alitera tura infantil no processo de forma
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MARIA ELIANE NUNES SOARES BATISTA
A LITERA TURA INFANTIL NO PROCESSO DEFORMA<;:AO DO LEITOR
Monografia apresentada para 0 Curso deEspecializa'iao em Educayao Inrantil: Pre-escola e Alfabetiza9ao do Centro de P6s-Graduayao, Pesquisa e Extensao, daUniversidade Tuiuti do Parana, sob aorienta<;aoda professora Elisiani Ticpoto.
CURlTffiA
1999
II'J
SuMARIO
RESUMO ...
1 INTRODU(:AO ...
2 LITERATURA lNFANTIL NO PROCESSO DE AU'ABETIZA(:AO ....
2.ICONSIDERAcOES SOBRE LITERATURA INF ANTIL
2.1.1 Conceitos Sobre Literatura e Literatura InfantiL.
2.1.2 Adjetivo e Genero da Literatura [nfantil..
2.2 HISTORIA E EVOLUCAO DA LlTERATURA INFANTIL...
2.3 L1TERATURA INFANTIL BRASILEIRA.. II
iii
2.4 A L1TERATURA INFANTIL... IS
2.4.1 A Importancia das I-listorias... 15
2.4.2 A Arte de Contar Historias... 17
2.4.3 A Poesia para Crianyas... 18
2.4.4 Os Contos de Fadas... 20
2.4.5 A Leitura Critica... 23
2.4.6 As Ilustra<yoesdo Livre InfantiL 24
2.4.70 Livro Infantil e a Crianya em Alfabetizayao.. 26
2.5 A LEITURA E A ESCRIT A NO PROCESSO DE ALF ABETIZACAO... 27
2.5.1 A Leitura na Escola .. 28
2.5.2 A Escrita na Escola... 29
2.5.3 Tipos de Leitura.... 30
2.6 ATIVIDADES PARA SE TRABALHAR COM A L1TERATURA INFANTIL... 31
3 CONSIDERAC;OES FINAlS... 33
REFERENCIAS BIBLlOGRAFICAS.... 36
RESUMO
o presente trabalho tern pOf finalidade colocar como se apresenta a literatura infantilno processo de escoJariz3vao. lnicialmente, fazem-se considera~oes sobre a literaturainfantiJ e urn historico da mesma, de maneira ampJa e abrangente. Ao se tratar de literaturainfantil, associa-se 0 leitor a quem ela e destinada: a criancra. Criam;:a essa que nao pode seT
pensada simplesmente "uma perspectiva etaria, mas urn seT bern mais completo, queinfiuencia 0 mundo e e influenciado pOT cle. Considerando-se assim, torna-se importanteanalisar de que maneira se da a literatura infantil no processo de escolarizavao, e se osprofessores tern realmente utilizado os Iivros inrantis para desenvolver e despertar aimaginacrao, criatividade e 0 interesse pela literatura para a fonna~ao do leitor. Em seguida,mostrou-se como as historias, os contos de fadas, as poesias, 0 livro infantil comeltam afazer pane do processo de alfabetiz3ltao da crianya, enfocando 3 maneira de trabalhar, berncomo, as reialtoes desta com 0 Judico e 0 imaginario. Apresentaram-se. a seguir. atividadesque podem ser trabalhadas com a literatura infantil, nas quais observa-se a irnporUincia docontato com as hist6rias infant is para poder desenvolver nas crianltas 0 gosto pela leituradesde cedo , que bern trabalhada levara a urn crescimento intelectual, moral, social. afetivoe cultural.
iii
I INTRODU<;:AO
Esta monografia busca comprecnder a irnportiincia da Literatura Infantil no processo
de alfabclizayao. Prclcnde-se, neste trabalho, elaborar um estudo sabre a importancia da
litemtura infantil no processo de escolarizat;:ao. como motiv3c;:ao para a formac;:ao do lei tor.
Tern como objetivo evidcnciar a neccssidade de se trabalhar com a literatura
infantil, alertando para a riqueza e a contribuiyao das hist6rias infantis como estimulo para
o desenvolvimento cognitivo, afetivo, fisico e social na aprendizagem de conteudos
diversos durante 0 processo de alfabetizac;:ao.
Num primeiro momento procura-sc discutir as questoes que giram em toma da
literatura infantil, sellS conceitos, 0 adjetivo «infantil", sua historia e evo\uyao no mundo e
no Brasil, portanto urn relato do seu surgimento, abrangendo os caminhos percorridos por
cia. Depois, sera exposta a Iiteratura em 51, sua importancia, a arte de contar historias, os
conlos de fadas e suas significaI;:5es. a poesia infantil e sua relac;ao com as crianc;as, as
ilustrac;oes do livro infantil eo livro infanti!.
Sera discutido tambem a escola como veiculo da leitura, os cuidados que ela deve
ter e principal mente 0 que e importante na leitura, como se trabalhar a leitura e a literatura
na escola no processo de escolariza~ao.
Com a real.izac;ao de um trabalho serio com a literatura infantil, e possivel fonnar
leitores admiradores que sabem que os autores tern algo a lhes dizer, respeitando-os e
fazendo-os cresccr atraves de suas hist6rias. Observando-se que nem todos aqueles que se
dizem escritores dedicados ao publico infantil estao real mente empenhados em
proporcionar 0 prazer de urna leitura ludica e criadora.
Pretcnde-se que a crianc;a entre em contato com 0 mundo da Icitura e da escrita de
fonna significativa, desta maneira e preciso oferecer a crianc;a urn ambiente rico em
estimulos, levando-a a perceber que tudo que possa ser imaginado, pensado e falado pode
estar escrito, urn espac;o onde a crianQa elabora a construc;ao de seu conhecimento,
mediante multiplos oportunidades de atuar com a lingua escrita.
Acredita-se que a literatura infantil seja urn recurso eficaz para a introduc;ao no
mundo da leitura e da escrita, possibilitando a interaQiio com urn modelo rico, expressivo e
significativo. Atraves dos textos, pode-se observar que a crianc;a deve ser trabalhada como
urn todo, onde todas as suas potencialidades sejarn desenvolvidas, pennitindo assim, que
ela, por intermedio de urn trabalho bern desenvolvido, seja capaz de tomar-se por si s6, urn
bom leitor.
A atividade da leitura esta presente em todos os niveis educacionais, come~ando
pela alfabetizayao e passando por toda a vida escolar do aluno, mesmo mediante a todo 0
processo dos meios de comunica~ao, que rnuitas vezes relega 0 Iivro a urn segundo plano,
na escola ele telll espa.;o garantido. Quase lodas as atividades escolares dependem de urna
certa maneira de leitura.
Optou-se por tal assunto por se compreender que a inicia~ao cia literatura infanti!
consiste em urna base de todo urn trabalho que a literatura pode abranger. A escola tern a
fun~ao de fomecer ao aluno elementos para 0 desenvolvirnento de sua capacidade de
leitura, visando a urna integra.;ao entre alnno-Ieitor e 0 mundo que 0 eerea. 0 contato desde
cedo com os livros infantis podem proporcionar a crian~a urn arnplo desenvolvimento, resta
saber se os professores tern utilizado a literatura infantil para desenvolver e despertar na
erian.;a a irnagina.;ao, criatividade, criticidade e 0 interesse pela literatura.
2 A LITERATURA INFANTTL NO PROCESSO DE FORMACAO DO LEITOR
No processo de Alfabetizac;ao da crianc;a, muitos professores questionam-se como
trabalhar e 0 que utilizar nesse processo tao importante para 0 descnvolvimento do seu
aluno, pois percebe-sc cada vez mais a necessidade de despcrtar nos alunos 0 interesse e 0
gosto peJa leitura desde cedo, a fim de promover a formay8o do leitor
Aparecc entaD como uma das altemativas para esse problema 0 trabalho com a
literatura infantil, observando sua importancia e signific3y3.0 para 0 dcspertar da criany3
pela leitura.
Dentro da nOyaO de ieiturn, surge entao a literatura como parte integrante do
processo de leilum na escola. Atraves das historias infantis a crianC;3 podera vivenciar urn
outro mundo, contribuindo assim para 0 desenvolvimento de sua criatividade, criticidade,
consciencia e prazer. E para tanto, e preciso que a crian((a entre em contato com textos que
realmente contribuam para seu desenvolvimento.
DALLA-80NNA (1998) diz que as criam;as em fase de alfabetiza~ao s6 tern accsso
a livros de literatura infantil que na verdade sao apenas cartilhas, mascaradas de livros de
literatura. E isso se da, pela concepc;:ao arcaica de aifabetizac;ao, ainda predominante nas
escolas, procurando trabalhar com familias silabicas, em textos muito curtos e marcados
pelas repeti'Yoes. Assim, crian((3S que gostavam de ler ou escutar historias, deixam de sentir
esse prazcr, porque 0 texto literario e usado para entao ensimi-Ias a ler, a dominar a
oi1ografia, 0 vocabulario e alguns conteudos.
"Alfabetiza((ao e literatura, nao sc confundindo, sao auxiliares uma da outra. Como,
alias, com rela~ao a outras experiencias, a alta qualidade de uma facilita 0 desenvolvimento
da oulra". (DALLA-BONNA, 1998, p.IO)
2.1 CONSIDERA<;:OES SOBRE A LlTERATURA lNFANTIL
A literatura e, em sentido amplo, toda atividade estetica expressa por meio da
palavra. Especificamente em sc tratando de literatura infantil, costuma-se designar tudo 0
que e escrito visando a crian((3. A criamya tern seu proprio mundo, expectativas, val orcs e
interesses que a levam em busca de novas descobertas.
o trabalho com a literatura infantil deve estar atento e procurar atender a essas
expectativas, e, para tanto, 0 born livro de literatura infantil e aquele que considcra suas
caracteristicas psiquicas e responde as suas exigcncias intelectuais e espiriruais, valorizando
a capacidade de pensar do seu lei tor. Dentro dos varios generos que existem nos Iivros de
literatura infantil, tcmos os livros de aventuras, fantasias, realistas, de humor e s~itira, entre
outros, cada urn com sua caracleristica e importancia especificas.
A literatura infantil no pracesso de alfabetizar;ao faz com que a crianya vivencie urn
mundo difercnte, despertando a imaginar;ao e a criatividade, gerando prazer com a
canvivcncia com os livros alem de auxiliar na fonnar;ao do lei tor.
Mas a que se sabe sabre Literatura infantil? Suas conceituar;oes, suas origens c seu
universo?
2.1.1 Canceitos Sobre Literatura Infantil
Estudando sobre 0 tema, vale colocar aqui algumas conceituar;oes dadas aLiteratura, como tambem a Literatura Infantil.
MASSAUD (1974, p. 310, 314) diz sobre Literatura:
"Latim Litteratura (m), de littera (m), letra. Problema fulcral e pennanente, situada
na base de todas as controversias criticas e teoncas, a conceito de "Literatura" tern side
amplamente examinado, sem conduzir a resultados definitivos .... Literatura e a expressao
dos conteudos da ficr;ao, au da imaginacao, por meio de palavras polivalentes au
metaforas".
Ou ainda FERREIRA (1986, p. 1040):
" [Do Lat. Litteratura] s.f I.Arte de compor ou escrever em trabalhos artisticos em
prosa au verso. 2. 0 conjunto de trabalhos literarios de urn pais ou duma epoca .... 7.
Qualquer dos usos esteticos da Iinguagem: literatura oral [q.v]. 8. Fam. irrealidade, ficr;ao:
sonhador tudo quanta diz e literatura .... Literatura oral. 0 conjunto das lendas eJou
narrativas transmitidas por tradicao"
Vejamos entao sabre Literatura infantil:
Para COELHO (1993), a litcratura infantil e antes de tudo Iiteratura, e arte:
fenomeno de criatividade que representa 0 mundo, 0 hom em, a vida, atraves da palavra,
ande hi uma fusao dos sonhos com a vida pritica, do imagimirio cam 0 real, dos idealS e
sua possivel ou impossive! realizacao, ou seja, a literatura esta presente em nossas vidas e
sendo assim compartilhamos algumas de nossas cxpectativas com cia.
Segundo ZILBERMAN (1998), conceituar literatura infantil significa marcar
frontciras de uma situa~ao de campo de trabalho diverso, onde tern de urn lado: as fonnas
nao literarias e de outro aquilo que nao e dedicado ao lei tor infanti!, ou seja, a literatura
infanti! nao tcm ncccssidadc de uma conceitua~ao propria, pois seu proprio titulo ja diz de
si mesmo. Uma literatura que tern como foco principal a crianya.
A literatura e antes de tudo uma arte, e, como tal, nao apresenta uma detini~ao
concreta e unica. Assim tam bern acontece com a Literatura lnfantil.
" A func;ao da literatura infanti! e alegrar, divertir ou emocionar 0 espirito das
crianc;as, e isto de maneira ludica e instigante, levandoMos a perceberem e a interrogarem a
si mesmos e ao mundo que os rodeia. Ela e muito mais que mero entretenimento, ela e
aventura espiritual, capaz de engajar 0 leitor em uma experiencia rica de vida, inteligcncia e
emoc;oes ... Ela tern que ser capaz de promover 0 senso critico e de superar os limites das
experienciasja adquiridas" (DALLA-BONA, 1998, pAJ
2.1.2 Adjetivo e Genero da Literatura lnfantil
KJ-IEDE (1986) diz que com rela~ao ao genero percebe-se que no caso da literatura
infanto-juveni! 0 problema e complexo por implicar 0 sUfbrirnento de urna produ~ao que se
quer literaria embora necessite, a todo momento, de estabelecer limites entre a cultura de
massa e 0 folclore; entre 0 mito e 0 mistico. Genero que se articula na dinamica de urn novo
publico e de novas form as de linguagem. E que tarnbern enfrenta inumeros desniveis no
relacionamento emissor-receptor. Nao sendo cultura de massa e nem tampouco cultura
popular, a 1iteratura infanto-juvenil e caracteristica no sentido de que 0 seu produtor e urn
adulto que deseja chegar ao nivel da crian~a e do jovem, sendo-Ihe impossivel, desfazer-se
do seu "status" de adulto.
A literatura infantil tern recebido algumas contestac;oes devido ao sell adjetivo,
infantil, que alguns estudiosos dizem ter uma conotayao de minoria, de uma litemtum
simplista.
Segundo LAJOLO (1991), 0 adjetivo infantil possui urn peso circllnstancial para a
expressao literatura infantil. Ele define a destinayao da obra, essa destina~ao, no entanto,
nao pode interferir no litenirio do texto. A literatura infantil, com parada corn a literatura
nao-infanti!, sofre marginalizayao quanta a sua legitimay3.o atraves da critica, da
universidade e das academias. Como se a menoridade de seu pllblico a contagiasse, a
literatura infantil costuma ser encarada como produyao cultural inferior.
Ou, como diz CADEMARTORI (1995, p. 14), "a Litcratura Infantil destina-se a urn
leitor mirim e a condiyao de nao desfrutar do status de obra de arte. Sendo assim econsiderada par algum tempo e por alguns estudiosos como de menor valor".
2.2 HJSTORIA E EVOLUCAO DA L1TERATURA INFANTIL
Visto as discussoes que giram em torno da Iiteratura infantil , vejamos entao como
esta leve seus primeiros passos no mundo.
De acordo com COELHO (1991), sempre que se pensa em Iiteratura infantil, tem-se
em mente os contos c1ilssicos, os contos-de-fada ou os contos maravilhosos de Perrault,
Grimm au Andersen, au as fabuias de La Fontaine, mas muitos esquecem ou ignoram que
esses nomes nao sao dos verdadeiros autores de tais narrativas e sim alguns dos autores que
desde 0 secuio XVII tinham interesse na literatura fo1c16rica criada pelo povo de seus
respectivos paises, que ha seculos vinham sendo transmitidas , oral mente de gcrayao em
gerayao, e entaD tiveram a preocupayao em colocar essa literatura de forma escrita em
livros c por isso tais colctaneas receberam as names de seus "escritores" e continuaram
sendo transmitidas ao longo do tempo.
Com a tentativa de chegar 11 verdadeira origem da Literatura Popular, e como esta
leria resislido por tanto tempo ate 0 momento em que entra na Hist6ria , ao transfonnar sua
fala em escritura, muitos estudiosos dizem que as chamadas primeiras formas de escrita,
como (inscriyoes em pedras, escrituras em papiro ou pergaminho, em tabuinhas de argila au
vegetal, livros manuscritos e tambCm pela boa memoria de alguns contadores-de-estorias),
len ham comribuido para sua preservay3.o
Na Literatura Primordial, transmitida pela memoria do povo(pois nao era escrita),
foi descoberto 0 fundo fabuloso das narrativas orientais, que surgiu desde antes de Cristo e
que se difundiu por todo 0 mundo atraves da Tradiyao Oral, apresentando urn carater
magi co ou fantasioso nas suas narrativas.
Dessas narrativas primordiais orientais nascem as narrativas medievais arcaicas, que
se popularizam na Europa e no Brasil, e se transformam ern literatura folcJorica (temos a
litcratura de cordel, no Nordeste) ou em literatura infantil (registros de Perrault,
Grimm, etc.).
Em Portugal e no Brasil, verificou-se que a literatura folc1orica, apresenta-se
bastante variada de acordo com cada regiao em que surgiu e que a literatura infantil ereproduzida praticamente sern altera~Oes, isso ocorre devido it transmissao oral, portanlo
mutavel, que caracteriza a literatura fOlclorica, contniria it fixa~ao do texto literario,
portanto escrito, que caracteriza a Iiteratura infantil.
Viu-se entaD ate agora que os indicios da literatura sao de fontes orientais, agora
veremos algumas das obras: Calila e Dimna e considerada a cotetanea mais antiga das
narrativas que estao nas origens da Literatura Popular europeia; tal coletanea surgiu na
india ,por volta do seculo V antes de Cristo. E importanle saJientar que os relatos existentcs
na obra se passam fora do limite do mundo conheeido, mostrando que desde suas origens
procurava-se dizer algo que nao so explieasse a existencia conereta mas tambem as que
fieassem alem dos limites conhecidos e compreensiveis. Este pode ter influenciado As Mil e
Uma Noites e Alihahci e os Quarenta Laddies. Tambem na india aparecem . Hilopadesa ou
/nslrur;{jO proveilosa, Sendebar Oll Uvro dos enganos das mu/heres (imagem negativa da
mulher, vista como astuta, mentirosa, traidora, ambieiosa, ... )~ deste livro saiu as Aventuras
de Simhad, 0 marujo. Bar/aam e Josajal, reconhecida como urna versao crista da lenda de
Buda. As Mil e Uma Noiles so teve maior irnportancia a partir do seculo XIX, sendo
divulgada como Literatura InfantiL
A Iiteratura, desde suas origens at6 seus dias atuais, segue atraves dos tempos
influenciada pela cuitura, ideologia, economia, politica, mcio social de cada epoca em que
foi criada, escrita e repassada.
Na Idade Media surgem narrativas de fontes distintas: uma popular e outra cuha. A
de fontc popular e a prosa narrativa derivada das antigas fontes orientais ou gregas,
aftnnando os problemas da vida cotidiana, os val ores de comportamento etieo-soeial ou as
li~oes da sabedoria popular. A de origem culta e a prosa aventureira das novelas de
caval aria, de inspira~ao ocidental, real~ada de urn idealismo extremo e urn rnundo de magia
e de rnaravilhas completamente estranhas a vida real e concreta.
De acordo com CUNHA (1997), antes da institui~ao da literatura infantil a literatura
era destinada a dois tipos de crian~a: a crian~a da nobreza, que Iia geralmente ehissicos e as
erianyas das classes desprivilegiadas, que ham ou ouviam as hist6rias de eavalaria, de
aventuras. As lendas e os contos folc16ricos formavam uma literatura de eordel de grande
interesse das classes populares.Segundo COELHO (1991), foi entre os sceulos IX e X que, na Europa, cireulam
oralmente uma Iiteratura popular que mais tarde ina transformar-se em literatura folc16riea
e literatura infanti!. Na ldade Media a reiigiao foi a diretriz para os textos Iiterarios que
surgiram para a literatura ocidental. Nesse periodo a literatura e marcada pelo carater
moralizante, didittieo e sentencioso , mas sempre urna literatura que divulga ideais, que
busca ensinar, divertindo, nurnmomento em que a palavra liteniria era vista como atividade
superior do espirito: 0 Conhecimento das Coisas.
A violencia tambem esta presente nas narrativas desse pcdodo, mas vai
desaparecendo ao longo do tempo, 0 que pode ser percebido ao passar da versao de Perrault
para a de Grimm e depois para as versocs contemponineas que, transformadas em literatura
infantil, perderam toda a agressividade original. Alguns dos livros medievais que se
tornaram populares e foram adaptados para crianyas sao: Os lsopets ( 0 Romance da
Raposa: umafabu/a), Disciplinu C/ericais, a Livro das Maravilhas e 0 Livro dos Animais
(Besliario), 0 Livro de petronio ou 0 Conde Llicanor. Outras fontes da tradiyao medieval:
o Livro de Exemp/os, Livro dos Gatos, 0 Livro de Esopo. E Horlo do Esposo, A nove/a de
cava/aria: criariio ocidenlal.
As noveias de cavalaria foram se diversificando em vario ciclos: 0 ideal guerreiro e
substituido pelo ideal cavaleiresco, depois surge 0 ideal mistico-amoroso. As novelas de
cavalaria foram trazidas para 0 Brasil, a partir do seculo XVlI, pelos colonizadores
portugueses, e difundiram-se por todo 0 pais, mas s6 foram editadas em 1840. Muitas
dessas novelas fazem parte do acervo popular nordestino. As crian9as contribuiram em
grande parte para que esse acervo continuasse atraves da transmissao cultural, pois,
basicamente, a transmissao dos fatos fo1cloricos se faz no meio familiar e no meio
comunitario. Outra novela existente no periodo de transiyao da Tdade Media para 0
Renascimento e: Decameron: uma obra liml/roJe.
No Renascimento, nasce uma Arte e uma Literatura que, com 0 tempo, se
transformarao em "modelo c1assico" para 0 mundo ocidental. Na literatura popular esse
impulso renovador nao penetra de imediato. No seculo XVI, continuam a circular a
literatura surgida na Idade Media, em novas variantes ou simples imitayoes. Na literatura
cuUa surgem grandes obras renascentistas, enquanto na literatura popular aparecem qualro
obras: Noiles Agradaveis- de Gianfrancesco Straparola da Caravaggio, Contos do
Troncoso, COIl(O dos Contos all Penlameroll- de Giambattista Basile, As/ucias SUlilissimas
de Bertoldo- de Giulio Cesare Crocco E ainda, Pedro Malasartes.
Segundo LAJOlO (1991), as primeiras obms publicadas para 0 publico infantil
surgem no mcreado na primeira metade do seculo XVIII. Antes desse periodo, somente no
c1assicismo frances no seculo XVII, foram escritas hist6rias consideradas apropriadas para
o publico infantil: as Fabulas, de La Fontaine editadas em 1668 e 1694, As avellluras de
Telemaco, de Fenelon em 1717 e os C01110S da Mamile Gansa que tinha como titulo
original Hi8l6rias ()u narralivas do tempo passado com /}/oralidade, que Charles Perrault
publicou em 1697.
Sobre Perrault, LAlOLO fala que ele nao e respons<ivel apenas pelo primeiro surto
de literatura infantil, seguidos por La Fontaine e Fenelon. Seu livro provoca tambem uma
grande preferencia pelo conto de faetas, literalizando uma produyao que era apenas de
natureza popular e circulay3.o oral, adotada como prineipalleitura infanti\' Mas a literatura
para crianyas desenvolvida na Franya, tern 0 mesmo paralelo de desenvolvimento na
Inglaterra.
Com a Revolw;ao Industrial no seculo XVlll, percebe-se 0 crescimento politico e
finaneeiro das eidades e a decadencia do feudalismo iniciada na ldade Media. A burguesia
consolida-se como c1asse social, reivindicando urn pader politico que va; conquistando aos
poucos, incentivando instituiQoes que trabalham em seu favor. a atingir as metas desejadas.
Tem-se como uma dessas instituiyoes a familia, que adota urn modo de vida mais
domeslico e com pouea participaQ30 publica, chegando a ser considerado como 0 modelo
de familia moderno e ideal para ser imitado por todos. Tal modelo familiar poe como
divisao do trabalho 0 pai responsclvel pelo sustento da familia e a mae responsclvel pela vida
domestica privada. E nesse modelo de familia burguesa, a crian.;a passa a ter urn novo
papel na sociedade. incentivando 0 surgimento de objetos industrializados (brinquedos),
culturais (livros) ou novos ramos da eicncia (a psicologia infantil, a pedagogia ou a
pediatria). Outra institui.;3.o a sofTer tal influencia, para colaborar com a solidific3yaO
politica e ideol6gica da burgucsia. e a escola. Considerada facultativa e ate dispensada no
10
seculo XVTII, a escolarizac;uo das criam;as toma-se obrigat6ria, pois a escola e qualificada
como 0 espac;o de mediac;ao entre a crianc;a e a sociedade, fazendo corn que essas
instituic;oes (familia x escola) sc complementcm e neutralizcm ccnnitos que possam existir.
De acordo com LAJOLO (1991), a literatura infantil surge com as primeiras obras
publicadas na Franca, mas e na Inglaterra que se desencadeia sua difusao, pais onde a
industrializac;ao e modernizayao tern grande crescimento. A literatura infantil assume desde
a inicio como urn produto de mercadoria. No seculo XVIII, com 0 aperfeiyoamento das
tipografias, ocorre urna grande produyao de Iivros. Como 0 Iivro era escrito para criam;:as.
conclui-se que essas crianC;8s saibam le-Io; entaD nesse momento, a presenl(a da crian9a na
escola e cada vez mais necessaria. Percebe-se, dessa fonna, que a Iiteratura infantil surgiu
para as crian9as que precisam antes estar nas escolas para consumi-Ios posteriormente com
a sua compra.
Seguindo 0 sucesso de Perrault com seus contos de fada, surgem adaptac;.Oes de
romance de aventuras, como 0 ja chlssico Robson Crusue (1719), de Daniel Defoe e
Viagens de Gulliver (1726) de Jonathan Swift. 0 seculo XIX surge entao com os Inn5.os
Grimm (1812) que editam a colecrao de contos de fadas que sUfle urn t,rrande efeito positivo
para a Icitura do grupo infantil. Esses livros eomel(am a ser escritos seguindo tais linhas,
com est6rias fanHlsticas, modele adotado por Hans Christian Andersen, nos seus Contos
(1833), Lc"vis Carroll em Alice no I'ais das Maravilhas (1863), Collodi em Pinoquio
(1883), e James Barrie em Peter Pan (1911), entTC os principais. Como tambem hist6rias de
aventuras ocorridas em espac;.os ex6ticos e comandadas por jovens audazes, como 0 Ullimo
dos Moicanos (1826), de James Fenimore Cooper, nos varios livros publicados por Jules
Verne a partir de 1863, como Cinco Semanas num /3a/tio, As Avenlura,\' de Tom Sawyer
(1876) de Mark Twain e A IIl1a do Tesoll.ro (1882) de Robert Louis Stevenson. Outra linha
e 0 cOlidiano da crianc;.a, com a vida di<iria como motivadora de al(5.o e interesse, como
escrevem 0 Conego Von Schmid, em Os Ovos de PascoQ (1816), A Condessa de Segur em
As menin(lS Exemplares (1857), Louise M. Alleon, em Mulherzinllas (1869), Johanna Spiry
em Heidi (1881)e Edmond De Amicis em Cora,iio (1886).
Todos os autores da Segunda mctade do seculo XIX confirmam a literatura infantil
como uma produl(ii.o liteniria da socicdade burguesa e capitalista. E tal condil(iio vai se
solidificando cada vez mais.
II
2.3 L1TERATURA INFANTfL BRASILEIRA
De acordo com LAJOLO (1991), quando se comCI;3 a editar livro no Brasil para 0
publico infantil, na Europa esse acervo ja esta bern solidificado. Dessa maneira, surge a
vertente brasileira do genera, e as hist6rias, mesmo com particularidades e elementos
pr6prios nae fogem do roteiro original. Se a literatura infantil europeia teve seu inicio as
vesperas do seculo XVIII, quando em 1697, Charles Perrault publicou os celebres Contos
do IV/all/fie Gal/sa, a Iiteratura infanti! hrasileira s6 veio a surgir muito tempo depois, quase
no seculo xx. Com a implantayao da lmprensa Regia, que da inicio em 1808 a atividade
editorial no Brasil, comc!fam enHio as puhlicacy:oes de livros para as crianyas: a tradU(;ao de
As Aventuras Plasmosas do Baroo de Munkausen e, em 1818 a coletanea de Jose Saturnino
da Costa Pereira, Leillira para Meninos, mas lais cdi<;oes cram raras e as novas s6 surgiram
em 1848 com outra edi<;ao das Avenluras do Bariio de Miillchhallsell (Laemmert), tida
como insuficiente para ser considerada uma produ<;ao literaria brasileira regular para as
crian<;as.
Como sistema regular, a Iiteratura infantil brasileira s6 teve inicio em melo a
Proclamayao da Republica, periodo de grandes transfonnayoes para 0 pais. Com a grande
urbanizayao do pais entre 0 scculo X[)( e 0 comeyo do seculo XX, hoi urn perfodo
impot1ante para 0 aparecimento da literatura infantil, pois a populayao comeya a consumir
diferentes e variados produtos para as suas necessidades. Em 1905 surge 0 Tico Tico, urna
revista infantil que tern grande repercllssao e sucesso para °publico infantil, pois sellS
personagcns sao considerados importantes para a construyao do imaginario cia crianya.
Como e a instituiyao escola que as sociedades modemas confiam a iniciayao da crianya aos
seus ideais, habilidades e tecnicas, e entre os seclllos XIX e XX que se abrem espayos nas
letras brasileiras para urna prodllyao dirigida ao publico infanti!.
ComeyamMse carnpanhas para a instruyao, pela alfabetizayao e pela escoia, e essas
campanhas deram prestigio e contribuirarn para que fosse adotada no Brasil uma literatura
infantil nacional. Tal necessidade advem de que na maio ria das obras infantis editadas ate 0
momento cram profundamente marcadas por obras estrangeiras.
No final do seculo passado, ha urna grande traduyao e adapta<;ao de obras infantis.
Antes de 1880, estavam no Brasil as traduyOes de Conego de Christoph, a Conario (1856)
de Von Schmid, A Ceslillha de Flores (1858), e as avos de i'ascoa (1860). Carlos Jansen
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(traduc;oes) e Figueiredo Pimentel (adapta~oes), se encarregaram de obras estrangeiras para
o publico infanti!. Com sellS trabalhos esmo no Brasil. Contos Selelos dus Mil e Uma Noites
(1882), Rohinson Crusoe (1885), Viagens de Gulli\ler (\888), As Aventuras do Celeberrimo
Barao de Miinchhullsell (1891), Contos para /"iI/lOS e Netas (1894) e Dom QUixote de La
Mancha (1901), todos vestidos para a lingua portuguesa por Carlos Jansen. Enquanto Is50,
os chissicos de Grimm, Perrault e Andersen sao divulgados nos Contos da Carochinha
(1894), nas His/orias da avo;;nha (1896) e nas His/orias da Baralinha (1896), assinadas
poT Figueiredo Pimentel c editadas pela Livraria Quaresma. Ternos tarnbem as traduc;oes de
Jono Ribeiro, em 1891, do livro Italiano COlll·e e , a partir de 1915, as tradU(;oes e
adaptayoes coordenadas por Arnaldo de Oliveira Barreto eonstituiram a Biblioteea Infantil
Melhoramentos. Ha ainda 0 livro Contos in!allli.\"(1886), de Julia Lopes de Almeida e
Adelina Lopes Vieira, em 1904 Olavo Bilae c Coelho Neto editam Contos Patrios, e em
1907 Julia Lopes de Almeida lanya Hi.\"/6riasda Nossa Terra.
Em 1910 surge a narrativa longa AII"Qw!S do Brasil de Olavo Bilae e Manoel
Bonfim, sete anos depois, Julia Lopes de Almeida lan~a Era UIJ/aVe.:,e em 1919 Tales de
Andrade com 0 romance Sal/dade pratieamcnte cneerra 0 primeiro perfodo da literatura
infantil brasileira.
Quanto it poesia, Zalina Rolim em 1893 inclui alguns poernas infantis no seu livro
Coraqiio e publica em 18970 Utlro das criam;as em pareeria com Joao Kopke. Em 1904,
Olavo Bilae edita suas Poesias in!anfi.\"e em 1912 Francisea Julia e Julio da Silva lan~am
Alma iJ?fanlif. Nesse mesmo perfodo aparecern as antologias folc16rieas e tematieas, estas
ultirnas com 0 objetivo de screm utilizadas nas eseolas.
Havia no pais urna grande queixa pela falta de material Hterario brasileiro esta
distancia entre a realidade lingUisticas dos texlos disponiveis e ados leitores e reelamada
por lodos que por muilO tempo discutiam a neeessidade da cria~ao de urna Iiteratura infanlil
brasilcira, surgindo assim varios program as de nacionalizayao desse aeervo Iitenirio
europeu para crianyas. 0 primeiro e feito atraves de diferentes form as de adaptay3.o, tal
como ocorre com os dois projetos editoriais, que pratieamente abrem e feeham 0 periodo:
em 1894, com Conlos da Carochinha 0 famoso Figueiredo Pimentel inaugura a eole~ao
Biblioleca Infantil Quaresma que ao longo dos varios titulos faz circular entre a inffineia
brasileira as ve1has hist6rias de Perrault, Grimm e Andersen. A partir de 1915, a editora
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melhoramentos inaugura sua biblioteca infantil que sob a dire~ao do educador Arnaldo de
Oliveira Barreto publica como 0 primeiro volume de sua colcyao, 0 Palinho Feio de
Andersen.
A adaptayao do modelo europeu, que chegava atraves de Portugal, nao se deu
somentc atraves dos contos de fadas, DeOffeu tambem a apropriayao brasileira de urn
projeto educativa ideol6gico que via no texto infantil e na escola, bons aliados para a
fonnayao do cidadao. Tal fen6rneno desenvolvido a partir da Republica, naseeu na Europa
com os livros de G. Bruno (1877) e do escritor italiano Edmond De Amicis (1886) essas
obras desenvolviam em sellS textos alTIor a patria, nOyoes de obediencia, sentimento de
familia, pnitica das virtudes civis e tinham como personagem central criant;as, mas na
maioria dos textos a imagem cia crian~a e estereotipada, quer como virtuosa e de
comportamento exemplar, quer como negligente e cruel.
Essa situa~ao confinnava os compromissos com 0 projeto pedag6gico que se
acreditava na reproduyao passiva de comportamentos, atitudes e val ores que os textos
manirestavarn e, rnanifestando, desejavam incu1car nos leitores. 0 livro frances de G.
Bruno inspirou em 1910 0 [amoso livro Atraves do Brasil, escrito por Olavo Bilac e
Manoel Bonfirn que se tornou uma leitura obrigat6ria e apaixonada de rnuitos brasileiros
tendo como enfoque 0 civisrno, 0 patriotismo e a exa1ta~3o da natureza. A valorizay30 da
natureza e ainda expressa atraves do livro Saudade (1919) de Tales de Andrade, 0 primeiro
livro escolar adotado no Brasil.
Monteiro Lobato publica 0 segundo livro para a escola em 1921, Narizinho
Arrebitado. e repete 0 sucesso de vendas do livro Saudade. De 1920 a 1945 a produ~ao
Iitcraria para crianyas tern urn grande aumento despertando 0 interesse de editoras como
Mclhoramentos e Editora do Brasil. Ern 1931, Lobato refonnula a hist6ria original de
Narizinho e escreve Reina{:oes de Narizinho contribuindo assim para 0 surgimento de
novos autores como Viriato Correa com 0 Iivro Cazuza. em 1938 au Malba Tahan. Varios
autores participam da evoluyao da literatura infantil brasileira alguns trabalham com 0
folclore e as hist6rias populares outros criam narrativas originais ou lanyando urn unico
titulo ou ainda mantendo uma prodUy30 regular por algum tempo. No geral predominou a
fic~ao, enquanto a poesia fica quase ausente, mas Henriqueta Lisboa escreve 0 livro de
poesia mais importante nesse perfodo, 0Menino Poeta (1943).
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o mercado toma-se favoravel it produC;30 de livros para crianl;:as. Essa situac;ao esmrelacionada a fatores sociais como a consolidac;:ao da c1asse media em decorrencia do
avanc;:o da industrializac;ao e da modemizac;:ao econornica e administrativa do pais, 0
aumento da escolarizac;:ao dos grupos urbanos e a nova posivao da Iiteratura e da arte ap6s a
revoluc;ao modemista.
As ohras de Monteiro Lobato trazem um grande significado para a literalura infantil,
pois 0 Sitio na~ e apenas 0 cemirio onde a ac;3.opode transcorrer. Ele representa igualmente
uma conccP9ao a respeito do mundo e da sociedade, bern como uma tomada de posic;:ao a
proposito da criac;:ao de obras para a inffincia.
Muilas das obras surgidas nesse pcdodo nao tern presente a oralidade,
predominando a modalidade escrita. Por isso, Lobato em Reil1(J(:;oes de Nari:inho e outros
texlos procurou recupernr 0 estatuto oral da literatura infanti!. Lobato procurou
revolucionar os textos, pois criticava os texlos que se apresentavam ingenuos, sem
imaginac;ao, com repetic;oes, 0 conceito pejorativo de povo e 0 uso de formulas desgastadas.
A industria de livros para criam;as firmava-se cada vez mais como trabalho da
gerac;ao modemista, contanto com 0 apoio de editoras como a Brasil, Melhoramentos e
Saraiva, e em menor proporc;ao a Brasiliense, herdeira da obra de Monteiro Lobato. Muitos
esctitores comec;am a produzir livros para 0 publico infanto-juvenil no periodo de 1940 a
1960. A poesia nao leve muitos seguidores, como ja acontecera, Iimitando-se unicamente
ao Iivro de Olegiuio Mariano, 1'anguarii conta historias (1952).
Nos anos 70, 0 Instituto Nacional do Livro (1973) eomec;a a editar obras infantis e
juvenis, para uso escolar, que apresentavam urn baixo indice de leitura. Nesse periodo 0
mereado de livros para as eseolas veio com a inc1usao de instruc;oes e sugestoes de Icitura,
questiomirios, roteiros de eomprecnsao de textos para serem trabalhados na escola. Muitos
autores de renome participaram desse creseimento do livro infanti1. como: Mario Quintana,
Cecilia Meireles, Vinieius de Morais e Clarice Lispector.
A literatura infantil comec;a a apresentar uma eritiea mais radical da sociedade
eontemporanea, atraves de temas como miseria e sofrimento infantil, que vao se
incorporando aos poueos aDs novos textos. Representando urn contexto rcalista social, a
partir de 1977, tcmos 0 livro }live/e, de Henry Correia de Araujo. A partir dai, varias obras
se oeupam em representar situac;Ocs ate entao evitadas na literatura infantil, por serem
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consideradas tabus. como: baixa qualidadc de vida. poluic;.ao da natureza. separac;.ao
conjugal, exterminio de indios, do amadurecimento sexual, reprcssao social, entre outros.
A poesia infantil desenvolveu-se rnuito nesses ultimos anos, foi apenas oeste ultimo
periodo que ela incorporou as conquistas da poetica modernista. A literatura infantil
brasileira aD longo do tempo, conseguiu 0 direito de falar com realismo sem 0 rclaque da
realidade hist6rica, e ao mesmo tempo que redescobriu as fontes do fantastico e do
imagimirio, a literatura infantil contempla-se a si mesma em seus textos.
Na decada de 80, a literatura infantil volta a sofrer uma certa instabilidade. Com 0
desenvolvimento da tecnologia c conquistas cientificas, surgcm novas Iinhas litenirias,
levando a crianya ao mundo da imaginay3.o, do livre pensamento, do raciocinio e da
refiexao criadora.
Hoje, varias tendencias coexistem, poderosas e vivas, ora separadas, ora fundidas no
Realismo Magico ou na Ficyao Cientifica. E possivel encontrar uma infinidade de temas e
estilos. 0 Iivro e urn produto comercial muito explorado. 0 material gnifico e mais
elaborado e a produc;ao oferece uma grande variedade de titulos, desde os quadrinhos ate
textos infonnativos. 0 autor pode produzir textos dos mais variados, porque, pouco a
pouco, os preconceitos sao deixados de lado.
Uma nova literatura infantil vai surgindo, com uma Iinguagem vigorosa e original,
focalizando temas tipicamente brasileiros e aproveitando da literatura oral que e rica entre
nos.
A literatura infantil, ao longo do tempo constituiu-se em modalidade Iiteraria e os
livros infantis, em literatura, indepcndentemente do seu genero, adjetivo ou conceito.
2.4 A LITERATURA INFANTIL
2.4.1 A Importancia das Historias
Para CADEMARTORI (\995), a convivencia com textos litenirios provoca a
fonnayao de novos padroes e 0 desenvolvimento critieo. Tern grande importancia, na
medida em que questiona os convencialismos de interpretay3.o e comportamento e
apresenta novas perspectivas tanto existenciais, como sociais, politicas e educacionais. Enessa dimensao que a literatura se constitui em meio emancipat6rio que a escola e a familia,
como instituiyoes nao podem oferecer. A marupulayao ludica dos sons da lingua pela
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crianc;a, frui9ao do sonoro independentemcnte do significado, constitui·se em parte
fundamental do desenvolvimento iinguistico.
A fase de abstrac;ao da criancya, que se da quando e criada a situac;ao imaginaria no
brinquedo tern continuidade na experiencias com hist6rias infantis, situa9~es ficcionais que
dao prosseguimento a essa expcriencia nao fortuita na vida da crianya que e a simuiayao,
primeira tentativa de emancipar-se das imposiyoes do meio. Atraves da hisl6ria, a dimensao
simb6lica da linguagcm e experimentada, assim como sua conjuncy3.o com 0 imaginario e
com 0 real.
"A literalura infantil, assim como as manifestac;Oes de cultura popular e agnUica,
prestam-se a que, na alfabetizacyao, a crianya de continuidade a experiencias expressivas j6.
adquiridas e Ihe seja assegurada uma relaQao aliva com sua lingua pelo conhecimento das
potencialidades expressivas do c6digo". (CADEMARTORI, 1995, p.81)
CADEMARTORJ (1995) diz, ainda. que 0 contato inicial com a Iiteratura nao
exige 0 dominio do c6digo escrito. A experiencia pre-escolar, geralmente, poe na bagagem
infantil narrativas orais - classicas ou populares - versos, trava-Iinguas. advinhas e tantas
outras manifestaQOes ricas em ludismo sonoro e semantico. Portanto, composi~oes poeticas
e fic~ao infantil, quando integradas ao programa da primeira serie, nao se constituem em
novidade, mas a continuidade de uma experiencia Iingtiistica ja iniciada.
A poesia e a narrativa oferecem it crianc;:a em fase de alfabetiza~ao a oportunidade
de experimcntar a potencialidade lingtiistica, descohrindo novos efeitos de sentido e as
diversas possibilidades de nomea~ao que mediam seu conhecimento do mundo. 0 livro e a
leitura, nesse momento, serao apresentados it crianya como 0 suportc e a aQao do
conhecimento que legitima 0 esforQo empreendido para tomar-se alfabetizado. 0 papel da
literalura nos primeiros anos e fundamental para que se processe uma rela9aO ativa entre
falante e a lingua.
Para ABRAMOVICH (1997), ouvir muitas hist6rias e de grande importancia para a
forma~ao da crian9a, pois ao escuta-las a crian~a dfl inicio ao seu aprendizado para tamar-
se leitor. Os prirneiros cantatas da crianc;a com urn texto sao feitos de fonna oral, atraves da
leitura de historias, contos de fadas, poemas e outros tipos de textos, lidos par pessoas de
sua familia. Ler historias para as crian~as e fazer com que ela particiJX! da propria historia,
e despertar 0 imaginario, agu9anda a curiosidade, a vontade de descobrir novas coisas, e
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poder se divertir, ou sentir varias emol;oes como, tristeza, medo, raiva, alegria, inseguram;a,
entre outras, e poder sentir e enxergar com os 0lh05 do imagimlrio.
Alraves das hist6rias as crianyas podem descohrir Dutros lugares, tempos, outras
culturas, e poder conhccer a i-iist6ria, Geografia, Fiiosofia, Politica, Sociologia, sem
precisar saber 0 nome de tudo isso, pois se souberem, essa lcitura deixa de seT Jiteratura e
passa a seTDidatica que nao tern nada a ver com as hist6rias.
2.4.2 A Arte de Cantar Hist6rias
A contay30 de hist6rias esta presente desde cedo na vida das crianyas e para que ela
continue a maravilhar e a entusiasmar sempre, e preciso saber como se cantar urna hist6ria.
Segundo ABRAMOVICH (1997), alraves das hist6rias pode-se descobrir palavras
novas, entrar em contato com a musica e corn a sonoridade das frases, dos nomes, captar 0
ritmo, brincar com a melodia dos versos, 0 acerto das rimas, 0 jogo das palavras, uma
verdadeira arte.
Contar hist6rias e uma arte, e ela que equilibra 0 que e ouvido com 0 que e sentido,
eo uso simples e hann6nico da voz principalmente iniciada pela senha magica: "Era uma
vez ... ", que causa expectativa e prazer.
Ao contar hist6rias, 0 narrador deve ser capaz de transfonnar 0 c1ima em magi co,
fazendo com que a crianya, de maneira descontraida, concentre-se e consiga vivenciar urn
mundo diferente. Ao narrar nao se deve apegar a detalhes, e sim deixar 0 campo mais
aberto a imaginayao para que 0 ouvintc vivencie c tome uma posiyao perante a hist6ria
instigados pela curiosidade.
Uma maneira de prender a atenyao das crianyas e narrar de fonna descontraida
narrativas curtas e alraentes, tendo como artificio a entonayaO de voz, falar baixinho
quando a personagem e calma ou encontra-sc pensando, aurnentar 0 lorn de voz quando
esta se exalta e pratica uma ayiio mais agitada, usaf fecursos onomalopaicos variados que
ajudam no sucesso da narrativa, tomando-a mais atraente e com maior forya de expressiio.
A literatura traz a crianc;a urn grande prazer, contribuindo assim para seu
desenvolvimento, por isso, nao se deve correr 0 risco de improvisar, narrando scm 0
conhecimento previo da hist6ria. E de fundamental importancia a familiariza9ao com 0
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texto, pois e ele que garante ao narrador a seguran<;a e a naturalidade. Qualquer deslize sera
provavelmente evidenciado pela crianc;a.
Antes de se contar uma hist6ria c preciso saber qual e 0 assunto presente, se einteressante, se dcmonstra riqueza de imaginac;ao e se consegue agradar as crianc;as. Epreciso que transmita confianc;a, motive a aten93.0 e desperte 0 estusiasmo.
Como diz ZLLBERMAN (1998), quando uma criamya escuta a hist6ria que the econtada, penclra ncla simplesmente como hist6ria. Mas existe uma "orelha", que conserva a
significay30 do conto e 0 revela mUlto mais tarde, gerando uma interpretac;ao concisa no
momento oportuno, principal mente na fase escolar.
2.4.3 A Poesia Para Criam;:as
Necessaria se faz destacar a poesia na alfabetiza9ao, pois esta tern liga9ao com a
crian~a desde cedo, principalmente atraves de brincadeiras orais que proporcionam 0 prazer
ludico. 0 primeiro contato que a crian9a tern com a poesia OCarre ainda no ber~o. atraves
das cantigas de ninar e prossegue com as cantigas de rodas e brincadeiras recitadas. pois as
rimas contidas nessas manifesta90es agradam muito 0 publico infantil.
Para rONDE (1986), alguns autores nao se preocupavam com a estetica de suas
obras literarias escritas para criam;as, sendo entao consideradas como subliteratura. Mas
para a autora, a poesia e, por excelt~ncia, urn dos meios de se criar novas linguagens e de se
respeitar 0 mundo da crian9a, que tern uma 16gica particular e caractenstica. A crian9a
passui urn modo de perceber 0 mundo diferente do adulto, par isso sua apreensao e
emocional e globalizante, sendo assim a poesia com sua linguagem altamente condensada e
emotiva sensibiliza a crian~a de maneira intensa.
A leitura de forma linear come9a com a alfabetjza~ao, a partir dai come~a a atrofiar
esta visao emocional e simultanea da vida, que so a poesia podem restaurar. 0 proprio
processo de leitura da fic~ao contribui para esse ernpobrecimcnto, porque exige que se
entcnda palavra por palavra para se entender 0 scntido da frase. Isto nao acontece com a
poesia, que privilegia 0 todo e nao as partes, pela propria constitui~ao economica da
linguagem. E tal situa9ao ocorre porque a poesia transb1fide as nOnTIas objetivas e racionais,
criando uma nova 16gica que se aproxima do "ilogismo" infanti\. 0 poema nao diz 0 que e,e sim 0 que poderia ser, transfigurando a realidade pelo ato da cria~ao, portanto, nao se
19
trata de urna redu~ao ou de urn empobrecimento, mas de urn Dutro enfoque, diferente do
empregado pela ciencia e pcJos adultos.
Toda expressao literaria e sempre poetica e transgressora e a pocsia apresenta urn
grau muito maior de diferenciayao na sua linguagcm, C econ6rnica porque opera
basicamente com imagens e simbolos. dispcnsando palavras de Iigaltuo e tudo 0 que esup6rnuo, para ocorrCT uma maior identilic39ao do leitor com a emo9ao do pocta. A poesia
elimina a distancia entre 0 eu e 0 objeto, a palavra se torna magica porque evoca e
presentifica 0 objeto, tal processo e muito cornum entre as crian~s porque ainda nao
dominam a no.;ao do tempo. A poesia preserva a magia natural do homem, Iibertando-o das
conven90es e Icvando-o a urn retorno as origens. Com esle processo instaurado pela
linguagem, a dominar;ao do adulto sobre a crianya se dilui, porque 0 adulto se volta para 0
nlvel da crianya, sem mostrar-se superior. S6 assim pode-se chegar a urn conceito de poesia
infantil que nao implique doutrinatyao.
" A leitura de textos poeticos a crianya em fase de alfabetizayao, nao s6 aproxima ao
livro como fonte de conhecimento e prazer, como exerce pape\ importante na fonnayao da
expressao verbal". (CADEMARTORJ, 1995, p.71)
Segundo ABRAMOV1CH (1997), a poesia e urn genero Iiten'uio que sofre os
maiores preconceitos editoriais, pois edita-se muito pouco e muitas vezes quando sao
editadas nao sao criteriosamente avaliadas. Grandes poetas brasileiros nao tern vers5es
infantis de suas obras, enquanto poctas menores que nao dominam 0 verso e nao [alam de
modo sensivel e belo, tem suas obras impressas. Essa autora faz criticas a quem acha que a
poesia infantil tern que ser moralizadora, pequenininha, tratar de ternas patri6ticos ou falar
de assuntos sentimentais. Pois, a poesia para crianyas, assirn como a prosa, tern que ter
antes de tudo, qualidade litenlria. Na poesia percebe-se urn grande jogo de palavras, rimas,
ritmos, que agradam as crianyas, trabalharn com as sensatyOes, sonhos, emOyoes, como
tambern a vivencia infanti\' Outra variayao existente na poesia sao as poesias narralivas e a
prosa poetica.
Para ABRAMOVICH (1997), pode-se trabalhar com a poesia em sala de aula,
atraves da lei lura em voz alta de urn poema que despertou interesse, encontrar poesias que
explorem os aspectos sensoriais de cada urn, trabalbar com poernas que falam do mesmo
assunto, mas de form as diferentes, trocar experiencias pessoais a partir de urn poema que
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roi lido. Fazer com que a crian((a tcnha urn cademo, ou album, ou agenda, que possa anotaT
pecmas inteiros ou versos que sao particulannente belos, sensiveis, esclarecedores e
interessantes. Trabalhar as expressoes poeticas atraves de musicas, criando melodias, poder
Ie-los em conjunto ou em voz alta. As crian~s poderem criar seus proprios poemas, a partir
de jogo de Timas, de inversoes, brincando com 0 senti do das palavras, com cada Frase ou
estrofe.
Ao sc trabalhar corn urn poema oa sala de aula, e preciso que a professora 0 conhc((a
bern, que 0 tcnha lido vilrias vezes, para poder passar a sellS alunos, a verdadeira emoltao, 0
ritma, a descoberta de cada estrofe e mudam;:as acontecidas durante a leitura do paema.
Ao se1ecionar urna poesia para seT lida pelas crianyas, que esta nao seja escrita por
inieiantes, e sim por autores que ja dominam 0 verbo, constroem 0 verso, control am 0
ritmo, que sabem eliminar 0 superfluo, que sabem condensar de modo exato e belo, as
imagens e provocar encantamento, suspiros, vontade de querer mais, de repetir a ieitura, e
descobrir cada vez mais.
2.4.4 Os Contos de Fadas
o que leva uma crianya a dizer: eonta aquela historia pra mim ? ou entao, conta de
novo? Essa pergunta pode ser respondida atraves do maravilhoso, da fantasia e das
emoc;6es que urna hist6ria apresenta e que contagia a crianya e 0 lei tor.
Segundo ABRAMOVICH (1997), os contos de fadas estao envolvidos num mundo
onde 0 real e a fantasia se misturam, sao historias que passam fora dos limites de tempo e
espac;o, apresentam pcrsonagens simples, mas que passam por situac;oes diversas,
procurando encontrar respostas fundamentais, chamando a crianc;a ao seu encontro para
percorrer e a aehar uma resposta para seu conflito. E issa, transcorrendo atraves do
imaginario, da fantasia, com interven~ao de entidades fantasticas como: bruxas, fadas,
duendes, animais falantes, plantas magicas e outros elementos que contribuem para a
criaC;ao do maravilhoso.
ABRAMOVlCI-I (1997) diz que por lidarem com conteitdos da sabedoria popular e
com conteudos essencials da condic;ao human a, os contos de fadas sao muito importantes
para as crianc;as, conseguindo sobreviver ate hoje. Mas, uma historia nao e conto de fadas
por apresentar bruxas boas, fadas ou gigantes comil5es. A magia nao csta no fata de haver
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uma fadaja anunciada no titulo, mas na sua forma de a<;ao, de apanyao, de comportamento,
de abertura de portas, pois cada elemento dos contos de fadas tern urn papel significativo e
irnportante, e se for retirado, suprido au atenuado, vai impedir que a crianya compreenda
intcgralmente 0 conlo.
A autora ainda faz criticas sobre quem canta as hist6rias pela metade au suavizadas,
scm sellS elementos pr6prios, suas facetas de crueldade, de angustia. Pois, au se canta a
hist6ria de maneira integral, respeitando a totalidade da narrativa, ou se muda de historia.
Os contos de fadas sao muito rices, despertando para seu eSludo, psicanaJistas, soci6logos,
antrop61ogos, psic61ogos, que inlerpretam e se aprofundam na area de seu interesse.
Alguns autores tornaram-se muito famosos, como: Perrault (Fran9a. 1628·1703),
que ficou conhecido por seu unico volume de contos para criam;as. Muitos de seus contos
foram recontados pelos innaos Grimm, mas com menos quaJidade litenlria. Os innaos
Jacob Grimm (Alemanha-I785-1863) e Wilhelm Grimm (1786-1859) nao prelendiam
cscrever para crian9as, mas em 1&15, Wilhelm usou seu material fantastico de fonna
sensivei, conservando a ingenuidade popular, a fantasia e 0 poetico ao escreve-lo. Hans
Christian Andersen (Dinamarca·1805-1875) criou seus pr6prios contos, era filho do povo e
os seus contos fazem parte da sua propria inffincia.
Os contos de fadas falam de medos, como na traduQao feila por Ana Maria Machado
o homem que saiu em busca do medo, do volume Chapeuzinho Vermelho e outros contos
de Grimm, ou nos livros de Marina Colasanti, Uma id6ia fada a::ul e Do=e reis e a moqa do
labirinfo de vento, ou Andersen, em Os sapalos vermelllOs.
Os contos de fadas falam de amor, mas em lodas as suas dimensoes, sofrimentos,
descobertas, encantos, possibilidades, inicio e tennino. Tern-se: 0 menino mau, 0
soldadinl1o de c1l11mbo, A pequeno sereia, de Andersen e Maria colasanti em Um eJ,pinho
de marjim. Os contos de fadas falam da diticuldade de ser crian9a, tem·se com os innaos
Grimm, 0 menino pas/or, 0 pequeno po/egar, James Barrie, com Peter Pan, Perrault, com
Cinderela ou Gala l3orralheira, Pete de Burro ou Pele de Asno. Os contos de fadas falam
das carencias, como afetividade, comida; os innaos Grimm contarn sobre isso em
.1ooo=inl1o e Maria=inlw e Andersen em A men ina dos /os/oros.
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Os contos de fadas falam de autodescobertas, e da descoberta da propria identidade,
o que e fundamental para 0 cTescimento da crianc;a, como em 0 patin/w jeio, de Andersen,
e a mesma his16ria cootada por Ziraldo em Flicls e Andre Carvalho em DOllrado.
Os contos de fadas falam de perdas e buscas, de abandonos. de esquecimentos, de
quem foi significativo urn dia e que por alguma razao nao e mais, como em 0 pinheirinlw
de Andersen e Bela Adormecida de Perrault.
Os contos de fadas ainda falam de traiyoes, de temores, de juramentos, de
sentimentos de perda, de infidelidades, abandonos, de que, as vezes, os familiares sao
injustos, vingativQs, perversos e que a ajuda pode seT de urn desconhecido, de desafios que
precisam ser enfrentados, de prisoes, de tristezas, de revela~oes, de sexualidade, de vida e
morte, que todas essas dificuldades intemas e externas, podem ser compreendidas ou
resolvidas atraves do encantamento , da magi a, cia presem;:a do maravilhoso. Falam da
fantasia, do poder de sonhar, desejar e do querer 0 proximo.
Segundo BETTELHEIM (1998), os contos de fadas forarn banidos por urn
determinado tempo por que muitas pessoas consideravam que eles nao apresentavam
quadros de vida "verdadeiros", e que pOT isso nao cram saudaveis. Alguns pais temem que
contar aos filhos os casos fantasticos dos contos de fadas seja "mcntir" para os filhos. Isso
se deve it pergunta que a crian~a faz: Isto e verdade?
Se urn pai sabe 0 valor dos contos de fadas a partir de sua experiencia infantil, nao
sentira dificuldades em responder as perguntas do filho, mas se urn pai acredita que os
contos de fadas sao apenas mentiras, teni dificuldade de conlar para a crianya, entao emelhor que nao 0 conte, pois nao sera capaz de relatar de forma a enriquecer a vida da
crianya.
Outro medo que as pais temem e que a mente da criayao possa ficar tao cheia de
fantasia de fadas que nao aprenda a lidar com a realidade. Os contos de fadas sofreram
duras criticas quando as novas descobertas da psicanalise e da psicologia infantil revelaram
o quanta a imaginayao da cnanya e violenta, ansiosa, destrutiva e sadica. E alguns dos
estudiosos diziam que essas hist6rias encorajavam esses pensamentos conturbados.
Os que baniram os contos de fadas tradicionais e folcloricos achavam que se
existissem monstros nas historias narradas para a crianya eles deveriam ser amigaveis,
tirando-Ihes, assim, a capacidade de poder elabarar suas fantasias ern toma da imagem que
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conheccm nos contos de fadas, nao trabalhando 0 medo que existe dentro dela e suas
ansiedades. Nao ali men lando a imaginalYao da crian-ra, espera-se que todos os monstros
existentes desaparc((am. 0 que nao e verdadc.
'"Os contos de fadas sao amados pela criany3 nao porque as imagens que encontra
neles cstejam con forme aD que se passa dentro dela, mas, porque - apesar de lodos os
pensamentos raivosos e ansiosos de sua mente, aos quais 0 conto de fadas da forma e
conteudo especificos - estas est6rias tern sempre urn resultado feliz, que a crian((3 naD pede
imaginar por conta propria". (BETTELI-IE[M, 1998, p. I 54)
2.4.5 A Leitura Critica
Segundo CADEMARTORI (\995), a escola e 0 lugar de consagrac;:ao do status quo,
sua vocac;:ao e conservadora, pois trata de garantir 0 que ja esta estabelecido. A Iiteratura,
por sua vez, propicia uma reorganiza~ao das percep~5es do mundo e desse modo,
possibilita uma nova ordena~ao das experiencias existenciais da crian~a. A convivencia
com textos iitenirios provoca a forma~ao de novos pactr5es e 0 descnvolvimento do senso
critico.
Para CAGLIARI (1997), a maneira pela qual a escola trabalha a interpret ••;.o de
texto, atraves de perguntas que nao levam a rcflexao, faz com que 0 aluno pense que a
interpretayao de urn texto e identificar 0 sujeito da oraQao ou outros elementos, como
tam bern desestimula a lehum, a medida que esta apresenta um questiomirio a ser
respondido. Para que a interpretaQao de texlos nao caia nesse eITO, 0 que pode ser feito e
urna discussao do assunto com os alunos, ou ainda, que eles contem a mesma hist6ria com
suas proprias palavras, dessa maneira, pode-se razer uma interpretaQao criativa, nao-
repetitiva, do texlo. Nem tudo °que se Ie preeisa ser discutido. comentado, interpretado ou
analisado, mas apenas pelo prazer de ler.
Segundo ABRAMOVICH (1997), ao ler uma hist6ria a crianQa tarnbern desenvolve
todo urn potencial critieo. A partir desse ponto cia pode pensar, duvidar, perguntar,
questionar. Pode se sentir inquieta, qucrendo saber mais e melhor ou perceber que se pode
mudar de opiniao, mas isso so aconlece se essa atividade fizer parte da rotina escolar, de
maneira sistematizada e regular.
24
Ao fazer uma leitura e preciso saber se 0 alune gostou au nao do que roi lido au
contado, se concordou au nae, saber se ele ficou envolvido na leitura, querendo leT mais ou
se nao gostou do que leu, achando a historia desinteressantc. E formar opinino pr6pria, efannaT seus proprios crilerios, e comec;:ar a gostar de urn all Dutro autar, au genero, au uma
ideia, urn assunto e, a partir dai seguir urn caminho em busca de novos livTos.
Para ABRAMOVICH (1997), hfl muito 0 que ana1isar, 0 que discutir, 0 que fazer a
crianc;:apcrceber e opinar criticamente, para que cIa fanne seu espirito entice. Pode-se
comec;:arpela propria hist6ria, se cia e interessante au nao, a ideia do autar, se ja foi vista
antes au e nova. Discutir 0 ritmo da lcitura, se foi longo au nipido, discutir 0 corne~o e 0
lim da hist6ria, se 0 come~o deu vontade de continuar ou de desistir da leitura, e se 0 tim
estava relacionado com que aconteceu na hist6ria ou mudou total mente. Se a historia estava
bern escrita, se as personagens tinham vida ou eram apagadas, se tinham urn papel atuante
na historia.
Discutir e comentar 0 proprio livro, sua capa, seu titulo, a encademactao, a
paginactao, as letras, 0 formato do livro, as ilustractoes, para que no final, a crianya possa
sentir 0 livro como urn todo e 0 todo do livro.
2.4.6 As Ilustrayoes do Livro Infantil
De acordo com WERNEC (1986), cresce cada vez mais a impornincia da leitura
pict6rica que antecede a Icitura verbal nas crianctas pequenas, nos adultos com dificuldade
de alfabetizay3o, pois 0 c6digo pictorico e urna represcnta.yao semi-concreta, apresentando
urna cornunicay30 mais dircta do que 0 c6digo verbal escrito que se representa de forma
abstrata. Isso porque a ilustra~ao e urna linguagem internacional, podendo ser
compreendida por quaJquer pessoa, portanto a ilustracao e mais irnportante do que 0 texto
para criam;a pequena e para 0 jovem analfabeto ou semi-alfabetizado.
A ilustracao confere ao livr~, aiem de seu valor cstetico, 0 apoio ,a pausa e 0 sonho
tao irnportantes nurna leitura criadora. Transmitir urna mensagem nao e privih!gio da
linguagem, cscrita, pois a pictoriea tambern eonta estoria. A imagem desenhada ou pintada
seleciona 0 real sem necessariamente empobrece-Ia.
Mesmo com opinioes diversificadas sobre as ilustracoes do livro infantil
WERNEC (\986), opta por nao Jular contra os livros ilustrados e sirn a favor de Iivros bern
25
ilustrados, nos aspectos tecnicos, esteticos e estimuladores do pensamento, pois 0 livro nao
e apenas urn objcto visual com experiencias ligadas ao sentido da visao, e sim com
percept;:oes predominantes.
Akm do visual da comunicayao das ilustrayoes, pode-se observar tambem 0
fonnate do livrD, 0 numcro de paginas, a distribui<;:ao das ilustra90es e do texlc, as
diferenles lecnicas usadas pelo ilustrador e as tecnicas de impressao. POTrazoes de riquezas
de expressao, 0 ilustrador prefere manter a dualidade dos mundos real e imaginario oa
mesma imagem, pois a melhor maneira de acreditar no fantastico e a de lidar a apan!ncia da
realidade. Ha livros em que a ilustrat;:ao manifesla urn certo preconceito que nao esta
explicito no texto, utilizando-se de estere6tipos para mascarar uma detenninada realidade.
o reducionismo da adaptay3.o de hist6rias, principalmente 0 realizado por pessoas
com objctivos did:iticos, leva a urn empobrecimento da linguagem e da ilustrayao. E muito
importante a n~ao da relatividade presente nas ilustraltoes oferecidas as crianyas.
favorecendo 0 desenvolvimento de multiplos pontos de vista. Em alguns ilustradores
animalistas como Mikos Hanak, encontra-se a preOCUpay30 de ilustrar os animais pouco
conhecidos pel as crianyas em diferentes pontos de observaltao, favorecendo a totalidade da
imagem.
o ilustrador nao precisa representar todo 0 texto, pois algo de simb61ico pode
representar 0 conteudo, sem precisar da caracterizayao dos personagens, 0 que ja e comum
em alguns livros para adolescentes. Tal variayao e muito importante para 0
desenvolvimento das crianltas e jovens nurn mundo de cipidas mudam;as, onde a expressao
criadora e urn bern que deve ser preservado, nao para a fonnaltao de artistas. mas para 0
pleno desenvolvimento do homem. As ilustrayoes de boa qualidade ,sejam elas em guache,
anilina. lapis de cor, pastel, recorte e colagem, nanquim, aguya a perce~ao, desenvolvem a
observaltao e contribuem para 0 sense critico do leiter sobre materiais visuais
estereotipados presentes em nosso meio.
"Se a literatura infantil se destina a crianyas e se se acredita da qualidade de
desenhos como clemento a mais para reforyar a hist6ria e a atrar;ao que 0 Iivro pode cxercer
sobre os pequenos lehores, fica patente a importancias das ilustra~es a eles dirigidos".
(LAJOLO, 1991, p. 13)
26
De acordo com LAJOLO (1991), da analise dos cern anos estudados em sua obra, 0
livro infantil brasileiro sofreu transforma~Oes, desde a importa~ao dos cliches que se
ilustravam as hist6rias traduzidas ate os sofisticados trabalhos graticos de ZiraJdo, Gian
Calvi ou Eliardo Franrw:a.Esse entre outros motivos, serve para que ao refletinnos sebre as
ilustrayoes nos livros para crianyas, esses passem, gra(j:as a cIa, a constituir uma especie de
novo objeto cultural. onde visual e verbal se mesclam.
"as livros infantis brasileiros contemponlneos VaG manifestar ainda urn outro tra90
da modernidade: a enrase em aspectos gnificos, naD mais vistos como subsidiarios do texlc,
e sim como elemento autonomo, praticamente auto-suficiente", (LAJOLO, 1991, p.127)
2.4.70 Livro Infantil e a Crianc;a em Alfabetizac;ao
De acordo com CADEMARTORl (1995), desde seu surgimento, 0 livro infantil
veio para atender a uma exigencia de mercado que se cncontrava propicio para seu
crcscimento, de hi para ca , esse mercado de Iivro para crianc;as so tern aumentado. Mas, ao
lado de edic;5es bern trabalhadas, seja do ponto de vista grafieo quanto da estctiea liteniria,
h3 0 impresso que, destinado ao publico infantil, nao tern, eontudo, compromisso com os
trac;os que afinnam a literatura com wn genero litera rio. Por isso, nem tudo que cireula
como livra para crian~as e, de fato, literatura infantil.
Por que enta~ esse fascinio dos livros pelas crianc;as das diversas idades? Porque sao
livros das mais diversas variedades, desde livres para crianc;as que nao sahem ler, ate liVTos
para crianc;as maiores que ja dominam a leitura. Livros de bolso, pequenos, que podem se
levados para qualquer lugar, com poucas paginas ou muitas paginas, Iivros que enehern os
olhos com suas cores variadas e alegres, livros finos au grossos, leves ou pesados, com
letras pequenas ou grandes, com textos longos ou curtos, com capa e folhas duras ou finas,
com muito, pouco au somente dcsenhos (ilustrac;ao), caros ou baratos.
Livros e mais livros que procuram despertar 0 interesse de todas as crianc;as, alguns
gostosos de abrac;ar, como os livros de pano, alguns gostosos de brincar na banheira, como
os de plasticos, outros interessantes, como as Iivros interativos, outros comunicativos e
sonoras, como as livros musicais, livros em preto e branco, para serem coloridos, livros
decorativos, que tomam varios fonnas, livros didaticos, que trazem atividades para serem
27
respondidas, livros que tern fonna de animais, meios de transportes, brinquedos, objetos,
alem de livros que junto com eles dao brinquedos para as crian~as.
Ao dirigir-se para qualquer livraria, 0 espa~o destinado aos Iivros infantis e semprc
cheio de novidades ou atrac;oes, para alingir seu publico, como mesas e cadeiras coloridas
apropriadas para as crianltas, ou ainda 0 P090 encantado que contem dentro dele uma
varicdade de Iivros que a crian98 pade escolher, e e 56 se observar esse espa90 para
conc1uiTque realmente ele consegue atrair os pequenos leitores.
Segundo CADEMARTORI (1995), hoje, 0 mcrcado de Iivros infantis oferecem
produc;oes de boa qualidade para lOOasas faixas emrias. desde livros para crianc;as que nao
sabem leT, sao livros sem textos que usam apenas a linguagem visual Alguns autores que
trabalham com esse tipo de livro: Eva Furnari (Toda diu e De ve.: em quando, J:":.\·conde-
esconde e Cabra-cega), Angela Lago (Outra vez), Juarez Machado (ida e volta), entre
outros.
2.5 A LEITURA E A ESCRITA NO PROCESSO DE ALFABETIZA<;:AO
"Enquanto ato de conhecimento e ato criador, 0 processo de alfabetiza9ao tern, no
alfabetizando, 0 seu sujeito. 0 fato de ele necessitar da ajuda do educador, como ocorre em
qualquer rela9ao pedag6gica, nao significa dever a ajuda do educador anular a sua
criatividade e a sua responsabilidade na construyao de sua linguagem escrita e na leitura
desta Iinguagem ... A alfabetiza9ao e a cria9ao ou a montagem da expressao escrita da
expressao oral. Esta montagem nao pode ser feita pclo educador para ou sobre 0
alfabetizando. Ai tern ele urn momento de sua tarefa criadora" (FREIRE, \999, p.!9)
No processo de alfabetiza93.0, duas atividades estiio intimamente Iigadas para que se
obtenha urn born resultado desse aprendizado: a leitura e a escrita. Mas esse processo nao esimples, depende e muito de como se trabalha cssas duas atividades ao longo desse
processo, e como 0 trabalho de Iiteratura infanti! pede contribuir e muito para esse processo
e preciso primeiro saber tambem como se configura a escrita e a leitura no nosso meio e no
meio escolar.
28
2.5.1 A Escrita
Para CAGLIARI (1997) 0 ensino de portugues tern sido dirigido para escrita,
preocupando-se mais com sua aparcncia do que 0 que cia real mente faz e represent3. Para
de urn dos objclivos mais importantes da alfabetiza~ao e ensinar a escrever. A escrita eurna atividade nova para a crian~a, sende necessario urn tratamento especial na
alfabetizar;ao. Mesmo que a crian.;a tcnha contato frequente com livros, revistas, que veja
adultos e crian~as mais velhas lendo e escrevendo, 0 trabalho sistematico da escrita e leitura
durante a alfabetizaQao se coloca como urn novo desafio.
No processo de aquisit;ao da Iinguagem oral, percebe-se que a crian93 aprende a
faJar natural mente, pois ao comec;:ar a falar cia tern a opor1unidade e a liberdade de atuar
sabre a abjeto (fala), de fonnular hipoteses sobre suas form as, de tentar generalizayoes, de
errar em busca do modelo ideal. Quando suas tentativas nao sao bern sucedidas os adultos
atuam como mediadores entre a crian~a e 0 modelo, e assim a crian9a acaba construindo
naturalmente 0 seu sistema iingOistico adequadarnente.
Mas com rela~ao a escrita, 0 que se percebe e a imposi~ao de urn modele scm
qualquer possibilidade. espacial ou temporal, para a experimentayao, tentativas e
dcscobertas de cada crianya, que se Iimitam como tare fa ao fazer copias de tra9ados, urn
verdadeiro exercicio de treinamento manual. Pois preocupada com a ortografia, a escola
esquece que 0 principal, num prirneiro momento, e que as crianyas transportem suas
habilidades de [alantes para os textos escritos. Aos poucos se cuidani da orto!:,Tfafia, que
deve ocorrer de fonna que nao amedronte quem ainda na~ sabe escrever.
A escrita tern como objetivo primeiro pennitir a leitura. A leitura e uma
interpreta9ao da escrita que consiste em traduzir os simbolos escritos em fala. A escrila
deve ter como objetivo essencial 0 fato de alguern ler 0 que esta escrito. Ler e urn ato
linguistico diferente da produ9uo exponlanea da fala sobre urn assunto qua\quer, pois a
leitura e condicionada pela escrita. Ler e exprimir urn pensamento estruturado por outra
pessoa, nao pelo leitor falante.
A escrita se diferencia de outras ronnas de representa9ao do mundo, nao so porque
induz a leitura, mas tarnbem porque essa leitura e motivada. isto e, quem escreve,
diferentemente por exemplo de quem desenha, pede ao leitor que interprete 0 que esta
escrito, nao pelo puro prazer de faze-la, mas para realizar alga que a escrita indica.
29
2.5.2 A Leitura
Para CAGLIARI (1997), a leitura e uma atividade fundamental desenvolvida pela
escoia, e saber ler e muito mais importante do que saber escrever. A leitura e uma extensao
da escola na vida das pessoas, pois a maior parte do nossa aprendizado esta relacionado
com 0 que aprendemos atraves da leitura fora da escola. A leitura realiza 0 objetivo da
escrita, pois quem escreve , espera que 0 que foi escrito seja lido por alguem.
"As pessoas que naD leern sao pessoas vazias ou suhnutridas de conhecimento. E:claro que a experiencia cia vida nao se reduz it leitura", (CAGLIARI, 1997, p.150)
A leitura e uma decifTa9iIo e uma decodificac;ao, onde 0 leitor primeiro decifra a escrila
para depois cntcnder a Iinguagem utilizada, entaD decodifica as implica90es contidas no
texto para entao poder refletir e fonnar 0 proprio conhecimcnto e a opiniao a respeito do
texto lido. A leitura e antes de tudo uma atividade lingUistica e precisa da uniao de
significados com significantes, para poder ser entendida.
A escrita atua na convenc;ao da representa.yao dos signos gnificos, enquanto que a
leitura atua na convenc;ao dos elementos lingOisticos, como tambem culturais, ideologicos,
filosoficos, sociais , entre outros, do lei tor. Por isso, cada leitor possui sua propria
interpretac;ao da leitura realizada.
Na escola, ao se trabalhar com a Ieitura, e preciso que a escola conhec;a essa
individualidade para poder respeitar a leitura feita por cada crianc;a. Como a leitura e uma
atividade Jigada it escrita, e existem muitos tipos de escrita, assim tambem existira varios
tipos de leitura.
A ve10cidade com que uma pessoa Ie e a compreensao que ela tern do texto esta
ligada it habilidade do Ieitor como falante de sua lingua, pois quem fala sua lingua com
rapidez e fluencia e capaz de ler bern e rapidamente, mas quem fala com dificuldade im ler
com dificuldade, porque tera duvidas , procurando assim fazer no momento da leitura as
correc;oes que se acham nccessarias .
"Ensinar as crianc;as a ler no proprio dialcto e fundamental para formar bons
lcitorcs. A crianc;a que fala numa variedade do portugues diferente da que a escola usa e
que aprende que a Ieitura deve necessariamcntc seT feita no dialeto da escola, levaTa esse
30
habita para a vida e, quando for leT, precis8ra fazer urn esfor~o muito grande para conciliar
vclocidade de leilura e compreensiio" (CAGLIAR1, 1997, p.154)
«A leitura do mundo precede a leitura da palavra, dai que a posterior leitura desta nao
possa prescindir da continuidade cia leitura daquele. Linguagem e realidade se prendem
dinamicamente. A compreensao do texto a seT alcanc;ada por sua leitura critica implica a
perce~ao das reial(Oes entre 0 texto e 0 contexto", (FREIRE, 1999, p.ll)
"A insistencia na quantidade de leituras sem 0 devido adentramento nos textos a serem
compreendidos, e nao mccanicamente memorizados. revel a urna visao magica da palavra
escrita. Visao que urge seTsuperada". (FREIRE, 1999, p.IS)
2.5.3 Tipos de Leitura
De acordo com CAGLlARI (1997), tem-se varios tipos de leitura. Uma leitura pode ser
ouvida, vista ou falada. A leitura oral nao e feita somcnte por quem a Ie, ela pode ser
dirigida a outras pessoas, que tambem "h~ern" 0 texto ouvindo-o. Mas a leitura oral, ou
falada, na maloria das vezes realizada apenas na escola, e rnarcada por muitos preconceitos
IinbrOisticos que a considera como uma reali7..a'tao do dialeto-padrao no seu nivel mais
fonnal.
A crianya tern seu primeiro contato com os textos, atraves da leitura destes feita pel os
adultos, que leem as historias para elas. E escutar, tambem e urna fonna de leitura. A
diferenya entre ouvir a fala e ouvir a leitura, esta em que a fala e uma a't30 espontiinea
enquanto que a leitura esta sendo dirigida por urn texto escoto, com suas proprias
caracteristicas.
Certarnente crianyas que escutarn radio, televisao ou mesrno pessoas falando tern urn
desenvolvirnento maior do que as crian'tas que nao tern presente tais manifesta'toes em sua
vida. Na nossa sociedade, e dado mais enfase na leitura silenciosa e visual, deixando de
lade a leitura oral que pode ser ouvida por urn detenninado publico.
Mas a leitura visual, alem de ser mais freqilente na vida das pessoas, cia tern algumas
vantagens como: nao provoca inibiy30 na pessoa que Ie (pois esta esta lendo para si), e
pennite uma maior rapidez na leitura, podendo parar ou voltar se for preciso, 0 que na
leitura oral de urn texto e dificil acontecer.
31
A escola comcle urn erro com crianyas que ainda nao sabem ler, naD considerando que
esla atividade 6 muito dificil. pois impliea uma decifrayao da ieitura. Para leT, e preciso tcr
habilidade e a criam;;a precisa de tempo para conseguir exilO. Para tanto e preciso que cia
estudc, decifre e treine sua leitura para que nao se sinta frustrada diante da sua lei lura, de
sellS colegas e de sua professora. Se 0 aluno for fon;ado a ieT, ele podeni dcsenvolver urn
pCssimo habito de leilura, como a soletrayao, a deturpal\=30 fonetica da qualidade de
segmcntos e a falta de controle sobre 0 pensamento ao longo da leitura.
"Para conseguir ler, deve-se, pois, decifrar foneticamente a escrita, processa-Ia para a
fala e realizar lodas as elapas necessarias para prodUl;:ao do que se vai dizer. da maneira
como se vai dizer" (CAGLIARI, 1997, p. 164)
2.6 ATIVIDADES PARA SE TRABALHAR COM A L1TERATURA INFANTIL
De acordo com ABRAMOVICH (1997), uma das atividades que podem ser
desenvolvidas apos as discuss5es orais sobre 0 texto lido, e cada aluno escrcver sabre tudo
o que foi discutido, de maneira pessoal, scm roteiros definidos, deixando que crianc;:a
busque 0 que mais the encantou, lhe chamou atenyao.
Dutra atividade para se desenvolver com a literatura infantil, e propor it crianc;:a que
releia urn livro que mais gostou ou que tenha chamado sua atenyao, pois reler pode ser tao
agradavel e esc1arecedor quanto a primeira leitura.
Para CAGLIARI (1997), quando a escola nao possui obras de bons autores, eimportante que a professora produza pequenos livros, para facilitar a leitura da crianc;a,
com historias e trechos de obras !iterarias, que sejam de interesse da crianya como: poesias,
canc;5es, letms de musicas populares, proverbios, advinhac;oes,jogos de palavras, etc. Gutra
o~ao e a elaborac;ao de livros escritos e ilustrados pelos proprios alunos, seja de forma
coletiva ou individual.
DALLA-BONNA (1998) sugere varias tecnicas para se trabalhar com a literatura
infantil. como musica para iniciar uma historia, 0 usa de fantoches e recursos variados com
novelo de la, confecc;ao de bonecos, gravuras. mascaras, fantasias, maquetes, dramatizac;ao,
sonoplastia, jogral, dobraduras, criac;ao de poemas e historias, quadrinhos, parlendas,
gestos, caixa-surpresa, todas com a finalidade de tomar mais atrativo e divertido 0 trabalho
com a literatura infantil.
32
E preciso que se valorize 0 trabalho com 0 irnaginario, caracteristico do mundo
infantil, pois a imagina¢o, assim como a inteligencia e a sensibilidadc, ou e cultivada, ou
se atrofia.
33
3 CONSIDERACOES FINAlS
A partir desse trabalha, procurou-se evidenciar a importancia da literatura infantil
no processo de escolarizac;ao para a fonnayao de leitores e sua relac,:ao com a educac,:ao.
Atraves da literatura infantil, a criam;a vai seT incentivada a aprender com maior
facilidade e empenho. 0 professor, atraves da Iiteratura, devera estirnular a capacidade de
observac.:ao, pcrccP9iio, imaginac.:ao, analise e avaliac,:ao da crianc.:a; dessa fonna, estani
preparando seus alunos para viverem com coragem, habilidade c disciplina. A literatura
infantil pode seT trabalhada em qualquer momento do ensino, pais a atividade de leitura faz
parte da nossa vida, contribuindo assim para a educac,:ao integral do aluno.
Percebe-se que 0 livro e parte importante na educa<;ao e no desenvolvimento da
crian<;a como apoio didatico, despertando 0 interesse que induz a urna rela~tio intima entre
a crianya e 0 livro. Assim se ve a importancia da educac;;ao Iiteraria, al6m de contribuir e
influenciar na fonna<;tio da crianc;;a, possibilita urn crescirnento sadio e urn enriquecimento
pennanente, integra-se ao mais alto espirito de uma pratica democnitica enquanto investe
numa produ<;ao seria do conhecimento.
Entende-se que a formac;;ao educacional deve estar integrada a diferentes formas de
aCao. Desta forma, 0 eixo norteador das praticas pedag6gicas no processo de alfabetizac;;ao
deve ser voltada para 0 desenvolvimento de ac;;oes que possibi1item e assegurem a
indissociabilidade entre teoria e prMica, materializando-se num conjunto de avoes que
garantam a conexao ensino-aprendizagem-Iudicidade.
Constatou-se atraves das discussoes aqu! colocadas que existem varias formas de
atrair a crian~a para 0 mundo dos livros, mesmo as que ainda nao sabem ler, pois hoje no
mercado encontramos livros coloridos que valorizam as i1ustrac;;oes que instigam a
curiosidade, a percepc;ao, desenvolvendo a expressao oral e a cnaeao espontaneas de novas
hist6rias.
As crian<;as que entram em contato com os livros ou hist6rias desde 0 ambiente
familiar iniciam 0 contato com a escrita e a leitura atraves do mundo da fantasia, com
hist6rias infantis narradas com entusiasmo e diversao, terao mais facilidade para a
apreensao de novos conhecimentos, atraves dos estimulos que as hist6rias proporcionam,
34
desencadeando. assim, urna alfabetizayuo significativa que contribui para a formaQao do
leitor.
o sucesso da aprendizagem depende e muito de quem esta envolvido na Educa<;ao,
pois este precisa buscar caminhos concretos, visando promover 0 gosto pela permanencia
do aluno fla escola. Cabe principalmente aD professor, em especial aD alfabetizador. uniT a
leoTia it pni.tica, venccndo todos os obstaculos, adaptando metodos e tecnicas as suas ja
existentes para que a alfabetiza<;3.o se consolide e traduza como urn marco inicial
fascinante na vida escolar do aluno pOT meio do prazer Judico da leitura.
Dentre da pluralidade de opiniOes dos rnais respeitados autores, procurou-se
sintetizar conhecimentos, tendo sernpre 0 cuidado de evitar e aceitar como verdadeira uma
orienta9ao doutrimiria, sem sobre ela pesquisar os fundamentos do seu conteudo.
E preciso que as atividades com a literatura infantil nao sirvam apenas como fins em
si mesmas, mas como meios de se atingir objetivos pre·estabelecidos, agu9ando assim 0
interesse em aprendcr para poder transformar.
A literatura infantil brasileira, ao longo de seu surgimento, foi marcada por grandes
discussoes e questionamentos. Antes era considerada por alguns como uma lileratura
"menor", com 0 tempo ela sc firmou como modelo lilerario, conseguindo respeito no meio
academico. Assim como a Iiteratura 0 livro infantil, tambem participou desses mudan9Bs,
surgido como objeto de mercado, hoje configura urn aspecto muito maior que uma
mercadoria, sua importancia surge no despertar de criam;as que ainda nao sabem lcr, sendo
contempladas com Iivros das mais variadas ilustra90es, a crianyas que ja sabem ler, com
historias escritas por muitos autores respeitados no meio litenirio.
A Iiteratura no processo de alfabetizayao faz com que a crianya desperte sua
imagina9ao e sua fantasia ao entrar em contato corn as historias, os contos de fadas, a
poesia infantil, Icvando·a a criar sua propria consciencia critica, compreender que muitas
vezes algumas historias apresentam preconceitos que precisam ser discutidos e analisados,
a lim de nao criar opinioes distorcidas de uma detenninada situa9ao ou realidade.
o trabalho com a literatura infantil deve seT considerado da maior importancia na
escoia, escola esta que precisa valorizar a leitura desde os primciros anos escolares e nao
considera·la como uma atividade secunda ria na sal a de aula. Isso com a contribui9ao, como
ja foi colocada, do professor, que deve proporcionar a seus alunos, a contato de lodos os
35
tipos de leitura e de escrita, tamar frequente as visitas as bibliotecas e a circulayao de Iivros
entre as crianc;as dos mais diversos generos.
o contato com os textos literaTi os dos livros infantis leva a criam;:a a construir
gradativamente seu eSliio de leitura para que, no momento em que for faze-Ia. se sinta
preparada para esse atividade sem constrangimento e, conseqOentemente, se sentindo apIa a
buscar novas lcituras por si s6.
Portanto, no momento em que 0 atuno comt!93T a fazer tal pnitica, a busca de novas
ieituras, 0 trabalho com a literatura infantil tcnt atingido seu objetivo maior, que e fonnayao
de leitores, e a efetiv39ao de uma escolarizayao que busca formaT leitores de fato.
36
REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS
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