1 caminho - carater

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Prólogo do autor Lê devagar estes conselhos. Medita pausadamente estas considerações. São coisas que te digo ao ouvido, em confidência de amigo, de irmão, de pai. E estas confidências as escuta Deus. Não te contarei nada de novo. Vou revolver as tuas recordações, para que aflore algum pensamento que te fira. E assim melhores a tua vida, e entres por caminhos de oração e de amor. E acabes por ser alma de critério. (Caminho, Prólogo do autor)

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O Caminho São josemaria Escrivá

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  • Prlogo do autor

    L devagar estes conselhos. Medita pausadamente estas consideraes. So coisasque te digo ao ouvido, em confidncia de amigo, de irmo, de pai. E estasconfidncias as escuta Deus. No te contarei nada de novo. Vou revolver as tuasrecordaes, para que aflore algum pensamento que te fira. E assim melhores a tuavida, e entres por caminhos de orao e de amor. E acabes por ser alma de critrio.(Caminho, Prlogo do autor)

  • CAPTULO

    1Carter

    1 Que a tua vida no seja uma vida estril. - S til. - Deixa rasto. - Ilumina com oresplendor da tua f e do teu amor.

    Apaga, com a tua vida de apstolo, o rasto viscoso e sujo que deixaram ossemeadores impuros do dio. - E incendeia todos os caminhos da terra com o fogo deCristo que levas no corao.

    2 Oxal fossem tais o teu porte e a tua conversao que todos pudessem dizer, ao ver-teou ouvir-te falar: Este l a vida de Jesus Cristo.

    3 Gravidade. - Deixa esses meneios e trejeitos de mulherzinha ou de moleque. - Que oteu porte exterior seja o reflexo da paz e da ordem do teu esprito.

    4 No digas: Eu sou assim..., so coisas do meu carter. So coisas da tua falta decarter. S homem - esto vir.

    5 Acostuma-te a dizer que no.6 Vira as costas ao infame quando te sussurra ao ouvido: Para que hs de complicar a

    vida?

    7 No tenhas esprito de caipira. - Dilata o teu corao, at que seja universal,catlico.

    No voes como ave de capoeira, quando podes subir como as guias.

    8 Serenidade. - Por que te zangas, se zangando-te ofendes a Deus, incomodas os outros,passas tu mesmo um mau bocado... e, por fim, tens de acalmar-te?

    9 Isso mesmo que disseste, dize-o noutro tom, sem ira, e ganhar fora o teu raciocnio,e sobretudo no ofenders a Deus.

    10 No repreendas quando sentes a indignao pela falta cometida. - Espera pelo diaseguinte, ou mais tempo ainda. - E depois, tranqilo e com a inteno purificada, nodeixes de repreender.

    - Conseguirs mais com uma palavra afetuosa do que com trs horas de briga. -

  • Modera o teu gnio.

    11 Vontade. - Energia. - Exemplo. - O que preciso fazer, faz-se... Sem hesitar... Semcontemplaes.

    Sem isso, nem Cisneros teria sido Cisneros1, nem Teresa de Ahumada, SantaTeresa..., nem Iigo de Loyola, Santo Incio...

    Deus e audcia! - Regnare Christum volumus!2

    12 Cresce perante os obstculos. - A graa do Senhor no te h de faltar: Inter mediummontium pertransibunt aquae!: - passars atravs das montanhas!

    Que importa que de momento tenhas de restringir a tua atividade, se em breve, comomola que foi comprimida, chegars incomparavelmente mais longe do que nuncasonhaste?

    13 Afasta de ti esses pensamentos inteis que, pelo menos, te fazem perder o tempo.14 No percas as tuas energias e o teu tempo, que so de Deus, jogando pedras aos

    cachorros que te ladrem no caminho. Despreza-os.

    15 No deixes o teu trabalho para amanh.16 Perder-se na massa? Tu... da multido?! Mas, se nasceste para lder!

    - Entre ns, no h lugar para os tbios. Humilha-te, e Cristo voltar a inflamar-te comfogos de Amor.

    17 No caias nessa doena do carter que tem por sintomas a falta de firmeza paratudo, a leviandade no agir e no dizer, o estouvamento..., a frivolidade, numa palavra.

    Essa frivolidade, que - no o esqueas - torna os teus planos de cada dia to vazios(to cheios de vazio), se no reages a tempo - no amanh; agora! -, far da tuavida um boneco de trapos morto e intil.

    18 Obstinas-te em ser mundano, frvolo e estouvado porque s covarde. Que , senocovardia, esse no quereres enfrentar-te a ti prprio?

    19 Vontade. uma caracterstica muito importante. No desprezes as pequenas coisas,porque, atravs do contnuo exerccio de negar e te negares a ti prprio nessas coisas- que nunca so futilidades nem ninharias -, fortalecers, virilizars, com a graa deDeus, a tua vontade, para seres, em primeiro lugar, inteiro senhor de ti mesmo.

    E depois, guia, chefe, lder! - que prendas, que empurres, que arrastes, com o teuexemplo e com a tua palavra e com a tua cincia e com o teu imprio.

  • 20 Chocas com o carter deste ou daquele... Tem de ser assim necessariamente; no smoeda de ouro que a todos agrade.

    Alm disso, sem esses choques que se produzem ao lidar com o prximo, como haviasde perder as pontas, as arestas e salincias - imperfeies, defeitos - do teutemperamento, para adquirires a forma cinzelada, polida e energicamente suave dacaridade, da perfeio?

    Se o teu carter e o carter dos que convivem contigo fossem adocicados e molescomo gelatina, no te santificarias.

    21 Pretextos. - Nunca te faltaro para deixares de cumprir os teus deveres. Que farturade razes... sem razo!

    No pares a consider-las. - Repele-as e cumpre a tua obrigao.

    22 S enrgico. - S viril. - S homem. - E depois... s anjo.23 Dizes que... no podes fazer mais? - No ser que... no podes fazer menos?24 Tens ambies: de saber..., de ser lder..., de ser audaz.

    Muito bem. Est certo. - Mas... por Cristo, por Amor.

    25 No discutais. - Da discusso no costuma sair a luz, porque apagada pela paixo.26 O Matrimnio um sacramento santo. - A seu tempo, quando tiveres de receb-lo,

    que o teu Diretor ou o teu confessor te aconselhem a leitura de algum livro til. - Eestars mais bem preparado para levar dignamente as cargas do lar.

    27 Ests rindo porque te digo que tens vocao matrimonial? - Pois verdade: issomesmo, vocao.

    Pede a So Rafael que te conduza castamente ao termo do caminho, como a Tobias.

    28 O matrimnio para os soldados e no para o estado-maior de Cristo. - Ao passo quecomer uma exigncia de cada indivduo, procriar apenas uma exigncia daespcie, podendo dela desinteressar-se as pessoas individualmente.

    nsia de filhos...? Filhos, muitos filhos, e um rasto indelvel de luz deixaremos, sesacrificarmos o egosmo da carne.

    29 A relativa e pobre felicidade do egosta, que se encerra na sua torre de marfim, nasua prpria carcaa..., no difcil de conseguir neste mundo. - Mas a felicidade doegosta no duradoura.

    Ser que queres perder, por essa caricatura do Cu, a felicidade da Glria, que no

  • ter fim?

    30 s calculista! - No me digas que s jovem. A juventude d tudo quanto pode; d-sea si prpria sem medida.

    31 Egosta! - Tu, sempre atrs das tuas coisas. - Pareces incapaz de sentir afraternidade de Cristo: nos outros, no vs irmos; vs degraus.

    Pressinto o teu fracasso rotundo. - E, quando estiveres afundado, querers que vivamcontigo a caridade que agora no queres viver.

    32 Tu no sers lder se na massa s vires o escabelo para empoleirar-te. - Tu serslder se tiveres a ambio de salvar todas as almas.

    No podes viver de costas para a multido. preciso que tenhas nsias de torn-lafeliz.

    33 Nunca queres esgotar a verdade. - Umas vezes, por correo. Outras - a maioria -,para no passares um mau bocado. Algumas, para evit-lo aos outros. E, sempre, porcovardia.

    Assim, com esse medo de aprofundar, jamais sers homem de critrio.

    34 No tenhas medo verdade, ainda que a verdade te acarrete a morte.35 No gosto de tanto eufemismo: covardia chamais prudncia. - E a vossa

    prudncia ocasio para que os inimigos de Deus, com o crebro vazio de idias,tomem ares de sbios e ascendam a postos a que nunca deviam ascender.

    36 Esse abuso no irremedivel. - falta de carter permitir que continue, como coisadesesperada e sem possvel retificao.

    No te esquives ao dever. - Cumpre-o em toda a linha, ainda que outros deixem decumpri-lo.

    37 Tens, como por a se diz, muita lbia. - Mas, com todo o teu palavreado, noconseguirs que eu justifique (foi providencial!, disseste) o que no tem justificao.

    38 Ser verdade (no acredito, no acredito...) que na terra no h homens, masestmagos?

    39 Pea que eu nunca queira deter-me no fcil. - J o pedi. Agora s falta que teempenhes em cumprir esse belo propsito.

    40 F, alegria, otimismo. - Mas no a estupidez de fechar os olhos realidade.41 Que modo to transcendental de viver bobagens vazias, e que maneira de chegar a

  • ser algum na vida - subindo, subindo - fora de pesar pouco, de no ter nada,nem no crebro nem no corao!

    42 Por que essas variaes de carter? Quando fixars a tua vontade em alguma coisa?- Larga esse teu gosto pelas primeiras pedras, e pe a ltima ao menos em um deteus projetos.

    43 No sejas to... suscetvel. - Magoas-te por qualquer coisinha. - Torna-se necessriomedir as palavras para falar contigo do assunto mais insignificante.

    No te zangues se te digo que s... insuportvel. - Enquanto no te corrigires, nuncasers til.

    44 Desculpa-te com a cortesia que a caridade crist e a vida social exigem. - E, depois,para a frente! - com santa desvergonha, sem parar, at subires inteiramente aencosta do cumprimento do dever.

    45 Por que te doem essas errneas conjecturas que se fazem a teu respeito? - A maisbaixo chegarias se Deus te abandonasse. - Persevera no bem, e encolhe os ombros.

    46 No achas que a igualdade, tal como a entendem, sinnimo de injustia?47 Essa nfase e esse ar emproado ficam-te mal; v-se que so postios. - Procura, pelo

    menos, no os empregar com o teu Deus, nem com o teu Diretor, nem com os teusirmos. E haver uma barreira a menos entre ti e eles.

    48 Pouco firme o teu carter: que nsia de te meteres em tudo! - Obstinas-te em ser osal de todos os pratos... e - no te zangues se te falo claramente - tens pouca graapara ser sal; e no s capaz de desfazer-te e passar despercebido vista, como essecondimento.

    Falta-te esprito de sacrifcio. E sobra-te esprito de curiosidade e de exibio.

    49 Cala-te. - No sejas menino, caricatura de criana, bisbilhoteiro, intriguista,linguarudo. - Com as tuas histrias e mexericos, esfriaste a caridade: fizeste a pior dasobras. E... se por acaso abalaste - m lngua! - os muros fortes da perseverana deoutros, a tua perseverana deixa de ser graa de Deus, porque instrumentotraioeiro do inimigo.

    50 s curioso e bisbilhoteiro, xereta e intrometido. No tens vergonha de ser, at nosdefeitos, to pouco masculino? - S homem. E esses desejos de saber da vida dosoutros, troca-os por desejos e realidades de conhecimento prprio.

    51 Teu esprito varonil, retilnio e simples, confrange-se ao sentir-se envolvido em

  • enredos e mexericos, que no acaba de compreender e em que nunca se quismisturar. - Sofre a humilhao de andar assim em boca alheia e procura que essa duraexperincia te d mais discrio.

    52 Por que razo, ao julgares os outros, pes na tua crtica o amargor dos teus prpriosfracassos?

    53 Esse esprito crtico (concedo-te que no murmurao), no o deves exercer no teuapostolado, nem com teus irmos. - Esse esprito crtico , para o vossoempreendimento sobrenatural (perdoas-me que o diga?), um grande estorvo, porque,enquanto examinas - embora com elevada finalidade, acredito - o trabalho dos outros,sem teres nada a ver com isso, no fazes nenhuma obra positiva, e dificultas, com oteu exemplo de passividade, o bom andamento de todos.

    Ento... - perguntas, inquieto - ...esse esprito crtico, que como que a substnciado meu carter...?

    Olha (vou tranqilizar-te): apanha uma caneta e um papel, escreve simples econfiadamente - ah!, e com brevidade - os motivos que te torturam, entrega a nota aosuperior e no penses mais nela. - Ele, que quem vos dirige (tem graa de estado),guardar a nota... ou a jogar no cesto dos papis. - Para ti, como o teu espritocrtico no murmurao, e s o exerces para fins elevados, tanto faz.

    54 Contemporizar? palavra que s se encontra ( preciso contemporizar!) no lxicodos que no tm vontade de lutar - comodistas, manhosos ou covardes -, porque deantemo se sabem vencidos.

    55 Olha, meu filho: s um pouco menos ingnuo (ainda que sejas muito criana, emesmo por o seres diante de Deus), e no ponhas na berlinda, diante de estranhos,os teus irmos.

    1 Regente do trono de Espanha e confessor da Rainha Isabel, a Catlica. Comeou a reforma da Igreja na Espanha,antecipando-se que seria iniciada, anos depois, pelo Conclio de Trento para toda a cristandade. Foram notrias atmpera e a energia do seu carter. (N. do T.).2 Queremos que Cristo reine! (N. do T.).