27. dados históricos - portal da prefeitura de uberlândia · altar e volta para o mar. vem então...

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301 tempo do cativeiro, quando o senhor me batia, eu gritava por Nossa Senhora, ai meu Deus, quando a pancada doía.” O mito fundante do Congado em Uberlândia é um relato da aparição e resgate de Nossa Senhora do Rosário e possui pelo menos duas versões aqui sintetizadas: a) Nossa Senhora do Rosário estava dentro do mar, um garoto a vê submergir, chama os pais para verem, eles não acreditam. Então ele chama os Marinheiros, que também presenciam a santa submergir, eles tentam tirá-la com suas cordas, mas ela não sai do local. Chegam brancos e padres que conseguem retira-la da água e levá-la para uma capela, mas a santa “foge” do altar e volta para o mar. Vem então o terno de Congo, todo colorido e canta para ela sair da água, ela submerge, mas ao ser levada para a capela dos brancos, volta a “fugir” para o mar. Então um terno de Moçambique, todo vestido de branco e descalço, canta para ela, que então submerge e lhes acompanha, eles a levam devagar até o local onde constroem uma capela e ali Nossa Senhora do Rosário permanece, o terno de Moçambique então se retira sem lhe dar as costas, lhe fazendo reverência; b) a segunda versão, contada por Maria Conceição Cardoso, do Moçambique Rosário de Fátima, de Ibiá - MG, afirma que ao tentar capturar escravos fugidos na serra da Montanhesa, um grupo de capitães do mato encontra um grupo de negros, vestidos de branco, fazendo rosários, com contas de lágrima em frente a uma árvore de umbaúba onde Nossa Senhora do Rosário estava encravada num galho. Os capitães do mato tentam surrar os negros e capturá-los, mas eles permanecem imóveis, como se nada os pudesse atingir. Apavorados com a visão voltam para a cidade e chamam um padre para ir até o local verificar o fato. E como na primeira versão, brancos e Congos não conseguem levá-la, Nossa Senhora do Rosário acompanha apenas o Moçambique que canta vestido de branco, de pés descalços, que anda devagar e lhe constrói uma igreja e não lhe dá as costas ao se retirar de sua presença. 27. Dados Históricos: As bandeiras têm suas origens nas insígnias, sinais distintivos de poder ou de comando, usadas desde a antiguidade e que poderiam ser figuras recortadas em madeira ou metal, ou pintadas nos escudos. As primeiras bandeiras da história do homem costumavam representar um grupo sócio-cultural através de imagens e de cores dotadas de significados, a que a comunidade respectiva confere alto valor. As bandeiras fixadas a um mastro surgiram na China e foram introduzidas no Ocidente Medieval pelos Islâmicos. As bandeiras de tecido, no mundo ocidental, foram criadas pelos romanos e eram denominadas vexillium (insígnia, bandeira, estandarte). Desde a antiguidade os povos usaram mastros com imagens, carregados na mão ou fixados nos carros de combate. A grande difusão do seu uso foi feita pelos romanos e cada divisão da legião tinha o seu

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tempo do cativeiro, quando o senhor me batia, eu gritava por Nossa Senhora, ai

meu Deus, quando a pancada doía.” O mito fundante do Congado em Uberlândia é

um relato da aparição e resgate de Nossa Senhora do Rosário e possui pelo menos

duas versões aqui sintetizadas: a) Nossa Senhora do Rosário estava dentro do

mar, um garoto a vê submergir, chama os pais para verem, eles não acreditam.

Então ele chama os Marinheiros, que também presenciam a santa submergir, eles

tentam tirá-la com suas cordas, mas ela não sai do local. Chegam brancos e padres

que conseguem retira-la da água e levá-la para uma capela, mas a santa “foge” do

altar e volta para o mar. Vem então o terno de Congo, todo colorido e canta para ela

sair da água, ela submerge, mas ao ser levada para a capela dos brancos, volta a

“fugir” para o mar. Então um terno de Moçambique, todo vestido de branco e

descalço, canta para ela, que então submerge e lhes acompanha, eles a levam

devagar até o local onde constroem uma capela e ali Nossa Senhora do Rosário

permanece, o terno de Moçambique então se retira sem lhe dar as costas, lhe

fazendo reverência; b) a segunda versão, contada por Maria Conceição Cardoso,

do Moçambique Rosário de Fátima, de Ibiá - MG, afirma que ao tentar capturar

escravos fugidos na serra da Montanhesa, um grupo de capitães do mato encontra

um grupo de negros, vestidos de branco, fazendo rosários, com contas de lágrima

em frente a uma árvore de umbaúba onde Nossa Senhora do Rosário estava

encravada num galho. Os capitães do mato tentam surrar os negros e capturá-los,

mas eles permanecem imóveis, como se nada os pudesse atingir. Apavorados

com a visão voltam para a cidade e chamam um padre para ir até o local verificar o

fato. E como na primeira versão, brancos e Congos não conseguem levá-la, Nossa

Senhora do Rosário acompanha apenas o Moçambique que canta vestido de

branco, de pés descalços, que anda devagar e lhe constrói uma igreja e não lhe dá

as costas ao se retirar de sua presença.

27. Dados Históricos: As bandeiras têm suas origens nas insígnias, sinais

distintivos de poder ou de comando, usadas desde a antiguidade e que poderiam

ser figuras recortadas em madeira ou metal, ou pintadas nos escudos. As primeiras

bandeiras da história do homem costumavam representar um grupo sócio-cultural

através de imagens e de cores dotadas de significados, a que a comunidade

respectiva confere alto valor. As bandeiras fixadas a um mastro surgiram na China

e foram introduzidas no Ocidente Medieval pelos Islâmicos. As bandeiras de tecido,

no mundo ocidental, foram criadas pelos romanos e eram denominadas vexillium

(insígnia, bandeira, estandarte). Desde a antiguidade os povos usaram mastros

com imagens, carregados na mão ou fixados nos carros de combate. A grande

difusão do seu uso foi feita pelos romanos e cada divisão da legião tinha o seu

302

militares, mais especificamente para identificar os corpos de cavalaria. O Pendão

é uma bandeira grande, armada em vara, atravessada horizontalmente sobre o

mastro e levada em procissões. O Gonfalão é uma bandeira de guerra com partes

que prendem perpendicularmente a uma haste com três ou quatro pontas pendentes.

Os Estandartes do Congado mesclam elementos das bandeiras militares e

religiosas e são utilizados para identificar o terno que os conduz e para louvar os

santos de sua devoção. .

28. Referências Documentais: Fotografias e entrevistas realizadas com Custódio

José Izídio, Maria Aparecida Izídio e Eliane Izídio

29. Informações Complementares: O estandarte é uma espécie de bandeira e

falar em Bandeira no congado é um pouco complexo, pois possui pelo menos três

significados. Bandeira pode se referir à jornada, ao trajeto, à caminhada realizada

nas campanhas e festas. Também pode ser utilizado para se referir à bandeira em

tecido no formato retangular de aproximadamente 60 x 40 cm que trás estampado

imagens dos santos, com um cabo de madeira na extremidade superior por onde a

bandeireira (virgem, menor de 10 anos) segura. Esta pequena bandeira sempre

acompanha o terno, abrindo-lhe os caminhos, tanto em dias de campanha quanto

no dia da festa. Bandeira também pode referir-se ao estandarte em formato

retangular de aproximadamente 1,5 m de altura por 1m de comprimento, sustentado

por um mastro que o eleva à aproximadamente 2,5m de altura donde pendem fitas

cujas pontas as Bandeireiras seguram enquanto dançam e que traz identificações

do terno e homenagens aos santos. Geralmente o estandarte e as Bandeireiras só

saem em dia de festa. O tecido das bandeiras e estandartes são trocados

periodicamente, geralmente de dois em dois anos. As Bandeireiras ou Andorinhas

são meninas que conduzem as fitas do estandarte fazendo coreografias.

“Antigamente” esta função só era desempenhada pelas garotas virgens. Muitas

mulheres relatam que se a menina não fosse virgem e levasse a fita ou o mastro da

bandeira, muitos acidentes poderiam acontecer. Nossa Senhora do Rosário seria

a responsável por denunciar a farsa. Adereços de cabelo poderiam cair ou a roupa

se rasgar, a própria bandeira poderia sofrer danificações, como quebrar, rasgar.

estandarte. Foi na Idade Média que bandeiras e estandartes começaram a

representar reinos e regiões. As bandeiras foram usadas tanto em períodos de paz

como de guerra. Sendo um símbolo identificador eram usados pelos exércitos

aliados. Para não se confundirem uns com os outros e evitarem o temido fogo amigo,

usavam um pedaço de pano hasteado num estandarte, com as cores e sinais de

identificação do batalhão ou companhia envolvida. De acordo com seu tamanho ou

uso, a bandeira tem uma palavra sinônima. Estandarte é utilizado para insígnias

303

Levantamento Data: Abril de 2007

Fabíola Benfica Marra (Historiadora)

Larry Guimarães de O. Filho (Formatação, estagiário de arquitetura)

Larissa Gontijo T. Cunha (Formatação, estagiário de arquitetura)

Elaboração Data: Abril de 2007

Fabíola Benfica Marra (Historiadora)

Revisão Data: Abril de 2007

Anderson Henrique Ferreira (Historiador)

Gisele Pinto de Vasconcelos Costa (Arquiteta)

31. Ficha Técnica

30. Atualização das informações:

Desmaios e doenças também dificultariam a execução da função. Caberia a menina

se afastar quando não fosse mais “digna” de carregar a bandeira do Congado. A

execução desta função indevidamente poderia acarretar problemas ainda maiores

para os ternos, como esquecer música ou errar a “batida”. Hoje, no entanto, esta

tradição não é mantida pela maioria dos ternos.

304

BENS MÓVEIS E INEGRADOS

04.Propriedade: Particular

05. Endereço: Rua Consolação, 55 – Dom Almir

06. Responsável:Custódio José Izídio

01. Município: Uberlândia

02. Distrito: Sede

03. AcervoTerno Congo

Cruzeiro do Sull

07. Designação: Oratório do Terno Congo Cruzeiro do Sul08. Localização Especifica: quando não está em época de campanha fica naestante na sala09. Espécie: Móvel religioso10. Época: 200611. Autoria: Altair, marido de Eliana12. Origem: Uberlândia13. Procedência: Uberlândia14. Material / Técnica: Madeirite recortado, pregado, tinta esmalte sintético liláz,tramela de madeira, duas dobradiças metálicas, soquete com lâmpadafosforescente, porta de plástico transparente, crucifixo no alto, imagens de NossaSenhora do Rosário e de São Benedito em gesso afixados com cola de contato,flores de tecido.15. Marcas / Inscrições / Legendas: Crucifixo recortado em madeirite preso noalto.16. Descrição: Oratório no formato de capelinha, com telhado em duas águas.Crucifixo recortado em madeirite preso no alto por pregos. Oratório elaborado emmadeirite recortado, pregado, coberto com fina camada de tinta esmalte sintéticolilás. Porta de plástico transparente, fechado com tramela de madeira, preso porduas dobradiças metálicas. No interior, soquete com lâmpada fosforescente afixadono fundo do oratório, imagens de Nossa Senhora do Rosário e de São Beneditoem gesso afixados na base com cola de contato, acabamento com flores de tecido.17- Condições de segurança:( x ) Boa( ) Razoável( ) RuimObs:

SECRETARIA MUNICIPALDE CULTURA

INVENTÁRIO DE PROTEÇÃODO ACERVO CULTURAL

Minas Gerais-MG

305

19- Documentação fotográfica

18- Proteção Legal:

( ) Federal

( ) Estadual

( ) Municipal

20- Estado de Conservação:

( ) Excelente ( x ) Bom

( ) Regular ( ) Péssimo

Obs:

21- Dimensões:

Altura: 46cm

Profundidade: 26cm

Largura: 32cm

22. Análise do Estado de Conservação: Oratório em bom estado de conservação,

sem sinais de desgaste por insetos ou rachaduras.

23. Intervenções – Responsável / Data: NT

24. Características Técnicas:

Oratório no formato de capelinha, com telhado em duas águas. Crucifixo recortado

em madeirite preso no alto por pregos. Oratório elaborado em madeirite recortado,

pregado, coberto com fina camada de tinta esmalte sintético. Porta de plástico

transparente, fechado com tramela de madeira, preso por duas dobradiças

metálicas. No interior, soquete com lâmpada fosforescente afixado no fundo do

oratório, imagens religiosas em gesso afixadas na base com cola de contato,

acabamento com flores de tecido.

25. Características Estilísticas:

Estilo popular (sem característica estilística específica).

(X ) Nenhuma

( ) Tombamento Isolado

( ) Tombamento em Conjunto

Fotos do Quartel Terno Congo Cruzeiro do Sul

Uberlândia/MG Ano 2007

306

26. Características Iconográficas: Nos oratórios do Congado figuram as imagens

de Nossa Senhora do Rosário, de São Benedito e em alguns casos outras imagens

como a de Santa Ifigênia, Nossa Senhora Aparecida, São Domingos, etc.Cada

santo é associado a elementos distintos. Santa Efigênia ou Ifigênia, pelo que os

congadeiros dizem é a dona da festa do Congado. Santa Ifigênia, segundo Câmara

Cascudo é uma virgem mártir da Etiópia, devoção de negros e pessoas menos

favorecidas. A festa do Congado acontecia em louvor à Santa Ifigênia, a santa

negra, mas os brancos não aceitaram e para que a festa se legitimasse eles criam

a imagem de Nossa Senhora do Rosário. Segundo o Cláudio, filósofo, pesquisador

do Congado e dançador do Terno de Camisa Verde, os negros pegam o rosário

que é de Santa Ifigênia e colocam na imagem de Nossa Senhora do Perpétuo

Socorro, criando assim a imagem de Nossa Senhora do Rosário. Segundo Seu

Zezão, capitão do terno Congo de Santa Ifigênia, ele colocou em seu terno o nome

de Santa Ifigênia porque as pessoas precisavam reconhecer que a festa é dela.

Seu Zezão conta que deu muito trabalho para aceitarem o terno porque somente os

padres sabiam da “verdadeira história” de Santa Ifigênia, de Nossa Senhora do

Rosário e de São Benedito. Segundo ele, para haver união entre os pretos e os

brancos Chico Rei comprou a coroa de Santa Ifigênia para coroar Nossa Senhora

do Rosário, comprando assim a sua benção. Como garantia da fidelidade de Nossa

Senhora do Rosário colocaram um menino nos braços de São Benedito que não é

Jesus, mas um menino branco do povo. Se Nossa Senhora do Rosário algum dia

trair os negros, São Benedito deve cortar o pescoço do menino. De acordo com

seu Zezão, São Benedito está sempre ao lado de Nossa Senhora do Rosário como

um soldado, um general. Esta surpreendente narrativa de Seu Zezão introduz a

história de Chico Rei e trata de uma negociação entre os santos. Mas, o que mais

chama atenção é a mudança do papel de São Benedito. Este, tido como mártir

sempre foi referido como uma figura bondosa e que multiplicava os alimentos, uma

espécie de Cristo negro. Agora São Benedito é tomado como um militar frio, capaz

de decapitar um bebê branco em nome da proteção dos negros. Não ouvi de mais

ninguém a confirmação desta versão mitológica. Quando se conversa com seu Zezão

percebe-se claramente a existência de uma disputa pelo capital simbólico. Em meio

às críticas aos pesquisadores e aos trabalhos existentes sobre o congado ele

questiona a “ciência” dos “verdadeiros” “fundamentos” de sua prática ritual tanto

pelos pesquisadores como pelos capitães dos outros ternos. Insinuando ser ele um

dos poucos detentores dos conhecimentos tidos como “fundamentos” do Congado.

Diversas outras pessoas

307

tomam este comportamento como prática. Fazer o Congado sem “fundamento”

seria um ultraje. O convívio nos quartéis envolve aprendizado constante e um

“verdadeiro” capitão precisa passar por esta escola e aprender todas as lições

antes de ousar montar o seu próprio terno.O lendário Chico Rei, que é o criador da

Irmandade do Rosário em Minas Gerais, era rei em Moçambique, mas na perda de

uma batalha fora apreendido e vendido como escravo, trazido para o Brasil. Os

escravos trazidos de Moçambique eram os conhecedores das técnicas de

mineração, “farejavam as minas”, como diziam os invasores europeus. Chico Rei,

após enriquecer seu senhor e demonstrar ser um grande conhecedor do processo

de mineração conseguiu comprar com ouro a alforria de familiares e amigos, e

construir uma capela em homenagem à Santa Ifigênia em Vila Rica (Ouro Preto).

Após descobrir algumas minas Chico Rei disse que não trabalharia mais se o seu

senhor não trouxesse para junto de si seu filho e parentes que estavam distantes,

vendidos para outros senhores de escravos. Mais tarde conseguiu comprar a alforria

de diversos outros escravos. Segundo Câmara Cascudo “No dia de Reis, em Vila

Rica, as negras do cortejo de Chico Rei vinham com as carapinhas polvilhadas de

ouro lavá-las e deixar o ouro numa pia de pedra existente no Alto da Cruz, onde

havia uma imagem de Santa Ifigênia. O ouro servia para a libertação de outros

escravos.” (1972, p.449). O Rei “Moçambiqueiro” que no Brasil passa a ser chamado

de Chico Rei recria aqui o seu reino, supera a condição de escravo e constrói uma

das bases do movimento negro. Muitos negros se mantinham escravos e

cooperavam no movimento liderado por Chico Rei para a libertação de seu povo.

27. Dados Históricos Os primeiros oratórios datam dos primórdios da Idade Média.

Pequenos armários que podiam guardar não só o santo protetor, mas tudo que se

relaciona à devoção cotidiana. Propiciando um ambiente adequado às reflexões e

orações no interior das residências. Os oratórios geralmente simulam pequenos

templos, trazidos para o interior das casas para conferir aos seus donos segurança

e intimidade com o mundo do sagrado. Utilizados também em momentos festivos e

em celebrações coletivas.

Nos primeiros anos da colonização do Brasil, os oratórios exerceram importante

papel no exercício da fé, pois inexistindo igrejas, era diante desses nichos ou

armários de guardar santos que o povo fazia suas rezas. Deste modo as casas se

constituíam no local mais reservado para a devoção religiosa.

O oratório utilizado no Congado é o que designam por Esmoler ou oratório Itinerante

ou de viagem. Estes oratórios são encontrados principalmente em espaços urbanos

e utilizados para arrecadar dinheiro para a edificação de um templo de uma

irmandade e para angariar recursos para a realização de festas religiosas.

308

28. Referências Documentais:

Fotografias e entrevistas realizadas em visitas ao quartel Cruzeiro do Sul.

Site: http://www.museudoratorio.com.br

CD Rom “Álbum de Família: Famílias Afro-descendentes em Uberlândia no Século

XX” – Produzido por Fabíola Benfica Marra, com recurso da lei Municipal de Incentivo

à Cultura, finalizado em 2005.

29. Informações Complementares:

O oratório cumpre uma importante função no Congado. Durante as campanhas o

oratório fica na casa onde será realizada a novena e/ou o leilão. Quando o terno sai

para as novenas, as mulheres vão à frente para rezar com os moradores da casa. A

bateria chega quando a novena já encerrou.Uma virgem (geralmente criança menor

de 10 anos) leva uma bandeira com a imagem de São Benedito ou de Nossa

Senhora do Rosário, ou ambos, “escoltados” pela mãe e pela madrinha da bandeira

e do terno à frente da guarda. Eles tocam em saudação aos donos da casa que sai

para recebê-los. A bandeira é saudada com devoção e após passar sobre as

cabeças das pessoas da casa é levada para o interior da residência para que

sejam abençoados todos os cômodos e todos os moradores. Os dançadores

também entram tocando e realizando suas performances e logo se retiram. Após o

terço é realizado o leilão das prendas arrecadadas pelo morador da casa que está

recebendo o oratório do terno. O oratório andor permanece no interior da casa até

que todas as prendas sejam compradas. Uma “secretária”, geralmente uma das

Madrinhas, anota em um caderno cada produto e o valor arrematado e o nome do

comprador. Os produtos geralmente são arrematados por valores acima do valor

real de mercado. Encerrado o leilão, o terno toca para sair, agradece aos donos da

casa, que em alguns casos também oferecem um lanche. Os soldados descansam

as caixas do lado de fora enquanto as meninas rezam se despedindo. Os donos da

casa se despedem dos santos e do oratório que irá partir para abençoar outra

casa. Quando a bandeira sai, o capitão e seus soldados cantam e tocam se

despedindo e as meninas levam dançando o oratório andor com os santos e a

bandeira para a casa onde será realizada a próxima novena e/ou leilão. Ao chegar

os soldados chamam o morador que sai até a porta para receber a Bandeira (terno)

e o oratório. Todos rezam e combinam o dia certo para o leilão e/ou novena, que

poderá ser no dia seguinte ou nos próximos. A Bandeira (o terno) parte de volta

para o quartel, onde ficará a bandeira (levada pela virgem) e os instrumentos até o

próximo leilão. O oratório com as imagens dos santos é levado no dia da festa por

alguns ternos.

309

30. Atualização das informações:NT

31. Ficha Técnica

Levantamento Data: Abril de 2007

Fabíola Benfica Marra (Historiadora)

Larry Guimarães de O. Filho (Formatação, estagiário de arquitetura)

Larissa Gontijo T. Cunha (Formatação, estagiário de arquitetura)

Elaboração Data: Abril de 2007

Fabíola Benfica Marra (Historiadora)

Revisão Data: Abril de 2007

Anderson Henrique Ferreira (Historiador)

Gisele Pinto de Vasconcelos Costa (Arquiteta)

310

BENS IMATERIAIS

01. Município: Uberlândia

02. Distrito: Sede

03. Designação: Quartel do

Terno Congo Cruzeiro do Sul

07. Histórico:A família de seu Custódio reside há 17 anos no bairro Dom Almir. No

seu primeiro ano de existência o quartel do Congo Cruzeiro do Sul é na residência

de Custódio José Izídio

08. Descrição:A área construída ocupa aproximadamente 80% do terreno de

10X25m. Durante o dia da festa, os soldados transitam por todo o terreno, não

sendo construído nenhuma estrutura específica para o Congado além da área

residencial e dos cômodos comerciais desativados, que estão sendo utilizados

para guardar os instrumentos e a estrutura do estandarte.

Designação: Quartel do Terno Congo Cruzeiro do Sul

04. Endereço: Rua Consolação, 55 – Dom Almir

05. Propriedade: Privada

06. Responsável: Custódio José Izídio

09. Documentação Fotográfica:

SECRETARIA MUNICIPALDE CULTURA

INVENTÁRIO DE PROTEÇÃODO ACERVO CULTURAL

Minas Gerais-MG

311

10. Uso Atual:( x ) Residencial ( ) Institucional( ) Serviço ( ) Industrial( ) Comercial ( ) Outros11. Situação de Ocupação:( x ) Própria( ) Alugada( ) Cedida( ) Comodato( ) Outros

Fotos do Terno Congo Cruzeiro do Sul

Ano 2007 Uberlâdia -MG

312

12. Proteção Legal Existente

( ) Tombamento

( ) Municipal ( ) Estadual

( ) Federal ( X ) Nenhuma

13. Proteção Legal Proposta:

( ) Tombamento Federal ( ) Inventário

( ) Tombamento Estadual ( ) Tombamento Integral

( ) Tombamento Municipal ( ) Tombamento Parcial

( ) Entorno de Bem Tombado ( ) Fachadas

( )Documentação Histórica ( ) Restrições de Uso e Ocupação

( ) Volumetria

14. Análise do Entorno - Situação e Ambiência: Localiza-se em área plana com

com passeios, arborização, redes elétrica, rede de esgoto, rede de água tratada,

As edificações são predominantemente de volumetria simples apresentando

partidos retangulares, com vários “puxadinhos”, altimetria de um pavimento,

materiais de acabamento de alvenaria de tijolo cerâmico, pintura com grande

variação de cores e esquadrias de metalon ou alumínio, coberturas metálicas ou

com telhas cerâmicas.

15. Estado de Conservação:

( ) Excelente ( X ) Bom

( ) Regular ( ) Péssimo

16. Análise do Estado de Conservação:O estado de conservação é bom,

podendo-se notar, inclusive, reformas recentes, como a troca de algumas

esquadrias.

17. Fatores de Degradação:A inexistência de reboco em algumas áreas facilita

muito a ocorrência de infiltrações causadas pela ação das intempéries.

18. Medidas de Conservação:Manutenção preventiva

19. Intervenções:Não identificadas

20. Referências Bibliográficas:*Marra, Fabíola Benfica. Álbum de Família:

Famílias Afro-descendentes no Século XX em Uberlândia – MG – CD-Rom produzido

entre os anos de 2004 e 2005, através da lei municipal de Incentivo à Cultura.*Slenes,

Robert W. “Na Senzala uma flor: esperanças e recordações da família escrava,

Brasil Sudeste, Século XIX” Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999.

21. Informações Complementares:Os quartéis são os locais onde os soldados

de cada guarda se reúnem para fazer as campanhas ou para sair em viagens. É

também onde guardam os instrumentos e realizam as refeições durante os dias de

festa e fazem intervalos de descanso.

313

Todas as atividades do Congado começam e terminam no quartel. Geralmente o

quartel é o local de moradia da família do capitão ou da madrinha do terno. As

construções são o que se chamam colônias: diversas casas pequenas, construídas

em períodos distintos, dispostas umas ao lado das outras e com um pátio, uma

área comum, um terreiro no meio. A área não construída no meio é utilizada para

reunir o terno, para realizar as refeições coletivas, afinar instrumentos. Em muitos

casos, banheiros, tanques, pias e locais para passar roupas são de uso comum a

todos os moradores da colônia. Nos Quartéis, realizam grandes refeições conjuntas,

mesmo não sendo dia de festa Congado. O milagre multiplicador dos alimentos

promovido por São Benedito é realizado pelas matriarcas todos os dias e se estende

aos “praticamente filhos”, pois muitas crianças, jovens e adultos são atraídas para

o convívio das famílias de congo, estendendo os laços familiares para além dos

consangüíneos. O Congado que acontece na porta da igreja Católica é o ápice, o

momento máximo desta festa que dura praticamente o ano inteiro dentro dos terreiros

e quartéis. A família é festejada diariamente. Grandes matriarcas reúnem ao seu

redor seus muitos filhos todos os dias.Segundo Robert W. Slenes1, a palavra Senzala

origina-se do dialeto Kimbundu e significa “residência de serviçais em propriedade

agrícola” ou ainda “moradia de gente separada da casa principal”. Senzala também

pode significar “Povoado” ou “grupo de parentesco”. (p. 148). Enquanto a expressão

Quilombo é utilizada para designar “acampamento de guerreiros” (p. 173). Os

Quartéis de Congado abriga Soldados com suas caixas e seus Estandartes durante

as Campanhas. No Congado, os guerreiros conduzem caixas e são designados

Soldados, organizados por Capitães, seguem seus Estandartes e se abrigam no

Quilombo chamado Quartel. (Footnotes)

22. Atualização das informações:NT

23. Ficha Técnica

Levantamento Data: Abril de 2007

Fabíola Benfica Marra (Historiadora)

Larry Guimarães de O. Filho (Formatação, estagiário de arquitetura)

Larissa Gontijo T. Cunha (Formatação, estagiário de arquitetura)

Elaboração Data: Abril de 2007

Fabíola Benfica Marra (Historiadora)

Revisão Data: Abril de 2007

Anderson Henrique Ferreira (Historiador)

Gisele Pinto de Vasconcelos Costa (Arquiteta)

314

Secretaria Municipal de Cultura

CONGO CAMISA

VERDE

316

BENS IMATERIAIS

01. Município: Uberlândia

02. Distrito: Sede

03. Denominação: Terno

Congo Camisa Verde

INVENTÁRIO DE PROTEÇÃODO ACERVO CULTURAL

Minas Gerais-MG

04. Natureza: Festas Populares/ Celebrações/

Cultos Afro-brasileiros

05. Responsável: Maria Rosária de Fátima

Nascimento (Dona Fátima)

06. Informe Histórico:Maria do Rosário Nascimento, atual presidente do terno Congo de Camisa Verde,nasceu no dia 15/09/1937 na cidade de Araguari. Mudou-se para Uberlândia em1952 para trabalhar de doméstica e foi através do casamento com José Olímpio doNascimento que passou a integrar o Congo de Camisa Verde. José Olimpio erasobrinho de Elias Nascimento, na época presidente da Irmandade de NossaSenhora do Rosário e São Benedito em Uberlândia, além de comandar o TernoCongo de Camisa Verde. Dona Gercina, esposa do seu Elias, comandava oMarinheiro de Nossa Senhora do Rosário, o Marinheirinho. Dona Fátima recordaque o terno foi primeiro do Manoel Angelino, que passou para o seu Elias Nascimentoe para o José Mendes, que passou para o José Olimpio. Após a morte de JoséOlimpio, seu Deny Nascimento, atual presidente da Irmandade, filho de EliasNascimento, passou o comando do terno Congo de Camisa Verde para os cuidadosde Dona Fátima.Quando Carlos Roberto Nascimento, nascido em 28/04/1960, tinha treze anos, seuDeny passa para ele o comando do terno Congo de Camisa Verde. Nessa épocaJosé Mendes e Custódio eram capitães que auxiliavam Carlos.07. Documentação fotográfica:

Fotos do Terno Congo de Camisa Verde

Uberlândia/MG Ano 2007

SECRETARIA MUNICIPALDE CULTURA

317

08. Descrição: O terno Congo de Camisa Verde é um dos ternos mais antigos da

cidade, está diretamente ligado à família que comanda a Irmandade do Rosário.

Possui ligações com os ternos Congo de Camisa Verde das cidades de Araguari e

de Ituiutaba. Os ternos Camisa Verde de Araguari e de Ituiutaba envia soldados

para participarem da festa em Uberlândia, sendo retribuída a visita dos

uberlandenses nessas cidades. Os soldados usam calças e sapatos brancos,

camisa de manga comprida verde, capa amarela, chapéus com cordões de

miçangas que pendem cobrindo os olhos do dançador. As capas atualmente são

bem longas, até quase tocar o chão, mas de acordo com fotografias antigas, essas

capas eram menores. A indumentária fica a cargo do soldado que irá usa-la, variando

muito os ornamentos e bordados de capas e chapéus. As bandeireiras e madrinhas

utilizam roupas e sandálias iguais, luvas e adereços florais nos cabelos.

09. Grupos Sociais Envolvidos: Irmandade do Rosário, familiares de Dona

Fátima, moradores do bairro Aparecida

10. Organizadores:

Presidente: Maria Rosária de Fátima Nascimento

1º Capitão: Carlos Roberto Nascimento

2º Capitão: Edson Nascimento

Capitães Auxiliares: Eduardo, João dos Reis

Madrinhas: Neuza e Mariza

11. Participantes:aproximadamente 100 integrantes

12. Local de Realização:Quartel localizado na Rua Feliciano de Moraes, 147 -

Aparecida

13. Data/ periodicidade de ocorrência: A “campanha” do Congado, como os

congadeiros dizem, começava por volta do dia 15 de setembro, atualmente ela

começa por volta do dia 10 de agosto. Por causa da mudança da data da festa de

novembro para outubro, a campanha também começa mais cedo. A festa do

Congado realizada na Igreja de Nossa Senhora do Rosário no centro da cidade de

Uberlândia, atualmente ocorre no segundo domingo e segunda-feira de outubro,

antes era no segundo domingo e segunda-feira de novembro. Ocorre também uma

festa na igreja de São Benedito, no bairro Planalto no mês de maio. Várias festas

em outras cidades ocorrem em diversas datas ao longo do ano, sendo visitadas

pelos ternos de Uberlândia.

14. Informações Complementares:

O Congado é um ritual afro-brasileiro que nasce dos cortejos de coroação de reis,

do culto aos ancestrais africanos e das celebrações de santos da Igreja Católica.

Uma dança ritual executada por guardas ou ternos de Congo, Moçambique, Marujo,

Marinheiro e Catupé.

318

Os dançantes prestam homenagem à Nossa Senhora do Rosário e a São Benedito,

aos antepassados e aos santos de sua devoção, principalmente aos santos negros

Santa Ifigênia e N. S. Aparecida, mas também São Domingos, Nossa Senhora da

Guia, Nossa Senhora d’Abadia, etc. Cada terno se diferencia do outro nas coresdas roupas e dos acessórios, nos ritmos das músicas, nos instrumentos e na formada dança.Prevalesse o canto antifonal, isto é, um solista, geralmente o PrimeiroCapitão, apresenta o tema e o coro responde. O Segundo Capitão com seu bastãoe apito comanda os soldados na execução instrumental. Cada Capitão “puxa” umasérie de músicas que podem ser elaboradas por ele ou pelo grupo e ainda outrasaprendidas com outros ternos ou com os antepassados. Algumas músicas são“tradicionais” do terno, passadas de capitão para capitão. Outras são específicasde cada guarda. Existem também cantorias que são consideradas “segredo” quenão podem ser reveladas para “os de fora” e que são aprendidas e “guardadas nocoração”, só são executadas em cerimônias reservadas.

O trajeto do Congado é uma manifestação pública da fé, do pertencimento aomovimento cultural afro-brasileiro-mineiro-uberlandese. Os congadeiros rompemos muros que cercam suas comunidades e ganham a cidade, comemorando amanutenção de suas famílias e de sua cultura.

O ritual composto por elementos da cultura bantu é reelaborado no Brasil sobinfluência do contato com outros povos africanos, europeus e nativos. O Congadoem Uberlândia, é fundamentado no mito da aparição e resgate da imagem de NossaSenhora do Rosário e possui pelo menos duas versões: a) Nossa Senhora doRosário estava dentro do mar, um garoto a vê submergir, chama os pais para verem,eles não acreditam.

Então ele chama os Marinheiros, que também presenciam a santa submergir, elestentam tirá-la, mas ela não sai do local. Chegam brancos e padres e tentam levá-lapara uma capela, mas a santa “foge” do altar e volta para o mar. Vem, então o ternode Congo, todo colorido e canta para ela sair da água, ela submerge, mas ao serlevada para a capela dos brancos, volta a “fugir” para o mar. Um terno deMoçambique, todo vestido de branco, descalço, com gungas nos pés, canta paraela, que então submerge e lhes acompanha, eles então constroem uma capelapara ela e ali Nossa Senhora do Rosário permanece, o terno de Moçambique entãose retira sem lhe dar as costas. b) a segunda versão, contada por Maria ConceiçãoCardoso, do Moçambique Rosário de Fátima, afirma que ao tentar capturar escravosfugidos na serra da Montanhesa, um grupo de capitães do mato encontra um grupode negros, vestidos de branco, fazendo rosários, com contas de lágrima em frentea uma árvore de umbaúba onde Nossa Senhora do Rosário estava encravada numgalho. Os capitães do mato surram os negros e tentam capturá-los, mas elespermanecem imóveis. Apavorados com a visão voltam para a cidade e chamamum padre para ir até o local verificar o fato.

319

E como na primeira versão, brancos e Congos não conseguem levá-la, Nossa

Senhora do Rosário acompanha apenas o Moçambique que canta, vestido de

branco e lhe construiu uma igreja e não lhe dá as costas ao se retirar de sua presença.

O Moçambique é, por isso, a Guarda Real. Isto é, são os ternos de Moçambique os

responsáveis por conduzir as imagens dos santos, bem como os reis durante a

procissão. É responsável por levantar o mastro na porta da Igreja dando início ao

Congado, é quem geralmente conduz os casais reais até a procissão e também no

encerramento da festa. Ouvi de diversos capitães em Uberlândia, que quem conduz

o casal real é o Moçambique ou “Congo de coroa”. A coroa além de representar a

realeza, também é símbolo de Nossa Senhora e confere a quem a utiliza a autoridade

para conduzir os reis e santos. A coroa também está associada aos Pretos Velhos,

na Umbanda, representa o poder e a sabedoria dos anciões. O Catupé faz a guarda

do Moçambique e pode substituí-lo nessas funções.. As músicas, as roupas e

adereços e o trançar de fitas característico do terno de Marinheiros e Marujos, fazem

referência ao mar que traz os negros para o Brasil e de onde Nossa Senhora é

retirada, e às atividades do Marinheiro.Os ternos de Congo são de louvação, os

tocadores de maracanãs e caixas fazem performances saltando com os

instrumentos, mas esta performance, atualmente, também é reproduzida por outras

guardas.Segundo os integrantes do Marinheiro de São Benedito a performance

dos saltadores ou caixeiros de frente, em que os dançadores pulam com as caixas

revezando entre ajoelhar-se e saltar é cheia de significação.

Quando estão ajoelhados, estão pedindo axé e quando estão pulando, estão

agradecendo as graças recebidas. Axé é energia vital, essencial para existência.

Uma das características diferenciadoras dos ternos de Congo que vem se

extinguindo em Uberlândia é o uso de cuíca e de tamborins (caixinhas quadradas

confeccionados em madeira e couro, percutidas com uma vareta), bem como o

uso de pandeiros, adufes e instrumentos harmônicos como violões, cavaquinhos,

banjos e sanfonas.

A organização das guardas, a hierarquia dos ternos, segue os modelos militares

ou políticos. Na maior parte dos ternos, o “regente” é chamado Capitão, mas em

outros recebe o distintivo de General ou Guia. Existem outras funções, tais como,

Presidente, Fiscal, Conselheiro, Secretário, Tesoureiro, Madrinha do Terno, Madrinha

da Bandeira, Soldados, Bandeireiras, etc. que variam de terno para terno, tanto em

número como em funções e significações. “Antigamente” a função de Primeiro

Capitão era designada em alguns ternos de Marechal e as bandeireiras de Juizas,

o Presidente era conhecido como o Dono do terno. As designações presidente,

vice-presidente geralmente tem seu equivalente como primeiro capitão, segundo

capitão, madrinha.

320

O primeiro capitão se desloca o tempo todo se certificando se tudo corre bem comtodo o terno e também puxa as músicas. O segundo capitão geralmente éresponsável por reger a bateria, é o maestro. Dois outros capitães ou fiscaisprotegem as laterais e também se locomovem entre os dançadores. A madrinha doterno geralmente segue a frente, junto à virgem que carrega a bandeira, mas tambémtransita pelo terno auxiliando na medida em que se faz necessário. A madrinha dabandeira auxilia as bandeireiras. Elas também são responsáveis pelas crianças,no Marinheirão existe a função de capitão das crianças, outras pessoas, geralmenteas mães também cuidam das delas, carregando-as no colo quando se cansam.Os Fiscais auxiliam na condução do terno, na execução das músicas, naorganização dos dançadores. São os imediatos do Capitão, geralmente tambémimpunham um bastão e trazem um apito. As funções de Presidente, tesoureiro eSecretários, exigidas para o registro oficial, geralmente são desempenhados pelospróprios Capitães, Madrinhas e Fiscais.Os Soldados são os tocadores edançadores. As Bandeireiras conduzem as Bandeiras ou estandartes e suas fitas fazendocoreografias, também podem ser chamadas de Andorinhas.“Antigamente” esta função só era desempenhada pelas garotas virgens. Muitasmulheres relatam que se a menina não fosse virgem e levasse a fita ou o mastro dabandeira, muitos acidentes poderiam acontecer. Nossa Senhora do Rosário seriaa responsável por denunciar a farsa. Adereços de cabelo poderiam cair ou a roupase rasgar, a própria bandeira poderia sofrer danificações, como quebrar, rasgar.Desmaios e doenças dificultariam a execução da função. Caberia a menina seafastar quando não fosse mais “digna” de carregar a bandeira do Congado. Hojeno entanto esta tradição não é mantida pela maioria dos ternos.Alguns atribuem sentidos místicos à escolha das cores, dos instrumentos, dosacessórios e dos ritmos, outros vêm nesses elementos traços distintivos dos ternos.As roupas e acessórios são usados apenas nos dias de festa, durante a campanha,cada um se veste a seu modo. As meninas geralmente fazem roupas que podemser usadas no cotidiano, já que todo ano elas fazem duas trocas de roupa: umapara o domingo e outra para a segunda. Alguns ternos modificam os modelos desuas roupas todo ano, outros mantém a vestimenta dos homens durante algumperíodo. Constatei a preocupação de anciões quanto à manutenção das roupasconsideradas tradicionais dos ternos. A indumentária que mais inova é a dasbandeireiras, geralmente as roupas dos soldados possuem elementosidentificadores dos ternos e não mudam de um ano para o outro, a mudança quandoocorre é gradativa. A indumentária é um dos elementos identificadores dos ternos,por isso a Irmandade do Rosário intervém na escolha das cores e adereços.Os ternos só recebem a Carta de Comando – ordem para participar dos festejos –se estiverem filiados à Irmandade de Nossa Senhora do Rosário de Uberlândia.Aqueles registrados em cartórios participam do Reinado sem o aval da Irmandade.Um representante da Igreja, geralmente o pároco, participa diretamente das decisõesda Irmandade.

321

A Irmandade é o elo de ligação dos ternos com a Igreja Católica e as subvençõesgovernamentais. A Irmandade gerencia a festa, decide data de realização da festa,faz e refaz o estatuto da Irmandade e da Festa, decide horários de realização demissas, procissões etc. A diretoria da Irmandade do Rosário é na verdade umreinado, onde os cargos são hereditários. Cada terno é como se fosse um “reino”ou “estado”, “clã”, “facção”, um batalhão, um pelotão, pertencente à um tipo deguarda. Com organização e agenda de rituais própria. Cada terno possui o seu“diplomata”, geralmente um capitão, que fará sua representação nas reuniões coma Irmandade e os órgãos governamentais ou financiadores.Apesar de muitos congadeiros negar que exista rivalidade entre os ternos, a disputatorna-se muito clara em muitos momentos.Disputam a ocupação do espaço na praça da igreja, qual a execução mais perfeitadas músicas, qual o maior número de componentes, qual a melhor organização edisposição dos soldados na apresentação, qual a melhor e mais bonita indumentária,ocorre disputa na demarcação do território onde realizaram sua campanha, etc.Em alguns momentos verdadeiras batalhas orquestrais ocorrem: os ternos seenfrentam com os instrumentos, o apito e a expressão corporal dos capitães deixamclara a luta enquanto os soldados rufam seus tambores.Durante “campanha” do Congado, como os congadeiros dizem, são confeccionadosou reformados acessórios, roupas e instrumentos. Realizam ensaios, novenas,leilões, reuniões com a Irmandade e com a Coordenadoria Municipal Afro-Racial(CoAfro). Fazem benzições, trabalhos espirituais. Visitam outras cidades em festa.A campanha é o período que precede a festa.Geralmente é o Presidente do terno ou a Madrinha quem fica responsável poragendar os leilões e novenas. Os donos da casa onde serão realizados os leilõesarrecadam “prendas”, geralmente alimentos, produtos de higiêne, bebidas, quitutes,roupas, etc, que serão leiloados a favor do terno. Reúnem-se os dançadores, afinam-se os instrumentos e cada terno sai do seu quartel sob o comando do bastão e doapito de seus capitães realizando jornadas noturnas que extrapolam os limites dosbairros para realizar as novenas e os leilões. Estes deslocamentos pela cidadeenchem a noite com as sonoridades dos instrumentos. Algumas pessoas saem naporta das casas para ver os ternos passarem, nos seus ensaios para o dia dafesta.Cada terno possui o seu “território”, demarcado pelas casas dos amigos queoferecem prendas para o leilão ou solicitam a visita da bandeira para a realizaçãoda novena. Cada terno possui um quartel, que pode ser a casa de um dos capitãesou de pessoas ligadas ao terno. O “território” dos ternos extrapola, inclusive asfronteiras das cidades, pois cada terno possui uma agenda de festas e encontrosformando distintas redes de sociabilidade. Os ternos também costumam visitarsuas cidades de origem.

322

Quando um terno se encontra com outro no trajeto pode acontecer pelo menos trêsações diferentes: 1 – se os ternos forem amigos, se cumprimentam e até mesmo tocam juntos;2 – se os ternos tiverem algum tipo de diferença, rixa, ou questão a ser resolvida,poderá haver uma espécie de confronto, um duelo de instrumentos, ou um ternoimpede o outro de atravessar uma rua ou passar na porta da igreja.3 – se os ternos ainda não se conhecerem pode acontecer dos Capitães cantaremum para o outro saldando as bandeiras e se identificando. Pode também haverneste caso uma espécie de duelo em que os capitães disputam cordialmente parasaber qual dos capitães é mais experiente ou qual a bateria faz mais evoluções.O trajeto até a casa da novena é utilizado para realizarem o ensaio para o dia dafesta. Durante o trajeto até as casas onde se realizarão as novenas, os capitãesensinam as músicas aos novatos e ensinam a tocar os instrumentos. É comum acriação de músicas novas para apresentarem no dia da festa. A composição podeser feita por capitães, madrinhas ou dançadores do terno ou ainda ser atribuídas amentores espirituais. Muitas músicas tocadas durante a campanha podem não serexecutadas no dia da festa. Existem também músicas específicas para cadaocasião: para chamar o dono da casa, para agradecer as prendas para o leilão,para abençoar o interior da casa, músicas de novena, em louvor a São Benedito,em louvor a Nossa Senhora do Rosário, que relembram os antepassados, que falamde fenômenos climáticos, para solicitar a saída da bandeira, para saldar Reis eRainhas, de despedidas, para quando ocorre um encontro com outro terno seja eleamigo ou não e uma infinidade de outras possibilidades, variando de terno paraterno.Existem duas versões para a origem do Congado em Uberlândia. A primeiraconsidera o Distrito de Miraporanga (antiga Santa Maria) o local de onde seoriginaram os ternos de Congado do município, na época, o arraial de São Pedrode Uberabinha. Segundo Paulino (In Brasileiro, 2001:31), o primeiro terno demoçambique surgiu em Miraporanga, não sendo inicialmente aceito pelosmoradores de São Pedro do Uberabinha. A Igreja do Rosário de MIrapóranga,construída em 1850, foi fundada por escravos, que posteriormente se mudariampara o futuro bairro Patrimônio em Uberlândia, às margens do Rio Uberabinha,levando consigo as celebrações do Congado.A segunda versão indica que o movimento do Congado se iniciou no Sertão daFarinha Podre, por volta de 1874, através do “Mestre André”. Esse senhor reuniaos negros da região do Rio das Velhas e Olhos D’Água, tocando tambor em culto àNossa Senhora do Rosário, padroeira dos negros, pedindo para libertá-los daescravidão. O início do movimento ocorre por volta de 1876, período de expectativae temor quanto à abolição da escravatura no Brasil Império. Vale lembrar que em1881 foi decretada a lei nº 2040, conhecida como a “Lei do Ventre Livre” e em 1885a “Lei do Sexagenário” ou “Lei Saraiva Cotegipe”, as quais participaram de umprocesso que culminou na própria abolição da escravatura, em 1888.

323

O município de Uberlândia se localiza na região do Triângulo Mineiro, área conhecida

no século XVIII e XIX como Sertão da Farinha Podre. Esta região era denominada

de Sertão da Farinha Podre por causa dos sacos de palha com farinha, encontrados

pelos colonizadores, enterrados ou pendurados nas árvores. Das histórias contadas

sobre a origem deste nome, existe uma que afirma que quando as bandeiras se

aproximavam os indígenas e quilombolas que aqui habitavam escondiam sua

farinha, base de sua alimentação, com esperança de poderem voltar algum dia

para suas aldeias e ter alimentos até a nova plantação dar seus frutos. Eles se

refugiavam nas matas e esperavam os bandeirantes abandonarem suas moradias

após arrasá-las com saques e incêndios. Muitas aldeias tinham que mudar

constantemente sua localização, abandonando sacos de farinha pelo caminho de

sua fuga. Por causa de sua localização geográfica, o Sertão da Farinha Podre

passou a ser um entreposto para os avanços das bandeiras. Local de de descanso

e comércio de tropas uma parada na rota de tropeiros e mineradores em direção a

Goiás e Mato Grosso. A farinha que fora escondida pelos quilombolas e/ou

indígenas apodrecia com a ação do tempo, e depois era encontrada pelos novos

habitantes do lugar. Por causa da grande quantidade de mantimentos apodrecidos

encontrados, a região da bacia do rio Paranaíba que abrange o atual Triângulo

Mineiro e parte do sul do estado do Goiás, ganhou o nome de Sertão da Farinha

Podre.

O Sertão da Farinha Podre era povoado por vários núcleos quilombolas distribuídos

como pontos de uma rede. Os documentos oficiais referem-se a diversos deles

como pertencentes ao Quilombo do Campo Grande. O Quilombo do Ambrósio,

localizado na zona rural de Ibiá, cujo sítio arqueológico é tombado pelo patrimônio

histórico, foi como uma célula central de onde partiam os integrantes que formavam

os outros núcleos da rede. A historiografia oficial considera que o Quilombo do

Ambrósio tenha sido destruído em 1746, sendo referido como o maior núcleo,

comportando até mais de “mil negros, e grande número de negras e crias”. Os

documentos oficiais que narram a destruição deste núcleo e de “outros menores”

informam o número de três oficiais e duzentos e sessenta “homens capazes, e dos

mais desocupados” reunidos nas freguesias de Brumado (hoje Patrocínio), Sta

Rita, Carijos, Congonhas, Ouro Branco e Prado. E para a destruição do Quilombo

do Campo Grande foram enviados quatrocentos e depois mais trezentos homens

da cidade de Mariana, São João de El Rey, São José, Sabará e Vila Nova da

Raynha. Sendo que estas comitivas levavam cartas solicitando que todas as

comarcas lhes fornecessem “munições de guerra e de boca”.

324

Embora, os documentos oficiais relatem expedições bem sucedidas na destruição

destes quilombos, deixam a entender que muitos quilombolas fugiam recomeçando

um novo quilombo em áreas não ocupadas pelo homem branco. A área onde hoje

se localiza Uberlândia só foi ocupada pelo homem branco a partir de 1821,

possuindo ainda reminiscências dos antigos quilombos do Campo Grande. Mas a

construção de hidrelétricas tem destruído paulatinamente os vestígios arqueológicos

destes quilombos que geralmente escolhiam áreas estratégicas próximas aos rios

para se instalar. Os quilombolas escolhiam sua localização de acordo com os

elementos oferecidos pelo ambiente buscando áreas que lhes possibilitasse a

permanência (agricultura e pecuária de subsistência, assaltos às tropas de

comerciantes e viajantes e contrabando) e a defesa da comunidade. A região ainda

preserva na toponímia referências aos antigos quilombos (Pau Furado e Quilombo).

A ocupação efetiva desta área pelo homem branco ocorreu a partir do século XIX,

sendo a produção pecuária e a agricultura de subsistência primordiais, pois

possibilitaram a instalação das fazendas e dos arraiais que futuramente constituiriam

vários municípios e distritos. O arraial de São Pedro do Uberabinha, núcleo inicial

da cidade de Uberlândia, formou-se no início do século XIX, a partir da aquisição

de sesmarias do governo da Província de Minas Gerais por algumas famílias. O

marco inicial da atual cidade foi a antiga Sesmaria de São Francisco, doada a

João Pereira da Rocha, em 1821. A chegada de outras famílias, com destaque

para a “Alves Carrejo”, intensificou a ocupação da região.

Em 1846, Felisberto Alves Carrejo, após aquisição de área de dez alqueires entre

o Córrego São Pedro e o Córrego Cajubá, obteve, juntamente com Francisco Alves

Pereira, aprovação do Bispado de Goiás para a construção de uma capela curada,

consagrada a Nossa Senhora do Carmo e a São Sebastião da Barra. No ano de

1852 foi criado o Distrito de Paz do São Pedro do Uberabinha, pela lei provincial n.

602, e em 1853 a primeira capela foi concluída. A criação da paróquia, em 1857,

ocorreu no mesmo ano da formação do patrimônio da capela, composto de terras

doadas por um grupo de moradores locais que haviam adquirido 100 alqueires da

Fazenda do Salto (Vale, 1998: 252). As primeiras edificações do arraial se São

Pedro do Uberabinha se concentravam ao redor do largo da Igreja Matriz, em terrenos

aforados do patrimônio de Nossa Senhora do Carmo. Em 1883 foram doados,

ainda, doze alqueires de terra à margem esquerda do córrego Uberabinha, próximo

aos limites do arraial, destinados ao patrimônio de Nossa Senhora da Abadia

(Lourenço, 1986:16)

325

Em 31 de agosto de 1888, a então freguesia foi transformada em vila, com o nome

de São Pedro do Uberabinha, tendo sido instalada oficialmente em 1891. Em 24

de maio de 1892, a vila foi elevada à categoria de cidade pela lei nº 23. Em 1895,

a Estrada de Ferro Mogiana atingiu a cidade de Uberlândia e se verifica o

desenvolvimento da produção agropecuária e de indústrias, com destaque para a

produção de charque (Brasileiro, 2001: 253). “Nas duas primeiras décadas do século

XX foram instaladas em Uberlândia indústrias ligadas à produção rural. Têm-se

registro das seguintes indústrias, existentes em 1922: beneficiadoras de arroz e

algodão, serrarias, carpintarias, charqueadas, curtumes e outros estabelecimentos

de produção de couro e carne, além de fábricas de banha, sabão, calçados e

arreios” (Lourenço, 1986: 20). Vale ressaltar que o fornecimento de energia elétrica

teve início em 1909, aumentando a possibilidade da instalação de várias fábricas.

Em 1929, a cidade recebeu o nome de Uberlândia, através da lei nº 843. Na década

de 1930, a abertura de estradas de rodagem em direção às áreas de exploração

de diamantes do Rio Araguaia intensificou o desenvolvimento da área, que se tornou

ponto de troca e abastecimento de caravanas e compradores de diamantes . Em

1933 , iniciou -se a construção da nova igreja Matriz concluída em 1941. A padroeira

Santa Terezinha foi escolhida para substituir os antigos padroeiros da cidade Nossa

Senhora do Carmo e São Sebastião da Barra. A antiga igreja Matriz foi demolida

em 1943, dando lugar a estação Rodoviária, que hoje sedia a Biblioteca Municipal

. Em 1940, cidade passa por um rápido crescimento e adensamento populacional,

e desde então tem se configurado importante centro regional, localizado em local

estratégico, próximo a seis capitais (Campo Grande, Cuiabá, Goiânia, Belo

Horizonte, São Paulo e Brasília ). De 1985 a 1996, o seu crescimento anual do P I

B de 5, 09%, superior ao crescimento de Minas Gerais (2,17%) e do Brasil (2,28%).

Hoje, a cidade se destaca pelo desenvolvimento dos setores de agro industria,

tecnologia da informação, setor atacadista - distribuidor, e mais recentemente, de

biotecnologia, sendo também considerado pólo na área de ensino superior.

Há referências históricas de que a primeira Capela de Nossa Senhora do Rosário

tenha sido iniciada pelo Padre João Dantas Barbosa, em 1876, a qual não foi

concluída, tendo sido definitivamente levantada na atual praça Cícero Dr. Duarte.

Em decorrência do abandono da capela anterior, entre 1891 e 1893, ocorreu a

construção da nova Capela do Rosário “com estrutura de madeira, tijolos de adobe

e telha comum, situada no centro da cidade e com fachada voltada para o bairro

General Osório (atual bairro fundinho).”

326

Já em meados de 1890, o então presidente da Irmandade do Rosário passou a

comandar a nova procissão. O vigário Pio Dantas estimulou a participação da

comunidade negra nas festividades religiosas. (Ibidem, 2001).

Com o crescimento da cidade, a segunda capela precisou ser ampliada. Foi

composta uma comissão responsável por angariar donativos particulares e recolher

uma mensalidade cobrada da Irmandade do Rosário. A capela anterior foi demolida

e, no mesmo local, a partir de 1928, foi construída uma nova capela com projeto de

autoria do arquiteto Thomaz Hovanez. Em 1931, a Capela Nossa Senhora do

Rosário foi re-inaugurada. Em 1985, a Capela de Nossa Senhora do Rosário foi

tombada pelo Patrimônio Histórico Municipal (lei nº 4263, de 9 de setembro) e

entre 1987 e 1988, foi restaurada pela Secretaria de Cultura do Município com

apoio do IEPHA/MG (Vale, 1998:257). A Capela de Nossa Senhora do Rosário

passou por processo de restauração no de 2006.

15. Referências:

* Anais da Biblioteca Nacional – Volume 108 – Rio de Janeiro, 1988 pg. 47-113 –

Carta de Gomes Freire de Andrade para o Capitão-mor da Vila de S. João de El

Rey Manuel da Costa Golvea, 27 de junho de 1746. Mss. APM, Códice SC84,

Registro da providoria da Fazenda de Minas Gerais p.111 (Ver laudo IPHAN 004/

98)

*Brasileiro, Jeremias. Congadas de Minas Gerais – Brasília: Fundação Cultural

Palmares, 2001.

* Laudo IPHAN 004/98 – Dossiê do Tombamento do Remanescente do Antigo

Quilombo do Ambrósio – Ibiá – Mg

*Lucas, Glaura. Os Sons do Rosário – Um Estudo Etnomusicológico do Congado

Mineiro – Arturos e Jatobá. Dissertação de Mestrado, São Paulo: ECA-USP,

1999.

*Marra, Fabíola Benfica. Álbum de Família: Famílias Afro-descendentes no

Século XX em Uberlândia – MG – CD-Rom produzido entre os anos de 2004 e

2005, através da lei municipal de Incentivo à Cultura.

*Martins, Tarcisio José. Quilombo do Campo Grande: A História de Minas Roubada

do Povo. São Paulo: Gazeta Maçônica, 1995.

*Lima Jr., Walter. Chico Rei. Embrafilmes, 1986.

327

*LOURENÇO, Luis Augusto Bustamante. Bairro Patrimônio: Salgadores e

Moçambiqueiros. Uberlândia: Secretaria Municipal de Cultura, 1983.

*Martins, Leda M. Cantares – Afrografias da Memória. São Paulo: Perspectiva:

1997.

*Moura, Clovis (org). Os Quilombos na Dinâmica Social do Brasil – Maceió:

Edufal, 2001.

*RIBEIRO, Maria de Lourdes Borges. A Música Africana. Rio de Janeiro: Funart,

1981

*VALE, Marília Brasileiro Teixeira. Arquitetura Religiosa do Século XIX no antigo

“Sertão da Farinha Podre”. Tese apresentada à Faculdade de Arquitetura e

Urbanismo da Universidade de São Paulo para obtenção do Grau de Doutor,

São Paulo, 1998.

16. Atualização das informações:NT

17. Ficha Técnica

Levantamento Data: Abril de 2007

Fabíola Benfica Marra (Historiadora)

Larry Guimarães de O. Filho (Formatação, estagiário de arquitetura)

Larissa Gontijo T. Cunha (Formatação, estagiário de arquitetura)

Elaboração Data: Abril de 2007

Fabíola Benfica Marra (Historiadora)

Revisão Data: Abril de 2007

Anderson Henrique Ferreira (Historiador)

Gisele Pinto de Vasconcelos Costa (Arquiteta)

328

BENS MÓVEIS E INTEGRADOS

01. Município: Uberlândia

02. Distrito: Sede

03. Acervo: Terno Congo de

Camisa Verde

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INVENTÁRIO DE PROTEÇÃODO ACERVO CULTURAL

Minas Gerais-MG

04. Propriedade: Particular

05. Endereço: Rua Feliciano de Moraes, 147 -

Aparecida

06. Responsável: Maria Rosária de Fátima

Nascimento

07. Designação: Bandeira do terno Congo de Camisa Verde08. Localização Especifica: quando não está em época de campanha fica noquarto de Dona Fátima09. Espécie: Bandeira /Distintivo/Insígnia Religiosa10. Época: 200611. Autoria: Coletiva12. Origem: Uberlândia13. Procedência: Uberlândia14. Material / Técnica: cabo de madeira, tecido veludo verde, imagens de NossaSenhora do Rosário e São Benedito impressa em papel plastificado, lantejoulasno formato de estrela, miçangas verde, dourada e prateada, terço, galho e crucifixobordados com cordão de lantejoulas brancas, franja amarela.15. Marcas / Inscrições / Legendas: imagens religiosas de Nossa Senhora doRosário e São Benedito e adereços.16. Descrição: No desfile do Congado em 2006 a bandeireira do terno Congo deCamisa Verde carregava uma bandeira com imagem de Nossa Senhora do Rosárioimpressa em papel plastificado com um terço bordado com cordões de lantejoulasbrancas contornado a imagem com acabamento de passamanaria cor de ouro-envelhecido. Na visita ao quartel foi apresentada uma bandeira de tecido veludoverde com formato mais arredondado com imagem de São Benedito impressa empapel plastificado com acabamento de passamanaria cor de ouro-envelhecido. Portoda a bandeira lantejoulas douradas no formato de estrela. Flores elaboradas commiçangas verdes, douradas e prateadas ladeiam a imagem de São Benedito egalho bordado com cordão de lantejoulas brancas abaixo da imagem. Na parte detrás da bandeira, um crucifixo bordado com cordão de lantejoulas brancas e detalhesde miçangas verdes, douradas e prateadas . Franja amarela por toda a extensãoda bandeira. As medidas que seguem são da bandeira de São Benedito, quecertamente é a bandeira das campanhas, sendo a de Nossa Senhora do Rosáriouma bandeira um pouco maior utilizada apenas em dias de festa.

SECRETARIA MUNICIPALDE CULTURA

329

18- Proteção Legal:

( ) Federal

( ) Estadual

( ) Municipal

( x ) Nenhuma

( ) Tombamento Isolado

( ) Tombamento em Conjunto

Fotos do Terno Congo de Camisa Verde

Uberlândia/MG Ano 2007

19- Documentação fotográfica

20- Estado de Conservação:

( x ) Excelente ( ) Bom

( ) Regular ( ) Péssimo

Obs:

21- Dimensões:

Altura: 42cm

Largura: 52cm

22. Análise do Estado de Conservação:

Bandeira em excelente estado de conservação, não apresenta nenhum sinal de

desgaste, de perdas ou de infestação por insetos ou de mofo.

17- Condições de segurança:( ) Boa( ) Razoável( ) Ruim Obs:

330

23. Intervenções – Responsável / Data: NT

24. Características Técnicas:

Bandeira com imagem religiosa impressa em papel plastificado com um terço

bordado com cordões de lantejoulas contornado a imagem com acabamento de

passamanaria. Bandeira de tecido veludo com formato mais arredondado com

imagem religiosa impressa em papel plastificado com acabamento de

passamanaria. Por toda a bandeira lantejoulas no formato de estrela. Flores

elaboradas com miçangas ladeiam a imagem, e galho bordado com cordão de

lantejoulas brancas abaixo da imagem. Na parte de trás da bandeira, um crucifixo

bordado com cordão de lantejoulas e detalhes de miçangas. Franja por toda a

extensão da bandeira.

25. Características Estilísticas: Estilo popular (sem característica estilística

específica).

26. Características Iconográficas:

Nas bandeiras do Congado figuram as imagens e/ou os nomes de Nossa Senhora

do Rosário, de São Benedito e em alguns casos outras imagens como a de Santa

Ifigênia, Nossa Senhora Aparecida, São Domingos, etc.

Cada santo é associado a elementos distintos. Santa Efigênia ou Ifigênia, pelo que

os congadeiros dizem é a dona da festa do Congado. Santa Ifigênia, segundo

Câmara Cascudo é uma virgem mártir da Etiópia, devoção de negros e pessoas

menos favorecidas. A festa do Congado acontecia em louvor à Santa Ifigênia, a

santa negra, mas os brancos não aceitaram e para que a festa se legitimasse eles

criam a imagem de Nossa Senhora do Rosário. Segundo o Cláudio, filósofo,

pesquisador do Congado e dançador do Terno de Camisa Verde, os negros pegam

o rosário que é de Santa Ifigênia e colocam na imagem de Nossa Senhora do

Perpétuo Socorro, criando assim a imagem de Nossa Senhora do Rosário.

Segundo Seu Zezão, capitão do terno Congo de Santa Ifigênia, ele colocou em seu

terno o nome de Santa Ifigênia porque as pessoas precisavam reconhecer que a

festa é dela. Seu Zezão conta que deu muito trabalho para aceitarem o terno porque

somente os padres sabiam da “verdadeira história” de Santa Ifigênia, de Nossa

Senhora do Rosário e de São Benedito. Segundo ele, para haver união entre os

pretos e os brancos Chico Rei comprou a coroa de Santa Ifigênia para coroar Nossa

Senhora do Rosário, comprando assim a sua benção. Como garantia da fidelidade

de Nossa Senhora do Rosário colocaram um menino nos braços de São Benedito

que não é Jesus, mas um menino branco do povo. Se Nossa Senhora do Rosário

algum dia trair os negros, São Benedito deve cortar o pescoço do menino.

331

De acordo com seu Zezão, São Benedito está sempre ao lado de Nossa Senhora

do Rosário como um soldado, um general. Esta surpreendente narrativa de Seu

Zezão introduz a história de Chico Rei e trata de uma negociação entre os santos.

Mas, o que mais chama atenção é a mudança do papel de São Benedito. Este, tido

como mártir sempre foi referido como uma figura bondosa e que multiplicava os

alimentos, uma espécie de Cristo negro. Agora São Benedito é tomado como um

militar frio, capaz de decapitar um bebê branco em nome da proteção dos negros.

Não ouvi de mais ninguém a confirmação desta versão mitológica. Quando se

conversa com seu Zezão percebe-se claramente a existência de uma disputa pelo

capital simbólico. Em meio às críticas aos pesquisadores e aos trabalhos existentes

sobre o congado ele questiona a “ciência” dos “verdadeiros” “fundamentos” de sua

prática ritual tanto pelos pesquisadores como pelos capitães dos outros ternos.

Insinuando ser ele um dos poucos detentores dos conhecimentos tidos como

“fundamentos” do Congado. Diversas outras pessoas tomam este comportamento

como prática. Fazer o Congado sem “fundamento” seria um ultraje. O convívio nos

quartéis envolve aprendizado constante e um “verdadeiro” capitão precisa passar

por esta escola e aprender todas as lições antes de ousar montar o seu próprio

terno.

O lendário Chico Rei, que é o criador da Irmandade do Rosário em Minas Gerais,

era rei em Moçambique, mas na perda de uma batalha fora apreendido e vendido

como escravo, trazido para o Brasil. Os escravos trazidos de Moçambique eram os

conhecedores das técnicas de mineração, “farejavam as minas”, como diziam os

invasores europeus. Chico Rei, após enriquecer seu senhor e demonstrar ser um

grande conhecedor do processo de mineração conseguiu comprar com ouro a

alforria de familiares e amigos, e construir uma capela em homenagem à Santa

Ifigênia em Vila Rica (Ouro Preto). Após descobrir algumas minas Chico Rei disse

que não trabalharia mais se o seu senhor não trouxesse para junto de si seu filho e

parentes que estavam distantes, vendidos para outros senhores de escravos. Mais

tarde conseguiu comprar a alforria de diversos outros escravos. Segundo Câmara

Cascudo “No dia de Reis, em Vila Rica, as negras do cortejo de Chico Rei vinham

com as carapinhas polvilhadas de ouro lavá-las e deixar o ouro numa pia de pedra

existente no Alto da Cruz, onde havia uma imagem de Santa Ifigênia. O ouro servia

para a libertação de outros escravos.” (1972, p.449). O Rei “Moçambiqueiro” que

no Brasil passa a ser chamado de Chico Rei recria aqui o seu reino, supera a

condição de escravo e constrói uma das bases do movimento negro. Muitos negros

se mantinham escravos e cooperavam no movimento liderado por Chico Rei para

a libertação de seu povo.

332

Os negros então alforriados passam a viver nos centros urbanos nascentes e/ou se

deslocam com as expedições desempenhando funções de carpinteiro, pedreiro,

ferreiro (serralheiro), barbeiro, quituteiras, vendedores e outras profissões tidas hoje

como “liberais”. Observem que nesta narrativa, o negro se retira do sistema de

escravidão utilizando a linguagem que está nas bases do sistema capitalista. Ocorre

um rompimento com a escravidão, mas não com sua lógica, pois há uma busca

pela inserção do negro no sistema capitalista decorrente desta. Nos movimentos

quilombolas, onde este sujeito excluído busca uma nova forma de associação e de

socialização fora da sociedade opressora, ocorre uma quebra com os padrões

antes impostos. Mas os negros quilombolas precisavam permanecer em estado

de vigília por causa das constantes investidas das expedições contra suas

comunidades. Mas esta é uma outra história.

Voltando aos mitos do Congado, a principal referencia ao São Benedito é em

relação à alimentação, ele provém o sustento das famílias, dá força. São Benedito

está mais ligado à saúde, à manutenção da vida material, é um mártir negro e santo

mesmo em vida, uma espécie de Cristo Negro. Um dos mitos de São Benedito me

foi contado por seu Charqueada, um dos congadeiros vivo mais antigo de

Uberlândia, ancião do terno Moçambique Pena Branca. Conta seu Charqueada,

que certa feita, o senhor dono da fazenda onde o Benedito era cozinheiro mandou

que ele preparasse uma refeição para seus muitos escravos, mas não lhe deu a

provisão suficiente para tanto. Na despensa não havia banha e o arroz e o feijão

eram pouco. O Benedito então pede o auxílio divino e logo obtém resposta do Todo

Poderoso que lhe diz para ir até o chiqueiro e retirar um naco com toucinho e carne

de um dos porcos, que fosse desde a cabeça até o rabo do porco e então preparar

a comida. E assim o Benedito fez. Milagrosamente, a carne do porco que fora

retirada se reconstituiu na mesma hora, permanecendo o porco vivo. Todos os

escravos se alimentaram até saciar a fome e depois de banquetear tocaram e

dançaram em agradecimento ao São Benedito. O patrão, vendo tamanha festança,

foi ter com o Benedito e inquiriu dele como foi que conseguira arranjar tanto alimento.

O Benedito então lhe relatou como conseguira a banha e o toucinho. O patrão não

acreditando no milagre ameaçou castigar o Benedito, mas quando foi golpeá-lo o

São Benedito levita e fica suspenso no ar... Este mito traz o Benedito enquanto

“multiplicador dos alimentos”, realizador de “milagres” extraordinários, figura louvada

pelos seus. Esta narrativa é compartilhada pela maioria dos congadeiros, sendo

que São Benedito é considerado o santo da cozinha, da alimentação, do sustento,

da fartura, por isso sua imagem geralmente é colocada na cozinha, para que na

casa não falte o alimento.

333

É prática em várias partes do território nacional, colocar café para o São Benedito,

é comum ver sua imagem próxima a uma xícara de café. Outro ritual realizado

popularmente é tomar o café do Benedito, que é um café amargo destituído de

qualquer forma de adoçantes, bebido em pequenos goles pelos congadeiros e

participantes de celebrações, festas, etc. O café do Benedito é tomado como uma

bebida capaz de proteger a quem a ingere.

Nossa Senhora do Rosário está sempre relacionada à chuva, às riquezas, à

proteção, à geração da vida e também à morte. Recorrem a Nossa Senhora para

pedir um bom parto e também uma “boa morte”, a ela intercedem a favor dos entes

queridos que já partiram. Em todas as festas que presenciei houve homenagens a

congadeiros falecidos no período entre festas. Nossa Senhora está vinculada à

vida e à morte, ao rezar a última estrofe da “Ave Maria”, isto fica explicito: “Santa

Maria, mãe de Deus, rogai por nós pecadores agora e na hora de nossa morte.

Amém.” Durante o Congado intercedem à Nossa Senhora do Rosário pela vida e

pela proteção na inevitável hora da morte. Pedem saúde para os seus, proteção

em todos os momentos, recorrem a ela como à Grande Mãe. O culto às deusas

mães foi muito combatido pelo judaísmo, islamismo e demais religiões patriarcais,

mas encontra solo fértil nas tradições afro-descendentes e católicas. Uma música

muito difundida tanto no Congado como na Capoeira e na religiosidade ressalta o

aspecto protetor de Nossa Senhora:

“No tempo do cativeiro, quando o senhor me batia,

eu gritava por Nossa Senhora, ai meu Deus, quando a pancada doía.”

O mito fundante do Congado em Uberlândia é um relato da aparição e resgate de

Nossa Senhora do Rosário e possui pelo menos duas versões aqui sintetizadas:

a) Nossa Senhora do Rosário estava dentro do mar, um garoto a vê submergir,

chama os pais para verem, eles não acreditam. Então ele chama os Marinheiros,

que também presenciam a santa submergir, eles tentam tirá-la com suas cordas,

mas ela não sai do local. Chegam brancos e padres que conseguem retira-la da

água e levá-la para uma capela, mas a santa “foge” do altar e volta para o mar. Vem

então o terno de Congo, todo colorido e canta para ela sair da água, ela submerge,

mas ao ser levada para a capela dos brancos, volta a “fugir” para o mar. Então um

terno de Moçambique, todo vestido de branco e descalço, canta para ela, que então

submerge e lhes acompanha, eles a levam devagar até o local onde constroem

uma capela e ali Nossa Senhora do Rosário permanece, o terno de Moçambique

então se retira sem lhe dar as costas, lhe fazendo reverência;

334

b) a segunda versão, contada por Maria Conceição Cardoso, do Moçambique

Rosário de Fátima, de Ibiá - MG, afirma que ao tentar capturar escravos fugidos na

serra da Montanhesa, um grupo de capitães do mato encontra um grupo de negros,

vestidos de branco, fazendo rosários, com contas de lágrima em frente a uma árvore

de umbaúba onde Nossa Senhora do Rosário estava encravada num galho. Os

capitães do mato tentam surrar os negros e capturá-los, mas eles permanecem

imóveis, como se nada os pudesse atingir. Apavorados com a visão voltam para a

cidade e chamam um padre para ir até o local verificar o fato. E como na primeira

versão, brancos e Congos não conseguem levá-la, Nossa Senhora do Rosário

acompanha apenas o Moçambique que canta vestido de branco, de pés descalços,

que anda devagar e lhe constrói uma igreja e não lhe dá as costas ao se retirar de

sua presença.

27. Dados Históricos:

As bandeiras têm suas origens nas insígnias, sinais distintivos de poder ou de

comando, usadas desde a antiguidade e que poderiam ser figuras recortadas em

madeira ou metal, ou pintadas nos escudos. As primeiras bandeiras da história do

homem costumavam representar um grupo sócio-cultural através de imagens e de

cores dotadas de significados, a que a comunidade respectiva confere alto valor.

As bandeiras fixadas a um mastro surgiram na China e foram introduzidas no

Ocidente Medieval pelos Islâmicos. As bandeiras de tecido, no mundo ocidental,

foram criadas pelos romanos e eram denominadas vexillium (insígnia, bandeira,

estandarte). Desde a antiguidade os povos usaram mastros com imagens,

carregados na mão ou fixados nos carros de combate. A grande difusão do seu uso

foi feita pelos romanos e cada divisão da legião tinha o seu estandarte. Foi na

Idade Média que bandeiras e estandartes começaram a representar reinos e

regiões. As bandeiras foram usadas tanto em períodos de paz como de guerra.

Sendo um símbolo identificador eram usados pelos exércitos aliados. Para não se

confundirem uns com os outros e evitarem o temido fogo amigo, usavam um pedaço

de pano hasteado num estandarte, com as cores e sinais de identificação do

batalhão ou companhia envolvida.

De acordo com seu tamanho ou uso, a bandeira tem uma palavra sinônima.

Estandarte é utilizado para insígnias militares, mais especificamente para identificar

os corpos de cavalaria. O Pendão é uma bandeira grande, armada em vara,

atravessada horizontalmente sobre o mastro e levada em procissões. O Gonfalão

é uma bandeira de guerra com partes que prendem perpendicularmente a uma

haste com três ou quatro pontas pendentes. Os Estandartes do Congado mesclam

elementos das bandeiras militares e religiosas e são utilizados para identificar o

terno que os conduz e para louvar os santos de sua devoção

335

28. Referências Documentais: * Entrevista e fotografias realizadas no trabalhode campo no quartel do Congo de Camisa Verde*Fotografias do Congado dosanos 2004 e 2006*Marra, Fabíola Benfica. Álbum de Família: Famílias Afro-descendentes no Século XX em Uberlândia – MG – CD-Rom produzido entre osanos de 2004 e 2005, através da lei municipal de Incentivo à Cultura.29. InformaçõesComplementares: Falar em Bandeira no congado é um pouco complexo, poispossui pelo menos três significados. Bandeira pode se referir à jornada, ao trajeto,à caminhada realizada nas campanhas e festas. Também pode ser utilizado parase referir à bandeira em tecido no formato retangular de aproximadamente 60 x 40cm que trás estampado imagens dos santos, com um cabo de madeira naextremidade superior por onde a bandeireira (virgem, menor de 10 anos) segura.Esta pequena bandeira sempre acompanha o terno, abrindo-lhe os caminhos, tantoem dias de campanha quanto no dia da festa. Bandeira também pode referir-se aoestandarte em formato retangular de aproximadamente 1,5 m de altura por 1m decomprimento, sustentado por um mastro que o eleva à aproximadamente 2,5m dealtura donde pendem fitas cujas pontas as Bandeireiras seguram enquanto dançame que traz identificações do terno e homenagens aos santos. Geralmente oestandarte e as Bandeireiras só saem em dia de festa. As Bandeireiras ouAndorinhas são meninas que conduzem as fitas do estandarte fazendo coreografias.“Antigamente” esta função só era desempenhada pelas garotas virgens. Muitasmulheres relatam que se a menina não fosse virgem e levasse a fita ou o mastro dabandeira, muitos acidentes poderiam acontecer. Nossa Senhora do Rosário seriaa responsável por denunciar a farsa. Adereços de cabelo poderiam cair ou a roupase rasgar, a própria bandeira poderia sofrer danificações, como quebrar, rasgar.Desmaios e doenças também dificultariam a execução da função. Caberia a meninase afastar quando não fosse mais “digna” de carregar a bandeira do Congado. Aexecução desta função indevidamente poderia acarretar problemas ainda maiorespara os ternos, como esquecer música ou errar a “batida”. Hoje, no entanto, estatradição não é mantida pela maioria dos ternos.30.Atualização das informações:NT31. Ficha TécnicaLevantamento Data: Abril de 2007Fabíola Benfica Marra (Historiadora)Larry Guimarães de O. Filho (Formatação, estagiário de arquitetura)Larissa Gontijo T. Cunha (Formatação, estagiário de arquitetura)Elaboração Data: Abril de 2007Fabíola Benfica Marra (Historiadora)Revisão Data: Abril de 2007Anderson Henrique Ferreira (Historiador)Gisele Pinto de Vasconcelos Costa (Arquiteta)

336

BENS MÓVEIS E INTEGRADOS

01. Município: Uberlândia

02. Distrito: Sede

03. Acervo: Terno Congo de

Camisa Verde

INVENTÁRIO DE PROTEÇÃODO ACERVO CULTURAL

Minas Gerais-MG

04. Propriedade: Particular

05. Endereço: Rua Feliciano de Moraes, 147 -

Aparecida

06. Responsável: Maria Rosária de Fátima

Nascimento

07. Designação: Bastão

08. Localização Especifica: Ao lado da cama de Dona Fátima

09. Espécie: Objeto ritualístico

10. Época: Ignorada

11. Autoria: Ignorada

12. Origem: Uberlândia

13. Procedência: Uberlândia

14. Material / Técnica: madeira, verniz, cordões de miçangas brancas e de esferas

metálicas, fita plástica dourada, gotas sintéticas vermelhas afixadas com cola de

contato, ponteira metálica

15. Marcas / Inscrições / Legendas: NT

16. Descrição: bastão em madeira envernizada, com linhas realizadas com ponta

incandescente, cordões de miçangas brancas e de esferas metálicas e fita plástica

dourada circundam todo o bastão. Duas gotas sintéticas vermelhas afixadas no

alto com cola de contato, na base ponteira metálica.

17- Condições de segurança:

( x) Boa

( ) Razoável

( ) Ruim

Obs:

SECRETARIA MUNICIPALDE CULTURA

337

18- Proteção Legal:

( ) Federal

( ) Estadual

( ) Municipal

( x ) Nenhuma

( ) Tombamento Isolado

( ) Tombamento em Conjunto

Fotos do Terno Congo de Camisa Verde

Uberlândia/MG Ano 2007

19- Documentação fotográfica

20- Estado de Conservação:

( ) Excelente ( X) Bom

( ) Regular ( ) Péssimo

Obs:

21- Dimensões:

Comprimento: 1,14m

22. Análise do Estado de Conservação:

Bastão em bom estado de conservação, sem sinais de desgaste por insetos ou

rachaduras.

338

23. Intervenções – Responsável / Data: NT

24. Características Técnicas: Bastão em madeira envernizada, com linhas

realizadas com ponta incandescente, cordões de miçangas e de esferas metálicas

e fita plástica circundam todo o bastão. Duas gotas sintéticas afixadas no alto com

cola de contato, na base ponteira metálica.

25. Características Estilísticas: Estilo popular (sem característica estilística

específica).

26. Características Iconográficas:

Nos estandartes do Congado figuram as imagens e/ou os nomes de Nossa Senhora

do Rosário, de São Benedito e em alguns casos outras imagens como a de Santa

Ifigênia, Nossa Senhora Aparecida, São Domingos, etc.

Cada santo é associado a elementos distintos. Santa Efigênia ou Ifigênia, pelo que

os congadeiros dizem é a dona da festa do Congado. Santa Ifigênia, segundo

Câmara Cascudo é uma virgem mártir da Etiópia, devoção de negros e pessoas

menos favorecidas. A festa do Congado acontecia em louvor à Santa Ifigênia, a

santa negra, mas os brancos não aceitaram e para que a festa se legitimasse eles

criam a imagem de Nossa Senhora do Rosário. Segundo o Cláudio, filósofo,

pesquisador do Congado e dançador do Terno de Camisa Verde, os negros pegam

o rosário que é de Santa Ifigênia e colocam na imagem de Nossa Senhora do

Perpétuo Socorro, criando assim a imagem de Nossa Senhora do Rosário.

Segundo Seu Zezão, capitão do terno Congo de Santa Ifigênia, ele colocou em seu

terno o nome de Santa Ifigênia porque as pessoas precisavam reconhecer que a

festa é dela. Seu Zezão conta que deu muito trabalho para aceitarem o terno porque

somente os padres sabiam da “verdadeira história” de Santa Ifigênia, de Nossa

Senhora do Rosário e de São Benedito. Segundo ele, para haver união entre os

pretos e os brancos Chico Rei comprou a coroa de Santa Ifigênia para coroar Nossa

Senhora do Rosário, comprando assim a sua benção. Como garantia da fidelidade

de Nossa Senhora do Rosário colocaram um menino nos braços de São Benedito

que não é Jesus, mas um menino branco do povo. Se Nossa Senhora do Rosário

algum dia trair os negros, São Benedito deve cortar o pescoço do menino.

De acordo com seu Zezão, São Benedito está sempre ao lado de Nossa Senhora

do Rosário como um soldado, um general. Esta surpreendente narrativa de Seu

Zezão introduz a história de Chico Rei e trata de uma negociação entre os santos.

339

Mas, o que mais chama atenção é a mudança do papel de São Benedito. Este, tido

como mártir sempre foi referido como uma figura bondosa e que multiplicava os

alimentos, uma espécie de Cristo negro. Agora São Benedito é tomado como um

militar frio, capaz de decapitar um bebê branco em nome da proteção dos negros.

Não ouvi de mais ninguém a confirmação desta versão mitológica. Quando se

conversa com seu Zezão percebe-se claramente a existência de uma disputa pelo

capital simbólico. Em meio às críticas aos pesquisadores e aos trabalhos existentes

sobre o congado ele questiona a “ciência” dos “verdadeiros” “fundamentos” de sua

prática ritual tanto pelos pesquisadores como pelos capitães dos outros ternos.

Insinuando ser ele um dos poucos detentores dos conhecimentos tidos como

“fundamentos” do Congado. Diversas outras pessoas tomam este comportamento

como prática. Fazer o Congado sem “fundamento” seria um ultraje. O convívio nos

quartéis envolve aprendizado constante e um “verdadeiro” capitão precisa passar

por esta escola e aprender todas as lições antes de ousar montar o seu próprio

terno.

O lendário Chico Rei, que é o criador da Irmandade do Rosário em Minas Gerais,

era rei em Moçambique, mas na perda de uma batalha fora apreendido e vendido

como escravo, trazido para o Brasil. Os escravos trazidos de Moçambique eram os

conhecedores das técnicas de mineração, “farejavam as minas”, como diziam os

invasores europeus. Chico Rei, após enriquecer seu senhor e demonstrar ser um

grande conhecedor do processo de mineração conseguiu comprar com ouro a

alforria de familiares e amigos, e construir uma capela em homenagem à Santa

Ifigênia em Vila Rica (Ouro Preto). Após descobrir algumas minas Chico Rei disse

que não trabalharia mais se o seu senhor não trouxesse para junto de si seu filho e

parentes que estavam distantes, vendidos para outros senhores de escravos. Mais

tarde conseguiu comprar a alforria de diversos outros escravos. Segundo Câmara

Cascudo “No dia de Reis, em Vila Rica, as negras do cortejo de Chico Rei vinham

com as carapinhas polvilhadas de ouro lavá-las e deixar o ouro numa pia de pedra

existente no Alto da Cruz, onde havia uma imagem de Santa Ifigênia. O ouro servia

para a libertação de outros escravos.” (1972, p.449). O Rei “Moçambiqueiro” que

no Brasil passa a ser chamado de Chico Rei recria aqui o seu reino, supera a

condição de escravo e constrói uma das bases do movimento negro. Muitos negros

se mantinham escravos e cooperavam no movimento liderado por Chico Rei para

a libertação de seu povo.

340

Os negros então alforriados passam a viver nos centros urbanos nascentes e/ou se

deslocam com as expedições desempenhando funções de carpinteiro, pedreiro,

ferreiro (serralheiro), barbeiro, quituteiras, vendedores e outras profissões tidas hoje

como “liberais”. Observem que nesta narrativa, o negro se retira do sistema de

escravidão utilizando a linguagem que está nas bases do sistema capitalista. Ocorre

um rompimento com a escravidão, mas não com sua lógica, pois há uma busca

pela inserção do negro no sistema capitalista decorrente desta. Nos movimentos

quilombolas, onde este sujeito excluído busca uma nova forma de associação e de

socialização fora da sociedade opressora, ocorre uma quebra com os padrões

antes impostos. Mas os negros quilombolas precisavam permanecer em estado

de vigília por causa das constantes investidas das expedições contra suas

comunidades. Mas esta é uma outra história.

Voltando aos mitos do Congado, a principal referencia ao São Benedito é em

relação à alimentação, ele provém o sustento das famílias, dá força. São Benedito

está mais ligado à saúde, à manutenção da vida material, é um mártir negro e santo

mesmo em vida, uma espécie de Cristo Negro. Um dos mitos de São Benedito me

foi contado por seu Charqueada, um dos congadeiros vivo mais antigo de

Uberlândia, ancião do terno Moçambique Pena Branca. Conta seu Charqueada,

que certa feita, o senhor dono da fazenda onde o Benedito era cozinheiro mandou

que ele preparasse uma refeição para seus muitos escravos, mas não lhe deu a

provisão suficiente para tanto. Na despensa não havia banha e o arroz e o feijão

eram pouco. O Benedito então pede o auxílio divino e logo obtém resposta do Todo

Poderoso que lhe diz para ir até o chiqueiro e retirar um naco com toucinho e carne

de um dos porcos, que fosse desde a cabeça até o rabo do porco e então preparar

a comida. E assim o Benedito fez. Milagrosamente, a carne do porco que fora

retirada se reconstituiu na mesma hora, permanecendo o porco vivo. Todos os

escravos se alimentaram até saciar a fome e depois de banquetear tocaram e

dançaram em agradecimento ao São Benedito. O patrão, vendo tamanha festança,

foi ter com o Benedito e inquiriu dele como foi que conseguira arranjar tanto alimento.

O Benedito então lhe relatou como conseguira a banha e o toucinho. O patrão não

acreditando no milagre ameaçou castigar o Benedito, mas quando foi golpeá-lo o

São Benedito levita e fica suspenso no ar... Este mito traz o Benedito enquanto

“multiplicador dos alimentos”, realizador de “milagres” extraordinários, figura louvada

pelos seus. Esta narrativa é compartilhada pela maioria dos congadeiros, sendo

que São Benedito é considerado o santo da cozinha, da alimentação, do sustento,

da fartura, por isso sua imagem geralmente é colocada na cozinha, para que na

casa não falte o alimento.

341

É prática em várias partes do território nacional, colocar café para o São Benedito,

é comum ver sua imagem próxima a uma xícara de café. Outro ritual realizado

popularmente é tomar o café do Benedito, que é um café amargo destituído de

qualquer forma de adoçantes, bebido em pequenos goles pelos congadeiros e

participantes de celebrações, festas, etc. O café do Benedito é tomado como uma

bebida capaz de proteger a quem a ingere.

Nossa Senhora do Rosário está sempre relacionada à chuva, às riquezas, à

proteção, à geração da vida e também à morte. Recorrem a Nossa Senhora para

pedir um bom parto e também uma “boa morte”, a ela intercedem a favor dos entes

queridos que já partiram. Em todas as festas que presenciei houve homenagens a

congadeiros falecidos no período entre festas. Nossa Senhora está vinculada à

vida e à morte, ao rezar a última estrofe da “Ave Maria”, isto fica explicito: “Santa

Maria, mãe de Deus, rogai por nós pecadores agora e na hora de nossa morte.

Amém.” Durante o Congado intercedem à Nossa Senhora do Rosário pela vida e

pela proteção na inevitável hora da morte. Pedem saúde para os seus, proteção

em todos os momentos, recorrem a ela como à Grande Mãe. O culto às deusas

mães foi muito combatido pelo judaísmo, islamismo e demais religiões patriarcais,

mas encontra solo fértil nas tradições afro-descendentes e católicas. Uma música

muito difundida tanto no Congado como na Capoeira e na religiosidade ressalta o

aspecto protetor de Nossa Senhora:

“No tempo do cativeiro, quando o senhor me batia,

eu gritava por Nossa Senhora, ai meu Deus, quando a pancada doía.”

O mito fundante do Congado em Uberlândia é um relato da aparição e resgate de

Nossa Senhora do Rosário e possui pelo menos duas versões aqui sintetizadas:

a) Nossa Senhora do Rosário estava dentro do mar, um garoto a vê submergir,

chama os pais para verem, eles não acreditam. Então ele chama os Marinheiros,

que também presenciam a santa submergir, eles tentam tirá-la com suas cordas,

mas ela não sai do local. Chegam brancos e padres que conseguem retira-la da

água e levá-la para uma capela, mas a santa “foge” do altar e volta para o mar. Vem

então o terno de Congo, todo colorido e canta para ela sair da água, ela submerge,

mas ao ser levada para a capela dos brancos, volta a “fugir” para o mar. Então um

terno de Moçambique, todo vestido de branco e descalço, canta para ela, que então

submerge e lhes acompanha, eles a levam devagar até o local onde constroem

uma capela e ali Nossa Senhora do Rosário permanece, o terno de Moçambique

então se retira sem lhe dar as costas, lhe fazendo reverência;

342

b) a segunda versão, contada por Maria Conceição Cardoso, do Moçambique

Rosário de Fátima, de Ibiá - MG, afirma que ao tentar capturar escravos fugidos na

serra da Montanhesa, um grupo de capitães do mato encontra um grupo de negros,

vestidos de branco, fazendo rosários, com contas de lágrima em frente a uma árvore

de umbaúba onde Nossa Senhora do Rosário estava encravada num galho. Os

capitães do mato tentam surrar os negros e capturá-los, mas eles permanecem

imóveis, como se nada os pudesse atingir. Apavorados com a visão voltam para a

cidade e chamam um padre para ir até o local verificar o fato. E como na primeira

versão, brancos e Congos não conseguem levá-la, Nossa Senhora do Rosário

acompanha apenas o Moçambique que canta vestido de branco, de pés descalços,

que anda devagar e lhe constrói uma igreja e não lhe dá as costas ao se retirar de

sua presença.

27. Dados Históricos:

Os bastões, cajados, cedros, caduceus, varas são objetos ritualísticos utilizados

pelas mais diversas religiões com os mais diferentes significados. O cedro é símbolo

de poder utilizado pelos reis. O cajado é utilizado pelos pastores como apoio nas

caminhadas e é símbolo de magia como na história bíblica de Moisés que utiliza

seu cajado para abrir as águas do Mar Vermelho. O bastão é um instrumento de

ataque e de defesa e também simboliza a detenção do comando de uma situação.

Um símbolo fálico, emblema de poder e controle do poder, representa a vontade e

a força dominante. Utilizado como instrumento de invocação e também para dirigir,

controlar e cortar energias. O bastão com estrias no sentido diagonal e com uma

serpente enrolada é símbolo do mito grego Esculápio e representa a sabedoria, a

renovação do conhecimento e o poder de curar, adotado pela medicina e pela

farmácia como seu símbolo. No mito de Hermes, “deus dos viajantes, patrono dos

ladrões e dos trapaceiros, protetor da magia e da adivinhação e responsável pelos

golpes de sorte e pelas súbitas mudanças de vida”, duas serpentes enroladas

simbolizam os opostos: o bem e o mal, masculino e o feminino. O símbolo da

eternidade na mitologia egípcia é um cajado com incisões, fissuras que lembram o

entalhe de um reco-reco.

28. Referências Documentais:

Sharman-burke, Juliet e Greene, Liz. O Tarô Mitológico – São Paulo: Siciliano,

1988

343

29. Informações Complementares:

Os bastões e os apitos são os instrumentos utilizados pelos capitães de Congado

para conduzir seus soldados e reger as músicas executadas pelos tambores. Nos

ternos de Moçambique os bastões são utilizados não apenas por capitães como

acontece na maioria dos ternos, mas por muitos dançantes, que formam uma ala

fazendo coreografias. Em muitas guardas, fiscais e madrinhas utilizam os bastões

alinhados ao final do desfile, fechando a apresentação do terno. Alguns bastões

são em formato de cobra, outros com carrancas de Pretos Velhos, outros com

imagens de Nossa Senhora Aparecida, Santa Efigênia e São Benedito, crucifixos

e inscrições diversas, fitas de cetim, alguns enfeitados com contas de lágrima, com

ervas (alecrim, arruda, espada de são Jorge), etc. Nas festas de Pretos Velhos nos

centros de Umbanda pratica-se uma dança-ritual muito parecida com a realizada

pelos moçambiqueiros: tocam as pontas dos bastões no alto, revezando com

batidas no chão, dançando em círculo. Quando hasteiam os mastros dando início à

festa do Congado, os moçambiqueiros tocam os mastros com seus bastões. Alguns

ternos realizam coreografias colocando suas coroas nos bastões e erguendo acima

da cabeça. A condução de reis e rainhas, bem como dos santos numa procissão

pode em alguns casos vir dentro de um espaço delimitado por condutores de

bastões. Quando se quer delimitar um espaço com bastões, os dançantes os

colocam na horizontal e com as mãos o moçambiqueiro liga o seu bastão ao bastão

do outro, formando uma corrente.

30.Atualização das informações:NT

31. Ficha Técnica

Levantamento Data: Abril de 2007

Fabíola Benfica Marra (Historiadora)

Larry Guimarães de O. Filho (Formatação, estagiário de arquitetura)

Larissa Gontijo T. Cunha (Formatação, estagiário de arquitetura)

Elaboração Data: Abril de 2007

Fabíola Benfica Marra (Historiadora)

Revisão Data: Abril de 2007

Anderson Henrique Ferreira (Historiador)

Gisele Pinto de Vasconcelos Costa (Arquiteta)

344

BENS MÓVEIS E INTEGRADOS

01. Município: Uberlândia

02. Distrito: Sede

03. Acervo: Terno Congo de

Camisa Verde

ytfrhfhfhg

INVENTÁRIO DE PROTEÇÃODO ACERVO CULTURAL

Minas Gerais-MG

04. Propriedade: Particular

05. Endereço: Rua Feliciano de Moraes, 147 -

Aparecida

06. Responsável: Maria Rosária de Fátima

Nascimento

07. Designação: Estandarte do Congo de Camisa Verde

08. Localização Especifica: quando não está em época de campanha o tecido

fica no quarto de Dona Fátima e a estrutura de madeira no cômodo junto com os

instrumentos e os utensílios de cozinha

09. Espécie: Bandeira /Distintivo/Insígnia Religiosa

10. Época: estrutura de aproximadamente década de 1980, tecido trocado todo

ano

11. Autoria: Ignorada

12. Origem: Uberlândia

13. Procedência: Uberlândia

14. Material / Técnica: madeira, tecido veludo verde, coroa e coração bordados

com tecido amarelo, lantejoulas no formato de estrela, miçangas verde, dourada e

prateada, letras, terço e galho bordados com cordão de lantejoulas brancas, franja

amarela; no primeiro estandarte cordões verdes e no segundo amarelos.

15. Marcas / Inscrições / Legendas: No primeiro estandarte, na face: “Irmanzinha

de Nossa Senhora do Rosário e São Benedito Camisa Verde” na parte de trás:

“salve 22 de outubro 2006 uberlândia”, no segundo estandarte registrado apenas a

face durante a festa de 2006: “salve nossa senhora do rosário e toda a irmandade”.

16. Descrição: O Terno Congo de Camisa Verde utiliza dois estandartes, mas na

visita que fiz ao quartel, me foi apresentado apenas o que saiu em primeiro lugar no

desfile. A estrutura dos estandartes é elaborada em madeira, no primeiro os cordões

verdes são sustentados em um círculo acima do retângulo, separado da bandeira

feita em tecido veludo verde. No segundo estandarte as cordas amarelas partem

da parte superior do tecido. Na face dos dois estandartes figura coroa bordada

com tecido amarelo com miçangas verdes, douradas e prateadas, abaixo galhos

elaborados com cordão de lantejoulas brancas.

SECRETARIA MUNICIPALDE CULTURA

345

18- Proteção Legal:

( ) Federal

( ) Estadual

( ) Municipal

( x ) Nenhuma

( ) Tombamento Isolado

( ) Tombamento em Conjunto

Fotos do Terno Congo de Camisa Verde

Uberlândia/MG Ano 2007

19- Documentação fotográfica

No segundo estandarte, a coroa está envolta por um terço, na parte de trás do

primeiro estandarte um coração em veludo amarelo com lantejoulas prateadas. Por

todo o tecido lantejoulas no formato de estrelas. Letras com cordão de lantejoulas

brancas, formam no primeiro estandarte, na face:”Irmanzinha de Nossa Senhora do

Rosário e São Benedito Camisa Verde” na parte de trás: “salve 22 de outubro

2006 uberlândia”, no segundo estandarte registrado apenas a face durante a festa

de 2006: “salve nossa senhora do rosário e toda a irmandade”. Nas extremidades,

franja amarela.

17- Condições de segurança:

( x ) Boa

( ) Razoável

( ) Ruim

Obs:

20- Estado de Conservação:

( ) Excelente ( x ) Bom

( ) Regular ( ) Péssimo

Obs:

21- Dimensões:

Altura: 1,36m

Comprimento da haste: 0,67m

Largura: 0,73m

346

22. Análise do Estado de Conservação: Estandarte em bom estado de

conservação, sem sinais de desgaste por insetos ou mofo.

23. Intervenções – Responsável / Data: NT

24. Características Técnicas: Dois estandartes elaborados em madeira. Um deles

apresenta cordões sustentados em um círculo acima do retângulo, separado da

bandeira feita em tecido de veludo; na parte de trás, um coração em veludo com

lantejoulas. Por todo o tecido lantejoulas no formato de estrelas. Letras com cordão

de lantejoulas brancas formando, na face e na parte de trás, inscrições religiosas.

Ou outro estandarte com cordas que partem da parte superior do tecido, com

inscrição religiosa formada também com lantejoulas, e franja nas extremidades. Na

face dos dois estandartes figura coroa bordada em tecido e com miçangas, abaixo

galhos elaborados com cordão de lantejoulas. No segundo estandarte, a coroa está

envolta por um terço.

25. Características Estilísticas: Estilo popular (sem característica estilística

específica).

26. Características Iconográficas:

Nos estandartes do Congado figuram as imagens e/ou os nomes de Nossa Senhora

do Rosário, de São Benedito e em alguns casos outras imagens como a de Santa

Ifigênia, Nossa Senhora Aparecida, São Domingos, etc.

Cada santo é associado a elementos distintos. Santa Efigênia ou Ifigênia, pelo que

os congadeiros dizem é a dona da festa do Congado. Santa Ifigênia, segundo

Câmara Cascudo é uma virgem mártir da Etiópia, devoção de negros e pessoas

menos favorecidas. A festa do Congado acontecia em louvor à Santa Ifigênia, a

santa negra, mas os brancos não aceitaram e para que a festa se legitimasse eles

criam a imagem de Nossa Senhora do Rosário. Segundo o Cláudio, filósofo,

pesquisador do Congado e dançador do Terno de Camisa Verde, os negros pegam

o rosário que é de Santa Ifigênia e colocam na imagem de Nossa Senhora do

Perpétuo Socorro, criando assim a imagem de Nossa Senhora do Rosário.

Segundo Seu Zezão, capitão do terno Congo de Santa Ifigênia, ele colocou em seu

terno o nome de Santa Ifigênia porque as pessoas precisavam reconhecer que a

festa é dela. Seu Zezão conta que deu muito trabalho para aceitarem o terno porque

somente os padres sabiam da “verdadeira história” de Santa Ifigênia, de Nossa

Senhora do Rosário e de São Benedito. Segundo ele, para haver união entre os

pretos e os brancos Chico Rei comprou a coroa de Santa Ifigênia para coroar Nossa

Senhora do Rosário, comprando assim a sua benção. Como garantia da fidelidade

de Nossa Senhora do Rosário colocaram um menino nos braços de São Benedito

que não é Jesus, mas um menino branco do povo. Se Nossa Senhora do Rosário

algum dia trair os negros, São Benedito deve cortar o pescoço do menino.

347

De acordo com seu Zezão, São Benedito está sempre ao lado de Nossa Senhorado Rosário como um soldado, um general. Esta surpreendente narrativa de SeuZezão introduz a história de Chico Rei e trata de uma negociação entre os santos.

Mas, o que mais chama atenção é a mudança do papel de São Benedito. Este, tidocomo mártir sempre foi referido como uma figura bondosa e que multiplicava osalimentos, uma espécie de Cristo negro. Agora São Benedito é tomado como ummilitar frio, capaz de decapitar um bebê branco em nome da proteção dos negros.Não ouvi de mais ninguém a confirmação desta versão mitológica. Quando seconversa com seu Zezão percebe-se claramente a existência de uma disputa pelocapital simbólico. Em meio às críticas aos pesquisadores e aos trabalhos existentessobre o congado ele questiona a “ciência” dos “verdadeiros” “fundamentos” de suaprática ritual tanto pelos pesquisadores como pelos capitães dos outros ternos.Insinuando ser ele um dos poucos detentores dos conhecimentos tidos como“fundamentos” do Congado. Diversas outras pessoas tomam este comportamentocomo prática. Fazer o Congado sem “fundamento” seria um ultraje. O convívio nosquartéis envolve aprendizado constante e um “verdadeiro” capitão precisa passarpor esta escola e aprender todas as lições antes de ousar montar o seu próprioterno.

O lendário Chico Rei, que é o criador da Irmandade do Rosário em Minas Gerais,era rei em Moçambique, mas na perda de uma batalha fora apreendido e vendidocomo escravo, trazido para o Brasil. Os escravos trazidos de Moçambique eram osconhecedores das técnicas de mineração, “farejavam as minas”, como diziam osinvasores europeus. Chico Rei, após enriquecer seu senhor e demonstrar ser umgrande conhecedor do processo de mineração conseguiu comprar com ouro aalforria de familiares e amigos, e construir uma capela em homenagem à SantaIfigênia em Vila Rica (Ouro Preto). Após descobrir algumas minas Chico Rei disseque não trabalharia mais se o seu senhor não trouxesse para junto de si seu filho eparentes que estavam distantes, vendidos para outros senhores de escravos. Maistarde conseguiu comprar a alforria de diversos outros escravos. Segundo CâmaraCascudo “No dia de Reis, em Vila Rica, as negras do cortejo de Chico Rei vinhamcom as carapinhas polvilhadas de ouro lavá-las e deixar o ouro numa pia de pedraexistente no Alto da Cruz, onde havia uma imagem de Santa Ifigênia. O ouro serviapara a libertação de outros escravos.” (1972, p.449). O Rei “Moçambiqueiro” queno Brasil passa a ser chamado de Chico Rei recria aqui o seu reino, supera acondição de escravo e constrói uma das bases do movimento negro. Muitos negrosse mantinham escravos e cooperavam no movimento liderado por Chico Rei paraa libertação de seu povo.

348

Os negros então alforriados passam a viver nos centros urbanos nascentes e/ou se

deslocam com as expedições desempenhando funções de carpinteiro, pedreiro,

ferreiro (serralheiro), barbeiro, quituteiras, vendedores e outras profissões tidas hoje

como “liberais”. Observem que nesta narrativa, o negro se retira do sistema de

escravidão utilizando a linguagem que está nas bases do sistema capitalista. Ocorre

um rompimento com a escravidão, mas não com sua lógica, pois há uma busca

pela inserção do negro no sistema capitalista decorrente desta. Nos movimentos

quilombolas, onde este sujeito excluído busca uma nova forma de associação e de

socialização fora da sociedade opressora, ocorre uma quebra com os padrões

antes impostos. Mas os negros quilombolas precisavam permanecer em estado

de vigília por causa das constantes investidas das expedições contra suas

comunidades. Mas esta é uma outra história.

Voltando aos mitos do Congado, a principal referencia ao São Benedito é em

relação à alimentação, ele provém o sustento das famílias, dá força. São Benedito

está mais ligado à saúde, à manutenção da vida material, é um mártir negro e santo

mesmo em vida, uma espécie de Cristo Negro. Um dos mitos de São Benedito me

foi contado por seu Charqueada, um dos congadeiros vivo mais antigo de

Uberlândia, ancião do terno Moçambique Pena Branca. Conta seu Charqueada,

que certa feita, o senhor dono da fazenda onde o Benedito era cozinheiro mandou

que ele preparasse uma refeição para seus muitos escravos, mas não lhe deu a

provisão suficiente para tanto. Na despensa não havia banha e o arroz e o feijão

eram pouco. O Benedito então pede o auxílio divino e logo obtém resposta do Todo

Poderoso que lhe diz para ir até o chiqueiro e retirar um naco com toucinho e carne

de um dos porcos, que fosse desde a cabeça até o rabo do porco e então preparar

a comida. E assim o Benedito fez. Milagrosamente, a carne do porco que fora

retirada se reconstituiu na mesma hora, permanecendo o porco vivo. Todos os

escravos se alimentaram até saciar a fome e depois de banquetear tocaram e

dançaram em agradecimento ao São Benedito. O patrão, vendo tamanha festança,

foi ter com o Benedito e inquiriu dele como foi que conseguira arranjar tanto alimento.

O Benedito então lhe relatou como conseguira a banha e o toucinho. O patrão não

acreditando no milagre ameaçou castigar o Benedito, mas quando foi golpeá-lo o

São Benedito levita e fica suspenso no ar... Este mito traz o Benedito enquanto

“multiplicador dos alimentos”, realizador de “milagres” extraordinários, figura louvada

pelos seus. Esta narrativa é compartilhada pela maioria dos congadeiros, sendo

que São Benedito é considerado o santo da cozinha, da alimentação, do sustento,

da fartura, por isso sua imagem geralmente é colocada na cozinha, para que na

casa não falte o alimento.

349

É prática em várias partes do território nacional, colocar café para o São Benedito,

é comum ver sua imagem próxima a uma xícara de café. Outro ritual realizado

popularmente é tomar o café do Benedito, que é um café amargo destituído de

qualquer forma de adoçantes, bebido em pequenos goles pelos congadeiros e

participantes de celebrações, festas, etc. O café do Benedito é tomado como uma

bebida capaz de proteger a quem a ingere.

Nossa Senhora do Rosário está sempre relacionada à chuva, às riquezas, à

proteção, à geração da vida e também à morte. Recorrem a Nossa Senhora para

pedir um bom parto e também uma “boa morte”, a ela intercedem a favor dos entes

queridos que já partiram. Em todas as festas que presenciei houve homenagens a

congadeiros falecidos no período entre festas. Nossa Senhora está vinculada à

vida e à morte, ao rezar a última estrofe da “Ave Maria”, isto fica explicito: “Santa

Maria, mãe de Deus, rogai por nós pecadores agora e na hora de nossa morte.

Amém.” Durante o Congado intercedem à Nossa Senhora do Rosário pela vida e

pela proteção na inevitável hora da morte. Pedem saúde para os seus, proteção

em todos os momentos, recorrem a ela como à Grande Mãe. O culto às deusas

mães foi muito combatido pelo judaísmo, islamismo e demais religiões patriarcais,

mas encontra solo fértil nas tradições afro-descendentes e católicas. Uma música

muito difundida tanto no Congado como na Capoeira e na religiosidade ressalta o

aspecto protetor de Nossa Senhora:

“No tempo do cativeiro, quando o senhor me batia,

eu gritava por Nossa Senhora, ai meu Deus, quando a pancada doía.”

O mito fundante do Congado em Uberlândia é um relato da aparição e resgate de

Nossa Senhora do Rosário e possui pelo menos duas versões aqui sintetizadas:

a) Nossa Senhora do Rosário estava dentro do mar, um garoto a vê submergir,

chama os pais para verem, eles não acreditam. Então ele chama os Marinheiros,

que também presenciam a santa submergir, eles tentam tirá-la com suas cordas,

mas ela não sai do local. Chegam brancos e padres que conseguem retira-la da

água e levá-la para uma capela, mas a santa “foge” do altar e volta para o mar. Vem

então o terno de Congo, todo colorido e canta para ela sair da água, ela submerge,

mas ao ser levada para a capela dos brancos, volta a “fugir” para o mar. Então um

terno de Moçambique, todo vestido de branco e descalço, canta para ela, que então

submerge e lhes acompanha, eles a levam devagar até o local onde constroem

uma capela e ali Nossa Senhora do Rosário permanece, o terno de Moçambique

então se retira sem lhe dar as costas, lhe fazendo reverência;

350

b) a segunda versão, contada por Maria Conceição Cardoso, do Moçambique

Rosário de Fátima, de Ibiá - MG, afirma que ao tentar capturar escravos fugidos na

serra da Montanhesa, um grupo de capitães do mato encontra um grupo de negros,

vestidos de branco, fazendo rosários, com contas de lágrima em frente a uma árvore

de umbaúba onde Nossa Senhora do Rosário estava encravada num galho. Os

capitães do mato tentam surrar os negros e capturá-los, mas eles permanecem

imóveis, como se nada os pudesse atingir. Apavorados com a visão voltam para a

cidade e chamam um padre para ir até o local verificar o fato. E como na primeira

versão, brancos e Congos não conseguem levá-la, Nossa Senhora do Rosário

acompanha apenas o Moçambique que canta vestido de branco, de pés descalços,

que anda devagar e lhe constrói uma igreja e não lhe dá as costas ao se retirar de

sua presença.

27. Dados Históricos:

As bandeiras têm suas origens nas insígnias, sinais distintivos de poder ou de

comando, usadas desde a antiguidade e que poderiam ser figuras recortadas em

madeira ou metal, ou pintadas nos escudos. As primeiras bandeiras da história do

homem costumavam representar um grupo sócio-cultural através de imagens e de

cores dotadas de significados, a que a comunidade respectiva confere alto valor.

As bandeiras fixadas a um mastro surgiram na China e foram introduzidas no

Ocidente Medieval pelos Islâmicos. As bandeiras de tecido, no mundo ocidental,

foram criadas pelos romanos e eram denominadas vexillium (insígnia, bandeira,

estandarte). Desde a antiguidade os povos usaram mastros com imagens,

carregados na mão ou fixados nos carros de combate. A grande difusão do seu uso

foi feita pelos romanos e cada divisão da legião tinha o seu estandarte. Foi na

Idade Média que bandeiras e estandartes começaram a representar reinos e

regiões. As bandeiras foram usadas tanto em períodos de paz como de guerra.

Sendo um símbolo identificador eram usados pelos exércitos aliados. Para não se

confundirem uns com os outros e evitarem o temido fogo amigo, usavam um pedaço

de pano hasteado num estandarte, com as cores e sinais de identificação do

batalhão ou companhia envolvida.

De acordo com seu tamanho ou uso, a bandeira tem uma palavra sinônima.

Estandarte é utilizado para insígnias militares, mais especificamente para identificar

os corpos de cavalaria. O Pendão é uma bandeira grande, armada em vara,

atravessada horizontalmente sobre o mastro e levada em procissões. O Gonfalão

é uma bandeira de guerra com partes que prendem perpendicularmente a uma

haste com três ou quatro pontas pendentes. Os Estandartes do Congado mesclam

elementos das bandeiras militares e religiosas e são utilizados para identificar o

terno que os conduz e para louvar os santos de sua devoção.

351

28. Referências Documentais:* Entrevista e fotografias realizadas no trabalho de campo no quartel do terno Congode Camisa Verde*Fotografias do Congado dos anos 2004 e 2006*Marra, Fabíola Benfica. Álbum de Família: Famílias Afro-descendentes no SéculoXX em Uberlândia – MG – CD-Rom produzido entre os anos de 2004 e 2005,através da lei municipal de Incentivo à Cultura.29. Informações Complementares:O Estandarte é uma espécie de Bandeira e falar em Bandeira no congado é umpouco complexo, pois possui pelo menos três significados. Bandeira pode se referirà jornada, ao trajeto, à caminhada realizada nas campanhas e festas. Tambémpode ser utilizado para se referir à bandeira em tecido no formato retangular deaproximadamente 60 x 40 cm que trás estampado imagens dos santos, com umcabo de madeira na extremidade superior por onde a bandeireira (virgem, menorde 10 anos) segura. Esta pequena bandeira sempre acompanha o terno, abrindo-lhe os caminhos, tanto em dias de campanha quanto no dia da festa. Bandeiratambém pode referir-se ao estandarte em formato retangular de aproximadamente1,5 m de altura por 1m de comprimento, sustentado por um mastro que o eleva àaproximadamente 2,5m de altura donde pendem fitas cujas pontas as Bandeireirasseguram enquanto dançam e que traz identificações do terno e homenagens aossantos. Geralmente o estandarte e as Bandeireiras só saem em dia de festa. AsBandeireiras ou Andorinhas são meninas que conduzem as fitas do estandartefazendo coreografias. “Antigamente” esta função só era desempenhada pelasgarotas virgens. Muitas mulheres relatam que se a menina não fosse virgem elevasse a fita ou o mastro da bandeira, muitos acidentes poderiam acontecer. NossaSenhora do Rosário seria a responsável por denunciar a farsa. Adereços de cabelopoderiam cair ou a roupa se rasgar, a própria bandeira poderia sofrer danificações,como quebrar, rasgar. Desmaios e doenças também dificultariam a execução dafunção. Caberia a menina se afastar quando não fosse mais “digna” de carregar abandeira do Congado. A execução desta função indevidamente poderia acarretarproblemas ainda maiores para os ternos, como esquecer música ou errar a “batida”.Hoje, no entanto, esta tradição não é mantida pela maioria dos ternos.30.Atualização das informações:NT31. Ficha TécnicaLevantamento Data: Abril de 2007Fabíola Benfica Marra (Historiadora)Larry Guimarães de O. Filho (Formatação, estagiário de arquitetura)Larissa Gontijo T. Cunha (Formatação, estagiário de arquitetura)Elaboração Data: Abril de 2007Fabíola Benfica Marra (Historiadora)Revisão Data: Abril de 2007Anderson Henrique Ferreira (Historiador)Gisele Pinto de Vasconcelos Costa (Arquiteta)

352

BENS MÓVEIS E INTEGRADOS

01. Município: Uberlândia

02. Distrito: Sede

03. Acervo: Terno Congo de

Camisa Verde

ytfrhfhfhg

INVENTÁRIO DE PROTEÇÃODO ACERVO CULTURAL

Minas Gerais-MG

04. Propriedade: Particular

05. Endereço: Rua Feliciano de Moraes, 147 -

Aparecida

06. Responsável: Maria Rosária de Fátima

Nascimento

07. Designação: Oratório do terno Congo de Camisa Verde

08. Localização Especifica: quando não está em época de campanha fica no

quarto de Dona Fátima

09. Espécie: Móvel religioso

10. Época: Aproximadamente década de 1980

11. Autoria: Ignorada

12. Origem: Uberlândia

13. Procedência: Roosevelt

14. Material / Técnica: Compensado recortado, envernizado, encaixe, pregos,

parafusos, porta de vidro, duas dobradiças metálicas, imagens em gesso, papel

alumínio revestindo interior do oratório, porta encaixada, puxador de madeira

torneada, flores de tecido, terços com contas de plástico azul, fitas de cetim

15. Marcas / Inscrições / Legendas: crucifixo de 14 cm destacado no telhado.

16. Descrição: Oratório tipo capelinha, com telhado plano e frente elevada com

um crucifixo medindo 14 cm. Caixote de compensado recortado, envernizado,

elaborado utilizando encaixes e pregos. Papel alumínio revestindo interior do

oratório. Porta de vidro encaixado, sustentado por ripas pregadas, duas

dobradiças metálicas, presas por parafusos. A porta apenas se encaixa para

fechar, possuindo um puxador de madeira torneada. As imagens são em gesso,

São Benedito bem maior que Nossa Senhora do Rosário com pequenos

lacerados. Na frente das imagens flores de tecido, terços com contas de plástico

azul, fitas de cetim.

17- Condições de segurança:

( x ) Boa

( ) Razoável

( ) Ruim

Obs:

SECRETARIA MUNICIPALDE CULTURA

353

18- Proteção Legal:

( ) Federal

( ) Estadual

( ) Municipal

( x ) Nenhuma

( ) Tombamento Isolado

( ) Tombamento em Conjunto

Fotos do Terno Congo de Camisa Verde

Uberlândia/MG Ano 2007

19- Documentação fotográfica

20- Estado de Conservação:

( ) Excelente (X ) Bom

( ) Regular ( ) Péssimo

Obs:

21- Dimensões:

Altura: 36cm + 14cm crucifixo

Profundidade: 22,5cm

Largura: 22,5cm

354

22. Análise do Estado de Conservação:

Bastão em bom estado de conservação, sem sinais de desgaste por insetos ou

rachaduras.

23. Intervenções – Responsável / Data: NT

24. Características Técnicas:.

Oratório tipo capelinha, com telhado plano e frente elevada com um crucifixo medindo

14 cm. Caixote de compensado recortado, envernizado, elaborado utilizando

encaixes e pregos. Papel alumínio revestindo interior do oratório. Porta de vidro

encaixado, sustentado por ripas pregadas, duas dobradiças metálicas, presas por

parafusos. A porta apenas se encaixa para fechar, possuindo um puxador de madeira

torneada. Imagens religiosas em gesso, uma bem maior que a outra, com pequenos

lacerados. Na frente das imagens, flores de tecido, terços com contas de plástico,

fitas de cetim.

25. Características Estilísticas:

Estilo popular (sem característica estilística específica).

26. Características Iconográficas:

Nos oratórios do Congado figuram as imagens e/ou os nomes de Nossa Senhora

do Rosário, de São Benedito e em alguns casos outras imagens como a de Santa

Ifigênia, Nossa Senhora Aparecida, São Domingos, etc.

Cada santo é associado a elementos distintos. Santa Efigênia ou Ifigênia, pelo que

os congadeiros dizem é a dona da festa do Congado. Santa Ifigênia, segundo

Câmara Cascudo é uma virgem mártir da Etiópia, devoção de negros e pessoas

menos favorecidas. A festa do Congado acontecia em louvor à Santa Ifigênia, a

santa negra, mas os brancos não aceitaram e para que a festa se legitimasse eles

criam a imagem de Nossa Senhora do Rosário. Segundo o Cláudio, filósofo,

pesquisador do Congado e dançador do Terno de Camisa Verde, os negros pegam

o rosário que é de Santa Ifigênia e colocam na imagem de Nossa Senhora do

Perpétuo Socorro, criando assim a imagem de Nossa Senhora do Rosário.

Segundo Seu Zezão, capitão do terno Congo de Santa Ifigênia, ele colocou em seu

terno o nome de Santa Ifigênia porque as pessoas precisavam reconhecer que a

festa é dela. Seu Zezão conta que deu muito trabalho para aceitarem o terno porque

somente os padres sabiam da “verdadeira história” de Santa Ifigênia, de Nossa

Senhora do Rosário e de São Benedito. Segundo ele, para haver união entre os

pretos e os brancos Chico Rei comprou a coroa de Santa Ifigênia para coroar Nossa

Senhora do Rosário, comprando assim a sua benção. Como garantia da fidelidade

de Nossa Senhora do Rosário colocaram um menino nos braços de São Benedito

que não é Jesus, mas um menino branco do povo. Se Nossa Senhora do Rosário

algum dia trair os negros, São Benedito deve cortar o pescoço do menino.

355

De acordo com seu Zezão, São Benedito está sempre ao lado de Nossa Senhora

do Rosário como um soldado, um general. Esta surpreendente narrativa de Seu

Zezão introduz a história de Chico Rei e trata de uma negociação entre os santos.

Mas, o que mais chama atenção é a mudança do papel de São Benedito. Este, tido

como mártir sempre foi referido como uma figura bondosa e que multiplicava os

alimentos, uma espécie de Cristo negro. Agora São Benedito é tomado como um

militar frio, capaz de decapitar um bebê branco em nome da proteção dos negros.

Não ouvi de mais ninguém a confirmação desta versão mitológica. Quando se

conversa com seu Zezão percebe-se claramente a existência de uma disputa pelo

capital simbólico. Em meio às críticas aos pesquisadores e aos trabalhos existentes

sobre o congado ele questiona a “ciência” dos “verdadeiros” “fundamentos” de sua

prática ritual tanto pelos pesquisadores como pelos capitães dos outros ternos.

Insinuando ser ele um dos poucos detentores dos conhecimentos tidos como

“fundamentos” do Congado. Diversas outras pessoas tomam este comportamento

como prática. Fazer o Congado sem “fundamento” seria um ultraje. O convívio nos

quartéis envolve aprendizado constante e um “verdadeiro” capitão precisa passar

por esta escola e aprender todas as lições antes de ousar montar o seu próprio

terno.

O lendário Chico Rei, que é o criador da Irmandade do Rosário em Minas Gerais,

era rei em Moçambique, mas na perda de uma batalha fora apreendido e vendido

como escravo, trazido para o Brasil. Os escravos trazidos de Moçambique eram os

conhecedores das técnicas de mineração, “farejavam as minas”, como diziam os

invasores europeus. Chico Rei, após enriquecer seu senhor e demonstrar ser um

grande conhecedor do processo de mineração conseguiu comprar com ouro a

alforria de familiares e amigos, e construir uma capela em homenagem à Santa

Ifigênia em Vila Rica (Ouro Preto). Após descobrir algumas minas Chico Rei disse

que não trabalharia mais se o seu senhor não trouxesse para junto de si seu filho e

parentes que estavam distantes, vendidos para outros senhores de escravos. Mais

tarde conseguiu comprar a alforria de diversos outros escravos. Segundo Câmara

Cascudo “No dia de Reis, em Vila Rica, as negras do cortejo de Chico Rei vinham

com as carapinhas polvilhadas de ouro lavá-las e deixar o ouro numa pia de pedra

existente no Alto da Cruz, onde havia uma imagem de Santa Ifigênia. O ouro servia

para a libertação de outros escravos.” (1972, p.449). O Rei “Moçambiqueiro” que

no Brasil passa a ser chamado de Chico Rei recria aqui o seu reino, supera a

condição de escravo e constrói uma das bases do movimento negro. Muitos negros

se mantinham escravos e cooperavam no movimento liderado por Chico Rei para

a libertação de seu povo.

356

Os negros então alforriados passam a viver nos centros urbanos nascentes e/ou se

deslocam com as expedições desempenhando funções de carpinteiro, pedreiro,

ferreiro (serralheiro), barbeiro, quituteiras, vendedores e outras profissões tidas hoje

como “liberais”. Observem que nesta narrativa, o negro se retira do sistema de

escravidão utilizando a linguagem que está nas bases do sistema capitalista. Ocorre

um rompimento com a escravidão, mas não com sua lógica, pois há uma busca

pela inserção do negro no sistema capitalista decorrente desta. Nos movimentos

quilombolas, onde este sujeito excluído busca uma nova forma de associação e de

socialização fora da sociedade opressora, ocorre uma quebra com os padrões

antes impostos. Mas os negros quilombolas precisavam permanecer em estado

de vigília por causa das constantes investidas das expedições contra suas

comunidades. Mas esta é uma outra história.

Voltando aos mitos do Congado, a principal referencia ao São Benedito é em

relação à alimentação, ele provém o sustento das famílias, dá força. São Benedito

está mais ligado à saúde, à manutenção da vida material, é um mártir negro e santo

mesmo em vida, uma espécie de Cristo Negro. Um dos mitos de São Benedito me

foi contado por seu Charqueada, um dos congadeiros vivo mais antigo de

Uberlândia, ancião do terno Moçambique Pena Branca. Conta seu Charqueada,

que certa feita, o senhor dono da fazenda onde o Benedito era cozinheiro mandou

que ele preparasse uma refeição para seus muitos escravos, mas não lhe deu a

provisão suficiente para tanto. Na despensa não havia banha e o arroz e o feijão

eram pouco. O Benedito então pede o auxílio divino e logo obtém resposta do Todo

Poderoso que lhe diz para ir até o chiqueiro e retirar um naco com toucinho e carne

de um dos porcos, que fosse desde a cabeça até o rabo do porco e então preparar

a comida. E assim o Benedito fez. Milagrosamente, a carne do porco que fora

retirada se reconstituiu na mesma hora, permanecendo o porco vivo. Todos os

escravos se alimentaram até saciar a fome e depois de banquetear tocaram e

dançaram em agradecimento ao São Benedito. O patrão, vendo tamanha festança,

foi ter com o Benedito e inquiriu dele como foi que conseguira arranjar tanto alimento.

O Benedito então lhe relatou como conseguira a banha e o toucinho. O patrão não

acreditando no milagre ameaçou castigar o Benedito, mas quando foi golpeá-lo o

São Benedito levita e fica suspenso no ar... Este mito traz o Benedito enquanto

“multiplicador dos alimentos”, realizador de “milagres” extraordinários, figura louvada

pelos seus. Esta narrativa é compartilhada pela maioria dos congadeiros, sendo

que São Benedito é considerado o santo da cozinha, da alimentação, do sustento,

da fartura, por isso sua imagem geralmente é colocada na cozinha, para que na

casa não falte o alimento.

357

É prática em várias partes do território nacional, colocar café para o São Benedito,

é comum ver sua imagem próxima a uma xícara de café. Outro ritual realizado

popularmente é tomar o café do Benedito, que é um café amargo destituído de

qualquer forma de adoçantes, bebido em pequenos goles pelos congadeiros e

participantes de celebrações, festas, etc. O café do Benedito é tomado como uma

bebida capaz de proteger a quem a ingere.

Nossa Senhora do Rosário está sempre relacionada à chuva, às riquezas, à

proteção, à geração da vida e também à morte. Recorrem a Nossa Senhora para

pedir um bom parto e também uma “boa morte”, a ela intercedem a favor dos entes

queridos que já partiram. Em todas as festas que presenciei houve homenagens a

congadeiros falecidos no período entre festas. Nossa Senhora está vinculada à

vida e à morte, ao rezar a última estrofe da “Ave Maria”, isto fica explicito: “Santa

Maria, mãe de Deus, rogai por nós pecadores agora e na hora de nossa morte.

Amém.” Durante o Congado intercedem à Nossa Senhora do Rosário pela vida e

pela proteção na inevitável hora da morte. Pedem saúde para os seus, proteção

em todos os momentos, recorrem a ela como à Grande Mãe. O culto às deusas

mães foi muito combatido pelo judaísmo, islamismo e demais religiões patriarcais,

mas encontra solo fértil nas tradições afro-descendentes e católicas. Uma música

muito difundida tanto no Congado como na Capoeira e na religiosidade ressalta o

aspecto protetor de Nossa Senhora:

“No tempo do cativeiro, quando o senhor me batia,

eu gritava por Nossa Senhora, ai meu Deus, quando a pancada doía.”

O mito fundante do Congado em Uberlândia é um relato da aparição e resgate de

Nossa Senhora do Rosário e possui pelo menos duas versões aqui sintetizadas:

a) Nossa Senhora do Rosário estava dentro do mar, um garoto a vê submergir,

chama os pais para verem, eles não acreditam. Então ele chama os Marinheiros,

que também presenciam a santa submergir, eles tentam tirá-la com suas cordas,

mas ela não sai do local. Chegam brancos e padres que conseguem retira-la da

água e levá-la para uma capela, mas a santa “foge” do altar e volta para o mar. Vem

então o terno de Congo, todo colorido e canta para ela sair da água, ela submerge,

mas ao ser levada para a capela dos brancos, volta a “fugir” para o mar. Então um

terno de Moçambique, todo vestido de branco e descalço, canta para ela, que então

submerge e lhes acompanha, eles a levam devagar até o local onde constroem

uma capela e ali Nossa Senhora do Rosário permanece, o terno de Moçambique

então se retira sem lhe dar as costas, lhe fazendo reverência;

358

b) a segunda versão, contada por Maria Conceição Cardoso, do Moçambique

Rosário de Fátima, de Ibiá - MG, afirma que ao tentar capturar escravos fugidos na

serra da Montanhesa, um grupo de capitães do mato encontra um grupo de negros,

vestidos de branco, fazendo rosários, com contas de lágrima em frente a uma árvore

de umbaúba onde Nossa Senhora do Rosário estava encravada num galho. Os

capitães do mato tentam surrar os negros e capturá-los, mas eles permanecem

imóveis, como se nada os pudesse atingir. Apavorados com a visão voltam para a

cidade e chamam um padre para ir até o local verificar o fato. E como na primeira

versão, brancos e Congos não conseguem levá-la, Nossa Senhora do Rosário

acompanha apenas o Moçambique que canta vestido de branco, de pés descalços,

que anda devagar e lhe constrói uma igreja e não lhe dá as costas ao se retirar de

sua presença.

27. Dados Históricos:

Os primeiros oratórios datam dos primórdios da Idade Média. Pequenos armários

que podiam guardar não só o santo protetor, mas tudo que se relaciona à devoção

cotidiana. Propiciando um ambiente adequado às reflexões e orações no interior

das residências. Os oratórios geralmente simulam pequenos templos, trazidos para

o interior das casas para conferir aos seus donos segurança e intimidade com o

mundo do sagrado. Utilizados também em momentos festivos e em celebrações

coletivas. Nos primeiros anos da colonização do Brasil, os oratórios exerceram

importante papel no exercício da fé, pois inexistindo igrejas, era diante desses nichos

ou armários de guardar santos que o povo fazia suas rezas. Deste modo as casas

se constituíam no local mais reservado para a devoção religiosa.O oratório utilizado

no Congado é o que designam por Esmoler ou oratório Itinerante ou de viagem.

Estes oratórios são encontrados principalmente em espaços urbanos e utilizados

para arrecadar dinheiro para a edificação de um templo de uma irmandade e para

angariar recursos para a realização de festas religiosas.

28. Referências Documentais: Fotografias e entrevistas realizadas em visitas à

residência de Creuza Romão de Oliveira, quartel do terno Congo de SainhaCascudo,

Luiz da Câmara. Dicionário do Folclore Brasileiro. Rio de Janeiro: Edições de Ouro,

1972Site: http://www.museudoratorio.com.brCD Rom “Álbum de Família: Famílias

Afro-descendentes em Uberlândia no Século XX” – Produzido por Fabíola Benfica

Marra, com recurso da lei Municipal de Incentivo à Cultura, finalizado em 2005.

29. Informações Complementares:

O oratório cumpre uma importante função no Congado. Durante as campanhas o

oratório fica na casa onde será realizada a novena e/ou o leilão. Quando o terno sai

para as novenas, as mulheres vão à frente para rezar com os moradores da casa. A

bateria chega quando a novena já encerrou.

359

Uma virgem (geralmente criança menor de 10 anos) leva uma bandeira com aimagem de São Benedito ou de Nossa Senhora do Rosário, ou ambos, “escoltados”pela mãe e pela madrinha da bandeira e do terno à frente da guarda. Eles tocamem saudação aos donos da casa que sai para recebê-los. A bandeira é saudadacom devoção e após passar sobre as cabeças das pessoas da casa é levada parao interior da residência para que sejam abençoados todos os cômodos e todos osmoradores. Os dançadores também entram tocando e realizando suas performancese logo se retiram. Após o terço é realizado o leilão das prendas arrecadadas pelomorador da casa que está recebendo o oratório do terno. O oratório andorpermanece no interior da casa até que todas as prendas sejam compradas. Uma“secretária”, geralmente uma das Madrinhas, anota em um caderno cada produto eo valor arrematado e o nome do comprador. Os produtos geralmente sãoarrematados por valores acima do valor real de mercado. Encerrado o leilão, oterno toca para sair, agradece aos donos da casa, que em alguns casos tambémoferecem um lanche. Os soldados descansam as caixas do lado de fora enquantoas meninas rezam se despedindo. Os donos da casa se despedem dos santos edo oratório que irá partir para abençoar outra casa. Quando a bandeira sai, o capitãoe seus soldados cantam e tocam se despedindo e as meninas levam dançando ooratório andor com os santos e a bandeira para a casa onde será realizada a próximanovena e/ou leilão. Ao chegar os soldados chamam o morador que sai até a portapara receber a Bandeira (terno) e o oratório. Todos rezam e combinam o dia certopara o leilão e/ou novena, que poderá ser no dia seguinte ou nos próximos. ABandeira (o terno) parte de volta para o quartel, onde ficará a bandeira (levada pelavirgem) e os instrumentos até o próximo leilão. O oratório com as imagens dossantos é levado no dia da festa por alguns ternos.

30.Atualização das informações:NT

31. Ficha Técnica

Levantamento Data: Abril de 2007

Fabíola Benfica Marra (Historiadora)

Larry Guimarães de O. Filho (Formatação, estagiário de arquitetura)

Larissa Gontijo T. Cunha (Formatação, estagiário de arquitetura)

Elaboração Data: Abril de 2007

Fabíola Benfica Marra (Historiadora)

Revisão Data: Abril de 2007

Anderson Henrique Ferreira (Historiador)

Gisele Pinto de Vasconcelos Costa (Arquiteta)

360

ESTRUTURA ARQUITETÔNICA E URBANÍSTICA

INVENTÁRIO DE PROTEÇÃODO ACERVO CULTURAL

Minas Gerais-MG

Fotos do Quartel Terno Congo Camisa Verde

Uberlândia/MG Ano 2007

01. Município: Uberlândia

02. Distrito: Sede

03. Designação: Quartel do

Terno Congo Camisa Verde

04. Endereço: Rua Feliciano de Moraes, 147 -

Aparecida

05. Propriedade: Privada

06. Responsável: Maria Rosária de Fátima

Nascimento07. Histórico:

Na época em que o terno Congo de Camisa Verde era comandado por Elias

Nascimento, o quartel era na casa do Presidente da Irmandade na rua Prata. Em

1963 o quartel passa a ser na Rua Feliciano de Moraes, 147 – Aparecida. Domicílio

em nome de José Olimpio Nascimento, permanecendo atualmente neste local onde

reside Dona Fátima.

08. Descrição:

Localizado na região central de Uberlândia, a área construída ocupa

aproximadamente 30% do terreno de 8x30m, sendo um cômodo destinado

exclusivamente para abrigar os instrumentos e as vasilhas da cozinha do Congado.

Durante as festas é armada uma lona para cobrir o restante do terreno, garantindo

sobra e abrigo da chuva para os soldados. O madeiramento, estrutura para a

cobertura, é mantido no local o ano inteiro, a lona, após o período de festas é

dobrada e guardada junto com os instrumentos.

09. Documentação Fotográfica:

SECRETARIA MUNICIPALDE CULTURA

361

09. Documentação Fotográfica:

Fotos do Quartel Terno Congo de Camisa Verde

Uberlândia/MG Ano 2007

362

10. Uso Atual:( x ) Residencial ( x ) Serviço( ) Comercial ( ) Institucional( ) Industrial ( ) Outros 11. Situação de Ocupação:( x ) Própria ( ) Alugada( ) Cedida ( ) Comodato( ) Outros12. Proteção Legal Existente( ) Tombamento( ) Municipal( ) Federal( ) Estadual( x ) Nenhuma13. Proteção Legal Proposta:( ) Tombamento Federal( ) Tombamento Estadual( ) Tombamento Municipal( ) Entorno de Bem Tombado( )Documentação Histórica( x ) Inventário( ) Tombamento Integral( ) Tombamento Parcial( ) Fachadas( ) Volumetria( ) Restrições de Uso e Ocupação

14. Análise do Entorno - Situação e Ambiência: Localiza-se em área plana com

com passeios, arborização, redes elétrica, rede de esgoto, rede de água tratada,

As edificações são predominantemente de volumetria simples apresentando

partidos retangulares, com vários “puxadinhos”, altimetria de um pavimento,

materiais de acabamento de alvenaria de tijolo cerâmico, pintura com grande

variação de cores e esquadrias de metalon ou alumínio, coberturas metálicas ou

com telhas cerâmicas.

15. Estado de Conservação:

( ) Excelente

( ) Bom

( x ) Regular

( ) Péssimo

363

16. Análise do Estado de Conservação:O estado de conservação está regular,

necessitando de repintura, já que a atual apresenta muitas marcas de reformas

recentes, como torça de esquadrias e também de infiltrações causadas por água

de chuva.

17. Fatores de Degradação:Infiltração causada por ação das intempéries

18. Medidas de Conservação:Conservação preventiva

19. Intervenções:Não identificadas

20. Referências Bibliográficas:*Marra, Fabíola Benfica. Álbum de Família:

Famílias Afro-descendentes no Século XX em Uberlândia – MG – CD-Rom produzido

entre os anos de 2004 e 2005, através da lei municipal de Incentivo à Cultura.*Slenes,

Robert W. “Na Senzala uma flor: esperanças e recordações da família escrava,

Brasil Sudeste, Século XIX” Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999.

21. Informações Complementares:

Os quartéis são os locais onde os soldados de cada guarda se reúnem para fazer

as campanhas ou para sair em viagens. É também onde guardam os instrumentos

e realizam as refeições durante os dias de festa e fazem intervalos de descanso.

Todas as atividades do Congado começam e terminam no quartel. Geralmente o

quartel é o local de moradia da família do capitão ou da madrinha do terno. As

construções são o que se chamam colônias: diversas casas pequenas, construídas

em períodos distintos, dispostas umas ao lado das outras e com um pátio, uma

área comum, um terreiro no meio. A área não construída no meio é utilizada para

reunir o terno, para realizar as refeições coletivas, afinar instrumentos. Em muitos

casos, banheiros, tanques, pias e locais para passar roupas são de uso comum a

todos os moradores da colônia. Nos Quartéis, realizam grandes refeições conjuntas,

mesmo não sendo dia de festa Congado. O milagre multiplicador dos alimentos

promovido por São Benedito é realizado pelas matriarcas todos os dias e se estende

aos “praticamente filhos”, pois muitas crianças, jovens e adultos são atraídas para

o convívio das famílias de congo, estendendo os laços familiares para além dos

consangüíneos. O Congado que acontece na porta da igreja Católica é o ápice, o

momento máximo desta festa que dura praticamente o ano inteiro dentro dos terreiros

e quartéis. A família é festejada diariamente. Grandes matriarcas reúnem ao seu

redor seus muitos filhos todos os dias.

364

Segundo Robert W. Slenes1, a palavra Senzala origina-se do dialeto Kimbundu e

significa “residência de serviçais em propriedade agrícola” ou ainda “moradia de

gente separada da casa principal”. Senzala também pode significar “Povoado” ou

“grupo de parentesco”. (p. 148). Enquanto a expressão Quilombo é utilizada para

designar “acampamento de guerreiros” (p. 173). Os Quartéis de Congado abriga

Soldados com suas caixas e seus Estandartes durante as Campanhas. No Congado,

os guerreiros conduzem caixas e são designados Soldados, organizados por

Capitães, seguem seus Estandartes e se abrigam no Quilombo chamado Quartel.

(Footnotes)

Slenes, Robert W. “Na Senzala uma flor: esperanças e recordações da família

escrava, Brasil Sudeste, Século XIX” Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999.

22. Atualização das informações:NT

23. Ficha Técnica

Levantamento Data: Abril de 2007

Fabíola Benfica Marra (Historiadora)

Larry Guimarães de O. Filho (Formatação, estagiário de arquitetura)

Larissa Gontijo T. Cunha (Formatação, estagiário de arquitetura)

Elaboração Data: Abril de 2007

Fabíola Benfica Marra (Historiadora)

Revisão Data: Abril de 2007

Anderson Henrique Ferreira (Historiador)

Gisele Pinto de Vasconcelos Costa (Arquiteta)

CONGO DE

SAINHA

366

BENS IMATERIAIS

01. Município: Uberlândia

02. Distrito: Sede

03. Denominação: Terno

Congo Sainha

INVENTÁRIO DE PROTEÇÃODO ACERVO CULTURAL

Minas Gerais-MG

04. Natureza: Festas Populares/ Celebrações/

Cultos Afro-brasileiros

05. Responsável: José Eustáquio

06. Informe Histórico:

A segunda madrinha do terno, Dona Creuza Romão de Oliveira, nascida em 24/04/

1948, é a proprietária do domicílio onde atualmente funciona o quartel do terno

Congo de Sainha. O terno Congo de Sainha é fundado por José Rafael fundou em

1950, tendo como segundo capitão o atual segundo capitão José Justino, o pai de

Dona Creuza, João Romão Cesário, nascido em 15/02/1915 e falecido em 27/05/

1993, era lavrador e desde a fundação do terno Congo de Sainha dançou como

tocador de caixa, caixeiro. A mãe de Dona Creuza, Silenaura Mariana, nascida em

24/03/1917, na cidade de Nova Ponte, era uma das madrinhas do terno Congo de

Sainha na época de sua fundação. A função de primeira madrinha do terno

atualmente é desempenhada pela filha de Dona Creuza, Cláudia Romão de Oliveira.

O José Eustáquio é filho de criação de José Rafael e dona Abadia, quando seu

José Rafael falece no início da década de 1980, a função de presidente e primeiro

capitão do terno Congo de Sainha é passada para o jovem José Eustáquio,

permanecendo o José Justino na função de segundo capitão.

Fotos do Terno Congo de Sainha

Uberlândia/MG Ano 2007

SECRETARIA MUNICIPALDE CULTURA

367

Fotos do Terno Congo de Sainha

Uberlândia/MG Ano 2007

07. Documentação fotográfica:

08. Descrição:

O terno Congo de Sainha é um dos ternos mais antigos da cidade, é o único terno

de Congo que mantém uma estrutura tradicional e utiliza indumentária e instrumentos

harmônicos tradicionalmente associados aos ternos de Congo. Os soldados utilizam

“chapéu de coroa” e saiote azul sobre calça e camisa branca, com sapatos também

brancos, as meninas utilizam vestido cor-de-rosa, meia-luva, adereços florais na

cabeça e uma faixa saldando Nossa Senhora do Rosário. A indumentária feminina

é padronizada, já a dos soldados mantém apenas o padrão e as cores, já que fica

a cargo de cada soldado preparar seu “uniforme”. Muitos dançadores são adultos

e idosos, não faltando a presença de jovens e crianças. Os instrumentos utilizados

são sanfona, viola, violão, cavaquinho, pandeiro, chocalho e três bitolas de caixa.

09. Grupos Sociais Envolvidos:

Os participantes do terno Congo de Sainha não pertencem à grupos unificadores,

são integrantes das famílias dos seus fundadores, que desde o princípio não

pertenciam à uma única linhagem familiar.

10. Organizadores:

Presidente e primeiro capitão: José Eustáquio

Segundo Capitão: José Justino

Madrinhas Cláudia e Creuza Romão

368

11. Participantes: aproximadamente 100 integrantes

12. Local de Realização: Rua Cel. Antônio Alves Pereira, 2475 - Saraiva

13. Data/ periodicidade de ocorrência:

A “campanha” do Congado, como os congadeiros dizem, começava por volta do

dia 15 de setembro, atualmente ela começa por volta do dia 10 de agosto. Por

causa da mudança da data da festa de novembro para outubro, a campanha também

começa mais cedo. A festa do Congado realizada na Igreja de Nossa Senhora do

Rosário no centro da cidade de Uberlândia, atualmente ocorre no último domingo e

segunda-feira de outubro, antes era no segundo domingo e segunda-feira de

novembro. Ocorre também uma festa na igreja de São Benedito, no bairro Planalto

no mês de maio. Várias festas em outras cidades ocorrem em diversas datas ao

longo do ano, sendo visitadas pelos ternos de Uberlândia.

14. Informações Complementares:

O Congado é um ritual afro-brasileiro que nasce dos cortejos de coroação de reis,

do culto aos ancestrais africanos e das celebrações de santos da Igreja Católica.

Uma dança ritual executada por guardas ou ternos de Congo, Moçambique, Marujo,

Marinheiro e Catupé. Os dançantes prestam homenagem à Nossa Senhora do

Rosário e a São Benedito, aos antepassados e aos santos de sua devoção,

principalmente aos santos negros Santa Ifigênia e N. S. Aparecida, mas também

São Domingos, Nossa Senhora da Guia, Nossa Senhora d’Abadia, etc. Cada terno

se diferencia do outro nas cores das roupas e dos acessórios, nos ritmos das

músicas, nos instrumentos e na forma da dança.

Prevalesse o canto antifonal, isto é, um solista, geralmente o Primeiro Capitão,

apresenta o tema e o coro responde. O Segundo Capitão com seu bastão e apito

comanda os soldados na execução instrumental. Cada Capitão “puxa” uma série

de músicas que podem ser elaboradas por ele ou pelo grupo e ainda outras

aprendidas com outros ternos ou com os antepassados. Algumas músicas são

“tradicionais” do terno, passadas de capitão para capitão. Outras são específicas

de cada guarda. Existem também cantorias que são consideradas “segredo” que

não podem ser reveladas para “os de fora” e que são aprendidas e “guardadas no

coração”, só são executadas em cerimônias reservadas.

369

O trajeto do Congado é uma manifestação pública da fé, do pertencimento ao

movimento cultural afro-brasileiro-mineiro-uberlandese. Os congadeiros rompem

os muros que cercam suas comunidades e ganham a cidade, comemorando a

manutenção de suas famílias e de sua cultura.

O ritual composto por elementos da cultura bantu é reelaborado no Brasil sob

influência do contato com outros povos africanos, europeus e nativos. O Congado

em Uberlândia, é fundamentado no mito da aparição e resgate da imagem de Nossa

Senhora do Rosário e possui pelo menos duas versões: a) Nossa Senhora do

Rosário estava dentro do mar, um garoto a vê submergir, chama os pais para verem,

eles não acreditam.

Então ele chama os Marinheiros, que também presenciam a santa submergir, eles

tentam tirá-la, mas ela não sai do local. Chegam brancos e padres e tentam levá-la

para uma capela, mas a santa “foge” do altar e volta para o mar. Vem, então o terno

de Congo, todo colorido e canta para ela sair da água, ela submerge, mas ao ser

levada para a capela dos brancos, volta a “fugir” para o mar. Um terno de

Moçambique, todo vestido de branco, descalço, com gungas nos pés, canta para

ela, que então submerge e lhes acompanha, eles então constroem uma capela

para ela e ali Nossa Senhora do Rosário permanece, o terno de Moçambique então

se retira sem lhe dar as costas. b) a segunda versão, contada por Maria Conceição

Cardoso, do Moçambique Rosário de Fátima, afirma que ao tentar capturar escravos

fugidos na serra da Montanhesa, um grupo de capitães do mato encontra um grupo

de negros, vestidos de branco, fazendo rosários, com contas de lágrima em frente

a uma árvore de umbaúba onde Nossa Senhora do Rosário estava encravada num

galho. Os capitães do mato surram os negros e tentam capturá-los, mas eles

permanecem imóveis. Apavorados com a visão voltam para a cidade e chamam

um padre para ir até o local verificar o fato.

E como na primeira versão, brancos e Congos não conseguem levá-la, Nossa

Senhora do Rosário acompanha apenas o Moçambique que canta, vestido de

branco e lhe construiu uma igreja e não lhe dá as costas ao se retirar de sua presença.

O Moçambique é, por isso, a Guarda Real. Isto é, são os ternos de Moçambique os

responsáveis por conduzir as imagens dos santos, bem como os reis durante a

procissão.

370

É responsável por levantar o mastro na porta da Igreja dando início ao Congado, é

quem geralmente conduz os casais reais até a procissão e também no encerramento

da festa. Ouvi de diversos capitães em Uberlândia, que quem conduz o casal real é

o Moçambique ou “Congo de coroa”. A coroa além de representar a realeza, também

é símbolo de Nossa Senhora e confere a quem a utiliza a autoridade para conduzir

os reis e santos. A coroa também está associada aos Pretos Velhos, na Umbanda,

representa o poder e a sabedoria dos anciões. O Catupé faz a guarda do

Moçambique e pode substituí-lo nessas funções.. As músicas, as roupas e adereços

e o trançar de fitas característico do terno de Marinheiros e Marujos, fazem referência

ao mar que traz os negros para o Brasil e de onde Nossa Senhora é retirada, e às

atividades do Marinheiro.Os ternos de Congo são de louvação, os tocadores de

maracanãs e caixas fazem performances saltando com os instrumentos, mas esta

performance, atualmente, também é reproduzida por outras guardas.Segundo os

integrantes do Marinheiro de São Benedito a performance dos saltadores ou

caixeiros de frente, em que os dançadores pulam com as caixas revezando entre

ajoelhar-se e saltar é cheia de significação.

Quando estão ajoelhados, estão pedindo axé e quando estão pulando, estão

agradecendo as graças recebidas. Axé é energia vital, essencial para existência.

Uma das características diferenciadoras dos ternos de Congo que vem se

extinguindo em Uberlândia é o uso de cuíca e de tamborins (caixinhas quadradas

confeccionados em madeira e couro, percutidas com uma vareta), bem como o

uso de pandeiros, adufes e instrumentos harmônicos como violões, cavaquinhos,

banjos e sanfonas.

A organização das guardas, a hierarquia dos ternos, segue os modelos militares

ou políticos. Na maior parte dos ternos, o “regente” é chamado Capitão, mas em

outros recebe o distintivo de General ou Guia. Existem outras funções, tais como,

Presidente, Fiscal, Conselheiro, Secretário, Tesoureiro, Madrinha do Terno, Madrinha

da Bandeira, Soldados, Bandeireiras, etc. que variam de terno para terno, tanto em

número como em funções e significações. “Antigamente” a função de Primeiro

Capitão era designada em alguns ternos de Marechal e as bandeireiras de Juizas,

o Presidente era conhecido como o Dono do terno. As designações presidente,

vice-presidente geralmente tem seu equivalente como primeiro capitão, segundo

capitão, madrinha.

371

O primeiro capitão se desloca o tempo todo se certificando se tudo corre bem comtodo o terno e também puxa as músicas. O segundo capitão geralmente éresponsável por reger a bateria, é o maestro. Dois outros capitães ou fiscaisprotegem as laterais e também se locomovem entre os dançadores. A madrinha doterno geralmente segue a frente, junto à virgem que carrega a bandeira, mas tambémtransita pelo terno auxiliando na medida em que se faz necessário. A madrinha dabandeira auxilia as bandeireiras. Elas também são responsáveis pelas crianças,no Marinheirão existe a função de capitão das crianças, outras pessoas, geralmenteas mães também cuidam das delas, carregando-as no colo quando se cansam.Os Fiscais auxiliam na condução do terno, na execução das músicas, naorganização dos dançadores. São os imediatos do Capitão, geralmente tambémimpunham um bastão e trazem um apito. As funções de Presidente, tesoureiro eSecretários, exigidas para o registro oficial, geralmente são desempenhados pelospróprios Capitães, Madrinhas e Fiscais.Os Soldados são os tocadores edançadores. As Bandeireiras conduzem as Bandeiras ou estandartes e suas fitas fazendocoreografias, também podem ser chamadas de Andorinhas.“Antigamente” esta função só era desempenhada pelas garotas virgens. Muitasmulheres relatam que se a menina não fosse virgem e levasse a fita ou o mastro dabandeira, muitos acidentes poderiam acontecer. Nossa Senhora do Rosário seriaa responsável por denunciar a farsa. Adereços de cabelo poderiam cair ou a roupase rasgar, a própria bandeira poderia sofrer danificações, como quebrar, rasgar.Desmaios e doenças dificultariam a execução da função. Caberia a menina seafastar quando não fosse mais “digna” de carregar a bandeira do Congado. Hojeno entanto esta tradição não é mantida pela maioria dos ternos.Alguns atribuem sentidos místicos à escolha das cores, dos instrumentos, dosacessórios e dos ritmos, outros vêm nesses elementos traços distintivos dos ternos.As roupas e acessórios são usados apenas nos dias de festa, durante a campanha,cada um se veste a seu modo. As meninas geralmente fazem roupas que podemser usadas no cotidiano, já que todo ano elas fazem duas trocas de roupa: umapara o domingo e outra para a segunda. Alguns ternos modificam os modelos desuas roupas todo ano, outros mantém a vestimenta dos homens durante algumperíodo. Constatei a preocupação de anciões quanto à manutenção das roupasconsideradas tradicionais dos ternos. A indumentária que mais inova é a dasbandeireiras, geralmente as roupas dos soldados possuem elementosidentificadores dos ternos e não mudam de um ano para o outro, a mudança quandoocorre é gradativa. A indumentária é um dos elementos identificadores dos ternos,por isso a Irmandade do Rosário intervém na escolha das cores e adereços.Os ternos só recebem a Carta de Comando – ordem para participar dos festejos –se estiverem filiados à Irmandade de Nossa Senhora do Rosário de Uberlândia.Aqueles registrados em cartórios participam do Reinado sem o aval da Irmandade.Um representante da Igreja, geralmente o pároco, participa diretamente das decisõesda Irmandade.

372

A Irmandade é o elo de ligação dos ternos com a Igreja Católica e as subvençõesgovernamentais. A Irmandade gerencia a festa, decide data de realização da festa,faz e refaz o estatuto da Irmandade e da Festa, decide horários de realização demissas, procissões etc. A diretoria da Irmandade do Rosário é na verdade umreinado, onde os cargos são hereditários. Cada terno é como se fosse um “reino”ou “estado”, “clã”, “facção”, um batalhão, um pelotão, pertencente à um tipo deguarda. Com organização e agenda de rituais própria. Cada terno possui o seu“diplomata”, geralmente um capitão, que fará sua representação nas reuniões coma Irmandade e os órgãos governamentais ou financiadores.Apesar de muitos congadeiros negar que exista rivalidade entre os ternos, a disputatorna-se muito clara em muitos momentos.Disputam a ocupação do espaço na praça da igreja, qual a execução mais perfeitadas músicas, qual o maior número de componentes, qual a melhor organização edisposição dos soldados na apresentação, qual a melhor e mais bonita indumentária,ocorre disputa na demarcação do território onde realizaram sua campanha, etc.Em alguns momentos verdadeiras batalhas orquestrais ocorrem: os ternos seenfrentam com os instrumentos, o apito e a expressão corporal dos capitães deixamclara a luta enquanto os soldados rufam seus tambores.Durante “campanha” do Congado, como os congadeiros dizem, são confeccionadosou reformados acessórios, roupas e instrumentos. Realizam ensaios, novenas,leilões, reuniões com a Irmandade e com a Coordenadoria Municipal Afro-Racial(CoAfro). Fazem benzições, trabalhos espirituais. Visitam outras cidades em festa.A campanha é o período que precede a festa.Geralmente é o Presidente do terno ou a Madrinha quem fica responsável poragendar os leilões e novenas. Os donos da casa onde serão realizados os leilõesarrecadam “prendas”, geralmente alimentos, produtos de higiêne, bebidas, quitutes,roupas, etc, que serão leiloados a favor do terno. Reúnem-se os dançadores, afinam-se os instrumentos e cada terno sai do seu quartel sob o comando do bastão e doapito de seus capitães realizando jornadas noturnas que extrapolam os limites dosbairros para realizar as novenas e os leilões. Estes deslocamentos pela cidadeenchem a noite com as sonoridades dos instrumentos. Algumas pessoas saem naporta das casas para ver os ternos passarem, nos seus ensaios para o dia dafesta.Cada terno possui o seu “território”, demarcado pelas casas dos amigos queoferecem prendas para o leilão ou solicitam a visita da bandeira para a realizaçãoda novena. Cada terno possui um quartel, que pode ser a casa de um dos capitãesou de pessoas ligadas ao terno. O “território” dos ternos extrapola, inclusive asfronteiras das cidades, pois cada terno possui uma agenda de festas e encontrosformando distintas redes de sociabilidade. Os ternos também costumam visitarsuas cidades de origem.

373

Quando um terno se encontra com outro no trajeto pode acontecer pelo menos trêsações diferentes: 1 – se os ternos forem amigos, se cumprimentam e até mesmo tocam juntos;2 – se os ternos tiverem algum tipo de diferença, rixa, ou questão a ser resolvida,poderá haver uma espécie de confronto, um duelo de instrumentos, ou um ternoimpede o outro de atravessar uma rua ou passar na porta da igreja.3 – se os ternos ainda não se conhecerem pode acontecer dos Capitães cantaremum para o outro saldando as bandeiras e se identificando. Pode também haverneste caso uma espécie de duelo em que os capitães disputam cordialmente parasaber qual dos capitães é mais experiente ou qual a bateria faz mais evoluções.O trajeto até a casa da novena é utilizado para realizarem o ensaio para o dia dafesta. Durante o trajeto até as casas onde se realizarão as novenas, os capitãesensinam as músicas aos novatos e ensinam a tocar os instrumentos. É comum acriação de músicas novas para apresentarem no dia da festa. A composição podeser feita por capitães, madrinhas ou dançadores do terno ou ainda ser atribuídas amentores espirituais. Muitas músicas tocadas durante a campanha podem não serexecutadas no dia da festa. Existem também músicas específicas para cadaocasião: para chamar o dono da casa, para agradecer as prendas para o leilão,para abençoar o interior da casa, músicas de novena, em louvor a São Benedito,em louvor a Nossa Senhora do Rosário, que relembram os antepassados, que falamde fenômenos climáticos, para solicitar a saída da bandeira, para saldar Reis eRainhas, de despedidas, para quando ocorre um encontro com outro terno seja eleamigo ou não e uma infinidade de outras possibilidades, variando de terno paraterno.Existem duas versões para a origem do Congado em Uberlândia. A primeiraconsidera o Distrito de Miraporanga (antiga Santa Maria) o local de onde seoriginaram os ternos de Congado do município, na época, o arraial de São Pedrode Uberabinha. Segundo Paulino (In Brasileiro, 2001:31), o primeiro terno demoçambique surgiu em Miraporanga, não sendo inicialmente aceito pelosmoradores de São Pedro do Uberabinha. A Igreja do Rosário de MIrapóranga,construída em 1850, foi fundada por escravos, que posteriormente se mudariampara o futuro bairro Patrimônio em Uberlândia, às margens do Rio Uberabinha,levando consigo as celebrações do Congado.A segunda versão indica que o movimento do Congado se iniciou no Sertão daFarinha Podre, por volta de 1874, através do “Mestre André”. Esse senhor reuniaos negros da região do Rio das Velhas e Olhos D’Água, tocando tambor em culto àNossa Senhora do Rosário, padroeira dos negros, pedindo para libertá-los daescravidão. O início do movimento ocorre por volta de 1876, período de expectativae temor quanto à abolição da escravatura no Brasil Império. Vale lembrar que em1881 foi decretada a lei nº 2040, conhecida como a “Lei do Ventre Livre” e em 1885a “Lei do Sexagenário” ou “Lei Saraiva Cotegipe”, as quais participaram de umprocesso que culminou na própria abolição da escravatura, em 1888.

374

O município de Uberlândia se localiza na região do Triângulo Mineiro, área conhecida

no século XVIII e XIX como Sertão da Farinha Podre. Esta região era denominada

de Sertão da Farinha Podre por causa dos sacos de palha com farinha, encontrados

pelos colonizadores, enterrados ou pendurados nas árvores. Das histórias contadas

sobre a origem deste nome, existe uma que afirma que quando as bandeiras se

aproximavam os indígenas e quilombolas que aqui habitavam escondiam sua

farinha, base de sua alimentação, com esperança de poderem voltar algum dia

para suas aldeias e ter alimentos até a nova plantação dar seus frutos. Eles se

refugiavam nas matas e esperavam os bandeirantes abandonarem suas moradias

após arrasá-las com saques e incêndios. Muitas aldeias tinham que mudar

constantemente sua localização, abandonando sacos de farinha pelo caminho de

sua fuga. Por causa de sua localização geográfica, o Sertão da Farinha Podre

passou a ser um entreposto para os avanços das bandeiras. Local de de descanso

e comércio de tropas uma parada na rota de tropeiros e mineradores em direção a

Goiás e Mato Grosso. A farinha que fora escondida pelos quilombolas e/ou

indígenas apodrecia com a ação do tempo, e depois era encontrada pelos novos

habitantes do lugar. Por causa da grande quantidade de mantimentos apodrecidos

encontrados, a região da bacia do rio Paranaíba que abrange o atual Triângulo

Mineiro e parte do sul do estado do Goiás, ganhou o nome de Sertão da Farinha

Podre.

O Sertão da Farinha Podre era povoado por vários núcleos quilombolas distribuídos

como pontos de uma rede. Os documentos oficiais referem-se a diversos deles

como pertencentes ao Quilombo do Campo Grande. O Quilombo do Ambrósio,

localizado na zona rural de Ibiá, cujo sítio arqueológico é tombado pelo patrimônio

histórico, foi como uma célula central de onde partiam os integrantes que formavam

os outros núcleos da rede. A historiografia oficial considera que o Quilombo do

Ambrósio tenha sido destruído em 1746, sendo referido como o maior núcleo,

comportando até mais de “mil negros, e grande número de negras e crias”. Os

documentos oficiais que narram a destruição deste núcleo e de “outros menores”

informam o número de três oficiais e duzentos e sessenta “homens capazes, e dos

mais desocupados” reunidos nas freguesias de Brumado (hoje Patrocínio), Sta

Rita, Carijos, Congonhas, Ouro Branco e Prado. E para a destruição do Quilombo

do Campo Grande foram enviados quatrocentos e depois mais trezentos homens

da cidade de Mariana, São João de El Rey, São José, Sabará e Vila Nova da

Raynha. Sendo que estas comitivas levavam cartas solicitando que todas as

comarcas lhes fornecessem “munições de guerra e de boca”.

375

Embora, os documentos oficiais relatem expedições bem sucedidas na destruição

destes quilombos, deixam a entender que muitos quilombolas fugiam recomeçando

um novo quilombo em áreas não ocupadas pelo homem branco. A área onde hoje

se localiza Uberlândia só foi ocupada pelo homem branco a partir de 1821,

possuindo ainda reminiscências dos antigos quilombos do Campo Grande. Mas a

construção de hidrelétricas tem destruído paulatinamente os vestígios arqueológicos

destes quilombos que geralmente escolhiam áreas estratégicas próximas aos rios

para se instalar. Os quilombolas escolhiam sua localização de acordo com os

elementos oferecidos pelo ambiente buscando áreas que lhes possibilitasse a

permanência (agricultura e pecuária de subsistência, assaltos às tropas de

comerciantes e viajantes e contrabando) e a defesa da comunidade. A região ainda

preserva na toponímia referências aos antigos quilombos (Pau Furado e Quilombo).

A ocupação efetiva desta área pelo homem branco ocorreu a partir do século XIX,

sendo a produção pecuária e a agricultura de subsistência primordiais, pois

possibilitaram a instalação das fazendas e dos arraiais que futuramente constituiriam

vários municípios e distritos. O arraial de São Pedro do Uberabinha, núcleo inicial

da cidade de Uberlândia, formou-se no início do século XIX, a partir da aquisição

de sesmarias do governo da Província de Minas Gerais por algumas famílias. O

marco inicial da atual cidade foi a antiga Sesmaria de São Francisco, doada a

João Pereira da Rocha, em 1821. A chegada de outras famílias, com destaque

para a “Alves Carrejo”, intensificou a ocupação da região.

Em 1846, Felisberto Alves Carrejo, após aquisição de área de dez alqueires entre

o Córrego São Pedro e o Córrego Cajubá, obteve, juntamente com Francisco Alves

Pereira, aprovação do Bispado de Goiás para a construção de uma capela curada,

consagrada a Nossa Senhora do Carmo e a São Sebastião da Barra. No ano de

1852 foi criado o Distrito de Paz do São Pedro do Uberabinha, pela lei provincial n.

602, e em 1853 a primeira capela foi concluída. A criação da paróquia, em 1857,

ocorreu no mesmo ano da formação do patrimônio da capela, composto de terras

doadas por um grupo de moradores locais que haviam adquirido 100 alqueires da

Fazenda do Salto (Vale, 1998: 252). As primeiras edificações do arraial se São

Pedro do Uberabinha se concentravam ao redor do largo da Igreja Matriz, em terrenos

aforados do patrimônio de Nossa Senhora do Carmo. Em 1883 foram doados,

ainda, doze alqueires de terra à margem esquerda do córrego Uberabinha, próximo

aos limites do arraial, destinados ao patrimônio de Nossa Senhora da Abadia

(Lourenço, 1986:16)

376

Em 31 de agosto de 1888, a então freguesia foi transformada em vila, com o nome

de São Pedro do Uberabinha, tendo sido instalada oficialmente em 1891. Em 24

de maio de 1892, a vila foi elevada à categoria de cidade pela lei nº 23. Em 1895,

a Estrada de Ferro Mogiana atingiu a cidade de Uberlândia e se verifica o

desenvolvimento da produção agropecuária e de indústrias, com destaque para a

produção de charque (Brasileiro, 2001: 253). “Nas duas primeiras décadas do século

XX foram instaladas em Uberlândia indústrias ligadas à produção rural. Têm-se

registro das seguintes indústrias, existentes em 1922: beneficiadoras de arroz e

algodão, serrarias, carpintarias, charqueadas, curtumes e outros estabelecimentos

de produção de couro e carne, além de fábricas de banha, sabão, calçados e

arreios” (Lourenço, 1986: 20). Vale ressaltar que o fornecimento de energia elétrica

teve início em 1909, aumentando a possibilidade da instalação de várias fábricas.

Em 1929, a cidade recebeu o nome de Uberlândia, através da lei nº 843. Na década

de 1930, a abertura de estradas de rodagem em direção às áreas de exploração

de diamantes do Rio Araguaia intensificou o desenvolvimento da área, que se tornou

ponto de troca e abastecimento de caravanas e compradores de diamantes . Em

1933 , iniciou -se a construção da nova igreja Matriz concluída em 1941. A padroeira

Santa Terezinha foi escolhida para substituir os antigos padroeiros da cidade Nossa

Senhora do Carmo e São Sebastião da Barra. A antiga igreja Matriz foi demolida

em 1943, dando lugar a estação Rodoviária, que hoje sedia a Biblioteca Municipal

. Em 1940, cidade passa por um rápido crescimento e adensamento populacional,

e desde então tem se configurado importante centro regional, localizado em local

estratégico, próximo a seis capitais (Campo Grande, Cuiabá, Goiânia, Belo

Horizonte, São Paulo e Brasília ). De 1985 a 1996, o seu crescimento anual do P I

B de 5, 09%, superior ao crescimento de Minas Gerais (2,17%) e do Brasil (2,28%).

Hoje, a cidade se destaca pelo desenvolvimento dos setores de agro industria,

tecnologia da informação, setor atacadista - distribuidor, e mais recentemente, de

biotecnologia, sendo também considerado pólo na área de ensino superior.

Há referências históricas de que a primeira Capela de Nossa Senhora do Rosário

tenha sido iniciada pelo Padre João Dantas Barbosa, em 1876, a qual não foi

concluída, tendo sido definitivamente levantada na atual praça Cícero Dr. Duarte.

Em decorrência do abandono da capela anterior, entre 1891 e 1893, ocorreu a

construção da nova Capela do Rosário “com estrutura de madeira, tijolos de adobe

e telha comum, situada no centro da cidade e com fachada voltada para o bairro

General Osório (atual bairro fundinho).”

377

Já em meados de 1890, o então presidente da Irmandade do Rosário passou a

comandar a nova procissão. O vigário Pio Dantas estimulou a participação da

comunidade negra nas festividades religiosas. (Ibidem, 2001).

Com o crescimento da cidade, a segunda capela precisou ser ampliada. Foi

composta uma comissão responsável por angariar donativos particulares e recolher

uma mensalidade cobrada da Irmandade do Rosário. A capela anterior foi demolida

e, no mesmo local, a partir de 1928, foi construída uma nova capela com projeto de

autoria do arquiteto Thomaz Hovanez. Em 1931, a Capela Nossa Senhora do

Rosário foi re-inaugurada. Em 1985, a Capela de Nossa Senhora do Rosário foi

tombada pelo Patrimônio Histórico Municipal (lei nº 4263, de 9 de setembro) e

entre 1987 e 1988, foi restaurada pela Secretaria de Cultura do Município com

apoio do IEPHA/MG (Vale, 1998:257). A Capela de Nossa Senhora do Rosário

passou por processo de restauração no de 2006.

15. Referências:

* Anais da Biblioteca Nacional – Volume 108 – Rio de Janeiro, 1988 pg. 47-113 –

Carta de Gomes Freire de Andrade para o Capitão-mor da Vila de S. João de El

Rey Manuel da Costa Golvea, 27 de junho de 1746. Mss. APM, Códice SC84,

Registro da providoria da Fazenda de Minas Gerais p.111 (Ver laudo IPHAN 004/

98)

*Brasileiro, Jeremias. Congadas de Minas Gerais – Brasília: Fundação Cultural

Palmares, 2001.

* Laudo IPHAN 004/98 – Dossiê do Tombamento do Remanescente do Antigo

Quilombo do Ambrósio – Ibiá – Mg

*Lucas, Glaura. Os Sons do Rosário – Um Estudo Etnomusicológico do Congado

Mineiro – Arturos e Jatobá. Dissertação de Mestrado, São Paulo: ECA-USP,

1999.

*Marra, Fabíola Benfica. Álbum de Família: Famílias Afro-descendentes no

Século XX em Uberlândia – MG – CD-Rom produzido entre os anos de 2004 e

2005, através da lei municipal de Incentivo à Cultura.

*Martins, Tarcisio José. Quilombo do Campo Grande: A História de Minas Roubada

do Povo. São Paulo: Gazeta Maçônica, 1995.

*Lima Jr., Walter. Chico Rei. Embrafilmes, 1986.

378

*LOURENÇO, Luis Augusto Bustamante. Bairro Patrimônio: Salgadores e

Moçambiqueiros. Uberlândia: Secretaria Municipal de Cultura, 1983.

*Martins, Leda M. Cantares – Afrografias da Memória. São Paulo: Perspectiva:

1997.

*Moura, Clovis (org). Os Quilombos na Dinâmica Social do Brasil – Maceió:

Edufal, 2001.

*RIBEIRO, Maria de Lourdes Borges. A Música Africana. Rio de Janeiro: Funart,

1981

*VALE, Marília Brasileiro Teixeira. Arquitetura Religiosa do Século XIX no antigo

“Sertão da Farinha Podre”. Tese apresentada à Faculdade de Arquitetura e

Urbanismo da Universidade de São Paulo para obtenção do Grau de Doutor,

São Paulo, 1998.

16. Atualização das informações:NT

17. Ficha Técnica

Levantamento Data: Abril de 2007

Fabíola Benfica Marra (Historiadora)

Larry Guimarães de O. Filho (Formatação, estagiário de arquitetura)

Larissa Gontijo T. Cunha (Formatação, estagiário de arquitetura)

Elaboração Data: Abril de 2007

Fabíola Benfica Marra (Historiadora)

Revisão Data: Abril de 2007

Anderson Henrique Ferreira (Historiador)

Gisele Pinto de Vasconcelos Costa (Arquiteta)

379

BENS MÓVEIS E INTEGRADOS

01. Município: Uberlândia

02. Distrito: Sede

03. Acervo: Terno Congo de

Sainha

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INVENTÁRIO DE PROTEÇÃODO ACERVO CULTURAL

Minas Gerais-MG

04. Propriedade: Particular

05. Endereço: Cada bastão fica na casa de seu

portador

06. Responsável: o portador

07. Designação: Bastão

08. Localização Especifica: os bastões costumam ficar ao lado da cama de seu

responsável

09. Espécie: Objeto ritualístico

10. Época: variadas

11. Autoria: coletiva

12. Origem: Uberlândia

13. Procedência: Uberlândia

14. Material / Técnica: madeira, verniz ou esmalte sintético, fitas de cetim, cordão

com contas de lágrima

15. Marcas / Inscrições / Legendas: NT

16. Descrição: Na visita que realizei no quartel, na casa de Dona Creuza, não

pude registrar nenhum bastão, mas na festa do Congado em 2006 registrei os

bastões acima. Geralmente elaborados em madeira, envernizada ou coberta com

esmalte sintético, com fitas de cetim e cordão de contas de lágrimas.

17- Condições de segurança:

( x ) Boa

( ) Razoável

( ) Ruim

Obs:

SECRETARIA MUNICIPALDE CULTURA

380

18- Proteção Legal:

( ) Federal

( ) Estadual

( ) Municipal

( x ) Nenhuma

( ) Tombamento Isolado

( ) Tombamento em Conjunto

Fotos do Terno Congo de Sainha

Uberlândia/MG Ano 2007

19- Documentação fotográfica

381

20- Estado de Conservação:( ) Excelente( X) Bom( ) Regular( ) PéssimoObs:21- Dimensões: Comprimento: geralmente 1m22. Análise do Estado de Conservação: Bastão em bom estado de conservação,sem sinais de desgaste por insetos ou rachaduras.23. Intervenções – Responsável / Data: NT24. Características Técnicas: Os bastões são geralmente elaborados em madeira,envernizada ou coberta com esmalte sintético, com fitas de cetim e cordão de contasde lágrimas.25. Características Estilísticas: Estilo popular (sem característica estilísticaespecífica).26. Características Iconográficas:Nos bastões do Congado figuram as imagens e/ou os nomes de Nossa Senhorado Rosário, de São Benedito e em alguns casos outras imagens como a de SantaIfigênia, Nossa Senhora Aparecida, São Domingos, etc.Cada santo é associado a elementos distintos. Santa Efigênia ou Ifigênia, pelo queos congadeiros dizem é a dona da festa do Congado. Santa Ifigênia, segundoCâmara Cascudo é uma virgem mártir da Etiópia, devoção de negros e pessoasmenos favorecidas. A festa do Congado acontecia em louvor à Santa Ifigênia, asanta negra, mas os brancos não aceitaram e para que a festa se legitimasse elescriam a imagem de Nossa Senhora do Rosário. Segundo o Cláudio, filósofo,pesquisador do Congado e dançador do Terno de Camisa Verde, os negros pegamo rosário que é de Santa Ifigênia e colocam na imagem de Nossa Senhora doPerpétuo Socorro, criando assim a imagem de Nossa Senhora do Rosário.Segundo Seu Zezão, capitão do terno Congo de Santa Ifigênia, ele colocou em seuterno o nome de Santa Ifigênia porque as pessoas precisavam reconhecer que afesta é dela. Seu Zezão conta que deu muito trabalho para aceitarem o terno porquesomente os padres sabiam da “verdadeira história” de Santa Ifigênia, de NossaSenhora do Rosário e de São Benedito. Segundo ele, para haver união entre ospretos e os brancos Chico Rei comprou a coroa de Santa Ifigênia para coroar NossaSenhora do Rosário, comprando assim a sua benção. Como garantia da fidelidadede Nossa Senhora do Rosário colocaram um menino nos braços de São Beneditoque não é Jesus, mas um menino branco do povo. Se Nossa Senhora do Rosárioalgum dia trair os negros, São Benedito deve cortar o pescoço do menino.

382

De acordo com seu Zezão, São Benedito está sempre ao lado de Nossa Senhorado Rosário como um soldado, um general. Esta surpreendente narrativa de SeuZezão introduz a história de Chico Rei e trata de uma negociação entre os santos.

Mas, o que mais chama atenção é a mudança do papel de São Benedito. Este, tidocomo mártir sempre foi referido como uma figura bondosa e que multiplicava osalimentos, uma espécie de Cristo negro. Agora São Benedito é tomado como ummilitar frio, capaz de decapitar um bebê branco em nome da proteção dos negros.Não ouvi de mais ninguém a confirmação desta versão mitológica. Quando seconversa com seu Zezão percebe-se claramente a existência de uma disputa pelocapital simbólico. Em meio às críticas aos pesquisadores e aos trabalhos existentessobre o congado ele questiona a “ciência” dos “verdadeiros” “fundamentos” de suaprática ritual tanto pelos pesquisadores como pelos capitães dos outros ternos.Insinuando ser ele um dos poucos detentores dos conhecimentos tidos como“fundamentos” do Congado. Diversas outras pessoas tomam este comportamentocomo prática. Fazer o Congado sem “fundamento” seria um ultraje. O convívio nosquartéis envolve aprendizado constante e um “verdadeiro” capitão precisa passarpor esta escola e aprender todas as lições antes de ousar montar o seu próprioterno.

O lendário Chico Rei, que é o criador da Irmandade do Rosário em Minas Gerais,era rei em Moçambique, mas na perda de uma batalha fora apreendido e vendidocomo escravo, trazido para o Brasil. Os escravos trazidos de Moçambique eram osconhecedores das técnicas de mineração, “farejavam as minas”, como diziam osinvasores europeus. Chico Rei, após enriquecer seu senhor e demonstrar ser umgrande conhecedor do processo de mineração conseguiu comprar com ouro aalforria de familiares e amigos, e construir uma capela em homenagem à SantaIfigênia em Vila Rica (Ouro Preto). Após descobrir algumas minas Chico Rei disseque não trabalharia mais se o seu senhor não trouxesse para junto de si seu filho eparentes que estavam distantes, vendidos para outros senhores de escravos. Maistarde conseguiu comprar a alforria de diversos outros escravos. Segundo CâmaraCascudo “No dia de Reis, em Vila Rica, as negras do cortejo de Chico Rei vinhamcom as carapinhas polvilhadas de ouro lavá-las e deixar o ouro numa pia de pedraexistente no Alto da Cruz, onde havia uma imagem de Santa Ifigênia. O ouro serviapara a libertação de outros escravos.” (1972, p.449). O Rei “Moçambiqueiro” queno Brasil passa a ser chamado de Chico Rei recria aqui o seu reino, supera acondição de escravo e constrói uma das bases do movimento negro. Muitos negrosse mantinham escravos e cooperavam no movimento liderado por Chico Rei paraa libertação de seu povo.

383

Os negros então alforriados passam a viver nos centros urbanos nascentes e/ou se

deslocam com as expedições desempenhando funções de carpinteiro, pedreiro,

ferreiro (serralheiro), barbeiro, quituteiras, vendedores e outras profissões tidas hoje

como “liberais”. Observem que nesta narrativa, o negro se retira do sistema de

escravidão utilizando a linguagem que está nas bases do sistema capitalista. Ocorre

um rompimento com a escravidão, mas não com sua lógica, pois há uma busca

pela inserção do negro no sistema capitalista decorrente desta. Nos movimentos

quilombolas, onde este sujeito excluído busca uma nova forma de associação e de

socialização fora da sociedade opressora, ocorre uma quebra com os padrões

antes impostos. Mas os negros quilombolas precisavam permanecer em estado

de vigília por causa das constantes investidas das expedições contra suas

comunidades. Mas esta é uma outra história.

Voltando aos mitos do Congado, a principal referencia ao São Benedito é em

relação à alimentação, ele provém o sustento das famílias, dá força. São Benedito

está mais ligado à saúde, à manutenção da vida material, é um mártir negro e santo

mesmo em vida, uma espécie de Cristo Negro. Um dos mitos de São Benedito me

foi contado por seu Charqueada, um dos congadeiros vivo mais antigo de

Uberlândia, ancião do terno Moçambique Pena Branca. Conta seu Charqueada,

que certa feita, o senhor dono da fazenda onde o Benedito era cozinheiro mandou

que ele preparasse uma refeição para seus muitos escravos, mas não lhe deu a

provisão suficiente para tanto. Na despensa não havia banha e o arroz e o feijão

eram pouco. O Benedito então pede o auxílio divino e logo obtém resposta do Todo

Poderoso que lhe diz para ir até o chiqueiro e retirar um naco com toucinho e carne

de um dos porcos, que fosse desde a cabeça até o rabo do porco e então preparar

a comida. E assim o Benedito fez. Milagrosamente, a carne do porco que fora

retirada se reconstituiu na mesma hora, permanecendo o porco vivo. Todos os

escravos se alimentaram até saciar a fome e depois de banquetear tocaram e

dançaram em agradecimento ao São Benedito. O patrão, vendo tamanha festança,

foi ter com o Benedito e inquiriu dele como foi que conseguira arranjar tanto alimento.

O Benedito então lhe relatou como conseguira a banha e o toucinho. O patrão não

acreditando no milagre ameaçou castigar o Benedito, mas quando foi golpeá-lo o

São Benedito levita e fica suspenso no ar... Este mito traz o Benedito enquanto

“multiplicador dos alimentos”, realizador de “milagres” extraordinários, figura louvada

pelos seus. Esta narrativa é compartilhada pela maioria dos congadeiros, sendo

que São Benedito é considerado o santo da cozinha, da alimentação, do sustento,

da fartura, por isso sua imagem geralmente é colocada na cozinha, para que na

casa não falte o alimento.

384

É prática em várias partes do território nacional, colocar café para o São Benedito,

é comum ver sua imagem próxima a uma xícara de café. Outro ritual realizado

popularmente é tomar o café do Benedito, que é um café amargo destituído de

qualquer forma de adoçantes, bebido em pequenos goles pelos congadeiros e

participantes de celebrações, festas, etc. O café do Benedito é tomado como uma

bebida capaz de proteger a quem a ingere.

Nossa Senhora do Rosário está sempre relacionada à chuva, às riquezas, à

proteção, à geração da vida e também à morte. Recorrem a Nossa Senhora para

pedir um bom parto e também uma “boa morte”, a ela intercedem a favor dos entes

queridos que já partiram. Em todas as festas que presenciei houve homenagens a

congadeiros falecidos no período entre festas. Nossa Senhora está vinculada à

vida e à morte, ao rezar a última estrofe da “Ave Maria”, isto fica explicito: “Santa

Maria, mãe de Deus, rogai por nós pecadores agora e na hora de nossa morte.

Amém.” Durante o Congado intercedem à Nossa Senhora do Rosário pela vida e

pela proteção na inevitável hora da morte. Pedem saúde para os seus, proteção

em todos os momentos, recorrem a ela como à Grande Mãe. O culto às deusas

mães foi muito combatido pelo judaísmo, islamismo e demais religiões patriarcais,

mas encontra solo fértil nas tradições afro-descendentes e católicas. Uma música

muito difundida tanto no Congado como na Capoeira e na religiosidade ressalta o

aspecto protetor de Nossa Senhora:

“No tempo do cativeiro, quando o senhor me batia,

eu gritava por Nossa Senhora, ai meu Deus, quando a pancada doía.”

O mito fundante do Congado em Uberlândia é um relato da aparição e resgate de

Nossa Senhora do Rosário e possui pelo menos duas versões aqui sintetizadas:

a) Nossa Senhora do Rosário estava dentro do mar, um garoto a vê submergir,

chama os pais para verem, eles não acreditam. Então ele chama os Marinheiros,

que também presenciam a santa submergir, eles tentam tirá-la com suas cordas,

mas ela não sai do local. Chegam brancos e padres que conseguem retira-la da

água e levá-la para uma capela, mas a santa “foge” do altar e volta para o mar. Vem

então o terno de Congo, todo colorido e canta para ela sair da água, ela submerge,

mas ao ser levada para a capela dos brancos, volta a “fugir” para o mar. Então um

terno de Moçambique, todo vestido de branco e descalço, canta para ela, que então

submerge e lhes acompanha, eles a levam devagar até o local onde constroem

uma capela e ali Nossa Senhora do Rosário permanece, o terno de Moçambique

então se retira sem lhe dar as costas, lhe fazendo reverência;

385

b) a segunda versão, contada por Maria Conceição Cardoso, do Moçambique

Rosário de Fátima, de Ibiá - MG, afirma que ao tentar capturar escravos fugidos na

serra da Montanhesa, um grupo de capitães do mato encontra um grupo de negros,

vestidos de branco, fazendo rosários, com contas de lágrima em frente a uma árvore

de umbaúba onde Nossa Senhora do Rosário estava encravada num galho. Os

capitães do mato tentam surrar os negros e capturá-los, mas eles permanecem

imóveis, como se nada os pudesse atingir. Apavorados com a visão voltam para a

cidade e chamam um padre para ir até o local verificar o fato. E como na primeira

versão, brancos e Congos não conseguem levá-la, Nossa Senhora do Rosário

acompanha apenas o Moçambique que canta vestido de branco, de pés descalços,

que anda devagar e lhe constrói uma igreja e não lhe dá as costas ao se retirar de

sua presença.

27. Dados Históricos:

Os bastões, cajados, cedros, caduceus, varas são objetos ritualísticos utilizados

pelas mais diversas religiões com os mais diferentes significados. O cedro é símbolo

de poder utilizado pelos reis. O cajado é utilizado pelos pastores como apoio nas

caminhadas e é símbolo de magia como na história bíblica de Moisés que utiliza

seu cajado para abrir as águas do Mar Vermelho. O bastão é um instrumento de

ataque e de defesa e também simboliza a detenção do comando de uma situação.

Um símbolo fálico, emblema de poder e controle do poder, representa a vontade e

a força dominante. Utilizado como instrumento de invocação e também para dirigir,

controlar e cortar energias. O bastão com estrias no sentido diagonal e com uma

serpente enrolada é símbolo do mito grego Esculápio e representa a sabedoria, a

renovação do conhecimento e o poder de curar, adotado pela medicina e pela

farmácia como seu símbolo. No mito de Hermes, “deus dos viajantes, patrono dos

ladrões e dos trapaceiros, protetor da magia e da adivinhação e responsável pelos

golpes de sorte e pelas súbitas mudanças de vida”, duas serpentes enroladas

simbolizam os opostos: o bem e o mal, masculino e o feminino. O símbolo da

eternidade na mitologia egípcia é um cajado com incisões, fissuras que lembram o

entalhe de um reco-reco.

28. Referências Documentais:

Sharman-burke, Juliet e Greene, Liz. O Tarô Mitológico – São Paulo: Siciliano,

1988

386

29. Informações Complementares:

Os bastões e os apitos são os instrumentos utilizados pelos capitães de Congado

para conduzir seus soldados e reger as músicas executadas pelos tambores. Nos

ternos de Moçambique os bastões são utilizados não apenas por capitães como

acontece na maioria dos ternos, mas por muitos dançantes, que formam uma ala

fazendo coreografias. . Em muitas guardas, fiscais e madrinhas utilizam os bastões

alinhados ao final do desfile, fechando a apresentação do terno. Alguns bastões

são em formato de cobra, outros com carrancas de Pretos Velhos, outros com

imagens de Nossa Senhora Aparecida, Santa Efigênia e São Benedito, crucifixos

e inscrições diversas, fitas de cetim, alguns enfeitados com contas de lágrima, com

ervas (alecrim, arruda, espada de são Jorge), etc. Nas festas de Pretos Velhos nos

centros de Umbanda pratica-se uma dança-ritual muito parecida com a realizada

pelos moçambiqueiros: tocam as pontas dos bastões no alto, revezando com

batidas no chão, dançando em círculo. Quando hasteiam os mastros dando início à

festa do Congado, os moçambiqueiros tocam os mastros com seus bastões. Alguns

ternos realizam coreografias colocando suas coroas nos bastões e erguendo acima

da cabeça. A condução de reis e rainhas, bem como dos santos numa procissão

pode em alguns casos vir dentro de um espaço delimitado por condutores de

bastões. Quando se quer delimitar um espaço com bastões, os dançantes os

colocam na horizontal e com as mãos o moçambiqueiro liga o seu bastão ao bastão

do outro, formando uma corrente.

30.Atualização das informações:NT

31. Ficha Técnica

Levantamento Data: Abril de 2007

Fabíola Benfica Marra (Historiadora)

Larry Guimarães de O. Filho (Formatação, estagiário de arquitetura)

Larissa Gontijo T. Cunha (Formatação, estagiário de arquitetura)

Elaboração Data: Abril de 2007

Fabíola Benfica Marra (Historiadora)

Revisão Data: Abril de 2007

Anderson Henrique Ferreira (Historiador)

Gisele Pinto de Vasconcelos Costa (Arquiteta)

387

BENS MÓVEIS E INTEGRADOS

01. Município: Uberlândia

02. Distrito: Sede

03. Acervo: Terno Congo de

Sainha

ytfrhfhfhg

INVENTÁRIO DE PROTEÇÃODO ACERVO CULTURAL

Minas Gerais-MG

04. Propriedade: Particular

05. Endereço: Rua Cel. Antônio Alves Pereira, 2475

- Saraiva

06. Responsável: Creuza Romão de Oliveira e

José Eustáquio

07. Designação: Estandarte do Congo de Sainha

08. Localização Especifica: quando não está nas campanhas fica guardado no

quarto de dona Creuza

09. Espécie: Bandeira /Distintivo/Insígnia Religiosa

10. Época: Ignorada

11. Autoria: costureira Dona Siana

12. Origem: Uberlândia

13. Procedência: Uberlândia

14. Material / Técnica: estrutura de madeira, ponteiras metálicas, gancho metálico,

tecido veludo rosa, miçangas e lantejoulas brancas, franja de cetim branca, imagem

de Nossa Senhora do Rosário impressa em papel plastificado, cordões brancos

15. Marcas / Inscrições / Legendas: Imagem religiosa de Nossa Senhora do

Rosário

16. Descrição: O estandarte utilizado pelo Congo de Sainha segue o modelo

tradicional chamado Pendão que é uma bandeira armada em vara, atravessada

horizontalmente sobre o mastro e levada em procissões. A estrutura do pendão é

feita estrutura de madeira com três ponteiras metálicas. A vara que sustenta a

bandeira é presa na haste por um gancho metálico. A bandeira é elaborada em

tecido veludo rosa, com bordado de rosas elaboradas com miçangas e lantejoulas

brancas. Detalhes do corte realçados por franja de cetim branca. No centro uma

imagem de Nossa Senhora do Rosário impressa em papel plastificado. Os cordões

carregados pelas bandeireiras são brancos e presos na base superior da bandeira.17- Condições de segurança:( ) Boa( ) Razoável( ) Ruim Obs:

SECRETARIA MUNICIPALDE CULTURA

388

18- Proteção Legal:

( ) Federal

( ) Estadual

( ) Municipal

( x ) Nenhuma

( ) Tombamento Isolado

( ) Tombamento em Conjunto

Fotos do Terno Congo de Sainha

Uberlândia/MG Ano 2007

20- Estado de Conservação:

( ) Excelente ( x ) Bom

( ) Regular ( ) Péssimo

Obs:

21- Dimensões:

Altura: 1,20m

Comprimento da haste: 2,40m

Largura: 0,80m

22. Análise do Estado de Conservação:

Estandarte em bom estado de conservação, sem sinais de desgaste por insetos

ou mofo.

19- Documentação fotográfica

389

23. Intervenções – Responsável / Data: NT

24. Características Técnicas: Estandarte cujo pendão é uma bandeira armada

em vara, atravessada horizontalmente sobre o mastro. A estrutura do pendão é

feita estrutura de madeira com três ponteiras metálicas. A vara que sustenta a

bandeira é presa na haste por um gancho metálico. A bandeira é elaborada em

tecido de veludo, com bordado de rosas elaboradas com miçangas e lantejoulas.

Detalhes do corte realçados por franja de cetim. No centro uma imagem religiosa

impressa em papel plastificado. Cordões presos na base superior da bandeira.

25. Características Estilísticas: Estilo popular (sem característica estilística

específica).

26. Características Iconográficas:

Nos estandartes do Congado figuram as imagens e/ou os nomes de Nossa Senhora

do Rosário, de São Benedito e em alguns casos outras imagens como a de Santa

Ifigênia, Nossa Senhora Aparecida, São Domingos, etc.

Cada santo é associado a elementos distintos. Santa Efigênia ou Ifigênia, pelo que

os congadeiros dizem é a dona da festa do Congado. Santa Ifigênia, segundo

Câmara Cascudo é uma virgem mártir da Etiópia, devoção de negros e pessoas

menos favorecidas. A festa do Congado acontecia em louvor à Santa Ifigênia, a

santa negra, mas os brancos não aceitaram e para que a festa se legitimasse eles

criam a imagem de Nossa Senhora do Rosário. Segundo o Cláudio, filósofo,

pesquisador do Congado e dançador do Terno de Camisa Verde, os negros pegam

o rosário que é de Santa Ifigênia e colocam na imagem de Nossa Senhora do

Perpétuo Socorro, criando assim a imagem de Nossa Senhora do Rosário.

Segundo Seu Zezão, capitão do terno Congo de Santa Ifigênia, ele colocou em seu

terno o nome de Santa Ifigênia porque as pessoas precisavam reconhecer que a

festa é dela. Seu Zezão conta que deu muito trabalho para aceitarem o terno porque

somente os padres sabiam da “verdadeira história” de Santa Ifigênia, de Nossa

Senhora do Rosário e de São Benedito. Segundo ele, para haver união entre os

pretos e os brancos Chico Rei comprou a coroa de Santa Ifigênia para coroar Nossa

Senhora do Rosário, comprando assim a sua benção. Como garantia da fidelidade

de Nossa Senhora do Rosário colocaram um menino nos braços de São Benedito

que não é Jesus, mas um menino branco do povo. Se Nossa Senhora do Rosário

algum dia trair os negros, São Benedito deve cortar o pescoço do menino.

390

De acordo com seu Zezão, São Benedito está sempre ao lado de Nossa Senhorado Rosário como um soldado, um general. Esta surpreendente narrativa de SeuZezão introduz a história de Chico Rei e trata de uma negociação entre os santos.

Mas, o que mais chama atenção é a mudança do papel de São Benedito. Este, tidocomo mártir sempre foi referido como uma figura bondosa e que multiplicava osalimentos, uma espécie de Cristo negro. Agora São Benedito é tomado como ummilitar frio, capaz de decapitar um bebê branco em nome da proteção dos negros.Não ouvi de mais ninguém a confirmação desta versão mitológica. Quando seconversa com seu Zezão percebe-se claramente a existência de uma disputa pelocapital simbólico. Em meio às críticas aos pesquisadores e aos trabalhos existentessobre o congado ele questiona a “ciência” dos “verdadeiros” “fundamentos” de suaprática ritual tanto pelos pesquisadores como pelos capitães dos outros ternos.Insinuando ser ele um dos poucos detentores dos conhecimentos tidos como“fundamentos” do Congado. Diversas outras pessoas tomam este comportamentocomo prática. Fazer o Congado sem “fundamento” seria um ultraje. O convívio nosquartéis envolve aprendizado constante e um “verdadeiro” capitão precisa passarpor esta escola e aprender todas as lições antes de ousar montar o seu próprioterno.

O lendário Chico Rei, que é o criador da Irmandade do Rosário em Minas Gerais,era rei em Moçambique, mas na perda de uma batalha fora apreendido e vendidocomo escravo, trazido para o Brasil. Os escravos trazidos de Moçambique eram osconhecedores das técnicas de mineração, “farejavam as minas”, como diziam osinvasores europeus. Chico Rei, após enriquecer seu senhor e demonstrar ser umgrande conhecedor do processo de mineração conseguiu comprar com ouro aalforria de familiares e amigos, e construir uma capela em homenagem à SantaIfigênia em Vila Rica (Ouro Preto). Após descobrir algumas minas Chico Rei disseque não trabalharia mais se o seu senhor não trouxesse para junto de si seu filho eparentes que estavam distantes, vendidos para outros senhores de escravos. Maistarde conseguiu comprar a alforria de diversos outros escravos. Segundo CâmaraCascudo “No dia de Reis, em Vila Rica, as negras do cortejo de Chico Rei vinhamcom as carapinhas polvilhadas de ouro lavá-las e deixar o ouro numa pia de pedraexistente no Alto da Cruz, onde havia uma imagem de Santa Ifigênia. O ouro serviapara a libertação de outros escravos.” (1972, p.449). O Rei “Moçambiqueiro” queno Brasil passa a ser chamado de Chico Rei recria aqui o seu reino, supera acondição de escravo e constrói uma das bases do movimento negro. Muitos negrosse mantinham escravos e cooperavam no movimento liderado por Chico Rei paraa libertação de seu povo.

391

Os negros então alforriados passam a viver nos centros urbanos nascentes e/ou se

deslocam com as expedições desempenhando funções de carpinteiro, pedreiro,

ferreiro (serralheiro), barbeiro, quituteiras, vendedores e outras profissões tidas hoje

como “liberais”. Observem que nesta narrativa, o negro se retira do sistema de

escravidão utilizando a linguagem que está nas bases do sistema capitalista. Ocorre

um rompimento com a escravidão, mas não com sua lógica, pois há uma busca

pela inserção do negro no sistema capitalista decorrente desta. Nos movimentos

quilombolas, onde este sujeito excluído busca uma nova forma de associação e de

socialização fora da sociedade opressora, ocorre uma quebra com os padrões

antes impostos. Mas os negros quilombolas precisavam permanecer em estado

de vigília por causa das constantes investidas das expedições contra suas

comunidades. Mas esta é uma outra história.

Voltando aos mitos do Congado, a principal referencia ao São Benedito é em

relação à alimentação, ele provém o sustento das famílias, dá força. São Benedito

está mais ligado à saúde, à manutenção da vida material, é um mártir negro e santo

mesmo em vida, uma espécie de Cristo Negro. Um dos mitos de São Benedito me

foi contado por seu Charqueada, um dos congadeiros vivo mais antigo de

Uberlândia, ancião do terno Moçambique Pena Branca. Conta seu Charqueada,

que certa feita, o senhor dono da fazenda onde o Benedito era cozinheiro mandou

que ele preparasse uma refeição para seus muitos escravos, mas não lhe deu a

provisão suficiente para tanto. Na despensa não havia banha e o arroz e o feijão

eram pouco. O Benedito então pede o auxílio divino e logo obtém resposta do Todo

Poderoso que lhe diz para ir até o chiqueiro e retirar um naco com toucinho e carne

de um dos porcos, que fosse desde a cabeça até o rabo do porco e então preparar

a comida. E assim o Benedito fez. Milagrosamente, a carne do porco que fora

retirada se reconstituiu na mesma hora, permanecendo o porco vivo. Todos os

escravos se alimentaram até saciar a fome e depois de banquetear tocaram e

dançaram em agradecimento ao São Benedito. O patrão, vendo tamanha festança,

foi ter com o Benedito e inquiriu dele como foi que conseguira arranjar tanto alimento.

O Benedito então lhe relatou como conseguira a banha e o toucinho. O patrão não

acreditando no milagre ameaçou castigar o Benedito, mas quando foi golpeá-lo o

São Benedito levita e fica suspenso no ar... Este mito traz o Benedito enquanto

“multiplicador dos alimentos”, realizador de “milagres” extraordinários, figura louvada

pelos seus. Esta narrativa é compartilhada pela maioria dos congadeiros, sendo

que São Benedito é considerado o santo da cozinha, da alimentação, do sustento,

da fartura, por isso sua imagem geralmente é colocada na cozinha, para que na

casa não falte o alimento.

392

É prática em várias partes do território nacional, colocar café para o São Benedito,

é comum ver sua imagem próxima a uma xícara de café. Outro ritual realizado

popularmente é tomar o café do Benedito, que é um café amargo destituído de

qualquer forma de adoçantes, bebido em pequenos goles pelos congadeiros e

participantes de celebrações, festas, etc. O café do Benedito é tomado como uma

bebida capaz de proteger a quem a ingere.

Nossa Senhora do Rosário está sempre relacionada à chuva, às riquezas, à

proteção, à geração da vida e também à morte. Recorrem a Nossa Senhora para

pedir um bom parto e também uma “boa morte”, a ela intercedem a favor dos entes

queridos que já partiram. Em todas as festas que presenciei houve homenagens a

congadeiros falecidos no período entre festas. Nossa Senhora está vinculada à

vida e à morte, ao rezar a última estrofe da “Ave Maria”, isto fica explicito: “Santa

Maria, mãe de Deus, rogai por nós pecadores agora e na hora de nossa morte.

Amém.” Durante o Congado intercedem à Nossa Senhora do Rosário pela vida e

pela proteção na inevitável hora da morte. Pedem saúde para os seus, proteção

em todos os momentos, recorrem a ela como à Grande Mãe. O culto às deusas

mães foi muito combatido pelo judaísmo, islamismo e demais religiões patriarcais,

mas encontra solo fértil nas tradições afro-descendentes e católicas. Uma música

muito difundida tanto no Congado como na Capoeira e na religiosidade ressalta o

aspecto protetor de Nossa Senhora:

“No tempo do cativeiro, quando o senhor me batia,

eu gritava por Nossa Senhora, ai meu Deus, quando a pancada doía.”

O mito fundante do Congado em Uberlândia é um relato da aparição e resgate de

Nossa Senhora do Rosário e possui pelo menos duas versões aqui sintetizadas:

a) Nossa Senhora do Rosário estava dentro do mar, um garoto a vê submergir,

chama os pais para verem, eles não acreditam. Então ele chama os Marinheiros,

que também presenciam a santa submergir, eles tentam tirá-la com suas cordas,

mas ela não sai do local. Chegam brancos e padres que conseguem retira-la da

água e levá-la para uma capela, mas a santa “foge” do altar e volta para o mar. Vem

então o terno de Congo, todo colorido e canta para ela sair da água, ela submerge,

mas ao ser levada para a capela dos brancos, volta a “fugir” para o mar. Então um

terno de Moçambique, todo vestido de branco e descalço, canta para ela, que então

submerge e lhes acompanha, eles a levam devagar até o local onde constroem

uma capela e ali Nossa Senhora do Rosário permanece, o terno de Moçambique

então se retira sem lhe dar as costas, lhe fazendo reverência;

393

b) a segunda versão, contada por Maria Conceição Cardoso, do Moçambique

Rosário de Fátima, de Ibiá - MG, afirma que ao tentar capturar escravos fugidos na

serra da Montanhesa, um grupo de capitães do mato encontra um grupo de negros,

vestidos de branco, fazendo rosários, com contas de lágrima em frente a uma árvore

de umbaúba onde Nossa Senhora do Rosário estava encravada num galho. Os

capitães do mato tentam surrar os negros e capturá-los, mas eles permanecem

imóveis, como se nada os pudesse atingir. Apavorados com a visão voltam para a

cidade e chamam um padre para ir até o local verificar o fato. E como na primeira

versão, brancos e Congos não conseguem levá-la, Nossa Senhora do Rosário

acompanha apenas o Moçambique que canta vestido de branco, de pés descalços,

que anda devagar e lhe constrói uma igreja e não lhe dá as costas ao se retirar de

sua presença.

27. Dados Históricos:

As bandeiras têm suas origens nas insígnias, sinais distintivos de poder ou de

comando, usadas desde a antiguidade e que poderiam ser figuras recortadas em

madeira ou metal, ou pintadas nos escudos. As primeiras bandeiras da história do

homem costumavam representar um grupo sócio-cultural através de imagens e de

cores dotadas de significados, a que a comunidade respectiva confere alto valor.

As bandeiras fixadas a um mastro surgiram na China e foram introduzidas no

Ocidente Medieval pelos Islâmicos. As bandeiras de tecido, no mundo ocidental,

foram criadas pelos romanos e eram denominadas vexillium (insígnia, bandeira,

estandarte). Desde a antiguidade os povos usaram mastros com imagens,

carregados na mão ou fixados nos carros de combate. A grande difusão do seu uso

foi feita pelos romanos e cada divisão da legião tinha o seu estandarte. Foi na

Idade Média que bandeiras e estandartes começaram a representar reinos e

regiões. As bandeiras foram usadas tanto em períodos de paz como de guerra.

Sendo um símbolo identificador eram usados pelos exércitos aliados. Para não se

confundirem uns com os outros e evitarem o temido fogo amigo, usavam um pedaço

de pano hasteado num estandarte, com as cores e sinais de identificação do

batalhão ou companhia envolvida.

De acordo com seu tamanho ou uso, a bandeira tem uma palavra sinônima.

Estandarte é utilizado para insígnias militares, mais especificamente para identificar

os corpos de cavalaria. O Pendão é uma bandeira grande, armada em vara,

atravessada horizontalmente sobre o mastro e levada em procissões. O Gonfalão

é uma bandeira de guerra com partes que prendem perpendicularmente a uma

haste com três ou quatro pontas pendentes. Os Estandartes do Congado mesclam

elementos das bandeiras militares e religiosas e são utilizados para identificar o

terno que os conduz e para louvar os santos de sua devoção.

394

28. Referências Documentais:

Fotografias e entrevistas realizadas no quartel do terno Congo de Sainha

29. Informações Complementares:

O Estandarte é uma espécie de Bandeira e falar em Bandeira no congado é um

pouco complexo, pois possui pelo menos três significados. Bandeira pode se referir

à jornada, ao trajeto, à caminhada realizada nas campanhas e festas. Também

pode ser utilizado para se referir à bandeira em tecido no formato retangular de

aproximadamente 60 x 40 cm que trás estampado imagens dos santos, com um

cabo de madeira na extremidade superior por onde a bandeireira (virgem, menor

de 10 anos) segura. Esta pequena bandeira sempre acompanha o terno, abrindo-

lhe os caminhos, tanto em dias de campanha quanto no dia da festa. Bandeira

também pode referir-se ao estandarte em formato retangular de aproximadamente

1,5 m de altura por 1m de comprimento, sustentado por um mastro que o eleva à

aproximadamente 2,5m de altura donde pendem fitas cujas pontas as Bandeireiras

seguram enquanto dançam e que traz identificações do terno e homenagens aos

santos. Geralmente o estandarte e as Bandeireiras só saem em dia de festa. As

Bandeireiras ou Andorinhas são meninas que conduzem as fitas do estandarte

fazendo coreografias. “Antigamente” esta função só era desempenhada pelas

garotas virgens. Muitas mulheres relatam que se a menina não fosse virgem e

levasse a fita ou o mastro da bandeira, muitos acidentes poderiam acontecer. Nossa

Senhora do Rosário seria a responsável por denunciar a farsa. Adereços de cabelo

poderiam cair ou a roupa se rasgar, a própria bandeira poderia sofrer danificações,

como quebrar, rasgar. Desmaios e doenças também dificultariam a execução da

função. Caberia a menina se afastar quando não fosse mais “digna” de carregar a

bandeira do Congado. A execução desta função indevidamente poderia acarretar

problemas ainda maiores para os ternos, como esquecer música ou errar a “batida”.

Hoje, no entanto, esta tradição não é mantida pela maioria dos ternos.

30.Atualização das informações:NT

31. Ficha Técnica

Levantamento Data: Abril de 2007

Fabíola Benfica Marra (Historiadora)

Larry Guimarães de O. Filho (Formatação, estagiário de arquitetura)

Larissa Gontijo T. Cunha (Formatação, estagiário de arquitetura)

Elaboração Data: Abril de 2007

Fabíola Benfica Marra (Historiadora)

Revisão Data: Abril de 2007

Anderson Henrique Ferreira (Historiador)

Gisele Pinto de Vasconcelos Costa (Arquiteta)

395

BENS MÓVEIS E INTEGRADOS

01. Município: Uberlândia

02. Distrito: Sede

03. Acervo: Terno Congo de

Sainha

ytfrhfhfhg

INVENTÁRIO DE PROTEÇÃODO ACERVO CULTURAL

Minas Gerais-MG

04. Propriedade: Particular

05. Endereço: Rua Cel. Antônio Alves Pereira, 2475

- Saraiva

06. Responsável: Creuza Romão de Oliveira e

José Eustáquio

07. Designação: Oratório do terno Congo de Sainha

08. Localização Especifica: quando não está em época de campanha, fica no

quarto de Dona Creuza em cima de um criado, ao lado da cama

09. Espécie: Móvel religioso

10. Época: década de 1950

11. Autoria: Ignorada

12. Origem: Uberlândia

13. Procedência: Uberlândia

14. Material / Técnica: Madeira recortada, torneada, prego, cola, parafuso, esmalte

sintético marrom e branco, vidro texturizado em detalhes na fachada e nas laterais,

vidro liso encaixado na abertura, renda branca, flores de tecido, fita de cetim, imagens

de Nossa Senhora do Rosário, São Benedito e Nossa Senhora Aparecida em gesso

presas com fitas de cetim, busto de anjo em gesso colado na fachada, sineta de

cobre, cetim cor-de-rosa recobre o interior, terços de contas de plástico, orações

impressa em santinhos e orações manuscritas.

15. Marcas / Inscrições / Legendas: NT

16. Descrição: Oratório em madeira recortada, torneada, colada, pregada e

parafusada. Coberta com esmalte sintético marrom e detalhes em esmalte sintético

branco no telhado que é composto por quatro partes: uma parte envergada presa

por três triângulos pregados e colados. Aberturas na madeira cobertos por vidro

texturizado formam “janelas” na lateral e na fachada. Um vidro liso é encaixado na

abertura, sendo retirado e colocado num vão existente na fachada. Tecido cetim

cor-de-rosa recobre o interior, próximo à “porta” renda branca, flores de tecido

preenchem o oratório, fitas de cetim azul e rosa estão colocadas presas nos pés

das imagens e se estendem saindo do oratório para serem beijadas pelos devotos.

SECRETARIA MUNICIPALDE CULTURA

396

18- Proteção Legal:

( ) Federal

( ) Estadual

( ) Municipal

( x ) Nenhuma

( ) Tombamento Isolado

( ) Tombamento em Conjunto

Fotos do Terno Congo de Sainha

Uberlândia/MG Ano 2007

19- Documentação fotográfica

17- Condições de segurança:

(x ) Boa

( ) Razoável

( ) Ruim

Obs:

Imagens de Nossa Senhora do Rosário, São Benedito e Nossa Senhora Aparecidaem gesso presas com fitas de cetim, a imagem de Nossa Senhora do Rosário émaior e a de Nossa Senhora Aparecida a menor das três imagens. Um busto deanjo em gesso pigmentado colado na fachada com enfeites de flores de tecido elaço de fita amarelo. Uma sineta de cobre, terços de contas de plástico, oraçõesimpressa em santinhos e orações manuscritas são mantidas no interior do oratórioe compõem o ritual das novenas. Dona Creuza refere ter havido uma ligação elétrica,mas foi desativada.

20- Estado de Conservação:

( ) Excelente ( x ) Bom

(X ) Regular ( ) Péssimo

Obs:

21- Dimensões:

Altura: 50cm

Profundidade: 30cn

Largura: 35cm

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22. Análise do Estado de Conservação: Oratório em bom estado de conservação,sem sinais de desgaste por insetos ou rachaduras.23. Intervenções – Responsável / Data: NT24. Características Técnicas:.Oratório em madeira recortada, torneada, colada,pregada e parafusada. Coberta com esmalte sintético e detalhes também emesmalte sintético no telhado, que é composto por quatro partes: uma parte envergadapresa por três triângulos pregados e colados. Aberturas na madeira cobertos porvidro texturizado formam “janelas” na lateral e na fachada. Um vidro liso é encaixadona abertura, sendo retirado e colocado num vão existente na fachada. Tecido cetimrecobre o interior, renda próxima à “porta”. Flores de tecido preenchem o oratório,e fitas de cetim estão colocadas presas nos pés das imagens e se estendem saindodo oratório para serem beijadas pelos devotos. Imagens religiosas em gesso presascom fitas de cetim, cada uma delas com tamanhos diferentes. Um busto de anjo emgesso pigmentado colado na fachada com enfeites de flores de tecido e laço defita. Uma sineta de cobre, terços de contas de plástico, orações impressa emsantinhos e orações manuscritas são mantidas no interior do oratório e compõemo ritual das novenas.25. Características Estilísticas:Estilo popular (sem característica estilísticaespecífica).26. Características Iconográficas:Nos oratórios do Congado figuram as imagens e/ou os nomes de Nossa Senhorado Rosário, de São Benedito e em alguns casos outras imagens como a de SantaIfigênia, Nossa Senhora Aparecida, São Domingos, etc.Cada santo é associado a elementos distintos. Santa Efigênia ou Ifigênia, pelo queos congadeiros dizem é a dona da festa do Congado. Santa Ifigênia, segundoCâmara Cascudo é uma virgem mártir da Etiópia, devoção de negros e pessoasmenos favorecidas. A festa do Congado acontecia em louvor à Santa Ifigênia, asanta negra, mas os brancos não aceitaram e para que a festa se legitimasse elescriam a imagem de Nossa Senhora do Rosário. Segundo o Cláudio, filósofo,pesquisador do Congado e dançador do Terno de Camisa Verde, os negros pegamo rosário que é de Santa Ifigênia e colocam na imagem de Nossa Senhora doPerpétuo Socorro, criando assim a imagem de Nossa Senhora do Rosário.Segundo Seu Zezão, capitão do terno Congo de Santa Ifigênia, ele colocou em seuterno o nome de Santa Ifigênia porque as pessoas precisavam reconhecer que afesta é dela. Seu Zezão conta que deu muito trabalho para aceitarem o terno porquesomente os padres sabiam da “verdadeira história” de Santa Ifigênia, de NossaSenhora do Rosário e de São Benedito. Segundo ele, para haver união entre ospretos e os brancos Chico Rei comprou a coroa de Santa Ifigênia para coroar NossaSenhora do Rosário, comprando assim a sua benção.

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Como garantia da fidelidade de Nossa Senhora do Rosário colocaram um meninonos braços de São Benedito que não é Jesus, mas um menino branco do povo. SeNossa Senhora do Rosário algum dia trair os negros, São Benedito deve cortar opescoço do menino.De acordo com seu Zezão, São Benedito está sempre ao lado de Nossa Senhorado Rosário como um soldado, um general. Esta surpreendente narrativa de SeuZezão introduz a história de Chico Rei e trata de uma negociação entre os santos.Mas, o que mais chama atenção é a mudança do papel de São Benedito. Este, tidocomo mártir sempre foi referido como uma figura bondosa e que multiplicava osalimentos, uma espécie de Cristo negro. Agora São Benedito é tomado como ummilitar frio, capaz de decapitar um bebê branco em nome da proteção dos negros.Não ouvi de mais ninguém a confirmação desta versão mitológica. Quando seconversa com seu Zezão percebe-se claramente a existência de uma disputa pelocapital simbólico. Em meio às críticas aos pesquisadores e aos trabalhos existentessobre o congado ele questiona a “ciência” dos “verdadeiros” “fundamentos” de suaprática ritual tanto pelos pesquisadores como pelos capitães dos outros ternos.Insinuando ser ele um dos poucos detentores dos conhecimentos tidos como“fundamentos” do Congado. Diversas outras pessoas tomam este comportamentocomo prática. Fazer o Congado sem “fundamento” seria um ultraje. O convívio nosquartéis envolve aprendizado constante e um “verdadeiro” capitão precisa passarpor esta escola e aprender todas as lições antes de ousar montar o seu próprioterno.O lendário Chico Rei, que é o criador da Irmandade do Rosário em Minas Gerais,era rei em Moçambique, mas na perda de uma batalha fora apreendido e vendidocomo escravo, trazido para o Brasil. Os escravos trazidos de Moçambique eram osconhecedores das técnicas de mineração, “farejavam as minas”, como diziam osinvasores europeus. Chico Rei, após enriquecer seu senhor e demonstrar ser umgrande conhecedor do processo de mineração conseguiu comprar com ouro aalforria de familiares e amigos, e construir uma capela em homenagem à SantaIfigênia em Vila Rica (Ouro Preto). Após descobrir algumas minas Chico Rei disseque não trabalharia mais se o seu senhor não trouxesse para junto de si seu filho eparentes que estavam distantes, vendidos para outros senhores de escravos. Maistarde conseguiu comprar a alforria de diversos outros escravos. Segundo CâmaraCascudo “No dia de Reis, em Vila Rica, as negras do cortejo de Chico Rei vinhamcom as carapinhas polvilhadas de ouro lavá-las e deixar o ouro numa pia de pedraexistente no Alto da Cruz, onde havia uma imagem de Santa Ifigênia. O ouro serviapara a libertação de outros escravos.” (1972, p.449). O Rei “Moçambiqueiro” queno Brasil passa a ser chamado de Chico Rei recria aqui o seu reino, supera acondição de escravo e constrói uma das bases do movimento negro. Muitos negrosse mantinham escravos e cooperavam no movimento liderado por Chico Rei paraa libertação de seu povo.

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Os negros então alforriados passam a viver nos centros urbanos nascentes e/ou se

deslocam com as expedições desempenhando funções de carpinteiro, pedreiro,

ferreiro (serralheiro), barbeiro, quituteiras, vendedores e outras profissões tidas hoje

como “liberais”. Observem que nesta narrativa, o negro se retira do sistema de

escravidão utilizando a linguagem que está nas bases do sistema capitalista. Ocorre

um rompimento com a escravidão, mas não com sua lógica, pois há uma busca

pela inserção do negro no sistema capitalista decorrente desta. Nos movimentos

quilombolas, onde este sujeito excluído busca uma nova forma de associação e de

socialização fora da sociedade opressora, ocorre uma quebra com os padrões

antes impostos. Mas os negros quilombolas precisavam permanecer em estado

de vigília por causa das constantes investidas das expedições contra suas

comunidades. Mas esta é uma outra história.

Voltando aos mitos do Congado, a principal referencia ao São Benedito é em

relação à alimentação, ele provém o sustento das famílias, dá força. São Benedito

está mais ligado à saúde, à manutenção da vida material, é um mártir negro e santo

mesmo em vida, uma espécie de Cristo Negro. Um dos mitos de São Benedito me

foi contado por seu Charqueada, um dos congadeiros vivo mais antigo de

Uberlândia, ancião do terno Moçambique Pena Branca. Conta seu Charqueada,

que certa feita, o senhor dono da fazenda onde o Benedito era cozinheiro mandou

que ele preparasse uma refeição para seus muitos escravos, mas não lhe deu a

provisão suficiente para tanto. Na despensa não havia banha e o arroz e o feijão

eram pouco. O Benedito então pede o auxílio divino e logo obtém resposta do Todo

Poderoso que lhe diz para ir até o chiqueiro e retirar um naco com toucinho e carne

de um dos porcos, que fosse desde a cabeça até o rabo do porco e então preparar

a comida. E assim o Benedito fez. Milagrosamente, a carne do porco que fora

retirada se reconstituiu na mesma hora, permanecendo o porco vivo. Todos os

escravos se alimentaram até saciar a fome e depois de banquetear tocaram e

dançaram em agradecimento ao São Benedito. O patrão, vendo tamanha festança,

foi ter com o Benedito e inquiriu dele como foi que conseguira arranjar tanto alimento.

O Benedito então lhe relatou como conseguira a banha e o toucinho. O patrão não

acreditando no milagre ameaçou castigar o Benedito, mas quando foi golpeá-lo o

São Benedito levita e fica suspenso no ar... Este mito traz o Benedito enquanto

“multiplicador dos alimentos”, realizador de “milagres” extraordinários, figura louvada

pelos seus. Esta narrativa é compartilhada pela maioria dos congadeiros, sendo

que São Benedito é considerado o santo da cozinha, da alimentação, do sustento,

da fartura, por isso sua imagem geralmente é colocada na cozinha, para que na

casa não falte o alimento.

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É prática em várias partes do território nacional, colocar café para o São Benedito,

é comum ver sua imagem próxima a uma xícara de café. Outro ritual realizado

popularmente é tomar o café do Benedito, que é um café amargo destituído de

qualquer forma de adoçantes, bebido em pequenos goles pelos congadeiros e

participantes de celebrações, festas, etc. O café do Benedito é tomado como uma

bebida capaz de proteger a quem a ingere.

Nossa Senhora do Rosário está sempre relacionada à chuva, às riquezas, à

proteção, à geração da vida e também à morte. Recorrem a Nossa Senhora para

pedir um bom parto e também uma “boa morte”, a ela intercedem a favor dos entes

queridos que já partiram. Em todas as festas que presenciei houve homenagens a

congadeiros falecidos no período entre festas. Nossa Senhora está vinculada à

vida e à morte, ao rezar a última estrofe da “Ave Maria”, isto fica explicito: “Santa

Maria, mãe de Deus, rogai por nós pecadores agora e na hora de nossa morte.

Amém.” Durante o Congado intercedem à Nossa Senhora do Rosário pela vida e

pela proteção na inevitável hora da morte. Pedem saúde para os seus, proteção

em todos os momentos, recorrem a ela como à Grande Mãe. O culto às deusas

mães foi muito combatido pelo judaísmo, islamismo e demais religiões patriarcais,

mas encontra solo fértil nas tradições afro-descendentes e católicas. Uma música

muito difundida tanto no Congado como na Capoeira e na religiosidade ressalta o

aspecto protetor de Nossa Senhora:

“No tempo do cativeiro, quando o senhor me batia,

eu gritava por Nossa Senhora, ai meu Deus, quando a pancada doía.”

O mito fundante do Congado em Uberlândia é um relato da aparição e resgate de

Nossa Senhora do Rosário e possui pelo menos duas versões aqui sintetizadas:

a) Nossa Senhora do Rosário estava dentro do mar, um garoto a vê submergir,

chama os pais para verem, eles não acreditam. Então ele chama os Marinheiros,

que também presenciam a santa submergir, eles tentam tirá-la com suas cordas,

mas ela não sai do local. Chegam brancos e padres que conseguem retira-la da

água e levá-la para uma capela, mas a santa “foge” do altar e volta para o mar. Vem

então o terno de Congo, todo colorido e canta para ela sair da água, ela submerge,

mas ao ser levada para a capela dos brancos, volta a “fugir” para o mar. Então um

terno de Moçambique, todo vestido de branco e descalço, canta para ela, que então

submerge e lhes acompanha, eles a levam devagar até o local onde constroem

uma capela e ali Nossa Senhora do Rosário permanece, o terno de Moçambique

então se retira sem lhe dar as costas, lhe fazendo reverência;