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Criminalidade Empresarial: Breves reflexes poltico-criminais sobre o tratamento
dos crimes fiscais no Brasil e na Espanha.
Jos Maria Panoeiro
RESUMO: O presente trabalho se prope a investigar o desenvolvimento de uma
poltica criminal para a criminalidade empresarial. Para tanto realiza uma anlise
conjunta dos sistemas brasileiro e espanhol em relao aos delitos fiscais.
ABSTRACT: The present study aims to investigate the development of a criminal
policy for corporate crime. For that performs a joint analysis of brazilian and spanish
systems in relation to tax offenses.
PALAVRAS-CHAVE: Criminalidade Empresarial Poltica Criminal Delitos Fiscais
Comparao entre os sistemas brasileiro e espanhol.
KEY-WORDS: Corporate crimes Criminal Policy Tax offenses - Comparison
between brazilian and spanish systems.
Sumrio: 1. Delimitao do tema. 2. Criminalidade Empresarial e Direito Penal. 3.
Sistema Brasileiro: Do regramento vacilante do pagamento extintivo da punibilidade.
Da autonomia das instncias prejudicial administrativa (Smula Vinculante 24/STF).
4. Sistema Espanhol: Da prejudicial administrativa prejudicial penal. Do regramento
legal do pagamento extintivo da punibilidade. 5. Concluso.
1. Delimitao do tema.
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Tratar da criminalidade empresarial nos dias atuais imergir num rol de temas
extremamente vasto que vai da opo poltico-criminal pela criminalizao ao concurso
de agentes, no sem passar pela problemtica dos bens jurdicos supraindividuais, do
erro jurdico penal ou, enfim, debater a (im)possibilidade de uma responsabilidade penal
da pessoa jurdica. Cumpre, porm, uma advertncia, por razes metodolgicas, para
garantir uma maior fidelidade do texto doutrina citada, preservou-se as citaes na
lngua original, permitindo ao leitor exercer de forma mais ampla a crtica ao texto.
Feita tal advertncia, volta-se o presente trabalho para a Poltica Criminal
desenvolvida, tanto no Brasil como na Espanha, para os delitos fiscais e em face da
criminalidade empresarial. Assim porque como disseram Jescheck e Weigend la
Poltica criminal se ocupa de la pregunta acerca de como dirigir al Derecho penal para
poder cumplir de la mejor forma posible su misin de proteger a la sociedade.1
Desta forma busca-se, atravs de uma viso panormica das opes poltico-
criminais nos sistemas jurdicos, investigar a adequao, ou no, da poltica
empreendida em face de um dos mais frequentes crimes empresariais, o delito fiscal.
Destarte, o juzo sobre o acerto ou desacerto das escolhas do legislador passa,
ao que parece, pela compreenso do que e o que representa a criminalidade envolvida
no processo de criminalizao, sem olvidar, contudo, do prprio funcionamento do
sistema de Justia. Neste sentido advertem Hassemer e Muoz Conde:
Objeto del Derecho penal es la criminalidad. Quien se ocupa del Derecho
penal, tiene que ocuparse tambin de la criminalidad y tiene, por tanto, que
conocer junto a las normas jurdicopenales y su interpretacin tambin la
criminalidad y el delito. Quien no conozca o conozca mal el aspecto emprico
de la Administracin de Justicia penal, difcilmente podr manejar las reglas
normativas del Derecho penal material, ya que estas reglas se refieren a la
criminalidad y al delito. Este conocimiento de la criminalidad y del delito
tambin es necessario a la hora de elaborar y aplicar las leyes. No se puerde
decir que al legislador penal slo le interese el conocimiento de la
criminalidad, y que al que aplica la ley penal slo le interese el conocimiento
del delito. Tanto en una como en otra fase es peciso un conocimiento de las
dos realidades. 2
Dito de outro modo, no basta ao legislador conhecer da existncia do fato
reputado lesivo a determinados interesses sociais para que a criminalizao e as
1 JESCHECK, Hans-Heinrich; WEIGEND, Thomas. Tratado de derecho penal: parte general. Granada:
Comares Ed., 2002. p. 24. 2 HASSEMER, Winfried; MUOZ CONDE, Francisco. Introduccin a la Criminologia y al Derecho
Penal. Valencia: Tirant lo Blanch, 1989. p. 29.
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respostas penais a determinado fato se tornem legtimas e, principalmente, eficazes. H
de se atentar para as repercusses prticas no seio da Justia Criminal daquelas opes,
sem o que torna-se incua a prpria deciso em torno da criminalizao.
Assim sendo a lei, enquanto produto de uma determinada poltica criminal, o
objeto fundamental de exame no presente trabalho, isto , o modo como os dois
sistemas dispem sobre tais crimes. No obstante, o dinamismo das relaes
econmicas e das atividades empresariais a elas vinculadas faz com que se coteje a lei
com a realidade concreta a ela subjacente, de forma que se supere a opo por um
discurso mais ou menos liberal e se atenha s consequncias prticas daquelas opes
poltico-criminais.
Ocorre que a lei tem perdido o papel de centralidade no ordenamento jurdico,
o que desgua num processo que se tem denominado de crise da lei. Sobre o tema
Becerra Muoz discorre:
Desde la instauracin del Estado de derecho liberal, uno de los ragos
principales del derecho moderno es la centralidade de la ley como
instrumento de configuracin del ordenamento jurdico. Dicho concepto de
ley incluye una serie de atributos racionales que configuran a la ley como
fuente nica, originaria, superior a todas las dems fuentes del ordenamiento
jurdico y omnipotente, de creacin del Derecho. Junto a ello, la ley ha de
tener su origen en la voluntad general, que la convierte en norma imperativa
por la legitimidade que le otorga el contrato social que sustenta su processo
de creacin. El fenmeno de la crisis de la ley es consecuencia de la
perdida de contundencia de este discurso filosfico-poltico em los ltimos
tempos [...]3
Como assenta o autor, a lei, que sempre representou o mximo de poder e
autoridade do Estado, sofre nos dias atuais a concorrncia da prpria Constituio e da
atividade regulamentar, ambas como expresso daquele poder estatal e destinadas a
cuidar de parcelas antes exclusivas da lei.4
Na Espanha como consequncia dessa concorrncia normativa tem se aberto
discusses relevantes no que diz respeito, por exemplo, distino entre infraes
administrativas e infraes penais, tema caro no mbito dos delitos fiscais ante a
3 BECERRA MUOZ, Jos. La toma de decisiones en poltica criminal: Bases para un anlisis
multidisciplinar. Valencia: Tirant to Blanch, 2013, p. 33. 4 BECERRA MUOZ, Jos. op.cit., nota 2, p. 31.
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conexo entre crime e obrigao tributria. Assim porque a Constituio Espanhola, ao
distinguir em seu artigo 255 entre infraes administrativas de um lado, faltas e delitos
de outro, no apenas entabula o que se denomina de sistema jurdico-sancionador, mas,
tambm, de maneira muito clara, abre espao para uma hierarquia entre as infraes
administrativas e penais (faltas ou delitos) que chancelada, inclusive, pela
jurisprudncia do Tribunal Constitucional daquele pas.6 Assim discorre Navarro
Cardoso:
El sistema jurdico-sancionador, como sistema de control social formal de
reaccin, tiene como caractersticas fundamentales: estar dirigido a las
conductas desviadas ms graves y, por tanto, hacer uso de los mecanismos de
reaccin ms graves. Su fundamento se halla en el artculo 25 de la
Constituicin, que consagra en su apartado primero, dos formas diferentes de
manifestarse [...]: bien pueden calificarse [...] como infracciones
adminsitrativas (Derecho Administrativo sancionador), o bien pueden
apreciarse como delitos y faltas (Derecho Penal). Pero el proprio precepto
[...] va ms all , estabelecendo una jerarquizacin entre las reacciones
propias de ambas manifestaciones.7
Essa questo, de uma hierarquia entre as infraes parece repercutir nas
discusses em torno do ne bis in idem, assim como no prprio regime da persecuo
penal dos delitos fiscais na Espanha.
De outra banda, no Brasil, por fora da Emenda Constitucional 45/2004, a lei
passou a ter a concorrncia das Smulas Vinculantes do Supremo Tribunal Federal,
reputada por alguns como resultado de uma funo normativa da interpretao judicial8
ou verdadeiro ato normativo da funo jurisdicional.9 Com a edio da Smula
Vinculante 24, que condicionou a persecuo penal de determinados crimes tributrios a
5 Artculo 25
1. Nadie puede ser condenado o sancionado por acciones u omisiones que en el momento de producirse no contiuyan delito, falta o infraccion administrativa, segn la legislacin vigente
aquel momento.
2. [...] 3. La Administracin civil no podr imponer sanciones que, directa o subsidiariamente, impliquen
privacin de liberdad. 6: NAVARRO CARDOSO, Fernando. Infraccin Administrativa y Delito: Lmites a la Intervencin del
Derecho Penal. Madrid: Colex, 2001. p. 23. 7 Ibidem.
8 SILVA, Celso de Albuquerque. Do Efeito Vinculante: sua Legitimao e Aplicao. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2005, p. 91/96. 9 SIFUENTES, Mnica. Smula Vinculante: Um estudo sobre o poder normativo dos tribunais. So
Paulo: Saraiva, 2005, p. 275/302.
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prvio pronunciamento administrativo, tem-se, de fato, um novo panorama para tais
crimes. Este novo quadro regulatrio, porm, no encontra na lei um dispositivo que
seja determinando tal condicionamento, seno regulando o momento do
encaminhamento da notcia-crime por parte da Administrao Pblica.10
Refletir sobre estes dois sistemas o que se prope no presente trabalho.
2. Criminalidade Empresarial e Direito Penal.
No de hoje que a apario de novas formas de criminalidade, entre as quais a
empresarial, tm constrangido a dogmtica penal a recondicionar as estruturas
tradicionais do Direito Penal que pareciam, at ento, verdadeiros ncleos intangveis.11
Como se sabe, o Direito Penal da Ilustrao, ao qual correspondia a ideia de que as
classes menos favorecidas economicamente eram geradoras de criminalidade e
desordem social, teve no roubo e no furto suas infraes centrais12
, justamente por
corresponderem ao comportamento das classes sociais mais baixas.13
Contudo, parece
evidente o Direito Penal no tem mais se ocupado apenas das leses ao direito de
propriedade, mas tambm da periculosidade social decorrente da aquisio e do uso da
propriedade14
, fenmenos estes ligados atividade empresarial.
Por tais razes, a dogmtica penal tem sido levada a deitar os olhos para uma
realidade bastante negligenciada pelo Direito Penal clssico, a empresa, enquanto
atividade econmica organizada, que igualmente sempre se apresentou como causa de
leses a bens jurdicos relevantes. Ainda que no fossem as pessoas que ali se
encontravam alcanadas pelo sistema jurdico-penal.15
Cogitar, assim, de criminalidade
10
Nestes termos a interpretao do STF sobre o Art. 83 da Lei 9430/96 durante o julgamento da ADI
1571 (Pleno, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ 30.04.2004). 11
GARCA FALCONI, Ramiro. Nueva Delincuencia y Nuevos Delincuentes: Las Teoras de La
Criminalidad Econmica. In: GARCA FALCONI, Ramiro; GRACIA MARTN, Luis; SCHNEMANN,
Bernd, TERRADILLOS BASOCO, Juan Mara. Derecho Penal Econmico, Tomo I, 1 Ed. Santa Fe:
Rubinzal-Culzoni, 2012, p. 11. 12
GARCA FALCONI, Ramiro. op.cit., nota 1, p. 11/12. 13
SCHNEMANN, Bernd. Del Derecho Penal de La Clase Baja al Derecho Penal de la Clase Alta: Um
Cambio de Paradigma como Exigencia Moral? In: In: GARCA FALCONI, Ramiro; GRACIA MARTN,
Luis; SCHNEMANN, Bernd, TERRADILLOS BASOCO, Juan Mara. Derecho Penal Econmico,
Tomo I, 1 Ed. Santa Fe: Rubinzal-Culzoni, 2012, p. 51. 14
SCHNEMANN, Bernd. Del Derecho Penal de La Clase Baja al Derecho Penal de la Clase Alta: Um
Cambio de Paradigma como Exigencia Moral? op.cit. nota 3, p. 57. 15
Poder-se-ia, em tese, vincular essa omisso prpria diversidade de tratamento dispensada sistema
penal que tem num exemplo de Sutherland um registro histrico. Dizia o socilogo americano que no era
idntico o tratamento dispensado uma manuteno por companhias sediadas em Chiacgo de uma
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empresarial ou de empresa ou de crimes corporativos16
reconhecer, numa primeira
perspectiva, que se est diante de um comportamento delitivo que s pode ser cometido
por pessoas de elevada estatura social, como relata Garca Falcon:
Los estudios criminolgicos realizados durante la segunda mitad del siglo
XX y la primera dcada del XXI nos muestran una nueva criminalidade em la
que ya no participan las clases socioeconmicas bajas, sino aquellas
constitudas por el grupo dirigente y detentador del poder. As, atividades
realizadas a travs del sistema financeiro, del mercado de valores o del
sistema de seguro privado, por ejemplo, resultan por definicin vedadas a los
membros ms pobres de la sociedade, pero constituyen evidentemente el
entorno em el que se cometen uma serie de delitos de carcter econmico por
parte de los estratos superiores. Em el caso ecuatoriano, la quebra fraudulenta
de casi 60% del sistema financeiro nacional, a finales de la dcada de los 90,
nos demostr que se puede ser un banqueiro importante, un dedicado padre
de familia, un membro respetado de clubes sociales y um delincuente a la
vez.17
Assim a criminalidade empresarial ou de empresa acaba por se aproximar,
seno quase que se identificar com o nominado Direito Penal Econmico.18
Este
verdadeiro subsistema do Direito Penal19
tem sido objeto de profundo e recente
desenvolvimento terico, no obstante ainda preserve muito da ideia de um Direito
Penal de tempos de crise. Isto porque esteve durante algum tempo associado a perodos
mais drsticos pelos quais passaram determinadas sociedades. Assim, no Imprio
Romano, Diocleciano promoveu um rgido controle de preos, inclusive por meio de
sanes penais que chegavam pena de morte, visando conter um profundo processo
inflacionrio fomentado pela cobia dos comerciantes, o qual estava corroendo as bases
daquela sociedade.20
escola de sabotagem e fraude realizada por um trabalhador para obter um financiamento. O primeiro fato era absolutamente desprezado, seja pelos operadores do sistema ou mesmo pelas agncias de
comunicao. Sobre o tema: SUTHERLAND, Edwin H. El Delito de Cuello Blanco. Montevideo: Ed.
BdeF, 2009. p. 83. 16
BAJO, Miguel; BACIGALUPO, Silvina. Derecho Penal Econmico. 2. ed. Madrid: Editorial Centro
de Estudos Ramn Areces, 2010, p.22-23. 17
GARCA FALCONI, Ramiro. op.cit., nota 1, p. 12/13. 18
SOUZA, Artur de Brito Gueiros. Da Criminologia Poltica Criminal: o Direito Penal Econmico e o
Novo Direito Penal. In: SOUZA, Artur de Brito Gueiros (Org.). Inovaes no Direito Penal
Econmico: contribuies criminolgicas, poltico-criminais e dogmticas. Braslia: Escola Superior do
Ministrio Pblico da Unio, 2011, p. 120. 19
Segundo alguns autores tamanho o nmero de excees s estruturas do Direito Penal clssico que se
deve reconhecer no Direito Penal Econmico um verdadeiro subsistema. Neste sentido: QUINTERO
OLIVARES, Gonzalo. Sobre Los Delitos Econmicos como Subsistema Penal. In: SERRANO-PIEDECASAS, Jos Ramn; DEMETRIO CRESPO, Eduardo. El Derecho penal econmico y
empresarial ante los desafios de la Sociedade mundial del riesgo. Madrid: Colex, 2010. p. 113. 20
GARCA FALCONI, Ramiro. op.cit., nota 1, p. 13.
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Durante a Segunda Grande Guerra, o Direito Penal Econmico esteve
igualmente associado a um perodo de crise. A intensa regulamentao das atividades
econmicas traduzia o controle de tais atividades que deveriam se voltar para o esforo
de guerra.21
Porm, num contexto posterior ao das duas grandes guerras mundiais,
com a crise do Estado de Bem Estar, a constatao do desastre econmico gerado por
certas atividades econmicas e o surgimento de novos interesses relacionados
sociedade de risco que o Direito Penal Econmico inicia o processo de desenvolvimento
ainda hoje em curso.22
De rigor possvel dizer que tal desenvolvimento encontra fundamento na
ideia de interveno do Estado na economia, que nas palavras de Eros Grau se
materializaria numa conformao dos regimes do contrato e da propriedade.
Conformao esta, agora, sob o paradigma de um Estado Social, por ser o contrato
instituto fundamental na economia de mercado.23
Dito de outro modo, o que justifica a
citada interveno no outro propsito seno o de proteger o capitalismo dos
capitalistas. 24 25
Superam-se, com isto, as vises de um Direito Penal vinculado ao
perodo de guerra, como citado, ou mesmo a regimes totalitrios.26
com este objetivo, o de preservar o sistema econmico capitalista, no qual as
relaes econmicas so baseadas na liberdade do homem, de produzir e de consumir,
que surgiro uma srie de delitos econmicos voltados a proteger os mais variados
interesses individuais e coletivos.
Os delitos econmicos, nos quais os vnculos entre Economia e Direito so de
visita obrigatria, tem levado o estudioso do Direito Penal a deitar olhos sobre estudos
de law and economics para a melhor compreenso da conduta incriminada e da resposta
a ser dada a tal conduta. Sobre essa relao explica Sztajn:
21
TIEDEMANN, Klaus. Manual de Derecho Penal Econmico: parte general y especial. Valencia:
Tirant to blanch, 2010. p. 61.
22 GARCA FALCONI, Ramiro. op.cit., nota 1, p. 13.
23 GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econmica na Constituio de 1988. 12. ed. So Paulo: Malheiros,
2007. p. 95.
24 Ibidem. p. 58.
25 Sobre a prevalncia de um modelo que compatibiliza capitalismo e socialismo na Constituio de 1967,
modelo este que teria sido reproduzido na Constituio de 1988: SOUZA, Washington Peluso Albino de.
Teoria da Constituio Econmica. Belo Horizonte: Del Rey, 2002. p. 93.
26 BAJO, Miguel; BACIGALUPO, Silvina. Derecho Penal Econmico. 2. ed. Madrid: Editorial Centro
de Estudos Ramn Areces, 2010. p. 11-12.
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A relao entre Direito e Economia to antiga quanto a ltima, embora seja
vista como alguma coisa marginal, de pouca importncia, e imensa a
contribuio que o dilogo entre Direito e Economia (Cincias Sociais
aplicadas) pode oferecer ao propor solues para questes atuais, ao contrrio
do que afirmam os detratores dessa corrente de estudos. [...] No sculo
XVIII, Adam Smith e Jeremy Bentham, o primeiro a estudar os efeitos
econmicos decorrentes da formulao de normas jurdicas, o outro ao
associar legislao e utilitarismo, demonstravam a importncia de analise
interdisciplinar ou multidisciplinar de fatos sociais. Embora haja estudos
anteriores, a partir dos anos 60 do sculo passado que se inicia o
desenvolvimento da denominada rea de Law and Economics, que vem se
fortalecendo na pesquisa acadmica.27
Parece correto dizer que uma Poltica Criminal relacionada a delitos econmicos
deva se fazer orientada pelos ditames de law and economics, deve ter em conta que o
lucro o objetivo maior de toda empresa e que na busca por este, muitas das vezes,
lesionam-se relevantes interesses sociais.
Assim a opo pela criminalizao deve passar, ao que parece, pela onerao da
empresa no sentido de tornar menos proveitosa ou mais arriscada a atividade criminosa
em seu bojo desenvolvida, assim como pela perda integral dos ganhos ilcitos
decorrentes de condutas de pessoas a ela vinculados.
Porm, no pode escapar do legislador o agente por trs do fato, o qual deve ser
sancionado penalmente de modo a que se reafirme a reprovabilidade do comportamento.
Essa inferncia toda encontra respaldo na lio de Tiedemann, quando ressalta
que o Direito Penal Econmico abarca bens jurdicos relacionados proteo de
instrumentos do trfego econmico, como os delitos de contabilidade, ou de balano de
empresas e justifica:
la gran importancia que tienen estos instrumentos para la vida econmica y la
lucha contra la criminalidade econmica queda demonstrada, por ejemplo,
com el caso de las milionrias falsificaciones de balances em los Estados
Unidos em el ao 2000 (Enron, Tyco, WorldCom, entre otros), que ocasionaron las quiebras ms grandes em la histria econmica de los
Estados Unidos y que encuentran um smil actual en los comportamentos
contables de empresas alemanas del as llamado nuevo mercado del grupo
Flow-Tex [...] y en las graves falsificaciones de balances del consorcio de produtos alimenticios italiano Parmalat.28
27
SZTAJN, Rachel. Law and Economics. In: ZILBERSZTAJN, Dcio; SZTAJN, Rachel. Direito e Economia. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005. p. 76.
28 TIEDEMANN, Klaus. Manual de Derecho Penal Econmico: parte general y especial. Valencia:
Tirant to blanch, 2010. p. 59-60.
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dizer, mais do que olhar para a falsidade no balano de uma empresa como um
delito que atinge a f pblica, em se tratando de empresas tal procedimento pode se
direcionar a diminuir o pagamento de tributos, aumentando o lucro, ou ainda frustrar os
devidos controles das atividades da empresa com graves leses a acionistas e prpria
coletividade.
Tambm no h de escapar do legislador a grande capacidade organizacional
que envolve a criminalidade empresarial, o que faz com que o crime tenha cada vez
menos aparncia de crime. Sobre este trao j discorreu Srgio Demoro Hamilton:
fcil observar que a criminalidade, dia aps dia, vai assumindo novos
contornos, caracterizando-se por uma audcia e por um aperfeioamento de
mtodos que tornam cada vez mais difcil a persecuo criminal do Estado.
[...] conhecida a expresso de Sutherland, "white colar crime expresso
que designa pessoas de nvel scio-econmico superior, que, desviando-se de
suas atividades normais, ingressam no mundo do crime, causando graves
leses coletividade. um tipo de atividade criminosa sui generis, muito
comum no mundo dos negcios, envolvendo pessoas de grande prestgio no
s no campo financeiro como tambm e como consequncia lgica nas
altas rodas sociais e polticas.Trata-se de um "criminoso de luxo", que "no
passa recibo", e, pois, em processo em que esteja envolvido, enorme ser a
dificuldade do Ministrio Pblico para obter xito na persecuo criminal. Os
crimes praticados por tais pessoas no diferem dos delitos comuns, porm, a
punio torna-se extremamente difcil, seno impossvel, caso os indcios no
sejam levados na devida conta.29
Contudo, h um outro trao menos visvel e, por isso mesmo, mais nefasto da
criminalidade econmica. Na medida em que expressa o comportamento ilcito dos
detentores do poder econmico, os agentes envolvidos em tal atividade tem forte
influncia no processo legislativo, o que lhes permite fazer surgir toda sorte de normas
destinada a arrefecer o processo de criminalizao de suas condutas.30
Tal fenmeno
registrado por Aller:
29
HAMILTON, Srgio Demoro. Aspectos da Prova Indiciria. In: ______. Temas de Processo Penal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1998. p. 41-52.
30 Seria um exemplo desse tipo de influncia a recente modificao do delito de Quadrilha ou bando
(Art. 288 - Associarem-se mais de trs pessoas, em quadrilha ou bando, para o fim de cometer crimes )
redesignado de Associao criminosa (Art. 288. Associarem-se 3 (trs) ou mais pessoas, para o fim
especfico de cometer crimes) pela Lei 12.850/2013. A insero no tipo da expresso para o fim
especfico tem o condo de provocar discusses se empresrios podem responder por tal delito ou se o
fato de estarem, originalmente, associados para atos empresariais os exclui de tal prtica. Sobre o tema,
ainda na vigncia da redao original: ESTELLITA, Helosa. Criminalidade de Empresa, Quadrilha e
Organizao Criminosa. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. Em sentido contrrio:
MIRABETE, Julio Fabbrini; FABBRINI, Renato Nascimento. Manual de Direito Penal: parte especial,
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Divide la organizacin del delito em formal e informal. La primera (la que
aqui interesa) es aquella por la cual los hombres de negcios se organizan
para el control de la legislacin, la selecin de los administradores y la
restricin de as apropriaciones para la promulgacin de leyes que puedan
afectarlos.31
A superao deste trao s possvel quando se est diante de um Judicirio
capaz de fazer prevalecer certos valores constitucionais, aceitando expurgar do
ordenamento toda legislao voltada para anular a criminalizao dessas condutas.32
No quando este Poder se revela extremamente subserviente na interpretao do
Princpio da Legalidade, preso a uma dimenso formal e no material, o que h algum
tempo foi criticado por Mrcia Dometila Lima de Carvalho:
O Judicirio, com uma formao apropriada para o combate criminalidade
clssica, no vem revelando uma sensibilidade adequada para a captao das
sutilezas inerentes criminalidade econmica. Mostra, ao contrrio, um
apego exagerado a uma certa interpretao liberal, no condizente com a
nova realidade do Direito, emergente de um Estado de Justia Social,
concepo atual do Estado de Direito. 33
3. Sistema Brasileiro: Do regramento vacilante do pagamento extintivo da
punibilidade subordinao da instncia penal administrativa (Smula
Vinculante 24/STF).
Arts. 235 a 361 do CP. 20. ed. So Paulo: Editora Atlas, 2005. v. 3. p. 200. Na jurisprudncia
admitindo o crime: STF: HC 84223/RS, rel. Min. Eros Grau, Primeira Turma, DJ 27/08/2004.
31 ALLER, German. White collar crime. Edwin H. Sutherland y el delito de cuello blanco. Revista de
Derecho Penal y Procesal Penal, Buenos Aires, n. 6, p. 12-35, feb. 2005.
32 Colacione-se como exemplos da ausncia de tomada de posio do Judicirio brasileiro em face da
legislao penal tributria, a tramitao, no STF, das ADIs 3002/DF e 4273/DF. Tais aes diretas de
inconstitucionalidade atacam, respectivamente, os programas de recuperao fiscal promovidos pelas Leis
10.684/2003 e 11.941/2009, por violarem uma srie de princpios constitucionais. A primeira deu entrada
no STF em 24/09/2003 tendo sido julgada prejudicada monocraticamente pelo Ministro Celso de Mello
em 11/12/2009 sem sequer ter sido levado a apreciao o pedido de liminar. A razo aventada foi,
justamente, a da supervenincia da Lei 11.941/2009.
(Fonte:http://www.stf.jus.br/portal/peticaoInicial/verPeticaoInicial.asp?base=ADIN&s1=Lei%2011.941&processo=3002 - Acesso em 25 jun. 2014). Contudo, a ADI 4273/DF, que deu entrada no STF em 21/07/2009, no conta at a presente dada, com um despacho sequer do relator, o Ministro Celso de Mello
(Fonte:http://www.stf.jus.br/portal/peticaoInicial/verPeticaoInicial.asp?base=ADIN&s1=4273&processo=4273- Acesso em 25 jun. 2014). 33
CARVALHO, Mrcia Dometila Lima de. Fundamentao Constitucional do Direito Penal. Porto
Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1992. p. 117.
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Desde que os delitos tributrios ganharam certa autonomia sistemtica, o que se
deu com a Lei n. 4.729/65, o legislador ptrio tem se valido de uma srie de normas que
atribuem ao pagamento o efeito de extinguir a punibilidade. E foi com a citada lei que
iniciou sua vacilante regulao do pagamento, nela atribuindo o efeito extintivo da
punibilidade apenas se o recolhimento do tributo se desse antes do incio da ao fiscal
(art. 2).34
Posteriormente, editou-se a Lei n. 5498/68, a qual em seu art. 1 possibilitava a
extino da punibilidade em razo do parcelamento ou do pagamento de dbitos do
Imposto de Renda.35
Seguiu-se, ento, o art. 14 da Lei n. 8.137/90, lei esta que passou a
regulamentar os crimes contra a ordem tributria, e que trouxe a citada norma, agora
dando efeito extintivo da punibilidade para o pagamento realizado at o recebimento da
denncia.36
O dispositivo foi revogado pela Lei n. 8.383/1991 por ter, entre outros
inconvenientes, o largo alcance capaz de atingir, at mesmo, condutas relacionadas
corrupo de funcionrios da Administrao Tributria.
Porm, a Lei n. 9.249/95 por meio de seu art. 34, reinstituiu a causa de extino
da punibilidade, agora direcionada apenas aos crimes tributrios previstos na Lei n.
8137/90 e na Lei n. 4.729/65, desde que o pagamento, com todos os seus acrscimos se
desse antes do recebimento da denncia.37
Tal dispositivo deveria se firmar como a
norma geral relacionada ao pagamento extintivo da punibilidade.
No parece ilgico admitir que o pagamento produza o efeito de extinguir a
punibilidade nos crimes tributrios, afinal, diversos pases, inclusive a Espanha,
possuem regras similares.
O que talvez merea reflexo o fato de que no se impe limites
possibilidade de utilizao da causa de extino, o que se torna um estmulo a que os
agentes econmicos no faam o recolhimento do tributo no momento adequado.
34
Art 2 Extingue-se a punibilidade dos crimes previstos nesta Lei quando o agente promover o
recolhimento do tributo devido, antes de ter incio, na esfera administrativa, a ao fiscal prpria. 35
Art 1 Extingue-se a punibilidade dos crimes previstos na Lei nmero 4.729, de 14 de julho de 1965,
para os contribuintes do impsto de renda que, dentro de 30 (trinta) dias da publicao desta Lei,
satisfizerem o pagamento de seus dbitos na totalidade, ou efetuarem o pagamento de 1 (primeira) quota
do parcelamento que lhes tenha sido concedido.
1 Fica igualmente extinta a punibilidade dos contribuintes, mencionados neste artigo, que tenham pago
seus dbitos ou que os estejam pagando na forma da legislao vigente. 36
Art. 14. Extingue-se a punibilidade dos crimes definidos nos arts. 1 a 3 quando o agente promover o
pagamento de tributo ou contribuio social, inclusive acessrios, antes do recebimento da denncia. 37
Art. 34. Extingue-se a punibilidade dos crimes definidos na Lei n 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e
na Lei n 4.729, de 14 de julho de 1965, quando o agente promover o pagamento do tributo ou
contribuio social, inclusive acessrios, antes do recebimento da denncia.
-
Alis, mesmo as modernas propostas de mitigao do rigor penal como a
terceira via de Claus Roxin, que faz da reparao do dano uma causa de dispensa da
pena em infraes menos graves, no permite tamanha benevolncia, pois se afere do
mrito da dispensa.38
Contudo, no obstante tal dispositivo, o legislador a partir do ano 2000 passou a
editar e reeditar de tempos em tempos normas temporrias sobre parcelamento do dbito
tributrio, ao qual atribui o efeito de suspender a pretenso punitiva e o prazo de
prescrio, e pagamento com efeito de extinguir a punibilidade, mas agora sem
estabelecer restries temporais.
Neste sentido vieram as Leis n. 9.964/2000, n. 10.684/200339
, n. 11.941/2009 e
a Lei n. 12.685/2013 que reabriu o prazo para adeso lei que lhe antecedeu. Todas as
normas ali veiculadas incidindo sobre dbitos especficos, isto , normas temporrias,
que jamais revogaram o art. 34 da Lei n. 9.249/95.40
Em meio a esse cipoal de leis, tiveram lugar, ainda, as Leis n. 12.350/2011 e
12.382/2011, que alteraram a redao do art. 83 da Lei n. 9430/96, com vistas a tornar
este dispositivo a norma permanente sobre parcelamento e pagamento de dbitos
tributrios, os quais estariam, limitados pelo recebimento da denncia, com remisso
expressa ao art. 34 da Lei n. 9.249/95.41
38
ROXIN, Claus; et al. Derecho penal: parte general: Fundamentos. La estructura de la teora del delito
Madrid: Civitas, 1997. t. 1. p. 108.
39 Em relao a esta lei a Medida Provisria 303/2006, que no chegou a ser convertida em lei, reabriu o
prazo para adeso quele programa at 15/09/2006, limitando, porm, o parcelamento a 130 meses.
Contudo, os efeitos processuais e penais eram os mesmos da Lei n. 10684/2003 qual se reportava. 40
Sobre o carter temporrio das normas penais e processuais penais dos Programas de Recuperao
Fiscal j se teve oportunidade de discorrer: PANOEIRO, Jos Maria de Castro. As controvrsias da Lei
n 8.137/1990 (sonegao fiscal) e suas repercusses econmico-criminais. In: SOUZA, Artur de Brito
Gueiros (Org.) Inovaes no Direito Penal Econmico. Braslia: ESMPU, 2011, p. 301/333. 41
Art. 83. A representao fiscal para fins penais relativa aos crimes contra a ordem tributria previstos
nos arts. 1 e 2 da Lei n 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e aos crimes contra a Previdncia Social,
previstos nos arts. 168-A e 337-A do Decreto-Lei n 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Cdigo Penal),
ser encaminhada ao Ministrio Pblico depois de proferida a deciso final, na esfera administrativa,
sobre a exigncia fiscal do crdito tributrio correspondente. ( Redao dada pela Lei n 12.350, de 20 de
dezembro de 2010)
1 Na hiptese de concesso de parcelamento do crdito tributrio, a representao fiscal para fins
penais somente ser encaminhada ao Ministrio Pblico aps a excluso da pessoa fsica ou jurdica do
parcelamento. (Includo pela Lei n 12.382, de 25 de fevereiro de 2011)
2 suspensa a pretenso punitiva do Estado referente aos crimes previstos no caput, durante o perodo
em que a pessoa fsica ou a pessoa jurdica relacionada com o agente dos aludidos crimes estiver includa
no parcelamento, desde que o pedido de parcelamento tenha sido formalizado antes do recebimento da
denncia criminal. (Includo pela Lei n 12.382, de 25 de fevereiro de 2011)
-
E foi com base justamente neste ltimo dos dispositivos citados que o STF
promoveu a grande virada em sua jurisprudncia, para condicionar a instncia penal
instncia administrativa, o que j havia sido tentado de maneira mais sutil quando da
edio da Lei n. 9430/96. Esta lei desde sua redao original condicionou, no art. 83
caput, o encaminhamento da representao fiscal para fins penais por parte dos agentes
do Fisco ao esgotamento da instncia administrativa.42
Atacada por meio da ADI 1571/DF o que se viu no julgamento do mrito desta
ao direta de inconstitucionalidade, que se deu em conjunto com o HC 81.611/DF, foi
o STF afirmar que a ao penal no estava condicionada a representao, porm, o
Ministrio Pblico deveria aguardar o lanamento.
Para sustentar tal tese valeu-se o STF do argumento de que o contribuinte tinha
direito ampla defesa administrativa, razo pela qual o oferecimento precoce de
denncia pelo Ministrio Pblico lhe impediria de manejar a causa de extino da
punibilidade prevista no art. 34 da Lei n. 9.249/95 sem abrir mo do devido processo
legal administrativo. Ademais, afirmou-se que o lanamento era uma atividade do
Fisco, no do Ministrio Pblico na ao penal, e sem lanamento no h tributo e
muito menos sonegao de tributos.
Para tentar, ento, enquadrar juridicamente o lanamento tributrio em relao
ao crime tributrio, num primeiro momento falou-se em condio objetiva de
3 A prescrio criminal no corre durante o perodo de suspenso da pretenso punitiva. (Includo pela
Lei n 12.382, de 25 de fevereiro de 2011)
4 Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos no caput quando a pessoa fsica ou a pessoa jurdica
relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos dbitos oriundos de tributos, inclusive
acessrios, que tiverem sido objeto de concesso de parcelamento. (Includo pela Lei n 12.382, de 25 de
fevereiro de 2011)
5 O disposto nos 1 a 4 no se aplica nas hipteses de vedao legal de parcelamento. (Includo
pela Lei n 12.382, de 25 de fevereiro de 2011)
6 As disposies contidas no caput do art. 34 da Lei n 9.249, de 26 de dezembro de 1995, aplicam-se
aos processos administrativos e aos inquritos e processos em curso, desde que no recebida a denncia
pelo juiz. (Renumerado pela Lei n 12.382, de 25 de fevereiro de 2011)
42 Art. 83. A representao fiscal para fins penais relativa aos crimes contra a ordem tributria definidos
nos arts. 1 e 2 da Lei n 8.137, de 27 de dezembro de 1990, ser encaminhada ao Ministrio Pblico
aps proferida a deciso final, na esfera administrativa, sobre a exigncia fiscal do crdito tributrio
correspondente. (Redao original)
-
punibilidade, porm, quando da edio da Smula Vinculante 24 optou-se por justificar
o condicionamento com a alegao de que no se tipifica o crime sem o lanamento.
Este condicionamento da instncia penal instncia administrativa, associada a
uma regulamentao benevolente do pagamento faz com que os riscos para quem
sonega se reduzam de sobremaneira, o que cria um ambiente favorvel fraude
tributria.
No plano concreto da funcionalidade do sistema penal seria possvel representar
a persecuo penal em face de agentes com maior envergadura econmica como uma
verdadeira corrida de obstculos, onde a persecuo penal jamais alcanar a linha de
chegada. Por outro lado, aqueles de menor capacidade econmica veem a persecuo
penal se desenvolver sem quaisquer obstculos e chegar ao termo final onde a punio
apenas refora o sentimento de injustia presente em todo o sistema fiscal.
4. Sistema Espanhol: Da prejudicial administrativa prejudicial penal. Do
regramento legal do pagamento extintivo da punibilidade.
Na Espanha, segundo Ayala Gmez, os problemas relacionados ao combate da fraude
fiscal no diferem muito daqueles vivenciados em diversos pases, da porque a necessidade de
desenhar um modelo tendo conhecimento da funcionalidade, ou no, do modelo de interveno
penal existente.43
Talvez por essa razo, buscar na exposio de motivos de determinadas leis de reforma
do sistema penal tributrio as justificativas para a modificao possa representar mais do que o
entendimento dos dispositivos, mas o prprio reconhecimento do fracasso de um modelo
anterior. Da porque a Exposio de Motivos da Ley 36/2006, onde esto destacados os nefastos
efeitos sociais da fraude fiscal, nos descortina a evoluo do sistema espanhol na luta contra
esse tipo de crime. Diz Ayala Gmez:
La Exposicin de Motivos [...] Partiendo de la consideracin de que el fraude
fiscal es um fenmeno del que se derivan graves consecuencias para la sociedad en su conjunto. Supone uma merma para los ingresos pblicos, l
43
AYALA GMEZ, Ignacio. Antecedentes Legislativos de Los Delitos Contra La Hacienda Pblica. In: TOLEDO y UBIETO, Emilio Octavio (Coord.). Delitos e Infracciones Contra la Hacienda Pblica.
Valencia: Tirant to Blanch, 2009. p. 25-26.
-
que afecta a la presin fiscal que soportan los contribuyentes cumplidores;
condiciona el nvel de calidad de los servicios pblicos y las prestaciones
sociales; distorciona la actividade de los distintos agentes econmicos, de tal
modo que las empresas fiscalmente cumplidoras deben enfrentar-se a la
competencia desleal de las incumplidoras; em definitiva, el fraude fiscal
constituye el principal elemento de inequidad de todo sistema tributario, seala que la accin legislativa debe encaminarse, no slo a la deteccin y
regularizacin de los incumplimientos tributrios sino, y com mayor nfasis,
a evitar que esos incumplimientos se produzcan, haciendo hincapi en los aspectos disuasorios de la lucha contra el fraude al tiempo que se favorece el
cumplimiento voluntario de las obligaciones tributarias.44
De se ver, como referido anteriormente, que o Cdigo Penal Espanhol de 199545
j
trazia no art. 305.4, cujo teor original apresentava a regularizao da situao tributria (rectius:
pagamento) como justificativa para excluso da responsabilidade penal.46
Porm, o pagamento do dbito tributrio s excluiria a responsabilidade penal, se
ocorresse previamente a qualquer atuao estatal (Fazenda Pblica, Advogado do Estado ou do
Ministrio Pblico), no sentido de cobrar o tributo ou responsabilizar penalmente pelo delito.
Assim, parece decorrer de norma desse jaez a inexistncia de um condicionamento da
instncia penal instncia administrativa, na medida em que excluem o benefcio legal a
atuao, alternativa, do Ministrio Pblico ou da Fazenda Pblica. Da porque parece
equivocado sustentar, com base na existncia de norma que d ao pagamento o efeito extintivo
da punibilidade, a necessidade de prvio exaurimento da instncia administrativa.47
Contudo, anteriormente Ley Orgnica 10/1995 trilhava a legislao espanhola outro
caminho.
Durante a vigncia da Ley 50/1977, de 16 de novembro de 1977 condicionava-se a
instncia penal administrativa48
49
, o que era, com acerto, objeto de inmeras crticas como
44
Ibidem, p. 26/27. 45
Ley Orgnica 10/1995. 46
4. Quedar exento de responsabilidad penal el que regularice su situacin tributaria, en relacin con
las deudas a que se refiere el apartado primero de este artculo, antes de que se le haya notificado por la
Administracin Tributaria la iniciacin de actuaciones de comprobacin tendentes a la determinacin de
las deudas tributarias objeto de regularizacin, o en el caso de que tales actuaciones no se hubieran
producido, antes de que el Ministerio Fiscal, el Abogado del Estado o el representante procesal de la
Administracin Autonmica, Foral o Local de que se trate, interponga querella o denuncia contra aqul
dirigida, o cuando el Ministerio Fiscal o el Juez de Instruccin realicen actuaciones que le permitan
tener conocimiento formal de la iniciacin de diligencias. (Disponvel em:
Acesso em: 31 maio 2013)
47 TAVARES, Juarez. La Persecucin de los delitos econmicos en Brasil. In: BAJO FERNNDEZ,
Miguel; BACIGALUPO, Silvina; GMEZ-JARA DEZ, Carlos (Coord.) Poltica Fiscal y Delitos contra
la Hacienda Pblica. Madrid: Ramn Areces, 2007. p. 147 48
Artculo treinta y sete Uno. Los delitos fiscales slo son perseguibles a instancia de la
Administracin, sin necesidad de querella.
-
aquela assestada por Muoz Conde50
, que afirma que a prejudicial se constitua numa
oportunidade aberta corrupo.
Conforme registro de Ayala Gmez, parte da doutrina da poca no compreendeu o
profundo significado democrtico do tipo penal (tributrio) e as transformaes que implicaria,
da porque a aceitao sem maiores questionamentos, da prejudicial administrativa; tanto que
alguns, retirando o delito de suas coordenadas histricas, chegaram a pugnar que Cortes
Constitucionais afastassem o dispositivo, por uma pretensa inconstitucionalidade.51
Com isso se delineou um sistema em que a punio se destinava aos matutos que
cometiam contrabando.52
Em 1984, comeou a tramitar novo projeto de lei que, atendendo aos comandos do art.
31 da Constituio Espanhola de 197853
, visava a reprimir a fraude fiscal. O Proyecto de Ley
de Represin del Fraude Fiscal do qual derivou a Ley Orgnica 2/1985 que alterou o Cdigo
Penal Espanhol, introduzindo ttulo especfico dedicado aos Delitos contra la Hacienda
Pblica. Concomitantemente, tramitou uma reforma da Ley General Tributaria, buscando
evitar antinomias.54
Uma das causas apontadas, at ento, para o fracasso do combate aos delitos fiscais era,
justamente, a existncia da prejudicial, pelo que se resolveu, por suprimi-la na Ley 10/1985.55
Dos. Uma vez que hayan adquirido firmeza las actuaciones administrativas y, en todo caso, cuando haya
racado resolucin del Tribunal Econmico-Administrativo Central, el Delegado de Hacienda de
Inspeccin e Inspector Jefe, del Administrador de Tributos [...] deber poner em conocimiento del
Ministerio Fiscal los hechos que se estimen constitutivos de delitos fiscales. (Disponvel em:
Acesso em: 08 jun.2013)
49 Sobre a prejudicial administrativa ao tempo da Ley 50/1977: ESPEJO POYATO, Isabel.
Administracin tributaria y jurisdiccin penal en el delito fiscal. Madrid: Marcial Pons, 2013. p. 86.
50 [...] La prejudicialidad administrativa (cfr. Art. 37 Ley 50/1977) obstaculizaba una intervencin
directa del Derecho penal, permitiendo arreglos y componendas entre el contribuyente y la
Administracin que hacan luego imposible la exigncia de responsabilidad penal [...](MUOZ CONDE, Francisco. Derecho Penal: parte especial. 18. ed. Valencia: Tirant to blanch, 2010. p. 989-990.
51 AYALA GMEZ, Ignacio. Op. cit. Nota 43, p. 40-41.
52 Ibidem.
53 Articulo 31
l. Todos contribuirn al sostenimiento de los gastos pblicos de acuerdo con su capacidad econmica
medianta un sistema tributario justo inspirado en los principios de igualdad y progresividad que, en
ningn caso, tendr alcance confiscatorio. (Disponvel em:
Acesso em: 08 jun. 2013)
54 AYALA GMEZ, op.cit., nota 868, p. 55-57.
55 Ibidem. p. 57-58.
-
Hoje, porm, a vigente Ley 58/2003 (Ley General Tributria) regula a matria de
maneira diversa. Atenta ao princpio do non bis in idem56
, submete a instncia administrativa
instncia penal, como se extrai do dispositivo do artculo 180 da citada lei, com o esclarecedor
ttulo de Principio de no concurrencia de sanciones tributarias.57 Neste sentido, esclarece
Almud Cid:
56
Sobre o contedo de tal princpio Espejo Poyato esclarece:
En base a este principio se afirma que la Administracin debe, no ya cambiar su actuacin, lo que sea
lgico, dados los princpios procedimentales em juego, que necessariamente en caso de delito fiscal han
de ser diferentes de los que rigen la esfera de actuacin estrictamente tributaria, sino paralisar sus
actuaciones, todas, em cuanto surge el indicio de crime. El Manual de Delitos Contra la Hacienda
Publica de la Direccin General del Servicio Jurdico del Estado explica el funcionamento del principio
ne bis in idem em los seguientes trminos: [L]a imposibilidad de que pueda concurrir una dualidade de sanciones en los casos en que nos encontramos ante la identidade de sujeto, hecho y fundamento, h de
traducirse necessariamente por uma preferencia por la aplicacin de la norma que sanciona el ilcito
penal frente la norma que sanciona el ilcito administrativo; de esta forma, el eventual conflito que
pudiera surgir entre ambos procedimentos debe resolverse siempre a favor de la aplicacin de la norma
penal, lo que se traduce em uma doble consideracin: a) La previa imposicin de uma sancin
administrativa no excluye la possibilidade de iniciar un processo penal, aun cuando concurra la triple
identidade a la que nos estamos referiendo; de no ser as, estaramos dejanod en manos de la
Administracin la valoracin de si determinadas conductas son o non delictivas, cuestin esta reservada
a los rganos jurisdiccionales; b) En el caso de que hubiese mediado sancin administrativa, no por ello
puede dejar de imponerse una sancin penal, pues la mera declaracin de imposicin de una nueva
sancin no vulnera el principio ne bis in idem siempre que en la imposicin de la sancin penal se
descuente la sancin administrativa y todos los efectos negativos derivados de la misma.[...] (ESPEJO POYATO, Isabel. Administracin tributaria y jurisdiccin penal en el delito fiscal. Madrid: Marcial
Pons, 2013. p.265-266).
57 Artculo 180.
Principio de no concurrencia de sanciones tributarias.
1. Si la Administracin tributaria estimase que la infraccin pudiera ser constitutiva de delito contra la
Hacienda Pblica, pasar el tanto de culpa a la jurisdiccin competente o remitir el expediente al
Ministerio Fiscal, previa audiencia al interesado, y se abstendr de seguir el procedimiento administrativo
que quedar suspendido mientras la autoridad judicial no dicte sentencia firme, tenga lugar el
sobreseimiento o el archivo de las actuaciones o se produzca la devolucin del expediente por el
Ministerio Fiscal.
La sentencia condenatoria de la autoridad judicial impedir la imposicin de sancin administrativa.
De no haberse apreciado la existencia de delito, la Administracin tributaria iniciar o continuar sus
actuaciones de acuerdo con los hechos que los tribunales hubieran considerado probados, y se reanudar
el cmputo del plazo de prescripcin en el punto en el que estaba cuando se suspendi. Las actuaciones
administrativas realizadas durante el perodo de suspensin se tendrn por inexistentes.
2. Una misma accin u omisin que deba aplicarse como criterio de graduacin de una infraccin o como
circunstancia que determine la calificacin de una infraccin como grave o muy grave no podr ser
sancionada como infraccin independiente.
3. La realizacin de varias acciones u omisiones constitutivas de varias infracciones posibilitar la
imposicin de las sanciones que procedan por todas ellas.
Entre otros supuestos, la sancin derivada de la comisin de la infraccin prevista en el artculo 191 de
esta ley ser compatible con la que proceda, en su caso, por la aplicacin de los artculos 194 y 195 de
esta ley. Asimismo, la sancin derivada de la comisin de la infraccin prevista en el artculo 198 de esta
ley ser compatible con las que procedan, en su caso, por la aplicacin de los artculos 199 y 203 de esta
ley.
-
De acuerdo con lo previsto em el artculo 180 de la Ley General Tributaria, si
la Administracin tributariaa estimase que la infraccin pudiera ser
constitutiva de delito contra la Hacienda Pblica, pasar el tanto de culpa a la
jurisdiccin competente o remitir el expediente al Ministerio Fiscal [...]
Como es evidente, la remisin del tanto de culpa al mbito penal podr
producirse tanto en el seno de um procedimiento de comprobacin o
investigacin o, incluso, uma vez que se h comenzado a sustanciarse el
proceso penal. No obstante, el principio de non bis in idem, plenamente
aplicable em la esfera administrativa sancionadora, determina que la
Administracin deba abstenerse de sancionar al presunto infractor por los
hechos que considere que pueden ser constitutivos de delito.58
Embora evidente a submisso da instncia administrativa penal, em certos casos,
diante da expressa adoo na lei tributria do non bis in idem, se fosse aplicada a sano
administrativa, por consequncia, presente a identidade de fatos, ficaria afastada a possibilidade
de sano penal. A soluo seria a mesma adotada na passagem do regime da Ley 50/1977 para
a Ley 10/1985.59
Contudo, atualmente tal situao s poderia ser verificada pelo
descumprimento do rito estabelecido na legislao tributria.60
o que se constata da
jurisprudncia do Tribunal Supremo da Espanha:
[] en el odenamiento jurdico espaol, el sistema de punicin del delito
fiscal est atribudo directamente a la jurisdiccin penal y la actuacin de sta
no est condicionada a ninguna clase de prejudicialidad administrativa o
tributaria. Este sistema significa, adems, que es el tribunal penal el que debe
realizar la actuacin de liquidacin tributaria que resulta necesaria para el
clculo de la cifra que determina el delito [...] (STS 7 feb. 2007)61
4. Las sanciones derivadas de la comisin de infracciones tributarias resultan compatibles con la
exigncia del inters de demora y de los recargos del perodo ejecutivo. (Disponvel em:
Acesso em: 08 jun. 2013)
58 ALMUD CID, Jos Manuel. El Procedimiento Sancionador em Materia Tributaria. In: TOLEDO y
UBIETO, Emilio Octavio (Coord.). Delitos e Infracciones Contra la Hacienda Pblica. Valencia:
Tirant to Blanch, 2009. p. 504-505).
59 VELLOSO, Andrei Pitten. A pregiudiziale tributaria: anlise da jurisprudncia brasileira luz das
experincias italiana e espanhola. Revista de Doutrina da 4 Regio, Porto Alegre, n.20, out. 2007.
Disponvel em: Acesso
em: 08 jun. 2013.
60 O princpio do non bis in idem na Espanha tem um forte desenvolvimento a partir da jurisprudncia e
deriva, no campo dos delitos tributrios, da regra da no concorrncia de sanes. Para maiores
consideraes sobre o tema, que no objeto especfico da presente dissertao: GARBER
LLOBREGAT, Jos; BUITRN RAMREZ, Guadalupe. Principio de no concurrencia de sanciones tributarias. In: GARBER LLOBREGAT, Jos. Procedimiento sancionador, infracciones y sanciones tributarias. Valencia: Tirant to Blanch, 2005. t. 1. p. 340-420.
61 ALMUD CID, Jos Manuel. El Procedimiento Sancionador em Materia Tributaria. In: TOLEDO y
UBIETO, Emilio Octavio (Coord.). Delitos e Infracciones Contra la Hacienda Pblica. Valencia:
Tirant to Blanch, 2009. p. 505.
-
Mais recentemente, ainda, a Ley Orgnica 5/2010, que reformou o estatuto repressivo
espanhol, no alterou o art. 305.4, o qual se viu modificado, apenas, pela Ley Orgnica 7/2012,
de 27 de diciembre. Sua essncia, porm, foi preservada.62
Interessante, porm, em especial quando se confronta com a sistemtica brasileira
decorrente da Smula Vinculante 24, a previso do Cdigo Penal de que o efeito extintivo da
punibilidade ocorre, mesmo quando prescrito o direito de a Administrao determinar seu
montante administrativamente. Sinaliza-se, com isso, que a pretenso punitiva permanece
ntegra, independentemente de inrcia ou desdia da Administrao:
4. Se considerar regularizada la situacin tributaria cuando se haya
procedido por el obligado tributario al completo reconocimiento y pago de
la deuda tributaria, antes de que por la Administracin Tributaria se le haya
notificado el inicio de actuaciones de comprobacin o investigacin
tendentes a la determinacin de las deudas tributarias objeto de la
regularizacin o, en el caso de que tales actuaciones no se hubieran
producido, antes de que el Ministerio Fiscal, el Abogado del Estado o el
representante procesal de la Administracin autonmica, foral o local de que
se trate, interponga querella o denuncia contra aqul dirigida, o antes de que
el Ministerio Fiscal o el Juez de Instruccin realicen actuaciones que le
permitan tener conocimiento formal de la iniciacin de diligencias.
Asimismo, los efectos de la regularizacin prevista en el prrafo anterior
resultarn aplicables cuando se satisfagan deudas tributarias una vez
prescrito el derecho de la Administracin a su determinacin en va
administrativa.
62
Da exposio de Motivos da Ley Orgnica 7/2012 se extrai:
Una primera modificacin ha consistido en configurar la regularizacin de la situacin tributaria como
el verdadero reverso del delito de manera que, con la regularizacin, resulte neutralizado no slo el
desvalor de la accin, con una declaracin completa y veraz, sino tambin el desvalor del resultado
mediante el pago completo de la deuda tributaria y no solamente de la cuota tributaria como ocurre
actualmente.Esta nueva configuracin de la regularizacin hace que sta guarde una relacin de
equivalencia prctica con el pago tempestivo del impuesto, tal y como han destacado tanto la Fiscala
General del Estado, como el Tribunal Supremo, que de forma muy expresiva se han referido a la
regularizacin como el pleno retorno a la legalidad que pone fin a la lesin provisional del bien jurdico
protegido producida por la defraudacin consumada con el inicial incumplimiento de las obligaciones
tributarias.
En coherencia con esta nueva configuracin legal de la regularizacin tributaria como el reverso del
delito que neutraliza completamente el desvalor de la conducta y el desvalor del resultado, se considera
que la regularizacin de la situacin tributaria hace desaparecer el injusto derivado del inicial
incumplimiento de la obligacin tributaria y as se refleja en la nueva redaccin del tipo delictivo que
anuda a ese retorno a la legalidad la desaparicin del reproche penal. Esta modificacin se
complementa con la del apartado 4 relativa a la regularizacin suprimiendo las menciones que la
conceptuaban como una excusa absolutoria. Disponvel em:
Acesso em: 02 jun. 2013.
-
La regularizacin por el obligado tributario de su situacin tributaria
impedir que se le persiga por las posibles irregularidades contables u otras
falsedades instrumentales que, exclusivamente en relacin a la deuda
tributaria objeto de regularizacin, el mismo pudiera haber cometido con
carcter previo a la regularizacin de su situacin tributaria.63
(sem grifo no
original)
Com toda essa regulamentao a Espanha ainda enfrenta problemas no combate
fraude fiscal, porm, seu sistema parece se revelar mais adequado ao resguardo do interesse
social subjacente ao tributo.
5. Concluses
Diante da nova realidade representada pela criminalidade empresarial parece
decisivo o argumento em prol de uma compreenso global do problema penal, que
passe pela necessria integrao de Criminologia, Poltica Criminal e Direito Penal.
Trata-se, pois, de um tipo de criminalidade que opera dentro de uma realidade,
extremamente dinmica, a economia.
Alm disso, esta criminalidade tem por trs pessoas, adequadamente nominadas
por Sutherland como criminosos do colarinho branco, os quais detm no apenas uma
capacidade de organizar o delito de molde a dificultar sua persecuo, seno tambm
influenciar no processo de formao da lei erigindo sucessivos obstculos sua
responsabilizao.
Demais disso, as atividades econmicas se movem para um norte, o lucro, e
sempre que surgirem opes economicamente mais favorveis para viabilizar este
resultado, ser este o caminho escolhido pelo agente econmico.
Essa dinmica faz com que o delito fiscal no Brasil tenha na instabilidade
normativa relativa ao pagamento um problema de contornos bastante especficos. Assim
porque a reedio, de tempos em tempos, de Programas Recuperao Fiscal (REFIS)
tem promovido a anulao da resposta penal a tais fatos criminosos, abrindo espao,
tambm, para um reforo na ideia de seletividade do sistema penal, mesmo dentro de
um subsistema onde as pessoas j teriam um status diferente daquele pblico alvo do
Direito Penal clssico.
63
Disponvel em: Acesso: 02
jun. 2013.
-
Por todas essas razes parece que o sistema brasileiro, longe de estimular o
cumprimento regular da obrigao tributria, fomenta mais e mais a sonegao e a
fraude e, o que pior, atrai, pela necessidade de subsistncia no mercado, cada vez mais
empresrios.
O sistema espanhol pode, pelo que se viu, indicar um caminho mais preciso a
seguir.
Neste sentido, h uma regra estvel quanto ao pagamento extintivo da
punibilidade, o qual deve se verificar antes de qualquer atuao estatal (Administrao
Tributria ou Ministrio Pblico).
Com esta mecnica cria-se um risco elevado para o agente econmico de se
sujeitar a sanes penais, em casos de descumprimento mediante fraude da obrigao
tributria, o que pode ter um carter mais forte do que o simples manejo de sanes
exclusivamente tributrias.
Outro aspecto relevante destacado no trabalho diz respeito vinculao das
instncias. Como restou demonstrado, trilhou o Brasil, pela via jurisprudencial, tambm
submetida influncia do poder econmico, o caminho inverso ao da legislao
espanhola.
Subordinamos hoje, com base na Smula Vinculante 24, a instncia penal a um
pronunciamento administrativo, o que abre espao para um controle poltico do crime,
questo problemtica em face dos agentes potencialmente neste caso. Essa construo
quando associada ao regime de extino da punibilidade pelo pagamento do tributo cria
um ambiente extremamente favorvel sonegao e a toda sorte de expedientes para
impedir ou desconstituir o lanamento, fazendo tbula rasa da prpria existncia de
crimes tributrios no Brasil.
Aqui tambm o sistema espanhol parece dar uma resposta no apenas mais
adequada questo, mas verdadeiramente superior em termos tcnicos.
Ao estabelecer a nvel constitucional um sistema jurdico sancionador nico,
evitando a duplicidade de sanes pelo mesmo fato, o sistema resolve a questo no
mbito penal.
Isto , presente elementos de um crime a apurao remetida para a instncia
penal, superando-se o antigo sistema da prejudicial administrativa que conduzia a uma
absoluta ineficcia do sistema penal tributrio.
A soluo espanhola parece, ainda, engenhosa, na medida em que a proximidade
das infraes administrativa e penal no mbito do Direito Penal Econmico pode
-
sugerir uma certa confuso entre as sanes, abrindo espao para discusses em torno
da legitimidade da prpria interveno penal, se houver, por exemplo, identidade de
sanes.
Tudo isso perde espao na medida em que apenas uma das sanes subsistir e
que cabe ao legislador estatuir as sanes penais e qualificar, ou no, um fato como
crime.