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_____________________ ANAIS DO XIII ENCONTRO DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO DA FACULDADE DE FILOSOFIA, CIÊNCIAS E LETRAS DE CARUARU FAFICA _____________________

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ANAIS DO XIII

ENCONTRO DE

ENSINO, PESQUISA E

EXTENSÃO DA

FACULDADE DE

FILOSOFIA, CIÊNCIAS

E LETRAS DE

CARUARU – FAFICA

_____________________

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GT: Acessibilidade e Tecnologias Inclusivas

Coordenador: xxxxxxxxxxx

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A dislexia e o uso de softwares no ensino básico

1Jakeline Tavares da Silva - FAFICA 2Jonny Kefferson Rodrigues G. da Silva- FAFICA

RESUMO: Este artigo apresenta, inicialmente, algumas reflexões sobre a informática na educação, analisando o uso do computador, o software educativo, o papel do professor e o papel do aluno disléxico no processo ensino aprendizagem. Posteriormente, discute a utilização do computador como ferramenta de auxílio na aprendizagem, no ensino básico analisando um trabalho realizado. Este trabalho consiste na apresentação de um software educacional aos alunos disléxicos buscando ampliar os seus conhecimentos acerca da mobilidade no ensino aprendizagem ao aluno disléxico, possibilitando que eles aprendessem mais com a utilidade do próprio software. Assim, coerente com a perspectiva construtivista de educação, oportunizou-se uma participação ativa e criativa dos alunos nos seus processos de construção do conhecimento. Os resultados revelam o quanto eles interagem prazerosamente com o computador, e brincando com suas próprias idéias e aprendendo com a facilidade de utilização desses softwares.

Palavras chave: Dislexia; Educação; Software Educacional; Informática.

Introdução

A leitura é um instrumento essencial que permite ao indivíduo ter acesso

à informação, construir o seu conhecimento, estimular a reflexão crítica e trocar

ideias. No entanto, só uma parte da população se dedica à leitura de livros,

revistas e jornais e entende plenamente toda a informação visual e verbal

oferecida pelos meios de comunicação social, a outra parte da população

apresenta um nível de leitura e escrita insuficiente, que se traduz por reduzidos

1Acadêmica da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Caruaru. E-mail: [email protected] 2 Acadêmico da faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Caruaru, Professor da Escola Municipal Maria Stela Costa Cavalcanti de Agrestina- Pernambuco. E-mail: [email protected]

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ou nenhum conhecimento das mesmas. O analfabetismo atinge, com efeitos,

taxas consideradas ainda elevadas no nosso país, de acordo com o dado de

2013 do Pnad o analfabetismo brasileiro está atingindo 8,3% da população

brasileira com mais de 15 anos. Esta insuficiência na leitura e escrita pode ser

justificada por vários fatores, nomeadamente, por causas sociais, econômicas,

educacionais ou de saúde (perturbações cognitivas, atrasos mentais, etc.). Uma

das grandes dificuldades de aquisição da leitura e escrita menos conhecida pela

população em geral é a dislexia.

A dislexia é considerada como um distúrbio na aprendizagem,

caracterizada por dificuldades em compreensão, leituras e interpretação.

Existem alguns tipos de dislexia, entre elas a auditiva e visual, no caso da

auditiva também chamada de disfonética, é caracterizada pela deficiência no

processamento auditivo, onde há dificuldades na memorização e ordenação nos

sons das palavras, a visual também chamada por diseidética, acontece devido à

dificuldade do processamento da visão como destaca STOLK (2013). Neste caso

a criança apresenta dificuldade em diferenciar certas letras, pouca percepção e

interpretação para memorizar palavras ou textos. (p.414), essa dificuldade como

o autor diz que ela é o ponto inicial para a descoberta dessa síndrome que é

dislexia logo nas séries iniciais onde o professor deve ter a concepção deste fato

e informar aos pais sobre este síndrome para que os mesmo busquem um meio

para facilitar o aprendizado deste filho, para Stolk:

Atualmente a dislexia é o distúrbio com mais incidência em sala de aula. A dislexia não está relacionada à doença, deficiência mental, falta de inteligência, condições socioeconômicas ou baixa qualidade no processo de ensino. A dislexia é considerada um distúrbio neuropsicológico que se caracteriza pela dificuldade de identificação, compreensão e também interpretação de símbolos gráficos da leitura. (p.414)

A verdade é que todas as crianças, potencialmente e desde que não

possuam nenhuma inaptidão grave, podem vir a serem adultos eficientes,

responsáveis e intervenientes e desempenhar um papel de relevo na sociedade,

mesmo aquelas que apresentam dificuldades na leitura e escrita, ou seja,

aquelas que apresentam dislexia. Os alunos com menor rendimento escolares

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não podem ser considerados como “pessoas menores”, pois, com o devido

acompanhamento, também eles poderão atingir as metas estabelecidas pela

sociedade. A inexistência da ajuda adequada no momento certo pode contribuir

para a formação de indivíduos excluídos socialmente e com muita dificuldade em

superar todos os desafios que lhes venham a ser colocados ao nível pessoal,

social e profissional.

Com isto, torna-se muito importante que a escola básica disponibilize aos

alunos, no tempo preciso, professores, técnicos, meios e métodos adequados

para o acompanhamento de alunos com dificuldades. Só assim os seus

problemas poderão ser superados, desenvolvendo, à medida que vai obtendo

êxito escolar, a sua auto-estima.

No caso de não ser possível à escola ajudar na reeducação dos alunos

com dislexia, estes deverão ser encaminhados para centros de reeducação

adequados, para contarem aí com o auxílio de profissionais especializados.

Entre outros recursos e soluções de apoio, a educação através de computador

pode constituir uma ajuda importante para estes alunos, uma vez que o uso de

softwares educativos adequados pode tornar-se, como exploraremos neste

trabalho, numa alternativa mais eficaz para reduzir o nível das dificuldades

educativas de alguns alunos.

Entre todas as tecnologias disponíveis, o computador ainda se destaca

pelo poder de processamento de informação. Para isso, é importante que a

utilização de softwares em sala de aula seja avaliada conforme capacitação do

professor: caso este possua conhecimento e domínio suficiente de uma

ferramenta, pode usufruir as mais variadas formas de utilização durante o

processo de ensino. Existem algumas maneiras de utilização da tecnologia para

a aprendizagem, que podem ser aplicadas conforme o objetivo que se deseja

alcançar. Por exemplo, a simulação, que é uma maneira de simular a realidade

de forma que não apresente risco ao aluno em seu primeiro momento de

aprendizagem.

A aprendizagem por descoberta, ou investigação, que tem por objetivo

despertar a curiosidade do aluno e fazê-lo pensar, tornando-o mais criativo e

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investigativo. Os pacotes de aplicativos como jogos, editores de textos e

planilhas também são utilizados, tanto em casa quanto em sala de aula. Estes

não possuem um objetivo específico, mas auxiliam indiretamente facilitando o

seu dia-a-dia. E por último, a exercitação, que é a forma mais comum dentro das

escolas. Trata-se da aplicação de atividades repetitivas que podem ser utilizadas

para o aprendizado de temas variados. A exercitação trabalha sobremaneira a

memória, auxiliando e facilitando o acompanhamento individual do aluno.

Quando utilizado o formato de tutoriais, a exercitação determina que o aluno siga

algumas instruções e forneça respostas quando questionado, cabendo ao

software validar a resposta como certa ou não.

Nos tutoriais, uma resposta incorreta encaminha o aluno para refazer o

processo, e uma resposta correta permite-lhe avançar ao próximo nível ou fase

despertando no aluno disléxico o interesse em que aprender de forma mais

aplicada considerando assim seu aprendizado por meio desses softwares

educativos, em que alguns governos estão utilizando eles em seus tablets,

notebooks e desktops, facilitando de tal modo o aprendizado deste aluno

disléxico do ensino básico e é com esses softwares que diversos professores se

utilizam do método do ensino programado ou por exercitação, relacionadas a

situações como, por exemplo, auxiliar alunos que apresentam algum tipo de

dificuldade ou então que necessitam de apoio extraclasse, ou no apoio à tarefa

de memorização da informação. Este método também auxilia na aprendizagem

que requer automatização de respostas, como a aprendizagem da tabuada de

multiplicar, na formação de palavras, no reconhecimento de animais e de formas

geométricas.

A dislexia varia muito de pessoa para pessoa, um estudante que tem

determinadas dificuldades de aprendizagem pode ser diferente de outros

estudantes que também têm a dislexia. Cada caso diagnosticado como dislexia

precisa ser estudado separadamente, porque a dislexia é uma condição “auto”

criada, e que tem também o seu aspecto favorável. Alguns pesquisadores

chegam afirmar que a dislexia é um dom no mais amplo sentido da palavra, um

talento, uma habilidade especial, pois muitas pessoas utilizam o lado positivo

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dela para as atividades profissionais e se tornam homens e mulheres de

sucesso. No entanto, outras pessoas, mal conseguem mover-se neste mundo

regulado pelo tempo/espaço, um dos problemas cruciais para as pessoas com

disfunção cognitiva.

Por isso é necessário a inclusão de metodologias propicias que venham

a inserir este aluno ao invés de excluí-lo, respeitando as diferenças de cada um,

não só os professores devem participar desse processo, mas também as escolas

devem estar inclusa, nessa construção de conhecimento do aluno, mesmo não

tendo a mesma facilidade de aprendizagem de um aluno “normal”, o educando

portador de dislexia também é capaz de aprender, mesmo que leve mais tempo,

é preciso que o processo de conhecimento se dê de forma atrativa, e que os

educadores e toda equipe escolar possa interagir com o mesmo como diz Stolk:

‘’A necessidade de conteúdo didático para auxílio de aprendizagem dentro ou

fora da escola, e as iniciativas existentes, possuem um papel importante para o

auxílio no desenvolvimento e aprendizagem. ’’ (p.414).

O termo dislexia foi, primeiramente, utilizado para descrever vários

problemas de aprendizagem. Com o tempo, os problemas foram subdivididos e

categorizados para descrever as diferentes disfunções de linguagem e cognição.

São tantas as disfunções que levam esse nome que se pode alcunhá-la a mãe

dos problemas de aprendizagem. Não se trata de uma enfermidade nem é

resultado de um defeito genético, dano cerebral, má formação do cérebro, do

ouvido interno ou do globo ocular, a dislexia não está limitada à troca de letras e

palavras como muitas pessoas costumam pensar. Nesta abordagem, a dislexia

é um estilo diferente de aprender e perceber, é um produto do pensamento e

uma maneira especial de reagir ao sentimento de confusão.

A dislexia é um fator biológico/neurológico, que poderá estar relacionada

a fatores históricos individuais e coletivos ou filogenéticos, porém, muitos fatores

precisam ser investigados para se chegar a uma avaliação segura como destaca

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CAMPOS, OLIVEIRA E MUNÕZ a quando se trata do funcionamento do disléxico

em questão aos outros alunos diz que:

A dislexia afeta o funcionamento do cérebro ao sugerir que os déficits de processamento fonológico podem ser resultantes de diferenças na função do hemisfério esquerdo cerebral entre leitores disléxicos e os normais. Especialmente afetadas aparecem às regiões que ligam áreas cerebrais da percepção e da produção da fala. O cérebro funciona perfeitamente, entretanto, o desenvolvimento motor dos disléxicos ocorre de maneira diferenciada das outros alunos. (p.4-5).

Assim, o disléxico é capaz de aprender a ler e escrever, mas de maneira

mais lenta em comparação às outras crianças, é o que vai diferenciar esse aluno

dos demais em sala de aula, pois eles precisam de uma atenção diferenciada

para que possa ajudar em seu aprendizado.

TIPOS DE DISLEXIA

A dislexia contém várias características que podem se manifestar de

maneira diferente de criança para criança. Sendo assim, uma criança que possui

dislexia pode apresentar características diferentes de outra criança com este

mesmo distúrbio, por isso, a dislexia pode ser classificada basicamente em dois

tipos: auditiva e visual ou como chamam CAMPOS, OLIVEIRA E MUNÕZ (2012)

de Dislexia disfonéticas ou dislexia diseidéticas assim são caracterizados por

eles:

Dislexias-disgrafias linguísticas ou disfonéticas: falha na audição, mas escuta bem. Não há assimilação dos fonemas. Consequências: troca de letras; dificuldade em ditados, em soletrar as palavras e dificuldade com o alfabeto. Dislexias-disgrafias visomotoras ou diseidéticas: falhas no viso-espacial, ou melhor, dificuldade na percepção visual. Consequências: soletra, mas não lê corretamente; escrevem palavras e sílabas todas juntas; pouca orientação espacial; troca das letras como p por b e q por p; dificuldades para fazer cópias e motricidade fina alterada. (p.6).

Deste modo elas são caracteristicamente duas em que podemos

compreender sobre cada uma em que citamos a dislexia auditiva, também

chamada de disfonética, é caracterizada por um déficit no processamento

auditivo. Trata-se, pois da dificuldade em interpretar e memorizar a ordenação e

os sons das palavras. Casos como omissão de som ou percepção de sons

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diferentes do meio de uma palavra são frequentes. Para este tipo de dislexia, a

audição pode se apresentar pouco confusa, mas não comprometida.

Dislexia visual, ou diseidética, ocorre devido a uma disfunção no

processamento visual. Neste caso a criança apresenta dificuldade em diferenciar

certas letras, pouca percepção e interpretação para memorizar palavras ou

textos. Neste caso, ela pode ainda alterar a ordem na qual uma palavra é escrita,

ler omitindo alguma letra ou ler de trás para frente são algumas das situações

possíveis neste tipo de dislexia. Há também possibilidade da manifestação dos

dois tipos de dislexia ao mesmo tempo em uma criança, sendo neste caso

considerada como dislexia mista.

SOFTWARE EDUCACIONAL

Depois de identificado e analisado as necessidades desse público alvo,

deve ser proposto soluções que venham a auxiliar estudantes e professores com

relação à aprendizagem dos alunos portadores de dislexia. Com a utilização de

softwares educativos, será possível a melhor interação e compreensão dos

estudantes em relação aos conteúdos propostos em sala de aula, pois os

mesmos possuem relativamente à atração e aprendizado, além de maior

facilidade na relação entre os colegas e professores como diz Stolk (2013):

A proposta de uso do software educacional prevê o acesso de uma criança disléxica para a realização de atividades que não somente favoreçam seu entendimento do conteúdo apresentado, como também sirvam como repositório de treinamento para as limitações Impostas pelo distúrbio, como o não reconhecimento de certos signos da linguagem ou mesmo os fonemas equivalentes. (p.416).

Logo após a inclusão destes softwares educacionais, essa alternativa

será direcionada principalmente aos alunos do ensino básico que tem o

diagnóstico de dislexia, o uso dos softwares pode ser compartilhado com os

professores, onde os mesmos poderão ter acesso a esta tecnologia para poder

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interagir com os alunos, usando esse método como apoio de sua prática

metodológica.

Os softwares também têm um caráter que proporciona ao aluno

independência, onde os mesmos poderão em casa acessá-los e ter um feedback

do software informando onde o aluno errou, onde ele acertou, permitindo ao

professor também poder participar e ver o que em seu estudante pode ser

melhorado, é possível detectar com mais clareza onde está a dificuldade, e o

que o professor pode fazer para ajudá-lo da maneira mais viável.

Na esfera pedagógica, a cognição, que também pode ser entendida como

aprendizagem ou pedagogia inativa, se é que podemos chamar assim, atua na

ação, tem uma visão sistêmica, e propõe mudança de posicionamento no

tratamento ao aprendiz, principalmente aos portadores de necessidades

especiais, habitualmente excluídos pelo rígido sistema behaviorista que

considerava a entropia, as diferenças, as mudanças, as dificuldades de fluência

no tempo/espaço, problemas que deveriam ser eliminados, porque destoavam

dos demais acontecimentos; problemas não-lineares tendiam a ser tratados sem

muita discussão e até com desprezo; o ritmo, o tempo/espaço de aprendizagem

era desconsiderado. Hoje, as pesquisas mostram que as dificuldades de

aprendizagem, como é o caso das dislexias, estão estreitamente relacionadas

às dificuldades de locomoção no tempo/espaço. Por que e como as tecnologias

podem ser úteis a sujeitos aprendizes com essa maneira diferente de ver e

mover-se no mundo onde MATTEI (2012, p.4) vai destacar algumas

características que são:

Explore a criatividade, a iniciativa e a interatividade, propiciando ao

aluno a

Postura ativa diante da máquina e do sistema;

Desperte a curiosidade;

Incentive o trabalho cooperativo e interdisciplinar;

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Estimule ou não a competitividade (de acordo com a linha pedagógica

adotada) nas diversas dimensões (com relação aos colegas, ao

computador, a si próprio etc.);

Estimule à reflexão, o raciocínio, a compreensão de conceitos;

Ressalte a importância do processo em vez do resultado obtido

(ganhar ou perder, certo ou errado);

Encoraje o alcance dos objetivos propostos, evitando-se as tentativas

irrefletidas sobre o processo e levando-se em consideração a

dimensão tempo;

Provoque mudanças desejáveis no processo ensino/aprendizagem;

Propicie a construção do conhecimento;

Contemple aspectos de linguagem (faixa etária, gênero, ambiente...);

Considere aspectos socioculturais, éticos, pedagógicos etc.;

Estimule o aluno a propor e resolver problemas.

Desta forma o uso adequado dos softwares oportuniza o desenvolvimento

e a organização do pensamento, bem como, desperta o interesse e a

curiosidade, dos alunos aspectos fundamentais para a construção do

conhecimento e da aprendizagem.

O uso da informática pelas escolas cresce a cada dia, tanto na área

administrativa quanto na área pedagógica. Seu uso adequado oportuniza o

desenvolvimento e a organização na construção do pensamento, bem como,

desperta o interesse e a curiosidade dos alunos, elementos fundamentais para

a construção do conhecimento, contudo por ser um caso como raro entre os

alunos ainda são poucos os softwares que servem para esse intuído da

aprendizagem e a redes públicas de ensino utilizam esses programas de forma

mais compactada assim como diz Mattei (2012):

Os softwares devem oportunizar uma maior interação entre o aluno, o professor e o ambiente de aprendizagem. Porém nem todos os softwares que encontramos no mercado oferecem qualidade. Há softwares cujos resultados são bastante óbvios. São tão predefinidos que o aluno não possui outra alternativa senão a de seguir um único

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caminho para atingir o resultado esperado. Ele propõe caminhos e resultados únicos substituindo, portanto aquele professor tradicional.

Como MATTEI destaca que os softwares servem de uma forma para um

maior aperfeiçoamento da aprendizagem do aluno disléxico o que um professor

tradicional não consegue atingir em questão da metodologia aplicada por ele por

se tratar de um aluno diferenciado e com uma atenção mais cautelosa, pois as

maiorias dos professores do ensino básico ainda não estão preparados para o

convivo com esse aluno disléxico.

A dislexia é um fator biológico/neurológico, que poderá estar relacionada

a fatores históricos individuais e coletivos ou filogenéticos, porém, muitos fatores

precisam ser investigados para se chegar a uma avaliação segura. De qualquer

maneira, o sucesso de qualquer tratamento, vai depender também da

compreensão que os envolvidos na solução desse problema têm a respeito das

relações sujeito/objeto, da ciência e da tecnologia; o sucesso dependerá,

sobretudo, do grau de consciência, do espírito de investigação, da criatividade,

da viabilização de recursos necessários à criação e desenvolvimento de

ambientes virtuais adaptados à situação apresentada; das metodologias

interativas que valorizem imagens ao invés de palavras e permitam melhor

adaptação do aprendiz ao sistema e ao ambiente.

Quando as descobertas científico-tecnológicas principalmente as

referentes à neurociência, estiverem suficientemente disponibilizadas a

indivíduos portadores de necessidades especiais não importa a classe, raça ou

credo, diremos que a tecnologia estará agregando valor ao processo de auto-

organização e aprendizagem do indivíduo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

No nível de concretização do grande objetivo deste trabalho, que abrangia um

estudo sobre a dislexia e o modo como as novas tecnologias podem dinamizar

o ensino de crianças disléxicas, pareceu-nos alcançado, mas longe de estar

esgotado. Nesta área específica do ensino especial, a tecnologia revelou-se

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importante devido à sua potencialidade de conjugação de texto, imagem, som e

animação gráfica já que, os meios tecnológicos retiram a carga psicológica que

relaciona uma aprendizagem da criança disléxica com a obrigação de estudar

páginas e páginas de texto.

Este estudo permitiu ainda constatar a importância dos meios multimídia

demonstrando o seu enorme potencial devido ao fato de serem recursos que

apoiam a realização de tarefas, a construção de conhecimentos, serem meios

de aprendizagem mais estimulantes e interativos, contribuem para uma melhor

adaptação, integração e desenvolvimento destas crianças, ou seja, cooperarem

para uma melhoria da sua inclusão no sistema de ensino básico.

Considerando a essência da investigação efetuada, entende-se que

importa, principalmente, sublinhar o enquadramento que este poderá

proporcionar para a concretização de trabalhos futuros. Com isto, temos

esperança e convicção que outros como nós apostarão em estudos e pesquisas

que impulsionem a dinamização de aplicações multimídia e a sua

implementação no ensino especial a alunos com dislexia.

REFERÊNCIAS

STOLK, Alecsandro Bez, CASAGRANDE, Carlos Eduardo, BERNHARDT, Muriel de Fatima. Aprendendo com as sílabas: software de apoio ao aprendizado de crianças com dislexia. Novas Ideias em Informática Educativa. Criciúma, p.413-418. Junho/Agosto. 2013.

CAMPOS, Tercilia Vieira, OLIVEIRA, Graciete Maria de, MUÑOZ, Manuel Alfonso Diaz. O Papel do Professor no Letramento dos Disléxicos. RevistaFormação@Docente. Belo Horizonte. Vol.4, nº 2. Julho/Dezembro. 2012.

MATTEI, Claudinéia. O prazer de aprender com a informática na educação infantil. Instituto Catarinense de Pós-Graduação. Florianópolis. Novembro. 2012. PORTAL BRASIL, Penal. Disponível em: http://www.brasil.gov.br/educacao/2014/09/cresce-numero-de-criancas-com-mais-de-4-anos-na-escola> Acesso em: 18 de Novembro de 2014.

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GT: Currículo e Identidade

Coordenador: xxxxxxxxxxx

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A pedagogia de comenius – ética, moral e religiosidade na educação

Victória Magna Torres e Silva Magno [email protected]

RESUMO: Este artigo expõe o pensamento do pedagogo, teólogo e bispo moraviano Jon Amos Komenský (1592-1670), mais conhecido pelo seu nome em latim – Comenius. Explana sua ousada proposta pedagógica, lançada no livro Didática Magna, a ideia de pansofia, uma educação universal onde homens e mulheres, ricos e pobres seriam formados em ciência, moralidade e piedade. Discorre sobre a educação familiar e religiosa, onde Comenius propunha que os pais deveriam ser os primeiros mestres da criança, os guiando no ensino das ciências e na iniciação da vida cristã. Podemos ver a atualidade do pensamento comeniano no uso da ludicidade e do livro didático nas aulas, na abolição dos castigos corporais, na educação para a paz e no PNUD da UNESCO. É neste contexto que apresentamos a pedagogia de Comenius.

PALAVRAS-CHAVE: Comenius; Didática Magna; Ética moral e religiosidade; Educação Cristã.

ABSTRACT

This article exposes the thinking of the teacher, theologian and Moravian bishop Jon Amos Komenský (1592-1670), better known by its Latin name - Comenius. Explains his bold pedagogical proposal, launched the book Didactica Magna, the idea pansophy, universal education where men and women, rich and poor would be formed in science, morality and piety. Discusses the family and religious education, where Comenius proposed that parents should be the first teachers of the child, guiding them in science teaching and initiation of the Christian life. We can see the actuality of thought of Comenius use playfulness and textbook in class, in the abolition of corporal punishment in education for peace and UNDP - UNESCO. In this context, we present the pedagogy of Comenius.

KEYWORDS: Comenius. Didática Magna. Ethics, morality and religiosity. Christian Education.

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Introdução

Educar é o ato de desenvolver e aperfeiçoar as faculdades intelectuais e

mentais do ser humano. Mas nem sempre se teve essa ideia de educação. O

ato de educar era simplesmente visto como abarrotar as mentes dos alunos com

conteúdos enfadonhos e complexos, forçando a decorá-los, sem um cauteloso

esclarecimento. E ainda, a criança era um ser desvalorizado durante a Idade

Média e havia uma distinção de educação entre as classes sociais, e geralmente,

as mulheres eram privadas do processo de escolarização (ISHII, s/d).

Jan Amos Komenský, mais conhecido pelo seu nome em latim –

Comenius, nascido em Nivnice, uma cidade da Morávia (atual República

Tcheca), bispo protestante da Igreja dos Irmãos Morávios, publica em 1657, sua

obra prima “Didática Magna”, onde propõe a ideia da arte universal de ensinar

tudo a todos.

Comenius explana uma didática universal, que auxiliaria os docentes a

lecionarem de um modo consistente, usando como exemplo a natureza, para

parti-la do ensino concreto seguirem ao abstrato. As crianças iriam aprender

brincando e divertindo-se; e o professor não precisaria utilizar da força ou do

autoritarismo para disciplinar os alunos. Mas, ainda assim, a escola deveria ter

autoridade sobre o aluno, pois uma escola sem disciplina é como um moinho

sem água.

A Didática Magna fundamenta-se principalmente no ensino moral e

religioso, no ensino em ciclos, durante um período de 24 anos, onde cada fase

dura seis anos. Na primeira fase a Escola Materna, a criança deveria ser

educada pelos pais, com um ensino básico sobre a língua materna, de acordo

com a faixa etária, com um ensino dos valores éticos cristão de amor ao próximo;

e também com coordenação motora e noções de espaço, Comenius já almejava

uma educação que visasse a psicomotricidade.

A segunda fase seria a Escola Vernácula, dividido em seis ciclos, cada

um com seu livro didático. Fazendo uso da ludicidade os alunos deveriam

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aprender tudo o que lhes fosse necessário para a vida. Seria iniciado o ensino

das ciências e colocado em prática a vida cristã.

A terceira fase seria a da Escola Latina, O ensino seria dividido em seis

ciclos, começando, em sequência, pela Gramática, Física, Matemática, Ética,

Dialética e Retórica; avançando gradualmente. A última fase era a da Academia.

Só deveriam chegar a ela aqueles que tinham inclinação para os cargos públicos,

medicina ou teologia.

Para o autor, o homem seria uma criação sublime, pois Deus o fez à Sua

imagem e semelhança (cf. Gn 1.27). Então, todos, sem distinção, deveriam ser

escolarizados: homens e mulheres, pobres e ricos. A educação teria um papel

primordial na sociedade: o de transformar vidas, levando os homens ao

conhecimento pleno.

Assim, os educadores devem incutir nos educandos que essa vida é uma

preparação para a vida eterna; lembrando de que tudo se direciona a grandeza,

sabedoria, benevolência e ao domínio de Deus, que apronta para os eleitos, um

novo céu e uma nova Terra, onde não haverá luto, nem pranto, nem dor (cf. Ap

21.4). Ele propunha que a educação deveria transformar o homem e levá-lo à

salvação. Comenius sempre enfatizava a o pecado inicial de Adão e Eva (cf. Gn

3.22) e como isso afetava o gênero humano e a maneira que Deus usou de sua

infinita misericórdia para manifestar a nós a Sua sabedoria.

De acordo com Lopes, Comenius afirmava que a cura para o gênero

humano, “[...] não está no engano dos homens, mas em examinar a realidade e

em reconhecer que o problema existe e necessita ser tratado” (LOPES, 2008, p.

11). O autor de Didática Magna alegava que não devemos ignorar o nosso

próprio mal, mas, necessitamos analisar a nós mesmos e repensar nossas

práticas para vivermos em paz conosco e com a sociedade.

A motivação desse artigo tem seus fundamentos em meu desejo de voltar

às raízes de nossos pensadores da educação. Desde o primeiro momento em

que tive contato com a obra de Comenius, fui tomada por um enorme desejo de

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estudá-la, pois o pensamento de Comenius é muito atual, mesmo ele tendo

nascido no século XVI.

O legado de Comenius influencia a educação de um modo geral, e, não

somente a educação cristã. Ele fundamentou a didática moderna, dividiu os

alunos em classes, criou o livro didático e um sistema de ensino gradual,

respeitando cada fase de desenvolvimento cognitivo da criança. A obra de

Comenius, posteriormente, veio a influenciar o pensamento de Jean Piaget.

Encontramos, na literatura científica brasileira, poucos estudiosos da obra

de Comenius; mas podemos destacar Lopes, em sua principal obra, Ensino

Religioso:quem deve educar nossos filhos? Educação Religiosa na Pampaedia

de Comenius (2011), que sugere o resgate de um dos mais fundamentais

conceitos educacionais, isto é, o papel da família ou dos seus responsáveis na

educação dos seus filhos ou de pessoas sob sua tutela. E também seu artigo O

conceito de educação em João Amós Comenius (2008), que revisita o

pensamento do autor moraviano, expondo-o como o “pai da pedagogia

moderna”. Podemos citar Gasparin, em Comênio – A emergência da

modernidade na educação (1998), que resume o pensamento de Comenius.

Temos também Coelho, com seu artigo A Pedagogia Teológica de Comenius:

Um olhar em favor da Educação Eclesiástica (2012), que enfatiza a relação entre

o pensamento teológico e pedagógico de Comenius, examinando sua vida e

obra. E, por fim Ishii (s/d), Contribuições de Comenius para a Educação Cristã.

Ela ressalta a atualidade do pensamento de Comenius e as suas contribuições

para a educação, principalmente a confessional cristã.

A partir da obra de Comenius, podemos fazer as seguintes reflexões: qual

a importância da família na educação? Como devemos ensinar? Como trabalhar

nas crianças o conceito de ética, moral e religiosidade? E como podemos fazer

com que elas pratiquem tais condutas?

O presente artigo sobre a obra do pedagogo morávio Comenius, tem

como principal objetivo analisar a obra comeniana através dos vieses

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educacional e teológico. Essa pesquisa utiliza-se da abordagem qualitativa.

Como nos diz Minayo (1994; p. 21-22)

A pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares. Ela se preocupa [...] com um nível de realidade que não pode ser quantificado. Ou seja, ela trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis.

Minayo nos diz que a pesquisa qualitativa lida com fenômenos que não

podem ser quantificados e valoriza os aspectos descritivos e as percepções

pessoais sobre o objeto de estudo.

Esse estudo, além de trabalhar com uma abordagem qualitativa, também

tem uma dimensão bibliográfica, que segundo Macedo,

[...] é a busca de informações bibliográficas, seleção de documentos que se relacionam com o problema de pesquisa (livros, verbetes de enciclopédia, artigos de revistas, trabalhos de congressos, teses etc.) e o respectivo fechamento das referências para que sejam posteriormente utilizadas (na identificação do material referenciado ou na bibliografia final) (MACEDO, 1994, p.13).

Em linhas gerais, pesquisa bibliográfica é a busca de uma

problematização de um objeto de estudo a partir de referências já publicadas,

por exemplo, livros e artigos científicos, analisando e discutindo as contribuições

culturais e cientificas dessas obras.

Baseado no que foi exposto, o propósito principal desse artigo é analisar

a obra do Comenius, através dos vieses educacional e teológico, fazendo um

resgate da sua obra, fundamentada em autores brasileiros contemporâneos.

Como objetivos secundários temos o de explicitar a importância da educação

familiar e religiosa, entender a necessidade de ensinar as crianças a serem

adultos morais, éticos e religiosos, para termos uma sociedade de paz, onde

respeitamos a nossa vida e a vida de pessoas ao nosso redor.

Este estudo contribuirá para entendermos o início da pedagogia como

ciência, e, entendermos a proposta de uma educação lúdica e reflexiva,

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almejando o conhecimento e educação dos alunos em todas as esferas:

educativas, sociais, políticas e culturais.

DESENVOLVIMENTO

A IMPORTÂNCIA DA PEDAGOGIA CLÁSSICA

Os grandes clássicos da pedagogia parecem estar esquecidos,

esperando que alguém venha ressuscitá-los. Nomes como Platão (428/427 a.C.-

348/347 a.C.), Aristóteles(384 a.C.-322 a.C.), Ratke (1571-1635), Pestalozzi

(1746-1827) e Herbart (1776-1841) são estudados superficialmente nos cursos

de Licenciatura, apegamo-nos com muita ênfase, à teoria socioconstrutivista e

deixamos de lado esses grandes pensadores. Sempre estamos em busca do

novo e nos esquecemos de que o antigo tem muito a nos ensinar. A obra

comeniana é de riquíssimo valor para os pedagogos, pois, ele afirma que papel

da escola incide na formação moral e intelectual dos alunos, para assumir sua

posição na sociedade. Um de seus inúmeros méritos é ver, no homem, a glória

refletida de Deus, conseguir enxergar a totalidade do social, explicitar a

importância da educação doméstica; e de termos pessoas aptas, no âmbito

educacional, para exercerem o papel de preletores, que são aqueles que

lecionam a aula. Entendemos que essas questões ainda não foram resolvidas

no âmbito educacional brasileiro.

A OUSADA PROPOSTA DE UMA DIDÁTICA UNIVERSAL

Comenius instituiu o conceito de didática, que significa a “arte de ensinar

tudo a todos” (COMENIUS, 2011, p. 11). Ele promete fundamentar o protótipo

de escola, com um modo certo e excelente de educar, com um método onde os

alunos aprendam mais, sem precisar de gritos ou autoritarismo, ansiando que o

ambiente escolar seja um local proveitoso e alegre, opondo-se à elitização do

ensino, Comenius aponta que a finalidade da educação é produzir, no homem,

três marcas: verdadeira formação cultural ou ensino, bons costumes ou moral e

a mais profunda piedade almejando a sabedoria universal, onde todos os

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homens e mulheres, ricos ou pobres, sejam instruídos em ciência, moralidade e

piedade (COELHO, 2012).

“Ora, no meu entender, a didática tem uma importante contribuição a dar:

clarificar o papel sóciopolítico da educação, da escola e, mais especificamente,

do ensino” (VEIGA, 2008, p. 44). Durante muito tempo, se entendeu que

didáticas seriam técnicas e metodologias pedagógicas. A didática não deve ser

um amontoado de regras de como ensinar e educar, mas, sim, uma teoria de

ensino em que o professor pode fundamentar e refletir a sua prática.

Na concepção comeniana a educação pode levar o homem à culminância

de sua plenitude, Comenius nos diz: “[...] quanto mais nessa vida obrarmos por

amor à instrução, à virtude, à piedade, tanto mais nos aproximaremos do fim

último” (COMENIUS, 2006, p. 56). Nos escritos de Comenius podemos perceber

o quando ele almejava que o homem fosse formado integralmente. Ele desejava

que a educação não execrasse os conhecimentos prévios da criança,

trabalhando assim com a sua realidade, onde o ponto de partida do ensino seria

o “conhecido”. Ele também colocava como de grande importância, a formação

religiosa, pois, assim as crianças teriam um modelo moral a seguir e aprenderiam

a ser pessoas piedosas e generosas com o próximo. Como bispo de uma Igreja

Cristã, propunha o ensino de Cristianismo.

Ele próprio reconhece a ousadia de sua proposta, pois “Ensinar a arte das

artes é, portanto, tarefa árdua que requer o juízo atento não de um só homem,

mas de muitos (...)” (op. cit. p. 15). Gasparin, em seu livro Comênio – A

emergência da modernidade da educação expõe que “(...) sua Didactica se

intitula Magna. Ela trata da vida e do destino de todos não somente do seu povo,

mas de todas as nações” (GASPARIN, 1997, p. 68).

Esse pensamento de Comenius é uma grande utopia, uma aspiração

democrática, por mais que seja o desejo de boa parte das pessoas, e também

das Nações Unidas que por meio do Programa das Nações Unidas para o

Desenvolvimento (PNUD), estabeleceu a meta de que [...] “até 2015, todas as

crianças, de ambos os sexos, terminem um ciclo completo de ensino básico”

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(PROGRAMA das Nações Unidas para o Desenvolvimento, 2009, p.1). É

impossível que todas as pessoas tenham acesso a qualquer informação que

desejem. O ideal comeniano de universalismo é tão grande que ele propunha

uma única língua para todos os povos.

A educação universal, segundo Comenius, indicaria uma convivência de

paz e segurança entre os seres, de maneira que pessoas de bom caráter não se

corromperiam; e as de mau caráter se transformariam em boas pessoas.

Comenius afirmava que deveria ser desejo dos homens, de que toda a

humanidade fosse educada; pois, através da educação, o ser humano pode se

tornar livre para fazer suas próprias escolhas, não, só imitando o outro, e sim,

julgando a si mesmo. Na perspectiva comeniana, liberdade não incide em fazer

tudo o que se quer, porque essa conduta ataca os outros. A liberdade deve ser

praticada com responsabilidade.

A PERSPECTIVA TEOLÓGICA DO PENSAMENTO COMENIANO

Comenius pode ser descrito como um metafísico, que buscava entender

a essência do mundo, para assim, expor uma prática universal. Seu método

teológico-pedagógico sempre aponta para o Criador, como essência do homem.

Como princípio geral da Didática Magna, podemos colocar o

teocentrismo, onde Deus é o centro de todas as coisas. O homem não é o centro

do universo, como pregava o humanismo, mas, um ser criado à imagem e

semelhança de Deus. Comenius arquiteta a ideia de que tudo foi criado por

Deus. (cf. Gn 1.1, Neem 9.6) E que o homem é uma criatura excelsa, pois ele é

o único portador desta imagem, caída, mas, que pode ser restaurada, porque

todos os homens têm em si a semente da religião. (cf. Gn 01.27 e 3.1-7, Jer

31.33).

Comenius afirma que o homem é um microcosmo, ou seja, uma miniatura

do universo e que, através da espécie humana, derivam-se todos os

conhecimentos, todas as artes, todas as ciências e suas aplicações práticas

(GASPARIN, 1997).

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Com apenas 24 anos, Comenius foi ordenado bispo da Igreja dos Irmãos

Morávios, pelo Sínodo de Zeravice. “Os Irmãos Morávios caracterizavam-se por

praticarem um Cristianismo rígido em doutrina e conduta e destacavam-se pelo

apelo às Sagradas Escrituras, pela humildade e pela profunda piedade;”

(COVELLO, 1999 apud COELHO, 2012. p. 3) O fundador dos Irmãos Morávios

foi John Huss, que foi reitor da Universidade de Praga. Posteriormente Comenius

foi nomeado reitor da escola de Preov. Comenius morava em Praga quando

ocorreu a Guerra dos Trinta Anos e Karl Von Liechtenstein, governador dos

absburgos, baniu todo o clero de Praga. Comenius conseguiu fugir, mas perdeu

sua mulher e os dois filhos; toda a sua propriedade foi queimada, inclusive seus

livros.

Sua identidade cristã é muito presente em sua obra. A educação para

Comenius é o remédio divino para a cura da corrupção do gênero humano,

citando a Bíblia, em Provérbios 22:6 (ISHII, s/d)

“Ensina a criança no caminho que deve andar, e, ainda quando for velho, não se desviará dele.” (...) O provérbio promete que a iniciativa moral do educador desde cedo tem um efeito positivo permanente na vida da pessoa, mas não esgota todos os fatos relacionados à instrução religiosa (BÍBLIA DE ESTUDO DE GENEBRA, 2009, p. 840).

Esse provérbio não é uma promessa de que todo filho de bons pais, que

o ensinaram retamente, será uma boa pessoa, mas é uma máxima que expressa

à importância do ensino e expressa aquilo que geralmente acontece.

“A educação seria, então, o último caminho para levar à correção do

gênero humano. Esse caminho, no entanto, não dispensa o homem, o educador

e a igreja, a empreendedora da educação” (COELHO, 2012, p.9). Comenius

afirma que a educação é um importante meio de transformação social; ele, então,

convoca os ministros dos estados, pastores, gestores, professores e pais, para

educarem, com retidão a juventude. O ensino deve começar em casa desde

cedo com a família, “(...) porque na vida só não se deve aprender, como também

agir.” (COMENIUS, 2011, p. 78). Nunca se sabe quando cada um será arrancado

dessa vida, e após a morte não há como obter conhecimento. (cf. Jó 14.5, Ecl

8:8) A educação cristã precisa lembrar aos pequeninos que essa vida não passa

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de uma preparação para a vida eterna, seja com Deus ou sem ele (COMENIUS,

2011).

A INTERLIGAÇÃO DO PENSAMENTO FILOSÓFICO E PEDAGÓGICO DE

COMENIUS

O cérebro, na idade infantil, é como um solo fértil, apto para o saber e

pronto para receber instruções. Se bem germinado, o amor pelo conhecimento

e pela instrução libertará o homem dos males desse mundo, ou seja, da

impiedade, blasfêmia, arrogância, presunção, indisciplina e preguiça. Só através

da educação podemos formar homens cultos, virtuosos e religiosos.

Outro ponto relevante na obra de Comenius é seu pensamento filosófico,

que foi fortemente influenciado pelo Renascimento, “(...) à volta dos séculos XV

e XVI, em que se deu uma renovação científica, literária e artística, e que era

fundada, em grande parte, na imitação da Antiguidade” (PRIBERAM). Na

Didática Magna há várias citações de Platão, Isócrates, Cícero, Aristóteles,

Horácio, Agostinho e Sêneca.

A pedagogia comeniana baseia-se em três pilares: conhecimento, moral

e religião; é impossível dissociar um aspecto do outro. Se fizermos isso,

estaremos sabotando seu pensamento. Esse pensamento triconômico de

Comenius revolucionou o mundo: Montesquieu apresentou três formas de

governo: a república, a monarquia e a tirania. Thomas Jefferson adicionou à

Constituição dos EUA os princípios de unidade, justiça e liberdade. Lincoln tinha

como preceito: o governo do povo, para o povo e pelo povo. Hoje podemos ver

que o sistema tricotômico, não foi uma mera utopia (GASPARIN, 1997).

Comenius fazia a amarração entre a filosofia e a educação. Ele afirmava

que o homem não só deveria aprender todas as ciências, mas, também, sua

aplicação prática; e que o conhecimento era construído de forma gradual e

racional, adquirindo um conhecimento denso e não meramente superficial. A

educação deveria formar o homem para a vida (COMENIUS, 2011).

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Na Didática Magnaexiste um constante paralelo entre a natureza e o

homem. Comenius mostra que o homem é semelhante a uma árvore. Uma

árvore só dará bons frutos se for regada e adubada constantemente. Segundo

ele da mesma maneira ocorre com o homem; o homem só será integro, sábio, e

piedoso, se bem educado, desde a primeira infância (op. cit., 2011).

À medida que vamos nos aprofundando na obra de Comenius,

percebemos a relação da filosofia com a pedagogia, na busca pela racionalidade

e integridade do homem, pela capacidade de todo homem ser educado. Esse

teórico nos diz que o conteúdo a ser estudado nas várias fases da educação, é

o mesmo; o que muda é o seu grau de aprofundamento em cada fase.

Para que o ensino seja bem-sucedido, fazendo com que o educando

aprenda plenamente, Comenius nos propõe o método sincrético, ou seja,

interdisciplinar. Por meio de imagens, o ensino poderá ser mais dinâmico,

primeiramente os novos conteúdos deveriam ser abordados com algum exemplo

concreto e, depois, seria mais fácil lecionar o conteúdo. (ISHII, s/d). Ele

contrariou aqueles que buscavam um método mais simples para ensinar,

propondo um novo método de trabalho, pois ele partia do prático ao teórico, e

não, o movimento contrário, que é ainda comum nos dias de hoje.

Comenius também ressaltou a importância de se ensinar os conteúdos

pouco a pouco como hoje vêem nas obras de Piaget, no que diz respeito ao

desenvolvimento cognitivo, que, em cada faixa etária, há um modo de se ensinar

e aprender. (op. cit., s/d)

Seu sistema educacional divide-se em quatro fases, durante um período

de vinte e quatro anos, onde cada fase dura seis anos, sempre adotando a

natureza como orientação.

A primeira fase é a Escola Materna, onde o ensino seria explanado de um

modo mais rudimentar, apresentando apenas os fundamentos das artes, das

ciências e das línguas. Deveria se trabalhar noções de espaço, de tempo e

coordenação motora, desenvolver o gosto pela política e utilizar o livro didático,

que, aliás, foi inventado por Comenius. No ensino da moral estudava-se

temperança, para aprender a lidar com as adversidades; asseio, para o bem-

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estar e estética; respeito para com os mais velhos; obediência, para viver bem

em sociedade; sinceridade, para jamais mentir ou enganar ao próximo; justiça,

para instituir valores éticos; amor, para estar em prontidão para ajudar ao

próximo, pois nisso se resume a fé cristã.

A segunda fase é a Escola Vernácula, que iria dos seis aos doze anos,

repartida em seis classes. Cada classe teria seu livro didático, sendo apenas um

livro abordando todo o conteúdo. Os títulos dos livros deveriam ser atraentes

para as crianças. Nesta etapa seria ensinado às crianças, tudo aquilo que lhes

será útil no decorrer da vida. Então, nesta fase as crianças iriam aprender a ler

e escrever com maestria, contar e calcular, entender os princípios da geografia

geral, colocar em prática a doutrina moral e todo o catecismo, salmos, hinos e

as Escrituras Sagradas. Sempre fazendo uso de brincadeiras e jogos para

ensinar os alunos de um modo lúdico e alegre.

A terceira fase é a Escola Latina, que iria dos 12 aos 18 anos, que fecha

o ciclo dos estudos das artes, das ciências e das línguas. O ensino seria dividido

em seis ciclos, começando, em sequência, pela Gramática, Física, Matemática,

Ética, Dialética e Retórica; avançando gradualmente. Por completar esse ciclo,

não significa que se tenha alcançado a perfeição, mas sim, que se deve

aperfeiçoar a prática e a teoria.

A quarta fase é a Academia. O método de Comenius só abrange as três

primeiras escolas, mas, ainda assim ele não deixa de fazer suas aspirações.

Essa escola teria o propósito de formar homens plenos em conhecimento, atingir

o ápice de todas as ciências. Só deveriam chegar à Academia aqueles que têm

inclinação para os cargos públicos, medicina ou teologia; e, não se admite

ignorantes, mas somente os que são aplicados ao estudo. Quanto aos outros,

devem ocupar-se daquilo para que nasceram; lavoura, trabalhos mecânicos ou

comércio.

Lopes, em sua obra, ressalta a importância que Comenius dá a educação

doméstica, fundamentado na Pampaedia, ou seja, educação universal visando

atingir a totalidade do social. Ele afirma que “não são poucos os pais que

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entendem que ao enviarem seus filhos à escola já cumpriram com suas

responsabilidades educacionais” (LOPES, 2011, p.14). Aprimeira educação,

fornecida pelos pais ou responsáveis no seio familiar, deve se ocupar da

disciplina.

“[...] há, no pensamento comeniano, uma aliança escola-família, a qual

implica numa articulação entre a educação familiar e educação escolar, na qual

ambas possuem funções distintas” (op. cit., 2011, p.101). Segundo Comenius,

os pais devem ser os primeiros mestres da criança, mas como suas

responsabilidades aumentaram, os pais podem confiar os seus filhos ao cuidado

de pessoas preparadas para este fim, que saibam disciplinar e instruir as

crianças em virtude e conhecimento. É uma grande responsabilidade criar os

filhos no temor de Deus e em honestidade; isso só é possível dentro de um

relacionamento estável (op. cit. 2011).

A disciplina é essencial e indispensável no processo de formação do

homem. Por meio da disciplina, os pais garantem a sobrevivência dos filhos,

fazem com que eles distingam o bem do mal e vivam uma vida plena em

felicidade, tornando-se “paraíso de delícias de Deus”.

Ainda há uma grande defasagem na literatura científica brasileira, sobre

a obra comeniana, “Todavia, mesmo com o aumento da procura relativa ao

pensamento comeniano há somente duas obras disponíveis [...] A Didática

magna e a Pampaedia.” (op. cit., 2011).

Mas a obra de Comenius é bastante relevante para o cenário educacional

brasileiro, pois ele discorre sobre educação familiar e religiosa, já que hoje se

tem a concepção de que a Educação Religiosa no Brasil trata somente de se

conhecer os fundamentos históricos das religiões, quando conhecer os preceitos

morais das religiões, poderia ser de grande valia. E sobre a educação familiar

podemos ver a importância da articulação entre família e escola, família e escola

devem formar uma equipe, onde trabalhem conjuntamente para o

desenvolvimento intelectual, moral, físico e psíquico das crianças.

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Devemos destacar que o direito à educação deve ressaltar os

fundamentos da universalidade e equidade de direitos iguais para homens e

mulheres, além do mais o direito de igualdade é constitucional, mas ainda não é

colocado em prática em sua totalidade. Uma educação para a igualdade é uma

condição mínima para a cidadania.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esse estudo teve como objetivo explanar a obra de Comenius, visitando

todos os aspectos da pedagogia triconômica comeniana, ou seja, o ensino

científico, moral e religioso. Não é fácil resumir os elementos fundamentais da

teoria de Comenius, mas apresentamos os pontos mais relevantes de seu

pensamento.

Examinamos a obra prima de Comenius, Didática Magna, e estudos de

autores contemporâneos brasileiros. Foi possível concluir que Comenius

fundamentou o conceito de didática e foi o artífice do livro didático. Ele almejava

uma didática universal, e educação para todos, sem nenhum tipo de exceção.

A ideologia de Comenius chega a ser utópica em alguns aspectos, propor

que todos sejam escolarizados e instruídos em todas em coisas, e, também

sugerir uma língua universal, é no mínimo uma ideia extravagante, mas, o

mesmo reconhecia a ousadia de sua proposta.

Comenius nos inspira a repensar o modelo educacional vigente e

colocarmos em prática alguns de seus ideais, enfim, uma educação em favor de

todos, em que os alunos aprendam através da observação e lúdico, visando à

construção integral do ser humano, para que ele se torne assim um

“microcosmo”.

Por fim, como fundamentos relevantes do pensamento do bispo e

pedagogo moraviano Comenius, entendemos que Deus é o centro de todas as

coisas e o homem foi criado à Sua imagem e semelhança; portanto, os homens

devem ser educados para uma vida de comunhão com Deus e com o próximo,

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pois só a educação pode regenerar a corrupção humana e fazer com que o

mesmo tenha a piedade como qualidade fundamental.

REFERÊNCIAS

Bíblia de Estudo de Genebra. 2ª ed. Barueri, SP : Sociedade Bíblica do Brasil

; São Paulo : Cultura Cristã, 2009.

COELHO, Lázara Divina. A pedagogia teológica de comenius: um olhar em

favor da educação eclesiástica. Disponível em:

<http://www.faifa.edu.br/revista/index.php/voxfaifae/article/view/53/69>

COMENIUS, Jan Amos. Didática Magna. 4ª ed. São Paulo: Martins Fontes,

2011.

GASPARIN, João Luiz. Comênio ou a arte de ensinar tudo a todos. Petrópolis,

RJ: Vozes, 1997.

ISHII, Liliana. Contribuições de Comenius para a educação cristã. Disponível

em:

<http://www.mackenzie.br/fileadmin/Graduacao/EST/Revistas_EST/III_Congres

so_Et_Cid/Comunicacao/Gt05/Liliana_Ishii.pdf> Consultado em 23.09.2014

LOPES, Edson Pereira et al. Ensino religioso: quem deve educar nossos

filhos? Educação Religiosa na Pampaedia de Comenius. 1ª ed. São Paulo:

Fonte Editorial, 2011.

MACEDO, Neusa Dias de. Iniciação a pesquisa bibliográfica. 2ª ed. São

Paulo: Edições Loyola, 1994.

MINAYO, M. C. de S. (Org.). Pesquisa social: teoria método e criatividade.

17ª ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 1994

PRIBERAM, Definição de Renascimento. Disponível em:

<http://www.priberam.pt/dlpo/renascimento> Consultado em 23.09.2014.

VEIGA, Ilma Passos Alencastro. Repensando a didática. 26ª ed. Campinas,

SP: Papirus, 2008.

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As influências do espaço físico escolar na aprendizagem

Juciê Inaldo do Nascimento - FAFICA3

RESUMO: Este artigo surgiu com intuito de entender as possíveis influências que o espaço físico escolar pode ter sobre a aprendizagem dos alunos. Entendendo que em muitos casos os alunos passam mais tempo no ambiente escolar que em suas casas, fazendo-se necessário o estudo de como eles se relacionam, usam e sentem-se no espaço físico da escola, se o mesmo lhes proporciona conforto suficiente e propicio à aprendizagem e ao desenvolvimento de suas aptidões. Todo o estudo desenvolvido em diálogo com os autores: (LIMA 1995; MIRANDA, GOMES 2002; BELTRAME, SOUZA, 2003; FIORI, 2011; BARBOSA, HORN 2008; e ZABALZA, 1998) e as observações feitas na escola campo de estágio que mostram que as condições físicas do espaço escolar podem influenciar positiva ou negativamente na aprendizagem. Influências negativas se apresentam como baixo desempenho do aprendizado, problemas de saúde e mudanças no comportamento; influências positivas mostram-se em alunos com alto índice de aprendizado e motivados a frequentarem o recinto escolar. Palavras-chave: Influências, Espaço físico, Aprendizagem, Conforto.

Introdução

A percepção de que o espaço físico da escola pode influenciar na

aprendizagem dos discentes ainda se mostra imatura. É através do diálogos

sobre esta temática, que podem ser encontrados possíveis transtornos a

aprendizagem de crianças, adolescentes e jovens. Os seres humanos

necessitam de viver harmoniosamente, tanto entre os mesmos, como também

com o ambiente. Essa harmonia com o ambiente inclui, certamente, o espaço

físico seja de sua casa, local de trabalho ou de estudos.

3 Graduando do 4º período do curso de Licenciatura Plena em História - da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Caruaru.

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É na escola que o discente passa, muitas vezes, a maior parte do dia. No

entanto, pouco se é levado em conta, no que diz ao ambiente físico, se é propicio

ou não para o desenvolvimento intelectual desse discente. Porém, segundo

Beltrame e Souza, “desde os primórdios da história sobre os espaços destinados

à educação sempre houve preocupação com a busca de um espaço que

favorecesse a aprendizagem” (2003, pág. 4). Mesmo assim a estrutura física de

muitas escolas não corresponde ao mínimo esperado para uma aprendizagem

de qualidade.

Se o individuo não se sentir acolhido ao ambiente e não estiver

minimamente confortável, sua produção intelectual poderá apresentar um

declínio, da mesma forma que se o ambiente for agradável o desempenho do

indivíduo em qualquer que seja a atividade será promissor. Beltrame e Souza

ressaltam que “sentir-se confortável é uma das melhores sensações dos seres

humanos. Alguns estudos já comprovaram que condições desfavoráveis de

conforto ambiental são causa de mau desempenho dos alunos”. (2003, pág.5).

Por esses e outros pressupostos faze-se necessário o diálogo sobre a temática

das influências do espaço físico escolar na aprendizagem.

Partindo de experiência própria e da inquietação por ser um problema,

muitas vezes, visível na escola; e a fim de contribuir com mais conhecimento,

num diálogo baseado no que alguns teóricos abordaram sobre a temática e entre

o uso e o estado do ambiente físico observado na escola campo de estágio. E

de procurar entender como o futuro docente pode lidar com possíveis problemas

na aprendizagem ligados a algum tipo de influência do espaço físico escolar e

que me proponho a produzir este artigo.

A escola campo de estágio na qual fiz minhas observações para análise

localiza-se na cidade de São Caetano - PE tem aproximadamente 840 alunos,

divididos em 16 turmas, sendo sete de 1º ano, cinco de 2º ano e quatro de 3º

ano do ensino médio. É uma escola pública de referência em tempo integral,

possui biblioteca, laboratório de informática, de química e biologia, e de

matemática e física. Nela há uma quadra coberta para prática de educação

física. A escola funciona das sete da manhã às cinco da tarde.

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Nesta escola há um estacionamento, o terreno da escola é extenso,

porém a parte construída se aproxima dos 50% do tamanho do terreno. A escola

está localizada as margens da BR232, e a entrada de alunos e por uma calçada

que está aproximadamente a um metro da pista. Há muros por toda a extensão

do terreno e antes que se entre na parte construída da escola há grades de

ferros. Rampas para acesso de cadeirantes também estão presente por toda

parte do prédio da escola.

Neste artigo que está dividido em quatro seções; a primeira intitulada: O

que é o espaço físico? - discutirei o significado dessa expressão e em que se

materializa o espaço físico do qual me refiro. A segunda seção intitulada:

Relação entre o aluno e o espaço físico - nessa seção analisarei quais aspectos

são necessários para um ambiente que proporcione uma aprendizagem

saudável e produtiva. Na terceira seção intitulada: Realidade do espaço físico da

escola - analisarei o que realmente se percebe no cotidiano escolar, pois, entre

a teoria e a prática, muitas vezes, há defasagens. A quarta seção intitulada:

Programas ligados aos espaços físicos das escolas - trarei uma rápida analise

sobre programas que a partir do FNDE4, são direcionados de alguma forma,

recursos para manutenção, reforma e ampliação dos espaços físicos escolares,

a fim de contribuir para a melhoria da aprendizagem.

O QUE É O ESPAÇO FÍSICO?

Para entender as possíveis influências e consequências causadas à

aprendizagem pelo espaço físico é necessário entendê-lo em si. O espaço físico

nos traz o sentido de que é a capacidade material ou construída de um terreno

e suas adjacências. A escola não foge a regra. Nela podemos distinguir

diferentes objetos que, no entanto, são parte integrante do espaço físico.

Quando se pensa em espaço físico escolar, logo se imagina paredes,

telhado, piso, etc. da escola. Porém, o espaço físico também pode ser

4 Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - autarquia federal criada pela Lei nº 5.537, de 21 de Novembro de 1968, e alterada pelo Decreto nº 872, de 15 e Setembro de 1969; é responsável pela execução de políticas educacionais do Ministério da Educação.

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identificado como as carteiras das salas de aula, ventiladores, birôs, lousas,

portas; na quadra de esportes: as redes; na cozinha: as panelas, o fogão e o

refrigerador, ou seja, além das paredes, o espaço físico escolar também é os

objetos que o compõem. Entendendo esses significados é importante saber que:

Para qualquer ser vivo, o espaço é vital, não apenas a sobrevivência, mas, sobretudo para seu desenvolvimento. Para o ser humano, o espaço, além de ser um elemento potencialmente mensurável, é o lugar de reconhecimento de si e dos outros, porque é no espaço que ele se movimenta, realiza atividades, estabelece relações sociais.(LIMA, 1995, p. 187 citado por MIRANDA, GOMES 2002).

Se o espaço físico escolar não for adequado a subsidiar uma

aprendizagem de qualidade, ele pode deixar marcas na vida do discente, como

problemas na aprendizagem. Assim fala Beltrame e Moura “o ambiente e os

elementos que o compõem formam um conjunto inseparável que interfere

diretamente nas pessoas que nele estão inseridas” (2003, pág. 2). Sendo assim,

é visível que o espaço físico insere influência, positiva ou negativa, na

aprendizagem e que se faz necessária a devida atenção a esta temática.

Essas influências são direcionadas a aprendizagem dos alunos, mas

também a prática dos educadores. São vários os aspectos físicos que existem

nas escolas, e é preciso estar atento as suas especificidades. Durli e Brasil

(2012) inferem que

questões como a altura das janelas, a dimensão das salas, dos corredores, dos banheiros, bem como o tipo de materiais, incidem sobre o espaço pedagógico na direção de atender às necessidades das crianças no seu processo de aprendizagem e desenvolvimento, em consonância com a concepção de educação do professor. (pág. 116).

A prática docente também pode ser prejudicada com a falta de materiais

necessários ao fazer pedagógico e a precariedade dos espaços físicos para a

aprendizagem. Portanto, o docente que identifica os problemas de espaço físico

e por meio da gestão procura soluções está não só contribuindo para a melhoria

da aprendizagem dos alunos como para a melhoria de sua prática de sala de

aula.

RELAÇÃO ENTRE O ALUNO E O ESPAÇO FÍSICO

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Em algumas escolas os alunos passam cerca de nove horas no recinto

escolar, a exemplo das escolas de tempo integral. Nestes locais o ambiente

torna-se importantíssimo para a aprendizagem. E o conforto existente nele é que

mostrará como responderam os alunos ao que lhes é solicitado. Os móveis das

salas de aula, os corredores e pátios externos podem ou não propiciar

segurança, conforto e comodidade, além de acessibilidade aos que

necessitarem. E assim contribuírem para um processo de ensino-aprendizagem

produtivo.

Fiori (2011), diz que “a interação que ocorre dentro dos espaços são de

grande influência no aprendizado” (pág., 14). O espaço influencia no

aprendizado não só dentro da sala de aula, mas também fora, nos outros

espaços de socialização dos discentes. A aula de educação física e os diálogos

no intervalo são de extrema importância para a aprendizagem.

Se o espaço físico não propiciar momentos prazerosos de diálogo e

descontração entre as aulas, voltar à sala de aula não será tão produtivo quanto

o esperado. Por isso para Barbosa e Horn, “o espaço físico é o lugar do

desenvolvimento de múltiplas habilidades e sensações e, a partir de sua riqueza

e diversidade, ele desafia permanentemente aqueles que o ocupam” (2008, pág.

120). A aprendizagem também se dá na socialização entre os discentes, portanto

subsidiar espaços físicos de descontração dentro da escola é uma atitude

favorável a uma aprendizagem satisfatória. Espaços que propiciem jogos

educativos nos intervalos de aula, assim esse momento tão importante de

socialização não se resumirá apenas ao ato de comer, como acontece,

corriqueiramente, nas escolas.

Uma alternativa para subsidiar espaços físicos dentro e também fora da

escola para descontração é a readaptação dos espaços físicos e mudanças de

hábitos dentro da escola, tais como: aulas passeios, jogos interclasses, que se

mostram com uma alternância para sair da rotina e quebrar o ciclo vicioso de

que apenas a sala de aula é lugar de aprendizagem.

O espaço físico escolar aparece como responsável por uma

aprendizagem sadia, mas, não é apenas nele que se aprende. De acordo com

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Zabalza (1998), “Um espaço deve ser promotor da aprendizagem, que possibilite

(...) liberdade para criar, produzir e, ainda, divertirem-se ao aprender e ao se

constituírem” (pág. 42). Portanto, uma praça, um museu, um cinema também

são espaço agradáveis a aprendizagem. E caso o espaço físico da escola não

seja dos melhores, buscar inovar pode surtir efeito.

A escola é local de construção de conhecimento, a integração harmoniosa

entre os que nela estão e seu espaço físico é primordial para resultados

positivos. Um consenso entre aulas em sala, e fora de sala traz uma mudança

de ambiente que propicia a inovação, mesmo nos espaços da escola onde se

parece impossível a aprendizagem, como: banheiros em aulas de química e

biologia para estudos sobre bactérias, próximos aos muros da escola, em aulas

de física e matemática para estudos de trigonometria. Essas alternativas se

mostram ainda mais favoráveis em escolas onde não existem laboratórios.

Saber utilizar o espaço em que se vive é imprescindível para uma vida

saudável. E com isso na escola uma aprendizagem fértil e transformadora. Fiori

(2011) aborda essa questão quando diz que:

Os espaços construídos (...), devem ser explorados (...), em uma relação de interação total, de aprendizagem, de troca de saberes, de liberdade de ir e vir, de prazer, de individualidades, de partilhas, enfim, de se divertir aprendendo. As aprendizagens que ocorrem dentro dos espaços disponíveis e ou acessíveis (...), são fundamentais na construção da autonomia, tendo a mesma como própria construtora de seu conhecimento (pág. 12).

A autora traz o enfoque de que os espaços disponíveis ao alcance dos

discentes devem ser utilizados como forma de trazer autonomia. É improvisando

que se inicia a mudança, porém a busca por um espaço físico escolar concreto

e passível de uma boa aprendizagem deve ser paralela. Existem alternativas,

mas e necessário cobrar dos responsáveis o ambiente favorável a que todos têm

o direito de usufruir.

REALIDADE DO ESPAÇO FÍSICO NA ESCOLA

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Podemos refletir sobre as condições físicas encontradas em muitas

escolas em nossa realidade. Nem toda instituição escolar, principalmente as

públicas, tem condições de proporcionar um ambiente confortável aos que a

frequentam. Segundo a pesquisadora da UNESCO, Abramovay “a falta de

espaço é indicada como um dos principais problemas quando se referem à infra-

estrutura escolar, assim como a adequação do espaço às necessidades das

crianças e dos jovens, como locais para educação física, recreio e atividades

culturais” (2003, pág. 283).

De início, o entendimento de que a aprendizagem acontece também fora

da sala de aula, e até mesmo da escola, pode ser fator decisivo na mudança de

hábitos para melhoria da relação com o espaço físico. A partir do momento que

o educador e a gestão escolar percebem a necessidade de buscar melhorias no

espaço físico, e entende que esse espaço pode influenciar na aprendizagem, um

caminho pode aparecer.

Sabemos que as estruturas físicas das escolas públicas, em alguns

casos, não são de fácil reorganização ou reforma. E mesmo que se identifique o

carecer de reformas estruturais, o âmbito financeiro e burocrático nem sempre é

favorável. Mas, identificar os problemas no espaço físico que possivelmente

estejam influenciando na aprendizagem dos discentes é um grande passo,

sejam eles, a falta de espaço, de materiais, de mobília ou qualquer outro.

Problemas como falta de água para higiene e preparo de alimentos na

escola, carteiras desconfortáveis5 nas salas de aula, falta de ventiladores ou ar-

condicionado, são frequentes e provocam interrupções sérias na aprendizagem,

tais como: sem higiene, doenças; sem alimentos, a saída mais cedo da aula;

sem os ventiladores, mal estar por causa do calor, que se agrava muitas vezes,

pelo número de alunos excessivo por sala de aula.

Outros problemas também podem ser vistos nas escolas como:

corredores com uma única saída, salas de aula sem porta, lousa manchada,

janelas quebradas, entre outros. Esses fatos influenciarão no caso das janelas

5 Principalmente, aquelas feitas de madeira sem acolchoamento.

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quebradas: no que diz ao clima na sala; no caso da salas sem porta: na timidez

para falar dos alunos, pois várias pessoas estão circulando no corredor além de

tirarem o foco da atenção dos discentes.

A lousa manchada dificulta a escrita do professor e o uso de projetores

direcionados a ela. No caso de corredores com uma única saída, o risco é muito

maior. Numa hipótese, se uma parte do teto do inicio o corredor desaba ou

acontece um incêndio nas primeiras salas, todos os alunos se veriam trancados

num beco sem saída. Isso se agravaria ainda mais se nos corredores da escola

não houver extintores de incêndio.

A questão do cuidado com o espaço físico escolar, em alguns lugares,

parece não influenciar na aprendizagem e nem fazer diferença dentro a escola.

Porém, o espaço físico escolar é de extrema importância e merece atenção, pois

é um elemento indispensável para a escola. É sua constituição concreta, sendo

a educação sua constituição intelectual.

Abramovay (2003), diz que: “Os alunos observam que a sujeira e a

desarrumação do ambiente escolar são aspectos que interferem negativamente

no processo de aprendizagem” (pág. 291). Disso podemos concluir que se o

próprio aluno tem essa concepção, não se admite que equipe gestora e docente

não percebam a necessidade de reformulações e organização do espaço físico

para que se tenha uma educação sólida e satisfatória. A identificação dos

problemas físicos da escola é o primeiro passo para a mudança e a melhoria

desses problemas.

PROGRAMAS LIGADOS AOS ESPAÇOS FÍSICOS DAS ESCOLAS

As escolas dispõem de vários mecanismos para auxiliar na adequação do

espaço físico. Existem programas do Governo Federal por meio do FNDE, para

auxiliar no âmbito físico das escolas, como o PAPE - Plano de Assistência ao

Prédio Escolar, usado para reformas estruturais nas escolas. Ele “é um projeto

cujas intervenções visam restabelecer na unidade escolar, condições de

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segurança, salubridade, estabilidade e funcionalidade, sem alteração da área

construída e da disposição de seus espaços internos”.6

Outro programa é o FUNDEB7 - Fundo de Manutenção e Desenvolvimento

da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação - que prevê

que no máximo 40% do valor disponibilizado seja usado, entre outras coisas,

para a “aquisição, manutenção, construção e conservação de instalações e

equipamentos necessários ao ensino”.8 tais como: compra de terreno para

construção de anexo da escola, reformas e ampliação física da escola, compra

de mobiliário, etc.

As escolas possuem meios para melhorar suas condições físicas, pois, se

disponibiliza recursos. Se esses recursos são bem geridos e se chegam às

escolas realmente, não posso afirmar, mas políticas de apoio aos espaços físicos

escolares estão sendo praticadas. Sua ampliação pode ser discutida, a fim de

buscar mais subsídios aos espaços físicos escolares, e assim, a aprendizagem

de qualidade, tendo como resultado alunos motivados, professores valorizados

e uma educação pública digna.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Há vários caminhos para que se possa chegar à almejada educação de

qualidade, porém, é certo que para chegarmos a ela haveremos de prestar a

atenção devida aos problemas dos espaços físicos das escolas. Se tivermos

salas arejadas, bem equipadas e com materiais disponíveis para o trabalho do

docente com seus alunos, se tivermos espaços de socialização dentro da escola

que comportem o quantitativo de alunos que muitas escolas possuem,

poderemos num futuro próximo caminhar a passos largos para uma

aprendizagem melhor.

6 Manual para adequação de prédios escolares. 5ª ed. Brasília, Fundescola/DIPRO/FNDE/MEC, 2005. 7 FUNDEB foi criado pela Emenda Constitucional nº 53/2006 e regulamentado pela Lei nº 11.494/2007 e pelo Decreto nº 6.253/2007, em substituição ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério - Fundef, que vigorou de 1998 a 2006. 8 Guia de orientação aos membros do conselho do FUNDEB. Dezembro de 2012, São Paulo.

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Enquanto não se possui, em grande parte, essas características positivas

em nossas escolas; necessário se faz utilizar os meios disponíveis. Inovar com

o que temos. Usar dinâmicas que diversifiquem as aulas e procurar

paralelamente solucionar os problemas existentes na estrutura física de nossas

escolas.

Reivindicar também aos responsáveis pela educação os subsídios para

melhoria dos espaços físicos das escolas. Programas de apoio existem, e estão

distribuídos no âmbito educacional para que sejam utilizados. É necessário que

sejam postos em prática. Identificar os problemas, expor essas falhas e pedir

soluções são práticas que podem iniciar uma melhoria nos espaços escolares e

assim uma melhoria na aprendizagem, na própria educação escolar.

REFERÊNCIAS

ABRAMOVAY, Miriam. CASTRO, Mary Garcia. Ensino Médio: Múltiplas vozes. Brasília: UNESCO, MEC, 2003. BARBOSA, Maria Carmem Silveira. HORN, Maria da Graça Souza. Projetos pedagógicos na educação infantil. Porto Alegre; Artmed, 2008. In: FIORI, Carla Coelho. Os espaços físicos na educação infantil e suas relações com o processo de ensino aprendizagem. TCC. Criciúma, Julho de 2011, Universidade do Extremo Sul Catarinense - UNESC. BELTRAME, Mauria Bontorim. SOUZA, Graziella Ribeiro Soares. Edificações escolares: infra-estrutura necessária ao processo de ensino e aprendizagem escolar. São Paulo. 2003. <<erevista.unioeste.br/índex.php/travessias/article/download/3378/2663>> Acesso em 24 de Agosto de 2014. DURLI, Zenilde. BRASIL, Marizete Rossana Aparecida. Ambiente e espaço na educação infantil: concepção dos documentos oficiais. Roteiro, Joaçaba, v. 37, n. 1, p. 111-126, jan./jun. 2012. Disponível em: <<editora.unoesc.edu.br/index.php/roteiro/article/download/1433/pdf>> Acesso em: 09 de Outubro de 2014. FIORI, Carla Coelho. Os espaços físicos na educação infantil e suas relações com o processo de ensino aprendizagem. TCC. Criciúma, Julho de 2011, Universidade do Extremo Sul Catarinense - UNESC. GUIA DE ORIENTAÇÃO AOS MEMBROS DO CONSELHO DO FUNDEB. Dezembro de 2012, São Paulo. Disponível em:

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<<http://www4.tce.sp.gov.br/sites/default/files/guia-de-orientacao-aos-membros-do-conselho-do-fundeb-dez-2012.pdf>> Acesso em: 01 de Outubro de 2014. LIMA, Mayumi Watababe de Souza. Arquitetura e educação. São Paulo, Studio Nobel, 1995. IN: MIRANDA, Elaine Cristina de Freitas, GOMES, Leda. Ambiente escolar e aprendizagem na visão de pais do ensino fundamental. Boletim de Iniciação Científica em Psicologia - 2002, 3(1): 53-73. MANUAL PARA ADEQUAÇÃO DE PRÉDIOS ESCOLARES. 5ª Ed./Elaboração Carlos Alberto Araújo Guimarães, Cláudia Maria Videres Trajano, Erinaldo Vitório, Rodolfo Oliveira Costa, Willamy Mamede da Silva Dias. – Brasília: Fundescola/DIPRO/FNDE/MEC, 2005. 50p. Disponível em: <<ftp://ftp.fnde.gov.br/web/fundescola/publicacoes_manuais_tecnicos/manual_adequacao_predios_escolares.pdf>> Acesso em: 01 de Outubro de 2014. ZABALZA, Miguel Antônio (org). Qualidade em educação infantil. Tradução: Beatriz Affonso Neves. Porto Alegre: Artmed, 1998. In: FIORI, Carla Coelho. Os espaços físicos na educação infantil e suas relações com o processo de ensino aprendizagem. TCC. Criciúma, Julho de 2011, Universidade do Extremo Sul Catarinense - UNESC.

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GT: Currículo e avaliação das aprendizagens no trato das diferenças

Coordenador: xxxxxxxxxxx

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Ensino e aprendizagem de expressões algébricas: há indícios

de contextualização nas escolas do campo em são Caetano-

PE?

Antônio Andrade de Morais Filho

[email protected]

Maria Joselma do Nascimento Franco

[email protected]

RESUMO: O presente trabalho tem como objeto o ensino e a aprendizagem dos

elementos constitutivos das expressões algébricas no oitavo ano do Ensino Fundamental,

em escolas do campo do município de São Caetano no Agreste de Pernambuco. O estudo

deste objeto justifica-se por compreendermos que a abordagem do conteúdo de álgebra,

favorecerá um alicerce para situações que requeiram dedução matemática e consolidação

de instrumentos, embasando o conteúdo matemático, numa perspectiva de

aprofundamento gradual e contínuo na resolução de problemas cotidianos e escolares.

Para tanto, temos como problema: O ensino das expressões algébricas tem se revelado

em processos de aprendizagem contextualizada dos alunos no oitavo ano do ensino

fundamental, em escolas do campo? Tendo como objetivo geral: Analisar se o ensino de

expressões algébricas em escolas do campo, tem possibilitado o domínio da leitura

matemática, da fatoração básica e das estruturas algébricas no contexto do campo. Os

específicos são: 1) Analisar o plano de aula do professor considerando que este é o

direcionador da vivência em sala de aula, validando o ensino das expressões algébricas.

2) Identificar os procedimentos e o tipo de atividade adotada pelo professor para a

aprendizagem de álgebra contextualizada em sala de aula. 3) Levantar nos documentos

oficiais (PCN de Matemática, DCN da Educação do Campo, OTM) os indicativos de

conteúdo e procedimentos a serem adotados para o ensino e a aprendizagem de expressões

algébricas e no contexto do campo; 4) Averiguar se os alunos dominam o conhecimento

matemático de expressões algébricas, contextualizada (leitura matemática, fatorações

básicas e estrutura de algumas expressões). A metodologia dar-se – á, através dos

procedimentos da análise documental (PCN de Matemática, OTM, plano de aula do

professor, caderneta, produções dos alunos) e da entrevista semi-estruturada com seis

professores de Matemática de escolas do campo do município de São Caetano, além da

aplicação de uma atividade didática que contemple as expressões algébricas tratadas

através da análise de conteúdo, pela análise temática categorial (Bardin, 2011).

contextualizadas para quatro turmas do oitavo ano do ensino fundamental. Os dados serão

Palavras-chave: Ensino; Aprendizagem, Expressões Algébricas; Educação do Campo.

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Introdução

Adotamos como ponto de partida para este estudo a difusão do conteúdo

matemático que por vezes é tratado de maneira superficial, sendo resumido a

fórmulas, procedimentos e resultados. Em se tratando da álgebra, como meio

pelo qual se fundamenta a base do valor expresso como saber matemático, mais

que isso os instrumentos e mecanismos utilizados na explanação e consolidação

do conhecimento algébrico são de suma importância para a concretização de

elementos básicos estruturais. Trata-se especificamente das expressões

algébricas, uma das primeiras expressões que os discentes encontram na

vivência escolar de sala de aula no 8º ano do ensino fundamental, esta é

essencial na construção de uma leitura matemática posterior, para a

continuidade e formação do pensar dedutivo matemático.

Contemplando a educação matemática no contexto da educação do

campo, percebe-se que as expressões algébricas tomam um relevante papel no

que se refere à análise de como as expressões matemáticas estão sendo

ensinadas e consideradas como uma importante ferramenta na aprendizagem

dos alunos em sala de aula e na aferição de uma matemática contextualizada,

para um futuro alicerce da reflexão abstrata.

A aprendizagem gerada a partir da ótica de que a didática do professor

aqui toma corpo, na elaboração do plano de aula, adquirindo a forma pela qual

as expressões algébricas serão apresentadas de maneira que os alunos

interajam e construam sua própria leitura matemática, perpassando pela

identificação do assunto com a realidade do campo inserida no estudo das

expressões matemáticas, valorando não só aspectos técnicos, porém

expandindo um horizonte a vislumbrar novos caminhos que reafirmarão a

indispensável atribuição do pensar matemática de onde se vive.

Diante do exposto, “o ensino e a aprendizagem dos elementos

constitutivos das expressões algébricas no oitavo ano do Ensino Fundamental’,

em escolas municipais do campo, passa a ser o nosso objeto de estudo.

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Tomando como realidade do agreste de Pernambuco, contexto que nos

permitiu planejar este estudo referente ao ensino e aprendizagem de expressões

algébricas a partir do contexto da educação do campo

Para tanto temos o seguinte problema: O ensino das expressões

algébricas tem se revelado em processos de aprendizagem contextualizada dos

alunos no oitavo ano do ensino fundamental, em escolas do campo?

Ao se tratar do estudo de álgebra, mais especificamente das expressões

algébricas que requerem uma abordagem clara, contínua, enfatizando os

elementos constitutivos das expressões, essas permearão toda uma jornada na

construção e aquisição de dedução matemática futura para realização escolar e

cotidiana.

Para tanto, temos o seguinte objetivo geral: Analisar se o ensino de

expressões algébricas em escolas do campo tem possibilitado o domínio da

leitura matemática, da fatoração básica e das estruturas algébricas no contexto

do campo.

Como específicos elegemos: 1) Analisar o plano de aula do professor

considerando que este é o direcionador da vivência em sala de aula, validando

o ensino das expressões algébricas.

2) Identificar os procedimentos e o tipo de atividade adotada pelo

professor para o ensino e a aprendizagem de álgebra contextualizada em sala

de aula.

3) Levantar nos documentos oficiais (PCN de Matemática, DCN da

Educação do Campo, OTM) os indicativos de conteúdo e procedimentos a serem

adotados para o ensino e a aprendizagem de expressões algébricas e no

contexto do campo;

4) Averiguar se os alunos dominam o conhecimento matemático de

expressões algébricas, contextualizada (leitura matemática, fatorações básicas

e estrutura de algumas expressões).

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APORTE TEÓRICO

ENSINO DAS EXPRESSÕES ALGÉBRICASPARA ESCOLAS DO CAMPO

A educação do campo surge como sendo um contexto a ser discutido em

virtude de educação voltada especificamente para o contexto e características

próprias do campo, para isso vimos em Arroyo (2004) que:

A educação do campo precisa ser uma educação específica e diferenciada, isto é, alternativa. Mas, sobretudo deve ser educação, no sentido amplo de processo de formação humana, que constrói referências culturais e políticas para a intervenção das pessoas e dos sujeitos sociais na realidade, visando a uma humanidade mais plena e feliz (ARROYO, 2004, p.23).

Nesse sentido apresenta-seno marco legal a educação do campo como

necessidade permeada pelo ensino específico da realidade do campo. Como se

percebe no Artigo 28º das Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.

Na oferta de educação básica para a população rural, os sistemas de ensino promoverão as adaptações necessárias à sua adequação às peculiaridades da vida rural e de cada região, especialmente: I - conteúdos curriculares e metodologias apropriadas às reais necessidades e interesses dos alunos da zona rural; II - organização escolar própria, incluindo adequação do calendário escolar às fases do ciclo agrícola e às condições climáticas; III - adequação à natureza do trabalho na zona rural. (BRASIL, 2008)

Para tanto percebe-se que os PCNs se constituem como importante

mediador, na prática docente e na realização educacional de questões que

abrangem a aprendizagem e o ensino.

No entanto para o PCN Parâmetro Curricular Nacional (1998) de

matemática, a álgebra esta direcionada, no seguinte termo de efetivação e

validação, para o ensino fundamental, expressos da seguinte maneira:

O estudo da Álgebra constitui um espaço bastante significativo para que o aluno desenvolva e exercite sua capacidade de abstração e generalização, além de lhe possibilita a aquisição de uma poderosa ferramenta para resolver problemas. (p.115)

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O estudo realizado permite-nos refletir acercados procedimentos a serem

adotados para o ensino e a aprendizagem de expressões algébricas no contexto

da educação do campo.

DISCUTINDO OS PCN - PARÂMETRO CURRICULAR NACIONAL DE

MATEMÁTICA

Os PCN são instrumentos importantes para a prática docente. Eles são

propostas de currículo para orientar a educação básica, numa perspectiva

cidadã e aponta para a necessidade de mudança no ensino, uma vez que os

tempos mudam. Os PCN apresentam o objetivo de instrumentalizar o estudante

para compreender o mundo em sua volta, busca oferecer condições para que

ele possa compreender a matemática como área de conhecimento que pode

estimular o desenvolvimento de habilidades.

Através do estudo dos PCN (BRASIL, 1998) na área da matemática,

podemos perceber a proposta de ampliação do trabalho escolar numa interação

com a realidade que está em mutação, diante do exposto esse documento nos

revela que emerge a necessidade do desenvolvimento de práticas pedagógicas

eficientes, através de iniciativas que favoreçam o ensino da matemática.

Podemos então, perceber que o currículo da área da matemática se daria

através do conhecimento da sua natureza, o que pode contribuir para a formação

cidadã.

Percebemos que o saber matemático para o professor se dá através da

compreensão da matemática como uma ciência dinâmica, mas sempre aberta à

incorporação de novos conhecimentos, e que a escola pode contribuir para a

aprendizagem do estudante através do desenvolvimento da capacidade de

natureza prática de lidar coma atividade matemática.

Para que a aprendizagem se dê, a relação professor e estudante precisam

acontecer numa perspectiva de trabalho, em que o último seja considerado

protagonista, e o trabalho do professor ganha novas dimensões como mediador

e incentivador da aprendizagem.

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O documento em análise aponta alguns caminhos para trabalhar a

matemática em sala de aula, seja pela via da história da matemática que pode

oferecer uma importante contribuição ao processo de ensino e aprendizagem

dessa área de conhecimento, como também pelo uso das tecnologias da

comunicação, além do uso dos jogos, que também favorecem a aplicação da

matemática em sala de aula.

Ainda nos PCN (BRASIL, 1998), na área da matemática, são

apresentados os conteúdos de matemática para o ensino fundamental, pautados

na:

[...] discussão sobre a seleção e a organização de conteúdos tem como diretriz a consecução dos objetivos arrolados no item precedente e seu caráter de essencialidade ao desempenho das funções básicas do cidadão brasileiro (p.48).

A avaliação do desempenho dar-se-á na perspectiva do currículo de

matemática para o ensino fundamental numa seleção de critérios que

contemplem uma visão matemática como uma construção significativa. Contudo,

percebemos que o uso dos PCN de matemática é relevante para o

aprimoramento de concepções acerca da área, pois sugere a realização e

organização de atividades que propunha obtenção de informações,

sistematização e interpretação de problemas detectados. Compreendemos os

PCN como um instrumento importante para a efetivação da disciplina de

matemática na educação básica e percebemos que o estudo dessa orientação

favorece o ensino e a aprendizagem.

Como o estudo está iniciando, estamos na fase da análise documental,

tratando dos PCN (1998) de Matemática, enquanto instrumento de coleta de

dados.

CONTEXTO DO CAMPO DE ESTUDO

Como lócus de pesquisa foram eleitas três escolas localizadas no

município de São Caetano – PE, as mesmas se alocam em regiões de

características do campo, marcadas pela agricultura familiar, pecuária e outro as

atividades produtivas referentes à atividade rural.

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A primeira escola encontra-se nas localidades do distrito de Maniçoba,

onde é ofertado na escola “A”, ensino primário e fundamental, com um total de

500 alunos estudando no período diurno e tarde.

A segunda escola está localizada no distrito de Tapiraim, cuja escola “B”,

disponibiliza de ensino, primário, fundamental com um quantitativo aproximado

de 600 alunos, integrantes da mesma localidade.

A terceira escola está situada no sítio de Santa Luzia, a escola “C”,

oferece em suas atividades educacionais, primário e fundamental, com cerca de

500 alunos compondo o quadro de discentes. No contexto do estudo, há fortes

aspectos do campo por estar na região do sítio do boqueirão, localidade do

campo do município. Sendo assim, são estas três escolas aqui mencionadas

fazem parte integral do contexto a ser estudado no município de São Caetano

PE.

METODOLOGIA

Em busca de materializar os seguintes objetivos de: Analisar os planos de

aula dos professores considerando que este é o direcionador da vivência em

sala de aula, validando o ensino das expressões algébricas; Identificar os

procedimentos e o tipo de atividade adotada pelo professor para a aprendizagem

de álgebra contextualizada em sala de aula; Levantar nos documentos oficiais

(PCN de Matemática, DCN da Educação do Campo, OTM) os indicativos de

conteúdo e procedimentos a serem adotados para o ensino e a aprendizagem

de expressões algébricas e no contexto do campo; além de Averiguar se os

alunos dominam o conhecimento matemático de expressões algébricas,

contextualizada (leitura matemática, fatorações básicas e estrutura de algumas

expressões). Elegemos como instrumentos de coleta de dados a análise

documental e a entrevista semi-estruturada. A entrevista semi-estruturada será

realizada com seis professores de matemática da escola do campo e a atividade

contextualizada realizaremos com quatro turmas do oitavo ano do ensino

fundamental, objetivando averiguar o repertório de aprendizagem a que nos

propomos. A entrevista pautada em Ludke e André (1986) é concebida como

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“uma das principais técnicas de trabalho em quase todos os tipos de pesquisa,

utilizados nas ciências sociais” (p.33)

Os dados serão tratados através da análise de conteúdo a partir de Franco

(2008), Bardin (2011), nos referenciando na análise categorial, concebida como:

uma operação de classificação de elementos constitutivos de um conjunto, por

diferenciação e, seguidamente, por reagrupamento segundo o gênero

(analogia), com critérios previamente definidos. (p.111)

Assim instrumentalizados, busca-se organizar analisar os dados, a fim de

desenvolver um estudo voltado para analisar o ensino e a aprendizagem de

expressões algébricas em escolas do campo.

REFERÊNCIAS

ARROYO, Miguel. CALDART, Roseli Salete. MOLINA, Mônica Castanha (organizadores). Por uma educação do campo. Petrópolis, RJ: Vozes, 2004.

BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais. 5ª a 8ª Séries. Matemática. Brasília: MEC /SEF, 1998.

LÜDKE, Menga. ANDRÉ, M. D. A. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo: EPU, 1986.

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Fracasso escolar: uma análise sobre a inter-relação família, escola e aluno no desenvolvimento

humano

Rosinery Maria Nascimento Diniz9 Jessica Jaciale da Silva Mota Maciel

RESUMO: O presente trabalho trata do fracasso escolar, que é atualmente um dos mecanismos bastante discutido quando se trata da relação família-escola, pelo fato de estar intimamente ligada a relação do individuo no meio social. As inquietações que motivaram este trabalho partem da observação que em detrimento dos princípios de educação que implicam para a evasão escolar e não aprendizado didático. Nossos objetivos são identificar os elementos que contribui para o fracasso escolar e analisar como a relação escola-família pode intervir no desenvolvimento humano, social, cultural e intelectual do aluno. Para tanto, nos valemos dos estudos de Dessen (2007), e Gottardo (2006), para nos apropriarmos conceitualmente do tema. Utilizaremos a observação e entrevistas semi-estruturadas (MINAYO, 2009) com professores (as) e alunos (as) e funcionários (as) da escola campo de estágio. Nosso trabalho, embora esteja em fase preliminar de analise, aponta para a afetividade como principio de desenvolvimento humano, social e intelectual.

Palavras chaves: Fracasso; escolar; família; escola.

Introdução

Este trabalho tratado mecanismos que influenciam o fracasso escolar,

podemos ressaltar como principais representantes a evasão, a não

aprendizagem e o nível de desenvolvimento escolar e social, que muitas vezes

é causado pela falta de estímulo. Analisaremos como a inter-relação escola-

família pode intervir no desenvolvimento do individuo enquanto não só aluno,

mas, também enquanto ser social e cultural.

9Rosinery Dinize Jessica Maciel, graduandas do 4º periodo de licenciatura Plena em História da Faculdade de filosofia ciencias e letras de caruaru.

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Abordamos este tema para buscarmos compreender os métodos que

devem ser usados pela escola para possibilitar a aproximação da família no dia-

a-dia do indivíduo, quais os fatores que implicam para o fracasso escolar e qual

a posição da família nessa relação, e a importância da presença da família para

que haja um bom desenvolvimento tanto intelectual quanto social.

A escolha do tema surgiu a partir de uma experiência no campo de

estágio, quando uma mãe chegou à escola reclamando por conta de uma nota

baixa que a filha tinha tirado na prova. Isso nos levou a refletir como a escola se

posiciona diante de uma situação como esta e até que ponto vai à

responsabilidade da família no processo de aprendizagem e na formação social

do indivíduo.

O tema proposto irá nos possibilitar refletir sobre métodos pedagógicos

e a compreensão da nossa posição enquanto professor em sala de aula

contribuinte para a formação acadêmica e social do aluno, buscando

compreender o aluno como um todo e não como parte. Pois, ele é formado pelo

contexto social, familiar e escolar. Enquanto em nossa formação social, essa

análise irá nos levar a refletir e intervir, contribuindo assim para uma formação

crítica-reflexiva, social e cultural e ser atuante na sociedade em que estamos

inseridos.

Este trabalho está organizado em três seções. Onde iremos estabelecer

uma reflexão sobre o fracasso escolar, fazendo uma análise de dados,

observando e dialogando com o campo de estágio e com autores que discutem

o tema proposto.

O termo fracasso escolar parece resumir toda a insatisfação e insucesso

decorrente da postura do professor e do aluno vivenciadas no dia a dia em sala

de aula. As principais causas do fracasso escolar são diversas, em sua maior

parte, os sistemas de ensino que não conseguem atender às diversidades de

necessidades presentes nas escolas. Dentre os inúmeros fatores

correlacionados com o fracasso escolar, aparecem tanto os extra-escolares

como os intra-escolares. De acordo com explicado por Gottardo,

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O vínculo interno é a parte inconsciente, relacionado com a intimidade do sujeito, o que geralmente é ignorado. Externo quando se refere às relações que o sujeito estabelece com os outros ou com objetos que podem ser desde objetos concretos até o objeto do conhecimento. (2006 P.52)

Como vimos, os fatores extra-escolares correspondem também às más

condições de vida e de subsistência de grande parte da população brasileira em

relação à escolaridade, tais como as péssimas condições sociais e as relações

afetivas familiares que aparecem como o topo nas influências do

desenvolvimento humano do aluno. Já os fatores intra-escolares se relacionam

ao currículo, aos programas escolares, o trabalho desenvolvido pelo professor

em sala de aula, as avaliações de desempenho dos alunos. Contribuindo assim

para o fracasso escolar. O que é reforçado por Gottardo;

Perceber o fracasso escolar como uma simples falta de condição do aluno em adquirir conhecimentos, é livrar-se de responsabilidades que cabem a toda a sociedade, é aceitar que existem pessoas melhores, que a diferença é pretexto para encobrir fracassados. A escola não pode apresentar-se como mais uma instituição que contribui para exclusão social. (2006 p.53)

Partindo dessa concepção, faremos uma análise de dados procurando

identificar os fatores presentes na escola campo de estágio. Nesta vertente,

discutiremos o conceito de fracasso escolar, família e escola usando de diálogos

com professores e alunos da escola campo.

FRACASSO ESCOLAR

O fracasso escolar é um dos mecanismos bastante discutidos quando se

trata da relação escola-família, pelo fato de estar intimamente ligada a relação

de indivíduos no meio social. Por muitas vezes, é estimulado pela própria família

ou até mesmo pelo próprio professor no dia-a-dia em sala de aula. BOSSA, 2002

nos diz que “O fracasso escolar só surgiu a partir da escolaridade obrigatória a

partir do século XIX, em função das mudanças econômicas e estruturais da

sociedade”.

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O fracasso escolar pode ser compreendido num primeiro momento,

como algo vinculado a auto-estima no processo de aprendizagem, algo que

dificulta a capacidade do indivíduo de aprender, de acreditar e sentir-se digno de

que pode obter o conhecimento. É muito difícil de ser definido e compreendido,

pois tem como causa um leque de motivos e condições, nesse mesmo contexto,

Gottardo afirma que:

O fracasso escolar não pode ser medido apenas por porcentagem de reprovados por série. Deve-se analisar profundamente a caminhada do aluno, seu desenvolvimento, enquanto ser humano e cidadão. Ver a aprendizagem como a capacidade de reproduzir conteúdos é abstrato diante da necessidade de formar cidadãos capazes de se adaptar às realidades diversas ou adaptar a realidade às suas necessidades. (p.53)

Entender o fracasso escolar no seu sentido amplo é observar e

compreender a questão do fracasso escolar em uma dimensão muito maior do

que pensamos, ou seja, não se pode pensar o fracasso escolar como um simples

agravante as dificuldades de aprendizagem do aluno, temos que pensar nesse

individuo como participante de uma família, de uma instituição escolar e em um

meio social.

O fracasso escolar está diretamente relacionado com família, classe

social, escola e a aprendizagem do aluno. Pois a escola é o eixo impulsionador

da aprendizagem didática do sujeito, mas tem que exercer essa função com um

algo a mais para compreender esse sujeito como uma totalidade e não como

uma metade que não ultrapassa os portões da escola e deixando do lado de fora

seu contexto social e familiar.

Conceituar o papel de cada uma destas instituições importantes da

sociedade, família e escola, diríamos que é quase impossível. Os ambientes

familiares e o escolar são descritos como contextos de desenvolvimento

humano, ressaltando a importância do estabelecimento de relações apropriadas

entre ambos. Necessita

No entanto, a família destaca-se por ter seu espaço como agente

socializador, enfatizando aspectos relacionados às configurações familiares, à

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rede social de apoio, aos vínculos estabelecidos e suas implicações para o

desenvolvimento humano. Enquanto a escola é destacada como um contexto de

desenvolvimento, priorizando uma reflexão sobre sua função social, as suas

tarefas e papéis na sociedade atual, especificamente no que diz respeito ao

cenário político-pedagógico.

A POSIÇÃO DA FAMÍLIA NO CONTEXTO ESCOLAR

A família é o primeiro grupo social em que a criança começa a interagir,

a aprender, e onde busca as primeiras referências no que diz respeito aos

valores culturais, emocionais, etc. Hoje a família perdeu seu núcleo pai, mãe e

filho, tornando-se um amontoado de pessoas vivendo sob o mesmo teto ou até

em tetos diferentes, tentando educar o filho com diferentes visões de mundo,

para assim encaminhá-los à escola. Do outro lado, temos a escola que

inconformada com o que tem recebido das famílias se põe no papel de

responsável em educar, interferindo no desenvolvimento humano natural do

individuo, pois segundo KREPPNER, citado por DESSEN;

A família, presente em todas as sociedades, é um dos primeiros ambientes de socialização do indivíduo, atuando como mediadora principal dos padrões, modelos e influências culturais. (Amazonas,Damasceno, Terto& Silva, 2003; Kreppner, 1992, 2000).

Portanto podemos afirmar que a família desempenha um papel

primordial na transmissão da cultura, sobressaindo de todos os grupos humanos.

É na relação família que o indivíduo recebe a primeira educação e aprende a

reprimir seus instintos mais primitivos.

Acredita-se que quando a criança tem bons vínculos familiares,

independentemente de como essa família se organiza enquanto estrutura, ela

também terá uma boa relação com professores e amigos. O que é reforçado por

Dessen,

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Portanto, a familia e a escola emergem como duas instituições fundamentais para desencadear os processos evolutivos das pessoas, atuando como propulsoras ou inibidoras do seu crescimento físico, intelectual, emocional e social. (P.22)

Partindo desta afirmação podemos supor que cada um tem suas

responsabilidades quanto à transmissão de conhecimento, no proceso de

desenvolvimento humano a criança necessita de referencia, pois nada mais é do

que transmissão de culturas e a família sobressaem nesse ponto, pois, é na

familia onde tudo começa no proceso de desenvolvimento.

A ESCOLA NO DESENVOLVIMENTO SOCIAL E CULTURAL DO ALUNO

Assim como a família, a escola é responsável por fazer a mediação entre

o indivíduo e a sociedade. O que nos afirma MAHONEY, citado por Dessen,

A escola constitui um contexto diversificado de desenvolvimento e aprendizagem, isto é, um local que reúne diversidade de conhecimentos, atividades, regras e valores e que é permeado por conflitos, problemas e diferenças” (Mahoney, 2002). APUD, DESSEN;(P.25).

O maior desafio da escola é identificar e compreender as diversidades

dos indivíduos, para inseri-lo no meio social escolar sem exclui-lo, mesmo sem

perceber, por sua particularidade. A escola tem dificuldades em trabalhar com a

diversidade de elementos que a realidade produzem cada indivíduo.A dificuldade

se encontra na diversidade de realidades e na lentidão do sistema de educação

em acompanhar as mudanças sociais.

Ter na escola uma visão salvadora do mundo é a concepção de escola

do senso comum, e essa visão acaba interferindo na relação família e escola.

Portanto é muito difícil de identificar uma comunidade que compreenda que a

função da escola não é educar, transmitir valores, e sim de transmitir

conhecimento pedagógico. A escola e a família necessitam estreitar as relações

entre elas, pois, segundo Gottardo:

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Só a escola não resolverá os problemas de aprendizagem. Há questões sociais que deverão ser superadas a fim de que se possam garantir condições mínimas para o indivíduo querer aprender. Estas questões sociais geram carências afetivas que são significativas, barreiras a serem superadas e que bloqueiam e limitam as condições de aprendizagem. Nesse contexto, a questão do vínculo ganha especial relevância, à medida que denota a importância da natureza das relações que o indivíduo estabelece consigo mesmo, com seus circundantes, com o meio no qual se insere e com o conhecimento..(2006 p.55)

A escola sozinha não resolverá todas as circunstâncias que envolvem a

questão das dificuldades escolares, mas o que deve ser intensificada é a

preparação das escolas e professores para receber alunos com capacidades

adquiridas de histórias culturais cada vez mais diferentes, o que produz seres

humanos com capacidades diferentes.O caminho e a parceria entre família e

escola são fundamentais.

Ambas precisam se acolher, se entender e se ajudar para o bem comum

desse indivíduo, preparado como pessoa para viver em sociedade. Juntar as

competências da família e da escola faz com que crianças e jovens se

desenvolvam bem. Mais do que as cobranças e as críticas que as famílias fazem

das escolas e vice-versa, é importante fazer essa integração da equipe escolar

com a família.

As escolas atualmente desenvolvem projetos, onde visam aproximar

pais, professores, psicopedagogos e direção escolar tudo em busca de melhorar

o desenvolvimento do ensino; Propondo aos pais, uma maior participação do

desenvolvimento imposto a seus filhos; De forma que venha a auxiliar os

professores, no desenvolvimento da tarefa do ensinar; Procurando ter uma maior

participação, com atuação mais eficaz na cobrança com seus filhos mediante as

tarefas impostas pelo educando. Possibilitando desta forma mais conjunta entre

escola, professores, pais e alunos, tendo objetivos mais concluídos e alcançados

por meio de uma aprendizagem mais eficaz.

Portanto, buscar soluções para o fracasso escolar não consiste em

patologizar o aprende-temas em ampliar este foco, abrindo espaço para outras

variáveis que também influenciam no processo da aprendizagem, Gottardo

ressalta que;

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A escola fracassa quando não consegue visualizar o que é importante, necessário para seu aluno dominar. Há um grande impasse, uma grande indefinição entre professores, há quem defende que os conteúdos são importantes, que o aluno só pode passar para a série seguinte se tiver dominado os conteúdos da etapa anterior (2006 p.53)

Diante da organização social vigente, a escola deve aprender a liberta-

se da condição de reprodutora,de um sistema, apresentar-se como uma

instituição que instiga o povo a dizer o que pensa e é necessário ser dito, a lutar

para livrar-se de seus medos, a saber, diferenciar o certo do errado. A escola

será aprovada quando aprender a investigar seu aluno e descobrir um ser fruto

de um contexto, reflexo de suas relações familiares e sociais, que busca na

escola mais que aprender conteúdos mas ser compreendido.

Partiremos agora para a análise no campo de estágio, onde usaremos

da observação e do diálogo para estabelecer uma ponte entre o que dizem os

professores e o que pensam os alunos à respeito do fracasso escolar e da

posição da família na relação praticada entre a escola e a família.

Segundo a gestora entrevistada, o principal motivo para o fracasso

escolar é a falta de estimulo, que deveria partir da família, que em muitos casos

se anula diante da responsabilidade de orientação educacional. Afirma-nos

ainda que, a necessidade de trabalhar, a falta de orientações familiar e a

desvalorização do conhecimento acabam causando a evasão escolar com mais

frequência. Ao perguntarmos a um aluno de 19 anos, que cursa o 7º ano do

ensino fundamental o que ele entende por fracasso escolar, nos respondeu que

“é quando o aluno não aprende de jeito nenhum”. Ao perguntarmos sobre qual a

participação dos seus pais na escola ele nos respondeu: “Meus pais nunca iam

à escola, a não ser pra renovar minha matrícula”, nos relata ainda, suas diversas

desistências, pelo fato de ter que trabalhar para ajudar sua família. Confirmando

o que foi dito pela gestora acima citada.

Como podemos ver, a família é a base da formação do indivíduo, no

entanto, não é determinante. Percebe-se que uma família estruturada fornece

maior segurança e estabilidade emocional e intelectual ao aluno, mas por vezes,

a escola vem desempenhando este papel.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

O fracasso escolar é o resultado de várias lacunas na inter-relação ou

até mesmo na ausência da relação família e escola. Pois é nessa relação que

se pode observar diversos agravantes nesse não desenvolvimento.

A Família exerce grande influencia na construção dos vínculos afetivos,

na autoestima e no autoconceito da criança como também na construção de

modelos e relações que são transferidos por meio da interação social. Porem ela

não pode ser responsabilizado pelo insucesso no desenvolvimento intelectual da

criança.

Muitas vezes esses indivíduos não têm uma família estruturada, que

possa dar suporte a escola, por vezes essas famílias nem tem o conhecimento

didático que tentam oferecer aos seus filhos através da escola em observação a

uma “charge de internet” percebi quanto esse fator contribui para essa relação:

a charge é um dialogo entre dois alunos, onde um se queixa que foi repreendido

pela professora por não ter feito a tarefa de casa, em sua fala ele diz: “a

professora disse que a culpa é da mina mãe, mas, minha mãe não sabe ler”.

Esse caso é mais comum do que se imagina, e muitas famílias não tem

conhecimento do que é fracasso escolar, que pelo nome “fracasso escolar”

acabam atribuindo a responsabilidade exclusivamente à escola e não é.O

fracasso escolar é estimulado Por vários fatores, com mais significância aparece

a condição social, pois dela deriva vários aspectos como estrutura familiar e

escolar. E são esses três estruturantes que acaba definindo a formação tanto

intelectual quanto social do indivíduo. Sendo assim é coerente afirmar que não

existe culpado ou inocente no fracasso escolar, o que existe é a necessidade de

interação entre família e escola para superar os impactos da condição social

como influenciador na não aprendizagem.

Mas, a relação escola-família só será facilitada se houver o diálogo. Pois,

segundo MULLER, 2002, “a atitude dialógica é aquela que parte de uma questão

problematizada para desencadear o diálogo”. No entanto, podemos perceber

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que, o diálogo é fundamental para que haja uma interação entre a família, o aluno

e a escola.

Entendemos por interação a relação existente em todos os meios e

aspectos sociais. Não podemos deixar de ressaltar, nesse contexto, a relação

afetiva, pois caminha ao lado do diálogo. Com isso, usando da afetividade,

ambos poderão facilitar a relação escola-família. Favorecendo então o bom

desenvolvimento tanto intelectual quanto humano social.

REFERÊNCIAS

GOTTARDO, Edelar Carlos, Fracasso Escolar: família X escola, 2006, Disponível em ÁGORA Revista Eletrônica, 2013 - agora.ceedo.com.br

DESSEN, Maria Auxiliadora; POLONIA, Ana da Costa . Universidade de Brasília, Distrito Federal, Brasil, (A Família e a Escola como contextos de desenvolvimento humano, (2007). Disponível em www.scielo.br/paideia

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GT: Direitos Humanos e Democracia

Coordenador: xxxxxxxxxxx

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A corrupção política e os seus impactos na educação

Hilton Buenos Aires10 Arquimedes Fernandes Monteiro de Melo11

Adilson Silva Ferraz12

RESUMO: O presente trabalho objetiva analisar uma possível relação entre a corrupção na política e seus efeitos na educação. Utilizamos relatórios internacionais com indicadores de corrupção para identificar seu impacto na esfera educacional e buscamos delimitar o conceito por meio das descrições presentes na literatura sobre o tema. Concluímos que há fortes indícios de que há uma relação de proporcionalidade entre os dois fenômenos, o que não exclui a possibilidade de influência de outros fatores, tais como, a pobreza e a distribuição desigual de renda. Palavras-chave: Corrupção, Direitos Humanos, Educação, Política.

INTRODUÇÃO

Ao assistirmos os noticiários ou lermos qualquer jornal, facilmente

encontraremos alguma matéria tratando sobre corrupção. A mídia veicula

informações que chegam a repercutir inclusive no exterior, virando verdadeiros

escândalos políticos, como o caso do “mensalão” e dos contratos da Petrobras.

A profusão de casos ligados a esta temática é tão comum no cotidiano brasileiro,

que dificilmente alguém a desconhece.

Ademais, mesmo sendo notadamente uma ação contrária à lei e aos

ditames da justiça, a opinião pública em sentido amplo, não aparenta levar a

sério o atual cenário, ignorando a gravidade deste crime, fazendo com que a

corrupção seja algo banal em nossa vida e em nosso Estado. É bem verdade se

tratar de um dos delitos mais graves da atualidade, pois seus efeitos afetam

10 Graduando do Curso de Direito da Faculdade ASCES. Ator. 11 Doutor em Farmácia. Professor da Faculdade ASCES e da UPE. 12 Doutorando em Direito pela Universidade de Buenos Aires (UBA), doutorando em Filosofia pela Universidade Católica Argentina (UCA), mestre em Filosofia pela UFPE; Professor assistente da Faculdade ASCES, FAFICA e auxiliar de II da UBA. [email protected]

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diversas áreas da sociedade e degradam bens, valores e direitos individuais e

difusos, além de ser causa direta e indireta na ocorrência de outros delitos.

Pretendemos analisar se a corrupção de fato, atinge a manutenção de direitos

sociais, tal qual o direito à educação.

CORRUPÇÃO POLÍTICA: CONCEITOS E DEFINIÇÕES

Analisando o sentido semântico da palavra em nosso idioma, “corrupção”

é uma derivação de “corrupção”, de origem latina “corruptione (corruptio/onis)”,

que significa “ato ou efeito de corromper; decomposição, putrefação;

Devassidão, depravação, perversão; Suborno peita etc.”. Percebemos

facilmente se tratar de um sinônimo para tudo aquilo considerado “errado,

desviado, desleal”. Já para o homem latino dos séculos I e II, a palavra

corruptionis tinha seu significado a partir de outros dois termos: cum e rumpo –

do verbo romper – quando se rompe com as estruturas, destruindo os

fundamentos de algo, ou separar violentamente algo de alguma coisa 13.

Durante séculos a ideia de corrupção estava ligada a um processo, tendo

suas primeiras conotações no sentido biológico/naturalista. Esta linha de

raciocínio tem sua origem no berço da filosofia, na Grécia antiga, onde alguns

filósofos como Heráclito, Platão e Aristóteles, ao analisarem o ciclo de vida dos

seres, perceberam que todo organismo vivo passa pelas etapas de nascimento,

crescimento e desenvolvimento até chegar a seu ápice, para em seguida,

começar um processo de degradação, em que a matéria vai languescendo, até

a vida se esvair do indivíduo 14.

Os filósofos, após compreenderem-na pelo viés biológico, passaram a

examinar os entes políticos e a sociedade como “corpos naturais”, vislumbrando

dessa forma o mesmo ciclo de nascimento, crescimento, desenvolvimento e

decadência, desta vez na sociedade e nas instituições políticas. Sob o ponto de

vista naturalista, a entidade pública daria seus sinais de corrupção, no momento

13 MARTINS, José Antônio. Corrupção. 1.ª ed. São Paulo: Globo, 2008, p. 12. 14 Idem, Ibidem, p. 13

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em que começasse a perder sua força e vigor, desviando-a dos seus primeiros

princípios 15.

Porém a palavra “corrupção” possui significados ligados à moral

individual, como “depravação, devassidão, e perversão”, para explicarmos como

ela passou a ser atribuída à conduta, devemos explicar que alguns padres da

Igreja Católica na antiguidade, afirmaram que as práticas difundidas na

sociedade romana, decorrentes da “corrupção moral” e das imoralidades

públicas, como as orgias, os enormes banquetes que perpetuavam o pecado da

gula, os abortos, os assassinatos cometidos entre familiares, parricídios (filhos

que matam os pais), fratricídios (irmão que mata o irmão) etc. supostamente

levaram Roma à ruína. De acordo com este preceito, a falta de retidão moral dos

governantes, foi à grande responsável pela destruição de tantos impérios, como

o Romano, Egípcio e Babilônico. Se a entidade pública e a sociedade são corpos

naturais e estão submetidos à lei natural do ciclo de vida, no momento em que

estes começam a se desvirtuar, afastando-se de seus princípios, havendo o

“rompimento de estruturas”, inevitável que a esta sociedade “corrompida”

chegue a um fim 16.

Este modo de enxergar a corrupção moral e os vícios particulares da

pessoa, não tem grande relevância para se analisar a administração daquele

que ocupa algum cargo público. O maior problema da acepção religiosa e

moralista, é que acarreta a inversão da qualificação do mundo político, levando

o caráter individual das pessoas como sendo o principal vetor de avaliação da

corrupção de algum lugar. Sendo esta vista, analisada e julgada de acordo com

o próprio indivíduo, mesmo que este seja um agente público, a alçada moralista

“exclui” a presença da corrupção política, ao afirmar que o que de fato existe são

indivíduos políticos que são “corruptos” 17.

Desta forma, se o problema da corrupção fosse unicamente ligado ao

caráter do funcionário público, a solução para a questão seria igualmente

15 Idem, Ibidem, p.15 16 MARTINS, José Antônio. Corrupção. 1.ª ed. São Paulo: Globo, 2008, p. 17 17 Idem, Ibidem, p. 21.

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simples, bastando conscientizá-lo, “moralizando-o”, fazendo-o valorizar a

“moralidade individual”, para que a partir daí, não aceitasse casos de desvio de

conduta. Mas, como veremos os sintomas deste fenômeno não param neste

ponto.

José Antônio Martins defende que Nicolau Maquiavel, na Itália

Renascentista, foi um dos responsáveis pela modificação desta concepção

moralista da corrupção. As suas ideias foram consideradas um marco para as

teorias do Estado, que influenciaram o pensamento político até os dias

presentes. Para Maquiavel, as corrupções morais e políticas são fenômenos

distintos, pois o mundo político tem regras próprias, devendo ser analisadas de

forma autônoma e desvinculadas da moral particular, pois a noção de corrupção

política é diferente da concepção de corrupção moral. De acordo com o “Mestre

dos príncipes” é possível analisar a corrupção lato sensu por dois prismas

interpretativos: um ligado à moral individual que indica a ruptura com a virtude,

o empobrecimento do caráter, levando consequências terríveis à sociedade, e

do outro lado, mostrando que a corrupção é um efeito que vem diretamente dos

resultados das regras do mundo político, sem maiores ligações com a retidão do

homem 18.

Esta linha de raciocínio é a mais apropriada para se compreender a

corrupção em nossos dias, pois responsabiliza a fraqueza das leis e das

instituições políticas, a falta de preocupação e ação do cidadão em relação às

coisas públicas, como sendo geradoras desta “doença endêmica” que há

décadas assola o Brasil 19. Nesse viés se incide a questão da educação, pois ela

possui um papel extremamente importante, não só em fornecer conhecimento

ao cidadão, mas principalmente, possibilitar que o indivíduo desenvolva

habilidades e competências para permitir sua participação efetiva na sociedade,

na economia e na política. Antes de analisarmos os indicadores educacionais do

Brasil e de alguns países, junto com os índices de corrupção, devemos explicar

18 MARTINS, José Antônio. Corrupção. 1.ª ed. São Paulo: Globo, 2008, p. 23 19 Idem, Ibidem, p. 25

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algumas das faces e formas de incidência da corrupção nas sociedades e nos

ordenamentos jurídicos.

Manuel Villoria Mendieta a estuda em quatro grupos distintos, pois

existem em seu meio, perspectivas econômicas, jurídicas, sociológicas e

políticas, sendo impossível estudá-la isoladamente. Em primeiro lugar temos as

definições ligadas ao abuso de autoridade e ao descumprimento das normas

jurídicas por parte do agente público. A corrupção decorrente do abuso de

autoridade pode existir por razões de “benefício particular, não necessariamente

econômico”. Em uma visão geral do fenômeno, seria toda e qualquer “ação de

um funcionário público, no exercício de seu cargo, quando este age em

desacordo com as normas jurídicas previamente estabelecidas, com fim de

atender a interesses pessoais, familiares, econômicos” etc. 20.

O segundo grupo mencionado por Mendieta, diz respeito às análises

econômicas e de mercado. Um funcionário considerado corrupto é aquele que

“utiliza seu cargo como um negócio”, o que acontece de forma comum em

lugares que não possuem um bom “desenvolvimento jurídico” (leia-se,

educação). O objetivo deste agente público seria quase que única e

exclusivamente, “maximizar seus lucros”, e para isso, se aproveita da situação

favorável do mercado e da natural demanda 21. Neste diapasão percebe-se a

correlação e a funcionalidade entre a corrupção e o modelo econômico, como

são os casos da lavagem de dinheiro, tráfico de drogas e de influência.

O terceiro grupo analisado é aquele que define interesses gerais. Fazendo

que ela seja presente quando o responsável por algum cargo público é, por

razões econômicas ou de outra natureza legal, induzido a atuar favorecendo a

quem lhe proporciona algum benefício, e por causa disso, traz danos à

coletividade22. Um exemplo claro deste grupo é o tão conhecido por nós

brasileiros, financiamento privado de campanha política.

20 MENDIETA, Manuel Villoria, Ética Pública y Corrupción, 2002, p. 30, disponível em: < http://codex.colmex.mx:8991/exlibris/aleph/a18_1/apache_media/VS5X9VIH8JCVCV6EH4SPR93GF7FAYS.pdf > Acesso em 16/08/2014. - (tradução livre). 21 Idem, Ibidem, p. 31. 22 MENDIETA, Manuel Villoria, Ética Pública y Corrupción, 2002, p. 32.

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E por fim, o quarto grupo se refere aos autores que criticam as

aproximações mais moralistas e incluem conceitos históricos e sociológicos do

fenômeno em si. É evidente que a estrutura do Estado e os ambientes políticos,

sociais, econômicos e jurídicos, variam entre os países, por isso, ao se analisar

a corrupção, devem-se utilizar os conceitos históricos apropriados. “Certas

condutas consideradas corruptas eram perfeitamente válidas na Europa

Ocidental vários séculos atrás, assim, Montesquieu defendia a venda de cargos

públicos, ao invés de outros métodos de nomeação [...]” 23.

Neste aspecto, se vislumbra três subdivisões nas definições: corrupção

negra, cinza e branca, sendo a negra aquela que engloba toda e qualquer ação

condenada pelas elites morais e pela população de modo geral de um

determinado país; essa situação faz com que exista uma congruência entre a lei

e a opinião pública. Na cinza há uma situação de ambiguidade: de um lado a

elite a condena, mas a maioria da população não a repudia. Como foi o caso do

consumo de bebidas alcoólicas nos Estados Unidos, durante a vigência da lei

seca na década de 1920. Já a branca é aquela livre de oposição pela população

de modo geral, e se condenada pela elite, esta não o faz de maneira expressa

nem clara. O desenvolvimento moral dos indivíduos e da sociedade poderá

explicar como, em um momento o que é considerado corrupção branca, passa a

ser cinza e finalmente negra 24. Mais uma vez, percebemos a influência e

relevância da educação na apuração de casos corruptos.

Este crime, como podemos ver, sempre apresentou uma vertente que o

considera como um abuso de confiança. De acordo com essa linha, o funcionário

público é o autor principal, e quem o corrompe, o “corruptor”, autor secundário,

formando assim uma unidade criminosa, “sendo que, nesta bilateralidade,

ambos são partícipes do crime” 25.

A existência da bilateralidade é crucial, incluindo-se a presença do

corruptor e do funcionário corrupto. Outra visão mostra que ela seja uma conduta

23 Idem, Ibidem, p. 32. 24 Idem, Ibidem, p. 33. 25 LIVIANU, Roberto. Corrupção e Direito Penal - Um diagnóstico da Corrupção no Brasil. São Paulo: Quartier Latin, 2006, p. 31

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independente e sujeita a dois tipos penais, “corrupção passiva” e “corrupção

ativa” 26. No âmbito social ela altera a ordem natural das coisas, sendo um

fenômeno permanente na vida humana. “Consiste em tornar privado o que é

público, ação que resulta no abuso de prerrogativas de alguém que exerce um

monopólio” 27.

INDICADORES SOCIAIS DA CORRUPÇÃO E EDUCAÇÃO

Feitas essas ponderações, o índice divulgado pela organização

Transparência Internacional, avalia o nível de percepção da corrupção no setor

público em 177 países. Em uma escala de pontuação que vai de 0 (altamente

corrupto), a 100 (nada corrupto), no ano de 2013 o nosso país obteve 43 pontos,

segurando o 72° lugar do ranking. Com a melhor pontuação, sendo considerado

o país menos corrupto, está à Dinamarca, com 91 pontos, e o melhor colocado

da America Latina foi o Uruguai, com 73, na posição mundial de número 19º,

seguido pelo Chile, com 71 pontos, sendo o 22º colocado 28.

Analisando outros indicadores, a OCDE (Organização para a Cooperação

e Desenvolvimento Econômico) mantém um ranking da educação em 36 países,

neste, o Brasil amarga atualmente a penúltima posição, estando à frente

somente do México. Como critérios avaliados pela organização estão o

desempenho dos alunos no “Programa Internacional de Avaliação de

Estudantes” (PISA), a média de anos que os alunos passam na escola, a

quantidade de pessoas que terminam o ensino médio, e a porcentagem da

população que está cursando ensino superior 29.

No Brasil, 43% dos adultos entre 25 e 64 anos possuem o equivalente

ao diploma de ensino médio, muito menos que a média da OCDE de 75%.

Entre os jovens o indicador é um pouco melhor, 57% das pessoas com 25 a 34

26 Idem Ibidem, p. 39 27 Idem, Ibidem, p. 31. 28 TransparencyInternational Índices de Corrupção Política, disponível em: < http://cpi.transparency.org/cpi2013/results/ > 29 OECD Better Life Index, disponível em: < http://www.oecdbetterlifeindex.org/pt/quesitos/education-pt/> Acesso em: 14/09/2014

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anos possuem o equivalente a um diploma de ensino médio, mas também

é ainda menor que a média da OCDE de 82%. A média de anos de estudo no

Brasil gira em torno de 16,3 anos entre os 5 e 39 anos de idade, menos que a

média da OCDE de 17,7 anos. Este nível de expectativa de escolaridade pode

influenciar o futuro desempenho do Brasil no que diz respeito ao grau de

instrução de sua população de 25 a 34 anos de idade 30.

Entretanto, mesmo sendo importantes, as taxas de conclusão dos estudos

falam pouco sobre a qualidade da educação recebida. O PISA analisa a

extensão das habilidades e conhecimentos essenciais para a plena participação

nas sociedades modernas, especialmente no que diz respeito à leitura,

matemática e ciência, dos alunos próximos ao final da educação obrigatória, que

é normalmente por volta dos 15 anos. Em 2012, o PISA avaliou alunos de 65

países, indicando que o aluno mediano no Brasil obteve pontuação de

402, menos que a média da OCDE de 497. Coréia do Sul e Japão são os países

com melhor desempenho, com pontuações médias no PISA de 542 e 540,

respectivamente. Outros países com bons resultados no que dizem respeito às

habilidades dos alunos incluem Finlândia (529), Estônia (526), Canadá (522)

e Polônia (521). Havendo 140 pontos de diferença, separando o Brasil da Coréia

31.

Os melhores sistemas educacionais conseguem oferecer educação de

alta qualidade à maioria dos alunos. Na, Islândia, Estônia e Noruega, por

exemplo, os estudantes tendem a apresentar bom desempenho independente

da classe social. Já na França, Nova Zelândia e República Eslovaca, a diferença

entre os alunos das classes socioeconômicas mais baixas e os alunos das

classes socioeconômicas mais altas atinge mais de 125 pontos, sugerindo que

a base socioeconômica dos alunos tende a impactar seus resultados. Em média,

entre os países da OCDE, há uma diferença de 96 pontos nas pontuações do

PISA entre os alunos mais pobres e os mais ricos. Em nosso país, a diferença

30 Relatório sobre quesito educação OECD Better Life Index, disponível em: < http://www.oecdbetterlifeindex.org/pt/quesitos/education-pt/> Acesso em: 14/09/2014 31 Idem, Ibidem

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média desses resultados, é de 84 pontos, menor que a média da OCDE, isso

sugere que o sistema educacional brasileiro fornece acesso relativamente

igualitário à educação de alta qualidade 32.

Além da educação/escolaridade, a Organização ainda avalia outros

quesitos de seus países membros, tais quais moradias, renda, emprego,

comunidade, meio ambiente, saúde, segurança, satisfação pessoal, etc.. Nesses

quesitos as análises trazem pontuações de 0 a 10, Finlândia, Polônia e Estônia

receberam as notas de 9.1, 8.4 e 8.0, respectivamente, no quesito escolaridade.

Para a nossa preocupação, o Brasil ostenta a nota 1.9, à frente do México

apenas, com 1.4 33.

O Fórum Econômico Mundial (WEF, na sigla em inglês) é mais um órgão

internacional a explicitar uma realidade cujas autoridades brasileiras e o próprio

senso comum reconhecem: quando se trata de educação, o Brasil está mais

perto dos piores exemplos do mundo do que dos melhores. Em seu Relatório de

Capital Humano, o WEF nos colocou na 88ª posição de um total de 122 países

no quesito educação. Na lista da vergonha, lideram os últimos colocados Iêmen

e Burkina Faso. No Topo, sendo exemplo de educação estão à Finlândia em 1º

e o Canadá em 2º. “Por ironia do destino”, a Finlândia é o país que ocupa a 2ª

posição na lista de transparência política supracitada 34.

Passemos agora à seguinte análise: de acordo com a OCDE, os 5 países

com as melhores educações são: Finlândia (1º), Polônia (2º), Coréia do Sul (3º),

Estônia (4º) e Alemanha (5º). Esses mesmos países figuram no ranking de

corrupção da Transparência Internacional, respectivamente, 3º, 38º, 46º, 28º e

12º. Já os 5 países com os piores índices de educação de acordo com a mesma

32 Idem, Ibidem 33 Relatório sobre quesito educação OECD Better Life Index, disponível em: < http://www.oecdbetterlifeindex.org/pt/quesitos/education-pt/> Acesso em: 14/09/2014. 34 Relatórios Education and Skills 2.0: New Targets and Innovative Approaches, Disponível em: <http://www.weforum.org/issues/education>. E Human Capital Report, Disponível em: <https://www.google.com.br/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=3&ved=0CDgQFjAC&url=http%3A%2F%2Fwww3.weforum.org%2Fdocs%2FWEF_GlobalCompetitivenessReport_2013-14.pdf&ei=_HgXVI-OK9e8ggTn5YHgCQ&usg=AFQjCNFGBL-5-KGuiuBpKv2AhohT8FKnzg&sig2=BUb7CV--_jwVsWH8ZWY9PA&bvm=bv.75097201,d.eXY&cad=rja> Acesso: 10/09/2014

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organização são: México (36º), Brasil (35º), Turquia (34º), Chile (33º) e Portugal

(32º). Esses mesmos países com os índices mais baixos do quesito educação

ostentam respectivamente, as seguintes colocações no mesmo ranking de

transparência política: 106º, 72º, 53º, 22º e 33º.

Contudo, devemos ressaltar que a OCDE possui um ranking de apenas

36 países, enquanto a Transparência Internacional inclui 177, ademais,

Francesco Kjellberg afirma que os índices da Transparência Internacional são

válidos, porém limitados, pois só conseguem medir de forma precisa aquelas

ações “que quebram normas legais, e cujo resultado são benefícios diretos para

o político”, por se tratarem do pressuposto mais comumente compreendido como

corrupção, os famosos subornos ou os peculatos 35.

Se observarmos os índices de outra Organização no quesito da

Educação, e compararmos com o ranking de corrupção política, teremos outros

questionamentos: o Fórum Econômico Mundial (WEF em inglês), que possui

uma análise mais extensa, indica que os países com as melhores educações

são: Finlândia (1º), Singapura (2º), Suíça (3º), Bélgica (4º) e Alemanha (5º).

Esses países ocupam respectivamente, as posições nos índices de corrupção

política: 3º, 5º, 7º, 15º e 12º 36.

Já a Zâmbia que ocupa a 76º posição de educação da WEF, é a 83º em

corrupção. Lesoto 105 na educação, 55º corrupção; Malawi 113 educação, 91º

corrupção; Uganda 119 em educação, 140º na corrupção; Namíbia 128 em

educação, 57 na corrupção; Moçambique 137 em educação, 119 em corrupção

e África do Sul 148 no ranking de educação, 72 no ranking de transparência

política, empatada com o Brasil.

Ademais, existem algumas críticas ao World Economic Forum, afirmando

que os seus relatórios e índices não são muito confiáveis 37, ainda assim, em

35 KJELLBERG, Francesco, apud MENDIETA, Manuel Villoria, Ibidem, p. 33, (tradução livre) 36 Relatório Statistic of the Month: The World Economic Forum Global Competitiveness Rankings, 2012-2013 Disponível em: http://www.ncee.org/2012/10/statistic-of-the-month-the-world-economic-forum-global-competitiveness-rankings-2012-2013/> Acesso: 15/09/2014 37Relatório Is SA bottom of the class in maths and science? WEF ranking is meaningless Disponível em: http://africacheck.org/reports/is-sa-bottom-of-the-class-in-maths-and-science-why-ranking-is-meaningless/#sthash.bsPZ939R.GWu4zIDJ.dpuf> Acesso: 15/09/2014

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alguns casos analisados, percebemos que determinados países que possuem

baixos índices de educação, tendem a mostrar mais presença de corruptos

dentro do aparelho estatal

CONCLUSÃO

A corrupção política, de fato influencia o nível da qualidade de educação?

As análises devem ser feitas com grande cautela e redobrada atenção, pois, por

se tratarem de fenômenos sociais complexos, há inúmeras variáveis que podem

intensificar ou diminuir a incidência. Há fortíssimos indícios de que o crime de

corrupção seja estimulado em razão dos baixos índices de educação de algum

lugar, numa escala de proporcionalidade. Mas também é possível vislumbrar que

a corrupção anda de mãos dadas com a pobreza e distribuição desigual de

renda, pois os países que demonstram menor transparência política, além de

indicarem resultados ruins em educação, também possuem as populações mais

pobres.

REFERÊNCIAS

KJELLBERG, Francesco. Corruption as na Analytical Problem: Some Notes on Research in Public Corruption, artigo apresentado em International Political Science Association VXIII World Congress, Quebec, 1-5 de agosto de 2000. LIVIANU, Roberto. Corrupção e Direito Penal - Um diagnóstico da Corrupção no Brasil. São Paulo: Quartier Latin, 2006, MARTINS, José Antônio. Corrupção. 1.ª ed. – São Paulo: Globo 2008 MENDIETA, Manuel Villoria, Ética Pública y Corrupción, 2002, disponível em: < http://codex.colmex.mx:8991/exlibris/aleph/a18_1/apache_media/VS5X9VIH8JCVCV6EH4SPR93GF7FAYS.pdf > Acesso em 16/08/2014. TRANSPARENCY INTERNATIONAL Índices de Corrupção Política, disponível em: < http://cpi.transparency.org/cpi2013/results/ > WEF, Relatório Statistic of the Month: The World Economic Forum Global Competitiveness Rankings, 2012-2013 Disponível em:

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Eutanásia e a rede pública de saúde: violações a dignidade

humana e a autonomia de vontade

Germana Rafaela Pontes de Carvalho

Faculdade ASCES

Resumo: O presente trabalho objetiva a ação médica, como de toda equipe relacionada a enfermagem, no diagnóstico final do paciente com sua morte prematura. Morte esta, resultante de escolhas unilaterais dos médicos, que de forma hierárquica, incutem no paciente sua vontade, desrespeitando assim, a autonomia e dignidade deste, pela ineficiência muitas vezes do aparato técnico dos hospitais públicos. Atentando-se para o fato de que a vontade do médico está sempre, associada a um conjunto de fatores que os acabam influenciando a tomar essas decisões. Fatores estes, portanto, que se combina com a vontade do Estado em diminuir gastos que a depender do diagnóstico do paciente são considerados desnecessários, como pela má gestão dentro dos hospitais por seus diretores, o que acaba refletindo no tratamento do paciente e a posterior em suas escolhas, afetando, consequentemente, sua vida, dignidade e autonomia. Neste, são trazidos à baila as diferentes concepções e sentimentos do ser humano frente à morte e ao morrer. Busca-se, portanto, com este trabalho, dar ênfase a propagação da ação desumana e criminosa silenciada, sufocada, dentro dos hospitais públicos. Assim, mais a frente, atuação médica e o Código de Ética Médica são colocados em embate e analisados segundo a ótica constitucional, principio lógica e bioética. Metodologicamente, utilizou-se de pesquisa bibliográfica, com o uso de livros, artigos científicos, trabalho de conclusão de curso, revistas, bem como, matérias disponibilizadas nos meios de comunicação virtual. Em assim sendo, os métodos e fontes empregados foram o dedutivo, indutivo e qualitativo, e as fontes primárias, secundárias e terciárias. Palavras-chave: Eutanásia. Sistema Único de Saúde. Dignidade Humana. Autonomia de Vontade. ABSTRACT: This study aims to medical action, as all staff related to nursing, the final diagnosis of the patient with his untimely death. This death, resulting from unilateral choices of doctors who hierarchically, will instill in the patient, disregarding thus the autonomy and dignity of this, the inefficiency often the technical apparatus of public hospitals. Is paying attention to the fact that the will of the doctor is always associated with a set of factors that ultimately influence to make such decisions. These factors, therefore, that combines with the will of the State to reduce spending that depend on the patient's diagnosis are considered unnecessary, as the mismanagement within hospitals by its directors, which ends up reflecting in patient care and retrospectively by their choices, affecting

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consequently your life, dignity and autonomy. In this, are brought to the fore the different conceptions and feelings of man towards death and dying. One aim, therefore, with this work, emphasizing the spread of silenced inhuman and criminal act, smothered within the public hospitals. So later on, medical action and the Code of Medical Ethics are placed in confrontation and analyzed according to constitutional perspective, principled and bioethics. The method employed is a literature search, using books, scientific articles, completion of course work, magazines, as well as materials available in the virtual media. That being so, the methods and sources used were deductive, inductive and qualitative, and the primary sources, secondary and tertiary.

Keywords: Euthanasia. Health System. Human Dignity. Will Autonomy.

INTRODUÇÃO

O processo de descentralização na seara da saúde, embora plenamente

contido no texto da Constituição de 1988 e em demais legislações esparsas, teve

sua estruturação no início da década de 1980, onde começaram a brotar ideias

de descentralização da gestão pública sobre o sistema de saúde. Todavia, a

instituição do Sistema Único de Saúde (SUS), teve início a partir dos anos 90,

quando o até então arquétipo do sistema de saúde brasileiro abandonou sua

inclinação “estadualista” desenhada pelo Sistema Unificado e Descentralizado

de Saúde (SUDS). (UGÁ, 2003)

Assim, os municípios foram assumindo o papel de atores estratégicos do

SUS, dada sua competência constitucional (IBIDEM), competência esta, inserida

no artigo 30, inciso VII, da Carta Maior. Contudo, a Norma Operacional Básica –

SUS NOB 01/91começou a instituir, comungando de outro entendimento, um

novo sistema de alocação de recursos organizado em cinco fluxos: a)

financiamento da atividade ambulatorial proporcional à população; b) recursos

transferidos a cada unidade executora, proporcional à população; c) custeio da

máquina administrativa do INAMPS/MS; d) custeio de Programas Especiais em

saúde. (BRASIL, 1991) Esta forma de “definição dos valores da UCA foi

altamente regressiva, tendo em vista que os estados com melhores condições

socioeconômicas e sanitárias ficaram com valores per capita da UCA superiores

aos demais”. (UGÁ, 2003)

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Passou então, a acontecer uma recentralização do sistema de saúde.

Frente à desaprovação do sistema adotado, a Norma Operacional do Ministério

da Saúde NOB 01/93 galgou em correntes contrárias. Foi em direção ao retorno

do processo de descentralização do sistema, estabelecendo agora três níveis de

autonomia de governo das esferas infranacionais: “incipiente”, “parcial” e

“semiplena”. (IBIDEM) A grande novidade trazida pela NOB 01/93, foi à

existência de um teto financeiro para cobertura hospitalar. “Expressar em valores

financeiros os tetos destinados à assistência hospitalar possibilitou, por um lado,

efetuar transferências diretas, fundo a fundo, e, por outro, adotar maior

transparência na distribuição de recursos”. (IBIDEM)

A NOB 01/93 aos poucos, foi tentando reavivar o espírito da

descentralização, ofertando incentivos aos Estados e Municípios para que

paulatinamente, fossem adquirindo autogoverno em seu âmbito. Assim, era de

entendimento da NOB 01/93 que a “descentralização deveria ser um processo

lento e gradual, com liberdade de adesão por parte das unidades federadas”.

(IBIDEM)

Se a NOB 01/93 trouxe a ideia de descentralização do sistema de saúde,

a NOB/96 buscou disciplinar “o processo de organização do cuidado à saúde,

com o objetivo de induzir um novo modelo de atenção no país”. (IBIDEM) A tática

primacial da NOB/96 foi a de introduzir um novo padrão de alerta e cautela

associado ao arcabouço do financiamento adotado para o financiamento das

ações e serviços de atenção básica de saúde perante gestão municipal, através

do Piso de Atenção Básica (PAB), criado pela NOB e regulamentado conforme

as portarias GM n. 1.882, de 18/12/97 e GM n. 2.091, de 26 de fevereiro de 1998.

(IBIDEM)

Antes da implantação do Sistema Único de Saúde, o sistema público de

saúde atendia ao contribuinte da Previdência Social. Assim, quem não era

contribuinte dependia da caridade e da filantropia. Portanto, possuía poderes

centralizados concomitante a uma responsabilidade federal; os usuários não

participavam do sistema público de saúde. (IBIDEM)

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Em 2008, com o programa Mais Saúde, a concepção do sistema público

de saúde, pela implantação do SUS “muda”. Entretanto, o que vemos

cotidianamente não se compatibiliza com o rol de benefícios “instituídos” e

agregados nesta nova forma de sistema de saúde.

Paulatinamente, a luta do povo brasileiro para ter direito a um tratamento

digno e total, do começo do diagnóstico até o fim da ameaça da patologia, tem

sido crescente. O que se vê, são propagandas nauseabundas que remetem toda

sociedade à ilusão mercadológica do novo Sistema Único de Saúde.

Indicar nos leitos de uma UTI, sem a menor falta de frieza quem deve

prosseguir ou ter interrompido seu tratamento, vai de encontro aos princípios

basilares da nossa Constituição Cidadã, a dignidade humana e a autonomia de

vontade – esta última, intrínseca à condição de dignidade –, vai de encontro aos

preceitos éticos, morais; machuca a ideia de fraternidade. É crime.

Parece utópica, “imaginária”, a maneira colocada neste trabalho sobre a

ocorrência da Eutanásia dentro dos hospitais públicos, mas não. Infelizmente,

não. Milhares de famílias têm suas vozes caladas, inquietadas e agonizantes. O

desejo de ver o familiar recuperado ou ter seu último desejo respeitado não

encontra mais espaço em algumas realidades não tão distantes.

DESENVOLVIMENTO

Origem da Vida

Há tempo, somos ensinados o valor da vida e sua efemeridade. Buscamos

a todo instante compreender o lapso de tempo entre o viver e o morrer. Afinal,

uns morrem tão cedo, enquanto outros passam pela linha da vida e perdem-se

em seu cômputo, vivendo de forma imperceptível para os relógios do viver.

O direito à vida, mencionado genericamente no artigo 5º, caput, da

Constituição, contempla o direito de não ser morto, ter sua vida suprimida. Como

também, o direito de permanecer vivo, e desfrutar de uma vida digna. (LENZA,

2011)

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Mesmo estando protegida a vida, não implica esta condição no “continuar

vivendo”, mesmo sabendo da futura chegada da morte. O princípio da dignidade

da pessoa humana, insculpido na Constituição Federal de 1988 faz menção à

vida em condições de igualdade sem prejudicar o brotar da personalidade em

todos os seres.

Na construção das linguagens e reflexões sobre o “fenômeno” Vida,

Marcello Guimarães traz à baila pensamentos de filósofos conhecidos como

Platão, Aristóteles e Santo Tomás, identificando o olhar e concepção de cada

um. Comenta que Platão “identificava alma e vida, eis que considerava próprio

da alma a capacidade de mover-se por si”. Ao interpretar ou tentar interpretar

Aristóteles, percebe que este tinha por vida, a “nutrição, o crescimento e a

destruição que se originam por si mesmos”. Vai mais além quando traz Santo

Tomás como filósofo e por conseguinte, colaciona a visão deste de forma bela,

pois Santo Tomás trazia um significado à vida no qual seria esta, “a substância

à qual convém por natureza mover-se ou conduzir-se espontaneamente e de

qualquer modo à ação”. (GUIMARÃES, 2011)

Vida, do Latim Vita, é “o período compreendido entre o nascimento e a

morte; existência”. (LAROUSSE, 2001) O Supremo Tribunal Federal na ADI

3.510-0 que tratava da análise do artigo 5º da Lei nº. 11.105/2005 (Lei de

Biossegurança), enfrentou a significação da definição do conceito vida. Em seu

voto, a Ministra Ellen Gracie (Presidente) destacou que a formação do embrião

em feto, instante ocorrido na nidação, ou seja, momento de implantação de um

embrião na parede uterina, tendo início a formação das estruturas embrionárias,

como: placenta, cordão umbilical e saco amniótico (MELDAU, 2014), episódio a

partir do qual há que se falar em origem da vida.

Há na doutrina pátria divergências quanto ao momento do início da vida.

O artigo 2º do Código Civil Brasileiro dispõe que: “A personalidade civil da pessoa

começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os

direitos do nascituro”.

A partir do disposto no Código Civil Brasileiro, temos em mente que a vida

possui início a partir da concepção, quando um oócito juntamente com o

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espermatozóide se unem. A partir desta fertilização, forma-se o zigoto. Com a

formação do zigoto, tem início à vida de um novo ser.

Comungando outra linha de raciocínio, Lucio Freitas leciona que se o

Código Civil põe a salvo o nascituro, o resguardando a partir da concepção,

reflete que nítido está à constituição da vida neste momento. Ressalva que antes

da chamada concepção só há presença de óvulo e espermatozóides, ao passo

que a legislação vigente não resguarda direitos de óvulo e espermatozóide,

posto que, conclui por acreditar ser o marco inicial da vida o momento da

fecundação ou concepção. (FREITAS, 2014)

Como dito acima, para o direito brasileiro, inúmeras são as correntes que

discorrem sobre o início da vida, momento exato do nascimento de um ser vivo.

São elas: a) Teoria natalista, b) Teoria concepcionista e c) Teoria da

personalidade condicional.

Sobre a Teoria Natalista, tem como escopo o funcionamento

cardiorrespiratório do recém-nascido. Este, nascendo com vida e vindo a morrer,

adquiriu direitos e contraiu obrigações. Stolze e Pamplona Filho, afirmam que a

partir do momento que tem início o aparelho cardiorrespiratório, este, passível

de ser constatado frente ao exame de Docimasia Hidrostática de Galeno, contrai

o neonato personalidade jurídica, passando, portanto, a ser sujeito de direitos

ainda que venha minutos depois entrar em óbito. (GAGLIANO e FILHO, 2007)

No que pertine a Teoria Concepcionista, teve enorme destaque e

influência do ordenamento francês, sua linha de raciocínio aponta para que a

datar da concepção, estaria reconhecido o direito do nascituro e com isso, sua

personalidade jurídica. Não sendo necessário o nascimento com vida para todos

os ramos do direito, apenas, para os que versem sobre direitos patrimoniais.

(FALCÃO 2014)

Sobre a Teoria da personalidade condicional, temos que o neonato

adquire personalidade jurídica nascendo com vida, no entanto, seu direito está

sujeito a uma condição suspensiva, sendo, portanto, um direito eventual.

(DONZELE, 2014)

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Frente às teorias acima, instaura-se inúmeras posições acerca do início

da vida. Por assim posicionarem-se filósofos, doutrinadores e demais

estudiosos, temos que não há uma definição única do conceito vida nem do

momento em que o sujeito passa adquirir direitos e obrigações. O código civil

posiciona-se no sentido de que há vida, a partir do momento em que o “sujeito”

respira pela primeira vez, mesmo que por poucos instantes, assegurando, no

entanto, que o nascituro dispõe de direitos desde a concepção.

Aceitar o findar da existência tomou posições adversas do que acontecia

há épocas, onde a morte era encarada e muito bem recepcionada. Morrer era

um “evento”. Por assim ser, precisava de um bonito “espetáculo” e com bastante

“aplausos”. Contudo, ao passar dos anos, a solidão da morte foi tomando

espaço em uma sociedade “moderna” demais para encará-la como tal.

A Dignidade Humana frente à Constituição Federal de 1988

A Constituição Federativa do Brasil de 1988 trouxe em seu corpo

princípios basilares para sua construção. Princípios estes, que conduziram e

ainda conduzem o corpo de normas Constitucionais. A Constituição em seu

artigo 1º deu ênfase a todos os preceitos fundamentais que tiveram por escopo

a construção de uma Constituição mais humana.

Nascer com vida, gera por si só o direito a desfrutar desta de forma digna.

A dignidade vem atrelada a saúde, a paz, a educação, ao lazer, a um meio

ambiente sadio e equilibrado e em especial, a ter seus direitos resguardados.

Direitos estes de pensar e chegar a alguma conclusão livremente, de professar

uma crença, de ter realmente seus valores respeitados.

Em seu artigo 3º, inciso I, a Constituição enumera os objetivos

fundamentais em que fora baseada e construída. ‘Dignidade Humana’ nunca foi

um conceito a priori, que teve sua existência marcada ao longo dos anos. O

conceito de dignidade humana foi edificado paulatinamente, consequência de

inúmeros momentos históricos, tornando-se um dos primaciais direitos para a

espécie humana. (GALDINO, 2014)

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O Rol de direitos presentes na Carta Maior é extenso. O direito a vida e com

dignidade, é um deles. A dignidade do ser humano vai muito além do nascer,

está presente no crescer e morrer. Encontra-se estampada em toda Constituição

como um direito Fundamental. Os artigos 1º e 5º juntamente com seus incisos e

parágrafos, trazem o verdadeiro significado de dignidade humana

coadunamente com o seu exercício por todos os cidadãos nascidos,

naturalizados e ou “visitantes” neste território.

Nascer com vida, cometo um pleonasmo, não significa simplesmente nascer

respirando, mas nascer desfrutando de um ambiente sadio, equilibrado e em

especial, um ambiente de igualdades, esse último às vezes impossível. Viver

dignamente é ser reconhecido e respeitado em toda esfera coletiva.

Constatar a ocasião em que nasce a ideia de dignidade se tem como árdua;

no entanto, tornam-se plausível examinar marcos, períodos históricos, além de

doutrinadores e filósofos que tragam a construção da idéia baseada no valor

próprio e intrínseco ao ser humano. (MÖLLER, 2012)

Kant assegura que a dignidade humana é inerente a figura do “ser” humano.

Por vezes, a doutrina tenta definir o que seja dignidade humana, contudo, Kant

com seu raciocínio traz a ideia de que nascer humano já faz o homem digno.

Digno de dignidade. "Só o homem não existe em função de outro e por isso pode

levantar a pretensão de ser respeitado como algo que tem sentido em si mesmo".

(KANT, 2000) Não há necessidade de pertencimento a algum grupo social,

religioso ou de raça.

As condições de dignidade da pessoa humana devem ser propiciadas pelo

Estado, mas não são prerrogativas outorgadas pelas entidades governamentais.

No entanto, a falta de pressupostos econômicos não proporciona para a

humanidade o respeito à dignidade. Deve haver um contrapeso do Estado frente

a estas, uma vez que se propôs a guardar zelar por elas. (AGRA, 2012)

Desta maneira, percebemos que o conceito de dignidade humana se

complementa com o de direitos humanos, ao passo que qualquer violação a este

direito, gera implicações além de éticas, judiciais. Ao buscar compreender o

equilíbrio com a consequente isonomia social, a dignidade do homem vem

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cotidianamente sofrendo com atitudes completamente díspares com o disposto

e proclamado em toda Constituição e em Leis esparsas.

A Morte e o Morrer nas Sociedades Contemporâneas Dentro do SUS

O sentimento de repulsa nutrido pelos seres humanos frente à morte e

consequentemente ao morrer, faz com que a busca por diagnósticos que findem

o estado melancólico do enfermo ou ampliem o ciclo natural perseguido pela vida

humana seja frenética e avassaladora. Colocar um ponto final em uma situação

aparentemente desgastante para o paciente, faz da equipe médica seres

audazes.

“Vivemos na cultura do narcisismo, caracterizada pela dificuldade de

discernir o que realmente somos da fantasia dos produtos que consumimos”.

(LASCH, 1978) Como mencionado por Lasch em 1978, verificamos hoje no

século XXI, a real necessidade de tirarmos as máscaras e percebermos que não

somos os senhores do poder, porque somos inteligentes a ponto de desvendar

algumas coisas consideradas misteriosas, ou até curar o que não tem o poder

da cura. A verdade é que somos tão fracos que destoamos dos produtos que

consumimos, como por exemplo, a ponto de não poder reverter o mistério

da morte. “Escamoteia-se a morte porque ela é a comprovação de nossa finitude,

nosso limite”. (EIZIRIK; POLANCZYK e EIZIRIK, 2000)

Frente às angústias vividas cotidianamente, torna-se difícil o argumento

sobre as questões morte e até mesmo éticas do morrer. Comungamos do

pensamento da mortalidade, porém, o anestesiamos com o querer e o “viver” da

imortalidade. “Pensar a morte, encará-la em sua essência, é algo penoso para o

homem e expõe lembranças remotas de perdas, dor do luto e receio de um futuro

misterioso e incerto”. (ZAIDHAFT apud EIZIRIK; POLANCZYK e EIZIRIK, 2000)

Questões que envolvam sofrimentos ou grandes decisões são deixadas

de lado por simples pensamentos como: “Isso não irá acontecer”; “comigo não”;

“no dia eu penso”; “quando for à hora, minha família decide” etc. Todavia,

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acontece que nem sempre a vontade do moribundo ou de sua família é

respeitada.

A cultura do silêncio tem aberto espaço para a dor da notícia que um

familiar recebe ao saber que a pessoa amada, não goza mais do pensamento

da imortalidade. Afinal, luta-se por este. E é com este sentimento de não

pertencimento ao mundo atual ou a comunidade frequentada, que sofre o

paciente/moribundo, quando se depara com a negligência dentro do hospital

público onde vai buscar um possível tratamento.

No que pertine ao capital repassado pela União, Estados e Municípios ao

Sistema Único de Saúde, a Emenda Constitucional nº 29 estabelece que os

gastos da União devem ser iguais ao do ano anterior, corrigidos pela

variação nominal do Produto Interno Bruto (PIB). Já os Estados devem garantir

obrigatoriamente 12% de suas receitas para o financiamento pertinente à saúde,

e os Municípios, devem contribuir aplicando pelo menos 15% de suas receitas.

(IBIDEM)

Destacado todo processo de competência e repasses de verbas,

caracteriza-se o Sistema Único de Saúde como uma política de Estado que visa

“a ampliação dos direitos sociais, buscando assegurar a cidadania” (MOSTRA,

2009), vale ser destacado. Em 1990 com a entrada em vigor das Leis nº 8.080 e

nº 8.142, os serviços de saúde passaram a ser regulamentados com a plena

participação da sociedade e em fim, com as bases de funcionamento do SUS.

Antes das críticas e do tecimento de algumas considerações, cabe afirmar

que o pensamento sobre o qual fora erguido o Sistema Único de Saúde é de

considerável estigma.

Como visto acima, os repasses são feitos uma parte pelo Governo Federal

e outra pelo Estado ou Município. Assim, Repassadas as verbas pelo Governo

Federal para os hospitais públicos, esses ainda encontram deficiência no que diz

respeito à gestão qualitativa de seus recursos, o que indica uma má aplicação

das verbas em tratamentos, medicamentos, maquinários, de forma proporcional

a busca pelos tratamentos considerados primaciais para o atendimento

equitativo à população.

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Posto isto, esses fatores quando somados a decisão médica frente ao

quadro clínico do paciente pode levar a decisão do médico, muitas vezes através

do enfermeiro, pela eutanásia.

Estranho, porém, se dá quando da análise da política do Estado frente

para o SUS, quando diz que este é “a ampliação dos direitos sociais, buscando

assegurar a cidadania”. A cidadania não somente é assegurada na medida em

que além de receber, poder estar à disposição do cidadão brasileiro uma oferta

qualitativa de saúde como também deste, ter acesso digno ao tratamento que

lhe salve, ou que ao menos, lhe dê uma chance de escolha.

Respeitar o contido em uma Lei maior com medo de ser punido

judicialmente ou moralmente, já não tem o mesmo peso de algum tempo atrás.

A corrida contra o tempo instigada a cada minuto dentro dos hospitais públicos,

tendo em vista a quantidade de leitos ocupados e a imensa entrada de novos

pacientes gera a “cultura” do descarte.

Seja por questões de espera, que já não podem ser alongadas, mas

abreviadas, seja por questões que envolvam o Capital da administração pública.

Afinal, manter uma pessoa usufruindo de maquinário, energia, medicamentos,

tratamentos outros, altamente dispendiosos, em que não se visa qualquer

possibilidade, mínima que seja de retorno, não parece um “negócio viável”.

Tratamentos de Média Complexidade Ambulatorial e Hospitalar são ações

e serviços de saúde os quais pretendem acolher as primaciais adversidades e

agravações da saúde populacional. Estas ações e serviços são realizados em

ambiente ambulatorial ou hospitalar, como a própria nomenclatura aduz,

exigindo o uso de equipamentos e profissionais especializados em determinadas

patologias, além da disposição da utilização de recursos tecnológicos para a

sustentação do diagnóstico e tratamentos. Integra-se à Atenção Básica através

de um sistema de regulação. (VOLTA REDONDA, 2014)

O funcionamento destas unidades de Média Complexidade pauta-se

especificamente em uma missão com um fim específico na garantia da volta pelo

usuário à Unidade de Atenção Básica (AB), com o intuito de possibilitar o

prosseguimento do cuidado, do tratamento. Essas unidades na verdade, são as

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Policlínicas, os Centros de Atenção Psicossocial, os Centros de Reabilitação, os

Centros Especializados de Odontologia, o Centro de Doenças Infecciosas,

enfim, as unidades em que são propagados os cuidados especializados em

saúde. (IBIDEM)

Ressalte-se que todos os procedimentos de média e alta complexidade

de forma alguma, podem realizar-se pelo Ministério da Saúde, ou seja, pela

União. Devem ser realizados através dos gestores locais. Afinal, neste bloco de

financiamento a União passa a assumir o papel de definidora das políticas

públicas, repassando regularmente os valores necessários aos Estados e

Municípios. (FEIJÓ, 2012)

É neste ponto que reside o grande problema. Deixar para a União

repassar o capital “necessário” a ser utilizado pelos Estados e Municípios no que

diz respeito às unidades de Média e Alta Complexidade ambulatorial e hospitalar.

METODOLOGIA

O estudo proposto estrutura-se sob a égide da proteção aos Direitos

Humanos e, por consequência, da autonomia da vontade do paciente e de seus

familiares, se inserindo, infelizmente, no cotidiano avassalador dentro dos

hospitais públicos por tratamentos de doenças raras, conceito dado pelo alto

grau da dificuldade de cura de algumas patologias, ganhando espaço nas

decisões médicas que passam a ser “tomadas” unilateralmente, sem ouvir os

anseios dos pacientes tendo em vista com esta prática a possível demora nas

decisões pertinentes ao diagnóstico final. Foi verificado a partir deste estudo, a

quantidade de vidas que cotidianamente são ceifadas dentro da rede pública de

saúde, mas propriamente, no Sistema Único de Saúde. Esses dados foram

analisados através de matérias jornalísticas, e a partir disto, aprofundados em

teses de doutorado e livros específicos sobre o tema.

RESULTADOS

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Desde a antiguidade, os fenômenos da vida são explicados a partir do

momento em que passam a ser atrelados à sua capacidade de autoprodução.

São alicerçados pela naturalidade com que se locomovem, crescem, alimentam-

se, procriam-se e morrem. Presume-se com seus posicionamentos, não

dependerem a eventos externos, coisas externas. (GUIMARÃES, 2011)

O show da vida desperta a curiosidade do fenômeno morte. Afinal, lidar

com o sentimento da perda não é algo sublime. Estar vivo consome o

pensamento humano o qual queda-se inerte ante a capacidade de sua espécie

em observar a dinâmica da existência e locupletar-se com o vazio deixado pelos

rituais fúnebres. O ser humano enche-se com o vazio. Por mais paradoxal que

seja, faz-se assim o sentimento da “criatura” perante o movimento da vita.

A visão empregada pela Constituição de 1988 sobre o que pertine à

Dignidade da Pessoa Humana, nasce da presunção de que todos os homens

detém a mesma natureza e por isso, são dotados de idêntico valor, não

importando posições sociais, econômicas, culturais ou raciais, sua dignidade

deve ser assegurada. (AGRA, 2012)

Entretanto, o respeito à vontade humana e ao possível anseio do

paciente/moribundo, é deixado de lado por uma soma de fatores que atrelados,

conduzem a prática da Eutanásia em sua forma Imprópria dentro dos hospitais

públicos. O contido seja na Constituição, seja no Código de Ética Médica ou em

Leis esparsas, portanto, acaba deixando de ser “seguido”.

DISCUSSÃO

A prática da Eutanásia em sua forma Imprópria dentro do Sistema Único

de Saúde ocorre de maneira, diria que intensa, haja vista a presença de alguns

fatores que atrelados, geram esta prática. Fatores estes, seja pela falta de

gerência (administração) por meio dos gestores do capital repassado pelo

Estado para a rede pública de saúde, Estado, diga-se de passagem, englobando

não só o Governo Federal, mas o Estadual e Municipal, haja vista, ser o Sistema

Único de Saúde, descentralizado; seja pela ineficiência do Estado, aqui,

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particularizo a União, no repasse das verbas, já que atualmente decaiu para a

casa dos 40% de repasse para o SUS; ou, pela prática médica, prática esta

dirigida pelo poder de decisão que não deveria, mas que o médico detém sobre

o paciente, haja vista sua condição hierárquica no momento do diagnóstico e do

acompanhamento com o paciente pela demanda recorrente nos hospitais

públicos com a falta de leitos, maquinários, medicamentos insuficientes,

pressionando esses exercitores da medicina ou da enfermagem, a agirem

pautados pela rotatividade nestes hospitais.

CONCLUSÃO

Pretendeu-se discutir com este trabalho, a ocorrência silenciada da

Eutanásia dentro dos Hospitais Públicos brasileiros. A temática defendida a todo

instante, esteve fulcrada na condição dos pacientes e de seus familiares que

encaram um “cotidiano hospitalar” totalmente diverso do que deveria ser em sua

essência.

O medo de morrer nutrido pelos pacientes em estado crítico reveste-se de

solidão frente à recepção da sociedade e da própria família, ao indivíduo e sua

presente “condição”. Sentimento este, maximizado quando vivido dentro destes

hospitais. A procura pelos familiares e pacientes quanto à questão da cura da

enfermidade, ganha lugar para o medo de ver calar pela equipe médica, seus

anseios, desejos.

A escolha entre o que realmente espera o paciente e seus familiares ao

longo de todo o tratamento e o fim alcançado, enraivece, fere, destrata a

dignidade e autonomia do ser enfermo/moribundo.

Este trabalho teve por escopo, a exposição da realidade atual vivida pela

sociedade na qual, vidas estão sendo interrompidas em seu curso natural por

manobras criminosas e indignas realizadas dentro de hospitais públicos.

Assim, os resultados desta pesquisa revelam o quão silencioso e

recorrente são as práticas eutanásicas (em sua forma imprópria) dentro dos

Hospitais Públicos. A simples escolha entre quem vive e quem morrem passa a

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ser cotidiana. Os médicos decidem unilateralmente sobre a vida de cada

moribundo que se encontra “em suas mãos”.

A desorganização, a falta de planejamento e a má gerência dos recursos

por parte dos seus responsáveis administrativa e financeiramente, que adentram

no hospital faz com que a falta de leitos aumentem, a ausência de medicamentos

apavore e a luta por uma UTI se intensifique.

A falta de equidade no tratamento se corporifica, não há na verdade

condições de atendimento aos pacientes com mesmo diagnóstico e tratamento.

A UTI não abarca todos, a rotatividade se faz necessária e, em sendo assim, a

escolha entre a vida e a morte dos pacientes também.

Depreende-se, no entanto, que a eutanásia tem sido utilizada como forma

de descarte de pacientes que demoram a mostrar um resultado clínico positivo

que favoreça seu diagnóstico. Buscar o consentimento de familiares ou do

próprio paciente enquanto capaz de discernimento, seria como esgotar o ciclo

de reposição de novos enfermos nos aparelhos utilizados; o Sistema Único de

Saúde carrega em si, a mancha da ação ilegal da eutanásia imprópria.

REFERÊNCIAS

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GT: Filosofia e desafios contemporâneos

Coordenador: xxxxxxxxxxx

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Alcoolismo na adolescência: um estudo desenvolvido a partir dos adolescentes entre 14 e 17 anos em caruaru-

PE

Maria Eduarda de Rezende Mendonça Cirana Vasconcelos

Maria Joselma Franco Valdenice Maria Pereira Cavalcanti

Resumo: O estudo em desenvolvimento tem como título: alcoolismo na adolescência. A escolha do tema partiu da curiosidade em saber o que leva adolescentes a ingerirem bebidas alcoólicas. O estudo se justifica pela relevância social de identificar os motivos que provocam nos adolescentes a necessidade de ingestão de bebidas alcoólicas, objetivando contribuir para ações preventivas. O objetivo geral do estudo é: analisar o perfil dos adolescentes que ingerem bebidas alcoólicas. Enquanto os objetivos específicos: Analisar os motivos que levam o adolescente a ingerir bebida alcoólica; Identificar se os adolescentes possuem conhecimentos sobre os ricos da bebida alcoólica; Verificar o meio em que os adolescentes vivem e se as pessoas de convívio são influências para ingerir bebidas alcoólicas. Os estudos teóricos se pautaram em Silva e Padilha (2013) contribuindo com o estudo a partir das representações sociais de adolescentes sobre alcoolismo e as implicações do alcoolismo na história de vida dos adolescentes; Varella (2014) que alerta sobre os danos biológico que o álcool produz no corpo. O procedimento metodológico adotado foi o questionário misto, aplicado aos adolescentes de 2 (duas) escolas, sendo uma pública e outra privada, com estudantes do 1º ano do ensino médio com faixa etária entre 14 e 17 anos. As sessões para o desenvolvimento do estudo aconteceram de fevereiro a novembro 2014, com uma sessão semanal de 2 horas de trabalho. Os resultados parciais mostram que os jovens em que se encontram em famílias que têm uma renda abaixo de 2salários mínimos ingerem bebidas alcoólicas com menos frequência em relação aos que apresentam uma renda familiar acima de 5salários mínimos. Esses dados serviram de confronto com a hipótese inicialmente construída e estão em fase de tratamentos, pretendemos apresentá-los no evento.

Palavras-chave: Alcoolismo; Adolescência; Acesso

INTRODUÇÃO

A adolescência é uma fase de descobrimento onde os indivíduos neste

período de vida descobrem as mudanças corporais, comportamentais e os

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grupos sociais que desejam conviver, como afirma Silva e Padilha, esse

momento para o ser humano torna crítico.

A adolescência é um período crítico na vida das pessoas, no qual ocorrem novas descobertas significativas que são fundamentais para a construção da personalidade e da individualidade, sob o ponto de vista biopsicossocial. Nesse período, o conceito de interação grupal é perceptível e a adolescente busca pertencer a um grupo com o qual se identifica que terá a capacidade de influenciar suas ações e fará com que ele adote atitudes que serão a prova de sua aceitação na "tribo". (2013; p.2)

Sendo assim, diversos adolescentes na inquietação de conhecer como

são as festas, os grupos populares, acreditam que é interessante fazer uso do

álcool para torna-se popular na sociedade e usa como meio para diversão o

álcool. Porém, através de pesquisas constatamos as frustrações de

adolescentes e familiares que vivenciam essa experiência do alcoolismo.

Varella (2014) em uma entrevista com o Dr. e PHD em Dependência

Química, abordam questões referentes aos riscos que bebidas alcoólicas

produzem nos diferentes sexos, declarando que a mulher tem um padrão

enzimático de absorção do álcool mais efetivo e rápido, pois possui relativamente

mais gordura e menos água no organismo. Se compararmos uma menina e um

menino, com mesma estatura e peso, que tenham ingerido quantidade igual de

álcool, veremos que a concentração alcoólica é maior no sangue da menina.

Sendo assim, o dano biológico que o álcool produz no corpo, torna mais

prejudicial no corpo da menina.

Nesta mesma entrevista, foi perguntado ao Dr. Laranjeira, o que os pais

dos adolescentes devem fazer para evitar que seus filhos tornem-se alcoólatras

ou tenha algum contato com álcool, ele respondeu “Temos de acreditar nas leis

e respeitá-las. No Brasil, o Estatuto da Criança e do Adolescente deixa claro que

é proibido oferecer até os dezoito anos qualquer tipo de substância que aja no

cérebro da criança. Então, os pais que, em sua casa ou numa festa, permitem

servir bebida alcoólica para adolescentes estão infringindo a lei do país.”

Hoje em dia, é fácil comprar algum tipo de bebida alcoólica, e pela

facilidade, adolescentes e jovens não consideram o ato de ingerir álcool, algo

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errado. No tempo de festas, a circulação de álcool, drogas é facilitada no

ambiente. Então os adolescentes e jovens aproveitam o momento para garantir

“status” na busca da popularidade, consistindo o pensamento que: “Meus amigos

bebem, por que eu não vou beber também? Não há nada de errado, meus pais

não iram saber disso, então... está tudo certo”, esse é o pensamento dos

adolescentes e jovens atualmente.

Diante desse contexto, o estudo em desenvolvimento se justifica pela

relevância social de identificar os motivos que provocam nos adolescentes a

necessidade de ingestão de bebidas alcoólicas, objetivando contribuir para

ações preventivas. A partir disso, temos algumas perguntas que desejamos

responder, considerando a análise dos dados que constitui esse estudo, como:

Quais fatores influenciam adolescentes a ingerir álcool? Qual o índice de

adolescentes entre 14 e 17 anos que ingerem bebidas alcoólicas na cidade de

Caruaru- PE? Será influência familiar ou de amigos?

Pretende-se também descobrir se os adolescentes ingerem bebidas

alcoólicas mesmo sabendo os danos prejudicais a saúde, verificando se a

condição financeira do adolescente influencia o acesso e uso de bebidas

alcoólicas durante a adolescência.

Como questão hipótese, temos que: os adolescentes da escola particular

ingerem menos bebidas, enquanto os alunos da escola pública são, em sua

maioria, o inverso.

Nesta perspectiva de estudo temos como objetivo geral: analisar o perfil

dos adolescentes que ingerem bebidas alcoólicas. Enquanto os objetivos

específicos: Analisar os motivos que levam o adolescente a ingerir bebida

alcoólica; Identificar se os adolescentes possuem conhecimentos sobre os ricos

da bebida alcoólica; Verificar o meio em que os adolescentes vivem e se as

pessoas de convívio são influências para ingerir bebidas alcoólicas.

METODOLOGIA

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O procedimento metodológico adotado foi o questionário misto, de acordo

com Lakatos “questionário é um instrumento de coleta de dados, constituído por

uma série ordenada de perguntas, que devem ser respondidas por escrito”. Por

ser misto é caracterizado por perguntas abertas e fechadas.

De acordo com Lakatos, a classificação é apresentada da seguinte

maneira: perguntas abertas “Também chamadas livres ou não limitadas, são as

que permitem ao informante responder livremente, usando linguagem própria, e

emitir opiniões”. Já as perguntas fechadas “também denominadas limitadas ou

alternativas fixas, são aquelas que o informante escolhe sua resposta entre duas

opções: sim e não”. Vale ressaltar que utilizamos em nossa pesquisa os dois

tipos de perguntas, abertas e fechadas.

Aplicado aos adolescentes de dois (duas) escolas, sendo uma pública e

outra privada, com estudantes do 1º ano do ensino médio com faixa etária entre

14 e 17 anos. As sessões para o desenvolvimento do estudo aconteceram de

fevereiro a novembro 2014, com uma sessão semanal de 2 horas de trabalho.

É a partir dos estudos realizados e dos questionários que pretendemos

responder nossas indagações, contribuindo assim para a sociedade refletir sobre

as concepções de adolescentes e jovens do porquê mesmo cientes dos danos

que podem sofrer, ingerem bebidas alcoólicas. Participaram do questionário 45

alunos de Escola Privada e 30 alunos de Escola Pública, sendo, todos eles

alunos do 1º ano do Ensino Médio.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Foram entrevistados 45 alunos de Escola Privada e 30 alunos de Escola

Pública, sendo, todos eles alunos do 1º ano do Ensino Médio. Os alunos da

Escola Privada recebem acima de 5 salários mínimos, enquanto os da Escola

Pública, recebem de 1 a 2 salários mínimos. Os resultados e discussão dos

dados está baseado ao questionário aplicado e os estudos realizados.

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Diante os dados coletados, fomos surpreendidos logo com o resultado das

perguntas iniciais, quando questionamos: “Ingerem algum tipo de bebida

alcoólica?”. As respostas obtidas foram confrontadas com a hipótese inicial.

Acreditava-se que os adolescentes da Escola Pública ingeriam com mais

frequência bebidas alcoólicas, por ser um meio de diversão de baixo custo e de

fácil acessibilidade. A partir do questionário aplicado na Escola Pública e

Privada, constatamos que são os alunos da Escola Privada que ingerem com

mais frequência bebidas alcoólicas, por apresentarem mais liberdade e

condições financeiras para frequentar festa e/ou bares.

Outra questão que nos surpreendeu foi em identificar o quanto o álcool é

ingerido fora do tempo, segundo relatos dos adolescentes, o primeiro contato foi

quando criança, acredita-se que foi por curiosidade.

Na perspectiva de conhecer se os adolescentes são cientes dos riscos da

ingestão exagerada de bebidas alcoólicas, de acordo com 45 adolescentes da

Escola Privada em responder o questionário, 39 adolescentes conhecem os

riscos, dentre eles 32 ingerem bebidas alcoólicas, e apenas dois adolescentes

desconhecem os ricos. Na Escola Pública, de 30 adolescentes: 24 deles

conhecem os riscos, sendo 11 que ingerem bebidas alcoólicas, quatro alunos

desconhecem os riscos e dois alunos não responderam.

Esses adolescentes estão em fase de crescimento e todos frequentando

a escola, e tal ingestão de álcool prejudica seu crescimento e sua aprendizagem.

Como é tratado em estudos:

Comprovado cientificamente que o álcool é nocivo em qualquer faixa etária, seus malefícios entre os adolescentes são evidentes, sobretudo, durante a fase escolar, uma vez que o uso contínuo da substância atrapalha o rendimento, além de provocar confusão mental, falta de coordenação, problemas de memória e de aprendizado. (Redação em pauta – 14 de mar. 2012; Envolver de: jornalismo e sustentabilidade)

Diante as falas dos adolescentes tanto da escola pública, quanto

particular, percebe-se os conhecimentos sobre os ricos que a bebida

proporciona.

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“Brigas, discussões, matar, roubar”. (Adolescente Escola Pública, Setembro, 2014) “Várias doenças, transtornos na família, e até mesmo a morte”. (Adolescente Escola Pública, Setembro, 2014) “Problemas no pulmão, coração, e muitos morrem por isso”. (Adolescente Escola Pública, Setembro, 2014) “Vício e problemas no fígado”. (Adolescente da Escola Privada, Setembro, 2014) “Afeta os neurônios que pode prejudicar a aprendizagem”. (Adolescente da Escola Privada, Setembro,2014)

Em analisar os motivos que levam os adolescentes a ingerir bebida

alcoólica, percebe-se através dos dados que os motivos são diversos, como:

curiosidade, diversão, relaxamento.

“Para saber o gosto”. (Adolescente da Escola Privada, Setembro, 2014) “Porque é legal e divertido”. (Adolescente da Escola Privada, Setembro,2014) “Para relaxar”. (Adolescente da Escola Privada, Setembro,2014) “Porque relaxo”. (Adolescente Escola Pública, Setembro, 2014) “Por diversão e influência dos amigos”. (Adolescente, Escola Pública, Setembro, 2014)

Em verificar o meio em que os adolescentes vivem e se as pessoas de

convívio são influências para ingerir bebidas alcoólicas na adolescência, ao

serem questionados os adolescentes da Escola Privada se possuem parentes

e/ou amigos que ingerem bebidas alcoólicas, 41 alunos afirmam que sim e

apenas 4 alunos afirmam que não. Enquanto, na Escola Privada, 24 alunos

afirmam que sim, 5 alunos afirmam que não e apenas 1 não respondeu ao

questionário. Sendo assim, demostra que o meio social em que eles convivem

pode influenciar, ao ponto dos adolescentes deixarem de estudar, realizar

alguma atividade esportiva ou até mesmo social para vivenciar o consumo de

bebidas alcoólicas que são nocivas ao organismo.

A partir desse contexto, concordamos que quando os parentes ingerem

bebidas alcoólicas, o controle ou impedimento para os adolescentes não ingerir

bebidas, é falha, como podemos constatar o seguinte:

Na tentativa de reduzir o índice de dependência química entre os jovens, o neurologista destaca que o tratamento pode começar a partir da mudança de comportamento, e que os adolescentes devem se conscientizar dos males que a bebida provoca não apenas ao corpo, mas também nos relacionamentos interpessoais. Os pais precisam

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exercer total autoridade e manter um diálogo franco sobre o tema, restringindo de imediato o consumo. (Redação em pauta – 14 de mar. 2012; Envolverde: jornalismo e sustentabilidade)

Para prevenir ou combater o acesso dos adolescentes às bebidas

alcoólicas torna-se difícil quando os pais possuem consumo frequente, sendo

assim, na maioria das vezes, seus filhos procuram seguir tais costumes.

CONSIDERAÇÕES PARCIAIS

Retomando as perguntas que desejávamos responder inicialmente, quais

fatores influenciam adolescentes a ingerir álcool? Qual o índice de adolescentes

entre 14 e 17 anos que ingerem bebidas alcoólicas na cidade de Caruaru- PE?

Será influência familiar ou de amigos?

O estudo ofereceu dados que possibilitou refletir sobre as indagações, sendo

assim, destacamos que os principais fatores que influenciam a ingerir álcool na

adolescência ou antes desse período é a curiosidade, meio de diversão e

relaxamento. O perfil dos adolescentes que ingerem bebidas alcoólicas com

mais frequência, são os que possuem renda familiar maior. Vale ressaltar que

os adolescentes possuem em sua grande maioria a presença dos familiares que

ingerem bebidas alcoólicas.

Os dados serviram de confronto com a hipótese apresentada, em constatar

que os jovens em que se encontram em famílias que têm uma renda abaixo de

2salários mínimos ingerem bebidas alcoólicas com menos frequência em relação

aos que apresentam uma renda familiar acima de 5salários mínimos. O fato

deles possuírem mais poder aquisitivo, torna-se mais fácil a compra de bebidas

alcoólicas. Adolescentes conhecem os riscos que a bebida alcoólica causa ao

nosso organismo, mesmo assim, ingerem. O desenvolvimento desse estudo é

importante para os adolescentes conhecerem alguns riscos da ingestão de

bebidas alcoólicas, principalmente na fase da adolescência

REFERÊNCIAS

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Varella, Drauzio. Alcoolismo na Adolescência. Entrevista. Disponível em:<http://drauziovarella.com.br/dependencia-quimica/alcoolismo-na-adolescencia/ >. Acesso em: 15 de Agos. de 2014. Lakatos, Eva Maria. Fundamentos de metodologia científica. – 6.ed. – 3. Reimpr. São Paulo: Atlas 2006.

Redação em pauta. Consumo excessivo de álcool danifica o cérebro. Envolverde: jornalismo e sustentabilidade. Disponível em: < http://envolverde.com.br/saude/abuso/consumo-excessivo-de-alcool-danifica-o-cerebro/ >. Acesso 12 de set. de 2014.

Silva, Sílvio Éder D.; Padilha, Maria I. - O alcoolismo na história de vida de adolescentes: uma análise à luz das representações sociais. Scielo. Texto Contexto Enferm, Florianópolis, 2013 Jul-Set; 22(3): 576-84. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/tce/v22n3/v22n3a02.pdf>. Acesso em: 06 de Jun. de 2014.

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Gravidez na adolescência: um estudo desenvolvido em uma escola pública no município de caruaru – PE

Janaina da Graça Bezerra Silva

Cirana Vasconcelos Maria Joselma Franco

Valdenice Maria Pereira Cavalcanti

Resumo: O estudo em desenvolvimento tem como título: Gravidez na Adolescência: um estudo desenvolvido em uma escola no município de Caruaru – PE. A motivação para o estudo se deu a partir da indagação: o que faz com que as adolescentes engravidarem mesmo cientes dos meios de prevenção? Para tanto, tomamos como objetivo geral: Compreender o que faz com que as adolescentes engravidem por falta de prevenção, mesmo cientes dos meios preventivos. Os objetivos específicos são: Identificar o nível de apoio dos pais em enfrentar a gravidez precoce; Analisar quais são os fatores que contribuíram para a gravidez não planejada; Apresentar casos de adolescentes que tiveram a experiência da maternidade cedo e as dificuldades que vieram em consequência. Nossas reflexões se pautaram em estudiosos como Varella 2014; Waissman 2014; Leite 2014; Ribeiro 2014. O procedimento metodológico adotado foi o questionário com questões abertas. Estas trataram de aspectos relevantes para os adolescentes que vivenciaram a gravidez precoce. O desenvolvimento do estudo exigiu encontros semanais de fevereiro a novembro de 2014. Os dados foram coletados em uma escola pública estadual no município de Caruaru, com o total de 08 sujeitos. O tratamento dos dados mostra que quando adolescentes engravidam precocemente vivenciam momentos de rejeição da família, amigos e às vezes do parceiro. É possível constatar a não aceitação da gravidez no período inicial, porém, as adolescentes mostram que as famílias cedo ou tarde conformam-se com a situação. Quanto aos meios de prevenção todas mostraram conhecimento, são cientes dos meios de prevenção de gravidez, mas mesmo assim engravidaram, por ausência de prevenção. Os dados continuam em fase de tratamento e nos propomos apresentá-los no evento.

Palavras-chave: Gravidez; Adolescência; Consequências.

INTRODUÇÃO

Segundo Varella (2014), em uma pesquisa analisou-se que em 1990 o

índice de gravidez na adolescência era apenas 10%, no entanto, em 2000 o

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índice aumentou para 18%, ou seja, quase o dobro de adolescentes que

engravidam entre 12 a 19 anos. No início do século passado as mulheres se

casavam cedo e tinham filho logo sem receber nenhum tipo de assistência e que

mesmo com os avanços da atualidade não impediram de engravidarem.

Conforme a Dra. Waissman(2014), ela afirma que “não é falta de

informação que leva à gravidez, pois 92% das adolescentes sabem no mínimo

um método contraceptivo que é a camisinha, e pensa ela que talvez seja o

pensamento mágico dos adolescentes em busca e descobrir a curiosidade das

fases ou talvez por achar que nunca vai acontecer com elas, que provoca tantas

jovens grávidas ainda muito cedo”.

De acordo com a psicóloga e pedagoga Leite (2014), ela afirma que “os

principais fatores que levam a gravidez na adolescência são a liberação da

sexualidade, desconhecimento do tema, urbanização acelerada”,

A fase da adolescência é um período que de fato precisa-se de apoio,

conselho dos familiares, até porque é um período da vida que deixa a infância e

parte para a fase adulta, como aborda Yazlle.

A adolescência corresponde ao período da vida entre os 10 e 19 anos, no qual ocorrem profundas mudanças, caracterizadas principalmente por crescimento rápido, surgimento das características sexuais secundárias, conscientização da sexualidade, estruturação da personalidade, adaptação ambiental e integração social. (2006; p.444)

Diante do exposto, se faz necessário que se tenham pessoas preparadas

para lidar e orientar a juventude, objetivando ações preventivas frente ao

aumento contínuo da população de adolescentes grávidas. É necessário existir

confiança no ambiente familiar, informações mais detalhadas sobre métodos

contraceptivos e acima de tudo, respeito e limite quanto ao início de sua atividade

sexual.

O estudo se justifica pela contribuição social que pode trazer, partimos do

pressuposto que o alto índice de adolescentes grávidas, deve-se à falta de

informação, influência de um mesmo grupo social, da ausência de orientação em

relação ao tema sexualidade por parte dos pais. Após essas adolescentes serem

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mães, suponho o tempo dedicado à maternidade e a criança, a baixa condição

financeira, ausência de apoio dos pais atrapalham nos estudos e na condução

da vida pessoal. A justificativa do ponto de vista pessoal é de estudar este tema,

buscando entender o porquê as adolescentes ainda cometem um erro que pode

facilmente ser evitado.

Sendo assim, pretendemos responder as seguintes questões: O que faz

com que as adolescentes engravidarem mesmo cientes dos meios de

prevenção? Quais mudanças há na vida delas depois de se tornarem mães?

Consideramos como hipótese inicial, que a maioria das adolescentes

sabem se prevenir em relação à gravidez, tem informações advindas da escola,

publicidade, colegas da mesma faixa etária, mas o desejo de vivenciar as

experiências nesta fase da vida é tão intensa, que acaba influenciando

emocionalmente e não fazendo uso de um método preventivo.

Muitas vezes as adolescentes realmente sabem se prevenir, mas

dependendo da ocasião, entre a emoção e a razão, vivem intensamente a

experiência movida pela emoção, sem conseguir avaliar as consequências

danosas que a ação pode trazer.

O objetivo geral dessa pesquisa é compreender o que faz com que as

adolescentes engravidem por falta de prevenção, mesmo cientes dos meios

preventivos. Os objetivos específicos são: Identificar o nível de apoio dos pais

em enfrentar a gravidez precoce; Analisar quais são os fatores que contribuíram

para a gravidez não planejada; Apresentar casos de adolescentes que tiveram a

experiência da maternidade cedo e as dificuldades que vieram em

consequência.

Algumas famílias não aceitam de maneira alguma as filhas submeterem-

se a gravidez precoce, já que muitas das vezes resultam de transtornos.

Enquanto outras famílias acolhem e ajudam na gravidez, procurando assim

minimizar os impactos acontecidos. Adolescentes com tanta informação ainda

engravidam, não se previnem e se põem em risco de se contaminar com uma

DST- Doença Sexualmente Transmissíveis, AIDS e outras doenças.

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MATERIAIS E MÉTODOS

O procedimento metodológico adotado foi o questionário com questões

abertas. De acordo com Lakatos (2006) esse tipo de perguntas “Também

chamadas livres ou não limitadas, são as que permitem ao informante responder

livremente, usando linguagem própria, e emitir opiniões”. (p. 206)

As perguntas trataram de aspectos relevantes para os adolescentes que

vivenciaram a gravidez precoce. O desenvolvimento do estudo exigiu encontros

semanais de fevereiro a novembro de 2014. Os dados foram coletados em uma

escola pública estadual no município de Caruaru-PE, com o total de 08 sujeitos

entre 12 a 20 anos de idade. No estudo é utilizado as siglas A1(Adolescente 1),

A2, A3 e assim sucessivamente, isso para manter a identidade de cada

adolescente que participou do questionário. Na perspectiva de refletir as

principais questões que contribuíram para a gravidez, analisando de maneira

minuciosa as ausências dos fatores que influenciaram na mesma.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

O estudo teve a participação de 08 sujeitos, entre adolescentes e jovens

de 12 a 20 anos de idade, sendo uma adolescente de doze anos; quatro

adolescentes de16 a 17anos; três adolescentes entre 18 a 20anos. Dentre elas

4 moram com os pais e as outras 4 se diz serem independentes. Mas através do

questionário, percebe-se que de oito adolescentes que engravidaram, cinco

delas declaram de não ter condições para criar seus filhos.

Diante a esses dados, destaca-se como consequência da gravidez não

planejada, a afirmação das jovens em dizer que “não possui condições

financeiramente de criar seus filhos”.

“A gestação nessa faixa etária, embora possa ser desejada de forma

consciente ou inconsciente, geralmente não é planejada, estando relacionada a

fatores intrínsecos, da faixa etária, como socioculturais e econômicos.” Isso

significa que essas adolescentes, após o parto, iniciam um período de despesas

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com a criança, como fraldas, leites, remédios e os outros custos referentes às

despesas em geral, por isso algumas adolescentes preferem continuar morando

com os pais, como mostra o estudo, de 8 questionada 4 moram com os pais e

as outras 4 são independentes.

Na perspectiva de compreender o motivo da gravidez precoce, considerou

a seguinte indagação: “Teve instruções em casa, na escola, com as amigas para

prevenção da gravidez”?

Nesta questão foi visto que a maioria sabia se prevenir, mas mesmo assim

engravidaram por considerar que a gravidez não aconteceria com elas. Para

esses casos, alguns estudiosos acreditam que seja consequência da liberação

da sexualidade, como afirma a psicóloga Leite (2014), “os principais fatores que

levam a gravidez na adolescência são a liberação da sexualidade,

desconhecimento do tema, urbanização acelerada”.

Buscamos questionar as adolescentes sobre o apoio dos pais em relação

à gravidez, em que se destacam as seguintes falas: “A minha mãe chorou muito,

mas me deu apoio” (Sujeito A-7, Setembro, 2014); “Não foi muito boa, mas ela

aceitou” (Sujeito A-8, Setembro, 2014).

De acordo com as respostas analisadas, a maioria dos pais apoiou

quando souberam da gravidez, porém, declararam que os pais choraram, mas

atualmente já se conformaram. Outras, por medo, escondem dos pais e buscam

tentar resolver seu “problema” procurando o aborto.

De acordo com as respostas analisadas, os pais apoiaram quando

souberam da gravidez, porém, cinco das questionadas declararam que os pais

choraram muito e no começo não conformava-se com a notícia, mas atualmente

sente-se convencidos. Mas nem sempre os pais, as famílias e amigas apoiam o

momento da gravidez na adolescência, outras, por medo, escondem dos pais e

buscam tentar resolver seu “problema” procurando o aborto, como foi constado

na fala da jovem:

Esqueci de tomar o comprimido e quando soube tentei abortar de todo jeito possível, mas depois desistir e agora é minha vida (Sujeito A-5, Setembro, 2014)

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Conheci o rapaz há 7 anos, e em 1 ano e meio a gente começou um relacionamento sério, sempre me preveni, mas aconteceu que a minha concepção (menstruação) começou a vim irregular, os remédios não serviram mais e engravidei. Pensei em abortar, mas lembrei da dor que tive ao lembrar que minha mãe tentou abortar também, então escolhi a vida da minha pequena. (Sujeito A-3, Setembro, 2014)

Ao questionar sobre a reação no momento da descoberta da gravidez,

observou-se que a maioria dos parceiros teve uma boa aceitação, mas relatam

enfrentar certa dificuldade no começo por se tratar de um fator do qual

decorreram várias mudanças na sua vida, o que pode ser observado a partir da

fala de gestantes adolescentes. Em estudo realizado na Universidade Estadual

de Londrina, com abordagem da paternidade na adolescência, ao analisar a

reação do pai no momento da descoberta da gravidez, observou-se que alguns

pais no primeiro momento ficaram confusos e até assustados, porém depois tudo

ficou normalizado e a adolescente recebeu todo o apoio e aceitação de seu

parceiro, essas reações também foram relatadas pelas adolescentes

questionadas.

Um pouco da história das adolescentes grávidas do município de Caruaru

O relato da seguinte adolescente, foi uma situação mais estruturada, pois

ela e seu parceiro já moravam juntos e a criança foi desejada. Enquanto, as

demais não demonstram que não tiveram intenção de engravidar.

“Eu sempre fui uma pessoa muito independente então no meu tempo de escola

conheci meu esposo e nós concordamos em ter um filhinho e não me arrependo

hoje meu filho tem 3 aninhos”. (Sujeito A-2, Setembro, 2014)

“Não queria engravidar, pois tomava o remédio na hora certa”. (Sujeito A-7,

Sujeito, 2014)

“Eu era uma menina alegre e quando descobrir que estava grávida com 12 anos

para mim foi um choque minha mãe ficou decepcionada comigo e minhas amigas

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toda pararam de falar comigo foi muito ruim para mim, mãe nova sem

experiência” (Sujeito A-6, Setembro 2014)

Através do estudo foi possível constatar que a maioria das adolescentes

que vivenciaram a gravidez precoce, não desejou, mas por falta de algum

cuidado específico na prevenção, consequentemente engravidaram.

Mensagens das adolescentes para meninas da sua idade

“Que se cuide, que se previna não só de uma doença mais de uma gravidez,

porque ser mãe é muita responsabilidade e tem muitas mulheres ai que não tem

e muito menos se deve ter um filho porque um filho é uma benção” (Sujeito A-4,

Setembro, 2014)

“Que tome cuidado não se iluda com homens que querem só fazer um filho

nelas”. (Sujeito A-6, Setembro, 2014)

“Se prevenir é a melhor opção, mais se acontecer seja realista e cuide, afinal é

uma vida que gera em você”. (Sujeito A-3, Setembro, 2014)

Percebe-se através dos relatos das adolescentes que todas enfatizam o

método de prevenção e tomar cuidado, pois perceberam que a gravidez é uma

responsabilidade muito grande e tem que haver planejamento e apoio das

pessoas ao seu redor e principalmente de seu parceiro.

CONSIDERAÇÕES PARCIAIS

O estudo possibilitou responder as indagações iniciais, retomando as

questões, temos: O que faz com que as adolescentes engravidarem mesmo

cientes dos meios de prevenção? Quais mudanças há na vida delas depois de

se tornarem mães?

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A partir dessas inquietações constatamos que as adolescentes as quais

engravidam precocemente em sua maioria é de fato ausência do cuidado

específico os meios de prevenção, apesar das adolescentes demonstrarem

conhecimento aos métodos de prevenção, consequentemente engravidam.

Quanto às mudanças na vida após se tornarem mães, vivenciam momentos de

rejeição da família, amigos e às vezes do parceiro. É possível constatar a não

aceitação da gravidez no período inicial, porém, as adolescentes mostram que

as famílias cedo ou tarde conformam-se com a situação.

A hipótese inicialmente apresentada foi de encontro com os dados da

pesquisa, pois a maioria das adolescentes sabem se prevenir em relação à

gravidez tem informações advindas da escola, publicidade, colegas da mesma

faixa etária, mas o desejo de vivenciar as experiências nesta fase da vida é tão

intenso, que acaba influenciando emocionalmente e não fazendo uso de um

método preventivo. Várias das adolescentes que participaram do estudo

declaram serem influenciadas pelo parceiro.

Diante à apresentação dos casos de adolescentes que vivenciaram a

gravidez precocemente, contribui para sociedade em conscientizar e alertar as

adolescentes de hoje em dia que se prevenir é a melhor opção e que esse

acontecimento também pode acontecer com qualquer uma e não apenas com

as outras.

Portanto, considera-se a importância da mídia, escolas, as famílias,

realizarem constantemente um trabalho de formação que contribua para

conscientização das adolescentes, enfatizando as conseqüências que a

gravidez precoce pode ocasionar.

REFERÊNCIAS

Lakatos, Eva Maria. Fundamentos de metodologia científica. – 6.ed. – 3. Reimpr. São Paulo: Atlas 2006.

Yazlle, Marta E. H. D. - Gravidez na adolescência.Scielo. Rev. Bras. Ginecol. Obstet. vol.28 no.8 Rio de Janeiro Agosto. 2006.

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Varella, Dr. Drauzio. Gravidez na adolescência. Entrevista. Disponível em: <doutordrauziovarella.com.br/mulher-2/gravidez-na-adolescencia-2>. Acesso em: 06 de Junho de 2014.

Leite, Pisani. Eliane: Disponível em:<www.pedagogobrasil.com.br/psicologia/gravidez>Acesso em: 06 de Junho de 2014.Gravidez na Adolescência: Disponível em: <http://gravidez-na-adolescencia.info/mos/view/Causas_da_Gravidez_Precoce/ >. Acesso em 08 de Agosto de 2014.

Revista de Adolescente e Saúde. Gravidez na Adolescência. Vol. 1 nº 1 - Jan/Mar – 2004.http://www.adolescenciaesaude.com/detalhe_artigo.asp?id=226

Nascimento, Mirlene Garcia; Xavier,Patricia Ferreira; Passos, Rafaella Domingos.Adolescentes grávidas: a vivência no âmbito familiar e social.Adolescência e Saúde. Rio de Janeiro, v. 8, n. 4, p. 41-47, out/dez 2011Disponivel em: http://www.adolescenciaesaude.com/detalhe_artigo.asp?id=294. Acesso em 17 de out. 2014

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Nova divisão macrorregional do Brasil: cultura e política numa perspectiva de educação nacional

Tassicio Leal de Oliveira Graduando de Filosofia do 4º Período – FAFICA

RESUMO: Este trabalho é resultado de uma indagação sobre a atual divisão macrorregional brasileira, fruto de estudos e pesquisas iniciadas na UFRN e que nos interessou pesquisar. Seu objetivo é apresentar uma nova divisão macrorregional no território brasileiro e a partir desta configuração abordar as mudanças positivas que poderão acontecer, sobretudo, nas áreas culturais e política dos estados afetados. Atualmente os estados brasileiros estão organizados em cinco macrorregiões, a saber – Sul, Sudeste, Centro-Oeste, Norte e Nordeste – que assim encontram-se para uma melhor organização da geografia e da pesquisa. A coleta de dados sobre o país é bem mais apreciada a partir das macrorregiões. O Brasil está organizado da forma atual desde 1988, quando sofreu sua última alteração – a criação do Estado do Tocantins. Contamos com 26 estados e um Distrito Federal, distribuídos nas macrorregiões, a partir das características comuns que os aproximam. Na Região Sul, destaca-se o cultivo de frutas, a criação de suínos e de aves e, sobretudo, apresenta o clima mais frio do país. No Sudeste concentram-se os grandes produtores de riquezas, que reúnem a maior população industrial do nosso território. No Centro-Oeste predominam a vegetação do serrado e a forte criação bovina, como cultura de subsistência. No Norte, grande parte de sua população reside na beira dos rios e tem como principal atividade econômica a exploração de vegetais e minerais; levamos em consideração, que esta região está, em sua maior parte, coberta pela Floresta Amazônica. A Região Nordeste, por sua vez, é caracterizada pelo clima semi-árido e pelo crescente cultivo da cana-de-açúcar; é marcada pelo forte turismo, sobretudo, nas capitais onde o clima é mais úmido. Utilizaremos como referenciais teórico metodológico, Dantas (2011), Santos (1996) e Minayo (1999). Enquanto pesquisa bibliográfica, o estudo indica a partir da visão de Santos (1996) e apresentada por Dantas (2011) a necessidade de rever a atual divisão territorial brasileira. Esta proposta visa melhor responder às exigências advindas pela configuração geográfica, cultural e política principalmente dos estados do Norte do país, num sentido globalizado. Ao invés de cinco, teremos seis macrorregiões. A nova receberá o nome de “Região Noroeste”. Todo esse processo de estudo e pesquisa seria de relevância para a Educação Nacional, uma vez que despertaria a atenção de todo o Brasil para a nova proposta a ser aplicada.

PALAVRAS-CHAVE: Macrorregiões, Brasil e Educação Nacional.

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INTRODUÇÃO

A pesquisa a Nova divisão macrorregional do Brasil: Cultura e Política

numa perspectiva de Educação Nacional é resultado de questionamentos

relevantes a partir do desequilíbrio existente na atual divisão macrorregional

brasileira. A pesquisa teve inicio na UFRN (Universidade Federal do Rio Grande

do Norte) e julgando-a positiva em seus objetivos e proposta, interessou-me

pesquisar. Temos como fonte primária Dantas (2011). Seu objetivo é propor a

criação de uma sexta macrorregião – Noroeste – que contornará problemas

detectados na geografia da região Norte; e estes problemas refletem nas áreas

culturais, política, econômica, administrativa e social. Trataremos neste trabalho,

sobretudo das reflexões que se estendem nas áreas culturais e política. É uma

pesquisa de tipo bibliográfico, ancorada no referencial teórico-metodológico de

Dantas (2011), Santos (1996) e Minayo (1999).

A primeira divisão histórica que aconteceu no território brasileiro foi em

1534, no período das Capitanias Hereditárias, organizada pela Coroa

Portuguesa. Esta primeira divisão correspondia a quinze faixas de terra. A

administração das terras era de responsabilidade dos donatários38 que deveriam

governá-las e promover o seu desenvolvimento. Desse período, das quinze

capitanias existentes, as que prosperaram foram apenas a de São Vicente e a

de Pernambuco. Em 1549, diante dos fracassos nas Capitanias, o rei de Portugal

criou um novo sistema administrativo para o Brasil, o Governo Geral. Este

governo seria centralizador, cabendo a um único governador as funções antes

atribuídas aos 15 donatários.

No século XX, em 1913, aconteceu a configuração territorial que se

aproxima da que contemplamos atualmente. O que seriam as regiões foram na

38 Título utilizado na época da colônia portuguesa conferido a alguém de confiança do rei para a administração de determinado território, com intuito de desenvolvê-lo através da exploração de seus recursos.

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época chamadas de “brasis”. Logo, o território estava dividido em cinco brasis.

Eram assim chamados: Brasil Setentrional ou Amazônico, Brasil Norte - Oriental,

Brasil Oriental, Brasil Meridional e Brasil Central. Esta divisão foi

organizada por Delgado de Carvalho (geógrafo e professor francês enraizado no

Brasil), como resultado da Proclamação da República em 1888. Era necessário

fortalecer a imagem do Brasil como uma nação organizada.

Com a criação do IBGE em 1936, o Governo brasileiro teve que escolher,

em 1938, uma divisão concreta para fazer o Anuário Estatístico do Brasil (AEB);

um documento que continha informações sobre a população, o território e outros

dados referentes ao desenvolvimento da economia do país. Somente em 1940

aconteceu a nomenclatura das regiões que se aproximam das atuais. Eram as

seguintes: Sul, Leste, Centro, Norte e Nordeste.

Em 1942, com a exploração e o desenvolvimento de novas áreas, houve

acréscimos ao mapa brasileiro. Um dos acréscimos foi a do Arquipélago de

Fernando de Noronha à região Nordeste, estado de Pernambuco. Para melhor

atender as exigências da extensão territorial do país, em 1945, o Brasil estava

com sete regiões: Norte, Nordeste Ocidental, Nordeste Oriental, Leste

Setentrional, Leste Meridional, Centro-Oeste e Sul. Pensando num melhor

progresso capitalista e no desenvolvimento das regiões, em 1969, o número de

regiões diminuiu de sete para cinco. Somente no final da década de 1980

encontramos a configuração que perdura até hoje.

A partir da concepção do Brasil como portador de uma pluralidade cultural

marcante, Dantas (2011) propôs uma nova alteração no mapa que o deixará

dividido em seis macrorregiões. Nesta proposta, a Região Norte seria dividida,

de modo que os estados do Amazonas, Acre, Rondônia e Roraima - comporiam

a Região Noroeste. À Região Norte, seria agregado o estado do Maranhão que

até então pertence à Região Nordeste. Os critérios para a nova configuração do

território a partir das regiões baseiam-se principalmente em aspectos culturais e

políticos, mas contornam também aspectos econômicos, administrativos e

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sociais, uma vez que os estados da nova região compõem um vetor regional

comum.

Nosso artigo, portanto tem por estruturantes além da introdução, onde

abordamos historicamente as divisões territoriais ocorridas no Brasil, desde as

Capitanias Hereditárias á última alteração, no final do século XX; uma

contextualização que narra à situação atual dos estados emergentes. O segundo

tópico caracteriza os aspectos culturais das regiões; e o terceiro, enfatiza os

aspectos políticos do país por meio de um resgate histórico. As considerações

confirmam a ideia da nova divisão a partir do envolvimento da educação

nacional.

BRASIL E SUA DIVISÃO TERRITORIAL: UMA CONTEXTUALIZAÇÃO

Investigando de forma minuciosa as diversas transformações dentro do

território brasileiro, Santos (2011) traz considerações relevantes, que nos

proporcionam compreender as mudanças ocorridas nas décadas de 1980 e

1990, e que refletem atualmente. Sobre educação e saúde, diz: “Educação e

saúde vêm impor novos ritmos e novos padrões à sociedade brasileira

contemporânea. Isso, em todas as regiões do país” (SANTOS, 2011, p. 229-

231). O intuito do teórico é mover-nos a pensar que o Brasil de antes, não é o de

hoje e que assim como em educação e saúde, avançamos consideravelmente,

outras áreas precisam ser contornadas.

Há, no estado do Tocantins uma realidade diferente da dos demais

estados do solo brasileiros. Devido à extensão do Rio Tocantins, os limites

territoriais do estado se encontram comprometidos com Goiás e Mato Grosso.

No Tocantins, menos de 20% de suas fronteiras se encontram dentro do

padrão de sua própria região. Dessa forma, os limites territoriais que

compreendem espaços de terra, são apenas os que fazem fronteira com o

estado do Pará e com o estado do Maranhão.

Além disso, ainda neste estado, por uma análise de fluxos e redes capaz

de determinar o grau de coesão das unidades administrativas dentro da região,

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observa-se que o estado mantém fortes laços administrativos e comerciais com

o Pará e com o Maranhão. Na nova proposta de divisão, o Tocantins, estaria

junto do Maranhão (até então, pertencente ao Nordeste), podendo aprimorar

suas estruturas culturais, políticas, econômicas e administrativas.

Figura nº 1. Projeção da proposta de mudança macrorregional no mapa

Brasileiro.

A Região Norte, mesmo que não expressa juridicamente, na prática, se

divide unicamente em duas porções polarizadas por Manaus – AM e Belém –

PA. Em Belém, capital do estado do Pará, acontece à polarização de toda a

porção leste da região Norte. Separando as duas potências, possivelmente

haveria um incentivo e ao mesmo tempo, necessidade para o desenvolvimento

das demais capitais. Consequentemente, seus respectivos estados. No

Nordeste, o Maranhão apresenta características naturais e culturais

diferenciadas dos outros oito estados que compõem a região.

Dessa forma, entendemos que se anuncia uma proposta de equilíbrio nas

unidades mais afetadas. O geógrafo Cazzolato (2011), propõe e defende a

revisão da atual divisão macrorregional. Para ele, “a melhor solução seria a

formação da região Noroeste e a reconfiguração das regiões Norte e Nordeste.

Ajustada à realidade dos fluxos geográficos, econômicos, políticos e

demográficos, a divisão regional é um instrumento privilegiado de planejamento

e ação governamental” (CAZZOLATO, 2011, p.72). Além dos aspectos

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apresentados pelo geógrafo – econômicos, políticos e demográficos –

acreditamos que os aspectos culturais serão fortemente afetados. No tópico

seguinte, confirmamos esta posição, destacando a importância de preservar os

aspectos culturais das macrorregiões brasileiras.

DIVERSIDADE CULTURAL: BRASIL, CHÃO AGREGADOR DE MUITOS

POVOS

O Brasil reconhece, em sua Constituição Federal a pluralidade de

culturas. A partir disso é sabido que, apresentando heterogeneidade notável, em

sua composição populacional, o Brasil desconhece parte de si mesmo. No país

é comum prevalecerem estereótipos, tanto regionais, como relacionados a

grupos éticos, sociais e, sobretudo, culturais.

Em que pese essa pluralidade, vivemos uma forte referência monocultural

em nossas escolas, considerando que conhecemos mais, parte da cultura

exterior, em relação à nossa. A grandiosidade geográfica do Brasil favorece este

desconhecimento. A nova divisão macrorregional por sua vez, contornaria uma

realidade diferente, considerando a aproximação das culturas. Não

pretendemos, com a nova divisão geográfica, homogeneizar as culturas.

Diferente do que afirmam alguns pesquisadores, que acreditam no

estabelecimento de uma homogeneização da cultura, do sistema de valores, a

partir da globalização.

Percebemos que muitas pessoas que residem em Pernambuco,

desconhecem os traços culturais do Maranhão, apesar de ser uma mesma

região (Nordeste). Do mesmo modo, muitos que localizam-se no Acre,

desconhecem a cultura do Tocantins, embora também, estejam numa mesma

região (Norte). Amenizar estas lacunas é uma de nossas reflexões a partir da

nova configuração do mapa. Com uma nova macrorregião poderíamos ampliar

o conhecimento dos aspectos culturais dos povos residentes nas áreas que

serão afetadas.

O sociólogo brasileiro Renato Ortiz (1994) afirma que existe uma cultura

mundializada que se expressa na emersão de uma identidade cultural popular,

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cujos signos estariam dispersos pelo mundo; no nosso caso, pelo Brasil. É

lamentável que tanta riqueza cultural – sobretudo, nas regiões Norte e Nordeste

–, por vezes, passem despercebidas e desconhecidas em estados próximos.

Estreitando os laços culturais, poderíamos resgatar grande parte dessas culturas

e até seria possível envolvê-las nas práticas religiosas, culinárias, artesanais e

festivas de cada estado, tendo em vista uma ligação maior entre os mesmos; isto

seria possível a partir da nova divisão geográfica. As regiões Sul, Sudeste e

Centro-Oeste já vivem esta experiência cultural. Além da cultura, seria

configurado no Brasil um meio existencial técnico-científico, “no qual a

construção ou reconstrução do espaço geográfico se dará com um conteúdo de

ciência e de técnica”. (SANTOS, 1991, p. 11).

ASPECTOS POLÍTICOS QUE TECEM HISTÓRIA

Ao compreender as Capitanias Hereditárias, como início da demarcação

do espaço geográfico brasileiro, voltamos nossa atenção para a os anos de 1534

a 1536, quando D. João III, Rei de Portugal, resolveu dividir as terras recém

descobertas, em faixas. As enormes faixas de terra foram confiadas aos

donatários. Devemos reconhecer que as dificuldades de administração das

capitanias eram inúmeras. Houve dificuldades quanto à falta de recursos que

favorecessem boa economia.

Hoje, enxergamos um Brasil cuja política não é centralizadora como nas

Capitanias, nem como no Governo Geral. Temos um Brasil com vasto território

para mostrar que cada “pedaço autônomo de chão” faz parte de uma República

de grandes conquistas. Em 1943, do grande território foram desmembrados seis

estados estratégicos na fronteira com outros países, com a finalidade de uma

administração melhor. Dentre os seis, três tornaram-se estados com políticas

autônomas: Roraima, Rondônia e Amapá. Já em 1960, um território menor foi

desmembrado de Goiás, para sediar a nova capital, Brasília. O que era o antigo

Distrito Federal tornou-se o Rio de Janeiro. Muito desenvolvimento passou a

existir ali, favorecendo a criação de um estado produtivo e de estimadas

riquezas. Em 1977 a região sul do Mato Grosso foi desmembrada da totalidade,

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passando a nominar-se Mato Grosso do Sul. Com a criação do Tocantins, a

Constituição de 1988 deixou a estrutura como é hoje.

Também na política, a contribuição de Milton Santos é ampla. Ele afirma

que “quem se globaliza mesmo são as pessoas” (SANTOS, 1993, p.16). A partir

deste comentário, nos dá pistas de como conduzir uma reflexão sobre a

globalização em seu aspecto político. Para Santos, “o espaço geográfico é uma

funcionalidade da globalização”. (SANTOS 1994, p. 48). Ele vai ser produzido de

acordo com as demandas de quem o idealiza, para permitir fluir suas

necessidades. O espaço político, portanto, viabiliza a globalização.

Apesar de uma estrutura aparentemente equilibrada, faz-se necessária

agora, para uma verdadeira globalização, uma nova configuração no mapa, de

modo que as maiores necessidades emergentes, sobretudo da Região Norte,

venham a ser contornadas. Conforme Santos, “a construção ou reconstrução do

espaço se dará com um conteúdo de ciência e de técnica" (SANTOS, 1991,

p.11). A política que, outrora no século XX, dividiu o Brasil nas porções

autônomas de terra que temos presentes nos 26 estados que enumeramos,

necessita agora, sob um olhar reflexivo, promover uma nova forma de garantir

melhores condições de vida e desenvolvimento para os estados, em situação

desequilibrada política, territorial e culturalmente.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Dantas (2011) em sua proposta, visando a nova divisão macrorregional

no mapa brasileiro, diferente do que possa-se pensar, não quer ser contrário à

globalização. O geógrafo brasileiro estaria mais preocupado em construir um

sistema teórico que permitiria elaborar outra maneira de congregar pessoas em

escala nacional: Macrorregião Noroeste.

Desde 2003 está em discussão e em diferentes estágios de tramitação no

Congresso Nacional, a proposta da criação de 18 novos estados, no nosso

território, que consequentemente, elevaria o Brasil a um total de quarenta e cinco

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(45) unidades federativas. O Brasil não necessita ser, no momento, “retalhado”

para amenizar suas carências políticas, culturais, territoriais e administrativas. A

criação de uma nova macrorregião poderia, na visão atual, contornar as

situações que consideramos mais gritantes, levando em conta os aspectos já

citados. Sobre a criação das novas unidades, vale à pena considerar que os

argumentos desfavoráveis à criação destas se concentram nos altos custos que

abrangeriam.

Tratar do desenvolvimento, de globalização, de um Brasil com

características em processo de desenvolvimento, requer mudanças que sejam

significativas. Santos (1996) entende que o desenvolvimento desigual é

combinado e é resultado de "uma ordem, cuja inteligência é apenas mediante o

processo de totalização, isto é, o processo de transformação de uma totalidade

em outra totalidade" (SANTOS, 1996, p.101). Como seguimos com perspectivas

em uma outra linha de pensameno, cogitamos um desenvolvimento visível a

partir da nova divisão macrorregional.

A experiência de macrorregiões com menos estados, como no caso do

Sul, Sudeste e Centro-Oeste, tem promovido uma maior concentração de

riquezas, tanto no sentido produtivo capitalista, como no cultural. Amenizar as

estruturas de concentração de muitas estados – Região Nordeste com 9 estados

e Região Norte com 7 – possivelmente, seria, no momento, a melhor forma que

dispomos para apresentar melhores condições que nos dirijam a um Brasil que,

além de tamanho geográfico, diferencia-se por qualidade.

REFERÊNCIAS

ANDRÉ, Marli Eliza Dalmazo Afonso de. Texto, contexto e significados: algumas questões na análise de dados qualitativos. Cadernos de Pesquisa. São Paulo, n. 45, p. 66-71, maio, 1983.

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O conceito de liberdade na explicitação da autonomia da vontade segundo a Fundamentação da Metafísica

dos Costumes de Kant

Eduardo Victor Silva Rocha Nalfran Benvinda Modesto**

RESUMO: Kant em sua fundamentação moral, elenca a liberdade como sendo o eixo norteador da boa vontade, que para este filosofo, nada mais é do que o efetivo uso da razão, tornando o homem autônomo e livre de inclinações. O Imperativocategórico é dado como lei universal guiada pela razão humana. Para Kant, temos que agir de modo tal, que o nosso agir se torne uma máxima universal que possa ser utilizada por qualquer homem em qualquer tempo e lugar. Agindo desta forma somos guiados pela boa vontade, dissipando nossas inclinações pessoais. Esta moral é sediada na razão humana, ou seja, é no pleno exercício da faculdade racional que cada indivíduo pode construir juízos de valores e como a razão é comum a todos os homens, aí está sua universalidade. Neste ponto Kant inaugura uma nova forma de pensar a moral humana e faz uma inversão, pois antes dele, o fundamento moral estava nas práticas humanas que tendiam à virtude. O homem moral era o homem que cultivava as boas virtudes e para os gregos a prudência era o liame para alcançar o cultivo destas virtudes.

Palavras-Chave: Ética. Liberdade. Dever. Inclinações.

INTRODUÇÃO

A ética é a parte da filosofia que trata das justificações ou fundamentações

das ações humanas, que são constitucionalizadas por sistemas legislativos

pelos quais as sociedades institucionalizam e delimitam os atos humanos

através das leis. As tradições elementares de um povo também estão no campo

da moral e da ética, mesmo que estas tradições ainda não sejam instituídas

como leis, mas podem vir a serem visibilizadas como tal, depois de serem

Graduando em Filosofia pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Caruaru. [email protected] ** (orientador) Mestre em Filosofia Pela UFPE.

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analisadas e passarem pelo crivo da moralidade constituído naquela cultura. Por

isso a parte da Filosofia que se dedica aos aspectos éticos é de extrema

importância para pensarmos as bases edificantes de uma sociedade

politicamente organizada.

Este presente artigo traz o tema da ética investigado pelo filosofo Alemão

Immanuel Kant e tem relevante importância para a moral popular, pois questiona

a formatação de tal moral e tenta destituir os argumentos utilizados em vista do

bem como fim ultimo da moral. “Na ordem prática, assentando toda a vida moral

não mais sobre o bem, mas sobre a pura forma do dever, [...]” 39Não baseando-

se apenas nos dados empíricos, mas nas formas a priori do conhecimento

humano. Kant não pretende fundamentar seu sistema moral apenas em vista da

felicidade do homem, mas sim constituí-lo de forma segura sobre bases firmes,

esta estabilidade Kant encontra na razão de forma pura e universal. Toda a

tradição filosófica tentou trabalhar este tema por viés diferente de Kant.

Aristóteles, por exemplo, na Filosofia Clássica traz a moral no campo das ações

justas que visam à felicidade baseando-se no cultivo das virtudes em vista do

equilíbrio dos vícios. Na idade medieval o Filosofo Tomás de Aquino também se

debruça sobre uma moral propriamente cristã, mas com bases também nos

escritos recém descobertos de Aristóteles conservados pelos Árabes até serem

redescobertos pelo ocidente.

Este trabalho visa interpelar e investigara constituição conceitual acerca

do tema da ética sobre as posições do filosofo Kant em suas pesquisas que

tentaram viabilizar a possibilidade de construção de uma lei universal destituída

de qualquer inclinação pessoal, ou seja, uma lei pura, advinda da razão. Esta

pretensão do filosofo está exposta nos argumentos desenvolvidos na obra

intitulada Fundamentação da Metafísica dos Costumes onde Kant traz diversos

questionamentos a cerca da moral, entre eles estão os conceitos de dever,

autonomia da vontade, liberdade, boa vontade, que neste artigo vamos tentar

39 MARITAIN, Jacques. A Filosofia Moral. Rio de Janeiro: Ed. AGIR, 1973. p. 118

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explaná-los e junto ao autor instigar uma reflexão sobre os conceitos a priori e a

posterioridade moral.

Este trabalho como aqui já foi posto, trata da obra intitulada

Fundamentação da Metafísica dos Costumes de autoria do filosofo Immanuel

Kant. Em suas três partes, Kant se debruça sobre diversos aspectos da moral.

Na sua primeira seção o filosofo traça uma reflexão sobre os aspectos do

conhecimento moral vulgar e sua transição para um conhecimento voltado para

o conceito metafísico, ou seja, uma tentativa de discutir e conceituar

filosoficamente a moral humana; Na segunda seção Kant faz a efetiva tentativa

de transição de uma moral popular para uma moral fundamentada na

conceituação metafísica de uma razão pura que justifique a elaboração de uma

lei plenamente universal, pois está deve ser fundada sobre a razão mais pura,

desconstituída de qualquer inclinação pessoal; Na terceira seção a obra toma o

encaminhamento relacional entre a moral efetivada na metafísica dos costumes

para a implantação da Crítica da Razão pura prática delimitando o caráter

universal de sua teoria moral.

PRIMEIRA SEÇÃO:

TRANSIÇÃO DO CONHECIMENTO MORAL DA RAZÃO VULGAR PARA O

CONHECIMENTO FILOSÓFICO

A autonomia da vontade imbuída de sua plena efetivação de liberdade é

a sublimação intuitiva da boa vontade que influi no querer humano tornando-o

livre. Ao abordar estes aspectos éticos de autonomia da vontade, liberdade, boa

vontade, dever e etc. Kant introduzem novos horizontes para a discussão ética,

pautada em uma prática fundamentada numa razão pura. A constituição de um

caráter tem necessariamente de ser bom, enquanto pressuposto de uma prática

universal. O bom deve necessariamente ser anteposto ao caráter para que este

tenha uma intuição livre de inclinações e construa uma conduta moral pura, não

determinada por inclinações. Esta conduta moral deve ser entendida como lei

universal, pois deve guiar qualquer homem em suas ações constituindo o seu

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caráter. Como nos mostra Kant em sua célebre frase contida na obra que trata

este artigo. “Devo proceder sempre de maneira que eu possa querer também

que a minha máxima se torne uma lei universal”.40

A máxima deve ser entendida como dever pautado na boa vontade que

constitui o caráter do homem livre e que deve servir como base para a

constituição de uma lei universal. O homem é livre quando tem como princípio a

boa vontade auxiliando o homem a tomar decisões de caráter estritamente ético,

pois estas ações devem consistir desprovidas de inclinações, desta maneira, o

homem que agi segundo suas inclinações pessoais não pode ser considerado

um homem de ações livres, e mais ainda, um homem de caráter puramente ético.

A boa vontade deve ser entendida como constituída em si mesma, pois não se

pode julgá-la em contrapartida das ações dos indivíduos, mas tão somente da

pura e simples razão de uma metafísica voltada ao querer. O querer humano,

levando em conta a boa vontade, deve ser analisado não como uma prática da

moral, mas tão somente como uma análise do princípio ético do querer humano.

O conceito de inclinação tematizado na moral formulada por Kant indica

uma alta complexidade nas relações humanas, pois parece visível que todos os

homens façam, mesmo nas ações boas, ações condicionadas de uma inclinação

pessoal. Se os homens fossem guiados por um dever desprovido de qualquer

interesse pessoal, estes estariam sendo guiados por um caráter constituído de

uma intenção pura, sem inclinações. Desta maneira, o próprio Kant nos indica

na Fundamentação da Metafísica dos Costumes a maneira do homem ético agir.

“praticasse a ação sem qualquer inclinação, simplesmente por dever, só então é

que ela teria o seu autêntico valor moral”.41O fazer o bem neste contexto ético

de Kant, seria agir conforme o dever desprendido de qualquer inclinação pessoal

que lhe conferisse uma intenção particular, neste contexto o agir deve ser tão e

simplesmente pelo dever, produto da boa vontade.

40 KANT, Immanuel. Fundamentação da Metafísica dos Costumes. Lisboa: Ed. 70, 2007. p. 33. 41 Idem, p. 28.

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Assegurar a felicidade é uma busca aparentemente justa e moral, mas

levando em consideração as intenções pessoais que determinam as inclinações

do homem, pode-se chegar à possibilidade de transgredir o dever para o fim de

uma felicidade humana. O dever é necessariamente agir guiado não pela

satisfação pessoal, mas em conseguir não fazer o que sua vontade lhe inclina e

ínsita a fazer, deixando de lado a satisfação e por outro lado à felicidade tão

desejada e pretendida pelo homem. Estas ações do homem pautadas no dever

devem ser guiadas pelo simples agir segundo um dever moralmente desprovido

de uma satisfação pessoal para uma lei universalmente reconhecida por todos

os homens. O dever deve constituir a felicidade, pois somente o homem de uma

moral pura e livre é feliz seguindo suas ações pelo dever intuído pela boa

vontade e desprovido de qualquer declínio pessoal que deturpe a intenção livre

do homem guiado por uma moral pura.Notemos então que a intenção moral e o

fim para a felicidade podem coincidir para a mesma ação, desta forma o homem

agiu moralmente e tende para a felicidade. É quando o homem age pelo dever e

conforme o dever.

O querer agir conforme uma lei universal formulada pela subjetividade

humana implica determinar como uma lei pode ser gestada sem o consentimento

de uma vontade impetrada das nossas inclinações pessoais, desta maneira, o

fato de o homem agir determinado por essa lei universal indica um respeito

vinculado à máxima universal. A subjetividade humana guiada pela razão pode

edificar este respeito e produzir atitudes morais desvinculadas das

determinações às quais todos os homens estão sujeitos. Os efeitos desta lei em

detrimento das causas é o que deve ser observado e vinculado à lei subjetiva

que impomos sobre nossa capacidade de discernimento, mas sempre se deve

ter em perspectiva que a máxima universal deve ser desprovida de toda e

qualquer inclinação e elevando sua aplicabilidade a todos os seres racionais.

O dever é um aspecto moral fundamentado numa subjetividade relativa à

intenção pessoal da qual o homem tem capacidade de discernir. Este dever deve

ser para o indivíduo que age moralmente, uma lei que leve em consideração o

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sentido puro do agir humano, desta maneira, deve-se ponderar todas as

possibilidades de consequências que as minhas ações poderão me advir

posteriormente, e não me abster delas, mas agir conforme o dever e não me

furtar de agir moralmente em detrimento dos possíveis medos e consequências

advindas das minhas atitudes conforme o princípio do dever. A máxima é a

elevação da minha ação a uma lei universal que pode ser pretendida e praticada

por todos os seres racionais, pois tem o seu valor em si mesma, desta forma,

esta lei deve ser sublimada como guia das ações humanas em geral, mesmo

que parta da subjetividade íntima de um indivíduo, sem que este leve em

consideração suas inclinações pessoais.

Os homens dotados de senso comum utilizam as experiências como

distinção entre o que é bom e o que é mau, desta maneira a moral dos homens

é constituída de uma razão prática. O homem tem em si uma efetivação da

subjetividade que está voltada para as ações morais, desta maneira é o próprio

homem que pode discernir o que é moral. “[...] o conhecimento daquilo que cada

homem deve fazer e, por conseguinte saber, é também pertença de cada

homem, mesmo do mais vulgar”.42Mesmo se utilizando da prática para edificar

leis particulares, os homens precisão abstrair seus conceitos para uma melhor

correspondência das adequações de suas leis em relação as suas ações.

SEGUNDA SEÇÃO:

TRANSIÇÃO DA FILOSOFIA MORAL POPULAR PARA A METAFÍSICA DOS

COSTUMES

O conceito de dever estar fundado no agir humano, mas seu fundamento

está determinado no campo metafísico, pois o conceito, que é abstrato, se

materializa nos exemplos empíricos. A causa determinante da vontade que está

imbuída de amor-próprio e está voltada para a vontade que é subjetiva e impele

um dever que é constituído de uma moral propriamente particular, determina que

42 Idem, p. 36.

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por esta causa propriamente particular não se pode chegar a uma análise total,

pois nem o próprio indivíduo pode penetrar nas suas intenções mais íntimas,

porque o que determina seus atos está na esfera mais inconsciente de suas

inclinações pessoais, moralmente aceitas para aquele indivíduo.

A virtude em busca da felicidade pode constituir uma moral construída

com o fim de satisfazer um amor-próprio, desta maneira, a dúvida da pura

construção de uma moral em vistas da felicidade parece não está conforme uma

lei pura e verdadeira, universalmente útil. O que determina tais ações em si é a

razão à qual é o crivo da moral subjetiva que previamente ordena todas as

intenções humanas. Desta forma fica em aberto questionamentos acerca da

construção de uma máxima universalmente reconhecida partindo de exemplos

empíricos forjados pela razão humana, já que esta não pode ser desprovida de

inclinações.

[...] “E como é que as leis da determinação da nossa vontade hão de serem consideradas como leis da determinação da vontade de um ser racional em geral, e só como tais consideradas também para a nossa vontade, se elas forem apenas empíricas e não tirarem a sua origem plenamente a priori da razão pura, mas ao mesmo tempo prática?” 43

A razão humana é guia para justificar as nossas ações do cotidiano, pois

o que iremos fazer, antes mesmo que executemos, consultou nossa razão para

determinar se tal ato é moralmente aceitável. A razão, pois, é a verdadeira

origem da moral humana, os atos são exemplos empíricos das determinações

deste princípio intuitivo humano entendido como racionalmente eficaz. A

determinação de uma moral verdadeiramente pura em si, deve ser constituída

numa razão aprimore determinada como pura. A razão pura é pretendida como

o campo livre para que o homem fundamente toda sua moral, desprovido de

qualquer determinismo que influencie sua moral e assim construa um autêntico

princípio moral e sublime da sua prática baseando-se neste mesmo princípio.

“[...] é sem dúvida muito louvável, contanto que se tenha começado por subir até

43 Idem, p.42.

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aos princípios da razão pura e se tenha alcançado plena satisfação neste ponto;

isto significaria primeiro o fundamento da doutrina // dos costumes na

metafísica”.44

A vontade livre é a plena efetivação de liberdade que o homem pode se

utilizar para se distanciar dos seus impulsos e fazer não o que eles determinam,

mas sim o contrário. Este conceito de vontade livre é formulado pela razão e

guiado por ela, desta maneira o que determina nossas ações morais mais puras,

não é a observação dos exemplos, mas sim a formulação de princípios a priore

que a razão pura formula em prol da vontade livre. Uma lei baseada na liberdade

é justamente determinar o homem para não seguir suas inclinações

deliberadamente, mas sim fazer aquilo aos quais suas inclinações não querem

fazer, ou seja, fazer aquilo que não quero, desta maneira o individuo vai ser livre

para formular leis universalmente reconhecíveis e para isso se utilizando apenas

da razão mais pura da subjetividade humana.

Será que pela natureza racional podemos chegar aos conceitos mais

puros da moralidade humana? Estes questionamentos devem ser feitos em

contrapartida das investigações da moralidade em detrimento da metafísica dos

costumes e em contrapeso a uma prática efetivamente empírica. O

desprendimento do empírico deve ser entendido como a necessidade de se

lançar no campo da abstração para chegar a uma metafísica que determine os

conceitos intuitivos de uma moralidade pura, ou seja, é se debruçar sobre os

conceitos a priore para fundamentar os princípios da moralidade e desta maneira

criar subsídios que podem servir abstratamente para julgo pessoal do homem e

imbuído desta capacidade racional criar leis universalmente reconhecidas. Desta

maneira o homem pode contribuir para com os questionamentos provenientes

de uma prática popular da moralidade humana. A razão humana é essa

possibilidade de liberdade para conceituar e fundamentar uma moral desprovida

de todas as influências empíricas das ações humanas, nesta reflexão que a

44Ibidem, p. 43.

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razão faz sobre si, há a tentativa de clarear a razão para edificar uma metafísica

dos costumes em relação ao conceito mais puro de dever.

[...] mas duma filosofia popular, que não passa além do ponto onde pode chegar às apalpadelas por meio de exemplos, até a metafísica (que não se deixa deter por nada de empírico e que, devendo medir todo o conteúdo do conhecimento racional deste gênero, se eleva em todo o caso até as ideias, onde mesmo os exemplos nos abandonam), temos nós de seguir e descrever clara-mente a faculdade prática da razão, partindo das suas regras universais de determinação, até ao ponto em que dela brota o conceito de dever.45

Os seres racionais tendem para a capacidade de formularem leis pela

razão, as leis são formuladas segundo certos princípios, ou seja, segundo a

representação das leis. Só os homens dotados de pleno exercício racional são

guiados por essa vontade que nada mais é que a razão prática. A razão faz a

distinção do que é realmente necessário para as escolhas do homem. A vontade

é a capacidade do homem de escolha, delimitado pela razão que determina o

que é bom.

Se o homem em suas vontades não é deliberado pela sua razão, ou seja,

tende a inclinações e a determinismos, este objetivamente não agi de maneira

totalmente livre, mas sim por obrigação. Essa obrigação determina a vontade,

mesmo que essa seja observável pela razão.

O conceito de mandamento é instituído por Kant como sendo princípio

obrigante para uma vontade, enquanto que a fórmula do mandamento é

denominada por imperativo. O dever é explanado pelo imperativo que

relativamente não é uma obrigação deliberada pela razão, considerando a

influência subjetiva existente nos homens, mas as práticas humanas estão

ligadas ao fazer porque é delimitado com valor de bom, demarcados pela

representação da razão que os determinam. O agradável é diverso do bom,

levando em consideração que o agradável é experimentado pelos sentidos, que

45Idem,p. 47.

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é distinto do processo racional, que pode ser estabelecido como prática universal

tornando-se princípio ou mandamento. (pag. 49 – 1º parágrafo)

TERCEIRA SEÇÃO:

TRANSIÇÃO DA METAFÍSICA DOS COSTUMES PARA A CRÍTICA DA RAZÃO

PRÁTICA PURA

A liberdade dentro do sistema moral do filosofo prussiano, indica a

extrema ligação e dependência da causalidade com o conceito de autonomia da

vontade, interligando e buscando o fundamento do conceito de vontade, ou seja,

todos os seres racionais agem pela sua própria vontade, tendo a liberdade como

possibilidade racional universal, sendo esta delimitadora e norteadora das

influências no agir humano. A ética proposta por Kant tem a liberdade como

pressuposta do agir moral conforme a boa vontade. Ora, não existe agir sem o

pressuposto da liberdade, a não ser que a coação seja impetrada como força

implicante a um agir determinado. A liberdade é o cerne que gera vontade, sendo

esta, causa própria de si mesma, pois opera efetivamente determinando

posicionamento e consequentemente agir conforme a causa que lhe deu

fundamento. “A vontade é, em todas as ações, uma lei para si mesma»,

caracteriza apenas o princípio de não agir segundo nenhuma outra máxima que

não seja aquela que possa ter-se a si mesma por objeto como lei universal. ”46A

máxima elencada pela moral kantiana é determinada a operar conforme

deliberação fundamental de uma lei que seja respaldada no âmbito do agir

configurado universalmente possível, sendo este agir consignado como

possibilidade a todo ser possuidor de racionalidade.

A moral universalmente reclamada por Kant em sua teoria ética imprime

nos indivíduos dotados de razão o seu caráter universal, pois que, se a moral é

construída por seres racionais, esta deve se estender a todos os seres dotados

desta mesma racionalidade. “Pois como a moralidade // nos serve de lei somente

46KANT, Immanuel. Fundamentação da Metafísica dos Costumes. Lisboa: Ed. 70, 2007. p. 94

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enquanto somos seres racionais, tem ela que valer também para todos os seres

racionais;” 47Efetiva-se assim o fundamento do caráter universal da moral da boa

vontade, pois todo homem que delibera suas ações intuídas pela razão que lhe

é própria, agi com eficiente capacidade que todos os outros homens são

dispostos pela lei racional que é inerente a todos. A liberdade determina a

vontade, mas a liberdade só pode ser demonstrada na vontade, que emerge

como que delimitação à propriedade da liberdade inspirando as ações morais

conforme sua própria vontade. “Ela tem de considerar-se a si mesma como

autora dos seus princípios, independentemente de influências estranhas;” 48

delimitando a liberdade como guia indispensável, proporcionando fidelidade à

sua própria autonomia. “[...], por conseguinte, como razão prática ou como

vontade de um ser racional, tem de considerar-se a si mesma como livre;” 49 A

propriedade desta idéia de liberdade pelos indivíduos só pode ser fundada numa

vontade plenamente livre, portando o caráter de liberdade deve ser destituído de

qualquer inclinação, para que a ação seja considerada por excelência.

RESULTADOS

O fundamento pelo qual a teoria moral kantiana elenca como possibilidade

de estabelecimento de uma premissa fundante, é a liberdade, esta enquanto

visualização subjetiva a priori, estabelece o liame pelo qual o indivíduo deve

pautar-se exclusivamente como pressuposto de uma ação moral por excelência

e universalmente reconhecível. Sendo o fenômeno a possibilidade inerente a

visualização das ações como incipientes aos sentidos e ao entendimento,

pertencendo à visibilidade subjetiva, a qual não caracteriza a coisa como sendo

ela mesma em si, mas sim apenas como fenômeno. “[...] e clareza que o

entendimento possa acrescentar, senão somente ao conhecimento dos

fenómenos, e nunca ao das coisas em si mesmas.” 50Pois as coisas em si,

47KANT, Immanuel. Fundamentação da Metafísica dos Costumes. Lisboa: Ed. 70, 2007. p. 95 48KANT, Immanuel. Fundamentação da Metafísica dos Costumes. Lisboa: Ed. 70, 2007. p. 96 49KANT, Immanuel. Fundamentação da Metafísica dos Costumes. Lisboa: Ed. 70, 2007. p. 96 50KANT, Immanuel. Fundamentação da Metafísica dos Costumes. Lisboa: Ed. 70, 2007. p. 99

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segundo Kant, não podem ter o esclarecimento destas como possibilidade

totalmente exigível, sendo possível ao homem apenas conhecer aquilo que

estritamente lhe afeta.

REFERÊNCIAS

MARITAIN, Jacques. A Filosofia Moral. Rio de Janeiro: Ed. AGIR, 1973.

KANT, Immanuel. Fundamentação da Metafísica dos Costumes. Lisboa: Ed.

70, 2007.

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Os adolescentes e suas ideologias no mundo político: um estudo a partir do olhar dos adolescentes entre 16 e

18 anos

Lucas Iago Bezerra Monteiro

Steffane Katarine Neves de Oliveira Cirana Vasconcelos

Maria Joselma Franco Valdenice Maria Pereira Cavalcanti

Resumo: O estudo em desenvolvimento tem como objetivo “Os adolescentes e suas ideologias no contexto político”. A curiosidade em torno do tema se dá pelo nível de insatisfação que a sociedade civil apresenta em relação às atitudes dos nossos representantes políticos, sobretudo os adolescentes. Coordenado pela equipe da Iniciação Científica do Colégio Diocesano de Caruaru no período de fevereiro a novembro de 2014, no município de Caruaru-PE. Composto por duas professoras, uma estagiária de graduação e os alunos do ensino médio, o estudo tem como objetivo geral: Analisar e traçar a concepção dos adolescentes a respeito do perfil dos políticos que apresentam mudanças de atitudes, quando assumem o cargo. Como objetivos específicos temos: Identificar o sentimento dos adolescentes ao comportamento dos políticos no poder; Analisar o posicionamento dos eleitores, quanto às atitudes dos políticos em relação à política de governo apresentada; Apresentar o posicionamento dos eleitores sobre candidatos eleitos. Para realização da pesquisa foi necessário, encontros semanais para a elaboração do projeto, estudos teóricos, preparação do instrumento e tratamento dos dados. Os teóricos com os quais dialogamos são: Divergir (1970), Mainwaring (1991), Katz (et. al 2001) abordam que a influência do partido no processo de seleção de candidatos varia conforme o tipo de sistema eleitoral e a estrutura de autoridade partidária.O procedimento metodológico adotado foi o questionário fechado e aberto. Os dados foram coletados em uma escola particular de Caruaru com adolescente a partir dos 16 anos que possuem o título de eleitor. O resultado parcial do nosso questionário revela a descrença dos adolescentes nas propostas dos políticos, mas mesmo assim os adolescentes acreditam que o país pode melhorar através de uma boa administração política. As conclusões estão sendo analisadas a partir das informações coletadas pelo questionário. Tendo como considerações parciais 32 alunos entrevistados. Os dados estão fase de tratamentos e pretendemos apresentá-los no evento.

Palavras chave: Política; Adolescentes; Ideologia

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INTRODUÇÃO

A política é uma atividade orientada ideologicamente para a tomada de

decisões de um grupo para alcançar determinados objetivos. Também pode ser

definida como sendo o exercício do poder para a resolução de um conflito de

interesses (Bonifacio;2013). Como projeções de um futuro melhor, as utopias

políticas são construídas sempre a partir de algum tipo de insatisfação com as

condições da existência social, presente para se concretizarem e estabelecerem

formas de ruptura com a ordem social.

Historicamente, as utopias políticas se diferenciam pela predominância de

alguns elementos que apontam para a construção de uma sociedade futura às

vezes mais justa às vezes mais pacífica e às vezes mais abundante. Sabe-se

que a corrupção é um fenômeno global com incidência variada, sendo sua

prática geralmente mais difundida e mais sistematicamente enraizada nos

países subdesenvolvidos (ou em desenvolvimento) do que nos países

desenvolvidos.

Segundo Braga e Amaral (Apud, Duverger (1970), Mainwaring (1991),

Katz, Rahat e Hazan (2001); 2013; p. 41), a influência do partido no processo de

seleção de candidatos varia conforme o tipo de sistema eleitoral e a estrutura de

autoridade partidária. De acordo com Francisco Cabral (2014), descreve que:

“Maquiavel procurava fundamentar uma filosofia política tendo em vista a dominação dos homens. Para ele a concepção de história era cíclica e os governos sempre se degeneravam da monarquia à tirania, desta à oligarquia e à aristocracia, que, por sua vez, recaíam na democracia que, enfim, só terá solução com um ditador. Isso acontece (e se repete) porque os seres humanos têm uma essência universal. É o desejo de poder e os vícios a que são acometidos os homens (governantes e seus sucessores) que fazem com que o governo se degenere. Maquiavel acreditava que para chegar ao poder e a sua manutenção vale utilizar qualquer método.”

Segundo Costa (1997; p.144), baseado na teoria de John B. Thompson a

"Ideologia é sentido a serviço do poder, ou seja, estudar ideologia é compreender

e explicar as maneiras pelas quais as formas simbólicas são usadas para a

implantação e para a manutenção de relações de dominação”.

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Prado (2010; p.10), utilizando-se do conceito do livro ideologia alemã,

baseado na teoria de Karl Marx, acredita que a ideologia é uma “consequência

de uma teoria do conhecimento ingênua, ela significa ilusão ideal, figuração

distorcida da realidade, máscara de uma verdade empiricamente evidente”.

Diante desse contexto, o estudo se justifica pela insatisfação que

apresenta a população na atualidade com as atitudes dos representantes

políticos. É importante que a sociedade seja ciente dos limites e contribuições

que os adolescentes oferecem diante as concepções do mundo político.

Mostraremos como os adolescentes sentem-se em relação ao atual momento da

política brasileira.

As ideologias políticas dividem-se em: esquerda política e direita política.

A esquerda política descreve uma visão ou posição específica que aceita ou

suporta igualdade social. Normalmente envolvendo uma preocupação com

os cidadãos que são considerados em desvantagem em relação aos outros e

uma suposição de que há desigualdades injustificadas que devem ser reduzidas

ou abolidas. Já a direita política descreve uma visão ou posição específica que

aceita ou dá suporte à hierarquia social ou desigualdade social.

A hierarquia social e a desigualdade social são vistas por aqueles filiados

à direita como inevitável, natural, normal, ou desejável se surge através de

tradicionais diferenças sociais ou para competição nas economias de

mercado. Mas dependendo do contexto a utilização desses termos pode variar

em função das transformações sofridas em um determinado contexto político.

Os partidários que se colocam contra as ações do regime vigente seriam

entendidos como “de esquerda” e os defensores do governo em vigência

ocupariam a ala “de direita”. Dessa forma, a determinação dos grupos políticos

varia segundo os partidos ou orientação ideológica que controlam o poder

central.

Na perspectiva de responder as inquietações que os debates políticos

propõem, temos como questão problema: Com tantos problemas de corrupções

e decepções das propostas apresentas pelos políticos, será que os adolescentes

acreditam que através da política o país pode melhorar?

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A hipótese levantada é que: conforme aumentam a quantidade de

escândalos de corrupção (seja por desvio de dinheiro, nepotismo, suborno ou

até mesmo o não cumprimento das propostas de campanha), aumenta-se

também o nível de insatisfação, assim como a descrença da população no

âmbito político. Acredita-se que a insatisfação da população com os políticos,

especialmente os adolescentes que apesar de terem pouca vivência com a

política, mas já possuem um enorme descontentamento com a atual política

brasileira, principalmente por perceberem que as propostas dos candidatos não

são realizadas.

Sendo assim, temos como objetivo geral: analisar e traçar a concepção

dos adolescentes a respeito do perfil dos políticos que apresentam mudanças de

atitudes, quando assumem o cargo. Enquanto os objetivos específicos:

Identificar o sentimento dos adolescentes ao comportamento dos políticos no

poder; Analisar o posicionamento dos eleitores, quanto às atitudes dos políticos

em relação à política de governo apresentada; Apresentar o posicionamento dos

eleitores sobre candidatos eleitos.

Portanto, para fundamentação do estudo dialogamos com teóricos,

relacionando com os dados coletados com jovens que possuem título eleitoral

ente 16 e 18 anos de idade da cidade de Caruaru-PE.

MATERIAIS E MÉTODOS

Para estruturação da metodologia foi utilizado um questionário com

perguntas abertas e fechadas, para os alunos do ensino médio de um colégio

particular de Caruaru-PE. Através do questionário coletamos dados do nosso

estudo. Lakatos (2006, p. 203), trata o questionário como: “instrumento de coleta

de dados, constituído por uma série ordenada de perguntas, que devem serem

respondidas por escrito e sem a presença do entrevistado”.

Seguimos as orientações de Lakatos quando classifica os tipos de

perguntas, abertas “Também chamadas livres ou não limitadas, são as que

permitem ao informante responder livremente, usando linguagem própria, e

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emitir opiniões”. Já as perguntas fechadas “também denominadas limitadas ou

alternativas fixas, são aquelas que o informante escolhe sua resposta entre duas

opções: sim e não”. Vale ressaltar que utilizamos em nossa pesquisa os dois

tipos de perguntas, abertas e fechadas.

A população pesquisada foram 32 estudantes de escola particular, que

estão cursando especificamente o 3º ano do ensino médio que possuem idade

a partir dos 16 anos e têm título de eleitor. Os adolescentes foram questionados

na perspectiva de responderem as inquietações que deram origem ao estudo.

Foi através dos dados coletados, que realizamos um discurso sobre a concepção

dos adolescentes diante das ideologias do mundo político.

RESULTADOS E DISCURSSÕES

Os dados do estudo serão abordados de acordo com a participação de 32

adolescentes entre 16 e 18 anos de idade, de uma escola particular da cidade

de Caruaru, que responderam a um questionário de perguntas abertas e

fechadas. Será mantido a identidade de todos os adolescentes, serão

identificados por A1(adolescente 1), A2, A4 e assim sucessivamente. A escolha

dos sujeitos da pesquisa foi em considerar que no Brasil o título de eleitor é

obrigatório a partir dos 18 anos, porém com 16 anos os adolescentes podem

exercer a democracia.

Iniciamos o estudo com a indagação de conhecer se os adolescentes

acreditam nas mudanças do país através da política. Sendo assim, constatamos

que de 32 adolescentes, 28 acreditam que o mundo pode sim melhorar através

da política. Enquanto 4 dos adolescentes dizem não acreditar que a mudança do

país seja decorrente da política.

Apesar da descrença que atual política brasileira encontra-se, cerca de

87% dos adolescentes questionados acreditam que o país pode melhorar,

mesmo com os escândalos de corrupção nos poderes: executivo, legislativo e

judiciário.

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Foi possível identificar a descrença dos adolescentes, quando

questionados a respeito das propostas dos políticos, se eles acreditavam. Com

isso foi possível sustentar a hipótese inicial de que os adolescentes, apesar de

terem pouca vivência com a política, já possuem um enorme descontentamento

com a atual política brasileira, principalmente por perceberem que as propostas

dos candidatos não são realizadas. Pois, de 32 jovens, apenas 6 deles acreditam

nas propostas dos políticos.

É interessante destacar, mesmo os adolescentes não possuir tanta

experiência nas discussões partidárias, eles apresentam preferência de partidos.

Percebe-se no questionário suas justificativas em relação a pergunta aberta

“Você possui alguma preferência por partido político? Qual?”

“Sim, o PSB”. (A1, Setembro, 2014) “Sim, o PT”. (A2, Setembro, 2014)

“Sim, o PSOL”. (A9, Setembro, 2014)

“Sim, o PT e o PSOL”. (A27, Setembro, 2014)

Enquanto isso, 27 responderam não, sendo que 5 deles justificaram a

pergunta da seguinte maneira:

“Não, mas tenho resistência e rejeição ao DEM”. (A18, Setembro, 2014)

“Não, eu gosto de qualquer um menos do PT”. (A17, Setembro, 2014) “Não, pois eu opto pelo que apresente mais benefícios”. (A20,

Setembro,2014) “Não, só não aguento mais o PT”. (A31, Setembro,2014)

“Não, acho que não devemos ter preferência por partidos, pois em cada um deles há alguém bom, não deveremos julgar um grupo e sim

o candidato, o político”. (A32, Setembro, 2014)

De acordo com Braga e Amaral (Apud, Duverger (1970), Mainwaring

(1991), Katz, Rahat e Hazan (2001); 2013; p. 34) “A influência do partido no

processo de seleção de candidatos varia conforme o tipo de sistema eleitoral e

a estrutura de autoridade partidária. Percebemos através das falas dos

entrevistados o quanto os partidos que estão em mais evidência influenciam os

eleitores.

O gosto da política também foi evidenciado nos dados coletados, pois 18

adolescentes dizem gostar de política, e 14 posicionam-se declarando que não.

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É visto o número de adolescentes que não gostam de política preocupante.

Apesar de ter o maior número de jovens que gostam de política, é interessante

refletir o sobre o número de adolescentes que demonstram desinteresse da

política.

Em busca de identificar o sentimento dos adolescentes ao comportamento

dos políticos no poder, os adolescentes foram questionados se “Partindo do

princípio de que todos são iguais, você acha justo que os políticos tenham mais

privilégios que os cidadãos comuns?”. Nesse contexto, destacamos algumas

respostas.

“Não, pois o político é um indivíduo que foi selecionado para representar uma maioria, então se os deveres e privilégios forem diferentes entre população e políticos, o mesmo não estaria sendo um representante popular”. (A20, Setembro, 2014) “Não, em muitos outros países os políticos andam de metrô, dividem quartos, vivem como seus eleitos, assim que deveria ser aqui no Brasil”. (A18, Setembro, 2014)

Os comportamentos e a vida que os políticos demonstram a sociedade,

reflete na visão que os eleitores possuem em relação a intenção dos políticos

em conquistar o poder de governar. É satisfatório contemplar o posicionamento

dos adolescentes sobre seus conhecimentos a respeito da política, por serem

iniciantes eleitores, já mostra seu ponto de vista a respeito dos debates políticos.

Também foi feito pelos adolescentes uma análise se conhece as ideias da direita

e da esquerda, se sim, qual delas se simpatizavam-se. Destacamos a seguintes

falas:

“Sim, a de esquerda, por causa da bolsa família e o programa mais médicos o cujo tirou muita gente da pobreza e melhorou a saúde” (A2, Setembro, 2014) “Sim, as de esquerda, pois elas promovem uma maior igualdade”. (A5, Setembro, 2014) “Sim, as de esquerda, pois são voltadas para os pobres”. (A7, Setembro, 2014) “Sim, a de esquerda, pois acredito em princípios populares e na integração dos grupos minoritários que devem ser respeitados como membros da sociedade” (A9, Setembro, 2014) “Sim, a de esquerda, pois eu prefiro uma ideia no qual a população é mais valorizada, principalmente a camada mais pobre”. (A14, Setembro, 2014) “Sim, a de direita, pois visam a melhoria trabalhista”. (A23, Setembro, 2014)

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Para finalizar as análises dos dados, como pergunta conclusiva, na

perspectiva de proporcionar aos adolescentes reflexões sobre seu papel diante

a votação e analisar o posicionamento dos eleitores, quanto às atitudes dos

políticos em relação à política de governo apresentada, propomos a seguinte

pergunta: “Se você fosse votar amanhã, qual seria sua maior dúvida?”. A partir

dessa indagação, contatamos que a maior dúvida é em relação a descrença que

desde cedo os eleitores possuem, quando irá eleger os representantes do país.

Como apresentamos nas falas seguintes:

“Se as propostas irão ser cumpridas”. (A4, Setembro, 2014) “Nas promessas dos políticos”. (A6, Setembro, 2014) “Se os políticos realmente estão ali para lutar para um país melhor para todos”. (A7, Setembro, 2014). “Saber se os políticos cumpririam suas promessas”. (A9, Setembro, 2014). “Saber quais as propostas que seriam melhores para nós e que se realmente a pessoa iria cumprir com elas”. (A15, Setembro, 2014). “Se o candidato realmente vai manter sua postura ideológica após se eleger”. (A27, Setembro, 2014).

Sendo assim, o questionário proporcionou ao estudo dados fundamentais

para responder nossos objetivos previstos. Mostrando o quanto é importante a

participação dos jovens eleitores diante a sociedade. Oresultado parcial do

nosso questionário revela a descrença dos adolescentes nas propostas dos

políticos, mas mesmo assim os adolescentes acreditam que o país pode

melhorar através de uma boa administração política.

CONSIDERAÇÕES PARCIAIS

Retomando a pergunta inicial do estudo, Com tantos problemas de

corrupções e decepções das propostas apresentadas pelos políticos, será que

os jovens acreditam que através da política o país pode melhorar?.

Diante dessa indagação o estudo proporcionou conhecer a concepção

dos jovens eleitores, ou seja, a visão dos adolescentes a respeito da política.

Sendo assim, constatamos que os adolescentes, não possuem tamanha

experiência nos debates políticos, mesmo assim posicionam-se de forma crítica.

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Declarando em sua maioria a não acreditar nas propostas dos políticos, mas

acreditam que o país pode sim melhorar através da política.

A hipótese inicialmente apresentada, foi de encontro com os dados

coletados, pois confirma-se que a população, sobretudo os jovens demonstram

a descrença nas propostas dos políticos, enfatizando que a maior dúvida em

eleger os representantes do país é se realmente serão cumpridas as propostas

apresentadas no período de campanha.

As concepções dos adolescentes em relação a política mostram algumas

considerações feitas por eles, destacando as propostas de governo de esquerda

e direita, as preferências de partidos políticos e a insegurança das propostas

apresentadas no momento de votação.

O estudo é de suma importância para a sociedade e não apenas para os

jovens eleitores, pois contribui para a população refletir o quanto as atitudes dos

políticos influenciam na construção de concepções da política. Através do

posicionamento dos jovens eleitores, é possível constatar que os mesmos

procuram ter conhecimento no âmbito político.

REFERÊNCIAS

Bonifácio, Robert. – A afeição dos cidadãos pelos políticos mal- afamados: Identificando os perfis associados á aceitação do “rouba mas faz” no Brasil. Opinião pública. Campinas, vol. 19, nº 2, novembro 2013, p. 320- 345. Lakatos. Eva Maria. Fundamentos de metodologia científica. – 6.ed. – 3. Reimpr. São Paulo: Atlas 2006. Braga, Maria do Socorro Sousa; Amaral Oswaldo E. Implicações do processo de seleção de Candidatos na competição partidária: O caso brasileiro. Revista de sociologia e política v. 21, nº 46: 33-43 jun. 2013. Disponíel em: <http://www.scielo.br/pdf/rsocp/v21n46/03.pdf> . Acesso: 14 de nov. de 2014 Costa, Alexandre Ferreira. Thompson, John B. Ideologia e cultura moderna: teoria social crítica na era dos meios de comunicação de massa. Cadernos de Linguagem e Sociedade, 3 (1) 1997. Disponível em: < file:///C:/Users/willams/Downloads/1325-3756-1-PB%20(2).pdf >. Acesso dia 17 de outubro de 2014

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Prado, Eleutério F. S. História em: A Ideologia Alemã. Curso Marx livro a livro – FFLCH. Dia 12/05/2010. Disponível em: < http://www.fea.usp.br/feaecon//media/livros/file_581 > Acesso dia 17 de outubro de 2014 Dicionário Online. Significados de palavras. Disponível em: <http://www.significados.com.br/politica/>. Acesso dia 06 de junho de 2014.

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Os diferentes ritmos musicais entre os adolescentes: um estudo desenvolvido com uma população entre 13

e 17 anos em caruaru-PE

Eduarda Cristina Da Silva Barbosa Yuri De Andrade Wu Cirana Vasconcelos

Maria Joselma Franco Valdenice Maria Pereira Cavalcanti

Resumo: O estudo em desenvolvimento tem como objeto do estudo “Os diferentes ritmos musicais entre adolescentes”. O estudo se justifica pela relevância social de se identificar dentre os adolescentes, qual a preferência musical predominante. Resultado de um trabalho realizado com o grupo da Iniciação científica do Colégio Diocesano de Caruaru durante o período de fevereiro a novembro de 2014, no município de Caruaru Pernambuco. O objetivo geral: Compreender quem influência os estilos musicais dos jovens de diferentes classes sociais. Os objetivos específicos são: Identificar por quem e como os jovens são influenciados em relação à música; analisar qual a preferência musical; e elencar os principais ritmos predominantes em diferentes grupos de jovens de Caruaru. Para realização da pesquisa foi necessários encontros semanais, onde realizamos reflexões a partir de Pimentel, Gouveia e Vasconcelos (2005) que discutem os estilos musicais de jovens no Brasil. O procedimento metodológico adotado foi o questionário misto. Os dados foram coletados com adolescentes do primeiro ano do ensino médio de um colégio público e outro particular, totalizando 60 adolescentes. Os resultados parciais mostram o distanciamento na renda familiar entre a população do colégio público e do privado. A preferência musical tem predominantemente a influência dos amigos. A música clássica se apresenta como o estilo musical de menor expressão na população estudada e a classe social pouco influencia a opção pelo estilo musical. Os dados estão fase de tratamento e pretendemos apresentá-los no evento.

Palavras-Chave: Música; Estilo; Classe Social.

INTRODUÇÃO

A música acompanha a humanidade desde seus primórdios como

elemento que envolve e emociona as pessoas. Nos últimos anos, estudos

científicos têm mostrado que a musicalização e o aprendizado de um instrumento

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também podem ajudar na assimilação de conteúdos trabalhados em disciplinas

que exigem raciocínio lógico e concentração. A razão disso é a estimulação de

regiões do cérebro ativadas especialmente no estudo de matérias como

matemática e línguas, que também atuam no processamento e produção de

sentido e emoção da música. (Revista, Terra; 28 de abril de 2012).

A música pode ser considerada uma das artes que mais influenciam na

sociedade, é tanto que ela pode influenciar no jeito de vestir, no pensar, no

comer. Os jovens possuem mais facilidades de serem influenciados, nas roupas,

quanto no modo de agir,nos gostos musicais. Sendo assim, concordamos com

Oliveira (2012) em tratar a música como meio de relações sociais.

Assim, com os grupos e do mesmo modo com a música, os jovens estabelecem trocas, experimentam, divertem-se, produzem, sonham, constroem a si mesmos, suas identidades e, ainda, os diferentes modos de ser jovem. Contudo, a relação entre a música e as agregações juvenis não pode ser entendida como natural, pois, justamente ao contrário, é uma construção histórica. (2012; p.7)

Considerando que a música é vista como construção histórica, sentimos

a inquietação de conhecer os diferentes tipos musicais entre os adolescentes da

cidade de Caruaru Pernambuco. O estudo se justifica pela relevância social de

se identificar dentre os adolescentes, qual a preferência musical predominante.

Buscando compreender se as situações sociais influenciam diretamente na

preferência musical.

No repertório musical, encontramos vários tipos de música, mas é claro

que cada pessoa tem seu gosto musical. Os jovens geralmente seguem um

padrão, pois, são influenciados pelos amigos. Mas também temos as músicas

midiáticas que auxiliam na constituição de subjetividades e assume importância

fundamental nos processos de socialização. Segundo os autores Pimentel (et.al;

2005) em um estudo,apresenta a porcentagem dos estilos musicais mais

ouvidos pelos jovens do Brasil:

Forró (50,6%), MPB (46,1%), música religiosa (43%), pop music (39,5%), samba (33,4%), pagode (33,5%), samba (33,4%), pagode (33,2%), reggae (33,2%), heavy metal (25, 9%), funk (20,8%), punk/ hardcore (19,9%), música sertaneja (17,7%), música clássica (16,8%) e rap (15,9%). (2005; p.409)

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Diante esses dados, temos como hipótese inicial que os adolescentes da

escola pública valorizam mais o ritmo da música, que a própria letra. Já os que

estudam em escolas particulares preferem estilos musicais como o rock, MPB.

Através desse estudo pretende-se responder as seguintes perguntas: O

que os jovens de diferentes classes sociais gostam de ouvir em relação a

música? A influência realmente causa uma forte diferenciação? Será a classe

economicamente desfavorecida prefere um ritmo predominante, diferente das

classes economicamente favorecidas?

O objetivo geral: Compreender quem influência os estilos musicais dos

jovens de diferentes classes sociais.E os objetivos específicos são: Identificar

por quem e como os jovens são influenciados em relação a música; analisar qual

a preferência musical; elencar os principais ritmos predominantes em diferentes

grupos de jovens de Caruaru.

Para realização da pesquisa foi necessário, encontros semanais, onde

realizamos reflexões a partir de Pimentel (et. al; 2005) que discutem os estilos

musicais de jovens no Brasil, entre outros.

METODOLOGIA

O procedimento metodológico adotado foi o questionário misto, que

segundo Lakatos “questionário é um instrumento de coleta de dados, constituído

por uma série ordenada de perguntas, que devem ser respondidas por escrito”.

Os dados foram coletados com adolescentes do primeiro ano do ensino médio

de uma escola pública e outra particular, totalizando 60 adolescentes entre 13 a

17 anos de idade.

As escolas selecionadas para o questionário, sendo público em um bairro

de classe economicamente baixa, enquanto o particular em bairro de classe

economicamente alta. Esta seleção partiu da inquietação de compreender os

gostos musicais de diferentes classes.

Resultado de um trabalho realizado com o grupo da Iniciação científica do

Colégio Diocesano de Caruaru durante o período de fevereiro a novembro de

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52%

10%

10%

7%

6%

6%

3%3% 3%

Preferência Musical na Escola Pública

Rock Religioso Funk Pop Music Sertanejo Pagode Forró MPB Reggae

2014, no município de Caruaru Pernambuco. Para fundamentação do estudo foi

fundamental encontros semanais, onde realizamos momentos de leituras,

refletindo sobre os estudos já existentes referente aos gostos musicais.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

O estudo realizado em escola particular e pública totalizou de 60 sujeitos,

entre 13 a 17 anos de idade. Partimos da inquietação de conhecer os gostos

musicais dos adolescentes de diferentes classes sociais. Inicialmente tínhamos

como hipótese para desenvolvimento do estudo que a renda financeira da família

influência nos estilos musicais, em pensar que a população de classe

economicamente baixa prefere funk.

Mas através dos estudos e do questionário aplicado em diferentes classes

sociais, constatamos que, entre 30 adolescentes de classe economicamente

baixa a serem questionados a preferência musical, 52% preferem o rock. Diante

os dados coletados, observa-se a diversidade, dos gostos musicais.

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14%

9%

34%

31%

6%6%

Preferência Musical da Escola Particular

Rock: 5 Religioso: 3 Forró: 12 Pop Music: 11 Sertanejo: 2 MPB: 2

14%

9%

34%

31%

6%6%

Preferência Musical da Escola Particular

Rock: 5 Religioso: 3 Forró Pop Music Sertanejo MPB: 2

A construção desse estudo possibilita mostrar a sociedade, que a posição

de classe não influencia diretamente a preferência musical.Consideramos assim

que não é bem a renda familiar que influencia nos gostos musicais, mas a

convivência de amigos, pois de 30 adolescentes de colégio particular que

responderam ao questionário, 22 deles são influenciados pelos amigos. Da

mesma maneira foram os adolescentes da escola pública com o quantitativo

maior, em que constatou que de 30 dos questionados, 25 deles também tem

influenciais dos amigos.

Os adolescentes dos dias atuais não possuem tanto interesse asmúsicas

clássicas, pois constatamos que dentre 60 adolescentes questionados apenas 2

de escola pública e 7 de escola particular escutam músicas clássicas. A

desvalorização por esse estilo musical é visível entre a juventude atual. Vejamos

as preferências dos estilos musicais dos 30 adolescentes da escola particular.

Ao serem questionados os adolescentes da rede pública e particular sobre

a seguinte pergunta: “costumam ouvir músicas diariamente”, 97% afirmam que

sim e 3% dizem que não. Isso pode significar que mesmo com a facilidade do

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acesso dos vários tipos de músicas que temos através do computador, TV, rádio

e outros. A juventude possui tanta empolgação e utilização da música.

Portanto, os resultados mostram o distanciamento na renda familiar entre

a população da escola pública e particular. A preferência musical tem

predominantemente a influência dos amigos.

A música clássica se apresenta como o estilo musical de menor expressão

na população estudada e a classe social pouco influencia a opção pelo estilo

musical. De acordo com o questionário aplicado 27% ouvem música clássica.

CONSIDERAÇÕES PARCIAIS

Através desse estudo pretende-se responder as seguintes perguntas: O

que os jovens de diferentes classes sociais gostam de ouvir em relação a

música? A influência realmente causa uma forte diferenciação? Será a classe

economicamente desfavorecida prefere um ritmo predominante, diferente das

classes economicamente favorecidas?

Diante desses dados, temos como hipótese inicial que os adolescentes

da escola pública valorizam mais o ritmo da música, que a própria letra. Já os

que estudam em escolas particulares preferem estilos musicais como o rock,

MPB. Os dados foram de confronto com a hipótese inicial, pois constatamos

através do questionário que os adolescentes de escola pública em sua maioria

preferem rock.

A preferência musical tem predominantemente a influência dos amigos. A

música clássica se apresenta como o estilo musical de menor expressão na

população estudada e a classe social pouco influencia a opção pelo estilo

musical. Os dados estão fase de tratamento e pretendemos apresentá-los no

evento

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REFERÊNCIAIS

Carlos, Eduardo Pimentel; Valdiney Veloso Gouveia; Tatiana Cristina Vasconcelos. Preferência musical, atitudes e comportamentos anti–sociais entre estudantes adolescentes: um estudo correlacional. Scielo.Estud. psicol.(Campinas) vol.22 no.4 Campinas Oct./Dec. 2005.Disponível:<http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0103166X2005000400008&script=sci_arttext >. Acesso em: 06 de jun. de 2014. Lakatos, Eva Maria. Fundamentos de metodologia científica. 6.ed. – 3. Reimpr. – São Paulo: Atlas 2006.

Revista. Terra. Música ativa região do cérebro ligada ao raciocínio e concentração. Disponível em: < http://noticias.terra.com.br/ciencia/pesquisa/musica-ativa-regiao-do-cerebro-ligada-ao-raciocinio-e concentracao, dafa00beca2da310VgnCLD200000bbcceb0aRCRD.html>. Acesso 29 de Out. de 2014.

Oliveira, Pereira de Vilmar. A Influência do Gosto Musical no Processo de Construção da Identidade na Juventude. Psicologia o portal dos psicólogos.Documento produzido em 13.01.2013.Disponível em:<http//www.seer.ufrgs.br/EmPauta/article/view/9381 >. Acesso em: 23 de out. de 2014.

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Psicopatas: nasceram assim ou são constituídos

socialmente?

Fabíola Vitória do Nascimento Neves Giovanna Lorena Monteiro Silva

Cirana Vasconcelos Maria Joselma Franco

Valdenice Maria Pereira Cavalcanti

Resumo: O estudo em desenvolvimento tem como título: Psicopatas: Nasceram assim ou são constituídos socialmente? O motivo da escolha do tema baseou-se na curiosidade e no interesse em compreender os transtornos de conduta designado a psicopatia e suas causas. Resultado de um trabalho realizado com o grupo da Iniciação Científica do Colégio Diocesano de Caruaru durante o período de fevereiro a novembro de 2014, no município de Caruaru Pernambuco. O objetivo geral é compreender o que os profissionais analisaram sobre a origem da psicopatia e o que os levam a tomar determinadas atitudes. E os objetivos específicos são: Identificar o que é e qual a origem da psicopatia; Elencar atitudes comuns identificadas nos psicopatas; Apontar se é possível identificar a psicopatia desde a infância; Apresentar os tratamentos existentes para recuperação dos mesmos. Para o estudo do objeto tomamos por base os estudos de Hare Robert (2014); DavoglioTárcia (2010) e Lakatos (2005). O procedimento metodológico adotado foi o questionário misto. Para tanto, realizamos sessões semanais de fevereiro a novembro de 2014. Os dados foram coletados em um hospital psiquiátrico do município de Caruaru. Os sujeitos da pesquisa são 9 profissionais que trabalham na área da psiquiatria.Os primeiros dados mostram que há fatores genéticos e de influências externas, o que exige das pessoas que estão em seu entorno, conhecimento e habilidade para lidar.

Palavras-chave: Psicopatia; Transtorno; Mente.

INTRODUÇÃO

Nos últimos anos a sociedade tem apresentado inúmeros casos de

pessoas que são consideradas como psicopatas. De acordo com os autores

Davoglio e Argimon(2010),“o sujeito é dominado por uma desordem de

personalidade, e apresenta características de comportamento anti-social por

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uma incapacidade de controle comportamental”. Nessa situação a sociedade por

diversas vezes demonstra momentos de violência e preocupação aos cidadãos.

O Brasil tem apresentado a cada dia um alto índice de violência. Diante

deste fato, como serão julgados os sujeitos que realizam o crime? Para estudar

estas questões relacionadas ao comportamento e sua relação com as questões

mentais, podemos destacar dentre outras áreas a Psicologia, Segundo o

dicionário online o termo psicologia "é a ciência que investiga os processos e

estados conscientes, assim como as suas origens e efeitos".

Segundo Dr. Miguel em redação da UOL,o Professor de Psiquiatria,

denomina-se Psiquiatria Forense ou Psiquiatria Legal a sub-especialidade da

Psiquiatria que trata dos problemas psiquiátricos envolvidos nas causas legais.

Sob este aspecto (relação com problemas legais), a Psiquiatria difere de outras

especialidades médicas.

Davoglio e Argimon definem a diferença da psicologia e da psiquiatria

forense, defesas existentes para as ações violentas praticadas pelos sujeitos

que assustam a sociedade:

Do ponto de vista legal, quando o autor de um ato infracional é reconhecido como capaz de responsabilizar-se por suas condutas, o próprio judiciário, através da legislação, encarrega-se de conduzir o caso. Porém, quando o delito envolve a capacidade de julgamento do indivíduo ou o controle do próprio comportamento, a avaliação da responsabilidade legal sai da esfera jurídica e se enviesa nas capacidades mentais do sujeito. (2010; p.111-118)

Diante do exposto percebe-se que os crimes cometidos estão submetidos

às análises dos comportamentos dos detentos, com a proposta de concluir que

foram motivados por questões sociais ou mentais. Sendo assim, é possível

pesquisar se as atitudes dos homicidas referem-se à originalidade de distúrbio

mental ou a sociedade o transformou em um ser violento.

Segundo a matéria da revista UOL “A psicopatia transtorno anti-social da

personalidade”, Robert Hare, autoridade mundial da psicologia criminal e

professor da Universidade da Colúmbia Britânica (Canadá), afirmou que a única

característica inconfundível de um psicopata é, exatamente, “a falta de emoções,

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da capacidade de se colocar no lugar de outra pessoa, para, pelo menos,

imaginar seu sofrimento”.

O estudo desenvolvido justiça-se da importância de informar a sociedade

características de psicopatas, levando a refletir se eles nasceram com esse

transtorno ou se são constituídos socialmente.

Assassinos que cometem crimes bárbaros são facilmente julgados como

psicopatas pela sociedade, pois não há uma explicação lógica para seus atos

criminais. Este estudo procura responder as seguintes perguntas: Os psicopatas

nasceram assim ou é uma doença socialmente constituída? Será que existe

recuperação?

O objetivo geral é compreender o que os profissionais analisaram sobre a

origem da psicopatia e o que os levam a tomar determinadas atitudes. E os

objetivos específicos são: Identificar o que é e qual a origem da psicopatia;

Elencar atitudes comuns identificadas nos psicopatas; Apontar se é possível

identificar a psicopatia desde a infância; Apresentar os tratamentos existentes

para recuperação dos mesmos.

Diante os casos apresentados em fontes jornalísticos temos

acontecimentos que foram comprovados através de especialistas, que as ações

dos psicopatas surgiram por questões sociais, enquanto outras são

diagnosticadas por ações originadas por distúrbio mental. De acordo com esse

contexto, trabalhemos na perspectiva de conhecer se as atitudes dos psicopatas

são por questões sociais ou são originadas por distúrbio mental.

Trata-se de um assunto polêmico que contribuirá para esclarecer dúvidas

que são pertinentes no nosso cotidiano, com a possibilidade de realizar um

paralelo com estudos realizados, prevenindo as pessoas dos perigos que os

psicopatas demonstram.

METODOLOGIA

O procedimento metodológico adotado foi o questionário misto, como

Lakatos (2006) apresenta: [“...] é um instrumento de coleta de dados, constituído

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por uma série ordenada de perguntas, que devem ser respondidas por escrito”.

Para realização do estudo, realizamos sessões semanais de fevereiro a

novembro de 2014. Os dados foram coletados em um hospital psiquiátrico do

município de Caruaru. Os sujeitos da pesquisa são 9 profissionais que trabalham

na área da psiquiatria.

Procuramos obter conhecimento partindo de profissionais que trabalham

com psicopatas, na inquietação de conhecer as principais características de

atitudes, bem como no que diz respeito a sua origem, prevenção e o tratamento.

Considerando as principais características que identifica se os sujeitos são

reconhecidos com atitudes mentais desde o nascimento ou se estas vão se

constituindo ao longo da vida, por outros motivos sociais.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Em busca de conhecer e estudar os fatores que identifique se os

psicopatas nasceram com o transtorno ou a sociedade transformou-o

socialmente, participaram 9 profissionais da área da saúde, sendo: Sendo 1

psicólogo, 1 enfermeiro, 5 técnicos e 2 auxiliares, os quais atuam em instituições

públicas e privadas.

De acordo com os dados coletados, as atitudes mais comuns para

identificar psicopatas, segundo os profissionais, são atitudes anti-sociais,

empatia, ausência de medo, ser manipulador, frio e calculista e não sentir

remorso, além de achar que tem poder sobre tudo e tem dificuldade de

estabelecer vínculos.

Esses dados remetem a concepção de Davoglio e Argimon (2010), que

declaram que o psicopata é dominado por uma “desordem de personalidade, e

apresenta características de comportamento anti-social por uma incapacidade

de controle comportamental”. Isto reforça tanto a teoria, quanto a visão dos

profissionais que estão trabalhando na prática.

Os profissionais da saúde ao serem questionados, se eles concordam que

pessoas que possuem altos cargos profissionais, que exigem alta capacidade

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intelectual, bem como, boas condições financeiras, estão propícias a psicopatia?

. As respostas foram às seguintes: Não, na verdade são pessoas que

conseguem, por manipulação, os cargos elevados, mas já tem a personalidade

anti-social.

“Não, na verdade são pessoas que conseguem, por manipulação, os cargos elevados, mas já tem a personalidade anti-social”. (P1, Setembro, 2014) “Não, por conta da predisposição, mas essas pessoas também têm alto nível de intelecto que propiciam a manipulação”. (P3, Setembro, 2014) “Não, porque pode ocorrer independente de sua classe social”. (P4, Setembro, 2014) “Sim, por causa da alta cobrança dos mesmos”. (P5, Setembro, 2014) “Sim, pois o psicopata é muito inteligente e calculista”. (P6, Setembro, 2014) “Sim, por ter condições melhores que os outros”. (P7, Setembro, 2014) “Não existe nenhum estudo epidemiológico até onde sei que coloque essas pessoas como mais vulneráveis”. (P8, Setembro, 2014) “Dentro dos meus conhecimentos não existe associação deste tipo que relacione uma coisa a outra”. (P9, Setembro, 2014)

Os nove profissionais questionados, seis responderam que não, pois é um

transtorno que ocorre independente da classe social e que não existe nenhum

estudo epidemiológico que coloque essas pessoas como mais vulneráveis.

Enquanto três dos questionados afirma que sim, pois consideram os psicopatas

extremamente manipuladores, com um alto nível de intelecto, inteligentes e

calculistas. Além da alta cobrança a si mesmo.

As instituições de saúde que contribui para os tratamentos de pessoas

consideradas psicopatas são: Clínicas psiquiátricas, ambulatórios públicos que

trabalham com psicoterapia, psicoterapia individual e hospitais especializados.

Na perspectiva de conhecer se há cura para a psicopatia, quatro

profissionais da saúde declaram que: Não há cura para a psicopatia, já que é um

comportamento ligado ao comportamento anti-social, ao desenvolvimento da

personalidade. Por outro lado, olhando do ponto de vista da complexidade, da

subjetividade, da singularidade do sujeito, principalmente na lógica, que o

homem, é um ser de possibilidades, não se pode radicalizar. Havendo

tratamento para seus impulsos e melhoramento de suas relações sociais.

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Visando informar os possíveis procedimentos preventivos para a

psicopatia são: ambiente familiar estruturado com harmonia e paz na infância,

limites, amor, orientação familiar, tratamento terapêutico e respeito aos outros.

A prevenção se torna difícil, porque a visibilidade do comportamento inadequado

não se manifesta inicialmente, com difíceis procedimentos.

Enquanto isso, os tratamentos da psicopatia são: acompanhamento de

psicólogos e psiquiatras, a psicoterapia individual (dependendo do paciente),

cuidados e conhecimento. Este que vai depender de uma série de fatores

relacionados a avaliações psicológicas e psiquiátricas.

Nota-se através dos dados do estudo que as principais atitudes são a

relação da diferença de ser difícil de precisar, pela sutileza de cada caso, já que

certas atitudes só serão tomadas por pessoas com este transtorno, crimes,

abusos, situações que fogem do comum e são repetidas. Diferenciamos pela

avaliação, o egocentrismo, insensibilidade, atitudes anti-sociais, prática de atos

momentâneos, falando bastante sobre maldade, comportamento rotativo e a

crueldade.

O posicionamento dos profissionais em relação à identificação se a

criança é psicopata, atitudes que dão início a psicopatia, destaca-se que,

atitudes durante a infância precisa-se serem observadas minuciosamente. Os

profissionais posicionaram-se que o indivíduo desde criança apresenta atitudes

estranhas que podem ocorrer na escola ou com os brinquedos ou até mesmo

com outros seres vivos como os animais. As atitudes seriam agressividade, mau

comportamento problemas de conduta. Mesmo com todas essas atitudes, o

diagnóstico não pode ser concluído na infância e sim na adolescência ou na

idade adulta.

Através do estudo os profissionais possibilitaram refletir se “Psicopatas

nascem assim, ou a sociedade os torna psicopatas?”, Qual de fato é a origem

da psicopatia?”“. Como mostra nas falas.

“Existem os fatores genéticos e as influências externas (ambiente agressivo)”. (P2, Setembro, 2014)

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“Depende do meio de vivência, alguns nascem em um meio violento e acabaram desenvolvendo distúrbio de conduta; outros nascem em ótima convivência familiar mesmo assim já tem a predisposição de desenvolver o distúrbio”. (P3, Setembro, 2014) “Ninguém muda a índole, mas mudam o comportamento, as atitudes. Todos nós sofremos a influência direta ou indireta do meio em que vivemos”. (P5, Setembro, 2014) “Não existe um fator isolado em termos de etiologia. Os estudos mostram que as questões da hereditariedade, o meio familiar e social, a própria questão biológica, podem contribuir para o surgimento da psicopatia. É importante ressaltar, que a literatura traz um formato generalizado no contexto, o que vai determinar à dinâmica e evolução do quadro, e a singularidade do sujeito”. (P8, Setembro, 2014)

Os dados possibilitam refletir as diferentes ações, situações para

alertar sobre um possível psicopata. Mostrando que há fatores genéticos e de

influências externas, o que exige das pessoas que estão em seu entorno,

conhecimento e habilidade para lidar

CONSIDERAÇÕES PARCIAIS

O estudo oferece refletir sobre as seguintes perguntas: Os psicopatas

nasceram assim ou é uma doença socialmente constituída? Será que existe

recuperação?

Constatamos através dos profissionais de saúde que a psicopatia trata-se de

um transtorno de personalidade que pode ter origem de um fator genético que

se reflete em um déficit afetivo, atuando de forma proposital, imoral e perverso

por natureza (psicopata primário), ou causado por fatores ambientais, como por

exemplo, um indivíduo que sofreu algum trauma na infância ou algum tipo de

abuso, e em consequência destas experiências negativas, reagem com

sentimento de raiva, revanche (psicopata secundário).

Apesar de não existir cura, há tratamento através da psicoterapia, que é um

tipo de terapia, cuja finalidade é tratar os problemas psicológicos, tais como

depressão, ansiedade, dificuldades de relacionamento, entre outros problemas

de saúde mental.

As principais características identificadas nos psicopatas são: a

incapacidade de amar, a frieza, crueldade, tolerância fraca, crueldade, não

possui empatia, dissimulação de sua real personalidade, manipulação e

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intimidação, inteligência fora do normal, aparência “simpática”, habilidades

verbais, apresentam um grande ego, ações impulsivas e imorais, acessos de

raiva e desprezo pela vida humana. Vale ressaltar que a psicopatia é possível

ser identificada na fase adulta.

Para recuperação dos psicopatas as instituições que contribuem para o

tratamento são consultórios psiquiátricos, clínicas psiquiátricas e consultórios

especializados, acompanhamento psicológico ou internamento, psicoterapia.

Tratando de psicopatas, vale considerar que é um assunto complexo, para

seu estudo depende muito dos profissionais especializados na área da saúde. É

importante se estudar os fatores que constituem psicopatas para alertar a

população e possibilitar características fundamentais para tomada de

conscientização em procurar ajuda médica, para as pessoas que precisam de

tal tratamento.

REFERÊNCIAS

Davoglio,Tárcia R.; Argimon, Irani I. L.- Avaliação de comportamentos anti-sociais e traços psicopatas em psicologia forense.Scielo. Avaliação Psicológica, 2010, 9(1), pp. 111-118. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?pid=S1677-04712010000100012&script=sci_abstract>Acesso em: 06 de jun. de 2014. Acesso em: 06 de jun. 2014. Dicionário online.Significado de palavras.Disponível em <http://www.significados.com.br/psicologia/>. Acesso, 08 de agosto de 2014. Lakatos, Eva Maria. Fundamentos de metodologia científica. – 6.ed. – 3. Reimpr. São Paulo: Atlas 2005. Revista Abril. Qual a diferença entre psicopata e sociopata? .Disponível em < http://mundoestranho.abril.com.br/materia/qual-a-diferenca-entre-psicopata-e-sociopata >. Acesso 06 de Junho de 2014. Redação. Psiquiatria Forense. UOL. Disponível em: < http://emedix.uol.com.br/doe/psi016_1f_forense.php >. Acesso 30 de out. de 2014. Redação. Psiquiatria Forense. UOL. Disponível em: < http://emedix.uol.com.br/doe/psi016_1f_forense.php >. Acesso 30 de out. de 2014.

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Anne Barbosa. Saiba como identificar psicopatas no mercado de trabalho. Disponível em <http://g1.globo.com/concursos-e-emprego/noticia/2014/05/saiba-como-identificar-psicopatas-no-mercado-de-trabalho.html>.Acesso em 14-11-2014 Entrevista. Robert Hare;Laura Diniz. Psicopatas no divã. Disponível em <http://veja.abril.com.br/010409/entrevista.shtml. acesso em 07-11-2014>

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GT: Fraternidade e Política

Coordenador: Adilson Silva Ferraz

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Estudo comparativo entre o conceito de amor de Agostinho e Chiara Lubich

Augusto César Quaresma Oliveira Santos Debora Taina de Azevedo

Adilson Silva Ferraz

INTRODUCAO

O mundo não foi só rosas para Santo Agostinho (354 d.C –430 d.C). Vindo

de família com crenças distintas, e enfrentando crises durante boa parte de sua

juventude, participando de ventos de doutrina como o maniqueísmo, ele não

imaginava que estava prestes a marcar a historia da teologia e se tornar um dos

mais importantes filósofos e teólogos do cristianismo.O homem que é hoje

reconhecido pela sua fé, já sofreu de depressão por um longo período. Seu

legado é imenso, além de ensinar a retórica, e deixar um dos conceitos mais

bem elaborados do amor, Santo Agostinho inspira hoje, muitas pessoas a

seguirem uma doutrina muito admirada.

Por outro lado, a vida de Chiara Lubich mas que nasceu como Silvia

Lubich (1920- 2008) tampouco foi fácil. Nascida na cidade de Trento (Norte da

Itália) teve que render os seus esforços ainda bastante nova, sendo professora

para custear o seu curso de Filosofia onde ela tinha como principal objetivo

procurar a verdade das coisas. Isso aconteceu justamente durante a época da

segunda guerra mundial período de pleno ódio e violência. Vivenciando todo

esse clima desfavorável Chiara no dia 7 de Setembro de 1943 aos 23 anos

sozinha em uma capela no colégio dos capuchinhos, ela entrega a sua vida a

Deus e promete que para sempre ela se doara apenas a ele. Nesse dia ela

entende que o amor de Deus é o principal e é suficiente para reger toda a sua

vida. A compreensão do Deus amor muda a vida da jovem Chiara:

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A compreensão de Deus Amor irrompe na vida de Chiara e transforma-a. Esta descoberta é imediatamente comunicada e compartilhada por outras jovens que se irão tornar as suas primeiras companheiras. Para os abrigos antiaéreos levam apenas o Evangelho: aquelas palavras são iluminadas por uma nova luz. É nelas que encontram o modo de corresponder a este Amor. Descobrem no mandamento que Jesus chama seu e novo, o coração do Evangelho: "Amai-vos uns aos outros como eu vos amei". Vivendo-o com radicalismo dão um salto de qualidade na vida pessoal e comunitária. No testamento de Jesus - "Que todos sejam um" - encontram o motivo das suas vidas: contribuir para a realização dos planos de Deus para a família humana.” (http://www.focolare.org/pt/chiara-lubich/chi-e-chiara/Acesso 15/11/14)

Neste trabalho, não é nossa intenção afirmar a superioridade de um dos

pensamentos, senão apontar as aproximações e distanciamentos entre a

interpretação que fazem do amor. O nosso artigo versa sobre a problemática:

Um contraponto entre o conceito de amor em Agostinho e Chiara Lubich.

O CONCEITO DE AMOR EM SANTO AGOSTINHO

Santo Agostinho viveu em uma época onde o poder do imperador se

sobrepunha a qualquer outro poder, seus entendimentos relacionados ao amor

e seus outros conceitos, são inter-relacionados a uma mudança que desejava

ver na atualidade.

Primordialmente, toda a formação de Santo Agostinho, pende para o lado

da igreja, mas anteriormente seu objetivo não era fazer parte de tudo isso.

Quando iniciou seu trabalho, decidiu ser professor em uma universidade, que

sem sucesso, o professor percebia claramente o desinteresse dos alunos e logo

desistiu, iniciando assim seu trabalho em outra universidade, onde obteve a

mesma ideia da primeira e logo desistiu de lecionar, integrando-se a corte da

igreja. Santo Agostinho aposta sua crença em um ser sublime, indicando que o

amor, só poderia vir desse ser.

Sua crença era rondada em torno do amor em Cristo, à verdade só

poderia vir dele. A filosofia agostiniana é uma constante busca da verdade, que

culmina na Verdade, em Cristo. É um movimento incessante, uma paixão, e,

precisamente, a paixão principal: o amor. “Amor meus, pondusmeum”, o amor é

o peso que dá sentido à minha vida. Verdade e Amor. Essa filosofia se baseia

no neoplatonismo, onde o homem já se baseia na nova corrente. Para Agostinho

o amor é uma regra a ser seguida, aquele que não ama portanto é infeliz o seu

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amor deve estar direcionado para o único digno segundo ele que é Deus.

Entretanto a natureza pecaminosa do homem sempre faz com que ele seja

desvirtuado do seu alvo principal as concupiscências tiram o alvo e o foco do

homem que passa a ficar afastado do amor de Deus.

É interessante refletir no conceito da verdade sendo algo que vai de

encontro ao homem, não existindo a necessidade de busca-la. O tempo é uma

condição psicológica junto com o ser humano e com o universo, só existindo

assim o agora, o presente, resvalando certa lógica, pois ao falarmos em passado

citamos lembranças, e quando citamos o futuro, o colocamos em meio à

imaginação. O tempo faz parte assim, do buraco nomeado por ele de Deus, no

qual está o homem. Segundo Hanna Arendt, o que faz você entender melhor a

passagem do tempo é a mudança, caso você ficasse inerte, estatizado, não

notaria a passagem do tempo, ou seja, você precisa mudar de ideias, de gosto,

e de opinião para entender melhor até a si mesmo, e diz assim, que só Jesus vai

colocar-se na passagem do tempo, como exemplo, se alguém está com ódio de

outrem e assim, acaba desenvolvendo certa mágoa, e se essa pessoa não

perdoa, ela irá não notar a passagem do tempo, permanecendo inerte.

Já para Agostinho o homem é um plano de Deus. A predestinação de

fazermos o que fazemos vem da nossa natureza. Como exemplo pode-se citar

o queijo suíço: porque ele tem buracos? Porque ele é um queijo suíço e queijos

suíços são predestinados a ter buracos. É da natureza do homem fazer o que

faz e por isso Santo Agostinho acredita na predestinação.

Agostinho entendeu que o amor jorra de uma fonte inesgotável, para ele

Deus é afonte. Cabem as pessoas, amá-lo sobre todas as coisas, abdicando

inclusive das suas vontades e desejos por amor a Deus. Logo, se essa pessoa

ama a Deus ela também amara os seus “irmãos”. Gerando oque nós

conhecemos por amor Fraterno ao passo que eu amo o meu irmão eu estou

fazendo a vontade de Deus e portanto amando a ele também. Ele ensinava as

pessoas a amar através das suas atitudes, dos seus ensinamentos, da sua

humildade.

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Aquele que ama expressa a sua totalidade amorosa no outro. E ao fazê-lo, surge o respeito mútuo. No respeitar-se mutuamente, cada um assume o outro como prolongamento de si mesmo. O amor, como prolongamento de si mesmo, é capaz de transformar o outro. Percorrido esse caminho, surge a felicidade que é também o grande desejo de Agostinho, porque para ele o amor dá significado à existência humana. (Gomes, Rogerio – O amor em santo agostinho, 02)

Agostinho afirma que a antes de tudo o amor é uma lei, para que o

indivíduo exista ele precisa amar. Mas amar o que? Amar a quem? Ele vai dizer

que o simples fato do nascimento já significa uma grande declaração de amor

do amor supremo, Deus, portanto, tudo que existe está pautado em uma

bondade suprema que é o amor de Deus. Os recursos dos quais os seres

humanos desfrutam são todos independente de usa dimensão, provas de amor

enviadas por Deus.

Criatura alguma é autossuficiente, quer para existir, para conhecer ou para viver; (...) todo o nosso ser depende de Deus: a nossa existência, de sua eternidade, nosso conhecimento das razões eternas, de sua sabedoria e a nossa vida moral do seu amor. (Gomes, Rogerio – O amor em santo agostinho, 04)

Vamos usar uma passagem bíblica da Carta de São Paulo, que foi um dos

seus influenciadores:

Ainda que eu falasse línguas, as dos homens e as dos anjos, se eu não tivesse a caridade, seria como um bronze que soa ou como um címbalo que tine. Ainda que eu tivesse o dom da profecia, o conhecimento de todos os mistérios e de toda a ciência, ainda que tivesse toda a fé, a ponto de transportar os montes, se eu não tivesse a caridade, eu nada seria. Ainda que eu distribuísse todos os meus bens aos famintos, ainda que entregasse o meu corpo às chamas, se não tivesse a caridade, isso nada me adiantaria. A caridade é paciente, a caridade é prestativa, não é invejosa, não se ostenta, não se incha de orgulho. Nada faz de inconveniente, não procura o seu próprio interesse, não se irrita, não guarda rancor, não se alegra com a injustiça, mas se regozija com a verdade. Tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo suporta. A caridade jamais passará (...) Agora, portanto, permanecem fé, esperança, caridade, estas três coisas. A maior delas, porém é a caridade.”(Bíblia NTLH 1Cor 13, 1-8;13)

A caridade, portanto, é objeto do amor, o ser que ama a Deus, é feliz está

satisfeito e preenchido por bondade, caridade. Logo se ele ama a Deus, as suas

atitudes levaram a amar o próximo. A sociedade deve, portanto, se tratar como

um corpo onde cada um tem papel primordial e essencial, e é indispensável a

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participação de todos. Mas essa deve acontecer de maneira fraterna,

respeitando os limites se doando de modo a ajudar e completar o seu “irmão”.

São seres humanos e eu os amo, não por serem animais, mas por serem humanos, isto é, pelo fato de terem almas racionais as quais eu amo mesmo nos ladrões. Pois posso amar a razão em alguém, embora de direito ter aversão àquele que usa mal aquilo que amo. De modo que mais amo os meus amigos, quanto melhor eles usam a alma racional,

ou quanto desejam fazer bom uso dela.13

O CONCEITO DE AMOR EM CHIARA LUBICH

Chiara Lubich viveu em um período bastante conturbado presenciou e

viveu a segunda guerra mundial. Teve sua cidade destruída, tinha todos os

motivos para ser uma pessoa vingativa. Porém, a realidade é bem diferente.

Chiara em plenos 23 anos de idade, uma jovem bonita, decide entregar sua vida

e seus caminhos, por amor a Deus e decide que vai viver apenas para ele e por

ele. Apesar de ser leiga, ela não imaginava que naquele dia 7 de dezembro de

1943 um grande movimento começava a surgir. Ela passa a ser direcionada pelo

amor de Deus, “Quando ninguém falava de aproximação entre civilizações, ela

soube indicar, na sociedade internacionalizada, o caminho da fraternidade

universal. Respeitou a vida e buscou o sentido do sofrimento. Traçou um

caminho de santidade, religiosa e civil, praticável por qualquer pessoa, não

reservada a poucos eleitos. (http://www.focolares.org.pt/sobre/chiara-lubich,

2014 – Acesso 15/11/14)

Chiara Lubich foi a grande responsável por disseminar o “movimento

focolare”. Uma unidade de paz, dialogo, respeito, entre os povos, religiões, e

culturas. Buscando fundar um modelo de fraternidade universal possível. A

primeira unidade do movimento surge na cidade de Trento, sua cidade natal,

juntamente com algumas amigas em 1944, o primeiro focolare masculino nasce

em 1948. Toda a produção de Lubich está pautada no amor, ela assim como

Agostinho explica que o amor da razão a tudo, observe a sua opinião sobre o

amor recíproco:

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Outra consequência do amor recíproco, cuja medida é o dom da vida, é que nos torna capazes de pôr em comum os bens materiais. Foi o que fizemos desde o princípio. Um dia, no primeiro focolare,tiramos as nossas poucas e pobres coisas do armário e amontoamos no meio do quarto. Depois cada umade nós recebeu o que lhe era indispensável e demos todo o resto aos pobres. Colocamos em comumtambém os ordenados; e decidimos fazer o mesmo com todos os bens, de menor ou maior valor quetínhamos ou que viríamos a ter.Em seguida a comunidade, desabrochada à volta do focolare, acostumou-se a colocar em comum, mês após mês, o supérfluo, que servia às pessoas que passavam necessidades.De modo análogo, para atuar o mandamento novo, põem-se em comum os bens espirituais. Asexperiências construtivas, fruto do novo modo de viver - porque Deus ilumina aqueles que amam: "Aquem me ama (...), me manifestarei" - cfJo 14, 21 - são comunicadas por amor e sempre nos limites daprudência e no momento oportuno. (LUBICH, Chiara, Discurso Castel Gandolfo, 3 de janeiro de 1989).

Para entendermos a dimensão do amor em Chiara precisamos ler o seu

discurso no dia de Santa Chiara, onde ela fala que é preciso escolher Deus no

caminho da unidade:

Então, querem uma palavra de conclusão, que é aquela que dizemos sempre no dia de santa Clara. Quando éramos jovens como vocês, como a maioria aqui, sempre nos impressionou muito umafrase que santa Clara disse a são Francisco, quando são Francisco praticamente a arrastou pelo seucaminho. São Francisco lhe perguntou: "Filhinha, o que deseja?"Poderíamos pensar em mil coisas, que ela dissesse: "Eu quero seguir você pelo caminho dapobreza. Eu quero ser freira, trancar-me num convento", etc. Ao invés, ela acertou em cheio. "Filhinha, oque você deseja?" E ela respondeu: "Deus". Desejava Deus, escolhia Deus, porque Deus a tinhaescolhido.É a mesma escolha que fizemos no início do Movimento. Fizemos uma única escolha: Deus! Deus emergiu acima dos bombardeios e de todas as coisas. Acreditamos em Deus. Fizemos de Deus oideal da nossa vida.E vemos que é sempre novo, porque a escolha de Deus nos faz pospor todas as riquezas quevamos acumulando até mesmo sem perceber. Pode ser que sejamos ricos do focolare. Sejamos ricos dascoisas, ricos da nossa inteligência, dos estudos. Somos ricos, não sei, dos nossos parentes. Somos ricosdo nosso sacerdócio. Somos ricos de outras coisas ainda. O nosso ideal, que é Jesus abandonado, que é onada, que se fez nada, nos ajuda a pospor tudo para colocar Deus antes de tudo e fazer todo o restoporque é vontade de Deus.É o que nos recorda também hoje Santa Clara. Ela agiu assim, escolhendo o caminho da pobreza.Nós o fazemos, escolhendo o caminho da unidade, tendo sempre Jesus no nosso meio, o Ressuscitado eJesus em nós, em virtudo do amor a Jesus abandonado.” (http://www.focolare.org/pt/chiara-lubich/chi-e-chiara/ , Acesso 15/11/14)

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CONCLUSOES

Portanto, com a análise do conceito de amor de Agostinho e Chiara

Lubich, concluímos que ambos possuem bastantes semelhanças. Por mais que

tenham vivido em épocas totalmente distintas, e situações bem diferentes. Eles

partem de um mesmo pressuposto: O amor como forma de integração e

pacificação da sociedade. Propagam que a fraternidade deve ser levada a sério

e colocam como regra geral o amor, amor esse que vem do amor supremo, que

para eles é o único digno. É o amor supremo que transforma o ser que por sua

vez transforma a sociedade. Agostinho e Lubich tiveram importância periclitante

na formação do conceito de fraternidade. Através de seus estudos que

objetivaram um modelo de “fraternidade universal” onde o amor é o caminho, é

o que faz “um” é o que transforma.

REFERÊNCIAS

AGOSTINHO. Confissões. São Paulo: Editora Vozes, 2009. Bíblia NTLH.

GOMES, Rogério. O amor em Santo Agostinho, antes de sua conversão.

Artigo Revista PUC. Campinas, 1999.

SCHNEIDER, Paulo. O conceito de amor em Agostinho. Disponível em: http://www.mundofilosofico.com.br/arquivos/artigos/schneider/conceito_amor.pdf Acesso em: 01/11/2011 http://www.focolare.org/pt/chiara-lubich/chi-e-chiara/ , Acesso 15/11/14

LUBICH, Chiara. Discurso Castel Gandolfo. 3 de janeiro de 1989.

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As múltiplas facetas da linguagem: poder e

diálogo

Izaquiel Arruda Siqueira51 Maria de Fátima Batista Costa52

Resumo: A linguagem se constitui através das relações dos homens com o mundo. Estes homens, desde as épocas mais remotas, perceberam que a necessidade do compartilhamento da vida era indispensável para a sobrevivência. De tal modo, partilhando as experiências da vida privada e pública, construíram relações e se constituíram como relação. Com os desdobramentos de tal desenvolvimento surge a vontade de domínio e em consequência disto, a experiência do poder. No entanto, usar este poder requer o cuidado devido para não transformá-lo em tirania, pois a tirania mina a ação política dos sujeitos, reduzindo o espaço da intersubjetividade e isolando os indivíduos na vida privada, aniquilando a vida pública. Desse modo, o diálogo é um dos caminhos da compreensão e reconciliação humana contra as formas tirânicas dos relacionamentos humanos. O diálogo pode surgir de forma única a partir do milagre, que, segundo Hannah Arendt, é uma ação que nunca antes existiu, algo inovador. É sobre esta temática que o presente artigo versa.

Palavras-chaves: linguagem; poder; diálogo; relações humanas.

INTRODUÇÃO

O presente estudo foi norteado a partir de leituras de textos filosóficos que

trazem a problemática da linguagem como discussão central sobre a condição

humana. Johann Gottfried Herder, filósofo do século XVIII, na obra Ensaio

Sobre a Origem da Linguagem, já havia percebido que a linguagem não surge

a partir de uma invenção divina ou algo parecido, mas da própria convivência

51 Concluinte do curso de Licenciatura Plena em Filosofia e aluno-pesquisador do Programa de Iniciação Científica (PIC), vinculado ao Núcleo de Pesquisa (NUPESQ) da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Caruaru – FAFICA. E-mail: [email protected] 52 Doutora em Letras e mestra em Filosofia pela UFPE. Professora da FAFICA/ESTACIO/ESUDA, cuja presente pesquisa está sob sua orientação.

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dos seres humanos entre si e dos desafios do mundo que os cerca. O homem

inventa a linguagem e é modelado por ela, assim, esta obra de Herder é de

importância fundamental para os estudos sobre a linguagem e também para

antropologia. O século XX é inaugurado por um conjunto de reflexões

imprescindíveis sobre a questão da linguagem. Martin Heidegger, Hans-Georg

Gadamer, Maurice Merleau-Ponty, dentre outros, empregaram seus esforços no

sentido de tentar dilucidar os enigmas do homem como ser de linguagem.

Hannah Arendt, também filósofa do século XX, mais conhecida pela

contribuição que dá sobre o pensamento político, irá construir uma obra que trata

dos vários problemas que afligem o homem dentre eles, a questão da linguagem.

Arendt compreendia a linguagem como fundamentadora das relações entre os

sujeitos. Portanto, para o presente trabalho foram usados os textos que

contemplam a discussão proposta, sobretudo o capítulo V da obra A Condição

Humana, onde a pensadora se detém na relação entre ação e discurso.

Buscamos ainda outros filósofos contemporâneos para solidificarmos a reflexão

sobre a linguagem como poder e diálogo que são, além dos já citados Gadamer

e Merleau-Ponty, Martin Buber e o cientista político Norberto Bobbio, dentre

outros.

Para Arendt, conviver é estabelecer relações de poder, isso porque ela

compreende que o próprio poder faz parte da organicidade da vida privada e

pública. Neste artigo iremos desvencilhar a ideia que poder é algo ruim ou até

mesmo “que corrompe” a vida humana. Na visão arendtiana, o perigo que

repousa sobre o poder não é o fato de se ocupar dele para aparelhar a vida dos

sujeitos, mas sim, permitir que ele se transforme no pior que poderia ser: a

tirania.

A ORIGEM DA LINGUAGEM E SUA FUNÇÃO NA VIDA HUMANA

Pensar a questão da linguagem não é tarefa simples, requer investigação,

análise e sensibilidade nas observações bibliográficas e empíricas. Muitos

pensadores, filósofos, linguistas, filólogos, dentre outros, mergulharam nesse

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oceano reiteradamente explorado e sempre obscuro. Pensar a linguagem é

buscar compreender sua natureza e utilidade, sua origem e sua força humana.

Qual a origem da linguagem e que relação mantém com o mundo prático da vida

humana? Johann Gottfried Herder demonstrou, em sua obra Ensaio Sobre a

Origem da Linguagem, que a linguagem não é uma invenção divina, ao

contrário, é constituída a partir da relação do homem com o mundo, a partir do

desenvolvimento de sua potencialidade. Na visão de Herder,

[...] este homem não saiu da caverna de Platão, dum sombrio calabouço onde tivesse passado uma série de anos desde o seu primeiro momento de vida, sem luz e sem movimento, de olhos abertos mas cego, dotado de membros saudáveis mas paralisados, e que, pelo contrário, saiu das mãos da natureza com as suas forças, as suas seivas no mais puro estado, com a melhor, a mais apropriada disposição para se desenvolver desde o primeiro momento. 53

Nós, seres humanos, desde o momento em que nascemos, somos

inseridos em um mundo que não conhecemos, mas que passa a ser nosso a

partir do nosso nascimento e desenvolvimento, confirmado no discurso e na

ação. Importa perceber que, ao falar em discurso e ação, Hannah Arendt não

está fazendo uma “análise do discurso”, mas falando de duas propriedades

fundamentais da vida política, da vida dos cidadãos no mundo comum. Assim,

em sua célebre obra, A Condição Humana, destaca que essa inclusão no

mundo não é estabelecida pelas necessidades, apenas, mas instigada na

vivência com os outros:

É com palavras e atos que nos inserimos no mundo humano, e essa inserção é como um segundo nascimento, no qual confirmamos e assumimos o fato simples do nosso aparecimento físico original. Não nos é imposta pela necessidade, como o trabalho, nem desencadeada pela utilidade como a obra. Ela pode ser estimulada pela presença de outros a cuja companhia possamos desejar nos juntar, mas nunca é condicionada por eles; seu impulso surge do começo que veio ao mundo quando nascemos e a qual respondemos quando começamos algo novo por nossa própria inciativa (2014, p. 221).54

53HERDER, Johann G. Ensaio Sobre a Origem da Linguagem. Trad. José M. Justo. Lisboa: Ed. Antígona, 1987. p. 119. 54 ARENDT, Hannah. A Condição Humana. Trad. Roberto Raposo. 11ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2014. p. 221.

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É no desbravamento da existência, mediada pelas relações interpessoais,

que vamos descobrindo-nos como seres de relação, de ‘comunidade’. Nunca

seremos produtos isolados, pois foi à própria condição humana quem já nos

instituiu interligada com a vida exterior e interior, numa dinâmica que, em sendo

comunidade, tornamo-nos participantes de tudo aquilo que concerne a esta. Nós

somos na medida em que compartilhamos. E é próprio da condição humana a

intertroca de experiências mundanas, em situações que nos insere na

coexistência com o outro.

A origem da linguagem provém do relacionamento dos humanos com sua

própria condição, relação de complexidade e possibilidades com o mundo à sua

volta que, quanto mais vasto e múltiplo este mundo, mais necessidade de

linguagem o homem terá, pois é na pluralidade da existência que a linguagem

se dá. É nesse sentido que Herder afirma que os “sentidos e a organização do

homem não estão aperfeiçoados numa direção específica” 55, juntamente com

Hannah Arendt quando ressalta que: “O domínio público, enquanto mundo

comum reúne-nos na companhia um dos outros [...]” 56, e “[...] a ação e o discurso

são os modos pelos quais os seres humanos aparecem uns para os outros,

certamente não como objetos físicos, mas qual homens”.57 Herder e Arendt

compreenderam que a existência humana é sempre uma experiência

compartilhada e nisto reside a possibilidade de desenvolvimento do mundo.

Viver em comunidade requer uma busca de entendimento da própria

condição como ser de relação, pois o homem se dá e se tece como ser relacional.

Não ficará nunca isento desta tarefa de intercomunicação com o mundo. Essa

intercomunicação é potencializada com o uso da razão, que é uma das

categorias responsáveis pelo processo de desenvolvimento da linguagem. No

entanto, os animais tambémse comunicam, trata-se de saber de que ordem é

esta comunicação e se guarda ainda relação com o processo de comunicação

humana, visto que sendo a razão humana resultado de um descolamento da

55HERDER, Johann G. Ensaio Sobre a Origem da Linguagem. Op. cit. p.44. 56ARENDT, Hannah. A Condição Humana. Op. cit. p.64. 57 Ibidem. p. 220.

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natureza e de uma consequente complexificação da condição deste ser que se

descolou, ou seja, que não mais responde de forma natural ao que a natureza

lhe perguntou, e mais, interroga a própria natureza compreendendo-a como

enigma e desafio, sua constituição de linguagem tem um caráter especifico.

O homem não se comunica apenas e tão somente por necessidade

instintiva ou condicionada, mas sim pela necessidade de criação de si mesmo,

de seu sentido, através da reflexão. Deste modo, compete a afirmativa de Herder

quando diz que: “[...] se o homem não podia ser um animal instintivo, então,

devido à força positiva da sua alma e à liberdade de ação dessa força, tinha que

ser uma criatura dotada de reflexão”58. Nesta mesma direção Hans-George

Gadamer, a partir de uma interpretação efetivada por Aristóteles a respeito da

diferença entre a condição animal e a condição humana, confirma o que Herder

dissera outrora:

[...] os animais têm a possibilidade de entender-se mutuamente, mostrando uns aos outros o que lhes causa prazer, a fim de poder buscá-lo, e o que lhe causa dor, a fim de evitá-lo. Aos animais a natureza só lhe permitiu chegar a esse ponto. Apenas aos homens foi dado ainda o logos, para que se informem mutuamente sobre o que é útil ou prejudicial, o que é justo e injusto.59

Ter um logos60 constituindo sua condição faz com que o homem se

aperceba como aquele que só pode se desenvolver quando está em contínua

58HERDER, Johann G. Ensaio Sobre a Origem da Linguagem. Op. cit. p. 52. 59 GADAMER, Hans-Georg. Verdade e Método II: complementos e índices. Trad. Ênio Paulo Giachini; revisão de trad. de Marcia Sá Cavalcante Schuback. Petrópolis: Vozes, 2002.p. 173. 60Em Platão e Aristóteles, o conceito de λόγος é polissêmico e, de tal modo, que os vários significados tendem a se dispersar, sem a orientação positiva de um sentido fundamental. Mas, de fato, isso é somente uma aparência que se há de manter enquanto não se puder apreender devidamente o conteúdo primordial de sua significação básica. Quando dizemos que o significado básico de λόγος é fala, essa tradução literal só terá valor completo quando se determinar o que é uma fala. A história posterior do significado da palavra λόγος e, sobretudo, as interpretações diversas e arbitrárias da filosofia posterior encobrem constantemente o sentido próprio de fala, que e bastante claro. Desse modo, se “traduz”, o que sempre quer dizer, interpreta-se λόγος por razão, juízo, conceito, definição, fundamento, relação, proporção. Mas como poderia a fala modificar-se tanto para que λόγος signifique tudo isso e, justamente, no uso de uma linguagem científica? Mesmo quando se entende λόγος como enunciado, e o enunciado como “juízo”, esta tradução aparentemente correta pode, na verdade, deixar de fora o significado básico, sobretudo quando se concebe juízo no sentido hodierno de uma “teoria do juízo”. Em todo caso, λόγος não diz, ou não diz primeiramente, juízo, caso se entenda por juízo uma “ligação” ou um “posicionamento” (aceitar-rejeitar) (HEIDEGGER, 2007, p.71).

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ligação com aquilo que o outro é. Sem isso, haveria prejuízo em sua formação

humana, pois, assim como o corpo humano necessita se manter de alimentos

necessários à sua nutrição, a condição humana necessita da presença do outro,

condição indispensável para a tomada de sua própria humanidade. Deste modo,

a linguagem é uma iniciativa humana, e ao mesmo tempo, o processo e o

resultado dessa busca por relação. “A linguagem é”, portanto.

A ausência que faz com que o homem busque a comunicação é,

primeiramente, sua necessidade extrema de participação na vida pública. Sem

vida social o homem não se afirma, pois a vida privada, unicamente, não dá

condições e garantias do suprimento das necessidades políticas e

intersubjetivas. É através desta necessidade de comunicar, de trazer o outro

mais para perto, de fazer com que o ausente se torne presente, de narrar suas

façanhas que a vida pública se tornou o lugar primordial de seu discurso e ações.

“Relação é reciprocidade”61, dizia Buber. A vida no isolamento ao mesmo tempo

em que é insuportável, é impossível, e não há um só ser humano que desenvolva

a linguagem na reclusão, isolado do convívio com os outros.

Ao contrário da fabricação, a ação jamais é possível no isolamento. Estar isolado é estar privado da capacidade de agir. A ação e o discurso necessitam tanto da presença circunvizinha de outros quanto a fabricação necessita da presença circunvizinha da natureza, da qual obtém seu material e de um mundo onde coloca o produto acabado. A fabricação é circundada pelo mundo e está em permanente contato com ele; a ação e o discurso são circundados pela teia de atos e palavras de outros homens, e estão em permanente contato com ela.62

No contexto relacional da vida humana , a ação e o discurso ganham significados

simbólicos, revelando as mais íntimas particularidades do ser:

[...] uma palavra ouimagem é considerada simbólica no momento em queimplica algo além de seu significado manifesto e imediato, algo que não pode ser precisamente definido ouexplicado.Por este motivo, [...]frequentemente usamos termossimbólicos para representar

61 BUBER, Martin. Eu e Tu. Tradução do alemão, introdução e notas por Newton Aquiles Von Zuben. São Paulo: Centauro, 2001. p. 60. 62 ARENDT, Hannah. A Condição Humana. Op. cit. p.p. 235.

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conceitos que não conseguimosdefinir completamente. Um exemplo é autilização de linguagem simbólica [...].63

No entanto, essas ações e discursos simbólicos, que deixam de ser meras

atuações, principiam na vida privada e se dilatam na vida pública. Assim, os atos

humanos são geralmente carregados de significação e simbolismo,

característicos da própria linguagem e que abrem possibilidades para a

diversidade, a pluralidade. O homem não está só no mundo, sua presença requer

presenças, e é por isso que existir implica convivência, pois a comunicação

humana é essencial para o seu “dar-se”. Conviver é interagir, mesmo a palavra

falada estando ausente: experiência do “não-dito” que esconde em si uma gama

de interpretações; esse “não-dito” é a força de expressão da linguagem que se

manifesta na gesticulação, nas emoções, nos olhares, na fala etc.

O “não-dito” torna-se “dito” afirmando ou negando aquilo que é

comunicado. Muitas vezes quando dizemos “sim” a uma situação que queríamos

dizer “não”, emitimos sinais quedemonstram o contrário, nos denunciando. É aí

que percebemos que a linguagem está pautada na ótica simbólica. No entanto,

o contrário do “não-dito” existe: é o “dito”, propriamente falando. O “não-dito”

completa o “dito” exprimindo aquilo que somos. Assim, a vida privada e pública

são manifestação de linguagem simbólica.

É pelo discurso e ação que o homem toma posse da atribuição e

participação na vida pública, a política64 que, no entendimento grego, requer

liberdade. Portanto, é na liberdade que mostramos quem somos, enquanto

pessoa, através da fala e da ação, como afirma Hannah Arendt:

A ação e o discurso ocorrem entre os homens, uma vez que a eles são dirigidos, e conservam sua capacidade de revelar o agente (agent-revealing) mesmo quando o seu conteúdo é exclusivamente “objetivo”, dizendo respeito a questões do mundo das coisas no qual os homens se movem, mundo este que se interpõe fisicamente entre eles e do qual procedem seus interesses específicos, objetivos e mundanos. Esses interesses constituem, na acepção mais literal da palavra, algo

63RIBEIRO, Emílio Soares. Um estudo sobre o símbolo, com base na semiótica de Peirce. Estudos Semióticos. [on-line] Disponível em: h http://www.fflch.usp.br/dl/semiotica/es i. Editores Responsáveis: Francisco E. S. Merçon e Mariana Luz P. de Barros. Volume 6, Número 1, São Paulo, junho de 2010, p. 46–53. Acesso em “01/07/2014”. p. 48. 64ARENDT, Hannah. A Condição Humana. Op. cit. p. 247.

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que inter-essa(inter-est), que se situa entre as pessoas e que, portanto, é capaz de relacioná-las e mantê-las juntas.65

Sendo revelado, o sujeito não fala sem uma consciência, mas a sua

própria fala e a sua consciência é uma experiência só, pois a elaboração de uma

ideia já é o processo de linguagem, sendo a linguagem, portanto, uma

experiência do corpo próprio, sua expressão. E neste sentido o corpo é portador

de uma intencionalidade. O filosofo Merleau-Ponty aponta para o fato de que o

homem não tem um corpo e uma linguagem como experiências estanques,

separadas, mas o corpo é o possibilitador do dito e do “não-dito”.

[...] a intenção de falar só pode encontrar-se em uma experiência aberta; ela aparece, assim como a ebulição em um líquido, quando, na espessura do ser, zonas de vazio se constituem e se deslocam para o exterior. A partir do momento em que o homem se serve da linguagem para estabelecer uma relação viva consigo mesmo ou com seus semelhantes, a linguagem não é mais um instrumento, não é mais um meio, ela é uma manifestação, uma revelação do ser íntimo e do elo psíquico que nos une ao mundo e aos nossos semelhantes.66

É importante destacar que Merleau-Ponty acena para a questão do

envolvimento entre corpo e fala, fala e pensamento: “[...] na realidade, eles estão

envolvidos um no outro, o sentido está enraizado na fala, e a fala é a existência

exterior do sentido”67. Esses sentidos são trespassados por símbolos, o que quer

dizer que quando nos expressarmos através da linguagem simbólica, aquilo que

somos é anunciado. Somos o que falamos, quer dizer isto que o discurso e o

agir segue o ser? Ainda sobre isto, esclarece Merleau-Ponty:

[...] as linguagens, quer dizer, os sistemas constituídos de vocabulário e sintaxe, os “meios de expressão” que existem empiricamente, são o depósito e a sedimentação de atos de fala nos quais o sentido não formulado não apenas encontra um meio de não traduzir-se no exterior, mas ainda adquire a existência para si mesmo, e é verdadeiramente criado como sentido.68

65ARENDT, Hannah. A Condição Humana. Op. cit. p. 228 66Merleau-Ponty, Maurice. Fenomenologia da Percepção. São Paulo: Martins Fontes, 1994. – (Coleção Tópicos). p. 266. 67Ibidem. p. 247. 68 Ibidem. p. 266.

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Os relacionamentos humanos se dão porque o homem os inventa sendo

também inventado no mesmo movimento, igualmente acontece com a

linguagem, pois esta é uma dimensão que o próprio sujeito desenvolve através

das potencialidades que lhes são inerentes. No entanto, como todo ato livre, tem

o homem também que aprender a escolher e decidir tendo em vista a pluralidade

dos homens e o mundo comum, isso porque o uso que se faz não apenas da

linguagem, mas também de outras potencialidades humanas, pode resultar em

instrumento de repressão ou mesmo de aniquilamento humano, como é o caso

da repressão política. Não temos plena consciência da relevância daquilo que

comunicamos aos outros, pois cada um de nós ao falar está sempre emitido

juízos e estes se comportam muitas vezes como sentenças.

O PODER E O DIÁLOGO COMO EXPRESSÃO DA LINGUAGEM

Toda a história humana está atravessada pelo poder como forma de

dominação. Homem e poder caminham juntos, igualmente linguagem e poder.

No entanto, sempre que falamos nessa palavra, imediatamente associamos com

o conceito pejorativo dessa ação. Acredita-se em poder somente como uma

forma negativa de dominação, atemorização, imposição. No entanto, é

importante saber que poder, necessariamente, não significa só isso, mas supera

as conceituações do senso comum, pousando na ideia da organicidade da

comunidade humana. A vida humana, portanto, está estreitamente ligada a

inúmeros tipos de poder: social, político, parental, religioso, educacional, afetivo

etc. Existir é obrigatoriamente estabelecer relações de poder, que faz com que

os sujeitos vivam juntos em comum, como afirma Arendt:

O único fator material indispensável para a geração do poder é a convivência entre os homens. Estes só retêm poder quando vivem tão próximos uns aos outros que as potencialidades da ação estão sempre presentes; e, portanto, a fundação de cidades, que como cidades-Estados se converteram em paradigmas para toda organização política ocidental, é na verdade a condição prévia material mais importante do poder. O que mantém unidas as pessoas depois que passa o momento fugaz da ação (aquilo que hoje chamamos de “organização”) e o que

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elas, ao mesmo tempo, mantém vivo ao permanecerem unidas é o poder.69

Este poder social, sustentado no discurso atrelado à ação, é aquele no

qual o homem exerce poder sobre outro homem. Em toda sociedade, a questão

do conhecimento implica numa questão de poder, no entanto o poder não é

patrimônio exclusivo daqueles detentores de uma quantidade maior de saber, o

poder está distribuído em todas as esferas da sociedade, de modo diferente.

Mesmo o falar, como resultado da compreensão humana, é uma articulação do

poder sobre o outro. Por exemplo, um pai tem poder sobre filho, um médico sobre

o paciente, o professor sobre o aluno, o sacerdote sobre os fiéis, o Governo

sobre o povo, a propaganda sobre os consumistas etc., no entanto, o caminho

inverso também é feito com graus e especificidades de poderes diferentes, e

esses tipos de relações são determinantes para os comportamentos dos

sujeitos. Por exemplo, pela força de influência, segundo Norberto Bobbio (2000),

um professor, que é aquele que facilita a construção do conhecimento, tem poder

sobre a vida acadêmica do aluno. Com isso, o discente deve comportar-se de

maneira a corresponder às determinações do docente, senão o prejuízo estará

assegurado na sua vida intelectual. Observa-se que o discurso e a ação do

professor geram uma mudança de atitude no aluno, ou seja, é uma relação entre

atitudes para agir:

De uma parte, A tem a possibilidade de ter um comportamento cujo objetivo é a modificação do comportamento de B. De outra parte, se esta possibilidade é levada a ato, é provável que B tenha o comportamento em que se concretize a modificação de conduta pretendida por A. Um chefe militar exerce Poder sobre seus soldados quando ordena o ataque e seus soldados executam a ordem. E tem

Poder sobre eles se é provável que os soldados atacariam se o comandante ordenasse. Uma vez que exerce o Poder implica necessariamente ter a possibilidade de exercê-lo, o Poder social, em seu sentido mais amplo, é a capacidade de determinação intencional ou interessada no comportamento dos outros.70

69ARENDT, Hannah. A Condição Humana. Op. cit. p. 251. 70BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco.Dicionário de Política. Trad. Carmen C. Varriale... [et al]; coordenação da trad. João Ferreira; revisão geral João Ferreira e e Luís Guerreiro Pinto Cascais. 5ª ed. Brasília: Editora Universidade de Brasília: São Paulo: Impressa Oficial do Estado, 2000.p. 936.

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É importante destacar que o poder social e histórico (que é construído por

relações humanas) só existe porque há quem esteja pronto a obedecer-lhe. Só

existe censura porque existe quem esteja disposto a curvar-se a ela, legitimando

o poder dos censuradores. Esse cerceamento deixa na vida daquele que é

silenciado, inevitavelmente, conseqüências que podem ser boas ou más,

dependendo de como foi a experiência: a identidade afetada pelo poder.

Na maioria das vezes o poder tirânico é visto como a principal forma má

de exercício de poder, no entanto, há uma variedade grande desses tipos de

experiências, desde as mais sutis, as mais atrozes. Um problema conceitual

dessa ordem acontece quando atrelamos o conceito de poder à tirania, ou

estigmatizamos o poder como aquele que corrompe a ação humana. Isso se dá

a partir dos tipos de relações que os seres humanos estabeleceram e

estabelecem ao longo da história: colonizações, regimes totalitários,

silenciamento cultural e religioso, neoliberalismo, manipulação ideológica etc.

Esses tipos de relações levaram a subjetividade humana ao prejuízo, impondo

um sentido singular para suas vidas.

A linguagem tem um papel inquestionável e indispensável nas execuções

tirânicas, onde a “(...) a autoridade é confundida com poder e associada com a

força”71 através do discurso e da ação. No entanto, a autoridade só se torna

autoritarismo onde o poder perdeu seu vigor, perdeu sua legitimidade, e com

essa perda surgiu a violência. A violência é a forma escrupulosa de calar a

liberdade. Só que esta liberdade não é,a priori, a liberdade intersubjetiva, mas

sim, a liberdade política: livre falar e agir no espaço público da vida social. “A

raison d’être da política é a liberdade, e seu domínio de experiência é a ação”.72

Assim sendo, a tirania é a pior inimiga da liberdade, pois mina a pluralidade e,

ainda que esteja focada nessa liberdade política, respinga na liberdade privada,

que não deixa de ser política também. Ameaçada nossa liberdade, é necessário

os atos de fundação; Bignoto (2001) comenta:

71 SOUKI, Nádia. In MORAES, Eduardo Jardim; BIGNOTO, Newton (orgs). Hannah Arendt: diálogo, reflexões e memórias. Belo Horizonte: Ed. UFMH, 2001. p. 125. 72 ARENDT, Hannah. Entre o passado e o futuro. São Paulo: Perspectiva, 2013. p.192.

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A liberdade política se expressa num mundo no qual a pluralidade é parte essencial e produto da ação contínua dos homens. Nesse sentido, o ato de fundação, criação de novos espaços humanos, é o ato que melhor expressa nossa capacidade de inventarmos nossa condição de seres livres. Dizendo de outra maneira, os atos de fundação são para Arendt as ações livres mais importantes que podemos levar a cabo, uma vez que derivam diretamente de nossa capacidade, única na natureza, de começarmos repetidamente a obra de nossa própria condição.73

Temos um exemplo muito próximo a nós: o movimento gerado no Brasil a

partir da tomada do poder por parte dos militares em 1964 é um exemplo no qual

observamos a linguagem usada tanto para a legitimação da tirania como da

libertação através de um ato de fundação, que apregoavam que seria uma breve

intervenção no Estado, apenas. Mas foi além, iniciando uma ditadura “à

brasileira”, com características totalitárias que silenciou inúmeros jornalistas,

políticos, artistas e cidadãos que se posicionaram contra o regime, reduzindo-os

à inimigos do governo, taxando-os de comunistas e até exilando-os em outros

países, sem falar nas torturas, mortes e outras formas de punições. Assim,

através do discurso ideológico, geravam para a sociedade uma imagem de

“inimigo comum”, expondo os “revoltosos” como exemplos para todo aquele que

se rebelasse contra a ordem militar. Entretanto, os militantes de esquerda, que

faziam da reflexão seu carro chefe de partida contra a linha ditatorial, usaram a

linguagem.

Músicas de duplo sentido levaram os jovens a refletir; discursos e cartas

de políticos desafiavam o governo déspota; matérias jornalísticas contavam a

verdadeira face do terror que o Brasil sucumbia. E a única maneira que os

militares usavam para calar os grupos pensantes era silenciá-los. A linguagem,

estava, portanto, a serviço dos dois grupos. Com a coragem dos inconformados,

provieram, então, as atrocidades: mortes, exílio, prisões, torturas, ameaças,

redução da subjetividade isolando o sujeito que passava para o estado de

73 BIGNOTO, Newton. In MORAES, Eduardo Jardim; BIGNOTO, Newton (orgs). Hannah Arendt: diálogo, reflexões e memórias. Belo Horizonte: Ed. UFMH, 2001. p. 118.

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desolação. Arendt (1998), acentua o efeito totalitário do isolamento que gera

solidão, como uma das piores punições do regime:

O homem isolado que perdeu o seu lugar noterreno político da ação é também abandonado pelo mundo das coisas, quando já não é reconhecido comohomo faber, mas tratado como animal laborans cujo necessário "metabolismo com a natureza" não é dointeresse de ninguém. É aí que o isolamento se torna solidão. (...) Enquanto o isolamento se refere apenas ao terreno político da vida, a solidão se refere à vida humanacomo um todo. O governo totalitário, como todas as tiranias, certamente não poderia existir sem destruir aesfera da vida pública, isto é, sem destruir, através do isolamento dos homens, as suas capacidadespolíticas. Mas o domínio totalitário como forma de governo é novo no sentido de que não se contenta comesse isolamento, e destrói também a vida privada. Baseia-se na solidão, na experiência de não se pertencerao mundo, que é uma das mais radicais e desesperadas experiências que o homem pode ter.74

No entanto, em 1985 a ditadura brasileira teve um fim, como tiveram,

noutras épocas, diversos regimes totalitários. Os desastres e as lições retiradas

desses eventos marcantes na vida dos sujeitos são muitos. E o que ficou mais

explícito foi como o agente foi revelado através da linguagem, preferindo a tirania

ao diálogo. Este último é o único capaz de fazer com que os humanos se

compreendam, que significa muito mais que um mero entender. Dialogar é, antes

de tudo, se colocar no lugar do outro e adentrar seu mundo para uma

compreensão respeitosa daquilo que ele é. Tarefa difícil, pois praticamente todos

os sujeitos experimentaram alguma vez na vida situações de tirania, que ainda

subsistem de forma sorrateira e velada nos pequenos e grandes grupos sociais

de nossas comunidades.

Contudo, buscar o diálogo implica uma saída de si para, num ato de

humildade, buscar também, compreender o mundo que nos rodeia, conhecer as

articulações e ordenamentos da sociedade, ter uma visão crítica e real da teia

relacional (GADAMER, 2002). Isso pressupõe reflexão, tempo, ponderação e

assaz esclarecimento, pois compreender as mudanças bruscas às quais a

sociedade vem presenciando é um trabalho melindroso, já que estas mudanças

74 ARENDT, Hannah. Origens do totalitarismo. São Paulo: Cia. Das Letras, 1998. p. 527.

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cada vez mais fragmentam e liquidam a realidade, embaraçando as condições

dos sujeitos para uma relação dialógica. Há momentos, nas relações sociais em

que não damos prioridade para ouvir o outro, as crianças, os jovens, os

empobrecidos, os doentes, os felizes, os idosos, ouvir a si, a natureza, a música,

ouvir a voz da sociedade [...]. Não nos detemos mais na reflexão gerada pelo

auscultar, isto é, pelo escutar a partir de uma compreensão do que o outro é,

compartilhando do seu mundo.

Deixamos cada vez mais o espaço privado – este que é o lugar por

excelência do diálogo – ser invadido pelos ruídos de uma sociedade barulhenta.

É na vida privada que se aprende a dialogar para a vida pública. E vemos que,

a situação política e social atual – desprovida de um compromisso ético com a

humanidade – só agrava a falta de compreensão. E, bem lá no “olho do furacão”

todo esse caleidoscópio de incompreensão tem uma razão: a busca desenfreada

de interesses privados: interesses de indústrias, grandes marcas, governos,

agendas ideológicas etc. E é por isso que acreditamos que a única vereda por

seguir nesse momento crucial da história humana invadida pela falta de diálogo

é ouvir o outro. Um ouvir que começa no mais absurdo e fútil cotidiano da vida.

No entanto, ainda ressoa a pergunta: o que é mesmo o diálogo? Gadamer

responde essa interrogação destacando suas características:

O que é um diálogo? De certo que com isso pensamos num processo entre pessoas, que apesar de toda sua amplidão e infinitude potencial possui uma unidade própria e um âmbito fechado. Um diálogo é, para nós, aquilo que deixou uma marca. O que perfaz um verdadeiro diálogo não termos experimentado algo de novo, mas termos encontrado no outro algo que ainda não havíamos encontrado em nossa própria experiência de mundo. Aquilo que movia os filósofos a criticar o pensamento monológico é o mesmo que experimenta o indivíduo em si mesmo. O diálogo possui uma força transformadora. Onde um diálogo teve êxito ficou algo para nós e em nós que nos transformou. O diálogo possui, assim, uma grande proximidade com a amizade. É só no diálogo (...) que os amigos podem encontrar-se e construir aquela espécie de comunhão onde cada qual continua sendo o mesmo para o outro porque ambos encontram o outro e encontram a si mesmos no outro.75

Experienciar um verdadeiro diálogo com o outro requer um desnudamento

do que se é. Só dialoga quem entra na dinâmica da horizontalidade. A

75GADAMER, Hans-Georg. Verdade e Método II: op. cit.p.247.

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verticalidade nesse momento atrapalha o andamento da compreensão. Assim,

saber que a opinião (doxa, do grego)do outro tem uma valor, ainda que não

concorde, quebra o egoísmo e ânsia de querer ser aquele que é detentor da

verdade. Todos nós, enquanto sujeito, temos algo a dizer. E é no diálogo onde

vemos duas características que marcam a sua própria essência, a liberdade e a

democracia. A partir da horizontalidade na discussão se chega à uma reposta ou

pergunta comum.

O êxito de um diálogo dá-se quando já não se pode recair no dissenso que lhe deu origem. Uma solidariedade ética e social só pode acontecer na comunhão de opiniões, que é tão comum que já não é minha nem tua opinião, mas uma interpretação comum do mundo.76

O diálogo, como expressão da linguagem, é capaz disso: não prevalece

a minha ou a sua asserção, mas prevalecerá aquela final, na qual os dois são

contemplados e criam uma só afirmativa. Isso é uma comunhão de opiniões.

Gadamer aponta: “A verdadeira realidade da comunicação humana é o fato de

o diálogo não ser nem a contraposição de um contra a opinião do outro e nem o

adiantamento ou soma de uma opinião à outra. O diálogo transforma a ambos”.77

Dialogar, portanto, é fazer-se ao largo, escancarando as portas da alma para

que o outro entre, através da linguagem que é, sem sombras de dúvidas,

[...] o centro do ser humano, quando considerada no âmbito que só ela consegue preencher: o âmbito da convivência humana, o âmbito do entendimento, do consenso crescente, tão indispensável à vida humana como o ar que respiramos.78

A linguagem está posta no diálogo derrubando a tirania, e conduzindo o

ser humano a uma profunda intercomunicação, e essa intercomunicação

propiciada pelo querer compreender, podemos dizer que é uma ação capaz de

romper com as barreiras da linguagem tirânica através do milagre da liberdade,

76 GADAMER, Hans-Georg. Verdade e Método II: op. cit.p.221. 77 GADAMER, Hans-Georg. Verdade e Método II: op. cit.p.221. 78 GADAMER, Hans-Georg. Verdade e Método II: op. cit.p.182.

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que Hannah Arendt conceitua como a possiblidade de surgir algo novo na

história:

Milagre é a palavra que nossa autora usa repetidamente para compreender a possibilidade de um novo começo na história. Desde seus primeiros textos, passando pelos comentários sobre o fenômeno revolucionário até sua última obra, A Vida do Espírito, ela sempre insistiu sobre o fato de que a capacidade de começar é o dom mais extraordinário que recebemos e esse dom é, segundo ela, idêntico à liberdade: “O milagre da liberdade reside no poder de começar, que por seu turno reside no fato de que cada homem, tendo em vista que pelo nascimento vem ao mundo que já existia antes e vai continuar depois de sua morte, é ele mesmo um novo começo.”79

O milagre de uma ação inédita que faz surgir o diálogo é o caminho,

portanto, do encontro, da compreensão, da libertação do egocentrismo, da ponte

que liga os adversários. É através do milagre da liberdade que podemos tomar

a iniciativa de romper com a linguagem que segrega e divide os sujeitos em bons

e maus, dando um sentido singular à suas vidas. A linguagem a serviço do

diálogo é o resultado da ação e do discurso do sujeito que não se deixa vencer

pela tirania, mas sim pela fraternidade, assumindo sua condição de cidadão do

mundo, homem político.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Após a explanação da origem da linguagem, seu uso em duas formas, fica

claro que alinguagem é um processo inacabado, que se dá pelas relações que

os homens estabelecem entre si e com o mundo ao seu redor não por criação

divina. As interpretações da linguagem, enquanto expressão da consciência, é a

chave que abre a porta da percepção da intencionalidade do agir do sujeito. Esse

agir não está radicado em uma ação desprovida de significações. Pois que, esse

agir e discursar encontra seu lugar estável na vida pública, já queo homem

79BIGNOTO, Newton. In MORAES, Eduardo Jardim; BIGNOTO, Newton (orgs). Hannah Arendt: diálogo, reflexões e memórias. Belo Horizonte: Ed. UFMH, 2001. p. 117.

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desenvolve essa capacidade de comunicação nos relacionamentos que a vida

comum lhe enxerta.

Na medida em que os sujeitos vão compartilhando suas experiências na

vida privada e pública, a linguagem vai ganhando características e seu uso é

perpassado pelo poder, o que não haveria de ser diferente, já que toda a nossa

experiência humana é organizada por ele. No entanto, o perigo no qual os

sujeitos correm é o da linguagem ser usado a serviço da tirania e não do diálogo.

A linguagem se transformaria, neste caso, em instrumento que atemoriza a vida

política e intersubjetiva dos sujeitos, acarretando danos em sua personalidade

como foi o caso dos regimes totalitários denominados de nazismo, fascismo,

ditaduras do socialismo realmente existente etc. Nós vivenciamos, também,

experiência semelhante, que foi a ditadura brasileira, que tinha traços totalitários.

Esta se serviu da linguagem para levar a cabo seu plano de silenciar a voz de

muitos cidadãos, como igualmente seus direitos.

Analisando os estudos daqueles que se dedicaram a investigar a

linguagem, percebemos que ela surgiu como necessidade de convivência. Esta

convivência exige consenso, mais que isso, diálogo. O diálogo é a força capaz

de romper com as incompreensões, gerando agregação na pluralidade, pois

onde a pluralidade não é respeitada e aceita da forma mais comum o poder se

transforma na sua forma mais temerosa, reduzindo os sujeitos a objetos e

isolando-os sem que tenha o direito de serem ouvidos. Deste modo, algo novo

deve surgir para romper com a rede de cerceamento da linguagem humana: o

milagre da liberdade, segundo Hannah Arendt. E, com isso, concluímos que “...a

capacidade constante de voltar ao diálogo, isto é, de ouvir o outro, parece-me

ser a verdadeira elevação do homem a sua humanidade”.80 Pois, se o diálogo,

que é resultado de um auscultar, não for a meta primeira da compreensão

humana, toda a sua existência estará fadada ao desencontro com sua própria

condição. E dessa maneira, as ausências existenciais que só podem ser

80GADAMER, Hans-Georg. Verdade e Método: complementos e índice. Trad. Ênio Paulo Giachini. Petrópolis: Vozes, 2002.p. 251.

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preenchidas pela convivência humana, ficará sempre sofrendo os danos dos

desencontros do humano com sua própria condição.

REFERÊNCIAS

ARENDT, Hannah. A Condição Humana. Trad. Roberto Raposo. 11ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2014. ________. Entre o Passado e o Futuro. São Paulo: Perspectiva, 2013. ________.Origens do Totalitarismo. São Paulo: Cia. Das Letras, 1998. BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de Política. Trad. Carmen C. Varriale... [et al]; coordenação da trad. João Ferreira; revisão geral João Ferreira e e Luís Guerreiro Pinto Cascais. 5ª ed. Brasília: Editora Universidade de Brasília: São Paulo: Impressa Oficial do Estado, 2000. BUBER, Martin. Do Diálogo e do Dialógico. Trad. Marta Ekstein de Souza Queiroz e Regina Weinberg. São Paulo: Perspectiva, 2007. _______. Eu e Tu. Trad. do alemão; introdução e notas por Newton Aquiles Von Zuben. São Paulo: Centauro, 2001. GADAMER, Hans-Georg. Verdade e Método II: complementos e índices. Trad. Ênio Paulo Giachini; revisão de trad. de Marcia Sá Cavalcante-Schuback. – Petrópolis: Vozes, 2002. HEIDEGGER, Martin. Ser e Tempo. Trad. revisada e apresentação de Marcia Sá Cavalcante Schuback; posfácio de Emmanuel Carneiro Leão. 2ª ed. Petrópolis: Vozes. Bragança Paulista: Editora Universitária são Francisco, 2007. HERDER, Johann G. Ensaio Sobre a Origem da Linguagem. Trad. José M. Justo. Lisboa: Ed. Antígona, 1987. MERLEAU-PONTY, Maurice. Fenomenologia da Percepção. São Paulo: Martins Fontes, 1994. – (Coleção Tópicos). MORAES, Eduardo Jardim; BIGNOTO, Newton (orgs).Hannah Arendt: diálogo, reflexões e memórias. Belo Horizonte: Ed. UFMH, 2001. RIBEIRO, Emílio Soares. Um estudo sobre o símbolo, com base na semiótica de Peirce. Estudos Semióticos. [on-line] Disponível em: h http://www.fflch.usp.br/dl/semiotica/es i. Editores Responsáveis: Francisco E. S.

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Merçon e Mariana Luz P. de Barros. Volume 6, Número 1, São Paulo, junho de 2010, p. 46–53. Acesso em “01/07/2014”.

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A FRATERNIDADE COMO FUNDAMENTO DA POLÍTICA

NOS PENSAMENTOS DE CHIARA LUBICH E ENRIQUE

DEL PERCIO

Adilson Silva Ferraz81

A FUNDAMENTACAO DA POLITICA NA TEOLOGIA DA FRATERNIDADE UNIVERSAL DE CHIARA LUBICH82

“Fazer-se um é o verdadeiro realismo político.” (Chiara Lubich)

“Nós entendemos que nosso movimento surgiu para preencher

esta parte do evangelho. Que «todos » seria nosso campo de ação, e unidade e nossa razão de ser. Fazendo isto, o sonho de Deus, nossa própria ligação com o céu. Ao mesmo tempo, ele está inserido na história da humanidade, para desvelar o caminho em direção à irmandade universal.” (Lubich, 2007, p. 266)

Bertrand Russell (2014, p. 186) está correto quando afirma em seu

ensaio “Psicologia e Política” que nem sempre as opiniões políticas se baseiam

na razão. Mesmo um assunto tão técnico como o padrão-ouro teria sido

determinado fundamentalmente por sentimentos. A questão é saber se um

sentimento específico deve servir de base para a política e qual seria o melhor

sentimento para esta tarefa. Campello (SILVA, M. A. ANDRADE, F. G. LOPES,

P. M. (Orgs.), 2014, p. 13), por exemplo, em seu texto “Política e Amor: revendo

uma relação difícil”, afirma que é uma vantagem associar a política não somente

a racionalidade e a forma. Seria necessário entendê-la como uma dimensão

81 Doutorando em Direito pela Universidade de Buenos Aires (UBA), doutorando em Filosofia pela Universidade Católica Argentina (UCA), mestre em Filosofia pela UFPE, professor assistente da Faculdade ASCES, assistente da FAFICA e Auxiliar de II da Universidad de Buenos Aires - UBA. [email protected] 82 Chiara Lubich é a fundadora do movimento dos Focolares. Nasceu em 22 de janeiro de 1920, em Trento, morreu em 14 de março de 2008.

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constitutiva do ser humano, em que paixões, desejos e afetos cumprem um papel

fundamental.

Essa parece ser a proposta de Chiara Lubich quando fala em fraternidade,

um conceito que desde sua origem esteve ligado de alguma forma ao aspecto

não racional das relações humanas. Seu pensamento não constitui uma ciência

ou teoria em sentido estrito, senão uma teologia cristã que propõe uma ética

aplicada e um modelo de sociedade. A fraternidade, segundo a proposta de

Lubich, resumida nas palavras de Maria Voce (2014, p. 101): “(...) poderia

constituir um princípio de fundo útil, ou talvez indispensável (acreditam os

focolarinos), para reformular política e economia, comunicação e educação, ética

e cultura.” Como podemos observar, a fraternidade seria um princípio “guarda-

chuva” segundo o qual as mazelas do mundo poderiam ser desfeitas. Seguindo

esta perspectiva, a fraternidade teria sido esquecida no período moderno

(BAGGIO, 2008, p. 33), provocando uma distorção na tríade da revolução

francesa, já que somente em uma sociedade fraterna que a igualdade e a

liberdade poderiam ser verdadeiramente vividas. Seria preciso resgatar a

fraternidade, enquanto ideal, elemento interno ao homem e como pratica social

que levaria à paz mundial:

A fraternidade é capaz de dar fundamento à ideia de uma comunidade universal, de uma unidade de diferentes, na qual os povos vivam em paz entre si, sem o jugo de um tirano, mas no respeito das próprias identidades. E justamente por isso a fraternidade é perigosa. Descobrimos que somos livres e iguais porque somos irmãos. (BAGGIO, 2008, p. 53)

Esta não é a perspectiva adotada por Jean-Luc Ferry (2012, p. 123)

quando afirma que “(...) o segundo humanismo é da emoção e da afetividade.”

Segundo o francês, vivemos um momento histórico, o segundo humanismo, que

tem como principal característica o amor. Não o amor a um Deus, a uma pátria

ou a uma grande causa, mas o amor das relações cotidianas que dariam sentido

à nossa existência. Lubich, de modo bem distinto, defende o resgate do amor

nas relações humanas, mas sob uma perspectiva crista, com pretensões

ecumênicas. Podemos citar como principais características da teologia universal

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de Lubich: 1) é uma teologia cristã, na medida em que estaria inserida em sua

história (o movimento focolare surge a partir de um “carisma da unidade”) e utiliza

seus conceitos, 2) é normativa, pois dá diretrizes para o agir, 3) é programática,

já que propõe um modelo de sociedade a ser alcançado, 4) é kantiana (ainda

que não expressamente), pautando-se na pretensão de universalidade e

cosmopolitismo, 5) é antropológica, ao descrever o humano, 6) é um movimento

político, 7) baseia-se no conceito de “humanidade”, 8) é expansionista, ao

utilizar-se do conceito de “inundações”, 9) apresenta-se através de uma origem

espiritual ou divina, 10) está inserida num contexto de determinismo

escatológico, 11) é organicista, pois entende a sociedade partindo do indivíduo,

em direção a família, povo, humanidade, Deus, como um grande organismo. Não

é nosso objetivo neste trabalho explicar cada um destes pontos senão

apresenta-los como elementos importantes para a compreensão do modelo de

sociedade proposto por Chiara Lubich, que superaria a fragmentação atual.

Sobre a unidade, Lubich (2007, p. 227) esclarece em seu texto “Pessoas em

Comunhão” que:

Nós temos vivido o poder de educar, de oferecer alternativas, do desafio destas palavras, que é sempre vivo e sempre novo. Passo a passo, como foi imprimido em nossas vidas, e foi dada a elas (e essa é a tremenda tarefa da educação) uma unidade existencial. Esta unidade nos ajuda a superar a fratura e a fragmentação que as pessoas tem frequentemente vivido em relação a elas mesmas, aos outros, com a sociedade, a Deus, que ao mesmo tempo desenha a originalidade, e a irrepetível univocidade de cada um.

De acordo com essa visão resumida anteriormente, a política não nasce

do temor ao inimigo (é uma criação interior e exterior, na forma de uma pessoa,

grupo, comunidade estrangeira, etc.), mas pelo amor ao amigo, e a principal

causa da existência de uma falsa política seria a alienação (econômica, cultural,

etc.) e a incapacidade de doar-se.

Na verdadeira política não há fim que justifique como meio um ato de

inimizade, já que nela todo meio deve ser bom em si mesmo. Definir

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a política em função do inimigo criaria o inimigo e a guerra significaria o fracasso

da política. A verdadeira política seria uma via de perfeccionamento,

promovendo um diálogo entre a sociedade. Nesse modelo de política existiriam

os políticos que participam por um ideal, de modo altruísta, e não por

conveniência. Este modelo de político é chamado de “político da unidade”. A

base social para a unidade seria o amor reciproco, sendo a fraternidade o motor

que lhe gera, libertando os indivíduos da pressão dos interesses privados,

canalizando-os para a prática do bem comum. Segundo Lubich (2007, p. 81), o

cumprimento do eterno desejo de Deus se baseia no amor fraterno, que é

encontrado neste mandamento: “Eu vos dou um novo mandamento, que vos

amem uns aos outros.” Desse modo, a fraternidade seria uma condição para a

existência da verdadeira política. Abaixo, há uma síntese da passagem da falsa

política a uma verdadeira política com o modo pelo qual é realizado o processo

de mudança.

DIVERSIDADE UNIDADE MODO

REAL IDEAL ADEQUACAO

INDIVIDUO HUMANIDADE CONVERGENCIA

EGOISMO ALTRUISMO TRANSFORMACAO

PARTICULAR UNIVERSAL CONVERGENCIA

CONFLITO PAZ TRANSFORMACAO

Há adequação quando o parâmetro é alcançado. A unidade é lograda

quando o real alcança ou se encaixa com o ideal. Com a convergência é

diferente pois o indivíduo não se dissolve na humanidade, conservando suas

características. Igualmente ocorre com a convergência entre particular e

universal, na medida em que o particular é particular no universal. Já com a

transformação o que ocorre é uma mudança na natureza do fenômeno. O

egoísmo deixa de ser o que é para ser altruísmo. O mesmo ocorre com o conflito,

que vira paz. Entretanto, não devemos entender essas mudanças de forma dual.

Lubich acredita em um mundo que reflete a natureza divina, que seria sempre

ternário. Desse modo, a política verdadeira seria uma expressão autêntica do

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sagrado e uma etapa de realização da criação. Esta é, em linhas gerais, uma

fundamentação da política segundo a religião, na versão cristã apresentada por

Lubich.

FRATERNIDADE E CONFLITO NA FILOSOFIA DE ENRIQUE DEL PERCIO

(...) la fraternidad también nos muestra que, si bien los

Hermanos muchas veces se pelean, no siempre se matan.

A veces, los Hermanos se toleran, se resignan a aceptarse

y hasta, en ocasiones, se quieren entrañablemente. E

incluso, pueden pelearse y quererse por igual. Este carácter

ambiguo puede molestar al intelectual acostumbrado a

trabajar con esencias y conceptos claros y distintos. (Del

Percio, 2014, p. 36)

Para Enrique del Percio, em seu libro “Ineludible Fraternidad”, que pode

ser traduzido como “Fraternidade Inescapável”, a fraternidade é um dado

antropológico não reconhecido pela grande maioria dos teóricos. O que isto quer

dizer? Que podemos falar da fraternidade no sentido descritivo, mas o emprego

mais frequente é no sentido normativo, que indica o desejo que os frates se

gostem, que se deem bem (Del Percio, 2014, p. 20). Uma visão antropológica

sobre a fraternidade colocaria em realce sua face realista, que olha para a origem

e revela seu carácter de luta ou conflito.

(...) en la familia, los padres establecen la verticalidad que tiende

a disolver el conflicto. En cambio, en el ámbito público no hay

padre ni madre: no hay persona ni grupo que pueda detentar

“naturalmente” la función paterna de establecer la ley, ni hay una

sociedad-útero en cuyo seno maternal todo antagonismo se

disuelve. (PERCIO, 2014, p. 20)

Com as devidas diferenças, é a mesma perspectiva basicamente

defendida por Alexandre Costa Lima (SILVA, M. A. ANDRADE, F. G. LOPES, P.

M., 2014, p. 85) em seu texto “Cidadania Não-Liberal e Fraternidade: as

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contribuições de Arendt e Schmitt”, onde destaca o valor do conflito para uma

política democrática fraterna. Acredita que longe de transformar a política em um

campo de batalhas, proporciona um exercício positivo da liberdade pública. Essa

perspectiva realista contribuiria para um exercício mais efetivo da cidadania, na

medida em que os antagonismos são transformados de modo criativo em um

ambiente de pluralismo democrático.

Uma das teses principais do livro de Del Percio, que materializa a única

filosofia construída até o momento sobre o tema, diz respeito ao fato de que a

fraternidade seria uma catacrese, e nao uma metáfora: “En retórica, una metáfora a la

que falta uno de sus términos o « lados », no es propiamente una metáfora. Catacresis

es la figura retórica que consiste en designar una cosa para que se carece de nombre,

usando el nombre de otra cosa. Por ejemplo, los « brazos » del sillón (...)” (Del Percio,

2014, p. 44). Entender a fraternidade desse modo permite defini-la sem recorrer a um

detalhamento mais extensivo, já que não ha como fundamentar uma antropologia do

humano sem emaranhar-se na metafísica, ao mesmo tempo em que a catacrese é

utilizada como chave para entender o fenômeno político.

Outro ponto importante é a relação entre fraternidade e ideologia. A

fraternidade poderia devolver a possibilidade de pensar a politica como uma

construção coletiva de novas ideologias, sempre abertas a experimentação (Del

Percio, 2014, p. 115). A política neste sentido é um processo e não uma

substância, de modo que a liberdade e a igualdade são produto dessa

construção social. Com a fraternidade a liberdade se tornaria “liberação”, que é

o caminho para a “justiça social”, o correlato da igualdade após ser

ressignificada. Essa fraternidade é também universal, de modo a não ser

excludente, mas também situada, o que quer dizer que parte das diferenças

entre os particulares em vez de universalizar um particular. O universal-situado

da as bases para uma forma particular de pensar o movimento da história,

constituindo, segundo o autor, uma proposta ética e epistemológica:

El pensar desde las victimas pone al resguardo el carácter universal de la fraternidad al distinguirlo de la universalidad imperial propia de la filosofía europea y de ciencias disciplinarias,

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la que es una universalidad derivada de una particularidad exitosa que niega las otras particularidades. (Del Percio, 2014, p. 79)

Dessa forma, a fraternidade permite pensar o universal desde as

particularidades de cada situação, garantir a inclusão dos terceiros (que escapa

a relação eu-tu), os outros, os excluídos. Ademais, o reconhecimento da

fraternidade como abertura ao conflito liberaria os sujeitos do desejo (desejar

viria de de-siderare, liberar-se do destino imposto pelas estrelas) narcisista

capitalista:

Pero ¿Quién puede devolver la capacidad de desear? Es decir, “¿quién puede decirle a ese chico o a este pueblo: “tu destino no está escrito, vos podés liberarte de las estrellas, vos podés ser artífice de tu propio destino y no un instrumento de la ambición de nadie”?: la acción política. Una acción política que al asumir el valor de la fraternidad entienda que somos seres humanos, ni totalmente buenos ni totalmente malos (…) Del Percio (2014, p. 223)

Essa nova concepção de fraternidade resgataria um modelo de política

que permitiria que os sujeitos vivessem a vida não como um destino, senão

respeitando as diferenças, aceitando o conflito como elemento intrínseco da

política, dessacralizando as pessoas e instituições. Abaixo, um quadro que

sintetiza as principais características da fraternidade segundo a filosofia de

Enrique del Percio.

Quanto à Origem Antropológica

Quanto à Definição Catacrese

Quanto ao Modo de Desvelamento Conflito

Quanto à Proposta Proteção às Vitimas

Quanto a Abrangência Universal-Situado

Quanto as Consequências Liberaçao e Justiça Social

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A fraternidade, realizada na horizontalidade, ocorre pelo fato de não haver

verticalidade na condição humana, embora possa existir como produto da

interação entre os sujeitos. A fraternidade, segundo essa concepção, ocorre

justamente na ausência do pai.

Para continuarmos, após apresentarmos sucintamente a teologia da

fraternidade de Chiara Lubich e a Filosofia da fraternidade de Enrique del Percio,

vamos tentar reconstruir o conceito de fraternidade desde um ponto de vista

neutro, tentando adotar uma perspectiva reflexiva e crítica.

CONCLUSÃO

Obviamente, muitos argumentos presentes neste trabalho precisam ser

melhor explorados e explicados. Nossa intenção foi repensar o fenômeno da

fraternidade partindo das duas principais teorias sobre a fraternidade à luz da

busca por um modelo melhor de sociedade. Algumas perguntas devem persistir:

Como ser fraterno se eu não sei o que é fraternidade? É possível um uso

discursivo não ideológico e retorico da fraternidade moral e jurídica?

REFERÊNCIAS BAGGIO, A. M. (Org.). O Princípio Esquecido: exigências, recursos e definições da fraternidade na política. Vargem Grande Paulista: Cidade Nova, 2008. FERRY, J-L. A Revolução do Amor: por uma espiritualidade laica. Tradução de Véra Lucia dos Reis. São Paulo: Objetiva, 2014. RUSSELL, B. Ensaios Céticos. Porto Alegre: L&PM, 2014. SILVA, M. A. ANDRADE, F. G. LOPES, P. M. (Orgs.) Cidadania, Participação e Fraternidade – Uma abordagem multidisciplinar. Recife: Editora UFPE, 2014. PERCIO, E. Ineludible Fraternidad – conflito, poder y deseo. Buenos Aires: CICCUS, 2014.

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LUBICH, C. Essential Writings. Spirituality. Dialogue. Culture. New York: New City Press, 2007. VOCE, M. Desafios. Vargem Grande Paulista: Cidade Nova, 2014.

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Fraternidade como paradigma para uma ciência

emancipatória

Eugênio Cardoso: Mestrando em Saúde Pública pela ENSP/Fiocruz.

[email protected]

Wagner de Lima: Bacharelando em Enfermagem pela ASCES.E-mail: [email protected]

Existem dois projetos em jogo, isso já está claro; Contradição entre sem terra e latifundiários. Pois um projeta a liberdade, vida e produção. O outro, a injustiça, morte e especulação. (Zé Pinto) Atravessamos um dos períodos históricos mais sombrios da humanidade.

“Estamos diante de uma emergência planetária ambiental, colocando em risco a

maioria das espécies do planeta, incluindo a nossa, e que esta catástrofe

iminente tem suas raízes no sistema econômico capitalista” (FOSTER, 2013). A

ciência é um dos pilares fundamentalmente importante para as transformações

imprimidas e conduzidas pelo capitalismo e a serviço do capital. As

transformações sofridas nos meios de produção são condensações dos avanços

da ciência, e implica diretamente na organização social do trabalho. A ciência

como produto de uma dada sociedade “não é somente resultado, mas ao mesmo

tempo condições do processo de trabalho” (MARX, 1983).

A fraternidade ‘emerge’ nesse contexto como um novo paradigma do fazer

ciência numa nova perspectiva – emancipatória. O desenvolvimento de uma

ciência deve ter como um dos horizontes principais a produção de conhecimento

libertário em uma sociedade excludente, desumana e injusta. O conhecimento

para ter valor enquanto tal é fundamental implicar em transformação concreta da

realidade contribuindo para uma sociedade mais justa, humana e igualitária.

Divisão social do trabalho na ossatura do modelo capitalista

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A organização da produção em suas diferentes fases no capitalismo concebeu

algumas leis que são gerais e outras especificas de cada período histórico. Uma

das leis gerais é a alienação como elemento crucial na exploração da força de

trabalho. Uma dos mecanismos de maior eficiência desse modelo vigente é a

alienação; é através do afastamento dos sujeitos da realidade concreta que lhes

permite um maior aprofundamento da exploração dos sujeitos nos diversos

campos da produção, inclusive no campo cientifico. E a reprodução da alienação

se dá em diferentes espaços da sociedade nas relações sociais. Segundo

GOMEZ,

Há um vasto campo de estudos a ser desenvolvido sobre os condicionantes ideológicos que constituem a longa historia do adestramento social, baseado no dualismo da divisão social do trabalho (trabalho intelectual/trabalho manual). Nesse sentido e dentro do conceito dialético de totalidade, é bom lembrar que todas as instituições de nossa sociedade capitalista (a família, a escola, a Igreja, a politica, a economia, etc.) contribuem para reproduzir a dominação. Por isso, criam hábitos de comportamento, de ação, de pensamentos apropriados ao nosso tipo de inserção no modo de produção. (2012, pág. 69)

Diante desse debate se faz necessário trazer a luz da analise o papel do

trabalho. É através do trabalho que o homem transforma a natureza, e, ao

mesmo tempo se transforma. Ao atuar, por meio desse movimento, sobre a

Natureza externa a ele e ao modificá-la, ele modifica, ao mesmo tempo, sua

própria natureza (MARX, 1983). Essa relação metabólica entre homem-natureza

nas relações capitalistas tem colocado em xeque as espécies e própria

existência humana. Em mesma proporção que esse modelo de produção produz

riqueza, produz pobreza. Um determinante fundamental, e não vou me deter

nisso, é a questão ambiental que tem pagado um preço caro para fornecer seu

sangue, sua carne, e seu próprio espirito está em xeque frente a desenfreada

agressividade do capital aos recursos naturais como principal alvo dos

investimentos financeiro.

É fundamentalmente importante destacar que a expropriação e

consequentemente a acumulação crescente de capital por uma pequena parcela

da sociedade, gozando do mel dessa terra se dá frente a exploração e

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expropriação das massas que se alimentam do fel. Mas o que isso tem haver

com ciência e fraternidade? Não existe sociedade sem ciência, sem saber, sem

cultura, sem um conjunto de valores associadas ao modelo de produção

(entendendo que o trabalho realizado pelo homem/mulher altera o meio e ao

mesmo tempo altera a si mesmo/a).Todavia, não é concebível fazer uma leitura

de qualquer sociedade e do conjunto de seus valores sem conhecer as relações

de trabalho dela. As ideias de Taylor, “conhecido como o pai da “administração

cientifica”” (GOMEZ, 2012), vai marcar uma nova etapa nas formas de

organização do trabalho. Segundo GOMEZ,

Ele soube dar corpo e vida a várias ideias e experiências de submissão dos operários, estabelecendo assim as bases necessárias para ajustar o trabalho ao processo de acumulação do capital no ultimo século. Seus princípios, que resumimos a seguir, são suficientemente transparentes para dispensar comentários adicionais:

a) Para garantir o controle, a gerencia necessita se apropriar do saber-fazer que ainda possui o trabalhador. Deve reunir esses conhecimentos práticos e “classifica-los, tabulá-los, reduzi-los a normas, leis e fórmulas, grandemente úteis ao operário para execução de seu trabalho diário” (Taylor, 1964, p. 52); b) Selecionar e treinar o trabalhador adequado para cada tarefa concebida pela gerência. Para isso não é preciso achar “homens extraordinários, mas simplesmente escolher entre os homens comuns os poucos especialmente apropriados para o tipo de trabalho em vista” (Taylor, 1964, p. 76); c) Programar as operações dos trabalhadores e supervisioná-las, em função de um tempo-padrão predeterminado: “Na tarefa é especificado o que deve ser feito e também como fazê-lo, além do tempo exato concebido para a execução” (TAYLOR apud GOMEZ, 2012, p. 71).

Esses princípios vão ser aplicados e adaptados por Henry Ford a sua linha

de montagem; e vai para além dos muros da montadora.Essas mudanças serão

fatores determinantes para rápidas e profundas mudanças na intensificaçãodo

controle e organização da produção. Os arranjos a partir das mudanças sofridas

nos meios produtivos condicionam um novo homem, um novo trabalhador, novas

formas de exploração que necessitam de uma aparelhagem que subsidiem e

correspondam as demandas do modelo de produção vigente. A ciência não é

um campo alheio às relações sociais de produção em seu tempo/espaço. Márcio

Rolo traz alguns elementos que nos mostram como a divisão social do trabalho

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imbrica um estranhamento nos sujeitos que participam dos processos de

produção. Segundo Rolo,

[...] essa divisão de trabalho que perpassa o mundo da ciência acha-se assentada na atividade funcional de três atores sociais principais: os cientistas que produzem o conhecimento científico, os professores, que tratam de transmiti-lo aos alunos, e a sociedade, que consome a ciência na forma de produtos tecnológicos. Cada uma destas funções acha-se organizada em espaços institucionais distintos e especializado: o espaço especializado do laboratório cientifico, o espaço especializado da escola e o espaço especializado do mercado de trocas. Às voltas com suas praticas, valores e rituais próprios, estes espaços, como se sabe, acham-se de costas uns para os outros, seus atores quase não dialogam entre si.

A ciência como a história sempre esteve nas mãos da classe dominante;

logo, jamais haverá história ‘dos de baixo’ contada pelos ‘de cima’, ou seja, a

ciência sempre esteve a serviço das elites para as elites. A ciência é um dos

campos de maior disputa nessa luta de classes por se tratar de uma esfera que

vai além da produção de conhecimento, produzindo determinantes fundamentais

e decisivos para o avanço da reprodução do capital. É através da ciência que se

podem potencializar os meios de produção e consequentemente inovar a

organização do trabalho na perspectiva de maximizar os lucros – alvo principal

do capitalismo – e isso só se realiza a partir da exploração da força de trabalho.

Importante salientar que não fazemos menção de esvaziar o papel da

ciência e sua importância na perspectiva de atender as demandas

socioambientais na construção de uma sociedade cada vez mais justa, humana

e inclusiva. A ciência hoje está, quase que exclusiva, voltada a atender as

demandas de acumulação do capital. É necessário dissecar ela, a ciência, e seu

papel para transformá-la. Segundo Rolo e Ramos (2012), o modo como as

coisas são em sua essência não se manifesta imediatamente ao homem, e para

que elas o façam é preciso, antes, um esforço do pensamento de descobrir as

suas estruturas e as suas leis de funcionamento (p. 151).Estamos atravessando,

talvez, o curto período histórico de maior intensificação e desenvolvimento da

ciência. A era da biotecnologia tem alterado rapidamente com profundas

transformações político-econômico, sociais e culturais. A ciência em suas

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diferentes ramificações tem atuado veementemente na perspectiva de propiciar

o ‘melhor’ e mais rápido desenvolvimento do capital.

Um exemplo, ostransgênicosque ganhou notável impulso sob a égide de

combater a fome mediante sua capacidade de produção de alimentos em grande

escala e com a redução dos agrotóxicos, e o que vemos? O Brasil desde 2008,

segundo a ANVISA, se tornar o maior consumidor de agrotóxicos do mundo.

Oagronegócio avança na monoculturae consequentementeno

desmatamento,desenfreadamente nas reservas naturais, concentração

fundiária, expropriação de terras, grilagem, etc., expropriação das sementes, dos

direitos destruindo a soberania alimentar brasileira, tudo sob influência do

agronegócio que traz consigo a transgenia e os agrotóxicos. Segundo Giraldo

(2012),

As plantas transgênicas desenvolvidas não atenderam às necessidades da agricultura familiar; no entanto, são esse pequenos agricultores os responsáveis pela produção da maior parte dos alimentos no Brasil. Além disso, o uso de plantas resistentes a herbicidas aumenta o grau de dependência dos agricultores aos agrotóxicos, endividando-os e ampliando a concentração dos latifúndios monocultores. A venda de sementes transgênicas é vinculada à venda dos agrotóxicos, produzidos, em geral, pela mesma empresa, que tem, frequentemente, enorme poder de pressão sobre a economia, a politica e o Estado (p. 762).

Todo esse exemplo que citamos acima se torna compreensível quando

analisamos a ciência sob a ótica do materialismo histórico dialético que nos

permite enxergar o nó desatado, ou seja, “sob o capitalismo, “o efeito útil” de

uma mercadoria “retira-se para segundo plano, tornando-se o único incentivo o

lucro a ser feito sobre a sua venda”” (FOSTER). Assim, uma ciência a serviço

dos interesses do capital internacional jamais contribuirá para uma sociedade

emancipada e a serviço das populações do campo, da cidade, das águas e

floresta, voltada para os reais interesses ‘dos de baixo’, dos marginalizados.

Além dessa fragmentação no/do processo de produção que implica em

estranhamento dos sujeitos participantes dessa dinâmica produtiva, Rolo nos

mostra aquilo que vai chamar de quarto ator, omitido nos manuscritos histórico-

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contemporâneo da ciência – “o financiador da pesquisa cientifica”. A força

compressora da esfera econômica sobre a produção cientifica reflete nas

relações produtivas sob o manto dos interesses de mercado. Existe um dito

popular que quem paga a banda escolhe a músicae essa é uma expressão real

na produção do conhecimento, dos valores socioterritoriais, das subjetividades

que tornam uma sociedade alienada, engodada nas entranhas desse sistema

opressor, excludente e dominante.

Há um alinhamento do financiamento das pesquisas aos interesses do

capital internacional que determina o direcionamento das pesquisas e

consequentemente os resultados, ainda que negativos para o conjunto da

sociedade. Trata-se, portanto, dos interesses do capital que por vias diretas –

corporações, ou por via do Estado, chamado por K. Marx de comitê da burguesia,

que define os rumos dos “empreendimentos”. Não são as necessidades sociais

que determinam o foco da pesquisa, é o foco das pesquisas que determinam as

necessidades sociais – e é nesse bojo que a alienação cumpre papel

fundamental na teia da dominação.

É insustentável essa ciência tal qual está colocada que fortalece o modelo

de produção hegemônico, formatando participantes dessa totalidade alheios aos

resultados e distantes duma intervenção real no/do processo produtivo. No

campo da ciência os cientistas (os que produzem ciência – conhecimento

científico), os professores (que transmitem esse conhecimento aos alunos/as), a

sociedade (consumidora desse conhecimento sob novos produtos tecnológico

envolvido de um saber novo) e o financiador (quem dita o rumo e os trilhos da

pesquisa cientifica) configuram um‘time’complexo que participa do processo de

produção da ciência – a história é feita pelo homem sob a égide de determinantes

político-econômico e ideológico. “Como disse o matemático e filosofo da ciência

Hugh Lacey,

A pesquisa que fornece a evidencia da eficácia do medicamento não explica nada sobre os efeitos que ele tem em virtude de ser mercadoria. Da mesma maneira, a pesquisa que fornece a evidencia da eficácia do uso das culturas transgênicas em combinação com um

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pesticida particular não explica nada sobre os seus potenciais efeitos ecológicos e sociais”. (LACEY apud ROLO)

Hoje, em nome dum tal de desenvolvimento destroem os recursos

naturais, os saberes populares, subjugam e alienam as populações e guia a

sociedade para um abismo escuro que nos coloca em xeque, na condição de

repensar o saber e sua produção.

Fraternidade: (re)construção de paradigma

O arquétipo de desenvolvimento deve está associado incondicionalmente

àsustentabilidade socioambiental. É importante o conexo com as condições

político-econômicas e ideológicas que viabilizem a efetivação das politicas

construídas com esses fins, alias, devem ser a basede todas as politicas

construídas e efetivadas – sem tirar o pé do chão da realidade no sentido que

cada passo seja na perspectiva de garantia na qualidade de vida das diferentes

populações, do campo, da cidade, das águas e florestas. As sociedades

precisam compreender a totalidade dos processos de produção e suas reais

consequências à sociedade e ao ambiente. Não tem como construir uma nova

ciência sem (re)construir o modelo de desenvolvimento que deve está

organicamente relacionado com a sustentabilidade dos recursos ambientais e

social. Não se trata de um planeta infinito, mas finito; portanto, seus projetos

devem ser a partir das condições concretas.Por que insistimos na questão do

modelo de produção? Porque é a partir da produção que reproduzimos todos os

elementos necessários a nossa própria reprodução, seja produção concreta ou/e

subjetividades – a simbologia cumpre historicamente um papel importante. Na

sociedade capitalista, os valores subjetivos cumprem uma relevância

fundamental no processo de alienação, mas não vamos abordar aqui. Se trata

da base de determinações que condicionam as formas de organização e

reprodução social.

A ciência coisificada, mecânica, tecnicista que temos hoje precisa ser

reconstruída por novos valores que permita o surgimento de uma ciência para

os trabalhadores ao invés de uma ciência dos trabalhadores. Isso altera a

correlação de forças ao permitir os saberes empíricos, populares dialogar com o

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mundo científico numa perspectiva transformadora/emancipatória. E é nesse

dialogo de saberes que a fraternidade se coloca como novo paradigma que nos

aponta novos horizontes para uma ciência emancipatória, libertária e a serviço

da humanidade e do meio ambiente.

A fraternidade aqui vai além daquele senso comum de religiosidade. A

religiosidade pode até ser fraterna, mas a fraternidade vai além dos púlpitos e de

todas as relações de religiosidade. Enquanto que solidariedade diz respeito ao

reconhecimento de igualdade dos sujeitos, a fraternidade no permite o

reconhecimento sujeitos-irmãos. E é a partir desse paradigma que, a priori,

parece superficial, pautamos a importância e necessidade de repensarmos o

fazer ciência, por quem e pra quem. Precisamos romper com essa cultura de

que apenas o saber científico está correto ou é verdadeiramente o saber, mas

dialogar saberes (empírico e cientifico – e até transformar esses saberes

populares em científicos e os científicos em populares) e nesse exercício

dialético construir um mundo melhor, mais humano e justo.

Mas, o que vemos? A ciência andando contra a maré, ou melhor,

movimentos sociais, organizações não governamentais,setores e segmentos da

sociedade civil insistindo em andar contra a maré do capital em diferentes formas

de resistência. “A ciência deveria concorrer para aumentar a qualidade de vida

da humanidade, enriquecer sua existência – e, no entanto, não é isto o que se

vê”. Vemos uma ciência estritamente voltada a atender os interesses do capital.

“Alienada por conta do processo de exploração capitalista, a ciência, como disse

Karl Marx, passou a confrontar o homem “como algo exterior a ele””. Segundo

Rolo, a classe trabalhadora, que é quem, com o seu trabalho, cria o valor das

mercadorias e financia a pesquisa (privada ou publica), fica alijada do seu direito

de discutir e de se responsabilizar pelos rumos do projeto cientifico desenhado

para sua vida.

Na perspectiva de tecer novos caminhos na teia de reflexões mais

profundas no que cerne as causas dos problemas reais da sociedade Marcio

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Rolo traz “para o primeiro plano” das discussões a concepção sobre ciência do

materialismo histórico-dialético, elaborada ainda em meados do século XIX por

Karl Marx, mas atua como uma trena na perspectiva das analises sobre a

realidade e sobre os moldes de construção de novos valores, de uma nova

sociedade. Para tal, é necessária uma leitura analítica da realidade, pois uma

interpretação errada consequentemente leva a ações erradas; e, esses passos

implicam reflexos na ótica da sociedade que podem custar muito caro (para além

da perspectiva econômica). Segundo Rolo,

Essa concepção [...] nos permite desvelar a complexidade dos determinantes econômicos e sociais que incidem sobre a produção do conhecimento de uma época – e é especialmente da nossa – e por isto, como ferramenta critica de interpretação, nos permite projetar as bases de uma outra ciência para a humanidade, uma ciência que não mais confronte o homem desde fora.

Eric Hobsbawm (1995) na Era dos Extremos: O breve século XX (1914-

1991) fala que “a principal tarefa do historiador não é julgar, mas compreender,

mesmo o que temos mais dificuldade para compreender”, e ouso afirma que esse

ofício vai para além das tarefas do historiador; o próprio Marx afirmou que os

filósofos de sua época atentaram apenas para interpretar os fatos, mas ele

ressaltou a importância e necessidade de transformar e essa transformação não

se dá de forma impulsiva. Requer esforços coletivos, de saberes diversos, das

partes à totalidade e da totalidade às partes. É necessário considerar as

contribuições das diferentes populações, culturas, raças, tribos e nações na

construção de trilhas no rumo de dias melhores que sejam ambientalmente

sustentável, socialmente justo e economicamente viável.

Estamos atravessando um período histórico crucial da humanidade que

exige dos peregrinos repensar o seu pensar e o seu agir, mas também refazer

suas praticas de imediato. Os dados explícitos através de diferentes pesquisas

mostram a corda bamba que caminhamos hoje e o papel relevante dessa

geração de revitalizar a partir de ditames populares cada átomo, cada célula na

constituição de um novo organismo social capaz de permitir às futuras gerações

a possibilidade de viver e desfrutar das benesses dessa vida. Newton Duarte

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(2003) na sua obra Sociedade do Conhecimento ou Sociedade das Ilusões?

Polemicas de nosso tempo traz algumas inquietações e, dentre tantas, uma me

chamou a atenção ao afirmar que “é mais importante adquirir o método cientifico

que o conhecimento cientifico já existente”. Segundo Piaget apud Duarte,

Existem dois princípios fundamentais e correlacionados dos quais toda educação inspirada pela psicologia não poderia se afastar: 1) que as únicas verdades reais são aquelas construídas livremente e não aquelas recebidas de fora; 2) que o bem moral é essencialmente autônomo e não poderia ser prescrito. [...] A formação humana dos indivíduos é prejudicada quando verdades, que poderiam descobrir sozinhos, lhes são impostas de fora, mesmo que sejam evidentes ou matemática: nós os privamos então de um método de pesquisa que lhes teria sido bem mais útil para a vida que o conhecimento correspondente! [PIAGET apud DUARTE, pág. 9, 2003]

A construção do saber, da ciência não atenda as demandas sociais de

qualquer sociedade quando ela é verticalizada. Não tem como compreender a

historia estratificando e fazendo leituras isoladas, mas imersas na complexidade

das relações sociais. Segundo Marx e Engels, só se conhece uma ciência, a

ciência da historia. A história pode ser vista por dois lados: ela pode ser dividida

em historia da natureza e historia do homem. Os dois lados, porem, não devem

ser vistos como esferas independentes.Segundo Rolo,

A produção do conhecimento precisa ser compreendida como um processo que se desenrola no interior do próprio desenvolvimento das forças produtivas, que tanto o sujeito do conhecimento quanto o objeto cientifico investigado são polos de uma relação engendrada no interior da totalidade das relações sociais – e daí a impossibilidade, para o materialismo histórico-dialético, de haver uma linguagem universal, uma linguagem exterior ao mundo capaz de descrevê-lo como uma espécie de ponto arquimediano absoluto.

Hobsbawm (1995) afirma que a Era do Ouro se baseou na mais avançada

e muitas vezes esotérica pesquisa cientifica, que agora encontrava aplicação

pratica em poucos anos. Precisamos conceber uma nova roupagem,sob os

princípios da fraternidade, ao papel da ciência, e, mas que isso, o jeito de fazer

ciência precisa ser reinventado e essa tarefa deve ser sob a ótica socioambiental

e cultural na perspectiva de ser a serviço da sociedade, e não a serviço do

capital. Que seja pautada pelas demandas populares e que as populações se

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apropriem do método no âmbito de fortalecer e garantir a soberania popular em

seus diferentes aspectos.

Considerações finais

A ciência como componente da luta de classes deve ter como ponto de

partido as necessidades reais da população, e, realizado também com ela e para

ela. É fundamentalmente importante e necessário na construção de

conhecimento através da ciência ter sempre como horizonte a transformação

social, contribuindo para a emancipação social das amarras do capital que

determina todo conjunto da organização social do trabalho, tornando-os sujeitos

estranhos de si mesmo (alienação) e forjou uma sociedade consumista, egoísta,

racista, preconceituosa definindo o perfil das diferentes gerações no seu

tempo/espaço. Que a fraternidade, pensando-a como principio que fortaleça a

identidade da classe trabalhadora (é somente a classe trabalhadora que a partir

da tomada da consciência pode romper com esse ciclo de exploração e exclusão

e construir uma sociedade nova, um homem novo, uma mulher nova, novos

valores) possa contribuir para uma ciência humanística voltada à promoção de

vida e não para produção e reprodução do capital.

Referências ROLO, Marcio. A natureza como uma relação humana, uma categoria histórica.__. ___. DUARTE, N. Sociedade do conhecimento ou sociedade das ilusões? Quatro ensaios critico-dialéticos em filosofia da educação. Campinas, SP: Autores Associados, 2003. HOBSBAWM, Eric J.. Era dos Extremos: o breve século XX: 1914-1991. Tradução Marcos Santarrita; São Paulo: Companhia das Letras, 1995. MARX, K. O Capital. Critica da economia politica, (págs. 149 - 163), Vol. I. Abril Cultural, 1983. GOMEZ, Carlos Minayo. Trabalho e Conhecimento: dilemas na educação do trabalhador. [et al.]. – 6. ed. – São Paulo: Cortez, 2012.

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FOSTER, J. B. A ecologia da Economia Política de Marx. Disponível em http://racismoambiental.net.br/2013/05/a-ecologia-da-economia-política-de-marx-po-jonh-bellamy-foster-leitura-essencial/#more-103760. Dicionário da Educação do Campo. / Org. por Roseli Caldart, Isabel B. Pereira, P. Alentejano e G. Frigotto. – (Págs.151 e 762). Rio de Janeiro, São Paulo: Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, Expressão Popular, 2012.

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Fraternidade como princípio jurídico

Alex André da Silva83 Adilson Silva Ferraz84

Resumo: No tocante a fraternidade, sua origem é cristã. Um passo importante foi sua difusão da esfera religiosa para a política, este cenário ocorre, em primeiro momento, com a Revolução Francesa que tinha como lema: Liberdade, Igualdade e Fraternidade. Estes formariam respectivamente a 1°, 2° e 3° dimensão dos direitos e garantias fundamentais. Sendo a princípio mais relevante para norma jurídica a primeira e a segunda dimensão, ao passo que a fraternidade ficou à margem. Esse paulatinamente ganhara importância na norma jurídica. Segundo José Roberto Dromi, o futuro do constitucionalismo “deve estar influenciado até identificar-se com a verdade, a solidariedade, o consenso, a continuidade, a participação, a integração e a universalidade”. Portanto, esse trabalho tem por finalidade verificar a possibilidade da fraternidade se constituir enquanto princípio jurídico.

Palavras-Chave: Fraternidade, Direitos e Garantias Fundamentais, Constitucionalismo.

Introdução

No que diz respeito à fraternidade ela é abordada, de modo geral, nas áreas

religiosas, filosóficas e políticas. Sendo a fraternidade uma categoria

essencialmente cristã que por meio da Revolução Francesa ganha uma

dimensão política. Porém, enquanto categoria política encontra-se certa rejeição

por parte da mentalidade acadêmica e política. Baggio justifica tal rejeição:

A fraternidade é capaz de dar fundamento à idéia de uma comunidade universal, de uma unidade de diferentes, na qual os povos vivam em paz entre si, sem jugo de um tirano, mas no respeito das próprias identidades. E justamente por isso que a fraternidade é perigosa.85

83 Discente do 1° Período do curso de Direito da Faculdade Asces – Associação Caruaruense de Ensino Superior, noturno. Sob orientação do professor Adilson Ferraz. E-mail: [email protected] 84 Doutorando em Direito pela Universidade de Buenos Aires (UBA), doutorando em Filosofia pela Universidade Católica Argentina (UCA), mestre em Filosofia pela UFPE; Professor assistente da Faculdade ASCES e da FAFICA. [email protected] 85 BAGGIO, Antonio Maria (Organizador), O principio esquecido, p. 53.

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Embora, a fraternidade tenha ganhando espaço em diversas áreas há uma

dificuldade em abordá-la enquanto categoria jurídica. Mas, não restam dúvidas

de sua importância no meio jurídico. Pois, a fraternidade da origem a terceira

dimensão dos direitos e garantias fundamentais. Por sua vez, a Constituição

Federal de 1988, embora já tivesse sido sugerido na Carta Magna de 1946 e

1967, confere a proteção aos direitos de terceira dimensão, apontados pelo lema

de solidariedade ou fraternidade.

Além disso, no início do século XXI, a doutrina começa a desenvolver uma

nova perspectiva em relação ao constitucionalismo, denominada

neoconstitucionalismo o qual busca não apenas a limitação do poder político,

mas principalmente, busca a eficácia da Constituição, fazendo com que o seu

texto não tenha mero caráter retórico, mas sim, caráter efetivo, sobretudo diante

da concretização dos direitos fundamentais.

Portanto, este trabalho tem por objetivo explanar a fraternidade no meio

jurídico, superando o mito da fraternidade está limitada a esfera religiosa. Nesta

perspectiva, há uma busca de evidencias que possam consolidá-la como

princípio jurídico. Entre tais evidencias encontramos: o preâmbulo da

Constituição Federal; a terceira dimensão ou geração dos direitos e garantias

fundamentais; os princípios fundamentais da Carta Magna e decisões jurídicas

fundamentadas pela fraternidade.

Fraternidade – Conceito e Origem

Fraternidade possui vários significados entre eles podemos a princípio

destacar: relação de parentesco presente entre irmãos e convivência afetuosa

entre irmãos. Percebe-se que a palavra comum em ambos os significados vem

do termo (frater) que significa irmão, este lança a ideia consanguínea.

Restringindo a fraternidade a membros da família por laço sanguíneo.

Porém, Jesus Cristo vai expandir extraordinariamente o conceito de

fraternidade ao semear que todos são irmãos, pois todos somos filhos de Deus.

Desta maneira, o conceito de fraternidade é ampliado largamente e passa a

significar também: Convivência equilibrada e agradável entre as pessoas; amor

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demonstrado pelo próximo e afeto revelado àqueles os quais não se conhece.

Evidencia-se neste cenário um caráter universal da fraternidade.

Logo, a fraternidade tem origem cristã, uma vez que, os cristãos

consideram todos os filhos de Deus e buscam uma relação de harmonia entre

si. O principal personagem da fraternidade no aspecto religiosa é Jesus Cristo,

pois foi quem semeou e propagou a fraternidade universal.

Desta forma, explica-se a fraternidade ser uma categoria essencialmente

cristã. A fraternidade ampliará seu horizonte, isto é, sairá da esfera religiosa, com

a Revolução Francesa e posteriormente com os Direitos Fundamentais de

terceira dimensão ou geração.

Revolução Francesa de 1789

Em relação à fraternidade a Revolução Francesa o qual daria origem ao lema

(liberdade, igualdade e fraternidade) foi um fato histórico extremamente

importante, pois por meio da revolução de 1789 que a fraternidade, antes vista

meramente no aspecto religioso, atinge uma dimensão política.

“O fato é que a Revolução de 1789 constituiu um ponto de referência

histórica de grande relevância, porque, durante o seu andamento, pela primeira

vez na Idade Moderna a idéia de fraternidade foi interpretada e praticada

politicamente.” 86

O que é novo na trilogia de 1789 é a fraternidade ganhar uma dimensão política, pela sua aproximação e sua interação com os outros dois princípios que caracterizam as democracias atuais: a liberdade e a igualdade. Porque, de fato, até antes de 1789 fala-se de fraternidade sem liberdade e a igualde civis, políticas e sócias; ou fala-se de fraternidade em lugar delas. A trilogia revolucionária arranca a fraternidade do âmbito das interpretações – ainda que bem matizadas – da tradição e insere-a num contexto totalmente novo, ao lado da liberdade e da igualdade, compondo três princípios e ideais constitutivos de uma perspectiva política inédita. Por isso, a trilogia introduz – ou, amenos insinua – um mundo novo; um novum que

86 BAGGIO, Antonio Maria (Organizador), O principio esquecido, p. 7.

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questiona inclusive o modo como o cristianismo entenderá até então a fraternidade.87

Vale ressaltar também a relevância que a trilogia trouxe para as

democracias contemporâneas. Alberto Martinelli corrobora ao falar sobre a

trilogia:

Liberte, egalité, fraternité [...] constituíram, durante dois séculos, o núcleo normativo e o critério interpretativo da sociedade moderna. Os três princípios não expressam conceitos e aspirações radicalmente novos, mas se transformaram e se estenderam à ação coletiva, adquirindo um significado universal e definindo, com especial vigor sintético, o projeto moderno de sociedade desejável.88

No Brasil, a Carta Magna vigente inseriu os três valores da revolução de

1789. Assim, a trilogia (liberdade, igualdade e fraternidade), por sua vez, vai dar

origem respectivamente a 1º, 2º e 3º dimensão ou geração dos direitos e

garantias fundamentais.

Fraternidade como princípio jurídico

Antes de verificar a possibilidade da fraternidade se constituir enquanto

princípio jurídico é necessário compreender o próprio conceito de princípio

jurídico, este possui inúmeras definições na Teoria do Direito, é meio século de

reflexão e discursão a luz do tema, e grandes são as divergências.

Desta forma, a afirmação de GUASTINI, ilustra bem este cenário, ao

declarar que não se deveria sequer buscar um definição unitária dos princípios

jurídicos, mas apenas aceitar, primeiro, que alguns autores o utilizam com um

significado e outros com outro e, segundo, que o termo princípio pode referir-se

a vários fenômenos, e não somente a um só.89

Existem duas vias, a primeira acredita que os princípios têm funções

auxiliares na aplicação do direito, intitulado de “princípios gerais do direito”, estes

estão implícitos na totalidade do ordenamento e surge, em geral, como

87 BAGGIO, Antonio Maria (Organizador), O principio esquecido, p. 8. 88 MARTINELLI, 1988, p.57 89 GUASTINI, Riccardo, Teoria e dogmatica delle fonti. Giuffrè, Milani, 1998, p. 276.

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fundamento de decisões judiciais. A segunda defende que os princípios

possuem caráter normativo o qual estão positivados em um sistema jurídico.

De forma geral, acredita-se que a norma condicionada por um princípio

traz consigo a solução dos conflitos. Esta concepção é aderida pelo

jusnaturalismo o qual considera um princípio jurídico, a verdade em sua gênese

devendo nortear o processo legislativo.

Conforme o juspositivismo, partindo da premissa que o Direito é norma,

os princípios são concebidos como fonte normativa que derivam das leis. Caso

a norma constitucional contemple um princípio considerado universal, ele deve

condicionar a elaboração das demais normas.

Outra questão recorrente e também complexa na doutrina é diferenciar

princípios e regras. Esta questão, devido à relevância do assunto e também para

uma melhor compreensão do que venha a ser um princípio jurídico, será exposta,

sem prender-se a problemática, de forma sucinta.

Um sistema não pode ser composto somente de princípios, ou só de regras. Um sistema só de princípios seria demasiado flexível, pela ausência de guias claros de comportamento, ocasionando problemas de coordenação, conhecimento, custos e controle de poder. E um sistema só de regras, aplicadas de modo formalista, seria demasiado rígido, pela ausência de válvulas de abertura para o amoldamento das soluções às particularidades dos casos concretos. Com isso se quer dizer que, a rigor, não se pode dizer nem que os princípios são mais importantes do que as regras, nem que as regras são mais necessárias que os princípios. Cada espécie normativa desempenha funções diferentes e complementares, não se podendo sequer conceber uma sem a outra, e a outra sem a uma. Tal observação é da mais alta relevância, notadamente tendo em vista o fato de que a Constituição Brasileira é repleta de regras, especialmente de competência, cuja finalidade é, precisamente, alocar e limitar o exercício do poder.90

No palco da grande temática sobre princípios e regras Humberto Ávila,

por sua vez, faz uma analise crítica às concepções dominantes entre elas a de

DWORKIN e ALEXY os quais atualmente sofrem discursões a cerca de sua

aplicação, não sendo objetivo de estudo entrar neste mérito, vejamos apenas a

proposta de definição de regras e princípios dada por Ávila:91

90 ÁVILA, Humberto, Teoria dos princípios, 10 ed., p. 120 -1. 91ÁVILA, Humberto, Revista diálogo jurídico, Ano I – vol. 1 – n° 4, Julho de 2001, Salvador – Bahia, p. 17.

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Podem-se definir os princípios como normas que estabelecem diretamente fins, para cuja concretização estabelece com menor exatidão qual o comportamento devido (menor grau de determinação da ordem e maior generalidade dos destinatários), e por isso dependem mais intensamente da sua relação com outras normas e de atos institucionalmente legitimados de interpretação para a determinação da conduta devida.

As regras podem ser definidas como normas que estabelecem indiretamente fins, para cuja concretização estabelece com maior exatidão qual o comportamento devido (maior grau de determinação da ordem e maior especificação dos destinatários), e por isso dependem menos intensamente da sua relação com outras normas e de atos institucionalmente legitimados de interpretação para a determinação da conduta devida.

Ávila explica que a diferença entre regras e princípios existe na ligação da

previsão normativa com a concretização de fins ou de condutas. Desta forma, as

regras consistiriam em normas de conduta, e os princípios em normas finalísticas

o qual não estabelecem os fins propriamente ditos, mas estabelecem a

realização de estados almejados, ou seja, o fim seria o conteúdo imediato da

norma finalística, por outro lado seu conteúdo mediato consiste nas condutas a

serem realizadas para concretização dos fins devidos. Logo, os princípios são

normas imediatamente finalísticas e mediatamente de conduta.

Diante do que foi exposto, vejamos a inserção da fraternidade no texto

constitucional e sua possível relação de se consolidar como princípio jurídico,

este, como foi dito, pode surgir de forma expressa como norma positiva ou

aparecer de forma implícita comumente denominada de princípios gerais. A

Constituição Federal de 1988 anuncia a fraternidade, logo de início, na parte do

preâmbulo:

“Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia

Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a

assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança,

o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos

de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia

social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica

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das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte

CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL”.

O preâmbulo trata-se, de uma proclamação de princípios, lá encontramos

as diretrizes gerais que inspiraram a feitura de uma carta maior, as justificativas,

objetivas e finalidades da nova ordem construída. Mesmo não fazendo parte do

corpo prescritivo da lex mater, sintetizam os fins primordiais da nova ordem

implantada, traçando diretrizes políticas, filosóficas e ideológicas do Estado.92

Logo, quando o preâmbulo afirma “uma sociedade fraterna”, ele também

afirma o princípio da fraternidade. Seguindo a mesma via, vejamos outras

evidencias que consolida a fraternidade como princípio jurídico.

Neste assunto, quem traz grande contribuição são os direitos

fundamentais de terceira dimensão ou geração, pois são transindividuais que

transcendem os interesses particulares e passam a ser preocupar com a

proteção do gênero humano, com elevado grau de universalidade e humanismo.

A terceira dimensão engloba os denominados direitos de fraternidade ou

solidariedade, estes tratam-se de:

“Os direitos difusos em geral, como o meio ambiente equilibrado, a vida

saudável e pacífica, o progresso, a autodeterminação dos povos, o avanço da

tecnologia, são alguns dos itens componentes do vasto catálogo dos direitos de

solidariedade, prescritos nos textos constitucionais hodiernos, e que constituem

a terceira geração dos direitos humanos fundamentais.” 93

A terceira dimensão revela o caráter do princípio da fraternidade, este

norteia a norma prescritiva influenciando a sua redação. O artigo 225 da

Constituição Federal, que trata do meio ambiente, é um bom exemplo:

“Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,

bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se

ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as

presentes e futuras gerações. § 1º - Para assegurar a efetividade desse direito,

incumbe ao Poder Público: [...]”

92 BULOS, Uadi Lammêgo, Curso de direito constitucional, 8° ed., 2014, p. 501. 93 BULOS, Uadi Lammêgo, Curso de direito constitucional, 8° ed., 2014, p. 529.

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Direito ao meio ambiente: os "direitos de terceira geração (ou de novíssima dimensão), que materializam poderes de titularidade coletiva atribuídos, genericamente, e de modo difuso, a todos os integrantes dos agrupamentos sociais, consagram o princípio da solidariedade e constituem, por isso mesmo, ao lado dos denominados direitos de quarta geração (como o direito ao desenvolvimento e o direito à paz), um momento importante no processo de expansão e reconhecimento dos direitos humanos, qualificados estes, enquanto valores fundamentais indisponíveis, como prerrogativas impregnadas de uma natureza essencialmente inexaurível. Todos sabemos que os preceitos inscritos no art. 225 da Carta Política traduzem, na concreção de seu alcance, a consagração constitucional, em nosso sistema de direito positivo, de uma das mais expressivas prerrogativas asseguradas às formações sociais contemporâneas. Essa prerrogativa, que se qualifica por seu caráter de metaindividualidade, consiste no reconhecimento de que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Trata-se, consoante já o proclamou o Supremo Tribunal Federal (RTJ, 7 58:205-2 06, Rei. Min. Celso de Mello), de um típico direito de terceira geração (ou de novíssima dimensão), que assiste, de modo subjetivamente indeterminado, a todo o gênero humano, circunstância essa que justifica a especial obrigação - que incumbe ao Estado e à própria coletividade - de defendê-lo e de preservá-lo em benefício das presentes e futuras gerações, evitando-se, desse modo, que irrompam, no seio da comunhão social, os graves conflitos intergeracionais marcados pelo desrespeito ao dever de solidariedade na proteção da integridade desse bem essencial de uso comum de todos quantos compõem o grupo social " (STF, A D l n 3 .540-1 -MC/DF, Rei. Min. Celso de Mello, decisão de 1º-9-2005).94

Encontramos, mais uma vez, a fraternidade ligada à constituição, na parte

dos princípios fundamentais, sendo mais preciso, art. 3.º da CF/88. Que trata

dos objetivos fundamentais da república federativa do Brasil. Perceba que o

inciso primeiro fala em “construir uma sociedade livre, justa e solidária”. A

solidariedade aparece aqui consagrando os direitos de terceira dimensão.

Por fim, o princípio da fraternidade também tem sido importante para

fundamentar algumas decisões relevantes como, por exemplo, a que autorizou

a pesquisa de células-tronco embrionárias (ADI 3510).

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 3.510 DISTRITO FEDERAL

II - LEGITIMIDADE DAS PESQUISAS COM CÉLULAS-TRONCO EMBRIONÁRIAS PARA FINS TERAPÊUTICOS E O CONSTITUCIONALISMO FRATERNAL. A pesquisa científica com

94 BULOS, Uadi Lammêgo, Curso de direito constitucional, 8° ed., 2014, p. 529.

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células-tronco embrionárias, autorizada pela Lei n° 11.105/2005, objetiva o enfrentamento e cura de patologias e traumatismos que severamente limitam, atormentam, infelicitam, desesperam e não raras vezes degradam a vida de expressivo contingente populacional (ilustrativamente, atrofias espinhais progressivas, distrofias musculares, a esclerose múltipla e a lateral amiotrófica, as neuropatías e as doenças do neurônio motor). A escolha feita pela Lei de Biossegurança não significou um desprezo ou desapreço pelo embrião "in vitro", porém a mais firme disposição para encurtar caminhos que possam levar à superação do infortúnio alheio. Isto no âmbito de um ordenamento constitucional que desde o seu preâmbulo qualifica "a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça" como valores supremos de uma sociedade mais que tudo "fraterna". O que já significa incorporar o advento do constitucionalismo fraternal às relações humanas, a traduzir verdadeira comunhão de vida ou vida social em clima de transbordante solidariedade em benefício da saúde e contra eventuais tramas do acaso e até dos golpes da própria natureza. Contexto de solidária, compassiva ou fraternal legalidade que, longe de traduzir desprezo ou desrespeito aos congelados embriões "in vitro", significa apreço e reverência a criaturas humanas que sofrem e se desesperam. Inexistência de ofensas ao direito à vida e da dignidade da pessoa humana, pois a pesquisa com células-tronco embrionárias (inviáveis biologicamente ou para os fins a que se destinam) significa a celebração solidária da vida e alento aos que se acham à margem do exercício concreto e inalienável dos direitos à felicidade e do viver com dignidade (Ministro Celso de Mello).

Portanto, diante do exposto, percebemos não só a íntima relação que a

fraternidade tem com a constituição, seja na parte preâmbulo, nos direitos

difusos em geral ou nos princípios fundamentais, mas também a sua relação

como fundamento de importantes decisões judicias.

Desta forma, justifica-se a fraternidade ser um principio jurídico, este de

forma implícita tem grande importância no ordenamento jurídico, servindo para

nortear as regras de condutas e também as decisões judiciais. Para corroborar

a conclusão, vejamos uma última definição de princípio jurídico:

Princípio jurídico mandamento nuclear do sistema, alicerce, pedra de toque, disposição fundamental, que esparge sua força por todos os escaninhos do ordenamento. Não comporta enumeração taxativa, mas exemplificativa, porque, além de expresso, também pode ser implícito. Seu espaço é amplo, abarcando debates ligados à Sociologia, à Antropologia, à Medicina, ao Direito, à Filosofia, e, em particular, à liberdade, à igualdade, à justiça, à paz etc.95

95 BULOS, Uadi Lammêgo, Curso de direito constitucional, 8° ed., 2014, p. 507

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Referências

BAGGIO, Antonio Maria (Organizador). O Princípio Esquecido. São Paulo: Editora Cidade Nova, 2008. ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios. São Paulo: Editora Malheiros, 4º edição, 2005. ÁVILA, Humberto. Revista diálogo jurídico, Ano I – vol. 1 – n° 4, Julho de 2001, Salvador – Bahia. BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de direito constitucional. São Paulo: Editora Saraiva, 8º edição, 2014. LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. São Paulo: Editora Saraiva, 16º edição, 2012.

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Fraternidade e participação política: reflexões

arendtianas sobre a contemporaneidade.

Clarice Alves Mota96

RESUMO: Este artigo parte do intuito de compreender o princípio da fraternidade no bojo das relações humanas na contemporaneidade. Realizou-se uma análise crítica sobre a sociedade contemporânea, também denominada de sociedade do consumo, marcada pelo individualismo e, consequentemente, pelo desestimulo da participação dos indivíduos a compartilharem os espaços públicos para discutirem/decidirem assuntos de interesse coletivo. Sobre esse cenário, o olhar de Hannah Arendt é bastante fecundo por possibilitar uma retomada crítica ao pensamento Ocidental, na busca de condições políticas, sociais e jurídicas garantidoras de um mundo comum. Diante de tantos desafios, a fraternidade torna-se essencial, na medida em que aparece como um elemento que possibilita o desenvolvimento de relações mais igualitárias, atribuindo identidade comum a indivíduos com interesses diversos.

Palavras-chaves: Fraternidade; Participação política; Sociedade do consumo.

Gênese e ressignificação da fraternidade

Não será realizado um percurso histórico sobre a origem e, o

desenvolvimento da fraternidade, apenas busca-se entender esse conceito e

seus desdobramentos políticos-jurídicos na atualidade. Para tanto, faz-se

necessário pontuar algumas questões que contribuíram para a (re)discussão da

fraternidade enquanto categoria política na contemporaneidade. Assim, o

entendimento, mesmo que breve, do significado da Revolução Francesa para a

sociedade Ocidental, deve ser destacado.

96 Graduada em História pela Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Caruaru(FAFICA); Bacharel em Direito pela Faculdade ASCES; Advogada.

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A Revolução Francesa simboliza o início da modernidade, momento

histórico que põe fim ao Antigo Regime e declara uma nova forma de sociedade

e Estado, tendo como lema de luta: Liberdade, Igualdade e Fraternidade. “Não

será exagero dizer que ela ajudou a dar forma ao mundo Ocidental

contemporâneo, moldando as instituições e os ideais que nos animam e que

consideramos universais,” (GRESPAN, 2003, p.09) construindo um ethos de

fraternidade política, embora o nascimento da fraternidade seja identificado em

época anterior.

Giussepe Tossi (2009, p. 43-57) identifica na teologia cristã a gênese da

fraternidade e dos direitos humanos, por serem, inicialmente, legitimados pelo

reconhecimento cristão de direitos inerentes a cada pessoa, com o pensamento

que “cada ser humano é criado a imagem e semelhança de Deus”, logo, existe

algo que torna a todos iguais, sendo a generosidade uma benção do Pai criador

a todas as pessoas unidas por esse laço.

A origem da fraternidade está presente nas bases do pensamento cristão.

O cristianismo foi um importante meio pelo qual, pregou-se o pensamento

universalista de que todos os indivíduos são iguais e, estão unidos por vínculos

solidários.

Esse, também, é o entendimento de Pezzimenti sobre o inicio da

fraternidade, mas apenas neste ponto os autores citados concordam. Quando a

questão é sobre os meios de efetivação de laços fraternos, há uma extrema

discordância entre os dois pensadores.

Pezzimenti(2008. p. 58-73) visualiza nas religiões o único meio de juntar as

pessoas por vínculos solidários, capazes de propiciar um ambiente socialmente

fraterno. Ele chega a essa conclusão ao analisar as consequências que a

Revolução Francesa e a Revolução América propuseram em seus respectivos

países. O autor buscou analisar as ideias de três autores, quais sejam, Alexis de

tocqueville, Cochim e Antônio Gramsci.

Segundo ele, para Tocqueville a grande diferença entre as duas revoluções

consiste nas bases subjetivas de suas atuações. Assim, foi possível implementar

uma democracia-liberal na América, porque seu processo revolucionário foi

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guiado por bases religiosas, enquanto a França propagava ideias

demasiadamente abstratas, impossibilitando o surgimento de uma Democracia.

Cochim é colocado de modo a dar sustentação a tese desenvolvida por

Tocqueville, porque diz que o único resultado da Revolução Francesa foi apenas

o autoritarismo jacobino, com a pretensão de impor um modelo social que tornou-

se extremamente autoritário, deixando de mencionar as importantes

contribuições ideológicas da Revolução francesa, que como mencionado

anteriormente, contribuíram para a busca de uma sociedade igualitária e

fraterna.

Antônio Gramsci é o mais criticado por Pezzimenti, visto que, Gramsci vê

no cristianismo uma cruel forma de opressão, e acredita numa Revolução que

toma por base mudanças culturais, afastadas de visões do cristianismo e do

catolicismo.

Portanto, o artigo imprime a mensagem de que só será possível a

formação de uma consciência de respeito pelo outro, ou seja, fraterna e

humanitária, por vias religiosas.

Em desacordo com Pezzimenti, Tosi (2009, p. 43), embora reconheça no

cristianismo as raízes da fraternidade, não acredita na religião como única forma

de desenvolver respeito, tolerância e capaz de trazer o reconhecimento de cada

individuo como detentor de direitos e deveres.

O olhar histórico revela o cristianismo como defensor de uma sociedade

hierarquizada e extremamente injusta, já que:

Apesar de ter alguma plausibilidade, essa resposta encontra o desmentido da própria história da igreja, que deveria alertar para o fato de que, ao longo dos séculos em que o paradigma da fraternidade foi hegemônico na Societas e na RespublicaChristiana, isso não impediu a criação de sociedades altamente hierarquizadas, com privilégios de status, com fortes conflitos internos e externos, em que prevalecia um paradigma organicista de subordinação da parte pelo todo, em que os súditos tinham mais obrigações do que direitos etc. E não podemos culpar por isso a falta de religiosidade ou o individualismo burguês, que ainda não havia surgido.(TOSSI,2009, p. 59)

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Incontestavelmente, a religião não se apresenta como único meio de

relações fraternas, já que tem sua história marcada pela opressão. Assim, a

busca por uma construção social justa, cada vez mais, passa a ser

responsabilidade dos cidadãos, já que a igualdade pregada pela doutrina cristã

não se preocupava (e normalmente, atualmente, continua assim) com

sofrimentos (opressão) terrenos. Colabora com este entendimento Comparato:

Mas essa igualdade universal dos filhos de Deus só valia, efetivamente, no plano sobrenatural, pois o cristianismo continuou admitindo, durante muitos séculos, a legitimidade da escravidão, a inferioridade natural da mulher em relação ao homem, bem como a dos povos americanos, africanos e asiáticos colonizados, em relação aos colonizadores europeus.(2010, p.30)

Descartando o fundamento religioso, buscaram-se novas justificativas para

aplicar leis universais para todos os homens. Justamente por romper com uma

organização social extremamente excludente, de submissão aos poderes

monárquicos, tidos como representantes de Deus na terra foi, que a revolução

de 1789 fez nascer um sentido politico para a fraternidade, e consequentemente,

para os direitos humanos, como contemporaneamente são entendidos.

Portanto, uma sociedade mais justa e igualitária, passa pela disposição de

homens e mulheres em construírem relações de respeito com o próximo, onde

a participação politica seja realizada como mecanismos de aprimorar a

sociedade para todos os cidadãos, com bases fraternas de convívio social.

Limites e possibilidades de concretização da fraternidade na

sociedade do consumo.

Partindo do pressuposto de que o consumo é essencial à sobrevivência de

todos os seres vivos, é conveniente esclarecer as mudanças nos padrões de

consumo que diferencia a sociedade contemporânea das sociedades

antecedentes.

Nos diferentes períodos históricos os padrões de consumo passam por

algumas mudanças, visto que está em constante transformação, assim as

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mudanças aqui elencadas nos possibilita diferenciar consumo de

consumismo.Segundo Bauman:

De maneira distinta de consumo, que é basicamente uma característica e uma ocupação dos seres humanos como indivíduos, o consumismo é um atributo da sociedade. Para que uma sociedade adquira esse atributo, a capacidade profundamente individual de querer, desejar e almejar deve ser, tal como a capacidade de trabalho na sociedade de produtores, destacada (“alienada”) dos indivíduos, e reciclada/reificada numa força externa que coloca a “sociedade de consumidores” em movimento e a mantém em curso como uma forma especifica de convívio humano, enquanto ao mesmo tempo estabelece parâmetros específicos para as estratégias individuais de vida que são eficazes e manipula as probabilidades de escolha e conduta individuais.(2008, p. 41)

O sentido da vida, cada vez mais é buscado no consumo, este assume o

“ethos” da existência humana, o que propicia identidade e auto afirmação

enquanto seres dignos e competentes.

Para Nicolau Sevcenko, o fim do século XIX é um marco histórico para as

transformações que cominaram com a atual sociedade do consumo. O

desenvolvimento científico-tecnológico potencializou a produção e

consequentemente os bens e serviços consumidos no mundo.

Tomamos como nosso ponto de referência mais distante a Revolução Cientifico-Tecnólogica de 1870 e pudemos acompanhar seus desdobramentos que, em direção ao final do século XX, foram se tornando progressivamente mais acelerado, intenso e dramático. (...) verificamos que as mudanças dos mecanismos e processos técnicos, num primeiro momento e de forma mais direta, amplia os potenciais produtivos de dado sistema econômico, seja aumentando sua capacidade de produção e consumo, seja multiplicando sua riqueza, representada pelo fluxo de recursos humanos, conhecimentos, equipamentos, mercadorias e capitais. (SEVCENKO ,2001. p.60)

Todas essas mudanças alteraram significativamente as percepções e os

valores humanos, “afinal, agora os indivíduos não serão mais avaliados pelas

suas qualidades pessoais ou pelas diferenças que tornam única uma

personalidade. Não há tempo nem espaço para isso.” (Sevcenko, 2001, p.63)

Neste sentido, os indivíduos passam a ser percebidos e identificados a partir de

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sua capacidade de consumir, para potencializar essa pratica são utilizados os

mais sofisticados métodos, radicalizando o sentido do consumo. Continua

ajudando nesse entendimento Sevcenko:

Primeiro, que não basta aos produtos da indústria serem melhores, mais funcionais e mais fáceis de usar, não basta investir em qualidade, eficiência e conforto. Num mundo marcado pela hipertrofia do olhar, o fundamental é que os produtos pareçam mais modernos, que se tornem eles mesmos manifestos de propaganda da modernidade que as pessoas anseiam por incorporar em seu cotidiano, pois isso lhes permitem irradiar a autoconfiança, o otimismo e o sentimento de superioridade dos que vão adiante do tempo, abrindo o caminho para o espírito de aventura e alma de exploradores, para os que seguem logo atrás. (2001, p.63)

Os sujeitos incorporam rapidamente a necessidade do consumo, dando

sustentabilidade a uma sociedade de desejos efêmeros, que foi denomina

“sociedade do espetáculo,” neste contexto de consumo intenso, os indivíduos

passam a ser percebidos por sua capacidade de adquirir bens e serviços.

Para Betania Assy (2008, pag. 81 a 99), o imaginário humano

contemporâneo mostra-se empobrecido na capacidade de encontrar prazeres

distantes dos anseios pessoais ou materiais da sociedade de consumo. Citando

Hannah Arendt, menciona a sobrevalorização da experiência interior ocupando

espaços coletivos com assuntos de interesse da vida privada, em estancias a

serem ocupadas por assuntos de interesse coletivo.

O “somos-no-mundo” que implica para Arendt, em aparecer para si e para

ou outros, necessariamente percebendo e sendo percebido pelos outros,

demanda julgamentos que fundamentalmente necessitam da presença dos

outros para nos lançarmos no campo público, exercendo nossa cidadania entre

os outros cidadãos. Para ela, segundo Assy, o exercício de pluralidade na

atividade de pensar é capaz de “criar um espaço”, um elemento político,

ratificando a “mentalidade alargada” Kantiana que seria a atitude política por

excelência.

Ao contrário do que é incentivado e incorporado pela sociedade de

consumidores, como simplesmente estar no mundo, e Ser significar apenas

aparecer, por realizamos desejos consumistas, sem necessariamente fazer

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parte dele emitindo reflexões e opiniões para a criação de espaços políticos, o

pensamento arentidiano, apropria-se da estética Kantiniana com o intuito de

evidenciar a capacidade humana de sentir prazer com aquilo que diz respeito

aos interesses público.

Hanna Arendt, ainda na análise de Assy, ressalva que as consequências

resultantes das transformações trazidas pela “sociedade de consumidores”, não

estimou a busca da participação política humana, pois não houve o cultivo dos

sentimentos públicos (ser afetado por meio da satisfação), envolvendo

apreciação a sentimentos coletivos.

Os espaços públicos passaram a ser um reflexo do modo de vida baseado

essencialmente na busca por consumo, não podendo “existir uma esfera

verdadeiramente pública, mas apenas atividades privadas exibidas em público.”

(ARENDT, 2001, p. 146 )

Lima (2009, p.76) enfatiza a importância do pensamento complexo diante

da realidade excludente proporcionada pela lógica alienante do consumo, que

fomenta o pensamento de uma única realidade capaz de propiciar a felicidade,

qual seja, à posse de bens matérias.

Esse posicionamento conduz, nas palavras dele, ao nacionalismo,

bairrismo, à intolerância e ao desrespeito à diversidade. Já o pensamento

complexo como elemento integrador de ângulos diferentes para a análise do

mesmo problema, abre-se para as surpresas e transformações, assim, revela

que mesmo as pequenas ações podem levar a consequências amplas, em

contraponto, a exclusão que empobrece consideravelmente a realidade.

Atualmente, a “sociedade, deslumbrada ante a abundância de sua

crescente fertilidade e presa ao suave funcionamento de um processo

interminável, já não seria capaz de reconhecer a sua própria futilidade”

(ARENDT, 2001, p.148), daí a dificuldade de desenvolvimento do pensamento

complexo valorizador da pluralidade e diversidade.

Por tudo exposto, a fraternidade encontra grandes dificuldades para firmar-

se (concretização) enquanto princípio político, já que há uma hierarquização

social, dificultando a igualdade entre todos os cidadãos. Assim, a cidadania

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indispensável para o sujeito político, que não encontra espaço nesse cenário, é

substituída pelo consumo.

Considerações finais

Celso Lafer (2013), em artigo publicado sobre a contribuição de Hannah

Arendt na construção contemporânea dos direitos humanos, evidencia que a

percepção Arendtiana sobre a realidade é extremamente fecunda, na medida em

que sua proposta busca uma retomada crítica ao pensamento Ocidental na

busca de condições políticas e jurídicas garantidoras de um mundo comum

diante da complexidade social da atualidade.

Segundo Lafer, Hannah Arendt ao pensar uma comunidade política, como

possibilidade de ações conjuntas e de criação/invenção de pessoas dispostas a

participarem das decisões públicas que afetam a vida de todos, traz

possibilidades de rompimento “com uma ordem colonial ou baseada em impérios

dinásticos por meio da liberdade de agir em conjunto”, garantindo o exercício da

cidadania, indispensável ao fortalecimento de laços comuns a humanidade.

A repercussão desse entendimento atinge a percepção sobre o interesse

público dos cidadãos, por recuperar a capacidade de ação e gerar poder pela

ação conjunta em contraponto a opressão.

A intenção é resgatar o verdadeiro sentido do poder, na medida em que as

decisões políticas são fruto de esforços coletivos para alcançar um bem comum.

Essa é uma importante contribuição, trazida por Arendt, como mecanismo de

afirmação da liberdade e igualdade por caminhar na construção coletiva de

relações fraternas.

Referências

ARENDT, Hanna. A condição Humana. 10ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001.

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ASSY, Batania. Revista da Faculdade de Direito da UFPR. ISSN: 0104-3315, Vol.47, 2008. Disponível em:http://ojs.c3sl.ufpr.br/ojs2/index.php/direito/article/view/15736. Acesso em: 28 março 2013. BAUMAN, Zygmunt. Vida para o Consumo: a transformação das pessoas em mercadoria. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2008. COMPARATO, Fabio Konder. A afirmação histórica dos direitos humanos. 7ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010. GRESPAN, Jorge. Revolução Francesa e Iluminismo. São Paulo: contexto, 2003. LIMA, Alexandre José Costa. A dialética da fraternidade, da dignidade e do pluralismo. Livro: O principio esquecido: exigências, recursos e definições da fraternidade na política. Antônio Maria Baggio Organizador. Vargem Grande Paulista: 2009. Editora: cidade nova SEVCENKO, Nicolau. A corrida para o século XXI: no loop da montanha russa. 2ª ed. São Paulo: Companhia das Letras,2001. PEZZIMENTI, Rocco. Fraternidade: o porquê de um eclipse. In: Antônio Maria Baggio (org). O Principio Esquecido 1: a Fraternidade na Reflexão Atual das Ciências Políticas. Vargem grande paulista SP: Editora cidade Nova, 2008. ---------------------. A fraternidade é uma categoria política? In: BAGGIO, Antônio Maria (Org). O Principio Esquecido: Exigências, Recursos e Definições da Fraternidade Política. Vargem Grande Paulista SP: editora cidade nova, 2009. TOSSI,Giussep. A fraternidade é uma categoria política? In:BAGGIO, Antônio Maria (Org). O Principio Esquecido: Exigências, Recursos e Definições da Fraternidade Política. Vargem Grande Paulista SP: editora cidade nova, 2009.

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Uma análise da reforma protestante à luz da teoria da

fraternidade de Enrique del Percio

Diego Dorgival de Macêdo97

Adilson Ferraz98

Resumo: A Reforma Protestante foi a grande responsável pelo desenvolvimento econômico e social da Europa, rompendo com a Idade Média e inaugurando o período Moderno de nossa história. Tomando como ponto de partida a relação fraternal entre os cristãos da Europa medieval, este trabalho pretende fazer uma análise crítica da Reforma Protestante à luz da teoria sobre fraternidade do pensador argentino Enrique Del Percio. A partir de Martinho Lutero, buscaremos estabelecer uma ponte com a dimensão conflitiva existente em tal relação. A par disso, nosso objetivo é mostrar que toda relação fraternal carrega em si uma carga de conflito, poder e desejo que gera para a sociedade, sob a ótica destes três aspectos, um progresso.

Palavras-chave: Fraternidade, Protestantismo, Enrique Del Percio.

Abstract: The Protestant Reformation was largely responsible for the economic

and social development of Europe, breaking with the Middle Ages and Modern

inaugurating the period of our history. Taking as its starting point the brotherly

relationship between Christians of medieval Europe, this paper aims to make a

critical analysis of the Protestant Reformation in the light of the theory of

brotherhood of the Argentine thinker Enrique Del Percio. From Martin Luther, we

will seek to establish a bridge with the existing conflictual dimension in this

relationship. Alongside this, our goal is to show that all fraternal relationship

carries with it a load of conflict, power and desire that generates for society, from

the perspective of these three aspects, progress.

Keywords: Fraternity, Protestantism, Enrique Del Percio.

97 Graduando do VI período do Curso de Licenciatura Plena em Filosofia pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Caruaru – FAFICA. Email: [email protected] 98 Orientador. Doutorando em Direito pela Universidade de Buenos Aires, Doutorando em Filosofia pela Universidade Católica Argentina, Mestre em Filosofia, professor da Fafica e da Faculdade Asces. Professor orientador.

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Introdução

Na figura emblemática de Martinho Lutero, podemos contemplar a face de

um homem capaz de revolucionar todo o Ocidente com a coragem de expressar

e defender suas convicções. Lutero é o estopim da Reforma Protestante –

movimento que pregava radicais mudanças no universo católico – e aquele que

defendeu igual irmandade entre os cristãos, sem que houvesse a consolidada

hierarquia católica, composta pelo Papa, o sucessor direto de São Pedro, os

bispos, legítimos sucessores dos apóstolos, os padres, religiosos e por últimos

os leigos. Para ele, não poderia haver essa diferença de posições, mas todos

deveriam ser tratados de maneira igual e possuir iguais direitos. É este o ponto

que mais se aproxima do pensamento de Enrique Del Percio no que se refere à

fraternidade: para o pensador argentino toda relação horizontal é geradora de

conflitos, mas quando reportamos tal relação para o campo da fraternidade

esses conflitos são causadores de progressos positivos. No caso da Reforma,

foi o conflito entre os irmãos (católicos) que proporcionou a abertura do Ocidente

a uma nova era: a modernidade.

A Reforma Protestante – breve relato

O século XVI será profundamente marcado pela ruptura da unidade

católica que acarretará em uma total reviravolta em toda Europa e

consequentemente no mundo. Mas, falar sobre esta ruptura que, historicamente,

é conhecida como Reforma Protestante não é uma tarefa fácil, pois suas causas

são tão complexas quanto imaginamos. Isso acontece porque “a reforma

religiosa teve origens independentes” (DAWSON, 2014, p. 111). O que iremos

fazer será elencar alguns pontos relevantes a fim de proporcionar uma

compreensão mais clara do que ocorreu neste período.

De antemão já podemos pontuar um assunto que perpassou todo este

evento: o desejo por liberdade. Como constata Marcos Antônio (2007, p. 87) “[...]

o tema central de toda a Reforma Protestante do século XVI é o da liberdade.”;

aqui o conceito de liberdade se estende por diversos âmbitos, principalmente o

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religioso, mas acarretará em profundas “consequências sociais, institucionais,

políticas, econômicas, culturais.” (AZEVEDO, p. 87). Outro ponto importante a

se considerar é que os cristãos daquele período enfrentavam uma grande crise

espiritual devido à prática, tanto ritual quanto pastoral, dos líderes religiosos

(religiosos, padres e bispos). Exemplo disso é que desde muitos séculos antes

do estopim da reforma, em 1517 com as 95 teses de Lutero, já surgiam

movimentos que apontavam a necessidade de uma reforma na ação dos

pastores da Igreja; podemos citar São Francisco de Assis (século XIII) que

revoluciona a práxis dos religiosos ao fundar a Ordem dos Frades Menores que

tinham como regra básica a pobreza evangélica e o desapego à ostentação

vivida pelo clero católico. Outro modelo de reformador é anterior ao Santo de

Assis: São Bernardo de Claraval (século XII) responsável por reformar a vivência

monástica, oferecer relevantes contributos à teologia e principalmente pelo dom

em resolver alguns cismas e contendas que a Igreja enfrentou no século XII.

A partir destes pressupostos podemos perceber que esse movimento que

sinalizava para mudanças na Igreja Católica já vinha maturando ao longo de

alguns séculos. Então foi

Neste “caldeirão de insatisfação” diante da Igreja Católica Apostólica

Romana, eclode a primeira afronta a seus ditames centenários:

Martinho Lutero (monge Alemão) afixa na porta da Igreja de

Wittenberg, em 1517, suas 95 teses criticando algumas práticas

litúrgicas do catolicismo que se afastavam dos mais básicos preceitos

bíblicos e propõe o Luteranismo, (nova doutrina baseada na salvação

do homem de acordo com a sua fé), apoiado por muitos Reis e

Príncipes, principalmente alemães e suíços. Este ato de Lutero deu

margem ao nascimento de outros levantes religiosos sob a égide de

Movimento Protestante. (MOREIRA; CARVALHO; SILVA, 2005, p. 3)

Agora trataremos, como diz Marcos Antônio (2007, p. 88), de fazer uma

breve análise do “século maduro para a implementação do movimento conhecido

como a Reforma Protestante”, dando ênfase à figura de Martinho Lutero, primeiro

responsável por externar o movimento reformador, o que até então acontecia de

modo interno e regulado pela Igreja. Christopher Dawson (2014, p. 113), ao falar

sobre Lutero diz que “era um homem do povo e um homem medieval, que pouco

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deveu às novas influências intelectuais da Renascença.”, ele assim o define ao

compará-lo com outros intelectuais da época que apontaram mudanças não só

religiosas, como Erasmo de Roterdã, mas que sofreram influência do alvorecer

renascentista – o que não ocorreu com Lutero.

Era um homem de profunda intelectualidade, tanto que com menos de

trinta anos tornou-se professor de Sagrada Escritura na Universidade de

Wittenberg. Foi lá que o monge agostiniano passou a combater o escolasticismo,

adotando uma teologia totalmente bíblica.

Lutero foi, sem dúvida, um gênio, um homem de poder e força titânicos,

que combinou, em um nível extraordinário, a eloquência vernácula do

demagogo com a convicção religiosa do profeta. Sabia como falar para

“seus” alemães em linguagem que o homem comum compreendesse

e, ao mesmo tempo, falava com convicção e profundidade dos mais

insondáveis mistérios da fé cristã. (Dawson, 2014, p. 114)

Em contrapartida seus defeitos terminavam por abafar sua magnitude

intelectual. “O temperamento violento e apaixonado não admitia nenhuma

contradição, e em cada controvérsia, destruía o adversário com a grosseria e

obscenidade de um camponês enfurecido” (DAWSON, 2014, p. 114). Esse

antagonismo presente em Lutero o levou a relativizar quase todas as coisas:

Não reconhecia nenhuma verdade, salvo as que sentia e via

diretamente ou por um ato imediato de intuição psicológica.

Comparativamente, nada mais importava. A autoridade da Igreja, o

testemunho da tradição, a experiência religiosa de outros, os dogmas

das escolas teológicas, pouco ou nada contavam, uma vez que não

concordassem com suas intuições e convicções pessoais. Isso torna o

ensinamento de Lutero mais subjetivo e parcial do que o de qualquer

outro pensador cristão. (DAWSON, 2014, p. 114)

Foi em uma viagem a Roma que Martinho Lutero começou a desejar

efetivamente reformular a prática da Igreja Católica, principalmente em dois

aspectos: o comportamento moral do clero e a venda de indulgências. A sede do

catolicismo estava envolvida na faraônica obra de construção da nova basílica

de São Pedro, iniciada pelo Papa Júlio II, e precisava arrecadar muito dinheiro

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para conseguir concluir tal obra. Para tanto, durante o pontificado do sucessor

de Júlio II, o Papa Leão X resolveu vender indulgências (perdão dos pecados)

em favor dos falecidos por toda a Europa. Outro fato relevante era a vida

totalmente promíscua que grande parte do clero e dos religiosos vivia em Roma.

Lá haviam bordeis somente para clérigos e o pecado da luxúria havia se tornado

algo banal entre aqueles que eram “modelos de perfeição”.

Foi diante de todo esse cenário que o monge Martinho voltou à Alemanha

convicto de que a Igreja estava se corrompendo e adentrando numa perdição

irreversível. Para salvar a Igreja era preciso propor algumas mudanças. Lutero

então se achou aquele que foi enviado por Deus para defender as pessoas de

Satanás. Ele seria o defensor de Deus na Terra. (Cf. DAWSON, 2014, p. 115).

A culminância da intenção de Lutero foram as famosas 95 teses que, segundo

consta, foram afixadas na porta da igreja de Wittenberg em 31 de outubro de

1517. Nestas teses Martinho Lutero propunha uma série de mudanças no que

dizia respeito à prática das indulgências, ao papado e a alguns dogmas e rituais

católicos. O que mais impressionou nas suas teses foi a linguagem agressiva e

direta utilizada e principalmente sua coragem em afrontar a Igreja de Roma.

A oposição que encontrou em Roma e na Alemanha o fez continuar,

mesmo antes da condenação por Roma, até a ruptura final com o

papado e toda a tradição medieval do catolicismo, o que é expresso

nos grandes panfletos de 1520, À nobreza Cristã da Nação Alemã, Do

Cativeiro Babilônico da Igreja e Da Liberdade do Cristão. (DAWSON,

2014, p. 117)

Como relata Christopher Dawson (2014, p. 120), em sua obra A divisão

da Cristandade, “do lado católico, a resistência foi, no início, extraordinariamente

fraca.”, haja vista muitos líderes católicos terem considerado Martinho Lutero “um

beberrão que num devaneio havia escrito aquilo, mas que logo após a retomada

de sua sobriedade retiraria tudo o que havia dito nos escritos”. Mas, ao

perceberem a seriedade nas investidas de Lutero contra a Igreja, principalmente

nos escritos posteriores as 95 teses, a cúpula católica começou a se movimentar

e tomar algumas decisões. Para tanto, os bispos alemães recorreram à

autoridade secular na pessoa do imperador Carlos V, que estava convicto a

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cumprir aquilo que era seu dever para com a Igreja. Dessa forma, o imperador

“expressou claramente [...] sua opinião em Worms, em 1521, e foi forte o

bastante para forçar a Dieta a aceitar a bula papal contra Lutero e a proferir uma

sentença de banimento, apesar da resistência dos partidários de Lutero.”

(DAWSON, 2014, p. 120).

O mundo católico enfrentava outros grandes combates, haja vista seus

principais líderes na Europa medieval serem monarcas ou estarem ligados à

burguesia. Após a Dieta de Worms, Martinho Lutero partiu para a Espanha e

permaneceu por lá durante sete anos, e foi nesse período que os adeptos do

luteranismo avançaram de uma forma descontrolada na Alemanha – o que a

levou para um estado de anarquia e revoltas.

Em todo esse tumulto não havia discussão quanto a execução do Édito

de Worms; ao contrário, as forças do protestantismo se tornaram a

cada ano mais fortes e mais autoconscientes, especialmente nas

cidades livres do Império e nas cidades hanseáticas do Mar Báltico. Ao

longo desses anos quase todos aceitaram a nova doutrina, aboliram a

missa, secularizaram monastérios e estabeleceram uma nova política

eclesiástica. (DAWSON, 2014, p. 121)

O cume de toda esta situação deu-se entre os anos de 1521 a 1522

quando Lutero retirou-se em Wartburg, disfarçado de Juncker Georg. Esse

período marcou a ruptura entre o Martinho pregador reformado da Igreja e o novo

Martinho, fundador de igrejas evangélicas antipapistas e antiepiscopais. Este

“novo” Martinho Lutero também defendia a secularização em oposição ao

monaquismo e defendia o casamento de monges e freiras. (Cf. DAWSON, 2014,

p. 121). Com o Lutero fundador do luteranismo surgiram enormes mudanças

culturais, sociais, políticas e econômicas assim como outros reformadores e

fundadores, como é o caso de João Calvino na Inglaterra. É preciso termos a

clareza de que ao se falar sobre a Reforma Protestante iniciada no século XVI,

não estamos falando apenas de uma mudança espiritual ou religiosa, mas de

uma mudança radical que pode ser considerada o início da Era Moderna.

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A fraternidade universal: um resumo da teoria de Enrique Del Percio

É de suma relevância fazermos uma breve explanação acerca da teoria

de fraternidade apresentada por Enrique Del Percio em sua obra Fraternidade

inevitável: Conflito, poder e desejo, para podermos aproximá-la com os eventos

que se sucederam no período da Reforma Protestante.

Já de início é importante levarmos em consideração qual tipo de

fraternidade estamos falando, pois, como o próprio Enrique Del Percio (2014, p.

19, tradução nossa) nos coloca, ela pode ser interpretada tanto “como aquele

bem que efetivamente é quanto àquele que queríamos que fosse”. Neste

primeiro ponto nós encontramos algo muito interessante para entendermos a

fraternidade a partir da ótica social, pois quando falamos neste âmbito veremos

que não existe uma relação vertical, como podemos notar em nossas famílias,

mas na sociedade as relações se estabelecem de modo horizontal e é daí que

brota todo conflito. Assim, o bem do qual falamos acima se torna um ideal

utópico, pois toda relação horizontal é conflitiva por essência.

Vale lembrar que ao pensarmos a sociedade devemos considerá-la como

produto de uma construção e não algo já dado, acabado, haja vista que

“a cara realista nos dá o dado de que nada está dado de antemão e

que, portanto, tudo é questão de construções, e que nunca são

definitivas e, em sua dinâmica, são resultado de lutas e de consensos,

de diálogos e imposições.” (PERCIO, 2014, p. 20, tradução nossa).

Fica-nos claro que a vida social é uma construção contínua que sempre

estará longe de ficar pronta e quando incluímos a noção de fraternidade no seio

desta ela ganha um caráter universal, que, se não for bem compreendida e

interpretada, pode ser reduzida apenas a “um ideal que nunca se realizará

plenamente” (PERCIO, 2014, p. 20, tradução nossa). Isso acontece porque a

maioria dos pensadores vê a “fraternidade como ideal a alcançar, caracterizado

pela abertura ao outro, a reciprocidade, a unidade, o dom, a generosidade e a

comunhão” (PERCIO, 2014, p. 21, tradução nossa).

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O que Enrique insiste em fazer é trabalhar a teoria da fraternidade como

originária da vida social: “Mas, insisto, também podemos pensar na outra face

da bifronte fraternidade, a face que olha a origem.” (PERCIO, 2014, p. 22,

tradução nossa). Esta face que “mira al origen” é que sustenta o argumento de

que uma característica originária de toda relação social é a fraternidade e para

provar tal proposição Del Percio se utiliza das narrativas míticas que mostram-

nos o surgimento das principais cidades e civilizações históricas e percebe um

fato interessante: todas elas se originam do conflito entre irmãos. Foi assim com

Roma que foi fundada após a briga entre Rômulo e Remo, com a cidade de

Henoc que surge depois da morte de Abel e com tantas outras cidades que tem

sua fundação narrada através de mitos. Este fato serve de lastro para uma

constatação importante: “as relações fraternas são, em si mesmas, conflitivas.”

(PERCIO, 2014, p. 23, tradução nossa)

Um outro aspecto a se considerar na teoria de Del Percio é que a

fraternidade também deve ser considerada um categoria política, pois não

esqueçamos que ela é conflitiva e inevitável. A política é característica

puramente humana como “já ensinava Aristóteles faz dois milênios e meio que

somos animais políticos” (PERCIO, 2014, p. 33, tradução nossa). Estando a

política arraigada em nossa condição humana, em nossa origem social, “a

fraternidade, desde as origens das diferentes culturas, vive uma conexão

essencial com a instalação da experiência política.” (BAGGIO, 2009, p. 206 apud

PERCIO, 2014, p. 33-34, tradução nossa), sob a ótica desta relação essencial

entre fraternidade e política e, considerando o conceito de fraternidade enquanto

originária da vida social, esta mesma fraternidade

É muitas vezes apresentada como insustentável ou dilacerante, de

qualquer forma, como uma relação que contém e exemplifica o conflito

e a dificuldade radical das relações humanas [...] mostra a necessidade

do outro, da parte de cada um, para compreender a própria identidade.

(BAGGIO, 2009, p. 206 apud PERCIO, 2014, p. 34, tradução nossa)

Não somente base da vida social como também construtora da identidade

individual de cada pessoa, a fraternidade revela aquilo que temos em comum ao

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mesmo tempo em que desnuda nossas idiossincrasias. Numa relação fraternal

a igualdade coletiva e a diferença individual aparecem simultaneamente, pois “a

fraternidade fala de ralações horizontais e a horizontalidade estimula o conflito,

enquanto a verticalidade tende a desencorajar o ‘de baixo’ para não confrontar

seu superior” (PERCIO, 2014, p. 34, tradução nossa). Nesta dicotomia entre

relações horizontais e verticais Del Percio deixa claro que não existem

hierarquias naturais, portanto, a relação vertical não passa de uma construção

social em que uma parte abre mão de sua posição de igualdade para que outrem

se ponha acima na esfera social. Quando adota-se este padrão falar de

fraternidade é algo incômodo, irritante, pois “ela questiona, critica, traz o conflito

ao centro da cena. Ou talvez não seja ‘trazer’ o verbo mais adequado;

deveríamos dizer ‘descobrir’, pois embora não o vendo, o conflito está” (PERCIO,

2014, p. 36, tradução nossa).

Para uma compreensão mais clara de qual fraternidade queremos tratar,

vale lembrarmos que a palavra fraternidade que tratamos neste trabalho é

utilizada como uma metáfora e não no sentido estrito do termo.

Quando se refere a fraternidade como catacrese, se evidencia que esta

não tem por que ter exatamente as características da fraternidade do

sentido próprio. Embora não possa haver irmãos sem um pai ou uma

mãe, pode-se haver fraternidade universal (analogia catacretíca) sem

pais. (PERCIO, 2014, p. 48, tradução nossa)

A catacrese faz-se necessária nesta teoria porque

Não há outro termo que designe o fato de que todos os seres humanos

estão em condição de horizontalidade; e vale que a horizontalidade não

é sinônimo de igualdade: os irmãos estão nessa condição, mas não

são iguais. Sempre há fraternidade, mas a história nos mostra que

poucas vezes há igualdade. (PERCIO, 2014, p. 48, tradução nossa)

Fraternidade ética: a virtude aristotélica

Para falar de ética na teoria de Enrique Del Percio não podemos nos deter

a uma perspectiva platônica que afirma existir um bem que existe por si mesmo,

o qual devemos buscá-lo para conseguir um padrão de conduta, mas a ética

fraterna de Del Percio é puramente aristotélica. Para tal, Enrique se apropria do

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conceito de virtude em Aristóteles: “o bem é algo que acontece, que vai se

realizando mediante nosso agir em comum” (PERCIO, 2014, p. 107, tradução

nossa).

Neste campo, indivíduo e sociedade são concebidos como relação, “o que

nos permitirá apreciar que existem questões estruturais que condicionam as

ações e condutas, mas sem chegar a eliminar totalmente a liberdade última do

sujeito” (PERCIO, 2014, p. 110, tradução nossa). O que se pretende é pensar a

ética a partir da utilidade e da felicidade; aqui seja uma utilidade individual ou

coletiva.

A utilidade se define em função do vínculo entre o sujeito com os

objetos, incluindo os outros indivíduos como objeto, pois a utilidade

privilegia as relações posicionais entre as pessoas: fazer algo a fim de

adquirir uma coisa e/ou de posicionar-me melhor que outros no status

social. (PERCIO, 2014, p. 110, tradução nossa)

Em contrapartida podemos entender a felicidade “em função da relação

que um seja capaz de manter consigo mesmo e com os demais, considerando

que eles me constituem” (PERCIO, 2014, p. 110, tradução nossa). Precisamos

compreender que esses dois conceitos não se contrapõem, mas tem uma

relação de meio e fim. Meio e fim porque “em geral, a felicidade exige a utilidade

para realizar-se [...] a utilidade é um dos meios mais importantes para alcançar

a felicidade” (PERCIO, 2014, p. 112, tradução nossa).

Fraternidade e conflito

Para esclarecer a dimensão conflitiva presente na fraternidade, Del Percio

toma como base algumas reflexões acerca do conflito com o intuito de organizar

uma tipologia clara. O primeiro ponto trabalhado por ele é a metáfora do conflito

enquanto protagonismo ou como antagonismo, “o conflito como protagonismo é

quando as partes em conflito encontram um objetivo em comum e como

antagonismo quando o objetivo imediato é derrotar ou eliminar o outro” (PERCIO,

2014, p. 146, tradução nossa). É evidente que o conceito que está presente no

conflito fraternal é o protagonismo, pois este é canalizável, é articulável a fim de

se chegar a um objetivo comum. É um conflito que existe, mas o centro da

questão é a busca de acordo entre ambas as partes, a procura de um objetivo

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comum para as partes em conflito. Portanto, não existe articulação em uma

sociedade compreendida com uma pirâmide onde existe um grupo que está no

topo e outro que está à margem, abaixo. Uma sociedade esquematizada de

modo vertical não articula seus conflitos, mas quando a sociedade compreende

sua dimensão igualitária, seu aspecto fraternal, ela torna-se capaz de articular e

canalizar os conflitos existentes em seu seio com o intuito de promover o bem-

comum.

A relação entre a Reforma Protestante e a teoria da fraternidade de Enrique

Del Percio

Chegamos ao cerne de nosso estudo e, consequentemente, a parte mais

complexa e delicada: concatenar a teoria de Enrique Del Percio com os eventos

que aconteceram no período da Reforma Protestante a fim de validar esta teoria.

Para tanto tomaremos os conceitos mais relevantes em ambas as partes e

buscaremos uma aproximação conceitual dos fatos ocorridos no século XVI com

o pensamento de Del Percio.

A primeira questão a ser abordada é a irmandade existente e pregada

entre os cristãos: todos são irmãos, pois são filhos de Deus e participam da

mesma família através do batismo. Aqui não encontramos dificuldade para

aplicar o conceito de fraternidade universal formulado por Del Percio (2014, p.

56, tradução nossa) “às vezes é uma particularidade que, para universalizar sua

demanda, constrói-se um tipo de fraternidade necessária para transformar a

realidade vigente”. Foi o caso do monge alemão Martinho Lutero que, para

universalizar a necessidade de mudanças na Igreja Católica, criou uma

fraternidade entre aqueles adeptos à suas ideias com o intuito de persuadir a

Igreja a acatar suas teses, o que acarretou no surgimento do luteranismo. É

interessante perceber que Lutero constrói este conceito de fraternidade para

contrapor ao modelo hierárquico da Igreja Católica e, mesmo sem perceber,

também contrapõe o modelo de sociedade imperante na Alemanha medieval que

seguia o modelo de uma pirâmide onde o imperador estava no topo e

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Abaixo do imperador havia sete eleitores – eclesiásticos e leigos.

Subordinados aos eleitores estavam os príncipes – duques, bispos e

príncipe-abades. Sob os príncipes estavam as cidades livres, os

cavaleiros e os condes – todos eram governantes independentes nas

próprias pequenas províncias, que muitas vezes não eram maiores que

as terras de um fidalgo rural inglês. Na base da pirâmide social

estavam os camponeses, que carregavam nas costas todo o ônus do

edifício, mas que não tinham meios de expressão política (DAWSON,

2014, p. 110)

Defendendo uma fraternidade horizontal entre os cristãos, Martinho

Lutero publicou em 1520 o primeiro escrito da Reforma, À Nobreza Cristã da

Nação Alemã. Nesta obra Lutero afirma e defende “que todos os cristãos eram

iguais. Não há verdadeira distinção entre as ordens temporal e espiritual. Padres

e bispos são simplesmente funcionários da sociedade cristã e não possuem

poder inerente de jurisdição” (DAWSON, 2014, p. 118). O que Lutero pretendia

era uma igreja onde todos fossem e possuíssem igual direito de participação,

principalmente no tangente ao acesso de todo povo às Sagradas Escrituras:

“Não cabe somente ao clérigo decidir o que deve ser feito. A Palavra de Deus e

as Escrituras são propriedade comum de todos os fieis.” (DAWSON, 2014, p.

118). Novamente nos reportamos à teoria de Enrique quando este falará de seu

caráter universal:

Se todos somos irmãos, não somos filhos nem pais. A horizontalidade

levanta incômodos pela direita os expoentes da hierarquia, mas

também pela esquerda às vanguardas esclarecidas que tratam aos

subalternizados como crianças às quais devem explicar-lhes ao que

estão submetidas e como devem libertar-se. (PERCIO, 2014, p. 57,

tradução nossa)

Outro fato importante é que uma parte da teoria de fraternidade

apresentada pelo pensador argentino utiliza o exemplo das narrativas míticas

entre irmãos, para demonstrar a dimensão progressista presente em um conflito

fraternal. Com a Reforma não precisamos nos munir de nenhum mito, mas os

próprios fatos tratam de confirmar a perspectiva de Del Percio. Segundo Marcos

Antônio (2007, p. 87) a Reforma Protestante trouxe “consequências sociais,

institucionais, políticas, econômicas, culturais”. Se para surgir a cidade de Roma

foi preciso haver o fratricídio entre Rômulo e Remos, para que se consolidassem

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radicais mudanças culturais, econômicas e principalmente políticas fez-se

necessária a Reforma que “estendeu-se na cultura e na vida política e social da

Europa como um todo e, certamente, no Ocidente.” (AZEVEDO, 2007, p. 89).

Conclusão

Com a Reforma Protestante uma série de profundas mudanças ocorreu

em todo Ocidente. Podemos afirmar que houve um enorme progresso em toda

Europa, mas que custou a vida de muitos. Foi um período de muitos conflitos

entre católicos e protestantes, entre aqueles que defendiam a permanência da

realidade medieval e aqueles que queriam a liberdade para inaugurar uma nova

era, com novas perspectivas, um novo modelo de sociedade.

A teoria da fraternidade apresentada pelo argentino Enrique Del Percio

vem para elucidar muitos aspectos relevantes deste período da história. Dentre

eles as ideias revolucionárias de Martinho Lutero, principalmente no que diz

respeito à sua tese de que todos os cristãos possuem iguais direitos já aqui na

Terra. O conceito de universalidade trabalhado por Enrique explica de maneira

muito objetiva a raiz da Reforma, pois ao articular todas as demandas da

Alemanha medieval, Lutero “concentra o poder para dizer aos defensores [...]

‘vocês não são nossos pais, mas nossos irmãos: tão irmãos como Rômulo e

Remo ou Caim e Abel’” (PERCIO, 2014, p. 56, tradução nossa).

Referências

AZEVEDO, Marcos Antônio Farias de. A liberdade cristã em Calvino: uma

resposta ao Mundo Contemporâneo. 2007. Tese (Doutorado em Teologia) –

Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2007.

DAWSON, Christopher. A Divisão da Cristandade: Da Reforma Protestante à

Era do Iluminismo. São Paulo: É Realizações Editora, 2014.

PERCIO, Enrique Del. Ineludible Fraternidad: Conflicto, poder y deseo. 1 ed.

Ciudad Autónoma de Buenos Aires: Ediciones CICCUS, 2014.

MOREIRA, Andressa Barroso de O. et al. A Reforma Protestante e a Contra

Reforma Católica. 2005. Artigo apresentado no 5º período do Curso de História

(Licenciatura) – Faculdade José Augusto Vieira, Lagarto, 2005. Disponível em:

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<http://linux.alfamaweb.com.br/sgw/downloads/142_023927_AReformaProtesta

nte_andrezza.pdf> Acesso em: 19 outubro 2014.

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GT: Histórias e sensibilidades o oficio do historiador e as suas sensibilidades humanas

Coordenador: xxxxxxxxxx

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O (re) fazer em Gilberto Gil: visões de cidade e de

mundos

Antonio Manuel da Silva Junior – Mestrando em História - UFPB

Considerações sobre História & Música

A importância da música na elaboração da consciência e cultura

histórica é eminente. Podemos perceber que em todas as fases de nossa vida,

desde nascimento até a nossa morte, e por todos os rituais que nos cercam, a

música é de fundamental importância. Quase todas as nossas atividades

ritualísticas, a música está presente. Celebramos a vida, a morte, nossa alegria,

através da música. Contudo, a música também irá torna-se veículo de

manifestações política, social e cultural.

Primeiramente, vamos perceber que a música, ou o documento artístico-

cultural, na visão de Napolitano (2002, p. 32), torna-se um documento histórico,

proporcionando processos de mediação da experiência histórica subjetiva nas

esferas socioculturais além de envolver diversas ações de aproximação entre

indivíduos ou grupos sociais fluindo certas composições e alianças ideológicas

de culturas e de grupos culturais. Não podemos negar a inserção da canção em

nossa vida prática e em consequência, a formulação de nossa consciência

histórica.

Mesmo com quase quatro décadas de estudos podemos observar que a

temática História e Música tornam-se ainda pertinente e o uso da música como

fonte historiográfica, pegando um gancho na História Cultural ainda está em fase

embrionária.

A história cultural da música popular no Brasil vem se desenhando e tomando forma aos poucos. É um trabalho um tanto intrincado para o historiador querer estabelecer relação entre o conhecimento histórico e a música, pois nem sempre os acadêmicos, em sua maioria, deram prioridade para essa relação tão intrigante, certamente devido à existência de questões heurísticas que necessitam de atenção

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especial. O historiador que se envereda por esse caminho primeiramente, irá se deparar com questões relacionadas ao balizamento metodológico no trato com a documentação. (MANOEL, 2014, p. 02)

Quando apreendemos essa expressão da cultura, através da música,

as mesmas funcionam como relatos da sociedade em que vivemos é utilizada

como documento Histórico.

…o documento artístico-cultural é um documento histórico como outro qualquer, na medida em que é produto de uma mediação da experiência histórica subjetiva com as estruturas objetivas da esfera socioeconômica. Os processos de mediação cultural, de natureza diversificada, envolvem as diversas ações de aproximação entre indivíduos ou grupos sociais e as obras da cultura, via produção cultural, meios de comunicação, crítica de arte, ações institucionais. (NAPOLITANO, 2002, p. 32).

Quando se fala dessas possibilidades na escrita da história, podemos

destacar a questão sobre as operações da vida prática que constituem a

consciência histórica como pressuposto e fundamento do conhecimento

histórico: a consciência histórica constitui-se mediante a operação, genérica e

elementar da vida prática, do narrar, com a qual os homens orientam seu agir e

sofre no tempo.

Contando com essa possibilidade, da música como fonte histórica e a

música como expressão artística que gravita em muitos focos de conhecimento,

percebemos que a análise de algumas canções de Gilberto Gil será instigante e

prazerosa além de verificar as visões de mundo do artista baiano.

Proposta das músicas da fase “RE”

A proposta deste artigo é inicialmente realizar uma análise de algumas

músicas da obra de Gilberto Gil, principalmente Refazenda e Refavela, incluindo

outras que possam integrar nossos estudos. Podemos, nessas músicas de

Gilberto Gil, perceber também os diversos temas tratados, desde linguística,

música, história, sociologia a geografia.

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As principais músicas trabalhadas neste artigo são da “fase RE” de

Gilberto Gil que inicia-se em 1975, como nos diz Calvani (1998):

A partir de 1975, Gil iniciou um processo de repensar sua vida e sua trajetória, que ficou conhecido como “Fase Re”, em virtude dos discos Refazenda (1975), Refavela (1977), Refestança (1977), culminando com Realce (1979). Foi um período de reformulação no plano existencial e artístico. Gil fez uma revisão de seus trabalhos e conceitos, se setorializa e divide-se em vários “Gils”, preparando-se para a fusão dos anos 80. Refazenda apresenta Gil rural e regional, interessado no enriquecimento que pode vir da visão rural; Refavela nasceu após sua participação em um festival na Nigéria e assunção definitiva de sua ligação com a cultura e musicalidade negras. (CALVANI, 1998, p. 197-198)

Essa fase Re, traz novas perspectivas de Gilberto Gil e percebemos a

sua interação com várias áreas do conhecimento. Analisando a música

Refazenda (1975), podemos observar onde o Misticismo e a ecologia se casam.

Sugere também, Bacchini (2008), os aspectos linguísticos fazendo referências

aos neologismos, a partir já do próprio título da canção onde sugere três formas

de interpretação:

“O primeiro passo, arriscado, mas inevitável e essencial, que se deve cumprir para aceder à proposta formulada em ‘Refazenda” consiste, justamente, no confronto com o título. O nonsense do neologismo “refazenda” abre-se fundamentalmente a três hipóteses interpretativas. O termo poderia ser o resultado de (1) a soma do prefixo “re” com a palavra fazenda: REFAZENDA = RE + FAZENDA; (2) a fusão entre o gerúndio do verbo refazer e a palavra fazenda: REFAZENDA = REFAZENDO A FAZENDA; (3) o encaixe entre um corpo central constituído pelo verbo fazer a palavra renda, divididas em duas unidades (re-nda) que são colocadas nas extremidades: REFAZENDA = RE + FAZE[R] + NDA. (BACHINI, 2008, p. 108)

As três formas são possíveis. Observamos também essa busca da

ruralidade que fala Calvani e o próprio Gil no encarte do seu álbum:

Na época pensavam que eu me referia à ditadura militar e ao ato institucional, o que nem me passou pela cabeça. O que me veio mesmo foi à natureza em seu contexto doméstico, amansada, a serviço da fruição – daí a ideia de pomar e das estações. Refazenda é a rememoração do interior, do convívio com a natureza; reiteração do diálogo com ela e do aprendizado do seu ritmo.99

99 Registro fotográfico na exposição GIL70 em Salvador – BA, em 27/12/2013

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O que nos traz a tona as palavras de Bacchini e do próprio Gil, são

aspectos linguísticos, místicos e ecológicos, sem deixar de lado as questões da

geografia, do tempo:

Abacateiro teu recolhimento é justamente O significado da palavra temporão Enquanto o tempo não trouxer teu abacate Amanhecerá tomate e anoitecerá mamão Abacateiro sabes ao que estou me referindo Porque todo tamarindo tem o seu agosto azedo Cedo, antes que o janeiro doce manga venha ser também (GIL, 1994, f. 03)

Amanhecer, Anoitecer, Agosto, Janeiro, são referências de tempo um

tanto quanto ruralizado, onde as estações do ano, o passar do dia, a safra das

frutas, é o que marca o dia, o tempo nas zonas rurais, principalmente antes dos

nossos aspectos tecnológicos que chegaram as mais remotas distâncias.

Lembramo-nos da vida regrada em períodos medievais, que foi

substituído pelo relógio de ponto e escuridão das fábricas da era industrial. Gil

relembra o tempo onde o doce da manga, chega cedo, em pleno janeiro ou o

gosto azedo do tamarindo no mês de agosto.

Quanto às interpretações das construções neologística do título,

Bacchini pode ter, em certo momento, ter analisado, em sua terceira hipótese o

seguinte trecho:

Abacateiro serás meu parceiro solitário Nesse itinerário da leveza pelo ar Abacateiro saiba que na refazenda Tu me ensina a fazer renda que eu te ensino a namorar Refazendo tudo Refazenda Refazenda toda Guariroba (GIL, 1994, f. 03)

A construção “FAZER RENDA” colocada posteriormente a “Refazendo

tudo” pode sugerir a questão da construção da renda, ou até mesmo da Fazenda,

não aquela que seja uma porção de terra demarcada, mas a fazenda, aquela

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que usualmente no nordeste, se chama um pedaço de pano para se costurar

roupas.

(Re)visitar o meio rural, o seu interior, foi o propósito de Refazenda.

Agora a (re)construção do urbano vem na canção Refavela (1977). Como o

próprio Gilberto Gil nos diz sobre a música e como ela surgiu:

Em 77, eu fui participar do FESTAC, festival de arte e cultura negra, em Lagos, na Nigéria, onde reencontrei uma paisagem suburbana do tipo dos conjuntos habitacionais surgidos no Brasil a partir dos anos 50, quando Carlos Lacerda fez em Salvador a Vila Kennedy, tirando muitas pessoas das favelas e colocando-as em locais que, em tese, deveriam recuperar uma dignidade de habitação, mas que, por várias razões, acabaram se transformando em novas favelas.100

As questões relativas às razões que acabaram esses conjuntos

habitacionais, mais uma vez se tornarem favelas, percebe-se devido à total falta

de estrutura presente nesses “novos bairros”. Continuam sem mobilidade, sem

água, sem transporte decente, sem assistência do governo, enfim, continua no

abandono, sem perspectivas para avanço, para sair da condição de

marginalizados da sociedade.

Apesar de, Gilberto Gil, nos apontar que as políticas de habitação no

Brasil surgem nos anos 50, tem que observar que um dos principais programas

de habitação do Brasil foi o BNH (Banco Nacional da Habitação), que o mesmo

até cita na música.

Apesar do BNH ter sido idealizado no início da ditadura militar, e, nossa

historiografia ainda trata o período da Ditadura como algo que trouxe sempre

malefícios para a nossa sociedade, perceberemos que as intenções do

programa eram as melhores possíveis. Medeiros (2013, p. 02), trata o BNH da

seguinte forma:

O Banco Nacional da Habitação (BNH) marca a história da política habitacional do país. O BNH foi o primeiro órgão de alcance nacional a instituir uma política habitacional. Sua trajetória é marcada por diversas críticas que vão desde a atuação econômica, o abandono da questão social, o afastamento do problema habitacional com o direcionamento

100 Registro fotográfico na exposição GIL70 em Salvador – BA, em 27/12/2013

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para outros setores, a repetição de modelos arquitetônicos e a ocupação do espaço urbano. Os estudos sobre a história do BNH são diversos, mas pontuais. O tema tende a ter certo preconceito por referir-se a uma instituição do período da ditadura militar. Agrega-se a imagem do BNH não só os erros cometidos por essa instituição, mas toda a simbologia que o período militar remota. Há de se investigar a política adotada pelo BNH para refletir as ações das políticas em pauta e para avaliar os méritos das acusações a que este responde.

Esse programa resultou futuramente e outros programas de habitação

como as COHABs e recentemente o “Minha Casa, Minha Vida”, porém percebe-

se que o problema maior não é tirar o barraco, dar uma casa de tijolos e telhas,

mas todo o contexto social do entorno desse novo ambiente.

A refavela Revela aquela Que desce o morro e vem transar O ambiente Efervescente De uma cidade a cintilar A refavela Revela o salto Que o preto pobre tenta dar Quando se arranca Do seu barraco Prum bloco do BNH (GIL, 2004, f. 01)

Nessas duas estrofes vemos o conflito do morro e asfalto, onde “aquela”

desce o morro para transar numa cidade efervescente. Na segunda estrofe

verifica-se justamente a implantação do BHN, onde se tenta dar um salto, e

principalmente aquele que é o mais descriminado e com menos acesso, que é o

preto pobre. Nas próprias” palavras de Gilberto Gil, comentando a música

percebe-se que a falta de infraestrutura é o grande pecado.

A esses fatores se somaram outros, locais: a mobilidade, por vezes difícil, outras vezes facilitada, dos negros cariocas na relação morro-asfalto e o movimento da juventude black-Rio, que se instalava propondo novos estilos de participação na questão da negritude no Brasil e mundo, com mais atividade cultural e absorção de elementos do discurso e da luta negra da América e da África.101

101 Registro fotográfico na exposição GIL70 em Salvador – BA, em 27/12/2013

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O acesso a outras atividades culturais é importante para a mudança real

da favela, não apenas o físico. E Gilberto Gil apresente no comentário isso e na

música.

A refavela Revela o passo Com que caminha a geração Do black jovem Do black-Rio Da nova dança no salão Iaiá, kiriê Kiriê, iaiá A refavela Revela o choque Entre a favela-inferno e o céu Baby-blue-rock Sobre a cabeça De um povo-chocolate-e-mel (GIL, 2004, f. 01)

As lutas dos movimentos sociais em prol da habitação, não se resume

ao acesso a moradia como fala Motta (2014, p. 09-10):

Quando falamos do problema da habitação e de lutas e movimentos sociais a ela relacionados, logo pensamos na falta de moradias, esquecendo que essa questão tem outras facetas e reivindicações, como as condições de infra-estrutura urbana (saneamento, transporte etc.) e a forma de implantação de obras de urbanização. Por isso apresentamos uma tipologia dos conflitos relacionados à moradia nas áreas urbanas, segundo as reivindicações em questão, lembrando que essa é uma classificação para fins de análise, uma vez que os processos reais demonstram que as reivindicações estão, muitas vezes, associadas.

Cada parcela da população deve procurar manifestar-se a partir de suas

condições. Desta forma, percebemos que Gilberto Gil, engajado na luta negra,

na luta por moradia, nas condições do “negro-pobre” utiliza-se da música para

fortalecer os movimentos sociais e protestar e reivindicar melhores condições

para isso.

Além da fase “RE”

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Como vimos, Refavela e Refazenda nos mostra o lado urbano e rural no

prisma de Gilberto Gil. Mas as visões de mundo dele não se resumem a essas

duas. Em outras músicas que Gil nos traz sua visão de mundo, temos

Parabolicamará. A música é de 1991, do álbum homônimo. A música, apresenta

aspectos sobre a globalização e as mudanças que ela trouxe principalmente

referente aos meios de transporte e de comunicação. O próprio título da música

faz referência a parabólica, um tipo de antena que capta o sinal vindo de satélites

que ficam ao redor da terra. Podemos relacionar até as questões tratadas no

tópico anterior, da fase “RE”, onde o meio rural representado pela música

Refazenda já foi modificado pelas “Antenas Parabólicas” e pelos novos meios de

comunicação e transporte.

A dimensão de tamanho de mundo e a proximidade existente agora com

o avanço dos meios de transportes e comunicação estão relatado na primeira

estrofe da música:

Antes mundo era pequeno Porque Terra era grande Hoje mundo é muito grande Porque Terra é pequena Do tamanho da antena parabolicamará Ê, volta do mundo, camará Ê, ê, mundo dá volta, camará (GIL, 1994, f. 10)

As consequências dessa modernidade, para Giddens (1991, p. 69-70),

que julga que a modernidade é globalizante.

Na era moderna, o nível de distanciamento tempo-espaço102 é muito maior do que em qualquer período precedente, e as relações entre formas sociais e eventos locais e distantes se tornam correspondentemente “alongadas”. A globalização se refere essencialmente a este processo de alongamento, na medida em que as modalidades de conexão entre diferentes regiões ou contextos sociais se enredaram através da superfície da Terra como um todo. (GIDDENS, 1991, p. 69)

102 Ver Giddens, 1991, p. 25-29

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As distâncias ficam se transformam. O que era longe, agora era perto, a

nossa visão só ia “ali defronte”, mas o mundo dá voltas e mostra que as

mudanças levam ao avanço.

Antes longe era distante Perto, só quando dava Quando muito, ali defronte E o horizonte acabava Hoje lá trás dos montes, den de casa, camará Ê, volta do mundo, camará Ê, ê, mundo dá volta, camará (GIL, 1994, f. 10)

As referências as distâncias com relação com o tempo gasto e o meio

de transporte, mostra também as transformações e com fala Giddens, (1991):

A globalização pode assim ser definida como a intensificação das relações sociais em escala mundial, que ligam localidades distantes de tal maneira que acontecimentos locais são modelados por eventos ocorrendo a muitas milhas de distância e vice-versa. (GIDDENS, 1991, p. 69)

Gilberto Gil então, fazendo referência entre espaço-tempo-meio de

transporte, relata na canção:

De jangada leva uma eternidade De saveiro leva uma encarnação De avião, o tempo de uma saudade Esse tempo não tem rédea Vem nas asas do vento O momento da tragédia Chico, Ferreira e Bento Só souberam na hora do destino apresentar Ê, volta do mundo, camará Ê, ê, mundo dá volta, camará (GIL, 1994, f. 10)

Os aportes relativos ao tempo também vemos em Zygmunt Bauman

(2001, p. 107-149). Suas referências sobre o tempo e espaço mostram como

hoje a nossa vida é instantânea. Os produtos são feitos para não durar. Bauman,

citando Sennett, faz uma comparação de Bill Gates com Rockefeller:

Gates, diz Sennett, “parece livre da obsessão de agarrar-se às coisas. Seus produtos surgem furiosamente para desaparecer tão rápido como

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aparecerem, enquanto Rockefeller queria possuir oleodutos, prédios, máquinas ou estradas-de-ferro por longo tempo”. (BAUMAN, 2001, p 144)

Uns dos grandes avanços e importantíssimo para o avanço dos meios

de comunicação foi e é a internet. Gilberto Gil então, faz em 1994 uma canção

onde faz referência a esse novo meio de comunicação que iria revolucionar o

contato entre as pessoas. Pela Internet.

O processo de informatização ganhou novo fôlego com a popularização da internet. A rede mundial de computadores criou um novo tipo de trabalhador no final do século [XX]. O trabalho sem sair de casa. Diante da tela de um microcomputador pessoal, é possível fazer compras, obter informações e comunicar-se com o mundo tudo, “navegando” na rede. (WORMS & COSTA, 2005, p. 180)

Notam-se também suas referências ao navegar, que também estava

presente em Parabolicamará.

Criar meu web site Fazer minha home-page Com quantos gigabytes Se faz uma jangada Um barco que veleje Que veleje nesse infomar Que aproveite a vazante da infomaré Que leve um oriki do meu velho orixá Ao porto de um disquete de um micro em Taipé (GIL, 1997, f. 11)

Os aspectos referentes às facilidades e a redução do tempo e espaço,

agora pelos meios de comunicação. Quando se promove debates e até os crimes

que se tornam globalizados.

Eu quero entrar na rede Promover um debate Juntar via Internet Um grupo de tietes de Connecticut De Connecticut acessar O chefe da milícia de Milão Um hacker mafioso acaba de soltar Um vírus pra atacar programas no Japão (GIL, 1997, f. 11)

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Na última estrofe, Gilberto Gil faz um “link” com o primeiro samba

gravado por Dondinho “Pelo telefone”. O título da música, Pela Internet, já é uma

referência da música de Dondinho, serve como um “up grade” do samba da

década de 1920.

Eu quero entrar na rede pra contactar Os lares do Nepal, os bares do Gabão Que o chefe da polícia carioca avisa pelo celular Que lá na praça Onze tem um videopôquer para se jogar (GIL, 1997, f. 11)

Considerações Finais

Trabalhar a canção como documento, não é tarefa fácil. Perceber ele

como documento é o primeiro desafio. Quando ele se torna majestoso, devemos

então observar o trato que devemos dar a ele.

Perceber todos os meandros de uma composição musical, suas

imbricações sociais, políticas e culturais, é um desafio para o pesquisador de

história quando se trata da canção como documento. A análise inteirada entre

música, ritmo, melodia e letra, não pode escapar de análise.

Gilberto Gil, em suas composições, traz documentos históricos

preciosos. Suas referências a vida prática, faz com que nós Historiadores

possam ver, nas entrelinhas de suas músicas, aspectos que constrói ao longo

de nossas vidas a nossa fadada consciência histórica.

Nosso caminho para que possamos realizar uma narrativa onde

indícios da vida prática estejam presentes na narrativa é a busca do encontro

entre História e Música. A música, que é produto sociocultural, não tempo como

não representar vivência da vida prática e que muitas vezes sofre a intenção ou

interpretação do tempo. E como vimos, esse produto forma a consciência

histórica.

O percurso da música popular, consolidação e avanços, mostra

também a face sempre contestadora que a música pode ter representação da

vida prática e servir de base para a exemplificação da vida prática, postulando

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também, a realização de narrativas que afloram a consciência Histórica. O

caminho é longo, para que possamos observar elementos da vida prática, da

consciência histórica, juntando música e História, mas não é impossível.

REFERÊNCIAS

BACCHINI, Luca. Refazendo tudo: Gilberto Gil e o Nonsense utópico da nação.

In: DE CARLI, Ana Mery Sehbe & RAMOS, Flávia Brocchetto (orgs.) Tropicália:

gêneros, identidades, repertórios e linguagens. Caxias do Sul: EDUCS,

2008. p. 108

CALVANI, Carlos Eduardo Brandão. Teologia e MPB. São Paulo: Edições

Loyola, 1998.

GIDDENS, Anthony. As Consequências da Modernidade. Tradução: Raul

Fiker. São Paulo: UNESP, 1991.

GIL, Gilberto. Eletracústico. Manaus: WEA Music, 2004. CD Stereo (14 faixas).

Faixa 01

___________. Gilberto Gil Unplugged. Manaus: WEA Music, 1994. CD Stereo

(16 faixas). Faixa 03

___________. Gilberto Gil Unplugged. Manaus: WEA Music, 1994. CD Stereo

(16 faixas). Faixa 10

____________. Quanta. Manaus: WEA Music, 1997. CD Stereo (13 faixas).

Faixa 11

MANOEL, Diogo Silva. Música para Historiadores: [RE]Pensando Canção

Popular como Documento e Fonte Histórica. In: Encontro Regional de História:

Profissão Historiador: Formação e Mercado de Trabalho, XIX. Juiz de Fora.

Anais... Juiz de Fora 2014 acessado em

http://www.encontro2014.mg.anpuh.org/site/anaiscomplementares em

18/11/2014 às 11:44

MEDEIROS, Sara Raquel Fernandes Queiros de. BNH: Outras perspectivas.

Artigo acessado em

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<www.cchla.ufrn.br/cnpp/pgs/anais/.../BNH,%20outra%20pespectiva.pdf> em

01/11/2014 as 20:54

MOTTA, Luana Dias. A Questão da Habitação no Brasil: Políticas Públicas,

Conflitos Urbanos E O Direito À Cidade. Acessado em

<http://conflitosambientaismg.lcc.ufmg.br/ wp-content/uploads/2014/04/TAMC-

MOTTA_Luana_-_A_questao_da_habitacao_no_Brasil.pdf. em 18/11/2014 às

12:14

NAPOLITANO, Marcos. História & Música: História cultural da música

popular. Belo Horizonte: Autêntica, 2002. (Coleção História &… Reflexões)

WORMS, Luciana Salles & COSTA, Wellington Borges. Brasil Século XX: ao

pé da letra da canção popular. 1ª Ed. Curitiba: Positivo, 2005.

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GT: Memória e verdade: reflexões sobre a redemocratização e justiça de transição na américa

latina e brasil

Coordenador: Emerson Francisco de Assis

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“Que país é esse?”: uma análise da redemocratização

no Brasil através da cultura popular

Samara Glícia Alves de Souza Oliveira**

Kétura de Souza Lins***

Resumo: O processo de redemocratização brasileira se deu de forma

conturbada, existiam pressões externas e internas para a implementação da

democracia no Brasil em caráter de urgência, enquanto o governo militar

desejava uma redemocratização lenta e gradual. Setores da sociedade

clamavam nas ruas por eleições diretas, liberdade de expressão e um governo

civil como solução para os problemas sociais e econômicos existentes.

Desemprego e inflação crescentes, uma dívida externa galopante e indicadores

sociais de países subdesenvolvidos, como altos índices de mortalidade infantil,

subnutrição, concentração de renda e analfabetismo, demonstravam para a

sociedade brasileira que o governo militar havia falhado na construção de um

país melhor e mais justo, e o governo civil e democrático deveria ser instaurado

imediatamente. O presente trabalho tem por objetivo analisar e retratar essa

época através de expressões culturais brasileiras como a música, o cinema e a

literatura. Cultura vem do latim ‘colere’ e significa “cultivar”, podemos então,

através do método dedutivo concluir que a cultura cultiva e reproduz a história

de um povo, podendo ser utilizada como retrato de uma época e do pensamento

de uma sociedade. A metodologia utilizada para a consecução deste trabalho

será de caráter exploratório e qualitativo, realizar-se-á inicialmente um

levantamento do “estado da arte” com autores que utilizaram a mesma

ferramenta textual, a saber, o uso da literatura, música e cinema. Conjuntamente,

discutir-se-á a utilização da cultura como método historiográfico, por fim, através

de uma revisão bibliográfica, tracejar-se-á o retrato da redemocratização

brasileira através de expressões culturais.

Palavras-chave: Redemocratização. Cultura. Ditadura Militar. Nova República.

INTRODUÇÃO

**DiscentedeFilosofia/[email protected] ***DiscentedeCiênciasEconômicas/CAA/[email protected]

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Durante a segunda metade do séculoXX, o mundo tentava se reorganizar

social, política e economicamente. Com o fim das Grandes Guerras, começou a

chamada Guerra Fria, uma disputa ideológica caracterizada pela polarização

capitalista/comunista que deixou a população mundial sob tensão por cerca de

50 anos– aflição justificada pela possibilidade de um novo conflito armado de

grandes proporções, agora com o uso intensivo de armas nucleares e outras

tecnologias bélicas antes inimagináveis.

As maiores potências da época, Estados Unidos da América (EUA) e

União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), lutavam entre si para

estabelecer seu poderionão sóbélico, mas também político em países que

aceitavam se submeter às exigências norte-americanas ou soviéticas muito por

serem economicamente dependentes. A União Soviética oferecia suporte

(político, militar e financeiro) aos países que visavam implantar o regime

comunista, como China e Cuba, enquanto os Estados Unidos tentava conter o

avanço soviético apoiando a intervenção político-militar de caráter

antidemocrático. Foi um período caracterizadoporditaduras, protestos

estudantis, greves operárias e outros momentos marcantes como a Guerra do

Vietnã e a construção do Muro de Berlim.No Brasil não foi diferente.

As Forças Armadas tomaram o poder no dia 31 de março de 1964, com o

apoiodos Estados Unidos da América, intervenção justificada pelasuposta

ameaça comunista, devido às relações que o então presidente da República,

João Goulart (Jango), mantinha com comunistas, além da iminente crise

econômica, decorrente das dívidas obtidas durante o governo de Juscelino

Kubistchek (1956-1961). No campo econômico, os militares tomaram medidas

para conter a crise e o primeiro momento do Regime Militar (1964-1973) ficou

conhecido como Milagre Econômico, pois,ao adotar uma política

desenvolvimentista,conseguiram baixar a inflação e fazer o país crescer em

vários setores da indústria.

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No entanto, no âmbito sociopolítico, começou a forte perseguição aos

opositores, que em sua maioria foram presos ou exilados,foi elaborada uma nova

Constituição (1967) que garantia plenos poderes ao governo, além da imposição

de diversas leis excepcionais e Atos Institucionais e suspensão de alguns direitos

civis.Com as crises do petróleo na década de 1970, a economia nacional foi

abalada; a mudança de fontes energéticas e a modernização da indústria se

tornaram prioridades para o governo, que, para manter a produção em ritmo,

recorreu a empréstimos, agravando o problema da dívida externa. A volta da

democracia era vista pela sociedade como solução para os inúmeros problemas

que assolavam o país, como a inflação em alta, taxa de desemprego

crescente,desabastecimento, alto índice de mortalidade infantil e analfabetismo.

Durante o período ditatorial, viu-se a e participação de diversos setores da

sociedade em movimentos que contestavam o regime

vigente,especialmentejovens estudantes (pertencentes à União Nacional dos

Estudantes – UNE que atuava na ilegalidade) e artistas, que utilizavam

ferramentas culturais como música, teatro, literatura e cinema para expressar

sua opinião e convocar outros à luta.“A irreverência da juventude deixou as ruas

e subiu nos palcos.” (VIEIRA, 2010).

Apesar da censura, a arte foi usada como meio de conscientização

política, uma forma de mostrar a força do povo e reivindicar seu direito de

governar.Algumas batalhas foram ganhas,o sistema ditatorial estava

enfraquecido e iniciou-se a transição de regime. A redemocratização ocorreu de

forma conturbada e não correspondeu às expectativas da maior parte da

população. Num primeiro momento, não houve mudanças significativas para o

povo brasileiro, nem mesmo eleições diretas ocorreram. As dificuldades sociais

pioravam, o quadro econômico continuava caótico e o povo voltou às ruas para

protestar.

Marcaram essa época movimentos como a campanha Diretas Já!,que

começou em 1983 e contou, em uma das várias manifestações, com a

participação de cerca mais de 400 mil pessoas na Praça da Sé, na cidade de

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São Paulo,em 1984, e, mais tarde, a campanha Fora Collor, que exigia o

impeachment do presidente Fernando Collor de Melo – acusando de corrupção,

em 1992. O Brasil só começou a se reestabelecer com a implantação do Plano

Real em 1994 no governo de Itamar Franco (1992-1995), que estabilizou a

economia e possibilitou aadoção de programas social que possibilitaram uma

melhoria de vida para o povo brasileiro já durante o governo de Luís Inácio da

Silva (2003-2010).

Todo esse período que compreende da década de 1960 até a década de

1990 foi marcado por uma intensa atividade cultural. Cultura, que deriva do latim

‘colere’, que significa “cultivar”, tem um amplo sentido antropológico, referindo-

se ao desenvolvimento e expressão do pensar humano. Esendo o homem um

ser cultural, cada momento da História é retratado pelas atividades culturais,

carregadasde mensagens de caráter social e político. O que é vivenciado é então

transposto, através da cultura, para a experiência sensível, assim sendo

transmitida para as futuras gerações.A arte, que é uma expressão cultural, é

tratada na Filosofia como forma de conhecimento, estudada especificamente

pelaEstética, que é designada como o estudo das “características formais que a

arte assume em determinado período”.“A estética tem exigências próprias em

termos de verdade, pois alia a sensação e o sentimento à racionalidade”.

(ARANHA, 2009). Ao aplicar razão à observação da cultura, descobre-se a

significação daquela arte e exclui-se o risco de banalização damesma. “É

importante acompanhar a produção historiográfica (da cultura) e entender como

os historiadores a pensam” (BITTENCOURT, 2008), pois entende-seque a

análise da produção cultural, aliada ao devido estudo dos dados acadêmicos,

serve de auxílio para melhorcompreenderuma época, sabendo não apenas os

fatos ocorridos, mas também como eles afetaramquem os presenciou,

permitindo assim um estudo mais claro e completo da História.

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“CORAÇÃO DE ESTUDANTE” 103

Universidades invadidas, repressão cultural e outras formar de privação que

afetaram diretamente a vida dos jovens, levaram toda uma geração a refletir e

se posicionar em relação ao contexto em que se encontrava o país. A União

Nacional dos Estudantes (UNE), posta na ilegalidade pelo governo, continuava

a agir e teve um papel fundamental na organização de movimentações

antiditatoriais. A Passeata dos Cem Mil, que aconteceu na cidade do Rio de

Janeiro em 26 de junho, foi um dos mais marcantes momentos do intenso ano

de 1968, retratado no poema “Diante das fotos de Evandro Teixeira”, de Carlos

Drummond de Andrade: “Das luas de rua no Rio em 68, que nos resta mais

positivo, mais queimante do que as fotos acusadoras, tão vivas hoje como

então,a lembrar como a exorcizar?”.

Festivais, greves, protestos e manifestações de todo tipo eclodiram pelo

mundo. Em maio do mesmo ano, em Paris, estudantes haviam se unido para,

inicialmente, protestar contra a nova política educacional, mas o movimento

acabou ultrapassando o objetivo central e passou a simbolizar os anseios da

juventude que lutava por direitos. Nos Estados Unidos, os jovens usavam a arte

para pregar contra a guerra, o racismo e a repressão sexual.“Os jovens fizeram

história.” (VIEIRA, 2010).

“Desse período, a música “Pra não dizer que não falei

das flores” de GeraldoVandré,transformou-

seemhinoderesistência,cantadadeformaemocionada no

Festival Internacional da Canção em 1968, e

silenciada,assim como seu autor, até 1979”. (CUNHA,

2005).”

E foi “caminhando e cantando e seguindo a canção” 104que a população

enfrentou os chamados “Anos de Chumbo”.

103 Coração de estudante (1983; Milton Nascimento. Composição de Wagner Tiso) 104 Pra não dizer que não falei de flores (1968; Geraldo Vandré. Composição de Geraldo Vandré)

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“as músicas são representações, não se constituem em

discurso neutro, mas identificam o modo como, em

diferentes lugares e em diferentes tempos, uma

determinada realidadesocial é pensada e construída.”

(ABUD, 2005)

Em dezembro de 1968, o governo decretou o AI-5, considerado o ato mais

radical do regime militar, que intensificou a perseguição e a censura. Nos 10

anos seguintes ocorreram mais atentados, sequestros, torturas e assassinatos,

atos de crueldade cometidos tanto pelo governo quanto pelas guerrilhas

armadas que se formavam por todo o país.

Diversos artistas foram presos ou exilados por sua criação considerada

‘subversiva’ e desrespeitosa pelos militares, entre eles Chico Buarque e Gilberto

Gil, que com a música “Cálice” 105,denunciaram a“realidade morta”, o uso de

“tanta mentira, tanta força bruta” que deixava os brasileiros com a “palavra presa

na garganta”, sem poder falar por medo. Gilberto Gil, em “Não chores mais” 106,

lembra dos “amigos presos, amigos sumindo assim, pra nunca mais”, em

referência aos inúmeros desaparecimentos, muitos dos quais ainda hoje não se

sabe informação.Mas a juventude continuava a resistir, acreditando que

“amanhã há de ser outro dia”107, prometendo “cobrar com juros, todo esse amor

reprimido, esse grito contido, este samba no escuro”.

“A VOLTA DO IRMÃO DO HENFIL” 108

Quando Ernesto Geisel assumiu o poder em 1974, iniciou-se o processo

de redemocratização, “lento, gradual e seguro”, como o próprio afirmou em seu

105 Cálice (1970;Chico Buarque e Gilberto Gil composição de Chico Buarque e Gilberto Gil) 106 Não chores mais (No woman,no cry) (1974;Bob Marley.Composição de Vincent Ford.Versão brasileira por Gilberto Gil) 107 Apesar de você (1970; Chico Buarque. Composição de Chico Buarque) 108 O bêbado e a equilibrista, 1972, composição de João Bosco e Aldir Blanc. O trecho

selecionado faz referência ao sociólogo Herbert José de Souza, ‘Betinho’, exilado em 1971,

irmão do cartunista Henrique de Souza Filho, conhecido como Henfil, que usou seu trabalho

para se posicionar contra o Regime Militar

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discurso de posse. No ano anterior (1973) ocorrera a o primeiro choque do

petróleo, o que foi um abalopara a economia nacional, que experimentara há

pouco um desenvolvimento acelerado. O foco do novo governo era agora

a contenção da crise a diversificação das fontes energéticas. Quando o Brasil

parecia superar a crise, acontece o segundo choque do petróleo (1979), que

desestabilizou de vez a economia interna, consequentemente agravando os

problemas sociais.

Havia pressão interna e externa para acabar com a ditadura, que já estava

desgastada. Democracia agora era uma necessidade. No ano de 1978, foi

anulado o AI-5, no ano seguinte seria concedida a anistia. A canção “O bêbado

e a equilibrista”,que fez sucessona voz da cantora Elis Regina, ficou conhecida

como o Hino da Anistia. Lançada seis anos antes, a música apresentava um país

que sonha com a voltade “ tanta gente que partiu” e que chora com as “Marias e

Clarisses”109,em referência aqueles que perderam seus familiares e amigos por

causa da Ditadura Militar.

“Encontrei o Henfil e o Chico Mário, que só falavam do

mano que estava no exílio. O papo me deu um estalo.

Cheguei em casa, liguei para o João e sugeri que

criássemos um personagem chapliniano, que, no fundo,

deplorasse a condição dos exilados.”(BLANC,2007)

Quando João Baptista Figueiredo (1979-1984) assumiu o poder, a

inflação chegava a 200% ao ano e a dívida externa já atingira mais de 100

bilhões de dólares. As greves operárias no ABCD paulista também causaram

transtornos no começo do governo de Figueiredo, que encontrou dificuldades

para negociar com os sindicatos. Na ausência do AI-5, a extrema direita cometia,

por conta própria, atrocidades contra aqueles contrários ao atual regime (

situação lembrada por Renato Russo na música “Faroeste Caboclo” 110 : “Não

109 Maria refere-se a esposa do operário Manuel Fiel Filho,torturado e morto em 1976 no DOI-CODI (SP); Clarice é a esposa do jornalista Vladimir Herzog, que sob as mesmas condições em 1975. 110 Faroeste Caboclo (1979, lançada em 1987; Legião Urbana. Composição de Renato Russo)

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boto bomba em banca de jornal, nem em colégio de criança, isso eu não faço

não, e não protejo general de dez estrelas”).

O descontentamento popular era expresso nas canções de bandas como

Ultraje a Rigor, que, ironizando as recentes afirmações do presidente, dizia “a

gente não sabemosescolher presidente, a gente não sabemos tomar conta da

gente, a gente não sabemos nem escovar os dente” 111. Em novembro de 1983,

na Praça da Sé, capital paulista, iniciou-se a campanha Diretas Já! , que não

obteve resultados, mas foi um marco da organização popular pela luta contra o

autoritarismo.

“Quase todos os que saíram às ruas bradavam por muito

mais do que eleições diretas para presidente: desejavam

um outro modelo econômico e social, que supunha um

Estado verdadeiramente democratizado”(DIAS,2012)

(IM) PERFEIÇÃO112

O regime militar teve fim em 1985, com a eleição indireta do presidente

Tancredo Neves, o qual faleceu em abril do mesmo por problemas de saúde.

Sendo assim, quem assume a presidência é José Sarney. Logo a sociedade

percebe que a esperança de que os problemas seriam solucionados com a Nova

República era uma ilusão, sentimentoregistrado na crônica “O veneno da

inflação”, de Carlos Eduardo Novaes:

“Quando instalou-se a Nova República pensei: 'Oba! Teremos novas desculpas! 'Mas não: elas continuam sendo repetidas, como um disco quebrado, pelos personagens da República do Jerimum”. (NOVAES, 1987)

A consolidação da democracia não seria uma tarefa fácil. Era preciso

reorganizar apolíticae abrir caminho para as eleições diretas. Uma das medidas

tomadas foi a Assembleia Nacional Constituinte de 1987, para elaborar uma

111 Inútil (1985; Ultraje a rigor. Composição de Roger) 112 Perfeição (1993; Legião Urbana. Composição de Renato Russo, Dado Villa-Lobos e Marcelo Bonfá)

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nova Constituição, que veio a ser promulgada em outubro de 1988.A crescente

inflação era alarmante. A população vivia em clima de insegurança por causo do

desemprego e da falta de produtos básicos, situaçãomais uma vez ilustrada pelo

cronista Novaes,em “O dia em que faltou papel higiênico”:

“Estamos em janeiro de 87 mas existe no ar qualquer coisa de Alemanha, 1944. Vivemos uma economia de guerra. Falta tudo: da pasta de dentes ao carro de luxo. (…) Há meses o papel higiênico desapareceu do mercado. (…) A população começou a se inquietar. De repente, o papel higiênico, algo que tratamos com a mais absoluta indiferença, tornou-se mais importante que tudo (…) Vários doleiros mantinham suas casas de cambio só como fachada para poderem vender papel higiênico no black (…) hoje, cada brasileiro que venha do exterior só pode trazer, no máximo, cinco metros de papel higiênico” (NOVAES,1987).

Em 1986, o governo lançou o Plano Cruzado, que determinou o

congelamento dos preços e a mudança da moeda (de Cruzeiro para Cruzado).

A iniciativa, em um primeiro momento, obteve sucesso, mas, pelo crescimento

descontroladodo consumo, não foi possível sustentá-la, e, em pouco tempo, veio

a fracassar, sendo substituída por uma série de medidas igualmente

fracassadas. A primeira eleição direta ocorreu em 1987 e elegeu Collor de Melo

como presidente, e novamente as expectativas do povo brasileiro seriam

frustradas.

As medidas impopulares, como o confisco das poupanças, e as denúncias

de corrupção causaram revolta no povo, como apresentam os versos de “Metal

contra as nuvens” 113:“Quase acreditei na sua promessa, e o que vejo é fome e

destruição”;ou ainda,de forma mais rude,a música “Tô feliz (Matei o

presidente)”114 do rapper conhecido como Gabriel, ‘O Pensador’, que para

expressar o descontentamento, hipoteticamente assassina o então presidente,

afirmando que “ele ganhou a eleição e se esqueceu do povão [...].Prometeu e

não cumpriu.”.

113 Metal contra as nuvens (1991; Legião Urbana. Composição de Renato Russo) 114Tô feliz (Matei o presidente) (1992;Gabriel,O Pensador.Composição de Gabriel,O Pensador)

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A sociedade volta às ruas,dessavez para exigir o impeachment do

presidente no ano de 1992, demonstrando assim a compreensão do significado

da palavra ‘democracia’ como ‘governo do povo’.Com a saída de Collor, Itamar

Franco assume a presidência e a população começa a se acalmar. No ano de

1994 é adotado o Plano Real, que consegue o êxito de estabilizar a economia

brasileira, garantido aos governos seguintes(Fernando Henrique Cardoso, 1995-

2003; Luís Inácio “Lula” da Silva, 2003-2011; Dilma Rousseff, 2011-atualmente)

a possibilidade de melhorias sociais como a diminuição do desemprego,

elevação dos indicadores sociais e desenvolvimento industrial.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

No ano de 2014 marcamos os 50 anos do Golpe Militar e lembramos que

muitas marcas desse período permanecem. Ainda temos que lidar com os

danos, muitos dos quais jamais serão reparados.Saber o que realmente

aconteceu pode ajudar no processo, e, para tanto, o governo federal criou, em

2011, a Comissão Nacional da Verdade, com a tarefa de investigar e revelar os

crimes cometidos durante o Regime Militar. No entanto, desde o dia 31 de março

deste ano, um grupo de pessoas tem se unido para pediruma nova intervenção

militar, usando como justificativa uma suposta conspiração comunista do Partido

dos Trabalhadores – movimento intensificado com a reeleição da presidente

Dilma Rousseff. A imagem equivocada de que os militares impuseram ordem no

país e melhoraram a saúde e educação pode parecer convincente, pode parece

distante demais no tempo para se ter noção do que representa a privação de

direitos civis e a violação de direitos humanos. Nossa democracia ainda é frágil,

sofredora e imatura, mas a História e a cultura nos mostram o quanto ela é

preciosa, merecendo, portanto, ser preservada e aperfeiçoada. “Temos muito

ainda por fazer.” “Apenas começamos.”115

115 Metal contra as nuvens (1991; Legião Urbana. Composição de Renato Russo)

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GT: Historia, poder e cultura: interfaces e diálogos contemporâneos

Coordenador: XXXXXXXXXX

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O diabo no imaginário medieval

Ezequiel José da Silva116 - FAFICA

Resumo: O presente trabalho tenta demonstrar como a figura do Diabo teve uma importante função durante a Idade Média, servindo como principal referência para a propaganda da Igreja Católica. As terríveis torturas a que o homem mal seria submetido no inferno e as maravilhas do paraíso povoavam os discursos e conduziam o imaginário do período. A imagem grotesca e aterradora visava assustar as pessoas para que obedecessem as leis morais e se afastassem dos pecados. Analisando a presença do Diabo no cotidiano medieval.

Palavras-chave: Diabo – Imaginário - Idade média – História

Abstract: This paper attempts to demonstrate how the Devil's figure had an important role during the Middle Ages, serving as the main reference for advertisement of the Catholic Church. The terrible tortures to which man would be submitted evil in hell and the wonders of paradise populated speeches and led the imaginary period. The grotesque and terrifying image was intended to scare people to obey the moral law and to depart from sin. Analyzing the presence of the Devil in medieval everyday.

Keywords: Devil - Imaginary - Medieval - History

O Diabo ganha chifres

A figura diabólica é resultado das varias dualidades que permeiam o cotidiano

do homem, e seu desenvolvimento parti deste principio dualístico de ideias, o

belo o feio, a sorte o azar, o certo e o errado, a vida e a morte. Percebe-se uma

possível construção de um ser ao qual é atribuído todo o mal. Ganhando força

com uma forma de dominação pelo medo.

116 Graduando em História. Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Caruaru- FAFICA

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Percebemos a diferença nos livros do Antigo Testamento. O mal encarna

a figura de um indivíduo que se opõe a Deus e busca atormentar a vida de todos

os seguidores da religião.

Num dia em que os filhos de Deus vieram apresentar-se perante o SENHOR, veio também Satanás entre eles. Então, perguntou o SENHOR a Satanás: Donde vens? Satanás respondeu e disse: De rodear a terra e passear por ela. Perguntou o SENHOR ainda a Satanás: observaste meu servo Jó? Porque ninguém há semelhante a ele, homem íntegro e reto, temente a Deus e que se desvia do mal. Então, respondeu Satanás ao SENHOR: Porventura, Jó debalde teme a Deus? Acaso, não o cercaste com sebe, a ele, a sua casa e a tudo quanto tem? A obra de suas mãos abençoaste, e os seus bens se multiplicaram na terra. Estende, porém, a mão, e toca-lhe em tudo que tem e verás se não blasfema contra ti na tua face. (JÓ 1. 6-11)

Em primeiro momento, o demônio hebraico não assume a postura estreitamente

aterrorizante que conhecemos no cristianismo. Em várias passagens do Velho

Testamento, ele surge como uma espécie de colaborador que recebe a

autoridade divina para punir ou testar os fieis seguidores de Javé. O sofrimento

de Jó, que perdeu todas as suas terras e ficou adoentado, exemplifica esse tipo

de postura que o demônio assume inicialmente no texto bíblico.

A fama do Diabo apareceu mais tarde, com o aparecimento da religião cristã.

Autores como São João e São Paulo dedicam linhas e mais linhas em terríveis

batalhas em que o diabo trava uma intensa guerra contra Deus.

Satanás tinha saído dos quatro primeiros séculos do cristianismo com um singular estatuto: ele existia efetivamente, mas não se sabia verdadeiramente quem era nem por que é que tinha nascido. Em termos filosóficos, poder-se-ia assim concluir que a ideia acerca disso, mas ele não existia de comum acordo; em suma, não havia teoria do diabo. (MESSADIÉ, 2001,p.345)

Figura do Diabo não assumia uma feição definida, era um ser pouco discutido

na Idade Média, limitado a discussão teológica a alguns concílios, aos

monastérios e a elite laica cristã, não havia um consenso sobre quem ou o que

era o Diabo.

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Então nos primeiros séculos do catolicismo medieval, a cultura popular

imaginava o Diabo como uma figura de pouca expressão, quase inofensiva. Essa

figura era possível ser facilmente derrotada. Refletindo essa condição nos

primórdios da era cristã, quase não havia pinturas sobre o diabo na arte sacra

cristã. No entanto, nos séculos seguintes houve uma mudança de percepção

sobre os poderes do Diabo. E as manifestações artísticas acompanharam essa

mudança.

A ligação mais intima entre o Diabo da arte e o Diabo da literatura é o demônio do teatro. A elaborada literatura de visão sobre o inferno influenciou as artes de representação tanto quanto Dante, e algumas pinturas são virtualmente ilustrações de tais visões. Arte e teatro influenciam-se pelo menos no fim do século XII, quando o teatro vernáculo começou a ser popular. A representação do Diabo no teatro foi derivada de impressões visuais e literárias, e em troca artistas que tinham visto produções de teatro modificaram a própria visão deles. O pequeno e preto de rabinho que não pode ser representado facilmente no teatro declinou no final da idade media. O desejo de impressionar as audiências com fantasias grotescas pode ter encorajado o desenvolvimento do grotesco na arte, fantasias de animais com chifres, rabos, presa, casco rachado e asas; fantasias de monstro, meio-animal e meio-humano: e fantasias com faces de nádegas, barriga ou joelhos. Mascaras, luvas com garras e dispositivos para projetar fumaça pela face do demônio também eram usados. (RUSSEL, 2003, P.245-6)

O teatro contribuiu para a personificação do Diabo, dando-lhe características na

tentativa de personalizar a realidade abstrata do mal. A também uma parcela de

contribuição na arte da icnografia do Diabo dos séculos XII ao XVI, tem sua

importância ao descrever de forma pictográfica a mentalidade e o imaginário

existente sobre o Diabo no momento em que ele desfruta de uma alta

credibilidade na sociedade europeia, em quanto que os estudos sociológicos e

históricos nos possibilitam compreender as necessidades dos dominadores de

utilizar tais recursos para a manutenção de suas ideologias políticas e religiosas.

A igreja instrumentaliza o Diabo

No devir histórico dos séculos XII ao XVI, a elite do corpo religioso cristão

europeu, engendrou o desenvolvimento das descrições impactantes de Satã no

imaginário popular a partir dos sermões e pregações. As necessidades políticas

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da Igreja católica pariram uma mentalidade que deveria temer o aspecto

demoníaco que, segundo ela, rondava todos os seguimentos sociais e

individuais.

A ideia da influência e intervenção diabólica no mundo era bastante corrente,

observa-se o surgimento de uma espécie de “surto demoníaco” na mentalidade

eclesiástica, ou seja, um medo intenso do Diabo e seus agentes. Assim sendo,

diversos tipos sociais passaram a ser amplamente atacados por serem supostos

mandatários do inferno. Como exemplo podemos citar idólatras, judeus,

muçulmanos, mulheres, feiticeiros, enfim, toda uma gama de pessoas

consideradas, de alguma forma e por alguma razão, expressões do mal.

Durante esse período o temor do diabo refletia uma época de incertezas, de

grandes medos e de eminência do fim do mundo que era anunciada pelos

discursos religiosos baseados nas escrituras.

“a partir do século XIII, o medo do Diabo aumenta sem cessar, e essa reviravolta da percepção da cristandade dos poderes e continuas vitorias de Satã encaminhou a Europa Ocidente par a uma onda de pânico, na qual no século XIV, a grande crise do feudalismo, com a intensificação das catástrofes e o aumento da miséria, provoco o delírio das consciências aterrorizadoras que buscavam no demônio e seus sequazes os responsáveis pelo sofrimento da coletividade. Os homens sentem-se abandonados por Deus, submersos em um mundo de terror. O reino do Diabo, em ascensão lentamente encobre a imagem da Cidade de Deus” (NOGUEIRA, p.60-1)

Na idade media o Diabo foi responsável por todos os males que os europeus

estavam passando, guerras, fome, peste e cabia a igreja possibilitar o único

acesso a salvação. Contudo, para enfatizar a necessidade de salvação, a Igreja

outorgou ao Diabo, a partir dos tratados teológicos, vastos poderes.

Por meio do imaginário existente na sociedade ocidental – tanto culto como

popular, a figura do Diabo foi representada de diversas maneiras pela arte.

Mediante o devir social e histórico, as representações sobre a figura do Diabo

passam a evidenciar um ser com poderes incríveis, anunciando que o fim do

mundo estava por vir refletindo a atmosfera que revestia as noções inculcadas

de danação e salvação. Essa mentalidade propiciou o surgimento de diversas

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obras de arte que denotavam as características da sociedade medieval, ou seja,

o poder da igreja católica, a existência do medo da morte por causa da questão

do Diabo e do inferno e a crença das populações em supertições e em elementos

sobrenaturais.

“Os demônios mais altos agem diretamente sobre os sentidos humanos e indiretamente sobre o intelecto; usando sua ‘ação imaginativa’, ‘phantastikos’, provocam imagens em nossas mentes. Os demônios mais baixos tem mentes como a dos animais. Estes espíritos [...] precipitam-se cruelmente sobre nós, causando doenças e acidentes fatais, e nos possuindo. E por isso que as pessoas possuídas frequentemente exibem um comportamento animal”. (RUSSEL, 2003, p.38)

A história por testemunha, declara a construção e personificação do ser

diabólico. Sendo datado no final do século XII, em um momento em que, devido

sobre tudo à acentuação das ameaças heréticas, se passa de um estado de

relativo equilíbrio na matéria a uma acentuada preocupação pela ação diabólica.

Tornado-se um campo fértil, instrumentalizado pela igreja, divulgando-o e

outorgando poderes ainda mais surpreendentes a esse ser. Pois a igreja se fez

necessário em lhe dar poderes para se fazer necessária aos fieis, criando um

clima de medo constante e modificando o cotidiano das pessoas de período

medieval.

A Igreja medieval se utilizou de vários fatores para estabelecer seu poder

supremo. Mas foi do monopólio do conhecimento. Em que a Igreja exerceu seu

domínio tanto nos assuntos religiosos como sobre assuntos mundanos,

lançando mão de vários instrumentos de coerção para impor sua autoridade.

Na tentativa de reconhecer a presença do mal ou do Diabo, a Inquisição passou

a traçar parâmetros e classificações que auxiliassem tal identificação. Havia uma

tendência no discurso cristão e clerical em ver o Diabo em diversas

manifestações oriundas da cultura popular. A ingerência diabólica aparecia

frequentemente nas leituras que os inquisidores e, de modo geral, as elites

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eclesiásticas faziam das práticas mágicas. Havia então uma nova categoria de

acusação, diferente daquela popular, segundo (DELUMAEU,2009): “as que vêm

da população local mencionam apenas malefícios; ao contrário, as formuladas

pelos juízes giraram cada vez mais em torno do pacto e da marca diabólica, do

Sabá e das liturgias demoníacas e, portanto, do crime de ‘lesa-majestade

divina’.” No entanto, não se pode dizer que o ponto em comum entre todas as

práticas incluídas sob o termo “feitiçaria” pelas elites era de implicar

necessariamente em vinculo com o Demônio. Pois em muitos processos não há

qualquer referência ao Diabo.

Ainda assim, tal personagem aparece constantemente fazendo parte do

imaginário da elite letrada inquisitorial em relação às crenças heterodoxas. O

conhecimento do oculto, na perspectiva da elite religiosa, só pode provir de três

fontes: do estudo e do saber humano (limitado à cultura escrita); da revelação

divina (reservada aos santos, beatos, homens piedosos tocados pela Graça); da

intervenção diabólica (à excepção da profecia e da visão de origem divina, toda

a adivinhação é uma arte demoníaca).” A possibilidade da ação demoníaca na

vida cotidiana trazia consigo o medo e, consequentemente, uma tentativa de

investigação e normatização de comportamentos religiosos considerados

perigosos. Quanto à questão do medo, Delumeau coloca que Satã esteve mais

presente entre os receios da elite eclesiástica que entre os do povo ou

camponeses, e tal sentimento é essencial para perceber as atitudes das elites.

Nesse contexto, o grupo dirigente procurou sempre desmascarar o Diabo e seus

agentes de forma a vencê-los, ou seja, além de temer suas “presenças”,

procuravam identificá-las, administrá-las e bani-las.

A possessão é maior prova da influência do Diabo sobre o corpo humano, a

entrada do diabo poderia ser para nos testar, ou já atraído pelos nossos pecados

ou até por não ter fé ou pelo simples azar de engolir um demônio que estava no

alimento, ou em uma tentativa do demônio de impedir o homem de se aproximar

de Deus, ou seja, o demônio poderia possuir os corpos de várias formas e

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controlá-los. O Martelo das Feiticeiras, de Del Rio relata da seguinte forma a

confissão de um padre possuído:

“Estou privado do uso da razão unicamente quando quero dedicar-me à oração ou visitar lugares santos [...]. [Então o demônio] dispõe de todos os meus membros e órgãos – meu pescoço, minha língua, meus pulmões – para falar e gritar quando lhe apraz. Ouço, sem dúvida, as palavras, mas não posso absolutamente resistir; e quando ardentemente eu gostaria de entregar-me a alguma oração, ele me assalta mais violentamente, soltando minha língua com mais força.” (DELUMEAU, 2009, p. 359-360).

A possessão era temida e muito vista na Idade Moderna, André Celichius,

escrevia em 1595 sobre os casos de possessão: “Quase em toda parte, perto ou

longe de nós e tão considerável que se fica surpreso e afligido, e essa talvez a

verdadeira praga pela qual nosso Egito e todo o mundo caduco que o habita

estão condenados a perecer.”

(DELUMEAU, 2009, p. 362). Lutero também comentava sobre as possessões:

“Somos corpos e sujeitos ao Diabo, e estrangeiros, hóspedes, no mundo no qual o Diabo é o príncipe e o deus. O pão que comemos, a bebida que bebemos, as roupas que usamos, ainda mais o ar que respiramos e tudo que pertence à nossa vida na carne é portanto seu império.”(DELUMEAU, 2009, p. 372).

A afirmação de Lutero serve para observamos alguns elementos. Primeiro, o

Diabo está em todo lugar que se liga ao material, tudo que é material a ele

pertence. Segundo, o corpo é do Diabo e tudo que fazemos que seja puramente

carnal é, por conseguinte, elemento do Diabo.

A porta para invasão dos demônios são os próprios pecados, assim como

a entrada de doenças é pela atração de humores estranhos no corpo do ser

humano, logo o pecado era um humor errado e um atrativo para as doenças. A

teoria dos humores, de Hipócrates, assim como os estudos de Eduardo Galeno,

servirão de grande inspiração para os médicos da Idade Moderna, estes que

souberam muito bem associá-los as forças diabólicas. Se o corpo era um

envoltório de humores, como esses poderiam ser alterados? Poderia ocorrer

naturalmente, como através de muito trabalho, ou até pensamentos negativos e

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impuros poderiam alterar o humor. Eles poderiam ser mudados por forças

alheias, poderiam ser contaminados por humores de outras pessoas.

Na bíblia vemos várias passagens que se comenta que a causa das

doenças são os demônios, como por exemplo: Mateus 17: 14-20 ou Mateus 10:

5-8. 9 ou do ambiente. O “[...] princípio do contágio, ele foi, a nosso ver, o vetor

principal de uma visão mágica do corpo, cuja parte sombria foi a de contribuir

para dar crédito às teses demonológicas e para desencadear perseguições em

massa às feiticeiras.” (MUCHEMBLED, 2001, p. 95). Em mundo onde a ciência

médica evoluía, mas não possuía um conhecimento físico e matemático

avançado, estas não propiciaram uma quebra dos mitos diabólicos, mas sim um

aumento. O ar contaminado, era devido às forças diabólicas, esse ar estava cada

vez mais associado ao Sabá, as bruxas e as forças luciferinas, possibilitando

uma diabolização dos sentidos.

Os demônios usavam todos os nossos sentidos, através da possessão podiam

mudar nossa visão, nos fazer ouvir coisas. Usam truques ilusórios, mexendo com

a mente e os sentidos para nos enganar, nos matar. Os sentidos humanos eram

brinquedos dos demônios que tinham toda a capacidade de manipulá-los para o

mal e para os pecados. Dentre todos os sentidos, sem dúvida, o olfato foi o mais

diabolizado, já que tinha o aparato dos médicos e da Igreja. O ar pestilento

continha uma “malignidade oculta e indizível”, como cita Ambroise Paré em 1568.

Logo, para ele, um conhecido cirurgião, o ar da peste não era mais putrefato,

como para Hipócrates e Galeno, mas sim venenoso, por isso que os médicos da

peste usavam as máscaras com aqueles longos bicos, cheios de aromas, para

impedir a entrada desses gases venenosos.

Considerações finais

O medo ao Diabo que era sentido pelas pessoas no medievo serviu para ratificar

a autoridade da Igreja e com isso, estabelecer valores as relações entre Servos

e Senhores Feudais. Com uma mentalidade de que todos eram servos de Deus,

sendo ele o grande Senhor Feudal do universo, e qualquer ser pensante deveria

reverenciá-lo.

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O grande combate ao Diabo, acabou por ser uma ferramenta política e eficaz

para a Igreja, onde a acusação de servidão ao "maligno" era proferida contra os

opositores tanto nobres, servos ou clérigos. O confisco de bens dos culpados,

segundo o Santo Oficio, se tornou comum e legitimo e favoreceu a Igreja para

eleva-la ao status de "dona da verdade absoluta". Em uma época em que a

economia era extremamente ligada a terra, para uma instituição que era a grande

detentora de terras no medievo era natural que se tornasse referencia em todos

os seguimentos da sociedade.

Mas também, estes medos foram um elemento eficiente no tocante ao controle

das massas. As vendas de indulgências e o pagamento de tributos a Igreja tem

como fundamentação a imposição destes medos, pois possuir algum objeto

santo afastaria o mal mesmo que por algumas semanas.

Referências

DELUMEAU, Jean. História do Medo no Ocidente 1300 – 1800: Uma cidade sitiada. Tradução: Maria Lúcia Machado; Tradução de notas: Heloísa Jahn. São Paulo: Companhia das Letras, 2009. LE GOFF, Jacques. O Imaginário Medieval. Editora Estampa, 1994. GINZBURG, Carlo. História noturna. São Paulo : Companhia das Letras, 2012. DELUMAEU, Jean. Historia do medo no ocidente, 1300-1800: uma cidade sitiada. São Paulo, SP: Companhia das Bolso,2009. LE GOFF, Jacques. O imaginário Medieval. Editora Estampa, 1994. NOGUEIRA, Carlos Roberto F. O diabo no imaginário cristão. São Paulo: Ática, 1986. MESSADIE,Gerald. A História geral do Diabo. Editora Europa, 1°Ed, 2001. RUSSEL, Jeffrey Burton. Lúcifer: o Diabo na Idade Média. Editora Masdra, 2003.

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1 PORTELLI, Hugues. Gramsci e a questão religiosa. Tradução de Luiz João Gaio: Edições

Paulinas, 1984, p. 37. 1Ibdem, p. 35. 1BLOCH, Marc. Apologia da História, ou o Ofício do Historiador. Tradução de André Telles, Jorge Zahar Editor, Rio de Janeiro, 2001, p. 61. 1 CARDOSO, Ciro Flamarion. Um historiador fala de teoria e metodologia: ensaios. Bauru, SP: Edusc, 2005, p. 20. 1 DELGADO, Lucilia de Almeida Neves; PASSOS, Mauro (Org.). Catolicismo: direitos sociais e direitos humanos (1960 -1970). In: FERREIRA, Jorge; DELGADO, Lucilia de Almeida Neves (Org.). O Brasil Republicano: o tempo da ditadura – regime militar e movimentos sociais em fins do século XX. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003, p. 96. 1 A chamada questão religiosa foi um episódio da história Brasileira em que se envolveram alguns bispos ultramontanos entre eles: Dom Vital, bispo de Olinda; Dom Macedo Costa, bispo do Pará e Dom Pedro Maria de Lacerda, bispo do Rio de Janeiro no ano de 1972, o primeiro deles determinou que as irmandades católicas expulsassem os maçons de seus quadros, o segundo não permitia mais a participação de maçons em atividades religiosas, além de defender que não mais tinham direito à sepultura eclesiástica e à absolvição sacramental o terceiro e último, em abril daquele ano suspendeu o padre Almeida Martins, que havia proferido discurso em homenagem ao visconde de Rio Branco, grão-mestre da Maçonaria. Os maçons recorreram ao governo provincial, que encaminhou o recurso à Corte. Tanto Antônio de Macedo quanto Vital Maria foram declarados sem autoridade para punir as irmandades, o que só caberia ao imperador Dom Pedro II, declaração que não foi obedecida por ambos, no fim daquele ano, o Conselho de Ministros, perante insubordinação dos bispos, decidiu apresentar denúncia formal contra os dois, e no início de 1874, Antônio de Macedo e Vital Maria foram condenados a quatro anos de prisão. Em 1875 após acordo do Imperador Dom Pedro II e o Papa Pio IX, foram concedidos anistia aos bispos e o papa acabou suspendendo as punições contra as irmandades do Pará e de Olinda.

1 ROMANO, Roberto. Brasil: Igreja contra Estado. Editora Kairós, São Paulo, 1979, p. 111. 1 Arcebispo do Rio de Janeiro em 1930 e escolhido o segundo cardeal brasileiro no mesmo ano. 1 RODRIGUES, Cândido Moreira. A Ordem – uma revista de intelectuais católicos (1934-1945). Belo Horizonte: Autêntica / Fapesp, 2005, p. 138.

1 SILVA, Severino Vicente da.Entre o Tibre e o Capibaribe: os limites da igreja progressista na Arquidiocese de Olinda e Recife. Recife: Ed. Universitária da UFPE, 2006, p. 128.

1 CASTRO, Marcos de. 64: conflito Igreja x Estado. Ed. Vozes. Petrópolis, 1984, p. 55. 1O Liberalismo é entendido como corrente modernista surgida no século XIX, colocava-se em defesa da liberdade do individuo contra o poder de sistemas sejam religiosos, sociais, políticos. No catolicismo tal corrente pretendia a relativização de conceitos e princípios de índole teológica, litúrgica e moral no catolicismo, sob o argumento da alteração segundo cada época e contexto. O liberalismo teve suas proposições condenadas pelos papas Pio IX, Leão XIII, Pio X através de documentos eclesiais como a: encíclica Qui pluribus de 1846, aencíclica Quanta cura de 1864, encíclica Inescrutabili de 1878, e em Alocução do papa Pio X em 17 de abril de 1907.

1 ANTOINE, Charles. O Integrismo Brasileiro. Ed. Civilização Brasileira: Rio de Janeiro, 1980.

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1 Conhecido também pelo pseudônimo “Tristão de Athayde” nasceu em 11 de dezembro de 1893 e converteu-se ao catolicismo aos 34 anos: notabilizou-se ao longo do século XX, por sua presença no cenário intelectual brasileiro: como crítico literário, ensaísta, professor universitário, tradutor, além de autor de várias obras. Escreveu para milhares de colunas jornalísticas do país. Faleceu em 14 de agosto de 1983. 1 MAINWARING, Sott. A Igreja Católica e política no Brasil, 1916-1985. São Paulo: Brasiliense, 2004, p. 84.

1 FONSECA, Mário. História da Diocese de Caruaru. Caruaru, edição do autor, 1973, p. 165. 1 Carta Pastoral Sobre a Ação Católica de Dom Paulo Hipólito. 1 ANTOINE, Charles. O Integrismo brasileiro. Editora Civilização Brasileira, Rio de Janeiro, 1980, p. 18-19. 1 Este “progressismo católico” será identificado na visão dos conservadores, com a aliança de muitos intelectuais e eclesiásticos entorno de uma leitura marxista dos problemas sociais e políticos do país, e da posse de uma atenuada concepção modernista da teologia da Igreja. Refletindo-se na nova atuação pastoral da Igreja no Brasil e nas muitas mudanças internas na Igreja quanto à organização, liturgia e anuncio da mensagem da Igreja perante a Sociedade. Para os conservadores este processo resultava num afrouxamento da fidelidade de muitos clérigos com as diretrizes da Santa Sé, começando pela colaboração destes com o socialismo - marxismo e de uma teologia moldes modernistas, ambas correntes condenadas pelo Magistério dos papas Pio IX, Pio XII, Leão XIII, e outros. 1 Não foi possível registrar com exatidão o ano destas visitas, mas alguns testemunhos orais indicam que a reação dos estudantes ocorreu entre 1967-1968. A pesquisa conseguiu conversar também com o Sr. Raymond de Souza que confirmou ter passado por Caruaru em 1969, integrando caravana da TFP que promoveu na cidade uma edição especial da Revista Catolicismo. 1 Sobre a destruição da bandeira da TFP, pelo Sr. Manoel engraxate. O entrevistado Mons. João Cabral Bosco foi quem confirmou a história, logo foi solto a pedido de Dom Augusto Carvalho. 1 O referido acontecimento foi confirmado pelos entrevistados Mons. João Cabral Bosco e pelo Mons. Guilherme Gomes. Também confirmado por informações levantadas com o professor e pesquisador Josué Euzébio Ferreira que estava entre os estudantes secundaristas que se colocaram contra a caravana da TFP. 1 O Mons. Guilherme Gomes ao relatar a história em entrevista, menciona que escutou a noticia pela rádio, só não conseguiu lembrar-se do nome da referenciada rádio que transmitiu a noticia para a cidade. 1LenildoTabosa Pessoa nasceu em janeiro de 1935 em Caruaru, era filho do Dr. Luiz Pessoa da Silva. Começou sua carreira no jornal A Defesa. Ex-seminarista cursou Teologia e Filosofia na Universidade Gregoriana de Roma, formou-se em Direito no Recife. Além de ter trabalhado em diversos jornais do sul do país, foi também corresponde no Brasil do jornal L'Osservatore Romano periodico semioficil da Santa Sé, Faleceu em 15 de Agosto de 1993 em acidente aéreo. 1Nasceu em 29 de junho de 1907, em Lagoa Seca, município de Nazaré da Mata, hoje Itapetinga, município de Aliança/PE. Foi dos articuladores e membros da comissão de criação da Diocese de Caruaru em 1944. Contribuiu solidamente para a educação em Caruaru nos seus níveis médio e superior. Fundou em 1932, a Academia de Comércio de Caruaru; em 1934, o Ginásio de Caruaru que, mais tarde, se chamou Colégio de Caruaru; em 1936, a Escola de Odontologia e Farmácia de Caruaru; em 1956, a Faculdade de Odontologia de Caruaru; em 1957, a Faculdade de Direito de Caruaru; e, em 1960, o Instituto Santo Antônio. No decorrer da vida ganhou alguns títulos da sociedade caruaruense, título de contador do movimento que legou a cidade à mais antiga Escola de Comércio do Interior de Pernambuco, título de bacharel em ciências jurídicas e sociais, título de professor secundário de inglês, português e francês; título de bacharel em letras neolatinas e o título de licenciado em letras neolatinas. Ajudou na fundação da Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Caruaru, tendo seu diretor entre os anos de 1963 a 1972. Foi presidente do primeiro Conselho Particular Vicentino de Caruaru, também presidiu o Círculo Católico, em 1960. Neste mesmo ano, no dia

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29 de outubro, recebe título de “Cidadão de Caruaru” dado em vista de suas enormes contribuições para com a cidade, além de sua importância. Faleceu no dia 4 de abril de 1983.

1 FONSECA, Mário. História da Diocese de Caruaru. Caruaru, edição do autor, 1973, p. 261. 1Algumas das condenações estas presentes nas encíclicasQui pluribus de 1846,Quod Apostolici muneris de 1878, Rerum Novarum de 1891, Divini Redemptoris em 1937. Além do Decreeagainstcommunism de 1949 (que excomungava automaticamente os católicos que fossem comunistas) e a encíclica Mater et Magistra em 1961 do Papa João XIII.

1 ALVES, Márcio Moreira. A Igreja e a política no Brasil. São Paulo: editora brasiliense, 1979. 1 Ibidem p. 44. 1 Exortação Quaresmal de 1947.

1 SILVA, Severino Vicente da.Entre o Tibre e o Capibaribe: os limites da igreja progressista na Arquidiocese de Olinda e Recife. Recife: Ed. Universitária da UFPE, 2006, p. 148.

1 BOSCO, João Cabral. Entrevista, Caruaru, 22 de Março de 2012. 1 MONTENEGRO, Antonio Torres. História, metodologia, memória. São Paulo: Contexto, 2010, p. 137. 1 O semanário A Defesa foi fundado em 5 de Junho de 1932, pelo Círculo Católico de Caruaru. Posteriormente em 1950, foi restaurado pelo bispo de Caruaru Dom Paulo Libório, circulou até 1985 em Caruaru. Na década de 1960 se tornará um dos principais veículos de comunicação da cidade ao lado do jornal Vanguarda de Caruaru, circulava também nas cidades de Recife, Olinda, Maceió/AL, Teresina/PI, Aracaju/SE, Campina Grande/PB, Vitória de Santo Antão, São Joaquim do Monte, Altinho, Bonito, São Caetano, Brejo da Madre de Deus, Pesqueira, Água Preta, Arcoverde, São Bento do Una, Riacho das Almas, Cachoeirinha, Jataúba, Agrestina, Sapucarana, Afogados da Ingazeira e outros municípios do agreste e sertão de Pernambuco. 1 O jornal A Defesa foi o único jornal à circular em Caruaru nos dias seguintes ao golpe civil-militar de 1964. Por razões de reformulação editorial o jornal Vanguarda não circulou nos dias seguintes ao golpe de 64.

1 Diário de Pernambuco, 1 abri. Nº 74, 1964. 1 Então governador de Pernambuco eleito de forma expressiva nas eleições de 1962, foi deposto pelas Forças Armadas em 02 de abril de 1964. Miguel Arraes de Alencar nasceu em Araripe em 15 de Dezembro de 1906, faleceu em 13 de agosto de 2005. Foi prefeito do Recife, deputado estadual e deputado federal, foi governador por três mandatos. 1 Nasceu em Afogados da Ingazeira, no dia 8 de dezembro de 1905, ficou conhecido como o “padre jagunço do Pajeú”. Formado em Direito Canônico em 1925 no seminário de Olinda. Doutorou-se em Filosofia na Academia de São Tomás de Aquino em Roma, onde também foi ordenado sacerdote e obteve doutorado em Teologia Dogmática pela Universidade Gregoriana. Durante sua via teve forte participação na política, combateu os militares do 21º Batalhão de Caçadores que se insurgiram em 1931 no Recife contra o governador Carlos de Lima Cavalcanti, foi constituinte em 1934, deputado federal de 1935 a 1937. No Partido Social Democrático (PSD) tornou-se um grande articulador político. Foi diretor e vice-presidente da Caixa Econômica de Pernambuco em 1938. Após o fim do Estado Novo foi um dos fundadores do Partido Democrata Cristão (PDC), pelo qual foi constituinte em 1946, deputado federal, além de ter exercido o cargo de presidente nacional do PDC. Em 1948 recebeu o título de monsenhor, na década de 1950 foi reeleito quatro vezes pelo PDC, e duas pela Aliança Renovadora Nacional (Arena) que dava sustentação a Ditadura Militar, faleceu em 21 de fevereiro de 1970 sem concluir seu sexto mandato.

1 Diário de Pernambuco, 26 marc. Nº 69, 1964.

1José Cosa Cavalcanti nasceu em Fortaleza no dia 06 de Janeiro de 1918. Militar formou-se na Escola Militar de Realengo em 1935, na década de 1950 morou nos EUA e lá participou de curso na InfantarySchool de Fort Benning, Georgia. Tenente-coronel em 1959, foi nomeado Secretário de Segurança Pública de Pernambuco por influencia do Ministro da Guerra Henrique

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Lott, filiou-se a UDN e foi eleito deputado federal em 1962. Foi opositor ao governo de João Goulart, e grande entusiasta do golpe de 1964, foi reeleito pela ARENA em 1966, Ministro das Minas e Energia no governo de Costa e Silva, em 1969 foi posto no Ministério do Interior, permanecendo até todo o fim do governo Médici, em 974 foi nomeado diretor geral de Itaipu por Geisel exercendo o cargo até o fim do governo de João Figueiredo, em 1983 foi para a Reserva do Exército. Morreu no Rio de Janeiro em 10 de Agosto de 1991.

1 Diário de Pernambuco, 27 marc. Nº 70, 1964, p. 1. 1 Governador do estado do Paraná entre 1961 e 1965 pelo Partido Democrata Cristão. 1 QUEIROZ, Luiz Roberto de Souza, A ordem era a subversão. Jornal A Defesa, Caruaru, p. 2, 25 abri. 1964. 1 Outra destas “averiguações” será vista pode ser percebida entre as linhas da redação do jornal A Defesa que descreverá em 7 de Maio de 1964, através, do artigo “Agitador não teve chance” em sua primeira página. O caso do Sr. Manoel Messias na época assessor do governador do Estado em Caruaru junto a um grupo de estudantes, se dirigiu ao sindicato dos agricultores em Brejão para reclamar da situação de subordinação do referido órgão a aprovação do Clero e da Igreja, logo os associados que estavam reunidos reagem e os estudantes são linchados, a redação do jornal considera que o acontecido serve de lição “para os semi-brasileiros e simpatizantes de Fidel Castro”.

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A recepção da história cultural e da história social na elaboração do livro didático e no ensino de história

Fabrícia Evellyn Araújo Medeiros-UEPB117

José Adilson Filho118

RESUMO: Esta comunicação é resultado do que está sendo trabalhado no projeto de PIBIC-UEPB (cota 2014-2015) intitulado “O Livro Didático e a recepção da Historia Cultural e da História Social”, coordenado pelo professor Dr. José Adilson Filho. Procura-se analisar como as novas tendências teóricas e metodológicas, novas fontes e novos temas cada vez mais ampliados pelas ciências sociais e humanas estão sendo empregados e refletidas no ensino de história e na elaboração dos livros didáticos. No entanto, o foco principal concentra-se na análise da história cultural e da história social e como estas concepções alteram a prática do professor em sala de aula ao precisar adequar-se ao uso de novos conceitos, temas e novos sujeitos da história, como por exemplo, representações, imaginário, mentalidades, cotidiano, gênero e etc. Nossa pesquisa insere-se na linha de Ensino e História da Educação trabalhando diversos temas voltados para esta vertente, e utiliza-se da análise de produções bibliográficas referentes as novas tendências historiográficas como Peter Burke (1992), Lynn Hunt (2001) e referentes ao livro didático e ao ensino de história como Leandro Karnal (2013) e Jaime Pinsky (2012).

Palavras Chaves: História Cultural; História Social; Ensino de História;

Introdução

Atualmente além de uma ampla discursão acerca da produção

historiográfica e do papel do historiador como produtor e interlocutor desse

conhecimento, uma nova discursão entra em cena já que, com a ampliação do

conhecimento histórico, de novas abordagens e novos temas é necessário

também que o historiador e professor de história esteja sempre se atualizando,

117Aluna do curso de Graduação em História da Universidade Estadual da Paraíba. Trabalho apresentado em simpósio temático de História Poder e Cultura: Interfaces e Diálogos Contemporâneos. Maio de 2014. E-mail: [email protected]. 118Professor orientador, Doutor em Sociologia pela Universidade Federal da Paraíba. Professor titular da Universidade Estadual da Paraíba, Brasil.

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visto que, seu trabalho não é apenas tratar do passado em si, mais também tratar

de novos temas do tempo presente, além de transmitir conhecimento a uma

sociedade que está em constante movimento e mudança. Assim além dos

clássicos da história tradicional produzida nos séculos XVII, XIII ou até antes, o

historiador deve estar atento a essa nova produção historiográfica que está

emergindo, atualizando-se metodologicamente e teoricamente O proposito deste

texto é abordar mesmo que breve questões que movem o conhecimento

histórico, compreendendo a emergência da nova história, com ênfase na história

social e cultural e suas ramificações, como a história vista de baixo e a micro-

história.

Para isso usamos dois autores que tratam especificamente dessas

questões, Peter Burke (1992) e Lynn Hunt (2001). Além das novas tendências

historiográficas, abordaremos também algumas discursões de historiadores que

refletem sobre o ensino de história, sobre os novos temas, as novas abordagens

em sala de aula e novas práticas de ensino, para isso utilizaremos obras

referentes ao ensino de história de Leandro Karnal (2013), Jaime Pinsky (2012),

e Carla Pinsky (2010).

Esperamos que a bibliografia exposta neste trabalho, bem como nossa

discursão possa contribuir para repensar a prática de ensino de história e

responder a algumas questões que frequentemente cercam o fazer do professor,

com o maior objetivo de contribuir para o desenvolvimento de novas ideias que

seguindo este trabalho continuarão a ser estudadas e desenvolvidas.

A nova história: novos temas, novas abordagens, novas fontes

Ao longo do século XIX surge um grande debate acerca daquilo que

pode ser abordado pelo campo da história pelos historiadores,que travaram um

intenso debate ao alargarem seus campos de estudos para dar voz a novos

sujeitos, novos temas e novos objetos antes marginalizados pela dita História

Tradicional. Aqui trataremos especificamente de dois novos campos da história

que se fragmentaram das tradicionais história política e econômica, são estas a

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História Social e a História Cultural, que representam apenas dois dos mais

variados campos da chamada Nova História.

Como estão sendo elaborados os livros didáticos dos quais os

professores precisam seguir uma linha de temas e conteúdos para ministrar suas

aulas? Os estudos da Nova História estão conseguindo atenção no que diz

respeito ao ensino fundamental e médio? Como o professor de História está

lidando com esta amplitude de novos temas em sala de aula? São questões

complexas, mas que precisam ser aos poucos analisadas, pois esta ampliação

de temas e sujeitos históricos não podem se deter apenas as paredes da

academia, e sim ter fôlego chegando a ocupar os mais variados espaços das

escolas e da sociedade em geral.

Peter Burke (1992), discute a ampliação do campo da história a partir de

um exemplo básico e que é muito discutido por professores tanto da academia

quanto do sistema básico de ensino, que consiste na atual atenção dada a

história mundial e a história regional em contraponto a história nacional, alvo das

maiores atenções durante o século XIX. A Nova História busca romper com essa

História Tradicional, dando atenção as particularidades, aos mais diversos

aspectos da vida humana que podem ser analisados.

Há hoje nas produções historiográficas, uma variedade de novos

campos, alguns deles apenas fragmentaram-se dos campos tradicionais da

história. É o caso da história social e da história cultural que fragmentaram-se da

história econômica, que por sua vez também dividiu-se em antiga e nova história

econômica, além de campos como o da história da publicidade, a história

ambiental e a história política que também já não é mais praticada de maneira

tradicional, mas que procura compreender o poder articulado das mais diversas

maneiras e instituições dentro da sociedade.

Neste sentido Burke (1992) analisa as consequências da expansão da

história para os historiadores, causando uma crise de identidades e até uma

definição mais precisa dos temas trabalhados. No entanto Burke além de

analisar os aspectos fundadores e formadores dessa nova história, também

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analisa como ela vai coexistir junto com a História Tradicional, permitindo-nos

apreender as variedades dessa história contemporânea.

A Nova História ficou sendo associada a fundação da ÉcoledesAnnales

(Escola dos Annales) fundada na França em 1929 pelos historiadores Marc

Bloch e LucienFebvre, e por sua segunda geração sob a direção de Fernand

Braudel. No entanto novos temas e novos problemas históricos já vinham sento

pesquisados e trabalhados por uma geração antes de Braudel, Bloch e Febrve,

esta geração já vinha rompendo com o paradigma tradicional produzindo uma

história baseada nos acontecimentos, contudo este tipo de produção

historiográfica foi muito rejeitada entre os historiadores tradicionais.

Não só pelas novas abordagens que davam voz a personagens e temas

marginalizados pela produção historiográfica tradicional, a nova história também

foi muito criticada pelos historiadores tradicionais, pelos novos tipos de fontes as

quais ela recorria para fazer releituras do passado e estabelecer um diálogo com

seus novos objetos de estudo. Relatos orais, evidencias em imagens, textos

literários, registros oficiais, interrogatórios, diários, tais fontes deram vida a

estudos famosos como as obras “O queijo e Os vermes” de CarloGuinzburg, ou

“Eu Pierre Rivière, que degolei minha mãe, minha irmã e meu irmão” de Michael

Foucault.

Tais obras são apenas dois exemplos dessa nova história produzida no

século XXI, por dois autores distintos, mas que inserem-se dentro dessa lógica

da produção de uma história que busca contar a história das minorias, das

massas, aqueles que são menos conhecidos ao mesmo desconhecidos, mas

que marcaram a sociedade por suas práticas e atitudes e que deixaram seus

registros de alguma forma.

Segundo Peter Burke (1992) o universo dos historiadores está se

expandindo cada vez mais com essa nova abertura da história à um diálogo cada

vez mais crescente com novas disciplinas, como a economia, a filosofia,

sociologia, antropologia, e a literatura, com cada grupo de historiadores

trabalhando dentro de sua especialização, que contribui para um maior

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conhecimento humano e métodos mais rigorosos e eficazes para seu campo de

pesquisa.

Contudo houve um grande entusiasmo por essa história estrutural, pela

emergência da história social e os novos campos da história, como a história das

mulheres e a história da cultura popular, que foram tratadas de maneira oposta

a cultura erudita e da história dos homens. Outras tendências como a história

vista de baixo, a micro-história e a história da vida cotidiana, foram reações à

necessidade de uma nova alternativa que não fosse apenas a escrita da história

da “elite”, contra o estudo das grandes tendências sociais. (BURKE, 1992)

Essa nova perspectiva do passado histórico amplia os limites das

pesquisas dos historiadores e a diversidade temática explorando novas

experiências de homens e mulheres e de experiências passadas da massa da

população que puderam viver determinada situação. Segundo Peter Burke, essa

história recebe uma grande contribuição do marxismo sugerindo uma amplitude

temática que os historiadores sociais também poderiam estudar, contudo os

historiadores marxistas tendiam a restringir os estudos da história vista de baixo

a episódios e movimentos em que as massas estavam engajadas, e que, de

acordo com Eric Hobsbawm os historiadores dos movimentos trabalhistas não

estudavam somente as pessoas comuns, mais as pessoas “comuns” que se

destacavam dentro dos movimentos sociais.

No início da década de 1970 os historiadores passam ampliar suas

pesquisas, além da vida da classe baixa passam a explorar também as culturas

populares enriquecendo seu material quantitativo, com o estudo das

mentalidades para dar voz a artesãos, camponeses, e trabalhadores. E.P.

Thompson e Natalie Davis foram dois historiadores que estudaram o

comportamento cultural popular, abrindo a partir de seus trabalhos uma nova

abordagem cultural da história social (HUNT, 2001).

A obra desse dois autores tem como grande característica estudar os

acontecimentos através das ações da sociedade, e ainda mais da cultura

popular. Segundo Lynn Hunt, não há como desenvolver um trabalho sobre a

reforma sem ter lido Davis, nem estudar o Revolução Industrial sem ter lido as

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obras de Thompson. Esses dois autores trabalham com um métodos em que

coloca em evidência os elementos culturais, além dos estudos antropológicos

que ajudam o historiador a conhecer as experiências humanas, os rituais, as

práticas e ritos duma sociedade.

Thompson foi um historiador produtor da história social, história que

passa a se interessar não somente por documentos oficiais e história de grandes

nomes como imperadores, generais ou líderes religiosos, pelo contrário havia a

necessidade de não contar somente a história das elites, mais sim o que

Thompson denomina de história vista de baixo, a história das massas populares,

uma história cultural.

Essa história social feita por Thompson é ainda semelhante a uma micro-

história que enxerga as diferenças que acontecem na história, por exemplo, via

que o feudalismo não possuía as mesmas características em todos os territórios,

se interessava pelos personagens e pelo contexto em que a trama se passava,

queria também dar nome as pessoas e tira-las do anonimato é o exemplo do

livro já citado de Carlo Ginzburg que narra a vida o cotidiano e o julgamento de

um moleiro acusado de práticas heréticas, esta é um exemplo de história cultural,

das mentalidades e de micro-história.

Essa nova produção historiográfica que passa a ser produzida no século

XXI se maneira geral aparenta-nos um tanto distante da pratica do ensino de

história, mas, ao ser produzida novas histórias ou até mesmo uma nova visão de

fatos já estudados o historiador e professor de história ou aquele que está

inserido nos cursos de graduação prestes torna-se professor não pode por uma

venda nos olhos e deixar de lado essa nova historiográfica, essa nova história

que muitas vezes está mais próxima do cotidiano dos alunos, para sem cometer

anacronismos relacionar o passado ao presente deixando o aluno muito mais

próximo daquilo que lhe é exposto.

Recepção da nova história no ensino de História

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Eu diria que ensinar História, é uma atividade submetida a duas transformações permanentes: do objeto em si e da ação pedagógica. [...] precisamos ter cada vez mais consciência de que qualquer pratica em sala de aula nasce de uma concepção teórica.

(Leandro Karnal)

Com a produção dessa nova história cultural e da história social além de

novos temas surgem também novos modelos de abordagens históricas. Um

simples exemplo, fica claro quando nos referimos as primeiras aulas de história

do ensino fundamental, quando tratamos de uma breve introdução à história, fica

claro nos livros didáticos a introdução de novas fontes, do tempo histórico, do

papel do historiador como produtor de conhecimento, um conhecimento que um

historiador que não tem mais o ego de se dizer objetivo.

No livro “História na sala de aula: conceitos, práticas e propostas”,

organizado por Leandro Karnal vários autores que vem discutindo novas

abordagens de novos temas em sala de aula estabelecem uma rica discursão

acerca de abordagens e recortes históricos propostos por historiadores

especialistas em cada recorte. Além de reflexões teóricas importantes para sala

de aula estabelecem um diálogo com esses recortes clássicos que todo

historiador estudou ou encontra-se estudando em sua graduação.

Uma aula pode ser extremamente conservadora e ultrapassada contando com todos os mais modernos meios audiovisuais. Uma aula pode ser muito dinâmica e inovadora utilizando giz, professor e aluno. Em outras palavras podemos utilizar meios novos, mas é a própria concepção de história que deve ser pensada. O recorte que o professor faz é uma opção política. (KARNAL, 2003, P.09)

Em cada recorte são mencionadas autores e obras clássicas de

referências, para a formação dos historiadores e professores que

consequentemente produzem os livros didáticos utilizados nas escolas de ensino

fundamental e médio com base nessas produções. Um exemplo dessas obras é

a coleção de Eric Hobsbawn utilizadas em programas de disciplinas como

História Contemporânea, seu primeiro volume que começa com a Revolução

Francesa, o segundo que abarca o auge do capitalismo, o terceiro o imperialismo

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e o quarto que trata segundo Hobsbawn do “curto século XX abrangem um

período que vai de 1848 até o ano de 1989.

Além dessa referência clássica para a história contemporânea, há

também para os estudos de história do Brasil a coletânea de quatro volumes de

História da vida Privada no Brasil organizada por Laura de Mello e Fernando A.

Novais descrevendo os costumes e hábitos brasileiros aos longo de quase cinco

séculos, da colonização portuguesa até os dias de hoje. Da mesma forma há

também a coleção de História da Vida Privada de cinco volumes organizada por

Georges Duby e Philippe Ariès abrangendo o período que vai do Império

Romano até os nosso dias.

Todas essas obras atentam para características particulares da história,

tratam assim como Eric Hobsbawn de questões ligadas ao cotidiano aos

movimentos sociais, a cultura, e as artes. (KARNAL, 2013, p. 171). Segundo

Karnal este é apenas um exemplo dessa nova historiografia que está formando

alunos nos cursos de graduação de história, e material de apoio para professores

e pesquisadores.

Além de coletâneas referentes a historiografia pesquisadores

preocupados com o ensino de história, com novas práticas em sala de aulas e

com a abordagem de novos temas, veem se organizando e produzindo livros

com novas propostas e com as discursões que estão sendo feitas na academia

e nos encontros de História. Assim como o livro organizado por Leandro Karnal,

há também o livro organizado por Carla BassaneziPinsky que traz uma proposta

clara de novos temas nas aulas de História, dentre eles muitos estão sendo

amplamente discutidos entre os historiadores, como, gênero, alimentação,

cultura, História regional, e meio ambiente, com a proposta de aproximar o que

vem sendo discutido no ambiente escolar.

A história regional no Brasil por exemplo durante muito tempo foi usada

de forma errônea no ensino de história, mais este erro não foi por parte

exclusivamente dos professores, mais das circunstancias que levaram-nos a

usar tal perspectiva em sala de aula. Os primeiros trabalhos da história regional

tiveram por base os aspectos principalmente focados nos acontecimentos da

história de São Paulo, local que se destacou por seus primeiros

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desenvolvimentos e por ser sede da estadia da corte no Brasil, acontecimento

importante para sua história. (MARTINS, 2010)

A partir de 1980 surgem novas perspectivas e novos estudos regionais,

não mais centrados apenas no modelo paulista, o trabalho do local especializa-

se e passa a conectar-se com o regional e com o nacional. Novos temas passam

a ser abordados possibilitando trabalhar os aspectos do regional e dos processos

indenitários do pais no ensino de história.

Segundo Carla Pinsky ao trabalhar especificamente a história do Brasil,

não podemos homogeneíza-lo, mas temos que saber diferenciar os aspectos da

cada uma de suas regiões, principalmente os aspectos mais básicos da cultura

de cada estado que possui inúmeras variações importantes para o estudo do

local, que possibilita também o desenvolvimento de atividades turísticas e

históricas dentro de cada região.A exemplo básico, dentro do nosso pais cada

região possui categorias diferentes, da linguística, na gastronomia, nos contos,

na música, e em vários outros aspectos que as diferenciam entre si, podendo ser

trabalhados em sala de aula de maneira a caracterizar cada lugar e a preservar

as particularidades de cada cultura, de cada região.

Contudo estudar o regional é importante no ensino principalmente na

modernidade em que a globalização tende a universalizar costumes, gostos e

valores, colocando os aspectos mais regionais como atrasados. Entender o

regional é entender o próprio capitalismo e as mudanças que ele trouxe ao

mundo, e ainda como ele precisa se adaptar aos gostos e costumes resistentes

de cada região.

Os hábitos alimentares por exemplo discutido por Ramos (2010), podem

ser abordados para mostrar uma linha dos vários estágios da sociedade humana

e de suas culturas, e, de como estas culturas marcam e definem a cultura

alimentar, que, ao mesmo tempo distinguem sociedades, e suas práticas

culturais com características, costumes e hábitos diferenciados.

Ligados ao ensino de história, um dos primeiros temas que podemos

abordar nas aulas de história usando os fatores alimentares é a evolução

humana, podemos usa-las como recursos de debates nas primeiras aulas de

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pré-história e de como a espécie humana se desenvolveu a partir de seus hábitos

alimentares.No entanto de acordo com Ramos (2010) podemos usar o tema da

alimentação de duas maneiras, uma delas é como fator primeiro para o

desenvolvimento das sociedades humanas, como, a partir de um elemento de

subsistência ela se tornou elemento de riquezas, e ponto de partida para os

primeiros avanços e intercâmbios culturais.

Outra forma é utiliza-la como fator de diferenciação e distinção entre

países, regiões, religiões, cultura, classes sociais ou etnias. Como citado nos

aulas, as influências alimentares foram misturando-se pelo mundo ao longo dos

primeiros comércios, um exemplo claro é o Brasil que sofreu influências de várias

culturas do mundo e que sofre ainda hoje, no que dizemos respeito a

alimentação hoje no Brasil, várias culturas se encontram presentes, como a

Europeia e de seus diversos países específicos, a africana, japonesa, chinesa,

estadunidense, etc.

Esses temas citados podem ser trabalhados em sala de aula de diversas

formas, e articulando de maneira coerente podem atrair a atenção dos alunos ao

estarem diretamente ligados com a sua vivência cotidiana, e mesmo sem

estarem diretamente como recortes nos livros didáticos são temas presentes em

qualquer período histórico, o importante está na diferenciação que deve ser feita.

Segundo Pinsky (2012), o historiador carrega consigo o objetivo de

desvendar e entender os acontecimentos do passado, o que dá ao historiador

uma série de dificuldades ao realizar seu trabalho de investigação pois isto

requer pessoal especializado com técnicas apropriadas e vontade de fazer

história, uma vasta documentação bem organizada e confiável, verbas e uma

série de fatores que permitirão a ele realizar seu trabalho.

Assim Pinsky demonstra o tipo de história que passou a ser contada do

Brasil desde a sua descoberta, pelos viajantes que aqui estiveram, que não

estavam preocupados com o rigor dos fatos ou as técnicas adequadas para se

atribuir verdades as suas narrações, eles apenas narravam aquilo que estavam

observando e suas impressões do local, produzindo assim alguns mitos que são

levados em contas até hoje, como o modo de vida dos indígenas por exemplo,

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este é um mito que deve ser desconstruído pela historiografia brasileira ou pelo

menos com já vem sendo, ser reescrito visto que a maneira do índio

contemporâneo não condiz com o passado.

De acordo comPinsky passa-se a questionar que tipo de nação brasileira

está sendo constituída, visto que no Brasil a uma mescla de povos, nativos,

brancos, africanos, estes últimos que vieram trabalhar como mão-de-obra

escrava, que posteriormente é substituída pelo trabalho livre, passando a haver

um discurso que estes negros não seriam dignos de trabalho livre e estariam

prejudicando a nação, então passa-se a buscar povos que propiciem uma

melhoria de raça para esta nação.

Pinsky (2012) após um longo questionário sobre como se constituiria a

nação brasileira, mesmo está sendo formada por diversos povos, raças etnias

culturas diferentes, chega-se à conclusão baseadas em algumas leituras de

Gilberto Freyre que esta mistura proporcionou ao Brasil uma particularidade, um

jeito único que caracteriza a formação e a existência desta nação.

Segundo Nadai (2012) o surgimento da história como disciplina escolar

ocorre devido ao movimento de laicização da sociedade e da constituição das

nações modernas, marcado também por um estudo da genealogia e uma

investigação das origens desata civilização contemporânea. Estes estudos

possibilitou a unificação de dois modelos ao ensino de história, o do século XVIII,

enciclopédico, e o do século XIX, metodológico.

De acordo com Nadai (2012) há uma renovação na produção

historiográfica neste período do século XX onde é deixado de lado este modelo

positivista, surgindo um novo olhar do historiador sobre as fontes e os fatos

históricos, desta maneira o historiador descobre-se como construtor do seu

objeto de investigação.

Assim ao lado das mudanças no estatuto da ciência histórica, ocorrem

também mudanças nas suas aplicações na escola. Amplia-se o acesso dos

alunos das classes populares mais baixas à escola, mais percebe-se que os

discursos das autoridades de melhoria na educação para estes alunos não são

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levados a diante na pratica, hoje busca-se respostas que possam melhorar os

currículos escolares e o ensino de história no Brasil (NADAI, 2012).

Considerações Finais

Podemos concluir de acordo com todo decorrer do trabalho que o

conhecimento faz parte do saber e das ações humanas, e a história é um saber

que descreve os acontecimentos históricos que por sua vez são frutos das ações

humanas no tempo. Desta forma o historiador torna-se sujeito da sua própria

história ao tratar de acontecimentos do tempo presente bem como não deixa de

colocar suas impressões ou se colocar no lugar do outro ao pesquisar e tratar de

histórias de um longo tempo passado. E justamente é desvinculando-se do

debate objetivista que na modernidade mais contemporânea vão surgir às

questões e implicações a fim de esclarecer a mente humana de que nem todo

conhecimento é capaz de estabelecer uma verdade absoluta como assim visava

a própria ciência história proposta no século XIX por Leopold Von Ranke.

Com tudo isto ao fim da leitura podemos compreender que tal como a

nova produção histórica, o professor de história em sua prática cotidiana também

expõe sobre ela suas impressões e seus anseios, selecionando aquilo que visa

ser mais importante para dar conta de determinados conteúdos. Juntamente a

isto há professores desmotivados ou que já há muito tempo lecionando

encontram-se afastados de novos debates acerca das produções históricas e do

ensino de história. Tais referências de agradável leitura podem contribuir para o

despertar de uma nova prática, bem como para aqueles que ainda nem

chegaram a lecionar pode despertar o desejo pelo ensino a pôr em pratica tudo

o que lhe é exposto na academia.

Referências

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BURKE, Peter. (Org.) A escrita da História. Assis: Unesp, 1994.

MARTINS, Marcos Lobato. História Regional. In.:_____. Novos temas nas

aulas de História. 2 ed. São Paulo, Contexto, 2010, p. 135-152.

KARNAL, Leandro (ORG.) História em Sala de aula. Conceitos, práticas e

Propostas. São Paulo: Contexto, 2012.

HUNT, Lyn. A nova História Cultural. Rio de Janeiro: Martins fontes, 2001

PINSKY, Jaime. O Ensino de História.Campinas: Contexto, 2012.

RAMOS, Fabio Pestana. Alimentação. In.:_____. Novos temas nas aulas de

História. 2 ed. São Paulo, Contexto, 2010, p.95-118.

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Cana-de-açúcar o ópio de pernambuco retratado no

romance de josé lins do rêgo: fogo morto

Kétura de Souza Lins - UFPE119

Samara Glicia Alves de Souza Oliveira - FAFICA120

Resumo: A partir do romance de José Lins do Rêgo pode-se ter um retrato do que ocorreu nos engenhos de cana-de-açúcar na época da decadência destes. Como se deu esta derrocada e as consequências destas, nas relações sociais e econômicas, que precederam a sociedade nordestina atual, principalmente nas áreas que viveram com intensidade o auge da cultura do açúcar. Torna-se evidente, a gama de malefícios que o cultivo de cana gerou a Pernambuco. Desde suas exigências iniciais, monocultura, latifúndio e, trabalho escravo, há herança de cada uma delas, a cana legou aos moradores pobres de Pernambuco, dor, sofrimento, exploração, miséria, fome e, marginalização. Aos poucos homens ricos, a cana proporcionou grande riqueza e, poder.Faz-se necessário entender de onde surgiram estas relações, como se instalaram na sociedade e o porquê de permanecerem inalteradas mesmo após a derrocada da cultura do Senhor de engenho. Palavras-chaves: Cana-de-açúcar, Latifúndio, Nordeste, Exploração. Abstract: From the novel by José Lins do Rego can have a picture of what occurred on the plantations of sugar cane at the time of the decay of these. How did this collapse and the consequences thereof, by the social and economic relations that preceded the current Northeastern society, especially in areas that have lived with the peak intensity of the sugar culture. Becomes apparent, the range of harms that cane cultivation begat Pernambuco. Since their initial requirements, monoculture, large estates and slave labor, no inheritance of each, the cane bequeathed to the poor residents of Pernambuco, pain, suffering, exploitation, misery, hunger and marginalization. Gradually wealthy men, sugarcane yielded great wealth and power. It is necessary to understand where these

relationships have emerged, as have settled in society and why remain unchanged even after the collapse of the culture of the Lord of ingenuity. Keywords: Canesugar,Landlordism, Northeast, Exploration.

119Graduanda em ciências econômicas – UFPE – CAA, [email protected] 120Graduanda em Filosofia – FAFICA, [email protected]

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INTRODUÇÃO

Em Fogo Morto, José Lins do Rego, retrata o Nordeste açucareiro desde a

grandeza dos engenhos até a sua decadência, com todas as nuances das relações

sociais e econômicas. Relações de poder, domínio, servidão e, dependência permeiam

o romance do autor paraibano. Nascido em Pilar, município do estado da Paraíba, em

um engenho chamado corredor, ao se tornar de mãe e tendo um pai ausente, José Lins,

foi viver no engenho do avô materno. Tendo, desta forma, passado a sua infância vendo

e vivendo as relações sociais dentro dos engenhos de açúcar do Nordeste brasileiro,

fato que marcou toda a sua obra literária. Em Fogo Morto não é diferente, a infância

vivida à sombra de uma sociedade patriarcal está presente em várias passagens do

livro que marcou a sua carreira como sua maior obra.

A partir do romance supracitado pode-se ter um retrato do que ocorreu nos

engenhos de cana-de-açúcar na época da decadência destes. Como se deu esta

derrocada e as consequências destas, nas relações sociais e econômicas, que

precederam a sociedade nordestina atual, principalmente nas áreas que viveram com

intensidade o auge da cultura do açúcar. Faz-se necessário porem, entender de onde

surgiram estas relações, como se instalaram na sociedade e o porquê de

permanecerem inalteradas mesmo após a derrocada da cultura do Senhor de engenho.

O presente trabalho, portanto, visa responder estes questionamentos através de

uma analise exploratória bibliográfica de caráter qualitativo, e conterá três seções.

Sendo a primeira esta introdução, seguida pela seção onde será realizada a

fundamentação teórica, tendo como baliza o romance de José Lins do Rego, Fogo

Morto. A terceira e ultima seção trará as considerações finais e conclusão.

REFERENCAL TEÓRICO

A metodologia utilizada para a consecução deste trabalho, será de caráter

exploratório e qualitativo, realizar-se-á inicialmente um levantamento

bibliográfico dos autores que utilizaram a mesma ferramenta textual, para a

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realização de trabalhos nas áreas da ciência econômica, a saber, o uso da

literatura. Conjuntamente, discutir-se-á a utilização da literatura como método

historiográfico na economia, por fim, através de uma revisão bibliográfica,

tracejar-se-á a imagem do cenário socioeconômico do Nordeste da cana-de-

açúcar.

Para se construir conhecimento cientifico se faz necessário seguir alguns

preceitos básicos, a fim de garantir certa credibilidade e respeitabilidade ao

resultado auferido. A partir do método utilizado é possível dizer se estamos

construindo conhecimento científico, pois a metodologia é o que caracteriza as

diversas formas de manifestações da ciência. Isto quer dizer, de imediato, que o

conhecimento produzido a partir de determinadas regras, ou métodos, se

diferencia daquele construído sem o uso das mesmas. Alguns autores afirmam

que este conhecimento sem qualquer baliza técnico-metodológica pode ser

entendido como um resultado vulgar.

Alguns autores já adentraram nos textos literários, tanto para utilizá-los

como ferramenta complementar a suas teorias, como objeto de estudo. O

presente trabalho através dos escritos destes últimos e com o apoio de uma

discursão metodológica, demonstrará a possibilidade da utilização da literatura

no estudo das ciências econômicas.

Entre alguns dos autores mencionados no paragrafo anterior, Henry W.

Farnan (1853-1933) economista americano, pode ser considerado um dos

pioneiros nesta forma de escrever sobre economia. Professor de economia

politica na Universidade Yale, filho do magnata de ferrovias Henry Farnam, o

mesmo, foi presidente da associação americana de economia e escreveu entre

outros ensaios: The EconomicUtilizationofHistoryandOtherEconomicStudies

(1913). Em “A Economia em Shakespeare” (1931), Farnam analisa o principio

do capitalismo, e o inicio da economia como ciência, através das peças de

Shakespeare, demonstrando que muitos conceitos economicos estavam

presentes em suas obras. Há no referido texto inúmeras passagens da obra de

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Shakespeare, seguidas por textos explicativos de como e onde os conceitos

econômicos se entrelaçam com a supracitada obra. O texto de Farnam

demonstra como a economia adentra todos os aspectos sociais, sem contudo,

enveredar pelo caminho do economicismo.

Outro ensaio sobre o mesmo assunto, mas com viés diferenciado, é de

autoria de Gustavo Franco, professor no Departamento de Economia da PUC-

Rio desde 1986. O mesmo foi diretor e presidente do Banco Central do Brasil,

entre 1993 e 1999, é sócio fundador da Rio Bravo Investimentos e tem vários

livros publicados, entre eles: Crônicas da convergência, O desafio brasileiro, As

leis Secretas da Economia e O Plano Real. “Shakespeare e a Economia” é o

terceiro livro de Gustavo Franco abordando a economia em textos de literatos,

aborda a economia do teatro, a linguagem, as companhias teatrais, sua

organização e seus resultados financeiros, demonstra como Shakespeare era

dono de uma fortuna considerável e o seu empreendedorismo. Com trechos da

obra de Shakespeare inseridos no seu interior, misturando a literatura mundial,

e a ciência econômica de forma clara e simples.

O primeiro texto de Franco a mesclar o estudo da economia e a literatura

foi: “A economia em Pessoa - Verbetes contemporâneos e ensaios empresariais

do poeta” onde, o mesmo reúne e comenta ensaios de economia e administração

do poeta Fernando Pessoa, em cada capítulo Franco, relaciona os textos com

temas contemporâneos, tais como globalização, marketing, e-mail, blog, entre

outros. Em “A economia em Machado de Assis - O olhar oblíquo do acionista”,

Franco reuniu texto de Machado de Assis que tratam das transformações na

economia brasileira com o fim da monarquia e o início da República.Desta forma

pode-se notar que o uso da literatura nos estudos econômicos pode ser balizado

através do seu uso anterior por autores diversos.

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Resultados

Economia e Sociedade

As relações socioeconômicas no Nordeste brasileiro, pouco evoluíram nos

quinhentos anos desde o inicio da colonização, uma sociedade hierarquizada

verticalmente sempre foi a marca desta sociedade, além de um paternalismo

institucional, e social preponderante em todas as esferas sociais.

A conquista de terras extremamente férteis, para produção de açúcar em

Pernambuco rendeu á Portugal grandes lucros e, aos habitantes pobres, fome e miséria.

Isso porque, a monocultura, sistema escolhido para aumentar os lucros, exigia

abundância de terra, e mão-de-obra barata. A destruição da diversidade da vegetação,

bem como a impossibilidade de diversificação nas plantações, para a implementação

da monocultura de cana-de-açúcar, gerava fome, além de transformar a alimentação

dos habitantes da região em uma alimentação monótona como denominava o autor

Josué de Castro (1992).

Durante os dois primeiros séculos da colonização, aí se plantou cana e

enraizou-se a dominação portuguesa. As moendas esmagaram a cana,

retiraram-lhe o sumo e transformaram-no em doce açúcar. Mas o

engenho representou também o esmagamento, o total aproveitamento

da força de trabalho do negro escravo, trabalho convertido em capital

originário, alavanca do moderno capitalismo (FERLINI, 1998, p.28).D

Essa sociedade açucareira, que Dabat (2007) chamou de bipolar, onde havia o

senhor, dono de tudo e senhor de todos, inclusive dos homens pobres livres, e os

escravos, que eram “coisas”, e dessa forma, não desfrutavam de direito algum, nem

direito sobre a sua própria vida, moldou a nação brasileira. A filosofia dos senhores de

engenho que Carvalho (1988) denomina “o que parece é”, é um dos principais traços da

civilização do açúcar, na qual o senhor de engenho e sua família, ostentam ao máximo,

em cada detalhe, a imagem do senhor de engenho é sinônimo de poder, riqueza e

autoridade.

As convenções sociais o tornam uma figura repleta de contradições. Grande

anfitrião, mostra-se generoso com seus hospedes. Um protetor dos desvalidos, seu

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patriarcalismo, o tornava senhor até de homens livres. Estes últimos, estando presos ao

senhor de engenho por laços de gratidão e medo.

Muitos dos problemas enfrentados no Nordeste, principalmente na região onde

prosperou o cultivo da cana-de-açúcar, como é o caso do Estado de Pernambuco, são

provenientes deste paternalismo. A dependência da maioria dos trabalhadores rurais,

advêm das anteriores relações trabalhistas, iniciando-se estas relações com o trabalho

servil, passando para a relação de morada e posteriormente ao trabalhador autônomo,

mas tão dependente quanto nas relações anteriores. Este paternalismo perpetuou

várias distorções sociais, em especial, a exploração da terra e do homem. Já que o mal

de ser escravo, só se compara com o mal de ser senhor. Assim a cana deixa não só o

homem doente pela falta de nutrição adequada, devido a sua autofagia, mas também,

adoece toda a sociedade pela continuação de ciclos de explorados e exploradores, que

se arrasta de senhores de engenho, para usineiros e, de escravos para moradores.

Essas relações de trabalho, profundamente marcadas pela herança escravista, mantiveram-se sob o formato da ‘morada’ garantindo aos plantadores a permanência dos canavieiros no local de trabalho. A categoria compreendia doravante a maioria dos trabalhadores nas plantações de senhores de engenho e usineiros. (DABAT, 2007).

Com a abolição surge a necessidade de fixar a mão-de-obra, sem que isso seja

dispendioso aos proprietários de terra, para tanto, o sistema de morada foi estabelecido.

A morada muito se parecia com a senzala, com infraestrutura precária e, condições

sanitárias terríveis, os programas sociais do governo não eram acessíveis e, tampouco

as vacinas. Com a finalidade de pagar o menor salário monetário possível, os usineiros

ofereciam a morada e, a chamada “brecha camponesa”. Esta última era a produção de

alimentos em terras cedidas, onde o cultivo se daria nos dias de folga do morador.

Desde então já havia uma forte ligação entre a classe dominante e o Estado. O

Estado era empreendedor e, a legislação pós-independência, consolidou o monopólio

das terras. Com a alta concentração de terras, a disponibilidade de mão-de-obra

também aumenta, pois, a população rural não dispõe de outra forma de sobreviver a

não ser trabalhar para os grandes latifundiários. Acontecendo assim, a perpetuação da

herança escravista no trabalho rural em Pernambuco.

A deplorável situação dos trabalhadores rurais servia como argumento para os

usineiros, que conseguiam mais e mais dinheiro do Estado. Como reflexo da filosofia do

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senhor de engenho, os usineiros consideram símbolo de prosperidade, a aglutinação de

terras. Essa concentração fundiária crescente, aumenta os lucros e as facilidades de

crédito, e o Estado cumpre seu papel de fiador dos usineiros. Com o passar do tempo,

os usineiros diversificam seus investimentos e, perpetuam a concentração de renda.

Com a malha rodoviária, os trabalhadores tornam-se itinerante, culminando na

proletarização do trabalhador rural, cuja presença constante já não se fazia necessária.

A soma de fatores como a alta taxa de analfabetismo e, a concentração de terras,

deixava os trabalhadores rurais sem alternativas empregatícias, restando-lhe somente

a favela rural. Culminando em um processo de empobrecimento do trabalhador rural

que desassistido pelo Estado, perdia a complementação do seu salário deplorável.

As relações de morada, portanto, enquanto foram convenientes aos senhores

proprietários da terra foram mantidas como forma de manter mão-de-obra barata, tão

ou mais dependente de quando escrava, já que a cana-de-açúcar ocupava a maior parte

da área cultivada, e pouca terra restante pertencia aos grandes latifundiários.

Estas relações estão presentes no livro de José Lins do Rego, onde encontramos

como os três personagens principais, o morador, o dono do engenho e o jagunço.

Personagens preponderantes também nas relações sociais vividas no Nordeste

açucareiro.

Princípio das Relações Sociais no Nordeste

Com a introdução da monocultura do açúcar no século XVI no Nordeste brasileiro

foi imposto o trabalho escravo, como mão-de-obra barata e a forma de latifúndio como

característica da ocupação do Brasil colônia. Graças ao desenvolvimento da lavoura de

cana e fabricação do açúcar no solo fértil do nordeste, a colônia, passou a ser

fundamental ao império português. Figurado no engenho, o complexo socioeconômico

colonial sendo o Senhor de engenho o ‘aristocrata’ deste sistema.

A localização do engenho se dava às margens de rios e riachos. Isso, tanto

porque a maioria dos engenhos era movida a água, como também, por ser uma forma

de incrementar a dieta, do Senhor de engenho e de sua família, com alimentos

marinhos. Posto que a cana ocupava as melhores terras, sendo os alimentos vendidos

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a altos preços, o que sujeitava os pobres e os escravos a fome como companheira

durante toda vida colonial. Assim se fundamentou a base social nordestina, desde o

Brasil colônia até meados do século XX, com fortes resquícios desta estrutura social

ainda nos dias de hoje, segunda década do século XXI.

O escravismo do mundo dos senhores do açúcar foi elemento da história da gênese do capitalismo, mas este não foi seu referencial ideológico. A sociedade nascida no Nordeste açucareiro transcendeu sua finalidade puramente mercantil e constituiu-se, com seus próprios valores, na "civilização do açúcar”. (FERLINI, 1998).

O homem mais poderoso desta aristocracia rural é o Senhor de engenho. Dono

de tudo, e senhor de todos. O objetivo deste fidalgo do açúcar ia muito além dos lucros.

Vivia uma filosofia, presa às aparências. Dessa forma, a imagem do senhor de engenho

é sinônimo de poder, riqueza e autoridade, seu patriarcalismo, torna-se característica

da sociedade açucareira e as convenções sociais tornam-no uma figura repleta de

contradições.

Grande anfitrião mostra-se generoso com seus hospedes. Um protetor dos

desvalidos, seu patriarcalismo, o tornava senhor até de homens livres. Estes últimos,

estavam presos ao senhor de engenho por laços de gratidão e medo. Este mostrava

grande preocupação, pela vida e saúde de sua parentela. Reiterando, sua

responsabilidade patriarcal. Entretanto no núcleo familiar, esposa e filhos, era

simplesmente tirano. Determinava-lhes o que era permitido e proibido. Onde a

desobediência, seria rigorosamente punida. Sua relação familiar, é comparada à sua

administração do engenho. Onde sua presença, transmitia receio de punições.

Na sociedade, representava um homem abastado. Ostentava em todos os seus

atos. Desde seus moveis, nada confortáveis, mas, verdadeiras obras de arte, passando

por cada objeto, que por ele seria utilizado. Em cada uma das suas atitudes, transmitia

sua posição de homem rico, poderoso e influente. Assim vivia um senhor de engenho:

ostentando. As joias compunham esse personagem. Estas, não eram tidas, pelo senhor

de engenho, como reserva. Mas sim, como carta de credito. Pois, esbanjar joias, trazia

à família grande prestigio. Que por sua vez prestigio era sinônimo de crédito. Esse

raciocínio, explica a preocupação demasiada com as aparências. Outro exemplo,

seriam as grandes festas, sempre eram custeadas pelo senhor de engenho. Cuja

imponência, não podia variar pelo custo de vida. Magnificas festas, rendiam ao senhor

de engenho, prestigio politico, posição de domínio econômico, influencia e credito.

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No engenho não existiam os três fatores de produção considerados normalmente pela teoria econômica – terra, capital e trabalho, pois cada escravo era um bem capital, uma simples máquina de produzir. (CARVALHO, 1988).

Em relação aos escravos, o senhor de engenho mantinha sua imagem de

severo. Até os mais benevolentes, pediam que a filha, intercedesse publicamente pelos

escravos, com a finalidade de não demonstrar benevolência. Acreditavam que se fosse

diferente, proliferaria a indisciplina, que seria a ruina do engenho. Na ótica do senhor de

engenho, escravo era igual a boi. Ambos, insumos necessários á produção do açúcar.

Celso Furtado expressou esse pensamento, referir-se ao escravo como ‘gado humano’.

Os escravos eram uma maquina de trabalho. Por ser uma maquina cara, o numero de

escravos auferia status de riqueza ao senhor. Aos escravos domésticos, era destinadas

roupas à europeia, situação bem diferente dos demais escravos, com a finalidade de

conferir à casa grande mais sofisticação (CARVALHO, 1988).

Todo e qualquer trabalho deveria ser feito por mãos de escravos. Devido a esse

pensamento, o trabalho impregnou-se com a pior conotação possível. Essa máxima,

que o trabalho é coisa de escravo, é uma das consequências do sistema escravocrata,

a qual, Joaquim Nabuco considerou como degeneração do trabalho. Como efeito,

negros e mestiços livres, preferiam á prostituição, ou mendicância a trabalhar.

O casamento entre escravos, embora raro, era possível. Geralmente essa união,

era bem vista, pois geraria filhos, para o senhor de engenho significava aumento da

riqueza. Contudo, o casamento não retirava a condição de escrava da negra. Assim o

senhor continuava a servir-se sexualmente de seu objeto, sempre que queria. Desta

situação, resultam filhos cuja paternidade seria sempre incerta, demonstrando que a

vontade do senhor de engenho, se impunha até aos sacramentos da igreja. A estes

casamentos, Ferline referiu-se, como ligações múltiplas e passageiras. Revelando que

embora a religiosidade fosse um elemento forte e inegável à sociedade açucareira,

figurou-se de forma artificial. E ainda, que nem ela, saiu ilesa da escravidão.

As missas dominicais, o custeio de reformas paroquiais, de folguedos, e

especialmente, a imposição dos sacramentos, serviam para o senhor de engenho

demonstrar sua religiosidade. Até aos negros, eram impostos os sacramentos,

principalmente o batizado, obrigando-os a ter o cristianismo como religião oficial. Um

catolicismo superficial, e mesclado às crenças africanas, foi o resultado desta

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imposição, classificado por Carvalho, como cristianismo projetado para o escravo. Ou

fetichismo católico, é como Nabuco denomina essa distorção religiosa, cuja mistura de

ritos, não passa de mais um mal que devemos à escravidão.

Mas a escravidão não só corrompe a religião, a família e os escravos, seus

senhores também são oprimidos por ela. Uma ilustração disto, é o pânico, que o senhor

sentia da morte. Temia, que pós-morte Deus o tratasse, como havia tratado seus

escravos em vida. Movido por tamanho pavor, deixava esmolas, destinadas para os que

fossem rezar por ele, clamando por santos intercessores.

Durante os dois primeiros séculos da colonização, aí se plantou cana e enraizou-se a dominação portuguesa. As moendas esmagaram a cana, retiraram-lhe o sumo e transformaram-no em doce açúcar. Mas o engenho representou também o esmagamento, o total aproveitamento da força de trabalho do negro escravo, trabalho convertido em capital originário, alavanca do moderno capitalismo. (FERLINI, 1998).

No final do século XVIII, o império açucareiro entrou em crise. Neste período, o

café assumiu importância comercial. A economia cafeeira, como a açucareira, faz uso

intensivo de mão de obra escrava, e do fator terra. Porem, a empresa cafeeira,

diferencia-se de sua antecessora, por seus custos monetários ainda menores, e

fundamentalmente, por sua classe dirigente. Cuja experiência comercial e, grande

desenvoltura na manipulação do governo, faz desta, singular entre os demais grupos

dominantes.

A usina

A derrocada dos tradicionais engenhos de cana-de-açúcar embora tenha se

iniciado com o advento do café, teve seu golpe final com a entrada em cena das usinas,

a concorrência com uma estrutura industrializada extinguiu o brilho e o brio dos

engenhos de cana-de-açúcar. A revolução industrial trouxe a partir de meados do século

XIX, a inovação à economia açucareira. Os mecanismos movidos a vapor aumentaram

a produção e com isso conseguiam reduzir seus custos, foram implantadas usinas

centrais que compravam a cana das regiões vizinhas transformando os senhores de

engenho em apenas fornecedores de insumos.

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A terra se tornou cada vez mais concentrada nas mãos dos usineiros, os quais na

maioria das vezes foram financiados por estrangeiros algumas com capital aberto, fato

este que levou a alguns dos ainda prósperos senhores de engenho a se tornarem cotista

destes empreendimentos. A compra dessas ações foi essencial para o aceleramento da

derrocada dos engenhos, pois muitos dos senhores de engenho após esta compra,

mudaram-se para as cidades, abandonando as casas-grandes e visitando as suas

propriedades algumas vezes ao ano. Desta forma, ficando os engenhos, em sua maioria

apenas fornecedores de cana, administrado por um terceiro, já que os filhos destes

senhores, agora citadinos, já não se enquadram na ruralidade.

O Estado por diversas vezes demonstrou a quem servia, a saber: os grandes

empresários. Sua falta de assistência aos moradores e, sua generosidade com os

usineiros, subsidiou a perpetuação dos problemas gerados pelo ópio de Pernambuco:

a cana. A perpetuação de situações maléficas, quem era escravo, torna-se morador e,

por fim, trabalhador itinerante, e respectivamente, quem outrora morava em senzalas,

passa a morar em moradas e, depois em favelas rurais. Como também, a perpetuação

do poder, senhor de engenho, usineiro e, empresário.

Assim, Os dias dos grandes senhores feudais nordestinos aproximavam-se do

fim. Embora, muitos dos grandes senhores tenham lutado com afinco contra a invasão

da industrialização, terminaram por ver seu património desaparecer nas mãos do

sistema financeiro, que acabava por se tornar dono da terra que pertencia há séculos a

uma mesma família. José Lins do Rego, retrata esse processo e a luta desigual entre o

fazendeiro tradicional e o gigante industrial, em seu livro Fogo morto, bem como o que

resultou das relações sociais anteriores a era industrial ser instalada na zona açucareira.

Fogo morto

A obra de José Lins do Rego trata do período da cana-de-açúcar partindo do seu

auge, na segunda parte do livro, denominada O Engenho de seu Lula, onde o autor volta

ao período de 1850, origem do engenho Santa Fé. Para posteriormente retratar um

mundo em extinção, o cenário onde o próprio autor viveu sua infância. Entre as obras

de José Lins do Rego que descrevem o nordeste da cana-de-açúcar, a mais descritiva

da ruina dos engenhos é Fogo Morto, na qual o aponta para o final da produção nos

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engenhos. “Fogo Morto” é a expressão utilizada para engenhos que interromperam a

sua atividade, em uma referência às fornalhas apagadas.

O romance mostra a vida do homem rural, o forte poder patriarcal nas relações

sociais do nordeste, o coronelismo, a manipulação do governo e suas instituições, a

violência seja ela perpetrada pela polícia, ou pelos jagunços e cangaceiros. Na primeira

parte do livro aparece o personagem do mestre José Amaro em sua condição de

morador do engenho e submetido ao poder dos coronéis e ao sistema patriarcal.

Angustiado cada dia mais, pois, com o advento da mecanização e das cidades, o

mesmo se ver compelido pelo senhor de engenho a deixar a terra onde mora de favor.

Esta parte demonstra a relação entre o proprietário e o homem pobre do campo,

morador de favor.

Na parte terceira do livro em questão, o processo de decadência do engenho Santa

Fé é visível assim como a violência na sociedade, seja por parte da polícia, seja pela

ação dos jagunços e dos cangaceiros. Estes últimos, apesar de não se subordinarem a

os coronéis, mantém com eles estreitos laços de lealdade.

CONCLUSÕES

Portanto, pode-se verificar que o romance de José Lins do Rego, traz consigo

uma grande carga emocional, já que o mesmo contém o cenário e possíveis memórias

do autor. Quanto à economia retratada na supracitada obra, bem como as relações

sociais. Com o devido apoio de teóricos sobre a zona canavieira nordestina, pode-se

concluir que o autor retrata a situação de dependência e insegurança vivida pelos

moradores de favor nos engenhos.

Com a industrialização da produção do açúcar esses moradores são quase extintos

passando a existir o trabalhador autônomo, geralmente vivendo na periferia das cidades

da zona canavieira. A relação de dependência se perpetua, só que os trabalhadores

não são mais trabalhadores servis ou com regime de semi-servidão, apenas devido à

própria condição de vida que foi perpetuada pelo canavial, a saber, analfabetismo,

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desnutrição entre outros tantos males, a sua dependência só se transportou para outro

lugar. A “ponta de rua”.

Em fim, as consequências do cultivo de uma planta autofágica, foram além do

objetivo mercantilista do lucro, formaram uma população doente, desnutrida, pobre e,

analfabeta, cujo ciclo miserável, já difícil de ser rompido, ainda conta com o Estado para

protegê-lo.

REFERÊNCIAS

CARVALHO, Z. C. Rosto e Mascara do Senhor de Engenho de Pernambuco (1822-1888). Recife: Fundação Joaquim Nabuco – Editora Massangana, 1988.

CASTRO, J. Geografia da fome, 11ª Ed. Rio de Janeiro: Gryphus, 1992.

DABAT, C. R. Moradores de engenho: relações de trabalho e condições de vida dos trabalhadores rurais na zona canavieira de Pernambuco segundo a literatura, a academia e os próprios autores sociais. Recife: ed. Universitária da UFPE, 2007. FERLINI, V. L. A. A civilização do açúcar. 11ª ed. 1ª reimpressão. São Paulo: Editora Brasiliense, 1998.

FRANCO, G. H. B.; FARNAM, H W.Shakespeare e a Economia. [tradução do texto de Farnam por Pedro Maia Soares e dos trechos da obra de Shakespeare por Barbara Heliodora]. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2009. A economia em Machado de Assis - O olhar oblíquo do acionistahttp://www.economia.puc-rio.br/gfranco/MDA_sumario_cap1.pdf, acesso em 10/09/2013. A economia em Pessoa - Verbetes contemporâneos e ensaios empresariais do poetahttp://www.zahar.com.br/sites/default/files/arquivos//t1160.pdf, acesso em 10/09/2013.

Fogo morto: violência e opressão no sertão coronelista: http://www2.marilia.unesp.br/revistas/index.php, acesso em 10/09/2013. O Amargo Sabor do Açúcar: personagens femininas em Fogo Morto, de José Lins do Rego http://repositorio.ul.pt/bitstream/10451/1708/1/21659_ulfl071877_tm.pdf, acesso em 10/09/2013.

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Cidadania e leitura literária em contexto escolar: diálogos com o plano nacional do livro e leitura

Nascimento, Cícera Maria do Estudante de mestrado do Programa de Pós-Graduação em Educação

Contemporânea – UFPE/CAA [email protected]

CUNHA, Kátia Silva

Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação Contemporânea – UFPE/CAA

[email protected]

RESUMO: O presente artigo está inserido no contexto da pesquisa do mestrado em Educação Contemporânea da UFPE/CAA, na linha de pesquisa Educação, Estado e Diversidade, cujo objeto é a política para formação de leitoras(es), na perspectiva do Plano Nacional do Livro Leitura, efetivada na Rede Municipal de Ensino de Caruaru/PE. Por se tratar de trabalho iniciado este ano (2014), ainda não dispomos de resultados, sendo o texto aqui apresentado, resultado da construção do aporte teórico da pesquisa. Nesse sentido discorremos: O Centro Regional para o Fomento do Livro para a América Latina e o Caribe (CERLALC), ao incentivar seus países membros a criarem planos do livro, leitura e bibliotecas traz como uma das justificativas que, o acesso ao livro e à leitura promove a participação cidadã das populações dessas regiões. No Brasil, é apresentado à sociedade o Plano Nacional do Livro e Leitura (PNLL) em 2006. Publicizado como marco na consolidação de políticas públicas de leitura, nele são apresentadas, dentre outras propostas, ações de leitura e cultura que se propõem ressignificar as práticas sociais e culturais com o livro, a leitura e as bibliotecas. O documento enfatiza a influência desses elementos para a construção de sociedades democráticas e para exercício da cidadania, sendo a escola uma instituição imprescindível para o sucesso dessa empreitada. Considerando que as políticas educacionais atuais, hegemonicamente, enfatizam os resultados dos índices de desempenho e que a política de leitura propõe ressignificar as práticas sociais e culturais de leitura, com ênfase para a consolidação da democracia e o exercício da cidadania, no presente artigo problematizamos sobre as condições para a efetivação dos objetivos da política de leitura apresentada no PNLL, dadas as contradições desses objetivos com a política educacional em vigência no Brasil. Na intenção de atendermos aos objetivos do texto, consideraremos o entendimento de Pinsky (2013), de que a definição de cidadania não é estática, mas histórica, por isso, sujeita ao tempo e espaço em que é forjada. Dessa forma, a partir do Plano Nacional do Livro e Leitura, discorreremos sobre a definição de cidadania que esse contempla e a problematizamos com as possíveis contradições que essa pode encontrar para a efetivação de ações de leitura literária em contexto escolar.

PALAVRAS-CHAVE:Cidadania. Leitura literária em contexto escolar. Plano Nacional do Livro e Leitura.

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Introdução

No decorrer da história da humanidade o acesso à leitura e ao livro está

permeado por conflitos, repressões e contradições. Para os romanos antigos,

por exemplo, possuir ‘livros’ era demonstração de poder, tanto que, em algumas

imagens da época, não raro, aparece a representação de homens exibindo suas

tabuinhas.

A hegemonia da igreja católica romana, introjetou na sociedade europeia

a censura e a disseminação de que somente o clero estava apto a fazer a

mediação entre o livro e o leitor, principalmente se esse leitor fosse uma mulher,

dado o caráter pernicioso que a leitura seria capaz de desencadear em uma

pessoa desgovernada. Conforme Chartier (1998, p. 23), as relações com a

chamada “cultura escrita é inseparável dos gestos violentos que a reprimem”.

Nos processos de colonização dos espaços invadidos, uma das medidas

tomadas pelas metrópoles era o de proibir a produção e circulação de livros nas

colônias. No Brasil, por exemplo, somente três séculos depois da ocupação

portuguesa, e ocasionada pela estadia da corte de D.João VI no Rio de Janeiro,

foi criada a Imprensa Régia.

A leitura, considerado o fator preponderante, foi na chamada Idade Antiga,

símbolo destatus; na Idade Média e ainda na Moderna, de perniciosidade. No

entanto, foi à insistência burguesa em viabilizar um modelo de sociedade

embasada na mentalidade de igualdade social e principalmente política, que a

leitura ganhou expansão institucional irreversível (ZILBERMAN; SILVA, 2005).

No Brasil, a substituição do governo monárquico para o republicano

impeliu o desenvolvimento das cidades e com elas a expansão de uma classe

social intermediária entre a aristocracia rural e a alta burguesia (LAJOLO;

ZILBERMAN, 1988). Entretanto, mesmo com a intenção da classe culturalmente

dominante, de agregar valor simbólico positivo à leitura como elemento do

progresso brasileiro, na transição da Monarquia para a República, somente na

década de 1937 ações políticas visando a formação de leitoras(es) no Brasil

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foram ensaiadas. No entanto, mesmo com a carência de políticas direcionadas

para o acesso ao livro e à leitura de literatura, não significa dizer que práticas de

leitura não se encontravam no solo da escola. Utilizada na escola moderna como

meio para repassar lições de coisas (MEDINA, 2012), a leitura literária desde

cedo serviu como instrumento para pedagogização dos mais diversos temas

abordados, desde a incitação ao ufanismo até conteúdos das ciências naturais.

Marco da instituicionalização das ações de leitura no Brasil é a criação do

Instituto Nacional do Livro (INL), fundado em 1937, em plena vigência do golpe

do Estado Novo, perdurou até o ano de 1990, sendo o órgão governamental

responsável pela política do livro e da leitura. No entanto, por figurar parte da

sua existência em períodos de governos ditatoriais - como o Estado Novo (1937

a 1945) e o golpe militar (1964 a 1985), serviu muito mais como instrumento de

repressão e censura do que para gestar políticas em prol da difusão do livro e

da leitura (ROSA; ODDONE, 2006).

Após a extinção do INL, o investimento em programas e planos com

objetivos de promover o fortalecimento da democratização do acesso e do

fomento à leitura e à literatura literária em contexto escolar, se apresenta através

de programas como o Programa Nacional de Incentivo à Leitura (PROLER),

inaugurado em 1992,visando à valorização social da leitura e em 1997 o Plano

Nacional de Biblioteca da Escola (PNBE), que tem como ação mais evidente a

distribuição de livros para a constituição da Biblioteca Escolar.

Após dezesseis anos da extinção do Instituto Nacional do Livro e

representando diversas articulações políticas é apresentado à sociedade

brasileira o Plano Nacional do Livro e Leitura (PNLL). Publicizado como marco

da busca de consolidação de políticas públicas de leitura no Brasil, o Plano está

sob a responsabilidade e parceria dos Ministérios da Cultura e da Educação, por

meio da portaria interministerial nº 1.442 de 10 de agosto de 2006. Nele são

apresentadas ações de leitura e cultura que se propõem ressignificar as práticas

sociais e culturais com o livro, a leitura e as bibliotecas; nortear ações para

formação de agentes de leitura; estimular o comprometimento da sociedade civil

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organizada; assim como, buscar estratégias para responsabilizar estados e

municípios na efetivação das propostas apresentadas no documento.

Conceito de cidadania no Plano Nacional do Livro e Leitura

O Plano Nacional do Livro e Leitura enfatiza a influência da leitura na

construção de sociedades democráticas e no exercício da cidadania. Nesse

sentido a apresentação do ministro de estado da educação, Fernando Haddad,

sintetiza:

As diretrizes para uma política pública voltada à leitura e ao livro no Brasil (e, em particular, à biblioteca e à formação de mediadores), apresentadas neste Plano, levam em conta o papel de destaque que essas instâncias assumem no desenvolvimento social e da cidadania e nas transformações necessárias da sociedade para a construção de um projeto de nação com uma organização social mais justa (BRASIL, 2006, p.8).

Ao fazer referência ao papel de destaque que a biblioteca e a formação

de mediadores representam para o desenvolvimento social e da cidadania o

PNLL ressalta que: “Deve haver escolas que saibam formar leitores, valendo-se

de mediadores bem formados (professores, bibliotecários) e de múltiplas

estratégias e recursos para alcançar essa finalidade” (BRASIL, 2006, p. 16),

sendo que:

O desafio de tornar a leitura literária um patrimônio de todos os brasileiros exige ações como as que o MEC vem promovendo e precisa ir além. Este éum dos sentidos do PNLL: agregar todos os esforços disponíveis para superar históricas desigualdades no acesso ao livro e à leitura, formar mediadores, estimular a produção editorial e fortalecer, na sociedade, o valor do livro como instrumento de promoção de uma vida melhor para todos e para cada um (MARQUES NETO, 2010, p. 29).

Ao assinalar a política para acesso ao livro e à formação de leitoras(es)

de literatura literária que visam o contexto escolar enquanto sustentáculo para o

fortalecimento da democracia e a promoção da cidadania (BRASIL, 2006),

trazemos o sentido de cidadania enquanto condição de acesso aos bens

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culturais produzidos pela humanidade e dentre esses bens o texto literário

enquanto possibilidade de fruição, inclusive conforme o texto do Plano Nacional

do Livro e Leitura apresenta:

A partir do ato da leitura podemos então desenvolver um certo número de operações cognitivas, hierarquizando os argumentos, comparando os enunciados, descartando idéias que pouco nos agradam, destacando outras e colocando aquelas que mais apreciamos em contato com idéias e enunciados de outros livros, de outros temas, de

outros autores, de outros mundos (BRASIL, 2006, p. 2).

Conforme Pinsky, “Cidadania não é uma definição estanque, mas um

conceito histórico, o que significa que seu sentido varia no tempo e no espaço”

(PINSKY, 2013, p. 9). Assim considerada, a cidadania foi tomada de múltiplos

sentidos ao longo da história ocidental partindo dos hebreus até os nossos dias.

Entretanto, foi a consciência histórica da desigualdade, desencadeada a partir

século XVII e que impulsionou as revoluções burguesas que apresenta as

condições históricas onde floresce o conceito de cidadania que nos debruçamos

na atualidade. No cerne desses movimentos estava a reivindicação por

condições de vida justa, baseada nos direitos civis e políticos. Marcos dessa

postura foi a Revolução Inglesa, a Revolução Americana e a Revolução

Francesa. A partir desses marcos da história ocidental o conceito

contemporâneo de cidadania vem se configurando.

Portanto, a definição de cidadania, no nosso tempo, está imbricada no

seio das lutas pela consolidação dos direitos sociais, que vieram à tona no século

XX. Mesmo que, de acordo com o entendimento dos direitos humanos (BOBBIO,

1992), não se possa pensar na garantia de direitos quando estes são

apresentados de forma fragmentada, e, com o advento das pressões sociais,

intensificadas no século XX, que fica marcada as condições para a consolidação

da cidadania plena enquanto expressão concreta do exercício da democracia

para homens e mulheres.121

121 Termo utilizado por Jaime Pinsky que destaca: “Exercer a cidadania plena é ter direitos civis, políticos e sociais.” (PINSKY; PINSKY, 2013, p.9).

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Contradições na efetivação de ações de leitura literária em contexto escolar

No Brasil, a ausência de políticas públicas de leitura, permanentes e

articuladas que contemplem os diversos segmentos da sociedade, contribui para

os baixos índices de leitura no país comprometendo as condições concretas para

o exercício da cidadania plena. Nesse sentido o PNLL destaca:

É importante observar que, embora nas sociedades atuais a leitura seja imprescindível para o ingresso no mercado de trabalho e para o exercício da cidadania, no Brasil as pesquisas e as avaliações educacionais apontam para a precária formação de um público leitor e revelam o fracasso das ações envolvidas na solução do problema (BRASIL, 2006, p. 12).

Pesquisas divulgadas sobre as habilidades e práticas de leitura da

população brasileira,122 demonstram o quanto as ações que objetivam mudar

esse quadro de exclusão têm que ser desenvolvidas com urgência. Essa

ausência de políticas sociais efetivas que busquem a afirmação dos direitos

fundamentais como o da educação e, portanto, o direito à leitura, são

representativas da atual configuração política preponderante nos países

capitalistas, que seguindo as orientações das agências internacionais

multilaterais implantam modelos de educação de cunho neoliberal que buscam

a manutenção do sistema econômico hegemônico.

As políticas educacionais concebidas nas últimas décadas do Século XX – e em desenvolvimento nesse início de Século XXI –devem ser compreendidas no âmbito das transformações econômicas, geopolíticas e culturais em curso no mundo capitalista contemporâneo. As reformas educativas implementadas atualmente, na maioria dos países da América Latina, são decorrentes portanto, do processo de reestruturação pelo qual passa o capitalismo mundial sob a égide dos princípios neoliberais (CABRAL NETO, 2007, p. 13).

Sob a égide dos princípios neoliberais, a promoção da leitura enquanto

inserção crítica no mundo fica relegada a ações pontuais e a cidadania enquanto

122 Dentre essas, o Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf), criado pelo instituto Paulo Montenegro a

partir2001; a Retratos da Leitura no Brasil que teve sua 3ª edição divulgada em março de 2012; o

Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (PISA) iniciado em 2000 e o qual também é utilizado

como referencial para o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb).

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princípio de autonomia e formação humanística se vê ameaçada, pois a busca

da efetivação de uma política educacional que prioriza os índices desemboca na

instrumentalização da educação, logo na instrumentalização dos sujeitos. Uma

das repercussões das políticas de resultado, evidenciada pela busca

desenfreada de índices, em escolas onde há bibliotecas e uma equipe que

planeja e desenvolve ações de estímulo à leitura literária, fortes conflitos se

desencadeiam. Nesse cenário, temos de um lado uma prática educativa que

apresenta aos sujeitos escolares a possibilidade da leitura enquanto fruição e

conflito, enquanto de outro lado temos as pressões desencadeadas para

alcançar as metas apresentadas pelo Índice de Desenvolvimento da Educação

Básica (IDEB).

Além dos elementos apontados sobre os conflitos visíveis entre a

perspectiva para a formação de uma sociedade leitora, inclusive se

considerando a escola enquanto organização fundamental para o sucesso desse

objetivo, explicitado no PNLL e as políticas educacionais hegemônicas no Brasil,

nos debruçamos na questão de que a literatura literária, sendo arte, é

considerada pela escola como subversiva, pois apresenta possibilidades de

instigar os sujeitos a interlocuções efetivas com o meio social, estimulando-os à

criatividade e à crença de que a realidade é passível de mudança. Nessa

perspectiva Antônio Cândido nos apresenta:

[...] nas mãos do leitor o livro pode ser fator de perturbação e mesmo de risco. Daí a ambivalência da sociedade em face dele, suscitando por vezes condenações violentas quando ele veicula noções ou oferece sugestões que a visão convencional gostaria de proscrever. No âmbito da instrução escolar o livro chega a gerar conflitos, porque o seu efeito transcende as normas estabelecidas (CANDIDO, 2004, p. 18).

Segundo (PAIVA, 2005), a construção do prazer pela leitura não se dá

sem uma mediação articulada. Neste caso, a mediação deve se propor ao

desenvolvimento de habilidades leitoras, pois o puro discurso da leitura por

prazer, pode se perder ou na complexidade do texto que distancia o leitor(a) em

dado momento, ou senão pela pura falta de atrativos, desafios. Nesse sentido

as ações que buscam a formação leitora consideram que “quando falamos de

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livro e leitura falamos, portanto, de expansões e de potencialidades” (BRASIL,

2006, p. 4). Desafio que se coloca nas ações planejadas e desenvolvidas no

contexto escolar, haja vista, os elementos já destacados a respeito da

instrumentalização da leitura literária que historicamente se apresenta na escola,

assim como no âmbito exigências apresentadas pelas políticas educacionais

hegemônicas na atualidade.

Considerando o exposto, percebemos que fortes contradições aparecem

entre as políticas de cunho neoliberal que também perpassam a escola através

da cobrança de índices de desempenho pautados na meritocracia e na

competitividade, onde a criação de ambientes que possibilitem a formação de

um leitor(a) crítico encontra resistências, tanto pelo projeto de educação que tem

se firmado nas escolas, como pelo tratamento que a leitura literária recebe no

contexto escolar, onde a ênfase na pedagogização dos textos elimina as

possibilidades de uma leitura compromissada com a leitura do mundo e as

significações que o sujeito leitor lhe confere, sendo tornada centro para execução

de exercícios didáticos.

Considerações finais

A literatura literária provoca conflitos porque possibilita o acesso às

variadas formas de relações humanas. Assim sendo, quem dela se aproxima

está exposto às provocações que a realidade desencadeia. Levando em

consideração esse fato suspeitamos que, no contexto escolar seja, muitas vezes

e de diversas formas, perseguida e execrada por se colocar em oposição à

formação de sujeitos passivos. Outro elemento que destacamos enquanto

desafio para o desenvolvimento de ações para a formação de leitoras(es) de

leiteratura literária em contexto escolar, está relacionado com o saber fomentado

através dessa modalidade de leitura, saber esse que não pode ser quantificado,

muito menos em curto prazo.

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Nesse intuito, inquirimos na perspectiva da promoção da cidadania

justificada pelo CERLALC, em um Estado com políticas educacionais de cunho

neoliberal, que têm como foco a quantificação dos resultados. No que se refere

à promoção da cidadania o CERLALC se coloca como agente de incentivo e

acompanhamento de projetos desenvolvidos por seus países membros “que

tenham relação com a leitura e com a escrita e a liguem à auto-estima, à inclusão

social, à criatividade e à participação cidadã” (LÓPEZ; HOYOS, 2011, p. 103).

As atuais políticas de educação desenvolvidas no Brasil são

hegemonicamente de cunho neoliberal ao empreenderem medidas que

contribuem para a precarização da educação, quando estabelecem como meta

ações que contemplam a lógica do mercado capitalista, responsabilizando

sujeitos e instituições escolares pelos fracassos e sucateamento da educação.

Nossa busca em compreender como através do Plano Nacional do Livro

e Leitura do Brasil têm sido efetivadas ações, em contexto escolar, para a

formação de leitoras(es) de literatura literária, se justifica porque também

sabemos que, dentro das contradições apresentadas no contexto escolar, são

desenvolvidas ações que buscam fortalecer as práticas de leitura literária, tendo

como foco os eixos do Plano Nacional do Livro e Leitura, em diversos municípios

brasileiros, dentre esses destacamos Agrestina, Altinho e Caruaru, os três do

estado de Pernambuco. Os referidos municípios desenvolvem nas escolas das

suas redes ações que incidem na formação de mediadoras(es) de leitura e no

acesso ao livro e à leitura, norteadas pelo projeto Escola Leitora,123 tendo em

vista que de acordo com Liszt Vieira “A cidadania deve ser vista como uma

atividade ou uma prática, e não – como sustentam os liberais – simplesmente

como o status de pertença” (VIEIRA, 2001, p. 40) [grifos do autor].

A partir do exposto a respeito do processo de construção de políticas do

livro e leitura no Brasil, considerando que, a formação de leitoras(es) de literatura

literária em contexto escolar acontece permeada por relações de/em conflito

123 Até o ano de 2014, o referido projeto foi implantado em escolas dos municípios pernambucanos de

Agrestina e Altinho, entre 2010 a 2012 e em escolas do município de Caruaru, começou a ser implantado

em 2007, quando foi firmada parceria com a organização não governamental Bagulhadores do Mió.

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entre o que as próprias políticas educacionais conceituam como leitura e os

papéis que a leitura, no nosso caso, a leitura literária, é significada na sociedade

e como no contexto escolar as ações se materializam, é o que motiva nosso

questionamento sobre como através do Plano Nacional do Livro e Leitura

(PNLL), têm sido efetivadas ações, em contexto escolar, para a formação de

leitoras(es) de literatura literária na Rede Municipal de Ensino de Caruaru/PE?

Nosso percurso converge na busca da escuta dos sujeitos escolares envolvidos

no processo que visa consolidar a política para formação de leitoras(es) de

literatura literária, com vistas a dois eixos do PNLL: democratização do acesso;

fomento à leitura e a formação de mediadoras(es). Nossa hipótese nesse

sentido, é a de que ações objetivando a formação de leitoras(es) de literatura

literária acontecem no contexto escolar. Dessa forma, nossa busca é a de

compreender, mediante o diálogo das ações materializadas, de aporte teórico e

das categorias teóricas emergentes no Plano Nacional do Livro e Leitura, como

acontece a materialização dessas ações em meio às contradições inerentes à

política de índices e as condições para o exercício da cidadania plena.

Referências

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Digitalização de Documentos Históricos: Um Relato de Experiência

Luiz Henrique S. C. de Melo1, César França1,2, Rodrigo Lopes1

1FAFICA – Faculdade de Filosofia Ciências e letras de Caruaru. Caixa Postal 55.000.000 – CARUARU – PE – Brasil

2Centre for Advanced Studies and Systems at Recife – C.E.S.A.R Recife-PE, Brazil

[email protected],{cesar, rodrigo.lopes}@fafica.edu-pe.br

Abstract: This article reports the experience of digitization of historical documents belonging to the Faculdade FAFICA, in Caruaru, Brazil. We described the forms used, scanning equipment, as well as all the techniques acquired through research by our team to start the project. As a reference, we use projects already carried out by some research groups and companies have developed work of scans. However we improved and added information on this project that may be useful for those that need to carry out digitalization activities in the future.

Resumo: Este artigo relata uma experiência de digitalização de documentos históricos pertencentes à Faculdade FAFICA, em Caruaru, Brasil. Nós descrevemos as formas usadas, equipamentos para digitalização, assim como todas as técnicas adquiridas através de pesquisas feitas por nossa equipe para inicio do projeto. Como referência, usamos projetos já realizados por grupos de pesquisa e empresas que desenvolveram trabalhos de digitalizações. Contudo aprimoramos e acrescentamos informações neste projeto, que podem ser úteis para aqueles que forem executar atividades de digitalização no futuro.

Introdução

Em 2014, a FAFICA, Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Caruaru, por meio do

NUPESQ, Núcleo de Pesquisas da FAFICA, tomou a iniciativa de desenvolver um

projeto visando a digitalização de documentos históricos adquiridos da Diocese pela

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instituição de ensino superior (FAFICA).Tal iniciativa visava a melhor manipulação

destes documentos em finalidade de estudos e pesquisas pelos próprios alunos ou até

mesmo de terceiros.Além de disso, proporciona uma melhor preservação de seus

originais, possibilitando um armazenamento próprio,uma vez que o contato diretode

pesquisadores com os documentos originais seria significativamente reduzido.

Os documentos tratados neste projeto têm décadas de existência, alguns com mais de

100 anos, e encontravam-se em estado de risco de degradação.Somando-se a isto, a

própria Faculdade já continha outros documentos antigos em seu acervo, pertencentes

à um jornal local cuja circulação data do século passado, e que já haviam sido doados

à faculdade no advento do encerramento das atividades do jornal. Sendo assim, o

NUPESQ enxergou a tecnologia da informação como um meio de preservar e facilitar o

acesso a essas valiosas fontes históricas de pesquisa.

Esse artigo tem como objetivo, portanto,descrever uma experiência de preparação

para a digitalização dos documentos históricos, isto é, relatamos em detalhes as

pesquisas bibliográficas iniciais sobre estratégias de digitalização e cuidados

necessários para a lida com os documentos sensíveis (Seção 2), a elaboração de um

processo de digitalização (Seção 3), e a avaliação da eficácia do processo, bem como

das lições aprendidas com a tentativa de validação do processo com um conjunto de

documentos não-sensíveis (Seção 4). Por fim, apresentamos as conclusões e as

contribuições deste trabalho para a literatura.

Revisão Bibliográfica

A conservação de informações escritas em papel é um problema de grande

importância para arquivos, bibliotecas, responsáveis por pequenos ou grandes acervos.

O papel ainda é considerado o principal instrumento de armazenamento da maioria dos

conhecimentos de nossa civilização. Portanto, a relevância do problema da digitalização

destes documento é proporcional ao valor atribuído às informações que tais documentos

carregam.

O homem (como ser humano) sempre sentiu a necessidade de deixar anotado

seus feitos, seus sentimentos, suas vitórias e derrotas, duas interrogações e repostas,

enfim sua passagem pelo mundo. Uma das formas de expor essa necessidade é através

do papel, e este por sua vez exige condições estáveis dos níveis de temperatura ou

umidade para o seu manuseio e ideal conservação. Quando um objeto e mantido

em condições adequadas de armazenamento e exposição, os fatores de

degradacaosao estabilizados, necessitando apenas a sua conservacao, como por

exemplo, higienizacao, controle de insetos, entre outros.

A degradacao de um objeto e um processo natural de envelhecimento e

resultante de reacoes que ocorrem em sua estrutura, na busca de um equilibriofisico-

quimico com o ambiente. Alem do processo natural, existem os fatores externos que

podem acelerar a deterioracao. Os fatores ambientais sao as causas principais da

deterioracao dos materiais e influenciam diretamente na permanencia do objeto.

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Segundo CONARQ (2005) os documentos devem ser armazenados em locais

com condições climáticas adequadas pelo tempo de guarda, tempo este estabelecido

em tabela de temporalidade e destinação (Figura 1).

Segundo FARIA (2006):

Tabela de temporalidade é o instrumento com o qual se determina

o prazo de permanência de um documento em um arquivo e sua

destinação após este prazo, pois existem documentos que devem ser

guardados por mais tempo como os relacionados às áreas contábil,

fiscal, financeira e pessoal. Ela é muito utilizada pelos órgãos

públicos, é importante frisar que a eliminação de documentos de

arquivos, devem obedecer às normas do CONARQ, em destaque os

documentos produzidos por todos os órgãos integrantes do poder

público.

Faria (2006, p.35).

Figura 1 - Exemplo de tabela de Temporalidade

FARIA (2006) descreve uma experiência em que a aplicação da tabela de

temporalidade ajudou a aumentar de forma significativa o tempo de conservação dos

documentos estudados, dadas as condições ideais do ambiente e tempo de

armazenamento de cada tipo de documento. No entanto a decomposição ainda era uma

realidade.

Após anos de pesquisa em conservação e prevenção de documentos, estudiosos

constataram que era impossível armazenar um documento de papel por mais de uma

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década, sem que o mesmo não sofresse desgaste, pois já seria de sua natureza

desgastar-se. A partir desta conclusão, estudos intensificaram-se em propor soluções

para o armazenamento do conteúdo escrito no papel. Uma soluções apresenta por

Kurzweil (1975) sugere a utilização do scanner, através o qual o conteúdo exposto no

papel poderia ser digitalizado e armazenado em mídias lógicas de computadores e seu

tempo de preservação passaria a ser indeterminada. Além disso, seu conteúdo poderia

ser acessado e usado remotamente por meio da internet.

Figura 2 - Sala com condições ideais de armazenamento de documentos - (Foto do arquivo histórico de Jaraguá do Sul)

A Câmara Técnica de Documentos Eletrônicos - CTDE, do Conselho Nacional

de Arquivos – CONARQ, define digitalização como o “processo de conversão de um

documento, emqualquer suporte ou formato, para o formato digital, por meio de

dispositivo apropriado”.Portanto, digitalizar significa transformar a informação de um

documento convencional, definido como entidade física, em um conjunto de dígitos

binários, possíveis de serem lidos por um computador. Diversas organizações, como é

o exemplo da EMBRAPA (2006), vêm adotando então a técnica de digitalizar

documentos para preservar seu conteúdo. Tais experiências servem de exemplo para

outras entidades que têm interesse de iniciar o mesmo processo de conservação,

apontando os fatores positivos e negativos.

Aprofundando as pesquisas, vimos a necessidade de ter a certeza de não

estarmos realizando projetos de outras entidades ou similares e constar que seriam

idéias nossas, por isso realizamos pesquisas para constatar a originalidade do

procedimento aqui descrito. Em pesquisa no site “arquivo.com”, na revista digital

“faa.edu.br” e no próprio “Google.com” vimos que autores como PENA,2009, realizaram

trabalhos com certa semelhança, mas não com as dificuldades que enfrentamos,

tomamos soluções como a adoção de métodos para digitalizar folhas com dobras e

frágeis. Para isso nos veio a idéia de se usas uma folha de papel sintético reengrossado,

que é colocado em baixo da folha digitalizada assim o scnner captura a mesma de forma

plana e adequada, nos dando uma melhor qualidade de imagem.

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O objetivo principal da presente pesquisa está na necessidade de armazenar

conteúdos de documentos em papel afim de conserva-los. Com o avanço da tecnologia,

esse processo de digitalização se torna a cada dia menos complexo e mais acessível,

uma vez que existem à disposição, no mercado, equipamentos de alta resolução em

diversos tamanhos e qualidades. No entanto, é preciso ressaltar que mesmo

apresentando-se como uma solução atrativa para o problema apresentado, o processo

de digitalização ainda apresenta um obstáculo relacionado com o manuseio adequado

do material a ser digitalizado.

Metodologia

O senso comum pode nos levar à interpretação de que o processo de digitalização trata-

se apenas de “colocar um papel em um scanner e transportá-lo para a tela de seu

computador”.No entanto, este entendimento é bastante limitado.O processo de

digitalizar documentos écomplexo, na verdade, tendo em vista a necessidade de uma

seguir orientações, de lidar com diferentes formas como descritas em CONARQ (2010)

e FARIA (2006), da forma de gerenciar organizacionalmente o projeto de digitalização

com o uso de tabelas para fazer a sistematização e divisão dos documentos

digitalizados de forma física (SILVA, 2000), ou de realizar o mesmo processo de forma

lógica, com o uso de banco de dados centralizados, disponibilizando seu conteúdo na

web MORESI (2002).

Outros pontos que devem ser levados em consideração são:

a forma de manuseio do material a ser digitalizado, uma vez que o papel em sua composição já é um material frágil e fácil de danificar, e em alguns casos ao tratar com documentos de tempo de existência consideravelmente antigos, devemos ter ainda mais cautela em seu manuseio, o modo de segurar, posicionar junto ao scanner, pois pode levar a danificar o material, isso é de extrema gravidade pois levaria à perca da informação ali existente.

após a digitalização devemos ter o cuidado de verificar a qualidade do material digitalizado, todo o conteúdo deve estar legível e nítido.Para garantir a qualidade do material no nosso processo de digitalização, usamos o software PaintNet124 para realizar edição e composição dos documentos.

Para iniciar o processo, então, tomamos como referência os aprendizados

relatados em EMBRAPA(2006), e nos outros artigos citados na seção anterior. Tais

referências nos permitiram ter um melhor entendimento sobre os riscos que seriam

encontrados no desenvolver do projeto.

O Scanner selecionado para uso neste projeto foi o Onescan 2, do fabricante

Mile Soluções. Esse tipo de scanner é posto na parte superior da folha a ser digitalizada,

e próprio scanner faz a movimentação, digitalizando a mesma. Isto o torna capaz de

digitalizar folhas com mais de 40 centímetros de largura, por exemplo os jornais, através

da digitalização de faixas do jornal.Ao final, a junção das faixas digitalizadas é feita por

meio de um software, restaurando assim a imagem completa no computador.

124http://www.getpaint.net/

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Para avaliar então o processo de digitalização sem causar riscos diretos aos

documentos históricos, decidimos então experimentá-lo através da digitalização de 7

volumes de livros impressos dos anais do Encontro de Ensino, Pesquisa e Extensão da

FAFICA, que atualmente encontra-se em sua 13ª edição. Em sua oitava edição, tal

evento passou a produzir seus anais já em formato digital. Esta experiência, cujos

resultados estão descritos na seção seguinte, nos permitiu então extrair lições

aprendidas, que serão úteis para evitar danos aos documentos sensíveis quando estes

forem ser digitalizados.

Resultado

No desenvolver da parte prática do projeto, identificamos alguns desafios não-

previstos que são detalhados ao longo desta seção.

Uma vez que os objetos digitalizados tratavam-se de livros impressos e

encadernados em formato de brochura, algumas edições apresentavam o conteúdo das

páginas muito próximas ao centro, que causavam dois tipos de problemas (A e B). Um

terceiro problema deu-se por conta da espessura do papel utilizado nas impressões (C).

Os três problemas estão ilustrados na Figura 3 e descritos em detalhes a seguir.

Problema A: Ondulação da superfície digitalizada

Dependendo da quantidade de páginas, o livro a ser digitalizado não permitia uma

abertura suficiente para deixar a página a ser digitalizada plana, causando uma

ondulação.Esta ondulação representa um desafio pois ela dificulta o contato do Scanner

com o conteúdo mais interno impresso no livro, o que causa defeitos na imagem

digitalizada, chegando a torna-las até ilegíveis em alguns casos.

Problema B: Região Cega

O Scanner utilizado neste estudo possui uma área cega nas suas laterais, ou seja o

local de captura da imagem é quase que no centro do scanner. Próximo à uma de suas

margens há um conjunto de cilindros que, ao girarcom o arrasto do Scanner no papel,

são responsáveis por acionar a digitalização.

Sendo assim, a encadernação dos livrosem forma de brochura também causou

outro problema para fazer a digitalização das partes mais internas das páginas. Em

algumas situações, o leitor do Scanner responsável pela digitalização não conseguia

alcançar aquele conteúdo por causa dos obstáculos criados pelas bordas do próprio

dispositivo, ou tais obstáculos impediam o arrastodo dispositivo, consequentemente ele

não acionava a leitura.

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Figura 3 - imagem do scanner usado em um documento prototípico, com recurso da folha espessa

Problema C: Translucênciadas páginas

O terceiro desafio constituiu-se da transparência das páginas de alguns volumes dos

anais. Os anais digitalizados foram produzidos em anos diferentes, utilizando materiais

de qualidade diferentes, e encontravam-se em estágios de degradação distintos. Como

pode ser visto no exemplo apresentado na Figura 3, o Scanner captava a informação

das páginas do verso do papel, tornando a informação digitalizada, em algumas

situações,completamente ilegível.

Soluções adotadas

Uma das soluções adotadas foi o uso de uma folha de papel de espessura grossa, e de

dimensões maiores do que a página do livro como recurso para combater os problemas

A, B e C, porém com algumas limitações:

Problema A: A folha posicionada exatamente atrás da página que estava sendo submetida à digitalização contribuía para diminuir a curvatura da página, pois a sua espessura era grossa, e antes do início da digitalização, a folha era forçada cuidadosamente ao limite da brochura. No entanto, embora tenhamos sido suficientemente cuidadosos, foi possível observar que a adoção desta folha causava um pequeno desgaste na brochura dos volumes digitalizados.

Problema B: A dimensão da folha era maior do que a página que estava sendo digitalizada para permitir ao scanner rolar os cilindros ativadores após o término da lateral externa dos livros, possibilitando assim resolver o problema da área cega externa das páginas. As áreas cegas internas, no entanto, continuaram como um problema não resolvido.

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Problema C: O terceiro problema também foi parcialmente resolvido com

o auxílio da folha grossa. Parcialmente pois, dada a sua espessura, o scanner não era mais capaz de capturar a imagem da página posterior, contribuindo assim para a melhoria da qualidade da imagem digitalizada. No entanto, em alguns casos, a página impressa no verso ainda aparecia nas digitalizações, porém não observamos mais riscos ao entendimento do conteúdo.

Para facilitar a montagem das páginas digitalizadas nos softwares específicos, usamos

pastas de arquivos devidamente identificadas, nas quais eram depositados os arquivos

digitalizados. Seguindo este procedimento, foi possível concluir a digitalização das

aproximadamente 700 páginas dos anais do evento em apenas duas semanas.

Reflexão sobre o uso do procedimento com os documentos históricos

A experiência relatada nesta Seção, como citado anteriormente, teve a intenção de

avaliarmos os riscos que este processo traria à integridade física dos documentos

históricos. No entanto, a principal diferença é que os documentos que foram utilizados

não eram tão sensíveis e valiosos quanto os documentos históricos que são a principal

questão. Mesmo assim, esta experiência foi útil para identificar problemas que não

encontramos relatados na literatura, e que serão úteis para avaliar os riscos da

digitalização dos nossos documentos.

No que diz respeito ao formato da encadernação, os documentos históricos são

compostos tanto por volumes encadernados em brochura, quanto volumes soltos. É

possível constatar que o problema da curvatura da página será enfrentado em algumas

das obras. A solução da folha de grossa espessura parece ser adequada, embora ainda

tenhamos que desenvolver uma forma de evitar o desgaste da brochura. Observamos

também que, no caso das folhas quebradiças, ou seja, cujo papel já encontra-se em

avançado estado de decomposição, não serão apresentados os problemas A e C, pois

neste estado de composição o papel não apresenta mais curvatura nem translucência.

Conclusão

Este artigo teve como finalidade apresentar um relato de experiência sobre a

digitalização de documentos históricos na faculdade FAFICA. O texto relata apenas o

teste do processo de digitalização em documentos com um baixo nível de sensibilidade,

a fim de, baseado em nossas lições aprendidas, incrementar o processo e diminuir os

danos que tal processo podem trazer aos documentos históricos em questão.

Como descrito anteriormente, a digitalização pode trazer benefícios que incluem

desde a possibilidade de criar um programa de preservação adequada para estes

documentos, até a possibilidade de permitir o acesso às informações destes

documentos através do computador (e internet), diminuindo também os danos causados

pela operação deste material sensível pelos pesquisadores.

Vimos aqui neste artigo uma sugestão de processo de digitalização elaborada a

partir de experiências relatadas em pesquisas anteriores.Porém, o processo elaborado

apresentou três problemas principais que não foram previstos com base na literatura,

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relacionados particularmente com (a) a curvatura do papel, (b) as regiões cegas

causadas pelo modelo de Scanner adotado, e (c) a translucência do papel a ser

digitalizado. Adotamos uma estratégia de mitigação que aliviou os três problemas, mas

que ainda apresenta limitações a serem resolvidas em incursões futuras.

O próximo passo desta pesquisa será iniciar a digitalização pelos documentos

menos sensíveis, isto é, que apresentam um melhor estado de conservação. Assim,

será possível melhorarmos da nossa técnica de digitalização de forma incremental, até

que todos os documentos sejam devidamente digitalizados. As nossas intenções

incluem a disponibilização de todo este material na internet. Além disso, uma pesquisa

futura também irá estudar alternativas para reconhecimento de texto para permitir a

busca através de software nos documentos digitalizados, tornando ainda mais prática a

forma como os historiadores lidam com estes documentos.

Referências

Adriana Cox Hollós, A. P. (01 de Abril de 2010). CONARQ(2010). Acesso em 04 de

Setembro de 2014, disponível em www.conarq.gov.br:

http://www.conarq.arquivonacional.gov.br/media/publicacoes/recomenda/recomendaes

_para_digitalizao

CLAUDINA MARIA DUTRA MORESI, A. R. (2002). Estudo e digitalização da obra de

Guignard, pintor modernista . Estudo da obra do pintor modernista Alberto da Veiga

Guignard. Belo Horizonte-MG.

Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – EMBAPA(2006). Guia para

digitalização de documentos. Embrapa Informações Tecnológicas 2006. Brasili-DF:

Autoria Propria.

FARIA, C. R. (2006). USOS ELETRÔNICOS DO PASSADO: DIGITALIZAÇÃO DE

DOCUMENTOS E POLÍTICA DE ARQUIVOS. (pp. v.4, n.2, p. 3-16). Ria de Janeiro -

RJ: UNESP – FCLAs – CEDAP.

SILVA, A. /.. SILVA(2000). A DIGITALIZAÇÃO DE DOCUMENTOS HISTÓRICOS E A

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FAA, Nucleo de Informação de Tecnologia da. http://www.faa.edu.br/revista/v1_n1_art05.pdf. 2009. (acesso em Outubro de 2014).

google.com. google.com/metodos+de+digitalizacao+de+documentos+hidtoricos/. outubro de 2014. www.google.com (acesso em 24 de Otubro de 2014).

Pena, Carlo Verio. http://www.faa.edu.br. 2009. http://www.faa.edu.br/revista/v1_n1_art05.pdf (acesso em 24 de Outubro de 2014).

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Desafios e possibilidades no uso do conceito de: Cultura Política

Amelia Neta Diniz de Oliveira(UEPB)

José Adilson Filho(UEPB)

Resumo: Este trabalho visa compreender algumas discursões que estão sendo comumente postas em debate pelos historiadores e tem sido alvo de grandes e novos interesses, que é a temática de história e cultura política. Tais abordagens resultam das leituras e discursões propostas pelo grupo de estudos de “história e cultura política e cultura do tempo presente”, coordenado pelo prof. José Adilson Filho (UEPB) e tem como principal objetivo discutir como este campo tem sido recepcionada e largamente trabalhado pelos historiadores, bem como conceitua-lo segundo as abordagens de (MOTTA, 2009), GIRADET(1987) BURKE(2009) BLOCH(1993) a fim de discutir o conjunto de práticas que vem a constituir as culturas politicas existentes e os vários conceitos que perpassam e compreendem este campo tais como representações, tradições e valores. Estes conceitos e conjunto de práticas que acabam se legitimando e formando verdadeiros mitos políticos podem ser observados e analisados na verdadeira obra de representações de grandes mitos políticos reconhecidos até os dias atuais. Pretendemos com isso analisar a cultura política sobre a ótica das práticas legitimadoras do rei Luiz XVII a partir da obra de Peter Burke.

Palavras chaves : Cultura, politica, representação

Introdução

Neste artigo pretendemos analisar o conceito de Cultura Política, e de

que maneira ele vem sendo usado no meio acadêmico e meios sociais, pois

ultimamente ele é usado, inclusive na mídia, o que muitas vezes acabam se

tornando um problema, devido ao seu uso indiscriminado.

Pois devemos observar o conceito de cultura Política como algo amplo, que

segue regras, normas, e acima de tudo modelos históricos, não é tão simples

conceituar Cultura Política, pois faz parte de toda uma construção histórica, para

dar consistência a esse tipo de questionamentos e consolidação dentro do

campo da história política utilizaremos as de Raoul Girardet com seu livro Mitos

e Mitologias, Marc Bloch, e os “Reis Taumaturgos”, e Peter Burke, com “A

Fabricação do Rei” ambos são historiadores que trabalham com História cultural.

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Para os historiadores da história cultural, a cultura é uma rede de relações

econômicas, sociais e mentais, que são praticadas nos espaços de vivência

humana, formando uma teia de simbolismos que estabelece as identidades

particulares de cada cultura. Desta forma as práticas e experiências da vida

cotidiana dos indivíduos devem ser estudadas de forma a analisar seus impactos

dentro das tradicionais instituições dominantes e ajudando para uma explicação

de tais conceitos.

Apropriação do uso da Cultura Politica

Nos dias atuais é comum vemos as pessoas utilizando o termo de cultura política

muitas vezes, sem ter a mínima noção do que realmente sejam. É justamente

para isso que devemos tentar explicar tais questões sobre esse assunto, sendo

necessário uma breve explicação do tema. Podemos destacar de princípio os

estudos de Serge Bernstein e Jean François Sirinelli que visavam estudar

naquele momento o uso desse termo para estudar a história política francesa.

Esses estudos acabaram servindo posteriormente de base para outros

trabalhos, inclusive brasileiros, o que de certa maneira acabou sendo favorecido

pela hegemonia do paradigma Cultura lista, na atualidade é pecpitivél que a

cultura determina o desenrolar dos acontecimentos, da mesma maneira que

algumas décadas atrás pensavam que fosse a economia, serviam para

entender toda uma dinâmica histórica.

Logo assim o interesse por cultura política tem aumentado

consideravelmente nos últimos anos, dessa forma um interesse antes que era

discutido por intelectuais dentro das academias. Transpõe esses limites e agora

é deinteresse de outras áreas como a mídia, e porque não falar nos políticos e

outros órgãos sociais, é justamente nesse momento que surgir a necessidade

de entendemos e conhecemos esse termo, para que ele não seja usado de

maneira errônea ou generalizado.

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Não é o intuito desse trabalho rotular seu uso, ou tornar seu uso

inacessível, mas sim mostrar que quando não se sabe usá-lo corretamente ele

pode ser facilmente substituído por outros como, ideias políticas, discursos

políticos ou hábitos políticos que de fato é necessário lembrarmos é que seu uso

envolve um campo conceitual muito amplo é a partir dele podemos tentar explicar

um pouco de sua origem.

Conceito Antigo

Segundo MOTTA (2009) esse conceito teve sua origem no século XX,

mas as aspirações para constituição desse conceito são bem mais antigas, do

que imaginamos. Um dos influenciadores para construção dessa categoria

política, foi Tocqueville, que, que, que, que desenvolveu em seu livro, a

Democracia da Americano qual ele desenvolveu uma ideia de Organização

Política, que estavam diretamente ligado com as instituições e hábitos que

diretamente estão ligados a cultura de um povo.

Esse conceito acabou sofrendo ampliado também pelas ciências sociais,

e não podemos esquecer de citar da historiografia Alemã que desenvolveram o

conceito de Kultur, que entendiam que alguns povos eram superiores aos

demais. Logo assim entendemos que alguns povos eram culturalmente

superiores aos demais, o que podemos notar desde o início é que o uso de

conceito é marcado pela uma forte Hierarquização em compreensão de um povo,

seria culturalmente mais avançadas que os outros, ou ainda que esses

culturalmente não avançados, seriam em forma inferior ou incompleta.

Dessa maneira torna-se necessário desenvolver a cultura desses povos,

no Brasil esse conceito foi usado, antes de ter sido revisado pelas ciências

sociais, dessa maneira o Brasil era visto como país sem cultura, necessitando

assim de uma formação cultural, para esse povo inculto. Só em 1950 a 1960, o

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conceito de cultura política ganhou um status acadêmico, em meio as reflexões

das ciências sociais norte americanas.

Essas revistas que foram desenvolvidas tinham com intuito maior ampliar

o campo de discursões que se via muito limitado as influencias iluministas que

ao ver desses estudiosos, era insuficiente para estudar esse conceito. Logo

assim esses estudiosos começaram a formular hipóteses que levavam mais em

consideração, os próprios cidadãos enquanto importantes agentes importantes

para a Cultura Política.

Outro enfoque importante para estudar esse conceito de cultura política,

seria o fato de que precisavam se fortalecer o campo democrático, que viviam

em constante disputa entre o bloco socialista, logo assim tornasse necessário

estudarmos o porquê de tantas diferenças no Campo Político, para isso foram

necessárias influencias das pesquisas realizadas em Antropologia e

principalmente Psicologia pois elas eram capazes de nos fornecem elementos

para compreensão de ações políticas.

Que posteriormente acabam influenciando valores, sentimentos e

tradições de um povo, que acabam se transformando em Cultura Política,

mesmo sofrendo pequenas alterações, apresentados de três maneiras, sendo

elas: Cultura Política Paroquial, Cultura Política da Sujeição, Cultura Política

Participativa. Essa última caracterizam se como elemento de participação, que

acabou originando consequentemente a Cultura Cívica.

Esse conjunto de cultuaras acima mencionados, pode ser facilmente

caracterizado por subcultura política, uma vez que enquadramos várias culturas

em uma categoria, segundo o modelo de Almond e Verba. Como sabemos ao

longo do século XX os historiadores se apropriaram desse conceito de Cultura

Política, um deles foi Bernard Bailyn em seu livro As Origens Ideológicas da

Revolução Americana em 1967, no qual se aborda a influência de uma cultura

Anglo Americana, sobre os colonos que acabaram se rebelando e construindo

uma nova Nação.

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Tentativa de conceituar Cultura Politica

Não quero com isso afirma que houve uma generalização do seu uso, pois

de início poucos historiadores se interessaram pelo conceito, pois em sua

maioria se interessavam mais por História Econômica, só veio se apropriado de

fato pelos historiadores em 1980 e 1990, esse interesse aconteceu sobretudo na

França. Mas é de fundamental importância uma vez que esse conceito é usado

poderemos ampliar o campo político, renovando assim muitas abordagens

dentro do campo da própria história.

Dessa maneira torna-se mais que necessário tentarmos conceituar o de

fato seria a Cultura Política.

Uma definição adequada para cultura política, evidentemente influenciada pelos autores já mencionadas poderia ser: conjunto de valores, tradições, práticas e representações políticas partilhado por determinado grupo humano, que expressa uma identidade coletiva ou fornece inspiração para projetos políticos direcionados ao futuro.Importa_se ressaltar que a categoria representações está sendo entendida no sentido de “re_apresentar uma presença (sensorial,pespectiva)ou fazer presente alguma coisa ausente, isto é reapresentar como presente algo que não é diretamente dado aos sentidos “.Dessa maneira com base em enfoque de sentido amplo, representações configuram um conjunto que inclui ideologia, linguagem, memória, imaginário, e iconografia e mobilizam, portanto, mitos, símbolos, discursos. (Apud; Falcon, 2000:46).

Diante dessa possível conceituação podemos destacar alguns trabalhos

que dialogam com tais perspectivas na de Representação, trazer algo no

discurso que não estar presente que não é dado diretamente aos sentidos. Logo

assim podemos utilizar algumas obras para tornar ainda mais verídico, o próprio

conceito de Cultura Política, uma delas seria: A fabricação do Rei de Peter Burke,

e outra Os Reis Taumaturgos de Marc Bloch.

Marc Bloch em seu livro “Os Reis Taumaturgos” faz uma análise das

práticas de cura realizadas pelos reis, em especial na Inglaterra e na França, se

remetendo do século XIV até o século XVIII, ou seja, do seu auge até o momento

que o rito começa a entrar em decadência. É referindo-se justamente a este

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contexto histórico, que o autor nos traz uma importante contribuição para

analisarmos como estes reis taumaturgos que tinham o poder curativo do toque

realizavam estes ritos, podendo dar significações e grande importância ao poder

político vigente nesta época, chegando a sacralizar a imagem do rei e seu

governo absoluto. Chama-nos atenção ainda mais para os significados e a

importância que a cultura existente atribui a estes ritos, e como todo o contexto

social da época favorece as práticas representativas do poder monárquico, a

cura das escrófulas junto com todos os ritos que permeiam esta pratica

constituindo toda a pompa e glória da realeza.

Na mesma linha Peter Burke em seu livro a ‘Fabricação do rei' tratando-

se mais do século XVII e da política representativa da corte de Luís XIV, mostra

como já neste período a propaganda e a política de representação contribuem

para a elaboração da imagem e do poder do homem político, mostrando aquilo

que podemos chamar de “os bastidores da política” e de como o resultado destes

bastidores são absorvidos pelo público a que é dirigido.

Quando remete-se ao período referente a Idade Média o poder atribuído

a realeza conta com o apoio de uma instituição de alta importância e dominante

neste período, a igreja católica. Desde os primórdios do toque e da popularização

das curas das escrófulas a igreja já fazia parte desse ciclo e sacralizando esse

ritual composto por inúmeros simbolismos, a doença em si já era simbólica pelo

fato de ser uma peste que atingia as classes mais baixas da sociedade que

ávidos pela melhora recorriam a todo tipo de tentativa de cura que lhes fossem

indicados, chegando até a descoberta da cura pelo toque miraculoso dos reis.

Marc Bloch faz uma pesquisa detalhada da origem do toque até o que

motiva o seu fim. Mas, os meios importantes para pensarmos sobre a

legitimidade do poder e as permanências é questionarmos como esse ato

taumaturgo regulamentado pela igreja católica contribuiu para a existência

secular de uma monarquia sagrada vista como a representante do próprio Deus

na terra.

Em um contexto histórico em que a sociedade passa por grandes crises,

a busca por um milagre era constante, indo em direção ao grande representante

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do povo na terra, o rei, que ganha apoio da igreja recebendo o sacramento da

unção, a partir daí ninguém mais duvidará de seu poder, que, ungido com o óleo

santo, trazido pela pomba, praticado regularmente por ritos que legitimam seu

poder e o torna santo e deificado. Desde os primeiros relatos das práticas

taumaturgas e de sua sacralização percebemos o quanto é forte para um político

o apoio da instituição cristã e da criação de símbolos que possam andar junto

com os fiéis.

Eventos regulares colocavam os fiéis aos pés de seus reis para que eles

pudessem atuar e demonstrar seu status sagrado, não só a curar as escrófulas,

os reis também participavam de atos religiosos, distribuíam esmolas, sinais

régios, anéis medicinais ungidos por suas mãos santas, ou tudo que ele

houvesse tocado, da sua roupa até mesmo a água que usava para lavar as

mãos, a crença atribui valor curativo a tudo, uma carga de simbolismos que só

aumentava fortalecendo os ritos populares os quais permaneceram vivos por

muito tempo, e mesmo quando a racionalização, tentou atribuir-lhe menos

importância continuaram mantendo sua resistência.

Diante tais concepções teóricas podemos destacar que a Cultura Política

não pode ser enquadrada como uma linha evolutiva, se seguimos essa linha

notaremos que a Cultura Politica só pode existir como um fenômeno estruturado

e reproduzido ao longo do tempo, se usarmos por exemplo a tipologia de

Fernando Braudel, para configurarmos a Cultura Política, seria necessário pelo

menos uma média duração. Logo assim pensamos como considerar situações

passageiras, se anteriormente já foi mencionado que para utilizar tal conceito

necessitamos de elementos arraigados a cultura de um grupo.

O valor desse conceito de Cultura Politica estar ligado diretamente a

crenças, mitos ou simplesmente força de uma tradição. Logo assim entendemos

que as Culturas Politicas existem sim e devem ser encaradas como realidades,

que estão a todo momento em contato umas com as outras, concorrendo a todo

tempo com espaços controlados sobre o estado, dessa maneira devamos

entender que os estudos de cultura política tem que ser estudadas de maneira

mais ampla, se se apegar apenas ao tema de representações.

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Para essa construção de história política, de mitos e heróis, podemos

utilizar também GIRARDET(1987) que em seu livro: Mitos e Mitologias, nos traz

uma ampla diversidade de conceitos utilizados para construção de um imaginário

político, dessa maneira o autor analisa, acontecimentos históricos, que nos

remetem a Idade do Ouro, por exemplo, na tentativa de demarcar espaços que

vão sendo ocupados pelos políticos.

Segundo o autor, os mitos políticos da sociedade contemporânea, não

se diferencia muito de grandes mitos que foram se consagrando ao longo da

história, pois o essencial que os constitui é o mesmo basicamente, algumas

vezes perdem lugar outros ganham espaços, sem dúvida é uma rede de

poderes, onde a todo tempo forças são movidas para realizar determinados

interesses.

Pois mesmo em “Tempos Modernos” o autor nos adverte para o fato de

que a população sempre esperar um político que faça por ela aquele papel de

pai, que cuida da sociedade, que lhes presta algum tipo de assistência políticos.

Que vai ao encontro do povo, que cuida que estar sempre disposto a ajudar a

população, nas obras anteriormente mencionadas vimos bem esse fator, que

acabam tracedendo os próprios valores.

Considerações Finais

Ao longo deste artigo, pensamos ter demonstrado as imensas

contribuições que as novas perspectivas historiográficas do século XX foram

capazes de nos proporcionar, com novas abordagens dos diversos aspectos da

vida social, portanto, podemos analisar como as práticas culturais vigentes em

determinada época interferem na constituição da cultura e das identidades

políticas que são formadas ao longo dos séculos. E como é necessário a

realização de estudos para que as pessoas entendam como o estudo da Cultura

Política é importante para o cotidiano e para formação de novos conceitos.

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Referências

BLOCH, Marc. Os reis taumaturgos: O caráter sobrenatural do poder régio,

França e Inglaterra. São Paulo: Companhia das Letras, 1993.

BURKE, Peter. A fabricação do rei: a construção da imagem pública de Luís

XIV. 2.ed.Rio de Janeiro: Zahar, 2009.

GIRARDET, Raoul. Mitos e Mitologias. São Paulo, Companhia das

Letrsa,1987.

MOTTA, Rodrigo Patto sá.O Conceito de cultura Política. Anais do X Encontro

Regional da ANPUNH_MG.Mariana,1996, pp.83_91.

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Mulheres artesãs do alto do moura

Aldir José da Silva

Universidade Federal de Pernambuco – CAA

Mestrando em Educação Contemporânea

História, Poder e Cultura: Interfaces e diálogos contemporâneos.

Introdução

Estudar ou escrever sobre estas mulheres Artesãsque sofreram, sofrem e são

silenciadas no seu cotidiano, no seu lar e na sua Comunidade são meios para

perguntarmos quais são estas ferramentas ou Métodos em pleno Século XXI de

silenciar tais mulheres? Mulheres Artesãs que não são reconhecidas como

“Mestra” por parte das Autoridades Competentes. Mulheres que trazem novas

visões Epistemológicas de criar e fazer na arte do barro no Alto do Moura

caminhos de vida.

Mulheres Artesãs que introduziram no seu cotidiano o barro como meio de

Sobrevivência da sua Família. Constatamos assim que os primeiros registros na

comunidade do Alto do Moura a essas Mulheres ficaram conhecidas como as

“louceiras” que faziam peças utilitárias como: potes, panelas, quartinhas, copos

e outras.

Poderíamos no nosso estudo abordar dezenas delas, mas, o nosso ponto de

partida écom apenas três MulheresArtesãs que fizeram e fazem parte da história

e da Comunidade do Alto do Moura. Entre elas estudaremos: Ernestina falecida,

Marliete e Rosário de Carvalho.

Ernestina foi uma Artesã contemporânea do Mestre Vitalino, onde teve a

oportunidade de aprender com ele e si tornar uma grande Artesã e pioneira na

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arte Figurativa do Alto do Moura. Já Marliete é uma das Grandes Artistas que

inova e renova a arte do barro com suas peças miniaturas, que buscam da

natureza as tonalidades de cores e passa para os bonecos. No Alto do Moura

ela é respeitada pela sua criatividade e por ter conseguido ganhar vários títulos

de reconhecimento do seu trabalho no barro, mas, diante do Estado ela ainda

não foi reconhecida como Patrimônio vivo, ou como “Mestra” já que este é um

dos maiores Títulos de reconhecimento a artista vivo no Estado de Pernambuco.

Mas, o interessante é que para a comunidade do lugar esta Artesã é uma grande

Mestra, porque tem um grande conhecimento na arte, mas para o Estado só se

torna Mestra quando ganha uma Titulação como Patrimônio Vivo. A Outra Artesã

que gostaria de destacar na minha pesquisa é Rosário de Carvalho, primeiro por

ser mulher, Artista Plástica e por si tonar a primeira mulher Presidentada

Associação que representa todos(as) Artesãos(ãs) e moradores do lugar, a

ABMAM (Associação dos Artesãos em Barro e Moradores do Alto do Moura).

Tentar compreender como essas Mulheres que dedicaram e dedicam parte de

sua vida ao barro, é entender uma Epistemologia “Outro”, uma forma “Outra” de

vida. Ao mesmo tempo é dizer que é um rompimento do pensamento tradicional,

MachistaePatriarcal o que os estudos chamam de Pensamento de Fronteira.

Deixar de não reconhecer o trabalho e a Importância dessas Mulheres que ora

a sociedade denomina Sexo frágil, ora vemos que são Mulheres Guerreiras na

sua luta Diária no trabalho,na Sobrevivência da vida.

Mostrar como Elas têm contribuído para a construção de um espaço

epistemológico dentro da comunidade é compreendê-las como protagonistas

das suas formas “outras” de pensar o seu trabalho dentro de uma construção de

vida Artesã.

Observar como elas vivenciam a fé e a inspiração na Arte do barro dentro do

silencio cotidiano é comungar de uma construção do pensamento do saber.

Passando pelas Mãos e Mentes Femininas junto com oconhecimento

compartilhado.

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Como tem sido a experiência de casamento e de família dessas mulheres como

Mães e companheiras ao mesmo tempo que divide o seu espaço com os filhos,

marido e com o Artesanato?Como elas têm conquistado espaços dentro de um

mundo Masculino para apresentar sua Arte a comunidade? E como eles

(Artesãos) veem o trabalho feminino?há uma preocupação por parte dos órgãos

públicos para o ensino-aprendizagem no Alto do Moura abordando estas artesãs

como protagonistas para a continuidade desta arte?

Objetivo Específico

Se olharmos de uma forma geral como o trabalho é realizado dentro desta

comunidade dizemos que existe apenas uma técnica comum, mas se olharmos

de uma forma minuciosa a realização ou a criação de cada peça, por artesão,

logo observamos que existem técnicas criadas para cada tipo de peça, para cada

tamanho, para cada formato. “Por exemplo: um lampião feito por Luiz Galdino

não é idêntico ao que é feito por Elias Francisco. Uma peça feita pelo mesmo

artista, em momentos diferentes, também sofre alterações.” (FERREIRA e

SILVA FILHO, 2009, p. 73).Ainda sobre o Alto do Moura:

As terras do Alto do Moura são férteis e o rio Ipojuca garante água. Era natural, portanto que inicialmente seus habitantes se dedicassem à agricultura. Com o tempo descobriu-se que a argila da região era de ótima qualidade, surgindo então os louceiros que faziam peças utilitárias, como potes, panelas, moringas, alguidares, chaleiras, jarros e quartinhas. Logo o povoado ficou conhecido como o lugar dos oleiros. (MELLO, Op. Cit., p.03).

Para analisar melhor o aproveitamento do barro como matéria-prima na

confecção de utensílios é preciso viajar um pouco dentro do contexto histórico-

geográfico em Pernambuco. Estudando outros trabalhos verificamos que a

cerâmica utilitária já era feita pelos índios Kariri.

Tradicionalmente, a produção de cerâmica entre os povos indígenas brasileiros

é delegada às mulheres. Elas são as responsáveis por todo o processo de

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produção, inclusive extração do barro. Essa extração acontece normalmente na

época das secas. As índias extraem o barro das margens do rio, retirando as

impurezas, amassando-o (...) A prática ceramista (era) desenvolvida no

ambiente doméstico, entre os afazeres da casa e o cuidado com os filhos. A

produção se limitava à confecção de potes, jarros, moringas e utensílios

domésticos destinados ao uso próprio. (LIMA, 2001, p.56/57).

Considerando que as mulheres, indígenas ou não, foram as “primeiras” a

colocar a mão no barro e produzir peças utilitárias, então nada de extraordinário

que às mãos femininas depois de muitos anos tendo sua expansão nas novas

comunidades louceiras às margens do Rio Ipojuca.

As técnicas utilizadas por essas louceiras eram muito semelhantes às técnicas utilizadas pelos índios. O barro era extraído (não só pelas as mulheres) das margens do Rio Ipojuca nas épocas de seca. Depois de levado para casa, o barro era selecionado, retirando-se as impurezas. Logo após o barro era pisado até ficar macio e liso para dar a ‘liga’ necessária para a confecção da peça. (LIMA, 2001, p. 57-58).

Se o Alto do Moura era conhecido como o lugar das louceiras que faziam peças utilitárias e ao mesmo tempo desenvolvendo as pequenas olarias, este ambiente ficou sendo favorável a instalação de várias comunidades que trabalhavam com o barro nas margens do Rio Ipojuca.

Na verdade, ao longo destes quase quatrocentos anos, consolidou-se a produção de uma cerâmica semi-industrializada, voltada para a produção de tijolos, lajotas, manilhas, telhas e azulejos, e ainda objetos de uso doméstico, como jarras, panelas, potes, alguidares, vasos e tigelas, essas últimas geralmente feitas por mulheres, as chamadas louceiras. (MELLO, 1995, p.19).

Estudo recente reforça aquilo que já era visto e aceito por muita gente: o

rio e a feira foram fatores determinantes para a história do Alto do Moura. “O rio

Ipojuca e a Feira de Caruaru foram, sem sombra de dúvida, dois elementos muito

importantes na história da arte do barro no Alto do Moura. O rio, enquanto fonte

de matéria-prima, na medida em que as suas margens oferecem uma argila de

excelente qualidade (...) e a feira, enquanto espaço para ofertar os produtos

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cerâmicos” (FERREIRA ; SILVA FILHO, 2009, p. 55-56).Outro olhar importante

que desejamos analisar a respeito desta pesquisa no Alto do Moura é identificar

os benefícios e os malefícios das decisões politicas do município, desassociadas

de um projeto cultural. Na sequencia veremos o papel da Associação dos

Artesãos em Barro e Moradores do Alto do Moura(ABMAM) como ponto

importante para a continuidade e para a sobrevivência daquelas famílias,

agregando, reforçando e divulgando o trabalho dos artistas.

Objetivo Geral

O Alto do Moura tornou-se famosa principalmente por ser a comunidade

da produção da arte figurativa, pela mítica misteriosa (que muitos chamaria de

“Dom”) em torno dos seus artistas e, pela complexidade em relação a troca de

experiência entre eles mesmos.

Para explicar estas questões desejamos estudar as relações familiares

dentro de ateliê, e sobre a maneira como se produz e se transmite a técnica da

produção artesanal. Pois, é algo que não se discute, sabemos estar sempre

presente, mas difícil de explicar. Existe um sentimento entre os moradores

daquela comunidade em relação ao universo produtivo, como sendo fruto de um

conhecimento coletivo, porém específico, próprio do lugar.

Em pequenas comunidades onde o trabalho coletivo é muito presente, o aprendizado das técnicas tem sido passado informalmente, permitindo o surgimento contínuo de novos artistas. (MASCELANI, 2002, p.19).

Trata-se de uma de “escola de arte figurativa” onde quase todos,

principalmente os mais velhos são como professores e os alunos são

naturalmente as crianças. O mesmo processo pode ser compreendido também

pela possibilidade de um artista mais jovem desenvolver uma nova técnica e ser

aceita e copiada por seguidores.

Compreendemos que o processo de ensino-aprendizagem na arte

artesanal acontece não como uma escola no formato tradicional, com sua

especificidade de cadeiras, salas, etc., mas uma “escola” da coletividade, da

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transmissão oral, da observação, da conversa entre os amigos, da troca dos

saberes, etc. tudo ensinado e repassado por gerações sucessivas. É um

aprendizado oral desde a infância sobre como retirar o barro, reconhecer a

qualidade da argila e do seu tratamento (pisar), da modelagem das peças e

também como queimá-las.

Tudo depende de uma técnica adquirida e aplicada que só torna-se

eficiente com a pessoa praticando. Dependendo do caso, até como, e o que se

deve pintar em cada peça, a partir da temática trabalhada. Essas são as fases

da construção coletiva da arte figurativa que envolve centenas de famílias, que

sobrevivem do barro do Alto do Moura.

É uma escola informal, onde até admiradores podem se integrar dentro desse modelo já que não se ouve falar em segredo ou receita misteriosa. Sobre a aceitação de novidades pelos artistas do Alto do Moura, basta lembrar que,

Até o próprio Vitalino incorporou novos elementos desconhecidos que foram trazidos por seus ‘discípulos’ a partir de sua própria obra, quer dizer, havia uma harmonia e troca de aprendizado (FERREIRA e SILVA FILHO, Op. Cit., p. 57).

“Estudar” essa escola é reforçar e afirmar a existência da coletividade

onde os artesãos e as artesãs mantêm um compromisso e um dever de

convivência harmoniosa e isso não é uma tarefa fácil na convivência humana.

Isto faz com que a comunidade do Alto do Moura se fortaleça e cresça a cada

dia. Exemplo claro disso é a família do próprio Vitalino Pereira.

Percebemos que poucos são os artistas que se preocupam com a exclusividade e com o diferenciar-se dos demais artistas. Por este motivo, essa comunidade consegue dar continuidade a essa produção que passa de pai para filho. (FERREIRA e SILVA FILHO, Op. Cit., p. 59).

Esta coletividade faz-se rotineira, na forma de compartilhar as tarefas ou

fases da produção, e ao mesmo tempo garantirá forma de sobrevivência de seus

moradores. Este trabalho sendo desenvolvido por várias mãos ganha

característica própria que formatou um modelo coletivo que lhe garante

autenticidade. Até no campo visual. “Como prova dessa identidade familiar, para

muita gente que conhece o que é produzido no Alto do Moura, basta um olhar,

para identificar a peça como sendo daquele lugar.” (FERREIRA e SILVA FILHO,

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Op. Cit., p. 60). Porém, tudo isso que está sendo dito, não impede que cada

artista tenha sua própria criatividade de estilo e desenvolva sua técnica

particular.

Portanto, observamos no Alto do Moura a formação de uma escola de arte

surgindo na coletividade desses velhos e novos artesãos/ãs, e ao mesmo tempo

comungando das mesmas aprendizagens, dos mesmos saberes, fortalecendo o

grupo como surgimento de uma expressão artística surgida e desenvolvida no

Agreste pernambucano.

Metodologia

No Método biográfico, escolheremos as técnicas das entrevistas e da

Observação participante, além de fontes impressas que ao longo das entrevistas

e observações serão apresentadas e sugeridas. As entrevistas mostrarão

oportunas e necessárias, como vias de aceso a estas Artesãs que, de modo

simultâneo e complementar, elaborou suas Epistemologias “outras” no barro, e

na liderança comunitária. As artesãs que fizeram tais percursos Epistemológicos

sem serem lideranças formadas em Universidadesou escolas de formações,

mas, construíram suas formas “outras” epistêmicas.

Se olharmos de uma forma geral como o trabalho delas é realizado dentro

desta comunidade dizemos que existe apenas uma técnica comum, mas se

olharmos de uma forma minuciosa a realização ou a criação de cada peça, por

artesão(ã), logo observamos que existem técnicas criadas para cada tipo de

peça, para cada tamanho, para cada formato. “Por exemplo: um lampião feito

por Luiz Galdino não é idêntico ao que é feito por Elias Francisco. Uma peça feita

pelo mesmo artista, em momentos diferentes, também sofre alterações.”

(FERREIRA e SILVA FILHO, 2009, p. 73).

Ainda sobre o Alto do Moura:

As terras do Alto do Moura são férteis e o rio Ipojuca garante água. Era natural, portanto que inicialmente seus habitantes se dedicassem à agricultura. Com o tempo descobriu-se que a argila da região era de ótima qualidade, surgindo então os louceiros que faziam peças utilitárias,

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como potes, panelas, moringas, alguidares, chaleiras, jarros e quartinhas. Logo o povoado ficou conhecido como o lugar dos oleiros. (MELLO, Op. Cit., p.03).

Para analisar melhor o aproveitamento do barro como matéria-prima na

confecção de utensílios é preciso viajar um pouco dentro do contexto histórico-

geográfico em Pernambuco. Estudando outros trabalhos verificamos que a

cerâmica utilitária já era feita pelas índias Kariri.

Tradicionalmente, a produção de cerâmica entre os povos indígenas brasileiros é delegada às mulheres. Elas são as responsáveis por todo o processo de produção, inclusive extração do barro. Essa extração acontece normalmente na época das secas. As índias extraem o barro das margens do rio, retirando as impurezas, amassando-o(...) A prática ceramista (era) desenvolvida no ambiente doméstico, entre os afazeres da casa e o cuidado com os filhos. A produção se limitava à confecção de potes, jarros, moringas e utensílios domésticos destinados ao uso próprio. (LIMA, 2001, p.56/57).

Considerando que as mulheres, indígenas ou não, foram as “primeiras” a

colocar a mão no barro e produzir peças utilitárias, então nada de extraordinário

que às mãos femininas depois de muitos anos tendo sua expansão nas novas

comunidades louceiras às margens do Rio Ipojuca.

As técnicas utilizadas por essas louceiras eram muito semelhantes às técnicas utilizadas pelos índios. O barro era extraído (não só pelas as mulheres) das margens do Rio Ipojuca nas épocas de seca. Depois de levado para casa, o barro era selecionado, retirando-se as impurezas. Logo após o barro era pisado até ficar macio e liso para dar a ‘liga’ necessária para a confecção da peça. (LIMA, 2001, p. 57-58).

Se o Alto do Moura era conhecido como o lugar das louceiras que faziam

peças utilitárias e ao mesmo tempo desenvolvendo as pequenas olarias, este

ambiente ficou sendo favorável a instalação de várias comunidades que

trabalhavam com o barro nas margens do Rio Ipojuca.

Na verdade, ao longo destes quase quatrocentos anos, consolidou-se a produção de uma cerâmica semi-industrializada, voltada para a produção de tijolos, lajotas, manilhas, telhas e azulejos, e ainda objetos de uso doméstico, como jarras, panelas, potes, alguidares, vasos e tigelas, essas últimas geralmente feitas por mulheres, as chamadas louceiras. (MELLO, 1995, p.19).

Outro olhar importante que desejamos analisar a respeito desta pesquisa

no Alto do Moura é identificar a participação da primeira mulher na Presidência

de uma Associação que representa os Artistas da localidade que até então era

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Administrado por homens. A Administração desta mulher como Presidenta são

pontos para ser analisados nos nossos estudos e Suas decisões politicas com

relação a comunidade, associada de um projeto cultural. Na sequencia veremos

o papel da Associação dos Artesãos em Barro e Moradores do Alto do Moura

(ABMAM), como ponto importante para a continuidade e para a sobrevivência

daquelas famílias, agregando, reforçando e divulgando o trabalho dos artistas.

Referências

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O genocídio dos povos indígenas na ditadura civil-

militar

(1967-1974)

Rodrigo Lins Barbosa-UFPE

RESUMO: Este trabalho faz parte da dissertação que estamos desenvolvendo no mestrado de História da Universidade Federal de Pernambuco. A pesquisa pretende aprofundar os estudos referentes ao período de 1967 a 1974, em que o Brasil conviveu com o abuso de autoridade, a repressão, a censura e as prisões, quando os militares assumem o poder, depois do golpe de 1964, estabelecendo uma Ditadura no país. Nessa perspectiva, temos como objeto de estudo, as comunidades indígenas e o massacre que sofreram durante esse período, sendo gravemente afetadas por uma política econômica expansionista. Em virtude disso, gigantescos projetos rodoviários, de mineração e de pecuária foram implementados, passando a ocupar territórios indígenas na Amazônia e provocando consequências desastrosas para os povos indígenas, como o aumento de doenças, mortes e destruição cultural. Para isso, pretendemos relacionar a política econômica do tipo desenvolvimentista dos governos militares no contexto social, analisando os objetivos estruturais que motivaram a perda de territórios, mortes e doenças sofridas pelos indígenas. Sendo assim, abordaremos os conflitos e revoltas que surgiram durante o período e também analisaremos as causas e as consequências conjunturais para que as informações pesquisadas sejam pertinentes e concisas para a historiografia. O objeto de estudo foi escolhido, devido a carência de pesquisas historiográficas relacionadas à história dos povos indígenas durante o período da Ditadura e com isso, sentimos a necessidade de articular fontes das mais diversas sobre o período proposto para termos uma visão mais ampla do ocorrido. Para a análise utilizamos de fontes como jornais, fotografias, mapas, legislação e relatórios. Dentre os documentos mais importantes, podemos enfatizar, o Relatório Figueiredo que contém informações sobre casos de genocídio, torturas, cárcere privado de povos indígenas e também sobre casos de corrupção envolvendo integrantes do SPI (Serviço de Proteção aos Índios) que foi substituído em 1967 pela FUNAI. Durante a Ditadura a região norte foi utilizada para a construção de rodovias e hidrelétricas que provocaram o massacre de indígenas, sobretudo podemos destacar, os Waimiri-atroari que segundo Egydio Schwade (ex-secretário do CIMI-Conselho Indigenista Missionário) morreram cerca de dois mil Waimiri-Atroari durante a ocupação de seus territórios. Mas o massacre de etnias que se opuseram às grandes obras é apenas um dos capítulos dessa história. Tal como outros grupos subjugados nos porões da ditadura, os habitantes de

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várias povos indígenas pelo Brasil afora, também foram alvo de prisões clandestinas, assim como, torturas e desaparecimentos, como por exemplo, o Reformatório Agrícola Indígena Krenak (MG). Palavras-chave: Ditadura, Genocídio e Indígenas. INTRODUÇÃO

São os momentos de protesto ou de violência coletiva que tornam visíveis

as massas, assim como, de crimes submetidos individualmente, que dão

visibilidade ao homem comum. Só assim, o historiador chega às massas e aos

indivíduos menos favorecidos através desses fatos que repercutem na

sociedade. Nesse sentido, quando nos debruçamos sobre a história dos povos

indígenas, sobretudo no que diz respeito ao vivido no período da Ditadura

brasileira, mas especificamente entre os anos 1967-1974, verificamos uma

manutenção de uma história silenciada, onde só temos acesso à parte dos

acontecimentos. É uma história dos “vencidos” que ainda é pouco relatada na

historiografia, pois se procura em abordá-la pela perspectiva dos “vencedores”.

Isso fica bem evidente em grande parte da literatura que trata da questão

indígena, o índio não passa de um personagem oculto ou exótico, sendo

silenciado por um processo histórico que prefere ignorá-lo, ou não reconhecê-lo

como tal. Em relação a isso, podemos citar Nelson Werneck Sodré, em sua

conhecida obra sobre a “História Militar”, que não conseguiu fazer nenhuma

referência à questão indígena.

A nossa pesquisa se aprofunda nos estudos referentes ao período de

1967 a 1974, em que o Brasil conviveu com o abuso de autoridade, a repressão,

a censura e as prisões, quando os militares assumem o poder, depois do golpe

de 1964, estabelecendo uma Ditadura no país. As comunidades indígenas e o

massacre que sofreram durante esse período, vítimas de uma política

econômica expansionista, levada a efeito pelos tecnocratas do modelo de

desenvolvimento aplicado. Em virtude disso, gigantescos projetos rodoviários,

de mineração e de pecuária foram implementados, passando a ocupar territórios

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indígenas na Amazônia brasileira e provocando consequências desastrosas

para as nações indígenas, como o aumento de doenças, mortes e destruição

cultural.

POLÍTICA INDIGENISTA NA DITADURA

Ao analisar as políticas indigenistas dos governos militares, não podemos

deixar de considerá-las, como políticas do Estado, onde os militares utilizam das

instituições para se fortalecerem, como ocorreu como SPI e posteriormente a

FUNAI.

A questão indígena sempre esteve na história brasileira, intimamente

associada à construção do Estado e aos problemas militares (COSTA:

1992).Seguindo esse raciocínio, a partir de uma análise da política de Estado,

podemos indagar sobrea seguinte questão: teria sido possível uma atuação

militar junto aos povos indígenas, fora da perspectiva integracionista e

assimiliacionista? Ou seria tolerável uma ação que efetivamente contemplasse

os interesses indígenas, enquanto grupos etnicamente diferenciados,

culturalmente portadores de sabedorias milenares e possuidores de uma história

com projetos de vida inseridos em suas comunidades. Ao longo do estudo,

vemos que o objetivo do Estado em integrar os povos indígenas aos não índios,

acabou negando o pluralismo cultural e étnico existentes nos grupos indígenas.

Como mostraremos mais adiante, esta política não mudou desde o início

da formação do Brasil. Os rótulos se modificam, mas os conceitos permanecem.

O sertanista é herdeiro do Bandeirante, o Posto indígena não difere em muito

das Aldeias e Reduções e o administrador continua a administrar, quer que se

chame Diretor, Encarregado ou Chefe de posto. Ainda sobre a política associada

ao pensamento militar, o Estado Nacional é considerado a forma mais alta de

organização política (RATTENBACH: 1972). Sendo assim, a instituição militar

delineia as ações, estratégias, estabelece relações e define suas políticas, traça

objetivos e busca meios de concretizá-los. Busca, em suma realizar a sua função

de aparelho atrelado ao Estado.

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No período da Ditadura, o pensamento militar é marcado pela ideia de

segurança. A primeira preocupação é com a segurança do país, seu território,

sua soberania. Como desdobramento desse conceito de segurança, vemos as

forças armadas empenhadas na expansão e fortalecimento do Estado, que só

será possível através de um acelerado desenvolvimento tecnológico e industrial,

o que exigirá e possibilitará forças armadas fortes.

Para implantar a política indigenista do modelo de segurança e

desenvolvimento propostos pelos governos militares, foram dados alguns

passos fundamentais como: organizar o sistema e segurança dentro da FUNAI

e criação da GRIN (Guarda Rural Indígena) e também a presença efetiva de

pessoas ligadas a essa área nos cargos de chefia do órgão.

No período de transição entre o SPI (Serviço de Proteção aos Índios) e a

FUNAI ocorreram invasões de terras indígenas, cenas de violência que eram

constantes (embora nem sempre tornadas públicas e praticamente nunca

punidas!). O cenário trágico exigia medidas urgentes. O presidente da FUNAI,

Queiroz Campos reuniu os delegados regionais do órgão para discutirem

medidas cabíveis. Em reunião, na ilha do bananal, foi decidida a criação de um

sistema de segurança próprio, formado de índios, capazes de coibir as invasões,

violências e abusos, ou seja, uma Guarda Rural Indígena. Porém, o capitão

Manoel dos Santos Pinheiro, um dos executores do projeto da GRIN, diria em

entrevista que teria sido ele o criador da Guarda Rural Indígenae idealizador da

Colônia Penal Krenak.125 Mas para tirarmos às dúvidas, a Guarda Rural Indígena

foi criada por lei, em 1929. Porém, o SPI, desde seu início, introduziu e estimulou

a implantação de uma espécie de estrutura militar nas aldeias. Algo como

“patrulhas da ordem”, onde um índio-capitão tinha sob seu mando seus índios-

cabos, sargentos e soldados. E estes, acabavam sendo subordinados aos

agentes do SPI e, posteriormente, à FUNAI. Mas, por que desengavetar essa

lei, quarenta anos depois?

125JORNAL DO BRASIL, 27/08/1972.

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Entre os objetivos da criação da Guarda Rural Indígena, seria para manter

a ordem interna das aldeias, até então sob a responsabilidade de mecanismos

mais informais e modelados pela própria estrutura política e social de cada grupo

que acabou se transformando na ação básica da Guarda Rural Indígena. Com

isso,provocando consequências muito graves para as várias comunidades

indígenas, pois, “foi o início da implantação do sistema policial, com delações e

espionagem, dentro das tribos”126. Na mesma matéria do Jornal do Brasil,

podemos perceber as consequências nocivas da GRIN:

“Criada para preservar as tradições e manter a integridade territorial, a Guarda tem sido, ao contrário, um elemento desagregador, não se tendo notícias de que haja impedido qualquer invasão de terras destinadas aos indígenas. A primeira consequência da Guarda tem sido o desprestigio dos caciques e do Conselho Tribal, pois os guardas, “educados” por um oficial da polícia militar mineira, passaram a se considerar superior a todos”. São citadas as arbitrariedade da GRIN como espancamento, prisões e até a abertura de prostíbulos.127[...].

Em junho de 1970, Queiroz Campos é demitido da FUNAI pela justificativa

de instituir um desastroso sistema policialesco nas aldeias. As duras críticas à

GRIN, levaram à interrupção do processo de formação de novas turmas.

Ao analisarmos a Guarda Rural Indígena, percebemos a relação entre a

semelhante iniciativa, aparentemente isolada, e a doutrina de segurança

nacional. O binômio fundamental desta doutrina: desenvolvimento e segurança

tem, sem dúvida, desdobramentos sobre a problemática dos povos indígenas. E

quando vemos que a GRIN que se desenvolveu no período do “milagre

brasileiro”, com uma expansão acelerada das frentes econômicas sobre novos

territórios, especialmente na Amazônia e com o AI-5 aumentando a repressão,

não fica difícil enxergar a preocupação com a questão indígena.

Nesse sentido, as terras e riquezas naturais passaram a ter restrições e

controle para o seu aproveitamento, de imediato e indiscriminado, pelo processo

desenvolvimentista em curso. O capitão Pinheiro, responsável pelo treinamento

da Guarda Indígena, dizia que “o índio é um fator de segurança nacional, pois,

126 JORNAL DO BRASIL, 08/ 06/ 1970. 127 Ibid., 08/06/1970.

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quando ele se revolta, cria a desordem e a subversão e, deste modo, depois de

preso pela GRIN, é enviado a Krenak (Colônia penal indígena) para reeducar-se

e ser um índio bom.”128

A Colônia penal indígena ou Reformatório-presídio Indígena Krenak foi

implantado sob a administração do Capitão Manoel Pinheiro, da Polícia Militar

do Estado de Minas Gerais e para lá eram enviados os indígenas que se

opunham à resistência aos ditames dos administradores de suas aldeias ou eram

considerados como desajustados socialmente. No Presídio eram mantidos em

regime de cárcere, sofrendo repressões, como o confinamento em solitária e

castigos físicos em casos de insubordinação. Eram-lhes impostas atividades na

agricultura durante o dia, sob forte vigilância de soldados da Polícia Militar de

Minas Gerais e dos indígenas agregados à Guarda Rural Indígena (GRIN),

também fundada pelo Capitão Pinheiro, guarda composta por índios

devidamente treinados, fardados e encarregados de manter a ordem interna nas

aldeias, coibir os deslocamentos não autorizados, vigiar os trabalhos e denunciar

os infratores ao Destacamento da Polícia Militar (PARAÍSO, 1991).

Na medida em que os militares assumem efetivamente o poder do Estado,

criando estruturas que sustentem um projeto político e econômico de médio e

longo prazo, a questão indígena ganha destaque, não apenas por sua vinculação

com a segurança, mas por sua estreita e importante relação com o projeto de

desenvolvimento econômico a ser implantado. Não só as terras ocupadas pelos

índios se constituem em objeto de preocupação, como as riquezas naturais nelas

existentes, que passam a adquirir destaque. Nesse cenário, a Amazônia emerge

como área estratégica, pelo seu potencial de riquezas e como espaço a ser

integrado à comunhão nacional. A reforma ministerial do início do governo Costa

e Silva cria um ministério com o objetivo prioritário de cuidar do processo de

expansão das fronteiras econômicas, ocupação dos espaços e integração

nacional. O Ministério do Interior surge para implementar essa política. São

definidos parâmetros, redefinidos órgãos, criadas estruturas administrativas e

128 Ibid., 27/08/1972.

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bases legais. Nesta conjuntura, é extinto o SPI, criando-se em seu lugar a

FUNAI. As denúncias do Ministro do Interior, General Albuquerque Lima, com

respeito à grave situação dos povos indígenas e à corrupção no órgão

indigenista oficial, situam-se neste contexto de adequar o Estado ao projeto de

desenvolvimento socioeconômico.129

O MASSACRE DOS POVOS INDÍGENAS

Em 1967, no governo do presidente Costa e Silva, a atenção internacional

concentrou-se nas notícias que denunciavam as agressões contra os indígenas.

Em resposta a essas denúncias, no mesmo ano, o Ministro do Interior, General

Albuquerque Lima, encarregou o Procurador-Geral Jader Figueiredo de

investigar as denúncias de crimes cometidos por agentes do SPI (Serviço de

Proteção aos Índios), órgão anterior à FUNAI. As investigações começaram em

1967 e tiveram como base comissões parlamentares de inquérito de 1962 e

1963, assim como denúncias posteriores de deputados. Figueiredo e sua equipe

de investigadores viajaram mais de 16 mil quilômetros, entrevistando dezenas

de agentes do SPI e visitando 130 postos espalhados em 18 estados do Brasil.

Em março de 1968, o General Albuquerque Lima deu uma entrevista

coletiva no Rio de Janeiro, onde tornou público o resultado deste relatório. O

relatório de mais 7 mil páginas expõe métodos de tortura, escravização e

exploração do patrimônio indígena por funcionários do extinto SPI. Jáder

Figueiredo menciona, inclusive, os massacres de índios que foram denunciados

e ainda não haviam sido apurados, tais como as chacinas no Maranhão,

promovidas por fazendeiros locais; a extinção de uma comunidade pataxó

localizada em Itabuna, na Bahia através de inoculação do vírus da varíola e o

massacre dos Cintas Largas, no Mato Grosso. Este relatório foi resultado da

129Muitas dúvidas foram levantadas sobre as motivações que teriam levado o Ministro Albuquerque Lima a assumir pessoalmente o processo de apuração das irregularidades no SPI e denunciá-las nacional e internacionalmente. Shelton Davis, aponta as aspirações do Ministro à Presidência da República, como uma das possíveis causas dessa atitude. Apesar de ser plausível, ela deixa de considerar a conjuntura política e econômica de uma forma mais abrangente.

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Comissão de Inquérito presidida por Jader Figueiredo, popularmente identificada

por Relatório Figueiredo.130

O Relatório foi publicado em junho de 1968. Embora a Comissão de

Inquérito tenha sido proposta no governo de Costa e Silva, por intermédio do

Ministério do Interior, a repercussão internacional abalou a imagem do Brasil no

exterior. Se por um lado as populações indígenas eram consideradas um entrave

à política desenvolvimentista da época, por outro, a divulgação das atrocidades

e massacres prejudicava as relações internacionais. Em dezembro de 1968 é

instaurado o AI-5. No mesmo ano, sem que as investigações fossem concluídas

e os indiciados tivessem respondido pelos seus crimes, os processos foram

arquivados na sede da FUNAI, em Brasília, onde ficariam por mais de quarenta

anos, até serem transferidos em 2008 para o arquivo do Museu do Índio.131

Sendo assim, a análise de documentos como o Relatório Figueiredo, nos

faz elaborar questionamentos, como por exemplo, o que aconteceu com os

indígenas,porque eles não deram seus testemunhos? Por que a Comissão

colheu depoimentos de funcionários e de outros agentes, mas nunca dos índios?

Por que quando percorreram aldeias, a Comissão não valorizou o testemunho

dos principais interessados? Por que não foi possível, em muitas ocasiões,

fotografar as mazelas testemunhadas, como fala Jader Figueiredo em seu

relatório? Houve quem fosse indiciado por divergências políticas? Nos arquivos

encontramos rastros através dos quais podemos reconstituir testemunhos e

recontar a história sob novos ângulos. O testemunho reconhecido como

documento e documentado através da escrita faz emergir novos sujeitos

históricos. “É um rastro escrito, aquele que o historiador encontra nos

documentos de arquivos” (RICOEUR, 2000: 180) e através destes indícios e do

130Acreditava-se que o Relatório Figueiredo estava desaparecido ou tinha sido destruído em um incêndio no Ministério da Agricultura há mais de 40 anos, sendo um dos documentos mais importantes produzidos pelo Estado brasileiro no último século e foi encontrado recentemente no Museu do Índio. 131 Na documentação oriunda de Brasília em 2008, consta apenas vinte e nove dos trinta volumes da Comissão de Inquérito e há mais de sete mil páginas, e não as 5.115 divulgadas na ocasião que o Relatório Figueiredo foi exposto em 1968.

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reconhecimento de novas narrativas que poderemos reescrever parte da

história, com a voz destes novos sujeitos.

A presença dos militares nas políticas indigenistas oficiais tem sido uma

constante em todo o período republicano, mais especificamente a partir da

criação do SPI, em 1910. Isso, revela o interesse dos militares por mais diversos

que tenham sido os princípios e intenções pela questão indígena. Porém, a

presença militar a partir de 1969, vai moldando uma nova prática indigenista,

onde se destaca um integração acelerada dos indígenas ao projeto econômico

do Estado de Segurança e Desenvolvimento.

No contexto da modernização autoritária, a política desenvolvimentista é

adotada na Ditadura com o objetivo de avançar pelo interior da Amazônia. A

partir dessa expansão, os povos indígenas foram gravemente afetados,

principalmente osWaimiri-Atroari. A quantidade de indígenas mortos durante a

Ditadura por motivos territoriais ou devido à construção de rodovias e

hidrelétricas não está totalmente definida.No final da década de 1960, o Governo

Federal iniciou uma ocupação maciça do território dos indígenasWaimiri-

Atroari, através de grandes projetos de desenvolvimento regional.

Entre os anos de 1972-1977 esse território foi cortado pela estrada BR-174, que liga Manaus à Boa Vista. Na abertura da BR-174, foi organizada uma operação de "pacificação" e realocação dos Waimiri-Atroari pela FUNAI, cujas consequências dominam a vida desses índios até hoje (BAINES: 1993).

Os Waimiri-Atroari foram submetidos a uma "Frente de Atração"132 da

FUNAI, que acompanhou as obras da estrada BR-174 no território indígena, a

132 A "Frente de Atração Waimiri-Atroari" (FAWA) foi implantada pela FUNAI em 1970,

tendo "como principal objetivo realizar a atração dos Waimiri-Atroari acelerando seu

processo de integração na sociedade nacional, assim como realizar trabalhos de apoio aos

serviços da estrada BR-174" (Relatório da FAWA, de 27.10.73). A política da FAWA,

desde sua implantação, era de manter um contingente muito grande de funcionários na

área (mais de cem em 1977), com o objetivo de submeter os sobreviventes Waimiri-

Atroari, abruptamente, a uma ressocialização forçada em aldeamentos dirigidos pela

FUNAI. Em 1983, havia 59 funcionários quando a população Waimiri-Atroari tinha sido

reduzida a menos de 350 pessoas (BAINES, 1988:99).

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partir de 1970, em que um grande contingente de funcionários da FUNAI impôs

um plano de "integração acelerada", agrupando os sobreviventes Waimiri-

Atroari, em aldeamentos próximos aos postos indígenas. Essas mudanças

abruptas e violentas impostas durante a "pacificação" pelos funcionários da

"Frente de Atração Waimiri-Atroari"(FAWA), submeteram este povo a um

estilo de vida totalmente alheio à sua cultura, seguindo um regime disciplinador

de trabalho agrícola e modelo imposto pela FUNAI. Assim, a população foi sendo

drasticamente dizimada por epidemias que desestruturaram completamente a

rede de aldeias, sendo os sobreviventes submetidos a campos de

ressocialização forçada (os chamados aldeamentos da FAWA).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Enfim, no nosso trabalho, faz uma análise das políticas indigenistas dos

governos militares, nos seus diferentes nuances e fases de desenvolvimento,

com especial ênfase para a atuação da presença militar na administração e na

definição e execução dessas políticas. Além disso, focalizamos de forma

específica a Amazônia, com toda a problemática, envolvendo a questão de

fronteiras, modelos de desenvolvimento e ocupação. As políticas indigenistas e

os massacre dos índios foram analisados tendo como base documental a

imprensa escrita (especialmente jornaise relatórios). E ainda, documentos dos

acervos da FUNAI e do CIMI. O período entre 1967 a 1974 foi escolhido porque

marca o período do processo de desenvolvimento econômico e de exploração

de recursos naturais da Amazônia, mas também, sendo um período em que a

construção da imagem do índio foi utilizada como empecilho para a

modernidade. Nesse aspecto, a nossa pesquisa se torna relevante dentro de

uma perspectiva relacional, ou seja, quando analisamos os processos históricos

que motivaram tais crimes e abordamos as consequências que o período de

repressão e antidemocrático provocou às comunidades indígenas. Com isso,

estamos trazendo à tona personagens e histórias silenciadas.

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