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HISTÓRIA DA ESCRITA

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    Universidade do Estado do Rio de Janeiro Faculdade de Formao de Professores

    Filosofia para crianas: um caminho para o resgate de valores na escola e na famlia?

    Mariethe de Azevedo Martins

    Orientadora: Prof.Dr. Helena Amaral da Fontoura.

    So Gonalo 2010

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    CATALOGAO NA FONTE UERJ/REDE SIRIUS/CEH/D

    Filosofia para crianas: um caminho para o resgate de valores na escola e na famlia?

    M386 Martins, Mariethe de Azevedo. Filosofia para crianas: um caminho para o resgate de valores na escola e na

    famlia? / Mariethe de Azevedo Martins. 2010. 61f.

    Orientador: Helena Amaral Fontoura. Monografia (Licenciatura em Pedagogia) - Universidade do Estado do Rio

    de Janeiro, Faculdade de Formao de Professores.

    1. Crianas e filosofia. 2. Filosofia Estudo e ensino (Ensino fundamental). 3. Cidadania. I. Fontoura, Helena Amaral. II. Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Faculdade de Formao de Professores.

    CDU 372.81

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    Monografia apresentada como requisito parcial para obteno do ttulo de graduado em Pedagogia, ao Departamento de Educao da Faculdade de Formao de Professores da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.

    Orientadora: Prof.Dr. Helena Amaral Fontoura

    So Gonalo

    2010

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    Aprovada em _______________________________________________

    Banca Examinadora

    _______________________________________

    Prof.Dr. Helena Amaral da Fontoura.

    _______________________________________

    Prof.Dr. Luiz Fernando Conde Sangenis

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    AGRADECIMENTOS

    Em primeiro lugar agradeo a Deus por iluminar o meu caminho dando-me foras para

    concluso deste trabalho.

    Aos meus familiares e ao meu filho pelo apoio que me deram.

    A todos os professores e s crianas que participaram em minha pesquisa de campo e ao grupo

    de crianas da igreja que foram a mola mestra desta monografia.

    E principalmente orientadora Helena que com pacincia e dedicao me incentivou a buscar

    caminhos para a elaborao deste trabalho.

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    A Ignez de Azevedo Martins (In Memoriam)

    No existe coisa mais bonita, do que criana, renda e fita.

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    SUMRIO

    INTRODUO 7

    CAPTULO I: A ORIGEM DA FILOSOFIA PARA CRIANA 1.1 . Um breve histrico sobre a filosofia no Brasil 10 1.2 . Origem histrica da filosofia para Criana 12 1.3 . Filosofia para Criana no Brasil 15 1.4 . Fundamentao Terica 17 1.4.1 . Lipman e Scrates 19 1.4.2 .Lipman e Peirce 20

    1.4.3 .Lipmam e Vygotsky 22 1.4.4 .Lipman e Dewey 23

    1.4.5 .O pensar Superior 25

    CAPTULO II: A FILOSOFIA E A CRIANA NA ESCOLA 2.1. O currculo 28

    2.2. Os manuais 29 2.3. As habilidades Cognitivas 30 2.4. Habilidade de raciocnio 31 2.5. Comunidade de investigao 33 2.6. Materiais didticos do Programa Matthew Lipman 35 2.7. A criao do IAPC e ICPIC 37 2.8. As entidades criadas no Brasil e Suas dissidncias 38

    CAPTULO III: OBSERVAO DA PRTICA 3.1. Uma observao da prtica de filosofia para Crianas: Pesquisa de Campo em uma Escola Pblica de Duque de Caxias. 41 Consideraes Finais 54 Referncias Bibliogrficas 56 Anexos 57

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    INTRODUO:

    Esta pesquisa originou-se atravs de um olhar para o passado, quando em 1994 fiz um curso de Pedagogia Crist para me capacitar como docente de Escola dominical da Igreja Evanglica onde lecionava para crianas de 06 a12 anos. O curso durou 10 meses e possibilitou um grande aprendizado. Os ensinamentos foram colocados em prticas nas salas de aulas da Igreja, multiplicando os conhecimentos. Muitas vezes no decorrer do perodo das aulas observava as crianas na sua maneira de pensar o mundo em sua volta e da relao deles com o outro e de suas dificuldades para expressar seus pensamentos, apesar de serem criativas e muito ativas. Ao conversar com suas mes, fui percebendo a deficincia que existia na formao educacional e a falta de preparo que existia nestas famlias para lidarem com esta situao. Ao cursar a disciplina Filosofia da Educao no curso de Pedagogia, fiquei intrigada com o assunto levantado pelo professor sobre o pensar reflexivo das crianas que me levou diretamente as observaes feitas em sala de aula, no perodo que estava com elas na Igreja. Este assunto me motivou e fiz dele o meu tema para minha monografia. Os principais questionamentos deste trabalho so sobre as relaes entre criana, famlia e escola, sobre como as crianas esto sendo preparadas e direcionadas nesta sociedade neoliberal, onde os pais em busca da sobrevivncia responsabilizam a escola pela educao de seus filhos e a escola por sua vez atravs de um perfil neoliberal que analisa a escola como um todo no d condies ao professor de se reciclar. Neste contexto questiono o que est acontecendo com o pensamento reflexivo de nossas crianas e como os valores ticos, morais e de cidadania esto sendo estudados em sala de aula do ensino fundamental.

    Investigo a possibilidade da aplicao de aulas de filosofia, com material didtico que leve as crianas a refletirem sobre estes valores em um ambiente de sala de aula investigatrio.

    Neste trabalho iremos percorrer caminhos que nos levam filosofia para criana, um projeto que teve sua origem nos EUA com o Professor de filosofia Matthew Lipmam e que foi implementado em diversos pases inclusive aqui no Brasil. Como esta nova viso da educao que est movimentando as escolas que aderiram a este projeto? Mostrando aos seus alunos valores que implicam diretamente a sua formao de cidado.

    No primeiro captulo, iremos fazer um breve histrico da filosofia no Brasil, a origem histrica da filosofia para criana, bem como sua chegada ao pas, e o referencial terico.

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    No segundo captulo falaremos das entidades que trabalham em prol da propagao deste trabalho no Brasil, com o objetivo de formar alunos reflexivos. Iremos conhecer o material didtico e a metodologia do programa de Filosofia para Criana do Prof. Matthew Lipman aplicada por estas entidades e as dissidncias.

    No terceiro captulo apresentaremos a transcrio das observaes colhidas no trabalho de campo, analisando a luz dos aspectos tericos, as crticas deste programa. Finalizaremos o trabalho com nossas consideraes.

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    Oito Anos Adriana Calcanhotto

    Composio: Dunga / Paula Toller

    Por que voc flamengo E meu pai botafogo? O que significa "impvido colosso"? Por que os ossos doem Enquanto a gente dorme? Por que os dentes caem? Por onde os filhos saem? Por que os dedos murcham Quando estou no banho? Por que as ruas enchem Quando est chovendo? Quanto mil trilhes Vezes infinito? Quem Jesus Cristo? Onde esto meus primos? Well, well, well Gabriel... Well, Well, Well, Well... Por que o fogo queima? Por que a lua branca? Por que a terra roda? Por que deitar agora? Por que as cobras matam? Por que o vidro embaa? Por que voc se pinta? Por que o tempo passa? Por que que a gente espirra? Por que as unhas crescem? Por que o sangue corre? Por que que a gente morre? Do que feita a nuvem? Do que feita a neve? Como que se escreve Re...vi...llon Well, Well, Well Gabriel

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    CAPTULO I

    1.1- UM BREVE HISTRICO SOBRE A FILOSOFIA NO BRASIL

    A presena da filosofia no ensino brasileiro e no ensino mdio se fazendo notar desde o sculo XVI com a chegada dos jesutas e sempre esteve ligada escola. A companhia de Jesus, surgida em 1534 por obra de Incio de Loyola, funda em 1553 o Colgio da Ordem Jesutica em Salvador, o Colgio Bahia, encarregado do ensino secundrio e onde aparecer em 1572 o primeiro curso de filosofia. Aps alguns sculos tumultuados para filosofia aqui no Brasil em 1826, a Comisso de Instruo Pblica j havia elaborado um Projeto de Reforma de ensino que dividiria as escolas em 04 graus, onde a Filosofia ficaria encaixada em uma das cadeiras do ginsio. Neste projeto a Filosofia se dividiria em ensinar a ideologia ou a anlise completa das faculdades e operaes do entendimento. A lgica ou a arte de pensar e raciocinar, a cosmologia e os princpios da moral, seria chamado de Filosofia Racional e Moral. A filosofia especulativa ensinaria a gramtica geral ou a arte de falar a lngua portuguesa e a retrica ou a arte de escrever. At 1837, vrias reformas educacionais se sucederam, porm a filosofia no fez parte desta reforma no estando presente nas grades curriculares. De 1850 a 1951 foram contabilizadas dezoito reformas de ensino no qual pelo menos cinco delas a filosofia foi omitida. Em 1961 com a Lei 4024, a primeira lei de diretrizes e bases para a Educao, atribui ao Conselho Federal de Educao a indicao de disciplinas complementares. A filosofia ir pertencer a este grupo e poder ou no ser contemplada, dependendo das foras polticas no Conselho. A partir de 1964 com a criao de disciplinas como Moral e Cvica para o E.M. e Estudos de Problemas Brasileiros nos cursos superiores desencadeou a retirada do ensino de filosofia nas escolas.

    Em 1971 foi criada a lei 5692 que probe introduzir nos currculos de E. M. novas disciplinas e como a filosofia estava ausente da maioria das escolas, ela deixa de ser contemplada no ensino do 2 grau. Surgem os ensinos de 1 e 2 graus. O parecer 5692/72 do C. F.E., estabelece que a filosofia passe a ser facultativa nos currculos, ficando a cargo das escolas de E. M. introduzi-la ou no. O parecer 5692 foi elaborado com o intuito de priorizar a formao bsica profissionalizante. O acordo MEC/USAID, apoio tcnico internacional ao regime militar, deu-

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    se entre o MEC e a Agncia Norte Americana para o Desenvolvimento Internacional exige do Brasil a adaptao ao novo modelo de desenvolvimento econmico. Este acordo impe uma necessidade da reforma curricular que contemplasse a modernizao, o carter profissionalizante (qualificao de mo de obra para a solidificao das multinacionais no pas), valorizando a rea tecnolgica. Sendo assim o modelo tecnicista foi implantado nos currculos de E.M. e mais uma vez a filosofia sai do currculo. Em 1976 fundada na PUC- RJ a SEAF (Sociedade de Estudos e Atividades Filosficas) acionando um movimento a favor do retorno da Filosofia nos currculos. Em 1982 o Conselho Federal de Educao (CFE) edita o parecer 7.044/82 onde a filosofia passa a fazer do elenco de disciplinas do ncleo diversificado, cabendo ao C.E.E. a implantao. A LDB 9.394/96, artigo 36, parag.1, INCISO III est escrito que ao final do E.M. o estudante deve ser capaz de demonstrar o domnio dos conhecimentos de filosofia e sociologia necessrios ao exerccio da cidadania. Esta lei sintetizou a poltica educacional do governo de Fernando Henrique Cardoso que tinha como alvo principal o interesse do mercado, colocando a educao como a grande estratgica para o alvio da pobreza. Em 1983 o Departamento de filosofia da USP escreve carta ao ministro Paulo de Tarso Santos reivindicando a volta da disciplina de Filosofia no Ensino Mdio Em 2006 aps muita luta e dificuldade de todos aqueles que trabalharam arduamente para a incluso da filosofia no currculo do E. M. torna-se obrigatoriedade em todo territrio nacional o ensino de Filosofia e Sociologia, com prazo de implantao at o final de 2007. Neste processo investigatrio, senti a necessidade de expor este histrico acima, pois eu vivi o processo de profissionalizao do E. M. e atravs dos dados acima pude compreender algo que me incomodava h muito tempo, que era a falta de filosofia na escola. Koman (2002) aponta que a situao do ensino mdio da filosofia no Brasil j abrange hoje vrias reas geogrficas, mas isso vem acontecendo aos poucos. Conforme descrito acima a disciplina de filosofia no ensino mdio, tornou-se obrigatria. No ensino superior o nmero de trabalhos produzidos de dissertaes, mestrado como tambm as teses de doutorado sobre o ensino de filosofia vm tomando o seu lugar nas universidades. No ensino fundamental existe um movimento que no para de crescer, que o ensino de filosofia para criana demonstrando uma posio de grande relevncia na cultura brasileira comparando-se com dcadas anteriores, demonstrando que a militncia do passado no foi em vo. Kohan (2002) cita que a situao da filosofia nas instituies est longe de ser vista com conformismo ou satisfao, uma vez que o objetivo maior a ser alcanado no a ocupao de um espao, mas sim da importncia de compreenso do papel que a mesma faz neste espao, ou

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    seja, o tipo de filosofia que se pratica, sua relao com outras reas do saber, com as instituies da vida econmica, social e poltica do pas.

    1.2- ORIGEM HISTRICA DA FILOSOFIA PARA CRIANA

    Matthew Lipman um professor americano nascido em 1923, formado em Filosofia na Universidade de Stanford (Califrnia) em 1948, obtendo ttulo de doutorado na universidade de Columbia (Nova York) em 1954. Matthew ensinou durante dezoito anos lgica na Universidade de Columbia e vinte e dois anos na universidade City, ambas em Nova York Estados Unidos. Desde 1972 professor na universidade de Montclair (Nova Jersey Estados Unidos) onde Distinguished Universty Scholar.

    No final dos anos sessenta Lipman era professor de Introduo Lgica e de Teoria do Conhecimento na Universidade de Columbia, Nova York nos Estados Unidos. Observando as revoltas estudantis de 1968, na qual Columbia era uma das universidades que mais militou nestas manifestaes, se preocupou com o que estava acontecendo.

    Ao ver os esforos desajeitados das Universidades em se reavaliar, no pde deixar de concluir que os problemas de Columbia no podiam ser resolvidos no quadro dessa instituio. Estudantes e professores, todos tinham sado da mesma matriz da escola primria e secundria. Concluiu que se no tnhamos recebido uma Educao boa, muito provavelmente tnhamos chegado a compartilhar as mesmas idias errneas que nos levariam a estropiar nossa educao posterior em feliz conluio mtuo. (1998, p. 21-22)

    Lipman comeou a perceber que seus alunos tinham falhas nos raciocnios, eles mostravam muita capacidade para memorizar, repetir tudo o que lhe ensinavam, porm o resultado no era timo, muito menos na hora de aplic-los, conheciam as regras da lgica expunham corretamente nas provas, porm tinham dificuldades para reconhec-los e utiliz-los na vida cotidiana.

    Segundo Kohan e Wuensch (1998), o contacto com a filosofia e a lgica nos EUA, s era possvel na Universidade, a filosofia tem, historicamente, uma fraca presena nas instituies educativas - ainda atualmente no faz parte dos currculos escolares em nenhum dos seus nveis. (p. 85).

    Um outro momento importante para a criao deste projeto foi a oportunidade que Lipman teve ao observar as dificuldades de um professor de crianas com deficincia neurolgica aprender a ler. Lipman sugeriu ao professor que inclusse nas atividades das

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    crianas, exerccios para tirar inferncias lgicas. Passado algum tempo o professor comunicou-lhe que esta prtica ajudou muito com o aprendizado das crianas.

    Lipman confirmou o seu palpite de que as crianas podiam aproveitar a instruo no raciocnio, contando que recebessem contribuies da Filosofia, especialmente das suas reas de lgica, tica, esttica e epistemologia. Era claro que se podiam ajudar as crianas a pensar com mais clareza, j que lhe parecia que elas pensavam to naturalmente como falavam e respiravam. Porm, a questo radicava em: como conseguir que pensassem bem? As falhas nos raciocnios dos seus alunos, os comportamentos e o trabalho de professores com crianas incapacitadas neurologicamente foram as causas, entre outras, que levaram o pioneiro a pensar que os jovens no s precisavam de estudos sobre a Lgica e Filosofia, como o contacto com ambas teria que ser muito antes da universidade. As crianas e a filosofia so aliadas naturais, pois em ambas o assombro o princpio do questionamento. Lipman, diz: s os filsofos e os artistas se comprometem sistemtica e profissionalmente em perpetuar o assombro, to caracterstico da experincia cotidiana da criana (Lipman, 1999, p. 24).

    Lipman foi percebendo que no era s importante as crianas aprenderem a pensar de maneira correta num sentido lgico, tico, mas como tambm pudessem pensar a cerca de esttica, poltica e fazer bons julgamentos em torno de diferentes questes que tradicionalmente tinham sido patrimnio da filosofia. Meninos e meninas precisavam da filosofia para esclarecer conceitos que so filosficos como: verdade, tempo, justia e que ao mesmo tempo, fazem parte de todos os dias. Os adultos dizem continuamente que crianas devem se comportar bem, mas nunca discutem com eles o que o bem, pedem que digam a verdade, mas nunca falam com eles acerca do que a verdade.

    E no s no discutem com as crianas, como tambm no concedem espaos para que elas conversem a respeito entre si ou que pesquisassem por si mesmo.

    Segundo Wuensch (2000), a ironia est em que o programa de Filosofia para Criana foi concebido pelo professor Matthew Lipman de dentro de uma universidade norte-americana, como uma forma de responder, a partir da Filosofia, um problema vivenciado no sistema educacional americano na dcada de sessenta. Buscava-se, ento uma maneira de elevar a qualidade de ensino e superar a tendncia a favorecer a memorizao e a transmisso linear de informaes, que no gerava compreenso e sentido para os alunos. Existiam outros projetos com propostas inovadoras em responder o desafio, daquela poca onde o programa de Filosofia para Criana era apenas mais um deles, com o diferencial, claro de utilizar a filosofia para realizar seus objetivos.

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    No se tratava de levar s crianas a filosofia no sentido acadmico, mas sim buscar na filosofia os instrumentos necessrios no sentido de construir uma educao que ensinasse a pensar. Um pensar reflexivo, crtico, criativo e ponderado. Neste sentindo Lipman se deparou com vrios obstculos, um deles foi a apresentao de um currculo e uma metodologia que pudessem ser usadas em sala de aula.

    O pensar reflexivo se refere ao pensamento contemplativo, voltado para si mesmo interrogando a si mesmo. A crtica se d quando se investiga uma afirmao para conhecer sua legitimidade. A criatividade acontece no momento que a pessoa se lana em algo novo que poder ser a resposta de um problema ou uma sugesto, ou seja, a prpria pessoa vai criando respostas para as situaes apresentadas a ela. Ele ponderado no sentido da auto correo, sempre analisando os problemas colocados.

    Segundo Castro, Lipman tinha dois problemas a resolver: O primeiro, como seria possvel de trazer crianas e jovens para essa temtica metodolgica do desenvolvimento sistemtico do raciocnio, numa linguagem acessvel a cada idade. Na busca dessa soluo j que no havia uma tradio educacional Nos nveis escolares que aplicasse Filosofia (esta disciplina s aparecia no currculo das universidades) Lipman escrevia novelas filosficas possibilitando que os jovens e as crianas tenham fios da meada significativos para suas vidas, ou seja, os temas filosficos (Castro, 2002, pp.14-15).

    O segundo problema seria que tipo de metodologia poderia se adequar apresentao dessas novelas filosficas. Ele props um mtodo que chamou de comunidade de investigao, na qual possvel que sejam desenvolvidas integradamente habilidades cognitivas que so o questionamento, a formao de conceitos, alm de desenvolver nos alunos e a traduo, construindo um raciocnio superior. Este trabalho bastante produtivo: as crianas inseridas na investigao juntamente com as outras, sendo auxiliadas por um educador experiente, que saiba co ordenar adequadamente os esforos de todos os membros da comunidade de investigao. Mais adiante ser visto como se d na prtica esse mtodo.

    Em Nova York, Lipman realizou suas primeiras experincias de ensino de filosofia para criana, tendo como substrato terico as idias de Scrates John Dewey, Lev Vygotsky, Charles Sandro Peirce, e Justus Buchler; seu trabalho chamou ateno da comunidade acadmica e inclusive obteve o reconhecimento pela UNESCO e em 1972 foi convidado a dar aulas na Universidade de Montclair (Nova Jersey). L o filsofo desfrutou de apoio para desenvolver sua inovadora proposta educacional e conheceu sua principal colaboradora, Ann Margareth Sharp.

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    Para difundir o programa Filosofia para criana Educao para o Pensar, Lipman e Sharp fundaram em 1974 o IAPC (sigla em ingls para Instituto para o Desenvolvimento da Filosofia para Crianas). A entidade ajudou a promover a implantao do mtodo e centros regionais em mais de 30 pases entre eles: Frana Inglaterra, Alemanha, Canad, Chile, Argentina, Colmbia, Israel dentre outros.

    1.3- FILOSOFIA PARA CRIANA NO BRASIL

    A filosofia para criana chegou ao Brasil atravs de Catherine Young Silva (1973 1993) em 1984 e junto com um grupo de professores difundiram o trabalho de Lipman que consiste na prtica do dilogo filosfico com crianas inspirado pelos materiais e mtodo de Matthew Lipman e seus colaboradores. Catherine fez seus estudos de mestrado em filosofia para criana na Montclair State University, dirigido por Lipman em 1983 e 1984, aps a descoberta meio casual da existncia do curso em 1982. De volta ao Brasil, trazia consigo o direito cedido por Lipman para traduzir e adaptar os materiais, bem como a autorizao para formar professores e desenvolver o trabalho na s escolas. Catherine, de origem americana, era naturalizada brasileira e o seu trabalho anterior como professora de ingls para criana sempre levou em conta o problema do ensino da lngua e as questes culturais envolvidas no seu aprendizado. Isto fez com que Catherine reformulasse os materiais didticos do Instituo Yzigi. Atravs do seu trabalho Catherine observou o poder das crianas na interao dos adultos e estava convencida de que o programa de Filosofia para Criana era um poderoso aliado no desenvolvimento da autonomia moral e intelectual infantil. Esta observao levou Catherine a modificar o material didtico da Filosofia para criana para ser adaptado realidade brasileira.

    Catherine apoiada pelo filho Ricardo Silva e sua amiga de mestrado Marion Burleigh inicia nas instalaes do Yzigi em So Paulo a divulgao desta proposta nas escolas e universidades de So Paulo, Capital. Duas escolas particulares comearam naquele ano uma experincia informal com o programa que contava apenas com tradues incompletas do material. Ao longo dos anos com apoio de Marcos Lorieri (que foi professor de Catarine no curso de filosofia da PUC- SP) e das professoras de filosofia e ingls Ana Luiza Falcone e Syvia Hamburger Mandel, foram feitos contatos para a formao de professores e a implantao do trabalho nas escolas pblicas da zona leste de So Paulo que comeou a

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    acontecer no ano seguinte. Em janeiro de 1985, este grupo criou O centro Brasileiro de Filosofia para criana (CBFC), entidade civil sem fins lucrativos que passou a se dedicar traduo dos materiais e divulgao desta proposta e formao de professores para o desenvolvimento do programa nas escolas.

    Com as participaes de Lipman em vrios Congressos, palestras e conferncias aqui no Brasil e a disseminao em vrias escolas no s em So Paulo, como Paran, Santa Catarina, Minas e outros estados, o movimento de filosofia para criana comeou a crescer. Entretanto os filsofos universitrios brasileiros que vinham a saber desta proposta olhavam com uma certa reserva e muitas crticas. Porm na dcada de 90 depois de uma srie de reportagem de jornais e revistas apresentaram o programa e seus resultados no caderno MAIS! Da folha de So Paulo de 05 05- 1994, publicou uma das mais significativas reportagens sobre o tema. Este movimento a favor da filosofia para criana de Lipman comeou a mudar as opinies dos filsofos dando a esta proposta mais credibilidade. Segundo Wuensch (1998), do movimento para criana no Brasil, as pessoas que se permitiam pensar nesta proposta tinham dois desafios. O primeiro colocar a questo mais terica sobre a possibilidade do ensino da filosofia para crianas, o que implicava uma reviso da idia e das relaes entre o que filosofia e o que se entende por crianas e a infncia em geral, e, por outro lado o contato direto com elas na sala de aula do ensino fundamental (o que tambm no faz parte da formao tradicional do filsofo). O segundo desafio era realizar esta proposta na sala de aula, no qual os professores deveriam vivenci-la e acompanhar o seu desenvolvimento e os resultados. Catherine e Marcos Lorieri entendendo que estas questes deveriam ser pensadas junto com a prtica e que a importncia deste trabalho estava ligada diretamente s escolas pblicas, iniciaram junto com a equipe do CBFC os contatos com a regional de ensino (DRE CAP.2) em 1984 e em 1985 a experincia piloto com um grupo de professores da EEP. SG Santos Dumont bairro da Penha em So Paulo. O resultado obtido foi um sucesso, em 1992 quarenta escolas j estavam no projeto no qual a Secretaria Estadual de Educao de So Paulo garantiu a primeira traduo do material didtico de Lipman juntamente das novelas filosficas (iremos falar sobre o material didtico e seus objetivos na metodologia) e os manuais para o professor no Brasil. Segundo Lorieri o sucesso desta experincia despertou desta o interesse das escolas particulares de So Paulo e outros estados reforados pelo trabalho da apresentao pblica do programa em seminrios palestras e congressos realizados no perodo. Este movimento com escolas pblica e particulares na dcada de noventa proporcionou um fortalecimento que

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    contribuiu para expanso quantitativa e para novas abordagens da prtica de Filosofia para Crianas no Brasil.

    1.4 FUNDAMENTAO TERICA

    Em busca de solues para resolver as falhas nos raciocnios de seus alunos, Lipman achou necessrio que eles tivessem um contato com a lgica e a filosofia bem antes da universidade, mais esta soluo no seria de uma hora para outra, pois estudantes e professores tinham sado da mesma matriz de uma escola primria e secundria. Lipman comeou a perceber que o caminho para retomada de uma boa educao estaria no olhar para as crianas.

    Se quisermos democratizar nossas sociedades diria Lipman preciso educar nossas crianas na filosofia e na democracia. Por que as crianas? Porque e aqui Lipman parece mais pragmatista do que nunca. - para adultos talvez seja tarde demais. Porque uma socializao pouco democrtica e pouco filosfica j tenha feito estragos neles. Por isso a nica esperana certa segundo Lipman est nas crianas... (Kohan, 2000, p.47)

    Lipman o fundador do movimento por levar sistematicamente a prtica de filosofia educao das crianas tendo como propsito de contribuir com a reforma do sistema educacional, para que este desenvolva adequadamente o raciocnio e a capacidade de julgar dos seus alunos. A prtica da filosofia, o fazer a filosofia segundo Lipman, ferramenta indispensvel desta tarefa. Lipman no s fundamentou teoricamente o papel da filosofia na educao das crianas, como tambm desenvolveu uma metodologia e um currculo para lev-las s escolas.

    Segundo Kohan (2000) nada impediria que este programa fosse aplicado fora da escola, porm sua proposta est fundamentada em uma reforma do sistema educacionais institudo.

    Lipman afirma: A criana j no pode ser pensada como separada do aluno. ((Kohan 2003, p.95) seu propsito revela a criana na sua potencialidade, ou seja, naquilo que ele pode ser formado a partir da educao escolar que recebe.

    Lipman em suas obras aponta acerca da importncia do meio familiar no desenvolvimento infantil. Entretanto, sua nfase recai sobre a funo da sala de aula, quando transformada em comunidades de investigao como veculo de acesso das crianas filosofia, rea do conhecimento humano capaz de proporcionar aos pequenos um pensar melhor, assinalado por este filosfico, como pensar de ordem superior ou excelente. Considera

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    que os primeiros cinco ou seis anos da criana so passados em casa e que isto no parece prejudicar as energias intelectuais da criana, parece estranho condenar o ambiente da criana como responsvel pela perda subseqente da curiosidade e investigao. mais provvel que isto se deva natureza da educao escolar. Como podemos explicar por que a vivacidade intelectual da criana no se extingue nas circunstncias freqentemente adversas da vida familiar, enquanto que esta muitas vezes diminui nas circunstncias adequadas da sala de aula (Lipman,1995) De certa maneira a criana em sua casa no consegue ser estimulado devido prpria natureza familiar criada numa sociedade neoliberalista na qual o esforo para manter esta famlia a criana acaba sendo desprivilegiada do cuidado dos pais. E a escola por sua vez comete o engano de ignorar a criana como um ser em desenvolvimento contnuo e inibe as suas idias e sua forma de expressar e pensar, colocando-as em uma armadura sistematicamente pronta para satisfazer esta sociedade neoliberal e globalizada. Lipman deslumbrou na filosofia uma proposta de utiliz-la como uma proposta para as respostas a este paradoxo que existe na famlia na famlia e na escola em relao a educao (paradoxo no sentido de as duas instituies deveriam proteger e educar as crianas mais no possvel devido ao prprio sistema neoliberal das sociedades. Segundo o autor a filosofia uma dimenso insubstituvel da educao, quanto a educao uma dimenso insubstituvel da filosofia. Sem sua dimenso educacional a filosofia se torna vazia; sem sua dimenso filosfica a educao se torna cega.(Kohan, 2000).

    A filosofia ensinada por Lipman no qual ele pratica com as crianas no a filosofia da lgica ou da poltica, uma filosofia que tem como compromisso a transformao social. Mas qual seria esta transformao social?

    Que a filosofia tenha uma dimenso poltica substantiva nas escolas no quer dizer que filosofia e poltica caminhem juntas nem que a prtica da filosofia seja um instrumento de doutrinao ideolgica; significa que a filosofia tem um compromisso com a transformao social. No cabe filosofia sinalizar os caminhos dessa transformao, mas contribuir para elucidar e compreender as obscenidade da atual sociedade neoliberal Globalizada, bem como para pensar as condies de sua superao. (Kohan 2000 p.104)

    Mas como trazer as crianas para este novo paradigma da educao? Segundo Lipman precisamos envolv-las em um desafio filosfico. Afirma que

    necessrio criar nossas crianas na filosofia e na democracia, se conseguirem que elas pratiquem a filosofia em comunidades de investigao deliberativas, ento haver muitas

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    chances de que elas sejam pessoas razoveis e democrticas e que a partir dessa prtica filosfica e democrticas, elas lutem para que as instituies e prticas sociais sejam mais igualitrias e menos autoritrias. Segundo Kohan a fundamentao que Lipman oferece para sua proposta claramente normativa, ou seja, Lipman diz como deveria ser uma educao filosfica s crianas. As argumentaes de sua proposta esto baseadas em trs categorias: a filosofia, a investigao e a educao democrtica.

    A proposta de Lipman tem como idia central levar a filosofia para as crianas. Nos seus muitos trabalhos Lipman enfatiza a distino entre filosofia e filosofar, entre a filosofia como um sistema ou teoria e ela como prtica. Como fazer? a prtica que Lipman tenta levar as crianas com o modelo de Comunidade de Investigao na sala de aula atravs de suas histrias. Iniciando as crianas a praticarem a filosofia; fazendo-a executando-a e vivenciando-a em cada encontro. Nesta prtica Lipman teve o cuidado de adicionar como um conjunto de pensamentos. Deste modo fez uma reconstruo da histria da filosofia para que ela pudesse ser experimentada pelas crianas.

    Segundo Lipman no se pode filosofar sem filosofia no se pode fazer filosofia sem o contato com aquilo que a filosofia tem produzido de melhor durante tantos sculos da cultura ocidental. Sendo assim Lipman neste novo modelo de educao teve seus primeiros embasamentos tericos em algumas referncias como Scrates, Charles Sanders Peirce, Lev Vygotsky, John Dewey, Justus Bucher.

    1.4.1 LIPMAN E SCRATES

    Apesar das referncias na filosofia acadmica sobre a criana no tenha sido muito favorvel infncia temos em Scrates o filsofo que mais se aproximou de maneira positiva das crianas. Scrates que ensina adolescentes a filosofia na praa pblica, afirma sua paixo maior ter um bom amigo, est com ele desde sua infncia (Plato, Isis 2IId). As referncias de Lipman em relao a Scrates esto exatamente de praticar a filosofia, a atividade principal de Scrates era conversar, conversar justamente sobre o conhecimento do homem sobre si mesmo e sobre as virtudes, tais como a sabedoria e a justia. Enquanto os pr-Scrates se afastavam do convvio intenso com multides, Scrates procurava o convvio com as multides, fazia isso para poder conversar com eles. O compartilhamento da concepo filosfica de Scrates expressa e prtica compartilhada por Lipman nas seguintes similaridades: Tanto Lipman com Scrates enfatizam

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    a dimenso prtica e dialgica da filosofia, os dois do prioridade filosofia como atividade filosfica, para ambos a filosofia algo que se exerce, se cultiva, se vive em dilogo com os outros, esta prtica tem implicaes educacionais de grande importncia em uma unidade de sentido sociopoltico. Como se, para um ser humano, viver sem perguntas no fosse viver de verdades (Kohan, 2000, p. 21). Segundo Kohan para os dois uma verdadeira educao no pode deixar de ser filosfica e uma verdadeira filosofia no pode deixar de ser educativa. No h requisitos prvios para se ter acesso filosofia; para participar desta busca basta reconhecer sua necessidade e o no saber sobre o assunto a ser investigado, assim como o desejo de aprender. Esta dinmica no qual Lipmam agregou o seu novo modelo de educao da investigao filosfica em comunidades que comea com o questionamento, continua com o dilogo investigativo e se projeta um final de resposta em aberto, fazendo parte do modo socrtico de perguntar, proposto por Lipman, marca o espao do professor proposto por ele. A filosofia entendida como uma busca, um caminho tendo o professor a primordial funo de promover e facilitar essa busca gerando condies para que o outro aprenda a percorrer um caminho de perguntar e perguntar-se.

    1.4.2 LIPMAN E PEIRCE

    Lipman define como investigao toda prtica autocrtica e auto corretiva que tem como propsito obter um saber compreensivo que por sua vez seja capaz de produzir juzos mais apurados a cerca do que a nossa experincia do mundo tem de problemtica. A proposta terica de Dewey vem se aproximar de Lipman neste sentido.

    Quando Lipman caracteriza a filosofia, a educao e a democracia como formas de investigao, ele no as cita de modo como elas existem, mas sim uma normativa para elas. Neste sentido a prtica existente ser considerada boa, a partir de um ponto de vista filosfico, educacional ou democrtico, pela aplicao de um mesmo critrio pragmtico. Na medida em que ela contribui para uma sociedade melhor, sendo os critrios para determinar a bondade de uma sociedade tambm pragmticos, promover o crescimento dos seus membros e o enriquecimento de sua experincia pessoal e coletiva (Kohan, 2000 ).

    Lipman prope a criao da Comunidade de Investigao como novo paradigma em educao, as aulas deveriam deixar de ser aquilo que so para converter-se em comunidades de investigao filosfica. Este conceito vem de uma longa tradio pragmtica na qual Charles

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    S. Peirce um dos pilares. Peirce considera a cincia como paradigma de toda investigao e achava que o melhor que a comunidade de filosofia podia fazer era transformar a filosofia nua cincia estrita.

    A influncia de Peirce sobre Lipman foi a sua caracterizao do processo de investigao e o valor que ele atribua comunidade nesse processo. Para Peirce, a investigao cientfica um processo idneo para se estabelecer ou fixar crenas. Segundo Peirce toda investigao cientfica parte de antemo da ausncia de resposta antemo. Ela est fundamentada na experincia e tenta firmar uma crena que se substitua ao estado de dvida que gera uma contra argumentao ou uma nova prova emprica que a questiona (Kohan, 1998, p.102), recriando assim sem cessar o caminho da investigao cientfica atravs da seqncia: crena dvida crena.

    Segundo Koman, neste processo indefinido de fixao de crena a comunidade de investigao estabelece critrios de verdade e realidade: A investigao e o questionamento cientfico mostraro ao final do caminho, como crenas estabelecidas, aquelas que a comunidade for admitindo como verdades e reais. Neste caminho todas as possibilidades de investigao so esgotadas, no sendo mais possvel melhorar a resposta. Toda realidade se d ento atravs de um processo coletivo ilimitado de interpretao que encontra o seu canal de expresso, confirmao e refurtao numa comunidade sem limites definidos. Peirce reconhce em sua teoria que sem comunidade no h sinal de interpretao, nem portanto, realidade, cincia ou indivduos. (Koman 1998 p.103)

    O conceito epistemolgico que sustenta este processo ilimitado e progressivo de interpretao a falibilidade; o fato de todo conhecimento ser falvel significa que sempre passvel de confirmao ou retificao, no seu confronto com a experincia.

    O que Peirce props para cincia, Lipman adota para a filosofia. Para Lipman a filosofia uma investigao sem limites determinados. Isto significa que por um lado a lgica formal filosfica, os saberes positivos dessa investigao, mesmo as prprias regras lgicas, so sempre provisrios, contestveis e falveis. Para Lipman nesse reconhecimento socrtico-

    perciano est o maior pilar do pensamento filosfico que a importncia da auto correo. importante auto corrigir-se porque nunca podemos estar certos da verdade das nossas crenas, mais ainda, porque sabemos que elas nunca so verdadeiras que no podem s-lo porque a verdade algo que est em nosso horizonte, no em nossa possesso. (Kohan1998 p. 31).

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    1.4.3 LIPMAN E VYGOTSKY

    Para Lipman a comunidade o ponto de partida e de chegada do dilogo filosfico, o que d sentido tarefa de aventurar-se cada investigador na filosofia. Ento a prtica filosfica entendida como dilogo coletivo sem fim, requer alm de todo saber adquirido, a disposio dos co-investigadores buscarem caminhos de pensamento coletivo regradores por uma comunidade dadora de sentido (Koman, 1998). Sendo assim, Lipman compartilha com Vygotysk a afirmativa de que os seres humanos so antes de tudo seres sociais. Como se revela a evoluo da linguagem na pessoa. Ela primeiramente interpsquica para s depois ser intrapsquica (Vygotsky, 1989).

    Vygotysk, no teve inteno de postular qualquer tipo de teoria do desenvolvimento infantil. Suas concluses sobre a infncia decorrem da necessidade de compreender as funes mentais superiores (termo usado por Vygotysk para se refrerir aos processos psquicos do pensamento da memria, da percepo e da ateno), bem como o comportamento humano do ponto de vista das alteraaes scio-histrico-culturais. Para ele, as funes mentais superiores so formadas por intermdio de um processo de interligao que mediado pela cultura.

    Este processo tem incio to logo a criana chega ao mundo humano culturalmente organizado. A criana colocada no cerne da histria que precede o desenvolvimento cultural, por causa do uso do instrumento e da fala humana, segundo Vygotysk, produtos humanos e culturais. por intermdio destes produtos, denominados pelo terico como instrumentos e signos, que o ser humano tem sua relao com o mundo.

    Para Vygotsky a definio de signo e instrumento dentro de sua proposta terica muito importante pois destas definies se pode compreender o conceito de infncia. Para Vygotsky o instrumento e o signo consistem em tudo o que se interpe entre o homem e a natureza para ampliar e modificar sua ao. por intermdio dos signos, considerado por Vygotsky como instrumentos psicolgicos, que os seres tm suas funes mentais superiores

    modificadas.(Vygotsky, 1984). Segundo Vygotsky a linguagem o sistema de signos mais importantes para o homem

    e atravs dela que a criana se aproxima dos objetos em sua volta e das significaes socialmente construdas. Dentro desta perspectiva a linguagem falada tem em Vygotsky um papel especfico na histria do desenvolvimento da criana.

    Para Vygotsky a infncia o divisor das guas entre os homens e os animais. Trata-se do perodo em que a atividade prtica das crianas associada utilizao da linguagem,

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    constituindo alm de modificaes no comportamento mudanas intelectuais. Assim para Vygotsky a linguagem na criana reorganiza os processos do funcionamento cognitivo.

    A linguagem habilita as crianas a providenciarem instrumentos auxiliares na soluo de tarefas difceis, a superar a ao impulsiva, a planejar uma soluo para o problema antes de sua execuo e a controlar seu prprio comportamento. Signos a palavras constituem para as crianas, o primeiro e acima de tudo, um meio de contato social com outras pessoas.As funes cognitivas e comunicativas da linguagem tornam-se, ento a base de uma forma nova e superior de atividade nas crianas.( Vygotsky, 1998, p.38).

    Sendo assim atravs desta pequena parte da teoria de Vygotsky sobre pensamento e linguagem na criana podemos reconhecer no quanto Lipman procurou em ter fundamentado seu trabalho. Para ele toda atividade intelectual no pressupe nada alm da linguagem smbolos significativos e a capacidade de adotar atitudes dos demais para dialogar com a prpria atitude e promovendo tambm a prtica de escutar atentamente os membros da comunidade. Lipman tem reconhecido nos seus romances a constituio social do pensar e da pessoa oferecendo uma narrativa onde a prticas pedaggicas se baseiam no dilogo e os personagens refletem a cada passo o modo em que seu pensar e agir est ligado a um contexto social ao qual pertencem.

    No h dilogo se os participantes no se escutam com ateno. Ao mesmo tempo, ela cultiva a auto estima naqueles que se sentem reconhecidos pelos seus pares como portadores de uma linguagem significativa, e promove a reciprocidade e a cooperao quando quem escuta atentamente tem a sua vez de falar.Por ltimo,isto leva a pessoa a reconhecer se nas palavras dos demais e a estes na prpria voz. Esta prtica - e todas as outras promovidas numa comunidade de questionamento e investigao - tentam criar um contexto social de modo que as pessoas a ele expostas internalizem essas prticas em todos os mbitos da sua experincia. (Koman 1998 p.108)

    1.4.4 LIPMAN E DEWEY

    Segundo Kohan a influncia mais significativa em Lipman a de Jonh Dewey. Embora Lipman no tenha tido muito contato direto com Dewey a marca deste notvel tanto nos seus interesses temticos quando em pontos cruciais do seu pensamento.

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    importante ressaltar que a comunidade de questionamento e investigao, como prtica educativa, filosfica e social nada mais que uma ressonncia criativa do modo como Lipman leu algumas das propostas de Dewey sobre democracia e educao (Kohan, 1999).

    Dewey tinha sua formao acadmica em filosofia e biologia mas foi no pragmatismo uma corrente filosfica fundada por Charles Sanders Peirce e Willian James que ele fundamentou todo o seu trabalho, Dewey acreditava que toda idia, valor e instituio social originavam se a partir das circunstncias prticas da vida humana. No eram nem criaes divinas, nem to pouco mediam determinado tipo de ideal. A verdade no representava uma idia espera de ser descoberta; s poderia ser concretizada na prtica.

    Com este pensamento Dewey fundou na Universidade de Chicago uma escola laboratrio de nvel bsico para ajudar a avaliar, modificar e desenvolver suas idias psicolgicas e educacionais. Todavia um desentendimento com o reitor da universidade em parte ocasionada com o uso da escola-laboratrio como instituio de formao de professores, levou Dewey a demitir-se da Universidade em 1904.

    Dewey encontra-se particularmente preocupado com o desenvolvimento de uma comunidade democrtica num pas que encontrava-se em risco de perder o seu compasso moral e espiritual. Para ele a democracia genuna no se referia simplesmente a rituais governamentais, mas pelo contrrio, pretendia-se com o processo dinmico de uma participao diria ativa e igual que inclua, no apenas o aparelho poltico formal, como tambm a cultura e a economia em essncia todas as fases da vida.

    A democracia genuna era segundo ele primariamente um modo de vida associado, de experincia comunicada conjuntamente. Para Dewey uma sociedade democrtica uma sociedade que muda que se corrige, que se renova.

    Para Dewey a chave do desenvolvimento intelectual e conseqentemente do progresso social, era escolarizao, sobretudo na poca em que as influncias educacionais de outra instituies (o lar, a igreja) decresciam to drasticamente. Dewey destacou a natureza moral e social da escola a acreditava que esta poderia servir como uma comunidade em miniatura na sociedade embrinica particularmente uma sociedade que dinamizava ativamente o crescimento da democracia que havia minimizado com a sociedade urbano industrial nos Estados Unidos. Esta viso se encontrava em claro contraste com o modelo do Sistema Fabril no qual o papel do estudante como matria prima relativamente passiva a ser moldada pelo (as) professores (as), pelos mtodos de ensino apoiado pela repetio e matrias escolares dissociadas do contedo social.

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    Dewey defendeu que a escola deveria assumir um papel participativo na transformao para uma ordem social. Para ele a educao um processo contnuo de recriao reorganizao ou reconstruo individual e social da experincia do estudante (Kohan, 1998).

    Lipman compartilha com Dewey a idia que a educao atravs da filosofia na proposta de uma comunidade de questionamento e investigao filosfica contribui para ajudar a criana na sua construo de um ser social e democrtico em um ambiente institucionalizado. Lipman nesta proposta procura tirar a filosofia do mbito terico e acadmico para conceb-la em uma prtica pedaggica desde o nvel mais bsico da escola.

    1.1.5 O PENSAR SUPERIOR

    Para se falar em pensar superior iremos primeiramente nos referir a teoria metafsica

    radical do Juzo de Justus Buchler formada na dcada de cinquenta. Esta teoria amplia o conceito tradicional que entende o ato de julgar como atividade

    discursiva e estende-o a toda esfera humana. Para Buchler todos os ambientes da vida humana ou das relaes humanas - qualquer instncia do dizer, fazer ou produzir geram juzos.Sendo assim, ele com a restrio do juzo ao ambiente lingstico na consequncia indesejvel da tradio intelectualista predominante na histria da cultura universal (Kohan, 1998)

    Ao afirmar o carter universal do juzo Buchler quer significar que todo ser humano em cada uma das suas palavras, aes e obras, tem que adotar sempre uma postura , uma posio um julgar perante o mundo. Quando age ou fala a pessoa discrimina alternativas, pronuncia uma viso do mundo e pe valores em jogo. Toda ao humana exprime uma perspectiva revelando com isso um juzo.

    Segundo Buchler para se chegar este produto chamado juzo a pessoa individual passa por trs processos:a histria individual, a natureza e a comunicao social. Deste modo o juzo se torna posicionar numa complexa trama individual, natural e social revelando a sua particularidade em posio perante o mundo, sendo assim cada um dos seus atos, dizeres e obras estar produzindo um juzo.

    Segundo Buchler existem trs modos de julgar que corresponde ao fazer (juzo ativo) ao produzir (juzo mostrativo) e ao dizer (juzo assertivo).As funes dos juzos so:ativo ativo quando expressam algo sobre o o bom ou o mau em uma ao. Mostrativa, quando do forma ou arranjo a materiais de qualquer tipo (objetos, signos, sons, etc) em termos de belo e no belo. Assertativa quando afirmam algo em relao ao verdadeiro ou falso no dizer

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    Buchler influenciou muito Lipman em sua obra no qual ele deu a maior importncia ao juzo e capacidade de julgar.

    Segundo Lipman um dos propsitos de uma comunidade de questionamento e investigao filosfica potencializar e melhorar a capacidade de julgar e os juzos das crianas que toda investigao tem como produto um juzo e que potencializar o pensar gera esses juzos uma das tarefas de uma educao filosfica.

    Faremos um retorno em Dewey quando ele distingue o pensar e o conhecer. Para Dewey distinguir o pensar e o julgar por um lado, e o conhecer pelo outro. Ele props considerar a escola como um espao de construo social do pensar e de formao e exerccio de capacidade de julgar das crianas e no como um lugar de transmisso de conhecimento. O pensar e o julgar desenvolvem capacidades e foras ativas, como a habilidade de discriminar ou selecionar, enquanto adquirir informaes promove uma aprendizagem hipotticos, projetam-se sobre um futuro; j o conhecer procura apreender o que dado, ao passo que o julgar e o pensar devem partir sempre de uma experincia, o conhecimento, como informao a respeito dessa experincia, ser permanentemente um material indispensvel ao pensar , mas nunca um fim em si mesmo: apenas uma fonte ou alimento de um processo de questionamento e investigao cujo o propsito melhor o pensar e a capacidade julgar dos estudantes.(Kohan 1998)

    Segundo Lipman o pensar de ordem superior diferencia um pensar normal ou cotidiano de um bom pensar ou pensar de nvel superior segundo Lipman o primeiro acrtico e mecnico; ele desconhece categoria como criatividade ou responsabilidade, no entanto o pensar de nvel superior complexo e inventivo.

    Combinando trs aspecto ou possibilidades do pensar: criticidade, criatividade e o cuidado.cSomente com a juno destes trs aspectos ou modo de pensar:a criticidade, a criatividade e o cuidado, revela um pensamento de ordem superior.

    O pensar de ordem superior no aspecto crtico, est governado por regras, inquisitivo, deliberativoc(problemativa, distingue, examina, e avalia critrios e as razes em que se baseiam as crenas). Ele leva a emitir juzos metdicos auto corretivo, sendo sensvel ao contexto histrico e pluralista (Kohan 1998).

    O pensar de ordem, no seu aspecto criativo pe em ao os critrios, embora no se norteei por eles;procura produzir juzos expressivos e transcedendo a si mesmo, expressivo inovador e independente, maiutico, dialtico (no sentido hegeliano) e governado e regido pelo contexto; pluralista :faz questo da variedade, da unicidade e da diferena; por ltimo

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    ressalta os valores do adequado e do ntegro muito mais do que do bom ou correto.(Kohan 1998).

    O pensar de ordem superior, no seu aspecto do cuidado, exprime aquilo que uma pessoa considera importante ou valioso; emprega valores no prprio pensar e reconhece, por sua vez, outros quatros modos possveis: o pensar valorativo, o ativo, o afetivo e o normativo.

    O modo de pensar valorativo pode avaliar um objeto de valor por exemplo sem qualificar o seu valor como obra de mercado comercial e sim pelo valor que ela pode representar quando manifesta algo de celebrao ou de comemorao ou seja se valoriza sem valor comercial. O pensar ativo reflete o pensar que oculta se em nossas aes: a nossa conduta fala por ns , mostra que cuidamos e por que o fazemos. O pensar afetivo tenta romper com a dicotomia razo/emoo, concebendo as emoes com formas do pensar ou de emitir juzos. O pensar normativo pe em ao a dimenso ideal, o deve ser, o carter prescrito do pensar.

    Os modos do cuidar so formas do pensar que afirmam, entre outros valores:o preservar, restaurar, proteger, salvar, alimentar, nutrir, celebrar, respeitar, remediar, admirar, promover, cultivar e comemorar.

    Segundo Kohan esta distino proposta por Lipman entre os trs modos, formas ou dimenses do pensar de ordem superior paralela classificao funcional dos juzos de Buchler:o modo crtico do pensar corresponde ao modo assertivo do julgar ;o modo criativo do pensar , ao modo mostrativo do julgar . Assim como os modos do julgar esto presentes em diferente proporo em todo juzo, tambm em todo pensar de ordem superior h uma composio variada de criticidade, criatividade e cuidado.Nesse sentido, cada pensamento um microcosmo que exprime uma pluralidade de formas ou dimenses do pensar.

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    CAPTULO II A FILOSOFIA E A CRIANA NA ESCOLA

    Segundo Ann Margareth Sharp em 1969 Lipmam disse a si mesmo: se eu pudesse colocar o contedo dessa disciplina (lgica) em novelas, talvez os alunos de oito, nove, dez anos, pudessem enfrentar as mesmas questes que ensino na universidade. Pensando nisto Lipman criou novelas, histria da filosofia ocidental. Segundo Kohan suas novelas filosficas so dilogos entre crianas, professores, pais, vizinhos. A maioria dos personagens so crianas, sendo estes dilogos acontecendo sempre na escola. As crianas representam modelos de investigadores que debatem questes significativas do seu cotidiano.

    Para que os professores sem formao na histria da filosofia pudessem explorar o dilogo filosfico com seus alunos, Lipman escreveu os manuais que propunha exerccios e planos de discusses, a partir de idias principais contadas pelas novelas.

    2.1 O CURRCULO O currculo constitudo por oito programas que contm as histrias e os manuais

    abarca os trs primeiros nveis de escolaridade desde a pr- escola at o ensino mdio. Cada programa est planejado para ser trabalhado durante dois anos escolares.

    O primeiro programa escrito por Lipman no final dos anos 1960, A descoberta de Ari dos Telles (Ari), atinge questes de lgica e teoria do conhecimento e considerado por Lipman a espinha dorsal do programa, e assim por diante todas as outra novelas vem trazendo consigo conceitos a serem discutidos com a comunidade de investigao filosfica

    At o incio de 1990 o currculo desenvolveu sete programas completos, e desenvolveu tambm um programa continuador de Pimpa, Nou, em 1996, para dar conta de uma demanda crescente sobre formao tica.

    A estrutura curricular se desenvolve em forma espiral, significando que embora cada programa tenha tema especfico ou pontual, os mesmos temas vo se recuperando e reforando no decorrer dos programas, seguindo o desenvolvimento cognitivo das crianas.

    Um exemplo est no tema liberdade, ele tratado em praticamente todos os programas, sendo que para as crianas menores ele tratado como a questo de escolha entre opes, e s a partir de Pimpa aparece o tema liberdade.

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    O currculo de filosofia para crianas Textos . habilidades . temas

    Novelas Filosfica

    Elfie

    Issao e Guga

    Pimpa

    Nous

    A descoberta

    de Ari Telles

    Lusa

    Satie

    Marcos

    Ano de publicao 2.ed.

    1988

    1982/86

    1981

    1996

    1974 / 1982

    1976 / 1983

    1978

    1980

    Manual Colocando

    junto nossos pensamentos

    Maravilhando-se com o

    mundo

    Em busca do sentido

    Decidindo o que fazer

    Investigao filosfica

    Investigao tica

    Investigao esttica

    Investigao social

    Idade

    5 6 anos

    7 8 anos

    9-10 anos

    11 -12 anos

    13 -15 anos

    13 -17 anos

    13 17 anos

    13 17 anos

    Srie escolar

    Pr- escola

    1 e 2 sries

    3 e 4 sries

    3 e 4 sries

    5 e 6 sries

    7 e 8 sries

    Ensino mdio

    Ensino mdio

    Temas

    Comunidade de

    investigao filosfica

    Filosofia da natureza

    Filosofia Da

    Linguagem ontolgica

    Formao tica

    Lgica / teoria do

    Conhecimento / filosofia da

    Educao

    tica

    Esttica

    Filosofia social

    2.2 OS MANUAIS

    Os manuais so instrumentos chaves para o professor. Eles traam uma ponte entre a

    filosofia a filosofia dos filsofos e as inquietaes e possibilidades filosficas das crianas. (Kohan, 2000).

    Eles tm como objetivo oferecer ao professor modelos claros, e especficos para fazer filosofia a la Lipman eles abrem o caminho para o professor que no tem formao em filosofia, oferecendo-lhes a possibilidades para ir alm em suas pesquisas .Os exerccios procuram fortalecer algumas habilidades especficas de pensamento e os procedimentos mais habituais de investigao filosfica, os planos de discusses visam a formao de conceitos filosficos nos alunos. As perguntas vo geralmente do mais simples conceito aos mais complexos do mais claro ao mais obscuro de situaes particulares a universais, respeitando

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    cada faixa etria. Estes planos de discusses tambm podem apenas colocar um problema, que se espera, provocar debate.

    2.3 AS HABILIDADES COGNITIVAS

    Lipman agrupa as habilidades a serem desenvolvidas nas crianas em quatro grupos:habilidades de investigao, habilidades de raciocnio, habilidades de organizao da informao e habilidades de traduo(dilogo)

    O conceito de investigao uma chave para a proposta de Lipman. Para ele, tanto a filosofia como a educao so formas de investigao, o que significa prticas corretivas. Esta habilidade no muda sensivelmente no decorrer do programa tratando-se apenas de mudanas de grau.

    O raciocnio para Lipman uma forma de ampliar o conhecimento que temos a partir da experincia. A lgica o ponto principal do raciocnio. Ela permite perceber que o que verdadeiro para um membro de um grupo pode no ser para o grupo todo, que a partir da verdade de algumas afirmaes podemos ter certeza sobre a verdade de outras; que alguns argumentos so melhores que o outro. A lgica que permite perceber, segundo Lipman, que a racionalidade possvel. Para que o dilogo seja vivel preciso dispor de ferramentas para organizar as diversas informaes e experincias nele presentes. Para Lipman A descrio e a narrao so processos organizacionais que um bom pensador precisa dominar.

    Os conceitos, as oraes e os esquemas so, segundo Lipman, trs unidades principais nessa organizao da informao. Os conceitos so os veculos do pensamento: form-los supe agrupar as coisas em funo de similitudes; analis-los, clarificar e remover ambigidade.

    A traduo para Lipman a demonstrao da passagem de uma forma de expresso para outra, como um msico expressa um poema ou um pintor intitula uma de suas obras, ou quando se passa as frases da linguagem comum linguagem comum linguagem estandartizada da lgica. Lipman define o pensamento como uma forma de produtividade e , consequentemente, a traduo como forma de intercmbio que procura preservar o sentido nas diversas linguagens. Exemplos de habilidades especficas da traduo colocar-se no lugar do outro, interpretar, inferir vises do mundo.

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    As habilidades cognitivas em filosofia para crianas: principais tipos

    Raciocnio Questionamento e investigao

    Formao de conceitos

    Traduo

    - precisar o que for vago e ambguo - traar inferncias - raciocinar por analogia - pensar por meio de: regra de converso hipteses silogismos princpio de no- contradio estandartizao lgica de relaes - universalizar - distinguir a verdade de validade - detectar falcias

    - dar e pedir boas razes Distinguir: - razes de no-razes, Boas de ms razes - formar e confrontar hipteses - dar e pedir exemplos e contra exemplos - levantar questo, problematizar - analisar a consistncia - antecipar e explorar conseqncias - provar - definir, aplicar e avaliar critrios - detectar, justificar e questionar pressuposto - ser sensvel ao contesto -auto corrigir-se - resistir arbitrariedade - criar e explorar alternativas - potencializar a imaginao - buscar sentido

    - estabelecer relaes - traar distines - precisar semelhanas - definir conceitos filosficos como: Experincias Poder Bem Razo Justia Pessoa Amizade Realidade verdade

    - escutar os outros - ser sensvel dimenso afetiva - inferir vises do mundo - ser emptico - ser aberto intelectualmente - respeitar os outros - dialogar - ser importante - pr ego em perspectiva - ter auto controle - propiciar confiana No bloquear a investigao e o questionamento - cuidar do crescimento dos outros

    2.4- HABILIDADES DE RACIOCNIO

    Segundo Santos (2000), Lipman no via a afirmao de Piaget que as crianas em idade mais tenra no conseguem abstrair do mundo seno as atualidades concretas e sensoriais, onde os conceitos e as idias parecem pertencer a outro mundo como uma verdade. Porm esta teoria piagetiana proporcionou um reducionismo do processo educacional resultando em geraes desprovidas de abstrao, muitas vezes incapazes de travarem a justaposio entre realidade e aparncia, belo, direito, alm de serem incapazes de realizar incurses pela metacognio.

    Ao atrasar estas construes estamos privando a criana, o adolescente e o adulto de construrem a compreenso e de preencherem de significados a natureza, a sociedade e sua prpria identidade.

    O descontentamento da teoria piagetiana estava se alastrando no meio acadmico e cientfico da educao americana e a nova tendncia era a teoria de Vygotsky e suas palavras mgicas: pensamento, habilidades cognitivas e metacognio. ( Lipman 1995).

    O raciocnio crtico e criativo no est vinculado s faixas etrias, mas presentes desde a idade, mas tenras, complexificando ao passar dos anos. No surgem inatamente, pois seu

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    estabelecimento e significando, so construes sociais que se articulam e se complexificam, recombinam-se para fundamentar melhor na sua identificao do que se supe universal: o homem (Santos, 2000). Sendo assim no se pode pensar que uma criana antes dos sete anos no possa realizar alguns atos mentais; a abstrao no privilgio dos adultos, ela pode se estruturar melhor com o exerccio do cotidiano). Se privarmos uma criana de contatos com elaboraes mentais, certamente eles tero dificuldades, quando tiverem que lidar com seus problemas mais distantes.

    Segundo o Programa Filosofia para Criana, a criana tem a capacidade de simbolizao da linguagem que a edificao e a construo do que socialmente est configurado, em particular o significado e o papel da narrativa, sendo compartilhada medida em que um grupo gera uma histria dos mecanismo utilizados para se chegar at as concluses.

    A construo do significado narrativo ajuda a esclarecer situaes que envolvem pensamentos, crenas e valores. Assim a criana comea a descobrir o real, descortinado gradativamente o seu mundo mgico e passa a fazer parte em um mundo humano e real. Segundo Santos as diversas situao que constam nas histrias do programa tm o objetivo de evidenciar circunstncia dos personagens prximo a do leitor em seu processo de desvelamento do mundo, estimulando o dilogo acerca dos conceitos veiculados nos texto, onde o comportamento dos personagens se torna modelo de busca para os alunos.

    O debate em torno da histria lida ou daquilo que inspira, gerado pela comunidade de investigao em sala de aula, provoca a busca dos significados e desconstruo, obrigando os alunos a usarem os procedimentos da razo(chamados no programa de disposies mentais e habilidades de raciocnio) para identificar as evidncias, construir hipteses, verificar compatibilidades, enfim, submeter o mundo reflexo e compreenso, fugindo da forma dogmtica e autoritria que a sociedade nos impe, e que a escola em muitas situaes reproduz. As histrias do livro texto se prolongam sobre a histria de cada aluno, provocando um envolvimento investigativo de circunstncia que parecem brotar de cada personagem, que lentamente se dirige para as experincias dos alunos. Texto e vida formam uma interao de desejos e desafios. As habilidades do Raciocnio que envolvem a capacidade de: concentrar-se numa questo, analisar argumentos, elaborar e responder perguntas ou desafios, dar razes, ponderar sobre a credibilidade das fontes de informaes, observar, deduzir, induzir, identificar pressuposies, decidir-se por uma ao, interagir com os outros, concluir, usar a lgica relacional, identificar contradies, buscar consistncia e validade, lidar com ambigidade, compreender as conexes entre arte- do todo e todo-parte, trabalhar com analogias, estabelecer

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    relaes de causa e efeito, construir hiptese, contextualizar, classificar, hierarquia, prever conseqncias, gerar idias correlatas, identificar razes expressas e no expressas.

    2.5 - COMUNIDADE DE INVESTIGAO

    Lipman em suas pesquisas se inspirou em Peirce para a criao da comunidade de investigao tendo como propsito formar um ambiente propcio para investigao filosfica entre as crianas ou adolescentes. Este ambiente formado pelas crianas em sala de aula, atravs do dilogo e orientao do professor o bero do desenvolvimento e amadurecimento das habilidades cognitivas. (Santos, 2000). Lipman afirma que fundamental que a escola se converta prtica reflexiva e a comunidade de investigao surge como mdulo adquirido na medida em que se funde a exploso autocrtica.

    Para Lipman a racionalidade vem da prtica da argumentao dando continuidade ao comunicativa, produzindo assim um entendimento sem pretenso de padronizar. Segundo Santos ao argumentarem os sujeitos tematizam e ponderam a solidez do argumento produzindo ou no convencimento, deixando de ser acidental, passando a ser passvel da refutabilidade e do insucesso das intervenes criando com isto os passos para reflexo. Dentro do raciocnio o erro passa a fazer parte desta construo e reconstruo da idias de idias em comunidade, se torna parte do crescimento do grupo de seu esprito auto corretivo. Este momento gera no grupo a percepo de ousadia, criatividade, pois uns funcionam como protetores dos outros diante do dilogo, os alunos perdem o receio do errar, no se omitindo, participando e se sentindo respaldado pelo grupo. O pensamento crtico essencial dentro da escola e da sociedade (Santos, 2000). No possvel conceber na sociedade e uma escola onde as pessoas sejam inertes fazendo somente aquilo que lhes for mandado. A idia de uma democracia desprovida de criticidade no existe, cabendo o professor neste caso promover o exerccio constante de promoo de seus alunos busca do que ele ainda no conhece, sistematizando ou problematizando para que este pensamento crtico venha cada vez mais ser acelerado em atitudes. tarefa do professor trazer nossos desafios, aprimorar o discernimento, garantindo o acesso e o exerccio das habilidades do pensar. Tendo como ponto de partida o senso comum, o conhecimento dogmtico, ou mistificado, mas com certeza no o fim. O professor orienta o caminho.

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    Segundo Kohan (1998) o professor na prtica escolar co-ordena, o exerccio prtico e terico da proposta filosfica educativa de Lipman, isto significa que a forma de trabalho que realizada por todos os membros do grupo, tendo como base averiguaes srias sobre as possibilidades reais de atendimento s necessidades educacionais objetivas das crianas.

    Na co- ordenao reside o fundamento do seu direito- obrigao de trazer ao grupo-classe uma proposta, ou uma forma de trabalhar, a ser realizada por todos, cabe a ele fazer acontecer tal proposta co-ordenando a sua realizao em sala de aula. Em uma comunidade de investigao em relao sala de aula existe na construo da comunidade o circulo.

    A sala de aula tradicional com escrivaninha do professor na frente e os alunos sentados em fileiras ordenadas voltados para o professor transmitem certas mensagens em relao ao poder e autoridade em sala de aula. recomendvel sentar-se em crculo quando possvel. Este arranjo possibilita o estmulo concentrao ao tema proposto, permite um pleno contato visual, alm de o crculo simbolizar a unidade da comunidade. Juntos, sentados de tal forma, como co-indicadores, professores e crianas podem iniciar a sua aventura de perguntar-se e esquadrinhar sob a superfcie. Segundo Ann Margareth, co autora de uma srie de texto do programa, Lipman afirma que algumas atitudes compatveis com a comunidade de investigao devem levar em considerao a capacidade que cada aluno tenha de: exigir critrios, fazer perguntas relevantes, est aberto a novas idias, demonstrar preocupao com a conscincia de uma opinio, ser capaz de edificar idias em conjunto, considerar com seriedade a contribuio dos outros alunos dentre outros (Santos, 2000). Neste programa o dilogo fundamental para as crianas, por ser provocativo, obriga-os, por vezes a ver as coisas a partir do outro. Isto no significa que ao ver o outro este venha se abdicar de seu referencial de onde partiu a sua idia ou dilogo, mas que provoque nela o alargamento do seu prprio horizonte. O dilogo se presta nesta situao como um resgate de razes ou evidncias da fragilidade das crianas, j que refletimos no somente sobre os argumentos que so apresentados, sobre a sua disposio interna que so apresentadas, ou seja, sobre a forma de sua sustentabilidade e validade. Sendo assim possvel construir novos valores atravs do dilogo, sem necessariamente abdicar de seus valores individuais. Segundo Santos (2000) o dilogo no grupo da sala de aula, ou comunidade de investigao o fundamento da sociedade democrtica. Para Lipman, a concepo de que a soma das diferentes vises, seja igual realidade falsa, o fundamental no o consenso ou a concordncia, mas a conscincia da existncia de

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    outras razes para explicar a realidade. Preparar intelectualmente as crianas apresentando-lhes problemas complexos, no quer dizer que eles tero com sete anos critrios poderosos para resolv-los.

    Segundo Santos existe a vida e a escola, mas ignorar que crianas no consigam identificar diante da situao as implicaes, os motivos ou as alternativas o mesmo que dizer que elas no pensam.

    2.6 - MATERIAIS DIDTICOS DO PROGRAMA DE LIPMAN Os personagens so modelos de crianas que se provocam, animam, encorajam, fazendo

    de suas experincias desafios a serem superados. De acordo com Kohan, os dilogos acontecem geralmente numa escola (Koman, 2000).

    Os conjuntos de novelas so: A descoberta de Ari Telles, Elfie, Issao e Guga, Pimpa, Nous, Lusa, Satie e Mark.

    Os colaboradores de Lipman tm escrito outros programas complementares. Ann Sharp criou o Hospital de bonecas para a pr- escola; Ronald Reed escreveu Rebeca; Alice dos Santos produziu Alice meu nome; Gilbert Talbot escreveu uma adaptao de Ari chamada Felix e Sofia; (Koman, 2000).

    Segue abaixo um resumo das principais caractersticas e aspectos de cada novela:

    A descoberta de Ari dos Telles

    A lgica o contedo bsico desse conjunto de histrias destinado para as turmas de quinta e sexta sries.

    Quando no consegue responder corretamente uma pergunta feita pelo professor, Ari dos Telles comea a buscar o porqu de sua resposta errada. Realiza construes que compe a estrutura da lgica, Sentindo-se desafiado, regressa e revisa o caminho para suas respostas, ampliando sua investigao, conseguindo ento xito. A percepo de si mesmo iniciando o desenvolvimento da autonomia social e intelectual, a grande descoberta de Ari Telles no primeiro captulo.

    Conceitos presentes nos primeiros captulos: O que pensar, estrutura e proposies lgicas, converso, pensar, os pensamentos mgoa,

    ambigidade, verdade, compreenso, objetivo da escola, pensar por si mesmo, aprender.

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    Lusa Essa novela vem se mostrando a mais importante, pois carrega o que realmente o programa espera dos alunos envolvidos com filosofia (Santos 2002). a ltima novela traduzida e destina-se aos alunos das stimas sries e tem como tema a tica. Uns dos conceitos bsicos apresentados nos dois primeiros episdios so: como devemos viver mistrios, certo e errado, problemas, direitos, boas razes, meios e fins, consistncia, raciocnio condicional.

    Suki

    A novela destinada s duas primeiras sries do ensino mdio e tem como tema central a esttica. Ainda no se encontra traduzida para o portugus. Lipman encontrou inspirao em Hegel e John Dewey, entre outros.

    Mark

    Temos Mark como uma aluso a Max, cujo contedo a filosofia social e poltica (Santos 2002). Esta novela tem como temas centrais: critrios, propriedade, liberdade, crime, democracia, anomia (anarquia), mobilidade social, comunidade, constituio, associao, sociedade integrada, relaes pessoais, direito e minorias, lei e justia.

    Rebeca

    Ana Lusa e Slvia Mandel encontram um material escrito por Ronald Reed chamado Rebeca. O mesmo destinado a crianas da pr- escola e gira em torno da lgica, ou seja, serve como trampolim para as crianas imergirem na discusso das idias. Os conceitos apresentados so morar, perto e longe, ser amigas, realidade e fantasia, entender semana, imaginar dar razes, gostar, enganar-se, equilbrio, chorar, boas razes, perguntar, ser parecido, cor, causa, e efeito, tempo, medo, crescer, mudar (Santos2002).

    Issao e Guga Destinado s crianas de primeiro e segundo ano do ensino fundamental, baseia-se na organizao de descobertas que segundo Lipman, as crianas nessa fase realizam. Tem como modelo filosfico a perspectiva do pr-socrtico. As personagens principais so duas crianas com idade aproximada entre sete e oito anos. Issao um garoto rfo e Guga uma menina com deficincia visual. Ela consegue superar a compaixo dos colegas, mostrando que capaz de compreender o mundo assim como eles.

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    Sua relao com Issao rica, uma vez que faz uso de outros sentidos para suprir a falta de viso. Consegue assim propiciar momentos de reflexo vividos por ambos. Encontramos as seguintes habilidades de raciocnio: achar pressuposies, identificar alternativas, analisar ambigidades, identificar evidncias, comparar, inferir, dar exemplos, dar razes narrar, definir, pensar, encontrar semelhana, prever, fazer distines, raciocnio analgico, formular respostas, raciocnio casual, raciocnio hipottico, raciocnio simtrico.

    Conceitos: Aparecer, cor, bom, culpa, cegueira, histrias, considerar bvio, lugar palavras, mente, propsitos, mundo, realidade, luz, tempo, nomes.

    Pimpa Essa novela uma continuidade de Issao e Guga e tem como personagem principal uma menina chamada Pimpa. Destinada s crianas entre nove e dez anos, ou 3 e 4 anos do ensino fundamental, apresenta a perspectiva da filosofia da linguagem. A partir de um passeio ao zoolgico, o professor pede aos alunos, inclusive Pimpa, que criem uma histria sobre uma criatura misteriosa e a guardem em segredo. As crianas se envolvem em discusses, interligando suas idias com o real, relacionando mente e corpo, conhecendo o significado das coisas, percepo e comunicao. Pimpa estabelece como raciocnio a comparao entre coisas diferentes.

    Os principais conceitos e habilidades apresentadas nos primeiros quatro captulos so: Nomes, relaes familiares, comparaes, relevncia, analogias, razes, ambigidades, com tratar as pessoas, atos mentais, pensar e escrever, justia e direitos, pensar e falar, pedir ajuda definies, sonhar acordado, pensar e investigar, pensar e sentir, gesto, fingir e linguagem corporal. Essas habilidades vo sendo internalizadas a partir da reflexo em torno de temas como histria, amizades nomes, linguagem, realidade e pensamento.

    2.7 - A CRIAO DO IPAC E DO ICPIC

    A ampliao das experincias com o programa trouxe a necessidade de envolver mais pessoas e, conseqentemente, de organizar cursos de capacitao para os interessados para isto era preciso institucionaliz-la, dar-lhe uma existncia jurdica, assim em 1974, Lipamn e Sharp fundam o IAPC Institute for Advancement of Philosophy for Children (Instituto para o Desenvolvimento de Filosofia para Criana) -, cujo principal objetivo era organizar e coordenar

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    a difuso e a implementao do Programa de Filosofia para Criana, no apenas nos Estados Unidos, mas tambm em outros pases. Uma vez institucionalizado, o Programa de Filosofia para Criana poderia, agora ser mais facilmente divulgado e defendido, o que seus colaboradores souberam fazer com bastante competncia: aceitando convites ou se oferecendo para proferir palestras, ministrar cursos ou participar de debates em qualquer lugar onde isso se mostrasse vivel; conquistando espao na imprensa, falada, escrita e televisiva; promovendo cursos de treinamento em escolas; publicando textos tericos em defesa do Programa; produzindo novos materiais didticos com as novelas apresentadas No sub captulo2. 6. A abertura do IAPC para o mundo levou Lipman a criar o International Council for Philosophical Inquiry With Children (Conselho Internacional para Investigao Filosfica com Crianas) ICPIC em 1985. Em reunies anuais, os integrantes desse Conselho discutem os principais problemas que envolvem a aplicao do Programa nos diferentes pases em que introduzido, como por exemplo, o da traduo e da adaptao das novelas s culturas locais.

    2.8 AS ENTIDADES CRIADAS NO BRASIL E SUAS DISSIDNCIAS

    O programa chegou ao Brasil pelas mos de Chatherine Young Silva j falecida em 1993. A primeira experincia prtica com o programa aconteceu no segundo semestre do ano de 1984 com um grupo de crianas que se reunia no Instituto Yazigi.

    Para que o programa fosse de fato implementado no Brasil era preciso que mais pessoas se envolvessem e se capacitassem para desenvolv-lo. At ento o curso era ministrado nos Estados Unidos. Assim Chaterine e seus colaboradores fundaram o Centro Brasileiro de Filosofia para Crianas(CBFC), oficializado em 30 de Janeiro de 1985.

    Uma vez institucionalizado como sociedade civil sem fins lucrativos, de carter cientfico e cultural, a entidade passou a centralizar todas as aes relativas divulgao e implantao da Filosofia para Crianas no Brasil.

    No processo de crescimento e expanso do CBFC tm ocorrido algumas rupturas advindas da lgica institucional especfica adotada para um programa filosfico educacional como Filosofia para Crianas. A mais significativas delas a ciso do Centro de Filosofia Educao para o Pensar de Santa Catarina presidido pelo prof. Silvio Wonsovicz. Essa instituio atende um nmero considervel de escolas e desenvolve atualmente um trabalho independente do CBFC em nvel nacional, com um programa prprio de novelas e manuais,

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    semelhante em sua estrutura com a de Lipman. Esse Centro propicia a criao de ncleos de filosofia, Educao para pens-lo (j existem dez ncleos formados e seis em formao em oito estados da Unio) e oferece cursos de capacitao, assessoria e encontros regionais de Educao de Educao para o pensar. Seu programa oferecido tanto para escolas particulares como pblicas.

    O Centro de Filosofia Educao para o Pensar tem sua sede no tradicional Colgio Corao de Maria em Florianpolis, SC (Rua Emir Rosa 120 CEP 88020-050) Florianpolis Santa Catarina. Ele montou a sua prpria editora, Sophos, que publica um currculo de novelas e manuais para trabalhar desde o pr-escolar at o 8 ano.

    Ao programas que conformam esse currculo so; Deslizando pelas letras e nmeros da (pr escola), O menino e a cabor (investigao Conceitual 1 e 2 ano), Irmos de sangue (investigao analgica, 3 e 4 ano), O internauta (Investigao lgica 5 e 6 ano) e Um cidado de alto nvel (Investigao tica, 7 e 8 ano). A estrutura desses programas a mesma de Lipman e a poltica editorial do centro, semelhante do CBFC: ele s vende os materiais queles que recebem formao neles.

    O centro publica tambm alm de outras matrias o Boletim bimestral Corujinha e ainda Fhilos, Revista Brasileira de Filosofia no Ensino Fundamental.

    Alm dos centros de filosofia para crianas, algumas universidades tm mostrado progressivamente interesse na rea. Como Universidade Catlica de So Paulo, Universidade Catlica do Paran, Universidade do Passo Fundo e a Universidade de Braslia.Estas realizam Atualmente programas especiais de ps-graduao na rea. Na Faculdade de Educao, Universidade de Braslia h uma linha de pesquisa, ligada a um projeto de extenso Filosofia na Escolaque no aplica o programa de Lipman. Sobre o projeto de Filosofia na Escola (Caixa Postal 04348, Faculdade de Educao de Braslia, Universidade de Braslia, CEP 70910-900), cabe ressaltar suas caractersticas mais distintas:

    a) Ele trabalha exclusivamente com a educao pblica; b) gratuito para os professores e escolas participantes; c) um projeto terico e metodologicamente experimental, no se aplica programas

    prontos;

    d) Est associado a um projeto integrado de pesquisa contnuo sobre as possibilidades educacionais da filosofia;

    e) Insere-se em escolas com projetos polticos pedaggicos que favoream a efetiva autonomia do aluno e do professor

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    f) Trabalha a partir dos projetos em desenvolvimento nas escolas; g) Trabalha a formao permanente dos professores na escola e na universidade; h) Envolve professores e alunos de trs cursos: Filosofia, Pedagogia, Psicologia; i) Afirma um conceito horizontal, no hierrquico, de interdisciplinaridade; j) Integra extenso, ensino e pesquisa na formao de alunos de cursos de graduao da

    universidade.

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    CAPTULO III

    OBSERVAO DA PRTICA

    3.1. UMA OBSERVAO DA PRTICA DE FILOSOFIA PARA CRIANAS: PESQUISA DECAMPO EM UMA ESCOLA PBLICA DE DUQUE DE CAXIAS.

    Visita realizada no dia seis de julho de 2010, na Escola Municipal Joaquim da Silva Peanha, localizada no Bairro Beira Mar, Duque de Caxias, Com a presena da pesquisadora do Projeto Filosofia na Escola, coordenado pelo prof. Walter Koman da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Fabiana Olarieta. Fabiana me relatou que os encontros comearam em 2008, primeiro com um curso para os professores.

    Os trabalhos comearam a ser realizados em uma sala reformada e agora ganharam uma casa que ir se transformar em um salo, as crianas a chamam de casa da filosofia. Este projeto est sendo realizado nesta escola h aproximadamente trs anos e esta escola foi includa por um projeto da FAPERJ. Quando este trabalho comeou os alunos estavam no 4 ano e agora eles j esto no 6 ano, os alunos tm em mdia 11 anos. Na metodologia deste projeto os trabalhos so realizados com temas escolhidos pelos alunos, no existe material pr-determinado. Os encontros so filmados e gravados com a autorizao dos pais, porm neste dia no teria a filmadora. Devido a isto s pude fotografar o espao do encontro e gravar algumas falas dos alunos.

    A casa da filosofia possui uma cozinha pequena, um banheiro, uma sala de cores claras e na parede em frente janela contm um mural. No piso esto vrias almofadas em crculo para a acomodao de todos.

    O grupo era formado por dez crianas, uma professora (Ana) e a pesquisadora Fabiana. O encontro durou aproximadamente uma hora, neste perodo foram questionados pelos alunos alguns temas como: religiosidade, espao geogrfico, questes sobre real e imaginrio, verdade e mentira.

    Comeamos as atividades, relembrando o ltimo encontro onde o grupo tinha feito a seguinte atividade: Fabiana colocou no mural um poema e vrias fotos. Desse conjunto de material saram vrias perguntas formuladas pelos alunos, cada aluno escolheu uma pergunta para ser respondida. Seguem abaixo as perguntas:

    - Como o lugar quando ningum passa por ele? - Existem as coisas sem serem vistas?

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    - Existe, existe o mundo apenas pelo olhar que o cria e lhe oferece especialidade? - O mundo que vemos uma realidade? - Existe o mundo porque vemos ou ele existe independente de nossa imaginao?

    Segue abaixo trechos da narrativa dos alunos. Fabiana pediu para que no fossem colocado os nomes das crianas, neste caso usaremos apenas letras significando o nome de cada uma:

    Fabiana: Ento, j tem 15 dias do nosso ltimo encontro, algum lembra. Grupo: Ah!, Ah! Ah!

    Fabiana: Eu no perguntei ainda! O que a gente fez no encontro passado? H vrios encontros estamos discutindo

    sobre a mesma questo, ento quem se oferece um pouco para reconstruir o que a gente vem fazendo?

    Aluno A:

    A gente tava falando daquele muralzinho ali e das perguntas que voc botou ali para ver o que representa, o que a gente pensou.

    Fabiana: Ns estamos discutindo a partir do mural, a voc contou o que a gente fez. Que questo a gente vem falando? Eu perguntei o que a gente est discutindo? A partir desses poemas a. Qual o tema que a gente vem conversando? Aluno A:

    Responder o que acham daquelas perguntas e pensar na resposta, saber se tem sentido.

    Fabiana: Mas a? Isto no apareceu do nada. H vrios encontros viemos falando da mesma questo. Em que questo a gente vem falando? Aluno B:

    A gente estava falando do mural e do poema? (O que eu percebo a que existe sobre o poema um conjunto de frases expostas no

    cartaz).

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    Fabiana: O que a gente est descobrindo a partir do poema? Este poema no apareceu do nada. Ento, no encontro uma daquelas perguntas. Alunos quietos.

    Tem alguma idia para responder? Vamos pegar o caderno. Aps entregar os cadernos aos alunos, Fabiana verifica quem respondeu; depois ela

    comea a estruturar o dilogo com a seguinte proposta: Ento, vamos escolher algum, algum que se oferece, qual a pergunta que escolheu.

    Vamos escutar o que a pessoa fala e se algum escolheu a mesma pergunta pode pedir tambm para falar.

    Aluno A: A frase.

    Existem as coisas sem serem vistas? Eu acho que pra mim precisa de um olhar humano para enxergar as coisas quando as pessoas passam por um problema, depois pode falar que aquelas coisas existem, mas naquele momento no tem certeza que existe.

    Fabiana: Algum entendeu o que A respondeu? Ana:

    Eu entendi, precisa de um olhar humano para enxergar as coisas, no final ele falou outra coisa.

    Fabiana: O que voc colocou no final?

    Aluno A:

    As pessoas acreditam no que elas vem. Estou nervoso. Ana:

    As pessoas s acreditam vendo. Aluno A:

    Depois pode at falar que aquilo existe. Aluno B:

    Ele falou que as pessoas acreditam no que elas vem, nas coisas que eles vem, depois que elas verem podem dizer que existe, se no verem no existe.

    Fabiana: Ah! Entendi!

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    Fabiana: Existem as coisas sem serem vistas?

    Fabiana: Ento, o que voc responderia a partir desta pergunta, sim ou no? Aluno A:

    Acho que sim.

    Fabiana: Mas a, voc falou que precisa de um olhar humano. Ana:

    Que as pessoas s crem se elas vem as coisas. Fabiana: Voc acredita que no ento. Aluno A:

    S acredito vendo. Aluno C: Voc evanglico

    Aluno A:

    Sou. Aluno C:

    Ah, ento porque voc vai igreja? Aluno A:

    No, mas assim diferente. Aluno C:

    A maioria das pessoas vai igreja e no v Deus. Aluno A:

    Voc j viu Deus falando? Aluno C:

    J ouvi, mas nunca vi Deus.

    Fabiana: Vamos dar lugar aos outros, eles esto esperando. Aluno D:

    Ah voc, Antrtica ou outros pases que voc no viu, voc j viu outros pases alm do Brasil?

    Voc sabe que ele existe?

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    Aluno A:

    Sei.

    Aluno D:

    Mas voc nunca viu?

    Aluno A:

    Mas passa na televiso n?

    Aluno D:

    A a Antrtica voc nunca viu, j viu? Aluno D:

    J viu pela televiso?

    Aluno A:

    J vi a Antrtica pela televiso.

    Fabiana: No precisa ver tecnicamente...(aluno D interrompe a professora) Aluno D:

    Voc falou que precisa ver pelo olhar humano, est escrito a no est?

    Aluno A:

    Voc filma pelo olhar humano.

    Fabiana: A televiso um olhar humano.

    Aluno A:

    Tem foto de satlite e me falaram, Antrtica um continente, ali. Aluno D:

    Mas voc nunca viu?

    Aluno A:

    A pessoa v pessoalmente.

    Aluno A:

    Mas comprovado que neve, que gelado. Ana:

    A televiso, ela pode at mostrar algumas partes da Antrtica, mas no pode mostrar toda, mas tem coisa que voc no viu ainda. Por exemplo, a fotografia at mostra as coisas, mas no mostra tudo que tem naquele lugar, ento tem coisa naquele lugar que talvez no tinha visto, ento no existe?

    Aluno A:

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    , pode existir n? Aluno A:

    Eu estou na Antrtica eu vou olhar para l e no vou ver nada. Fabiana: Ento tem coisas que a gente no v mais existe voc acha que tem coerncia? Uma

    coisa ver com a outra.

    Aluno A:

    mais ou menos. Fabiana: Como possvel que exista alguma coisa que no viu. Aquilo que a gente no viu

    no, no existe