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Rua Joaquim Floriano, 72 • 13º e 15º andares • cjs. 133/155 04534-000 • São Paulo - SP

Tel.: (55 11) 3706-7777 • Fax: (55 11) 3078-9476 www.dinamarco.com.br

C Â N D I D O R A N G E L D I N A M A R C O C Â N D I D O D A S I L V A D I N A M A R C O T A R C I S I O S I L V I O B E R A L D O M A U R Í C I O G I A N N I C O B R U N O V A S C O N C E L O S C A R R I L H O L O P E S L U I S G U I L H E R M E A I D A R B O N D I O L I C L A R I S S E F R E C H I A N I L A R A L E I T E D A N I E L R A I C H E L I S D E G E N S Z A J N S A M U E L M E Z Z A L I R A M A R C O S D O S S A N T O S L I N O J O Ã O F R A N C I S C O N A V E S D A F O N S E C A N A T Á L I A F E R N A N D E S S A N C H E Z O S W A L D O D A G U A N O J U N I O R R A F A E L S T E F A N I N I A U I L O B R U N O R O D R I G U E S D E S O U Z A L I A C A R O L I N A B A T I S T A C I N T R A M A R C E L O M A R C U C C I P O R T U G A L G O U V Ê A J O S É E D U A R D O D E O L I V E I R A M A G A L H Ã E S S T E F A N I A L U T T I H U M M E L G I O V A N N A F I L I P P I D E L N E R O J O Ã O G U I L H E R M E V E R T U A N L A V R A D O R J O Ã O C Á N O V A S B O T T A Z Z O G A N A C I N J O Ã O E D U A R D O B R A Z D E C A R V A L H O M A R C E L L A B E S E R R A M A S S A R O T T O S T E P H A N Y N O G U E I R A B R I T O F L Á V I A G O T T A R D I M O R E L L I

L U I Z R O D O V I L R O S S I P E D R O D A S I L V A D I N A M A R C O J O S É R O B E R T O D O S S A N T O S B E D A Q U E H E L E N A M E C H L I N W A J S F E L D C I C A R O N I M Á R C I O A R A Ú J O O P R O M O L L A A N D E R S O N M A R T I N S D A S I L V A A N A C R I S T I N A S I L V A D E A R A U J O M A R S I L L I C L Á U D I O A M A R A L D I N A M A R C O T H A I S R E G I N A G A R R E T A F R A N Q U E I R A G U I L H E R M E G A S P A R I C O E L H O M E L I N A M A R T I N S M E R L O J O Ã O C A R L O S D E C A R V A L H O A R A N H A V I E I R A C L A U D I A T R I E F R O I T M A N F R A N C I S C O E T T O R E G I A N N I C O N E T O M A R I A N A P A O L I E L L O C . D E C A S T R O G U I M A R Ã E S M A R I A N A D E S O U Z A A N D R A D E M A R I A L Ú C I A P E R E I R A C E T R A R O J U L I A P R A D O M A S C A R E N H A S C A R O L I N E D A L P O Z E Z E Q U I E L N A T H Á L I A A B E L T Ú L I O W E R N E R S O A R E S N E T O I S A B E L A P E R A S S I J Ú L I O C É S A R F E R N A N D E S D A N I E L M E N E G A S S I Z O T A R E L I D A N I E L M O N A R I

EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA 2ª VARA FEDERAL DA SUBSEÇÃO DE SÃO CARLOS – SP. - ação civil pública - proc. n. 0001531-02.2014.4.03.6115

COMPANHIA MÜLLER DE BEBIDAS, nos autos do processo em

epígrafe movido pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, vem apresentar suas alegações

finais, fazendo-o pelos motivos a seguir aduzidos.

1- BREVE SÍNTESE

O Parquet vem ajuizando centenas de ações civis públicas contra

empresas privadas, a fim de receber indenização por danos causados às rodovias

federais por excesso de peso dos caminhões que por elas circulam.

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Esse modus operandi do Parquet se deve ao fato de que ele não está

tendo sucesso em obrigar a UNIÃO e o DNIT a fiscalizar com maior rigor –

instalando novas balanças em pontos estratégicos das rodovias –

os caminhões que deliberadamente desrespeitam as leis de trânsito e

trafegam nas rodovias federais com excesso de peso.

Essa ação civil pública é apenas mais uma dessas ações movidas pelo

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, só que agora contra a COMPANHIA MÜLLER DE

BEBIDAS. Nela, assim como nas demais ações, o Parquet pretendeu impor à ré a

“obrigação de não fazer, qual seja, a abstenção de promover a saída

de mercadoria e de veículos de carga de seus estabelecimentos comerciais,

ou de estabelecimentos de terceiros contratados a qualquer título, com

excesso de peso, em desacordo com a legislação de trânsito e as

especificações do veículo, além da condenação à obrigação de indenizar o

dano material que o transporte de carga com excesso de peso causa ao

pavimento da rodovia federal” (fls. 3).

O Parquet pediu ainda a condenação da CIA. MÜLLER a indenizar

por danos morais pela suposta infração à lei de trânsito.

Todos esses danos alegados foram calculados pelo Parquet no

desproporcional e desarrazoado valor de R$ 7.420.913,84.

O núcleo duro da pretensão do Parquet reside no fato de que a

suposta conduta irregular da ré “não é um fato isolado, episódico, esporádico,

constituindo, sim, um modus operandi, com a finalidade de gastar menos e lucrar

mais, ainda que isso implique a ocorrência de acidentes de trânsito, em prejuízo de

várias vidas inocentes, e a destruição do pavimento de rodovias federais” (fls. 5).

Em sede antecipatória o Parquet pediu a concessão de liminar

inaudita altera parte para impedir que a ré continuasse a violar as regras de trânsito

que vedam a circulação de veículos com excesso de carga, sob pena de aplicação de

multa de R$ 100.000,00 por infração de trânsito, o que foi deferido naquela

oportunidade (fls. 51).

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Contra essa R. decisão a CIA. MÜLLER interpôs agravo de

instrumento. Logo em seguida ela deu cumprimento ao disposto no art. 526 do

Código de Processo Civil e requereu a reconsideração da R. decisão agravada

(CPC, art. 523, § 2°), pois

(a) não é possível que seja criada uma super multa de trânsito, em substituição ou em

complemento àquela prevista no art. 231 do Código Brasileiro de Trânsito,

no desproporcional valor de R$ 100.000,00, pois compete ao Poder Legislativo

alterar as leis para adequar o valor da multa prevista na legislação para uma nova

realidade vislumbrada pelo Parquet, sendo vedado ao MINISTÉRIO PUBLICO FEDERAL

querer legislar sobre a questão de excesso de peso nas rodovias federais;

(b) a legislação de trânsito já prevê medidas administrativas suficientes para coibir aqueles

que não respeitam as regras de trânsito (multa, apreensão do veículo e transbordo da

carga em excesso), devendo ser aplicadas as sanções/penalidades legalmente

previstas no art. 231 da lei 9.503/97 e não aquelas indicadas pelo Parquet em sua

petição inicial (R$ 100.000,00 por nova infração);

(c) não há prática reiterada de infração às leis de trânsito. Ao contrário das alegações do

Parquet, as pouquíssimas infrações de trânsito equivocadamente imputadas à

CIA. MÜLLER representam aproximadamente 0,73% do volume total de veículos

embarcados no mesmo período dessas multas (2010-2013). E ainda, em mais da

metade dessas multas o limite de peso ultrapassado foi de pouquíssimos quilos

(10kg, 30kg, 50kg...), o que demonstra que não houve qualquer vantagem com esse

insignificante sobrepeso.

(d) a CIA MÜLLER não tem responsabilidade por essas multas e fez tudo o que estava a seu

alcance para impedir que ocorressem novas autuações administrativas por excesso de

peso. Afinal, considerando que a ré não tem caminhões próprios e que a retirada das

mercadorias é de responsabilidade do comprador (cláusula FOB), informações

equivocadas prestadas pelos transportadores sobre os caminhões ou mesmo a colocação

de novas cargas após a saída desses caminhões do pátio da CIA. MÜLLER são causas

mais do que prováveis desses excessos de peso. Exatamente por esse problema que a

CIA. MÜLLER não deu causa, mas que administrativamente acaba sendo solidariamente

responsável, que ela fez uma grande reforma em sua sede – gastando centenas de

milhares de reais – para instalar uma balança de precisão para realizar a pesagem desses

caminhões, a fim de que ela tenha uma prova de que nenhum deles saiu de seu pátio

acima do limite de peso permitido por lei; e

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(e) não há dano material ou moral indenizável. De qualquer forma, mesmo que tais danos

realmente existissem, o fato é que eles jamais poderão ser presumidos e devem ser

provados, sob pena de violação ao art. 944 do Código Civil (fls. 96-98).

Em razão desses robustos argumentos houve a corretíssima

reconsideração da R. decisão agravada para o fim de indeferir a liminar, pois

(a) não há prática reiterada de carregamento dos caminhões com

excesso de peso; (b) nas pouquíssimas autuações os caminhões foram

autuados com poucos quilos acima do peso; (c) o excesso de peso estaria

dentro do da porcentagem de tolerância; (d) a ré não é responsável pelo

transporte da mercadoria, mas sim o comprador dos produtos que contrata

a empresa para realizar a retirada da mercadoria (cláusula FOB) e (e) a ré

fez tudo que estava ao seu alcance para evitar que caminhões saíssem da

sua fábrica com excesso de peso, inclusive colocando uma balança de

precisão para evitar tal conduta (fls. 265-266 verso).

Logo em seguida a CIA. MÜLLER apresentou sua contestação e

reiterou os mesmíssimos argumentos que haviam sido desenvolvidos nas razões do

seu recurso (fls. 287-322). Em sua singela réplica o Parquet não dedicou uma

linha sequer para rebater as robustas provas apresentadas pela ré (fls. 330-333).

Em seguida foi proferida R. decisão fixando o ponto controvertido,

o qual “cinge-se ao embarque e transporte de mercadorias de responsabilidade da ré

com excesso de peso” (fls. 379). Na sequencia as partes se manifestaram no sentido

de que não há mais provas a serem produzidas (fls. 385, 393-396 e 451), razão pela

qual V. Exa. deu por encerrada a instrução e determinou que fossem apresentadas

alegações finais.

2- NÃO É POSSÍVEL QUE O PARQUET CRIE UMA SUPER MULTA PARA O CASO DE SER COMETIDA UMA NOVA INFRAÇÃO DE TRÂNSITO

Dispõe o Código de Trânsito Brasileiro (lei 9.503/97) que o tráfego de

veículos com excesso de peso constitui infração de trânsito e enseja a aplicação de uma

série de medidas administrativas para impedir e coibir esse tipo de infração

(multa, apreensão do veículo e transbordo da carga em excesso).

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Eis o que prevê o art. 231, incs. V e X, do Código de Trânsito

Brasileiro, verbis:

“Art. 231. Transitar com o veículo:

(...) V - com excesso de peso, admitido percentual de tolerância

quando aferido por equipamento, na forma a ser estabelecida pelo

CONTRAN:

Infração - média;

Penalidade - multa acrescida a cada duzentos quilogramas ou fração

de excesso de peso apurado, constante na seguinte tabela:

a) até seiscentos quilogramas - 5 (cinco) UFIR; b) de seiscentos e um a oitocentos quilogramas - 10 (dez) UFIR; c) de oitocentos e um a um mil quilogramas - 20 (vinte) UFIR; d) de um mil e um a três mil quilogramas - 30 (trinta) UFIR; e) de três mil e um a cinco mil quilogramas - 40 (quarenta) UFIR; f) acima de cinco mil e um quilogramas - 50 (cinqüenta) UFIR;

Medida administrativa - retenção do veículo e transbordo da carga excedente;

X - excedendo a capacidade máxima de tração:

Infração - de média a gravíssima, a depender da relação entre o

excesso de peso apurado e a capacidade máxima de tração, a ser

regulamentada pelo CONTRAN;

Penalidade - multa;

Medida Administrativa - retenção do veículo e transbordo de carga

excedente.

Parágrafo único. Sem prejuízo das multas previstas nos incisos V e

X, o veículo que transitar com excesso de peso ou excedendo à capacidade

máxima de tração, não computado o percentual tolerado na forma do

disposto na legislação, somente poderá continuar viagem após descarregar

o que exceder, segundo critérios estabelecidos na referida legislação

complementar”.1

1- A Resolução n. 258/07 do Conselho Nacional de Trânsito regulamenta os dispositivos e prevê os

valores das multas a serem aplicadas em cada uma das hipóteses do art. 231, incs. V e X da lei 9.503/97.

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Ou seja, independentemente da atuação do Parquet nessa ação civil

pública, toda a vez que um veículo trafegar com excesso de peso nas rodovias

federais ele deverá ser (a) multado pelos órgãos de fiscalização e (b) recolhido ao

pátio ou ter que realizar o transbordo da carga excedente para só então receber

autorização para prosseguir seu caminho.

No entanto, o Parquet, desprovido de qualquer estudo mais apurado

sobre a legislação que definiu as penalidades e as medidas administrativas sobre o

tráfego com excesso de peso, tenta legislar sobre a matéria, exigindo a aplicação de

novos valores de multas para essa mesmíssima infração de trânsito.

Como se sabe, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e o Poder Judiciário

têm como função essencial zelar pelo cumprimento das leis. Zelar pelo cumprimento

das leis não dá o poder de criar leis. A função destinada à elaboração de leis a fim de

criar, modificar ou extinguir direitos é exclusiva do Poder Legislativo

(como claramente diz o art. 48, inc. XII, da Constituição Federal). E a Carta Magna

jamais atribuiu ao Parquet essa possibilidade. Ao contrário, o art. 129, inc. IX, da

Constituição Federal veda tal iniciativa, por ser incompatível com sua função.

Boa ou ruim, a lei é clara e não deixa margens a discussão.

Interpretá-la de modo diferente é contrariar seu espírito e sua intenção.

É, acima de tudo, uma indevida intromissão do Judiciário na seara de

atuação dos Poderes Executivo e Legislativo, contrariando os legítimos

fins por eles perseguidos.

Lembre-se a pertinente lição de MAURO CAPPELLETTI, em sua

clássica obra Juízes Legisladores?:

“o bom juiz bem pode ser criativo, dinâmico e ‘ativista’ e como tal

manifestar-se; no entanto, apenas o juiz ruim agiria com as formas e as

modalidades do legislador, por, a meu entender, se assim agisse deixaria

simplesmente de ser juiz”.2

2- MAURO CAPPELLETTI, Juízes Legisladores?, tradução de CARLOS ALBERTO ALVARO DE

OLIVEIRA, Porto Alegre, Sérgio Antonio Fabris, 1999, p. 74.

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O pensador italiano transcreve ainda o precioso ensinamento de

LORD DIPLOCK, o qual afirma que “quando o significado das palavras da lei é pleno e

não ambíguo, não cabe aos juízes inventar ambigüidades fantasiosas para não darem

eficácia àquele preciso significado”.3 EDUARDO COUTURE é igualmente enfático ao

traçar os limites da atuação do juiz:

“o juiz é um homem que se move dentro do direito como o

prisioneiro dentro de seu cárcere. Tem liberdade para mover-se e nisso

atua sua vontade; o direito, entretanto, lhe fixa limites muito estreitos,

que não podem ser ultrapassados”.4

Portanto, se o Parquet entende que o valor das multas previstas no

Código de Trânsito Brasileiro não seria suficiente para coibir o tráfego de caminhões

com excesso de peso nas rodovias federais e ressarcir o suposto prejuízo causado,

caberia a ele procurar os caminhos adequados para alterá-lo: seja pela via legislativa,

seja pela propositura de uma ação direta de inconstitucionalidade por omissão.

Sobre essa impossibilidade de o Parquet criar uma super multa, eis o

que já foi decidido em outras ações civis públicas idênticas à presente movidas pelo

Parquet, verbis:

“quando o legislador estabelece uma conduta, altamente previsível,

como infração e estabelece uma penalidade, essa penalidade representa uma

prefixação da reparação de todos os danos que essa conduta lesiva causa à

sociedade acrescida de um componente punitivo, de forma a desestimular a

prática de novas infrações. Se a realidade eventualmente mostrar que os

danos causados à sociedade são maiores do que a multa legalmente

cominada, cabe à lei, aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo

Presidente da República, aumentar a penalidade, observada a anterioridade.

E não cabe ao Poder Judiciário substituir-se ao legislador para aumentar a

sanção cominada, que é uma das pretensões do Ministério Público, que

pretende que a multa legalmente estabelecida seja substituída por uma multa

de R$ 20.000,00 estabelecida judicialmente”.5

3- Duport Steels Ldt. vx. Sirs (1980), I, All ER, 529 p. 541, apud MAURO CAPPELLETTI, Juízes

Legisladores?, op. cit., p. 26. 4- Introdução ao estudo do processo civil, 3ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 1998, p. 58. 5- Sentença de improcedência proferida pelo MM. Juiz da 5ª Vara Federal da Seção Judiciária do

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“(...) para evitar e combater a conduta prevista na legislação de

regência, o Código de Trânsito Brasileiro e os devidos atos regulamentares já

trouxeram a punição devida. Portanto, se a realidade eventualmente mostrar

que os danos causados à sociedade são maiores do que a multa legalmente

cominada, cabe à lei, aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo

Presidente da República, aumentar a penalidade, observada a anterioridade.

O que não se pode admitir é o Poder Judiciário substituir-se ao legislador para

aumentar a sanção cominada: isto é, anular a multa legalmente estabelecida

por indenizações por danos diversos, no valor mínimo de R$ 70.000,00

(setenta mil reais), como pretende o MPF neste caso específico. A pretensão

autoral, tal como formulada, provocaria a inversão dos papeis

constitucionalmente definidos pelo Constituinte. Ou seja, o Judiciário iria

substituir o legislador, aumentando o valor das multas, bem como substituir a

Administração, na aplicação das multas por excesso de peso”.6

“diante das previsões normativas de imposição de multa e medidas

administrativas pelos atos imputados ao requerido, não cabe ao

Poder Judiciário a criação de normas genéricas e impositivas de novas sanções,

sob pena de ofensa ao princípio de separação dos Poderes da República.

Houve escolha do legislador pelas sanções previstas no CTB quanto às

violações cometidas pelos condutores de veículos com excesso de peso”.7

Na prática, o Parquet pretende que o Poder Judiciário substitua não

só o legislador como também a própria Administração pública, realizando a

fiscalização e punindo com multas desproporcionais aqueles que cometerem

infrações de trânsito por excesso de peso, em clara violação ao princípio da

separação dos Poderes (art. 2º da Constituição Federal).

Distrito Federal (proc. n. 0032024-81.2012.4.01.3400). Nesse mesmo sentido: sentença de improcedência proferida pelo MM. Juiz da 5ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal (proc. n. 32109-67.2012.4.01.3400).

6- Sentença de improcedência proferida pelo MM. Juiz da 1ª Vara Federal da Seção Judiciária de Minas Gerais, Subseção de Patos de Minas (proc. n. 5273-71.2010.4.01.3806). Nesse mesmo sentido: sentença de improcedência do processo n. 443-28.2011.4.01.3806.

7- Sentença de improcedência da ação civil pública proferida pelo MM. Juízo da 2ª Vara Federal da Seção Judiciária de Minas Gerais, Subseção de Patos de Minas (proc. n. 503-64.2012.4.01.3806). Nesse mesmo sentido: sentença de improcedência proferida no processo n. 504-49.2012.4.01.3806.

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Eis o que já foi dito pelo MM. Juiz da 5ª Vara Federal do Distrito

Federal sobre esse tema, verbis:

“a pretensão veiculada nos presentes autos faria não só o Judiciário

substituir-se ao legislador, para aumentar o valor das multas, como substituir-

se também, a administração, pois as multas por excesso de peso passariam a

ser aplicadas não só pelo DNIT ou polícia Rodoviária Federal, como pelo

Poder Judiciário, mantendo o presente processo em curso até o final dos

tempos. De fato, acolhida a pretensão do Ministério Publico Federal, toda e

qualquer (multa) lavrada por excesso de peso pelo DNIT ou POLÍCIA

RODOVIÁRIA FEDERAL geraria uma espécie de processo judicial-

administrativo em apenso, onde a autuada poderia se defender da infração e

seria proferida uma sentença, que levaria ao direito de recorrer, tudo isso

mediante a aplicação da ‘legislação’ editada pelo Poder Judiciário”.8

Aliás, sobre essa impossibilidade de o Poder Judiciário atuar como

verdadeiro legislador positivo em ação civil pública, eis o pacífico posicionamento

do Col. Supremo Tribunal Federal, verbis:

“A jurisprudência desta Corte é firme no sentido da impossibilidade

de o Poder Judiciário atuar como legislador positivo. Precedentes”.9

Portanto, o Parquet é carecedor da ação (impossibilidade jurídica do

pedido) e a presente ação civil pública deve ser julgada extinta sem resolução do

mérito (CPC, art. 267, inc. VI) ou, se se entender que essa impossibilidade se

relaciona com o próprio mérito da ação civil pública, então que a demanda seja

julgada improcedente por esses mesmos fundamentos.

3- A LEI DE TRÂNSITO JÁ PREVÊ MEDIDAS ADMINISTRATIVAS SUFICIENTES PARA PUNIR AQUELES QUE NÃO A RESPEITAM

Ainda que na omissão da lei fosse possível ao Poder Judiciário suprir

essa lacuna e criar normas que aumentem ou mesmo criem novas multas de trânsito 8- Sentença de improcedência da ação civil pública proferida pelo MM. Juízo da 5ª Vara Federal da

Seção Judiciária do Distrito Federal (proc. n. 0032024-81.2012.4.01.3400). Nesse mesmo sentido: sentença de improcedência proferida no proc. n. 32109-67.2012.4.01.3400.

9- STF, 2ª T., RE n. 599.850/DF, rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI, j. 24.6.14, v.u.

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por meio de uma ação civil pública, o fato é que no caso concreto não há omissão,

pois existem no Código de Trânsito Brasileiro diversas medidas administrativas

capazes de coibir esses abusos narrados pelo Parquet, bastando haver a fiscalização

dos órgãos responsáveis.

Como noticiado, o art. 231, incs. V e X, da lei n. 9.503/97 prevê que

aquele que for flagrado pela fiscalização com excesso de peso deverá pagar multa,

podendo ainda ter o seu veículo apreendido ou ter que realizar o transbordo da

carga excedente. Ou seja, tais medidas administrativas previstas no Código de

Trânsito Brasileiro são mais do que suficientes para coibir e reparar eventuais danos

causados às rodovias federais, bastando que os órgãos competentes exerçam o

verdadeiro poder de polícia.

Se a fiscalização dessas medidas administrativas não é colocada em

prática de forma ostensiva e abrangente por simples omissão dos órgãos

competentes, mesmo assim não é minimamente razoável criar novas

sanções para simplesmente compensar essa omissão da UNIÃO e do DNIT,

como, por exemplo, uma pesadíssima multa de R$ 100.000,00 por nova

infração de trânsito.

Sobre esse tema, eis o que já foi dito pelo E. Tribunal Regional

Federal da 5ª Região sobre essa omissão da UNIÃO e do DNIT em fiscalizar o excesso

de peso nas rodovias federais, verbis:

“tenho que a solução para o problema do excesso de peso nos

veículos que transitam nas rodovias federais está, não na aplicação,

via ação civil pública, de multa, em abstrato, por dano material ou dano

moral coletivo supostos a uma determinada empresa, em virtude de suas

infrações passadas, mas na utilização de forma eficaz das normas de

trânsito já existentes, com o fim de prevenir o cometimento de eventuais

danos e para reparar e sancionar de forma suficiente a lesão efetiva ao bem

jurídico tutelado, podendo a autoridade utilizar-se, para tanto, de vasto

suporte material e legal posto à sua disposição, bem como do poder de

polícia. Se, por outro lado, a autoridade de trânsito, apesar de todo o

aparato anteriormente citado não consegue impedir o dano às rodovias,

qual a utilidade final de um provimento jurisdicional que simplesmente

exacerbe multas não aplicadas por inação da autoridade administrativa?

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Penso que o efeito de tal medida consistiria tão somente em transferir ao

Judiciário um ônus que não lhe cabe, aumentando, de forma indireta e

ilegal, a própria multa prevista e não aplicada, como deveria, pela

autoridade, usurpando o papel dos órgãos de trânsito ao cobrar valores que

poderiam ter sido exigidos na via administrativa, extrapolando, desta

forma, o contido na própria lei de trânsito, caracterizando um verdadeiro

bis in idem inadmitido pelo ordenamento”.10

O E. Tribunal Regional Federal da 1ª Região também já entendeu

que não se pode aplicar uma nova multa por infrações por excesso de peso, pois essa

infração já conta com sanções específicas previstas no Código de Trânsito Brasileiro

(CTB, art. 231), verbis:

“substanciando infração de trânsito apenada com multa em valor

estabelecido com fundamento na legislação que o disciplina, o tráfego de

veículo, em rodovias federais, com excesso de peso, inadmissível,

mediante liminar em ação civil pública, proposta com propósito de coibir

conduta que já é proibida por lei e apenada com a sanção específica, a

cominação de astreinte para a hipótese de descumprimento da obrigação,

por representar, na prática, e apenas contra o réu na demanda, apenação

adicional em caso de transgressão da conduta legalmente proibida”.11

“defiro parcialmente o pleito de atribuição de efeito suspensivo ao

agravo, para sustar os efeitos da multa imposta à ora agravante, por

identificar, em juízo de cognição sumária, próprio dos juízos liminares, a

presença concomitante, no particular, dos requisitos previstos no art. 558

do Código de Processo Civil. São relevantes os fundamentos deduzidos no

arrazoado recursal, diante da circunstância de que o transporte de carga

com excesso de peso caracteriza infração de trânsito, já apenada pelo

Código Brasileiro de Trânsito, e pode advir à agravante, até o julgamento

do recurso, dano de difícil reparação”.12

10- TRF-5, 3ª T., Apel. 565424-CE, rel. Des. GERALDO APOLIANO, j. 29.5.14, v.u. 11- TRF-1, 6ª T., Ag. de Inst. n. 0056520-92.2012.4.01.0000, rel. Des. CARLOS MOREIRA ALVES,

j. 23.8.13, v.u. 12- TRF-1, 6ª T., Ag. de Inst. n. 0069252-08.2012.4.01.0000, rel. Des. CARLOS MOREIRA ALVES,

j. 23.1.14, decisão monocrática. Nesse sentido: TRF-1, 6ª T., Ag. de Inst. n. 0057686-62.2012.4.01.0000, rel. Des. MARCELO DOLZANY DA COSTA, j. 23.1.14, v.u.

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Há ainda outras decisões monocráticas provenientes de diversas

Varas Federais de competência do E. Tribunal Regional Federal da 1ª Região que

afastam a possibilidade de criação de mais uma multa a ser aplicada aos condutores

de veículos que trafeguem com excesso de peso, verbis:

“a solução editada pelo legislador para coibir a ação dos

transportadores irregulares quanto ao excesso de limite de peso conduzido já

está definida: a imposição de multa para cada carga acima do limite.

Incabível, portanto, suplementar determinação judicial para que os usuários

das rodovias se abstenham de trafegar com veículos em condução de cargas

em patamar superior ao limite máximo de peso permitido, tendo em vista que

há legislação expressa com comando voltado a coibir tal prática”.13

O E. Tribunal Regional Federal da 4ª Região também tem esse mesmo

posicionamento sobre essa questão da aplicação de novas multas por excesso de peso:

1) “A legislação de trânsito já estabelece penalidades e medidas

administrativas para fazer cessar os danos causados pelos veículos flagrados

com excesso de carga, não havendo razões para que este Juízo profira decisão

tendente a fazer cumprir o que já está estabelecido em lei, ainda mais em

cognição sumária e ausente oitiva da parte contrária. A própria inicial indica

que já está havendo a autuação das empresas responsáveis pelo transporte

irregular de cargas na região, tanto que foi esta a causa que deflagrou o

inquérito civil público noticiado na peça inaugural. Em tais condições, não se

verifica o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, requisito

necessário para a antecipação de tutela pleiteada. A Administração detém o

dever-poder de aplicar a penalidade de multa cabível às ocorrências de

excesso de peso verificadas em suas vias. Além disso, o próprio CTB, em seu

artigo 231, parágrafo único, determina que o veículo flagrado com excesso de

peso seja retido administrativamente, permitida a continuidade da viagem

somente após o transbordo da carga excedente, o que demonstra que as

próprias medidas administrativas a serem tomadas são suficientes para, em

cada caso, fazer cessar o risco de dano”.14

13- Sentença de improcedência da ação civil pública proferida pelo MM. Juízo da 2ª Vara Federal da

Seção Judiciária de Minas Gerais, Subseção de Patos de Minas (proc. n. 503-64.2012.4.01.3806). Nesse mesmo sentido: sentença de improcedência proferida no processo n. 504-49.2012.4.01.3806.

14- TRF-4, 3ª T., Ag. de Inst. n. 5024712-63.2013.404.0000, rel. Des. NICOLAU KONKEL JÚNIOR, j. 26.2.14, v.u. Nesse sentido: TRF-4, 3ª T., Ag. de Inst. n. 5024720-40.2013.404.0000,

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2) “entendo que as autuações narradas na inicial pelo transporte

irregular das cargas, bem como a penalidade prevista no 231 do CTB, tal

como entendeu o magistrado a quo, são suficientes para fazer cessar o

risco de dano. Destarte, entendo por manter a decisão agravada. Indefiro

o pedido de efeito suspensivo’. Não vejo motivos para alterar a decisão

anteriormente proferida. Ante o exposto, voto por negar provimento ao

agravo”.15

Portanto, considerando que a legislação de trânsito já estabelece

penalidades e medidas administrativas capazes de fazer cessar os eventuais danos

causados às rodovias federais, não há razão para o julgamento de procedência da

demanda, a fim de obrigar a ré a cumprir a legislação de trânsito sob pena de multa

adicional de R$ 100.000,00 para cada nova infração.

4 INEXISTÊNCIA DE PRÁTICA REITERADA DE DESCUMPRIMENTO DO ART. 231 DO CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO

Além da impossibilidade de o Parquet substituir o legislador e criar

uma super multa de trânsito, o fato é que também não são verdadeiras suas alegações

de que “a conduta da empresa não é um fato isolado, episódico, esporádico” e que seria

um “modus operandi, com a finalidade de gastar menos e lucrar mais” (fls. 5).

O número de multas imputadas à CIA. MÜLLER no período entre

30/07/2010 e 18/10/2013 (350 infrações) espelha uma parcela quase que

insignificante do número de caminhões que nesse período foram embarcados na

sede da ré em Pirassununga. Nesse mesmo período foram carregados nada menos

que 47.666 caminhões (cf. conteúdo do CD acostado às fls. 133). Ou seja, o número

de infrações mencionadas pelo Parquet corresponde a apenas 0,73% do total de

caminhões carregados.

rel. Des. NICOLAU KONKEL JÚNIOR, j. 2.4.14, v.u; TRF-4, 3ª T., Ag. de Inst. n. 5024715-18.2013.404.0000, rel. Des. CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JÚNIOR, j. 20.3.14, v.u. e TRF-4, 3ª T., Ag. de Inst. n. 5024718-70.2013.404.0000, rel. Des. CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JÚNIOR, j. 6.12.13, v.u.

15- TRF-4, 3ª T., Ag. de Inst. n. 5029143-43.2013.404.0000, rel. Des. MARGA INGE BARTH TESSLER, j. 26.2.14, v.u.

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A própria R. decisão que acertadamente indeferiu a liminar

reconheceu esse estado de coisas e confirmou que não há prática reiterada da

CIA. MÜLLER em carregar caminhões com excesso de peso, verbis:

“um dos argumentos que levaram este juízo a deferir a antecipação

de tutela foi a alegada contumácia da ré em carregar os veículos que

transportavam suas mercadorias com excesso de peso, pois entre

30/07/2013 a 18/10/2013 ocorreram 339 (trezentas e trinta e nove

autuações). No entanto, do total de embarcações realizadas no período

(aproximadamente 47.000 carregamentos), 339 autuações representa

apenas 0,73% do volume total de veículos carregados, conforme relatório

de fls. 133. Ressalto que, analisando referido documentos, somente no dia

30/07/2010 – primeiro dia do período abordado, foram carregados

71 (setenta e um) caminhões, o que leva a verossimilhança da alegação da

ré, ou seja, de que não há pratica reiterada de transporte das suas

mercadorias com excesso de peso” (fls. 265 verso).

Apenas essa informação do número de caminhões embarcados já

seria suficiente para desmanchar toda a tese criada pelo Parquet em torno dessa

suposta prática reiterada para “gastar menos e lucrar mais”. Quem em sã consciência

poderia pensar que uma parcela tão insignificante de multas poderia dar ensejo a uma

conclusão de que a CIA. MÜLLER adotaria a prática de maximizar seus lucros dessa

forma?

De toda forma, grande parte dessas multas impostas à CIA. MÜLLER

deveu-se a pouquíssimos quilos acima do permitido pela legislação. Se realmente ela

estivesse de má-fé e com a intenção de colaborar com os transportadores para burlar

a lei, certamente não seriam apenas alguns quilos, mas sim algumas toneladas acima

do permitido. Mas essa não é a forma de trabalho da CIA. MÜLLER.

Apenas exemplificando, a seguir serão colacionadas algumas multas

recebidas pela CIA. MÜLLER que apontam que o excesso de peso era de pouquíssimos

quilos acima do limite previsto na legislação de trânsito (fls. 134-194), as quais

representam cerca de 50% do total de multas recebidas:

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órgão autuador auto de

infração data da infração

peso total

excesso de peso

DNIT B068107516 05/02/2013 50.925 kg 50 kg

DNIT B047043628 29/04/2013 77.700kg 70 kg

DNIT B068114058 07/05/2013 50.925kg 110 kg

DNIT B068114259 09/05/2013 59.850kg 80 kg

DNIT B063102701 10/07/2013 50.925kg 60 kg

DNIT B045054504 22/07/2013 24.150kg 170 kg

DNIT B069083581 24/07/2013 50.925kg 80 kg

DNIT B070059676 31/07/2013 55.650kg 30 kg

DNIT B069084674 04/08/2013 43.575kg 30 kg

DNIT B068124330 24/08/2013 50.925kg 100 kg

DNIT B068124985 30/08/2013 59.925kg 100 kg

DNIT B088081327 31/08/2013 50.925kg 80 kg

DNIT B045061494 25/09/2013 59.850kg 10 kg

Esses são alguns poucos exemplos de que muitos dos caminhões

multados – que eram de propriedade dos compradores das mercadorias e não da

CIA. MÜLLER – estavam apenas pouquíssimos quilos acima do peso permitido por lei,

não se podendo concluir pela existência de uma prática reiterada de carregar os

veículos com excesso de peso com vistas a gerar lucro indevido à CIA. MÜLLER.16

16- Segundo a R. decisão que indeferiu a liminar, “no relatório trazido pela ré de fls. 133 está

discriminado, em cada nota fiscal, qual o tipo de veículo de transporte e sua respectiva capacidade de carga. Em todas as autuações carreadas pela ré às fl. 137-254 os caminhões

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Portanto, o embarque de mercadorias com excesso de peso não é

uma filosofia de trabalho e muito menos uma prática reiterada da CIA. MÜLLER,

razão pela qual não há necessidade de qualquer atuação no Parquet no sentido de

fazer cessar uma conduta e multar o infrator por uma prática que já está devidamente

prevista no Código de Trânsito Brasileiro.

5- OS VERDADEIROS RESPONSÁVEIS PELO EXCESSO DE PESO SÃO OS COMPRADORES E TRANSPORTADOR DAS MERCADORIAS: VENDAS REALIZADAS PELA CLÁUSULA FOB

Não obstante a CIA. MÜLLER tenha sido autuada por excesso de peso

em algumas oportunidades, ela não foi responsável por nenhuma dessas infrações de

trânsito. Afinal, nenhum dos caminhões autuados por excesso de peso era da ré,

mas de propriedade de transportadoras contratadas pelos seus clientes (compradores

do produto), em razão da inclusão da venda-e-compra por meio da cláusula FOB

(free on board). Explica-se.

Os produtos comercializados pela CIA. MÜLLER devem ser retirados

pelos compradores diretamente na sede da empresa na cidade de Pirassununga

(São Paulo). Por ser responsável pela retirada do produto, o comprador também se

responsabiliza pela contratação do transportador que levará a sua mercadoria da

fábrica até o destino final por ele indicado.

Trata-se de uma venda com a inclusão da cláusula FOB (free on

board), a qual limita a responsabilidade do fabricante até o momento em

que a mercadoria é embarcada no caminhão contratado pelo comprador.

Tão logo a carga seja embarcada no veículo e deixe as suas dependências,

o comprador e/ou o transportador são os únicos responsáveis pelo

transporte da carga.

tinham capacidade de carga maior que 6t. Faço essa correlação porque, sem em 45,51% das autuações o excesso de peso foi inferir a 200kg, mesmo que, hipoteticamente, todos os caminhões tivessem a capacidade mínima (6t), o excesso de carga estaria dentro da margem de tolerância (5%)”

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A própria R. decisão que acertadamente indeferiu a liminar confirma

esse estado de coisa ao dizer que “o comprador das mercadorias fabricadas

pela ré é quem arca com o transporte/frete (cláusula FOB). Desta forma, o

transporte é realizado por terceiros, os quais são contratados pelos

adquirentes das mercadorias” (fls. 266 verso).

Não-obstante ela não possa ser civilmente responsabilizada por

eventuais danos causados pelo transporte dessa mercadoria,17 a legislação de trânsito

indica que administrativamente o embarcador poderá ser solidariamente responsável

pela infração de trânsito por excesso de peso desde que seja simultaneamente

“o único remetente da carga e o peso declarado na nota fiscal, fatura ou manifesto for

inferior àquele aferido” (CTB, art. 257, § 4º).18

Mas é exatamente em razão dessa solidariedade administrativa prevista

em lei que são cometidos abusos por parte dos compradores/transportadores.

A CIA. MÜLLER sempre pautou seus negócios pelo respeito à lei e

pelo princípio da boa-fé. Uma empresa desse porte não sobreviveria por mais de

cinquenta anos, como líder mundial em seu setor, se não respeitasse todas as normas

em vigor e principalmente respeitasse o seu maior patrimônio: o cliente.19

17- “Sob a cláusula FOB (frete por conta do destinatário), o comprador recebe a mercadoria e, a

partir deste momento, o vendedor não mais tem controle ou responsabilidade sobre sua destinação, ou qualquer outra ocorrência sobre a mercadoria. A cláusula FOB é condição mercantil, instituto de direito privado que não pode ser alterado por lei tributária (artigo 10 do CTN). A realização de contrato de compra e venda com a inclusão da cláusula FOB se dá com a saída da mercadoria que pode ser pela retirada pelo comprador ou transportador do estabelecimento do vendedor ou em outro local contratado, obrigando-se o adquirente pelo transporte ou destinação da mercadoria” (TJ-SP, 3ª Câm. Cível, Apel. n. 0001996-05.2009.8.26.0459, rel. Des. MARREY UINT, j. 14.5.13, v.u.).

18- “Art. 257. As penalidades serão impostas ao condutor, ao proprietário do veículo, ao embarcador e ao transportador, salvo os casos de descumprimento de obrigações e deveres impostos a pessoas físicas ou jurídicas expressamente mencionados neste Código. (...) § 4º O embarcador é responsável pela infração relativa ao transporte de carga com excesso de peso nos eixos ou no peso bruto total, quando simultaneamente for o único remetente da carga e o peso declarado na nota fiscal, fatura ou manifesto for inferior àquele aferido”.

19- A incessante busca pela melhoria contínua de suas práticas e processos resultou em importantes certificações como a ISO 9001:2008 (Gestão de Qualidade), ISO 14001:2004 (Gestão de Meio Ambiente), Kosher (Preparação dos Produtos de Acordo com as Lei Judaicas), Certificação Etanol Verde (Gestão Ambiental no Setor Sucroenergético) e para a Unidade Taboão (Pirassununga) a OHSAS 18:001:2007 (Gestão de Segurança e Saúde Ocupacional).

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Exatamente por isso ela sempre foi muito rigorosa sobre a inexistência

de excesso de peso e sobre a correta acomodação da mercadoria nos caminhões.

Por essa razão nenhum caminhão deixa sua fábrica com mercadorias além da sua

capacidade. Afinal, qualquer sobrepeso dos caminhões dos seus clientes poderia

gerar multas não só para eles como também para a CIA. MÜLLER, nos termos do art.

257, § 4º, do Código de Trânsito Brasileiro.

Contudo, não-obstante essa sua clara preocupação, algumas multas

começaram a chegar para a CIA. MÜLLER. Em diversas oportunidades a CIA. MÜLLER

revisou a sua política de carregamento de caminhões para tentar localizar onde estaria o

equívoco. Somente algum tempo depois os reais motivos dessas autuações ficaram

claros para a ré e apontavam os seus clientes e os transportadores como os reais

culpados por esse excesso de peso nos caminhões.

Quando o caminhão da transportadora contratada pelo comprador

era enviado à fabrica, também eram enviadas as informações do transporte, como o

tamanho do caminhão e as suas especificações técnicas, para que a CIA. MÜLLER

pudesse saber a quantidade de carga que seria possível embarcar no veículo.

Mas se as especificações do caminhão passadas pelo transportador

ou pelo motorista não estivessem de acordo com os parâmetros do fabricante

(capacidade de peso total e de carga), poderia haver um excesso de peso por

culpa exclusiva do transportador por não fornecer informações adequadas de seu

veículo.

E tal conduta jamais poderia ser imputada à CIA. MÜLLER, que não

tinha como auferir exatamente qual era a tara do caminhão (peso), mas tão

somente confiar nas informações repassadas pelo proprietário do veículo.

Exatamente por isso a contratação é realizada pela cláusula FOB.

Afinal, até mesmo uma diferença de 10 kg no peso do caminhão já seria

capaz de gerar uma autuação, sendo necessário que as informações fossem

precisas para não cometer qualquer irregularidade.

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Além disso, constatou-se que, após a saída do caminhão da fábrica da

CIA. MÜLLER, o transportador ou o motorista ‘aproveitava’ o frete contratado pelo

comprador da mercadoria para levar outras cargas além daquelas contratadas com a ré,

ultrapassando com isso a capacidade total do caminhão.

Obviamente, a CIA. MÜLLER – responsável apenas pela embarcação

do produto – não tinha qualquer tipo de controle sobre outras cargas que

eram inseridas no caminhão no trajeto até o destino final.

Mas, quando esse veículo é fiscalizado, a única nota fiscal

apresentada pelo motorista é aquela referente à mercadoria embarcada pela

CIA. MÜLLER, o que a responsabiliza pelo excesso de peso. Afinal, se fossem

apresentadas as duas notas fiscais das mercadorias que foram colocadas no caminhão

– a primeira referente à carga da CIA. MÜLLER e a segunda referente à carga

indevidamente inserida pelo motorista – somente o transportador seria

responsabilizado pelo excesso de peso, excluindo qualquer responsabilidade do

embarcador, nos termos do art. 257, § 4º, do Código de Trânsito Brasileiro.

É obvio que o transportador – responsável pelo excesso de peso –

não quer pagar essa conta sozinho, mas repassar o problema para o

embarcador do produto.

Esse fato, por falha da fiscalização que não verifica se toda a carga

do caminhão realmente refere-se à nota fiscal emitida, acaba gerando algumas multas

para a CIA. MÜLLER mesmo sem ela ter qualquer responsabilidade por esse tipo de

burla à legislação.

6- BOA-FÉ DA CIA. MÜLLER: ELA FAZ TUDO QUE ESTÁ AO SEU ALCANCE PARA IMPEDIR QUE OCORRAM NOVAS AUTUAÇÕES ADMINISTRATIVAS POR EXCESSO DE PESO

Pensando nesse problema a que sem dúvida a CIA. MÜLLER não dá

causa e sobre o qual não tem qualquer controle, foi realizada uma enorme reforma

em sua fábrica e a ré adquiriu uma balança de precisão – auferida pelo INMETRO –

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que registra na saída do caminhão o seu peso total e o peso limite suportado entre

eixos, para que assim a CIA. MÜLLER possa ter enfim uma prova de que os veículos

saem de sua fábrica com o peso correto e que, se houver sobrepreso, é porque no

trajeto a carga foi modificada.

Eis algumas fotos dessa balança onde os caminhões

obrigatoriamente devem passar antes de ser liberados para o transporte de carga.

E como já dito nenhum caminhão deixa as dependências da fábrica com a carga se o

peso não estiver de acordo com a legislação de trânsito.

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Esses gastos da CIA. MÜLLER – no valor aproximado de

R$ 800.00,00 – afastam a alegação de que o excesso de peso seria uma prática

recorrente visando ao lucro indevido. Afinal, quem realizaria gastos de tal monta

apenas para obter uma prova de que os caminhões são carregados em sua fábrica

dentro do peso previsto em lei? A resposta é clara: a CIA. MÜLLER preocupa-se com

a ética do mercado e com o fiel cumprimento das leis de trânsito.

Essa notícia de que a CIA. MÜLLER adquiriu a balança para evitar

qualquer responsabilidade sua pelos caminhões que trafegam com excesso

de peso nas rodovias federais foi levada ao conhecimento do próprio

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL em 1º de novembro de 2012, momento em

a ré prestou informações sobre essas multas no inquérito civil instaurado

pelo Parquet (fls. 57-58 do inquérito civil).

Portanto, a CIA. MÜLLER fez tudo o que estava ao seu alcance para

colaborar com esse problema de excesso de peso nas estradas federais e apontar

quem são os verdadeiros responsáveis, não podendo ser condenada ou mesmo

responsabilizada civilmente por infrações que não tem como evitar e a que não deu

causa, apesar de todos os investimentos realizados.

Essa conduta foi expressamente reconhecida pela própria R. decisão

que indeferiu a liminar, verbis:

“visando minorar as autuações por excesso de carga, em razão do

disposto no art. 257, § 4º, do CBT, instalou, em 2012, balança eletrônica

em sua fábrica a fim de que o peso de veículo possa ser auferido no

momento em que é carregado, sendo anexado em todas as notas fiscais um

ticket impresso (fls. 204) da balança, conforme item 8 de fls. 121/125.

Isso demonstra sua diligência para que os veículos sejam carregados sem

excesso de peso” (fls. 266 verso).

Tanto é verdade que esses problemas são causados exclusivamente

pelos compradores/transportadores que, mesmo após o início da operação dessa

balança na fábrica da ré, algumas infrações de trânsito continuaram a ser enviadas à

CIA. MÜLLER. Só que nesses casos a CIA. MÜLLER tinha uma prova de que os

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caminhões saíram da sua fábrica com o peso correto e que por isso a carga foi

modificada pelo transportador no trajeto até o seu destino.

Tais fatos foram levados ao conhecimento do DNIT por meio de

diversos recursos administrativos, sendo eles acompanhados dos respectivos tickets

impressos da balança, os quais indicavam que o peso do caminhão na saída da

fábrica estava correto e que certamente foram modificados pelos transportadores no

trajeto até o seu destino final.

Eis alguns exemplos dessas multas que foram objeto de recursos

administrativos (fls. 195-156):

órgão autuador

auto de infração

data da infração

peso total (carga + caminhão)

excesso de peso

DNIT B068139541 01/02/2014 77.770kg 60 kg

DNIT B068139629 02/02/2014 50.925kg 100 kg

DNIT B068139761 03/02/2014 50.925kg 80 kg

DNIT B047058865 05/02/2014 77.700kg 250 kg

DNIT B068140473 08/02/2014 50.925kg 150 kg

DNIT B045072175 22/02/2014 77.700kg 40 kg

DNIT B068149216 11/05/2014 50.925kg 90 kg

DNIT B044055460 15/05/2014 30.450kg 50 kg

DNIT B047064166 18/05/2014 59.850kg 190 kg

Por mais esse motivo, não há como punir com uma multa tão pesada

quem faz tudo para evitar uma situação que não é sequer por ela causada.

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7- INEXISTÊNCIA DE DANO MATERIAL A MULTA JÁ PREVÊ O RESSARCIMENTO DO HIPOTÉTICO DANO ÀS RODOVIAS IMPOSSIBILIDADE DE PRESUNÇÃO DO DANO (CC, ART. 944)

Quando o legislador positiva uma lei acerca de uma conduta

previsível e recriminável, por consequência estabelece uma pena como forma de

coação dessa conduta que se mostra lesiva à sociedade. No caso concreto, as

penalidades ligadas às infrações de trânsito vêm como forma de coibir eventuais

infrações, além de serem em valor compatível com o ressarcimento de eventuais

prejuízos causados.

Quando há uma conduta vedada, tal como o transporte de produtos

em caminhões acima do peso, a lei estipula multa com um duplo escopo:

desestimular a prática dessa conduta e ressarcir o prejuízo por ela causado.

Portanto, é crucial observar novamente o que dispõe o Código de

Trânsito Brasileiro (lei 9.503/97) sobre o tráfego de veículos com excesso de peso,

principalmente no que tange à prévia previsão de ressarcimento gradativo e

proporcional do peso excedente. Diz o art. 231, incs. V e X, do Código de Trânsito

Brasileiro:

“Art. 231. Transitar com o veículo:

(...) V - com excesso de peso, admitido percentual de tolerância

quando aferido por equipamento, na forma a ser estabelecida pelo

CONTRAN:

Infração - média;

Penalidade - multa acrescida a cada duzentos quilogramas ou fração

de excesso de peso apurado, constante na seguinte tabela:

a) até seiscentos quilogramas - 5 (cinco) UFIR;

b) de seiscentos e um a oitocentos quilogramas - 10 (dez) UFIR;

c) de oitocentos e um a um mil quilogramas - 20 (vinte) UFIR;

d) de um mil e um a três mil quilogramas - 30 (trinta) UFIR;

e) de três mil e um a cinco mil quilogramas - 40 (quarenta) UFIR;

f) acima de cinco mil e um quilogramas - 50 (cinqüenta) UFIR”.

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Por isso, não poderia o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL pleitear nova

indenização por esses mesmo fatos. Sem falar que por si só isso já configuraria um

bis in idem e enriquecimento sem causa do Poder Público, pois o infrator se vê

obrigado a pagar indenização de decorrência direta da lei e outra em decorrência de

uma decisão judicial.

Além disso, a própria legislação já prevê medidas administrativas

para se evitar o dano (multa, apreensão do veículo ou transbordo da carga em

excesso), conforme o mesmo artigo 231 supracitado:

“Art. 231. Transitar com o veículo:

....................

X - excedendo a capacidade máxima de tração:

Infração - de média a gravíssima, a depender da relação entre o

excesso de peso apurado e a capacidade máxima de tração, a ser

regulamentada pelo CONTRAN;

Penalidade - multa;

Medida Administrativa - retenção do veículo e transbordo de carga

excedente.

Parágrafo único. Sem prejuízo das multas previstas nos incisos V e

X, o veículo que transitar com excesso de peso ou excedendo à capacidade

máxima de tração, não computado o percentual tolerado na forma do

disposto na legislação, somente poderá continuar viagem após descarregar

o que exceder, segundo critérios estabelecidos na referida legislação

complementar”.20

Daí a improcedência da demanda. O Poder Público tem meios e

determinações legais para o caso de flagrar um caminhão circulando com excesso de

peso. Se um veículo estiver acima do peso permitido, o fiscal rodoviário deve autuar

e apreender o veículo ou determinar o transbordo da mercadoria, eliminando o

excesso de peso. Assim se impede que o veículo continue a causar danos à rodovia.

20- A Resolução n. 258/07 do Conselho Nacional de Trânsito regulamenta os dispositivos e prevê os

valores das multas a serem aplicadas em cada uma das hipóteses do art. 231, incs. V e X da lei 9.503/97.

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De todo modo, dano não se presume. Ou seja, o an debeatur e o

quantum debeatur devem ser provados.

Contrariando essa premissa, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL faz

uma curiosa divisão aritmética de todos os gastos do GOVERNO FEDERAL na

manutenção das estradas pelas multas por excesso de peso (de todo o território

nacional, frisa-se). E conclui o Parquet que a cada infração de trânsito

corresponderia um valor indenizatório médio de R$ 23.821,06 devido aos cofres

públicos.

Com base nesse ininteligível critério e sem qualquer estudo prévio,

pediu a condenação da ré em R$ 8.337.370,80 ao multiplicar o “valor médio” de

gastos do Poder Público (R$ 23.821,06) pelo número de infrações imputadas à

CIA. MULLER no período de 2010 a 2013 (350 multas).

Sem precisar trazer novamente as considerações feitas acima de que

as 350 multas mencionadas são na verdade 0,73% do volume total de veículos

embarcados no mesmo período pela CIA. MULLER, não havendo, pois, prática

reiterada que objetive lucro do frete, não pode o pedido indenizatório vir baseado em

um suposto “valor médio” de prejuízo.

Aceitar a demanda do Parquet seria considerar que a ré pagaria pela

média de danos às rodovias federais de todo território nacional sem que jamais tivesse

circulado por essas rodovias! Pagaria a ré pelo descaso do repasse notório de

investimentos pontuais em cada região do Brasil, como Norte, Nordeste, Centro-Oeste,

regiões essas carecedoras sim de manutenção nas estradas, mas não por culpa da

CIA. MULLER, porque não se pode presumir que um “valor médio” encontrado pelo

MINISTÉRIO PÚBLICO corresponderia ao dano efetivo ocasionado, como se só

trafegassem pelas rodovias federais caminhões com excesso de peso! Como se veículos

com peso adequado também não causassem danos ao pavimento! Como se o precário

estado das rodovias já não fosse muito anterior a esse período descrito pelo autor!

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A responsabilidade civil só existe em relação a condutas específicas

e individualizadas do agente. O MINISTÉRIO PÚBLICO não pode intuitivamente

escolher uma empresa e presumir que ela tenha causado dano às rodovias federais do

Brasil inteiro. Não há qualquer demonstração de culpa nem de nexo de causalidade.

Afinal, o suposto dano causado por um excesso de 10kg não será o mesmo do

excesso de 5 toneladas, não podendo haver tratamento indistinto para condutas

diversas, pois as consequências são diversas.

Portanto, a equação do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL é uma mera

presunção de responsabilidade que contraria o art. 944 do Código Civil, impondo-se

a improcedência dos pedidos.

8- DANO MORAL COLETIVO?

O Parquet pede ainda a absurda condenação da ré a indenizar por

supostos danos morais coletivos, no também arbitrário valor de R$ 3.252.228,44.

Mas são inúmeros os precedentes do Col. Superior Tribunal de Justiça no sentido de

que a noção de dano moral é incompatível com a de interesses transindividuais,

guardando pertinência exclusivamente com os interesses afetos a indivíduos certos e

determinados:

“É inviável, em sede de ação civil pública, a condenação por danos

morais coletivos” (Min. ARI PARGENDLER).21

“a Egrégia Primeira Turma firmou já entendimento de que, em

hipóteses como tais, ou seja, ação civil pública objetivando a reabertura de

postos de atendimento de serviço de telefonia, não há falar em dano moral

coletivo, uma vez que ‘Não parece ser compatível com o dano moral a

ideia da 'transindividualidade' (= da indeterminabilidade do sujeito passivo

e da indivisibilidade da ofensa e da reparação) da lesão” (Min. HAMILTON

CARVALHIDO).22

21- STJ, 1ª T., AgRg no REsp. n. 1.305.977-MG, rel. Min. ARI PARGENDLER, j. 9.4.13, v.u. 22- STJ, 1ª T., AgRg no REsp. n. 1.109.905/PR, rel. Min. HAMILTON CARVALHIDO, j. 22.6.10, v.u.

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“necessária a vinculação do dano moral à noção de dor, de

sofrimento psíquico, de caráter individual. Incompatibilidade com a noção

de transindividualidade (indeterminabilidade do sujeito passivo e

indivisibilidade da ofensa e da reparação)” (Min. LUIZ FUX).23

Essa também é a jurisprudência desse E. Tribunal Regional Federal

da 3ª Região:

“é cediço que o dano moral está intrinsecamente ligado à dor e ao sofrimento da psique humana, ou seja, é extremamente subjetivo e não guarda relação lógica com a ideia da transindividualidade, consoante, inclusive, crescente e maciço entendimento no âmbito do Egrégio Superior Tribunal de Justiça.

Isso porque inviável transportar a mensuração desse abalo psíquico - o

qual, inclusive, deve indubitavelmente ultrapassar o mero dissabor e eventual

descontentamento e insatisfação com os programas veiculados nas redes de

televisão -, para um número indeterminado de sujeitos, quando a própria

ofensa cometida pelo agente mostra-se indivisível, salvo comprovação do

efetivo prejuízo à coletividade, o que, in casu, não restou demonstrado, não

bastando para tanto as alegações genéricas acerca da frustração e insegurança

provocadas na sociedade em razão dos fatos expostos”.24

O E. Tribunal Regional Federal da 4ª Região já decidiu em caso

idêntico que, ainda que houvesse o transporte de mercadorias com excesso de peso,

isso não geraria qualquer dano moral coletivo indenizável:

“razão não assiste ao agravante, porquanto não demonstrado suficientemente o perigo de dano irreparável, nem a ocorrência do alegado dano moral difuso. No caso presente, o recorrente não deduziu, minimamente, na sua fundamentação, em que medida ocorreria risco de prejuízo fatal, limitando-se a reiterar que se a agravadas não pararem de transitar com os seus veículos em excesso de peso, haverá continuidade de dano ao patrimônio público, além de violar a segurança e a integridade dos cidadãos, sujeitos a acidentes fatais”.25

23- STJ, 1ª T., REsp. n. 598281-MG, rel. Min. LUIZ FUX, j. 2.5.06, v.m. 24- TRF da 3ª Região, 3ª Turma, apel. cível n. 0004791-79.2007.4.03.6100, Juiz Convocado

ROBERTO JEUKEN, j. 16.5.2013, v.u. 25- TRF-4, 3ª T., Ag. de Inst. n. 5024712-63.2013.404.0000, rel. Des. NICOLAU KONKEL JÚNIOR,

j. 26.2.14, v.u.

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Esse também é o posicionamento adotado em caso idêntico pela

R. sentença proferida pelo MM. Juiz da Subseção Judiciária de Patos de Minas:

“tenho que o instituto do ‘dano moral coletivo’ aplica-se tão somente aos direitos difusos e coletivos stricto sensu (os efetivamente marcados pelo caráter de transindividualidade e indivisibilidade), não se destinando à reparação de prejuízos a interesses ou direitos individuais homogêneos”.26

Mesmo que fosse, em tese, configurável o chamado dano moral

coletivo, ele só seria indenizável em situações se houvesse um efetivo dano ligado a

uma determinada conduta de um agente e que esteja devidamente provado.

No caso, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL não fez menção a

qualquer fato ou indício de uma comoção coletiva ou mesmo de conduta da ré

passível de causar esse suscitado dissabor à honra da coletividade. Trata-se apenas de

um hipotético prejuízo a um grupo de pessoas perfeitamente delimitado e

identificado e que, se existir, é meramente patrimonial (tanto que há pedido de

ressarcimento específico). Nem com muito boa vontade se consegue vislumbrar qual

prejuízo imaterial a coletividade teria sofrido.

Ademais, segundo entendimento doutrinário e jurisprudencial, o mero

aborrecimento não é apto a gerar qualquer dano moral. A propósito, lembra ANTÔNIO

JEOVÁ DOS SANTOS que nem todo mal-estar configura dano moral indenizável:

“pode parecer que qualquer abespinhamento propicia o

exsurgimento do dano moral. Qualquer modificação no espírito, ainda que

fugaz, aquele momento passageiro de ira, pode causar indenização. Sem

contar que existem pessoas de suscetibilidade extremada. Sob qualquer

pretexto, ficam avermelhadas, raivosas, enfurecidas. Não se pode dizer

que não houve lesão a algum sentimento. Porém, seria reduzir o dano

moral a mera sugestibilidade, ou proteger alguém que não suporta nenhum

aborrecimento trivial, o entendimento que o dano moral atinge qualquer

gesto que cause mal estar”.27

26- Sentença de improcedência proferida pelo MM. Juiz da 1ª Vara Federal da Seção Judiciária de

Minas Gerais, Subseção de Patos de Minas (proc. n. 443-28.2011.4.01.3806). 27- Dano Moral Indenizável, 4ª Ed., Revista dos Tribunais, 2003, pág. 111. Nesse sentido, diz

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Nesse sentido diz a jurisprudência:

“a reparação do dano moral é uma compensação pela violação dos

aspectos mais íntimos da personalidade humana. Para que ela seja acolhida, é

necessário que a vítima tenha sofrimento significativo e não um simples

aborrecimento, como na espécie dos autos, sob pena de se tornar numa fonte

injustificada de lucro. (...) Por isso, nega-se provimento ao recurso”.28

Portanto, inexiste também um concreto dano moral. E sem a

presença simultânea do trinômio culpa-dano-nexo não há responsabilidade civil.

9- DESPROPORCIONALIDADE DA MULTA DE R$ 100.000,00 (CEM MIL REAIS) IMPOSTA À CIA. MÜLLER POR NOVA INFRAÇÃO DE TRÂNSITO

Na remotíssima e improvável hipótese de condenação da ré, pede-se

ao menos que o valor da multa seja reduzido para patamares minimamente

aceitáveis, pois a quantia de R$ 100.000,00 (cem mil reais) por infração de trânsito

certamente inviabilizará economicamente os negócios da CIA. MÜLLER.

Afinal, são milhares de caminhões de terceiros que todos os meses

carregam as mercadorias vendidas pela CIA. MÜLLER em sua sede em Pirassununga.

Qualquer mínimo problema com esses veículos, como a inclusão pelo transportador e/ou

proprietário – e não pela embarcadora do produto – de novas mercadorias para

‘aproveitar’ o frete, poderá gerar um passivo gigantesco à ré.

Apenas lembrando que a CIA. MÜLLER não é responsável pela carga

transportada, pois efetua a venda dos seus produtos mediante a cláusula

FOB (free on board). Por força dessa cláusula, a responsabilidade da

vendedora (CIA. MÜLLER) com relação à carga e aos riscos a ela

relacionados persiste até o carregamento do caminhão contratado pela

compradora, passando a ser, a partir de então, exclusivamente da

compradora e dos transportadores. Excepcionalmente a embarcadora de

SÉRGIO CAVALIERI FILHO, “mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral" (Programa de Responsabilidade Civil, 2ª Ed., Malheiros Editores, p. 78).

28- 1º TAC-SP, 2ª Câm., ap. nº1128148-6, rel. Juiz NEMER JORGE, j. 06.08.03, v.u.

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produtos, no caso a CIA. MÜLLER, poderá ser solidariamente responsável

na esfera administrativa se “simultaneamente for o único remetente da

carga e o peso declarado na nota fiscal, fatura ou manifesto for inferior

àquele auferido” (CTB, art, 257, § 4º).

Por isso, pede-se ao menos que essa nova multa seja fixada em valor

não superior a R$ 500,00 por infração e desde que provado que a embarcadora seja a

responsável, nos termos do art. 257, § 4º, do Código de Trânsito Brasileiro.

10- PEDIDOS E REQUERIMENTOS FINAIS

Por tais motivos, pede-se que a demanda seja julgada totalmente

improcedente.

Subsidiariamente, pede-se que eventual condenação limite-se ao

valor do efetivo prejuízo e que a multa por infração não supere R$ 500,00.

Em ambas as hipóteses pede-se que a R. decisão tenha eficácia circunscrita aos

limites territoriais do órgão prolator.

São Paulo, 17 de abril de 2015.

Cândido da Silva Dinamarco

OAB-SP n. 102.090

Anderson Martins da Silva

OAB-SP n. 234.321

Túlio Werner Soares Neto OAB-SP n. 344.360