anÁlise crÍtica do livro cartas entre freud e pfister

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FAECAD JOSÉ MAURÍCIO DA SILVA ANÁLISE CRÍTICA DO LIVRO CARTAS ENTRE FREUD E PFISTER Rio de Janeiro Setembro de 2009

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Trabalho apresentadoem cumprimento das exigênciasda disciplina de Psicologia da Religião,do curso de Bacharel em Teologia

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Page 1: ANÁLISE CRÍTICA DO LIVRO CARTAS ENTRE FREUD E PFISTER

FAECAD

JOSÉ MAURÍCIO DA SILVA

ANÁLISE CRÍTICA DO LIVRO CARTAS ENTRE FREUD E PFISTER

Rio de Janeiro

Setembro de 2009

Page 2: ANÁLISE CRÍTICA DO LIVRO CARTAS ENTRE FREUD E PFISTER

JOSÉ MAURÍCIO DA SILVA

ANÁLISE CRÍTICA DO LIVRO CARTAS ENTRE FREUD E PFISTER

Trabalho apresentado

em cumprimento das exigências

da disciplina de Psicologia da Religião,

do curso de Bacharel em Teologia

Orientador Professor César Moisés

Rio de Janeiro

Setembro de 2009

Page 3: ANÁLISE CRÍTICA DO LIVRO CARTAS ENTRE FREUD E PFISTER

À minha querida família

pela compreensão por minha dedicação

em tempo integral à este trabalho.

Page 4: ANÁLISE CRÍTICA DO LIVRO CARTAS ENTRE FREUD E PFISTER

AGRADECIMENTOS

À Deus pela força, ânimo, saúde e sabedoria.

À minha esposa pelo modelo de apresentação do trabalho acadêmico.

Ao professor César Moisés que corrigirá meu trabalho de forma mais crítica

possível, apontando todos os erros, de modo que eu possa crescer na vida

acadêmica, atingindo maturidade para os próximos trabalhos.

Page 5: ANÁLISE CRÍTICA DO LIVRO CARTAS ENTRE FREUD E PFISTER

… luto por uma amada causa com um

amado adversário.

(Pfister, Zurique 20.2.1928)

Page 6: ANÁLISE CRÍTICA DO LIVRO CARTAS ENTRE FREUD E PFISTER

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO......................................................................06

2. DESENVOLVIMENTO

1. CREDENCIAIS DOS AUTORES E SUAS OBRAS..........07

2. RESUMO DA OBRA........................................................10

1. PERÍODO DE 1909 a 1919

1. Início da Amizade..................................................11

2. Análise de Obras...................................................11

3. O Campo das Idéias.............................................13

4. Influência Mútua....................................................15

2. PERÍODO DE 1920 a 1929

1. Análise de Obras...................................................16

2. O Campo das Idéias.............................................20

3. Influência Mútua....................................................24

3. PERÍODO DE 1930 a 1939

1. Análise de Obras...................................................27

2. O Campo das Idéias.............................................28

3. Influência Mútua....................................................28

3. Conclusão (Resenha Crítica)................................................................................29

Page 7: ANÁLISE CRÍTICA DO LIVRO CARTAS ENTRE FREUD E PFISTER

1. Introdução

O presente trabalho tem por objetivo uma resenha crítica do livro

Cartas entre Freud e Pfister, um diálogo entre a psicanálise e a fé cristã, cujo o

interesse é tomar conhecimento prévio do conteúdo e do valor deste livro,

permitindo uma triagem do tema a ser estudado.

O livro em questão é organizado em cartas trocadas entre os

autores, no período de 1909 a 1939.

No início do trabalho, são dadas as credenciais dos autores, bem

como a citação das obras analisadas no livro.

Em seguida o resumo da obra.

A melhor forma que encontrei para resumir a obra e obter um melhor

desenvolvimento do raciocínio foi primeiramente contextualizar as cartas

primeiramente separadas em décadas e estas subdivididas em temas que julguei

mais importantes no livro, quais sejam, “O início da amizade entre Freud e

Pfister”, “A análise de obras” escritas pelos autores constantes no livro, “O Campo

das Idéias” onde procurei organizar as idéias de cada um tinha e a tentativa de

influência de pensamento entre eles e finalmente “A Influência Mútua” onde

demonstra quando, em concordância, admitiram um a linha de pensamento do

outro, a partir ou não do “Campo das Idéias”. Intencionalmente procurei reproduzir

destacando entre aspas a opinião direta dos autores, a fim de manter a essência

de suas idéias.

Finalmente a conclusão aonde reside a resenha crítica da obra.

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Page 8: ANÁLISE CRÍTICA DO LIVRO CARTAS ENTRE FREUD E PFISTER

RESENHA CRÍTICA

FREUD, Sigmund; PFISTER, Oskar. Cartas entre Freud & Pfister [1909-1939]:

Um diálogo entre a psicanálise e a fé cristã. 3ª Edição. Viçosa, Ultimato, 2009.

200 p.

CREDENCIAIS DOS AUTORES

Sigmund Freud (Příbor, 6 de maio de 1856 — Londres, 23 de setembro de 1939)

foi um médico neurologista judeu-austríaco, fundador da psicanálise. Nasceu em

Freiberg, Morávia (hoje Příbor), quando esta pertencia ao Império Austríaco.

Interessou-se inicialmente pela histeria e, tendo como método a hipnose, estudou

pessoas que apresentavam esse quadro. Mais tarde, com interesses pelo

inconsciente e pulsões, entre outros, foi influenciado por Charcot e Leibniz,

abandonando a hipnose em favor da associação livre e da interpretação dos

sonhos. Estes elementos tornaram-se as bases da psicanálise. Freud, além de ter

sido um grande cientista e escritor (Prémio Goethe, 1930), possui o título, assim

como Darwin e Copérnico, de ter realizado uma revolução no âmbito humano: a

idéia de que somos movidos pelo inconsciente.

Freud, suas teorias e seu tratamento com seus pacientes foram controversos na

Viena do século XIX, e continuam a ser muito debatidos hoje. Suas idéias são

freqüentemente discutidas e analisadas como obras de literatura e cultura geral

em adição ao contínuo debate ao redor delas no uso como tratamento científico e

médico.

Outras obras:

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Page 9: ANÁLISE CRÍTICA DO LIVRO CARTAS ENTRE FREUD E PFISTER

1. FREUD, Sigmund. Delírios e sonhos no Gadiva de Jensen. Rio de Janeiro:

Imago 1907.

2. FREUD, Sigmund. Notas sobre um caso de neurose obsessiva. Rio de Janeiro:

Imago, 1909.

3. FREUD, Sigmund. Três ensaios sobre a teoria da sexualidade. Leipzig/Viena:

Deuticke, 1905. v VII.

4. FREUD, Sigmund. Cinco lições de psicanálise. Rio de Janeiro, Imago, 1910.

5. FREUD, Sigmund. Coletânea de pequenos escritos sobre o estudo das

neuroses. Viena: 1906.

6. FREUD, Sigmund. O interesse pela psicanálise, em Scientia. Bologna: 1913.

7. FREUD, Sigmund. Inibição, sintoma e ansiedade. Rio de Janeiro: Imago, 1926.

8. FREUD, Sigmund. A questão da análise leiga. Rio de Janeiro, Imago, 1926.

9. FREUD, Sigmund. O futuro de uma ilusão. 1927.

10. FREUD, Sigmund. O mal estar da civilização. Rio de Janeiro: Imago 1930

11. FREUD, Sigmund. O Ego e o Id

Oscar Pfister, (Zurique, 23 de fevereiro de 1873 - 1956) foi pastor protestante e

psicanalista, um dos primeiros psicanalistas leigos, sendo aceito pela Sociedade

Psicanalista de Zurique, única aceitar analistas não médicos, pioneiro em

interligar a psicanálise estudou teologia filosofia em Zurique, Basileia e Berlim.

Recebeu os títulos de doutor em filosofia e de doutor honoris causa em teologia

pela Universidade de Genebra. Trabalhou na educação e orientação de jovens,

atuando junto a crianças e adolescentes, através do trabalho eclesiástico e do

magistério, levando-o a estender os benefícios da análise para as faixas etárias.

Criou a pedanálise – aplicação da psicanálise à pedagogia.

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Page 10: ANÁLISE CRÍTICA DO LIVRO CARTAS ENTRE FREUD E PFISTER

Foi o único analista suiço a permanecer ao lado de Freud, depois da cisão deste

com Jung.

Outras obras:

1. PFISTER, Oskar, Representações delirantes e suicídio de alunos, 1909, Nº

1.

2. PFISTER, Oskar, Um caso de psicanalítica de almas e convalescença da

alma. Evangelischer Freiheit, 1909. Nº 3-5.

3. PFISTER, Oskar, A religiosidade do Conde Zinzendorf. Leipzig/Viena:

Deucike, 1910.

4. PFISTER, Oskar, A pesquisa analítica sobre a psicologia do ódio e da

reconciliação, Jarbuch, 1910.

5. PFISTER, Oskar, A decifração psicológica da glossolalia religiosa e da

criptografia automática. Leipzig/Viena: Deusticke, 1912.

6. PFISTER, Oskar, Histeria e mística em Margaretha Ebner. Zentralblatt,

1911.

7. PFISTER, Oskar, Criptolalia, criptografia e quadro enigmático inconsciente

na normalidade. Jahrbuch, 1913.

8. PFISTER, Oskar, Aplicações da psicanálise na pedagogia e cura de almas.

Imago, 1912.

9. PFISTER, Oskar, O método psicanalítico; descrição sistemática e

científico-experimental. Leipzig: Klinkhardt, 1913.

10.PFISTER, Oskar, O que a psicanálise oferece ao educador. Leipzig. 1917.

11. PFISTER, Oskar, Sobre a luta pela psicanálise, Internationaler

Psychoanalysticher Verlag, 1920. Psychoanalystiche Schriten, 1921.

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Page 11: ANÁLISE CRÍTICA DO LIVRO CARTAS ENTRE FREUD E PFISTER

12.PFISTER, Oskar, O desenvolvimento do apóstolo Paulo. Um esboço

histórico-religioso e psicológico. Imago, 1920.

13.PFISTER, Oskar, O fundo psicológico e biológico dos quadros

expressionistas. Berna: Bircher, 1920.

14.PFISTER, Oskar, O tratamento de crianças difíceis e anormais. Berna<

Bircher, 1921.

15.PFISTER, Oskar, Platão como precursor da psicanálise. Zentralblatt,

1921.

16.PFISTER, Oskar, Sonhos experimentais referentes a assuntos teóricos,

Psyche und Eros, 1924.

17.PFISTER, Oskar, O amor da criança e sua falhas de desenvolvimento.

Bierna: Bircher, 1922.

18.PFISTER, Oskar, Amor em crianças e suas aberrações. London: Allen and

Unwin, 1924.

19.PFISTER, Oskar, O amor pré-matrimonial e suas falhas de

desenvolvimento, Berna: Bircher, 1921.

20.PFISTER, Oskar, A lenda de Sundar Singh, Berna/Leipzig: 1926.

21.PFISTER, Oskar, A psicanálise a serviço da educação. Kopenhagen: 1934.

RESUMO DA OBRA

O livro é constituído de cartas, cada uma delas sob a responsabilidade de

um autor, sendo 134 manuscritos de Freud, traduzindo a amizade do criador da

psicanálise com o pastor protestante, troca de idéias, textos, desabafos,

compartilhando também suas vidas, na intimidade, tanto que Pfister e

descendentes de Freud acharam por bem censurar o conteúdo das cartas para

publicação. Influenciando-se mutuamente na busca da compreensão do homem,

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Page 12: ANÁLISE CRÍTICA DO LIVRO CARTAS ENTRE FREUD E PFISTER

devido ao temperamento, honestidade e descompromissada busca da verdade

de ambos, em alguns casos com agudos embates de palavras, soou mais alto o

apreço mútuo, mostrando autêntica tolerância e empatia recíproca, evidenciando

que uma diferença de opinião não precisa de modo algum levar à ruptura, a não

ser que as mentalidades fossem fundamentalmente divergentes, não aplicável

neste caso pois eram profundamente próximos, enraizadas no amor à verdade,

como fator central para a compreensão das pessoas. As correspondências

incitaram muitas obras de Oskar Pfister assim como estimulou Freud em suas

pesquisas, como na técnica de análise de crianças.

Neste resumo procurei contextualizar a obra em períodos de 10 anos,

analisando a crítica mútua de obras, a tentativa de influência no campo das idéias

pessoais e a influência causada em suas vidas.

Período de 1909 a 1919

Início da amizade – Pfister aproxima-se Freud, enviando-lhe a obra

Representações delirantes e suicídio de alunos, estabelecendo contato

através de Jung amigo de Freud, com quem supervisionava os casos

mais difíceis da psicanálise, a qual se interessou devido a busca da

compreensão da prática de cura de almas, coerente com a crítica que

fazia da teologia, que não se aproximava do âmago das pessoas. Freud

expressa satisfação “porque nossas pesquisas encontraram guarida

num cura de almas espiritual”, mostrando interesse nas demais obras

de Pfister, cujo nome já era mencionado frequentemente por Jung, logo

na primeira carta.

Análise de Obras - Freud referindo-se à obra de Pfister,

Representações delirantes e suicídio de alunos, como “precioso

trabalho”, promete relatar à Sociedade Psicanalítica das Quarta-feiras e

sugere uma oportunidade para maior troca de idéias. Quanto à Um

caso de psicanalítica de almas e convalescença da alma, entende que

o contexto e o público impuseram-lhe a necessidade de omitir muitas

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Page 13: ANÁLISE CRÍTICA DO LIVRO CARTAS ENTRE FREUD E PFISTER

coisas ou censurá-las, mas que a comunicação deveria ser menos

temerosa. Fala sobre o dilúvio como lenda. Ao receber uma prova

tipográfica do texto de Pfister contra Foerster (Freud adjetivou Foerster

como “repulsivo, pegajoso e sórdido”, “que sem hesitação e de forma

determinada, emite julgamentos publicamente com tão pouco

conhecimento de causa não pode ser trazida à razão nenhuma

influência externa, mas segue o demônio interior que tem de seguir”,

dizendo ainda que “aí a debilidade torna-se palpável”, “eu tinha

esperado algo mais habilidoso e inteligente” quando Foerster criticou

FREUD, Sigmund. Psicopatologia da Vida Cotidiana. Imago 1901)

réplica que era esperada ansiosamente por Freud, sobre algo feito por

parte de Foerster à Pfister, que tinha sido alertado anteriormente por

acha-lo “puro reconhecimento pelo senhor!” e que “creio que o senhor

espera muito dele, seu otimismo de bom pastor eleva demasiadamente

sua expectativa”, fica admirado pela forma que Pfister escreveu “tão

moderada, humana, cheia de tolerância, tão objetiva, tão mais para o

leitor que contra um inimigo”, que “eu não seria capaz de escrever

assim” e conclui que “deixemos que continuem latindo”. Sobre A

pesquisa analítica sobre a psicologia do ódio e da reconciliação, Freud

a pedido de Pfister pronuncia-se sobre a análise que diz esta “sofrer do

mal hereditário da – virtude”, “é obra de um homem decente demais,

que também se sabe comprometido com a discrição”, “a própria análise

só anda quando o paciente desce das abstrações substitutivas para os

pequenos detalhes”, concluindo que “a discrição é, portanto,

incompatível com uma boa configuração de uma análise”. Diz o que “o

senhor informa basta plenamente para justificar suas conclusões –

estas, aliás, dignas de honra – , mas o leitor não recebe nenhuma

impressão, não pode sensibilizar-se com seu inconsciente e por isso, a

rigor, não consegue criticar a fundo.” Referindo-se a técnica “o senhor

reconheceu corretamente que o experimento de associação serve bem

para uma primeira orientação, mas não para a realização da cura, já

que com cada nova palavra-estímulo, a gente se interpõe na fala do

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Page 14: ANÁLISE CRÍTICA DO LIVRO CARTAS ENTRE FREUD E PFISTER

paciente e corta-lhe a palavra. A formação espontânea de sequência de

palavras, da qual o senhor se serve na análise, com certeza é

incomparavelmente melhor, mas ela não fornece nenhum belo quadro,

nem compreensões claras, e não me parece nenhuma economia”. “A

formação de sequências é apenas um meio de contornar a resistência,

e atualmente detesto esta formação”. Freud diz que o caráter principal

de sua técnica “atual” é negligenciar os complexos contras as

resistências e procurar aproximar-se diretamente destas últimas. Com a

transferência, diz que “é preciso orientar-se pelass particularidades do

doente, e também não se deve abandonar seu modo de ser”, que “o

paciente deve ser mantido na abstinência, no amor infeliz, o que é

plenamente possível”. Sobre a transferência concluiu que “o senhor tem

maior facilidade que nós, médicos, porque pode subliminar a

transferência na religião e na ética, pois pratica a psicanálise a serviço

da cura de almas em pessoas jovens, cuja maioria ainda se encontra

distante da seriedade do erotismo.” Sobre O método psicanalítico;

descrição sistemática e científico-experimental de Pfister, Freud diz-se

estimulado de que “ganharíamos entre os pedagogos um novo círculo

de leitores” e alegrou-se por ver que “o senhor escreve com tanta

autoconfiança, e quando nada hostil lhe tenha acontecido”. Em O que a

psicanálise oferece ao educador, de Pfister, Freud expressa que

“contém um calor que alegra o coração e mostra todas as belas

qualidades que apreciamos no senhor: sua capacidade de entusiasmo,

seu amor pela verdade e pelas pessoas, sua coragem de professar-se,

sua compreensão e também – seu otimismo.”, “prestará bons serviços a

nós, já que este ponto de vista prático também deve ser mencionado”.

Mostrou-se insatisfeito com um ponto: “o seu desacordo com minha

teoria sexual e minha ética”, “na minha experiência, a maioria é ralé,

tanto faz se professam abertamente esta, aquela ou nenhuma corrente

ética”, entretanto “o que há com a teoria sexual?”, “como pode o senhor

negar a decomposição da pulsão sexual em pulsões parciais, a qual a

análise nos obriga diariamente?”, “parece-me que o senhor quer uma

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Page 15: ANÁLISE CRÍTICA DO LIVRO CARTAS ENTRE FREUD E PFISTER

síntese sem análise prévia”, “deve ter-se escondido no senhor o

remanescente da sua resistência contra o sexual”, “tente revisar este

aspecto junto a si mesmo”, “a beleza da religião certamente não

pertence à psicanálise”, “na terapia, nossos caminhos se separem”.

Campo das idéias – Freud focaliza a diferença que existe “entre sua

atividade e a atividade médica”: que “o êxito da psicanálise

seguramente depende de dois resultados: que haja descarga de

satisfação e que se domine a pulsão recalcitrante...”; “O senhor, porém

tem a feliz possibilidade de conduzir para Deus, e de produzir num

ponto o estado feliz de outrora, em que a fé religiosa sufocava as

neuroses. Para nós não existe essa chance de resolver as coisas.”;

“Nosso público é não-religioso”, “Nós também o somos”; “... a religião

são demasiado difíceis aos nossos pacientes”; “Nós não podemos ver

na satisfação sexual em si algo proibido ou pecaminoso”. Cita que a

psicanálise é um instrumento do qual tanto o religioso como o laico

poderão servir-se. Pfister diz que a própria ética protestante “retirou do

relacionamento sexual a mácula da impureza” e que como “modernos

pastores protestantes”, com “absoluta liberdade”, “podemos pensar

livremente”, e que falta a clareza sobre a possibilidade de se “achar um

amor totalmente livre que não passe pelo matrimônio”. Que a libertação

do flagelo da neurose e da perversão é possível com “a melhoria de

condições sociais, uma educação e conduta mais saudáveis”. Freud diz

que “a diferença entre nossas visões somente começa quando moções

emocionais passam a influir sobre os processos de pensamento”. Que

Pfister ao continuar trabalhando, pensará sobre muitas coisas de modo

diferente e mais corretamente, destacará problemas isolados e

pressentirá conexões mais profundas, falando numa linguagem

“compreensível somente a nossa comunidade”, não causando impacto

na maioria e que “agora, na transição do modo comum e o modo

psicanalítico de pensar, o senhor tem força subjetiva de arrastar

consigo os ainda intocados”, pensando que é isto que Pfister quer.

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Page 16: ANÁLISE CRÍTICA DO LIVRO CARTAS ENTRE FREUD E PFISTER

Quanto à uma dúvida teórica de Pfister, Freud conclui que “todos os

recalcamentos processam sobre recordações, não sobre vivências, que

podem no máximo, ser recalcadas posteriormente.” e quanto aos

complexos “por mais imprescindível que seja o conceito para diversas

práticas e demonstrações, quando se teoriza, deve-se sempre pôr em

lugar do conceito o que está por detrás dele, pois é demasiado vago e

inadequado.” O que Pfister chama de “compensação” Freud fala que

cabe debaixo do que ele chama de “sublimação”, ou debaixo do

conceito parecido e mais exato da “formação reativa”, contidos nas

Cinco Lições de Psicanálise. Freud aconselha Pfister a cerca da

composição de um livro respondendo abertamente que “ o modo pelo

qual o senhor se sente menos atraído, parece-me o mais adequado

para o propósito e o mais vantajoso para o leitor”. No O método

psicanalítico; descrição sistemática e científico-experimental, Freud

diverge de Pfister na teoria sexual, a ponto de perguntar “por que

nenhum de todos estes devotos criou a psicanálise, por que foi

necessário esperar por um judeu completamente ateu?”. Pfister

explicou que “ porque devoção ainda não significa gênio de descobridor,

e porque os devotos em boa parte não foram dignos de produzir estes

resultados”, que “o senhor primeiramente não é judeu” e “o senhor não

é ateu, pois quem vive para a verdade vive em Deus, e quem vive pela

libertação do amor, segundo 1 João 4.16, permanece em Deus” e que

“jamais houve cristão melhor”. Acerca da Associação Internacional,

Freud disse “uma sociedade nova não pode ser constituída de analistas

formados”.

Influência Mútua – Freud lembra-se de quão grande auxílio o método

psicanalítico pode fornecer à cura de almas, deduz dos relatórios de

Pfister que a técnica de associação tem apreciável valor “para os

estados psicóticos como demência precoce, ela é totalmente

imprescindível” . Pfister entende corretamente a tarefa da psicanálise

“um método de cura de almas”. Freud após ser aconselhado numa

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Page 17: ANÁLISE CRÍTICA DO LIVRO CARTAS ENTRE FREUD E PFISTER

visita de Pfister, desiste do propósito inatingível de ficar rico por um

modo honesto, ficando bem e animado, dando-lhe toda a razão e que

“sem a sua visita eu jamais teria conseguido”. Que “suas observações

sobre transferências e compensações terão de mim a consideração que

merecem”. O estado de ânimo causado pela visita de Pfister influenciou

Freud na redação do livro Notas sobre um caso de neurose obsessiva.

Freud, à respeito da visita de Pfizer, fala que “teve tanto impacto nas

crianças e trouxe tanto bem-estar a mim mesmo”, assim como “O

senhor nos torna felizes porque chama à consciência o que, em função

da disposição infeliz do homem, esconde-se atrás dos pequenos

sofrimentos e preocupações fugazes”, referindo-se a Pfister em uma

das cartas como “Caro homem de Deus”. Pede que envie publicações

da área de Pfister, “de preferência em quantidade, também dos

adversários, ou me der as referências sobre as encontrar” para reunir

na Biblioteca da Sociedade Psicanalítica de Viena. Freud em relação à

obra A pesquisa analítica sobre a psicologia do ódio e da reconciliação”,

de Pfister, menciona que “suas frases finais demonstram quanta

clarificação e enriquecimento a psicologia atual pode ganhar com a

nossa psicanálise”. Em relação ao Zinzendorf, Freud recusa-se a

devolvê-lo pois “ele tem toda a qualificação imaginável para um caderno

de Textos de psicologia aplicada”, “convincente para todo aquele que, a

qualquer custo, não se precaver de ser convencido.” Freud fez o

prefácio do livro O método psicanalítico; descrição sistemática e

científico-experimental, de Pfister.

Período de 1920 a 1929

Análise de Obras - Sobre a luta pela psicanálise, de Pfister, Freud

corrigiu de próprio punho. O fundo psicológico e biológico dos quadros

expressionista, de Pfister agradou muito a Freud e ao mesmo tempo

disse que “não pode superar a dificuldade de uma apresentação para

não analistas”, considerando o livro “novo enriquecimento do meu

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Page 18: ANÁLISE CRÍTICA DO LIVRO CARTAS ENTRE FREUD E PFISTER

tesouro psicanalítico.” O tratamento de crianças difíceis e anormais, de

Pfister foram considerados bem melhores que Freud esperava e que

“serão instrumentos úteis de agitação e formação”. Em O amor da

criança e sua falhas de desenvolvimento, Pfister observa em obra que

de sua parte “significa um avanço em relação a meu estado anterior, à

medida em que superei uma série de imprecisões que tinham crescido

em mim através de Jung e Adler”. Nesta obra , “cujo primeiro volume

consiste numa monografia sobre desenvolvimento e falhas de

desenvolvimento do amor, dirijo-me a pais e educadores, pois a minha

fé nos letrados encolheu consideravelmente.. Em primeira linha quero

ajudar a vencer o sofrimento, e posso fazê-lo melhor direcionando o

povo para os analistas, do que me batendo com um bando de

psicólogos e pedagogos bitolados”. Freud em relação à obra, diz “para

ser autêntico, não se pode ser tão otimista na vida como o senhor. À

rancorosa dualidade entre a razão e a necessidade, certamente a gente

só se converte na velhice”. O livro Amor em crianças e suas

aberrações, de Pfister, proporcionou uma grande alegria em Freud,

assim como “pela repercussão que suas idéias encontram”. Acerca do

livro O amor pré-matrimonial e suas falhas de desenvolvimento, de

Pfister, Freud diz “que todos os bons espíritos, nos quais ainda parece

acreditar, possam conserva-lhe o prazer e a força para tais esforços por

mais alguns decênios”. Em relação ao livro A lenda de Sundar Singh,

de Pfister, sobre “um extravagante santo indiano em moda”,

“prevenindo contra a fé estúpida nos milagres, que eleva o faquir acima

do nível humano”, e sobre a repercussão do livro “os círculos

protestantes mais liberais estão encantados com as minhas revelações.

Eu queria combater a superstição, a ignorância e o fanatismo que revira

os olhos. No entanto Freud critica dizendo ter ficado penalizado “pelo

senhor, que tenha de se ocupar com essa chamemos, porcaria.

Provavelmente tenha seu valor para determinados círculos. Do

contrário o senhor não o teria escrito. Contudo é uma pena que o

senhor não possa ser totalmente sincero. Pois não é possível que o

17

Page 19: ANÁLISE CRÍTICA DO LIVRO CARTAS ENTRE FREUD E PFISTER

senhor atribua ao psicopata o mérito de que ele saiba dar tão belos

discursos”. Sobre o livro de Freud, A questão da análise leiga, Pfister

diz que “O senhor nunca tinha escrito de modo tão facilmente

compreensível.”, mas que “o senhor fala dos casos pedagógicos, mas

deixa de lado a enorme área dos adultos que não estão doentes, no

sentido clínico, mas que necessitam da análise em grau máximo. Penso

nos alcoólatras, excêntricos, confusos no amor, artistas marginalizados

e outros. Como tais casos fazem parte do campo de trabalho da cura de

almas, tenho tido muito o que fazer com eles, e eu lhe peço de coração

que aprecie com olhar benevolente a cura de almas analítica, que

também é filha sua. Sem dúvida, haverá uma cura de almas fora da

igreja, até não religiosa. Se tão somente as pessoas forem tornadas

boas e felizes, com ou sem religião, o querido Deus aprovará este

trabalho com um amável sorriso”. Freud no entanto diz a Pfister que

“não o julgue como uma exposição conscienciosa e objetiva. É

essencialmente texto de polêmica e de ocasião. Do contrário, eu

certamente não teria ignorado a aplicação da análise na cura de almas”,

dizendo que pensou nisto mas “na Aústria católica é totalmente

inconcebível um religioso que trabalhe com análise”. Na brochura O

futuro de uma ilusão, onde Freud trata de sua “posição totalmente

contrária a religião – em todas as formas e diluições” e que temia “e

ainda temo que uma declaração pública lhe seja constrangedora”,

querendo saber “que medida de compreensão e tolerância ainda

consegue ter para com este herege incurável”, Pfister responde que

“sua rejeição à religião não me traz nada de novo”, que aguarda com

“alegre interesse” e que “um adversário de grande capacidade

intelectual é mais útil à religião que mil adeptos inúteis”, que “não

poderia imaginar que uma declaração pública sua me pudesse

melindrar; sempre achei que cada um deve dizer sua opinião honesta

de modo claro e audível. O senhor sempre foi paciente comigo, e eu

não o seria com o seu ateísmo? Certamente o senhor também não vai

levar a mal se eu oportunamente expressar com franqueza minha

18

Page 20: ANÁLISE CRÍTICA DO LIVRO CARTAS ENTRE FREUD E PFISTER

posição divergente”. Em outra carta Pfister ressalta que “minhas

ressalvas contra sua rejeição da religião não comprometem nem de

forma mínima minha posição em relação ao senhor, nem minha alegria

pela psicanálise. Sempre enfatizei que a psicanálise constitui a parte

mais fecunda da psicologia, porém nunca a totalidade do conhecimento

sobre o anímico, muito menos engloba uma visão de vida e de mundo.

Seguramente o senhor é da mesma opinião”, acrescentando que “o que

o senhor diz das contradições do pensamento religioso e teológico, o

senhor mesmo as chama de repetição, uma repetição

psicanaliticamente aprofundada de pensamentos há muito conhecidos.

Porém, o que me admira é o que o senhor não dê atenção às vozes

daqueles defensores da religião que destacam, ao menos do mesmo

modo agudo, aquelas contradições e as diluem em uma abordagem

filosófico-religiosa mais elevada”, um dos quais é um extraordinário

filósofo, professor de teologia que “pensa sobre a interpretação ético-

otimista do mundo de maneira tão pessimista como o senhor”, “mas é aí

que o verdadeiro problema inicia” pois “ele tampouco se fecha para

compreender a visão de mundo do sem visão de mundo”. Inclui ainda

que “seu substitutivo para a religião é, na essência, o pensamento

iluminista do século XVIII em nova e orgulhosa revificação”, que não crê

“apesar dos progressos da ciência e da técnica”, “na suficiência e

sustentabilidade desta solução para os problemas da vida, sendo

questionável se “o avanço científico tornou os homens mais felizes e

melhores”, dizendo não compreender bem “sua visão de vida” e que “o

senhor tem tanta tolerância para com este testemunho público quanto

eu para com suas heresias, que há muito me são conhecidas?”,

persistindo “entre o senhor e mim esta grande diferença: Eu pratico a

análise dentro de um plano de vida que o senhor, com bondosa

consideração, tolera como condição da minha profissão, enquanto eu

não considero esta visão de vida apenas como poderoso fomento para

a cura, mas justamente como consequência de uma filosofia mais

condizente com a natureza humana e o cosmos, que ultrapassa o

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Page 21: ANÁLISE CRÍTICA DO LIVRO CARTAS ENTRE FREUD E PFISTER

naturalismo e o positivismo, e que é bem fundamentada em termos de

higiene da alma e da sociedade”. Em resposta Freud tenta chamar a

atenção de Pfister para o fato de que “o senhor trabalha com o

argumento: isto tem de estar errado...” quanto a posição dos dois. Faz

questão de que “o senhor publique uma crítica – na Imago – se quiser –

e espero que nesta o senhor ressalte expressamente nossa límpida

amizade mútua e sua adesão inabalável à análise” e que “a influência

sobre a terapia analítica através da concessão ou recusa de uma

satisfação ilusória dos sentimentos, está colocada severamente de

lado, pois por mais bondosamente que o analista se comporte, ele

obviamente não pode encarregar-se de substituir a Deus e à

providencia para o analisando”, “o analista não pode satisfazer o anseio

em si, ele tem de deixá-lo para o analisando, se este o supera após o

esclarecimento, saciando-o de forma religiosa ou diferentemente de

forma sublimada.”

Campo das Idéias – Freud defende energicamente Groddeck

(psicanalista e escritor alemão), perguntando “o que o senhor teria dito

como contemporâneo de Rabelais?” contra a respeitabilidade de Pfister

que comenta que “o espírito que o leva a promover Groddeck é

exatamente o mesmo que o faz ser descobridor e vanguarda da

psicanálise”, “que não pode fazer meu o seu pensamento” e que há

uma diferença muito grande entre Rabelais e Groddeck: “o primeiro

está no pale do satírico e se resguarda muito bem do lapso de querer

valer por um erudito. Groddeck, ao contrário, oscila entre a ciência e a

beletrística. O senhor é que diz que a tendência dele é decididamente

científica, mas neste caso incomoda-me seu modo de inricar com

gracejos”. Freud se alegrou por “realmente tem de ser possível, entre

nós que possamos nos dizer verdades, isto é, rudezas, e que assim

permaneçamos de bem um com o outro, como neste caso”. Acerca de

dúvidas de Pfister sobre o sonho Freud diz que “parecem-me ser

apenas de cunho classificatório” e que “não esqueçamos a definição

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Page 22: ANÁLISE CRÍTICA DO LIVRO CARTAS ENTRE FREUD E PFISTER

mais genérica do sonho, que ele é a atividade anímica durante o estado

de sono”. Freud em outra ocasião cita que “ocorre com frequência que

pessoas maravilhosas e sérias precisem atormentar-se mutuamente por

não conseguirem expressar de forma plena o seu amor de outro modo”.

Pfister diz que “o decisivo para a análise é a catagogia”. Sobre a

educação diz “que tem de ter um sentido ético. O senhor mesmo

acentuou outrora que se precisam educar as crianças. E quando

analisamos, precisamos também preencher com intensões honestas as

pequenas bestas e anjos com que lidamos. Não que não lhes

sopremos nosso próprio hálito de pensamento e lhes inspiremos nossa

própria alma; contudo, uma porção de higiene anímica e social elas

certamente precisam ter e concretizar num amor sadio. Mas a análise

como tal precisa considerar todos os produtos do inferno como

autênticos e sérios; não se pode vestir o diabo com folhas de parreira,

assim como precisa fazer plena justiça à parábola do joio no meio do

trigo”. Por outro lado Freud diz que naturalmente “é necessário que haja

educação, ela pode até ser severa; não é prejudicial que ela se apóie

em conhecimentos analíticos. Mas a análise em si é algo diferente e

primeiramente uma constatação honesta. Nisto, portanto estamos de

acordo. Não combina com um analista a melindrosa preocupação de

que o mais sublime da pessoa possa sofrer algum dano”. Em relação

ao texto FERENCZI, S., RANK, Alvos de desenvolvimento da

Psicanálise. Viena: 1924, Pfister disse que “fornece-me vários caroços

para quebrar. Não posso e não quero admitir que a psicanálise pareça

conduzir a uma nova visão de mundo. A análise somente é capaz de

fornecer contribuições muito valiosas para elaboração de uma imagem

do mundo” e que “é exagerado dizer que faz parte da cura ideal que

nunca mais se escute nada do analisando. Pois é humano que reste

uma gratidão, ainda que discreta; isto não significa cerceamento da

liberdade”. Freud diz que “o homem não pode ser mudado e tem de ser

engolido assim como ele é”. Em relação aos teólogos e pedagogos,

Pfister diz “que é doloroso para mim que os teólogos permaneçam

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Page 23: ANÁLISE CRÍTICA DO LIVRO CARTAS ENTRE FREUD E PFISTER

atrasados e fracassem de modo tão lamentável”, “os pedagogos tem

aceitado muitas coisas e, de todos os lados, ouço que a análise vai

ocupando cada vez mais o centro dos interesses.”, “os teólogos

envolveram-se demais numa tola disputa por princípios, em vez de se

preocuparem com o bem-estar psíquico dos laicos – e o seu próprio”.

A partir do final de 1924, à um conflito de idéias entre Pfister e Freud

sobre um paciente jovem americano, com neuroses compulsivas

graves, no qual Freud indica o Dr Reick que “com extrema paciência e

profunda compreensão, e também não sem sucesso, um conde russo

que lhe pude enviar”. Diante da insistência de Pfister, Freud fala que

“traga junto o seu americano. Não estou nem um declinado em aceitá-lo

para tratamento...”, “o principal, é claro, será a impressão que o jovem

causará em mim no nosso encontro”. Com a visita do pais do rapaz à

Freud ele antecipa um pouco a aceitação do mesmo, porém “é meu

desejo intenso que ele permaneça com o senhor”. Confidencia a Pfister

que “o senhor deve deixá-lo ir para a sua ruína” e que “não há nenhuma

ocupação para ele, pela sua condição insociável. Assim eu correria o

risco de ter de me envolver com ele de modo intensivo demais”. Pfister

relata sobre a análise de Schjelderup que sofria “com sua torturante

enxaqueca semanal” que tornara mais forte e que trabalhando em

análise arduamente durante quatorze dias ocorreu o último acesso,

significativamente atenuado não se mostrando os “inicialmente

violentos recalcamentos patogênicos”, parando após três semanas,

após então sumindo totalmente. Sobre a diferença de procedimentos

Schjelderup fizera anteriormente o que fizera junto a Pfister, escreveu

“O senhor, porém colocava a ênfase sobre a própria tomada de posição

e a participação. Somente deste modo parece ser criada a possibilidade

de realmente dar conta das atitudes inconvenientes. Através do

estímulo à atividade própria também se consegue a impressão de um

real trabalho em conjunto entre o analista e o analisando. Desaparece,

por isto, em grande parte, o aspecto humilhante , e uma transferência

sadia é tornada viável”. Pfister de seu ponto de vista atribui o sucesso

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Page 24: ANÁLISE CRÍTICA DO LIVRO CARTAS ENTRE FREUD E PFISTER

“somente uma certa relação de gratidão e afeição, que me parece mais

natural e curadora que a fria despedida de uma pessoa a quem se tem

tanto a agradecer. Pois por detrás dos relacionamentos pessoais

objetivamente ilegítimos, gerados pela transferência propriamente dita,

deve haver relações autênticas que estão fundamentadas nas

características pessoais de ambos os indivíduos”, acrescentando que “é

importante que o analista transmita valores que assegurem

compensação maior que o ganho secundário ou o sentimento de culpa”.

Em contrapartida Freud, quanto à terapêutica, diz que “o senhor, como

cura de almas, tem naturalmente razão em recorrer a todas as tropas

auxiliares que estão à sua disposição. Nós, como analistas, temos de

ser mais reservados e deslocar a ênfase principal sofre o esforço de

tornar o paciente independente, o que muitas vezes resulta num

prejuízo para a terapia. Mas no geral, não estou tão distante do seu

ponto de vista como o senhor imagina” e que “muito mais premente é

uma análise mais profunda da situação transferencial”. Freud menciona

que “tanto combati a subestimação da nossa terapia como a

superestimação. Tenho afirmado que os sucesso psicanalíticos não

precisão esconder-se diante da medicina interna, que a análise

proporciona tudo o que se pode exigir de uma terapia hoje. Por outro

lado, temos que estar preparados para reconhecer seus limites”. Pfister

em relação à Freud fala que “a principal diferença entre nós reside

provavelmente em que o senhor cresceu perto de formas patológicas

de religião, as quais considera como a religião, enquanto eu tive a sorte

de poder dirigir-me a uma forma livre de religião. Ao senhor, esta

religião parece ser um esvaziamento do cristianismo, mas para mim, é

o centro e a substância do evangelismo”. Em resposta Freud diz que

“alguns de seus argumentos parecem-me lirismo; outros, como a

enumeração dos grandes intelectuais que mesmo assim acreditaram

em Deus parecem-me baratos. Exigir da ciência que estabeleça uma

ética é injusto – a ética é uma espécie de código de trânsito para o

tráfego entre os homens” e que um erro da física “é explorado de

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Page 25: ANÁLISE CRÍTICA DO LIVRO CARTAS ENTRE FREUD E PFISTER

maneira tendenciosa por todos os famintos da fé” e por fim “por que

diabos o senhor une tudo o que devemos esperar na vida ao seu

postulado de uma ordem moral universal?”. Em outra carta Freud diz

não saber “se o senhor adivinhou a ligação secreta entre a Análise

Laica e a Ilusão. Na primeira quero proteger a análise dos médicos, na

segunda, dos sacerdotes. Quero entregá-la a uma categoria que ainda

não existe , uma categoria de curas de alma seculares, que não

necessitam ser médicos e não podem ser sacerdotes”. Pfister refuta

Freud sobre a observação de que “os analistas desejados pelo senhor

não podem ser sacerdotes. Parece-me que a análise como tal precisa

ser uma atividade puramente secular” e que “como o protestantismo

suspendeu a diferença entre laicos e sacerdotes, assim também a cura

de almas deve ser desclericalizada e secularizada. Até o mais devoto

tem que admitir que o amor de Deus não corresponde somente àquilo

que traz consigo um cheirinho de incenso” e que “não só crianças, mas

também adultos, muitas vezes têm anseio por valores de vida positivos

de ordem intelectual, por visão de mundo e ética, e a psicanálise não os

pode dar”. Acrescenta que “muitos já necessitam de ponderações éticas

para resolução de conflitos morais patogênicos, que eles não querem

simplesmente regular pela via da transferência. A rigor, se o pastor não

puder analisar, não o poderia fazer também nenhum cristão, e nenhuma

pessoa religiosa e eticamente alicerçada; mas o senhor mesmo

ressaltou que a análise é independente da visão de mundo. A

descrença é simplesmente uma crença negativa. Não creio que a

psicanálise ponha de lado a arte, a filosofia, a religião, mas que ajude a

purificá-las”. Em resposta Freud sobre o caso dos sacerdotes, diz ter

falado de “um futuro distante”, concorda que “análise não fornece uma

nova visão de mundo. Mas ela não o necessita, pois repousa sobre a

visão de mundo científica comum, com o qual a religiosa permanece

incompatível”, acrescentando que “sua essência são as ilusões

piedosas de providência e ordem ética do mundo, que contradizem a

razão. O sacerdote ficará amarrado a representá-las”.

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Influência Mútua - Sobre a luta pela psicanálise, de Pfister, este fez

cuidadosa verificação concernente às objeções e sugestões de

alteração de Freud, achando-as totalmente justificadas e que seu

trabalho “vai ganhar muito com seu apadrinhamento” e “que a sua falta

de filosofia me alegra”. Freud se agrada muito do livro O

desenvolvimento do apóstolo Paulo. Um esboço histórico-religioso e

psicológico, de Pfister, dizendo que “Paulo, um caráter autenticamente

judeu, sempre teve minha especial simpatia.” Pfister fez um achado em

Platão que iria alegrar a Freud: “NACHMANSOHN, Max. A teoria da

libido de Freud comparada com a doutrina de Platão. Zentralblatt, 1915,

3.65-83” pois em Platão também se encontra a frase: “A terapêutica é o

reconhecimento das moções de amor do corpo; quem nestas coisas

distingue corretamente o belo e o mau amor, (….) quem promove a

troca, de modo que o corpo, em vez de se apropriar de uma amor se

apropria do outro, e quem é capaz de ensinar o amor aos que não

carregam amor dentro de si, (….) este seria o mais perfeito terapeuta.”

No livro O amor da criança e sua falhas de desenvolvimento, Pfister

reconhece o acerto das colocações de Freud “também nos aspectos em

que por longo tempo não tivera experiências próprias. No que concerne

à ética, religião e filosofia existe uma diferença, que nem eu

percebemos como abismo”. Freud demonstrou grande satisfação do

afastamento por parte de Pfister “cada vez mais nítido e sólido” de Jung

e Adler, aconselhando decisivamente a não repudiar o livro O método

psicanalítico; descrição sistemática e científico-experimental. Freud já

havia estado de acordo com que Pfister “se oponha às inovações de

Jung” e nutria algo contra Jung pois atribuíram “muitas coisas que Jung

não criou, como por exemplo a análise expectral” e a manifestação

pessoal de Jung “de que ele não me rejeita, mas misericordiamente me

deixa valer, de que apenas me corrige e me limpa [ou domestica], além

da crítica ao tratamento dado à uma paciente de Jung que avalia como

“ele nunca teve oportunidade de tratar um caso de tal intensidade e não

tem nenhuma ideia das dificuldades da questão. Não acreditei muito em

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um entendimento pessoal permanente entre mim e Jung. Ele exige

demais de mim, e eu estou me retraindo bastante depois da

superestimação da sua pessoa”. Contra Adler, Freud achou bom que “o

Zentralblatt desvencilhou-se de um redator (Adler), e como novamente

estou de bem com Stekel, ficará mais debaixo de minha influência” pois

as teorias de Adler segundo Freud “afastaram-se demais do caminho

correto. Era hora de fazer oposição à isto” e “ele criou para si um

sistema mundial sem amor, e estou executando nele a vingança da

ofendida deusa Libido”. Pfister fazendo menção “quando a situação se

torna séria, qualquer um pode notar quão grande e maravilhosa é a

análise, e que enriquecimento ela dá à nossa vida.”, agrade a Freud

“Para mim trouxe um alvorecer sem igual à minha existência, e jamais

poderei agradecer-lhe o suficiente por tudo com que o Senhor me tem

presenteado, através de suas pesquisas e de sua bondade de coração”

e fala ser difícil não escrever “quando se aprendeu algo tão grandioso e

importante do senhor”. Ao analisar a obra Alvos de desenvolvimento da

psicanálise, Pfister lembra que “que não se trata de um recordar, mais

sim de um reviver, isto o senhor sempre me ensinou ao ressaltar que

recordar não é suficiente, mas que é necessário que isso aconteça

pleno de emoção”. Freud em dado momento em relação a Pfister diz

que “muito me deliciou que o senhor resista um pouco à fundamentação

orgânica bem como à superestrutura metapsicológica da análise. Na

realidade, precisamos trabalhar em todos os andares ao mesmo

tempo”. Pfister em relação à recusa de tratamento do jovem americano

por parte de Freud, responde com “sua tendência de resignação me

entristece” , que em resposta diz que “uma reação tomou conta de mim.

O pobre rapaz deu-me pena, também se achou horário melhor, talvez

eu tenha vencido um acesso de desânimo”, embora ainda estivesse

temeroso. Diz ainda que se seus pais “o deixarem continuar, minha

posição será substancialmente fortalecida e melhorada”, “... e não terei

pena dele”. Freud acha muito lisonjeiro “que o senhor ainda tenha tanta

confiança em mim”. Durante o tratamento Freud diz a Pfister que

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“minha convicção médica, de que ele se encontra na fronteira de uma

demência paranóide, aumentou”, estando bem próximo de desistir “mas

algo tocante que ele tem em si me detém, e diante da ameaça de

interrupção ele novamente se torne meigo e acessível, assim que

mantemos atualmente um bom entendimento mútuo”. Mais tarde diz

que “algumas coisas mudaram. Felizmente foi vencida sua

insuportabilidade, eu até me afeiçoei a ele, e parece que ele retribui”.

Que após um terrível esforço “conseguimos clarear algumas partes da

sua história evolutiva íntima, e o efeito disto foi bem favorável, como

também confirmaram parentes que o viram nas férias. Externamente

ele ainda se comporta de modo excêntrico e ainda está muito longe do

normal”, embora “suas idéias e conexões de pensamento tem

frequentemente algo de estranho, e seus sintomas poderiam ser

chamados sem constrangimento de idéias delirantes”. Com o tempo

Freud observa que “ainda não abandonou suas reações infantis face à

influência da autoridade”, que “tem traços bastante esquizofrênicos”,

mas que não pode mandá-lo embora por estar “ligado a ele por tanta

simpatia”. Freud em outra ocasião em relação a dois trabalhos

enviados, da parte de Pfister diz que “pude ver com satisfação que

grande parte do caminho da análise podemos trilhar juntos”. Em

resposta à uma outra carta de Pfister, a cerca do anseio dos paciente

por valores éticos diz que “é digno do meu respeito; não vejo nenhum

problema nisso.

Período de 1930 a 1939

Análise de Obras – A pedido de Freud, Pfister faz uma “livre crítica” do

livro O mal estar da civilização, dizendo que “sem dúvida contém

muitíssimos pensamentos profundos e importantes, mas que assim me

parece, não acerta em tudo”, “na doutrina das pulsões o senhor tem

pensamento conservador, eu progressista”, que “mesmo a morte dos

indivíduos não pode deter o desenrolar da vontade universal, mas

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apenas fomentá-la”, “que seria incorreto julgar as abominações culturais

presentes como sendo simplesmente a cultura, pois a elas também se

contrapõem magnificências culturais” e que são importantes para o

indivíduo “a higiene individual e social para a cultura, bem como para a

vida individual”.

Campo das Idéias – Em relação ao livro O Ego e o Id, de Freud ao ter

lido possivelmente pela 10ª vez diz não compreender totalmente que “o

senhor pensa o homem de modo tão conservador, fala de identificação,

de formação do Ideal do Eu através dos pais”, “parece-me que todos os

conservadores têm uma falha na forma de sentimentos de inferioridade,

e quem quiser ser como o pai, sente-se inferior a ele”. “A imoralidade

não pode, de forma alguma, ser a última palavra, senão o engano e a

mentira seriam tão bons e valiosos como a sinceridade, e a luta pela

verdade com armas brancas seria uma tolice”. “No intuito de concretizar

esta vontade de bem-estar é necessário sublimar, ou melhor, organizar

a personalidade toda, com inclusão das pulsões”. “Prefiro a moralização

total, que sempre carrega no amor humano uma bela medida de libido,

no sentimento mais estrito”. Pelos acontecimentos na Alemanha, Freud

escreve uma carta, datada de 28.5.1933, dizendo que “houve poucos

motivos para mudar meu julgamento a respeito da natureza humana,

principalmente a cristã-ariana”.

Influência Mútua – Ao receber o livrete A psicanálise a serviço da

educação, Freud, a respeito de Pfister diz “que o senhor possa ser um

analista tão convicto e ao mesmo tempo um homem espiritual,

pertencente às contradições que tornam a vida tão interessante”.

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CONCLUSÃO DO RESENHISTA

Analisando a obra Cartas entre Freud e Pfister, um diálogo entre a

psicanálise e a fé cristã, acerca do valor do livro tanto para analistas

como para cristãos, assim como o público em geral, é de minha opinião

que, pelo seu conteúdo, é um livro digno de ser lido, principalmente

pela troca de argumentações entre os autores, muitas vezes de forma

acirrada, ora gentil, pela amizade de pessoas que possuem pontos de

vistas totalmente diferentes em relação à religião, mas que possuem

pontos em comum em relação à psicanálise, muitos deles por influência

mútua ou de um dos autores.

A temática do livro gira em torno de confidências, análise de

obras, linhas de pensamento e principalmente na influência mútua.

O objetivo principal é a cura de pessoas e cura de almas,

problema que se desenrola do início ao fim do livro, ora cada um

fazendo ao seu modo, ora por consulta ou influência por um dos

autores.

Ressalta-se também o valor científico e religioso da obra, repletos

de pontos principais e significativos, rica em conceitos, sendo quase

que impossível sintetizá-los dada a importância, além da ajuda

recíproca para chegarem à um objetivo comum – a cura de pessoas.

A tolerância religiosa entre os dois, em prol da cura de pessoas,

leva-nos a um exemplo, apesar de ter atingido um ápice de

discordância religiosa em relação a técnicas de cura, com troca de

farpas, que poderia levar à ruptura da amizade, que não foi abalada

graças a amizade mútua e o desejo comum pela cura humana.

Trata-se portanto de uma importante obra de cunho científico,

filosófico, biográfico e religioso.

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