anÁlise de obras: pinacoteca do estado
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A arte é uma forma de expressão do homem diante da qual a sensação é de contemplação. No entanto, para que se possa entender a arte, somente uma observação simplista pode não ser suficiente, exigindo do expectador técnicas de análise. Este trabalho tem como objetivo analisar três obras da Pinacoteca do Estado de São Paulo que foram observadas in loco durante visita ao museu. As obras são Figuras de Animais, Porteuse de Parfum e o próprio edifício da Pinacoteca. Considera-se na análise a obra, sua análise, a biografia do autor e outras obras, uma análise de contextualização do momento em que a obra foi concebida e uma análise pessoal. Por fim, verifica-se a relação entre as obras estudadas e a importância dos seus criadores para o movimento artístico da época, além de reafirmar a importância de como ler uma obra de arte para a formação pessoal.TRANSCRIPT
UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBIEdegar Bernardes Silva
ANÁLISE DE OBRAS: PINACOTECA DO ESTADO
São Paulo2014
EDEGAR BERNARDES SILVA
ANÁLISE DE OBRAS: PINACOTECA DO ESTADO
Trabalho apresentado como exigência parcial para a disciplina de História da Arte, do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Anhembi Morumbi, sob a orientação da Profa. Adriana Valese.
São Paulo2014
“A arte não é um elemento vital, mas um elemento da vida.” – Mário de Andrade.
SUMÁRIO
RESUMO...........................................................................................................................06
INTRODUÇÃO...................................................................................................................1
CAPÍTULO 1 – Figuras de Animais, 1954.........................................................................3
1.1 A obra.....................................................................................................................3
1.2 O autor....................................................................................................................4
1.2.1 Biografia...........................................................................................................4
1.2.2 Outras Obras.....................................................................................................6
1.3 Análise do assunto.................................................................................................6
1.4 Análise sintática.....................................................................................................7
1.4.1 Composição......................................................................................................7
1.4.2 Desenho............................................................................................................7
1.4.3 Cores e Luz.......................................................................................................7
1.4.4 Técnica e Matéria.............................................................................................7
1.5 Análise histórica.....................................................................................................8
1.6 Análise pessoal.......................................................................................................8
CAPÍTULO 2 – La Porteuse de Parfum, 1923/1924.........................................................10
2.1 A obra...................................................................................................................10
2.2 O autor..................................................................................................................10
2.2.1 Biografia.........................................................................................................10
2.2.2 Outras Obras...................................................................................................12
2.3 Análise do assunto...............................................................................................12
2.4 Análise sintática...................................................................................................13
2.4.1 Composição....................................................................................................13
2.4.2 Técnica e Matéria...........................................................................................13
2.5 Análise Histórica..................................................................................................13
2.6 Análise pessoal.....................................................................................................14
CAPÍTULO 3 – Pinacoteca do Estado de São Paulo, 1897/1900......................................14
3.1 A obra...................................................................................................................14
3.2 O autor..................................................................................................................15
3.2.1 Biografia.........................................................................................................15
3.2.2 Outras Obras...................................................................................................17
3.3 Análise da obra.....................................................................................................18
3.4 Análise histórica...................................................................................................19
3.5 Análise pessoal.....................................................................................................20
CONCLUSÃO...................................................................................................................21
BIBLIOGRAFIA...............................................................................................................22
ANEXOS...........................................................................................................................24
ANEXO A..................................................................................................................24
ANEXO B..................................................................................................................27
RESUMOA arte é uma forma de expressão do homem diante da qual a sensação
é de contemplação. No entanto, para que se possa entender a arte,
somente uma observação simplista pode não ser suficiente, exigindo
do expectador técnicas de análise. Este trabalho tem como objetivo
analisar três obras da Pinacoteca do Estado de São Paulo que foram
observadas in loco durante visita ao museu. As obras são Figuras de
Animais, Porteuse de Parfum e o próprio edifício da Pinacoteca.
Considera-se na análise a obra, sua análise, a biografia do autor e
outras obras, uma análise de contextualização do momento em que a
obra foi concebida e uma análise pessoal. Por fim, verifica-se a
relação entre as obras estudadas e a importância dos seus criadores
para o movimento artístico da época, além de reafirmar a importância
de como ler uma obra de arte para a formação pessoal.
INTRODUÇÃOA socióloga húngara Agnes Heller (1985) cita que a arte é um tipo de manifestação
humana que desloca o ser do mecanicismo do cotidiano e que fortalece a consciência de si
mesmo e de seu mundo ao redor. Já, segundo Coli (1991), a arte é a forma de expressão da
atividade humana diante da qual a sensação é de contemplação. Ambos não definem a arte per
se, mas apresentam em suas explicações aspectos sensitivos à arte: a consciência de si, a
contemplação.
O espectador pode observar uma obra de arte de maneira simplista, revelando seu gosto
ou desgosto, muito devido às sensações que ela passa ao observador. Mas poderá também
analisá-la a partir de certos parâmetros com a finalidade de compreender a obra, seu propósito,
seu contexto, o porquê da utilização de determinado estilo e técnica etc. É importante ressaltar
que ambas as abordagens são válidas, com suas vantagens e desvantagens, mas é o processo
analítico de uma obra de arte que possibilitará uma compreensão mais técnica e contextual, ainda
que, segundo Coli (1991), nunca será uma análise completa do que a obra pode oferecer como
um todo, por melhor que a análise seja. Um exemplo dado por Gombrich (1951) é a comparação
entre a obra de Guido Reni (Testa di Cristo, c. 1640 – Figura 1) e de uma obra da Idade Média
(c. 1270 – Figura 2).
1
Figura 1 - Cabeça de Cristo, detalhe da pintura, c. 1640. London, National Galery.
Figura 2 - Mestre de Toscana: Cabeça de Cristo.
Detalhe d’um crucifixo, c. 1270. Florência, Uffizi.
Segundo o autor, a expressão no quadro de Reni é mais fácil de entender, o que agradaria
a algumas pessoas. Quando ele o pintou, queria, sem sobra de dúvidas, que o espectador
encontrasse toda a agonia e glória da Paixão de Cristo em sua face, de modo que tal expressão
foi copiada em diversas capelas e casas onde “pessoas sabem nada sobre arte” (GOMBRICH,
1951, p. 13). Mas, de acordo com o mesmo autor, ainda com tal expressão fidedigna, não se deve
fechar os olhos para trabalhos cujas expressões não sejam tão simples de entender. O pintor
Italiano da Idade Média que fez o trabalho da Figura 2 teria sido tão sincero quanto os
sentimentos de Reni sobre a Paixão de Cristo, porém é preciso conhecer seus métodos de
desenho para entender seus propósitos de forma que, quando compreendidos, uma obra deste
tipo pode até ser mais admirada, justamente por ter uma expressão menos óbvia (GOMBRICH,
1951).
Diante do exposto, mostra-se a importância de analisar uma obra sob diversos ângulos,
não se esquecendo, no entanto, da frase de Émile Male: “Diferentemente do filósofo, o artista
não nos dá suas razões: ele se contenta em admirar e revelar”. Logo, volta-se à questão
apontada acima sobre a arte como despertador de sentimentos da emoção, do espanto, da
intuição, das associações, das evocações, das seduções, uma vez que o artista dá a perceber sua
obra por modos que se possa talvez nomear, mas que escapam ao discurso, pois jamais deixarão
de pertencer ao campo do não racional. (COLI, 1991, p. 105).
2
Desta forma, este trabalho tem como objetivo analisar três obras de arte observadas na
Pinacoteca do Estado de São Paulo, no dia 8 de Junho de 2014, de acordo com roteiro (ANEXO
A) apresentado na disciplina “História da Arte”, do curso de Arquitetura e Urbanismo da
Universidade Anhembi Morumbi. Para cada uma, será feita uma descrição da obra, do autor, do
assunto e uma análise sintática, histórica e de percepção pessoal. Além disso, o trabalho objetiva
uma breve reflexão do ser pensante defronte uma obra de arte.
Para atingir os objetivos deste material, as seguintes obras foram selecionadas:
Figuras de Animais, 1954 – Di Cavalcanti;
La Porteuse de Parfum, 1923/1924 – Victor Brecheret;
Edifício Pinacoteca do Estado de São Paulo, 1896/1900 - Ramos de Azevedo.
A escolha dessas obras deu-se simplesmente por questões de afinidade que serão
melhores compreendidas na análise pessoal de cada obra. Já a escolha do edifício da Pinacoteca
como obra de arte justifica-se não só pela grande importância de Ramos de Azevedo como
arquiteto em São Paulo, mas também por reiterar a afirmação de que o arquiteto deve, sim,
associar intimamente a Arquitetura à Arte, evitando, assim, graduar-se como um arquiteto
meramente tecnocrata ou pobre de reflexão estética, pois dentre outros motivos, segundo o
filósofo Friedrich Schiller, o excesso da razão acaba com a possibilidade do dogma e da fantasia
como partes da vida humana (LOPES, 2012, p. 195), o que pode eliminar o processo de
criatividade. Neste sentido, procura-se seguir aspectos da filosofia estética schilleriana, a qual
busca colocar a educação estética na base da moralidade, formando o homem racionalmente sem
deixar de lado o elemento sensível em seu desenvolvimento (LOPES, 2012).
3
CAPÍTULO 1 – FIGURAS DE ANIMAIS, 1954
1.1 A OBRA
Figura 3 - Figuras de Animais, 1954. Reprodução fotográfica pessoal.
Figuras de Animais (Fig. 3) é uma pintura de óleo sobre tela de dimensões (146,5 mm x
412,5 mm), criada em 1954, quando Di Cavalcanti tinha 57 anos, e que toma grande espaço em
uma das paredes da Pinacoteca. Tem como procedência a doação pela Secretaria dos Transportes
em 1986.
1.2 O AUTOR
1.2.1 BiografiaEmiliano Di Cavalcanti foi um pintor brasileiro
nascido em 1897, no Rio de Janeiro, um dos primeiros artistas
a pintar elementos da realidade brasileira, como festas
populares, favelas, operários, o samba (Fig. 5) etc. Foi um dos
idealizadores da Semana de Arte Moderna de 1922
(dicavalcanti.com.br; e-biografias.net, s.d.). Aos 17 anos de
idade, já fazia ilustrações para a Revista Fon-Fon (Fig. 4),
obrigado, devido à morte de seu pai, uma vez que vinha de
família humilde. Próximo de alcançar os 20 anos de idade,
mudou-se para São Paulo para cursar a Faculdade de Direito,
porém segue fazendo ilustrações, inicia a pintura, freqüenta o
atelier do impressionista George Elpons
e torna-se amigo de Mário e Oswald de
Andrade. Entre 11 e 18 de fevereiro de
4
Figura 4 - Samba, 1925. Reprodução fotográfica Vera Albuquerque. Coleção Geneviève e Jean Boghici.
1922, aos 25 anos de idade, idealiza e organiza a Semana de Arte Moderna, no Teatro Municipal
de São Paulo. Para essa ocasião, cria as peças promocionais do evento com catálogo e programa
(Fig. 6). Di Cavalcanti mudou-se para Paris em 1923, como correspondente do jornal Correio da
Manhã, permanecendo até 1925. Lá, freqüentou a Academia Ranson e expos em Londres,
Berlim, Bruxelas, Amsterdã e Paris. Quando retornou ao Brasil, seguiu fazendo ilustrações,
como o livro Losango Cáqui, de Mário de Andrade, bem como os painéis de decoração do Teatro
João Caetano no Rio de Janeiro (dicavalcanti.com.br; e-biografias.net, s.d.).
Os anos 30 encontram um Di Cavalcanti imerso em dúvidas quanto a sua liberdade como
homem, artista e dogmas partidários. Inicia suas participações em exposições coletivas, salões
nacionais e internacionais como a International Art Center em Nova Iorque. Em 1932, aos 35
anos de idade, funda em São Paulo, com Flávio de Carvalho, Antonio Gomide e Carlos Prado, o
Clube dos Artistas Modernos. Publicou o álbum A Realidade Brasileira, série de doze desenhos
satirizando o militarismo da época. Voltou para a Europa onde
permaneceu até 1940. Em Paris, estabeleceu contato com
Picasso, Léger, Matisse, Eric Satie, Jean Cocteau e outros intelectuais franceses. Em 1937
recebeu medalha de ouro com a decoração do Pavilhão da Companhia Franco-Brasileira na
Exposição de Arte Técnica, em Paris (dicavalcanti.com.br; e-biografias.net, s.d.).
Com a iminência da Segunda Guerra, retorna ao Brasil, fixando-se em São Paulo. Passa a
combater abertamente o abstracionismo através de conferências e artigos, viaja para o Uruguai e
Argentina, expondo em Buenos Aires. Em 1946 expõe no Rio de Janeiro, na Associação
Brasileira de Imprensa, ilustra livros de Vinícius de Morais, Álvares de Azevedo e Jorge Amado,
além de participar com Anita Malfatti e Lasar Segall do júri de premiação de pintura do Grupo
dos 19 (dicavalcanti.com.br, s.d.).
É convidado e participar da I Bienal de São Paulo, 1951. Fez doação generosa ao Museu
de Arte Moderna de São Paulo, constituída de mais de quinhentos desenhos. Recebe a láurea de
melhor pintor nacional na II Bienal de São Paulo, prêmio dividido com Alfredo Volpi. Em 1954
o MAM, Rio de Janeiro, realiza exposição retrospectivas de seus trabalhos. Faz novas exposições
na Bacia do Prata, retornando à Montevidéu e Buenos Aires. Publica Viagem de minha vida.
1956 é o ano de sua participação na Bienal de Veneza e recebe o I Prêmio da Mostra
Internacional de Arte Sacra de Trieste. Seus trabalhos fazem parte de exposição itinerante por
países europeus. Recebe proposta de Oscar Niemayer para a criação de imagens para tapeçaria a
5
Figura 6 - Capa do catálogo da exposição da Semana de Arte Moderna, 1922. Reprodução Fotográfica Romulo Fialdini.
ser instalada no Palácio da Alvorada também pinta as estações para a Via-sacra da catedral de
Brasília (dicavalcanti.com.br, s.d.).
Ganha Sala Especial na Bienal Interamericana do México, recebendo Medalha de Ouro.
Torna-se artista exclusivo da Petite Galerie, Rio de Janeiro. Participa da Exposição de Maio, em
Paris, com a tela Tempestade e com Sala Especial na VII Bienal de São Paulo. Recebe indicação
do presidente João Goulart para ser adido cultural na França, mas não assume por causa do golpe
de 1964. Lança novo livro, Reminiscências líricas de um perfeito carioca e desenha jóias para
Lucien Joaillier (dicavalcanti.com.br, s.d).
Faz exposição de obras recentes na Bolsa de Arte e sua pintura Cinco Moças de
Guaratinguetá é reproduzido em selo. Falece no Rio de Janeiro em 26 de Outubro de 1976 aos 79
anos (dicavalcanti.com.br, s.d.).
1.2.2 Outras ObrasMulatas, Samba, Paisagem de Subúrbio, Pescador Galego, Gafieira, Mulheres
Protestando, Vendedoras de Peixes, Mulher Deitada e Cachorro (Fig. 7), entre muitas outras.
Figura 7 - Mulher Deitada e Cachorro, 1954 - Reprodução fotográfica Caio Kauffmann/Itaú Cultural.
1.3 ANÁLISE DO ASSUNTOO quadro tem como tema o retrato-paisagem rural, uma vez que as personagens e a
presença de cavalos sugerem um local mais rural que urbano.
Nesta obra, há mulheres, aparentemente armazenando algum alimento nos recipientes que
levam em mãos. A mulher de primeiro plano leva consigo possivelmente algum grão ou cereal
6
que é atacado por aves brancas (talvez pombos); no segundo plano, a mulher de verde carrega
algo que parece ser o esqueleto de um peixe; já a terceira mulher carrega uma espécie de
vasilhame, mas não é possível ver o que exatamente há dentro. Há também um rapaz de verde
que sorri tocando um banjo a observar a situação.
Além das mulheres, recortes nos planos de fundo mostram alguns cavalos providos de
asas ou não, carregando algum humano ou não.
É interessante observar que o quadro tem uma relação grande entre largura e altura, o que
dá esse aspecto de enquadramento de uma paisagem com vários motivos evidentes.
1.4 ANÁLISE SINTÁTICA
1.4.1 ComposiçãoO próprio formato do quadro, em proporção de paisagem, sugere eixos na horizontal (Fig.
8). No entanto, a posição das personagens, tanto humanas como de cavalos, mostram claramente
a quebra da horizontalidade do quadro com linhas praticamente verticais (Fig. 8). Não há o uso
de perspectiva. O trabalho com recortes superpostos dá sentido de profundidade com o uso de
proporções menores de desenhos se a cena estiver mais ao fundo.
Os eixos de simetria verticais localizados na porção central levam o espectador a dirigir
seu olhar para essa região, sendo que sua leitura se dá de baixo para cima.
Figura 8 - Eixos da composição. Eixos predominantemente verticais em vermelho e predominantemente horizontais em amarelo.
1.4.2 DesenhoAs linhas da obra em questão estão bem marcadas. É possível verificar que elas são
importantes na pintura, pois sugerem bem as formas geométricas de cada desenho. Portanto, a
linha tem papel fundamental.
1.4.3 Cores e LuzPara a avaliação do uso de cores, foram utilizados os esquemas cromáticos do ANEXO B.
Há predominância de cores análogas entre os objetos do quadro. A mulher de verde, possui cores
7
análogas, que são praticamente complementares as cores da mulher de marrom em terceiro
plano. Ambas contrastam com a mulher em primeiro plano que possui cores neutras (preto e
branco). O jogo de cores se repete nos cavalos à esquerda, usando cores análogas num mesmo
cavalo, mas complementares entre um cavalo e outro. Uma mesma personagem (o tocador de
banjo), no entanto, tem em seu corpo o mesmo jogo com as cores: em seus membros inferiores
há cores análogas que, comparadas à parte superior da personagem, são complementares.
1.4.4 Técnica e MatériaAs pinceladas são largas feitas em óleo sobre tela sendo uma técnica bastante utilizada
por Di Cavalcanti, mas não exclusiva, uma vez que também trabalhou em outras obras com
xilografia, nanquim, madeira, serigrafia e até mosaico (Fig. 9). Tal técnica a óleo já era utilizada
há tempos e em larga escala no momento de produção da obra estudada.
Figura 9 - Faixada do Teatro Cultura Artística, São Paulo: Alegoria das Artes, 1950. Obra de Di Cavalcanti feita em mosaico de vidro. Fonte: www.cursosdemosaico.com.br/historia-do-mosaico.php.
1.5 ANÁLISE HISTÓRICAQuando finalizou Figuras de Animais, Di Cavalcanti tinha 57 anos, idade com a qual já
havia se consagrado como artista da época moderna. No caso deste quadro, não mudam as
tendências de se mostrar a cultura brasileira tão presente em suas obras. Mais que isso, Di
Cavalcanti, como já foi mencionado, buscou mostrar o retrato da cultura negra nesta e em outras
obras, característica da qual não abriu mão mesmo em suas obras mais tardias. Sua influência
inicial pela Art Nouveau surge em suas obras da década de 20 (séc. XX) com o retrato da figura
feminina. Suas pinturas exprimem sobretudo a sua busca do belo por meio de um modelo que
8
ocorre ser de origem negra (ZANINI, 1983, p. 1024). Mas seu desenho evolui para figuras
hipertrofiadas e formas que parecem se rompe, além de cores usadas em liberdade (ZANINI,
1983). Tais traços, que já surgem antes de sua primeira viagem à Europa, o acompanham ao
longo de sua vida e, conseqüentemente, na obra em questão.
1.6 ANÁLISE PESSOALQualquer que seja a interpretação da pintura de Di Cavalcanti, é possível perceber que há
um aspecto de unificação dos seres em uma só categoria (animais que o são), sobretudo se se
comparar o segundo quadro também titulado de Figuras de Animais, que, por sinal, encontra-se
ao lado do trabalho estudado em questão. A Figura 10 mostra que há a representação de uma
classe social mais abastada, dentro de uma casa, mas que, todavia, não as fazem menos animais,
ao menos pelo título dado pelo autor. É interessante notar que na figura XX, as mulheres são
brancas, enquanto que o uso de cores na figura XX sugere que as pessoas são mais morenas ou
negras.
Figura 10 - Figuras de Animais, 1954. Fonte: Design & Muito Mais (designmuitomais.blogspot.com.br/).
Os elementos, apesar de classes sociais diferentes, aparecem: cavalos alados ou não, aves
(agora, sob um aspecto de harmonia e não mais como alimento), uma pessoa tocando um
instrumento (no caso, um violoncelo) à direita da pintura.
Apesar da relação com o labor pesado na cena estudada, o quadro passa uma sensação de
harmonia não só no que é feito/trabalhado, mas entre os próprios animais, sobretudo no âmbito
ecológico com a predação de peixes e aves para a alimentação e cavalos para a domesticação,
atividades essas que, realizadas de tal maneira, costumam impactar muito pouco o ambiente. A
simplicidade da cena também passa um bem estar e desejo de se apropriar daquele momento não
9
como uma das personagens, mas como mais um integrante daquela paisagem de certa forma
bucólica.
CAPÍTULO 2 – LA PORTEUSE DE PARFUM, 1923/1924
1.7 A OBRALa Porteuse de Parfum (ou, em português, A portadora de
Perfume. Fig. 11) é uma escultura com dimensões de 341 mm x
100 mm x 87 mm feito em gesso finalizada em 1924, quando
Victor Brecheret tinha 30 anos de idade. Foi uma obra doada
pelo próprio artista à Pinacoteca. Atualmente, encontra-se
conservada em um dos corredores do segundo andar com alguma
iluminação vinda de porta de vidro ao seu lado.
1.8 O AUTOR
1.8.1 BiografiaVictor Brecheret nasceu em Farnese di Castro, Itália, no
ano de 1894, e com 18 anos iniciou seus estudos de desenho,
entalhe e modelagem no Liceu de Artes e Ofícios de São Paulo.
Diferente dos artistas do modernismo brasileiro, Brecheret era de
origem humilde e vem a São Paulo com seus tios maternos
(MAC/USP, s.d.). Em 1913, viaja à Europa para estudar
escultura, tornando-se aluno do escultor Arturo Dazzi, em Roma.
Com 22 anos obtém o primeiro lugar na Exposição Internacional
de Belas-Artes, em Roma, com a obra "Despertar". Nesse
período, alguns críticos observam a influência em seu trabalho
dos escultores Bourdelle, Rodin (IVB, s.d.) e Mestrovic, neste
principalmente devido à expressividade, tensão, alongamento e torsões das figuras (MAC/USP,
s.d.).
Em 1919, participa da exposição Mostra Degli Stranieri alla Casina del Pincio e
novamente seus trabalhos recebem elogios da crítica. Retorna ao Brasil e instala seu ateliê no
Palácio das Indústrias, com a ajuda de Ramos de Azevedo. Ali trabalha intensamente e em
completo isolamento, sofrendo dificuldades de adaptação (IVB, s.d.).
10
Figura 11 - La porteuse de Parfum, 1923-1924. Arquivo Pessoal.
Em 1920, Victor Brecheret torna-se
conhecido dos pioneiros do movimento de
renovação artística, Menotti Del Pichia,
Helios Seelinger, Di Cavalcanti e Oswald
de Andrade, que o fazem símbolo do
movimento. Ele é o moderno que os
modernistas querem mostrar, repartindo
com Anita Malfati o papel essencial no
momento “heróico” que antecedeu a semana de Arte Moderna de 1922. Ainda em julho de 1920,
Brecheret, sob a influência do sentimento nativista dos jovens modernistas, realiza a maquete do
"Monumento às Bandeiras” (IVB, s.d.).
No dia 24 de abril de1921, na Casa Byington, expõe a escultura "Eva" (Fig. 12), que é
adquirida pela Prefeitura de São Paulo. Torna-se bolsista do Pensionato Artístico do Estado de
São Paulo e viaja para a França, deixando algumas esculturas que farão parte da Semana de Arte
Moderna de 1922. Na França, expõe a escultura "Templo da Minha Raça" no Salon d'Automne
em Paris e é premiado, entre quatro mil
concorrentes. Tem participação significativa, através de suas obras, na Semana de Arte Moderna
de 1922, mesmo estando em Paris (IVB, s.d.).
Em 1924, aos 30 anos de idade, expõe "Portadora de Perfume" no Salon d'Automne, obra
de análise deste trabalho, e, em 1925, expõe novamente no Salão da Sociedade dos Artistas
Franceses e recebe menção honrosa. No Salon d'Automne expõe "A Dançarina" (IVB, s.d.).
Como boa parte dos artistas da Escola de Paris, Brecheret está alinhado ao surgimento do
“Art Déco” a partir de 1925 com a Exposição Internacional das Artes Decorativas e Industriais
Modernas. Concordante com esta arte de vanguarda, modifica sua escultura, adotando formas
geometrizadas, lisas e luminosas, sendo bastante elogiado pela crítica (MAC/USP, s.d.). Mas é
só em 1926 que o artista realiza neste mesmo ano sua primeira exposição individual, em São
Paulo (IVB, s.d.).
Sócio-fundador da Sociedade Pró-Arte Moderna, SPAM, no período de 32, a grande
atuação na vida paulista, organizando exposições, festas, encontros sociais, enfim, criando um
ambiente para o convívio entre artistas e intelectuais e o desenvolvimento das novas idéias da
arte. (IVB, s.d.).
11
Figura 12 - Eva, 1919. Fonte: Andreia Jardim - Flickr.
Participa da XXV Bienal de Veneza em 1950 e, em 51, é convidado para a I Bienal
Internacional de São Paulo e é agraciado com o Prêmio Nacional de Escultura com "O Índio e a
Suaçuapara". Durante o ano de 52, também acaba participando da XXVI Bienal de Veneza (IVB,
s.d.).
Um novo marco para São Paulo surge no dia 25 de Janeiro de 1953, aniversário da
Cidade de São Paulo com inauguração do "Monumento às Bandeiras" (Fig. 13). Nesse ano,
realiza a fachada do Jockey Club de São Paulo (IVB, s.d.).
Figura 13 - Monumento às Bandeiras. Fonte: Wikipédia.
Em 1955, participa da III Bienal Internacional de São Paulo e da mostra Artistes
Brésiliens, em Paris, organizada pelos Museus de Arte Moderna do Rio de Janeiro e de São
Paulo. Em 17 de Dezembro desse ano, Victor Brecheret morre em São Paulo (IVB, s.d.).
1.8.2 Outras ObrasMonumento às Bandeiras, Sepultamento, Dançarina, Beijo, Depois do Banho,
Monumento ao Duque de Caxias, Fauno, entre outras.
1.9 ANÁLISE DO ASSUNTOEm La Porteuse de Parfum, o nome propriamente dito mostra o que é a cena: uma figura
feminina nua carrega em seu ombro direito uma espécie de vaso em formato elíptico com
12
perfume em seu interior. A mulher parece retraída, devido à torção natural de sua perna e cabeça
para lados opostos, levando a uma sensação de angústia e instabilidade.
1.10 ANÁLISE SINTÁTICA
1.10.1 ComposiçãoA figura feminina possui um eixo claramente vertical que, apesar de a torção gerar uma
sensação de instabilidade, tal posição ereta sugere solidez e equilíbrio ao carregar o pote de
perfume.
1.10.2 Técnica e MatériaA escultura é feita em gesso, mas a pintura aplicada à obra pode confundir o expectador
quanto ao tipo de material utilizado, que parece ser mais robusto. De fato, gesso não era o
material dos mais utilizados por Brecheret como obra acabada. Durante sua vida, utilizou muito
o bronze e várias obras na Pinacoteca são compostas por esse material. Uma obra também
nominada de Carregadora de Perfume (mas essa em português), em cobre, exatamente igual ao
original em gesso, foi adquirida em 1998 pela Pinacoteca por meio de Protocolo de intenções
doação do Museu Nacional de Belas Artes, o Banco Safra e sua filha, Sandra Brecheret
Pellegrini (PINACOTECA, s.d.). Logo, a primeira obra feita em gesso, deve ter sido feita para
ser facilmente carregada para o Salon d’Automne de 1924 e transferida posteriormente para seu
local definitivo, dado que o gesso é um material de muito baixo peso específico e mais fácil,
portanto, de se carregar que o bronze. Ainda assim, Brecheret conseguiu dar belo aspecto ao
gesso com uma pintura que simulava de alguma forma uma escultura feita em algum material
metálico.
1.11 ANÁLISE HISTÓRICAVictor Brecheret deu sinais da qualidade de sua obra no Brasil quando Oswald de
Andrade, Di Cavalcanti e o pintor e caricaturista Hélios Seelinger o descubriram, no ano de
1920, em um atelier improvisado por Ramos de Azevedo no Palácio das Indústrias. Monteiro
Lobato e Menotti del Picchia, a seguir, iniciaram a divulgação de sua obra (ZANINI, 1983).
Impressionados com suas esculturas, tornou-se “fácil” para o escultor ser um dos expoentes da
Semana de Arte Moderna de 1922 (SAM). Como iria amadurecer seu trabalho na sua segunda
viagem à Europa em 1921, deixou diversos trabalhos para a SAM.
Neste período em que aperfeiçoa sua técnica em Roma, entrou em contato e pôde admirar
as obras do então Iugoslavo Ivan Mestrovic, o qual influenciou sua obra, sobretudo com relação
13
à torção das figuras esculpidas, fato que também teve influência desde muito cedo de Rodin,
antes mesmo desta sua segunda viagem. Este aspecto de torção do corpo está presente também
na Portadora de Perfume.
O registro anatômico acurado de algumas obras como Eva (Fig. 12), influência da Art
Decó, começa a ser eliminado a partir desta viagem à Europa e a figura geométrica simples
feminina surge, dando um aspecto mais analítico à forma geométrica do motivo.
1.12 ANÁLISE PESSOALA portadora de perfume é daquelas esculturas que chamam a
atenção primeiramente por sua altura, que traz certa imponência à
primeira vista, mas ao mesmo tempo, lembra também delicadeza
devido às curvas de suas formas, basicamente cilíndricas ou
esféricas (Fig. 14). O padrão de beleza, contrário aos atuais, denota
naturalidade e não deixa de emanar sensualidade por não seguir tais
padrões contemporâneos. Sua localização na pinacoteca exige uma
crítica para que a escultura fique em local aberto para que a
incidência da luz destaque suas curvas de maneiras diferentes ao
longo dos dias, o que valorizaria muito mais a obra.
CAPÍTULO 3 – PINACOTECA DO ESTADO DE SÃO PAULO, 1897/1900
1.13 A OBRA
O Edifício da Pinacoteca do Estado de São Paulo (Fig. 15), projeto do escritório de
Ramos de Azevedo com desenho de Domiciano Rossi, foi parcialmente construído sem a cúpula
(Fig. 16) e o revestimento externo em 1900
(FIALDINI, 2005). A falta de revestimento
deixou aparente seus tijolos, maiores e
mais pesados que os utilizados nos dias de
14Figura 16 - Entrada principal da Pinacoteca do Estado, 2005. Acervo Pinacoteca / Foto: Cristiano Mascaro.
Figura 15 - Elevação a partir da Av. Tiradentes do projeto original para o edifício do Liceu de Artes e Ofícios, 1896. Fonte: ARAÚJO, 1994.
Figura 14 - Detalhe da escultura onde se pode ver formas geométricas. Arquivo pessoal.
hoje. Além disso, o projeto original tinha como finalidade abrigar o Liceu de Artes e Ofícios. Em
1998, a pinacoteca tem sua reforma concluída com projeto assinado pelo escritório do arquiteto
Paulo Mendes da Rocha, o qual interveio na estrutura com o uso do aparente do aço. Possui
10.815 m² de área construída em um terreno de 7.000 m².
1.14 O AUTOR
1.14.1 BiografiaComo um dos maiores responsáveis
pela mudança operada na cidade de São
Paulo, em termos arquitetônicos, a figura de
Francisco de Paula Ramos de Azevedo (Fig.
17) deve sempre ser lembrada, como o é na
famosa Praça no centro de São Paulo que
margeia uma de suas obras mais importantes:
o Teatro Municipal de São Paulo.
Nascido a 8 de dezembro de 1851,
filho de uma tradicional família de Campinas (POLI/USP), iniciou a sua carreira de engenheiro
matriculando-se na Escola Militar do Rio de Janeiro. Não sentindo pendor para a vida de quartel,
abandonou-a e ingressou na Escola Central (Politécnica), na mesma cidade do Rio de Janeiro,
onde fez os primeiros estudos. Não podendo completar aí o seu curso, deixou a escola e retornou
à terra natal. Começou, então, em 1871, a trabalhar como prático na Companhia Mogiana de
Estradas de Ferro. Em 1872 passou para a Companhia Paulista de Vias Férreas, que a esse tempo
fazia o prolongamento da linha que ligava Campinas a Rio Claro. Era seu engenheiro-chefe o
famoso Antônio Rebouças, a quem Ramos de Azevedo foi solicitar o modesto emprego de
ajudante numa das seções da linha. Satisfeito em seu desejo, trabalhou durante dois anos com o
chefe de seção, partindo ao cabo desse tempo (1875) para a Bélgica, onde fez o seu curso de
engenheiro civil e arquiteto, na Universidade de Gand. Tão grande foi a nomeada de Ramos de
Azevedo na Universidade, que seus trabalhos foram por ela escolhidos para figurar na Exposição
de Paris em 1878 (ano de sua formatura). Formado, Ramos de Azevedo volta ao Brasil (em
1879) e instala-se em Campinas, que era então uma velha cidade do interior onde as construções
também se faziam com taipa, pesadamente, sem arte e sem gosto (LOUREIRO, 1981 p. 47).
15
Figura 17 - Retrato de Ramos de Azevedo, 1929. Oscar Pereira da Silva. Fonte: FIALDINI, 2005.
A velha matriz campineira, com suas largas paredes de taipa, muitas delas fendidas,
estava ainda por acabar e ameaçava ruir. A comissão encarregada da construção do templo
consulta o seu jovem conterrâneo engenheiro e este assume o encargo de concluí-la, dando-lhe
melhor aspecto e consolidando-a. E assim o fez, transformando o edifício em um templo elegante
e formoso, interna e externamente. Logo após, constrói o Matadouro de Campinas e,
paralelamente, inicia a construção de uma série de casas particulares, entre as quais o solar de
Antônio Corrêa Barbosa, e que deu à capital agrícola do Estado (como então era chamada
Campinas) a feição moderna que passou a ter (LOUREIRO, 1981 p. 48).
Mas à época Campinas era um
campo muito estreito para a qualidade do
trabalho de Ramos de Azevedo. Ao cabo
de poucos anos, em 1886, ele transfere a
sua residência para São Paulo e tem a
sorte de encontrar à frente do governo da
Província o Conde de Parnaíba, que o
conhecia e que o encarregou, por ordem
do Governo Geral, da construção do
edifício destinado à Tesouraria da
Fazenda, hoje Secretaria da Justiça e da
Defesa da Cidadania (Fig. 18). Concomitantemente, Ramos de Azevedo foi procurado por
grande número de particulares para construir palacetes e casas de moradia. Nelas imprimiu uma
feição original e elegante, que diferia completamente dos pesados e desgraciosos edifícios então
existentes. Essas construções, além de enriquecerem o património artístico da cidade, muito
contribuíram para o desaparecimento do aspecto provinciano da velha Paulicéia, concorrendo
para a sua vertiginosa transformação na grande metrópole de hoje (LOUREIRO, 1981 p. 48).
Além de sua atividade como engenheiro, Ramos de Azevedo exerceu inúmeros cargos,
entre os quais o de Conselheiro do Banco Ítalo-Belga, da Sociedade Paulista de Agricultura, da
Caixa Económica de São Paulo, da Comissão Administrativa do Teatro Municipal, de Mesário
da Santa Casa de Misericórdia (desde 1902 até o ano de seu falecimento a 13 de junho de 1928).
Foi presidente do Instituto de Engenharia, e um dos primeiros lentes que constituiu a primeira
Congregação da Escola Politécnica, em 1894, tomando parte saliente na elaboração do
16
Figura 18 - Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania. Fonte: ecoturismo-sustentabilidade.com/
Regulamento e do Regimento da Escola. Por morte do diretor, Dr. Paula Souza, foi ele (que já
era vice-diretor) nomeado diretor (LOUREIRO, 1981 p. 49).
Mas sua mais importante gestão desenvolveu-se como Diretor do Liceu de Artes e
Ofícios, que fora fundado em 1873, com o nome de Escola Propagadora da Instrução. Imprimiu
Ramos de Azevedo grande dinamismo ao Liceu. Qualquer artífice ou mestre de valor que
chegava do estrangeiro, era logo conquistado por ele para o Liceu, visando a formação de mão-
de-obra qualificada. E o Liceu tornou-se o centro de onde se irradiou o movimento de artes
aplicadas num São Paulo que adotara o estilo d’Art Nouveau com entusiasmo (LOUREIRO,
1981 p. 49).
A primeira escola profissional de caráter industrial no Brasil funcionou junto ao Liceu, a
partir de 1900, por iniciativa do arquiteto Ramos de Azevedo. Pouco tempo antes da fundação da
escola, Ramos de Azevedo terminava a sua residência, onde já se observavam inúmeros
elementos floreais, realizados por Luís Scattolini. Quando fundaram a escola, Ramos de
Azevedo convidou o jovem Scatollini para auxiliá-lo na organização. Tão grande foi o
desenvolvimento e notoriedade alcançados pelo Liceu, que chegou a obter o primeiro prêmio,
medalha de ouro, em "artistic furniture", na Exposição Universal de St. Louis, em 1904, com
umas vitrinas giratórias estilo Art Nouveau. Desta forma, Ramos de Azevedo formou artífices de
aprimorada técnica, dos vários alunos que
passaram pelo Liceu de Artes e Ofícios.
Apesar de quase octogenário, não descansou
até os últimos momentos, pois o seu vigor
físico e energia intelectual o impeliam a
novos projetos. Faleceu no Guarujá a 12 de
junho de 1928, aos 76 anos de idade.
(LOUREIRO, 1981 p. 49-50).
1.14.2 Outras ObrasEscola Politécnica (atual FATEC-SP), Teatro Municipal, Palácio das Indústrias, o
edifício dos Correios e Telégrafos, o Hotel Guarujá (Santos), o Mercado Municipal de Campinas
(Fig. 19), a Estação Sorocabana, entre outras.
17
Figura 19 - Mercado Municipal de Campinas. Fonte: cinarasplace.blogspot.com.br/
1.15 ANÁLISE DA OBRAO edifício possui três pavimentos e
tem orientação simétrica ao redor de uma
rotunda em forma octogonal central,
projetada para receber uma grande cúpula
que nunca foi executada. Além do octógono
central (Fig. 20), há ainda dois pátios laterais
retangulares, também simétricos, ao redor
dos quais se organizam as salas. Seguindo os
ideais do arquiteto, o prédio foi construído
em alvenaria estrutural de tijolos de barro
(ZASNICOFF, 2007, p. 77-78).
Em 1930, dois fatos mudaram radicalmente o uso do edifício: um incêndio no prédio e a
instalação de um quartel provisório, em função das revoltas políticas – a Revolução de 1930 e a
Revolução Constitucionalista de 1932. O Liceu de Artes e Ofícios foi transferido para um
edifício na Avenida Tiradentes e continuou operando também no edifício da Rua Cantareira, que
ainda hoje é a sua sede. O Liceu jamais retornou à sede original. A Pinacoteca permaneceu
fechada por dois anos. Sua reabertura aconteceu no edifício da Imprensa Oficial do Estado, seu
endereço até 1947, quando retornou ao Jardim da Luz e passou a dividir o edifício com a Escola
de Belas Artes, que entre 1932 e 1939 fora responsável pela guarda e preservação de seu acervo.
Para a sua instalação no edifício, a escola de Belas Artes realizou reformas devastadoras. Seu
programa de necessidades era muito maior do que o espaço disponível, o último pavimento do
edifício. Assim, implantaram um novo pavimento, dividindo o pé-direito em dois e destruindo as
esquadrias e a alvenaria (ZASNICOFF, 2007, p. 78-79).
A partir dos anos 1970, iniciou-se um movimento pela recuperação da Pinacoteca mas foi
só entre 1993 e 1998 que ela passou por uma reformulação completa, enfrentando a maior
reforma de toda a sua história, sob o comando do arquiteto Paulo Mendes da Rocha
(ZASNICOFF, 2007). A reforma trouxe o uso de material de aço, nas passarelas, elevadores e
outras estruturas, e vidro, na clarabóia (Fig. 21), além da restauração de estruturas que estavam
comprometidas com o tempo.
18
Figura 20 - Planta do primeiro pavimento da Pinacoteca. Ao centro, o octógono. Fonte: ARTIGAS, 2000, p. 211.
Figura 21 - Vista do pátio, com passarela metálica, clarabóia e elevador. Fonte: ARTIGAS, 2000, p. 207.
Segundo a Carta de Veneza (1964), a intervenção no edifício deve ser evidente, não deve
ficar disfarçada, com a utilização de estilos e materiais que simulem aqueles da construção
original; deve ser realizada segundo as tecnologias construtivas do seu momento de realização –
para não induzir ao engano; deve, portanto, ostentar a marca do nosso tempo (Art. 9º, Carta de
Veneza, 1964). Assim, o material utilizado pelo arquiteto Mendes da Rocha e seu escritório
procurou seguir tais princípios a fim de evidenciá-los na obra. Mostrando, desta forma, que a
Pinacoteca é uma obra de arte resultante do Histórico de sua ocupação ao longo do tempo, de
suas intervenções arquitetônicas e, inclusive, de sua não finalização do projeto original
arquitetado pelo escritório de Ramos de Azevedo.
1.16 ANÁLISE HISTÓRICARamos de Azevedo comandava muitos profissionais ligados à construção civil e tinha
como ideologia a renovação da cidade, através da substituição da cidade colonial feita em taipa,
pela nova construída em tijolos. Neste contexto, realizou uma reforma curricular que pretendia
criar bases para a formação da Escola de Belas Artes de São Paulo (ZASNICOFF, 2007, p. 77).
19
Com seu prestígio ante os entes políticos, conseguiu recursos e terreno para levantar, ainda que
incompleto, em 1900 o Liceu de Artes e Ofícios sob regras de composição de influência
classicista (ZASNICOFF, 2007), como pode ser visto por Carlos Lemos no trecho a seguir:
“...Em resumo, o procedimento era esse: escolhido o terreno, vistas as
suas proporções, era imaginado um edifício grandiloqüente concebido
dentro de todas as regras de composição classicizantes, se o profissional
estivesse atrelado à tradição arquitetônica da Beaux Arts parisiense (que
era o caso de Ramos) e depois, dentro do espaço então resultante era
estudada a adequação do programa de necessidades. Está claro que há
um certo exagero nesta última afirmativa assim genericamente exposta.
A tendência era essa. A forma tinha prioridade sobre a função (...)
(ARAUJO, 1994. p.10).
Assim, renovado pelas tendências européias, mas ainda presos ao academicismo do
neoclassicismo, os edifícios da urbanização paulistana trazem consigo essas características.
1.17 ANÁLISE PESSOALO edifício da pinacoteca encanta muito pelos tijolos empregados na sua construção. As
colunas de estilo clássico empregadas em tijolo realmente dão um ar distinto ao prédio de estilo
acadêmico. Incrível é pensar que ele não foi totalmente acabado e que sua feição seria outra, caso
houvesse sido, talvez com uma cara mais parecida à antiga Escola Politécnica (atual FATEC-
SP), muito próxima dali, de autoria do mesmo arquiteto. Apesar de alguns autores julgarem que a
intervenção em uma obra deva ser aparente, como já foi apontado, as estruturas de aço e a
cobertura central não agradam tanto quanto a estrutura original, mas há de se confessar que a
imitação da estrutural original não faria trabalho melhor. A ausência da cúpula do projeto
original, a falta de acabamento e a intervenção recente pelo escritório Paulo Mendes da Rocha
demonstram a história peculiar que esse edifício tem e muito de seu charme vem daí. Se um dia a
sociedade avançar e permitir, as grades que o protegem serão retiradas e não haverá mais
interferências visuais para sua contemplação, seja a partir da Estação da Luz ou a partir do
Parque da Luz.
20
CONCLUSÃOA descrição das três obras analisadas mostra não somente suas peculiaridades, inclusive
como obras de materiais, técnicas e ofícios distintos, mas também é possível notar nelas as
peculiaridades do estilo predominante de cada artista, seja ele um escultor, seja um arquiteto.
Mais próximas entre si estão as obras de Di Cavalcanti e de Victor Brecheret, muito
devido ao momento em que obtiveram êxito em suas carreiras e, principalmente, por terem sido
um dos protagonistas da Semana de Arte Moderna em São Paulo.
Já Ramos de Azevedo, adota um estilo mais acadêmico, típico estilo neoclássico
brasileiro adotado como segundo estilo artístico pós-barroco e não só em voga na Europa durante
algum tempo, mas muito difundido no Brasil por meio da Academia de Belas Artes carioca.
Como o arquiteto vem de uma geração anterior aos outros artistas estudados, é de se esperar que
sua influência artística seja menos moderna que a dos seus contemporâneos. No entanto, é de
suma importância ressaltar sua posição destacada na mudança da arquitetura paulista, na virada
do século XX, que mudou a cara do que viria a ser a futura megalópole brasileira.
É interessante ressaltar que em algum momento da vida, todos esses personagens da
história artística brasileira puderam se encontrar e se conhecer: a convite do então já consagrado
arquiteto Ramos de Azevedo, Victor Brecheret improvisa um atelier no Palácio das Indústrias
(atual Museu do Catavento) no qual se isola para produzir obras importantes de sua carreira. No
entanto, como bolsista do Estado, sente-se insatisfeito naquela posição solitária, e o encontro
com Di Cavalcanti e outros vanguardistas da época fazem com que a obra de Brecheret seja
descoberta e divulgada no Brasil e no mundo. O encontro entre esses belos artistas não poderia
gerar melhores frutos: a Semana de Arte Moderna, que revolucionaria a arte no Brasil.
No processo de análise das obras, pode-se perceber que houve refinamento e melhora das
observações, mostrando que a contemplação e síntese das conclusões de uma análise artística não
é imediata, mas exige um treinamento e conhecimento de como fazê-la. É um esforço cultural no
qual se deve apoiar os professores não só de ensino superior, mas também os de formação básica.
Adaptando o que diz Jorge Coli em seu livro sobre o que é arte, para que se possa deveras
emocionar-se em uma partida de futebol, é preciso conhecer as suas regras. O mesmo vale para a
Arte pois, do contrário, tudo passará despercebido e como às vezes é feito em museus, passar-se-
ia de modo indiferente pela obra.
21
BIBLIOGRAFIAARAUJO, Emanoel (Coord.). Pinacoteca do Estado. São Paulo: Banco Safra, 1994.
ARTIGAS. Rosa (Org.). Paulo Mendes da Rocha. São Paulo: Cosac & Naify,
2000.
COLI, Jorge. O que é Arte. Coleção Primeiros Passos. São Paulo: Editora Brasiliense, 12ª
Edição, 1991.
FIALDINI, R. 100 Anos da Pinacoteca – A formação de um acervo. Pinacoteca do Estado (SP).
São Paulo: Editora Pinacoteca do Estado, 2005.
GOMBRICH, E. H. The History of Art. London: Oxford University Press, 4th Edition, 1951.
HELLER, Agnes. Historia y vida cotidiana – aportación a la sociologia socialista. Traducción
de Manuel Sacristán. Barcelona: Editorial GRIJALBO S.A., 1985.
LOPES, Rafael W. Educação Estética e Vida Ética em Friedrich Schiller. Cultura e Fé, vol. 35,
n. 137, 181-198, abr./jun., 2012.
LOUREIRO, Maria A. S. Evolução da casa paulistana e a arquitetura de Ramos de Azevedo.
São Paulo: Voz do Oeste, Secretaria do Estado da Cultura, 1981.
ZANINI, Walter (Org.). História geral da arte no Brasil. São Paulo, Instituto Walther Moreira
Salles, 1983. 2v., il.
ZASNICOFF, P. D. C. da S. A Dimensão Pública da Arquitetura em Museus: uma análise
de projetos contemporâneos. Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado da Escola de
Arquitetura da Universidade Federal de Minas Gerais, como requisito parcial à obtenção de título
de Mestre em Arquitetura e Urbanismo. Área de concentração: Teoria e prática do projeto
arquitetônico. Belo Horizonte, 2007.
Referências na internet:
Carta de Veneza, disponível em http://portal.iphan.gov.br/portal/baixaFcdAnexo.do?id=236.
Acesso em Junho, 2014.
Di Cavalcanti, disponível em http://www.dicavalcanti.com.br. Acesso em Junho, 2014.
E-biografias, disponível em http://www.e-biografias.net/di_cavalcanti/. Acesso em Junho, 2014.
IVB - Instituto Victor Brecheret, disponível em
http://www.mac.usp.br/mac/templates/projetos/seculoxx/modulo2/modernismo/artistas/brech/
index.htm. Acesso em Junho, 2014.
22
MAC/USP - Museu de Arte contemporânea da Universidade de São Paulo, disponível em
http://www.brecheret.com.br/. Acesso em Junho, 2014.
Pinacoteca do Estado de São Paulo, Acervo Artístico de Victor Brecheret. Disponível em:
http://www.pinacoteca.org.br/pinacoteca-pt/default.aspx?
mn=545&c=acervo&letra=V&cd=2339. Acesso em Junho, 2014.
POLI/USP – Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, disponível em
http://www.poli.usp.br/pt/a-poli/historia/galeria-de-diretores/200-prof-dr-francisco-de-paula-
ramos-de-azevedo-.html. Acesso em Junho, 2014.
23
ANEXOS
ANEXO A
Roteiro para o Trabalho Leitura de Obras de Arte
Escolher 3 obras do Acervo da Pinacoteca e realizar a análise das obras seguindo o roteiro abaixo.
Formatar o trabalho segundo as Orientações para Trabalhos Acadêmicos – ppt em Material de Aula na Unidade Web
Orientações:
1. Observar atentamente as informações dadas na legenda da obra : autor(se houver);
título ; data da execução; suporte/material ; dimensões; lugar de conservação.
2. Obter dados sobre o autor: data e lugar de nascimento e morte ; origem social ; anos e
lugares de formação; idade que tinha quando da realização da obra; outras obras suas.
3. Reconhecer o tipo de assunto representado (tema ou gênero): cena religiosa ; histórica ;
mitológica; alegoria ; retrato ; paisagem ... (se e quando apareceu ao público ; acolhimento...).
4. Analisar o assunto propriamente dito : descrever o que está representado ; lugares ;
enquadramento da cena; personagens; ação das personagens ; objetos...
Deve tentar perceber-se porque é que o autor pintou um quadro com aquelas dimensões e
não outras, proceder à análise da cena, do enquadramento desta, dos móveis, dos objetos
representados, da paisagem, da posição das personagens, identificando-as, como estão vestidas,
em que atitude se encontram , etc.
Análise sintática
A composição - Quais são as linhas que organizam o quadro? Isto é, a organização das
figuras segundo esquemas geométricos ou não, com eixos bem marcados ou não, segundo leis de
perspectiva ou sem elas (como é criado o sentido de profundidade).
24
O desenho - qual é a função da linha, a sua espessura e forma? Tem um papel
fundamental ou acessório?
As cores - Quais são as cores dominantes? Cores quentes ou frias?, análogas ou
complementares?
A luz - De onde vem a luz? Está repartida uniformemente? Qual é o seu efeito?
A técnica - se for uma pintura: pincelada larga, pontilhada; se for um desenho: linear,
sfumato; se for uma escultura: superfície lisa, rugosa, polida, opaca, colorida.
A matéria _óleo, têmpera, argila, mármore, bronze, grafite, etc.
Deverá analisar se o olhar do espectador é atraído para algum ponto em especial e
porquê ; o que se pretende traduzir com determinadas cores ; se o emprego de determinada
técnica marca decididamente o estilo do autor; se o emprego de determinadas matérias representa
um avanço em relação a outros, inserção ou não nas técnicas comuns, etc
Análise histórica
Por que este tema? Por que esta técnica? Por que este estilo? Que efeito pretendeu
produzir no público?
Insere-se numa corrente artística ou rompe com as correntes dominantes?
A resposta a estas questões levará à descoberta de problemas relacionados com: tipos de
encomendas , ideias perfilhadas pelo autor, mentalidade dominante ; tipo de materiais colocados
à sua disposição, influências de outros artistas, etc.
Fazer um comentário pessoal sobre a obra de arte
Comentar do ponto de vista pessoal uma obra de arte, é exprimir a sua adesão ou não, à
obra, quer do ponto de vista intelectual, quer do ponto de vista afetivo, justificando a sua
posição.
Assista os (“sic”) vídeos no da série Obra Revelada.
25
São análises de obras feitas por pessoas conhecidas e desconhecidas, mas cada qual faz
uma leitura pessoal de uma obra de arte.
Edilson de Souza - Obra Revelada
http://www.youtube.com/watch?v=g_3dlQRn_ wc
Fabrício Carpinejar - Obra Revelada
http://www.youtube.com/watch?v= AsTwTfQCbbo
Benedito Nunes - Obra Revelada
http://www.youtube.com/watch?v=Bo7PCx_o9-w
Niede Guidon - Obra Revelada
http://www.youtube.com/watch?v=ZxrVDNG6hAI
Carlos Reichenbach - Obra Revelada
http://www.youtube.com/watch?v=L0SoPLRcym8
Augusto Damineli - Obra Revelada
http://www.youtube.com/watch?v=rtCEJHqIo5g
Elke Maravilha - Obra Revelada
http://www.youtube.com/watch?v=P42bDpAGuu8
João Sayad - Obra Revelada
http://www.youtube.com/watch?v=bqenv0EK1AM
26
ANEXO B
Figura 22 - Roda de Cores. Fonte: http://www.wl.com.br/roseantonelli/artigos/teoria.htm.
Figura 23 - Cores primárias, análogas, secundárias e complementares. Fonte: http://www.dcoracao.com/2010/10/teoria-das-cores-circulo-cromatico.html.
27