2014 - caderno de debates - enecom alagoas

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Educação às avessas: Da formação que temos à Comunicação que queremos! Enecom Alagoas 2014 19 a 26 de julho Maceió/Alagoas Caderno de debates Pre-encontros - Enecom Alagoas 2014 ,

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Caderno de debates para embasar as discussões dos pré-encontros para o Enecom Alagoas 2014

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Educação às avessas:Da formação que temos à

Comunicação que queremos!

Enecom Alagoas 201419 a 26 de julhoMaceió/Alagoas

Cadernode debates

Pre-encontros - Enecom Alagoas 2014

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Indice

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4 1o pre-encontro

15 2o pre-encontro

32 3o pre-encontro

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Olá, comunicadores/as :)

Faltam menos de dois meses para o Enecom Alagoas 2014. É preciso preparar os/as estudantes para participar deste espa-ço. Por isso, o Coletivo Enecos Alagoas organizou este cader-no de textos para auxiliar na realização dos pré-encontros em cada estado / cidade.

As sugestões aqui são apenas um passo inicial nas discussões que a Executiva Nacional dos Estudantes de Comunicação Social (Enecos) realiza. Na internet e no site da Enecos, é pos-sível encontrar mais materiais para aprofundar os debates.

Lembrando que a participação nos pré-encontros é essencial para poder se inscrever no Enecom Alagoas. A ideia é fortale-cer os debates e, consequentemente, nossa Executiva.

Qualquer dúvida na realização dos pré-encontros ou sobre o próprio evento, não deixe de procurar a Comissão Orga-nizadora (C.O.). Nosso e-mail é: [email protected] .

Já já nos vemos em Alagoas!

Coletivo Enecos AlagoasMaio de 2014

Apresentacao,

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1o pre-encontro

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A formação que temos

Texto 1: A qualidade de formação do/a Comunicador/a

Texto 2:Quatro anos de quê? Uma digressão sobre a Universidade e o Curso de Comunicação SocialAntonio Albino Canelas Rubim

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Veja também:

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Texto 1

A qualidade de formação do/a comunicador/a

Você já parou para pensar como é a comunicação no país? Ela é realmente democrática, do jeito que acreditamos que ela deve ser? Parou para pensar que nós, como futuros/as co-municadores/as, somos responsáveis por ela também? E que, portanto, podemos fazer algo para modificá-la? Refletir sobre a qualidade dos nossos cursos, ainda na universidade, é um primeiro passo para mudar o quadro da Comunicação no país! Mas o que significa lutar por Qualidade de Formação em Co-municação (QFC)?

A luta por qualidade de formação em comunicação tem como pano de fundo a defesa de uma universidade voltada para a formação crítica e humana. Uma universidade compro-metida com a sociedade que a cerca, baseada numa educação emancipadora. Que faça refletir sobre os problemas sociais – tendo em vista a necessidade de superação dessa sociedade desigual – e faça perceber a realidade como uma construção históricosocial que, portanto, é feita ou desfeita por tod@s nós.

É importante perceber, então, que o curso de comunica-ção não está isolado. Muitos problemas que encontramos nas nossas escolas são compartilhados por estudantes do país todo. Acordar para isso é perceber que nosso curso está inseri-do num modelo de universidade e num contexto de educação que vão nortear suas características. Sendo assim, o curso de comunicação, hoje, também está sendo atingido por um mo-delo tecnicista de universidade que mais parece um “escolão” de terceiro grau, onde conhecimento produzido se apresenta como mera mercadoria e é voltado exclusivamente para aten-der as demandas do mercado de trabalho.

Por isso as escolas de comunicação estão cada vez mais

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preocupadas em formar pessoas que dominam a técni-ca, ao invés de formar comunicadores capazes de ana-lisar criticamente a mídia e de atuar criticamente nessa realidade. Você mesmo pode notar isso no seu curso! É só observar a quantidade de disciplinas humanas que existem no seu currículo; se algum professor/a discute a tal democratização da comunicação na sala de aula; ou o quanto se valoriza a pesquisa e a extensão uni-versitária, se é que existe isso na sua escola! Defender a QFC é também notar que a Comunicação Social tem, hoje, um papel fundamental na construção da cultura, da política, dos valores da sociedade e que, portanto, não pode ser apenas um curso “técnico” superior.

A bandeira de Qualidade de Formação em Comuni-cação apresenta diversas reivindicações e discute di-ferentes questões, como a infraestrutura do curso, as condições dos nossos laboratórios, a falta de equipa-mentos para algumas disciplinas, o papel dos veículos laboratoriais e universitários, a importância da pesqui-sa e da extensão, a falta de professores e/ou a má von-tade de outros que só fazem nos enrolar, a questão da divisão do curso em habilitações, a problemática dos estágios, a falta de livros na biblioteca, a composição do nosso currículo, a avaliação institucional, o papel do/a comunicador/ra diante do contexto de comunica-ção e sociedade em que vivemos.

E você, já parou pra pensar como está a situação na sua escola? Como fazer o seu curso ficar melhor? Como pode ser um curso que discuta, de fato, o papel social da comunicação? Todas essas questões são discuti-das dentro da ENECOS, nos nossos encontros de estu-dantes, nas campanhas que fazemos! E também pelo Grupo de Estudo e Trabalho (GET) de Qualidade de Formação em Comunicação. Se você acredita na real transformação da comunicação e do país, comece por transformar o seu curso!

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Texto 2

Quatro anos de quê? Uma digressão sobre a Universidade e o Curso de Comunicação Social

Por: Antonio Albino Canelas Rubim

A crise atual traz depressão e desesperança. Além de tirar nossa perspectiva de vida, tira o brilho de nosso olhar.

Telma de Souza

Aos libertários radicais e risonhos que, por vezes, habitam salas de aula.Antonio Albino Canelas Rubim

O tempo universitário, no qual o estudante freqüen-ta a instituição, sem dúvida é tempo precioso de vida, transcorrido em momento muito especial de abertura e curiosidade vital pelo mundo, por si e pelos outros. Momento essencial de formação, enquanto indivíduo e cidadão. Momento de (certa) disponibilidade, de paradoxais e intensos desejos e interesses. Pensar os quatro anos de Universidade significa, portanto e ine-vitavelmente, refletir sobre o sentido mais profundo de (como) dedicar esta parcela fundamental de vida ao curso universitário. Vale a pena? Eis a questão primordial.

Infelizmente o balanço parece ser negativo. Em ge-ral a sintonia entre este momento especial de vida e a “vida” universitária parece muitas vezes não se reali-zar. Hoje o fosso quase sempre existente entre vida e “vida” acadêmica pode derivar de uma diversidade de dimensões, algumas imanentes à instituição, outras to-talmente sobrepostas e mesmo impostas ao seu fluir.

Os dilemas próprios da juventude, o atual e forte ape-

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lo do mercado de trabalho e de necessidades, efetivas ou construídas através da lógica do consumo capitalis-ta, de sobre(vivência); a situação de desmonte delibe-rado a que estão submetidas as Universidades públicas e sua indigência de condições de trabalho/salário e de estudo, dentre outros inúmeros outros componentes que independem da vontade da instituição e de seus participes, aprofundam esta ruptura e este fosso.

Mas contribuição significativa ao descompasso en-tre a vida e a “vida” acadêmica decorre em linhagem e responsabilidade direta das práticas e formulações da instituição universitária, feridas muitas vezes por um tradicionalismo arcaico, pela aceitação acrítica de uma visão burocrática da vida e da Universidade, pela abso-luta ausência de criatividade e sintonia com as ques-tões existenciais e essenciais da contemporaneidade e/ou por um descompromisso e falta de dedicação inad-missíveis de seus quadros.

Resta ao estudante o consolo do diploma ganho? O aluno que assim pensa e deste modo se comporta em nada difere daqueles professores e funcionários que igualmente fingem viver a Universidade. O já famoso “pacto da mediocridade” está então devidamente acor-dado e definitivamente selado e aceito. Cabe aqui a questão: será tal situação irreversível e sem saída?

Se pensarmos que tal itinerário não nos está predes-tinado, a questão que agora nos interpela passa a ser: como reverter esta situação? Como pensar e construir, pois não se trata apenas de imaginar uma outra Univer-sidade e um outro curso de comunicação que, ao reter qualidade, seduza e realize uma formação que satisfa-ça, recompondo no limite do possível a interação entre vida e via (agora sem aspas) universitária? Como, em suma, ganhar estes anos?

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Em primeiríssimo lugar, lutar com todas as forças contra a redução da vida e da formação universitárias à sala de aula. Tal redução talvez seja o resultado mais profundo da intervenção da ditadura militar na Universidade brasileira. Com todos os limites e sem nenhuma nostalgia, a Universidade, antes de ser agredida, em processo por vezes paulati-no vinha adquirindo uma vida mais plural com a presença de inúmeras modalidades de atividades que começavam a habitar o espaço/tempo universitários: a política, a cultura, a pesquisa, a extensão, a preocupa-ção com grandes temas nacionais, etc.

Rebelar-se com esta redução, buscar trajetórias e meios para, ao des-construí-la, simultânea e intrinsecamente refazer a instituição em con-cepções e configurações radicalmente diversas – complexas, plurais e criativas – torna-se então essencial ao reinventar a Universidade e de sua (nossa) vida(s).

A Universidade deve ser concebida e realizada como conjunção, em complexidade e diversidade, de uma rica multiplicidade de atividades, onde a sala de aula aparece apenas como um momento, sem dúvida fundamental e obrigatoriamente bem mais qualificado que hoje, mas nunca como atividade única e absoluta.

Isto implica, sem mais, no reconhecimento que o conhecimento pode ser adquirido, transmitido e criado, através de uma diversidade de modalidades. Neste sentido, o curso universitário deve incorporar além da “tradicional” sala de aula (cada vez mais qualificada): disciplinas realizadas tutorialmente; estudos orientados; oficinas com produtos la-boratoriais obrigatórios para a publicação dos trabalhos, simulação do exercício profissional e experimentação, debates e conferências perió-dicos e abertas, objetivando uma interação intensa com a multifaceta-das vozes e visões sociais e com as temáticas inscritas em relevância na atualidade, etc.

Atividades de extensão e de pesquisa devem ser obrigatoriamente vivenciadas pelos estudantes como atividades também localizadas no interior do curso/currículo e não apenas opcionalmente, como ativida-des extra-curso. Nesta ótica, o currículo antes de ser um conjunto de disciplinas, entendidas quase sempre como sala de aula, surge 9

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concebido como reunião de atividades, inclusive de pesquisa e extensão, em formulações plurais e sempre adequadas aos conteúdos a serem trabalhados. Não existem, por conseguinte, formas canônicas de ensino.

Além de estar aberto aos conteúdos mutantes e atualizados aceleradamente pela contemporaneidade e às formatações múltiplas e adequadas, o curso, in-clusive em sua tradução curricular, deve possibilitar e comportar a liberdade e a correlata responsabilidade dos estudantes de construírem no cotidiano acadêmi-co seu curso/currículo. Assim, as atividades optativas de escolha dos alunos e a partir de um leque predeter-minado, mas expressivo e rico de possíveis devem ser vivamente estimuladas e contempladas.

Mas a vida e o curso universitários não podem ser reduzidos ao “curso”, ao instituído no currículo. Indis-pensável também a existência plural e continuada de um conjunto de atividades extra-currículo para aten-der aos anseios acadêmicos mais específicas de alu-nos e mesmo os interesses e potenciais diferenciados de alguns estudantes. Daí a necessidade imperiosa de que uma Universidade e um curso qualificado realizem de modo permanente e cotidiano seminários, cursos, debates, oficinas, conferências, encontros, exposições, mostras, etc, além de atividades laboratoriais, onde se efetuem estágios e, especialmente e com destaques à pesquisa.

A afirmação da Universidade, enquanto tal, sua não deterioração em mero escolão de terceiro grau, está de maneira umbilical ligada à questão da produção do sa-ber, seja ele científico, artístico ou cultural, em um sen-tido mais largo. Sem esta produção de conhecimento, que supõe sempre pesquisa, a Universidade não pode com seriedade ser assim nomeada. A criação de co-nhecimento aparece estão com cerne, como momento

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essencial da instituição e elemento fundamental para a qualidade de seu ensino. Sem conhecimento novo, em sua diversidade de modalida-des culturais, o ensino torna-se, na melhor e mais remota das hipóteses, dada a comum não ambiência de estudos em lugares onde inexiste a pesquisa, mera transmissão do conhecimento já estocado pela institui-ção universitária.

O requisito óbvio para a realização deste complexo curso que extra-vasa o obrigado pelo currículo: não só condições de trabalho e salário satisfatórias, mas um corpo de professores e funcionários técnico admi-nistrativos qualificados, que se identifique com seu trabalho, criativos, produtivos, com iniciativa, com lideranças acadêmicas e, em especial, articulados em torno de um projeto acadêmico de curso e de Univer-sidade.

Aliás, talvez o maior desafio hoje colocado à Universidade e aos seus cursos seja justamente a construção de projeto(s) acadêmico(s), sem os quais a instituição e os cursos ficam desprovidos de sua coluna verte-bral, de suas singularidades e, por conseguinte, de sua identidade.

No caso do curso universitário, o projeto acadêmico construído a par-tir das potencialidades e negociações intelecto-vivenciais de seus pro-fessores, estudantes e funcionários, deve traduzir-se em um currículo pleno e específico. A existência dos autoritários e centralizados currícu-los mínimos interdita esta tradução, obrigando os cursos a realizarem verdadeiras acrobacias intelectuais que terminam por descaracterizar a diferença e possível riqueza de seus projetos e de seus currículos. Com isto, se impõe um insosso e padronizado currículo que não traz benefí-cios a ninguém. Acabar com os currículos mínimos definidos de modo centralizado torna-se questão chave para a qualificação dos cursos uni-versitários brasileiros e para sua verdadeira autonomia que necessita perpassar o fundante registro da pedagogia.

Para além do currículo e do curso, os tempos, os espaços e as ativi-dades de convivência emergem como essenciais para a constituição de “tribos” universitárias que, em rede de vivências e publicização, possam configurar uma vida e um espírito verdadeiramente universitários. As atividades extra-aula, sejam elas de estudo científicas – de ini-

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ciação à pesquisa, por exemplo –, de extensão e está-gio universitários, mas também as culturais, políticas, lúdico-recreativas e festivas emergem como fundantes desta nova Universidade.

No campo específico da comunicação, o curso deve buscar uma formação qualificada articulada, contemplan-do diferenciadas dimensões do conhecimento. Em um patamar teórico, o currículo pretende uma sólida e gene-rosa formação que possibilite ao estudante trabalhar com conceitos e teorias. Em um nível analítico informativo, o curso buscar dotar o aluno de informações fundamentais acerca da comunicação e da cultura, em seu largo sentido, especialmente no Brasil, e desenvolver sua capacidade de analisar temáticas da atualidade. Já em um plano prático/profissional, o currículo objetiva possibilitar aos estudan-tes a experimentação e o domínio das diversas lingua-gens da comunicação e da cultura contemporâneas. Por fim, todo o currículo deve ser perpassado por conteúdos que realizem uma consistente formação ético-política do comunicador, bem como viabilizem uma compreensão de seu significativo papel na contemporaneidade.

A existência e a conexão destes conteúdos deve bus-car evitar uma postura simplória que se detém em um polarizado antagônica entre teoria e prática. Inegável que existe uma tensão, aliás constitutiva dos cursos de comunicação, entre uma antiga demanda profissiona-lizante e, em formulação mais rigorosa, uma expecta-tiva acadêmica, recente, que representando uma nova demanda social enfatiza e dá atenção a uma atitude mais interpretativa dos fenômenos e ressonâncias da comunicação no mundo contemporânea. Na procura de manter e tornar produtiva a tensão constitutiva, o acionamento e a centralidade curricular da no-ção de “linguagens” operam como procedimento estruturante essencial.

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Ao recorrer à noção estruturante de “linguagens” o curso pode su-perar, em procedimento simultâneo, um viés teoricizante e, bem mais comum, se pensar e fazer como algo estritamente técnico. A experi-mentação e o exercício das diferenciadas “linguagens” da comunicação contemporânea, a requerer sempre e necessariamente conteúdos, exi-ge que a comunicação seja encarada como complexa atitude e ativida-de cultural, como produção cultural e como realização de um novo e poderoso poder social.

Para finalizar, parece necessário um condicionante cristalino, sem o qual todo este processo entra em colapso, a sedução e a participação ativa, absolutamente imprescindível, dos estudantes como usuários, mas principalmente também como sujeitos desta Universidade e deste curso qualificados.

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Antonio Albino Canelas Rubim – professor do Departa-mento de Comunicação e do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Cultura Contemporâneas. Diretor da Fa-culdade de Comunicação da UFBa. Pesquisador do CNPq.

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2o pre-encontro

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A comunicação que queremos

Texto 1: Democratização da Comunicação

Texto 2:Marco Civil da Internet: três razões inovadoras para comemorar

Texto 3:A mídia que abraçou a ditadura não faz mea culpa, faz peça publicitária

Texto 4: Ser rico e dono da mídia, que mal tem?

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Veja também:

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Texto 1

Democratização da ComunicaçãoCoordenação Nacional da Enecos 2012

Gestão “Aos Que Virão”

Compreender a luta pela democratização da comunicação é entender que ela é, antes de tudo, uma disputa de projeto. De um lado os grandes oligopólios privados que dominam os mercados das telecomunicações, como seu projeto que mer-cantiliza a comunicação e do outro lado estão mais de 190 milhões de brasileiros ludibriados com a qualidade técnica das produções, mas tendo seu direito a voz negado. Até pode parecer exagero, mais não, no Brasil, a “elite intelectual” e os governos federais e estaduais, defendem o direito à liberdade de expressão como se fosse apenas a liberdade de trocar de canal quando for desejado, isso é o que podemos chamar de democracia de controle remoto. Você pode “decidir” o que irá ouvir, mas não o quer ouvir, nem tão pouco sonhar em ser ou-vido por esses veículos de comunicação. E sabe por quê? Pelo “simples” fato de que o projeto de comunicação que esta em vigor hoje no Brasil coloca a comunicação como uma merca-doria, onde um minuto, em horário nobre, na maior rede de televisão do país custa o equivalente a 40 carros populares. É preciso também ter claro que essa disputa de projeto aconte-ce por vários âmbitos.

Utilização de veículos universitários comoferramenta de Democratização da Comunicação

Notamos cada dia mais forte que as rádios, tevês, jornais e revistas universitárias estão funcionando como verdadeiros meios comercias, com jornalistas contratados e estudantes sendo usados como mão-de-obra barata. Esses veículos, que em sua grande maioria são institucionalizados, acabam ser- 15

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vindo como porta-vozes das reitorias e dos governos.

Partindo da perspectiva apontada pelo próprio sis-tema brasileiro de radiodifusão, onde os veículos uni-versitários são categorizados como educativos, per-cebemos a necessidade cada vez maior de ampliar as discussões em torno da utilização dessa ferramenta comunicativa: a serviço de quem eles estão, quem os controla e com quais objetivos.

É fundamental que se compreenda que a universi-dade é o local onde os horizontes são ampliados, onde novos modelos devem ser debatidos, estudados e tes-tados, onde uma nova comunicação deve ser construí-da.

E são nos veículos universitários que os novos pro-fissionais da Comunicação devem qualificar sua forma-ção, ao invés de terem que se submeter a estágios ex-ploratórios em empresa privadas, que não contribuem para a formação intelectual, muito pelo contrário, aca-bam atrapalhando seus estudos.

Esses veículos devem servir como canais de veicu-lação de novas vozes, nacionais, regionais e locais, com novas estéticas e lógicas que possam alterar de maneira profunda o paradigma de formação do senso comum na sociedade. Sendo assim, para uma efetiva democratização da sociedade, torna-se indispensável à democratização das ferramentas de comunicação. Não é suficiente falar em liberdade de expressão e manifes-tação, caso isto não seja acompanhado do direito de expressar opiniões.

Visualizando a extensão universitária enquanto um importante canal de troca entre o conhecimento pro-duzido na universidade e o saber popular, considera-dos fora de qualquer hierarquia. Os alunos devem ter a

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oportunidade de superar os limites do padrão de saber convencionado, através, por exemplo, de projetos de extensão embasados numa expe-riência dialética concreta. Se constituindo em sujeito ativo durante todo o processo reconstruindo possibilidades, e alterando a realidade social em que está inserido.

Primando o interesse público, deve-se estimular a diversidade de for-matos, abordagens e gêneros. Obtendo a liberdade necessária para um real aprendizado, a partir de experiências emergidas de anseios sociais, e da criatividade pessoal, em vez de fins estritamente comerciais.

E compreendendo a Comunicação como um Direito Humano, central para consolidação de uma sociedade democrática, valerá o direito à in-formação plural, diversa, independente e que contemple as diferentes características; além de promover a apropriação do conhecimento e de uma visão autônoma em relação à mídia, visando à formação de espec-tadores críticos.

Marco Regulatório das Comunicações

É a interferência do estado, para garantir a liberdade individual de expressão da população. Em um Estado democrático de direitos, as leis são as formas de garantir que o todas(os) as(os) cidadãs(ãos) terão seus direitos garantidos. Nas democracias mais consolidadas do mundo, para tentar garantir o acesso de todas(os), as telecomunicações, os mar-cos regulatórios do setor já foram criados há muito tempo. Mas, no Bra-sil, o assunto ainda é tratado sem a devida atenção das autoridades, e é apontado como o grande monstro da censura, que foi vivida pelas(os) brasileiras(os) nos tempos da Ditadura. O mais contraditório é que esse discurso vêm dos grupos empresariais que mais se beneficiaram desse período obscuro da história brasileira, como é o caso das Organizações Globo, que se alimentam, política e economicamente da falta de regu-lamentação do setor.

No segundo semestre de 2010, já no final do mandato do ex-pre-sidente Lula, o governo federal montou um grupo com a finalidade

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de elaborar um ante projeto de uma nova lei para as co-municações, o Marco Regulatório das Comunicações.

A proposta foi entregue ao Ministro das Comunica-ções, Paulo Bernardo. Em anúncios, o ministro afirmou que no segundo semestre de 2012, uma nova versão do anteprojeto seria enviada ao Congresso, mas até agora a sociedade não tem informações concretas so-bre como andam os trabalhos.

Quando o assunto é regulamentação das comunica-ções, o Brasil está muito atrasado em relação aos seus vizinhos do Mercosul, como é o caso da Argentina, que nós últimos anos vêm tomando medidas importantes para quebrar o monopólio de grupos como o Clarín.

A Democratização da Comunicação no Brasil está na pauta política, mas ainda está longe de ser concretiza-da, por conta da hegemonia dos grupos que contro-lam as comunicações no nosso país. As concessões dos grandes veículos de comunicação no nosso país estão concentradas nas mãos de onze famílias e de grupos religiosos. Das 34 redes brasileiras de TV, apenas qua-tro delas (Globo, SBT, Band e Record) controlam 843 de 1.151 veículos, aí incluídas as geradoras e as retrans-missoras. Formou-se um monopólio e essas famílias comandam a agenda midiática do país.

Além disso, cerca de 270 políticos são donos de uma ou mais emissoras de rádio e/ou TV no Brasil. É neces-sário que todos tomem conhecimento desses números para que se compreenda que os políticos responsáveis pela regulamentação da Comunicação e pela aprova-ção de um Marco Regulatório das Comunicações, são os mesmos que comandam as oligarquias midiáticas do país.

A concentração dos veículos de comunicação nas

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mãos desses poucos grupos, trazem danos gigantescos para os brasilei-ros, que não têm diversidade e pluralidade de vozes asseguradas.

Várias são as questões que nós levam a exigir a regulamentação do setor. Além da liberdade individual de expressão, direito humano fun-damental, podemos elencar mais alguns pontos: a rádio fusão é um ser-viço público igual à educação, saúde, distribuição de água, luz e como é um serviço público é necessário que seja regulada; nos últimos anos, com a evolução da internet, a revolução digital, diluição das fronteiras e a convergência de mídias, é fundamental o debate sobre o rearranjo da área e políticas para o setor; as principais leis de referência para o setor de rádio fusão e das telecomunicações estão completamente desatua-lizadas; normas importantes da própria constituição de 1988 não foram regulamentadas, por tanto não foram cumpridas; restrições relativas as rádios comunitária que não existem em relação as rádios comerciais.

Vemos como passo importantíssimo para a democracia do país, a in-terferência do estado como garantidor de direitos, sobre tudo da liber-dade de expressão individual, levando em consideração as exigências dos movimentos sociais, que lutam pela democratização da comunica-ção no nosso país, para resolvermos o problema histórico do Brasil, que é o de não dar voz a quem precisa ter voz. Esse é o motivo principal da nossa luta e é o que justifica o debate pela liberdade de expressão e regulamentação da mídia.

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Marco Civil da Internet: três razões inovadoras para comemorar

Sivaldo Pereira da Silva

Deveria ser normal em qualquer país de-mocrático. Porém, no Brasil uma legislação que não privilegie os desejos das empre-sas de comunicação é uma novidade.

No final do mês passado, o Brasil ganhou uma nova lei que trata dos direitos online do cidadão, privacida-de digital e os limites das empresas no tratamento de dados dos usuários. O Marco Civil da Internet, agora denominado de Lei nº 12.965, é uma legislação inova-dora que não seguiu uma trajetória comum e, portan-to, merece especial atenção. Trata-se de uma inovação em pelo menos três sentidos: quanto ao processo de sua elaboração, quanto ao teor de suas determinações e quanto ao seu significado no cenário internacional.

Olhemos um pouco para trás: no final da última déca-da agravou-se no Brasil um ambiente de insegurança ju-rídica diante da importância social, econômica e cultural que a Internet adquiriu. Abusos online; invasão de priva-cidade; retiradas unilaterais de conteúdo por provedores; pressões para estratificar usuários por parte das empresas de telecomunicações. Este conjunto de questões já não podia ser respondido pela legislação analógica vigente.

Para piorar este quadro, o surgimento de Projetos de lei sobre cibercrimes, como o PL 84/99, ameaçava cobrir esse vazio legal, porém violando ainda mais os direitos, sob a alegação de dar instrumentos ao apare-lho policial para deflagrar ações investigativas. Emergia

Texto 2

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a necessidade de se criar um código que estabelecesse os princípios sob os quais a internet deveria ser regulada, especificamente no que diz respeito à proteção dos direitos civis.

Assim, em outubro de 2009, a Secretaria de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, em parceria com a Fundação Getúlio Vargas, lan-çou o projeto para a elaboração do Marco Civil da Internet através de um processo colaborativo, baseado em ferramentas online de participa-ção. A ideia não era fabricar uma minuta de lei em um gabinete e jogá-la no parlamento: o objetivo era construir um texto a partir de diversas intervenções, somando ideias, incorporando perspectivas e ouvindo as diversas partes interessadas no debate.

Entre novembro de 2009 e junho de 2010, a plataforma online do projeto recebeu cerca de 18.500 visitas, totalizando mais de 2.000 con-tribuições. A partir disso, se elaborou o texto que foi encaminhado para a Câmara dos Deputados na forma de um projeto de lei. A boa partici-pação e a qualidade das propostas demonstraram que a internet, quan-do bem utilizada, é uma ferramenta plenamente capaz de fortalecer a democracia servindo como um vibrante canal para a participação políti-ca, legitimando proposições e, importante frisar, qualificando-as.

Como outras experiências de engajamento político digital que vem ocorrendo no mundo, o Marco Civil é inovador e exemplar: seu proces-so, se incorporado no design das instituições brasileiras, pode torná-las mais abertas, participativas e aproximá-las do cidadão conectado.

Decorrente dessa dinâmica, o projeto de Lei, em seu conteúdo, pas-sou a refletir um sólido e atual sistema de princípios, cujo espírito estava centrado na perspectiva de defesa do interesse público. Isso deveria ser normal em qualquer país democrático. Porém, no Brasil uma legislação que não privilegie os desejos das empresas de comunicação é uma no-vidade, um ponto fora da curva. Uma lei no campo da comunicação cuja essência é a defesa do interesse do cidadão significa uma ousada e im-portante inovação na história deste segmento. Não por acaso, foi uma dura batalha na Câmara dos Deputados. Ao chegar na Casa legislativa, o projeto ficou parado durante quase 3 anos devido ao forte lobby das empresas de telecomunicações.

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Essa barricada ocorreu principalmente porque as te-les não aceitavam a consolidação do princípio da neu-tralidade de rede, que as impedia de tratar o usuário de forma estratificada, vendendo acessos diferencia-dos a depender do conteúdo. Por exemplo, isso abria caminho para a operadora cobrar a mais no acesso de um vídeo, um blog, para transmitir som ou usar mídias sociais. Significaria, sobretudo, o fim da internet como a conhecemos e a liberdade de expressão online seria uma questão financeira: quem pagar mais poderia se expressar livremente, baixando, postando todo tipo de conteúdo e utilizando todos os canais disponíveis. E quem não tivesse dinheiro seria um sub-usuário, com uma meia-cidadania online. Felizmente, boa parte dos princípios do projeto original do Marco Civil foi manti-da e a neutralidade foi assegurada, embora ainda pre-cise ser regulamentada via decreto.

Este é um embate mundial que está ocorrendo em todos os continentes. Isso porque estamos num mo-mento histórico no qual a maioria dos países ainda está criando suas leis que tratam especificamente dos direi-tos do cidadão na rede. A pressão das empresas para que estas novas legislações incorporem seus interesses de interferir, coletar, processar e vender acesso e dados do usuário com base na perspectiva de mercado (e não na perspectiva dos direitos humanos) configura hoje como uma verdadeira guerra que pode mudar a forma como a internet nasceu e cresceu.

Sendo o Brasil um dos maiores mercados do mundo e um importante ator político emergente no cenário internacional, a aprovação do Marco Civil era bastan-te esperada por analistas estrangeiros. Isso significou o desfecho de um “round” desta batalha, apontando para uma tendência que pode agora a inspirar outros paí-ses e ser seguida como um exemplo. A não aprovação do projeto brasileiro teria consequências ruins: inibiria

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tentativas mais ousadas e daria às corporações mais poder para influen-ciar outras nações.

Naturalmente, o Marco Civil, como toda lei, não é perfeita e possui seus pontos frágeis. O principal deles trata-se do artigo 15 que obriga a guarda de registros de aplicação (por um período de 6 meses) de todas as empresas que atuem na internet para fins de investigação criminal. Para muitos analistas, incluindo um conjunto de organizações civis que assinaram um manifesto pedindo o veto deste artigo, isso fere o princí-pio jurídico da “Presunção de Inocência e Proporcionalidade”. Em outras palavras, isso pressupõe que todos os cidadãos são alvos potenciais de investigações.

Mesmo que o usuário não seja suspeito de qualquer crime ou que ainda não tenha cometido qualquer ato ilícito. Isso também pode au-mentar os custos dos serviços, estimulando as empresas a comerciali-zarem esses dados ilegalmente para cobrir seus gastos. Apesar disso, a permanência do artigo não ofusca a importância de toda a Lei que, num balanço geral, sem dúvida é um avanço nas políticas de comunicação no Brasil, tanto no processo de sua construção, quanto em seu conteú-do e seu significado para a comunidade internacional.

Por fim, vale lembrar que o Marco Civil só entra em vigor 60 dias após a sua sanção, ou seja, só passa a valer a partir da última semana de junho. É importante ressaltar que toda lei só faz diferença se for devida-mente aplicada e respeitada e o Estado brasileiro ainda não desenvol-veu os instrumentos técnicos e procedimentos burocráticos capazes de realizar uma efetiva fiscalização das empresas para garantir o cumpri-mento dessas normas. Esse é o grande desafio agora.

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Sivaldo Pereira da Silva é jornalista, doutor em Comunica-ção, professor da Universidade Federal de Alagoas e do Pro-grama de Pós-graduação da Universidade de Brasília. É inte-grante do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social.

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A mídia que abraçou a ditadura não faz mea culpa, faz peça publicitária

Caio Hornstein

A oposição feroz entre os grandes grupos de comunicação e a censura na ditadura civil-militar é só a imagem que a grande mídia quer projetar de si mesma.

Não é novidade que a imprensa brasileira teve par-ticipação efetiva na articulação civil-militar que derru-bou o presidente João Goulart. Com a exceção de al-guns poucos veículos de comunicação, como o jornal carioca Última Hora e a TV Excelsior, que se colocaram em defesa da ordem democrática e foram posterior-mente perseguidos pelo regime militar, todos os prin-cipais grupos de mídia deram apoio explícito à inter-venção militar.

Passados cinquenta anos do episódio histórico que deu início a uma ditadura que durou mais de 21 anos, os veículos de mídia que apoiaram o golpe têm se vis-to na obrigação de dar explicações que relativizem sua participação no evento. Valendo-se de desavergonha-do contorcionismo retórico, os editoriais dos jornalões têm, em linhas gerais, justificado a opção pelo golpis-mo como fruto de um período conturbado em que ex-tremismos de todos os lados não teriam permitido um posicionamento moderado.

A leitura de tais editorais deixa claro que esse mea culpa não representa um genuíno arrependimento por parte dos barões da mídia, que mantêm até hoje os mesmos vícios e práticas de 1964; ao contrário, são

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apenas peças publicitárias que pretendem blindar os veículos de comu-nicação de possíveis críticas, como se estes tivessem rompido absoluta-mente com seu passado autoritário.

Uma mentira ajuda a fortalecer a imagem redentora que os grupos de comunicação querem projetar de si mesmos: a ideia de que, depois de terem contribuído para o sequestro da ordem democrática, arrepen-deram-se e passaram a fazer oposição heroica à ditadura. A prova irre-futável dessa postura redentora e do rompimento do casamento entre mídia e militares, defendem, teria sido a implacável censura de que fo-ram vítimas.

Mentiras que desmoronam à luz dos fatos. O livro Cães de Guarda – jornalistas e censores, do AI-5 à constituição de 1988, da historiado-ra Beatriz Kushnir, é fundamental para compreender as relações entre mídia e censura durante a ditadura civil-militar. Contrariando a posição revisionista dos grupos de comunicação, a obra de Kushnir rememora episódios em que houve colaboracionismo explícito entre militares e veículos de comunicação, trazendo à tona o emblemático exemplo da Folha da Tarde, periódico cuja redação foi dominada por policiais. Além disso, Cães de Guarda esmiúça a relação entre censores e jornalistas, ex-pondo uma convivência por vezes muito menos tensa do que se supõe.

Em entrevista à Carta Maior, Beatriz Kushnir desconstrói o mito de que houve oposição ferrenha entre a censura do regime militar e os grandes grupos de comunicação. Confira.

Carta Maior: Os grandes grupos de comunicação no Brasil realmente fizeram um enfrentamento combativo à ditadura militar?

Beatriz Kushnir: A cada vez que escuto uma pergunta como esta, eu penso: se houve tanta resistência, por que a ditadura perdurou 21 anos? Creio ser mais que oportuno, nesse momento de ponderações sobre os 50 anos do Golpe, retomar uma ideia apontada, quando dos 30 anos do AI-5, pelo jornalista Jânio de Freitas.

Freitas, na época, publicou na Folha de S. Paulo, uma advertên-cia ainda não cumprida por seus pares: “a imprensa, embora uma

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ou outra discordância eventual, mais do que aceitou o regime: foi uma arma essencial da ditadura. (...) Os ar-quivos guardam coisas hoje inacreditáveis, pelo teor e pela autoria, já que se tornar herói da antiditadura tem dependido só de se passar por tal”. Portanto, traçar os papeis da imprensa no período, é fazer um mergulho profundo nestes acervos. E ao cotejá-los com entre-vistas orais, perceber as duas imagens: a que salta das páginas dos jornais, e a construção atual das memórias de si.

CM: Quando se fala em censura aos grandes veícu-los de imprensa durante a ditadura militar, a publica-ção de versos de Camões no jornal Estado de S. Paulo e de receitas culinárias no Jornal da Tarde em espaços censurados é uma lembrança recorrente. Esse tipo de atitude incomodava efetivamente o regime militar?

BK: O jornalista Oliveiros Ferreira, que por décadas trabalhou no Estadão, me contou, em entrevista, que a Redação recebia ligações indagando que a receita de bolo na primeira página do Jornal da Tarde estava errada. O bolo solava. Ou, como sublinhou Coriolano de Loyola Cabral Fagundes, censor desde 1961 e que atuou no Estadão, os poemas de Camões foram ali uma concessão.

Certamente a censura federal apostava que o leitor não entenderia o porquê destas estratégias. O ponto fundamental da lógica censória é, como brilhantemen-te descreveu o jornalista Cláudio Abramo, não se deixar capturar pelo equívoco de que “(...) no Brasil, o Estado desempenha papel de controlador maior das informa-ções. Mas não é só o Estado, é uma conjunção de fato-res. O Estado não é capaz de exercer o controle, e sim a classe dominante, os donos. O Estado influi pouco, porque é fraco. Até no caso da censura, ela é dos donos e não do Estado. Não é o governo que manda censurar

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um artigo, e sim o próprio dono do jornal. Como havia censura prévia durante o regime militar, para muitos jornalistas ingênuos ficou a im-pressão de que eles e o patrão tinham o mesmo interesse em combater a censura”.

CM: Uma característica do controle da imprensa no regime militar foi a existência da autocensura em diversas redações. Ou seja, o governo transferia a responsabilidade da censura para os próprios administrado-res dos veículos de comunicação, que deveriam julgar o que é ou não publicável. Qual o significado dessa medida?

BK: A autocensura não foi inventada naquele momento. A autocen-sura é uma prática constante em qualquer empresa de comunicação. Todo jornalista sabe disto. O jornal, a rádio, a TV são exemplos de em-presas, negócios, lucros. Vende-se um serviço de utilidade pública: a notícia. Os governos, quando querem calar as vozes de oposição nos meios de comunicação, soltam verbas publicitárias. Como toda empre-sa tem um dono, nos meios de comunicação só é publicado o que o patrão acha conveniente.

CM: Em seu livro Cães de Guarda, você expõe a trajetória da Folha da Tarde, periódico do grupo Folha que contou com policiais em sua reda-ção e se notabilizou por ocultar e distorcer a morte de militantes políti-cos. Além de um enfrentamento passivo aos abusos do regime militar, é possível dizer que, em muitas ocasiões, os grandes grupos de mídia foram colaboracionistas?

BK: Em vários graus e tonalidades, em momentos diferenciados, as grandes corporações de comunicação apoiaram e pediram o golpe; aproveitaram-se do momento autoritário e repressivo para ampliar seus universos de atuação, diversificando os negócios; no pós-1979, criaram uma visão para si de resistência. A trajetória deste setor, como de di-versos outros da sociedade brasileira, demonstra as raízes autoritárias e conservadoras que nos seguram e que estão distantes da imagem idea-lizada de que somos democratas.

CM: É correto afirmar que, à exceção de divergências pontuais, os grandes veículos de imprensa estavam, em linhas gerais, satisfeitos

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com a condução política do governo militar e concor-davam sobre a necessidade de repressão após o AI-5?

BK: Os dirigentes das empresas brasileiras estavam satisfeitos com o milagre econômico e, os que soube-ram, aproveitaram muitíssimo daquele momento. Cer-ta vez, ouvi uma explicação que o fim da ditadura es-tava intimamente ligado à crise do milagre. Não creio que precisamos ser tão simplistas. Mas este é um ponto importante a se considerar.

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Texto 4

Ser rico e dono da mídia, que mal tem?Bruno Marinoni

Qual o problema de a família mais rica do Brasil ser dona dos principais meios de comunicação do país? Resposta: po-der demais

No último dia 13, a Revista Forbes divulgou seu ranking de “ricaços” do Brasil. Os Marinho lideram a competição com uma fortuna estimada em US$ 28,9 bilhões. Qual o problema de a família mais rica do Brasil ser dona dos principais meios de comuni-cação do país? Resposta: poder demais. Poder eco-nômico e cultural (ideológico, simbólico ou como se quiser chamar). Isso se falarmos genericamente.

Se pensamos de forma mais concreta, obser-vando a história do setor da comunicação social no Brasil, responderemos de outra forma. O total domínio do interesse privado-comercial, o jogo de influências (e privilégios) políticas, a inexistência de mecanismos democráticos de participação so-cial na comunicação (o que gera um sério proble-ma para a garantia da liberdade de expressão), a extrema oligopolização e uma série de outros pro-blemas nos fazem pensar que a resposta mais cor-reta, na verdade é: dominação demais.

Uma sociedade que pressupõe que “todo o po-der emana do povo”, que se pretende “livre, justa e solidária” e que afirma que “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações” deve fazer os ajustes necessários para que possa garantir liber-

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dade, justiça, solidariedade, igualdade e poder po-pular. E isso significa não permitir que o poder se concentre nas mãos de alguns poucos indivíduos. E dinheiro é poder. E comunicação é poder.

Opa! Ouvi alguém ali comentando: “mérito!”. Será? Dos 65 bilionários constantes na lista de ri-caços do Brasil, 25 são “herdeiros”. Assim também acontece coincidentemente com o trio de irmãos Marinho. Ainda que não fosse isso, porém, quem disse que é legítimo o assassinato da democracia pela meritocracia? E que mérito se tem em ser mais poderoso porque se tem mais recursos do que os outros?

Imediatamente atrás dos Marinho, no ranking, estão as famílias de banqueiros. Safra (da família homônima), Ermírio de Moraes (Votorantim), Mo-reira Salles (Unibanco-Itaú). Os governos do Brasil pós-ditadura não ousaram mexer com os primeiros, magnatas da comunicação, e nutriram os últimos, senhores do vil metal. Quem se atreveria a enfren-tar tamanho poder, diante de compromissos mais urgentes como a garantia da governabilidade? Já pensou o que seria de um governo deslegitimado por todos os meios de comunicação? Melhor não mexer aí, ganhar confiança, oferecer uma vaga de ministro ao Hélio Costa, não insistir com esse papo de mané projeto de Agência Nacional do Audiovi-sual... Vai que os Marinho se zangam... Já pensou? Nem pensar!

Aliás, os Marinho já constam no ranking da For-bes desde 1987, primeira vez em que foi publica-do, acompanhados pelas famílias Ermírio de Mo-

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raes e Camargo (Camargo Correa). E, assim, se dá prosseguimento à triste tradição brasileira de mandar quem pode (e tem poder) e obedecer quem tem juízo. Ou não.

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Bruno Marinoni é repórter do Observatório do Direito à Comunicação, doutor em Sociologia pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e integrante do Conselho Diretor do Intervozes

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3o pre-encontro

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Luta permanente no combate às opressões

Texto 1: Opressões e classe: o capitalismo necessita das opressões para mais lucrar

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Texto 1

Opressões e classe: o capitalismo necessita das opressões para mais lucrar

As relações de propriedade e produção definem a sociedade dividida em classe e determinam quem serão os exploradores e os explorados. Para além da diferenciação de classes, existem ainda outras baseadas em diferenças de etnia, nacionalidade, gênero e geração. Mesmo tendo surgido em período anterior, o capitalismo se apropria dessas diferenciações e dá a elas um novo sentido, passam a ser uma ferramenta para acentuar o processo de domesticação e exploração dos não possuidores.

As ideologias dominantes usam dessas diferenças para de-terminar o lugar de negros, indígenas, mulheres, jovens e homoafetivos na sociedade e no mundo do trabalho, trans-formando-os assim em setores duplamente oprimidos, já que a discriminação passa a ser realizada também através da su-perexploração do trabalho com diferenças salariais, de condi-ções de trabalho, com assédio moral, etc.

Frações isoladas do proletariado são incapazes de conduzir um processo de abolição do Estado e do capital. Entendendo isso, a burguesia estrategicamente faz com que sua ideologia excludente seja assimilada pela classe trabalhadora com o claro objetivo de dividi-la, atravancar sua organização para a luta e obter maiores taxas de lucro. Por esse motivo, a mídia, a igreja e a família são transformadas em propagadoras de valo-res castradores, conservadores e opressores. A classe trabalha-dora é massacrada de fora para dentro e de dentro para fora, cotidianamente, pelo machismo, racismo, homofobia, transfo-bia, lesbofobia, entre outras distintas formas de opressão.

Esses setores historicamente oprimidos hoje começam a vis-lumbrar possibilidades de combater as opressões, mas em

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geral estão reféns das tendências pós-modernas que desacredita na luta macro (disputa entre as classes) e privilegia apenas as microesferas culturais, o que ori-gina o individualismo e o policlassismo das lutas seto-riais. Essa perspectiva condena a organização desses setores ao reformismo imobilista, que se limita às rei-vindicações de visibilidade ou reconhecimento e con-cessões do Estado burguês, através de projetos de lei ou campanhas publicitárias.

Contrapondo a ilusão da conquista meramente par-cial de direitos e do empoderamento, a via classista de combate às opressões aponta a necessidade do prota-gonismo dos setores oprimidos da classe trabalhadora, que devem assumir a ação direta e se colocar na linha de frente do processo de derrubada da burguesia que lucra com toda forma de opressão e do Estado que a produz e reproduz.

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Publicado no jornal Avante! nº 8

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Contato

Bom, por enquanto é isso!

A C.O. está 24h ligada para tirar qualquer dúvida com relação a mobilização, aos pré-encontros, à escolha dos/as mobiliza-dores/as, aos formulários... Qualquer coisa é só mandar um e-mail para [email protected] que estaremos disponíveis para tirar toda e qualquer dúvida!

Contamos com a ajuda de todos/as! Vamos juntos/as cons-truir um Enecom inesquecível!

http://www.enecos.com.br/enecom2014

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