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EVATA Empresa Viosense de Assessoria Tcnico Acadmica Ltda

DISCIPLINA: RECUPERAO DE REAS DEGRADADAS

_______________________________________________________________ ____Professor MAURCIO NOVAES SOUZA

RECUPERAO AMBIENTAL E DESENVOLVIMENTO SUSTENTVEL

CURSO DE PS-GRADUAO LATO SENSU EM GESTO AMBIENTAL VIOSA MINAS GERAIS - BRASIL 2005

Recuperao de reas Degradadas, 251p. Ps-graduao Lato Sensu em Gesto Ambiental

Prof. Maurcio Novaes Souza EVATA: Viosa, MG

Sumrio Apresentao........................................................................................................................ Introduo............................................................................................................................. Objetivos................................................................................................................................ Captulo I ............................................................................................................................... 1. A degradao ambiental pelo fator antrpico.............................................................. 1.1. Objetivo.............................................................................................................. 1.2. Introduo.......................................................................................................... 1.3. O capital natural................................................................................................. 1.4. As funes ambientais de ordem econmica e a ruptura do equilbrio............. 1.4.1. Externalidades............................................................................................. 1.4.2. Custos privados e sociais............................................................................ 1.4.3. Considerao .............................................................................................. 1.5. Fatores de desequilbrio.......................................................................................... 1.5.1. Poltica Agrcola........................................................................................... 1.5.2. O modelo de pesquisa................................................................................. 1.5.3. O xodo rural e a urbanizao.................................................................... 1.5.4. Extenso rural acesso informao e ao livre mercado......................... 1.5.5. Difuso de tecnologia e a interinstitucionalidade......................................... 1.5.5.1. O clima organizacional brasileiro.............................................................. 1.5.5.2. Relaes entre organizaes................................................................... 1.5.5.3. Difuso de tecnologia efetiva................................................................... 1.5.5.4. Adoo da tecnologia............................................................................... Estudo de Caso 1.5.5. (1) Degradao nas pastagens da Zona da Mata Mineira.............. 1.5.6. Os modelos de produo agropecurio e florestal...................................... 1.5.6.1. Modelo tradicional ou familiar................................................................... 1.5.6.2. Modelo convencional ou agroqumico...................................................... 1.5.6.3. A importncia dos modelos no mundo atual e os desafios para o futuro. 1.5.6.4. A sustentabilidade do sistema familiar..................................................... 1.5.6.5. A sustentabilidade do sistema agroqumico............................................. 1.5.6.6. O direcionamento da pesquisa ................................................................ 1.6. Impactos Ambientais................................................................................................ 1.6.4.1. Mtodos de Avaliao de Impactos Ambientais....................................... 1.6.4.2. Relatrio de Impacto Ambiental (RIMA) .................................................. 1.6.4.3. Necessidade de Estudo de Impacto Ambiental........................................ 1.6.4.4. Medidas preventivas e aes estratgicas cabveis para evitar impactos ambientais................................................................................................ 1.6.4.7. Consideraes........................................................................................... 1.7. Classificao das fontes antrpicas de degradao ambiental............................... 1.7.1. Classificao temporal................................................................................. 1.7.2. Classificao quanto atividade................................................................. 1.8. Consideraes........................................................................................................... Captulo II............................................................................................................................... 2. Recuperao Ambiental.............................................................................................. 2.1. Objetivo.............................................................................................................. 2.2. Introduo.......................................................................................................... 2.3. Histrico............................................................................................................. 2.4. Definies e objetivos da recuperao ambiental............................................. 2.5. A justificativa da necessidade de recuperao ambiental................................. 2.6. Abordagens para a caracterizao de rea degradada.................................... 2.6.1. Abordagem segmentada....................................................................... 2.6.1.1. Caracterizao segmentada considerando o componente solo......... 2.6.1.2. Indicadores de qualidade do solo....................................................... 2.6.2. Abordagem no segmentada................................................................ 2.7. A construo de cenrios................................................................................. 2.7.1. Cenrio pr-degradao........................................................................ 2.7.2. Cenrio ps-degradao.......................................................................

02 06 08 10 11 11 11 11 15 16 18 20 21 21 22 23 24 25 27 28 28 28 29 30 36 37 38 39 39 40 41 42 46 48 49 49 50 51 51 52 53 55 55 55 55 57 58 60 61 62 62 64 65 67 68 69

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2.8. Importncia da revegetao para a sustentabilidade dos procedimentos de recuperao....................................................................................................... 2.8.1. Estratgias de revegetao................................................................... 2.8.2. O uso do topsoil.................................................................................. 2.8.2.1. Ajuste das condies fsicas e qumicas dos meios substitutos........ 2.8.2.2. Proteo do topsoil.......................................................................... 2.8.3. O acmulo de matria orgnica............................................................ 2.8.3.1. Processos de degradao e o manejo em florestas plantadas.......... 2.8.3.2. Ciclagem de nutrientes....................................................................... 2.8.3.2.1. Ciclo geoqumico............................................................................. 2.8.3.2.2. Ciclo bioqumico.............................................................................. 2.8.3.2.3. Ciclo biogeoqumico........................................................................ 2.8.3.3 Perspectivas para mitigao de impactos em florestas plantadas...... 2.8.4. A biota do solo e o restabelecimento do ciclo do carbono ................... 2.8.5. O uso da serapilheira e a seleo de espcies..................................... 2.8.6. Recuperao de voorocas................................................................... 2.9. Procedimentos para o sucesso da recuperao............................................... Estudo de Caso 2.9. (2) A recuperao de reas degradadas por atividades minerrias 2.9.1. Introduo.............................................................................................. 2.9.2. A regulamentao do setor minerrio................................................... 2.9.3. A recuperao de reas mineradas...................................................... 2.9.4. A mitigao dos impactos na vida selvagem......................................... 2.9.5. Drenagem cida.................................................................................... 2.9.6. Observaes complementares.............................................................. 2.9.7. Possibilidades de uso resultante do processo de recuperao............ 2.10. Alteraes climticas e a estabilidade de encostas de reas recuperadas.... 2.10.1. Eroso: importncia, necessidade de quantificao e preveno...... 2.11. Recuperao de pastagens em reas de relevo acidentado.......................... 2.12. Recuperao e conservao de nascentes..................................................... Estudo de Caso 2.12. (3) As pastagens e a recuperao de nascentes: o caso de Viosa, MG............................................................................................. 2.13. Recuperao de canais................................................................................... 2.13.1. Reduo de enchentes........................................................................ 2.13.2. Recuperao de matas ciliares e a estabilizao das margens.......... 2.13.2.1. Tcnicas de recuperao de matas ciliares...................................... 2.13.2.2. Indicadores de recuperao de matas ciliares.................................. 2.14. Recuperao de bacias hidrogrficas............................................................. 2.14.1. Mitigao e recuperao de ecossistemas aquticos eutrofizados.... 2.14.2. Mtodos ecotecnolgicos para aplicao no ecossistema aqutico... 2.14.3. A necessidade de priorizao de recuperao dos recursos hdricos 2.14.4. Uso da gua: a viso holstica da paisagem....................................... 2.14.5. Recursos hdricos e a legislao......................................................... 2.14.6. Gesto dos recursos hdricos.............................................................. 2.15. Quadro atual e sugestes em pesquisas para recuperao ambiental........... 2.15.1. A necessidade da interdisciplinaridade na formao de disciplinas.... 2.15.2. As contribuies das diversas cincias............................................... 2.16. Consideraes................................................................................................. Captulo III.............................................................................................................................. 3. O Desenvolvimento Sustentvel ................................................................................. 3.1. Objetivo.............................................................................................................. 3.2. Introduo.......................................................................................................... 3.3.Conceitos............................................................................................................ 3.4. Anlise conceitual: divergncias e propostas alternativas................................ 3.5. Questes ambientais atuais.............................................................................. 3.6. Diretrizes necessrias....................................................................................... 3.6.1. Poltica pblica...................................................................................... 3.6.2. Viso e postura do setor produtivo........................................................ 3.7. Perspectivas para o desenvolvimento sustentvel............................................ 3.8. Agronegcio cooperativo e o desenvolvimento sustentvel......... Recuperao de reas Degradadas Ps-graduao Lato Sensu

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3.9. Tecnologias apropriadas e o desenvolvimento sustentvel.............................. 3.9.1. Atributos e critrios das tecnologias apropriadas.................................. 3.9.2. Gesto da tecnologia............................................................................. 3.10. Gesto Ambiental e Desenvolvimento Sustentvel......................................... 3.10.1. Definio.............................................................................................. 3.10.2. Objetivos.............................................................................................. 3.10.3. Sistema de Gesto Ambiental: oportunidades e riscos....................... 3.10.4. Implantao do Sistema de Gesto Ambiental................................... 3.11. Licenciamento ambiental................................................................................. 3.12. Consideraes................................................................................................... Captulo IV............................................................................................................................. 4. Propostas de modelos de produo sustentveis....................................................... Objetivos...................................................................................................................... 4.1. O capitalismo natural......................................................................................... Estudo de Caso 4.1. (4) Recuperao ambiental de reas contaminadas por agroqumicos e metais pesados....................................................................... 4.1.1. Objetivos......................................................................................................... 4.1.2. Introduo....................................................................................................... 4.1.3. A necessidade da recuperao e sua caracterizao.................................... 4.1.4. Prticas de remediao e recuperao de reas contaminadas por metais pesados.......................................................................................................... 4.1.4.1. Tcnicas de engenharia.............................................................................. 4.1.4.2. Fitorremediao .......................................................................................... 4.1.4.2.1.Fitoextrao............................................................................................... 4.1.4.2.2. Fitoestabilizao....................................................................................... 4.1.5. Prticas agrcolas rotineiras para recuperao por fitorremediao.............. 4.1.5.1. Calagem ..................................................................................................... 4.1.5.2. Gessagem .................................................................................................. 4.1.5.3. Fertilizao e matria orgnica ................................................................... 4.1.6. Medidas auxiliares para a identificao de impactos ambientais e de recuperao................................................................................................... 4.1.6.1. Utilizao de bioindicadores........................................................................ 4.1.6.2. Equipamentos de preciso e a reduo dos impactos ambientais.............. 4.1.7. Ferramentas auxiliares para a recuperao ambiental.................................. 4.1.7.1. Utilizao de composto de reciclagem de resduos orgnicos.................... 4.1.7.1.1. Efeito corretivo.......................................................................................... 4.1.7.2. Microorganismos simbiontes: fixao biolgica de Nitrognio.................... 4.1.7.3. Agricultura orgnica..................................................................................... 4.1.7.4. Plantas halfitas ......................................................................................... 4.1.7.5. Regenerao natural e sucesso................................................................ 4.1.8. Componentes interligados - a sustentabilidade da recuperao.................... 4.1.8.1. A fauna silvestre.......................................................................................... 4.1.8.2. Os ecossistemas aquticos......................................................................... 4.1.8.2.1. A influncia da eroso sobre os ecossistemas aquticos........................ 4.1.8.2.2. A qualidade da gua e o manejo da irrigao.......................................... 4.1.8.2.3. A poluio hdrica e a ecotoxicologia....................................................... 4.1.8.2.4. Medidas para a recuperao de ecossistemas aquticos........................ 4.1.9. Consideraes ............................................................................................... 4.2. Cincia Generativa............................................................................................ Estudo de Caso 4.2. (5) A destinao dos resduos slidos urbanos: reciclagem, aterro sanitrio e recuperao ambiental de reas degradadas por lixes - o caso de Viosa, MG..................................................... 4.2.1. Objetivos......................................................................................................... 4.2.2. Introduo....................................................................................................... 4.2.3. O lixo no Brasil................................................................................................ 4.2.3.1. O lixo no municpio de Viosa..................................................................... 4.2.3.2. A usina de reciclagem de Viosa................................................................. 4.2.3.2.1. Aspectos econmicos............................................................................... 4.2.3.2.2. Aspectos sociais....................................................................................... Recuperao de reas Degradadas Ps-graduao Lato Sensu

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4.2.3.2.3. Aspectos legais......................................................................................... 4.2.4. Recuperao de reas degradadas por lixes............................................. 4.2.5. Consideraes................................................................................................. 4.3. Mecanismo de Desenvolvimento Limpo........................................................... Estudo de Caso 4.3. (6) Os sistemas agroflorestais (SAFs) e a recuperao ambiental como externalidade benfica....................................................... 4.3.1. Objetivos......................................................................................................... 4.3.2. Introduo....................................................................................................... 4.3.3. Conceitos e definies.................................................................................... 4.3.4. Caracterizao de Sistemas Agroflorestais.................................................... 4.3.5. Princpios ecolgicos: orientando a sustentabilidade dos SAFs.................... 4.3.6. Manejo e processos sucessrios nos SAFs.................................................. 4.3.6.1. Sucesso orientada..................................................................................... 4.3.6.2. Manejo por meio de podas: ativao de processos.................................... 4.3.7. Aspectos econmicos dos SAFs................................................................... 4.3.7.1. Produo comercializvel............................................................................ 4.3.7.2. Rentabilidade econmica............................................................................ 4.3.7.3. Fomento florestal......................................................................................... 4.3.8. Sistemas agroflorestais como tcnica de recuperao ambiental.................. 4.3.8.1. Sistemas silvipastoris: recuperao, seqestro de carbono e o clima........ 4.3.8.1.1. O solo e a imobilizao de CO2................................................................ 4.3.8.1.2. Os sistemas silvipastoris e o clima........................................................... 4.3.8.1.3. Manejo de regenerao natural em pastagens........................................ 4.3.8.1.4. Enriquecimento de pastagens com rvores de uso mltiplo.................... 4.3.8.2. SAFs e a fruticultura tropical....................................................................... 4.3.8.3. Opes alternativas de prticas florestais: agroflorestas............................ 4.3.8.3.1. Cercas vivas............................................................................................. 4.3.8.3.2. Arborizao de pastagens........................................................................ 4.3.8.3.3. Alley cropping forrageiro........................................................................ 4.3.8.3.4. Florestas produtoras de forragem............................................................ 4.3.8.3.5. Sistema agrcola rotativo (Sistema Taungya)........................................ 4.3.9. Monitoramento................................................................................................ 4.3.10. Os SAFs e as reas de Preservao Permanente (APP) e de Reserva Legal (ARL)................................................................................................. 4.3.11. Funes, servios e externalidades ambientais promovidas pelos SAFs... 4.3.12. Fatores limitantes dos SAFs..................................................................... 4.3.12. Consideraes finais....................................................................................

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5. CONCLUSES................................................................................................................... 218 6. OBSERVAES FINAIS................................................................................................... 220

7. SUGESTES...................................................................................................................... 221 8. REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS.................................................................................. 222

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Apresentao

A humanidade enfrenta problemas de degradao ambiental que remontam no tempo. O meio ambiente, que sempre desempenhou sua funo depuradora com eficincia, encontra-se hoje excessivamente sobrecarregado pelas atividades antrpicas: sofre o risco de exausto dos seus recursos, no conseguindo em determinadas situaes, recuperar-se por si s, necessitando o auxlio do homem. Porm, considerando os atuais modelos de produo e desenvolvimento que priorizam a maximizao econmica em detrimento conservao ambiental, a soluo definitiva dessas questes parece estar distante de ser encontrada. Recentemente, essa preocupao ganhou adeptos em todo o mundo e, efetivamente, existe uma maior conscientizao s causas ambientais, incluindo casos de sucesso nos procedimentos de recuperao e propostas viveis para o desenvolvimento sustentvel, que deve ser o objetivo maior. Porm, sendo a Recuperao Ambiental uma cincia nova e esse modelo de desenvolvimento ainda encontrar-se no estgio de compromisso em formao, apresentam lacunas que precisam ser preenchidas, ampliando as chances para que os resultados sejam mais efetivos e duradouros. Esta apostila est dividida em quatro captulos: o Captulo I faz uma anlise da origem da degradao ambiental e quais os fatores de desequilbrio que mais influenciaram para a acelerao deste processo; caracteriza os principais modelos de produo agropecurios e florestais, a sua importncia no mundo atual e os desafios para o futuro; inclui a avaliao de impactos ambientais; identifica as principais atividades e os fatores de degradao ambiental. Introduz Estudos de Caso por representarem um importante instrumento didtico, sendo este um dos objetivos desta apostila: nos Estudos de Caso, a teoria adquire vida por ser aplicada ao entendimento dos fatos da realidade. O Captulo II analisa o processo da recuperao ambiental: suas dificuldades, suas limitaes e seu potencial; define rea degradada e as abordagens para a sua caracterizao; discute sobre a importncia da elaborao de cenrios, e por fim sugere e delineia os passos essenciais para que o sucesso desses procedimentos seja duradouro, por meio de um Estudo de Caso sobre a recuperao de reas mineradas e outro sobre a recuperao de pastagens e nascentes em reas de relevo acidentado. No captulo III conceituado desenvolvimento sustentvel, visando sua integrao posterior aos conceitos de degradao e recuperao, sob a tica econmica, ecolgica, tica e social, evidenciando suas caractersticas, princpios e perspectivas. So apresentadas algumas propostas para que este seja consolidado, gerando emprego e renda com maior eqidade social; identifica polticas ambientais a) estruturadoras, como o licenciamento ambiental, e b) indutoras de comportamento, como a educao, certificao e gesto ambiental. Estas podem funcionar como ferramentas teis preveno e ao policiamento da agresso e explorao de forma predatria imposta ao meio ambiente, evitando novos casos de degradao, como tambm auxiliando na gesto e no monitoramento dos procedimentos de recuperao ambiental, garantindo a sua sustentabilidade. No captulo IV, os conceitos sobre desenvolvimento sustentvel so reforados no contexto da recuperao ambiental, com a apresentao de trs propostas que j vm sendo implementadas em vrias partes do mundo, com relativo sucesso, evidenciadas pelos seguintes Estudos de Caso: 1) Recuperao ambiental de reas contaminadas por agroqumicos e metais pesados: como caracteriz-las; as prticas de remediao e

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recuperao; as medidas e ferramentas auxiliares para a identificao de impactos ambientais; e os componentes interligados ao processo de recuperao, como a fauna silvestre e os ecossistemas aquticos, para a garantia da sua sustentabilidade; 2) Os sistemas agroflorestais (SAFs) e a recuperao ambiental como geradores de externalidades benficas: sua caracterizao, importncia para a produo de madeira e as externalidades positivas; so identificados os princpios ecolgicos que orientam sua sustentabilidade; sendo discutidos: a) manejo e processos sucessrios; e b) o monitoramento e os indicadores de sustentabilidade - e como utiliz-los para projetos de seqestro de carbono do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo e em procedimentos de recuperao ambiental; e 3) A destinao dos resduos urbanos: reciclagem, aterro sanitrio e recuperao de reas degradadas por lixes - o caso de Viosa, MG: identifica o problema do lixo nas reas urbanas brasileiras, responsvel em grande parte pela alterao da paisagem e instabilidade das encostas, causando poluio e assoreamento dos cursos dgua; aponta a reciclagem como uma atividade que possibilita a reduo desse problema, sendo necessria, entretanto, a conscientizao das comunidades para a reduo na utilizao dos recursos naturais e no seu descarte, podendo ser conseguida por meio da educao ambiental; e procedimentos de remediao e recuperao, utilizando-se de mtodos como a compostagem e disposio final dos resduos no-reciclveis, em aterros sanitrios. Na concluso, poder-se- observar crticas e sugestes, porm no sentido de converter essas novas idias e conceitos em ao. Sugere-se mudana do atual modelo de produo agropecurio, florestal e industrial, dada a visvel insustentabilidade verificada at o presente momento. Por ltimo, algumas recomendaes, que apesar de seu conhecimento testado e comprovado, tm passado despercebidas, sendo de extrema importncia para a) evitar novos casos de degradao; b) favorecer os procedimentos de recuperao ambiental; e c) promover o desenvolvimento sustentvel.

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Introduo

Em 1992, durante as reunies preparatrias para a Conferncia das Naes Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD), a ECO 92, realizada no Rio de Janeiro, ocorreram intensas discusses sobre as atividades e mecanismos econmicos especialmente impactantes para o meio ambiente e capazes de depauperar os recursos naturais. O documento denominado Agenda 21 resultante dessas discusses, contendo inmeras recomendaes, inclusive aquelas que enfatizam a importncia dos governos e organismos financeiros internacionais priorizarem polticas econmicas para estimular a sustentabilidade por meio da taxao do uso indiscriminado dos recursos naturais, da poluio e despejo de resduos, da eliminao de subsdios que favoream a degradao ambiental e da contabilizao de custos ambientais e de sade (ELDREDGE, 1999; PULITANO, 2003). Em agosto de 2002, em Johannesburgo, na frica do Sul, ocorreu a reunio da Cpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentvel (Rio + 10), onde 189 pases se reuniram para fazer um balano de uma dcada de iniciativas para conservar os ambientes do planeta e melhorar a qualidade de vida de seus habitantes, como tambm para traar novos rumos para alcanar o desenvolvimento sustentvel. Porm, constatou-se nessa reunio, que no s os indicadores ambientais esto piorando, de florestas ao clima, mas que o movimento para o desenvolvimento sustentvel est enfraquecido por uma crise globalizada, delineada por uma relativa distenso das relaes internacionais, permeada pela perplexidade e o novo conhecimento que as transformaes geopolticas impem (CAPOBIANCO, 2002; PULITANO, 2003). Os indicadores mundiais referentes s questes ambientais, tais como florestas, biodiversidade, gua, efeito estufa, consumo de energia, terras cultivadas, pobreza e populao, so alarmantes. Estima-se, que desde a metade do sculo passado, o mundo perdeu uma quinta parte da superfcie cultivvel e um quinto das florestas tropicais (RELATRIO..., 1991). Alguns dados, compilados de HARRISON e PEARCE (2000), complementados por informaes de outros autores, confirmam esse fato: Em 1990, havia 3,960 bilhes de hectares (ha) de florestas nas diversas regies do planeta; em 2000, a rea de florestas havia cado para 3,866 bilhes. Estima-se, de acordo com o RELATRIO...(1991), que a cada ano so perdidos 20 milhes de ha de florestas e 25 bilhes de toneladas de hmus por efeito da eroso, desertificao, salinizao e outros processos de degradao do solo; Em 1992, estimava-se que cerca de 180 espcies de animais haviam sido extintas e outras mil estavam ameaadas de extino; desde 1992, 24 espcies (considerando apenas os vertebrados) foram extintas e 1.780 espcies de animais e 2.297 de plantas esto ameaadas; Em 1990, a populao do planeta usava cerca de 3.500 km3 de gua doce por ano; em 2000 o consumo total anual chegou a 4.000 km3 (crescimento de 12,5%). Esse problema, de acordo com TUNDISI (2003), torna-se mais preocupante em face da reduo do suprimento global de gua com o aumento da populao e dos usos mltiplos e com a perda dos mecanismos de reteno

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de gua (remoo de reas alagadas e das matas de galeria, desmatamento, perda de volume por sedimentao de lagos e represas); Em 1990, a humanidade lanava 5,827 bilhes de toneladas de CO2 na atmosfera, acentuando o aquecimento global; em 1999 as emisses tinham subido para 6,097 bilhes de toneladas (nos pases ricos, de acordo com o PNUD (2003), as emisses de dixido de carbono per capita so de 12,4 toneladas (t) - enquanto nos pases de rendimento mdio so de 3,2 t e nos pases de rendimento baixo, de 1,0 t); Em 1992, o consumo de energia no planeta era equivalente a 8,171 trilhes de toneladas de petrleo por ano; em 2000 o consumo subiu para o correspondente a 9,124 trilhes de toneladas de petrleo por ano; Em 1987, a rea da Terra usada para a agricultura era de 14,9 milhes de km2 (297 ha/1.000 pessoas); em 1997, o nmero subiu para 15,1 milhes de km2 (ou seja, cada grupo de mil pessoas passou a contar com apenas 259 ha). De acordo com o RELATRIO...(1991), apenas por conta da salinizao, uma quarta parte da superfcie irrigada do mundo est comprometida, aumentando os problemas relacionados fome; Em 1992, o planeta tinha 5,44 bilhes de habitantes; em 2000 a estimativa de 6,24 bilhes (um crescimento de 13% sobre 1992); e O nico dado que apresentou uma ligeira melhora, refere-se a renda, porm ainda nada otimista: em 1992, o nmero de pessoas vivendo com at US$ 1 por dia (a chamada pobreza absoluta) era de 1,3 bilho; hoje, 1,2 bilho de pessoas vivem com US$ 1 por dia. Entretanto, de acordo com o PNUD (2003), dos 67 pases considerados com baixo ndice de desenvolvimento humano (IDH), aumentaram as taxas de pobreza em 37, de fome em 21 e a mortalidade infantil em 14. Tambm, dos 125 pases em desenvolvimento, em 54 o rendimento per capita diminuiu. Diante desse atual quadro de degradao e da conscincia de que os recursos naturais so escassos, evidencia-se a urgncia da busca por uma nova postura ambiental. Por essas questes, a tomada de deciso deve ser direcionada com vistas produtividade dos recursos: a ecoeficincia. O seu conceito foi desenvolvido principalmente entre as empresas do setor privado para designar aperfeioamento no uso do material e reduo do impacto ambiental causados durante os processos produtivos. Harmonizar as metas ecolgicas com as econmicas exige no s a ecoeficincia, mas tambm a observncia a trs princpios adicionais, todos interdependentes e a reforarem-se mutuamente, sendo considerados importantes em iguais propores, os aspectos: a) econmicos; b) ambientais; e c) sociais (HAWKEN et al., 1999). Essas consideraes so de extrema importncia, posto que a interao do homem com o meio ambiente, quer seja ela de forma harmnica ou no, provoca srias mudanas em nvel global. A busca do crescimento econmico protegendo o meio ambiente - o ecodesenvolvimento - visando assegurar a sobrevivncia das geraes futuras, na prtica, tem sido um objetivo extremamente difcil de ser alcanado. Essa deve ser a busca constante, podendo ser atingida por meio das propostas do desenvolvimento sustentvel, cuja definio, mais abrangente, explicita conceitos de ecoeficincia e ecodesenvolvimento (ACIESP, 1987): modelo de desenvolvimento que leva em considerao, alm de fatores econmicos, aqueles de carter social e ecolgico, assim como as disponibilidades dos

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recursos vivos e inanimados e as vantagens e os inconvenientes, a curto e em longo prazos, de outros tipos de ao. Entretanto, na prtica, esse modelo de difcil implementao, diante da complexidade econmica e ecolgica atuais, pois tanto as consideraes scio-econmicas como as ecolgicas por parte da sociedade, empresas e governos, so individualizadas. Dessa forma, no h como chegar a um objetivo consensual, considerando haver fatores e objetivos sociais, legais, religiosos e demogrficos divergentes, que tambm interferem na aplicao de consideraes e diretrizes ecolgicas s finalidades e processos de desenvolvimento (RESENDE et al., 1996). Apesar de todas essas divergncias, j existe um nmero considervel de exemplos animadores da experincia empresarial em desenvolvimento tecnolgico, econmico e comercial sustentvel. Emerge nos mais diversos setores, tais como: no transporte, na construo civil, na indstria, nas exploraes florestais, na agropecuria e na minerao. Porm, em um ritmo ainda abaixo do desejvel e necessrio. Os sistemas de clculo para avaliao do progresso econmico, via de regra, utilizam dados de desvalorizao de mquinas e equipamentos; entretanto, no consideram a desvalorizao do capital natural, renovveis ou no, como o petrleo, eroso do solo e desmatamento (RESENDE et al., 1996). Existe a necessidade de um projeto integrado que contemple ao mesmo tempo, em cada nvel: a) dos dispositivos tcnicos aos sistemas de produo e s empresas; b) aos setores econmicos, s cidades e s sociedades de todo o mundo (HAWKEN et al., 1999). Dessa forma, para que sejam atendidas essas premissas, precisam ser analisados os dois enfoques: o econmico e o biolgico, ou seja: a) o do produto nacional bruto e o de indicadores biolgicos; e b) o de crescimento econmico e o de desenvolvimento e sustentabilidade da qualidade de vida (RESENDE et al., 1996). Considerando: a) o aumento da populao e a conseqente necessidade de maior produo de alimentos para atender a essa demanda crescentes; b) a certeza da impossibilidade de multiplicao dos recursos na velocidade requerida; e c) a quantidade de reas degradadas ou em processo de degradao existentes; faz-se necessrio a recuperao dessas reas. Evitar-se- que funcionem como focos de impactos ambientais/degradao e, principalmente, para que possam ser reincorporadas ao processo produtivo, evitando a abertura de novas fronteiras agropecurias e a persistente reduo dos ecossistemas naturais. Portanto, os modelos de produo e de desenvolvimento devem ser revistos, para que o desenvolvimento sustentvel torne-se realidade. Para TUNDISI (2003), a vida continua em seu eterno ciclo. Entretanto, para se perpetuar, o homem deve incluir-se nele e dele participar, recuperando-o e mantendo-o.

Objetivos - No Brasil, cada vez mais existe a preocupao de se formular pensamentos para a conscientizao da necessidade de recuperao ambiental e, principalmente, evitar o surgimento de novas incidncias de reas degradadas.

Objetivo geral - Com o intuito de auxiliar nos procedimentos de capacitao em recuperao ambiental, esta apostila objetiva, principalmente, descrever a questo da degradao e recuperao ambiental no Brasil, com vistas ao desenvolvimento sustentvel. Sero referenciadas as principais

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prticas e ferramentas utilizadas atualmente nos procedimentos de recuperao, as instituies de pesquisa envolvidas e as suas limitaes, possibilitando tornar visveis lacunas existentes, indicando diretrizes bsicas para novas pesquisas e maior cooperao entre elas.

Objetivos especficos a) Agrupar informaes abrangentes sobre degradao e recuperao ambiental; b) Disponibilizar material didtico em recuperao ambiental, auxiliando na formao acadmica com a introduo de estudos temticos e os seus fundamentos bsicos; c) Oferecer alguma contribuio que possa ser til aos pesquisadores, professores e extensionistas, servindo de orientao no estudo, na divulgao e na investigao dessa cincia, favorecendo pesquisas especializadas sobre problemas pendentes de soluo nesse campo; d) Apresentar Estudos de Caso sobre questes atuais com o objetivo de mostrar determinadas prticas de recuperao, evidenciando o seu aspecto multidisciplinar; e) Identificar as inter-relaes existentes entre degradao, recuperao ambiental e desenvolvimento sustentvel; e f) Propor modelos de desenvolvimento capazes de no causarem degradao e auxiliarem nos procedimentos de recuperao ambiental de maneira sustentvel, gerando emprego e renda com eqidade social, conservando os recursos naturais e a capacidade de regenerao dos ecossistemas, ou seja, promover o desenvolvimento sustentvel.

CAPTULO I

1. A degradao ambiental pelo fator antrpico 1.1. Objetivo - O objetivo deste captulo descrever a evoluo da degradao ambiental promovida pelas atividades antrpicas ao longo da Histria. Objetiva tambm: a) Identificar a importncia do capital natural e a interferncia antrpica imposta ao meio ambiente, particularmente aps a Revoluo Industrial; b) Visualizar os principais fatores de desequilbrio e as suas conseqncias scio-ambientais; c) Mostrar a importncia dos modelos de produo para a sustentabilidade dos sistemas; d) Definir e avaliar impactos ambientais; e e) Identificar as principais fontes e atividades antrpicas promotoras de degradao ambiental e a adoo de medidas preventivas. Dessa forma, conhecer a origem da degradao ambiental, identificar e avaliar os seus impactos ambientais propiciar condies para evit-los. Tambm, permitir determinar os procedimentos e passos necessrios para a escolha dos meios mais favorveis recuperao ambiental, garantindo o seu sucesso com resultados efetivos e duradouros.

1.2. Introduo - A perturbao e a degradao do solo, resultantes das atividades antrpicas, ocorre desde tempos remotos, sendo que as causas que produziram tais distrbios foram as mais variadas: a) o desmatamento e a pecuria, causaram problemas severos de eroso durante os perodos clssicos grego e romano; b) o modelo inca, incluindo prticas conservacionistas do solo e da gua, desmoronou por questes poltico-militares, alm de outras prioridades; c) o modelo agrcola dos sumrios, esgotou-se devido salinizao dos solos decorrente da prtica de irrigao (TOY e DANIELS, 1998); d) o modelo romano, pelo desprovimento de cuidados com as florestas e sua Recuperao de reas Degradadas Ps-graduao Lato Sensu

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preocupao nica com conquistas (PERLIN, 1992); e e) vrios modelos ou sistemas agrcolas fracassaram ou foram destrudos pelas presses provocadas pelo aumento da populao (WEID, 1996). A demanda cada vez mais acentuada por terras frteis, planas e agricultveis, tem reduzido de forma acentuada as formaes vegetais, pressionando drasticamente os recursos naturais. A expanso demogrfica atingiu grandes propores nestas ltimas dcadas, como pode ser observado no Quadro 1, preocupando em termos de produo de alimentos que garantam a segurana alimentar.

QUADRO 1 - Crescimento da populao mundial Ano Populao (milhes de hab.) 1650 500 1800 900 1850 1200 1900 1600 1950 2500 1990 5250 1999 5947 2001 6134 Fonte: Banco Mundial (2000/2001) e ONU (2001). Taxa de crescimento anual (%) No disponvel 0,16 0,53 0,64 0,89 1,60 1,00 1,00

Mesmo tendo havido, recentemente, queda na taxa de crescimento, ainda impressiona o tempo necessrio, cada vez mais reduzido, para acrscimo da populao, como se pode observar no Quadro 2. QUADRO 2 - Tempo necessrio para acrescentar mais 1 bilho populao mundial Ordem Tempo necessrio (bilho) (anos) Primeiro 2.000.000 Segundo 100 Terceiro 30 Quarto 15 Quinto 11 Sexto 9 Fonte: Naes Unidas, apud BROWN (1990). Ano em que atingiu ou atingir (projeo) 1830 1930 1960 1975 1986 1995

Ainda, pode-se considerar como fator agravante, o fato deste aumento ter sido mais significativo nos pases subdesenvolvidos. A situao pode tornar-se ainda mais drstica sob determinadas situaes, como no Kuwait, por no possuir suprimento de gua e apresentar acelerado crescimento populacional, como se pode observar no Quadro 3. Somados a esse desproporcional crescimento, historicamente, o descuido do homem com os recursos naturais, como nas atividades agropecurias. Primitivamente, e em alguns casos nos dias atuais, baseava-se no extrativismo predatrio, com a derrubada de matas nativas e o uso do fogo para a implantao de atividades agrcolas. Posteriormente, quando se tornavam menos produtivas, eram direcionadas pecuria com a introduo de pastagens sem a devida utilizao de prticas conservacionistas e de manejo. Na verdade no havia preocupao com a conservao ambiental, quando eram utilizadas grandes reas para atender s suas necessidades. Com o Recuperao de reas Degradadas Ps-graduao Lato Sensu

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excesso de pastoreio, acima da capacidade de suporte (densidade mxima terica que um determinado sistema capaz de sustentar), ocorria, entre outros, a compactao do solo. Dessa forma, a produtividade caa a tal ponto que inviabilizava o funcionamento do sistema, causando a sua degradao.

QUADRO 3 - Populao, tempo necessrio para a sua duplicao e suprimento de gua Suprimentos de guas renovveis (m3/pessoa) Blgica 840 Holanda 660 Singapura 210 Kuwait 0 Arglia 730 Ruanda 820 Qunia 560 Fonte: Modificado de POSTEL (1997). Pases Populao (milhes) Tempo de duplicao da populao (anos) 347 147 51 23 27 20 19

10,0 15,2 2,8 1,4 26,0 7,7 26,2

O maior problema resultante desse procedimento era a sua contnua repetio, impactando locais diversos, reduzindo a biodiversidade, afetando drasticamente a qualidade, a quantidade e a distribuio dos recursos hdricos, com reflexos nos dias atuais. No Quadro 4 pode-se observar a drenagem de guas pluviais e a sua distribuio, influenciadas por interferncia humana que alteraram o ciclo da gua em diversas regies e pases, identificando projees dessas alteraes afetando a sua disponibilidade.

QUADRO 4 - Drenagem pluvial anual per capita de 10 pases em 1983, com projees para 2000 1983 (1.000m3) Sucia 23,4 Noruega 91,7 Japo 3,3 Unio Sovitica 16,0 Estados Unidos 10,0 China 2,8 ndia 2,1 Brasil 43,2 Nigria 3,1 Qunia 2,0 Fonte: Modificado de POSTEL (1997). Pas 2000 (1.000 m3 ) 24,3 91,7 3,1 14,1 8,8 2,3 1,6 30,2 1,8 1,0 Alteraes (%) +4 0 -6 -12 -12 -18 -24 -30 -42 -50

Estima-se, atualmente, que 120 mil Km3 de gua doce com potencial de utilizao pelo homem, encontram-se contaminados; para 2050, espera-se uma contaminao de 180 mil Km3, caso persista a poluio. O problema se agrava quando ocorre contaminao das guas subterrneas, composta por vrias substncias ou elementos, dificultando seriamente a sua recuperao. Mais de 1 bilho de pessoas tm problemas de acesso gua potvel e 2,4 bilhes no tm acesso ao saneamento bsico, aumentando os riscos de contaminao, tanto das guas de superfcie, como

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das subterrneas. Em funo dessa realidade, a diversidade global dos ecossistemas aquticos vem sendo significativamente reduzida. Mais de 20% de todas as espcies de gua doce esto ameaadas ou em perigo, devido, principalmente, ao desmatamento, com vistas abertura de novas fronteiras agropecurias, construo de barragens e urbanizao, causando diminuio do volume de gua e danos por poluio e contaminao (UNESCO, 2003). Recentemente, impactos relevantes ocorreram com a implantao de modelos de desenvolvimento acelerados, como no Cerrado brasileiro. Com a ajuda do governo, por intermdio do Conselho de Desenvolvimento da Pecuria (CONDEPE), a partir da dcada de 60, os cerrados foram transformados numa imensa pastagem. A implantao ocorria por meio de subsdios para o cultivo de plantas desbravadoras, como o arroz, transformando-se em pastagem posteriormente, e mais tarde, monocultivos de soja. Em 1995, por estimativa da EMBRAPA, dos potenciais 60 milhes de ha de pastagens nos cerrados, 80% so consideradas reas degradadas. Desse total, 41 milhes eram pastagens do gnero Brachiaria sp., formando os extensos e extensivos latifndios pecurios. Por esse motivo, a degradao dos solos um dos principais problemas ambientais atual do cerrado (SHIKI, 2003). Recentemente, o mesmo processo vem acontecendo na Regio Norte do pas. Nas ltimas dcadas, a expanso da atividade pecuria em reas de floresta foi considerada pioneira para a ocupao da Amaznia, resultado do desenvolvimento do sistema virio, das presses polticas e scioeconmicas de outras regies do pas, estimulados com os incentivos governamentais. No entanto, a expanso desordenada tem apresentado como conseqncia a degradao das pastagens, um dos fatores mais importantes que contribuem para a baixa eficincia biolgica e econmica desse sistema de uso da terra (SIMO NETO e DIAS FILHO, 1995). Estima-se, atualmente, que 62% das reas desflorestadas na regio amaznica foram destinadas a empreendimentos pecurios, onde foram implantados cerca de 25 milhes de ha de pastagens. Desse total, calcula-se que a metade est degradada ou em processo de degradao (SERRO et al., 1993). Neste contexto, o estado de Rondnia j perdeu pelo menos 21% de sua cobertura florestal original, que representa cerca de 4 milhes de ha, dos quais aproximadamente 63%, encontram-se abandonados na forma de capoeira ou foram transformadas em pastagens, que via de regra, encontram-se em diferentes estdios de degradao (TOWNSEND et al., 2001). Uma das principais conseqncias nocivas da implantao desse modelo foi o desflorestamento, resultando na reduo da biodiversidade. De acordo com o IBAMA (2003), o Brasil apresenta a maior diversidade do planeta, com aproximadamente 70% das espcies vegetais e animais, distribudas nos biomas e nas diversas formaes florestais brasileiras. Entretanto, existem algumas regies onde remanescentes da vegetao natural so mnimas ou inexistentes, interferindo no controle biolgico espontneo, em face da destruio de habitats naturais. Nesses locais, o manejo inadequado desta vegetao restante, tem provocado a extino de espcies endmicas da flora e da fauna, devido alterao da estrutura e composio vegetacional. Tambm, vm reduzindo ou mesmo levando escassez de matria-prima para a produo de madeira e do carvo vegetal; eliminando espcies medicamentosas, frutferas nativas e leguminosas com potencial forrageiro; alm

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de muitas outras espcies teis dessas formaes. De acordo com PEREIRA (1999), fragmentos que possuem rea inferior a 10 ha, apresentam at 90% de sua rea afetada pelo efeito de borda. Entre os diversos problemas advindos da retirada da cobertura florestal, alm da reduo da biodiversidade, destacam-se (PERLIN, 1992): a) o esgotamento dos estoques de lenha (fonte primria de energia para 75% da populao dos pases em desenvolvimento); b) as inundaes severas; c) a degradao acelerada do solo; d) a eroso e a desertificao gradativa; e e) a reduo da produtividade primria da terra. Esses problemas tornam-se mais graves nos pases subdesenvolvidos. Nas economias industrializadas, os problemas ambientais geralmente esto associados poluio, cujas polticas ambientais so orientadas para a reverso desse quadro, evitando o agravamento da degradao. Com essas medidas, so restaurados os padres de qualidade de gua, ar e solo anterior crise. Nos pases subdesenvolvidos, a crise ambiental est diretamente associada ao esgotamento de sua base de recursos. Por esse motivo, as suas polticas deveriam dar prioridade gesto racional dos recursos naturais. Atualmente, sabe-se que fatores naturais, como as alteraes climticas, tambm tiveram e tm influncia sobre a vegetao original. Mostram que a natureza apresenta-se em forma permanentemente evolutiva, promovendo a diversificao biolgica, em que espcies so substitudas e a dominncia alterada, num processo lento e espontneo ao longo de centenas de anos. Assim, os organismos se adaptam ao ambiente fsico e, por meio da sua ao conjunta nos ecossistemas, tambm adaptam o ambiente geoqumico de acordo com as suas necessidades biolgicas. Dessa forma, fazem com que as comunidades de organismos e seus ambientes evoluam e desenvolvam-se conjuntamente, tal como nos ecossistemas. Porm, a interveno antrpica, principalmente com o desenvolvimento tecnolgico acelerado das ltimas dcadas, tem quebrado essa dinmica natural das formaes originais, suprimindo-as e criando em seus lugares paisagens altamente modificadas, numa forma no sincronizada para o homem com o ambiente. Geralmente, essas alteraes so nocivas, reduzindo a resistncia (capacidade de um sistema se manter frente a um distrbio ou estresse) e a resilincia (potencial que o sistema tem de se regenerar ao sofrer um estresse ou distrbio) dos ecossistemas (ODUM, 1988; RESENDE et al., 1996).

1.3. O capital natural - Os recursos naturais, de acordo com BELLIA (1996), so...os elementos naturais biticos e abiticos de que dispe o homem para satisfazer suas necessidades econmicas, sociais e culturais. Ento, o capital natural compreende todos estes recursos usados pela humanidade, tais como o solo, a gua, a flora, a fauna, os minrios e o ar. Abrange tambm, os ecossistemas, tais como as pastagens, as savanas, os mangues, os esturios, os oceanos, os recifes de coral, as reas ribeirinhas, as tundras e as florestas tropicais. Estes, em todo o mundo e num ritmo sem precedentes, esto se deteriorando e tendo a sua biodiversidade reduzida, conseqncia da poluio ambiental gerada pelo atual modelo de produo e desenvolvimento agropecurio, florestal e industrial (HAWKEN et al., 1999). A humanidade herdou um acmulo de 3,8 bilhes de anos de capital natural: mantendo-se os padres atuais de uso e degradao, muito pouco h de restar at o fim do sculo XXI. Nas

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ltimas trs dcadas consumiu-se um tero dos recursos da Terra, ou seja, de sua riqueza natural. Os servios de armazenamento de gua e da regulao do ciclo de carbono, entre outros, cria condio para um meio ambiente saudvel, oferecendo no s gua e ar limpos, chuvas, produtividade ocenica, solo frtil e elasticidade das bacias fluviais, como tambm certas funes menos valorizadas, mas imprescindveis para a manuteno da sustentabilidade, tais como: a) o processamento de resduos (naturais e industriais); b) a proteo contra os extremos do clima; e c) a regenerao atmosfrica (HAWKEN et al., 1999).

1.4. As funes ambientais de ordem econmica e a ruptura do equilbrio - HURTUBIA (1980) conceitua ecossistema como um sistema aberto integrado por todos os organismos vivos, inclusive o homem, e os elementos no viventes de um setor ambiental definido no tempo e no espao, cujas propriedades globais de funcionamento (fluxo de energia e ciclagem da matria) e auto-regulao (controle) derivam das relaes entre todos os seus componentes, tanto pertencentes aos sistemas naturais, quanto aos criados ou modificados pelo Homem. O homem interage com o ambiente sua volta, modificando-o e transformando-o de acordo com suas necessidades. Os resultados dessas aes so facilmente perceptveis ao longo de toda a biosfera. Esta interferncia ocorre nos diversos nveis, agindo diferentemente sobre os componentes ambientais: ar, solo, gua e seres vivos. Os reflexos, geralmente desastrosos, podem ser observados, por exemplo, nas atividades agropecurias e florestais, particularmente quando praticadas de forma extensiva, causando profundas alteraes na paisagem, em nvel mundial. Nos sistemas urbanos, tambm, so encontradas marcas profundas da interveno humana (BASTOS e FREITAS, 1999). A Revoluo Industrial criou o modelo de capitalismo atual, cujos processos de produo consideravam como plos excludentes o homem e a natureza, com a concepo desta como fonte ilimitada de recursos sua disposio. A partir dessa poca, a capacidade produtiva humana comeou a crescer exponencialmente (o que era feito por 200 operrios em 1770, podia ser feito por apenas uma mquina de fiar da indstria britnica em 1812) e a fora de trabalho tornou-se capaz de fabricar um volume muito maior de produtos bsicos, a custos reduzidos. Esse fato elevou rapidamente o padro de vida e os salrios reais, fazendo crescer a demanda dos diversos produtos das indstrias, lanando os fundamentos do comrcio moderno (DAHLMAN, 1993; HAWKEN et al., 1999). O meio ambiente tem diversas funes. No modelo industrial padro, a criao de valor apresentada como uma seqncia linear: extrao, produo e distribuio. A natureza fornece a matria-prima ou recursos, o trabalho emprega a tecnologia para transformar tais recursos em produtos, os quais so vendidos a um consumidor, a fim de se obter lucros. Este sistema mostra a primeira funo do meio ambiente: fornecer insumos para o sistema produtivo (HAWKEN et al., 1999; JACOVINE, 2002). Estima-se, em escala mundial, algo em redor de 15 bilhes de toneladas de matria-prima sejam extradas da Terra todos os anos, sendo apenas uma parte delas renovveis (CALLISTER JUNIOR, 2000).

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Os resduos do processo de produo - como tambm, em breve, os prprios produtos - so de algum modo descartados, gerando um volume cada vez maior de resduos no sistema. Sabe-se que existe uma relao direta entre o uso dos recursos e a soma dos fluxos de resduo gerado. Se desconsiderar que a produo tambm cria estoque de capital, ento a quantidade de resduo igual quantidade de recursos naturais utilizados, ou seja, a quantidade de resduos produzidos dos prprios recursos, dos produtos e do consumidor final (BELLIA, 1996; HAWKEN et al., 1999; CALLISTER JUNIOR, 2000; JACOVINE, 2002). A razo para essa equivalncia pode ser explicada por no se poder criar ou destruir energia e matria. A extrao crescente de recursos naturais, seu transporte e uso, assim como sua substituio por resduo erode permanentemente o estoque de capital natural. Considerando a Terra como um sistema fechado, a sua nica fonte externa de energia a solar (hiptese de GAIA). Logo, possui um estoque de recursos, os quais reduzindo, reduzem tambm a expectativa de vida dos habitantes da terra, no qual economia e meio ambiente no so caracterizados por interligaes lineares, mas sim por uma relao circular (BELLIA, 1996; HAWKEN, 1999; JACOVINE, 2002). Com o contnuo aumento da populao, alteraes dos hbitos de consumo e com a evoluo da cincia, estimulados pela prpria Revoluo Industrial, ficou evidente que o nosso planeta um sistema econmico fechado em relao aos seus materiais constituintes. medida que a sociedade amadurece, redobra a conscincia de que os seus recursos so finitos e tornam-se cada vez mais escassos - conceito que ficou fortalecido durante a Conferncia de Estocolmo (Conferncia das Naes Unidas sobre o Meio Ambiente Humano), organizada em 1972 pela ONU, requerendo maior ateno para a sua utilizao e maiores conhecimentos sobre o ciclo de materiais. Alm disso, para cada ciclo de produo, deve ser fornecida energia durante cada um dos estgios. Estima-se, que nos Estados Unidos, metade da energia consumida pelas indstrias de manufatura seja gasta para a produo e a fabricao de materiais (CALLISTER JUNIOR, 2000; TUNDISI, 2003). Qualquer produto utilizado terminar no sistema ambiental: no pode ser destrudo, pode ser convertido ou dissipado. Por esse motivo, existe a necessidade de que o sistema linear seja convertido num sistema circular, em que parte dos resduos ser reciclada e incorporada ao processo produtivo (JACOVINE, 2002). Em todo sistema produtivo, para a manuteno dos sistemas vitais, ocorre o aumento da produo de energia. Caso o sistema torne-se deturpado ou desordenado como resultado de um estresse, natural ou antrpico, aumenta a entropia do sistema, ou seja, passa a existir uma maior desordem (DIAS, 2003a). Dessa forma, cria-se um obstculo fsico ou uma limitao para um sistema fechado e sustentvel. O meio ambiente tem a capacidade de converter os resduos novamente em produtos no prejudiciais ou ecologicamente teis. Esta a segunda funo do meio ambiente: assimilador de resduos. Parte destes resduos pode ser reciclado e convertido em recurso. A partir dessa realidade, surge a terceira funo do meio ambiente, como fluxo de consumo (bens e servios): fornecer utilidade diretamente na forma de prazer esttico e conforto espiritual - seja o prazer de uma viso agradvel, o patrimnio cultural, a ausncia de rudos ou os sentimentos proporcionados pelo contato com a natureza (JACOVINE, 2002).

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O fluxo circular chamado tambm de modelo de equilbrio dos materiais. A descarga de resduo em excesso, com relao capacidade de assimilao dos ecossistemas, causa danos terceira funo do ambiente, por exemplo, rios e ar poludos. Dessa forma, ficam identificadas as trs funes econmicas do meio ambiente: fornecedor de recursos, assimilador de resduo e como fonte direta de utilidade (BELLIA, 1996; JACOVINE, 2002). Quando se visualiza essas questes sob a tica econmica, a sustentabilidade para o caso de recursos naturais renovveis, requer que a sua taxa de uso no exceda sua taxa de regenerao e, tambm, a disposio de resduos em determinado compartimento ambiental no deve ultrapassar sua capacidade assimiladora. Considerando os recursos no-renovveis, preciso determinar sua taxa tima de utilizao e buscar medidas alternativas ou compensatrias reduo de seu estoque, como a substituio pelos recursos renovveis (PEARCE e TURNER, 1989). Entretanto, tem-se observado, que o mau tratamento dos recursos naturais surge porque no so conhecidos, em termos de preos, os valores para estas funes. So funes econmicas porque todas tm valor econmico positivo, caso fossem compradas ou vendidas no mercado. A inabilidade de valorar objetivamente os bens e servios ambientais uma das causas do descaso gerencial (JACOVINE, 2002; GRIFFITH, 2003). Deve-se, ento, considerar os efeitos dos custos das externalidades negativas.

1.4.1. Externalidades - Uma economia externa encontrada quando o custo marginal social de uma atividade menor que seu benefcio marginal social. Uma deseconomia externa ocorre quando o custo marginal social maior do que o benefcio marginal social. Todos estes efeitos no bem-estar de outras pessoas e empresas so denominados externalidades (BELLIA, 1996). Para CONTADOR (1981) externalidades so efeitos, favorveis (desejveis) ou desfavorveis (indesejveis), no bem-estar de outras pessoas e empresas. Tais efeitos so positivos, quando o comportamento de um indivduo ou empresa beneficia involuntariamente os outros, caso contrrio, as externalidades so negativas. Segundo esse mesmo autor, uma externalidade existe quando as relaes de produo ou utilidade de uma empresa (ou indivduo) incluem algumas variveis cujos valores so escolhidos por outros, sem levar em conta o bem-estar do afetado, e alm disto, os causadores dos efeitos no pagam nem recebem nada pela sua atividade. Assim, a proviso de bens e servios para um grupo torna possvel a outro grupo receber algum benefcio sem pagar por ele, ou incorrer em prejuzos sem a devida compensao. Isso caracteriza os danos causados pelos problemas advindos da utilizao inadequada dos recursos em regime de livre acesso, ou seja, na ausncia de limitao e de controle de acesso, por exemplo, o ar atmosfrico. Os exemplos de externalidades so os mais variados possveis, desde a admirao e prazer visual causado pelo jardim bem cuidado de um vizinho, at a perda da produo agrcola causada por poluio do ar proveniente de uma fbrica de cimento. O primeiro exemplo pode ser considerado irrelevante sob o ponto de vista da sociedade, mas o segundo, certamente no pode ser ignorado, pois houve uma perda provocada pela contaminao ambiental. Um bom exemplo o descrito por BELLIA (1996), envolvendo uma usina de peletizao de ferro (Compaia Minera del Pacfico - CMP) situada no Vale do Huasco, no Chile. At 1978, quando a fbrica comeou a operar,

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o vale era o mais importante produtor de azeitonas do Chile, colhendo mais de 6.000 toneladas (t) anuais. Hoje, a colheita mal atinge 1.000 t/ano. O carter involuntrio (incidental) uma caracterstica da externalidade. A usina citada no tem interesse nenhum em poluir o ar. A poluio apenas uma conseqncia, um subproduto desagradvel da sua atividade, com efeitos incmodos em outras pessoas (provocando custos extras com a sade) e indstrias (gerando aumento dos custos de suas atividades), ou seja, uma externalidade negativa. Os custos privados freqentemente diferem dos custos sociais porque um recurso que est sendo excessivamente usado, no propriedade da pessoa ou empresa que infringe danos aos recursos. Por esse motivo, pode-se afirmar que os custos sociais da produo so maiores do que os custos privados. Caso houvesse a incluso dos custos externos no processo decisrio, levaria a um preo maior e uma menor quantidade do produto produzido e consumido, ou seja, quando os custos econmicos no so completamente suportados pelos criadores daqueles custos, o preo reduzido demais e a quantidade produzida extremada (CONTADOR, 1981; BELLIA, 1996). Outra caracterstica importante das externalidades que estas resultam da definio imprecisa do direito de propriedade. Uma fbrica polui a atmosfera, provoca distrbios respiratrios nas pessoas e prejudica a vida animal e vegetal, porque no existem direitos de propriedade sobre o ar puro, ou seja, o ar um recurso de propriedade comum e de livre acesso. Dessa forma, os direitos de propriedade so indefinidos ou inexistentes, e sempre que assim for, os custos sociais sero diferentes dos custos privados. A falta de valor de mercado tambm caracterstica das externalidades. Existindo direito de propriedade, envolve uma contratao entre os proprietrios e os utilizadores potenciais. Sempre que a contratao e execuo de direitos de propriedade forem relativamente baratas, os custos sociais e os custos privados tendero a ser iguais. Essa a razo pela qual as externalidades constituem problemas apenas na rea de atividades da nossa sociedade que afetam bens de livre acesso e de propriedade comum (entendida como sistema de apropriao comum), quais sejam, os bens ambientais - de espaos e recursos (CONTADOR, 1981; BELLIA, 1996; DIEGUES, 1997). Do ponto de vista econmico, na presena de externalidades, os mercados no distribuem os recursos de forma eficiente, porque normalmente no so registrados os custos de negociao ou de transao. Um empreendedor no recebendo pelas externalidades positivas que produz, no ir atender quantidade necessria da qual a sociedade deseja, enquanto que aquele que produz externalidades negativas, no sendo punido, produzir mais do que a sociedade suporta. A principal preocupao com o problema de externalidade, mesmo considerando um mercado de competio perfeito, caso no seja tratada, ela impedir que a mxima eficincia econmica do ponto de vista social seja alcanada. Assim, na presena de externalidades, sempre haver divergncia entre valores scio-ambientais e os interesses privados (REZENDE, s.d.). Apesar das anlises econmicas tradicionalmente ressaltarem as variaes mensurveis referentes ao aumento das rendas, no tm sido dedicadas avaliaes dos custos e dos benefcios externos referentes ao meio ambiente, em face da sua considervel dificuldade (poltica, terica e tcnica) que permitam a internalizao dos custos e benefcios at agora considerados externos.

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Caso houvesse essa internalizao, auxiliaria os processos de deciso que afetam o meio ambiente e, conseqentemente, toda a sociedade.

1.4.2. Custos privados e sociais - As externalidades originam-se de trs fontes (CONTADOR, 1981): Deficincia dos direitos de propriedade - quando atinge um pequeno nmero de pessoas, as externalidades se corrigidas, via subsdio ou taxao, podem permitir um ganho social lquido; Avano tcnico que gera retornos crescentes de escala e custos mdios decrescentes no longo prazo - o mecanismo de mercado incapaz de eliminar tais externalidades tecnolgicas por duas razes: 1) porque os custos mdios decrescentes tendem a propiciar a formao de monoplios, com conseqente divergncia entre preos e custos marginais (custo de produzir uma unidade extra do produto) o que implica em taxao aos consumidores; e 2) mesmo que os custos mdios decrescentes no desemboquem em monoplios, ainda assim o mecanismo de mercado no assegura o timo social. Custos mdios decrescentes implicam custos marginais inferiores ao mdio. Para eficincia alocativa, preciso que o preo e o custo marginal se igualem e, em tal situao, haver um prejuzo lquido para cada produtor; No caso de bens pblicos - o mecanismo de mercado no permite a formao de preos competitivos. Na verdade, o mecanismo de mercado no funciona perfeitamente no caso de bens pblicos devido a sua natureza, e no porque ocasionem externalidades. necessrio ateno para identificar corretamente uma externalidade, pois muitos efeitos em terceiros so erroneamente assinalados na literatura como externalidades, sendo na verdade de formao no tima de preos. Caso o sistema de preos tenha condies de eliminar o fenmeno, a externalidade no mais existe. Uma forma de eliminar uma externalidade por meio de acordos voluntrios, como pode ser verificado no exemplo da Figura 1, em que as serrarias diminuiriam a quantidade de corte em troca de parte do ganho social (CONTADOR, 1981).

FIGURA 1 - Comparao entre custos privados (serrarias) e os custos sociais (reinvindicados pela sociedade que desfruta dos benefcios proporcionados pelas florestas) da produo de madeira. Fonte: OLIVEIRA (1993).

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Verifica-se na Figura 1, que os clculos internos das empresas que exploram madeira, por exemplo, de florestas tropicais (serrarias), determinam o nvel de produo de madeira Q. A quantidade Q e o preo P do produto (madeira) so fixados pela interseo das curvas de demanda e oferta, determinadas pelo livre funcionamento do mercado. Porm, o custo marginal social, que inclui os efeitos (externalidades) da destruio das florestas tropicais, ultrapassa o custo marginal privado das empresas e, portanto, o ponto timo de produo do ponto de vista da sociedade seria o nvel Q. Sem a devida considerao do excesso dos custos sociais sobre os custos privados, h uma superproduo de madeira igual diferena entre as quantidades Q e Q. A rea sombreada indica o valor total do prejuzo social, em virtude da superproduo de madeira (SCHETTINO et al., 2002). Atualmente, em virtude dos novos conceitos de vida, os modelos de desenvolvimento tm sido repensados. Deve-se levar em conta o desenvolvimento humano e as condies ambientais, alm do aspecto econmico. Como e de que forma os recursos naturais sero utilizados, ou seja, as externalidades do desenvolvimento, devem ser avaliadas.

1.4.3. Consideraes - Como principais conseqncias da Revoluo Industrial, destacam-se: a) a alterao nos padres de consumo e nos hbitos da populao; b) a severa interferncia nos ecossistemas, pelo avano da agropecuria para suprir a demanda por alimentos, em face do maior crescimento da populao; e c) a viso produtiva que deixou de ser rural, sendo direcionada para o setor urbano, alterando as relaes de trabalho e os valores culturais. No meio urbano, provocou um inchao populacional, transformando-se em fonte de degradao humana e ambiental. Politicamente, provocou profundas alteraes. A poltica agrcola brasileira conseqncia desse modelo, conhecido como Revoluo Verde, que produziu o xodo rural e a concentrao de terras. A extenso rural, recentemente, mediante ao seu premeditado sucateamento, no possui a dinmica exigida para atender demanda de servios e promover a necessria ligao pesquisador-produtor. Esses aspectos sero discutidos, considerando apenas, a fase mais recente, a partir da dcada de 60 (FRIEDMAN, 1962; HOMEM DE MELO, 1985). As economias, micro e macro, nacionais e mundiais, estatais e privadas, podem sobreviver por longos perodos de tempo, em tais estados de desequilbrio. Porm, para atingir o desenvolvimento sustentvel, torna-se importante estabelecer algumas condies para a

compatibilidade dessas economias e seu meio ambiente, posto que essas perdas envolvem custos sociais e no devem ser ignoradas na avaliao de projetos (JACOVINE, 2002). Isso porque a imprevisibilidade das alteraes impostas aos ecossistemas acima da sua capacidade de suporte, considerando a interdependncia entre economia e meio ambiente, a falta de cuidados na apropriao desses recursos naturais podem alterar a sua qualidade, gerando impactos negativos e deseconomias. Deve-se reconhecer o meio ambiente como um insumo escasso, portanto com custo alternativo que no seja nulo (BELLIA, 1996).

1.5. Fatores de desequilbrio - Para um perfeito equilbrio no funcionamento de qualquer sistema ou atividade so exigidas certas condies bsicas. Entretanto, cabe considerar, que este equilbrio relativo, posto serem dinmicos. Assim, interferncias externas podem agir negativamente nos

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sistemas, alterando-os e promovendo a degradao ambiental e humana. Considerando o aumento da populao e o modelo de produo, criados e desenvolvidos pela Revoluo Industrial, como fatores de desequilbrio, outros sero agora relacionados, cuja postura tambm tm contribudo para estes desarranjos.

1.5.1. Poltica Agrcola - No Brasil, a Revoluo Industrial teve seus reflexos mais drsticos no campo, a partir da dcada de 30. Como conseqncia da crise de 1929 e a longa depresso que se seguiu, soma-se a Revoluo de 1930, que ocasionou a perda da hegemonia poltica pela burguesia cafeeira em favor da classe industrial ascendente, uma parte do colonato pde comprar lotes de fazendas colocadas venda por fazendeiros falidos. Porm, paralelamente, havia formado um imenso excedente populacional, que logo passou a exercer forte presso para ter acesso terra. No incio da dcada de 60, ocorre acentuada acelerao desse processo, agravada pelo movimento das ligas camponesas nordestinas e dos movimentos de sem-terra sulistas. Estes lutavam por reforma agrria e contestavam o modelo implementado pela Revoluo Verde (VEIGA, 1995; ALMEIDA, 2003). Nas dcadas de 50 e 60, acentua-se a crise do setor rural, conseqncia do processo de industrializao do Pas, dentro da estratgia de substituio de importaes. O modelo de produo familiar era prejudicado, principalmente, devido (VEIGA, 1995): a) falta de subsdio e crdito, contrapondo-se ao excesso de privilgios para o setor industrial urbano, para o qual os recursos provenientes da agricultura eram canalizados; b) confisco cambial, cmbio sobrevalorizado e outros impostos indiretos; e c) queda dos preos dos produtos agrcolas, manipulados intencionalmente para controle das taxas de inflao, refletindo na queda de preos dos produtos da cesta bsica; inclusive, perpetuando-se at aos dias atuais, como pode ser observado na Figura 2.

FIGURA 2 - ndices dos preos reais dos produtos da cesta bsica - set./1975 a jul./2000. Fonte: ALVES, 2001. Por esses motivos, a partir da dcada de 60, os grandes proprietrios de terra, passaram a investir na indstria, relegando s atividades agrcolas, um papel secundrio. Esse fato pode ser justificado pelo papel imposto ao setor agrcola: fornecer capital e divisas para a expanso do setor industrial. Ao mesmo tempo, ainda predominavam na agricultura brasileira, juntamente com os latifndios improdutivos, com terras frteis, na mo de um nmero reduzido de grandes proprietrios, as grandes propriedades agrcolas voltadas para a exportao; entretanto, apresentando baixo nvel

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de aproveitamento do solo e de produtividade. Em sua grande maioria, na dcada de 60, a populao rural era formada de lavradores sem-terra, submetidos relaes de trabalho espoliativas. A poltica agrcola foi, e ainda , direcionada por grupos de interesses, que dominam os processos de financiamento rural desde a pesquisa concesso do crdito. A reforma agrria iniciada nesse perodo no se consolidou, efetivamente, por essa questo principal: os grandes industriais, tambm eram os donos de terra (HOMEM DE MELO, 1985; DAHLMAN, 1993; CARMO, 1998; COELHO, 1998; LACERDA et al., 2003). Assim, verifica-se nesse mesmo perodo, a exigncia de excessivas funes e contribuies pelo Governo, e tambm pela sociedade, do setor agropecurio brasileiro, particularmente nas dcadas de 60 a 80, tais como: a) aumentar a produo e a produtividade; b) ofertar alimentos e matrias-primas a preos decrescentes; c) gerar excedentes para exportao ampliando a disponibilidade de divisas; d) transferir mo-de-obra para outros setores da economia; e) fornecer recursos para esses setores; e f) expandir o mercado interno por meio da compra de produtos e bens industrializados (HOMEM DE MELO, 1985; ALVES e CONTINI, 1987). Nota-se nessas funes a) o privilgio destinado ao setor industrial; b) a despreocupao com a distribuio demogrfica brasileira - privilegiando a metropolizao; e c) a ausncia de preocupao com as conseqncias ambientais que acompanhariam tais metas. Resumindo, a meta era o desenvolvimento econmico baseado no aumento do Produto Nacional Bruto (PIB), per capita, como sinnimo de desenvolvimento econmico, o qual sob esse ponto de vista, raramente contempla a sustentabilidade (RESENDE et al., 1996). Por esses motivos, o modelo de produo familiar, ficou desamparado. Como ltimo recurso, a mo-de-obra abandonou o campo buscando emprego nas reas urbanas. As conseqncias foram o aumento do xodo rural e dos preos dos produtos da cesta bsica, sem que tal aumento fosse em benefcio do produtor. O direcionamento da pesquisa pblica nesse perodo, tambm confirma o privilgio ao modelo convencional ou agroqumico (VEIGA, 1995; WEID, 1996).

4.1.5.2. O modelo de pesquisa - A expanso da agricultura no Brasil no perodo de 1950 a 1980 ocorreu s custas do avano contnuo da fronteira agrcola e com a introduo de tcnicas de produo intensivas em capital, propostas pelo pacote tecnolgico da Revoluo Verde, brao da Revoluo Industrial no campo. A rea dos estabelecimentos agrcolas praticamente dobrou nesse perodo, com um aumento de 1,67 milho de Km2. Entretanto, persistiram os problemas de concentrao da propriedade, as desigualdades e a ausncia de mobilidade social do setor rural. Nesse perodo, consolidou-se o sistema de pesquisas especficas para as condies tropicais, tendo como resultados ganhos significativos de produtividade. Apesar dessa situao, para culturas de mercado interno, como arroz, feijo e mandioca, tpicas do modelo de produo familiar, constatou-se a estagnao ou o declnio da produo. Esse processo pode ser explicado, em parte, pelo modelo de pesquisa utilizado no Brasil naquele perodo (RELATRIO...,1991). Em funo da organizao histrica da agropecuria e plantaes florestais brasileiras serem dominadas por grandes empresas e, ou, grupos, que detm o poder poltico e econmico, temse atualmente, como principais demandantes das tecnologias produzidas pelo setor pblico voltado

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para estas atividades, os grandes proprietrios agropecurios/florestais e as indstrias produtoras de insumos e processadoras de produtos agropecurios. Para beneficiar os pequenos produtores, como aqueles do modelo de produo familiar, devero ocorrer mudanas na estrutura poltica, onde o legislativo tenha maior poder de deciso. Porm, na sociedade capitalista moderna, que uma sociedade estratificada, essa transformao se d no contexto dos interesses dos grupos sociais que dirigem uma forma de produo fundamentada no progresso tcnico. Assim sendo, tanto o sistema produtivo institudo, como a tecnologia e as adaptaes ambientais so orientadas para responder aos fins da acumulao de bens e capital. Na verdade, as pesquisas destinadas ao modelo familiar, que agride menos o meio ambiente quando bem orientado e conduzido, podendo inclusive, promover a recuperao ambiental e auxiliar no controle do xodo rural, todavia, recebem poucos recursos e ateno dos rgos de pesquisa pblicos.

1.5.3. O xodo rural e a urbanizao - A ausncia de definio de uma poltica agrcola focada no longo prazo, fortalecida pelo direcionamento da pesquisa e pela ausncia da extenso na difuso tecnolgica, propiciou uma acelerada onda migratria do campo para os meios urbanos durante as dcadas 70 e 80. No Brasil, est ligado a duas situaes preocupantes e carentes de solues alternativas (RESENDE et al., 1996): a) A grande transferncia de recursos humanos do meio rural para as zonas urbanas (Quadro 5); QUADRO 5 - Distribuio da populao brasileira em 1970, 1980 e 1990 Ano 1980 Milhes de habitantes (%) Rural 41,0 (44) 38,6 (32) Urbana 52,1 (56) 80,4 (68) Total 93,1 (100) 119,0 (100) Fonte: Anurios estatsticos do IBGE, em RESENDE et al., 1996. 1970 Populao

1990 37,6 (25) 112,8 (75) 150,4 (100)

Do ponto de vista econmico, o principal problema verificado a pssima distribuio de renda. Apesar do PIB ter-se elevado significativamente, de US$ 194 bilhes, em 1964, para US$ 324 bilhes em 1988, esse crescimento no veio acompanhado de desenvolvimento humano (NEDER, 1995); e b) A grande concentrao de renda verificada nas ltimas dcadas (Quadro 6).

QUADRO 6 - Participao da populao na renda nacional em 1960, 1970 e 1980 1970 (%) 20% mais pobres 3,9 3,4 50% mais pobres 17,4 14,9 10% mais ricos 39,6 46,7 5% mais ricos 28,3 34,1 1% mais rico 11,9 14,7 Fonte: Anurios estatsticos do IBGE, em RESENDE et al., 1996. Camadas da populao 1960 1980 2,8 12,6 50,9 37,9 16,9

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No sculo passado, cerca de 65% da populao rural brasileira transferiu-se para o setor urbano. O Brasil, tipicamente agrcola, mudou drasticamente num intervalo de tempo relativamente curto, sem que as cidades tivessem tempo de se estruturarem para absorver esta populao. Na verdade, os vrios projetos de desenvolvimento e suas respectivas polticas econmicas foram implementados no perodo de 1930 ao final da dcada de 70, transformando profundamente a estrutura produtiva do pas. Ao final da dcada de 80, cerca de 50 milhes de habitantes, aproximadamente 35% da populao, residiam em aglomerados urbanos com mais de 250 mil habitantes (NEDER, 1995; LACERDA et al., 2003). A sociedade brasileira levou menos de 50 anos para transformar-se de um pas agrrio, exportador de produtos primrios, em uma sociedade de base urbano-industrial, em que a exportao de produtos industrializados corresponde a mais da metade das exportaes totais (LACERDA et al., 2003). O efeito indireto foi o aumento do nmero de consumidores que no so produtores. A grande maioria dos migrantes era produtora de alimentos de subsistncia, com um pequeno excedente destinado ao mercado; a agricultura moderna era voltada para a exportao ou produtos agroindustriais no alimentares. Como conseqncia, houve uma relativa queda na oferta de alimentos com efeitos imediatos no custo de vida. Devido s precrias condies da infra-estrutura bsica urbana, proliferaram favelas em beiras de rio, com riscos de alagamento e, nas encostas, com riscos de desabamento, alm das condies sanitrias e de habitao subumanas. Outra conseqncia, a excluso da mo-de-obra, deixando uma camada de 20 a 30% no desemprego ou subemprego, provocando a reduo no consumo de alimentos e o aumento da subnutrio dessa populao migrante, aumentando significativamente a criminalidade (WEID, 1996; LACERDA et al., 2003). Estimavam-se, em 1995, cerca de 500.000 casas abandonadas na zona rural (LEITE, 1996). Outro srio problema criado por esse modelo foi o processo de minifundizao, como pode ser observado no Quadro 7, que via de regra conduz pauperizao e degradao, perpetuando-se o ciclo que acelera o xodo rural e ampliam-se os problemas urbanos.

QUADRO 7 - Processo de minifundizao no Brasil no perodo de 1960 a 1985 Nmero de propriedades (milhes) 1960 1,5 1980 2,6 1985 3,1 Fonte: Dados da pesquisa compilados do RELATRIO...(1991). Ano rea mdia (hectares) 4,0 3,5 3,1

Por esse motivo, entre outros fatores de ordem macroeconmica, associados ao rpido crescimento da agricultura, trouxe ao lado do agravamento das crises sociais, problemas ecolgicos e ambientais. Para o RELATRIO...(1991), problemas que at ento no haviam sido observados.

1.5.4. Extenso rural - acesso informao e ao livre mercado -

A extenso rural tem suas

razes nos Estados Unidos da Amrica quando da passagem de uma estrutura agrcola escravista para uma estrutura mercantil e capitalista. Formalizada pelo governo em 1914 como Servio Cooperativo de Extenso Rural, tinha por finalidade permitir populao rural americana, ausente Recuperao de reas Degradadas Ps-graduao Lato Sensu

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das faculdades agrcolas, o acesso a conhecimentos teis e prticos relacionados agricultura, pecuria e economia domstica para a adoo de novos hbitos e atitudes no desenvolvimento de suas atividades produtivas (OLIVEIRA, 1988). Terminada a Segunda Grande Guerra, o mundo passou a viver um processo de bipolarizao poltico-ideolgica, tendo de um lado, o sistema capitalista de produo (representado como principal potncia o Estados Unidos), e de outro, o socialismo (com a Unio das Repblicas Socialistas Soviticas). O contexto de guerra no declarada, com o Brasil estreitando suas relaes polticas e comerciais com os Estados Unidos, foi responsvel pela implementao de medidas e programas no sentido de no permitir, por todos os meios possveis, que o pas demorando a declarar guerra aos pases do Eixo, mudasse seu curso, tornando-se mais independente em relao aos Estados Unidos. Nesse processo de aproximao, surgiriam no Pas as Associaes de Crdito e Assistncia Rural (ACAR), que faziam extenso rural, ou seja, levavam novas tcnicas ao campo, mas no prestavam assistncia tcnica, que daria suporte s inovaes introduzidas (MAGALDI, 2003). Em Minas Gerais, a ACAR foi fundada em 1948 e, como nos Estados Unidos, apostava na juventude rural para tentar alcanar seus objetivos. O trabalho comeou com a conscientizao dos jovens agricultores, sustentados por quatro princpios bsicos, os 4S: saber, sentir, servir e sade. Com momentos de favorecimento, a ACAR foi-se desenvolvendo