2011 apostila processo de execução - prof. lúcio flávio

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Direito Processual Civil Processo de Execuo

DIREITO PROCESSUAL CIVIL PROCESSO DE EXECUOLCIO FLVIO SIQUEIRA DE PAIVAContato com o Professor: e-mail: [email protected] Telefone: 3252-10-12 Atualizada at agosto de 2011.

1Prof. Lcio Flvio Siqueira de Paiva

Direito Processual Civil Processo de Execuo

APRESENTAO Caro aluno, Iniciamos nosso curso de processo de execuo, matria por muitos considerada difcil e rida. Veremos que assim no , porm. Bem estudada e compreendida, a execuo se mostra uma das mais interessantes reas do processo civil brasileiro, sem mencionar sua enorme utilidade prtica. Conhecer o vasto campo da execuo , pois, a um s tempo, um desafio e uma obrigao. A apostila que lhes agora entregue representa no mais do que um roteiro de nossa matria, uma simples introduo, e justamente por isso no tem a pretenso de esgotar o assunto. Desse modo, recomendo que o estudo de vocs transcenda os estreitos limites dessa desvalida apostila, para encontrar as excelentes obras de ALEXANDRE CMARA e FREDIE DIDIER JR, para citar dois brilhantes jovens processualistas, e tambm os ensinos de ARAKEN DE ASSIS, CNDIDO DINAMARCO e HUMBERTO THEORODO JUNIOR, mestres reconhecidos e tradicionais em nossas letras jurdicas. A todos, um excelente semestre! Lcio Flvio Siqueira de Paiva*

SOBRE O AUTOR: Lcio Flvio Siqueira de Paiva advogado, scio do escritrio GONALVES, MACEDO, PAIVA E RASSI. Mestre em Direito, Rel. Internacionais e Desenvolvimento pela PUC/GO, Especialista em Direito Empresarial pela FGV. Professor Efetivo de Direito Processual Civil da PUC/GO, da Escola da Magistratura do Estado de Gois, do Axioma Jurdico e do Instituto IOB-SP. Contato: www.gmpadvogados.com.br [email protected] Escritrio: Rua 99, n 69, St. Sul, Goinia, Gois fone: 3252-10-12

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NDICE CAPTULO I TEORIA GERAL DA EXECUO............................................................4 CONCEITO.............................................................................................................................4 PRINCPIOS ESPECFICOS DO PROCESSO DE EXECUO........................................4 COMPETNCIA....................................................................................................................6 LEGITIMIDADE....................................................................................................................7 REQUISITOS PARA REALIZAR QUALQUER EXECUO.........................................11 A RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL.......................................................................17 LIMITAES DA RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL...........................................20 A RESPONSABILIDADE PROCESSUAL CIVIL DAS PARTES NA EXECUO.......20 A NOVA LIQUIDAO DE SENTENA (de acordo com a Lei 11.232/05)....................21 CAPTULO II AS VRIAS ESPCIES DE EXECUO..............................................25 Notas Introdutrias................................................................................................................25 A Execuo para a Entrega de Coisa Certa...........................................................................25 A EXECUO PARA ENTREGA DE COISA INCERTA................................................27 EXECUO DAS OBRIGAES DE FAZER E NO FAZER.......................................29 A EXECUO POR QUANTIA CERTA CONTRA DEVEDOR SOLVENTE................31 Do Cumprimento da Sentena (ou Execuo por Quantia Certa dos Ttulos Judiciais).......31 Execuo por Quantia Certa Contra Devedor Solvente Fundada em Ttulo Extrajudicial...39 Da Avaliao.........................................................................................................................52 Das Tcnicas Expropriativas de Bens Novidade da lei 11.382/06.....................................53 CAPTULO III AS DEFESAS DO EXECUTADO..........................................................55 EMBARGOS DO DEVEDOR..............................................................................................55 EXCEO DE PR-EXECUTIVIDADE...........................................................................55

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CAPTULO I TEORIA GERAL DA EXECUO 1) CONCEITO Execuo o conjunto de atos estatais atravs dos quais, com ou sem a vontade de devedor (e at contra ela), invade-se seu patrimnio para, custa dele, realizar-se o resultado prtico desejado concretamente pelo direito objetivo material. (DINAMARCO1) O conceito transcrito d a nota clara da atividade executiva: em contraposio ao processo de conhecimento, em que se tem, de forma preponderante, atividade certificadora do direito, a execuo anela tornar efetivo o direito que j foi previamente tido por certo. Na clssica lio de DINAMARCO2, enquanto o processo de conhecimento orientado soluo das crises jurdicas de certeza, o processo executivo destinado solucionar as crises de adimplemento, as quais, ressalte-se, presumem a existncia de um direito j previamente certificado.2) PRINCPIOS ESPECFICOS DO PROCESSO DE EXECUO

Explica ARAKEN DE ASSIS3 que os princpios devem ser entendidos como valores historicamente preponderantes, originados de prvio consenso e estabelecidos em dado sistema. So, por assim dizer, a diretriz basilar de um sistema jurdico. Nas felizes palavras de ALEXANDRE FREITAS CMARA, os princpios so vetores hermenuticos que orientam a interpretao do sistema jurdico. Optou-se, neste item, por expor apenas os princpios tpicos ou especficos do processo executivo. Deve, porm, ficar claro que execuo aplicam-se tambm todos os princpios gerais do processo, hauridos originariamente do prprio texto constitucional. certo, pois, que o devido processo legal, a ampla defesa e contraditrio, para citar apenas os mais famosos, so tambm aplicveis execuo, pois que impem, na feliz expresso de CASSIO SCARPINELLA BUENO4, um modelo constitucional de processo. Seguem, pois, analisados, apenas aqueles que tocam especificamente ao processo de execuo. Princpio da Autonomia (ao sincretismo): este princpio contava com nota marcante na estrutura original do CPC, dividido que fora, por Alfredo Buzaid, em trs tipos diferentes e autnomos de processo: conhecimento, execuo e cautelar. Hoje, todavia, tem-se adotado, cada vez mais, o modelo sincrtico de processo, que contempla a possibilidade de, em1 2

CANDIDO RANGEL DINAMARCO, Execuo Civil,, Malheiros. CANDIDO RANGEL DINAMARCO, Instituies de Direito Processual Civil, vol. II, Malheiros. 3 ARAKEN DE ASSIS, Manual da Execuo, 11 ed., RT, 2007. 4 CASSI SCARPINELLA BUENO, Curso Sistematizado de Direito Processual Civil, vol.1, Saraiva, 2007.

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nica base procedimental, efetivarem-se atos de natureza cognitiva e executiva5. Todavia, alerta autorizada doutrina que subsiste a autonomia funcional do processo de execuo, pois ainda quando realizados no bojo do processo cognitivo, seus atos distinguem-se daqueles, na medida em que orientam-se a realizar o direito previamente reconhecido na sentena. Princpio da realidade da execuo: toda execuo real, isto , a atividade executiva deve atingir, regra geral, o patrimnio no executado e no sua pessoa. As excees classicamente admitidas eram: devedor de penso alimentcia e depositrio infiel. Todavia, de acordo com posicionamento atual do STF, a priso do depositrio infiel no mais se coaduna com o sistema constitucional brasileiro, notadamente por fora dos tratados internacionais de proteo aos direitos humanos. Nesses termos, foi editada a Smula Vinculante n 25, que reza: ilcita a priso civil de depositrio infiel, qualquer que seja a modalidade de depsito. Princpio do menor sacrifcio possvel ao executado: art. 620 do CPC: quando por vrios meios o credor puder promover a execuo, o juiz mandar que se faa pelo modo menos gravoso para o devedor. Segundo DIDIER6 e outros, h nesse dispositivo clara aplicao do princpio da proporcionalidade ao processo de execuo. Princpio do desfecho nico (ou Princpio do Resultado): o nico fim normal do processo de execuo a satisfao do credor. Qualquer outro resultado considerado anmalo. Princpio da especificidade da execuo: dizer que a execuo deve ser especfica significa que esta deve seguir a mxima de dar ao credor aquilo e exatamente aquilo que ele tem direito, ou seja, deve coincidir no mximo possvel com o resultado que se obteria caso o devedor cumprisse a obrigao de forma espontnea. Princpio da disponibilidade de execuo: encontra-se este princpio positivado no artigo 569 do CPC: o credor tem a faculdade de desistir de toda a execuo ou de apenas algumas medidas executivas. De fato, como visto em item anterior, o processo de execuo desenvolve-se rumo a uma nica finalidade, qual seja, satisfazer o crdito. Assim, eventual desistncia da ao executiva no traria prejuzo ao devedor, antes, como bem observa MARCELO ABELHA RODRIGUES7, traria um benefcio. A norma citada (art. 569), entretanto, fixou limites dessa desistncia, certamente visando coibir a desistncia nos casos em que o exeqente se visse na iminncia de ser vencido na ao de embargos do devedor. Por isso, deu tratamento especfico aos efeitos da desistncia em casos de execuo embargada, conforme se l do pargrafo nico e alneas do mesmo dispositivo.5

Com a insero do 7 ao art. 273 do CPC, no se pode deixar de mencionar a possibilidade de se ter tambm a concesso de tutelas cautelares no seio do processo de conhecimento, o que no deixa de ser um tipo de sincretismo processual, que rompe com a regra clssica da autonomia do processo cautelar.6

FREDIE DIDIER, LEONARDO J.C. CUNHA, PAULA SARNO BRAGA e RAFAEL OLIVEIRA, Curso de Direito Processual Civil V Execuo, Ed. JusPodivm, 2009.7

MARCELO ABELHA, Manual da Execuo Civil, Ed. Forense Universitria,

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Princpio do respeito dignidade humana: segundo HUMBERTO THEODORO JUNIOR8, a execuo no pode ser utilizada como instrumento para causar a runa, a fome e o desabrigo do devedor e de sua famlia, gerando situaes incompatveis com a dignidade humana. Da porque, para proteger esse que se pode chamar de patrimnio mnimo, institui o legislador o regime das impenhorabilidades. Princpio do ttulo: toda execuo fundar-se- em ttulo executivo. Isto o que dispe o artigo 586 do CPC: a execuo para cobrana de crdito fundar-se- sempre em ttulo de obrigao certa, lquida e exigvel.. Segundo ARAKEN DE ASSIS, ele o bilhete de acesso via executiva. 3) COMPETNCIA O CPC alude a 4 espcies de competncia, a saber: a) funcional (ligada natureza, grau, peculiaridades da funo exercida pelo rgo jurisdicional art. 93); b) material (relacionada natureza da relao jurdica deduzida na demanda art. 91); c) por valor (valor atribudo causa art. 91); d) territorial (arts. 94 e seguintes). 3.1. A Competncia para a Execuo por Ttulo Judicial Competncia funcional do juzo da cognio: por fora do artigo 575 do CPC, a competncia para a execuo de ttulo judicial era do juzo perante o qual tramitou a demanda cognitiva. Entretanto, com a lei 11.232/05 essa antiga regra foi alterada, sendo que a nova sistemtica dada pelo par. nico do art. 475-P estipula que tal cumprimento poder ocorrer perante o juzo do local onde se encontram bens sujeitos a execuo e o juzo do novo domiclio do executado. Em outras palavras, houve uma migrao da antiga e rgida regra de competncia funcional (absoluta) do juzo prolator da sentena condenatria, para uma nova sistemtica, de competncia territorial (relativa, portanto) concorrente. Ressalte-se que a competncia dos tribunais para execuo s ocorre quando perante eles fluiu, originariamente, o processo cognitivo. O fato de terem apreciado a demanda em sede recursal no desloca essa competncia. Ainda sobre a execuo dos ttulos judiciais, h algumas situaes peculiares que merecem ateno, quais sejam: a) Sentena penal condenatria: a execuo da sentena penal condenatria foge da regra segundo a qual o juzo prolator da sentena tem competncia para sua execuo, pois o artigo 575, IV, expressamente remete para o juzo cvel competente. b) Sentenas estrangeiras homologadas pelo STJ: esse tipo de ttulo executivo judicial, por fora do artigo 109, X, da CF/88, tem sua execuo perante a Justia Federal de primeira instncia.

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HUMBERTO THEODORO JUNIOR, Curso de Direito Processual Civil, vol. II, 41 ed., Ed. Forense, 2007.

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c) Sentena arbitral: a execuo da sentena arbitral condenatria igualmente foge da regra segundo a qual o juzo prolator da sentena tem competncia para sua execuo, pois que, nesse caso, o juzo arbitral no detm competncia para a fase executiva, a qual, obrigatoriamente, deve realizar-se perante o Poder Judicirio. Por isso, o artigo 575, IV, expressamente remete para o juzo cvel competente a execuo desse ttulo judicial. 3.2 A Competncia para a Execuo de Ttulo Extrajudicial Segue, em geral, as regras estabelecidas no CPC para o processo de conhecimento. Quanto competncia para a execuo de ttulo extrajudicial com origem no exterior, h que se observar o seguinte: ser de competncia da Justia brasileira sempre que (i) no Brasil for domiciliado o devedor, (ii) no Brasil deva ser cumprida a obrigao, ou (iii) aqui se situe o imvel sobre o qual haja de incidir a execuo. As duas primeiras, de ndole concorrente; a ltima, exclusiva. 4) LEGITIMIDADE De acordo com LIEBMAN9, parte legtima a pessoa que pode promover a execuo e contra a qual se pode promover a execuo. Esse tema encontra-se enfrentado pela legislao nos artigos 566 e 567, que definem a legitimidade ativa e no artigos 568, que trata da legitimidade passiva. No presente captulo, adotar-se- a classificao das legitimidades ativa e passiva idealizada por ARAKEN DE ASSIS, por se tratar da mais completa sobre o tema. 4.1. Legitimidade Ativa Ordinria - A legitimidade ativa ordinria poder ser primria ou superveniente. Primria ser a legitimidade daqueles que figuram nominados no ttulo executivo, enquanto a superveniente ocorre quando, no obstante omisso o ttulo, determinados sujeitos assumem a qualidade de legitimados ativos execuo. 4.1.1. Legitimidade Ativa Ordinria Primria Conforme dispe o artigo 566, I, do CPC, em regra, ter legitimidade ativa primria o credor a quem a lei confere ttulo executivo. O legitimado ativo primrio, em regra, figurou como parte no processo que originou o ttulo ou participou do acordo de vontades que deu origem ao ttulo extrajudicial. 4.1.2. Legitimidade Ativa Ordinria Superveniente - Legitimidade Ativa Ordinria Superveniente do Esplio, Herdeiros e Sucessores: nos termos do artigo 567, I, do CPC. A doutrina tem reservado a essa legitimidade ativa a denominao de ordinria superveniente. ordinria porque o esplio, herdeiros e sucessores buscam em nome prprio, direito prprio (art. 6 do CPC); , por sua vez,9

Apud ARAKEN DE ASSIS, obra citada pg. 381.

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superveniente, por no figurarem no ttulo executivo como credores, pois que no participaram da sua formao (ver item 4.1.). - Legitimidade Ativa Ordinria Superveniente do Cessionrio: nos termos do artigo 567, II, do CPC. Hiptese aplicvel aos casos de cesso que antecedem ao processo de execuo. Acaso j proposta a demanda, tratar-se- de alienao de direito litigioso, devendo observar-se o artigo 42 do CPC. Sobre o tema, esclarece ALEXANDRE FREITAS CMARA: de se notar, aqui, porm, que a cesso do crdito que se d no curso do processo executivo verdadeira alienao do direito litigioso (art. 42 do CPC), o que significa dizer que a legitimidade das partes no alterada. Em outros termos, nada impede que, a despeito da cesso do crdito exeqendo, o cedente permanea no processo executivo, agora atuando em nome prprio na defesa de interesse alheio (do cessionrio), como substituto processual). No preciso, porm, que nesta hiptese aja concordncia do executado para que possa ocorrer a sucesso processual no plo ativo. O cessionrio poder ingressar no processo, em lugar do cedente, sendo para isso irrelevante o consentimento do executado. - Legitimidade Ativa Ordinria Superveniente do Sub-rogado: nos termos do artigo 567, III, do CPC, sendo a esta hiptese aplicvel tudo o que se disse quanto ao cessionrio. 4.2. Legitimidade Ativa Extraordinria Os casos de legitimidade ativa no processo de execuo tornaram-se mais comuns com a ampliao da tutela coletiva de direitos Trata-se, contudo, de legitimidade extraordinria (pois o MP atua em nome prprio na defesa de direito alheio), sendo a mais tpica delas, na atualidade, a legitimao extraordinria para promover a execuo coletiva, fenmeno tambm denominado de fluid recovery10. H, ainda, a legitimidade do MP para promover a execuo de sentena de procedncia proferida em ao popular, se o demandante ou outro qualquer cidado no demandar a execuo no prazo de sessenta dias contados da publicao da deciso de segundo grau de jurisdio (art. 16 da lei 4.717/65). Ainda na seara da legitimao extraordinria executiva do Parquet, o Superior Tribunal de Justia, no julgamento do REsp n 1.119.377-SP, Relator Ministro Humberto Martins, reconheceu ao Ministrio Pblico a legitimao extraordinria para promover a execuo de ttulo executivo extrajudicial decorrente de deciso do Tribunal de Contas estadual. FREDIE DIDIER e outros11, em excelente obra dedicada ao processo de execuo, cogitam da atuao executiva do MP como legitimado ordinrio. Citam como exemplo o Parquet litigando em face de ente poltico com o objetivo de receber parcela oramentria: eventual sentena condenatria seria executada pelo MP na qualidade de legitimado ordinrio. 4.3. Legitimidade Passiva10

O tema das aes coletivas e a possibilidade de execuo coletiva pelo Ministrio Pblico, a despeito de interessante, extrapola os singelos limites dessa apostila. Por isso, aos interessados, indica-se a leitura da excelente obra de FREDIE DIDIER JR. e HERMES ZANETI JUNIOR, Curso de Processo Civil, Processo Coletivo, vol. 4, Ed. JusPodivm, Salvador, 2006.11

FREDIE DIDIER, LEONARDO J.C. CUNHA, PAULA SARNO BRAGA e RAFAEL OLIVEIRA, Curso de Direito Processual Civil V Execuo, Ed. JusPodivm, 2009.

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4.3.1. Legitimidade Passiva Ordinria Primria: nos termos do artigo 568, I, legitimado passivo ordinrio primrio o devedor, reconhecido como tal no ttulo executivo. Trata-se, aqui, de legitimidade ordinria passiva e primria, j que o executado consta como devedor no ttulo executivo. 4.3.2. Legitimidade Passiva Ordinria Superveniente - O Esplio, os Herdeiros ou Sucessores do Devedor, nos termos artigo 568, II, do CPC. caso de legitimidade passiva ordinria, mas de natureza superveniente, pois que os legitimados adquiriram essa condio em momento posterior ao da formao do ttulo executivo, por obra da sucesso causa mortis. Como bem pontua ALEXANDRE FREITAS CMARA, necessrio destacar que, nesse caso, os sucessores s respondem pelas dvidas do de cujus nos limites de sua herana, ou seja, nos limites do quinho hereditrio que lhes haja sido adjudicado. H ainda, no caso em comento, peculiaridade digna de nota: a responsabilidade patrimonial pela sucesso causa mortis compete ao esplio at a partilha, razo pela qual, ao invs de ingressar com a execuo, pode o credor optar por postular o adimplemento da dvida no juzo do inventrio, pela via da habilitao de crdito, prevista nos arts. 1017 e seguintes do CPC. - O Novo Devedor, nos termos do artigo 568, III, do CPC: segundo ARAKEN DE ASSIS 12, a situao legitimadora do artigo 568, III, abriga todas as formas de cesso de dvida. Pontua, entretanto, que a cesso de dvida, no direito brasileiro, s adquire eficcia perante o credor com o seu consentimento. Entretanto, caso exista a cesso vlida da dvida, ou seja, presente a concordncia do credor, no mais ser possvel o prosseguimento da execuo contra o antigo devedor, pois que este no mais estar submetido responsabilidade patrimonial. Deve haver, pois, a sucesso processual no plo passivo.caso. 4.3.3. A POLMICA DA LEGITIMIDADE PASSIVA DO FIADOR O artigo 568, III, do CPC, traz ainda como situao legitimadora no plo passivo, a do fiador judicial. Segundo prestigiosa doutrina, fiador judicial aquele que presta, no curso do processo, garantia pessoal ao cumprimento da obrigao de uma das partes. Inadimplida a obrigao pela qual se obrigou o fiador judicial, poder a execuo ser instaurada contra ele13. Trata-se de legitimidade passiva ordinria superveniente, apesar de ARAKEN DE ASSIS14 afirmar, com argumentos robustos, tratar-se de legitimidade passiva extraordinria. Por outro lado, apesar da redao da lei referir-se ao fiador judicial, polmica se formou quanto legitimidade passiva do fiador convencional. Parte da doutrina, partindo de uma interpretao literal, simplesmente nega legitimidade passiva ao fiador convencional na execuo. a posio firme de SERGIO BERMUDES, citado por ARAKEN DE ASSIS15:12 13

ARAKEN DE ASSIS, obra citada, pg. 397. ALEXANDRE FREITAS CMARA, obra citada, pg. 182. 14 ARAKEN DE ASSIS, na obra tantas vezes citada, conclui pela legitimao extraordinria do fiador judicial, trazendo baila a clssica diferenciao entre dvida e responsabilidade. Sobre o tema, remete-se o leitor ao item abaixo que trata da RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL. 15 ARAKEN DE ASSIS, obra citada pg. 400.

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contra o fiador no judicial, descabe execuo sem prvia condenao, imposta por sentena proferida em relao processual de conhecimento, qual foi devidamente integrado. Outra parcela da doutrina, v o fiador convencional como legitimado passivo ordinrio primrio, com base nos arts. 585, III e IV. a posio de THEODORO JR. Outrossim, a doutrina de ARAKEN DE ASSIS, que entende o fiador convencional como legitimado passivo extraordinrio, afirmando que existir extenso da eficcia subjetiva do ttulo, em que consta o afianado, redundando na legitimidade extraordinria do fiador. Dentre as trs posies, certamente a segunda a que se apresenta mais correta. Aderindo a ela, explica ALEXANDRE FREITAS CMARA16: Outros autores, porm, consideram ter o fiador convencional legitimidade passiva ordinria primria, estando esta legitimidade includa no alcance do art. 568, I, do CPC. A razo, a nosso sentir, est com esta ltima posio. O CPC no fala do fiador convencional por ser tal referncia expressa desnecessria. O art. 585, III, do Cdigo coloca, no elenco dos ttulos executivos extrajudiciais, o contrato de cauo, gnero a que pertence, indubitavelmente, o contrato de fiana. Assim sendo, o fiador convencional devedor (ou, para sermos mais rigorosos tecnicamente, responsvel) reconhecido como tal no ttulo executivo. No faria sentido nenhum atribuir-se eficcia executiva ao contrato de fiana sem se conferir legitimidade passiva primria ao fiador convencional. De fato, no se pode negar a qualidade de legitimado passivo ordinrio ao fiador convencional, pois que ele, o fiador, responsvel pelo pagamento da dvida, encontrandose, portanto, em juzo, na defesa de direito prprio, caracterstica tpica da legitimidade ordinria. 4.3.4. A LEGITIMIDADE PASSIVA DO RESPONSVEL TRIBUTRIO Tema de relevantes conseqncias prticas o da legitimidade passiva do responsvel tributrio. No se pretende, nesse trabalho, incursionar pelo campo do direito tributrio, mas relevante se torna definir quem, luz desse ramo do direito, responsvel tributrio. Nessa toada, responsvel o sujeito que, no sendo contribuinte, vale dizer, vinculado ao fato gerador, obriga-se por fora de lei17. Sobre o tema responsabilidade tributria indica-se a excelente obra do eminente professor goiano LEONARDO BUISSA FREITAS18. Para o processo civil, o tema relevante, por exemplo, em sede de execuo fiscal, quando, no raro, so trazidos para o campo da responsabilidade patrimonial os scios da empresa executada. Aqui, entendemos que o responsvel tributrio est na mesma situao do fiador convencional: legitimado passivo ordinrio, pelas razes j expostas. 4.4. A POSSIBILIDADE DE CUMULAO DE DEMANDAS EXECUTIVAS Ainda no Ttulo I (Da Execuo em Geral), no Captulo I, que cuida das partes no processo de execuo, inseriu o legislador o tema da cumulao de demandas executivas. No se trata, por certo do local mais adequado para tanto, mas cumpre examinar tambm essa hiptese, retratada no artigo 573 do CPC:16 17

ALEXANDRE FEITAS CMARA, obra citada, pg. 183. ARAKEN DE ASSIS, obra citada, pg. 402. 18 LEONARDO BUISSA FREITAS, Apostila de Direito Tributrio do Axioma Jurdico, 2006, pg. 175.

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Art. 573. lcito ao credor, sendo o mesmo o devedor, cumular vrias execues, ainda que fundadas em ttulos diferentes, desde que para todas elas seja competente o juiz e idntica a forma do processo. Com efeito, pode-se extrair do artigo transcrito trs requisitos para a cumulao de demandas executivas: (i) identidade de partes, (ii) competncia do juzo e (iii) identidade de procedimento para todos os ttulos executivos. Sobre o tema, que tem enorme importncia prtica, o primeiro destaque a ser feito que no se mostra possvel a cumulao, em um s processo, de execuo fundada em ttulo judicial e extrajudicial. Conforme se ver, os procedimentos executivos para esses ttulos so totalmente distintos, o que inviabiliza tal cumulao19. luz desse dispositivo, perfeitamente admissvel que JOO, titular de duas dvidas contra MARCOS, representadas, uma delas, por nota promissria e outra por duplicata, maneje uma s demanda executiva, para receber ambas as dvidas, lastreadas, cada qual, em um ttulo distinto. O que no se admite, por exemplo, JOO, credor de MARCOS em dvida representada por nota promissria, e credor de MARCELO em dvida representada por duplicata, maneje uma nica execuo colocando MARCOS e MARCELO no polo passivo. Isso porque no se permite, conforme lio de TEORIA ALBINO ZAVASCKI, citado por DIDIER20 e outros, o que no se permite a coligao de devedores, ou seja, que o credor cumule a execuo de diferentes obrigaes, cada qual com distintos devedores. 5) REQUISITOS PARA REALIZAR QUALQUER EXECUO Basicamente, dois so os requisitos para que se possa realizar a execuo: um de ordem formal, que o ttulo executivo, e outro de ordem prtica, que a constatao da inadimplncia do devedor. O prprio Cdigo de Processo Civil deixa clara essa realidade, quando elenca como requisitos necessrios para realizar qualquer execuo o inadimplemento do devedor e a presena de um ttulo executivo. 5.1 - A INADIMPLNCIA DO DEVEDOR O ttulo executivo, que ser estudado mais a frente, veicula o prazo dentro do qual o devedor dever cumprir a obrigao. No observado esse prazo, constata-se o inadimplemento, tornando a dvida (obrigao) exigvel e fazendo surgir para o credor o direito (rectius, o interesse de agir) de manejar ao de execuo. Necessrio , pois, que o devedor esteja em mora, ou seja, em estado de inadimplemento. bem verdade, diga-se de passagem, que os conceitos de inadimplemento e mora no necessariamente so equivalentes, notadamente luz do Cdigo Civil Brasileiro. Em artigo doutrinrio de nossa autoria21, tivemos a oportunidade de esclarecer o tema:19

No sentindo do texto, DIDIER e outros, em obra aqui j citada. Contra, admitindo tal cumulao, MARCELO ABELHA e tambm LEONARDO GRECO. 20 FREDIE DIDIER, LEONARDO J.C. CUNHA, PAULA SARNO BRAGA e RAFAEL OLIVEIRA, Curso de Direito Processual Civil V Execuo, Ed. JusPodivm, 2009. 21 PAIVA, Lcio Flvio Siqueira de. O inadimplemento absoluto, a mora e a violao positiva do contrato . Jus Navigandi, Teresina, ano 13, n. 2206, 16 jul. 2009. Disponvel em:

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Por inadimplemento absoluto entende-se um descumprimento tal da obrigao, que a torne desinteressante para o credor, ainda que o devedor se disponha a cumpri-la extemporaneamente. o caso, tantas vezes citado em doutrina, do buf, que contratado para servir os convidados do contratante no sbado s 22 horas, chega s 04 da manh, quando todos j deixaram a festa. Aqui, ainda que o contratado se disponha a cumprir a obrigao, essa tornou-se totalmente desinteressante para ao credor. Eis o inadimplemento absoluto, a ensejar, caso queira o credor, a resoluo do negcio jurdico e perdas e danos. Trata-se, nesse caso, de verdadeiro direito potestativo que surge para o credor e, como todo direito potestativo, a parte contrria no pode fazer outra coisa seno sujeitar-se ao exerccio do mesmo. bem verdade, diga-se de passagem, que a doutrina j vem controlando abusos nessa seara, notadamente nos casos em que o inadimplemento mnimo. Incumbir, em casos tais, ao juzo aferir se realmente aquele descumprimento deve ensejar a resoluo do contrato ou, ao contrrio, reconhecer que por ter a parte implementado parte substancial da avena, deve a mesma ser mantida, remetendo-se o credor a vias outras para a satisfao do seu direito. Noutro giro, o inadimplemento relativo ou mora d-se quando, descumprida a obrigao no seu tempo, a sua extempornea efetivao ainda se mostra interessante ao credor, sendo que seu cumprimento evitar a resoluo do negcio jurdico. o caso do locatrio, que tendo a obrigao de adimplir os alugueres at o dia 10 de cada ms, atrasa a prestao, vindo a cumpri-la apenas no dia 20. Ora, o recebimento dos valores, a despeito de extemporneo, ainda til ao credor, configurando-se, assim, a mora, a ensejar o acrscimo de penalidades na obrigao (juros, correo monetria, honorrios advocatcios), mas no a resoluo do negcio jurdico. A esse conserto da mora, em que o devedor cumpre a obrigao, em que pese a destempo, d-se o nome de purga da mora, fazendo cessar os efeitos do atraso. De todo modo, a despeito de relevante a distino na seara do direito material, para fins da satisfao do requisito do inadimplemento que autoriza a instaurao do processo executivo, tanto o inadimplemento, quanto a mora, so suficientes. A inadimplncia do devedor condio da ao de execuo, consistente no interesse de agir-necessidade, no obstante encontre-se em doutrina opinio de que o inadimplemento integra o objeto litigioso da execuo, ou seja, seu prprio mrito (ARAKEN DE ASSIS). A matria relativa ao inadimplemento do devedor regulada pelos arts. 580, 581, 582, e 614, III, do Cdigo de Processo Civil, sendo digna de destaque a norma do artigo 582, que em redao infeliz e confusa quis fazer referncia tradicional exceptio non adimpleti

. Acesso em: 05 ago. 2009.

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contractus, de modo que, de maneira simples, no poder ser exigida uma prestao pelo exeqente se ele mesmo no cumpriu a sua parte22. 5.2 O TTULO EXECUTIVO 5.2.1. Conceito: Para CNDIDO DINAMARCO23, Ttulo Executivo o ato ou fato jurdico legalmente dotado da eficcia de tornar adequada a tutela executiva para a possvel satisfao de determinada pretenso. Ele torna adequada as medidas de execuo forada para a atuao da vontade da lei. Para ARAKEN DE ASSIS24, Faz o ttulo prova legal ou integral do crdito. 5.2.2. Natureza Jurdica: Principais Teorias: - Teoria Documental (Carnelutti): o ttulo enquanto representao ou prova da existncia do crdito exeqendo. - Teoria do Ato Jurdico (Liebman):ttulo enquanto ato jurdico a que a lei atribui eficcia executiva teoria que predomina no Direito ptrio. - Teoria do Acertamento do Direito (Mandrioli): o ttulo representaria um prvio acertamento do direito, outrora controvertido. - Teoria Mista: o ttulo ato e representao documental do crdito. (Greco Filho) 5.2.3. Indispensabilidade do Ttulo Executivo para a Ao de Execuo: - Justificativa Poltica: Proteo esfera jurdica do indivduo, pois s o ttulo executivo mostra a probabilidade da existncia de um preceito material descumprido e justifica o sacrifcio a seus direitos individuais (patrimnio). Princpios Consectrios: a) nulla executio sine titulo; b) nullus titulus sine lege. - Justificativa Legal: quanto ao Ttulo Executivo Judicial, a oportunidade prvia de procedimento em contraditrio, fiscalizado pelo rgo jurisdicional. Quanto ao Ttulo Executivo Extrajudicial, embora no tenha ocorrido tal prvia oportunidade, o legislador elegeu abstratamente atos que, na experincia comum, normalmente indicam a existncia efetiva de um crdito, atribuindo-lhes, pois, a condio de ttulo executivo. Poder-se-ia cogitar, tambm, que o ttulo extrajudicial seria uma oportunidade de acertamento, inter parts, do direito eventualmente controvertido, o que acabaria por aproximar essa idia da teoria do ttulo enquanto ato de acertamento25 ver 6.2.2 supra. 5.2.4. Funo do Ttulo Executivo22 23

Idem, pgina 147. CANDIDO RANGEL DINAMARCO, obra citada, pg. 474 e seguintes. 24 ARAKEN DE ASSIS, obra citada, pg. 143 e seguintes. 25 Ressalte-se que a opinio lanada no texto do Autor em particular, no representando o entendimento doutrinrio corrente.

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A funo do ttulo executivo clara: tornar possvel e adequada a tutela executiva. Liga-se, portanto, ao interesse de agir in executivis. Afasta-se, com essa afirmao, a idia de que o ttulo executivo a prpria causa de pedir da execuo. Absolutamente. Ele o elemento sem o qual o Estado se recusa a ofertar a via executiva. Na execuo, a causa de pedir , da mesma forma que no processo de cognio, a situao de fato que originou o direito alegado pelo exeqente, associada ao fundamento jurdico da pretenso deduzida e atitude do executado, ou seja, o inadimplemento. Afasta-se, tambm, a idia de que o ttulo fator de legitimao, uma vez que pode ser parte legtima para a execuo tambm aquele que no conste do ttulo (sucessores e subrogado, por exemplo, que so legitimados ordinrios, passivos ou ativos, supervenientes). No parece, outrossim, adequado considerar o ttulo executivo um pressuposto processual. Ainda que ausente o ttulo, o processo ou a relao processual existente e vlida, vez que pode ser instaurada mediante provocao da parte (demanda), perante rgo jurisdicional, com regular e vlida citao do executado, por intermdio de advogado (a chamada capacidade postulatria) todos esses pressupostos processuais de existncia; e ainda atravs de petio inicial apta, manejada perante rgo jurisdicional competente esses dois pressupostos processuais de validade. O ttulo executivo, nesse contexto, no se acomoda a qualquer dessas categorias citadas, o que desautoriza consider-lo pressuposto processual. , pois, sem dvida, componente do interesse de agir, por tornar adequada a tutela jurisdicional executiva. 5.2.5. Requisitos Formais e Substanciais do Ttulo Executivo: A adoo de qualquer uma das teorias que buscam explicar a natureza do ttulo executivo haver de influir, inegavelmente, na exata compreenso de seus elementos constitutivos, elencados pela lei, no art. 586, com a agora correta redao que lhe emprestou a lei 11.382/06, como elementos de uma obrigao dotada de certeza, liquidez e exigibilidade. Abstradas, de todo modo, concepes puramente tericas, que muitas vezes servem apenas para afastar o profissional do direito da indispensvel dimenso prtica dos institutos analisados, parece ter razo ARAKEN DE ASSIS26 ao afirmar que o ttulo tem, em verdade, duas dimenses distintas: no plano material (...) se sobreleva a declarao de certeza (relativa!), tanto obtida atravs do rgo jurisdicional (...), quando alcanada mediante consenso dos particulares. Na perspectiva processual, porque imprescindvel a vista da natureza dos atos do juiz no curso do processo e da posio de vantagem usufruda pelo credor, interessa o documento, dotado de certos requisitos formais ad hoc. Quanto a esses requisitos, encontra-se em doutrina (DINAMARCO, Execuo Civil) interessante classificao, dividindo-os em requisitos formais e requisitos substanciais. Nesse passo, requisitos formais seriam aqueles referentes ao ato em si mesmo, regulados pelo direito material e indispensveis perfeio do ttulo. Substanciais, por sua vez, seriam os requisitos referentes ao prprio contedo do ato, assim entendida a perfeita individualizao do direito a que esse ato se refere. So requisitos substanciais: a certeza, a liquidez e a exigibilidade.

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Araken de Assis, Manual da Execuo, RT, p. 137.

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Todos esses requisitos, destaque-se, relacionam-se com o interesse de agir in executivis, razo pela qual a ausncia de um deles acarretar o fenmeno conhecido como carncia de ao. 5.2.6. Ttulo Executivo Judicial No direito romano, s tinha acesso ao processo executivo o portador de sentena judicial. Contudo, na Idade Mdia, com o florescimento das relaes de crdito, surgiu a necessidade de se outorgar a determinadas categorias de crdito uma tutela mais segura, rpida e eficaz, razo pela qual houve a equiparao dos ttulos criados pelos particulares ao ttulo originado de sentena judicial. Ambos passaram, desde ento, a render executio parata. Os ttulos executivos judiciais encontram-se elencados, agora, no art. 475-N, que revogou o art. 584 do CPC. - Art. 475-N, I: a sentena proferida no processo civil que reconhea a existncia de obrigao de fazer, no fazer, entregar coisa ou pagar quantia. Havendo provimento com eficcia condenatria em uma sentena, esta habilitar o acesso ao processo de execuo. O termo sentena merece interpretao ampliada. Tambm acrdos, que substituem a sentena nos limites da matria impugnada, rendem ensejo execuo. Tambm decises interlocutrias, em determinados casos, possibilitam execuo. Outrossim, no se pode deixar de afirmar que a redao atual do art. 475-N, I, no corresponde antiga redao do artigo 584, revogado por este. L, no antigo dispositivo, falava-se em sentena condenatria; neste, o novo artigo, fala-se em sentena que reconhea a existncia de obrigao de fazer, no fazer, entregar coisa ou pagar quantia. Tal modificao tem sido utilizada por parte da doutrina para se defender que, aps a mudana legal, as sentenas meramente declaratrias, propostas quando j possvel o manejo da demanda condenatria, assumiriam eficcia executiva. O tema, com certeza, controvertido, e abord-lo em suas mincias desbordaria os limites desse trabalho. De todo modo, apenas para citar o tamanho da divergncia: de um lado, defendendo a eficcia executiva de determinadas sentenas declaratrias, FREDIE DIDIER JR27 e HUMBERTO THEODORO JUNIOR28; de outro lado, defendendo que apesar da mudana tudo prossegue como antes, ALEXANDRE FREITAS CMARA29 e ARAKEN DE ASSIS30. - Art. 475-N, II: Sentena Penal Condenatria Transitada em Julgado Um mesmo fato contrrio ao direito pode gerar efeitos diversos nas esferas penal e civil. o fenmeno denominado mltipla incidncia. A sentena penal condenatria traz como efeito anexo a outorga de ttulo executivo em favor da vtima ou seus herdeiros.27 28

FREDIE DIDIER JUNIOR, Curso de Direito Processual Civil, 6. Ed, JusPodivm, pg. 19 e seguintes. HUMBERTO THEODORO JUNIOR, Curso de Direito Processual Civil, 41 ed., pg. 74 e seguintes. 29 ALEXANDRE FREITAS CAMARA, Lies de Direito Processual Civil, 14 ed., pg. 192. 30 ARAKEN DE ASSIS, Manual da Execuo, 11 ed. RT, pg. 156 e seguintes.

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Em sendo efeito anexo que decorre de expressa disposio legal, absolutamente irrelevante o fato de o juiz indic-la ou no em seu provimento. Esta sentena penal submete-se a fase de liquidao, sendo que a revisibilidade pro reo da sentena criminal no inibe a execuo. - Art. 475-N, III: Sentena Homologatria de Conciliao e Transao, ainda que inclua matria no posta em juzo Por terem eficcia de coisa julgada, as sentenas homologatrias de transao e conciliao podem lastrear execuo forada sempre que uma das partes tiver a obrigao de prestar um bem outra. Podem envolver at matrias no postas em juzo. - Art. 475-N, IV : Sentena Arbitral Regulada pela lei 9307/96, o laudo arbitral foi equiparado, em termos de eficcia, sentena judicial, submetendo-se, assim, execuo nos moldes de um ttulo judicial. - Art. 475-N, V: O acordo extrajudicial, de qualquer natureza, homologado judicialmente Trata-se, aqui, de novidade inserida pela lei 11.232/05. O acordo extrajudicial j , luz do art. 585, ttulo executivo extrajudicial, desde que obedecidas as formalidades ali elencadas. O interesse de submet-lo homologao judicial decorre, por um lado, da maior estabilidade que os ttulos judiciais sabidamente tm, e em segundo lugar, para limitar as possveis defesas a serem postas disposio do executado em eventual Impugnao ao cumprimento da sentena (defesa do executado na execuo dos ttulos judiciais). - Art. 475-N, VI: Sentena Estrangeira Homologada Como ressalta ARAKEN DE ASSIS, a jurisdio se liga essencialmente soberania, razo pela qual, em princpio, atos judiciais emanados de autoridades judiciais estrangeiras nada valem em outro territrio. Entretanto, por fora do sistema de colaborao existente entre os Estados, possvel atribuir validade a esses atos. No Brasil, adota-se o juzo de delibao, sendo concedida eficcia sentena estrangeira aps exame extrnseco de sua harmonia com o direito ptrio. Atualmente, por fora de alterao trazida pela EC n 45/04, a competncia para homologar sentena estrangeira pertence ao Superior Tribunal de Justia. - Art. 475-N, VII: Formal ou Certido de Partilha A partilha de bens, em inventrio ou arrolamento, se homologa por sentena. representada pelo formal ou certido. Acaso algum herdeiro, a fim de igualar quinhes, deva repassar quantia certa a outro, cabvel ser ao de execuo fundada nesse ttulo. Cumpre destacar que o formal ou a certido de partilha no autorizam execuo para entrega de coisa, ou seja, para haver os bens mveis ou imveis partilhados. Encontrandose esse bens na posse de herdeiros ou legatrios, o desapossamento dever ser feito nos 16Prof. Lcio Flvio Siqueira de Paiva

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prprios autos do inventrio; estando em posse de terceiros, cabvel ser ao reivindicatria. 5.2.7. Ttulos Executivos Extrajudiciais Disciplinados no art. 585 do CPC e em diversas leis extravagantes. 6) A RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL Instituto extremamente importante para o processo de execuo, pode-se conceituar a responsabilidade patrimonial como a situao meramente potencial, caracterizada pela sujeitabilidade do patrimnio de algum s medidas executivas destinadas atuao da vontade concreta do direito material. (DINAMARCO31). Encontra-se prevista no artigo 591 do CPC: O devedor responde, para o cumprimento de suas obrigaes, com todos os seus bens presentes e futuros, salvo as restries estabelecidas em lei. Trata-se de instituto diretamente ligado ao princpio da realidade da execuo, antes estudado, pois que faz incidir a responsabilidade do devedor sobre o seu patrimnio e no sobre sua pessoa, como j ocorreu em remoto passado. Importante notar que, a teor da norma antes transcrita, a responsabilidade incide sobre os bens existentes quando da instaurao da demanda executiva e, tambm, sobre aqueles que vierem a ser adquiridos em seu curso. Os bens passados, todavia, salvo excees (as fraudes que sero estudadas a seguir), ficam fora da incidncia da execuo. Outrossim, mostra-se muito importante proceder-se diviso conceitual entre DVIDA e RESPONSABILIDADE: dvida dever jurdico de realizar uma prestao; trata-se de noo decorrente do direito material. Responsabilidade, por sua vez, a sujeio do patrimnio para assegurar a satisfao do credor. noo processual. Por essa distino, admite-se existir dvida sem responsabilidade (jogo), e responsabilidade sem dvida (fiador). Essa distino torna possvel o entendimento do artigo 592, que trata de casos em que, apesar de existir responsabilidade patrimonial, inexiste dvida propriamente dita. da que decorre a diferenciao, feita pelo prprio cdigo, de responsabilidade patrimonial primria e secundria. Aquela consiste na exposio dos bens do devedor execuo, sendo que este , a um s tempo, devedor e responsvel. Aquela responsabilidade patrimonial secundria - a sujeio de patrimnio de um responsvel, no originariamente devedor. No se pode, porm, como pretendem alguns doutrinadores, negar ao responsvel secundrio a qualidade de parte na execuo. Basta ver os casos antes j mencionados do fiador convencional e do responsvel tributrio: trata-se de responsabilidade patrimonial secundria; entretanto, sua legitimidade passiva na execuo ordinria32. 6.1. Os casos de responsabilidade patrimonial secundria31 32

CANDIDO RANGEL DINAMARCO, Execuo Civil, Malheiros.

O tema, entretanto, no pacfico. FREDIE DIDIER, LEONARDO J.C. CUNHA, PAULA SARNO BRAGA e RAFAEL OLIVEIRA, em Curso de Direito Processual Civil V Execuo, Ed. JusPodivm, 2009, entendem que a responsabilidade do fiador primria; portanto, seria ele, o fiador, devedor e responsvel a um s tempo; a dvida, entretanto, seria acessria.

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Os casos designados como sendo de responsabilidade patrimonial secundria encontram-se expostos no CPC, art. 592: ficam sujeitos execuo os bens: I do sucessor a ttulo singular, tratando-se de execuo fundada em direito real ou obrigao reipersecutria; II do scio, nos termos da lei; III do devedor, quando em poder de terceiros; IV do cnjuge, nos casos em que os seus bens prprios, reservados ou de sua meao respondem pela dvida; V alienados ou gravados com nus real em fraude de execuo. 6.2. A Alienao Fraudulenta de Bens O direito brasileiro conhece trs tipos distintos de alienao fraudulenta de bens, cada qual variando de acordo com seu grau de intensidade e sano prevista em lei, sendo: fraude pauliana ou fraude contra credores; fraude execuo; e alienao de bem penhorado. Para fins didticos pode-se afirmar que, no direito ptrio, o termo alienao fraudulenta de bens gnero, que comporta a trs espcies antes mencionadas. 6.2.1. Fraude contra Credores Tambm chamada de fraude pauliana, consiste na diminuio patrimonial do devedor at o ponto de reduzi-lo insolvncia. A doutrina aponta como requisitos para a sua configurao: a) eventus damni reduo do devedor insolvncia; b) concilium fraudis elemento subjetivo, consistente na prova da inteno do devedor em praticar a alienao a fim de provocar a reduo patrimonial ao estado de insolvncia. Sobre esse requisito subjetivo concilium fraudis calha transcrever pertinente lio de notvel processualista carioca33: Quanto a este requisito subjetivo, porm, preciso estabelecer algumas distines. Assim que, sendo o ato fraudulento praticado a ttulo gratuito (por exemplo, uma doao), no se deve cogitar da verificao do intuito fraudulento, que se presume de forma absoluta. J nos atos onerosos, preciso que o devedor tenha, ao menos, o potencial conhecimento de que seu ato o tornar insolvente (pouco importando, aqui, que o devedor aja com animus nocendi, ou seja, com a inteno deliberada de fraudar) e alm disso exige-se do terceiro adquirente que este tenha conhecimento (efetivo ou presumido) da condio de insolvncia a que se reduzir o devedor com aquela alieno. Requer ao prpria para ver seus efeitos revertidos denominada de ao pauliana ou revocatria, que no passa, na realidade, de uma ao de conhecimento, de procedimento comum, rito ordinrio -, cujo objetivo ver reconhecido, por sentena, a ineficcia34 da alienao com relao ao credor do alienante. A sentena proferida na ao pauliana assume eficcia declaratria e desconstitutiva, tornando o negcio jurdico ineficaz com relao ao credor35. 6.2.2.Fraude Execuo33 34

ALEXANDRE FREITAS CMARA, obra citada, pg. 224. Apesar de a lei referir-se, a todo momento, a invalidade, o Autor do presente trabalho filia-se corrente processualista majoritria (ver DINAMARCO, FREITAS CMARA, THEODORO JUNIOR entre outros) que entende tratar-se, em realidade, de ineficcia do ato de alienao. Discorrer sobre o tema, de enorme importncia prtica, redundaria em extravasamento dos limites desse trabalho, razo pela qual indica-se a leitura do livro Execuo Civil, cap. VI, de Cndido Rangel Dinamarco, que com maestria trata do tema. 35 No mesmo sentido do texto, ALEXANDRE FREITAS CMARA, obra citada, pg. 229/230.

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A fraude de execuo uma espcie de alienao fraudulenta de bens que a lei considera mais grave que a fraude contra credores. Por isso, a lei dispensa a demonstrao do requisito subjetivo concilium fraudis necessrio configurao da fraude pauliana. Encontra-se prevista no art. 593, II, do CPC: considera-se fraude de execuo quando, ao tempo da alienao ou onerao, corria contra o devedor demanda capaz de reduzi-lo insolvncia. So requisitos objetivos para a sua configurao: a) litispendncia; b) reduo insolvncia. Ressalte-se que no apenas a pendncia de execuo, mas tambm demanda cognitiva condenatria configura a fraude de execuo, pois que tambm a demanda cognitiva capaz de reduzir o devedor ao estado de insolvncia. Trata-se de ineficcia originria do negcio jurdico ao contrrio da fraude pauliana, em que a ineficcia sucessiva, ou seja, necessita de sentena judicial que a reconhea -, razo pela qual no se mostra necessrio ajuizar demanda destinada a seu reconhecimento. Tratase de alienao que no retira o bem do mbito da responsabilidade patrimonial. O tema em comento, por sua enorme importncia, sempre levado ao conhecimento dos tribunais, que claudicam no que toca forma de reconhecer a existncia da fraude de execuo. Por exemplo, a 3 Turma do STJ, no ano de 2008, no julgamento do REsp 618625-SC, relatado pela eminente Ministra NANCY ANDRIGHI, trilhou senda interpretativa interessante, na qual afirma que ao comprador (ou seja, terceiro adquirente) incumbe o nus de provar que no sabia e no tinha como saber da existncia de demandas ajuizadas contra o alienante e que o pudessem conduzir insolvncia (ver Informativo STJ n 345, de 18 a 22 de fevereiro de 2008). Tal posicionamento, se por um lado contribui para favorecer a represso da prtica de alienaes que fraudem a execuo, por outro lado cria clima inseguro para as transaes, principalmente imobilirias, na medida em que obriga o adquirente a realizar uma pormenorizada pesquisa, eventualmente nos foros de todo o Brasil, sobre a vida judicial do alienante. Talvez por isso, o prprio Superior Tribunal de Justia, ao que tudo indica refluindo do entendimento que, por sua 3 Turma, chegou a adotar, uniformizou a jurisprudncia do tribunal, por intermdio da Corte Especial e editou a Smula n 375 que assevera: Smula 375. O reconhecimento da fraude execuo depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de m-f do terceiro adquirente. Com o entendimento agora sumulado, o terceiro adquirente fica mais protegido nas negociaes, pois que s ser considerada fraude de execuo quando provada a sua m-f, a qual decorre, a nosso ver, ou do registro da penhora, ou da averbao da existncia da execuo junto ao registro de matrcula do imvel (ou do registro do veculo, por exemplo), nos termos do art. 615-A do CPC. Alias, esse artigo 615-A do CPC configura verdadeira novidade inserida no cdigo pela lei 11.382/06. Como antes visto, um dos requisitos essenciais configurao da fraude de execuo o estado de litispendncia, entendido este, para o ru, como aquele que ocorre aps a sua citao vlida, isso a teor do clssico artigo 219 do CPC. 19Prof. Lcio Flvio Siqueira de Paiva

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Todavia, o novo artigo 615-A altera esse termo a quo (litispendncia para o ru, com a sua citao) para fins de configurao da fraude de execuo, antecipando-o, conforme se nota da leitura do novo dispositivo, in verbis: Art. 615-A. O exeqente poder, no ato da distribuio, obter certido comprobatria do ajuizamento da execuo, com identificao das partes e do valor da causa, para fins de averbao no registro de imveis, registro de veculos ou registro de outros bens sujeitos penhora ou arresto. (...) 3. Presume-se em fraude execuo a alienao ou onerao de bens efetuada aps a averbao. Em funo dessa mudana, no resta dvida em afirmar que, uma vez realizada a averbao constritiva que tem sido denominada em doutrina de averbao premonitria qualquer ato de alienao ou onerao que lhe seja posterior ser considerado fraude de execuo, ainda que o executado/devedor no tenha sido citado para a demanda capaz de lhe reduzir insolvncia. 6.2.3. Alienao de Bem Penhorado Estando o bem penhorado (constrito judicialmente), no poder este ser alienado. Em o sendo, o negcio ser ineficaz em relao ao juzo da execuo, ou seja, a alienao no afasta o bem do campo da responsabilidade patrimonial. Difere da fraude de execuo, pois no exige a reduo do devedor insolvncia. Como ensina ALEXANDRE FREITAS CMARA36: Verifica-se, assim, a existncia de uma escalada de situaes, quanto ao nvel de gravidade, entre as diversas modalidades de fraude. Da menos grave (fraude pauliana, onde se exige a reduo do devedor insolvncia e o elemento subjetivo fraude), passando pela fraude de execuo (onde apenas o elemento objetivo, insolvncia do devedor, exigido), at chegar-se modalidade mais grave (alienao de bem penhorado) onde nem mesmo a insolvncia do devedor requisito da fraude. 7) LIMITAES DA RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL Como visto no item anterior, o devedor responde, pela dvida, com seus bens presentes e futuros. Essa a regra. Todavia, por fora de imperativos de tutela de um patrimnio mnimo para o executado e sua famlia, entendeu por bem o legislador excluir determinados bens da esfera de responsabilidade patrimonial do devedor. A esta sistemtica d-se o nome de regime de impenhorabilidade,explicado no artigo 648 no esto sujeitos execuo os bens que a lei considera impenhorveis ou inalienveis e regulamentado nos artigos 649 e 650 do CPC. 8) A RESPONSABILIDADE PROCESSUAL CIVIL DAS PARTES NA EXECUO 8.1. A Responsabilidade Processual Civil do Exeqente - artigo 574 do CPC - Responsabilidade Objetiva - Requisitos: (i) sentena, (ii) transitada em julgado, (iii) que declarar inexistente, no todo ou em parte, a obrigao que deu lugar execuo.36

ALEXANDRE FREITAS CMARA, obra citada pg. 234.

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- Efeito Anexo e liquidao nos prprios autos da execuo 8.2. A Responsabilidade Processual do Executado - Lealdade processual: arts. 599 e 600 do CPC - A indenizao do artigo 601 do CPC - A relao do artigo 600 com o contempt of court pena de 20% sobre o valor atualizado do dbito em execuo. 9) A LIQUIDAO DE SENTENA (de acordo com a Lei 11.232/05) 9.1. Notas Introdutrias A lei 11.232/05, como se sabe, foi a responsvel por profundas modificaes levadas a efeito no processo de execuo. Adotando um novo paradigma, a lei nova vem romper com a estril e pouco efetiva pureza das tutelas processuais at ento existente, criando o que se convencionou chamar de um processo sincrtico, divido em meras fases destinadas efetivao do direito e no mais processos estanques e burocratizados como at ento se conhecia. No que tange ao antigo sistema de liquidao das sentenas, a mudana foi expressiva, sendo a primeira delas, topolgica: o que era o captulo intitulado Liquidao de Sentena e que fazia parte do Livro II, destinado o processo de execuo, migrou para o Livro I, em claro sinal dado pelo legislador que o que se tem e isso a doutrina sempre pontuou na liquidao autntica atividade cognitiva. Agora, contudo, e na esteira da atual reforma, no mais se pode falar em processo de liquidao de sentena, mas em mera fase de liquidao, que em alguns casos anteceder a fase prxima, qual a lei batizou de cumprimento de sentena. 9.2. A Finalidade da Liquidao de Sentena Segundo CASSIO SACARPINELLA BUENO37, a liquidao de sentena tem como finalidade a descoberta do valor da condenao, a quantificao do valor da obrigao a ser adimplida pelo devedor, tal qual reconhecida pela sentena. Esse, a propsito, o sentido e alcance definidos na prpria lei, que traz no caput do novo artigo 475-A a seguinte definio: quando a sentena no determinar o valor devido, procede-se sua liquidao. 9.3. Anlise dos Dispositivos: Artigos 475-A a 475-H O 1 do artigo 475-A traz importantssima inovao. Atestando a opo do legislador por tornar a liquidao uma mera fase do processo destinado a reconhecer o direito e torn-lo efetivo, tem-se agora a intimao do devedor para a fase de liquidao e no mais a sua citao, como no antigo regime.

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Cssio Scarpinella Bueno, A Nova etapa da Reforma do Cdigo de Processo Civil, Saraiva, 2006.

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Por bvio que a inovao em tela agrega celeridade ao procedimento, porquanto dispensa, para dizer o mnimo, as incansveis diligncias para proceder a citao do ru, muitas vezes frustradas pela prpria atitude desleal deste, que busca por todas as formas ocultar-se e com isso impedir a citao. O 1, alis, diz que a parte ser intimada na pessoa de seu advogado, o que facilita ainda mais o procedimento, mormente nas capitais, onde intimaes tais so feitas mediante publicao no Dirio de Justia. Essa simplicidade, ressalte-se, demonstra o intento do legislador de desburocratizar o processo civil, unificando, em uma nica base procedimental, todas as fases necessrias ao alcance da real e prtica efetivao do direito. NELSON NERY JR. tambm parece reconhecer essa nova postura adotada pela reforma, conquanto insista em fixar a liquidao de sentena como verdadeira ao, como se nota do trecho seguinte: a liquidao ao de conhecimento, de natureza constitutivointegrativa, que visa complementar o ttulo executivo (...). Mesmo sendo ao, a atual sistemtica empreendida pela lei 11232/05 simplifica e agiliza a liquidao, de modo a dar-lhe rito procedimental mais expedito, sem a autonomia e independncia que havia no regime revogado.38 O 2 do art. 475-A, por sua vez, indica que a liquidao poder ser requerida na pendncia de recurso, processando-se em autos apartados, no juzo de origem, cumprindo ao liquidante instruir o pedido com cpia das peas processuais pertinentes. O dispositivo em questo tem recebido aplausos de toda doutrina39, sendo batizado pelo Professor CASSIO SCARPINELLA de liquidao provisria. de se destacar que o interessado poder requerer a liquidao da sentena, tenha ou no o recurso de apelao sido recebido no efeito suspensivo. Isso quer dizer que, em qualquer caso possvel adiantar o trabalho, liquidando em primeiro grau a sentena, enquanto essa se encontra pendente de julgamento no juzo ad quem. Como natural, o recebimento do recurso de apelao produz o efeito de levar os autos (fisicamente, inclusive) do processo ao tribunal, razo pela qual dever a parte extrair cpia das peas pertinentes, para que se possa iniciar a fase de liquidao no juzo a quo. Encerrando o artigo 475-A, de se destacar o contedo de seu 3, cuja redao a seguinte: nos processos sob procedimento comum sumrio, referidos no art. 275, inciso II, alneas d e e desta Lei, defesa a sentena ilquida, cumprindo ao juiz, se for o caso, fixar de plano, a seu prudente critrio, o valor devido. Tratam, as alneas d e e do incisso II do art. 275, da ao de ressarcimento por danos causados em acidente de veculo de via terrestre e ao de cobrana de seguro, relativamente aos danos causados em acidente de veculo. Em casos tais, a lei passou a vedar a prolao de sentena ilquida. Assim sendo, ou h elementos nos autos que conduzam a uma definio do quantum e o juiz condenar em sentena j lquida ou, em no havendo tais elementos, dever o magistrado estipular o quantum de acordo com seu prudente critrio. ALEXANDRE FREITAS CMARA40 tece severa crtica ao dispositivo em questo, afirmando que, no caso de cobrana devida por seguradora, parece-nos razovel a vedao da sentena ilquida, uma vez que o sinistro j ter ocorrido e o contrato de seguro tem de prever as coberturas, o que d ao juiz parmetros seguros para fixar o valor da condenao. J no caso da reparao de dano por acidente de veculo de via terrestre,38 39

Nelson Nery, Cdigo de Processo Civil Comentado, RT, 2006. Ver, por todos, Alexandre Cmara, em Lies de Direito Processual Civil, vol.II. 40 Obra citada, p. 463.

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a nova regra nos parece desarrazoada. comum que acidentes de trnsito gerem a necessidade de se submeter a vtima a longos tratamentos, os quais muitas vezes superam em durao o prprio tempo do processo. Por isso, a lei processual permite que se formule pedido genrico quando, no momento da propositura da demanda, ainda no possvel determinar a extenso da obrigao. Ora, nesses casos pode perfeitamente ocorrer de no ser ainda possvel determinar-se o quantum debeatur no momento da prolao da sentena.Ocorre que com a nova disposio legal, o juiz teria de arbitrar um valor de indenizao, o que pode gerar injustias (...). Pensamos, assim, que a soluo ser, nesse caso, admitir-se a converso do procedimento sumrio em ordinrio, no qual inexiste a proibio de sentena condenatria genrica. Mais razovel seria, porm, que no houvesse essa vedao (...). Por sua vez, o artigo 475-B traz disposio que no nova, porquanto j existente na sistemtica anterior. Trata-se dos casos em que a determinao do quantum da condenao depender apenas de clculos aritmticos, que o credor possa fazer sozinho, sem auxlio de tcnico. Em casos tais, dever ser seguido procedimento do cumprimento de sentena contido no artigo 475-J, sendo que incumbe ao credor, fazer acompanhar ao requerimento que inaugurar a fase executiva do processo, uma planilha de clculos demonstrando como chegou ao valor que pretende executar. Estando em poder o devedor dados essenciais para se chegar ao clculo do quantum da condenao, determina o 1 do artigo 475-B que o juiz determinar sejam esses apresentados dentro de, no mximo, 30 (trinta) dias, sob pena de no sendo apresentados no prazo e no havendo justificativa, nos termos do 2 do mesmo artigo, reputarem-se corretos os clculos que forem apresentados pelo credor. Segundo ensina NELSON NERY, como a norma reputa como corretos os clculos apresentados pelo credor na hiptese de recusa injustificada do devedor em fornecer os dados necessrios elaborao da memria de clculo, isso quer significar que o devedor fica impedido de opor impugnao por excesso de execuo (art. 475-L V). Trata-se de presuno iures et de iure, que no admite prova em contrrio. O 3, a seu turno, aduz que o juiz, de ofcio, poder valer-se de contador do juzo, quando a memria apresentada pelo credor aparentemente exceder os limites da deciso exeqenda e, ainda, nos casos de assistncia judiciria. Essa providncia, por bvio, s tem lugar quando os clculos apresentados pelo credor em muito sobejarem, aparentemente, o que se poderia ter como correto para a execuo. Isso ocorrendo, o juiz lanar mo dos clculos feitos pelo expert do juzo, que poder encontrar valor diferente daquele apresentado pelo credor. Nesse caso, segundo entendimento esposado por NELSON NERY, deve-se abrir um contraditrio para que possa o credor debater o novo valor encontrado, mormente se este for a menor. Somente aps se ter por decidido este incidente que se pode aplicar a regra do 4 do mesmo artigo, que diz que a execuo far-se- pelo valor encontrado pelo devedor, mas a penhora ter por base o valor encontrado pelo contador. Noutra banda, os arts. 475-C, 475-D, 475-F e 475-G tratam do procedimento das liquidaes por arbitramento e por artigos. Nesse particular, a lei 11232/05 no trouxe inovaes, mantendo-se o esquema j conhecido da sistemtica revogada. A liquidao por arbitramento, como destaca o artigo 475-C ter lugar quando assim for determinado na sentena ou convencionado pelas partes, ou ainda quando o exigir a natureza do objeto da liquidao. Essa liquidao por arbitramento realizada por perito nomeado pelo juzo. 23Prof. Lcio Flvio Siqueira de Paiva

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A liquidao por artigos, a seu turno, ter lugar quando se fizer necessrio alegar e provar fato novo para se chegar ao quantum da obrigao. a modalidade mais comum de liquidao, sendo importante destacar, conquanto parea bvio, que os fatos a serem alegados e provados referem-se, apenas, ao quantum da condenao. A obrigao em si indiscutvel nessa fase, principalmente porque o foi, de forma exauriente, at o momento da prolao da sentena. Por esse motivo que o artigo 475-G peremptrio: defeso, na liquidao, discutir de novo a lide ou modificar a sentena que a julgou. Entretanto, caso a sentena transitada em julgado tenha determinado que a liquidao se faa de uma forma e entender o juiz da fase de liquidao que essa deve se dar por maneira distinta, no haver bice alterao, conforme assevera a Smula n 344, de 28/11/2007, do STJ: A liquidao por forma diversa da estabelecida na sentena no ofende a coisa julgada. Finalmente, o artigo 475-H, que traz uma das maiores novidades na liquidao de sentena: da deciso de liquidao caber agravo de instrumento. Aqui se nota a clara inteno do legislador de abandonar o sistema burocratizado de processos autnomos, transformando tudo em meras etapas ou fases de um mesmo processo. Por isso que, coerente com o novo paradigma que a lei 11323/05 vem impor, a deciso que resolve a fase de liquidao de sentena qualifica-se como interlocutria e, assim sendo, desafiar recurso de agravo de instrumento e no mais apelao, como antes se tinha.

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CAPTULO II AS VRIAS ESPCIES DE EXECUO 1. Notas Introdutrias O procedimento a ser observado na execuo depender, a teor do Livro II do CPC, do tipo de obrigao que se pretende executar. Assim, para cada uma das obrigaes fazer e no fazer, entregar coisa e dar corresponder procedimento especfico. No se pode deixar de notar, outrossim, que com as recentes reformas do Cdigo de Processo Civil, o procedimento tambm pode variar de acordo com o ttulo executivo que embasa a execuo. Assim, tem-se que a execuo das obrigaes de fazer/no fazer e entregar coisa, quando fundada em ttulo judicial, dar-se- nos termos do artigo 461 e 461A do CPC (Lei 10.444/02), enquanto que a execuo das obrigaes de dar (leia-se, pagar), quando fundadas em ttulo judicial, dar-se- na forma do recm inserido sistema de cumprimento de sentena, trazido pela novel lei 11.323/05. Por outro lado, as obrigaes de pagar quantia consubstanciadas em ttulo executivo extrajudicial prosseguem com execuo autnoma, segundo o modelo clssico do CPC de 1973, revitalizado, agora, pela reforma profunda levada a cabo pela lei 11.382/06. Com efeito, o presente captulo apresentar uma necessria combinao desses dois critrios. Primeiramente, ser observada a diviso das diversas espcies de execuo de acordo com a obrigao exeqenda e, dentro do tpico dedicado a cada uma dessas execues, far-se- a distino procedimental quando forem estas embasadas em ttulo judicial e extrajudicial. 2. A Execuo para a Entrega de Coisa Certa A execuo para a entrega de coisa certa tem procedimento diferenciado das demais espcies de execuo, da porque merece anlise em tpico especfico. Outrossim, nos termos do que foi explicitado no item anterior, seu procedimento comportar variaes em funo do ttulo que embasa essa execuo. 2.1 A Execuo para Entrega de Coisa Certa Fundada em Ttulo Executivo Judicial Para execues tais, deve-se observar o procedimento previsto no artigo 461-A do CPC, complementado, no que for cabvel, pelas disposies contidas no artigo 461 do mesmo diploma legal. Tais disposies, como reiteradamente explica a doutrina mais abalizada, referem-se ao que se convencionou chamar de tutela especfica, entendida essa como aquela destinada a obter objeto diferente de dinheiro a tutela que pretende obter dinheiro, por sua vez, reservou-se a denominao de tutela genrica. Destarte, a tutela especfica das obrigaes de entregar coisa certa fundada em ttulo judicial seguem o art. 461-A, que reza que na ao que tenha por objeto a entrega de coisa, o juiz, ao conceder a tutela especfica, fixar o prazo para o cumprimento da obrigao. 25Prof. Lcio Flvio Siqueira de Paiva

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Em casos tais, julgado procedente o pedido, o juiz fixar prazo para o cumprimento da obrigao, ou seja, para a entrega da coisa certa, sob pena de, conforme o caso, determinar a busca e apreenso da coisa, quando mvel, ou a imisso na posse, quando imvel. Poder, ainda, o julgador, dado o carter mandamental da deciso em tela41 arbitrar a multa por descumprimento prevista no artigo 461 (a famosa astreinte), em verdadeira combinao de mecanismos sancionatrios de sujeitao (busca e apreenso e imisso na posse) e mecanismos sancionatrios de induo (multa por tempo de atraso)42. No demais destacar que a execuo (ou como prefere o CPC, efetivao) dessa obrigao ocorre nos prprios autos da demanda cognitiva, dispensando a formao de processo de execuo autnomo, o que revela a adoo, pelo legislador, daquilo que se convencionou chamar de processo sincrtico, dispensando a tradicional e pouco eficiente executio ex intervallo. Tal opo legislativa, diga-se de passagem, que se iniciou com a efetivao das tutelas especficas, mostrou-se de tal modo eficiente, que acabou por ser estendida ao cumprimento da tutela genrica (obrigao de pagar), por fora da recente lei 11.232.05. 2.2 A Execuo para Entrega de Coisa Certa Fundada em Ttulo Executivo Extrajudicial O procedimento desse tipo de execuo, quando fundado em ttulo executivo extrajudicial, dar-se- em processo autnomo, que se inicial mediante demanda oferecida pelo credor e que se submete ao regramento dos artigos 621 a 628 do Cdigo de Processo Civil. Assim, nos termos do artigo 621 do CPC, o devedor de obrigao de entrega de coisa certa, constante de ttulo executivo judicial, ser citado para, dentro de 10 (dez) dias, satisfazer a obrigao ou, seguro o juzo (art. 737, II), apresentar embargos. A redao do artigo mencionado, reconhea-se, no das melhores, pois que d a impresso que o executado ser citado para, no prazo de dez dias contados da juntada do mandado citatrio aos autos, satisfazer a obrigao, mediante entrega da coisa, ou oferecer embargos, mediante depsito da mesma. Todavia, no bem assim. O executado, uma vez citado, ter o prazo de dez dias para entregar a coisa, satisfazendo a obrigao o que, por bvio, ter o condo de encerrar o processo -, ou o mesmo prazo de dez dias para depositar a coisa em juzo, caso pretenda oferecer embargos execuo. Seguro, ento, o juzo, pelo depsito, abrir-se-ia novo prazo para o oferecimento dos embargos. Ocorre que a lei 11.382/06 promoveu profunda alterao na sistemtica dos embargos do devedor inclusive revogando o art. 737 do CPC, a que o artigo 621 faz expressa meno -, sendo duas dessas alteraes dignas de meno pois que importam ao estudo do artigo 621 do CPC: (i) a primeira a desnecessidade atual de prvia garantia do juzo para o oferecimento de embargos; (ii) a segunda, o prazo que agora de 15 dias, contados da juntada aos autos do processo do mandado citatrio devidamente cumprido. Assim, surgem os seguintes questionamentos: haveria ainda a necessidade, para o oferecimento de embargos execuo para entrega de coisa certa, de prvia garantia do juzo, ou seja, do depsito da coisa? Outrossim, qual seria o prazo para tal oferecimento?41

Ressalta-se, por oportuno, que no se pretende, nesse momento, ingressar na polmica da classificao das eficcias preponderantes da sentena, se trinaria ou quinria. De todo modo, no se pode negar que, mesmo admitindo-se que as sentenas mandamentais nada mais so do que espcies de sentena de eficcia condenatria, a sua subclassificao em mandamental e executiva lato sensu tem, no mnimo, forte apelo didtico, razo pela optou-se por adotar essa denominao no texto. 42 Sobre o tema, consultar a magnfica obra de Eduardo Talamini, Tutela Relativa aos Deveres de Fazer e No Fazer.

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ALEXANDRE FREITAS CMARA43 assim se posiciona sobre tais questes: Agora, de se considerar que o executado citado para, em dez dias, entregar a coisa ao exeqente. Feita a entrega, extinguir-se- a execuo. Poder, ainda, o executado oferecer a coisa em depsito, no mesmo prazo de dez dias e, com isso, evitar a incidncia de multa. O depsito, porm, deixou de ser exigido para oferecimento dos embargos do executado, cabveis em quinze dias a contar da juntada aos autos do mandado de citao devidamente cumprido. A essa interpretao aderimos, bem como parcela da doutrina, como se extrai das lies de PAULO HENRIQUE LUCON44. De fato, citado, as seguintes atitudes podem ser adotadas pelo executado: (i) entrega a coisa no prazo de 10 dias, encerrando-se a execuo pois que satisfeita a obrigao; (ii) no deposita a coisa e oferece embargos no prazo de 15 dias, contados da juntada aos autos do mandado citatrio cumprido; (iii) deposita e coisa e oferece embargos, nesse mesmo prazo; (iv) queda-se inerte. O pargrafo nico do mesmo dispositivo assevera, a seu turno, que o juiz pode determinar a aplicao de multa diria pelo descumprimento da obrigao. Caso queira o devedor forrarse a esse risco deve ou cumprir a obrigao no prazo de 10 dias ou, ento, depositar a coisa nesse mesmo prazo e discutir a obrigao em sede de embargos. Pode ainda ocorrer que o devedor, devidamente citado deixa transcorrer in albis o prazo de 10 dias, momento em que o juiz determinar ou a busca e apreenso da coisa, ou a imisso na posse, conforme se trate de coisa mvel ou imvel artigo 625 do CPC. Nos termos do artigo 626, estando a coisa em poder de terceiro, contra este ser lavado mandado para apreenso da coisa, sendo que se abre a esse terceiro a possibilidade de defender a sua posse pelo procedimento especial dos embargos de terceiro. Outrossim, pode ocorrer de ter a coisa certa perecido, fato que acarretar a transformao da execuo em quantia certa, mediante prvia liquidao (pelo mecanismo dos j estudados artigos 475-A usque 475-H), ou diretamente, quando o ttulo extrajudicial j trouxer o valor da coisa. Finalmente, havendo benfeitorias feitas pelo executado, dever ser observado o artigo 628 do CPC, uma vez que, nesse caso, o executado, autor das benfeitorias, tem direito de ser indenizado. Em casos tais, segundo a sempre lcida lio de ALEXANDRE FREITAS CMARA45, tendo o executado realizado benfeitorias indenizveis na coisa, no poder o exeqente receb-la antes da liquidao de seu valor. Havendo saldo em favor do autor das benfeitorias, este dever ser depositado pelo demandante quando requerer o levantamento do bem; havendo saldo em favor do demandante ( o que pode ocorrer quando o demandante tambm for credor de alguma quantia em dinheiro, operando-se a compensao dos crditos com saldo em seu favor), este poder execut-lo nos mesmos autos (art. 628). 3. A EXECUO PARA ENTREGA DE COISA INCERTA O procedimento para a entrega de coisa incerta respeita, assim como aquele tratado no item anterior (entrega de coisa certa), variao procedimental quando for aparelhado por ttulo judicial ou extrajudicial. Quando a execuo for embasada neste ltimo, ter-se- processo43 44 45

ALEXANDRE FREITAS CMARA, Lies de Direito Processual Civil, Lmen Jris, 2006.

PAULO HENRIQUE LUCON e outros, Cdigo de Processo Civil Interpretado, Ed. Atlas, 3 Ed. 2008.ALEXANDRE FREITAS CMARA, Lies de Direito Processual Civil, Lmen Jris, 2006.

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autnomo, seguindo o rito previsto nos arts. 629 a 631 do CPC; quando for embasado no primeiro, ser executiva lato sensu, em sistema sincrtico de cognio e execuo (separado por fases e no processos), nos termos dos artigos 461 e 461-A do CPC. Remete-se, pois, o leitor, s consideraes sobre esse tema que foram expendidas no item 02 supra. 3.1. Coisa Incerta x Coisa Fungvel A questo que inicialmente se coloca quando se comenta o procedimento em tela definirse o que se pode entender por coisa incerta. Nesse particular, alguma divergncia doutrinria se constata, mormente no que tange a se saber se coisa incerta e coisa fungvel seriam a mesma coisa. A disputa noticiada decorre do prprio texto legal, que define como coisa incerta aquelas determinadas pelo gnero e quantidade, conceito que adequado, por vezes, tanto para coisas efetivamente incertas, quanto para coisas fungveis, o que conduziu parcela da doutrina a no fazer diferena entre ambos. No entanto, como bem ressalta LUIZ RODRIGUES WAMBIER46, coisa fungvel e coisa incerta no coincidem necessariamente. H exemplo elucidativo, comumente formulado: a obrigao de entregar um quadro de Picasso recai sobre coisa incerta (h de se definir um dentre tantos quadros do pintor), mas nem por isso se trata de bem fungvel, na medida em que cada quadro do artista nico e insubstituvel. Mas tambm no certo afirmar que jamais ser necessria a individualizao de bens fungveis. Recorra-se a outro exemplo mais uma vez apresentado pela doutrina: a obrigao de entregar mil sacas de soja tem por objeto bens fungveis, e, no entanto, poder ser necessrio o procedimento de escolha, a fim de definir qual o tipo desse cereal deve ser entregue. Em suma, caber a execuo para a entrega de coisa incerta toda vez que o ttulo confira ao credor ou ao devedor a incumbncia de individualizar o bem, a partir de seu gnero e quantidade, pouco importando sua relativa fungibilidade intrnseca. ALEXANDRE CMARA, por sua vez, acolhendo lio do emrito professor BARBOSA MOREIRA, entende de maneira diferente, aduzindo que, sempre que for fungvel a coisa, dever se submeter execuo para a entrega de coisa certa, porquanto a coisa fungvel, por definio, pode ser substituda por outra do mesmo gnero, qualidade quantidade. Deste modo, sendo algum obrigado a entregar dez sacas de feijo preto, pouco importa j que a qualidade deve ser sempre a mesma se so entregues essas ou aquelas sacas. Assim, parece mais adequado considerar que o CPC, ao tratar da execuo para entrega de coisa incerta, est se referindo s hipteses em que algum obrigado a entregar coisa indeterminada (mas determinvel), devendo o objeto a ser entregue ser escolhido entre coisas de qualidade diversa.47 A nosso ver, a despeito das sempre felizes lies de CMARA e BARBOSA MOREIRA, assiste razo parcela da doutrina que, simplificando o raciocnio, afirma ser cabvel, em regra, a execuo para entrega de coisa certa sempre que fungveis os bens, salvo se se mostrar necessrio, no caso concreto, a prvia individualizao da coisa, ocasio em que se deve inicialmente obedecer o procedimento da execuo para entrega de coisa incerta.

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Luiz Rodrigues Wambier et alli, Curso Avanado de Direito Processual Civil 2, RT, 2006. ALEXANDRE CMARA, Lies de Direito Processual Civil, Lmen Jris, 2006.

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3.2. O Procedimento O primeiro passo do procedimento determinar-se a quem incumbe a escolha da coisa: se ao credor, dever este indic-la na petio inicial (seja na inicial da demanda cognitiva, que ter por base o artigo 461-A do CPC, seja na inicial da ao de execuo do ttulo extrajudicial que determine a obrigao de entregar coisa incerta). Cabendo a escolha ao devedor, este ser citado para, ou fazer a escolha na contestao da demanda cognitiva, ou, no caso de execuo de ttulo extrajudicial, ter o devedor o prazo de dez dias para entregar a coisa ou deposit-la para que possa oferecer embargos. Natural concluir, nesse particular, que o devedor, ao entregar a coisa ou deposit-la para oferecer embargos, j a ter escolhido. Quedando-se inerte, porm, o devedor, em qualquer caso a escolha passa a ser do credor. Feita a escolha incidente que se denomina concentrao da obrigao -, a parte contrria ou seja, aquela que submete escolha poder oferecer impugnao no prazo de 48 horas. Caso seja o devedor quem formule tal impugnao, at que seja a mesma decidida, restar suspenso o prazo para o oferecimento dos embargos. Resolvido o incidente de acerca da concentrao da obrigao, dever ser observado o procedimento aplicvel execuo para a entrega de coisa certa. 4. EXECUO DAS OBRIGAES DE FAZER E NO FAZER Na execuo das obrigaes de fazer e no fazer, uma vez mais se mostra pertinente destacar que o procedimento ser diferenciado, conforme a natureza do ttulo que aparelha a execuo. Quando fundada em ttulo executivo judicial, far-se- conforme o artigo 461 do CPC, que trata da tutela especfica, dispositivo que, por tantas vezes ter recebido comentrios ao longo do presente resumo, dispensa maiores aprofundamentos nessa passagem. Passa-se, pois, diretamente anlise dos artigos que tratam da execuo das obrigaes de fazer e no fazer quando fundada em ttulo extrajudicial, cujas tcnicas podem tambm receber aplicao subsidiria dos dispositivos destinados efetivao dessas obrigaes quando fundadas em sentena. 4.1. Execuo das obrigaes de fazer quando fundada em ttulo extrajudicial Essa execuo, quando aparelhada por ttulo extrajudicial, iniciar-se- pela apresentao, em juzo, de uma petio inicial, na qual o credor requerer, nos termos do artigo 632 do CPC, a citao do executado para que satisfaa a obrigao no prazo que o juiz lhe assinalar, se outro prazo no estiver determinado no ttulo executivo extrajudicial. O juiz, ento, estando em termos a petio, determinar a citao do devedor para que, em prazo especfico, cumpra a obrigao ou oferea embargos, sob pena de incidir em multa diria pelo atraso, nos termos do artigo 645 do CPC, que assevera: na execuo de obrigao de fazer ou no fazer, fundada em ttulo extrajudicial, o juiz, ao despachar a inicial, fixar multa por dia de atraso no cumprimento da obrigao e a data a partir da qual ser devida. Uma vez recebida a inicial, fixado prazo para o cumprimento e eventualmente arbitrada a multa pelo atraso no cumprimento da obrigao, o devedor ser citado, ocasio em que, 29Prof. Lcio Flvio Siqueira de Paiva

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conforme lio do Professor LUIZ RODRIGUES WAMBIER48, trs alternativas no procedimento sero abertas: 1) o executado atende ao mandado, cumprindo a obrigao de fazer. Nesse caso, o processo de execuo ter atingido sua finalidade a satisfao do credor -, razo pela qual dever receber sentena que o extinga, declarando cumprida a obrigao. 2) o devedor prope embargos execuo, no prazo de 15 dias contados da juntada, aos autos da execuo, do mandando citatrio cumprido. Ressalte-se que esse prazo, ou seja, 15 dias, para embargar, deve ser observado como prazo geral de embargos s execues fundadas em ttulos extrajudiciais. 3) o devedor nem embarga a execuo e nem cumpre a obrigao, momento a partir do qual, alm da passar a incidir a multa diria, a execuo prosseguir rumo tentativa de promover a satisfao da obrigao. Diz-se tentativa por ser imprescindvel, nesse momento, a perquirio quanto fungibilidade ou no da prestao devida. Sendo absolutamente infungvel, dever ser convertido o procedimento em perdas e danos, com uma liquidao incidente e seguindo-se, da em diante, a sistemtica da execuo por quantia certa. Pode ser, entretanto, que conquanto infungvel, seja possvel a obteno do resultado prtico equivalente49, ocasio em que o credor poder optar ou por esse resultado prtico equivalente o que se obtm atravs da prestao da obrigao de fazer por ato de terceiro ou pela converso da obrigao em perdas e danos, seguindo, por bvio, de liquidao incidente e execuo por quantia certa. Outrossim, tratando-se de obrigao de fazer fungvel, poder a mesma ser prestada por terceiro ou, ainda, convertida em perdas e danos, conforme claramente assevera a norma do artigo 633: se, no prazo fixado, o devedor no satisfizer a obrigao, lcito ao credor, nos prprios autos do processo, requerer que ela seja executada custa do devedor, ou haver perdas e danos; caso em que ela se converte em indenizao. 4.2. Execuo das obrigaes de no fazer quando fundada em ttulo extrajudicial Regra geral, execuo das obrigaes de no fazer aplica-se o procedimento que regula as obrigaes de fazer. Isto pois, conforme bem observa ALEXANDRE FREITAS CMARA, citando lio de MENDONA LIMA, no existe, em verdade, uma execuo por ttulo extrajudicial de obrigao de no fazer. Tal afirmativa decorre do fato de que no existe mora nesse tipo de execuo. A obrigao de no fazer uma obrigao negativa, e estar sendo cumprida enquanto o obrigado no realizar a atividade a que est obrigado a no fazer.50 Com efeito, a execuo das obrigaes de no fazer apenas tem lugar quando o executado pratique o ato que lhe era vedado, vindo o exequente a juzo pleitear o desfazimento do mesmo, conforme demonstra a cristalina redao do art. 642: se o devedor praticou o ato, a cuja absteno estava obrigado pela lei ou pelo contrato, o credor requerer ao juiz que48 49

Luiz Rodrigues Wambier, Curso Avanado de Processo Civil vol. II, RT, 2006. Alexandre Cmara cita exemplo esclarecedor: o que se d, por exemplo, no caso da indstria obrigada a colocar filtros em suas chamins para impedir a emisso da gases poluentes. Embora se trate de obrigao infungvel, possvel alcanar-se resultado prtico equivalente (atravs, por exemplo, de provimento judicial que determine o fechamento da empresa). 50 Alexandre Freitas Cmara, obra citada, p. 259.

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lhe assine prazo para desfaz-lo. Ora, o ato de desfazer positivo, consistente em um fazer,motivo pelo qual, como se afirmou antes, aplica-se o procedimento para a execuo dessas obrigaes. 5. A EXECUO POR QUANTIA CERTA CONTRA DEVEDOR SOLVENTE No regime anterior lei 11.232/05, tanto a execuo por quantia certa fundada em ttulo judicial, quanto aquela aparelhada por ttulo extrajudicial seguiam exatamente o mesmo procedimento. Isso, ressalte-se, no acontecia quanto s execues de tutela especfica, que desde antes da lei 11.232/05 j possuam sistema prprio de efetivao nos prprios autos processos sincrticos quando fundadas em sentena. Entretanto, o legislador, provavelmente motivado pelo xito alcanado pelo sistema trazido pelos arts. 461 e 461-A do CPC, resolveu unificar as execues fundadas em ttulo judicial. A partir da lei 11.232/05, seja qual for a obrigao exeqenda, se fundada em ttulo judicial, ser processada segundo o instituto do cumprimento de sentena, tal como destacado no novel artigo 475-I do CPC: o cumprimento da sentena far-se- conforme os arts. 461 e 461-A desta Lei ou, tratando-se de obrigao por quantia certa, por execuo, nos termos dos demais artigos deste captulo. Em suma, com a unificao promovida pela lei 11.232/05, tambm a execuo por quantia certa dar-se- por processo sincrtico, dividido apenas por fases destinadas efetivao do direito reconhecido na sentena. Com efeito, agora as execues por quantia tambm comportam a mesma variao procedimental, a depender do ttulo que as aparelha: se ttulo judicial, cumprimento de sentena; se ttulo extrajudicial, execuo autnoma, nos moldes tradicionais, mas profundamente reformulado pela lei 11.382/06. Para obedecer a essa sistemtica, o presente trabalho, a exemplo do que at aqui ocorreu, analisar a execuo por quantia de acordo com as variantes decorrentes do ttulo executivo. 6. Do Cumprimento da Sentena (ou Execuo por Quantia Certa dos Ttulos Judiciais) Como bem destaca o Professor NELSON NERY JR.51, a grande reforma trazida pela lei 11232/05 foi desburocratizar o processo de execuo. Essa simplificao, segundo o autor, faz com a que as aes de conhecimento, liquidao e execuo, sejam processadas em seqncia, sem soluo de continuidade a execuo no se processa ex intervallo, mas sim sine intervallo. Com efeito, no h que se ter medo de firmar que a execuo em processo autnomo, ressalte-se - por quantia certa contra devedor solvente fundada em ttulo judicial no mais existe no direito brasileiro, tendo sido substituda pelo instituto ora em estudo, qual seja, o do cumprimento de sentena. O artigo 475-I, que inaugura essa parte da reforma, cristalino ao dispor: Art. 475-I. O cumprimento da sentena far-se- conforme os arts. 461 e 461-A desta Lei ou, tratando-se de obrigao por quantia certa, por execuo, nos termos dos demais artigos deste captulo.51

Obra citada, p. 640

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1. definitiva a execuo da sentena transitada em julgado e provisria quando se tratar de sentena impugnada mediante recurso ao qual no foi atribudo efeito suspensivo. 2. Quando na sentena houver uma parte lquida e outra ilquida, ao credor lcito promover simultaneamente a execuo daquela e, em autos apartados, a liquidao desta. O procedimento do cumprimento de sentena se inicia na forma do artigo 475-J, cujo caput assevera: Art. 475-J. Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou j fixada em liquidao, no o efetue no prazo de 15 (quinze) dias, o montante da condenao ser acrescido de multa no percentual de 10% (dez por cento) e, a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, inciso II, desta Lei, expedir-se mandado de penhora e avaliao. O artigo transcrito, por sua novidade, conduz a alguns questionamentos. O primeiro deles: a partir de que momento, ou seja, qual o termo a quo que deve ser levado em conta para a fluncia do prazo de 15 dias descrito no artigo? O tema, de contornos a princpio singelos, tem sido objeto de divergncia doutrinria e jurisprudencial. Formaram-se, at o momento, trs posies diferentes sobre a questo 52: a) a primeira, entende que o pr