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27/11/11 Acórdão do Tribunal da Relação de Évora 1/15 dgsi.pt/jtre.nsf/«/0820bf53cf5869228025718c0054c183?OpenDocument Acyrdãos TRE Acórdão do Tribunal da Relação de Évora Processo: 2408/05-3 Relator: GAITO DAS NEVES Descritores: CESSÃO DE POSIÇÃO CONTRATUAL Data do Acordão: 30-03-2006 Votação: UNANIMIDADE Texto Integral: S Meio Processual: APELAÇÃO CËVEL Decisão: REVOGADA A SENTENÇA Sumário: I ± Numa cessão de posição contratual estão envolvidos dois contratos: Contrato base do qual emerge a posição que o cedente transmite ao terceiro; Contrato instrumento que opera a transmissão contratual. II ± Nada tendo sido estipulado em contrário no contrato instrumento, o cedente só garante a existência do contrato base e não o cumprimento pontual do mesmo (art. 426º C.C.). III ± Numa cessão de posição contratual e salvo estipulação em contrário, não se transmitem para o cessionário as obrigações já vencidas à data da efectiva transmissão, nem o transmitente tem direito a perceber prestações correspondentes a período posterior à efectiva cedência e já prestadas pelo cessionário. Decisão Texto Integral: PROCESSO Nº 2408/05 * ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA * “A”, com sede na Rua …, em …, instaurou a presente acção contra “B” e marido “C”, residentes na Rua …, nº …, em …, alegando: A Autora tem por objecto social a exploração de empreendimentos hoteleiros, de restauração, empreendimentos turísticos, investimentos imobiliários na actividade de alojamento turístico. No dia 30 de Julho de 1998, entre a Autora e os Réus foi celebrada uma escritura pela qual estes deram de trespasse àquela, que recebeu, o estabelecimento industrial de hotelaria denominado …, sito em …, freguesia de …, concelho de … À data da celebração da escritura estavam em vigor vários contratos que passaram a ser cumpridos pela ora Autora. Acontece que várias importâncias, que totalizam 7.370.960$00, foram recebidas pelos Réus e estes, embora reconheçam que tais importâncias devem ser restituídas à Autora, a verdade é que não o fazem. Termina, pedindo a condenação dos Réus a pagarem-lhe tal montante, acrescida de juros desde a citação até integral pagamento.

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27/11/11 Acórdão do Tribunal da Relação de Évora

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Acórdãos TRE Acórdão do Tribunal da Relação de Évora

Processo: 2408/05-3

Relator: GAITO DAS NEVES

Descritores: CESSÃO DE POSIÇÃO CONTRATUAL

Data do Acordão: 30-03-2006

Votação: UNANIMIDADE

Texto Integral: S

Meio Processual: APELAÇÃO CÍVEL

Decisão: REVOGADA A SENTENÇA

Sumário:

I – Numa cessão de posição contratual estão envolvidos dois contratos:

Contrato base do qual emerge a posição que o cedente transmite ao

terceiro;Contrato instrumento que opera a transmissão contratual.

II – Nada tendo sido estipulado em contrário no contrato instrumento, o

cedente só garante a existência do contrato base e não o cumprimento pontualdo mesmo (art. 426º C.C.).

III – Numa cessão de posição contratual e salvo estipulação em contrário, não

se transmitem para o cessionário as obrigações já vencidas à data da efectiva

transmissão, nem o transmitente tem direito a perceber prestaçõescorrespondentes a período posterior à efectiva cedência e já prestadas pelo

cessionário.

Decisão Texto Integral: PROCESSO Nº 2408/05

*ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA

*

“A”, com sede na Rua …, em …, instaurou a presente acção contra

“B” e marido “C”, residentes na Rua …, nº …, em …, alegando:

A Autora tem por objecto social a exploração de empreendimentos hoteleiros,

de restauração, empreendimentos turísticos, investimentos imobiliários naactividade de alojamento turístico.

No dia 30 de Julho de 1998, entre a Autora e os Réus foi celebrada uma

escritura pela qual estes deram de trespasse àquela, que recebeu, o

estabelecimento industrial de hotelaria denominado …, sito em …, freguesia de

…, concelho de …

À data da celebração da escritura estavam em vigor vários contratos que

passaram a ser cumpridos pela ora Autora. Acontece que várias importâncias,

que totalizam 7.370.960$00, foram recebidas pelos Réus e estes, embora

reconheçam que tais importâncias devem ser restituídas à Autora, a verdade é

que não o fazem.

Termina, pedindo a condenação dos Réus a pagarem-lhe tal montante,acrescida de juros desde a citação até integral pagamento.

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Citados, contestaram os Réus, alegando:

Nos termos do que foi contratualmente acordado entre Autora e Réus estes

nada devem àquela nem alguma vez reconheceram que deviam, pelo que a

acção deve ser julgada improcedente.

*

Procedeu-se a julgamento de discussão e julgamento.

Na Primeira Instância, foram dados como provados os seguintes factos:

1. A Autora é uma sociedade comercial em cujo objecto social constam as

seguintes actividades: exploração de empreendimentos hoteleiros e derestauração, exploração de empreendimentos turísticos, investimentos

imobiliários na actividade de alojamento turístico (alínea A) dos factos

assentes).

2. A Autora encontra-se registada na Conservatória do Registo Comercialde … sob o n.º … (alínea B) dos factos assentes).

3. No dia 30 de Julho de 1998 entre a Autora e os Réus foi celebrada uma

escritura de trespasse outorgada no Segundo Cartório Notarial de …,lavrada de fls. 30 a fls. 33 do livro de notas para escrituras diversas nº

101-A, cujo teor se dá por integralmente reproduzido (fls. 13 a 20) (alíneaC) dos factos assentes) onde constam os seguintes dizeres:

"Trespasse No dia 30/07/1998, no 2º Cartório Notarial de … (...) compareceram (…) e

pelo primeiro e segundo outorgante, na qualidade em que outorgam, foidito: Que a representada do primeiro e o segundo são proprietários de um

estabelecimento industrial de hotelaria, denominado "…", de quatroestrelas, e sito num prédio sito na …, na freguesia de …, concelho de …,

composto por cave, rés-do-chão, primeiro e segundo andares, tendo nacave uma cozinha, quatro despensas e uma garagem, no rés-do-chão dez

quartos, treze casas de banho, um corredor, uma sala de recepção, noprimeiro andar doze quartos, treze casas de banho e um corredor, uma

suite, e no segundo andar sete quartos, um bar, sete casas de banho, umcorredor de dois terraços, com a área coberta de duzentos e cinquenta

metros quadrados e descoberta de oitocentos e cinquenta metrosquadrados, inscrito (…) e descrito (…), de sua propriedade, e consideradode utilidade turística, atribuído a título definitivo, à unidade já descrita,

por despacho (…) e que se mantém válida, conforme ofício (…), queexibiram.

Que pela presente escritura, trespassam à Sociedade representada doterceiro outorgante, livre do ónus ou encargos, designadamente perante o

fisco e a segurança social, com todo o seu activo, designadamente os bensmóveis e equipamentos, objecto de inventário anexo à presente escritura e

dela fica fazendo parte integrante, incluindo todos os alvarás e licenças, einteiramente livre de todo o passivo, o referido Estabelecimento pelo preço

de sessenta milhões de escudos, correspondendo cinquenta milhões de

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escudos ao valor global dos móveis e equipamentos descritos noinventário, já referenciado, assumindo a representada do primeiro e

segundo outorgantes, os trespassantes, a responsabilidade exclusiva portodos os actos ou omissões da administração da … até à data da

assinatura desta escritura, ainda que venham ao conhecimento após estadata, pelo pagamento de todas as dívidas, incluindo créditos emergentes de

contratos de trabalho, já reclamados ou que venham a ser reclamados,pelo pagamento de quaisquer indemnizações ou compensações que venha a

ser exigidas, judicial ou extrajudicialmente e se reportem a factosanteriores à data desta escritura, quer respeitantes à actividade comercial

quer derivadas de obrigações assumidas por aqueles perante entidadespúblicas ou administrativas. Que transmitem para a sociedade representada do terceiro, todos os

direitos de propriedade industrial que respeitem ao Estabelecimento …,designadamente os direitos da marca com o nome "…" e da insígnia …,

com tal registado no Instituto da Propriedade Industrial, o primeiro com onúmero (...) e o segundo com o número (…) em nome do proprietário

marido. Que ficam expressamente excluídos do âmbito deste trespasse todas as

viaturas automóveis constantes do mapa de imobilizado, designadamente ade marca Mercedes, modelo 100 D, de matrícula (…), a de marca Peugeot,

modelo 306, de matrícula (…) e de marca Volkswagen, modelo Pollo, dematrícula (...) e de marca Toyota, modelo Land Cruiser, de matrícula (…)bem como o motociclo de marca Yamaha de matrícula (...) e o telefone

portátil de marca Ericson, modelo 338, Que eles trespassantes se obrigam perante a sociedade cessionária a

permitir o acesso e a utilização, a título gratuito, da piscina e demais zonasde uso comum dos Apartamentos …, pelos clientes da …, enquanto

mantiverem a exploração daquele empreendimento turístico; obrigando-se,ainda, a facultar nos mesmo moldes, aos clientes da … o acesso eutilização da piscina e demais zonas de utilização comum, do Aldeamento

que vai construir e explorar nas redondezas da …, logo que tal seja

possível; o cedente marido se, para tal for solicitado e quando terminar aexploração dos Apartamentos … disponibilizar-se-á para, em nome e no

interesse da Sociedade, ou com a mesma negociar a manutenção de tais

facilidades com os proprietários do imóvel onde se encontram instalados

os "Apartamentos …" ou com quem venha a assumir a sua exploração. O outorgante marido obriga-se a prestar à sociedade adquirente toda a

colaboração e diligências necessárias para o funcionamento do

estabelecimento, incluindo deslocações e permanências na …, desde que

para tal seja solicitado, até ao termo do prazo de três meses a contar dacelebração desta escritura.

Os cedentes têm a sua situação contributiva regularizada perante o Centro

Regional de Segurança Social e perante a Repartição de Finanças,conforme certidões que arquivo.

Os cedentes declaram que o Estabelecimento .., objecto do presente

trespasse obedece aos requisitos pelo Decreto-lei n.º 167/97, de 4 de Junho

e Dec. Reg. 36/97, de 25 de Setembro. Os cedentes obrigam-se a entregar à Sociedade o certificado de Segurança

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da …, oportunamente requerido junto dos Bombeiros Voluntários de …,

assumindo a responsabilidade pelo pagamento de todas as taxas e

encargos com a emissão de tal documento e bem assim a executar, aexpensas suas, todas as obras e alterações que para tal se revelem

necessárias após a data desta escritura.

Pelo terceiro outorgante foi dito: Que para a sociedade “A”, sua representada, aceita o trespasse nos termos

exarados.

Assim o outorgaram, por minuta.

Exibiram: Fotocópia em substituição da Caderneta Predial Urbana emitida pela

Repartição de Finanças do concelho de …, em (…), e ali actualizada em

(…).

Foi esta escritura lida e explicado o seu conteúdo em voz alta e napresença simultânea de todos os outorgantes."

4. Em 6 de Maio de 1997 foi celebrado um contrato de ocupação turística(contrato nº 472/1998 FAO) entre o operador turístico “D”, com sede na

Alemanha representada em Portugal pela sua congénere portuguesa “E” e

os Réus, na qualidade de donos e proprietários do estabelecimento "…"

(alínea D) dos factos assentes).

5. O referido contrato teve início em 1 de Novembro de 1997 e termo em

12 de Novembro de 1998 (alínea E) dos factos assentes).

6. Em 12 de Março de 1998 foi celebrado um contrato de ocupação

turística (contrato nº 682/1999 F AO) entre o operador turístico “D”

representada em Portugal pela sua congénere portuguesa “E” e os Réus,na qualidade de donos e proprietários do estabelecimento "…", cujo teor

aqui se dá por integralmente reproduzido (fls. 37) (alínea F) dos factos

assentes).

7. O referido contrato teve início em 1 de Novembro de 1998 e terminará

em 13 de Novembro de 1999 (alínea G) dos factos assentes).

8. No âmbito das negociações contratuais mantidas entre a Autora e osRéus, com vista à celebração do trespasse, os Réus cederam à Autora a sua

posição contratual nos referidos contratos, a produzir efeitos a partir da

data em que fosse celebrada a escritura de trespasse (alínea H) dos factosassentes).

9. A sociedade “D”, representada em Portugal pela “E” aceitou a cessão

referida em H) (alínea I) dos factos assentes).

10. De acordo com os referidos contratos, o estabelecimento hoteleiro

"…", na pessoa dos Réus, obrigava-se a fornecer serviços que

compreendiam o alojamento e pequeno-almoço, em regime deexclusividade, para os clientes do operador “D”, em contrapartida, este

garantia a ocupação turística diária, durante os prazos contratuais e

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remunerava esses serviços nos termos previstos na cláusula 6ª dosreferidos contratos (docs. 3 e 4) (alínea I) dos factos assentes).

11. Relativamente ao contrato com início em 1 de Novembro de 1997 e

termo em 12 de Novembro de 1998 (contrato nº 472/1998 FAO) pelareferida ocupação turística a “D” pagaria à "…" o valor total de Esc.

40.500.000$00 (alínea L) dos factos assentes).

12. Foi acordado aquando da celebração do contrato (cláusula 63) que ospagamentos seriam feitos, parcelarmente, e os mesmos foram feitos nas

seguintes datas e dos seguintes montantes: em 22 de Maio de 1997 a “D”

pagou aos Réus a quantia de Esc. 8.100.000$00 referente a 20% do valordo contrato, em adiantamento do preço; em 31 de Outubro de 1997 a “D”

pagou aos Réus a quantia de Esc. 4.050.000$00 em adiantamento do

preço; em 24 de Novembro de 1997 a “D” pagou aos Réus a quantia de

Esc. 3.471.428$00; em 15 de Dezembro de 1997 a “D” pagou aos Réus aquantia de Esc. 3.209.663$00; em 28 de Fevereiro de 1998 a “D” pagou

aos Réus a quantia de Esc. 3.471.428$00; em 21 de Abril de 1998 a “D”

pagou aos Réus a quantia de Esc. 3.403.161$00; em 26 de Junho de 1998 a

“D” pagou aos Réus a quantia de Esc. 3.348.228$00; em 21 de Julho de1998 a “D” pagou aos Réus a quantia de Esc. 3.594.628$00 (alínea M) dos

factos assentes).

13. Os Réus prestaram alojamento e serviram pequenos-almoços aos

clientes do operador “D” nos dias compreendidos entre 1 de Novembro de

1997 e 30 de Julho de 1998 (alínea N) dos factos assentes).

14. Mercê da cessão da posição contratual dos Réus à Autora no contrato

em causa, foi esta que passou a cumprir (a partir de 30 de Julho de 1998)

as obrigações contratuais daqueles, isto é, passou a ser a Autora quem, apartir de 30 de Julho de 1998, prestou serviços de alojamento, pequenos-

almoços, limpeza e arrumação da "…" e recepção dos clientes (alínea O)

dos factos assentes).

15. Em 18 de Setembro de 1998 a Autora recebeu da “D” o pagamento da

quantia de Esc. 3.471.428$00 conforme doc. 6 que se dá por integralmente

reproduzido para todos os efeitos legais. E, em 30 de Outubro de 1998, a

Autora recebeu da “D” a quantia de Esc. 4.050.000$00 conforme doc. 7que se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais

(alínea Q) dos factos assentes).

16. Dos montantes referidos em M) os réus nada entregaram à Autora

(alínea R) dos factos assentes).

17. Como adiantamento ao contrato referido em F), os Réus receberam em27 de Março de 1998 por conta desse contrato e a título de adiantamento,

a quantia de Esc. 3.942.567$00, ver doc. 5 (alínea S) dos factos assentes).

18. Os serviços referentes a este contrato e nesta data (a partir de 1 de

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Novembro de 1998) foram todos fornecidos pela Autora. Foi a Autora

quem forneceu alojamento aos clientes da “D”, foi a Autora quem

preparou e confeccionou os pequenos-almoços que os clientes da “D”tomaram na "…", foi a Autora quem tratou da limpeza e arrumação da

"…", foi a Autora quem recepcionou os clientes da “D” (alínea T) dos

factos assentes).

19. A quem a “D” pagou as demais prestações do preço, vencidas em 31

de Outubro de 1998, em 24 de Novembro de 1998 e em 31 de Dezembro de

1998, conforme estabelecido na cláusula 6a do contrato (alínea U) dos

factos assentes).

20. As partes celebraram o contrato junto a fls. 56 e ss. cujo teor se dá porintegralmente reproduzido (alínea X) dos factos assentes) que tem o

seguintes dizeres:

"Contrato Promessa de Compra e Venda e de Trespasse que entre si

celebram:

A) De um lado e como primeira outorgante, promitentes vendedores e

trespassantes “B” e marido “C” , casados (…), a primeira representada

neste acto pelo seu procurador (...), B) e de outro lado, doravante designado como segundo contratante,

promitente-comprador e trespassário, “F”,

Mediante as seguintes cláusulas e condições:

1. A primeira contratante é dona e legítima possuidora do seguinte prédio:

urbano, destinado a … composto por (…).

2. Pelo presente contrato a primeira contratante promete vender ao

segundo ou a uma sociedade que esta venha a constituir, que por sua vezpromete comprar, livre de quaisquer ónus ou encargos, designadamente os

referidos no artigo seguinte, sem arrendamentos ou outras limitações à sua

fruição, o prédio identificado no artigo anterior.

3. Sobre o prédio objecto da presente promessa de compra e venda incide

a inscrição C-1 AP.07/091092 - hipoteca voluntária a favor do Fundo de

Turismo, com sede em Lisboa, para garantia do empréstimo no valor de

capital de Esc. 120.000.000$00 e a inscrição C-3, AP. 26/010895 -

hipoteca voluntária a favor do Fundo de Turismo, com sede em Lisboa,para garantia de empréstimo no valor de capital de Esc. 20.000.000$00,

comprometendo-se a primeira contratante a proceder a expensas suas, ao

seu cancelamento junto da Conservatória do Registo Predial competente,

ou a autorizar o segundo a deduzir os emolumentos registrais devidos do

preço.

4. A primeira contratante é dona e legítima possuidora do estabelecimento

de … instalado no prédio referido no artigo primeiro, denominado …, dequatro estrelas, como tal devidamente registado na Direcção Geral do

Turismo.

5. Também pelo presente contrato a primeira contratante promete

trespassar ao segundo ou a uma sociedade que este venha a constituir, que

por sua vez promete comprar, livre de quaisquer ónus ou encargos,

designadamente perante o fisco e segurança social, com todo o seu activo,

incluindo todos os alvarás e licenças e inteiramente livre de todo o passivo,

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o estabelecimento …, assumindo a primeira contratante perante o segundo

a responsabilidade exclusiva por todos os actos ou omissões da

administração da … até à data da assinatura da escritura pública, ainda

que venham ao conhecimento após esta data, pelas dívidas, indemnizações

ou compensações que venham a ser reclamadas, judicial ou

extrajudicialmente e, se reportem a factos anteriores à acima referida

data, quer respeitantes à actividade comercial quer derivadas deobrigações assumidas com entidades públicas ou administrativas.

6. Também são objecto do presente contrato a promessa de transmissão

dos direitos de propriedade da marca com o nome "…" e da insígnia "…",

como tal registados no Instituto da Propriedade Industrial, o primeiro sob

o nº (…) e o segundo com o nº (…), em nome do primeiro contratante

marido.

7. O preço da prometida venda e do trespasse é de Esc, 180.000.000$00

(cento e oitenta milhões de escudos), correspondendo a: a) Escudos: 120.000.000$00 (cento e vinte milhões de escudos), pelo

prédio referido no artigo primeiro;

b) Escudos: 60.000.000$00 (sessenta milhões de escudos), pelo trespasse

do estabelecimento …, no qual está incluído o valor de Escudos:

50.000.000$00 (cinquenta milhões de escudos), correspondente ao valor

global dos móveis e equipamentos que constituem o inventário anexo ao

presente contrato, Anexo l, devidamente rubricado pelas partes. 8. As partes expressamente acordam que o presente contrato é uno e

indivisível no que respeita ao objecto da promessa de compra e venda e de

trespasse.

9. O preço será pago da seguinte forma:

a) A título de sinal e princípio de pagamento o promitente-comprador e

trespassário entrega à primeira contratante a quantia de Escudos:

25.000.000$00 (vinte e cinco milhões de escudos) que esta confessa terrecebido e de que dá integral quitação, pela assinatura do presente

contrato.

b) A restante parte do preço será paga no acto da assinatura da escritura

pública de compra e venda e de trespasse.

10. A escritura pública de compra e venda e de trespasse será assinada

provavelmente na data de 30 de Junho de 1998, se estiver concluído o

processo de constituição e registo de uma sociedade que o segundo

contratante vai constituir para efeitos de outorga da escritura pública decompra e venda e de trespasse ora prometida, comprometendo-se o

segundo a empreender todos os esforços no sentido de cumprir todas as

fases do processo de constituição da sociedade com a maior diligência,

cabendo a sua marcação ao segundo contratante que, deverá avisar a

primeira com pelo menos cinco dias de antecedência, por meio de

comunicação escrita registada a expedir para a morada da … em (…) do

dia, hora e cartório notarial em que será celebrada a escritura. 11. Na data da escritura pública de compra e venda e de trespasse a

primeira contratante obriga-se a manter o prédio objecto do presente

contrato de promessa de compra e venda definitivamente inscrito a seu

favor na conservatória do registo predial competente.

12. No estabelecimento … objecto da presente promessa de trespasse estão

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incluídos, entre outros bens e direitos, todos os bens móveis e

equipamentos relacionados no inventário, que constitui o anexo I aopresente contrato, que depois de rubricado pelas partes, dele fica a fazer

parte integrante, declarando a primeira contratante que os mesmos se

encontram integralmente pagos e desembaraçados, não se encontrando

penhorados, arrestados ou empenhados.

13. Ficam expressamente excluídos do âmbito do presente contrato todas

as viaturas automóveis constantes do mapa de imobilizado,

designadamente a de marca Mercedes (…), a de marca Peugeot (…), a de

marca Volkswagen (…), a de marca Toyota (…), bem como o motociclo demarca Yamaha (…) e o telefone portátil de marca Ericsson (…).

14. É da responsabilidade da primeira contratante o pagamento de todas

as despesas, taxas ou impostos, que se referiram ao exercício do direito de

propriedade e uso do prédio e do estabelecimento em causa, e cujo factos

gerador se situe em data anterior à da celebração da escritura de compra e

venda, ainda que venham ao conhecimento após esta mesma data.

15. O estabelecimento … objecto da presente promessa de trespasse étransmitido livre de quaisquer créditos laborais. A primeira contratante

assume a responsabilidade pelo pagamento de quaisquer créditos laborais,

já reclamados ou que venham a ser reclamados após a data da celebração

da escritura pública de compra e venda e de trespasse, cláusula que deverá

obrigatoriamente constar da escritura prometida.

16. O estabelecimento …, objecto da presente promessa de trespasse, será

transmitido para o segundo contratante com os trabalhadores que neleexercem a sua actividade profissional, os quais constam da lista anexa,

anexo II, que constitui parte integrante deste contrato, obrigando-se a

primeira contratante a colaborar com a segunda com vista ao

cumprimento do disposto no nº 3, do art.º 37º da Lei do Contrato

Individua! de Trabalho.

17. A primeira contratante obriga-se a permitir o acesso e a utilização, a

título gratuito, da piscina e demais zonas de uso comum dos Apartamentos

…, pelos clientes da …, enquanto mantiver a exploração daqueleempreendimento turístico.

a) o primeiro contratante marido obriga-se a facultar, nos mesmos moldes,

aos clientes da …, o acesso e utilização da piscina e demais zonas de

utilização comum, do aldeamento que vai construir e explorar nas

redondezas da …, logo que tal seja possível.

b) O primeiro contratante marido se, para tal for solicitado e, quanto

terminar a exploração dos Apartamentos …, disponibilizar-se-á para, emnome e no interesse do segundo, ou com ele, negociar a manutenção de

tais facilidades com os proprietários do imóvel onde se encontram

instalados os "Apartamentos .." ou com quem venha a assumir a sua

exploração.

18. A primeira contratante obriga-se a ceder ao segundo ou à sociedade

que este venha a constituir a sua posição contratual nos contratos em

garantia de ocupação turística por si celebrados com o operador turístico“D”, referentes à ocupação da …, sendo que um dos contratos terminará

em 31 de Outubro de 1998 e o outro iniciar-se-á em 1 de Novembro de

1998 e terá o seu termo em 31 de Outubro de 1999.

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19. Desde a dada da assinatura do presente contrato promessa fica o

segundo contratante autorizado a ter acesso e obter cópias de todos os

documentos de contabilidade e administrativos, incluindo contratos,

relativos à …, podendo para o efeito solicitar ao primeiro contratante

todas as informações de que necessite, obrigando-se este a prestá-las deimediato.

20. A partir da data da celebração do presente contrato, fica o primeiro

contraente impedido de contratar mais trabalhadores subordinados dos

que actualmente existem, de praticar qualquer acto de disposição ou

liberalidade relativo ao estabelecimento …, sem o acordo do segundo,

ficando, em caso de incumprimento, obrigado a restituir ao segundo o

valor de tais bens ou direitos, passando a administração da …, em todos osassuntos não correntes, a ser confiada a ambos os contratantes.

21. A primeiro contratante obriga-se a prestar ao segundo toda a

colaboração e diligência necessárias para o funcionamento do

estabelecimento, incluindo deslocações e permanências na …, desde que

para tal seja solicitado, até ao termo do prazo de três meses a contar da

data da celebração da escritura pública prometida, cláusula que poderá

constar da escritura pública, se o segundo contratante assim o entender. 22. O presente contrato sujeita-se ao regime da execução específica.

23. Ao prédio objecto da presente promessa de compra e venda foi

concedido pela Câmara Municipal de … o alvará de licença de utilização

nº (…).

24. A primeira contratante obriga-se a entregar ao segundo, oito dias

antes da data da celebração da escritura de compra e venda e de

trespasse, certidão emitida pelo Centro Regional da Segurança Social do… e pela Repartição de Finanças competente, pelas quais se ateste a

situação regularizada da entidade exploradora do estabelecimento face a

essas duas entidades públicas.

25. Mais se obriga a primeira contratante a entregar ao segundo, antes da

data da celebração da escritura pública, documentos comprovativos de

todos os trabalhadores subordinados ao ser serviço, tipos de contratos de

trabalho, incluindo cópias dos meses, se escritos, recibos de remuneração,

folhas de pagamento da Segurança Social e, bem assim, listagem de todosos trabalhadores subordinados que tenham terminado o seu contrato de

trabalho, durante os últimos doze meses, por qualquer motivo,

indemnizações ou compensações pagas ou em dívida.

26. A primeira contratante declara que se mantém em vigor a declaração

de utilidade turística concedida a título definitivo à …, por despacho (…).

27. A primeira contratante garante ao segundo que a … obedece aos

requisitos exigidos pelo DL n.º 167/97, de 4 de Junho e Dec. Reg. n.º 36/97,de 25 de Setembro.

28. A primeira contratante obriga-se a entregar ao segundo antes da data

da escritura pública, o certificado de segurança da …, oportunamente

requerido junto dos Bombeiros Voluntários de …, assumindo a

responsabilidade pelo pagamento de todas as taxas e encargos com a

emissão de tal documento e, bem assim, a executar, a expensas suas, todas

as obras e alterações que para tal se revelem necessárias, mesmo após adata da escritura pública prometida.

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29. A primeira contratante obriga-se a entregar ao segundo, antes da data

da escritura pública prometida, aditamentos escritos aos contratos de

trabalho vigentes com os trabalhadores José (…) de molde a que o

trabalhador referido em primeiro lugar passe a trabalhar algumas horas

por dia para a primeira contratante e o referido em segundo lugar fique à

disposição do segundo ou da sociedade que este venha a constituir, para

prestar serviço quando tal lhe foi solicitado, assumindo a primeira e osegundo contratantes a responsabilidade pelo pagamento conjunto das

retribuições dos referidos trabalhadores, na proporção de metade para

cada um.

30. A lei do presente contrato é a lei portuguesa.

31. O foro deste contrato é o de … com expressa renúncia a qualquer

outro.

O presente contrato é feito em duplicado, ficando o original selado naposse do segundo contratante.

Albufeira, 5 de Junho de 1998".

21. No decurso das negociações os Réus facultaram à Autora cópias dos

mencionados contratos e prestaram todas as informações a eles atinentes,

designadamente os preços acordados com a “D”, as condições de

pagamento, as quantias recebidas e a receber, as datas previstas para osrecebimentos, a natureza dos serviços a prestar, bem como os serviços

compreendidos no âmbito de ambos os contratos (resposta ao artigo 5° da

base instrutória).

22. Tendo a Autora de tudo ficado ciente (resposta ao artigo 6° da base

instrutória).

*

Com base em tal factualidade, na Primeira Instância foi a acção julgadaimprocedente.

*

Com a sentença não concordou a Autora, tendo interposto o respectivo

recurso, onde formulou as seguintes CONCLUSÕES:

1. Entre autora e réus foi celebrado um contrato misto que reúne os

elementos do trespasse e da cessão da posição contratual. Face à matériaprovada nos autos não resta dúvida que o fim do negócio ao qual todos os

aspectos do mesmos se subordinam foi o do trespasse, conforme o disposto

no artigo 405 nº 2 do CC.

2. O trespasse é a transferência definitiva do estabelecimento entendido

como um complexo ou unidade económica. Nos termos estabelecidos entre

as partes para o trespasse constava a transferência do estabelecimentocom todo o seu activo e livre de passivo.

3. O conceito de passivo engloba não só as dividas mas também as

obrigações, que no caso dos autos traduzem-se no período a partir do qual

a autora deveria fornecer os serviços de alojamento turístico sem receber

qualquer contrapartida financeira. Relativamente a um dos contratos os

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réus só prestaram parte dos serviços e relativamente ao outro, não

prestaram qualquer serviço.

4. Configura-se desta forma, a transmissão do estabelecimento com

passivo, em violação do negócio estipulado entre as partes. Ao perfilhar

entendimento diferente violou a sentença recorrida o disposto nos artigos

397°, 398° n° 1 e 2 e 762° nº 1 e 2° todos do CC.

5. Mas, e ainda que entendamos que ao caso dos autos só seria de aplicaras regras da cessão da exploração, e entendendo-se esta como a

transmissão dos respectivos direitos e deveres emergentes de um

determinado negócio em bloco, ao se transmitir à autora somente a

obrigação de prestar serviços de alojamento turístico aos clientes do

operador turístico “D”, sem a correspondente transmissão dos direitos

patrimoniais inerentes a tais obrigações, violou a sentença recorrida o

disposto no artigo 424º do CC.

6. E, por último e caso assim se o não entenda temos sempre que

considerar que, os réus beneficiaram da obtenção de uma deslocação

patrimonial, traduzida na obtenção de uma vantagem patrimonial,

consubstanciada nos adiantamentos feitos por conta do preço referentesao período posterior à data da celebração da escritura de trespasse, em

que os serviços de alojamento turístico deixaram de ser prestados pelosréus e foram-no integralmente suportados pela autora. Aliás, tal

deslocação patrimonial relativamente a um dos contratos significou que osréus receberam um adiantamento do preço e não prestaram qualquer

serviço!!

7. Existe pois, um enriquecimento por parte dos réus que, a partir da data

da celebração da escritura de trespasse deixou de ter causa justificativa.Ao decidir de forma diferente violou a sentença recorrida o disposto no

artigo 473º do CC.

Termos em que a sentença recorrida deve ser revogada e substituída poroutra que considere procedente o pedido formulado pela autora, assim sefazendo

JUSTIÇA!!*

Contra-alegaram os Apelados, concluindo pela improcedência do recurso.*

Corridos os vistos legais, cumpre decidir.*

Para que tudo fique melhor esclarecido, importa colocar a situação, na parte

que ora nos interessa, sob o aspecto cronológico.

PRIMEIRONo dia 06 de Maio de 1997, foi celebrado um contrato de ocupação turística

entre “D” e os Réus, que teria o seu início em 01 de Novembro de 1997 etermo no dia 12 de Novembro de 1998 (nºs 4 e 5 da matéria factual provada).

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SEGUNDONo dia 12 de Março de 1998, foi celebrado um contrato de ocupação turística

entre a “D” e os Réus, que teria o seu início em 01 de Novembro de 1998 etermo no dia 13 de Novembro de 1999.

TERCEIROOs contratos de ocupação turística implicavam que a … fornecesse alojamento

e pequeno-almoço, em regime de exclusividade aos clientes da “D”, medianteremuneração desde logo fixada.

QUARTO

No dia 05 de Junho de 1998, foi celebrado um contrato-promessa no qual osora Réus declararam prometer trespassar a “F” ou a uma sociedade que este

venha a constituir e este declarou prometer assim tomá-lo, um estabelecimentocomercial denominado …, sito na freguesia de … – …O preço do trespasse (incluindo os bens móveis, excepto viaturas automóveis)

foi de 60.000.000$00, tendo ficado aprazado, em princípio, para o dia 30 deJunho de 1998, a outorga da respectiva escritura.

Na Cláusula 18ª deste contrato-promessa constava: “A Primeira Contratante(leia-se, ora Réus) obriga-se a ceder ao Segundo (“F” ou à sociedade que

este constituir) a sua posição contratual nos contratos em garantia de ocupaçãoturística por si celebrados com o operador turístico “D”, referentes à ocupaçãoda …

Um dos contratos terminaria a 31 de Outubro de 1998 e um outro teria início nodia 01 de Novembro de 1998 e terminaria em 31 de Outubro de 1999.

Por seu turno, na Cláusula 19ª ficou estipulado que “F” tinha acesso e podiaobter cópia de todos os documentos, incluindo contratos, relativos à …

QUINTOUm mês depois da data inicialmente prevista, foi outorgada a escritura pública

de trespasse, 30 de Julho de 1998.Outorgaram a escritura os ora Réus, na qualidade de trespassantes e “F” na

qualidade de Presidente do Conselho de Administração da ora Autora, comoadquirente do trespasse.

O preço manteve-se em 60.000.000$00 (incluindo móveis, excepto viaturasautomóveis).

Atentando nos factos provados, haverá ainda que reter:

SEXTONo âmbito das negociações mantidas entre Autora e Réus, estes cediam àquela

a sua posição contratual nos contratos celebrados com a “D”, a produzirefeitos a partir da data em que fosse celebrada a escritura de trespasse – nº 8.

SÉTIMOA “D” aceitou tal cessão – nº 9.

Encontramos a noção de “cessão da posição contratual no artigo 424º, nº 1,

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do Código Civil: “No contrato com prestações recíprocas, qualquer daspartes tem a faculdade de transmitir a terceiro a sua posição contratual,desde que o outro contraente, antes ou depois da celebração do contrato,

consinta na transmissão”.

Desta definição resulta, necessariamente, que numa cessão de posiçãocontratual estão, à partida, envolvidos dois contratos:

- o contrato base, do qual emerge a posição que o cedente transmite ao terceiro(no nosso caso os contratos celebrados entre os Réus e a “D”);

- o contrato instrumento que opera a transmissão da posição contratual (ocontrato entre a Autora e os Réus).

Nada resultando em contrário da matéria factual provada, haverá que atentar aoque nos diz o artigo 426º, nº 1, do Código Civil: “O cedente garante ao

cessionário, no momento da cessão a existência da posição contratualtransmitida, nos termos aplicáveis ao negócio …”. E, precisamente, por

depararmos com um verdadeiro afastamento do cedente e dúvidas nãosurgirem, é que houve o cuidado de esclarecer no nº 2 do preceito: “A garantiado cumprimento das obrigações só existe se for convencionado …”, isto é,

acaso a “D” deixasse de cumprir, não poderia a Autora reclamar dos Réusqualquer prestação em dívida pela “D”, acaso isso mesmo não tivesse sido

estipulado, nem poderia a ora Autora, por falta de cumprimento da “D”,resolver o contrato com os Réus – cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código

Civil Anotado, 4ª ed., Vol. I, pag. 403-404.

No caso sub judice constatamos que o contrato base se prolongava no tempo.

Sendo assim, os Réus cumpriram as obrigações que haviam assumido para coma “D” até à data da escritura de trespasse, passando, a partir de então, a ora

Autora a fornecer o alojamento, os pequenos-almoços, limpeza, arrumação erecepção dos clientes – conf. nºs 13, 14 e 18 da matéria factual.

Conforma resulta do artigo 425º, o contrato celebrado entre a Autora e os Réusnão estava sujeito a qualquer formalidade, podendo ser acordado verbalmente e

a “D” deu o seu consentimento à cessão da posição contratual.

Segundo provado ficou, no âmbito das negociações ficou entendido que os réuscediam à Autora a sua posição contratual quanto à “D”, a partir do momento

em que fosse celebrada a escritura de trespasse da … Ora, dispõe o artigo227º, do Código Civil: “Quem negoceia com outrem, para conclusão de umcontrato deve, tanto nos preliminares como na formação dele, proceder

segundo as regras da boa fé …”.

Na sentença recorrida foi seguido o entendimento que a Autora não podereclamar dos Réus qualquer montante por estes percebidos, mas

correspondente a serviços já prestados pela Autora. E sendo assim,logicamente, a acção foi julgada improcedente.Invoca como alicerce de tal posição um Acórdão da Relação do Porto de

15.07.1996 e a doutrina defendida pelo Prof. Antunes Varela.Vejamos.

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Quanto ao Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, pensamos que estáincorrectamente identificado. Foi Relator o Exmº Desembargador Sousa Leite e

foi proferido no dia 09.10.1997 (processo nº 9730334). O que nele se diz é“Se a relação contratual básica respeitar a relação duradoura, não se

consideram transmitidas para o cessionário as obrigações já vencidas nadata da cessão, salvo na hipótese de estipulação efectiva em sentidocontrário” (sublinhado nosso). E bem se compreende que assim seja. No nosso

caso, os Réus, até determinado dia, forneceram alojamento, pequeno-almoço,procederam a limpeza, arrumações e recepção dos clientes. Terão que receber

o quantitativo respectivo pelo trabalho prestado. A questão surge emcontinuarem a ser pagos, quando deixaram de exercer tais funções,

locupletando-se com o esforço e despesas suportadas por outrem. E, por isso,necessário se torne que este outrem, indubitavelmente, dê o seuconsentimento…

Quanto à posição defendida por Antunes Varela, salvo o devido respeito,

também este eminente civilista o que diz é algo bem diferente daquilo que foiinterpretado. Vejamos: “O cedente … não cede … o próprio contrato que

celebrou, o acordo negocial na sua «fase genética». Mas cede, «emdeterminado momento», a posição jurídica que lhe cabe na relaçãonascida do contrato básico; transmite uma parte dessa relação, em

determinado momento da sua «fase» funcional”.E diz mais. Elucida quanto aos efeitos da transmissão, decompondo-a:

A – Perda para o transmitente, dos créditos, dos direitos potestativos e dasexpectativas correspondentes à posição contratual cedida;

B – Liberação (para o mesmo contraente) das obrigações, dos deveres edos estados de sujeição referentes à mesma posição;C – Aquisição derivada translativa, para o cessionário, dos créditos,

direitos e expectativas perdidas pelo cedente e subingresso daquele nosvínculos que este fica exonerado”.

E termina: “E transmissão que atinge, em princípio, a relação contratualbásica com a configuração que ela reveste no momento da cessão, e não

no momento imediatamente posterior à celebração do contrato (básico).”E, para que não possam surgir quaisquer dúvidas quanto à sua doutrina,apresenta o seguinte exemplo: “Se, no contrato de fornecimento de 200 t. de

algodão, a empresa produtora já tiver fornecido 50 t. na altura em que afirma compradora cede a terceiro a sua posição, é o direito à prestação

remanescente e a correlativa obrigação de pagar o preço correspondenteque transitam para a firma cessionária da posição contratual”.

Após toda a dissertação que temos vindo a fazer, a solução surge-nos, salvodevido respeito por interpretação contrária, como cristalina.

Atentando na matéria factual vejamos o primeiro Réus/”D”

1 - A escritura de trespasse ocorreu no dia 30 de Julho de 1998.

2 – No dia 01 de Novembro de 1997 havia-se iniciado tal contrato deocupação turística com a “D”, que se manteria em vigor até ao dia 12 deNovembro de 1998 (nº 5 da matéria factual).

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A “D” pagaria o valor de 40.500.000$00.

Então:A - O contrato teria a validade de 377 dias. O preço dia era de 107.427$20.

B - Os Réus prestaram os serviços correspondentes durante 272 dias.C – Teriam que perceber, como compensação, 29.220.159$00.

D – A Autora receberia como compensação, 11.279.841$00.

Receberam os Réus (nº 12 da matéria factual): 32.648.536$00.

Passemos ao segundo contrato celebrado Réus/”D”

Este contrato iniciar-se-ia no dia 01 de Novembro de 1998, isto é, já após a

cessão do mesmo, pelo que nenhum serviço foi prestado pelos Réus.

Todavia receberam 3.942.567$00.

DECISÃO

Atentando em tudo quanto se procurou deixar esclarecido, revoga-se a

decisão proferida na Primeira Instância e, em consequência, condenam-se os Réus a pagarem à Autora o montante de 36.766,11 €, acrescida dejuros legais contados desde a data da citação e até integral pagamento.

Custas pelos Apelados.

*Évora, 30.03.06