acumulação por espoliação

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Espoliação

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  • Acumulao por espoliao: uma reflexo... 228

    Revista IDeAS, v. 7, n. especial, pp. 228-259, 2013.

    Interfaces em Desenvolvimento, Agricultura e SociedadeInterfaces em Desenvolvimento, Agricultura e SociedadeInterfaces em Desenvolvimento, Agricultura e SociedadeInterfaces em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade

    Acumulao por espoliao: Uma reflexo sobre a

    sua introduo em Moambique

    Elmer Agostinho Carlos de Matos1

    Rosa Maria Vieira Medeiros2

    Resumo: Resumo: Resumo: Resumo: Nos ltimos tempos a acumulao por espoliao, materializada na expropriao de terras de populaes pobres e na privatizao de bens pblicos, tem caracterizado a atual forma de acumulao do capital. O presente ensaio pretende abordar as implicaes da introduo da acumulao por espoliao em Moambique, a partir do seu carro chefe neoliberalismo. Com base em quatro exemplos selecionados, analisamos como as reformas legais facilitaram o despojamento de milhares de famlias moambicanas dos seus territrios e foradas a construrem uma nova histria e identidade em espaos desprovidos de condies bsicas para a sua sobrevivncia.

    PalavrasPalavrasPalavrasPalavras----chave: chave: chave: chave: acumulao por espoliao, neoliberalismo, Moambique.

    AbstractAbstractAbstractAbstract: In the last times the accumulation by dispossession, materialized in the lands expropriation of poor populations and the privatization of public goods, characterize the actual form of accumulation of the capital. The present article intends to approach the implications of the introduction of the accumulation by dispossession in Mozambique, bringing by neoliberalismo. Starting from four selected examples, we analyzed as the legal reforms facilitated the divestment of thousands of Mozambican families of their territories and forced to build a new history and identity in spaces without basic conditions for his survival.

    Key Key Key Key words: words: words: words: accumulation by dispossession, neoliberalismo, Mozambique.

    1 Doutorando em Geografia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul ([email protected]) 2Prof. Dr. de Geografia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul ([email protected])

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    Revista IDeAS, v. 7, n. especial, pp. 228-259, 2013.

    I.I.I.I. IntroduoIntroduoIntroduoIntroduo

    Nos ltimos tempos, a acumulao por espoliao, materializada na expropriao de terras de populaes pobres e na privatizao de bens pblicos, tem caracterizado a atual forma de acumulao do capital. Para a compreenso da acumulao por espoliao, implica recuarmos no tempo e recorrermos aos escritos de Marx, que descreve a acumulao "primitiva" ou "original", para explicar o surgimento e a consolidao do capitalismo como uma fora motriz de direcionamento da vida econmica, poltica, social e at cultural. Para Marx, a acumulao original era o estgio primitivo do capitalismo e, supunha que essa fase havia terminado e que o capitalismo tinha encontrado formas de acumulao docapital mais eficientes e modernas.

    Porm, Harvey, em seus estudos, veio demonstrar que a forma primitiva de acumulao que parecia ter sucumbido no tempo, havia resistido e adotado novas mscaras, mas desempenhando a mesma funo e com os mesmos objetivos. Os processos que lhe do vida aparentam seguir os mesmos caminhos, claro com alguns ajustamentos nova conjuntura, mas escrevendo, como referira Marx, "com letras indelveis de sangue e de fogo".

    A passagem da acumulao primitiva para outras formas de acumulao do capital, quer seja a acumulao fordista ou flexvel, pareceu apresentar uma localizao geogrfica bem definida, pois esses espaos j haviam experimentado processos primitivos de acumulao e o capitalismo havia se consolidado. Todavia, como nos informa Harvey (2012), o capitalismo vive de crises, que geralmente resultam da sobre acumulao, forando o sistema a encontrar novas formas de solucionar, que segundo o autor, passam pela ordenao espao-temporal e, nesse recurso, a acumulao "primitiva" ou "original" volta a fazer parte das alternativas de soluo.

    Numa dessas formas de solucionar as crises do capitalismo, a ordenao espacial desempenha um papel importante. A ordenao espacial normalmente implica investimento em outros territrios (e/ou espaos), muitas vezes ricos em recursos naturais e onde as lgicas do capitalismo so ainda remotas (normalmente localizados nos pases perifricos). Para que essa opo se processe necessrio que esses espaos estejam abertos s incurses do capitalismo. A no abertura de seus territrios s lgicas de funcionamento do capitalismo, como foram os exemplos de vrios estados nacionalistas da periferia, colocavam em causa o sistema capitalista. Era urgente encontrar uma soluo vivel acumulao do capital e, o neoliberalismo surgiu como uma varinha mgica, capaz de tornar os territrios perifricos

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    obedientes aos estados centrais e, capaz de facilitar o exerccio livre da lgica capitalista. importante referir que a ordenao espacial nem sempre se encontraseparada da temporal, pois as duas podem agir em simultneo, tanto no mesmo espao como em espaos diferentes.

    O presente ensaio pretende abordar as implicaes da introduo da acumulao por espoliao em Moambique, a partir do seu carro chefe neoliberalismo e suas consequncias para as comunidades locais3, que foram obrigadas a perder a sua histria, cultura e identidade. Ao discutirmos a acumulao por espoliao em Moambique, recorreremos a quatro exemplos de despojamento de significativos grupos populacionais dos seus meios de (re)produo e de sua existncia tradicional. Os casos escolhidos foram:a produo de agrocombustveis a base de cana-de-acar em Massingir, provncia de Gaza (sul de Moambique); explorao de carvo mineral de Benga e de Moatize, ambos no distrito de Moatize, provncia de Tete (centro de Moambique); e explorao de areias pesadas em Moma, provncia de Nampula (norte de Moambique) (mapa 1). Todos esses projetos se implantaram no territrio moambicano depois das alteraes legislativas que ocorreram devido introduo de polticas neoliberais e, implicaram em desalojamento de comunidades que dependiam desses territrios para a sua reproduo social, cultural e econmica.

    3Segundo a Lei de Terras de 1997, comunidade local um agrupamento de famlias e indivduos, vivendo numa circunscrio territorial de nvel de localidade ou inferior, que visa a salvaguarda de interesses comuns atravs da proteo de reas habitacionais, reas agrcolas, sejam cultivadas ou em pousio, florestas, stios de importncia scio-cultural, pastagens, fontes de gua e reas de expanso.

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    Mapa 1: Localizao da rea de estudo

    As abordagens defendidas por Harvey (2008, 2012) sustentam as anlises que so efetuadas ao longo do ensaio. Compreendemos a introduo do neoliberalismo, em Moambique, como a locomotiva que permitiu o desembarque de alteraes legais e institucionais necessrias para a introduo da acumulao por espoliao. Para alm de Harvey, recorremos a Marx (1964)e Aroz (2011)para nos auxiliarem a compreender melhor a dinmica da acumulao do capital.Autores como Fernandes (2008) eSilveira (2011)ajudaram-nos a compreender o conceito de territrio utilizado no ensaio. Os estudos realizados pela FIAN (2010) e Selemane (2010), associados a pesquisas feitas em jornais online,permitiram-nos entender melhor os casos escolhidos para as anlises.

    A escolha dos quatro casos analisados neste artigo deveu-se ao fato dos projetos selecionados:

    Ocuparem reas de significativa extenso geogrfica; Demandarem considerveis investimentos estrangeiros, sendo superiores a US$ 450 milhes; Representarem interesse internacional e terem como mercado principal dos seus produtos o exterior (e no Moambique); e Os processos de reassentamento no terem sido pacficos e envolverem descontentamento por parte dos despojados.

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    II.II.II.II. Acumulao por espoliaoAcumulao por espoliaoAcumulao por espoliaoAcumulao por espoliao ---- metodologia de anlise do metodologia de anlise do metodologia de anlise do metodologia de anlise do processo de expropriao de territrios dos nativosprocesso de expropriao de territrios dos nativosprocesso de expropriao de territrios dos nativosprocesso de expropriao de territrios dos nativos

    A acumulao por espoliao uma forma de acumulao do capital, mais ajustada nova realidade, mas que as bases que a sustentam se materializam em prticas que deram origem ao capitalismo e, que Marx (1964) a descreveu como a acumulao "original" ou "primitiva". A sua aplicao, nos tempos atuais, principalmente depois da crise de 1973, consolidou-lhe como uma prtica comum, especialmente em pases da periferia, onde a reproduo expandida do capital se apresentava como uma miragem. claro, como foi ressaltado por Harvey (2012), que esta forma de acumulao de capital no se restringe apenas aos pases da periferia, porm, nelas onde ocorrem as suas manifestaes mais viciosas e desumanas.

    Analisando as formas de superao das crises econmicas que de tempos em tempos tm fustigado o crescimento econmico e dificultado a acumulao do capital, Harvey (2012) conseguiu entender que os pressupostos bases da acumulao "primitiva", que alguns autores colocavam como parte de um processo de acumulao capitalista do passado, se fazem presentes ainda nos tempos atuais. Nesse mbito, o autor argumenta que "como parece estranho qualificar de primitivo ou original um processo em andamento, substituirei a seguir esses termos pelo conceito de 'acumulao por espoliao'" (HARVEY, 2012, p. 120-121). Com recurso a essa nova conceituao, Harvey pretende demonstrar que a acumulao "primitiva" ou "original" ainda faz parte das prticas do capitalismo, mas sob uma nova roupagem.

    Marx (1964) socorreu-se da acumulao "primitiva" para explicar o surgimento e a consolidao do sistema capitalista como uma relao social que alterou completamente as anteriores relaes sociais, pois "o capital uma relao entre pessoas, relao esta que se estabelece por intermdio das coisas" (p.124). Essa relao foi estabelecida a partir da violncia, onde se registrou uma separao radical entre o produtor e os meios de produo. A usurpao dos bens comunais dos camponeses e a expulso das suas terras criaram uma massa considervel de proletariados. As violentas usurpaes, como foram referidas por Marx (1964), eram atos individuais, no cobertos pela legislao do momento e que foram combatidos, mas sem resultados satisfatrios. Esses atos reinaram por um perodo de 150 anos. No sculo XVII foram criadas as condies legais para a implementao dos processos de

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    espoliao, o que no significou um impedimento aos usurpadores de recorrerem a recursos particulares, como os extralegais.

    Marx (1964) refere, ainda, que aps a criao violenta de um proletariado sem condies de subsistncia, seguiu-se implementao de uma disciplina sanguinria que a transformou em classe operria. Esse processo foi legalizado pela legislao e, o Estado se fez ausente na defesa dos assalariados atuando na legitimao da explorao do trabalhador, favorecendo a acumulao do capital.

    Com o passar do tempo, essa forma de acumulao do capital pareceuter ficado na histria. Harvey (2012) argumenta que alguns autores a constataram como uma prtica no mais relevante na atualidade e outros, como o caso de Luxemburgo, como uma forma "exterior" ao capitalismo, pois a consideravam como um sistema fechado. A acumulao expandida apresentava-se como a forma mais adequada aos interesses capitalistas e bem enquadrada ao contexto do momento.

    Apesar de a acumulao expandida tersido a responsvel pela acumulao do capital, Harvey (2012) acrescenta que a acumulao por espoliao sempre esteve presente, mas de uma forma discreta e menos dominante. S a partir da crise de 1973 que a acumulao por espoliao se consolida como a principal responsvel pela acumulao do capital. Essa transio est relacionada com a crnica crise que atravessava a reproduo expandida. Mas tambm, segundo Harvey (2012, p.127), pode "refletir tentativas de empreendedores determinados e Estados desenvolvimentistas no sentido de 'integrar-se ao sistema' e buscar diretamente os benefcios da acumulao do capital".

    As crises em que o sistema capitalista vivia estavam relacionadas com asobreacumulao, que resultam da falta de oportunidades para investimentos lucrativos do excedente de capital (e por vezes acompanhado de excedente de trabalho). A soluo para esse tipo de crise ancorava-se na acumulao por espoliao, visto que esta "faz liberar um conjunto de ativos (incluindo fora de trabalho) a custo muito baixo (e, em alguns casos, zero). O capital sobreacumulado pode apossar-se desses ativos e dar-lhes imediatamente um uso lucrativo" (HARVEY, 2012, p.124).

    Harvey utiliza o conceito de acumulao por espoliao para designar a continuidade e a proliferao de prticas de acumulao que Marx havia denominado de "primitivo" ou "original", durante o processo de formao e consolidao do capitalismo. Para ele, incluem-se:

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    a mercadificao e a privatizao da terra e a expulso violenta de populaes camponesas; a converso de vrias formas de direitos de propriedade (comum, coletiva, do Estado, etc.) em direitos exclusivos de propriedade privada; a supresso dos direitos dos camponeses s terras comuns [partilhadas]; a mercadificao da fora de trabalho e a supresso de formas alternativas (autctones) de produo e consumo; processos coloniais, neocoloniais e imperiais de apropriao de ativos (inclusive de recursos naturais); a monetarizao da troca e a taxao, particularmente da terra; o comrcio de escravos; e a usura, a dvida nacional e em ltima anlise o sistema de crdito como meios radicais de acumulao primitiva (HARVEY, 2012, p. 121)

    Harvey (2008) sustenta que a acumulao por espoliao apresenta quatro principais caractersticas, nomeadamente:

    Privatizao e mercadificao - o objetivo principal desta caracterstica abrir acumulao novos campos at ento considerados fora das contas de obteno da lucratividade. A corporatizao, a mercadificao e a privatizao de ativos pblicos tm sido a sua marca registrada. Os processos que o corporizam consistem em transferir os ativos do domnio pblico e popular para o domnio privado e de privilgio de certa classe; Financializao - caracteriza-se pela forte onda de financializao, marcada por um estilo especulativo e predatrio, com graves consequncias para a populao que, na sua maioria, se tornou escrava creditcia; Administrao e manipulao de crises - as crises econmicas passaram a ser orquestradas, manipuladas e controladas para racionalizar o sistema assim como para a redistribuio de ativos e de riqueza dos pases pobres para os pases ricos; e Redistribuies via Estado - o Estado passa a desempenhar um papel fundamental na reverso de benefcios que anteriormente iam para as classes baixas, agora para a classe alta. Fomenta a privatizao, com prejuzos significativos para as classes baixas, incentiva a entrada de capital privado, oferece uma vasta gama de subsdios e isenes fiscais a pessoa jurdica e, protege o investimento privado, podendo se socorrer do monoplio da violncia para garantir os direitos da pessoa jurdica.

    As caractersticas da acumulao por espoliao apresentadas por Harvey vm transportadas no ombro do neoliberalismo, que

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    passou a ser uma poltica econmica e social difundida como a salvao das crises econmicas que apoquentavam o sistema capitalista, ao mesmo tempo em que se apresentava como a soluo para a melhora da condio de vida para a populao dos pases da periferia. O projeto neoliberal primou, principalmente, pela privatizao de tudo, abrindo oportunidades para investimentos lucrativos, ao mesmo tempo em que permitia que o sistema tomasse conta dos recursos naturais (matria-prima) a preos baratos aumentando, desta forma, os lucros.

    A soluo para as crises do capitalismo, que vinham desde a dcada de 1970, estava encontrada. Porm, era necessrio que os diferentes espaos estivessem abertos entrada da lgica capitalista, neste caso de polticas neoliberais. Harvey (2012) argumenta que no passado, depois da Primeira Guerra Mundial, o principal problema para a incapacidade de solucionar-se o problema da sobreacumulao de 1930 foi a formao de imprios fechados. Nesta altura, encontradas as causas, necessrio ultrapass-la, nem que seja a fora.

    Aroz (2011) analisa que depois da segunda guerra mundial boa parte dos pases do Sul comeou a emancipar-se e a adotar polticas nacionalistas. Essas polticas permitiram aos Estados tomarem conta das riquezas dos recursos naturais existentes nos seus pases e, dificultar a circulao barateada desses recursos para as regies centrais que tanto dependiam do controle e acesso a custos bastante reduzidos das matrias-primas. Esse cenrio agudizou-se nos anos 70 com o encarecimento dos custos da aquisio do petrleo.

    O medo do ocidente se confirmava com a subida ao poder de estados nacionalistas e defensores de polticas mais populares e menos receptveis lgica de funcionamento do capital. Em Moambique, esse cenrio acontece com o alcance da independncia em 1975, quando o novo governo expulsa os portugueses do territrio nacional e envereda pelo socialismo. Esse sistema nacionalizou a terra, as indstrias e dificultou a existncia da iniciativa privada.

    Este cenrio barrava um dos principais pressupostos da acumulao do capital, que a possibilidade dos espaos estarem abertos entrada do sistema capitalista. Dessa forma, como foi descrito por Aroz (2011), apoiando-se nos argumentos de Leff(2004) e Martnez Alier (1995), as polticas nacionalistas no s alimentaram uma crise ao nvel do regime de poder mundial sobre as formas de acumulao de capital, como tambm provocaram uma crise de governabilidade ao nvel da sociedade

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    dos pases centrais onde em boa medida resolviam os seus problemas mediante a exacerbao consumista.

    Para os pases centrais e para a sobrevivncia do capitalismo, era importante a reposio da normalidade (isto , a circulao barateada dos recursos naturais e a aberturadas novas fronteiras entrada do capital). A soluo encontrada foi a "violenta" (grifos nosso) introduo de polticas neoliberais nos pases da periferia. A maioria dos pases da periferia, com algum destaque para os da Amrica Latina e de Moambique, encontrava-se mergulhados na crise da dvida e, em troca de um reescalonamento da dvida, foram "obrigados" (grifos nosso) a introduzirem reformas institucionais como cortes nos gastos sociais, leis do mercado e de trabalho mais flexveis e privatizaes. Foi introduzido, em geral, o ajuste estrutural (HARVEY, 2008).

    Aroz (2011) refere que a introduo "violenta" (grifos nosso) de polticas neoliberais significou a reorganizao do poder mundial, a redefinio das estratgias e modalidades de dominao, basicamente produzidas atravs da reestruturao dos fluxos produtivos e comerciais a escala global. A liberalizao por um lado permitiu acelerar o ritmo de circulao do capital (como mecanismo bsico de recomposio estrutural da taxa de rentabilidade do sistema), e por outro lado permitiu restaurar a anterior hierarquia geopoltica internacional.

    A estratgia adotada pelo sistema para a reposio das hierarquias geopolticas se construiu ao nvel da escala internacional, tendo atores como o Banco Mundial e o Fundo Monetrio Internacional a liderarem a sua aplicao na periferia. Os mesmos garantiam financiamento de vrios projetos, ditos de desenvolvimento,a partir de reformas econmicas e sociais. Caso esses mecanismos de implementao pacfica fracassassem, mtodos no legais eram aplicados, tudo em funo da abertura dos novos espaos ao capital.

    No meio de todas essas transformaes, o Estado desempenhou e desempenha um papel importante. Harvey (2012) refere que o capital necessita do Estado para garantir o arcabouo institucional e sustentar o funcionamento do capital atravs de arranjos institucionais definidos. Para ele, o Estado

    tem tido um papel-chave na acumulao original ou primitiva, usando seus poderes no apenas para formar a adoo de arranjos institucionais capitalistas, mas tambm para adquirir e privatizar ativos como a base original da acumulao do capital (HARVEY, 2012, p.80).

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    Nesse contexto, podemos olhar para o Estado como um dos principais responsveis pela acumulao por espoliao, pois tem garantido que os mecanismos necessrios sua aplicao sejam criados e, garante que se respeite-os. Porm, o papel do Estado tem sido contraditrio como nos demonstrado por Scotto (2011) e Echaveet al (2009) ao evidenciarem que o Estado, por um lado, cria as condies para a acumulao por espoliao e, por outro lado, se posiciona a favor das comunidades afetadas, defendendo os seus interesses.

    O carter mltiplo e contraditrio exercido pelo Estado se fundamenta pelas suas diferentes agncias e instncias estatais que intervm no processo. Algumas delas esto ligadas promoo de investimentos estrangeiros, defendendo a explorao de recursos naturais pelas multinacionais interessadas. Outras foram criadas para defender os interesses das comunidades locais, lutando para manter os interesses delas. Esse processo cria certa contradio na ao desempenhada pelo Estado, evidenciando um carter mltiplo e contraditrio.

    Estudo realizado por Echaveet al (2009) demonstrou que a atuao do Estado nos diversos casos analisados no estudo se revelaram ineficientes, ineficazes, imprecisos, improvisados e incapazes de solucionar os conflitos entre as empresas de explorao mineira e as comunidades locais. O estudo tambm constatou que a interveno do Estado estava mais orientada para resolver os problemas gerados nos campos de conflitos do que nas reais causas que o originaram.

    Porm, importante referir que as atuaes do Estado concorrem para a consolidao da acumulao por espoliao. Scotto (2011) refere que o processo da concesso de explorao de recursos naturais j uma forma de apontar os interesses do Estado. Apoiando-se nas argumentaes de Martinez Alier, o autor constata que se o Estado cedesse s comunidades locais o usufruto dos recursos e se lhes permitisse que os mesmos fossem geridos de acordo com as valoraes locais, ficaria evidente que os interesses do Estado tenderiam a beneficiar as comunidades locais. Contudo, isso no acontece, pois o Estado cria as bases para a acumulao por espoliao, aplicando uma lgica comercial explorao dos recursos naturais.

    Os casos estudados por Echaveet al (2009) elucidam essa vertente do Estado, que apesar de algumas de suas agncias defenderem os direitos das comunidades locais, constata-se que as mesmas, muitas vezes, no conseguem contrariar as diretrizes de funcionamento do Estado face a lgica capitalista.

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    No meio de todo esse cenrio, se encontram as comunidades locais, como os atores com menos poderes e localizados na escala local. Os territrios das comunidades locais apenas se apresentam como espaos sujeitos aplicao de aes definidas emescalas superiores.

    Os territrios das comunidades locais passam a ser espaos alvo do capital e, nele so introduzidas aes e objetos estranhos realidade local, conformando uma realidade que atende aos interesses internacionais. Os novos objetos, aes e tcnicas introduzidas no territrio tornam incompatvel o uso do territrio pelas comunidades locais e transformam as lgicas horizontais, que caracterizavam as comunidades locais, em lgicas verticais, onde o local se liga diretamente ao global.

    As transformaes territoriais provocam resistncia nas comunidades, pois perderterritrio o mesmo que perder a sua histria, a sua identidade, os traos culturais, os seus modos de vida, perder parte de si, e at mesmo, morrer. E, nesse embate de cosmovises sobre o territrio, observa-se que a terra no o mesmo que territrio. Essa diferena foi bem captada por Stavenhagen (2001) ao afirmar que a terra fundamentalmente um espao fsico de ocupao de uma famlia ou de uma comunidade e que nela retira a sua produo e o seu sustento. Nesse contexto, a terra passa a ser um elemento indispensvel para a sobrevivncia do grupo social. Todavia, territrio um conceito mais amplo que o de terra. Refere-se a um espao geogrfico onde se desenvolve a dinmica da vida de uma comunidade e que acumula a histria, a cultura e a identidade do grupo. Em relao terra, as comunidades reivindicam por uma necessidade econmica e social, enquanto que para o territrio a reivindicao mais complexa, pois ela inclui a necessidade histrica e cultural do grupo, vinculados aos direitos de autonomia e da autodeterminao.

    importante referenciar que o territrio uma totalidade. Compreender o territrio como uma totalidade diferente de entend-lo como sendo uno, isto , como sendo apenas um espao de governana, ignorando-se a existncia de outros tipos de territrios. Ao desfazermo-nos da associao do territrio como uno, estamos a incluir a multidimensionalidade e a multiterritorialidade que esto associados categoria do territrio (FERNANDES, 2008).

    Fernandes (2008)apresenta de uma forma didtica, trs tipos diferentes de territrio, sendo o primeiro considerado o territrio de governana, formado pelo poder pblico, isto , pelo territrio do Estadoe das suas unidades territoriais internas. O segundo

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    territrio o territrio que se organiza a partir do primeiro, podendo se localizar numa das unidades territoriais do Estado (ou do primeiro territrio), como por exemplo, o municpio. O segundo territrio formado pelas propriedades privadas capitalistas ou propriedades comunitrias (ou propriedades privadas no capitalistas). Nesse segundo territrio podem estar contidos os territrios das empresas ( exemplo o territrio de explorao do carvo mineral ocupado por uma determinada empresa) e os territrios de uma determinada comunidade (ou de um grupo de quilombolas localizados na Amaznia). O terceiro territrio formado por diferentes espaos que so controlados por relaes de poder, podendo ser formado dentro do primeiro e do segundo territrio. Segundo Fernandes (2008, p.283) "so territrios fluxos ou moveis controlados por diferentes sujeitos e so produzidos nos territrios fixos do primeiro e do segundo territrio".

    Fernandes (2008) argumenta que normalmente se valoriza mais o territrio concebido como espao de governana, mascarando-se a existncia de outros tipos de territorialidade, como as defendidas pelas comunidades locais, onde se verificam os processos de pertencimento e de identidade. Segundo o autor, essa forma de conceber o territrio como uno, serve como uma estratgia de dominao, a partir da aplicao de polticas neoliberais.

    Essa estratgia concebe o poder pblico (ou o Estado) como definidor das polticas, ditas de desenvolvimento, que no fundo pretendem implantar mecanismos adequados para a operacionalizao do neoliberalismo. Tais polticas provocam processos de desterritorializao, principalmente fomentadas pela acumulao por espoliao, que introduzidos nos pases da periferia, tm sido responsveis pela destruio das identidades territoriais das comunidades locais.

    Entendemos que ao discutirmos o territrio estamos levando em conta o seu uso e no apenas o territrio em si. De acordo com Santos (1999, p.10), compreendemos o territrio usado como "o fundamento do trabalho, o lugar da resistncia, das trocas materiais e espirituais e do exerccio da vida". Nesse mbito nos juntamos s constataes feitas por Silveira (2011, p.44) que enxerga, com base na abordagem de Santos, que "no h como explicar o espao geogrfico sem considerar que objetos e aes so portadores de um sentido nascido da copresena

    Silveira (2011) faz uma ligao bastante interessante entre territorialidade e sentimento de pertencimento, defendendo que s existe territorialidade quando se observa uma necessidade dos que a reivindicam desejarem consolidar os seus laos de pertencimento ao territrio, caso contrrio, ento no estamos perante uma

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    territorialidade. A autora sublinha que a territorialidade " um processo de formao de uma 'conscincia de confraternizao' entre as pessoas" (p.42).

    Para sustentar a sua viso, Silveira (2011, p. 52) recorre s empresas desterritorializadas para evidenciar a falta de uma "verdadeira territorialidade". A autora defende que nas empresas apenas h "na realidade, um uso explorador, extorsivo, pragmtico de um pedao de territrio. Existe o sentido de posse, mas no o sentido de pertencimento e de enraizamento, pois a capacidade de sair do lugar evidente". Para reforar os seus argumentos, a autora remata, "a rigor, no pode haver territorialidade de uma empresa global, se continuarmos a entender a territorialidade como o sentido de pertencimento, porque a corporao no fiel a nenhum lugar e porque a organizao que cria no contgua" (SILVEIRA, 2011, p. 52). Com essas argumentaes fica bem claro que a relao que a autora estabelece entre territorialidade e identidade bem forte, pois pertencer ao territrio significa consider-lo como parte de si, sua extenso.

    O conceito de territrio adotado por ns se aproxima mais do conceito de Fernandes, pois inclui o segundo tipo de territrio definido pelo autor. O conceito permite-nos compreender mais as dinmicas de resistncia das comunidades locais, que olham para os seus territrios, como espaos que condensam a sua histria, cultura e identidade, onde perder, significa morrer (aqui tambm inclumos a abordagem de Silveira). O conceito tambm nos permite captar as estratgias do capital que conceber o territrio apenas como espao de governana, onde so introduzidas as ditas polticas de desenvolvimento, do projeto neoliberal, e se ignora o territrio das comunidades locais. Fernandes (2008) nos alerta que o capital compreende o territrio como regio e/ou espao, pois desta forma mascara as resistncias das comunidades que so afetadas pelo seu projeto de acumulao do capital e, podem ser defendidas pelo Estado, como sendo projetos de interesse nacional.

    III.III.III.III. A expropriao da terra e A expropriao da terra e A expropriao da terra e A expropriao da terra e o deslocamento involuntrioo deslocamento involuntrioo deslocamento involuntrioo deslocamento involuntrioddddeeee comunidades locaiscomunidades locaiscomunidades locaiscomunidades locais em Moambiqueem Moambiqueem Moambiqueem Moambique

    A economia moambicana esteve, desde muito, assentada na explorao dos recursos naturais. Durante o perodo de colonizao portuguesa, Moambique era um territrio reservado para a explorao dos recursos naturais, com algum destaque para as monoculturas que tinham como destino a metrpole (o pas

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    colonizador). Tambm, era uma fonte de mo-de-obra barata, exportada para o vizinho pas da Repblica da frica do Sul.

    O territrio nacional foi organizado por forma a responder as necessidades dos colonizadores, sendo reestruturado de acordo com as exigncias econmicas da metrpole. As infra-estruturas implantadas elucidam bem essa necessidade, pois as mesmas, com destaque para as ferro-porturias, apenas visavam responder transferncia de matria-prima do interior para a costa, e da para a Europa. Esta estruturao do territrio nacional pouco contribua para a integrao econmico-social do pas.

    Esta forma de construo do territrio nacional vigorou at 1975, perodo em que se alcana a independncia nacional. Durante esse perodo, constatou-se que aos moambicanos pouco ou mesmo nada se beneficiavam com a explorao dos recursos naturais (e humanos?) existentes. A explorao de monoculturas, como o algodo, o sisal, a copra, a explorao mineira e a da madeira, empurravam os nativos para reas pouco produtivas, deixando as melhores nas mos dos colonizadores. A terra e os recursos existentes pertenciam ao governo colonial que os concedia a empresrios portugueses e/ou europeus para explorarem. Nessa concesso, os direitos de acesso a terra aos nativos era vedado e, a sua deslocao era feita sem o pagamento das devidas compensaes por uma deslocao forada.

    Com o alcance da independncia em 1975, o governo da FRELIMO4 entendeu que era necessrio alterar radicalmente a forma de gesto do territrio e, devolver ao povo moambicano o direito ao territrio nacional. Uma das aes desencadeadas pelo governo foi a nacionalizao da terra, isto , a terra passou a ser do povo moambicano. E, para impedir que se mantivessem os desequilbrios socioespaciais e evitar a entrada de mecanismos de gesto pro-capitalistas, o governo enveredou por um sistema socialista como um projeto de sociedade e de economia.

    Durante esse perodo que se prolongou at meados da dcada de 80, registraram-se progressos significativos nos campos econmicos e sociais para os moambicanos, que haviam experimentado longos perodos de privaes. Como mais de 90% da populao vivia em reas rurais e, muito deles em povoamentos dispersos, o governo moambicano primou pela socializao do meio rural, que segundo Arajo (1983) e Mosca (2005), o mesmo significou a criao de dois eixos principais, nomeadamente: as empresas estatais e as cooperativas, que originaram as aldeias

    4 Frente de Libertao de Moambique. Partido que liderou a guerra de libertao nacional.

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    comunais ou foram a sua consequncia. Esta forma de gesto do desenvolvimento territorial, com enfoque para o meio rural, tornava o Estado mais interventivo e presente nas preocupaes das comunidades. A estratgia rompia com as estruturas organizacionais herdadas do sistema colonial, com enfoque para o individualismo, a propriedade privada e as formas de povoamento rural disperso (que resultavam do seu assentamento em redor das propriedades dos colonizadores).

    A orientao poltico-econmica seguida pelo governo da FRELIMO encontrou resistncia ao nvel internacional, repercutindo-se ao nvel interno, com o desenrolar da guerra civil que durou 16 anos (iniciou em 1976 e terminou em 1992) e a relutncia da comunidade internacional em apoiar o pas face carncia alimentar que se vivia devido a seca que fustigava boa parte da regio Sul pas. Tambm se associa a crise internacional provocada pela subida do preo do petrleo e das taxas de juros (MOSCA, 2005; HANLON; SMART, 2008). A comunidade internacional pouco fez para ajudar o pas a enfrentar a crise, forando, indiretamente, o pas a mudar a sua orientao poltico-econmica. Esses acontecimentos colocaram em xeque a economia nacional. Como forma de solucionar a crise que o pas atravessava, a alternativa foi a sua adeso s polticas neoliberais fomentadas pelo Banco Mundial (BM) e pelo Fundo Monetrio Internacional (FMI). Em meados da dcada de 80 o pas comeou a abandonar o sistema socialista e iniciou a caminhada rumo a uma nova era poltico-econmica e social.

    A entrada num novo projeto de desenvolvimento, orientado pelas polticas neoliberais, significou uma mudana radical nos fundamentos que norteavam a viso de desenvolvimento calcada durante os anos de luta de libertao nacional. As novas polticas impuseram a uma liberalizao econmica, a privatizao, a desregulamentao, a descentralizao e a reduo do intervencionismo do Estado como o principal agente do desenvolvimento. Introduziram-se, inicialmente, os Programas de Reajustamento Econmico (PRE) e mais tarde, nos incios da dcada de 90, os Programas de Reajustamento Econmico e Social (PRES), que pouco impacto tiveram na qualidade de vida da maioria dos moambicanos, pois resultaram num maior empobrecimento da populao, num aumento do desemprego e na excluso socioespacial.

    Um dos principais ganhos da independncia foi o direito e acesso a terra. A terra propriedade de todo o povo moambicano. Com a entrada no neoliberalismo o mesmo significou a abertura para a iniciativa privada. E, como o pas apresentava (e apresenta) uma

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    economia alicerada na explorao dos recursos naturais, era fundamental que os investidores tivessem as garantias de uso da terra. Para isso, era necessrio que se reformulasse a lei de Terras, dando maior tranquilidade aos investidores nacionais e internacionais, isto , abrindo as portas acumulao do capital.

    A nova lei de terras criada em 1997 conseguiu agradar aos investidores e s comunidades locais. A lei defende que a terra do Estado moambicano, no podendo ser vendida ou por qualquer outra forma ser alienada, hipotecada ou penhorada (artigo 3 da Lei de Terras). Neste contexto, o Estado concede o Direito de Uso e Aproveitamento da Terra (DUAT) atravs da ocupao da mesma ou atravs de um pedido de autorizao. A aquisio por ocupao permite que as comunidades locais e cidados moambicanos que adquiriram a terra por normas e prticas costumeiras lhes sejam garantida a posse da terra. Tambm, dentro dessa categoria (ocupao), se inclui os moambicanos que de boa f tenham ocupado uma determinada parcela de terra por pelo menos dez anos.

    A lei aparenta ser mais benvola para as comunidades locais e aos ocupantes de boa f, ao dispensar a necessidade de obteno de ttulo, bastando para tal que haja apenas a prova testemunhal dos membros da comunidade local. Para os casos em que h uma disputa ou conflitos de uso de terra ou dos recursos naturais e quando h um provvel investimento na rea, quer pelo Estado ou pelo setor privado, a delimitao necessria. A delimitao providencia a Certido.

    A posse do DUAT no significa que o beneficirio tem o direito de explorao dos recursos existentes nele e no subsolo. Em caso de explorao de outros recursos, a lei apenas confere que o mesmo seja feito para o uso prprio, isto , para o consumo da famlia ou da comunidade, no podendo ser explorado para fins de mercado. Caso o beneficirio pretenda faz-lo, ento ter que requerer ao Estado, estando sujeito s taxas e a apresentar um comprovante que demonstre que tem capacidades para o efeito.

    Os recursos existentes no subsolo ou no solo so, tambm, propriedade do Estado. A sua explorao requer procedimentos definidos pela legislao setorial.

    Nos ltimos anos, se vem verificando uma maior procura por explorao mineira no pas. Por forma a responder a essa demanda, o governo reviu a legislao de minas e, aprovou a nova legislao em 2002. Essa lei d mais prioridade explorao mineira em detrimento dos outros tipos de uso. Segundo a mesma lei, no seu artigo 43, no nmero 2, o uso da terra para operaes minerais tem prioridade sobre outros usos da terra quando o

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    benefcio econmico e social relativo das operaes mineiras seja superior. Isso demonstra a preocupao do governo face importncia da explorao mineira sobre os restantes tipos de uso, visto que esta forma de explorao parece estar atraindo um nmero significativo de investimentos para o pas.

    As duas legislaes alteradas vieram dar mais oportunidades ao capital para se apossar dos territrios de comunidades locais e de l extrair o lucro. A lei de terras que se proclama como sendo uma das melhores leis de terras do mundo, permitiu que a posse de terra continuasse nas mos das comunidades locais. Porm, a mesma criou condies para que o capital pudesse se apoderar das terras comunitrias, com a capa de investimentos de importncia nacional. Em relao lei de minas, esta veio a colocar os interesses das comunidades abaixo dos interesses do capital, passando a considerar toda explorao mineira, vivel economicamente, como tendo primazia at mesmo sobre as formas de subsistncia das comunidades locais.

    A procura de terra para a implantao de projetos alheios s necessidades das comunidades locais e mesmo da necessidade nacional veio a aumentar, nos ltimos anos, depois das alteraes legais e institucionais, provocando processos de espoliao de terras das comunidades locais. Os exemplos a seguir elucidam melhor esse processo, demonstrando como os projetos considerados de interesse nacional, sob ponto de vista econmico e social, despojaram milhares de famlias, colocando-as em pssimas condies de vida.

    a) Produo de Biocombustveis em Massingir, provncia de Gaza

    Em 2007 o governo Moambicano aprovou o primeiro projeto de produo de biocombustveis em grande escala. O projeto, denominado por PROCANA, previa o cultivo da cana de acar e a construo de infra-estruturas necessrias ao processamento do etanol.

    O projeto PROCANA, financiado pela Companhia de Minerao e Explorao da frica Central (CAMEC em ingls), pretendia investir cerca de US$ 510 milhes e ocupar uma rea de 30000 ha. O projeto pretendia produzir, na fase de pleno funcionamento, cerca de 300000 m de etanol por ano, podendo deste modo, competir com a produo brasileira (FIAN, 2010). O objetivo fundamental era fazer face demanda de energia nos pases da regio e contribuir para a produo de plsticos, respondendo s

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    necessidades da frica do Sul, Botsuana, Zimbbue, Malaui e Suazilndia.

    As autoridades administrativas distritais bem como nacionais indicavam que a rea a ser ocupada pelo projeto PROCANA no era habitada e, desenvolviam-se algumas atividades "ilegais", como a produo de carvo vegetal que responsvel pela destruioda floresta. A FIAN e a ONG Centro Terra Viva, que visitaram a rea, constataram que a rea pretendida para a implementao do projeto era ocupada por vrias comunidades, nomeadamente Chinbangane, Chitar, Zulu, Mahiza, Mocatini, Banga, Cubo, Tihovene e Condzwane (FIAN, 2010; MANUEL; SALOMO, 2009).

    O tamanho da populao afetada pelo projeto no conhecido oficialmente, porque as autoridades administrativas no queriam admitir que o nmero da populao afetada fosse significativo. Numa estimativa feita pela FIAN, que visitou uma das comunidades afetadas pelo projeto, constatou que o projeto iria deslocar um mnimo de 360 famlias.

    As comunidades afetadas pelo projeto dedicam-se a trs principais atividades econmicas, nomeadamente: criao de animais, produo de carvo vegetal e a prtica da agricultura de subsistncia. A deslocao dessas comunidades significava ter em conta as suas atividades de subsistncia, bem como a perda da sua histria e de sua identidade sacralizada naquelas terras.

    Para a implantao do projeto era necessrio o cumprimentoda legislao de terras que obriga a consulta s comunidadese que as mesmas participem de todo o processo. A FIAN e a ONG Centro Terra Viva constataram que as comunidades foram "consultadas" pelo projeto, porm o processo de consulta foi enviesado, pois apenas se "negociou" (grifo nosso) a terra onde as reassentar e como efetuar esse processo. A necessidade de perderem ou no o seu territrio nunca foi objeto de debate. Nesse processo de "consulta" (grifo nosso), a informaotransmitida s comunidades foi, principalmente, sobre os benefcios que o projeto traria nas comunidades, pois empregaria um nmero significativo dos membros das comunidades afetadas pelo projeto (FIAN, 2010; MANUEL; SALOMO, 2009).

    A FIAN (2010) refere que o processo de "negociao" com as comunidades para o abandono dos seus territrios foi menos participativo e mais imposto. Isso se refletiu no local escolhido para o reassentamento compulsrio que no foi do agrado das comunidades e era um espao escolhido para o reassentamento das comunidades que seriam deslocadas do Parque Nacional do Limpopo, dado o seu repovoamento e a sua integrao ao projeto

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    Grande Limpopo, que unir os trs principais parques da regio (Parque Nacional do Limpopo, em Moambique; Parque Nacional do Kruger, na frica do Sul; e Parque Nacional de Gonarezhou, no Zimbbue).

    O projeto PROCANA foi cancelado pelo governo moambicano em 2009 por incumprimento do acordo de produo do etanol. At essa data o projeto havia limpado cerca de 850ha de terra, dos quais 25ha j estavam plantados seis variedades de cana de acar. Apesar de o governo ter cancelado o projeto, a terra alocada ficou disposio de qualquer investidor que queira investir na agricultura nos termos aprovados pelo governo (FIAN, 2010). Isso refora que apesar do projeto no ter-se materializado, os problemas provocados e que seriam provocados voltaro a acontecer caso a terra interesse a um novo investidor.

    b) Explorao de carvo mineral de Benga em Moatize, provncia de Tete

    O projeto de explorao do carvo mineral de Benga, no distrito de Moatize, pertence companhia Rio Tinto, que comprou todos os projetos africanos da Riversdale Mining, uma companhia australiana. A Riversadale havia adquirido a licena de explorao do carvo de Benga em 2009, mas em 2011 a companhia vendeu a sua concesso por mais de 3 mil milhes de euros.

    O projeto Benga ocupa uma rea de 4560ha e tem um investimento de US$ 850 milhes. O projeto previa o incio das suas atividades de explorao mineira em 2010, produzindo inicialmente o carvo para a exportao com destino ao mercado asitico, principalmente o indiano. Para alm da extrao do carvo mineral, o projeto prev a criao de uma usina termoeltrica, cujo principal objetivo abastecer as necessidades energticas dos pases vizinhos (FIAN, 2010).

    A implantao do projeto implica a deslocao das comunidades que ocupavam essas terras, bem como daquelas que estando prximos da rea abrangida pelo projeto, podero ser diretamente afetadas. O projeto abrangeu diretamente cinco comunidades, nomeadamente: Capanga Nzinda, Capanga Gulo, Capanga Luani, Mpala e Nhanganjo. Segundo o censo realizado pelo projeto, constatou-se que viviam nessas comunidades cerca de 1147 famlias, que devero ser reassentadas na localidade de Mwaladzi, que dista 44km da principal cidade da provncia, cidade de Tete e a cerca de 29km da vila de Moatize, principal centro urbano do distrito.

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    Para alm das cinco comunidades que se encontram dentro da rea concessionada para a explorao do carvo de Benga, o projeto abrange, parcialmente, outras comunidades ou, as mesmas se encontram nas imediaes da rea concessionada. Para essas comunidades, constata-se que o projeto indenizar parcialmente, podendo elas ficarem nos seus territrios ou serem deslocadas, mesmo sabendo-se que as que permanecerem nos seus territrios podero ser afetadas pelas atividades da minerao (FIAN, 2010).

    As comunidades afetadas pelo projeto dedicavam-se a agricultura de subsistncia, a pesca no rio Revuboe, a criao de animais, apicultura e fabricao de tijolos. Todas as atividades desenvolvidas pelas comunidades, com exceo da fabricao de tijolos se destinavamprincipalmente ao consumo familiar. Apesar do principal destino das suas atividades ser o auto consumo, constata-se que parte delas era colocada no mercado, por forma a adquirir produtos que o campo de cultivo no pode fornecer. A venda desses produtos era feita nos mercados mais prximos, localizados na vila de Moatize e nos aglomerados populacionais de Bele e Matondo. Para o transporte dos produtos, as comunidades recorriam associao local, que possua 10 carroas.

    O processo de reassentamento foi imposto s comunidades, deixando-as sem alternativa5. A FIAN (2010) constatou, no seu trabalho de campo, que as comunidades entendiam as pretenses do governo e os ganhos que o projeto "ofereceria" (grifo nosso)aos cofres do Estado, mas discordavam das formas como o processo estava a ser conduzido, visto que:

    A avaliao das suas residncias, efetuada pela empresa de consultoria contratada para o efeito, era viciado e menos realstico; O estudo de compensaes realizado pela empresa de consultoria omitia as perdas que as comunidades teriam na sua segunda colheita, para alm do local (Mwaladzi) escolhido no possuir fontes de gua segura como as que os seus territrios apresentam; O local de reassentamento era distante dos principais mercados de venda e de aquisio de produtos necessrios ao dia-a-dia. O local de reassentamento, Mwaladzi, localiza-se no meio de uma rea rida, sem condies para a prtica da

    5O processo de atribuio de terra aos investidores estrangeiros ou nacionais,

    muitas vezes carregado de controvrsias e falta de informao clara s

    comunidades. Em alguns casos elas so aliciadas pela possibilidade de novos

    empregos ou com possibilidades de melhoria na qualidade devida. Muitas vezes

    essas promessas no so cumpridas. Os jornais Savana (impressos) de 20/09/2012,

    p. 4 e de 30/11/2012, p. 7 mostram alguns exemplos e demonstram os casos

    ocorridos com as comunidades abrangidas pelas atividades da Rio Tinto e da Vale.

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    agricultura e para a criao de animais. Tambm enfrentariam dificuldades de transporte para colocar os seus produtos nos mercados anteriores, pois deveriam percorrer cerca de 29 km para alcanar o mercado mais prximo; A deslocao da rea as faria perder as suas rvores de fruta, principalmente a maanica, que fundamental para a segurana alimentar das famlias em tempos de escassez, bem como no poderiam vend-la para gerar renda familiar. O estudo realizado pela empresa de consultoria ignorou esse fato; O esquema de compensao de terras perdidas no tomou em conta a terra coletiva ou da associao, apenas incluiu a terra de posse familiar; e H discordncia na forma de tratamento dos locais sagrados das comunidades, como so os casos dos cemitrios. Como as comunidades tero de abandonar a rea, o projeto pretendia transportar os restos mortais para o novo local de reassentamento. Porm, as comunidades no concordam com o processo de transferncia de restos mortais, pois feri com a cultura local.

    Apesar de todas essas discordncias por parte das comunidades locais, o projeto de reassentamento teve incio em novembro de 2010 e, muitas das reinvidicaes no foram atendidas.

    c) Explorao de carvo mineral de Moatize, provncia de Tete

    O governo moambicano assinou, em junho de 2007, um contrato mineiro atribuindo a Companhia da Vale do Rio Doce a concesso de explorao do carvo mineral de Moatize. A Vale investiu mais de US$ 1,2 bilhes, podendo ultrapassar os US$ 2 bilhes com a construo de uma usina termoeltrica. A produo do carvo mineral tem como destino principal dois pases do continente asitico, nomeadamente China e ndia. Mosca e Selemane (2011) referem que os principais financiadores do projeto em Moambique so a multinacional IDC, o ramo do setor privado do Banco Mundial (IFC) e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econmico e Social (BNDES) do Brasil.

    A rea de implantao do projeto ocupa uma extenso de 23780ha e prejudicar 1313 famlias, das quais 760 famlias encontravam-se a residir na rea de produo do carvo. As 1313 famlias afetadas pelo projeto residiam em cinco comunidades, nomeadamente: Chipanga, Bagamoyo, Chithata, Malabwe e Mithethe (SELEMANE, 2010). A FIAN (2010) refere que algumas comunidades queresidiam nas imediaes das terras concessionadas ao projeto seriam esquecidas nas compensaes

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    pelos danos ambientais e nas perdas dos seus meios de vida que seriam afetados pelas atividades do projeto.

    Tal como obriga a legislao setorial, a Vale iniciou o processo de mapeamento, censo e "consulta" (grifo nosso) s comunidades locais em 2007 e em novembro iniciou o processo de reassentamento que veio a terminar em abril de 2010. Durante o perodo que durou a consulta com as comunidades, Selemane (2010) refere que as comunidades de Chipanga e Mithethe tiveram que interromper o curso normal das suas atividades, pois foram proibidas de desenvolver qualquer tipo de construes ou benfeitorias, bem como foram suspensos os trabalhos nas suas terras de cultivo.

    O censo realizado pelo projeto constatou que a implementao do projeto afetaria dois grupos de populaes, classificadas em rurais e semi-rurais. Essa classificao tinha em conta o principal tipo de atividade desenvolvida pelas famlias. As famlias que tinham a agricultura de subsistncia como a principal atividade e principal fonte de renda foram classificadas como rurais. As que para alm da prtica da agricultura desenvolviam atividades em outros setores, que no estavamdiretamente ligadas agricultura, foram classificadas como semi-rurais.

    Do censo realizado, 717 famlias foram classificadas como rurais e reassentadas na localidade de Cateme, que dista 40km da cidade de Tete e cerca de 25km da vila de Moatize. Um total de 288 famlias foi classificado como semi-rurais e foram reassentadas no bairro 25 de Setembro na vila de Moatize. As restantes famlias preferiram no se enquadrarem em nenhuma dessas categorias e receberam uma indenizao resultante da avaliao dos seus bens (SELEMANE,2010).

    Selemane (2010) refere que durante o perodo que levou a consulta at o perodo de realizao do reassentamento involuntrio, surgiram mais 50 famlias que resultaram da separao da convivncia dos filhos com seus pais, isto , alguns filhos atingiram a idade de casar e construram uma nova famlia. Essas novas famlias no foram previstas no censo realizado pela Vale e, a companhia recusou de compens-las.

    O processo de reassentamento foi imposto s comunidades, no abrindo campo para o debate sobre a sua implantao. As comunidades no concordaram com os termos e os processos de reassentamento, mas foram obrigadas a aceitar. As reivindicaes eram frequentes e, sempre, endereadas ao governo local, a companhia e ao secretariado distrital da FRELIMO, mas sem uma resposta favorvel. As principais reivindicaes das populaes estavam relacionadas com:

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    Os valores resultantes das avaliaes das suas residncias; A construo das casas, pela empresa brasileira OLDERBRECHT, no refletia os aspetos culturais das comunidades e, em alguns casos, algumas famlias receberam casas menores as que tinham. Tambm se acrescenta a m qualidade das casas construdas6; As avaliaes efetuadas pela empresa de consultoria responsvel por avaliar as perdas das famlias negligenciou a segunda colheita; O novo local de reassentamento, Cateme, no oferecetimas condies de solo para a prtica da agricultura e a quantidade de gua disponvel no responde as necessidades dirias das atividades dos reassentados; As reas de pastagens ficam longe da rea de reassentamento e so de qualidade inferior s que possuam; Os reassentados no bairro 25 de Setembro no foram compensados pelas perdas dos seus campos de cultivo; e Cateme fica distante do mercado da vila de Moatize que respondia s necessidades das comunidades.

    d) Explorao de areias pesadas em Moma, provncia de Nampula

    Localizada na provncia de Nampula, no distrito de Moma, a Kenmare, uma empresa pblica irlandesa, obteve a concesso de explorao de areias pesadas em 2007. AKenmare investiu cerca de US$ 460 milhes com o objetivo de produzir anualmente 800000 toneladas de ilmenite, 56000 toneladas de zirco e 21000 toneladas de rtilo. A produo tem como finalidade exportar para

    6A precariedade das casas foi o ponto alto de saturao das comunidades reassentadas involuntariamente, pois as casas haviam sido o smbolo da qualidade de vida que as comunidades teriam. Quando os problemas relacionados com as habitaes comearam a surgir, associou-se tambm a perda de antigas atividades, como a olaria e a pssima qualidade dos solos para a prtica da agricultura. As comunidades promoveram manifestaes contra a deteriorao da qualidade de vida que haviam sido submetidas pela Vale. A resposta do Governo foi energtica e pronta, tendo ferido e detido vrios manifestantes, sob a alegao de estarem a paralisar o funcionamento normal das atividades da companhia. Esse fato foi largamente noticiado pelos jornais como atestado pelos seguintes jornais on-line: http://www.verdade.co.mz/economia/37189-vitimas-do-carvao-de-tete, acessado em 25/05/2013; http://opais.co.mz/index.php/sociedade/45-sociedade/27320-novas-ameacas-de-manifestacoes-pairam-em-moatize.html, acessado em 18/11/2012; http://rm.co.mz/index.php/component/content/article/71-recomendado/3707-vale-mocambique-anuncia-melhoria-das-condicoes-de-vida-das-populacoes-de-cateme.html, acessado em 05/18/2012

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    o mercado internacional, nomeadamente os de EUA, Europa, China e Japo (SELEMANE, 2010).

    Dada a qualidade e quantidade de recursos existentes na rea, a empresa pretende expandir as suas instalaes, com vista a aumentar o nvel total de produo anual para 1,2 milhes.

    Para a implantao do projeto, a Kenmare teve que negociar com as comunidades que anteriormente viviam na rea. Estudo realizado por Selemane (2010) indica que a empresa tinha pressa no processo de negociao e transferncia das comunidades da rea. Topuito foi a rea escolhida para o reassentamento compulsrio. O processo teve incio em 2007 e no mesmo ano as atividades da empresa j estavam a funcionar.

    O projeto da Kenmare ocupou uma rea de cerca de 28000 ha. O local escolhido para o reassentamento das comunidades afetadas pelo projeto, em Topuito, foi indicado por um rgulo (chefe tradicional mximo de uma comunidade). Foram construdas 144 casas para os reassentados. Apesar da escolha do local ter sido feita com a participao do rgulo, os reassentados queixam-se das precrias condies a que foram submetidas no local de reassentamento. As insatisfaes foram reportadas empresa que prometera solucionar, mas at 2011 as condies continuavam. De acordo com Selemane (2010), as principais queixas estavam relacionadas com:

    Falta de gua para as necessidades dirias e domsticas. O local escolhido carece de fontes de gua prximas. Como forma de solucionar o problema, a Kenmare prometera construir um sistema de abastecimento de gua que pudesse abranger toda a rea. Enquanto no se construsse o sistema e, dada a necessidade urgente de reassentar as comunidades, a companhia passou a fornecer gua diariamente atravs de um caminho-cisterna. Porm, o fornecimento irregular e registram-se dias em que o caminho no circula; Algumas famlias no se beneficiaram de reas para a prtica da agricultura que era a sua principal atividade. Passados trs anos, essas famlias continuam a brigar por terra, queixando-se ao governo distrital que se recusa a resolver o problema, alegando que responsabilidade da Kenmare solucionar o problema, pois faz parte do pacote de obrigaes que a companhia tem com as comunidades reassentadas; A Kenmare prometera construir um centro de sade e dotar-lhe de uma ambulncia. Quando a companhia se preparava para construir o centro de sade, o governo distrital inviabilizou o projeto alegando que deveria ser construdo num outro local. A ambulncia adquirida pela companhia tambm

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    teve o mesmo destino. Dessa forma, as comunidades tm de percorrer distncias significativas para ter acesso a uma unidade sanitria; e As casas recebidas pelas comunidades so de m qualidade, apresentando graves problemas,comofissuras nas paredes e permitem a infiltrao de gua. Como forma de solucionar esses problemas, as comunidades recorrem argila, material local usado para a construo de suas casas, mas o resultado no tem tido efeito satisfatrio, pois as casas foram construdas com material diferente, denominado de "convencional".

    Para agravar mais a situao das comunidades, constata-se que as relaes entre o governo distrital e a Kenmare no so boas. O governo local tem acusado a companhia de no se envolver nas questes e/ou assuntos do distrito e a companhia alega que o governo distrital apenas quer tirar vantagens particulares da localizao da companhia no distrito (SELEMANE, 2010). No meio desse desentendimento, as comunidades reassentadas so as que mais sofrem, porque o governo distrital tem feito pouco ou nada para defender os interesses das comunidades.

    As ligaes verticais que existem na relao entre a companhia e o governo central (em Maputo)tm contribudo para o estgio atual de relao entre as duas entidades. A Kenmaredefine as suas aes no seu pas de origem, colabora com o governo central em Maputo e, em Moma apenas so implementadas as aes, muitas vezes, sem o conhecimento do governo distrital

    IV.IV.IV.IV. Acumulao por espoliao e as implicaes nas Acumulao por espoliao e as implicaes nas Acumulao por espoliao e as implicaes nas Acumulao por espoliao e as implicaes nas comunidades locaiscomunidades locaiscomunidades locaiscomunidades locais

    A entrada no sistema neoliberal permitiu criar as condies legais para a implantao de mecanismos de expropriao de terras das comunidades locais. As legislaes de terras e de minas vieram a consolidar a acumulao por espoliao.

    Os quatro casos estudados anteriormente evidenciam processos de espoliao de terras comunitrias, pois cerca de 3000 famlias foram "expulsas" (grifos nosso) de suas terras,perdendo a sua histria, cultura e identidade e condenadas a viver em pssimas condies de vida7. Os casos demonstraram que em nenhum

    7 Aps o processo de reassentamento, constatou-se que as condies de vida das comunidades envolvidas deteriororaram-se. Um relatrio da HumanRightsWatch, com o ttulo O que uma casa sem comida de maio de 2013, evidencia os problemas causados pelos processos de

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    momento a consulta, como definida pela lei de terras, foi respeitada, pois no se colocava se as comunidades queriam perder o seu territrio, mas sim para onde gostariam de ir. Esses processos foram menos participativos e foram introduzidos de uma forma autoritria e vertical.

    Protegidos pelo poder do Estado, os projetos tiveram tambm o apoio dos governos locais, que foi fundamental para garantir que as comunidades fossem "expulsas" (grifos nosso) de seus territrios. Para facilitar a deslocao involuntria, os projetos faziam vrias promessas, que depois de reassentadas as mesmas desmanchavam-se no ar.

    Os quatro exemplos apresentados so todos de origem internacional e com investimentos acima dos US$450 milhese, apresentados como projetos que traro o desenvolvimento ao pas. Impedir a implantao desses projetos seria o mesmo que dificultar o desenvolvimento nacional. As vantagens apresentadas para a sua implantao no pas soilusrias, seno vejamos:

    Os produtos resultantes das operaes dos projetos so para responder ao mercado internacional e/ou regional. As atividades realizadas no pas so extrativas, isto , nos processos pouco valor acrescentado. Dessa forma, o pas apenas serve de um espao onde so "expulsos" (grifos nosso) os detentores da terra e colocados na misria; so destrudas vastas reas que se tornariam reas de prtica de agricultura de subsistncia e de criao de animais; e as comunidades locais so prejudicadas com os problemas ambientais resultantes das atividades; Muitos dos projetos implantados no pas beneficiam-se das isenes fiscais, o que lhes permite obter uma remessa integral de lucros estrangeiros, deixando pouco (ou quase nada) do seu lucro no pas onde se encontram a operar. Dessa forma, pouco

    reassentamento promovidos pelas companhias mineiras a operar em Moatize (Vale e Rio Tinto). O relatrio revela problemas que j vinham sendo denunciados por ONGs, pesquisadores nacionais e jornais. Os jornais on-line evidenciam esse fato: http://www.verdade.co.mz/nacional/24289-moatize-comunidades-reassentadas-pela-vale-mocambique-impedem-a-saida-de-comboio-para-a-beira, acessado em 10/01/2012; http://opais.co.mz/index.php/sociedade/45-sociedade/25052-manifestantes-de-varios-paises-denunciam-irregularidades-da-vale.html, acessado em 25/04/2013; http://rm.co.mz/index.php/component/content/article/103-opiniao/12090-tete-governo-defende-condicoes-sustentaveis-para-reassentados-pela-mineracao.html, 01/10/2013.

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    contribui para a melhoria da qualidade de vida, nem dos moambicanos em geral, e muito menos dos "expulsos" (grifos nosso). A criao de emprego tem sido colocada como a principal vantagem que esses projetos trazem para as comunidades locais e para o pas. Porm, isso uma iluso, porque:

    a) qualquer tipo de projeto dessa dimenso tem de criar novos postos de emprego, porque vai requerer mo-de-obra nos seus canteiros de obra e de produo, logo nada de novo; b) os empregos criados pelo projeto no tm beneficiado, em sua maioria, os membros das comunidades afetadas visto que a maioria analfabeta, logo so beneficiados os mais escolarizados e os imigrantes de outras regies do pas; c) os projetos desempregam um nmero significativo de membros das comunidades, pois o seu territrio que era a sua fonte de renda, ou seja, essas pessoas estavam empregadas nas atividades que desenvolviam nos seus respectivos territrios. Logo, ao "expulsar" (grifos nosso) essas comunidades esto criando um exrcito de desempregados que tero de competir com os novos imigrantes que procuram emprego ou, ento tero que viver de caridade nos novos locais de reassentamento obrigados a transformar esses novos espaos "primitivos" (grifos nosso) em territrio, processo que pode levar geraes; d) os ditos empregos providenciados pelos projetos so temporrios, porque o tempo de contrato de explorao dos recursos limitado pela viabilidade econmica de explorao ou ainda, alguns dos empregos so oferecidos por empresas que prestam servios s companhias, no oferecendo direitos trabalhistas e, os contratos de prestao de servio podem vencer e colocar um significativo nmero de pessoas no desemprego. Os membros das comunidades que tiverem a infelicidade de trabalhar naqueles canteiros de obras e de produo, para alm de herdarem problemas de sade, voltaro a engrossar a reserva de desempregados e, agora sem condies fsicas e psicolgicas para trabalhar na agricultura ou na sua anterior atividade econmica;

    Os projetos trazem novas dinmicas para o local e para as proximidades dos seus canteiros de obra e de produo. As cidades crescem, em termos de populao, infra-estruturas, instituies financeiras e em muito mais. Porm, esse crescimento pode ser prejudicial para a gesto das cidades e vilas, pois o nmero crescente de populao imigrantecria problemas como a falta de infra-estruturas sociais para responder nova demanda. O preo dos produtos alimentares e

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    de vrios outros bens aumenta de uma forma "galopante", impedindo o acesso aum significativo nmero de cidados. Um estudo realizado por Selemane e Mosca (2011) na cidade de Tete e na vila de Moatize, onde se encontram instalados os projetos da Vale e da Rio Tinto, evidencia que o preo dos produtospara a alimentao bsicaaumentou significativamente e tornou-se num fardo pesado para a maioria da populao desses centros urbanos.

    Os projetos apresentam-se, quase sempre, distanciados das relaes com o governo distrital. Como so projetos de grandes investimentos, constata-se que as relaes so verticais, isto , as decises so tomadas ao nvel da capital nacional (e quase sempre na escala internacional), ou melhor, ao nvel da escala nacional, enquanto que ao nvel da escala local apenas se apresentam como espaos de implementao. Os governos locais pouco ou nada tm a fazer quanto s alteraes das lgicas de funcionamento ou das decises das companhias, sob pena de irem contra as decises tomadas ao nvel central. O caso do projeto da Kenmare elucida bem esta questo, onde o governo local alega a sua incapacidade de solucionar as preocupaes das comunidades por no ter nenhuma relao com a companhia e, desconhecer as atividades desenvolvidas pela empresa. Essa ausncia do governo local prejudica as comunidades locais, pois seria esse nvel escalar que melhor preservaria os direitos das comunidades locais.

    Na implantao desses tipos de projeto pouco se analisa sobre as questes culturais eidentitrias das comunidades a serem prejudicadas com a instalao dos projetos. Nesse mbito, consta-se que se aplica o primeiro territrio definido por Fernandes, o territrio como uno, espao de governana e que serve para a materializao das polticas neoliberais, consequentemente a acumulao por espoliao. Sob esse tipo de compreenso do territrio, mascara-se o territrio das comunidades locais, espao das horizontalidades e onde a luta pela sua histria, cultura e identidade se afirmam. Os quatro exemplos apresentados mostram que as verticalidades dos projetos foram responsveis pelas destruies dos territrios comunitrios, processos esses que no foram pacficos, mas forados e acompanhados pelo poder do Estado, como o principal aliado da acumulao por espoliao.

    A acumulao por espoliao em Moambique mascara-se como um processo que visa dinamizar a economia moambicana, com a finalidade de melhorar a qualidade de vida das comunidades afetadas pela perda dos seus territrios, conquistados pelos ditos "projetos de desenvolvimento" (grifos nosso). Porm, esses territrios so entregues ao capital, que os transforma em espaos

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    homogneos e produtores de lucratividade. O processo inicia com a "expulso" (grifos nosso) das comunidades, mas no as coloca na categoria dos sem-terra, numa primeira fase, mas as coloca em espaos "primitivos" (grifos nosso) em que as comunidades so obrigadas a reconstrurem uma nova histria, cultura e identidade.

    Como os novos espaos de reassentamento tendem a ser locais de precariedade das condies de vida dos assentados, as mesmas tornam-se hostis presena humana. Com o passar do tempo, as famlias passaro por uma segunda expulso, motivadas pelas precrias condies de vida que o local oferece. Essa expulso conduzir as comunidades para os centros urbanos mais prximos, criando os sem-teto e sem-terra, porque estaro desprovidos da terra para a prtica da agricultura que o seu principal meio de subsistncia.

    Compreender a dinmica desses processos implica compreender tambm as consequncias que no atual estgio parecem ser apenas delimitadas espacialmente e temporalmente. Em longo prazo o processo de implantao de projetos, ditos de desenvolvimento, conduziro a uma maior e a uma crescente marginalizao de um nmero significativo de comunidades que perderam a terra, mas principalmente perderam o seu territrio. Este cenrio parece ser negligenciado nos estudos atuais, que evidenciam mais a perda de terra e pouco evidenciam que a perda do territrio e ser o principal fator de deteriorao da qualidade de vida dos atingidos pela implantao de projetos de "desenvolvimento"(grifos nosso) de origem neoliberal.

    Compreender esses processos, tambm implica em entender as transformaes que os mesmos causam no pas, pois a acumulao por espoliao tende, geralmente, a beneficiar a elite dirigente do pas (observando-se na composio acionista dos principais projetos ligados indstria extrativa) e os investidores estrangeiros. Esses processos, normalmente permitem a restaurao e/ou a criao do poder de classes dos estratos mais ricos da populao. s comunidades, apenas lhes reservado a funo de engrossarem o exrcito daqueles que so forados a vender a sua fora de trabalho para sobreviver. Esse processo conduzido pela fora da"expulso" (grifos nosso) das comunidades dos seus territrios, jogados em espaos primitivos (que entendemos serem espaos desprovidos de tempo condensado), onde a produo do territrio se dilui nas pssimas condies que os mesmos apresentam e se contradiz com a lgica de vida introduzida no cenrio local, que destruiu modos de vida (re)produzidospor vrias geraes.

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    MATOS, Elmer A. C. de; MEDEIROS, Rosa M. V. Acumulao por espoliao: uma reflexo sobre a sua introduo em

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