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SALUTE
CLÓVIS RICARDO MONTENEGRO DE LIMA
BIBLIOTECONOMIA VOLUME 3
E DISCURSO
HABERMAS, DISCURSOE ORGANIZAÇÕES
ORGANIZADOR
CLÓVIS RICARDO MONTENEGRO DE LIMA
(Organizador)
HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES
Volume 3
BIBLIOTECONOMIA
E DISCURSO
Rio de Janeiro
2019
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
© 2019 EDITORA Salute
Organizador: Clóvis Ricardo Montenegro de Lima.
Diagramação: Tirza Cardoso.
Capa: Tirza Cardoso Ferreira Rodrigues Vargas.
Escultura da capa: Tasso Scherer
Revisão: Dos autores.
Ficha catalográfica elaborada por Daniela Capri CRB14/1418
B582
Biblioteconomia e discurso / Organizador Clóvis Ricardo
Montenegro de Lima. — Rio de Janeiro: Salute, 2019.
(Habermas, discurso e organizações, v. 3)
187 p.
ISBN: 978-85-68478-08-0
1. Habermas, Jurgen. 2. Agir Comunicativo. 3. Discurso.
4.Luhmann. 5. Biblioteconomia. I. Lima, Clóvis Ricardo
Montenegro de, Org. II. Série.
CDD 193 (22ª Ed.) CDD 193 (22ª Ed.)
Este trabalho está licençiado sob a Licença Atribuição-Não Comercial 3.0 Brasil da Creative Commons. Para ver uma cópia desta licença, visite http://creativecommons.org/licenses/bync/3.0/br ou envie uma carta para Creative Commons, 444 Castro Street, Suite 900, Mountain View, California, 94041, USA.
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
Agradeço a Maria Nélida González de Gomez
e Flávio Beno Siebeneichler,
por me apresentar e orientar os estudos de Habermas.
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
Dedico este trabalho aos meus pais,
Clóvis e Regina (em memória),
meus irmãos, Cássio, Carlos e Célia
e meus filhos, Eduardo e Nicolas.
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
PREFÁCIO
Nos assentos acadêmicos da graduação, futuros bibliotecários aprendem que as
bibliotecas são organizações complexas. Encarar estas organizações como lugares de guarda da
memória legitimada (e legitimadora) do saber socialmente relevante e disponibilizá-la ao
público, passa a ser parte do cotidiano profissional daqueles que assumem este fazer
profissional.
Avançar este "saber fazer" arregimentando a reflexão em nível de pós-graduação é uma
necessidade - e cada vez mais, um luxo - para os que escolhem pensar a profissão do lugar
discursivo comunicacional.
Neste volume, o professor Clóvis Ricardo Montenegro de Lima reúne trabalhos que
supervisionou em disciplinas por ele ministradas no Programa de Pós-Graduação em Ciência
da Informação abrigado sob o mandato acadêmico da UFRJ. Tenho a honra de assinar um
destes, porque eu mesma solicitei acompanhar suas aulas ao lado de mestrandos e doutorandos
em 2015!
Nestes trabalhos veremos Habermas em discussões com outros autores da Filosofia e da
Sociologia. Tateamos todos? Sim, tangenciamos questões, vislumbramos respostas.
Percebemos problemas, intentamos soluções; todas elas pautadas na consciência do trabalho
em equipes humanas nas bibliotecas. Há a consciência sobre a questão da verdade encoberta na
seleção das bibliotecas e a mentira descoberta nas obras e algumas coleções em que o poder de
seleção não consegue atuar pelas complexas determinações institucionais; há a questão da
construção discursiva das normativas dos trabalhos cooperativos, uma tradição da
biblioteconomia, tanto pra os repositórios digitais, como para a Biblioteca Digital de Teses e
Dissertações; há a questão da ética do discurso em todo o trabalho informacional e finalmente
a competência comunicativa como uma das competências necessárias ao profissional de
informação.
"Existirmos, a que será que se destina?" Este verso de Cajuína, canção de Caetano Veloso em
homenagem poeta Torquato Neto que Habermas jamais deve ter escutado, encerra uma das
principais questões da Filosofia, desde os gregos. E é respondida pelo próprio Habermas:
existimos para nos entendermos ... "nesta matéria vida tão fina".
Bibliotecas são instituições que operam no mundo da vida. Nelas operam pessoas que amam,
que pensam, que fazem. Aí está uma contribuição informada e consistente de bibliotecários que
pensam no que fazem.
Marcia Heloísa Tavares de Figueredo Lima
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
APRESENTAÇÃO
A publicação destas coletâneas visa mostrar de modo organizado os resultados de 10
anos de pesquisas para uma teorização critica da informação, a partir da Teoria do Agir
Comunicativo de Jürgen Habermas, investigando e discutindo suas aplicações, principalmente
na administração de organizações complexas como institutos de pesquisa, universidades e
hospitais. Espera-se contribuir para a administração das organizações, particularmente no que
se refere à melhoria de processos e a inovação. Este trabalho faz parte das atividades
desenvolvidas como pesquisador do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia
– IBICT a partir de abril de 2009.
A investigação parte do pressuposto de que as organizações se constituem e funcionam
reduzindo a complexidade das relações sociais, particularmente no que se refere à redução das
dinâmicas de comunicação, em combinação com a racionalização estratégica dos seus
processos. Uma das formas privilegiadas de redução da complexidade da comunicação é através
da estruturação dos fluxos de informação, que reduz a comunicação à perspectiva do observador
externo.
A redução da complexidade pode ser adequada para organizações e processos
produtivos simples. Os fluxos estruturados de informação funcionam para a repetição de
funções, como em procedimentos operacionais. Entretanto, eles parecem ser insuficientes e
inadequados para melhoria de processos e inovações tecnológicas em organizações complexas.
Organizações mais complexas precisam de grande autonomia dos seus trabalhadores e
os seus usuários participam ativamente dos processos produtivos. Isto é particularmente
relevante em organizações focadas na produção e no uso intensivo de saberes e tecnologias.
Nestes casos parece ser necessário ampliar as dinâmicas complexas das organizações, de modo
a que se fortaleçam a solidariedade e a colaboração.
É partir destes pressupostos que são investigadas, analisadas e discutidas as melhorias
de processos e a inovação, relacionando-as com as dinâmicas de informação e comunicação. A
Teoria do Agir Comunicativo abre possibilidades éticas e políticas de ir além da reprodução
das formas hegemônicas da economia capitalista, constituindo processos éticos e políticos em
que os sujeitos se singularizam, conquistam autonomia e podem colaborar.
Espera-se contribuir para melhor compreensão crítica dos novos paradigmas de informação
e comunicação, particularmente no contexto das organizações complexas, contextualizando-a
no processo de construção da sociedade de bem-estar. Ao mesmo tempo a melhor compreensão
da melhoria de processos e da inovação pode contribuir para maximizar resultados substantivos
nos esforços para reduzir desigualdades sociais e econômicas no país e para promoção do bem-
estar social.
Este trabalho evidencia que a mudança de perspectiva da filosofia da consciência para a
filosofia da linguagem, especialmente com o uso das Teorias do Agir Comunicativo e do
Discurso de Habermas, constitui-se em poderoso instrumento de crítica do trabalho com
informação e da administração da informação em organizações. O abandono da visão
funcionalista e instrumental pode ser compensado por uma reconstrução dos modos de ação nos
contextos organizacionais a partir dos recursos dos mundos da vida dos seus participantes, mais
amplos e mais complexos do que a visão do observador não participante e do participante não-
critico.
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
A abordagem discursiva crítica pode contribuir para uma abordagem racional ampliada
das organizações. A primeira grande questão sobre o uso da Teoria do Agir Comunicativo é
exatamente a possibilidade real desta abordagem racional comunicativa dentro das
organizações. Cabe recordar que no agir comunicativo em sentido fraco o entendimento mútuo
significa apenas que o ouvinte compreende o conteúdo da declaração de intenção ou da
solicitação e não duvida de sua seriedade. A base do entendimento mútuo eficaz para a
coordenação de ação é a aceitação da pretensão de veracidade levantada para declaração de
intenção ou solicitação, pretensão autenticada pela racionalidade reconhecível de uma decisão.
O discurso e as argumentações são como ilhas ameaçadas de se verem submersas pelas
ondas no oceano de uma prática onde o modelo da solução consensual dos conflitos de ação
não é de modo algum dominante. Os meios de entendimento mútuo não cessam de se verem
desalojados pelos instrumentos da violência. Assim, o agir que se guia por princípios éticos tem
que se arranjar com os imperativos resultantes das imposições estratégicas. É nesta espécie de
restrições ao discurso que o poder da história se faz valer em face das pretensões e interesses
transcendentes da razão.
Outra questão relevante parece ser como é que os participantes de uma interação podem
coordenar seus planos de ação, evitando conflitos e o risco de uma ruptura da interação. Na
ação orientada para o sucesso a coordenação das ações de sujeitos que se relacionam depende
do modo como se dão os cálculos de ganhos egocêntricos. O grau de cooperação e a estabilidade
resultam das faixas de interesses dos participantes. No agir comunicativo são harmonizados os
planos de ação sob a condição de um acordo existente ou a se negociar sobre a situação e as
consequências esperadas.
Rio de Janeiro, 1 de junho de 2019.
Clóvis Ricardo Montenegro de Lima.
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
SUMÁRIO
Capítulo 1
ADMINISTRAÇÃO DISCURSIVA: UMA NOVA PERSPECTIVA PARA AS BIBLIOTECAS
UNIVERSITÁRIAS BRASILEIRAS ..................................................................................................................... 11
Clóvis Ricardo Montenegro de Lima; Simone Faury Dib
Capítulo 2
COMPETÊNCIA COMUNICATIVA: UMA COMPETÊNCIA ADMINISTRATIVA PARA O BIBLIOTECÁRIO
UNIVERSITÁRIO CONTEMPORÂNEO ............................................................................................................ 32
Clóvis Ricardo Montenegro de Lima; Fabiana Menezes Santos da Silva; Geni Chaves Fernandes
Capítulo 3
ADMINISTRAÇÃO DE BIBLIOTECAS EM INSTITUIÇÕES PRIVADAS DE ENSINO SUPERIOR: UMA
ABORDAGEM DISCURSIVA A PARTIR DAS NOVAS DEMANDAS DE ACESSO E USO DA INFORMAÇÃO
................................................................................................................................................................................... 43
Clóvis Ricardo Montenegro de Lima; Fátima Santana da Silva; Geni Chaves Fernandes
Capítulo 4
AÇÃO DISCURSIVA DO BIBLIOTECÁRIO ESCOLAR ................................................................................... 62
Clóvis Ricardo Montenegro de Lima; Simone Alves da Silva
Capítulo 5
ADMINISTRAÇÃO DA INFORMAÇÃO PARA A INOVAÇÃO EM UMA ORGANIZAÇÃO ...................... 80
Clóvis Ricardo Montenegro de Lima; Lidiane dos Santos Carvalho
Capítulo 6
DA COMISSÃO NACIONAL DA VERDADE AO DIREITO À VERDADE: A VALIDAÇÃO DISCURSIVA DAS
COLEÇÕES NAS BIBLIOTECAS ......................................................................................................................... 95
Clóvis Ricardo Montenegro de Lima; Kelly Pereira de Lima; Sarah Miglioli
Capítulo 7
CONTRIBUIÇÕES DA DISCURSIVIDADE PARA A CONSTRUÇÃO DE REPOSITÓRIOS
DIGITAIS .............................................................................................................................................................. 110
Clóvis Ricardo Montenegro de Lima; Jobson Francisco da Silva Júnior; Márcio da Silva Finamor
Capítulo 8
UMA ABORDAGEM HABERMASEANA PARA OTIMIZAR O DESENVOLVIMENTO DE
ORGANIZAÇÕES: O CASO DA BIBLIOTECA DIGITAL DE TESES E DISSERTAÇÕES
BRASILEIRA ........................................................................................................................................................ 127
Bruna Carla Muniz Cajé; Clóvis Ricardo Montenegro de Lima; Marcia H. T. de Figueredo Lima
Capítulo 9
UMA ABORDAGEM HUMANÍSTICA PARA O TRABALHO COM INFORMAÇÃO .............................. 142
Clovis Ricardo Montenegro de Lima; Tirza Cardoso Ferreira Rodrigues Vargas;
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[10]
Capítulo 10
UMA PERSPECTIVA ÉTICA PARA O TRABALHO INFORMACIONAL: O DISCURSO EM
ORGANIZAÇÕES COMPLEXAS ....................................................................................................................... 155
Clóvis Ricardo Montenegro de Lima; Márcio da Silva Finamor
SOBRE OS AUTORES ........................................................................................................................................ 180
PUBLICAÇÃO ORIGINAL DOS ARTIGOS ..................................................................................................... 185
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[11]
Cap
ítulo
1 ADMINISTRAÇÃO DISCURSIVA: UMA NOVA PERSPECTIVA PARA AS BIBLIOTECAS UNIVERSITÁRIAS BRASILEIRAS
Clóvis Ricardo Montenegro de Lima
Simone Faury Dib
_____________________________________________________________________________
Resumo: Introdução: Neste artigo é apresentada visão geral sobre as bibliotecas universitárias na
sociedade contemporânea, abordados os pressupostos básicos relacionados à administração discursiva
e reveladas as formas de administração utilizadas nessas bibliotecas, divulgadas no Seminário
Nacional de Bibliotecas Universitárias (SNBU). Objetivo: Embasar a proposta de administração
discursiva nas bibliotecas universitárias brasileiras, como alternativa às formas vigentes. Metodologia:
Investigação das formas de administração utilizadas nas bibliotecas universitárias brasileiras, na
sociedade contemporânea, divulgadas no Seminário Nacional de Bibliotecas Universitárias.
Resultados: Apresenta diretrizes gerais para adoção da administração discursiva nas bibliotecas
universitárias. Conclusões: A administração discursiva constitui-se em alternativa possível e
interessante, coerente com as demandas da sociedade contemporânea e que pode contribuir para o
desenvolvimento das pessoas, a racionalização dos processos organizacionais, a aprendizagem e a
inovação. Palavras-chave: Habermas. Biblioteca universitária. Administração de bibliotecas.
Administração discursiva. Teoria do agir comunicativo. Ética do discurso.
_____________________________________________________________________________
1 INTRODUÇÃO
A transição da sociedade industrial para a sociedade da informação provoca mudanças
econômicas, sociais e políticas. Nesse novo cenário, que privilegia um modelo de produção mais
flexível, a multidisciplinaridade, a criatividade, a pro atividade, a otimização do tempo de resposta, a
não delimitação de fronteiras “espaciais” e, principalmente, a valorização do trabalho intelectual e das
habilidades das pessoas, a informação e o conhecimento são considerados recursos fundamentais para
o crescimento econômico e social.
A biblioteca universitária, organização vinculada a uma organização maior – a universidade –
, também se enquadra nesse contexto. Dessa forma, dela são requeridas novas estratégias de ação que
favoreçam sua adequação à nova realidade e permitam, por exemplo, acompanhar os avanços
tecnológicos, desenvolver iniciativas que atendam às demandas dos usuários, procurando sempre estar
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[12]
em consonância com as diretrizes da universidade mantenedora e promover a interação e a colaboração
no ambiente de trabalho.
É fundamental que a forma de administração utilizada na biblioteca valorize a comunicação
tanto interna quanto externa, ou seja, entre todos os membros da biblioteca, entre estes e seus
superiores, usuários e parceiros.
A forma de administração não deve se restringir ao enfoque funcionalista/instrumental, mas
valorizar a interação efetiva entre os indivíduos, viabilizando a criação e a manutenção de vários canais
de comunicação abertos e possibilitando que os habituais canais verticais de comunicação sejam
complementados pelos canais horizontais e diagonais (BARAÑANO, 2005). A comunicação interna
eficiente favorece a comunicação externa, tornando-a adequada e produtiva. O resultado é a
cooperação, a aprendizagem contínua e a inovação. Entretanto, para que esse processo seja pleno, é
fundamental o respeito à diversidade e à pluralidade cultural, e que todos os membros da organização
possam efetivamente participar da tomada de decisão, sem qualquer tipo de coação. Essa mudança de
perspectiva é o diferencial que certamente favorecerá o acompanhamento das novas tendências e,
consequentemente, a adequação das bibliotecas universitárias brasileiras ao novo cenário. Assim, a
administração discursiva, abordagem crítica da Administração a partir das teorias do Agir
comunicativo e do Discurso de Jürgen Habermas, constitui-se em alternativa interessante para as
bibliotecas universitárias brasileiras, uma vez que pode ser considerada uma forma de administração
que valoriza a relação intersubjetiva entre todos os indivíduos, de forma igualitária, e prioriza a tomada
de decisão coletiva e consensual, sem qualquer tipo de coação, possibilitando a aprendizagem, a
melhoria de processos e a inovação.
2 UNIVERSIDADE E BIBLIOTECA UNIVERSITÁRIA
Segundo Prestes (1996, p. 105), a educação pode ser considerada uma ação social entre sujeitos
que acontece “[...] sob o thelos do diálogo, em processo interativo, onde a constituição do sujeito se
dá pela ação comunicativa entre os homens. ” Desta forma, “[...] a recuperação da educação, enquanto
formadora do homem como sujeito de ação cognitiva, ética e política só se efetiva sob a rubrica de
uma razão capaz de produzir entendimento. ”
Nesse cenário, a universidade, que cumpre papel determinante na sociedade contemporânea,
seja exercendo a função precípua de ensino na formação de cidadãos e de profissionais para o mercado
de trabalho, seja nas funções de pesquisa e extensão, é pressionada a se adequar às demandas da
atualidade.
Conforme destaca Dias Sobrinho (2005a, p. 29), a permanência da universidade como
instituição macrossocial imprescindível é justificada em virtude de “[...] sua grande capacidade de
preservar sua solidez estrutural e de se renovar continuamente, sem, entretanto, se desnaturar ou
afastar-se dos seus princípios naturais. ” Essa solidez, que permitiu a sobrevivência da universidade
ao longo de séculos, deve-se a duas características contraditórias:
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[13]
De um lado a universidade guarda uma forte tendência a resistir às mudanças e de assegurar
a unidade, por outro lado ela apresenta grande flexibilidade, capacidade de adaptação às
mudanças que vão surgindo e abertura à diversidade. A universidade tem sobrevivido a todas
as mudanças sociais porque, ainda que erre e falhe, tem enorme capacidade de se superar, de
se adaptar, de se transformar e de pensar o futuro (DIAS SOBRINHO, 2005a, p.29-30).
A emergência das tecnologias de informação e comunicação e a globalização são aspectos
importantes que afetam as universidades na sociedade contemporânea. Sobre a influência das novas
tecnologias, destaca-se o ponto de vista de González de Gómez (2011, p. 237), no qual afirma que “A
reconstrução argumentativa de uma universidade plural e comunicativamente interativa, teria que
atender a condições e possibilidades que vão além das infraestruturas de acesso. ” A autora destaca o
fato de que, ao mesmo tempo em que as tecnologias de informação e comunicação favorecem o
surgimento de novas formas de “[...] reunião de saberes e pessoas, geram também novas formas de
dispersão, novas polifonias, novas formas em que os quadros normativos ficam obscurecidos pelas
novas expressões polinômicas de redes sem fronteiras institucionais. ” Dessa forma, a universidade,
na perspectiva de González de Gómez (2011, p. 237), deve manter
[...] suas funções de provisão de recursos aos mundos da vida, através da formação e de
diferentes funções e atividades, mas principalmente, através de espaços públicos constituídos
no interior dos diferentes campos disciplinares, e desde onde a Universidade estabelece uma
comunicação pública, plural e dispersa com a sociedade.
A globalização, por sua vez, além de provocar transformações na economia, no comércio e na
cultura, afeta o ensino superior e a universidade. Como ressalta Dias Sobrinho (2005b, p. 169) “[...]
nos países de industrialização avançada, induz novos temas e práticas de pesquisa, difunde rápida e
amplamente os resultados e aplicações das investigações. ” Essas mudanças impactam os
pesquisadores e sua relação com a ciência e a sociedade. Dias Sobrinho (2005b, p. 169) destaca três
aspectos, nesse sentido, que considera relevantes:
O primeiro é o quantitativo: nos últimos cinqüenta anos, e de modo crescente, a humanidade
vem apresentando um acúmulo de conhecimentos incomparavelmente superior a qualquer
outro período. Uma segunda observação diz respeito a uma mudança na esfera da produção
dos conhecimentos, especialmente caracterizada por uma tendência de passagem da ciência
básica, muitas vezes da pesquisa desinteressada, para os contextos de aplicação e de controle
do conhecimento. O impacto disso, e esse é o terceiro aspecto, é muito grande tanto nas esferas
mais alargadas quanto nas microdimensões da vida.
A educação superior, na concepção de Dias Sobrinho (2005b, p. 170), constitui-se em
patrimônio público quando “[...] exerce funções de caráter político e ético, muito mais que uma
simples função instrumental de capacitação técnica e treinamento de profissionais para as empresas.
” O autor acredita ser fundamental que a educação superior
[...] produza conhecimentos e formação com um grande sentido de pertinência social. Por
meio do conhecimento e do trabalho de formação, sem abdicar de suas competências críticas,
ela deve desenvolver à capacidade de resposta às demandas e às carências da sociedade. A
pertinência requer autonomia para identificar as prioridades e o conteúdo social das carências
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[14]
e demandas. Isso exige uma ampla participação de estudantes, professores e pesquisadores na
definição de prioridades sociais e na produção e socialização do conhecimento rigoroso e
adequado. [...] é preciso instaurar uma ética da responsabilidade social que vincule os atores
acadêmicos e os agentes da sociedade civil organizada às agendas públicas realmente voltadas
ao atendimento das demandas das populações, e não à legitimação do mercantilismo da
globalização neoliberal.
Em sua análise, Dias Sobrinho (2005b, p. 172) considera que a educação superior é importante
na medida em que “[...] seja um bem público e [...] desenvolva o conhecimento e a formação como
bens comuns e direitos de todos [...]” e, também, “[...] que sirva ao desenvolvimento econômico,
porém como um instrumento de humanização e não como horizonte último e razão determinante da
sociedade. ” Nessa perspectiva, a autonomia e a solidariedade são valores que devem ser construídos,
com o intuito de que o:
[...] aumento da produtividade e o fortalecimento da dimensão material das sociedades não se
afastem da produção de maior eqüidade, inclusão e participação social. Não há porque rejeitar
os progressos materiais se eles efetivamente vêm fundados na produção de sentidos, na ética
da justiça social, das políticas de maior inclusão e da mais ampla participação dos cidadãos
na vida pública (DIAS SOBRINHO, 2005b, p. 172).
A universidade, na concepção de Habermas (1993), deve recuperar sua função de ser o lugar
em que os processos de aprendizagem devem ser privilegiados. Segundo Habermas (1993, p. 122)
“[...] o sistema científico diferenciado não deve desenvolver-se apenas em ligação com a economia, a
técnica e a administração, mas antes, por meio da sua tradicional convergência de funções, manter-se
enraizado no ‘mundo da vida. ” Embora a universidade acompanhe as inovações, não deve deixar de
priorizar suas principais funções que estão relacionadas ao desenvolvimento social, cultural e ético.
Habermas (1993, p. 128) afirma que “[...] são as formas comunicativas da argumentação
científica que afinal permitem dar coesão e unidade aos processos de aprendizagem universitária nas
suas diversas funções. ” Desta forma, o autor defende que todos os indivíduos, em seus mundos da
vida, têm competência para aceitar ou rejeitar argumentos, em contextos conflituosos, problemáticos,
reflexivos e deliberativos, não sendo função exclusiva das comunidades de eruditos, “[...]
reformulando assim aquela idealização iluminista do uso público da razão, e abrindo uma via de
articulação entre as universidades, a esfera pública e os mundos da vida. ” (GONZÁLEZ DE GOMÉZ,
2011, p.
236).
Outra questão importante relacionada à universidade na sociedade contemporânea,
especialmente a universidade brasileira, diz respeito à forma de administração. Segundo Bernheim e
Chauí (2008, p. 12), a universidade atual passa a ser considerada
[...] organização administrada (no sentido em que Adorno e Horkheimer empregam o conceito
de administração capitalista) [...]. Governada mediante contratos de gestão, avaliada com base
em indicadores de produtividade e projetada para ser flexível, a universidade é estruturada
por estratégias e programas de eficiência organizacional, ou seja, pela particularidade e
instabilidade dos meios e objetivos.
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[15]
É importante esclarecer que a reforma do Estado realizada no governo brasileiro, afeta a
universidade no país, principalmente a universidade pública. Segundo Chauí (2003, p. 6) essa reforma,
[...] ao definir os setores que compõem o Estado, designou um desses setores como setor de
serviços, não exclusivos do Estado e nele colocou a educação, a saúde e a cultura. Essa
localização da educação no setor de serviços não exclusivos do Estado significou: a) que a
educação deixou de ser concebida como um direito e passou a ser considerada um serviço; b)
que a educação deixou de ser considerada um serviço público e passou a ser considerada um
serviço que pode ser privado ou privatizado. [...]. A reforma do Estado definiu a
universidade como organização social e não como uma instituição social (grifo nosso).1
Neste cenário em que as universidades passam por mudanças que provocam rupturas em seus
modelos estabelecidos, as unidades a elas vinculadas também são afetadas pelos impactos dessas
transformações. A biblioteca universitária, como instituição partícipe de todo esse processo, precisa
ser adequada às exigências do novo contexto, para atender às novas demandas e, assim, fortalecer a
parceria com a comunidade acadêmica.
Sobre a importância da biblioteca universitária para a universidade, destaca-se o ponto de vista
de González de Gómez (2011, p. 239), ao enfatizar que:
A recomposição virtual de uma esfera pública ampla a partir das plurais esferas públicas
situadas hoje em estruturas ainda segmentares da universidade (Escolas, departamentos, redes
temáticas de pesquisa) pode ter nos sistemas de Bibliotecas Universitárias um ator
privilegiado, enquanto aberto a parcerias e a re-significações de práticas, instrumentos,
mediações. Um ponto diferencial seria sua intervenção para promover a articulação das
esferas públicas internas das “pequenas sociedades” disciplinares [...] com as esferas públicas
e os múltiplos atores da sociedade civil e os públicos anônimos que lutam pela construção da
voz; atualização do papel da universidade – aninhadas nas esferas públicas, com seus feixes
de funções, unificadas não por uma unidade ideal da ciência nem por uma forma
administrativa abstrata, mas pela sua imersão nas heterogêneas e porosas esferas
comunicativas dos mundos da vida.
Sob essa perspectiva, as bibliotecas universitárias podem ser consideradas parte das
expectativas e das possibilidades da construção de espaços comuns do conhecimento, que reúnem as
tecnologias de informação e comunicação e as energias “[...] reflexivas e produtivas de seus processos
infocomunicacionais, como sua contribuição para tornar permeáveis e interativas as esferas públicas
internas dos campos disciplinares e as esferas práticas e instrumentais das complexas sociedades
contemporâneas. ” (GONZÁLEZ DE GÓMEZ, 2011, p. 240).
As bibliotecas universitárias seguem as diretrizes e as políticas de sua universidade
mantenedora e, por isso, sua autonomia é limitada. Sua missão é apoiar as atividades de ensino,
1 A Lei nº 9.637 de 15 de maio de 1998 “Dispõe sobre a qualificação de entidades como organizações sociais, a criação
do Programa Nacional de Publicização, a extinção dos órgãos e entidades que menciona e a absorção de suas atividades
por organizações sociais, e dá outras providências. ” (BRASIL, 1998).
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[16]
pesquisa e extensão da universidade, contudo, sua estrutura e serviços, de forma geral, têm
características próprias.
Durante muito tempo, essas bibliotecas são reconhecidas como o repositório do conhecimento
das universidades, cujo objetivo principal é proporcionar o acesso a esse conhecimento e, assim,
transmiti-lo às novas gerações. Entretanto, na atualidade, a biblioteca universitária está deixando o seu
lugar como principal fonte de busca, em virtude, principalmente, da evolução das tecnologias.
É importante observar, também, que pesquisa realizada no Brasil, no ano de 2012, pela
Interactive Advertising Bureau (IAB) em parceria com a empresa de pesquisas de mercado comScore,
com o objetivo de analisar os hábitos dos internautas brasileiros e identificar a relação destes usuários
com a publicidade digital, revela que “[..] 82% dos brasileiros com acesso à internet consideram a web
uma ferramenta indispensável e essencial para a sobrevivência. ” Além disso, a pesquisa mostra que
“[...] a internet é preferencialmente usada pelos jovens, mas que o uso da web é feito por pessoas de
todas as idades, classes e regiões, além de ser a atividade preferida para entreter. ” (FERRER, 2012).
O panorama apresentado mostra mudança nos hábitos e comportamentos de busca por
informação. As tecnologias de informação e comunicação influenciam, de forma contundente, a
relação usuário - biblioteca - fonte de informação. O ambiente informacional passa a ser, em grande
escala, virtual, deixando de ser exclusivamente presencial.
Na opinião de Vergueiro, Castro Filho e Silva (2011, p. 67):
Cada vez mais, o modelo convencional de propriedade dos materiais informativos perde
espaço para o modelo de acesso atual. Hoje, as bibliotecas universitárias são instituições
híbridas, tanto no sentido de armazenamento do acervo como na prestação dos serviços, em
ambos os casos abrangendo elementos físicos e eletrônicos.
Neste cenário, emerge, também, a discussão sobre a “[...] desmaterialização da biblioteca e da
obsolescência da ideia de biblioteca como espaço [...]” (AMANTE, 2007, p. 2). Entretanto, em meio
ao debate, é importante considerar que as bibliotecas, especialmente as universitárias, constituem-se
em ambientes de aprendizagem, onde os usuários estudam, realizam investigações e se encontram.
“Esta ideia é tão forte que, em muitos países, a construção de novos edifícios para a biblioteca deixou
de ter como prioridade a arrumação física dos materiais e passou a considerar os utilizadores e as
atividades por si desenvolvidas. ” (AMANTE, 2007, p. 3).
As mudanças sociais e econômicas impactam no desenvolvimento e a sustentabilidade das
bibliotecas universitárias, e estudos são realizados com o objetivo de identificar tendências e/ou
propostas para as mesmas. Em nível nacional pode-se citar o trabalho de Cunha (2010) e em nível
internacional, destacam-se as pesquisas desenvolvidas pelo ACRL2 Research, Planning and Review
Committee3, um componente do Research Coordinating Committee.
2 A Association of College & Research Libraries (ACRL) é uma divisão da American Library Association (ALA). 3 O comitê é responsável por criar e atualizar uma varredura contínua e dinâmica no ambiente que engloba as tendências
nas bibliotecas universitárias, no ensino superior e de forma mais ampla, como, por exemplo, no ambiente econômico,
demográfico e político, proporcionando anualmente uma varredura ambiental rápida. Além disso, o comitê tem como
responsabilidade identificar "as 10 maiores tendências” da ACRL e divulgá-las de 2 em 2 anos. Para identificá-las, os
membros do comitê fazem revisão de literatura, participam de conferências e entram em contato com especialistas
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[17]
A expansão do espaço virtual e o reaproveitamento do espaço físico nas bibliotecas, a ênfase
cada vez maior na cooperação e na colaboração entre os bibliotecários, o E-science, a curadoria de
dados, a preocupação com a preservação de documentos digitais, com as mudanças na educação
superior e com a gestão de pessoas (bibliotecários) são algumas questões também contempladas nos
estudos que, juntamente com as anteriores, apontam necessidade de adequação da biblioteca
universitária às novas demandas da sociedade contemporânea. Para isso, é fundamental repensar a
biblioteca universitária como um todo, extrapolando o conceito de biblioteca tradicional, balizada
basicamente na posse da informação, para espaço facilitador da aprendizagem e de socialização, que
seja provedor de acesso a múltiplas fontes de informação e, ao mesmo tempo, represente fórum de
interação e colaboração entre os usuários, entre esses e os bibliotecários, entre os parceiros da
biblioteca e os funcionários da universidade com os bibliotecários.
3 ADMINISTRAÇÃO DISCURSIVA
A distorção comunicativa é comum no âmbito das organizações, centradas na lógica
competitiva do mercado econômico, em que os indivíduos são considerados instrumentos que podem
ser manipulados (VIZEU, 2005).
A cultura organizacional capitalista fomenta a concorrência entre os membros da organização,
visando à eficiência e à eficácia. No entanto, a competição de todos contra todos limita a comunicação,
impedindo que as informações relevantes fluam livremente por toda a organização. Por sua vez, a “[...]
competição gera o ‘segredo do negócio’ entre as divisões, de modo que as possibilidades de
colaboração entre elas tornam-se cada vez mais exíguas. ” (GUTIERREZ, 1999, p. xi). Assim, a
comunicação interna nas organizações é estruturada em fluxos orientados para o sucesso e, dessa
forma, os participantes dos processos internos – os membros da organização – são geridos para agir
de acordo com esses interesses, o que acarreta a perda da autonomia para agir, para falar e para facilitar
a circulação das falas (LIMA; CARVALHO; LIMA, 2010).
A linguagem, nesse caso, é utilizada apenas como instrumento nas organizações, com o
objetivo de auxiliar o alcance dos objetivos. “O esforço focado na rentabilidade resulta em redução
dos participantes dos processos produtivos a condição de trabalhadores silenciosos. ” (LIMA;
CARVALHO; LIMA, 2010, p. 14). Entretanto, a linguagem é inerente ao ser humano e o seu uso nas
organizações, como expressão, representação e integração4, não apenas como instrumento, possibilita
a comunicação entre os indivíduos, o que é fundamental para que se produzam e compartilhem valores
familiarizados com as tendências atuais relacionadas à educação superior (ASSOCIATION OF COLLEGE AND
RESEARCH LIBRARIES, 2012). 4 Segundo González de Goméz (2009, p. 116), “A potência da linguagem sobre a qual se sustenta a racionalidade
comunicativa é exercida em três direções: como representação, pela remissiva do enunciado a um domínio de referência;
como comunicação, enquanto construção em comum de significados e instauração do compromisso pragmático entre os
participantes da ação comunicativa; como expressão da subjetividade, por colocar o ator social frente aos outros,
parceiros, públicos ou oponentes, dando ocasião à atitude reflexiva e à formação de identidades, que são condições da
autonomia e responsabilidade de sujeitos imputáveis.”
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[18]
e conhecimentos. Nesse sentido, o discurso nas organizações amplia as perspectivas de representação
de seus interesses, “[...] politizando suas decisões e possibilitando a racionalização mediadora
discursiva. ” (LIMA; CARVALHO; LIMA, 2010, p. 15). Assim, o discurso
[...] tem papel ativo na transformação das organizações, valorizando e viabilizando expressão
e comunicação entre os que participam dos processos produtivos. A ampliação da expressão
das perspectivas e a viabilidade da comunicação que vão proporcionar a aprendizagem a partir
dos próprios processos produtivos (LIMA; CARVALHO; LIMA, 2010, p. 15).
A Teoria do Agir Comunicativo e a Ética do Discurso, de Jürgen Habermas, podem contribuir
para o desenvolvimento de abordagem não funcionalista da Administração, baseada na discussão
argumentativa como forma de mediar situações de conflito de poder e fixar ações comuns.
Segundo Habermas (1989), a discussão prática ocorre quando o modo de agir carece de
fundamentação de natureza coletiva e as pessoas precisam chegar a uma decisão comum sobre suas
ações, e têm que tentar convencer-se mutuamente de que é interessante para cada um que todos ajam
assim. Neste processo, cada um indica ao outro as razões por que ele pode querer que um modo de
ação seja tornado socialmente obrigatório. Cada pessoa tem de se convencer de que a norma proposta
é igualmente boa para todos. A discussão pode criar argumentos que legitimem a decisão de
orientações para a ação coletiva e acordos práticos.
Na administração discursiva, denominação adotada por Lima, Carvalho e Lima (2010), podem
ser construídos valores e normas comuns. Esta forma de administração, que valoriza a relação
intersubjetiva entre todos os indivíduos e de forma igualitária, prioriza a tomada de decisão coletiva e
consensual, sem qualquer tipo de coação, possibilitando a aprendizagem, a melhoria de processos e a
inovação. Segundo Lima, Carvalho e Lima (2010, p. 1),
A inclusão dos participantes aumenta a complexidade da organização, que resulta em
colaboração com autonomia e vincula as finalidades da organização ao mundo da vida,
tornando-a capaz de produzir riqueza e bem-estar socialmente distribuídos.
Vizeu (2005, p. 15) destaca que, em função da centralidade da interação linguística na práxis
social, o agir comunicativo representa:
[...] construto que integra múltiplas visões de mundo e de indivíduo, e essa multiplicidade é
relevante para a compreensão do fenômeno organizacional. Permite que se verifiquem
contradições nas relações interpessoais nem sempre enfocadas pelos estudos organizacionais,
já que a idéia de distorção comunicativa, antes de ser um mero problema de comunicação
organizacional, reflete a dificuldade de reconhecimento do outro enquanto sujeito
competente, enquanto membro integrante de uma mesma comunidade cultural.
Assim, a administração discursiva, ancorada nas teorias de Habermas, pode ser considerada
forma de administração viável na sociedade contemporânea, principalmente porque tem “[...] o
potencial de enfrentar os problemas decorrentes da redução da dinâmica da comunicação nos sistemas,
com a inclusão das perspectivas dos seus participantes. ” (LIMA; CARVALHO, 2011, p. 51). Na
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[19]
administração discursiva todos os membros da organização participam dos seus processos, não apenas
executando tarefas, mas compartilhando informações e pensando os problemas de forma crítica,
buscando soluções e acordos práticos. Além disso, esta forma de administração influencia as relações
do sistema com o seu entorno, na medida em que favorece a interação, baseada no respeito e no
diálogo, com os atores externos (LIMA; CARVALHO, 2011).
Alguns elementos 5 relacionados às teorias de Habermas são fundamentais para que a
administração seja discursiva, ou se consiga implantar uma gestão comunicativa6, conforme
apresentado na figura 1. Cada elemento pode ser entendido como:
Figura 1 – Elementos fundamentais para uma administração discursiva
Fonte: Baseado em Gutierrez, 1999.
a) Formação discursiva da vontade coletiva
Segundo Habermas (1990, p. 74), as interações comunicativas, através dos atos de fala
realizados sem reserva, coloca as orientações da ação e os processos de fala, adaptados conforme o
ator, sob os limites estruturais de uma linguagem compartilhada intersubjetivamente. Essas limitações
impõem a seguinte mudança: “[...] os atores têm de abandonar o enfoque objetivador de um agente
orientado pelo sucesso [...] e assumir o enfoque performático de um falante, o qual procura entender-
se com uma segunda pessoa sobre algo no mundo. ”
Procura-se, por meio da formação discursiva da vontade coletiva, o “[...] desarmamento das
posturas estratégicas em benefício do grupo, a partir de uma situação onde todos os participantes
achem satisfeitas suas exigências de validade para o plano comum de ação. ” (GUTIERREZ, 1999, p.
36).
5 Baseado em Guiterrez (1999). A Gestão comunicativa, denominação adotada por Gutierrez (1999), significa “[...]
implantar na multiempresa um tipo de gestão em que passariam a prevalecer valores do mundo da vida, ou seja, em que
as pessoas seriam convencidas a deixar de integrar coligações rivais e em vez disso exerceriam a ação comunicativa para
negociar um consenso entre todos. Este consenso deveria substituir os objetivos particulares e exclusivos pelo objetivo
comum de maximizar o desempenho da multiempresa como um todo.” (GUTIERREZ, 1999, p. xi).
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[20]
b) Comportamento individual maduro dos indivíduos
Este tipo de comportamento, como ressalta Gutierrez (1999), compreende desde as “[...]
normas de educação até a ausência de desvios patológicos que possam impedir a
percepção do sentido geral de uma discussão, ou a revisão pessoal de comportamentos e conceitos
quando confrontados com argumentos distintos.”
Habermas (1989, p. 154) observa que o desenvolvimento moral significa:
[...] que a pessoa em crescimento transforma e diferencia de tal maneira as estruturas
cognitivas já disponíveis em cada caso que ela consegue resolver melhor do que anteriormente
a mesma espécie de problemas, a saber, a solução consensual de conflitos de ação moralmente
relevantes. Ao fazer isso, a pessoa em crescimento compreende o seu próprio
desenvolvimento moral como um processo de aprendizagem. [...] As estruturas cognitivas
que subjazem à faculdade de julgar moral não devem ser explicadas nem primariamente por
influências do mundo ambiente, nem por programas inatos e processos de maturação, mas,
sim, como o resultado de uma reorganização criativa de um inventário cognitivo préexistente
e que se viu sobrecarregado por problemas que reaparecem insistentemente.
c) Condições próximas do ideal
Essas são condições básicas que viabilizam as interações comunicativas, como liberdade,
autonomia, segurança, acesso às informações, diálogo e compromisso entre todos os indivíduos
(GUTIERREZ, 1999).
Habermas (1989, p. 111) observa que, no discurso argumentativo, “[...] mostram-se estruturas
de uma situação de fala que está particularmente imunizada contra a repressão e a desigualdade: ela
apresenta-se como uma forma de comunicação suficientemente aproximada de condições ideais. ” O
autor enfatiza, também, que os participantes de uma argumentação:
[...] não podem se esquivar à pressuposição de que a estrutura de sua comunicação, em razão
de características a se descreverem formalmente, exclui toda coerção atuando do exterior
sobre o processo de entendimento mútuo ou precedendo dele próprio, com exceção da coerção
do argumento melhor, e que ela assim neutraliza todos os motivos, com exceção do motivo
da busca cooperativa da verdade (HABERMAS, 1989, p. 111).
d) Competência comunicativa
Cabe enfatizar a importância da competência comunicativa em todo esse processo. A utilização
da linguagem para fins de entendimento está relacionada a um saber intuitivo que os indivíduos
socializados possuem e que se revela como uma “[...] competência comunicativa adquirida pela
inserção no mundo da vida e que os indivíduos utilizam na ação comunicativa. ” (BOUFLEUER,
2001, p. 36). Ainda segundo o autor,
A competência comunicativa consiste no domínio não-reflexivo (préteórico) de certas
pressuposições que acompanham o entendimento lingüístico. Tais pressuposições têm caráter
similar ao das regras gramaticais, que o indivíduo utiliza ao falar e que nem por isso lhe são
conscientes. Portanto, da mesma forma como o indivíduo que fala é capaz de utilizar
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[21]
corretamente as regras gramaticais, mesmo sem dominá-las reflexivamente, assim também os
sujeitos capazes de linguagem e de ação fazem uso de certas pressuposições pragmáticas ao
utilizarem a linguagem voltada ao entendimento. Esse saber pré-teórico, que serve ao
entendimento linguístico, pode ser reconstruído racionalmente numa perspectiva universalista
[...] (HABERMAS, 1989 apud BOUFLEUER,
2001, p. 36).
É importante acrescentar que o discurso pode ser entendido como esfera da aprendizagem, uma
vez que “[...] o aprendizado é socialmente determinado por interações subjetivas e intersubjetivas entre
os atores no processo de interação mediado pela linguagem em contextos específicos. ” (LIMA;
CARVALHO; LIMA, 2010, p. 15). Assim, as organizações que fomentam a comunicação e a
cooperação entre os indivíduos favorecem a aprendizagem, sendo caracterizadas como “[...] sistema
cognitivo capaz de sustentar processos de aprendizagem, isto é, as organizações que discutem são
organizações capazes de aprender. ” (LIMA; CARVALHO; LIMA, 2010, p. 15).
Nesse sentido, a administração discursiva pode ser considerada uma forma de administração
possível e coerente com as demandas da sociedade contemporânea, possibilitando aos membros da
organização o estabelecimento de relações gratificantes e duradouras, o alcance de níveis
significativos de autorrealização e aprendizado e o embasamento de suas ações, a partir de uma
racionalidade comunicativa, e, por outro lado, proporcionando às organizações o alcance de níveis
satisfatórios de desempenho.
5 PERSPECTIVAS DE ADMINISTRAÇÃO DISCURSIVA NAS BIBLIOTECAS
UNIVERSITÁRIAS
As organizações mudam constantemente, seja por influência externa, seja por necessidades
internas – essas em menor intensidade – e os reflexos dessas transformações repercutem em toda a sua
estrutura e, principalmente, na cultura organizacional. Nesse sentido, é fundamental que sejam
administradas de forma cautelosa, possibilitando o atendimento das demandas internas, assim como
auxiliando na adaptação aos novos contextos ambientais.
A biblioteca universitária também se enquadra nesse contexto. Deve ser administrada de forma
que acompanhe as mudanças e cumpra sua missão e seus objetivos com excelência e, assim, possa
atender às suas próprias necessidades e às de seus usuários, além de auxiliar a universidade a exercer
plenamente suas funções social e formativa. A trajetória das bibliotecas universitárias é marcada pela
utilização de diversas formas de administração que, de alguma maneira, têm relação com o tipo de
administração adotado nas universidades, em virtude do vínculo existente entre a biblioteca e a
instituição na qual se insere.
A pesquisa realizada mostra as formas de administração utilizadas nas bibliotecas
universitárias brasileiras, na sociedade contemporânea, divulgadas no Seminário Nacional de
Bibliotecas Universitárias (SNBU), apontando algumas tendências relacionadas à administração
dessas bibliotecas. O Seminário tem importância reconhecida, uma vez que se constitui em fórum de
discussão, troca de ideias e estabelecimento de parcerias, proporcionando aos profissionais que atuam
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[22]
nas bibliotecas universitárias o acesso aos estudos e às pesquisas desenvolvidos na área, além do
importante contato com profissionais de bibliotecas congêneres e de empresas e instituições que
participam do evento.
Assim, a pesquisa compreende os anos de 2004, 2008 e 2012, período que abrange anos
intercalados, escolhidos de forma aleatória. Esse tipo de escolha também é válido para a quantidade
de eventos arrolados. Do total de 189 comunicações orais em 2004, 178 em 2008 e 198 em 2012, são
selecionadas para amostra aquelas que contêm os termos “gestão” ou “administração” na palavra-
chave e no título. No primeiro campo, são encontradas 82 comunicações e, no segundo, 56. Em
seguida, é realizado o cotejamento dos dados, o que resulta em 100 comunicações orais. A
classificação dos dados selecionados na amostra é realizada por meio de categorias temáticas,
definidas com base nos assuntos identificados no título, na palavra-chave e no resumo de cada
comunicação oral. Cada uma das categorias é conceituada, conforme apresentado no quadro 2. As
categorias temáticas representam as formas de administração que compreendem processos,
estratégias, políticas, práticas, metodologias, modos de gestão e estilos relacionados à administração
de uma organização.
Quadro 2 – Categorias temáticas utilizadas para classificar as comunicações orais
Categorias
temáticas Conceituação
Administração
estratégica
"[...] processo amplo que permite à organização procurar atingir o seu
propósito ao longo do tempo. Esse processo abrange a visão, a formulação e a
implementação, bem como o feedback contínuo e a avaliação dos resultados,
tendo em vista orientar e empreender as ações organizacionais de natureza
estratégica, tática e operacional." (ALBUQUERQUE, 2002, p. 40).
Administração
participativa
“[...] filosofia ou política de administração de pessoas que valoriza sua
capacidade de tomar decisões e resolver problemas. [...] A administração
participativa aprimora a satisfação e a motivação no trabalho. [...] A
administração participativa contribui para o melhor desempenho e a
competitividade das organizações. ” (MAXIMIANO, 1995, p. 19-20).
Gestão
ambiental
“Condução, direção, proteção da biodiversidade, controle do uso de recursos
naturais, através de determinados instrumentos, que incluem regulamentos e
normatização, investimentos públicos e financiamentos, requisitos
interinstitucionais e jurídicos. Este conceito tem evoluído para uma
perspectiva de gestão compartilhada pelos diferentes agentes envolvidos e
articulados em seus diferentes papéis, a partir da perspectiva de que a
responsabilidade pela conservação ambiental é de toda a sociedade e não
apenas do governo, e baseada na busca de uma postura pró-ativa de todos os
atores envolvidos.” (FULGENCIO, 2007, p. 309).
Gestão da
informação
“[...] conjunto de estratégias que visa identificar as necessidades
informacionais, mapear os fluxos formais de informação nos diferentes
ambientes da organização, assim como sua coleta, filtragem, análise,
organização, armazenagem e disseminação, objetivando apoiar o
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[23]
desenvolvimento das atividades cotidianas e a tomada de decisão no ambiente
corporativo [...]" (VALENTIM, 2004).
Gestão da
mudança
"Processo de reinvenção e/ou reestruturação continuadas da cultura, estratégia
e estrutura de uma organização." (FULGENCIO, 2007, p. 309).
Gestão da
qualidade total
"Modo de gestão de uma organização, centrada na qualidade, baseado na
participação de todos os seus membros, visando ao sucesso de longo prazo,
através da satisfação do cliente e dos benefícios para os membros da
organização e para a sociedade." (FULGENCIO, 2007, p. 309).
Gestão de
pessoas
"[...] refere-se às políticas e práticas necessárias para administrar o trabalho
das pessoas, tais como: [...] Agregar talentos à organização [...] Integrar e
orientar talentos em uma cultura participativa, acolhedora e empreendedora
[...] Modelar o trabalho seja individual ou em equipe de maneira à torná-lo
significativo, agradável e motivador [...] Recompensar os talentos pelo
excelente desempenho e pelo alcance de resultados como reforço positivo [...]
Avaliar o desempenho humano e melhorá-lo continuamente [...] Comunicar,
transmitir conhecimento e proporcionar retroação intensiva [...] Treinar e
desenvolver talentos para criar uma organização de aprendizagem [...]
Proporcionar excelentes condições de trabalho e melhorar a qualidade de vida
no trabalho [...] Manter excelentes relações com talentos, sindicatos e
comunidade em geral [...] Aumentar a competitividade dos talentos para
incrementar o capital humano da organização e, conseqüentemente, o capital
intelectual [...] Incentivar o desenvolvimento organizacional."
(CHIAVENATO, 2008, p. 15).
Gestão de
processos
“Um conjunto articulado de tarefas permanentes para projetar e promover o
funcionamento e o aprendizado sobre os processos. Essas tarefas podem ser
agrupadas em: [...] desenhar processos com o objetivo de definir ou redefinir
como os processos devem ser projetados para serem melhorados e
implantados. [...] gerir os processos no dia-a-dia com o objetivo de assegurar
a efetiva implementação dos processos e a realização de alocação de recursos
para sua execução, bem como a realização de mudanças e adaptações de curto
prazo. [...] promover a evolução dos processos e o constante aprendizado com
o objetivo de registrar o conhecimento gerado sobre os processos e construir
uma base para que seja criado conhecimento para sustentar a evolução dos
processos.” (PAIM et al., 2009, p. 139).
"[...] aplicação de conhecimento, habilidades, ferramentas e técnicas às
atividades
Gestão de
projetos
do projeto a fim de atender aos seus requisitos. O gerenciamento de projetos é
realizado através da aplicação e da integração dos seguintes processos: [...]
iniciação, planejamento, execução, monitoramento e controle, e
encerramento." (PROJECT MANAGEMENT INSTITUTE, 2004, p. 8).
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[24]
Gestão do
conhecimento
“[...] conjunto de estratégias para criar, adquirir, compartilhar e utilizar ativos
de conhecimento, bem como estabelecer fluxos que garantam a informação
necessária no tempo e formato adequados, a fim de auxiliar na geração de
idéias, solução de problemas e tomada de decisão [...]" (VALENTIM, 2004).
Marketing
"[...] processo de planejar e executar a concepção, a determinação de preço
(pricing), a promoção e a distribuição de idéias, bens e serviços para criar
negociações que satisfaçam metas individuais e organizacionais." (KOTLER,
2000, p. 30).
Outros Aborda formas de administração que não se enquadram nas categorias
anteriores.
Fonte: Autores.
O gráfico 1 mostra, em termos percentuais, as comunicações orais classificadas por categoria
temática, representando as formas de administração utilizadas nas bibliotecas universitárias
brasileiras.
Gráfico 1 – Comunicações orais por categoria temática
Fonte: Autores.
As diversas formas de administração utilizadas nas bibliotecas universitárias brasileiras,
identificadas na pesquisa, mostram a busca por caminhos e formas de atuação, principalmente com
base nas abordagens contemporâneas da Administração, o que indica o estreito vínculo entre essa área
e a Biblioteconomia.
O resultado da pesquisa revela que os pressupostos da administração discursiva não são
identificados no universo analisado e sugere, também, a predominância de racionalidade instrumental
nessas bibliotecas, tipo de racionalidade que favorece o agir estratégico e a distorção comunicativa, o
que reduz as relações entre os membros da organização à dimensão objetiva. Entretanto, as bibliotecas
universitárias podem ser pensadas a partir de uma dinâmica de interações e de agir comunicativo, o
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[25]
que abre caminho para interpretação menos ligada à racionalidade instrumental e mais focada em uma
racionalidade comunicativa.
Dessa forma, a administração discursiva pode ser considerada uma alternativa interessante,
uma vez que possibilita a interação entre as pessoas e a reflexão coletiva, e, além disso, amplia a forma
de perceber e entender os problemas práticos e de buscar soluções.
Um aspecto fundamental dessa abordagem é a busca da integração, da possibilidade de um
projeto solidário, que deve ser compreendido como desafio gerencial permanente. Para isso, os fluxos
de comunicação devem ser ampliados e deve ser estimulado o diálogo, visando à construção de
projetos que possam ser assumidos por todos como compromissos. Nessa perspectiva, é
imprescindível a descentralização do poder, a delegação permanente e a administração criativa e
voltada à aprendizagem. É fundamental que o gestor deixe de ser apenas um observador, para atuar
como participante na dinâmica comunicacional, e que a tomada de decisão aconteça de forma coletiva
e consensual.
A utilização desta forma de administração implica tanto mudanças organizacionais como
também pessoais, constituindo-se em processo gradativo de aprendizado que deve envolver toda a
organização.
Nas bibliotecas universitárias, como em qualquer outra organização, mudança envolve
planejamento, que, por sua vez, deve ser participativo, valorizando o diálogo e a transparência do
processo como um todo. É o momento de se entender a situação atual e decidir-se para onde ir e de
que forma, levando-se em consideração diversos fatores, como as características da biblioteca e da
universidade a que está vinculada, as necessidades, expectativas e desejos do público a que atende, as
demandas e os desafios impostos pela sociedade contemporânea.
É condição sine qua non que os membros da organização conheçam e aceitem a proposta da
administração discursiva. No caso da biblioteca universitária, devem ser consultados bibliotecários,
técnicos e auxiliares, como também estagiários e profissionais de outras áreas que atuam na biblioteca.
Além disso, os gestores e/ou representantes da universidade também devem ser consultados. O apoio
da universidade é fundamental, pois garante, em nível organizacional, a seriedade e a duração da
proposta. O processo de planejamento da mudança deve ser conduzido de forma coesa e harmônica e
envolver os membros da biblioteca e os gestores e/ou representantes da universidade. Devem ser
realizadas reuniões, em que a proposta é discutida e são realizados os esclarecimentos necessários.
Após o aceite de todos, devem ser estabelecidos os direcionamentos para a concretização da proposta.
Algumas ações devem ser empreendidas6, para que a administração discursiva seja utilizada nas
bibliotecas universitárias em sua plenitude.
Dentre elas, destacam-se:
6 As ações foram elaboradas com base em Gutierrez (1999), em Lima, Lima e Moreira (2010), em Lima, Carvalho e
Lima (2010) e Lima e Carvalho (2011).
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[26]
a) Ajustar a prática interna da biblioteca ao novo contexto, sempre de forma transparente e
colaborativa. Isso inclui, por exemplo, a missão, os objetivos, as metas, as políticas, as
atividades, sejam rotineiras ou não, os fluxos de trabalho e os procedimentos;
b) investir na consolidação de um ambiente de segurança e liberdade, que incentive formas
cooperativas e inovadoras de relacionamento interpessoal;
c) procurar minimizar o ambiente estratégico, favorecendo a substituição das relações
estratégicas pelas relações originais do mundo da vida;
d) analisar a cultura organizacional, enquanto elemento de viabilidade da mudança, visando
ao estabelecimento de metodologia para o seu acompanhamento;
e) incentivar a harmonia entre a vida pessoal dos membros da biblioteca e a cultura
organizacional;
f) viabilizar o acesso às informações;
g) incentivar o aperfeiçoamento individual e o desenvolvimento da competência
comunicativa;
h) estimular o desenvolvimento de habilidades de liderança, que visem à capacidade de
mediação nas relações interpessoais;
i) ampliar os fluxos de comunicação, dentro e fora do ambiente da biblioteca;
j) estimular a participação coletiva, em igualdade de condições, contribuindo para a formação
discursiva da vontade coletiva. É fundamental incentivar as pessoas a discutirem, sem
medo de represálias, superando a timidez e o receio à exposição;
k) dispor de instrumento que viabilize as relações intersubjetivas, possibilitando que as
questões problematizadas sejam discutidas, visando à obtenção de consenso.
Em relação a esse último item, é importante esclarecer que o instrumento em questão pode ser
o que Vizeu (2009) chama de “espaços de fala legítimos”, espaços que favorecem a interação e o
diálogo livremente. Segundo o autor, “No âmbito das organizações, a superação da distorção
comunicativa tem sido vislumbrada especialmente pelo estabelecimento dos espaços de fala legítimos
e pelo reconhecimento recíproco do outro enquanto um membro da comunidade de fala. ” (VIZEU,
2009, p. 12).
Webler e Tuler (2000 apud VIZEU, 2009, p. 12) apontam alguns critérios para que os processos
de decisão coletiva possam se constituir em espaços de fala legítimos, com base nos critérios de
validade da ação comunicativa. São eles:
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[27]
a. acesso ao processo de decisão, que não somente diz respeito a [sic] presença física do
participante no debate, mas também a [sic] possibilidade de falar e ser ouvido;
b. poder para influenciar o processo e seus resultados, tendo em vista que, a competência
discursiva somente pode ser considerada como autêntica se ela puder realmente ser
efetivada em termos de resultados;
c. interação construtiva facilitada por meio de estruturas adequadas, correspondendo aos
aspectos estruturais do debate [...];
d. interação construtiva facilitada por meio de comportamento pessoal, significando a
postura pessoal que facilita a confiança e a crítica construtiva, como, por exemplo, a
tolerância e a paciência;
e. acesso à informação, tendo em vista que em relação a certas questões somente alguns têm
acesso direto a informações e/ou conhecimento especializados;
f. análise adequada da informação, de maneira que esta não seja tendenciosa ou parcial (o
que envolve, quando necessário, um processo de tradução ou interpretação isento de
interesses particulares);
g. habilitação de condições necessárias para processos futuros, de maneira que sejam
aproveitadas em outras oportunidades as deliberações que possam ser utilizadas sem
nenhum comprometimento, de maneira a não empreender novos processos de discussão e
negociação.
Pode-se pensar a Comissão de Biblioteca, existente em muitas bibliotecas universitárias, como
um possível “espaço de fala legítimo”. Conforme destaca Miranda (1978, p. 6), a Comissão tem como
objetivo principal “[...] orientar o Diretor da Biblioteca nas suas decisões quanto a seleção de material
bibliográfico, distribuição do orçamento de aquisição, etc.”. Entretanto, para que a Comissão de
Biblioteca seja utilizada no sentido proposto, seus objetivos, sua estrutura e suas atividades devem ser
adequados aos pressupostos da administração discursiva. Nesse sentido, a referida Comissão deve,
por exemplo, possibilitar a todos os membros da biblioteca e a todos os demais atores que, de alguma
forma, estejam relacionados a ela, a oportunidade de expressar sentimentos, desejos, expectativas,
fazer questionamentos, refutar pretensões de validade, sem qualquer tipo de coação, com o objetivo
de alcançar o consenso e, assim, auxiliar o desenvolvimento da biblioteca como um todo.
Outros “espaços de fala legítimos” podem ser instituídos nas bibliotecas universitárias, desde
que estejam em consonância com os pressupostos da administração discursiva. Cabe ressaltar,
também, que esses espaços não precisam, necessariamente, ter uma dimensão física, ou seja, podem
ser virtuais, desde que prevaleçam as práticas discursivas.
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[28]
Uma questão importante, que deve ser levada em consideração na administração discursiva,
diz respeito à colaboração, não apenas interna, entre todos os membros da organização, mas também
externa. Segundo Carvalho (2009, p. 109),
A colaboração interna e externa facilita não apenas o compartilhamento de informações e
conhecimentos, mas também resulta deles. A colaboração viabiliza diálogos, e os diálogos
viabilizam colaboração. As organizações não inovam sozinhas, mas sobre informações e
conhecimentos acumulados dentro e fora delas.
Nesse sentido, a colaboração entre todos os membros da biblioteca e também entre esses e os
funcionários das demais unidades que compõem a universidade deve ser estimulada, como também
com usuários, fornecedores e parceiros em geral, tendo em vista que a colaboração é condição para a
melhoria dos processos e para a inovação. Como a tendência é cada vez mais as bibliotecas se tornarem
espaço facilitador da aprendizagem e de socialização, em vez de apenas depósito de coleções,
propiciando o acesso a múltiplas fontes de informação e também o encontro, a interação e a
colaboração entre os usuários, é fundamental que a forma de administração utilizada na biblioteca
reflita isso, o que, certamente, agrega valor a essa organização.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A emergência da sociedade da informação representa quebra de paradigmas em várias
dimensões, seja no contexto social e econômico, seja no político e no cultural. A rápida evolução
tecnológica, associada a essas mudanças, afeta todos os segmentos da sociedade, inclusive o
educacional. Nesse cenário, a universidade sofre pressões para se adequar às demandas da atualidade,
o que implica mudanças que provocam rupturas em seus modelos estabelecidos, afetando as unidades
a ela vinculadas.
No bojo dessas mudanças, a biblioteca universitária precisa ser repensada e adequada às novas
demandas da sociedade contemporânea. Isso envolve envidar esforços para lidar com questões
internas e externas que, direta ou indiretamente, impactam essas organizações. A forma de
administração adotada na biblioteca deve viabilizar a adaptação às mudanças, priorizando a interação
entre as pessoas e a colaboração no ambiente de trabalho, o que favorece o processo como um todo.
A comunicação é considerada a palavra de ordem da sociedade contemporânea.
Nesse sentido, a comunicação nas organizações deve ser pensada, principalmente, como forma
de construção do entendimento, quanto a resultados e meios para obtê-los. O agir comunicativo e o
discurso têm papel fundamental nas organizações, uma vez que valorizam e viabilizam a comunicação
entre os que participam dos processos produtivos onde todos definem, de forma cooperativa, seus
planos de ação, no horizonte de um mundo da vida compartilhado, tendo por base interpretações
comuns da situação.
A administração discursiva constitui-se em alternativa possível e interessante, coerente com as
demandas da sociedade contemporânea e que pode contribuir para o desenvolvimento das pessoas, a
racionalização dos processos organizacionais, a aprendizagem e a inovação. É uma forma de
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[29]
administração que pode coexistir com outras, desde que os seus pressupostos sejam respeitados. As
vantagens da administração discursiva nas bibliotecas universitárias são inúmeras, a saber: possibilita
a interação e a colaboração entre as pessoas; viabiliza o diálogo, a autonomia e a liberdade; assegura
o compromisso de todos com as decisões e com as escolhas adotadas; democratiza o processo de
administração da biblioteca; promove o desenvolvimento, proporcionando melhores resultados para a
biblioteca, e, por conseguinte, para a universidade, propiciando o bem-estar pessoal e o aprendizado
contínuo de seus membros.
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COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[32]
2 COMPETÊNCIA COMUNICATIVA: UMA COMPETÊNCIA ADMINISTRATIVA PARA O BIBLIOTECÁRIO UNIVERSITÁRIO CONTEMPORÂNEO
Clóvis Ricardo Montenegro de Lima
Fabiana Menezes Santos da Silva
Geni Chaves Fernandes
_____________________________________________________________________________
Resumo: Introdução: Nesta pesquisa indaga-se sobre competências administrativas que permitam
aos bibliotecários gerenciarem suas bibliotecas nas atuais sociedades complexas, considerando-se que
a própria Ciência Administrativa tem renovado seus aportes teóricos a fim de contemplar estruturas
organizacionais mais flexíveis e participativas em seus arranjos e decisões. Objetivo: Propor a
competência comunicativa como elemento fundamental da competência administrativa de
bibliotecários na contemporaneidade. Metodologia: Revisão de literatura sobre os modos de gestão e
as competências em administração de bibliotecários brasileiros e suas origens. Exame da literatura das
alternativas administrativas, baseadas nas teorias de Habermas e Luhmann, que pretendem contemplar
modos de gestão em sociedades complexas. Resultados: Identificam-se limitações nas competências
administrativas dos bibliotecários, ainda muito alicerçadas na emergência das bibliotecas públicas do
século XIX, quando a formação de bibliotecários tomou o caminho de um saber técnico para o
tratamento documental, que hoje precariza suas habilidades administrativas. Dentre as habilidades
administrativas para reconfigurar bibliotecas contemporâneas se destaca, como um primeiro resultado
desta pesquisa, a competência comunicacional, própria de uma Administração Discursiva, capaz de
abrir espaços argumentativos para uma reconstrução racional e consensual de modelo de biblioteca
próprio às sociedades complexas. Conclusões: Os esforços para garantir competência administrativa
do bibliotecário devem incluir sua competência comunicativa como habilidade indispensável para
formulação de novos modelos de bibliotecas em sociedades complexas.
_____________________________________________________________________________
Cap
ítu
lo
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
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INTRODUÇÃO
Este trabalho tem por tema central indagar a amplitude e os limites dos conhecimentos
administrativos fornecidos nos cursos de biblioteconomia brasileiros aos futuros profissionais, que os
permitam reconfigurar e gerir suas bibliotecas nas atuais sociedades complexas. A pesquisa tem em
conta, de um lado, que as próprias teorias administrativas se têm transformado a fim de fornecer
elementos que possam otimizar as estruturas de gestão e favoreçam a produção colaborativa do
conhecimento organizacional e, de outro, que não é suficiente melhorar as bibliotecas, mas reconstruí-
las, indagando-se, então, por quais possíveis caminhos.
Apresentam-se elementos que articulam reflexões da literatura sobre administração de
bibliotecas brasileiras, elementos históricos e das teorias dos Sistemas de Luhmann e do Agir
Comunicativo de Habermas, assim como a proposta da Administração Discursiva, que permitiram
incluir no conceito de competência administrativa a competência comunicativa, que se apresenta como
primeiro resultado de pesquisa.
Deve-se considerar que as características da sociedade contemporânea trazem consigo novos
horizontes e expectativas. A expansão do processo produtivo, os novos relacionamentos e regras
mundiais e a globalização, aliados aos avanços tecnológicos, possibilitam grandes mudanças que
atingem de maneira diferenciada todas as esferas da sociedade.
A expectativa moderna do desenvolvimento de uma racionalidade que coloca na comunidade
de eruditos, especialmente na ciência, a autoridade e responsabilidade para deliberar sobre os caminhos
e soluções para a sociedade, transita ou pode transitar hoje para a responsabilidade do “todos nós”,
“[...] abrindo uma via de articulação entre a as universidades, a esfera pública e os mundos da vida. ”
(GONZÁLEZ DE GÓMEZ, 2011, p.
236).
Não se trata aí de simplesmente reunir ou votar em opiniões, mas, conforme as propostas de
Habermas, da abertura de espaços argumentativos em vista de construir coletivamente soluções tanto
racionais como consensuais; soluções resultantes de uma comunicação em que todos foram ouvidos e
igualmente considerados, portanto, com as quais todos estão comprometidos.
As universidades devem ser hoje, na concepção de González de Gómez, um espaço público de
experimentação e aprendizagem social. Não lugares fechados donde se espera vir soluções, mas
capazes de “[...] acompanhar e subsidiar as mudanças tecnológicas, econômicas, culturais,
educacionais [...] num cenário de interdependência e pluralismo epistemológico e cultural”.
(GONZÁLEZ DE GÓMEZ, 2011, p. 236-237)
As bibliotecas, especialmente as universitárias e públicas, são chamadas a renovar seu papel de
articulação e mediação de diversos espaços públicos, abrindo um espaço comum de conhecimentos e
saberes. Não apenas como locais onde se disponibilizam informações, mas de ações que permitam a
permeabilidade e interatividade entre esferas sociais nos processos de aprendizagem coletiva, que
caminhem para a reconstrução racional das regras que norteiam a sociedade.
Bibliotecas enquanto instituições sociais devem acompanhar e inovar em vista destas
modificações sociais, econômicas e tecnológicas. Considera-se que a rigidez estrutural de oferta de
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[34]
conhecimentos prontos e de construção unilateral, criado em alicerce taylorista, não mais atende às
atuais expectativas de construção de uma sociedade da informação, apontando-se a necessidade de sua
reconfiguração e ampliação de seus espaços de ação. Neste sentido, os bibliotecários podem e devem
se apropriar do leque de possibilidades que se colocam, de forma a assumirem integralmente o
importante papel que lhes cabe, de viabilizar a produção, o acesso e o uso da informação em seus
diferentes suportes.
Estão os bibliotecários preparados para reconfigurar suas bibliotecas de modo a conduzi-las a
um espaço de interlocução entre as esferas da vida social? De um modo geral, ainda muito guiada pelo
modelo moderno de biblioteca, grande parte dos profissionais encontra-se condicionada às atividades
técnico-operacionais e pouco próximas às atividades de renovação gerencial. Obviamente o caminho
que permita reconfigurar a biblioteca contemporânea é um caminho de aprendizagem, onde teorias e
metodologias da administração são fundamentais. Não basta querer, é preciso saber fazer.
DESENVOLVIMENTO E DEMANDAS ADMINISTRATIVAS NAS BIBLIOTECAS
Em todas as sociedades o ser humano usa o conhecimento sobre os recursos da natureza de
modo a desenvolver e melhorar as suas condições de vida. Castells (2001) afirma que cada modo de
desenvolvimento é definido pelo elemento fundamental à produtividade no processo de produção. No
modo de desenvolvimento industrial, o principal indutor de produtividade se encontra na introdução
de novas fontes de energia e na capacidade de descentralização do seu uso ao longo dos processos de
produção. Na sociedade da informação a fonte de produtividade se encontra nas tecnologias de geração
de conhecimentos, de processamento da informação e de comunicação de símbolos.
Neste processo profundo de mudanças, as bibliotecas sofrem impactos tecnológicos,
organizacionais e humanos. Entretanto, apesar das discussões sobre sentido das bibliotecas face aos
novos contextos que se apresentam, os bibliotecários ainda hoje trabalham com fortes traços do modelo
de organização que foi cunhado para atender o modo de organização social estabelecido na segunda
metade do século XIX: a perspectiva de uma biblioteca pública emerge como fruto das ideias da
Revolução Francesa e das necessidades advindas da Revolução Industrial. Naquela época a educação
e qualificação para o trabalho nas indústrias e na administração pública é uma reivindicação cujo
atendimento inclui as bibliotecas totalmente mantidas pelo Estado e para uso de toda sociedade.
As bibliotecas, até então prioritariamente voltadas para preservação de sabedorias do passado,
devem assumir também a função pedagógica na disseminação de conhecimentos sempre renovados e
que atendessem às esferas da cultura e da produção. No caso do modelo de biblioteca pública
americana é necessário um grande aumento no contingente de bibliotecários, estruturando-se em 1876
o curso para sua formação: Columbia College Scholl of Library Economy (GALLARDO, 2001, p. 86-
89).
A biblioteca pública americana vinga pelos esforços políticos de bibliotecários frente ao
governo, que também são responsáveis pela elaboração do seu modelo. O sistema é planejado por
bibliotecários intelectuais experientes como Thomas H. William, Chales Ammi Cutter e Melvil
Dewey, aliados a John Eaton, comissário da Educação nos Estados Unidos (MIKSA, 1983, p. 51-51),
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[35]
mas implantado por profissionais recémformados em nível técnico. É neste contexto que aparecem os
primeiros códigos de classificação, os arranjos para organização das estantes e os serviços de referência
(ALMEIDA JÚNIOR, 2000) revelando a demarcação das tarefas operacionais na organização da
informação.
O caráter pedagógico da biblioteca pública do final do século XIX acopla com uma ciência
cujos conhecimentos positivos a autorizam a recomendar caminhos e soluções para todos os campos
da vida, com seu caráter normativo. A formação de bibliotecários em curso técnico é uma inovação
alinhada ao modelo de produção fordista, onde cada qual deve saber fazer bem a sua parte.
Se a partir de 1930 a capacidade da ciência para responder sozinha que caminhos devem ser
trilhados para atender às demandas sociais entra em xeque, “[...] colocando-se em suspenso as certezas
iluministas da relação afirmativa entre progresso e racionalidade”, nos anos 1960 é o próprio modo de
produzir, conduzir e organizar o conhecimento que passa a ser tematizado, levando à preocupação, no
final do século, com “[...] a forma de organização da aprendizagem social e da produção de
conhecimentos sob novas premissas políticas e culturais [...] dando lugar a um viés ético político.”
(GONZÁLEZ DE GÓMEZ, 2011, p.231-232).
As bibliotecas precisam, agora, lidar com estas novas possibilidades de acesso e uso da
informação. É preciso migrar de um modelo tradicional de biblioteca centrado na disponibilidade e
pensar em um modelo de biblioteca que prime pela acessibilidade (TARGINO, 2010) e, consideramos
nós, por uma maior abertura do leque do que abriga como saberes.
Silva (2013), ao examinar a administração de bibliotecas universitárias, mapeia na literatura
trabalhos que indicam fragilidade de conhecimentos administrativos, o que preocupa, porque estes
conhecimentos são fundamentais para criar novos modelos de biblioteca e modo de agir do
bibliotecário.
A falta de planejamento é responsável pela desconexão entre o que pensamos “poder fazer” e
as atividades desenvolvidas nas bibliotecas (LEAL, 2010). Carvalho identifica como possível causa
para esta desconexão a ausência de um perfil adequado, que pode ser explicado pela não apropriação
das teorias administrativas por parte dos bibliotecários; revelando o pouco diálogo destes profissionais
com estas teorias (CARVALHO, 2012).
Certamente uma considerável competência administrativa é necessária para reconfigurar
bibliotecas à feição das sociedades complexas. Não se trata apenas de um saber que articule os
processos em vista dos objetivos da biblioteca, mas de repensar seu papel e objetivos, portanto, criar
novos processos, meios e procedimentos.
Trata-se de formar um profissional da informação cujo perfil incorpore habilidades e
competências de comunicação e expressão, técnico-científicas, gerenciais, sociais e políticas. Isto
porque em suas práticas profissionais os bibliotecários têm sido constantemente postos à prova na
apropriação da informação e do conhecimento e no desenvolvimento de competências que atendam às
novas realidades sociais e técnicas que emergem (CARVALHO, 2012).
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[36]
ELEMENTOS PARA UMA ADMINISTRAÇÃO DISCURSIVA
A racionalidade tem sido uma questão central nas teorias da Administração desde o seu advento
como campo de conhecimento sistematizado. A racionalidade administrativa também reduz as relações
entre os sujeitos a uma dimensão objetiva. Os teóricos críticos têm sugerido que importante limitação
do modelo burocrático reside na unilateralidade das relações interpessoais subjacente a esse tipo de
organização, expressa especialmente na manipulação do significado em interações comunicativas
quando se tem por objetivo o cálculo utilitário (LIMA; LIMA; MOREIRA, 2010, p. 670).
O uso da Teoria do Agir Comunicativo de Habermas constitui-se em poderoso instrumento de
crítica da Administração. O abandono da visão funcionalista e instrumental pode ser compensado por
uma avaliação e uma reconstrução dos modos de ação nos contextos organizacionais a partir dos
recursos dos mundos da vida dos seus participantes, mais amplos e mais complexos do que a visão do
observador não participante e do participante não-critico. A inclusão discursiva das perspectivas
críticas pode contribuir para uma abordagem racional ampliada das situações organizacionais (LIMA;
LIMA; MOREIRA, 2010, p. 689).
Vizeu (2005, p. 11) observa que o foco na relação intersubjetiva entre o sujeito e o outro, dado
na Teoria do Agir Comunicativo de Jürgen Habermas, oferece uma base explicativa para a ação do
administrador, especialmente no que se refere as deficiências da teoria administrativa tradicional e às
explicações mais comuns do fenômeno das organizações. Além disso, a Teoria do Agir Comunicativo
também pode ser usada para uma crítica teórica na administração, que contribuam a discussão das
questões da autonomia e da emancipação.
Na visão de Luhmann, os sistemas aparecem como uma tentativa de redução da complexidade
existente no entorno, por meio do processo de seleção de possibilidades. O processo seletivo ocorre
pelo fato de que o sistema não suporta internalizar toda a complexidade existente no entorno. O
sistema, então, seleciona apenas algumas possibilidades que lhe fazem sentido de acordo com a função
que desempenha, tornando o entorno menos complexo para ele. Se selecionasse todas elas, não
sobreviveria. Ao mesmo tempo em que a complexidade do entorno diminui, a sua aumenta
internamente. Isso porque o número de possibilidades dentro dele passa a ser maior, podendo,
inclusive, chegar a ponto de provocar sua diferenciação em subsistemas (KUNZLER, 2004, p. 124-
125).
O agir comunicativo é um referencial adequado para a elaboração de novos critérios de
racionalidade, de maneira a minimizar a contradição da forma de organização social na atualidade.
Nesse sentido, a crítica à razão instrumental se desdobra na crítica ao modelo burocrático, no sentido
de que a burocracia corresponde a reificação do ethos racional-instrumental na forma de um sistema
autossustentado, capaz de coordenar e controlar a vida social tendo por base os critérios de utilidade.
O processo de “colonização do mundo da vida” implica na substituição da regulação social mediada
pela interação linguística, pela regulação do poder e do dinheiro, do Estado e da economia.
É a predisposição ao entendimento na interação comunicativa que permite a Habermas propor
a reconstrução racional do ato de fala que permite a superação das contradições da racionalidade
unilateral. Esta reconstrução racional é feita por meio da pragmática universal, um conceito que indica
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[37]
pretensões de validade universais pressupostas no ato de fala e que permitem o compartilhamento de
significados entre os participantes da interação (VIZEU, 2005, p. 13).
A racionalidade comunicativa se caracteriza por ser uma racionalidade que tem como
pressuposto fundamental a linguagem convertida em uma competência argumentativa que é capaz de
produzir um entendimento recíproco entre os participantes da interação. Na racionalidade de cunho
comunicativo interacional o mecanismo de coordenação das ações orientadas para o entendimento vem
vinculado ao acordo como resultado, que a processualidade embutida no entendimento permite gerar
mediante o reconhecimento intersubjetivo das pretensões de validez criticáveis que se fazem refletir
através dos respectivos mundos a que se vinculam (BOLZAN, 2005, p. 96).
Os sujeitos que agem de modo comunicativo, ao se entenderem uns com os outros no mundo,
também se orientam por pretensões de validez normativas. Não existe forma de vida sociocultural que
não esteja pelo menos de modo implícito orientada para o seguimento do agir comunicativo com meios
argumentativos – por mais rudimentar que tenha sido o desenvolvimento das formas de argumentação
e por mais pobre que tenha sido a institucionalização dos processos discursivos de entendimento mútuo
(HABERMAS, 2003, p. 123).
O princípio do discurso refere-se a um procedimento: o resgate discursivo de pretensões de
validez normativa. Nessa medida, o discurso pode ser caracterizado como formal: ele não indica
orientações de conteúdo, mas o processo do discurso prático. Esse não é um processo para a produção
de normas justificadas, mas para o exame da validade de normas propostas ou hipotéticas. Sem o
horizonte do mundo da vida de um determinado grupo social e sem conflitos de ação numa determinada
situação, na qual os participantes consideram como sua tarefa a regulação consensual de uma matéria
social controversa, não tem sentido querer empreender um discurso (HABERMAS, 2003, p. 126).
Bloquear a linguagem nas organizações é negar aos que participam dos processos produtivos a
sua condição humana. É o uso da linguagem que permite a comunicação entre pessoas, incluindo a
comunicação os que trabalham nas organizações. A comunicação é fundamental para que se produzam
e compartilhem valores e conhecimentos. A perda da autonomia de falar nas organizações resulta no
empobrecimento de valores e conhecimentos, e também na redução dos vínculos solidários entre os
que trabalham. As reduções têm um custo: qualquer racionalização de processos, melhoria ou inovação
nas organizações requer investimentos para a introdução de novos conhecimentos. O comando externo
na perspectiva do observador implica em custos para apropriação, aceitação e legitimidade dos novos
conhecimentos (LIMA; CARVALHO; LIMA, 2010).
O Discurso tem papel ativo na transformação das organizações, valorizando e viabilizando
expressão e comunicação entre os que participam dos processos produtivos. A ampliação da expressão
das perspectivas e a viabilidade da comunicação que vão proporcionar a aprendizagem a partir dos
próprios processos produtivos. O Discurso pode ser uma esfera de aprendizagem, pois o aprendizado
é socialmente determinado por interações subjetivas e intersubjetivas entre os atores no processo de
interação mediado pela linguagem em contextos específicos. A organização pode ser entendida como
um sistema cognitivo capaz de sustentar processos de aprendizagem, isto é, as organizações que
discutem são organizações capazes de aprender (LIMA; CARVALHO; LIMA, 2010).
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[38]
COMPETÊNCIA COMUNICATIVA NA ADMINISTRAÇÃO DE BIBLIOTECAS
A questão-proposta conceitual que se coloca aqui, primeiramente em âmbito geral, e em seguida
no âmbito da administração das bibliotecas indaga sobre participação efetiva dos sujeitos nas decisões
de como deve ser o mundo em que vivem. Entretanto, esta competência não se reduz a escolha racional
de meios e habilidades para informar-se. A competência comunicativa está associada a fazer propostas
e apresentar argumentações, escutar e considerar as propostas e justificativas dos demais interessados.
Nesta dinâmica entre linguagem e ação, atos de fala são considerados como tendo pretensões
de validação universal que atendem a requisitos de verdade proposicional, sinceridade, retidão e
inteligibilidade. O compartilhamento pleno de significados entre participantes de uma interação se dá
quando todos os requisitos de validez são cumpridos e desta forma conduzem a dois tipos básicos de
ação racional:
• a ação racional instrumental: [...] [onde] o atributo racional da ação se deve ao fato
de esta ser justificada por fatos ou ter por base o seu resultado objetivo (êxito ou
eficácia da ação), medido em termos de eficiência técnica no uso de meios;
• a ação racional comunicativa: [...] [onde] a legitimidade dos argumentos é obtida
pela satisfação de todas as pretensões de validez. Neste tipo de ação, ocorre uma
orientação dialógica, tendo em vista que a coordenação mútua é dada em função da
capacidade comunicativa, recurso disponível a todos os participantes (VIZEU, 2005,
p.14).
Na ação comunicativa a racionalidade está fundamentada no processo de reconhecimento
intersubjetivo que leva ao entendimento mútuo sobre algo no mundo. Na prevalência da orientação
racional instrumental, a ação é estratégica. O atributo racional se dá na perspectiva de um dos
participantes, mas o outro é apenas um meio para que se alcance o resultado esperado. Neste sentido,
a comunicação é frequentemente distorcida em algumas de suas dimensões.
A utilização da linguagem para fins de entendimento está relacionada a um saber intuitivo que
os indivíduos socializados possuem e que se revela como uma competência comunicativa adquirida
pela inserção no mundo da vida e que os indivíduos utilizam na ação comunicativa.
A competência comunicativa consiste no domínio não-reflexivo (pré-teórico) de certas
pressuposições que acompanham o entendimento linguístico. Tais pressuposições têm caráter similar
ao das regras gramaticais, que o indivíduo utiliza ao falar e que nem por isso lhe são conscientes.
Portanto, da mesma forma como o indivíduo que fala é capaz de utilizar corretamente as regras
gramaticais, mesmo sem dominá-las reflexivamente, assim também os sujeitos capazes de linguagem
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[39]
e de ação fazem uso de certas pressuposições pragmáticas ao utilizarem a linguagem voltada ao
entendimento (HABERMAS, 1989a apud BOUFLEUER, 2001, p. 36).
A competência comunicativa apresentada por Prestes (1996) para tratar do papel da educação
é apropriada por Dib (2013) para interpretar os desafios contemporâneos da universidade na formação
não apenas de profissionais competentes em termos operacionais, mas também capazes de ações
sociais significativas que precisam aliar crítica social e competência para ouvir e expor ideias e motivos
para um entendimento mútuo (razão comunicativa).
Não se trata de um saber dado, inscrito em algum manual que se pode simplesmente lançar
mão, ou de uma racionalidade inata que precisa ser simplesmente ativada, mas de competência que
pode ser aprendida, de como estabelecer modos discursivos e inovadores de integração social.
As bibliotecas podem ser entendidas como sistemas, no sentido luhmanniano, em um acordo
pragmático que reduz a complexidade ligada aos dispositivos, suportes e conteúdos informacionais.
Esta redução da complexidade é inerente a construção de processos que viabilizam fluxos, acesso e
uso. A redução opera por regras e limitações de inclusão, ordenamento e disponibilização, ou seja, nos
meios que nos permitem lidar com a informação.
O aumento da complexidade do informacional e seu destaque na sociedade contemporânea
fazem aparecer pressões sobre os sistemas. Há uma crescente tensão entre nossa capacidade de
trabalhar com a complexidade e a necessidade de o sistema tornar-se mais e mais complexo. Além
disto, demandas humanísticas no mundo da vida entram em choque com os sistemas do poder e do
dinheiro.
O agir do bibliotecário nesta sociedade contemporânea mais complexa depende obviamente de
competências administrativas. Mas esta competência, embora necessária, não pode ser reduzida a uma
competência instrumental e funcionalista. O agir de um bibliotecário que responda às demandas
contemporâneas requer esta competência comunicativa, normativa, que dá sentido ético as suas
relações com o mundo. Não é um conhecimento dado, mas de uma aprendizagem de interlocução sobre
como deve ser (DIB, 2013, p. 26).
Na proposta de uma Administração Discursiva (LIMA; CARVALHO, 2009; LIMA; LIMA;
MOREIRA, 2010) a competência comunicativa se coloca como necessária para estabelecer um projeto
em comum e consensual entre os interessados.
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[40]
A competência requerida do bibliotecário é maior do que uma acumulação de teorias e
metodologias da administração instrumental. Elas são necessárias, mas não são suficientes. Há outra
competência racional integradora: comunicação, argumentação, discurso.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este trabalho indaga sobre as competências administrativas de bibliotecários no contexto
contemporâneo de sociedades complexas, que demandam novos modos de bibliotecas.
O caminho percorrido indica precariedade nos conhecimentos de Administração de
bibliotecários brasileiros, mais aproximados da concepção moderna quando se constrói a exitosa
biblioteca pública e se passa a formar bibliotecários como técnicos capazes de fornecer tratamento
padronizado aos documentos para acesso a uma população recém urbanizada e proletarizada.
Após mais de cem anos, com novos meios de comunicação e informação e uma nova ordem de
organização social, as chamadas sociedades complexas, as habilidades administrativas dos
bibliotecários precisam ser tanto reforçadas como modificadas, sem o que não serão possíveis criar
novos modos de agir.
Destaca-se também a necessidade da competência comunicativa, habilidade que pode ser
aprendida e aperfeiçoada. Esta disposição para argumentação e discussão é fundamental para o
entendimento, mas não apenas para escolhas racionais.
Esta opção normativa pela escuta do outro é importante para uma crítica da administração
instrumental das organizações.
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COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[43]
Cap
ítulo
3 ADMINISTRAÇÃO DE BIBLIOTECAS EM INSTITUIÇÕES PRIVADAS DE ENSINO SUPERIOR: UMA ABORDAGEM DISCURSIVA A PARTIR DAS NOVAS DEMANDAS DE ACESSO E USO DA INFORMAÇÃO
Clóvis Ricardo Montenegro de Lima
Fátima Santana da Silva
Geni Chaves Fernandes
_____________________________________________________________________________
Resumo: Introdução: Indaga sobre a adequação da atual administração de bibliotecas em instituições
privadas de ensino superior, quando a expansão e diversificação do perfil do alunado de graduação, as
demandas de formação e informacionais na sociedade da informação, configuram novos modos de
ensino e produção de conhecimentos. Objetivo: Propõe uma abordagem discursiva, a partir das novas
demandas de acesso e uso da informação, para a administração destas bibliotecas. Metodologia:
Opera-se um diálogo entre análises obtidas por mapeamento da literatura sobre administração de
bibliotecas acadêmicas brasileiras (BRAPCI e SNBUs) e pesquisa de campo junto a bibliotecários de
instituições privadas de ensino superior, docentes e estudantes, em estudo de caso no Rio de Janeiro,
apontam a um momento oportuno para repensar a reconstrução destas bibliotecas. Resultados: A
expansão e diversificação do perfil do alunado de graduação, as demandas de formação e
informacionais na sociedade da informação, contrastam com o pouco conhecimento das teorias da
administração e a inadequação da atual configuração destas instituições aos modelos contemporâneos
de gestão. Destacam-se a insipiente comunicação e participação entre gestores e as equipes e entre a
biblioteca e seus usuários. A fragilidade do conhecimento em administração, no caso destas unidades,
sugere a inexistência de claras políticas administrativas, de modo que a avaliação dos cursos de
graduação pelo INEP aparece como uma espécie de substituto da política de desenvolvimento de
coleções. Conclusões: Propõe-se uma Administração Discursiva, conjugando as bases teóricas de agir
comunicativo de Habermas e percepção da biblioteca como um sistema que pode aumentar sua
complexidade, da teoria de Luhmann. As queixas e demandas de interessados na biblioteca são
apresentadas como pontos que podem ser utilizados em uma ação de aproximação com estudantes e
docentes, para abrir um diálogo em que, juntos possam construir uma biblioteca que podem ter e que
também seja a que querem ter.
_____________________________________________________________________________
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[44]
1 INTRODUÇÃO
O que se espera hoje, em termos de condução administrativa, quando se pensa em um
desempenho adequado das bibliotecas em instituições de ensino superior? Esta não é uma resposta
simples, uma vez que precisa contar com mapeamentos dos critérios que atualmente as norteiam,
especialmente frente às novidades disponíveis em acesso e meios de informação e comunicação, e
com os efeitos das políticas de expansão de vagas no ensino superior.
A expansão implicou no aumento de usuários e condicionou as avaliações de qualidade dos
cursos de graduação a critérios de oferta, dentre eles a disponibilização de quantitativos de exemplares
de material bibliográfico por estudante/disciplina (INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E
PESQUISAS EDUCACIONAIS, 2012). Além disso, esperara-se que seu bom desempenho resulte de
uma administração contemporânea que busque o comprometimento dos nela.
Para ser efetiva, a resposta, além de carecer de alguns diagnósticos, precisa resultar da escuta
e consideração mútua das demandas de seus múltiplos interessados e dos motivos que apresentam para
sustentá-las, sem o que qualquer configuração, que nunca será perfeita, será insatisfatória do ponto de
vista de seus interessados e alvo constante de críticas de inadequação e distanciamento. Abrindo-se
mão de uma biblioteca utópica perfeita, na qual basta ao usuário adentrar, física ou virtualmente, para
ser plenamente atendido em todas as suas necessidades informacionais, resta-nos a biblioteca que
queremos e podemos ter.
Os diagnósticos requerem esforços distribuídos por muitas mãos, que mapeiem e forneçam
análises por diferentes tipos de instituições de ensino superior (privadas, públicas, universidades,
centros acadêmicos, faculdades isoladas), por instituições, unidades da federação ou região, de
possíveis variados critérios norteadores da administração destas bibliotecas, dos usos e efeitos das
TICs e dos novos formatos eletrônicos nas suas práticas e de seus usuários diretos, indiretos e
potenciais, assim como os impactos da expansão de vagas de graduação e dos critérios de avaliação
do INEP, já que devem implicar na mobilização de recursos financeiros e humanos destas unidades
para seu atendimento.
Já uma condução administrativa contemporânea, que permita a seus múltiplos interessados
terem a biblioteca que podem, considerando que é a biblioteca que querem, depende de alicerces
teóricos que apontem o que é esta escuta, esta mútua consideração de motivos, depois, caminhar nesta
aprendizagem de um agir comunicativo em vista do comprometimento dos interessados de como deve
ser a biblioteca, tarefa de cada unidade e, finalmente, de pôr mãos à obra da reconstrução.
Este trabalho tem em vista contribuir como uma destas mãos com diagnósticos limitados a
bibliotecas cariocas, em instituições privadas de ensino superior. O primeiro universo da investigação
empírica foi o grupo que forma o Compartilhamento entre Bibliotecas do Rio de Janeiro (CBIES-RJ),
o seguindo estudantes e docentes de uma universidade privada carioca. Para dialogar com os
resultados lançou-se mão de revisão de literatura sobre administração de bibliotecas acadêmicas, em
mapeamentos nos artigos da BRAPCI (Base de Dados Referencial de Artigos de Periódicos em
Ciência da Informação) de 2002 a 2012, que fornecem análises acadêmicas, e dos trabalhos
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[45]
apresentados nos SNBUs (Seminário Nacional de Bibliotecas Universitárias), de 2008 a 2012, porque
estes estudos contam com análises e reflexões de profissionais bibliotecários.
Este trabalho também tem em vista apontar caminhos para uma administração contemporânea,
com base na Administração Discursiva, alicerçada nas contribuições teóricas de Habermas quando
trata de apontar os caminhos de aprendizagem ética em vista do estabelecimento de regras e
configurações que norteiem as relações entre os interessados.
2 BIBLIOTECAS NO ENSINO SUPERIOR
O recorte, que visa o ensino superior privado, tem em conta que as políticas para o ensino
superior e a pesquisa, desde o governo militar, acabaram resultando em uma significativa
especialização do setor privado no atendimento às demandas por formação profissional em cursos de
graduação.
O ensino superior público, mesmo tendo ampliado o número de instituições, tendeu à
concentração, reunindo escolas e faculdades em universidades, observando-se uma redução de sua
participação tanto no número de instituições quanto no de matriculados. O privado expandiu-se em
número de instituições, especialmente pela abertura de faculdades isoladas e no número de
matriculados, sendo responsável por 74% das matrículas em 2011.
Tabela 1 - Evolução de instituições e matriculados no ensino superior brasileiro: Anos selecionados
de 1970 a 2011
ANO
INSTITUIÇÕES MATRICULADOS NA GRADUAÇÃO
1970 619 184 30% 435 70% 425.478 210.613 50% 214.864 50%
1980 882 200 23% 682 77% 1.377.28 6 492.232 36% 885.054 64%
1990 918 222 24% 696 76% 1.540.08 0 578.625 38% 961.455 62%
1994 851 218 26% 633 74% 1.661.03 4 690.450 41% 970.584 59%
2000 1.18
0 176 15% 1.00
4 85% 2.694.24 5 887.026 33% 1.807.21
9 66%
2005 2.16
8 231 11% 1.93
7 89% 4.453.15 6 1.192.18
9 27% 3.230.96
7 73%
2011 2.36
5 284 12% 2.08
1 88% 6.739.68 9 1.773.31
5 26% 4.966.37
4 74%
Fonte: SEDIA/INEP (2000); Rigotto; Souza (2005); INEP (2007); INEP (2011).
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[46]
Os dados da tabela acima apontam, para os anos mais recentes, que o PROUNI – Programa
Universidade Para Todos - teve maior impacto no aumento do número de matriculados (175% de 200
para 2011) do que no aumento do número de instituições privadas (107% de 2000 para 2011),
resolvendo problemas de vagas ociosas nestas instituições e seu consequente aumento de dívidas com
tributos à União, via benefícios ficais aos que aderem ao programa.
As Instituições de Ensino Superior (IES) experimentaram, via PROUNI e REUNI, uma
expansão que tem demandado a adaptação e redimensionamento de suas estruturas, incluindo-se aí
suas bibliotecas, desde o espaço físico, até a contratação de novos profissionais, mobiliário, material
bibliográfico para novos cursos implantados. Também precisam conhecer seus novos usuários e
pensar em produtos e serviços que os atendam, uma vez que não só se expandiu, mas se diversificou
o perfil dos ingressantes no ensino superior, sem se esquecerem dos demais usuários da comunidade
e suas diferentes atividades.
Concomitantemente, as transformações contemporâneas colocam centralidade na inovação
alavancada pelo conhecimento, seja na economia, seja para “[...] mediar novos experimentos
econômicos, sociais e culturais [...].” (GONZÁLEZ DE GÓMEZ, 2011, p. 227). As estruturas
precisam ser muito mais criativas e flexíveis, para além das disponibilidades digitais, onde a ciência e
a tecnologia, a pesquisa e a educação aparecem como fatores insubstituíveis. “As universidades, nesse
quadro, são chamadas a assumir seu papel, na démarche de um projeto multifacetado de inquietantes
e urgentes demandas de transformação”. Emergem novos modos de produção da informação e do
conhecimento, cabendo às IES e às suas bibliotecas interpretar essas novas necessidades,
diversificando suas funções, repensando seu papel e o envolvimento com o tripé pesquisa, ensino e
extensão.
Se na era industrial a educação esteve organizada de forma pré-definida, desde a elaboração de
seus conteúdos com encontros em sala de aula e alicerçada, quase sempre, em especialidades bem
distintas, modelos alternativos e valorizadores de formações mais interdisciplinares têm sido
implementados. As relações de ensino aprendizagem extrapolam os limites da sala de aula com
disciplinas semipresenciais e até mesmo totalmente a distância.
O mundo do trabalho sinaliza a necessidade de conhecimentos e habilidades renovados e
múltiplos, implicando em mais investimentos para a educação continuada.
Ter acesso à informação não é suficiente, é necessário saber explorar suas potencialidades para
produção de novos conhecimentos (SOUZA, 2011, p. 221).
As bibliotecas ainda são espaços sociais que salvaguardam a memória humana documentada,
mas também têm aumentado seu valor pelo que servem, ou seja, pela forma com que disponibilizam
e dão acesso à informação (CURY; RIBEIRO; OLIVEIRA, 2001, p. 6). As bibliotecas universitárias,
que devem atender à sua comunidade interna, estender conhecimentos à sociedade e ser efetivas nos
projetos nacionais para a pesquisa e o ensino superior, encontram-se, portanto, no entrecruzamento de
demandas e de transformações que propiciam momento oportuno para sua reestruturação.
Os bibliotecários gestores em IES têm como uma de suas principais atividades o planejamento
de suas ações, dentre elas as exigências do INEP que requer conhecimentos sobre a tramitação dos
processos, manuais de orientação e conhecimentos gerais sobre a IES, constituindo oportunidades para
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[47]
fornecer à direção da biblioteca um panorama dos cursos avaliados e as lacunas aí existentes, abrindo
oportunidades para o diálogo e a ação.
Existem novas práticas de ensino e leitura no âmbito acadêmico, baseados no uso de novas
tipologias documentais e modos de acesso remoto? Quais os efeitos das propostas interdisciplinares
sobre a produção de literatura acadêmica? Quais os efeitos das avaliações de cursos sobre a
administração das bibliotecas? A biblioteca atende aos docentes? E aos discentes? O que diz a
literatura? O que dizem os bibliotecários, docentes e estudantes?
Em vista de buscar algumas respostas a estas indagações, revisão de literatura permitiu obter
meios para interpretação de respostas a instrumento de pesquisa de campo (questionário
semiestruturado), com aplicação de questionários aos 17 bibliotecários de IES privadas participantes
do CBIES-RJ (10 respondentes 17), e a estudantes (80 respondentes em 1399) e docentes (28
respondentes em 465), em estudo de caso em Universidade carioca, especialmente em relação às
formas e finalidades de uso e acesso à informação para fins acadêmicos, assim como o entendimento
do papel da biblioteca e suas expectativas.
3 O ESTADO DA ARTE DA ADMINISTRAÇÃO DE BIBLIOTECAS DE IES
Da literatura mapeada apresentam-se análises e reflexões teóricas que apontam modos de
adequação e de não adequação das bibliotecas. Também se apresentam trabalhos gerados a partir de
relatos de práticas. De um modo geral, os trabalhos sugerem caber ao bibliotecário conhecimentos
múltiplos em constante atualização, que lhe permitam compreender e atender às demandas dos
interessados nos serviços da biblioteca. Aí se identificam tanto falhas de conhecimento teórico e
instrumental de Administração como na apropriação e uso das novas tecnologias de comunicação. A
interlocução entre os profissionais da biblioteca e entre estes e a comunidade a ser atendida são
recomendações recorrentes nos trabalhos analisados.
A atuação do bibliotecário tem se modificado, com destaque para a função de administrador,
responsável pelas atividades de coordenação, planejamento e controle de sua unidade de informação,
devendo estar preparado para administrar os novos canais de distribuição da informação (SILVA;
SILVA, 2012). “[O] bibliotecário-gestor que souber integrar habilidades, aprendizado coletivo,
tecnologias e conhecimentos [...] poderão atuar efetivamente na satisfação de seus usuários/clientes,
além de estarem investindo na sua própria carreira profissional. ” (SILVA; SILVA, 2012).
Recomendações para uma boa administração de bibliotecas em IES no Brasil alertam para as
mudanças nas teorias e práticas administrativas que visam flexibilidade, aumento da participação e
interlocução entre o administrador, os funcionários e os usuários. Não se tratam apenas de estudos de
usuários e usos, embora esta seja uma recomendação recorrente, mas de tornar usuários
coparticipantes dos projetos, desenhos de serviços e processos da biblioteca.
Bibliotecários precisam realizar uma maior apropriação de teorias contemporâneas da
Administração, este é outro aspecto recorrente. Niklas Luhmann é apresentado por Carvalho como
uma destas bases, pois serve à interpretação da realidade complexa destas bibliotecas onde “[...] novos
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[48]
suportes da informação emergem e sistemas robustos para operacionalizar e garantir o acesso ao
conhecimento científico tornam as atividades de gestão mais complexas. ” (CARVALHO, 2012, p. 3)
Leal considera que as bibliotecas precisam ser reestruturadas, reinventadas. Não se trata de
uma reorganização para a introdução de melhorias, mas de criar novas regras, estruturas e processos
(LEAL, 2010, p. 4). Para Leal “[...] o grande equívoco gerencial da administração de bibliotecas é a
falta de planejamento [...]”. Embora seus profissionais conheçam a realidade, as necessidades, a
história e a estrutura da unidade administrada, “[...] não há uma conexão entre o que existe, o que se
almeja e o que se pode fazer. Não há um ponto de encontro entre o ideal e o aplicável à biblioteca. ”
(LEAL, 2010, p. 7).
“[A] moderna administração, que se distancia dos pressupostos do Tayolysmo /Fordismo, pode
constituir em um novo espaço de interlocução e dar alguma fluidez às práticas gestoras na biblioteca
universitária. ” (GOMES; LION, 2012, p. 2). Mas, gestores de bibliotecas acadêmicas tendem a
valorizar suas próprias ideias administrativas, o que se torna um empecilho na incorporação de uma
visão estratégica em sua gestão. O usuário deve ter maior interferência no desenho do produto e do
processo produtivo, “[...] influenciar seus produtos e serviços através de suas aspirações e
necessidades. ” (GOMES; LION, 2012, p. 5).
Em vista da abertura diálogo entre gestores e usuários, Melo e Pinto (2012) realizaram pesquisa
junto a usuários da biblioteca da Universidade Federal do Ceará sobre o perfil dos gestores das
bibliotecas. Tomando o bom gestor como aquele com habilidade e clareza no processo de
comunicação, conhecedor das necessidades de seus usuários, proativo e ético. A maioria sabia
identificar estas características do bom gestor, porém, não as percebiam no desempenho dos gestores
da biblioteca pesquisada, apontando a importância de ter em conta essas percepções e considerá-las
na melhoria dos processos de gestão.
As recomendações de interlocução não se restringem aos usuários, estendendo-se à equipe de
profissionais da biblioteca. Silveira (2009) traz revisão de literatura sobre a gestão de recursos
humanos em unidades acadêmicas, considerando que o gestor da biblioteca deve buscar
conhecimentos multidisciplinares e, ao mesmo tempo “[...] humanizadores, que os levem a alcançar a
sabedoria necessária, de modo a alcançar objetivos sociais coletivos, justos e legítimos, superando os
desafios impostos às agências sociais e às pessoas, nesses tempos de globalização [...], era da
competitividade acirrada e dos apelos à produtividade exacerbada [...].” (SILVEIRA, 2009, p. 139).
Além do domínio dos conhecimentos específicos da área gerencial, é preciso ter capacidade de
transformá-los em boas práticas no desenvolvimento organizacional e da equipe. (SILVEIRA, 2009,
p. 130)
Pinto e Moreiro-González (2010), consideram que o conhecimento administrativo de gestão
de pessoas é fundamental a todo bibliotecário, uma vez que exercem esta atividade de forma indireta,
no serviço de referência. Este serviço precisa ser bem conduzido, já que coloca maior liberdade e
autonomia ao bibliotecário. Já nas atividades técnicas, em que essa autonomia é limitada para que não
ocorram erros em grande escala, o autor sugere que, além de capacitação, devem ocorrer discussões
periódicas para identificar a melhor forma de execução das atividades e proporcionar a troca de
experiências.
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
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A biblioteca deve ser o ente responsável pela integração do usuário à tecnologia disponível de
acesso à informação. São necessárias “[...] novas competências e habilidades que levem a melhor
interação com os usuários, participando do processo interativo do conhecimento compartilhado”
(SANTOS, 2012, p. 10). Bibliotecas precisam oferecer “Informações precisas e atualizadas, em tempo
hábil, serviços de disseminação seletiva, treinamentos específicos para necessidades específicas de
informação, acesso remoto à bases de dados especializadas [...].” (SERAFIM, 2012, p. 9) para atender
às necessidades e adequar serviços já existentes.
Conforme estudo de Jovanovich e Torre (2012), muitas bibliotecas já compartilham
informações e divulgam seus produtos e serviços através de recursos oferecidos pelas
TICs como: e-mails, redes sociais; os chats no setor de referência, o MSN e o Skype, utilizados para
comunicação entre os funcionários, o flickr para divulgação de fotos de eventos promovidos pela
biblioteca e até mesmo para mostrar espaço físico disponível, websites e blogs para divulgação de
informações, notícias, etc.
Na linha das ferramentas da Administração de Empresas, Serafim (2012), Jovanovich e Torre
(2012) e Nascimento (2012) apontam o valor de conhecer as técnicas do marketing e divulgação,
especialmente com recurso às novas tecnologias de comunicação para melhoria da qualidade dos
serviços, já que “[...] promover a satisfação informacional é missão de toda e qualquer unidade de
informação! Logo, se faz necessário, para melhor garantir a satisfação do usuário, estudá-lo e conhecê-
lo. ” (NASCIMENTO, 2012, p. 5).
Prado (2005) realizou análise dos modelos de gestão de bibliotecas de 19 IES de Santa
Catarina, sendo 15 instituições privadas, observando: estrutura, gestão de recursos financeiros, de
pessoas, da coleção, avaliação dos produtos e serviços, etc. Os resultados mostram que estas
bibliotecas caminham a uma administração participativa, embora ainda centrada na gestão da coleção.
“[E]stão demonstrando novas alternativas, buscando novos referenciais junto às empresas mais
modernas. Esses novos referenciais direcionam para a ênfase na qualidade, para cliente, para a
aprendizagem organizacional, para o capital intelectual, entre outros. ” (PRADO, 2005, p.1). Ainda
existem falhas no conhecimento administrativos, já que quanto à formalização de normas e padrões,
a maioria ainda utiliza muitos procedimentos informais.
4 PERSPECTIVA DOS BIBLIOTECÁRIOS PARTICIPANTES DO CBIES-RJ
Conforme nossa revisão, a interação colaborativa da equipe apresenta-se como caminho
desejável para uma administração contemporânea. Neste quesito, 90% dos chefes de bibliotecas
declararam realizá-las, mas 50% não responderam quem eram os participantes destas reuniões.
Recolocada a questão, 50% dos entrevistados declararam se tratar de reuniões esporádicas a fim de
“solucionar problemas pontuais”.
Indagou-se sobre o orçamento e sua alocação. Apenas 40% possuem orçamento próprio, sendo
a maior parcela devotada à aquisição de itens para o acervo físico. É interessante observar que 80%
dos informantes afirmam que a decisão do que adquirir não é realizada pela biblioteca, e 60%
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[50]
destacaram que as aquisições são feitas para atender aos critérios descritos no instrumento de avaliação
de cursos de graduação do INEP/MEC, indicando uma frágil, senão inexistente, política de
desenvolvimento de coleções.
As evidências vão ao encontro das questões colocadas por Lubisco (2008); Lubisco et al.
(2009), Cunha (2010), Oliveira (2010), Passos, Oliveira e Vieira (2010) de falta de uma avaliação
específica para estas bibliotecas, desconexão com uma política para desenvolver coleções e uma
enormidade de exemplares versus um número reduzido de títulos. Isto tende a causar um desvio onde
a administração da biblioteca é substituída pela administração das demandas de avaliação dos cursos
de graduação. Entretanto, 40% dos chefes destas bibliotecas consideram o sistema de avaliação de
cursos de graduação um aliado para a manutenção das bibliotecas, porque a atualização dos acervos
depende desta exigência na maioria das instituições.
Pensando nas inovações de formatos e modos de acesso trazidos pelas TICs, na expansão e
diversificação do perfil do estudante universitário e na tendência a construção de cursos com aportes
interdisciplinares, perguntou-se sobre a percepção de mudanças na configuração e demandas
acadêmicas em relação à biblioteca e seus serviços. Neste quesito 40% dos profissionais afirmaram
que não percebem mudanças e que a frequência à biblioteca se tem mantido estável, já 62,5%
declararam perceber mudanças e aumento na frequência da biblioteca que pode ser justificado pelo
aumento no número de matriculados anualmente.
Ao indagar-se sobre iniciativas da biblioteca, nos últimos cinco anos, a maioria descreveu
serviços tradicionais, como: disponibilização de caderno de sugestões, visitas guiadas, orientação para
pesquisa em bases de dados, disponibilização de acesso a redes de internet sem fio. Mas aparecem
algumas iniciativas que visam agilizar processos por meio de novos instrumentos. Dentre essas
destacamos a “implementação de suportes digitais”, fazendo com que o atendimento da biblioteca se
tornasse muito mais dinâmico através de formulários on-line para solicitações, atendimentos via chats,
implantação de ferramentas de busca que dinamizasse o serviço de recuperação da informação, etc.
A maioria dos bibliotecários apontou o acervo e a equipe como pontos fortes da biblioteca, já
no que se refere aos pontos fracos os mais citados foram: falta de espaço físico, falta de recursos
eletrônico e quadro reduzido de funcionários. Como complementação perguntou-se quais seriam os
pontos fundamentais para a elaboração de um projeto para sua biblioteca, partindo do princípio que
teriam recursos financeiros, humanos e materiais. Segue abaixo uma lista com a compilação dos
possíveis projetos mais citados:
Ampliação do espaço físico (entendemos ser espaço para leitura);
Otimização do espaço destinado ao acervo, com a inclusão de documentos
eletrônicos (e-books) e digitalização do acervo de trabalhos acadêmicos;
Atualização constante do acervo;
Capacitação e atualização dos recursos humanos;
Buscar meios para interação com o corpo docente;
Elaboração de projetos culturais
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[51]
Aquisição de equipamento com tecnologia de autoatendimento.
5 PERSPECTIVA DOS DOCENTES
Considerando-se que uma administração discursiva tem em vista uma reconstrução racional
(em que se colocam razões) que quer interlocução para o entendimento dos concernidos aos planos
que nortearão a biblioteca, a perspectiva dos usuários apresenta-se como elemento de sua exposição
de motivos. Trata-se, primeiramente, de saber se há motivos, de seu ponto de vista, para uma
reconstrução administrativa da biblioteca, segundo, que aspectos teriam a propor para seu papel e
funcionamento.
O que primeiro chama atenção é o baixo número de respondentes 28 de 465 docentes de uma
universidade carioca, que foi o estudo de caso. Os dados sugerem desinteresse e distanciamento da
biblioteca. Também é interessante notar que dos que responderam, 71% são docentes há mais de dez
anos, portanto, com experiência na vida acadêmica.
Começando pela relação bibliografia dos cursos e biblioteca, indagou-se se os docentes
conheciam o processo de avaliação do INEP: 93% conhecem e 79% sabem informar o número de
títulos exigidos para as bibliografias. Daí quis-se indagar sobre seu uso efetivo, uso de outros recursos
e os modos de disponibilização ou indicação de acesso.
Quanto aos recursos, além da bibliografia básica e em outros meios de informação, 83%
indicam e disponibilizam ao aluno materiais em suporte eletrônico e/ou em links para acesso on-line,
que não constam na bibliografia do curso (25% indicam e-books). Quanto à controvertida “pasta do
professor”, que, além de poder ser uma prática ilegal, contribui ao apagamento das funções da
biblioteca (GOMES, 2010; OLIVEIRA; BOTELHO, 2007; ROSA, 2006), apenas 7%% afirmaram
utilizar a “pasta do professor”.
Rosa (2006) tem em conta que a tendência a estudos interdisciplinares, as condições
socioeconômicas do novo perfil do alunado e a carga elevada de leitura em ciências humanas e sociais
podem ser os motivos para a “pasta do professor”. Nesta pesquisa, que se aplicou a cursos em quatro
áreas do conhecimento, 60% dos docentes afirmam que as disciplinas que ministram dependem de
conhecimentos de caráter interdisciplinar e 40% afirmam ser os conhecimentos necessários, em parte,
indisciplinares. Aparece prática da “pasta eletrônica do professor”, para além da bibliografia básica,
em 71% dos entrevistados. Observe-se que 97% dos docentes consideram que a popularização da
internet modificou o modo como seus alunos buscam e acessam informações, de modo que a nova
prática vai no sentido de alinhamento a este novo modo.
Dos apenas 28 respondentes em 465 docentes, 61% (17) declararam-se não usuários da
biblioteca. Dos 39% (11) usuários, 54% (6) vão à biblioteca a fim de verificar a adequação do acervo
ao material didático indicado em sua disciplina, enquanto 36% (4) utilizam a biblioteca para obtenção
de material para pesquisa. Há certamente um grande abismo entre a biblioteca e os docentes, cuja
maioria, 70%, não identifica claramente a existência de canal de comunicação que divulgue os serviços
da biblioteca. Para 30% dos professores respondentes, que mantêm alguma comunicação com a
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[52]
biblioteca, 60% afirmaram não conhecer canais de divulgação da biblioteca. Um percentual de 10%
não respondeu a esta indagação.
70% dos professores afirmaram que a biblioteca não contribui para o desenvolvimento de suas
pesquisas, o que pode indicar dois problemas, não mutuamente exclusivos: falta de divulgação de
serviços que podem ser obtidos (bases de dados, por exemplo) e o significativo dispêndio de recursos
para atender aos processos de avaliação de cursos de graduação pelo INEP/MEC, conforme apontando
na pesquisa junto aos gestores das bibliotecas, restando pouco para atender às demandas de pesquisa,
pósgraduação e extensão.
Observe-se que os bibliotecários consideram os pontos fracos da biblioteca a falta de espaço,
a falta de recursos eletrônicos e de recursos humanos, embora coloquem em seus projetos a atualização
do acervo e maior interação com o corpo docente. Já os docentes, ao serem indagados sobre os pontos
fracos da biblioteca, responderam:
21,9 % - Quantidade insuficiente de títulos
21,9 % - Acervo desatualizado
21,9 % - Falta de intercâmbio e comunicação com o usuário
18,7 % - Falta de acesso remoto a bases de dados e material eletrônico
9,4 % - Ter uma biblioteca mais dinâmica e menos patrimonialista
3,1 % - Quantidade insuficiente de exemplares
3,1 % - Sem ponto fraco
6 PERSPECTIVA DOS ESTUDANTES
De um total de 1399 estudantes 80 responderam ao questionário. Isso sugere a falta de
engajamento da comunidade acadêmica com as questões relacionadas à biblioteca.
Indagou-se sobre a tipologia documental recomendada por seus professores. Os estudantes
informaram sua distribuição entre: 32,5% ainda mantém a indicação de um livro básico para a
disciplina, 30% indicam miscelâneas (partes de livros, filmes, material da internet, etc.), 20% reúnem
partes ou capítulos de vários livros, 15% fazem uma junção entre partes de livros e textos que se
encontram na internet e 2,5% não responderam a esta questão. Esta forma diversificada de composição
do material das disciplinas reflete a prática real na sala de aula, que possivelmente conjuga
necessidades de atualizações rápidas e a tendência a abordagens interdisciplinares. Por outro lado,
também favorece a uma menor frequência à biblioteca.
Quanto ao modo de acesso aos livros constantes na bibliografia básica, dos 26% que utilizam
o livro básico indicado pelo professor, a maioria (57%) utiliza os exemplares disponíveis na biblioteca,
mas existe um percentual (43%) que está distribuído entre a compra do livro e a cópia. Sobre este
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[53]
aspecto, nossos resultados corroboram com os observados por Lubisco et al. (2009), em um estudo
sobre a utilização de livros sinalizados nas bibliografias, que destaca haver uma dissociação entre
biblioteca e plano de curso; facilidade de acesso a outras fontes de informação (internet) e facilidade
de fotocópia interferindo no recurso à biblioteca.
A frequência à biblioteca foi outro item da pesquisa em que 71, % dos alunos julgaram
frequentar a biblioteca regularmente e apenas um percentual de 14% informou frequentar apenas antes
das provas, um outro pequeno grupo equivalente a 11% que prioriza a ida à biblioteca quando tem que
fazer algum trabalho e 4% não responderam à questão.
Elencamos um ranking dos serviços que os estudantes afirmam mais utilizar: 1º Empréstimos
domiciliares; 2º Biblioteca como local de estudo e consulta local do acervo; 3º Acesso á internet wi-
fi; 4º Reserva de material; 5º Comutação bibliográfica.
Quando se trata de acesso à informação, a maioria dos alunos (64%) busca primeiramente a
informação na internet e apenas 36% tem o catálogo da biblioteca como primeira fonte de informação.
Destes 36%, a maioria realiza suas pesquisas em catálo on line (65,5%), sem a necessidade de se
dirigir fisicamente à biblioteca. Os estudantes destacaram como elementos importante em uma
biblioteca: exemplares em quantidade suficiente; disponibilização de serviços online; aumento da
disponibilização de espaços para estudo em grupo.
Este último item nos chamou à atenção, porque mesmo com a disponibilidade de acesso remoto
e em redes contemporâneos, o encontro presencial ainda é importante para a realização de discussões
e trabalhos em grupo.
7 DESENCONTROS E VIAS PARA REENCONTROS
Com base na pesquisa identificam-se pontos convergentes em destaque entre o ponto de vista
de cada grupo de atores, como mostra a figura abaixo.
Figura 1 - Pontos e convergência sobre a biblioteca entre os entrevistados
Fonte: Os autores
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
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A atualização do acervo e a disponibilização de quantitativo foi um item convergente, uma
demanda em comum. Este é um tópico que ainda deixa lacunas na maioria das bibliotecas afetando os
alunos e pode justificar a colocação por docentes e discentes da pouca contribuição da biblioteca no
processo de aprendizagem do aluno. A maioria das bibliotecas, na concepção dos atores analisados,
não está preparada para atender às demandas “tradicionais” dos livros da bibliografia básica (INEP) e
tão pouco as demandas “emergentes” que seriam a diversidade de fontes e formatos indicados por
professores em sala de aula.
O espaço físico da biblioteca é um aspecto que merece atenção, pois foi apontado como
insuficiente tanto por bibliotecários como por estudantes. Espaços renovados é um dos itens citados
por Anglada (2012) para uma biblioteca contemporânea que deve reorganizar seu espaço físico a fim
de proporcionar conforto e um ambiente propício a trabalhos colaborativos. O espaço físico nas
bibliotecas no contexto contemporâneo já começa a ser discutido por arquitetos que percebem que
terão que levar em conta todas essas transformações em projetos para bibliotecas. Valada (2011)
apresenta estudo de duas bibliotecas acadêmicas de administração contemporânea, observando que
ambas apresentam características comuns como a preocupação alargada de difusão do conhecimento,
“[...] a um público alargado à escala da cidade e uma infinidade de culturas. Para isso procuram
actualizar constantemente o seu desempenho espacial, informacional e social e utilizá-lo como um
factor fundamental de atractividade.” (VALADA, 2011, p. 68, grifo nosso).
Para alunos e professores o acervo é um ponto forte da biblioteca, mas com vertentes negativas,
uma vez que o número de exemplares e a variedade não atende adequadamente. A falta de
comunicação e divulgação dos serviços é outro ponto convergente entre alunos e professores que
sinalizam isto como um problema, assim como a falta de recursos on-line que facilitem o acesso à
informação e a comunicação. Chama atenção que os bibliotecários tenham colocado como quinta
iniciativa desejável, se tivessem recursos, aproximação com a comunidade acadêmica.
No que tange ao acervo e ao espaço, a resolução também depende de recursos financeiros e
reformulação da infraestrutura, em contrapartida, uma administração contemporânea que leve em
conta as transformações da sociedade e escute seus interessados depende mais da compreensão de
alcance desta interlocução, do que de recursos financeiros.
8 ADMINISTRAÇÃO DISCURSIVA DE BIBLIOTECAS ACADÊMICAS
Para Gutierrez “[...] competição de todos contra todos [...] limita a ação comunicativa, ou seja,
não permite que as informações relevantes fluam livremente por toda organização” (GUTIERREZ, p.
xi, 1999). Novas formas de trabalho constituem um desafio para uma sociedade, antes habituada a
modelos rigidamente hierarquizados, assim como as transformações nos modos de acesso à
informação que influenciam nas práticas de ensino/leitura no ambiente acadêmico, na chamada
sociedade da informação, o que certamente demanda repensar a biblioteca, seus serviços e
abrangências.
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
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Em busca de uma abordagem contemporânea da administração, as intuições de Lima; Carvalho
(2009), Lima; Lima; Moreira (2010) e Siebeneichler (2006) partem do cotejamento das Teoria do Agir
Comunicativo de Habermas e Teoria de Sistemas de Lhuhmann. Trata-se de um recurso metodológico
que visa propiciar a ações comunicativas entre o sistema e seu entorno, contribuindo para a cooperação
e melhoria dos processos na biblioteca. Quer-se uma abordagem discursiva para a administração que
consiga equacionar as demandas da sociedade e o novo perfil dos profissionais que integram as
organizações, um tipo de administração onde “[...] as pessoas seriam convencidas a deixar de integrar
coligações rivais e em vez disso exerceriam a ação comunicativa para negociar um consenso entre
todos. ” (GUTIERREZ, 1996, p. xi)
Tomando o ponto de vista de Luhmann (2010), podemos entender a biblioteca como um
sistema para o qual seus múltiplos interessados fazem parte de um entorno desconhecido. A
incorporação de mudanças no sistema, em vista de atender demandas externas, opera como redutor de
complexidade do entorno (mais conhecido), ao mesmo tempo em que aumenta a complexidade do
sistema biblioteca. Mas como se poderia caminhar no sentido de que este aumento de complexidade
se desse como modo de comprometimento destes múltiplos interessados com os desenhos e ações?
Trata-se aqui não de estudos de usuários, necessário para conhecer seus perfis, mas de um redesenho
da biblioteca, dentro dos limites possíveis, com o qual estivessem comprometidos todos os a ela
concernidos.
A teoria habermasiana (HABERMAS, 2003) propõe as ações comunicativas que possibilitem
escuta, entendimento e compromisso. Para Gutierrez (1999) “A diferença e originalidade do modelo
comunicativo de gestão está na percepção das organizações como sistemas onde imperam as relações
estratégicas, o que limita e condiciona o alcance de qualquer tentativa de mudança. ” (GUTIERREZ,
1999, p. 66).
A atual condução administrativa das bibliotecas, elucidadas no estudo de caso e na análise da
literatura, podem ser aproximadas à metáfora das organizações como máquinas, descritas por Morgan
(2002), remetendo à ideia de uma estrutura “estática, fechada e burocrática”. Outra metáfora
aproximativa é a da organização como cultura, onde valores e rituais alimentam a cultura corporativa,
redundando em resistência às transformações sociais. As bibliotecas funcionam como
“minissociedades que têm seus próprios padrões específicos de cultura e subcultura. ” (MORGAN,
2002, p. 148).
A literatura aponta carência de conhecimento administrativo na condução destas bibliotecas.
Observando os resultados da pesquisa de campo, entende-se que, de um lado, não havendo práticas
administrativas definidas, o instrumento de avaliação de cursos de graduação fica no lugar de uma
política da biblioteca, principalmente no que se refere ao desenvolvimento de coleções. Por outro lado,
na avaliação dos cursos, a biblioteca aparece como um apêndice. Portanto, as características desejáveis
a estas bibliotecas ficam fora do horizonte de avaliação dos cursos e das instituições em que se
encontram.
Uma racionalidade instrumental não parece suficiente para atender às novas demandas, visto
que, de acordo com Vizeu (2011, p. 67) possui um caráter monológico, onde o sujeito argumenta tendo
em vista seu êxito pessoal, o que é racional, mas não é comunicativo.
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
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Em vista de uma Administração Discursiva, o primeiro passo é o estabelecimento de estratégias
de aproximação, que cabem à administração da biblioteca. Algumas queixas e expectativas de
estudantes e docentes, levantados nesta pesquisa, manifestam os pontos de vista dos interessados e
podem ser uma abertura, mas cabe à administração buscar esta aproximação com sua comunidade.
Cabe a ela mediar os conflitos de interesses complexos em vista de soluções que contemplem as
necessidades dos docentes, discentes, técnico-administrativos, comunidade local, sem deixar de lado
as exigências do INEP sobre a biblioteca nas avaliações dos cursos de graduação. A Administração
Discursiva propõe iguais oportunidades de exposição de pontos de vista, de sorte que os concernidos
às e regras que norteiem seus serviços, participantes de seu desenho, tenham compromisso com elas,
considerando que têm a biblioteca que podem e querem ter.
Lima afirma que esta comunicação [...] deve ser pensada não somente como meio de
estabelecer relações e nexos entre ações, mas também como modo de construção do entendimento
quanto a resultados esperados e meios para obtê-los. A comunicação possibilita construir “projetos
comuns”. (LIMA et al., 2009). Na falta de comunicação, a biblioteca fecha-se em si mesma. Definir o
que é importante, e priorizar o que deve ser realizado requer um esforço de cooperação. À medida que
as decisões são tomadas coletivamente, todos estarão comprometidos com o que for decidido. Tal
abordagem administrativa exige amadurecimento e capacidade de aprendizagem de todos os
envolvidos. De um lado os profissionais que precisarão reconfigurar suas práticas profissionais,
estando abertos a uma administração que contemple novas possibilidades. De outro a comunidade
acadêmica precisa expressar suas necessidades e expectativas. “O sujeito é obrigado a sair do seu lugar
privilegiado de observador imparcial para participar da interação discursiva, compartilhando
informações e ideias, construindo novos saberes e se questionando em suas convicções mais
profundas” (BOLZAN, 2005 apud LIMA; CARVALHO; LIMA, 2010). Caberá à biblioteca abrir
caminho ao entendimento coletivo e aos usuários aceitar o convite ao mútuo entendimento.
Tomando como referência os trabalhos de Lima; Carvalho e Lima (2009), Lima; Carvalho e
Moreira (2010), Gutierrez (1999) e Vizeu (2005), em que a ampliação dos canais de comunicação nas
organizações podem contribuir para uma administração contemporânea, quer-se pensar em uma a
administração de bibliotecas que propicie a interação entre sistema e entorno, à medida que todos os
interessados tenham oportunidade de expor suas necessidades, apresentar seus motivos e ouvir os
motivos dos demais, sem o que não se comprometerão com as decisões tomadas.
9 CONSIDERAÇÕES FINAIS
As características que marcam o atual contexto em que estão as bibliotecas acadêmicas,
especialmente a em instituições privadas de ensino superior, abrem um tempo propício para se pensar
na sua reconstrução racional. A atual administração de bibliotecas de IES, ainda com traços
mecanicistas e de ordem instrumental, onde o indivíduo é um elemento do sistema, sem oportunidade
de participação, já não atende à realidade contemporânea. A literatura mostra a fragilidade de
conhecimentos no âmbito da Administração de Empresas por parte destes profissionais, que reflete a
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
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falta de planejamento e metas e, especialmente, de interlocução com os interessados em sua
subsistência.
Ao bibliotecário cabe desenvolver competências, de modo a apropriar-se dos conhecimentos
da ciência administrativa, adequar e dinamizar a biblioteca. É preciso construir um espaço dialógico
no qual a comunidade a ser atendida sinta confiança em expor suas necessidades, considere que vai
ser sinceramente ouvida e seus motivos considerados. É necessário buscar caminhos que possibilitem
o entendimento e possível equacionamento das diferentes demandas.
Esta pesquisa quis também servir como um canal de comunicação, buscando ouvir e entender,
as queixas, opiniões e sugestões dos interessados nos serviços da biblioteca e também dos profissionais
responsáveis pela administração dos mesmos.
Este sistema, chamado biblioteca, não tem motivo de ser se não tiver em conta as demandas de
seu entorno. Sendo assim, a apropriação de elementos da teoria de sistemas e Luhmann, que fornece
elementos relevantes da análise sistêmica, seus limites e possibilidades de maior complexidade, e da
teoria da Ação Comunicativa de Habermas, que aponta à argumentação e à escuta na construção de
desenhos e regras de convivência, de sujeitos éticos e comprometidos, pode servir como o ponto de
encontro para se pensar em uma Administração Discursiva em bibliotecas de IES.
Seu redesenho a contento depende da vontade e da participação dos interessados, sua
predisposição para participar de um diálogo, expor seus pontos de vista, estar preparado a defender
seus argumentos e se comprometer com o consenso da comunidade, dos profissionais, da instituição,
sem deixar de lado os processos de avaliação do INEP.
Uma biblioteca sem diretrizes administrativas próprias, visando apenas o cumprimento das
exigências da direção da IES a que está vinculada, anula seu papel social e pedagógico, como também
a importância de seus profissionais na elaboração e planejamento das ações, colocando o processo
avaliativo do INEP/MEC sobre os cursos de graduação no lugar da política de desenvolvimento de
coleções. A biblioteca acaba reduzindo sua complexidade e mantendo seu entorno desconhecido.
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COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[62]
Cap
ítu
lo
4 AÇÃO DISCURSIVA DO BIBLIOTECÁRIO ESCOLAR
Clóvis Ricardo Montenegro de Lima
Simone Alves da Silva
_____________________________________________________________________________
Resumo: Introdução: O presente estudo tece algumas considerações sobre a biblioteca e a prática
profissional do bibliotecário escolar. Com base nisso, apresenta reflexões acerca do seu agir no
processo de ensino-aprendizagem em uma perspectiva comunicativo-discursiva. Objetivo: Refletir a
prática do bibliotecário escolar à luz das Teorias do Agir Comunicativo e do Discurso de Jürgen
Habermas. Metodologia: Estudo bibliográfico das obras de Jürgen Habermas e revisão de literatura
que se centra na prática do bibliotecário escolar. Resultados: Devido a emergência de uma
racionalidade comunicativa e pedagógica na prática do bibliotecário escolar, as teorias de Jürgen
Habermas se constituem em um importante referencial teórico, pois podem promover o
desenvolvimento de estruturas cognitivas e sócio afetivas individuais, ética e política, bem como a
criação de solidariedade e a formação de identidades sociais permitindo que a comunidade escolar
ascenda a novos patamares de integração social. Conclusões: Aponta para a necessidade de o
bibliotecário refletir a sua prática no ambiente educacional, tendo em vista que este profissional
geralmente é visto como guardião de livros, ordenador e detalhista técnico. Indica a importância de
se desenvolver novos estudos sobre essa temática que envolva outros elementos de análise permitindo
assim avaliações mais detalhadas.
__________________________________________________________________________
1 INTRODUÇÃO
Na sociedade contemporânea a educação é a chave para o desenvolvimento e para o
enfrentamento das desigualdades, uma vez, que nesse contexto não basta ter o domínio da tecnologia,
mas também a habilidade para transformar o imenso volume de informações em conhecimento. O
papel da educação é desenvolver a habilidade das pessoas de processar informações, ampliando suas
potencialidades reflexivas, críticas, criativas, comunicativas e expressivas, capacitando-as para lidar
com diversas situações e tomar decisões na resolução de problemas.
A biblioteca escolar, como instituição vinculada ao sistema educacional, enquadrase nesse
contexto. Dessa forma, dela são requeridas novas estratégias de ação que favoreçam sua adequação à
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[63]
nova realidade e permitam, por exemplo, acompanhar os avanços tecnológicos, desenvolver
iniciativas que atendam as demandas das pessoas, integrando processos de ensino-aprendizagem que
privilegiem a promoção da interação e colaboração criativa no ambiente educacional.
Essas novas demandas levam o bibliotecário a refletir sobre suas atribuições, habilidades e
responsabilidades no âmbito educacional, pois o seu agir não deve se restringir ao enfoque técnico,
mas incentivar a interação efetiva entre os indivíduos, viabilizando a criação e a manutenção de canais
de comunicação abertos e espaços de socialização do conhecimento no âmbito da escola.
Assim, partindo-se desses pressupostos, o objetivo geral deste estudo é proceder a um esforço
inicial de refletir o agir do bibliotecário escolar no processo de ensinoaprendizagem à luz das Teorias
do Agir comunicativo e do Discurso de Jürgen Habermas, uma vez que estas favorecem o
desenvolvimento de processos de aprendizagem por meio da intersubjetividade entre sujeitos capazes
de falar e de agir.
Dessa forma, a questão que norteia a pesquisa é “O agir comunicativo pode favorecer a efetiva
inserção do bibliotecário escolar no processo de ensinoaprendizagem? ”
Nessa perspectiva, acredita-se que o bibliotecário pode assumir a importante função de mediar
o conhecimento e atuar no processo de ensino-aprendizagem como um orientador, um avaliador e um
motivador, permitindo assim que a biblioteca se constitua em um espaço de efetiva interação e
comunicação entre os atores da comunidade escolar e de produção de cultural e conhecimento.
2 AGIR COMUNICATIVO, DISCURSO E RECONSTRUÇÃO RACIONAL
As estruturas da racionalidade, identificadas como: epistêmica, teleológica e comunicativa –
se encontram no mesmo nível e são interligadas pela racionalidade discursiva. A racionalidade
discursiva pressupõe, “[...] uma auto-relação reflexiva da pessoa com o que ela pensa, faz e diz; por
meio das auto-referências correspondentes, essa capacidade se entrelaça com as estruturas racionais
centrais do saber, da atividade orientada a fins e da comunicação.” (HABERMAS, 2004, p. 102).
A busca de Habermas por uma forma de racionalidade que não ficasse restrita à unilateralidade
da dimensão cognitiva e que não se preocupasse apenas com a questão da verdade, mas também com
a justiça e a sinceridade desvinculando-se da racionalidade da dominação, resulta no desenvolvimento
da racionalidade comunicativa, que corresponde à comunicação lingüística voltada ao entendimento
(SIEBENEICHLER, 2003).
Siebeneichler (2003) aponta as características da racionalidade comunicativa a partir dos
processos comunicativos, que compreendem: comunicação como ação social; coordenação através de
atos de fala; variedade de ações comunicativas. A comunicação como ação social, tem como princípio
a definição de que toda ação é determinada para um fim racional que o sujeito estabelece. No entanto,
Habermas amplia esta definição ao considerar que a orientação da ação racional não se efetiva apenas
pela realização do sujeito, mas também pela comunicação intersubjetiva.
A racionalidade comunicativa é orientada pelos atos de fala que possuem uma força
coordenadora de ações que decorre dos seus elementos comunicativos e ilocucionários, o que se
justifica pelo fato do componente ilocucionário ser formado por verbos performativos pelos quais se
fundamentam as pretensões de validade.
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[64]
Siebeneichler (2003, p. 67) afirma que estes elementos são determinantes para que
[...] o falante e o ouvinte entrem numa relação intersubjetiva, a qual, como já sabemos,
repousa na base de pretensões de validade que têm de ser levantadas, de deveres de
justificação que têm de ser assumidos e da pressuposição de uma possível união verdadeira
no discurso.
A última característica da racionalidade comunicativa refere-se à pluralidade de ações
comunicativas decorrentes dos três tipos de atos de fala, a saber: os atos constativos caracterizam as
ações de conversação; os regulativos determinam o agir comandado por normas; por fim, os
expressivos caracterizam o agir dramatúrgico (SIEBENEICHLER, 2003).
Para trazer à tona o conteúdo normativo dos processos de comunicação e as formas de
aquisição e utilização do conhecimento resultante das interações intersubjetivas no mundo da vida,
Habermas vai buscar na teoria sociológica da ação os mecanismos de coordenação de ações para
estabelecer os padrões de interação. Na sua concepção, a interação se efetiva por meio das ações que
se encontram coordenadas de acordo com regras. Tais regras são consubstanciadas no mútuo acordo,
que para Habermas (2010, p. 139),
[...] significa que os intervenientes aceitam um saber como válido, ou seja, como
intersubjetivamente vinculativo. Só então um conhecimento comum, na medida em que
contenha componentes ou implicações relevantes para as consequências da interação pode
assumir funções de coordenação de ações.
Essas funções de coordenação da ação guiam-se pela força ilocucionária dos atos de fala,
determinando assim o modo de ação dos atores em uma interação, a saber: a ação teleológica,
estratégica, normativa, dramatúrgica e comunicativa.
A ação teleológica objetiva a concretização de fins ou realização de um plano de ação onde
apenas um ator está envolvido. Este, por sua vez, atinge seu objetivo escolhendo os meios promissores
de êxito e aplicando-os de forma apropriada. Essa estrutura teleológica constitui os demais conceitos
de ação, todavia, esses conceitos de ação distinguem-se segundo a forma de coordenação das ações
individuais. Desse modo, os participantes da interação podem adotar uma atitude orientada para o
êxito ou para o entendimento (HABERMAS, 2010).
Na ação estratégica as forças ilocucionárias dos atos de fala não assumem uma função
coordenadora da ação, a linguagem adquire uma concepção de manipulação instrumental, por meio
da qual os sujeitos impõem sua convicção, manipula outros sujeitos para atingir seus próprios fins
transformando-se em um simples meio de informação (GONZALEZ DE GÓMEZ, 2009; PINZANI,
2009). A coação é a sua força motriz, por essa razão pode-se chegar ao consenso, mas não à um acordo
mútuo, porque este não pode ser imposto, “[...] seja de forma instrumental, por intervenções imediatas
sobre a situação da ação, ou de forma estratégica, pela influência calculada em função do êxito sobre
as atitudes do parceiro. ” (HABERMAS, 2010, p. 140).
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[65]
A ação regulada por normas, na concepção de Habermas (2010, p. 145), é aquela em que “[...]
os membros de um grupo social orientam a sua ação por valores comuns. ” Nesse modelo o
entendimento visa atualizar um acordo pré-existente.
A ação dramatúrgica no entendimento de Habermas (2010, p. 142),
[...] apoia-se na relação consensual entre um intérprete que se põe em cena, causando uma
determinada impressão e o seu público, e a interação mediada pela linguagem requer o
estabelecimento de consensos, seja pela adoção interpretativa de papéis e a sua projeção
criativa, ou por processos de interpretação cooperativos.
A ação comunicativa se orienta por convicções intersubjetivamente partilhadas que vinculam
mutuamente os participantes de uma interação em direção ao entendimento sobre algo no mundo. O
entendimento se desenvolve a partir da relação reflexiva atormundo, na qual os participantes do agir
comunicativo colocam demandas por meio de pretensões de validade que podem ser aceitas ou
refutadas (GONZÁLEZ DE GÓMEZ, 2009).
A contraposição entre ação comunicativa e estratégica constitui ponto central da teoria social
de Habermas, uma vez que permite explicar a forma de reprodução da vida humana que pode
estabelecer-se por meio de ações de êxito ou de entendimento. Na primeira, as ações sociais são
reguladas pela competição por dinheiro ou poder, neste caso a sociedade se apresenta sob uma ordem
instrumental (HABERMAS, 2010). Na segunda, devido a concepção de integração social que decorre
da força consensual do entendimento linguístico, e por meio da qual as energias de ligação da própria
linguagem tornam-se efetivas para a coordenação das ações, faz com que a ação comunicativa se
constitua no ponto de engate para a solidariedade social formando uma sociedade mais justa
(HABERMAS, 2012).
O agir comunicativo, segundo Pinzani (2009, p. 98) se configura a partir de processos de
comunicação que podem acontecer em três níveis, a saber:
[...] a relação do sujeito do conhecimento com um mundo de eventos ou fatos. [...] a relação
do sujeito prático, que age e está envolvido em interações com os outros. [...] a relação do [...]
sujeito com a sua própria natureza, com a sua subjetividade e com a subjetividade dos outros.
Esses processos de comunicação referem-se aos Três Mundos de Popper:
objetivo, social e subjetivo. O primeiro corresponde à construção do conhecimento verdadeiro
sobre o mundo de fatos e estados de coisas. O segundo, refere-se à crítica ou resgate das
normas, valores, significados compartilhados que orientam as interações. O último ocupa-se
da crítica ou do resgate da sinceridade da subjetividade do sujeito e do seu projeto individual
de vida (BANNELL, 2006).
Habermas (2012) afirma que as pretensões de validade se caracterizam por diferentes
categorias de saber: verdade proposicional, correção normativa e veracidade subjetiva. Na medida em
que essas demandas são problematizas e a correspondente pretensão de validade é desafiada, existe a
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[66]
possibilidade de se entrar na forma reflexiva do agir comunicativo, que o teórico denomina de
Discurso, que visa questionar a validade da pretensão levantada pela argumentação.
Em um procedimento argumentativo ideal, todos os integrantes do discurso participam, todas
as vontades subjetivas são expressas, todas as críticas e ponderações são consideradas, todas as
consequências práticas são antecipadas e todos os efeitos colaterais de uma possível ação são pesados,
conforme descrito por Habermas (2003, p.120),
[...] os participantes da interação unem-se através da validade pretendida de suas ações de fala
ou tomam em consideração os dissensos constatados. Através de suas ações de fala são
levantadas pretensões de validade criticáveis, as quais apontam para um reconhecimento
intersubjetivo. A oferta contida num ato de fala adquire força obrigatória quando o falante
garante, através de sua pretensão de validade situada, que está em condições de resgatar essa
pretensão, caso seja requerido, empregando o tipo correto de argumento.
A ética do discurso pressupõe alguns aspectos, a saber: esfera pública; distribuição equitativa
de direitos de comunicação; a competência comunicativa dos integrantes do grupo; situações
dialógicas ideais, livres de coerção e violência; autenticidade; e um sistema linguístico elaborado que
permita por em prática o discurso teórico e prático. Habermas (2003, p. 113) identifica estes aspectos
como a base de validade do discurso que implica em quatro condições essenciais para se participar do
processo discursivo e suas respectivas pretensões de validade universais.
A reconstrução racional centra-se na ideia de reflexão, não como no sentido de reflexão
transcendental e monológica da filosofia da consciência, mas como um meio que busca alcançar o
sentido oculto de um texto ou comunicação sistematicamente distorcida.
Assim, a reflexão apresenta-se como uma
[...] força esclarecedora, [que pode] revelar-nos, no âmbito de uma crítica da ideologia, aquilo
que antes estava oculto, atrás de nossas costas, determinando-nos ideologicamente: opiniões,
preconceitos ingênuos, visões de mundo. Ela é capaz de detectar os contextos de ação
sistematicamente distorcidos, os elementos não entrevistos de coação e de dominação
(SIEBENEICHLER, 2003, p. 83).
O conceito de reflexão adotado por Habermas, segundo Siebeneichler (2003), é complexo e
envolve três concepções distintas, a saber: a) reflexão como forma de fundamentação racional
transcendental de todo saber teórico possível e de toda a ação moral possível, trata-se de uma reflexão
sobre as condições de possibilidade das competências do sujeito que conhece, fala e age; b) reflexão
como dissolução crítica, levado a cabo pela consciência, autocrítica, que produz a libertação em
relação a uma objetividade aparente; c) reflexão no sentido de psicanálise freudiana, trata-se de uma
ideia de autocrítica no nível subjetivo, estando relacionada à experiência reflexiva do sujeito que se
encontra em um estado de falsa consciência sobre si mesmo, devido a padrões de percepção e de ação
restringidos através de coação.
A reconstrução racional é o elemento principal da teoria da pragmática universal de Habermas
(1996, p. 9), cuja função “[...] é identificar e reconstruir condições universais de possível compreensão
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
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mútua (Verständigung7)”, dentro de um sistema de condições, categorias e regras que condicionam
um falante competente a construir e utilizar conhecimentos, bem como agir racionalmente. Neste
sentido, é fundamental que o indivíduo consiga estabelecer uma comunicação que acontece em dois
níveis (simples e metacomunicação).
As expressões linguísticas são formadas por enunciados performativos e por enunciados com
conteúdo proposicional (dependente do primeiro). O enunciado performativo determina a relação
intersubjetiva entre falante e ouvinte; o proposicional serve para comunicar coisas ou circunstâncias.
A construção de enunciados performativos e proposicionais, por sua vez, depende que os atores de
uma interação disponham de competência linguística, uma vez que esta corresponde à capacidade de
dominar o sistema de regras e normas próprio de uma comunidade e de aplicá-las refletidamente no
seu agir cotidiano (PINZANI, 2009).
Dispondo de tal competência linguística, os participantes de uma interação conseguem
estabelecer uma comunicação em dois níveis: a comunicação simples e a metacomunicação – princípio
fundamental para se alcançar a compreensão mútua. A comunicação simples refere-se a coisas ou
circunstâncias que somente pode estabelecerse se houver simultaneamente uma metacomunicação
sobre o sentido do uso do enunciado proposicional (PINZANI, 2009). Dessa forma, em qualquer
situação de entendimento, é fundamental que os indivíduos estabeleçam esses dois níveis de
comunicação.
A habilidade de estabelecer uma comunicação em dois níveis é denominada por Habermas de
competência comunicativa que se constitui “[...] na reconstrução do sistema de regras que um falante
competente tem de dominar se pretender fazer jus ao postulado da simultaneidade entre o nível
comunicativo e metacomunicativo da comunicação. ” (SIEBENEICHLER, 2003, p. 92). Apoia-se
também no paradigma da interpretação da hermenêutica macroscópica de Garfinkel, a qual se refere
à habilidade de questionamento e julgamento racional das pretensões de validade do saber utilizado
pelos participantes de um diálogo, sendo assim decisivo para a interpretação e compreensão mútua,
logo para uma comunicação isenta de obstáculos (SIEBENEICHLER, 2003).
O princípio da reconstrução racional, proposto por Habermas em suas teorias, orienta-se na
teoria de Wittgenstein, referindo-se, assim como as ciências hermenêuticas, a um universo de objetos
estruturados simbolicamente: fatos culturais, formações linguísticas, conceitos, critérios, regras e
esquemas (HABERMAS, 1996; SIEBENEICHLER, 2003). Este princípio apoia-se também na ideia
que os indivíduos que produzem as configurações simbólicas, aplicam seu sistema de regras sem
consciência de sua existência. Nesse sentido, o princípio reconstrutivo da pragmática universal
consiste em
[...] explicitar sistematicamente, através de categorias apropriadas, as estruturas profundas e
os elementos de um “saber de regras” pré-teórico, intuitivo, que os sujeitos têm de dominar
praticamente quando entram numa situação de interação através da fala (SIEBENEICHLER,
2003, p. 92).
7 A palavra Verständigung é ambígua: no sentido mais restrito indica que dois participantes de uma comunicação
compreendem da mesma forma uma determinada expressão linguística. No sentido mais amplo, refere-se a existência
de um acordo entre esses participantes no que se refere ao acerto de uma expressão de uma base normativa mutuamente
reconhecida (HABERMAS, 1996).
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
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Esse conhecimento pré-teórico e implícito do sistema de regras linguístico de um falante é
definido como know-how. No momento em que um intérprete compartilha e compreende o conteúdo
desse conhecimento implícito do falante, transformando-o em conhecimento específico, trata-se de
um know-that. Este processo representa a função da reconstrução racional, a qual funciona como um
sistema de avaliação do saber pré-teórico, como salienta Habermas (1996, p. 28-29),
Com efeito, as propostas reconstrutivas são orientadas para os domínios do conhecimento pré-
teórico, ou seja, não para uma qualquer opinião implícita mas sim para um conhecimento
prévio e intuitivo já comprovado. A consciência de regras dos falantes competentes funciona
como um tribunal de avaliação, por exemplo, no que se refere à gramaticalidade das frases.
[...] Quando o conhecimento pré-teórico, a ser reconstruído, expressa uma capacidade
universal e uma competência (ou subcompetência) geral cognitiva, linguística ou interativa,
então aquilo que começou como uma explicação do significado adquire um objetivo de
reconstrução de competências específicas.
3 EDUCAÇÃO E EMANCIPAÇÃO
Apesar da educação não ser o tema central da teoria de Habermas, acredita-se que a
racionalidade presente no agir comunicativo se configure em uma abordagem que pode trazer
importantes contribuições na construção de uma educação que promova a autonomia e o
esclarecimento, pois se constitui na possibilidade “[...] de uma ação emancipatória na escola, a partir
da constituição de um sujeito, cuja racionalidade não seja nem instrumental nem a do procedimento.
” (PRESTES, 1996, p. 11).
Partindo desse pressuposto, Habermas articula a sua teoria da racionalidade comunicativa e a
Teoria do Agir Comunicativo com o conceito de esclarecimento que é um importante fator no processo
histórico da liberdade e da emancipação do homem, constituindo-se em elemento chave no processo
de aprendizagem. A importância do esclarecimento é reforçada ao longo da história do pensamento
moderno, como também na sociedade contemporânea, por envolver conceitos que visam: justiça,
liberdade, emancipação, ação, sujeito, igualdade, totalidade e humanidade libertada
(SIEBENEICHLER, 2003).
Nesse sentido, o esclarecimento não tem somente o papel de ensinar aos homens os direitos e
os deveres de fazer uso da razão sem limites e de tomar uma decisão ética inteiramente livre, mas
enquanto movimento histórico e processo de emancipação pode modificar a estrutura da consciência,
das instituições econômicas, jurídicas, da arte, da religião e dos costumes através da interação mediada
pela linguagem (SIEBENEICHLER, 2003).
Para construir o seu conceito de esclarecimento Habermas se baseia nesses princípios e na
concepção de esclarecimento de Kant, Hegel e Marx que ensinam a utilização da razão e tentam
estabelecer uma conexão entre liberdade, emancipação e história (SIEBENEICHLER, 2003). No
pensamento desses teóricos, o esclarecimento se constitui no:
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[69]
[...] trabalho crítico da razão, que passa a analisar tanto o estado de dominação, como o de
liberdade conquistada pelo homem num determinado momento de sua história, como ainda o
dos objetivos a serem atingidos no futuro (SIEBENEICHLER, 2003, p. 12).
Habermas acredita no potencial emancipatório de um esclarecimento complexo, baseado no
racionalismo lógico, normativo, social, estético e subjetivo. No entanto, o teórico prefere seguir o
contra discurso da filosofia do esclarecimento prático moderno que busca analisar os limites e a
ignorância do esclarecimento. Embora Habermas siga a linha do esclarecimento prático, convém
salientar que o teórico apoia seu pensamento esclarecedor na relação entre racionalidade e o processo
histórico orientado à emancipação (BANNELL, 2006; SIEBENEICHLER, 2003). Seu objetivo é
desenvolver a emancipação humana através do esclarecimento e do processo de racionalização, cuja
finalidade é “[...] resgatar e liberar a pretensão de razão anunciada nas estruturas teleológicas e
intersubjetivas da reprodução social. ” (BANNELL, 2006, p. 18), o que favorece a formação racional
da identidade do indivíduo e da coletividade.
Com isso, Habermas faz uma distinção entre emancipação em relação à natureza exterior e em
relação às formas de dominação social e política. Segundo Aragão (2006), a primeira se concretiza
através do progresso técnico e a segunda por meio de novos níveis de reflexão, nos quais os sujeitos
assumem posições de aceitação ou recusa de normas e formas de identidade vigente.
Assim, a educação na perspectiva habermasiana visa promover um processo de formação de
sujeitos capazes de linguagem e de ação. Esse processo de formação se constitui em uma série
irreversível de estágios de desenvolvimento discretos e cada vez mais complexos que conduzem os
sujeitos a novos níveis de reflexão, isto é, a aprendizagem, o que lhe permite ganhar um grau sempre
maior de autonomia, assim como satisfazer determinadas exigências levantadas pelo seu ambiente
natural e social (PINZANI, 2009).
Esses estágios dos processos de aprendizagem relacionam-se com as quatro categorias da
racionalidade da ação: ação teleológica (estratégica), ação normativa, ação dramatúrgica e o agir
comunicativo. Essas ações podem ser planejadas, executadas e avaliadas segundo o grau de
racionalidade empregada na ação, o que determina a sua validade e eficácia (BANNELL, 2006). Outra
questão salientada por Bannell (2006), diz respeito aos pressupostos ontológicos de cada modelo de
ação que são cada vez mais complexos exigindo que a racionalidade seja empregada na mesma
proporção, elevando o nível de descentração do indivíduo.
Na ação teleológica a racionalidade é avaliada segundo critérios de validade e eficácia. O
primeiro refere-se às crenças do agente sobre o mundo objetivo representadas nos conteúdos
proposicionais dos proferimentos que podem ser verdadeiras ou falsas. O segundo, diz respeito à
capacidade do agente em modificar ou não o mundo de acordo com seus desejos e intenções podendo
ser eficaz (racional) ou ineficaz (irracional). A aprendizagem se dá no plano cognitivo de percepções
e crenças do indivíduo que podem estar condizentes ou não com a realidade em que está inserido
(BANNELL, 2006).
Na ação normativa o agente estabelece uma relação reflexiva com o mundo objetivo e o mundo
social. É nesse contexto que se determinam as normas que serão aceitas como válidas pelos atores e
aquelas que imprimem legitimidade às interações e relações interpessoais entre os agentes. A
racionalidade da ação normativa pode ser avaliada de duas formas: se há conformidade das ações com
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[70]
as normas existentes ou se as normas condizem com os interesses dos membros da comunidade e
merecem aceitação (BANNELL, 2006). A aprendizagem no contexto normativo “[...] refere-se à
internalização de valores e à formação de um complexo motivacional adequado ao contexto normativo
existente [...]”, bem como as relações interpessoais. (BANNELL, 2006, p. 44).
É importante salientar, que neste modelo de ação existe a possibilidade de uma aprendizagem
mais complexa por não contar somente com a formação do complexo cognitivo da ação teleológica,
mas também com a formação do complexo motivacional8.
Segundo Bannell (2006, p. 44), esse processo de aprendizagem visa:
[…] avaliar se as normas consideradas legítimas, aqui e agora, realmente satisfazem seus
interesses generalizáveis, por meio de um processo discursivo de interpretação das suas
necessidades. Nesse caso, a força motivadora das normas existentes pode enfraquecer,
desencadeando uma situação em que novas necessidades são interpretadas e desenvolvidas
em novas disposições, por meio de processos de aprendizagem.
No caso da ação dramatúrgica, é estabelecida uma relação com o mundo subjetivo, que na
concepção de Habermas (2012, p. 91) representa a “[...] totalidade de experiências subjetivas a qual o
ator tem, em relação aos outros, um acesso privilegiado. ” No mundo subjetivo são considerados os
desejos e sentimentos, que são experiências primárias e manifestações da necessidade humana, apesar
disso, os sentimentos devem ser compreensíveis de tal modo, que outros membros que compartilham
a mesma tradição cultural possam reconhecer suas próprias necessidades nas interpretações.
Nesse contexto, a racionalidade é avaliada segundo a coerência entre os desejos e sentimentos
expressos pelo agente e os padrões culturais compartilhados pela comunidade em que está inserido.
Desse modo, a aprendizagem se dá pelo ajuste entre sentimentos e os padrões culturais
compartilhados; pela maneira de expressar a natureza interior e as experiências internas que temos de
fato; e por fim, pelo ajuste das nossas ações com a expressão dos sentimentos (BANNELL, 2006).
Como o agir comunicativo visa a uma relação reflexiva com o mundo objetivo, social e
subjetivo, possibilita a interação orientada à busca do entendimento mútuo e a coordenação das ações.
Desse modo, constitui-se na forma de ação com o maior potencial de aprendizagem, seja no nível
individual ou coletivo promovendo a racionalização da sociedade e consequentemente seu
desenvolvimento.
Na esfera do agir comunicativo ainda pode haver um nível mais elevado de entendimento (o
consenso) que corresponde à passagem para a esfera do discurso (a forma reflexiva do agir
comunicativo) que permite estabelecer acordos verdadeiramente racionais, os quais se diferem do
consenso fático que se dá no nível da comunicação quotidiana. Tal procedimento racional possibilita
a avaliação crítica das relações de forças e das posições assumidas em relação aos mundos objetivo,
social e subjetivo, que na concepção de Habermas compõem o mundo da vida, conferindo ao homem
um progresso na autonomia da ação, a liberdade da dominação política e social e consequentemente a
formação da sua identidade e da sua consciência moral. (ARAGÃO, 2006; HABERMAS, 1996).
8 Complexo motivacional refere-se ao fato do agente poder adotar uma atitude em relação ao mundo objetivo
e outra atitude em relação ao mundo social (BANNELL, 2006).
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[71]
A linguagem assume assim, um importante papel no processo de emancipação da humanidade
devido ao seu caráter social, uma vez que atua como medium universal para comunicação.
Siebeneichler (2003, p. 50) ressalta que a comunicação linguística,
[...] constitui, pois uma “força” a qual sujeitos devem a sua maioridade. Porque a comunicação
é a figura de uma vida verdadeira. A interrupção da comunicação é a figura de uma vida falsa,
porque não apenas faz silenciar o falante, mas torna-se sem linguagem, isola-o na solidão. A
comunicação constitui o equilíbrio, o balanceamento salvador entre a solidão sem linguagem
e a alienação, entre o sacrifício da individualidade e o isolamento daquele que se tornou só.
A maioridade alcançada com a comunicação linguística, isto é, a capacidade de construir o
saber a partir da crítica racional e da competência comunicativa resulta de processos de aprendizagem,
que na opinião de Habermas (2003), é indispensável à evolução social. Na visão habermasiana a
aprendizagem se baseia nas seguintes suposições:
[...] a suposição de que o saber em geral pode ser analisado como um produto de processos
de aprendizagem; depois, que o aprendizado é um processo de solução de problemas no qual
o sujeito que aprende está ativamente envolvido; e, finalmente, que o processo de
aprendizagem é guiado pelos discernimentos dos próprios sujeitos diretamente envolvidos
nesse processo (HABERMAS, 2003, p. 50).
Essas suposições, que fundamentam o processo de aprendizagem, correspondem à capacidade
da abstração reflexionante que leva o sujeito à descentrações progressivas. O conceito de abstração
reflexionante se refere a
[...] processos mais gerais de equilibração e possui diferenciação de graus e natureza.
Conforme indica a etimologia, abstrair significa “descolar”, “arrancar”, extrair algo de
alguma coisa. O sujeito por uma ação intelectual representativa “retira” dos objetos aquilo
que seu esquema de assimilação permite retirar. Os esquemas, por sua vez, dependem da
totalidade das experiências anteriores, das abstrações realizadas (PRESTES, 1996, p. 43-44,
grifo do autor).
O conceito de descentração corresponde ao “[...] sistema de coordenação [do homem] que
permite por em correspondência relações diferentes. ” (HERMANN, 2012, p. 3). Uma consciência
descentrada tem a habilidade de estabelecer relações complexas ao passo que o conhecimento anterior
dá lugar a um conhecimento novo, conduzindo o homem a níveis mais elevados de racionalidade e de
evolução social.
No entendimento de Hermann (2012), o processo de aprendizagem baseado no agir
comunicativo pode contribuir na promoção do desenvolvimento de estruturas cognitivas e sócio
afetivas individuais, permitindo que as sociedades ascendam a novos patamares de integração social.
Além disso, os níveis atingidos de descentramento e de racionalização favorecem o desenvolvimento
de potenciais cognitivos, morais e interativos que orientam o agir e as demandas sociais.
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[72]
Neste sentido, é necessário manter um trabalho crítico sobre a responsabilidade da instituição
e dos profissionais que nela atuam, com o fim de organizar critérios de racionalidade capaz de produzir
entendimento e criar estruturas que objetivem:
• promover a capacidade discursiva daqueles que aprendem;
• promover condições favoráveis a uma aprendizagem crítica do próprio conhecimento
científico;
• inocular a semente do debate, considerando os níveis de competência epistêmica dos
alunos;
• promover a discussão pública sobre os critérios de racionalidade subjacentes às ações
escolares, seja através dos conhecimentos prevalentes no currículo, seja pela definição de
políticas públicas que orientem a ação pedagógica;
• estimular processos de abstração reflexionante, que permitam a níveis superiores a crítica
da sociedade e dos paradoxos de racionalização social e, a partir daí, realizar processos
de aprendizagem, não só no plano cognitivo, como também no plano político e social;
• promover a continuidade de conhecimentos e saberes da tradição cultural que garantam
os esquemas interpretativos do sujeito e a identidade cultural (PRESTES, 1996, p. 107).
A educação pode ativar as estruturas da interação e da comunicação para produzir o
entendimento e o compromisso ético na ação dos sujeitos, tornando-os mais esclarecidos e
emancipados. Além disso, pode produzir uma prática educativa sem ingenuidades e voluntarismos
formando um público capaz de refletir criticamente e atuar em discussões, o que pode transformar as
estruturas produtivas, normativas e pessoais necessárias à reprodução da vida humana.
4 DO “CONFORMISMO” AO AGIR DISCURSIVO: REFLEXÕES SOBRE A
PRÁTICA DO BIBLIOTECÁRIO ESCOLAR
Morigi e Bonotto (2004, p. 148) destacam que o esforço para compreender os elementos que
compõem as representações da comunidade escolar em relação à biblioteca e ao bibliotecário permite
[...] atualizar e reordenar as nossas impressões e as imagens sobre a realidade presente e,
assim, provocar modificações nas nossas representações sobre o tempo passado. Por esse
motivo, a partir das ideias no presente, podemos reconstruir as impressões sobre o passado.
Ao realizarmos essa operação, também atualizamos o nosso imaginário, o nosso acervo
cultural.
Discutir as impressões e as imagens da biblioteca escolar e do bibliotecário na comunidade
escolar é fundamental para repensar as suas bases e o agir biblioteconômico. A relevância do tema
deve-se ao fato de muitas bibliotecas escolares ainda se encontrarem em estado de profunda
precariedade em todos os aspectos (acervo, infraestrutura, organização, etc.), constituindo-se em
verdadeiros depósitos de livros “velhos”, onde impera um “ar sombrio e silencioso” (CAMPELLO,
2012; FURTADO, 2012; MILANESI, 2002; MORO; ESTABEL, 2011; SILVA, 1995).
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
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A biblioteca escolar, sobretudo a da escola pública, serve como lugar de passagem ou repouso
profissional, onde professores por doença, velhice ou fastio pedagógico são encostados ou
funcionários indisciplinados de outros setores são encaminhados. Diante de tantos problemas, a
biblioteca escolar se encontra em um profundo silêncio: silenciam as autoridades, ignoram-na os
pesquisadores, calam-se os professores, omitem-se os bibliotecários (FURTADO, 2012; SILVA,
1995).
Nesse cenário o primeiro contato com a biblioteca escolar geralmente é considerado
desagradável, sinônimo de castigo, imposição, proibição e desconforto, tanto na visão do professor
quanto na do aluno (CORRÊA et al., 2002; MILANESI, 2002; SILVA 1995). Ou então, na melhor
das situações, a biblioteca é instituída como o lugar para pesquisar e copiar verbetes conforme
orientação do professor, na qual o aluno cumpre uma obrigação para obter aprovação (CAMPELLO,
2012).
Essas concepções contradizem a missão da biblioteca escolar que é habilitar “[...] os alunos
para a aprendizagem ao longo da vida e desenvolver sua imaginação, preparando-os para viver como
cidadãos responsáveis. ” (INTERNATIONAL FEDERATION OF LIBRARY ASSOCIATIONS
AND INSTITUTIONS/ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A EDUCAÇÃO, A
CIÊNCIA E A CULTURA, 2005, p. 4). Por conseguinte, a biblioteca não pode se restringir à tarefa
técnica de organização e disponibilização da informação, sendo fundamental que
[...] ela exerça influência ativa e dinâmica no contexto envolvente, preocupando-se com a
qualidade do seu acervo e dos seus serviços, com a origem e necessidades dos usuários, com
a democratização dos seus espaços e com o planejamento de programas socioculturais
(SILVA, 1993, p. 72).
Nesse sentido, a biblioteca deve ser um local de mediação na construção do conhecimento e o
bibliotecário é o principal ator nesse processo, uma vez que ele é quem cumpre essa função. Mas,
como se constrói o conhecimento em um local que não há discussão, debate e reflexão? O trabalho de
mediar implica intervir, opinar, falar e participar, isto é, o bibliotecário deve refletir com o estudante
acerca do tema questionado, ajudando-lhe a construir um pensamento crítico, o que leva a
transformação do seu estágio inicial do conhecimento.
Contudo, constata-se na literatura, que o termo mediar na prática biblioteconômica assume um
sentido passivo de conformação e de neutralidade, uma vez que o bibliotecário é considerado por
alguns autores o “intermediário” que interliga o usuário ao acervo, sendo sua função apenas organizar
e disponibilizar, ou simplesmente incentivar a leitura, sem uma participação mais ativa (MORO;
ESTABEL, 2011).
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[74]
Dessa forma, é essencial repensar o agir do bibliotecário e eliminar o seu pensamento
conformista. Para tanto, deve-se
[...] abandonar a lamúria e conferir a atuação [do bibliotecário] escolar uma característica
mais agressiva. Basta de reclamar que o aluno e o professor não vão à biblioteca! Basta de
lamentar que a biblioteca escolar está esquecida na escola! Mas vale desenvolver mecanismos
que atraiam o professor e o aluno para a tarefa, eminentemente coletiva, de pensar e fazer
uma biblioteca escolar atuante, eficiente e capaz de enriquecer o trabalho docente e a
aprendizagem do aluno (SILVA, 1995, p. 62-63).
Somente assim, a biblioteca deixará de ser apenas um lugar que abriga livros e fechada em si
mesma para se abrir à democratização do conhecimento, transformando-se em um organismo vivo e
dinâmico propício à prática de ensino-aprendizagem e interação entre os sujeitos (CALDIN, 2005;
MORO; ESTABEL, 2003). Nessa perspectiva, entende-se a biblioteca escolar como:
[...] um centro de aprendizagem com uma participação direta em todos os aspectos do
programa de educação com materiais de todo tipo, onde educadores, estudantes e usuários
em geral podem redescobrir e ampliar os conhecimentos, desenvolver pesquisas,
desenvolver aptidões para leitura, para opinar, para avaliar, assim como desenvolver todos
os meios de comunicação de que dispõe o ser humano com o objetivo de assegurar uma
aprendizagem total [...] (TOMÉ, 2009 apud MORO; ESTABEL, 2011, p. 18).
Convém ressaltar que, independentemente da adoção de qualquer padrão ou execução de
objetivos para a biblioteca escolar, a efetiva inserção desta no processo de ensino-aprendizagem
depende de dois fatores: o primeiro é a definição de uma filosofia de aprendizagem subjacente que
seja compartilhada por bibliotecário, professor e diretor da escola (KUHLTHAU, 1999). O segundo é
o bibliotecário munir-se de conhecimentos pedagógicos, uma vez que este não dispõe de formação
para atuar no aparelho escolar “[...] seja no âmbito da organização, do planejamento e da administração
do acervo disponível, seja no que se refere ao trabalho de dinamização da leitura entre os alunos.”
(SILVA, 1995, p.14).
Nesse processo, torna-se, também fundamental, desenvolver as habilidades do pessoal da
biblioteca, tendo em vista que o a biblioteca lida com diversos grupos de pessoas (pais, alunos,
professores, administradores, profissionais de aconselhamento) que requerem habilidades especiais
que podem ser assim definidas:
Habilidades de comunicação de forma positiva e aberta com crianças e adultos;
entendimento das necessidades dos usuários; cooperação com indivíduos e grupos dentro
e fora da comunidade escolar; conhecimento e compreensão da diversidade cultural;
conhecimento de metodologia de ensino e da teoria da educação; habilidades no uso da
informação; materiais que compõem o acervo da biblioteca e como ter acesso aos mesmos;
literatura, meios de comunicação e cultura infantis; conhecimento e aptidão no campo
da gerência e do marketing; no campo da tecnologia da informação (INTERNATIONAL
FEDERATION OF LIBRARY ASSOCIATIONS AND INSTITUTIONS/ORGANIZAÇÃO
DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A EDUCAÇÃO, A CIÊNCIA E A CULTURA, 2005, p. 14,
grifo nosso).
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[75]
Assim, o bibliotecário deixa de ser um mero guardião, secular zelador de livros, severo,
ordenador e detalhista técnico, cujas ações intimidam e cerceiam qualquer iniciativa de comunicação
e discussão, para transformar-se em um educador como os outros, além de servir como apoio e
complemento para os professores. O bibliotecário escolar será um educador, cuja disciplina é ensinar
a aprender (MILANESI, 2002; VÁLIO, 1990).
Nesta pesquisa aponta-se não somente para a necessidade de aprofundar os estudos e a
discussão sobre o papel do bibliotecário escolar, mas também para a importância de refletir o agir
desse profissional sob a perspectiva comunicativo-discursiva. Pode-se fazer a reconstrução racional
do agir do bibliotecário escolar, conferindo-lhe novas competências no processo de ensino-
aprendizagem à luz das teorias do Agir comunicativo e do Discurso de Jürgen Habermas.
Nesse sentido, o exercício de reflexão sobre o agir do bibliotecário escolar, constitui um
esforço inicial que pretende contribuir para a construção da identidade teórica e prática, dotando-o de
parâmetros que podem inspirar ações educativas com enfoque na interação e na comunicação. A
reflexão se fundamenta na teoria do Agir comunicativo, na qual se busca aspectos relacionados à
aprendizagem, e também uma perspectiva de ação com foco na comunicação e na interação discursiva
entre o bibliotecário e os atores da comunidade escolar.
Borba (2011) ressalta a importância de o bibliotecário assumir uma postura reflexiva da sua
prática, pois tal atitude possibilita a ampliação de perspectivas que podem contribuir para o
desenvolvimento de uma postura pedagógica com vistas a desenvolver a capacidade crítica, analítica,
criativa e reflexiva do indivíduo por meio de processos de ensino-aprendizagem que privilegiem o
enfoque comunicativo-discursivo. Assim, o entendimento do processo educativo, o planejamento e a
avaliação das ações são peças fundamentais.
Desse modo, a teoria do agir comunicativo constitui-se em um referencial teórico ímpar à
construção de uma dimensão humanista e pedagógica na prática biblioteconômica. Pois, por centrar-
se em convicções intersubjetivamente compartilhadas pelos participantes de uma interação que busca
o entendimento sobre algo no mundo, a teoria possibilita a renovação do saber cultural, a integração
social e a criação de solidariedade e a formação de identidades sociais.
A construção de uma narrativa educacional na prática do bibliotecário escolar fundada na
perspectiva da pedagogia da ação comunicativa favorece o desenvolvimento de uma
[...] práxis emancipatória, humanamente libertadora, pois implica o reconhecimento de cada
sujeito como um “outro”, distinto e livre possuidor do seu próprio horizonte de sentido. Na
comunicação solidária o outro aparece em sua dignidade própria como alguém que não pode
ser reduzido a aspecto ou momento de um sistema qualquer (BOUFLEUR,
2001, p. 87).
Torna-se fundamental que o bibliotecário escolar empreenda ações educativas baseadas na
lógica pedagógica da ação comunicativa, uma vez que esta permite desenvolver uma concepção de
aprendizagem baseada na relação intersubjetiva entre os sujeitos, que é um fator elementar na
construção da subjetividade. Nessa concepção de aprendizagem, a construção do conhecimento se
processa por meio da compreensão das razões que
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
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[...] justificam algo no mundo como sendo uma feição verdadeira no mundo objetivo, ou como
uma norma justa no mundo social, ou ainda como manifestação sincera no mundo subjetivo.
O conhecimento da “realidade do mundo”, dessa forma, não aparece como um desvelamento
de sua pretensa essencialidade, mas como apreensão das relações intersubjetivas que
constituem essa realidade (BOUFLEUR, 2001, p. 80).
Roe (1999 apud DUDZIAK, 2001) considera que o domínio da ação do bibliotecário no
processo de aprendizagem deve se embasar em quatro conceitos fundamentais relacionados a lógica
da ação comunicativa:
• Intencionalidade: quando o bibliotecário direciona a interação e o aprendizado;
• Reciprocidade: todos os atores envolvidos no processo de mediação aprendem;
• Significado: quando a experiência se torna significativa para todos os envolvidos;
• Transcendência: quando a experiência adquirida na aprendizagem é apreendida na vida
dos atores.
Entre as práticas baseadas nos pressupostos da ação comunicativa e do discurso que estão
sendo desenvolvidas em algumas instituições educacionais, pode-se mencionar as “comunidades de
aprendizagem”, que objetivam resolver o problema do fracasso escolar envolvendo todos os atores
inseridos nesse contexto, inclusive o bibliotecário, em uma prática educativa que visa:
[...] estimular, favorecer e desenvolver, o exercício do direito à participação por parte de quem
esteja direta ou indiretamente nela implicada, considerando que a deliberação é possível em
coletivos que se colocam em disposição para dialogarem na busca pelo entendimento
(BRAGA,
2010, p. 8).
Nas comunidades de aprendizagem as relações entre os atores são mediadas pela aprendizagem
dialógica que
[...] se mostra como a mais adequada para responder às novas exigências sociais e educativas
da sociedade da informação ao fazer com que a comunidade se envolva na educação das
crianças, já que a escola não pode assumir mais toda esta responsabilidade sozinha; ao facilitar
a entrada de diversas pessoas e culturas na escola possibilitando aprendizagens mais ricas e
variadas; ao estimular o diálogo igualitário entre todos os agentes educativos ante um objetivo
comum; ao utilizar o diálogo para aprender mais (potencializam-se as capacidades de seleção
e processamento da informação através de um diálogo que gera reflexão) e melhor
(aprendizagem com valores: solidariedade, respeito etc.) (BRAGA, 2010, p. 8).
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[77]
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A crise da racionalidade produtivista vivenciada pela educação em decorrência das novas
dinâmicas da sociedade e da economia obriga o bibliotecário escolar a repensar o seu papel e sua
atuação nesse contexto em contínua mutação.
A visão tradicional da educação é substituída por um enfoque diferenciado, cuja ênfase está no
aprendizado ao longo da vida e no desenvolvimento de habilidades essenciais para manipulação da
informação e do conhecimento no ambiente digital. Assim, grandes desafios são impostos à educação,
que deve desenvolver uma política pedagógica para formar um coletivo inteligente com habilidades
críticas e criativas capaz de participar ativamente de processos sociais, acompanhando as
transformações estruturais e tecnológicas, e principalmente, respeitando a pluralidade cultural.
Tendo em vista esses desafios, cabe ao bibliotecário escolar enquanto profissional inserido
nesse contexto, repensar o seu agir profissional para adaptar-se às novas mudanças.
Geralmente o bibliotecário é visto como um guardião de livros, um ordenador e detalhista
técnico. Do mesmo modo, o bibliotecário parece não ter qualificação pedagógica para agir na
biblioteca escolar, e por essa razão a sua função se restringe a organizar o acervo para disponibilização.
Por conseguinte, a biblioteca é considerada um grande depósito de livros ou lugar para copiar verbetes.
Isto resulta em distância das ações pedagógica desenvolvidas na escola, comprometendo a inserção
da biblioteca no contexto educacional como espaço de ensino-aprendizagem.
A proposta apresentada representa esforço inicial para repensar o agir do bibliotecário escolar
no processo de ensino-aprendizagem. Devido à complexidade do tema, são necessários novos estudos,
que envolvam outros elementos de análise, permitindo avaliações mais detalhadas. Espera-se,
contudo, que contribua como sugestão de reflexão e debate aos bibliotecários escolares e também
incentive o desenvolvimento de uma prática biblioteconômica fundada na racionalidade comunicativa.
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set. 2012.
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[80]
Cap
ítulo
5 ADMINISTRAÇÃO DA INFORMAÇÃO PARA A INOVAÇÃO EM UMA ORGANIZAÇÃO
Clóvis Ricardo Montenegro de Lima
Lidiane dos Santos Carvalho
_____________________________________________________________________________
Resumo: Introdução: Neste artigo é apresentam-se visões distintas da informação: o operador
funcional de sistemas sociais ou uma dinâmica complexa. Objetivo: Discutir questões da
administração da informação para inovação em uma organização. Esta discussão é realizada a partir
do estudo específico na Fundação CERTI – Centros de Referência em Tecnologias Inovadoras,
vinculada a Universidade Federal de Santa Catarina. Metodologia: Esta investigação combina
observação participante, busca de documentos e entrevistas estruturadas. Resultados: São
apresentados resultados parciais da investigação sobre informação, comunicação e inovação
tecnológica na Fundação CERTI, instituição de pesquisa e desenvolvimento tecnológico, vinculada à
Universidade Federal de Santa Catarina com foco na inovação em negócios, produtos e serviços.
Conclusões: Sugere é que a Ciência da Informação pode contribuir com o desenvolvimento teórico e
metodológico da administração da informação para inovação das organizações.
_____________________________________________________________________________
1 INTRODUÇÃO
Neste artigo o objetivo geral é discutir questões da administração da informação para inovação
em uma organização. Esta discussão é realizada a partir do estudo específico na Fundação CERTI –
Centros de Referência em Tecnologias Inovadoras, vinculada a Universidade Federal de Santa
Catarina.
Apresentam-se visões distintas da informação: o operador funcional de sistemas sociais ou uma
dinâmica complexa. O conceito de informação usado interfere profundamente na forma como se
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[81]
representa e analisa a sua organização e gestão. São discutidos conceitos de inovação e dos processos
de inovação para destacar neles o papel da informação, como elemento constitutivo e dinamizador.
Machado, Lehmann e Araujo (2008, p. 159) caracterizam inovação como:
[...] a capacidade de uma organização de articular e mobilizar recursos (humanos, financeiros,
materiais, etc.), para captar oportunidades e neutralizar ameaças (operacionais,
mercadológicas, etc.); o processo de transformação de idéias (inovação) em soluções que
atendam às necessidades existentes ou latentes; e o resultado de uma atividade criativa que
resulta na forma de produtos, processos e sistemas, novos ou modificados (grifo nosso).
São apresentados resultados parciais da investigação sobre informação, comunicação e
inovação tecnológica na Fundação CERTI, instituição de pesquisa e desenvolvimento tecnológico,
vinculada à Universidade Federal de Santa Catarina com foco na inovação em negócios, produtos e
serviços. Esta investigação combina observação participante, busca de documentos e entrevistas
estruturadas.
2 INFORMAÇÃO E INOVAÇÃO
Ao responder a indagação “do que falamos quando se fala de informação”, Gonzalez de Gómez
(2000) afirma tratar-se de um termo flutuante que, tal como o de democracia, produz diferentes efeitos
de sentido em diferentes contextos. Informação, como construção e sintoma da sociedade
contemporânea, designa algo que se desdobra em vários planos de realização – todos eles
transcendidos por valores semânticos e quadros normativos, da ordem do ideacional, e ancorados no
solo de sua inscrição ou manifestação, da ordem do visível e do temporal.
Gonzalez de Gomez (2008) observa que a informação tem para Habermas uma dupla
ancoragem - socio-cognitiva e instrumental-estratégica. Por um lado, a informação está ancorada
naquela temporalidade que atrela corpo e cultura numa configuração diferenciada e permite a abertura
de múltiplas perspectivas sobre o mundo. Associada a algumas das plurais possibilidades heurísticas
das ações - cotidianas e especializadas - a informação designa uma diferença que se instala nas
experiências de confronto entre nossas expectativas prévias e do que acontece em nossas relações
atuais com o mundo. Por outro lado, a informação, enquanto codificada, reconstitui-se através dos
meios, nas zonas de trocas e negociação entre os sistemas e os mundos da vida - mediação, porém
constituída numa relação histórica e não “lógica”, plausível, então, de ambivalências e de
transformações.
A informação designa uma instância de constante reabertura das relações entre o mundo da
vida e o mundo. A informação é considerada neste caso como constitutiva dos processos de
objetivação nos contextos da experiência e da ação. Nessas dinâmicas da informação acontece a
manifestação da alteridade, do que surpreende, e como tal, ela faz parte das condições da
aprendizagem e dos desafios à imaginação linguística (GONZALEZ DE GOMEZ, 2008).
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[82]
A informação, enquanto codificada e imersa nos meios, opera no domínio dos sistemas - da
administração, da economia e do mercado -, em exercícios funcionais instrumentais, e nas zonas de
intermediação entre o sistema e os mundos da vida. A informação, mediatizada, ficaria associada ao
problema da constituição do vínculo social, nas sociedades contemporâneas: nas situações em que a
integração social, comunicativa, é substituída pela integração estabelecida por meios (GONZALEZ
DE GOMEZ, 2008).
A pesquisa do termo “innovation” realizada na base de dados Library and Information Science
Abstracts – LISA identifica cento e noventa e dois registros de artigos indexados nos últimos 30 anos.
A base de dados LISA é desenvolvida pela Proquest – CSA, e indexa atualmente mais de quatrocentos
e quarenta periódicos publicados em sessenta e oito países.
A Figura 1 apresenta uma classificação hierárquica ou dendograma dos descritores dos cento
e noventa e dois artigos encontrados na base LISA. Os principais descritores encontrados são:
inovação, gestão de pessoas, gestão do conhecimento, desenvolvimento de produtos, organizações,
cooperação, tecnologia de informação, apropriação tecnológica, softwares e Internet.
Figura 1 - Classificação hierárquica de descritores
Fonte: Os autores.
A Figura 2 mostra a classificação não hierárquica dos descritores dos mesmos cento e noventa
e dois artigos encontrados na base LISA. Esta classificação sinaliza a formação de quatro agregados
(clusters) de descritores. O primeiro agregado compreende: gestão do conhecimento, tecnologia de
informação, apropriação tecnológica, desenvolvimento de produtos e Internet.
O segundo agregado compreende: cooperação, educação, gestão de pessoas, Internet, softwares
e recuperação de informação on line. O terceiro cluster inclui: trabalho com informação,
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[83]
investigações, publicação, bibliotecas, serviços de usuários e revistas acadêmicas. O quarto cluster
inclui: cientometria, ciência e tecnologia, pesquisa e bibliometria.
Figura 2 - Classificação não hierárquica de descritores
Fonte: Os autores.
Estes quatro agregados são importantes indicações da atual produção sobre informação e
inovação tecnológica em parte da Ciência da Informação. Estas indicações são particularmente
pertinentes para orientar revisões de literatura amplas que tenham por foco e interesse às abordagens
instrumental e sistêmico-funcional predominantes nesta área do conhecimento.
A inovação é, de acordo com o Manual de Oslo, um processo complexo e a gama de atividades
exigida para a inovação em uma organização pode variar consideravelmente. O desenvolvimento
dentro da própria organização de um produto radicalmente diferente e sofisticado para o mercado de
massa pode envolver muitas etapas mais do que a introdução de processo aprimorado resultante de
tecnologia incorporada em uma máquina pré-programada adquirida para tal fim (ORGANIZAÇÃO
PARA A COOPERAÇÃO E DESENVOLVIMENTO ECONÓMICO, 2004).
Um ponto de partida para análise da atividade de inovação, segundo o Manual de Oslo, pode
ser a pesquisa e desenvolvimento, que assume uma variedade de formas funcionais relacionadas com
a solução de problemas. Argumenta-se frequentemente, por exemplo, que as organizações precisam
fazer pesquisa para reconhecer, usar e, por conseguinte, adotar, tecnologias que tenham sido
desenvolvidas em outro local (ORGANIZAÇÃO PARA A COOPERAÇÃO E
DESENVOLVIMENTO ECONÓMICO,
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[84]
2004).
Schumpeter (1961) afirma que são cinco os tipos básicos de inovação: 1) desenvolvimento de
um novo produto, ou de uma nova tecnologia de um bem existente; 2) desenvolvimento de um método
de produção, ou de uma nova logística comercial; 3) desenvolvimento de um novo mercado; 4)
desenvolvimento de novas fontes de suprimento das matérias-primas ou produtos semi-
industrializados; 5) desenvolvimento de uma nova organização industrial, como a criação ou a
fragmentação de uma posição de monopólio.
A inovação tecnológica é movida pela geração de conhecimento e sua aplicação na geração de
novos produtos e processos que possam trazer vantagens competitivas para as empresas. Dosi (1984)
destaca três características econômicas relevantes para a análise da inovação tecnológica: a) grau de
oportunidade tecnológica - oportunidade de introdução de avanços tecnológicos rentáveis; b)
cumulatividade nas capacidades tecnológicas ― inerente aos padrões de inovações e à capacidade de
inovar das empresas; e c) apropriação privada das vantagens advindas da inovação ― retorno
econômico do progresso técnico. As três características condicionam fortemente o processo de
inovação e são utilizadas pelas empresas como fatores para proteger eventuais vantagens competitivas
e erguer barreiras aos concorrentes.
Lemos (1999) observa que uma organização não inova sozinha, pois as fontes de informações,
conhecimentos e inovação podem ser localizar tanto dentro, como fora dela. O processo de inovação
é, portanto, um processo interativo, realizado com a contribuição de variados agentes econômicos e
sociais que possuem diferentes tipos de informações e conhecimentos.
Gorz (2005) comenta que a pesquisa privada nas organizações quase sempre tem como objetivo
principal permitir que quem a realiza possa erguer um monopólio do conhecimento que proporcione
rendimento exclusivo. O rendimento esperado conta mais do que o uso social do conhecimento
produzido. Com investimentos em inovações e custosas campanhas de propaganda, toda empresa visa
chegar antes das outras a consolidação de posição monopolista.
3 ADMINISTRAÇÃO DA INOVAÇÃO EM ORGANIZAÇÕES
A grande contribuição de Luhmann é renovar a teoria dos sistemas, baseada numa mudança
paradigmática: passar da distinção do todo e das partes, para a distinção de sistema e entorno, tendo
como referência o conceito de complexidade. Entre a extrema complexidade do mundo e a capacidade
de entendimento humana existe uma lacuna. Os sistemas sociais assumem a sua função, assumindo a
tarefa de redução de complexidade (NEVES; NEVES, 2006).
Os sistemas sociais agem para reduzir a complexidade do mundo em dois planos:
por meio da estruturação ou redução da complexidade interna e através da seletividade ou redução da
complexidade externa. É por meio da comunicação que se seleciona a informação disponível no
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[85]
ambiente. Os sistemas sociais usam a comunicação como seu particular modo de reprodução
autopoiética (LUHMANN, 1984).
Lyytinien (1987) afirma que os sistemas de informação são uma instituição comunicativa. A
comunicação através do sistema de informação cria, controla e dá sustentação às interações sociais
num contexto organizacional. O caráter específico de um sistema de informação como meio de
comunicação deriva da natureza formal de sua linguagem e dos modos preestabelecidos de seu uso.
Gonzalez de Gómez (2004) comenta que os estudos de Lyytinien, que introduziriam conceitos
da Teoria do Agir Comunicativo de Habermas ao domínio da concepção de sistemas, além de colocar
em relevo o caráter comunicacional do sistema de informação, introduzem elementos críticos nas
visões racionalistas de transparência do sistema. No contexto, a noção de agir comunicativo é um
desdobramento da intuição segundo a qual o telos do entendimento habita na linguagem. Habermas
propõe o empreendimento intersubjetivo através da discussão, que deriva da concepção construtivista
da aprendizagem, na medida em que compreende a formação discursiva da vontade como forma de
reflexão do agir comunicativo e exige a passagem do agir estratégico para a discussão.
A teoria da discussão de Habermas (2004) põe em cena a noção de procedimentos e
pressupostos da comunicação para formação democrática da opinião e da vontade, funcionando como
importantes escoadouros da racionalização discursiva das decisões na administração de organizações.
Racionalização significa mais do que mera legitimação, mas menos do que a própria ação de constituir
o poder, o qual administrativamente disponível modifica seu estado de mero agregado, desde que a
formação democrática da vontade não se exerça apenas no controle posterior do exercício do poder,
mas que também o programe de uma maneira ou de outra o exercício do poder.
A ética da discussão desenvolvida por Habermas (1989) não dá orientação de conteúdo, mas
sim o procedimento rico em pressupostos que deve garantir a imparcialidade da formação de juízo. O
discurso prático é um processo, não para a produção de normas justificadas, mas para o exame da
validade de normas consideradas hipoteticamente. É só com este procedimento que a ética da
discussão se diferencia de outras éticas cognitivistas, universalistas e formalistas. Todos os conteúdos,
mesmo os concernentes a normas de ação, não importa quão fundamentais estas sejam, têm de ser
colocados na dependência de discursos reais.
A discussão prática acontece quando o modo de agir carece de fundamentação de natureza
coletiva e os membros da organização têm que chegar a uma decisão comum sobre suas ações, e têm
que tentar convencer-se mutuamente de que é interessante para cada um que todos ajam assim. Neste
processo cada um indica ao outro as razões por que ele pode querer que um modo de ação seja tornado
socialmente obrigatório. Cada pessoa tem de se convencer de que a norma proposta é igualmente boa
para todos. A discussão pode criar argumentos que legitimem a decisão de orientações para a ação
coletiva e acordos práticos (HABERMAS, 1989).
A discussão conta com a intersubjetividade presente nos processos de entendimento que se
cumprem, por um lado, na forma institucionalizada de aconselhamento nas organizações, e, por outro,
nas redes de comunicação. As estruturas de comunicação da opinião compõem rede amplamente
disseminada de sensores que reagem à pressão de situações-problema nas organizações. A opinião
transformada em poder comunicativo segundo procedimentos democráticos não pode “dominar”, mas
apenas direcionar o uso do poder administrado para determinados canais. O discurso argumentativo
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[86]
imuniza ações de repressão e desigualdades, apresenta-se como forma de comunicação aproximada
das condições ideais de cooperação.
A busca constante pela inovação, por meio da criação e desenvolvimento de novos produtos e
processos, diversificação, qualidade e absorção de tecnologias avançadas, é indispensável para
assegurar elevados níveis de eficiência, produtividade e competitividade das organizações. Isso
implica acumulação constante de conhecimentos e capacitação tecnológica contínua. Nesse contexto,
insere-se a aprendizagem organizacional (aprendizado contínuo e interativo), configurando-se como
o processo mais importante para o desenvolvimento da inovação tecnológica (TOMAÉL; ALCARÁ;
DI CHIARA, 2005).
As organizações que cultivam a aprendizagem organizacional são organizações com
habilidades para criar, adquirir, transferir conhecimentos e modificar comportamentos, refletindo o
novo conhecimento e o novo insight. As organizações de aprendem possuem habilidades em cinco
principais atividades: resolução sistemática de problemas, experimentação de novas abordagens,
aprendizado com base na própria experiência e história passada, aprendizado por meio de experiências
e melhores práticas de outros e a transferência do conhecimento de forma rápida e eficiente por toda
a organização (TOMAÉL; ALCARÁ; DI CHIARA, 2005).
Knox (2002) enumera quatro aspectos que sustentam uma organização inovadora:
a cultura e o clima organizacional; capacidades e habilidades de gerenciamento; controle e estrutura
organizacional; e novos produtos e desenvolvimento de processos. O autor salienta que a inovação
contínua está baseada nas capacidades e atitudes das pessoas que trabalham na organização. Estas
capacidades e atitudes dependem da cultura organizacional, que estimule o empreendedor individual
e o trabalho em equipe (apud MACHADO; LEHMANN; ARAUJO, 2008).
Barbieri et al. (2004) destacam que existem fatores que condicionam a inovação. Os fatores
são delimitados pelo modelo de gestão que poderá favorecer o surgimento de inovações. Eles
argumentam que motivação, satisfação no trabalho, estímulo à criatividade, redução de conflitos entre
gerências, liderança, comunicação interna, gestão de projetos de inovação, empreendedores internos,
sistemas de recompensas e clima inovador são alguns temas relacionados com modelos de gestão que
interferem em processos de inovação.
Barbieri et al. (2004) afirmam que é difícil manter um ritmo constante de inovações, mesmo
de desenvolvimento ou incrementais. Eles sugerem que inovações tecnológicas ou organizacionais se
processam através de formas complexas, envolvendo atividades realizadas por pessoas dentro e fora
das organizações. As condições para que operem de forma mais eficiente e eficaz podem ser
conseguidas através da formulação e condução de modelos de gestão para o favorecimento e
manutenção de um meio inovador interno, podendo, inclusive, gerar uma cultura de inovação.
Machado, Lehmann e Araujo (2008, p. 161) enuncia os fatores condicionantes do
meio inovador interno: eficiência percebida com a inovação, incerteza sobre a inovação, escassez de
recursos, padronização de procedimentos, grau de influência nas decisões, expectativas de prêmios e
sanções; liderança do time de inovação, liberdade para expressar dúvidas e aprendizagem encorajada.
Arranjos organizacionais mais flexíveis demandam e facilitam maneiras de pensar que
transcendem estreitos domínios profissionais, de serviço ou de setor. Considerando que muitas
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[87]
habilidades e recursos essenciais para a organização estão fora de suas fronteiras, e, portanto, fora do
controle direto da administração, parcerias e alianças não devem mais ser vistas como opções, mas
como uma necessidade (SILVEIRA, 2005).
Silveira (2005) afirma que a migração para um ambiente colaborativo com a prevalência de
relacionamentos organizacionais pode ser considerada uma mudança de paradigma. O real desafio na
construção e gestão de ambientes informacionais cooperativos é o compartilhamento de significados,
uma vez que a informação – como o conteúdo da interação social – provê os materiais brutos a partir
dos quais a “construção de significados” pode acontecer.
Barañano (2005, p. 59), ao estudar a gestão da inovação tecnológica em micro e pequenas
empresas portuguesas, observa que:
[...] o sucesso da inovação tecnológica empresarial depende, em grande medida, de aspectos
como a estrutura da força de trabalho, a estratégia, as alianças com outras empresas ou com
universidades e, acima de tudo, a organização interna da empresa. O desenvolvimento de
inovações tecnológicas está fortemente condicionado pela existência de um ambiente interno
no qual as idéias criativas possam emergir, e ser aplicadas com eficácia e os conhecimentos
quer tecnológicos, quer de gestão, possam ser acumulados.
Barañano (2005, p. 60) afirma que nenhum elemento isolado tem possibilidade de ser eficaz e,
portanto, nenhuma ferramenta ou técnica de gestão cria e sustenta sozinho um ambiente propício a
inovação. A inovação é um complexo processo sociológico e econômico que envolve uma teia
extremamente intrincada de interações, tanto no interior da empresa como entre estas e o seu contexto
econômico, técnico e social. É um conjunto de diferentes fatores inter-relacionados que devem
funcionar para criar e reforçar o tipo de ambiente que facilita o sucesso da inovação tecnológica.
Estes fatores ou práticas de gestão podem agrupar-se em redor dos cinco eixos seguintes:
(i) criação e manutenção de canais de comunicação fluidos, quer internos, quer externos;
(ii) atenção aos clientes atuais e potenciais, envolvendo-os no processo de inovação;
(iii) apoio explícito da alta gestão à inovação tecnológica;
(iv) disponibilidade de recursos humanos altamente qualificados e presença na organização
de indivíduos que apóiem os projetos de inovação tecnológica, especialmente nos
momentos críticos;
(v) criação e manutenção de uma estrutura organizacional flexível (BARAÑANO, 2005, p.
61).
O sucesso dos processos de inovação requer a criação e a manutenção de fluidos canais de
comunicação internos e externos. A implementação de inovações depende da combinação de
diferentes tipos de conhecimentos, que habitualmente estão distribuídos entre as várias unidades
organizacionais. Em conseqüência, para terem sucesso nos seus projetos de inovação, necessitam da
cooperação entre as áreas de investigação, desenvolvimento, produção, marketing e finanças, de forma
a permitir a contínua partilha de dados, de informação e de conhecimentos.
Albagli e Maciel (2004) afirmam que difusão e compartilhamento de informações e
conhecimentos requerem a conexão entre os atores, com canais ou mecanismos de comunicação que
propiciem fluxos de conhecimento e o aprendizado interativo. Referemse à existência de correlação
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[88]
entre presença de relações cooperativas, diversidade de mecanismos de comunicação entre agentes
diferenciados e desempenho inovador das organizações. Observa-se que as organizações e agentes
que cooperam introduzem maior número de inovações do que os que não cooperam e o grau de
inovação aumenta com a variedade de parceiros que se comunicam entre si.
Baranãno (2005) considera que o sucesso dos processos de inovação requer como medida
básica a criação e manutenção de múltiplos canais de comunicação abertos, bem como de
complementar os habituais canais verticais de comunicação, com canais de comunicação horizontais
e diagonais que liguem indivíduos localizados em diferentes unidades organizacionais. A fluidez da
comunicação interna e, acima de tudo, a integração de todas as atividades, contribuem para o
lançamento de inovações com sucesso, pois garante que todos os esforços apontem numa mesma
direção.
4 INFORMAÇÃO E INOVAÇÃO NA FUNDAÇÃO CERTI
O estudo das relações entre informação, comunicação e inovação é desenvolvido na Fundação
CERTI - Centros de Referência em Tecnologias Inovadoras, que é uma instituição independente de
pesquisa e desenvolvimento tecnológico com foco na inovação em negócios, produtos e serviços. A
CERTI é hoje referência em âmbito nacional e internacional pelo desenvolvimento de projetos
inovadores que envolvem soluções de convergência digital, como a urna eletrônica brasileira, os
terminais de automação bancária e terminais públicos de acesso à Internet.
Criada em 1984, por iniciativa de algumas empresas brasileiras, da Universidade Federal de
Santa Catarina e dos Governos Federal e Estadual, a Fundação CERTI surge dentro do Labmetro -
Laboratório de Metrologia do Departamento de Engenharia Mecânica da UFSC – Universidade
Federal de Santa Catarina, e desde 1990 funciona em prédio próprio no campus da UFSC.
A partir desse mesmo ano a CERTI passa a atuar expressivamente na gestão da qualidade e
produtividade, em consequência das grandes mudanças nas políticas econômicas e industriais do
Brasil. A partir da década de 90, voltou-se à prestação de serviços metrológicos de alto nível, com
ênfase na calibração, buscando desde cedo à ampla acreditação dos seus serviços laboratoriais junto
ao INMETRO e organismos internacionais, como forma de contribuir para o fortalecimento da
credibilidade da metrologia no país.
Em 1995 a incubadora da CERTI passa a operar no Parque Tecnológico Alfa em Florianópolis-
SC, com a designação de CELTA – Centro Empresarial de Laboração de Tecnologias Avançadas. Em
1999 inaugura uma filial na cidade de Manaus para dar apoio às empresas de base tecnológica
estabelecidas naquela região. Como instituição de ciência, tecnologia e inovação, a CERTI nasce
direcionada para a pesquisa tecnológica aplicada. Para tanto, firma e amplia parcerias com
universidades e centros de pesquisas do país e exterior, como a própria UFSC, o MIT (Massachusetts
Institute of Technology), nos Estados Unidos e o PTB (Physikalisch Technische Bundesanstalt), na
Alemanha.
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[89]
Ao longo dos seus vinte e dois anos a Fundação CERTI tem focado suas ações na cadeia
produtiva da tecnologia da informação, sistemas mecatrônicos, metrologia e garantia da qualidade,
com uma atuação integrada de seus Centros de Referência, dos seus Laboratórios e de seus Institutos.
Em função de demandas empresariais, a Fundação estabeleceu em Manaus e em Brasília institutos
tecnológicos que atuam em áreas semelhantes e complementares, respectivamente, o Instituto CERTI
Manaus e o Instituto Sapientia.
No campo da pesquisa e desenvolvimento, a CERTI destaca-se ao longo dos anos nos campos
da metrologia, no desenvolvimento e customização de projetos que envolvem a prototipagem e
montagem de placas de circuitos eletrônicos com o diferencial de produção em séries pequenas, na
Meca optoeletrônica, em sistema da qualidade e, mais recentemente, na área de gestão empresarial.
Mais de seiscentas empresas e instituições de todo o Brasil beneficiam-se, anualmente, dos serviços
tecnológicos, dos projetos de melhoria de processos, dos desenvolvimentos de produtos inovadores e
dos empreendimentos tecnológicos desenvolvidos pelos Centros da Fundação CERTI.
A Fundação CERTI é formada por equipes com duzentos e vinte colaboradores, especializados
em Universidades do Brasil e do exterior, que possuem amplo know-how em suas áreas de atuação. O
valioso capital intelectual é considerado um fator-chave para alcançar os melhores resultados e manter
a posição de destaque em Inovação, Ciência e Tecnologia.
A inovação pode advir da criação de novos processos nas organizações, quer processos
produtivos novos para um produto, quer processos produtivos que possibilitam a criação de novos
produtos. O processo inovador industrial deve gerar diferenças em preço, qualidade e singularidade.
Ele parte de ideias e oportunidades para construir elementos do processo que assegura diferencial
competitivo de domínio exclusivo da empresa. Eles usualmente implicam em recursos e no uso de
saberes especializados avançados (Ver Figura 3).
O conceito de inovação usado na Fundação CERTI orienta suas ações para assegurar três
condições: ter a gestão interna para promover a inovação; manter cooperação e parceria com outras
empresas e instituições de pesquisa e desenvolvimento; e, por último, saber fazer uso de oportunidades
de incentivos e financiamentos (FUNDAÇÃO CERTI, 2009).
Por outro lado, é muito difícil a organização desenvolver a multiplicidade de operações
requeridas de forma autônoma. O conhecimento, as tecnologias e as operações associadas podem ser
ou fortalecidas ou supridas pela cooperação com Instituições de Ciência, Tecnologia e Inovação, ou
mesmo por outras empresas. Finalmente, para que o processo de inovação seja eficaz e efetivo, é
fundamental uma boa gestão, de forma a diminuir riscos, aperfeiçoar o uso de recursos e aproveitar as
oportunidades de parcerias e financiamentos existentes no Estado, no País e até no exterior (INOVA,
2007).
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
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Figura 3 - O processo industrial inovador na Fundação CERTI
Fonte: Fundação CERTI (2007).
A partir de iniciativa cooperativa de fomento da inovação do Governo do Estado de Santa
Catarina, a Fundação CERTI estabelece parceria com o INOVA- SC. Este programa público-privado
tem como objetivo do programa proporcionar informações estratégicas e promover ações estruturantes
em prol da dinâmica de inovação tecnológica nas empresas catarinenses, por meio da cooperação entre
empresas, agentes de fomento e entidades geradoras de conhecimento e tecnologia, atuando de forma
integrada e harmonizada (INOVA 2007).
No Ciclo de Inovação Tecnológica realizado pelo Instituto de Estudos Avançados da
Universidade de São Paulo em 2006 a Fundação CERTI apresenta os desafios da gestão da inovação
tecnológica (Figura 4). As diretrizes desta gestão da inovação são os seguintes: mínimo tempo e custo
de desenvolvimento, qualidade adequada e inserção de conhecimentos avançados.
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
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Figura 4 - Os elementos chave do processo de inovação tecnológica
Fonte: Fundação CERTI (2007)
Os nove desafios da gestão do processo de inovação tecnológica sugeridos pela Fundação
CERTI são os seguintes: prospecção tecnológica, atividade de pesquisa própria, captação de recursos,
planejamento e gestão de projetos, gestão de parcerias, garantia da qualidade, controle de custos,
propriedade intelectual, avaliação e documentação.
Em 2006 a Fundação CERTI teve aprovado pela FINEP – Financiadora de Estudos de Projetos
um projeto para desenvolvimento da SINAPSE - Sistema de Gestão da Inovação Tecnológica para
institutos promotores de ambientes de inovação. O objetivo geral do projeto é estruturar, aperfeiçoar
e desenvolver um conjunto de sistemas de gestão e tecnologias da informação focada nos desafios e
especificidades da gestão da inovação tecnológica em institutos que se propõe a atuar como produtores
de ambientes de inovação dinâmicos e competitivos.
O projeto apresentado pela Fundação CERTI é desenvolvido em torno de algumas questões:
− Como operar um instituto de tecnologia para desempenhar papel relevante na promoção de ambientes de
inovação formados por novas empresas, empresas inovadoras estabelecidas, universidades e outros
institutos?
− Quais práticas, ferramentas e sistemas de gestão de inovação tecnológica são necessários a criação de
ambiente efetivamente sinérgico, criativo e competitivo?
− Como a atuação diferenciada de um instituto de tecnologia com parceiros e clientes pode oferecer novas
perspectivas de sustentabilidade e crescimento, baseadas na obtenção de royalties e na participação no
capital de novas empresas de base tecnológica?
− Ë possível estabelecer no Brasil um verdadeiro cluster de inovação dinâmico e competitivo?
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[92]
A Fundação CERTI vem ao longo da sua história desenvolvendo e aperfeiçoando os seus
sistemas de gestão organizacional, de forma a cumprir adequadamente a sua missão de fornecer
soluções inovadoras estratégicas e competitivas para seus clientes e para a sociedade. Na sua
experiência a Fundação CERTI desenvolve, absorve e implanta práticas e sistemas que contribuem
para o avanço da instituição. Ela tem obtido resultados e conquistas tanto no segmento empresarial
como governamental.
O aprendizado acumulado da Fundação CERTI “a faz concluir que a única forma de um
instituto sobreviver numa conjuntura global e nacional como a que vivemos atualmente é estruturar e
fortalecer um ambiente de inovação dinâmico e competitivo, no qual o instituto tenha um papel de
protagonista” (FUNDAÇÃO CERTI, 2006).
Assim, a organização precisa:
− praticar gestão tecnológica exemplar em seus processos e projetos;
− relacionar-se com outros institutos parceiros de forma inovadora e eficaz;
− trabalhar com seus clientes como um verdadeiro parceiro estratégico;
− induzir e apoiar a criação de empresas inovadoras a partir de seus projetos e de suas equipes;
− posicionar-se como grande elemento articulador e facilitador do ambiente de inovação em
que está inserido.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O que a investigação sugere é que a Ciência da Informação pode contribuir com o
desenvolvimento teórico e metodológico da administração da informação para inovação das
organizações. Cabe aqui pensar a informação como dinâmica organizacional que abre possibilidades
para a criação, a melhoria e a inovação dos processos e produtos.
Assim, a administração da informação é mais do que uma racionalização funcional das ações
de informação. A discussão dos processos em um sistema permanentemente problematizado pode
ampliar as possibilidades de interação e colaboração entre os trabalhadores, destes com os gestores, e
da organização com o seu entorno.
A colaboração interna e externa facilita não apenas o compartilhamento de informações e
conhecimentos, mas também resulta deles. A colaboração viabiliza diálogos, e os diálogos viabilizam
colaboração. As organizações não inovam sozinhas, mas sobre informações e conhecimentos
acumulados dentro e fora delas. Cabe então pensar nas relações entre comunicação, colaboração e
inovação.
A colaboração é condição para a inovação tecnológica, em primeiro lugar para que a
informação possa fluir de modo não linear dentro das organizações e entre elas e o seu entorno. A
comunicação pode contribuir com ideias e oportunidades para a inovação e na interação entre os
colaboradores da organização, ao mesmo tempo em que difunde seus processos e produtos e cria
condições para sua aceitação e uso.
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[93]
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COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[95]
Cap
ítulo
6 DA COMISSÃO NACIONAL DA VERDADE AO DIREITO À VERDADE: A VALIDAÇÃO DISCURSIVA DAS COLEÇÕES NAS BIBLIOTECAS Clóvis Ricardo Montenegro de Lima
Kelly Pereira de Lima
Sarah Miglioli
_____________________________________________________________________________
Resumo: Introdução: Analisa o conceito de informação, verdade e validade discursiva. Propõe a
formalização e revisão da Política de Desenvolvimento de Coleção em vista da ética informacional, Comissão
Nacional da Verdade e censura. Objetivo: Discute o posicionamento do agir do profissional da informação, de
forma socialmente responsável, diante do novo cenário e atuação por meio de uma política de desenvolvimento
de coleção com decisões éticas de quais verdades irão fazer parte do acervo Metodologia: O marco teórico
deste artigo se propõe a analisar a complexidade da questão da verdade por meio de Jürgen Habermas e Michel
Foucault, sob a égide da filosofia da linguagem e da consciência, respectivamente. Primeiramente aborda sob
o foco crítico a relação entre informação e verdade. Posteriormente, serão trazidos os fatos históricos da
Comissão Nacional da Verdade, a verdade nas bibliotecas, e por último, a validação discursiva do
desenvolvimento de coleções. Resultados: Através de Habermas, o marco teórico se utiliza da aprendizagem
intersubjetiva por meio da linguagem, ou seja, no discurso residente na possibilidade do entendimento mútuo
e da prevalência da verdade. Ter coragem de dizer e procurar a verdade, sugeridas por Foucault, são posturas
que compõe a ética de um profissional que é solidário com a dignidade humana de cada integrante de sua
comunidade. Conclusões: O profissional da informação tem uma responsabilidade social, por ser a
incorporação da alma de uma sociedade e de seu pressuposto democrático. Sua relevância encontra-se no fato
de reger o potencial inerente às coleções de maneira a promover a verdade, sem a qual sua atuação perderia o
viés moral e ético.
____________________________________________________________________________
1 INTRODUÇÃO
Este artigo se insere nos estudos acerca das configurações sociais e das políticas de
informação. Através do processo de reconstrução histórica e redescoberta da verdade, analisa-se
o processo da dinâmica da informação.
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[96]
No âmbito da esfera pública, investiga-se a partir da reconstrução histórica, representada
pelas ações da Comissão Nacional da Verdade, mais precisamente as relações entre informação,
verdade e o desenvolvimento de coleções.
No Brasil, as Comissões da Verdade instauram aura de redemocratização e reconstrução
histórica para descortinar a verdade dos fatos acontecidos durante regime ditatorial em seu
passado recente. Procura-se nessas ações encontrar os responsáveis pelo descumprimento aos
direitos humanos durante o regime militar que se instaurou no Brasil, entre as décadas de 60 a 80.
Passa então a averiguar informações para alcançar uma demonstração consensual da
verdade. Para além da restauração da memória histórica coletiva e individual dos indivíduos
vitimizados, tal período caracterizou como fértil campo de ação comunicativa na esfera do
discurso.
O marco teórico deste artigo se propõe a analisar a complexidade da questão da verdade
por meio de Jürgen Habermas e Michel Foucault, sob a égide da filosofia da linguagem e da
consciência, respectivamente. Primeiramente aborda sob o foco crítico a relação entre informação
e verdade. Posteriormente, serão trazidos os fatos históricos da Comissão Nacional da Verdade,
a verdade nas bibliotecas, e por último, a validação discursiva do desenvolvimento de coleções.
2 INFORMAÇÃO E VERDADE: UMA ABORDAGEM CRÍTICA
A Informação é objeto de pesquisa de muitas áreas do saber. Sua onipresença e
multiplicidade de interpretações sobre seu significado no mundo real a torna elemento complexo.
Uma definição que abrange sua plenitude ainda não foi possível, embora alguns teóricos a tenha
delimitado dentro do seu campo de conhecimento.
Na Ciência da Informação, Buckland (1991) apresenta três sentidos para a informação,
podendo ser entendida como processo, conhecimento e coisa. A informação como processo
acontece na ação da fala, na comunicação, quando uma pessoa é informada, e aquilo que conhece
é alterado. No conhecimento, a informação é o que é percebido ou transmitido na informação
como processo. Quando coisa, a informação é materializada em objeto informativo.
Currás (1993 apud MACHADO, 2003) menciona que a informação não existe por si
mesma, mas é propriedade relacionada entre fontes e receptores, por meio de fenômeno, acontece
pela comunicação, ou como processo, quando é registrada em algum suporte informacional.
Pela comunicação a informação é veiculada, sendo a linguagem elemento e via de acesso
ao mundo, criando vínculo com outros indivíduos e mediando as relações sociais. Para Bannell
(2009) “Não temos acesso à realidade senão pela mediação linguística; nossa compreensão da
realidade é sempre atrelada à linguagem. ” A linguagem natural pode ser utilizada como meio de
transmissão de informações ou fonte de integração social de modo que o alter conecta seus planos
e ações aos planos e ações de ego, resultando diferentes tipos de interações (HABERMAS, 1990).
No agir estratégico, a influência dos atores é uns sobre os outros e sobre a situação da ação; e no
agir comunicativo a força consensual do entendimento torna-se efetiva para a coordenação das
ações, e os atores participantes tentam definir cooperativamente os seus planos de ação, levando-
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[97]
se em conta mutuamente. O que distingue o agir comunicativo do agir estratégico é a coordenação
da ação apoiada na força racionalmente motivadora de atos de entendimento, que se manifesta
nas condições requeridas para um acordo obtido comunicativamente, e não na racionalidade dos
planos individuais (HABERMAS, 1990).
Como processo, a informação é contextual e representa a realidade. É estabilizada quando
se materializa em um suporte, sendo ele analógico ou digital, “[...] instrumento para promover a
circulação social do conhecimento [...]” (ORTEGA; LARA, 2010). Paul Otlet emprega o termo
“documento” ou “unidade documentária” para denotar objetos informativos que contenham
“signos representativos de certos dados intelectuais” (OTLET, 1996 apud ORTEGA; LARA,
2010). Para Briet (1951), documento é todo índice concreto ou simbólico, conservado ou
registrado a fim de representar ou provar um fenômeno físico ou intelectual. Nesse contexto, os
objetos não são na sua essência documentos, mas se transformam em registros, se processados
com finalidades de fornecer informação (BUCKLAND, 1991). Murguia (2010, p. 127)
considerava o documento como dispositivo de validação, que “[...] é sustentado e sustenta os
discursos que o incluem, se materializa nos objetos e age institucionalmente [...]”, como uma
construção social.
Os enunciados expostos são divulgados e submetidos ao crivo de uma comunidade de
relevância de uma área do saber, entre os pares, ou grupo social. As argumentações apresentadas
podem elevar os enunciados como verdade. Habermas (2004a) afirma que a verdade é como uma
propriedade inalienável dos enunciados e,
[...] um enunciado seria verdadeiro precisamente se e somente se pudesse resistir, sob
os exigentes pressupostos pragmáticos dos discursos racionais, a todas as tentativas de
invalidação, ou seja, se pudesse ser justificado numa situação epistêmica ideal.
(HABERMAS, 2004a, p. 46).
A noção de verdade é temporal, e não universal. No transcorrer dos marcos históricos, as
verdades acompanham os cenários políticos, econômicos e sociais. A verdade pode ser posta em
prova, de modo procedural, sob condições de práxis de argumentação. Habermas (2004a) propõe
pressupostos idealizantes, como publicidade e inclusão de todos envolvidos; distribuição
equitativa dos direitos de comunicação; cenário que admite apenas a força não-coerciva do
melhor argumento; e o proferimento de todos os participantes.
Para atingir o nível de verdade, são proferidos discursos com a prerrogativa de se chegar
ao assentimento ou consenso. As evidências apresentadas no contexto de justificação devem
bastar para autorizar a levantar pretensões de verdade, existindo uma relação interna entre verdade
e justificação (HABERMAS, 2004a).
Os discursos são como máquinas de lavar: filtram aquilo que é racionalmente aceitável
para todos. Separam as crenças questionáveis e desqualificadas daquelas que, por um
certo tempo, recebem licença para voltar as status de conhecimento não problemático.
(HABERMAS, 2004b, p. 63)
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[98]
Os discursos narrativos na prerrogativa da justificação, para o alcance da validação, são
recursos pedagógicos de desenvolvimento de exposições de argumento e desenvolvimento moral.
As estruturas cognitivas do indivíduo se transformam e se diferenciam, conseguindo resolver
melhor do que anteriormente a mesma espécie de problemas e conflitos de ação moralmente
relevante (KOHLBERG apud HABERMAS, 1989).
A ética do discurso de Habermas (1989) vai ao encontro da concepção construtiva da
aprendizagem pelo desenvolvimento moral, na medida em que compreendemos a formação
discursiva da vontade (assim como a argumentação em geral) como uma forma de reflexão do
agir comunicativo; e na medida que exige, para a passagem do agir para o discurso, há uma
mudança de atitude.
O agir comunicativo depende do uso da linguagem dirigida ao entendimento, para
Habermas (1990, p. 72, grifo do autor),
[...] os atores participantes tentam definir cooperativamente os seus planos de ação,
levando em conta uns aos outros, no horizonte de um mundo da vida compartilhado e
na base de interpretações comuns de situação. Além disso, eles estão dispostos a atingir
esses objetivos mediados da definição da situação e da escolha dos fins assumindo o
papel de falantes e ouvintes, que falam e ouvem através de processo de entendimento.
No âmbito do humanismo, Foucault também aborda o tema da veracidade ao tratar da
parresía. Foucault (2014) propõe uma eticidade, uma ética do falar, do expressar. O autor traz a
ideia da dignidade de dar voz, sem mediação, falar em seu próprio nome. Diferente da retórica,
na parresía de Foucault (2014, p. 4), “o indivíduo se constitui e é constituído pelos outros como
sujeito que pronuncia um discurso de verdade. ”
O dizer a verdade sobre si mesmo sempre “[...] foi uma atividade conjunta, uma atividade
com os outros, e mais precisamente uma atividade com um outro, uma pratica a dois. [...] O
estatuto desse outro é variável, portanto. [...] Pode ser também uma espécie de conselho político.
” (FOUCAULT, 2014, p. 6-7). O conceito assume que cada sujeito é uma potência (força) e suas
atitudes são ações de forças e jogos (resistência e aceitações dos participantes) resultando em
papeis e atitudes. O ser e estar são exercícios de forças.
Foucault (2014) retoma e empreende a análise da parresía no campo das práticas políticas,
empregando o falar a verdade com um valor positivo, sem dissimulação nem reservas.
Para que haja parresía é preciso que, dizendo a verdade, se abra, se instaure e se enfrente
o risco de ferir o outro, de irritá-lo, de deixá-lo combativo e de suscitar de sua parte
algumas condutas que podem ir até a mais extrema violência. É portanto a verdade, no
risco da violência. [...] De onde essa nova característica da parresía: ela implica uma
certa forma de coragem, coragem cuja forma mínima consiste em que o parresiasta se
arrisque a desfazer, a deslindar essa relação com o outro que tornou possível
precisamente seu discurso. De certo modo, o parresiasta sempre corre o risco de minar
essa relação que é a condição de possibilidade do seu discurso. (FOUCAULT, 2014, p.
12).
A ética da parresía engloba esse falar apesar das consequências, que resgata a dimensão
humana no valor da eticidade. Podemos considerar isso para pensar a veracidade, nesse sentido,
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[99]
assim como Habermas também se preocupa com a verdade, a validação da verdade e agir
comunicativo.
3 COMISSÃO NACIONAL DA VERDADE E A VERDADE NAS BIBLIOTECAS
O fato histórico das Comissões da Verdade como espaço de ação da linguagem, remetem
às relações de informação, seus registros documentais e a veracidade. Torna-se importante tratar
da Comissão Nacional da Verdade, do contexto histórico e da validação de informação que
compuseram o cenário desse processo. As informações foram colhidas através da página
governamental da Comissão (cnv.gov.br) e a Lei 12.528, de 2011, que cria a Comissão Nacional
da Verdade no âmbito da Casa Civil da Presidência da República do Brasil. A Comissão Nacional
da Verdade foi criada pela Lei citada em 2011 e instituída em 2012. A Comissão tem como fim
verificar e investigar violações de Direitos Humanos ocorridas entre os anos de 1946 a 1988 no
Brasil.
Segundo a lei (BRASIL, 2011), a Comissão é composta de forma pluralista, integrada por
sete membros, designados pelo Presidente da República, dentre brasileiros de reconhecida
idoneidade, conduta ética, e respeito aos direitos humanos.
São objetivos da Comissão Nacional da Verdade esclarecer os fatos e as circunstâncias
dos casos de graves violações de direitos humanos; promover o esclarecimento circunstanciado
dos casos de torturas, mortes, desaparecimentos forçados, ocultação de cadáveres e sua autoria,
ainda que ocorridos no exterior; identificar e tornar públicos as estruturas, os locais, as instituições
e as circunstâncias relacionadas à prática de violações de direitos; encaminhar aos órgãos públicos
competentes toda e qualquer informação obtida que possa auxiliar na localização e identificação
de corpos e restos mortais de desaparecidos políticos; colaborar com todas as instâncias do poder
público para apuração de violação de direitos humanos; recomendar a adoção de medidas e
políticas públicas para prevenir violação de direitos humanos, assegurar sua não repetição e
promover a efetiva reconciliação nacional; e promover, com base nos informes obtidos, a
reconstrução da história dos casos de graves violações de direitos humanos, bem como colaborar
para que seja prestada assistência às vítimas de tais violações.
[...] não podemos depositar muitas expectativas na capacidade da revelação da verdade
oficial servir para “fechar o livro” da história e encerrar o passado num capítulo. Existem
vários argumentos que dizem que a revelação da verdade preenche uma necessidade
social de confirmar oficialmente aquilo que foi durante muito tempo negado; que a
‘verdade’ reintegra as vítimas na sociedade, através do reconhecimento do seu
sofrimento e oferecendo uma forma de justiça distributiva ou social, contribuindo com
recursos não convencionais para promover a conscientização social, a memória coletiva,
a solidariedade e a superação de baixa autoestima. Pode ser que o esquecimento seletivo
seja parte do processo de produção histórica, constituindo os silêncios descritos por
Trouillot; mas esquecer o significado de eventos passados pode ser como perder a
bússola moral. A verdade também tem sido vista como uma forma de ‘justiça como
reconhecimento’ ou ‘justiça compensatória’, que restabelece o sentido de justiça outrora
quebrado. As comissões da verdade oficiais também já têm sido valorizadas como peças
centrais nos ‘processos de refundação histórica’ quando existe uma ruptura simbólica e
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[100]
moral com um passado obscuro. Elas podem contribuir para ‘estabelecer um consenso
sobre os limites do intolerável. (BRITO, 2009, p. 77).
A Ditadura militar no Brasil foi o regime que permaneceu de 1964 a 1985, e possuía
caráter nacionalista e autoritário. Instaura-se a partir de um golpe militar que retira do governo o
presidente eleito João Goulart, e perdura por vinte e um anos. O governo da ditadura militar então
cria diversas normas e decretos, os Atos Institucionais, que estavam acima de todas as demais
normas e até mesmo da
Constituição. Os Atos Institucionais eram usados como instrumentos de legitimação e legalização
das ações políticas deste governo, instaurando para seu próprio governo formas de poderes
extraconstitucionais, sob a ideia de combater a “corrupção e a subversão”. Esse processo culmina
com o AI-5 de 1968, que veio a vigorar por dez anos.
A partir de então liberdades civis foram anuladas, com a criação de um código de processo
penal militar que permitia que o Exército brasileiro e a Polícia Militar prendessem indivíduos
considerados suspeitos. Foi nesse período que milhares de pessoas, entre ativistas políticos,
sindicalistas e outros civis desapareceram, ou foram torturados e mortos.
A partir de 1979, o governo brasileiro promulgou a Lei da Anistia, que concedia indulto
aos exilados políticos e militares envolvidos em violações aos direitos humanos, fazendo com
que nenhum militar envolvido fosse julgado ou condenado por seus atos. Então, após 1985, o
regime militar começou o processo de transferência de poder para um governo civil, evitando
uma mudança drástica que pudesse incitar uma revolta do povo e provocasse a acusação contra
líderes militares.
As Forças Armadas admitiram oficialmente que possa ter havido tortura e assassinatos,
pela primeira vez, em setembro de 2014, em resposta à Comissão Nacional da Verdade. O
documento, assinado pelo Ministro da Defesa, Celso Amorim, menciona que “o Estado brasileiro
[...] já reconheceu a ocorrência das lamentáveis violações de direitos humanos ocorridas no
passado. ” (AMORIM, 2014).
Para além da perseguição política, também foi cassada a liberdade de expressão, e se
instaurou um período de repressão e censura a todas as publicações e obras que fossem
consideradas contra a ideologia propagada pelo regime militar. Como se caracterizou por regime
autoritário, a censura era ferramenta de controle e preservação do poder. Com o argumento de
manter a moral e os bons costumes, o regime determinou por decreto-lei (BRASIL, 1970) a
regulação de informações registradas.
Art. 1º Não serão toleradas as publicações e exteriorizações contrárias à moral e aos
bons costumes quaisquer que sejam os meios de comunicação. Art. 2º Caberá ao
Ministério da Justiça, através do Departamento de Polícia Federal verificar, quando
julgar necessário, antes da divulgação de livros e periódicos, a existência de matéria
infringente da proibição enunciada no artigo anterior. Art. 3º Verificada a existência de
matéria ofensiva à moral e aos bons costumes, o Ministro da Justiça proibirá a
divulgação da publicação e determinará a busca e a apreensão de todos os seus
exemplares. Art. 4º As publicações vindas do estrangeiro e destinadas à distribuição ou
venda no Brasil também ficarão sujeitas, quando de sua entrada no país, à verificação
estabelecida na forma do artigo 2º dêste Decreto-lei. Art. 5º A distribuição, venda ou
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[101]
exposição de livros e periódicos que não hajam sido liberados ou que tenham sido
proibidos, após a verificação prevista neste Decreto-lei, sujeita os infratores,
independentemente da responsabilidade criminal. (BRASIL, 1970).
Muitas publicações foram elaboradas durante o período do regime militar com o intuito
de propagar os ideais do governo autoritário.
Diversas obras foram postas em circulação, inclusive livros didáticos, que veiculavam
informações sob o ponto de vista da moral conservadora (MARCELINO, 2009).
O caráter democrático e social do papel do bibliotecário, contribuidor do acesso à
informação, foi colocado em questão sob a pressão de um regime autoritário como o que o Brasil
passou em sua história, no auge da ditadura militar, sob a pressão do governo sobre a circulação
de certas informações e a censura de livros.
4 A VALIDAÇÃO DISCURSIVA DO DESENVOLVIMENTO DE COLEÇÕES
A terceira Lei da Biblioteconomia de Shiyali Ramamritam Ranganathan institui que para
cada livro há um destinatário. Um conjunto de obras compõe uma coleção, que é dedicada a um
grupo de faixa etária, social, nível intelectual ou ramo do saber. Isso implica numa identidade,
que se constrói para responder e atender os anseios de seus utentes.
Cada ramo do saber possui um arcabouço teórico e este aporte se faz presente e eminente
nas bibliotecas. A gênese de uma coleção é constituída por produções de um colégio intelectual
que fundamentam e compõem as bases teóricas de um conhecimento.
As bibliotecas não podem ser consideradas inertes, mero local de estagnação para
apreensão do saber, e sim espaços políticos, sociais, de cidadania e de conflito. Os conceitos,
juízos, ideias e perspectivas materializadas em documentos, propiciam embates e concordâncias
de verdades. Numa mesma prateleira ou estante podemos encontrar ideias convergentes e
divergentes de autores que participam da mesma comunidade intelectual.
Sempre inserida num panorama sócio histórico, a seleção e desenvolvimento de coleções
é atividade primórdio das bibliotecas. Na Antiguidade “[...] as bibliotecas eram arquivos dos reis,
para uso próprio. ” (PINHEIRO, 2006, p. 34). As grandes bibliotecas da Antiguidade como da
Mesopotâmia, de Pérgamos e de Alexandria são “[...] fruto de uma política sistemática de
aquisições, que busca a completude, a acumulação e todas as formas de saber e de criação
confiadas à escrita. ” (JACOB, 2000, p. 51).
As bibliotecas tiveram que repensar no processo de formação e constituição de suas
coleções, no final da década de 60 e início da de 70 a partir do “Movimento para o
Desenvolvimento de Coleções” na biblioteconomia internacional, “Boa parte dos bibliotecários
começaram a preocupar-se com suas coleções, buscando desenvolvê-las, selecioná-las, expurgá-
las, enfim, transformá-las em alguma coisa mais coerente. ” (VERGUEIRO, 1989, p. 11).
As políticas de desenvolvimento de coleção surgem em um cenário onde a biblioteca passa
de acumuladora de obras para um espaço comum de algumas verdades. A produção intelectual é
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[102]
inversamente proporcional ao espaço físico disposto pelas bibliotecas. A falta de verba, espaço e
recursos humanos direciona a escolhas de títulos que podem contribuir, atualizar ou questionar o
acervo instituído.
O modelo de processo de desenvolvimento de coleções elaborado por G. Edward Evans
(apud VERGUEIRO, 1989), ainda hoje é aplicado nas bibliotecas, compreendendo as políticas
de seleção, seleção, aquisição, desbastamento, avaliação e estudo da comunidade. A construção
de uma política implica em estabelecer um conjunto de normas que irão reger as rotinas de
desenvolvimento de coleção (FIGUEIREDO, 1993); estabelecer de forma clara e delineada os
objetivos e metas, os quais se propõem a alcançar com base na coleção existente e de acordo com
a instituição e a comunidade; avaliar o grau de força e fraqueza os recursos existentes e determinar
a profundidade e o escopo da política de informação (RESOURCES AND TECHINCAL
SERVICES DIVISION apud FIGUEIREDO, 1993). Dessa forma o desenvolvimento de coleção
possui caráter cíclico e ininterrupto.
Considerando esse caráter cíclico, a política de desenvolvimento de coleções está
diretamente atrelada à relação entre ética informacional. Envolve as escolhas que são feitas ou
que têm de ser feitas. Entretanto há uma grande distinção entre a ética prática e teórica. Day
(2015) aborda as questões éticas, que devem ser analisadas pelas ordens morais e o espírito
racional humano, que muitas vezes esbarra na ética e moral já estabelecida. Harré (1993 apud
DAY, 2015) denomina "ordens morais" como conjunto de expectativas normativas de papéis
sociais e regras de comportamento. Para Day (2015) ocupamos vários papéis sociais morais (pai,
irmão, amigo, empregado etc.) e respondemos de forma diferente conforme a situação, temos
responsabilidades sobre nossas respostas e ações. Os dilemas éticos são confrontos de aplicar ou
não as regras morais. Nem sempre agimos conforme as regras, transgredimos. Ordens morais são
culturalmente construídas e culturalmente, são aprendidas, produtos de experiência e
desenvolvimento psicológico. As escolhas éticas às vezes ocasionam uma mudança histórica para
a pessoa que faz a escolha. Um bibliotecário deve agir de forma socialmente responsável mesmo
no fornecimento de recursos de informação. Agir com responsabilidade ética e não apenas
mecanicista para seguir uma regra determinada (DAY, 2015).
As bibliotecas ainda não se deram conta da importância de formalizar suas políticas,
instrumento normativo e discursivo. Como a “[...] falta de uma política definida para o
desenvolvimento do acervo é terreno fértil para o exercício da censura e da autocensura, pois
nada existirá para impedir a atividade de censores externos e internos. ” (VERGUEIRO, 1987, p.
25). Para fins de exemplificação, considera-se a censura o ato de análise crítica às produções
literárias e artísticas, antes de serem expostas ao público, conforme um regime político, religioso
ou moral atuante.
Vergueiro (1987) eleva a questão da postura do bibliotecário, quanto selecionador e
responsável pelo desenvolvimento da coleção, lidando com a censura e com a liberdade
intelectual do usuário. A liberdade intelectual é um direito assegurado e qualquer restrição que se
faça a ela é um atentado digno de protesto e reação. Entretanto em termos práticos a questão é
mais complexa e exige atitudes mais expressivas:
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[103]
[...] contra as pressões que vêm de parte de autoridades governamentais, de associações
civis ou de indivíduos que se sentem no direito de exigir a retirada, da coleção da
biblioteca, de livros e outros materiais que veiculem conceitos dos quais discordam e
que não gostariam de ver disseminados entre os outros membros da comunidade.
(VERGUEIRO, 1987,
p. 21).
Existem três tipos de censura, a governamental; pressão individual ou de grupo; e
autocensura, sendo “[...] muito mais fácil lidar com os dois primeiros tipos de censura do que
com o terceiro, pois naqueles existem apenas duas alternativas: ou se luta contra a censura ou se
compactua com ela. ” (EVANS, 1979 apud VERGUEIRO, 1987, p. 24). Como parâmetro de
resistência e luta contra a censura e a favor da liberdade intelectual nas atividades e serviços dos
bibliotecários, podemos nos conduzir pela Library Bill of Rights (Declaração de Direitos da
Biblioteca).
A American Library Association (ALA) publica o Manual de Liberdade Intelectual para
responder a questões práticas que enfrentam os profissionais da informação na aplicação dos
princípios da liberdade intelectual nos serviços da biblioteca. Afirma que todas as bibliotecas são
fóruns de informação e ideias, apresentando uma visão geral dos problemas de hoje e os novos
desafios, da Internet à privacidade e confidencialidade. A publicação não garante por si só que os
direitos dos bibliotecários e os usuários nunca serão desafiados ou que as dificuldades não irão
surgir, mas aderir a estes princípios em cada biblioteca é absolutamente essencial se profissionais
da informação e os cidadãos pretendem desfrutar de todos os benefícios da liberdade de
expressão.
Aprovada em 1939 pelo Intellectual Freedom Committee, a Library Bill of Rights
(Declaração de Direitos da Biblioteca) elege princípios básicos que devem reger os serviços de
todas as bibliotecas. A declaração teve algumas modificações e a última data 1996. No período
da 2ª Guerra Mundial, imperava um período de grande ameaça à liberdade intelectual, onde
governos realizam supressão de tudo o que considerava contrário aos interesses, tendo a
Declaração papel importante como instrumento de resistência às pressões.
As questões surgem a respeito da aplicação de princípios para práticas específicas da
biblioteca. As políticas fundamentais devem orientar seus serviços e listam 6 (seis) princípios
básicos:
I. Livros e outros recursos da biblioteca devem ser providos para o interesse, informação
e esclarecimento de todas as pessoas da comunidade a ser servida. Os materiais não
devem ser excluídos devido à origem, fundo, ou pontos de vista daqueles contribuindo
para a sua criação. II. As bibliotecas devem prover materiais e informações que
apresentam todos os pontos de vista sobre temas atuais e históricos. Os materiais não
devem ser proibidos ou removidos por causa da desaprovação partidária ou doutrinária.
III. As bibliotecas devem desafiar a censura no cumprimento de sua responsabilidade
de prover informação e esclarecimento. V. As bibliotecas devem cooperar com todas as
pessoas e grupos preocupados em resistir à restrição da livre expressão e livre acesso às
ideias. V. O direito de uma pessoa a usar uma biblioteca não deve ser negado ou
abreviada por causa de origem, idade, antecedente, ou pontos de vista. VI. Bibliotecas
devem se tornar espaços de exposição e salas de reuniões disponíveis para o público que
servem; devem fazer tais instalações disponíveis numa base de igualdade,
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[104]
independentemente das crenças ou filiações de indivíduos ou grupos que solicitam a sua
utilização.
(AMERICAN LIBRARY ASSOCIATION, 1996).
O desenvolvimento de coleções nesse sentido é muito mais que meramente fazer escolhas
aleatórias para compor o acervo, deve estar a par do contexto da comunidade que integra. A
técnica de constituir e organizar uma coleção em uma biblioteca requer conhecer tanto os livros
como as pessoas o bastante para fornecer e recomendar os livros apropriados para os seus leitores
(FIGUEIREDO, 1993).
Segundo Figueiredo (1993), as políticas de desenvolvimento de coleções envolvem
princípios básicos: a coleção de biblioteca contribui com informação, devendo ir ao encontro das
demandas de informação feitas pelos indivíduos e pela sociedade, em segundo, a biblioteca deve
contribuir para um programa de educação pública fornecendo informação e conhecimento,
essencial para a função educacional da coleção da biblioteca. De fato, aos bibliotecários de
biblioteca “[...] cabe o papel de educadores, e a importância e o valor da sua tarefa são
inestimáveis. ” (FIGUEIREDO, 1993, p. 19).
Para tanto, é condição sine qua non que sejam traçados os objetivos gerais da biblioteca,
relacionados com a instituição e a comunidade que a ela serve, para de acordo com estes objetivos,
ser traçada a política de seleção da biblioteca (FIGUEIREDO, 1993).
Considera-se o que os livros podem significar para o desenvolvimento individual: na
formação do caráter, na ativação da inteligência, no enriquecimento dos recursos, no
aprofundamento da sensibilidade. Eles oferecem material para a formação do caráter
através do conhecimento e do pensamento. A formação do caráter é um processo
contínuo e inconsciente de autoeducação na escola diária da vida; quando a mente
alcança o uso e o controle destes fios, todo o panorama da vida no mundo, passada e
presente, se torna constantemente mais variada e interessante, enquanto, ao mesmo
tempo, os poderes de reflexão e julgamento da própria mente são exercitados e
fortalecidos. (FIGUEIREDO, 1993, p. 33).
A política de seleção é, então, um conjunto de diretrizes e normas que visa estabelecer
ações, delinear estratégias gerais, determinar instrumentos e delimitar critérios para facilitar a
tornada de decisão na composição e desenvolvimento de coleções em consonância com os
objetivos da instituição e os usuários do sistema.
A seleção deve ser realizada por uma comissão composta de uma representação dos
usuários, da organização mantenedora e do pessoal que atende aos usuários e que, portanto,
conhece a comunidade. A política de seleção deve ser flexível e atualizada, e expressar de forma
a facilitar as decisões e a justificar a incorporação ou não de determinados itens (LIMA;
FIGUEIREDO, 1984).
A política de seleção pode se transformar em dispositivo social e político, proporcionando
fundamentos para as decisões nas admissões ou não de uma obra, não sendo pressionado ou
induzido pelo modismo, tendência ou hegemonia cultural, além de possibilitar abertura para os
discursos dos grupos minoritários, logo que,
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[105]
As ideias da classe dominante são, em todas as épocas, as ideias dominantes, ou seja, a
classe que é o poder material dominante da sociedade é, ao mesmo tempo, o seu poder
espiritual dominante. A classe que tem à sua disposição os meios para a produção
material dispõe assim, ao mesmo tempo, dos meios para a produção espiritual, pelo que
lhe estão assim, ao mesmo tempo, submetidas em média as ideias daqueles a quem
faltam os meios para a produção espiritual. [...] Os indivíduos que constituem a classe
dominante também têm, entre outras coisas, consciência, e daí que pensem; na medida,
portanto, em que dominam como classe e determinam todo o conteúdo de uma época
histórica, é evidente que o fazem em toda a sua extensão, e portanto, entre outras coisas,
dominam também como pensadores, como produtores de ideias, regulam a produção e
a distribuição de ideias do seu tempo; que, portanto, as suas ideias são as ideias
dominantes da época. (MARX; ENGELS, 2002, p. 56).
Há que se evitar que a coleção seja mera representação das ideias dominantes em cada
período sócio histórico, podendo se tornar vulneravelmente manipulável. Se as ideias dominantes
são as ideias da classe dominante, como Marx e Engels (2002) afirmaram, a Biblioteca deve ser
o espaço em que o silêncio dos dominantes é quebrado.
Não se pode permitir que a Biblioteca se torne a não voz dos vencidos, caindo nas
armadilhas da história dos vencedores e de uma revisão subserviente da coleção. Os livros que
vão para a estante compõem o acervo e não podem representar a história contada pelos
vencedores, cabendo ao bibliotecário quebrar o silêncio e desvelar os segredos que permanecem
em esquecimento reconfortante (DECCA, 2004).
O desenvolvimento da coleção das bibliotecas não pode ficar à disposição de modismos e
tendências, ficando subjugada à hegemonia cultural de determinada época. O conceito formulado
por Gramsci (1978) para descrever o tipo de dominação ideológica descreve a conjuntura que
muitas organizações se submetem, mantendo em seus acervos obras representativas de ideologias
dominantes em coleções obtusas de realidade.
Sabe-se que durante a exposição ao regime militar, muitas bibliotecas brasileiras se
tornaram alvos fáceis para a imposição de obras publicadas pelo Exército Brasileiro
(MARCELINO, 2009; SILVA, 2014). Muitas bibliotecas tiveram que incluir em seus acervos
materiais produzidos pelo governo disseminando uma ideologia da “boa moral e bons costumes”,
ou retirar livros sob a censura do regime.
O documento da política de coleções deve ser o resultado de interações entre os
bibliotecários e aqueles a quem a mesma se destina, representando a validação discursiva da
verdade. Por intermédio de comissões deliberativas ou consultivas, instituídas como uma
modalidade a trazer maior número de vantagens, deve representar o canal de comunicação e de
divisão de responsabilidade pela seleção com a própria comunidade, trazer uma forma de
participação mais ativa na gestão (VERGUEIRO, 1989), instituir um dispositivo de resistência
do trabalho conjunto a ordens predominantes, que vão de encontro com a liberdade intelectual e
de acesso.
A composição de comissões deliberativas torna a biblioteca um espaço de esfera pública,
pela integração de representantes da comunidade na tomada de decisão colegiada e coletiva
(VERGUEIRO, 2010), valendo-se do conceito do agir comunicativo de Habermas, uso da
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[106]
linguagem natural como meio de interação social nas coordenações das ações conduzidas pela
força consensual do entendimento.
O esboço do agir comunicativo é um desdobramento da intuição segundo a qual o telos
de entendimento habita na linguagem. O conceito de “entendimento” possui conteúdo
normativo, que ultrapassa o nível da compreensão de uma expressão gramatical. Um
falante entende-se com outro sobre uma determinada coisa. E ambos só podem visar tal
consenso se aceitarem aos proferimentos por serem válidos, isto é, por serem
reconhecimento aberto à crítica. (HABERMAS, 1990, p. 77).
A seleção das verdades que integrarão o acervo pode reestabelecer e reconstruir a história
de uma sociedade, no momento em que “[...] seus participantes regulam sua pertença a grupos
sociais e garantem a solidariedade [...]” (HABERMAS, 1990, p. 96) aos direitos humanos e a
dignidade humana, dando voz ao silêncio dos vencidos, oprimidos e minoritários.
[...] as condições de verdade são o critério para saber se um proferimento preenche ou
não sua função de representação; todavia, o preenchimento da função interativa e
expressiva da linguagem mede-se através de condições da autorização e da sinceridade,
que são análogas à verdade. (HABERMAS, 1990, p. 80).
Foucault tem essa concepção da constituição do ser, elaborada por uma ética, que
compreende o falar a criticidade, veracidade, para a além do irônico crítico.
A parresía é, portanto, em duas palavras, a coragem da verdade naquele que fala e
assume o risco de dizer, a despeito de tudo, toda a verdade que pensa, mas é também a
coragem do interlocutor que aceita receber como verdadeira a verdade ferina que ouve.
(FOUCAULT, 2014, p. 13).
A ideia da coragem da verdade permite pensar a informação como algo criativo, dentro de
uma ação social. A parresía é um agir na coragem de falar. E a informação nesse contexto é uma
informação verdadeira, que se constrói no sentido da verdade, em função da verdade.
Nesse sentido, propõe-se que as bibliotecas revejam sua política de desenvolvimento de
coleções, de modo que, pelo caminho aberto pelas diretrizes da Comissão Nacional da Verdade,
num movimento paralelo a fim de esclarecer os fatos e as circunstâncias históricas do país,
possam representar a adoção de medidas para prevenir violação de direitos humanos, assegurar
sua não repetição, promover a efetiva reconciliação nacional e a reconstrução da história,
repreendendo danos aos direitos humanos.
Com Foucault, observamos a importância da parresía, ou seja, da coragem da verdade, de
dizer a verdade sobre si mesmo. Com isso, vemos como as bibliotecas precisam ser campo de
revisão de suas políticas de desenvolvimentos de coleções, para que elas representem a verdade
e a democracia, sendo as bibliotecas mesmas representações da ética e dignidade. Através da
revisão de suas políticas, visando o compromisso com a verdade e a reconstrução histórica,
propõe-se o olhar para as obras retiradas por meio da censura de um regime ditatorial e as
incluídas como meio de disseminação de ideais políticos.
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[107]
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este artigo abordou as questões da veracidade no âmbito de uma eticidade, traçando uma
abordagem teórica por meio de Habermas e Foucault. Através de Habermas, o marco teórico se
utiliza da aprendizagem intersubjetiva por meio da linguagem, ou seja, no discurso residente na
possibilidade do entendimento mútuo e da prevalência da verdade.
A reconstrução histórica como processo liderado por iniciativa da Comissão Nacional da
Verdade, através dos documentos como informação registrada, levanta a possibilidade de
reconstrução histórica de um passado submetido a graves violações dos direitos humanos.
Fomentar espaços de interações sociais e políticos na biblioteca, estabelecer consenso do
entendimento nas coordenações das ações entre a equipe administrativa e a sociedade, e ter
coragem de dizer e procurar a verdade, são posturas que compõe a ética de um profissional que é
solidário com a dignidade humana de cada integrante de sua comunidade.
O profissional da informação tem uma responsabilidade social, por ser a incorporação da
alma de uma sociedade e de seu pressuposto democrático. Sua relevância encontra-se no fato de
reger o potencial inerente às coleções de maneira a promover a verdade, sem a qual sua atuação
perderia o viés moral e ético.
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COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[110]
Cap
ítulo
7 CONTRIBUIÇÕES DA DISCURSIVIDADE PARA A CONSTRUÇÃO DE REPOSITÓRIOS DIGITAIS
Clóvis Ricardo Montenegro de Lima
Jobson Francisco da Silva Júnior
Márcio da Silva Finamor
______________________________________________________________________________________________________
Resumo: Introdução: Nesta pesquisa discute-se a (re) construção dos repositórios digitais, usando como
exemplo o Repositório Institucional Digital do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia –
RIDI, sob a perspectiva da discursividade com a adoção da Teoria do Agir Comunicativo (TAC) de Jürgen
Habermas. Objetivo: Propor o diálogo – entendimento mútuo - como um dispositivo para compreender quais
seriam as contribuições de se adotar uma abordagem discursiva para a implementação de repositórios digitais.
Metodologia: Adota uma abordagem crítica fundamentada na teoria de Habermas para discutir o agir
comunicativo e a humanização nas organizações. Resultados: Observa-se que a adoção de uma abordagem
discursiva apresenta potencialidades para se repensar a implementação e a manutenção dos repositórios digitais.
Conclusões: Reflete sobre a constituição de repositórios digitais, e questões correlatas como suas políticas de
preservação, e aponta a mediação como uma forma de otimizar a implementação dos mesmos.
_____________________________________________________________________________
1 INTRODUÇÃO
Ao observarmos a implementação e manutenção dos repositórios digitais, hoje, é
facilmente identificável uma séria de questões que podem ser repensadas para a otimização desta
ferramenta, desde a própria elaboração do repositório (desenvolvimento e/ou customização do
software) a questões como as políticas de acesso, preservação e também questões relativas aos
direitos autorais dos documentos disponibilizados, tomando essas questões como ponto de partida
vemos como uma possível solução para estas questões a implementação dos repositórios digitais
a partir de um ambiente conversacional.
Para isso, destaca-se a Teoria do Agir Comunicativo (TAC), de Habermas, como método
para (re) construção de repositórios digitais. O fundamento dessa teoria está pautado na interação
dos envolvidos e, no entendimento mútuo, dos processos de gerenciamento humanístico em
qualquer ambiente organizacional. Ou melhor, em processos de gerenciamento organizacional
com o víeis humanístico. Partindo desse princípio, procurou-se aplicar a TAC nesse estudo a
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[111]
respeito da constituição dos repositórios, seja em seu desenvolvimento ou em seus processamentos
técnicos específicos. Busca-se estabelecer critérios para que haja um consenso entre os indivíduos
no que diz respeito à criação de políticas, nos processos que envolvem serviços e na execução das
atividades. Através dos atos de fala: em que se estabeleça a conformidade entre os indivíduos no
ambiente das atividades, para chegar ao melhor argumento na consecução de determinado serviço;
processos; criação das políticas; dentro da concepção dos repositórios digitais.
O conceito do agir comunicativo refere-se à interação de pelo menos dois sujeitos capazes
de falar e agir estabelecendo uma relação interpessoal (seja por meios verbais ou extraverbais). Os
atores buscam um entendimento da situação para, de maneira concordante, coordenar seus planos
de ação e, com isso, suas ações (HABERMAS, 2012, p. 166).
Em esclarecimento inicial, e significativo, para que seja factível desenvolver repositórios
institucionais adequados a políticas e a modelos específicos e que, ao mesmo tempo, acomodem a
pluralidade de interesses das diversas comunidades, é necessário adotar plataformas de software
versáteis, com capacidade de expansão e de integração a outros programas que possam apoiar o
atendimento às demandas atuais e futuras. Adicionalmente, é necessário ainda incluir uma
dimensão voltada para a gestão e administração do repositório que incluem, por exemplo, a gestão
de direitos e de acesso, da preservação digital, das coleções, da segurança da informação, e ainda
os instrumentos de gestão voltados para o usuário final (MARCONDES; SAYÃO, 2009).
O desenvolvimento dos repositórios, dos conhecimentos científicos e técnicos, que
propiciam o crescimento e o aperfeiçoamento das forças produtivas, provê o sistema capitalista de
um mecanismo regular que assegura a sua manutenção sem estar isento de crises. Desta forma, “se
institucionaliza a introdução de novas tecnologias e de novas estratégias”, isto é, “institucionaliza-
se a inovação enquanto tal”, cumprindo a ciência e a técnica o papel de legitimar a dominação
(HABERMAS, 1987b, p. 62).
Pois, “esses sistemas são os inibidores da ação comunicativa do discurso”. É necessário
retirar essas barreiras que impedem a interação e a comunicação que estão presentes dentro do
ambiente de trabalho, como: autoridade, competitividade e atritos, dentre outros. Pelo contrário,
construir pontes para a interação e socialização, através do diálogo e do consenso entre as partes,
estabelecer a humanização nas organizações e, consequentemente, uma maior colaboração da rede
de equipe.
As pessoas em suas atividades conhecem seus serviços e estão familiarizados com a
técnica, dessa forma, com o tempo adquirem novas experiências e podem colaborar com aquilo
que sabem e aquilo que vivenciaram. Sabendo que tal norma ou prática se mudasse, aprimoraria a
forma como era conduzida, assim, melhorando os processos e serviços, sobre outro olhar mais
curado. Daí que surge, a necessidade de interação e o diálogo para a formulação e aprimoramento
dos serviços.
A proposta, da ideia da meta do entendimento [na ação comunicativa]. Isto é, a produção
de um acordo, que reside na compreensão mútua da comunidade intersubjetiva, do saber
compartilhado, da confiança recíproca e da concordância de uns e outros. O acordo através da
discursividade descansa sobre a base do reconhecimento das quatro correspondentes pretensões de
validez: inteligibilidade, verdade, sinceridade e retidão (HABERMAS, 1989).
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[112]
Sob o olhar tecnológico dos repositórios e dentre as pretensões de validez: o discurso aqui
é concebido num sentido cultural abrangente, na medida em que visa, em parte, a formação de
preferências e de convicções, e não apenas a agregação de interesses para competição. Ao invés
de pensar a deliberação como o resultado de um encontro dialógico singular (o ato de fala que
acontece através da internet), podemos pensar as condições da deliberação numa dimensão cultural
mais ampla e cooperativa (MAIA, 2010).
2 DISCURSO: UM MÉTODO PARA A ADMINISTRAÇÃO DAS ORGANIZAÇÕES
COMPLEXAS E SUA HUMANIZAÇÃO
“Verständigung” é um conceito Habermasiano, que traduzido do alemão para o português
significa: chegar a um entendimento (ARAGÃO, 1992, p. 39). E esse entendimento se dá por meio
do diálogo – ponto central desse artigo – através do uso da linguagem (no uso social) como
representação, interpretação e na comunicação dos atos de fala, através dos argumentos e pontos
de vistas na construção das ideias e resolução dos problemas.
Habermas (1989) assemelha-se o discurso como as argumentações. Tal como: ilhas
ameaçadas de se verem submersas pelas ondas no oceano de uma prática, onde o modelo da solução
consensual dos conflitos de ação, não é de modo algo dominante. Os meios de entendimento mútuo
não cessam de se verem desalojados pelos instrumentos da violência. A ação do agir, que se guia por
princípios éticos tem que se arranjar com os imperativos resultantes das imposições estratégicas. É
nesta espécie de restrição ao discurso que o poder dos fatos se faz valer em face das pretensões e
interesses transcendentes da razão.
O autor acrescenta que essas premissas derivam de um princípio moral universal da ética
do discurso e que essa concepção se diferencia de outras perspectivas pelo seu caráter
procedimental, ao invés de se construir a partir de conteúdos normativos. Toda norma válida tem
que preencher a condição de que as consequências e efeitos colaterais, que previsivelmente
resultem de sua observância universal para a satisfação dos interesses de todo indivíduo, possam
ser aceitas sem coação por todos os concernidos (HABERMAS, 1989).
Um dos aspectos fundamentais a necessidade de resoluções dos problemas organizacionais
está na argumentação consistente e elaborada. Estabelecendo o melhor argumento (consenso
mútuo), através da exposição das opiniões entre os indivíduos, seja através do discurso prático9,
explicativo10 ou teórico11. A importância está na existência do diálogo nas organizações e nos
processos.
9 O discurso prático, com pretensão à correção das normas. É racional aquele que justifica suas ações e julga com
imparcialidade; 10 O discurso explicativo, com pretensão à compreensibilidade. É racional aquele que forma adequadamente suas
construções simbólicas e se dispõe a explicar o significado de suas expressões; e 11 O discurso teórico, com pretensão à verdade ou eficácia dos fatos. Aqui, racional é aquele que profere opiniões
fundamentadas e age com eficiência. (HABERMAS, 1987, p. 38-42 apud ALVES, 2009, p. 190).
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[113]
Ao estabelecer o ato de fala, inicia-se uma relação intersubjetiva entre falante e ouvinte e,
ao mesmo tempo, numa relação objetiva com o mundo. Ao se conceber o entendimento mútuo
como telos inerente à linguagem, impõe-se a co-originalidade de representação, comunicação e
ação. Uma pessoa entende-se com outra sobre alguma coisa no mundo. Como representação e
como ato comunicativo, dado que, a articulação linguística aponta em duas direções ao mesmo
tempo: o mundo e o destinatário (HABERMAS, 2004).
Vizeu (2009) considera a linguagem como atributo essencial na construção de significados.
E a comunicação como um processo que assume um novo patamar na compreensão da realidade
organizacional. Em outras palavras, grande parte do que é a organização e dos processos gerenciais
e técnicos, podem ser definidos pela interação comunicativa entre seus membros e entre estes e os
seus públicos externos (real e virtual). É a partir desta interação comunicativa que as visões de
mundo feitas por estes distintos grupos internos e externos são (re) construídas. Tendo em conta
que tais percepções orientam a ação social, podemos inferir que a dinâmica da atividade
organizacional cotidiana é, essencialmente, definida pelas interações comunicativas das pessoas e
grupos participantes.
Habermas (1989) considera as interações comunicativas como aquelas nas quais as pessoas
envolvidas se põem de acordo para coordenarem seus planos de ação, o acordo alcançado em cada
caso, medindo-se pelo reconhecimento intersubjetivo das pretensões de validez. No caso dos
processos de entendimento mútuo linguísticos, os atores erguem com seus atos de fala, ao se
entenderem uns com os outros sobre algo, pretensões de validez, mais precisamente, pretensões de
verdade, de correção e de sinceridade, conforme se refiram a algo no mundo objetivo, no mundo
social comum e no mundo subjetivo próprio.
A partir do momento em que entendemos a socialização intencional do mundo como:
mediada através da comunicação, não contamos mais com seres inteligíveis, oniscientes, sem
corpo e que agem fora de um contexto; porém com atores ligados a um corpo, socializado em
formas de vida concretas, localizados no tempo histórico e no espaço social, envolvidos nas redes
do agir comunicativo, os quais, ao interpretar provisoriamente a respectiva situação, têm que
alimentarse das fontes indisponíveis de seu mundo da vida (HABERMAS, 2010).
Mesmo em tais condições ideais de discursos e negociações, só podem desenvolver sua
capacidade de solucionar problemas, na medida em que os problemas em foco forem captados de
modo sensível, à luz de tradições pós-tradicionais reflexivas, descritos adequadamente e
respondidos de forma produtiva. Um entendimento discursivo garante o tratamento racional de
temas, argumentos e informações; todavia, ele depende de contextos de uma cultura e de pessoas
capazes de aprender. Ou seja, a visão de mundo na forma dogmática e de padrões rígidos na
socialização podem constituir obstáculos para um modo de socialização discursiva (HABERMAS,
2010).
A ideia do discurso, como conduta para uma administração nas organizações, é uma
abordagem ainda pouco usada na prática. As organizações ainda trabalham em fronteiras rígidas,
entre departamentos e processos de produção fechada e mecânica, onde inibem as pessoas a
tomarem iniciativas de socialização e inovação. A idealização de substituir esse modelo
organizacional, por fronteiras permeáveis, flexíveis, com mobilidade suficiente para reagir às
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[114]
mudanças impostas pelo ambiente externo num modelo discursivo. Como o bom relacionamento
e a ligação dos membros, através da visão e do debate humanístico para uma maior transparência
na comunicação e ampliação da racionalização. Sendo esse caminho como argumento para as
organizações fazer de seus processos e serviços inovadores e coletivos. Ou seja, a administração
das organizações sobre o método de um acordo em comum entre os envolvidos. Isto é, o
reconhecimento e a prática de que “A natureza das humanizações nas organizações se da na
construção dela em torno das pessoas. ” (MORGAN, 2006, p. 142).
Como bem colocam os autores Lima, Carvalho e Lima (2010, p. 15), sobre a questão do
discurso nas organizações como o elemento chave para uma organização rica, pois, uma vez que:
A perda da autonomia de falar nas organizações resulta no empobrecimento de valores e
conhecimentos, e também na redução dos vínculos solidários entre os que trabalham. As
reduções têm um custo: qualquer racionalização de processos, melhoria ou inovação nas
organizações requer investimentos para a introdução de novos conhecimentos. A
aprendizagem das organizações com seus próprios processos se perdem neste silêncio. O
comando externo na perspectiva do observador implica em custos para apropriação,
aceitação e legitimidade dos novos conhecimentos. Treinamento e motivação são
ferramentas necessárias para quem faz calar os participantes dos processos produtivos.
O Discurso amplia as perspectivas de representação de interesses nas organizações,
politizando suas decisões e possibilitando a racionalização mediadora discursiva. O
Discurso tem papel ativo na transformação das organizações, valorizando e viabilizando
expressão e comunicação entre os que participam dos processos produtivos. A ampliação
da expressão das perspectivas e a viabilidade da comunicação que vão proporcionar a
aprendizagem a partir dos próprios processos produtivos.
Para fortalecer a participação igualitária, são necessárias não apenas estruturas
comunicacionais eficientes, ou instituições propícias à participação, mas também devem estar
presentes a motivação correta, o interesse e a disponibilidade dos próprios cidadãos para se engajar
em debates. As novas aplicações tecnológicas, independentemente de favorecer ou dificultar a
democracia, devem ser pensadas de maneira associada com os elementos sócio-históricos próprios
dos atores sociais e com os procedimentos da comunicação estabelecida entre os sujeitos
comunicantes concretos (MAIA, 2010).
A título de exemplo, se a discussão acontece em um ambiente livre de medo, de intimidação
ou de ridículo, uma variedade maior de pontos de vista pode ser expressa tanto virtualmente, como
pessoalmente. Do ponto de vista virtual, a “força do melhor argumento”, que não guarda uma
relação com o papel social dos participantes, tem maiores chances de se impor num fórum público
virtual (MAIA, 2010).
Habermas (1990) distingue diferentes tipos de interação: primeiro lugar, de acordo com o
mecanismo de coordenação da ação; é preciso saber, antes de mais nada, se a linguagem natural é
utilizada apenas como meio para transmissão de informações ou também como fonte de integração
social nesse caso trata-se, do agir estratégico. No segundo caso, a força consensual do
entendimento linguístico, isto é, as energias de ligação da própria linguagem, tornam-se efetivas
para a coordenação das ações, ao passo que no primeiro caso o efeito de coordenação depende da
influência dos atores uns sobre os outros e sobre a situação da ação, a qual é veiculada através de
atividades não linguísticas que é do agir comunicativo.
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[115]
Iniciativas de Democracia Digital contemplam princípios, práticas e valores tão
importantes quanto ou mesmo moderadores das qualidades da participação. Tão valioso quanto
aproximar os cidadãos de processos de tomada de decisão é muni-los de informações relevantes,
qualificadas e compreensíveis, de modo a promover o maior nível possível de transparência
(AGGIO; SAMPAIO, 2013).
Seguindo nessa direção, voltando aos repositórios digitais, novos padrões, procedimentos
técnicos e gerenciais estão surgindo na constituição de repositórios; esquemas de representação e
de arquivamento, recuperação e disseminação estão sendo reconfigurados, tendo como pano de
fundo o movimento de acesso livre às informações científicas, que estende rapidamente a sua pauta
de interesse para as questões de acesso aos dados de pesquisa, enquanto parte essencial da memória
científica mundial. Pelo lado mais pragmático e operacional, um conjunto de atividades gerenciais,
técnicas e informacionais fortemente padronizadas chamado coletivamente de curadoria de dados12
de pesquisa, permite que os dados possam ser tratados, arquivados em ambientes digitais
confiáveis, preservados e reconfigurados de forma que possam ser aplicados em novos contextos
científicos; sirvam de base para novas pesquisas; sejam aproveitados para fins educacionais; e,
sobretudo, colaborem para minimizar a duplicação de esforços nas estratégias de criação de dados
(SAYÃO; SALES, 2013).
A implementação desses novos padrões que surgem a cada dia, seja técnico ou tecnológico,
é algo inevitável nas Instituições que permeiam a constituição dos repositórios. Um dos desafios,
nos processamentos técnicos e tecnológicos, está na interação tecnológica (interoperabilidade)
entre repositórios no Brasil. E na questão da comunicação e satisfação do usuário (plataforma
intuitiva). Com o apoio da teoria da ação que tem como foco a melhoria dos processos e inovação,
dessa forma, instrui-se o uso da discursividade e na transparência das comunicações para
aperfeiçoar os processos, no repensar do uso da tecnologia e na dependência de sistemas, nos
serviços, no planejamento das políticas entre outros, para a constituição de repositórios.
Habermas (2012) afirma que só funciona como mecanismo de coordenação da ação do agir,
à medida que os participantes da interação se põem de acordo quanto à validade pretendida para
suas interações, ou seja, à medida que reconhecem intersubjetivamente as pretensões de validade.
Um último ponto de aproximação dessa teoria está na perspectiva de liderança. Onde
consiste a transformação e na construção de uma relação em que permite enxergar o outro como
12 Curadoria de dados de pesquisa: é a contribuição para o estabelecimento de um modelo de curadoria digital no país. Ela
emerge como uma nova área de práticas e de pesquisa de espectro amplo que dialoga com várias disciplinas e muitos
gêneros de profissionais. Assegura a sustentabilidade dos dados para o futuro, não deixando, entretanto, de conferir valor
imediato a eles para os seus criadores e para os seus usuários. Facilitam o acesso persistente a dados digitais confiáveis
por meio da melhoria da qualidade desses dados, do seu contexto de pesquisa e da checagem de autenticidade. Dessa
forma, contribui para assegurar a esses dados validade como registros arquivísticos, significando que eles podem ser
usados no futuro como evidência legal. O uso de padrões comuns entre diferentes conjuntos de dados, proporcionado
pela curadoria digital, cria mais oportunidades de buscas transversais e de colaboração. O outro elemento básico desse
modelo são as ações que devem ser tomadas no decorrer do processo de curadoria. Em três tipos como: ações para todo
o ciclo de vida; ações sequenciais e ações ocasionais. Essas ações, para cada uma, existem uma lista de normas, para agir
especificamente, incluso no artigo: “Curadoria Digital: um novo patamar para preservação de dados digitais de pesquisa”
desses autores. Esse modelo permite uma visão coletiva sobre o conjunto de funções necessárias à curadoria e à
preservação de dados de pesquisa. Além de definir papeis, responsabilidades e conceitos, ele explicita a infraestrutura de
padronização e as tecnologias que devem ser implementadas (SAYÃO; SALES, 2012, p. 184-187, grifo dos autores).
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[116]
um participante legítimo da organização, onde se estabelece a interação social. Para isso, a ênfase
na comunicação e nos diálogos orientados para o reconhecimento do outro está presente tanto na
TAC, quanto no modelo da liderança transformacional. A ação comunicativa somente se
estabelece quando há o reconhecimento do outro como um sujeito com poder de participação
legítimo, e isso só ocorre quando há o reconhecimento das motivações do outro – no mínimo,
quando há a intenção desse reconhecimento (VIZEU, 2011).
Os processos de entendimento mútuo visam um acordo que depende do assentimento
racionalmente motivado ao conteúdo de um proferimento. O acordo não pode ser imposto à outra
parte, não pode ser extorquido ao adversário por meio de manipulações: o que manifestamente
advém graças a uma intervenção externa não pode ser tido na conta de um acordo. Este assenta-se
sempre em convicções comuns (HABERMAS, 1989).
A força decisiva nessas negociações é a comunicação. Os projetos e as soluções somente
se tornam racionalmente compreensíveis através de práticas interativas concretas, que inclui
normas institucionalizadas e negociações pragmáticas. Os atores podem beneficiar-se da
comunicação mais horizontal e interativa proporcionada pelas novas tecnologias da informação;
podem beneficiar-se da redução de custos propiciada pela internet para se auto-organizar,
coordenar a ação coletiva, bem como para produzir e distribuir material informativo de maneira
autônoma (MAIA, 2010).
Os interesses não existem antecipada ou independentemente de sua articulação no discurso.
Os atores devem, sobretudo, elaborar uma metalinguagem, a fim de relacionar os problemas
práticos de suas causas ao conjunto de categorias simbólicas da sociedade, bem como ao sistema
normativo. Devem estabelecer pontes comunicativas entre os diferentes atores sociais e ambientes
de conhecimento. Devem ser convincentes para interferir nos consensos éticos que orientam a
coexistência social e articular, de modo consequente, demandas específicas, a fim de que possam
ser mais facilmente encampadas pelas Instituições Políticas (MAIA, 2010).
Em vias de projeção de uma organização onde a comunicação se dá sem barreiras, com um
envolvimento multidisciplinar para fazer pensar e agir na resolução de problemas. Em uma
organização num modelo horizontal que se constitui mais flexível e mais dinâmica. Sem
proliferação de níveis hierárquicos, sequer autocráticos. Mas sim, dialógica e discursiva entre as
redes de equipes para fazer de suas atividades criativas e inovadoras.
Dessa maneira, defendemos aqui que iniciativas da discursividade e da administração
horizontalizada é uma das estruturas e mecanismos existentes para uma orientação democrática,
onde se encontra meios para a construção e (re) construção de repositórios digitais. Por essas
razões, concentraremos nossos esforços na perspectiva da Teoria do Agir Comunicativo.
Esse modo de participação, essencialmente, permite convocar os indivíduos a dialogar e se
entender mutuamente. Dessa forma, estabelecendo compromissos nos processos organizacionais
do programa. Sendo o processo relevante e, consequentemente, resultando em atributos
consistentes e duradouros. Sem o processo, não se tem o produto de qualidade. E um bom processo
organizacional se dá por meio do envolvimento com a equipe, ou seja, pelos discursos e diálogos.
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[117]
Esta constatação leva à questão acerca dos efeitos do modelo consultivo do Repositório
Institucional Digital (RIDI) do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia
(IBICT). Na repercussão como modelo admissível para a construção dos repositórios digitais no
país. Sob o ponto de vista do agir comunicativo para as aplicações da teoria Habermasiana.
Esse repositório tem o encargo de disponibilizar um acervo crescente das publicações
científicas produzidas no Instituto. O principal objetivo do RIDI é armazenar, preservar, divulgar,
dar acesso à produção intelectual do IBICT, proporcionando uma maior visibilidade e
maximizando os impactos da pesquisa como parte do movimento pelo Acesso Livre à informação
(IBICT, 2015).
Em relação ao DSpace é o software predominante. Que é usado pelo RIDI. Sendo esse, um
sistema desenvolvido pelo MIT em parceria com a Hewlett-Packard Company (HP), e é distribuído
no Brasil pelo IBICT, que capacita as Instituições em sua implementação, oferece suporte técnico
e incentiva a publicação de materiais de apoio em português, fundamentando a predominância
desse software no território nacional, o que reforça escolha desse repositório. A ampla adoção do
DSpace, no Brasil, é explicada por Murakami e Fausto (2013) quando afirma que o engajamento
de um órgão oficial na distribuição do software de repositórios influencia o sistema predominante
em determinado país.
Portanto, um fator determinante na viabilização dessas dimensões e modelo é a qualidade
da plataforma do software e a sua adequabilidade aos requisitos funcionais sobre a qual o
repositório irá operar. Portanto, o desafio de selecionar uma plataforma de software como parte do
ciclo de planejamento de repositórios institucionais tornase uma fase crítica para o sucesso do
empreendimento (MARCONDES, SAYÃO, 2009).
A questão das tecnologias e softwares é de fato proveitosa e essencial para o
desenvolvimento de repositórios. A tecnologia da informação e seus componentes são cruciais
nesse processo, pois, permitem a disseminação da produção científica em formato digital, no
acesso rápido em qualquer parte do mundo, do suporte para as informações, registro, preservação
e recuperação da informação científica.
No entanto, a velocidade do crescimento tecnológico e a dificuldade de acompanhamento
das modernas tecnologias é algo a ser discutido. Dado que, o alto investimento em tecnologia, seu
desenvolvimento é de tal magnitude, que quando adquirir o software e até implantar, processar,
treinar todos os envolvidos, no final desse processo a tecnologia já pode está ultrapassada.
Resultando na perda de tempo, no esforço e empreendimento que pode não ser mais aproveitado e
do custo para o desenvolvimento tecnológico.
A melhor forma de lidar com isso seria o uso de plataformas livres (software livre). Existe
nele o seu custo e manutenção como qualquer custo tecnológico. No entanto, a idéia de ser um
modelo livre, para a organização construir de acordo com suas necessidades e interesses funcionais
e, principalmente, longe de ser substituído por outra tecnologia parece ser incontestável. Com o
modelo de software livre – customizado – onde consegue priorizar os sistemas e as Instituições a
trabalharem em conjunto, o que remete a questão da interoperabilidade. Já que, esse, é um dos
grandes desafios para a construção de repositórios: a escolha da plataforma.
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[118]
Com base na literatura sobre repositórios, outros problemas mais frequentes e entre os mais
aludidos, estão a preservação, as políticas (normas) e a tecnologia (interoperabilidade) e o direito
autoral.
Sobre a questão da preservação Hollós (2010), ressalta que a preservação documental e
(digital) deve ser entendida como uma atividade multidisciplinar. Para isso, a atualização de alguns
conceitos e posturas relacionados à preservação, como a própria mudança de olhar do conservador:
um olhar ampliado que busca a convergência de visão e valores, voltados a estratégias e ações
integradas de preservação sistêmica. Isto é, a preservação, para além da conservação física dos
suportes materiais, como parte de um corpo representado também pela gestão, o acesso e a difusão
da informação e do conhecimento (HOLLÓS, 2010). No caso dos documentos analógicos,
preservação do suporte e sua forma física asseguram a conservação do conteúdo, porém, a mesma
situação não se aplica a documentos digitais (WEITZEL; MESQUITA, 2015).
Em que, os equipamentos e softwares utilizados são substituídos rapidamente por versões
mais recentes e o risco da obsolescência é o grande inimigo ainda não dominado. A forma digital,
embora aparentemente se mostre bastante atrativa, logo se torna obsoleta, exigindo uma
preservação vigiada e permanente, com garantias de recursos materiais para as atualizações
necessárias. A necessidade de elaboração de um “testamento”, de uma política específica de
preservação e acesso em que “selecione e nomeie, que transmita e preserve, que indique onde se
encontram os tesouros e qual o seu valor”, para contribuir para que o sentido e o desejo de
preservação, imanente em cada um de nós, se transforme em algo real e positivo, e deixe de ser o
espectro que atordoa e frustra a nós diante do fato de que todas as coisas criadas pelo ser humano
estão sujeitas às mesmas circunstâncias e acasos que determinam a nossa existência: a perda de
tudo que é perecível (HOLLÓS, 2010, p. 28-29).
Deparamo-nos com uma mudança de paradigma que implica reconhecer a conservação
preventiva como um meio eficaz de ampliação das possibilidades da preservação documental.
Esses documentos, nascidos digitais, constituem-se um desafio de preservação ainda maior. Afinal,
grande parte da informação produzida nos dias atuais, em praticamente todas as áreas da atividade
humana, será perdida e deixará de se constituir como lugar de memória, a menos que sejam
desenvolvidos políticas e mecanismos de gestão e preservação para conservá-la às gerações futuras
(HOLLÓS, 2010).
Observa-se, por meio da literatura, que a preservação digital ainda é uma questão nova e
suscita discussões acaloradas, mostra-se um ponto sensível a preservação dos conteúdos
intelectuais das obras disponibilizadas nos repositórios. Em estudos realizados sobre repositórios
institucionais na região Sudeste do Brasil, Weitzel e Mesquista (2015) mostram que ainda não se
tem nas instituições a prática de formalizar as políticas de preservação, onde num estudo
envolvendo nove instituições apenas possuía uma política de preservação digital formalizada:
Esse fato pode ser responsável por práticas pobres, tais como o baixo índice do uso de
extensões de arquivos de alta adequação de preservação digital e a falta de diversificação
nas estratégias de preservação digital, privilegiando: backup; inclusão de metadados; e
preservação da tecnologia. (WEITZEL; MESQUISTA, 2015, p. 183).
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[119]
É preciso pensar não só na preservação do suporte físico, mas também no seu acesso futuro.
Das estratégias para a preservação digital hoje destacamos a preservação da tecnologia, emulação,
migração, encapsulamento, metadatos, identificadores persistentes, backup, redes de distribuição
de preservação digital, e de todos esses mecanismos o mais utilizado no Brasil ainda são os backups
(WEITZEL; MESQUISTA, 2015).
3 ABORDAGEM DISCURSIVA: UM MODELO PARA A CONSTITUIÇÃO DE
REPOSITÓRIOS INSTITUCIONAIS
Habermas afirma que somente pela ação comunicativa é possível conciliar um acordo entre
sujeitos livres, pois, é nessa categoria que reside a argumentação livre e a significação
intersubjetiva, onde se consideram aspectos de verdade, de sinceridade de retidão e de
inteligibilidade (VIZEU, 2011).
Toda interação mediada pela linguística gera uma aprendizagem. É pela linguagem que
habita o meio para o ideal entendimento. Nas palavras de Habermas (1990, p. 77), “O esboço do
agir comunicativo é um desdobramento da intuição segundo a qual o telos do entendimento habita
na linguagem. ” Para tanto, é preciso fazer entender o conceito de diálogo e discurso empreendidos
aqui. O primeiro se dá na interação, na filosofia da consciência no – esclarecimento. E no segundo,
pela filosofia da linguagem – uma construção interativa para o entendimento intersubjetivo. Isto é,
uma ação para a socialização e o outro para a construção de um entendimento mútuo entre as
pessoas. A interação orientada pelo entendimento é denominada como ação comunicativa.
Vizeu (2003) inspirado nos fundamentos da Teoria de Habermas sobre a prática
comunicativa nas organizações, enquanto espaço de interações linguísticas entre os sujeitos, tendo
por referência a mudança do paradigma da filosofia da consciência para o paradigma da
linguagem, mudança esta denominada, por Habermas e seu intérpretes, como guinada linguística:
[...] deve ter o pressuposto de que os membros que interagem dentro da organização
(assim como em seu ambiente) o fazem a partir de um processo intersubjetivo de troca
de significados, onde todos detêm a competência essencial para a consecução e
coordenação da ação coletiva. Neste novo foco, o sentido essencial da comunicação é
dialógico, e o processo de comunicação monológico (comunicação de cunho apenas
informacional) indica comunicação distorcida. (VIZEU, 2003, p. 14).
A hierarquia, por exemplo, é um dos elementos inibidor da ação comunicativa. Dado a
necessidade por reciprocidade, a dificuldade psicológica e estrutural gerada pelo pressuposto
hierárquico representa um pré-constrangimento para a comunicação intersubjetiva. Assim sendo,
apesar de os sistemas hierárquicos atenderem ao interesse pela eficiência, preconizam dificuldades
no processo comunicativo. Neste ponto, as estruturas organizacionais flexibilizadas não somente
correspondem a alternativas para o problema da dinâmica organizacional, mas também facilitariam
a comunicação intersubjetiva. Deste modo, reuniria ideias subjetivas (individuais) em relação ao
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[120]
determinado objeto de estudo, ou na resolução de algum problema, onde se tenta captar uma ideia
geral um (consenso), do ponto de vista global de um grupo discursor (VIZEU, 2003).
A teoria habermasiana é apenas uma de muitas abordagens existentes para se avaliar
criticamente a questão da comunicação organizacional e sua humanização. Optamos por apresentá-
la por entender seu potencial enquanto uma perspectiva sociológica afiliada as vertentes
hermenêuticas, vertentes estas que têm observado o papel central da linguagem na explicação da
vida social. De resto, apesar de serem relativamente simples as bases do modelo de gestão e
organização orientado pela racionalidade comunicativa, na prática, este não se estabelece de forma
tão fácil. Ao contrário, é enorme o desafio para o gestor implantar esta nova referência,
especialmente por que ele é condicionado a viver sob a pressão do resultado, o que faz com que a
ação estratégica seja uma opção muito mais interessante no curto prazo. Contudo, se desejamos
realmente desenvolver sistemas de gestão éticos e que permitam a emancipação das pessoas
sujeitas a estes sistemas, a orientação racional-instrumental destes sistemas deve ser repensado
(VIZEU, 2009).
Cabe ressaltar que a tese de Habermas e seus estudos relacionados ao uso da linguagem,
são voltados a construção de uma teoria crítica da sociedade e neste contexto a linguagem é
entendida enquanto mediadora das relações sociais. Aqui, o que se objetiva é minimamente
discernir sobre o que destes estudos habermasianos poderiam contribuir à Ciência da Informação
e na construção de repositórios para que esta, por sua vez, pudesse agregar a suas teorias e práticas,
concepções que lhe permitissem pensar e agir com a informação e as técnicas processuais em
contextos interativos e de comunicação. Para Habermas a interação comunicativa tem uma
natureza essencialmente cooperativa e existiriam, conforme o autor, quatro condições que
compõem uma situação ideal de discurso, sendo elas a sinceridade, a veracidade, a inteligibilidade
e a justificabilidade (GRACIOSO, 2010).
4 REPOSITÓRIOS INSTITUCIONAIS: DISCURSO E MEDIAÇÃO
A preocupação com a criação de dispositivos que armazenem e, ao mesmo tempo, garantam
o acesso a informação na sua mais variada tipologia, é uma crescente nos dias de hoje. Nesse
contexto, o RIDI se mostra como uma ferramenta de grandes potencialidades para auxiliar nesta
questão. Tomaél e Silva (2007) afirmam que data de 2002 o desenvolvimento dos repositórios
institucionais como uma estratégia apropriada pelas Universidades para assumir o papel de
editoras, facilitando a disseminação da produção científica no formato digital.
Deste modo os repositórios digitais são entendidos como:
[...] bases de dados online que reúnem de maneira organizada a produção científica de
uma instituição ou área temática. Os RDs armazenam arquivos de diversos formatos.
Ainda, resultam em uma série de benefícios tanto para os pesquisadores quanto às
instituições ou sociedades científicas, proporcionam maior visibilidade aos resultados de
pesquisas e possibilitam a preservação da memória científica de sua instituição. Os RDs
podem ser institucionais ou temáticos. Os repositórios institucionais lidam com a
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[121]
produção científica de uma determinada instituição. Os repositórios temáticos com a
produção científica de uma determinada área, sem limites institucionais. (IBICT, 2015).
Estes repositórios mostram-se ferramentas valiosas para arquivos correntes e
intermediários, arquivos permanentes, bibliotecas digitais, acervos de obras de arte digitais e
curadorias de dados digitais de pesquisa (BRASIL, 2014).
O RIDI, especificamente, possibilita o gerenciamento de diferentes formatos digitais “[...]
para coletar, preservar, indexar e distribuir os itens digitais de ambientes acadêmicos
(departamentos, laboratórios, centros, escolas, programas). ” (BLATTMANN; WEBER, 2008, p.
467).
Por ser um sistema que adota o protocolo da Iniciativa de Arquivos Abertos (Open Archives
Initiative Protocol for Metadata Harvesting – OAI-PMH), o Dspace (já mencionado no item 2)
transfere a responsabilidade e os custos das atividades de arquivamento e publicação as instituições
que o adota. Ao refletirem sobre a implementação de repositórios digitais Blattman e Weber (2008)
apontam dez itens que devem ser levados em consideração: definições das políticas internas e
externas do repositório, identificação da massa documental, auto arquivamento, disponibilização
do conteúdo na internet, utilização de protocolos internacionais (como o OAI-PMH e Dublin
Core), estimulação do trabalho colaborativo, preservação do conteúdo digital, recuperação da
informação, acessibilidade e o aumento da visibilidade internacional a produção contida no
repositório, para as autoras estes seriam os pontos que necessitariam de mais atenção para a
implementação de repositórios, acrescentamos a essa lista a questão da customização do software
adotado, nesse quesito o Dspace se apresenta como uma das melhores plataformas de acesso aberto
disponíveis hoje.
O Conselho Nacional de Arquivo (CONARQ) no uso de suas atribuições cria a Resolução
nº 39, de 29 de abril de 2014, que:
Estabelece diretrizes para a implementação de repositórios digitais confiáveis para a
transferência e recolhimento de documentos arquivísticos digitais para instituições
arquivísticas dos órgãos e entidades integrantes do Sistema Nacional de Arquivos –
SINAR. (BRASIL, 2014).
Ao consultarmos a literatura sobre os repositórios digitais, observamos que ela aborda
muitos assuntos diferentes, como a implementação, preservação digital, ambientes de
aprendizagem, confiabilidade, organização da informação dentre outros assuntos, porém, é
observável que a produção sobre a temática adota um enfoque tecnicista, a própria resolução do
CONARQ aqui citada é um exemplo disso, onde os aspectos técnicos e tecnológicos sobrepõem-
se aos aspectos sociais. Contudo, a experiência tem nos mostrado que apenas focar nos aspectos
técnicos não é o suficiente e como reposta a isso temos, cada vez mais, fortes os movimentos de
humanização das organizações.
É preciso focar nos processos de mediação, aqui entendida como “Processo de interlocução
ou interação entre os membros de uma comunidade, pelo qual se estabelece, alimentam ou
restabelecem laços de sociabilidade, constituindo assim o mundo da vida. ” (RODRIGUES, 2000,
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[122]
p. 84). Dessa forma, o discurso e a mediação podem ser apropriados como dispositivos para a (re)
construção dos repositórios digitais, criando um ambiente conversacional propício não apenas para
a implementação dos repositórios, mas para a contínua alimentação dos mesmos.
Tomaél e Silva (2007) ilustram a importância dos processos de mediação quando afirma
que a elaboração de qualquer política de informação, em qualquer esfera que seja, necessita a
participação de todos os envolvidos, porque sem um consenso geral sobre os princípios e diretrizes
de quem faz o quê, como e quando, não se pode criar fundamentos para a construção da
autossuficiência informacional, se não existe meios para resolver as divergências (mediação) a
maior parte da energia será desviada para conflitos internos em vez de ser direcionada para lidar
com os desafios externos.
Vizeu (2005) afirma que a adoção da TAC tem sido crescente nos estudos organizacionais,
desta forma, a criação de um ambiente conversacional mostra-se como uma forma de otimizar a
implementação dos repositórios digitais, que precisa de abordagem que consigam dar conta da
complexidade inerente aos fenômenos sociais, a TAC, nesse contexto, é utilizada para criar bases
teóricas para a construção de formas contrárias ao modelo tradicional de gerência, um modelo
baseado numa abordagem discursiva.
A implementação dos repositórios digitais tem sido pautada, até agora, numa razão
instrumental, que objetiva uma desnaturalização da condição humana, agindo de forma
dominadora (VIZEU, 2005), o que significa que na prática os repositórios são desenvolvidos,
assim como as próprias políticas dos repositórios, sem que haja um diálogo com as pessoas
responsáveis pela manutenção do mesmo ou seus usuários, o que pode gerar um súbito de
animação por parte das instituições que, infelizmente, não dura muito, transformando os
repositórios em mais uma ferramenta digital que caí rapidamente no desuso.
Neste momento voltamos nosso olhar para a TAC como um dispositivo de mediação,
criando de um ambiente conversacional onde os integrantes ocupam uma posição de igualdade,
que estimula uma construção coletiva evolvendo vários setores da organização, o que resolveria,
por exemplo, o problema da continuidade na alimentação dos repositórios.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
De uma forma geral, para o cumprimento das políticas na Instituição, estabelecerá
mecanismos de estímulo, assim como ações de integração que possibilitem evitar duplicações de
esforços. Além disso, a implementação de políticas poderá suscitar a elaboração, discussão,
regulamentação e estabelecimento de normas e mecanismos específicos de forma a garantir a plena
alimentação do repositório institucional e, por conseguinte, a preservação da produção científica
institucional (KURAMOTO, 2009).
Os repositórios institucionais são serviços vinculados organicamente aos seus ambientes
institucionais; são cumulativos e persistentes e, portanto, têm compromissos fortes com a formação
da memória digital acadêmica, com a preservação de longo prazo de materiais de valor contínuo e
com os movimentos de livre acesso. Para tal, esses repositórios têm como base tecnológica
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[123]
sistemas abertos e interoperáveis e aderência aos padrões das áreas de Biblioteconomia,
Arquivologia, Ciência da Informação e Tecnologia da Informação (MARCONDES, SAYÃO,
2009). Os respectivos profissionais dessas áreas têm o papel de estar atuante na rede de equipe, a
todo o momento o diálogo comum entre eles, sem que haja distorção entre o discurso intelectual e
do conhecimento prático de cada um. Ressaltamos a necessidade de se pensar a questão, a partir
de um ponto de vista discursivo, fugindo de uma visão tecnicista, que tem se mostrado falha a
longo prazo.
Acentuamos que o tratamento horizontal é o diferencial e requisito crucial para as
Instiutições/Organizações operar sobre estruturas vantajosas e adaptativas. Onde se pode construir,
praticar e experienciar a discursividade. Desempenhando um conjunto de prioridades para os
processos organizacionais sob o olhar humanísticos e registrando e agindo nos estudos para a
aplicação de métodos experimentais.
Pesquisas relacionadas aos repositórios têm se mostrado um extenso campo de exploração
dentre variadas investigações específicas. Relacionar esses campos com o modelo teórico e
discursos crítico de Habermas multiplica o campo de estudos. Portanto, inicialmente, sugere-se
então, como novo tema o de investigar os potenciais das tecnologias da informação, na teoria da
ação comunicativa. Num enfoque participativo e crítico dos padrões de softwares em repositórios
digitais.
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COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
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Cap
ítulo
8 UMA ABORDAGEM HABERMASEANA PARA OTIMIZAR O DESENVOLVIMENTO DE ORGANIZAÇÕES: O CASO DA BIBLIOTECA DIGITAL DE TESES E DISSERTAÇÕES BRASILEIRA
Bruna Carla Muniz Cajé
Clóvis Ricardo Montenegro de Lima
Marcia Heloísa Tavares de Figueredo Lima
_____________________________________________________________________
Resumo: Propõe uma releitura da história da BDTD e da Portaria n. 13, da Capes, com base na
proposta da democracia radial habermaseana, na qual os concernidos devem ser chamados a deliberar
coletivamente sobre os fins a serem atingidos e os meios de atingir os fins coletivamente deliberados.
_____________________________________________________________________________
1 INTRODUÇÃO13
“Qualquer potencial de liberdades comunicativas, imprescindíveis em todo Estado
democrático de Direito, disposto a garantir efetivamente liberdades subjetivas iguais, traz em
seu bojo certos germes anárquicos” (HABERMAS, 1996, v. 1, p. 11)
Este artigo tem o objetivo anárquico, no sentido habermaseano, de refletir sobre a questão da
adesão às normas no âmbito das organizações públicas através do destaque aos procedimentos
cooperativos nas organizações governamentais, utilizando como exemplo a Portaria n. 13 de 2006 da
CAPES que institucionaliza a obrigatoriedade de disponibilização das dissertações e teses em
plataformas eletrônicas e a Biblioteca Digital de Teses e Dissertações (BDTD), um trabalho
cooperativo institucionalizado, historicamente anterior a este ato normativo. Analisar um conjunto
normativo destinado a reger políticas de formação de uma coleção digital com fins específicos é, para
nós, parafraseando Pinzani, "somente um exemplo concreto de como seria possível esse resgate da
dimensão democrática" (2012, p. XII).
13 Parte desta comunicação foi originalmente preparada para introdução de dissertação de mestrado de CAJÉ (2014).
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[128]
Os cursos de pós-graduação stricto sensu, mestrado e doutorado, visam capacitar professores
para o ensino superior e formar pesquisadores e/ou profissionais de alta qualidade em vários níveis.
As dissertações14 e teses15, trabalhos de conclusão destas modalidades de estudo continuado,
são documentos produzidos como um testemunho escrito que têm o objetivo específico de referendar
e garantir a entrada de um indivíduo como membro de uma “comunidade científica” após a aprovação
por seus pares. Teses de doutorado e dissertações de mestrado são documentos que fundamentam um
fato histórico – científico, e por não contarem com um sistema de publicação comercial, são
consideradas como "literatura cinzenta" ou não convencional (CAMPELLO, 2000; ALMEIDA,
2000).
Por outro lado, o conjunto das dissertações e teses apresentadas como produtos finais de cursos
de mestrado e doutorado são documentos comprobatórios das atividades fins destes cursos,
correspondendo ao critério que pode classificá-las como documentos arquivísticos, motivo pelo qual
estão elencados como documentos de guarda permanente pela Portaria n° 92 de 2011 do Arquivo
Nacional.
Este conjunto documental lança desafios em nível macro de gerenciamento da produção
científica e tecnológica do país, afetando, simultaneamente,o nível micro das organizações como os
institutos de pesquisa e as universidades. A necessidade de originalidade destes documentos, por um
lado e a necessidade de avaliação de políticas públicas de financiamento da pesquisa, por outro, são
fatores que justificam a demanda de um sistema de gestão da informação sobre teses e dissertações
em nível nacional. Neste sentido, a BDTD pareceria ser um projeto cooperativo ideal para a
implantação fáctica desse sistema, como argumentaremos adiante.
As seguintes questões são as bases deste artigo: como as instituições cumprem a normativa
instituída pela Portaria 13/2006 da CAPES? A BDTD seria o sistema cooperativo ideal para o
gerenciamento dos produtos intelectuais dos cursos de mestrado e doutorado? Onde está a força do
bom argumento cooperativo para a (re) construção cooperativa de uma fonte de informação que tem
a função prática de fonte de informação, assim como fonte de memória do investimento brasileiro em
pesquisa e, ainda deveria ser um fundamental instrumento de gestão desses investimentos públicos
em pesquisa? Neste sentido, nossa proposta é refletir em termos habermaseanos sobre as tensões da
adesão cooperativa à BDTD.
A tese central deste artigo é que há uma tensão entre as normas existentes - criadas sob a lógica
burocrática-estatal weberiana - e a necessária ancoragem social na convicção cooperativa dos atores
concernidos na gestão de um sistema de controle bibliográfico de teses e dissertações, o que seria
fundamental para dar visibilidade ao núcleo de produção científica comprobatória do sistema
educacional (em nível de pós graduação stricto sensu) de pesquisa brasileiro, fornecendo indicadores
14Dissertação - documento que apresenta o resultado de um trabalho experimental ou exposição de um estudo científico
retrospectivo, de tema único e bem delimitado em sua extensão, com o objetivo de reunir, analisar e interpretar informações.
Deve evidenciar o conhecimento de literatura existente sobre o assunto e a capacidade de sistematização do candidato. É
feito sob a coordenação de um orientador (doutor), visando a obtenção do título de mestre (NBR 14724/ 2011). 15Tese - documento que apresenta o resultado de um trabalho experimental ou exposição de um estudo científico de tema
único e bem delimitado. Deve ser elaborado com base em investigação original, constituindo-se em real contribuição para
a especialidade em questão. É feito sob a coordenação de um orientador (doutor) e visa a obtenção do título de doutor, ou
similar (NBR 14724/ 2011).
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[129]
para gestão e avaliação dos programas e políticas públicas afinadas comas necessidades da população
brasileira, melhor investimento das agências de fomento, estudos de comunicação científica e
avaliações epistemológicas em domínios regionalizados do saber.
No caso em análise, nos interessou examinar particularmente as condições de possibilidade de
estruturação de normas infra-legais afeitas à questão de padrões bibliotecários (e arquivísticos) para
registro, controle e disseminação de teses e dissertações via o trabalho de cooperação entre
bibliotecários, atores sociais que são herdeiros de uma prática cooperativa histórica, se comunicam
em igualdade de situações educacionais e que possuem um minimum de informações compartilhadas,
pressupostos do entendimento racional entre sujeitos habermaseanos decididos a cooperar para a boa
realização de um evento no sistema educacional e de pesquisa do país.
Inobstante a existência da Portaria n°13, da CAPES,e a Portaria n° 92, do Arquivo Nacional,
ainda em 2015, faltam diretrizes, políticas e normas que regulamentem as rotinas necessárias ao
processo de depósito legal nas IFES, o que acarreta problemas na sistematização da preservação e
acesso às teses e dissertações ocasionados pela falta de políticas nacionais que normalizem tais
processos. A falta de padrão nas práticas de depósito das teses e dissertações, dificulta a preservação
e acesso aos seus conteúdos. Sendo assim, a produção fica dispersa, o que prejudica a comunicação
científica, a gestão estatal e a visibilidade organizacional das instituições de ensino e pesquisa ligadas
ao ensino de pós-graduação, uma vez que o acesso a esses conteúdos carece da confiança na
completude dos acervos tanto para o suporte às pesquisas subsequentes, como suporte para aferição
da aplicação de recursos públicos.
No intuito de elencar questões sobre e propor soluções para as dificuldades de adesão
cooperativa ao trabalho de coleta de dados e disponibilização digital da BDTD, essa comunicação
consiste das seguintes seções: na seção dois, apresenta-se a proposta da teoria do agir comunicativo
para a decisão coletiva conduzida por Habermas; na seção três o histórico da questão da
responsabilidade sobre os acervos de teses e dissertações; na seção quatro, descreve-se e apontam-se
algumas questões sobre a Portaria nº13/2006 da CAPES e, por fim, na seção 5, as considerações finais,
sempre provisórias em um documento que pretende ser uma pauta para a continuidade das discussões
em torno do trabalho cooperativo de construção de infraestruturas de informação.
2 A FACTICIDADE DAS NORMAS VIA TEORIA DO AGIR COMUNICATIVO
Em "Direito e Democracia", Habermas (1996) parte da convicção de que liberdades
comunicativas são imprescindíveis em toda realização cooperativa da auto-organização coletiva na
qual os próprios participantes precisam entender-se preliminarmente (v.1, p. 12). Toda uma teoria da
ação coletiva é derivada de uma correlata e anterior teoria (e uma ética) do discurso. Propõe uma
teoria reconstrutiva da sociedade pautada na razão comunicativa e na ética do discurso o que demarca
um respeito otimista pelas virtudes da normatividade que serve como "fio condutor para a
reconstrução do emaranhado de discursos formadores de opinião e preparadores da decisão, na qual
está embutido o poder democrático exercido conforme o Direito" (p. 21). Neste sentido, na perspectiva
da teoria crítica, incorporando princípios da pragmática do discurso, Habermas parte do pressuposto
de linguagens mediadoras entre conflitos e interesses, apostando na possibilidade de negociação e
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[130]
propõe a razão comunicativa para analisar a força social da normatividade em todas as esferas do
social em que haja o potencial conflito de pontos de vista.
Habermas, partindo da concordância com um projeto de sociedade progressivamente racional
weberiano, vê uma função social integradora do Direito - e das normas obtidas por consenso racional
e argumentado entre os participantes do discurso - e não o reduz a um mero nexo formal com a
dominação burocrático-estatal imposta por uma racionalidade de divisão do poder weberiano. Se para
Weber, a progressiva racionalização da sociedade repousa na construção racional da burocracia
moderna e no monopólio estatal da violência, para Habermas as normas obtêm sua validade por via
da legitimidade na representação (legitimamente delegada) e possuem força estabilizadora do trabalho
coletivo por meio da discussão racional das normas no sistema jurídico, capaz, para ele, de domesticar
os sistemas econômico e político.Habermas destaca a eficácia social das práticas jurídicas existentes.
Os dois volumes de Direito e Democracia são uma defesa contundente do poder domesticador do
Direito nas sociedades capitalistas. "Toda ordem normativa tem um componente de agir orientado por
interesses" (Habermas, 1996, v. 1, p. 45; Habermas, 2012, p. 46 apud Pinzani, 2012, p. XX). Nos
estados contemporâneos laicos, a garantia de obediência às normas tem que ser mantida na convicção
da produção procedimental coletiva discursiva das normas fundamentada em recíprocos direitos
humanos que garantam a dignidade de todos os concernidos.
A razão comunicativa, para Habermas, é derivada da linguagem ou medium linguístico que é
a principal condição de possibilidade para a estruturação da vida social via ações de entendimento,
interações e interligações. Todos podem na honesta tentativa de entender-se com o outro, adotar
enfoques performativo e aceitar determinados pressupostos como: procurar atingir fins
ilocucionários16; apresentar pretensões de validade criticáveis e simétricas em relação aos outros
participantes; reconhecer os melhores argumentos racionais para buscar a concordância sobre os
objetos da discussão e os métodos para chegar aos fins propostos; ter o propósito de aceitar as
obrigações decorrentes do consenso assim obtido. A razão comunicativa é uma forma de obter essas
regras via uma construção conjunta, orientada pela busca do entendimento (p. 20). O “ter que” obtido
em uma discussão não é o mesmo que uma coerção ou regra de ação, mas uma “coerção transcendental
fraca derivada da validade deontológica de um mandamento moral, da validade axiológica de uma
constelação de valores preferidos ou da eficácia empírica de uma regra técnica” (p. 20-21).
Habermas leva em conta as críticas de correntes sociológicas puramente normativistas, como
as puramente objetivistas - contra esta dicotomia reconhece a capacidade estabilizadora das normas
nas relações entre atores concernidos que partem das virtudes da racionalidade posta em discurso - a
força dos melhores argumentos para nós que aqui estamos assim pactuamos quanto aos melhores
argumentos apresentados às nossas simétricas pretensões de validade, uma norma que sirva para
orientar nossa ação aqui e mais adiante (quanto a questões no mundo social). Sinaliza que questões
tradicionais do mundo da vida postas em discurso e submetendo-se ao crivo da razão comunicativa
perdem sua roupagem subjetivista. Assim perguntas clássicas da filosofia como "o que é bom para
mim, ou o que devo fazer" (a busca da felicidade, os contrapesos éticos), colocadas em discurso
16O ato ilocucionário realiza uma ação pelo dizer algo a alguém num contexto, realiza-se através de atos de fala de
afirmação, de promessa, de ordem, de pedido.
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[131]
transforma-se, via razão comunicativa em "o que é bom para nós, o que devemos fazer". A razão
comunicativa assume assim princípios da ética do discurso apta a propor o consentimento dos
concernidos que desejam agir coletivamente.
[...]como ninguém dispõe diretamente das condições de validade que não sejam interpretações,
a validade tem que ser entendida epistemicamente como validade que se mostra para nós (v.
1, p. 32).
Neste sentido, Habermas recorre aos estudos de Peirce sobre a "comunidade comunicativa de
pesquisadores" (1996, v,1, p, 33), cujo modelo ideal deve transcender o espaço-tempo da própria
discussão para obter validade veritativa. Ainda que Peirce tenha feito assertivas para uma comunidade
de pesquisadores, uma comunidade particular de intérpretes, uma "república de eruditos" que busca
cooperativamente a verdade científica, tais assertivas são válidas mutati mutantis para as
comunicações orientadas por pretensões de verdade no dia a dia.
Do mesmo modo que para Peirce a prática da argumentação é ineludável da prática científica
(HABERMAS, 1996, v. 1, p. 34), a prática da discussão racional é constituinte dos trabalhos
cooperativos. Atos de fala são imprescindíveis para uma teoria da ação: o entendimento linguístico é
um mecanismo de coordenação da ação. Atores sociais que estão dispostos a entenderem-se
preliminarmente para atuarem juntos, segundo Habermas, também tem predisposição para acatarem
normas legítimas. O direito positivo - o conjunto de normas legais e legítimas-, nesta visão, assume
uma peculiar força estabilizadora na integração social (HABERMAS, 1996, v.1, p. 35).
O agir comunicativo tem como base o fato de considerar a linguagem orientada pelo
entendimento como fonte primária da integração social não violenta. Nessa visão, todo ato de fala tem
como uma de suas características principais reconhecer a possibilidade de um enunciado com
pretensão de validade ser criticável intersubjetivamente e, ao mesmo tempo, resgatável via um
entendimento racional. Outra característica é a de o sujeito envolvido desejar entender-se com o outro
sobre algo no mundo, mobilizando ambos, as energias da linguagem como possibilitadoras da
coordenação de planos de ação (HABERMAS, 1996, p.36). Os atos de fala construídos em termos de
argumentos que se postulam perante um auditório da comunidade de interpretação ilimitada têm que
ser justificados e aceitáveis racionalmente (idem, p 37).
A construção de um sistema normativo "vive da necessidade de redefinir ou reafirmar a
validade das pretensões de justiça elaboradas nos discursos jurídicos e políticos" (PINZANI, 2012, p.
XV). Um primeiro problema de tensão entre facticidade e validade de normas obtidas via ações de
fala voltadas ao entendimento diz respeito à linguagem de participantes que desejam entender-se: o
medium linguístico tem que ser comum, ou, pelo menos, traduzível, mesmo que, aparentemente
desrespeite as regras gramaticais de uma linguagem científica, ou padrão culto. Este primeiro nível
de tensão tem que ser superado pelos próprios participantes (HABERMAS, 1996, v. 1, p. 38). Um
segundo nível de tensão diz respeito ao reconhecimento mútuo da própria possibilidade de
discordância:
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[132]
Todo acordo obtido comunicativamente e que torna possível a coordenação de ações, bem
como a estrutura complexa de interações e a interligação de sequências de ações mede-se
pelo reconhecimento intersubjetivo de pretensões criticáveis (HABERMAS, 1996,p. 38-39).
Toda socialização é permeada por uma instabilidade que é constituinte, por isso não existe um
contexto zero para acordos capazes de coordenar a ação: as proposições contrafactuais sempre são
possíveis e devem ser esperadas pelos participantes da discussão: as pretensões de validade das
proposições em quaisquer tentativas de entendimento estão permanentemente ameaçadas pelo risco
do dissenso. Por outro lado, atores dispostos a agir em conjunto sabem que o preço a ser pago pelo
dissenso é alto. As poucas saídas para “resolver” o dissenso são: simples consertos, o recorrer a
discursos mais pretensiosos, a desconsideração de pretensões controversas, a quebra da comunicação
e a saída do campo, e finalmente a mudança para o agir estratégico orientado para o sucesso de cada
um.
A favor da possibilidade de um agir comunicacional orientado para o entendimento há, na
opinião de Habermas, um amplo horizonte de convicções comuns não problemáticas que se alimentam
em fontes de algo que sempre foi familiar, um amplo conjunto de lealdades, habilidades e padrões de
interpretação consentidos (HABERMAS, 1996, v. 1, p. 40).
O lugar teórico do agir comunicativo situado entre o discurso e o mundo da vida [...] O mundo
da vida forma o horizonte para situações de fala e constitui, ao mesmo tempo, a forma das
interpretações, reproduzindo-se somente através das ações comunicativas. (HABERMAS,
1996, v. 1, p. 40-41).
Essa certeza latente e imperceptível do pano de fundo que é o mundo da vida, que torna
possível o agir comunicativo, é uma forma condensada de saber e de poder, dos quais nós nos servimos
inconscientemente, por vezes, com caráter de certeza absoluta. Esse saber só se torna potencialmente
criticável quando proferido e tematizado em situações sociais de fala - isto é, posto em discurso.
Enquanto convicção pessoal não exposta ao outro, às vezes em um confronto decepcionante com a
realidade (HABERMAS, 1996, v. 1,p. 42), a se estabiliza como saber implícito e tem a força de uma
ideia arraigada que nivela a tensão entre facticidade e validade (HABERMAS, 1996, v. 1, p. 41) com
base em argumentos "sempre fizemos assim"," isto é necessário", ou "isto é bom, isto é útil". Portanto,
um passo fundamental na reconstrução de um modo legal e legítimo de agir é a substituição das
certezas do mundo da vida pela exposição e problematização pública das convicções
comunicacionalmente (HABERMAS, 1996, v. 1, p. 44).
Toda uma proposta e uma teoria reconstrutiva das normas repousam sobre esta percepção:
normas são legítimas porque produzidas segundo uma ética discursiva. Há demanda de algum setor,
órgãos weberianamente construídos sob a noção de organização burocrática de estado reúnem-se em
comissões e estatuem normas para coordenar a ação cooperativa de atores sociais via experts ou
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[133]
diretamente concernidos para articularem ações coletivas para atingirem fins sociais bons para nós e
para os outros. A legitimidade das normas é percebida tanto quanto aos fins que deseja atingir quanto
aos meios como são produzidas.
Mais recentemente, examinando a questão supranacional de coordenação de ação e da vontade
para a construção da Comunidade Europeia, Habermas examina e critica os dilemas da que, segundo
uma linha cética e crítica à qual ele endossa, vem se afastando progressivamente dos anseios populares
e da opinião pública ao assumir discursos econômicos de desregulamentação e privatização como
necessários, inelutáveis, uma espécie de "federalismo executivo" que deixa à União Europeia as
opções: ou "consegue incluir mais os cidadãos nos processos decisórios ou se submeterá cada vez
mais a um governo tecnocrático sem controle democrático" (Pinzani, 2012, p. XXI).
Ora, o surgimento de uma entidade política supranacional levanta vários problemas
nesse sentido, já que no âmbito de instituições internacionais (e isso vale não somente para a
UE, mas também para as Nações Unidas) as decisões são tomadas sem que haja o mesmo
nível de participação popular existente no processo decisório doméstico. Isso implica em uma
queda do nível de legitimação.
Na leitura de Pinzani (2012, p. XXII), Habermas identifica um deficit na legitimidade
democrática na construção da unidade europeia, que seria resolvido, "incluindo decididamente os
cidadãos".
Aprofundando a análise de Habermas, Pinzani sintetiza Direito e Democracia como uma
proposta de solidariedade (Pinzani, 2012 p. XXVII): "um recurso fundamental para a subsistência de
uma comunidade política estável e coesa", o que dependeria de processos de aprendizagem, estágio
que, decididamente, os bibliotecários concernidos na concepção da BDTD, já ultrapassaram.
Dada esta introdução sobre os benefícios da ação coordenada pelo entendimento, passemos ao
exame de alguns aspectos históricos e legislativos da BDTD e um questionamento sobre a quantas
andaria a legitimidade dos processos decisórios atinentes a um trabalho que teve raiz cooperativa, mas
que se afasta cada vez mais da fonte de legitimação no espírito cooperativo dos bibliotecários.
3 ASPECTOS HISTÓRICO-LEGISLATIVOS SOBRE OS ACERVOS DE TESES E
DISSERTAÇÕES
As primeiras iniciativas para regulamentação dos cursos de pós-graduação no Brasil ocorreram
no início da década de 1950. Quando a pós-graduação foi institucionalizada no Brasil,em 1965,
praticamente não existia preocupação com o controle bibliográfico das teses e dissertações, o que, em
consequência, gerava também dificuldades no acesso às mesmas. Após a regulamentação dos cursos
de pós-graduação, em meados da década de 1960, começaram a surgir, de forma restrita, iniciativas
para o controle bibliográfico daqueles documentos, a partir de tentativas isoladas de catálogos e
bibliografias que as relacionavam (CAMPELLO; CALDEIRA, 1977). Dessa forma, os pesquisadores
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[134]
careciam de instrumentos que lhes permitissem conhecimento e acesso à produção técnico-científica
de seus pares, além dos inequívocos riscos de duplicação de financiamentos e o risco das querelas em
torno da primazia da pesquisa.
Na década de 1970, como alternativa para garantir o controle bibliográfico das teses e
dissertações, a Biblioteca Nacional ficou responsável pelo depósito legal desses documentos.
Durante o VIII Seminário Nacional de Bibliotecas Universitárias (SNBU)17, houve consenso e
foi decidido o compartilhamento de responsabilidades, com base nos pressupostos do trabalho
cooperativo em rede, de certo modo uma tradição nos serviços bibliotecários, que as instituições de
ensino superior passariam a ser responsáveis pela guarda da produção de teses e dissertações nelas
produzidas sem, contudo, especificar diretrizes que orientassem e padronizassem procedimentos. Em
uma primeira fase, esta decisão gerou uma sobreposição de responsabilidades, pois entendia-se que a
Biblioteca Nacional era a responsável pelo depósito legal de toda a produção intelectual escrita
brasileira. Dez anos depois, em 2004, a Lei n° 10.994,a nova Lei do Depósito Legal, retiraria a
Biblioteca Nacional desse processo ao determinar que somente materiais impressos para distribuição
ou venda passariam a ser captados pelo depósito legal.
A Portaria da CAPES nº 13, de 15 de fevereiro de 2006, instituiu a obrigatoriedade de
divulgação digital das teses e dissertações produzidas pelos programas de pós-graduação nacionais,
como um dos requisitos para sua avaliação. Posteriormente, a Tabela de Temporalidade de
Documentos de Arquivo Relativo às Atividades-fim das Instituições Federais de Ensino Superior –
IFES, aprovada pela Portaria n° 092/2011 de 23 de setembro de 2011, do Arquivo Nacional, determina
que as teses e dissertações são documentos de guarda permanente sob o código 134.33418. Mais
recentemente a Portaria MEC nº 1.261, de 23 de dezembro de 2013, determina que esta Tabela é de
uso obrigatório nas IFES.
A Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD) é uma iniciativa do IBICT em
colaboração com instituições de ensino superior e pesquisa brasileira, que visa integrar os sistemas de
informação de teses e dissertações dessas instituições. Tem por objetivo estimular a publicação e o
registro das teses e dissertações brasileiras em meio eletrônico, bem como, promover a visibilidade da
produção acadêmica e científica nacional (IBICT, 2009).
A BDTD, com o apoio da Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP), foi desenvolvida no
âmbito do programa da Biblioteca Digital Brasileira (BDB).Tal projeto objetivaintegrar em um único
portal os mais significativos repositórios de informação digital, permitindo consultas simultâneas e
unificadas aos conteúdos informacionais destes acervos (IBICT, 2009).
Em meados da década de 1990, o IBICT elaborou um sistema cooperativo que integrava em
uma única base de dados referências bibliográficas de teses e dissertações. Os dados desse sistema
eram oriundos de 17 IES, e contava com cerca de 120 mil registros em 1995. Embora a iniciativa
17VIII SNBU - Integração e compartilhamento. Universidade de Campinas (UNICAMP), Campinas, 1994. 18Tabela de Temporalidade de Documentos de Arquivo Relativo às Atividades-fim das Instituições Federais de
Ensino Superior – IFES. Disponível em:
<http://www.siga.arquivonacional.gov.br/media/ifes_codigo_e_tabela_temporalidade/portaria_n0922011_tabela_de_tem
poralidade_e_destinao.pdf>
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[135]
tivesse importância reconhecida, sua abrangência era limitada, por tratar-se apenas da descrição
bibliográfica dos documentos (IBICT, 2009).
Para ter acesso à versão integral dos documentos, os pesquisadores deveriam consultar
pessoalmente os acervos físicos das instituições, nem sempre uma opção viável, dadas às dimensões
continentais do país. Havia a possibilidade de solicitação dos documentos através do serviço de
comutação bibliográfica (COMUT), também coordenado pelo IBICT, oferecido pelas bibliotecas
universitárias em todo o país, o que também consistia em uma opção onerosa e lenta, por depender de
pagamento de taxas de reprodução e postagem.
Na virada dos anos 2000, a publicação eletrônica de documento foi viabilizada com o
desenvolvimento das tecnologias de informação e comunicação (TICs). Dessa forma instituições
nacionais e internacionais estabeleceram ações para que textos completos desse tipo fossem
disponibilizados na rede de computadores (IBICT, 2009).
A meta passou a ser a disponibilização do texto integral. Visando seguir esta tendência
internacional, em janeiro de 2001, o IBICT formou um grupo de estudos, reunindo especialistas do
IBICT, Centro Latino-Americano e do Caribe de Informação em Ciências da Saúde – BIREME,
CNPq, USP, PUC-Rio, UFSC e contratando consultores, “para analisar questões tecnológicas e de
conteúdo relacionado com a publicação de teses e dissertações na Internet” (IBICT, 2009).
Essa iniciativa culminou na criação de um repositório nacional de teses e dissertações,
primeiramente denominado Biblioteca Digital de Teses e Dissertações, hoje, Biblioteca Digital
Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD). Na ocasião, a BDTD objetivava:
• estudar experiências existentes no Brasil e no exterior de desenvolvimento de bibliotecas
digitais de teses e dissertações;
• desenvolver, em cooperação com membros da comunidade, o modelo para o sistema;
• definir padrões de metadados e tecnologias a serem utilizadas pelo sistema;
• absorver e adaptar as tecnologias a serem utilizadas na implementação do modelo;
• desenvolver um sistema de publicação eletrônica de teses e dissertações para atender àquelas
instituições de ensino e pesquisa que não possuem sistema automatizado para implantar suas
bibliotecas digitais;
• difundir os padrões e tecnologias adotadas e dar assistência técnica aos potenciais parceiros
na implementação das mesmas (IBICT, 2009).
Neste sentido, em dezembro de 2001, um projeto-piloto foi desenvolvido para o qual três
universidades (USP, PUC-Rio e UFSC) enviaram amostras dos metadados das teses e dissertações
depositadas em seus servidores, seguindo o padrão de metadados estabelecido pelo grupo (MTD-BR).
Apesar da base de dados gerada apresentar erros de conversão de formatos, a mesma demonstrou “a
viabilidade da solução proposta e a consolidação do padrão nacional de metadados, denominado
Padrão Brasileiro de Metadados de Teses e Dissertações (MTD-BR)”. O padrão foi criado tendo como
base o padrão internacional Dublin Core (IBICT, 2009).
Meses depois, em abril de 2002, foi instalado um comitê técnico-consultivo (CTC), composto
por representantes do IBCT, do CNPq, do Ministério de Educação – MEC (Capes e Sesu), da FINEP
e das universidades que participaram do grupo de trabalho e do projeto-piloto (USP, PUC-Rio e
Universidade Federal de Santa Cataria – UFSC). O CTC é um colegiado responsável por “referendar
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[136]
o desenvolvimento da BDTD, assim como atuar na especificação de padrões a serem adotados no
âmbito do sistema da BDTD” (IBICT, 2009).
Em 25 de abril de 2002, durante reunião ocorrida no IBICT, foram apresentadas e discutidas
metas e ações futuras para o projeto da BDTD. Entre aquelas, foi discutida uma proposta que previa
incorporar a base de dados referenciais sobre teses e dissertações à base de dados de textos completos.
Nessa reunião, foi aprovado o estabelecimento do Consórcio Brasileiro de Teses de Dissertação,
composto por instituições de ensino e pesquisa que colaboram com o instituto, “integrando as duas
iniciativas – a do registro bibliográfico e a de publicação eletrônica de teses e dissertações – que
passou a ser o principal alimentador da BDTD” (IBICT, 2009).
Um ano após, em abril de 2003, foi concluída uma versão preliminar do Sistema de Publicação
Eletrônica de Teses e Dissertações (TEDE), sistema desenvolvido pelo IBICT, objetivando apoiar
instituições de ensino e pesquisa na implantação de bibliotecas digitais de teses e dissertações locais.
Para avaliar o sistema, o IBICT instituiu projetos-piloto em quatro universidades: Universidade
Federal Fluminense (UFF), Universidade Castelo Branco (UCB), Universidade de Brasília (UnB) e
Universidade Federal do Ceará (UFC). As experiências resultantes dos projetos-piloto subsidiaram
ações para a instituição do pacote em nível nacional. Foram lançadas alterações no sistema e uma
nova versão do padrão de metadados, o MTD2-BR (IBICT, 2009).
No mês seguinte, em 26 de maio de 2006, durante a quarta reunião do CTC, foi apresentado e
aprovado o projeto para a reestruturação do sistema BDTD (IBICT, 2009).
A estrutura utilizada, atualmente, pela BDTD é o do Open Access Iniciative (OAI)19 “e adota o
modelo baseado em padrões de interoperabilidade consolidado em uma rede distribuída de bibliotecas
digitais de teses e dissertações [...]” (IBICT, 2009).
Esse modelo conta com a existência dos provedores de dados (data providers) e dos provedores
de serviço (service providers). Os provedores de serviço “são instituições ou serviços de terceiros que
implementam os serviços com valor agregado a partir dos dados coletados junto aos [...] repositórios
digitais”. Os provedores de dados são os gestores dos repositórios digitais.
Na BDTD, o IBICT atua como provedor de serviços, “coletando metadados de teses e
dissertações dos provedores, fornecendo serviços de informação sobre esses metadados e expondo-os
para coleta por outros provedores de serviços [...]” (IBICT [s.d.]), enquanto as instituições de ensino
e pesquisa funcionam como provedores de dados.
4 A PORTARIA CAPES N°13,DE 15 DE FEVEREIRO DE 2006
O primeiro ato normativo a tratar especificamente do controle, da divulgação e da
disponibilização das teses e dissertações brasileiras foi a Portaria n° 13 de 15 de fevereiro de 2006,
da CAPES, que instituiu a obrigatoriedade da divulgação digital do texto integral deste documentos
produzidos pelos programas de doutorado e mestrado reconhecidos. Essa portaria foi desenvolvida
19O Movimento de Acesso Aberto surgiu em 1999, com a criação do Open Access Initiative (OAI), na Convenção de Santa
Fé, realizada no Novo México, em virtude da crise dos periódicos, iniciada em meados de 1980, devido à impossibilidade
das bibliotecas universitárias e de pesquisa de manutenção de suas coleções de periódicos. A principal meta do OAI é
contribuir para a transformação da comunicação científica (GUÉDON, 2006; KURAMOTO, 2006).
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[137]
levando em consideração as manifestações do Conselho Técnico-Científico da entidade em 2005,
“indicando que a produção científica discente é um relevante indicador da qualidade dos programas
de mestrado e doutorado, não aferível apenas através da publicação seletiva nos periódicos
especializados [...]” (BRASIL, 2006).
No entanto, apesar da portaria determinar a divulgação e o acesso às teses e dissertações, caráter
de trabalho cooperativo de coleta, preservação e disseminação deste tipo de acervo (literatura
cinzenta) ainda tem problemas. Algumas lacunas foram encontradas na portaria, o que dificulta sua
aplicação prática, e, portanto, o processo que ela institui. O artigo 1° determina que seja entregue uma
cópia impressa das teses e dissertações, sem definir, no entanto, o local onde estas devem ser entregues
-supõe-se as coordenações dos programas - e armazenadas - tipicamente documento de arquivo
previsto nas tabelas de temporalidade das IFES.
Art. 1º....
§1º Os programas de pós-graduação exigirão dos pós-graduandos, a entrega de teses e
dissertações em formato eletrônico, simultânea à apresentação em papel, para atender
ao disposto neste artigo.
§2º Os arquivos digitais disponibilizarão obrigatoriamente as teses e dissertações defendidas
a partir de março de 2006.
§3º A publicidade objeto deste artigo poderá ser assegurada mediante publicação através de
sítio digital indicado pela CAPES, quando o programa não dispuser de sítio próprio (BRASIL,
2006, grifo nosso).
O artigo 1° da portaria estabeleceu o prazo até 31 de dezembro de 2006 aos programas de
mestrado e doutorado para instalação e manutenção de arquivos digitais acessíveis ao público através
da internet que permitissem a divulgação das teses e dissertações defendidas a partir de março de
2006. Determinou, ainda, que os programas de pós-graduação exijam dali por diante a entrega das
teses e dissertações em formato eletrônico pelos alunos, bem como, a cópia impressa. Esse artigo
determina, também, que caso o programa não disponha de sítio próprio, a divulgação das teses e
dissertações poderá ser realizada através de publicação em sítio digital indicado pela CAPES.
É importante destacar que a Portaria determina que seja entregue uma cópia impressa das teses
e dissertações, sem definir, no entanto, a responsabilidade pela guarda e preservação destes
documentos. Este já se configura como um primeiro problema de ação coletiva dos concernidos no
processo de preservação e divulgação desses documentos. A natureza de documento comprobatório
das atividades fins dos cursos de pós-graduação e a enunciação deste em tabela de temporalidade
parece sintonizar todos os concernidos de que se tratam de documentos de natureza arquivística - de
caráter histórico e ademais comprobatório das atividades fins dos programas de pós-graduação.
O artigo 2° trata da avaliação dos programas de pós-graduação e ordena que a ausência de
depósito de alguma obra deve ser justificada, quando do envio de relatórios para avaliação e
acompanhamento do programa, desde que a mesma seja “motivada pela proteção de sigilo industrial
ou ético” (BRASIL, 2006).Destaca-se neste artigo o caráter mandatório cogente (de obrigatoriedade)
do depósito legal das teses e dissertações pelos mestrandos e doutorandos junto aos respectivos
programas.
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[138]
O artigo 3° aborda o acesso às teses e dissertações, e regulamenta que, para fins de avaliação e
acompanhamento dos programas de pós-graduação, “serão ponderados o volume e a qualidade das
teses e dissertações publicadas, além de dados confiáveis sobre a acessibilidade e possibilidade de
download” (BRASIL, 2006).
No artigo 4° está disposto que uma lista dos arquivos, ordenada por área do conhecimento, será
divulgada pela CAPES em seu sítio digital (BRASIL, 2006). A CAPES possui, em seu site, como um
de seus serviços o Banco de Teses, parte do Portal de Periódicos da CAPES/MEC, que objetiva
simplificar o acesso a teses e dissertações defendidas nos programas de pós-graduação brasileiros. As
ferramentas de busca permitem pesquisa por título, autor ou palavra-chave, e consulta a resumos de
teses e dissertações defendidas a partir de 1987.
O artigo 5° discorre sobre a obrigatoriedade da divulgação de teses e dissertações, determinando
que trabalhos financiados com verba pública, sejam através de bolsas de estudo ou por auxílios
concedidos ao Programa, devam obrigatoriamente ser apresentados aos membros da sociedade que
proporcionou sua realização. No entanto, a Portaria não apresenta como deve ser realizada a
divulgação de teses e dissertações com conteúdo sigiloso, entende-se o "sigiloso", no caso, como
aquelas produções que poderiam gerar patentes.
Enumerados os principais pontos normatizados sobre a questão do controle, disseminação e
divulgação de dissertações e teses no Brasil, propomos a seguir algumas reflexões sobre o problema,
conforme os estudos de Habermas.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Um ponto favorável à convocação dos concernidos é que o trabalho em redes de bibliotecas é
uma tradição para a Biblioteconomia brasileira: já há o fatum de uma sociabilidade a priori - comitês,
comissões de bibliotecários - o trabalho em rede, enfim - já é uma prática sócio-profissional
entranhada nas formas de agir destes atores.
O ponto que nos parece essencial no aqui exposto é a convocação dos concernidos no sentido
de estabelecerem um acordo normativo sobre responsabilidades de arquivamento do documento em
papel (os arquivos permanentes, dada à tipificação documental, as bibliotecas assumindo o papel de
depositárias de uma coleção permanente) e de plataforma eletrônica preferencial de divulgação dos
produtos dos programas de pós-graduação brasileiros.
Evidencia-se a necessidade de desenvolvimento de uma política nacional, que poderia ser
elaborada discursivamente pelos concernidos, com base na "substância norrnativa da dignidade
humana igual de cada um" (Habermas, p. 11 apud Pinzani, 2012, p. XIII): a Comissão Brasileira de
Bibliotecas Universitárias (CBBU), o IBICT que detém a expertise da BDTD, representantes dos
mestres e doutores, das associações de arquivos universitários para definir responsabilidades e
procedimentos quanto ao depósito legal e controle bibliográfico das teses e dissertações Essa política
permitiria a padronização dos processos de preservação e acesso à produção de teses e dissertações
nas IES brasileiras. A política permitiria, ainda, a melhor divulgação dos conteúdos das teses e
dissertações, o que possibilitaria acompanhar o desenvolvimento acadêmico dos programas de pós-
graduação, bem como, verificar os rumos da ciência, tecnologia e inovação no país.
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[139]
E tais pressupostos nos encorajam a afirmar que somente a radicalização habermaseana da
racionalidade posta em discurso - ou em discussão - somada à inclusão decisiva dos concernidos no
processo poderá modificar o patamar de cooperação solidária da BDTD.
"Ações aglutinadoras que permitem a integração social se fazem via o agir comunicativo"
(Habermas, 1996, v. 1, p. 45). Esta não deixa de ser uma visão anárquica sobre a BDTD.
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[142]
Cap
ítulo
9 UMA ABORDAGEM HUMANÍSTICA PARA O TRABALHO COM INFORMAÇÃO
Clovis R. Montenegro de Lima
Tirza Cardoso Ferreira Rodrigues Vargas
_____________________________________________________________________________
Resumo: Neste artigo apresentamos uma proposta de ação normativa do bibliotecário para
humanização das organizações. O trabalho desenvolvido hoje pelos bibliotecários reflete uma
especialização limitada para o mercado, e falta aos bibliotecários contemporâneos uma visão
humanista. Foram pesquisados os seguintes conceitos: os modos de produção do conhecimento
existentes e um novo modo de produção do conhecimento proposto chamado “modo de produção 3”;
e o artesanato organizacional. A partir daí idealizou-se um bibliotecário que age e engaja pessoas e
grupos em processos como busca e seleção de conteúdo, organização do trabalho e mediação de
conflitos na organização. A partir desses conceitos pretende-se aprofundar o estudo de um bibliotecário
com ações éticas normativas sob uma perspectiva discursiva, que cria argumentos que legitimam
decisões para ações coletivas e acordos práticos, além de promover uma reflexão de uma idealização
do bibliotecário como artesão da informação que poderá mudar o seu posicionamento na sociedade.
____________________________________________________________________________________
1 INTRODUÇÃO
Este artigo tem como objetivo principal apresentar uma proposta de ação normativa do
bibliotecário para humanização das organizações em que trabalha. Nesse contexto, serão apresentados:
o artesanato, o novo modo de produção do conhecimento como referência para ação dos bibliotecários
nas organizações; a ética do discurso como fundamento da ação do bibliotecário nas organizações e a
idealização de um bibliotecário que possui ações que são imprescindíveis dentro das organizações.
Uma das principais razões que motiva esse projeto é perceber que o trabalho desenvolvido hoje
pelos bibliotecários não reflete a especialização para qual a sociedade necessita, e a consequência desse
fato é a falta de bibliotecários contemporâneos com uma visão humanista. A má qualidade da formação
do bibliotecário ao longo dos anos originou profissionais poucos especializados e sem paixão pelo que
fazem.
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[143]
A contextualização do tema principal foi desenvolvida em torno de alguns pontos principais
que possivelmente contribuíram para a interpretação da proposta desse projeto: a) os modos de
produção do conhecimento existentes e um estudo desenvolvido pelo doutor e professor Harry
Kunneman, da Universidade da Holanda, sobre um novo modo de produção do conhecimento proposto
chamado “modo de produção 3”; b) o artesanato organizacional, conceito criado por Richard Sennet,
sociólogo e historiador norte-americano; c) a idealização de um bibliotecário que age
comunicativamente dentro do ponto de vista de uma ética discursiva, como engajador de pessoas,
grupos e processos como seleção, organização e mediação de conflitos na organização em que trabalha.
Este artigo também toma como base Estudos Humanísticos da Informação que visam
enriquecer as diferentes formas de produção de conhecimento (Modo 1 e Modo 2) e impulsionar a
dinâmica informacional com o Modo 3 de conhecimento, isto é, com recursos morais e insights
articulados nas culturas organizacionais e exercidas por profissionais no desenvolvimento real do
Modo 1 e Modo 2 do conhecimento tendo em vista promover uma vida significativa, apenas laços
sociais e uma sociedade mundial sustentável. (KUNEMMAN, 2015).
Espera-se com essa proposta que o bibliotecário tenha conhecimento e o entendimento que
aquele bibliotecário funcionalista dentro de um sistema que reduz a complexidade, formalista e
dependente de ferramentas e processos não é suficiente na sociedade contemporânea. Um bibliotecário
com ações éticas normativas sob uma perspectiva discursiva, que cria argumentos que legitimam
decisões para ações coletivas e acordos práticos, com entendimento de que os sistemas existem dentro
do mundo da vida, e que dentro desses sistemas há um aumento da complexidade, pode mudar seu
posicionamento na história das Ciências Humanas e no mercado de trabalho.
2 ESTUDOS HUMANÍSTICOS DA INFORMAÇÃO OU HUMANISTIC
INFORMATION STUDIES (HIS)
O termo Estudos Humanísticos da Informação emerge como um novo conceito criado pelo
pesquisador do IBICT Clovis Montenegro de Lima, decorrente de suas visitas à Universidade de
Estudos Humanísticos da Holanda e conversas com Harry Kunneman e Fernando Muller, professores
desta instituição. Um dos frutos dessas conversas originou o artigo: Humanistic information studies:
a proposal, publicado em março de 2015 por Harry Kunneman, para a revista Logeion: filosofia da
informação do IBICT.
O artigo foi uma iniciativa de registrar os primeiros estudos e despertar discussões na
comunidade acadêmica sobre assunto. O desdobramento desse tema envolveu três dicotomias em torno
da dinâmica informacional, das questões políticas, sociais, científicas e tecnológicas e das interações
humanas nos estudos da informação.
A importância e objetivo dos Estudos Humanísticos da Informação se dá por meio de três
dicotomias relacionadas. Em primeiro lugar o empírico e questões normativas a que os estudos de
informação proporcionam uma rica incursão. Em segundo lugar, as duas formas diferentes de
complexidade - empíricas e éticas - quando os Estudos Humanísticos da Informação confrontam
esforços para conectar questões empíricas e normativas com o outro. E por último a falta de ligação
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[144]
entre ciência e tecnologia, por um lado e estudos humanísticos por outro lado, elucidado por meio da
oposição latente entre dois polos: reducionismo e culturalismo. (KUNNEMAN, 2015).
Diante do pano de fundo dessas dicotomias, um dos aspectos fascinantes da dinâmica
informacional que está transformando sociedades modernas sob os nossos olhos é o fato que também
contribui fortemente para a transformação da epistemologia profundamente enraizada e quadros
culturais fundamentais a estas dicotomias. (KUNNEMAN, 2015).
Em seus estudos Kunneman afirma que uma ilustração desta transformação é fornecida pela
"democratização" da cultura que tem andado de mãos dadas com a crescente digitalização dos artefatos
culturais, especialmente livros e música, mas também pinturas e fotografias. Questões como a
arrogância cultural e o "analfabetismo científico" de intelectuais literários “tradicionais” era parte de
uma cultura elitista, voltada principalmente para formulários impressos, em especial para livros físicos.
Atualmente as tecnologias de informação e os desenvolvimentos científicos entraram no mundo da
vida da maioria cidadãos, em todo o mundo. Este processo, em toda a sua ambivalência, também
contribuiu para uma democratização profunda da acessibilidade de todos os tipos de informações,
conhecimentos e recursos culturais que antes eram acessíveis apenas pela elite cultural.
A ciência e a tecnologia tornaram-se a força econômica, cultural e social mais importante na
determinação da forma e do curso das sociedades modernas e modernização das sociedades em todo o
mundo. Como consequência, as humanidades e os valores orientados para o livro 'interpretativos
"amado por eles estão sob grave pressão hoje em dia. Em alguns países, eles estão ameaçados por uma
marginalização cultural e científica. (KUNNEMAN, 2015).
Como uma prévia definição os Estudos Humanísticos Informação visam enriquecer as
diferentes formas de produção de conhecimento (Modo 1 e Modo 2) e impulsionar a dinâmica
informacional com o Modo 3 de conhecimento, isto é, com recursos morais e insights articulados nas
culturas organizacionais e exercidas por profissionais no desenvolvimento real do Modo 1 e Modo 2
do conhecimento tendo em vista promover uma vida significativa, apenas laços sociais e uma
sociedade mundial sustentável. (KUNEMMAN, 2015).
A zona de transição entre o sistema e o mundo da vida é cada vez mais o local onde os valores
humanistas podem florescer. Nesta zona de interferência, profissionais e organizações orientadas até
certo ponto por valores humanistas, lutam para se conectar à lógica sistêmica caracterizada pelo
cerceamento de deliberação e de diálogo, por um lado e a "lógica" comunicativa e dialógica do mundo
da vida, por outro lado, sobre o nível do conteúdo do trabalho que fazem [...]. (KUNNEMAN, 2015).
3 OS MODOS DE PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO E A SUA CRÍTICA
Até início da década de noventa a produção do conhecimento existente, conhecida como Modo
1, concentrava a solução de problemas no contexto acadêmico, em que a base do conhecimento era
disciplinar, com características homogêneas em relação à diversidade, autonomia no processo de
produção do conhecimento com qualidade tradicional (peer review).
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[145]
Em meados do século 20, emergiu o “modo 2”, chamado assim por alguns autores, uma nova
forma de produção de conhecimento, com olhar para a dinâmica da ciência e investigações nas
sociedades contemporâneas. Essa nova produção ampliou o horizonte de aplicação e aumentou a
reflexibilidade no contexto de produção. Além de concentrar a solução dos problemas no contexto de
aplicação, o modo 2 se apresenta com base de conhecimento transdisciplinar e heterogênea.
No modo 1, problemas são definidos e resolvidos em um contexto regido pelos interesses (em
grande parte acadêmica) de uma comunidade específica. Em contrapartida, no Modo 2 o conhecimento
é produzido em um contexto de aplicação envolvendo uma gama muito mais ampla de perspectivas.
(GIBBONS, et. al, 1994, tradução livre).
Na questão da heterogeneidade e diversidade organizacional, no Modo 1, o desenvolvimento
do conhecimento disciplinar tem sido historicamente associado com as universidades e outras
instituições de ensino superior. Estas instituições, muitas vezes existem em (torre de marfim)
isolamento de problemas do mundo real. No Modo 2, o conhecimento é produzido em vários locais
por equipes com membros de várias instituições de resolução de problemas: as empresas
multinacionais, firma de rede, instituições governamentais, universidades de pesquisa, laboratórios e
institutos, bem como programas de investigação nacionais e internacionais. (GIBBONS, et. al, 1994,
tradução livre).
Quando o controle de qualidade é observado entre os modos existentes: Modo 1 e Modo 2,
existem algumas diferenças: ainda que a revisão por pares exista no Modo 2, este inclui um conjunto
mais amplo, mais temporário e heterogêneo de profissionais, colaborando em um problema definido
em um contexto específico e localizado. Como tal, o Modo 2 envolve um sistema expandido de
controle de qualidade em comparação com o Modo 1. (GIBBONS, et. al, 1994, tradução livre).
Em inícios do século XXI, emerge um terceiro modo de conhecimento, a favor de um
humanismo crítico atendo-se a uma visão cosmopolita20 de uma sociedade mundial mais justa e
sustentável, mas também crítica com relação às diferentes manifestações da miopia humanista21.
(KUNNEMAN; SURANSKY, 2011).
O conhecimento do Modo 3 diz respeito a respostas profissionais significativas aos desafios
morais que confrontam cientistas e engenheiros, mas também gerentes e funcionários públicos dentro
do contexto da produção de conhecimentos do Modo 2. É de central importância para a ideia de
conhecimento do Modo 3 o elo entre considerações políticas e morais e o conteúdo de soluções
tecnológicas e arranjos organizacionais. (KUNNEMAN, 2011).
A nova interpenetração entre conhecimento científico e tecnológico tradicional ligado a
demarcações disciplinares por um lado ("Modo 1") e novas formas de produção do conhecimento
20 O desenvolvimento de uma sociedade mundial cosmopolita pede relações aceitáveis e sustentáveis social e
ecologicamente. (KUNNEMAN; SURANSKY, 2011). 21 Essa miopia nasce da crença de que “lá no fundo” todos os seres humanos estão orientados primariamente para formas
benevolentes, empáticas e dialógicas de se vincular com os outros. Isso leva a uma negligência sistemática das propensões
e capacidades dos seres humanos para formas indiferentes, malévolas e violentas de relacionar-se com os outros. Além
disso, essa miopia está ligada a uma visão da política como um esforço dialógico-deliberativo e com uma perspectiva
sobre ciências e tecnologia como recursos neutros e objetivos, negligenciando a função crucial preenchida por instituições
políticas e práticas tecnológicas para organizar e legitimar redes de exploração econômica e submissão política.
(KUNNEMAN; SURANSKY, 2011).
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[146]
científico que "absorvem" interesses sociais e os valores, por outro lado ('Modo 2'), estimularam o
desenvolvimento de novas formas de conhecimento e discernimento ético e moral no contexto de
produção de conhecimento científico e tecnológico. Esta nova forma de conhecimento, designada por
vários autores como “Modo 3", é de fundamental importância para o desenvolvimento de Estudos
Humanísticos da Informação porque proporcionam uma resposta à pergunta crucial colocada acima,
no que diz respeito aos valores que podem orientar a reflexão crítica sobre as questões éticas e morais
relacionados com a dinâmica informacional. (KUNNEMAN, 2015).
O quadro abaixo mostra a relação entre os Modos 1 e 2, com base em (GIBBONS et. al, 1994)
e adaptação pela autora para apresentar uma proposta do Modo 3 com base nos conceitos
desenvolvidos por Harry Kunneman.
Figura 1 – Modos de produção do conhecimento
Fonte: Gibbons, Trow, Scott et al. 1994 (adaptação da autora)
4 O ARTESANATO ORGANIZACIONAL
Antes de esclarecer o que é artesanato organizacional, será preciso antes fazer uma breve
apresentação sobre dois autores fundamentais na constituição dessa expressão que se traduzirá em um
novo conceito: Richard Sennet22 e Harry Kunneman23.
Richard Sennett é considerado um dos maiores intelectuais em sociologia urbana da atualidade.
Graduado pela Universidade de Yale e com Ph.D. em História da Civilização Americana pela
22 Dados sobre o autor foram coletados do site oficial http://www.richardsennett.com. 23 Dados sobre o autor foram coletados do site oficial da Universidade de Estudos Humanísticos da Holanda
http://www.uvh.nl/contact/zoek-medewerker?person=odfsijDsHqwOhbPA.
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[147]
Universidade de Harvard. Sua pesquisa envolve etnografia, história e teoria social. Foi aluno da
filósofa alemã Hannah Arendt e com influências do filósofo francês Michel Foucault, seus estudos
analisam a vida dos trabalhadores no meio urbano e questões ligadas à arquitetura das cidades. Richard
Sennett também recebeu os Prêmios Hegel e Spinoza e um doutorado honorário da Universidade de
Cambridge entre outros prêmios.
Durante suas pesquisas explorou como os indivíduos e grupos constroem sentido social e
cultural de fatos relevantes - sobre as cidades em que vivem e sobre o trabalho que fazem. Ele se
concentra em como as pessoas podem tornar-se intérpretes competentes de sua própria experiência,
apesar dos obstáculos que a sociedade oferece.
Em meados de 1990, com as rápidas e radicais mudanças do capitalismo contemporâneo,
Sennett começou um projeto para traçar as consequências sociais e morais do capitalismo. Mais
recentemente, explorou os aspectos mais positivos do trabalho em uma triologia com os seguintes
volumes: “The Craftsman” [2008] (O artífice); “The Rituals, Pleasures and Politics of Cooperation”
[2012] (Os rituais, prazeres e política de cooperação) e “The Open City” (A cidade aberta) que surgirá
em 2016.
Harry Kunneman é professor de Filosofia Social na Universidade de Estudos Humanísticos da
Holanda, especialista em teoria e prática da profissionalização normativa.
Formou-se em 1974 em sociologia na Universidade de Amsterdam (cum laude) e PhD da universidade
em 1986 em filosofia no livro A Verdade Funil (cum laude). A partir de 1974 - 1989 ele atuou como
professor assistente de filosofia social na Faculdade de Filosofia da Universidade de Amsterdã, onde
trabalhou especificamente em teoria crítica, e se especializou no pensamento de Jürgen Habermas. A
partir de 1990-2013 foi professor na Universidade de Estudos Humanísticos, onde ocupou a cadeira
de Teoria Social e Política.
Kunneman publicou uma dezena de livros e coleções e muitos artigos no campo da teoria social
e filosofia das ciências humanas, especialmente o pensamento pós-moderno. Sua pesquisa atual
concentra-se em questões de moralidade pós-moderna, a ciência humana crítica e a renovação do
humanismo contemporâneo. Foi presidente da Humanistische Alliantie. E também reitor da
universidade 2000-2004. Em 2014, tornou-se integrante do comitê editorial da revista eletrônica
Logeion: Filosofia da Informação do IBICT.
Em 2014 esteve no Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia e realizou duas
conferências em torno do seu objeto de pesquisa sobre os estudos humanísticos da informação: 1)
Humanistic Information Studies (Estudos Humanísticos da Informação) – com a apresentação de um
novo modo de produção do conhecimento, chamado Modo 3; 2) Craftsmanship and normative
professionalization (Artesanato e Profissionalização Normativa), título do livro que resultou de uma
conferência internacional realizada na Universidade de Estudos Humanísticos em Outubro 2012,
centrada sobre o recente trabalho de Richard Sennett. Harry Kunneman desenvolveu parte desses
estudos por meio de pesquisas sobre o seu trabalho.
Após apresentar brevemente os atores principais também é preciso definir alguns conceitos no
contexto desse projeto para facilitar a compreensão do estudo que seguirá.
O artesanato, traduzido da palavra em inglês “craftsmanship”, neste contexto, conceitua um
jeito novo de agir, aponta para um novo horizonte político que pode ajudar no confronto com os
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[148]
desafios econômicos, sociais e ecológicos da atualidade. O artesão ou artífice, traduzido da palavra em
inglês “craftsman”, nesse contexto, representa uma condição humana especial: a do engajamento.
A habilidade artesanal a qual Sennet se refere designa um impulso humano básico e
permanente, o desejo de um trabalho bem feito por si mesmo. Nesse caso, o artífice [ou artesão]
frequentemente enfrenta padrões objetivos de excelência que são conflitantes; o desejo de fazer alguma
coisa bem pelo simples prazer da coisa bem-feita pode ser comprometido por pressões competitivas,
frustações ou obsessões. (SENNETT, 2013, p. 19-20). Quando se trata de habilidade artesanal é
possível dar destaque a duas questões: a) o desejo do artífice de fazer um bom trabalho e b) as
capacidades necessárias para tal.
Um dos marcos do movimento pragmatista é a suposição de que existe um contínuo entre o
orgânico e o social. Enquanto certos sociobiólogos sustentam que a genética determina o
comportamento, pragmatistas como Han Joas afirmam que a riqueza do próprio corpo fornece os
materiais para uma ampla variedade de atos criativos. A habilidade artesanal mostra em ação o traço
contínuo entre o orgânico e o social [...]. Pode-se dizer que o moderno pragmatismo abraça como artigo
de fé a convicção de Jefferson de que aprender a trabalhar bem é a base da cidadania. (SENNET, 2013,
p.323-324).
No contexto organizacional, o artesanato funciona para atrair a profissionalização normativa.
Definimos provisoriamente profissionalização normativa como o - tanto arriscado e enriquecendo -
processo de desenvolvimento em direção a uma atitude reflexiva, e praticar uma relação crítica com a
ambivalência normativa do conhecimento profissional e ação profissional, diante do horizonte do
significado ético, moral e político de um bom trabalho. (KUNNEMAN, 2015).
A ética do artesanato e trabalho cooperativo contida no trabalho recente de Sennett tem uma
grande relevância política tendo em vista a desafios econômicos, sociais e ecológicos assustadores de
hoje. A pressão contemporânea sobre corporações e organizações públicas para "internalizar" em vez
de exteriorizar responsabilidades morais, confronta estas organizações com desafios morais internos
que não podem ser atendidos com base na objetiva lógica e estratégia dos mercados e das burocracias.
(KUNNEMAN, 2015)
Mas a indiferença moral da livre economia e do mercado de toda a sua apoiar sistemas
burocráticos, não pode ser remediado ou invocando os recursos morais da sociedade civil! O debate
público, a deliberação democrática e a articulação pública de valores morais de específicos podem
confrontá-los com os desafios morais, mas não podem ajudá-los a lidar internamente com esses
desafios. Aqui reside a importância política da teoria e da prática de profissionalização normativo em
geral, e do enriquecimento desta perspectiva fornecida pelo recente trabalho de Sennett, em
particular. (KUNNEMAN, 2015)
O artífice é quem explora essas dimensões de habilidade, empenho e avaliação de um jeito
específico. Focaliza a relação íntima entre mão e cabeça [...]. A relação entre mão e cabeça manifesta-
se em terrenos aparentemente tão diferentes quanto a construção de alvenaria, a culinária, a concepção
de um playground ou tocar violoncelo – mas todas essas práticas podem falhar em seus objetivos ou
em seu aperfeiçoamento. A capacitação para habilidade nada tem de inevitável, assim como nada há
de descuidadamente mecânico na própria técnica. (SENNETT, 2013, p. 20).
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[149]
Pensar o trabalho bem-feito, “good work”, do ponto de vista da retórica da qualidade serve aos
indivíduos no interior de organizações e grupos étnicos como instrumento de reinvindicação de status:
eu/nós somos mais motivados, mais empenhados e mais ambiciosos que os outros. (BOURDIEU,
1996). Nesse contexto, a distinção pode levar a um isolamento social ou uma suposta superioridade,
em que a busca pela excelência na figura do especialista pode oferecer perigo. Dessa forma, dois tipos
de especialista podem se configurar: o sociável e o antissocial.
Uma instituição bem constituída artesanalmente favorecerá o especialista sociável; o
especialista isolado é um sinal de que a organização está enfrentando problemas. (SENNETT, 2013,
p. 274). O especialista sociável sente-se à vontade com a orientação e o aconselhamento, fazendo eco
modernamente ao in loco parentis24 medieval. (SENNETT, 2013, p. 276).
A ideia de um especialista sociável remete ao artífice mestre da Idade Média, que além de ser
capaz igualmente de produzir e consertar, possuía uma visão além da técnica e tinha o dever de criar
vínculos sociais por meio de suas ações nas oficinas. É nesse sentido, que se espera no próximo tópico
iniciar um desenho idealizador do profissional da informação na sociedade contemporânea.
A construção do mapa conceitual abaixo (Figura 2) foi uma tentativa de apresentar o artesanato
organizacional e suas relações no mundo da vida. A tentativa de construção desse conceito partiu da
inspiração do artesanato desenvolvido nas antigas oficinas/ guildas da Idade Média apresentado por
Sennet em seu livro “O artífice”.
Figura 2: Mapa conceitual Artesanato organizacional
Fonte: Elaborado pela autora
24 The term in loco parentis, Latin for "in the place of a parent" refers to the legal responsibility of a person or
organization to take on some of the functions and responsibilities of a parent. Originally derived from English common
law, it is applied in two separate areas of the law. https://en.wikipedia.org/wiki/In_loco_parentis
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[150]
Dessa forma, pode-se definir provisoriamente artesanato organizacional como uma proposta
reflexiva para uma nova forma de ação humanista dentro das organizações. Essa ação tem como
objetivo desenvolver um bom trabalho – um trabalho bem feito por si próprio- e envolvem
profissionais com potências específicas para as demandas infocomunicacionais da modernidade. Nesse
contexto são fundamentais desenvolver o agir ético discursivo e a ação normativa segundo a teoria
habermasiana, e a profissionalização normativa, como um processo de desenvolvimento profissional
e uma relação crítica ao conhecimento, na concepção de Kunneman.
Na proposta desse projeto, os bibliotecários são os profissionais com as potências de buscar,
selecionar e organizar as informações e mediar os conflitos na comunidade de concernidos, que os
tornam um especialista sociável. Acredita-se que a partir de tais potências aliadas às ações normativas
é possível idealizar um profissional fundamental e engajador que contribua para uma nova forma de
produção de conhecimento e atitude humanizadora dentro das organizações.
5 A IMPORTÂNCIA DO BIBLIOTECÁRIO NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA
A proposta é apresentar uma idealização - no sentido no Craftsmanship, artesanato
organizacional – em que o bibliotecário (profissional da informação) é o artífice, aquele que restaura
a organização a partir da pessoalidade do seu trabalho, por ações normativas, por agir
comunicativamente e com a ética do discurso, do ponto de vista de Habermas.
Todo bom artífice sustenta um diálogo entre práticas concretas e ideias; esse diálogo evolui
para o estabelecimento de hábitos prolongados, que por sua vez criam um ritmo entre a solução de
problemas e a detecção de problemas. (SENNETT, 20013, 20).
Nesse ideal, o bibliotecário – encontra-se dentro dos sistemas organizacionais que tendem a
reduzir sua complexidade, além de possuírem uma perspectiva funcionalista – é capaz (no sentido de
potência) de agir sob uma perspectiva discursiva (aumenta a complexidade) para compreender as
demandas e ações dos profissionais da informação pensando o artesão que busca, seleciona e organiza
a informação e media conflitos entre a comunidade de concernidos.
A sociedade da informação, tendo em vista os avanços tecnológicos, e a racionalização da
dimensão humana nas organizações, se apresenta hoje com uma carência de profissionais que tenham
entendimento para identificar demandas das ações comunicativas decorrentes das interações humanas
organizacionais e que geram a informações em escalas cada vez mais complexas em sua diversidade.
Os limites devem ir muito além de gestores da informação e profissionais qualificados que exercerem
práticas de agregação de valor e descentralização à informação. Além de proporcionarem autonomia
aos usuários finais da informação por meio de ferramentas facilitadoras que hoje, com a tecnologia,
possibilitam a disseminação e o compartilhamento das informações de forma a contribuir com as
vantagens competitivas para as organizações, esses profissionais devem ser capazes de associar o fazer
com o pensar e consequentemente atuarem em diversas ações que contribuam para a humanização das
organizações em que trabalha.
A partir da análise das resistências em organizações, existem três tipos de perfis de pessoas: os
resistentes, os neutros e os inovadores. (COSTA; GOUVINHAS, 2002 apud SALVADOR, 2005). Os
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[151]
inovadores possuem características propícias para compor equipes, serem patrocinadores de
iniciativas, catalisadores de informações e engajadores de projetos dentro das organizações. Contando
com a demanda de profissionais da informação na modernidade tenha perfis diferenciados e
qualificados, primordialmente é necessário que esses profissionais agreguem características desse
perfil inovador.
Nesse contexto, a atuação dos bibliotecários no cenário atual pode agregar valores que o tornem
além de um profissional importante, um profissional imprescindível dentro das organizações,
destacando três principais de suas potências que serão mais detalhadas abaixo:
a) busca e seleção de informação – saber diferenciar a informação relevante para organização;
b) organização da informação – técnicas, sistemas e ferramentas de classificação;
c) mediação de conflitos entre os concernidos – no sentido habermasiano.
O bibliotecário é o profissional que consegue trazer a informação para a organização
rapidamente e de forma seletiva. Deixar que toda informação entre na organização é utopia. Quando a
informação entra livremente dentro do sistema, ele deixa de ser sistema, por isso a informação deve
ser seletiva.
A redução da complexidade, nesse contexto, se dá pela seleção dessas informações. O sistema
busca reduzir a complexidade do entorno e se tornar funcional criando espaços operacionais, por meio
da diferenciação de complexidade. Tal espaço possui mecanismos que o auto referenciam, ou seja,
desenvolvem a sua contingência, o sentido. Esses espaços podem ser descritos como os “sistemas”,
que são estruturas que possuem funções para fazer frente às complexidades do entorno (LUHMANN,
1996a; p. 133-134).
A organização do conhecimento é feita pelo bibliotecário de uma forma que a máquina não faz.
Ser capaz de facetar os conhecimentos, promover distinções e aproximá-los.
No sentido habermasiano, o mediador de conflitos é aquele que descentraliza a discursividade
e promove a inclusão na comunidade de concernidos. O bibliotecário pode ter a capacidade de
solucionar conflitos informacionais e ter competência comunicativa associada a uma cooperação entre
os indivíduos para estabelecerem vínculos.
A mediação é feita apenas por seres humanos, a ação normativa do bibliotecário pode ser capaz
de colocar os indivíduos para interagirem e argumentarem, independente do que eles vão argumentar
e dessa forma produzirem colaborativamente, podendo contribuir para humanização dessas
organizações. A mediação na comunicação científica participa dentro de um grande jogo
comunicacional, não pode ser democrático apenas com intelectuais, a ideia é ser democrático com o
ambiente sistêmico.
Pensar o bibliotecário como artesão inclui pensar que o ofício de produzir coisas materiais
permite perceber melhor as técnicas de experiência que podem influenciar nosso trato com os outros
[...] Desafios materiais como enfrentar uma resistência ou gerir ambiguidades contribuem para o
entendimento das resistências que as pessoas enfrentam na relação com as outras ou dos limites
incertos entre as pessoas. (SENNETT, 2013, p. 323).
Paralelamente as potências apresentadas acima, vale ressaltar as três habilidades essenciais que
constituem a base da perícia artesanal: as capacidades de localizar, tornar algo concreto; questionar,
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
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refletir sobre suas qualidades e abrir, expandir o seu sentido. (SENNETT, 2013, p. 309). Tais
habilidades agregadas às potências de busca e seleção, organização e mediação certamente
contribuirão para o engajamento do bibliotecário nas organizações em que trabalha.
Abrangendo o entendimento sobre o bibliotecário no mundo da vida, sob o ponto de vista
comportamental e social, foi realizado um estudo com base na análise dos arquétipos25, no contexto da
psicologia analítica. Desse modo, foi possível perceber que a categoria de bibliotecários se aproxima
ao arquétipo chamado “prestativo”. Esse arquétipo é um altruísta por natureza, movido pela
compaixão, generosidade e desejo de ajudar os outros, cuidadoso ou apoiador (PEARSON; MARK,
2003).
Essas características se tornam cruciais quando pensamos em observação, no “fazer pensando”,
a constante observação das reais necessidades daquele indivíduo, do outro, do mundo da vida e
imediatamente a ação do que pode ser feito para integrá-lo ao meio, ao colocá-lo para conversar com
os outros.
A analogia desse arquétipo para campo profissional representa um estímulo inconsciente de
suprir determinadas necessidades dos indivíduos dentro das organizações, bem como as próprias
organizações como um todo e não apenas isso, mas também suas potências expressas pelas
experiências profissionais, observação, inovação, criatividade e produção colaborativa que
possivelmente são atributos que contribuem para humanização das organizações.
Seja qual for o estatuto econômico e a posição dentro de um sistema global de dependências
sociais, as pessoas participam da vida social em proporção ao volume e à qualidade das informações
que possuem, mas, especialmente, em função de sua possibilidade de aproveitá-las e, sobretudo, de
sua possibilidade de nelas intervir como produtor de saber. (CHAUÍ, 1993).
A partir da idealização, experiências e estudos sobre comportamento humano e atuação dos
bibliotecários, diversos valores podem ser agregados à formação acadêmica do bibliotecário como
profissional da informação, assim como uma nova perspectiva e um novo posicionamento para o
bibliotecário na contemporaneidade.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Espera-se com essa proposta que o bibliotecário tenha conhecimento e o entendimento que
aquele bibliotecário funcionalista dentro de um sistema que reduz a complexidade, formalista e
dependente de ferramentas e processos não é suficiente na sociedade contemporânea. Um bibliotecário
com ações éticas normativas sob uma perspectiva discursiva, que cria argumentos que legitimam
decisões para ações coletivas e acordos práticos, com entendimento de que os sistemas existem dentro
25 Para Jung, arquétipo é uma espécie de imagem apriorística incrustada profundamente no inconsciente coletivo da
humanidade [...] Jung deduz que as "imagens primordiais" - outro nome para arquétipos - se originam de uma constante
repetição de uma mesma experiência, durante muitas gerações. Eles são as tendências estruturantes e invisíveis dos
símbolos. Por serem anteriores e mais abrangentes que a consciência do ego, os arquétipos criam imagens ou visões que
balanceiam alguns aspectos da atitude consciente do sujeito. Funcionam como centros autônomos que tendem a produzir,
em cada geração, a repetição e a elaboração dessas mesmas experiências. Eles se encontram entrelaçados na psique, sendo
praticamente impossível isolá-los, bem como a seus sentidos. Porém, apesar desta mistura, cada arquétipo constitui uma
unidade que pode ser apreendida intuitivamente. (WIKEPEDIA, 2015).
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
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do mundo da vida, e que dentro desses sistemas há um aumento da complexidade, pode mudar seu
posicionamento na história das Ciências Humanas e no mercado de trabalho.
REFERÊNCIAS
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COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[155]
Cap
ítulo
10
UMA PERSPECTIVA ÉTICA PARA O TRABALHO INFORMACIONAL: O DISCURSO EM ORGANIZAÇÕES COMPLEXAS26
Clóvis Ricardo Montenegro de Lima
Márcio da Silva Finamor
_____________________________________________________________________________
Resumo: Neste artigo pretendemos fazer uma discussão teórica e crítica sobre o trabalho
informacional dos profissionais da informação. Estabelecendo uma relação entre o discurso
(habermasiano) e aspectos das competências necessárias para o trabalho nas organizações complexas
como a profissionalização normativa e a competência comunicativa. Toda esta discussão tem fortes
referências do Filósofo Jürgen Habermas na teoria da ação comunicativa do discurso, do Filósofo
Harry Kunneman sobre os Estudos Humanísticos da Informação que trata da concepção de práticas
da profissionalização e de autores em consonância com esse raciocínio, mostrando a ligação entre o
discurso, ética e às ações de humanismo na profissão. Aponta perspectivas promissoras do
engajamento em equipes multiprofissionais pelo uso da discursividade, com isso, estabelece recursos
para a construção e troca de informações, conhecimentos e respectivamente meios para inovar e criar
no ambiente complexo. Conclui-se que o trabalho/produção informacional requer esforços morais e
éticos, além de práticas que visem à construção de vínculos afetivos e efetivos sobre ações que
resultem em bem-estar dos envolvidos – mas que requerem uma reconfiguração na formação dos
profissionais da informação e a aquisição de novas competências a partir de um olhar acurado e crítico
da profissão na Sociedade da Informação e nas relações com o outro em sua dignidade e na
convivência humanizadora.
_____________________________________________________________________________
26 Artigo elaborado a partir da parte teórica e crítica da dissertação de FINAMOR, M. S. intitulado: “O Agir Comunicativo
e Crítico do Bibliotecário nas Organizações de Saúde”. Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia –
IBICT/UFRJ.
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[156]
1 INTRODUÇÃO
Consideramos as organizações complexas um ambiente ambíguo e restrito por exigência da situação
vivida e das práticas profissionais e atitudinais dos envolvidos. É um ambiente onde acontecem
excessivas relações dialógicas, de trocas de informações e comunicações, de pensamentos e atitudes
humanas. Com isso, consideramos que colocar em prática a aplicabilidade de conceitos humanísticos
em ambientes complexos requer maiores esforços éticos e morais para os sujeitos, além de práticas
que visem à construção de vínculos afetivos e efetivos sobre ações que resultem em bem-estar dos
envolvidos, no sentido existencial, e melhoria das práticas da profissionalização dos profissionais da
informação sobre o trabalho informacional e comunicacional nesses ambientes. Para atingir esse
objetivo, é necessário nos apropriarmos de duas correntes filosóficas: habermasiana (humanista) e
luhmanniana (anti-humanista).
Para conduzirmos a senda deste caminho é preciso maior acuidade nas organizações complexas por
consequência um olhar proveniente do trabalho informacional de diferentes disciplinas e setores,
como, por exemplo, o olhar sobre a teoria dos sistemas do sociólogo Niklas Luhmann, para
conhecermos o desenvolvimento de sistemas e seu subsistema: que permiti entender a complexidade
das relações nesse ambiente. Consideramos que os profissionais da informação dentro de seu ambiente
de trabalho podem agir em diferentes interfaces de serviços de informação. Pois, nas organizações
complexas, existe a demanda sistêmica e seus subsistemas; inevitavelmente necessitamos de nos
apoderar da teoria de Luhmann – nesse caso de serviços de informação dentro do sistema. Esse
subsistema – especializado – é onde essas profissionais necessitam especializar-se para desenvolver
as atividades sociais, comunicacionais e informacionais dentro do sistema complexo.
De encontro a essas teorias, iremos adotar a teoria dos sistemas no viés metodológico e na forma de
observar os sistemas e subsistemas das organizações complexas. Diferenciando dos sistemas
complexos das organizações, reduzindo a complexidade do ambiente para então, conceber ações
comunicativas (aumentando a comunicação interna), gerando dessa forma, os subsistemas
especializados de serviços informacionais, para então através das interações entre os sujeitos mediante
linguagem corroborar com a socialização dos profissionais e pacientes. Isto é, entender a constituição
de uma organização é entender a constituição do seu sistema, que pode ser pensado em termos
luhmannianos.
Neste artigo, possui sua base nas áreas da Ciência da Informação e Estudos Humanísticos da
Informação. Tem como finalidade melhores aproveitamentos do uso social das interações e das
informações, da sua produção, da colaboração e apoio a tomadas de decisão, vantagens sociais e
comunicacionais. Sendo o início para a criação de uma sólida ponte para a uma efetiva contribuição
nas organizações complexas e para o fazer informacional dos profissionais da informação. Mas, para
isso, é preciso mais que sua contribuição técnica e teórica, é preciso interagir para construir a
informação no contexto das relações, isto é, na intersubjetividade 27 , na rede de equipe
multiprofissional.
27 Segundo (GOYARD-FABRE, 2002, p. 483), “a intersubjetividade é necessariamente o campo no qual, sobre fundo de
integração social, a razão “discursiva” e “comunicacional” apresenta, visando a outros e numa busca de consensualidade,
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[157]
Os aportes teóricos aqui citados provêm desse alicerce e dão subsídios para os profissionais operar
com ações transformadoras e abastecidas de competências nesse ambiente ambíguo e incerto na
perspectiva comunicacional e social. Certamente o profissional da informação está habilitado e
capacitado com as competências necessárias do seu fazer informacional: coletar, buscar, organizar e
mediar a informação. Consideramos esse ambiente propício para o fazer informacional especializado,
relevante e expressivo.
2 O TRABALHO INFORMACIONAL: O DISCURSO EM ORGANIZAÇÕES COMPLEXAS
As organizações complexas, como todas as organizações dotadas de um certo porte e de uma certa
capacidade de existir no tempo e interagir ativamente com a sociedade. Esse ambiente enquadra uma
equipe de multiprofissionais que contempla a articulação das ações e dos saberes dos diversos
profissionais inseridos nesse ambiente, promovendo a integralidade dos serviços e buscas por soluções
de problemas e desfecho de conflitos. Esse ambiente, considerado complexo, requer dos profissionais
um esforço maior no agir organizacional e relacional para lidar com a rotina do dia a dia. As ações
dos profissionais sobre a condição humana de diferentes perspectivas sociais dentro desse sistema
complexo trazem para eles grandes desafios no quesito das relações e nas funções e condições de
atender às demandas.
A teoria dos sistemas de Niklas Luhmann sobre as organizações complexas preocupa-se em direcionar
o olhar para as organizações da forma como lidamos e explicamos a sua complexidade e indica como
ela se reduz através de sua construção. Essa teoria mostra como é constituído e produzido o sistema
complexo, e concomitantemente trazemos um diálogo expressivo, com a teoria habermasiana
reconhecendo e dando subsídios para o agir dos profissionais nesse ambiente incerto na perspectiva
do agir socialmente e aumentar as comunicações e interações linguísticas.
Podemos compreender que as atividades informacionais e comunicacionais na perspectiva da teoria
sistêmica podem ser vistas como um processo que visa à expansão desse ambiente complexo, e dessa
forma os profissionais da informação pode introduzir serviços informacionais e comunicacionais
como um subsistema social especializado e complexo, já que envolve grande número de relações
profissionais. Esse serviço informacional é como um subsistema que atende às amplificações da
complexidade sistêmica e ao mesmo tempo reduz a complexidade. Ao olhar esse sistema complexo
para o aumento da complexidade através dos serviços informacionais e comunicacionais os
profissionais podem agir com mais segurança diante das ações comunicativas e informacionais
mediadas pela linguagem natural, gerando assim os subsistemas a partir do entendimento da
constituição da organização para a constituição do seu sistema interno e específico.
uma conduta “processual” de argumentação e de justificação”. Já para Japiassú e Marcondes (2006), a intersubjetividade
é a interação entre diferentes sujeitos, que constitui o sentido cultural da experiência humana. O problema da
intersubjetividade está relacionado à possibilidade de comunicação, ou seja, de que o sentido da experiência de um
indivíduo, como sujeito, seja compartilhado por outros indivíduos. Trata-se de noção encontrada contemporaneamente na
fenomenologia e na filosofia analítica da linguagem com o objetivo de superar o subjetivismo e o solipsismo. A
objetividade de vários sujeitos concordando quanto ao sentido de algo ou quanto a um resultado determinado (JAPIASSÚ;
MARCONDES, 2006).
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[158]
Luhmann ensina-nos que as organizações são construídas a partir da redução da complexidade na
relação com o meio ambiente. Assim, uma organização consiste sempre em escolher meios de
executar um objetivo entre muitas possibilidades. Essa redução da complexidade nas organizações
acontece especialmente por reduzir a comunicação no seu seio, como a estrutura da informação flui
em torno das escolhas feitas, e a racionalização nas organizações é sempre uma escolha orientada para
um fim, observando-se os imperativos do poder e do dinheiro (LUHMANN, 1996, apud LIMA,
2015).
O paradigma da organização complexa, e para agir nessa complexidade é preciso usar a teoria
discursiva de Habermas: ele próprio discute essa teoria e a compara com a dele mostrando que para
os sujeitos interagirem nesse ambiente complexo, teorizando e apresentando caminhos práticos
através da filosofia pragmática e da linguagem entre os indivíduos capazes de atos de fala, de
argumentação, de âmbito consensual e intersubjetivo, pois na teoria sistêmica de Luhmann não
existem sujeitos. Portanto, para entendermos esse ambiente complexo e o agir infocomunicacional
dos profisisonais, é preciso antepor-se à teoria dos sistemas e iniciar a discussão sobre a abordagem
filosófica da linguagem, da discursividade e do trabalho informacional e comunicacional com base na
teoria dos estudos humanísticos, do agir comunicativo e das ações interacionistas e, em seguida, do
uso da teoria discursiva e da teoria dos sistemas, ou seja, o agir dos profissionais, para ir além dos
limites sistêmicos.
A importância do uso da linguagem em qualquer ambiente organizacional, seja ela complexa ou não,
se dá pelo potencial que ela tem de tornar eficaz a coordenação das ações sociais. Assim, vive-se na
linguagem um fluir de coordenações consensuais de comportamentos e de emancipação dos sujeitos,
colocando em prática o agir comunicativo e os princípios dessas teorias. Essas ações têm o potencial
de criação de informações no contexto comunicacional e nas interações sociais em qualquer ambiente,
seja ele complexo ou simples, conforme aponta Habermas (2002).
A interação por meio da linguagem (no falar, no escutar e no argumentar) é debatido por Habermas
como o sucesso da comunicação; está vinculado aos processos comunicacionais, interacionais e por
mediações, seja pelas informações, seja pela dinâmica comunicacional em discursos e interações
consensuais. Esses processos estão na interação e na mediação, pois cada indivíduo é diferente do
outro, passa por experiências distintas que devem ser consideradas no contexto dinâmico da ação
social e nas relações argumentativas. A linguagem, a cultura e a ação comum são fatores críticos para
a interlocução e para a capacidade de conceber informações nas atividades comunicacionais e de
melhores práticas, que vai além de seu fazer tradicional para os aspectos relacionais e discursivos: o
que transcende suas ações de trabalho e ações no ambiente complexo.
Dentre as práticas dos profissionais da informação e outros profissionais, a mediação da informação
apresenta-se como inevitável nos seus afazeres do dia a dia, onde se manifesta na emergência de uma
linguagem comunicadora, de um sistema de representações comum a toda organização e a todas as
pessoas. E, ao mesmo tempo, esse sistema de representação gera um sistema social, coletivo, de
pensamento, de relações, de vida, ou seja, uma sociabilidade, que corresponde a uma forma de
identificação social e é equivalente, na lógica da filiação, à intersubjetividade. Entenda-se por essa
sociabilidade o conjunto de representações, de condutas e de práticas pelas quais uma pessoa é
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[159]
reconhecida como pertencendo a uma mesma sociedade, a uma rede e a uma equipe da mesma parte
do ambiente de trabalho, segundo Silva (2010).
A capacidade da informação no social nos faz perpetuar-nos sobre um conceito de produção da
informação nas relações intersubjetivas, onde convoca o de comunicação e ambos se reportam a um
fenômeno humano e social que tem a ver com a capacidade simbólica de cada pessoa e com a
necessidade de uma interagir com outra ou com outras. Essa conceituação abre, também, espaço para
que se instaure não mais abordagens práticas e instrumentais voltadas para o primado de descrever os
documentos (objetos culturais e patrimoniais conservados em instituições custodiadoras, como os
Arquivos e as Bibliotecas), mas um esforço de cientificidade que compreenda e explique os modos e
os contextos de produção informacional, os imperativos e as formas de mediação e os múltiplos
aspectos e nuances do comportamento individual e coletivo em face da busca, da mediação e do uso
da informação nesses ambientes (SILVA, 2010, p. 13).
Em vista disso, a presença de Habermas no corpo teórico deste artigo é significativo, pois ele não
trabalha sobre um desenvolvimento teórico acerca da informação, e sim numa abordagem integradora
da comunicação. Isto é, o desenvolvimento da construção das informações está na dinâmica
comunicacional. E a linguagem como instrumento de atos de falas que proporcionam aos indivíduos
ações argumentativas e esses discursos produzem entendimentos e reconstruções racionais no
ambiente de trabalho e no ambiente complexo.
Habermas (2004, p. 117-118) considera que apenas os atos de fala constituem ações eficientes, isto é,
os indivíduos em seus próprios atos e prolações linguísticas podem construir uma dinâmica
comunicacional integradora. Todavia a racionalidade comunicativa 28 corporificada em atos
ilocucionários também se estende, para além de prolações verbais, a ações ou interações sociais,
constituindo ações comunicativas e manifestação empírica da racionalidade com o intuito de ampliar
as relações humanas e integradoras para além do falar e ouvir: numa perspectiva emancipadora, do
aprender e do desenvolvimento moral.
No que Habermas chama de interações comunicativas, as pessoas envolvidas se põem de acordo para
coordenarem seus planos de ação, e o acordo alcançado em cada caso é medindo pelo reconhecimento
intersubjetivo das pretensões de validez. No caso dos processos linguísticos de entendimento mútuo,
os atores erguem com seus atos de fala, ao se entenderem uns com os outros sobre algo, as pretensões
de validez – mais precisamente, pretensões de verdade, de correção e de sinceridade, conforme se
refiram a algo no mundo objetivo (enquanto totalidade dos estados de coisas existentes), no mundo
social comum (enquanto totalidade das relações interpessoais legitimamente reguladas de um grupo
social) e no mundo subjetivo próprio (enquanto totalidade das vivências a que têm acesso
privilegiado) (HABERMAS, 1989, p. 79).
Os ambientes de trabalho em geral são feitos de pessoas e com elas podem e devem discutir para
melhoria dos serviços e processos – em nosso caso serviços informacionais, e para tanto as
28 “Racionalidade comunicativa traz consigo conotações que, no fundo, retrocedem à experiência central da força
espontaneamente unitiva e geradora de consenso própria à fala argumentativa, em que diversos participantes superam suas
concepções inicialmente subjetivas para, então, graças à concordância de convicções racionalmente motivadas, assegurar-
se ao mesmo tempo da unidade do mundo objetivo e da intersubjetividade de seu contexto vital” (HABERMAS, 2012, p.
37).
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[160]
organizações devem recuperar a dimensão humana. Para isso, é preciso facilitar a discursividade
dentro das organizações complexas. Essa é umas das principais tarefas dos agentes críticos,
permitindo que as pessoas discutam e maximizem os recursos para a renovação.
Nosso critério conceitual de trabalho no âmbito da era da informação se dá, conforme aponta Marques
(2016, p. 66-67), que no rol dos trabalhos mediados pelas atuais tecnologias da informação e
comunicação se incluem atividades laborais diversificadas que ampliam cada vez mais a
multiplicidade, a heterogeneidade e a complexidade do universo do trabalho. Assim, tornam-se menos
úteis as abordagens que flertam com visões dicotômicas que tendem a isolar, em esferas de agir
distintivamente, os trabalhadores que lidam com a produção intelectual e os trabalhadores
responsáveis pela produção tangível, passando a ter maior liberdade de ideias e de visões
democráticas, nos ambientes onde estão inseridos, os indivíduos dedicados à produção de
informações, mediações e comunicações.
Na perspectiva do trabalho informacional e comunicacional os profissionais da informação requerem
muito mais que técnicas e processos para organização e disseminação/mediação da informação,
postulamos a necessidade das interações sociais e o senso crítico na modelagem das discussões junto
com o outro (em seu mundo factual) sobre a ética e as relações deontológica, pois:
Ao se aplicar a fenomenologia social como base fundante para o entendimento da relação entre
formação e atuação do coletivo profissional da informação, pode-se voltar para o entendimento de
como se dá a construção da realidade social deste coletivo. Para tal se carece de compreender seus
sujeitos e suas experiências e, ainda, suas instituições, seus pensamentos e suas representações sociais,
bem como os conhecimentos intersubjetivados e socializados que amparam o desenvolvimento de
suas competências profissionais e o seu agir moral perante seu coletivo e perante a sociedade;
considerando sua história e o contexto de seu desenvolvimento social. (SOUZA et al., 2014, p. 12,
itálico nosso).
No âmbito da intersubjetivação, as pessoas constroem a informação (através do entendimento mútuo)
dentro do contexto comunicacional, isto é, na relação com o outro. A intersubjetividade, mediada pela
linguagem, subsidia a construção da informação. A linguagem, aqui, não é só uma ferramenta para
interpretar e representar; ela é um elemento da construção da sociabilidade. É nesse contexto da
construção da sociabilidade que os indivíduos interpretam, representam e produzem a informação, ou
seja, no contexto da intersubjetivação se dá a sua subjetivação (o tornar-se sujeito). E no contexto da
relação com os outros é que os indivíduos constroem a intersubjetivação concomitantemente, isto é,
não existe a construção da subjetividade fora das relações com os outros, ou seja, na perspectiva
habermasiana sempre terá de existir o outro para a comunicação e concepção da informação. Portanto,
o poder da informação encontra-se com maior êxito na capacidade das interações dos indivíduos sobre
o uso do aparelhamento (linguagem) do que na “informação” (“informação como coisa”)
propriamente dita.
Com isso, os profissionais da informação e equipes multiprofissionais podem estabelecer em suas
práticas uma perspectiva discursiva, resgatando características das pessoas em uma dimensão do agir
comunicativo e do cuidado de um trabalho correto (eticamente) pela interação e por suas ações
procedimentais no dia a dia, numa perspectiva do que ele faz e do seu agir construtivista e
interacionista: o fazer do dia a dia onde haja uma recomposição do trabalho com menos seriedade e
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
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mais integralidade de ações e tarefas integrais, com menos delegação e menos fracionamento do
trabalho.
3 ASPECTOS FILOSÓFICOS DAS INTERAÇÕES INFOCOMUNICACIONAIS NO
CONTEXTO SOCIAL: CAMINHOS PARA O REFLETIR E O AGIR DOS PROFISSIONAIS
O entendimento do processo infocomunicacional envolve a informação e a comunicação decorrente
da interação entre indivíduos e as trocas de informação no contexto social. Em nossa fundamentação
teórica, entendemos esse processo como um esforço para compreender novas formas de ser, de
pensar, de agir e de manifestar-se no mundo contemporâneo – com o uso da ação comunicativa e da
linguagem. Onde se exigem dos profissionais e de outros indivíduos uma postura aberta e
multirreferencial para entender e agir em fenômenos sociais, tendo como ponto de partida os
comportamentos humanos a partir do advento e da (r)evolução das tecnologias da informação, das
tecnologias móveis e da comunicação do século XX ao século XXI, bem como as formas de trabalho
e do direito social e individual de cada um de agir e comunicar-se na sociedade e em qualquer
ambiente sem coações e sem barreiras (físicas, de poder ou de formação).
O filósofo Rafael Capurro, cuja concepção linguística se aproxima da de Habermas e na qual o autor
questiona os processos e a produção de informação humana, indicando que, do ponto de vista do
conhecimento humano, ela equivale ao conceito de uma entidade linguística com um significado
único, que por sua vez só é possível num quadro aberto de possibilidades e de significado, que nada
mais é do que o uso da língua natural no ato de falar e de expressar nas relações sociais (CAPURRO,
2014).
Entre as várias correntes da filosofia continental, como a fenomenologia e a hermenêutica, um ponto
de encontro dessas posições é a concepção da linguagem como neutra e transparente através da qual
percebemos e pensamos em realidade como ela é, mas como a condição inevitável da possibilidade
de conhecimento da ação humana. Isso significa que a realidade é articulada como tal na língua e vice-
versa: a linguagem mostra sempre parcialmente quem somos e em que mundo vivemos. Assim, ainda
podemos resgatar sua intuição de que tanto a reflexão sobre o mundo quanto sobre a nossa própria
vida não pode escapar a algo inerente ao homem – a linguagem –, sendo permitido, portanto, uma
distância crítica dos significados contingentes ainda em uso que nos permitem não só criar novas
formas de vida mas também novas teorias científicas, novas formas de compreender e responder às
realidades em que vivemos, quem somos, o que fazemos e o que podemos fazer (CAPURRO, 2014).
Em via de projeção sobre o uso da linguagem, que induz uma tangente integradora nas relações,
consideramos a importância de os profissionais da informação adquirirem, sobre as competências aqui
discutidas que visam à linguagem, abordagens expansivas e ágeis das relações humanas com práticas
agenciadas à razão comunicativa: com o uso nas relações e do trabalho. Por isso:
Reforçamos que Habermas procura, no interior da linguagem, o norte da razão comunicativa que
defende existir. É no uso social que os sujeitos fazem da linguagem como forma de comunicação, que
se estabeleceriam os elementos para a construção de uma racionalidade comunicacional. A
racionalidade, para Habermas, é uma forma de coordenação de ação coletiva mediada pela linguagem,
por isso, ele relaciona a intersubjetividade às estruturas de comunicação e à integração social. Todavia,
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
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“acima” das ações racionais haveria, segundo Habermas, uma força emancipatória que conduziria o
uso dessa razão e que se estabelece, se institui e se manifesta na intersubjetividade comunicativa entre
sujeitos, em uma ação de comunicação. Esta ação, por sua vez, tem como objetivo um entendimento
mútuo entre os atores da comunicação. A integração social, portanto, se dá mediada pela linguagem.
(HABERMAS, 2002 apud GRACIOSO, 2009).
Por conta disso, e não só por isso, situamos o nosso entendimento da linguagem como ação, a ação
como informação e a informação como linguagem. É no bojo das ações informacionais e
comunicacionais que traçamos um panorama crítico e de capacitação desse profissional no seu fazer
e de ações na busca da informação, mediação e organização, seja ela física ou virtual (GRACIOSO,
2009). Nessa conjetura informacional/documental, é relativamente fácil contar o número de palavras
em um documento ou descrevê-lo de outras formas; muito mais difícil é tentar descobrir para quem
aquele documento tem relevância e quais as perguntas importantes a que ele pode responder. Questões
de interpretação também são difíceis porque frequentemente confundimos interpretação e abordagem
individualista. O significado, entretanto, é determinado nos contextos social e cultural (CAPURRO;
HJØRLAND, 2007, p. 193, itálico nosso).
Posto isso o consideramos como um dos desafios teóricos e práticos no trabalho informacional, bem
como na sociedade de informação, em razão de que o debate é particularmente concentrado na
síndrome reducionista, no medo de reduzir a pessoa humana a um mero organismo ou máquina de
processamento de informações, perdendo de vista os componentes culturais que caracterizam o
conhecimento e, mais exatamente, o observador humano. A informação, nessa perspectiva, é o
processo e o produto de uma sucessão de seleções, podemos dizer de argumentos. Esse aspecto
desempenha um papel decisivo na teoria da informação de Shannon, que exclui os aspectos
semânticos e pragmáticos ao atribuir o transmissor e o receptor humano e retomando, assim, a seleção
no sentido moderno e atual da noção de informação em linguagem comum (CAPURRO, 2014, itálico
nosso).
Para que funcione em um nível social, sem as estruturas de força vertical que bloqueiam tais processos,
é essencial que desenvolvamos e mantenhamos dispositivos de duas vias, a comunicação horizontal e
a comunicação recursiva: discussão sobre a noção de informação em uma concepção unilateral,
vertical e não recursiva de transmissão de mensagem. A percepção crítica dessa tensão entre
autonomia e heteronomia, horizontal e vertical, qualidade da informação e mensagem tem sido
possível graças à transmissão de mensagens que chamamos de internet, se vista a partir da genealogia
da noção de informação, a qual flui para o espaço de reflexão que chamamos de ética da informação
(CAPURRO, 2014, itálico nosso).
Tentar pensar as interações mediadas pela linguagem como uma percepção da dinâmica social, como
um jogo linguístico, é ter no ambiente de trabalho, do social e em qualquer esfera uma potência
criativa e de soluções de problemas e conflitos. Para quem trabalha com comunicação e informação
(como os profissionais da informação), isso o tira de vários modelos mentais anteriores, como, por
exemplo, a teoria da matemática da comunicação, do modelo de emissor e receptor. Pois o processo
discursivo e de interação é uma dinâmica social onde se rompe com a ideia de input e output. Isso nos
coloca o desafio de pensar na relação entre comunicação e informação, e é nesse momento que o
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profissional da informação aparece apto para lidar nessa dinâmica de interação, comunicação e
informação (visto que sua formação se baseia na tecnicidade da informação). No entanto, tal
possibilidade só será efetiva com o aperfeiçoamento e a aprendizagem da competência comunicativa
e com a aquisição mais profunda da teoria humanista e dos sistemas complexos, como as organizações
complexas.
O trabalho informacional dos profissionais da informação e de qualquer outro profissional requer
mudanças atitudinais que nos coloca adiante da necessidade de uma tomada de posição de abandono
da “máscara da neutralidade” em favor de se colocar na centralidade de nossos estudos, pesquisas e
afazeres profissionais a “razão de ser” e a “de um bom trabalho” da ação informacional, sem
abandonar a preservação da memória social e as condições de acesso à e uso da informação, cuja
mediação, entre outras coisas, deve incorporar o estímulo ao exercício da palavra, do diálogo, da
criatividade, da produção de sentidos e também do entendimento, tomando enfim como um dos
fundamentos do trabalho com a informação a construção e a manutenção do espaço crítico. Para este
último, a interação representa a esfera do social a partir da qual os sujeitos convivem, agem e se
comunicam para encontrar o caminho do entendimento e do consenso possível para as decisões em
torno das coisas do mundo do sistema e do mundo da vida29 (GOMES, 2016, itálicos nossos).
O protagonismo social representa o caminho promissor da construção ética das relações sociais
capazes de estabelecer e rever atitudes e verdades, na qual a produção, o acesso, o uso e a apropriação
da informação cumprem papel importante, isto é, o sujeito que age socialmente em ambientes e
práticas relacionados com a informação também se caracteriza como sujeito da ação protagonista. Daí
a relevância de problematizar e de reconstruir a racionalidade sob o conceito de informação para situar
suas relações com a comunicação, localizando nessa articulação o envolvimento com a ação que
demanda e gera o protagonismo da interação e da ética para assegurar um processo dialógico
promissor e envolvente com a rede de equipe (GOMES, 2016).
O processo dialógico é resultante e promotor de ação de compartilhamento de informações situada no
plano de ação dependente da interação. A informação, nesse caso, é produzida, organizada, acessada
e apropriada no processo de encontro com o outro. O outro que produz, o outro que organiza,
disponibiliza, facilita o acesso e uso, mas que também constrói e oferta dispositivos facilitadores do
encontro e do debate com os outros, ampliando nossas interpretações alocadas na intersubjetividade.
Sobre as relações estabelecidas com os outros no desenvolvimento do processo de apropriação da
informação, entende-se aqui a apropriação ou mediação como o processo por meio do qual podemos
conferir significado à informação e dar sentido às nossas próprias vidas, atitudes e fazeres laborais
(GOMES, 2016).
Desse modo consideramos que um dos principais desafios dos profissionais da informação o ensino
da Ciência da Informação e o desenvolvimento de currículos que proporcionem uma formação
29 O termo “mundo da vida” foi introduzido por Husserl e Habermas recorreu a este conceito para construir a ideia de que
também o agir comunicativo está contido no mundo da vida (Habermas, 1990b, p. 86). O mundo da vida está diretamente
implicado no processo de vida social. O tecido das ações comunicativas alimenta-se de recursos do mundo da vida e é, ao
mesmo tempo, o meio através do qual se reproduzem as formas de vida concretas (fatos). O mundo da vida se reproduz
através de ações comunicativas de forma que valores, normas e especialmente o uso da linguagem orientada para o
entendimento mútuo sejam postos sob o fardo da integração apenas numa sociedade que satisfaça as exigências
intencionalistas de uma socialização comunicativa pura (HABERMAS, 1990, p. 292).
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alinhada com os desafios do mercado global, sem deixar de se preocupar com a formação cultural e
humanística dos profissionais, em um contexto onde ocupem posições e desenvolvam atividades
estratégicas no mercado de trabalho, o que permite enriquecer o ambiente acadêmico com novas
visões e tendências. Tanto as aulas teóricas quanto as aulas práticas devem fazer uso dos modernos
recursos computacionais que permitem a reprodução, o desenvolvimento e a produção de ambientes
de pesquisa que levem o aluno e o professor a vivenciar a realidade em que as organizações estão
inseridas como meios para agir nesses ambientes sem receio ou sem competências para o trabalho
(PALETTA, 2016, p. 57-58, itálico nosso).
As práticas informacionais indicam que o trabalho com a informação demanda um profissional
protagonista e consciente de que o seu fazer se volta para o desenvolvimento do protagonismo social.
A condição do protagonista profissional evidencia o estado de mediador e também de sujeito ativo no
estabelecimento das condições da existência humana (o outro em sua dignidade e na convivência
humanizadora), já que as condições da atividade criadora são imprescindíveis e também constituem a
meta do seu trabalho social. A informação nasce, inspira, motiva e sustenta a ação interativa que traz
em si a potência da criatividade, da mudança, da integração, mas também do estabelecimento e
preservação da memória social e seus acessos e disseminações (GOMES, 2016).
Nesse aspecto, os profissionais da informação necessitam de uma teorização e de uma prática
informacionais mais elaboradas que deem conta das demandas informacionais e sociais das
organizações complexas. O que é fundamental é a necessidade de desenvolver ações que promovam
interações dentro dos sistemas complexos, uma vez que o subsistema de informação está cada vez
mais acoplado ao sistema de comunicação por uma questão habermasiana, a saber: não existe
informação fora do contexto da intersubjetividade. Um dos requisitos para essa consecução nas
organizações e na sociedade são as práticas sociais de interação como a percepção e a criação de
subsistemas de informação para o sistema em que trabalha. Ao se mediar e promover a socialização
– na perspectiva humanística –, geram-se subsídios para criar e inovar dentro dos ambientes sistêmicos
ali onde isso é considerado improvável por Luhmann. O elemento que corrobora esse enunciado é que
sem comunicação e interação não há informação/inovação. Isto é, quando as opiniões individuais são
estabelecidas por meio de argumentos e trocas de informações com outros sujeitos em amplo debate,
existe a possibilidade do surgimento de uma ideia em comum, um consenso, uma opinião pública, e
essa ideia parece-nos indiscutível, desenhada democraticamente, enquanto não aparece outro
argumento melhor, e dessa forma se sistematizam ideias inovadoras.
O processo de interação sinaliza percursos complexos de interação entre sujeitos, dos sujeitos e das
linguagens, dispositivos e conteúdos informacionais, processo que implica atividade, movimento,
tomada de posição e a consequente manifestação de oposições, demandando o nascimento e o
exercício do protagonismo social, que por sua vez requer discussões em torno da ética e da adoção de
parâmetros éticos sobre respeito no falar e ouvir. Fundamento ético da socialização baseado num
esforço moral e íntegro de cada um nas relações, ou seja, o ponto-chave das questões éticas se baseia
intensivamente na interação humana. Quando não há interação, equalizam-se tais esforços na tentativa
do diálogo (GOMES, 2016).
A prática dos profissionais da informação sob esse prisma inicia-se na luta pelo abandono do
comportamento hedonista em favor da dialogia e do consenso possível, representando um ato de
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coragem e de atualização e modernização profissional (normativa). Ao se contextualizar a ética e a
coragem no âmbito do fazer informacional, a dialogia surge em contorno ascendente como espaço de
exercício da crítica necessária à apropriação da informação, que por sua vez é potencializadora da
criação, da atividade que cria, que transforma, que ressignifica o mundo do sistema organizacional e
o mundo da vida. Isso implica a necessidade de valorização dos processos comunicativos
favorecedores dos espaços críticos e criativos do fazer informacional (GOMES, 2016). O que implica
também uma reconfiguração do fazer desse profissional no ambiente onde trabalha e na rede de
equipe, como também a aquisição de novos aprendizados.
Porque tanto a informação quanto a comunicação são ativas na construção do conhecimento e do ser
e representam um substrato imprescindível ao agir de cada sujeito nesse processo. A comunicação e
a informação ocupam lugar importante para que se possa propor, exigir, permitir e contestar verdades,
assim como para viabilizar o acesso a elas, sustentando-se a possibilidade do exercício da crítica para
que se possa revisitar, desconstruir ou redimensionar as verdades formuladas no consenso que a ação
comunicativa potencialmente gera sob a regência do entendimento. Informação e comunicação
contribuem para a potencialização da capacidade de interpelar, interferir, criar e recriar o
conhecimento instituído e o mundo, e são relevantes para o desenvolvimento do protagonismo social
(GOMES, 2016).
A informação é dependente e promotora do processo de comunicação. Assim, a informação se
constitui em elo entre o instituído e o instituinte, entre estabilidade e desestabilização, entre passado,
presente e futuro. A compreensão e a experiência com a informação nessa dimensão requerem a
consciência e a prática da ação comunicativa com a coragem da tomada de posição em favor da
construção do protagonismo social, o que coloca a ética como princípio norteador de todo processo
dialógico, de modo a tornar mais exequível o entendimento. Pode-se dizer que, assim como a
informação é o conhecimento em estado de compartilhamento, isto é, resultante do esforço de
compartilhamento que se efetiva na comunicação, ao mesmo tempo é elemento provocador da ação
de colocar em comum a (comunicação), a ética é resultante de uma existência humana na qual o
protagonismo social se efetiva e é também elemento que assegura a permanência desse protagonismo
e das condições da existência humana (GOMES, 2016).
Desse modo, observa-se que o trabalho de mediação da informação tem, na perspectiva da ação e do
protagonismo, as dimensões dialógicas, estética, formativa, ética e política que, interligadas,
compreendidas e sintonizadas entre si, colocam a informação como um elemento que pode
protagonizar a produção humanizadora do mundo em qualquer ambiente. E o profissional em questão
passa a ter maiores desafios no contexto social e competências práticas para lidar com essa dinâmica
comunicacional. O que requer dos homens e mulheres que trabalham e estudam esse fenômeno social
(como os profissionais da informação e os cientistas da informação) uma tomada de consciência e de
atitude a fim de colocar tais abordagens no escopo epistêmico da área, tornando o trabalho com a
informação um contributivo para a efetividade da vida ativa do homem, o que se caracteriza também
como um ato de coragem (GOMES, 2016).
Ao mesmo tempo que os profissionais da informação possuem grandes desafios, eles se apresentam
como grandes rendimentos e ações para o agir desse profissional. Antes de tudo, por ele lidar em sua
formação e em seu dia a dia de trabalho com diferentes tipos de informação e documentos, como: sua
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organização e disseminação entre outras atividades diretamente com esses insumos. A ausência de
conexões e de interações para o âmbito social configura-se como inevitável e como um campo imenso
de estudos e práticas nas perspectivas teóricas e engajadoras aqui apresentadas. Para tanto, incorporar
as práticas dos profissionais da informação no contexto social, nas dinâmicas comunicacionais e na
prestação de serviços informacionais requer uma “competência racional integradora: comunicativa,
argumentativa e discursiva”, assim como ações de um “bom trabalho” adquirido nas práticas da
profissionalização normativa, possibilitando dessa forma uma direção centralizadora e inovadora do
agir desse profissional para ir além do seu agir técnico e teórico nas organizações complexas.
4 PROFISSIONALIZAÇÃO NORMATIVA E COMPETÊNCIA COMUNICATIVA
Na atualidade é preciso maior reflexão crítica sobre as atividades do labor humano no dia a dia, como
também, as formas e modos de comunicação em geral, no que tange as relações, trocas de interações
e informações na perspectiva das diversidades direcionada na racionalidade comunicativa. Isto é, as
práticas dos profissionais ancorado sobre o olhar dos processos de gerenciamento organizacional e
das relações sociais com o viés humanístico. Sobre esse olhar, procurar apresentar os benefícios que
a incorporação de um modelo humanista aos quadros corporativos pode proporcionar nas
organizações, instituições e em qualquer entidade pública ou privada, modelos como ações
engajadoras e deliberativas para o desenvolvimento organizacional e pessoal (emancipatório e de
aprendizagem). Tornando-se de grande importância para uma amplificação da ótica tradicional da
formação dos profissionais da informação que restringe o seu agir a de um facilitador da relação com
a informação e comunicação como agente organizador, mediador e inovador nos serviços e produtos
informacionais. Quesitos esses relevantes para estudos e no que venha a ser as práticas da
profissionalização normativa e competência comunicativa desses profisisonais: como o estudo e a
ação propulsora desse acontecimento humanístico.
A profissionalização normativa são ações e práticas de transformações no ambiente de trabalho,
buscando promover atitudes engajadoras estabelecidas pelos Estudos Humanísticos da Informação,
que estão intimamente ligados com a dinâmica informacional e comunicacional, que, por sua vez,
também exerce enormes influências no social e no cultural (KUNNEMAN, 2015).
Os princípios dos estudos normativos e da humanização estão estritamente ligados às questões
normativas (práticas) e morais e com a dinâmica comunicacional (em atos de fala: no uso da
linguagem). Pois que, visto de uma perspectiva normativa, ela abre novas possibilidades, sem
precedentes, para a criação de novas conexões entre as pessoas, promovendo novas formas de
comunicação e de cooperação no apoio e reforço da liberdade das ideias dentro do trabalho, numa
forma democrática. Surge, então, a questão: quais valores poderiam orientar a reflexão crítica sobre
as questões éticas e morais relacionadas com a dinâmica comunicacional? Daí o surgimento de
obstáculos para o desenvolvimento da humanização como um esforço interdisciplinar que visa atender
tanto a empírica quanto a complexidade ética da dinâmica comunicacional. Por conseguinte, quando
a oposição binária de Habermas entre sistema e mundo da vida é substituída por este esquema, torna-
se possível desenvolver uma interpretação situacional da colonização do mundo da vida e de esforços
concretos para subverter essa colonização entre diferentes lógicas na zona de transição entre sistema
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e mundo da vida; implica que não é certo, de antemão, se a lógica dos sistemas terá lugar central ou
se a lógica comunicativa do mundo (KUNNEMAN, 2015).
Os Estudos Humanísticos da Informação e a profissionalização normativa estão intimamente ligados
no papel central desempenhado pelos profissionais, no qual se deve conectar o estudo descritivo (e
explicativo) da dinâmica comunicacional à reflexão crítica sobre a ética, questões morais e políticas,
ligadas internamente na dinâmica intersubjetiva. O que implica na necessidade de enfrentar uma dupla
complexidade: por um lado, a complexidade empírica da dinâmica inovadora relacionada com o
surgimento da sociedade da informação; por outro lado, a complexidade ética e moral (KUNNEMAN,
2015).
A dimensão desses estudos concentra-se em esforços individuais para integrarmos socialmente, na
construção de ambientes favoráveis e de transformações nesse universo a partir do uso de
instrumentos tecnológicos, serviços informacionais e, o mais importante, do uso das falas para a
comunicação, onde construímos nossa personalidade numa dimensão integradora e humana. Essa
construção de falar e ouvir com o uso da linguagem é algo inato ao ser humano e se distanciar desse
elemento social é fazer com que as restrições sociais e integradoras perdurem por mais tempo, e já
sabemos que não trazem benefícios tais barreiras.
Em vista disso, acentuamos a notável consideração das práticas normativas e éticas nos ambientes de
trabalho de quaisquer profissionais ao lidar com o outro e nos afazeres do dia a dia no trabalho com a
informação e comunicação. Por vezes, é necessário um olhar de outra área para compreender e
redescobrir meios para melhorar e aprimorar o desenvolvimento organizacional, através de algo
comum a todos os seres humanos – linguagem, informação e atos de fala – pois as ações efetivas dos
profissionais em atividades sociodiscursivas poderiam ser oferecidas em organizações como
elementos que subsidiam inovações e o seu desenvolvimento. Podemos inferir que do ponto de vista
da racionalidade comunicativa é: mais ampla, normativa, ética, moral, justa, mais adequada,
humanista, tecnicamente mais adequada, com várias virtudes dos sujeitos, sob o ponto de vista da
amplitude normativa que a organização está preocupada. É uma normatividade com certo
compromisso no humanismo, valores e eticidade que encontramos na profissionalização normativa e
que vislumbramos para esse profissional.
Hoje podemos ver referida zona de transição inicial como um lugar dinâmico, no qual a teoria
organizacional contemporânea e a profissionalização normativa podem abrir a perspectiva de valores
morais mais amplos. O maior desafio reside no lado normativo, que pede novas formas de cooperação
com base na igualdade radical entre pesquisadores acadêmicos e profissionais, entre gestores e
colaborador, entre o diretor e gestor, isto é, sem barreiras comunicacionais, relacionais e de identidade,
do poder, da formação e da designação de cada um que trabalha em organizações, para conectar as
diferentes formas de conhecimento sobre uma base da igualdade e nas características, situadas e
baseadas na prática da profissionalização normativa (KUNNEMAN, 2016).
Em relação ao ponto de vista da humanização o primeiro estágio para estabelecer práticas
humanísticas no fazer informacional e comunicacional é começar a entender de que quando falamos
de humanizar. É sobre a criação de uma sensibilidade para um determinado valor de humanização,
não se trata de saber o que é humanizante, mas sim sobre a criação de um valor humano dentro do
ambiente de trabalho, seja qual for a forma ou o conteúdo. É a partir dessa sensibilidade que podemos
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agir e discutir dentro do ambiente de trabalho e, assim, podemos procurar a humanização. Isto
significa que a sensibilidade é profundamente moral. Quando colocamos humanização diante,
queremos dizer que é moralmente importante e devemos promovê-la em nossas ações. A humanização
é uma espécie do que o Filósofo Gianni Vattimo chama do pensamento fraco. Um pensamento que
está consciente de suas limitações e de seu fracasso, mas ainda assim mantém a procura de significado
e por isso faz sentido. Humanização nas organizações é trazer o pensamento fraco para o ambiente
organizacional (KAULINGFREKS, 2014).
No centro dessa visão humanística, o conteúdo normativo do conhecimento profissional e agir
profissional, em particular a qualidade ética da relação entre profissionais e seus clientes, usuários e
os outros, é relativamente essencial e indispensável nas relações das práticas laborais na busca por um
esforço para esclarecer e compreender o conteúdo normativo da ação profissional em termos
filosóficos, epistemológicos e éticos, numa perspectiva crítica, na concepção de um antídoto
conceitual e prático contra o domínio crescente de formas instrumentais e tecnocráticas do
profissionalismo, por exemplo, a complexidade das relações no ambiente complexo. A questão é:
como vivemos um certo obscurecimento da sociedade do trabalho, então transcorrido e com vestígios
na contemporaneidade, há de se pensar na função da emergência, na relevância das interações sociais
e no contentamento laboral para uma articulação desse conteúdo normativo e complementar, inerente
de conhecimento profissional e ação profissional, que pode ser pensada com a ajuda da análise da
oposição entre o “sistema” e o “mundo da vida” em Habermas (KUNNEMAN, 2016).
Ademais, sobre a questão da humanização nas organizações inferimos que a intervenção no sistema
organizacional/ambiente e o olhar sobre o mundo da vida na perspectiva discursiva de Habermas, no
que tange a produção da informação, as dinâmicas comunicacionais e as relações sociais como uma
conduta para realizações práticas profissionais profícuas, que consideramos ainda uma abordagem
pouco usada na prática. No entanto, primordial, uma vez que esse comportamento e tratamento pode
quebrar as formas clássicas da administração, como as tayloristas, fordistas e fayolistas, as quais ainda
trabalham em fronteiras rígidas, entre departamentos e processos de produção fechada e mecânica,
que inibem as pessoas a tomarem iniciativas de socialização e inovação. A ideia de substituir esse
modelo organizacional por fronteiras permeáveis, flexíveis, com mobilidade suficiente para reagir às
mudanças impostas pelo ambiente externo, sobre um modelo discursivo de Habermas e da profissão
normativa, parece ser incontestável.
Em razão de que, até então, as organizações e seus processos encontram-se em constante
desenvolvimento e transformação e o fator humano é essencial para o apoio em serviços, processos,
na criação, inovação e no desenvolvimento organizacional. Por conseguinte, os conhecimentos
científicos e técnicos, que propiciam o crescimento e o aperfeiçoamento das forças produtivas,
proveem o sistema capitalista de um mecanismo regular que assegura a sua manutenção sem estar
isento de crises, de complexidade e de desafios. Desta forma, “se institucionaliza a introdução de
novas tecnologias e de novas estratégias”, isto é, “institucionaliza-se a inovação enquanto tal”,
cumprindo a ciência e a técnica o papel de legitimar a dominação (HABERMAS, 1987, p. 62).
Poderíamos, assim, situar a ação profissional nas organizações complexas dentro destes domínios e
compreender o conteúdo normativo da ação profissional em termos de interferência permanente da
lógica da produção econômica, da organização burocrática e da dialógica da ação comunicativa de
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alcançar o entendimento compartilhado. Isto permite-nos compreender as tensões e conflitos entre
estas duas “lógicas” também num sentido positivo, como uma possível fonte de resistência às formas
de situação de desumanização, mas também como para o desenvolvimento crítico e reflexivo de novas
formas de ação social, práticas humanizantes e moralmente responsáveis pela ação profissional
(KUNNEMAN, 2016).
A profissionalização normativa poderia, então, ser definida como o processo ativo de desenvolver e
manter uma atitude crítica e reflexiva para o conteúdo normativo do conhecimento e ação profissional,
com o horizonte moral dos valores sociais e políticas mais amplas. No compromisso ético, moral e
pessoal dos profissionais para entregar e fazer um "bom trabalho" e realmente se relacionar com as
necessidades e preocupações do ambiente organizacional para o seu desenvolvimento, entre outros,
na “ética do cuidado” (KUNNEMAN, 2016).
Por outro lado, reconhecemos as dificuldades de criar espaço para a profissionalização normativa
como um processo reflexivo no que diz respeito às combinações específicas de situação de diferentes
formas de conhecimento e vínculos. E, em termos de reforços dos recursos culturais nas organizações
e profissões onde enriquece o processo reflexivo: é crucial o entendimento da arquitetura conceitual
dos Estudos Humanísticos da Informação, em seguida, a imprescindível colisão entre a lógica
comunicativa da fala e atos de fala (debates), e a lógica redutora dos mercados e burocracias, como
analisado por Habermas. O que falta precisamente é esta imagem: o papel crucial de profissionais,
cientificamente treinados, construindo ativamente novos conhecimentos e moldando tecnologias e
formas de governança específicas na interferência entre "sistemas" e "modos de vida" (KUNNEMAN,
2016).
Pois, neste cenário e na perspectiva dos Estudos Humanísticos da Informação, o fenômeno da
informação pode assumir caráter emancipador e de aprendizado pela dinâmica comunicacional e nas
relações sociais. Os estudos relacionados à informação na perspectiva discursiva Habermasiana
procuram abordá-la como presente em processos de comunicação entre os sujeitos
intersubjetivamente, predominando a capacidade de estabelecer maior vínculo entre as pessoas, a
autonomia nas relações e autogestão. E a informação na dinâmica comunicacional passa a ser insumo
necessário para fazer do ambiente organizacional humanizado e desenvolvido. Nesse quesito que os
profissionais da informação devem alcançar fronteiras e horizontes de ação humanista e engajadora,
nesse ínterim que vos falta.
Em meio a múltiplas práticas que podemos pensar para a humanização na produção da informação e
meios para novas práticas normativas, a priori, podemos identificar os seguintes caminhos:
a) práticas éticas na produção da informação;
b) práticas gerenciais na produção da informação;
c) práticas tecnológicas na produção da informação;
d) práticas comunicativas na produção da informação;
e) práticas de serviços e produtos como subsídios concretos da produção da informação nas
organizações.
Consideramos esses aspectos cruciais para a construção humanizadora de cunho informacional nas
organizações, permitindo um diálogo expressivo com a teoria habermasiana e reconhecendo o modus
operandi organizacional-informacional.
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As atividades dos profissionais da informação e sua mediação informacional sugerem sempre a ideia
de dirigir e decidir. Na prática, também age com os princípios, normas e funções. A ideia da
administração aplica-se a diferentes objetos: administração de empresas, de pessoal, de material, da
informação. Nesse último, é, portanto, sempre uma atividade que envolve planejar, coordenar,
controlar, estabelecer princípios e normas, ou seja, definir políticas e funções visando a eficiência ou
atingir resultados positivos. Assim, a expressão “profissionalização normativa” possui conotação de
estabelecer planos, normas, regras e princípios em complemento com o humanismo no social e
práticas profissionais íntegras de um bom trabalho no dia a dia.
A prática da produção da informação quanto a organização da informação, livros e documentos são
inerentes à condição humana e social, e a necessidade do uso dessa mesma informação ditou
inevitavelmente a existência de processos de armazenamento, organização e representação como
meios para tornar exequível a sua recuperação e acesso. Sabemos, também, que esta prática foi
evoluindo e se tornou mais complexa à medida que a própria sociedade também se tornou mais
estruturada e se adaptou às diferentes tecnologias de produção, uso e comunicação (SILVA;
RIBEIRO, 2004, p. 3).
Nesse limiar, procura-se ultrapassar o risco de se cair na pura informatização de ineficiências,
assumindo a necessidade de se reformular novos modelos de gestão e de infocomunicação com os
indivíduos, orientando o seu agir nas organizações para a criação de fluxos procedimentais
simplificados e transversais aos vários serviços internos, alargando-os, inclusive, aos organismos
externos que com eles interagiam. Propósito essencial para uma articulação eficaz, através de um
processo de gestão de mudança que envolva os recursos humanos, os processos e métodos de trabalho,
o componente tecnológico, e, naturalmente, o sistema de informação organizacional, possibilitando a
criação de valor na organização ou no serviço por ela prestado, sustentado na eficácia organizacional,
na eficiência processual e no desenvolvimento de uma “Cultura de Serviço” e de uma “Cultura de
Qualidade” de bons serviços e de boas práticas comunicacionais e informacionais (PINTO; SILVA,
2005, p. 14).
Modificar o fluxo de informação significa intervir na organização efetuando uma mudança em seu
estado. Toda organização é composta por três subsistemas básicos, a saber: o subsistema técnico é
composto de tecnologias, equipamentos e métodos de trabalho, o subsistema social é composto pela
estrutura de relacionamento entre as pessoas, e, por fim, o subsistema político é composto pelas
estruturas organizacionais e pelas relações de poder entre os seus participantes. Portanto, ao buscar a
eficiência operacional, os ambientes de trabalho não devem estar preocupados especificamente com
um fluxo de informação, mas sim com o conjunto integrado de fluxos que suportam e integram as
atividades de uma organização em seus vários níveis. Os fluxos de informação devem ser construídos
a fim de atender às necessidades dos diversos níveis e das diversas atividades, (ANDRADE;
ROSEIRA; BARRETO, 2016, p. 108).
O processo de mediação da informação, e sua relação com a equipe pode começar e prolongar-se em
espaço digital, mas não se circunscreve aí, alimentando-se de contatos presenciais e, nesta medida,
não disputam a função mediadora ao especialista da informação. Significa isto que se condensam, no
espaço e no tempo, de forma unificada, fases ou momentos que, diante das possibilidades tecnológicas
atuais, eram separados local e cronologicamente: a coleta/busca, o uso intelectual (cognitivo) dos
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conteúdos obtidos e organizados e a produção informacional constituíam um ciclo fragmentado, agora
alterado pela sincronia e simultaneidade em que ocorrem dentro da rede. E a simples ativação de links,
ou remissivas mútuas entre os serviços institucionais com site no “espaço de fluxos” e todos os outros,
instaura-se como passo natural, corrente e normal a fim de estimular trocas mais estreitas e ousadas
entre os sujeitos (SILVA, 2010, p. 32).
Na complexidade desses ambientes uma diretriz transversal coexiste, constituindo um conjunto de
ações sobre diversas práticas e condições na prestação dos serviços, assim como em diferentes níveis
do sistema e subsistemas, formando, assim, uma construção coletiva de todos os atores envolvidos
para a dinâmica do fazer informacional e comunicacional e estabelecendo a priori maestria na
informação: adicionando os imperativos da cooperação interna.
Posto isso, entendemos que o resultante do:
agir comunicativo compreende um processo cognitivo e um processo de interação entre sujeitos que
desenvolveram competências de “fala”, capazes de distinguir quando influenciam estrategicamente
outras pessoas ou quando têm como objetivo central alcançar o entendimento junto com os sujeitos
dessa interação, para estabelecer um consenso sustentado em argumentos racionais, incessantemente
renováveis diante de novos problemas e processos de aprendizagem. Desta reflexão sobre a natureza
complexa de qualquer trabalho humano, ressalta-se que toda ação que recai sobre indivíduos, requer
uma concepção filosófica consciente e criticamente construída. Essa posição direcionará as ações a
serem realizadas, tendo em vista possibilitar uma linha de trabalho em harmonia com seus propósitos.
(GOMES; VARELA, 2016, p. 7, itálico nosso).
Acentuamos que o tratamento humanístico nas organizações complexas é um diferencial inarredável
e inovador nas relações do dia a dia. Em vias de projeção: um ambiente onde a comunicação, as
relações e o atendimento ocorrem sem barreiras, com um envolvimento multidisciplinar, humanizador
no fazer, pensar e agir na resolução dos problemas; em problemas organizacionais e sistêmicos, para
o auxílio e cooperação, do social e do labor humano. Podemos inferir que esse ambiente é livre e que
se formam e desoprimem uns aos outros. Considera-se um ambiente em modelo horizontal, que se
constitui flexível e mais dinâmico, sem proliferação de níveis hierárquicos nem autoritários da
linguagem ou sequer autocráticos. Uma linguagem dialógica e discursiva entre as redes de equipes
para o fazer de suas atividades é requisito crucial para ambientes complexos e para o agir dos
profissionais, operando sobre estruturas vantajosas e adaptativas. É um ambiente onde se pode
construir, praticar e experienciar a discursividade, desempenhando um conjunto de prioridades para
os processos organizacionais sob o olhar humanístico e emancipador.
Nessa perspectiva, inferimos que profissionais da informação, ao adquirir os conhecimentos sobre a
teoria dos sistemas na redução e aumento da complexidade, compreende que as organizações são um
tipo de sistema, só que feito de pessoas que interagem em maior ou menor grau. Esse entendimento
pode facilitar o olhar que esteja mal acurado para as ações e interações, colocando em prática o
estabelecimento do discurso. Desta forma, torna-se possível e, mais que isso, necessário já que são as
pessoas que constituem o sistema e elas estão imersas no mundo da vida, com suas crenças e valores
que podem dificultar a interação. As ações comunicativas e humanísticas podem favorecer a
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comunicação entre as pessoas, resgatando a dimensão humana das organizações, ampliando as
possibilidades de socialização, permitindo a discussão que subsidia a inovação e aprimoramento de
processos, serviços e produtos, etc. Através desse conhecimento adquirido e do esforço para lidar com
o outro, a interlocução do debate social passa para um nível integrador no que tange à reconstrução
racional do ambiente de trabalho, bem como a criação do potencial de informações e sua emancipação
na perspectiva crítica, integradora e humanística. Assim, recomendamos a aquisição e a aprendizagem
da “competência comunicativa” para os profissionais como a possibilidade de agir dentro dos sistemas
complexos e assim amplificando a comunicação dentro do sistema.
Ao observarmos as mudanças na contemporaneidade em relação às tecnologias, ao acesso às
informações, conhecimentos, e às conjecturas das relações interpessoais – em ambientes de trabalho
– é possível ver que a globalização modificou as redes de relacionamentos e o seu desenvolvimento
entre os indivíduos e serviços. Provocou mudanças no que configura uma sociedade que vive uma
reinvenção de valores e busca pela liberdade de interação e discussão a respeito de fins éticos e morais
na convivência social e no fazer do labor humano em ambientes organizacionais complexos.
Após mais de cem anos, com novos meios de comunicação e informação e uma nova ordem de
organização social, as chamadas sociedades complexas e as fragilidades das relações interpessoais, as
habilidades administrativas e competências administrativas necessitam ser remodeladas e as
competências humanísticas e integradoras precisam ser tanto reforçadas quanto modificadas. Quanto
a essas aptidões, a competência requerida desses profissionais é maior do que uma acumulação de
teorias e metodologias da administração instrumental. Elas são necessárias, mas não são suficientes.
Há outra competência racional integradora: comunicativa, argumentativa e discursiva, que é a
competência comunicativa. Habilidade essa que pode ser aprendida e aperfeiçoada e na qual esse
profissional está à disposição para argumentação e discussão, sendo de fundamental importância para
o entendimento, mas não apenas para escolhas racionais. Esta opção normativa pela escuta do outro e
do debate consensual é importante para uma crítica da administração instrumental das organizações e
do fazer laboral dos profissionais da informação (SILVA; FERNANDES; LIMA, 2013, p. 129-130,
grifo nosso).
Essa competência comunicativa não trata de simplesmente reunir ou votar em opiniões, mas,
conforme as propostas de Habermas, da abertura de espaços argumentativos em vista de construir
coletivamente soluções tanto racionais como consensuais; soluções resultantes de uma comunicação
em que todos foram ouvidos e igualmente considerados, portanto, com as quais todos estão
comprometidos com boas relações pessoais e de um bom trabalho. Não se trata de um saber dado,
inscrito em algum manual que pode simplesmente ser lançado, ou de uma racionalidade inata que
precisa ser simplesmente ativada, mas de uma competência que pode ser aprendida, de como
estabelecer modos discursivos e inovadores de integração social (SILVA; FERNANDES; LIMA,
2013).
Visto que nas relações sociais a noção do outro está relacionada ao reconhecimento da existência do
outro, que se constrói e se modifica no contexto das relações, e nessa construção das relações ambos
se modificam, isto é, no sentido de tolerância: no reconhecer a integridade do outro na sua integridade.
Essa interação discursiva (mediada pela linguagem) é onde os profissionais da informação, através da
capacitação da competência comunicativa, pode agir socialmente para a construção e “reconstrução
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[173]
racional” como potência para cooperar na criação de interfaces do fazer laboral, para mediar as
informações, e, sucessivamente, com a capacidade de estabelecer meios de sociabilidade e
interlocuções para inovação, visto que para criar e inovar é necessário interação e discussão das ideias
através do ato de falar e deixar proferir.
Habermas concebe uma força normativa inerente à linguagem que, se usada de forma comunicativa
(o agir comunicativo), é um meio eficaz de integração social. A partir do diálogo, entender e alcançar
um consenso sobre algo (do mundo da vida), através da linguagem, em suas próprias palavras:
Tão logo, porém, as forças ilocucionárias das ações de fala assumem um papel coordenador na ação,
a própria linguagem passa a ser explorada como fonte primária da integração social. É nisso que
consiste o “agir comunicativo”. Neste caso, os atores, na qualidade de falantes e ouvintes, tentam
negociar interpretações comuns da situação e harmonizar entre si os seus respectivos planos através
de processos de entendimento, portanto pelo caminho de uma busca incondicionada de fins
ilocucionários. Quando os participantes suspendem o enfoque performativo de um falante que deseja
entender-se com uma segunda pessoa sobre algo no mundo, as energias de ligação da linguagem
podem ser mobilizadas para a coordenação de planos de ação. Sob essa condição, ofertas de atos de
fala podem visar um efeito coordenador na ação, pois da resposta afirmativa do destinatário a uma
oferta séria resultam obrigações que se tornam relevantes para as consequências da interação
(HABERMAS, 1997, V. 1, p. 36).
O agir do profissional da informação nesta sociedade contemporânea mais complexa depende
obviamente de competências administrativas. Mas esta competência, embora necessária, não pode ser
reduzida a uma competência instrumental e funcionalista – dito clássica – desse profissional. Um agir
que responda às demandas contemporâneas requer a aquisição dessa competência comunicativa,
normativa e discursiva que dá sentido ético às suas relações com o mundo dentro das restrições
sistêmicas. Não é um conhecimento dado, mas de uma aprendizagem de interlocuções sobre como
deve ser no fazer de um bom trabalho (DIB, 2013, p. 26).
A competência comunicativa está na capacidade de se impor e agir para interagir com os outros. Em
retraçar esse profissional em habilidades de se interagir e comunicar em qualquer ambiente e nos
complexos, no sentido de integrar-se socialmente e socializar-se: essência da competência
comunicativa. Ou seja, é competente comunicativamente quando consegue, nas interações mediadas
pela linguagem, constituir-se, integrar-se e socializar-se. Esse processo exige mais do que um esforço
funcional, é uma competência social, essencialmente social. E não uma competência meramente
funcional – que são as técnicas instrumentais – do conhecimento dos profissionais da informação.
Isso porque a comunicação é uma dinâmica social e não uma dinâmica funcional. Quando Habermas
fala da linguagem, isto é, o aprender de uma gramática 30 a partir da sua competência, se dá a
construção de uma gramática social, ampliando, assim, a suas competências. Essa competência pode
ser desenvolvida e ampliada, ou seja, podemos aprender e melhorar a nossa capacidade de integrar-se
socialmente. Esse papel é fundamental para a introdução nas práticas profissionais e na formação
30 Gramática aqui é aprender novas linguagens: para interações; relações; e formas de vida para a constituição do ser.
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[174]
desse profissional, já que ele lida com informação e comunicação no dia a dia, e com essas novas
práticas sua arte passa a ser integradora.
Tal aquisição e inserção proporcionaria um agir que resgata uma dimensão humanística. É preciso
colocar as pessoas dentro das organizações para pensar, conversar, resgatando coisas do mundo da
vida, de experiências, de conhecimentos. Para isso, é preciso estabelecer uma dinâmica informacional
e comunicacional oferecida através do discurso. Os profissionais, estabelecendo uma perspectiva
discursiva, resgata características das pessoas que trabalham na organização, resgatando uma
dimensão de um certo agir comunicativo em uma perspectiva do que ele faz e do praticar de um bom
trabalho.
Nessa perspectiva, a ação dos profissionais da informação passa a ser um diferencial nas organizações,
dando subsídios para a inovação, relação através de interações, argumentos e da construção de
ambientes sociais favoráveis para lidar com as equipes. O uso social da linguagem, um importante e
poderoso instrumento que temos, serve tanto para desmitificar os conflitos de poder como para uma
comunicação racional e de interações com o outro na perspectiva do mundo da vida e da inclusão do
outro nas relações. Isto é, o agir comunicativo e a competência comunicativa como uma ação
metodológica prática para empreender processos de inovação nos serviços informacionais, nas
comunicações, ao lidar com o outro, nas organizações. Dessa forma, retificando a ideia de que não é
tudo que se constrói com a relação de trabalho, mas sim através das interações com os outros em
primeiro lugar.
Dessa forma, consideramos que comunicação e cooperação são componentes relevantes no processo
de inovação; parece ser fundamental que as metodologias de análise das interações tenham foco nestas
dinâmicas, nas quais emergem como possibilidade teórica e metodológica para estudar as interações
mediadas pela linguagem e os vínculos construídos entre as equipes. Este é o sentido de uma discussão
que parte do agir comunicativo – onde fundamenta a competência comunicativa e da discursividade
– para avaliar e compreender as relações sociais nos processos de inovação e relação (LIMA;
CARVALHO, 2011).
Além desse desafio, cabe aos profissionais o aprendizado dessa competência e de novos requisitos
práticos da profissionalização normativa, como também o conhecimento das relações práticas e
discursivas Habermasiana, do entendimento dos sistemas complexos, das relações humanísticas e dos
estudos humanísticos das informação e comunicação. Existe também o papel de facilitador no
processo de aprendizagem do usuário e equipes na condição de oferecer o desenvolvimento e
autonomia dos sujeitos numa forma democrática e humana das relações. A abordagem humanista dos
profissionais da informação traz como proposta que esses profissionais, nas relações com os outros,
se desenvolva sem intervenções, sem barreiras sobre os empecilhos morais, do poder, dentre outros.
Também essa abordagem restaura as relações interpessoais e o crescimento da personalidade do
indivíduo na construção e reconstrução da realidade factual de cada um numa perspectiva integradora.
Profissionais da informação devem focar nas relações humanísticas e nas suas particularidades
individuais, como, por exemplo: em suas inclinações identitárias; seu papel na construção de sua
cultura, identidade, memória e tradição, deve também se voltar para o lado social do indivíduo; sua
vida em cultura; os modos necessários para ele garantir sua sobrevivência, pensando mais na
transcendência do humano do que na permanência das “epistemologias engaioladas”. Isso é mediação.
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[175]
Mediação é esse voo comunicativo em interação, em compartilhamentos; mediar é garantir a liberdade
e o exercício de um pensar junto, unido, integrado ao humano e às suas necessidades ditas e
reivindicadas por ele e suas demandas, e não pelas ordenações socioculturais, sempre impositivas.
Uma mediação em harmonia com o outro, com sua humanidade e transcendência, mesmo dando voz
e vez às “contradições e ambivalências” da transdisciplinaridade (FEITOSA, 2016, p. 108).
Por fim, as ações devem transcender as relações e ações de um bom trabalho comunicativo e
informacional. Com a aquisição dessa competência comunicativa alinhada com a base teórica e prática
desse trabalho, consideramos o caminho para interagir no fazer de um “bom trabalho” dentro dos
ambientes complexos e sistêmicos em um olhar:
Para além dos discursos sobre a importância das mediações culturais e informacionais, é necessário
entender essa mediação contemplando as formas contemporâneas de interação, de interacionismo
simbólico, de cumplicidades culturais, de trocas simbólicas e de como esses fenômenos modificam
os contextos de onde são produzidas as informações, mas também aqueles por onde elas circulam e
nos quais são recebidas para provocarem, aí sim, as verdadeiras mediações socioculturais. (FEITOSA,
2016, p. 113).
Assim, a prática profissional mesmo a de maior facilidade de aferição junto aos seus usuários, equipes
multiprofissionais precisam remodelar o conceito de mediação à luz dos processos culturais advindos
das reações e relações dos sujeitos e das culturas destes, e não apenas aferindo seus modos de
organização e tratamento da informação (FEITOSA, 2016, p. 113).
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O trabalho e as ações dos profissionais da informação contemporâneo requerem mudanças e
superações, uma vez que o seu fazer tradicional e técnico daqui a alguns anos pode ser obsoleto e estar
superado por tecnologias, softwares e redes. O advento das tecnologias e das plataformas digitais em
tempo real e aplicativo está ocorrendo com uma força esmagadora. Diante disso, consideramos que
os profissionais da informação necessitam fazer uma autocrítica sobre o seu fazer laboral de hoje e do
futuro e procurar remodelar e apreender novas competências profissionais e sociais para não ser um
profissional desatualizado ante a competitividade e os desafios do mercado de trabalho.
Onde esse profissional mostra seu valor para a instituição e reaplica os conceitos fundamentais da
área, como coleta e tratamento de documentos e informações, em um contexto renovado e de forma
valorada. Simultaneamente instaura perspectivas comunicativas e integradoras relacionadas ao social,
com base em conhecimentos próprios, conhecimentos do perfil da rede de equipe e do seu mundo
vivido. Em contrapartida, atinge o viés do processo de argumentação intersubjetiva das relações e das
fragilidades dos sujeitos, no qual ele repensa a ação de seu trabalho e a união, deslocando, dessa
forma, acordos práticos para o agir comunicativo e estratégico em ambientes complexos, sendo esse
o caminho para novos paradigmas atitudinais e de competências dos profissionais.
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[176]
Nesse contexto das organizações complexas observando os modos de produção e mediação da
informação, o agir no ambiente complexo dos sistemas e a relação da dinâmica comunicacional com
o viés da profissionalização e as ações éticas dos profissionais, assim como as relações subjetivas e
intersubjetivas da equipe com o objeto informação, comunicação e seus processos.
Na academia da Ciência da Informação e escolas de Biblioteconomia podem direcionar o seu ensino
para novas competências e habilidades necessárias para ir além das bibliotecas e unidades de
informação, conduzindo as disciplinas para um horizonte crítico e humanístico em sua formação, onde
esse profissional ampliaria suas capacidades comunicativas, sociais, éticas e dialógicas, como a
competência comunicativa e a profissionalização normativa apontadas neste estudo, com o foco inicial
nas áreas da filosofia, da linguística, da administração, da comunicação e da integração social sobre o
alicerce do conceito intersubjetivo, como foi dito e direcionado neste artigo.
A corrente teórica e diversificada a partir da teoria dos sistemas de Luhmann e do agir comunicativo
e discursivo de Habermas, mostra e amplia o modelo de formação dos profissionais da informação e
principalmente o seu agir em novos ambientes. A importância do olhar acurado de Luhmann sobre as
organizações complexas, podemos perceber as grandes influências e complexidade dos sistemas nas
relações infocomunicacionais – informação, comunicação e social – no entorno da complexidade e
nas quais a redução dessa complexidade se dá através de sistemas funcionais, dinâmicos e
especializados por meio dos serviços informacionais e suas interfaces que podem ser criadas e
introduzidas pelos profissionais da informação nesse ambiente.
Uma vez que todo sistema implica a redução da complexidade, e esses sistemas têm certas restrições.
As organizações complexas constituem um tipo de sistema, só que se compõem de pessoas que
necessitam de interação e de relações humanísticas, relações essas que são dificultadas pela
complexidade do sistema e pelo imperativo poder e dinheiro. Por isso devemos apropriar-nos do
modelo proposto por Habermas, um modelo dialógico, discursivo e comunicativo que requer a
interação dos diferentes sujeitos, que devem se reconhecer mutuamente, favorecendo uma existência
digna e apresentando-se como um recurso necessário em um mundo cada vez mais complexo,
intolerante e individualista.
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COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[180]
ANEXO I
SOBRE OS AUTORES
Bruna Carla Muniz Cajé – Bacharel em Biblioteconomia pela Universidade Federal do Estado do
Rio de Janeiro. Especialista em Língua Francesa - Tradução pela Universidade Estadual do Rio de
Janeiro. Licenciado em Letras - Português/Francês pela Universidade Federal Fluminense. Mestre em
Biblioteconomia pelo Programa de Pós-Graduação em Biblioteconomia da Universidade Federal do
Estado do Rio de Janeiro. Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação pelo
Instituto Brasileiro de Informação, Ciência e Tecnologia. Atualmente é Bibliotecária da Universidade
Federal do Rio de Janeiro.
http://lattes.cnpq.br/1825135321057599
Clóvis Ricardo Montenegro de Lima - Graduado em Medicina na Universidade Federal de Santa Catarina
(1986). Mestre (1992) e Doutor (2005) em Ciência da Informação na Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Mestre (1993) e Doutor (2000) em Administração na Escola de Administração de Empresas de São Paulo da
Fundação Getúlio Vargas. Pós-doutorado no Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (2010).
Professor adjunto 2 da Universidade Federal de Santa Catarina (2006 a 2009). É pesquisador titular do Instituto
Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia desde 2009. Pesquisador visitante na Universiteit voor
Humanistiek em Utrecht entre 2013 e 2017. Coordenador do Grupo de Trabalho 5 - Política e Economia da
Informação da ANCIB - Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação entre
2011 e 2014. Editor das revistas Logeion - filosofia da informação e P2P&Inovação. Tem experiência nas áreas
de Ciência da Informação, Administração e Medicina. Tem abordado os seguintes temas nas suas pesquisas:
estudos humanísticos da informação; teorias do agir comunicativo e do discurso; aprendizagem e inovação;
liberdade intelectual; regulação; administração de organizações complexas, ética nas organizações e informação
em saúde. Pesquisador do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e tecnologia (IBICT).
http://lattes.cnpq.br/4727891485011869
clovismlima@gmail.com
Fabiana Menezes Santos da Silva - Mestre em Ciência da Informação (IBICT/UFRJ). Possui
graduação em Biblioteconomia e Documentação pela Universidade Federal Fluminense (2002) e
especialização em Gestão Estratégica pela Cândido Mendes (2005). Atualmente é bibliotecária da
Universidade Federal Fluminense atuando na Biblioteca da Escola de Engenharia e Instituto de
Computação.
http://lattes.cnpq.br/3988943434390548
bibliofa@yahoo.com.br
Geni Chaves Fernandes - Doutora em Ciência da Informação pelo IBICT/ UFRJ (2004), professora
associada da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO). Pesquisadora do grupo
Espaços e Práticas Biblioteconômicas (UNIRIO) e Filosofia e Política da Informação (IBICT). Co-
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[181]
Editora da Revista Logeion: Filosofia da Informação. Coordenadora do Programa de Pós-Graduação
em Biblioteconomia da UNIRIO, Linha de Pesquisa: Biblioteconomia, cultura e Sociedade. Temáticas
de trabalho: história e epistemologia da Ciência da Informação e Biblioteconomia Universitária.
Pesquisas atuais: de âmbito histórico, examina a genealogia da informação e do documento no
Renascimento; De âmbito das práticas de trabalho com informação: as transformações no regime de
produção de conhecimentos, e as atuais necessidades de informação nas práticas de pesquisa,
buscando identificar possibilidades de produtos e serviços informacionais que favoreçam as relações
entre pesquisadores e outros atores envolvidos na produção de conhecimentos.
http://lattes.cnpq.br/0028214455599057
geni@centoin.com.br
Jobson Francisco da Silva Júnior - Professor substituto no Curso de Biblioteconomia do Instituto de
Ciências Humanas, Comunicação e Arte da Universidade Federal de Alagoas. Doutor em Ciência da
Informação pelo Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da Universidade Federal do
Rio de Janeiro e do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia-IBICT. Mestre em
Ciência da Informação pela Universidade Federal da Paraíba. Graduado em Biblioteconomia pela
Universidade Federal da Paraíba. Foi estagiário na Procuradoria da República no Estado da Paraíba.
Voluntário PIVIC/CNPq/UFPB, com trabalhos na área de produção do conhecimento e relações
étnico-raciais. Atua na área de Ciência da Informação, com ênfase em Biblioteconomia. Participa dos
grupos de pesquisa Perfil-i e do Grupo de Estudos Integrando Competências, Construindo Saberes,
Formando Cientistas - GEINCOS - é membro do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Informação,
Educação e Relações Étnico-raciais - NEPIERE.
http://lattes.cnpq.br/1440366714960339
jobsonminduim@gmail.com
Kelly Pereira de Lima - Mestrado em Ciência da Informação pela Universidade Federal Fluminense
(2016), Pós-Graduação em Mídias Digitais pela Universidade Estácio de Sá (2012) e Graduação em
Biblioteconomia pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (2008). Bibliotecária da
Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro (PGE-RJ). Presidenta do Grupo de Profissionais em
Informação e Documentação Jurídica - GIDJ/RJ (2016-2019). Atuando principalmente nos seguintes
temas: gestão de unidade de informação especializada em direito, desenvolvimento de coleção, fontes
de informação, serviço de referência e biblioteca virtual.
http://lattes.cnpq.br/4682161497661580
kellybibli@yahoo.com.br
Lidiane dos Santos Carvalho - Doutorado em Ciência da Informação pelo Programa de Pós-Graduação em
Ciência da Informação do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia - IBICT/MCti em
convênio com a Universidade Federal do Rio de Janeiro-UFRJ (2014). Mestre em Ciência da Informação pela
Universidade Federal de Santa Catarina (2009). M.B.A em Marketing na Faculdade Metodista do Rio Grande
do Sul (2007). Graduada em Biblioteconomia - Hab. Gestão da Informação na Universidade do Estado de Santa
Catarina (2004). Estágio Docente na University of Humanistic Studies na Holanda (2013). Atualmente é
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[182]
Pesquisadora em Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz? FIOCRUZ (2014-atual) e Professora Adjunta na
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro - UNIRIO (2010-atual). Entre atividades e atribuições estão:
Coordenadora do Curso de Bacharelado em Biblioteconomia da Universidade Federal do Estado do Rio de
Janeiro (2013-2014). Colaboradora/orientadora do Curso de Especialização de Gestão de Organização Pública
em Saúde - UNIRIO (2014). Membro da Câmara de Pesquisa da Universidade Federal do Estado do Rio de
Janeiro (UNIRIO) (2014). Avaliadora do INEP - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio
Teixeira do Distrito Federal (2013-atual). Vice-presidente da Comissão própria de Avaliação da Universidade
Federal do Estado do Rio de Janeiro (CPA/UNIRIO). Membro do Centro de Estudos do Instituto de Informação
Científica e Tecnológica da Fundação Oswaldo Cruz- FIOCRUZ (2015-atual). Coordenadora da Disciplina de
Organização do Conhecimento (KO) Científico e tecnológico em Saúde no Curso de Especialização em
Informação Científica e Tecnológica em saúde (ICICT/Fiocruz (2015-atual)). Professor Convidado do Programa
de Pós-graduação em Informação, Comunicação e Saúde (PPGICS/ICICT/Fiocruz) (2016-atual). Professora
Colaboradora do Mestrado profissional em Preservação e Gestão do Patrimônio Cultural das Ciências e da Saúde
(2018-atual). Coordenadora Geral do Programa Institucional de Iniciação Científica ICICT/Fiocruz do (PIBIC)
e do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação (PIBITI)
(2018-atual). Têm experiência na área de Ciência da Informação, atuando principalmente nos seguintes temas:
Sociologia da Ciência, Educação e Ética da Informação em Saúde, Gestão da informação em C&Ti e Saúde e
Análise de Redes Sociais. Professora e Pesquisadora na Unisul, Faculdade Tecnológica Senac.
http://lattes.cnpq.br/2343843346662688
carvalho.ldn@gmail.com
Marcia Heloísa Tavares de Figueredo Lima – Professora adjunta e pesquisadora do Departamento
de Ciências da Informação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2016-), curso de
Biblioteconomia e do Programa de Pós Graduação em Ciência da Informação da UFRGS (2018-).
Professora associada e pesquisadora aposentada (Universidade Federal Fluminense - 1994-2016),
atuou na docência dos cursos de Arquivologia, Biblioteconomia (1994-2016) e Mestrado Acadêmico
do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação - PPGCI/UFF (2009-2016). É bacharel em
Biblioteconomia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1982), especialista em Informação
Ambiental pela Universidade Federal de Viçosa (1984), mestre (1994) e doutora (2004) em Ciência
da Informação pela Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro em convênio
com o IBICT. Tem experiência no ensino e pesquisa e extensão na área de Ciência da Informação,
produzindo reflexões sobre: direito à informação, acesso e acessibilidade, censura, memória, avaliação
quantitativa da produção científica e usuários de bibliotecas universitárias. Coordenou o grupo de
pesquisa "Do Direito à Informação à Informação sobre os direitos" e participa dos grupos
Representações, Memória Social e Cidadania e Epistemologia e Filosofia da Informação, ambos da
UFRGS. Realizou estágio pós-doutoral no Centro Brasileiro de Pesquisas da Democracia da PUC/RS
em 2013 com pesquisa financiada pelo CNPq premiada pelo GT1 do ENANCIB (Florianópolis, SC,
2013)acerca das consequências da LAI sobre a produção brasileira sobre direito à informação no
domínio do Direito ORCID.0000-0002-2392-1107
http://lattes.cnpq.br/6563330119993372
marciahelolima@gmail.com
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[183]
Márcio da Silva Finamor – Mestre em Ciência da Informação pelo convênio entre o Instituto
Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT) e a Escola de Comunicação (ECO) da
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Especialista em Gestão Estratégica da Informação
pela Escola de Ciência da Informação na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Graduado
em Biblioteconomia e Documentação pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Tem experiências
na área de Biblioteconomia e Gestão em Unidades de Informação. Tem interesse na Ciência da
Informação e Administração, com ênfase na Gestão da Informação, Gestão Estratégica da Informação,
Gestão da Inovação, Estudos Humanísticos da Informação, Humanização nas Organizações e na
Formação do Profissional da Informação e suas perspectivas de atuação.
http://lattes.cnpq.br/1986491314636524
marciofinamor@gmail.com
Sarah Miglioli - Doutorado em Ciência da Informação no Instituto Brasileiro de Informação em
Ciência e Tecnologia (IBICT) convênio com a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Mestrado em Ciência da Informação no Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia
(IBICT) convênio com a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Graduação em
Biblioteconomia pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO). Bibliotecária do
Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES/MEC). Desenvolve pesquisas na área da Surdez e
Ciência da Informação.
http://lattes.cnpq.br/6608498609961897
smiglioli@gmail.com
Simone Faury Dib - Mestre em Ciência da Informação pelo Programa de Pós-Graduação em Ciência
da Informação, convênio UFRJ/IBICT (2013). Possui especialização em Gestão do Conhecimento e
Inteligência Empresarial pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2003) e graduação em
Biblioteconomia pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (1995). Atualmente é
bibliotecária da Fundação Oswaldo Cruz e atua na Biblioteca de Saúde Pública, participando do
desenvolvimento de produtos e de projetos institucionais, ministrando palestras e treinamentos, entre
outras atividades. Principais áreas de atuação e interesse de pesquisa: Administração de bibliotecas,
Gestão do conhecimento, Gestão estratégica da informação, Política de informação, Gestão de
processos e projetos, Bibliotecas digitais, Repositórios institucionais e Normalização bibliográfica.
http://lattes.cnpq.br/6076639441496056
simonefdib@gmail.com
Tirza c. F. R. Vargas - Mestre em Ciência da Informação no Programa de Pós-Graduação em Ciência
da Informação do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia/ Universidade Federal
do Rio de Janeiro. Possui graduação em Biblioteconomia pela Universidade Federal do Estado do Rio
de Janeiro (2013), hab. em Gestão da Informação. Trabalha como analista de informação desde 2004.
Participa do Grupo de Pesquisa Economias Colaborativas e Produção P2P no Brasil do Instituto
Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia, IBICT. Editor assistente das revistas Logeion:
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[184]
Filosofia da Informação e P2P & Inovação. Participou de projetos de avaliação e análise de requisitos
para sistemas de gerenciamento eletrônico de documentos e projetos de inovação em organizações.
Experiência em gestão de informação, documentação técnica de engenharia e sistemas de gestão
eletrônica de documentos. Áreas de interesse: estudos humanísticos da informação; organização do
conhecimento; gerenciamento eletrônico de documentos; comunicação e inovação.
http://lattes.cnpq.br/0786948390376844
rodriguestirza@gmail.com
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[185]
ANEXO II
PUBLICAÇÃO ORIGINAL DOS ARTIGOS
LIMA, Clóvis Ricardo Montenegro de; DIB, Simone Faury . Administração discursiva: uma nova
perspectiva para as bibliotecas universitárias brasileiras. Informação@Profissões, v. 2, p. 92-118,
2013.
LIMA, Clóvis Ricardo Montenegro de; FERNANDES, G. C. ; SILVA, Fabiana Menezes Santos da .
Competência comunicativa: uma competência administrativa para o bibliotecário universitário
contemporâneo. Informação@Profissões, v. 2, p. 119-133, 2013.
LIMA, Clóvis Ricardo Montenegro de; SILVA, Fátima Santana da ; FERNANDES, G. C. .
Administração de bibliotecas em instituições privadas de ensino superior: uma abordagem discursiva
a partir das novas demandas de acesso e uso da informação. Informação@Profissões, v. 2, p. 66-91,
2013.
LIMA, Clóvis Ricardo Montenegro de; SILVA, Simone Alves da . Ação discursiva do bibliotecário
escolar. Informação@Profissões, v. 2, p. 134-157, 2013.
CARVALHO, L. S ; LIMA, Clóvis Ricardo Montenegro de . Administração da informação para a
inovação em uma organização. Informação & Informação (UEL. Online), v. 2, p. 1-20, 2014.
LIMA, K.P. ; MIGLIOLI, S. ; LIMA, Clóvis Ricardo Montenegro de . Da Comissão Nacional da
Verdade ao Direito à Verdade: a validação discursiva das coleções nas bibliotecas.
Informação@Profissões, v. 4, p. 31-55, 2015.
LIMA, Clóvis Ricardo Montenegro de; SILVA JUNIIOR, J.F. ; FINAMOR, M.S. Contribuições da
discursividade para a construção de repositórios digitais. Informação@Profissões, v. 4, p. 4-30,
2015.
CAJÉ, B.C.M. ; LIMA, Clóvis Ricardo Montenegro de ; LIMA, M.H. . Uma abordagem
habermasiana para otimizar o desenvolvimento de organizações: o caso da Biblioteca Digital de
Teses e Dissertações brasileira. In: Clovis Ricardo Montenegro de Lima. (Org.). Anais do 11 º
Colóquio Habermas e 2 º Colóquio de Filosofia da Informação. 1ed.Rio de Janeiro: Salute, 2016,
v. 1, p. 522-540
VARGAS, T. C. F. R. ; LIMA, Clóvis Ricardo Montenegro de . Uma abordagem humanistica para o
trabalho com informação. In: Clovis Ricardo Montenegro de Lima. (Org.). Anais do 12º Colóquio
Habermas e 3º Colóquio de Filosofia da Informação / 12º Colóquio Habermas e 3º Colóquio de
Filosofia da Informação. 1ed.Rio de Janeiro: Salute, 2016, v. 1, p. 202-217.
LIMA, Clóvis Ricardo Montenegro de; FINAMOR, M.S. . Uma perspectiva ética para o trabalho
informacional: o discurso em organizações complexas. In: LIMA. Clóvis Montenegro de. (Org.).
Anais do 13º Colóquio Habermas e 4º Colóquio de Filosofia da Informação. 1ed.R: S, 2017, v. ,
p. 332-362.
COLEÇÃO HABERMAS, DISCURSO E ORGANIZAÇÕES – V. 3
[186]
© 2019 EDITORA Salute
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