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1 Destaque Depec - Bradesco Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos Ano XII - Número 114 - 20 de julho de 2015 1 O CDS (Credit Default Swap) são tipos de derivativos de crédito utilizado como forma de proteção contra inadimplência (prejuízo). Leandro Câmara Negrão Elaboração: BRADESCO A importância da continuidade do ajuste macroeconômico em curso e o efeito para a taxa de juros de longo prazo A percepção de que está em curso uma recuperação mais sustentada da economia dos Estados Unidos ganhou força nos últimos meses. Essa leitura, somada à sinalização vinda da própria autoridade monetária do país, tem contribuído para aumentar a confiança dos analistas quanto à elevação da taxa básica de juros ainda neste ano. Essa perspectiva faz com que as atenções se voltem também à situação macroeconômica das economias emergentes. Nesse sentido, a economia brasileira ainda apresenta alguns desbalanceamentos, os quais a nova orientação de política macroeconômica tem buscado corrigir. Esse estudo tem como objetivo verificar como o Brasil está classificado em relação aos seus pares emergentes, bem como reforçar a importância de manutenção do ajuste macroeconômico em curso mensurando alguns benefícios que teríamos em caso de sucesso. Para o estudo serão consideradas quatro variáveis estruturais: PIB, inflação, conta corrente e contas públicas, com o intuito de criar um “termômetro estrutural” para cada economia. A análise contará com um grupo de dezoito países emergentes considerando as informações de 2003 a 2015. Para elaborar o “termômetro” utilizamos o método Z-score, que consiste basicamente em subtrair as variáveis da sua média histórica e posteriormente dividi-las por seu desvio padrão. Depois desse tratamento, as variáveis se tornam comparáveis. Assim, o resultado final será a soma das mesmas. A leitura desse indicador deve ser feita da seguinte maneira: i) se positivo, significa que a soma das variáveis aponta um desempenho melhor que a média histórica do país. Já, ii) se negativo, indica que o desempenho está abaixo da média histórica recente. Os países foram divididos em quatro quadrantes: i) “melhores países”, são aqueles que a nota final é positiva e aumentou entre 2003 e 2015. Esses países apresentam um CDS 1 médio de 87 pontos. ii) “Países em desaceleração”, os quais apresentam um nível da nota final positiva, mas pioraram em relação a 2003. Nesse grupo o CDS médio é de 156 pontos. iii) “Países em ascensão”, que apresentam uma nota final negativa, mas melhoraram em relação a 2003. Não temos nenhum país classificado nesse quadrante; e iv) “piores países”, que apresentam nota negativa e pioraram no período. Nesse grupo o CDS médio é de 199 pontos. Termômetro estrutural das economias emergentes -7,0 -6,0 -5,0 -4,0 -3,0 -2,0 -1,0 0,0 1,0 2,0 3,0 -8,0 -6,0 -4,0 -2,0 0,0 2,0 4,0 6,0 Ranking 2015 Var do Ranking 2015-2003 PIORES PAÍSES: Posicionado pior do que a média / Piorou no Ranking - CDS MÉDIO: 194 PAÍSES EM "DESACELERAÇÃO": Posicionado melhor do que a média / Piorou no Ranking - CDS MÉDIO: 157 PAÍSES EM "ASCENSÃO": Posicionado pior do que a média / Melhorou no Ranking - CDS MÉDIO: - MELHORES PAÍSES: Posicionado melhor do que a média / Melhorou no Ranking - CDS MÉDIO: 87 HU CZK KRW ILS PHP PLN IDR MXN THB COP PEN TRY INR CLP MYR BRL - CDS médio esse ano: 240 ZAR RUB

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Destaque Depec - BradescoD

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Econ

ômic

osAno XII - Número 114 - 20 de julho de 2015

1 O CDS (Credit Default Swap) são tipos de derivativos de crédito utilizado como forma de proteção contra inadimplência (prejuízo).

Leandro Câmara Negrão

Elaboração: BRADESCO

A importância da continuidade do ajuste macroeconômico em curso e o efeito para a taxa de juros de longo prazo

A percepção de que está em curso uma recuperação mais sustentada da economia dos Estados Unidos ganhou força nos últimos meses. Essa leitura, somada à sinalização vinda da própria autoridade monetária do país, tem contribuído para aumentar a confiança dos analistas quanto à elevação da taxa básica de juros ainda neste ano. Essa perspectiva faz com que as atenções se voltem também à situação macroeconômica das economias emergentes. Nesse sentido, a economia brasileira ainda apresenta alguns desbalanceamentos, os quais a nova orientação de política macroeconômica tem buscado corrigir. Esse estudo tem como objetivo verificar como o Brasil está classificado em relação aos seus pares emergentes, bem como reforçar a importância de manutenção do ajuste macroeconômico em curso mensurando alguns benefícios que teríamos em caso de sucesso.

Para o estudo serão consideradas quatro variáveis estruturais: PIB, inflação, conta corrente e contas públicas, com o intuito de criar um “termômetro estrutural” para cada economia. A análise contará com um grupo de dezoito países emergentes considerando as informações de 2003 a 2015.

Para elaborar o “termômetro” utilizamos o método Z-score, que consiste basicamente em subtrair as variáveis da sua média histórica e posteriormente dividi-las por seu desvio padrão. Depois desse tratamento, as variáveis se tornam comparáveis. Assim, o resultado final será a soma das mesmas. A leitura desse indicador deve ser feita da seguinte maneira: i) se positivo, significa que a soma das variáveis aponta um desempenho melhor que a média histórica do país. Já, ii) se negativo, indica que o desempenho está abaixo da média histórica recente.

Os países foram divididos em quatro quadrantes: i) “melhores países”, são aqueles que a nota final é positiva e aumentou entre 2003 e 2015. Esses países apresentam um CDS1 médio de 87 pontos. ii) “Países em desaceleração”, os quais apresentam um nível da nota final positiva, mas pioraram em relação a 2003. Nesse grupo o CDS médio é de 156 pontos. iii) “Países em ascensão”, que apresentam uma nota final negativa, mas melhoraram em relação a 2003. Não temos nenhum país classificado nesse quadrante; e iv) “piores países”, que apresentam nota negativa e pioraram no período. Nesse grupo o CDS médio é de 199 pontos.

Termômetro estrutural das economias emergentes

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Var do Ranking 2015-2003

PIORES PAÍSES: Posicionado pior do que a média / Piorou no Ranking - CDS MÉDIO: 194

PAÍSES EM "DESACELERAÇÃO": Posicionado melhor do que a média / Piorou no Ranking -

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Quando comparada a evolução desse termômetro estrutural do Brasil com a mediana tanto da América Latina como com o grupo de todos os países considerados no exercício, é possível notar que, entre 2004 e 2010, apresentamos uma dinâmica melhor que ambos. Porém, a partir de 2012 passamos a figurar abaixo dos mesmos, piorando entre 2013 e 2014 de

forma mais acentuada. Essa reversão foi reflexo do baixo ritmo de crescimento econômico nos últimos anos, acompanhado de uma aceleração do índice de inflação e de piora tanto no déficit em conta corrente como nas contas públicas. Com isso, passamos a figurar do grupo que concentra os países com risco país mais elevado.

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BrasilMediana do "termômetro" do grupo dos paísesMediana do "termômetro" da América Latina

Evolução do Termômetro estrutural do Brasil, mediana da América Latina e das economias emergentes

Desde o fim do último ano, a política econômica brasileira apresentou uma alteração de rota. Essa mudança tem contemplado diversas frentes, desde o realinhamento dos preços administrados, o aperto da política monetária, o aumento de transparência e da organização das contas públicas brasileiras, em conjunto com políticas que visam melhorar a situação de longo prazo das mesmas e, por fim, uma reorientação da agenda de abertura comercial. Todas essas ações em conjunto têm como principal objetivo central colocar o Brasil novamente no grupo das melhores economias emergentes. É importante destacar que todo processo de ajuste econômico costuma gerar um efeito negativo no seu curso, com queda do PIB e aumento da taxa de desemprego, mas o resultado final certamente será benéfico à sociedade. Para mensurar esses efeitos, elaboramos três cenários para as variáveis que foram utilizadas no cálculo do termômetro estrutural. A partir disso, verificamos qual

seria a posição do Brasil para cada um dos cenários considerando o mesmo ambiente retratado no primeiro gráfico do estudo. É possível notar que nos três casos o Brasil apresenta uma melhora em sua nota final. Porém, somente no terceiro cenário consegue migrar para o quadrante dos “melhores países”.

Para que esse cenário se concretize, seria necessário que o ajuste macroeconômico em curso seja bem-sucedido e consiga fazer com que o país voltasse a apresentar uma tendência mais sustentável para as variáveis estruturais citadas anteriormente. O PIB brasileiro voltaria a crescer ao redor de 3,0%, média dos últimos 15 anos, nossa conta corrente voltaria para a média do período pós-crise (2008 a 2014), 2,5%, o superávit primário do setor público iria para um nível que estabiliza a relação dívida bruta sobre o PIB, 2,5%, e a inflação convergiria para o centro da meta, 4,5%.

Cenários para as variáveis estruturais

2015 Cenário 1 Cenário 2 Cenário 3

PIB -1,5 1,0 2,0 3,0

INFLAÇÃO 8,2 6,0 5,5 4,5

CONTA-CORRENTE (% PIB) -3,9 -3,5 -3,0 -2,5

SUPERÁVIT PRIMÁRIO (% PIB) 1,1 1,0 1,5 2,5

Elaboração: BRADESCO

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Var do Ranking 2015-2003

PIORES PAÍSES: Posicionado pior do que a média / Piorou no Ranking - CDS MÉDIO: 194

PAÍSES EM "DECADÊNCIA": Posicionado melhor do que a média / Piorou no Ranking - CDS MÉDIO: 157

PAÍSES EM "ASCENSÃO": Posicionado pior do que a média / Melhorou no Ranking -

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MELHORES PAÍSES: Posicionado melhor do que a média / Melhorou no Ranking -

CDS MÉDIO: 87

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BRL (Cen 2)

BRL (Cen 3)

A média do risco país das economias que se encontram no quadrante dos melhores países é de 87 pontos, relativamente abaixo do observado para a economia brasileira atualmente, 240 pontos (média de janeiro a maio de 2015). Supondo que o Brasil, ao se direcionar para esse quadrante, obtenha um benefício de pelo menos uma parcela desse diferencial de risco país (cerca de 70% do total). Isso já levaria o CDS brasileiro para um patamar ao redor de 115 pontos. Utilizando uma equação para estimar a taxa de juros real de longo prazo no Brasil, que considera, entre outras variáveis, o CDS, essa redução implicaria uma taxa real entre 4,5% e 5,0%, ceteris paribus.

Os benefícios para o país de uma redução da taxa de juros de longo prazo já foram abordados por inúmeros

artigos na academia. As conclusões evidenciam que essa queda traria ganhos tanto para o governo como para os demais segmentos da sociedade. O governo passaria a ter um custo menor da dívida pública federal, enquanto que o restante da economia passaria a contar com um custo menor de financiamentos, uma menor taxa de inflação e um aumento da previsibilidade para a economia. Esses vetores contribuiriam para a retomada dos investimentos no país. Dessa forma, acreditamos que é importante dar continuidade a esse processo de ajuste macroeconômico iniciado na transição de 2014 para 2015, uma vez que os benefícios que poderão ser alcançados deverão possibilitar que o Brasil consiga atingir um patamar de juros mais sustentável no longo prazo.

Termômetro estrutural das economias emergentes – incluindo simulação de três cenários para as variáveis estruturais

Elaboração: BRADESCO

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Octavio de Barros - Diretor de Pesquisas e Estudos EconômicosMarcelo Cirne de Toledo - Superintendente executivoEconomia Internacional: Fabiana D’Atri / Felipe Wajskop França / Thomas Henrique Schreurs PiresEconomia Doméstica: Igor Velecico / Andréa Bastos Damico / Ellen Regina Steter / Myriã Tatiany Neves Bast / Ariana Stephanie ZerbinattiAnálise Setorial: Regina Helena Couto Silva / Priscila Pacheco Trigo / Leandro de Oliveira Almeida Pesquisa Proprietária: Fernando Freitas / Leandro Câmara Negrão / Ana Maria Bonomi BarufiEstagiários: Thomaz Lopes Macetti / Victor Hugo Carvalho Alexandrino da Silva / Davi Sacomani Beganskas / Ives Leonardo Dias Fernandes / Henrique Neves Plens / Mizael Silva Alves

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