4.tpd 003 - kasahra - qual democracia

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11 "Qual democracia? O uso de referenciais normativos em estudos comparativos" Yuri Kasahara * * * * Introdução A utilização da comparação no campo da ciência política filia-se a uma tradição iniciada, para muitos, pelos estudos de Aristóteles sobre as constituições das diversas Cidades-Estado gregas, tendo continuidade com textos clássicos de autores como Montesquieu, no século XVIII, e John Stuart Mill, no século XIX. Com a pretensão de dar seguimento a essa tradição, a ciência política norte-americana, a partir da segunda metade do século XX, passou a empreender um esforço sistemático no sentido de institucionalizar os estudos de política comparada, seja por meio da criação de departamentos universitários ou pela obtenção de generosos financiamentos públicos e privados para pesquisas. O sucesso desse esforço pode ser visto, por exemplo, no espaço adquirido pela chamada “comparative politics” na produção acadêmica norte-americana nas últimas décadas. Em relação aos aspectos teóricos que sustentam essa ascensão, a comparação pode ser considerada como um método indispensável para a produção de teorias e a confirmação ou refutação de hipóteses. Por meio dela, podemos encontrar características recorrentes ou contrastes que nos ajudem a explicar semelhanças ou diferenças. No caso da política comparada, podemos descobrir recorrências ou singularidades que nos possam explicar melhor a dinâmica de fenômenos políticos em diferentes países, produzindo teorias mais sólidas e confiáveis. Foi com a utilização de argumentos como esses – destacando a importância científica dos estudos comparados – que muitos dos defensores da política comparada conseguiram consolidar seu campo de estudo. Nesse sentido, a defesa da comparação como recurso legítimo para a produção do conhecimento na ciência política prevalece até hoje, mesmo que sua excessiva institucionalização gere discussões sobre a validade de se considerar a política comparada como um ramo autônomo de conhecimento ou apenas como uma frutífera metodologia de pesquisa 1 . * Professor da Escola de Direito da FGV-Rio. E-mail p/ contato: [email protected] 1 Para esse debate ver Collier (1993) e Lijphart (1971).

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  • 11

    "Qual democracia? O uso de referenciais normativos em estudos comparativos"

    Yuri Kasahara Introduo

    A utilizao da comparao no campo da cincia poltica filia-se a uma tradio

    iniciada, para muitos, pelos estudos de Aristteles sobre as constituies das diversas

    Cidades-Estado gregas, tendo continuidade com textos clssicos de autores como

    Montesquieu, no sculo XVIII, e John Stuart Mill, no sculo XIX. Com a pretenso de dar

    seguimento a essa tradio, a cincia poltica norte-americana, a partir da segunda metade

    do sculo XX, passou a empreender um esforo sistemtico no sentido de institucionalizar

    os estudos de poltica comparada, seja por meio da criao de departamentos universitrios

    ou pela obteno de generosos financiamentos pblicos e privados para pesquisas. O

    sucesso desse esforo pode ser visto, por exemplo, no espao adquirido pela chamada

    comparative politics na produo acadmica norte-americana nas ltimas dcadas.

    Em relao aos aspectos tericos que sustentam essa ascenso, a comparao pode

    ser considerada como um mtodo indispensvel para a produo de teorias e a confirmao

    ou refutao de hipteses. Por meio dela, podemos encontrar caractersticas recorrentes ou

    contrastes que nos ajudem a explicar semelhanas ou diferenas. No caso da poltica

    comparada, podemos descobrir recorrncias ou singularidades que nos possam explicar

    melhor a dinmica de fenmenos polticos em diferentes pases, produzindo teorias mais

    slidas e confiveis. Foi com a utilizao de argumentos como esses destacando a

    importncia cientfica dos estudos comparados que muitos dos defensores da poltica

    comparada conseguiram consolidar seu campo de estudo. Nesse sentido, a defesa da

    comparao como recurso legtimo para a produo do conhecimento na cincia poltica

    prevalece at hoje, mesmo que sua excessiva institucionalizao gere discusses sobre a

    validade de se considerar a poltica comparada como um ramo autnomo de conhecimento

    ou apenas como uma frutfera metodologia de pesquisa1.

    Professor da Escola de Direito da FGV-Rio. E-mail p/ contato: [email protected] 1 Para esse debate ver Collier (1993) e Lijphart (1971).

  • 12

    Sem entrar no mrito desta discusso, muito menos nos debates sobre as novas

    possibilidades abertas pela introduo de modernas tcnicas estatsticas nessa rea de

    estudo, parece importante destacar como alguns paradigmas tericos influenciaram e tm

    influenciado de forma decisiva a produo acadmica de um vasto universo de estudos

    comparativos. Dessa forma, o objetivo deste trabalho discutir a relao existente entre o

    surgimento desses paradigmas e o contexto poltico e econmico experimentado pelos EUA

    a partir do ps-guerra, a fim de traar uma breve trajetria dos conceitos-chave utilizados

    pela cincia poltica contempornea, tais como democracia e estabilidade poltica.

    Analisando esses paradigmas, esperamos tornar mais claros os aspectos normativos

    implcitos nas teorias que nortearam a produo da poltica comparada na segunda metade

    do sculo XX e sua influncia recente sobre estudos ligados ao desenvolvimento

    econmico de naes perifricas. Para tanto analisaremos alguns dos principais estudos

    realizados nesse mbito, referentes aos pases em desenvolvimento ou do antigo

    Terceiro Mundo. Assim pretendemos dar nfase aos trabalhos ancorados na chamada

    teoria da modernizao e queles dedicados a analisar os processos de transio

    democrtica e de reformas econmicas, em particular, na Amrica Latina.

    Comparao, Valores e Contexto

    Com essa pretenso cabe-nos, antes de tudo, estabelecer as particularidades do uso

    da comparao no contexto das cincias sociais. Nesse domnio, a comparao assume

    caractersticas bem distintas daquelas apresentadas quando utilizada nas cincias ditas

    exatas ou naturais (hard sciences). Se podemos estabelecer formas razoavelmente objetivas

    e universais para mensurar, por exemplo, a velocidade ou a temperatura de dois fenmenos

    naturais a fim de determinar qual o mais rpido ou qual o mais quente, nas cincias

    sociais esta mensurao depender de parmetros arbitrariamente escolhidos e construdos

    pelo pesquisador. Nessa escolha, passam a atuar elementos ligados subjetividade do

    pesquisador ou ao contexto histrico em que est inserido, tornando importante uma

    constante crtica dos prprios critrios utilizados na atividade comparativa. Nas cincias

    sociais, a antropologia e a economia talvez tenham sido os ramos que mais levaram a srio

    a existncia dessa subjetividade. No primeiro caso, a antropologia passa a encarar a prpria

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    subjetividade como um dos principais parmetros da produo do conhecimento, enquanto

    a economia evoluiu na direo de tentar abolir qualquer brecha para a subjetividade por

    meio da adoo de critrios como eficincia e racionalidade instrumental como base para

    seus modelos tericos.

    A despeito desta caracterstica das cincias sociais, no foram poucos os esforos e

    debates para se encontrar formas de validar o conhecimento produzido a partir da

    comparao. Entre os intelectuais que merecem destaque nesse debate encontra-se a figura

    de Max Weber (2003). Seu esforo em delimitar o campo e o mtodo de atuao das

    cincias sociais exemplar na medida em que assume os conceitos que nos servem para

    estabelecer uma comparao no campo das cincias sociais como termos repletos de

    valores contingentes. Valores, esses, fornecidos a partir do contexto poltico e cultural de

    cada poca histrica, que nos ditariam o que e como comparar. Nesse sentido as cincias

    sociais, enquanto cincias morais, ou seja, voltadas para o estudo dos valores e sentidos

    experimentados e vivenciados pelos seres humanos, estariam inelutavelmente ligadas aos

    fenmenos advindos do fluxo histrico.

    Mesmo no processo de elaborao de seus tipos ideais conceitos arquetpicos

    retirados a partir da observao de fenmenos histricos, construdos a fim de servir como

    parmetros para a comparao Weber no ignorava a possvel influncia de valores da

    poca ou de modismos acadmicos, pregando uma ateno redobrada para a elaborao de

    conceitos e critrios a serem utilizados pelas cincias sociais.

    No campo do conhecimento poltico em particular, os critrios desenvolvidos para

    o exerccio comparativo poderiam ser considerados como aqueles que sofrem uma

    influncia considervel do contexto de relaes de fora em que so produzidos. Em grande

    medida, essa afirmao pode ser sustentada pelo fato de que, historicamente, os critrios

    utilizados para comparar os objetos do mundo poltico como, por exemplo, regimes de

    governo, encontram-se em ntima ligao com as tenses e relaes de fora estabelecidas

    entre grupos que apiam este ou aquele regime.

    Richter (2002), por exemplo, nos mostra como durante o sculo XVIII, a

    comparao era utilizada por diferentes intelectuais europeus como recurso retrico para a

    sustentao de posies particulares sobre os regimes polticos sob os quais viviam,

    extrapolando nitidamente interesses exclusivamente tericos:

  • 14

    Comparisons and contrasts became crucial weapons in all major eighteenth

    century disagreements dividing Europeans among themselves, as well as in

    theories of where they stood in relation to the rest of the world. However

    cosmopolitan political theorists might be in theory, they lived within nations

    divided by different estates, parties, factions, classes, interests, churches and

    sects. Comparisons were used by some writers to state and justify those

    arrangements they preferred at home, or else to criticize or condemn them.

    (p.200)

    A comparao, alm de servir como recurso retrico na arena de debates

    domsticos, tambm era utilizada de forma recorrente para a caracterizao e a

    diferenciao das identidades nacionais dentre os diferentes Estados europeus. Eram

    comuns, por exemplo, ao longo do sc. XVII comparaes entre o parlamentarismo ingls

    em vias de consolidao e a monarquia absolutista francesa, sendo considerada tirnica por

    grande parte da classe poltica inglesa. Em outro plano, a comparao, no raramente, era

    utilizada como forma de definio de uma identidade europia apresentada, na maioria dos

    casos, como superior em termos civilizatrios a culturas ou povos estrangeiros3. Nesses

    dois nveis de debate, o destaque dado a diferenas e semelhanas entre povos era uma

    prtica que se mesclava aos debates domsticos travados entre os arautos dos ideais

    iluministas e seus opositores, defensores do ancien rgime:

    This comparative mode of analysis was not and could not be disinterested

    and non-partisan. It became an indispensable weapon in conflicts between

    champions of enlightment and its enemies; in attacks on and defenses of

    established churches; in the sharp disagreements separating defenders of

    absolutism from those opposed to it; in the disputes separating advocates of

    mercantilism and physiocracy from those favoring the market and free trade.

    (Richter 2002, p.200)

    3 Exemplos clssicos desta utilizao seriam a caracterizao da forma de governo desptica ou oriental feita por Montesquieu em sua obra O Esprito das Leis ou o mito do bom selvagem imortalizado por Rousseau.

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    Admitindo a existncia dessa relao entre contexto histrico e os critrios

    utilizados para o exerccio da comparao no campo poltico, podemos considerar esses

    prprios critrios como objetos histricos, passveis de anlise. Um meio de historicizar

    esses critrios consider-los como formulaes lingsticas resultantes de conflitos de

    interesses e disputas circunscritos a determinados contextos histricos. Desta forma a

    anlise dessas tenses pode nos ajudar a compreender melhor a ascenso e delimitao

    semntica desses mesmos critrios (Richter 2002, p.202).

    Se autores como Montesquieu, Hume, Voltaire, Herder, Rousseau e tantos outros

    manejavam referncias e informaes sobre outros povos e naes a fim de elaborar

    categorias comparativas capazes de sustentar suas posies em relao aos regimes

    polticos e ao contexto social nos quais viviam, no absurdo admitir a hiptese de que a

    produo da cincia poltica norte-americana em particular no ramo da poltica

    comparada tambm permeada por posturas prprias ao momento histrico no qual

    produzida. Passemos, ento, a um estudo das condies de estabelecimento institucional da

    cincia poltica norte-americana no ps-guerra.

    A Inveno da Cincia Poltica

    O envolvimento dos EUA na Segunda Guerra Mundial pode ser considerado como

    o episdio que definir a identidade da cincia poltica produzida neste pas nas dcadas

    subsequentes. A despeito de episdios como a Grande Depresso e as polticas promovidas

    pelo New Deal terem promovido uma certa valorizao da atuao de cientistas sociais e

    cientistas polticos em geral, somente a partir da participao desses profissionais nos

    projetos voltados para as atividades de guerra teramos sua entrada definitiva no mundo

    pblico como formadores de opinio.

    A participao de cientistas sociais na formulao das polticas de guerra

    promovidas pelo governo americano sustentava-se em argumentos que defendiam a

    capacidade destes profissionais em preverem o comportamento humano. Dessa forma,

    segundo Terence Ball, na hierarquia do conhecimento cientfico, as cincias sociais no

    ocupariam um lugar de desprezo: Physicists might say how atoms behaved and engineers

    how weapons worked, but social scientists could explain, predict, and, possibly, help to

  • 16

    control the behavior of those who pulled the triggers and dropped the bombs (2002,

    p.209). Com essa misso, cientistas sociais foram convocados para empreender pesquisas

    com temticas variadas tais como estudar o comportamento de soldados, o efeito da

    propaganda de guerra sobre a populao civil ou as polticas de subsdios do governo a

    agricultores americanos.

    Segundo Ball (2002), o engajamento em atividades burocrticas e a necessidade de

    apresentao de resultados concretos teriam feito com que muitos cientistas sociais e, em

    particular, cientistas polticos tomassem contato com uma realidade diferente da

    experimentada, at ento, nas universidades. Demandava-se agora que cientistas sociais

    formulassem teorias capazes de predizer o comportamento humano e formas de melhor

    control-lo. As discusses de carter moral ou filosfico sobre conceitos e formas de

    governo j no eram capazes de oferecer respostas razoveis a essas novas demandas.

    Por isso, com o intuito de lanar bases cientficas para novas pesquisas, no incio

    dos anos 50 a cincia poltica norte-americana tomada de assalto por um movimento

    conhecido como revoluo behaviorista. Seu projeto era tornar o estudo do fenmeno

    poltico mais objetivo, voltando-se para a anlise do comportamento dos atores polticos e

    de sua interao com realidade que os envolve. A discusso tradicional sobre modelos

    institucionais legtimos passaria a ser encarada como tarefa a ser realizada pela filosofia

    poltica. A cincia poltica, dessa forma, deveria antes de qualquer coisa se constituir em

    uma cincia do comportamento humano real.

    A nfase na cientificidade dos estudos sobre o comportamento poltico poderia ser

    vista como um movimento interno da prpria disciplina, onde a mudana de paradigma

    decorreria de limitaes do aparato conceitual anterior, entretanto no podemos

    desconsiderar certos incentivos externos fornecidos pelo contexto scio-poltico dos anos

    50. Como Ball (2002) nos sugere, o esforo institucional da cincia poltica americana em

    se mostrar um conhecimento com utilidade prtica no ocorre num vazio histrico. A esse

    respeito, dois episdios merecem destaque: 1) a crtica de setores da sociedade norte-

    americana s cincias sociais e 2) o contexto de disputa ideolgica experimentado ao longo

    da Guerra Fria.

  • 17

    A Luta por Reconhecimento

    Mesmo conquistando um espao at ento inexistente em projetos governamentais

    norte-americanos, os cientistas sociais ainda no possuam a confiana generalizada de

    polticos e de diversos setores da sociedade. Uma confiana que se mostraria indispensvel

    para a obteno posterior de recursos e financiamentos para a consolidao e expanso de

    pesquisas na rea. Dessa forma, vistos como subversivos ou pedantes, os cientistas sociais

    da poca despertavam a desconfiana de polticos em relao eficcia de seus mtodos e a

    validade dos resultados que encontravam. Alm disso, a idia de controle social derivada da

    defesa da capacidade de previso das cincias sociais despertava em diversos congressistas

    americanos o fantasma de uma sociedade planificada e controlada como a sovitica. Todas

    essas desconfianas eram vistas pelos cientistas sociais como um desafio, estimulando-os a

    elaborarem um discurso capaz de sustentar a neutralidade cientfica e tcnica de seus

    mtodos, assim como a utilidade prtica dos resultados encontrados. Nesse sentido, Ball

    nos resume a lgica do argumento apresentado por cientistas sociais em sua tentativa de

    convencer congressistas americanos sobre a validade cientfica de suas pesquisas:

    The social scientists testifying before congressional committees stressed the

    scientific character of their disciplines. All the sciences, natural and social,

    were said to subscribe to a single method the scientific method of objective

    observation and controlled inquiry. The only differences between the natural

    and social sciences were one of degrees of probability; otherwise they were

    essentially identical (2002, p.212).

    No obstante a nfase no carter cientfico da rea e do apoio de setores militares, as

    cincias sociais demoraram alguns anos para obter uma diviso prpria na National Science

    Foundation instituio governamental de fomento atividade cientfica nos EUA, criada

    em 1950. Somente em 1954, os cientistas sociais passaram a contar com uma diviso

    dedicada exclusivamente a financiar seus projetos4.

    Essa vitria poltica pode ser atribuda menos eficincia do lobby promovido

    insistentemente por cientistas sociais do que ao ambiente proporcionado pela Guerra Fria

  • 18

    que se instala definitivamente a partir da dcada de 50. A percepo cada vez mais

    dominante de que a Guerra Fria was above all a war of ideas and ideologies, of

    psychology and propaganda5 criou o ambiente propcio para que as perspectivas de

    conhecimento apresentadas por cientistas sociais fossem vistas como armas promissoras

    por polticos e militares. Em grande parte essa percepo ganhou fora no mbito

    domstico com o macartismo e, no mbito externo, com a revoluo cubana e o processo de

    descolonizao de pases na frica e na sia. A possibilidade de que pases vizinhos ou

    recm-independentes cassem sob a esfera de influncia sovitica e a atuao do inimigo

    interno eram ameaas que deveriam ser enfrentadas com armas apropriadas. Assim, em

    um cenrio onde a batalha tem por objetivo conquistar coraes e mentes, ser capaz de

    prever o comportamento dos seres humanos configura-se em um recurso preventivo

    indispensvel.

    Diante das condies apresentadas, as condies que proporcionaram a legitimidade

    obtida por cientistas sociais americanos frente a agncias de financiamento governamentais

    e privadas tiveram efeitos diretos sobre sua produo terica posterior. Se no podemos ser

    taxativos e dizer que os financiamentos concedidos por tais agncias passaram a determinar

    diretamente o andamento e resultados das pesquisas que patrocinavam, pelo menos uma

    forte influncia nas temticas e formas de abordagem inegvel. No caso da cincia

    poltica, essa influncia melhor percebida quando observamos as temticas de estudos

    financiadas de forma recorrente nos anos posteriores: o comunismo e suas bases de

    sustentao social, estabilidade poltica ou comportamento eleitoral.

    Alm do direcionamento nas temticas a serem estudadas, a produo posterior da

    cincia poltica norte-americana passou gradativamente a perder seu carter crtico e de

    reforma social. Em parte essa postura se deve nfase na neutralidade cientfica promovida

    pela revoluo behavioralista. Segundo Raymond Seidelman, essa postura significou uma

    ruptura com uma tradio da cincia poltica norte-americana de interveno poltica e de

    crtica social: Behavioral scientists of the 1950s and 1960s might have been the first

    generation of social scientists to consider democratic publics and American institutions as

    mere objects of inquiry rather than as subjects of political change .6

    4 BALL, T. (2002), p.215 5 Ibid, p.210 6 Seidelman (2002), p.317

  • 19

    Outro fator importante capaz de explicar a domesticao do potencial contestador de

    cientistas polticos o crescente envolvimento que estes passaram a ter com projetos

    relacionados elaborao da poltica externa e de defesa norte-americanas. Financiados

    com o intuito de ajudar na batalha ideolgica contra o comunismo, muitos cientistas

    polticos norte-americanos passaram a enxergar que o momento no era favorvel para a

    verbalizao de crticas contra o sistema que os sustentava (Gendzier 1985).

    Contudo, o momento no foi somente de esvaziamento do esprito crtico de boa

    parte da cincia poltica norte-americana. No s as crticas ao establishment e propostas

    reformistas foram abandonadas como diversos estudos passaram a apresentar teoricamente

    as instituies polticas norte-americanas como o pice do desenvolvimento democrtico.

    Ignorando por completo as tenses e contradies experimentadas pela sociedade norte-

    americana, os trabalhos dos cientistas polticos mais renomados dessa gerao passaram a

    eleger seu arranjo institucional domstico como modelo emprico a inspirar formulaes

    tericas ufanistas. A realidade norte-americana vista por esses trabalhos passa a ser

    encarada como o melhor dos mundos possveis. Consequentemente, essa transformao da

    sociedade norte-americana e de suas instituies em modelo terico possibilitou-lhe ocupar

    o posto de referncia normativa para a realizao de anlises comparadas. Em outras

    palavras, quanto mais distante da configurao apresentada pela sociedade norte-americana

    uma outra sociedade se mostrasse, menos moderna ou desenvolvida ela seria.

    Veremos a seguir, como a cincia poltica operou esse processo de transformao da

    realidade em teoria, passando a encarar antigos vcios da vida poltica norte-americana

    como novas virtudes indispensveis para a manuteno da democracia moderna.

    Estabelecendo os Critrios da Comparao

    No campo terico, um dos principais debates travados por cientistas polticos,

    antes mesmo da guerra, dizia respeito definio conceitual da democracia e de quais

    seriam os mecanismos responsveis pelo seu bom funcionamento. No centro desse debate

    destacavam-se duas abordagens: a primeira era representada pelo esforo em tentar

    estabelecer uma definio conceitual de democracia capaz de proporcionar parmetros para

  • 20

    mensurar quo realmente democrtico seria um governo7; a segunda, em relao direta com

    a primeira, dizia respeito delimitao das condies sociais responsveis pela manuteno

    da ordem democrtica. Nessa discusso despontavam as tenses entre correntes liberais,

    afeitas s questes ligadas conteno das prerrogativas do governo sobre os indivduos, e

    tericos preocupados com a baixa representatividade ou engajamento dos cidados na vida

    poltica norte-americana. Esse debate, inspirado diretamente na tradio constitucionalista

    norte-americana e na anlise tocquevilleana sobre a organizao scio-poltica desse pas,

    pecaria, no entanto, como seria acusado posteriormente, por ser um debate moral ou

    idealista despreocupado com a anlise emprica da realidade.

    Em relao primeira temtica, a obra de Joseph Schumpeter, Capitalismo,

    Socialismo e Democracia, pode ser considerada como a principal referncia terica para os

    trabalhos de cientistas polticos no ps-guerra. Neste livro, Schumpeter esfora-se por

    afastar idias que alinhem a superioridade do sistema democrtico com valores ticos ou

    morais. A democracia no deveria ser analisada pelo que as pessoas esperam ou acham

    dela, mas deveria ser tratada pelo que realmente seria: um sistema de formao de

    governos. Um sistema que, segundo Schumpeter, seria definido nos seguintes termos: (...)

    o mtodo democrtico aquele acordo institucional para se chegar a decises polticas em

    que os indivduos adquirem o poder de deciso atravs de uma luta competitiva pelos votos

    da populao.8 Dessa forma, a superioridade da democracia enquanto sistema de governo

    restringir-se-ia ao carter formal de permitir que os governados pudessem escolher seus

    governantes por meio de eleies peridicas. Apesar de seu ntido vis elitista, visto que a

    atividade cvica passa a ser encarada exclusivamente como participao eleitoral, a

    delimitao da democracia como um processo de formao de governos por meio de

    eleies fornecia um referencial simples para sua distino de regimes ditatoriais.

    Essa definio conceitual do regime democrtico, dada a sua alta aplicabilidade

    prtica, passou a alimentar diretamente os estudos de cientistas e tericos polticos sobre o

    comportamento eleitoral, o funcionamento institucional, a organizao partidria e a

    organizao de interesses na sociedade americana. A hiptese principal de muitos desses

    7 No debate norte-americano, a definio corrente de democracia como governo para o povo e pelo povo, imortalizada por Abraham Lincoln, mostrava-se difcil de ser operacionalizada, apesar de seu grande apelo retrico. 8 Schumpeter (1961), p.336

  • 21

    estudos era assumir que a perenidade da democracia norte-americana s poderia ser

    sustentada por meio de uma vida cvica vibrante refletindo o interesse dos cidados pelo

    bom funcionamento das instituies polticas.

    Os resultados de muitos desses estudos, entretanto, apresentavam uma realidade que

    colocava em xeque o entendimento clssico sobre quais seriam as condies necessrias

    para o bom funcionamento das instituies democrticas. Parecendo confirmar as previses

    feitas por Tocqueville sobre o despotismo consentido para o qual a sociedade norte-

    americana tinha srios riscos de se encaminhar as anlises sobre o processo de escolha

    eleitoral dos cidados apresentaram um comportamento poltico marcado pela apatia, falta

    de informao qualificada sobre o mundo pblico e, em casos extremos, pela completa

    irracionalidade da escolha feita por eleitores (Berelson, 1954).

    Esse quadro, para a perplexidade de muitos cientistas polticos, apresentava um

    paradoxo notvel: como uma democracia pode funcionar de maneira satisfatria com um

    nvel to baixo de engajamento poltico? Afinal, se a participao e o engajamento cvicos,

    tradicionalmente considerados como as virtudes motoras do sistema democrtico, estavam

    ausentes, como explicar a boa sade poltica da sociedade americana pela apatia e pela

    completa ignorncia de boa parte dos eleitores sobre o que se passa na esfera pblica? A

    resposta para esse paradoxo, segundo Bernard Berelson e seus colegas, parecia residir em

    uma reformulao da prpria teoria democrtica, a partir do abandono de sua nfase

    excessiva no engajamento poltico dos indivduos:

    That is the paradox. Individual voters today seem unable to satisfy the

    requirements for a democratic system of government outlined by political

    theorists. But the system of democracy does meet certain requirements for a

    going political organization. The individual members may not meet all the

    standards, but the whole nevertheless survives and grows. This suggests that

    where the classic theory is defective is in its concentration on the individual

    citizen. What are undervalued are certain collective properties that reside in the

    electorate as a whole and in the political and social system in which it

    functions.9

    9 Berelson et al. (1954), p.312

  • 22

    Segundo essa interpretao, o sucesso da democracia norte-americana no seria

    compreendido pelas qualidades individuais de seus cidados, mas sim em caractersticas

    mais gerais de seu sistema poltico, no qual o vcio da apatia torna-se uma virtude til ao

    bom funcionamento das instituies. Tendo como referncia o modelo sistmico

    desenvolvido por David Easton (1953), a falta de interesse dos cidados pela esfera pblica

    seria benfica, pois diminuiriam as chances de haver um excesso de demandas (inputs) que

    poderia vir a sobrecarregar o sistema poltico (as instituies democrticas) em sua

    capacidade de atend-las satisfatoriamente (outputs). A sobrecarga do sistema poltico

    representaria uma instabilidade que, a longo prazo, poderia gerar descrena crescente na

    capacidade da prpria democracia em responder eficazmente a demandas da populao.

    Segundo essa lgica, quanto mais continuado fosse o ativismo poltico dos cidados, maior

    seria o risco de surgirem conflitos e tenses entre diferentes grupos e interesses,

    prejudicando em termo que seria cunhado mais tarde a governabilidade da elite

    poltica eleita.

    Alm da ausncia de interesse no jogo eleitoral, outras caractersticas da sociedade

    norte-americana passaram a ser consideradas como benficas ao funcionamento das

    instituies democrticas, tais como: a ausncia de clivagens polticas profundas

    (religiosas, tnicas, ideolgicas ou de classe), a diversidade da vida associativa capaz de

    garantir uma representao ampla de interesses individuais e a existncia de uma trajetria

    histrica que soube superar as contradies das sociedades industriais por meio da adoo

    de um sistema meritocrtico. Segundo essa perspectiva, o baixo interesse na poltica formal

    seria compensada pelo dinamismo da vida associativa americana que, de tempos em

    tempos, mobilizaria interesses de grupos descontentes a fim de pressionar decises das

    diferentes esferas do governo. O sistema poltico norte-americano no seria sustentado pela

    fora mobilizadora de seus partidos, mas sim pela capacidade de lobby da sociedade civil.

    Por derivao lgica, esses atributos da sociedade norte-americana so

    transformados em condies sine qua non para o bom funcionamento de qualquer

    sociedade que se considere democrtica10. No causa espanto que a partir dessa teoria

    10 Um exemplo dessa lgica so as anlises pessimistas que muitos cientistas polticos norte-americanos faziam nas dcadas de 50 e 60 sobre a viabilidade da democracia em pases europeus. O grande peso de partidos trabalhistas e socialistas na vida poltica europia era entendido como um reflexo de clivagens graves na estrutura social. A instabilidade das instituies democrticas nesses pases, portanto, seria um resultado altamente previsvel.

  • 23

    consagrada posteriormente como pluralista alguns cientistas polticos renomados, como

    Seymour Lipset, pudessem afirmar que a sociedade norte-americana seria o exemplo cabal

    de boa sociedade em funcionamento11.

    O modelo de sociedade perfeita que despontava a partir dessas formulaes tericas

    poderia ser considerado, assim, como o primeiro resultado da aliana entre cientistas

    polticos, policymakers e militares. Uma aliana cujo objetivo parecia bem claro: criar uma

    fundamentao terica capaz de sustentar um consenso em torno da superioridade do

    modelo poltico norte-americano no contexto da Guerra Fria.12

    Expandindo os Horizontes da Anlise

    Os anos que se seguiram ao fim da Segunda Guerra Mundial marcaram o incio de

    um ativismo sem precedentes na poltica externa norte-americana. Diante de um contexto

    em que a Europa estava destruda e com a declarao de independncia generalizada de

    suas antigas possesses coloniais na frica e sia, uma srie de acordos, como o Plano

    Marshall e outros planos de ajuda econmica, militar e tecnolgica, so realizados com

    pases localizados em reas consideradas estratgicas para a geopoltica norte-americana.

    Por trs dessa ajuda sistemtica aos povos do mundo, havia a clara percepo de que os

    Estados Unidos deveriam ter um papel preponderante na conteno do avano sovitico.

    Sustentando esse planejamento, havia a convico de que os EUA no deveriam permitir

    que a conjuntura de instabilidade social e econmica experimentada por esses pases

    ocasionasse a ascenso ao poder de governos simpticos ou alinhados diretamente aos

    interesses soviticos. Para os principais formuladores da poltica externa norte-americana,

    esse objetivo era claro: In their work in these countries (...) should be our objective to use

    our assistance programs to shape and guide social and economic developments in these

    countries in ways which will help us to attain our political goals.14

    Em contraste com o pragmatismo de militares e policymakers, no plano terico,

    cientistas sociais se deparavam com tarefas complexas. Uma de suas principais misses era

    formular teorias capazes de prever os rumos do processo de modernizao enfrentado por

    11 Ball (2002), p.219 12 Gendzier (1985), p.55 14 Gendzier (1985), p.27

  • 24

    pases perifricos. A modernizao, no campo terico, era vista predominantemente como

    um meta-processo social englobando fenmenos como urbanizao, industrializao,

    desenvolvimento dos meios de comunicao, aumento da participao popular na vida

    poltica e, consequentemente, a criao de instituies democrticas. Como resultado bem-

    sucedido desse processo, deveramos esperar por sociedades nos moldes estabelecidos pela

    teoria pluralista com sua viso particular sobre o funcionamento da sociedade norte-

    americana.

    Essa interpretao dominante sobre o fenmeno da modernizao encontra-se

    sintetizada na teoria de estgios de desenvolvimento, idealizada pelo economista W. W.

    Rostow. Segundo Rostow (1966), a passagem de uma sociedade tradicional para a

    modernidade era marcada por estgios sucessivos e graduais de desenvolvimento social,

    econmico e poltico. Na dinmica por ele imaginada, processos scio-econmicos de

    urbanizao e industrializao levariam a uma crescente organizao de camadas populares

    reivindicando melhores condies de vida. O desenvolvimento scio-econmico criaria as

    condies de superao do tradicionalismo e da rgida hierarquia social presente em pases

    perifricos com economias agrrias, favorecendo a implantao de instituies

    democrticas como forma de organizao poltica.

    As hipteses presentes nessa teoria sobre a modernizao rapidamente difundida

    em diferentes ramos das cincias sociais foram apropriadas por cientistas polticos em

    seus esforos para entender e poder controlar melhor os efeitos de processos como

    urbanizao e industrializao nos pases perifricos. Seguindo os preceitos estabelecidos

    pela revoluo behaviorista, os cientistas polticos tinham diante de si a tarefa de entender o

    comportamento poltico praticado por habitantes desses pases e identificar aqueles mais

    favorveis implantao de instituies democrticas. Nesse sentido, dentre os vrios

    estilos de estudos desenvolvidos no campo da poltica comparada podemos destacar duas

    formas predominantes de abordagem do problema: uma de carter psicolgica e

    funcionalista, e outra de carter institucionalista. Apesar de algumas diferenas no enfoque,

    como veremos a seguir ambas, se apiam sobre a referncia comum das teorias elitistas-

    pluralistas em relao democracia e aos resultados encontrados a partir da interpretao

    do caso norte-americano.

  • 25

    A primeira abordagem, representada pelos trabalhos de Gabriel Almond e seus

    colaboradores, pode ser encarada como um apanhado terico que mescla premissas da

    teoria sobre a modernizao de Rostow, da teoria sistmica de Easton e de estudos sobre

    comportamento eleitoral. Segundo essa abordagem, a modernizao encarada como um

    processo de crescente complexidade que se d paulatinamente ao longo da histria das

    sociedades. O gradualismo dessas transformaes, como apresentadas pelo caso norte-

    americano e ingls, amenizaria seus impactos disruptivos sobre a estrutura social. Em um

    ritmo acelerado, no entanto, a modernizao poderia afetar negativamente a capacidade do

    sistema poltico dessas sociedades em processar os conflitos de interesses, ao mesmo tempo

    em que deveria integrar de modo satisfatrio novos grupos emergentes da diversificao da

    ordem social. A velocidade do processo de modernizao, dessa forma, seria contrria a

    uma expanso e consolidao sucessiva de direitos civis, polticos e sociais, consagrada por

    T.H. Marshall (1950) em sua descrio evolutiva sobre a construo da cidadania moderna.

    Em The Politics of the Developing Areas, Almond apresenta sua definio de

    sistema poltico como sendo that system of interactions to be found in all independent

    societies wich performs the functions of integration and adaptation (...) by means of the

    employement, or threat of employment, of more or less, legitimate physical compulsion.

    The political system is the legitimate, order maintaining or transforming system in the

    society.14 Essa definio genrica permitiria cincia poltica estabelecer uma taxonomia

    neutra de funcionamento dos diferentes sistemas polticos existentes no mundo, no

    importando se fossem ocidentais ou no, democracias capitalistas ou ditaduras comunistas.

    Resgatando a concepo weberiana sobre o Estado moderno, o sistema poltico seria

    responsvel pela coordenao das interaes sociais valendo-se do uso monopolstico de

    recursos de coero fsica.

    Segundo Almond, o sistema poltico saudvel seria aquele que conseguiria

    processar os fenmenos de complexificao social, integrando os interesses dos grupos

    emergentes prpria dinmica do sistema, por meio da socializao poltica de suas

    lideranas (elites). Rupturas, representadas por episdios revolucionrios, seriam

    consideradas como sinais da fragilidade do sistema poltico pr-existente. Um exemplo

    bem-sucedido desse processo, administrado de maneira lenta, gradual e controlada poderia

    14 Almond e Coleman (1960), p.7

  • 26

    ser percebido facilmente em pases como EUA e Inglaterra. A estabilidade e o

    desenvolvimento alcanados historicamente por esses pases seriam demonstraes de

    como sistemas polticos podem, no longo prazo, administrar as presses exercidas pelo

    processo de modernizao de forma a favorecer a consolidao da democracia.

    Na demonstrao do sucesso desse processo, fica claro o carter behaviorista deste

    trabalho. Segundo Almond, o bom funcionamento de um sistema poltico poderia ser

    apreendido como reflexo das atitudes e valores que os indivduos possuem em relao a ele.

    Dessa forma, o equilbrio positivo alcanado pelos sistemas polticos de pases anglo-

    saxes poderia ser identificado por meio de um conjunto de atitudes de seus cidados em

    relao a seus sistemas polticos, constituindo aquilo que Almond chamaria posteriormente

    de cultura cvica.

    Em seu trabalho posterior The Civic Culture (1965), Almond apresenta um estudo

    comparado entre cinco pases considerados democrticos, tentando delimitar quais seriam

    as caractersticas de uma cultura cvica compatvel com o funcionamento pleno de

    instituies democrticas. As culturas cvicas mais condizentes seriam aquelas apresentadas

    por EUA e Inglaterra, pois suas caractersticas sobrepostas de passividade e participao,

    adquiridas ao longo da histria, seriam as mais indicadas para manter o funcionamento

    estvel do sistema democrtico por meio da atuao das elites eleitas. A cultura cvica

    desses pases seria marcada pelo mito da participao, cuja funo seria a de incutir nos

    indivduos a imagem de que poderiam participar do processo poltico no momento em que

    lhes fosse mais conveniente: a cultura cvica democrtica seria, ento, um conjunto de

    atitudes potenciais que poderiam vir a ser empreendidas pelos cidados. A utilidade

    funcional dessa atitude aptica, obviamente, a de no sobrecarregar o sistema poltico

    com um excesso de ativismo e demandas por parte dos cidados.

    Os pases em vias de modernizao, sobretudo os recm-independentes,

    enfrentariam, por sua vez, um excesso de presses sobre seus sistemas polticos. A

    modernizao, com seu conflito de interesses, e a necessidade de construir uma identidade

    nacional colocar-se-iam como srios obstculos para lidar de forma gradual e controlada

    com as demandas e os novos atores oriundos desses fenmenos. A estabilidade do sistema

    poltico nesses pases estaria, portanto, ameaada pela velocidade e sobreposio de

    transformaes e suas conseqncias:

  • 27

    The problem in the new nations of the world is that such gradualness is not

    possible. (...) Tremendous problems of social change must be faced all at once.

    And what may be most crucial: the very acts of creating national boundaries

    and national identity must go on at the same time. A slow political development

    may foster a civic culture, but what the new nations of the world lack is the time

    for this gradual development.15

    O resultado dessa falta de tempo, inevitavelmente, poderia fazer com que pases

    menos desenvolvidos optassem por solues autoritrias e, no pior dos casos, optassem por

    modelos socialistas como forma de resolver as instabilidades experimentadas por seus

    sistemas polticos. Seguindo uma lgica funcionalista, essas opes seriam feitas, pois o

    prprio sistema poltico desses pases, guiado por seu instinto de sobrevivncia e

    preservao, optaria por bloquear o acesso de novos atores com suas demandas

    inexeqveis. O processo de modernizao, sob esse prisma, no se mostrava to

    compatvel assim com a consolidao da democracia no curto e mdio prazo em pases

    perifricos, contrariando as premissas da teoria de Rostow.

    A tenso existente entre modernizao e democracia, apresentada por essa

    abordagem funcionalista, passou a ser enfatizada tambm por anlises posteriores de cunho

    institucionalista. Corroborando o cenrio de incerteza apresentado pela abordagem

    funcionalista para pases perifricos, os institucionalistas passam a identificar o processo de

    modernizao como um fenmeno que, longe de criar condies para o estabelecimento de

    instituies democrticas, traz ameaas graves para a prpria manuteno do sistema

    poltico, podendo levar a srios retrocessos institucionais ou ao caos social. Para tanto, a

    cincia poltica deveria isolar a anlise das instituies polticas de outros efeitos

    produzidos pela modernizao.

    Nas palavras de um dos principais representantes dessa abordagem, Samuel P.

    Huntington, seria necessrio

    distinguish political development from modernization and to identify political

    development with institutionalization of political orgnizations and procedures.

    15 Almond e Verba (1965), p.369-370.

  • 28

    Rapid increases in mobilization and participation, the principal political aspects

    of modernization, undermine political institutions. Rapid modernization, in

    brief, produces not political development, but political decay.16

    O ponto de partida de Huntington criticar os estudos comparativos realizados

    anteriormente por seu excesso de otimismo e preocupaes interdisciplinares. Segundo o

    autor, o apego ao pressuposto de que a modernizao seria um processo intrinsecamente

    positivo para o desenvolvimento poltico das naes do Terceiro Mundo, teria feito com

    que suas anlises ignorassem ou minimizassem a instabilidade poltica produzida por

    golpes de Estado, revoltas e levantes populares, conflitos tnicos e guerras civis que se

    propagavam ao redor do mundo. A idia de que esses pases estariam sofrendo, ao invs de

    desenvolvimento, um retrocesso poltico, dessa forma, no poderia ser uma realidade

    ignorada pela teoria.

    A despeito dessa divergncia, as premissas tericas da abordagem institucionalista

    no se diferenciam tanto das que fundamentam a abordagem funcionalista. Mesmo com sua

    nfase na organizao e articulao das instituies polticas, Huntington continua a se

    valer de termos semelhantes aos utilizados pela abordagem funcionalista. Pares de

    oposies como simplicidade-complexidade, adaptao/rigidez, autonomia/subordinao,

    coerncia/fragmentao so reaproveitados de teorias funcionalistas e utilizados em sua

    anlise sobre instituies. Alm disso, Huntington opera segundo a mesma lgica sistmica

    de Easton, valendo-se da premissa de que a mobilizao social promovida pela

    modernizao aumenta as demandas (inputs) sobre as instituies polticas,

    impossibilitando que respondam eficazmente (outputs), produzindo, portanto, uma crise de

    governabilidade.

    O que aparentemente inovador na abordagem institucionalista sua radicalizao

    do carter elitista e conservador presente na abordagem funcionalista: qualquer forma de

    mobilizao social, a despeito de seu carter legtimo ou no, passa a ser vista como

    ameaa potencial ordem institucional vigente. Nesse sentido, esta abordagem no mostra

    receios em prescrever uma agenda de aes governamentais cujo objetivo seria controlar os

    efeitos nocivos do processo de modernizao sobre a ordem institucional. Ao que parece,

    16 Huntington (1965), p.386)

  • 29

    seguindo essa lgica, diante de uma modernidade que traz inexoravelmente consigo

    instabilidade aos sistemas polticos, restaria aos cientistas polticos estabelecer uma agenda

    capaz de preservar as instituies polticas de pases perifricos.

    Com esse intuito, Huntington apresenta duas linhas de ao conjugadas para

    garantir um desenvolvimento institucional slido. A primeira gama de aes seria composta

    por medidas capazes de diminuir a mobilizao social e a organizao extensiva de

    interesses contrrios ao sistema. Esse objetivo poderia ser alcanado por meio da adoo de

    trs estratgias distintas: 1) o aumento da complexidade da estrutura social, gerando uma

    diversidade de interesses que impedisse a concentrao e fortalecimento de posies

    radicalmente contrrias ao governo; 2) a limitao ou reduo dos meios-de-comunicao

    de uma sociedade, diminuindo a possibilidade de disseminao de opinies que incitem o

    descontentamento dos cidados; ou 3) a diminuio da competio entre segmentos da elite

    poltica por meio da cooptao e domesticao de seus interesses. Dessa forma, a

    possibilidade de uma crise de governabilidade gerada por excesso de demandas seria

    minimizada.

    A segunda linha de ao seria o processo de criao institucional. Em paralelo a

    esses modos de controle social deveria ser empreendida a construo de um aparato

    institucional capaz de, a longo prazo, garantir a limitao do poder das diferentes elites e

    uma competio poltica estvel. A liberao da competio em larga escala s poderia

    ocorrer num momento posterior construo de instituies fortes sobretudo em termos

    coercitivos capazes de responder eficazmente s presses e demandas emergentes.

    Por motivos bvios, para o sucesso desse empreendimento, Huntington prescreve

    medidas de carter extremamente autoritrio e repressor. Se os pases do Terceiro Mundo

    no possuem tempo para garantir o surgimento de uma cultura cvica democrtica, a cincia

    poltica, ao menos, pode fornecer os instrumentos maquiavlicos para que no caiam em

    uma completa anarquia social. Dessa forma, para os pases perifricos o ideal da

    democracia s poderia ser alcanado no longo prazo, aps inevitveis momentos de

    autoritarismo poltico.

    Em relao poltica externa norte-americana, Huntington apresenta de forma clara

    como sua teoria deveria ser adotada por policy makers para evitar que pases instveis

    institucionalmente cassem nas mos de foras alinhadas aos interesses soviticos.

  • 30

    Respeitando sua premissa de fortalecimento e estabilizao da ordem poltica, a maior

    preocupao norte-americana deveria ser em apoiar grupos capazes de centralizar a

    autoridade, proporcionado a preservao das instituies existentes:

    American policy should be directed to the creation within modernizing

    countries of at least one strong non-Communist political party. If such a party

    already exists and is in a dominant position, support of that party should be the

    keystone of policy. Where political life is fragmented and many small parties

    exist, American backing should go to the strongest of the parties whose goals

    are compatible with ours.(...) Where no parties exist and the government (wheter

    traditional, military, or charismatic) is reasonaly cooperative with the U.S.,

    american military, economic, and technical assistance should be conditioned

    upon the governments making efforts to develop a strong supporting party

    organization.17

    Essa declarao assertiva pode ser encarada apenas como uma radicalizao

    pessimista de uma possibilidade j apontada pela abordagem sistmica. A instabilidade

    poltica inerente ao processo de modernizao deveria, portanto, ser enfrentada e controlada

    da melhor maneira possvel. A validade dessa afirmao se daria, a partir do momento em

    que, apesar de veredictos um pouco diferentes, os princpios heursticos que movem essas

    abordagens se mostram os mesmos. Esses princpios comuns, segundo Mark Kesselman,

    seriam melhor percebidos se vislumbrssemos que(...) political development and order

    refer to a particular vision of the nation-state highly organized, centralized, stratified, and

    controlled (penetrated) by large instititutions (both public and private).18 Na medida em

    que sociedades perifricas no seriam agraciadas com o mito da participao presente em

    pases democrticos, nem com instituies polticas e associaes civis capazes de produzir

    esse mito, o caminho mais propcio parecia ser a adoo de uma trajetria inversa. A

    construo da autoridade poltica deveria preceder a organizao da sociedade.

    Voltamos, portanto, s nossas origens: ordem, estabilidade, integrao, autoridade

    institucional seriam, assim, caractersticas derivadas de uma viso que teorias pluralistas e

    sistmicas teriam do processo de modernizao e construo institucional experimentada

    17 Huntington (1965), p.429

  • 31

    pelos EUA. Elementos que, por sua vez, encontrar-se-iam ausentes ou de maneira frgil na

    maioria das sociedades perifricas. A trajetria da boa sociedade norte-americana

    mostrava-se paradoxalmente um experimento difcil de ser replicado.

    A transposio dessa concepo de mundo para anlises comparadas, naturalmente,

    passou a encarar qualquer possibilidade de distrbio na ordem institucional e social como

    uma espcie de patologia ou mal, ignorando-se a legitimidade daqueles que ousavam

    perturbar a paz. O que temos, ento, so teorias que pregam abertamente a manuteno da

    ordem a qualquer preo, mesmo que essa ordem tenha que ser mantida a fim de preservar

    no governo elites mais preocupadas com seu prprio bem-estar do que com o de seus

    governados.

    Dizer que essas teorias guiaram de maneira decisiva a poltica externa norte-

    americana talvez no seja exagero. Teorias conspiratrias parte, os diversos casos de

    ditaduras e golpes promovidos ao redor do mundo com o auxlio direto ou respaldo dos

    EUA so inegveis. Em relao a esse aspecto, os cientistas polticos parecem ter sido bem-

    sucedidos em sua misso de construir um aparato terico capaz de guiar e justificar as

    aes do governo norte-americano em seu esforo para ganhar a guerra ideolgica contra o

    comunismo. Sua idealizao da realidade americana se mostra mais claramente se notarmos

    a ausncia de qualquer meno, no trabalho desses autores, s lutas, muitas vezes violentas,

    pelos direitos civis empreendidas por minorias negras ou a casos de corrupo oriundos da

    oligopolizao da vida poltica norte-americana e ao predomnio dos interesses de grandes

    corporaes na formulao da agenda pblica. As discriminaes scio-econmicas e

    polticas sofridas por minorias tnicas, nesse momento, no pareciam abalar a confiana de

    que o modelo norte-americano seria a melhor expresso dos ideais democrticos em uma

    sociedade moderna.

    Em defesa desta corrente da cincia poltica norte-americana, o que poderamos

    dizer que sua preocupao no seria a de criar justificativas discursivas ou ideolgicas

    para as aes de seu governo durante a Guerra Fria, mas apenas de tentar encontrar

    respostas cientficas para que pases do terceiro mundo pudessem garantir a rota mais

    segura para seu desenvolvimento poltico. Infelizmente, sobre esse aspecto, os custos

    humanos e morais mostraram-se demasiadamente elevados.

    18 Kesselman (1973), p.154

  • 32

    Algumas Vozes Crticas

    Vista como um todo, a academia norte-americana no aderiu integralmente s

    premissas do mainstream terico do ps-guerra. Um exemplo de questionamento ao

    otimismo da teoria pluralista e excessiva preocupao com a questo da estabilidade do

    sistema poltico podem ser encontrados, respectivamente, nos trabalhos de E. E.

    Schattschneider e Barrington Moore.

    Schattschneider, em The Semisovereign People (1975 [1960]), procura demonstrar

    como grupos de interesse e suas causas ganham relevncia na arena poltica institucional a

    partir de duas variveis: 1) a capacidade de mobilizar diferentes segmentos da sociedade e

    2) a capacidade de mobilizar o sistema partidrio. O principal problema da teoria pluralista,

    segundo o autor, seria acreditar numa distribuio homognea dessas variveis entre os

    grupos de presso, tendo estes igual capacidade de organizao para pressionar o governo e

    de penetrao nas estruturas partidrias. A realidade da sociedade norte-americana,

    entretanto, seria bem diversa por uma srie de fatores: 1) dados empricos mostrariam que

    os grupos mais bem organizados esto fortemente correlacionados com os substratos mais

    ricos e melhor educados da populao; 2) o sistema bipartidrio americano seria a principal

    forma de coletivizao de conflitos, mas atuaria de maneira altamente seletiva na escolha

    de quais pleitos seriam mais apropriados para adentrar o debate pblico da poltica

    nacional.

    A partir desses dois dados temos um quadro no qual grupos com maior poder scio-

    econmico possuem melhor forma de organizao e maior capacidade de influncia sobre

    os partidos, na medida em que podem contribuir de maneira decisiva para o financiamento

    dos elevados custos da poltica partidria. Prevaleceria, na verdade, uma tendncia no

    vislumbrada de privatizao dos conflitos polticos, marcada por acordos entre partidos e

    organizaes com maiores recursos ou poder de barganha. Dessa forma, grupos de presso

    com posies privilegiadas buscariam resolver suas questes em salas fechadas com

  • 33

    lideranas partidrias a socializar seus interesses na arena pblica como forma de

    pressionar o governo. O que temos, ento, o predomnio de lobbies bem organizados

    comandando a pauta governamental em setores especficos, a despeito do melhor interesse

    pblico a ser obtido pelo debate aberto.

    O resultado prtico desse arranjo institucional, segundo Schattschneider, seria a

    percepo de que o jogo democrtico visa somente aos objetivos de parte da sociedade

    em particular aquela com maiores recursos econmicos. Os baixos ndices de participao

    eleitoral e conhecimento poltico, ao contrrio, seriam indcios de que boa parte da

    populao americana no se identificaria com a oferta poltica disponvel no cenrio

    partidrio. A no-participao, contrariando o fundamento do mito da participao, seria,

    na verdade, uma forma de protesto contra essa situao de baixa representatividade e oferta

    escassa apresentada pelo sistema poltico. Nesse sentido, a denncia de Schattschneider

    busca mostrar que os conflitos experimentados por boa parte da populao no tm

    encontrado voz na competio eleitoral, tendo suas pretenses abortadas previamente por

    interesses que j se encontram fortemente enraizados no jogo poltico democrtico.

    Essa crtica seria corroborada por estudos posteriores que mostram a alta correlao

    entre segmentos menos favorecidos da estrutura scio-econmica (com menor renda e

    baixos graus de escolaridade) e baixa atividade associativa e poltica. A partir desses dados

    j disponveis, por exemplo, na poca em que The Civic Culture escrito Carole

    Pateman (1981) critica o fundamento plutocrtico/aristocrtico existente de forma implcita

    na valorizao da apatia cvica pela teoria pluralista. Ao defenderem a funcionalidade de

    um nmero considervel de cidados estarem fora do sistema poltico formal, os tericos

    pluralistas engessariam a democracia em um perptuo jogo eleitoral cujo resultado j

    estaria pr-estabelecido pelos interesses de elites econmicas e polticas.

    A crtica de Moore, em The Social Origins of Dictatorship and Democracy (1993

    [1966]), ressalta a importncia da articulao dos interesses materiais de elites econmicas

    e polticas na implementao de modos capitalistas de produo. A partir dessa tica, o

    processo de modernizao visto fundamentalmente como a introduo de formas

    capitalistas de produo em uma sociedade. Um processo que envolve dinmicas de

    alianas e conflitos entre interesses de elites agrrias tradicionais, burguesias comerciais e

    industriais, trabalhadores urbanos e camponeses. Nessa perspectiva so enfatizados os

  • 34

    recursos de poder efetivos existentes por cada um desses segmentos, fazendo com que, por

    exemplo, o sucesso do sistema parlamentar ingls seja explicado pela aliana fortuita entre

    setores comerciais da nobreza agrria e a burguesia comercial e financeira. A formao

    dessa aliana, alimentada por desavenas religiosas e interesses econmicos contrariados,

    teria produzido conflitos bem-sucedidos pela limitao do poder real, capazes de garantir,

    de modo colateral, o respeito de direitos individuais, sobretudo de propriedade, e um

    Parlamento forte capaz de representar os interesses vitoriosos. Mas o fato a ser destacado

    por Moore a violncia com que demandas redistributivas exteriorizadas por camponeses

    e artesos so fortemente reprimida ao longo desse processo. Da mesma forma, o sucesso

    da democracia norte-americana residiria na capacidade de elites comerciais e industriais

    conseguirem promover um arranjo institucional no qual a defesa dos seus interesses

    produziu efeitos colaterais positivos para o restante da populao19.

    Se Inglaterra e EUA, a despeito de seus conflitos e movimentos repressivos, foram

    felizes na construo de uma trajetria capaz de combinar um processo de modernizao

    capitalista consolidao gradativa de instituies democrticas graas fora de suas

    elites burguesas, o problema residiria em pases nos quais essas foras fossem fracas ou

    incipientes. Pases com economias industrializadas, mas marcados por governos de cunho

    fascista ou autoritrio, como Alemanha e Japo, seriam exemplos nos quais a fraqueza da

    burguesia comercial e industrial no cenrio poltico forou a realizao de uma aliana com

    elites agrrias conservadoras. A partir dessa aliana, a idia de um regime democrtico

    representaria uma ameaa manuteno do status quo. Regimes comunistas, por sua vez,

    seriam marcados pela existncia de um grande contingente de camponeses a ser mobilizado

    por hbeis vanguardas revolucionrias, inspiradas em ideais socialistas, para a

    implementao de um processo de modernizao em larga escala. Entretanto, apesar de seu

    discurso abertamente contrrio explorao capitalista e a favor da igualdade entre os

    indivduos, esses modelos teriam se caracterizado por um autoritarismo excessivo

    decorrente da centralizao do poder nas mos de elites burocrticas.

    19 Moore ressalta, para o caso norte-americano, o papel preponderante da existncia de uma farta extenso de terras frteis a serem colonizadas. A existncia dessas terras foi fundamental para a criao nos EUA de uma classe de pequenos proprietrios rurais zelosa pela proteo de direitos individuais, em detrimento de uma classe camponesa nos moldes tradicionais. Alm disso, o mito da colonizao seria funcional para que as presses sociais existentes nos grandes centros urbanos fossem mitigadas.

  • 35

    Essa anlise, apesar de mostrar mais claramente a dinmica de interesses por trs de

    processos de modernizao, no apresentaria alternativas muito promissoras para pases

    perifricos. Em certa medida, o trabalho de Moore serviu para corroborar a tese de que a

    democracia liberal s pode ser bem-sucedida mediante a existncia de um consenso entre

    elites polticas e econmicas que satisfizessem as demandas populares de modo gradual

    dentro do marco capitalista. Moore, indiretamente, mostrava a mesma compatibilidade

    entre fascismo e capitalismo defendida por Huntington.

    Posies dissonantes como a de Schattschneider e Moore, no entanto, no

    encontravam muita receptividade acadmica ou efetividade poltica, tornando, no

    raramente, seus porta-vozes em prias que s receberiam alguma ateno dcadas mais

    tarde20. A descoberta de que a democracia pluralista seria o modelo a inspirar o mundo

    contra a ameaa socialista e que os cientistas polticos norte-americanos dispunham de um

    caminho para os pases perifricos atingirem esse objetivo no abria muito espao para

    auto-crticas.

    Dessa forma, a despeito das crticas, a hegemonia de certas teorias responsveis por

    explicar o bom funcionamento das instituies americanas permitiu que a cincia poltica

    obtivesse um conjunto de premissas a serem utilizadas como referncia para estudos

    comparativos. Estavam lanadas as bases para se entender quais as condies necessrias

    para o desenvolvimento de um regime democrtico e capitalista nos pases do Terceiro

    Mundo e a consequente conteno da ameaa sovitica.

    Perpetuando Paradigmas

    As generalizaes feitas pelas teorias da modernizao desenvolvidas por cientistas

    polticos norte-americanos passaram a receber duras crticas a partir dos anos 70, em

    relao tanto a sua consistncia interna e histrica (Tilly, 1975) quanto a sua subservincia

    aos interesses geo-polticos americanos (Kesselman, 1973). Seus princpios, entretanto,

    ainda continuavam claramente a predominar no senso comum ou no mundo acadmico.

    Afinal, o processo de institucionalizao da prpria cincia poltica se deu na contnua

    20 Para referncias a outros autores crticos teoria pluralista ver Gendzier (1985), p.113-115.

  • 36

    formao de profissionais, no mbito domstico e internacional, que operassem com base

    nesses paradigmas, reformulando-os em novos contextos histricos.

    Um exemplo dessa continuidade so os estudos desenvolvidos em funo dos

    processos de transio democrtica que ocorrem a partir da dcada de 80, com maior fora

    na Amrica Latina. Fiis s preocupaes tericas do campo, a principal preocupao

    desses trabalhos analisar as formas com que governos autoritrios permitem a instalao

    de novos regimes democrticos e entender suas possibilidades de perpetuao. Os

    principais trabalhos dessa literatura apiam-se em duas premissas bsicas: 1) a democracia

    como sistema eleitoral competitivo; e 2) a democracia vista como um jogo reiterado entre

    elites polticas. Esses dois pressupostos, por sua vez, relacionam-se diretamente

    preocupao com a questo da manuteno da estabilidade do sistema poltico em um novo

    contexto de hegemonia poltica e econmica dos EUA aps o fim da Guerra Fria. Com o

    colapso do comunismo sovitico, a maior ameaa a essas democracias emergentes passa a

    ser sua prpria capacidade de sobrevivncia em um sistema capitalista globalizado.

    Em relao ao primeiro ponto, apesar da ntida influncia da obra de Schumpeter,

    esses estudos parecem se apoiar na concepo desenvolvida posteriormente por Robert

    Dahl (1971). Considerado um dos principais tericos revisionistas da democracia, Dahl

    esfora-se em desenvolver um modelo no qual a democracia, chamada agora de poliarquia,

    encarada como um processo crescente de institucionalizao de regras de competio

    poltica associado expanso da participao eleitoral. A partir dessa concepo, a

    preocupao com a estabilidade poltica em transies democrticas se traduziria nos

    seguintes termos: como estabelecer um arranjo institucional que assegure a troca peridica

    de elites polticas simultaneamente a um processo gradual de universalizao de direitos

    civis e polticos?

    A partir dessa pergunta temos a atuao do segundo foco de anlise, baseado na

    percepo da democracia como um jogo de elites. A democracia, nessa perspectiva, s seria

    possvel caso houvesse uma ruptura na cpula do governo autoritrio, fazendo com que

    dissidentes buscassem apoio em outros segmentos da sociedade, sejam eles empresariais

    ou, de forma restrita, populares. No caso desse ltimo, lideranas de movimentos populares

    ou sindicais s poderiam ter uma participao significativa na transio caso agissem de

    modo estratgico arrefecendo suas demandas em prol de um apoio amplo democracia

  • 37

    emergente. Adotando essa postura, movimentos populares e sindicais integrar-se-iam ao

    sistema poltico por meio da socializao de suas lideranas, procurando diminuir a

    intensidade de suas reivindicaes.

    Adam Przeworski (1986) apresenta de maneira desencantada o resultado dessa

    combinao de premissas tericas: a instalao de um arranjo institucional democrtico

    estvel s seria possvel em sociedades onde faces de governos autoritrios pudessem se

    associar a setores moderados da sociedade, tanto empresariais quanto sindicais. Esse

    contexto criaria expectativas de um processo de liberalizao gradual onde os interesses do

    governo autoritrio no seriam contrariados at a sua sada da cena poltica. Como

    resultado deveramos ter um acordo poltico que envolvesse an almost complete docility

    and patience on the part of the organized workers (...) for a democratic transformation to

    succeed.9 A perseguio intransigente de interesses associados a classes trabalhadoras

    acarretaria em contrariar interesses de elites empresariais, fazendo com que essas retirassem

    seu apoio ao processo de institucionalizao democrtica e fossem criadas instabilidades

    econmicas e polticas que culminariam no retorno do autoritarismo. O preo, ento, para

    se ter a liberdade poltica seria abrir mo de reivindicaes para a melhoria de condies de

    vida dos segmentos populares. Reivindicaes que seriam postas de lado pelas presses da

    integrao financeira e comercial das dcadas subsequentes.

    A anlise realista, desiludida, de Przeworski tem o mrito de nos apresentar um dos

    principais focos emergentes de preocupao da cincia poltica na dcada de 90: a relao

    entre performance econmica e instituies democrticas, sobretudo aquelas recm-

    estabelecidas. A decadncia e fim do modelo sovitico marcaram as bases da vitria do

    modelo capitalista e da hegemonia poltica norte-americana a ser exercida a partir dos anos

    90. Nesse novo contexto, as sociedades do antigo Terceiro Mundo no teriam mais como

    ameaa o socialismo sovitico, mas sim suas prprias incapacidades institucionais em

    promover um conjunto de reformas, vistas por organismos financeiros e investidores

    internacionais, como as nicas capazes de modernizar suas economias e garantir sua

    integrao no capitalismo global. Dessa forma, a necessidade de investimentos por parte

    desses pases faria com que as reformas econmicas de carter liberalizante consagradas

  • 38

    posteriormente como Consenso de Washington20 despontassem como a nica opo de

    modernizao vivel. O capitalismo e a democracia, em sua verso liberal, teriam sido

    alados condio de the only game in town.

    A partir dessa premissa, The Political Economy of Democratic Transitions (1991)

    escrito por Stephan Haggard e Robert Kaufman tem pretenses exemplares: descobrir quais

    as caractersticas necessrias para que um sistema poltico em transio possa realizar com

    sucesso reformas macro-econmicas que visem a liberalizao de mercados possibilitando

    uma insero competitiva desses pases na economia global. A hiptese a ser demonstrada

    seria a de que democracias sucessoras de regimes autoritrios incapazes de realizar

    reformas e ajustes econmicos profundos herdariam a tarefa de implementar medidas

    econmicas extremamente impopulares. Uma misso que traria insatisfao popular em

    paralelo a um aumento de demandas impossveis de serem atendidas, levando essas jovens

    democracias a uma instabilidade institucional crnica.

    Respeitando a premissa da estabilidade poltica, os autores chegam concluso de

    que as democracias mais estveis e bem-sucedidas na realizao das reformas so aquelas

    resultantes de regimes autoritrios que mantiveram sua unidade poltica e sua capacidade de

    retaliao concentradas durante o processo de transio. Essas condies garantiriam,

    durante a transio, a execuo imediata de reformas econmicas extremamente

    impopulares cujo objetivo seria debelar as crises da economia mundial experimentadas ao

    longo da dcada de 80. Dessa forma, as democracias oriundas de tais contextos estariam

    mais aptas a sobreviverem numa economia global extremamente competitiva e menos

    propensas a sofrerem presses de setores insatisfeitos. Reeditando com outros termos a tese

    de Huntington, os autores definem seus achados com as seguintes palavras:

    Those best suited [institutions] for managing political and economic

    crises were those in which authority was concentrated.(...) Those

    [authoritarian] regimes that fell in the face of crisis were those in which

    external pressures fragmented the ruling coalition. (...)Those [authoritarian]

    20 O Consenso de Washington foi o termo associado a uma agenda de reformas macro-econmicas vistas como necessrias para que pases da Amrica Latina superassem seus processos inflacionrios e seus endividamentos externos crescentes. Composta por uma srie de medidas recomendando a diminuio dos gastos pblicos, liberalizao de mercados e privatizao de empresas estatais, essa agenda foi associada por

  • 39

    regimes that survived had developed centralized organizational means for

    controlling internal dissension, primarily by concentrating both political and

    military authority in the hands of a single individual. We also found that

    dominant-party authoritarian systems in middle-income countries proved more

    adept than military regimes at managing conflicts within the government and

    controlling and coopting broader political chalenges.21

    Mesmo no negando as restries polticas que uma democracia pode ter ao resultar

    de um governo autoritrio forte, os autores defendem a idia de que os arranjos

    institucionais democrticos desenvolvidos nesses casos (como, por exemplo, no Chile e na

    Coria do Sul) so os mais bem-sucedidos para a promoo de polticas macro-econmicas

    estveis. Na medida em que o autoritarismo precedente desmobilizara setores organizados

    da oposio, seria difcil encontrar vozes dissonantes ativas no novo contexto democrtico.

    Por outro lado, pases onde essa concentrao do poder no existiu encontrariam srias

    dificuldades em coordenar o carter extremamente impopular das reformas econmicas. A

    necessidade simultnea de construir consensos polticos e sociais que as implementem e

    legitimem lanaria incertezas sobre a possibilidade de consolidao institucional da

    democracia. No horizonte destes pases estaria se configurando mais uma crise de

    governabilidade, causada pelo excesso de demandas e expectativas reprimidas ao longo de

    anos de governos autoritrios.

    Sem exageros, talvez pudssemos dizer que essas anlises no se diferenciam em

    sua lgica interna das teorias desenvolvidas ao longo das dcadas de 50 e 60. Na trilha para

    o desenvolvimento econmico e a modernizao de pases perifricos coloca-se novamente

    a questo de saber como a democracia pode se configurar no melhor arranjo institucional

    para tal desafio. A diferena que, agora, ao lado da mera estabilidade poltica temos a

    eficincia econmica como premissas meta-tericas. Se a democracia apenas um mtodo

    de seleo de elites governantes, o desafio que a cincia poltica coloca agora para si o de

    identificar quais os elementos institucionais capazes de lhes permitir condies para a

    gesto eficiente da economia em um mundo dinmico e globalizado. Democracias que no

    atendem a esses requisitos passam a ser consideradas lentas, ineficientes e instveis. Mais

    segmentos polticos e populares aos interesses de credores internacionais quando implementadas. Para uma discusso sobre o termo ver Kuczynsky e Williamson (2003). 21 Haggard e Kaufman (1991), p.367

  • 40

    uma vez, a democracia, sob a tica de um segmento considervel da cincia poltica, s se

    mostraria vlida quando capaz de atender a certas vises hegemnicas sobre o mundo.

    Neoliberalismo e Neopopulismo na Amrica Latina

    O desenvolvimento de uma agenda de pesquisa com inspirao nesse novo

    paradigma democrtico, tomando como objeto a trajetria recente de pases latino-

    americanos, consolidou uma literatura que passaria a defender reformas institucionais

    favorveis centralizao de poderes na figura do Poder Executivo nacional,

    principalmente em seu corpo tcnico e alterao de regras eleitorais com o intuito de

    favorecer a criao de maiorias legislativas por meio da diminuio do nmero de partidos

    (Williamson & Haggard, 1994).22 Concedendo pouca importncia s crticas recorrentes ao

    excesso de prerrogativas concedidas aos chefes do executivo de pases latino-americanos,

    essas alteraes, como vimos, teriam o objetivo de viabilizar um lcus institucional slido

    capaz de implementar de forma abrangente reformas econmicas liberalizantes.

    Ao longo da dcada de 90, a hegemonia de facto de governos latino-americanos

    alinhados s reformas liberalizantes23 criava um contexto poltico favorvel ao

    desenvolvimento dessa percepo de que o fortalecimento do executivo poderia acelerar o

    processo de reformas. No entanto, a eleio sucessiva de governos de esquerda na dcada

    subseqente que passariam a adotar polticas destoantes, em graus variados, do receiturio

    neo-liberal, explicitariam os aspectos teleolgicos desse modelo e a contradio de suas

    propostas.

    A eleio de governos com nfase em polticas redistributivas a partir dos anos

    2000, colocaria em xeque as propostas de cientistas polticos e economistas que viam no

    fortalecimento do executivo um recurso vlido para acelerar o ritmo de reformas

    liberalizantes. Nas mos de governantes com concepes alternativas de desenvolvimento

    econmico, um executivo fortalecido teria a capacidade de implementar mais facilmente

    reformas no sentido oposto ao idealizado. Ironicamente, a reao mais recorrente do meio

    22 Para uma atualizao desses argumentos ver Navia & Velasco, 2003. 23 Como Stokes (2001) demonstra, a Amrica Latina da dcada de 90 foi marcada por inmeros switches polticos no mbito do executivo nacional, ou seja, a existncia de fortes discrepncias entre a plataforma de governo apresentada ao longo das eleies e as polticas adotadas efetivamente aps a posse do cargo. Nesse contexto, destaca-se que todas essas mudanas favoreceram reformas econmicas liberalizantes ou ortodoxas.

  • 41

    acadmico tem sido a de recuperar antigas classificaes em associao a esses governos,

    com destaque para a idia de neo-populismo. Desse modo, governos que buscassem

    propostas e polticas alternativas ao modelo neo-liberal seriam vistos como irresponsveis

    economicamente, naturalmente propensos a flertar como o autoritarismo e promotores de

    polticas sociais de carter assistencialista. exceo do Chile, nenhum dos governos de

    esquerda eleitos nos ltimos anos da regio escapou de ser taxado nesses termos.

    Castaeda (2006) em seu artigo Latin Americas Left Turn deixa clara essa

    decepo com os rumos da Amrica Latina ao elaborar uma tipologia dicotmica dos

    governos de esquerda da regio. Uma esquerda correta ou boa seria aquela que teria

    incorporado s premissas de uma economia de mercado e da ortodoxia monetria e fiscal,

    buscando polticas redistributivas nesse cenrio cujos exemplos seriam o Chile, o Uruguai e

    em menor grau o Brasil. A esquerda errada ou ruim, segundo Castaeda, seria aquela

    movida pelo fantasma do populismo latino-americano apresentando as caractersticas

    descritas acima. Nesse caso, teramos a Venezuela de Chvez, a Argentina de Kirchner e a

    Bolvia de Morales como tpicos representantes do retrocesso na regio.

    A despeito dessa tipologia estabelecer uma classificao muito simplista da

    realidade das esquerdas no continente, um aspecto interessante desse artigo, no entanto,

    sua defesa de uma neutralidade norte-americana em relao s aes desses governos, uma

    vez que possuem a seu favor a legitimidade democrtica. A retrica anti-americana e a

    adoo de polticas econmicas heterodoxas deveriam ser respeitadas at o momento em

    que esses governos tomassem atitudes que prejudicassem claramente a competio eleitoral

    ou rompessem com o sistema democrtico. Dessa forma, a ausncia de respeito aos

    resultados do processo democrtico em pases latino-americanos e da percepo de que a

    dinmica democrtica diz respeito muito mais a regras do que a resultados especficos so,

    provavelmente, as principais causas dos inmeros desacertos e equvocos da cincia

    poltica em seu processo de institucionalizao desde o ps-guerra.

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