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Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em ComunicaçãoXXV Encontro Anual da Compós, Universidade Federal de Goiás, 07 a 10 de junho de 2016
Trabalho apresentado no GT IMAGEM E IMAGINÁRIOS MIDIÁTICOS, no XXV Encontro Anual da Compós, Universidade Federal de Goiás, 07 a 10 de junho de2016.
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A ideia de saúde imaginária no reality show de reprogramaçãocorporal, uma análise de Medida Certa e Além do Peso
The idea of imaginary health on reality show of bodyreprogramming, an analysis of Medida Certa and Além do Peso
Patrícia Monteiro Cruz Mendes I / Cristina Teixeira Vieira de Melo II
I Doutoranda, PPGCOM - UFPE. Contato: [email protected]
IIDoutorado, PPGCOM - UFPE. Contato: [email protected]
Resumo: O artigo busca compreender como o imaginário midiático utiliza aassociação entre cuidados com o corpo e responsabilização dos indivíduos paraproduzir uma ideia de saúde atrelada à aparência, chamada aqui de “saúdeimaginária”. Utiliza-se o conceito de biopolítica e as teorias do imaginário parao estudo do material empírico: os reality shows Medida Certa e Além do Peso,veiculados pela TV Globo e TV Record, respectivamente. Propõe-se um modelo deanálise centrado em três categorias: 1) corpo sem formas, baseado no imagináriosocial sobre os riscos da gordura/sedentarismo à saúde; 2) modelagem midiáticados corpos, enfatizando os esforços em busca dos pesos e medidas da saúdeimaginária; e 3) corpo prêt-à-porter, destinado à apresentação de umcorpo-imagem pronto para exposição/consumo.
Palavra chave: Saúde, Imaginário, Biopolítica, Televisão, Reality show
Abstract: The article seeks to understand how media imagery uses the associationbetween body care and accountability of individuals to produce a health idea tiedto appearance, called here "imaginary health." We use the concept of biopoliticsand the imaginary theories to the study of empirical material: reality showsMedida Certa and Além do Peso, broadcast by TV Globo and TV Record,respectively. We propose a focused analysis model into three categories: 1) bodywithout forms, based on the social imaginary of the risks of fat/inactivity to health;2) media modeling of the bodies, emphasizing the efforts in search of weight andhealth measures; and 3) prêt-à-porter body, for the presentation of a body-imageready for exposure/consumption.
Keywords: Health, Imaginary, Biopolitics, TV, Reality show
1. Introdução
O personagem Argan, de “O doente imaginário”, não tem sintomas de doenças, porém,
se percebe à beira da morte. Mobiliza toda a família, um rol de médicos e torna-se ele
próprio um profissional da saúde para curar sua desordem. Nessa peça, Moliére (2009)
ilustra exemplarmente como a doença imaginária movimenta uma série de cuidados reais,
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fazendo com que o sujeito gaste tudo o que possui em busca da saúde perfeita, estado que
jamais alcança, pois, como se imagina doente, é incapaz de se vê de outra maneira. Passados
quatro séculos, esse texto serve como analogia para se pensar como, na contemporaneidade,
mais do que a doença, é a “saúde imaginária” que mobiliza uma série de cuidados e
investimentos físicos, financeiros e emocionais.
Na perspectiva assumida aqui, a saúde é um constructo imaginário, que, hoje em dia,
chega aos sujeitos especialmente através da mídia. A decisão de abandonar um vício, fazer
uma dieta ou praticar uma atividade física está baseada em notícias e propagandas
divulgadas pelos meios de comunicação, responsáveis por disseminar esses e tantos outros
imaginários.
De fato, num cenário em que a obesidade é um problema global e a indústria da saúde é
uma das que mais crescem no mundo, tornou-se urgente e conveniente para os meios de
comunicação divulgar informações sobre um estilo de vida mais saudável. Em
consequência, vive-se um “boom informativo sobre saúde” (TABAKMAN, 2013). Nesse
contexto, ter uma vida saudável é, como já se assinalou, cada vez mais, efeito de uma
modelagem midiática.
Mas que noção de saúde o imaginário midiático constrói? Que tipos de imagens estão
associadas à ideia de vida saudável? De que maneira as tecnologias do imaginário incitam e
conformam corpos, desejos e condutas? Quais as estratégias empregadas nesse processo?
Para responder a tais questões, utilizam-se as teorias do imaginário e a noção foucaultiana
de biopolítica como aparato de análise. Enquanto o biopoder situa a saúde em termos de
uma métrica dos pesos e medidas; utilizando o saber biomédico para acentuar e confirmar
seu discurso; o imaginário, afetado por imagens de corpo da cultura da boa forma, vincula,
por um lado, magreza/saúde/beleza, e, por outro, gordura/doença/feiura, sem que,
necessariamente, tais coisas se equivalham.
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Uma das sínteses do imaginário durandiano mais repetidas, é de que o imaginário
corresponde à uma resposta diante da angústia existencial quanto à passagem do tempo. Nas
análises do corpus, ver-se-á que esta aflição é ampliada diante da relação entre obesidade e
doença. Durand define o imaginário como “o conjunto das imagens e relações de imagens
que constitui o capital pensado do homo sapiens” (DURAND, 2012, p.18). No entender do
autor, as imagens não são dadas, prontas ou acabadas, como um conhecimento a ser
repassado hereditariamente. Toda imagem é portadora de um sentido que está associado
diretamente à significação imaginária.
O formismo maffesoliano é uma das vias teóricas utilizadas neste estudo. Segundo
Maffesoli (2010), as formas têm o sentido de aparências e estas, por sua vez, permitem
compreender as diversas modulações do contemporâneo, onde há uma saturação da
imagem. O autor defende que as aparências, as imagens, a teatralidade da vida cotidiana, o
visível, permitem compreender a profundidade do social. Nesse contexto,
a estética difratou-se no conjunto da existência. Nada mais permanece incólume. Ela
contaminou a política, a vida da empresa, a comunicação, a publicidade, o consumo e, é
claro, a vida cotidiana [...] do quadro de vida até a propagando do design doméstico, tudo
parece se tornar obra de criação, tudo pode se compreender como a expressão de uma
experiência estética primeira. (MAFFESOLI, 2010, p.12).
Para Maffesoli, a estética corresponde a “experimentar junto emoções, participar do
mesmo ambiente, comungar dos mesmos valores, perder-se, enfim, numa teatralidade geral,
permitindo, assim, a todos esses elementos que fazem a superfície das coisas e das pessoas,
fazer sentido” (MAFFESOLI, 2010, p.143). Também para Sodré e Paiva (2002), o
fenômeno estético corresponde ao sensível, ou seja, à “faculdade humana de sentir”:
Para além da obra, o campo social é afetado pelas aparências sensíveis, não
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necessariamente instaladas na ordem do real, mas também do possível e do imaginário.
Somos afetados todo o tempo por volumes, cores e ritmos, assim como por narrativas e
frases. O sensível é esse rumor persistente que nos compele a alguma coisa, sem que nele
possamos separar real de imaginário, sem que possamos, portanto, recorrer a estruturas e
leis para definir a unidade do mundo, pois o que aí predomina é a deriva contínua de um
estilo (SODRÉ; PAIVA, 2002, p. 38).
A compreensão de uma estética vinculada ao “sentir” conecta-se ao surgimento de uma
nova ética que valoriza a comunicação. Nesse contexto, o corpo ganha proeminência.
Segundo Maffesoli (2010), o corpo é uma “máquina de comunicar”,
Porque está presente, ocupa espaço, é visto, favorece o tátil. A corporeidade é o
ambiente geral no qual os corpos se situam uns em relação aos outros; sejam os corpos
pessoais, os corpo metafóricos (instituições, grupos), os corpos naturais ou os corpos
místicos. É, portanto, o horizonte da comunicação que serve de pano de fundo à
exacerbação da aparência (Idem, p. 117).
Essa nova importância assumida pelo corpo estimula um desejo de produzir a si mesmo
como espetáculo. Diferentemente de Debord (1997), Mafesoli enxerga um aspecto positivo
no espetáculo das imagens midiáticas, pois, elas retirariam as pessoas da solidão,
produzindo vínculo social, construindo uma experiência comum. O pensamento de
Maffesoli está em acordo com a teoria da complexidade de Morin (2002), para quem a
estética não é simplesmente a qualidade própria das obras de arte, e sim um fator de relação
humana.
Se tudo é contaminado pela estética, a hipótese defendida aqui é a de que a saúde é,
antes, uma experiência estética, possibilitada pelas tecnologias do imaginário. Produzida e
disseminada pelo imaginário midiático, a saúde atende a uma experiência estética,
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revelando que, por trás de uma biopolítica do corpo, há uma ética se mostrando, nas formas
das aparências. Isto é, a estética da saúde amplificada pelos meios de comunicação serve
cada vez mais ao consumo do olhar, revelando de que forma a imaginação midiática
entende como deve ser visto o gordo e o magro, o doentio e o saudável, girando em torno de
uma aparência teatralizada.
O corpo (saudável) atende, sobretudo, a uma ética da estética, voltada a despertar as
sensibilidades, os gostos, as realidades e os imaginários buscando consumir imagens
(corporais) adornadas ao consumo das tecnologias do imaginário. Tendo em vista o fator
estético tão primordial no cotidiano, relacionado ao sentir (particular) e ao experimentar em
comum (experiência coletiva), este corpo que consome a si mesmo, e que também entra no
mercado para ser consumido, assim se coloca não mais pela força de um controle
disciplinar, mas pela sedução do espetáculo audiovisual, que age primariamente sobre o
imaginário e sobre as subjetividades.
.
2. Caracterização dos corpora de análise
O reality show de reprogramação corporal serve como lócus privilegiado para
investigar de que maneira as imbricações entre saúde/aparência formam a ideia de “saúde
imaginária”. Situado entre a ficção e os efeitos de realidade, ele coloca imaginário e real em
sintonia, tomando a vida como produto da encenação midiática. Além disso, o reality show
sacia dois anseios que os meios de comunicação procuram resolver: informar e entreter.
Fernanda Bruno aponta que o biopoder da mídia voltado à vida e à saúde dos indivíduos
busca mais responsabilizar do que normalizar: “a função deles é informar mais que curar. A
gestão de si, do corpo e da saúde implica, portanto, o contato e o acesso à informação, e não
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mais uma relação de produção ou desvelamento da verdade” (BRUNO, 2006, p.73). Se as
instituições disciplinares criavam mecanismos para vigiar e punir os indóceis, as tecnologias
do imaginário, apoiando-se em instrumentos mais refinados, centrados na produção de uma
estética (de um gosto ou sentimento em comum), cercam o público por todos os lados com
uma perspectiva de dever de informação e de responsabilidade de gerir o corpo.
Já do ponto de vista da recepção, o reality show aguça o desejo do público de ser
imagem e de consumir imagem, na perspectiva de que os meios de comunicação
potencializam, na atualidade, o desejo arcaico de estar em comunhão em torno de uma
mesma comunidade de destino (MAFFESOLI, 2012). Vale registrar ainda que, na década de
2000, a proliferação dos reality shows coincide com o crescimento da cobertura de saúde na
mídia, sobretudo no jornalismo.
Os reality shows Medida Certa e Além do Peso, veiculados, respectivamente, pelas
emissoras TV Globo e TV Record, constituem o corpus de análise dessa investigação. Nos
dois não há confinamento. Como reality shows de “reprogramação corporal”, ambos
utilizam personagens (famosos ou anônimos) que estão com quilos a mais para levar o
público a diminuir pesos e medidas corporais, ganhando massa muscular e resistência física
e, por fim, sendo mensageiros da boa saúde.
2.1 Além do Peso
O Além do Peso é a versão brasileira do Cuestión de Peso, produção original da
Endemol Argentina. Inicialmente, esteve vinculado ao Programa da Tarde, sendo exibido
de segunda a sexta-feira, com duração em torno de 30 minutos. Com a extinção do
Programa da Tarde, passou a ser veiculado no semanal matutino Hoje em Dia. As suas
cinco temporadas tiveram duração variadas, de três a seis meses. A primeira temporada
ocorreu entre setembro e dezembro de 2013. Pela primeira temporada passaram 11
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participantes. A segunda temporada estreou em janeiro de 2014; o período de veiculação
extrapolou os três meses e se estendeu até julho de 2014, com a participação de13 pessoas.
Apenas três dias após o encerramento da segunda temporada, a Record iniciou a exibição da
terceira fase do quadro. Pela primeira (e única) vez o reality trabalhou com duplas. Quatro
duplas participaram da disputa. A quarta temporada ocorreu de fevereiro a junho de 2015. A
quinta temporada foi veiculada de outubro a dezembro de 2015, com uma novidade: pela
primeira vez pessoas famosas (mas sem tanta visibilidade pública) foram as personagens,
que contou com cantores, ex-BBB, ex-paquita, entre outros.
Em Além do Peso, durante 12 horas, do café da manhã até à noite, a rotina dos
participantes é acompanhada pela equipe de produção. O material é gravado pela equipe do
programa (geralmente o treino físico ou alguma dinâmica psicológica) e apresentado no
estúdio, sob a forma de reportagem. Não há uso de vídeo-diário ou câmera amadora, nem de
repórter e narração em off. A impressão que se tem é a de que os participantes estão agindo
espontaneamente quando, na verdade, são parte de uma narrativa montada pela direção do
programa. O programa investe bastante nos comentários sobre as matérias. Ao vivo, os
apresentadores conduzem estas cenas, chamando os participantes envolvidos na gravação ou
discutindo o assunto com especialistas. Uma característica peculiar do Além do Peso é que
participantes eliminados têm a chance de voltar à competição por meio de votação popular.
Os personagens de Além do Peso são, em sua maioria, obesos. O programa aborda a
obesidade dentro da chave do grotesco. Os corpos sem formas são expostos à exaustão,
corroborando o argumento de que,
Os feios, os disformes, os miseráveis, os discriminados – seres tendencialmente
colocados na lata de lixo do esteticamente correto – são exibidos como conformações
dissipativas da imagem humana. Neles, a periferia pode reconhecer-se; deles a elite pode
distinguir-se: a televisão é o lugar da síntese. Mas o homo festivus é inevitavelmente
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“grotescus” (SODRÉ; PAIVA, 2002, p. 141).
Em função desse tipo de tratamento que os participantes de Além do Peso recebem, a
noção de grotesco está sendo utilizada aqui para referenciá-los.
2.2. Medida Certa
Totalizando até o momento cinco edições, Medida Certa compõe a programação do
dominical Fantástico. Cada temporada tem a duração de três meses e os episódios giram em
torno de 10 a 21 minutos. Em três das cinco temporadas o quadro utilizou celebridades
como personagens. Na temporada de estreia, em 2011, os apresentadores-jornalistas Zeca
Camargo e Renata Ceribelli, à época, acima do peso ideal, figuraram como personagens.
Um ano depois três crianças comuns protagonizaram a versão mirim do reality, o
“Medidinha Certa” (incluindo uma criança abaixo do peso). Ainda em 2012, a temporada
Medida Certa – O Fenômeno foi “estrelada” pelo ex-jogador de futebol Ronaldo. Em 2013,
teve início a quarta temporada: Medida Certa – A disputa, caracterizada como uma
competição entre duplas de famosos: de um lado, a cantora Petra Gil e o humorista Fábio
Porchat; do outro, os cantores Gaby Amarantos e César Menotti. A quinta edição voltou a
investir em pessoas comuns, mas com uma “madrinha” famosa no comando, a atriz e
comediante Fabiana Karla, que também se submeteu ao programa de emagrecimento. Dessa
vez, 70 voluntários de um condomínio no bairro do Butantã, na Zona Oeste de São Paulo,
distribuídos em dois times (Laranja e Azul) disputaram quem perderia mais medidas em três
meses.
Os participantes de Medida Certa são aqui classificados como “olimpianos”, já que, no
geral, são celebridades que participam do quadro. A análise desenvolvida neste artigo se
centra nas temporadas protagonizadas pelos famosos.
Além do Peso e Medida Certa são expressões distintas, mas não contraditórias do
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imaginário midiático sobre saúde. Ambos tomam, da vida comum ou do olimpo midiático,
figuras sem formas que exemplificam, pela imagem, quem está mais ou menos ameaçado
fisicamente e, assim, partem da materialidade do corpo para iniciar um percurso de
remodelação da imagem. Esta, por sua vez, funciona como um atestado de verdade que,
aliada a certas informações sobre os riscos da obesidade, indica onde e como se deve agir.
É, portanto, no seio dessa ética da estética que faz sentido correr “junto” com as
celebridades em busca da “medida certa” ou se identificar com os dramas das pessoas
obesas em suas limitações que podem ser as mesmas de milhares de brasileiros.
3. Categorias de análise
As narrativas televisuais de Medida Certa e Além do Peso seguem uma curva dramática
que vai da apresentação dos personagens e seus conflitos até o desenlace feliz e vitorioso ao
final.
Incialmente, os corpos flácidos, disformes, gordos, desproporcionais, que se está
chamando de “corpo sem formas”, seja de grotescos ou olimpianos, são apresentados como
prova de um modo de viver que negligencia a saúde. Investiga-se a história e estilo de vida
dos participantes para responder à pergunta: o que faz um corpo engordar? Nesse momento,
mostra-se como os hábitos pouco saudáveis trazem riscos à saúde.
Num segundo momento, aciona-se toda a sorte de informações e põe-se em operação
uma série de estratégias com vistas à reprogramação corporal. Nesta etapa, chamada de
modelagem midiática dos corpos, vê-se o reality show firmando-se como um formato
biopolítico por excelência (Feldman, 2007), apto a corrigir as distorções (internas ou
externas), a formatar os erros, eliminar as desordens e otimizar o funcionamento do corpo.
Partindo de uma relação linear de causa-efeito entre moderação alimentar, aptidão física
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e saúde, o Medida Certa opera a modelagem dos corpos sem considerar fatores mais
complexos como as particularidades psicossociais. O corpo é entendido como uma máquina
cujos gostos, desejos, vontades e formas devem ser ajustados, mediante moderação, esforço
e sacrifício. Especialmente em Além do Peso, a lógica da punição e do prêmio permeia essa
categoria. Quem não atinge as metas é eliminado. Quem engorda é punido. Quem emagrece
é premiado.
Nesse momento de transformação dos corpos, entram em cena duas estratégias de
modelagem corporal: a reeducação alimentar e a atividade física. Paralelamente, a balança a
fita métrica e o espelho se destacam como instrumentos de controle. Os corpos disformes
passam pelas “mãos” dos profissionais especializados na (re)forma do corpo com base num
incessante combate aos fatores de risco e na prevenção das doenças (ainda que virtuais).
Após a modelagem midiática, o corpo está docilizado e, por isso, apto ao consumo da
cultura de massa. Chega-se ao corpo prét-à-porter. Nesta fase, vê-se o quanto biopoder
midiático atua atrelado ao imaginário social, produzindo uma imagem pronta para ser
exposta/consumida midiaticamente e compartilhada socialmente. Tal biopolítica não
domestica pela força, mas seduz pelo encanto das imagens de um corpo reprogramado que
se torna ícone do imaginário da saúde, da beleza, do bem-estar, da felicidade. Nesse
contexto, a complexidade da saúde se resume à apresentação de uma imagem corporal,
centrando-se naquilo que pode ser visto, filmado (ou fotografado) e veiculado. Isto reforça a
assertiva de Maffesoli (2007), para quem a imagem é uma das formas de modulação da
estética, confirmando que “o homem é menos criador de imagens, que forjado por elas”.
Afora a percepção da linha narrativa forjada pelos dois realities shows para mostrar a
trajetória dos diferentes corpos expostos nas telas, as noções de imaginário, imaginação e
imagem orientam as relações entre saúde e corpo assumidas neste trabalho. Parte-se do
pressuposto de que o corpo é imaginário (inserido em uma época), é imaginação (produz
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sentidos e deslocamentos) e imagem (representação). Com base na lógica acima exposta,
propõe-se o modelo de análise sintetizado abaixo, que serve de base para os comentários
feitos na sequência:
Categoria 1: Corpos sem formas. Temática: corpo é imaginário. Característica: Parte da
situação inicial de um corpo disforme, considerando a associação gordura e fatores de risco
que circula no imaginário social.
Categoria 2: Modelagem midiática dos corpos. Temática: corpo é imaginação.
Característica: Aciona a reprogramação corporal partindo de uma imaginação de saúde
como efeito de autocontrole, sacrifícios e moderação.
Categoria 3: Corpos prét-à-porter. Temática: corpo é imagem. Característica:
Conquista-se uma imagem de corpo que é ícone de uma ética da estética.
4. Um Olimpo de deuses disformes
O episódio de estreia de Medida Certa busca demonstrar por que as celebridades estão
fora da “medida certa” com base em dois imaginários fortemente arraigados ao padrão
corporal: o comportamento familiar e a relação com o mundo do trabalho.
Alguns participantes aparecem ora na cozinha, preparando a refeição, ora reunidos em
torno de uma mesa cercada de parentes. Tais cenas retomam o imaginário sobre as
sociedades arcaicas, que reservavam tempo para as refeições em família. Na atualidade,
preparar e compartilhar a refeição é algo cada vez mais raro. As pessoas recorrem aos
alimentos industrializados, restaurantes à quilo ou fast food.
Recuperando a mitificação da vida em família e da comida como expressão de amor,
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Medida Certa veicula o estereótipo que associa sobrepeso às preferências alimentares,
geralmente determinadas pela mãe. Neste ponto, a tradição surge como algo a ser observado
com cuidado. Caso as relações afetuosas e familiares contribuam para deformação da saúde
(e principalmente do corpo) devem ser reavaliadas, e o indivíduo deve trazer para si a
responsabilidade de suas escolhas alimentares.
Se, por um lado, a família aparece como o lugar dos “desvios” alimentares; por outro,
ela é mostrada como lugar da normalização dos corpos, indicando os códigos que definirão
o proibido e o tolerável. Por exemplo, Gilberto Gil, com as proibições alimentares que
impunha para a filha Preta Gil na infância, assume o papel da autoridade paterna de
controle.
Ainda no primeiro bloco do programa de estreia, a mídia, que antes alastrou o
diferencial de Preta Gil e Gaby Amarantos como referência de beleza das “mais cheinhas”,
agora, apoiada no discurso do cuidado com a saúde, enfatiza que as cantoras precisam entrar
na medida certa. Não é difícil de entender a mudança deste discurso. Sabe-se que o fardo
das imposições de um corpo perfeito pesa muito mais sobre a mulher, sobretudo em se
tratando de cantoras que utilizam o corpo como um veículo fundamental da carreira. Vê-se
que que, potencializando a herança genética e o estilo de vida “nada saudável”, mas também
o sonho, a busca pela felicidade e a luta contra a balança, Medida Certa investe na
reprogramação corporal como causa e efeito de uma insatisfação com a aparência.
No segundo bloco do programa, ancorado no par informação-responsabilização,
Medida Certa se apoia no discurso do risco para demonstrar que a falta de controle na
alimentação e o sedentarismo tem provocado danos à saúde das celebridades. A
racionalidade científica se volta para uma medicalização das aparências.
5. O corpo sem forma dos grotescos
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A história de vida também é a grande pauta do programa de estreia de Além do Peso. O
padrão alimentar da família, o estilo de vida sedentário, mudanças no corpo em função de
gravidez e uma série de problemas emocionais (traumas, frustrações, perdas) são apontados
como as causas da obesidade.
Nas imagens que antecedem a entrada ao vivo dos personagens em estúdio, eles
aparecem distantes e solitários. Os enquadramentos da câmera os mostram à sombra, à
margem. O olhar é de contemplação, a trilha é lenta e triste. A obesidade é retratada como
uma fobia que exclui socialmente suas vítimas. Os relatos abordam o quanto a obesidade
impacta no dia a dia, impedindo atividades simples como passar na catraca dos ônibus,
abaixar-se para calçar um sapato, levantar bruscamente, comprar roupas em lojas.
A estética do grotesco predomina. Os sujeitos são mostrados à moda das atrações dos
circos de anomalia humana da Idade Média (Vigarello, 2012), em que seres disformes são a
atração e provocam riso e choro, garantindo o entretenimento. Dobras, banhas e flacidez
ocupam a tela. As mulheres aparecem de top e os homens sem camisa. Pouca roupa para
muita gordura. Os participantes são apresentados como pessoas ávidas por comer. As
imagens revelam mãos apressadas em direção a pratos abarrotados, garfadas cheias de
comida, bocas bem abertas, olhos quase fechados. Enfim, o que se vê na tela são figuras
enormes e alvoroçadas, de apetite irrefreável e comportamento animalesco. A comida os
desumaniza.
Em determinado momento, entra em cena o espelho, inimigo implacável que reflete um
olhar acusador sobre a gordura. As imagens expõem exageradamente o corpo. A barriga é
mostrada no mínimo em dois ângulos: de frente para a câmera e de perfil. Por vezes, o
enquadramento começa fechado na barriga e depois vai abrindo até o rosto do participante
aparecer, sempre com ar triste, tenso, angustiado e, acima de tudo, constrangido. Alguns
choram diante do que veem. Nada mais teatral do que colocar um espelho como instrumento
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de aferição da obesidade e oferecer esta imagem a pessoas que lidam com o repúdio da
autoimagem, agora publicizada. Obrigados a olharem o corpo inteiro no espelho – o que
muitos dizem não fazer há anos -, os participantes rejeitam a própria imagem. Numa
inversão do mito narcísico, eles alimentam aspectos negativos sobre a aparência de si
mesmos. O espelho dá o mesmo veredicto a todos: é impossível se sentir bonito estando
gordo.
Funcionando como um instrumento de verdade, o espelho é um árbitro implacável das
aparências grotescas destinadas ao juízo do olhar, espécie de juiz que dá uma sentença aos
transgressores da boa aparência. Como “o espelho não mente”, ele se torna um aliado das
imagens televisuais que tentam rastrear a alma dos participantes, decepados em sua
autoestima, mas também dispostos a unir os pedaços e se (re)compor. O consumo de uma
nova aparência é tanto o anseio dos participantes quanto a resposta oferecida pelo programa.
Assim, produção da aparência e subjetividade caminham juntas.
Logo de saída, Além do Peso medicaliza os participantes. Os problemas relacionados ao
excesso de peso, tratados como risco à saúde em Medida Certa, em Além do Peso toma ares
de tragédia anunciada e autodestrutiva. Sendo a obesidade mórbida um assunto de
“calamidade pública”, o risco traduz-se numa imaginação antecipada da morte. O
personagem Eduardo, embora não chegue a mencionar qualquer problema de saúde, se
pergunta: “será que eu vou morrer gordo?”. A doença virtualmente instalada faz supor que o
fim está próximo. Ao colocar o futuro como uma dúvida, o medo imaginário descontrói os
aspectos positivos do presente. O reality suscita um sentimento de compaixão em favor de
pessoas cujo futuro está ameaçado pela obesidade.
Ao acentuar o risco de morte prematura, Além do Peso incentiva novas práticas de
cuidado. Os personagens assumem a culpa extraída de uma moral social, que diz: “você é
gordo porque falhou em administrar sua vida”. Imaginando a morte, os participantes podem
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acionar um maior controle da vida, até então negligenciada. Mortificando os desejos e
recusando as paixões da carne, os participantes do programa iniciam a via-crúcis rumo à
salvação. Este é o enredo dramático de Além do Peso.
6. Pesagens e métricas: o cálculo da saúde imaginária
A justiça que rege Além do Peso e Medida Certa toma a pesagem do corpo como
indício das boas e más ações. Assim, o dever do participante é equilibrar a alimentação
moderada com a atividade física regular, a fim de garantir sua permanência no jogo. O bom
jogador é aquele que aparece mais magro a cada semana (Além do Peso) e, sobretudo, na
pesagem final (Medida Certa). A causa maior (objetivo), que é a saúde, estaria na dianteira
de todos os esforços (deveres) da reprogramação, centrada em “comer melhor” e “se
exercitar com mais regularidade”.
O simbolismo da balança lembra a abordagem de Foucault (2004) acerca dos aparelhos
encarregados de vigiar o corpo nas sociedades modernas. Em Medida Certa, o instrumento
atende a três requisitos: mostrar o peso inicial (estreia), registrar se está havendo queima de
gordura (no primeiro mês ou nos primeiros 45 dias) e comprovar se o participante conseguiu
entrar na “medida certa” (episódio final). Nesse programa, as pesagens ocorrem no
consultório médico, resguardando uma suposta privacidade (agora exteriorizada) dos
olimpianos para o espaço das consultas, logicamente acompanhadas pelas câmeras. Apenas
no final do reality a balança é colocada no estúdio do Fantástico, para comprovar o novo
peso, ao vivo.
Em Além do Peso, a balança também aparece no consultório médico, mas brilha mesmo
no estúdio, onde está presente em três dos cinco dias de veiculação do programa. A
pesagem eliminatória ocorre às segundas e sextas-feiras, embaladas por trilhas sonoras que
denotam suspense e ampliam o terror sobre os participantes. Ao subir na balança, o
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personagem fica no centro do estúdio, em frente à plateia e de costas para os demais
colegas. O peso é antecipado ao público por um monitor inserido no vídeo, mas o
participante só tem conhecimento quando o apresentador anuncia o resultado. O participante
que não atinge a meta é automaticamente eliminado, ou seja, vale a lógica do “quem perde
ganha” de The biggest loser[1].
A chamada “pesagem de risco” ocorre normalmente às quintas-feiras, com o intuito de
conferir se os participantes estão próximos ou distantes da meta estipulada na segunda-feira
referente ao peso que devem apresentar na sexta-feira. Após o registro da balança, os
competidores que estão longe da meta devem usar uma camiseta preta, na qual está escrito:
“peso de risco”. O personagem que está no “peso de risco” tem menos de vinte e quatro
horas para intensificar os treinos e tentar atingir a meta. O biopoder exercido por Além do
Peso dissemina a ideia de que o veredicto da balança é sempre justo e definitivo: quem
engorda, não pode prosseguir.
Nos dois programas, outro importante aparelho utilizado para fiscalizar se os
participantes estão emagrecendo é a fita métrica. As imagens expõem com detalhes aquilo
que é um dos objetos mais venerados nesta sociedade de consumidores do corpo: a barriga.
Levantar a camisa, medir o abdome, contar e celebrar cada baixa no percentual de gordura
reforçam os apelos da saúde imaginária.
A lógica da fita métrica e da balança funciona com uma razão bem definida: perder
centímetros, diminuir o peso e definir o corpo. No jogo das medições, quem foi
ridicularizado pode ser reconhecido (Além do Peso); e quem já é reconhecido pode ser
ridicularizado com uma finalidade agregadora (Medida Certa). Além desses instrumentos,
também em ambos os programas entram em ação os responsáveis por comandar o
espetáculo: os formadores ou programadores da saúde imaginária.
7. Os formadores da saúde imaginária
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Como se destinam a tratar os “erros” já identificados pela balança, a fita métrica e o
espelho, Além do Peso e Medida Certa utilizam maciçamente o conhecimento de
especialistas em Saúde e Educação Física (educadores físicos, nutricionistas, psicológicos,
endocrinologistas) para explicar aos leigos como opera a “engenharia” do corpo humano em
busca de formatar e corrigir as “falhas”, potencializando o “sistema” que conduz à
reprogramação corporal. Os especialistas funcionam como “formadores” de um novo corpo.
Eles imaginam o que desejam criar e, utilizando as referências do imaginário social,
reproduzem a “fôrma” e os valores mais caros associados à saúde imaginária.
Em Além do Peso um especialista é pouco para tanta gordura a eliminar e tanto
transtorno a tratar. A voz legitimadora não é apenas de uma autoridade primordial, como
Márcio Atalla, em Medida Certa, mas de uma “equipe multidisciplinar”, formada por
preparador físico (Alexandre Bró), nutricionista (Bianca Naves), nutrólogo, na primeira
temporada (Thiago Volpi) ou endocrinologista nas temporadas seguintes (Rosa Rahmi) e
psicólogo/a (Vanessa Carminatti, na primeira fase, e Alessandro Vianna, nas demais).
Esses profissionais estão presentes em todos os programas, são os porta-vozes do saber
biomédico, direcionam as opções alimentares e os exercícios físicos; aproximam-se dos
personagens de modo afetuoso, mas, ao mesmo tempo, cheio de autoridade.
8. Do prazer à guerra: duas biopolíticas da forma
Em Medida Certa, o preparador físico Márcio Atalla utiliza o discurso da regularidade
no lugar daquele da atividade física intensiva. A regularidade está sintetizada em torno de
duas ênfases: 1ª) ensinar a cultura da atividade física como algo prazeroso e divertido e 2ª)
combater o “problema” nacional do sedentarismo atrelando aptidão física à promoção da
saúde.
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A cada semana o reality investe em uma prática diferenciada, das mais caseiras às mais
sofisticadas: vôlei, futebol, remo, boxe, pular corda, musculação, natação, hidroginástica,
tênis, entre outras. Vinculado à promoção da saúde, o esporte é explorado como produto do
estilo de vida ativo e da promoção da saúde.
A mistura lazer e movimento, é um discurso bastante aceitável para celebridades que
dormem pouco, viajam muito e não tem hora certa para fazer as refeições. Além do mais,
“qualquer um” pode pular corda, descer e subir as escadas de um prédio e colocar o corpo
em movimento. Diante de tão ampla oferta de exercícios, cada pessoa tem a oportunidade (a
responsabilidade) de escolher a prática que mais combina com suas preferências e gostos.
Quando Medida Certa cria todas as possibilidades para que, em casa, na academia, no
hotel, no parque, os famosos possam praticar alguma atividade física, a meta do
emagrecimento incendeia a mente do público: “querer é poder”; “só não se movimenta
quem não quer”; “magreza/beleza é uma questão de escolha”. Estes discursos são altamente
sedutores, porque, arraigados a eles, há imagens de pessoas que, assim como os famosos,
estão “priorizando” em suas vidas o cuidar de si.
Nesse sentido, a Caminhada Medida Certa multiplica o milagre da reprogramação. A
biopolítica utilizada para promover uma cultura do exercício aos participantes do programa
toma ares de política social, o controle do corpo privado se estende ao corpo público. A
saúde imaginária desloca-se do corpo individual para o coletivo. Nesse contexto, o antigo
estereótipo do telespectador passivo no sofá é substituído por um indivíduo ativo, que não
só busca as informações (na TV, nos aplicativos, nos blogs e sites), mas se responsabiliza
por si, exercitando-se.
Em Além do Peso, os exercícios corporais estão situados em outro campo: o da
exaustão física. Tomando o imaginário do exercício como uma batalha, sobressai-se no
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programa todo um palavreado associado ao discurso bélico. O imaginário do combate e da
guerra permeiam as reportagens. Para emagrecer, é necessário utilizar “táticas” militares,
comandadas com o rigor de um “sargento”. O preparador físico Alexandre Bró incorpora
esta imagem e se coloca como o oficial militar responsável por comandar a tropa de
“soldados” que forma o seu “exército”. Com palavras de ordem próprias desse universo, o
“sargento” Bró pergunta ao seu exército: “Vocês vieram aqui pra quê”? Ao que a tropa,
posicionada em frente ao preparador, responde: “Pra emagrecer!” O treino tem o objetivo de
“levar os participantes à exaustão”, uma estratégia comum em todas as temporadas, na
véspera da pesagem eliminatório da sexta-feira.
O educador físico é o pai imaginário que repreende (“castiga”) com a intensidade dos
exercícios, a partir de uma norma rígida e inegociável (colocar “na linha’), no entanto, por
mais contraditório que pareça, toda essa autoridade e zelo excessivos resultam de um “amor
incondicional”. Tal sentimento tem um poder milagroso de minimizar as más impressões
dos gritos e gestos autoritários, por vezes desrespeitoso, em nome de um sentimento paterno
que justificaria os excessos. Esta estratégia de Além do Peso encontra eco na imaginação
dos participantes, acentuando a mística que a mídia cria em torno dos especialistas que
conduzem à saúde imaginária. Os obesos submetem seu corpo a um esforço militar para
então serem valorizados e amados incondicionalmente. Segundo Chevalier e Gheerbrant, “a
dor diante do sacrifício consentido não tem de ser renegada” (2009, p. 798). No imaginário
religioso, o sofrimento tem como compensação uma esperança no porvir.
Vale frisar ainda que na biopolítica das formas corporais, imagens que expressam apoio
e solidariedade são utilizadas como modo de destacar uma espécie de paliativo para o
sofrimento implicado na sofrida ditadura da malhação. O abraço coletivo salienta uma
espécie de harmonia e cumplicidade, apagando qualquer conflito entre o imaginário militar,
durão e até obcecado que o preparador mostra durante os treinos, com aquele que agora se
revela: o de pai imaginário, que disciplina (como também faz o sargento), castiga e acima
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de tudo ama incondicionalmente. Neste tribalismo posto em cena pela televisão, o que vale
é ir ao encontro, é estar junto, equilibrando o peso da gordura com a leveza da partilha de
um sentimento em comum, o que demonstra a ética da estética em pleno funcionamento
(MAFFESOLI, 2012).
9. Comer sob prescrição
Na atual fase do biopoder, em que a norma foi substituída pelo risco e a verdade pela
informação (BRUNO, 2006), a ideia de moderação surge para dar conta de uma passagem
do dever para a responsabilização. Segundo Vaz (2006), combinar moderação e prazer é um
dos nexos associados ao discurso dos fatores de risco.
Nos dois programas, “moderação” é a palavra-chave quando se fala de reeducação
alimentar. Os hábitos alimentares, diretamente associados aos medos de engordar,
funcionam como pistas de como cada pessoa cuida (ou não) de si mesma. Nesse contexto, o
papel do nutricionista é fundamental, educando para novos modos de se alimentar.
No caso do Medida Certa, procura-se diferenciar as restrições alimentares indicadas aos
famosos (reeducação) das práticas radicais de emagrecimento (dietas). A expressão
“reeducação alimentar” mascara a direção estética da moral da boa forma, já que a seleção
entre alimentos proibidos e permitidos incide diretamente sobre as aparências.
Em Além do Peso, os participantes são submetidos a uma dieta rígida. Em um dos
episódios[2], eles recebem uma caixa apresentada como um “presente” na qual está o prato
preferido de cada um. Quando confrontados com a caixa-presente, o apresentador Britto
Júnior indaga à nutricionista: “isso é presente, doutora Bianca, ou é tortura?”, ao que ela
responde: “Depende do ponto de vista, Britto. Mas a pergunta que eu faço inicialmente é:
quem está gostando de emagrecer aqui?”. Diante do questionamento da nutricionista, todos
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os participantes levantam as mãos afirmativamente, transmitindo unanimidade e adesão,
num tribalismo próprio da decisão de emagrecer em grupo. Juntos, encontram um sentido
maior para a trajetória que estão desbravando no reality show. Como os membros de uma
mesma tribo, eles estão ali não para disputar, e sim para compartilhar experiências e dividir
provações.
O apresentador Britto Júnior ainda afirma que o “presente” pode despertar o monstro
que cada participante carrega. Neste momento, a associação entre obesidade e grotesco se
mostra mais uma vez: “a tensão do limite (ou da reversibilidade) entre o homem e o animal”
(SÓDRE e PAIVA, 2002, p.61). Mitologicamente o monstro combina características
humanas e animalescas e é um dos arquétipos que atravessam todas as culturas, indicando
os medos que devem ser domados, visto que eles ameaçam suas vítimas pelo poder e força
que têm. E o que se espera dos “monstros” que habitam os obesos? Espera-se que eles sejam
eliminados de vez. Domesticados a partir das técnicas dos “formadores” da modelagem
midiática, os monstros foram sacrificados nas provas de fogo da atividade física e da
moralidade alimentar. No lugar deles, surge um ser humano saudável, civilizado, autônomo,
capaz de gerir o próprio corpo e dominar a mente (EHRENBERG, 2010).
10. O tribalismo dos corpos prêt-à-porter
Nos episódios finais dos programas analisados, a ênfase está em mostrar os ganhos
obtidos durante o período de reprogramação corporal: um corpo mais próximo do padrão
almejado pela saúde imaginária, que permite aos sujeitos se subjetivarem de outra maneira.
Isso vale para grotescos e olimpianos. Ambos viram ícone de uma época que transforma o
corpo em imagem, em peças de propaganda.
Voltados para a apresentação e o consumo de si como imagem, os corpos prêt-à-porter
potencializam o imaginário dessa época, altamente encantada com as luzes do ver e do ser
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visto. De fato, nos reality de reprogramação corporal tudo funciona a serviço da arte de
mostrar. Nesse sentido, a ideia de corpo como “máquina de comunicar” é alargada ao
máximo, pois, o corpo individual se desloca, se reprograma, se refaz, se anima em um corpo
social. Reflexo de seu criador (os meios de comunicação), esse novo corpo individual
acentua seu pertencimento ao imaginário social, pois, foi gestado, antes, na imaginação. Ou
seja, a saúde imaginária domestica os corpos individuais, porém o grande objetivo é o corpo
social, as medidas coletivas, o controle biométrico de uma sociedade.
Da emissão no fluxo televisual às possibilidades de interação, o tempo inteiro os
programas querem ampliar o alcance do imaginário sobre a saúde, indo das lutas e vitórias
dos participantes (individuais) para as do público. Diante disso, enquadrando a participação
por meio da sedução das imagens, o reality show firma-se como um totem poderoso, que
não apenas insere os iniciados no percurso da modelagem midiática, mas também alcança as
necessidades daqueles que estão separados pelo tempo ou pelo espaço da emissão televisual.
Multiplica o dever de cuidar do corpo, mas também amplia a ética da estética, simbolizando
a identificação em torno de um imaginário comum: a saúde ideal.
O simples fato de aderir (ou assistir) ao reality show coloca o participante (e o público)
em sintonia com o tribalismo pós-moderno: as pessoas decidem emagrecer juntas e,
dispersando-se no grupo, se desprendem dos tormentos da escolha, ficam isentas da
responsabilidade de trilhar sozinhas – e pesadas – os rumos da vida sedentária. O convite da
reprogramação (modelagem) implica numa adesão, na formação de novos vínculos
propiciados nas ambiências das tecnologias do imaginário.
Para Silva, as tecnologias do imaginário cristalizam o trajeto antropológico na vida
social, funcionando num espaço de contradições.
As tecnologias do imaginário são dispositivos (Foucault) de intervenção, formatação,
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interferência e construção das “bacias semânticas” que determinarão a complexidade
(Morin) dos “trajetos antropológicos” de indivíduos ou grupos. Assim, as tecnologias do
imaginário estabelecem “laço social” (Maffesoli) e impõem-se como o principal mecanismo
de produção simbólica da sociedade do espetáculo” (Debord). (SILVA, 2012, p.20,21).
Antes de apresentar as conclusões deste texto, vale registrar pequenas diferenças entre
os dois programas em seus episódios finais: Medida Certa ilustra o imaginário da
pós-modernidade que confere ao corpo a razão moralizadora da aparência ideal. Quando o
programa induz Ronaldo a provar o blazer como forma de mostrar, na prática, o mérito do
emagrecimento, vê-se a ênfase que o programa dá a aparência, subjacente à reprogramação.
Além do Peso parece ir na direção do ideal platônico. Embora uma abordagem relativa à
beleza ainda se faça presente, busca-se uma autonomia da alma em relação ao corpo. A
beleza já não depende tanto das banhas ou da flacidez, ainda à vista, mas do que está “por
dentro”.
11. O vai e vem de corpos insubordinados
Para abordar as relações entre corpo, saúde, aparência, os reality show de
reprogramação corporal articulam a realidade da vida cotidiana às técnicas do espetáculo
televisual, nutrindo-se de estratégias como uma tópica da subjetividade exteriorizada
(BRUNO, 2013), uma biopolítica do corpo (FOUCAULT, 2013), e uma aliança entre a
promoção da saúde e os fatores de risco (VAZ, 2006). Agindo assim, eles combinam, num
só discurso, toda uma compreensão acerca do paradoxo padrão de corpo x vida saudável,
utilizando as aparências como formas formantes e fundantes (MAFFESOLI, 2010) de um
conhecimento sobre o que é e como obter saúde na vida cotidiana.
Tratando o corpo humano com uma lógica de reprogramação, Além do Peso e Medida
Certa fazem supor que “qualidade de vida” é produto de certas relações centradas em retirar
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(da “memória do corpo”) “hábitos ruins” e inserir hábitos bons, resultando no alcance da
“medida certa”. Mas, não custa alertar que, tão fugaz quanto os meses de reprogramação, é
a disposição de se manter na “medida certa”.
Tomando como referência os exemplos aqui analisados, é bom lembrar que, por vezes,
a promessa de vida saudável de olimpianos e grotescos se diluiu com o retorno à vida
cotidiana fora da medição e da mediação televisual. O corpo cumpriu seu destino na
narrativa televisual e depois se desfez. Finalizada a pressão de estar sob o controle das
câmeras, dos especialistas e acompanhados por milhões de brasileiros, alguns engordaram
após o reality show. Isso mostra que “reprogramar” corpos humanos não é algo tão
instrumental e linear, pois, nem sempre eles respondem exemplarmente a lógica racional de
causa e efeito. Há sempre a possibilidade de se deparar com bugs em corpos
insubordinados.
Notas
[1] A relação perda (de peso) e ganho (de dinheiro, beleza, saúde) é o mote desse reality show, criado em 2004 pela TVnorte-americana NBC. No Brasil foi chamado de “O Grande Perdedor”, veiculado pelo SBT.
[2] Além do Peso, 30/01/2014.
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