a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ INSTITUTO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO BIOLOGIA DE AGENTES INFECCIOSOS E PARASITÁRIOS A EPIDEMIOLOGIA DAS DOENÇAS INFECCIOSAS NO INÍCIO DO SÉCULO XX E A CRIAÇÃO DA FACULDADE DE MEDICINA E CIRURGIA DO PARÁ ARISTOTELES GUILLIOD DE MIRANDA Belém-Pará 2013

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Page 1: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ

INSTITUTO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO

BIOLOGIA DE AGENTES INFECCIOSOS E PARASITÁRIOS

A EPIDEMIOLOGIA DAS DOENÇAS INFECCIOSAS NO INÍCIO DO SÉCULO XX

E A CRIAÇÃO DA FACULDADE DE MEDICINA E CIRURGIA DO PARÁ

ARISTOTELES GUILLIOD DE MIRANDA

Belém-Pará

2013

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ARISTOTELES GUILLIOD DE MIRANDA

A EPIDEMIOLOGIA DAS DOENÇAS INFECCIOSAS NO INÍCIO DO SÉCULO XX

E A CRIAÇÃO DA FACULDADE DE MEDICINA E CIRURGIA DO PARÁ

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em

Biologia de Agentes Infecciosos e Parasitários do Instituto

de Ciências Biológicas da Universidade Federal do Pará

como requisito parcial para a obtenção do grau de Doutor

em Biologia de Agentes Infecciosos e Parasitários.

Orientador: Prof. Dr. Ricardo Ishak

Belém-Pará

2013

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ARISTOTELES GUILLIOD DE MIRANDA

A EPIDEMIOLOGIA DAS DOENÇAS INFECCIOSAS NO INÍCIO DO SÉCULO XX

E A CRIAÇÃO DA FACULDADE DE MEDICINA E CIRURGIA DO PARÁ

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Biologia de Agentes Infecciosos e

Parasitários do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal do Pará como

requisito parcial para a obtenção do grau de Doutor em Biologia de Agentes Infecciosos e

Parasitários.

Orientador: Prof. Dr. Ricardo Ishak

Instituto de Ciências Biológicas-UFPA

Banca Examinadora: Prof. Dr. Francisco de Paula Pinheiro

Instituto Evandro Chagas- IEC

Prof. Dr. José Maria de Souza

Instituto Evandro Chagas-IEC

Profª. Dra. Maria de Nazaré dos Santos Sarges

Instituto de Filosofia e Ciências Humanas-UFPA

Prof. Dr. Pedro Fernando Vasconcelos

Instituto Evandro Chagas-IEC

Prof. Dr. Antonio Carlos Rosário Vallinoto

Instituto de Ciências Biológicas-UFPA

Belém, 3 de outubro de 2013

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“A obra em si mesma é tudo; se te agradar, fino leitor, pago-me a

tarefa; se te não agradar, pago-te com um piparote, e adeus.”

Machado de Assis, por Brás Cubas

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Para Antônio e Lucy, onde tudo começou;

Vera, o porto seguro do amor e da cumplicidade;

Bruno e Bruna, filhos que me orgulham;

Renata, a filha pelo Amor de Bruno;

Vinícius e Beatriz, a nova geração, os netos, a continuação do caminho.

Para Meirevaldo Paiva (in memoriam), mestre e amigo; minha referência de professor.

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Agradecimentos

Aos professores Maria de Nazaré dos Santos Sarges, Habib Fraiha Neto, Pedro Fernando

da Costa Vasconcelos - mais amigos que julgadores -, que acompanharam o processo de

elaboração e muito contribuíram, com sugestões na qualificação, para o aprimoramento desta

proposta;

Aos professores Maria de Nazaré dos Santos Sarges, Pedro Fernando da Costa

Vasconcelos, Francisco de Paula Pinheiro e José Maria de Souza, componentes da banca na

defesa da tese, pelos novos olhares e acréscimos incluídos na redação final deste trabalho;

Ao professor Antonio Carlos Rosário Vallinoto, também componente da banca, pelo

incentivo ao longo da elaboração da tese;

Aos funcionários da Biblioteca Pública Arthur Vianna, a “equipe” da bibliotecária

Simone Matos Moreira, pelo profissionalismo e carinho especial com que me distinguiram

nas inúmeras vezes que ali estive, pelos vários anos em que tenho buscado as pistas sobre a

Faculdade;

Aos funcionários da Secretaria da Pós-Graduação da BAIP, pela seriedade e presteza no

atendimento sempre que solicitados;

Aos amigos e colegas que foram cúmplices durante as várias etapas da elaboração desse

trabalho, pacientes na escuta das histórias que contava, em especial a José Maria de Castro

Abreu Jr., parceiro, incentivador e principal responsável pela ideia do livro sobre a história da

Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, que acabou resultando nesta tese;

Ao Professor Ricardo Ishak, mais que orientador, o que pensou este trabalho associando

Epidemiologia e História e acreditou que ele seria possível;

A todas as pessoas que de algum modo colaboraram para que chegássemos até aqui.

Muito obrigado a todos.

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página

Figura 1 - Área geográfica da Amazônia e suas subdivisões......................................... 17

Figura 2 – Situação geográfica do Estado do Pará ................................................ ....... 19

Figura 3 – Faculdade de Direito do Pará ....................................................................... 39

Figura 4 – Faculdade de Farmácia do Pará ...................... ............................................ 40

Figura 5 – Faculdade de Odontologia do Pará .............................................................. 41

Figura 6 – Faculdade de Agronomia do Pará................................................................ 43

Figura 7 – Antônio Lemos ............................................................................................. 50

Figura 8 – Oswaldo Cruz e Belisario Penna .................................................................. 54

Figura 9 - Membros da equipe de Oswaldo Cruz no Pará ............................................ 56

Figura 10 – Equipamento para expurgo das residências ............................................... 57

Figura 11 – Equipe de expurgo em ação ....................................................................... 59

Figura 12 – Faculdade de Medicina da Bahia ............................................................... 65

Figura 13 – Barão de Anajás ........................................................................................ 78

Figura 14 – Diretoria da Sociedade Médico-Cirúrgica do Pará ................................... 82

Figura 15 – Magno e Silva .......................................................................................... 87

Figura 16 – Camilo Salgado ........................................................................................ 91

Figura 17 – Instalação da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará .......................... 92

Figura 18 – Necrotério Público ..................................................................................... 93

LISTA DE FIGURAS

Page 9: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

SUMÁRIO

LISTA DE FIGURAS.............................................................................................................. 8

RESUMO ............................................................................................................................... 11

ABSTRACT .......................................................................................................................... 12

1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 13

1.1 A REGIÃO AMAZÔNICA ......................................................................................... 17

1.1.1 O Pará e Belém no fim do século XIX e princípio do século XX ........................... 18

1.1.2 As doenças infecciosas mais comuns no Estado do Pará entre 1800 e 1920 ......... 24

1.1.2.1 Febre amarela ............................................................................................................. 24

1.1.2.2 Malária ........................................................................................................................ 26

1.1.2.3 Cólera......................................................................................................................... 29

1.1.2.4 Varíola ....................................................................................................................... 31

1.1.2.5 Gripe espanhola .................................................................................................... .....34

1.2 O ENSINO SUPERIOR NO PARÁ...........................................................................37

1.2.1 As escolas superiores no Pará no início do século XX........................................... 38

1.2.1.1 Direito........................................................................................................................ 38

1.2.1.2 Farmácia.................................................................................................................... 39

1.2.1.3 Odontologia ............................................................................................................ 41

1.2.1.4 Agronomia ................................................................................................................ 42

1.3 OBJETIVOS............................................................................................................... 44

1.3.1 Objetivo geral .............................................................................................................44

1.3.2 Objetivos específicos ............................................................................................... 44

2. MATERIAL E MÉTODOS......................................................................................45

2.1 PESQUISA BIBLIOGRÁFICA ............................................................................. 45

2.2 ENTREVISTAS ....................................................................................................... 45

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO............................................................................. 47

3.1 POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE NA PRIMEIRA REPÚBLICA.....................47

3.1.1 Oswaldo Cruz no Pará............................................................................................ 53

3.2 AS REFORMAS DO ENSINO MÉDICO NO BRASIL.......................................... 64

Page 10: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

3.2.1 Reforma Benjamin Constant................................................................................. 67

3.2.2 Reforma Rivadavia Correa.....................................................................................68

3.2.3 Reforma Maximiano de Carvalho......................................................................... 66

3.3 A ORGANIZAÇÃO DAS PRIMEIRAS SOCIEDADES MÉDICAS NO ESTADO

DO PARÁ ................................................................................................................ 73

3.3.1 A fundação da Sociedade Médico-Cirúrgica do Pará ......................................... 80

3.4 A CRIAÇÃO DA FACULDADE DE MEDICINA E CIRURGIA DO PARÁ ........86

4 CONCLUSÕES ................................................................................................95

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS................................................................................97

Page 11: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

Resumo

O final do século XIX mostrou duas características importantes na área da saúde. A

primeira indicava a continuidade da ocorrência de doenças ocasionadas por agentes

infecciosos que incluíam a febre amarela, malária, cólera e varíola. Por outro lado, a situação

econômica do Estado do Pará com o início da perda da exclusividade na produção extrativista

do maior gerador de riquezas para o Estado, a borracha, levou a uma situação em que se

tornava cada vez mais difícil e cara a formação de novos médicos paraenses no exterior ou em

outros Estados brasileiros. O início do século XX trouxe a abertura de faculdades na cidade de

Belém, incluindo duas na área da saúde (Farmácia e Odontologia), além de uma

regulamentação nacional para a criação e abertura de cursos de medicina. O Estado do Pará,

sob a influência do esforço de Oswaldo Cruz com o seu trabalho de eliminação da febre

amarela na cidade de Belém, em uma aplicação prática dos novos conhecimentos gerados pela

descrição de agentes infecciosos nas formas de transmissão por meio de vetores e a aplicação

de novas maneiras de prevenção e controle de doenças (saneamento e vacinas), após se

organizar, a princípio por meio de uma sociedade científica de forma inovadora, cria a oitava

escola de medicina do país, em 9 de janeiro de 1919 com o nome de Faculdade de Medicina e

Cirurgia do Pará.

Page 12: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

Abstract

The late nineteenth century showed two important features in the area of health. The

first indicated the continuous occurrence of diseases caused by infectious agents that included

yellow fever, malaria, cholera and smallpox. On the other hand, the economic situation of the

state of Pará with the early loss of exclusivity extractive production of the largest wealth

generator for the state, the rubber, has led to a situation where it became increasingly difficult

and expensive training new medical doctors abroad or in other Brazilian states. The early

twentieth century brought the opening of colleges in Belém, including two in the area of

health (Pharmacy and Dentistry), as well as national legislation for the creation and opening

of medical courses. The state of Pará, under the influence of the effort of Oswaldo Cruz with

his work of eliminating yellow fever in the city of Belém, in a practical application of the new

knowledge generated by the description of infectious agents in their transmission by vectors

and application of new ways of preventing and controlling diseases (sanitation and vaccines)

after organizing at first through a scientific society in innovative ways, creates the 8th medical

school in Brazil, on January 9, 1919, named Faculty of Medicine and Surgery of Pará.

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1 INTRODUÇÃO

O ensino médico no Brasil se iniciou oficialmente em 1808 com a vinda da família

real portuguesa para a sua principal colônia, fugindo da ameaça das tropas de Napoleão

Bonaparte (Torres, 1946; Lobo, 1964; Miranda & Abreu Jr., 2010; Abreu Jr., 2010). Apesar

desse marco temporal de 1808, há registro de algumas tentativas anteriores com a finalidade

de preparar médicos e cirurgiões para atender à população do Brasil Colônia, como o ofício

dirigido à Metrópole, em 1799, com a solicitação do Cirurgião-Mor José Xavier de Oliveira

Dantas de que fosse considerada como Aula Régia o curso de cirurgia e anatomia que

ministrava na Bahia, sendo este provavelmente o primeiro organizado em terras brasileiras

(Lobo, 1964).

Por iniciativa de José Corrêa Picanço, médico brasileiro que fazia parte da comitiva

real portuguesa, e preocupado com a falta de médicos diante da nova realidade surgida com a

presença da corte portuguesa, o rei D. João VI expediu a Carta Régia de 18 de fevereiro de

1808, criando na Bahia uma “Escola de Anatomia e Cirurgia” (Lobo, 1964) e, com ela, “uma

estrutura universitária embrionária com precárias instalações físicas e um currículo

desarticulado de disciplinas e cursos” (Luz, 1982). A escola funcionou, inicialmente, no Real

Hospital Militar da Bahia, instalado no prédio do Convento, anteriormente ocupado pelo

Colégio dos Jesuítas no Terreiro de Jesus, mesmo local onde após reformas se instalou a

Faculdade de Medicina, hoje integrante da Universidade Federal da Bahia (Torres, 1946).

Com a transferência da corte para o Rio de Janeiro, D. João VI adotou o mesmo

procedimento e, em 5 de novembro de 1808, criou uma “Escola de Anatomia, Cirurgia e

Medicina”, nos moldes da Bahia, para funcionar no Hospital Real Militar, no antigo Colégio

dos Jesuítas no Morro do Castelo (Lobo, 1964; Salles, 1971). Corresponde, atualmente, à

Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Por quase um século, as duas escolas foram as únicas no Brasil. No período

republicano, em 1898, foi criada a terceira, no Rio Grande do Sul. Sua criação está

relacionada aos desdobramentos da aplicação da Constituição de 1891 que, inspirada nos

princípios positivistas, defendia o exercício de qualquer profissão, independentemente de

diploma ou qualquer título (Sarinho, 1989).

O ideário positivista era previsto na própria Constituição do Rio Grande do Sul, sob o

governo de Júlio de Castilhos. Embora possa parecer contrassenso, ao mesmo tempo em que

defendia a liberdade do exercício profissional, o governador Júlio de Castilhos apoiava a

criação da faculdade, por ser esta fruto da iniciativa privada, como postulavam os positivistas.

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14

Tal fato gerou também a movimentação dos médicos gaúchos que, sentindo a necessidade de

manter sua reserva de mercado, viram na faculdade de medicina o canal para, de certo modo,

manter o monopólio do conhecimento médico (Hassen & Rigatto, 1998).

As escolas médicas, que eram três até a primeira década do século XX, somariam oito

na segunda década daquele século, com a criação da Faculdade de Medicina de Minas Gerais,

em 1911; da Faculdade de Medicina Hahnemanniana, com ênfase na medicina homeopática,

em 1912, no Rio de Janeiro (atual Escola de Medicina e Cirurgia); da Faculdade de Medicina

de São Paulo (atualmente integrada a USP), também em 1912; da Faculdade de Medicina do

Paraná, em 1912, já fazendo parte da Universidade do Paraná; e da Faculdade de Medicina e

Cirurgia do Pará, em 1919 (Abreu Jr., 2010).

Em seu discurso de paraninfo à segunda turma da Faculdade de Medicina e Cirurgia

do Pará, em 1926, o Prof. Orlando Lima, catedrático de Obstetrícia, afirmava que

um grupo de Periodeutas plantou no sólo fecundo do Pará a semente

do ensino médico. E ella medrou, cresceu, desenvolveu-se,

transformando-se no arbusto e depois na arvore adulta que agora

começa a dar os seus nutrientes e saborosos fructos, (Lima, 1927).

Pelo discurso, tem-se a impressão de que, um belo dia, médicos em prol de um bem

comum, iluminados e coesos, sob a batuta do “maestro” Camilo Salgado - não à toa, hoje

cultuado em Belém como santo popular (Costa, 2004) – chegaram à conclusão de que era

preciso fundar uma faculdade de medicina no Pará.

A aceitação de uma tese reducionista como esta, simplória e ao mesmo tempo

justificadora da personalidade “predestinada” dos criadores da escola, significaria desprezar a

existência de tantos outros acontecimentos vivenciados naquele período e esquecer que

eventos reais têm sempre o homem como ator principal.

Quando a Faculdade de Medicina do Pará foi fundada em 1919, havia sete faculdades

de medicina em funcionamento, nenhuma situada acima do Estado da Bahia (Sarinho, 1989).

Ademais, somente a da Bahia e a do Rio de Janeiro eram oficiais; as demais teriam que ser

equiparadas àquelas, a fim de que seus diplomas tivessem validade em todo o território

nacional (Miranda & Abreu Jr., 2010).

Na segunda década do século XX, o Estado do Pará já se ressentia dos efeitos

econômicos adversos oriundos da queda na produção da borracha (Santos, 1980; Weinstein,

1993) e continuava a conviver com índices alarmantes de doenças infecciosas, como a

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15

malária, a lepra, a febre amarela, a cólera e a tuberculose (Vianna,1906; Araujo, 1922). Tais

doenças, por não terem merecido a devida atenção dos governantes quando os recursos para

seu combate eram abundantes no período da “Belle Époque, mantinham as cidades insalubres

e em péssimas condições sanitárias, embora “embelezadas” em seus centros urbanos, com

altas taxas de morbimortalidade, comprometendo qualquer projeto de desenvolvimento

porventura sonhado.

Ainda assim, o Brasil e a região Amazônica continuavam a atrair interesses comerciais

internacionais, o que significava a existência de condições adequadas de saneamento.

Entretanto, para que as relações comerciais pudessem se estabelecer, principalmente com a

Europa, em especial com a Inglaterra, a grande potência de então, era necessário um programa

de saneamento para o país e para a região, o que implicaria não apenas em ações, mas,

sobretudo, na existência de mão-de-obra especializada, aí se incluindo os médicos, para levar

a contento esse projeto de desenvolvimento.

No início do século XX, o número de médicos atuando na Amazônia brasileira era

bastante reduzido, contribuindo para a precariedade do quadro sanitário da região. Embora

sem dados estatísticos concretos, Carvalho (1922) registra no Pará 82 médicos como

associados da Sociedade Médico-Farmacêutica do Pará (fundada em 1897 e ativa até 1900) e

cem médicos presentes à fundação da Sociedade Médico-Cirúrgica do Pará em 1914, para

uma população estimada no Estado de 445 mil habitantes em 1900 e em 783 mil habitantes

em 1910 (Santos,1980). A cidade de Belém contava com pouco menos que cem mil

habitantes na virada do século XX (Weinstein,1993). Grande parte desses profissionais era

oriunda de outros Estados, chegados ao Pará atraídos pela ilusão de desenvolvimento por que

passara a região Amazônica durante os anos do fausto da borracha. Pinto (1922) registra 98

médicos no Pará, em 1921, sendo 62 formados no Rio de Janeiro, trinta na Bahia e seis no

exterior.

Desse modo, era fundamental aumentar o número de médicos para atuar na Amazônia

brasileira, sem o que qualquer projeto sanitário resultaria inviável. Como não havia mais

como atraí-los de outros Estados com vantagens financeiras, talvez a criação de um curso de

medicina no Estado do Pará pudesse funcionar como importante instrumento no combate aos

péssimos índices epidemiológicos, contribuindo, assim, para a mudança do perfil sanitário e

social do Estado e da região.

Nesse aspecto, foi de grande importância a participação de Oswaldo Cruz, que

contratado pelo governo Estado do Pará, realizou um programa de erradicação da febre

amarela no Estado, com ênfase em Belém, no período de novembro de 1910 a outubro de

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16

1911 (Costa, 1973; Britto & Cardoso, 1973; Fraiha Neto, 2012). Sua vinda para Belém,

juntamente com médicos e técnicos, e a contratação de outros médicos e pessoal de apoio na

capital paraense deixou patente a necessidade de qualificação para enfrentar os desafios que a

busca pela melhoria dos índices epidemiológicos impunha.

Escolhidas por sua importância no contexto histórico e epidemiológico da capital no

recorte temporal pré-definido, as entidades nosológicas abordadas, quais sejam: febre

amarela, cólera, varíola, malária e gripe espanhola, não eram as únicas presentes no cotidiano

da “cidade miasmática” de Belém (Ritzmann, 1997) desde os tempos coloniais. Vianna

(1906) analisou também a peste bubônica entre as epidemias, além da febre amarela e da

varíola. Vale ressaltar ainda a tuberculose e a hanseníase, as quais mesmo hoje constituem um

grave problema de saúde pública (Rufino Neto, 2001; Magalhães & Rojas, 2007).

Sobre as três primeiras, historicamente consideradas as mais frequentes, existe farta

bibliografia no âmbito da historiografia da saúde, destacando-se em nível regional, os

trabalhos de Britto & Cardoso (1973) sobre a febre amarela, Beltrão (2004), sobre a cólera,

Silva (2009) sobre a varíola, Amaral (2006) sobre a febre amarela e a peste bubônica; Costa

(2006), que enfoca as condições de saneamento de Belém diante das epidemias; além do

mencionado trabalho de Vianna (1906), referência obrigatória quando se fala em epidemias

no Pará. Por outro lado, escassa é a bibliografia sobre a malária em historiografia da saúde.

Quanto à gripe espanhola, encontramos poucas referências regionais, como Gurjão (1922), no

qual faz um balanço dos dois meses de duração da epidemia em Belém.

A opção pela abordagem das doenças predefinidas no projeto partiu do pressuposto de

que, por meio delas, do seu conhecimento, das repercussões na sociedade paraense quando

das epidemias por elas causadas e das medidas empregadas para seu controle ou erradicação,

seria possível elaborar uma linha de raciocínio que nos levasse a sustentar hipótese sobre sua

importância influenciando a criação da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará.

Neste trabalho, nosso propósito foi o de analisar as circunstâncias envolvidas na

criação da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, buscando causas factíveis, como a

influência das doenças infecciosas mais prevalentes no Estado, contextualizando-as ao

momento histórico por que passava o Estado do Pará nas primeiras décadas do século XX.

Por volta da segunda década do século XX, quando surgiu a Faculdade de Medicina, o

Estado do Pará não mais vivia a confortável situação financeira disponibilizada pelo comércio

da borracha, o qual provocara grandes mudanças na história econômica e na geopolítica da

região amazônica, com reflexos positivos na sua conjuntura socioeconômica e fazendo de sua

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17

capital, Belém, uma importante cidade no contexto nacional (Santos, 1980; Weinstein, 1993;

Sarges, 2000).

Em contraponto, no que se refere às condições de saneamento, a cidade de Belém,

apesar de ter vivenciado um estágio de crescimento e desenvolvimento anteriormente jamais

alcançado (Sarges, 2000), continuava a conviver com altos índices de mortalidade e/ou

morbidade por conta de doenças infecciosas historicamente prevalentes na capital e suas

frequentes epidemias, agravado pelo crescimento populacional desordenado em razão das

frentes migratórias nordestinas, principalmente, fugindo da seca e na busca de sua redenção

econômica na Amazônia brasileira (Vianna,1906; Santos, 1980; Fontes, 2002, entre outros).

1. 1 A REGIÃO AMAZÔNICA

A Amazônia é um espaço geográfico que ocupa grande parte do hemisfério

setentrional da América do Sul. Considerada a maior região florestal e hidrográfica do mundo,

representa mais da metade das florestas tropicais remanescentes no planeta e compreende a

maior biodiversidade de floresta tropical do mundo (Amazônia. Disponível em:

http://educaterra.terra.com.br/voltaire/500br/amazonia.htm).

Figura 1 – Área geográfica da Amazônia e suas subdivisões

Fonte: http://www.pinonfriaes.com/images/mapa_panamazonia.jpg?761

Perfazendo mais de seis milhões de km², estende-se das margens do Oceano

Atlântico até o sopé da Cordilheira dos Andes, compreendendo parte do território de nove

países (Figura 1): Brasil, Venezuela, Colômbia, Peru, Bolívia, Equador, Suriname, Guiana e

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18

Guiana Francesa (http://portalamazonia.globo.com/pscript/amazoniadeaaz/artigoAZ.php?id

Az=134).

A Amazônia brasileira compreende os Estados do Pará, Amazonas, Acre, Rondônia,

Roraima, Amapá, Mato Grosso, Tocantins e parte do Maranhão. Fruto de um conceito

político – instituído pela necessidade do governo de planejar e promover o desenvolvimento

da região - e não de um imperativo geográfico, a Amazônia brasileira também é chamada de

Amazônia Legal, termo definido a partir da criação da Superintendência do Desenvolvimento

da Amazônia (SUDAM) em 1966.

A Amazônia brasileira cobre cerca de 61% do território brasileiro, numa superfície

aproximada de 5.217.423 km² abrigando uma população de mais de 21milhões de habitantes

(Thomas, 2003).

Os outros conceitos de divisões atribuídos à Amazônia são:

Amazônia Ocidental - constituída pelos Estados do Amazonas, Acre, Rondônia e

Roraima;

Amazônia Oriental - constituída pelos Estados do Pará, Maranhão, Amapá, Tocantins

e Mato Grosso;

Amazônia Continental - constituída por Brasil, Bolívia, Peru, Equador, Colômbia,

Venezuela, República da Guiana, Suriname e Guiana Francesa (http://www.sudam.gov.br/

amazonia-legal).

1.1.1 O Pará e Belém no final do século XIX e início do século XX

O Estado do Pará fica situado no centro-leste da região Norte do Brasil, sendo

marcado pela linha do Equador em seu extremo norte. Abrange uma área de 1.253.164,49

km², contando com uma população de cerca de 7,1 milhões de habitantes. Seu nome é de

origem tupi-guarani e significa “rio-mar”, que era como os indígenas da região denominavam

o braço direito do rio Amazonas, que acrescido das águas do rio Tocantins tornava-se tão

vasto como um mar ao ponto de não se poder ver a outra margem

(http://pa.gov.br/O_Para/gente.asp).

É o segundo maior Estado do país em superfície, ocupando mais de 16% do território

nacional, sendo menor apenas do que o Estado do Amazonas. Por sua extensão, faz limite

com os Estados do Amapá ao norte, Maranhão a leste, Tocantins a sudeste, Mato Grosso ao

sul, Amazonas a oeste e Roraima a noroeste.

Page 19: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

19

O Estado do Pará (Figura 2) tem fronteiras internacionais com o Suriname ao norte e a

Guiana a noroeste, sendo banhado pelo Oceano Atlântico a nordeste

(<://www.brasilrepublica.com/para.htm>).

Figura 2 – Situação geográfica do Estado do Pará

Fonte: http://www.jornaldosamigos.com.br/mapa_estado_para.jpg

De acordo com Santos (1980), a economia paraense está dividida em cinco fases: I –

fase de decadência: 1800-1840; II – fase da expansão gomífera: 1840-1910; III – fase de

declínio: 1910-1920; IV – fase não caracterizada (recuperação?): 1920-1940; V – fase de

crescimento moderado: 1940-1970.

No século XVIII, a região conheceu um período de grande prosperidade, no chamado

“ciclo agrícola”, com a proliferação de lavouras de café, arroz, cana-de-açúcar, cacau e

tabaco, além de fazendas de gado. Durante boa parte deste “ciclo”, a economia da região

permaneceu praticamente sem contato com os grandes mercados da época. A integração do

Maranhão e Grão-Pará foi desfeita em 1774, época que coincidiu com certa estagnação da

economia local, mas a instalação da Companhia Geral do Grão-Pará e Maranhão (1755-1778),

consolidando o contato entre a região e os mercados da Europa, além de introduzir o escravo

africano ajudou a melhorar os números da economia regional (Santos, 1980).

Até as primeiras décadas do século XIX, a economia regional pautou-se na exploração

das “drogas do sertão”, experimentando um ligeiro crescimento com a cultura de exportação

do cacau, seguida da cultura da cana-de-açúcar, algodão, tabaco e arroz. A atividade pesqueira

para consumo doméstico, a pecuária e umas poucas culturas agrícolas sem maior porte, afora

a reduzida atividade industrial, era tudo o que seu sistema apresentava de mais estável. O

cacau, produto mais importante, então, de cultura exclusivamente extrativista, vivia sujeito

Page 20: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

20

tanto às demandas do marcado externo quanto às peculiaridades do extrativismo (Santos,

1980).

A Cabanagem, revolução popular que aconteceu no Pará entre os anos de 1835 e 1840

desintegrou a vida econômica e social de toda a Amazônia, causando destruição de várias

áreas agrícolas e o abandono dos colonos que ali trabalhavam (Weinstein, 1993). A tendência

geral da economia foi de declínio, por conta da queda do preço do cacau no mercado externo e

das despesas feitas pelo governo colonial na luta contra a França, por causa do território da

então Guiana Francesa e da própria Cabanagem (Santos, 1980). A partir da segunda metade

do século XIX, o Pará voltou a alcançar um certo desenvolvimento econômico em função da

produção e exportação do látex, impulsionado pela crescente demanda da indústria

internacional, principalmente após a descoberta do processo de vulcanização por Charles

Goodyear (Sarges, 2000).

Assim, a economia paraense experimentou um novo ciclo de crescimento no final do

século XIX e início do século XX com a exploração da borracha, época que ficou conhecida

como Belle-Époque amazônica, marcada pelos traços artísticos do Art Nouveau, num

momento áureo no que se refere à urbanização e embelezamento da cidade, com Belém, a

capital do Estado, tornando-se polo de desenvolvimento e centro do comércio mundial da

borracha, seja como produtor ou como entreposto de escoamento da produção de outros locais

da Amazônia, levando ao surgimento de grandes lojas, bancos seguradores e firmas de

comércio em geral (Santos, 1980; Weinstein, 1993; Sarges, 2000).

A Hevea brasiliensis, nome científico de uma das árvores (seringueira) cuja seiva (o

látex) se fabrica a borracha, tem na Amazônia seu habitat natural. Desde o meado do século

XVIII se havia descoberto as seringueiras nativas, que se estendiam do Pará ao leste da

Bolívia (http://www.pinonfriaes.com/ciclo-borracha_29.html).

Em viagem pela região, em 1743, o explorador francês Charles Marie de La

Condamine descendo o rio Amazonas vindo do Equador observou a extração de um líquido

branco, viscoso, de uma árvore posteriormente denominada de Hevea brasiliensis. O líquido,

depois de coagulado, criava uma substância maleável, de grande elasticidade e

impermeabilidade, com a qual os índios faziam seringas, botas e brinquedos. Condamine

levou amostras do produto para a França, em 1745, onde produziu trabalhos chamando a

atenção para as propriedades do caoutchouc, como era denominado pelos habitantes da

região, e que significa “árvore que chora” (Condamine, 1992; Weinstein, 1993; Jackson,

2011).

Page 21: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

21

Explorada de forma incipiente desde o início do século XIX, a extração da borracha

na Amazônia se intensificou a partir de 1850, tendo seu apogeu em função do aumento da

demanda estrangeira pelo produto, em parte por conta da descoberta do método de

vulcanização por Charles Goodyear, num momento em que a região era o único produtor

mundial. Isto gerou um crescimento comercial e demográfico sem precedentes,

principalmente entre os anos de 1905 e 1912 transformando a Amazônia brasileira, antes

esquecida e muito atrasada, em um dos mais promissores centros de comércio do Brasil ,

tornando a economia brasileira praticamente dependente da borracha da Amazônia (Santos,

1980; Weinstein, 1993;Jackson, 2011).

O impacto econômico maior da borracha foi sentido plenamente nos “anos dourados”

da Amazônia – aproximadamente de 1880 a 1910 (Weinstein, 1993), refletindo-se na

construção de obras monumentais, como o Theatro da Paz. No Pará, as maiores concentrações

da Hevea brasiliensis encontravam-se nas regiões das ilhas (Breves, Melgaço, Anajás –

mesorregião do Marajó) e ao longo dos sistemas fluviais do Xingu e do Tapajós. As bacias

dos rios Tocantins e Guamá, a partir dos quais se chegava à cidade de Belém, também

continham áreas de seringueiras (Weinstein, 1993).

Em 1910, nos dois primeiros meses do ano, a borracha atingiu o ápice da alta de

preços no quilo, quase três dólares. Essa aparente euforia logo se dissiparia desvelando que a

súbita alta de preços no mercado exportador seria interrompida, o que aconteceu em maio

daquele ano: os preços da borracha começam a cair, com a chegada ao mercado internacional

da borracha asiática e a consequente perda da exclusividade na exportação mundial desse

produto. Após vinte anos de trabalho, as plantações de hévea da Ásia (Malásia), a partir das

sementes contrabandeadas do Pará pelo inglês Henry Wickham começaram a produzir

borracha em quantidades consideráveis. Sua vantagem: na Ásia, as seringueiras eram

plantadas próximas uma das outras; o terreno era limpo e plano, fácil ao cultivo; a plantação

era próxima aos postos de vendas; e apesar da grande produção, continuou-se a plantação em

série de seringueiras, garantindo a produção e o abastecimento futuro, por um período

praticamente infinito (Weinstein, 1993; Jackson, 2011).

Por mais que durante a segunda metade do século XIX não tenha havido, na América

Latina, uma expansão da economia voltada para a exportação, o comércio da borracha seria

responsável pelo rápido crescimento comercial do Pará neste período (Weinstein, 1993).

Com o declínio deste ciclo - que marcaria historicamente a região -, a partir da entrada

no mercado internacional da borracha produzida na Ásia, veio a estagnação, da qual o Pará só

sairia na década de 1960, com o desenvolvimento agrícola do sul do Estado. Na década de

Page 22: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

22

1970, o crescimento foi acelerado com a exploração de minérios, principalmente na região

sudeste do estado, como o ferro na serra de Carajás e do ouro em Serra Pelada

(http://www.brasilrepublica.com/para.htm.).

No Pará, a cidade de maior importância, historicamente, sempre foi a capital do

Estado, Belém, cidade fundada com o estabelecimento de uma fortificação militar pelos

colonizadores portugueses em 12 de janeiro de 1616, “em uma ponta de terra na foz do

Guamá, que entra nas águas caudalosas do rio Pará” (Tocantins, 1963), e para a defesa da

entrada dos domínios portugueses na Amazônia (Sarges, 2000).

Os primeiros tempos de colonização de Belém foram de luta contra algumas tribos

rebeldes à dominação e contra estrangeiros (holandeses, ingleses e irlandeses) localizados na

foz do Amazonas e em alguns pontos da ilha do Marajó, onde comercializavam com os

indígenas (Hurley, 1940).

Durante os séculos XVII e XVIII, a cidade de Belém apresentou um lento

crescimento, marcado por uma atividade econômica limitada à produção de gêneros nativos,

como o cacau, a cana-de-açúcar, o arroz e o algodão, destinados à exportação, pelo pequeno

número de habitantes e o próprio desinteresse da metrópole portuguesa em relação ao Norte

do Brasil (Cruz, 1973; Sarges, 2000).

A partir da segunda metade do século XIX, em decorrência do início da sistemática

exploração da borracha, Belém começou um novo ciclo de desenvolvimento econômico - cujo

ápice foram os anos entre 1880 e 1910 -, assumindo o papel de principal porto de escoamento

da produção de látex (Weinstein, 1993).

Ainda que o estado do Amazonas se constituísse no principal centro de produção da

borracha, a cidade portuária de Belém continuou a dominar a vida comercial e cultural da

região uma vez que além do escoamento da produção de látex, a cidade mantinha elevada a

exportação de produtos como o cacau, a castanha-do-pará e o algodão. Por sua localização

próxima à foz do rio Amazonas, a cidade de Belém prosperou com o comércio da borracha

tanto quanto a cidade de Recife com a economia açucareira (Weinstein, 1993).

O processo de urbanização da cidade, que abrigou um suntuoso projeto arquitetônico

profundamente inspirado nas referências estéticas europeias, a partir da segunda metade do

século XIX, está relacionado principalmente à função comercial, financeira, política e cultural

desempenhada durante a fase áurea da borracha no que é conhecido como a Belle-Époque

amazônica (Sarges, 2000).

Entre 1890 e 1910, período da administração do intendente Antônio Lemos, a

efervescência de “modernidade” adquiriu maior vigor. Grandes e luxuosas construções,

Page 23: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

23

praças, avenidas extensas e largas e bulevares sobrepuseram-se às estreitas e mal iluminadas

ruas da Campina e do bairro da Cidade Velha (Weinstein, 1993, Sarges, 2000; Pantoja, 2004).

Uma cidade com amplas avenidas e grandes áreas direcionadas para os novos bairros que

recebiam as famílias em processo de elevação social; praças ajardinadas, edifícios de

administração pública, várias escolas, hospitais, asilos e cadeias compunham as instituições

de controle e reprodução social. Completavam o conjunto urbano os estabelecimentos

industriais, casas bancárias e firmas seguradoras e as companhias de serviços urbanos como

telégrafos, telefonia, linhas de bonde e estrada de ferro, além das instituições culturais e

recreativas, religiosas e laicas. No porto, duas companhias inglesas faziam de dez em dez dias

a ligação com a Europa e a América do Norte, além da navegação costeira brasileira. Essas

transformações se estenderiam por toda a primeira década do século XX (Weinstein, 1993;

Daou, 2000; Sarges, 2000).

A borracha propiciou, entre os anos de 1870 a 1910, o principal surto econômico não

só do Estado do Pará, mas de toda a região Amazônica, período em que este produto ocupou o

primeiro lugar na pauta de exportações do Estado, permitindo o aporte de recursos e a

formação de uma elite econômica composta pelos modernos extrativistas (os seringalistas),

em substituição à tradicional burocracia administrativa. Esta nova elite, composta ainda por

fazendeiros, comerciantes e profissionais liberais, elegeu Belém como local de residência

principal, tendo seu porto como ponto de referência e originaria, também, uma “elite de

doutores”, composta pelos filhos dessa nova burguesia, que eram enviados para estudar na

Europa (Sarges, 2000).

Essa nova elite intelectual contribuiiu para a introdução de novos hábitos de vida, bem

como para o aumento do número de profissionais liberais, cuja repercussão, no âmbito da

sociedade paraense, se fez sentir anos depois, envolvendo as atividades científicas,

particularmente a medicina.

Paralela a essa face “oficial” da cidade coexistia outra, composta pelas camadas

populares, “tais como sapateiros, vendedores ambulantes, cozinheiras, criados, amas-de-leite,

barbeiros, peixeiros, leiteiros e tantos outros sujeitos”, que desprovidos de riquezas materiais,

sofreriam um processo civilizatório diferenciado, intensificado no início do século XX, em

função do crescimento econômico e urbano da cidade e dos problemas decorrentes deste

processo (Amaral, 2006). Sobre estes, assim se manifestava o intendente Antonio Lemos, em

seu relatório de 1898:

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24

Triste, realmente triste, o espetáculo que a cada passo deparava nos

pontos mais concorridos de Belém, onde os mercadores ambulantes de

grande número de coisas, estacionavam aliás e amarravam tendas,

semeando de imundícies os locais que impunemente ocupavam

convencidos de que exerciam ou estavam a sombra de um direito

(PARÁ, 1898).

Era necessário combater essas mazelas, afastar as “classes perigosas” da visibilidade

da cidade moderna (Amaral, 2006); remodelar hábitos e costumes sociais; alinhar a cidade aos

padrões da civilização europeia para que Belém se transformasse realmente numa metrópole

digna das benesses financiadas pela economia da borracha (Sarges, 2000).

Em que pese as condições de desenvolvimento advindas da economia da borracha, o

Estado do Pará e Belém, especificamente, convivia com índices sanitários desfavoráveis por

conta de constantes epidemias de doenças como febre amarela, malária, cólera, varíola e peste

bubônica, com a participação, ainda, da pandemia de gripe espanhola, em 1918. Portanto,

fazia-se necessário destruir a imagem da cidade desordenada, feia, promiscua, imunda,

insalubre e insegura, para mostrar ao mundo civilizado que Belém era o símbolo do progresso

(Sarges, 2000).

1.1.2 As doenças infecciosas mais comuns no Estado do Pará entre 1800 e 1920

1.1.2.1 Febre Amarela

A febre amarela é uma doença infecciosa aguda causada por um arbovírus da família

Flaviviridae, que se mantém endêmica ou enzoótica nas florestas tropicais da América e

África causando, periodicamente, epidemias (Vasconcelos, 2003) e cuja forma clássica se

caracteriza por um quadro íctero-hemorrágico, podendo manifestar-se ainda por quadros

inaparentes ou oligossintomáticos de difícil diferenciação com inúmeras outras doenças

febris.

O vírus causador da febre amarela é de origem africana (Vasconcelos, 2003; Bryant et

al, 2007). O primeiro relato de epidemia de doença semelhante à febre amarela é de um

manuscrito maia de 1648, em Yucatan, no México. Na Europa, a febre amarela já havia se

manifestado antes dos anos 1700, mas foi em 1730, na Península Ibérica, que se deu a

primeira epidemia, causando a morte de 2.200 pessoas (http://www.febreamarela.org.

br/febreamarela.html).

Page 25: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

25

Sua primeira epidemia na América do Sul aconteceu em 1648, sendo que no Brasil, a

primeira descrição da doença foi em 1640, em Pernambuco, provavelmente trazida pela

expedição de forças hispano-portuguesas (Britto & Cardoso, 1973) e disseminada pelos

navios que atracavam em portos brasileiros. Acredita-se que o Aedes aegypti tenha vindo da

África em navios negreiros trazendo junto o vírus da febre amarela.

Entre as últimas décadas do século XIX e os primeiros anos do século XX, a febre

amarela foi a doença que mais preocupou os médicos dedicados à saúde pública, sendo

apontada como a principal doença epidêmica que grassava no Brasil (Teixeira, 2003).

No Pará, a febre amarela deu entrada com a chegada da barca dinamarquesa “Pollux”

a Belém em 24 de janeiro de 1850, vinda de Pernambuco. Logo assumiu proporções

epidêmicas, calculando-se que tenha atingido 75% da população (Britto & Cardoso, 1973).

Além de Belém, Soure, Vigia, Maracanã e São Caetano de Odivelas também foram atingidas,

sendo na Vigia a mais extensa (Britto & Cardoso, 1973). A partir do ano seguinte, a doença se

tornaria endêmica, sendo que, de janeiro de 1850 a junho de 1906, um total de 5.007 mortos

foram registrados como causados pela febre amarela (Vianna, 1906).

O vírus é transmitido ao homem pela picada do mosquito infectado. Após um período

de incubação de três a seis dias, ocorre febre, dor de cabeça, e dores musculares que se

instalam abruptamente, acompanhadas por vermelhidão conjuntival, rubor de faces e

bradicardia. A doença causa hemorragias em fígado, rins e estômago, o que pode levar à

hematêmese. A desidratação e a lesão renal podem levar à insuficiência renal. No coração, a

doença pode causar uma miocardite com insuficiência cardíaca e arritmias. A doença é mais

grave em pessoas jovens e em idosos (Vasconcelos, 2003).

O exame de sangue mostra uma diminuição dos leucócitos. Após essa fase, na maior

parte dos casos a doença termina, mas em alguns pacientes, após um período que varia de

algumas horas a vários dias, os sintomas voltam de forma mais intensa com febre alta, dor de

cabeça, lombalgia, náuseas e vômitos, dor abdominal e sonolência, icterícia e hemorragias. A

febre amarela causa hepatite e insuficiências renal e cardíaca. Os pacientes evoluem para

choque com acidose metabólica, coma e convulsões. A morte ocorre em geral após sete a dez

do início do quadro clínico. A letalidade por febre amarela é estimada em 5-10%, muito mais

elevada do que a de outras viroses como a dengue. Os casos graves que evoluem com

síndromes íctero-hemorrágica e hepato-renal podem chegar a 50% (Vasconcelos, 2003).

O vetor urbano da febre amarela é o mosquito Aedes aegypti, que apresenta hábitos

domésticos e peridomésticos, reproduzindo-se em coleções de água, em ambientes no

domicílio (vasos com plantas, potes, filtros) e peridomicílio, especialmente em garrafas e latas

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26

abandonadas que acumulam água da chuva. Os principais responsáveis pela transmissão da

forma silvestre são os mosquitos do gênero Haemagogus (Vasconcelos, 2003).

Embora exista uma vacina eficaz, o vírus ainda é endêmico em grandes áreas das

Américas e do continente Africano, com grande morbimortalidade, constituindo um

considerável problema de saúde pública (Ishak, 1991). A forma urbana foi eliminada nas

Américas em 1954, porém ainda ocorre na África, continente que responde por 90% dos casos

anualmente notificados pela OMS (Vasconcelos, 2003).

A diminuição do número de casos nos últimos anos se deve provavelmente à

imunidade adquirida nas últimas epidemias e às campanhas de vacinação. Na América do Sul,

a bacia do Orinoco e a floresta Amazônica são as áreas de maior transmissão, junto com as

bacias dos rios Paraná e São Francisco (Vasconcelos, 2003).

A última epidemia urbana de febre amarela no continente americano aconteceu em

Trinidad Tobago em 1954 (Vasconcelos, 2003), mas a disseminação do Aedes aegypti nas

últimas décadas faz com que aumente o risco de futuras epidemias, principalmente nas

cidades próximas às florestas tropicais. Ressalte-se a ocorrência de um surto urbano da

doença em Assunção, Paraguai, em 2008 (OPAS, 2010).

A vacina contra a febre amarela é produzida com vírus vivo atenuado, tendo sido

introduzida no Brasil e em outros países da América do Sul e África subsaariana a partir de

1937. Embora desenvolvida há quase 70 anos, é uma vacina extremamente eficaz, conferindo

imunidade superior a 95%, e bastante segura. Aplicada em dose única, a validade do

certificado internacional de vacinação é de dez anos, mas há evidências de que a proteção

após a aplicação de uma única dose pode ser de mais de trinta anos (Pinheiro & Gomes, 1980;

Polland et al., 1981).

1.1.2.2 Malária

A malária é uma doença parasitária sistêmica, produzida por protozoários do gênero

Plasmodium (Haemosporidia), transmitida para o homem por vetores invertebrados do gênero

Anopheles e caracterizada clinicamente por um quadro onde predomina a tríade sintomática:

febre, calafrio e cefaleia (Souza et al., 1997).

São quatro as espécies principais dos agentes causadores da malária: Plasmodium

vivax, P.falciparum, P.malariae e P.ovale. Os tipos mais comuns são o P. vivax e o P.

falciparum. O mosquito adquire o parasito quando pica e suga o sangue de pessoas infectadas.

Os parasitos se reproduzem enquanto o mosquito usa o sangue para nutrir os seus ovos.

Quando o mosquito pica um humano novamente, os parasitos lhe são passados para o sangue,

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27

multiplicando-se rapidamente no fígado e nas hemácias. A partir daí, podem invadir outros

órgãos, incluindo o cérebro (Souza et al., 1997).

Admite-se que a malária se tenha originado na África tropical, onde o parasito se

adaptou ao hospedeiro humano durante o desenvolvimento da humanidade. Para Souza et al.

(1997), qualquer tentativa de estabelecer os princípios da história da malária no mundo ainda

esbarra na fragmentação e na escassez dos nossos conhecimentos. Nas Américas, duas

hipóteses são aceitas: uma, de que a doença teria sido trazida pelos conquistadores espanhóis;

a outra, de que já existiam o P. vivax e o P.malariae, e que o P.falciparum teria sido trazido

pelos espanhóis e portugueses com os escravos negros (Souza et al., 1997).

A característica intermitente da febre produzida pela malária permitiu sua

identificação em textos chineses e egípcios de três mil anos a.C., estando presente, também,

nos clássicos estudos de Hipócrates. Nos relatos médicos do Brasil é possível identificá-la já

no século XVI e, daí por diante, em toda a história médica brasileira, embora não existam, até

o século XIX, registros quantitativos sobre sua prevalência (Camargo, 2003). No fim deste

século, a malária estava presente em todo o território nacional, particularmente na costa

litorânea, poupando apenas alguns segmentos dos estados sulinos; a Amazônia e todo o

Planalto Central apresentavam altos índices da doença (Camargo, 2003).

No fim do século XIX, irrompeu uma grande epidemia na Amazônia. A borracha

tornara-se matéria-prima preciosa e as perspectivas de extração do látex e de riqueza imediata,

embora não fáceis, levaram para a Amazônia legiões de nordestinos flagelados por terrível

seca em suas terras. Dessa migração maciça nasceram a cultura do extrativismo seringalista, a

miscigenação de indígenas e nordestinos, dando origem aos amazônidas do século XX, e a

primeira grande epidemia amazônica de malária (Camargo, 2003)

Ainda em função da borracha, para facilitar o escoamento da produção, o Brasil

começou a construir a Estrada de Ferro Madeira-Mamoré. Para evitar o trecho encachoeirado

do rio Madeira, a estrada ligaria Santo Antônio (hoje parte de Porto Velho) a Guajará-Mirim

no rio Mamoré. Mais de uma empresa e várias levas de trabalhadores, muitos do Caribe,

tentaram, do fim do século XIX ao início do XX, construir a ferrovia do diabo, com milhares

sucumbindo à malária. Foi a segunda grande epidemia amazônica de malária, testemunhada

por Oswaldo Cruz e Carlos Chagas (Camargo,2003).

Presente em todas as capitais brasileiras e sendo endêmica em todo o país, somente

após a Segunda Guerra Mundial a malária desapareceu das capitais brasileiras e ficou restrita

a Amazônia (Camargo, 2003)

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28

O combate à malária iniciou o projeto de assistência sanitária à zona rural do Pará,

após surto da doença em 1909, quando quase todos os bairros suburbanos de Belém foram

afetados. Em 1912, o médico e deputado estadual Souza Castro apresentou um projeto

criando um serviço sanitário especial de combate à lepra e ao paludismo, nome pelo qual era

conhecida a malária, tendo um novo surto ocorrido em 1915 (Araujo, 1922).

Em 1917, por decreto estadual foi criada a Inspectoria de Prophylaxia do Paludismo,

constituída por vários postos distribuídos pelos subúrbios de Belém, chegando até o

Mosqueiro e posteriormente atingindo a área da estrada de ferro de Bragança, do

Entroncamento até Igarapé-Açu, com postos distribuídos ao longo das estações de parada dos

trens. Este serviço foi incorporado ao Serviço de Profilaxia Rural do Estado, criado em 1921

(Araujo, 1922).

A malária também pode ser transmitida de pessoa para pessoa por transfusão de

sangue infectado e por seringas e agulhas infectadas. Em áreas onde a doença é comum, as

pessoas são infectadas tantas vezes que desenvolvem um grau de imunidade adquirida,

podendo apresentar poucos sintomas ou até não apresentam nenhum sintoma (Coura et al.,

2006).

A doença permanece endêmica em 90 países, com cerca de 300 a 500 milhões de

infecções a cada ano, 90% nos países da África tropical, estimando-se que ocorram um a dois

milhões de óbitos por esta causa, anualmente. A OMS considera a malária como o maior

problema de saúde pública em muitos países, particularmente os do Terceiro Mundo (Souza et

al,. 1997). A expansão da malária em algumas áreas da Amazônia brasileira, nas duas últimas

décadas é preocupante, por sua reintrodução em algumas capitais da região como resultado da

ocupação desordenada, o que se tornou mais acentuado após a construção da rodovia

Transamazônica nos anos de 1970 (Ladislau, 2005; Telarolli Jr., 2011).

A maioria dos casos registrados no Brasil concentra-se no Mato Grosso, Rondônia e

Pará, responsáveis por 77,4% de todos os casos da Amazônia brasileira (Souza et al.,1997).

Embora esteja sendo pesquisada em vários países, ainda não existe uma vacina contra

a malária, sendo a prevenção a melhor maneira de evitar a doença, sendo a mais eficaz e

duradoura a eliminação do mosquito transmissor, obtida pela drenagem de pântanos e

charcos, locais preferidos para a reprodução do mosquito (Telarolli Jr., 2011).

O tratamento da malária é eficaz. As drogas são fornecidas e administradas à

população por agentes dos serviços de saúde. O tratamento dos pacientes sintomáticos, além

de curá-los, serve para limitar a disseminação da malária (Camargo, 2003).

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29

A malária é considerada a doença símbolo na formação e consolidação da Medicina

Tropical como uma nova disciplina científica a fazer parte da formação médica, por

constituir-se em um dos grandes problemas para o desenvolvimento das colônias nos trópicos

(Sá, 2010).

Relacionada diretamente ao subdesenvolvimento, a doença já desapareceu da Europa

e da América do Norte, onde existiu até a metade do século XX. Na última década do século

XX, apenas cerca de 400 casos anuais foram registrados no Canadá e 900 nos Estados Unidos,

a maioria destes importada de outros países e apenas uma dezena originada no próprio país

proveniente de transfusões de sangue (Camargo, 2003).

1.1.2.3 Cólera

A cólera é uma doença bacteriana intestinal aguda de seres humanos e de veiculação

predominantemente hídrica, causada pela enterotoxina do Vibrio cholerae 01 (Lainson et al.,

1997), existindo vários tipos de vibrião colérico, cada um responsável pelas diversas

epidemias de cólera que aconteceram no mundo (Telarolli Jr., 2011).

A doença, considerada como o paradigma da interdependência social (Hochaman,

1998), é originária da Ásia, mais precisamente da Índia e de Bangladesh, de onde se espalhou

para outros continentes a partir de 1817, quando uma grande epidemia assolou Calcutá, se

propagou a outras partes da Índia, ultrapassou fronteiras e, devido às rotas comerciais e aos

movimentos militares britânicos chegou à Europa (Lewinsohn, 2003). A partir de então, o

vibrião colérico expandiu-se, acompanhando os deslocamentos civis e militares, gerando seis

epidemias, cinco das quais tendo ocorrido antes de 1900 (Lainson et al., 1997).

Os relatos das primeiras ocorrências de cólera nas Américas datam de 1829, com a

doença fazendo vítimas no Peru, Chile, México e Estados Unidos (Beltrão, 2004). A doença

chegou ao Brasil em 1885, quando a galera portuguesa Defensor aportou em Belém do Pará,

proveniente da cidade do Porto. De Belém, disseminou-se pelo interior do Estado (Vianna,

1906). Declarada erradicada em todo o país no final do século XIX, cerca de um século

depois, em abril de 1991, a cólera chegou novamente ao Brasil, vindo do Peru, fazendo sua

primeira vítima brasileira na cidade de Tabatinga, Amazonas. (http://www.portalbrasil.

net/medicina_colera.htm).

O período de incubação da doença varia de algumas horas a cinco dias, em média dois

a três dias. A doença é transmitida principalmente pela ingestão de água e/ou alimentos

contaminados. Outra forma de transmissão é o transporte do vibrião, de um lugar para outro,

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30

por moscas e baratas (Telarolli Jr, 2011). Os doentes servem como fontes de infecção, tanto

no período de incubação quanto na fase de manifestações clínicas, na de convalescença e na

de portadores assintomáticos. O vibrião está presente nas fezes e vômitos dos pacientes

(Lainson et al., 1997; Ujvari, 2003).

Em sua forma clássica caracteriza-se por sintomas violentos e dramáticos: diarreia

volumosa, que logo se torna aquosa, profusa e incoercível, com vômitos copiosos, cólicas

abdominais e espasmos musculares violentos, levando a uma rápida desidratação que pode

resultar em acidose, colapso circulatório, coma e morte em poucas horas do início da doença

(Lewinsohn, 2003) As fezes de uma pessoa acometida pela doença têm consistência líquida,

semelhante à água do arroz que está sendo cozido (Telarolli Jr., 2011).

Os casos de cólera podem ser fatais se o diagnóstico não for rápido e o doente não

receber tratamento adequado. A mortalidade é de até 50% para os casos não tratados; com o

tratamento este índice cai para menos de 1% (Vieira, 1991; Lewinsohn, 2003).

O tratamento deve ser feito com acompanhamento médico, usando-se antibióticos para

combater a infecção e líquidos e eletrólitos para combater a diarreia e prevenir a desidratação.

A prevenção da cólera pode ser feita por meio de vacina e, principalmente, por medidas de

higiene e saneamento básico, com o tratamento adequado, rigorosamente fiscalizado, da água

potável e dos esgotos e dejetos humanos, pois uma caraterística das epidemias de cólera é a

sua ocorrência exclusiva em países e cidades onde há deficiências no saneamento básico

(Lewinsohn, 2003).

Pelo fato de poder haver portadores sãos, os indivíduos que possuem o vibrião colérico

em seu organismo, eliminando-o pelas fezes, mas sem apresentarem a doença, precisam ser

identificados e, consequentemente, tratados, em razão de poderem servir como fonte de

infecção para o ambiente (Telarolli Jr., 2011).

Em função da grande facilidade de deslocamento de pessoas entre cidades, países e até

continentes, pelos mais variados meios de transporte, principalmente o aéreo, é praticamente

impossível evitar a entrada da cólera em qualquer que seja o local, pois qualquer um que viaje

para onde estiver acontecendo uma epidemia, pode ser contaminado e trazer consigo a

doença. Se as condições sanitárias do local de origem forem boas, a doença não se propagará,

ainda que várias pessoas tenham sido contaminadas e retornem para um mesmo local

(Telarolli Jr. 2011).

Page 31: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

31

1.1.2.4 Varíola

A varíola é uma doença infecciosa aguda causada por um vírus da família Poxviridae

(a mesma dos vírus causadores de formas variantes da doença, próprias do gado bovino,

macacos, galinhas e camelos), subfamília Chordopoxvirinae, gênero Orthopoxvirus.

Extremamente resistente aos agentes físicos externos, como umidade e temperatura, é um dos

maiores vírus conhecidos que infectam seres humanos, com cerca de 300nm, permitindo sua

visualização como um ponto ao microscópio ótico (www.sobiologia.com.br/conteudos/

Seresvivos/Ciencias/biovirus9.php)). A varíola, que foi considerada uma das enfermidades

mais devastadoras da história da humanidade (Ferreira, 2006), é exclusiva dos seres humanos,

não sendo transmitida por outros animais, constituindo-se o protótipo das infecções

exantemáticas do tipo vesicular.

Historicamente, a doença afetou a humanidade de forma significativa por milênios,

com registro de sua presença em múmias egípcias, como a de Ramsés V, que data de mais de

mil anos antes de Cristo (http://www.sobiologia.com.br/conteudos/Seresvivos/Ciencias/

biovirus9.php).

Ocorreu de forma endêmica e epidêmica em todas as regiões do mundo e, até 1945,

mais da metade da população da terra vivia em áreas epidêmicas (Angulo, 1991). Encontra-se

erradicada das Américas desde 1973, segundo parecer de uma Comissão Internacional reunida

na FIOCRUZ em outubro daquele ano. Em 26 de outubro de 1977 foi anunciado o último

caso de infeção natural pelo vírus da varíola no mundo, na área de Merka, Somália

(Schatzmayr, 2001). A erradicação em todo o mundo foi anunciada pela OMS em maio de

1980 (Fenner et al., 1988).

A doença teria surgido na Índia ou no Egito, embora sua primeira descrição seja na

China, em 1122 a.C. Foi introduzida na Europa já na era cristã, assim como a sífilis e a peste,

atingindo segmentos amplos da população, deixando um rastro de mortes, cegueira e

cicatrizes irreversíveis (Schatzmayr, 2001). Doença de distribuição universal, suas epidemias,

aniquilando populações inteiras, como diversas tribos de índios brasileiros, por exemplo,

mudaram o curso da história: em algumas culturas antigas, a letalidade por varíola era

tamanha entre as crianças que estas só recebiam nomes se sobrevivessem à doença (Ferreira

2006).

A varíola foi introduzida nas Américas primeiro pelos colonizadores europeus e,

depois, pelos escravos africanos. No Brasil, seu primeiro registro foi na Bahia, em 1563, na

Page 32: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

32

ilha de Itaparica, de lá passando para Salvador, onde causou grande número de óbitos,

principalmente entre os indígenas (Schatzmayr, 2001).

Segundo Vianna (1906), só existe registro de casos no Pará a partir do bispado de D.

Frei Bartholomeu do Pilar, o primeiro bispo do Pará, que compreende o período de 1721 a

1733 e cujas ocorrências estão relatadas na obra O bispado no Pará, onde há a referência de

uma “forte epidemia, que arrebatou milhares de vidas”. A partir daí, outras epidemias foram

relatadas. No período de 1884 a 1904, três epidemias ocorreram em Belém. Descritas como

“Epidemias de varíola em Belém da Belle Époque” são relatadas e analisadas por Silva

(2009).

No Pará, a varíola esteve relacionada ao tráfico negreiro até a extinção deste, em 1850,

sendo frequente a disseminação entre os escravos pelas péssimas condições das embarcações

que os traziam para o Brasil. Da segunda metade do século XIX ao início do século XX, a

ocorrência da doença passou a ser atribuída às correntes migratórias para a Amazônia,

principalmente a nordestina, contribuindo para aumentar a discriminação, especialmente em

relação aos cearenses que vieram trabalhar na extração da borracha (Silva, 2009).

Em relatório sobre o Serviço Sanitário do Estado, o Dr. José Cyriaco Gurjão menciona

uma epidemia de varíola no Pará ocorrida em 1913, tendo sido notificados e removidos para o

Hospital São Sebastião 157 casos; em 1914, foram 145 casos. Relata, também, que foram

vacinadas 34.791 pessoas em 1913 e 18.774 no ano seguinte, quando não foi notificado

nenhum caso a partir de agosto até o início de 1920, com o Pará sendo considerado livre da

doença (Gurjão, 1922).

A transmissão é feita de pessoa para pessoa por contato direto e geralmente pelas vias

respiratórias. O período de incubação é de sete a 17 dias. Os sintomas manifestam-se por um

período prodrômico de dois a três dias, com febre elevada, mal estar e prostração,

acompanhados de forte cefaleia e dor lombar. A seguir, com o comprometimento do naso e

orofaringe, manifesta-se mal-estar, cefaleia, lombalgia e prostração, durando esse estado de

dois a cinco dias. Após este período, surge a fase eruptiva, com um exantema máculo-papular

que progride com pápulas (1 a 2 dias), depois vesículas por 2 a 3 dias, pústulas ao final da

primeira semana de doença, e finalmente crostas que surgem cerca de 12 dias após o início

dos sintomas. O exantema se inicia na mucosa oral, face e braços, progredindo para o tronco e

membros. Lesões podem ser observadas nas palmas das mãos e plantas dos pés, fato

raramente observado na varicela (Fenner et al, 1988; Schatzmayr, 2001). Nesse estágio o

risco de cegueira é maior, pois, ao tocar o olho com as mãos contaminadas, o enfermo pode

causar uma inflamação grave (Ferreira, 2006).

Page 33: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

33

Na varíola, as lesões na pele surgem como uma única onda, ao contrário da varicela,

que pode apresentar vesículas, pústulas e crostas ao mesmo tempo no paciente. As lesões são

sentidas como estruturas rígidas, circulares, elevadas e com alguns milímetros de tamanho.

Com a regressão das lesões, as crostas se soltam, e na cicatrização podem permanecer marcas

irreversíveis na pele, em especial quando as lesões são muito numerosas, com tendência a

confluir (Fenner et al., 1989; Schatzmayr, 2001).

Não existe tratamento específico contra a varíola. No geral, deve-se tentar amenizar o

prurido e a dor causados pela doença e esperar a reação natural do organismo. A

sobrevivência do doente depende da forma de varíola adquirida, já que a enfermidade pode se

apresentar de duas formas principais, a varíola major, com 30% de letalidade, e a varíola

minor, também conhecida como alastrim, que era mais comum no Brasil e com menos de 1%

de casos fatais (também existiam manifestações mais raras da doença, como a hemorrágica e a

maligna). Com o tempo, as pústulas secavam e transformavam-se em crostas, que se

desprendiam ao final de três ou quatro semanas. Caso o enfermo tivesse adquirido a forma

major, essas crostas costumavam deixar cicatrizes permanentes na pele (Ferreira, 2006).

A vacina contra varíola, descoberta pelo médico inglês Edward Jenner em 1796,

chegou ao Brasil em 1804, por iniciativa do barão de Barbacena, que enviou escravos a

Lisboa para serem imunizados à maneira jenneriana (Ferreira, 2006). Antes da descoberta de

Jenner, que fazia a inoculação com o vírus da varíola bovina (vaccínia), há muito já era

conhecida e bastante utilizada, inclusive na Europa, a técnica de variolização, que consistia na

inoculação de material retirado das pústulas de um doente na pele de um individuo são. Há

relatos da utilização deste método na Amazônia por missionários carmelitas por volta de 1730

(Sá, 2008).

Segundo Spix e Martius (apud Sá, 2008), o governo português já havia introduzido a

vacina jenneriana em Belém do Pará antes da epidemia de 1809, mas nunca havia levado a

sério esse procedimento na região, ainda que sabendo da sua eficácia. A vacina somente

começou a ser produzida no Brasil em 1887, por iniciativa do cirurgião Pedro Afonso Franco,

barão de Pedro Afonso, na época diretor da Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro, que

criou um instituto privado para o seu preparo. Mais tarde, o governo o encarregou de

estabelecer o Instituto Municipal Soroterápico no Rio de Janeiro. Em 1922, Instituto foi

transferido para o Instituto Oswaldo Cruz (Ferreira, 2006).

A inexistência de uma política pública eficaz para a região permitiu que a varíola e

outras doenças como a febre amarela e a cólera continuassem a assolar a região amazônica. A

Page 34: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

34

falta de inspeção sanitária nos portos, o negligenciamento da vacina, assim como o não

isolamento dos pacientes infectados favoreciam o caráter endêmico da doença (Sá, 2008).

Com o tempo, novas técnicas foram sendo empregadas na fabricação da vacina contra

a varíola, usando o vírus da vaccínia. A vacinação em massa permitiu que o número de casos

no mundo em cada ano caísse de 50 milhões, em 1950, para 15 milhões em 1967 (Ferreira,

2006).

Em 1958, a então União Soviética propôs à Organização Mundial da Saúde (OMS) o

estabelecimento de uma campanha internacional para a eliminação da varíola no mundo, uma

vez que naquela ocasião, a doença ainda ocorria em 33 países (Schatzmayr, 2001).

Declarada extinta pela OMS em 1980, as últimas instituições com estoques declarados

do vírus da varíola são o laboratório do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) de

Atlanta, EUA e o Instituto Vector da Rússia (Ferreira, 2006).

No Brasil, após a realização a vacinação sistemática de toda a população, entre 1967 e

1971, o último caso diagnosticado no país foi em abril de 1971, no Rio de Janeiro. A

vacinação foi sendo gradualmente desativada ao longo dos anos seguintes e, em 1976-1977,

foi interrompida com a perspectiva de erradicação da doença em todo o mundo (Gazêta, et

al.,2005).

1.1.2.5 Gripe espanhola

A “influenza maligna”, ou simplesmente gripe espanhola, é uma doença viral

possivelmente adquirida pelo contato humano com animais domesticados ou silvestres

(Silveira, 2005). Apesar de estar entre as mais antigas doenças da civilização, não há maiores

evidências de sua difusão entre os homens até os séculos XV e XVI, tornando-se a partir de

então frequente, atingindo a sociedade por meio de epidemias e pandemias de intensidades

variadas, sempre com taxa de mortalidade baixa e decorrente de complicações como

pneumonia, acometendo mais crianças e idosos (Ujvari, 2003; Silveira, 2005).

Em 1918 surgiu um novo vírus da gripe, com poder de invasão muito maior,

disseminando-se pelo mundo. Foi a maior e a mais devastadora das doenças que grassaram no

século XX, levando à morte estimadamente entre 20 e 40 milhões de pessoas em todo o

mundo, por conta da sua letalidade 25 vezes maior do que as gripes comuns, que matam um

em cada mil acometidos, enquanto que a gripe espanhola tinha um índice de mortalidade de

2,5% (Teixeira, 2003; Ujvari, 2003).

Page 35: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

35

Supõe-se tenham adoecido entre 80% e 90% da população mundial, que na época

estaria em torno de um bilhão de pessoas (Bertucci, 2004). A doença foi assim denominada

por se imaginar que tivesse se originado na Espanha (Brito, 1977).

De origem incerta, acreditando-se que tenha aparecido nos Estados Unidos ou na Ásia

(Ujvari, 2003), caracterizou-se por seu caráter pandêmico, expandiu-se rapidamente pelo

mundo durante o ano de 1918, num momento em que a comunidade científica e a sociedade

comemoravam os triunfos alcançados pelas descobertas da Microbiologia (Silveira, 2005),

vindo abalar ainda mais um cenário já transtornado pelos efeitos da Primeira Guerra Mundial,

sobretudo na Europa (Brito, 1977).

A pandemia manifestou-se em três ondas, tendo a primeira irrompido em março de

1918, na Espanha, fazendo com que o relato das agências espanholas sobre a gravidade da

epidemia, alertando a comunidade mundial, contribuísse para que a doença recebesse o nome

de “gripe espanhola” (Ujvari, 2003); a segunda, a partir de agosto do mesmo ano, altamente

virulenta, disseminou-se simultaneamente pelos Estados Unidos, Europa e costa oeste da

África (Ujvari, 2003); e a terceira, menos grave, surgiu em janeiro de 1919 durando até por

volta de maio do mesmo ano (Souza, 2009).

Entre as características reconhecidas da moléstia estavam sua extrema contagiosidade

e difusibilidade e seu caráter inespecífico determinando a ausência de uma sintomatologia

própria, o que dificultava a percepção e a identificação clara dos primeiros casos , fazendo

supor a ineficácia de medidas preventivas (Silveira, 2005).

Considerada a maior epidemia da História (Bertucci, 2004), a gripe espanhola chegou

ao Brasil em final de setembro de 1918, quando marinheiros brasileiros que prestaram serviço

militar em Dacar, na costa atlântica da África, desembarcaram doentes no porto do Recife.

Em pouco mais de duas semanas surgiram casos de gripe em outras cidades do Nordeste, em

São Paulo e no Rio de Janeiro, então capital federal. As autoridades brasileiras acreditavam

que o oceano impediria a chegada do mal ao país, mas tropas em trânsito por conta da guerra

conseguiram romper esta barreira (Rocha, 2006).

A gripe espanhola chegou ao Pará em 5 outubro de 1918 a bordo do vapor “Ceará”,

por intermédio de um passageiro oriundo do Rio de Janeiro. A epidemia durou em torno de

três meses, com um número de óbitos estimado em 575 pessoas (Pará, 1919). O navio,

quando ainda ancorado no porto de São Luís do Maranhão, já apresentava 26 casos de pessoas

contaminadas. No porto de Belém, após rigorosa inspeção sanitária de passageiros e

tripulantes e desinfecção das bagagens foi permitido o desembarque dos que convalesciam,

em número de 15, e remoção dos demais infectados para o Hospital São Roque (Cruz, 1973).

Page 36: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

36

No dia 9 de outubro mais doentes chegaram a Belém a bordo do vapor “Bahia”. Um

dos passageiros, que se hospedara no Hotel América, faleceu no dia 13, levando o Serviço

Sanitário do Estado a proceder a rigoroso expurgo naquele estabelecimento. Logo a gripe

tomaria conta de Belém. Segundo os jornais, em 20 de outubro mais de 3.000 pessoas

estavam doentes, lotando os hospitais e casas de saúde. Segundo Cruz (1973):

A cidade perdeu sua característica habitual. Tudo era desolação.

Sucediam-se os enterramentos, a todas as horas do dia e da noite. As

Farmácias não tinham mais capacidade para atender os doentes. Uma

autêntica calamidade pública.

Entre as medidas implantadas pelo governo para combater a epidemia constavam a

instalação de postos médicos em zonas afastadas do centro urbano, onde eram atendidos e

fornecidos medicamentos a todos os que os procuravam, com os médicos ficando na

obrigação de visitas domiciliares posteriores, a adaptação dos Hospitais São Roque e São

Sebastião para receber os pacientes e a criação, em novembro, de mais um hospital, que

funcionou no Grupo Escolar Benjamim Constant. Nos hospitais foram admitidos 458

pacientes, sendo registrados 90 óbitos em novembro. Em três meses, o número de óbitos

chegou a 757 (Cruz 1975). De acordo com a Mensagem do Governador Lauro Sodré, relativa

ao ano de 1919, a epidemia aumentou no mês de novembro de 1919 extinguindo-se em

dezembro do mesmo ano, sendo de 544 o número de óbitos em Belém (Pará, 1919; Gurjão,

1922 ).

Há três tipos de vírus da influenza: A, B e C, sendo que somente o tipo A é o causador

das grandes epidemias e pandemias. Na superfície do vírus A encontram-se duas

glicoproteínas que conferem a ele um poder de ligação às células do hospedeiro e de

replicação. A combinação entre essas glicoproteínas é que determina o aparecimento de

epidemias (Ujvari, 2003; Rezende, 2009; Ruiz, 2009).

A epidemia de 1918 foi causada pelo subtipo H1N1. Em outras epidemias foram

identificados os subtipos H2N2 (gripe asiática, 1957), H3N2 (gripe de Hong Kong, 1968),

H5N1 (gripe aviária, China, 1997). Além do tipo e subtipos, são comuns variantes de um

mesmo subtipo, o que dificulta a produção da vacina específica (Rezende, 2009).

Clinicamente, a doença começava como um tipo comum de gripe, mas os doentes

desenvolviam rapidamente uma doença respiratória aguda grave com a instalação de uma

Page 37: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

37

pneumonia extremamente letal. Duas horas após terem dado entrada nos hospitais, os

pacientes apresentavam manchas castanho-avermelhadas nas maçãs do rosto e algumas horas

depois se instalava cianose por toda a face, “até se tornar difícil distinguir o homem negro do

branco”. A morte chegava em poucas horas, por insuficiência respiratória (Rocha, 2006).

A grande letalidade da gripe espanhola deveu-se às complicações respiratórias

ocasionadas por infecções bacterianas e a ausência de antibióticos naquela primeira década do

século XX. As pandemias posteriores (1957, 1968, 1997) cursaram com taxas bem menores

de complicações e óbitos em razão da existência e a consequente utilização desses fármacos

em larga escala, bem como de vacinas e antivirais, além de medidas gerais de controle e de

suporte respiratório para os casos graves (Rocha, 2006; Ribeiro, 2007; Ruiz, 2009; Almeida et

al.).

1.2 O ENSINO SUPERIOR NO PARÁ

O ensino superior no Brasil colônia foi desincentivado e também proibido pelo

governo português. Quando muito os colégios jesuítas ofereciam cursos superiores de

Filosofia e Teologia ou eram concedidas bolsas para que filhos de colonizadores fossem

estudar na metrópole portuguesa. Com isso, Portugal pretendia impedir que os estudos

universitários operassem como coadjuvantes de movimentos independentistas, especialmente

a partir do século XVIII, quando o potencial revolucionário do Iluminismo fez-se sentir em

vários pontos da América (Cunha, 2000).

A vinda da família real portuguesa para o Brasil não levou à criação de universidades.

Em vez disso, criou cátedras isoladas de ensino superior para a formação de profissionais:

Medicina, na Bahia e no Rio de Janeiro, em 1808; e de Engenharia, agregada à Academia

Militar, no Rio de Janeiro, dois anos depois (Cunha, 2000).

Com a República, em 1889, e a promulgação de uma nova Constituição, em 1891, o

federalismo passou a ser a orientação do novo regime, embora o governo federal mantivesse o

poder de mando na área da educação.

As reformas educacionais introduzidas pela Constituição de 1891 criaram a figura da

equiparação dos estabelecimentos de ensino secundário e superior ao Ginásio Nacional (Pedro

II) e às faculdades mantidas pelo governo federal. As faculdades criadas e mantidas pelos

governos estaduais ou por particulares e cujos currículos fossem os mesmos das federais,

Page 38: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

38

desde que fiscalizadas, poderiam outorgar diplomas que seriam reconhecidos em todo o país

(Cunha, 2000).

O resultado dessas medidas foi uma grande expansão do ensino superior. No período

que vai da reforma de 1891 até 1910 foram criadas 27 escolas superiores no Brasil: nove de

Medicina, Obstetrícia, Odontologia e Farmácia; oito de Direito; quatro de Engenharia; três de

Economia e três de Agronomia (Cunha, 2000).

O novo modelo, republicano, gerou uma demanda social à procura da educação

secundária e superior: os abastados queriam filhos "doutores", como modo de lhes dar a

formação desejável para o bom desempenho das atividades políticas e o aumento do prestígio

familiar; os trabalhadores urbanos e os colonos estrangeiros, por sua vez, viram na es-

colarização dos filhos um meio de aumentar as chances de estes alcançarem melhores

condições de vida (Cunha, 2000).

O ensino superior no Pará somente passou a existir a partir da República. Num dos

primeiros governos republicanos, o de Paes de Carvalho (1897-1899), o governador

sancionou uma lei, em 1899, criando os cursos de Medicina, Direito e Engenharia, mas que se

tornou letra morta, não saindo do papel. Somente em 1901 é que um grupo de magistrados

iniciou as discussões visando à criação de um curso de Direito no Pará, dando início aos

cursos superiores no Estado (Borborema & Souza, 1956).

1.2.1 As escolas superiores no Pará no início do século XX

1.2.1.1 Direito

A Faculdade Livre de Direito, hoje Faculdade de Direito da Universidade Federal do

Pará (UFPA), foi instalada em 31 de março de 1902, sendo o primeiro curso superior a ser

criado no Pará (Chaves, 1956).

A ideia de sua criação partiu do desembargador Ernesto Adolpho de Vasconcellos

Chaves que, ao lado de outros ilustres membros da seara do Direito, os Desembargadores

Augusto de Borborema, Santos Estanislau Pessoa de Vasconcelos, Napoleão Simões de

Oliveira e Alfredo Raposo Barradas, juntamente com os advogados Antonio Acatauassú

Nunes e Arthur da Silva Lemos, fundaram em 1901 o Instituto Teixeira de Freitas. O

Instituto tinha entre suas funções fundar, instalar e fazer funcionar a “Escola Livre de

Direito”, o que aconteceu na data supramencionada (Borborema & Souza, 1956).

Page 39: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

39

Figura 3 - Faculdade de Direito

Fonte: Album do Estado do Pará, 1908

Inicialmente mantida com ajuda do governo do Estado - que passou a custeá-la e dirigi-

la por força da lei nº 839, de 30 de outubro de 1902, na gestão de Augusto Montenegro, em

virtude de acordo com o Instituto Teixeira de Freitas -, a Faculdade (Figura 3) foi

reconhecida pelo Decreto nº 4.904, de 27 de julho de 1903, do Governo Federal, e

regulamentada pelos estatutos aprovados na Diretoria do mencionado Instituto.

Tornada estadual em 1931, pelo Decreto nº 486, de 17 de setembro, a faculdade

deixou de ser Livre para ser Estadual. Em 1950 foi federalizada conforme a lei nº 1.254, de 4

de dezembro de 1950 (Beckmann, 2002).

Segundo Moreira (1989), de todas as Faculdades paraenses, a de Direito foi a que mais

exerceu influência na vida cultural do Estado; com exceção da Faculdade de Direito de

Pernambuco, nenhuma outra teve maior destaque em todo o Norte e Nordeste do Brasil.

1.2.1.2 Farmácia

O primeiro curso de Farmácia do Pará foi criado pela lei estadual nº 874, de 23 de

outubro de 1903, regulada pelo Decreto nº. 1.274, de 1º de fevereiro de 1904, sendo

oficialmente instalado em 11 de fevereiro do mesmo ano. Foi o segundo curso superior criado

no Estado do Pará. Em 29 de agosto de 1904, o Governo Federal equiparou-o aos

estabelecimentos oficiais do país, conforme o Decreto nº 5.294 (Pará-Medico,1922).

Page 40: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

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Como os demais estabelecimentos oficiais, o curso tinha a duração de dois anos, até

1911, quando entrou em vigor a Reforma Rivadávia, passando sua duração para três anos.

Funcionou em condições precárias nas dependências da Repartição Sanitária do

Estado, utilizando o laboratório dessa Repartição para as aulas práticas. Após a revolução de

1930, o interventor federal Magalhaes Barata, anexou-a à Faculdade de Medicina e Cirurgia

do Pará, segundo o Decreto nº 133, de 12 de fevereiro de 1931, situação em que permaneceu

por quase dez anos (Miranda & Abreu Jr., 2010).

Figura 4 - Faculdade de Farmácia

Fonte: Pará Médico, 1922

Considerada extinta em 1938, em virtude da suspensão do repasse da verba que o

Governo do Estado fazia à Faculdade de Medicina para sua manutenção, e o seu consequente

desligamento desta, a Faculdade de Farmácia (Figura 4) ressurgiu em 1941 como nova

entidade de ensino, por iniciativa da Associação Farmacêutica do Pará, sendo considerada

refundada em 16 de julho daquele ano (Miranda & Abreu Jr., 2010).

Após um arrastado trâmite burocrático, a Faculdade foi autorizada a voltar a funcionar

em 1945, conforme o decreto presidencial nº 19.299, de 31 de julho daquele ano. A

instalação oficial e o início das atividades escolares se deu em 20 de janeiro de 1946. Nesta

nova fase, o reconhecimento do curso foi obtido segundo o decreto nº 27.359, de 24 de

outubro de 1949 (Leitão, 1985).

Page 41: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

41

Com a federalização do ensino superior no Brasil, a Faculdade de Farmácia do Pará

foi incluída na lei nº 1.254, de 4 de dezembro de 1950, passando a integrar o grupo inicial

constitutivo da UFPA (Leitão, 1985).

Registre-se que a Faculdade de Farmácia, juntamente com a de Direito são as únicas

surgidas em pleno apogeu da economia da borracha.

1.2.1.3 Odontologia

O primeiro curso de Odontologia do Pará foi criado em 4 de julho de 1914 com o

nome de Escola Livre de Odontologia do Pará (Pará-Medico,1922), por intermédio da

Associação Científica do Pará (Leitão, 1985; Moreira, 1989).

Reconhecida pelo governo estadual pela lei nº 1.451, de 22 de outubro do mesmo ano,

constituiu-se no terceiro curso de Odontologia do Brasil (Ribeiro, 2005). Por decisão de sua

congregação, em 12 de abril de 1920, passou a denominar-se Faculdade Livre de Odontologia

do Pará. O curso de Odontologia (Figura 5) surgiu, assim, logo após o início da primeira

grande crise da economia da borracha, que aconteceu em 1913 (Moreira, 1989).

Figura 5 - Faculdade de Odontologia

Fonte: Boletim Informativo da UFPA, 1977

Encampada e incorporada ao quadro de estabelecimentos oficiais do Estado pelo

Decreto nº 2.165, de 30 de maio de 1936, teve seu nome modificado para Faculdade de

Odontologia do Pará, passando a ser fiscalizada pelo Governo Federal. Seu reconhecimento se

deu pelo Decreto Federal nº 6.079, de 13 de agosto de 1940 (Leitão, 1985)

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42

Federalizada pela lei nº 3.191, de 2 de julho de 1957, mesma lei de criação da

Universidade do Pará (atual Universidade Federal do Pará), passou a fazer parte do grupo

inicial da referida Instituição, tendo o Governo do Estado do Pará doado à nova Universidade

todos os bens de qualquer natureza que integravam o patrimônio da antiga Faculdade Livre de

Odontologia do Pará (Leitão, 1985).

A maioria de seus criadores comporia, também, o grupo formador da Faculdade de

Medicina. Segundo Ribeiro (2005), a resolução de criação da Faculdade de Medicina foi

deliberação unânime da Congregação da Odontologia. O próprio Diretor da Faculdade de

Odontologia, por ocasião da criação do curso de Medicina, Dr. Magno e Silva, fez parte do

primeiro grupo de médicos formados pela Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará

(Miranda & Abreu Jr., 2010).

1.2.1.4 Agronomia

Cronologicamente também anterior à Faculdade de Medicina, o curso de Agronomia,

atualmente integrante da Universidade Federal Rural da Amazônia, teve início em 1918, sob a

direção do Centro Propagador de Ciências, o qual tinha como finalidade a “criação e

manutenção de cursos e ensino superior” (Miranda & Abreu Jr., 2010). Com o objetivo de

ministrar uma educação profissional aplicada, mediante a difusão de conhecimentos

científicos e práticos necessários à exploração econômica de propriedades agrícolas (UFRA,

2013), o curso tinha a duração de três anos, “sendo regido por lentes de reconhecida aptidão”

(Miranda & Abreu Jr., 2010).

Em 1919, a escola recebeu a denominação de Escola de Agronomia e Veterinária do

Pará, mas permaneceu ministrando apenas o curso de Agronomia. Embora de caráter estadual,

a escola era inscrita no Ministério da Agricultura, recebendo apoio financeiro federal e

municipal, fato relevante devido à importância dada, à época, ao ensino superior agrícola

(UFRA, 2013).

Instalada no largo da Sé, próximo à praça Frei Caetano Brandão, em 1921 transferiu-

se para uma nova sede, na avenida Tito Franco (Figura 6), hoje Almirante Barroso, no local

em que funciona atualmente o colégio Souza Franco (UFRA, 2013).

Em 1931, a escola foi transformada pelo Governo do Estado em estabelecimento de

ensino superior com a denominação de Escola Superior de Agricultura e Veterinária. Em

1935 foi desmembrada em duas, passando o curso de Agronomia a ser ministrado pela Escola

Superior de Agricultura do Pará.

Page 43: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

43

Em 1937, a escola recebeu a denominação de Escola de Agronomia do Pará,

funcionando até 1943, quando encerrou suas atividades em função do Ministério da

Agricultura ter negado seu reconhecimento e, consequentemente os diplomas de Agrônomos e

de Médicos Veterinários por ela formados (Libonati, 1985; UFRA, 2013).

Figura 6 - Faculdade de Agronomia

Fonte:http://haroldobaleixe.blogspot.com.br/2009/10/escola-de-agronomia-e-

medicina.html

Como o Governo Federal criou em 1939 o Instituto Agronômico do Norte, com o

objetivo de realizar pesquisas agrícolas, incluindo levantamento de recursos naturais do solo,

clima, fauna e flora, com abrangência em toda a Amazônia, e nele trabalhavam pesquisadores

estrangeiros, que com o final da Segunda Guerra Mundial foram progressivamente retornando

aos seus países de origem, houve a necessidade de formação de recursos humanos, surgindo

assim a Escola de Agronomia da Amazônia, ligada ao Instituto (Libonatti, 1985; UFRA,

2013).

Por falta de recursos, a nova instituição, criada em 1945, somente foi instalada em

1951, entrando em exercício em 17 de abril daquele ano, funcionando no prédio da

representação das plantações Ford, à rua Gaspar Viana, com as atividades práticas

desenvolvidas no Instituto Agronômico do Norte.

Atualmente, faz parte da Universidade Federal Rural do Pará, compreendendo, além

do curso de Agronomia, os cursos de Engenharia Florestal, Medicina Veterinária, Zootecnia,

Engenharia de Pesca, Bacharelado em Informática Agrária, Licenciatura em Computação e

Engenharia Ambiental (UFRA, 2013).

Page 44: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

44

1.6 OBJETIVOS

1.6.1 Objetivo geral

Descrever as condições socioeconômicas e de saúde da população humana em Belém,

ao final do século XIX e primeiras décadas do século XX, com ênfase nas doenças infecciosas

mais comuns, que contribuíram para a criação do primeiro curso de medicina da Amazônia

brasileira.

1.6.2 Objetivos específicos

1. Descrever a situação epidemiológica e a realidade socioeconômica da Amazônia brasileira

no período;

2. Descrever as medidas governamentais da primeira república que caracterizaram a era do

saneamento e seu impacto na Amazônia brasileira;

3. Descrever a participação de Oswaldo Cruz no saneamento da Amazônia brasileira;

4. Descrever a participação das agremiações científicas paraenses no processo de saneamento;

5. Estabelecer os fatores que possam ter influenciado a comunidade médica paraense no

sentido da criação de um curso de medicina.

Page 45: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

45

2 MATERIAL E MÉTODOS

2.1 PESQUISA BIBLIOGRÁFICA

Realizamos pesquisa bibliográfica em fontes de historiografia do Estado do Pará, em

jornais, periódicos médicos e livros voltados para temas de historiografia médica,

pertencentes ao acervo da Biblioteca Pública Arthur Vianna (Belém-Pará).

Realizamos, igualmente, pesquisas nos arquivos da Faculdade de Medicina (antiga

Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará) do Instituto de Ciências da Saúde da Universidade

Federal do Pará, nos arquivos da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de

Janeiro e nos arquivos da Casa de Oswaldo Cruz (Fiocruz-Rio de Janeiro), particularmente

nos Fundos Oswaldo Cruz e Belizario Penna, acerca de documentação pertinente às

expedições de Oswaldo Cruz à Amazônia.

2.2 ENTREVISTAS

Com o intuito de obter informações que nos permitissem buscar fontes documentais

realizamos entrevistas pessoais ou por meio de questionário com as seguintes pessoas:

Abílio Maranhão Gonçalves, médico maranhense, formado no Pará pela Faculdade de

Medicina e Cirurgia do Pará (FMCP) em 1935. Radicado em Goiânia, foi entrevistado em

2010, aos cem anos de idade. Forneceu ligeiras impressões sobre seus professores, todos

fundadores da faculdade. Faleceu em outubro de 2011;

Ruy Ferreira dos Santos, médico formado em 1936, posteriormente professor na

FMCP. É o decano dos médicos paraenses, com um século de vida completado em 2011.

Entrevistado em 2010, forneceu depoimento sobre seus professores e os momentos iniciais da

Faculdade de Medicina;

Guaraciaba Quaresma Gama, médico formado em 1939 pela FMCP. Professor

catedrático por esta Faculdade foi também presidente do Instituto Histórico e Geográfico do

Pará. Em algumas conversas informais, ao longo de 2009 e 2010, forneceu informações sobre

seus anos de estudante, quando conviveu com os pioneiros da Instituição. Faleceu em outubro

de 2010;

Renato Chalu Pacheco, médico formado pela FMCP em 1947. Entrevistado em 2011,

discorreu sobre sua vida acadêmica e as condições de funcionamento da Faculdade;

Manoel Ayres, médico formado pela FMCP em 1948. Professor emérito pela UFPA é

professor nos cursos de pós-graduação e pesquisador pela mesma Universidade. Respondeu

Page 46: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

46

questionário em 2010, tendo forneceu dados sobre alguns de seus professores, pioneiros da

fundação da Faculdade;

Marina Lemos de Brito, médica formada pela FMCP em 1950. A mais antiga médica

ainda em atividade no Pará, respondeu a questionário em abril de 2012 ressaltando aspectos

do dia a dia daquela instituição;

Camillo Martins Vianna, médico formado pela FMCP em 1952, professor aposentado

pela UFPA. Foi, também, vice-reitor na referida instituição. Entrevistado em dezembro de

2012 forneceu valorosas informações sobre os bastidores da FMCP e histórias que ouviu

sobre os primórdios da instituição;

Elias Gatasse Kalume, médico formado pela FMCP em 1953. Professor aposentado da

referida instituição ocupou o cargo de pró-reitor na década de 1960. Em entrevista gravada,

em fevereiro de 2013, forneceu dados sobre o período de federalização da faculdade e sobre a

criação da Universidade Federal do Pará;

Almir José de Oliveira Gabriel, médico formado pela FMCP em 1956; ex-governador

do Estado, concedeu entrevista gravada em janeiro de 2012, dissertando sobre a faculdade de

seu tempo de estudante e as lutas estudantis do período;

Francisco Pinheiro, médico e pesquisador do Instituto Evandro Chagas (IEC), formado

pela FMCP em 1958; respondeu a questionário outubro de 2011 esclarecendo alguns pontos

sobre o ensino médico no Pará;

José Maria de Souza, médico e pesquisador do IEC, formado pela FMCP em 1958;

concedeu entrevista gravada em novembro de 2011 onde discorreu sobre o que conhecia dos

primórdios da faculdade e sua participação no movimento estudantil na década de 1950;

Habib Fraiha Neto Neto, médico e pesquisador da historiografia médica paraense,

formado pela mesma Faculdade em 1964. Pesquisador aposentado do Instituto Evandro

Chagas e do Núcleo de Medicina Tropical da UFPA; forneceu vasto depoimento sobre o

papel de Oswaldo Cruz no saneamento do estado, notadamente sobre a campanha sobre a

febre amarela. Entrevistado em janeiro de 2012;

Nazaré Sarges, historiadora, doutora em História, professora e pesquisadora da

Faculdade de História do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da UFPA. Em várias

conversas ao longo de 2012, forneceu diversas referências bibliográficas utilizadas na

elaboração desta tese.

Page 47: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

47

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1 POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE NA PRIMEIRA REPÚBLICA

As políticas de saúde pública e saneamento rural executadas no Brasil da Primeira

República (1889-1930), e mais especificamente nas duas primeiras décadas do século XX,

foram marcadas por ações governamentais centralizadoras, articuladas aos interesses

econômicos e políticos das classes dominantes visando, fundamentalmente, o controle das

doenças que ameaçavam a manutenção da força de trabalho e a expansão das atividades

econômicas capitalistas no país (Costa, 1986; Hochman, 1998). Tais ações se constituiriam

em parcela fundamental na ampliação da presença do Estado na sociedade e no imenso

território brasileiro, fazendo parte de um processo mais amplo de construção do Estado

Nacional (Lessa, 1998).

Este período, caracterizado pelo crescimento de uma consciência das elites quanto aos

graves problemas sanitários do país e de um sentimento geral de que o Estado nacional

deveria assumir mais a responsabilidade pela saúde da população e salubridade do território,

foi denominado por Hochman (1998) como a “era do saneamento”. Segundo o autor, um

momento como este em que a saúde tivesse lugar de destaque no projeto político nacional,

num autêntico “ciclo de estatização da política de saúde no Brasil Republicano”, permitiria

uma ampla reforma sanitária e que jamais se repetiria na história brasileira (Hochman, 1998).

A Proclamação da República, em 1889, tendeu a consolidar novas ideias oriundas da

formação do modo de produção capitalista brasileiro representado por uma política econômica

dirigida primeiramente para a agro exportação e, em segundo plano, para a industrialização, o

que implicava em uma grande necessidade de mão de obra, elemento então problemático

considerando a abolição da escravatura, em 1888. Para solucionar tal impasse, o Estado

buscou esses recursos humanos no imigrante europeu (Martins, 2006; Melo et al., 2010). Em

função das péssimas condições sanitárias, palco de epidemias frequentes, com reflexos na

balança comercial, por conta do receio dos investidores estrangeiros, havia a necessidade de

melhorar o estado sanitário do país tornando-o atrativo, também, para o imigrante (Hochman,

1998).

Tais ações foram representadas por melhorias nos portos – a principal porta de entrada

dos imigrantes estrangeiros –, pela urbanização das cidades e pelos projetos de saneamento.

Essa articulação entre a consciência social das elites e seus interesses materiais, originou as

políticas de proteção social aplicadas na nascente república brasileira, a partir de uma

intervenção mais direta do poder central, com o Executivo ditando normas, práticas e saberes

Page 48: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

48

às unidades da federação e contrariando o princípio federativo constitucional em vigor (Luz,

1982; Hochman, 1998; Martins, 2006).

Em consequência das epidemias e das doenças infectocontagiosas, a saúde passou a

ser vista pelo Estado como uma “questão de polícia”, por ocasionar perda de mão de obra e de

mercado consequente à alta morbimortalidade dos estrangeiros, em virtude da falta de

resistência destes às epidemias frequentes no país e também por permitir a entrada de doenças

juntamente com os emigrantes que aqui chegavam (Santos, 1985; Martins, 2006; Melo et al.,

2010).

Segundo Hochman (1998), o movimento sanitarista das primeiras décadas do século

XX apresenta-se dividido em dois períodos: o primeiro, na década de 1910, está relacionado à

presença de Oswaldo Cruz como dirigente dos serviços federais de saúde, entre 1903 e 1909,

e cujas ações se restringiam ao Distrito Federal (na ocasião, a cidade do Rio de Janeiro) e aos

portos. Neste período, as ações realizadas foram de saneamento urbano e de combate às

epidemias de febre amarela, peste e varíola, prioridade para livrar o país dos prejuízos ao

comércio exterior, causados pelas péssimas condições sanitárias da Capital Federal e seu

porto (Hochman, 1998).

Na segunda fase, entre as décadas de 1910 e 1920, a prioridade foi o combate às

endemias rurais, representadas pela ancilostomíase, malária e doença de Chagas, com a

finalidade de curar e integrar à comunidade nacional os habitantes das grandes áreas do

interior do país, fora dos centros urbanos, no que se designou chamar de “saneamento dos

sertões” ou a “descoberta dos sertões”. O ano de 1916 é emblemático desse período, com a

publicação do relatório da viagem dos médicos Arthur Neiva e Belisário Penna pelo norte da

Bahia, sudoeste de Pernambuco, sul do Pará e cruzando Goiás de norte a sul, denunciando as

péssimas condições de vida no interior do país (Santos, 1985; Hochman, 1998).

Fruto de uma expedição científica organizada pelo Instituto Oswaldo Cruz, durante o

ano de 1912, patrocinado pela Inspetoria de Obras contra as Secas, órgão do Ministério da

Viação, o relatório Neiva-Penna revelou um país com uma população desconhecida, atrasada,

doente, improdutiva e abandonada, e sem nenhuma identificação com a pátria (Hochman,

1998) e que a precariedade em que viviam os sertanejos, entre a fome, a desnutrição, as

doenças e o analfabetismo, não era devido às suas características raciais, mas a um problema

médico-sanitário, pois as doenças apresentadas eram perfeitamente curáveis. Era a doença e

não o clima e a raça o principal entrave ao progresso do Brasil (Sá, 2009; Ferreira, 2012).

Page 49: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

49

Acontece que as precárias condições sanitárias brasileiras não eram restritas aos

“sertões” e estes não se localizavam apenas às regiões Norte e Nordeste. Os “sertões” eram

mais uma categoria social e política do que geográfica; sua existência estava relacionada à

questão abandono & doença, redefinindo o próprio mapa do Brasil, que ao invés de se dividir

em estados e municípios, se constituiria em três regiões: a periferia do Distrito Federal (o Rio

de Janeiro), o litoral e o interior, definidas pela presença das três grandes endemias rurais e

não por critérios geopolíticos (Hochman, 1998).

No que se refere ao Estado do Pará, as políticas sanitárias republicanas foram

devidamente implementadas. Para Rodrigues (2008), os governantes paraenses da Primeira

República “procuraram aparelhar as instituições que cuidavam da higiene pública e da saúde

da população dentro de um sistema de atendimento que prestasse socorro em épocas

epidêmicas”.

Desde a divisão do Estado em distritos sanitários em 1894, no governo de Lauro

Sodré, a Comissão de Saneamento de Belém e seus arredores, criada em 1899 no governo de

Paes de Carvalho, a campanha de Oswaldo Cruz, em 1910, no governo de João Coelho,

chegando à reorganização da Saúde Pública, em 1914, no governo de Eneas Martins, vários

foram os atos e leis sanitárias editados visando melhorar os índices epidemiológicos do

Estado do Pará (Dias Jr, 1922).

Esse momento de transformação, também chamado de “Belle époque da saúde”,

devido a ações governamentais específicas na esfera do saneamento, tanto no âmbito

municipal quanto estadual refletia o novo conceito de modernidade surgido em Paris e Viena

no final do século XIX. Sob a tutela do progresso promoveu-se o embelezamento das áreas

centrais das cidades e a implantação de políticas higienistas visando o combate às doenças

infecciosas. Nesse contexto, Belém e Manaus ocuparam lugar de destaque tornando-se

referenciais no norte do Brasil do novo conceito de progresso aplicado às cidades brasilei ras.

(Sarges, 2000; Rodrigues, 2008; Silva, 2009).

Por razões óbvias, as políticas de saúde tiveram seu maior alcance na capital, Belém,

que entre os anos de 1889 e 1915 vivenciou um processo de modernidade e de grandes

transformações em função de acontecimentos políticos, sociais e econômicos representados

pela emancipação dos escravos, pela Proclamação da República e pela economia do ciclo da

borracha (Weinstein, 1993; Silva, 2010). Havia urgência em adequar a cidade aos novos

tempos.

Embora os serviços de saúde se concentrassem na capital, Lauro Sodré, que governou

o Estado entre 1891 a 1897, incrementou ações visando o saneamento rural com a criação da

Page 50: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

50

Inspetoria de Profilaxia do Paludismo e a abertura de vários postos sanitários tanto na capital

quanto em localidades ao longo da Estrada de Ferro de Bragança, além da criação dos

médicos regionais, que deveriam prestar atendimento nos interiores do Estado (Dias Jr.,1922;

Rodrigues, 2008).

No governo de José Paes de Carvalho (médico de profissão que governou o Estado do

Pará entre 1897 e 1901), foram implementadas ações com o objetivo de melhorar as

condições de salubridade da capital, seguindo os preceitos de Higiene baseado nos

conhecimentos modernos da microbiologia. Deste modo foram executados serviços visando

assegurar a pureza da água para o consumo doméstico, a correta distribuição dos detritos, a

inspeção e limpeza das habitações, a desinfecção de locais contaminados e a drenagem de

pântanos (Dias Jr, 1922).

Em Belém, a expressão modernizadora diria respeito mais às necessidades econômicas

e aos valores estéticos de uma nova classe social em ascensão, representada por seringalistas,

comerciantes e fazendeiros, do que ao atendimento das necessidades da população (Sarges,

2000). Simbolizada pela fase da administração de Antônio Lemos (Figura 7), que vai de 1897

a 1911, é quando surgem o Porto da cidade, o Mercado Municipal do Ver-o-Peso, o Telégrafo

com cabos submarinos, várias fábricas, bancos, companhias seguradoras, além da implantação

da iluminação a gás (Sarges, 2000).

Figura 7 - Antônio Lemos

Fonte: Album do Estado do Pará, 1908

Page 51: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

51

Em relação à saúde e ao saneamento, estes foram considerados um dos pontos

prioritários na administração de Antônio Lemos. Era preciso manter a cidade limpa e atrativa

para os investidores e a massa trabalhadora que para aqui chegava. As epidemias ainda

dizimavam grande parte da população do núcleo urbano e seu entorno, repercutindo na vida

de população em geral, conforme o conceito de interdependência humana (Hochman, 1998).

Portanto, era preciso “engendrar estratégias higienistas de desodorização do espaço público”

(Sarges, 2002). Como exemplo de realizações do poder público podemos citar a criação do

Departamento Sanitário Municipal, a Inspetoria Geral do Serviço Sanitário do Pará, o

Instituto Bacteriológico, o Instituto Vacinogênico, a Estatística Demográfica Sanitária, o

Laboratório de Análises Clínicas e Bromatológicas, o Laboratório Farmacêutico e o Hospital

de Isolamento (Silva, 2009).

Embora sejam patentes os grandes melhoramentos realizados no espaço urbano de

Belém, representados por pavimentação de ruas, construção de praças e jardins, limpeza

urbana, usina de incineração de lixo, etc., as contradições sociais persistiam, considerando que

tais melhoramentos se restringiam à área central cidade, onde a elite local e a classe média

emergente habitavam.

Era preciso afastar da zona central da cidade os ares fétidos causados pela emanação

mal cheirosa do lixo urbano e disciplinar os hábitos do cidadão (Sarges, 2000). Para tal, a

aliança com o governo do Estado era fundamental ao combate às epidemias, resultando na

divisão da cidade em distritos sanitários e com os médicos incumbidos de vacinar e revacinar

a população, além de visitas periódicas aos domicílios a fim de constatar as condições de

saneamento e o controle das epidemias na busca da melhoria desses índices, por meio de uma

“vanguarda sanitária na saúde pública”, sendo esta a primeira vez que o poder público fazia

um mutirão para controlar as epidemias na cidade (Sarges, 2002).

Tais modificações resultaram na elitização do espaço urbano, o desalojamento da

população pobre para as áreas mais distantes do centro e a consequente discriminação espacial

das classes sociais (Sarges, 2000).

O que se observa é que havia uma legislação e um projeto de saneamento no/para o

Estado do Pará na Primeira República com a aplicação das novas ideias científicas baseadas

nas descobertas da bacteriologia. Até porque o fato do governador – Paes de Carvalho – ser

médico pressupõe fosse do conhecimento dele essa nova realidade. É claro que a crise

econômica que se abateu sobre o Estado, a partir da segunda década do século XX, também

teve papel importante na descontinuidade das ações de saneamento.

Page 52: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

52

Além da questão econômica, o que parece ter acontecido foram ações ou inações,

nossas velhas conhecidas historicamente: a falta de planejamento a longo prazo e a falta de

continuidade nas ações, conforme o próprio Dias Jr.(1922) relata ao falar sobre o combate a

uma epidemia de malária ocorrida em Belém, em1909.

Ao detalhar as ações de combate à epidemia e os resultados positivos após cinco

meses de trabalho, o referido médico, que exercia a função de inspetor sanitário, lamenta que

a “brilhante victoria” tivesse tido curta existência, tendo todo o esforço caído em injustificado

descaso. E arremata:

Sinão fora a imprevidência dos nossos dirigentes, certamente todo

esse trabalho, inçado de mil difficuldades e dispendio de grandes

sommas, não resultaria perdido nem se condemnaria ao negro

abandono das cousas imprestaveis. Bastaria, para o aproveitamento

desse grande esforço offensivo, a persistencia defensiva de algumas

turmas de conservação das obras hydrographicas, além de mais alguns

medicos zelosós e que melhor se preoccupassem das zonas de sua

inspecção , porque sempre que se abandonam as medidas que a

prophylaxia oppõe aos elementos epidemiológicos da plasmocitose de

Laveran, irrompem novos surtos epidêmicos que dizimam, desta vez,

as pobres victimas que ainda cambalêam das primeiras infecções

(Dias Jr., 1922).

O texto, publicado em livro lançado em 1922 com um razoável distanciamento do

tempo, retrata uma realidade que persiste até os nossos dias: a falta de planejamento e o uso

de ações imediatistas e sem continuidade.

Se as providências necessárias tivessem sido tomadas, talvez não houvesse a

necessidade de “importar” os serviços de Oswaldo Cruz, no ano seguinte à esta epidemia de

malária. Afinal, as ações de combate a esta doença – na verdade, ao seu vetor de transmissão

– têm utilidade, também, contra à febre amarela, doença que já tinha sido debelada nas

cercanias de Belém, mais especificamente em Val-de-Cans, em 1908, pelo médico paraense

José Theodorico de Macedo, contratado por S. Pearson & Son, Limited, firma inglesa

responsável pela construção do porto de Belém, tendo também prestado serviços a Port of

Pará (Britto & Cardoso, 1973).

Seu trabalho consistiu de atitudes simples: promoveu a drenagem da área, recomendou

a construção de casas avarandadas, com portas e janelas teladas e cuidou para que o

Page 53: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

53

manancial de água utilizado para consumo estivesse dentro dos conceitos de potabilidade.

Tendo o primeiro caso de febre amarela em Val-de-Cans sido registrado em outubro de 1907,

após as medidas profiláticas a doença foi considerada extinta em fevereiro de 1908 (Britto &

Cardoso, 1973).

Evidentemente, não se pode deixar de levar em conta a crise econômica que assolou o

Estado do Pará a partir da segunda década do século XX. Este fato, aliado à falta de

planejamento, contribuiu também para os descaminhos na condução da política sanitária do

Estado.

3.1.1 Oswaldo Cruz no Pará

A história da Amazônia, como paisagem deslumbrante, como natureza usada

precariamente pelo engenho humano, é uma história igual à de muitas regiões que não foram

devidamente enfrentadas, reagindo às tentativas hesitantes dos que pretenderam dominá-las e

fazê-las de acordo com seus desejos, propósitos imediatistas e soluções primárias (Reis,

1972). À essa história, ainda hoje repleta de questionamentos vários, se liga Oswaldo Cruz,

por suas ações à serviço da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré e ao combate e erradicação da

febre amarela no Pará, nos anos de 1910-1911, num exemplo concreto da aplicação, no

Estado do Pará, da política sanitária da Primeira República, cuja repercussão ajudou a reforçar

o seu reconhecimento de Oswaldo Cruz no mundo científico internacional (Amaral, 2006).

Para se entender a presença de Oswaldo Cruz na Amazônia brasileira é preciso

contextualizá-la com o momento histórico por que passava a região, com suas ações sendo

bastante representativas da política de saneamento aplicada pelo governo federal na tentativa

de tornar o Brasil mais atraente aos imigrantes, afastando a péssima fama de insalubridade

pela qual o país era conhecido.

A relação de Oswaldo Cruz com os longínquos rincões do norte brasileiro iniciou-se

em 1905, quando ele, então Diretor Geral da Saúde Pública do Brasil, o equivalente hoje ao

Ministério da Saúde, percorreu toda a costa brasileira em direção ao norte, a partir do Rio de

Janeiro, penetrando pelo rio Amazonas e chegando até Manaus. Seu objetivo era organizar a

defesa sanitária dos 23 portos marítimos e fluviais, do Norte ao Leste do país, contra a

invasão de doenças infecciosas (Guerra, 1940). Foram 68 dias, entre 27 de setembro a 6 de

dezembro daquele ano. No Pará foram visitados: Belém, Santarém e Óbidos. Em sequência,

Parintins e, por fim, Manaus (Batista, 1972).

Oswaldo Cruz voltou ao norte do Brasil por mais três vezes: em 1910, sob a

responsabilidade de empresa construtora da estrada de ferro Madeira-Mamoré; ainda no

Page 54: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

54

mesmo ano, contratado pelo Governo do Pará, para combater a febre amarela; e de 1912 a

1913, através da Superintendência de Defesa da Borracha, para planejamento de ações de

profilaxia para a região (Batista, 1972).

Uma vez que a Companhia Madeira-Mamoré Railway, responsável pela construção da

estrada de ferro que ligaria Porto Velho a Guajará-Mirim, enfrentava problemas durante a

segunda fase da construção da ferrovia (1907-1912), em função da alta mortalidade dos

trabalhadores, provocada pelas epidemias que grassavam na região, especialmente a malária e

a febre amarela, o que atrasava as obras e aumentava seus custos, Oswaldo Cruz foi

contratado para avaliar as condições sanitárias da região e para propor medidas saneadoras

que viabilizassem sua conclusão (Cruz, 1910; Amaral, 2006; Fraiha Neto, 2012).

Tendo que passar obrigatoriamente por Belém, a Port of Pará Company,

administradora do porto de Belém e associada à Madeira-Mamoré, contatou Oswaldo Cruz

(Figura 8) para que, durante sua passagem pela capital paraense, pudesse contribuir com

conselhos aos interessados visando “melhorar as condições sanitárias da cidade de Belém”

(Folha do Norte, 30/6/1910).

Figura 8 - Oswaldo Cruz e Belisario Penna

Fonte: Fraiha Neto, 2012

Ao final do século XIX e início do século XX, as doenças mais frequentes em Belém

eram a varíola, a febre amarela e a peste bubônica (Vianna, 1906), merecendo a atenção dos

governantes, que implementavam medidas visando conter o avanço das doenças infecciosas,

como o isolamento dos doentes, conforme os preconizado pela ciência então, o que resultou

na construção de um hospital de isolamento, iniciado no Governo Lauro Sodré (1891-1897),

Page 55: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

55

em 1895, e inaugurado em 1899, já no mandato do Governador José Paes de Carvalho (1897-

1901) e que recebeu a denominação de Hospital Domingos Freire.

Empossado em 1909 como Governador, o Dr. João Antônio Luiz Coelho, engenheiro

civil formado na França (Borges, 1986), em sua primeira Mensagem ao Congresso

Legislativo do Pará, discorreu sobre as condições sanitárias da capital, com destaque para a

malária, endêmica na cidade, para o que contribuía a vinda de doentes oriundos de outras

localidades, dentre elas a Madeira-Mamoré.

Em relação à febre amarela, a doença estava restrita a Belém, com seu vetor de

transmissão da modalidade urbana (o mosquito Aedes aegypti) não sendo encontrado em

outras cidades de interesse comercial na ocasião, como os portos fluviais de Santarém,

Óbidos, Faro e Monte Alegre, por exemplo. Velho problema para a cidade, dizimando

principalmente estrangeiros sem imunidade para a doença, fez com que o governador João

Coelho, na mesma Mensagem de 1909, manifestasse sua preocupação com o combate à febre

amarela, que – dizia - precisava ser definitivamente extinta, e assim modificando as condições

de salubridade da região, o que era um entrave para o progresso (Pará, 1909).

Por ocasião da vinda de Oswaldo Cruz a Amazônia em 1910 e sua consequente

passagem por Belém, o Governador João Coelho apresentou-lhe seu plano de combate à febre

amarela para as necessárias modificações, tendo manifestado também o desejo do Governo do

Estado de contratar seus serviços a fim de combater a febre amarela, conforme relatou em sua

Mensagem ao Congresso Legislativo do Pará (Pará, 1910).

Nesta estada em Belém, Oswaldo Cruz permaneceu na cidade de 26 a 29 de junho de

1910, quando partiu para Manaus com destino a Porto Velho. Em sua volta à Belém, em 16 de

agosto, foram acertadas as providências para o combate ao mosquito transmissor da febre

amarela, após o que retornou para o Rio de Janeiro (Fraiha Neto, 2012).

Em mensagem do ano seguinte ao Congresso Legislativo, o governador João Coelho,

discorreu sobre suas preocupações acerca do combate à febre amarela, da presença de

Oswaldo Cruz em Belém e de sua intenção de submeter o plano governamental à avaliação do

“eminente bacteriologista”. Segundo a Mensagem, o governador expos seu programa e

invocou o patriotismo de Cruz, “para a rectificação de tópicos porventura em desaccordo com

as suas idéas e pratica na matéria”. Oswaldo Cruz concordou com a proposta governamental

comprometendo-se a tudo fazer para erradicação da febre amarela, o que considerava a

“solução de um problema nacional” (Pará, 1910).

Segundo a fala do governador, para Oswaldo Cruz seria necessário o prazo de um ano

para a erradicação da febre amarela, sendo os primeiros seis meses para debelar a forma

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epidêmica e os outros seis para combater os casos esporádicos. Tendo decidido dirigir

pessoalmente a campanha, Cruz definiu como indispensável para alcançar os objetivos: um

orçamento em torno de 3.000 contos de réis; a criação de uma Comissão de Profilaxia da

Febre amarela, composta por médicos e inspetores sanitários e auxiliares, autônoma e ligada

diretamente ao governador, em um total de oitenta e sete pessoas (Pará, 1910).

A comitiva comandada por Oswaldo Cruz chegou a Belém em 6 de novembro de

1910. Seus membros, elementos da mais alta confiança e respeito por parte do chefe, alguns

dos quais haviam trabalhado com ele desde os tempos da Diretoria Geral de Saúde Publica,

em 1903, e também em Manguinhos (Figura 9). Sua experiência fora adquirida nas várias

campanhas de profilaxia da varíola, peste bubônica, malária e febre amarela, “entre sabores e

dissabores”, como a Revolta da Vacina (Amaral, 2006).

Figura 9 - Membros da equipe de Oswaldo Cruz

Fonte: Fraiha Neto, 2012

Evidentemente que foi necessária a contratação de mais médicos e trabalhadores para

a execução do programa e ministrar-lhes treinamento, o que foi feito para os 200 homens

contratados para as tarefas, das quais se desincumbiriam convenientemente fardados com

“roupas brancas: calças, camisas de meia e de mangas brancas abotoadas e chapéus, para

facilitar a identificação da equipe” (Amaral, 2006), ficando a confecção do fardamento a

cargo do Instituto Lauro Sodré (Fraiha Neto, 2012).

Diversos procedimentos foram necessários tais como construir galpões nos fundos do

Palácio do Governo para abrigar os funcionários subalternos, adaptar as instalações do

Serviço Sanitário, que funcionava no térreo do Palácio, adquirir material na Europa, alugar

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57

prédios para hospedar os médicos e demais funcionários graduados, instalar telefones nos

variados setores em que funcionaria a Comissão e na própria residência dos chefes, melhorar

as vias de acesso e adaptar os hospitais para receber os pacientes que precisassem de

internação e isolamento, além de adaptar veículos para transporte desses pacientes aos

hospitais (Fraiha Neto, 2012).

Para o início das atividades foram contratados de imediato 150 trabalhadores e mais os

médicos Jayme Aben-Athar, Antonio Peryassu, Afonso Mac-Dowell, Miguel Meira de

Vasconcelos, Ageleu Domingues, Antonio de Figueiredo e Ophir de Loyola (Fraiha Neto,

2012). Após o treinamento, o grupo foi dividido em turmas para iniciar o ataque em todos os

bairros (Amaral, 2006). Foram utilizadas duas mil caixas de querosene, seis toneladas de

creolina, 33 toneladas de enxofre, duas toneladas de piretro, três aparelhos para borrifação dos

produtos, 18 carroças, um caminhão-automóvel e dois automóveis. A este “arsenal” (Figura

10) seriam incorporados quatro outros veículos já adquiridos (Britto & Cardoso, 1973).

Figura 10 - Equipamento utilizado para os expurgos nas residências em Belém

Fonte: Fraiha Neto, 2012

Os trabalhos em Belém iniciaram-se a 12 de novembro de 1910 estendendo-se até 16

de outubro de 1911, quando em correspondência ao governador, Oswaldo Cruz informou

oficialmente que a febre amarela estava erradicada em Belém (Fraiha Neto, 2012). Ressalte-se

que, com a adoção das medidas de combate à febre amarela, em 12 de junho de 1911 Oswaldo

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58

Cruz comunicou ao governador já não haver mais epidemia na cidade; o último caso

notificado ocorrera em maio daquele ano, de um doente oriundo de Manaus (Batista, 1972).

Diferente do que acontecera no Rio de Janeiro, na Revolta da Vacina (1904) e talvez

também por isso, antes do início dos trabalhos de campo uma espécie de campanha

publicitária foi desencadeada através da imprensa a fim de familiarizar a população com as

medidas a serem aplicadas pelos médicos, inspetores, chefes de turma e auxiliares em geral,

no sentido de se evitarem manifestações contrárias durante as ações nas residências a serem

submetidas ao expurgo. Assinado pelo próprio Oswaldo Cruz, os jornais publicaram o artigo

“médico-sanitário e pedagógico” intitulado: “A febre amarela. A Comissão sanitária de

prophylaxia da febre amarella á população de Belém” (Amaral, 2006).

A mensagem discorria sobre a doença e seu modo de transmissão; detalhava todo o

plano de trabalho visando combater o transmissor dizendo da necessidade de apoio da

população para o sucesso da empreitada, tanto facilitando o trabalho de campo das equipes,

quanto fazendo a sua parte, no que se refere à eliminação das áreas que permitissem a

proliferação do mosquito, tais como poças d’água, tinas e barris, e que pudessem servir para

armazenamento da água da chuva. Tudo numa linguagem simples, de fácil compreensão pela

população (Fraiha Neto, 2012).

Além de dirigir-se à população, Oswaldo Cruz buscou também o envolvimento dos

médicos de Belém convocando-os a fazer parte da cruzada antiamarílica. Em carta circular, o

chefe da Comissão solicitou o indispensável apoio dos clínicos, através da notificação dos

casos, que poderiam ser encaminhados à Comissão, a qualquer hora e com a máxima presteza.

Esta atitude tinha a finalidade de aproximar os médicos dos trabalhos da Comissão, tornando-

os coparticipes de um processo liderado por ninguém menos que o grande cientista Oswaldo

Cruz. O auxílio era a prova da colaboração e estima da população, já que a Comissão não

poderia ficar desamparada. Oswaldo Cruz cercava-se de cuidados evitando reações contrárias

à Campanha, nos moldes das que aconteceram no Rio de Janeiro, na Revolta da Vacina.

(Amaral, 2006).

As primeiras áreas urbanas expurgadas foram a rua Tomásia Perdigão e adjacências

seguidas por diversas casas da travessa 1º de Março, rua Paes de Carvalho, av.Almirante

Tamandaré, entre outras. Duas equipes, comandadas pelos médicos João Pedro de

Albuquerque e Belisario Penna, e Leocadio Chaves, respectivamente, iniciaram os trabalhos

partindo do palácio governamental, sob as vistas do governador João Coelho e do próprio

chefe da Comissão (Britto & Cardoso, 1973). Diferente do Rio de Janeiro, a recepção dos

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59

moradores impressionou os chefes de equipe, os quais haviam vivenciado a trágica

experiência carioca.

A dinâmica consistia na retirada dos moradores das residências; envolver em papel os

objetos susceptíveis de sofrerem a ação deletéria do enxofre e colocá-los em sacos de lona;

revestir com fina camada de vaselina os objetos metálicos e delicados; abrir e limpar os

móveis, depois fechá-los calafetando suas frestas com papel; deixar livre as comunicações

com o forro; cobrir o telhado com lona fixando seus bordos às paredes exteriores da casa por

meio de sarrafos de madeira (Figura 11). Além disso, todos os possíveis criadouros de

mosquitos existentes nas casas expurgadas, como calhas, latas vazias, vasos, etc., eram

destruídos. As casas eram reabertas 3 a 4 horas depois (Amaral, 2006).

Figura 11 - Turma de expurgo em ação em Belém

Fonte: Fraiha Neto, 2012

Os moradores das residências alvo das ações de expurgo ficavam sob vigilância

médica; os doentes ali encontrados eram removidos para os hospitais. Além do Hospital

Domingos Freire, os hospitais D. Luiz I (Beneficente Portuguesa), da Ordem Terceira de São

Francisco e da Santa Casa de Misericórdia, previamente visitados por Oswaldo Cruz, estavam

preparados para receber os doentes, após as adaptações sugeridas pelo chefe da Comissão

(Costa, 1973).

Quando as pessoas infectadas optavam por permanecer em casa era criado um

isolamento domiciliar: o médico da comissão escolhia uma dependência da casa bastante

ampla, com janelas e portas projetadas para outros aposentos amplos. Se havia várias portas,

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60

apenas uma ficava funcionando. O local escolhido era todo fechado, após o que passava por

um expurgo de 3 a 4 horas. Ao término desse procedimento, o quarto era aberto, ventilado e o

paciente para ali removido, após ter ficado isolado em outra dependência da casa, sob um

cortinado de filó (mosquiteiro), impedindo que fosse picado pelo mosquito e servisse de fonte

de infecção. O tempo de permanência no isolamento domiciliar era de sete dias correndo as

despesas por conta da família (Costa, 1973). A remoção era inevitável nos casos de moradias

consideradas insalubres (Amaral, 2006)

O trabalho era árduo para ser realizado no tempo preestabelecido. O investimento

aplicado e a grande responsabilidade da Comissão punham em jogo o nome e a credibilidade

de figuras tão ilustres, a começar do próprio Oswaldo Cruz. E ninguém queria que se

repetissem os dissabores de 1904, da Campanha no Rio de Janeiro. Tudo isto implicava o

comprometimento de todos. Mas para Amaral (2006), a única semelhança entre ambas era os

“preparativos para mais um dia de trabalho”.

Oswaldo Cruz estava atento a tudo, desde a contratação dos trabalhadores, seu

treinamento, a confecção dos uniformes e a fiscalização do barracão de alojamento. O dia

começava com uma reunião durante o café da manhã com os chefes de equipe para a

definição das tarefas do dia. Depois, Oswaldo Cruz passava o resto da manhã e a tarde

percorrendo de automóvel as ruas de Belém acompanhando as ações. Embora se possa

determinar as atribuições principais dos inspetores sanitários, conforme levantamento

realizado por Fraiha Neto (2012) ao analisar as notas da Comissão divulgadas pela imprensa,

este autor ressalta o envolvimento de todos os membros nos diversos trabalhos:

Não havia, porém, rigidez absoluta na observância de tais

atribuições. Várias vezes vamos encontrar Caetano Cerqueira,

Belisario Penna e João Pedro de Albuquerque chefiando o expurgo de

prédios. Desdobravam-se em esforços, dando tudo de suas

potencialidades para levar a bom termo, no prazo previsto a laboriosa

missão (Fraiha Neto, 2012).

A agitação tomou conta da cidade. Naquele mês, os índices oficiais de mortalidade

pela febre amarela atingiram a marca de 49 casos. Em 19 dias de trabalho haviam sido

visitados 5.085 prédios e extintos 9.973 focos de larvas. A estes números somavam-se 305

casas expurgadas, 7.925 metros de galerias de esgoto, 376 bocas de lobo petrolizadas, 150

embarcações visitadas, onde foram extintos 182 focos de larvas; 13 botes e 18 cavidades

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61

diversas esgotados e cinco navios submetidos a expurgos. E mais: 206 inspeções de calhas, 34

retificações com a retirada de 112 baldes de lixo do seu interior. Foram abertas 1.406 metros

de valas, limpados outros 2.020 metros e retificados outros 200 metros. Aterrados 225

terrenos e 54 poços e oito sarjetas desobstruídas. Foram calafetadas 719 caixas de descarga e

248 caixas d’água, outras 86 lavadas, além da remoção e enterramento de 586 carroçadas de

latas velhas (Fraiha Neto, 2012). Em relação aos doentes, foram notificados 172 casos, destes,

96 positivos, 56 negativos e 20 sem confirmação diagnóstica; 68 pacientes foram removidos

para hospitais e outros 24 foram isolados no próprio domicílio (Fraiha Neto, 2012).

Com vistas a organizar o material para ser apresentado na Exposição Internacional de

Higiene, a realizar-se na Alemanha no ano seguinte, e como a campanha seguia conforme o

planejamento preestabelecido, Oswaldo Cruz deixou o Pará em 5 de dezembro com destino ao

Rio Janeiro, de onde seguiu para a Europa. A viagem estava acordada com o Governador João

Coelho, pois Oswaldo Cruz estava incumbido de selecionar, organizar e preparar com Carlos

Chagas o material a ser exposto em Dresden, além de selecionar auxiliares e providenciar a

construção do pavilhão brasileiro (Amaral 2006; Fraiha Neto, 2012).

A direção dos trabalhos foi passada para João Pedroso de Albuquerque, que teria como

grande tarefa estabelecer as medidas sanitárias do porto de Belém, um “projeto idealizado por

Oswaldo Cruz em 1905 e que traçou o plano de defesa dos portos brasileiros” (Amaral, 2006).

Na Europa, preocupado com a continuidade da Campanha no Pará, devido à já instalada crise

econômica no Estado, em razão da queda do preço da borracha, Oswaldo Cruz, que era

mantido informado dos acontecimentos por seu substituto João Pedroso, retornou ao Pará em

8 de junho de 1911 (Britto & Cardoso, 1973).

Em Belém, Oswaldo Cruz recebeu do governador João Coelho a garantia da

sustentação financeira da Campanha, constatou o cumprimento da programação dentro do

cronograma estabelecido e acompanhou os dados favoráveis apresentados, como a não

ocorrência de óbitos por febre amarela a partir do mês de maio daquele ano. Em março, os

médicos haviam praticamente controlado a epidemia, mas o chefe da Comissão, o Dr. João

Pedroso de Albuquerque estava comedido e receoso com o ‘terror da morte’.” (Amaral, 2006)

Em carta ao governador do Pará, de 12 de junho, Oswaldo Cruz informou que “já não

grassa a febre amarela, sob forma epidêmica, na capital do Estado do Pará”, ressaltando que

“não está, porém, erradicada a moléstia da cidade” Para tanto era necessária a adoção de

outras medidas profiláticas, que de pronto foram acatadas pelo governador João Coelho: no

mesmo decreto que extinguiu a Comissão de Profilaxia da febre amarela constituiu a

Comissão de Profilaxia Defensiva para a mesma doença, constituída por um inspetor geral,

Page 62: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

62

cinco inspetores sanitários e um administrador (Fraiha Neto, 2012). Sua função era a de atuar

no expurgo e no monitoramento de focos, vigilância sanitária e médica no porto e isolamento

de doentes das embarcações (Amaral, 2006).

Para acompanhar a fase final da Exposição na Alemanha, Oswaldo Cruz partiu com

destino a Europa em 17 de junho, de lá retornando para o Rio de Janeiro. A Belém estaria de

volta, mais uma vez, em outubro, chegando no dia 10 para concluir sua grandiosa obra de

saneamento. Constatados os dados, em 16 de outubro informou oficialmente ao governador

que “está erradicada a febre amarela de Belém” (Fraiha Neto, 2012).

Na carta ao governador, Oswaldo Cruz fez um relatório das atividades no qual

informou que havia 178 dias que não adoecia ninguém de febre amarela e que os quatro casos

registrados eram provenientes de outros Estados. Falou da cuidadosa vigilância de toda a área

urbana, do estudo sistemático de todos os pacientes internados e da eficiência do corpo

clínico. Informou que as despesas ficaram aquém do orçamento e alertou para a necessidade

da manutenção de um serviço de profilaxia a fim de impedir a reincidência da doença.

Oswaldo Cruz deixou Belém em definitivo no dia 17 de outubro (Britto & Cardoso, 1973).

Debelado o foco de Belém, a nova Comissão voltou suas atenções para os casos

importados, aqueles oriundos de pacientes infectantes desembarcados na capital. Para o

isolamento destes foi reservado um pavilhão anexo ao Hospital Domingos Freire,

originalmente destinado à moradia das irmãs de caridade que ali atuavam, e que recebeu o

nome de Pavilhão Oswaldo Cruz em homenagem ao grande sanitarista (Costa, 1973).

Os últimos trabalhos da Comissão foram realizados em Santarém e Óbidos, sob a

responsabilidade de Angelo Moreira Costa Lima, um dos auxiliares de Oswaldo Cruz e que

mais tarde se tornaria destacado entomologista. Em julho de 1913, a febre amarela foi

considerada extinta em todo o território paraense e os remanescentes da Comissão inicial

retornaram a Manguinhos (Fraiha Neto, 2012).

A campanha de Oswaldo Cruz no Pará representou a consolidação da profissão médica

como condutora de uma política de saúde voltada para o bem estar comum da população.

Uma vitória da ciência e da saúde sobre a epidemia; o passaporte para o progresso, o

desenvolvimento econômico e a civilização (Amaral, 2006). Os resultados da campanha

foram além do combate à febre amarela, contribuindo, também, para a diminuição dos casos

de malária cujo mosquito transmissor foi atingido com a destruição dos criadouros nos

recipientes contendo água.

Page 63: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

63

O tratamento dispensado pelo governo ao projeto, a aceitação e adesão da população,

o apoio da imprensa ajudando na divulgação das informações, os resultados alcançados

transformaram os componentes da Campanha no Pará em “semideuses” (Amaral, 2006) .

Embora tenha sido de grande importância, para o próprio Instituto Oswaldo Cruz

como captador de recursos, ao mostrar a viabilidade de prestação de serviços a empresas

privadas e a governos estaduais, podendo servir para o desenvolvimento de pesquisas e

formação de novos cientistas, num momento em que as verbas e o prestígio diminuíram para

aquele órgão, após a saída do seu comandante da direção, até agora a atuação de Oswaldo

Cruz e sua Comissão, no Pará, não mereceu o devido reconhecimento no âmbito da

historiografia nacional, segundo Amaral (2006).

Para esse autor, que afirma que em suas pesquisas na biblioteca da Casa de Oswaldo

Cruz, seu excelente acervo “não cataloga a febre amarela em Belém”, um empreendimento

como este mereceria bem mais que “pequena nota de rodapé ou um ou dois parágrafos”.

Como ele conclui, “faz-se um denso silêncio sobre as atividades desenvolvidas em Belém por

médicos do Instituto Soroterápico Federal de Manguinhos, no início do século XX” (Amaral,

2006).

É fato que o trabalho da equipe de Oswaldo Cruz no Pará, no auge da sua atividade

chegou a movimentar mais de 500 trabalhadores, incluindo médicos e pesquisadores do

Instituto, mexendo com o cotidiano da cidade de Belém pelo menos por um ano, resultando

na mudança drástica do seu perfil epidemiológico. Os resultados foram divulgados

internacionalmente, através de gráficos, tabelas e fotos, sendo destaque no Congresso

Internacional de Microbiologia, dentro da Exposição Internacional de Higiene e Demografia,

realizado em Dresden, Alemanha, entre maio e outubro de 1911. Tudo isso contribuiu para o

reconhecimento científico internacional do grupo de Manguinhos tendo por base as pesquisas

produzidas pela Casa de Oswaldo Cruz (Amaral, 2006).

Numa avaliação menos ufanista, o trabalho de Oswaldo Cruz no Pará foi o de por em

prática as ações de profilaxia das doenças infecciosas a partir dos novos conhecimentos

baseados nas descobertas do mecanismo de transmissão da febre amarela, conforme a teoria

levantada por Carlos Finlay e comprovada pelos resultados obtidos em Cuba, em 1901, pela

comissão militar norte-americana comandada por Walter Reed. Tais ações, compostas de

eliminação de águas paradas e uso de mosquiteiros para impedir as picadas dos mosquitos,

foram também utilizadas com êxito por William Gorgas na área de construção do canal do

Panamá (Magalhães, 2010).

Page 64: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

64

Os trabalhos de Reed, que representaram o divisor de águas na Epidemiologia, foram

logo incorporados no Brasil como método de combate à febre amarela. Evidentemente, essas

descobertas eram do conhecimento de Oswaldo Cruz como também de outros tantos

estudiosos, como o paraense José Theodorico de Macedo, que em 1908 saneou a área de Val-

de-Cans, onde se instalaram os ingleses da companhia responsável pela construção do porto

de Belém. Este médico, formado no Rio de Janeiro em 1905, tomou conhecimento dos novos

conceitos sobre a transmissão da febre amarela e os aplicou em Belém, conforme expressa em

relatório aos seus contratantes (Britto & Cardoso, 1973).

Vale lembrar ainda que os ingleses Duham e Myers, membros da expedição da

Liverpool School of Tropical Medicine, a caminho de Belém para estudar a febre amarela em

1900, estiveram em Cuba e logicamente conheceram o trabalho da equipe de Walter Reed,

compartilhando suas teorias (Miranda & Abreu Jr., 2011).

Para desenvolver seu trabalho no Pará, Oswaldo Cruz contou com todo apoio do

Estado, tanto político quanto financeiro. Embora sua execução tenha se dado num período em

que as finanças do Estado já acusavam os efeitos da crise econômica ocasionada pela queda

dos preços da borracha, não houve cortes orçamentários. Além disso, com a experiência

adquirida com a reação contrária da população no Rio de Janeiro, em Belém, a campanha

ocorreu sem sobressaltos e com o apoio total da população local.

Vontade política, recursos financeiros, competência profissional, dedicação, trabalho

de equipe. A empreitada de Oswaldo Cruz no Pará tinha tudo para dar certo. E deu.

3.2 AS REFORMAS DO ENSINO MÉDICO NO BRASIL

Não é possível falar sobre a criação de faculdades de medicina no Brasil, no início do

século XX, sem comentar as diversas reformas por que passou a Educação brasileira e,

especificamente, o ensino médico. Do mesmo modo, não seria demais afirmar que a

Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará foi, também, fruto dessas reformas.

Quem vivesse no Brasil, até o século XIX, e desejasse estudar medicina, teria,

obrigatoriamente, que se deslocar para fora do país, o que por si só já se configurava um

privilégio para poucos - nobres ou abastados -, pois não havia cursos de medicina na então

colônia portuguesa da América do Sul.

O ensino médico iniciou-se no Brasil em 1808 com a chegada da família real e parte

da corte portuguesa a Salvador-Bahia, de onde partiu, meses depois, para o Rio de Janeiro.

Este acontecimento tornou o Brasil o centro administrativo do reino português, resultando na

Page 65: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

65

adoção de importantes medidas administrativas, econômicas e culturais, as quais

influenciaram, também, no desenvolvimento da medicina praticada ou aprendida no Brasil

(Maia, 2010).

Dentre as medidas iniciais tomadas por D. João VI, em terras brasileiras, estavam a

abertura dos portos brasileiros e a criação do Banco do Brasil. Não menos importante, no

plano político-administrativo instalou-se o Conselho de Estado, os Ministérios, os Tribunais, a

Escola de Marinha, as Intendências de Polícia e o Arsenal. No plano cultural e social surgiram

em 1808 a Imprensa Régia e a Escola de Anatomia e Cirurgia, em Salvador-Bahia (Figura

12), em 18 de fevereiro de 1808, e a Escola de Anatomia, Medicina e Cirurgia, no Rio de

Janeiro, em 5 de novembro do mesmo ano (Lobo,1964; Amaral, 2007).

Figura 12 - Faculdade de Medicina da Bahia depois de 1905. Fotografia s.d.

(Fonte: www.medicina/ufba/br)

Essas duas primeiras Escolas médicas, na verdade, ofereciam uma instrução bastante

rudimentar. Na escola da Bahia, o curso reduzia-se apenas às lições de Anatomia, Fisiologia e

Clínica Cirúrgica. Na do Rio de Janeiro havia aulas de Anatomia, Fisiologia, Terapêutica

Cirúrgica e Particular, Medicina Operatória e Arte Obstétrica, Medicina (equivalente, hoje à

Clínica Médica), Química, Matéria Médica e Farmácia (Nascimento, 1929). As aulas eram

ministradas nas dependências dos Hospitais Militares de ambas as cidades, a cargo de dois ou

três professores, que também ficavam encarregados de assistência a uma enfermaria dos

referidos hospitais (Torres, 1946; Lobo, 1964; Maia, 2009).

Os chamados Cursos médico-cirúrgicos passaram a ter a duração de quatro anos sendo

constituídos pelas seguintes disciplinas: Anatomia e Fisiologia, Terapêutica Cirúrgica e

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66

Particular, Medicina Cirúrgica e Obstétrica e Medicina, Química, Elementos de Matéria

Médica e Farmácia (Lobo, 1964). Concluído o curso, era necessário que o candidato

requeresse perante a Real Junta do Protomedicato a constituição de uma banca examinadora

para arguí-lo. Após o julgamento das aptidões do pretendente era expedido o título de médico

ou de cirurgião aos aprovados (Lobo, 1964). Com tais medidas pretendia-se modificar um

pouco a condição dos “simples enfermeiros rústicos, praticantes da cirurgia primitiva ou os

curadores analfabetos com carta do proto-medicato” (Magalhães, 1932).

Se contarmos desde a instalação dos cursos de medicina em nosso país, em 1808, até o

século XX, várias foram as reformas aplicadas à Educação como um todo e, particularmente,

ao ensino médico. Vale ressaltar que além da existência de uma legislação geral para a

Educação, as faculdades de medicina eram objeto de legislação específica – os estatutos e

regulamentos -, em que se definia todo o seu o funcionamento, desde a forma de acesso ao

curso, o currículo, as atribuições de diretores e professores até a fórmula de juramento

utilizada pelos formandos no ato da colação de grau.

Desconsiderando-se alguns decretos anteriores, de cunho administrativo restrito, a

primeira reforma por que passou o ensino médico brasileiro aconteceu em 1º de abril de 1813,

com o decreto criando a Academia Médico-Cirúrgica do Rio de Janeiro, considerada por Maia

(2009), “a primeira tentativa de dar forma a um curso de medicina”, pois o que existia até

então eram “aulas de Anatomia e Cirurgia, sem normas que caracterizassem um curso”.

Segundo Maia (2010), o curso “era irregular e ineficiente, carecendo de condições físicas

adequadas e de recursos didáticos e profissionais”. Na Bahia, reforma semelhante aconteceu a

partir de 29 de dezembro de 1815, por meio de carta régia expedida pelo Conde dos Arcos,

então Governador daquela capitania, quando a escola baiana passou a adotar o mesmo sistema

já vigente no Rio de Janeiro (Torres, 1946).

De acordo com essa reforma, o curso médico passou a ter a duração de cinco anos,

com o número de disciplinas aumentado para cinco (Ribeiro, 1997). O candidato deveria

saber ler e escrever corretamente e ter conhecimento de língua francesa e inglesa (Torres,

1946; Maia, 2009).

Os concluintes do Curso de Cirurgia recebiam o título de “Cirurgiões Aprovados”,

podendo praticar apenas a cirurgia. Os que cursassem durante mais um ano as matérias do

quarto e quinto anos do curso, e fossem aprovados com Distinção, obtinham o título de

“Cirurgião Formado”, podendo integrar o próprio Colégio de Cirurgia (assim também

denominada a Academia Médico-Cirúrgica) e ali ministrar aulas (Ribeiro, 1997).

Page 67: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

67

Com o ensino médico sendo considerado insuficiente, nova reforma aconteceu em

1832, quando ambas as Academias Médico-Cirúrgicas receberam a denominação de Escolas

ou Faculdades de Medicina. A nova lei concedeu grande autonomia às congregações, que se

tornaram responsáveis pela elaboração do regulamento das Escolas, documento que

normatizava o funcionamento total da instituição de ensino (Nascimento, 1932; Torres, 1946;

Maia, 2009). Enquanto não elaborassem seus próprios regimentos, as novas faculdades seriam

reguladas seguindo o modelo dos estatutos e regimentos da Faculdade de Medicina de Paris

(Maia, 2010).

Esta reforma elevou o número de disciplinas para catorze, divididas em três secções:

médica, cirúrgica e ciências acessórias, estabeleceu o ensino prático e a duração do curso

passou para seis anos. A reforma criou, também, o curso de Farmácia, com a duração de três

anos, e o de Partos, com a duração de dois anos, sendo este específico para mulheres (Torres,

1946; Lobo, 1964). Os alunos aprovados obtinham os títulos de Doutor em Medicina, de

Farmacêutico e de Parteira, respectivamente, expedidos pelas faculdades (Maia, 2010).

Com a finalidade de melhorar o ensino, desde a época do Império e prosseguindo no

período republicano, seguiram-se reformas gerais no sistema educacional, reformas no ensino

médico e, no âmbito das Faculdades de medicina, reformas nos seus estatutos. Somente na

Primeira República (1899-1930) aconteceram cinco grandes reformas, sem contar com

decretos complementares (Silva, 2008; Vieira, 2009).

Discorrer sobre todas as reformas seria fugir à nossa proposta inicial. Considerando

nosso objeto de estudo, dentre as reformas - algumas meros ajustes burocráticos no

funcionamento das Faculdades; outras promovendo mudanças radicais nestas -,

comentaremos com detalhes as que mais de perto se enquadram ao nosso projeto, quais sejam

a de 1891, intitulada Reforma Benjamim Constant, a de 1911, conhecida como Reforma

Rivadavia, e a de 1915, também chamada de Reforma Maximiano.

Tais instrumentos legais, quando analisados num contexto mais amplo, fornecem

importantes elementos que não podem deixar de ser considerados na análise das

circunstâncias que levaram à criação do primeiro curso de medicina no Pará.

3.2.1 Reforma Benjamim Constant

É considerada a primeira reforma do ensino após a Proclamação da República,

compreendeu, também, uma série de documentos anteriores à primeira constituição

republicana (Vieira, 2009). Permitia a existência de estabelecimentos particulares,

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68

denominados “Faculdades Livres”, com os mesmos privilégios e garantias dos

estabelecimentos oficiais (Frauches, 2004). Tinha como princípios orientadores a liberdade e

laicidade do ensino e a gratuidade da escola primária (Palma Filho, 2005).

No que se refere aos cursos de medicina, a Reforma é representada pelo Decreto nº

1.270, de 10 de janeiro de 1891, que na verdade consistiu na atualização dos estatutos que

regiam o funcionamento das Faculdades de Medicina, as quais passaram a ser denominadas

Faculdades de Medicina e Farmácia (Brasil, 1891). Por esse Decreto, houve a ampliação no

número das disciplinas para vinte e nove, distribuídas por doze sessões, seis séries e

classificadas em: Ciências Físicas e Naturais, Ciências que entendem com a estática e a

dinâmica do homem, Ciências que entendem com a estática e a dinâmica do homem doente e

Ciências que entendem com a estática e a dinâmica do homem são e do homem doente

(Borges, 2008).

A legislação criou, também, os cursos de odontologia e de parteira, como anexos às

Faculdades, e permitiu ainda que “cursos particulares, gratuitos ou remunerados” fossem

ministrados nas dependências das Faculdades, excetuando-se as clínicas e os laboratórios, por

“professores livres”, após anuência da congregação. Os cursos livres não davam título nem

regalias (Brasil, 1891; Frauches, 2004).

Essa primeira reforma republicana renovou a liberdade de ensino, a autonomia

didática e a garantia dos direitos dos professores na carreira universitária (Magalhães, 1932).

Como as demais reformas, as modificações na legislação do ensino assumiam o nome do

titular da pasta responsável pela educação. Por ocasião da reforma de 1891, a questão do

ensino estava subordinada ao Ministério da Instrução Pública, Correios e Telégrafos, sendo

Benjamim Constant o ministro.

3.2.2 Reforma Rivadávia Correa

A Reforma Rivadávia Corrêa foi instituída pelo Decreto nº 8.659, de 05 de abril de

1911), que em sua exposição de motivos afirmava [que]

Liberta a consciência acadêmica da opressão dos mestres, arredada

destes a tutela governamental, em cujo passivo se inscrevem todas as

culpas da situação periclitante a que chegaram as instituições do

ensino, acredito dar um passo para frente com a atual organização. O

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69

que produzir o futuro cairá sob a responsabilidade das congregações

(Brasil, 1911).

O Decreto pretendeu modificar radicalmente a estrutura do ensino superior em todo o

Brasil. Inspirada em princípios positivistas, a Reforma Rivadávia Corrêa fortaleceu a

liberdade de ensino suprimindo exigências relativas à frequência, diplomas e privilégios

relativos às escolas oficiais. Por meio dela, o presidente Hermes da Fonseca e seu ministro da

Justiça e Negócios Interiores, ao qual, na ocasião, era subordinada a Educação, o jurista

Rivadávia Cunha Corrêa, ambos seguidores da doutrina positivista, buscaram o fim do status

oficial do ensino (Cury, 2009).

Baseando-se em uma interpretação discutível de um artigo da Constituição de 1891, o

governo determinou que as escolas de ensino secundário e de ensino superior perderiam os

seus status de oficial e passariam a ser entidades corporativas autônomas. Com isso, o Estado

perdia a titularidade do monopólio da validade oficial dos diplomas e certificados, passando a

ser prerrogativa das instituições de ensino (Cury, 2009). A abolição dos privilégios, a

concessão de autonomia e a liberdade aos estabelecimentos de educação superior e secundário

dos estados e o caráter prático dado ao ensino e a criação do Conselho Superior de Ensino

representaram alguns dos destaques da nova medida de reforma, marcada pela

desoficialização e descentralização do ensino (Amaral, 2007; Vieira, 2009).

De acordo com Magalhães (1932), “não se compreende o motivo que levou o

legislador a juntar na sua obra tanta heterogeneidade”. (...) “Retalhava-se a legislação

admitindo regras antagônicas”. A Reforma retirava da União o monopólio da criação de

instituições de ensino superior. O governo dispensava a exigência de equiparação a uma

instituição modelo de nível federal, tornando possível a criação de universidades pela

iniciativa privada. Para o ingresso na faculdade, passou a ser exigido apenas um simples

exame, sem a necessidade de apresentação de documentos que comprovassem o curso

preparatório; o diploma seria substituído por um certificado de assistência e aproveitamento,

sendo os exames de admissão ao ensino superior transferido para as faculdades.

Essas medidas propiciaram a proliferação de cursos sem qualidade, unicamente preo-

cupados em formar bacharéis e doutores (Palma Filho, 2005). Instituições como a

Universidade Escolar Internacional, com sede no Rio de Janeiro, ofereciam por

correspondência, cursos de advogado, médico, engenheiro, etc. Ao final do curso, o aluno

recebia um artístico diploma. Assim se vendiam diplomas de bacharel e/ou doutor a 60$000 rs

Page 70: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

70

a unidade; diplomas que não passavam de verdadeiras iscas de pergaminho (Wachowicz,

2006).

Outro exemplo dos abusos cometidos por conta da liberalidade da lei de 1911 foi a

Superior Universidade do Estado de São Paulo. Esta instituição outorgava título de doutor

sob duas formas: doutorado de estado e doutorado por correspondência, oferecendo cursos de

engenharia, direito, medicina, obstetrícia, odontologia, farmácia e filosofia (Wachowicz,

2006).

Diante de tantas controvérsias e críticas, não poderia ser outro o destino da lei que não

sua revisão, o que acabou ocorrendo em 1915, com a mudança de governo, fazendo com que

aquela fase expansionista e de grande flexibilização na abertura de escolas fosse substituída

pelo retorno do poder do Estado na autorização e controle do ensino superior.

Entretanto, não se pode deixar de reconhecer o caráter original da reforma, que através

de seu ideário positivista, buscou um norte para o desenvolvimento da educação brasileira,

num contexto em que a sociedade civil ainda era muito fraca e sujeita aos interesses de uns

poucos.

Se por um lado, a saída do Estado da função regulamentadora do ensino abriu o campo

para alguns setores sadios da sociedade civil, por outro favoreceu a que toda sorte de

inescrupulosos tomassem de assalto a educação, transformando-a de serviço público e bem

público em um bem qualquer, mercadoria vendável no mercado (Cury, 2009). Torres (1946)

diz que a Reforma Rivadávia introduziu uma série de medidas tão estapafúrdias que foi

apelidada de Lei Desorganizadora do Ensino. Para Cunha (2000), a Reforma Rivadávia

Corrêa apontou ainda para outro paradoxo: embora representasse a exacerbação de uma

matriz de educação de livre-ensino, advinda do Império, abriu caminhos para o futuro da

política de educação da república no Brasil, pois a autonomia das instituições escolares não

deixou de marcar o tempo da modernidade educacional do país, que começaria a se formular

mais precisamente nas duas décadas seguintes.

A total autonomia didática e administrativa concedida aos institutos de ensino superior

pela Reforma Rivadavia provocou reações e criou expectativas de mudanças na direção

oposta, o que ocorreria já no governo seguinte (Vieira, 2009).

3.2.3 Reforma Maximiano de Carvalho

Em 11 de março de 1915, o governo federal, após vários debates no legislativo e

dando-se conta dos efeitos desastrosos dos resultados da Reforma Rivadávia para a educação

Page 71: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

71

brasileira, baixou o Decreto n. 11.530, que reorganizou o ensino secundário e superior na

República e, consequentemente, revogou a desoficialização tentada pela lei orgânica,

restabelecendo a ação imediata da União no ensino superior (Brasil, 1915). Segundo,

Wachowicz (2006), era o “golpe de mestre às instituições que comercializavam os diplomas”.

O objetivo da nova reforma foi criar mecanismos oficiais que reorganizassem o

ensino, mas com a manutenção da autonomia das instituições, sem que isso implicasse numa

“desresponsabilização” do Executivo no campo educacional (Lima et al. 2002). Entre as

principais modificações da assim chamada Reforma Maximiano estavam o retorno do sistema

de equiparação das instituições, para que os diplomas e/ou títulos por elas expedidos

pudessem concorrer com os emitidos pelas escolas oficiais; a introdução do exame vestibular

a ser realizado nas próprias faculdades, podendo a ele submeter-se apenas os candidatos que

tivessem diploma de conclusão de curso secundário; a abertura de cursos superiores somente

em cidades que tivessem mais de cem mil habitantes; a equiparação somente poderia ser

requerida após cinco anos de funcionamento de uma escola superior (Wachowicz, 2006).

Não poderia haver cursos equiparados em cidades com menos de 100 mil habitantes, a

menos que fosse capital de um Estado com mais de um milhão de habitantes, bem como

somente poderia haver até duas escolas de medicina, direito ou engenharia por Estado em tais

condições. Nos lugares onde houvesse uma escola oficial, somente uma particular poderia

pleitear reconhecimento federal (Saviani, 2008; Grijo, 2009).

Com a reforma de 1915, a União passou a exercer, novamente, a função fiscalizadora

sobre as faculdades livres, impondo limites àquelas possíveis de equiparação às federais,

consideradas essas como referência de organização administrativa, pedagógica e curricular.

Tais institutos, após sua equiparação, poderiam requerer a validade de seus diplomas junto aos

órgãos estatais que controlavam o exercício da profissão. O Conselho Superior de Ensino foi

mantido, agora como o órgão máximo de fiscalização dos estabelecimentos, para o qual as

escolas equiparadas deveriam recolher uma "taxa de fiscalização” (Grijó, 2009).

A reforma Maximiliano, considerada como a mais inteligente reforma da Primeira

República por ter mantido o melhor das reformas anteriores, (Moacyr, 1942), interrompeu a

tendência anterior de desoficialização do ensino no Brasil, vindo no sentido de mais uma vez

privilegiar, ao menos como parâmetro, o ensino oficial, bem como concentrar na União a ação

reguladora nesta área (Grijó, 2009). Sem ter a finalidade única e exclusiva de acabar com a

influência dos positivistas na legislação federal do ensino, suas orientações voltavam-se para

tentar melhorar sua qualidade (Ferreira, 2012).

Page 72: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

72

As diversas reformas por que passou a educação no Brasil desde o período colonial,

refletem inicialmente o distanciamento do governo português para a realidade de sua colônia,

vista apenas como produtora de matérias-primas. Com o advento da República, inicia-se

tentativa de se construir um país e com ele o processo de organização do sistema educacional

brasileiro, traduzido pelas reformas do ensino.

O que se observa é que após uma experiência liberalizante por intermédio da reforma

Benjamin Constant, em 1891, e Rivadavia Correa, em 1911, expressões do modelo federativo

e pensamento positivista vigentes, o Governo Federal retornaria a um modelo centralizador,

com a Reforma Maximiano, de 1915, considerando as consequências adversas do modelo

anterior.

Mas, se a crítica à Reforma Rivadavia era a sua extrema liberdade, este fato resultou

benéfico às ideias de ampliação na oferta de cursos superiores no país, por meio das “escolas

livres”, ideias que certamente chegaram ao Pará, como indica a criação dos primeiros cursos

superiores do Estado: a Faculdade de Direito, criada por iniciativa particular em 1902 e logo

assumida pelo Governo do Estado, seguida pela Faculdade de Farmácia, criada por lei

estadual em 1903. A manutenção dessas duas Faculdades pelo Governo Estadual é a

evidência de que o regime federativo favoreceu a iniciativa da participação dos Estados na

área educacional.

O terceiro curso superior do Estado do Pará, a Faculdade de Odontologia surgiu em

1914, quando ainda estava em vigor a Reforma Rivadávia. E chama a atenção a criação dessa

Faculdade, também por iniciativa privada, considerando as peculiaridades de materiais e

equipamentos necessários para o funcionamento ideal de um curso com as especificidades da

Odontologia.

Ao surgir a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, em 1919 já vigorava a Reforma

Maximiano com seu caráter mais restritivo e centralizador, no que se refere à criação de

Escolas superiores pela iniciativa privada. Se a nova lei não as proibiu, ao menos criou uma

série de critérios para que os chamados “cursos livres” fossem equiparados aos oferecidos

pelas faculdades oficiais e tivessem seus diplomas reconhecidos.

Mesmo assim, a “rigidez” oficial da lei Maximiano seria sutilmente abrandada nos

tempos iniciais da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, com a ajuda de forças políticas

locais, como no episódio da equiparação da Escola, em 1924, o qual pelo recorte cronológico

foge ao propósito deste trabalho.

De qualquer maneira, sem as reformas republicanas na educação, não teria sido

possível criar a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará.

Page 73: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

73

3.3 A ORGANIZAÇÃO DAS PRIMEIRAS SOCIEDADES MÉDICAS NO ESTADO DO

PARÁ

As agremiações científicas organizadas surgiram na Europa, entre os séculos XVI e

XVIII. Eram academias e sociedades, constituídas por pessoas interessadas em trabalhar em

prol do desenvolvimento das ciências. Já no final do século XVII, as sociedades perdem suas

características iniciais de diletantismo e amadorismo, dando lugar a certa organização de tipo

profissional (Ferreira et al., 1997). O desenvolvimento científico contrastando com o ensino

das universidades, ainda preso aos padrões medievais, contribuiu para a organização de

associações próprias “onde o aprendizado era feito sem formalismos, mas de maneira

eficiente” (Salles, 1971).

Na América Latina, as sociedades científicas seguiram uma evolução semelhante às

congêneres europeias nas quais se inspiravam. Mesmo que muitas destas tivessem durado

pouco, funcionando mais como órgão de prestígio acadêmico e social do que como um fórum

para discussões científicas, sua existência evidencia a vitalidade da ciência nesses países,

ainda que não seja passível de comparação com o associativismo dos países europeus e/ou

norte-americano (Ferreira et al., 1997).

Embora a maioria das associações fosse de iniciativa privada, os interesses de Estado

exerceram grande influência na sua manutenção e no apoio a outras ações como a fundação de

bibliotecas, a organização de museus, a realização de expedições científicas, atuando desse

modo como agentes da promoção de cultura no Novo Mundo (Ferreira et al., 1997).

Além dos propósitos civilizatórios da ciência, as sociedades assessoravam os governos

em várias matérias e se converteram num espaço de institucionalização da ciência,

estimulando debates científicos e divulgando o conhecimento através de publicações. Muitas

vezes funcionavam, também, como um grupo de pressão ao poder político local (Ferreira et

al., 1997).

Somente a partir do século XVIII registra-se no Brasil o surgimento de academias e

sociedades literárias, sediadas na Bahia e no Rio de Janeiro, e inspiradas nos moldes das

existentes em Lisboa. Referidas agremiações reuniam homens de cultura, sacerdotes,

bacharéis em leis, magistrados, funcionários graduados das coroas, oficiais superiores das

tropas, senhores de engenho letrados e os raros médicos e cirurgiões existentes. Sem

envolver-se em assuntos científicos, tais agremiações se dedicavam ao exercício da poesia,

por meio de odes, elegias e outras composições poéticas caracterizadas pela exaltação e

louvores aos soberanos, aos príncipes e aos ministros (Santos Filho, 1977).

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Apesar de voltadas para a atividade literária, algumas agremiações se propunham a um

caráter mais científico, como a “Academia Científica do Rio de Janeiro”, por vezes

denominada de “Academia de Ciências e História Natural do Rio de Janeiro”. De duração

efêmera (1771-1779), teve entre seus membros também médicos e cirurgiões, os quais

discutiam temas como História Natural, Física, Química, Agricultura e Farmácia, Medicina e

Cirurgia. É considerada a primeira sociedade com alguma finalidade declaradamente médica

criada em nosso país (Nascimento, 1929; Santos Filho, 1977; Salles, 1971).

A vinda da família real portuguesa para o Brasil, em 1808, fugindo da ameaça de

invasão pelas tropas napoleônicas, e a consequente elevação da colônia portuguesa à categoria

de Reino Unido mudou o panorama nacional. O governo português, agora instalado no Brasil,

promoveu uma série de reformas, criando as primeiras escolas de medicina no país,

inicialmente em Salvador e meses mais tarde no Rio de Janeiro, para onde se transferiu a corte

(Torres, 1946; Santos Filho,1977; Sarinho,1989). Assim procedendo, o governo regulamentou

a educação médica no Brasil, “como atividade diversa da praticada por barbeiros,

sangradores, práticos e curandeiros”, pondo fim à “era dos físicos e cirurgiões formados

exclusivamente na Europa” (Edler, 2003).

Passadas algumas décadas desde a institucionalização do ensino da medicina no

Brasil, os médicos que aqui exerciam sua atividade começaram a buscar o fortalecimento de

sua corporação, a defesa de sua profissão e do mercado de trabalho, culminando com o

surgimento das chamadas associações médicas (Santos, 1995).

A primeira sociedade brasileira voltada exclusivamente para medicina foi a

“Sociedade de Medicina do Rio de Janeiro”, criada em 1829 e elevada a condição de

“Academia Imperial de Medicina” em 1835 e, logo após a proclamação da república,

rebatizada como “Academia Nacional de Medicina” (Nascimento, 1929). Subvencionada pelo

Estado Imperial, esta entidade prestou grandes serviços à ciência e ao governo, atendendo às

demandas estatais na área da saúde pública, realizando estudos, discussões e publicando

textos sobre os principais males que acometiam a saúde da sociedade brasileira, além de

manifestar-se quanto às condições de higiene, às doenças tropicais e à oficialização das

práticas de cura (Vicente, 2012).

Com o passar dos anos e o aumento do número de médicos seria natural o surgimento

de sociedades médicas em outras províncias do Brasil. Cronologicamente, podemos citar a

“Sociedade de Medicina Pernambucana” (1841), a “Academia de Ciências Médicas da Bahia”

(1848), a “Associação Médico-Farmacêutica do Rio Grande do Sul” (1850), a “Sociedade

Baiana de Beneficência Médica” (1865), a “Sociedade Médico-Farmacêutica de Campos”

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75

(1879), a “Sociedade Rio Grandense Médico Cirúrgica” (1886), a “Sociedade de Medicina e

Cirurgia do Rio de Janeiro” (1887), a “Sociedade Médico-Cirúrgica de São Paulo” (1888), a

“Sociedade de Medicina de Porto Alegre” (1892), a “Sociedade de Medicina e Cirurgia de

Niterói” (1897), a “Sociedade de Medicina e Cirurgia de Manaus”, a “Sociedade de Medicina

e Cirurgia de Juiz de Fora” e a “Sociedade de Medicina, Cirurgia e Farmácia de Belo

Horizonte”, estas três últimas de 1899 (Salles, 1971).

No Pará, a organização, as modificações e modernizações por que passou a assistência

à saúde no Estado após a proclamação da República, em meio à euforia das reformas urbanas

da capital paraense ao final do século XIX, seguida pela tentativa de valorização da medicina

como categoria profissional, no início do século XX, ensejariam, consequentemente, a criação

de associações em nosso Estado, onde “fosse possível aos médicos resolver os seus dilemas e

encontrar o caminho para o reconhecimento público de sua figura” (Rodrigues, 2008).

Assim, em oito de novembro de 1897, em reunião para homenagear os médicos

paraenses que atuaram na campanha de Canudos, e por iniciativa do governador paraense e

médico José Paes de Carvalho, foi fundada a “Sociedade Medico-Pharmaceutica do Pará”

(doravante grafada Sociedade Médico-Farmacêutica do Pará). Para o governador, a nova

agremiação trataria de assuntos científicos, morais e materiais de ambas as categorias

profissionais, cujas vantagens e necessidade se impunham tanto ao espírito do médico quanto

do farmacêutico (Pará Medico, 1900a). A Sociedade deveria ser também beneficente e prestar

auxílio aos associados e suas famílias, caso necessário (Pará Médico,1900b).

Vale lembrar que, também por iniciativa de Paes de Carvalho, uma lei estadual de

1899, criou as Faculdades de Direito, Medicina e Engenharia (Pará, 1899). A lei não foi posta

em prática e somente em 1902 surgiu o primeiro curso superior neste Estado: a Faculdade de

Direito (Borborema & Souza, 1956).

Mesmo denominada de “médico-farmacêutica”, por ser comum a convivência desses

dois grupamentos profissionais em ações conjuntas em prol da ciência até a segunda metade

do século XIX, quando se inicia um gradativo processo de emancipação da farmácia em

relação à medicina (Velloso 2008; Vicente, 2012), a nova sociedade reuniu,também,

químicos, veterinários, cirurgiões dentistas e até o naturalista Emílio Goeldi, tendo sido

aventada ainda a associação de parteiras diplomadas, do que não há registro de ter acontecido

(Pará Medico,1900b).

O primeiro presidente da Sociedade Médico-Farmacêutica do Pará foi o médico

Américo Santa Rosa, tendo como vice o Barão de Anajás (médico, pai do futuro governador

Antonino Emiliano de Souza Castro e homônimo deste). Como presidentes de honra os

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76

decanos da medicina paraense, Augusto Thiago Pinto e Francisco da Silva Castro (Pará

Medico, 1900b).

A Sociedade Médico-Farmacêutica do Pará foi instalada em 1º de fevereiro de 1898,

com a finalidade de prestar serviços à medicina paraense e aos próprios associados e, segundo

o discurso do seu presidente, com espaço para todos por ser uma Associação puramente

científica e de caráter beneficente (Pará Medico, 1901c). Para o Governador do Estado, o Dr.

José Paes de Carvalho, que também se manifestou na cerimônia, a criação da Sociedade

representava o adiantamento do Estado, sendo esperado da agremiação ações importantes em

um país no qual da higiene pública dependia em parte o progresso e onde o povoamento era

questão capital. O Dr. Paes de Carvalho foi eleito sócio benemérito e presidente de honra da

Sociedade (Pará Médico, 1901c).

As atividades regulares da Sociedade Medico-Farmacêutica do Pará iniciaram-se em

13 de março de 1898, com reuniões mensais para apresentação de casos considerados difíceis

ou raros, teses, trabalhos, memórias, enfim temas que fomentassem discussão. Também eram

lidas comunicações e anunciados o recebimento de jornais e revistas científicas (Pará Médico,

1901c).

A Sociedade chegou a contar com 67 médicos, 24 farmacêuticos, seis cirurgiões

dentistas, dois químicos, um veterinário e um naturalista como sócios (Pará Médico, 1901f).

Pelo registro de suas reuniões nota-se a frequência decrescente dos participantes e a pequena

participação dos sócios não médicos, possivelmente pelo fato de os temas abordados serem

muito específicos à área médica.

Esse aparente descaso para com a Médico-Farmacêutica já era manifesto no discurso

do Dr. João Godinho, como presidente da Sociedade em 1901, ao dizer que a agremiação

precisava levantar-se do abatimento (Pará Medico,1901d). O secretário, Dr. Américo Campos,

foi mais enfático ao dizer, na mesma solenidade de posse, que a Sociedade Médico-

Farmacêutica ficara um longo período de tempo sem grande atividade e perguntava se este

fato se devia à “indiferença pelo cultivo direto e perseverante das ciências médicas” ou pelo

pouco tempo concedido pelos clínicos belenenses, “para meditação e repouso”, em virtude de

suas atividades profissionais (Pará Médico,1901d).

Apesar de tudo, havia otimismo quanto ao futuro da Médico-Farmacêutica: na mesma

sessão especial de 3º aniversário, o presidente João Godinho referiu-se a metas ambiciosas

como a organização de congressos científicos, a fundação de uma policlínica e sanatórios,

estes especialmente para o tratamento da tuberculose, e a criação de uma escola de Farmácia e

de enfermeiros (Pará Médico,1901d).

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O Governador Paes de Carvalho, em mensagem governamental sobre o ano de 1901,

manifestou seu entusiasmo para com a Sociedade, dizendo que ela fora criada na sua

administração e tinha-o como membro; que ali se reuniam médicos estudiosos e habilíssimos

e farmacêuticos distintos, os quais davam o exemplo de trabalho metódico e produtivo, e que

certamente fariam nascer o estímulo no meio dos cientistas paraenses, desenvolvendo-se

assim o amor pelas conquistas do saber (Pará, 1901).

A despeito dos seus projetos ambiciosos – jamais realizados -, a Sociedade Médico-

Farmacêutica deixou como legado seu órgão de divulgação, a revista “Pará-Médico”, de

periodicidade mensal, que se dizia “revista de medicina e farmácia”, cujo primeiro número

surgiu em novembro de 1900 com a proposta de um “trabalho de vulgarização scientifica em

pról da collectividade” e que serviria para “apertar os laços de solidariedade que devem existir

entre devotados apostolos do mesmo ideal”, aos quais caberia a responsabilidade de “cimentar

as bases em que se apoiam as nossas aspirações de progresso e civi lização” (Pará Médico,

1900a). A revista é mencionada ainda na mensagem governamental do Dr. Paes de Carvalho,

sendo citada a publicação de dois números, e que o periódico concorria para o brilho da nossa

paupérrima literatura profissional (Pará, 1901).

A revista “Pará-Médico” foi editada até abril de 1902, chegando a 13 fascículos (Dias,

1996). Durante sua circulação, publicou trabalhos bastante diversificados, com ênfase à

higiene pública e às doenças que mais preocupavam o Governo do Estado no período, como

malária, febre amarela e tuberculose, traçando painéis epidemiológicos e mostrando o

movimento dos hospitais existentes (Rodrigues, 2008).

A Sociedade Médico-Farmacêutica representou uma agremiação muito heterogênea,

não apenas por agregar diferentes categorias profissionais, mas também pela mistura de

gerações conflituosas, do ponto de vista da evolução da ciência, entre os médicos associados.

Entre seus sócios havia médicos remanescentes da luta contra a epidemia de cólera ocorrida

em 1855, ainda ligados a teorias arcaicas como a dos quatro humores, e médicos novos,

pertencentes a uma geração que tinha aprendido na faculdade a teoria microbiana de Pasteur

(Rodrigues, 2008).

Embora não seja possível avaliar a importância desse choque de gerações no

desaparecimento da Médico-Farmacêutica, outro fator que certamente contribuiu para seu

enfraquecimento foi a criação da Sociedade de Medicina e Cirurgia do Pará.

Nos primeiros meses de 1900, o Governador Paes de Carvalho demitiu o médico

Cyriaco Gurjão do Serviço Sanitário do Estado alegando o não cumprimento de suas

obrigações de funcionário público. O fato originou manifestações de protesto de um grupo de

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médicos, o que foi interpretado pelo Governador como uma afronta e um produto da oposição

alinhada ao ex-governador Lauro Sodré. Dias depois, Paes de Carvalho exonerou sete

médicos que haviam participado do protesto (Rodrigues, 2008).

Em maio do mesmo ano de 1900, uma nota em jornal convocava os médicos para a

criação de uma nova agremiação (Folha do Norte 12/05/1900). A nova associação

denominada de Sociedade de Medicina e Cirurgia do Pará, contando em seu quadro com os

médicos demitidos, outros solidários a estes, ou insatisfeitos de alguma forma com a

Sociedade Médico-Farmacêutica foi fundada no dia 13 de maio do mesmo ano (Folha do

Norte 13/5/1900; Rodrigues, 2008).

A sessão de instalação aconteceu em 11 de junho, tendo o Barão de Anajás,

presidente da nova agremiação, traçado belo e promissor programa de atuação para aquela

que seria “um núcleo de dedicados no estudo e à verdade no que entender com a ciência

médica e suas dificultosas relações com a nossa vida profissional”. (Folha do Norte 14/6/

1900).

Figura 13 – Barão de Anajás

Fonte: Acervo Faculdade de Medicina/UFPA

Sob o comando do Barão de Anajás, (Figura 13) vice-presidente na primeira gestão

da Sociedade Médico-Farmacêutica (Folha do Norte, 1º/8/1900), a Sociedade de Medicina e

Cirurgia seguiu funcionando regularmente. Suas reuniões aconteciam uma ou duas vezes por

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79

mês, com discussão de casos cirúrgicos, clínicos e questões de higiene pública. Há registro de

uma publicação desta Sociedade: os “Annaes da Sociedade de Medicina e Cirurgia do Pará”,

do qual Barata (1973) diz ter sido publicado apenas um número, em outubro de 1900.

Por todo o ano de 1901 e de 1902, ambas as sociedades Médico-Farmacêutica e de

Medicina e Cirurgia coexistiram, com os jornais noticiando a realização de suas reuniões. De

1903 em diante, as notícias sobre elas somem dos jornais. Qual ou quais teriam sido os

motivos para o desaparecimento de ambas?

Para Rodrigues (2008), a classe médica paraense da virada do século XIX para o XX

vivia em pé de guerra, sendo as principais características da maior parte dos médicos do Pará

neste período a falta de parâmetros éticos, um conhecimento terapêutico limitado, a ausência

de interesse científico e paixões partidárias exacerbadas.

Tal afirmação encontra respaldo no livro “A Medicina em Belém”, do médico

Eduardo de Léger Lobão Junior, publicado em 1901. Numa descrição nada abonadora da

medicina praticada na capital paraense, o autor dizia haver médicos que ainda não

acreditavam nas teorias antimicrobianas e de antissepsia, tirando bisturis direto do bolso e

fazendo injeções sem asseio (Lobão Junior, 1901). Também criticava o excessivo hábito dos

colegas em atestarem como causa de óbito as chamadas “polynevrites”, quando estas

representavam patologias de difícil diagnóstico e que nem eram assim tão mortais (Lobão

Junior, 1901). Em outro trecho do livro tem-se a de uma classe médica mais ligada a

carruagens do que aos estudos, diferente do que se acostumava ver nos relatos de época:

“Um dos maiores defeitos dum certo numero dos nossos medicos

velhos, é não pegarem em livro; e muitos neophytos é, além de não a

abrirem livro, o Carro. Quando se acham reunidos, os medicos, ou

melhor os latinos, sua conversa em geral versa sobre politica (o que é

improprio), sobre bandalheira (o que é feio), ou detractando os outros

collegas (o que é triste). Por vaidade, por ter muita clinica , ou como

reclame (o que parece mais certo), em consequencia da concorrencia

que já vae havendo aqui na nossa classe médica, o collega nóvel,

chegado anno atrasado ou passado, anda a carro. É um mal – o Carro

em todos os sentidos e temos-nos certificado; porque obriga o medico

novo a so pensar em cavallos, e... cavallos bons, bonitos, de raça!”

(Lobão Junior, 1901).

Page 80: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

80

Sobre as agremiações médicas criadas no período, Lobão Junior também não

demonstra piedade:

“Quando estuda então esse ou esses medicos? Só se elles entendem

que estudar é abrir um livro ou jornal de medicina e ler um capitulo!

Isso mesmo, queremos acreditar, que muitos não fação – velhos e

novos. – Em que tempo então, sendo assim, como é, poderá a

medicina desta terra, elevar-se? O anno passado constituio-se aqui a

Sociedade Medica e Pharmaceutica (e em 1900 – a de Medicina e

Cirurgia- por desavenças políticas, disem, da classe medica). Nunca lá

fomos; porque logo que ellas foram creadas perguntamos:- para que

isso? Já conheciamos o mundo médico onde vivemos. Houverão

algumas sessões; e ninguem mais fala nellas hoje (Perdão! Recuscitou

em fins de 1900 – a Sociedade Medica Pharmaceutica-) antes de um

anno de fundadas. Nem podia deixar de ser assim, visto quasi todos os

medicos velhos faserem – politica, e os moços – empregos, e

pensarem só em carros e cavallos” (Lobão Junior, 1901).

Por mais que as opiniões do Dr. Lobão Junior sejam relevantes, não devem ser

assumidas como a única verdade. Ainda mais se considerarmos possíveis ressentimentos, em

decorrência de seus estudos sobre os efeitos terapêuticos da flora amazônica, fazendo com

que ele fosse taxado de pajé pelo jornal “A Província do Pará” durante os catorze anos da

oligarquia de Antônio Lemos em Belém (Rodrigues, 2008).

Independente das causas, as promissoras Sociedades desapareceram dos noticiários.

Somente mais de uma década depois, uma nova geração de médicos, juntamente com

membros remanescentes das sociedades antigas, em um momento de paixões políticas menos

acirradas, criaria uma nova agremiação médica paraense, tomando emprestado o nome que

remetia a uma e usando o título da revista científica de outra. Assim nasceria a Sociedade

Médico-Cirúrgica do Pará.

3.3.1 A fundação da Sociedade Médico-Cirúrgica do Pará

Mais de dez anos sem notícia do funcionamento das Sociedades Médico-Farmacêutica

e de Medicina e Cirurgia, surgiu na imprensa de Belém a notícia da criação de uma nova

agremiação científica voltada para a medicina: a Sociedade Médico-Cirúrgica, “destinada ao

estudo dos mais importantes problemas medico-cirurgicos, observados na clinica desta

Page 81: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

81

capital”, e que deveria ter o nível de “suas congêneres do estrangeiro”, demonstrando que no

Pará a classe médica procurava acompanhar a evolução da ciência moderna. Uma

“Associação Médica” evidenciando o progresso do Estado e que contasse com uma “revista

médico-cirurgica” para registrar seus trabalhos, “levando para fora do Estado a prova do

nosso progresso científico” (Folha do Norte, 11/7/1914; Estado do Pará, 12/6/1914).

Na reunião de fundação, realizada em 12 de julho de 1914 e dirigida pelo Barão de

Anajás, este relembrou a existência de uma associação de idêntica denominação que existira

(a Sociedade de Medicina e Cirurgia do Pará) e que havia desaparecido (Estado do Pará,

13/7/1914). Na mesma sessão, o Barão de Anajás foi eleito seu presidente (Folha do Norte,

13/7/1914). Vale o registro de que dos vários médicos presentes à reunião, grande parte destes

faria parte do grupo fundador da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará (Folha do Norte,

13/7/1914; Miranda&Abreu, 2010).

Na reunião seguinte, dia 16 de julho do mesmo ano, sob a direção do Dr. Cruz

Moreira, vice-presidente, foi destaque a leitura da justificativa do Barão de Anajás, pelo seu

não comparecimento (Estado do Pará, 18/7/1914).

Por ocasião da terceira sessão preparatória, em 26 do mesmo mês, em carta o Barão de

Anajás reiterava o seu pedido de dispensa do cargo de presidente, “em virtude de subsistirem

os mesmos motivos que o determinaram”, havendo o aceite da plenária. Conforme as normas

estatutárias, na mesma ocasião houve eleição para o cargo vago com a renúncia, saindo

vitorioso o Dr. Camilo Salgado (Folha do Norte 23/7/1914). Deste modo, também por justiça

histórica registre-se ter sido o Barão de Anajás o primeiro presidente da então nascente

Sociedade Médico-Cirúrgica do Pará. A associação entre o Barão de Anajás e Camilo Salgado

se repetiria em 1923, nos primeiros anos de funcionamento da Faculdade de Medicina e

Cirurgia do Pará, quando o Barão, então Diretor daquela instituição, também se afastou do

cargo assumindo em seu lugar Camilo Salgado (Miranda&Abreu Jr., 2010).

A Sociedade Médico-Cirúrgica do Pará foi oficialmente instalada em 15 de agosto de

1914, data comemorativa da Adesão do Pará à Independência, em cerimônia presidida pelo

Governador do Estado, ocorrendo a posse da Diretoria (Figura 14) já sob o comando de

Camilo Salgado (Folha do Norte, 16/8/1914).

A imprensa repercutiu a “inauguração” da nova agremiação falando dos seus

propósitos “tão alevantados” e expressando a “grande satisfacção e o grande desejo de vel-a

prospera e feliz” (Folha do Norte, 18/8/1914).

Page 82: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

82

Figura14 - Primeira Diretoria da Sociedade Médico-Cirúrgica do Pará

Fonte: Pará Médico, 1922

Após comentar o estado de inação da classe médica, que até aquele momento tinha

vivido “sem concordancia de vistas, sem homogeneidade no sentir, sem a força social

resultante da coligação de esforços”, impossibilitando a execução de projetos de utilidade

geral, para o jornal, com a Sociedade criava-se um núcleo central capaz de atrair todas as

energias, todos os elementos necessários não só para o progresso da classe médica, mas

também “nos melhoramentos de ordem social de que merece”, destacando um “serviço

moderno de assistencia publica” (...) “amplo, rápido e eficaz”, o que corresponderia, hoje em

dia, a um Serviço de Pronto Socorro, de Atendimento de Urgência e Emergência (Estado do

Pará, 18/8/1914).

Outro tema abordado foi a criação de uma “Faculdade Livre de Medicina e Cirurgia,

onde se formassem pharmaceuticos, dentistas, médicos e cirurgiões” , justificando que tal

iniciativa “facilitaria os estudos da mocidade do Extremo Norte e do Meio Norte até

Pernambuco”, uma vez que “muitas vocações neste vasto trecho do nosso paiz ficam

impossibilitados de fazer seus estudos scientificos por não poderem se transportar para a

Bahia ou Rio e ali se manter" (Estado do Pará, 18/8/1914).

A importância de uma Faculdade de Medicina em Belém era reforçada com o

argumento de esta cidade localizar-se em plena zona tropical, o que levaria a que, em pouco

tempo, a escola seria “um verdadeiro instituto de medicina tropical”, especialidade importante

“por causa das tendencias colonizadoras das grandes potencias”. E que um instituto desta

Page 83: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

83

natureza, funcionando em local apropriado, operando ‘in loco’, teria mais possibilidade de

êxito que os que estavam mais distantes do foco das doenças que estudavam, “como o

Instituto de Medicina Tropical de Liverpool”, com a convicção de que, dentro de alguns anos,

“depois de repetidas comunicações levadas ao conhecimento dos grandes centros scientificos”

a Faculdade de Medicina, “gosaria de grande autoridade em materia de medicina tropical, e

que juntamente com o Instituto de Manguinhos, “iria levar a bôa fama da sciencia brasileira,

ao mundo inteiro” (Estado do Pará, 18/8/1914). Provavelmente, o autor da matéria jornalística

quis relembrar a expedição da Escola de Liverpool a Belém, em 1901, para estudar a febre

amarela, quando o pesquisador Walter Myers veio a falecer vitimado por esta doença.

(Miranda&Abreu Jr, 2011).

A notícia finalizava com uma afirmação que soava premonitória:

A idéa de creação de uma Faculdade de Medicina no Pará,

alimentada e encaminhada pela Sociedade Medico-Cirurgica, será

fatalmente posta em execução mais anno menos anno, para gloria da

terra paraense. (Estado do Pará,18/8/1914).

Na realidade, a Faculdade de Medicina ainda demoraria mais cinco anos para ser

criada, e não oficialmente por intermédio da Sociedade Medico-Cirúrgica, embora o grupo

idealizador da escola fizesse parte da referida Sociedade (Miranda e Abreu Jr, 2010).

As reuniões da Sociedade Médico-Cirúrgica, além da apresentação de trabalhos e

discussões de questões científicas, serviram também para a discussão de temas de interesse

geral, mostrando que os médicos tinham outras preocupações, na tentativa, talvez, de marcar

presença como destaque na sociedade, no processo de afirmação da profissão, conforme

apresentado por Rodrigues (2008). Na primeira reunião, após a instalação, foi proposta a

criação de uma revista, ficando adiada para quando houvesse melhor oportunidade (Folha do

Norte, 3/9/1914).

Uma proposição surgida no âmbito da Médico-Cirúrgica ainda no seu primeiro ano de

existência merece destaque. Dizia respeito ao uso de apetrechos de borracha em lugar de

equivalentes fabricados de palha, linha ou veludo, por serem mais higiênicos, mais fáceis de

limpar e mais adequados ao nosso clima. Além do mais, seria uma ajuda à crise econômica

instalada pela queda dos preços da borracha produzida na Amazônia (Folha do Norte,

16/10/1914).

Page 84: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

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O documento previa ainda apelar às congêneres da Médico-Cirurgica, à imprensa do

país, aos poderes públicos e a todos os cidadãos, a fim de “sanar uma anomalia, que razão

alguma justifica e que a sciencia medica e os mais elementares principios economicos

condemnam”. Referendada por 43 assinaturas, fora inspirada no memorial apresentado pelo

Dr. J.A de Magalhaes à Comissão da Defesa Econômica da Amazônia (Folha do Norte,

16/10/1914).

E assim foi seguindo sua trajetória a Sociedade Médico-Cirúrgica, sobrevivendo a

“todas as agourentas previsões que malsinavam a criação deste grêmio, que seria de pronto,

invadido por paixões políticas” afastando com o decorrer do tempo “aqueles que pretendiam

aqui erigir um altar onde se expusessem à adoração dos seus colegas”, ficando somente “os

que desejavam estudar, trabalhar lealmente pelo engrandecimento da profissão e do nosso

meio, pelo restabelecimento das boas práticas e pelo aperfeiçoamento”. Não que em um

século de existência não tivessem existido divergências entre seus membros, afinal, segundo o

Dr. J.A de Magalhães “... querer que entre os médicos não houvessem rivalidades, seria o

mesmo que esperar que eles não fossem homens e tivessem todos os atributos de santos”

(Rodrigues, 2008).

Os componentes do grupo inicial da Sociedade Médico-Cirúrgica do Pará vieram a

exercer importante papel na criação e organização da Faculdade de Medicina e Cirurgia do

Pará, em 1919 (Miranda & Abreu Jr., 2010). Eram novos tempos. O triunfo dessa nova

Sociedade e de seus ideais representava, também, o surgimento de um novo estilo médico

(Rodrigues, 2008). A Sociedade Médico-Cirúrgica do Pará, contribuiria, assim, por meio de

estudos e sugestões, tanto para referendar as ações governamentais atreladas à expansão da

economia, quanto, paralelamente, ao desenvolvimento científico.

Decerto, os médicos organizados, tinham mais poder e mais ingerência sobre

assuntos afeitos à saúde e ao exercício da profissão, sendo capazes de elaborar e por em

prática algo bem emblemático deste poder como uma Faculdade de Medicina, onde médicos

ali formados tendo como professores membros da Sociedade Médico-Cirúrgica seguissem os

modernos pressupostos científicos e os princípios éticos praticados por seus mestres

(Rodrigues, 2008). A ideia pode ter surgido nas reuniões da Sociedade, pelo menos é o que a

imprensa havia divulgado. Embora não possamos afirmar ser a Faculdade de Medicina e

Cirurgia do Pará fruto apenas desta agremiação médica, pelo menos os agentes históricos ali

estavam.

Por mais que não consideremos a Sociedade Médico-Cirúrgica como sucessora da

Sociedade Médico-Farmacêutica, não podemos deixar de registrar que aquele primeiro

Page 85: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

85

movimento associativo de 1897 sinalizou para a necessidade de organização como forma de

crescimento e de defesa dos interesses da classe.

Ao ser fundada em 1914, dentro de um novo contexto científico, social e,

principalmente, econômico da cidade de Belém, a Sociedade Médico-Cirúrgica significava o

traço de modernidade alcançado pela ciência médica de então, expressando ainda o ideal de

afirmação da medicina como profissão numa sociedade que ainda se utilizava bastante dos

conhecimentos da medicina tradicional, empírica, baseada nas crendices da cultura popular.

Para o fortalecimento desse grupamento profissional como elite intelectual, era

necessário que o número de seus representantes fosse significativo, a fim de que seus pares

participassem ativamente da vida social da cidade, ocupando espaços, preenchendo cargos,

desempenhando funções relacionadas à profissão, atendendo às demandas de uma população

que continuava convivendo com índices alarmantes de doenças infecciosas, divulgando na

imprensa suas conquistas e as novidades científicas a que tinham conhecimento.

Todas essas ações tinham como intuito divulgar e popularizar a profissão e os

profissionais, procurando eliminar da sociedade aqueles hábitos considerados atrasados de

recorrer a pajés e curandeiros em detrimento à medicina científica.

É aí que aquela elite intelectual, atingida também pela crise econômica, esbarrava na

deficiência do número de médicos necessários para fazer frente às solicitações da sociedade,

principalmente em um Estado com as dimensões e as peculiaridades geográficas do Pará, que

até hoje se ressente de uma adequada distribuição de profissionais de todas das áreas. E

buscou uma solução: criar uma faculdade de medicina, que formasse também farmacêuticos e

dentistas, como previsto nos regulamentos das faculdades de medicina existentes no Brasil e

referido nas notícias inaugurais da Sociedade Médico-Cirúrgica.

Mesmo que não se identifique o autor da matéria publicada no jornal “Estado do

Pará”, de 18 de agosto de 1914, que trata da instalação da Sociedade, o texto denota grande

conhecimento dos problemas, o que nos leva a crer ter sido escrito por um médico, fato

frequente nos jornais de então, quem sabe membro da nova agremiação.

Se a ideia de criação de uma Faculdade de Medicina tendo à frente a Sociedade

Médico-Cirúrgica, não prosperou de imediato por razões que oficialmente desconhecemos,

embora possamos novamente apontar o fator econômico como diretamente implicado, ao ser

posta em prática ao final de 1918, não há referência de que tal projeto fizesse parte dos planos

da Sociedade.

Em todo caso, pelo menos por sua capacidade de liderança e de penetração na

sociedade, além de destaque no meio científico, os dirigentes e membros da Sociedade

Page 86: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

86

Médico-Cirúrgica tiveram participação ativa na criação da Faculdade de Medicina e Cirurgia

do Pará, onde muitos desempenharam funções e exerceram cargos de professores,

contribuindo para consolidação e crescimento da nova escola médica.

3.4 A CRIAÇÃO DA FACULDADE DE MEDICINA E CIRURGIA DO PARÁ

Os registros dos tempos iniciais da Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará são

nebulosos devido à falta de documentos. Os que se aventuraram a escrever sobre o

acontecimento citam sempre o dia 9 de janeiro de 1919 como a data de fundação daquela que

seria a oitava Faculdade de Medicina do Brasil, embora não se tenha maiores dados sobre este

fato (Leitão, 1985; Meira, 1986; Beckmann, 2003; Miranda & Abreu Jr, 2010).

A edição da revista Pará Médico, de setembro de 1922, comemorativa do centenário

da Independência, informa no artigo Faculdade de Medicina do Pará, que no final do ano de

1918, membros da Associação Científica do Pará – que mantinha “uma Escola de

Odontologia” – procuraram o médico Camilo Salgado para que este se juntasse aos que

idealizavam criar uma Faculdade de Medicina. E considerando o grande prestígio que aquele

médico gozava junto à classe médica e à sociedade, ofereceram-lhe a direção da futura escola

(Pará Médico, 1922; Leitão, 1985).

Beckmann (2003), afirmava ter ouvido de Orlando Lima, professor catedrático de

Obstetrícia e um dos fundadores da Faculdade de Medicina, que a ideia de fundação nasceu

devido à dissidência no seio da Escola Livre de Odontologia, que era mantida pela Associação

Científica do Pará. Por iniciativa de Antônio Magno e mais Renato Franco, Hermógenes

Pinheiro, Evaristo Silva, Álvaro Gonçalves e Carlos Arnóbio Franco - todos professores da

Escola de Odontologia -, estes saíram pelas ruas do comércio de Belém, com uma bandeira

brasileira, angariando fundos visando à fundação de uma Faculdade de Medicina.

De acordo com Ribeiro (2005), foi na gestão de Antônio Magno e Silva, como Diretor

da Escola de Odontologia, que por deliberação unanime da Congregação daquela Escola “se

cria a Faculdade de Medicina e Cirurgia do Pará, nos idos de 1918”.

Embora sem documentação comprobatória, a participação de Magno e Silva na criação

da Faculdade de Medicina do Pará - como foi inicialmente denominada - seria ressaltada a

quando do seu falecimento:

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87

Foi ainda por sua iniciativa que se fundou a nossa Faculdade de

Medicina, idéa considerada por muitos como uma loucura, mas que

para sua alma de grande batalhador era uma realidade insofismável.

(Folha do Norte, 28/2/1939).

Magno e Silva (Figura 15), que era odontólogo e Diretor da Escola Livre de

Odontologia do Pará, fez parte da primeira turma de médicos formados pela nova Faculdade

de Medicina, tendo continuado na Direção da Escola de Odontologia até 1938 (Leitão, 1985;

Miranda & Abreu Jr, 2010).

Figura 15 – Magno e Silva

Fonte: A Semana, 1925

A dissidência mencionada anteriormente ajuda a esclarecer outra confusão entre a

Associação Científica do Pará e a Sociedade Propagadora das Ciências, que muitas vezes têm

sido citadas como sendo a mesma instituição, o que não procede.

A Sociedade Propagadora das Ciências ou Centro Propagador das Ciências, como é

denominada no Relatório de 1918 do Governador Lauro Sodré, foi fundada em 23 de janeiro

de 1918 e tinha por finalidade “a creação e manutenção de cursos e ensino superior”, tendo

Page 88: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

88

desde sua instalação fundado a Faculdade de Odontologia, com um programa de ensino

teórico-prático de três anos, sob a direção do médico Jayme Aben-Athar (Pará, 1918).

Na mencionada mensagem tem-se ainda a seguinte informação:

Funciona regularmente a Escola Livre de Odontologia do Pará,

fundada em Belém a 4 de Julho de 1914” (...) “Dirige-a o professor

Magno e Silva e é bem constituído seu corpo docente, composto de

médicos e cirurgiões dentistas (Pará, 1918).

Deste modo, verifica-se que em 1918 havia dois cursos de Odontologia em atividade

em Belém. Segundo os jornais do período, por divergências entre seus pares na Congregação

da Escola Livre de Odontologia, Jayme Aben-Athar demitiu-se dos cargos de diretor e de

professor da Escola e, junto com outros dissidentes, criou a Sociedade Propagadora das

Ciências e a Faculdade de Odontologia do Pará. Foi substituído na direção da Escola Livre de

Odontologia por Magno e Silva (Leitão, 1985; Miranda & Abreu Jr, 2010).

As duas Instituições de Ensino Superior coexistiriam até março de 1919, quando por

interferência do senador Cypriano Santos entraram em acordo, sendo extinto o curso criado

pela Sociedade Propagadora das Ciências e franqueado aos alunos da Faculdade de

Odontologia do Pará sua transferência para a Escola Livre de Odontologia do Pará. A

Sociedade Propagadora das Ciências sobreviveria mantendo apenas seu curso de Agronomia

(Miranda & Abreu Jr, 2010).

Voltando aos primeiros tempos da nova Faculdade, embora se tenha a informação de

sua criação em 9 de janeiro de 1919, o jornal Folha do Norte publicou em sua primeira

página, em 15 de janeiro de 1919, que “dentro de poucos dias”, seria fundado (grifo nosso)

um “importante estabelecimento de ensino superior, que se denominará Faculdade de

Medicina do Pará”. A notícia acrescentava ainda que a ideia, “nascida no seio dos mais

illustres membros da nossa classe médica”, teve simpática acolhida por parte de todos quantos

se interessavam pelo progresso intelectual e científico do Estado, e seria o primeiro no gênero

no norte, da Bahia ao Pará. Também que haviam sido convidados “os mais eminentes

médicos do nosso meio” para serem professores (Folha do Norte, 15/1/1919).

Após sua criação, a Faculdade de Medicina do Pará, precisava de alunos para

funcionar efetivamente, bem como de um local para o exercício das atividades didáticas.

Deste modo, os jornais anunciaram um corpo docente composto por 24 médicos “dos mais

notáveis do nosso meio”, a abertura de matricula no mês de março, para os candidatos ao

curso e o funcionamento do curso, “no prédio onde se acha installada a Escola Livre de

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Odontologia”, enquanto aguardava a transferência para um prédio “mais próprio e

conveniente” (Folha do Norte, 18/1/1919).

Outro detalhe interessante na notícia é a informação de que à Faculdade de Medicina

seriam anexados a Escola Livre de Odontologia e um curso especial de Obstetrícia (Folha do

Norte, 18/1/1919), evidenciando a ligação entre as duas instituições, fato corroborado por

pequenas notas publicadas ao longo do mês de março de 1919, em que o título “Faculdade de

Medicina e Escola de Odontologia do Pará” englobava os dois estabelecimentos (Folha do

Norte 01, 04, 06,11 e 22/3/1919). Tais fatos reforçam a tese de que a ideia de criação da

Faculdade surgiu no âmbito da Escola Livre de Odontologia do Pará.

Sobre essa ligação, o médico Clodoaldo Beckmann contava uma antiga anedota: a

família mandara Antônio Magno e Silva para o Rio de Janeiro a fim de estudar medicina. Por

motivos desconhecidos este retornou a Belém formado em Odontologia, para aborrecimento

de seu pai, que desejando ter seu filho médico, mas já sem recursos para mantê-lo estudando

em outro Estado, o teria obrigado a criar uma Faculdade de Medicina no Pará (Miranda &

Abreu Jr, 2010).

A história, embora pitoresca, carece de comprovação. O fato é que Antônio Magno e

Silva teve participação efetiva na criação da Faculdade de Medicina, o que é pouco conhecido

e divulgado, assunto que merece ser aprofundado, uma vez que seu nome foi aos poucos

sendo ofuscado no imaginário relativo à Faculdade, principalmente quando se pensa no culto

a Camilo Salgado.

Provavelmente por falta de candidatos ao curso de medicina (um reflexo da crise

econômica?), as inscrições para os exames de admissão foram prorrogadas até o final de

março de 1919. Este fato, inimaginável nos dias de hoje, deveu-se certamente ao descrédito

que deveria rondar uma empreitada como aquela: criar um curso de medicina nos longínquos

rincões do norte do Brasil.

Para facilitar o acesso dos pretendentes e o consequente funcionamento da Faculdade,

a direção da Escola, tendo a frente o médico Antonino Emiliano de Souza Castro - o Barão de

Anajás -, por deliberação da Congregação, decidiu que somente naquele ano estariam

dispensados dos exames os bacharéis em direito, engenheiros, farmacêuticos, dentistas

diplomados no Brasil ou que tivessem seus títulos reconhecidos por instituições brasileiras.

Além destes estariam liberados também dos exames de admissão professores normalistas e

mais aqueles que houvessem completado seu curso de humanidades em quaisquer

estabelecimentos de ensino superior do Estado ou a eles equiparados (Folha do Norte,

Page 90: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

90

11/3/1919). A atitude da Congregação parecia demonstrar que a Faculdade procurava

candidatos e não o contrário.

De qualquer modo, talvez com o propósito de divulgar a empreitada paraense

ajudando em sua consolidação, o noticiário dizia que a criação de uma nova escola médica

ultrapassara as fronteiras do Estado, atraindo a atenção de candidatos do Amazonas,

Maranhão, Ceará e Pernambuco (Estado do Pará, 25/2/1919), o que não parece se confirmar

ao se compulsar as listas dos primeiros formandos e seus locais de origem.

Com previsão inicial para funcionar em abril de 1919 (Estado do Pará, 14/2/1919), a

Faculdade de Medicina do Pará, que só passou a se chamar Faculdade de Medicina e Cirurgia

do Pará a partir de 1923, foi oficialmente instalada somente no dia1º de maio de 1919. De sua

criação, em 9 de janeiro, à instalação em 1º de maio, foram menos de quatro meses, tempo

recorde, considerando ser a Escola uma iniciativa exclusivamente particular.

Embora os jornais noticiassem ser grande o número de candidatos à matrícula e que

estava sendo ultimada a instalação dos gabinetes (Folha do Norte, 22/3/1919), na verdade,

parece ter sido pequena a procura, o que certamente limitava ainda mais os recursos

necessários para o funcionamento da nova Faculdade. Sobre os gabinetes, nada havia

concreto.

Apesar da delicada situação econômica do Estado, ao que tudo indica a cidade de

Belém não ficou de todo indiferente à iniciativa: alguns comerciantes contribuíram com

materiais; outros se prontificaram a fornecer material de papelaria para o expediente; outros

mais se comprometeram a colaborar com donativos de valor, na medida de suas posses e o

próprio Governo do Estado imprimiu gratuitamente os programas das disciplinas e os

Regulamentos da Instituição (Estado do Pará, 14/2/1919).

Outro fator complicador a considerar como dificuldade no início do funcionamento da

Faculdade foi a formação do seu corpo docente. Nas primeiras décadas do século XX, Belém

contava com um razoável número de profissionais médicos, muitos aqui chegados ainda nos

bons tempos da economia da borracha, e que exerciam o magistério em escolas tradicionais de

Belém, como o Ginásio Paes de Carvalho e a Escola Normal (atual Instituto Estadual de

Educação do Pará), e também nos cursos superiores existentes naquele período, como os de

Veterinária, Odontologia e Farmácia (Miranda & Abreu Jr, 2010).

Com todos estes pontos positivos e mesmo considerando o pensamento de Octavio de

Freitas, o idealizador da Faculdade de Medicina do Recife, surgida em 1915 e posta para

funcionar em 1920, para quem não haveria Faculdade de Medicina constituída

exclusivamente por celebridades ou sábios, sendo exigido dos professores que eles soubessem

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91

as matérias e tivessem amor e interesse pelo ensino (Freitas, 1944), parece que a ideia de ser

professor de medicina não atraiu de pronto determinados profissionais. E talvez para tentar

imprimir maior credibilidade ao curso de medicina que se iniciava, observa-se pelas notas na

imprensa uma preocupação em divulgar os nomes de quem faria parte do corpo docente da

instituição, para o que teriam sido convidados “os mais eminentes médicos do nosso meio,

que tem acolhido com enthusiasmo a idea” (Folha do Norte, 15/1/1919).

O corpo docente foi empossado em 3 de abril de 1919, podendo tais professores, em

número de trinta, serem considerados como os reais fundadores da Faculdade, embora nem

todos tenham honrado o compromisso, logo surgindo os primeiros pedidos de exoneração ou

de licença, quem sabe por desacreditarem no futuro da Escola.

Este fato gerou o que Beckmann (2003) denominou de “dança das cátedras”, com

licenças, transferências, substituições concretizadas por portarias e atos de nomeação para

professores interinos, substitutos, regentes, efetivos, catedráticos, resultando em mais

descrédito para a Faculdade.

Figura 16 – Camilo Salgado

Fonte: Acervo Faculdade de Medicina-UFPA

A situação somente se regularizaria com as modificações administrativas implantadas

por Camilo Salgado (Figura 16), auxiliado por seu secretário Olympio da Silveira, a partir de

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92

22 de março de 1922, quando Camilo assumiu o cargo de Diretor da Faculdade, do qual

somente se afastou por sua morte, em 1938 (Miranda & Abreu Jr., 2010).

Então, em 29 de abril de 1919, agora sob o título somente “Faculdade de Medicina do

Pará”, a Folha do Norte noticiava a solenidade de inauguração para o dia 1º de maio,

informando que a matrícula para o primeiro ano atingira o número de 46 alunos (Folha do

Norte, 29/4/1919).

A sessão solene de instalação, acontecida no salão nobre do Ginásio Paes de Carvalho,

mereceu grande destaque na imprensa. O evento, iniciado às 10h, contou com a presença de

diversas autoridades, de professores e do corpo diretivo da Escola, à frente o Diretor, Barão

de Anajás, a quem coube proclamar inaugurada a Faculdade de Medicina do Pará, além dos

alunos da nova Faculdade. A nota finalizava dizendo terem sido feitas duas fotos do evento:

uma dos professores da Faculdade e outra dos acadêmicos (Figura 17) (Estado do Pará,

3/5/1919).

Figura 17 - Professores e alunos na solenidade de instalação da Faculdade de

Medicina

Fonte: Estado do Pará 3/5/1919

Destaque para a oração proferida pelo Dr. Acylino de Leão, por ocasião da solenidade

de instalação, quando discorreu sobre a necessidade de médicos para levar para o interior seu

conhecimento, libertando as populações da pajelança e contribuindo para a saúde dos braços

que produziam o trabalho; que os médicos formados “pelas academias do sul”, a maioria

tomava o caminho de São Paulo, Minas e outras capitais, onde havia melhores condições; que

por isso, só os formados aqui é que poderiam lançar suas vistas ao interior, seja movidos pelo

Page 93: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

93

trabalho, pelo amor ao seu berço natal ou pelos laços de família que os prendiam (Estado do

Pará, 3/5/1919).

Após as festividades do dia 1º de maio, as atividades regulares do curso iniciaram no

dia 6 de maio, quando o Dr. Caribé de Rocha, lente da cadeira de História Natural e

Parasitologia proferiu a primeira aula regular do curso, em uma das duas salas cedidas pelo

Ginásio Paes de Carvalho para esta finalidade.

Sem local adequado para aulas, utilizando o Necrotério Público (Figura 18) e o

Laboratório do Estado para aulas práticas, com professores desconfiados e alunos também,

assim se iniciou o ensino médico na Amazônia brasileira.

Figura 18 - Necrotério Público

Fonte: Album do Estado do Pará, 1908

Diferente do que se tem até hoje nos relatos oficiais, a criação da Faculdade de

Medicina e Cirurgia do Pará não pode ser creditada apenas a iniciativa de um grupo de

médicos idealistas do início do século XX. Mesmo que se destaque nos eventos fundadores

toda a importância devida à participação de figuras como o Barão de Anajás, Magno e Silva e

Camilo Salgado, entre tantos, abstrair o contexto histórico e socioeconômico é reduzir a

importância do fato.

É claro que a Faculdade precisou dos idealistas para iniciar sua trajetória,

principalmente naqueles difíceis primeiros tempos. Havia desconfiança de que o projeto

pudesse dar certo. Eram tempos de crise. Como assegurar a manutenção financeira da

Instituição apenas com o pagamento dos alunos? Como realizar a aquisição dos equipamentos

Page 94: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

94

indispensáveis para as aulas? Como garantir o salário dos professores e funcionários? Como

pensar em uma sede adequada para o funcionamento da escola numa economia que se

ressentia dos bons tempos da borracha?

Esta situação é comprovada quando da abertura das inscrições para os novos alunos: a

pequena procura dos interessados fez com que fosse adiado o início das aulas, mesmo após

ser facilitada a admissão dos candidatos, como a dispensa das provas aos portadores de

diploma de curso superior. Não poderia ser por falta de dinheiro para pagar as despesas do

curso?

Naquela ocasião, o Estado do Pará contava com médicos competentes e conscientes da

sua importância no contexto social, exercendo também a atividade do magistério. Por que não

fazer parte do corpo docente de uma Faculdade de Medicina? E já começar como

catedráticos! Onde mais poderiam ter essa chance? Afinal, dos bons tempos da borracha

restara a formação científica em ligação direta com a Europa. E parece que o salário não era o

mais importante, haja vista que para a compra do prédio para a Faculdade, em 1923, os

professores abriram mão de meses dos seus salários como doação para a causa.

Além disso, ser professor significava criar uma escola de pensamento: os novos

médicos formados certamente os teriam por modelos, seguindo seus ensinamentos e suas

posturas numa sociedade onde a corporação médica se apresentava, agora, organizada e

lutando por sua valorização e seus interesses de classe. Como sugerido na matéria do jornal

sobre a fundação da Sociedade Médico-Cirúrgica, uma Faculdade de Medicina nos trópicos,

funcionando no local apropriado, operando ‘in loco’ poderia originar um Instituto de

Medicina Tropical do mesmo nível que Manguinhos e com mais possibilidades de êxito do

que o de Liverpool! Nada modesto.

Não se pode perder de vista também que aqueles que vivenciaram as etapas iniciais,

pela própria falta de distanciamento necessário para uma avaliação crítica isenta de paixões e

subjetividade, talvez não se tenham dado conta do papel dos vários atores no processo de

criação da escola. Num olhar mais acurado e desapaixonado, não é difícil ver que estavam

todos lá: a classe médica organizada e na busca de reconhecimento da medicina como

detentora do monopólio da cura, a crise econômica dificultando a manutenção da formação da

elite de doutores fora do Estado do Pará; a legislação do ensino facilitando a criação de

instituições não oficiais. E acima de tudo, o velho fantasma das epidemias e outras doenças

endêmicas resistindo aos propalados tempos de progresso e modernidade.

Page 95: a epidemiologia das doenças infecciosas no início do século xx e a

95

4 CONCLUSÕES

A região Norte, particularmente o Estado do Pará e a cidade de Belém, viveu um período de

apogeu econômico em decorrência do comércio da borracha na região, no final do século XIX

e início do século XX, entretanto, a situação epidemiológica, quanto às doenças infecciosas,

era caracterizada por epidemias frequentes de febre amarela, malária, cólera e varíola, dentre

outras;

Apesar da existência de políticas públicas de saúde e saneamento voltadas para o controle

das endemias, no Brasil da Primeira República, a vasta dimensão territorial do Estado do Pará,

associada ao número diminuto de médicos e à dificuldade para a formação destes devido à

distância das cidades onde havia Faculdade de Medicina, não permitiu que políticas fossem

implantadas de forma adequada;

A economia da borracha, em sua fase de prosperidade, originou uma nova classe social no

Estado do Pará, a qual buscou ascender socialmente por meio de seus filhos, que eram

mandados estudar fora do Brasil - que contava naquela ocasião com apenas duas escolas

médicas -, constituindo uma elite regional de doutores;

As reformas do ensino, no início da República no Brasil, permitiram a expansão do número

de Instituições de Ensino Superior, em razão de maior flexibilidade da legislação federal e

elevou o número de profissionais formados e aptos ao exercício da profissão médica;

A virada do século XIX para o século XX assinalou a construção do poder e prestígio da

medicina científica, representada pela modificação dos conceitos sobre a etiologia das

doenças, em razão das descobertas da bacteriologia e pela afirmação do pensamento

associativo da categoria médica;

A campanha de profilaxia da febre amarela no Estado do Pará, dirigida por Oswaldo Cruz

nos anos da década de 1910, mostrou a possibilidade de aplicação dos novos conceitos da

medicina científica no combate às doenças infecciosas e a consequente melhoria dos índices

epidemiológicos;

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96

A crise econômica na região Norte, advinda com a queda nos preços da borracha no

mercado internacional, fez com que a nova elite econômica originária do período áureo do

comércio daquele produto buscasse alternativas dentro da nova ordem social, para que a elite

intelectual continuasse agora formada nas Faculdades criadas no Estado do Pará;

No Estado do Pará, a criação da Sociedade Médico-Farmacêutica e, posteriormente, da

Sociedade Médico-Cirúrgica, representava essa nova ordem social da medicina, que se

ressentia do pequeno número de médicos no Estado, insuficientes para atender as demandas

da população;

A conjunção de todos esses fatores econômicos – o apogeu e a queda da economia da

borracha; sanitários – a era do saneamento e a política higienista; educacionais – as reformas

do ensino; e científicos – a institucionalização da medicina, culminou na criação da Faculdade

de Medicina e Cirurgia do Pará, dando início ao ensino médico na Amazônia brasileira.

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