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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE FACULDADE DE TURISMO E HOTELARIA DEPARTAMENTO DE TURISMO CURSO DE TURISMO VIVIANE DA SILVA MARTINS A JORNADA NAS NUVENS: O OLHAR DOS COMISSÁRIOS DE BORDO A RESPEITO DO AMBIENTE DE TRABALHO NITERÓI 2016

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

FACULDADE DE TURISMO E HOTELARIA

DEPARTAMENTO DE TURISMO

CURSO DE TURISMO

VIVIANE DA SILVA MARTINS

A JORNADA NAS NUVENS: O OLHAR DOS COMISSÁRIOS DE BORDO A

RESPEITO DO AMBIENTE DE TRABALHO

NITERÓI

2016

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

FACULDADE DE TURISMO E HOTELARIA

DEPARTAMENTO DE TURISMO

CURSO DE TURISMO

VIVIANE DA SILVA MARTINS

A JORNADA NAS NUVENS: O OLHAR DOS COMISSÁRIOS DE BORDO A

RESPEITO DO AMBIENTE DE TRABALHO

Trabalho de conclusão de curso de graduação

apresentado à Faculdade de Turismo e Hotelaria

da Universidade Federal Fluminense, como

requisito parcial para obtenção do grau de

Bacharel em Turismo.

Orientadora: Prof.ª Dr. ª Carolina Lescura de

Carvalho Castro

NITERÓI

2016

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A JORNADA NAS NUVENS:

O OLHAR DOS COMISSÁRIOS DE BORDO A RESPEITO DO AMBIENTE DE

TRABALHO

Por

VIVIANE DA SILVA MARTINS

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado

ao curso de graduação em Turismo da

Universidade Federal Fluminense como

requisito final de avaliação para obtenção do

grau de Bacharel em Turismo.

BANCA EXAMINADORA

_____________________________________________________

Prof.ª Dr.ª Carolina Lescura de Carvalho Castro

Orientadora – UFF

_____________________________________________________

Prof. ª Dr.ª Fátima Priscila Morela Edra

Departamento de Turismo - UFF

______________________________________________________

Prof. ª Dr.ª Verônica Feder Mayer

Departamento de Turismo - UFF

Niterói, 14 de dezembro de 2016

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Ficha Catalográfica elaborada pela Biblioteca Central do Gragoatá

M386 Martins, Viviane da Silva.

A jornada nas nuvens : o olhar dos comissários de bordo a respeito

do ambiente de trabalho / Viviane da Silva Martins. – 2016.

78 f. : il.

Orientadora: Carolina Lescura de Carvalho Castro.

Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Turismo) –

Universidade Federal Fluminense, Faculdade de Turismo e Hotelaria,

2016.

Bibliografia: f. 72-77.

1. Comissário de bordo. 2. Ambiente de trabalho. 3. Prazer.

4. Sofrimento. I. Lescura, Carolina. II. Universidade Federal

Fluminense. Faculdade de Turismo e Hotelaria. III. Título.

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A gente pode morar numa casa mais ou menos, numa rua mais ou menos numa cidade mais ou menos, e até ter um governo mais ou menos. A gente pode dormir

numa cama mais ou menos, comer um feijão mais ou menos, ter um transporte mais ou menos, e até ser obrigado a acreditar mais ou menos no futuro. A gente pode

olhar em volta e sentir que tudo está mais ou menos...

Tudo bem!

O que a gente não pode mesmo, nunca, de jeito nenhum... é amar mais ou menos, sonhar mais ou menos, ser amigo mais ou menos, namorar mais ou menos, ter fé

mais ou menos, e acreditar mais ou menos. Senão a gente corre o risco de se tornar uma pessoa mais ou menos.

(Chico Xavier)

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AGRADECIMENTOS

Em primeiro lugar, gostaria de agradecer a Deus por ter me abençoado ao nascer na

minha família, na qual fui tão bem-educada e tenho tanto amor ao meu redor. Sem

tal presente, minha caminhada até aqui poderia ter sido muito diferente. Com isso

agradeço aos meus amados pais, Jorge e Marlene, por sempre apoiarem os meus

sonhos e incentivarem meus estudos. Por terem me apontado o caminho certo, e me

ajudarem a caminhá-lo.

Aos meus irmãos, Felipe e Vilson, por caminharem junto comigo. Meus parceiros da

vida.

A minha avó Maria, por ser a melhor pessoa do mundo, e cuidar de mim como

ninguém desde bebê, e por isso merecer todos os agradecimentos do mundo,

sempre. Também ao meu querido e sábio avô, Vilson pelos seus ensinamentos, seu

foco e persistência, ao longo de todos esses anos.

Aos comissários de bordo que, prontamente, aceitaram participar deste estudo, sem

qual este trabalho não seria ser construído.

A todos aqueles que contribuíram, direta e indiretamente, para a realização desta

pesquisa, seja por gesto, pensamento ou intenção.

Também não posso deixar de agradecer aos meus amigos de turma 2012.1, assim

como meus amigos de infância, os quais estão sempre me incentivando e dando

bons exemplos.

A professora Erly, pela paciência, compromisso e dedicação ao me ajudar na revisão

e formatação do trabalho.

Por último, porém não menos importante, agradeço, a minha professora e

orientadora, Carolina Lescura, pelo tempo gasto, pela atenção, colaboração,

paciência e pelos conselhos e comentários pontuais, sem os quais não teriam

tornado essa minha ideia uma realidade concreta.

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Toda riqueza provém do trabalho, asseguram os economistas. E assim o é na realidade: a natureza proporciona os materiais que o trabalho transforma em

riqueza. Mas o trabalho é muito mais do que isso: é o fundamento da vida humana. Podemos até afirmar que, sob determinado aspecto, o trabalho criou o próprio

homem.

(ENGELS, 1990)

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RESUMO

O presente estudo teve como objetivo investigar a percepção dos comissários de bordo em relação ao ambiente e a rotina de trabalho em que estão inseridos. Pretendeu-se, especificamente, pesquisar quais fatores são capazes de motivar e influenciar esses profissionais a se manterem neste tipo de carreira. Em contrapartida, coube desvendar também quais pontos são críticos e não motivacionais para quem atua neste ramo. Para tanto, foi realizado um levantamento bibliográfico envolvendo turismo, a história da aviação e a carreira do comissário de bordo. Adiante tratou-se a respeito da qualidade de vida no trabalho, correlacionando-a com as concepções de prazer e sofrimento, capacidade para o trabalho e patologias. Para desenvolvimento deste tema, foi realizada uma pesquisa qualitativa exploratória, aplicando-se 6 entrevistas semiestruturadas aos comissários de bordo. Observa-se nos resultados encontrados que há um dúbio sentimento, ora de prazer, ora de sofrimento. Os fatores que mais influenciam a sensação de prazer são as recompensas e o estilo de vida. A qualidade de vida no trabalho é representada por três itens: experiência turística, remuneração e realização pessoal. Com relação ao sofrimento, nota-se que as doenças ocupacionais, o ritmo desgastante e a dificuldade em conciliar a vida profissional com a pessoal trazem algumas dificuldades para quem deseja fazer carreira como comissário. Palavras chaves: Comissário de bordo; Ambiente de trabalho; Prazer/Sofrimento.

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ABSTRACT

The present study had as objective to investigate the perception of flight attendants in

relation to the environment and the routine of work in which they are inserted.

Specifically, it was intended to investigate which factors are capable of motivating

and influencing these professionals to remain in this type of career. In contrast, It was

also necessary to find out which points are critical and not motivational for those who

work in this field. For that, a bibliographic survey was carried out involving tourism,

the history of aviation and the career of the steward. Later on, the quality of life in the

work was treated, correlating it with the conceptions of pleasure and suffering,

capacity for work and pathologies. For the development of this theme, a qualitative

exploratory research was carried out, applying six semi-structured interviews to the

flight attendants. It is observed in the results found that there is a dubious feeling,

now of pleasure, now of suffering. The factors that most influence the sensation of

pleasure are the rewards and the lifestyle. The quality of life at work is represented by

three items: tourism experience, remuneration and personal fulfillment. With regard to

suffering, it is noted that occupational illnesses, the exhausting rhythm and the

difficulty in reconciling work life with the personnel bring some difficulties for those

who wish to make a career as a flight attendants.

Keywords: Flight attendant; Wordplace; Pleasure / Suffering.

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LISTA DE SIGLAS

ALPA – Airline Pilots Association

ANAC – Agência Nacional de Aviação Civil

CCF – Certificado de Capacidade Física

CEMAL- Centro de Medicina Aeroespacial

CHT – Certificado de Habilitação Técnica

CRM – Corporate Resource Management

DAC - Departamento de Aviação Civil

FIOH – Finnish Institute of Occupational Health

GQVT- Gestão da Qualidade de Vida no Trabalho

ICAO – Internacional Civil Aviation

ICT- Índice de Capacidade para o Trabalho

QVT – Qualidade de Vida no Trabalho

RH – Recursos Humanos

REG – Regulamentação Profissional do Aeronauta

SNA – Sindicato Nacional dos Aeronautas

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 11

1 CONTEXTUALIZAÇÃO DO CAPÍTULO ............................................................. 14

1.1 AVIAÇÃO COMERCIAL E TURISMO ............................................................... 14

1.2 AVIAÇÃO COMERCIAL E COMISSÁRIO DE BORDO: LINHA HISTÓRICA .. 18

1.2.1 Aviação e comissário de bordo no Brasil ................................................. 25

1.3 O CARGO DE COMISSÁRIO DE BORDO ....................................................... 26

2 TRABALHO NO CONTEXTO SOCIAL E ORGANIZACIONAL .......................... 30

2.1 CAPACIDADE PARA O TRABALHO ................................................................. 30

2.2 PRAZER E SOFRIMENTO NO TRABALHO ..................................................... 32

2.3 PATOLOGIAS NO TRABALHO ......................................................................... 38

2.4 QUALIDADE DE VIDA NO TRABALHO ............................................................ 40

3. METODOLOGIA E ANÁLISE DOS RESULTADOS .......................................... 45

3.1 COLETAS DE DADOS ...................................................................................... 45

3.2 RESULTADOS OBTIDOS ................................................................................. 47

3.2.1 Perfil dos respondentes .............................................................................. 47

3.2.2 Motivações, expectativas e reconhecimentos .......................................... 48

3.2.3 Gestão de pessoas na profissão ................................................................ 55

3.2.4 Ambiente de trabalho ................................................................................. 60

3.2.5 Problemas de saúde ................................................................................... 63

3.2.6 O concílio da vida profissional com a pessoal ........................................ 67

CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................. 69

REFERÊNCIAS ..................................................................................................... 72

APÊNDICE ........................................................................................................... 77

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INTRODUÇÃO

A função de comissário de bordo surgiu como uma atividade masculina no

período pré-guerra. Entretanto, logo depois o término da primeira guerra, tornou-se

feminina cuja prevalência se permanece até os dias atuais. As moedas de

pagamento, neste ramo profissional, não é somente o salário base, mas o conjunto

de possibilidades que uma vida longe de casa e de familiares pode oferecer

(MATIAS, 2012).

A ideia de abordar o tema “A Jornada nas nuvens: o olhar dos comissários de

bordo a respeito do ambiente de trabalho” surgiu como um interesse da autora em

pesquisar e conhecer o cotidiano dessa profissão, com a finalidade de averiguar se é

mesmo essa carreira que gostaria de seguir profissionalmente, ou seja, no primeiro

momento, essa pesquisa possuiu um caráter pessoal.

A autora teve o desejo de fazer um estudo que englobasse quatro áreas do

conhecimento que gosta muito de estudar: turismo, gestão de pessoas, psicologia

organizacional e a profissão de comissário de bordo. Então, pensando em um

assunto que envolvesse essas quatro vertentes, chegou-se a este tema. Pesquisando sobre o assunto, percebeu-se que o estudo terá uma boa discussão no

meio acadêmico, pois, a temática que envolve ambiente de trabalho, sofrimento do

trabalhador, motivação, formação dos profissionais e direitos trabalhistas está

ganhando repercussão cada vez maior no mundo. Neste sentido, verificou-se a

necessidade de pesquisas mais atuais que envolvam funcionários do setor de

aviação, mais especificamente os comissários de bordo.

A importância de debater e analisar a satisfação, correlacionando com a

qualidade vida no trabalho dos comissários de bordo, é para avaliar quais as

situações existentes no meio que eles estão inseridos podem gerar o sofrimento e

desmotivação, prejudicando o alcance de resultados. Isso possibilita aos gestores

entender que a qualidade de vida no trabalho é oriunda da satisfação e motivação de

seus funcionários (ANTUNES, 2006).

O prazer associado à qualidade de vida no trabalho é uma temática

contextualizada por autores e organizações que procuram se manter competitivas no

mercado cada vez mais globalizado (ANTUNES, 2006).

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Com o aparecimento de companhias aéreas com preços mais atraentes, a

vertente do atendimento ao cliente torna-se um diferencial para selecionar a

empresa que se deseja voar.

Antunes (2006) considera que o ser humano é o algo diferenciador, é o

elemento mais importante no funcionamento do negócio. Partindo deste

pressuposto, a empresa só terá a satisfação do cliente se os seus colaboradores

estiverem motivados. De acordo com a autora, o nível baixo de felicidade e a má

vontade do trabalhador interferem no resultado final do serviço, fazendo que seja

aumentado o descontentamento do consumidor. A partir deste ponto de vista, a

qualidade de vida no trabalho passa a ser algo relacionado à competitividade.

Para a sociedade, a profissão de comissário de bordo proporciona aos seus

adeptos a possibilidade de “morar nas nuvens”, o domínio de idiomas, conhecer

várias localidades e culturas, hospedar-se em bons hotéis e ser elegante de acordo

com os padrões estéticos exigidos pelo setor da aviação. É uma atividade que

possui um caráter libertário, pois os seus praticantes podem ir e vir continuamente.

Porém, o que é de desconhecimento de muitos é que devido ao tempo de voo, à

dificuldade em conciliar a vida profissional com a pessoal e a falta de rotina, os

comissários de bordo podem, eventualmente, sofrer alguns problemas de saúde,

acarretando na desmotivação para exercer a sua função. Portanto, partindo dessa

presunção, o objetivo geral deste trabalho consiste em analisar qual a percepção

que os comissários de bordos possuem em relação ao ambiente e as condições de

trabalhos proporcionados no setor da aviação. Assim, foram traçados os seguintes objetivos específicos:

Relatar, brevemente, a trajetória de inserção dos profissionais no setor da aviação.

Discutir, na visão dos comissários, como é o ambiente e a rotina de trabalho

desses profissionais.

Identificar fatores de prazer e sofrimento relacionados a carreira de

comissário de bordo

Esta pesquisa é de natureza qualitativa exploratória e foi dividida em duas

etapas. A primeira constitui-se de uma revisão bibliográfica a respeito do assunto. A

segunda foi uma pesquisa de campo realizada com os comissários de bordo.

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Este estudo se estrutura em três capítulos. O primeiro apresenta o setor de

aviação comercial e sua importância para o desenvolvimento do turismo, trazendo

uma contextualização histórica desse setor e da profissão de comissário de bordo no

Brasil e no mundo. Além disso, é relatado o processo de formação do profissional e

as suas funções.

O segundo capítulo aborda os principais conceitos da psicodinâmica do

trabalho como organização do trabalho, estratégias coletivas de defesa, vivências de

prazer, sofrimento criativo e patogênico, subjetividade, inteligência prática,

ressonância simbólica, mobilização subjetiva, espaço de discussão, trabalho real e

trabalho vivo, reconhecimento, cooperação, capacidade para o trabalho, estresse e

patologia no trabalho, entre outros. Além disso, apresenta os principais pontos

responsáveis para qualidade de vida no trabalho, usando como base o modelo

teórico de Walton.

O terceiro capítulo foi compreendido em duas partes: a primeira expõe os

procedimentos metodológicos adotados para a realização desta pesquisa e a

segunda parte compreende a análise dos dados coletados.

Por fim, as considerações finais do trabalho, a partir da análise e reflexão das

informações obtidas, além de sugestões e apontamentos futuros para o incentivo de

novas pesquisas que envolvam a temática.

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1. CONTEXTUALIZAÇÃO DO CAPÍTULO

Este capítulo procura situar cronologicamente a história da aviação comercial

focando na criação e desenvolvimento da função de comissário de bordo, a fim de

familiarizar o leitor com o tema.

No primeiro momento, será abordado o desenvolvimento da aviação

comercial, ressaltando sua importância para o fomento do turismo no mundo. Além

disso, destaca-se o papel do departamento de gestão de pessoas como um fator

fundamental para a manutenção e consolidação da companhia aérea no mercado.

Em seguida, discorre-se sobre a história da profissão no mundo e Brasil citando as

evoluções e mudanças vivenciadas pela função de comissário de bordo ao decorrer

dos anos.

Por fim, é mencionado qual é o papel do comissário de bordo nos dias atuais,

apontando as exigências do cargo e descrevendo o processo de formação da

profissão.

1.1 AVIAÇÃO COMERCIAL E TURISMO

O transporte aéreo foi essencial para o desenvolvimento do turismo, pois

auxiliou na diminuição das barreiras geográficas e das distâncias, fomentando

assim, a aproximação de destinos turísticos potenciais em escala global. Além disso,

é considerado o meio de transporte mais seguro e rápido (ANJOS, 2014).

Com a formação de empresas turísticas e avanços tecnológicos nos meios de

transportes, as viagens passaram a ser realizadas com mais frequência. Ademais, a

redução na carga horária de trabalho após a segunda guerra mundial, também

motivou o aumento de viagens, pois as pessoas começaram a ter mais tempo livre

(PALHARES, 2002).

Para atender às necessidades das pessoas de realizar deslocamentos em

grandes distâncias de maneira mais rápida e eficaz, surgiu a aviação comercial.

Após a segunda guerra mundial, muitos trechos que eram feitos por navios e trens

foram substituídos por aviões, além do mais, esse tipo de viagem representava

glamour e status.

Os aviões foram responsáveis por possibilitar o acesso rápido e seguro aos quatro cantos do mundo, principalmente em função de utilizar o ar como via

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de transporte, sobrepujando barreiras geográficas às velocidades em torno de 900 km/h, o que torna possível, viagens de longas distâncias em algumas horas (PALHARES, 2002, p.38).

Fuster (1971) apud Melo e Tomé (2010) mencionam os quantitativos que

permitem analisar e comparar a evolução do número de pessoas que realizavam

viagens que atravessavam oceanos por meios de aviões e navios, entre os anos de

1930 e 1968. (Tabela 1)

Tabela 1: Evolução e decréscimo de passageiros em transporte marítimo e aéreo

ANO PASSAGEIROS PASSAGEIROS

VIA MARÍTIMA VIA AÉREA 1930 360.000 - 1952 194.000 138.000 1954 220.000 200.000 1955 214.000 268.000 1963 788.000 2.863.000 1968 375.000 5.258.000

Fonte: Fuster, 1971, p.32

Fazendo menção à análise da evolução feita por Fuster, Anjos (2014, p.12)

afirma que “em um relativo curto período de tempo, o transporte aéreo no mundo

cresceu muito em importância, com uma rápida e crescente quantidade no número de

pessoas usando aeronaves para trabalho e viagens de lazer”. Atualmente o número

de passageiros que utilizam o transporte aéreo é muito superior ao marítimo, fato

decorrido da redução dos valores de passagem aérea, permitindo maior

popularização deste tipo de transporte.

Após o término da segunda guerra mundial, os países se adequaram a aviação

comercial, fazendo uso de aeronaves maiores, mais confortáveis e modernas, e

também, construindo bases aéreas e aeroportos. Além disso, devido ao

acontecimento da época, tinham mais engenheiros e pilotos disponíveis para

exercerem os cargos (MELO, TOMÉ, 2010).

A aviação comercial foi essencial para o desenvolvimento do turismo, além de

diminuir distâncias entre as fronteiras, proporcionou que os países pudessem ter uma

relação econômica e diplomática mais próxima; acarretou na instalação de cadeias

hoteleiras nos países, promovendo destinos que se enquadram em rotas aéreas

internacionais e nacionais; gerou grande fonte de renda para o setor turístico

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por causa do aumento da demanda de passageiros, auxiliando no crescimento das

cidades, criando a infraestrutura necessária e colaborando, assim, para o

fortalecimento e criação de grandes destinos turísticos, possibilitou na criação de

empregos formais e informais, tanto como força de trabalho para as companhias

aéreas e no setor de serviços, entre outros benefícios (ANJOS, 2014).

Nos últimos anos, com o aumento de passageiros cada vez mais exigentes e

críticos, notou-se um acirramento da competitividade no setor de transporte aéreo,

fato que acarretou mudanças na dinâmica de mercado, impulsionando as empresas

a investirem em novas estratégias de negócio, de modo a se manterem bem

posicionadas. Uma ferramenta importante que as empresas aéreas adotaram é a

gestão estratégicas de pessoas, que visa alinhar as ações de recursos humanos aos

objetivos da empresa. A Gestão de Pessoas passou a ser mais valorizada, já que o

capital intelectual humano passou a ser reconhecido como grande diferencial das

empresas (CHIAVENATO, 1999).

Segundo Buren e Leona (1999) o capital humano é o um conjunto de fatores

compostos na personalidade de cada indivíduo, são eles: conhecimento,

habilidades, experiências individuais e criatividade. Além disso, há o capital social no

qual é definido pelos autores como um recurso que reflete o caráter das relações

existentes na organização, decorrente da orientação coletiva para alcançar os

resultados e a confiança compartilhada dos membros, facilitando o aprendizado

coletivo.

O capital social da organização, associado ao capital humano, compõe o

capital organizacional (BUREN, LEONA, 1999).

O capital organizacional é constituído pela cultura e sistemas organizacionais;

a imagem da empresa no mercado e de seus serviços e produtos; processo de

produção; direitos de propriedade intelectual entre outros ativos. O capital social

organizacional é subordinado ao capital humano, pois as relações sociais e

confiança mútua, bases para o aprendizado coletivo depende da equipe de pessoas

presentes na companhia. Portanto, o capital social humano e o capital

organizacional são ativos estratégicos capazes de promover a vantagem competitiva

sustentável (TEIXEIRA, ZACCARELLI, 2008).

Segundo Lima (1999), o grande diferencial hoje observado nas empresas

prestadoras de serviços é a qualidade de atendimento ao cliente. Nos serviços de

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transportes aéreos o atendimento ao cliente parece ter sido detectado, em nível

mundial, como fator relevante na diferenciação de uma empresa para outra.

Para os autores Berry e Parassuramann (1992) apud Lima (1999), o fator que

distingue uma empresa aérea das demais é a atitude e a postura dos funcionários

que trabalham na linha de frente, haja vista que todas, de um modo geral, utilizam os

mesmos tipos de aviões, voam para os mesmos aeroportos e oferecem serviços

agregados bastante similares. Portanto, analisando a percepção dos autores, o

profissional que realiza a função de comissário é importante para o desenvolvimento

e sucesso da companhia aérea no mercado, pois o critério de escolha de muitos

clientes é o tipo de serviço de bordo e a maneira de como ele é oferecido.

De acordo com Pimenta (2013), a educação do trabalhador é um instrumento

responsável por fidelizar e proporcionar uma memória positiva no cliente, pois

quando o funcionário possui uma qualificação direcionada à isso, ele adquire uma

consciência de que o seu atendimento é importante para a imagem da empresa,

estando ciente que futuramente pode ser recompensado e reconhecido pelo seu

desempenho no trabalho.

O setor de serviço em turismo possui diversos potenciais que podem ser

devidamente desfrutados. Teixeira e Zacarelli (2008) mencionam que a dimensão

intangível no qual se caracteriza pela forma de como o cliente é atendido, seja por

meio do discurso ou da comunicação não verbal - os gestos, a postura, as

expressões faciais - são essenciais para a consolidação da empresa no mercado.

Além disso, o fato do comissário de bordo ter uma proximidade direta com o cliente,

demanda a ele mais responsabilidade e comprometimento em evitar erros, pois

estes podem ser identificados imediatamente.

Para Pimenta (2013) depois que o serviço é realizado de maneira malfeita,

não há a possibilidade de voltar no tempo para refazê-lo e consertá-lo. Portanto,

destina-se ao profissional uma grande responsabilidade.

De acordo com Pimenta (2013) a qualidade pessoal no qual é denominada

pelo autocontrole, flexibilidade, trato pessoal e social, polidez, empatia e

receptividade são características necessárias e desejadas que o profissional da área

de turismo que trabalha na linha de frente deve apresentar, pois são consideradas

premissas importantes no qual proporciona a consolidação da empresa no mercado.

Portanto, é importante que a companhia aérea selecione profissionais que tenham

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essas características pessoais e uma inteligência emocional para ter êxito na

qualidade do seu serviço. Sendo assim, definir o perfil do profissional adequado é

uma ferramenta primordial para a qualidade do serviço prestado.

Além disso, quando se está diante de uma empresa de serviços, no caso do

turismo, os tópicos de treinamento, desenvolvimento, carreira, benefícios,

remuneração, motivação, comunicação, liderança, trabalho em equipe e

reciprocidade, exercem um fator essencial no resultado das atividades junto aos

clientes internos e externos (PIMENTA, 2003)

Dejours (2007) aborda que o trabalhador quando não se sente reconhecido

pelo seu trabalho e o seu potencial é desvalorizado, tem dificuldades em

desempenhar a sua função com eficácia e motivação.

Após relatar sobre a importância da aviação comercial para o desenvolvimento do

turismo, além de destacar a importância do capital humano nas empresas aéreas, a

próxima seção será destinada a tratar brevemente sobre alguns aspectos históricos

da aviação comercial.

1.2 AVIAÇÃO COMERCIAL E COMISSÁRIO DE BORDO: LINHA HISTÓRICA

A aviação comercial, nos seus primeiros anos, era direcionada à realização de

voos que possuíam somente o intuito de transportar cargas, principalmente malotes

de correios. Além disso, muitas aeronaves foram utilizadas durante a primeira guerra

mundial, sendo adaptadas para os possíveis combates (NERY, 2009).

O trem era o meio de transporte mais confortável e ágil, por isso, os passageiros o

preferiam. As aeronaves não possuíam uma estrutura adequada para carregar

pessoas, pois o ambiente não tinha pressurização ou isolamento acústico (NERY,

2009).

As pessoas que optavam em viajar nos aviões, naquele período, ficavam em

cabines desconfortantes, em biplanos feitos de madeira e tecidos. Além disso,

viajavam de capacetes, paraquedas e óculos para proteger os olhos. Ademais, era

necessário utilizar algodão nos ouvidos com a finalidade de diminuir o efeito do ruído

do motor e mastigar chicletes para abrir os canais auditivos, bloqueados por causa da

atitude. Geralmente, devido à extremidade (calor e frio) de temperatura sentiam

enjoos (NERY, 2009).

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Quando a aviação comercial começou a operar não existia serviço de bordo.

Era obrigatório que todos os viajantes se pesassem com o intuito do piloto calcular o

peso e o equilíbrio da aeronave antes de decolar. Não havia poltronas, então os

passageiros sentavam nos malotes de correspondências (NERY, 2009).

No ano de 1922, a empresa Britain´s Daimler Airways, contratou os cabin

boys. Esse termo era destinado aos primeiros comissários de bordo. Naquela época,

não havendo serviços de bordo, eles eram empregados para realizar as seguintes

funções: pesar e carregar os malotes de correio e a bagagem dos passageiros, fazer

check-in e oferecer apoio às pessoas durante o voo (MATIAS, 2012).

De acordo com Fuscher e Garvey (2009) apud Nery (2009) a aviação era para

homens, pois era visto como um serviço sujo, audacioso e às vezes perigoso, e na

época uma pessoa “precavida” julgava as mulheres, alegando que voar não era uma

tarefa feminina.

Para Whitelegg (2007) no início do século XX, mulheres pilotando aviões

eram apresentadas como aberrações em circos e parques de diversões, e foi

somente com os voos de Amelia Earhart, no final da década de 20, que a sociedade

começou a ver as aviadoras com olhos menos condenadores.

Em 15 de maio de 1930, uma enfermeira formada e que tinha ideias

vanguardistas naquela época, chamada Ellen Church, candidatou-se a uma vaga de

emprego oferecida pela Boeing Air Transport1, a precursora da United Airlines. O

cargo pretendido era a versão feminina do “cabin boy”. Ela foi a primeira comissária

de bordo de que se tem notícia (NERY, 2009).

Ellen Church foi a responsável pela “criação” da profissão de comissário de

bordo, em 1930. Ela era uma enfermeira apaixonada pela aviação. Portanto, já que

naquela época uma mulher não podia pilotar um avião, a mesma reivindicou e

sugeriu à Boeing Air Transport ¹ que colocasse enfermeiras a bordo de aviões para

cuidar da saúde e segurança dos passageiros durante a viagem (PIMENTEL, 2006).

Impossibilitada de pilotar por ser mulher, propôs ao gerente de Boeing Air Transport que habilitasse enfermeiras, para que as mesmas fossem responsáveis pela segurança e conforto dos passageiros durante o voo. A ideia foi tão bem-vinda, que além dela foram contratadas mais sete “enfermeiras registradas (FLIGHTLOG, 2003)

1 Empresa aérea americana fundada em 1917. Fonte: Wikipédia.

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A sugestão de Ellen Chuch foi bem-sucedida nos anos 30, pois devido à

simbologia de fragilidade que as mulheres apresentavam na época, ter uma figura

feminina a bordo representava uma sensação de segurança aos passageiros, porque

os mesmos vinculavam a presença delas dentro de uma aeronave a algo não perigoso

(PIMENTEL, 2006).

Se aquela moça estava lá, e sendo ela mulher e frágil, então voar seria bom para qualquer pessoa. Talvez, venha daí a origem da afirmação de que o avião é o transporte mais seguro do mundo, embora este aspecto atualmente esteja intimamente relacionado à moderna tecnologia da indústria aeronáutica e ás estatísticas que comparam os índices de acidentes que ocorrem entre os diversos meios de transporte (PIMENTEL, 2006, p.7).

Os critérios de seleção, iniciados pela Boeing Air Transport e seguidos pelas

demais empresas, ordenava que as comissárias contratadas na época deveriam ter

formação em enfermagem, pois esta exigência tinha o intuito de mostrar as pessoas

que dentro de uma aeronave teria profissionais com qualificações e conhecimentos

necessários para cuidar dos passageiros em casos de emergência. Este, porém, não

era a função mais essencial que a profissão representava na época. Muito mais do

que divulgar uma empresa, a figura de uma comissária de bordo tinha como objetivo

principal, como já mencionado, assegurar que o avião era um meio de transporte

seguro.

Aparentemente as companhias se favoreciam muito mais, e por isto preferiam ter profissionais que atendessem ao imaginário social, que simbolizassem a aventura, a liberdade o requinte e a beleza a ter pessoas preparadas tecnicamente para o desempenho de sua real e original função - a segurança (PIMENTEL, 2006, p.7).

Além disso, naquele período, as candidatas deveriam ser solteiras, ter no

máximo 25 anos de idade, altura máxima de 1,60 m e peso máximo de 52 quilos. Os

salários iniciais eram baixos (WHITELEGG, 2007 apud OMELIA e WALDOCK,

2006).

A título de ilustração, o presidente da Boeing Air Transport decretou que todas

as comissárias da época fossem solteiras. Esta exigência foi determinada devido a

uma ligação realizada por um marido de uma das funcionárias, pedindo informações

a respeito da esposa, pois ela não tinha regressado ao seu lar. Portanto, com o

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intuito de impedir o recebimento de telefonemas com este teor, ele determinou que a

empresa deveria exigir o celibato das profissionais (NERY, 2009).

Whitelegg (2007) aborda que as exigências físicas, como peso e altura,

justificavam- se pelas dimensões da cabine de passageiros, pois eram muito baixas

e estreitas. Além disso, proporcionais ao tamanho das aeronaves que eram

pequenas, e pela necessidade de controlar o peso dos objetos e pessoas

embarcadas, essencial para realizar os cálculos para decolar e voar.

Pimentel (2006, p.7) cita que “algumas companhias aéreas exploravam suas

comissárias semeando a mensagem de que eram mulheres jovens, disponíveis, ou a

procura de um marido.” As profissionais que conseguiam um matrimônio ou ficavam

grávidas eram demitidas do cargo.

Nos anos 30, as comissárias tinham diversas obrigações. Além da

responsabilidade de servir refeições e de atender e receber, elas deveriam parafusar

as poltronas, carregar baldes de combustível até a aeronave, pesar os passageiros e

as suas bagagens, limpar o chão do banheiro, engraxar os sapatos dos viajantes,

impedir que abrissem a porta de saída de emergência por engano, entre outras

atividades. Ademais, se houvesse um pouso forçado em uma pastagem, ajudavam a

derrubar cercas para que o avião pudesse decolar com segurança. Ao final do voo

ajudavam a empurrar o avião até o hangar, antes de voltarem para casa (MATIAS,

2012).

No período da segunda guerra mundial, na década de 40, as companhias

aéreas começaram a recrutar e selecionar mulheres que não tinham curso superior

em enfermagem. Pois, muitas enfermeiras foram chamadas para cuidar de feridos

durante o conflito. Segundo Whitelegg (2007) apud Omelia e Waldock (2006) esse

critério migrou para a exigência mais abrangente de um diploma universitário, e as

empresas passaram a incluir cuidados de enfermagem no currículo dos seus cursos

de formação.

Este fato, não possibilitou que o simbolismo da profissão de comissário de

bordo, que remetia a obrigatoriedade de ter uma imagem elegante e com um

comportamento impecável fosse mudada, pois esse simbolismo representava a

identidade da empresa.

No ano de 1945, a aeromoça Ada Brown exigiu melhores condições de

trabalho, salários mais dignos e diminuição nas jornadas de voo. Naquele período

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havia uma exploração demasiada dos profissionais, acarretando na alta rotatividade

da função. Ela foi a responsável pela criação da primeira associação das aeromoças

no qual se tornou uma divisão da Air Line Pilots Association (ALPA)2.

Nery (2009), descreve que Ada Brown, em 1945, dirigiu-se à diretoria da

companhia aérea que a empregava, tendo o aval de todas as suas companheiras de

profissão, com a finalidade de exigir melhores condições trabalhistas e de qualidade

de vida. Ela era uma comissária que possuía ideais vanguardistas na época.

Somente em 1946, foi negociado e assinado o primeiro contato oficial entre a

“associação” e a United Airlines, onde constava aumento de salário, aumento das

diárias para refeição, acesso ao prontuário profissional e, principalmente, restrição

no número de horas voadas por mês. Esta última conquista pautava-se

simplesmente no cansaço físico sentido pelos tripulantes, e evitava que as

empresas cometessem excessos, pois ainda não se tinha conhecimento suficiente

sobre qual seria o tipo de influência que o voo poderia trazer para o organismo

humano (PIMENTEL, 2006, p. 9).

No ano de 1946 as reivindicações das comissárias de bordo foram atendidas,

sendo assinado o primeiro contrato oficial entre a associação e a United Airlines.

Conseguiram diminuir o tempo de voo, acessar o prontuário profissional e aumentar

os salários e o período de refeições. De acordo com Pimentel (2006) a principal

indignação era o cansaço físico que a função proporcionava aos profissionais.

Portanto, por causa disso, procuraram rever essas questões com receio de que as

companhias aéreas abusassem na carga horária de trabalho e nos possíveis efeitos

e danos na saúde ocasionada pela rotina.

Whitelegg (2007) utiliza o termo space out para se referir e representar como

os comissários, principalmente as mulheres que exerciam o cargo, usavam o

emprego para obter “remuneração espacial”3 em oposição à “remuneração

financeira”. O autor declara que a profissão teve três fases de space out,

apresentando premissas diferenciadas.

A primeira fase foi denominada predestinação. Ela começou na década de 30 e

foi até o início da segunda guerra mundial. Neste período, as comissárias eram

oriundas da classe média. A profissão era vista como uma oportunidade de viajar com

um intuito de sair de casa e satisfazer o desejo de voar. Para essas mulheres, o fato de

2 A ALPA é a maior associação de pilotos de linhas aéreas do mundo. Fonte: Site da Instituição.

3 Remuneração espacial é o termo utilizado para definir a recompensa oriunda do estilo de vida proporcionado pela profissão. O fato de estar sempre voando é considerada uma remuneração.

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estar dentro de uma aeronave viajando e ter uma sensação de liberdade já eram uma

forma de remuneração. Geralmente, exerciam a atividade no máximo por um ano.

Já a segunda fase, nomeada de destinação, presente no início dos anos 40 até o

início da década de 70 tinha como o principal fascínio pelo estilo de vida exótico. Nessa

época, a profissão era vista como uma atividade atraente para as mulheres, pois

possibilitava que elas tivessem experiências espaciais no qual remetia a algo libertador e

flexível. Porém, o simbolismo glamoroso da profissão era ilusório, porque era um

trabalho cansativo, desgastante emocionalmente e desvalorizado (WHITELEGG, 2007).

Nos anos 50, o glamour da profissão teve uma maior consolidação com o

surgimento dos jatos, aumentando assim o número de destinos e viagens nacionais e

internacionais. Nesta fase, as mulheres viam a profissão como uma atividade

temporária, como uma oportunidade de viajar e conhecer o mundo, no período

compreendido entre o término da faculdade e antes do casamento. A remuneração

espacial vinha dos destinos oferecidos. Era comum, permanecer em média 2 anos na

função (WHITELEGG, 2007).

É nesse período que a imagem da comissária de bordo remetia a um simbolismo

de glamour e de “cartões de visitas”. As empresas de aviação usavam as suas

funcionárias para transmitir uma identidade e uma visão positiva aos seus clientes.

Deste modo, exigiam grau universitário, juventude e beleza física (NERY, 2009). De acordo com Whitelegg (2007), a curta permanência dos comissários no cargo era

algo vantajoso para as companhias aéreas, pois era uma maneira de não lidar com

funcionários experientes e com tempo de empresas suficientes para reivindicar

melhores condições de trabalho e salário.

Por fim, a terceira fase, pós – destinação, iniciou-se na década de 70 e pendura

até os dias atuais. Nesse período, a profissão não é mais vista como uma atividade

temporária e sim como uma carreira. A remuneração espacial, nessa fase, provém do

entendimento sobre o controle em que a pessoa proporciona a sua vida.

De acordo com Whitelegg (2007), quanto mais tempo exercendo a profissão

na empresa, mais vantajoso é para o comissário, porque os mais antigos possuem

mais liberdade em eleger os dias de folgas e trajetos antes dos novatos, podendo

assim, organizar os seus horários de acordo com os seus interesses pessoais.

Stein (2006) afirma que esse período foi marcado pela redução da

glamourização da profissão, fato que aconteceu devido à elevação do valor do preço

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do petróleo, acarretando na desregulamentação do setor aéreo, no aumento da

competitividade entre as empresas gerando diversas promoções e reflexos nos

preços das passagens.

Essas fases representam as mudanças que foram sofridas pela imagem da

comissária de bordo. Na primeira fase, do space out a profissional era vista como

uma futura esposa e mãe em treinamento no qual as publicidades utilizavam em

suas propagandas a ilustração de uma jovem servindo refeições aos passageiros,

cuidando de crianças e dando peças como travesseiros e cobertores.

Já a segunda fase a imagem da comissária de bordo remetia à uma mulher

disponível sexualmente, livre para ter relacionamentos com os clientes,

acrescentado ao status de glamour. Porém, a representação da imagem da

comissária de bordo como uma figura sexual foi criticada nas décadas de 60 e 70

pelos movimentos de direitos civis e femininos.

De acordo com Whitelegg (2007) as companhias aéreas estimularam a volta

dos comissários de bordo na segunda fase do space out, para que assim, garantirem

a alta rotatividade de funcionários e consequentes reflexos nos salários e na luta por

direitos trabalhistas.

Desde o início da profissão, a publicidade remetia ao fato que a função de

comissário de bordo fosse atrelada a servir, especialmente as atividades

domésticas.

Para Nery (2009), a divulgação publicitária ocasionou na grande de demanda

de mulheres que exercem a profissão. Contudo, independente das fases do space

out, a imagem do comissário de bordo não é representada em nenhum momento

pela a sua função original estabelecida de fato: responsáveis pela segurança dos

passageiros durante o voo.

O público vê regularmente os comissários desempenhando tarefas ligadas ao atendimento dos passageiros, mas frequentemente seu papel fundamental na segurança de voo não é reconhecido. O comissário parece ser hoje uma espécie de trabalhador invisível, cujo sorriso de boas-vindas não costuma ser retribuído, e que é solenemente ignorado ao transmitir às instruções de segurança de pré - voo (NERY, 2009, p.10).

Nery (2009) conta que as primeiras comissárias de bordo retratavam imagem

de uma mulher independente e elegante, ao contrário dos dias de hoje. Atualmente,

está direcionada ao rápido e prático, e não à magreza e elegância como

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antigamente. Este fato proporcionou que as escolas de formação incluíssem aulas

de etiquetas no currículo, com o intuito de proporcionar uma noção de etiqueta às

estudantes para que elas pudessem aprender a ter uma postura elegante e formal.

1.2.1 Aviação e comissários de bordo no Brasil

No Brasil, no ano de 1927 ocorreu o primeiro voo da Varig entre Porto Alegre

até Pelotas. Este fato foi o marco para o início da aviação comercial no país. Porém,

devido à aquisição de aviões americanos de guerra excedente que a atividade

passou a ser mais consolidada, logo depois ao término da primeira guerra mundial.

Segundo Pereira (1995) em 22 de abril de 1933, seis anos depois, o governo

brasileiro criou o Departamento de Aeronáutica Civil (DAC), subordinado ao extinto

Ministério da Viação e Obras Públicas, objetivando organizar definitivamente os

serviços de navegação aérea.

No Brasil, no ano de 1922, Thereza de Marzo realizou o seu primeiro voo

solo, vencendo todos os preconceitos e críticas da época. Sendo assim, a primeira

vez que a aviação brasileira teve uma presença feminina (NERY, 2009).

Embora não haja registro claro de quando as mulheres começaram a ser

aceitas como comissárias de bordo no Brasil, é razoável supor que tenham

começado a voar na década de 1950, durante a segunda fase de space out, mas

segunda fase à brasileira, com uma boa dose de space out da primeira fase.

(ABDALLAH; ROTHMAN, 2008).

Segundo Pereira (1995). O crescimento do número de passageiros

possibilitou a ascensão dos homens na profissão no qual a função foi denominada

“aeromoço”.

Segundo o autor, não tinha uma demanda feminina satisfatória para atender

todos os voos, portanto, foi necessária a contratação de indivíduos do sexo

masculino para desempenhar a função.

No Brasil, o início da profissão foi marcado pela praticidade e pela necessidade de atender às condições físicas que envolvam a prática de voar. Por não haver aqui no país uma infraestrutura com profissionais preparados para desempenhar cada uma das funções necessárias à descolagem de uma aeronave (PIMENTEL, 2006, p. 8).

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Opondo-se às intenções americanas, no Brasil o surgimento da função não foi

atrelada à sensualidade e aos cuidados com os passageiros. Segundo Pimentel

(2006) não existem registros bibliográficos informando a respeito desse modelo,

porém provavelmente, é algo que era mantido e ainda se mantém. A construção de

aeroportos e a modernização das máquinas fez com que aumentasse a contratação

de pessoas para vários setores. Além disso, segunda a autora, a expansão da

quantidade de viajantes e a proliferação de companhias áreas fomentaram a

utilização da imagem de comissário de bordo como uma ferramenta estratégica de

marketing, usando como padrão as ações realizadas pelas congêneres americanas.

1.3 O CARGO DE COMISSÁRIO DE BORDO.

Comissário de bordo é o auxiliar do comandante, encarregado do

cumprimento das normas relativas à segurança e ao atendimento dos passageiros a

bordo e da guarda de bagagens, documentos, valores e malas postais que lhe

tenham sido confiados; tripulante dos aviões comerciais encarregado de prestar

assistência aos passageiros em trânsito e controlar o movimento de bagagens,

malas postais e carga em geral (BRASIL, 2002).

No momento em que o comissário de bordo está desempenhando a sua

função, dentro da aeronave de transporte aéreo regular, ele é considerado um

tripulante. Já quando se encontra a bordo, mas sem exercer a sua função, é

designado tripulante extra. Além dos comissários, o comandante, o engenheiro de

voo, o copiloto, o navegador, o mecânico de voo, o radioperador de voo e

operadores de equipamentos especiais (em aeronaves homologadas para serviços

aéreos especializados) também são tripulantes (HAHN, 2002).

De acordo com Hahn (2002) quando o comissário está a bordo,

primeiramente, ele é subordinado ao comandante. Logo em seguida, obedece ao

chefe de equipe de comissários e ao comissário supervisor de cabine, este último se

houver. Já em terra é subordinado a esses dois últimos.

O termo tripulação na aviação é definido como o conjunto de tripulantes que

desempenham tarefas durante o voo. Ela pode ser mínima, simples, composta ou de

revezamento (ANAC, 2016).

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A tripulação mínima é definida pelo modelo de aviação, sendo somente

utilizada em voos regionais de instrução, de experiência, de vistoria e traslado. Já a

tripulação simples é formada pela a tripulação simples e pela quantidade necessária

de tripulantes necessários para a efetuação do voo. A tripulação composta é

constituída pela tripulação simples e mais o piloto que está no comando, do

mecânico de voo (quando é exigido pelo equipamento) e o mínimo de 25% do

número de comissários de voo ordenados para uma tripulação simples. Por fim, a

tripulação de revezamento que é constituída pela tripulação simples, acrescida do

piloto em comando, copiloto, mecânico de voo (quando o equipamento exigir) e 50%

do número de comissário de voo exigido para 1 tripulação simples (ANAC, 2016).

A quantidade de comissários de bordo em um voo é estabelecida pelos

seguintes critérios: o número de comissários será estabelecidos pelo total de portas

de emergências ao nível de peso (estabelece em função de segurança de

passageiros), padrão de atendimento a bordo, lugares oferecidos na aeronave

(mínimo de um comissário para cada 50 lugares) e tempo de jornada de trabalho.

(ANAC, 2016)

O Departamento de Aviação Civil (DAC) se houver necessidades, pode

determinar modificações na conjuntura da tripulação. Isso deve ocorrer levando em

consideração a segurança, as características do trajeto e o planejamento que foi

elaborado para o voo. (ANAC, 2016)

Para Hahn (2002) as tripulações denominadas compostas e de revezamento

só podem realizar viagens internacionais atendendo os seguintes pressupostos: em

casos de situações climáticas desfavoráveis ou de trabalhos de manutenção, essa

tripulação atende atrasos que foram ocasionados por esses fatos. Além disso, a

tripulação composta pode realizar voos domésticos que também foram afetados por

condições meteorológicas ruins e reparos de conversação das aeronaves.

A mudança da constituição da tripulação só deve ser feita na origem do voo e

até o limite de três horas contadas a partir da apresentação daquela previamente

escalada (ANAC, 2016).

A escala de trabalho dos comissários de bordo respeita o modelo denominado

regime de rodízio. A determinação para a prestação de serviços, respeitados os

momentos de folgas e os repousos regulamentares, serão feitos mediante (BRASIL,

2002):

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● Escala especial ou de convocação para realização de cursos ou exames; ● Escala, no mínimo semanal, divulgada com antecedência de pelo menos dois

dias para a primeira semana de cada mês, e sete dias para as semanas; ● Subsequentes (para os voos, serviços de reservas, sobreavisos e folga) ou

convocação, por necessidade do serviço.

Para realizar viagens domésticas, é exigido que os comissários de bordo

portem carteira de identidade, licença de voo, certificado de habitação técnica,

certificado de capacidade física. Já em voos internacionais, além dos documentos

citados, é obrigatório o passaporte (com visto de turista e de tripulante) e atestado

de vacinação (ANAC, 2016).

É de responsabilidade do comissário de bordo manter atualizado seu

certificado de habitação técnica e de capacidade física (ANAC, 2016). O International Civil Aviation Organization (ICAO) recomenda que a concessão da

Licença de Comissário de bordo fique sujeita ao atendimento dos requisitos abaixo

(BRASIL, 2002): ● Idade mínima de 18 anos; ● Comprovação de conhecimentos de socorros de urgência, utilização do

equipamento de emergência para salvamento e regulamentos pertinentes ao

desempenho da função a bordo de aeronaves civis; ● Ter concluído com aproveitamento curso reconhecido pelo DAC; ● Aptidão física e mental que satisfaçam os requisitos estabelecidos para a

expedição de um Certificado de Capacidade Física de 2°classe.

Para adquirir qualificação em comissário de bordo, é necessário que o

candidato faça um curso de habilitação que possui uma duração entre três a 8

meses. Geralmente é feito em uma escola preparatória para voos, além disso, o

estudante é responsável pelos custos da sua formação (ANAC, 2016).

Segundo Lima (1999), o exame médico junto ao Ministério da Aeronáutica é

primordial, porque é a primeira licença para trabalhar como comissário de bordo,

sendo três necessárias no total. De acordo com o Comando da Aeronáutica, nos

dias atuais, até o profissional completar 40 anos, os exames deverão ser repetidos

para que sejam atestadas as condições físicas para o exercício da profissão. Depois

que o trabalhador completar 40 anos, os exames passam a ser trimestrais.

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Durante o curso, além das disciplinas teóricas, como meteorologia,

navegação, etiqueta, gastronomia e enologia, há aulas sobre segurança de voo.

Este último possui maior tempo de treinamento e tem a sua carga horária dividida,

entre outros, em módulos de sobrevivência no mar, na selva e combate ao fogo,

todos em partes teóricas e práticas (LIMA, 1999).

No final do curso de formação, por encaminhamento da própria escola, o

candidato passa por exame escrito do DAC. Se aprovado, recebe o segundo dos

três certificados exigidos: a licença de voo. (ANAC, 2016)

Lima (1999) menciona que depois de aprovado no exame teórico do DAC, o

comissário precisa ainda de mais uma licença. Trata-se de habilitação específica

para o avião em que irá trabalhar, o certificado de habilitação técnica (CHT), obtido

normalmente após um treinamento fornecido pela empresa aérea que empregar. A

própria escola de formação pode ministrar também mais este módulo. Este

certificado tem validade de dois anos. Para renovação é necessário que o

profissional faça um novo exame escrito. Cada companhia aérea implementa cursos

de reciclagem, geralmente no mesmo período, com a finalidade de fazer com que os

conhecimentos na formação não sejam esquecidos por desuso.

As companhias aéreas lecionavam os cursos de formação de comissários

para as pessoas que foram aprovadas nos processos seletivos. As empresas tinham

que arcar com despesas de hospedagens em hotéis (quando o candidato não

morava na região do treinamento), uniforme, alimentação, material didático e entre

outros.

Lima (1999) cita que muitos profissionais do setor de treinamento dos cursos

de formação para comissários das companhias aéreas, aproveitaram a demanda

potencial e criaram as suas escolas de formação. Este fato fez com que as

empresas começassem a exigir das pessoas que desejavam seguir a carreira, a

conclusão do curso de formação como pré-requisito para participar da seleção.

Sendo assim, as empresas ficaram livres de despesas decorrentes da formação de

seus comissários.

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2. O TRABALHO NO CONTEXTO SOCIAL E ORGANIZACIONAL

Segundo Dejours (1994), o trabalho representa um status social ou uma

posição que o individuo se encontra perante a sociedade, não sendo somente algo

presente no seu meio de vida. “O trabalho refere-se ao tempo significativo no qual a

pessoa se empenha em atividades que serão realizadoras ou conflituosas. É uma

fonte de interesse, uma causa de fadiga, mas também um meio de desenvolvimento”

(MISTURA, SILVA FILHO, 2010, p.72).

Assim, o trabalho do comissário de bordo e seu contexto organizacional

afetam a saúde do trabalhador, na medida em que podem contribuir para a

construção de identidade, a inclusão social e o sentimento de realização, embora

possam, também, deteriorar sua qualidade de vida (MISTURA, SILVA FILHO 2010).

Partindo dos pressupostos acima, esse capítulo aborda os conceitos que

definem os panoramas que influenciam na posição do funcionário perante a sua

atividade. Discorre-se sobre a capacidade para o trabalho e envelhecimento

funcional; patologias ocasionadas pelo ambiente trabalhista; a relação de prazer e

sofrimento e fatores essenciais para a manutenção da qualidade de vida no trabalho.

2.1 CAPACIDADE PARA O TRABALHO

Segundo Pellegrino (2016), a capacidade para o trabalho consiste na

capacidade que o indivíduo possui para desempenhar o seu trabalho tendo em

consideração o seu estado de saúde, as exigências estabelecidas, suas limitações

psicológicas e físicas, representando uma medida do envelhecimento funcional.

A definição conceitual de capacidade para o trabalho foi proposta pelo Finnish Institute of Occupational Health - Instituto Finlandês de Saúde Ocupacional (FIOH), que após observar o envelhecimento da população trabalhadora, propôs um estudo que tinha com o objetivo de verificar se a aposentadoria por idade em relação ao tipo de trabalho realizado ainda era adequado como critério para aposentadoria. Além disso, também se propôs verificar se outros aspectos como o trabalho, a saúde, a capacidade física, a capacidade para o trabalho e o esforço percebido influenciaram o trabalhador em fase de envelhecimento (PELLEGRINO,2016 p.21).

O conceito de capacidade para o trabalho foi estabelecido a partir deste

estudo. “O quanto o trabalhador está ou estará bem no momento ou num futuro

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próximo e o quanto está apto para fazer seu trabalho com relação às exigências do

trabalho, à saúde e aos recursos mentais” (ILMARINEN, 2001, p. 546).

Para Pellegrino (2016) a contextualização do termo capacidade para o

trabalho refere-se ao processo de interação entre os recursos do homem e seu

trabalho. O autor menciona que as capacidades funcionais, educação, valores,

competência, proatividade, motivação, saúde física, psicológica e mental estão

relacionadas aos recursos provenientes do trabalhador.

“Quando o conjunto desses fatores está relacionado às demandas no trabalho

(física e mental), relações, ambiente de trabalho e gestão, o resultado pode ser

chamado de capacidade para trabalho do indivíduo” (PELLEGRINO, 2016, p. 21).

Para a autora, este é um processo dinâmico que sofre inúmeras mudanças ao longo

da vida de trabalho, principalmente relacionado ao envelhecimento funcional.

De acordo com a Organização Mundial de Saúde, a capacidade para o

trabalho está vinculada diretamente ao processo de envelhecimento. Pellegrino

(2016) afirma que a capacidade funcional será declinada se houver uma combinação

usualmente com o envelhecimento, fazendo com que ocorra uma instabilidade entre

as obrigações no trabalho e as capacidades funcionais.

Tuomi (1997) desenvolveu um modelo de capacidade para o trabalho no qual

realizou um estudo longitudinal entre os anos de 1981 a 1992. Ele analisou a

conexão da capacidade para o trabalho com o nível de saúde de servidores públicos

finlandeses. Esse modelo teve como finalidade averiguar a relação da baixa

capacidade para o trabalho com a alta existência de doenças cardiovasculares e

musculoesqueléticas nos sujeitos que possuem trabalhos que exigem esforços

físicos.

O estudo também mostrou que a capacidade para o trabalho de muitos

trabalhadores finlandeses estava deteriorada precocemente. A diminuição na

capacidade para o trabalho ocasionou no aparecimento de sintomas de doenças e

na redução da capacidade funcional. Além disso, verificou-se que aumentou o

número de aposentadorias por invalidez ou precoce, e também, a mortalidade antes

da idade de se aposentar. Esse resultado pode representar a influência do trabalho

no processo de envelhecimento precoce (TUOMI, 1997).

Costa (2005) aborda que o conceito de capacidade para o trabalho é um

processo dinâmico no qual é transformado ao decorrer da vida por meio dos seus

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componentes, sendo consequência do contato das aptidões pessoais (englobando a

saúde, capacidade funcional, educação, conhecimento e motivação), condições de

trabalho (relações humanas, ambiente, ferramentas e instrumentos de trabalho) e da

sociedade que o trabalhador está inserido.

Fischer (2005) cita que a capacidade para o trabalho possui os seguintes

determinantes:

● Aspectos sócio demográficos: a partir dos 45 anos, devido ao aparecimento

e/ou agravamento de diversos tipos de doenças, a capacidade funcional física

e mental pode começar a se deteriorar;

● Estilo de vida: em que o tabagismo, o consumo excessivo de álcool e a

obesidade estão inversamente associados à capacidade para o trabalho e à

capacidade física, ao contrário da prática de atividade física, por esta ser um

preditor de boa capacidade para o trabalho;

● Saúde: fator que exerce o maior impacto sobre a capacidade para o trabalho,

sendo que a saúde mental está menos relacionada com a capacidade para o

trabalho do que a saúde física;

● Educação e competência: em que a capacidade para o trabalho pode ser

promovida pelo aumento da competência, sendo entendida como as

habilidades e conhecimentos que o trabalhador dispõe para executar seu

trabalho;

Para Pellegrino (2016) é fundamental destacar que o tempo está

correlacionado com capacidade para trabalho, pois quanto maior o período que o

sujeito está exposto às exigências na sua atividade, o envelhecimento funcional será

mais frequente.

2.2 PRAZER E SOFRIMENTO NO TRABALHO

Na década de 1980, o francês, Cristophe Dejours, desenvolveu um estudo

acerca da psicodinâmica no trabalho no qual foi abordada a questão do sofrimento e

prazer no trabalho. De acordo com Dejours, o sofrimento é algo que causa o

adoecimento devido a um ambiente organizacional aversivo. (MISTURA, SILVA

FILHO, 2010).

A psicodinâmica do trabalho no final dos anos 90 revigorou-se como uma

abordagem científica tratando o trabalho como algo essencial para a formação da

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identidade do trabalhador e de inclusão social. A partir dessa conjuntura, o foco do

estudo começou a ser a visão subjetiva das vivências de prazer-sofrimento e a

utilização de artifícios defensivos contra as exigências adversas do trabalho. Seu

objeto de estudo são as relações dinâmicas entre a organização do trabalho e a

saúde mental, não fazendo restrição aos seus efeitos nocivos, mas englobando os

fatos que são favoráveis à construção da saúde. (MISTURA, SILVA FILHO, 2010).

Segundo Dejours (1994) partindo dessa perspectiva, os comportamentos de

prazer-sofrimento são fenômenos dialéticos que, mesmo havendo a predominância

de algum, devem coexistir a ser administrado por quem os vivencia.

Ferreira e Mendes (2001) apud Mistura e Silva Filho (2010) observam que o

contexto de trabalho é um fator de influência na saúde do trabalhador, já que a forma

como seu trabalho é realizado permite que sua atividade seja considerada prazerosa

ou não. Segundo os autores, para a ergonomia do trabalho4, a atividade realizada

faz o papel de mediadora entre o sujeito e o contexto organizacional, tendo como

parâmetro os objetivos a serem cumpridos. Assim, o sujeito que transforma seu meio

também é transformado pelos resultados de seu trabalho.

Os trabalhadores investem sua energia na realização de suas atividades. O custo físico refere-se às exigências corporais em termos de dispêndio fisiológico e biomecânico nas atividades do trabalho; o custo cognitivo refere-se às exigências cognitivas em termos de dispêndio intelectual, sob forma de aprendizagem necessária, de resolução de problemas e de tomada de decisão; e o custo emocional refere-se às exigências afetivas realizadas no contexto do trabalho (MISTURA, SILVA FILHO, 2010, p.73).

A psicodinâmica do trabalho aponta que o sofrimento está presente na vida

humana. Não é somente algo ligado à realidade, mas também a visão subjetiva que

cada indivíduo possui em relação mundo (MISTURA, SILVA FILHO, 2010). De

acordo com Dejours (1994), o sofrimento mobiliza a inteligência humana para resistir

ao real. Quando o trabalhador encontra o equilíbrio emocional e psicológico para

enfrentar os obstáculos, o sofrimento pode ser suportado e tolerado.

O prazer e o sofrimento são sentimentos oriundos de experiências subjetivas

que cada sujeito vivenciou no seu ambiente de trabalho em função do fracasso ou

do sucesso de seus esforços para resolver e lidar com conflitos no meio profissional.

4 A ergonomia é também conhecida como o estudo da relação entre o homem e o seu ambiente

laboral. Podemos dizer que a ergonomia no trabalho oferece ao indivíduo, o conforto adequado e os métodos de prevenção de acidentes e de patologias especificas para cada tipo de atividade executada (DEJOURS, 1994).

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O inconsciente e o pré-consciente de cada pessoa jogam entre si, fazendo

que a sensação de prazer, de sofrimento, de desejo e de saúde mental sejam

estabelecidas e negociadas. (DEJOURS, 1994)

O trabalho será fonte de prazer se tiver sentido para quem o realiza. O prazer

é obtido pelo ganho que se tem no trabalho, como a construção da identidade e a

realização de si mesmo. Também pode surgir pelo sofrimento criativo, pelo exercício

da inteligência prática5, pelo reconhecimento, pela liberdade, pelo orgulho da

atividade em si e pela ressonância simbólica6 (GODOY, 2009).

Ainda é possível vivenciar prazer, mesmo em contextos precarizados, desde

que a organização do trabalho ofereça condições para o trabalhador desenvolver

três importantes ações: mobilização da inteligência prática7, do espaço público da

fala e da cooperação (MENDES, 2007).

O sujeito é ameaçado quando se encontra em uma situação no qual é

destinado a ele realizar uma determinada atividade, e sem conseguir cumpri-la. De

acordo com a psicodinâmica do trabalho, exercer a tarefa de trabalhar é enfrentar o

fracasso. Entretanto, o indivíduo tem a possibilidade de procurar mecanismos para

fazê-la tanto no individual ou no coletivo (DEJOURS, 1994).

O sentimento de sofrimento e prazer pode ser misturado. Quando o

trabalhador está desempenhando a sua função, as sensações de angústia,

incompetência, inutilidade e ineficácia podem ser desenvolvidas. Porém, essas

sensações podem auxiliar na produtividade, desde que o indivíduo esteja motivado a

melhorar o seu trabalho, possibilitando assim, a encontrar uma paixão e uma

felicidade na sua atividade. (GODOY, 2009)

5 A Inteligência Prática está ligada à constituição de uma ação ou de um uso repetido que resulta em um conhecimento ou em uma práxis. É o poder de conquistar aprendizado com as vivências, construindo aptidões funcionais. Ela se distingue da acadêmica, mais voltada para a percepção teórica, e nos ajuda a compreender porque algumas pessoas com um QI elevado não obtêm, apesar disso, o êxito na profissão (GODOY, 2009).

6 Ressonância simbólica é um termo criado por Roger Woolger utilizado para descrever “de que modo os diferentes aspectos do complexo compartilham todos da mesma qualidade emocional, assim como imagens e timbres afetivos” (Woolger). Isso significa que o mesmo complexo pode se apresentar simbolicamente dentro de vários níveis, aspectos ou facetas diferentes conservando a sua natureza. A ressonância simbólica indica a capacidade do psiquismo de produzir associações e representações para indicar experiências, afetos e conflitos inconscientes (GODOY, 2009).

7Tem como umas de suas características a astúcia, pois frequentemente se opõe ao saber

conceitual; é também a intuitiva, porque está enraizada no corpo, ou seja, parte de percepções sensoriais. Dessa forma, "é o trabalho que produz a inteligência e não a inteligência que produz o trabalho" (DEJOURS,1994).

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De acordo com Ferreira e Mendes (2001) apud Mistura e Silva Filho (2010) a

tática para encarar o sofrimento, apesar de estar presente no trabalho, é buscar nas

suas tarefas a diminuição dos desgastantes psicológicos, combatendo o sofrimento,

e possivelmente, buscando mecanismos estratégicos para produzir a sensação de

prazer, tendo em vista ser um fator responsável pela estruturação psicológica do

trabalhador. Partindo dessa conjuntura, é possível compreender se o desempenho

da sua função é significativo ou não, podendo manifestar as suas experiências que

envolvem o prazer e o sofrimento.

A psicodinâmica do trabalho analisa duas vertentes que provocam o

sofrimento no trabalho. A primeira é denominada sofrimento criador no qual

possibilita ao homem usufruir da criatividade e da engenhosidade para resolver

conflitos e problemas no momento que está realizando a atividade. Já a segunda

seria o sofrimento patogênico8, vivenciado pelo sujeito quando a sua relação com o

seu empregador o impede de exercer a sua tarefa (DEJOURS, 1994).

De acordo com Dejours (1994), a dinâmica de reconhecimento tem uma base

voltada para essas duas vertentes: no esforço ao tentar desempenhar o seu trabalho

no qual surge o sentimento de prazer no sujeito por causa do reconhecimento

adquirido, possibilitando assim, a sua realização pessoal. Porém, o sofrimento

patogênico é submetido se não houver esse reconhecimento por parte dos líderes.

Na teoria da psicodinâmica no trabalho, a expressão prazer e sofrimento no trabalho relacionam-se com esse processo dinâmico de transformação de sofrimento em prazer no trabalho. Assim, o trabalho se caracteriza como mais um espaço no qual o sujeito pode transformar a angústia (sofrimento) do não saber, do não sou em conhecimento, em criação, em sentido (prazer) e dessa forma, ao ser reconhecido pelos seus esforços nesta busca, o sujeito estrutura a sua identidade, sua singularidade no mundo (GODOY, 2009, p.33).

Godoy (2009) cita que o reconhecimento é circunstância imprescindível no

desenvolvimento do processo de mobilização subjetiva da inteligência e da

personalidade no trabalho no qual executa uma função essencial na alteração do

sentimento de sofrimento em prazer. O reconhecimento é um elemento importante

para envolvimento subjetivo do funcionário ao trabalho, fazendo que ele encontre o

seu potencial e especialidade na sua atividade.

8 Sofrimento que causa adoecimento e possibilita no aparecimento de doenças (DEJOURS,1994).

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Godoy (2009) diz que esse reconhecimento acontece devido à chance de

acrescentar um fundamento ao sofrimento vivido pelas pessoas que trabalham. No

momento em que o sujeito repara que a qualidade do seu trabalho está sendo

reconhecida, possibilita a ele a achar um sentido, pois mesmo com angústias,

decepções, desânimos, esforços e dúvidas, o indivíduo percebe que a sua

performance no trabalho teve valor.

A cooperação é outro aspecto no trabalho coletivo, que se caracteriza por

permitir visibilidade de ações, confiança, discussão, consenso, deliberação,

participação nas decisões e construção de acordos e regras de trabalho. Para isso,

parte do pressuposto de que a mobilização subjetiva é que conduz o trabalhador

para a cooperação, a solidariedade, a confiança e o engajamento nas discussões do

grupo, com o objetivo de provocar mudanças. A mobilização subjetiva leva à

motivação e à capacidade do trabalhador para participar das discussões coletivas

que visem modificar as regras relacionadas ao conteúdo da tarefa e as relações

socioprofissionais que ocasionam sofrimento (DEJOURS, 1992 apud GODOY,

2009).

De acordo com Godoy (2009) quando os demais compreendem o esforço e o

reconhecem, eles fazem parte da mobilização subjetiva no qual procuram um

significado para o sofrimento no trabalho, transformando-o em prazer.

Quando a qualidade de meu trabalho é reconhecida, também meus esforços, minhas angústias, minhas dúvidas, minhas decepções, meu desânimo adquire sentido. Todo esse sofrimento, portanto, não foi em vão; não somente prestou uma contribuição à organização do trabalho, mas também fez de mim, em compensação, um sujeito diferente daquilo que eu era antes do reconhecimento. (DEJOURS, 1994, p. 34).

A mobilização subjetiva não pode ser prescrita pela organização do trabalho.

Ela é gerada espontaneamente pelas expectativas em relação às realizações

pessoais. Se a dinâmica do reconhecimento está paralisada, o sofrimento não

poderá ser transformado em prazer, pois o trabalhador não encontra sentido em sua

realização. Se ocorrer a ausência de reconhecimento, o homem engaja-se em

estratégias defensivas para evitar a doença mental. Assim, entre o sofrimento e a

doença podem-se intercalar as estratégias defensivas (GODOY, 2009).

Godoy (2009) menciona que a sobrecarga de trabalho, tédio e injustiças na

gestão de pessoas, o desgaste físico e psicológico, a realização de atividades de

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maneira repetida são fatores que podem gerar o sofrimento. “O sofrimento acontece

diante do conflito entre a organização do trabalho e o funcionamento psíquico do

trabalhador” (GODOY, 2009, p. 52). Para a autora, o sofrimento pode ser

neutralizado através de procedimentos criativos e defensivos.

Como há situações em que o trabalhador revela prazer e sofrimento, é possível que esses trabalhadores estejam utilizando mais estratégias criativas, visando transformar a realidade que gera sofrimento, o que se reflete na negação de algum tipo de sofrimento (GODOY, 2009. p 53).

Outra questão em relação à exploração do trabalhador pelo capital está

relacionada à forma de organização do trabalho, pois quanto mais rígido mais

explorado será o trabalhador.

a organização do trabalho é primeiramente, a divisão do trabalho e sua repartição entre os trabalhadores, isto é, a divisão de homens recortando as relações humanas de trabalho. Fracionamento máximo e rigidez intangível da organização científica do trabalho aparecem, então, como as características fundamentais do taylorismo, que engendra mais divisões entre os indivíduos do que pontos de união, confrontando os trabalhadores, um por um, individualmente e na solidão, às violências da produtividade (LUNARDI FILHO, 1996, p. 71).

A organização do trabalho pode ser vista como a expressão da vontade de

outro, na qual o trabalhador age de acordo com a vontade de outro. Este

trabalhador, domesticado e forçado a agir conforme a vontade do outro, encontra-se

diante das injunções da organização do trabalho, sob a direção hierarquizada,

desapropriado de sua competência para realizar o trabalho de acordo com as

determinações apresentadas pela organização. Com isso, resta somente a este

sujeito executar (DEJOURS, 1992 apud GODOY 2009).

Uma organização do trabalho autoritária, rígida e imutável impossibilita o

rearranjo do processo de trabalho pelo trabalhador, conduzindo ao aumento da

carga psíquica (DEJOURS, 1994). O sofrimento começa quando a energia pulsional

não acha descarga no exercício do trabalho. E este se acumula, podendo causar

manifestações no corpo, que responde com perturbações viscerais ou musculares.

(GODOY, 2009)

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2.3 PATOLOGIAS NO TRABALHO

O trabalho humano, quando executado em condições insalubres ou

inseguras, tem efeito direto sobre o bem estar físico e psíquico do homem, motivo

pelo qual muitos pesquisadores e profissionais ligados à questão da saúde e do

trabalho humano estão interessados em investigar as formas mais sutis com que o

trabalho impacta o funcionamento psíquico do individuo. Essas investigações

favorecem a compressão até mesmo de algumas doenças ocupacionais clássicas.

(LIMA, 1999)

De acordo com Dejours (2006) a contextualização da palavra estresse é vaga.

No sentido empírico, é definido equivocamente pela a sensação de mal e ansiedade

por meio de experiência de situações de trabalho qualificadas como estressantes.

Distingue - se entre acontecimentos repentinos e perturbadores que têm um efeito por vezes traumatizante, mas esporádico, e situações permanentes, vividas cotidianamente, que são menos espetaculares, mas extremamente nocivas. (Dejours, 2006. p. 224)

O estresse pode possibilitar no aparecimento de diversas doenças e no

desenvolvimento de sentimento de angústia, depressão, perturbações do sono e da

sexualidade. Algumas organizações cultivam o desempenho o estresse não é

considerado uma doença e sim um sentimento natural do ser humano (DEJOURS,

2006)

Lima (1999) afirma que o estresse surge segundo três naturezas básicas:

física, mentais e situacionais. A física está relacionada ao excesso de trabalho,

pouco descanso e má alimentação. A mental está relacionada aos desejos, medos e

tristeza do dia a dia.

Dejours (1994) cita alguns indicadores responsáveis pelo sofrimento e

estresse no trabalho. Segundo autor, esses fatores promovem no desenvolvimento

de doenças nos trabalhadores.

Medo físico relacionado à fragilidade do corpo quando exposto a determinadas

condições de trabalho. Medo moral, que significa o medo do julgamento dos outros e de não suportar a

situação de pressão e adversidade na qual realiza a tarefa. Tédio por desempenhar tarefas pouco valorizadas.

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Sobrecarga do trabalho, gerando a impressão de que não vai dar conta das

responsabilidades. Ininteligibilidade das decisões organizacionais, que gera falta de referência da

realidade. Ambivalência entre segurança, rentabilidade e qualidade. Conflitos entre valores individuais e organizacionais. Incertezas sobre o futuro da organização e seu próprio futuro. Perda do sentido do trabalho a partir da não compreensão da lógica das

decisões, levando à desprofissionalização. Dúvidas sobre a utilidade social e profissional do seu trabalho. Sentimento de injustiça, reflexo da ingratidão da empresa e das recompensas

sem considerar as competências. Falta de reconhecimento retratado na ausência de retribuição financeira ou moral

e do não reconhecimento do mérito pessoal. Dificuldade de poder dar sua contribuição à sociedade, gerando um sentimento

de inatividade, de inutilidade e de depreciação da sua identidade profissional. Falta de confiança, que produz a negação dos problemas, manifestada em um

sentimento de desordem, de culpabilidade, de vergonha e de fatalidade para lidar

com as situações de trabalho.

Risques (2003) afirma que a profissão de comissário de bordo possui muitas

características e particularidades que a diferem de tantas outras, a começar pela sua

regulamentação, que é bem específica, sua aposentadoria que é especial, o

pagamento de compensação orgânica e doenças próprias da profissão, tais como:

O aeroembolismo, que é a formação desorganizada de bolhas de nitrogênio no

sangue; A hipóxia, que é a baixa concentração de oxigênio nos tecidos; A alteração do ritmo circadiano, que é o ritmo biológico próprio de cada um; O fenômeno do jet lag que ocorre em caso de mudança de fusos horários devido

à falta de sincronia entre nosso relógio biológico interno e os indicadores de

tempo externo; além de outros problemas físicos desta natureza.

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Com todas estas particularidades e problemas causados pelo exercício da

profissão, se faz necessário tomar os devidos cuidados com a qualidade de vida no

trabalho.

Risques (2003) explica que outra característica desta profissão é o trabalho

em turnos alternados, que causam alguns problemas no aparelho digestivo, fadiga

causada por cansaço crônico, dificuldade de memorização, raciocínio e atenção,

exigindo assim mais esforço para a realização de qualquer atividade. Devido a estes

fatores, os riscos de acidente aumentam ainda mais.

Além de todos os problemas físicos já citados, existem também os problemas

psicológicos, tais como: nervosismo, medo, depressão, insegurança problemas

resultantes das condições de trabalho que são oferecidas ao trabalhador e por ser

difícil provar a relação direta com a profissão, acabam não sendo atribuídos à

responsabilidade pelo trabalho, mas, se uma profissão exige uma aposentadoria

especial, significa que as condições de trabalho podem ser tão ruins e suas

consequências tão graves que um profissional poderá se aposentar com 25 anos no

exercício da função para a mulher e 30 anos para o homem (RISQUES, 2003).

Talvez, por estes motivos, não restem dúvidas que a Qualidade de Vida no

Trabalho é um fator importante para qualquer profissão e, principalmente, para

aquela que é considerada insalubre, como ocorre neste caso.

2.4 QUALIDADE DE VIDA NO TRABALHO

A qualidade de vida no trabalho é o maior determinante para manutenção do

bem estar e satisfação social. Vida sem trabalho não tem significado. Assim sendo,

na sociedade contemporânea, o trabalho passou a ocupar um lugar central na vida

do homem, mais especificamente o trabalho organizacional (CHIAVENATO, 1999).

Haddad (2000) cita que não existe uma contextualização consensual a

respeito da qualidade de vida no trabalho, porém há diversas vertentes e

abordagens. Todavia, essa temática geralmente é vinculada ao estilo de vida, à

melhora das condições físicas e psicológicas dos trabalhadores, às políticas de

lazer, à infraestrutura apropriada da empresa, às reivindicações trabalhistas e

ampliações de benefícios.

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De acordo com Haddad (2000), a qualidade de vida no trabalho tem a função

de proporcionar ao trabalhador condições de vida melhores no seu âmbito

profissional, pessoal e social, zelando pelo seu bem-estar.

O modelo de Walton (1973), (figura 1), cita 8 categorias relacionadas à

qualidade de vida no trabalho que são primordiais para o seu alcance.

Figura 1: Modelo de Walter

Categorias

Fatores QVT

Compensação adequada e justa Refere-se à uma remuneração financeira justa. O salário deve ser compatível com o nível de trabalho.

Condições de segurança e saúde no trabalho Para zelar pela saúde dos empregados é fundamental que eles não sejam expostos à uma carga horária de trabalho excessiva e às condições psicológicas e físicas que sejam prejudiciais à saúde.

Oportunidade imediata para a utilização e Para que os trabalhadores possam usar e desenvolvimento da capacidade humana desenvolver suas habilidades e capacidades são necessários: autonomia no trabalho, utilização de múltiplas habilidades, informação e perspectiva de crescimento profissional, realização de tarefas completas e planejamento das atividades.

Oportunidade para crescimento contínuo e É importante que o trabalhador tenha a segurança possibilidade de autodesenvolvimento, aquisiçãodenovosconhecimentose perspectivas de sua aplicação prática, oportunidades de promoções e segurança no emprego.

Integração social na organização É crucial que o ambiente de trabalho seja sem preconceitos, de senso comunitário, fraca estratificação, mobilidade ascendente e franqueza interpessoal. Com esses elementos, haverá um bom nível de integração social.

Constitucionalismo na organização de trabalho São as condutas que definem os direitos e deveres dos trabalhadores. Os aspectos mais significativos abordam a respeito da privacidade, liberdade de expressão e o tratamento justo em todos os assuntos.

Trabalho e o espaço total da vida Na maioria das vezes, o trabalho pode absorver

parte da vida do empregado, pois algumas

pessoas trabalham em período extra ou no seu

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tempo livre. Esse fato pode afetar nos

momentos dedicados à família, ao lazer e à sua

convivência comunitária.

A relevância social da vida no trabalho A organização possui uma responsabilidade social pelos serviços e empregados. A auto estima e a produtividade podem ser afetadas se a empresa agir de forma irresponsável.

. Fonte: Walton 1973.

A qualidade de vida no trabalho é o conjunto das ações de uma empresa que

envolve a implantação de melhorias e inovações gerenciais e tecnológicas no

ambiente de trabalho. A construção da qualidade de vida no trabalho ocorre a partir

do momento em que se olha à empresa e as pessoas como um todo, o que

chamamos de enfoque biopsicossocial. O posicionamento biopsicossocial

representa o fator diferencial para a realização de diagnóstico, campanhas, criação

de serviços e implantação de projetos voltados para a preservação e

desenvolvimento das pessoas, durante o trabalho na empresa (CHIAVENATO,

1999).

A definição de qualidade de vida, no entender de Chiavenato (1999), procura

encaixar o sentimento de respeito profundo pelo trabalhador. De acordo com o autor,

a contextualização da qualidade de vida deve englobar os fatores psicológicos,

físicos presentes no ambiente de trabalho, além disso, envolve os interesses das

empresas quanto aos seus efeitos potenciais sobre a produtividade e a qualidade.

Com a finalidade de obter um bom grau de qualidade e produtividade, as

organizações devem motivar os seus funcionários, participando das atividades que

eles executam e recompensando-os pelas as suas colaborações.

A qualidade de vida no trabalho pode ser melhorada a partir do momento que

a organização usufrua de métodos para medi-la. Segundo Evangelista (2015), a

medição é essencial para a melhoria. Desse modo, a avaliação da satisfação dos

empregados da empresa de maneira sistemática é fundamental, pois o olhar dos

funcionários a respeito do ambiente de trabalho é uma ferramenta fundamental para

verificar quais são os fatores prejudiciais à qualidade de vida, para que assim, possa

rever estratégias, objetivos, processos de trabalho e políticas de recursos humanos,

objetivando a correção de desvios para dar continuidade ao caminho certo da

empresa (EVANGELISTA, 2015).

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A qualidade de vida é um conceito amplo que envolve a administração, a

engenharia, a economia, a psicologia, a sociologia, a ergonomia, a ecologia e

principalmente a saúde que é essencial para preservar a integridade física e mental

do trabalhador e dessa forma garantir a eficiência dos trabalhadores

(EVANGELISTA, 2015).

A constante evolução dos métodos de gestão empresarial, embora tenha

permitido uma maior eficiência na utilização dos recursos produtivos disponíveis,

trouxe uma série de efeitos negativos aos recursos humanos, como a excessiva

especialização do trabalho, a padronização da mão-de-obra e a rigidez das

hierarquias. Em consequência, os trabalhadores insatisfeitos com seu trabalho,

passam a apresentar elevados índices de absenteísmo, rotatividade e acidentes de

trabalho, desenvolvendo assim baixos índices de produtividade e pouca qualidade

dos produtos e serviços (EVANGELISTA, 2015).

A qualidade de vida no trabalho é utilizada como uma ferramenta de indicação

das experiências humanas no local de trabalho é uma forma de mensurar o grau de

satisfação dos indivíduos que desenvolvem as tarefas. Este conceito implica em

profundo respeito pelas pessoas que compõem a organização. Ao se falar de

competitividade organizacional, conjuntamente ao desempenho, sem esquecer-se

da qualidade e da produtividade, todas passam obrigatoriamente pelo programa de

qualidade de vida no trabalho; ou seja, para entender claramente o cliente externo, a

organização não deve de forma alguma ignorar o cliente interno. Logo, para que

possa se satisfazer o consumidor externo, as estruturas organizacionais, necessitam

primeiramente atender as necessidades de seus colaboradores, que são

responsáveis pelo produto e/ou pelos serviços oferecidos (EVANGELISTA, 2015).

A qualidade de vida no trabalho é uma ferramenta que possibilita o ambiente

de trabalho seja mais humanizado.

A Qualidade de vida no Trabalho vem como uma ferramenta que visa aproveitar as habilidades mais exímias dos funcionários, proporcionando aos mesmos um ambiente mais agradável e saudável ao desenvolvimento de suas atividades laborais (EVANGELISTA, 2015, p.52).

O trabalhador necessita alcançar as circunstâncias capazes de assegurar

segurança e, simultaneamente, satisfação em desempenhar o seu trabalho.

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O homem precisa encontrar aí condições capazes de lhe proporcionar um máximo de proteção e, ao mesmo tempo satisfação no trabalho. Mais ainda, o ambiente deve poder cumprir uma finalidade social de educar, criando no homem hábitos de higiene e de ordem que venha a estender ao seu lar. Um ambiente de trabalho é o resultado de um complexo de fatores, materiais ou subjetivos, todos importantes e que, tantas vezes, são mais fáceis de serem entendidos(EVANGELISTA, 2015, p.53).

O ambiente de trabalho apresenta dois tipos de fatores. Eles são nomeados

de fatores principais e secundários. Os fatores principais são compostos pelos

odores, cores, temperatura, vibrações e ruído. Já os fatores secundários são

constituídos pelas relações humanas, estabilidade, remuneração, arquitetura e apoio

social (EVANGELISTA, 2015).

A ligação existente entre a produtividade e a qualidade de vida no trabalho

mostra, conforme explica Evangelista (2015), não ser eficiente em virtude dos

processos gerenciais nos quais seus funcionários estão inseridos, bem como as

organizações podem ter excesso de gasto, não lucram e possuem um demasiado

custo social.

A qualidade de vida é enfatizada na conjuntura biopsicossocial no qual o ser

humano é caracterizado como algo complexo, dinâmico, indissociável, sendo

analisado em uma visão holística.

Essa nova forma de encarar o indivíduo abre um leque de oportunidades de investimento no capital humano, agregando a estes, valores que irão refletir sobre a organização na qual está inserido, assim sendo, é necessário ao gestor a percepção da importância da qualidade de vida na organização (EVANGELISTA, 2015, p.53).

A definição de biopsicossocial tem base na medicina psicossomática no qual

relaciona o homem a sua complexidade, isto é, ele é formado por suas

potencialidades sociais, biológicas e psicológicas que lidam paralelamente com

diversas condições de vida (EVANGELISTA, 2015). Por sua vez, estas respostas

apresentam-se combinadas de formas diferentes e em variadas intensidades e

níveis, podendo suas manifestações ser evidentes em um ou outro aspecto, no

entanto, todas as camadas são interdependentes. .

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3. METODOLOGIA E ANÁLISE DE RESULTADOS

Neste capítulo serão expostos os procedimentos metodológicos e a análise

dos resultados encontrados nesta pesquisa.

A metodologia realizada foi de caráter exploratório com o objetivo de buscar

as opiniões a respeito das questões levantadas para a discussão do presente

trabalho. A abordagem é qualitativa, sendo esta entendida como aquela que se

fundamenta “[...] em dados coligidos nas interações interpessoais, na coparticipação

das situações dos informantes, analisadas a partir da significação que estes dão aos

seus atos. O pesquisador participa, compreende e interpreta” (CHIZZOTTI, 1995).

Este trabalho teve dois processos, o primeiro foi a pesquisa bibliográfica,

cujos materiais consultados foram livros, artigos, teses, dissertações, monografias,

matérias de sites, documentos e pesquisas de instituições, referentes a temática

explorada.

Assim, houve uma compreensão maior do assunto investigado para, então,

formular, perguntas abertas que buscaram entender, responder e analisar o tema da

pesquisa “[...] com o objetivo de suscitar dos informantes respostas por escrito ou

verbalmente sobre assunto que os informantes saibam opinar ou informar”. (CHIZZOTTI, 1995)

Este capítulo estará dividido em subitens conforme os assuntos foram

abordadas nos questionários dessa pesquisa, de acordo com o método do

pesquisador. O método de coleta de dados será demonstrado no ponto seguinte

3.1 COLETA DE DADOS

O presente estudo teve a coleta de dados dividida em duas etapas: a primeira

etapa compreendeu a coleta de dados secundários por meio de uma pesquisa

bibliográfica em livros, artigos científicos e revistas eletrônicas e a segunda etapa, a

coleta de dados primários com o uso de perguntas abertas semiestruturadas.

O roteiro semiestruturado foi elaborado a partir dos conteúdos bibliográficos

pesquisados. Além disso, foram discutidos com a orientadora deste estudo quais

assuntos deveriam ser explorados na pesquisa de campo, formando assim as

perguntas a serem aplicadas com os entrevistados. Ainda foi definido em conjunto,

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quais seriam os respondentes da pesquisa, bem como, as estratégias e ferramentas

para a sua operacionalização.

O roteiro da entrevista foi elaborado em quatro blocos. O primeiro aborda os

dados pessoais dos entrevistados, citando o tempo de carreira, a empresa onde atua

e os aspectos motivacionais que foram responsáveis pelo o seu ingresso na

profissão. Já no segundo bloco, são retratados os subsistemas do departamento de

gestão de pessoas no contexto da função de comissário de bordo. O terceiro é

abordado o ambiente de trabalho, fazendo menção à qualidade de vida e à rotina

desses trabalhadores. Por fim, no último bloco, as perspectivas de futuro dos

entrevistados em relação ao cargo e as suas opiniões acerca do reconhecimento da

sua atividade.

Apesar de o roteiro ter sido organizado em blocos, não foi necessário seguir a

estrutura pré-estabelecida. A autora deste trabalho teve a liberdade de direcionar a

entrevista de acordo com o caminho que o entrevistado apontava, fazendo com que

desenvolvesse as suas respostas e observações livremente e sem interrupções. Para efetuar o estudo de campo utilizou-se a rede social, o Facebook, com o intuito

de divulgar a pesquisa. Foi publicada em grupos de aviação a proposta do trabalho,

a fim de captar respondentes para o estudo empírico. O contato que a autora já tinha

com alguns comissários ou com colegas que conheciam pessoas que atuavam nesta

função, auxiliou no aceite dos participantes da pesquisa.

Foram realizadas 6 entrevistas com comissários de empresas diferentes,

incluindo companhias aéreas nacionais e internacionais, sendo que uma entrevista

foi feita com um ex comissário. A autora teve dificuldades em conseguir mais

entrevistas porque os horários não batiam, muitos alegavam que estavam

trabalhando, não tinham tempo para realizar a pesquisa, dentre outros motivos. Foram entrevistados comissários da Azul Linhas Aéreas, Emirates, Latam Linhas

Áreas, Passaredo Linhas Aéreas e Sete Linhas Aéreas. Além disso, foi entrevistado

um ex-comissário da empresa americana Continental Airlines (atualmente United Airlines).

A primeira estratégia de entrevista era presencial e a segunda via Skype.

Porém, só foi realizada uma entrevista face a face e outras foram feitas por meio da

ferramenta de comunicação Whatsapp.

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O empecilho de realizar uma entrevista pessoalmente ocorreu devido aos

comissários não residirem na mesma cidade que a autora. O uso da segunda

estratégia não foi bem-sucedida, porque muitos informaram que não tinham Skype

ou estavam em pernoite no hotel, e, por conta disso, não tinham notebook e etc.

A autora percebeu que eles apresentavam certa timidez e insegurança de ter

um bate papo a respeito da sua profissão por Skype. A ferramenta utilizada para

obter entrevistas foi o Whatsapp, um mecanismo prático, no qual possibilitou o envio

e recebimento de áudios e não impediu a limitação no desenvolvimento das

respostas.

Os dados das entrevistas foram salvos no computador. Logo em seguida, a

autora do trabalho transcreveu as respostas. Para auxiliá-la nas transcrições, foi

utilizado a ferramenta google drive/documentos no qual há um item que ajuda a

identificar as palavras mencionadas nas gravações dos áudios.

3.2 RESULTADOS OBTIDOS

O próximo tópico aborda a análise das entrevistas realizadas. Os principais

resultados encontrados foram organizados em 6 blocos, denominados da seguinte

forma:

Perfil dos respondentes Motivações, expectativas e reconhecimento; Gestão de pessoas na profissão Ambiente de trabalho Problemas de saúde O concílio da vida profissional com a social

3.2.1 Perfil dos respondentes

Com o objetivo de preservar a imagem dos entrevistados, optou-se por não

mencionar os nomes dos participantes da pesquisa.

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48 Quadro 1: Perfil dos entrevistados

ENTREVISTADO COMPANHIA TEMPO DE ESTADO POSSUI

AÉREA CARREIRA CIVIL FILHOS

Entrevistada 1 Latam 6 anos Solteira Não

Entrevistada 2 Passaredo 5 anos Solteira Sim

Entrevistada 3 Sete Linhas 12 anos Solteira Não

Entrevistada 4 Azul 6 anos e meio Casada Sim

Entrevistada 5 Emirates 2 anos Solteira Não

Entrevistado 6 Continental 4 anos e meio Solteiro Não

Fonte: Elaboração própria

3.2.2 Motivações, expectativas e reconhecimentos.

A escolha de uma profissão depende de fatores sociais, pessoais e financeiros.

Segundo Lima (1999), a profissão de comissário é vista como um trabalho no qual os

seus adeptos têm a oportunidade de conhecer diversos lugares e de usufruírem de

bons hotéis, ou seja, há uma experiência turística e um estilo de vida no qual é difícil

encontrar em outras carreiras. A entrevista 3 confirma essa teoria a respeito das

vertentes que influenciaram sua escolha profissional.

Além de lidar com pessoas, cada dia é alguém diferente, cada dia é uma situação diferente. Eu acho que essa possibilidade de viver coisas novas o tempo inteiro, viver com pessoas novas, lugares novos, não ter rotina, não ter horários, é tudo muito diferenciado e isso tudo dá uma sensação de liberdade. Talvez eu não conseguisse trabalhar 8 horas por dia em um horário fixo, trancada dentro de uma sala com quatro paredes, acho que seria um pouco claustrofóbico para mim. Dentro do meu perfil, escolher essa profissão também teve muito a ver com isso, de ter a liberdade, a gente não tem hora pra nada, mas tem uma responsabilidade como tudo. O tempo todo é mutação, a vida de um tripulante é o tempo todo mutante, você está sempre em lugares diferentes, convivendo com pessoas diferentes, aprendendo com culturas diferentes, comendo comidas diferentes então tudo isso é mágico, se você conseguir viver isso, te dá uma gama de conhecimento, de aprendizado, de experiência até pessoal mesmo, do auto equilíbrio que é necessário para você conseguir se manter diante de tanta mudança, de tanta alteração ,você ter equilíbrio para conseguir se manter, levar à vida (ENTREVISTADA 3).

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No geral, observa-se nos relatos dos comissários de bordo que eles optaram

por essa carreira devido ao estilo de vida que a atividade proporciona. Além disso,

percebe-se que os entrevistados optaram pela função por vocação, curiosidade, por

gostarem de trabalhar com o público ou por já estarem inseridos no ambiente da

aviação e, desejarem permanecer, contudo, atuando em uma função diferente.

De acordo com os entrevistados, quando é perguntado o porquê de muitas

pessoas optarem por essa profissão, a maioria afirmou que é devido à imagem

criada à carreira de comissário de bordo.

Eu acho que é muito pelo glamour que a profissão aparenta ter, a pessoa que está de fora ela imagina realmente a profissão com uma coisa muito glamorosa, que você viaja bastante, que você dorme em hotel, tem aquele uniforme que é sempre pomposo, a gente tem sempre que estar impecável. Isso passa uma imagem de um bom emprego, então tem aquela coisa do voo internacional, de um dia voar internacional. Então eu acho que é isso (ENTREVISTADA 4).

Na terceira fase do space out o cargo de comissário de bordo teve a sua

glamourização reduzida devido aos fatores externos que ocorreram no meio da

aviação. Porém, a entrevistada 4 afirma que a atividade não perdeu a sua essência

consolidada na segunda fase do space out , relatando que as pessoas ainda optam

pela profissão por causa da imagem, do “glamour” e “liberdade” que passa para

quem não está inserido no meio. Entretanto, segundo Nery (2009), nos dias atuais, a

função está direcionada ao rápido e prático e não à elegância, como antigamente.

Todos os entrevistados mencionaram que o cargo de comissário de bordo não

é algo glamoroso como aparenta ser. Segundo eles, há os seus benefícios e

satisfações, mas também, suas desvantagens e seus pontos negativos. Porém,

apesar da profissão ter os seus malefícios, percebe-se nos relatos que o prazer que

atividade proporciona faz com que o sofrimento seja minimizado.

A entrevistada 2 conta que só o aspecto financeiro não é necessário para

manter a pessoa no cargo. Segundo ela, quem olha somente esse lado se

decepciona, sofre e não desempenha essa função por muito tempo. É uma profissão

que é subjetiva, pois para quem gosta, tem vocação e consegue administrar todas

as vertentes que englobam a sua vida pessoal com a profissional terá prazer na

atividade. Contudo, para aqueles que possuem dificuldades em lidar com o cotidiano

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e não são tão apaixonados pela aviação, a atividade pode se tornar frustrante e

desgastante.

Eu posso dizer que muita gente procura essa profissão por vários motivos. Tem o lado financeiro porque acredito que a maior parte das pessoas já se interessa por isso. Mas muitas pessoas que pensam dessa forma acabam se decepcionando, porque quando bate de frente com a realidade da profissão fica meio “deprê”. Claro que você tem que gostar, é uma coisa que tem que vir de você, não adianta ninguém forçar e insistir ou falar não vai. Se você gosta, você se dará bem, porque senão você não aguenta, vai ser muito chato, pesado e maçante para você, vai pesar muito na sua vida. Então tem que ser uma coisa bem pensada. As pessoas optam por achar bonito ver a comissária passando e falar: - Olha, que bonito! Mas tem que pensar bem porque é uma decisão muito séria. É uma profissão muito legal e bonita, mas de grande responsabilidade também (ENTREVISTADA 2).

Quando a pessoa escolhe uma profissão para se inserir no mercado de

trabalho, na maioria dos casos, ela cria uma expectativa sobre a função que irá

desempenhar. Segundo Chiavenato (1999), o indivíduo nunca conhecerá

efetivamente um trabalho, sem antes vivenciá-lo no seu cotidiano. Além disso,

mesmo que pesquise, questione e pergunte sobre a carreira que deseja seguir, o

sujeito antes de ingressar no meio terá uma percepção baseada na superficialidade

e até mesmo no senso comum.

De acordo com os entrevistados 1, 2, 3, 4 e 5, a profissão de comissário de

bordo atendeu e ainda atende todas as suas expectativas. Percebe-se nos

respondentes que estão há mais tempo na profissão que já há um desgaste físico e

psicológico, porém não é motivo que causa desilusão em relação à carreira.

Segundo a entrevistada 3, quando você gosta do ambiente que está inserido há uma

facilidade de desapegar dos problemas presentes no cotidiano da função.

Eu diria que atende sim as minhas necessidades, eu entendo porque foi exatamente a melhor escolha que eu fiz. Eu gosto de fazer isso, isso me satisfaz e dá prazer. Eu me sinto realizada profissionalmente, isso é fundamental, em 12 anos sempre tive o maior orgulho de dizer que eu sou comissária de voo e gosto dessa vida embora diversos momentos sejam doloridos e tão difíceis, mas se você gosta, você acaba passando por cima de tudo isso, coloca uniforme e vai pro voo e depois você esquece dos problemas (ENTREVISTADA 3).

A entrevistada 1 cita que o seu corpo sofre devido à rotina e infraestrutura de

trabalho, porém esse fato não reduz suas expectativas.

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Sim, atendeu as minhas expectativas. Não é que hoje não atenda mais, é como eu estou certo tempo, o meu corpo sente algumas coisas devido a isso. Eu gosto muito do que faço, mas o fato de não poder dormir 8 horas por noite, de trocar a noite pelo dia, de não se alimentar direito, isso influencia muito, mas a profissão em si atendeu desde começo e até hoje atende (ENTREVISTADA 1).

Os entrevistados 2 e 6 afirmaram que não tinham expectativa acerca da

profissão. A respondente 2 disse que as expectativas foram criadas durante o curso

de comissário de bordo e o 6 quando começou a desempenhar a função. Para eles,

o contato com atividade foi gerando a sensação de prazer, surpreendendo-os.

Eu fiz o curso de comissária, sem expectativa nenhuma, só por curiosidade mesmo e eu fiquei apaixonada pela primeira aula que foi sobre equipamentos, eu achei aquilo ali mágico. E foi despertando em mim o interesse (...). Ao longo do curso eu fui ficando ainda mais encantada com tudo aquilo, porque eu passei a conhecer como funcionava tudo lá dentro. Sim, a expectativa foi aumentando e a partir do momento que eu comecei a trabalhar com isso, atendeu com certeza as minhas expectativas. Foi ainda mais além do que eu imaginava que fosse, e foi uma coisa muito natural. Eu nunca tinha pisado dentro de uma aeronave antes de começar a trabalhar, é uma coisa muito engraçada, minha mãe achava que eu ia ter um treco lá dentro, mas atendeu sim as minhas expectativas e ainda atende (ENTREVISTADA 2).

No começo sim (...) quando entrei nesse emprego, eu acabei vendo que é um trabalho diferenciado de qualquer trabalho que você vai fazer. O meu primeiro voo eu nunca vou me esquecer, eu estava dentro do aeroporto, aí ligaram para o meu telefone e falaram assim: - Você está indo para o México agora. Até cair a ficha, eu pensei: Caramba, estou aqui em Washington agora. Na vida normal você tem que processar isso, eu levei um tempo para processar, 3 horas depois daquilo eu estava no México, na cidade do México, foi primeira vez que eu tinha ido para o México. Aí eu pensei: Caraca, que legal! Fiquei em um hotel 5 estrelas, eu não estava muito acostumado. Quando eu saí do México, no outro dia eu fui direto para Costa Rica. Na minha primeira semana de trabalho eu tinha ido para mais de 5 países. Então no começo do trabalho foi uma coisa muito interessante (ENTREVISTADO 6).

No geral, avalia-se nas respostas que, independente dos pontos negativos

que a função de comissário apresenta, é uma atividade que atende todas as

expectativas dos entrevistados, não sendo algo imaginário.

Nota-se nos depoimentos que não há queixas a respeito do salário base.

Contudo, alguns entrevistados afirmam que as empresas, principalmente as

nacionais, poderiam investir mais nas recompensas não financeiras.

Em relação à questão das recompensas, foi observado nos relatos, que, as

companhias aéreas nacionais não investem em um pacote de recompensas não

financeiras. Entretanto, nota-se que os fatores presentes no cotidiano da profissão

faz com que seus funcionários continuem motivados no cargo.

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Não tem nada disso, infelizmente. Eu sou aluna de administração de um curso à distância e isso é uma das coisas que eu me questiono, porque seria tão interessante ter essa motivação na empresa. É muito importante você ter um reconhecimento, isso paga mais do que um salário. Mas, infelizmente isso não acontece. (ENTREVISTADA 2,)

Olha guria, sinceramente, na antiga Tam era salário e só, não tinha esse negócio de muito obrigada, só em datas em especiais. Hoje é dia do comissário, parabéns! Hoje é natal, feliz natal! (...) não ganhamos bonificação, não ganha mais um salário. É tipo assim, faz a sua obrigação que eu faço a minha. (ENTREVISTADA 1)

Godoy (2009) cita que a falta de reconhecimento no trabalho pode dificultar o

envolvimento subjetivo do funcionário na tarefa que é estabelecida. Com isso, o

encontro com o seu potencial e especialidade pode ser prejudicado. Para o autor,

quando há uma percepção por parte do empregado que a sua tarefa está senda

reconhecida, isso lhe dá um sentido profissional e ameniza os aspectos negativos do

trabalho.

Já os entrevistados de empresas internacionais, relatam nas suas falas que a

questão das recompensas estão bastantes presentes no cotidiano dos profissionais. Fazendo uma análise comparativa entre as companhias áreas, nota-se nos relatos

dos comissários da Emirates e Continental que as suas respectivas empresas se

preocupam mais em implantar mecanismos diferenciados para recompensar. Isso

faz com que a produtividade dos seus comissários de bordo aumente e melhore a

qualidade dos seus serviços. Ademais, é uma estratégia para evitar a rotatividade,

pois de acordo com o entrevistado 6, muitos não abandonavam a profissão por conta

das recompensas.

Em alguns casos, as recompensas podem estimular o sofrimento criativo, pois

mesmo sofrendo, quando o indivíduo encontra um incentivo na carreira, ele pode

procurar estratégias e mecanismos para desempenhar a função, ser reconhecido e

recompensado, transformando assim, o sentimento em prazer. (DEJOURS, 1994)

Os entrevistados 5 e 6 relatam sobre as recompensas presentes nas suas

respectivas empresas abaixo.

A Emirates eu não tenho nem o que falar, eu conversei com as meninas que trabalham na Azul, na Gol e na Tam, eu nunca vi nada igual. Primeiro de tudo, ela (a empresa) te dá uma casa, você divide com uma pessoa, um

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apartamento com tudo mobiliado, te dá tudo. No segundo dia que você chega aqui, eles já te dão um dinheiro para ficar um mês aqui. Você tem casa, você tem transporte na porta da sua casa até a empresa, como se fosse ao centro. Tem um ônibus, então tem acomodação e transporte. Descontos nas viagens que nem se fala, vou te dar um exemplo mínimo: a passagem para o Brasil na econômica para o Rio está custando em torno de R$4000 a R$ 5000, a gente como comissário pagamos R$ 400 mais ou menos. Nós temos uma passagem de graça para o nosso país. Aqui em Dubai a gente tem desconto em quase todos os lugares, quase tudo, academia, shopping, nas lojas, quase tudo. Eu acho que em nenhuma você vai ter tantos benefícios assim. A gente tem uma clínica médica (...). É maravilhoso. Não tenho que reclamar, os benefícios são ótimos (ENTREVISTADA 5).

Na empresa que eu trabalhava, na Continental, se você ficasse 6 meses sem chegar atrasado, você concorria a um carro. E se você não quisesse concorrer um carro, você ganhava um dinheiro por fora. Então você tinha opções. Se você não concorre ao carro, recebe 100 dólares por exemplo. Obviamente você tentava concorrer ao carro, eu nunca ganhei. (...) Outros benefícios. Eu lá nos Estados Unidos tinha descontos com a FEDEX, que seria a SEDEX no Brasil, eu tinha desconto para isso. Eu tinha desconto para academia, eu tinha desconto para o hotel. Eu tinha desconto para praticamente tudo o que eu quisesse fazer para a minha vida. Eu tinha acesso a determinadas empresas com descontos muitos grandes. Banco, empréstimo, então realmente os benefícios eram bons mesmo (ENTREVISTADO 6, 2016).

Porém, durante o estudo observa-se que o estilo de vida exótico é o principal

estímulo que fazem os comissários se encantarem e continuarem na função. A

entrevistada 3 menciona que um aspecto que a faz motivada pela a sua profissão é

ter o seu trabalho realizado de maneira eficiente, fazendo com que o cliente se sinta

feliz e satisfeito com o seu serviço. Para ela, a sensação de dever cumprindo é algo

prazeroso e gratificante.

O que mais me encanta e motiva é a sensação de dever cumprido. De conseguir fazer o voo com segurança, de conseguir levar o passageiro para onde ele pretende ir e ver o sorriso no rosto da pessoa. Claro que nem sempre a viagem vai ser questão de felicidade, mas eu acredito que a gratificação é essa, de dever cumprido, de ir fazer o voo, de conseguir fazer tudo ok e voltar para casa. (ENTREVISTADA 2)

As respostas ressaltam os pressupostos deste estudo. A experiência turística

e o estilo de vida diferenciado dos profissionais são os principais fatores que

recompensam e motivam os comissários nessa carreira.

Nos relatos há um envolvimento de todas as características presentes nas

três fases do space out, no qual estar dentro de um avião viajando e ter um estilo de

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vida exótico é uma forma de remuneração. Além disso, o papel que a carreira

desempenha na vida do comissário também pode ser considerado uma recompensa

(WHITELEGG, 2007).

Todos os comissários de bordo afirmaram que se sentem reconhecidos e

realizados no seu trabalho. Porém, a respondente 2 tem uma opinião contrária aos

demais, ela cita que fica desmotivada e frustrada devido à falta de reconhecimento.

De acordo com Dejours (1994) quando isso não acontece, pode gerar um sofrimento

patogênico.

Eu não pretendo ficar muito tempo até porque comissária velha no Brasil não rola. E não sou reconhecida não, infelizmente. Somos apenas um número. Isso me deixa um pouco frustrada e desmotivada, mas continuamos firmes e fortes fazendo o que amamos, enquanto é possível. Enquanto somos jovens, magras e lindas, isso também são exigências (ENTREVISTADA 2).

Quando foi perguntado sobre o futuro na profissão, exceto o entrevistado 6

que disse que saiu do cargo para fazer uma faculdade, eles mencionaram que

desejam continuar na carreira por bastante tempo até “o corpo não aguentar mais”,

se aparecerem outros planos de vida ou não cumprirem mais as exigências da

empresa.

É óbvio que mais cedo ou mais tarde eu vou ter que escolher outros caminhos para minha vida, estou com 37 anos eu não consegui manter uma estrutura familiar, não dá, às vezes é muito difícil, especialmente, porque às vezes os homens não conseguem entender a mulher viajando o tempo inteiro, filhos é sempre muito difícil, então ser comissária é você abdicar de tudo isso e chega uma hora que isso tudo pesa. Não é que não seja impossível você viver as duas coisas, mas é difícil (ENTREVISTADA 3).

As falas acima comprovam o panorama acerca do cargo do comissário de

bordo na terceira fase do space out no qual a profissão é vista como uma carreira,

porém, há também, uma relação com a segunda fase do space out, pois é uma

atividade que as mulheres, em alguns casos, realizam antes do casamento e de

acordo com a entrevistada 3, no Brasil ainda é exigido ter uma aparência jovial.

(WHITELEGG, 2007).

A profissão de comissário não dá para ser por um longo tempo. Acontece que chega uma hora que a própria vitalidade já nos falta, está tudo numa condição física. Algumas companhias também optam por pessoas mais novas, pela própria ação, pela necessidade de força e outras coisas. Hoje no mercado brasileiro se tem muita essa concepção de comissário com

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alguém jovial, de rostinho simpático, diferente de muitas companhias no mundo afora que tem outra concepção que é aquela coisa mais pessoas mais velhas, mais experientes, mas a cultura brasileira é essa, a gente tem um pessoal mais novo e nessa visão, a gente também pensa futuramente em construir algumas coisas que talvez não vá bater muito bem com a profissão, construir uma família, filhos, enfim, vai chegar uma hora que isso é inevitável (ENTREVISTADA 3).

Nota-se que os relatos evidenciam que o futuro na profissão depende da

capacidade para o trabalho e do envelhecimento funcional do comissário de bordo.

Segundo Fischer (2005) a capacidade para o trabalho pode ser interferida por causa

dos aspectos sócio demográficos. O autor menciona que a capacidade funcional

física e mental pode começar a se deteriorar a partir dos 45 anos e quanto mais

tempo o indivíduo está submetido às exigências do seu meio trabalhista, o

envelhecimento funcional será mais frequente.

3.2.3 Gestão de pessoas na profissão

Esta seção denominada “Gestão de Pessoas na profissão” tem por objetivo

tratar de alguns aspectos que são próprios deste setor, como os processos seletivos

vivenciados pelos comissários de bordo, os programas de treinamento ao qual são

submetidos na carreira e as possibilidades de crescimento na profissão.

Sobre recrutamento e seleção, a entrevistada 1 menciona que os currículos das

pessoas que desejam seguir a carreira de comissário devem ser encaminhados para

um site chamado Elancers que é um site de vagas.

Tem que encaminhar o currículo por correio ou por um site chamando Elancers que é um site de vagas. Você vai ao site da companhia aérea, faz o cadastro e ela vai te encaminhar para esse site, tem que manter sempre atualizado o currículo lá. Às vezes a companhia publica no site a vaga, tu se candidata para vaga. Mas assim, quem fala é vendo os grupos no face ou recebe e-mail do próprio site ou boca a boca. Geralmente as vagas são boca a boca, mas na época eu tinha feito curso e a dona da escola que comentou, ela falou: - Olha, a Tam vai abrir vaga, tu não vai querer mandar o seu currículo? Aí eu mandei e a Tam me chamou” (ENTREVISTADA 1).

De acordo com os entrevistados, as vagas no setor da aviação são

geralmente divulgadas no site da companhia aérea. Entretanto, muitas pessoas que

visualizam o informativo sobre as futuras seleções, compartilham a notícia nas redes

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sociais e nas escolas de aviação. Além disso, na maioria dos casos, o recrutamento

é feito boca a boca.

Segundo os relatos, as formas de seleção nas companhias aéreas nacionais

são semelhantes. Geralmente, os processos seletivos são compostos por dinâmicas

de grupos muitos delas destinadas a avaliar a capacidade de tomar decisões dos

candidatos. Além disso, há redação com diversos temas, prova de inglês e de

conhecimentos gerais em nível básico. Finalizando essas etapas, há uma entrevista

face a face para saber das experiências profissionais e pessoais dos possíveis

futuros comissários de bordo.

Exceto a candidata 1, todos afirmaram que foram contratados na primeira

seleção que participaram.

Segundo a entrevistada 3, os processos seletivos realizados em empresas

regionais são mais humanizados e com menos pressão, pois há um número menor

de candidatos, fazendo com que haja mais tempo para conhecer as pessoas de

maneira mais detalhada e empática.

Primeiramente os processos seletivos em empresas menores, eles contam com números menores de participantes já que muita gente também não tem interesse nesses tipos de companhias. (...) São poucos candidatos. (...) Então numa companhia regional, as pessoas que estão tratando de seleção, elas acabam tendo essa postura muito mais humanizada no aspecto de observar que são pessoas que não simplesmente números. (...) Eu acho que nas grandes empresas o fluxo é tão grande, as coisas acontecem tão dinamicamente que não dá para você ter tempo, não é que as pessoas não queiram ter esse tratamento humanizado, mas às vezes elas não podem ter. Elas têm 100 ou 200 candidatos para observar num dia só e não dá para ficar perdendo muito tempo com isso (ENTREVISTADA 3).

Nas companhias internacionais observa-se que os processos seletivos são

mais rigorosos e criteriosos. A entrevistada 5 relata que na Emirates a seleção

possui 3 fases realizadas em dias distintos. A primeira fase é o open day no qual é

realizado por uma empresa de seleção presente em várias cidades do mundo, já a

segunda fase é denominada assessment day no qual é um dia que possui várias

atividades, e por último, a final interview que é uma entrevista presencial com a

chefe de cabine. Se o candidato passou no processo seletivo, ele recebe uma

ligação chamada gold call informando que foi contratado para o cargo.

O entrevistado 6 conta que o processo seletivo na Continental é realizado em

um dia. À medida que as etapas são finalizadas, os candidatos são eliminados.

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Quem é aprovado no final de todas as etapas já sai de lá empregado com

contrato assinado.

Nas companhias aéreas nacionais é obrigatório antes de ingressar na carreira

que o candidato faça um curso técnico no qual tem uma duração média de 3 meses

a um ano. De certa forma, esse curso é visto como um tipo de treinamento inicial,

pois lá o candidato tem contato com todas as premissas que ele deverá aprender

para se preparar como comissário de bordo. (LIMA, 1999)

De acordo com profissionais entrevistados, esse curso apresenta disciplinas

de primeiros socorros, de conhecimento de equipamentos de aeronaves, etiqueta,

combate ao incêndio, sobrevivência no mar e na selva e etc. No geral, o foco na

formação é em segurança. Depois que são finalizadas as disciplinas teóricas, a

entrevistada 5 conta que o aluno precisa passar no teste do CEMAL (Centro Médico

de Medicina Aeroespacial) no qual tem o intuito de avaliar a aptidão física e

psicológica do indivíduo, terminado esse processo, ele poderá fazer as matérias

práticas.

Após a contratação, o comissário de bordo novato precisa passar por

treinamento intenso realizado pela empresa. Cada companhia aérea tem o seu

procedimento.

Segundo Lima (1999) o que difere o serviço de uma companhia aérea para as

demais é a maneira como o cliente é atendido, por isso é importante investir no

treinamento dos profissionais que trabalham na linha de frente, ou seja, aqueles que

estão em contato direto com o público. A entrevistada 3 detalha todo o processo e

importância de um treinamento de um comissário de bordo.

Todo treinamento de um tripulante tem algumas características muitos similares, porque eles são definidos a partir de um órgão regulamentador que é a ANAC. Então existem parâmetros para esse treinamento, é claro que cada empresa vai colocar aquilo que está dentro do perfil dela. Agora com relação ao treinamento do comissário, além de toda a parte técnica, conhecimento de equipamento, conhecimento de emergências, as empresas têm consciência que essa pessoa vai lidar com público, e principalmente, que esse público é o cliente, é o carro-chefe de todo o processo, ele é que está pagando a passagem. Então dentro dessa visão as empresas têm focado nesse atendimento ao público (ENTREVISTADA 3).

Os comissários de bordo de empresa internacionais relatam que não é

necessário fazer um curso antes de ingressar na profissão. Segundo eles, a

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empresa oferece todo treinamento depois que é contratado. A entrevistada que

trabalha na Emirates cita que eles passam por um treinamento intenso durante 3

meses em um turno integral. Já o respondente que trabalhou na Continental afirma

que são 6 meses árduos de treinamento, depois que é finalizado a pessoa é

efetivada.

Já que a gente veio meio cru, que eles não pedem curso de nada, então a gente faz um curso aqui. A Emirates tem a escola de aviação que treina comissários e pilotos. O treinamento é feito em dois meses superintensos. Você não tem noção, só quem vive sabe, são 9 horas de treinamento por dia. E assim, você tem todos os treinamentos, de primeiros socorros, sobre os equipamentos da aeronave, tudo, você vai estudar a aeronave que você vai operar que no meu caso a gente opera aqui o Boeing 777 e o Airbus 380 ou 330 ou 340. O treinamento é muito intenso, tem prova quase todos os dias e é isso. São os procedimentos de segurança e tal. Então são dois meses, 1 mês de treinamento de segurança e primeiros socorros e o outro mês é de serviço ao cliente. A gente aprende toda metodologia de atendimento da empresa porque a Emirates agora é a melhor do mundo, então o atendimento tem que ser de primeira, atendimento tem que ser VIP, então a gente aprende tudo isso. Todo ano a gente vai para escola para revalidar a nossa carteira, mas é em relação ao treinamento de segurança. (ENTREVISTADA 5).

O entrevistado 6 cita que a vertente de atendimento ao público era bastante

valorizada na sua companhia aérea. Ele menciona que havia durante o treinamento

disciplinas direcionadas ao atendimento de determinadas nacionalidades.

Lá, como era uma companhia aérea que viajava o mundo inteiro, tinham aulas específicas em relação ao atendimento. Por exemplo, para o Japão, a gente aprendia como atender o japonês, se você dá um objeto com uma das mãos é considerado ofensa, tudo que você entrega para um japonês tem que entregar com as duas mãos, é algo que simboliza respeito. Então a gente tem esse tipo de atendimento, para Índia, para Israel, para o Japão, para Paris, então tem um foco no atendimento muito interessante dependendo do local que a empresa voa (ENTREVISTADO 6).

A profissão de comissário de bordo tem uma imensa responsabilidade pela

segurança e bem estar de todos que estão dentro da aeronave e pela imagem da

empresa. Portanto, os treinamentos exigem que os seus envolvidos tenham um grau

de comprometimento e maturidade, pois eles precisam estar preparados para

qualquer tipo de situação. Porém, o entrevistado 6 relata que vivenciou uma situação

no voo no qual os comissários de bordo cometeram um erro na parte de segurança.

Muitos comissários esquecem a segurança e focam no serviço. Eu mesmo, em determinados momentos, pensei: esquece isso aqui e foca na segurança. Em determinados momentos podem gerar situações desagradáveis. Um dia aconteceu no voo comigo, de você ver um passageiro extremamente drogado e liberaram para entrar no voo. Ele

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causou muito problema no voo, inclusive queria abrir a porta da aeronave, não conseguiu, mas causou um problema. porque ele estava do meu lado quando eu estava servindo, do nada ele surtou, então essa questão de segurança é importante sim, esse é o foco (ENTREVISTADO 6).

Nota-se que os treinamentos atuais ainda focam na principal vertente, a

segurança. Todos os comissários relataram que eles fazem um curso de reciclagem

com o intuito de avaliar se os profissionais não se esqueceram dos ensinamentos

aprendidos nos treinamentos anteriores. Entretanto, percebe-se que devido à

repetição de determinados procedimentos no voo, principalmente, em relação ao

serviço de bordo, os profissionais se esquecem de colocar em prática tudo o que foi

aprendido a respeito de outras áreas, em especial, a proteção dos passageiros na

aeronave.

Outro elemento que impacta diretamente no ambiente de trabalho é o modo

como os funcionários são avaliados. A partir dos relatos entrevistados, verificou-se

que nas companhias aéreas esse instrumento é praticado de modo semelhante.

Segundo todos os respondentes, os comissários auxiliares do voo são avaliados

pelos chefes de cabine e pelos passageiros, e os líderes dos voos são avaliados

pelos clientes.

Eles têm um programa chamado PEX que é um programa de excelência onde em todas as áreas pessoas são avaliadas. No nosso caso, nós líderes, eu sou comissária líder, avaliamos os auxiliares e os clientes nos avaliam. Então todos os voos que nós fazemos os clientes recebem uma pesquisa de satisfação e eles fazem avaliação, então eles conseguem medir o nível de satisfação do cliente em relação a nós líderes e dos auxiliares com a nossa pesquisa (ENTREVISTADA 4).

Esta questão a respeito da análise de desempenho corrobora com a teoria

abordada por Evangelista (2015). Verifica-se que é necessário medir o nível do

serviço prestado pelos comissários de bordo com a finalidade de verificar quais

pontos estão prejudicando a qualidade de vida no trabalho e a produtividade do

funcionário.

As companhias aéreas apresentam um plano de carreira semelhante. Os

comissários de bordo de empresas nacionais mencionaram que os possíveis

caminhos para crescer dentro da função são as seguintes: de comissário auxiliar o

profissional pode assumir a liderança do voo nacional, depois disso, há possibilidade

de ser promovido como comissário auxiliar de viagens internacionais, logo em

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seguida, pode se tornar chefe de cabine do voo nacional/internacional. Os

entrevistados citam que o nível máximo que um comissário pode alcançar dentro da

carreira é ser responsável e líder do avião inteiro internacional.

A entrevistada 3 diz que função de instrutor de voo/solo e checador é uma

possibilidade que o comissário de bordo pode desempenhar.

O plano de carreira não modifica muito de empresa para empresa, mas aqui funciona assim: você entra como comissário auxiliar, passa por todo o processo de treinamento e entra efetiva como comissária, começa a voar e tudo. Você precisa ter um período mínimo de experiência para ter uma indicação para ser instrutor de voo ou de solo, são dois tipos de instrução diferenciada e tem todo o controle da ANAC em relação essa formação também, depois que você consegue atingir esse estágio de instrutor, você pode ser indicado pela chefia ou diretoria a ser examinador credenciado que é o checador, aí tem que fazer o curso da ANAC, há uma homologação junto a ANAC. ANAC dá uma credencial para exercer essa função porque teoricamente essa função é da ANAC, ela te dá prerrogativa de exercer essa função e daí você pode ser também, juntamente com a parte de instrução de solo e voo, você pode ser instrutor de outras disciplinas. Nós temos uma disciplina chamada CRM que é um treinamento que vem do inglês chamado Corporate Resource Management que é um treinamento voltado para a segurança do voo. Aí você pode ministrar outros tipos de treinamentos, são diversos. A grade curricular de um treinamento ela é muito extensa e cada ano nós temos que refazer várias coisas (ENTREVISTADA 3).

Além disso, todos afirmaram que só há possibilidade de crescimento dentro

da empresa em algum cargo em terra, se o comissário possuir qualificação e

capacitação na função que for ofertada pela companhia aérea.

A análise das respostas sobre o plano de carreira comprova que a profissão

oferece oportunidades de crescimento, fator que pode influenciar na motivação e

permanência dos comissários de bordo na carreira.

3.2.4 Ambiente de trabalho

Para praticamente todos os comissários, no geral, as relações presentes no

ambiente de trabalho são tranquilas e amigáveis. O fato de trabalhar com pessoas e

chefes diferentes faz com que os problemas sejam diminuídos, pois evita

desavenças por causa da convivência. Contrariamente a este ponto de vista, a

entrevistada 2 definiu o seu ambiente de trabalho como não muito confiável.

Olha, até que não. Até que o ambiente de trabalho é bom, é bem tranquilo. Só que não é muito confiável. Assim, já melhorou bastante, mas é uma coisa que você não pode ficar muito à vontade, sabe. Você tem que ir lá e fazer o seu trabalho, mas não é todo mundo que você pode confiar. Mas, no

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geral, não é um ambiente competitivo, é tranquilo, todo mundo se entende, mas deveria ter mais união, um pouco mais de trabalho em equipe, mais comprometimento de toda a equipe. Isso eu sinto falta (ENTREVISTADA 2).

Quando as relações humanas no trabalho são prejudicadas por causa

divergências presentes no ambiente, isso pode possibilitar no desenvolvimento do

estresse, acarretando assim, no sentimento de sofrimento, e logo em seguida, o

adoecimento.

De acordo com os entrevistados, a rotatividade parece não ser algo presente

no cotidiano da profissão. Os comissários disseram que muitos desistem no começo

da carreira, mas logo depois o índice de demissão por conta própria é muito

pequeno. Para eles, quem permanece no cargo são aqueles que realmente gostam

e se adaptam ao cotidiano da profissão.

No começo quando você se forma, eu me formei com 44 pessoas. Nos primeiros três meses muitas pessoas desistem, por exemplo, 15 pessoas desistiram, é a questão de adaptação mesmo. A pessoa que chega na aviação nem sempre está preparada para fazer isso, então nos 3 primeiros meses ela vai ver se aquilo é para ela ou não, se você passar daquilo a rotatividade não é tão grande não, têm pessoas que trabalham lá há 50 anos. Então existe uma resistência no começo, rotatividade mesmo eu não observei muito (ENTREVISTADA 6).

A fala do entrevistado 6 confirma a concepção acerca da terceira fase do

space out no qual a profissão é vista como uma carreira. No relato ele cita casos de

pessoas que desempenham a função há 50 anos.

Sobre a questão da competitividade eles citaram que no geral não é algo comum,

porém a entrevistada 3 cita que no universo da aviação a disputa de egos é um fator

muito presente no ambiente de trabalho.

Eu acho que na verdade o grande problema da aviação é uma palavra chamada ego, muitas pessoas sentem superiores por estar em uma área como essa e às vezes isso é pura bobagem. [...] Às vezes esse ego leva um pouco as pessoas a criarem esses tipos de problemas (ENTREVISTADA 3).

Segundo uma das categorias propostas por Walton (1973) para a qualidade

de vida no trabalho, é importante que os funcionários tenham liberdade para dialogar

com todos os colegas de profissão, inclusive com os seus superiores. Durante a

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análise das respostas, observou-se que, no geral, os comissários têm autonomia

para expressar as suas ideias, opiniões e queixas.

Sim, perfeitamente. Não sei se em outras companhias teria essa possibilidade, mas aqui é tranquilo, todo mundo se conhece. Muitas coisas foram desenvolvidas a partir de observância de alguns comissários que trouxeram informações e coisas que durante o voo foram percebendo e as coisas foram se ajustando, até novas experiências. Então a empresa de certa forma é muito aberta a isso, facilita a forma da gente trabalhar (ENTREVISTADA 3).

Os relatos expõem as abordagens de Godoy (2009) a respeito da mobilização

subjetiva. O autor relata que isso gera motivação e a capacidade do trabalhador para

participar das discussões coletivas que visam modificar as regras relacionadas ao

conteúdo da tarefa e as relações socioprofissionais que ocasionam o sofrimento.

Porém, a entrevistada 2 menciona que a empresa na qual trabalha, a opinião do

funcionário não resulta em uma mudança. “Sim, sempre (sempre pode opinar). Mas

isso não significa que haverá mudanças” (ENTREVISTADA 2).

O preconceito parece não ser algo recorrente. Todos afirmaram que nunca

sofreram até mesmo quem trabalha em empresas internacionais. Porém, já

presenciaram situações entre passageiros. O entrevistado 6 relata que vivenciou um

caso entre os seus colegas de trabalho.

Eu presenciei um caso. O piloto na época queria ficar longe do comissário que estava a bordo só porque ele era árabe. Ele dizia que não o queria dentro da cabine do piloto e que ele apresentava um grande perigo no avião (ENTREVISTADO 6).

Walton (1973) aborda que a integração social na organização é uma categoria

para a consolidação da qualidade de vida no trabalho. Para o autor haverá um bom

nível de integração social se o ambiente coorporativo não tiver preconceitos, mas

sim senso comunitário e franqueza interpessoal. Sobre a questão de perder o emprego, muitos já temeram, em algum momento, ficar

desempregados. Para os comissários de bordo de empresas nacionais a atual crise

econômica no país os preocupa.

Com relação a perder o emprego diante de todo panorama econômico atual sim, o panorama não só na aviação, mas em vários setores está ruim e isso dá uma instabilidade muito grande também (ENTREVISTADA 3).

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O aumento do desemprego estrutural e a propagação de suas consequências

amplificam o medo no ambiente de trabalho, deixando o trabalhador muito mais

vulnerável, e em situação muito mais fragilizada. O empregado, que está dentro da

empresa, sofre com o medo e com as pressões que podem virar ameaças, e até

mesmo desembocar em novas demissões. (DEJOURS, 1994).

3.2.5 Problemas de saúde

Pimentel (2006) aborda que a profissão de aeronauta está propensa às

condições adversas que podem influenciar a saúde física e mental. O comissário de

bordo tem o seu bem estar afetado devido às condições ambientais que estão

inseridos. Eles podem sofrer devido aos ruídos, exposição à radiação cósmica, às

vibrações, à baixa pressão atmosférica na cabine e à baixa umidade relativa do ar.

Ademais, podem ser influenciados pela rotina estabelecida pela organização de

trabalho pelo fato de estarem submetidos a turnos alterados, pela falta de

sincronização do relógio biológico, voos demorados e fadiga aérea.

A entrevistada 3 relata que o ambiente de trabalho é nocivo, ela aborda que

há um desgaste orgânico, pois o organismo está sempre sofrendo uma variação

constante devido ao fato de decolar e pousar sempre. A respondente cita que os

comissários de bordo vivem em um ambiente de trabalho pressurizado e quando

abre a porta da aeronave, eles sofrem com o impacto da diferença de pressão. Além

disso, tem o problema da umidade do ar ser baixa, possibilitando o surgimento de

alergias e devido à despressurização, o profissional pode ter um tímpano estourado

e ter problemas de aeróbia.

O nosso ambiente de trabalho é muito nocivo, e além da gente ter esse ambiente muito nocivo lá em cima, a gente sofre a variação constante que é subir e descer o tempo inteiro, e a cada vez que a gente sobe e desce há uma espécie de tentativa do organismo se adaptar aquele novo momento e há um desgaste orgânico muito grande. (...) Além disso, ar condicionado, as aeronaves precisam estar com ar condicionado extremamente seco para poder manter os equipamentos. O ar condicionado precisa estar sempre muito forte justamente porque os equipamentos esquentam demais. Assim, a umidade do ar é muito baixa, muito mesmo e tudo isso vai desenvolvendo, coisas simples, como por exemplo, quem já tem certas alergias piora, rinite, enfim, essas coisas mais bobas acontecem muito. E tem também situações que são agravadas, por exemplo, quando você pega uma despressurização, tipo de incidente, o seu organismo também vai sentir isso, você pode ter um tímpano estourado, você pode ter problemas de aeróbia que é a formação de gases no seu sangue (ENTREVISTADA 3).

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Walton (1973) citou categorias necessárias para o alcance da qualidade de

vida no trabalho. Entre elas, há uma que trata a condição de segurança e saúde no

trabalho. O autor esclarece que a qualidade de vida pode ser afetada se os

funcionários estiverem submetidos a um ambiente que prejudique a sua saúde

psicológica e física.

Exceto a entrevistada 4, todos os respondentes informaram que já sofreram

algum problema de saúde ocasionado pela rotina de trabalho e pelo ambiente em que

estão inseridos. O caso mais grave é do entrevistado 6, pois ele relatou que teve

perda da audição total em um ouvido devido ao barulho da aeronave.

Em relação à questão de desenvolver problemas de saúde ocasionados pela

rotina de trabalho, foram relatados entre os relatados casos de hérnia de disco,

gastrite, dor de ouvido e garganta com bastante frequência, rinite, sinusite, perda da

audição, dor de cabeça, dor no corpo, casos de morte por câncer, alteração no ciclo

menstrual, barotraumas e etc.

Na entrevista foi perguntando se os respondentes já tiveram problemas de

saúde ocasionados pelo ambiente e rotina de trabalho. O quadro abaixo mostra os

problemas citados pelos entrevistados. Quadro 2: Problemas de saúde.

Problemas de Saúde Relatos

Entrevistada 1 Eu tenho gastrite (...) sinusite, renite (...) dor de ouvido direto, dor de garganta direto (...) a famosa hérnia de disco, eu ainda não tenho desenvolvida (...) a perda da audição, não tive total, mas tive 5% em ouvido.

Entrevistada 2 Eu nunca tive problemas graves (...). Mas se eu não faço um descanso adequado sinto muita dor de cabeça e dor no corpo, é o que nós chamamos de fadiga (...) eu não passei mal assim no voo, mas já me senti mal, muita dor de cabeça, tontura e fraqueza.

Entrevistada 3 Eu particularmente não tive grandes problemas, tive grandes alterações no ciclo menstrual, hormônios, muita retenção de líquidos, gases (...) já tive gastrite.

Entrevistada 4 Eu nunca tive

Entrevistada 5 A menstruação atrasou um pouco por conta do ambiente do avião (...) a menstruação foi o mais sério, mas depois volta ao normal.

Entrevistado 6 Eu perdi a audição de um lado do meu ouvido por causa da

pressurização do avião.

Fonte: Elaboração própria

Todos os comissários, exceto a entrevistada 1, mencionaram que já

presenciaram seus colegas com problemas em razão da rotina de trabalho. Foram

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relatados casos de síndrome do pânico, problemas cardiológicos e uso de drogas.

Segue abaixo, os relatos citados pelos respondentes.

Quadro 3: Colegas com problemas de saúde.

Colegas com problemas Relatos

de saúde

Entrevistada 1 Não relatou sobre problemas.

Entrevistada 2 Existem muitas pessoas aqui na empresa que estão com

problema de coluna, já fizeram cirurgias, estão com problemas psicológicos, síndrome do pânico essas coisas todas, porque tudo é muito intenso, eles exigem muito da gente.

Entrevistada 3 Já vi sim colegas de trabalho ter situações mais bem complicadas, inclusive se afastarem por questões psicológicas, por não estar tendo condições psicológicas de voar, isso é muito comum na aviação, tem pessoas que às vezes desenvolvem problemas cardiológicos por conta disso.

Entrevistada 4 Conheço colegas que tiveram

Entrevistada 5 Eu conheço um caso de menina que começou a voar, a

menstruação atrasou um pouco por conta do ambiente do avião, como eu te falei, é ambiente muito diferente. A rotina e o fuso horário, isso atrapalha muito. Acho que esse foi o problema mais sério que eu vi.

Entrevistada 6 Muitos comissários morrem de câncer por causa da radiação. (...) Muitos comissários, principalmente por essa questão de dormir, acabam usando muita droga, cocaína mesmo, vários amigos usaram porque eles tinham muito sono durante o voo. (...) Pessoal usava droga, aí usavam remédio para dor também, porque durante o voo, por exemplo, você tem uma dor de dente, uma dor na cabeça e está voando, a dor aumentava, então você tomava muitos remédios para diminuir a dor.

Fonte: Elaboração própria

Ainda ressaltando o relato do entrevistado 6, ele afirma que a maioria dos seus

colegas de trabalho faziam uso de drogas.

Praticamente a maioria das pessoas que trabalhavam comigo. Alcoolismo então era praticamente todo mundo. Então porque era um ambiente tranquilo para se trabalhar no quesito pessoas, mas em relação ao corpo, entra a questão de dormir e alimentação, acaba levando em outras coisas. Eu vou te dizer, não é fácil não (ENTREVISTADO 6).

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Para Fischer (2005) a capacidade para o trabalho e a capacidade física pode

ser afetada devido ao uso excessivo de drogas, isso pode acarretar no

envelhecimento funcional mais precoce em alguns funcionários. Além disso, existem

casos que podem provocar aposentadorias precoces por invalidez ou mortes.

O uso de drogas pode estar atrelado ao sofrimento, pois quando o indivíduo

não consegue desempenhar a sua função por causa de fatores físicos e psicológicos

e sobrecarga, não tendo controle sobre o seu corpo, ele sofre. Portanto, a utilização

de determinadas substâncias são uma forma de buscar estratégias defensivas para

conseguir realizar a atividade estabelecida.

Quando foram perguntados se o trabalho era desgastante, todos

responderam que sim. Segundo Lima (1999), todo trabalho possui agentes

potencialmente estressores. Para o autor condições de salubridade, jornada de

trabalho, ritmo, riscos potenciais à saúde, sobrecarga de trabalho, introdução de

novas tecnologias, natureza e conteúdo do trabalho podem ocasionar a produção do

desgaste. A entrevistada 3 explica na sua fala os aspectos e atividades presentes na

profissão que provocam o desgaste e na diminuição da qualidade de vida.

Não parece, mas é extremamente extenuante, muitas vezes a gente dorme pouco, a gente se alimenta muito mal, a gente faz muito esforço físico a bordo. Agacha, levanta, puxa mala, arruma, puxa carrinho, carrega peso e tudo isso tem um reflexo. Só que, além disso, tem um problema muito sério que a condição atmosférica, nós vivemos numa panela de pressão literalmente no qual a pressão não é a mesma que está aqui de baixo, a condição atmosférica é completamente diferenciada, absorção do oxigênio no organismo é diferenciada e é obvio que isso vai causar, nós chamamos na aviação de barotrauma, são os traumas causados por causa da pressão atmosférica que é diferenciada (ENTREVISTADA 3).

A entrevistada 4 menciona que apesar da profissão ser desgastante, ela é

prazerosa ao mesmo tempo.

Sim, ela é sim desgastante porque a gente trabalha no ar né, a gente trabalha em um ambiente pressurizado e isso acaba que deixa a gente mais um pouco cansado fisicamente e mentalmente também, mas é prazeroso, ao mesmo tempo em que é cansativo é prazeroso (ENTREVISTADA 4).

Percebe-se nessa fala que ela comprova a teoria presente no estudo de

Dejours (1994) acerca da psicodinâmica do trabalho. Para o autor o inconsciente e o

pré-consciente de cada pessoa jogam entre si fazendo com que a sensação de

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prazer e sofrimento seja estabelecida e negociada. Apesar dos relatos apontarem

para uma afinidade com a profissão, o ambiente desgastante e as potenciais

doenças podem prejudicar a carreira desses profissionais.

3.2.6 O concílio da vida profissional com a pessoal

Segundo Whitelegg (2007) quanto mais tempo de carreira o comissário de

bordo tiver, mais flexibilidade na sua escala ele terá. Essa afirmação está presente

na fala do entrevistado 6.

No começo não tem como você conciliar, você começa a ter isso depois de uns 8 anos de empresa. Eu não tinha aniversário, eu não tinha feriado, eu não tinha evento familiar. A sua vida pessoal literalmente pertence à empresa. (ENTREVISTADO 6)

Os comissários relatam que apesar da falta de rotina e a inexistência de uma

escala fixa, no geral dá para conciliar a vida profissional com a pessoal. Segundo

eles, o comissário que não consegue conciliar todos os aspectos da sua vida não

conseguem se manter no cargo por muito tempo. Porém, quem possui filhos tem

mais dificuldades e precisa da ajuda e compreensão, principalmente dos seus

parceiros.

A entrevistada 2 relata no seu depoimento que é sofrido conseguir conciliar

todos os seus compromissos familiares com os profissionais.

Eu posso te garantir que não é fácil. Todo mundo que tem filho e trabalha na aviação sabe como é sofrido e como é difícil, porque você fica só falando pelo telefone, resolvendo à distância. Você tem que ter alguém de confiança para cuidar dessa criança quando você não estiver. Nós temos as folgas, então eu tento me programar nessas folgas. Eu marco médico, eu marco festinhas, eu marco passeio, tudo nas minhas folgas e o restante nós vamos levando. É bem complicado e claro têm muitos casos. Eu poderia ficar a noite inteira te falando, inclusive tem gente que mora muito longe da onde trabalha. Por exemplo, eu tenho uma amiga, nós trabalhamos em Ribeirão Preto e ela mora em Recife, ela tem dois filhos e consegue ir para casa uma vez por mês na folga, nós temos direito a pedir 3 folgas durante o mês, é o período que ela consegue ficar com filhos. Então é muito ruim, é muito sofrido, é muito difícil. A gente sofre bastante em relação a isso, poderia ser mais fácil, mas não é. (ENTREVISTADA 2)

O relato acima mostra que a qualidade de vida no trabalho é prejudicada

nesse aspecto. Segundo Walton (1973) a satisfação do funcionário é afetada quando

o trabalho absorve parte da sua vida social. Os relatos comprovam que os

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comissários de bordo sofrem por causa deste fato, pois a sua carreira interfere nos

momentos dedicados à família, ao lazer e a sua convivência comunitária.

Analisando as respostas das entrevistas, percebe-se que há um sofrimento

por parte dos comissários de bordo em não poder estar presentes em muitos

eventos familiares e sociais. Além disso, por causa da escala de trabalho que estão

submetidos, muitos abdicam da ideia de constituir família.

Quando perguntado sobre a rotina relataram que não há. Que cada dia é uma

novidade, com pessoas, chefes, horários e lugares diferentes.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

As pesquisas sobre a temática da qualidade de vida no trabalho, associando-

a com a relação de prazer e sofrimento estão ganhando uma repercussão mais

abrangente no mundo. Durante a procura de pesquisas bibliográficas e referências

sobre o assunto foi possível perceber a importância de produções direcionadas a

esses conteúdos.

Um estudo sobre o ambiente de trabalho de aeronautas e sua visão acerca do

meio em que estão inseridos esclarece dúvidas e auxilia não só aos profissionais da

área, como também aqueles interessados ou até mesmo os mais receosos.

A atenção com a qualidade de vida dos funcionários e a sua influência na

produtividade tem se tornado a questão norteadora para várias organizações e seus

gestores. No universo da aviação não é algo diferenciado. O rendimento é medido

em horas de voo ou quilômetros voados, só que nesse setor há mais fatores

prejudiciais ao desempenho do empregado.

De acordo com a análise dos depoimentos o cargo apresenta limitação no

tempo para desempenhar, mas consolidou-se como uma “profissão carreira” no qual

as pessoas desejam trabalhar até a aposentadoria, arcando com os possíveis

impactos que as longas jornadas podem trazer. Doenças ocupacionais, transtornos

mentais menores, alterações corporais e de ritmo circadiano são apenas algumas

dessas consequências.

Contudo, a legislação brasileira atual é capaz de minimizar o sofrimento

proporcionado pelas condições insalubres resguardando pontos de psicohigiene. A

regulamentação, como é chamada o conjunto de leis que normatiza a atividade a

bordo dos aeronautas, comissários de bordo incluso, ainda se mostra capaz de

manter padrões mínimos de bem-estar durante o exercício profissional.

Observa-se nos resultados encontrados que, há um dúbio sentimento, ora de

prazer, ora de sofrimento. Por parte dos entrevistados, os fatores que mais

influenciam a sensação de prazer são as recompensas e o estilo de vida. A

qualidade de vida no trabalho é representada pelos seguintes itens: experiência

turística, remuneração, a missão da profissão e realização pessoal. Com relação ao

sofrimento, nota-se que as doenças ocupacionais, o ritmo desgastante e a

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dificuldade em conciliar a vida profissional com a pessoa trazem alguns obstáculos

para para quem deseja fazer carreira como comissário.

Resgatando os objetivos específicos deste trabalho, com relação ao primeiro

era sobre a trajetória e inserção desses profissionais no ramo, foi possível identificar

que entrevistados de companhias aéreas nacionais tiveram trajetórias parecidas.

Passaram por treinamentos e aulas semelhantes no curso de formação de

comissário de bordo. Além disso, tiveram resultados positivos de imediato no exame

da ANAC e no processo seletivo para ingressar nas suas respectivas empresas (as

atividades presentes nas seleções são idênticas entre as organizações).

Já os profissionais de empresas internacionais passaram por processos

seletivos e treinamentos diferenciados entre si. Sendo assim, percebe-se que a

trajetória foi mais criteriosa e rigorosa. Ao contrário dos comissários de companhias

brasileiras, os trabalhadores de organizações estrangeiras foram submetidos ao

treinamento depois de contratados.

Com relação ao segundo objetivo, que era discutir a rotina e o ambiente de

trabalho dos comissários, verificou-se que, de maneira geral, é um ambiente em que

não impera a competitividade. O desgaste entre os funcionários é pouco recorrente

em razão da dinamicidade da profissão (muitos lugares e diferentes contatos

pessoais).

Tratando do terceiro objetivo, com relação às motivações, as respostas estão

relacionadas às facilidades da profissão, ou seja: viajar pelo mundo, aprender novas

línguas, conhecer novas culturas e etc, facilidades estas que são consideradas

recompensas para quem está atuando na área. O surpreendente é que ainda que

submetidos a condições laborais desfavoráveis e relatarem que já sofreram

problemas de saúde ocasionados pela rotina e ambiente de trabalho. Muitos

entrevistados se sentem satisfeitos e motivados com a profissão. Desse modo, os

dados corroboram com Dejours (1994) que afirma que os trabalhadores alcançam

determinado equilíbrio psicológico, mesmo estando submetidos a condições de

trabalho sem uma estrutura adequada, se existir fatores que possibilitem a

transformação do sofrimento em prazer.

As dificuldades encontradas para realização deste estudo foi, em primeiro

momento, a familiarização com as teorias existentes sobre o tema, pois há uma

diversa gama de informações que aborda as vertentes direcionadas ao assunto.

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Logo em seguida, houve um esforço para colocar as ideias e as premissas em

ordem e associá-las, com o intuito de desenvolver a teoria.

Uma sugestão para as empresas que possuem o interesse em melhorar a

qualidade de vida no trabalho de seus funcionários neste ramo de atividade, é que

dialoguem mais com a academia, permitindo, por meio dos estudos, promover

melhores condições de trabalho. É importante lembrar também que não é possível

fornecer um excelente serviço aos clientes externos se não se conhece os clientes

internos, ou seja, os próprios funcionários.

Outra proposta de pesquisa seria ampliar o escopo deste estudo, investigando

a qualidade de vida no trabalho, dos comissários de bordo no Brasil e no mundo,

envolvendo, assim, mais empresas aéreas e participantes na pesquisa.

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APÊNDICE

ROTEIRO DE ENTREVISTA COM OS COMISSÁRIOS DE BORDO

1. Nome 2. Idade 3. Estado Civil 4. Tem filhos? Quantos? 5. Em quais empresas trabalhou ou trabalha? 6. Há quanto tempo trabalha como comissário de bordo? 7. Por que escolheu a profissão de comissário de bordo? 8. Na sua percepção, por que muitas pessoas optam por essa profissão? 9. Quando ingressou na profissão, o trabalho atendeu as suas expectativas? Ainda

atende? 10. Como foi o curso de comissário de bordo? Quanto tempo durou? 11. Como foi a prova da ANAC? 12. Como soube da vaga para trabalhar como comissário? 13. Como foi o processo seletivo? Quantos processos seletivos você participou? 14. Qual é o perfil desejado ou esperado para quem atua como comissário de

bordo? 15. Como foi o treinamento após a contratação? 16. As companhias aéreas costumam oferecer treinamento direcionado ao

atendimento ao cliente? Explique. 17. Além do salário, as companhias oferecem outros tipos de recompensas?

(Benefício, remuneração variável, recompensas não financeiras) 18. O desempenho do funcionário é avaliado? Conte-me sobre o processo. 19. As companhias aéreas oferecem oportunidade de crescimento para o

profissional? Fale sobre. 20. O que mais te motiva e encanta na profissão? 21. Conte brevemente como é a sua rotina? 22. Como você concilia a sua vida familiar e social com a profissional? 23. Como é o seu ambiente de trabalho? É competitivo? 24. A rotatividade nesse segmento é alta ou baixa? Por que na sua opinião?

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25. Você considera a profissão de comissário desgastante? Explique 26. Fale sobre os desgastes físicos e psicológicos 27. Você sofreu algum problema de saúde ocasionada pela rotina de trabalho ou

conhece algum companheiro de profissão que passa ou já passou por algum

problema? 28. Qual é a reação da empresa quando algum funcionário está sofrendo por causa

de trabalho? 29. Você já presenciou algum caso de injustiça ou sofrimento no seu ambiente de

trabalho? 30. Você já se sentiu ameaçado a perder o emprego? Isso é frequente? 31. Você se sente realizado profissionalmente? É reconhecido na profissão? 32. Você tem liberdade para expressar as suas opiniões, seus sentimentos, dá

ideias e etc? 33. Você já pensou em mudar de profissão ou já pensou nessa possibilidade? 34. Como você se enxerga nos próximos anos profissionalmente?