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António Fernandes

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António Fernandes

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Soneto 1-2018

Serás sempre o mais belo

rosto no meio do nevoeiro

que orla a duna do medo

em ser a copa do pinheiro

Com sabor a sal na brisa

o tronco pelo vento curvado

as pinhas, a lenha, a cinza,

de um tempo já passado

no recorte e no carreiro

do recanto escolhido

a caminho do mar

pinhão caído do pinheiro

asa solta, com sentido,

o de tanto te amar!

Braga, 4 de janeiro de 2018

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Soneto 2-2018

Há palavras que ferem

como o gume de uma lâmina

dizendo aquilo que sentem

como se foram uma arma

Há palavras que escritas

marcam profundamente

o momento em que são lidas

e se alojam para sempre

Por isso deve a palavra

de uma forma inteligente

quando for proferida

ou de outra forma lavrada

ser cuidado e paciente

franca, clara e sentida!

Braga, 13 de janeiro de 2018

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Soneto 3-2018

Perdi o ar, assim, repentinamente,

quando te vi no cimo da rua,

no meio de uma multidão de gente.

A pele alva, anca curva, completamente nua.

Surpreendeu-me que ninguém visse

aquilo que só os meus olhos viam.

E por isso, para mim próprio disse:

Que a rua, a multidão e tu, não existiam.

Para além da criação

de um momento artificial

numa tela por fazer,

numa rua por abrir

aonde as casas em geral

não tem vida, nem canção.

Braga 26 de janeiro de 2018

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SONETO 4/2018

Há flores a despontar no mato

e libelinhas a voar no rio.

Há sempre um sorriso no rosto

que desponta sem arrepio.

Há também a flor da carrasca

espalhando seu manto lilás

que pinta em toda a encosta

esse sorriso belo que tens.

Há uma lágrima de orvalho

que desliza para regar

as mais belas flores

Do cimo desse orgulho

que teimoso, só por teimar,

esconde os seus amores.

Braga, 28 de janeiro de 2018

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Soneto 5-2018

Tenho uma saudade enorme,

das coisas pequenas

em grandes momentos

que trago gravadas no cerne

aonde se incutem os pensamentos

Sem que o saiba ou sequer o queira.

Sem premeditação ou sequer vontade.

Construí muros, cavei trincheira,

na linha do horizonte prendi a liberdade!

Tenho uma saudade imensa

do riso, do toque, da altivez,

da áurea distante.

Daquela forma de ser, intensa.

Da incerteza com sensatez

De quão sou, insignificante...

Braga, 31 de janeiro de 2018

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Soneto 6-2018

Os dias são as opções.

Boas, más, mais ou menos.

Os dias, são as decisões,

com cujo ónus arcaremos.

Não adianta por isso

tirar a agua do capote

como se fosse feitiço,

maleita, sina, ou a má sorte.

Porque a água que escorre

face abaixo até ao chão

e a terra vazia sulca,

não é mais do que a polpa

de uma outra encenação

que nasce, vive e morre!

Braga, 6 de fevereiro de 2018

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Soneto 7-2018

Não sei o sentido

dessa dor sofrida

no sobrolho franzido

de um olhar sem vida

Que ficou no soslaio

do que já não interessa.

Um acaso. Um devaneio.

Um andar. Sem pressa.

Um momento sofrido

nas entranhas amorfas

de um troço sitiado

Que para castigo

fechou todas as portas

e saiu, apressado!

Braga, 14 de fevereiro de 2018

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Soneto 8-2018

Sinto um peso enorme

no peito

Um pulsar da saudade

sem jeito

Na brisa que o ar amacia

doçura

Na paz solta que irradia

ternura

Nos pinheiros mais altos

da duna

de que cuja copa ondula

Em beijo intenso de cópula

na alma

de todos os sobressaltos

Braga, 14 de fevereiro de 2018

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Soneto 9/2018

Foi num fim de tarde

frio com o vento a gretar

esta chama que arde

e que não se deixa apagar

Foi num fim de tarde

na contraluz crepuscular

que faz no molde a arte

e não a deixa esgotar

Nos devaneios suaves

de quem não sabe sonhar

nem sequer sentir o calor

que une as futilidades

aos sons fugazes do mar

e as contradições do amor.

Braga, 16 de fevereiro de 2018

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Soneto 10/2018

Passou por mim uma mágoa

que teimou em ficar

qual lapa, resistente à água

da onda batida do mar.

Passou por mim uma dor

que teimou em ficar

doeu, como só dói o amor

quando teima em acordar

Melhor fora adormecido

na maré vaza e calma

de uma manhã pachorrenta

No trovejar que rebenta

por de dentro da alma

que quero, mas não consigo!

Braga, 19 de fevereiro de 2018

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Textos: António Fernandes Fotografias: Isabel Costa Pinto