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 Universidade do Estado da Bahia – UNEB Departamento de Educação Grupo de Pesquisa: Comunidades Virtuais Campus I – Salvador Jogos eletrôni cos e educação: desenvolvimento, pesquisa e práticas pedagógicas Lynn Alves Salvador, dezembro, 2009

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Jogos eletronicos e educacao

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  • Universidade do Estado da Bahia UNEB Departamento de Educao

    Grupo de Pesquisa: Comunidades Virtuais

    Campus I Salvador

    Jogos eletrnicos e educao: desenvolvimento, pesquisa e prticas pedaggicas

    Lynn Alves

    Salvador, dezembro, 2009

  • Jogos eletrnicos e educao: desenvolvimento, pesquisa e

    prticas pedaggicas

    Lynn Rosalina Gama Alves1

    A presena dos jogos eletrnicos na sociedade contempornea vem crescendo

    de forma significativa, fomentando uma das maiores indstria de

    entretenimento. Segundo a ESA - Entertainment Software Association no

    perodo de 1996 a 2008 houve um crescimento das vendas de videogames nos

    Estados Unidos, atingindo em 2008 um percentual de 11 bilhes de dlares.

    Estes nmeros refletem no mercado Europeu que depois dos Estados Unidos e

    sia tambm apresenta nmeros expressivos.

    Contudo, o nmero de empresas brasileiras que atuam no mercado de games

    ainda bastante tmido. A Associao Brasileira de Desenvolvedores de Jogos

    Eletrnicos (ABRAGAMES), conta apenas com 29 empresas associadas e 14

    instituies afiliadas corporativas (Bahia, Rio de Janeiro, So Paulo, Braslia,

    Pernambuco, Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Chile), perfazendo um total de

    apenas 43 grupos que desenvolvem jogos digitais no Brasil. As empresas esto

    distribudas nos estados de So Paulo (10), Pernambuco (04), Sergipe (01), Rio

    Grande do Sul (05), Santa Catarina (03), Esprito Santo (01) e Minas Gerais

    (01), Paran (03), Amazonas (01)2. Em contraponto, na pesquisa realizada pela

    ABRAGAMES em 2005, foram identificadas cinqenta e cinco empresas, neste

    segmento sinalizando um possvel crescimento na rea e empregam em mdia,

    apenas 15 funcionrios e juntas, faturam R$ 20 milhes por ano.

    1 Professora Adjunta da UNEB Campus I, doutora em Educao e Comunicao. http://www.lynn.pro.br, [email protected] 2 Dados atualizados atravs de correspondncia eletrnica com Mariana Whitaker, responsvel pela pesquisa realizada pela ABRAGAMES em 2008.

  • No programa grandes Empresas e pequenos negcios exibido pela Rede Globo

    no dia 26/04/09 foi divulgado que no Brasil o Produto Nacional Bruto de jogos

    quase de R$ 90 milhes em software e hardware e o faturamento deste

    segmento em 2008 atingiu R$ 87,5 milhes3.

    Merece destaque no Brasil, o jogo desenvolvido pela Hoplon Entertainment, em

    Florianpolis (SC), o Taikodom, um massive social games, que levou quatro

    anos para ser concludo, com um custo de aproximadamente 15 milhes de

    reais4 e est sendo lanado pela Devir. Outro sucesso o Capoeira Legend,

    para PC, produzido pela Donsoft Entertainment e levou seis anos de

    desenvolvimento5.

    Esta discrepncia entre os dados (2005 e 2009) sinaliza a existncia de

    empresas que ainda no se associaram, embora essa filiao no implique em

    nenhum custo, a exemplo da Bahia que possui uma empresa voltada para o

    desenvolvimento de jogos em flash (inclusive advergames), duas empresas que

    dentre outros servios, produzem jogos e trs instituies de ensino e pesquisa

    que desenvolvem jogos eletrnicos, com apenas duas afiliada at o presente

    momento..

    Na Bahia, o desenvolvimento de jogos ainda inexpressivo, existem

    efetivamente cinco grupos que vem produzindo essas mdias para o mercado

    local. A Virtualize Interatividade Digital6 formada por egressos da Universidade

    do Estado da Bahia (UNEB) dos cursos de Computao e Desenho Industrial; o

    grupo de pesquisa Comunidades Virtuais da Uneb7, do Ncleo de Educao a

    3 Indstria do videogame movimenta bilhes em todo o mundo. Disponvel em: http://video.globo.com/Videos/Player/Noticias/0,,GIM1095900-7823-INDUSTRIA+DO+VIDEO+GAME+MOVIMENTA+BILHOES+EM+TODO+O+MUNDO,00.html 4 Disponvel para downloads na URL: http://www.taikodom.com.br/downloads 5 Este jogo ganhou o premio de melhor jogo nacional no SBGAMES -2009. Demonstrao gratuita para download na URL: http://capoeiralegends.com.br/capoeiralegends/TheGame.aspx?lg=Pt 6 http://www.virtualizeid.com.br/ 7 http://www.comunidadesvirtuais.pro.br/triade/

  • Distncia do Servio Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI)8; o

    Indigente9 ligado ao Departamento de Computao da UFBA, que centra suas

    atividades no desenvolvimento de motores em cdigo aberto e; o Instituto do

    Recncavo de Tecnologia10.

    Alm desses grupos podemos sinalizar tambm o grupo do Departamento de

    Computao - Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS) em parceria

    com o Departamento de Biologia da Universidade Federal da Bahia (UFBA)

    que como a UNEB e o SENAI foram selecionados no edital do

    MCT/FINEP/MEC Jogos Eletrnicos Educacionais 02/2006 para a construo

    e desenvolvimento de um jogo eletrnico educacional em sintonia com os

    Parmetros Curriculares Nacionais, documento que regulamenta os contedos

    escolares a serem desenvolvidos nas escolas do 1 ao 9 ano do Ensino

    Fundamental e do 1 ao 3 ano do Ensino Mdio. Este edital merece destaque

    devido a receptividade que teve das instituies de ensino e pesquisa que

    enviaram em torno de 105 projetos dos quais foram selecionados 13. As

    seguintes instituies foram selecionadas: Universidade Federal do Par

    (UFPA), Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS/CESUP),

    Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Universidade Federal da

    Bahia (UFBA), Fundao Universidade Federal do Rio Grande (FURG),

    Universidade Federal do Paran (UFPR), Universidade do Estado da Bahia

    (UNEB), Servio Nacional de Aprendizagem Industrial/Departamento Regional

    Bahia (SENAI/BA), Universidade Federal de So Paulo (UNIFESP),

    Universidade Federal da Paraba (UFPB), Universidade Federal do Rio Grande

    do Sul (UFRGS) e Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

    Estes dados apontam para o grande potencial que o Brasil vem apresentando

    no que se refere no s a discusso terica sobre os games, mas

    principalmente para o espao de produo dessas novas mdias em instituies

    8 http://www.senai.fieb.org.br/conteudo.asp?pg=ead/home.html 9 http://indigente.dcc.ufba.br/

  • de ensino e pesquisa.

    Assim, esses grupos e outros que ainda atuam de forma no institucionalizada,

    aps identificarem as crescentes oportunidades do setor, seja atravs das

    empresas incubadoras, seja mediante o simples interesse e desejo em produzir

    jogos voltados apenas para o lazer ou aplicados nas empresas advergames,

    jogos para propaganda e bussiness games11 , para educao educao

    bsica e profissionalizante e entretenimento, vm construindo no Brasil, uma

    trilha de desenvolvimento e pesquisa neste segmento.

    Uma trilha que tem espaos definidos para discusso e socializao das

    pesquisas e desenvolvimento. Estamos nos referindo ao Simpsio Brasileiro de

    Jogos e Entretenimento Digital SBGames - que apresenta na sua

    configurao quatro tracks como computao, arte e design, indstria e cultura.

    Este ltimo criado em 2007 e apresentou um crescimento significativo no

    encaminhamento de papers que relatam e socializam as investigaes

    realizadas pelos pesquisadores das reas de cincias humanas e cincias

    sociais aplicadas. Por exemplo, em 2007 foram vinte e nove papers registrados,

    quarenta e um em 2008 e oitenta e nove em 200912, apresentando um

    crescimento em torno de 117% em relao ao ano de 2008. Tal crescimento

    ratifica a demanda e interesse da comunidade acadmica em investigar os

    games.

    Outro evento significativo que agrega estes pesquisadores o Seminrio Jogos

    Eletrnicos, Educao e Comunicao construindo novas trilhas criado pela

    10 http://www.reconcavotecnologia.org.br/sitenovo/portal/Portal.do 11 A exemplo do Jogo online criado para venda do desodorante Ax. Disponvel em: http://www.irresistivel.net/ Ou ainda a campanha publicitria do filme Avatar pela McDonalds que permite atravs de um jogo a imerso no mundo de Pandora. Disponvel em http://www.mcdonalds.com.br/avatar/ 12 Conforme registro na Plataforma Jems

  • UNEB em 200513 e j foi realizado pela Universidade Estadual da Paraba e em

    2009 realizado pela Universidade de Alagoas. Este evento foi avaliado pela

    CAPES em 2009 como qualis nas seguintes reas: B2 Arquitetura e Urbanismo,

    B4 Cincias Sociais Aplicadas e

    C Ensino de Cincias e Matemtica. Aqui vemos uma grande contradio, pois

    o evento nasce em um departamento e em um mestrado em Educao, mas

    esta Cmera na CAPES no julga relevante este tipo de discusso nesta seara,

    embora atravs da pesquisa realizada por Moura (2009), no Portal da CAPES

    em 2008, utilizando as palavras-chave games, jogos eletrnicos e jogos digitais,

    foram encontrados quarenta e cinco trabalhos, sendo que trinta e seis so

    dissertaes de mestrado e nove teses de doutorados, destas treze so na rea

    de educao. Assim, percebemos que o descompasso entre o que acontece no

    contexto da sociedade contempornea e a rea de Educao no se resume

    apenas ao cenrio pedaggico nos quais professores e alunos trilham o

    processo de ensinar e aprender, mas tambm no locus daqueles que pensam a

    pesquisa e polticas voltadas para a educao.

    Tanto no SBGames como no Seminrio as representaes das instncias

    polticas em nvel federal e estadual, a exemplo da FINEP e Ministrio de

    Cultura - MINC tem se feito presente, discutindo com os participantes polticas e

    aes voltadas para o segmento games. Estas participaes tem sido

    significativa na construo de um olhar diferenciado para estas mdias,

    principalmente para o MINC que atravs da Secretaria de Audiovisual vem

    compreendendo-as como elementos audiovisuais. Em sintonia com estas

    polticas a Secretaria de Cultura do Estado da Bahia desde de 2008 abriu um

    espao para discutir a emergncia de uma Rede Audiovisual na qual teria a

    representao dos games.

    E em 2009 a FAPESB propem a criao do Game Cluster que ir se constituir

    em uma rede de desenvolvimento de jogos digitais no Estado da Bahia. Esta

    13http://www.comunidadesvirtuais.pro.br/eventos.php

  • rede ser formada por universidades pblicas, privadas e por empresas que j

    vem atuando no segmento games, seja na rea de pesquisa ou

    desenvolvimento. A rede ser estruturada em quatro linhas de atuao, so

    elas: Formao inicial e permanente de mo de obra para atuar na rea;

    Criao de laboratrios compartilhados para os grupos envolvidos no projeto,

    potencializando assim as expertises de cada grupo; Fomentar a vinda de

    empresas de porte que possam absorver demanda de mo de obra criada e

    compartilhar novos conhecimentos especficos desta rea; Fomentar o mercado

    para absoro dos produtos produzidos pela rede; Criao de uma biblioteca

    colaborativa para uso e reuso dos objetos produzidos. Sintonizados com estas

    aes pretendemos fortalecer os grupos e empresas que pesquisam e

    desenvolvem games na Bahia, marcando um espao no cenrio nacional qui

    internacional.

    neste contexto que vem sendo desenvolvido na UNEB jogos eletrnicos

    voltados para o ensino da histria, construindo uma perspectiva diferenciada

    para a presena destes elementos tecnolgicos na sociedade contempornea.

    Jogos e educao delineando percursos

    Autores com Gee (2004), Shaffer (2006), Mendez, Alonso e Lacasa (2007),

    Prensky (2007) e Johnson (2005) entre outros vm apontando as potencialidades

    dos games para aprendizagem e o desenvolvimento cognitivo dos jogadores,

    desmistificando a idia de que os jogos eletrnicos so viciantes e alienantes. Ao

    contrrio, essas pesquisas nos levam a inferir que os jogos eletrnicos podem se

    constituir em significativos elementos mediadores que atuam na Zona de

    Desenvolvimento Proximal - ZDP dos sujeitos. Para Vigotsky (1984) a ZDP

    caracteriza-se pela necessidade que o sujeito tem da ajuda do outro para realizar

    atividades que ainda no pode se concretizar de forma independente. Assim, a

    linguagem miditica tem um papel fundamental nesse processo de mediao.

    Um locus que deve estar atento s relaes com os games, so os espaos de

  • formao de professores, objetivando estabelecer articulao entre o que esta

    acontecendo fora da escola, tornando a aprendizagem dos seus educandos

    contextualizadas com suas demandas e necessidades. Dentro dessa perspectiva,

    a FINEP, MCT e MEC em 2006, propuseram um edital para desenvolvimento de

    jogos eletrnicos para educao, aproximando-se assim, da lgica e desejo da

    gerao que nasceu imersa no mundo digitalizado e que exige cada vez mais

    prticas pedaggicas interativas.

    Aprende-se em outros espaos que no mais a escola e os games se constituem

    em mais um desses ambientes que no podem mais ser preterido.

    Em sintonia com as demandas dos nativos digitais (expresso utilizada por

    Prensky (2007), para se referir a gerao que nasceu imersa no mundo digital), o

    Grupo de Pesquisa Comunidades Virtuais desenvolveu um jogo no estilo

    adventure com elemento de Role Play Games RPG, denominado Trade

    Igualdade, Fraternidade e Liberdade, fruto do Projeto Trade - mediando o

    processo de ensino aprendizagem da histria, submetido e selecionado no edital

    do MCT/FINEP/MEC Jogos Eletrnicos Educacionais 02/2006, entre os 13 de 105

    propostas enviadas para a construo e desenvolvimento de um jogo eletrnico

    educacional.

    O Trade14 tem como objetivo a construo de conceitos da rea de histria de

    forma ldica e prazerosa, atravs da simulao da Revoluo Francesa, incluindo

    digitalmente professores e alunos da rede pblica. O fato histrico Revoluo

    Francesa ocorrido em 1789, foi escolhido pelos reflexos que foram irradiados em

    vrios pases fora da Europa, influenciando diversas revoltas que contestavam o

    Absolutismo, como a Revolta dos Alfaiates, ocorrida em Salvador no ano de 1798.

    O grupo de pesquisa vem desenvolvendo o jogo Bzios: ecos da liberdade,

    baseado nesta revolta.15

    Assim, o jogo tem a inteno de despertar nos sujeitos do processo de ensinar e

    aprender o desejo de desvendar a Histria, participando ativamente dela, exigindo

    do jogador ateno, concentrao, raciocnio lgico, capacidade de tomar

    14 Disponvel para download em www.comunidadesvirtuais.pro.br/triade 15 www.comunidadesvirtuais.pro.br/buzios

  • decises, habilidade para interagir com inmeras informaes ao mesmo tempo,

    solucionando problemas e desafios propostos pelo jogo.

    importante elucidar que o intuito do jogo no substituir as discusses das

    aulas, mas utiliz-lo elemento mediador do processo de construo do

    conhecimento e compreenso de aspectos abstratos (FIRMINO, 2005). Nada mais

    prazeroso do que aprender a Histria em uma atividade que envolve o aluno em

    todo seu potencial e cria a possibilidade da troca entre os pares. Trocas que

    acontecem pelas conversas e discusses, pelo ouvir, pela apresentao de

    argumentos, pelos conflitos e a mediao do professor no sentido de auxiliar os

    seus alunos na busca de uma autonomia moral e intelectual e no apenas uma

    obedincia cega, heternoma.

    Desta forma, Trade mediando o processo ensino aprendizagem da Histria se

    constituiu em projeto de pesquisa que teve a inteno de investigar, em um

    primeiro momento, os sentidos que os estudantes atribuem ao jogo para

    posteriormente averiguar as contribuies para aprendizagem, objetivando

    apontar formas diferenciadas de aprender o fato histrico. Nossa inteno

    averiguar se o Trade atua na zona de desenvolvimento proximal dos alunos e

    professores, favorecendo a emergncia de diferentes saberes que podem transitar

    do resgate de questes que envolvem a Histria e identidade dos sujeitos do

    processo de ensinar e aprender inseridos no universo da cultura digital.

    A pesquisa que encontra-se em andamento, na medida em que ainda iremos

    investigar tambm as contribuies do jogo Bzios, em 2010, est em sintonia

    com as novas demandas da SEC/BA que visa o desenvolvimento de pesquisas e

    propostas pedaggicas que possam contribuir para amenizar os problemas de

    evaso e repetncia na educao bsica no nosso estado, garantindo assim a

    qualidade da educao.

    No dia 12/11/07 o governo do Estado firmou convnio com uma universidade

    pblica para o desenvolvimento de inovao tecnolgica no sentido de amenizar

    os ndices negativos que marcam o quadro da educao na Bahia, que se

    apresenta com altas taxas de repetncia escolar e de distoro idade-srie. Este

    panorama vem se agravando ao longo dos anos na medida em que nos

  • defrontamos com dificuldades que vo desde problemas que envolvem questes

    infra-estruturais que refletem na formao dos professores, na poltica salarial, nas

    condies mnimas de trabalho e consequentemente no desejo de ensinar e

    aprender.

    Assim, nossas prticas terminam por ficar muitas vezes desarticuladas da

    realidade dos sujeitos do processo ensino aprendizagem que vivem imersos em

    outros universos semiticos e interagem cotidianamente com diferentes

    linguagens independentes dos seus nveis socioeconmicos.

    Estes sujeitos aprendem hoje em distintos espaos de aprendizagem, inclusive

    mediados pelas novas mdias e especialmente pelos jogos eletrnicos. Os jogos

    eletrnicos sempre despertaram a curiosidade das crianas e adolescentes, que

    passam boa parte do seu tempo imersos nestes mbitos semiticos (GEE, 2004).

    Abrindo a caixa de Pandora

    A presena dos jogos eletrnicos na sociedade contempornea vem se

    constituindo em um fenmeno cultural que exige a construo de olhares

    diferenciados seja na comunicao, na psicologia e/ou na educao, na medida

    em que essas novas mdias podem atuar como elementos mediadores do

    processo de construo de distintos conceitos.

    Novas mdias aqui compreendidas na perspectiva de Manovich enquanto objetos

    culturais que usam a tecnologia computacional digital para distribuio e

    exposio. Portanto, a internet, os sites, a multimdia de computadores, os jogos

    de computadores, os CD-Roms e o DVD, a realidade virtual e os efeitos especiais

    gerados por computadores enquadram-se todos nas novas mdias (2005, p. 27).

    No que refere ao cenrio pedaggico, os games tornam-se espaos de

    aprendizagem para prticas colaborativas atravs de simulaes marcadas por

    formas de pensamento no lineares que envolvem negociaes, abrem caminhos

    para diferentes estilos cognitivos e emocionais (TURKLE, 1997).

    Os games classificados como de simulao possibilitam aos jogadores

    experimentar situaes que no podem muitas vezes ser concretizadas no

  • cotidiano. Assim, atravs da mediao desses jogos possvel criar novas formas

    de vida, gerir sistemas econmicos, constituir famlias, enfim, simular o real,

    antecipar e planejar aes, desenvolver estratgias, projetar os contedos

    afetivos, culturais e sociais do jogador que aprende na interao com os jogos

    eletrnicos, complexas simulaes sociais e histricas, mediados por games como

    Age of Empires, Age of Mythology, Civilization, Food Force, The Sims, Sim City,

    entre outros.

    Como estes jogos no tm regras rgidas, admitem a emergncia de vrios estilos

    de jogos, construindo uma arrativa bem particular, idiossincrtica, permitindo a

    presena dos diferentes modelos de aprendizagem. Nesses enredos, possvel

    projetar questes particulares dos envolvidos nos games, ressignificando-as, isto

    , tornando-os autores, atores e interatores de suas histrias, autorizando-se no

    seu prprio processo de descoberta e construo.

    Para Johnson (2005), a srie de eventos gerados ao jogar que ir traar uma

    narrativa que despertar no jogador o prazer de acompanhar o desenrolar da

    histria que ser construda pelos desafios do game. Os obstculos cognitivos que

    emergem no cenrio de cada trama desenvolvem duas modalidades de trabalho

    intelectual: a sondagem e a investigao telescpica.

    A sondagem consiste na explorao do ambiente virtual, imitando o outro jogador,

    depois explorando por tentativa e erro, decifrando as regras, os enigmas,

    efetivamente aprende-se futucando, sem a necessidade de manuais. Essa

    investigao realizada pelo jogador para descobrir a lgica presente no game, a

    complexidade do seu sistema, ocorre muitas vezes de forma intuitiva. E isso

    que, atrai o desafio de desvendar esse novo objeto de investigao.

    Nesse processo de busca alm da sondagem, o jogador realiza uma construo

    hierrquica das tarefas/desafios propostos pelo jogo, percebendo as relaes que

    so estabelecidas e determinando as prioridades, configurando uma investigao

    telescpica.

    Assim, a investigao telescpica se caracterizar pela ordenao dos objetivos

    que evoluem dentro de um processo de hierarquizao das tarefas exigidas pelo

    jogo, exigindo do jogador uma viso sistmica da situao apresentada para que

  • possa estabelecer relaes entre os fatos apresentados, determinar prioridades,

    tomar decises, enfim desenvolver uma srie de estratgias a longo prazo.

    Johnson (2005) afirma que a dinmica acima favorece uma aprendizagem

    colateral, categoria terica que toma emprestado de Dewey. Desta forma, o autor

    enfatiza que o importante o modo como os jogadores esto pensando enquanto

    jogam e no o que esto pensando. Assim, essa aprendizagem colateral no est

    relacionada a contedos, mas sim a conceitos que so desenvolvidos e podero

    ser utilizados em diferentes situaes escolares ou no.

    Na tentativa de elucidar esse processo, Gee aponta que a interao com os

    games permite aos jogadores: a) Aprender a experimentar (ver e atuar sobre) o

    mundo de uma forma nova; b) Obter o potencial para unir-se e colaborar com um

    novo grupo de afinidades; c) Desenvolver recursos para uma aprendizagem futura

    e para a resoluo de problemas nos mbitos semiticos que esto relacionados o

    jogo; d) Aprender a pensar sobre os mbitos semiticos como espaos de

    desenho que implicam e manipulam gente de certa forma e os ajudam a criar, por

    sua vez, certas relaes na sociedade entre gente e os grupos de pessoas,

    algumas das quais tem importante implicaes para a justia social (2004, p. 55-

    56).

    Assim, podemos afirmar que o contato com os games possibilita aos jovens

    habilidades fundamentais para o sucesso do processo de ensino e aprendizagem

    na medida em que proporcionam habilidades e competncias para que se

    mantenham vivos na vida e no mundo do trabalho.

    O Raciocnio lgico, a criatividade, a ateno, a capacidade de solucionar

    problemas, a viso estratgica e, principalmente, o desejo de vencer so

    elementos que podem ser desenvolvidos na interao com os games. A

    possibilidade de vivenciar situaes de conflito que exige tomada de decises se

    constitui em uma estratgia metodolgica que pode contribuir para a formao

    profissional dos estudantes dos diferentes nveis de ensino. A experincia do

    grupo Epistemic Games10 coordenado por David Schaffer pauta-se nessa

    assertiva, na medida em que so desenvolvidos games para adolescentes com o

    objetivo de favorecer a emergncia de habilidades cognitivas que podero

  • contribuir para uma escolha profissional futura. Os jogos produzidos por este

    grupo tm o objetivo de ajudar os jogadores atravs de simulaes a aprender a

    pensar como engenheiros, planejadores urbanos, jornalistas, advogados, dentre

    outras profisses, ando-lhes as ferramentas que precisam para sobreviver num

    mundo em mutao. O grupo j desenvolveu os jogos Digital Zo, Urban Science,

    ournalism.net, Science.net, Pandora Project e Eschers World.

    Logo, a mediao dos jogos eletrnicos pode promover uma aprendizagem

    dinmica e interativa que desafia cognitivamente os aprendentes a solucionarem

    problemas, contribuindo para construo de prticas construtivistas. A inteno

    no apenas animar o fazer pedaggico, mas implicar os alunos na interao

    com os objetos de conhecimento, desenvolvendo distintos conceitos, articulando a

    teoria com a prtica. Tambm no nosso objetivo transformar a escola em uma

    lan house, engessando os jogos em uma matriz curricular. Uma caracterstica

    bsica dos jogos ser divertido. Torn-lo uma experincia obrigatria no cenrio

    escolar pode se constituir em um grande equvoco, na medida em que estes

    elementos tecnolgicos por si s, no podem cumprir a funo da escola e

    consequentemente dos professores. Os games podem estar presentes no espao

    pedaggico articulados com as distintas linguagens (refiro-me a oralidade, escrita,

    imagem, informtica, dentre outras) que contribuem para transmisso e

    socializao de informaes que significadas e ressignificadas pelos alunos

    podem favorecer a construo de novos conceitos.

    a diversidade de alternativas, presentes nos jogos eletrnicos que mobilizam os

    sujeitos de diferentes faixas etrias para interagir com os suportes tecnolgicos,

    criando comunidades para efetivar discusses que transitam entre as estratgias

    dos jogos at questes relacionadas com as narrativas que exigem um

    conhecimento cientfico. Um exemplo disto so as comunidades de fansfictions

    que mediados por interfaces comunicacionais como os foruns, blogs, sites de

    relacionamento (a exemplo do orkut, facebook, etc), twitter, etc criam fices

    usando personagens e universos dos contedos miditicos. Assim, discutem,

    ampliam, criam, recriam os discursos miditicos com os quais tem afinidade. Para

    ilustrar tal afirmativa, podemos citar o caso, de uma comunidade no orkut criada

  • para discutir o jogo Metal Gear Solid que tem a sua primeira verso datada de

    1988, tendo, portanto, 21 anos de existncia. Este jogo que passou por um

    processo de evoluo da sua narrativa, da qualidade de sua arte, jogabilidade e

    realismo das cenas, rene jogadores de distintas idades para discutir os diferentes

    aspectos ligados ao jogo, inclusive questes de ordem filosfica, j que o MGS,

    como conhecido pelos jogadores, traz no roteiro a temtica da clonagem. Outro

    exemplo, tambm interessante o da comunidade do jogo O Inferno de Dante que

    ser lanado em 12 de fevereiro de 2010 e h mais de um ano tem uma

    comunidade que discute entre outros aspectos semelhanas e diferenas entre o

    livro, A Divina Comdia e o game.

    Desta forma, essas comunidades podem se tornar em locus para realizao de

    leituras crticas que passam pela anlise de contedos que envolvem aspectos

    relacionados com as questes culturais, de gnero, tnicas (elemento relevante

    para ser analisado, principalmente em um pas como o nosso, que apresenta uma

    grande diversidade cultural), ticas e os valores implcitos e explcitos se

    constituem tambm pontos relevantes, na medida em que temos disponvel no

    mercado jogos que so considerados politicamente incorretos, pois trazem aes

    violentas muitas vezes atreladas a prticas criminosas.

    Os avanos tecnolgicos que favorecem a interatividade, a interconectividade, o

    realismo e jogabilidade se constituem hoje o elemento que mais seduz os gamers,

    configurando a esttica do jogo. Obviamente que estes aspectos esto envoltos

    em questes ideolgicas e podem e devem ser discutidos sob diferentes pontos

    de vista, em uma perspectiva multirreferencial, tornando-se cenrio para frutferas

    investigaes e espao de aprendizagem formal.

    Na abordagem multireferencial, contempla-se diferentes olhares para a mesma

    realidade, sem excluir a contradio, a multiplicidade, heterogeneidade que

    permeiam a relao pedaggica. Os saberes so considerados incompletos, so

    constantemente ressignificados. Objetiva-se expandir as fronteiras de cada

    disciplina, desarticulando o fio condutor, transcendendo os limites territoriais da

    disciplina (BURNHAM, 1993)

    Os discursos presentes nos mbitos semiticos como os games, a Tv ou cinema

  • migram cotidianamente de uma mdia para outra na tentativa de atingir a

    audincia. Atualmente, percebemos um movimento interessante, o deslocamento

    das tramas e narrativas dos seriados exibidos em canais fechados para linguagem

    dos jogos eletrnicos. Seriados como 24 horas, Lost, CSI e mais recentemente

    Desperate Housewives se tornaram games, direcionando o pblico que at ento

    estava habituado a ver as imagens saltarem da tela atravs de narrativas

    predefinidas a se tornar interator, ator/autor das suas histrias preferidas.

    Esta convergncia miditica vem possibilitando a emergncia de uma da narrativa

    transmiditica defendida por Jenkins (2008) que se estrutura como uma nova

    esttica para atender as novas exigncias dos consumidores que passam a ser

    mais crticos e produtores de contedo, na medida em que participam ativamente

    de comunidades de conhecimento, criando um novo universo mediado por

    mltiplos suportes miditicos.

    Johnson (2005) em interlocuo com Steve Jobs nos aponta a diferena que este

    faz entre a televiso e a web. A primeira caracteriza-se pela mdia que assiste-se

    recostado e a segunda, que assiste-se sentado na ponta da cadeira. A idia dessa

    convergncia de linguagens que vem sendo realizada dos seriados para os games

    muito mais do que ficar em alerta na ponta da cadeira, mas convida-nos a

    imergir no universo da trama, participar, fazer escolhas, tomar parte do enredo.

    Assim, como Turkle (1997) que discutiu a vida na tela, Johnson nos alerta para

    pensar que a prxima gerao est deslocando essa lgica para um novo

    extremo: a tela no apenas algo que voc manipula, mas algo no qual voc

    projeta sua identidade, um local para trabalhar do comeo ao fim a histria de sua

    vida medida que ela desenrola. (2005, p.95). Nessa imerso os interatores so

    convidados a resolver enigmas, a tomar decises fazendo escolhas que como na

    vida real podem implicar em perdas. Como o j to estudado - jogo de faz de

    conta que marca o desenvolvimento cognitivo das crianas, estes jogos permitem

    o exerccio, a vivncia de situaes que no podem ser vividas

    momentaneamente, mas que podero ser exigidas no futuro.

    Nesse cenrio, surge uma grande preocupao com a forma como os nativos

    digitais vem aprendendo. Nativos digitais uma expresso tambm utilizada por

  • Kathleen Tyner para se referir a gerao que [...] gasta boa parte do seu dia com

    aquilo que ela chama de screen time (tempo de tela), o que inclui as mensagens

    on-line; os jogos eletrnicos; a navegao na internet; o download de msicas e

    documentos pela web; o envio de e-mails; e, claro, o ato de assistir TV, como

    acontece em qualquer parte do mundo16.

    Assim, a pesquisa17 realizada se caracterizou tambm como uma inovao

    tecnolgica na medida em que desenvolvemos um game a partir de um processo

    de investigao e aps o desenvolvimento do jogo eletrnico Trade18,

    identificamos as contribuies do jogo produzido para a aprendizagem dos

    sujeitos do processo de ensinar e aprender. A aprendizagem aqui compreendida

    alm da apropriao dos contedos escolares, mas os sentidos e significados que

    os alunos do 8. e 9. atriburam ao jogo.

    O jogo Trade foi desenvolvido com o objetivo de possibilitar o aprendizado da

    Histria, em especial da Revoluo Francesa, utilizando a linguagem na qual

    esto imersos os sujeitos que fazem parte de uma gerao que nasceu em

    contato direto com as novas mdias.

    O plano de fundo da trama do Trade, a Revoluo Francesa, retratada da

    maneira mais fiel possvel, levando em considerao o fato do jogo no ser vida

    real (HUIZINGA, 2001, p.11), pois atua como escape da vida cotidiana para um

    mundo imaginrio ou paralelo ao real. Elementos fictcios foram acrescentados

    trama fundamentados e/ou agregando valor ao enredo, criao de novos

    personagens e eventos baseados em especulaes (sem comprovao histrica).

    O cenrio do game a ambientao da Frana na poca revolucionria, nas quais

    foram registrados acontecimentos importantes do perodo em questo. Seguindo o

    16 T Y N E R , K a t h l e e n . E n t r e v i s t a d i s p o n v e l n a U R L : http://www.multirio.rj.gov.br/portal/riomidia/rm_materia_conteudo.asp?idioma=1&v_nome_area=Materias&idMenu=3&label=Materias&v_id_conteudo=63973>. Acesso em 10 mai. 2007. 17 importante ressaltar que tanto o processo de desenvolvimento quanto o de investigao junto aos alunos envolveu uma equipe formada por profissionais da rea de arte, design, msica, histria, informtica e pedagogia, alm dos mestrandos em Educao e Contemporaneidade e bolsistas de iniciao a pesquisa. Parte dessa pesquisa foi apresentada em ALVES, L. R. G., Neves, Isa, Martins, J., MOURA, J., FRAGA, Giulia, PAZ, T., RIOS, V. S. Games e Histria: construindo trilhas pedaggicas In: 19. Encontro de Pesquisa Educacional do Norte e Nordeste (EPENN), 2009, Joo Pessoa. 18 Disponvel para donwload em www.comunidadesvirtuais.pro.br/triade

  • esquema geral de um RPG, esses ambientes so visualizados atravs de mapas,

    dispostos em trs nveis: a) uma viso panormica da Frana, onde o jogador

    estar situado quanto disposio da cidade; b) uma viso intermediria, onde o

    jogador ter noo do espao geogrfico da cidade, podendo se deslocar, por

    exemplo, da feira para sua casa, etc; c) uma viso micro, na qual o jogador

    visualizar o espao interno das edificaes presentes no mapa da cidade, tais

    como: o interior de sua casa, de um palcio, etc.

    O jogo dever ser jogado no modo single player (um usurio por vez) e o jogador

    ir jogar com trs personagens (Henry de Vallois, Jeanne de Vallois e Claude).

    Os embates fsicos so inevitveis, contudo, o jogo no faz apologia violncia. O

    jogo tem pelo menos, dois possveis finais: um no qual Jeane se junta ao

    jacobinos e outro no qual estar do lado dos girondinos.

    No momento em que oferecemos para os jogadores a possibilidade de escolha

    entre dois enredos, que representam cada um deles, a hegemonia de interesses e

    anseios bastante diferentes, estamos favorecendo no somente a compreenso

    dos acontecimentos referentes ao perodo histrico estudado, mas a possibilidade

    do aluno/ jogador refletir acerca de outras possibilidades histricas.

    No que se refere ao ensino de histria, teremos uma simulao que favorecer

    uma postura crtica e reflexiva em relao ao contexto em questo (a Revoluo

    Francesa), pois o aluno no apenas se apropriar dos acontecimentos ocorridos

    na poca, como poder refletir, e experimentar no jogo outros acontecimentos.

    Independente do fato de uma vitria Jacobina (popular) ter sido ou no vivel

    historicamente, levando-se em considerao as reais possibilidades e

    amadurecimento da poca, acreditamos que essa possibilidade da fico do jogo

    cumpre um papel educacional: contribuir para a reflexo e questionamento

    histrico. (Por que ser que os jacobinos no ganharam a revoluo em 1789?

    Ser que se houvesse uma revoluo no Brasil hoje, ainda que bastante diferente

    da Francesa no sculo XVIII, os interesses populares teriam alguma chance? De

    que forma?).

    Partindo do scio-construtivismo como concepo poltico-pedaggica norteadora

    da pesquisa, temos como base para traar e fundamentar nossos objetivos, com

  • relao ao ensino de histria, a compreenso do o conhecimento histrico como

    dinmico, como uma atitude de reflexo e compreenso do passado, na qual o

    sujeito do presente interpreta as fontes histricas de maneira ativa e de acordo

    com o contexto no qual est inserido. Tal conhecimento, estruturado a partir da

    atitude investigativa do sujeito cognoscente, que ir analisar as fontes disponveis

    (textos, hipertextos, inventrios, mapas, histrias em quadrinho, vdeos, etc.) e

    construir criticamente sua compreenso, favorecer uma leitura interpretativa,

    histrica e/ou analtica do seu presente. O Trade visa contribuir nesse

    direcionamento.

    Logo, em consonncia com uma perspectiva vygotskiana, intencionamos em um

    segundo momento da pesquisa (maro de 2010) investigar se o jogo Trade atua

    na zona de desenvolvimento proximal dos alunos, mediando a aprendizagem dos

    pilares que marcaram a Revoluo Francesa, ao passo que proporcionar ao

    jogador/estudante uma reflexo acerca do seu atual contexto, das questes de

    desigualdade social e resistncia scio-poltica dos grupos sociais atualmente

    presentes na sua cidade/estado/pas, alm de servir como motivao para uma

    reflexo acerca do seu lugar na sociedade. O jogador/estudante, ao fazer suas

    escolhas no jogo (um jogo onde existir explicitamente interesses poltico-

    econmicos de grupos sociais distintos), ser convidado implicitamente a pensar

    interesses poltico-econmicos seus, da sua famlia, do seu grupo, fator que

    favorecer um sentimento consciente de pertencimento a determinado grupo

    social do seu contexto. Todo esse movimento de reflexo instigado pelo jogo ter

    como base uma analogia entre o contexto que subsidiar o jogo (final do sculo

    XVIII na Frana) e o contexto vivenciado pelo jogador/estudante, o incitar a se

    envolver em questionamentos do tipo: quem seriam os girondinos da atualidade?

    Quais seriam as reivindicaes, os anseios que mobilizariam uma revoluo hoje?

    Quais so as proximidades entre o que est sendo tratado no jogo e o que

    vivencio agora no sculo XXI? Dentre outras inmeras possveis questes.

    Diante desse principal objetivo o jogo pode atuar como propiciador de

    questionamentos e reflexes, alm da apropriao de elementos pertinentes ao

    contexto da Revoluo Francesa, mas ser necessrio e fundamental o

  • envolvimento com textos e livros que discutem o perodo em questo, a fim de

    subsidiar a construo do contexto histrico, da narrativa que no ser linear, mas

    que se ramificar mediante a participao dos jogadores. A inteno do jogo no

    definir um ganhador ou perdedor, mas envolver todos os alunos e professores no

    processo de construo de significados para a aprendizagem da histria de forma

    interativa, onde seja possvel intercambiar, negociar e socializar diferentes

    saberes, indo alm da memorizao de datas e fatos.

    Trade em cena

    Desenvolver um jogo com a mesma lgica dos jogos eletrnicos comerciais que

    seduzem os jogadores, com contedos escolares, se constituiu um grande desafio

    trilhado pelo grupo de pesquisa referenciado acima. Foi o momento de sair dos

    discursos tericos que norteiam as reflexes sobre os jogos eletrnicos e

    aprendizagem e produzir mdias que reflitam estas perspectivas19. Aps a

    produo do Jogo foi necessrio ir a campo e escutar os sujeitos/jogadores.

    O processo de concepo e desenvolvimento levou trinta e dois meses, incluindo

    trs processos de validao, a fim de avaliar as questes de interface e

    jogabilidade. Aps essas etapas o projeto iniciou o momento de interlocuo com

    os alunos com o objetivo de avaliar os sentidos que estes sujeitos atribuam ao

    Jogo.

    Assim, o Jogo entra em cena no perodo de agosto a dezembro de 2008, para os

    trinta e seis alunos do 8 e 9 ano do Ensino Fundamental de dois colgios

    situados no entorno da UNEB que atendem a estudantes cuja renda familiar

    mensal est em torno de seis salrios mnimos.

    A opo metodolgica da pesquisa foi qualitativa por ter a inteno de

    compreender o significado e as relaes que os alunos estabeleciam com o jogo.

    A pesquisa qualitativa tem como caractersticas: o ambiente natural como fonte

    direta dos dados e o pesquisador como instrumento-chave; os dados coletados,

    19 Estamos nos referindo aos autores Gee (2004), Shaffer (2006), Mendez, Alonso e Lacasa (2007),

  • em sua maioria, so essencialmente descritivos; os investigadores qualitativos se

    preocupam muito mais com o processo e no simplesmente com os resultados e o

    produto; a anlise dos dados tende a ser um processo indutivo; o "significado" que

    as pessoas do s coisas e sua vida a preocupao essencial na abordagem

    qualitativa (BOGDAN; BIKLEN, 1994).

    Partindo dessas premissas, iniciamos a investigao em trs momentos. No

    primeiro foi aplicado um questionrio com questes abertas e fechadas

    objetivando delinear o perfil dos jogadores. A interao dos sujeitos com o jogo

    desenvolvido caracterizou o segundo momento, no qual foram observadas as

    dificuldades e jogabilidade apresentada. E finalmente, realizamos a entrevista,

    para avaliar os sentidos/significados que foram atribudos ao jogo. importante

    ressaltar, que estas fases estavam interligadas e se retroalimentavam.

    Desvendando o universo dos jogadores

    O ambiente dos jogos eletrnicos foi sempre marcado pela presena do pblico

    masculino, por trazer narrativas que muitas vezes no eram atraentes para o

    pblico feminino. Contudo, essa configurao vem sofrendo modificaes, na

    medida em que os desenvolvedores de jogos vm apresentando produtos com

    roteiros que passam a atrair o gnero feminino, como uma estratgia comercial.

    Este dado pode ser ratificado no perfil dos sujeitos desta pesquisa, composto por:

    53% do gnero masculino e 47% do gnero feminino.

    O contato com os jogos foi registrada por todos os alunos entrevistados,

    principalmente com o The Sims que um simulador de papis, tambm conhecido

    como God Games, no qual possvel criar narrativas, escolhendo personagens

    que compem relaes familiares, brincando de Deus. Neste jogo, as histrias e

    os personagens podem ser criados e comandados pelos prprios jogadores que

    agendam atividades, programam o futuro, ou seja, interferem diretamente nos

    percursos dos personagens ao longo da histria (XAVIER, 2007).

    A pesquisa pode ratificar que os sujeitos que esto na faixa etria de 12 a 17 anos

    Prensky (2007) e Johnson (2005)

  • apresentam um nvel significativo de interao com as novas mdias,

    especialmente, os jogos eletrnicos.

    Assim, quando indagados sobre a freqncia com que interagiam com os jogos,

    coletamos os seguintes dados: 31,42% registraram que jogavam todos os dias,

    14,29% apenas uma vez por semana, 20% mais de uma vez por semana, 11,43%

    nos finais de semana e 22,86% raramente.

    A pesquisa realizada identificou que o locus predominante para interao com os

    jogos so os espaos pblicos, como as Lan House, pontuado por 44,44% dos

    entrevistados. Estes espaos se constituem em um fenmeno importado da

    Coria, a lanhouse um conceito que trabalha a interao entre usurios em rede. Sua concepo intimamente ligada aos jogos eletrnicos, todavia, atualmente bem mais ampla. Sua proliferao no comeo da dcada nos grandes centros passou por transformaes significativas. Antes focadas em clientes mais elitizados de reas nobres e shopping centers, hoje, existem lanhouses espalhadas pelas periferias, aglomerados e pelo interior do pas. Em muitas comunidades pobres existem centenas desses espaos (COMIT GESTOR DA INTERNET, 2008, p. 47-48).

    O dado acima ratifica a pesquisa realizada pelo Comit Gestor da Internet em

    2008, ao afirmar que [...] quase metade dos internautas brasileiros acessam

    Internet em locais pblicos pagos. Nesse particular, as lanhouses tm um papel

    fundamental, juntamente com cyber cafs e outros pontos de acesso. (p. 47-48).

    A Lan House um espao de intensa interao entre pessoas e neste cenrio, os

    jogos eletrnicos tm assumido um papel importante nessa dinmica, j que

    atravs dos contatos presenciais, os jogadores, que externam sensaes, trocam

    tticas de jogo, jogam de forma colaborativa, conhecem pessoas e se divertem.

    Imersos no universo digital, os sujeitos da pesquisa tiveram a oportunidade de

    interagir com um jogo que tinha a inteno de se constituir em um espao para

    aprendizagem escolar e que traz no seu roteiro um contedo indicado nos

    Parmetros Curriculares Nacionais, um jogo srio.

    Os Serious games ou jogos srios uma denominao que vem sendo utilizada

    para jogos eletrnicos produzidos com o objetivo de mediar aprendizagem ou

    treinar determinadas habilidades, ganhando cada vez mais, o mercado e a

    ateno dos consumidores e usurios de games. Os games com esta inteno,

    principalmente os jogos de computador, encontram um mercado crescente no

  • Brasil tanto para os processos de formao presenciais ou a distncia, mediados

    pelas tecnologias digitais e telemticas, estes elementos tecnolgicos passam a

    integrar o leque de mdias que podem ser utilizadas nos cursos seja nos espaos

    acadmicos ou empresariais. (VIEIRA, 2006,)

    Assim, estes jogos tm o objetivo de habilitar o jogador para agir em determinadas

    situaes, se diferenciando das demais categorias (adventure, RPG, combate,

    esporte, dentre outros.) devido a preocupao educacional que apia o processo

    de desenvolvimento que passa a ser norteado por uma concepo pedaggica

    explcita nos objetivos propostos pelo jogo. Os Serious games desenvolvidos para

    os cenrios pedaggicos tem a inteno de criar espaos de aprendizagem para o

    desenvolvimento e potencializao das funes cognitivas como memria,

    ateno, percepo, criatividade, entre outras; alm da construo de

    determinados conceitos. Dentro dessa perspectiva, o jogo desenvolvido pelo

    grupo de pesquisa Comunidades Virtuais pode ser classificado nesta categoria,

    por ser planejado e produzido em sintonia com a perspectiva scio-construtivista,

    com objetivos pedaggicos previamente estabelecidos que visam a aprendizagem

    de contedos histricos relacionado Revoluo Francesa.

    Construindo sentidos para o jogo produzido

    Para investigar os sentidos que os alunos construram para o jogo, realizamos

    uma entrevista semi-estruturada que possibilitou a emergncia dos dados abaixo.

    Assim, ao indagar se os sujeitos identificaram o tema do jogo, foram destacados

    os seguintes aspectos: contedo histrico, tipologia do jogo, relao com o pas

    evidenciado no jogo, relao com a narrativa e respostas divergentes do tema em

    questo, isto , que fugiam totalmente da temtica apresentada. O fato histrico

    Revoluo Francesa foi apontado por 66,6% dos alunos como tema central do

    jogo, 5,5% deles tambm abordaram aspectos como o contexto da Frana no

    sculo XVIII e apresentaram elementos referentes ao enredo do jogo, identificando

    na narrativa um pensamento de luta contra a Nobreza e o Clero representado pelo

    personagem principal. O lema Igualdade, Liberdade e Fraternidade foi tambm

  • apontado como tema do jogo apenas por 2,7% dos alunos e 25,2% no

    identificaram a temtica apresentada . Esses dados indicam que embora um dos

    trinta e seis alunos tenha alcanado a fase do jogo que retrata o incio dos atos

    revolucionrios, vinte e seis alunos identificaram o tema do jogo a partir do

    contexto apresentado na narrativa do game.

    No que se refere ao pas evidenciado no jogo, cerca de: 8,3% conseguiram

    identific-lo chegando a citar informaes sobre a cultura da Frana. No entanto,

    22,2% alunos apresentaram respostas divergentes referenciando o tema abordado

    no Jogo com informaes de outros pases e contextos histricos. Estes dados

    apresentam uma inconsistncia em relao ao item anterior, isto , vinte seis

    alunos indicam o tema mais apenas trs identificam o pas evidenciado no Jogo.

    Acreditamos que este fato deve-se ao reconhecimento apenas do contexto de luta

    social e revolucionrio presente no game.

    Dificuldades enfrentadas ao interagir com o Jogo

    Na interao entre jogadores-jogo, a dificuldade de atingir os objetivos propostos

    no Jogo foi ressaltada por 52,7%, principalmente nas situaes: a) encontrar a

    chave com o jardineiro; b) localizar os cinco personagens para a reunio, entre

    eles, Rousseau; c) encontrar o cachorro na feira; d) defender a manso dos

    guardas reais; e) procurar alguns objetos. O cumprimento desses objetivos no

    exige do jogador conhecimento sobre contedos histricos, mas envolve questes

    de jogabilidade, como interao com o mouse e movimentao do personagem no

    ambiente do jogo que foram evidenciadas por 47,3% dos alunos.

    Outro aspecto analisado foi a compreenso do enredo do jogo pelos sujeitos

    pesquisados. Neste quesito, a anlise das estratgias de leitura, interpretao dos

    objetivos e das consignas que guiavam o percurso dos jogadores, aliaram-se a

    compreenso dos aspectos histricos. Nos dados coletados, 69,4% no indicaram

    impedimentos para compreenso do roteiro do jogo, 3,5% consideraram o Jogo

    autoexplicativo, 5,5% dos alunos no compreenderam a pergunta da entrevista,

    apontando dificuldades relativas aos objetivos do Jogo, a exemplo da inteno de

  • reunir revolucionrios e levar as mulheres para a torre. Vale ressaltar que os

    entrevistados evidenciaram e compreenderam os aspectos histricos presentes no

    enredo, embora 2,7% deles tenham afirmado que enfrentaram dificuldades para

    identificar alguns aspectos histricos, justificando que sua ateno estava voltada

    para alcanar os objetivos do jogo. Os demais sujeitos apontaram dificuldades

    relativas sua proposta e comandos indicando os seguintes aspectos: a)

    incompreenso do papel do personagem principal; b) a linguagem do jogo foi

    indicada como formal; c) O jogador no compreendeu a cena em que o

    personagem principal morreu; d) a introduo do jogo no foi compreendida; e) os

    fatos histricos na narrativa do game no foram identificados; f) o jogador parou

    de prestar ateno no enredo; g) jogador no gostava de ler. Cada item acima foi

    registrado por um jogador, perfazendo assim 18,9%,

    Despertando o interesse pelo ensino de Histria

    O jogo produzido constri uma interface entre o ensino de Histria e a cultura dos

    games, objetivando tambm, articular novas possibilidades didticas para essa

    rea do conhecimento, superando uma perspectiva onde a memorizao ainda

    enfatizada no processo de aprendizagem. Atentos a essa cultura, o jogo se

    apropriou da lgica dos games comerciais para propor uma perspectiva

    metodolgica diferenciada no ensino e aprendizagem dos conhecimentos

    histricos.

    A autonomia intelectual era o grande desafio dos jogadores, que no encontraram

    uma perspectiva factual e linear da Revoluo Francesa, mais diversas

    possibilidades para os personagens e o enredo, alm das estratgias de leituras,

    anlise e compreenso requeridas.

    Essa contextualizao justifica os dados levantados sobre o interesse pelo ensino

    de Histria despertado por este jogo. No universo de trinta e seis alunos, todos

    afirmaram que o game pode provocar o interesse dos alunos pelo tema e

    justificaram sua opinio: 19,9% ressaltaram o carter ldico, o aprender por

    prazer; 13,8% indicaram que o tema Revoluo Francesa, apresentado de

  • maneira atrativa e outros 13,8% evidenciaram a possibilidade de vivenciar o

    contexto histrico, atravs da simulao. Cerca de 36,1% dos sujeitos destacaram

    que o jogo mobiliza: o estudo do tema, o desejo de ampliar as fontes de estudo,

    relao do adolescente com a tecnologia e possibilidade de aprender sobre o

    passado, ou seja, o jogo pode se constituir em uma fonte histrica para

    potencializar uma aprendizagem significativa e prazerosa do contedo proposto e

    de forma ampla, contribui para o ensino de Histria.

    Algumas respostas apontadas no trouxeram uma justificativa concreta sobre a

    referida questo: 8,3% dos alunos afirmaram que o jogo desperta o interesse no

    ensino de Histria por ser interativo; 2,7% dos alunos argumentaram que desperta

    o interesse em chegar o final do game; 2,7% dos alunos afirmaram que o jogo

    influencia os jovens a jogar; 2,7% dos alunos declararam que o jogo desperta o

    interesse pela aprendizagem de Histria.

    Estes sentidos sinalizados pelos alunos reforam o que vem sendo discutido e

    defendido pelos interlocutores tericos j evidenciados neste trabalho.

    Explorando os recursos do jogo

    Outro ponto questionado aos trinta e seis alunos referiu-se a leitura das Histrias

    em Quadrinhos (HQs), nas quais eram apresentadas parte da narrativa do jogo e

    caractersticas do contexto social, poltico e econmico da Frana no sculo XVIII,

    atravs de textos e imagens. Os trinta e seis alunos afirmaram que leram as

    histrias em quadrinhos (HQs), mas 36,1% dos alunos admitiram que leram

    apenas algumas HQs. Os principais motivos apresentados pelos alunos foram: as

    HQs eram grandes e se tornava cansativo ler toda hora; preguia de ler; ao

    reiniciar o jogo, no liam as HQs que haviam lido anteriormente; passagem rpida

    de algumas HQs e ter maior interesse pelos objetivos do jogo e no pelo aspecto

    textual.

    Ao serem questionados sobre a explorao dos hipertextos, mapas, inventrio e

    quadros, 22,4% dos alunos afirmaram que acessaram os hipertextos, recurso

    apresentado no Menu Inicial do jogo atravs do qual o jogador tem acesso a

  • informaes sobre o contexto da Frana no sculo XVIII e fatos histricos da

    Revoluo Francesa.

    No que se refere aos demais recursos apresentados, foi registrado que:

    a) os mapas, citados por 36,1% dos alunos, auxiliam o jogador a se localizar no

    ambiente virtual.

    b) o inventrio, local onde armazena os itens recolhido durante o jogo, foi listado

    por 16,6% dos alunos.

    c) os quadros, identificados por 11,1% dos alunos, estavam dispostos no

    ambiente do jogo e atravs deles o jogador pode acessar informaes sobre a arte

    barroca e renascentista.

    d) apenas 5,5% dos alunos afirmaram no explorar os recursos do jogo. Um

    deles justificou que preferiu iniciar o jogo, apesar de ter identificado a presena

    dos hipertextos no Menu Inicial

    Recursos do jogo como: teclas e mouse, a carta, ambiente, fala dos personagens,

    foram referenciados por 8,3% dos alunos.

    Estes dados nos levaram a repensar a estrutura da questo, que no definiu de

    maneira clara o que representava a expresso outros recursos do jogo.

    Estes recursos que utilizavam imagens mais predominavam por serem textuais

    provocavam nos jogadores um pequeno desprazer, j que exigiam um tipo de

    leitura convencional, semelhante aos que esto presentes nas representaes

    escolares. As HQs que tinham uma maior quantidade de texto provocava a busca

    pela tecla esc na tentativa de burlar a necessidade da leitura e remeter mais uma

    vez para a aventura de jogar, de escolher, de definir, de ser interator, ator e autor

    do processo, de participar.

    Estes sujeitos que tentam escapar das formas de leituras convencionais, tambm

    denominados de multitarefas (multitasking), pois motivados pelo desejo de serem

    mais produtivos fazem um certo nmero de coisas simultaneamente durante um

    certo tempo (SANTAELLA, 2007), impacientam-se em ter que esperar a leitura de

    um texto e/ou buscar informaes textuais dentro do jogo. Contudo so capazes

    de manter uma ateno parcial contnua, isto , mobilizados pelo desejo de ser

    um n vivo em uma rede, de conectar-se e ser conectado, de no perder nada,

  • sempre em alto estado de alerta. Isso fruto da tendncia de se mover na vida

    escaneando os ambientes, buscando sinais e deslocando a ateno de um

    problema para outro (SANTAELLA, 2007, p. 239).

    A histria do jogo

    Durante as entrevistas foi solicitado aos alunos20 que recontassem a histria do

    game. Com base no relato desses alunos, pode-se perceber que:

    a) os alunos utilizaram os objetivos do jogo para se referir a histria:

    [] ali na segunda parte bem no incio voc tinha que criar maneira de conseguir dinheiro, e no foi fcil, foi difcil, e depois voc tem que achar emprego, tem que entregar papel a um... cara na mo do seu chefe. E seguir uma pessoa. (G.16 anos, 8 ano)21

    b)os alunos se referiram a elementos da narrativa de forma coerente: A histria comea com um revolucionrio que o desejo dele muito mudar a Frana.Ento logo no incio ele convoca uma reunio na casa dele, com vrias pessoas importantes da poca... Guilhotine.. a depois da reunio...ele descobre que a casa dele est sendo invadida por guardas reais.[] a ele morre. A voc j comea jogando com a filha dele e j em outra cidade. [...] voc mora perto de uma feira que l voc encontra o feirante, o menino que procura o cachorrinho, jornalista, tem Claude, a depois que voc pega a menina, voc faz vrias misses com ela. A primeira voc tem que ... parece que a menina adotada por uma outra pessoa, na hora voc tem que fazer vrias misses que a primeira, voc tem que comprar o po, o peixe e a ma; a voc compra. Logo aps isso a voc tenta arranjar o emprego para arranjar o dinheiro nessa histria para comprar o vestido para ir pra uma festa. A quando... a voc faz uma misso que voc tem que entregar uma.. uns folhetos em cada casa avisando. A logo aps voc joga com Claude. Com ele voc faz coisas mais avanadas. A depois disso a parte que eu parei, a voc tem que achar um beco, e matar o traidor que vai trair eles: seus revolucionrios. (D. 14 anos, 7. ano)

    c) os alunos se referiram aos elementos da narrativa do jogo de forma

    incoerente: Um Rei que lutava para defender sua propriedade do qual tinha os intrusos querendo se intrometer na vida e na sua propriedade. (Dn. 14 anos, 8 ano)

    Ou ainda

    20 Optamos por reproduzir literalmente o discurso dos sujeitos 21 Para preservar a identidade dos sujeitos, utilizamos letras aleatrias para nome-los

  • Um rei que se preocupava muito com o centro do castelo, e deixa eu ver, que ele no tinha muita certa amizade com o outro reino, ai entraram em conflitos. (I. 13 anos, 8.ano)

    d) os alunos falaram de aspectos sobre a Revoluo Francesa presentes na

    narrativa do jogo:

    Oh...eu no fui muito longe hoje n, eu vi que foi um perodo pr-revolucionrio.[] no teve a Revoluo Francesa, mas sim as idias surgindo para ter a revoluo como a idia de liberdade, fraternidade e..igualdade para todos. (I. 13 anos, 7 ano).

    Os demais alunos destacaram aspectos sobre a Revoluo Francesa de forma

    equivocada, afirmando que no compreenderam bem a narrativa. Vale ressaltar

    que um aluno registrou que no lembrava da histria do jogo, mas apresentou

    noes bsicas e coerentes sobre esse aspecto.

    Esses elementos observados e analisados so fundamentais para avaliar o

    processo de produo do roteiro e principalmente os aspectos pedaggicos do

    jogo, na medida em que nos fornecem subsdios para ressignificar a proposta

    atual e projetos futuros nos defrontando com as seguintes angstias: Como

    desenvolver jogos com contedos pedaggicos sem utilizar a mediao de textos

    escritos, seja atravs das HQs ou hipertextos? Como mobilizar os

    jogadores/alunos para construrem significados para este tipo de game? De que

    maneira contribuir para que o jogador estabelea relao entre as informaes

    adquiridas nos jogos com contedos pedaggicos com os assuntos histricos

    ensinados em sala de aula? De que forma aliar a aprendizagem de Histria

    maneira mais ldica e expressiva como um jogo eletrnico?

    Estas angstias tambm se delineiam a partir das necessidades dos professores

    em tornar o jogo essencialmente pedaggico. Posio que discordamos, mas

    necessrio partir de demandas instrumentais para avanar e criar algo novo,

    coerente com a cultura dos games.

    Consideraes Finais

  • Ao longo do texto foram apresentados dados sobre a configurao, o

    desenvolvimento e resultado da pesquisa, com o intuito de analisar as

    contribuies do game evidenciado para o processo de ensino e aprendizagem da

    Histria, numa perspectiva crtica, dialgica e interativa, mapeando o perfil dos

    alunos e as suas relaes com a cultura dos games. Este trabalho tambm

    consolida a trilha do grupo de pesquisa Comunidades Virtuais na efetivao da

    relao teoria e prtica, isto , produzir jogos eletrnicos voltados para a

    educao, sintonizados com os discursos tericos aqui apresentados e com a

    lgica presente no universo dos games.

    Contudo, o resultado da investigao nos aponta algumas preocupaes que

    devemos ter ao desenvolver jogos eletrnicos voltados para o ensino, como por

    exemplo: a presena de textos que so fundamentais para compreender o

    contexto histrico evidenciado, mas que provocam no jogador desprazer, j que a

    leitura no se constitui em uma atividade valorizada pelos alunos, constituindo-se

    vazia de significados. A ausncia do domnio desta habilidade impossibilita o

    entendimento do objetivo e tambm a apropriao dos contedos e conceitos

    escolares que emergem no ambiente do jogo. Tal situao nos leva a questionar

    como estabelecer uma sintonia/compasso entre a produo miditica,

    especialmente os jogos eletrnicos, os aprendentes e os contedos escolares?

    Porm, no devemos esquecer que os mbitos semiticos dos jogos favorecem

    um outro tipo de letramento que envolve a significao e ressignificao dos

    contedos presentes nos mapas, FAQS, HQs, inventrios, hipertextos, tutoriais,

    etc, dentro do contexto nos quais esto inseridos.

    No Brasil essa discusso ainda recente, considerando que no temos uma

    expertise na rea de desenvolvimento de jogos eletrnicos voltados para

    educao nos cenrios acadmicos. Assim, temos o grande desafio de concretizar

    essa relao, criando espaos de aprendizagem prazerosos e que possibilitem

    aos alunos a construo de sentidos para os contedos que emergem nesses

    discursos miditicos, indo alm da criao de instrumento avaliativos que

    intencionam apenas mensurar o contedo aprendido. Esta tem sido uma grande

    demanda por parte dos professores a tomarem conhecimento do trabalho que

  • realizamos na UNEB.

    E por fim, este trabalho se constitui em uma provocao para que possamos

    atentar para o universo semitico no qual esto imersos nossos alunos, sem

    estabelecer comparaes entre as aprendizagens presentes nestes espaos e a

    exigidas pela escola, mas buscar integr-las.

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