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A MÚSICA COMO RECURSO PEDAGÓGICO NAS AULAS DE LÍNGUA INGLESA
Simone Apª Machado Mira1
Evanir Pavloski²
RESUMO: Este artigo apresenta o projeto produzido para as atividades do PDE (Programa de Desenvolvimento Educacional), que o Estado do Paraná oferta aos professores da Educação Básica e também o relato de sua implementação, que constou da elaboração de uma sequência didática com o gênero música. As atividades foram aplicadas na turma do 9º C do Colégio Estadual Anita Grandi Salmon – E.F.M, no município de Sengés. Este projeto abordou a questão dos preconceitos e racismo, utilizando a música para desconstruir pensamentos e atitudes racistas, valorizando a questão étnico-racial, tornando o espaço escolar um ambiente que busque a educação para a igualdade entre as raças. Como resultado as aulas de Inglês tornaram-se mais prazerosas e motivadoras, houve maior participação dos alunos durante as atividades e verificou-se que houve melhorias na leitura, escrita, oralidade e produção de textos.
Palavras-chave: língua inglesa; música, motivação, preconceito.
ABSTRACT: This work presents the project designed for the activities PDE (Programa de Desenvolvimento Educacional), that the Paraná’s State offers the teachers of Basic Education and also the story of its implementation, which consisted of the elaboration of a didactic sequence with the music genre. The activities were implemented in the class of 9º C State College Anita Grandi Salmon – E.F.M., in the city of Sengés. This project addressed the issues of prejudice and racism, using music to deconstruct thoughts and racist attitudes, valuing ethnic-racial issue, making the school an environment that seeks education for equality between the races. As a result English classes became more enjoyable and motivating, a greater participation of students during activities and found that there were improvements in reading, writing, and oral text production.
Key-Words: English; music, motivation, prejudice.
1 Professora da Rede Pública do Estado do Paraná, efetiva em Língua Inglesa.² Professor Orientador – UEPG – Universidade Estadual de Ponta Grossa.
1.INTRODUÇÃO
O Ensino de Língua Estrangeira em algumas escolas ainda é baseado no
método de gramática-tradução, abordado na época da educação jesuítica (DCEs
de LEM, 2008, p.39), que consiste na repetição, memorização e tradução de
estruturas gramaticais, pois se acredita, equivocadamente, que dessa forma os
alunos se tornam falantes fluentes da língua estrangeira. E somado a isso há o
fato da falta de motivação em nossas escolas públicas, pois quando os alunos
iniciam o 6º ano, possuem um desejo imenso em aprender uma nova língua,
porém, com o passar do tempo, esse desejo diminui e a língua estrangeira para
eles se torna um fardo, muitas vezes, levando-os à reprovação. É preciso mudar
esse cenário na escola pública. Faz-se necessário, portanto, que os professores
busquem novos métodos para atingir os alunos. Uma maneira eficaz é o trabalho
com gêneros textuais e sequências didáticas.
Cristóvão afirma que “o trabalho com gêneros pode ajudar no crescimento
dos alunos quando utilizados numa interação prática e dando espaço para que os
estudantes analisem e reflitam sobre utilidade social. Na prática com os gêneros
textuais, o aluno está mais perto da sua realidade, da realidade do mundo em que
vive e do seu cotidiano”. (CRISTOVÃO, 2007, p.33).
Ainda segundo Cristóvão (2007) o professor ao utilizar os gêneros deve
conhecer e entender seu funcionamento, e que os textos não sirvam apenas
como modelos ou pretextos para o ensino de vocabulário ou gramática. É preciso
que o aluno perceba que os gêneros fazem parte de seu cotidiano, do mundo
real, como por exemplo: uma carta formal de pedido de emprego, uma conta de
luz, uma lista de compras e tantos outros.
Os gêneros devem ser trabalhados pelo professor de forma consciente,
profunda e detalhada, para que o aluno possa aplicá-lo em suas atividades
diárias. É necessário ter objetivos claros para cada gênero trabalhado, ou seja, o
que se espera que o aluno aprenda e onde ele vai aplicar esse conhecimento.
DOLZ e SCHNEUWLY (1998) citados por CRISTÓVÃO (2007), defendem
a construção de modelos didáticos de gêneros, ou seja, o gênero como
instrumento para o ensino e a proposta de desenvolvimento de materiais didáticos
em forma de sequências didáticas. As sequências didáticas são um conjunto de
atividades diversificadas de um mesmo gênero, com objetivos claros e precisos,
de acordo com o nível de aprendizagem dos alunos.
Partindo da dificuldade que alguns professores ainda têm em trabalhar com
a língua estrangeira, seja pelo fato de ainda utilizarem o método gramática-
tradução, ou pela falta de motivação de alguns alunos, o gênero textual escolhido
para o nosso projeto de intervenção foi à música, pois é um recurso pedagógico
que estimula o aprendizado da língua estrangeira e auxilia na motivação.
Além de propiciar um ambiente confortável e alegre, a música se aproxima
da realidade dos alunos, pois trabalha com a linguagem coloquial utilizada por
eles no dia-a-dia. De acordo com ULHÔA (1999) citado por CARVALHO (2009)
por ser um instrumento de transmissão oral a música facilita a compreensão, pois
é resultado da junção da linguagem verbal com a linguagem musical.
LIBERATO (2003) citado por OLIVEIRA (2009), salienta que a música é um
mediador que proporciona ótimos resultados, envolvendo o aluno no processo de
aprendizagem, tornando o objetivo do estudo mais prazeroso ao aluno.
Conforme LIMA (2004) citado por OLIVEIRA (2009), a utilização de
músicas no ensino tem alvos diferentes. Pode-se além dos aspectos lingüísticos
como vocabulário, gramática, expressão oral e escrita propor também algo de
natureza cultural. Além disso, não só faz com que o aluno desenvolva sua
sensibilidade, despertando a criatividade, mas também promove um ambiente
favorável ao aluno para se expressar espontaneamente, favorecendo o
conhecimento da língua e sendo um instrumento facilitador tanto para a
introdução de aspectos culturais quanto para o aprendizado lingüístico.
Os temas escolhidos para o trabalho com gênero música foram o
preconceito e o racismo na escola.
Dentre os nossos objetivos com o referido projeto se destacam os
seguintes: utilizar-se da música como forma de desconstruir pensamentos e
atitudes racistas, valorizando a questão étnico-racial e tornando o espaço escolar
um ambiente que busque a educação para a igualdade entre as raças.
2.FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA2.1.O MÉTODO GRAMÁTICA TRADUÇÃO
Ao longo de muitos anos o ensino de Língua Estrangeira foi baseado em
traduções e atividades gramaticais, como se a Língua fosse algo desvinculado da
realidade, pois não havia ligação entre o que se aprendia na escola e o que se
aplicava na vida diária. O porquê dessa prática tradicional é explicado nas
Diretrizes Curriculares de Língua Estrangeira Moderna do Estado do Paraná
(DCEs de LEM, 2008, p.39). De acordo com o mesmo documento, na época da
nossa colonização, Portugal impunha a política de dominação e por isso usava a
expansão do catolicismo. Com esse objetivo foram trazidos os jesuítas para
catequizar os índios que viviam no Brasil e também para ensinar o latim, que era
visto como exemplo de língua culta.
Os europeus dominavam e exploravam com violência os povos indígenas,
e dessa forma os jesuítas eram vistos como um meio de salvação para esse
povo.
No entanto, durante a União Ibérica (1580-1640), os jesuítas foram considerados os principais incentivadores da resistência dos nativos, pois as reduções jesuíticas acabaram apresentando em sua estrutura organizacional um refúgio para os povos indígenas, em virtude da desumanidade e exploração desses povos pelos colonizadores (DCEs de LEM, 2008. p.38).
Esse foi um dos fatores que contribuiu para a decisão de expulsar os
padres jesuítas dos territórios portugueses na América e, em 1759, o ministro
Marquês de Pombal instituiu o sistema de ensino régio no Brasil, ao qual era
dever do Estado contratar professores não-religiosos. “As línguas ensinadas eram
o Grego e o Latim, por serem consideradas línguas importantes para o
desenvolvimento do pensamento e da literatura” (DCEs de LEM, 2008, p.38).
Em 1809, D.João VI assinou o decreto permitindo o ensino de Inglês e
Francês. O Colégio Pedro II foi fundado em 1837. Essa instituição se inspirava
nos moldes franceses e ensinava sete anos de francês, cinco de inglês e três de
alemão. A língua francesa representava um ideal de cultura e civilização enquanto
o inglês e o alemão facilitavam o acesso a obras literárias. Em 1929 o italiano
também passou a compor o currículo. Essas línguas consideradas línguas
modernas eram trabalhadas na abordagem gramática-tradução, que foi adotada
desde a época da educação jesuítica. Essa abordagem pedagógica priorizava o
conjunto de regras, uma vez que se acreditava que estudando a gramática o
aluno teria melhor desempenho na oralidade e na escrita. Essa prática durou até
o início do século XX, com o objetivo de permitir o acesso a textos literários e
possibilitar o domínio da gramática normativa, sendo o produto final a avaliação,
que tinha como foco principal o conhecimento tradicional.
MOROSOV e MARTINEZ afirmam que “apesar do método gramática
tradução ser bastante criticado, é ainda utilizado por muitos professores de
Língua Estrangeira” (MOROSOV E MARTINEZ, 2008, p.25). Ainda segundo as
autoras, depois de um longo tempo o ensino de LE ainda tem sido foi feito através
do método gramática-tradução. Especialistas da área de línguas se questionavam
e pesquisavam os resultados do ensino nesse método. Era preciso mudar esse
cenário, pois o professor era o “agente” central da aula e não havia espaço para
questionamentos por parte dos alunos; sendo assim “não havia comunicação
efetiva em língua estrangeira, pois era dada ênfase à habilidade de leitura durante
as aulas” (MOROSOV e MARTINEZ, 2008, p.26).
Com o passar do tempo muitos métodos foram adotados em língua
estrangeira, alguns baseados na escrita, outros na oralidade com ênfase em
repetição de estruturas lingüísticas. Comunicar-se vai além da oralidade; é um ato
social, proveniente de cada indivíduo quando se relaciona com o outro, ou seja,
quando há a interação. E não se pode esquecer que o professor ao trabalhar com
línguas estrangeiras deve ter em mente que não são apenas aspectos
gramaticais e orais que devem ser contemplados e sim lembrar que por trás de
toda língua ensinada há a cultura de um grupo social.
Entretanto, seja qual for o método adotado pelo professor, é preciso levar
em consideração que o processo de ensino e aprendizagem da língua forneça ao
aluno subsídios para se comunicar em língua estrangeira, fazendo uso do
discurso como prática social e se utilizando de conhecimentos da língua para seu
crescimento pessoal e profissional.
2.2.POR QUE APRENDER LÍNGUA ESTRANGEIRA?
O mundo atual exige competências mais elaboradas das pessoas para
atuarem no mercado do trabalho e da tecnologia. Aprender uma língua
estrangeira é mais do que aprender a decodificar palavras e regras gramaticais;
sobretudo é um instrumento fundamental de ação no mundo contemporâneo.
Através da língua as pessoas interagem entre si, se situam no ambiente em que
estão e também são capazes de transformar sua realidade. Daí compreende-se o
conteúdo estruturante de língua estrangeira moderna proposto nas Diretrizes
Curriculares: discurso como prática social.
Segundo JORGE no livro Ensino e Aprendizagem de Língua Inglesa,
A aprendizagem de língua estrangeira se justifica pelo seu caráter educativo, pois leva a educação plena do indivíduo através das possibilidades que são propiciadas e potencializadas pelo contato com uma língua estrangeira, fazendo com que este se torne mais consciente da diversidade que constitui o mundo. Percebendo essa diversidade o aluno reconhece as possibilidades da diferença, seja pela cultura, raça, religião, gênero; podendo assim tornar-se mais consciente de si próprio, em relação ao seu contexto local e ao contexto global a que está inserido” (JORGE, 2009, p.163).
O conhecimento de uma língua estrangeira tem como objetivos o acesso a
um número maior de informações, a compreensão de como as pessoas vivem em
outros lugares do mundo, o desenvolvimento de uma compreensão crítica das
desigualdades sociais em todos os níveis (classe social, gênero, sexualidade,
etc.), a percepção de como o discurso atualmente tem sido usado
estrategicamente para ensinar verdades e estabelecer padrões de
comportamento, aprender a criticar tais verdades e padrões, atuação com mais
competência no uso das tecnologias, no mundo do trabalho e na universidade.
Sendo assim, LOPES (2002) afirma que o ensino de língua estrangeira não pode
se restringir a aprender apenas a cultura do outro e sim um conhecimento que
possibilite ao aluno sua inserção no espaço social em quem vive podendo até
mesmo interferir nesse espaço, modificando-o.
Vivemos num mundo globalizado, conectados através da internet e da
mídia a lugares muito distantes. A rapidez com que se processam informações e
notícias atualmente é espantosa. A língua estrangeira, principalmente o inglês,
tem um papel fundamental nesse processo, pois através dela divulga-se o
conhecimento científico, sendo a linguagem usada na internet e nas relações
comerciais exteriores.
A língua inglesa é também chamada de língua franca, termo de origem
latina, “simbolicamente remove o sentido de propriedade da língua dos anglos”
(JENKINS, 2000, p.11, citado por BECKER, 2009, p.3), e quer dizer, em essência
“uma língua de contato usada entre povos que não compartilham uma primeira
língua, e é comumente entendida como querendo significar uma segunda (ou
subsequente) língua de seus falantes” (JENKINS, 2007, p.1, citado por BECKER,
2009, p.3). Originalmente o termo se referia a uma língua de natureza híbrida,
sem falantes considerados “nativos”.
Sendo assim de acordo com KALVA (2011), a língua inglesa deixou de ser
uma língua considerada internacional, vista como língua padrão (homogênea),
restrita apenas a países como Estados Unidos, Inglaterra e outros, e passou a ser
cada vez mais utilizada valorizando a pluralidade de variedades em comunidades
que a têm como segunda língua.
2.3.A IMPORTÂNCIA DO GÊNERO MÚSICA NO ENSINO DE LÍNGUAS
PEREIRA nos diz “que a música é uma linguagem universal, usada para a
comunicação, inspiração, educação, entretenimento etc. Ela consegue mudar o
humor das pessoas (quando estamos tristes, basta ouvirmos uma música alegre;
ou quando estamos nervosos ou ansiosos, é só ouvirmos uma música relaxante)”.
(PEREIRA, 2009, s/p).
Ainda segundo PEREIRA “as crianças aprendem mais rápido com músicas,
que se tornam memoráveis, pois ajudam aos alunos a se lembrarem da
linguagem facilmente, independente do foco do professor, gramática ou
vocabulário. Utilizando música, o professor pode começar a aula para apresentar
um tema novo, terminar outro, ou simplesmente utilizá-la no meio de um projeto
para enfatizar o assunto”. (PEREIRA, 2009, s/p).
A música é algo que faz parte da realidade do aluno e, de acordo com as
DCEs (2008), o trabalho com ela proporciona ao professor desenvolver atividades
significativas, a fim de que o aluno vincule o que é estudado com o que o cerca.
Segundo os autores Ledbetter (2005), Lake (2003), Medina (1993), Schopp
(2001), Saricoban e Metin (2000), citados por Oliveira (2009), a ideia de que a
música proporciona mudanças nas atividades em sala de aula, tornando-as
recursos importantes para o desenvolvimento da oralidade, escrita, leitura e para
ensinar vocabulário, pronúncia e gramática.
As atividades com música proporcionam ao professor a matéria-prima para
desenvolver as quatro habilidades. A habilidade da leitura proporciona aos alunos
a compreensão do texto. Através de palavras cognatas ou de palavras já
conhecidas por ele, durante a leitura o aluno interage com o texto. A oralidade é
uma forma do aluno se expressar e se comunicar com o outro, porém acredito
que seja considerada a habilidade mais difícil, porque não é a língua materna do
falante, consequentemente, ele não é exposto à língua inglesa em casa ou em
muitos ambientes, mas predominantemente na escola. Por isso, a oralidade deve
ser trabalhada focando a comunicação e a interação entre os alunos. Na
habilidade escrita, o aluno tem a oportunidade de produzir o que aprendeu, porém
o professor deve acompanhar o processo de produção da escrita, não priorizando
apenas o resultado final. Listening é a habilidade que envolve a audição, e
também identifica e entende o que as outras pessoas falam. Essa habilidade é
primordial para desenvolver a fluência em língua estrangeira. Dessa forma as
quatro habilidades devem ser trabalhadas interligadas, focando sempre a
aprendizagem do aluno, e sem priorizar uma habilidade ou outra.
Para ROMANELLI apud SILVA, a música [...] “é uma linguagem comum a
todos os seres humanos e assume diversos papéis na sociedade, como função
de prazer estético, expressão musical, diversão, socialização e comunicação”. Na
escola, [...] “a música é linguagem da arte, [...] é uma possibilidade de estratégia
de ensino, ou seja, uma ferramenta para auxiliar a aprendizagem de outras
disciplinas”. (ROMANELI apud SILVA, 2010, p.12)
VILAÇA (2006), citada por OLIVEIRA (2009), refere-se à ideia de que o
trabalho com música é uma ferramenta de aprendizagem, garantindo resultados
como instrumento de motivação e que desperta o interesse no ensino. Como
resultado de seu trabalho, concluiu que com o uso da música, pode-se trabalhar
qualquer tipo de texto, desenvolvendo as habilidades: e que a música auxilia na
pronúncia e entonação.
2.4.O DISCURSO ENQUANTO PRÁTICA SOCIAL REFORÇA PRECONCEITOS?
Como afirma BAKTIN “o uso da linguagem envolve ação humana em
relação a alguém em um contexto interacional específico” (BAKTIN apud LOPES,
2003, p.19).
Através da linguagem produzimos e reproduzimos discursos tendo em vista
um interlocutor num determinado contexto social. Porém, nossos discursos estão
relacionados a uma base sócio-histórica e cultural, frutos de nossa vivência
enquanto pessoas e que, dessa forma, constitui nossa identidade social. De
acordo com LOPES,
Quando utilizamos a linguagem não o fazemos com um interlocutor ou um usuário simplesmente, mas como, por exemplo, um homem mulato, bissexual, jovem, de classe trabalhadora, brasileiro, enfermeiro, etc, ou seja, a partir de suas marcas sócio-históricas (LOPES apud LOPES, 2003, p.20).
“Sendo sujeitos sociais e marcados por discursos historicamente
construídos, fazemos parte de uma sociedade exclusiva e hegemonicamente
branca, heterossexual e masculina, entre outros traços de nossas identidades
sociais” (GIDDENS, FAIRCLOUGH apud LOPES, 2003, p.58).
O Brasil é fruto de uma cultura dominante européia, branca, elitista, sendo,
consequentemente transmissor dessa cultura; tudo o que foge a esses padrões é
considerado inferior e alvo de discriminação. Porém, é visto como um país onde
não há o racismo, como diz MUNANGA, “na sociedade brasileira o racismo é
negado e ou camuflado pelo mito da democracia racial” (MUNANGA apud
COQUEIRO, p.4).
CUNHA PEREIRA (2004) nos diz que Roberto da Matta criticou essa
particularidade brasileira ao defender que as elites políticas e intelectuais
passaram a ideia de que no Brasil não há preconceito e discriminação e que
existe uma harmonia natural e tolerância entre os grupos raciais. Com essa crítica
Roberto da Matta cria o termo “democracia racial”. É uma tese presente no senso
comum: que o povo brasileiro é oriundo da união pacífica e congratulada das três
raças: branca, negra e indígena. Essa tese é reforçada nos livros didáticos, mídia,
literatura clássica e popular e demais formas de expressão. A maioria das
pessoas não se assume como racista, porém gosta de ouvir piadas que denigrem
negros ou músicas e propagandas na mídia que ridicularizam a identidade negra.
O preconceito é algo enraizado nas pessoas, surge no ambiente familiar e
muitas vezes é reforçado na escola. Forma-se o preconceituoso na família e este
põe suas ações em prática na sociedade. A escola é o ambiente onde
infelizmente ainda ocorrem práticas racistas, pois ainda há alunos e professores
que discriminam as pessoas negras, acham-nas incapazes intelectualmente e até
mesmo definem seu futuro: trabalhos braçais para os homens negros e
domésticas para as mulheres negras, pois com certeza eles não concluirão o
ensino médio e tampouco estudarão em uma universidade, porque além de serem
negros muitos vêm de classe social baixa e não conseguiriam uma vaga numa
universidade.
Esse é o retrato do nosso Brasil: as minorias são excluídas, são vistas
como “diferentes” e tudo o que foge a regra padrão em nosso país é considerado
inferior.
3.1.METODOLOGIA E INTERVENÇÃO
Este artigo surgiu da aplicação do projeto: “A música como recurso
pedagógico nas aulas de Língua Inglesa”, com o objetivo de mostrar que é
possível ensinar inglês de forma prazerosa através da música e motivando o
aluno a aprender gramática de forma contextualizada, focando a questão étnico-
racial para desconstruir preconceitos presentes em nossa cultura e na cultura de
países falantes da língua alvo.
Para implementar o projeto foi elaborada uma seqüência didática para ser
aplicada com os alunos do 9º C. É dividida em quatro seções, em torno de quatro
músicas, com atividades diferenciadas de vocabulário, leitura, escrita, gramática e
compreensão auditiva, buscando uma aprendizagem significativa em língua
inglesa.
Seção 1 – Música Where is the love – Black eyed Peas.
Seção 2 – Música Black or White – Michael Jackson
Seção 3 – Música I have a dream – Abba
Seção 4 – Música Born this way – Lady Gaga
A música trabalhada na Seção 1 foi Where is the love, do grupo Black eyed
Peas. Esta canção tornou-se um hino contra as guerras, pois retrata temas como
o multiculturalismo, a ganância, o racismo, entre outros.
Nessa seção as atividades de listening, vocabulary, grammar, writing,
singing, speaking foram retratadas com atividades diversas que despertaram a
atenção dos alunos. Houve um debate sobre os temas elencados, promovendo a
discussão entre alunos e professor, de maneira democrática e crítica.
Os alunos realizaram atividades de listening, bem como assistiram ao clip
da música. Trabalhou-se também o vocabulário, focando o significado das
palavras. O conteúdo gramatical retirado dessa música foi o Present Continuous.
Para realizar os exercícios de singing e speaking os alunos cantaram trechos de
músicas que continham verbos no present continuous e tentaram adivinhar por
mímicas, trechos da música trabalhada. Como produção textual dessa seção, os
alunos escolheram trechos da música que abordava igualdade e discriminação e
os representaram por meio de desenhos e colagens.
Para facilitar ao leitor a busca pelas referências bibliográficas, estas se
encontram ao final de cada seção
Na seção 2 a música trabalhada foi Black or White de Michael Jackson,
que retrata a igualdade entre as raças. A canção foi lançada numa época em que
Michael era alvo de muita polêmica devido a suas excentricidades e ao
clareamento de sua pele, que segundo ele era devido ao vitiligo (doença em que
a pessoa perde a pigmentação da pele).
Utilizou-se essa canção para atividades de listening (completar espaços em
branco na letra da música e colocar versos em ordem); writing e reading (ordenar
trechos da música, propiciando sentido à leitura; posteriormente cada aluno lê a
frase que formou), e grammar, com os tempos verbais: simple present e simple
past. (atividades de produção de orações, completar com os verbos auxiliares,
bingo de verbos, classificar verbos em regulares ou irregulares).
. A seção 3 iniciou com perguntas sobre Martin Luther King e o Movimento
Negro nos Estados Unidos. Em seguida, os alunos assistiram a um vídeo sobre o
Movimento Negro e responderam algumas questões. Também foram realizadas
atividades de vocabulário e escrita. Em outra aula os alunos ouviram a música I
have a dream (Abba) e realizaram atividade de listening (colocar os versos em
ordem ouvindo a música). Como homework os alunos produziram um pequeno
texto com o tema: I have a dream.
A seção 4 iniciou com perguntas sobre discriminação e o que os alunos
sabiam a respeito de Lady Gaga. Depois fizeram uma atividade de listening da
música Born this way; após assistirem ao clip e com a letra em mãos conferiram
se a atividade estava correta. Foram trabalhadas em outras aulas atividades de
leitura e escrita a partir do tema da canção.
3.2.RESULTADOS
O projeto foi desenvolvido no Colégio Estadual Anita Grandi Salmon –
Ensino Fundamental e Médio, onde trabalho há nove anos. O projeto foi
apresentado à direção, equipe pedagógica e professores durante a Semana
Pedagógica em fevereiro.
A princípio o projeto seria implementado em contra-turno com alunos do 9º
ano do período matutino. Quinze alunos se interessaram pelo projeto e foi
realizada uma reunião com os pais dos mesmos para apresentação de como
seria a implementação. Porém, após um mês alguns alunos desistiram, pois
participavam de outras atividades em contra-turno como: sala de apoio de
português e matemática, mais educação e CELEM. Restaram então, nove alunos,
o que não correspondia ao número mínimo para que a turma continuasse. Dessa
forma, a produção didático-pedagógica passou a ser ministrada na turma do 9º C,
período vespertino, onde leciono.
Essa turma possui alunos bastante indisciplinados, porém as atividades da
sequência didática “chamaram” a atenção dos alunos, que participaram
ativamente de tudo o que lhes foi proposto, e através das músicas os conteúdos
gramaticais foram apresentados de forma lúdica, sendo apreendidos mais
facilmente pela turma.
Com as atividades diferenciadas de cada seção, despertou-se nos alunos
um interesse em participar das aulas de forma direta, sendo sujeitos de seu
aprendizado, de forma autônoma e consciente.
Utilizar a música em sala de aula torna o aprender algo mais significativo,
com objetivos claros, tornando a aula um espaço que propicia prazer e
aprendizagem ao mesmo tempo.
Como produção final foi proposta uma exposição das atividades realizadas
pelos alunos, porém isto não foi possível, devido à falta de tempo, pois se mudou
a turma de implementação e o tempo ficou escasso.
3.3.ANÁLISE DAS DISCUSSÕES DO GTR
O Grupo de Trabalho em Rede é o momento de socialização com outros
profissionais na área de línguas sobre o projeto e a produção didático-
pedagógica. O GTR possui as seções fórum e diário. No fórum os professores
postavam as suas opiniões e interagiam com a opinião dos colegas e da
professora tutora. No diário, somente a tutora e cada cursista tinham acesso,
podendo postar seus comentários acerca de um tema definido.
O GTR foi composto de 15 participantes que tinham um prazo definido para
resolver as atividades propostas e foi dividido em três seções:
Na primeira seção do fórum os professores tinham de analisar o Projeto de
Intervenção Pedagógica e postar suas considerações sobre a falta de motivação
do aluno e o fato do método gramática-tradução ser ainda bastante utilizado em
sala de aula. No diário produziram um texto sobre a importância da música nas
aulas de Inglês, comentando sobre a relevância e a aplicabilidade deste tema na
escola pública atual.
Na segunda seção do fórum os cursistas discutiram e compartilharam
impressões sobre música e motivação; deveriam relatar se trabalham com
músicas em suas aulas e se a produção didático-pedagógica era aplicável na sua
escola. No diário argumentaram sobre a importância da música no trabalho com
as quatro habilidades de língua estrangeira, qual a relevância do tema
preconceito étnico-racial em nossas escolas e se é possível desconstruir
preconceitos enraizados em nossa cultura e na cultura dos povos falantes da
língua inglesa.
Na terceira seção foi proposto aos professores que relatassem uma prática
vivenciada em sala de aula com o uso da música. As contribuições nesse fórum
foram muito ricas, pois além de metodologias com a música, surgiram atividades
com teatro de fantoches, produção de um coral e banda.
Acredito que as interações nesse GTR contribuíram para enriquecer minha
prática pedagógica e das demais cursistas, pois resolviam as atividades
propostas em cada fórum e ainda sugeriam novas ideias de como melhorar o
ambiente em sala de aula para se atingir à aprendizagem dos alunos.
4.CONSIDERAÇÕES FINAIS
O ensino da língua inglesa não deve ficar restrito à tradução e conteúdos
gramaticais. Aprender uma nova língua consiste em perceber a cultura do outro,
perceber a sua própria cultura, inserindo-se socialmente no mundo atual, sendo
capaz de modificar o ambiente em que vive.
A língua é um instrumento de interação e inserção social, por meio dela as
pessoas interagem entre si, fazem inferências, questionam e são questionadas,
concordam e discordam sobre fatos diversos. Dessa forma a língua não deve ser
ensinada de forma maçante, como se fosse um “fardo” ao aluno; e sim de forma
descontraída, levando-o à aprendizagem de forma natural e agradável.
Este artigo propôs o ensino da língua inglesa através de músicas que
abordam a questão de preconceitos e racismo. Com o uso da música verificou-se
uma maior participação dos alunos, que realizaram as atividades gramaticais de
forma lúdica, despertando neles um interesse em participar, pois o aprendizado
trazia prazer e não apenas cobranças. Sendo assim, houve melhorias na leitura,
escrita, oralidade e produção de textos.
Portanto, o presente artigo mostra que é possível através da música
propiciar aulas de inglês atraentes e motivadoras, tornando o espaço da sala de
aula agradável e propício à aprendizagem.
5.REFERÊNCIAS
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