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claudia soares - a história de heliópolis (anotações de pesquisa do mestrado)
A história de Heliópolis
1971 – Ações do poder público
"não se faz mobilização social com heroísmo. As mudanças são construídas no cotidiano por pessoas comuns, que se dispõem a atuar coletivamente, visando alcançar propósitos compartilhados". (TORO e WERNECK,2004)
Hoje a cidade de São Paulo possui mais de duas mil favelas segundo
informações da prefeitura de São Paulo. Em 1957 segundo levantamento
realizado por Bonduki (2004) existiam 141 núcleos de favelas, totalizando 8, 5
mil barracos e 50 mil pessoas. As favelas em São Paulo surgem da crise do
mercado imobiliário na década de 40, significando uma resistência da
população em deixar as áreas centrais da cidade segundo Bonduki (2004), pois
ali eles tinham o emprego próximo e a moradia que eles pudessem pagar.
“Muitas das favelas surgidas nesse período, como a da Baixada do Penteado, Ibirapuera, Canindé, ordem e Progresso, Lapa, Vila Guilherme, Piqueri, Tatuapé, Vergueiro e Vila Prudente localizavam-se nas várzeas dos rios Tietê e Tamanduateí – públicas e ociosas devido a dificuldade de ocupação, próximos ao centro ou as áreas industriais.” (BONDUKI, 2004, p.262)
E é depois do período considerado democrático e populista que vai de
1946 a 1964, onde o Estado criou uma série de empreendimentos
habitacionais que não davam conta da demanda. Em 1964 com o golpe militar
uma nova fase na área da habitação, nas áreas sociais e até culturais estava
para ser consolidada. Na moradia há a criação do Banco Nacional de
Habitação – BNH. Em 1970 tínhamos uma política completamente desfavorável
ao trabalhador, desde o arrocho salarial decretado em 64 os trabalhadores não
conseguiam honrar suas dívidas levando-os a inadimplência até mesmo na
casa própria.
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“A partir de 1964, o “arrocho salarial” (redução do salário do trabalhador pelo artifício de ignorar a desvalorização da moeda) inviabilizou a poupança popular e por conseqüência a aquisição do lote na periferia e a autoconstrução da moradia popular. Nesta época as mulheres foram lançadas no mercado de trabalho para garantir o nível de renda familiar anterior. É desta época a primeira geração de menores abandonados que não eram órfãos.” (ALTENFELDER, 1975, APUD PASTERNACK, LEME E MOREIRA, 2007).
Segundo Sampaio (1991) a área de Heliópolis foi adquirida, em 23 de
abril de 1942 pelo Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Industriários -
IAPI, do Conde Silvio Álvares Penteado e outros, pela quantia de 17.500 mil
contos de reis. O IAPI tinha a intenção de construir na área casas para
residência dos associados do Instituto. Essa área já possuía algumas
construções que eram: seis casas, todas térreas, de boa construção, isoladas,
com área construída de sessenta e oito metros quadrados, situadas nas ruas
Almirante Mariath e Siqueira Bulcão; cinco casas na rua Cel. Silva Castro, com
a mesma metragem, porém geminadas. Todas essas casas tinham dois
dormitórios, banheiro e cozinha. Tinha também um sobrado, contendo no andar
térreo um armazém e nos altos uma residência, situado a rua Barão do Rio da
Prata, e mais um sobrado duplo, situado na rua Almirante Mariath. Segundo
escrituras que estão transcritas no 6º Cartório de Imóveis da Comarca de São
Paulo, essas casas faziam parte do Conjunto Residencial Vila Heliópolis, que
contava com 36 casas, que ocupavam lotes com áreas de 141 a 697m.
Sampaio (1991) descreve também como aquela área foi dividida, pois
em novembro de 1966, de acordo com o Decreto-Lei nº 72, que unificou os
diversos Institutos no INPS – Instituto Nacional de Previdência Social, a gleba
passou para o IAPAS – Instituto de Administração Financeira da Previdência e
Assistência Social, que a partir daí vendeu e ocupou o terreno. Em 1967 o
IAPAS vendeu uma área de 423.731m para a Petrobras - Petróleo Brasileiro S/
A, que em 1976, a título de permuta, transmitiu a Raul Diederichsen uma série
de pequenas áreas dentro da gleba, num total de 960m. Entre 1977 e 1985 os
compradores eram funcionários públicos estaduais e federais, químicos,
motoristas, advogadas entre outros. Em 1978 foi à vez da Companhia de
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Saneamento Básico do Estado de São Paulo - SABESP que ficou com uma
parte depois da desapropriação para a construção da Estação de Tratamento
de Esgotos do ABC, que só começou há funcionar 20 anos depois. E em abril
de 1969 o IAPAS constrói o Hospital Heliópolis e o Posto de Assistência
Médica-PAM.
Figura 10 - Estação de Tratamento de Esgotos do ABC ao lado Heliópolis Figura11 – Hospital Heliópolis
E é nessa paisagem que entre 1971 e 1972 a prefeitura sob o comando
do prefeito José Carlos de Figueiredo Ferraz retira 153 famílias de áreas
ocupadas na favela da Vila Prudente e Vergueiro, com a intenção de fazer vias
públicas e coloca essas pessoas em alojamentos "provisórios" no terreno do
IAPAS, mas que com o passar dos anos tornaram-se permanentes, pois a
maioria das famílias está lá até hoje. “Ou seja, um improviso da prefeitura que
resultou em uma favela gigantesca.”1 Outras famílias foram construindo seus
barracos. Pessoas que participaram da obra do Hospital e do PAM acabaram
permanecendo por lá.
A área de Heliópolis como outros espaços do município de São
Paulo, são áreas públicas que na maioria das vezes estão abandonadas.
Conforme descreve Sampaio (1991), sobre a omissão e a ação do governo que
contribui para a criação dos “guetos de pobreza no município.”
A história é marcada por diversas ocorrências envolvendo grileiros,
invasões, mutirões, informalidade, lutas contra a polícia, mas também
conquistas por instalação de infra-estrutura e pela posse da terra. A
1 Sampaio, Maria Ruth. Heliópolis: O percurso de uma invasão. Tese para título de livre-docente. 1991
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comunidade desde 1971 foi buscar alternativas e soluções através das suas
ações individuais e coletivas.
A paisagem de Heliópolis através de Dona Conceição – Ações
tarnsformadoras
O relato de Dona Conceição mostra as dificuldades do dia- a -dia, em
cuidar e educar as crianças, a briga com os grileiros, mas relata também as
relações sociais que fortalecem a comunidade. A igreja aparece como solidária
aos moradores.
Foto: Cláudia C. Soares
“Quando eu vim pra cá conheci Dona Lourdes que me tratava como filha, ela encontrou com
um tal de Mariano se dizia o dono dos terrenos aqui e Dona Lourdes conversou com ele para
ele vender um pedaço de terra para mim, e eu tinha que pagar 200 mil réis. Isso foi em 1972.
Eu sou uma das primeiras, quando eu vim morar aqui , só tinha 04 barracos, era o meu, da
comadre Nilza, Dona Maria, mãe do Thiaguinho e finada Dona Júlia. Aqui era um matagal que
eu fiquei com medo, pois eu mudei a noite quando eu vi no outro dia aquele matagal...Mas ai
Dona Lourdes falou com esse homem e ele deu pedaço de terra para mim. Dona Lourdes me
disse que não era dele não, a Dona Lourdes financiou todo o meu barraco, de prego a telha,
tudo, ficou um barraco tão bonito, 03 cômodos, ela comprou no deposito e pagou tudo a vista.
Ai meu Deus eu tinha que pagar o dinheiro da Dona Neuza e tinha que pagar o terreno, mas o
que iria dar de comida para os meus filhos...ai ela disse, tu me dá devagarinho e eu consegui
pagar tudo para ela, mas eu fazia compra na cooperativa mas vinha bastante coisa, mas no
outro mês descontava tudo...ai fui na igreja falar com padre Bento, ele foi uma benção na
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nossa vida ... Lá tinha a Dona Isabel que me dava sexta básica, eu participava do Clube de
mães que era na igreja ...ai quando o Seu mariano veio em buscar o aluguel, eu disse que eu
não tinha o dinheiro, ele ameaçou e disse que vinha derrubar o barraco, ai chorava , chorava.
Eu arranjei o dinheiro e dei pra ele... Mas meu marido bebia e vendeu o meu barraco, ai esse
mesmo Seu mariano me deu outro barraco, mas vinha outro cara aqui cobrar se dizendo dono
do barraco, era um grileiro. Ai chegou um advogada dizendo que aqui vocês não vão pagar
mais nada, pois isso aqui não é de grileiro nenhum, aqui é do IAPAS. E os grileiros foram para
cima do advogado, bateram nele ...mas ele sobreviveu, mas agora vem a melhor parte,
lavávamos roupa na mina, buscávamos água na mina, tinha uma tabua, um cano e cada um
lavava sua roupa, as mulheres chegavam lá cedo. Eu que coloquei o nome da rua da Mina, foi
eu, a assistente social perguntou e eu dei a idéia e ninguém diga que é mentira, foi a
assistente social a Lourdes, Rosana e Eliane, encontrei um dia desses ela em Higienópolis.
Quem colocou aquela rua da Mina foi eu. Depois chegaram Genésia, João Miranda, um monte
de gente e o matagal foi acabando...”
Figura 12 e13 : Dona Conceição e as duas netas. A sua casa possui 03 quartos, sala, cozinha balcão, uma lavanderia e dois banheiros, uma garagem para dois carros e a laje onde Dona Conceição e a vizinha estendem roupa e é o salão de festa da casa. Foto: Cláudia C. Soares
Pessoas, dados e números de Heliópolis
Heliópolis possui aproximadamente um milhão de metros
quadrados, localizada ao sul do município de São Paulo, região do Sacomã,
seus limites são a Avenida Juntas Provisórias, que se estende até a divisa com
São Caetano do Sul que tem como divisor de águas o Rio Tamanduateí e a Av.
Guido Aliberti. Fica a 25 km do centro de São Paulo. O transporte público não
entra em algumas ruas da comunidade, pois as mesmas são estreitas, então
as pessoas se deslocam até as vias principais, como a Estrada das Lágrimas,
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Av. Almirante Delamare, Rua Cel. Silva Castro e Rua Cônego Xavier, onde
estão localizados os pontos de ônibus. Na rua lateral do hospital Heliópolis
funciona como um terminal, tem ônibus para vários locais, pois a demanda é
grande, o hospital atende em média 1.000 pessoas. Heliópolis também fica
próxima as principais vias de acesso de São Paulo como a Rodovia Anchieta e
Avenida dos Estados. Hoje a comunidade conta com o terminal Sacomã
inaugurado em 2007, com ônibus que atende a vários bairros de São Paulo e
principalmente até o Centro de São Paulo com o Expresso Tiradentes que vai
até o Terminal Parque D. Pedro, com um percurso de 20 minutos. Com o
aumento das linhas do metrô, a menos de 6 km da comunidade, a população
conta com a linha verde Estação Alto do Ipiranga. Em 2006 a favela foi
rebatizada pelos moradores e pela prefeitura como BAIRRO que é denominado
de Nova Heliópolis.
Segundo dados do IBGE 92% da população são nordestinos, e estão lá
desde a década de 70. Não foram só as pessoas removidas pela prefeitura que
são moradores de Heliópolis hoje. Alguns trabalhadores entre 1970 e 1980
escolheram o Heliópolis para morar, pois trabalhavam nas metalúrgicas das
cidades vizinhas do ABC, nessa época havia uma crise de oferta de imóveis
para a população de baixa renda e os altos preços dos aluguéis
desestimulavam os trabalhadores.Além disso o desemprego e os baixos
salários direcionaram as pessoas a procurarem locais de maior concentração
de indústrias.
“Mais de 90 % da população de Heliópolis, inclusive eu, é formada por nordestinos que vieram para São Paulo. E nós aprendemos, desde muito cedo, uma coisa importante: não deixar nossos filhos passarem fome. Então, a educação, infelizmente, às vezes, fica relegada a segundo plano na escala de prioridade da pessoa. “(João Miranda, liderança, ex-presidente da UNAS, 03/2007)
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Figura 18. Reunião de moradia 08 de setembro de 2007 Foto: a autora
Dentro dessas 14 glebas ou núcleos ainda tem a atuação do trafico de
drogas, mas pelos dados oficiais da polícia em dois pontos somente, ou seja,
são dois grupos que atuam. Mas pelas ruas de Heliópolis brincam e correm
mais de 30 mil crianças de 7 a 14 anos, procurando a maneira mais segura de
aprender, crescer e conviver na comunidade.
Essa comunidade tem uma trajetória de lutas e conquistas, pois
Heliópolis surge da ação do poder público e logo em seguida essa ação tem
continuidade através de uma série de grileiros que agiam impunemente e
violentamente na região. Mas Heliópolis vai se consolidando quando o poder
público através da reivindicação da comunidade vai colocando infra-estrutura
como energia elétrica, água, creches, etc.
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Figua 14. 1980 Acervo UNAS
Segundo dados da prefeitura do município de São Paulo, Heliópolis
possui hoje 18.080 imóveis, 75% do bairro já tem infra-estrutura urbana, com
uma renda média familiar de R$ 479, 480. Nessa relação desigual que existe
em nossa sociedade, em Heliópolis a vulnerabilidade social atinge mais de
90% da população como mostra os dados abaixo.
Tabela II: Vulnerabilidade Social no município de São Paulo
Vulnerabilidade Social Nenhuma: 0,47Muito Baixa: 1,94Baixa: 1,23Média: 61,36Alta: 1,77Muito Alta: 33,20Índice: ,77
Fonte: Secretaria de Habitação /Prefeitura de SP/ 2008
Referente à infra-estrutura urbana Heliópolis conta hoje com 83% de
abastecimento de água, 62% de esgotamento sanitário, 94% das casas possui
rede elétrica, 57% das ruas são iluminadas, 97% das vias são pavimentadas.
Hoje com as obras do Programa de Aceleramento do Governo
Federal-PAC que iniciou em julho 2008 o projeto quer chegar a 100% de ruas
asfaltadas. O objetivo do PAC consiste em realizar um conjunto de medidas
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destinadas a: incentivar o investimento privado; aumentar o investimento
público em infra-estrutura; e remover obstáculos (burocráticos, administrativos,
normativos, jurídicos e legislativos) ao crescimento do local. O PAC depende
da participação do executivo, legislativo, dos trabalhadores e dos empresários
e por esse motivo foi montada uma comissão em Heliópolis formada por
diversas lideranças, uma de cada gleba para acompanhar o andamento das
obras, mas também para participar da elaboração dos projetos, realizando
reuniões comunitárias. O presidente Lula em maio de 2008, quando esteve em
Heliópolis para a assinatura das obras do PAC disse: “Cada um de vocês
poderão conhecer o projeto, poderão juntamente com os engenheiros dizer o
que é melhor e como fica melhor as coisas aqui na comunidade, esse é um
projeto de controle social, do controle de vocês.”(Presidente Lula,05/08).
Essa comissão de moradores está enfrentando dificuldades de atuar
ativamente no programa do PAC, pois não conseguem ter acesso aos projetos.
E os engenheiros que estão na obra não passam as informações.
“Já fomos na prefeitura, já informamos o Governo Federal, às vezes as pessoas que estão aqui na obra não sabem o que vai ser feito depois, sabemos que terão algumas praças ao lado do córrego, mas como será? Terá bancos, árvores, espaço para as crianças com parquinho. Conversamos com outras comunidades que estão no PAC e vimos que elas estão passando pela mesma dificuldade que nós. Por isso vamos montar oficinas para avisar a comunidade.” (Cleide Alves, moradora, liderança,julho/08)
Figura15 e 16.Assinatura das obras do PAC-Governo Federal, Estadual e municipal. 20/05/08.Foto:
Cláudia C. Soares
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Hoje em Heliópolis na questão do lixo, há coleta de resíduos em
toda a favela, a prefeitura considera como 100% de coleta que acontece
através de caminhões e caçambas que ficam espalhadas na frente das
pequenas ruas ou vielas, onde os caminhões não conseguem chegar. E isso
ocasiona alguns problemas como o relato de Dona Maria, moradora de
Heliópolis há 25 anos: "as pessoas jogam o lixo a qualquer hora na rua e os
cachorros fazem a festa... Você viu lá na entrada da rua uma caçamba de lixo? Ela fica
cheia o dia todo, cheira mal e mesmo assim as pessoas colocam todo o dia mesmo
sabendo que o caminhão só tira duas vezes por semana". (Dona Maria Alves,
63anos). Segundo a Secretaria de Habitação 75% do bairro de Heliópolis é
coberto pela infra-estrutura urbana.
Segundo Sampaio (1991) e Gohn (1970) os moradores das favelas
foram se organizando, passaram por lutas pacificas e violentas, lutas pela
direito de permanência na área e depois a obtenção de infra-estrutura básica e
na sequência a reconstrução do barraco, tornando-o habitação de alvenaria.
Figura 17. Ao fundo Idelci e sua vizinha em 1977, varrendo a calçada e o barro depois da chuva.
Acervo pessoal de Idelci (moradora)
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Existem hoje mais de três mil pontos comerciais dentro da favela,
segundo o levantamento da Associação dos Comerciantes de Heliópolis
(ACHE), são padarias, lojas, restaurantes, cabeleireiros, açougues, farmácias,
mercados, oficinas de carro e moto e lan-houses. A Associação de
Comerciantes também mostra um dado interessante e comum nas periferias
que é a quantidade de bares, pois, em Heliópolis são mais de 1.000 bares.
Segundo o levantamento sobre as atividades em Heliópolis
realizado pela Fundação Casper Líbero e a UNAS- União de Associações
e Moradores de Heliópolis. Existe hoje mais de 100 entidades (religiosas,
associações de moradores, ONGs) que realizam programas e projetos em
parceiras ou sozinhos na comunidade. Algumas entidades atuam com cunho
assistencialista2, como a entrega do leite ou de cestas básicas para as
famílias previamente cadastradas. Outras entidades atuam com políticas
de intervenção e promoção humana, com projetos voltados a práticas
educacionais não-formal, culturais, artísticas, religiosas e esportivas.
Todas as entidades procuram cada uma do seu jeito, conforme suas
estratégias melhorar a qualidade de vida da comunidade. Como é o caso
da União de Núcleos e Associações de Heliópolis (UNAS).
O urbano e suas lutas no Heliópolis
UNAS – Conexão de vontades
Segundo Bernardo Toro e Nisia Werneck "mobilizar é convocar
vontades para atuar na busca de um propósito comum, sob uma interpretação
e um sentido também compartilhados. Convocar vontades significa convocar
discursos, decisões e ações no sentido de um objetivo comum, para um ato de
paixão, para uma escolha que ‘contamina' todo o cotidiano."(WERNECK e
TORO,2004,p.2)
Foi a vontade de construir e ter a casa própria, morar perto do
trabalho, conquistar escola para as crianças, ruas asfaltadas, água encanada,
2 Entendemos aqui por “assistencialismo” uma política que ofereça bens escassos as pessoas de forma individualizada. Nesse caso não mantém ou estimula uma luta coletiva e organizada no sentido de tornar a participação ativa.
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entre outros desejos coletivos que motivaram o aparecimento da União de
Núcleos e Associações de Heliópolis – UNAS.
“ Quando eu ia trabalhar eu levava outro sapato, pois isso tudo aqui era barro. E eu não podia chegar com o pé sujo, pois iriam falar “olha a favelada”. Mesmo assim eu sempre disse que era do Heliópolis, mas eu tinha amigas que não diziam que era daqui e quando conseguia uma entrevista se atrapalhava toda em dizer onde morava. Eu não quero ter vergonha de onde eu moro, por isso sempre lutei pela melhoria daqui.” (Solanje Agda, 43 anos, moradora, liderança, coordenadora do Programa Mães jovens)
A organização da sociedade civil de maior atuação dentro do
Heliópolis é a UNAS. A vida dessa entidade está intimamente ligada à história
de Heliópolis. Eram moradores, hoje lideranças comunitárias que lutaram frente
a frente com os grileiros para defender a sua casa, com o poder público para
garantir o direito à moradia e contra a polícia nas ações de despejo. Hoje a
UNAS ainda tem em sua composição pessoas que em 1971 foram alocadas
naquele espaço público por ação da prefeitura, pessoas que invadiram as
áreas públicas desocupadas, homens e mulheres que compraram seus lotes
das mãos do próprio poder público, nesse caso do IAPAS, ou dos grileiros. Na
década de 70 e 80 em cada gleba de Heliópolis os moradores foram se
organizando, se encontrando em algum barraco a noite para fazer reuniões de
moradores. Em 1982 segundo a Profª Maria Ruth e também depoimento dos
próprios protagonistas, foi criado uma Comissão de Moradores que
correspondia às glebas da Mina, Flamengo, Viracopos, Lagoa, São Francisco,
Portuguesa, Imperador, Heliópolis, Sacomã e PAM, ou seja, cada gleba tinha
um representante. Existiam também mais duas associações, uma era a
Associação de Moradores de Heliópolis e a outra o Grupo PAM, ou seja, 03
comissões de moradores.
“ Agentes externos interferiram na dinâmica de organização e de atuação da Comissão de Moradores, como a Fabes/ Ipiranga, o Centro Acadêmico XXII de Agosto, a pastoral da favela, além de partidos políticos,
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especialmente do Partido dos Trabalhadores. Essas influencias algumas vezes facilitaram o processo de entrosamento COHAB/ Moradores, por exemplo quando em reuniões assumem o papel de moderador e em outras ocasiões a dificultaram, ao assumir posições reivindicatórias ou de pressão.”(SAMPAIO, 1991, p. 71)
Figura19. Sociedade dos Amigos, Moradores da Favela Heliópolis- Nov/ 1981
Em 12 de dezembro de 1984 o representante do secretário de
habitação, juntamente com o representante da COHAB informa que os três
grupos deveriam constituir uma única comissão de representantes para estar
presente nas reuniões, pois isso facilitaria a divulgação das informações. O
resultado dessa associação de lideranças deu origem a União de Núcleos e
Associações de Moradores de Heliópolis e São João Clímaco a UNAS.
Segundo Sampaio (1991) essa associação foi a principal interlocutora na
gestão de Jânio Quadros. Juridicamente a UNAS foi fundada em 20/01/1990,
como pessoa jurídica de direito privado sem fins lucrativos e econômicos, de
caráter cultural e social, de gestão comunitária composta por número ilimitado
de associados, com sede central na Capital de São Paulo, situada a Rua da
Mina nº 38, Heliópolis3. A missão da entidade é “Promover a Cidadania, a
melhoria da qualidade de vida e desenvolvimento integral da comunidade.”
3 Conforme artigo 1º do Estatuto Social da entidade.
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Dentre os objetivos da UNAS está a contribuição em organizar a
mobilização social, visando à melhoria da qualidade de vida, promovendo a
cidadania e a inclusão social. Uma das ações para que isso aconteça são os
“Movimentos” dos sem teto, sem creche entre outros que atuam diante a uma
demanda local existente. Esses grupos fazem encontros mensais ou bimestrais
para debater sobre o tema, criam comissões, trazem especialistas para debater
sobre o assunto, vão até o poder público e levam as suas contribuições que
acabam se tornando políticas públicas. Desse modo a comunidade vai
entendendo, interferindo e produzindo a sua paisagem.
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