a nefrologia para não-nefrologistas 2008 - cópia.pdf

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5555ºººº Curso de Nefrologia ClCurso de Nefrologia ClCurso de Nefrologia ClCurso de Nefrologia Clíííínica donica donica donica doCentro Hospitalar de Vila Nova de GaiaCentro Hospitalar de Vila Nova de GaiaCentro Hospitalar de Vila Nova de GaiaCentro Hospitalar de Vila Nova de Gaia

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OrganizaOrganizaOrganizaOrganizaççççãoãoãoão

Serviço de Nefrologia do CHVNG

Data e LocalData e LocalData e LocalData e Local

30 e 31 de Junho de 2008Parque Biológico, Vila Nova de Gaia

SecretariadoSecretariadoSecretariadoSecretariadoAcropole, Convenções, Secretariado e Serviços

Rua de Gondarém, 956, r/cFoz do Douro - 4150 - 375 Porto

Telefone: 22 619 96 80 - Fax: 22 619 96 [email protected]

FormadoresFormadoresFormadoresFormadores

Clara AlmeidaLuis Costa

João Carlos FernandesAna Marta GomesSerafim GuimarãesSusana PereiraJoaquim SeabraSónia Sousa

Isabel TavaresAna Ventura

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ApoiosApoiosApoiosApoios

BayerBial

Boheringer IngelheimFresenius Medical Care

GenerisNovartisPfizer

Roche Farmacêutica QuímicaSanofi-Aventis e BMS

Servier

PatrocPatrocPatrocPatrocíííínios Cientnios Cientnios Cientnios Cientííííficosficosficosficos

Associação Portuguesa de Médicos de Clínica GeralSociedade Portuguesa de Medicina Interna

Sociedade Portuguesa de NefrologiaSociedade Portuguesa de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo

5555ºººº Curso de Nefrologia ClCurso de Nefrologia ClCurso de Nefrologia ClCurso de Nefrologia Clíííínica donica donica donica doCentro Hospitalar de Vila Nova de GaiaCentro Hospitalar de Vila Nova de GaiaCentro Hospitalar de Vila Nova de GaiaCentro Hospitalar de Vila Nova de Gaia

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Sexta-feira, 30 de Maio de 2008

09h30 – Alterações do Potássio10h15 – Alterações do Sódio

11h00 - 11h30 – Coffee-Break11h30 – Alterações do Equilíbrio Ácido-Base12h15 – Exames Complementares de Diagnóstico

12h45-14h00 – Almoço14h00 – Hematúria e Proteinúria15h00 – Insuficiência Renal I

16h00 –16h30 – Coffee-Break16h30 – Insuficiência Renal II

Sábado, 31 de Maio de 2008

09h00 - Nefropatia Diabética09h30 - Hipertensão Arterial de causa renal10h00 – Substituição da Função Renal: a diálise e o transplante

11h00 - 11h30 – Coffee-Break11h00 – Infecções Urinárias11h30 – Litíase Urinária

12h30-14h00 – Almoço13h30 – Fármacos e Rim14h15 – Alterações renais nas doenças sistémicas

16h00 –16h30 – Coffee-Break15h30 – Referenciação à consulta de Nefrologia16h00 – Sessão prática – casos clínicos

5555ºººº Curso de Nefrologia ClCurso de Nefrologia ClCurso de Nefrologia ClCurso de Nefrologia Clíííínica donica donica donica doCentro Hospitalar de Vila Nova de GaiaCentro Hospitalar de Vila Nova de GaiaCentro Hospitalar de Vila Nova de GaiaCentro Hospitalar de Vila Nova de Gaia

AgendaAgendaAgendaAgenda

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AlteraAlteraAlteraAlteraçççções do Potões do Potões do Potões do Potáááássiossiossiossio

Sónia Sousa, Nefrologista do Serviço de Nefrologia do CHVNG/E

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ALTERAÇÕES DO POTÁSSIO

1- Conceitos Básicos

A manutenção de um balanço de potássio normal é essencial para uma

variedade de funções celulares e neuromusculares.

A reserva de potássio de um adulto normal é aproximadamente 3000 a 4000

mEq, e noventa e oito por cento deste potássio é intra-celular, daí que nos distúrbios

do potássio não é possível determinar o défice/excesso deste ião no organismo e o

tratamento envolve a determinação seriada do seu valor.

2- Factores envolvidos na homeostase do K+

A ingestão diária normal de potássio é cerca de 40-120 mEq/dia, é armazenado

principalmente nas células e é excretado sobretudo na urina e em menor quantidade

no suor e nas fezes.

A alteração da concentração do potássio plasmático envolve a modificação de

um ou mais destes processos.

Dieta

K+ plasmático células

Suor Fezes Urina

Os 3 mecanismos fisiológicos principais para a regulação do K+ envolvem:

� Transporte celular (entrada/saída das células)

� Eliminação urinária

� Eliminação gastrointestinal

De forma a minimizar aumentos transitórios da concentração plasmática do

potássio, após a ingestão e antes da excreção, o organismo desenvolveu vários

mecanismos fisiológicos para transportar o potássio para dentro das células. O

transporte celular do potássio através da membrana celular faz-se pela bomba Na+K+-

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ATPase, que é activada pela acção da insulina e pela estimulação dos receptores

ββββ2-adrenergicos. É o principal mecanismo de adaptação às alterações rápidas da

concentração do K+.

Figura 1. Hormonas envolvidas na homeostase normal do potássio (Insulina, catecolaminas β-

adrenergicas, aldosterona)

3- Homeostasia renal do K+

Nas 4 horas seguintes à ingestão/administração de potássio o rim excreta

cerca de 50% do valor total.

O potássio é livremente filtrado no glomérulo. A maioria do K+ é reabsorvida no

tubulo contornado proximal e na ansa de Henle, daí que em condições fisiológicas

normais, a chegada de K+ ao tubulo distal é mínima e praticamente constante.

A secreção de K+ ocorre no tubulo distal sobretudo na parte inicial do tubulo

colector e no tubulo colector cortical. A secreção de K+ no tubulo distal é geralmente

responsável pela maioria da excreção urinária do K+.

A célula principal do tubulo colector é a responsável pela secreção deste ião e

os reguladores fisiológicos mais importantes neste processo são a actividade

mineralocorticóide e a chegada de Na+ e água ao tubulo distal.

Page 9: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

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1. Mineralocorticóides

Os mineralocorticóides estimulam a secreção de potássio pelas células do

ducto colector por três mecanismos principais:

a. Aumentam a concentração intracelular de potássio por estimulação directa

da bomba Na+/K+-ATPase.

b. Aumentam a permeabilidade da membrana apical da célula principal ao K+.

c. Estimulam a reabsorção do sódio na membrana apical, o que despolariza a

célula relativamente ao lúmen tubular, aumentando o gradiente eléctrico

favorecendo a secreção de K+. A reabsorção do sódio pela membrana

apical é feita por um canal de Na+ sensível ao amilorido.

Figura 2. Célula principal do ducto colector

2. Aumento de sódio e água no tubulo colector

O aumento do ião sódio no ducto colector estimula a absorção deste a este

nível, despolarizando a célula, levando a que a bomba de Na+/K+-ATPase funcione a

um ritmo mais rápido e, consequentemente, ao aumento da secreção do potássio. O

aumento de fluxo tubular de água também aumenta a secreção do K+ porque dilui o K+

baixando a sua concentração luminal.

Em condições normais estes dois factores (mineralocorticóides e sódio tubular)

são inversamente regulados pelo volume arterial efectivo não havendo alterações na

concentração plasmática do potássio.

A redução do volume arterial efectivo está associada a um aumento da

secreção de aldosterona (por estimulação do eixo renina-angiotensina-aldosterona) da

que resulta um aumento da secreção de potássio, mas a redução do sódio no tubulo

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colector (por reabsorção no tubulo proximal) contraria esta secreção. Por esta razão a

excreção renal de K+ e o seu valor plasmático, são independentes do volume arterial

efectivo.

Só em determinadas condições patológicas é que a aldosterona e a chegada

de sódio ao tubulo distal actuam da mesma forma, tais como os diuréticos (provocam

depleção de volume provocando estimulação do eixo renina-angiotensina-aldosterona,

e aumentam a excreção de sódio estimulando a secreção de potássio no tubulo

colector).

No hiperaldosteronismo primário o defeito está no aumento da secreção de

aldosterona, provocando aumento da reabsorção de água e sódio e da excreção de

potássio; a hipervolemia consequente provoca também um aumento da excreção de

água e sódio renal e a chegada de iões sódio ao tubulo distal potencia a excreção de

potássio. O resultado final é a hipocalemia. No hipoaldosteronismo o contrário

acontece, há depleção de volume e retenção de potássio (pelo défice de aldosterona e

pela menor chegada do sódio ao tubulo distal).

Mineralocorticóides [Na+] tubo

distal

Secreção de

K+ Exemplos

Volume extra-celular ↑↑↑↑ ↓↓↓↓ ↑↑↑↑ S/alteração Hipervolemia

Volume extra-celular ↓↓↓↓ ↑↑↑↑ ↓↓↓↓ S/alteração Desidratação

↑↑↑↑ Primário mineralocorticoides ↑↑↑↑ ↑↑↑↑ ↑↑↑↑ Hiperaldosteronismo 1ário

Estenose da artéria renal

↓↓↓↓ Primário mineralocorticoides ↓↓↓↓ ↓↓↓↓ ↓↓↓↓ D. Addison

↑↑↑↑ [Na+] tubo distal ↑↑↑↑ ↑↑↑↑ ↑↑↑↑ Diuréticos

↓↓↓↓ [Na+] tubo distal ↓↓↓↓ ↓↓↓↓ ↓↓↓↓ Glomerulonefrite aguda

Fig 3. Regulação da secreção de potássio

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Hipocaliemia

K+ plasmático < 3,5 mEq/L

1. Mecanismos de hipocaliemia

1.1. Ingestão diminuída de K+

É uma causa rara de hipocaliemia. Numa dieta sem K+ o rim mantém uma

excreção constante de cerca de 15 mEq/dia de K+. Esta incapacidade de o rim

diminuir a excreção do K+ para quase zero poderá reflectir a prioridade em proteger o

organismo da hipercaliemia, mas que em situações de ingestão muito diminuída

associada ou não a outros factores (ex. diuréticos), em que o consumo é inferior às

perdas, pode levar a hipocaliemia.

Causas de Hipocaliemia

Ingestão diminuída

Caquexia

Anorexia

Redistribuição celular

Alcalose metabólica ou respiratória

Aumento de insulina

β2-agonistas

Paralisia periódica hipocalemica

Intoxicação por cloroquina

Perdas extra-renais

Diarreia

Uso de resina permutadora de iões

Uso de laxantes

Perdas cutâneas (queimaduras)

Perdas renais

Diuréticos tiazídicos ou de ansa

Excesso de mineralocorticoides

Síndrome de Liddle

Síndrome de Gittelman ou Bartter

Hipomagnesiemia

Poliúria

Fármacos (anfotericina B, L-dopa)

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1.2. Redistribuição celular do K+

A hipocaliemia pode resultar de um aumento do movimento do K+ para as

células. As catecolaminas promovem a entrada o K+ para as células (por estimulação

do receptor β2 adrenérgico) assim como a insulina. Ambos aumentam a actividade da

bomba Na+/K+-ATPase.

A alcaliemia, metabólica ou respiratória, promove a entrada de K+ para as

células. Nos estados de alcalose, os iões H+ saem das células para o fluido extra-

celular na tentativa de minimizar a elevação do pH. Para preservar a

electroneutralidade do líquido extracelular o K+ entra para as células.

A ingestão de alguns fármacos tais como a cloroquina ou a risperidona

provoca hipocaliemia, presumivelmente, devido a um shift celular do K+. A ingestão de

bário bloqueia os canais de K+ celulares que permitem a sua saída.

A paralisia periódica hipocalemica é uma doença rara caracterizada por

fraqueza muscular ou paralisia devido à movimentação súbita do K+ para dentro das

células. Pode ser familiar ou adquirida e é de transmissão autossómica dominante.

Resulta da mutação do gene que codifica uma subunidade do canal de cálcio ou do

sódio muscular.

1.3 Perdas extra-renais de K+

As perdas gastrointestinais de K+ são uma das causas mais frequentes de

hipocaliemia. Pode ocorrer por diarreia, fístulas intestinais, pelo uso de sondas de

drenagem (biliar SNG, etc.), pela presença de adenomas vilosos ou pelo uso abusivo

de laxantes.

As resinas permutadoras de iões são usadas frequentemente no tratamento da

hipercaliemia; do consumo abusivo destas substâncias pode resultar hipocaliemia,

hipomagnesiemia e ocasionalmente alcalose metabólica.

NOTA: Os vómitos causam por vezes hipocaliemia mas não se deve a perdas GI

porque a concentração de K+ nas secreções gástricas é baixa (5-10 mEq/L). Os

vómitos aumentam a produção de bicarbonato, desta forma aumentando a chegada de

NaHCO3 ao tubulo colector. O aumento do sódio no tubulo colector e o aumento de

aldosterona (pela depleção de volume) provocam espoliação renal de K+.

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Raramente a hipocaliemia pode resultar de perdas cutâneas de K+. Em

situações de exercício físico intenso num ambiente quente e húmido pode-se perder

cerca de 10L de suor diários. Destas perdas pode resultar hipocaliemia apesar de a

concentração de K+ no suor não ser superior a 5 mEq/L.

As queimaduras extensas são também uma fonte de perda de fluidos e K+

significativa.

1.4. Perdas renais de K+

A. Aumento da actividade mineralocorticóide primária

O aumento da actividade mineralocorticóide pode resultar de:

-Aumento primário da secreção da renina plasmática (tumores produtores de

renina, estenose da artéria renal)

-Aumento primário da secreção da aldosterona (hiperaldosteronismo 1ário –

adenoma, carcinoma, hiperplasia)

-Aumento de outros mineralocorticóides (síndrome paraneoplásico, S. Cushing)

-Síndrome de excesso aparente de mineralocorticóides

O diagnóstico diferencial a ter em consideração num doente com hipertensão

arterial, hipocaliemia e alcalose metabólica acenta nos níveis plasmáticos de renina e

de aldosterona. Aproximadamente 15% dos doentes com estenose da artéria renal

desenvolvem hipocaliemia em associação com níveis de renina e aldosterona

aumentados.

No síndrome de excesso aparente de mineralocorticóides os níveis de renina e

aldosterona estão suprimidos. Trata-se de uma doença rara, autossómica recessiva. O

receptor mineralocorticoide é capaz de se ligar ao cortisol e à aldosterona com a

mesma afinidade. Em situações normais a ligação do cortisol a este receptor é

impedida porque é rapidamente degradado pela enzima 11β-hidroxiesteroide

desidrogenase tipo 2. Nesta patologia a actividade desta enzima está diminuída

permitindo a activação persistente destes receptores pelo cortisol.

B. Aumento do sódio no tubulo distal

Os diuréticos tiazidicos e de ansa são a causa mais frequente de hipocalémia.

Um dos factores responsáveis é o aumento da concentração de sódio no tubulo

colector (inibição da reabsorção de sódio e água) mas a depleção de volume induzida

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pelos diuréticos estimula a produção de aldosterona, contribuindo também para a

hipocaliemia. A hipocaliemia secundária aos diuréticos é dose-dependente.

No défice de magnésio há uma reabsorção diminuída de sódio tubular,

aumentando desta forma a sua excreção e concentração tubular, daí a relação

frequente entre a hipomagnesiemia e a hipocaliemia refractária ao tratamento.

Em condições, tais como os vómitos e a ATR proximal, a hipocaliemia resulta da

presença de bicarbonato excretado na forma de bicarbonato de sódio.

No Síndrome de Liddle há um aumento da densidade e da actividade dos canais

de sódio no ducto colector, havendo desta forma um aumento da reabsorção do Na+ e

da excreção de K+. Este síndrome distingue-se do hiperaldosteronimo 1ário pela

presença de níveis plasmáticos reduzidos de renina e aldosterona.

2. Manifestações Clínicas

Manifestações clínicas da hipocaliemia aguda

• Fraqueza muscular ou paralisia (incluindo íleo paralítico)

• Arritmia cardíaca

• Rabdomiólise

3. Diagnóstico

A abordagem do doente hipocalémico deve incluir pelo menos:

- História clínica (fármacos, vómitos, diarreia, etc.)

- Exame físico (volume extracelular, TA)

- Determinação da excreção urinária de potássio (um K+ < 20 mEq/L na urina

de 24h sugere uma causa extra-renal de hipocaliemia)

1º →→→→ Se a perda de K+ é renal, vamos avaliar o volume vascular efectivo de

forma a distinguir entre as situações causadas por um aumento primário de

mineralocorticoides ou um aumento do Na+ no tubo colector.

2º →→→→ Se o doente se apresenta com um aumento do volume arterial efectivo,

frequentemente com HTA, mede-se a renina e aldosterona.

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3º →→→→ Se o doente está depletado de volume vamos medir o bicarbonato

sérico:

� se for baixo é uma acidose tubular renal;

� se for alto, o que é muito mais comum, a hipocalémia deve-se ao aumento do Na+

no tubo colector.

4º →→→→ Se a história clínica não permite diferenciar, mede-se o Cl- na urina:

� se o Cl- for baixo significa que há outro anião na urina que impediu a reabsorção

do Na+, é o que se passa na alcalose ou durante a administração de fármacos

que se comportam como aniões não reabsorvíveis.

↑↑↑↑R, ↑↑↑↑A ↓↓↓↓R, ↑↑↑↑A ↓↓↓↓R, ↓↓↓↓A

Fig 4. Diagnóstico

[K+] urina

Pressão arterial e volume arterial efectivo

Baixo – Normal

Diarreia

[HCO3-]

Baixo Elevado

Estenose artéria renal

Adenoma SR Hiperplasia SR Hiperaldosteronismo

remediável

S. Cushing Excesso aparente

mineralocorticoides S. Liddle

[Cl-] urina

Baixo Elevado

Vómitos Diuréticos ↓ Mg2+ Bartter Gittelman

ATR

< 20 mEq/L > 20 mEq/L

Alto

Renina, Aldosterona

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5. Tratamento

A redução do K+ plasmático de 4 para 3 mEq/L deve-se à perda de cerca de

200 a 400 mEq de K+, assumindo que a distribuição de K+ dentro e fora das células é

normal. Mas, como já referido, não é possível determinar o défice real de K+ dado a

que é um ião maioritariamente intra-celular e há situações clínicas variadas que

alteram a proporção da distribuição intra-extra celular do potássio.

O tratamento da hipocalémia consiste em repor o défice de K+ via oral (60-80

mEq/dia) ou ev. consoante a gravidade da hipocaliemia. Deve-se tratar/resolver, em

simultâneo, a causa da hipocaliemia.

Após o início do tratamento deve-se dosear frequentemente a sua

concentração plasmática de forma a suspender ou manter o tratamento.

Regras no uso de KCl e.v.:

1. Nos doentes com hipocaliemia grave (< 2,5 mEq/L), com arritmia cardíaca ou com

necessidade de administração e.v. rápida de K+ é necessária monitorização

cardíaca

2. Em geral a administração em bólus e.v. está contra-indicada

3. Se administrado por veia periférica não deve se deve usar uma concentração

superior a 40mEq/L porque pode causar flebite (60 mEq/L se veia central);

4. O ritmo de perfusão não deve ultrapassar os 10-20mEq/h excepto nos casos de

arritmias com risco de vida (não devendo exceder os 80 mEq/h).

5. A administração e.v. rápida de K+ (5 a 10 mEq em 10 min) deve ser reservada

para situações de emergência (arritmias malignas e paralisia dos músculos

respiratórios secundárias a hipocaliemia), através de um cateter central, com

doseamentos cada 30 min.

6. Se houver acidose e hipocalemia concomitantes, significa que o défice de K+ é

muito superior ao aparente (a acidose aumenta o K+ extra-celular e diminui o

intracelular).

7. Se a correcção da acidose exigir administração de bicarbonato, corrigir sempre

primeiro a hipocalemia ou vamos agravar ainda mais o défice de K+

8. Se coexistir hipomagnesiemia administrar sulfato de magnésio

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Hipercaliemia

K+ plasmático > 5,5 mEq/L

1. Pseudohipercaliemia

A causa mais frequente de pseudohipercaliemia é a hemólise que pode

ocorrer numa colheita de sangue.

Em indivíduos normais, é libertado K+ das plaquetas e leucócitos antes da

centrifugação do sangue colhido e o nível sérico aumenta cerca de 0,1-0,5 mEq/L.

Habitualmente o aumento mantém os níveis de K+ dentro dos limites normais mas

podem, no entanto, ocorrer erros na medição na presença de trombocitose ou

leucocitose marcadas.

2. Mecanismos de hipercaliemia

2.1. Redistribuição celular

Alterações na redistribuição celular causa mais frequentemente hipercaliemia

do que hipocaliemia.

A destruição celular provoca a saída do potássio intra-celular para o plasma.

Como causas temos a rabdomiólise, traumatismo tecidular, queimaduras, lise tumoral

(após tratamento) ou coagulação intravascular disseminada massiva.

O aumento da osmolaridade plasmática promove a saída do K+ para fora das

células, este mecanismo ocorre mais frequentemente nos diabéticos quando a

glicemia sobe.

Na acidose metabólica há saída de K+ das células de forma a manter a

electroneutralidade entre o espaço intra e extracelular (devido ao excesso de iões H+

dentro da célula). O efeito na concentração plasmática depende do grau de acidemia e

do estado de repleção corporal de K+. A hipercaliemia é mais grave em situações de

acidose mais severa e em doentes com reserva corporais de K+ normais-altas.

A Paralisia Periódica Familiar também tem uma variante hipercalémica.

Resulta de uma mutação do gene que codifica um dos canais do Na+ das células

musculares.

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2.2. Diminuição da Excreção renal

A diminuição da excreção renal do K+ deve-se a 3 mecanismos principais:

A- Insuficiência Renal

A insuficiência renal aguda (IRA) pode levar em algumas situações à

diminuição da chegada de sódio e água ao tubulo colector, que consequentemente

poderá diminuir a secreção de K+. Quando a IRA é oligúrica a hipercaliemia é um

achado frequente.

Na insuficiência renal crónica (IRC), em acréscimo à diminuição da taxa de

filtração glomerular (TFG), e portanto diminuição da chegada de sódio e água ao

tubulo colector, o número total de nefrónios também está diminuído havendo menos

tubulos colectores para secretar potássio. Esta situação é contra-balançada por vários

mecanismos de defesa:

- os ductos colectores remanescentes adquirem uma maior

capacidade de excretar K+

- a redistribuição celular é mais rápida nos IRC

- a excreção intestinal de K+ é maior (aumento de canais de K+)

Dado a estes mecanismos a hipercaliemia é habitualmente incomum até que a

TFG seja inferior a 5 ml/min. A ocorrência de hipercaliemia em doentes com TFG > 10

ml/min deve-se normalmente a níveis de aldosterona baixos ou a lesões no ducto

colector.

B- Disfunção do tubulo distal

Determinadas doenças intersticiais podem afectar, especificamente, o tubulo

distal, provocando hipercaliemia na ausência de insuficiência renal avançada e na

presença de níveis de aldosterona normais.

Existem situações geneticamente transmitidas, pseudohipoaldosteronismo

tipo I e tipo II, que se acompanham também de hipercaliemia.

C- Diminuição da actividade mineralocorticoide

A redução da actividade mineralocorticoide pode resultar de uma anomalia em

qualquer ponto do sistema renina-angiotensina-aldosterona. Estes distúrbios podem

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ser resultado de uma patologia ou secundários a fármacos. Como exemplos temos a

Doença de Addison e fármacos tais como os IECA, ARA II e a espironolactona.

A heparina parece reduzir a secreção de aldosterona por inibição directa

glandular. A hipercaliemia pela heparina só é evidente quando existe um distúrbio

adicional, por exemplo, insuficiência renal.

Fig 4. Fármacos que interferem no sistema renina-angiotensina-aldosterona podendo desta forma

alterarem a concentração do potássio plasmático.

Na ausência de uma causa óbvia (IRA oligúrica, diuréticos poupadores de K+,

IECA’s, etc.), o síndrome de hipoaldosteronismo hiporeninémico, é a causa de 50%

a 75% da hipercaliemia nos adultos. Esta patologia caracteriza-se por:

-Insuficiência renal leve a moderada (clear creat 20-75 ml/min)

-50% têm diabetes mellitus, os restantes têm NTI crónica

-Actividade da renina plasmática diminuída na maioria dos casos

-Hipercaliemia, tipicamente assintomática

Page 20: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

14

3. Manifestações Clínicas

Manifestações clínicas da hipercaliemia

• Fraqueza muscular ou paralisia (>8 mEq/L)

• Arritmia cardíaca (fibrilação ventricular, bradiarritmia)

Alterações electrocardiográficas

o Ondas T altas e pontiagudas

o Desaparecimento da onda P

o Alargamento do QRS

o Paragem cardíaca

4. Diagnóstico

A avaliação de um doente com hipercaliemia deve incluir:

-História clínica completa (consumo de K+ diário e antecedentes de

IRC, diabetes mellitus, diuréticos poupadores de K+)

-Exame físico (fraqueza muscular, depleção de volume ou edema)

-ECG

-GSA (pH)

-Bioquímica (glicose, ureia, creatinina, ionograma, cálcio)

Com esta informação, o diagnóstico pode ser simplificado considerando 3

grupos de condições clínicas, já expostas préviamente:

1. Aumento da ingestão

2. Saída das células

3. Redução da excreção renal

5. Tratamento

O tratamento da hipercaliemia varia com a gravidade do distúrbio electrolítico.

Os sintomas severos não são normalmente evidentes até que a concentração

plasmática do potássio seja superior a 7,5 mEq/L, embora varie de doente para

doente. A presença de uma concentração plasmática de K+ superior a 8 mEq/L, de

alterações no ECG marcadas ou de fraqueza muscular severa obrigam ao tratamento

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imediato englobando praticamente todas as abordagem descritas na seguinte

tabela:

Tratamento da hipercaliemia

Antagonismo das acções da membrana celular

Cálcio (gluconato/cloreto)

Promoção da entrada de K+ para as células

Glicose e insulina

NaHCO3

Agonistas β2-adrenérgicos

Remoção do excesso de K+ do organismo

Diuréticos

Resina permutadora de iões

Hemodiálise

Para que o tratamento seja eficaz é essencial a saída do K+ do organismo. Os

fármacos que promovem a entrada K+ para as células têm apenas um efeito

transitório havendo posteriormente, caso não haja excreção do excesso de K+, novo

aumento dos níveis de K+. Esta excreção pode ser feita pelo rim, pelo intestino ou

através da diálise.

Descrição dos fármacos:

Cloreto/Gluconato de Cálcio

Só usado em doentes com intoxicação grave pelo K+ e com alterações

electrocardiográficas secundárias à hipercaliemia, que não podem esperar 30 a 60 min

que a insulina e a glicose comecem a actuar.

O cloreto de cálcio contém uma concentração superior de cálcio elementar (3x

mais) em comparação com o gluconato de cálcio, e deve ser administrado

preferencialmente por uma veia central.

Efeito imediato (estabilizador da excitabilidade da membrana celular).

Dose habitual: Infusão lenta (2-3 min) de 10 mL de gluconato de cálcio a 10%

ou de 5-10 mL de cloreto de cálcio a 10%. Repetir dose 5 min depois se não houver

melhoria dos sinais electrocardiográficos.

Page 22: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

16

Glicose e insulina

Efeito com início aos 15 min e com efeito máximo aos 60 min, e pode persistir

várias horas depois.

Dose habitual: 20 U de insulina de acção rápida + 500cc de SG a 5% com 3

ampolas de glicose a 30%.

Bicarbonato de sódio

Efeito 30 a 60 min após a administração e pode persistir várias horas depois.

Efeito limitado quando usado em monoterapia e nos IRC. Deve ser reservado

apenas para doentes com acidose metabólica.

Dose habitual: 44-50 mEq de NaHCO3 infundido em 5 min. A dose poderá ser

repetida 30 min depois.

Agonistas ββββ2-adrenérgicos

Efeito máximo após 90 min do início da nebulização.

Pode precipitar taquicardia e isquemia cardíaca (a evitar na doença coronária

instável).

Dose: nebulização com salbutamol 10-20mg em 5 cc de SF.

Resina permutadora de iões

Efeito tardio (várias horas após administração)

Dose: oral – 15g 3x/dia,

enema (se a via oral não é possível) – 50g em 50cc de sorbitol a 70% +

100cc de água, permanecendo pelo menos 30 a 60 min.

Hemodiálise

Efeito quase imediato. Permite a remoção de cerca de 25-50 mEq de K+ por

hora.

Reservada nas situações em que as medidas conservadoras não foram

eficazes, existe hipercaliemia severa, insuficiência renal e/ou lesão tecidular extensa

com libertação de grande quantidade de K+.

Diuréticos

Não são úteis no tratamento imediato da hipercaliemia.

Úteis no tratamento da hipercaliemia nos doentes com diurese mantida.

Aumentam a excreção renal de potássio.

Page 23: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

17

Bibliografia

• Nephrology Self-Assessment Program – Vol 5, Nº 1, January 2006

• Clinical Phisiology of Acid-base and Electrolyte Disorders. Burton David

Rose, Theodore W. Post

Page 24: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

AlteraAlteraAlteraAlteraçççções do Sões do Sões do Sões do Sóóóódiodiodiodio

Joaquim Seabra, Director do Serviço de Nefrologia do CHVNG/E

Ana Marta Gomes, Interna Complementar de Nefrologia do CHVNG/E

Page 25: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

ALTERAÇÕES DA CONCENTRAÇÃO DE SÓDIO A osmolalidade (concentração de solutos ou partículas de um fluido) do Fluido Intracelular (FIC) e do Fluido Extracelular (FEC) é sempre igual porque a água difunde rapidamente através das membranas celulares de modo a conseguir o equilíbrio osmótico. Devido ao equilíbrio osmótico, as alterações no conteudo de água de um dos compartimentos afecta o FIC e o FEC (ao contrário das alterações do conteudo do sódio, que afecta principalmente o FEC ao qual está restringido). A osmolalidade da Água Corporal Total (ACT) é calculada pela seguinte fórmula OsmACT = OsmFEC = OsmPlasma = 2 x Na + Ureia/6 + Glicose/18 Como a Ureia é um osmole ineficaz (porque atravessa as membranas) e a Glicose contribui pouco para a osmolalidade num indivíduo euglicémico (cerca de 5 mOsm/l), então: Osmolalidade Efectiva da ACT = 2 x Na é portanto claro que a concentração plasmática de Sódio está intimamente relacionada com a Osmolalidade. A Hiponatremia e a Hipernatremia são causadas por alteração do balanço da água ou por alteração na distribuição da água entre os compartimentos intra e extracelulares. As alterações da concentração do sódio são causadas por desregulação do balanço da água. A regulação do balanço da água faz-se através da Hormona Antidiurética (ADH ou Vasopressina) e pelo Centros de Controlo da Sede do hipotálamo. Uma alteração persistente do sódio necessita de alterações na acção da ADH ou do mecanismo da sede.

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HIPONATREMIA Sódio < 135 mEq/L Causas: Para que não haja Hiponatremia é necessário que o Rim seja capaz de excretar uma urina diluída, para que tal aconteça são necessárias 3 condições:

1. Filtração glomerular intacta e chegada de fluido aos segmentos diluidores do nefrónio (ramo ascendente da ansa de Henle e túbulo contornado distal);

2. Reabsorção de Na e Cl sem água nestes segmentos; 3. Manutenção de uma urina diluída devido à impermeabilidade à água do ducto

colector por ausência de ADH Anormalidades em qualquer um destes passos impede a excreção normal de água livre e pode conduzir a hiponatremia. O estado do Volume Extracelular (reflecte o conteúdo corporal total de Sódio) pode estar diminuído (hipovolémico), normal (euvolémico) ou aumentado (hipervolémico) na Hiponatremia. A. Hiponatremia Hipovolémica: Causas renais ou não renais de perda de Sódio: o volume circulatório efectivo diminuído vai estimular a sede e a libertação de vasopressina e ambas causam hiponatremia por acumulação de água livre. O uso de Tiazidas é o exemplo clássico e muito comum de hiponatremia. O seu uso leva a uma alteração na capacidade de produção de urina diluída por alteração na função dos segmentos diluidores: A diminuição da volemia leva a um aumento da produção de ADH; Impedem a reabsorção de Na e Cl nos segmentos diluidores; A espoliação de Potássio leva a passagem de água de dentro para fora das células. São mecanismos semelhantes que levam à Hiponatremia quando há vómitos ou diarreia. B. Hiponatremia Hipervolémica: Ocorre nos estados edematosos: Insuficiência Cardíaca, Insuficiência Hepática, Insuficiência Renal, Síndrome Nefrótico como resultado da diminuição do volume circulatório efectivo que causa ao aumento da sede e dos níveis de vasopressina. São situações em que apesar do aumento do Sódio corporal total o excesso de água corporal ainda é maior. O grau de Hiponatremia está muitas vezes correlacionado com a gravidade da situação subjacente e é um importante factor prognóstico.

Page 27: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

C. Hiponatremia Euvolémica: 1. SIADH é a causa mais comum desta forma de hiponatremia. Resulta da libertação não fisiológica de ADH pela hipófise ou de produção ectópica de ADH. As causas mais comuns são doenças neuropsiquiátricas (meningite, encefalite, AVC, traumatismo), doenças pulmonares (pneumonia, tuberculose, insuf. respiratória) e tumores malignos. Diagnóstico de SIADH:

a) urina inapropriadamente concentrada (osmolalidade > 100 mOsm/L); b) euvolemia; c) ausência de disfunção tiroideia ou supra-renal; d) ausência de drogas que aumentam níveis ou acção da vasopressina

(antidepressivos, narcóticos, carbamazepina, AINEs, clorpropamida, oxitocina); e) ausência de stress ou dor (associados a libertação de vasopressina); f) ausência de hipoxemia e/ou hipercapnia

2. Hipotiroidismo por diminuição do débito cardíaco e da filtração glomerular. 3. Insuficiência Supra-Renal a deficiência de glicocorticóides leva directamente a uma hipersecreção de ADH e indirectamente por depleção de volume por náuseas e vómitos. 4. Polidipsia Psicogénica uma ingestão compulsiva de fluidos que pode ultrapassar a capacidade renal máxima de excreção de água (cerca de 12 L/dia).

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Diagnóstico Manifestações Clínicas A apresentação clínica da hiponatremia está relacionada com a entrada da água para dentro das células devida ao gradiente osmótico, que leva ao edema cerebral. Os sintomas são predominantemente neurológicos e a sua gravidade depende quer da magnitude da hiponatremia quer da rapidez com que se instalou. Na hiponatremia aguda (que se desenvolve em menos de dois dias) os sintomas podem ir de náuseas e mal-estar até cefaleias, letargia, confusão ou até estupor, com e convulsões com Sódio < 115 mEq/L. Na hiponatremia crónica (> 3 dias de duração) já foram postos em marcha mecanismos de defesa do volume celular e os sintomas são menos expressivos. A causa da hiponatremia é geralmente elucidada pela história e pelo exame físico com especial cuidado na avaliação do volume do compartimento extracelular e do volume circulatório efectivo. Estudos Laboratoriais

1. Osmolalidade Plasmática – está baixa em quase todos os doentes, se não for assim pensar em pseudo-hiponatremia;

2. Osmolalidade Urinária – está baixa na polidipsia primária e inapropriadamente alta em todos os outros casos (alteração na excreção de água livre devida a acção da vasopressina sobre o rim);

3. Sódio Urinário – ajuda a confirmar a existência de diminuição do volume circulatório efectivo e a discriminar entre perdas de Sódio renais ou extrarrenais.

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Tratamento

1. Velocidade de Correcção Depende da rapidez com que se desenvolveu a hiponatremia e se está associada a sintomas neurológicos. Quando a hiponatremia é marcada o tratamento deve ser monitorizado por determinações da concentração do sódio sérico, repetidas frequentemente. Os riscos de uma correcção demasiado rápida da hiponatremia são a sobrecarga de volume e a mielinólise central da protuberância (paralisia flácida, disartria, disfagia). O risco desta última complicação aumenta se o sódio sérico sobe mais de 12 mEq/L em 24 horas. Apesar destes riscos nos casos em que a hiponatremia provoca sintomas neurológicos graves é necessário proceder a uma correcção rápida da hiposmolalidade nas primeiras horas:

1. Restringir a ingestão de água; 2. Administrar Fluidos Salinos Hipertónicos (ou pelo menos com osmolalidade

superior à da urina); 3. Administrar eventualmente Furosemida para aumentar excreção de água

livre. O objectivo é fazer subir o sódio 1,5 – 2 mEq/L/hora nas primeiras 3 a 4 horas até os sintomas melhorarem mas sem exceder 10 a 12 mEq/L nas primeiras 24 horas e menos de 18 mEq/L nas primeiras 48 horas. A alteração na concentração plasmática do sódio resultante da administração destes fluidos pode ser calculada pela fórmula ∆ [Na] = {[Nai] + [Ki] - [Nas]} ÷ {(Peso Seco x 0.6) + 1} ∆ [Na] variação na concentração de Sódio [Nai] concentração de Sódio no fluido a infundir [Nas] concentração de Sódio inicial do doente [Ki] concentração de Potássio no fluido a infundir O denominador deve ser modificado para {(Peso Seco x 0.5) + 1} na mulher Na Hiponatremia crónica assintomática o sódio plasmático deverá ser corrigido mais lentamente (5 – 8 mEq/L/24 horas).

2. Tratamento Específico das Causas Hiponatremia Hipovolémica – primeiro corrigir a instabilidade hemodinamica com soro fisiológico em quantidade suficiente para restaurar a perfusão tecidular, administrar também qualquer deficit concomitante de Potássio também ajuda a aumentar a concentração plasmática do Sódio. Hiponatremia Hipervolémica – a hiponatremia da Insuf. Cardíaca e da Cirrose Hepática tende a reflectir a gravidade destas doenças e é geralmente assintomática.

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Restrição na ingestão de sódio e de água (ingestão de água deve ser inferior ao débito urinário), correcção da hipocaliemia, promoção da excreção de mais água do que de sódio com utilização da furosemida. SIADH – trata-se limitando a ingestão de água ou promovendo a sua excreção, ou ambas as medidas.

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HIPERNATREMIA Sódio > 145 mEq/L e representa um estado de hiperosmolalidade. Causas: A Hipernatremia pode ser causada por um ganho primário de Sódio ou por um deficit de Água, sendo este segundo mecanismo muito mais comum. Para que persista a Hipernatremia é necessário que haja uma avaria na resposta adequada à hiperosmolalidade: aumento da ingestão de água estimulado pela sede e excreção de uma urina maximamente concentrada por aumento do efeito da vasopressina.

A. Alteração da Sede Se as perdas obrigatórias de água não forem compensadas por um consumo adequado de água surge Hipernatremia, isto pode acontecer nas situações em que o acesso à água está limitado como nas crianças, no idoso ou no muito doente. Na maior parte das vezes a alteração da sede é um componente da Hipernatremia multifactorial, sem alteração no mecanismo da sede qualquer doença que pode conduzir a Hipernatremia será contrariada por um aumento da ingestão de água, fazendo com que a concentração de Sódio varie pouco. Para que haja Hipernatremia significativa é necessário haver alteração no mecanismo da sede ou da ingestão de água.

B. Hipernatremia por perda de água Perdas Extrarrenais de Água – podem ser perdas insensíveis (pele ou aparelho respiratório) ou perdas do aparelho digestivo. As perdas insensíveis estão aumentadas na febre, exercício, exposição ao calor, queimadura. A diarreia é a causa gastrointestinal mais comum de Hipernatremia. Perdas Renais de Água

1. Diurese osmótica – a causa mais comum é a glicosúria da descompensação diabética, pode ocorrer também com a administração de manitol ou na alimentação parentérica.

2. Diabetes Insípida Central – defeito na secreção de vasopressina por destruição da neurohipófise (trauma, neurocirurgia, neoplasia, acidente vascular ou infecção)

3. Diabetes Insípida Nefrogénica – resistência à acção da vasopressina (por doença renal intrínseca, por acção de drogas como o lítio e a anfotericina ou por alterações electrolíticas como na hipercalcemia e na hipocaliemia.

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C. Hipernatremia por Ganho Primário de Sódio

Ocorre muito raramente, devido à grande capacidade do rim excretar o excesso de sódio e da hipervolemia daí resultante. Pode acontecer em situações de administração de grande quantidade de fluidos hipertónicos (por exemplo administração de Bicarbonato de Sódio durante ressuscitação cardiopulmonar). Diagnóstico Manifestações clínicas A manutenção do equilíbrio osmótico na Hipernatremia causa diminuição do volume intracelular e portanto diminuição do volume das células cerebrais. Os sintomas mais graves da Hipernatremia são neurológicos e incluem alteração do estado de consciência, irritabilidade neuromuscular, deficits neurológicos focais, convulsões e coma. Tal como na Hiponatremia a gravidade dos sintomas está relacionada com a rapidez e a magnitude da Hipernatremia. A Hipernatremia crónica tende a ser pouco sintomática. Os doentes com Diabetes Insípida referem sede e poliúria. A história deve incluir a lista da medicação actual e recente. A determinação do estado de volemia do doente é importante na determinação da etiologia da Hipernatremia. Estudos Laboratoriais A resposta renal apropriada à Hipernatremia é a excreção de uma urina concentrada (osmolalidade > 800 mOsm/L) e em pequena quantidade (<800 ml/dia).

1. Osmolalidade Urinária – quando inferior a 800 mOsm/L sugere defeito na acção da vasopressina como ocorre na Diabetes Insípida

2. Débito Urinário – a poliúria pode ser devida a diurese osmótica ou a diabetes insípida. Uma excreção de solutos diária (Osmolalidade urinária x Volume de urina das 24 horas)> 900 mOsm define diurese osmótica

3. Resposta ao dDAVP – pode-se distinguir a Diabetes Insípida Central da Nefrogénica pela administração do análogo da vasopressina dDAVP após restrição de água. A osmolalidade urinária sobe pelo menos 50% na Central e não se modifica na Nefrogénica.

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Tratamento

1. Velocidade da Correcção Depende da rapidez com que se instalou a Hipernatremia e se está associada a disfunção neurológica. Haja ou não sintomas, quando a Hipernatremia é marcada, o tratamento deve ser monitorizado com determinações frequentes do sódio plasmático. Tal como na Hiponatremia a correcção agressiva da Hipernatremia é potencialmente perigosa. O deficit de água deve ser corrigido lentamente para evitar o edema das células cerebrais. Objectivo: descida do sódio 0.4 – 0.5 mEq/L/hora ou 10 mEq/L/dia. A maneira mais segura de administrara a água é por via oral ou sonda nasogástrica. Soro Glicosado 5% em situações de perdas puras de água (perdas insensíveis ou diabetes insípida). Soro salino hipotónico em situações em que também há perdas de electrólitos (perdas gastrointestinais ou urinárias). A alteração na concentração plasmática do sódio resultante da administração destes fluidos pode ser calculada pela fórmula ∆ [Na] = {[Nai] + [Ki] - [Nas]} ÷ {(Peso Seco x 0.6) + 1} ∆ [Na] variação na concentração de Sódio [Nai] concentração de Sódio no fluido a infundir [Ki] concentração de Potássio no fluido a infundir [Nas] concentração de Sódio inicial do doente O denominador deve ser modificado para {(Peso Seco x 0.5) + 1} na mulher A concentração de Sódio plasmática deverá ser corrigida mais lentamente do que 12 mEq/L/dia na Hipernatremia crónica assintomática com baixo risco de lesão neurológica causada pela Hipernatremia.

2. Tratamentos segundo a Causa Hipernatremia Hipovolémica – primeiro corrigir a instabilidade hemodinâmica com salino isotónico para restaurar a perfusão tecidular antes de se corrigir a hiperosmolalidade. Diabetes Insípida sem Hipernatremia – se o mecanismo da sede estiver a funcionar bem o doente não desenvolve Hipernatremia e portanto o tratamento é para aliviar a poliúria sintomática. O melhor tratamento é tratar a causa da DI. DIC – administrar dDAVP. DIN – dieta hipossalina e hipoproteica combinada com administração de Tiazida (redução da diurese induzida pela depleção de volume ligeira e pela diminuição da carga osmolar a excretar).

Page 34: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

Bibliografia: Rose BD, Post TW. Hypoosmolal States, Hyperosmolal States in Clinical Physiology of Acid-Base and Electrolyte Disorders. 5th edition McGraw-Hill, 2001:682-793. Adrogue HJ, Madias NE. Hyponatremia. N Engl J Med 342:1581, May 25, 2000 Review Article

Adrogue HJ, Madias NE. Hypernatremia. N Engl J Med 342:1493, May 18, 2000 Review Article

Page 35: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

AlteraAlteraAlteraAlteraçççções do Equilões do Equilões do Equilões do Equilííííbrio brio brio brio ÁÁÁÁcidocidocidocido----BaseBaseBaseBase

Ana Ventura, Nefrologista do Serviço de Nefrologia do CHVNG/E

Susana Pereira, Interna Complementar de Nefrologia do CHVNG/E

Page 36: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

ALTERAÇÕES DO EQUILÍBRIO ÁCIDO BASE

Objectivos:

• Conhecer as causas dos principais desequilíbrios àcido-base

• Compreender os mecanismos fisiopatológicos dos principais desequilíbrios àcido-

base

• Saber abordar um doente com desequilíbrios àcido-base

O estado ácido base do organismo é regulado de forma a manter o pH arterial entre

limites muito estreitos (7.35 e 7.45) e o pH intracelular entre 7.0 e 7.3.

Diariamente são geradas substâncias ácidas e alcalinas da dieta e do metabolismo que

rapidamente alterariam o pH do organismo.

A defesa imediata contra estas substãncias são os chamados tampões fisiológicos intra

e extracelulares que minimizam a alteração do pH. Estes tampões são moléculas

capazes de aceitar ou ceder hidrogeniões, e são constituídos na sua maioria pelas

proteínas, fosfatos e pelo sistema bicarbonato-ácido carbónico. Estes tampões são

saturáveis e portanto têm uma capacidade limitada para atenuar as alterações do

equilíbrio ácido-base. Eles minimizam as alterações ácido-base, mas não são capazes

de remover os ácidos e bases do organismo

A remoção é efectuada pelo pulmão e pelo rim. O pulmão actua regulando a PaCO2 e o

rim regulando a concentração de bicarbonato. O rim actua a dois níveis: reabsorvendo

o bicarbonato filtrado no tubulo proximal e regenerando bicarbonato através da

excreção de acidez titulável, sob a forma de amónia. A compensação respiratória

demora apenas 12 a 24 horas, enquanto a renal é mais lenta demorando até 5 dias.

Quando há diminuição da taxa de filtração glomerular a capacidade do rim regular o

equilibrio ácido base fica comprometida.

Page 37: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

Neste capítulo propomos uma forma sistematizada de analizar e abordar um doente

com alteração do equilibrio ácido base:

História clinica

Antecipação dos desequilibrios ácido-base

Análise dos dados da gasometria

Há perigo eminente?

A compensação é adequada?

Qual o disturbio primário

Estado hemodinâmicooxigenaçãoElectrólitos

Verificar variação HCO3- e PaCO2

Qual a causa do distúrbio?

História clinicaGAP aniónico

Com os dados da história clinica, conseguimos a maioria das vezes antecipar o

distúrbio. Exemplos a considerar:

Situação Alteração Previsível

Sépsis Acidose Metabólica

Vómitos Alcalose Metabólica

Diuréticos Alcalose Matabólica

Coma Diabético Acidose Metabólica

Paragem Cardio-Respiratória Acidose Respiratória e Acidose Metabólica

DPOC Acidose Respiratória

Hiperventilação Alcalose Respiratória

Overdose de Opiácios Acidose Respiratória

Passamos em seguida à análise dos dados da gasimetria de sangue arterial para

determinar o distúrbio primário.

As alterações do equilibrio ácido base podem ter na sua origem uma causa respiratória

ou metabólica (desequilíbrio primário).

Page 38: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

A hipoventilação de causa respiratória ou central, leva a uma retenção primária de CO2

e a consequente diminuição do pH. Daqui resulta uma acidose respiratória. A

compensação renal consiste no aumento de bicarbonato. A hiperventilação tem o efeito

oposto.

Quando há um aumento da produção de ácidos ou perda de bicarbonato o pH também

diminuí, resultando acidose metabólica. A compensação pulmonar consiste na

hiperventilação de forma a diminuir a Pa CO2.

A alcalose metabólica terá o efeito oposto, ou seja, hipoventilação e retenção de CO2.

↑↑↑↑

↓↓↓↓

↑↑↑↑

↓↓↓↓

pH

↓↓↓↓ ventilaçãoRetenção de HCO3-Alcalose

Metabólica

↑↑↑↑ ventilaçãoPerda de HCO3-Acidose

Metabólica

Consumo de HCO3-Perda de CO2Alcalose

Respiratória

Produção de HCO3-Retenção de CO2Acidose

Respiratória

Resposta compensadora

Distúrbio primárioDistúrbio

Do Eq. AB

É importante na análise imediata dos dados da gasimetria, avaliar se o doente corre

perigo eminente. O risco é sobretudo relacionado com a condição hemodinâmica do

doente (hupotensão grave), a presença e gravidade da hipóxia e as alterações

iónicas associadas. Os valores do pH só colocam a vida em risco quando as variações

são extremas e podem comprometer os processos enzimáticos.

Em seguida vamos avaliar se o distúrbio está compensado. Os níveis de compensação

esperados em face de um distúrbio primário estão determinados e podem ser

avaliados.

Page 39: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

Por cada ↑↑↑↑ de 10 mEq/l de HCO3-, ↑↑↑↑ 7 mmHg da PaCO2Alcalose metabólica

Por cada ↓↓↓↓ de 10 mEq/l de HCO3-, ↓↓↓↓ 12 mmHg da PaCO2Acidose metabólica

Por cada ↓↓↓↓ de 10 mmHg da PaCO2, ↓↓↓↓ 4 mEq/l de HCO3-Alcalose respiratória crónica

Por cada ↓↓↓↓ de 10 mmHg da PaCO2, ↓↓↓↓ 2 mEq/l de HCO3-Alcalose respiratória aguda

Por cada ↑↑↑↑ de 10 mmHg da PaCO2, ↑↑↑↑ 3,5 mEq/l de HCO3

-Acidose respiratória crónica

Por cada ↑↑↑↑ de 10 mmHg da PaCO2, ↑↑↑↑ 1 mEq/l de HCO3-Acidose respiratória aguda

Níveis de compensação

Uma

regra simples para a acidose e alcalose metabólica é que a PaCO2 esperada é igual

aos 2 últimos dígitos do pH.

Quando a compensação não é a esperada, significa que há um distúrbio misto. Isto

pode acontecer por patologia respiratória ou renal associada que impede a

compensação ideal do dísturbio, ou se coexistem situações patológicas que

proporcionam mais que um distúrbio, por exemplo um doente com intoxicação alcoólica

e vómitos pode apresentar uma acidose metabólica (cetoacidose alcoólica) e uma

alcalose metabólica pelos vómitos.

É importante notar que a compensação respiratória ou renal do desequilíbrio não

conduz à correcção do valor do pH, portanto se tivermos uma alteração do HCO3- ou da

PaCO2, com pH normal, isso significa que há um distúrbio misto.

Em seguida vamos determinar a causa do distúrbio, para poder proceder à sua

correcção.

Page 40: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

ACIDOSE METABÓLICA

Como vimos, a causa é habitualmente antecipável pela história clinica. O cálculo do

GAP aniónico é um procedimento essencial para ajudar a determinar/confirmar a

etiologia no caso das acidoses metabólicas. Mesmo nos outros distúrbios o GAP

aniónico deve ser calculado, pois ele pode ajudar a identificar um desequilibrio oculto.

O conceito de GAP aniónico baseia-se no facto do organismo manter sempre a

electroneutralidade. Ou seja, a soma das cargas positivas é igual às cargas negativas.

[Na+] + [outros catiões] = [Cl-] + [HCO3-] + [outros catiões]

Na prática clinica diária só se medem o sódio, o cloro e o bicarbonato, portanto há um

“défice” de aniões (GAP aniónico) que corresponde aos aniões não medidos. O valor

normal do GAP aniónico varia entre 8 e 12.

As cargas negativas não medidas, em condições normais, correspondem

maioritáriamente à albumina, daí que o valor do GAP aniónico deve ser corrigido para o

valor da albumina: por cada diminuição de 1g de albumina o valor do GAP aniónico

dimunui 2,5.

Valorizamos o valor do GAP aniónico quando ele é maior que 5 que o GAP normal

(corrigido para a albumina). Este valor significa sempre que há acidose metabólica,

mesmo com pH normal.

Quando há acidose metabólica, há diminuição do bicarbonato. A compensação da

diminuição das cargas negativas pode ser à custa de um aumento do cloro, e nesse

caso o valor do GAP aniónico não se altera, ou à custa de outros aniões não medidos

que desta forma vão aumentar o valor do GAP aniónico.

A etiologia da acidose metabólica pode ser por aumento de ácidos (endógenos ou

exógenos), por perda de bicarbonato ou ainda pela incapacidade do rim reabsorver ou

regenerar bicarbonato.

Page 41: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

Acidose Metabólica

Ânion-gap8 a 12

NaBicabornato

24

140

106 Cloro

Catiões Aniões

Ânion-gap8 a 12

Na 4 Bicabornato

140

126 Cloro

Catiões Aniões

Ânion-gap30

Na

140 4 Bicabornato

106 Cloro

Catiões Aniões

Acidose metabólica com GAP normalHiperclorémica

Acidose metabólica com GAP aumentadoNormoclorémica

As primeiras são acidoses com GAP aumentado, correspondendo o aumento dos

aniões não medidos a ácidos orgânicos (láctico, cetoácidos, ..). As segundas são

acidoses metabólicas com GAP normal, pois associam-se a aumento de cloro que

compensa a perda de aniões.

Com esta forma de abordagem, as causas de acidose metabólica são mais simples:

Acidose Metabólica - causas

Aumento da produção de ácidosEndógenos:

Acidose lácticaCetoacidoseInsuficiência renal avançada

Exógenos:MetanolEtilenoglicolSalicilatos

Perda de bicarbonatosDigestivaAcidose tubular renal tipo II

Diminuição da excreção de ácidos/ incapacidade de formar HCO3

-

Insuficiência renalAcidose tubular renal tipo I e IV

Ac. Metabólica com GAP aumentado Ac. Metabólica com GAP normal

Page 42: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

Conjugando o valor do GAP aniónico e os dados da história clinica, a etiologia da

acidose metabólica é clara na maioria dos casos.

A excepção, são as acidoses tubulares renais, que podem não ter uma história clinica

clarificadora. Estas acidoses são habitualmente moderadas (excepto a tipo I que pode

ser mais grave) e crónicas, permitindo uma análise mais atempada e detalhada para a

sua etiologia.

Segue-se um resumo das características principais de cada uma das acidoses

tubulares renais e das patologias associadas mais frequentes.

ATR tipo II (proximal)•Incapacidade em reabsorver o HCO3

- filtrado•Pode coexistir S. Fanconi (alteração da reabsorção deglicose, fosfato, ác. úrico, aminoácidos) •Hipocalémia •A terapêutica com bicarbonato aumenta o pH da urina e agrava a hipocalémia

ATR tipo I (distal)•Diminuição da secreção de H+ no tubo distal•Nefrolitíase /nefrocalcinose•Sintomas osteoarticulares•Hipocalémia•Corrige-se com citrato de potássio

ATR tipo IV•Diminuição da excreção de H+ e K+ no tubo distal•Hipercalémia•Habitualmente não necessita terapêutica

Doenças genéticasDisproteinémias

Fármacos

Doenças autoimunesHipergamaglobulinémia

Fármacos

DiabetesHipoaldosteronismo

Fármacos

A avaliação da função do tubulo proximal e o potássio sérico, são pistas para o

diagnóstico.

Por vezes são necessário estudos mais detalhados, que saem do âmbito deste

capitulo.

Apresenta-se um algorítmo simples de abordagem das acidoses tubulares renais:

Page 43: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

Acidose tubular renal

Funçãotúbulo proximal

Normal

K+ sérico

Diminuído

ATR tipo I

Aumentado

ATR tipo IV

Anormal

ATR tipo II

O tratamento das acidoses metabólicas incluí:

1. Tratamento imediato das situações de perigo iminente

- optimização do estado hemodinãmico

- correcção da hipóxia

- correcção das alterações electrolíticas

2. Correcção da causa

2.1. O tratamento das acidoses metabólicas com GAP aumentado, faz-se

corrigindo o distúrbio primário (por ex. insulina para a cetoacidose diabética).

A administração de bicarbonato só deve efectuar-se em situações de acidose

extrema que coloque o doente em risco (pH<7,0) e de forma a elevar o HCO3- para

8 a 10mEq/L. A rapidez de administração vai depender da gravidade da acidemia e

da situação cardíaca do doente.

Pode administrar-se uma dose inicial de 1mEq/Kg e reavaliar o pH.

Temos à disposição ampolas de 20ml, de bicarbonato de sódio a 8,4%, com 20mEq

de bicarbonato; e frascos de 500ml, de bicarbonato de sódio a 1,4% com 83mEq de

bicarbonato.

Page 44: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

2.2. O tratamento das acidoses metabólicas com GAP normal faz-se corrigindo o

disturbio primário e administrando bicarbonato para repor o défice. O objectivo é

manter o HCO3- maior que 20mEq/L.

Page 45: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

ALCALOSE METABÓLICA

Objectivos:

� Conhecer as causas de alcalose metabólica

� Compreender os mecanismos que perpetuam a alcalose metabólica

� Abordagem da alcalose metabólica

Definição

A alcalose metabólica manifesta-se por um aumento da concentração de

bicarbonato e habitualmente associa-se a hipocalémia.

Compensação respiratória

A primeira compensação do organismo ao aumento do bicarbonato é a

hipoventilação, com aumento da PaCO2. Por cada aumento de 10meq de

HCO3- a PaCO2 aumenta 7mmHg.

.

Fisiopatologia

Na clínica da alcalose metabólica interessa, além da identificação da causa é

necessário identificar os mecanismos de manutenção, já que a resposta

fisiológica do organismo ao excesso de HCO3- é o aumento da excreção renal

(maior filtração glomerular, menor reabsorção tubular). O que, em termos

práticos, significa que para tratarmos a alcalose temos que corrigir a causa e os

mecanismos que contribuiram para a sua perpetuação.

Causas de alcalose metabólica

1. Perda de valências ácidas

Page 46: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

Gastrointestinal

� Vómitos

� Drenagem gástrica

� Tratamento com antiácidos

Renal

� Diuréticos da ansa e tiazidas

� Hipercalcémia

� Hipocalémia

2. Ganho de HCO3-

� Administração de bicarbonato

� Pós-hipercapnia

3. Hiperaldosteronismo primário

Mecanismos de perpectuação (situações em que o rim perde capacidade de

excretar bicarbonato de forma eficiente)

� Contracção de volume

� Insuficiência renal

� Deplecção de Cl- ou K+

� PaCO2 elevada

� Hiperaldosteronismo

O rim corrige a alcalose metabólica excretando o excesso de bicarbonato na

urina. Se um sujeito normal ingerir diariamente 1000meq de bicarbonato

durante 2 semanas, todo o excesso de bicarbonato é excretado na urina e não

se desenvolve alcalose metabólica. As alterações que causam alcalose

metabólica estão associadas a ganho de bicarbonato muito menor, o que

significa que para se desenvolver alcalose metabólica o rim tem que perder

a capacidade de excretar o excesso de bicarbonato. A redução da taxa de

filtração glomerular (TFG) e o aumento da reabsorção tubular de bicarbonato

contribuem para este processo. O aumento da reabsorção tubular é o

Page 47: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

mecanismo mais importante, já que a diminuição da TFG isolada, como a

insuficiência renal crónica, habitualmente não cursa com alcalose.

� A deplecção de volume arterial efectivo aumenta a reabsorção de HCO3-

no tubo proximal na tentativa de preservar volume.

� O hiperaldosteronismo secundário também contribui porque aumenta a

reabsorção de Na+ no tubo colector cortical, o lúmen tubular fica mais

electronegativo, criando-se assim um gradiente favorável à secreção de H+ e

K+.

� A deplecção de Cl- também tem um papel importante no aumento da

reabsorção de HCO3- no nefrónio distal. A reabsorção de Na+ neste

segmento não é seguida pelo Cl-, há falta de Cl-, o que aumenta o gradiente

eléctrico que promove da secreção de H+. O resultado final é a reabsorção

quase completa do bicarbonato filtrado e o achado paradoxal de uma urina

ácida num doente que está alcalémico.

� A hipocalémia é um estímulo potente para a secreção de H+. A

hipocalémia condiciona acidose intracelular, por entrada de H+ para a célula

e saída de K+, esta acidose intracelular estimula, nas células tubulares, a

produção e excreção de NH4+ que em si gera mais HCO3

-, perpetuando a

alcalose.

� A hipercapnia compensatória também aumenta a reabsorção de

bicarbonato no nefrónio distal.

Abordagem do doente com alcalose metabólica

1. Integrar o quadro clínico e laboratorial

Clinicamente e para efeitos práticos podemos considerar quatro grupos:

� Doentes com depleção de volume, hipocalémia e hipoclorémia

Page 48: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

É o tipo mais comum. Normalmente a causa é a perda de ácido pelo tubo

digestive em consequência de vómitos ou drenagem gástrica. Estes doentes

apresentam aumento da reabsorção de bicarbonato no túbulo proximal em

resposta à deplecção de volume. A deplecção de volume leva ao aumento da

aldosterona que estimula a secreção de H+ e K+ no tubo colector, contribuindo

para perpetuar a alcalose.

O uso de diuréticos também causa deplecção de volume e de potássio e desta

forma associam-se frequentemente a alcalose metabólica.

As drogas aniónicas, como a carbenicilina, também se associam a alcalose

metabólica. Estes fármacos são livremente filtrados e não reabsorvidos, como

têm carga negativa impedem a reabsorção de Na+, desta forma mais Na+

chega ao tubo distal o que aumenta a secreção de K+ e H+. A hipocalémia e a

deplecção de volume perpetuam a alcalose metabólica.

A hipercalcémia estimula a secreção renal de H+ e a reabsorção de HCO3-

resultando em alcalose metabólica. A desidratação e a insuficiência renal que

habitualmente se associam à hipercalcémia contribuem para a perpetuar a

alcalose.

� Doentes com expansão de volume, hipocalémia

Estes doentes têm aumento primário de mineralocorticóides e não respondem

à reposição de volume. A etiologia do aumento de mineralocorticoides pode ser

diferenciada medindo a renina plamática.

� Administração exógena de bicarbonato

A administração de bicarbonato nos casos de acidose metabólica pode resultar

em alcalose metabólica. Isto ocorre particularmente nos casos de acidose

láctica ou cetoacidose diabética, em que o bicarbonato endógeno é substituido

por lactato ou β-hidroxibutirato. Não há perda de bicarbonato e quando o

distúrbio de base é corrigido o bicarbonato volta a ser regenerado. Assim, o

Page 49: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

bicarbonato administrado contribui para o excesso de bicarbonato, podendo

provocar alcalose metabólica.

Um problema semelhante ocorre quando se administram grandes quantidades

de bicarbonato a doentes com insuficiência renal, incapazes de excretar o

excesso de bicarbonato.

� Alcalose pós-hipercápnia

A acidose respiratória crónica está associada a um aumento da excreção renal

de H+ e retenção de bicarbonato, que representam a resposta compensatória

apropriada à acidose. O tratamento destes doentes com ventilação mecânica

pode levar à redução rápida da PaCO2 corrigindo a acidose respiratória,

mantendo-se o bicarbonato sérico elevado, já que a excreção renal é mais

lenta. Desta forma desenvolve-se alcalose metabólica com aumento rápido de

pH intracerebral o que pode originar alterações neurológicas graves e morte.

2. Examinar os gases do sangue

� Há perigo iminente?

� Como está o K+?

� Como está o pH?

� Qual é a alteração primária?

� A compensação é adequada?

� Há aumento do gap aniónico?

3. Identificar distúrbios mistos

Depois de identificar o distúrbio primário, vamos verificar se a compensação é

apropriada. Nos casos de alcalose metabólica, sabemos que por cada aumento

de 10 mEq de bicarbonato a PaCO2 aumenta 7mmHg. Se a PaCO2 não

aumenta de forma apropriada significa que coexiste alcalose respiratória.

Page 50: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

Em seguida vamos calcular o gap aniónico. Se há aumento do gap aniónico,

calculamos a variação do bicarbonato. Se a variação do gap aniónico for maior

que a variação do bicarbonato é porque há acidose metabólica.

4. Medir os electrólitos na urina

Como vimos, a etiologia da alcalose metabólica é habitualmente clara

atendendo à história clínica e exame físico do doente. No entanto, há casos em

que a história é inexistente ou não é clarificadora, como na ingestão surreptícia

de diuréticos ou vómitos induzidos. Nestes casos, a medição do Na+, Cl- e pH

urinários podem ser úteis no dianóstico diferencial das causas de alcalose.

Quando o doente tem vómitos recentes o pH urinário é elevado, dado o

aumento da filtração e excreção de bicarbonato, e por isso o Na+ na urina

também se encontra elevado. O Cl- na urina, neste caso, é baixo. Quando o

doente deixa de vomitar e há deplecção de volume, há retenção de Na+ e

bicarbonato, assim, o pH na urina é baixo, o Na+ é baixo e o Cl- é baixo. Como

a chegada de Na+ ao tubo distal está diminuida, menos K+ será secretado.

Se o Na+, K+ e Cl- na urina estão todos elevados devemos pensar em:

� uso de diuréticos,

� deficiência de magnésio ou

� alterações tubulares raras como os Síndromes de Bartter ou Gitelman.

Na+

urina Cl- urina K+ urina pH urina

Vómitos recentes alto baixo alto alto

Vómitos tardios baixo baixo baixo baixo

Diuréticos alto alto alto

Tratamento da alcalose metabólica

Page 51: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

O tratamento da alcalose metabólica deve considerar o tratamento da causa e

a correcção dos mecanismos que perpetuam a alcalose, ou seja corrigir o

défice de volume e Cl- e o défice de K+, o que começa pela administração de

soro fisiológico e cloreto de potássio.

O doente com insuficiência cardíaca congestiva, síndrome nefrótico ou cirrose,

desenvolvem muitas vezes alcalose metabólica secundária ao uso de

diuréticos. Nestes casos a administração de soro fisiológico não está indicada

pois iria agravar mais os edemas. O tratamento da alcalose, nestes casos,

pode fazer-se com acetazolamida (250 a 375mg PO). A acetazolamida é um

diurético inibidor da anidrase carbónica que aumenta a excreção de

bicarbonato.

A acetazolamida também pode ser usada nos doentes com edemas por cor

pulmonale e hipercapnia crónica. A correcção da alcalose é particularmente

importante nestes doentes porque o aumento do pH é em si próprio depressor

do centro respiratório. O uso de acetazolamida tem que ser cauteloso e

monitorizado de forma estricta pois pode agravar a acidose nestes doentes.

Os casos de aumento primário de mineralocorticoides não respondem a estas

medidas. O tratamento consiste nestes casos na correcção da causa primária.

Page 52: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

Exames Complementares de DiagnExames Complementares de DiagnExames Complementares de DiagnExames Complementares de Diagnóóóósticosticosticostico

Joaquim Seabra, Director do Serviço de Nefrologia do CHVNG/E

Page 53: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

1

MEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNÓÓÓÓSTICO EM STICO EM STICO EM STICO EM NEFROLOGIANEFROLOGIANEFROLOGIANEFROLOGIA

Joaquim Seabra

Serviço de Nefrologia do Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia

MEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNÓÓÓÓSTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIA

APRESENTAÇÃO CLÍNICA DA DOENÇA RENAL:

• Doente assintomático, mas com anormalidade detectada no exame físico ou laboratorial

• Doente com sintomas ou sinais físicos que indicam doença renal subjacente

• Doente com doença sistémica que pode estar associada a envolvimento renal

• Doente com história familiar de doença renal hereditária

MEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNÓÓÓÓSTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIA

I EXAME DA URINA

1. CONDI1. CONDI1. CONDI1. CONDIÇÇÇÇÕES DA COLHEITAÕES DA COLHEITAÕES DA COLHEITAÕES DA COLHEITA

• Evitar exercício físico intenso nas horas anteriores à colheita

• Não colher durante o período menstrual

• Lavar os orgãos genitais externos cuidadosamente

• Colher a urina após descartar a primeira porção da micção

• Colher pelo menos 50 ml

• Idealmente a urina deve ser analizada menos de 1 hora apóa a micção

MEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNÓÓÓÓSTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIA

I EXAME DA URINA

2. ASPECTOS F2. ASPECTOS F2. ASPECTOS F2. ASPECTOS FÍÍÍÍSICOSSICOSSICOSSICOS

• Cor - incolor a amarelo escuro

• Opacidade - clara ou transparente

• Odor - sui generis

• Densidade

• pH - 4,5 a 8,0

MEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNÓÓÓÓSTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIA

I EXAME DA URINA

HEMOGLOBINAHEMOGLOBINAHEMOGLOBINAHEMOGLOBINA

• As fitas reagentes são muito sensiveis, detectam sangue em baixa concentração

• Falsos Negativos - alta concentração de ácido ascórbico, de nitritos ou de formol na urina

• Falsos Psitivos - mioglobina, grande número de bactérias

MEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNÓÓÓÓSTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIA

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL DE URINA VERMELHA/CASTANHA

• Hematúria

• Hemoglobinúria

• Mioglobinúria

• Porfiria

• Drogas (fenacetina, rifampicina, nitrofurantoina, metronidazol, fenitoina)

• Corantes (beterraba, corantes alimentares, paprika, bagas)

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2

MEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNÓÓÓÓSTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIA

I EXAME DA URINA

LEUCLEUCLEUCLEUCÓÓÓÓCITOSCITOSCITOSCITOS

• As fitas são muito específicas para leucócitos lisados• Falsos Negativos - urina isotónica, presença de proteinas (> 5

gr/l) ou de glicose• Falsos Positivos - presença de formol ou detergentes

NITRITOSNITRITOSNITRITOSNITRITOS

• As fitas têm uma baixa sensibilidade mas uma especificidade altapara a presença de bactérias na urina

• Falsos Negativos - urina alcalina, algumas bactérias nã formam nitritoa (Pseudomonas, Strept. Faecalis, Staph. Albus)

MEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNÓÓÓÓSTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIA

I EXAME DA URINA

GLICOSEGLICOSEGLICOSEGLICOSE

• As fitas têm grande sensibilidade e especificidade para a glicosúria

• Falsos negativos - infecção urinária

• Falsos Positivos - presença de lixívia

MEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNÓÓÓÓSTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIA

I EXAME DA URINA

PROTEINASPROTEINASPROTEINASPROTEINAS

• As fitas reagentes só são sensíveis à Albumina e em concentração > 200 mg/l

• Falsos Negativos - não detectam a microalbuminúria, nem globulinas ou proteinas de Bence - Jones

• Falsos Positivos - urina muito alcalina ou urina muito pigmentada

MEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNÓÓÓÓSTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIA

I EXAME DA URINA

MICROALBUMINMICROALBUMINMICROALBUMINMICROALBUMINÚÚÚÚRIARIARIARIA

• Em condições fisiológicas um adulto excreta < 150 mg/dia de proteinas das quais cerca de 20 mg é albumina

• As fitas só detectam albumina > 300 mg/dia

• Microalbuminúria é uma concentração de albumina na urina superior ao normal mas não detectável nas fitas reagentes - 30 a 300 mg/24 horas

• Se a fita detecta não faz sentido pedir a Microalbuminúria

• Microalbuminúria aparece na Diabetes mas também na HTA, obesidade, tabagismo, uso de contraceptivos orais, sexo feminino e idade avançada

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I EXAME DA URINA

QUANTIFICAQUANTIFICAQUANTIFICAQUANTIFICAÇÇÇÇÃO DA PROTEINÃO DA PROTEINÃO DA PROTEINÃO DA PROTEINÚÚÚÚRIARIARIARIA

A colheita de Urina de 24 horas é considerada o “gold standard” mas:• Consome tempo e paciência• É incómoda• Frequentemente associada com erros de colheita grosseiros (amostras

desperdiçadas, erros no timing)

Pode ser substituida pela razão Proteinas / Creatinina em amostra spot:• Uprot(mg/dl) / Ucreat(mg/dl) preferivelmente calculada na primeira urina

da manhã• Correlaciona-se bem com o método clássico (se o ratio > 3 o doente tem

Proteinúria > 3 gramas/ 24 horas, se o ratio < 0,2 o doente tem Proteinúria < 0,2 gramas/24 horas

MEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNÓÓÓÓSTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIA

II EXAME MICROSCÓPICO DA URINA

ERITRERITRERITRERITRÓÓÓÓCITOSCITOSCITOSCITOS

• Podem ser encontrados na urina devido a hemorragia com origem em qualquer ponto do tracto urinário ou por contaminação

• A sua morfologia pode dar indicação sobre a origem da hemorragia:- eritrócitos irregulares e dismórficos - hematúria glomerular- ertrócitos regulares e iso mórficos - hematúria não glomerular

LEUCLEUCLEUCLEUCÓÓÓÓCITOSCITOSCITOSCITOS

• Achado típio na Infecção Urinária

• Também aparecem nas Glomerulonefrite activa, Nefrite Intersticial, Doenças urológicas ou por contaminação com secreções genitais

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MEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNÓÓÓÓSTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIA

II EXAME MICROSCÓPICO DA URINA

CILINDROSCILINDROSCILINDROSCILINDROS

São elementos alongados com a forma de cilindros que se formam nos tubulos distais e colectores do nefróneo a partir da proteina de Tamm-Horsfall

1.1.1.1. Hialinos Hialinos Hialinos Hialinos - contêm só proteina de Tamm-Horsfall e estão presentes em quantidade variável no indivíduo normal

2.2.2.2. HialinoHialinoHialinoHialino----GranularesGranularesGranularesGranulares - são cilindros hialinos que contêm granulos finos. Presentes nas glomerulonefrites

3.3.3.3. GranularesGranularesGranularesGranulares - contêm granulos grosseiros e são sinal de doença renal

4.4.4.4. CCCCééééreosreosreosreos - parecem feitos de cêra, são em geral grandes e largos. Aparecem na Insuf. Renal Crónica

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II EXAME MICROSCÓPICO DA URINA

CILINDROS (CILINDROS (CILINDROS (CILINDROS (contcontcontcont.).).).)

5. Cilindros Celulares 5. Cilindros Celulares 5. Cilindros Celulares 5. Cilindros Celulares A. Cilindros A. Cilindros A. Cilindros A. Cilindros EritrocitEritrocitEritrocitEritrocitááááriosriosriosrios - contêm eritrócitos. São altamente específicos de hemorragia glomerular.B. Cilindros B. Cilindros B. Cilindros B. Cilindros LeucocitLeucocitLeucocitLeucocitááááriosriosriosrios - contêm neutrófilos e indicam a origem renal dos leucócitos. São típicos das Pielonefrites, mas podem aparecer nas Glomerulonefrites Proliferativas e nas Nefrites IntersticiaisC. Cilindros C. Cilindros C. Cilindros C. Cilindros EpiteliaisEpiteliaisEpiteliaisEpiteliais ---- contêm células tubulares e aparecem na Necrose Tubular Aguda, Nefrite Intersticial, S. Nefrítico

6. Cilindros Gordos6. Cilindros Gordos6. Cilindros Gordos6. Cilindros Gordos - contêm lipideos e são típicos do S. Nefróticoou Proteinúria severa

MEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNÓÓÓÓSTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIA

II EXAME MICROSCÓPICO DA URINA

CRISTAISCRISTAISCRISTAISCRISTAIS

A presença de alguns cristais de ácido úrico, fosfato de cálcio ou de oxalato de cálcio é normal.

Raramente a presença de cristalúria marcada pode estar associada à precipitação intratubular de cristais e provocar Insuf. Renal Aguda (Nefropatia Aguda do Ácido Úrico, intoxicação pelo Aciclovir ou pelo etileno Glicol)

Alguns cristais são sempre patológicos, os cristais de Cistina indicam a presença de Cistinúria

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O exame da urina (microscópico e achados nas fitas reagentes) é decisivo no estudo das doenças renais e é útil na avaliação da sua actividade.

Define alguns padrões de doença renal:

1. Sedimento 1. Sedimento 1. Sedimento 1. Sedimento NefrNefrNefrNefróóóóticoticoticotico - grande quantidade de lipídeos e cilindros hialinos, granulares e epiteliais. Eritrócitos ausentes ou poucos

2. Sedimento 2. Sedimento 2. Sedimento 2. Sedimento NefrNefrNefrNefrííííticoticoticotico - presença de grande quantidade de eritrócitos associada a cilindros eritrocitários/hemoglobina. Típico das Glomerulonefrites Proliferativas

3. Sedimento 3. Sedimento 3. Sedimento 3. Sedimento NefrNefrNefrNefrííííticoticoticotico e e e e NefrNefrNefrNefróóóóticoticoticotico - coexistência de lipiduria com eritrocitúria e cilindrúria abundantes

4. Sedimento de Necrose Tubular Aguda4. Sedimento de Necrose Tubular Aguda4. Sedimento de Necrose Tubular Aguda4. Sedimento de Necrose Tubular Aguda - presença de células tubulares mais ou menos destruidas e de cilindros de cilindros epiteliais e granulares

5. Sedimento de Infec5. Sedimento de Infec5. Sedimento de Infec5. Sedimento de Infecçççção Urinão Urinão Urinão Urinááááriariariaria - tipicamente associação de leucocitúria e bacteriúria

MEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNÓÓÓÓSTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIA

III. AVALIAIII. AVALIAIII. AVALIAIII. AVALIAÇÇÇÇÃO DA FUNÃO DA FUNÃO DA FUNÃO DA FUNÇÇÇÇÃO RENALÃO RENALÃO RENALÃO RENAL

1.1.1.1. CLEARANCE E TAXA DE FILTRACLEARANCE E TAXA DE FILTRACLEARANCE E TAXA DE FILTRACLEARANCE E TAXA DE FILTRAÇÇÇÇÃO GLOMERULAR (TFG)ÃO GLOMERULAR (TFG)ÃO GLOMERULAR (TFG)ÃO GLOMERULAR (TFG)

• O cálculo da TFG é essencial na avaliação dos pacientes com doença renal.

• A TFG renal total é igual à soma das TF de cada um dos nefróneosfuncionantes, é um índice da massa renal funcionante. Por exemplo a perda de metade dos nefróneos funcionantes leva a uma significativa descida na TFG (pode ser só 20 a 30%, não 50%, devido a uma hiperfiltração compensatória nos nefróneos restantes).

• Uma descida da TFG pode ser o sinal mais precoce ou único de doença renal

• A medição seriada da TFG é usada para estimar a gravidade e seguir o curso das doenças renais

• É útil para determinar a dosagem apropriada das drogas excretadas pelo Rim nos doentes com Insuf. Renal

MEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNÓÓÓÓSTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIA

III. AVALIAIII. AVALIAIII. AVALIAIII. AVALIAÇÇÇÇÃO DA FUNÃO DA FUNÃO DA FUNÃO DA FUNÇÇÇÇÃO RENALÃO RENALÃO RENALÃO RENAL

CLEARANCE E TAXA DE FILTRACLEARANCE E TAXA DE FILTRACLEARANCE E TAXA DE FILTRACLEARANCE E TAXA DE FILTRAÇÇÇÇÃO GLOMERULAR (TFG)ÃO GLOMERULAR (TFG)ÃO GLOMERULAR (TFG)ÃO GLOMERULAR (TFG)

Para medir a TFG usa-se a Inulina - polissacárido capaz de atingir uma concentração estável no plasma, filtrada livremente no glomérulo e que não é reabsorvida, segregada, sintetizada ou metabolizada pelo Rim

TFG x Pin = Uin x V ou TFG = Uin x VPin

(Uin x V) / Pin é o Clearance da Inulina e reflecte com precisão a TFG.Exprime-se em ml / m e significa o volume de plasma que fica limpo (clear)

de Inulina em cada minuto através da excreção renal

Apesar da sua precisão o Clearance da Inulina não se faz na clínica por ser complicado

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MEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNÓÓÓÓSTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIA

III. AVALIAIII. AVALIAIII. AVALIAIII. AVALIAÇÇÇÇÃO DA FUNÃO DA FUNÃO DA FUNÃO DA FUNÇÇÇÇÃO RENALÃO RENALÃO RENALÃO RENAL

2. 2. 2. 2. ClearanceClearanceClearanceClearance da Creatininada Creatininada Creatininada Creatinina

• O método mais usado para estimar a TFG é o Clearance da Creatinina (Ccr)• A Creatinina deriva do metabolismo da creatina dos músculos esqueléticos.• A concentração plasmática da Creatinina (Pcr) é bastante estável.• Tal como a Inulina é filtrada livremente no glomérulo, e não é reabsorvida nem

metabolizada pelo Rim• Uma pequena quantidade chega à urina por secreção no túbulo proximal e

assim o Clearance da Creatinina (Ccr)Ccr = Ucr x V

Pcrtende a exceder o Cin em 10 a 20%

Doente com Pcr = 1,2 mg/dl; Ucr = 100 mg/dl; V = 1080 ml/diaDado que 1080 ml/dia : 1440 min/dia = 0,75 ml/m

Ccr = 100 mg/dl x 0,75 ml/m 1,2 mg/dl

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III. AVALIAIII. AVALIAIII. AVALIAIII. AVALIAÇÇÇÇÃO DA FUNÃO DA FUNÃO DA FUNÃO DA FUNÇÇÇÇÃO RENALÃO RENALÃO RENALÃO RENAL

2. 2. 2. 2. ClearanceClearanceClearanceClearance da Creatininada Creatininada Creatininada Creatinina

Suas limitações:

1. Colheita de urina de 24 horas incompletaA excreção diária de Creatinina é de 15 a 20 mg/Kg na mulher e de 20 a 25 mg/Kg no homem. Valores abaixo destas estimativas indicam uma colheita incompleta

2. A secreção tubular da Creatinina aumenta com a progressão da Insuf. RenalNa Insuf. Renal o Ccr sobrestima a TFG

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III. AVALIAIII. AVALIAIII. AVALIAIII. AVALIAÇÇÇÇÃO DA FUNÃO DA FUNÃO DA FUNÃO DA FUNÇÇÇÇÃO RENALÃO RENALÃO RENALÃO RENAL

3. Creatinina Plasm3. Creatinina Plasm3. Creatinina Plasm3. Creatinina Plasmáááática (Pcr)tica (Pcr)tica (Pcr)tica (Pcr)

• Alterações na TFG podem ser avaliadas pela medição da Creatinina Plasmática (Pcr)

• Pcr varia inversamente à TFG - se a TFG descer 50% a excreção da Creatinina dimimui, a creatinina que continua a ser produzida iráacumular-se no plasma até que a carga filtrada volte a igualar a quantidade produzida

• Pcr deve ser medida em jejum - uma refeição de carne pode fazer subir o Pcr até 1 mg/dl

• Pcr pode subir desproporcionadamente quando há destruição muscular

• Nos doentes desnutridos ou com insuf. hepática pode ocorrer uma diminuição da produção de creatinina e apresentarem Pcr anormalmente baixos substimando a TFG real

A relação entre a TFG e o Pcr é dependente da produção de creatinina, que éfunçaõ da massa muscular do doente - o mesmo valor de Pcr representa TFG muito diferenre num jovem de 80 Kg ou numa idosa de 40 KG

Relação Pcr e TFG

0

1

2

3

4

5

6

7

8

9

10

11

12

10 30 50 70 90 110

TFG, ml/m

Pcr, mg/dl

Esta relação mostra que a subida inicial do Pcr representa uma perda substancial de TFG - uma progressão significativa da doença pode ocorrer com uma pequena subida no Pcr

Numa pessoa com doença renal conhecida um Pcr estável a um nível inferior a 1,5 mg/dl não reflecte necessariamente doença estável

Em resumo o Pcr tende a variar inversamente à TFG - medidas seriadas do Pcr são usadas para monitorizar o doente com disfunção renal ( uma subida do Pcr indica progressão da doença enquanto a descida do Pcr sugere recuperação da função renal)

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III. AVALIAIII. AVALIAIII. AVALIAIII. AVALIAÇÇÇÇÃO DA FUNÃO DA FUNÃO DA FUNÃO DA FUNÇÇÇÇÃO RENALÃO RENALÃO RENALÃO RENAL

4. F4. F4. F4. Fóóóórmulas para calcular a TFGrmulas para calcular a TFGrmulas para calcular a TFGrmulas para calcular a TFG

O Clearance da Inulina é impossível de fazer na prática clínica, o Clearance da Creatinina está sujeito a erros grosseiros (colheita de urina de 24 horas) e o mesmo valor de Creatinina Plasmática representa TFG completamente diferentes conforme a idade, a massa muscular ou o sexo do doente.Desnvolveram-se fórmulas para calcular de uma forma simples e fiável a TFG:

• Cockroft / Gault(140 - Idade) x Peso na mulher multiplicar por 0,85

Pcr x 72.

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III. AVALIAIII. AVALIAIII. AVALIAIII. AVALIAÇÇÇÇÃO DA FUNÃO DA FUNÃO DA FUNÃO DA FUNÇÇÇÇÃO RENALÃO RENALÃO RENALÃO RENAL

4. F4. F4. F4. Fóóóórmulas para calcular a TFGrmulas para calcular a TFGrmulas para calcular a TFGrmulas para calcular a TFG

MDRD

GFR, in mL/min per 1.73 m2 =

(170 x (PCr [mg/dL])exp[-0.999]) x (Age exp[-0.176]) x ((Surea [mg/dL])exp[-0.170]) x ((Albumin [g/dL])exp[+0.318])

Esta fórmula utiliza a idade, a albumina plasmática e a ureia plasmática. valor obtido deverá ser multiplicado por 0,762 nas mulheres

Há vários sites na Internet que usam esta fórmula para calcular a TFG

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III. AVALIAIII. AVALIAIII. AVALIAIII. AVALIAÇÇÇÇÃO DA FUNÃO DA FUNÃO DA FUNÃO DA FUNÇÇÇÇÃO RENALÃO RENALÃO RENALÃO RENAL

5. Ureia Plasm5. Ureia Plasm5. Ureia Plasm5. Ureia Plasmáááática (tica (tica (tica (PurPurPurPur))))

Tal como a Creatinina a Ureia é excretada principalmente por filtração glomerular e pode ser usada para detectar alteração na TFG

Dois factores podem alterar o Pur sem alteração na TFG ou no Pcr:

1. A produção de Ureia e o Pur sobem quando mais aminoácidos são metabolizados no fígado - dietas hiperproteicas, aumento do catabolismo tecidular (trauma, hemorragia GI, corticoterapia). Por outro lado o Pur está reduzido na insuf. hepática severa e na baixa ingestão proteica

2. 40 a 50% da Ureia filtrada é reabsorvida nos túbulos. Nos estados hipovolémicos esta reabsorção aumenta, com diminuição da excreção da Ureia e subida do Pur.

3.

4. Em geral a relação Pur / Pcr é 25 a 40 para 1, quando esta relação excede 50:1 é de suspeitar de uma situação associada a aumento da produção de Ureia ou de diminuição do volume circulatório efectivo

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III. AVALIAIII. AVALIAIII. AVALIAIII. AVALIAÇÇÇÇÃO DA FUNÃO DA FUNÃO DA FUNÃO DA FUNÇÇÇÇÃO RENALÃO RENALÃO RENALÃO RENAL

SUMSUMSUMSUMÁÁÁÁRIORIORIORIO

• Cálculo da TFG continua a ser um método importante na avaliação dos doetes com problemas renais

• Na prática clínica o cálculo da TFG deve ser feito por uma das fórmulas apresentadas

• A Creatinina Plasmática é o parâmetro mais simples e mais fiável para seguir o curso da donça renal

• O principal uso clínico da Ureia Plasmática é o cálculo da relação Pur/ Pcr - que se vier elevada sugere que uma perfusão renal diminuidacontribui para a insuficiência renal (factor pré-renal)

MEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNÓÓÓÓSTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIA

IV. ESTUDOS IMAGIOLIV. ESTUDOS IMAGIOLIV. ESTUDOS IMAGIOLIV. ESTUDOS IMAGIOLÓÓÓÓGICOSGICOSGICOSGICOS

1. Ecografia1. Ecografia1. Ecografia1. EcografiaÉ o meio mais usado para avaliação morfológica nas doenças genito-urinárias pelo sua acessibilidade, segurança, baixo custo e ser não invasivo.

Indicações e VantagensDefinir número, localização, tamanho e forma dos rinsDetecção e caracterização de quistos renaisDetecção de massas renais sólidasAbordagem inicial da Insuficiência RenalDespiste de hidronefroseAvaliação de colecções líquidas perirrenaisDespiste de Abcesso Renal na Pielonefrite agudaDespiste de D. Renal PoliquísticaGuiar biópsias e outras intervenções percutâneas

LimitaçõesNão permite visualização do sistema colectorNão distingue uma dilatação obstrutiva de uma dilatação não-obstrutivaLesões ou anormalidades não litiásicas do aparelho urinário (neoplasias, coágulos, necrose papilar)

são de difícil avaliação por ecografia

MEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNÓÓÓÓSTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIA

IV. ESTUDOS IMAGIOLIV. ESTUDOS IMAGIOLIV. ESTUDOS IMAGIOLIV. ESTUDOS IMAGIOLÓÓÓÓGICOSGICOSGICOSGICOS

2. RX Simples2. RX Simples2. RX Simples2. RX Simples

Pode dar informação sobre cálculos urinários, calcificações ou massas renais, tamanho e contorno dos rins.

3. Urografia I. V. (UIV)3. Urografia I. V. (UIV)3. Urografia I. V. (UIV)3. Urografia I. V. (UIV)

Continua a ser usada mas em situações muito precisas:- Estudo de hematúria- Suspeita de tumores uroteliais ou necrose da papila- Casos do Litíase renal- Infecções urinárias complicadas (Tuberculose)

Inconvenientes:- Preparação complicada- Exposição a radiação- Efeitos adversos do meio de contraste (reacções anafilactóides e não anafilactóides, nefrotoxicidade)

MEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNMEIOS COMPLEMENTARES DE DIAGNÓÓÓÓSTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIASTICO EM NEFROLOGIA

IV. ESTUDOS IMAGIOLIV. ESTUDOS IMAGIOLIV. ESTUDOS IMAGIOLIV. ESTUDOS IMAGIOLÓÓÓÓGICOSGICOSGICOSGICOS

4. TAC4. TAC4. TAC4. TAC

A TAC helicoidal tornou-se a tecnologia de Tomografia Computorizada standard na avaliação do aparelho urinário e é cada vez mais usada

Pode ser utilizada em:- Avaliação de doença das artérias renais- Detecção, caracterização e estadiamento dos tumores renais- Avaliação do traumatismo renal- Estudo da litíase urinária

Nestas situações é mais informativa do que a Ecografia e a UIV e parece ser pelo menos tão eficaz com a UIV no estudo das lesões do tracto urinário

Como inconveniente - a exposição a radiações em dose não desprezível e uso de produtos de contraste nefrotóxicos.

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HematHematHematHematúúúúriariariaria e e e e ProteinProteinProteinProteinúúúúriariariaria

Clara Almeida, Nefrologista do Serviço de Nefrologia do CHVNG/E

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PROTEINÚRIA E HEMATÚRIA A proteinúria e a hematúria são duas das principais manifestações de doença renal, nomeadamente de doença glomerular. PROTEINÚRIA Nos adultos a excreção urinária normal de proteínas é inferior a 150mg/24h. Valores de excreção superiores, se persistentes, devem ser investigados. Numa urina normal, a proteína mais abundante é a proteína de Tamm-Horsfall, que é secretada a nível das células tubulares renais. A albumina e outras proteínas (imunoglobulinas, cadeias leves e outras) estão presentes em pequena quantidade. A forma mais usual de detecção da proteinúria é pelo uso de tiras-teste. Contudo, estas apenas são positivas quando a excreção de proteínas é superior a cerca de 300 a 500 mg/dia e só detectam a presença de albumina, não sendo sensíveis à presença de outras proteínas, como por exemplo cadeias leves de imunoglobulinas. As tiras-teste podem ser falsamente positivas, como acontece nos casos em que é testada uma urina muito concentrada ou na presença de hematúria macroscópica franca. Por outro lado numa urina diluída o resultado poderá ser falsamente negativo. A avaliação dos doentes com proteinúria persistente implicava, até há pouco tempo, o doseamento de proteínas nas 24h. Um método alternativo, muito mais simples e que tem sido cada vez mais usado actualmente, é a determinação da razão proteínas:creatinina numa amostra de urina ocasional, preferencialmente na primeira urina da manhã. Nos indivíduos normais a razão é inferior a 0,2, o que corresponde a uma excreção urinária inferior a 200mg/dia. Um valor igual ou superior a 3,5, correspondendo a uma excreção de proteínas igual ou superior a 3,5g/24h, sugere a presença de síndrome nefrótico. A microalbuminúria é a excreção aumentada de albumina na urina, mas em quantidade inferior ao limiar de detecção das tiras-teste habitualmente usadas. A excreção normal de albumina é inferior a 30mg/dia. Um teste é positivo se revelar valores entre 30 a 300mg/dia. O doseamento de microalbuminúria está claramente indicado na diabetes, onde tem valor prognóstico na detecção das fases precoces da nefropatia diabética. Nas outras doenças renais proteinúricas o seu papel ainda não está devidamente estabelecido. ETIOPATOGENIA A proteinúria pode ter origem glomerular, tubular ou ser provocada por overflow. A proteinúria de causa glomerular é a mais frequente e é causada por alteração da permeabilidade da membrana capilar glomerular, pelo que há

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filtração aumentada de macromoleculas. A proteinúria glomerular é composta sobretudo por albumina. A proteinúria de causa tubular é encontrada em patologias agudas ou crónicas que afectam os túbulos (como por ex. na pielonefrite aguda, na doença renal poliquística autossómica dominante). É geralmente de pequena quantidade (< 500 a 1g/dia). A proteinúria por overflow resulta da filtração de proteínas de baixo peso molecular presentes no soro em quantidade excessiva, quantidade esta que ultrapassa a normal capacidade de reabsorção e metabolização das células tubulares renais. Quase sempre são situações de mieloma múltiplo em que há produção excessiva de cadeias leves. Duas outras formas de proteinúria não se enquadram bem nesta classificação:

• A proteinúria ortostática, é encontrada nas crianças e adolescentes, que apresentam valores de excreção proteica aumentada quando em ortostatismo, mas cujos valores de excreção, doseados após período de decúbito, são normais. Raramente aparece após os 30 anos. O diagnóstico é feito pela demonstração da ausência de proteinúria patológica na colheita efectuada após o período nocturno, estando ela presente em valores anormalmente elevados na colheita correspondente ao período diurno. O sedimento urinário nestas circunstâncias é normal e o prognóstico a longo prazo favorável, com resolução espontânea na maioria dos casos.

• A proteinúria funcional é uma situação transitória que acompanha situações tão diversas como febre, insuficiência cardíaca descompensada e exercício físico violento, tendendo a desaparecer com a resolução do quadro ou a cessação do exercício. Pensa-se que será mediada por factores hemodinâmicos.

ABORDAGEM DO DOENTE COM PROTEINÚRIA A proteinúria persistente, sobretudo se acompanhada de microhematúria é geralmente causada por doença glomerular. Quando a proteinúria é nefrótica (> 3.5g/24h) a etiologia glomerular é quase certa. A história e o exame físico assim como alguns testes serológicos podem sugerir o diagnóstico etiológico, nomeadamente a presença de doenças sistémicas com envolvimento renal. Nas doenças glomerulares primárias só a biopsia renal permite o diagnóstico preciso da lesão glomerular subjacente. Proteinúria não-nefrótica assintomática Quando a proteinúria é inferior a 1,5-2g/24h, o doente é normotenso e a função renal é normal, a realização de biopsia renal é controversa, uma vez que o prognóstico é geralmente benigno e o resultado da biopsia não modifica, na maior parte dos casos, o tratamento destes doentes. Um follow-up cuidadoso é contudo necessário, pois desde que a proteinúria persista,

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TFG normal

Proteinuria <2g/dia

TFG reduzida

Proteinuria persistente

Biopsia renal

Excluir Proteinuria ortostática

Reavaliar em 6-12 meses

Proteinuria TFG

Pressão arterial

Se deterioração da função renal e/ou

aumento da TA e/ou aumento proteinuria

Dosear proteinuria de 24h (razão proteínas/creatinina na urina)

Medir taxa de filtração glomerular Ecografia renal

Proteinúria

assintomática

existe sempre o risco de progressão da doença renal. Nos doentes com proteinúria superior a 500 mg/dia deve ser considerado o uso de inibidores da enzima de conversão da angiotensina e/ou ARAII como medida de Reno-protecção. A abordagem do doente com proteinúria não-nefrótica isolada está esquematizada na tabela seguinte:

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Síndrome nefrótico O síndrome nefrótico é caracterizado pela presença de proteinúria maciça (>3.5g/24h) acompanhada por hipoalbuminemia, hiperlipidemia, edema e lipidúria. A presença de síndrome nefrótico é patognomónica de doença glomerular que pode ser primária ou secundária à presença de doença sistémica com envolvimento renal. As doenças glomerulares primárias que mais frequentemente causam síndrome nefrótico nos adultos são a glomerulonefrite membranosa e a glomeruloesclerose focal e segmentar. No síndrome nefrótico de causa primária a realização de biopsia renal é mandatória, permitindo estabelecer o diagnóstico, o prognóstico e definir a terapêutica. Das causas secundárias de síndrome nefrótico no adulto, sem dúvida a mais frequente é a nefropatia diabética. O síndrome nefrótico pode ser também secundário a doenças do tecido conjuntivo (LES, AR), infecções crónicas (hepatite B, hepatite C e HIV), amiloidose, neoplasias (adenocarcinomas, linfoma de Hodgkins) e fármacos ou tóxicos. O tratamento dos doentes com síndrome nefrótico engloba o tratamento das complicações do síndrome e, em determinados casos, o tratamento específico que é dependente do resultado da biópsia renal. Assumem particular importância neste contexto:

• o controle da pressão arterial • a redução da proteinúria • o tratamento do edema • o tratamento da hipercolesterolemia

As medidas que visam o controle da pressão arterial e a redução da proteinúria adquiriram particular importância recentemente, uma vez que se tornou evidente que o controle rigoroso da pressão arterial e a redução da proteinúria para níveis não nefróticos, poderá prevenir ou pelo menos diminuir a progressão da doença renal. Quer os inibidores da enzima de conversão da angiotensina (IECA) quer os antagonistas dos receptores da angiotensina devem ser usados como fármacos de primeira linha e podem ser utilizados mesmo nos indivíduos normotensos. O objectivo é reduzir a proteinúria para valores inferiores a 500 a 1000mg/24h e obter valores da pressão arterial inferiores a 125/75mmHg. O tratamento da dislipidemia parece ter também efeito benéfico na prevenção da progressão da doença renal. No tratamento do edema do síndrome nefrótico é fundamental o uso de diuréticos acompanhado de restrição salina. A furosemida é o fármaco de primeira escolha. A vigilância do peso do doente é a forma mais eficaz e objectiva de monitorizar a eficácia da terapêutica diurética instituída. O tratamento específico geralmente envolve a utilização de imunossupressores. Devem ser considerados quando a proteinúria é persistentemente grave, apesar das medidas atrás referidas, ou quando há evidência de deterioração da função renal.

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Apesar dos grandes avanços verificados na compreensão dos mecanismos imunes das doenças glomerulares, os tratamentos são ainda pouco precisos e pouco específicos, com efeitos laterais importantes, não podendo ser esquecido que a diálise é uma forma eficaz de tratamento de substituição da função renal, muitas vezes mais segura que cursos prolongados e repetidos de tratamentos tóxicos quando sem aparente beneficio. HEMATÚRIA A hematúria é a presença de um número aumentado de eritrócitos na urina. Pode ser macroscópica, sendo visível a olho nu e descrita como urina vermelha ou cor de coca-cola, ou microscópica, podendo ser nestes casos detectada em exames da urina efectuados ocasionalmente. Na avaliação inicial de um doente que refere alteração da cor da urina é importante excluir outras causas de coloração vermelha da urina, como hemoglobinúria ou mioglubinúria e nas mulheres, excluir contaminação vaginal. Além do contexto clínico ser importante, o exame do sedimento urinário confirmará a presença de glóbulos rubros em número aumentado no caso de hematúria. Num sedimento urinário normal, o número de eritrócitos é igual ou inferior a 2 por campo. A presença de hematúria, sobretudo se persistente e quando não explicada por uma causa óbvia como por exemplo cistite, implica uma avaliação cuidada já que pode ser tradutora de lesão importante subjacente. As causas de hematúria variam com a idade sendo as mais frequentes as devidas a:

• infecção (cistite, pielonefrite, prostatite) • cálculos • neoplasias do tracto urinário (em indivíduos mais velhos) • doenças glomerulares (geralmente associada a outros indicadores de

lesão renal) ABORDAGEM DO DOENTE COM HEMATÙRIA Na avaliação dos doentes com hematúria é importante determinar se esta é de origem glomerular ou extra-glomerular, já que esta distinção tem implicações não só em termos de investigação etiológica como de prognóstico. Quando a causa é glomerular a urina tem geralmente uma cor escura e praticamente nunca se observam coágulos. A origem glomerular da hematúria deve também ser suspeitada nos casos em que estão presentes:

• eritrócitos dismorficos • cilindros eritrocitários (virtualmente patognmónicos de doença

glomerular e indicadores de lesão grave) • proteinúria concomitante

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Se estes achados estão presentes pode ser presumida uma etiologia glomerular não sendo necessário investigar uma patologia urológica subjacente. As doenças glomerulares que mais frequentemente causam hematúria microscópica isolada são a nefropatia de IgA, o síndrome de Alport (história familiar de doença renal positiva) e a doença da membrana fina. A biópsia renal não está geralmente indicada na avaliação da hematúria microscópica isolada, mas deverá ser considerada caso se verifique aparecimento de proteinúria significativa, hipertensão arterial ou deterioração da função renal. Deverá ser igualmente considerada quando há suspeita de doença heredo-familiar renal. A hematúria macroscópica de causa glomerular é menos comum, verificando-se habitualmente nas crianças, adolescentes e adultos jovens. A causa mais frequente é a nefropatia de IgA, em que os episódios de hematúria macroscópica tipicamente são coincidentes com episódios de infecção respiratória. Nos indivíduos mais velhos a hematúria macroscópica de causa glomerular é muito mais rara, traduzindo geralmente atingimento renal severo. A hematúria macroscópica em indivíduos com idade superior a 50 anos traduz geralmente patologia urológica subjacente potencialmente grave e implica obrigatoriamente avaliação urológica. A abordagem do doente com hematúria de causa extra-glomerular está esquematizada na tabela seguinte: Achados Urinários

• sem GR dismórficos • sem cilindros eritrocitários • sem proteinuria

Cultura de urina e BK x 3 Exame da próstata Citologia (dependendo da idade)

Positivo Infecção do tracto urinário Tuberculose Neoplasias do tracto urinário

Não diagnostica

Ecografia/TAC UIV

Positivo

Doenças císticas Cálculos Neoplasias do tracto urinário

Não diagnostica

Cistoscopia / Pielografia retrógrada Positivo Lesões uretrais

Neoplasias do tracto urinário

Não diagnostica

Angiografia Positivo Malformações artério-venosas

Aneurismas Varizes uretrais

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BIBLIOGRAFIA

1. Evaluation of Isolated Proteinúria in Adults, UpToDate, Online16.1 2. Evaluation of Hematuria in Adults, UpToDate, Online 16.1 3. Hematuria: Glomerular versus Extra-Glomerular Bleeding, UpToDate,

Online16.1 4. Urinalysis in the Diagnosis of Renal Disease, UpToDate, Online 16.1 5. Differential Diagnosis of Glomerular Diseases, UpToDate, Online 16.1 6. Urinalysis, Comprehensive Clinical Nephrology, 2nd Edition 7. Introduction to Glomerular Disease: Clinical Presentations, Comprehensive

Clinical Nephrology, 2nd Edition

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Insuficiência RenalInsuficiência RenalInsuficiência RenalInsuficiência Renal

Ana Ventura, Nefrologista do Serviço de Nefrologia do CHVNG/E

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INSUFICIÊNCIA RENAL Insuficiência renal corresponde à diminuição da taxa de filtração glomerular, expressa por uma elevação da creatinina e ureia séricas. O tempo de instalação permite classificar a insuficiência renal em:

� aguda (se se instala em dias ou horas), � rapidamente progressiva ( se se instala em semanas) � crónica ( evolução há mais de 3 meses).

Para efeitos práticos e porque nem sempre a evolução temporal é bem conhecida, distinguimos habitualmente dois padrões: aguda (IRA) ou rapidamente progressiva (IRRP) e crónica (IRC). Perante um doente que se apresente com insuficiência renal o primeiro objectivo é determinar se ela é aguda ou crónica (fig. 1). A distinção é habitualmente simples, sendo a história clínica a maior parte das vezes a chave do diagnóstico:

� O doente tem alguma patologia que se associa a insuficiência renal crónica, como por exemplo diabetes mellitus, doença renal poliquística?

� O doente tem sintomas de deterioração do estado geral progressivas ou nictúria há mais de 6 meses?

� Há na história marcadores de problemas renais como HTA, proteinúria detectada em análises de rotina ou durante a gravidez?

� Há história de procedimentos urológicos ou litíase? A resposta positiva a estas questões põem-nos na pista de deterioração prolongada da função renal, ou seja insuficiência renal crónica. A revisão de exames analíticos anteriores, quando disponíveis, e das medicações em curso é fundamental. O exame objectivo é também útil. Nos casos de IRC é muitas vezes inexpressivo, para além da presença de HTA ou o achado de rins volumosos na doença renal poliquística. Nos casos de IRA pelo contrário, o exame físico é fundamental sobretudo no que diz respeito à avaliação do estado de hidratação/ preenchimento vascular. A oligúria é sempre indicativa de deterioração aguda da função renal. Dos exames auxiliares de diagnóstico, a ecografia renal é o mais importante para esta distinção. O achado de rins de tamanho diminuído com diminuição da espessura cortical, aumento da ecogenicidade e perda de diferenciação cortico-medular, são inequívocos de um processo crónico. No entanto, na diabetes e amiloidose a IRC pode cursar com rins de tamanho normal. Os exames laboratoriais são menos específicos para esta diferenciação, mas podem fornecer pistas importantes:

� o achado de anemia normocítica e normocrómica é usual na IRC, mas pode aparecer no contexto de IRA associada a doenças sistémicas como mieloma múltiplo ou vasculite. Nestes casos a anemia é habitualmente desproporcionada ao grau de insuficiência renal.

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� o achado de cálcio baixo e fósforo elevado são habituais na insuficiência renal, mas não permitem a distinção entre IRA e IRC.

� O doseamento de hormona paratireodeia (PTH) se elevado favorece o diagnóstico de IRC

Doentes com valores elevados de ureia e creatinina (por exemplo ureia>200mg/dl, creatinina>6mg/dl) que se apresentam pouco sintomáticos e relativamente bem (deambulam, conversam) e com diurese mantida, têm frequentemente IRC.

Insuficiência renal

Aguda/rapidamente progressiva

Crónica

história clinica�antecedentes : DM , HTA, doença aterosclerótica, função renal prévia� fármacos: Nefrotóxicos, AINE’s, IECA / ARA, diuréticos� contexto clinico em que surge�duração dos sintomas� hx familiar de doença renal� hx genésica

exame físico�oliguria / anúria� HTA / hipotensão� estado de hidratação/ avaliação da volémia� Pele: rash, púrpura, microenfartes

exames laboratoriais�anemia � relação ureia/creatinina (N:20)� cálcio e fósforo� PTH

ecografia renal

Fig. 1 – distinção entre IRA e IRC INSUFICIÊNCIA RENAL AGUDA A IRA á um problema clínico comum. Não é uma doença única mas sim um síndrome causado por uma multiplicidade de doenças e mecanismos fisiopatológicos. Após estabelecer o diagnóstico de IRA, importa perceber a sua causa. Tradicionalmente dividem-se as causas de IRA em (fig. 2):

� pré-renal, � renal (parenquimatosa) � pós-renal

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Esta classificação é útil porque permite uma base lógica para a investigação e tratamento da IRA. As causas pré e pós renais podem ser facilmente diagnosticadas e além de serem as causas mais frequentes de IRA, permitem após o seu diagnóstico , o estabelecimento de um plano terapêutico que rapidamente pode conduzir à restauração da função renal. Na prática, a avaliação clinica da IRA faz-se respondendo às seguintes questões:

� Trata-se de IRA ou IRC agudizada? � Há obstrução do tracto urinário? � Há redução do volume circulante efectivo? � Há nefrotóxicos que possam ser implicados? � Há evidência de oclusão de grandes vasos? � Há doença parenquimatosa renal diferente de necrose tubular aguda?

Pré-renal

Renal

Pós-renal

HipovolémiaRedução do volume intravascular efectivo

Oclusão das artérias renais

VasosSHU/PTTHTA malignaAteroembolismo

GlomérulosGlomerulonefrite aguda ou rapidamente progressiva

TúbulosNTA isquémicaNTA tóxica: toxinas endógenas, toxinas exógenas

InterstícioNefrite intersticial aguda

Oclusão das veias renais

Obstrução do tracto urinário

Parênquima

Fig. 2 – causas de insuficiência renal aguda A IRA pré-renal ocorre como um mecanismo de resposta renal às situações de diminuição da sua perfusão (fig.3):

� estados de desidratação, � hipovolémia, � diminuição do volume circulante efectivo como ICC ou sépsis � alteração da autorregulação renal

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IRA pré-renal

Redução do volume intravascular efectivo

Alteração da autorregulação renal

HipovolémiaHemorragiaPerda de volume: (GI, pele, respiratório)3º espaço

Insuficiência CardiacaDisfunção miocárdicaDisfunção valvularTamponamento cardíaco

VasodilataçãosistémicaSépsisCirroseAnafilaxiaAnestesia

Vasoconstrição pré-glomerular(arteríola aferente)HipercalcémiaSíndrome hepato-renalFármacos: AINE’s, CsA, adrenalina

Vasoconstrição pós-glomerular (arteríola eferente)IECAARA II

Fig. 3 – causas de IRA pré-renal Nestas situações há activação dos sistemas renina-angiotensina-aldosterona, sistema nervoso simpático e libertação de ADH. Daqui resulta a retenção ávida de sódio e água pelo rim como forma de restaurar a volémia (fig. 4). Por esta razão, a IRA é habitualmente oligúrica e se medirmos o Na+ urinário este é baixo (<10mEq/L).

hipovolémia insuf. cardíaca cirrose sépsis

redução do volume intravascular efectivo

activação dos barorreceptores centrais

libertação de vasopressina

activação do sistema renina-angiotensina-

aldosterona

activação do sistema nervoso simpático

vasoconstrição sistémica ⇒ manutenção da pressão arterialretenção renal de sódio e água ⇒ preservação do volume intravascular

Fig. 4 – Fisiopatologia da IRA pré-renal

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Se a perfusão renal não é reestabelecida há lesão isquémica dos tubulos renais e desenvolvimento de necrose tubular aguda (NTA). Nestes casos, os mecanismos de retenção de Na+ estão comprometidos pela lesão tubular, razão pela qual o Na+ urinário não é baixo (>20mEq/L). A história clinica associada a uma avaliação cuidadosa do estado de volemia do doente (fig. 5) , permitem a maior parte das vezes o diagnóstico.

Depleção de volume Aumento de volume História clinica � sede � Aumento de peso

� oligúria � ortopneia

� perdas de fluídos � Dispneia paroxística nocturna

� balanço hidrico negativo � balanço hidrico positivo � diminuição de peso Exame físico

� diminuição do turgor cutâneo � Edema

� mucosas secas � Turgescência venosa

jugular

� Ausência de suor axilar � S3 na auscultação cardíaca

� Diminuição da PV jugular � Crepitações

pulmonares � Taquicardia ou hipotensão

postural � Derrame pleural / ascite

Fig. 5 – avaliação do estado de hidratação A IRA pós renal resulta da obstrução do sistema colector urinário. Tal como a IRA pré-renal, ocorre sem existir dano estrutural do parênquima renal e por isso pode ser rapidamente reversível quando se resolve a causa. A obstrução pode ocorrer em qualquer local do tracto urinário desde os tubulos renais ao meato urinário (fig. 6).

Causas ureterais � Litíase � Coágulos � Tumores (pélvicos, retroperitoneais)

Causas uretrais � Estenoses uretrais (pós-instrumentação, pós-infecciosas,

pós-trauma) � Válvulas uretrais posteriores

Causas prostáticas � Hipertrofia benigna da próstata � Carcinoma da próstata

Causas vesicais � Tumores da bexiga � Cálculos � Schistosomiase � Bexiga neurogénica (trauma ou deficiência medular,

diabetes, esclerose múltipla, AVC, paramiloidose) Fig. 6 – causas de obstrução do tracto urinário

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As causas mais comuns são habitualmente sugeridas pela história clinica: história de prostatismo, antecentes de litíase renal ou doentes com contexto para bexiga neurogénea. A IRA obstrutiva cursa habitualmente com anúria se a obstrução for total, ou com diureses “flutuantes” (poliúria alternando com oligúria) se a obstrução for parcial. A ecografia reno-vesical facilmente permite o diagnóstico, mostrando dilatação caliceal. A ecografia é muito sensível para o diagnóstico de obstrução, mas muitas vezes não consegue evidenciar a causa. A presença de hidronefrose unilateral sugere obstrução do tracto urinário alto por litíase, coágulos ou tumores; neste caso só existirá insuficiência renal se a obstrução for num rim único funcionante. Pelo contrário, hidronefrose bilateral sugere obstrução ao nível do ureter pélvico ou da uretra (neste caso existirá globo vesical). Há casos raros em que a dilatação pode não ser evidente na ecografia (fig. 7). Falsos negativos Falsos positivos

� Obstrução recente � Inexperiência do operador � Diminuição do débito urinário

(desidratação, insuficiência renal) � Quistos renais múltiplos

� “encarceramento” dos ureteres (fibrose retroperitoneal, tumores)

Fig. 7 – causas de diagnósticos errados de obstrução do tracto urinário A ecografia deverá ser sempre complementada com Rx reno-vesical no sentido de detectar a presença de cálculos como causa da obstrução. Ultimamente tem sido sugerida a realização de TAC como exame de 1ª linha para a avaliação de IRA obstrutiva alta. A imagem por TAC não é mais sensível que a ecografia para diagnosticar obstrução do tracto urinário, mas pode fornecer informações adicionais em relação á causa da obstrução ureteral (patologia retroperitoneal, hematomas, cálculos e tumores). A maioria dos casos de IRA renal ou parenquimatosa é devida a NTA de causa isquémica ou tóxica. Excluídas estas etiologias (habitualmente pela história clinica), deve-se ter em consideração causas menos comuns de origem vascular, glomerular ou interstícial. As catástrofes vasculares (trombose ou embolia das artérias ou veias renais) são raras como causa de IRA. Devem ser suspeitadas em doentes com contexto clínico favorecedor de hipercoagulabilidade (síndrome nefrótico, síndrome antifosfolipideo, tumores) ou doença aterosclerótica severa, que se apresentam com anúria. Nestes casos serão necessários exames diferenciados como a angioressonância renal ou angiografia. A diferenciação das causas parenquimatosas renais pode ser conseguida com o exame sumário da urina e estudos serológicos (antiestreptolisina,

Page 73: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

antinucleares, ANCA, anti-MBG, níveis de complemento, detecção de crioglobulinas, factor reumatoide), mas por vezes, só a biópsia renal permite o diagnóstico definitivo e o estabelecimento do prognóstico.

Clinica Na+ urinário

Análise sumária da urina

Ecografia renal

Pré-renal Hipovolémia Diminuição do volume intravascular efectivo

<10 Normal normal

NTA Isquemia renal nefrotóxicos

>40 Cilindros pigmentados

normal

Glomerulonefrite aguda

Síndrome nefrítico agudo <10 Hematúria Cilindros eritrocitários proteinúria

Normal ou rins aumentados

Nefrite intersticial aguda

História medicamentosa Rash

variável Leucocitúria Cilindros leucocitários eosinofilúria

Normal ou rins aumentados

Catástrofe vascular

Estados de hipercoagulabilidade Doença aterosclerótica

- normal Normal ou rins diminuídos

Obstrução Hx de litíase, prostatismo, bexiga neurogénica

- normal Dilatação caliceal

Fig. 8 – sumário do diagnóstico diferencial da IRA O tratamento da IRA passa pela resolução da causa (fig.9). A terapêutica de suporte pode incluir diálise até que haja recuperação da função renal. A terapêutica de substituição da função renal na IRA faz-se habitualmente com hemodiálise intermitente, mas em alguns casos, a instabilidade hemodinâmica não o permite. Nestas situações usam-se terapêuticas dialíticas contínuas como a hemofiltração ou hemodiafiltração. As indicações absolutas para início de diálise na IRA são:

� Presença de síndrome urémico � Hipervolémia resistente � Hipercaliémia resistente � Acidose resistente.

Na prática, a hemodiálise é também habitualmente iniciada quando há oligúria ou valores elevados de ureia e creatinina, na ausência de evidência de recuperação da função renal a curto prazo, com base no conhecimento de que as complicações da uremia são frequentes nestas circunstâncias.

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Pré-renal

Renal

Pós-renal

HipovolémiaRedução do volume intravascular efectivo

Alteração da auto regulação renal

Oclusão das artérias renais

VasosSHU/PTT

HTA maligna

Ateroembolismo

GlomérulosGlomerulonefrite aguda

GNRP

TúbulosNTA isquémica

NTA tóxica

InterstícioNefrite intersticial aguda

Oclusão das veias renais

Obstrução do tracto urinário

Parênquima

Suspender diuréticosAdministrar coloides/cristaloides/sangueInotrópicosAntibióticos se sépsis

Suspender AINE’s; IECA

Anticoagulação/ trombóliseAngioplastia/stent/cirurgia

ImunossupressãoPlasmeferese

Controlo da TA

Tx suporte

Tx de suporte de pós-infeciosaAntibióticos se endocardite

Imunossupressão

Tx de suporteRestaurar perfusão renalSuspender nefrotóxicos

Suspender o fármaco implicadoConsiderar corticoides

Obstrução intratubularMieloma múltiplo

Cristais

Quimioterapia/ plasmaferese

Diurese alcalina se rabdomiólise ou nef. úrica

AnticoagulaçãoTx da doença glomerular se síndrome nefrótico

Cateter vesical / nefrostomiaTx cirúrgico

Fig. 9 – tratamento da IRA

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INSUFICIÊNCIA RENAL CRÓNICA A insuficiência renal crónica é uma deterioração permanente e progressiva da função renal. A prevalência da IRC não é conhecida, porque muitos casos não são reconhecidos, mas estima-se que seja aproximadamente 2000 casos por milhão de habitantes. As causas mais frequentes de IRC estão expressas na figura 10. Fig. 10 – causas de IRC Na abordagem de um doente com IRC procuramos:

� Definir a causa � Procurar factores reversíveis � Prevenir e tratar as complicações associadas � Preparar para a terapêutica de substituição da função renal

O estabelecimento da causa da IRC é importante no sentido de, quando possível, iniciar uma terapêutica que possa ser eficaz e prevenir a deterioração posterior da função renal. Por outro lado, o conhecimento da causa tranquiliza o doente, permite inferir o prognóstico e fazer o aconselhamento genético no caso de nefropatias hereditárias. Na maioria dos doentes a causa da IRC é clara na história clínica e exames iniciais (diabetes, HTA, doença renal poliquística, pielonefrite crónica, mieloma múltiplo, amiloidose, doenças sistémicas com envolvimento renal...). O problema põe-se nos doentes que se apresentam com insuficiência renal avançada, rins pequenos na ecografia e sedimento urinário inexpressivo. As etiologias mais prováveis nestas circustâncias serão nefropatia isquémica, ateroembolismo crónico, nefrite intesticial crónica ou glomerulonefrite crónica. A biópsia destes rins pequenos acarreta riscos importantes e as implicações para o tratamento são mínimas ou ausentes, pelo que não deve ser realizada. A segunda questão é se há factores de agravamento da função renal, ou seja, insuficiência renal aguda sobreposta em IRC (fig. 11).

Glomerulonefrite13%

Diabetes38%

Pielonefrite crónica7%

Hipertensão9%

Indeterminada19%

outras9%

Doenças císticas5%

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Causas de agravamento da função renal na IRC

� Desidratação � Diminuição da perfusão renal (ICC,

sépsis) � Alteração da autoregulação renal

(AINE’s, IECA, ARA) � Nefrotóxicos

� Obstrução � Hipercalcemia � Hipertensão � Nefrite intersticial � Infecção � Recidiva da doença de base

Fig. 11 – causas de IRA em IRC A procura sistemática destes factores permite a sua resolução e restauração do estádio anterior de IRC. A determinação da TFG é importante para estimar a severidade da IRC e as suas consequências, no sentido de implementar medidas de prevenção da progressão da insuficiência renal. Definem-se 5 estádios de gravidade (fig.12). Estádio Descrição TFG

(ml/min/m2) Consequências

1 Lesão renal com TFG normal ou ↑

>90 -

2 Lesão renal com ↓ ligeira da TFG

60-89 HTA +/-

3 ↓ moderada da TFG 30-59 HTA Hiperparatiroidismo 2º

4 ↓ severa da TFG 15-29 HTA Hiperparatiroidismo 2º

Anemia 5 Falência renal <15 ou diálise HTA

Hiperparatiroidismo 2º Anemia

Retenção hidro-salina Síndrome urémico

Fig.12 – Estádios da IRC A TFG pode ser determinada pela medição do clearance da creatinina. Esta determinação implica a colheita de urina de 24 horas o que além de incómodo para o doente se associa a uma grande margem de erro condicionada por colheitas inapropriadas. Por outro lado, a medição do clearance da creatinina sobreestima a TFG,já que a creatinina é secretada no tubo distal. A forma mais acurada de a determinar seria fazer a média do clearance da ureia e da creatinina. Uma forma rápida e prática de determinar a TFG é o recurso a fórmulas:

� Fórmula de Cockroft-Gault Clearance da creatinina = (140 – idade (anos)) x peso (Kg) 72 x creatinina plasmática (mg/dl) nas mulheres multiplica-se o resultado por 0,15.

Page 77: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

� MDRD Esta fórmula utiliza a idade, a albumina plasmática, a cratinina e a ureia séricas. É ajustada para o sexo e para a raça. É uma fórmula complexa que se encontra disponível em vários sites da internet ( por ex: www.hdcn.com)

Em todos os estádios de IRC devem ser iniciadas medidas de prevenção da progressão da IRC (renoprotecção):

� Dieta Há mais de 50 anos, Addis especulou que a gravidade da doença renal crónica poderia ser melhorada se se reduzisse a carga azotada a excretar, através da redução das proteinas ingeridas. Em animais de laboratório a restrição proteica diminui a progressão da IRC. A confirmação do efeito benéfico da restrição proteica em ensaios clínicos tem sido discutível. No entanto, é comummente aceite fazer restrição proteica moderada na doença renal. Uma meta análise recente de 5 ensaios randomizados e controlados de restrição proteica na progressão da IRC não diabética mostra haver benefício com este tipo de intervenção.

� Controlo da HTA O primeiro grande estudo a demonstrar e efeito renoprotector dos IECAs, no caso na Nefropatia Diabética tipo 1, foi o estudo Colaborativo Americano publicado em 1993. Depois deste estudo sucederam-se um grande número de outros tendo como finalidade demonstrar se os IECAs, e mais recentemente os ARA II, seriam capazes de diminuir a progressão da doença renal, e se esse efeito renal era independente do controlo tensional. Dessa multitude de estudos podem-se tirar as seguintes conclusões: - o bloqueio do sistema renina-angiotensina é benéfico na maior parte das nefropatias crónicas - os IECAs (e aparentemente os ARA II) são superiores aos outros tratamentos anti-hipertensores na prevenção da progressão da IRC - a redução da tensão arterial é benéfica nos doentes com nefropatia

� Redução da proteinúria A proteinúria por si só poderá contribuir para a progressão da lesão renal. Achados experimentais e clínicos dão suporte à hipótese que a filtração excessiva de proteinas séricas através de capilares glomerulares doentes contribui directamente para a progressão do dano renal. A forte associação entre redução da proteinúria e a renoprotecção nos estudos clínicos implica que a redução da proteinúria seja um objectivo terapêutico importante nas estratégias de renoprotecção.

� Tratamento da hiperlipidémia A doença renal crónica está frequentemente associada a anormalidades dos lipídeos plasmáticos, caracterizadas por níveis elevados dos triglicerídeos, das VLDL e LDL e por níveis baixos das HDL.

Page 78: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

Para além de aumentar o risco de doença cardiovascular, estas anormalidades lipídicas podem acelerar a progressão da doença renal. Aguardam-se resultados de grandes ensaios em curso, no entanto, os resultados de estudos mais pequenos e o facto do elevado risco e mortalidade cardiovascular dos doentes com insuficiência renal, justificam uma intervenção dietética e farmacológica para a correcção da hiperlipidemia

� Correcção da anemia Alguns estudos demonstram que a correcção da anemia se associa a melhoria da qualidade de vida, assim como a redução da morbilidade cardiovascular e da mortalidade. Outros estudos evidenciam que a correcção da anemia se associa a diminuição da progressão da IRC.

� Correcção da obesidade e deixar de fumar são outras medidas que se tem mostrado eficazes na diminuição da progressão da insuficiência renal crónica. Terapêutica de Renoprotecção Específica IECA ou ARA II para: Proteinúria < 0,5 gr/dia e declínio na TFG < 2 ml/m/ano (se objectivo não conseguido com monoterapia usar IECA+ARA II) Terapêutica Protectora Cardio-renal Adjuvante Outros antihipertensores para: T.A < 120/80 mmHg Restrição Proteica: 0,6 a 0,8 gr/Kg/dia Restrição Salina: 3 a 5 gramas/dia Controlo estrito da Diabetes: HgbA1c < 7% Valores normais do produto cálcio-fósforo Correcção da Anemia: Hgb > 12 gr/dl- LDL < 100 mg/dl Parar de fumar Controlo do Peso: BMI ideal Fig. 13 – estratégia para a diminuição da progressão da IRC No estádio 3, o controlo da HTA é mandatório. A profilaxia do hiperparatiroidismo secundário deve ser iniciada: controlo da ingestão de fósforo, prescrição de captadores do fósforo e análogos da vitamina D. A imunização para a hepatite B deve ser efectuada nesta fase, altura em que se pode esperar uma resposta mais eficaz. A vacinação nestes doentes deve ser feita com doses duplas da vacina, seguindo o calendário habitual. No estádio 4, para além das medidas anteriores, importa iniciar o tratamento da anemia, se presente. O tratamento da anemia visa não só uma melhoria da qualidade de vida, mas também a redução da morbilidade cardiovascular e da mortalidade. Quando a TFG é <20ml/min a preparação para uma terapêutica de substituição renal (hemodiálise, diálise peritoneal ou transplante) deve ser equacionada.

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Nefropatia DiabNefropatia DiabNefropatia DiabNefropatia Diabééééticaticaticatica

Isabel Tavares, Nefrologista do Serviço de Nefrologia do HSM, Braga

Page 80: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

NEFROPATIA DIABÉTICA

A nefropatia diabética é uma complicação que atinge 20 a 30% dos

diabéticos, quer do tipo I quer do tipo II. A sua definição assenta na

documentação de uma excreção urinária persistente de proteínas> 300-500

mg/24h, num doente diabético que em geral apresenta concomitantemente

retinopatia e hipertensão.

A nefropatia diabética caracteriza-se por evoluir progressiva, mas

inexoravelmente, para a insuficiência renal terminal, através de um declínio

mais ou menos rápido da função renal que é, desde a documentação da

proteinúria clínica até à chegada à diálise, em média, de 7 anos, quer na DM

tipo I quer na tipo II.

Vários factos justificam a importância crescente desta patologia:

No mundo ocidental, a nefropatia diabética constitui actualmente a causa

isolada mais importante de insuficiência renal terminal (IRCt) e a sua

frequência tem vindo a aumentar. Este aumento não se relaciona com o maior

número de doentes com DM tipo I mas, deve-se antes ao crescimento do

número e à maior longevidade da população de doentes com DM tipo II na

comunidade. O crescimento progressivo do número de doentes com DM tipo II

tem duas causas fundamentais:

- Envelhecimento progressivo da população (a DM tipo II é uma doença

do adulto e do idoso).

- Disponibilidade de melhores cuidados de saúde, o que têm permitido o

prolongamento da vida dos doentes diabéticos.

Por tudo isto, 70% dos doentes com nefropatia diabética que chegam à

hemodiálise têm DM tipo II e este número prevê-se que continue a aumentar

nos próximos anos.

A nefropatia diabética é não só muito frequente mas condiciona também

enormes gastos na saúde, acompanhando-se de índices de morbilidade e de

mortalidade elevadíssimos. De referir que o aumento do risco cardiovascular é

responsável por 50% da mortalidade nestes doentes.

Page 81: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

História natural da nefropatia diabética

A manifestação clínica mais precoce da nefropatia diabética é o

aparecimento de quantidades anormais de albumina na urina (>30 mg/dia ou

20 ug/min), a que se chama microalbuminúria. À presença de microalbuminúria

persistente chamamos nefropatia incipiente. Na DM tipo I e sem intervenção

terapêutica específica, 80% dos doentes com microalbuminuria vão apresentar

albuminúria clínica ou nefropatia estabelecida em 10-15 anos. Quando os

doentes apresentam nefropatia, a taxa de filtração glomerular vai diminuir

progressivamente, num período variável de anos, em média 10 ml/min/ano.

Nos doentes com nefropatia estabelecida, a IRCt ocorre em 50% ao fim de 10

anos e 75% em 20 anos.

Assim sendo, a história natural da doença renal está bem caracterizada

nos doentes com DM tipo I e é possível dividir a sua evolução em cinco

estadios bem definidos:

• Estadio I: presente no diagnóstico de diabetes, e que se caracteriza

por hipertrofia-hiperfunção renal;

• Estadio II: caracteriza-se pela presença de lesões glomerulares em

doentes com normoalbuminúria e normotensos.

• Estádio III: caracteriza-se pela presença persistente de albumina na

urina de 20 a 200µg/min (30 a 300 mg/24h) e ocorre tipicamente

após 7 anos ou mais de diabetes. As lesões glomerulares tornam-se

mais severas e dá-se o aparecimento da hipertensão arterial.

• Estádio IV: caracteriza-se por uma excreção persistente de albumina

na urina superior a 200µg/min ou 300 mg/24h e ocorre geralmente

após 10-20 anos de diabetes.

• Estádio V: caracteriza-se pela progressão para insuficiência renal

crónica terminal e ocorre 5-15 anos após o desenvolvimento de

proteinúria.

A história natural da doença é muito variável na DM tipo II e os doentes

poderão apresentar microalbuminúria ou mesmo proteinúria estabelecida à

data do diagnóstico de diabetes, isto porque a duração da diabetes nestes

Page 82: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

doentes é difícil de precisar (a diabetes poderá estar presente 5-10 anos antes

do diagnóstico clínico). Também a presença de microalbuminúria é menos

especifica para a presença de nefropatia diabética, sendo mais um marcador

preditivo de risco de nefropatia diabética.

Nos dois tipos de diabetes, a microalbuminúria para além de representar

um achado que confere um maior risco para o desenvolvimento de nefropatia,

constitui um importante factor preditivo de risco cardiovascular, sabendo-se que

na sua presença a mortalidade cardiovascular aumenta. Assim sendo, a

presença de microalbuminúria é indicação para efectuar screening de doença

cardíovascular e iniciar intervenção terapêutica agressiva sobre os factores de

risco cardiovascular (tabaco, dislipidemia, sedentarismo, obesidade,

hipertensão arterial, etc).

Detecção da microalbuminúria

Atendendo ao facto de permitir prever e anteceder vários anos o

desenvolvimento de nefropatia diabética clínica e de ser simultaneamente um

bom factor preditivo de risco cardiovascular, a identificação da

microalbuminúria no curso da diabetes é da maior importância.

Em que doentes se deve proceder à determinação de microalbuminúria?

� Em todos os doentes com DM tipo I com mais de cinco anos de

evolução

� Em todos os doentes com DM tipo II qualquer que seja o tempo de

evolução

Após a determinação inicial e face a um resultado negativo, a pesquisa de

microalbuminúria deverá ser efectuada anualmente.

Como se deve proceder à determinação da microalbuminúria?

A quantificação da excreção urinária da albumina pode ser efectuada por

3 métodos: avaliação da relação albumina/creatinina numa amostra de urina

casual, quantificação da excreção de albumina numa colheita de urina de 24h,

e quantificação da excreção de albumina numa amostra de urina temporizada

Page 83: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

(por exemplo, 4 horas ou 12 horas). O primeiro método é o mais fácil de

executar e providencia informação bastante precisa, sendo por isso o que se

aconselha. A determinação da relação albumina/creatinina na primeira urina da

manhã é ainda melhor devido à variabilidade da excreção de albumina ao

longo do dia.

O Micral-II (da Boehringer) – é um método imunoquímico para a

determinação semi-quantitativa de microalbuminúria na urina, utilizando-se

uma tira semelhante às vulgares tiras de Combur. Alguns estudos

evidenciaram que um resultado positivo com estas tiras apresentava uma

sensibilidade de 90% e um poder preditivo positivo de cerca de 80%. Porém

um resultado positivo com uma tira-teste deverá ser sempre confirmado por um

método mais específico.

Como existe variabilidade na excreção diária de albumina, necessitamos

de 2 ou 3 avaliações num período de 3-6 meses para confirmar o diagnóstico

de microalbuminúria persistente. É importante excluir a existência de factores

que possam agravar ou confundir a avaliação de microalbuminúria: febre,

infecção do tracto urinário, hiperglicemia ou hipertensão mal controladas e

insuficiência cardíaca congestiva.

Relação

albumina/creatinina

(ug/mg creatinina)

Urina de 24 horas

(mg/24h)

Colheita temporizada

(ug/min)

Normal < 30 < 30 < 20

Microalbuminúria 30-300 30-300 20-200

Albuminúria >300 >300 >200

Terapêutica

Controlo glicémico

Estudos prospectivos e controlados evidenciaram que a terapêutica

diabética intensiva (HbA1c< 7%) reduz significativamente o risco de

Page 84: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

desenvolvimento e progressão da microalbuminúria e nefropatia estabelecida

nos dois tipos de diabetes.

É importante não esquecer que o risco de episódios de hipoglicemia é

inquestionavelmente maior durante o tratamento intensivo, especialmente nos

doentes com insuficiência renal.

Controlo da tensão arterial

Nos doentes com DM tipo I a hipertensão arterial é geralmente causada

pela presença concomitante de nefropatia diabética, aparecendo geralmente na

fase de microalbuminúria. Nos doentes com DM tipo II, a hipertensão está

presente em 1/3 dos doentes à data do diagnóstico de diabetes. Em geral, a

hipertensão arterial nos dois tipos de diabetes, está associada a expansão do

volume plasmático, aumento da resistência vascular periférica e

hiporreninémia.

A hipertensão arterial, quer sistólica quer diastólica, promove o

aparecimento/progressão da nefropatia diabética. Assim, é indiscutível que a

terapêutica anti-hipertensora está indicada nos doentes com diabetes,

diminuindo significativamente a perda de função renal e aumentando a

esperança de vida destes doentes.

O objectivo primário da terapêutica anti-hipertensora é um valor de tensão

arterial <130/80 mmHg. Se este objectivo é atingido e tolerado, será benéfico

tentarmos uma maior redução da tensão arterial (125/70 mmHg),

essencialmente no doente jovem, com insuficiência renal e proteinúria >1g/dia.

A avaliação da pressão arterial deverá ser feita com o doente sentado e em

ortostatismo para excluir hipotensão ortostática, uma vez que a disautonomia é

frequente nestes doentes.

A utilização de fármacos antihipertensores, nomeadamente os inibidores

da enzima de conversão da angiotensina (IECA) e os antagonistas dos

receptores da angiotensina (ARA), tem benefícios que vão para além do

controlo da tensão arterial. O potencial renoprotector da terapêutica precoce

com IECA/ARA foi demonstrado em doentes diabéticos microalbuminúricos

independentemente da presença de hipertensão arterial.

Page 85: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

A terapêutica farmacológica deverá passar pela instituição de IECA ou

ARA como primeira opção e apenas substituídos por outros fármacos anti-

hipertensores quando não forem tolerados ou apresentarem efeitos adversos

graves (hipercaliemia persistentemente superior a 6 meq/l, deterioração da

função renal, etc). Importa reter que, para obtenção dos valores alvo da tensão

arterial é geralmente necessário associar outras classes terapêuticas. Os

diuréticos são uma boa opção porque os doentes diabéticos têm tendência

para reter sódio e apresentar hipervolemia. Por outro lado, estes fármacos são

uma boa associação com os IECA/ARA pois diminuem a tendência para a

hipercaliemia. Os bloqueadores dos canais de cálcio não-dihidropiridinicos têm

efeitos sinergísticos com os IECA/ARA na diminuição da proteinúria e da taxa

de perda de filtração glomerular, pelo que também são uma boa alternativa.

Alteração do estilo de vida

� Suspensão dos hábitos tabágicos – a taxa de progressão da

insuficiência renal é significativamente maior nos doentes diabéticos

fumadores do que nos não-fumadores;

� Perda de peso e exercício físico regular;

� Dieta hipossalina;

� Redução da ingestão de álcool;

Restrição proteica

Embora todos os estudos animais tenham mostrado benefício na

progressão da doença renal, os ensaios clínicos não são unânimes em

demonstrar um efeito benéfico na restrição proteica.

Na fase actual do conhecimento é relativamente consensual a diminuição

da ingestão proteica para 0,8 mg/kg/dia. A restrição da ingestão proteica para

0,8 g/Kg/dia, reduz significativamente a excreção urinária de proteínas e a

velocidade de declínio da taxa de filtração glomerular (TFG), sem afectar

adversamente o controlo glicémico.

Page 86: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

Numa fase mais avançada da doença, a restrição da ingestão proteica

para 0,6 mg/kg/dia poderá ser mais eficaz em atrasar a perda de TFG. Importa

reter que, é precisamente nestes doentes que há maior propensão para o

catabolismo e malnutrição, pelo que a instituição de uma restrição proteica

severa pode acentuar estes efeitos. Assim, a supervisão da dieta deverá ser

sempre feita por um nutricionista.

Tratamento do dislipidemia

Níveis elevados do colesterol sérico estão associados a uma progressão

mais rápida da doença renal na DM tipo I e tipo II. O objectivo terapêutico são

níveis de LDL<100mg/dl, HDL>40mg/dl e triglicerídios <150 mg/dl. As estatinas

(HMG-CoA) poderão ser especialmente indicadas no tratamento da

dislipidemia nos doentes com nefropatia diabética, por terem efeitos benéficos

para além da melhoria da dislipidemia.

Page 87: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

Hipertensão arterial de causa renalHipertensão arterial de causa renalHipertensão arterial de causa renalHipertensão arterial de causa renal

João C. Fernandes, Nefrologista do Serviço de Nefrologia do CHVNG/E

Susana Pereira, Interna Complementar de Nefrologia do CHVNG/E

Page 88: A Nefrologia para Não-Nefrologistas 2008 - Cópia.pdf

A Hipertensão Arterial De Causa Renal Introdução A hipertensão arterial (HTA) é comum nos países industrializados e tende a aumentar com a idade. É um factor de risco muito poderoso para doença cardiovascular. Em cerca de 89-95% dos casos a etiologia é desconhecida pelo que se chama HTA primária ou essencial (Quadro 1). Quadro 1

Adaptado de R. Johnson, J Fehally, Comprehensive Clinical Nephrology, 2nded. Se a avaliação inicial do doente hipertenso (história clínica, exame objectivo e estudo analítico) sugerir uma causa secundária, esta deve ser investigada. A correcção de algumas patologias que são causa de HTA secundária pode normalizar parcial ou totalmente a tensão arterial (TA). Existem 4 situações clínicas major sugestivas de HTA secundária:

���� HTA severa ou refractária ���� Aumento agudo da TA, em doente com TA prévia estável

���� Início de HTA antes da puberdade ou depois dos 50 anos ���� Idade de início < 30 anos em doentes não-obesos, raça não-negra e sem história familiar de HTA

Em 5 a 10% dos casos existe uma etiologia identificável para a HTA. As mais comuns são a doença parenquimatosa renal (2-6%) e a hipertensão renovascular (HTRV) (1-4%).

CAUSAS MAJOR DE HIPERTENSÃO

CAUSA %

Essencial 90

Doença Parenquimatosa Renal 3

Hipertensão Renovascular 2

Contraceptivos Orais 2

Aldosteronismo Primário 2

Coartação da aorta 0,2

Feocromocitoma 0,1

Outras 0,5

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I. HTA de causa Parenquimatosa Renal A HTA é uma característica comum na doença renal crónica e aguda, particularmente nas doenças glomerulares e vasculares (Quadro 2). Quadro 2

Causas de Doença Parenquimatosa Renal

Glomerulopatias

Doença Tubulointersticial Doença Poliquística

Nefropatia Obstrutiva

A presença de doença renal primária é sugerida por:

� História familiar de patologia renal, antecedentes de litíase, pielonefrites ou de abuso de medicamentos (analgésicos, AINEs), presença de sintomas urinários (hematúria, poliúria, nictúria) ou de edemas. � Aumento da Creatinina plasmática. � Alterações do Exame Sumário de Urina (proteinúria, hematúria, cilindrúria). � Ecografia renal: tamanho e simetria renais, e alterações estruturais ou obstrução.

A HTA parenquimatosa renal é facilmente suspeitada com os dados da história e dos exames complementares de diagnóstico sumários. A presença de eritrocitúria e/ou proteinúria é fortemente sugestiva de doença parenquimatosa. Proteinúria ligeira pode ser sinal de lesão de orgão alvo da HTA. A subida da creatinina plasmática indica uma insuficiência renal que pode ter a mesma causa da HTA (p. ex. glomerulonefrite crónica) ou ser secundária à HTA (nefroangiosclerose hipertensiva). A ecografia renal pode pôr-nos na pista de uma doença poliquística familiar, de HTRV, insuficiência renal crónica (IRC), pielonefrite crónica, litíase renal ou uropatia obstrutiva, mas mais geralmente é normal nas doenças parenquimatosas sem insuficiência renal. A investigação posterior depende dos achados e pode consistir em estudos imunológicos, biópsia renal, imagiologia, etc. Na doença renal parenquimatosa o controlo da HTA deve ter como objectivo valores inferiores a 130/80 mmHg. Se a proteinúria for superior a 1gr/dia e na nefropatia diabética, o objectivo são valores inferiores a 125/75 mmHg. Na IRC, por sua vez, a HTA é quase universal, sobretudo se secundária a glomerulonefrites, nefropatia diabética e doenças vasculares. É menos frequente nas doenças tubulo-intersticiais (nefrite intersticial, nefropatia obstrutiva, etc.). A sua prevalência e gravidade tende a aumentar com a diminuição da taxa de filtração glomerular. A HTA acelera o agravamento da função renal provocado pela doença original, gerando um ciclo vicioso. O tratamento da HTA previne não só a progressão da doença cardiovascular como a progressão da insuficiência renal. Por isso é importante a medição regular e

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frequente da TA como meio de prevenir, e também detectar precocemente, o agravamento da função renal. Na maioria dos doentes com IRC a expansão do volume e a sensibilidade ao sal são os mecanismos predominantes na fisiopatologia da HTA. Os dados actuais indicam claramente que um tratamento agressivo da TA é necessário para atrasar a progressão da doença renal, especialmente em doentes com creatininemia > 1,4 mg/dl. Nos doentes com doença parenquimatosa renal, qualquer classe de anti-hipertensores pode ser usada, mas existem algumas particularidades no tratamento que ajudam à sua optimização: � Reforço do papel da restrição salina como medida não farmacológica muito importante

� O controlo da HTA nos doentes com IRC implica frequentemente o uso de diuréticos. � Geralmente é necessário uma combinação de anti-hipertensores; os iECA/ARA II devem ser incluídos no esquema terapêutico, particularmente nos doentes com proteinúria e na nefropatia diabética, dado o seu papel de renoprotecção. Em fases avançadas da insuficiência renal são frequentemente necessários 3 ou mais classes de anti-hipertensores.

II. HTA Renovascular A HTRV é definida como HTA induzida por diminuição da pressão de perfusão renal secundária a lesão estenosante da artéria, ou artérias renais. Embora a relação entre a lesão orgânica (estenose da artéria renal, EAR) e a lesão fisiopatológica (HTRV) não seja universal nem linear, para efeitos de definição prática, se um doente com HTA tiver estenose superior a 75% em 1 ou ambas as artérias renais (ou superior a 50% com dilatação pós-estenótica), considera-se que a HTA é de causa renovascular. É uma causa importante de HTA secundária, eventualmente passível de correcção. A hipertensão resultante é mediada pela activação do sistema renina-angiotensina-aldosterona causada pela diminuição da perfusão sanguínea renal. A HTRV é a causa de cerca de 1% da HTA moderada e de 10 a 45% da HTA maligna ou severa. As manifestações clínicas associados a EAR variam de doente para doente e podem variar no mesmo doente ao longo do tempo, e incluem:

� Assintomática (achado ocasional) � Hipertensão renovascular � Insuficiência renal isquémica � Agravamento da insuficiência cardíaca congestiva, episódios recorrentes de edema pulmonar agudo não explicados por outras patologias (‘flash pulmonar’).

1. Etiologia da estenose da artéria renal As etiologias da estenose da EAR são a Aterosclerose e a Displasia Fibromuscular. Mais raramente a estenose é causada por compressão extrínseca, neurofibromatose tipo I, Síndrome de Williams, ou vasculite.

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A doença aterosclerótica da artéria renal está na base de mais de 90% das EAR e da HTRV. Tem tendência a aumentar com o envelhecimento da população e a sobrevivência a eventos vasculares cardíacos e centrais. Existe estenose superior a 50-60% em 6.8% da população geral com mais de 65 anos (mais nos homens - 9.1% - que nas mulheres - 5.8%) e em cerca de um terço da população com doença aterosclerótica significativa nos territórios coronário, aórtico ou periférico, ou nos doentes com insuficiência cardíaca classe II-IV com mais de 65 anos de idade. É encontrada em 18-20% dos doentes que fazem cateterismo cardíaco e em 35-50% dos que fazem arteriografia dos membros inferiores. Nem sempre a EAR está associada ou é causa de HTA ou IRC. O diagnóstico de EAR aterosclerótica depende da suspeita clínica. São geralmente doentes idosos, com história anterior de HTA essencial. A HTA pode aparecer de novo depois dos 50 anos, ou uma HTA fácil de controlar transformar-se de numa HTA mais grave. Têm outros factores de risco cardiovascular, frequentemente com evidência de lesões ateroscleróticas noutros territórios (doença cérebro-vascular, angina/enfarte cardíaco, insuficiência arterial periférica, etc.). São frequentes sopros carotídeos, renais, femorais, ou diminuição dos pulsos periféricos. Muitas vezes já existe insuficiência renal ou ela surge ou agrava-se com IECA/ARAs. Pode haver assimetria no tamanho renal. O sedimento urinário geralmente é normal mas pode existir proteinúria ligeira a moderada. Pode haver história de edemas pulmonares ou de insuficiência cardíaca congestiva de difícil compensação. A displasia fibromuscular, responsável por <10% das causas de estenose da artéria renal, é uma doença que afecta as artérias de pequeno e médio calibre, mais frequentemente a carótida e a artéria renal. A HTRV é a manifestação mais comum, e geralmente apresenta-se em mulheres dos 30-50 anos. A progressão da estenose é lenta e a função renal geralmente está preservada. 2. Indicações para despiste de HTA renovascular O screening de doença renovascular deve ser ponderado quando há suspeita clínica, mas apenas realizado em doentes com indicação para intervenção de revascularização, caso seja encontrada uma estenose significativa, ou seja, doentes em que o benefício previsível da revascularização seja superior ao do tratamento conservador e justifique os riscos e os custos. Quadro 3

Dados sugestivos de Hipertensão renovascular

Início da HTA < 30 anos, com história familiar negativa e sem outros factores de risco para HTA. Aparecimento de HTA estádio II ou HTA severa (TA > 160/100) após 55 anos. HTA resistente ou refractária (definida como resistente > 3 fármacos, que devem incluir diurético) Aumento súbito de TA em doente com TA estável. HTA maligna. Aumento agudo da Cr plasmática que ocorre após iniciar terapêutica com iECA’s e/ou ARA’s. HTA moderada a severa em doente com rim atrófico não explicado ou com assimetria no tamanho renal >1,5 cm. HTA moderada a severa em doente com doença aterosclerótica difusa, particularmente > 50 anos. HTA moderada a severa em doentes com EAP recorrente (Flash Pulmonar) ou IC não explicada. Sopro abdominal sistólico-diastólico que se lateraliza num dos lados.

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Foram definidos em 2005 pelos American College of Cardiology/American Heart Association (ACC/AHA), as situações em que o despiste da EAR deve ser ponderado (Quadro 3). 3. Diagnóstico da HTA renovascular Apesar da angiografia das artérias renais ser o método “Gold Standard” para diagnóstico, os riscos (0,5 a 2%) de nefrotoxicidade pelo contraste, embolização de colesterol e lesão das artérias renal/femoral, limitam a sua escolha. São preferidos os métodos não invasivos, particularmente na doença aterosclerótica. A angiorressonância das artérias renais é superior aos outros métodos. A sensibilidade e especificidade são superiores a 95%. A angioTC tem uma sensibilidade de 88-99% e especificidade de 93-98%. O ecodoppler tem elevada especificidade mas é dependente do operador. A angiorressonância com gadolínio está contra-indicada se a taxa de depuração da creatinina for inferior a 30ml/min, não pela nefrotoxicidade do gadolínio, mas pelo risco de dermatopatia fibrosante. Pode fazer-se Angiorressonância sem contraste (gadolíneo), com pouca perda de sensibilidade e especificidade. A potencial nefrotoxicidade da angioTC constitui a principal limitação ao seu uso. Pode e deve ser minorada com medidas de profilaxia de nefropatia de contraste a instituir antes do exame. A ecografia-dopller tem a vantagem adicional de fazer uma avaliação anatómica e funcional, permitindo avaliar fluxos das artérias. O índex de resistividade (IR) permite avaliar se existe doença de pequenos vasos intra-renais e inferir sobre fibrose parenquimatosa, e como tal pode predizer o sucesso da angioplastia. Constitui um bom método de follow-up da lesão vascular. Tem as desvantagens de ser muito dependente do operador e do perfil ecográfico do doente. A ecografia-doppler pode ser um método de primeira escolha apenas em centros com experiência. Se estes exames imagiológicos forem inconclusivos, e na presença de suspeita clínica elevada de doença renovascular, está recomendada a angiografia. Dada a elevada especificidade dos métodos anteriores, o teste do captopril, o renograma com captopril ou a medição da renina plasmática, actualmente, são exames pouco utilizados para o diagnostico de lesão estenótica. O renograma com captopril permite avaliar se a lesão estenótica é hemodinamicamente significativa. A principal limitação é o facto de ter menor sensibilidade do que a angiorressonância, angioTC ou ecodoppler A sensibilidade diminui ainda mais se houver insuficiência renal ou estenose bilateral. Exige a suspensão prévia dos iECA/ARAII. No entanto, existem alguns autores que na suspeita de HTRV com depuração de creatinina > 50ml/min, consideram o uso do ecodoppler ou renograma com captopril como método de escolha na avaliação inicial, e se estes forem positivos, a procede-se à realização posterior de angioRMN ou angiografia. 4. Tratamento da HTRV Após a suspeita clínica de HTRV o desafio que se coloca ao clínico é decidir quais os doentes em que se deve fazer diagnóstico definitivo e revascularização. Não é possível definir com segurança se a EAR é a causa da HTA ou da IRC, nem quais os doentes que beneficiarão com revascularização.

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Nos doentes jovens com suspeita de displasia fibromuscular, a simples perspectiva de fazer medicação anti-hipertensiva durante longos anos é suficiente para motivar a confirmação do diagnóstico e revascularizar. Os objectivos do tratamento são o controlo da HTA e a estabilização da função renal. Na aterosclerose, globalmente não existe diferença entre os resultados do tratamento médico e a revascularização. No entanto, muitos doentes beneficiam claramente com a revascularização, quer no controlo da TA quer na evolução da insuficiência renal. Por outro lado, em muitos doentes a revascularização é só parcialmente eficaz e pode até provocar agravamento rápido da função renal e outras complicações. O grande desafio é seleccionar os doentes que mais beneficiarão com cada uma das estratégias terapêuticas. A selecção dependerá das características do doente, e também do tipo de lesão e da experiência em revascularização. Estes doentes apresentam elevada taxa de aterosclerose sistémica, ou seja um elevado risco cardiovascular. São considerados como tendo equivalente a doença coronária, pelo que devem ser tratados como tal, independentemente da escolha de tratamento, conservador ou de revascularização. A. Tratamento médico O tratamento médico está indicado em todos os doentes. Além do controle da TA, devem controlar-se os outros factores de risco cardiovascular: tabaco, dislipidemia, obesidade, glicemia, etc. Uma redução agressiva da lipidemia pode levar a uma regressão da lesão aterosclerótica. Os valores da TA devem ser < 130/80. A escolha dos anti-hipertensores baseia-se não só na presença de EAR, mas também na presença de outras comorbilidades. Porque a HTRV está dependente do sistema renina-angiotensina-aldosterona, pela implicação deste sistema na aterosclerose, na hipertrofia miocárdica e na fibrose miocárdica e intersticial renal, e pela presença frequente de diabetes mellitus, insuficiência cardíaca congestiva e alto risco cardiovascular, os IECA/ARA serão de primeira escolha. Uma preocupação major é o agravamento da função renal ou mesmo insuficiência renal aguda com os IECAs. Este potencial problema não deve no entanto limitar o seu uso, mas implica monitorização terapêutica atenta. Na maioria dos doentes o aumento da creatinina é ligeiro, não exigindo suspensão do fármaco, ou é reversível após a descontinuação do fármaco. Nos doentes com suspeita de HTRV bilateral pode ser prudente usar-se um IECA de curta duração (captopril) e deve controlar-se a função renal e a caliémia, no máximo dentro de 1 mês. Se após controlo da TA, a TFG diminuir significativamente (mais de 30%) deverá ponderar-se a revascularização. A progressão da doença aterosclerótica é comum (30-60% em 4 a 7 anos), estando portanto indicado um follow-up regular. No entanto, a progressão para IRC estadio 5D é pouco frequente dada a elevada taxa de mortalidade por outros eventos cardiovasculares.

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B. Revascularização Indicações para revascularização Os doente com suspeita clínica de HTRV, devem apenas fazer investigação imagiológica para diagnostico de estenose das artérias renais, se tiverem indicações para revascularização, ou seja:

• Falência na terapêutica médica em controlar HTA • Intolerância à terapêutica • Se após controlo da TA, a TFG diminuir significativamente • IR progressiva devido a doença bilateral • HTA com rim unilateral pequeno não explicado por outra causa • Episódios recorrentes de flash pulmonar • Suspeita de doença fibromuscular em doente jovem (e deste modo evitar anti-

hipertensores). Os doentes com IRC grave (Scr > 3-4mg/dl) ou rins de tamanho diminuído (7-8cm), têm menor probabilidade de beneficiarem com revascularização. A avaliação nos doentes com insuficiência renal deve ser apenas realizada se existir risco de doença renal isquémica potencialmente reversível. A maneira mais objectiva de prever a reversibilidade é através da ecografia-doppler: um índex de resistividade elevado (> 0,8) indica fibrose parenquimatosa e baixa probabilidade de melhorar a HTA e/ou a insuficiência renal. A selecção mais correcta dos doentes e a escolha do timing apropriado para a revascularização são difíceis, atendendo à relativa imprevisibilidade dos resultados e aos riscos de manipular as artérias aorta e renais doentes. Não existem ainda estudos prospectivos controlados suficientes para uma objectiva selecção dos doentes e do timing. De momento ela depende da avaliação individualizada, global e imagiológica, e da capacidade e da experiência do centro em controlo cardio-vascular, em imagem e em angioplastia. Está em curso desde 2005 um estudo prospectivo controlado para comparar os efeitos do tratamento médico intensivo com a angioplastia com ou sem stent nos eventos cardiovasculares e renais (Cardiovascular Outcomes in Renal Artery Lesions, CORAL). Terapêutica por revascularização A. Doença Aterosclerótica A EAR pode ser um achado acidental (por exemplo durante a realização de estudo angiográfico cardíaco, periférico, etc.) num doente assintomático. Nestes casos não está indicada terapêutica de revascularização. De referir no entanto que a lesão estenótica pode progredir, pelo que é importante um seguimento regular.

A escolha do método depende da idade, da localização e gravidade da lesão, e da preferência do doente.

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O método de revascularização mais indicado na doença aterosclerótica é a angioplastia com colocação de stent, uma vez que as lesões são geralmente ostiais. A HTA só raramente é curada (<10%). Melhora em 29-75% dos casos e não se altera em 30% (0-54%). A taxa global de sucesso é de 65-80%, verificando-se re-estenose em 10-15% nos primeiros 6 meses. Globalmente a angioplastia com stent não condiciona melhoria da função renal, mas há um grupo que melhora, outro que não altera e outro que piora. Na maioria dos doentes não há alteração da função renal, embora aparentemente diminua o risco de progressão da IRC. Cerca de 27% dos doentes têm melhoria significativa da função renal. Por outro lado, 20% dos doentes têm agravamento rápido da função renal, devido a ateroembolismo, dissecção vascular e nefropatia de contraste – daqui a necessidade e dificuldade de uma correcta selecção dos doentes para angioplastia. O uso de um filtro distal à zona da angioplastia diminui os riscos de embolização distal de material da placa e é hoje considerado indispensável para prevenir o agravamento da função renal por embolização. A revascularização cirúrgica está indicada quando existem múltiplas pequenas artérias renais, quando é necessário reparação da aorta perto das artérias renais (aneurisma, dissecção) ou quando há insucesso da angioplastia. Pode consistir numa pontagem, na endarterectmia ou na vascularização extra-anatómica. A melhoria da TA é observada em 70-90% dos casos. No entanto a mortalidade é de 3-6%. Comparando os resultados da revascularização por angioplastia ou cirúrgica, parece não haver diferença na sobrevida. B. Displasia fibromuscular A revascularização está indicada apenas para controlo da TA, uma vez que a progressão ocorre apenas em 1/3 dos casos, pois a oclusão total rara. A técnica de eleição é a angioplastia isolada. Os resultados da angioplastia são muito melhores do que na estenose aterosclerótica (insucesso em menos de 15% e reestenose em menos de 10%). 5. Conclusão Em Resumo, o objectivo da terapêutica da HTRV centra-se no controlo da tensão arterial e estabilização da função renal. A doença aterosclerótica renal reflecte doença aterosclerótica sistémica, e por isso o curso clínico destes doentes é determinado fundamentalmente pelos eventos cardiovasculares, que por sua vez também parecem depender da função renal. Os doentes com estenose bilateral ou unilateral em rim único apresentam pior prognóstico. A estratégia terapêutica tem como base o tratamento médico. No entanto, a doença vascular não é estática, podendo progredir lentamente, o que implica um seguimento regular. Existe um subgrupo de doentes candidato a revascularização (Quadro 4), ou seja, que apresentam maior probabilidade de beneficiarem com esta a intervenção.

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Quadro 4

Quer com tratamento médico quer com revascularização, uma agudização da tensão arterial, da função renal ou outras manifestações em orgãos alvo, requerem reavaliação da progressão da doença ou da re-estenose.

Bibliografia recomendada

Brenner & Rector, The Kidney 7ed.

R. Johnson, J Fehally, Comprehensive Clinical Nephrology, 2nd

ed.

Renovascular Hypertensison and Ischemic Nephropathy, Circulation; 112:1362-1374, 2005

Renal Artery Stenosis, NEJM, 344, n.6, Feb 2001

The Case for Renal Artery Stenting for Treatment of RAS. Circulation, 115; 263-270, 2007

TheCcase Against Angioplasty and Stenting of Atherosclerotic RAS. Circulation, 115; 271-

276, 2007

Catheter-based Therapy for Atherosclerotic RAS,Circulation, 113: 1464-1473, 2006

Diagnosis and Treatment ot Ischmic Nephropathy, Clin. J. Am. Soc. Nephrol., 1: 172-181,

Mar 2006

www.coralclinicaltrial.org/

INDICAÇÕES PARA REVASCULARIZAÇÃO HTA RESISTENTE - Falência do tratamento médico em controlar arterial (>3 fármacos) - Diminuição da TFG com iECA/ARA II IR PROGRESSIVA – rins com potencial de recuperação - Aumento recente da creatinina - Diminuição da TFG com controlo da TA, especialmente com iECA/ARA II - Baixo índex de resistividade ICC REFRACTÁRIA COM ESTENOSE BILATERAL FLASH PULMONAR RECORRENTE

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A DiA DiA DiA Diáááálise e o Transplantelise e o Transplantelise e o Transplantelise e o Transplante

Serafim Guimarães, Nefrologista do Serviço de Nefrologia do CHVNG/E

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Substituição da Função Renal – a diálise e o transplante

1

Substituição da função renal: a diálise e o transplante

Com a evolução da doença renal crónica, a partir de certo grau de insuficiência já não é possível, com tratamento conservador, proporcionar ao doente uma vida minimamente saudável, sem os sintomas urémicos. Nesta fase impõe-se a substituição da função renal. Há dois tipos de tratamentos para substituir a função renal: a diálise e o transplante renal. O transplante substitui integralmente a função renal; a diálise apenas substitui as funções depurativas. Contamos com terapêuticas adjuvantes para suprir as funções não realizadas pela diálise.

A diálise é um processo de separação de moléculas e iões através de uma membrana semipermeável. As duas soluções postas em contacto por essa membrana são o plasma do doente e uma solução dialisante. O movimento dessas partículas dá-se por três mecanismos: a difusão (de acordo com um gradiente de concentração), a ultrafiltração (movimento de água, por aplicação de uma pressão transmembranar) e a convexão (a passagem de pequenas moléculas com o movimento de água). Assim, do sangue para a solução dialisante passam o potássio, o fósforo e as toxinas urémicas e, no sentido inverso, o cálcio e o bicarbonato passam da solução dialisante para o plasma. No fim da sessão de diálise as concentrações dos diversos componentes do plasma assemelham-se mais às suas concentrações normais, permitindo a correcção de alguns dos distúrbios metabólicos que estão na origem dos sintomas do síndrome urémico. Há duas técnicas de diálise: a hemodiálise e a diálise peritoneal.

Quem deve ser submetido a estes tratamentos? A diálise é um tratamento

incómodo, sofisticado e caro que não é benéfico para todos os doentes. Patologias incuráveis, como a demência irreversível, caquexia, neoplasia metastizada, ausência de vida de relação são exemplos de situações clínicas em que não há indicação para que o doente seja submetido a este tipo de tratamento. Só devem entrar em diálise regular aqueles doentes que se pensem vir a beneficiar com eles, em termos de melhoria da sua sintomatologia e qualidade de vida. Esse juízo deve ser feito pelo seu médico assistente e, sempre que possível, explicado aos familiares. Deve, pois, ser enquadrado no projecto geral de vida que se tem para este doente (ou que o doente tem para si próprio) não devendo ser orientado pelas alterações analíticas que surgem.

De um modo geral, os critérios para iniciar diálise são a exacerbação do síndrome urémico, com edema pulmonar, hipercaliemia, acidose metabólica, anorexia, náuseas, vómitos, emagrecimento, desnutrição, encefalopatia, fenómenos hemorrágicos, sintomas e sinais que, mais ou menos agudamente se estabelecem ultrapassando as terapêuticas médicas que vão sendo instituídos na fase de tratamento conservador.

1. A Hemodiálise A primeira é feita através de um equipamento que inclui um filtro denominado

dialisador. Esse filtro tem a forma de cilindro com aproximadamente 30 cm e no seu

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Substituição da Função Renal – a diálise e o transplante

2

interior possui milhares de fibras tubulares. Essas fibras são feitas do material que compõe a membrana semi-permeável já referida. Dependendo dos modelos, o sangue circula dentro ou fora dessas fibras e a solução dialisante no lado oposto. Esse dialisador está montado numa máquina que tem sensores de pressão, bombas de propulsão e de heparina, aquecedor da solução, doseadores de sódio, bicarbonato e cálcio e ainda a bomba responsável pela criação da pressão transmembranar que permite a ultrafiltração. Para a criação da solução dialisante é necessária a diluição de um concentrado com água ultra-pura, preparada num complexo sistema de tratamento de água. O sangue deve circular no dialisador a uma velocidade não inferior a 300 ml/min e a solução dialisante a 500ml/min, para uma diálise eficaz.

Para a realização da hemodiálise, o sangue tem que ser extraído da

circulação do doente a uma velocidade impossível de conseguir com o calibre das veias periféricas do doente. Assim, é essencial assegurar um acesso ao sistema vascular, sem o qual não é possível a diálise. Os acessos vasculares podem ser divididos em dois grandes grupos: os provisórios e os de longa duração. Os primeiros são utilizados em situações de insuficiência renal aguda e em situações nas quais não houve possibilidade de programar atempadamente o acesso. Em relação aos acessos de longa duração, há três tipos em uso: a fístula arterio-venosa (FAV) de Cimino-Brescia, as próteses vasculares e os cateteres tunelizados.

As FAV são uma comunicação entre uma artéria e uma veia do membro

superior construída cirurgicamente. As diferenças de pressão entre os sistemas arterial e venoso fazem com que parte do sangue seja desviado do seu trajecto, contribuindo para dilatar a veia, aumentando o seu calibre e permitindo a extracção de sangue para a diálise à velocidade pretendida. São o acesso preferível, sempre que for possível executar. São os que mais tempo duram, os que apresentam menor taxa de complicações, designadamente trombose e infecção. São, em quase todos os centros, feitos pelos cirurgiões vasculares e a sua falência acarreta a degradação do capital venoso; só há 6 locais para a sua construção: punho, antebraço e prega do cotovelo, de cada lado. Apresentam ainda o inconveniente de não serem imediatamente utilizáveis a seguir à sua construção.

As próteses vasculares são comunicações de PTFE (Politetrafluoroetileno),

um material (“plástico”) sintético que se aplica, com os mesmos objectivos das FAV, em doentes com exaustão do capital vascular. Apresentam como grande inconveniente a elevada taxa de trombose, devendo os centros que os utilizam ter uma política paralela de vigilância e desobstrução imediata com o objectivo de prolongar a vida da prótese.

Os cateteres de longa duração são o grande problema dos doentes em diálise

e dos serviços que os tratam. São cateteres, habitualmente de silicone, de duplo lúmen, que são introduzidos numa veia central (a grande maioria das vezes na jugular direita) e fazem um trajecto sub-cutâneo até ao quadrante supra-externo da região mamária, local onde se exteriorizam à pele. Nesse trajecto sub-cutâneo (túnel) têm um pequeno cilindro de material sintético que estimula uma reacção inflamatória e fibrose, isolando a parte externa do túnel da interna e impedindo a progressão dos microrganismos pelo túnel. Ainda assim, as infecções são uma complicação importante dos cateteres, assumindo por vezes gravidade significativa,

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com sepsis grave. Num doente com cateter, um episódio de febre é potencialmente o início de uma SIRS/sepsis grave, até prova em contrário. Uma outra complicação frequente é a obstrução do cateter, a qual é frequentemente resolvida com a infusão de fibrinolíticos. Finalmente, um problema de muito difícil resolução é o aparecimento de trombose venosa associada aos cateteres, a qual impossibilita, muitas vezes, a colocação de novos cateteres, quando necessário, e motiva o mau funcionamento dos mesmos.

Paralelamente, existem tratamentos medicamentosos destinados a suprir outras deficiências existentes no insuficiente renal crónico: os factores estimuladores da eritropoiese (eritropoetinas alfa e beta e darbepoetina alfa), os quelantes do fósforo (carbonato de cálcio e sevelamer) e análogos da vitamina D (calcitriol, alfacalcidol e paricalcitol), vários anti-hipertensores, e ainda outros fármacos destinados a corrigir anomalias entretanto geradas pelo tratamento (ferro, pelo excesso de consumo, vitaminas hidrossolúveis, para compensar perdas).

2. A diálise peritioneal A outra técnica dialítica é a diálise peritoneal (DP). Todos os princípios físicos

referidos para a hemodiálise estão presentes. A grande diferença é que o dialisador é a membrana peritoneal, o compartimento do sangue é a circulação sanguínea peritoneal, a solução dialisadora é introduzida na cavidade abdominal, através de um cateter que se coloca na região abdominal, numa posição paraumbilical. Periodicamente é feita uma infusão de solução peritoneal osmoticamente activa, a qual fica durante algum tempo em contacto com o peritoneu, o tempo necessário para se darem os movimentos de moléculas e iões necessários ao equilíbrio do doente. Ao contrário da hemodiálise, em que a solução dialisante passa pelo dialisador à velocidade de 500 ml/min, na DP o gradiente osmótico e químico entre as soluções esgota-se e, ao fim de algum tempo, é necessário substituí-la para voltar a haver gradiente para continuar a haver filtração. Estas trocas repetem-se várias vezes ao dia, de acordo com a prescrição médica. Para a extracção de água, recorre-se à força osmótica da glicose (simples ou polimerizada), havendo disponíveis sacos com três concentrações diferentes (1,5%, 2,5% e 4,25%).

A diálise peritoneal tem a grande vantagem de dar autonomia ao doente,

permitindo-lhe orientar o seu próprio tratamento. O doente aprende a executar a técnica, as regras de assepsia, aprende a escolher entre os diferentes tipos de soluções, aprende a reconhecer precocemente uma peritonite, a complicação mais frequente da DP. Por vezes é necessário aumentar a frequência das trocas. Acima de 4-5 trocas por dia a qualidade de vida fica significativamente alterada, pelo que se torna mais cómodo que as trocas sejam feitas durante o sono, para o que há uma máquina que se encarrega dessas trocas (diálise peritoneal automática). Por outro lado, doentes com doença inflamatória intestinal, diverticulite, doença isquémica intestinal, incapacidade mental e física, aderências abdominais, ostomias, Complicações não resolvidas de DP ou doentes sem abrigo não são bons candidatos a diálise peritoneal.

Do mesmo modo, doentes com problemas de acessos vasculares sem

resolução, crianças com menos de 5 anos ou doentes com com residência longe do

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centro de HD também não podem fazer hemodiálise. Dado que ambas as técnicas têm implicações no estilo de vida a adoptar pelo doente, na ausência de contra-indicações para qualquer uma delas, devem ambas ser apresentadas para permitir uma opção consciente pelo próprio doente.

Na grande maioria das vezes, os doentes em hemodiálise fazem os seus tratamentos 3 vezes por semana, com sessões de 4 horas. Este regime tem implicações na variação dos dados analíticos e no ritmo de aparecimento de alguns sintomas. Assim, o domingo (para os doentes que fazem diálise às segundas, quartas e sextas) e a segunda-feira à noite (para os que fazem às terças, quintas e sábados) são os dias em que os doentes estão três dias sem diálise, pelo que são aqueles em que a acumulação de líquidos ingeridos é máxima, bem como o perigo de hipercaliemia é maior. São, por isso as noites em que mais frequentemente recorrem ao serviço de urgência. Isto é particularmente verdade para os doentes anúricos. Mesmo nos outros dias, quando se fazem análises, é necessário ter em conta o tempo que passou desde a última sessão de diálise e quanto falta para a próxima, para uma correcta interpretação das mesmas.

Pelo contrário, nos doentes com diálise peritoneal, esta variação não existe. O

carácter contínuo deste tratamento faz com que todas as variáveis, bem como o estado metabólico do doente seja bastante mais constante. A principal complicação da DP é a peritonite, que requer tratamento rápido. Outras complicações possíveis são infecções do orifício de saída, hérnias, fugas, hidrotorax, hiperglicemia, obesidade e a dislipidemia.

As complicações agudas da hemodiálise são cada vez menos frequentes,

devido à sofisticação tecnológica que os equipamentos e as soluções atingiram. A hipotensão continua a ser o mais frequente, sendo todos os outros mais raros: reacções alérgicas, hipertensão, hemólise, síndrome de desequilíbrio, precordialgia, arritmias.

Além de uma arteriosclerose acelerada, as variações interdialíticas de

volume, a anemia, a HTA e a homocisteinemia são factores que contribuem para um risco cardiovascular aumentado. As causas cardiovasculares são a principal causa de morte dos doentes em diálise. 3. O Transplante Renal

O transplante renal é o método de substituição da função renal mais

completo, porque substitui todas as funções e não apenas a função depurativa. Pode ser feito com um dador vivo ou com rim de cadáver. O primeiro apresenta melhor sobrevida. O tempo médio de espera por um transplante renal aproxima-se agora dos 4 anos, sendo extremamente variável.

Em relação ao transplante de dador vivo, é necessário encontrar um dador

compatível. A lei portuguesa ainda vigente limita a dádiva a familiares até ao 3º grau. No entanto essa lei está em vias de ser alterada no sentido de uma maior liberalização.

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A probabilidade de um doente renal ser transplantado depende do aparecimento de um rim compatível com os grupos sanguíneos ABO, Rh e com o maior número possível de compatibilidades HLA. Cada centro transplantador tem a sua lista de candidatos activos e, quando é colhido um rim, atribui-o ao melhor receptor da sua lista. Ainda assim o soro do potencial receptor é posto em contacto com os tecidos do órgão a transplantar, num teste denominado “cross match”. Pela lei portuguesa há dois graus de urgência, sendo atribuído o maior grau de urgência às crianças e aos doentes sem possibilidades de construção de acesso vascular para hemodiálise e sem possibilidade de fazer diálise peritoneal.

As contra-indicações para um transplante renal são os estados inflamatórios e

infecciosos activos, neoplasias com menos de 5 anos de follow-up, doenças conhecidas por recidivarem nos rins transplantados, anomalias urológicas não corrigíveis, doença coronária ou incapacidade conhecida de o doente cumprir a medicação imunossupressora. A preparação para o transplante consiste no despiste destas causas.

A medicação imunossupressora pode ser dividida como tratamento de

indução, de manutenção e tratamento de rejeições. Os protocolos terapêuticos variam entre os centros, e, na maior parte das vezes, assentam em dois ou três fármacos: os inibidores da calcineurina (ciclosporina, tacrolimus, sirolimus), antiproliferativos (azatioprina, micofenolato de mofetil) e corticoides. Na indução e tratamento de rejeições assumem particular importância os anticorpos monoclonais. As doses de imunossupressores são elevadas no início e mais baixas com o passar do tempo. Os doentes transplantados podem, em certas circunstâncias, fazer antibióticos profiláticos (por exemplo o co-trimozazol ou ganciclovir). As interacções medicamentosas são também uma questão a ter em conta, quando se trata de introduzir novos fármacos. Os doentes transplantados, por causa da imunossupresão estão sujeitos a mais infecções e mais neoplasias que a população geral. As infecções têm um calendário típico: nos primeiros meses são mais frequntes as infecções oportunistas; a partir dos seis meses, o padrão de infecções aproxima-se da população em geral. Em relação às neoplasias a incidência pode atingir 100 vezes a da população normal. O risco cardiovascular está aumentado por comparação com a população geral, embora menor que na hemodiálise e diálise peritoneal. Apesar destes problemas, o transplante renal é, sem dúvida, o método de substituição da função renal que melhor se aproxima do orgão original, permitindo, quando não há complicações, a melhor reabilitação. De qualquer modo, a sobrevida média do enxerto é, actualmente, de 10 a 12 anos, pelo que, sobretudo em doentes mais novos, potencialmente com mais anos de vida pela frente, deve ser encarado como um entre várias possibilidades de tratamento da sua doença renal crónica. A hemodiálise, a diálise peritoneal e o transplante são as alternativas e um doente pode ter que passar pelas três ao longo da sua vida.

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Substituição da Função Renal – a diálise e o transplante

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Leituras Recomendadas

• Handbook of Dialysis, 4th ed, John T. Daugirdas, Peter G. Blake, Todd S. Ing, Lippincott Williams & Williams

• Manual Prático de Diálise Peritoneal, Francisco Coronel, Fresenius Medical Care

• Handbook of Transplantation, 4th ed, Gabriel M. Danovich, Lippincott Williams & Williams

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InfecInfecInfecInfecçççções Urinões Urinões Urinões Urinááááriasriasriasrias

Ana Marta Gomes, Interna Complementar de Nefrologia do CHVNG/E

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INFECÇÕES URINÁRIAS Nas infecções do tracto urinário (ITU), patologia muito frequente na população, a apresentação clínica pode variar desde uma cistite simples a urossépis. São classificadas em complicadas e não complicadas tendo em consideração a etiopatogénese e as características do hospedeiro, sendo esta divisão fundamental para a orientação diagnostica e instituição terapêutica adequada. Uma ITU complicada aumenta o risco de complicações graves e/ou falência terapêutica. Os microrganismos envolvidos podem atingir o tracto urinário por: - via ascendente (via mais comum), o que explica a maior frequência de ITU´s na mulher e a associação entre cateter vesical e ITU´s. - via hematogénea ou linfática (raramente) Na abordagem inicial de uma ITU devemos: -estabelecer a gravidade clínica -avaliar se estamos perante uma infecção complicada -considerar a possibilidade de obstrução urinária -estabelecer terapêutica empírica inicial Infecções Urinárias Não Complicadas Ocorrem em doentes sem alterações anatómicas ou funcionais do tracto urinário e na ausência de instrumentação recente do tracto urinário. São adquiridas na comunidade. Dividem-se em pielonefrite ou cistite se há ou não envolvimento do tracto urinário superior, respectivamente. A maioria ocorre em mulheres entre os 18 e 24 anos. A incidência é de 0,5/mulher/ano. Dos agentes infecciosos, o mais comum é a Eschericiae coli (70-95%). Em menos de 5% casos está implicado o Staphylococcus saprophyticus; ocasionalmente outras enterobacteriaceae. Manifestam-se geralmente por início agudo de sintomas do tracto urinário inferior: disúria, polaquiúria, hematúria, urgência miccional. A presença de febre, dor lombar ou vómitos, aponta-nos para o envolvimento do tracto urinário superior. Podem-se manifestar apenas por febre, sem outra sintomatologia. A disúria numa mullher sexualmente activa pode indicar cistite aguda, uretrite aguda ou vaginite, hipóteses que devem ser considerados no diagnóstico diferencial ou quando não há resposta terapêutica numa cistite aguda não complicada.

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Na suspeita clínica de ITU não complicada: A evidência laboratorial de ITU é bacteriúria (>105ufc/ml) ou piúria, podendo também haver hematúria. Geralmente é utilizado o Combur na suspeita clínica de ITU, o qual detecta a presença de esterase leucocitária e nitritos. O teste da esterase leucocitária tem uma sensibilidade de 76-96% e especificidade de 94-98% na detecção de mais de 10 leucócitos por campo. O exame microscópico está indicado quando o Combur é negativo para esterase leucocitária na presença de sintomas urinários. O teste de nitritos (detecta mais de 10mL de enterobacteriaceae) é muito sensível e específico, no entanto perde sensibiliddae nos casos de infecções causadas por outros uropatogéneos. O exame cultural de urina não é necessário na mulher com cistites não complicadas. Na suspeita clínica de pielonefrite aguda deve ser efectuado exame cultural de urina, assim como ecografia reno-vesical e Rx abdominal simples para excluir a presença de litíase, obstrução urinária ou a presença de colecções peri-renais. Abordagem terapêutica: 1. Cistite aguda: 3 dias:

• TMP-SMX - (nas comunidades onde a taxa de resistência da E. coli a esta terapêutica é menor do que 10-20%); eficaz, maior aderência, baixo custo, menos efeitos laterais e poupa as quinolonas para as ITU´s complicadas e prostatites onde são mais eficazes; • Fluoroquinolonas - se taxa de resistência ao TMP-SMX >10-20% ou alergia a este antibiótico • Se for utilizada nitrofurantoína a terapêutica deverá ser de 7 dias.

Nas cistites agudas não complicadas em doentes cujas condições sugerem envolvimento oculto renal/prostático mas sem factores de ITU complicada - sexo masculino, idosos, gravidez, instrumentação recente do tracto urinário, ITU´s na infância, uso de antibioterapia recente, sintomas com mais de 7 dias de apresentação-, a antibioterapia é semelhante, excepto a nitrofurantoína que não deve ser usada, mas mais prolongada - 7 dias. Antes de iniciar terapêutica neste subgrupo de doentes, deve ser feito exame bacteriológico de urina. Nas cistites agudas não complicadas não está indicado exame cultural de urina pós tratamento. Este deve ser efectuado apenas nas grávidas e previamente a instrumentação urológica ou cirúrgica. Se a cistite recorrer duas semanas após antibioterapia, a abordagem será a de uma nova ITU. Se recorrer em menos de 2 semanas deverá ser efectuado exame bacteriológico de urina e instituir antibioterapia mais prolongada, 7 dias.

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2. Cistite aguda não complicada recorrente em mulheres As ITU´s de repetição são um problema comum na mulher jovem e saudável. Não há evidência de complicações futuras ao nível renal, mas implicam morbilidade e custos económicos importantes. A maioria dos episódios são reinfecções os quais, em muitos casos, são provocadas por agentes que permanecem na flora fecal. Existem vários factores, biológicos, genéticos ou comportamentais, que contribuem para as ITU´s de repetição. A modificação de alguns factores comportamentais (aumentar a ingestão de líquidos, evitar o uso de espermicidas ou diafragma, micção após relação sexual) parece ter algum benefício. Quando a modificação de hábitos não foi eficaz ou possível, está indicado antibioterapia profiláctica nas mulheres com 3 ou mais cistites não complicadas por ano ou quando as ITU´s de repetição interferem negativamente na sua vida diária. Existem vários esquemas propostos, nomeadamente profilaxia contínua (diária ou 3 dias semanais), profilaxia pós-coito ou auto-medicação intermitente (não é uma verdadeira profilaxia uma vez que a doente inicia antibioterapia após o início dos sintomas, sem recorrer ao médico, o qual mantém durante 3 dias). A duração da profilaxia deverá ser de 6 meses, mas se o padrão de infecção recorrer, deverá reiniciar a profilaxia e mantê-la pelo menos durante 1 ano. Profilaxia Contínua Profilaxia pós-relação

sexual Cotrimoxazol 40/200 mg/d Cotrimoxazol 40/200mg Trimetoprim 40/200

mg/3xsem Cotrimoxazol 80/400 mg

Nitrofurantoína 100mg/d Nitrofurantoína 50-100mg Cefaclor 250 mg/d Cefaclor 250 mg Cefalexin 125-250 mg/d Cefalexin 250 mg Norfloxacina 200 mg/d Ciprofloxacina 125 mg Ofloxacina 100 mg

Norfloxacina 200 mg Nas mulheres pós-menopausa deve ser considerado o uso de estrogéneos intravaginais, uma vez que ajudam a normalizar a flora vaginal, reduzindo assim o risco de colonização por coliformes. A avaliação urológica nas mulheres com cistites de repetição não deve ser efectuada, uma vez que resulta em custos desnecessários e dado o potencial de toxicidade. 3. Pielonefrite Aguda

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Em mulheres não grávidas, na ausência de sinais de sépsis e vómitos, pode ser iniciada antibioterapia oral em ambulatório: 7 dias • Fluoroquinolona • TMP-SMX • Se gram positivo: amoxicilina ou amoxicilina/ácido clavulâmico Nos casos mais graves, com sinais de sépsis ou vómitos, deve ser efectuado internamento e iniciar antibioterapia EV:

14 dias • Fluoroquinolona ev • Aminoglicosídeo ± ampicilina • Cefalosporina de 3ª geração ± aminoglicosídeo (usar cefalosporina de 3º geração quando: resistência às fluoroquinolonas é elevada ou em casos em que estas estão contra-indicadas - gravidez, lactação, amamentação) • Se suspeita de enterococcus pelo gram: ampicilina+gentamicina, ou piperacilina+tazobactam Após melhoria clínica a antibioterapia deve ser convertida para a via oral. Geralmente, em doentes assintomáticos pós-terapêutica não é necessário realizar exame cultural de urina. Infecções Urinárias Complicadas Os doentes com ITU´s complicadas apresentam maior risco de infecção por agentes menos habituais, de complicações supurativas (pionefrose, abcessos renais e peri-renais) e sépsis. Obstrução Litíase

Neoplasia Estenoses uretrais ou ureterais Bexiga neurogénica

Alterações Anatómicas ou Funcionais

Gravidez Insuficiência Renal Crónica Transplante Renal Doença Renal Poliquística Refluxo vésico-urinário Resíduo pós-miccional >100ml

Instrumentação recente do tracto urinário

Cateter ureteral Cateterização vesical Instrumentação recente do tracto urinário

Comorbilidade Diabetes Mellitus

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susceptível de descompensação ou evolução menos favorável

Imunossupressão

Apesar do agente mais frequentemente implicado ser a E. coli, o espectro responsável é muito maior, devendo ser considerados os seguintes organismos: - Enterobactereaceae – E. coli em 60-75% -Proteus mirabilis -Providencia -Klebsiella spp -Considerar: Pseudomonas aeruginosa, Serratia spp, gram positivos- Staphylococcus e Enterococcus- e Cândida O isolamento de Staphylococcus aureus, raro, deve levantar a hipótese de disseminação hematogénea e obriga à procura de foco primário e outros focos secundários. A evolução pode originar abcessos renais únicos ou múltiplos. A apresentação clínica varia igualmente desde cistite simples a urosépsis. Para além dos sintomas típicos de cistite ou pielonefrite, sintomas não específicos como fadiga, irritabilidade, cefaleias, naúseas, dor lombar ou abdominal ou outros, podem fazer parte da apresentação clínica, especialmente nos extremos de idade. No diagnóstico, os critérios de cistite ou pielonefrite estão associados a factores que sugerem ITU complicada. É mandatório a realização de urocultura e hemoculturas em todos os doentes, assim como Rx abdominal simples e ecografia reno-vesical para excluir litíase, obstrução das vias urinárias ou colecções peri-renais. Dependendo das circunstâncias pode ser necessário realizar TC para melhor definir colecções peri-renais. Abordagem terapêutica: - Sem critérios de sépsis: o espectro deve incluir enterobacteriáceas e gram negativos • Fluoroquinolona • Aminopenicilina + B-lactâmico • Cefalosporina de 2ª ou 3ª geração • Aminoglicosídeo - Com critérios de sépsis: o espectro deve incluir enterococcus e pseudomonas • Fluoroquinolona • Tazobactam+piperacilina • Cefalosporina de 3ª geração • Carbapenem +/− aminoglicosídeo

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A antibioterapia deverá ser reajustada de acordo com os resultados bacteriológicos. A duração deverá ter entre 7-21 dias, dependendo das circunstâncias clínicas. Não esquecer: - A existência de ITU´s e obstrução é uma emergência cirúrgica. - Colecções peri-renais necessitam de drenagem percutânea ou cirúrgica. - Sempre que possível os cateteres urinários devem ser retirados e/ou substitiuídos Bacteriúria Assintomática É uma situação comum e geralmente benigna. A piúria está presente muitas vezes, especialmente nos idosos, e antecipa uma ITU em alguns grupos de doentes. Os agentes microbiológicos responsáveis são os mesmos que causam ITU´s. O tratamento geralmente não é necessário. Em alguns grupos de doentes (grávidas, transplantados, neutropénicos e doentes submetidos a cirurgia urológica), pelo risco de complicações graves deve ser realizada uma abordagem diagnostica e terapêutica intensiva. Infecções associadas a cateteres urinários A incidência de infecções em cateteres urinários é de 3-10%/dia, e a duração da cateterização é o factor mais importante para o desenvolvimento de ITU. A cateterização uretral prolongada (>30 dias) está invariavelmente associada a bacteriúria, habitualmente polimicrobiana. Não está indicado a terapêutica da bacteriúria assintomática ou profilaxia, uma vez que não diminuem a incidência de bacteriémia e aumentam a taxa de infecções por agentes multirresistentes. Em casos de ITU sintomática deve ser considerada uma ITU complicada e por isso requer terapêutica de espectro alargado, devendo ainda ser substituído o cateter uretral. Nos doentes hospitalizados a cateterização vesical constitui a causa mais comum de bacteriemia por gram negativos. Abcesso renal Os abcessos podem ser corticais (geralmente causados S. aureus, por disseminação hematogénea), córticomedulares (causados por ITU ascendente, geralmente no contexto de alteração subjacente do tracto urinário,

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nomeadamente obstrução ou refluxo vésico-urinário) ou peri-renais (no contexto de obstrução ou outros factores, e resultam da rotura de abcesso intrarenal, disseminação hematogénea ou disseminação por contiguidade de infecção). Os doentes com abcessos renais geralmente apresentam-se com febre, arrepios, dor abdominal, lombar ou no ângulo costo-vertebral, podendo não apresentar sintomas urinários se o abcesso não comunicar com o sistema excretor, situação que acontece geralmente nos abcessos corticais. Os sintomas clínicos podem ser insidiosos e pouco específicos, especialmente nos peri-renais, podendo portanto atrasar o diagnóstico. A bacteriémia é mais comum nos abcessos córtico-medulares ou peri-renais. O tratamento empírico deve ser de largo espectro e abranger S. aureus e outros agentes implicados nas ITU´s complicadas, e modificados após os resultados da cultura de urina. Nos abcessos corticais a terapêutica médica geralmente é suficiente. Nos abcessos córtico-medulares a terapêutica médica pode ser eficaz, mas podem necessitar de drenagem (médica ou cirúrgica). Nestes, a nefrectomia pode ser a única opção em doentes com envolvimento renal difuso ou com sépsis grave. Nos abcessos peri-renais, em que infecções polimicrobianas são comuns, a drenagem é a base terapêutica, e a nefrectomia está por vezes indicada. Prostatites Sintomas de prostatite são referidos por cerca de 50% dos homens adultos, no entanto apenas numa minoria são causados por uma prostatite aguda ou crónica. Os agentes microbianos mais frequentemente implicados são os bacilos gram-negativos, incluindo E. coli, Proteus spp, Klebsiella spp, P. aeruginosa e, menos comumente, S. aureus e enterococus. Na prostatite aguda os doentes apresentam-se com disúria, polaquiúria, urgência miccional, dificuldade na micção, febre, arrepios e mialgias. A próstata encontra-se aumentada e dolorosa ao toque rectal. A massagem prostática não deve ser efectuada devido ao risco de bacteriémia. Muitos doentes podem efectuar terapêutica em ambulatório, com fluroquinolona. A duração recomendada é de cerca de 6 semanas, prevenindo deste modo a evolução para prostatite crónica. A prostatite crónica, caracterizada por ITU´s de repetição pelo mesmo agente com períodos assintomáticos, durante os quais a próstata encontra-se normal à palpação. É caracterizada pela presença de >10 leucócitos/campo e a presença do patogéneo 10 vezes superior nas secreções prostáticas ou na urina pós-massagem, na ausência de piúria significativa no 1º jacto ou médio jacto urinários. A antibioterapia, sendo as fluoquinolonas a terapêutica de escolha, deve ser efectuada pelo menos entre 1 a 3 meses.

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Avaliação Urológica O estudo do tracto urinário nas ITU´s deve ser considerado: - Doentes que se apresentam com sintomas de obstrução, litíase, massa no flanco ou urosépsis - ITU’s, complicadas ou não, que não apresentam uma evolução clínica favorável após 72 h de terapêutica - Após 2 episódios de Pielonefrite - Pielonefrite em que se identificou factor de complicação - ITU no sexo masculino

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Resumo da Abordagem de uma ITU

Cistite Aguda Não Complicada

Pielonefrite Aguda Não

Complicada

Tx empírico 3 dias TMP-SMX Fluoroquinolona

Hospitalização

SIM NÃO

Urocultura Hemocultura

Urocultura

Tx EV Fluoroq. Cefalosporina 3ª geração Aminoglic.±ampicilina

Tx PO Fluroquinolona TMP-SMX

Tx EV Fluoroq. Cefalosporina 3ª geração Piperacilina+tazobactam Carbapenem±aminoglic.

Hospitalização Urocultura

Hemocultura

ITU Complicada

Evolução Favorável em 72 horas

NÃO SIM

Continuar ou mudar ATB para PO 7-14 dias

Rever bacteriológicos Repetir estudo imagiológico Hospitalizar se necessário

INFECÇÃO URINÁRIA

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LitLitLitLitííííaseaseasease UrinUrinUrinUrinááááriariariaria

Luis Costa, Urologista do Serviço de Urolologia do CHVNG/E

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LITÍASE URINÁRIA Aspectos práticos de actuação

I. INTRODUÇÃO A probabilidade global de um indivíduo vir a desenvolver urolitíase durante a vida ronda os 10%, com taxas de recorrência aos 10 anos de 50%. Cálcio Hipercalciúria absortiva O aumento da absorção de cálcio no jejuno resulta na supressão da secreção de paratormona, reduzindo a reabsorção tubular do ião Ca++ já de si aumentado pela sobrecarga glomerular. Podem distinguir-se três tipos de hipercalciúria absortiva, de incidência familiar, dois com origem em distúrbios intestinais intrínsecos e outro com origem numa disfunção tubular renal: Tipo 1: Hipercalciúria absortiva «intestinal» independente da dieta; Tipo 2: Hipercalciúria absortiva «intestinal» dependente da dieta (menos severa); Tipo 3: Hipercalciúria absortiva secundária a perda renal de fosfato e activação exacerbada da vitamina D. Hipercalciúria reabsortiva A reabsorção de cálcio dos depósitos endógenos, principalmente o osso, é resultado de hiperparatiroidismo (50% dos doentes com HPT primário têm urolitíase). Hipercalciúria «mista» (renal induced hipercalciuria) A alteração intrínseca dos mecanismos renais de controlo da excreção do ião Ca++ é responsável pela criação de um ciclo vicioso que resulta na perda de quantidades moderadas (mas litogénicas) de cálcio: a hipercalciúria primitiva provoca uma hipocalcemia moderada mas induz um hiperparatiroidismo secundário que estimula a reabsorção óssea e a absorção intestinal. Hiperuricosúria O aumento da excreção de uratos monossódicos provoca a adsorção de vários inibidores da litogénese, nomeadamente de citrato. Neste contexto, a formação de cálculos de cálcio ocorre em pH urinário distinto daquele necessário para a formação de cálculos de ácido úrico: - pH>5.5, precipitação de cristais de sais cálcicos; - pH<5.5, precipitação de cristais de ácido úrico. Este processo pode ocorrer tanto em doentes com défice enzimático no metabolismo das purinas como em doentes enzimaticamente normais mas com hábitos dietéticos ricos em purinas.

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Hiperoxalúria A sobrecarga glomerular de oxalatos é causada pelo aumento dos níveis séricos destes através de 2 mecanismos principais: Hiperabsorção intestinal. Associada a doença inflamatória intestinal ou ressecções intestinais extensas; Défice enzimático. Uma forma hereditária muito rara e muito severa e outra forma esporádica infrequente e muito mais branda. A alteração do metabolismo do oxalato em quadros de malabsorção resulta do aumento das gorduras intraluminais que promove a saponificação, bloqueando o cálcio e libertando o oxalato que é então absorvido passivamente. Hipocitratúria A complexação do citrato com o cálcio reduz a supersaturação urinária deste. A diminuição do citrato urinário pode ter origens muito variadas: - tiazidas – terapêutica prolongada; - diarreia crónica; - acidose tubular renal tipo 1; - infecções urinárias recorrentes. A função reguladora do pH desempenhada pelo rim envolve, entre outros, o citrato, variando a excreção deste com a necessidade de eliminar valências ácidas. Estruvite A formação de cálculos de fosfato de amónio e magnésio está associada à infecção por microorganismos com capacidade enzimática para desdobrar ureia (urease +): Proteus, Pseudomonas, Providencia, Klebsiella, Mycoplasma, algumas estirpes de E. coli e outros. É frequente a existência de fosfato de cálcio nos cálculos, devido aos fenómenos de nucleação heterogénea. A produção de amónio, resultante do catabolismo da ureia, torna a urina muito alcalina; com pH> 7.2 existem condições para a precipitação de cristais de fosfato de amónio e magnésio. O comportamento típico deste tipo de cálculo, mais frequente no sexo feminino, é o crescimento rápido até atingir grandes dimensões (cálculo coraliforme – bacinete e 2 ou mais cálices moldados). Este crescimento rápido frequentemente «encarcera» bactérias no seu interior, formando colónias protegidas do meio e capazes de completar o ciclo vicioso de crescimento do cálculo. Ácido úrico O aumento do teor urinário de ácido úrico promove a formação de cristais e cálculos deste produto do normal catabolismo celular, fenómenos que ocorrem em urina ácida: pH <5.5. Este tipo de litíase está associado a gota (défice enzimático), doenças mieloproliferativas ou QT antineoplásica sistémica (turnover celular aumentado). Contudo, a maioria dos doentes com litíase de ácido úrico não tem hiperuricemia. A oscilação do pH urinário para fora do espectro de precipitação do ácido úrico pode resultar no desenvolvimento de cálculos complexos: com o consumo de inibidores da litogénese, torna-se possível a deposição de sais cálcicos na superfície de um cálculo de ácido úrico preexistente.

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Cistina A cistinúria resulta de um erro congénito do metabolismo dos aminoácidos, de transmissão hereditária autossómica recessiva. Este defeito condiciona anomalias na absorção intestinal e na reabsorção tubular renal. Doentes homozigóticos apresentam cistinúrias superiores aos heterozigóticos (> 200mg/24h contra 100-150mg/24h), com níveis de supersaturação constantes. A solubilidade da cistina na urina é pH-dependente, aumentando exponencialmente em meio alcalino (pH> 7.0). Não são conhecidos inibidores da formação de cálculos de cistina e dietas pobres em percursores da cistina não têm qualquer efeito sobre a excreção desta. II. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS O quadro clínico mais sugestivo de litíase urinária é o de cólica renal. Outras apresentações menos habituais são a dor lombar «não-cólica» recorrente ou a hematúria assintomática. Ao exame físico, os achados mais frequentes são percussão e palpação bimanual dolorosas da loca renal. A investigação de episódios recidivantes de infecção urinária pode também levar ao diagnóstico de litíase urinária, frequentemente cálculos de estruvite. A ocorrência de febre associada a qualquer outra forma de apresentação da litíase é habitualmente um indicador de gravidade da situação, podendo sugerir alguns casos complicados de infecção especificamente associados à litíase – hidronefrose infectada, pionefrose, urosépsis e pielonefrite xantogranulomatosa. Cólica renal A cólica renal é um sintoma frequente, que causa grande sofrimento ao doente. A dor renal é devida à distensão aguda das cavidades excretoras por um obstáculo que é, em geral, litiásico. O cálculo ao progredir estimula a secreção de prostaglandinas (PGE2, PGI1, Prostaciclina), levando a um maior fluxo sanguíneo arterial do rim com crescente aumento da filtração glomerular. O ciclo fecha-se com a distensão aguda do bacinete, cálices e cápsula renal pela acumulação de urina acima do obstáculo, que desencadeia a dor intensa. Se se mantiver a obstrução do ureter ocorre consequentemente diminuição progressiva da função renal excretora e alívio da dor ao fim de 4 a 5 horas. A dor tem um início súbito, e intensidade rapidamente crescente até se tornar intolerável para o paciente. O doente não encontra posição antálgica, o que leva a uma agitação característica deste (diagnóstico diferencial com os quadros de abdómen agudo); habitualmente é unilateral, predominante no flanco, e que irradia antero-inferiormente para a fossa ilíaca, região inguinal ou órgãos genitais externos ipsilaterais. Um cálculo na junção ureterovesical causa muitas vezes urgência urinária, frequência e disúria (e pode erroneamente ser interpretado como cistite ou prostatite). Por vezes a cólica renal acompanha-se de sintomas digestivos (náuseas, vómitos ou distensão abdominal), provocados quer por um componente de irritação peritoneal quer por conexões do sistema nervoso autónomo através dos plexos celíaco, mesentérico e renal.

III. INVESTIGAÇÃO COMPLEMENTAR – IMAGIOLOGIA

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O primeiro exame a ser solicitado na suspeita clínica de litíase urinária é uma radiografia renovesical simples. O Rx. Permite identificar cálculos radiopacos em até 90% dos casos. Os cálculos de ácido úrico (radiotransparentes) e cálculos com menos de 2-3mm podem ser de difícil diagnóstico. Outro exame tradicionalmente utilizado é a Urografia Intravenosa, que tem sido suplantado pela ecografia (US) e pelo Tomografia Computorizada (TC). A US é um método seguro de detecção de cálculos, mesmo que radiotransparentes, hidronefrose e hidroureteronefrose. A eficácia deste exame é operador-dependente e menor na avaliação da metade inferior do trajecto do ureter. O TC é o exame mais sensível e específico num episódio agudo. Como vantagens adicionais, pode efectuar o diagnóstico diferencial entre coágulos ou tumores. IV. INVESTIGAÇÃO COMPLEMENTAR – LABORATÓRIO Em até 85% dos casos pode verificar-se hematúria microscópica, antes, durante ou após a expulsão do cálculo. A leucocitose é, nestes casos, um indicador mais fidedigno de infecção associada do que a leucocitúria. O grau de atingimento renal é avaliado através da creatininemia e do ionograma sérico. Depois de diagnosticar a litíase, sintomática ou não, deve iniciar-se a pesquisa de alterações metabólicas que favoreçam o seu aparecimento. Assim, em todos os casos deve fazer-se uma primeira abordagem simplificada: calcemia, albuminemia, creatinemia, uricemia, urina II (pH, leucocitúria/bacteriúria, cristalúria), e cistinúria. Se se identificarem factores de risco (recidivas múltiplas, litíase residual após tratamento, e história familiar) deve-se referenciar à consulta da especialidade. Para verificar categoricamente a natureza da litíase, deve-se proceder à análise bioquímica de pelo menos um cálculo após a sua eliminação. A presença de cristais na urina pode orientar o diagnóstico. V. TERAPÊUTICA Tratamento da cólica renal O tratamento da dor é conseguido em mais de 90% das situações, desde que os analgésicos sejam administrados na dose apropriada. 1ª Toma: Diclofenac de sódio 1 ampola IM de 75 mg, associado ou não a Tramadol 1 ampola IV de 100 mg (em perfusão) ou a Petidine 1 ampola IM de 50 mg; 2ª Toma: Se ao fim de 30 a 45 minutos não for evidente o alívio completo da dor, repetir Petidine IM ou Tramadol IV. Os AINE actuam sobretudo pelo potente efeito antiinflamatório local, e também pela sua acção analgésica central. Eles inibem a actividade das ciclo-oxigenases, bloqueando a formação das prostaglandinas, responsáveis directas pelo desencadear da dor renal. Deve ter-se em conta, no que respeita aos AINE e aos analgésicos de acção central, os efeitos laterais que devem condicionar o seu uso, e as respectivas contra-indicações. Persistem algumas «crenças» erróneas que por vezes dificultam a optimização dos tratamentos dos pacientes com cólica renal. Relativamente à ingestão hídrica,

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por exemplo, ela deve ser restrita a 500 ml de água por dia nos períodos de cólica. Ao diminuir a pressão na via excretora, diminui também a filtração glomerular, reduzindo a dor. Se se aumenta a diurese, há diminuição do peristaltismo ureteral e, assim, diminuição da capacidade de expulsão do cálculo. Estes dados não contrariam a noção de que os doentes com litíase urinária devem efectuar uma ingestão hídrica superior a 2 litros de água por dia, excepto nos períodos de cólica. Em suma, o quadro clínico da cólica renal é em regra bem definido. Na actuação imediata pretende-se apenas o alívio da dor. Cálculos de pequenas dimensões apresentam taxas de eliminação espontâneas bastante elevadas: até 80% para cálculos no ureter. Relativamente ao tratamento dos doentes com cólica renal recorrente com um cálculo com menos de 6 mm de diâmetro, quanto tempo podemos esperar antes do tratamento definitivo do cálculo? Três a 4 semanas é o tempo que se pode esperar para a eliminação espontânea de um cálculo parcialmente obstrutivo.

Tratamento e profilaxia A terapêutica da patologia litiásica não se esgota no tratamento do cálculo. Quando se identifica um distúrbio metabólico promotor da litogénese (até um terço dos casos) deve proceder-se à profilaxia da recidiva. Quadro 1:

Referência obrigatória à Urologia - Cólica renal resistente à medicação; - Uropatia obstrutiva persistente ou bilateral; - Infecção associada à obstrução com risco de pionefrose ou sépsis.

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VI. BIBLIOGRAFIA - Pedro Gomes Monteiro (2005) in Árvores de decisão em clínica urológica, APU, págs. 97-106 - Campbell’s Urology (2002) Saunders Ed., págs. 2698-2708 - Enciclopédia Médico-cirúrgica (2001) – Urologia, Manifestações clínicas da litíase urinária, E -18-104-A-30 - Campos Pinheiro (1999) in Acta Médica Portuguesa; 12: 9-11

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FFFFáááármacos e Rimrmacos e Rimrmacos e Rimrmacos e Rim

João C. Fernandes, Nefrologista do Serviço de Nefrologia do CHVNG/E

Susana Pereira, Interna Complementar de Nefrologia do CHVNG/E

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Fármacos e Rim O rim constitui a via de excreção principal de vários fármacos, pelo que é um alvo frequente de

lesão por agentes terapêuticos. Os fármacos são uma causa importante de insuficiência renal.

Numerosos fármacos podem ser nefrotóxicos. Por outro lado, a prescrição farmacológica em

doentes com insuficiência renal requer frequentemente um ajuste posológico em função do grau

de insuficiência renal, do estado de volemia, das comorbilidades, do estado hemodinâmico e da

patologia de base.

I. FÁRMACOS NEFROTÓXICOS Na avaliação de um doente com insuficiência renal as causas farmacológicas devem ser sempre

consideradas.

Os mecanismos de lesão renal incluem a vasoconstrição renal, microangiopatia trombótica,

alterações na hemodinâmica intraglomerular, toxicidade tubular, nefrite intersticial,

glomerulonefrite imuno-mediada e formação de cristais intratubulares.

A toxicidade renal é manifestada tipicamente por determinados síndromes nefrológicos. Um

agente pode causar mais do que um síndrome nefrológico. Existem 3 formas major de

apresentação de lesão renal (Tabela 1):

- Insuficiência Renal Aguda (IRA)

- Síndrome nefrótico

- Insuficiência renal crónica (IRC)

SÍNDROME NEFROLÓGICO FÁRMACO

Pré-renal/hemodinâmica

Ciclosporina, Tacrolimus, Contraste, iECA/ARAII, anfotericina B, AINE’s

Necrose Tubular Aguda Aminoglicosídeos, anfotericina B, Cisplatina, algumas cefalosporinas

Nefrite Intersticial Aguda

Penicilinas, cefalosporinas, Sulfonamidas, Rifampicina, AINE’s, Interferon

Insuficiência Renal Aguda

Pós-renal/obstrutiva Aciclovir, analgésicos, ciclosporina, metotrexato, indinavir, sulfadiazina

Insuficiência Renal Crónica Lítio, AINE’s, Ciclosporina, Tacrolimus, Cisplatina

Síndrome Nefrótico Ouro, penicilamina, AINE’s, captopril, interferon

Tabela 1 – síndromes nefrológicos provocados por fármacos. A. INSUFICIÊNCIA RENAL AGUDA Na IRA quatro mecanismos fisiopatológicos podem ser responsáveis pela insuficiência renal:

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1. Azotemia pré-renal Alguns fármacos provocam azotemia pré-renal, por mecanismos hemodinâmicos vasoconstrição

ou inibição da vasodilatação adaptativa. Por definição, a função renal melhora rapidamente após

a suspensão do fármaco. Em alguns casos a insuficiência renal pode persistir, resultante da

manutenção do fármaco ou da coexistência de outros factores. A ciclosporina, o tacrolimus ou a

anfotericina B podem causar insuficiência renal mesmo em doentes sem disfunção renal, ao

contrário dos AINE’s, que geralmente agravam a função renal em doentes desidratados, com

diminuição do volume efectivo (insuficiência cardíaca, cirrose) ou com insuficiência renal

prévia.

2. Necrose Tubular Aguda:

Acontece por lesão tubular directa aquando da eliminação renal do fármaco, como no caso dos

antibióticos aminoglicosídeos, anfotericina B ou cisplatina. Manifesta-se com instalação

progressiva de IRA não oligúrica. Geralmente há recuperação da função renal com a retirada do

agente, mas ela pode ser só parcial e ficar com insuficiência renal residual. O tempo de

recuperação pode ir até várias semanas. Se ao fim de 4 semanas não houver recuperação da

função renal, deverá confirmada a toxicidade, geralmente com biópsia renal, ou procurada outra

causa para a insuficiência renal. Insuficiência renal irreversível pode acontecer se houver

exposição repetida ao tóxico tubular.

3. Nefrite Intersticial Aguda:

Praticamente todos os fármacos podem causar nefrite intersticial aguda (NIA). No entanto, os

agentes mais comummente implicados são as penicilinas, cefalosporinas, análogos das

sulfonamidas, rifampicina e AINE’s e mais recentemente os inibidores da bomba de protões.

A nefrite intersticial aguda é caracterizada por uma inflamação intersticial, com diminuição do

fluxo sanguíneo e da taxa de filtração glomerular. O exame de urina caracteriza-se por

leucocitúria, eritrocitúria e proteinúria ligeira. Por vezes há eosinofilia e eosinofilúria. Sinais

sistémico como rash, artralgias e febre podem acompanhar a NIA, mas não são muito

frequentes.

A NIA na grande maioria dos casos resolve-se após a suspensão do fármaco. Se a função renal

não recuperar ao fim de 5-7 dias deve iniciar-se corticoterapia – prednisolona 1 mg/Kg/dia no

mínimo durante 1-2 semanas, e até 3 meses.

4. Obstrutiva

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A obstrução associada a fármacos pode ser intratubular ou menos frequentemente por obstrução

intraureteral ou secundária a fibrose retroperitoneal. Como exemplos do primeiro caso:

aciclovir, AINE’s e indinavir. O indinavir pode também ser causa de nefrolitíase ou cristalúria.

A obstrução pose manifestar-se agudamente ou ter um curso clínico insidioso. O metisergide, a

bromocriptina, os bloqueadores-beta, a hidralazina, a metildopa e os analgésicos podem

provocar fibrose retroperitoneal.

B. INSUFICIÊNCIA RENAL CRÓNICA

A lesão mais frequentemente responsável por IRC é a nefrite intersticial crónica. Os fármacos

implicados na maioria dos casos são os AINE’, o lítio, ciclosporina e cisplatina. O agravamento

da função renal geralmente é lento. As manifestações de disfunção tubular podem predominar

no quadro clínico, e incluem a acidose tubular renal, defeitos na concentração, defeitos na

secreção de potássio e proteinúria tubular. O exame de urina caracteriza-se por leucocitúria,

eritrocitúria e proteinúria ligeira. A progressão para IRC terminal acontece se o fármaco não for

retirado. A insuficiência renal pode estabilizar se o fármaco for suspenso.

C. SÍNDROME NEFRÓTICO:

Fármacos como os AINE´s, ouro ou penicilamina podem causar síndrome nefrótico. Os padrões

histológicos geralmente são a glomerulopatia membranosa ou doença de lesões mínimas. Na

maioria dos casos a proteinúria diminui com a suspensão do agente, no entanto em alguns casos

a lesão renal mantém a progressão.

Alguns agentes específicos que causam lesão renal:

1. AINE´s

São dos fármacos mais usados na prática clínica. A toxicidade renal é frequente, e pode ser

classificada em vários síndromes clínicos:

1. IRA vasomotora ou hemodinâmica

2. Síndrome nefrótico associado a nefrite intersticial (NI)

3. Insuficiência renal crónica

4. Retenção hidrossalina

5. Hipercalemia

1. IRA vasomotora ou hemodinâmica.

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Ocorre quando a manutenção da função renal é criticamente dependente das prostaglandinas

vasodilatadoras. Quando há diminuição do volume circulante efectivo (como no caso de

insuficiência cardíaca, cirrose hepática, síndrome nefrótico, sépsis, hemorragia, ou outros

estados de deplecção de volume intravascular), ou aumento da produção de vasoconstritores

intra-renais (agentes de contraste, obstrução urinária, glomerulonefrite aguda), o fluxo

sanguíneo renal mantém-se por vasodilatação provocada por aumento da síntese de PGs. A

inibição da sua síntese pelos AINEs leva à diminuição da taxa de filtração glomerular, isto é à

insuficiência renal. Geralmente a insuficiência renal é oligúrica, e inicia-se vários dias após o

início da terapêutica. O exame de urina não tem alterações relevantes. A hipercalemia é

desproporcional ao grau de insuficiência renal. Se suspendermos precocemente o AINE a

insuficiência renal é reversível. Os inibidores da COX-2 parecem não apresentar qualquer

vantagem em ralação aos clássicos inibidores da COX-1do ponto de vista de nefrotoxicidade.

2. Síndrome nefrótico associado a nefrite intersticial aguda (NIA).

Os que mais frequentemente levam a NIA são o ibuprofeno, naproxeno e fenoprofeno. As NIA

por AINEs diferem da NIA provocada por outros agentes em 3 aspectos: podem acontecer ao

fim de meses até 1 ano de administração, associam-se a proteinúria nefrótica em cerca de 90%.

e as manifestações extra-renais de NIA como febre, rash ou artralgias são muito raras.

Geralmente ocorre em doentes idosos. Cursa com remissão espontânea com a retirada do

fármaco. A recuperação da função renal pode demorar dias a semanas.

3. Insuficiência renal crónica.

A forma mais clássica de IRC induzida por fármacos é a nefropatia de analgésicos. O composto

analgésico apontado como nefrotóxico é classicamente a fenacetina. No entanto outros

analgésicos, e sobretudo a sua associação, causam esta nefropatia. É caracterizada por necrose

papilar e nefrite intersticial aguda. É mais frequente nas mulheres e tem um pico de incidência

aos 50 anos. A dose cumulativa para a nefropatia parece ser de 2-3Kg do composto. Para além

da IRC, estes doentes têm maior risco de hemorragia digestiva, hipertensão arterial, doença

cardiovascular e tumores do urotélio. Apresentam predominantemente disfunção tubular

caracterizada por defeitos na acidificação e concentração tubulares, e ocasionalmente nefropatia

perdedora de sais. A proteinúria é ligeira a moderada. Piúria estéril é comum. A nefropatia de

analgésicos é por vezes difícil de diagnosticar, quer pela sua progressão lenta, quer pelos sinais

e sintomas inespecíficos. O TAC sem contraste é um método útil para o diagnóstico de necrose

papilar. Achados característicos como rins pequenos de contornos irregulares e calcificações

intra-renais ajudam no diagnóstico. A sua incidência parece estar a diminuir.

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Por outro lado, a percentagem de casos de IRC secundária AINEs está a aumentar. Dados

actuais apontam para ser esta uma causa de IRC distinta da nefropatia de analgésicos: a

incidência é semelhante nos homens e mulheres, atinge doentes com mais 60 anos, a necrose

papilar é menos frequente e o estadio de IRC é menor que na nefropatia de analgésicos.

Também o risco de tumor urotélio e a doença cardiovascular são menos frequentes.

4. Retenção hidrossalina.

Em 25% dos doentes que tomam AINEs há retenção hidrossalina, por inibição das

prostaglandinas. A retensão hidrossalina interfere, agravando, o controlo da tensão arterial,

sobretudo nos doentes medicados com bloquador beta, nos idosos e na raça negra. Esta retensão

hidrossalina pode ser causa de hiponatremia.

5. Hipercaliemia.

Os AINEs associam-se a hipercalemia, mesmo em doentes com função renal normal. Nos

diabéticos, bem como nos idosos, este risco aumenta por terem hipoaldosteronismo-

hiporreninémico. Devemos ter uma maior precaução se os doentes tomam outros fármacos que

aumentem o potássio plasmático como os bloqueados beta, os iECA/ARA II, os diuréticos

poupadores de potássio, o trimetoprim e os inibidores calcineurina (ciclosporina, tacrolimus).

2. ANTIBIÓTICOS

Como classe, os antibióticos são os nefrotóxicos que mais frequentemente causam insuficiência

renal. Os aminoglicosídeos são responsáveis pela maioria dos episódios de nefrotoxicidade nos

doentes hospitalizados. Geralmente causam necrose tubular aguda. Nos antibióticos como as

penicilinas, rifampicina e sulfonamidas o mecanismo é mais frequentemente por NIA.

Aminoglicosídeos: A nefrotoxicidade varia entre 7 a 36% e a sua incidência aumenta com a

dose e duração da sua administração (risco de 50% se mais de 14 dias de terapêutica). A

apresentação clínica usual é o aumento da creatinina ao 5º-7º dia durante o curso deste

antibiótico, mas a diminuição da TFG pode acontecer mais precocemente se houver outros

factores de risco de insuficiência renal, sobretudo desidratação. A azotemia severa é geralmente

precedida por um período de poliúria provocada por defeito na capacidade de concentração. No

exame de urina há proteinúria ligeira, cilindros não celulares e células epiteliais ocasionais. A

insuficiência renal é na maioria dos casos reversível com a suspensão do fármaco, no entanto o

início da recuperação da função renal pode demorar, e a recuperação total pode levar algumas

semanas.

Na prescrição de aminoglicosídeos algumas regras diminuem o risco do nefrotóxico. A dose

deve ser ajustada ao grau de insuficiência renal existente. Nos doentes com maior risco de

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nefrotoxicidade (Tabela 2) devem monitorizar-se os níveis plasmáticos em pico e vale e a

creatinina plasmática cada 2-3 dias. Nas infecções a Gram- (bacteriemia, abdominais,

respiratórias, urinárias, ginecológicas) administrar a dose diária do aminoglicosídeo 1 vez por

dia parece diminuir o risco. A amicacina parece ser o aminoglicosídeo mais nefrotóxico.

Sempre que possível, nos doentes com maior risco de nefrotoxicidade deve ser considerada o

recurso de outro antibiótico alternativo.

TABELA 2. Factores de risco para desenvolvimento de nefrotoxicidade por aminoglicosídeos Curso prolongado (>10 dias) Depleção volume Sépsis Doença renal prévia Hipocalemia Idosos Combinação com algumas cefalosporinas Administração concomitante com outros nefrotóxicos

Cefalosporinas: São uma causa infrequente mas bem definida de insuficiência renal. O

mecanismo pode ser por NIA ou NTA. A mais nefrotóxica para os túbulos é o cefaclor e a

menos a ceftazidima. A combinação com aminoglicosídeos ou furosemida pode potenciar o

risco de NTA.

3. ANFOTERICINA B

O grau de nefrotoxicidade é cumulativo à dose total recebida. Pelo menos 2 mecanismos

medeiam a nefrotoxicidade. No 1º a lesão tubular leva a defeitos na concentração, perda de

potássio e magnésio e defeito na acidificação tubular distal. Este mecanismo precede a

azotemia. O 2º mecanismo é por vasoconstrição renal. A insuficiência renal é progressiva e não-

oligúrica, e a recuperação muito lenta com a suspensão farmacológica. Doses elevadas, cursos

prolongados ou exposições repetidas podem causar IRC. A correcção da deplecção de volume

ou uma replecção de sódio melhoram a função renal. O sexo masculino, doses elevadas diárias,

duração prolongada, internamento UCI, uso concomitante de ciclosporina são factores que

elevam o potencial de nefrotoxicidade desde anti-fúngico. A nefrotoxicidade das novas

formulações lipossómicas é inferior à das apresentações convencionais.

4. ACICLOVIR

A nefrotoxicidade está descrita com uso da via endovenosa e em doses elevadas (> 500mg/m2).

A via oral é desprovida de toxicidade, no entanto não esquecer que há ajuste de dose na

insuficiência renal. O mecanismo patológico é por precipitação tubular com obstrução

intratubular. O exame de urina pode ter leucócitos, eritrócitos e cristais em forma de agulha

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birrefringentes. A insuficiência renal na maioria dos casos regride com a suspensão do fármaco.

Factores de risco como a deplecção de volume e a administração em bólus devem ser evitados.

5. INIBIDORES DA CALCINEURINA (CICLOSPORINA E TACROLIMUS)

As manifestações clínicas são a IRA reversível e a nefrite intersticial crónica. A

nefrotoxicidadde aguda ocorre nos primeiros 6-12 meses de terapêutica e geralmente é dose-

dependente. Por isso sempre que se utilizam é obrigatório monitorizar os níveis plasmáticos. A

insuficiência renal é reversível quando se suspende o fármaco ou se reduz a dose. O mecanismo

de diminuição da TFG é hemodinâmico, por vasoconstrição renal.

A nefrotoxicidade crónica acontece por fibrose intersticial medular focal ou em banda, depois

de 6 a 12 meses de tratamento.

6. ANTI-NEOPLÁSICOS

Vários anti-neoplásicos podem ser nefrotóxicos (tabela 3). Os mais frequentes são cisplatina,

ciclofosfamida e metotrexato.

A cisplatina causa lesão tubular, dose dependente e cumulativa. Apesar de poder causar IRA, a

IRC constitui o maior problema. A hipomagnesemia por disfunção tubular é frequente. Este

desequilíbrio pode persistir durante vários meses, mesmo após descontinuação do fármaco. A

hidratação vigorosa é uma medida profiláctica eficaz. Nos protocolos de hidratação a

administração de cloreto de sódio isotónico está indicado, na dose de pelo menos 100ml/h e

preferencialmente 200ml/h, nas 12 horas antes e 12-18 horas após a administração da cisplatina.

TABELA 3. Nefrotoxicidade dos anti-neoplásicos Cisplatina Ciclofosfamida Estreptozocina

Lesão tubular. IRA. IRC. Hipomagnesemia Cistite hemorrágica. Hiponatremia IRA. Disfunção tubular

Mitomicina C Mitramicina

Síndrome Hemolítico Urémico NTA

Metotrexato 5-fluouracilo

IRA em doses elevadas IRA

IL-2 Interferon-alfa

IRA Glomerulosclerose segmentar e focal. NTA

Com o uso da ciclofosfamida a cistite hemorrágica e a hiponatremia são as complicações

possíveis. Quando são usadas em doses elevadas pode ocorrer hiponatremia. Tipicamente a

hiponatremia resolve-se nas 24 horas após um bólus, pelo que neste período não devem ser

administrados fluidos hipotónicos.

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O metotrexato raramente é nefrotóxico na ausência de insuficiência renal ou em doses normais.

A nefrotoxicidade pode ser por lesão tubular ou precipitação intra-tubular. Medidas de

profilácticas incluem diurese > 3 l, alcalinização da urina e não administração na insuficiência

renal moderada a severa.

II. PRESCRIÇÃO DE FÁRMACOS NA INSUFICIÊNCIA RENAL

Nos doentes com insuficiência renal o metabolismo dos fármacos está alterado, sobretudo a sua

eliminação. As prescrições medicamentosas devem ser ajustadas ao grau de insuficiência renal,

sob risco de acumulação e toxicidade importante. Nunca devemos prescrever um fármaco a um

doente com insuficiência renal sem ter a certeza de que não é necessário ajustar a posologia. Por

outro lado, alguns fármacos têm efeitos nefrotóxicos ou podem agravar as alterações

metabólicas secundárias à insuficiência renal.

1. Ajuste posológico em doentes com insuficiência renal

A diminuição da função renal acompanha-se de alterações da biodisponibilidade, da ligação às

proteínas plasmáticas, do volume de distribuição e do metabolismo dos fármacos, sobretudo dos

fármacos cuja excreção é feita por via renal. Atendendo a estas alterações, o esquema de

prescrição de um fármaco pode ser complexo. No entanto, na prática, o que fazemos é o ajuste

da posologia dos fármacos com eliminação renal ao grau de função renal.

Primeiro é necessário calcular aproximadamente a taxa de filtração glomerular. Na IRC estável

usam-se os meios habituais: taxa de depuração (‘clearence’) da creatinina, fórmulas de

Cockroft-Gault ou MDRD. Na insuficiência renal aguda (IRA), devemos ter em conta que a

insuficiência renal pode mudar muito rapidamente e o valor da creatinina pode ser enganador.

Nos doentes oligúricos a taxa de depuração da creatinina é inferior a 5 ml/min e nos anúricos é,

obviamente, zero, mesmo se a creatinina sérica for, p.ex. 2,3 mg/dL.

Existem duas formas de ajustar a posologia dos medicamentos com eliminação renal: reduzir a

dose ou aumentar o intervalo entre as tomas. Nos fármacos em que é importante o pico de

concentração o intervalo entre as doses deve ser prolongado. Nos fármacos em que o objectivo é

manter níveis mínimos é mais apropriado reduzir a dose e o aumentar o intervalo entre as tomas.

Devemos também ter em conta que a dose inicial ou dose de carga do fármaco prescrito pode

ser maior que a dose de manutenção. Isto acontece por exemplo com alguns antibióticos em que

a dose de carga permite atingir os níveis séricos desejáveis iniciais, e as doses subsequentes

serão menores ou dadas com intervalos de tempo maiores.

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Em resumo, na prescrição de um fármaco a um doente com insuficiência renal, os passos são os

seguintes:

1. Calcular a taxa de filtração glomerular através de um dos métodos habituais. Na IRA, mais do

que o valor da creatinina sérica, a evolução da função renal e o estado de oligúria/anúria são

importantes.

2. Consultar tabelas para determinar a dose inicial e dose de manutenção do fármaco. Existem

tabelas para todos os fármacos nos livros de texto, nos manuais terapêuticos, na Internet, nas

bulas dos medicamentos, etc. Prescrever conforme indicado pela tabela.

3. Sempre que possível, devemos monitorizar os níveis séricos dos fármacos e ajustar a

posologia, optimizando-a. É já uso corrente dosear vários fármacos com eliminação renal:

vancomicina, gentamicina, digoxina, carbamazepina, fenitoína, valproato, lítio, etc. O

doseamento pode ser feito em pico (após a toma) ou, melhor, em vale (antes da toma). Por

norma o doseamento deve ser feito após 3-4 tomas.

4. Os doentes em hemodiálise têm taxa de depuração da creatinina inferior a 10 ml/min. Por

princípio, devemos dar as drogas após a diálise, de modo a evitar a sua remoção durante a

diálise. As tabelas de ajuste posológico incluem geralmente os doentes em hemodiálise e muitas

vezes aconselham uma dose de reforço no final da diálise. Se programarmos os horários das

tomas de modo a que uma das tomas seja após a diálise, não precisamos de ter esta preocupação

específica.

A prescrição de determinados fármacos na IR podem agravar os efeitos metabólicos secundários

à insuficiência renal.

O mais grave é a hipercalemia. Fármacos ou associações de fármacos que provocam

hipercalemia - iECA /ARA II, bloqueadores beta, AINE’s, espironolactona, trimetoprim –

devem ser usados sob vigilância maior e podem mesmo estar contra-indicados.

As biguanidas (metformina, fenformina) estão contra-indicadas se creatinina for superior a 1,5

mg/dl pelo risco de acidose lática. A intoxicação pela metformina tem uma mortalidade até

50%.

Os AINE’s, corticóides, bicarbonato ou cloreto de sódio agravam a retenção hidrossalina que já

existe na insuficiência renal e podem precipitar crises hipertensivas, agravamentos dos edemas

ou até edema agudo pulmão.

O uso de aspirina aumenta o potencial de hemorragia pela disfunção plaquetária inerente à

uremia grave.

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Por último, num doente com insuficiência renal devemos evitar o mais possível o uso de drogas

nefrotóxicas. Mesmo um doente em hemodiálise pode ter algum grau de função renal que

convém proteger. Mas se já está anúrico, então pode fazer nefrotóxicos.

CONCLUSÃO

Os fármacos são uma causa importante de insuficiência ou toxicidade renal. Devemos sempre

inclui-los no diagnóstico diferencial das insuficiências renais ou alterações hidro-electrolíticas.

Estratégias preventivas que minimizam o risco dos fármacos conhecidos pela sua

nefrotoxicidade incluem a hidratação adequada, monitorização do fármaco, vigilância da

creatinina sérica e ajuste posológico nos casos de insuficiência renal.

Um doente com insuficiência renal pode, em princípio, fazer qualquer fármaco. No entanto,

temos sempre que verificar se tem eliminação renal importante e necessita ajusta da posologia.

Para isso, existem tabelas que orientam a prescrição na insuficiência renal que devemos

habituar-nos a usar.

BIBLIOGRAFIA

www.uptodate.com - versão 16.1

Davison A et al, Oxford Textbook of Clinical Nephrology, 3th Edition, Oxford, 2005

Jenette et al, Primer of kidney Diseases, 4th Edition, NKF, 2007

Perneger et al, Risk of kidney failure associates with the use of acetaminophen, aspirin, and nonsteroidal

antiinflamatory drugs. NEMJ 331: 1675-79, 1994

Schlondorff D: Renal complications of nonsteroidal antiinflamatory drugs. Kid Int 44:643-653, 1993

Aronoff et el, Drug Prescribing in Renal Failure – Dosing Guidelines for Adults, 4th Edition

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AlteraAlteraAlteraAlteraçççções renais nas doenões renais nas doenões renais nas doenões renais nas doençççças sistas sistas sistas sistéééémicasmicasmicasmicas

Clara Almeida, Nefrologista do Serviço de Nefrologia do CHVNG/E

Ana Marta Gomes, Interna Complementar de Nefrologia do CHVNG/E

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Alterações Renais nas Doenças SistémicasAlterações Renais nas Doenças SistémicasAlterações Renais nas Doenças SistémicasAlterações Renais nas Doenças Sistémicas Os rins são frequentemente envolvidos em diversas doenças sistémicas quer estas tenham natureza inflamatória, infecciosa ou sejam secundárias à deposição de proteínas anómalas (disproteinemias). Na maior parte das doenças sistémicas o glomérulo é a estrutura do parênquima renal envolvida e a sua lesão traduz-se pelo aparecimento de hematúria e/ou proteinúria. Contudo outras zonas do parênquima ou interstício renal também podem estar envolvidas. O reconhecimento da doença renal é, muitas vezes, o primeiro achado que nos aponta o diagnóstico de doença sistémica. Por outro lado, em determinadas patologias sistémicas é obrigatório o despiste de envolvimento renal.

1.1.1.1. Doenças inflamatóriasDoenças inflamatóriasDoenças inflamatóriasDoenças inflamatórias 1.A. 1.A. 1.A. 1.A. Vasculites sistémicasVasculites sistémicasVasculites sistémicasVasculites sistémicas O envolvimento renal é frequente nas vasculites sistémicas, sobretudo nas vasculites de pequenos vasos. Nas vasculites de grandes vasos (ex: Arterite Temporal ou Arterite de Takayasu) a vasculite atinge predominantemente os vasos de grande calibre (aorta, artérias renais) condicionando isquemia renal ou hipertensão reno-vascular. Nas vasculites de pequenos vasos (Granulomatose de Wegener, Poliangeite microscópica, Púrpura Henoch-Scholein, Crioglobulinemia) o envolvimento renal é muito mais frequente e atinge sobretudo os capilares glomerulares, manifestando-se como glomerulonefrite. Granulomatose de Wegener, Poliangeite microscópica e Síndrome de ChurgGranulomatose de Wegener, Poliangeite microscópica e Síndrome de ChurgGranulomatose de Wegener, Poliangeite microscópica e Síndrome de ChurgGranulomatose de Wegener, Poliangeite microscópica e Síndrome de Churg----StraussStraussStraussStrauss

Estas vasculites (Granulomatose de Wegener, Síndrome de Churg-Strauss e Poliangeite Microscópica) caracterizam-se por uma poliangeite necrotizante que afecta geralmente arteríolas, capilares e vénulas. A nível renal, o glomérulo é a estrutura renal predominantemente atingida e manifesta-se como glomerulonefrite. O diagnóstico do subtipo de vasculite baseia-se na sintomatologia acompanhante:

• Na Granulomatose de Wegener (GW) existe frequentemente atingimento do tracto respiratório superior.

• No Síndrome de Churg-Strauss (CS) ocorre asma e eosinofilia. • A Poliangeite Microscópica (PAM) ocorre na ausência evidente de GW e de

CS, isto é, na ausência de asma, eosinofilia e sem evidência de lesões granulomatosas.

A GW, CS, PAM estão associadas à presença de autoanticorpos séricos contra os componentes do citoplasma dos neutrófilos: ANCA. Geralmente, estes anticorpos podem ser dirigidos contra a mieloperoxidase (MPO), ou contra a proteinase 3 (PR3). Observações in vitro sugerem que estes anticorpos activam os neutrófilos, e estes provocam a lesões dos vasos. Os doentes afectados geralmente encontram-se entre a quinta e sétima década de vida e há um ligeiro predomínio no sexo masculino. O envolvimento renal é muito frequente na Granulomatose de Wegener e na Poliangeite microscópica, mas menor no Síndrome de Churg-Strauss. As manifestações renais são consequência do envolvimento glomerular e incluem hematúria, proteinúria e insuficiência renal (IR) que, na maior parte dos casos, tem uma evolução rapidamente progressiva.

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Sintomas gerais inespecíficos estão presentes e são bastante marcados. Os doentes referem frequentemente mal-estar geral, febre, anorexia, emagrecimento e artralgias. O envolvimento cutâneo é frequente e manifesta-se por púrpura palpável. O atingimento pulmonar é mais frequente na Granulomatose de Wegener e no Síndrome de Churg-Strauss. Quando ocorre atingimento pulmonar este pode apresentar-se como hemorragia pulmonar. Na Granulomatose de Wegener e Síndrome de Churg-Strauss podem, também, ocorrer nódulos pulmonares e cavitações que são a tradução radiológica de lesões granulomatosas necrotizantes. O comprometimento do tracto respiratório superior é mais frequente na GW e as suas manifestações incluem estenose subglótica, sinusite, rinite, otite média e inflamação ocular. Outros órgãos e sistemas, nomeadamente coração, sistema nervoso periférico e gastrointestinal, podem estar comprometidos mas com uma frequência muito inferior. O tratamento de indução consiste na combinação de corticóides e ciclofosfamida. O tratamento combinado induz remissão em aproximadamente 75% dos doentes aos 3 meses, e em 90% dos doentes aos 6 meses. A plasmaferese tem um papel importante no tratamento de indução particularmente nos doentes dependentes de diálise e com hemorragia pulmonar. Após 3 meses de tratamento, a ciclofosfamida é substituída por azatioprina. Com um tratamento imunossupressor adequado, a sobrevida renal e do doente após 5 anos é de cerca de 65 e 75%, respectivamente. Factores presentes no momento de apresentação associados a mau prognóstico são idade avançada, creatinina sérica elevada, hemorragia pulmonar e, especialmente dependência de diálise. 1.B. 1.B. 1.B. 1.B. Lúpus Eritematoso SistémicoLúpus Eritematoso SistémicoLúpus Eritematoso SistémicoLúpus Eritematoso Sistémico O Lúpus Eritematoso Sistémico (LES) é uma doença auto-imune que pode virtualmente afectar qualquer órgão. Tipicamente tem um curso clínico com períodos de actividade da doença seguidos de períodos de remissão. A Nefropatia Lúpica (NL) é uma das manifestações mais graves do LES. O glomerúlo está geralmente atingido. Em alguns casos os vasos e os túbulos renais também podem apresentar lesões. Os doentes com nefropatia lúpica têm tipicamente autoanticorpos dirigidos contra dsDNA, antigénio Sm e C1q, mas o papel patogénico destes autoanticorpos e dos imunocomplexos que surgem têm sido debatido.

O LES é mais frequente nos indivíduos de raça caucasiana. Na raça negra as manifestações são, em geral, mais graves. O sexo é o maior factor de risco para o desenvolvimento de LES, sendo o sexo feminino atingido em 90% dos casos. Só 30 a 50% dos doentes com LES têm atingimento renal na apresentação da doença. Contudo, o envolvimento renal pode manifestar-se mais tarde. Os achados mais importantes são proteinúria, microhematúria e cilindros eritrocitários, hipertensão e IR progressiva. Muitos doentes apresentam-se com sintomas inespecíficos como mal-estar, febrícula, anorexia, perda de peso. Podem também surgir alopecia, ulcerações nasais ou orais, artralgias ou artrite não deformativa e vários achados cutâneos incluindo fotosenssibilidade, fenómeno de Raynaud e o clássico rash malar. O envolvimento neuropsiquiátrico é um dos mais importantes e pode manifestar-se por cefaleias, que podem ser persistentes e muitas vezes migratórias, coreia, coma e psicose. A serosite pode estar presente sob a forma de pleurite e pericardite e afecta mais de 40% dos doentes. Esplenomegalia e linfoadenopatia estão presentes em ¼ dos doentes. As

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anormalidades hematológicas são comuns nos doentes com lúpus e incluem anemia, leucopenia e trombocitopenia.

Critérios para o diagnóstico de LES da American College of Rheumatology

A presença de 4 ou mais destes critérios tem cerca de 96% de sensibilidade e especificidade para o diagnóstico de LES

1. Rash Malar

2. Rash Discoide

3. Fotosensibilidade

4. Úlceras Orais

5. Atrite Não-erosiva

6. Pleuropericardite

7. Doença Renal

8. Distúrbios Neurológicos (convulsões, psicose na ausência de eventos

precipitantes)

9. Anormalidades hematológicas (anemia hemolítica, leucopenia/linfopenia,

trombocitopenia)

10. Células LE positiva, aumento dos títulos de dsDNA, anti-SM presente, teste para o

treponema falso positivo)

11. ANA’s positivos na imunofluorescência

A abordagem terapêutica da nefropatia lúpica depende dos achados histológicos encontrados na biopsia renal. Nos casos com indicação terapêutica, o tratamento é dividido em duas fases: fase de indução e manutenção. A fase de indução é crucial. Nesta fase a doença está muito activa e, na maior parte dos casos, atinge vários órgãos e sistemas, pelo que a instituição de um tratamento agressivo e eficaz é mandatória. Depois, segue-se a fase de tratamento de manutenção da doença. Nesta fase a protecção contra os efeitos laterais do tratamento e a prevenção das recidivas são prioritários. Os esquemas terapêuticos mais recentes incluem a utilização de ciclofosfamida na fase de indução convertida posteriormente para azatioprina ou micofenolato mofetil na fase de manutenção. Outra opção cada vez mais utilizada é a utilização do micofenolato mofetil como tratamento de indução e manutenção. Os corticóides são utilizados, também, em todas as fases do tratamento. Devem também ser instituídas medidas de profilaxia da doença cardiovascular e da osteoporose, para além da instituição de medidas de renoprotecção.

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Alguns achados epidemiológicos, clínicos e laboratoriais têm sido associados a um prognóstico desfavorável: raça negra, baixo status sócio-económico, idade jovem (menos de 24 anos), hipertensão, alta actividade na biopsia renal, presença de crescentes, creatinina sérica e proteinúria na apresentação elevadas, anemia e trombocitopenia, hipocomplementemia, aumento do dsDNA e atraso no início da terapêutica.

2. 2. 2. 2. Doenças InfecciosasDoenças InfecciosasDoenças InfecciosasDoenças Infecciosas Uma GN pode ocorrer em várias doenças causadas por bactérias, vírus, fungos e helmintas. Em alguns casos o atingimento é subclinico e transitório; noutros conduzem a IR crónica terminal (IRCT). A maioria das doenças renais associada a infecção é mediada por imunocomplexos. 2. A. 2. A. 2. A. 2. A. Hepatite BHepatite BHepatite BHepatite B A infecção aguda pelo HBV pode estar associada a uma doença do soro de curta duração: urticária ou rash maculopapular, neuropatia, artralgias ou artrite, hematúria microscópica e proteinúria não nefrótica. Geralmente este quadro resolve-se quando a hepatite melhora. A associação de hepatite B crónica e doença glomerular está bem documentada. Os portadores crónicos podem apresentar envolvimento glomerular e histologicamente podem ser encontradas 2 tipos de lesão: Glomerulopatia Membranosa (GM), GN Membranoproliferativa (GNMP). A GNMP é a lesão glomerular mais observada nos adultos. Hematúria microscópica está frequentemente presente, 53% dos casos têm hipertensão arterial e 20% IR. O AgHBs e o anti-HBs estão sempre presentes. No momento da apresentação, os doentes podem não ter história de doença hepática, mas geralmente têm transaminases elevadas. Se realizada a biopsia hepática mostra hepatite crónica activa ou persistente e ocasionalmente cirrose. A GM é mais frequente na Ásia. Tipicamente atinge crianças entre os 2 e os 12 anos de idade, na maior parte dos casos do sexo masculino, com síndrome nefrótico, hematúria microscópica e função renal normal. Outras apresentações clínicas incluem a proteinúria assintomática e a IR crónica. Muitas vezes não há história ou evidência clínica de hepatite e as enzimas hepáticas podem estar normais, mas AgHBs e anti-HBc estão presentes. O AgHBe está presente em cerca de 80% dos casos. A biopsia hepática mostra hepatite crónica persistente. Nas crianças geralmente resolve-se espontaneamente associando-se à seroconversão para anti-Hbe positivo. Nos adultos a sua resolução é pouco comum e, na maior parte dos casos, a doença progride. O tratamento antiviral está recomendado nos adultos. 2.B. 2.B. 2.B. 2.B. Hepatite CHepatite CHepatite CHepatite C Há relação forte e casual entre a infecção crónica pelo vírus da hepatite C (VHC) e doença glomerular. Três tipos principais de doença renal têm sido reconhecidos: Glomerulonefrite associado a crioglobulinemia, GN Membranoproliferativa e Glomerulopatia Membranosa. A maior parte destes doentes têm evidência de doença hepática reflectida pela elevação das concentrações de aminotransferases. Contudo, as aminotransferases séricas são normais em alguns casos e uma história de hepatite aguda está muitas vezes ausente. Assim, uma função hepática normal não excluiu a presença de VHC.

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A Crioglobulinemia mista é uma vasculite sistémica que tipicamente está associada a infecção crónica pelo HCV. Os doentes afectados tipicamente apresentam sintomas gerais inespecíficos, púrpura pálpavel, necrose da pele de áreas expostas, presença de crioglobulinas em circulação, hipocomplementemia (C4<C3) e doença renal. As manifestações clínicas de doença renal incluem hematúria, proteinúria (que muitas vezes é na faixa nefrótica), e insuficiência renal em graus variáveis. A infecção pelo HCV é, também, responsável por muitos casos de GNMP que se apresenta com hematoproteinúria, hipertensão e insuficiência renal e hipocomplementemia. A infecção pelo HCV pode também estar associada a GM apresentando-se sobretudo como proteinúria nefrótica.

Se é determinado que o grau de lesão hepática e/ou de outras manifestações extra-renais não são uma indicação para terapêutica antiviral, a decisão de tratar baseia-se entre o potencial benefício do tratamento da doença renal em relação ao seu potencial de toxicidade. Assim como noutras formas de GNMP ou GM as principais indicações terapêuticas são doença moderada a severa (síndrome nefrótico, elevação da creatinina plasmática, hipertensão de novo) ou doença progressiva. O tratamento da infecção crónica do VHC envolve a utilização de interferon alfa isoladamente ou em combinação com a ribavirina. 2.C. 2.C. 2.C. 2.C. Vírus de ImunodeficiVírus de ImunodeficiVírus de ImunodeficiVírus de Imunodeficiência Humaência Humaência Humaência Humana Ana Ana Ana Adquiridadquiridadquiridadquirida A infecção pelo VIH está associada a um número variado de síndromes renais, incluindo a nefropatia associada ao HIV, GN por imunocomplexos, microangiopatia trombótica, IR aguda e distúrbios electrolíticos. Para além disso, outras nefropatias causadas por outro tipo de infecção (HBV, HCV, sífilis) podem coexistir. Alguns fármacos utilizados no tratamento da infecção podem ambém causar disfunção renal.

3. Disproteinemias3. Disproteinemias3. Disproteinemias3. Disproteinemias 3.A. 3.A. 3.A. 3.A. Mieloma MúltiploMieloma MúltiploMieloma MúltiploMieloma Múltiplo O Mieloma Múltiplo é uma neoplasia hematológica pouco frequente em que ocorre a produção monoclonal de uma imunoglobulina de forma desregulada. A produção monoclonal de cadeias leves afecta particularmente o rim. No momento do diagnóstico mais de 50% dos doentes com MM têm evidência de alteração da função renal traduzida pela elevação dos níveis séricos de creatinina. Os doentes com MM de cadeias leves e IgD apresentam um risco acrescido de doença renal. A nefropatia de cilindros é uma lesão inflamatória túbulo-intersticial do rim. Caracteristicamente, múltiplos cilindros proteinaceus são identificados principalmente a nível do túbulo distal. A persistência destes cilindros provoca uma reacção inflamatória de células gigantes e atrofia tubular que caracterizam o rim de mieloma. Os glomérulos geralmente têm uma aparência normal. A idade média de apresentação dos doentes com MM é de 70 anos. A maior parte dos doentes apresenta-se com sintomas constitucionais (fadiga e perda de peso) e dores ósseas. A insuficiência renal é comum e as suas características inespecíficas. Geralmente, os rins têm um tamanho normal e o sedimento é inactivo. A

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excreção urinária de proteínas pode ser marcada dada a eliminação de cadeias leves. O exame de fita é negativo uma vez que este detecta só albumina. Um cálcio sérico elevado, presença de lesões osteolíticas, hipogamaglobulinemia ou níveis das outras Ig diminuídos e citopenias significativas são chaves que nos podem levar ao diagnóstico de MM. O tratamento do rim de mieloma passa pelo tratamento da doença hematológica e pela identificação atempada e tratamento de possíveis factores contribuidores da disfunção renal, presentes em cerca de metade dos doentes. Os factores precipitantes mais comuns são: hipercalcemia, sépsis e o uso de anti-inflamatórios não-esteróides. A maior parte dos doentes, após o tratamento ou eliminação dos factores precipitantes da IR (suspensão de nefrotóxinas, hidratação, tratamento da hipercalcemia, tratamento da sépsis) e redução da carga de CL através da quimioterapia apresenta uma resposta favorável com recuperação da função renal. Contudo, cerca de 10% evoluem para IRCT. 3.B. 3.B. 3.B. 3.B. AmiloidoseAmiloidoseAmiloidoseAmiloidose A Amiloidose caracteriza-se pela deposição de proteínas anómalas no espaço extracelular. As fibrilas amilóides são lineares, não ramificadas, com configuração beta pregueada. O potencial amiloidogénico está aumentado quando há um excesso de produção de proteínas, uma alteração na eliminação do precursor proteico ou por mutações transmitidas geneticamente. A classificação do tipo de Amiloidose depende do tipo de proteína precursora. As mais frequentes são a Amiloidose L (AL), cuja proteína anómala é uma cadeia leve de imunoglobulinas, e a Amiloidose A (AA) cuja proteína anómala é uma proteína de fases aguda A. Em Portugal, a Paramiloidose familiar secundária à deposição de uma proteína anómala de transtirretina também é uma causa frequente de amiloidose. Amiloidose AL

A idade média de apresentação da AL ocorre em média aos 64 anos de idade, com predomínio no sexo masculino. As manifestações renais incluem proteinúria, síndrome nefrótico e pode ocorrer IR. Tipicamente, não cursa com hematúria. As queixas principais são fraqueza e perda de peso. A amiloidose AL pode infiltrar qualquer órgão com excepção do cérebro. Quando ocorre envolvimento cardíaco podemos encontrar uma cardiomiopatia restritiva, arritmias e doença do nó auricular. A patologia cardíaca é responsável por cerca de metade das mortes ocorridas nestes doentes. Macroglosia, distúrbios da motilidade, má absorção, hemorragia e obstrução surgem quando ocorre infiltração do tracto gastrointestinal. O envolvimento do sistema nervoso periférico é responsável por uma neuropatia sensitiva dolorosa seguida de deficits motores. A neuropatia autonómica é responsável por hipotensão ortostática, ausência de sudorese, distúrbios gastrointestinais e vesical e impotência. Podem ocorrer alterações cutâneas como púrpura (em redor dos olhos), equimoses, pápulas, nódulos e placas na face e região superior do tronco. O diagnóstico de amiloidose AL deve ser considerado em qualquer doente que se apresente com proteinúria nefrótica com ou sem IR, cardiomiopatia não dilatada, neuropatia periférica, hepatomegalia ou neuropatia autonómica. A AL é uma das complicações mais graves da discrasias de células plasmáticas. A sobrevida média é de cerca de 10 meses. O envolvimento cardíaco com insuficiência cardíaca congestiva e arritmias contribui para cerca de 40% das mortes. O objectivo do tratamento é a eliminação do clone de células plasmáticas. Os doentes com AL devem ser submetidos a quimioterapia dada a melhoria da sobrevida nos

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respondedores. A resposta terapêutica baseia-se na resposta hematológica (desaparecimento de proteína monoclonal do soro e urina, normalização da razão das cadeias leves livres séricas e menos de 5% de células plasmáticas na biopsia da medula óssea) e dos órgãos envolvidos.

Amiloidose AA

A AA desenvolve-se em cerca de 5% dos doentes com elevação sustentada da proteína amilóide sérica A. Os doentes em risco são aqueles com doenças inflamatórias crónica de longa duração (mais de 10 anos de evolução). O rim é o principal alvo da AA. A disfunção renal pode ser aguda com síndrome nefrótico ou pode ser insidiosa. Os distúrbios gastrointestinais e a hepatoesplenomegalia são a seguir as manifestações mais frequentes. Em contraste com a AL, a insuficiência cardíaca congestiva, a neuropatia periférica, a macroglossia e o síndrome do túnel cárpico ocorrem menos frequentemente. O tempo de sobrevida dos doentes com AA é geralmente superior ao dos doentes com AL. Tal como na AL, uma creatinina sérica elevada e uma albumina sérica baixa são factores de mau prognóstico. As principais causas de morte são as infecciosas e as complicações relacionadas com a diálise. O tratamento das doenças subjacentes é fundamental. No caso de se tratar de doenças inflamatórias deve-se tentar atingir níveis de proteína sérica A inferior a 5mg/L.

Bibliografia: Richard J. Johnson John Feehally . Comprehensive Clinical Nephrology, 3rd ed, Elsevier, 2007

Arthur Greenberg ed. Primer on Kidney Diseases 4th. Elsevier, 2005. Up toDate 16.1

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ReferenciaReferenciaReferenciaReferenciaçççção ão ão ão àààà consulta de Nefrologiaconsulta de Nefrologiaconsulta de Nefrologiaconsulta de Nefrologia

Serafim Guimarães, Nefrologista do Serviço de Nefrologia do CHVNG/E

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REFERENCIAÇÃO À CONSULTA DE NEFROLOGIA Embora o senso comum (sobretudo o dos nefrologistas) levasse a acreditar que os doentes renais beneficiariam com o envio atempado aos cuidados nefrológicos, não havia, até há pouco tempo, estudos que demonstrassem conclusivamente esta impressão. Nos últimos anos têm surgido vários estudos, de larga escala, envolvendo grande número de doentes e em vários países, que permitem afirmar que a referenciação ao nefrologista, na altura certa, dos doentes com insuficiência renal melhora os resultados. Os médicos não-nefrologistas devem estar informados e convencidos deste conhecimento dado que são eles os responsáveis pelo envio dos doentes à nefrologia. BENEFÍCIOS DA REFERENCIAÇÃO PRECOCE Actualmente há forte evidência de que o envio precoce – mais de um ano antes do início de diálise – dos doentes com insuficiência renal ao nefrologista, melhora a sobrevida do doente. Os benefícios do seguimento nefrológico precoce parecem resultar de uma série de factores:

1. RELACIONADOS COM A DIÁLISE - Escolha informada da modalidade de diálise - Possibilidade de início atempado da diálise - Mais tempo para adequada maturação do acesso de hemodiálise (HD mais eficaz e maior duração do acesso) - Evitar complicações urémicas que obrigam a diálise emergente Hipercaliemia grave Edema pulmonar Pericardite - Evitar as complicações dos catéteres para acesso vascular temporário - Menos hospitalizações para início da diálise

2. NÃO RELACIONADOS COM A DIÁLISE

- Melhor controlo metabólico Regulação do metabolismo do cálcio e fósforo Correcção da acidose metabólica

Aconselhamento dietético específico - Maior sensibilidade ao elevado risco cardiovascular do insuficiente renal

Controlo tensional mais rígido Tratamento precoce da anemia Menos HVE (pelos dois factores acima) Maior atenção à dislipidemia

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De todos estes factores o mais importante parece ser o evitar o início de diálise urgente (não programada). Os doentes enviados tardiamente ao nefrologista estão mais sujeitos aos perigos das complicações agudas da uremia e das relacionadas com os catéteres venosos centrais. Os doentes referenciados tardiamente apresentam-se com níveis mais elevados de ureia e creatinina, acidose, anemia, hipoalbuminemia e hiperfosfatemia mais graves. Nestes doentes é mais comum a necessidade de hospitalização devida a complicações graves como edema pulmonar, pericardite ou crise hipertensiva. Os doentes com insuficiência renal crónica estado 2 (TFG 60-90 ml/m) podem ser tratados pelo seu médico de família quando não há problemas de diagnóstico a resolver. Um pré-requisito é que estes médicos estejam familiarizados com o cálculo da TFG pela fórmula de Cockroft-Gault ou pela equação MDRD (o “clássico” Clearance da Creatinina é pouco fiável – poucos doentes fazem uma colheita correcta e completa da urina de 24 horas). A referenciação ao nefrologista está indicada em geral quando a TFG é inferior a 50 ml/m, porque isto irá proporcionar as condições ideais para prevenir a deterioração progressiva da função renal e o tratamento precoce das complicações urémicas. INCIDÊNCIA DA REFERENCIAÇÃO TARDIA Actualmente na Europa e nos EUA 30 a 40% dos doentes são vistos pela primeira vez pelo nefrologista menos de 4 meses (cerca de 20% menos de1 mês) antes do início do programa de diálise, causando um risco de morte 3 vezes maior durante os primeiros meses de diálise. Muitas destas referenciações tardias podem ser prevenidas porque o médico destes doentes já conhecia a existência de doença renal. A educação dos médicos não-nefrologistas sobre o diagnóstico e tratamento da doença renal crónica, sobre o momento ideal do envio ao nefrologista e sobre as consequências da referenciação tardia deve ser intensificada. Quais as causas para estes números tão elevados de uma referenciação tardia e inadequada? Mesmo em condições óptimas haverá sempre um número residual de doentes (entre 10 e 15%) que chegará tardiamente aos cuidados de nefrologia: doentes que não vão ao médico ou não fazem análises, doentes que recusam a ida ao nefrologista com medo da diálise, doentes com insuficiência renal crónica ligeira que andam bem e que pioram abrupta e inesperadamente, doentes com quadros de insuficiência renal aguda que não recupera. No entanto a maioria pode e deve ter cuidados nefrológicos precoces. Em estudos europeus e americanos há características que levam a que a referenciação tardia seja mais provável: doentes mais idosos e mais doentes, com acesso mais difícil aos cuidados médicos, habitando em zonas mais remotas ou desfavorecidas economicamente, doentes com estatuto sócio-económico mais precário.

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A REALIDADE DO CONCELHO DE GAIA Nos últimos 4 anos, entre 60 e 90 doentes com insuficiência renal foram colocados, por ano, em programa de diálise pelo S. de Nefrologia do CHVNG. Se levarmos em conta os números respeitantes à incidência de doentes que iniciam diálise para o todo nacional (cerca de 200 doentes/milhão de habitantes), vemos que estes números estão abaixo do esperado – deveriam ser entre 90 e 100 doentes/ano. As razões possíveis para esta diferença:

- Incidência de insuficiência renal mais baixa neste concelho do que a média nacional;

- Doentes indevidamente referenciados a outros hospitais; - Doentes com insuficiência renal que continuam a morrer sem fazer

diálise. Dos doentes que o S. de Nefrologia coloca em diálise entre 30 e 40% foram vistos pela primeira vez menos de 3 meses antes do início da diálise e cerca de 10% menos de um mês antes. Esta situação só poderá melhorar com uma maior sensibilização dos médicos de família para o problema das doenças renais em geral e da insuficiência renal em particular e com o aperfeiçoamento da colaboração entre os cuidados de saúde primários e a nefrologia. Os médicos destas duas áreas têm que se encontrar mais e falar mais, daí resultará maior satisfação profissional para nós e melhor saúde para os nossos doentes.

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ALGUNS CRITÉRIOS PARA O ENVIO DE DOENTES À CONSULTA DE NEFROLOGIA

Frequentemente a informação enviada no pedido de observação por nefrologia é confusa (às vezes ilegível), telegráfica e muito incompleta. Isto dificulta a tarefa de quem faz a programação das consultas não permitindo a racionalização deste atendimento – definir o grau de prioridade, saber quem é o doente que precisa de uma consulta breve ou aquele que pode esperar um pouco mais. E, no entanto, não é necessário um grande relatório, podemos ser sucintos mas devemos ser precisos. É essencial que nesse pedido figure uma quantificação do problema e, se possível, há quanto tempo apareceu e como tem evoluido no tempo. Como vêm é simples e … não se esqueçam que há telefones! CRITÉRIO 1 / INSUFICIÊNCIA RENAL Enviar quando Filtração Glomerular < 50 ml/m Enviar de urgência (preferivelmente após contacto com nefrologista do Serviço) se:

a) Filtração Glomerular < 15 ml/m b) Subida rápida da Creatinina sérica c) Sintomatologia urémica d) Coexistir anemia grave (Hgb < 8 gr/dl) de causa renal e) Complicações graves da IRC (pericardite, insuf. Cardíaca, alterações

iónicas, etc) CRITÉRIO 2 / PROTEINÚRIA COM OU SEM HEMATÚRIA Enviar se proteinúria > 1 grama/dia Enviar de urgência se:

a) proteinúria coexistir com insuf. renal aguda ou rápidamente progressiva b) coexistir cm HTA grave c) proteinúria nefrótica e doente em anasarca

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CRITÉRIO 3 / HEMATÚRIA Enviar à consulta se:

a) recorrente ou persistente b) acompanhada de cilindrúria c) coexiste alteração da função renal d) integrada num quadro sistémico (HTA, LES, Púrpura, etc)

CRITÉRIO 4 / QUISTOS RENAIS Enviar à consulta se:

a) poliquistose renal (não é critério para consulta quisto(s) simples, isolado ou múltiplos) CRITÉRIO 5 / INFECÇÃO URINÁRIA Enviar à consulta se:

a) pielonefrite aguda de repetição CRITÉRIO 6 / DIABETES MELLITUS II Enviar à consulta se:

a) proteinúria > 500 mg/dia b) Filtração Glomerular < 50 ml/m c) Coexistirem outros critérios

CRITÉRIO 7 / DIABETES MELLITUS I Enviar à consulta se:

a) proteinúria b) HTA c) Coexistirem outros critérios

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Sessão PrSessão PrSessão PrSessão Práááática tica tica tica –––– casos clcasos clcasos clcasos clíííínicosnicosnicosnicos

Ana Ventura, Nefrologista do Serviço de Nefrologia do CHVNG/E

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