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Jornal de Brasília . Cidades . 6

BRASÍLIA, D O M I N G O, 10 DE AG O S TO DE 2008

DESRESPEITO AO ECA RE L AT Ó R I O AC U S A GDF DE NÃO APLIC AR RECURSOS NA ÁREA

Infância desassistidaED ALVES

I SELMA APA R E C I DA (E), DO CONSELHO TUTELAR DE CEILÂNDIA, AT UA NUMA U N I DA D E E X Í G UA EM NUM

UNIVERSO DE 700 MIL H A B I TA N T E S , Q UA N D O A R E C O M E N DA Ç Ã O É DE PELO MENOS UMA INSTITUIÇÃO PA R A

C A DA G RU P O DE 200 MIL. CRIANÇAS E ADOLESCENTES DE P RO G R A M A S DE P ROT E Ç Ã O SÃO PREJUDICADOS

Mara Puljiz

S obra dinheiro, mas faltaaplicação em programasde proteção da juventude

no Distrito Federal. É o queaponta um relatório elaboradopelo Fórum de Defesa da Crian-ça e do Adolescente (DCA).Segundo o órgão, desde o anopassado, houve baixíssima exe-cução orçamentária por parte doGDF em programas de proteçãona área da infância e da ado-lescência. A situação prejudica ofuncionamento das políticas pú-blicas desta área.

Para se ter uma idéia dadimensão do problema, o in-vestimento não teria chegado a1% da verba autorizada peloGoverno Federal para a ma-nutenção e funcionamento dosdez Conselhos Tutelares no DF.

Segundo o Fórum DCA,dos R$ 350.370, até agora,pouco mais de R$ 5 mil teriamsido aplicados na instituiçãoresponsável por zelar pelocumprimento dos direitos dacriança e do adolescente.

De acordo com o Fórum, asituação vem ocorrendo desde2007 e tem se repetido com maisintensidade este ano em áreasque envolvem a erradicação dotrabalho infantil, enfrentamentoda violência sexual, criação decreches e repasse de verba paraos Conselhos de Direito daCriança e do Adolescente doDF, responsáveis pelo recebi-mento de denúncias relacio-nadas à juventude.

O estudo aponta que in-vestimento para a erradicaçãodo trabalho infantil deveria tersido de R$ 4.825.906, no anopassado – entretanto, apenas9,57% desse montante teriamsido gastos pelo governo local. Odinheiro destinado à manuten-ção e funcionamento dos con-selhos de direito, ainda de acor-do com o levantamento do Fó-rum, também é escasso.

Enquanto, em 2006, 94%dos R$ 171.970 foram aplicadosem programas de proteção decrianças e adolescentes, em2007 a situação foi alarmante:nenhum centavo dos R$358.483 previstos teriam sidogastos. Este ano, a situação pa-rece seguir os mesmos índices doano anterior. Até agora, nenhumreal dos R$ 200.179 disponíveisfoi utilizado.

l Pr o m o t o r i aDiante desse quadro, os pro-

motores de Justiça de Defesa daInfância e da Juventude, Luisade Marillac e Pedro Oto de Qua-dros, entraram com uma re-presentação junto ao Tribunal deContas do Distrito Federal(TCDF), para que se regularizea aplicação dos investimentos."Entendemos que tem sido umasituação calamitosa. Esperamosque o TCDF adote uma posturade muito rigor com o GDF",disse Oto de Quadros.

Para ele, a questão orça-mentária pode ser encarada co-mo um ato de inconstitucio-nalidade e improbidade admi-nistrativa. A criança, destaca, de-veria ser atendida com prio-ridade absoluta, conforme diz oartigo 4º do Estatuto da Criançae do Adolescente (ECA).

A garantia de prioridadecompreende, ainda, a destinaçãoprivilegiada de recursos públicosnas áreas relacionadas com aproteção à infância e à juventude(veja quadro ao lado). "A nãoaplicação dos recursos compro-mete a qualidade e o pleno fun-cionamento das políticas públi-cas e reflete diretamente nobem-estar da população", avaliaOto de Quadros. O MinistérioPúblico quer entender para ondetem ido a verba destinada para ajuventude. "Até agora não re-cebemos explicação nenhuma.Estamos mantendo um diálogocom o governo e esperamos que,neste ano, a situação seja di-ferente", disse o procurador.

Conselho está na penúriaDentre os que mais sofrem

pela falta do repasse de re-cursos estão os conselhos tu-telares. Diariamente, rece-bem dezenas de jovens comproblemas relacionados aouso de droga, abuso sexual eem conflito familiar. No DF,há dez conselhos. O Con-selho Tutelar de Ceilândia,por exemplo, é o que maisfaz atendimentos.

São apenas cinco conse-lheiros para uma populaçãode quase 700 mil pessoas,enquanto a recomendação doConanda é de, pelo menos,um conselho para 200 milhabitantes. "Estamos cheiosde trabalho. Cada conselheirocuida, em média, de 600 pro-cessos, mas a gente acabaatendendo casos mais gritan-tes. Tenho na minha casa 150casos", diz a conselheira Sel-ma Aparecida Santos.

Além da alta demanda, osconselheiros convivem com

problemas estruturais. NoConselho Tutelar de Ceilân-dia, uma sala é destinada aoatendimento dos adolescen-tes. O órgão funciona numasala emprestada de um centrocultural da QNN 13. No lugarde paredes de concreto, di-visórias. Assim, a conversa en-tre vítima e conselheiro é fa-cilmente ouvida pelas pessoasque aguardam atendimento."Não há privacidade", apontaa conselheira. "O espaço épequeno e tem assuntos de-licados e sigilosos que nãopodem ser ouvidos".

O conselho não tem apa-relho de fax (para encami-nhamento de ofícios), faltapapel para impressão e com-putadores estão sem funcio-nar devido à falta de ma-nutenção. Acumulam-se 15mil processos, desde 2000,sem lugar para ser guardados.Os arquivos estão lotados decasos e as gavetas mal abrem

de tanto papel. Vários ofíciosforam encaminhados à Se-cretaria de Justiça e Cidadania(Sejus), requisitando armá-rios, mas até agora, segundoos conselheiros, não houveresposta. "São coisas que pa-recem insignificantes, mas sãofundamentais para a proteçãoda criança e do adolescente.Os documentos são cruciaisna vida deles e não podemficar jogados deste jeito", re-clama Selma Aparecida.

Para a assistente socialThais Moreira, do Centro deReferência, Estudos e Açõessobre Crianças e Adolescentes(Cecria), os recursos, na maio-ria, acabam sendo devolvidos àUnião. "É como se Brasília nãopassasse por nenhum proble-ma e não precisasse do di-nheiro. A verdade é que aaplicação dos recursos tem si-do um processo altamente bu-rocrático, como se não seguisseum planejamento".

Secretariasse defendem

Segundo o coordenadorde apoio técnico aos Con-selhos Tutelares da Secretariade Justiça (Sejus), MaurícioAlbernaz, cada conselho tu-telar recebe cerca de R$ 20 milpor ano. O dinheiro, explica,vem sendo repassado pela Se-jus, mas não vinha sendo de-bitado porque não havia umcódigo específico.

"Os gastos eram inclusosna conta geral da Sejus, quemantinha todos os órgãos, en-tre eles os conselhos, que nun-ca deixaram de receber o di-nheiro", informa. "Foi umaalocação de recursos respon-sável". Em 2009, afirma, issoserá corrigido: "Vamos facilitaro trâmite administrativo e cen-tralizar os recursos em umúnico programa".

O mesmo ocorre com orepasse de verba para o pro-grama deenfrentamentoàvio-lência sexual de crianças eadolescentes, mas o represen-tante da Sejus diz que os re-cursos estão sendo gastosdentro da Lei de Responsa-bilidade Fiscal, embora acre-dite que a quantia seja pe-quena diante do desafio. "Ogoverno tem consciência dis-so, mas uma coisa é ser cons-ciente e ter suas limitaçõesfinanceiras", admite.

Sobre os dados levantadospelo Fórum DCA sobre a apli-cação do dinheiro autorizadono Programa de Erradicaçãodo Trabalho Infantil, bem co-mo em relação à construção decreches, a Secretaria de De-senvolvimento Social e Tra-balho (Sedest) se limitou adizer que não condizem com arealidade e que está sendo feitoum levantamento do montanteinvestido. Quanto às creches, aassessoria do órgão informouque nenhum dinheiro foi de-bitado na conta da Sedest eque a responsabilidade seriada Secretaria de Educação.

Segundo a representantedo Fórum DCA, Perla Ribeiro,a situação demonstra o de-sinteresse do governo em po-líticas voltadas para os jovens."Ao fazer esse levantamento, agente se deparou com umdescaso do governo. Em ou-tubro, vamos retomar o re-latório e ver se a execução dosrecursos melhoraram, mas atéagora a realidade tem seguidoo mesmo rumo de 2007. Oque está acontecendo chega aser vergonhoso, mas espera-mos que o Estado passe acumprir com o seu dever."

O que diz o Estatutoda Criança e doAdolescente

I Art. 4º: É dever da

família, da

comunidade, da

sociedade em geral e

do poder público

assegurar, com

absoluta prioridade, a

efetivação dos direitos

referentes à vida, à

saúde, à alimentação, à

educação, ao esporte,

ao lazer, à

profissionalização, à

cultura, à dignidade, ao

respeito, à liberdade e

à convivência familiar e

comunitária;

I Parágrafo único: A

garantia de prioridade

compreende:

destinação privilegiada

de recursos públicos

nas áreas relacionadas

com a proteção à

infância e à juventude

ANTONIO SIQUEIRA

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