2001 - delta - reestruturação do setor bancário
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Os principais fatores que estão definindo a reestruturação do setor bancário são os seguintes: regulação, competição, globalização e tecnologia.TRANSCRIPT
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Maio 2001 volume 1 número 2
Reestruturação do Setor Bancário Luiz Nelson Porto Araujo
Os principais fatores que estão definindo a reestruturação do setor bancário são os se-
guintes: regulação, competição, globalização e tecnologia. A adaptação à nova realidade
é fundamental para a sobrevivência das instituições financeiras, tendo no planejamento
estratégico o ponto mais importante para a obtenção de resultados e crescimento sus-
tentado. No caso particular do Brasil, o processo de reestruturação do setor também é
bastante relevante e com uma particularidade adicional, a estabilidade econômica. Um
dos principais efeitos desta estabilidade é a redução da receita do float, impactando
diretamente a rentabilidade de cada instituição e, por consequência, do setor como um
todo.
Um banco é um intermediário depositante
que toma emprestado recursos de unidades
econômicas superavitárias e empresta a uni-
dades deficitárias (tomadores). Ele faz essa
operação mais eficientemente do que os em-
prestadores e tomadores poderiam fazer in-
dividualmente, ou seja, o custo de transação
é diminuído quando a realocação de recur-
sos financeiros é realizada por um intermedi-
ário especializado.1
A visão corrente é de que os bancos estão
perdendo espaço para um espectro bastante
1. A literatura sobre este tema é bastante extensa,
tanto para o caso brasileiro quanto para o internacio-
nal. Ver, por exemplo, Barros, e Almeida Jr. (1997),
amplo de concorrentes não bancários, como
financeiras, fundos mútuos e fundos privados
de pensão, dentre outros, que estão ofere-
cendo produtos bancários tradicionais de
maneira mais eficiente. Os motivos determi-
nantes da entrada de concorrentes são: i) as
inovações tecnológicas eliminaram as vanta-
gens até então reservadas aos bancos; ii) os
novos competidores estão livres de regula-
ções custosas impostas sobre os bancos e
iii) o excesso de liquidez no mercado de ca-
pitais.
Benston et al. (1982), Berger et al. (1987), Harker e
Zenios (1998), Herring e Santomero (1995), Roth e
Jackson III (1995).
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As implicações deste novo ambiente concor-
rencial são muito importantes para a dinâ-
mica do setor bancário no mundo, em geral,
e no Brasil, em particular. O caso brasileiro é
ainda mais significativo quando se considera
que a dinâmica deste mercado é também di-
recionada por outros fatores, dentre eles: i)
a estabilização inflacionária induzida pelo
Plano Real e as suas implicações sobre a es-
trutura de receitas e despesas das institui-
ções bancárias; ii) o grau de inovação tecno-
lógica (em particular, da tecnologia bancária)
embebido no setor; iii) a escala concorrencial
trazida pela entrada de instituições estran-
geiras que atuam globalmente; iv) as inova-
ções regulatórias e as instituições que rede-
finiram o grau do risco sistêmico do sistema
bancário nacional; e v) o potencial de banca-
rização da população de baixa renda – po-
dendo, mesmo, ser considerado como um
instrumento de inclusão social.
Setor Bancário
A análise da dinâmica do setor bancário é
feita a partir de seis temas fundamentais: i)
organização, ii) estrutura organizacional, iii)
regulação, iv) competição, v) globalização e
vi) tecnologia.2
Organização
Os motivos que explicam a expansão deste
setor na segunda metade do século passado
são importantes na elaboração de cenários
futuros. Em geral, esta organização está cor-
relacionada com fatores estruturais da eco-
nomia (população, renda, emprego, inflação
e tecnologia).
2. Para uma discussão ver, por exemplo, Aghion e
Tirole (1995), Aoki (1986), Chandler (1962), Kolari e
Zardkoohi (1987), March e Simon (1993), Milgrom e
Estes fatores, no longo prazo, são determi-
nantes do desenvolvimento econômico, da
distribuição da renda e da penetração do se-
tor bancário nas atividades das empresas,
das famílias e do setor público.
Estrutura organizacional
No período recente pode-se observar mu-
danças, sem paralelo, no sistema de decisão
interno dos bancos e na sua estrutura orga-
nizacional. As mudanças, sem dúvida, irão
impactar a maneira como eles disponibilizam
seus serviços de maneira eficiente, o quão
eficientemente eles interagem com os seus
clientes e o quão eficazmente eles compe-
tem nos diversos segmentos do mercado.
Basicamente, duas estruturas organizacio-
nais são tradicionalmente analisada, inclu-
sive para bancos3
: a tipo-U e a tipo-M. As Fi-
guras 1a e 1b resumem os atributos destas
estruturas.
Atualmente, existe um debate se o banco
universal, como formatado em vários países
(desenvolvidos e em desenvolvimento), cor-
responde à estrutura organizacional mais
apropriada para se assegurar a competitivi-
dade de longo prazo destas instituições. De
fato, estudos demonstram que:
sistemas de informações centralizados
tendem a aumentar o custo total;
sistemas de entrega de produtos centra-
lizados (centralized product delivery),
em geral, tem um impacto insignificante
sobre o custo total; e
operações de back-office centralizadas
reduzem o custo de maneira significa-
tiva, um resultado consistente com a
Roberts (1992). Estes referências tratam do caso ge-
nérico de uma organização.
3. Para uma discussão ver, por exemplo, Qian
(1999).
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existência de economias de escala em
operações de back-office.
A teoria e a evidência empírica sugerem que
a estrutura organizacional mais eficiente é a
do tipo-M, onde decisões estratégicas são
tomadas pela administração central ou head
office, e as decisões operacionais são aloca-
das às divisões (funcionais). Estruturas ma-
triciais e em rede, também podem ser im-
plantadas em instituições bancárias.
Até o início dos anos 70, a estrutura tradici-
onal era a do tipo-U, onde as principais uni-
dades são as divisões funcionais. Com as
mudanças no sistema econômico e regulató-
rio e, em particular, o aumento da concor-
rência por instituições não-bancárias e a
desregulamentação geográfica e de produ-
tos, os bancos se reposicionaram a partir de
uma estrutura organizacional voltada para o
mercado, similar em muitos aspectos àquela
observada nas organizações do tipo-M.
Em termos comparativos, a estrutura organi-
zacional voltada para o mercado e a do tipo-
M separam a tomada de decisões estratégi-
cas da tomada de decisões no âmbito das
divisões operacionais (isto é, descentraliza-
ção), e possuem controles e incentivos inter-
nos que eliminam os problemas de oportu-
nismo, perda de controle e racionalidade li-
mitada, característicos de organizações do
tipo-U.
A principal característica desta estrutura or-
ganizacional voltada para o mercado é a ele-
vação dos departamentos de clientes e de
marketing à níveis superiores da instituição.
Os departamentos passam a ser organizados
em torno de grupos de clientes ao invés de
funções bancárias. Todos os produtos e fun-
ções necessários ao atendimento de um par-
ticular grupo de cliente tendem a ser aloca-
dos em único departamento. A estratégia
deste tipo de estrutura é essencialmente es-
tar no mercado certo, com o produto certo,
no momento certo.
Comparada com a estrutura do tipo-U, a es-
trutura voltada para o mercado é menos cen-
tralizada, menos especializada e um pouco
menos formalizada. Qualquer conflito é resol-
vido considerando-se os objetivos do banco,
ao invés das funções individuais, e os admi-
nistradores possuem responsabilidades pela
obtenção de resultados (em geral, lucrativi-
dade). Neste sentido, dificuldades de coor-
denação e controle são corrigidas através de
um sistema de incentivo mais efetivo e pela
eliminação de competição entre as unidades
funcionais.
Assim, com a mudança para uma estrutura
organizacional voltada para o mercado, par-
tiu-se de um sistema de atendimento des-
centralizado para um centralizado. Neste úl-
timo caso, um agente (o representante da
conta) é responsável por todas as necessida-
des do cliente com relação ao produto e à
sua entrega. Em outras palavras, o represen-
tante age como um intermediário entre os
clientes e os membros das áreas funcionais
do banco que de fato produzem os diversos
serviços. Ao contrário, em um sistema de
atendimento descentralizado, os funcioná-
rios de cada unidade funcional atendem aos
clientes diretamente.
A mudança para um sistema de atendimento
centralizado foi induzida por diversos fatores,
em particular:
sob um sistema descentralizado, os
bancos não conhecem a rentabilidade
geral dos seus clientes, na medida em
que existe pouca comunicação e coor-
denação entre as diversas unidades fun-
cionais;
a mudança para um sistema centrali-
zado aumenta a percepção do cliente
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com relação à qualidade do serviço, na
medida em que neste sistema os pro-
blemas são resolvidos por apenas um
representante ao invés de diversos es-
pecialistas funcionais;
os sistemas centralizados podem ser
mais eficientes, do ponto de vista dos
custos, de se atender aos clientes.
Regulação
Pressões competitivas levaram os países a
desregularem os seus respectivos setores
bancários, um elemento importante que per-
mitiu uma globalização ainda mais intensa.
De fato, antes de 1970, a maior parte dos
países desenvolvidos possuíam regulamen-
tações protetivas e restritivas sobre o setor
bancário.
Em geral, as taxas de juros pagas sobre os
depósitos eram fixas ou com um limite supe-
rior, e a divisão entre banking e atividades
securities-related era bastante restrita (como
por exemplo no Canadá, nos Estados Unidos
e no Japão), ou ao menos limitada (na Bél-
gica, Dinamarca, Espanha, Inglaterra e Itá-
lia).
Nos anos 90, a desregulação alterou drasti-
camente o ambiente global bancário em re-
lação àquele que existia na década de 1960.
No entanto, em diversos países, as ativida-
des de banking e de securities ainda perma-
necem separadas.
A elevação do nível e volatilidade das taxas
de juros, em grande parte resultantes de au-
mento no nível e na volatilidade da inflação,
deram aos depositantes e aos ofertantes de
serviços financeiros incentivos para contor-
narem barreiras regulatórias que criaram te-
tos sobre as taxas de juros em depósitos à
vista e restringiram a criação de contas cor-
rentes aos bancos comerciais.
Ao mesmo tempo, avanços tecnológicos em
telecomunicações e em sistemas computa-
cionais, que facilitaram a rápida e barata
transferência de recursos e informação entre
contas e entre instituições, também permiti-
ram contornar barreiras regulatórias.
Na verdade, grande parcela da desregulação
de jure apenas validou a desregulação de
facto induzida pelas forças de mercado.
Neste momento de desregulação da ativi-
dade bancária, o papel do Banco Central
como regulador e emprestador de última ins-
tância é fundamental. No entanto, ele não
deve assegurar todas as instituições inde-
pendentemente do seu comportamento ou
sucesso da sua operação, sob o risco de in-
duzir os bancos a ignorar o risco e não per-
mitir ao público diferenciar entre as diversas
instituições que ofertam seus produtos e ser-
viços no mercado.
Competição
A busca de economias de escala e de escopo
é uma das características mais marcantes do
setor bancário ao final do século passado e
início deste. Esta competição também está
associada à maior inserção de outras insti-
tuições em atividades tradicionalmente de-
senvolvidas por bancos.
Nos Estados Unidos, por exemplo, durante a
década de 1980 a distinção entre bancos de
investimento e bancos comerciais tornou-se
menos clara, na medida em que os últimos
passaram a responder à maior competição
no mercado de capitais através do aumento
dos empréstimos, provimento de garantias fi-
nanceiras e colocação direta de securities
para os seus clientes. A distinção entre os
bancos comerciais e outras linhas de comér-
cio também tornaram-se confusas quando
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os provedores não-bancários de serviços fi-
nanceiros, cada vez mais oferecem serviços
e produtos que competem com aqueles dos
bancos comerciais.
Um banco mais competitivo tem maiores
chances de auferir resultados positivos e, no
longo prazo, de sobreviver. A maior competi-
tividade pode ser alcançada ao se: i) oferecer
produtos e serviços para clientes mais sofis-
ticados e exigentes; ii) estabelecer diretrizes
para atendar às exigências técnicas e legais;
iii) comprar de fornecedores mais avançados
e globais e iv) tratar seus colaboradores
como permanentes.
Além disso, o acirramento da competição em
mercados globais deve induzir os bancos a
buscarem parcerias estratégicas, que facili-
tem: i) novos e melhores produtos e serviços;
ii) linhas de produtos e serviços mais "inteli-
gentes"; iii) maior e melhor acesso a merca-
dos; iv) tecnologia de ponta; v) maior oportu-
nidade de crescimento; vi) preços e risco me-
nores e vii) menos exigências e obstáculos
para investimentos.
Globalização
Um dos motivos que explicam a expansão
global do setor bancário na segunda metade
do século passado e início deste foi o cresci-
mento no número e tamanho das empresas
multinacionais. Estas empresas possuem
necessidades específicas que tornam a aber-
tura de subsidiárias no exterior um negócio
bastante atraente. Estas empresas são de-
mandantes de recursos para as mais diver-
sas operações (investimento, aquisição, co-
mércio exterior).
Tecnologia
As inovações tecnológicas também foram
importantes na globalização do setor bancá-
rio. Através da telecomunicação e de redes
de fibra ótica os bancos puderam ofertar no-
vos produtos e serviços como cartões de cré-
dito, factoring, commercial papers, atendi-
mento eletrônico (principalmente, caixas),
diversas modalidades de fundos de investi-
mento e operações de câmbio.
A tecnologia permitiu aos bancos competi-
rem fora das áreas tradicionais de mercado
e de produtos e permitiu a outras firmas ofe-
recerem serviços financeiros até então restri-
tos aos bancos comerciais. Desta maneira, o
número e tipo de firmas pertencentes ao se-
tor de serviços financeiros aumentou e a
competição intensificou-se.
Alguns dos principais efeitos das inovações
tecnológicas que devem redefinir o posicio-
namento competitivo das instituições bancá-
rias são:
vulnerabilidade: o nível de informação
sobre qualquer banco ficou mais acessí-
vel a todos (colaboradores, clientes e
concorrentes);
lentidão: as instituições maiores são,
em geral, mais lentas do que os indiví-
duos para acompanhar as mudanças;
além disso, são também mais lentas do
que instituições menores;
obrigações: as instituições buscam
constantemente o atendimento ao cli-
ente (satisfação e qualidade são, cada
vez mais, fundamentais);
versatilidade: as instituições oferecem
opções aos seus clientes; de fato,, a es-
colha se tornou tão importante quanto o
produto e o serviço ofertado; e
opções: a fragmentação do mercado
gera novas oportunidades; no entanto, o
foco da instituição deve ser mantido.
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Reestruturação do Setor
A adaptação à nova dinâmica setorial é fun-
damental para a sobrevivência das institui-
ções bancárias, tendo no planejamento es-
tratégico um dos temais mais importantes
para a obtenção de resultados e o cresci-
mento sustentado.
Em função desta dinâmica este setor deve
ajustar o seu posicionamento estratégico
contemplando, em particular, as seguintes
dimensões: i) direcionamento das atividades
operacionais e ii) controle de riscos.
O ajuste deve envolver o redirecionamento
das atividades operacionais, com a volta das
funções tradicionais de intermediário entre
as unidades superavitárias e as deficitárias e
a reavaliação dos recursos empregados na
operação. No caso particular do Brasil, com
a redução do float, a prestação de serviços
ao cliente tornou-se de fato a única maneira
das instituições bancárias continuarem a
existir em um ambiente cada vez mais com-
petitivo.
Neste reposicionamento estratégico o con-
trole de riscos tem um papel fundamental,
na medida em que a sua assunção é ine-
rente à própria atividade bancária. No caso,
o problema dos bancos é a gestão – e nesta,
a mitigação – de riscos e não o avoidance.
Como a má gestão pode levar até mesmo à
quebra da instituição, o controle das opera-
ções e a gestão de riscos em mercados no-
vos e distantes tornou-se um desafio ainda
mais importante.
O risco na atividade bancária aumentou por
diversos motivos, dentre eles:
o maior nível e volatilidade das taxas de
juro;
as inovações tecnológicas, que permi-
tem a transferência imediata e quase a
custo zero de recursos e que aumentam
a importância, o custo e a complexidade
dos sistemas de controles internos e de
monitoramento;
ao crescimento e sofisticação dos mer-
cados financeiros, além da introdução
de novos instrumentos financeiros;
às variações (subidas e descidas) rápi-
das no preço dos ativos imobiliários,
energéticos e agrícolas;
às restrições financeiras em países em
desenvolvimento e desenvolvidos; e
à globalização dos mercados.
Reestruturação do Setor no Brasil
No caso particular do Brasil, o processo de
reestruturação do setor também é bastante
relevante e com uma particularidade adicio-
nal: a estabilidade econômica. Um dos prin-
cipais efeitos desta estabilidade é a redução
da receita do float, impactando diretamente
a rentabilidade de cada instituição e, por
consequência, do setor como um todo.
Este processo de reestruturação deve impli-
car em:
consolidação de bancos através de ope-
rações de fusão e de aquisição;
redução do número de colaboradores e
de agências;
investimento em tecnologia de trans-
missão de dados e processamento de
informações;
busca de novas fontes de receitas; e
definição estratégica do nicho de atua-
ção da instituição.
É importante ressaltar que a adaptação à
nova realidade que define o setor (organiza-
ção, estruturação organizacional, regulação,
competição, globalização e tecnologia) é fun-
damental para a sobrevivência e o cresci-
mento das instituições nacionais, tendo no
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planejamento estratégico e na busca de no-
vas fontes de receitas e rentabilidade os pon-
tos mais relevantes.
No caso brasileiro, os principais temas locais
que irão definir a reestruturação do setor são
resumidos a seguir. Alguns deles já estão
praticamente concluídos, enquanto que ou-
tras ainda estão em discussão, elaboração
e/ou implantação.
Acordo da Basiléia
A adequação ao Acordo da Basiléia foi feita
pela Resolução n° 2099, de 17/08/94, do
Conselho Monetário Nacional - CMN. Se-
gundo esta Resolução, os bancos devem
adequar-se à exigência de capital mínimo re-
alizado e patrimônio líquido, obtido pela pon-
deração dos ativos pelo risco, até o final de
1994 e cumprir os novos limites de capital
mínimo exigido pelo Banco Central do Brasil
- BACEN até o final de maio de 1995.
A principal mudança em relação às regras
anteriores está na transferência do cálculo
da capacidade de alavancagem de cada
banco do passivo para o ativo. O risco ope-
racional de uma dada instituição passa a ser
medido de acordo com o tipo de aplicação
feita com o capital que ela administra e não
mais pelo volume de recursos captados.
Como consequência, o endividamento má-
ximo dos bancos é reduzido.
Para evitar que as instituições financeiras
concentram suas aplicações em ativos de
risco zero sem limitação de volume, o BACEN
manteve a regra anterior ao Acordo de limite
de alavancagem de 15 vezes o patrimônio lí-
quido para o endividamento com recursos
captados de terceiros.
O cálculo do valor do patrimônio líquido exi-
gido para o enquadramento nas novas regras
representa a aplicação de 8% sobre o ativo
ponderado pelo percentual de risco. Nas re-
gras originais do Acordo, os ativos bancários
são classificados em cinco categorias de
risco. No Brasil, foram reagrupados em 4
classes.
PROER
A Resolução BACEN n° 2208, de 03/11/95,
instituiu no Banco Central o Programa de Es-
tímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento
do Sistema Financeiro Nacional - PROER. O
PROER é implementado por meio de reorga-
nizações administrativas, operacionais e so-
cietárias, previamente autorizadas pelo
BACEN, que resultem em transferência de
controle acionário de instituição financeira,
ou na modificação de seu objeto social para
finalidades não privativas de instituições in-
tegrantes do sistema.
O objetivo do PROER é assegurar liquidez e
solvência ao Sistema Financeiro Nacional e
resguardar os interesses de depositantes e
investidores.
O PROER compreende:
linha especial de assistência vinculada
à: i) títulos ou operações de responsabi-
lidade do Tesouro Nacional ou de enti-
dades da administração federal direta;
ii) perdas decorrentes do processo de
saneamento; iii) gastos com redimensi-
onamento e reorganização administra-
tiva e decorrentes de reestruturação e
modernização de sistemas operacio-
nais; e iv) desmobilização de ativos de
propriedade da instituição financeira
dele participante;
liberação de recursos do recolhimento
compulsório/encaixe obrigatório sobre
recursos à vista para aquisição de Certi-
ficados de Depósitos Bancários - CBDs
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de emissão de instituições participantes
do PROER;
flexibilização do atendimento dos limites
operacionais aplicáveis às instituições fi-
nanceiras (redução da obrigatoriedade
de que o banco comprador tenha patri-
mônio superior a 2,2 vezes o patrimônio
da instituição resultante da fusão, defi-
nida no Acordo da Basiléia (conforme
Resolução BACEN n° 2.099/94); e
diferimento dos gastos relativos aos cus-
tos, despesas e outros encargos com a
reestruturação ou modernização de ins-
tituições financeira.
FGC
O estabelecimento formal de sistemas de ga-
rantia de depósito é uma tendência global a
partir da 1990. No Brasil, a Resolução
2.197, de 31/08/95, do CMN, autorizou a
"constituição de entidade privada, sem fins
lucrativos, destinada a administrar mecanis-
mos de proteção a titulares de créditos con-
tra instituições financeiras".
A Resolução BACEN n° 2.211, de 16/11/95,
aprovou o Estatuto e Regulamento do Fundo
Garantidor de Créditos - FGC, associação civil
sem fins lucrativos, com personalidade jurí-
dica de direito privado. Esta Resolução tam-
bém fixou em 0,025% do montante dos sal-
dos das contas correspondentes às obriga-
ções objeto de garantia, a contribuição men-
sal das participantes do FGC.
A Circular BACEN n° 2.657, de 17/01/96, es-
tabeleceu a base de cálculo para a determi-
nação das contribuições das participantes do
FGC e os procedimentos para o seu recolhi-
mento:
a base de cálculo é o saldo apresen-
tado, ao final de cada mês, nos títulos e
4. Entre junho de 1997 e dezembro de 2000, sete
operações de privatização foram concluídas. Outras
subtítulos do COSIF relacionados no
Anexo desta Circular; e
o recolhimento será feito eletronica-
mente, por intermédio do Serviço de
Compensação de Cheques e Outros Pa-
péis – SCCOP.
Privatização e PROES
O Decreto-lei n° 2.321, de 25/02/87, já
identificava como alternativas a federaliza-
ção e privatização de instituições financeiras
sob intervenção ou regime de administração
temporária. Como exemplo, pode-se citar o
Banco Meridional, que pertencia ao Governo
do Estado do Rio Grande do Sul e que, de-
pois de federalizado, encontra-se incluído no
PND.
A Medida Provisória n° 841, de 20/01/95, al-
terou a Lei n° 8.031, de 12/04/90, que criou
o Programa Nacional de Desestatização -
PND. Esta Medida Provisória incorporou ao
PND as instituições financeiras controladas,
direta e indiretamente, pela União e também
os bancos estaduais, que tenham as suas
ações do seu capital social desapropriadas
por força de intervenção ou regime de admi-
nistração especial temporária, decretada
pelo BACEN.4
No ano seguinte, a Medida Provisória n°
1.514, de 07/08/96, estabeleceu mecanis-
mos objetivando incentivar a redução da pre-
sença do setor público estadual na atividade
financeira bancária e dispôs sobre a privati-
zação de instituições financeiras. Em se-
guida, a Resolução BACEN n° 2.365, de
28/02/97, instituiu no Banco Central o Pro-
grama de Incentivo à Redução do Setor Pú-
blico Estadual na Atividade Bancária -
três instituições financeiras estão em processo de pri-
vatização.
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PROES, no âmbito dos mecanismos estabe-
lecidos na Medida Provisória n° 1.556-7, de
13/02/97.
O PROES instituiu duas linhas de crédito des-
tinadas à renegociação dos passivos dos
bancos estaduais, sujeitas à medidas admi-
nistrativas e societárias. A primeira previa um
financiamento de 100% do total das dívidas
caso o banco estadual fosse privatizado,
transformado em agência de fomento ou ex-
tinto. A segunda linha de crédito previa um
financiamento de 50% do total das dívidas
caso o Estado optasse pelo saneamento de
sua instituição financeira.
A Tabela 1 apresenta as instituições financei-
ras estaduais que foram privatizadas no âm-
bito deste Programa, até 31/12/00. O Banco
do Estado do Rio de Janeiro - BANERJ foi o
primeiro banco estadual a ser privatizado
dentro do PROES. Em seguida, foram privati-
zadas as seguintes instituições: Credireal,
Bemge, Bandepe, Baneb, Banestado e Ba-
nespa. Estão em processo de privatização as
seguintes instituições: BEG, BEA e Paraiban.
Outros ajustes
O processo de reestruturação do setor ban-
cário no Brasil deve, necessariamente, impli-
car no estabelecimento de nova regulação
setorial, considerando-se em particular:
a regulamentação, por lei complemen-
tar, do art. 192 da Constituição Federal,
referente ao sistema financeiro nacio-
nal. A definição das regras de funciona-
mento do sistema financeiro ainda não
foram definidas, permanecendo em vi-
gor as disposições da lei; e
a privatização das instituições financei-
ras estaduais.
Resultados da Reestruturação
Algumas das principais tendências para o se-
tor, decorrentes do processo de reestrutura-
ção em curso são: i) a queda das barreiras
geográficas à competição, ii) a redução e eli-
minação, em alguns casos, das barreiras tra-
dicionais à competição entre os diferentes ti-
pos de instituições financeiras e iii) a inten-
sidade e velocidade das inovações tecnológi-
cas.
Primeiro, a queda das barreiras à competição
deve ter como consequência, um papel mais
importante às atividades de supervisão e de
regulação, na medida em que a extensão ter-
ritorial será ainda maior. Além disso, a coor-
denação entre diferentes supervisores e re-
guladores deve ser acentuada. Nesta coor-
denação está compreendida a necessidade
de se desenvolver mecanismos para a troca
de informações entre as diferentes autorida-
des.
Segundo, a redução das barreiras tradicio-
nais à competição entre instituições financei-
ras, também deve induzir a necessidade de
os supervisores terem maior conhecimento
das instituições, de maneira a entender e
monitorar os riscos associados com um es-
pectro novo de produtos e serviços.
Por fim, a intensidade e velocidade das ino-
vações tecnológicas induzem, diretamente,
inovações financeiras, tanto nos mercados
quanto nos produtos e serviços. Estas mu-
dança reduziram significantemente as restri-
ções tradicionais sobre a assunção de riscos
e facilitaram a redução do horizonte de re-
torno, permitindo aos participantes do mer-
cado serem mais agressivos e os mercados
mais voláteis.
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No caso brasileiro, os seguintes resultados
deste processo de reestruturação são espe-
rados: i) novos mecanismos para mitigação
dos riscos, ii) redimensionamento da mão-
de-obra empregada, iii) redirecionamento
das atividades operacionais, iv) inserção de
bancos estrangeiros, v) identificação de ni-
chos de mercado e racionalização dos custos
e vi) fontes de recursos para financiamento
de longo prazo.
Primeiro, com a estabilização da inflação, os
riscos assumidos pelas instituições bancá-
rias durante o período anterior de inflação e
volatilidade elevada devem ser reduzidos. No
entanto, novas fontes de risco irão surgir
neste novo cenário, em grande parte decor-
rentes da globalização dos mercados e da
maior concorrência.
Segundo, o redimensionamento da mão-de-
obra é uma das principais questões no âm-
bito deste processo de reestruturação. Existe
previsão de que com a utilização mais in-
tensa de tecnologia, o volume de emprego
irá reduzir-se. Com a estabilização e posterior
queda das taxas de juros, a demanda por
crédito pessoal e corporativo deve expandir-
se. Em consequência, a avaliação de riscos
das operações bancárias deve tornar-se
ainda mais relevante, particularmente o
acompanhamento da inadimplência.
Terceiro, o ajuste deve envolver o redirecio-
namento das atividades operacionais, com a
volta das funções tradicionais de intermediá-
rio entre as unidades superavitárias e as de-
ficitárias e a reavaliação dos recursos empre-
gados na operação.
Quarto, os bancos estrangeiros devem apro-
veitar o novo cenário financeiro nacional para
expandir suas operações, introduzindo novos
produtos e serviços, e exacerbando as pres-
sões competitivas dentro do setor. Os ajustes
mais profundos serão efetuados pelas insti-
tuições bancárias oficiais, em particular as
estaduais.
Quinto, a identificação de nichos de mer-
cado, conjuntamente com a racionalização
dos custos operacionais (em particular, mão-
de-obra, aluguéis e tecnologia) são desafios
que também devem ser equacionados pelas
instituições durante o processo de reestrutu-
ração.
Sexto, com o esgotamento das origens tradi-
cionais de recursos, o setor bancário depara-
se com a necessidade de buscar novas fon-
tes estáveis para o financiamento de longo
prazo. Uma alternativa é o Sistema de Previ-
dência Complementar. Este Sistema permite
compatibilizar prazos e taxas com retorno de
investimento de longo prazo, fundamental no
financiamento de atividades de longo prazo.
Nos países mais desenvolvidos, o patrimônio
destes fundos já tornou-se bastante rele-
vante, financiando inclusive exportações (por
exemplo, no caso do Japão).
Neste novo cenário espera-se que a perfor-
mance das instituições seja distinta, na me-
dida em que algumas delas terão vantagens
competitivas sobre as demais. Será perfeita-
mente visível para a autoridade monetária, e
mesmo o público em geral, as instituições
vencedoras e as perdedoras. Em consequên-
cia, espera-se também uma migração de ne-
gócios das últimas para as primeiras, com as
expectativas se auto realizando. Este pro-
cesso de seleção natural deve encorajar a
consolidação bancária no país, com as insti-
tuições mais poderosas absorvendo (medi-
ante fusões ou aquisições) as mais fracas.
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DELTA ECONOMICS AND FINANCE 11
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DELTA ECONOMICS & FINANCE 12
Figura 1a – Estrutura organizacional tipo-U
Figura 1b – Estrutura organizacional tipo-M
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DELTA ECONOMICS AND FINANCE 13
Tabela 1 - Privatização de bancos estaduais (1997/2000)
Instituição Data do leilão Comprador Valor (R$ milhões) Ágil (em %)
Banerj 26/06/97 Itaú 311,10 0,6
Credireal 07/08/97 BCN 134,20 10,9
Bemge 14/09/98 Itaú 603,06 92,0
Bandepe 17/11/98 ABN-Amro 182,90 0,0
Baneb 22/06/99 Bradesco 267,80 6,3
Banestado 17/10/00 Itaú 1.799,26 346,5
Banespa 20/11/00 Santander 7.160,92 287,1
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Luiz Nelson Porto Araujo, economista, é sócio-diretor da Delta Economics & Finance. Foi Professor do De-
partamento de Planejamento e Análise Econômica da EAESP-FGV e da FCECA da Universidade Macken-
zie.
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