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PALNDROMO N 10/2013 Programa de Ps-Graduao em Artes Visuais CEART/UDESC
PALNDROMO N 10 / 2013 101
GAMES EM INVESTIGAO: LENDO IMAGENS EM UMA LAN HOUSE
Dbora da Rocha Gaspar, Universidade Federal de Santa Catarina1
Resumo
A leitura de imagens de jogos eletrnicos o tema apresentado neste artigo. Aqui constam os dados de uma pesquisa desenvolvida para o Programa de Ps-Graduao em Educao da Universidade Federal de Santa Catarina, cujos sujeitos so estudantes que esto concluindo a Educao Bsica no Colgio de Aplicao da UFSC. O principal referencial terico uma abordagem de leitura de imagens desenvolvida por Sandra Regina Ramalho e Oliveira, a partir da Semitica Discursiva.
Palavras-chave: Leitura de Imagens, Jogos Eletrnicos, Ensino de Arte.
Abstract
The topic presented in this article is the reading of images in electronic games. The article contains the data of a research developed for the Education Post Graduate Program at Universidade Federal de Santa Catarina, whose subjects are students that are finishing Middle School at Colgio de Aplicao, at UFSC. The main theoretical framework is an image reading approach developed by Sandra Regina Ramalho e Oliveira, from the perspective of Discursive Semiotics.
Keywords: Eletronic game; Reading of image; Arte class.
1 Professora de Artes Visuais do Colgio de Aplicao da Universidade Federal de Santa Catarina e Doutoranda do Programa de Ps-Graduao em Arte e Educao da Universidade de Barcelona, Espaa.
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1. Game Play
H mais de quatro dcadas os jogos eletrnicos fascinam adultos e crianas em
vrias partes do mundo. At o incio dos anos 2000, a maioria das pesquisas
desenvolvidas no mbito da Educao sobre essa mdia, preocupava-se em verificar se
ela era boa ou ruim para as crianas e adolescentes, ou se seu contedo violento seria
um desencadeador de atitudes agressivas, ou ainda, se teria um efeito de catarse.
Entretanto, a preocupao deste estudo no qualificar os jogos eletrnicos, na dicotomia
heri ou vilo. O objetivo foi verificar se os estudantes que esto concluindo a
Educao Bsica analisam os elementos da linguagem visual para lerem as imagens dos
jogos eletrnicos, que costumam jogar em seu cotidiano.
Portanto, foi selecionada uma abordagem de leitura de imagem cujo marco terico
a Semitica Discursiva, desenvolvida por Ramalho e Oliveira (1998) para o mbito
educativo, que consiste em analisar o texto visual, partindo de sua expresso para chegar
aos efeitos de sentido, possibilitando, no caso deste estudo, uma coleta e anlise de dados
focada na prpria imagem.
A reflexo que parte Ramalho e Oliveira est relacionada ao problema do acesso
aos bens estticos, pois diante do imenso acervo de imagens produzido pela humanidade,
no qual as imagens dos jogos eletrnicos se inserem, inmeras pessoas mostram-se
destitudos de um referencial mnimo para sua leitura; consequentemente, acabam sendo
impedidos de acessar ao seu contedo (RAMALHO E OLIVEIRA, 2005, p.430). Desta
forma, sem o conhecimento do funcionamento dos cdigos imagticos, a autora adverte
para duas possibilidades ao cidado: ou as pessoas no sero capazes de fazer sua
traduo, sendo a elas, neste caso, sonegados conhecimentos, ou faro uma leitura
intuitiva, talvez equivocada (RAMALHO E OLIVEIRA, 1998, p.04).
O eixo principal da abordagem de leitura adotada para esta pesquisa permite
penetrar na complexidade da imagem por meio da sua desconstruo, pois desta forma
melhor se percebe seu plano de expresso, ou seja, tudo aquilo que perceptvel ao olhar,
o que ir fornecer os subsdios necessrios para a compreenso no plano do contedo.
Sabe-se que os planos de expresso e de contedo da imagem so indissociveis; no
entanto para efeito de estudo aqui so apresentados separadamente. O plano de expresso,
segundo o modelo de anlise adotado, subdivide-se em elementos constitutivos (ponto,
linha, plano, cor, superfcie, textura e dimenso, basicamente) e procedimentos relacionais
(simetria, contraste, ritmo, movimento, entres outros).
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Para clarear um pouco esta composio intrincada que a imagem, poderemos fazer analogias, que so bastante simplistas, mas tm funcionado. Uma das comparaes prope pensar na imagem como um texto verbal, onde os elementos constitutivos seriam as palavras, e os procedimentos relacionais corresponderiam sintaxe, ou seja, ao modo de organizar as palavras entre si. Mas preciso cuidado, pois existem distines para alm do aspecto visual de ambos os textos. Uma delas que nem a escrita nem a leitura da imagem so lineares; a outra que cada elemento no concorda com apenas um outro elemento, como j foi mostrado acima; ao contrrio, ele geralmente est articulado com diversos elementos, como que formando uma teia. Ou um rizoma. (RAMALHO E OLIVEIRA, 2005, p.433).
O primeiro passo para analisar uma imagem, consiste na busca de sua estrutura
bsica, na linha ou linhas que determinam a macroestrutura da imagem visual. Isto porque a
estrutura bsica da imagem vai dar sustentao composio visual no seu todo e, portanto,
ser fundamental no jogo de articulao dos significados (RAMALHO E OLIVEIRA, 2005, p.
432). Em seguida, traam-se esquemas visuais, buscando os contornos das figuras,
separando figura do fundo, destacando rebatimentos e contrastes, principalmente entre
linhas. Estas so apenas algumas possibilidades dos esquemas visuais, j que eles
dependem tanto da imagem quanto do seu leitor; no h uma normas, nem sequer diretrizes,
portanto, e podem ser elaborados tantos esquemas visuais quantos o destinatrio da
imagem achar necessrio para sua anlise.
Parte-se, ento para a identificao dos elementos constitutivos, como linhas,
pontos, cores, planos, formas, luz, dimenso, volume, textura. Ressaltam-se tambm, outros
trs elementos que no constituem a imagem, mas que geram efeitos de sentido, como o
suporte, o recorte e a moldura. Convm lembrar que quando se fala em moldura, no
sentido amplo, no s aquela madeira ou metal, decorado ou pintado, mas tudo o que est
em torno, que dialoga com a obra (RAMALHO E OLIVEIRA, 2005, p.432).
Depois de identificados os elementos constitutivos, buscam-se as articulaes entre
eles, que so chamadas procedimentos relacionais. Essas relaes podem ser encontradas
entre elementos, entre elementos e bloco de elementos, entre blocos de elementos entre si;
tambm um mesmo elemento pode estar articulado de modos diferentes (RAMALHO E
OLIVEIRA, 2005, p.433).
Ramalho e Oliveira prope um percurso que transita do todo da imagem para suas
partes e vice-versa, num caminhar incessante, desvelando os elementos constitutivos e
procedimentos relacionais do plano de expresso para chegar ao plano de contedo.
So as inmeras trilhas que se entrecruzam no visvel da imagem (plano
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de expresso) ao mesmo tempo em que tecem a significao (plano do contedo); da a necessidade de observar minuciosamente toda a imagem, resgatando pontos relevantes para, a partir deles, recriar, traduzindo uma teia de elementos e procedimentos significantes que, como tal, construda por meio de linhas paralelas, concntricas, todas relacionadas (RAMALHO E OLIVEIRA, 2005, p.434).
Tais procedimentos so necessrios para se chegar aos sentidos de um texto
imagtico. Todavia, a autora ressalta que no se deve considerar seus elementos
constitutivos como um vocabulrio auto-suficiente, uma vez que eles no adquirem sentido
no isolamento, mas sempre e somente na relao. A descoberta dessas relaes vai
conduzir o leitor aos efeitos de sentido, ou ao plano do contedo (RAMALHO E OLIVEIRA,
2005, p.434-435). A sntese de sua proposta pode ser visualizada do seguinte modo:
I Escaneamento visual da imagem, buscando a estrutura bsica da composio;
II Desconstruo da cor e destaque s linhas, na elaborao de esquemas visuais;
III Redefinio dos elementos bsicos constitutivos;
IV Busca dos procedimentos relacionais, estabelecidos entre os elementos;
V (Re)construo dos efeitos de sentido, com base no processamento dos procedimentos;
VI Trnsito incansvel entre elementos, bloco de elementos, procedimentos, todo e partes, esquema visual e imagem;
V Dados de identificao da imagem (RAMALHO E OLIVEIRA, 2005,
p.435).
Esta abordagem de leitura de imagem tem como referencial terico a Semitica
Discursiva que se origina nos estudos do suo Ferdinand de Saussure, considerado o pai
da lingustica. Saussure estudou a vida dos signos no seio da vida social (SAUSSURE, 1969,
p. 24), dedicou-se apenas linguagem verbal e somente vislumbrou a possibilidade de
aplicao de alguns de seus princpios em outras linguagens:
apresentando-se assim a linguagem como um dos fundamentos das sociedades humanas, no era difcil prever que a teoria lingustica acabaria por ser solicitada a prestar contas do que ocorria em outros campos gerados e sustentados por aquela matriz fundamental: o campo da arte, da arquitetura, do cinema, do teatro, da psicanlise, da sociologia e outras reas.
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o que nos diz Teixeira Coelho (1983, p.15-16), no sem chamar a ateno para o
fato de que, para estas adaptaes acontecerem, seria necessrio um grande percurso em
seus estdios de desenvolvimento. claro: a gramtica, com suas regras, fundamental na
linguagem verbal, ao passo que a quebra de paradigmas um dos modos de se manifestar
mais expressivos das demais linguagens estticas, mesmo da linguagem verbal, como o
caso de quando ela, por se tornar esttica, quebra normas gramaticais. Tratam-se das
licenas poticas, na linguagem em versos, por exemplo, ou seja, o direito que as
linguagens estticas tm, aquele de usar a linguagens de modos inesperados, originais,
fora de convenes.
Vrios discpulos seguiram as proposies de Saussure, revendo-as, alterando-as,
enfim, desenvolvendo os pressupostos da lingustica em diversas direes e sentidos.
Destacam-se Louis Hjelmslev, Roman Jakobson e Algirdas Julien Greimas.
Hjelmslev foi o responsvel pela substituio dos termos significado e significante,
palavras hoje ainda usadas como clssicas referncias ao corolrio de Saussure por,
respectivamente, plano de contedo e plano de expresso. Desta forma, o semioticista
dinamarqus Louis Hjelmslev (1899-1965) denominou assim as duas dimenses do texto,
plano de expresso e plano de contedo, os quais mantm uma relao de
interdependncia, ou seja, a forma de contedo e a forma de expresso so duas
constantes que dependem uma da outra como o verso e anverso da metfora saussureana
(NTH, 1996, p.59), planos estes que podem ser separados, provisoriamente, para efeitos
de anlise como no caso deste estudo. Hjelmslev, por meio de seus desenvolvimentos
tericos na trilha de Saussure, contribuiu para as discusses lideradas por A. J. Greimas na
chamada cole de Paris.
Algirdas Julien Greimas (1917-1992), juntamente com seu grupo, diversificou os
estudos de significao e extrapolou para alm do verbal, e assim seu projeto semitico
influenciou estudos na pintura, na moda, no cinema, na teologia, na arquitetura entre outras
reas do campo semitico, uma vez que o principal objetivo de sua teoria estudar o
discurso com base na ideia de que uma estrutura narrativa se manifesta em qualquer tipo de
texto. (NTH, 1996, p. 145). claro que esta estrutura narrativa no a mesma para
qualquer texto e linguagem, pois cada categoria de produto industrializado, por exemplo,
ter a sua. Por outro lado, cada texto criativo, cada criao esttica, visual, verbal, musical
ou cnica, ter a sua prpria estrutura. A estrutura inerente a seres humanos e aos
animais, que tm seu corpo assentado sobre uma estrutura ssea; e s pontes e aos
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edifcios, entre outras construes humanas, que no prescindem de uma estrutura de
sustentao.
Greimas prope, para o estudo do plano de expresso, formantes eidticos,
cromticos e topolgicos, categorias referentes aos elementos mnimos de significao, as
unidades discretas que, no caso do texto imagtico, so formas, cores, bem como sua
situao no espao da manifestao.
A teoria dos formantes que, apesar do voto de Hjelmslev, no se acha ainda constituda em lingustica, deveria encontrar aqui seu lugar. V-se bem que a constituio dos formantes por ocasio da semiose no outra coisa seno uma articulao do significante planar, no seno o seu recorte em unidades discretas legveis, tendo em vista uma certa leitura do objeto visual, que no exclui de modo algum j o vimos a propsito da dupla funo do alfabeto outras segmentaes possveis do mesmo significante. As unidades discretas assim constitudas a partir de traos so j bem conhecidas: so formas no sentido da Gestalttheorie, so figuras do mundo no sentido que lhes d G. Bachelard, so figuras do plano da expresso como que Hjelmslev (1984, p. 8).
Greimas (1984) afirma que os formantes ou categorias eidticas so aquelas que
esto encarregadas de estabelecer a discrio das diferentes unidades do significante, j os
formantes ou categorias cromticas so as que se embasam em apreenses individuantes
dos termos. No entanto, as categorias topolgicas
retilneas umas (como alto/baixo ou direito/esquerdo), curvilneas outras (como perifrico/central ou circunscrevente/circunscrito) bem como seus derivados e compostos, crivam, partindo daquilo que ela no , toda a superfcie enquadrada traando a os eixos e/ou delimitando as regies (plages), cumprindo com isso dupla funo, a de segmentar eventuais percursos sobre os quais se acham dispostos os diferentes elementos de leitura (GREIMAS, 1984, p. 9).
Greimas trabalhou em conjunto com distintos estudiosos, formando um grupo
interdisciplinar, e dada as formaes especficas de cada membro da cole de Paris, foi
possvel avanar a produo no s na pesquisa bsica, mas tambm na pesquisa aplicada,
e esta, em distintas reas da atividade humana. Entre os pensadores que deram
continuidade aos aprofundamentos daquele grupo destacam-se Eric Landowski, Jacques
Fontanille e Jean-Marie Floch.
Hoje se fala em semio-esttica, uma expresso cunhada por Jean-Marie Floch para
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denominar os estudos que entrelaam conhecimentos da semitica com os da esttica, ou
mais particularmente, da semitica com os da visualidade. No Brasil, os estudos de Floch
foram seguidos por Ana Claudia de Oliveira e Sandra Ramalho e Oliveira, sendo que a
ltima assim se expressa em relao a ele:
Jean-Marie FLOCH, semioticista francs, nasceu (...) em 1947, e faleceu, precocemente, em 2001, aos 54 anos. Colaborador de A. J. Greimas, Floch dedicou-se ao estudo das linguagens visuais. Em duas de suas publicaes, quais sejam, Identidades Visuais e Semitica, Marketing e Comunicao, ambas no traduzidas ainda para o portugus, Floch adotou, ainda que com a roupagem semitica, paradigmas propostos por Wlfflin, para a busca da compreenso da arte e de imagens estticas: o clssico e o barroco (RAMALHO E OLIVEIRA, 2004, p. 185-186).
Para Ana Claudia Oliveira, a diviso do plano de expresso se d em formantes
eidticos (forma), cromticos (cor) e topolgicos (organizao no suporte); mais adiante,
acrescentou a esses trs mais uma categoria, a dos formantes matricos, conforme o texto
Lisibilidade da imagem em que afirma que (...) uma imagem, uma semitica plstica,
formada no plano da expresso pelo material e as matrias que lhe do existncia visiva
(formantes matricos) (OLIVEIRA, 2001, p.6). Percebe-se que, na arte contemporanea, os
materiais utilizados a construo das imagens influenciam decisivamente a apreenso dos
efeitos de sentido, no campo das artes visuais, o que determinou a necessidade de ateno
a esta categoria, a do formante matrico.
Para a semio-esttica, ou seja, para a linha terica, no contexto da semitica
discursiva, que se dedica visualidade, uma imagem tambm considerada um texto, um
enunciado, uma manifestao ou um discurso, o que implica que toda a imagem um tecido
onde a significao tramada. A imagem, segundo esta linha terica da semitica, pode ser
denominada enunciado, o seu autor, o enunciador, e aquele que a traduz, elaborando
significados a partir dos efeitos de sentido do texto visual, o enunciatrio, que o
destinatrio da enunciao. Assim o discurso visual manifesta-se no plano da expresso,
por meio de imbricamentos na tessitura do nvel de expresso, esses formantes se
interrelacionam e, em feixes, e no formante e formante, ou seja, termo a termo,
correspondem a categorias do plano do contedo (OLIVEIRA, 2001, p.7).
Desta forma, a significao de um texto se d na relao entre os planos de
expresso e o de contedo e destes com cada enunciatrio especfico, pois ele que
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articula os planos nas mas nas relaes complexas e diversificadas geram efeitos de
sentido. Para tornar possvel o estudo desse intrincado fenmeno que a imagem, a
semitica visual prope instrumentos de descrio e anlise, contribuindo expressivamente
para as pesquisas desenvolvidas acerca do fenmeno da significao em textos imagticos.
2. Preparando o jogo investigativo
A pesquisa de campo foi realizada em duas etapas. Na primeira aplicou-se um
questionrio para todos os alunos do terceiro ano do Ensino Mdio do Colgio de
Aplicao da UFSC, campo da investigao. Na segunda etapa foram realizadas
entrevistas, em uma lan house, com os estudantes que afirmaram no questionrio que
costumam fazer screenshots enquanto esto jogando. Os screenshots so imagens fixas
do jogo, fotografias que os jogadores fazem, geralmente, para mostrar aos demais seus
desempenhos na partida.
As entrevistas realizadas com os estudantes na lan house se constituram em
conversas individuais, filmadas e gravadas para posterior transcrio. Formulou-se um
roteiro de perguntas que conduziu a entrevista. Para tanto, foi usado como referencial os
mesmos passos da abordagem de leitura de imagem desenvolvida por Ramalho e Oliveira
(1998), que so os seguintes: 1) um olhar geral para a imagem; 2) Reconhecer a estrutura
bsica da imagem; 3) Construir o esquema visual da imagem; 4) Identificar os elementos
constitutivos da linguagem visual presentes na imagem; 5) Identificar os procedimentos
relacionais presentes na imagem; 6) Chegar aos efeitos de sentido da imagem. Tais
etapas configuram os diferentes momentos da entrevista com os estudantes, conforme o
seguinte roteiro: Um olhar geral para a imagem (a) Antes de iniciar o jogo, deve-se pedir
ao aluno(a) que ao longo da partida selecionar uma cena para fotografar, um screenshot;
b) Enquanto joga deixar o aluno falar livremente sobre o jogo e suas imagens; c) Aps,
terminada a partida, olhar o screenshot (fotografia da cena selecionada durante o jogo) e
perguntar o motivo de ter selecionado essa imagem; d) Instigar o aluno a comentar
livremente acerca da imagem selecionada); Estrutura bsica da imagem (voc identifica
linhas ou formas que podem no estar evidentes, mas que formam a estrutura bsica
dessa imagem?); Esquema Visual (abrir o screenshot selecionado pelo aluno em um
programa de edio de imagem para ele retirar da imagem as linhas principais que a
compe.); Elementos constitutivos da linguagem visual (Quais so os elementos da
linguagem visual (ponto, linha, textura, dimenso, cor, volume, ...) que compem essa
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imagem? Conduzir a conversa fazendo com que o aluno aponte na imagem onde se
encontram os elementos e de que maneira esto sendo utilizados); Procedimentos
relacionais (Como os elementos que compem essa imagem esto articulados? Voc
observa ritmo, contraste, simetria, equilbrio... ? Conduzir a conversa fazendo com que o
aluno aponte na imagem onde se encontram os elementos e de que maneira esto sendo
utilizados); Efeitos de sentido ou significao (agora que voc j falou bastante dessa imagem, o que ela est dizendo? O que significa essa imagem?)
Convm ressaltar que para manter o sigilo da identidade dos estudantes foram
selecionadas, aleatoriamente, cores para identific-los: Vermelho, Azul, Verde e Roxo.
Antes de iniciar a partida, os estudantes tiveram total liberdade para selecionar o game
que gostariam de jogar. Como estvamos em uma lan house, por sugesto de um dos
estudantes, trs deles resolveram jogar juntos e selecionaram MU, um jogo eletrnico em
3D, da categoria MMORPG, produzido pela Webzen. A narrativa do jogo se passa num
universo medieval. MU era um lugar frtil e prspero, mas que se tornou catico devido s
lutas entre os senhores feudais. Neste contexto, Antonias, um homem mau e ambicioso se
entregou aos desejos de Lemulia, a feiticeira maligna, e libertou Kundun que pretende
dominar a Terra e escravizar a humanindade. Com a ascenso de Kundun ao poder, ele
trouxe seus asseclas que esconderam o selo de Etramu, a nica forma de deter o demnio.
Para proteger o selo o dividiram em 8 partes, cada uma delas vigiadas por criaturas
monstruosas. O desafio do jogo encontrar heris que consigam aprisionar Kundun com o
selo de Etramu, para que o mundo volte a ser livre. Em MU o jogador tem a opo de ser
um Cavaleiro Negro (Dark Knight), Fada/Elfa (Fairy/Elf), Feiticeiro Negro (Dark Sorcerer) e
Gladiador Mago (Magic Gladiator), para lutar pela liberdade de MU. Cada uma dessas
classes de personagens apresenta caractersticas prprias para lutar e seguir as aventuras
no mundo de MU. No entanto, o jogador pode selecionar suas vestimentas, suas
armaduras, escudos entre outros apetrechos que iro ajud-lo no desenvolvimento do jogo.
Este diferencial de equipar seu avatar com inmeras combinaes de itens foi ressaltada
por Azul como um fator que o levou a selecionar este game. Quando questionado o que o
atraia nesse jogo, ele respondeu:
Sei l! Tipo ele tem ... sei l! O design dele bom, tipo no como outros RPG que bem ruim o grfico. Ele tem uma qualidade de imagem, ele tem ... sei l! Ele tem bastantes opes, quando, tipo mostra armadura, tem um design da armadura, tipo coisas do personagem, j outros jogos de RPG no tem isso, por isso eu escolhi esse pra jogar.
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Apenas Vermelho quis jogar o clssico Tibia, pois o game que vem jogando
ultimamente, costuma jog-lo com seu irmo. Este jogo um RPG, cujo objetivo, segundo
Vermelho, ir matando animais, quanto mais animais matar mais experincia ganha para
matar animais cada vez mais fortes. Tibia um MMORPG (Multi Massively Online Role
Playing Game), que se passa num universo medieval em que os jogadores podem interagir
diretamente uns com os outros e com o mundo do jogo. Seus grficos so em duas
dimenses, a tela principal do jogo apresenta uma vista superior, mostrando toda a rea
prxima ao jogador. Tibia no possui um objetivo predeterminado a ser alcanado ou um
final: os jogadores determinam a forma como desejam seguir as suas aventuras, e o
mundo continua existindo e mudando mesmo que os jogadores no estejam l. Quando
um jogador entra no mundo, ele representado por um avatar virtual, um personagem que
representa aquele jogador. Tudo o que acontece com um jogador registrado no servidor
em tempo real, assim, quando ele voltar, o seu personagem estar com os mesmos
atributos e caractersticas de quando o jogador saiu. Cada personagem inicia a sua
jornada em uma ilha introdutria chamada Rookgaard. Nela eles podem aprender os
fundamentos do jogo, como: lutar contra monstros, manipular o personagem e objetos,
adquirir e comprar itens, entre outras possibilidades. Os personagens vo ficando mais
fortes medida que lutam. Cada vez que derrotam um monstro eles ganham pontos de
experincia (dependendo da fora do oponente derrotado). Quando um personagem atingir
certo nmero de pontos de experincia, este avana de nvel; o nvel um dos fatores que
determina a fora do personagem. Os personagens podem sair da ilha de Rookgaard a
partir do nvel oito, e ento explorarem o restante do mundo. Ao sarem da ilha, os
personagens devem escolher uma cidade natal (que pode ser mudada mais adiante) e
uma vocao: Knight (cavaleiro); Sorcerer (feiticeiro); Druid (druida); Paladin (paladino),
mas uma vez que escolherem sua profisso no podem mais mudar. No possvel para
um personagem viajar de volta Rookgaard uma vez que ele saiu dela.
Um fator interessante na escolha dos jogos que Tbia possui grfico em duas
dimenses, visto em terceira pessoa, j MU em trs dimenses, mas tambm tem o
mesmo ponto de vista. No entanto, o tratamento visual em MU mais rico em detalhes e
de maior definio que Tbia. Os dois games so do mesmo gnero MMORPG (Multi
Massively Online Role Playing Game).
Outro fator que chamou ateno foi a afirmao de Roxo, que comentou que ele,
Verde e Azul costumam jogar juntos, mas em ambientes distintos. Como MU via internet,
eles no necessitam estar no mesmo lugar real, como em uma lan house, mas se
encontram no mesmo espao virtual. Tal fator chamou a ateno da pesquisadora para as
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conversas que os participantes realizavam enquanto jogavam.
3. Imagens de Games: analisando os screenshots
3.1 Entrevista com Vermelho
Acerca da escolha da imagem, Vermelho comentou que queria registrar uma ao
de xito, com alto grau de dificuldade, matar dois monstros ao mesmo tempo. Porm, ao
observar a imagem que havia realizado, se deu conta que o foguinho que irradiava dos
avatares e indicava o xito de sua jogada, no ficou registrado na imagem. Vermelho,
diferente de seus colegas, fez uma nica imagem, devido dificuldade de fazer screenshot
no jogo que selecionou, Tbia. E quando questionado sobre a estrutura bsica da imagem
afirmou considerar a linha de contorno como o eixo principal.
Fig.1 Screenshot produzido por Vermelho
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Antes de iniciarem a leitura foi solicitado a todos os participantes que realizassem
o esquema visual dos screenshots, todos usaram o programa Paint para faz-lo. Desta
forma, antes mesmo de iniciar a leitura, enquanto faziam os esquemas visuais, os
estudantes tiveram a oportunidade de se aterem mais aos detalhes no momento de
salientar suas linhas.
Vermelho foi o primeiro a faz-lo, optou por utilizar inmeras cores para
representar cada objeto ou personagem. Quando questionado sobre os elementos
constitutivos presentes em sua imagem, Vermelho diz que no identifica que o modo como
a linha usada pode gerar textura. Porm, ao se referir ao grfico atual do game em
relao ao anterior, Vermelho afirma que a textura foi melhorada, alterando a
presentificao do que seria grama e pedra. Como consegue identificar o sentido que a
textura se refere, Vermelho afirma que o jogo no to pobre assim em relao a esse
elemento.
Vermelho quando questionado sobre os procedimentos relacionais analisa a
construo da imagem, mas inicialmente emitiu juzo de valor, (...) bom, porque (...) ,
todavia no lhe foi perguntado se os recursos visuais foram utilizados de modo bom ou
ruim. Vermelho afirma ainda que: acredito que tem uma harmonia nas cores, na hora que
Fig. 3 Esquema Visual produzido por Vermelho
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eu vejo nada me di o olho, digamos assim neh! Pde-se observar nas palavras de
Vermelho que este consegue fazer mais articulaes com os procedimentos relacionais do
que com os elementos constituitivos da linguagem visual.
O ltimo questionamento da entrevista foi sobre o significado da imagem.
Vermelho quando questionado afirma: ! Eu estou morrendo. (risos). Ento, perguntou-se
o porqu ele afirmava que estava morrendo, sua resposta foi: Por qu? Porque eu estou
tomando hit. Como no se sabia o que seria um hit, foi pedido que explicasse o que
seria: Hit porrada. (risos) Eu estou tomando hit de dois monstros ao mesmo tempo, isso
na verdade uma coisa ruim, neh!
3.2 Entrevista com Azul
As imagens que Azul, Verde e Roxo selecionaram apresentam o mesmo efeito de
ataque, em forma de estrela amarela brilhante no cho, no entanto Azul justifica sua
escolha pelo contraste deste efeito com seu personagem e por estar lutando com Verde. E
descreve a estrutura bsica de sua imagem assim: Deixa eu ver... uma linha pro
personagem aqui, uma linha para a estrela aqui assim, uma estrela mais ou menos aqui
pra fazer o ataque dele e as linhas horizontais aqui pro cenrio.
Fig. 4 Screenshot produzido por Azul
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Olhando para seu esquema visual, Azul questionado acerca dos elementos
constitutivos da linguagem visual. O elemento ressaltado por Azul a cor, mais
especificamente as diferenas de tons, ou segundo ele, o contraste de cor. Pois para Azul
no existe uma linha de contorno e sim a diferena de cor entre o laranja do ataque e o
verde da vegetao. No que se refere aos procedimentos relacionais Azul ressalta a
simetria das armaduras e tambm do ataque: o prprio ataque, aqui assim ele
simtrico, todos os negcios so iguais s muda a posio aqui, aqui tambm igual.
Volta a falar do contraste de cores.
Quando questionado sobre o sentido de seu screenshot Azul quis saber se seria
para falar usando seus conhecimentos sobre o jogo ou como se no conhecesse, ento foi
pedido que ele falasse dos dois modos. O significado da imagem para Azul o ataque,
percebe que os recursos visuais indicariam esse sentido mesmo que ele no conhecesse
o jogo e depois acrescenta que pela forma de presentificao do ataque ele sabe quem o
fez, pois o ataque de seu personagem tem outra forma, racha o cho.
3.3 Entrevista com Verde
Verde justifica a escolha de seu screenshot pela composio da imagem:
Fig.3 Esquema Visual produzido por Azul
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personagem centralizado e noo de movimento. Para ele a estrutura bsica de sua
imagem seriam os personagens, se tu for ver, todos eles poderiam estar numa linha
vertical. Esse mais atrs... esse....
Fig. 7 Screenshot produzido por Verde
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Diante de seu esquema visual Verde foi perguntado quais tipos de linhas ele
identificava, Verde considera que as curvas poderiam ser a estrada que varia um pouco.
As retas poderiam ser os personagens, como eu tinha falado e outras retas horizontais
poderiam ser a barra que tem embaixo... Verde descreve com mais detalhes a imagem,
observa-se que ele percebe que a textura pode ser formada por linhas e diferena de tons,
ressalta a noo de perspectiva, citando inclusive sua especificao, isomtrica. Comenta
sobre as formas e ressalta que todos esses recursos so utilizados para dar a idia de
dimensionalidade, ou seja, de tridimensionalidade.
Acerca dos procedimento relacionais Verde destaca o movimento de seu
screenshot, como se pode perceber em suas palavras:
Ah, acho que... o personagem que parece que ta caindo, o movimento dele d a impresso de ele ta dando uma espcie, talvez, de soco no cho. E isso d uma noo de movimento. Ainda mais, porque ele tem meio que um rosto de fogo por cima dele. D a idia que ele j esteve ali, j esteve naquela posio, agora ele ta em outra. E a estrela embaixo daria mais uma idia de destino, pra onde ele iria. Talvez, a direo dele mostra pra onde seria esse movimento. Esse aqui mostra que ele ta virado pra direita, ento esse seria o sentido dele.
Verde no faz afirmaes fechadas, utiliza palavras como: parece; d a
impresso de; uma espcie de ; d uma noo de; d a idia de. Em todo seu
Fig.9 Esquema Visual produzido por Verde
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discurso ele justifica a noo de movimento que ele ressaltou, descreve as caractersticas
que do esse sentido de movimento.
Para Verde o significado de sua imagem luta, um personagem contra o outro.
Justifica tal sentido atravs das indicaes fornecidas pelo jogo e por meio do movimento e
posio dos personagens.
3.4 Entrevista com Roxo
Roxo afirma ter selecionado o screenshot por aparecem os avatares dos trs
estudantes juntos (Azul, Verde e Roxo), todos lutando contra o mesmo inimigo, alm de
dois ataques que geram efeitos visuais distintos. Ele considera que a estrutura bsica de
sua imagem no seria o contorno mas sim o brilho... o que tu v assim, neh!
Fig10. Screenshot produzido por Roxo
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No que se refere aos elementos constituivos da linguagem visual, Roxo vai
respondendo a partir dos exemplos que so dados na pergunta, ele reafirma o que se
acabou de mencionar. No parece ter segurana em suas argies.
Roxo demonstra no ter compreendido o que so os procedimentos relacionais,
primeiro pergunta se para falar da linha da imagem, ento voltou a chamar ateno para
simetria, para ver se ele iria se desprender da linha. Ele diz que no havia reparado e
depois diz que sim, que s vezes ela simtrica, esse ela se refere linha. Depois muda
o eixo da conversa para as configuraes do computador. Roxo no consegue visualizar
na imagem os procedimentos quando questionado.
Ao foi o significado atribudo por Roxo a seu screenshot. Ento, perguntou-se o
que na imagem lhe dizia que era ao o sentido principal, Roxo respondeu:
Acho que a pose de batalha, tambm... aqui eu salto pra atacar o bicho... em volta, aqui, dele, por exemplo: eu atacando ele com fogo e ele espisoteando, no sei, acho que . D uma imagem bem de ao. Assim de luta.
Fig.12 Esquema Visual produzido por Roxo
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4. Reflexes sobre as leituras dos screenshots dos games
Alguns termos usados na entrevista tiveram que ser explicados aos estudantes,
pois no conheciam as nomenclaturas questionadas na entrevista, essa questo j havia
sido prevista pela pesquisadora. Ento, para explicar o que seria a estrutura bsica de
uma imagem foram oferecidas breves informaes, feitas analogias com o Raio X e usado
como exemplo um cartaz de jogo que estava diante dos estudantes na lan house. As
descries apresentadas pelos estudantes Vermelho, Azul e Roxo emolduraram o que
seria o ponto de ateno da imagem.
Ao longo das entrevistas verificou-se que Vermelho, Azul e Verde no
demonstram dificuldade em identificarem os elementos constitutivos. Azul fala de alguns
preocedimentos relacionais como elementos. Mas Verde que apresenta uma descrio
mais consistente dos elementos na imagem selecionada. Porm, Roxo demosntra mais
dificuldade em identific-los, suas respostas no apresentam consistncia na
compreenso desses elementos.
Durante a observao dos estudantes jogando na lan house o MU, pde-se
perceber que aquele ambiente virtual de fantasia e lutas, se mostrou tambm um espao
colaborativo, em que eles se deixaram morrer para ajudar o amigo. Desta forma, o ato de
matar se distncia do conceito que se tem na realidade, no exterminar algum, pois
no jogo eles possuem muitas pores de vida. Tal observao vem ao encontro das
concluses da pesquisa de Alves (2005), que apoiada nos estudos da psicanlise, analisa
a influncia dos jogos eletrnicos e as possveis implicaes em comportamentos violentos,
considerando, ento, que o jogo eletrnico um espao de catarse.
De acordo com as entrevistas, pode-se concluir que Verde demonstra ter mais
domnio dos conhecimentos estticos especficos da linguagem visual que Azul e
Vermelho, que demonstraram pouco conhecer. J Roxo conhece pouqussimo. Todavia,
todos chegam aos efeitos de sentido da imagem. Eles foram diretos e pontuais ao abribuir
significado a seus screenshots: Vermelho diz que est morrendo, Azul, Verde e Roxo que
luta. Mas s fazem relao do significado atribudo por eles com a composio da
imagem quando questionados, isso demonstra a dificuldade dos estudantes em realizar a
traduo da linguagem visual para a verbal. Apresentam, ento, leituras superficiais, com
vises aceleradas que podem levar a manipulao.
Convm lembrar que Verde, Azul e Vermelho estudaram no Ensino Fundamental
no Colgio de Aplicao, em seus respostas percebe-se que eles j ouviram falar nos
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elementos constitutivos e procedimentos relacionais, no com essa nomenclatura, o que
confirma como esta unidade de ensino desenvolve um trabalho diferenciado na rea de
Artes Visuais, se destacando da realidade brasileira, presentificada aqui por Roxo que veio
de uma instituio de outro estado do pas e quase nada sabia sobre os conhecimentos
estticos especficos da linguagem visual.
A preocupao com a leitura de imagens no Brasil, est presente desde a dcada
de 1980, quando Ana Mae Barbosa divulga sua ento metodologia triangular, hoje
Abordagem Triangular, na qual a aprendizagem em Arte se d na relao entre o fazer
artstico, a leitura da imagem e a contextualizao. Tanto os Parmetros Curriculares
Nacionais (PCNs) como a Proposta Curricular de Santa Catarina (PCSC), tambm
apresentam trs eixos norteadores no que se refere ao Ensino de Arte. Nos PCNs, como
lembrado anteriormente, esses eixos so a reflexo, a fruio e a produo artstica, e na
PCSC constituem-se em contextualizao, fruio e produo. Como se pode perceber, a
leitura e ou fruio da imagem aliceram as principais referncias para as propostas
pedaggicas em Arte.
A PCSC (1998, p. 195) prope que o professor se aproprie de diferentes
abordagens de leitura de imagem para trabalhar em sala de aula, por se entender que
nenhuma sozinha d conta do objeto a ser interpretado, devido ao seu carter aberto e
ambguo. Entre as abordagens destacadas pela PCSC (1998, p.195-196) encontram-se: a
sociolgica (possibilita perceber como o artista estabelece uma comunicao entre o
objeto e o grupo, suscitando sua participao na sociedade); semiolgica (interpretar
perceber e compreender a dinmica da construo e reconstruo de signos nos meios de
comunicao e na produo cultural das sociedades); iconogrfica (levanta
caractersticas prprias do estilo, estuda o contedo e o significado do objeto artstico,
observando sua forma); iconolgica (procura entender o objeto artstico dentro de uma
cultura, de uma filosofia ou de uma crena); esttica (procura identificar o que h de
universal presente no objeto artstico); gestltica (analisa a estrutura formal). Entretanto, a
PCSC (1998, p. 196) ressalta que necessrio que essa leitura transcorra atravs de
passos metodolgicos que auxiliam o aluno a adquirir a autonomia.
Esse posicionamento dos documentos oficiais estavam associados a abordagens
metodolgicas internacionais como as de Edmundo Feldman e de Michael Parsons.
Entretanto, estudiosos brasileiros desenvolveram abordagens pensando o contexto
brasileiro, destacando-se nesse cenrio Terezinha Sueli Franz; Anamlia Bueno Buoro; e
Sandra Regina Ramalho e Oliveira .
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Porm, nesta pesquisa, pde-se perceber que os estudantes que esto
concluindo o Ensino Mdio, ainda demonstraram dificuldades em utilizar os conhecimentos
especficos da linguagem visual no ato de ler, ou seja, no relacionam esses
conhecimentos, desenvolvidos na escola, com os efeitos de sentido propostos pelas
imagens. Nesta verificao, percebe-se, a efetivao da preocupao apontada por
Ramalho e Oliveira, em fornecer subsdios mnimos para a formao de leitores crticos em
relao s imagens do cotidiano.
Mesmo que os documentos oficiais, estudos e abordagens de leitura de imagens
para o ensino de Arte venham sendo desenvolvidas no Brasil, o que se percebeu que
essas propostas ainda so pouco expressivas na formao dos estudantes na Educao
Bsica. Ento, aponta-se para um outro questionamento: como articular esses estudos
com a prtica pedaggica?
Os jogos eletrnicos e as demais imagens em movimento fazem parte do
cotidiano desses estudantes em idade escolar, mas a escola no os prepara como leitores
nem para as imagens fixas, nem em movimento e muito menos para imagens digitais. Viu-
se que os estudantes tm domnio do computador e de seus recursos, assim a educao
no contexto da cibercultura no se encontra apenas no mbito do uso das tecnologias,
mas, como ressalta Ramal (2002), em acompanhar a mutao dos processos
comunicacionais e cognitivos que questionam as formas institucionais e culturais dos
sistemas educacionais tradicionais.
Portanto, considerando que a aprendizagem se d no espao-temporal de
interao, conforme Catapan (2001), o grande desafio para pesquisadores na rea de
Ensino de Arte, entrar no jogo da formao de leitores de imagens digitais. Mas quais
estratgias usar, quais caractersticas nossos heris devem ter?
Esta uma partida longa de um jogo que deve ser colaborativo, em que as
relaes entre as teorias e a prtica pedaggica, entre as imagens e seus efeitos de
sentido, entre ler e escrever visualmente, sejam elementos que movam as peas no
tabuleiro de formar leitures crticos no mbito da visualidade.
5. Bibliografia:
BARBOSA, Ana Mae. A Imagem no Ensino de Arte. So Paulo, Perspectiva; Porto Alegre, Fundao IOCHPE, 1991.
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CATAPAN, Araci Hack. Tertium: o novo modo do ser, do saber e do aprender (construindo uma taxionomia para medio pedaggica em tecnologia de comunicao digital). Tese (Doutorado em Engenharia de Produo) Universidade Federal de Santa Catarina, Florianpolis, 2001.
COELHO NETTO, J.T. Semitica, Informao e Comunicao. Perspectiva: So Paulo, 1983. GREIMAS, A. J. Semitica Figurativa e Semitica Plstica. Revista Brasileira de Semitica. n. 4. (1984). Traduzido por J. Assis da Silva, impressa em tipos datilogrficos. NTH, Winfried. A semitica no sculo XX. Anablume: So Paulo, 1996.
OLIVEIRA, Ana Claudia. Lisibilidade da imagem. Revista da FUNDARTEC. v.1, n.1(jan./jun. 2001) Montenegro: FUNDARTEC, 2001.
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RAMALHO E OLIVEIRA, Sandra Regina. Leitura de Imagens: uma busca de rizomas significantes. In: ENCONTRO NACIONAL DOS PESQUISADORES EM ARTES PLSTICAS, 14., 2005, Goinia. Cultura Visual e desafios da pesquisa em artes. Goinia, FAV/UFG, 2005, p. 430-439.
___________________. Imagem tambm se l. So Paulo: Rosari, 2006.
___________________. Leitura de imagens para a Educao. 1998. Tese (Doutorado em Comunicao e Semitica) Pontifcia Universidade Catlica, So Paulo, 1998.
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SAUSSURE, Ferdinand de. Curso de Lingstica Geral. Trad. Chelini, A, Paes, J. P. & Salum, I. N. Cultrix: So Paulo, 1969.