que torna a abordagem
estratégica mais frutífera analiticamente, pois direciona a atenção
para o que Jack Goody chamou de “estratégias dos herdeiros”, ou
seja, para os dispositivos legais ou institucionais que as famílias –
ou os chefes de família – usam para lidar com a escassez de
herdeiros. 68 Os procedimentos de modelagem que Goody e outros
pioneiros no assunto usam para estimar a probabilidade dos pais
não terem herdeiros entre seus filhos e a taxa de extinção
patrilinear, são um complemento indispensável à abordagem
estratégica de Bourdieu, uma vez que deslocando a análise para o
estudo do comportamento num quadro demográfico sólido é que
se pode decidir se o comportamento observado resultou de
58 • Revista Estudos Amazônicos
escolhas entre alternativas ou foi ditada pelos constrangimentos
demográficos.69
Outra debilidade apresentada pelos estudos antropológicos
acerca das sociedades camponesas europeias que aderiram à visão
de Bourdieu sobre a estratégia família está na tendência a
considerar as “estratégias dos camponeses” no isolamento de uma
série de restrições cruciais, como se famílias camponesas
estivessem com suas mãos completamente livres para, utilizando
os filhos como peças e as terras como tabuleiro, realizar um jogo
de mini-max com o meio ambiente. No entanto, mesmo um rápido
levantamento das obras que tratam do funcionamento dos padrões
de herança na Europa nos surpreende quando descobrimos que a
integridade da terra não era bem o objetivo do campesinato, como
se costuma supor, mas antes o objetivo dos detentores do poder
dominante. Para ter certeza, alguns estudos – especialmente sobre
os camponeses da Áustria – demonstram que em algumas
circunstâncias os objetivos de ambas as partes até poderiam
convergir, e que os senhores feudais podiam encontrar aliados
entre os membros das famílias camponesas.70 Mais
frequentemente, no entanto, as “estratégias de manutenção” dos
proprietários perseguiam fortemente as “estratégias de ascensão”
das famílias camponesas – um ponto que os estudos de famílias de
escravos na Rússia e em outras partes da Europa Oriental
deixaram bem claro.71
Revista Estudos Amazônicos • 59
Já demonstramos que o modelo de Bourdieu prevê estratégias
principalmente “defensivas” cujo objetivo é transmitir a terra o
mais intacta quanto possível para a próxima geração, manter um
dos irmãos do herdeiro celibatário, ou encontrar uma maneira de
“reparar” uma linhagem à beira da extinção. Para isso, bastaria
simplesmente que o chefe da família camponesa contornasse as
regras legais e lidasse com restrições demográficas e ambientais.
Pouca atenção, no entanto, é dada ao fato de que ele tinha também
de interagir com outros atores humanos – sejam eles os
proprietários de terras, como nos exemplos citados, ou talvez
outros chefes de família que, como Davis observou, também
queriam aumentar o “seu” patrimônio ou criar um se ele ainda não
existisse. Estas últimas estratégias que podemos chamar de
“agressivas”, obviamente, ocupam o quadro mais complexo, e
dependem da análise dos historiadores e antropólogos mais hábeis.
É possível que alguns tipos de estruturas sociais estimulem um
tipo de estratégia mais que o outro. No entanto, ambas as
estratégias “defensivas” e “agressivas” podem facilmente coexistir
no mesmo sistema, e na maioria dos casos, os ganhos de uma
família são obrigados a implicar, direta ou indiretamente, prejuízos
para outros. Além disso, as estratégias defensivas destinadas a
garantir a integridade de um patrimônio podem ter sido o
trampolim para um comportamento ulterior mais consumista,
quando as circunstâncias econômicas ou demográficas gerais,
talvez em uma fase mais favorável no desenvolvimento da própria
60 • Revista Estudos Amazônicos
família, tornou possível comprar algumas terras ou tomar posse de
uma fazenda maior.72
É relevante notar, a este respeito, que as estratégias familiares
que Bourdieu analisou foram baseadas na ausência de um mercado
fundiário. Ele retratou um sistema social onde o ideal dominante,
para a qual todas as estratégias deveriam ser submetidas, era a de
que a família deve possuir a mesma casa e a mesma terra por
gerações. O chefe da família era visto não como o proprietário das
terras da família, mas sim como seu gerente temporário a serviço
da linhagem. Sua tarefa era assegurar que o patrimônio fosse
transmitido intacto. Como Alan Macfarlane havia comentado, “um
movimentado mercado fundiário não colocaria por terra tais ideais,
mas é logicamente incompatível com elas”.73 Um movimentado
mercado fundiário, entretanto, dificilmente é incompatível com o
que chamamos de estratégias “agressivas”. Seu próprio estudo
sobre o parentesco, a herança e a venda de imóveis em
Neckarhausen, e uma revisão crítica da literatura sobre o mercado
imobiliário da Europa, levaram David Sabean a concluir que o
mercado não era um mecanismo independente capaz de dissolver
as relações familiares, como sugerido por alguns historiadores
(incluindo Macfarlane), “mas p[oderia] ser um instrumento de
estratégias familiares em competição uns com os outros”.74
Esta é uma mudança importante, tanto no foco de investigação
quanto na orientação teórica dos analistas. No entanto, não deixa
de ter problemas. A maneira mais fácil de reconstruir as estratégias
Revista Estudos Amazônicos • 61
em um contexto de mercado fundiário é concentrar-se nas
chamadas famílias “bem-sucedidas”, que, embora sejam uma
minoria, é provável que tenham sobrevivido por longos períodos
deixando rastros de si nos arquivos notariais por causa de sua
maior atividade no mercado fundiário. Esta abordagem pode
oferecer informações úteis, mas fatalmente produz uma imagem
distorcida ou muito incompleta. Como Richard Smith indicou em
sua introdução à Land, Kinship and Life-Cycle, a fim de entender
corretamente o funcionamento de um mercado fundiário e isolar o
elemento verdadeiramente estratégico nele, é essencial que
desenvolvamos modelos flexíveis que englobem muitas variáveis e
restrições diferentes: o quadro institucional, as várias fontes de
renda familiar, os efeitos da “loteria demográfica” e as
consequências das mudanças econômicas e demográficas de longo
prazo.75
Um importante passo – e de especial relevância tendo em vista
as questões discutidas neste trabalho – foi a contribuição de Ian
Blanchard à Land, Kinship and Life-Cycle, onde ele analisou a
estrutura do mercado fundiário em uma série de municípios de
Derbyshire entre 1380 e 1520.76 Ele se concentrou, principalmente,
nas relações entre dois grupos (ou, talvez, categorias) de famílias
aparentemente perseguindo diferentes, mas muitas vezes
complementares, estratégias no mercado fundiário: por um lado,
aqueles que obtiveram seu sustento exclusivamente da agricultura,
que diziam estar perseguindo estratégias defensivas visando a
62 • Revista Estudos Amazônicos
preservação da integridade da exploração familiar; e por outro
lado, as famílias que combinavam atividades industriais e agrícolas,
as quais seguiam estratégias agressivas usando o dinheiro que
ganhavam com seu trabalho industrial para fazer o que Blanchard
chamou de “incursões predatórias” no mercado fundiário. Apesar
de tão diferente em seu caráter, os dois grupos e as táticas que eles
implantaram estavam ligados por uma espécie de relação
simbiótica. As famílias “industriais” tiveram de operar em um
mercado onde a oferta era determinada pela disponibilidade de
terras temporariamente alienadas pelas famílias de “agricultores”,
que em certas fases do seu ciclo de desenvolvimento tinham que
abandonar o excesso de terras, a fim de eliminar os desequilíbrios
de curto prazo entre a terra e o trabalho. As famílias de
“agricultores”, por sua vez, tinham que confiar na demanda por
terras originárias de famílias industriais. De acordo com Blanchard,
no entanto, as famílias de “agricultores” retinham os “direitos de
reversão” pelo qual eles poderiam retomar a posse da terra que
tinham sido alienadas quando estas eram supérfluas para as suas
necessidades. Isso, segundo ele, explica por que, apesar da
transmissão da terra passar por três ou quatro mãos não familiares,
havia uma acentuada tendência para que estes lotes, finalmente,
fossem revertidos para a posse da família original ou patrilinear.
O estudo de Blanchard teve o mérito de reunir e organizar
inúmeras variáveis importantes de uma forma extraordinariamente
elegante e imaginativa. Além disso, era antropologicamente
Revista Estudos Amazônicos • 63
atraente porque fornecia a chave para dar sentido a alguns dos
aspectos mais intrigantes do modelo de ciclos de troca de
Lamaison. No entanto, tal como no caso do modelo de Lamaison,
a questão da intencionalidade permanecia aberta. Antes que
possamos aceitar com confiança afirmação de Blanchard de que a
terra tendia a voltar para as famílias que a tinham estrategicamente
descartado por um tempo, é necessário demonstrar com mais rigor
como isso aconteceu não somente por acaso, mas de propósito.77
Isto leva a uma questão de considerável importância para
historiadores e antropólogos, a saber, a questão de estabelecer, por
assim dizer, “como se dão as estratégias estratégicas”. Do lado
antropológico, vale a pena notar que um dos textos que abriram o
caminho para a abordagem estratégica em antropologia, de
Raymond Firth, salienta-se a necessidade de se concentrar com
mais vigor na análise da ação planejada, sublinhando ainda que
uma variedade de restrições podem impor limites à uma gama de
alternativas possíveis e que o arco no qual aparentemente a livre
escolha é exercida muitas vezes é muito pequeno. 78 Em outro
artigo muito influente, a historiadora econômica Claudia Goldin
analisou basicamente o mesmo ponto. Em tempos passados, ela
observou a capacidade do cidadão comum de planejar e tomar
decisões estratégicas era duramente limitada por restrições
econômicas, sociais e institucionais, mas as famílias, em algum
momento, passaram a controlar mais o presente e o futuro de suas
64 • Revista Estudos Amazônicos
vidas e, eventualmente, eram capazes de planejar estratégias de
longo prazo para seus membros.79
Em que momento da história ocidental as estratégias de longo
prazo tornaram-se viáveis e possíveis é uma questão a ser debatida,
e é bem possível que mais de uma resposta seja econtrada,
dependendo do tipo de estratégia envolvida. Goldin considera que
as estratégias de aluguel do trabalho doméstico se tornaram a
norma em algum momento no século XIX. Estratégias
envolvendo o acúmulo patrimonial, por outro lado, poderiam ter
se tornado muito comuns numa fase bem anterior, como Davis e
outros argumentaram. Permanece a dúvida, no entanto, se os
historiadores da classe operária europeia podem empregar a noção
de estratégia quando se referem a padrões de fertilidade, como
Tilly o fez em sua pesquisa sobre as famílias da classe trabalhadora,
quando demonstra que os pais em diferentes ambientes industriais
não só organizavam suas atividades como também o trabalho
infantil e o doméstico permitindo-o ou não, assim como
desenvolviam estratégias de alta fertilidade.80
Identificando Estratégias Conscientes no Passado
Pelo que sabemos sobre fecundidade no passado, a noção de
estratégia de alta fertilidade parece mal empregada, pelo menos se
aceitarmos que todas as estratégias envolvem algum nível de
Revista Estudos Amazônicos • 65
intencionalidade. A evidência disponível sugere que até o final do
século XIX, na maioria das regiões da Europa (no final do século
XVIII, em se tratando da França), a grande maioria dos casais da
classe trabalhadora não submetiam seus comportamentos de
fertilidade ao controle estratégico.81 Um comportamento acerca
das gestações, quando identificado em alguns contextos e
indicando a presença de estratégias conscientes de fertilidade, é
notoriamente difícil de documentar. É verdade que a fertilidade
dos trabalhadores permaneceu elevada por muito tempo após os
membros das classes médias e superiores da Europa começarem a
limitá-la. No entanto, a persistência da alta fertilidade e do fato dos
casais colocarem seus filhos para trabalhar não é suficiente – na
ausência de evidências mais diretas – para apoiar a noção de uma
estratégia de fertilidade. Certamente, pelo que sabemos sobre as
dificuldades de implementação de práticas contraceptivas no final
do século XIX, podemos aceitar a ideia de que os homens da
classe trabalhadora consideravam a alta fertilidade um objetivo
estratégico desejável. No entanto, dado o desejo expresso das
mulheres em limitar o número de suas gestações, parece difícil de
aceitar, sem evidências diretas, que as mulheres da classe
trabalhadora participavam voluntariamente das estratégias de alta
fertilidade, cuja racionalidade reside na disponibilidade de renda
obtida com o trabalho assalariado dos filhos.82 Tal como Lamaison
ou Delille, Tilly parece inferir as estratégias a partir de modelos
isolados.
66 • Revista Estudos Amazônicos
Ainda que o aparecimento dos estudos sobre o controle da
fertilidade consciente dentro do casamento, tanto na Europa
ocidental quanto nos Estados Unidos, sugiram que forças
econômicas mudaram e ajudaram a precipitar a documentação
acerca da estratégia consciente na fertilidade conjugal, uma questão
permanece.83 Se houve no passado um momento que os casais não
pensavam e agiam estrategicamente em relação à sua fertilidade, de
onde surgiram as estratégias intencionais? Aqui, um outro conceito
de Bourdieu parece bastante útil, pois permite considerar que o
comportamento mais humano – ainda que racional – não é
resultado de estratégias conscientes, mas do habitus – o que ele
entende como um conglomerado de respostas familiares e um
comportamento habitual. Como podemos partir do habitus ao
comportamento estratégico consciente, para entender a passagem
de uma fertilidade descontrolada para uma fertilidade controlada
durante a transição demográfica?
É possível que estratégias inovadoras de fato tenham existido
nas mentes dos atores históricos levando a reformulação da
racionalidade adaptativa, as quais muitas vezes fazem parte de um
costume ou de um comportamento habitual, entretanto, elas estão
longe de ser um comportamento verdadeiramente estratégico. Um
exemplo interessante pode ser encontrado no estudo de Simon
Szreter sobre o declínio da fertilidade britânica, em sua análise do
que ele chamou de uma “cultura da abstinência” – onde a
abstinência sexual dentro do casamento era um comportamento
Revista Estudos Amazônicos • 67
familiar entre os casais que se conformavam com prescrições
religiosas, no que se refere às relações sexuais durante os tempos
sagrados do calendário da igreja, especialmente na Quaresma.84
Aproveitando a discussão de Szreter, parece razoável supor que
este repertório de comportamentos associados à cultura religiosa,
na presença de outros fatores, mais tarde facilitaram a adoção da
abstinência dentro do casamento como parte do interesse
estratégico de controle da fertilidade. Práticas culturais familiares –
reunidas sob a noção de habitus de Bourdieu – pode, portanto,
fornecer a matéria-prima para a invenção e a elaboração de
estratégias individuais e totalmente conscientes.85
O fato de Tilly considerar a escolha consciente nas experiências
dos trabalhadores em suas experiências de alta fertilidade atraiu
menos crítica do que sua discussão sobre a noção de famílias como
“unidades” de tomada de decisão. Críticos da estratégia familiar
observam que o conceito ofusca o potencial conflito de interesses
existentes na família, e implica um consenso onde talvez não haja.
De fato, alguns estudiosos afirmam que este conceito é apenas
“uma forma abreviada de descrever o produto dos diferentes
interesses existentes entre os membros do agregado familiar e sua
capacidade de ver os seus próprios interesses serem aceitos pelos
demais”.86 Críticas feministas sobre a estratégia familiar foram mais
longe e identificaram embates intrafamiliar entre os sexos.87 Outros
recorreram a uma variedade de modelos de “conflito”, onde a
adoção de uma estratégia ou de outra é explicada como o resultado
68 • Revista Estudos Amazônicos
da negociação entre os membros da família com diferentes
interesses e recursos desiguais.88 No entanto, para ser justo, é
importante notar que uma das antropólogas que mais criticam o
modelo de “consenso” em torno da estratégia familiar, Sylvia
Yanagisako, também manifestou sérias reservas quanto à
alternativa do modelo de “conflito” com base nos resultados de
sua pesquisa sobre as estratégias dos coabitantes nipo-americanos.
Ela argumenta que “o modelo de conflito doméstico corre o risco
de ser utilizado para definir que a ação humana é universal e de
que existe um interesse pancultural de obter poder, ao invés de
objetivos e motivações culturalmente construídos”.89 Portanto,
seria imprudente supor que os membros de uma família,
inevitavelmente, têm desejos ou objetivos conflitantes. A questão
do “doutrinamento” dos membros subordinados à família tal
como sugere Bourdieu certamente é um passo importante. E como
a própria Tilly sugeriu, focar sobre os cursos de ação em que
interesses individuais parecem estar subordinados aos interesses
coletivos pode fornecer uma percepção mais nítida sobre os custos
ou benefícios advindos disso.90
Conclusão
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Dadas as dificuldades de se inferir estratégias a partir de dados
padronizados, é possível admitir que as “estratégias familiares”
nada mais são do que um modelo criado por historiadores e
antropólogos para interpretar um comportamento que tem certa
regularidade? Claro que não, dado que algumas pesquisas reuniram
evidências confiáveis de que as estratégias já existiam nas mentes e
nas condutas das pessoas sob investigação. No entanto, também é
claro que estudando grandes números (ou, por vezes, até mesmo
um pequeno número) de eventos, tais como aqueles que são
familiares aos historiadores da família ou demógrafos históricos
inevitavelmente produzem-se padrões de algum tipo. Determinar
se esses padrões resultaram da vontade humana é outra questão.
Sugerimos que o comportamento padronizado, tal como a ordem
de casamento por idade dos irmãos descoberta por Daniel Scott
Smith na Nova Inglaterra colonial (e que começou a se decompor
no final do século XVIII) “pode” ter sido um exemplo das
“estratégias matrimoniais” de Bourdieu, especialmente se
aceitarmos a sua crença de que as estratégias não precisam ser
conscientes.91 Por outro lado, sugere-se que tais padrões podem
muito bem ser o resultado da conformidade com o costume ou
habitus definido por Bourdieu.
A força de nossas observações está em que a noção de
estratégia ou sua transmutação para a ideia de estratégia familiar de
Bourdieu é inútil porque admite a presença de estratégias
inconscientes; pode levar à confusão sobre os objetos e sujeitos
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das estratégias; e, especialmente na ausência de noção de habitus de
Bourdieu, levar os historiadores sociais e antropólogos a ver
estratégias em grupos sociais quando a única evidência consiste em
padrões globais de comportamento. Tentamos demonstrar que,
embora o uso generalizado da noção de estratégia inicialmente
tenha ajudado a impulsionar o sentido da ação humana, mitigando,
assim, a sensação de impotência das pessoas diante de modelos
estruturalistas, seu uso tem muitas vezes exagerado as escolhas que
as pessoas fizeram no passado.
Para atenuar alguns destes problemas, defendemos uma visão
mais cética em relação àqueles que inferem estratégias apenas com
base em evidências diretas ou fortes evidências indiretas no
contexto em estudo. Sugerimos o uso de um vocabulário que
distinga com mais cuidado aqueles que produzem e aqueles que
são afetados por estratégias. Em muitos casos, acreditamos que o
uso de um termo mais modesto como “táticas” captura melhor o
horizonte de curto-prazo e a falta de controle sobre circunstâncias
externas nas quais as pessoas estão submetidas e no qual o termo
estratégia tende a ocultar.92 Acreditamos, também, que a ideia de
Bourdieu de que as estratégias podem ser inconscientes, embora
atraente em alguns aspectos, é em grande parte inútil. A noção de
habitus de Bourdieu parece totalmente adequada para descrever um
conjunto de crenças e práticas que informam e orientam o
comportamento das pessoas abaixo do nível da consciência.
Revista Estudos Amazônicos • 71
Os estudos de como as famílias funcionam seria muito mais
desenvolvido se os estudos abordassem a forma como os
diferentes membros “constroem” a família em suas próprias
mentes e comportamentos. Isso nos permitiria chegar ainda mais
perto do estado “êmico” dos grupos, tão importante para muitos
antropólogos sociais e culturais. Como demonstrou o trabalho de
historiadores como Christiane Klapisch-Zuber acerca dos registros
escritos sobre o Renascimento italiano, a maneira com que
diferentes atores históricos construíram “a família” a fim de
atender seus interesses de ação merece investigação mais crítica,
utilizando os tipos de textos qualitativos que evidenciem a
expressão de tais pensamentos.93
Depois de ter passado uma boa parte do espaço criticando
alguns dos problemas do legado de Bourdieu para os historiadores
e antropólogos, temos que admitir que Bourdieu dedicou alguma
atenção a essa ideia, e ao fazê-lo indicou o caminho para desfazer a
tendência em reificar a família como um ator coletivo – um dos
desafortunados subprodutos do uso que se fez do conceito de
“estratégias familiares”'. Em “Razão Prática”, Bourdieu citou com
aprovação o trabalho de etno-metodólogos que enfatizam que a
“família”, longe de ter lugar meramente na natureza das coisas, é
“construída socialmente”. Em seu “discurso da família”, escreveu
ele, “na linguagem que a família usa sobre a família, a unidade
doméstica é concebida como um agente ativo, dotado de vontade,
capaz de pensamento, sentimento e ação”. No entanto, o trabalho
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de construção da “família” envolve indivíduos que têm uma
multiplicidade de interesses e agendas. Os caminhos que eles
trilham ao construir suas próprias visões sobre família têm
importantes consequências na vida cotidiana. Assim, para
Bourdieu, a família é uma “conveniência” ou uma “ficção bem
fundamentada”.94 A família aponta para um importante “campo”
de ação; ela é reconhecida coletivamente; e aponta para um
conjunto real e contínuo de relações. Obtendo um maior
conhecimento sobre as formas que os indivíduos – classificados
por idade, gênero, classe, ou mesmo sensibilidade individual –
“constroem” estas diferentes famílias através de suas visões de
mundo e suas ações podemos muito bem reconstruir os objetivos
dos grupos que as compõem com mais precisão.
Artigo recebido em agosto de 2013 Aprovado em setembro de 2013
NOTAS * Historiador e antropólogo italiano especializado no estudo do campesinato alpino. Atualmente é professor de antropologia social no Departamento de Estudos Culturais, Sociais e Políticas da Universidade de Turim, Itália, na qual se graduou em 1975 com a tese Problemas religiosos y culturales del mundo tardo antiguo entre la historia y la etnología. Seus estudos se voltam para história social, demográfica e ambiental europeia, com especial referência à dinâmica
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populacional nos Alpes e em outras zonas montanhosas, bem como ao estudo de padrões de casamento e formas familiares no sul da Europa. Sua pesquisa atual aborda o papel do parentesco e da família como as agências de bem-estar social na Europa, histórica e contemporânea, os aspectos antropológicos das transições demográficas e as mudanças sócio-demográficas nas duas margens do Mediterrâneo.
** Historiadora e atual Diretora do Programa de Graduação da Universidade de Harvard. Ocupa-se dos estudos em história da família, estudos históricos sobre população e da história da caridade e do bem-estar das instituições no passado europeu. Seus últimos trabalhos discutem o papel da família na sociedade na transição entre a Idade Média e o período industrial. Usando evidências de cidades europeias, explora a forma como homens e mulheres criaram associações voluntárias fora da família – comunidades, como ela define – para complementar ou mesmo substituir solidariedades baseadas no parentesco. Sua mais recente pesquisa concentra-se no desenvolvimento de instituições de socorro aos pobres franceses na primeira metade do século XIX, particularmente em comparação com a Lei dos Pobres na Inglaterra do mesmo período. Também é professora visitante da Universidade de Paris - IV (Sorbonne) e Directeur d’Études na Ecole des Hautes Etudes en Sciences Sociales, em Paris.
*** Museu Paraense Emílio Goeldi. 1 Ver DAVIS, John. “Social Anthropology and the Consumption of History”, Theory and Society, 9 (1980), pp. 519-537. Ver também KERTZER, David I. “Anthropology and Family History”, Journal of Family History, 9 (1984), pp. 201-216; KELLOGG, Susan. “Histories for Anthropology: Ten Years of Historical Research and Writing by Anthropologists, 1980-1990”, Social Science History, 15 (1991), pp. 417-455; e VIAZZO, Pier Paolo. Introduzione all’antropologia storica. Rome: GLF editori Laterza, 2000, pp. 132-164. 2 Ver FORTES, Meyer. “Time and Social Structure: An Ashanti Case Study”, in idem (ed.), Social Structure: Studies Presented to A.R. Radcliffe-Brown. Oxford: Clarendon Press, 1949; in idem, Time and Social Structure and Other Essays. London: The Athlone Press, 1970, pp. 1-32; e idem, “Introduction” to Jack Goody (ed.), The Developmental Cycle in Domestic Groups. Cambridge: The Cambridge University Press, 1958, pp. 1-14. 3 Ver as contribuições de Jack Goody e Eugene Hammel presents em LASLETT, Peter e WALL, Richard (eds). Household and Family in Past Time. Cambridge: The Cambridge University Press, 1972; e BERKNER, Lutz K. “The Stem Family and the Developmental Cycle of the Peasant Household”, American Historical Review, 77 (1972), pp. 398-418. 4 Ver, por exemplo, CZAP, Peter, “A Large Family, the Peasant‟s Greatest Wealth: Serf Households in Mishino, Russia, 1814-1858”, in WALL, Richard; ROBIN, Jean, e LASLETT, Peter (eds), Family Forms in Historic Europe (Cambridge: The Cambridge University Press, 1983, pp. 105-151, esp. 135-141.
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5 BOURDELAIS, Patrice e GOURDON, Vincent. “L‟histoire de la famille dans les revues françaises (1960-1995): la prégnance de l‟anthropologie”, Annales de Démographie Historique, 37, 2 (2000), pp. 5-48, 30. 6 Para uma visão geral e discussão crítica da literatura, ver FERRANTE, Lucia. “Struttura o strategia? Discussione sulla storia della famiglia”, Quaderni Storici, 19 (1984), pp. 612-626. Ver também as contribuições de MOCH, Leslie Page; FOLBRE, Nancy; SMITH, Daniel Scott; CORNELL, Laurel L., e TILLY, Louise A. ao SSHA sobre “Family Strategy”, publicada no Historical Methods, 20 (1987), pp. 113-125; STRAW, Pat e KENDRICK, Stephen. “The Subtlety of Strategies: Towards an Understanding of theMeaning of Family Life Stories”, Life Stories/Récits de Vie, 4 (1988), pp. 36-48; MOEN, Phyllis e WETHINGTON, Elaine. “The Concept of Family Adaptive Stategies”, Annual Review of Sociology, 18 (1992), pp. 233-251; BAUD, Michel e ENGELEN, Theo. “Introduction: Structure or Strategy? Essays on Family Demography, and Labor from the Dutch N.W. Posthumus Institute”, The History of the Family, 2 (1997), pp. 347-354; e FONTAINE, Laurence e SCHLUMBOHM, Jürgen. “Household Strategies for Survival: An Introduction”, in FONTAINE, Laurence e SCHLUMBOHM, Jürgen (eds). Household Strategies for Survival, 1600-2000. Cambridge: The Cambridge University Press, 2000, pp. 1-17. 7 MOCH, Leslie Page. “Historians and Family Strategies”, Historical Methods, 20 (1987), pp. 113-115, 114. 8 Para uma descrição reveladora e autoritária acerca da abordagem estruturalista em Antropologia Social Britânica e da teoria de grupos de descendência unilinear, consulte FORTES, Meyer, Kinship and the Social Order. Chicago: Aldine, 1969. Leia também DUMONT, Louis. Introduction à deux théories d’anthropologie sociale. Paris: Mouton, 1971. Sobre o “transacionalismo” como uma reação à crise da teoria do grupo de descendência unilinear, consulte BOISSEVAIN, Jeremy. Friends of Friends: Networks, Manipulators and Coalitions. Oxford: Basil Blackwell, 1974, pp. 1-23. [N.T.] Para uma bibliografia em português acerca do assunto ver ORTNER, Sherry. “Teoria na antropologia desde os anos 60”, Mana 17 (2), 2011, pp. 419-466. 9 BARTH, Fredrik. Political Leadership among Swat Pathans. London: Athlone Press, 1959). 10 Ver especialmente a obra de FIRTH, Raymond. Elements of Social Organization. London: Watts, 1951; Barth reconhece seu débito para com Firth em Political Leadership, p.3. 11 BARTH, Fredrik. Models of Social Organization. London: Royal Anthropological Institute, 1966, p. 4. 12 Para uma discussão das estratégias ou da teoria dos jogos aplicadas aos modos de interação, consulte ELSTER, Jon. Ulysses and the Sirens: Studies in Rationality and Irrationality. Cambridge: Cambridge University Press, 1979, pp. 18-28. 13 Barth, Models of Social Organization, p. 4. Ver também idem. “Segmentary Opposition and the Theory of Games: A Study of Pathan Organization”, Journal of the Royal Anthropological Institute, 89 (1959), pp. 5-21.
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14 BOURDIEU, Pierre. Esquisse d’une théorie de la pratique. Trois études d’ethnologie kabyle. Geneva: Droz, 1972, uma versão revisada do que foi publicado em Inglês com o título Outline of a Theory of Practice. Cambridge: Cambridge University Press, 1977; e idem. “Les stratégies matrimoniales dans le système de reproduction”, Annales ESC, 27 (1972), pp. 1105-1127. 15 Esta versão da teoria do contrato social é central nas diversas variedades de individualismo metodológico. Ver, por exemplo, LUKES, Steven. “Methodological Individualism Reconsidered", British Journal of Sociology, 19 (1968), pp. 119-129. 16 Bourdieu, “Stratégies matrimoniales”, p. 1107. 17 Ibid., p. 1106: “le système des dispositions inculqués par les conditions d‟existence et par l‟éducation familiale”; e ainda: p. 1114: “tudo se passa como se todas as estratégias fossem engendradas a partir de um pequeno número de princípios implícitos”. A literatura antropológica do início dos anos 1970 considerou de extrema importância distinguir o conceito de “implícito” como algo bastante diferente do conceito de “inconsciente”. Para mais detalhes ver SPERBER, Dan, Le symbolisme en general. Paris: Hermann, 1974; e DOUGLAS, Mary. Implicit Meanings. London: Routledge and Kegan Paul, 1975. 18 Sobre intencionalidade como elemento crucial para a definição de uma estratégia, leia Elster, Ulysses and the Sirens, pp. 1-34. 19 Sobre as diferenças entre as duas vertentes de estruturalismo, tanto o do tipo britânico quanto o francês, ver Dumont, Introduction à deux theóries. 20 Bourdieu, Outline of a Theory of Practice, p. 48. 21 BOURDIEU, Pierre. In Other Words: Essays towards a Reflexive Sociology (Stanford: Stanford University Press, 1990), p. 59. O autor observa como “familiar” as práticas matrimoniais das famílias do Béarn, dada a sua pesquisa entre os Kabyla. Ele também observa (p. 69) que as memórias da corte de Luís XIV ou os romances de Proust oferecem mais detalhes sobre as estratégias matrimoniais do que os textos antropológicos. Seu trabalho foca nas “negociações” e na “diplomacia” estratégica envolvendo os arranjos matrimoniais, seja entre os membros da nobreza ou entre os camponeses do Béarn. Sobre as “estratégias de casamento” envolvendo parentes noutro contexto camponês, ler SABEAN, David Warren. Property, Production, and Family in Neckarhausen, 1700-1870 (Cambridge: Cambridge University Press 1990), pp. 329-334. 22 Uma recente contribuição a tal linha de raciocínio está em BAKER, Joanne. “Female Monasticism and Family Strategy: The Guises and Saint Pierre de Reims”, Sixteenth-Century Journal, 28 (1997), pp. 1091-1108. 23 Bourdieu, In Other Words, p. 68, observa esta manifestação de uma “estratégia matrimonial” na escolha de parceiros para várias crianças. Em “Stratégies matrimoniales” (p. 1120), ele argumenta a necessidade de ver cada casamento como um "momento em uma série de trocas materiais e simbólicas, onde o capital econômico e simbólico que a família envolve no casamento de um de seus filhos depende em grande parte, da posição que essa troca ocupa na história
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matrimonial da família” [Grifo do autor]. Laurel Cornell distingue competentemente estratégias e táticas em seu artigo “Where can Family Strategies Exist?”, Historical Methods, 20 (1987), pp. 120-123, 120. 24 Pierre Bourdieu, “Structures and the Habitus”, in Outline of a Theory of Practice, p. 72. Agradecemos a Rick Maddox por seus comentários a este respeito. 25 BOURDIEU, Pierre. “Marriage Strategies as Strategies of Social Reproduction”, in FORSTER, Robert e RANUM, Orest (eds). Family and Society: Selections from the “Annales”. Baltimore: Johns Hopkins University Press, 1976, pp. 117-144. 26 DAVIS, Natalie Zemon. “Ghosts, Kin, and Progeny: Some Features of Family Life in Early Modern France”, Daedalus, 106 (1977), pp. 87-114. 27 Idem, p. 87. 28 Idem, p. 88. 29 Idem, pp. 100-105. 30 Idem, pp. 87, 92. Sobre “estratégias de sobrevivência” consultar Fontaine e Schlumbohm, “Household Strategies”, pp. 9-10. 31 TILLY, Louise A. “Individual Lives and Family Strategies in the French Proletariat”, Journal of Family History, 4 (1979), pp. 137-152. 32 Idem, p. 138. 33 Ver também TILLY, Louise A. e SCOTT, Joan W. Women, Work, and Family. New York: Routledge, 1987, p. 7. Neste texto as autoras afirmam que o que eles querem dizer com a estratégia vai além do cálculo consciente. Ela tem “implicações mais amplas que nos permite pensar em como as pessoas tomam decisões em face da evolução de condições econômicas. Particularmente no período examinado, quando o cálculo racional era praticado em todos os níveis da vida social, uma avaliação do comportamento em termos de estratégias não parece fora de lugar.” 34 Tilly, “Individual Lives”, pág. 139. Na conclusão (p. 150), ela observa que os “custos” de várias estratégias, como a estratégia de alta fertilidade (discutido abaixo), pesaram mais fortemente sobre as mulheres e as crianças. 35 Bourdieu, In Other Words, pp. 69-70. Bourdieu inequivocamente nega ser este um problema da “estratégia matrimonial”, mas não consegue resolver o problema de forma substancial. Ele admite a existência de conflitos no interior da família em seu último trabalho, mas não trata de considerá-los como casos "patológicos" e "excepcionais" (“Stratégies matrimoniales”, p. 1117); o jovem, que era uma "vítima estrutural", aceitava os fatos de forma relativamente pacífica (p. 1123). 36 TILLY, Louise A. “Beyond Family Strategies,What?”, HistoricalMethods, 20 (1987), pp. 123-125, 124. 37 Marvin Harris, em seu The Rise of Anthropological Theory (New York: Crowel Crowel, 1968), foi quem começou a polêmica. Harris fornece uma discussão aprofundada dos termos “emico” e “ético”, e ainda reapresenta um importante ponto de referência do debate.
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38 OPPENHEIMER, Valerie Kinkade. “The Changing Nature of Life-Cycle Squeezes”, in FOGEL, Robert W. et al. (eds), Aging: Stability and Change in the Family. New York: Academic Press, 1981, pp. 47-81, especialmente pp. 54-55. Talvez valha a pena notar que Oppenheimer, como os proponentes da abordagem “ética” em antropologia, utiliza o conceito de estratégia “da maneira como os biólogos fazem quando discutem comportamentos biologicamente adaptativos no sentido evolutivo do termo” (p. 55). 39 Ver SMITH, Daniel Scott. “Family Strategy: More than a Metaphor?”, Historical Methods, 20 (1987), pp. 118-119, 118; Straw e Kendrick, “The Subtlety of Strategies”, pp. 39-40; e, mais recentemente, Fontaine e Schlumbohm, “Household Strategies”, p. 8, que observam que [os historiadores] têm de inferir as estratégias dos atores a partir de documentos que apenas refletem os resultados de comportamentos, enquanto que os antropólogos não apenas observam, mas também questionam as pessoas que estudam. 40 Tilly, “Beyond Family Strategies”, pp. 149-150, sugere que as mulheres adultas que vivem longe de suas famílias podem ter feito isso em “consequência da independência da estratégia familiar, do desafio às estratégias da família, ou da aceitação às decisões familiares, que as enviou para fora da casa”. No entanto, nenhuma evidência direta permitiu que ela distinguisse essas possibilidades. 41 HAREVEN, Tamara K. Family Time and Industrial Time: The Relationship Between the Family and Work in a New England Industrial Community. Cambridge: Cambridge University Press, 1982, p. 108. 42 Idem, pp. 109-110. 43 “No passado, a família tomava decisões como unidade coletiva, corporativa, e não como a soma de seus membros individuais”; HAREVEN, Tamara K. “A Complex Relationship: Family Strategies and the Processes of Economic and Social Change”, in FRIEDLAND, Roger e ROBERTSON, A.F. (eds). Beyond the Marketplace: Rethinking Economy and Society. New York: Aldine, 1990, pp. 215-244, 217. Cf. ANDERSON, Michael. Family Structure in Nineteenth-Century Lancashire. Cambridge: Cambridge University Press, 1971. 44 Hareven, Family Time, pp. 109-112. Em seu estudo sobre autobiografias da classe trabalhadora, Mary Jo Maynes observa a amargura que os filhos mais velhos muitas vezes expressavam sobre a dureza de suas vidas trabalhando como crianças dentro de tais famílias. Embora estivesse claro para os filhos mais velhos que seus pais eram vitimas das desigualdades do sistema social, sua percepção (e suas percepções, mesmo quando adultos) incluía o ressentimento real. Ver MAYNES, Mary Jo. Taking the Hard Road: Life Course in French and GermanWorkers’ Autobiographies in the Era of Industrialization. ChapelHill: University of North Carolina Press, 1995), pp. 78-81. 45 Na edição de 1987 de Women, Work, and Family, Tilly e Scott abordaram em sua crítica o conceito de “estratégia familiar”. Na página 9 pode ser consultada uma longa declaração sobre a necessidade de uma melhor análise acerca da tomada de decisão intrafamiliar no âmbito dos estudos sobre a estratégia
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familiar. Agradecemos Baruch Fischoff por seus comentários sobre a importância da dimensão do pensamento estratégico. 46 LÉVI-STRAUSS, Claude. Les structures élémentaires de la parente. Paris: Presses Universitaires de France, 1949). Ver também seu importante artigo sobre “The Future of Kinship Studies”, Proceedings of the Royal Anthropological Institute, (1965), pp. 13-22. 47 LAMAISON, Pierre. “Les stratégies matrimoniales dans un systéme complexe de parenté: Ribennes en Gévaudan (1650-1830)”, Annales ESC, 34 (1979), pp. 721-743. Ver também CLAVERIE, Elisabeth e LAMAISON, Pierre. L’impossible mariage: Violence et parenté en Gévaudan (Paris, 1982), pp. 270-297. 48 Lamaison, “Stratégies matrimoniales”, p. 738. 49 HÉRITIER, Françoise. L’exercice de la parente. Paris: Gallimard-Seuil, 1981. 50 Para identificar os padrões de casamento “preferencial”, Lévi-Strauss sugeriu que o critério de frequência seria significativamente maior do que o normal, se todos os casamentos fossem realizados de forma aleatória. 51 Martine Segalen ressalta que nem o estudo de Lamaison sobre Gévaudan nem seus próprios dados sobre a Bretanha derrubam a alegação de Héritier; SEGALEN, Martine. “Du nouveau à propos de la parenté dans les sociétés paysannes”, Ethnologie Française (n.s.), 14 (1984), pp. 79-85. As teses de Héritier parecem, por outro lado, ser apoiadas por MERZARIO, Raul em Il paese stretto. Strategie matrimoniali nella diocesi di Como, secoli XVI-XVIII. Turin: Einaudi, 1981; e DELILLE, Gérard. Famille et propriété dans le Royaume de Naples, XVe-XIXe siècle. Roma-Paris: École Française de Rome/Éditions de l'EHESS, 1985. 52 Elster, Ulysses and the Sirens, pp. 9-10. Ver também Bourdieu, Outline, p.6. 53 Ver Héritier, L’exercice de la parenté , pp. 160-166, e especiealmente Lamaison, “Stratégies matrimoniales”, p. 722. “Tudo parece ser implementado de modo que, graças as alianças, todo o sistema se perpetue: cada união parece ser o fragmento de uma estratégia global visando a manutenção”. 54 LÉVI-STRAUSS, Claude. Le cru et le cuit. Paris: Plon, 1964, p. 20: “Nós não pretendemos mostrar como os homens pensam os mitos, mas como os mitos pensam os homens, sem que estes tomem conhecimento.” 55 Héritier, L’exercice de la parenté , p. 161. 56 TERRAY, Emmanuel. “Sur l‟exercice de la parenté”, Annales ESC, 41 (1986), pp. 259-270, 269; e Segalen, “Du nouveau”, p. 81. 57 SEGALEN, Martine. Quinze générations de Bas-Bretons: Parenté et société dans le pays bigouden sud 1720-1980. Paris: Presses Universitaires de France, 1985, pp. 381-382. 58 Merzario, Il paese stretto, e Delille, Famille et proprieété. 59 Merzario, Il paese stretto, p.145. 60 Idem, pp. 153-154. 61 Além da linha levistrossiana representada por obras como as de Lamaison, Héritier, Merzario, e Delille, enfoques estratégicos, sobretudo influenciados pelo modelo de Barth também têm sido amplamente adotados.
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62 O‟NEILL, Brian Juan. Social Inequality in a Portuguese Hamlet. Cambridge: Cambridge University Press, 1987, p. 196. 63 Bourdieu, “Stratégies matrimoniales”, p. 1106. 64 Ver, por exemplo, Ibid., p. 1112; COLE, John W. e WOLF, Eric R. The Hidden Frontier: Ecology and Ethnicity in an Alpine Valley. New York: Academic Press, 1974, pp. 174-275; FINE-SOURIAC, Agnès. “La famille-souche pyrénéenne au XIXe siècle”, Annales ESC, 32 (1977), pp. 478-487, 483; Lamaison, “Stratégies matrimoniales”, p. 722; e O‟NEILL, Brian Juan. “Dying and Inheriting in Rural Trás-os-Montes”, Journal of the Anthropological Society of Oxford, 14 (1983), pp. 44-74, 73. Para uma discussão mais geral, ver VIAZZO, Pier Paolo. Upland Communities. Cambridge: Cambridge University Press, 1989, pp. 93-96 e 258-268. 65 RHOADES, Robert E. e THOMPSON, Stephen I. “Adaptive Strategies in Alpine Environments: Beyond Ecological Particularism”, American Ethnologist, 2 (1975), pp. 535-551. Se a indivisibilidade das terras representa uma melhor “estratégia adaptativa” às regiões montanhosas do que a partilha é algo discutível, uma vez que as vantagens adaptativas da indivisibilidade tornam-se evidentes somente se assumirmos – como a maioria dos antropólogos, implícita ou talvez inadvertidamente têm feito – que a população é crescente e os mecanismos de consolidação já não estão disponíveis. Entre os primeiros antropólogos a reconhecer esses pontos estão WIEGANDT, Ellen. “Inheritance and Demography in the Swiss Alps”, Ethnohistory, 24 (1977), pp. 133-148, esp. pp. 139-140, e DOWNING, Theodore E. “Partible Inheritance and Land Fragmentation in Oaxaca Valley”, Human Organization, 36 (1978), pp. 235-243. 66 BOURDIEU, Pierre. “Célibat et condition paysanne”, Etudes Rurales, 5-6 (1962), pp. 32-135. 67 Bourdieu, “Stratégies matrimoniales”, p. 1122. 68 GOODY, Jack e HARRISON, Graham A. “Strategies of Heirship”, Comparative Studies in Society and History, 15 (1973), pp. 3-20, reproduzido no capítulo 7 do livro de GOODY, Jack. Production and Reproduction. Cambridge: Cambridge University Press, 1976. 69 Ver WRIGLEY, Edward Anthony. “Fertility Strategy for the Individual and the Group”, in TILLY, Charles (ed.). Historical Studies of Changing Fertility. Princeton: Princeton University Press, 1978, pp. 135-154, cuja análise é desenvolvida por SMITH, Richard M. em “Some Issues Concerning Families and Their Property in Rural England, 1250-1800”, e idem, Land, Family and Life-Cycle. Cambridge: Cambridge Univesity Press, 1984, pp. 1-86. Sobre a extinção patrilinear, ver WACHTER, Kenneth W. e LASLETT, Peter. “Measuring Patriline Extinction for Modeling Social Mobility in the Past”, além de WACHTER, Kenneth W.; HAMMEL, Eugene A., e LASLETT, Peter. Statistical Studies of Historical Social Structure. New York: Academic Press, 1978, pp. 113-135. * Espécie de jogo semelhante ao xadrez. (N.T.)
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70 Um impresionante estudo sobre o assunto é o de REBEL, Hermann. Peasant Classes: The Bureaucratization of Property and Family Relations under Early Habsburg Absolutism, 1511-1636. Princeton: Princeton University Press, 1983. 71 Ver Czap, “A Large Family”, e especialmente BOHAC, Rodney D. “Peasant Inheritance Strategies in Russia”, Journal of Interdisciplinary History, 16 (1985), pp. 23-42 72 Daniel Bertaux e Isabelle Bertaux-Wiame elaboraram questões metodológicas semelhantes em “Le patrimoine et sa lignée: transmissions et mobilité sociale sur cinque générations”, Life Stories/Récits de Vie, 4 (1988), pp. 8-26. Eles observar que as estratégias familiares não devem ser vistas apenas como formas de lidar com limitações, mas também como respostas a disponibilidade de recursos desejáveis e outros tipos de oportunidades positivas, possivelmente criadas por gerações anteriores da família e condicionando o comportamento das gerações seguintes. 73 MACFARLANE, Alan. The Origins of English Individualism. Oxford: Basil Blackwell, 1978, p. 24. 74 Sabean, Property, Production, and Family, p. 412. Outros estudos sugerem que o mercado fundiário é um cenário favorável para observar as estratégias da família, entre eles está o trabalho de SIDDLE. David, “Inheritance Strategies and Lineage Development in Peasant Society”, Continuity and Change, 1 (1986), pp. 333-361; Levi, Inheriting Power; e vários artigos de Smith, como Land, Kinship and Life-Cycle. 75 Smith, “Some Issues Concerning Families”. 76 BLANCHARD, Ian. “Industrial Employment and the Rural Land Market 1380-1520”, in Smith, Land, Kinship and Life-Cycle, pp. 227-275. 77 Smith, “Some Issues Concerning Families”, p. 60. 78 Firth, Elements of Social Organization, p. 40. 79 GOLDIN, Claudia. “Family Strategies and the Family Economy in a Late Nineteenth-Century American City”, in HERSHBERG, Theodore (ed.). Philadelphia: Work, Space, Family, and Group Experience in the Nineteenth Century. New York: Oxford University Press, 1981, pp. 277-310, 279. 80 Tilly, “Individual Lives”, p. 144. 81 Para uma posição contrária, consulte a discussão presente em SZRETER, Simon. Fertility, Class and Gender in Britain, 1860-1940. Cambridge: Cambridge University Prress, 1996, pp. 488-501, e FRIEDLANDER, Dov; OKUN, Barbara S. e SEGAL, Sharon. “The Demographic Transition Then and Now: Processes, Perspectives, and Analyses”, Journal of Family History, 24 (1999), pp. 493-533, 508-510. 82 SECCOMBE, Wally. “Starting to Stop: Working-Class Fertility Decline in Britain”, Past and Present, 126 (1990), pp. 151-188. 83 HENRY, Louis. Anciennes familles genevoises: Etude Démographique, XVIe-XXe siècle (Paris, 1956); OSTERUD, Nancy e FULTON, John. “Family Limitation and Age at Marrriage: Fertility Decline in Sturbridge, Massachusetts, 1730-1850”, Population Studies, 30 (1976), pp. 48-94; KANTROW, Louise.
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“Philadephia Gentry: Fertility and Family Limitation among an American Aristocracy”, Population Studies, 34 (1980), pp. 21-30; e SMITH, Daniel Scott. “„Early‟ Fertility Decline in America: A Problem in Family History”, Journal of Family History, 12 (1987), pp. 73-84. 84 Szreter, Fertility, Class and Gender, pp. 389-424. 85 Bourdieu sugere a existência de uma série de estratégias de fertilidade entre os camponeses do Béar. Entre estes estavam a elevada idade ao casar, especialmente no final do século XIX. 86 KERTZER, David I. e SCHIAFFINO, Andrea. “Industrialization and Co-residence: A Life-Course Approach”, in BALTES, P.B. e BRIM, O.G. (eds). Life-span Development and Human Behavior. New York: Academic Press, 1983, pp. 360-391, 366. 87 WOLF, Diane L. “Does Father Know Best? A Feminist Critique of Household Strategy Research”, Research in Rural Sociology and Development, 5 (1991), pp. 29-43. 88 Tilly, “Beyond Family Strategies”, p. 125. Tem sido de grande relevância, a este respeito, a ênfase que os estudos feministas tem colocado no debate sobre a questão do gênero. Para mais detalhes ver FOLBRE, Nancy, “Family Strategy, Feminist Strategy”, Historical Methods, 20 (1987), pp. 115-118; e LASLETT, Barbara e BRENNER, Johanna. “Gender and Social Reproduction: Historical Perspectives”, Annual Review of Sociology, 15 (1989), pp. 381-404, esp. 382-386. 89 YANAGISAKO, Sylvia Junko. “Explicating Residence: A Cultural Analysis of Changing Households among Japanese-Americans”, em NETTING, Robert M.; WILK, Richard R. e ARNOULD, Eric J. (eds). Households: Comparative and Historical Studies of the Domestic Groups. Berkeley: University of California Press, 1984), pp. 330-352, 343. Para uma resposta a deteminados elementos da crítica feminista sobre os modelos consensuais de comportamento em torno da negociação familiar no passado, consulte LIU, Tessie P. “Le Patrimoine Magique: Reassessing the Power of Women in Peasant Households in Nineteenth-Century France”, Gender and History, 6 (1994), pp. 13-36. 90 Tilly, “Individual Lives”, p. 138. 91 SMITH, Daniel Scott. “Parental Power and Marriage Patterns: An Analysis of Historical Trends in Hingham, Massachusetts”, Journal of Marriage and the Family, 35 (1973), pp. 406-418, 425. Em sua “Women‟s Marital Timing at the Turn of the Century: Generational and Ethnic Differences”, The Sociological Quarterly, 38 (1997), pp. 567-585, 580, Sharon L. Sassler conclui, sem qualquer evidência direta, que o casamento tardio entre as mulheres judias de segunda geração nos Estados Unidos era parte de uma “estratégia étnico-famíliar”' (grifo dos autores). 92 LYNCH, Katherine. “Infant Mortality, Child Neglect, and Child Abandonment in European History: A Comparative Analysis”, in BENGTSSON, Tommy e SAITO, Osamu (eds). Population and Economy: From Hunger to Modern Economic Growth. Oxford: Oxford University Press, 2000, pp. 133-64, fn. 18.
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93 Ver, principalmente, KLAPISCH-ZUBER, Christiane. “Kin, Friends, and Neighbors: The Urban Territory of a Merchant Family in 1400”, in idem (ed.). Women, Family, and Ritual in Renaissance Italy. Chicago: University of Chicago Press, 1985, pp. 68-93, para uma discussão de como um florentino construiu sua família e o grupo de parentesco para fins narrativos. 94 BOURDIEU, Pierre. Practical Reason: On the Theory of Action. Stanford: Stanford University Press, 1998), pp. 65-66. Para uma afirmação mais radical sobre a construção social do parentesco e das relações de gênero, ver Jane COLLIER, Fishburne e YANAGISAKO, Sylvia Junko, “Toward a Unified Analysis of Gender and Kinship”, in idem (eds), Gender and Kinship: Essays toward a Unified Analysis. Stanford: Stanford University Press, 1987, pp. 14-50.