01 história constitucional e pontos centrais da cr88 (1)

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    ASPECTOS ESPECFICOS DA CONSTITUIO

    FEDERAL DE 1988

    Manuella da Silva Non

    2005

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    ESTUDO

    Cmara dos DeputadosPraa 3 PoderesConsultoria LegislativaAnexo III - Trreo

    Braslia - DF

    ASPECTOS ESPECFICOS DA

    CONSTITUIO FEDERAL DE 988

    Manuella da Silva Non

    Consultora Legislativa da rea IDireito Constitucional, Eleitoral, Municipal,

    Direito Administrativo, Processo Legislativo e Poder Judicirio

    ESTUDO

    MAIO/2005

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    SUMRIO

    IMPORTNCIA DA CONSTITUIO .................................................................................................3

    CARACTERSTICAS (CLASSIFICAO) DA CONSTITUIO......................................................4

    BREVE HISTRICO DAS CONSTITUIES BRASILEIRAS...........................................................5

    1 Constituio de 1824 ......................................................................................................................6

    2 Constituio de 1891 ......................................................................................................................8

    3 Constituio de 1934 ....................................................................................................................10

    4 Constituio de 1937 ....................................................................................................................11

    5 A Constituio de 1946.................................................................................................................13

    6 Constituio de 1967 ....................................................................................................................14

    7 Constituio de 1969 ....................................................................................................................15

    8 Constituio de 1988 ....................................................................................................................17

    ESTRUTURA.........................................................................................................................................19

    IMPORTNCIA E DISPOSIES ESPECFICAS NOS RELACIONAMENTOS:...........................20Nao/Estado ......................................................................................................................................20

    Federao/Unidades Federais .............................................................................................................23

    Partido/Governo..................................................................................................................................31

    Indivduo/Coletividade .......................................................................................................................35

    2005 Cmara dos Deputados.Todos os direitos reservados. Este trabalho poder ser reproduzido ou transmitido na ntegra, desde quecitadas a autora e a Consultoria Legislativa da Cmara dos Deputados. So vedadas a venda, a reproduoparcial e a traduo, sem autorizao prvia por escrito da Cmara dos Deputados.

    Este trabalho de inteira responsabilidade de sua autora, no representando necessariamente a opinio daCmara dos Deputados.

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    ASPECTOS ESPECFICOS DA CONSTITUIO

    FEDERAL DE 988

    Manuella da Silva Non

    IMPORTNCIA DA CONSTITUIO

    Juridicamente, a Constituio deve ser entendida como a leifundamental e suprema de um Estado, que contm normas referentes estruturao do Estado, formao dos poderes pblicos, forma de governo e aquisio do poder de governar, distribuiode competncias, direitos, garantias e deveres dos cidados.1Alm disso, a Constituio queindividualiza os rgos competentes para a edio de normas jurdicas, legislativas ouadministrativas.2Em sntese, a constituio o conjunto de normas que organiza os elementos

    constitutivos do Estado.3

    Analisando a rea de abrangncia da Constituio, Virglio de Jesus

    Miranda Carvalho entende

    que melhor se definir a Constituio como o estatuto jurdicofundamental da comunidade, isto , abrangendo, mas no se restringindoestritamente aopolticoe porque suposto este, no obstante a sua hoje reconhecidaaptido potencial para uma tendencial totalizao, como tendo, apesar de tudo,uma especificidade e contedo material prprios, o que no autoriza a que por ele (ouexclusivamente por ele) se defina toda a vida de relao e todas as reas de convivncia

    humana em sociedade e levar autonomizao do normativo-jurdicoespecfico(neste sentido, total e no apenas tendencialmente o Direito), bem como distino, no seio da prpria Constituio, entre a sua inteno ideolgica-poltica e ainteno jurdica stricto sensu. Com este sentido tambm poderemos, ento, definira Constituio como a lei fundamental da sociedade.

    1MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 14. ed. So Paulo: Atlas, 2003, p. 36.2CANOTILHO, J. J. Gomes, MOREIRA, Vital. Fundamentos da Constituio. Coimbra: Coimbra Editora, 1991, p.

    41.3SILVA, Jos Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 18. ed. So Paulo: Malheiros, 2000, p.40.

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    Importante destacar o chamado contedo ideal de constituio, imposto

    a partir do triunfo do movimento constitucional no incio do sculo XIX. Como ensina

    Canotilho,

    este conceito ideal identifica-se fundamentalmente com os postulados polticos-liberais, considerando-os como elementos materiais caracterizadores e distintivos osseguintes: (a) a constituio deve consagrar um sistema de garantias da liberdade (essaessencialmente concebida no sentido do reconhecimento de direitos individuais e da

    participao dos cidados nos actos do poder legislativo atravs do parlamento); (b) aconstituio contm o princpio da diviso de poderes, no sentido de garantia orgnicacontra os abusos dos poderes estaduais; (c) a constituio deve ser escrita (documentoescrito).4

    CARACTERSTICAS (CLASSIFICAO) DA CONSTITUIO

    Nossa Constituio a lei fundamental e suprema do Estado brasileiro.

    Toda autoridade s nela encontra fundamento e s ela confere poderes e competncias

    governamentais. Nem o governo federal, nem o governo dos Estados, nem os dos Municpios ou

    do Distrito Federal so soberanos, porque todos so limitados, expressa ou implicitamente, pelasnormas positivas da lei fundamental. Exercem suas atribuies nos termos nela estabelecidos. E

    todas as normas que integram a ordenao jurdica nacional s sero vlidas se se conformarem

    com as normas da Constituio Federal.

    Segundo lio concisa de Walber de Moura Agra5, a Constituio

    dotada de trs prerrogativas: supremacia, supralegalidade e imutabilidade relativa. A

    primeira, de que tratamos brevemente, ocupa funo preponderante, fazendo com que as normas

    constitucionais se tornem imprescindveis para o ordenamento jurdico. A Constituio se torna a

    norma supremado ordenamento jurdico porque , teoricamente, a lei primeira, constituindo-se

    na prpria soberania do Estado, por ser criada pelo Poder Constituinte. Ela funciona como

    norma-origem, que regulamenta o processo de criao das normas infraconstitucionais.

    Tambm goza de autogarantia, que na realidade uma supralegalidade material: declarada a

    inconstitucionalidade das normas que infringirem o preceituado por ela, deve-se expurg-las do

    ordenamento6. A supralegalidade formal, por sua vez, atua no controle de constitucionalidade

    4CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional. Coimbra: Almedina, 1993.5

    AGRA, Walber de Moura. Manual de Direito Constitucional.So Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002, p. 30.6ROCHA, Carmen Lcia Antunes. Constituio e Constitucionalidade. Belo Horizonte: L, 1991, p. 53.

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    formal durante o processo legislativo, regulamentando a normognese das normas

    infraconstitucionais. A supralegalidade significa um importante instrumento para a manuteno

    da supremacia constitucional, garantindo a obedincia dos seus postulados. Por fim,

    imutabilidade relativa a caracterstica que possui a Constituio que exige para sua

    reformulao um procedimento normativo mais severo que o utilizado para a modificao das

    normas infraconstitucionais, evitando a banalizao constitucional, com a conseqente perda de

    sua concretude normativa.

    Nossa atual Constituio Federal formal (o Estado reduzido, sob

    forma escrita, a um documento solenemente estabelecido pelo poder constituinte originrio e

    somente modificvel por processos e formalidades especiais nela prpria estabelecidos), escrita

    (codificada e sistematizada num texto nico), legal(Carta escrita fundamental, colocada no pice

    da pirmide normativa e dotada de coercibilidade), dogmtica(produto escrito e sistematizado

    por um rgo constituinte, a partir de princpios e idias fundamentais da teoria poltica e do

    direito dominante), promulgada(=democrtica, popular, derivando do trabalho de um rgo

    constituinte composto de representantes do povo, eleitos com a finalidade de sua elaborao),

    rgida(somente pode ser alterada por um processo legislativo mais solene e dificultoso do que o

    existente para a edio das demais espcies normativa, sendo imutvel no tocante s clusulas

    ptreas), analtica (no prev to-somente os princpios e as normas gerais de regncia do

    Estado, mas, ao contrrio, examina e regulamenta todos os assuntos que entenda relevantes

    formao, destinao e funcionamento do Estado).

    BREVE HISTRICO DAS CONSTITUIES BRASILEIRAS

    A histria brasileira evidencia o acerto da concepo sociolgica deLassale de Constituio como a soma dos fatores reais de poder. Sempre que ocorreu uma

    alterao fundamental na estrutura do poder poltico na histria brasileira, uma Constituio, uma

    nova lei bsica de organizao e delimitao dos poderes do Estado foi editada para dar a

    formulao jurdica conforme ordem surgida. No h como dissociar o acompanhamento da

    evoluo do direito constitucional do estudo da dimenso poltica e histrica existente no

    momento de cada alterao. O direito constitucional brasileiro apresenta momentos sucessivos de

    concentrao e desconcentrao de poderes polticos, reflexos das transformaes ocorridas no

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    seio da sociedade. Tais alteraes trazem evidentes modificaes na estrutura do Estado, bem

    como em seus limites:

    1 Constituio de 1824

    Tem como origem a Proclamao da Independncia, em 1822. Com a

    separao do Brasil de Portugal, ficava sem sentido continuar a aplicar o ordenamento jurdico

    portugus em um pas independente. A emancipao poltica precisou de uma emancipao

    jurdica, e quem realizou essa tarefa foi a Carta Constitucional.

    A Assemblia Constituinte, que fora eleita para confeccionar a

    Constituio, foi dissolvida por D. Pedro I porque estava realizando um texto de feitura liberal,

    sob os influxos do liberalismo poltico em voga na Europa, no que contrariou as intenes do

    Imperador. Ele nomeou um Conselho de Notveis, uma comisso de dez juristas para elaborar

    uma projeto de Constituio, que rapidamente ficou pronto. Para conseguir legitimidade, foram

    enviadas cpias a todas as Cmaras Municipais do pas, para que oferecessem sugestes e

    emendas. Sua inspirao foram os documentos legais ingleses e a Constituio francesa, todas de

    vertentes monrquicas.

    Ela instituiu uma monarquia, ficando a cargo do Poder Moderador (de

    inspirao de Benjamin Constant) a coordenao dos poderes, e a forma de Estado escolhida foi

    a unitria, com o territrio dividido em vinte provncias, governadas por presidentes escolhidos

    pelo Imperador. Em cada provncia, funcionava um Conselho-Geral, que tinha competncia para

    iniciar, propor e deliberar sobre os assuntos locais, depois apreciados pela Assemblia Geral dos

    Deputados. No que concerne ao municipalismo, eram as cidades e vilas administradas por

    Cmaras eletivas e temporrias, sendo o vereador mais votado ao mesmo tempo o chefe do

    Executivo municipal.

    A primeira Constituio no agasalhou de forma expressa o

    parlamentarismo, muito menos se pode rotul-la de querer instituir o presidencialismo, modelo

    incompatvel com a monarquia. Havia uma concentrao de poderes nas mos do imperador

    pelos seguintes motivos: a) o Poder Moderador era a chave de toda a organizao poltica (art.

    98); b) o imperador nomeava e demitia livremente os ministros que quisesse (art. 101) e era o

    chefe do Executivo, exercendo essa funo por meio de seus ministros; c) o imperador podia

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    remover, sob alegao de no estar prestando um bom servio (ao) Estado, o presidente de

    qualquer uma das provncias (art. 165).

    Essas prerrogativas se moldaram de forma precisa personalidade de D.

    Pedro I, fazendo com que durante o seu governo ele as exercesse de forma contumaz. Devido a

    essa atitude, ntida na forma autoritria de governar, muitos doutrinadores advogam a tese de que

    a Constituio de 1824 adotou um sistema similar ao presidencialismo, mas tratava-se apenas de

    uma forma desptica de administrar o Estado.

    Com a abdicao do imperador, inicia-se uma nova fase a regncia ,

    que, mesmo com a ascenso ao trono de D. Pedro II, no apresenta modificao significativa,

    continuando o imperador a reinar, sem, contudo, governar. O sistema de governo adquire feies

    de um modelo parlamentarista, fortalecido com a criao do cargo de Presidente do Conselho de

    Ministros pelo Decreto n. 523, em 1847. Para isso muito contribuiu a figura do Imperador D.

    Pedro II, seu temperamento moderado, deixando a funo executiva a cargo de seus ministros,

    propiciando que o partido conservador e o partido liberal se revezassem no poder durante o seu

    governo.A grande inovao desse Texto Constitucional foi a de ter introduzido

    uma declarao de direitos, no seu art. 179, antes da primeira Constituio europia, tida

    erroneamente como pioneira, que foi a da Blgica, em 1831.

    Com relao sua estabilidade, considerada uma Constituio semi-

    rgida, ou seja, uma parte era considerada flexvel, podendo ser alterada pelo mesmo

    procedimento de alterao das normas infraconstitucionais, e a outra parte era considerada rgida,

    passvel de alterao somente por procedimentos mais dificultosos. A parte da Constituio

    considerada rgida englobava a atribuio dos poderes polticos e os direitos individuais doscidados; as demais partes eram flexveis (art. 178).

    Na Constituio de 1824, a religio oficial era a Catlica Apostlica

    Romana. Aos demais credos religiosos era permitido o culto, desde que no fosse em locais

    abertos ao pblico. Assim, com arrimo no art. 95, III, dessa Lex Mater, apenas quem professasse a

    religio do Estado poderia ser deputado ou senador.

    O Poder Legislativo era denominado de Assemblia Geral, composto de

    duas Casas a dos deputados, eleitos para mandato de 4 anos, e a dos senadores , sendo que

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    estes eram vitalcios e escolhidos pelo imperador dentre os componentes de uma lista trplice

    eleitos pela provncia. A eleio era indireta e censitria, sendo exigida renda mnima anual para

    participar do processo eleitoral, e renda ainda maior para ser eleito, graduando-se conforme o

    cargo. O imperador poderia dissolver a Cmara a seu alvedrio. O Poder Judicirio era

    independente, formado de juzes e de jurados, mas o Poder Moderador poderia suspender os

    magistrados de sua funo.

    Houve uma reforma em seu texto em 1834, por meio de Ato Adicional,

    que suprimiu o Conselho de Estado e substituiu a Regncia Trina permanente por uma Regncia

    Una, dando ainda mais ampla expanso a uma tendncia federalista, uma vez que ampliou os

    poderes dos Conselhos-Gerais das provncias e os transformou em Assemblias Legislativas.

    Embora outorgada pelo Chefe de Estado, foi a Constituio de mais longa durao em toda a

    histria brasileira (65 anos). Outra reviso foi efetivada com a lei de interpretao do Ato

    Adicional, em 1940, de forte inspirao conservadora, quando se restabeleceu o Conselho de

    Estado e se reduziu um pouco a competncia das Assemblias Legislativas das provncias.

    2 Constituio de 1891

    A Proclamao da Repblica, em 1891, pouco depois da abolio da

    escravatura, foi o fator social que deu ensejo necessidade de reformulao da Carta Magna

    vigente. Com a modificao da forma de Estado e de governo, houve a implantao da forma

    federativa e da repblica, substituindo a forma unitria e a monarquia, tornando-se premente a

    necessidade de modificao da estrutura jurdica. Por intermdio de Rui Barbosa, seu principal

    idealizador, sua grande fonte de inspirao foi a Constituio norte-americana de 1787, o que se

    evidencia at mesmo pela prpria denominao adotada: Estados Unidos do Brasil.

    Com a derrubada da monarquia, houve uma legislao provisria

    estabelecida pelo Decreto 1, de 15 de novembro de 1889, que vigorou at a feitura da nova Carta.

    O erro da nossa primeira Constituio republicana foi o de tentar

    transplantar o texto americano para uma realidade diferente. O poder se encastelou nas

    oligarquias estaduais que, aliadas com o governo federal, dominaram o cenrio poltico durante

    toda a Primeira Repblica. O regime democrtico de governo no saiu do papel; o poder estava

    diludo entre o governo federal e as oligarquias estaduais.

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    Um ponto positivo na adoo da forma federativa dualista de Estado foi

    a outorga de autonomia para os Estados-membros. Contudo, como no houve uma justa diviso

    da receita tributria, os entes federativos estaduais no podiam atender s suas demandas, dando

    origem poltica do pires namo, em que os governadores, para verem seus pleitos atendidos,

    tinham de seguir as diretrizes do governo federal.

    Pela primeira vez, no que foi seguido por todos os demais textos

    constitucionais, as unidades federativas formaram uma unio perptua e indissolvel. Os

    componentes da federao, que se chamavam provncias, passaram a se denominar Estados-

    membros, contando com Constituies e leis prprias. As vinte provncias do imprio se

    transformaram em vinte Estados-membros. E o antigo Municpio Neutro, situado no Rio de

    Janeiro, passou a se chamar Distrito federal.

    O catolicismo deixou de ser a religio oficial do Estado brasileiro,

    permitindo-se o livre culto de todas as crenas.

    O Poder Moderador foi extinto, criando-se em seu lugar o sistema

    presidencialista, nos moldes norte-americanos. Os poderes polticos passaram a ser tripartidos:Executivo, Legislativo e Judicirio. O Poder Executivo era exercido pelo Presidente da Repblica,

    eleito por sufrgio direto e maioria absoluta, para mandato de quatro anos, embora Rui Barbosa

    sugerisse o prazo de seis. Caso nenhum dos candidatos obtivesse maioria absoluta, o Congresso

    Nacional elegeria o Presidente da Repblica, por maioria simples, entre os dois candidatos mais

    votados nas eleies gerais. O Presidente era auxiliado por Ministros da sua confiana, que

    deveriam referendar os atos praticados pelo Chefe do Poder Executivo nas diversas reas em que

    se dividia a Administrao Federal.

    O Poder Legislativo era exercido pelo Congresso Nacional, composto deduas Casas Legislativas, a Cmara dos Deputados e o Senado. A Cmara era constituda de

    representantes eleitos pelo povo, para mandato de trs anos, e o Senado, de trs representantes

    eleitos por cada Estado e pelo Distrito Federal, para mandato de nove anos, renovando-se

    trienalmente por um tero.

    O Poder Judicirio era formado por juzes e tribunais. Foi institudo o

    Supremo Tribunal Federal, com quinze juzes nomeados pelo Presidente da Repblica, aps

    aprovao pelo Senado Federal, dentre cidados de notvel saber e reputao.

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    Houve ampliao dos direitos individuais, com incluso do habeas corpus

    entre os direitos constitucionais do cidado brasileiro, e instituio de um sistema judicial difuso

    de controle de constitucionalidade, de acordo com o modelo norte-americano, admitindo-se o

    recurso para o Supremo Tribunal Federal de decises judiciais em que se questionasse a validade

    de leis e atos dos governos locais em face da Constituio.

    3 Constituio de 1934

    A Revoluo de 1930, que ps fim Repblica Velha, e o Movimento

    Constitucionalista de 1932 foram os motivos propulsores para a criao dessa nova ordem

    constitucional. Sua principal fonte de inspirao foi a Constituio alem de Weimar, de 1919,

    inaugurando o ciclo de Constituies de segunda dimenso, de teor material, em que o Estado

    intervm na economia para assegurar condies mnimas de sobrevivncia populao.

    Antes da Constituio de 1934 entrar em vigor, no perodo de 1930 at

    1934, a base do ordenamento jurdico foi o Decreto 19.938/1930, que criou o Governo Provisrio

    dos Estados Unidos do Brasil.

    O Senado foi concebido como um rgo de coordenao dos poderes,

    de manuteno da continuidade administrativa, e teve a incumbncia de velar pela guarda da

    Constituio. O Poder Legislativo passou a ser composto apenas da Cmara dos Deputados,

    cabendo ao Senado a colaborao no processo legislativo.

    A Constituio de 1891, tendo como inspirao a Constituio norte-

    americana, formulou um federalismo centrfugo, com maior distribuio de poder para os

    Estados-membros. O Texto de 1934 foge desse parmetro e implementa um federalismo

    centrpeto, com uma preponderncia de poderes nas mos da Unio. No houve uma rgidadistribuio de competncias. Nenhuma outra Lei Maior retornou aos moldes federativos

    implantados pelo Texto de 1891.

    Como inovao, a Constituio cria a justia eleitoral e possibilita o voto

    das mulheres, desde que exeram funo pblica remunerada. O Poder Judicirio era composto

    pela Corte Suprema e por trs ramos: Justia Federal, Militar e Eleitoral, alm das Justias

    Estaduais. H a instituio da Justia do Trabalho.

    Incorpora direitos sociais, representando uma prestao positiva do

    Estado. Regulamenta, ainda, na seara constitucional, o mandado de segurana, bem como a ao

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    popular. Foi a primeira Constituio brasileira a instituir um captulo sobre a Ordem Econmica e

    Social, entrando na era de proteo aos direitos materiais, e a conceber a interveno do Estado

    na economia como forma de regulamentao do mercado.

    Alm da representao poltica tradicional, baseada em partidos polticos,

    ela inova ao admitir, sob inspirao do fascismo italiano, a representao corporativa, em que os

    parlamentares so eleitos pelas organizaes profissionais (os agrupamentos profissionais foram

    divididos em quatro grupos: lavoura e pecuria; indstria; comrcio e transporte; profisses

    liberais e funcionrios pblicos).

    O Poder Executivo era exercido pelo Presidente da Repblica, eleito pelo

    voto universal, direto e secreto. Extinguiu-se o cargo de Vice-Presidente da Repblica.

    Como o papel do Senado ganhou relevncia, foi-lhe incumbida a funo

    de, no controle difuso, quando da declarao de inconstitucionalidade pelo Supremo Tribunal

    Federal, suspender a eficcia da deciso impugnada e converter seus efeitos para erga omnes,

    ampliando-os, constituindo-se um critrio poltico para a extenso da inconstitucionalidade.

    Outras duas importantes inovaes no sistema de controle de

    constitucionalidade foram introduzidas: a clusula de reserva de Plenrio, pela qual os

    tribunais, somente por maioria absoluta, podem declarar a inconstitucionalidade de leis ou atos do

    Poder Pblico, impedindo decises contraditrias de rgos fracionrios de um mesmo tribunal,

    bem como maiorias ocasionais; e a representao interventiva, criada a possibilidade de o

    Supremo Tribunal Federal, provocado pelo Procurador-Geral da Repblica, declarar a

    inconstitucionalidade de lei estadual que viole algum dos princpios constitucionais sensveis

    inseridos na Constituio.

    4 Constituio de 1937

    Numa poca de avano dos regimes totalitrios em todo o mundo, foi ela

    oriunda de um golpe de Estado efetuado por Getlio Vargas, instaurando um regime poltico

    conhecido como o Estado Novo, sob alegao de que poderia haver uma guerra civil entre os

    integralistas e os comunistas. Dissolveu-se o Senado e a Cmara dos Deputados e revogou-se a

    antiga Constituio. O idelogo da Carta foi Francisco Campos, que tomou como influncia a

    Constituio da Polnia, sendo a Constituio de 1937 conhecida como A polaca.

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    A Carta deveria ser ratificada por intermdio de um plebiscito, previsto

    no seu art. 187, mas ele nunca saiu do papel. Pelo art. 186, o Pas foi todo declarado em estado de

    emergncia, com a suspenso de direitos individuais. Esse artigo s foi revogado em novembro

    de 1945, com a redemocratizao do Pas e o afastamento de Getlio do poder. Como foi uma

    ordem jurdica outorgada, a Constituio tinha natureza autoritria, mitigando a autonomia dos

    Estados-membros. Instituiu no Pas o modelo corporativo de Estado, em que os entes estatais

    deveriam arbitrar o litgio entre o capital e o trabalho.

    O Poder Executivo, autoridade suprema do Estado, concentrou em si, de

    forma robusta, o poder, submetendo expressamente os demais poderes ao seu alvitre. Foram-lhe

    atribudas as funes de coordenar a atividade dos rgos representativos, dirigir a poltica interna

    e externa, promover e orientar a poltica legislativa de interesse nacional e superintender a

    administrao do Pas. Foi institudo, pela primeira vez, o decreto-lei, que permitiu ao Presidente

    da Repblica legislar sobre matrias de competncia legislativa da Unio, nos perodos de recesso

    parlamentar ou de dissoluo da Cmara dos Deputados, bem como dissolv-la.

    O Poder Legislativo, exercido pelo Parlamento Nacional, com acolaborao do Conselho da Economia Nacional e do Presidente da Repblica, voltou a ser

    formado pelo Conselho Federal (terminologia alem para o Senado) e pela Cmara dos

    Deputados. O Conselho da Economia Nacional deveria dar parecer nas matrias de sua

    atribuio e o Presidente da Repblica deveria atuar na iniciativa das matrias de sua competncia

    privativa e nas sanes dos projetos de lei. Nenhum membro das Casas Legislativas possua

    iniciativa isolada de projetos de lei. A iniciativa era, em princpio, do governo. Somente 1/3 dos

    Deputados ou membros do Conselho Federal poderia apresentar projetos de lei. Uma lei de

    iniciativa do Parlamento poderia conter somente normas gerais sobre determinado assunto.

    O Senado deixou de ser um rgo de coordenao dos poderes. Cada

    Estado-membro escolheria um representante por meio da Assemblia Legislativa, podendo o

    Governador do Estado vetar essa escolha. O Presidente da Repblica poderia nomear dez

    membros para compor o Conselho Federal, sendo este presidido por um Ministro indicado pelo

    Presidente da Repblica.

    O Poder Judicirio era composto do Supremo Tribunal Federal, de uma

    Justia Militar e de Justias Estaduais. Refletindo a mentalidade autoritria da nova Carta

    Constitucional, direitos e garantias individuais foram restringidos, e o mandado de segurana e a

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    ao popular, excludos do texto constitucional. Houve um retrocesso no processo de controle de

    constitucionalidade: uma lei declarada inconstitucional pelo Judicirio poderia ser novamente

    apreciada pelo Legislativo a pedido do Presidente da Repblica e, caso confirmada por 2/3 dos

    votos de cada Casa, a deciso do Supremo Tribunal Federal ficava sem efeito.

    5 A Constituio de 1946

    A origem desta Constituio pode ser creditada derrocada das potncias

    do Eixo em 1945 e redemocratizao do Pas aps a Segunda Guerra Mundial, com a

    conseqente queda de Getlio Vargas. Apodrecendo o modelo autoritrio, restaram sem utilidade

    as suas estruturas normativas, deixando aberto o caminho para uma Assemblia Nacional

    Constituinte e uma nova Constituio.

    Foi a mais democrtica das Cartas Magnas at ento elaboradas e a que

    proporcionou a Estados e Municpios a maior autonomia. Houve um retorno aos parmetros

    estabelecidos pela Constituio de 1934, seguindo os moldes de um texto de feitura social, com a

    interveno do Estado na economia para assegurar direitos bsicos para a populao.

    Na sua confeco participaram todos os espectros ideolgicos, desde os

    partidos representantes das classes dominantes, como a UDN e o PSD, at os partidos que

    representavam as classes populares, a exemplo do PCB e do PTB.

    Houve a restaurao do sistema da separao de Poderes e a retomada do

    regime democrtico. O Poder Legislativo teve uma modificao na sua terminologia: o

    Parlamento Nacional passou a ser chamado de Congresso Nacional e o Conselho Federal voltou

    a ser denominado de Senado Federal. Extinguiu-se a representao corporativa no Parlamento,

    que passou a ser escolhido integralmente pelo povo.A Cmara dos Deputados passou a ser composta de representantes

    eleitos diretamente pelo povo, por meio do sistema eleitoral proporcional. Os representantes

    classistas foram suprimidos. Cada unidade federativa foi representada no Senado por trs

    membros, escolhidos diretamente pelos eleitores. A presidncia do Senado coube ao Vice-

    Presidente da Repblica, seguindo o modelo implementado pelos Estados Unidos. Admitiu-se a

    possibilidade de comparecimento de Ministros de Estado ao Congresso Nacional para prestar

    esclarecimentos, por convocao ou voluntariamente.

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    Os direitos e garantias fundamentais foram reforados e ampliados. A

    longa estiagem a que haviam sido submetidos foi suplantada; em decorrncia, passaram a ser

    tratados com o devido valor. Reintroduziu-se o mandado de segurana e a ao popular no texto

    constitucional.

    A Constituio de 1946 manteve o controle difuso de constitucionalidade

    pela via de exceo. Contudo, a Emenda Constitucional n. 16, de 1965, introduziu entre as

    competncias do Supremo Tribunal Federal o julgamento da ao direta de inconstitucionalidade

    de lei ou ato normativo federal ou estadual proposta pelo Procurador-Geral da Repblica. Foi

    institudo um sistema duplo de controle de constitucionalidade, tanto pela via de ao como pela

    de exceo, ambos com caractersticas prprias.

    Durante a sua vigncia, sucederam-se numerosas crises provocadas por

    setores contrrios ao modelo econmico nacional-desenvolvimentista implantado: o suicdio de

    Getlio Vargas; o contragolpe implementado pelo General Teixeira Lott, para impedir Caf Filho,

    Vice-Presidente de Getlio, de realizar um golpe de estado; a renncia de Jnio Quadros; as

    restries contra a posse de Joo Goulart; e a campanha da legalidade, que permitiu que esteassumisse o governo.

    Foi durante essa Carta Magna que, como frmula de compromisso entre

    as foras democrticas e os militares, aps a renncia do ento Presidente Jnio Quadros, para

    assegurar a preservao da ordem constitucional e a posse de Vice-Presidente da Repblica eleito

    pelo voto popular, Joo Goulart, introduziu-se o sistema parlamentarista de governo, que teve

    efmera durao, pela Emenda Constitucional n. 4, de setembro de 1961. Houve um plebiscito

    em que a populao, por ampla maioria, escolheu o retorno ao presidencialismo, restabelecido

    pela Emenda Constitucional n. 6, de 1963.

    6 Constituio de 1967

    Sua motivao foi o golpe militar de 31 de maro de 1964, destituindo

    Joo Goulart e implantando um regime autoritrio. A poltica do nacional-desenvolvimentismo

    substituda por uma poltica econmica voltada para a integrao com o capital estrangeiro, cujo

    eixo de desenvolvimento passou a ser o endividamento externo. A inspirao jurdica dessa Carta

    foi a Constituio de 1937, com as suas normatizaes de teor autoritrio.

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    No dia 9 de abril, a Junta Militar editou o primeiro Ato Institucional,

    mantendo a Constituio de 1946, mas com diversas modificaes: eleio indireta do Presidente

    da Repblica; possibilidade de aprovao por decurso de prazo de projetos de lei de iniciativa do

    Presidente da Repblica; suspenso das garantias individuais de estabilidade e vitaliciedade, com

    possibilidade de demisso aps investigao sumria; suspenso de direitos polticos pelo prazo de

    10 anos; e cassao de mandatos legislativos. Pelo Ato Institucional n. 2 foram extintos os

    partidos polticos e excludos de apreciao judicial os atos praticados com fundamento em atos

    institucionais. Pelo Ato Institucional n. 4, o Congresso Nacional foi convocado

    extraordinariamente para discutir, votar e promulgar o projeto de Constituio apresentado pelo

    Presidente da Repblica em prazo pouco superior a quarenta dias. Essa a origem da

    Constituio de 1967. Os militares sentiram a necessidade de institucionalizar os ideais e princpios

    da Revoluo. Trata-se de uma Constituio outorgada, pois o Congresso Nacional no havia sido

    eleito com essa finalidade e no mais possua legitimidade poltica para representao da vontade

    nacional, visto que diversos congressistas haviam sido cassados. Essa Constituio prevaleceu por

    dois anos, sendo logo substituda pela Carta de 1969.

    A Constituio era, em diversos aspectos, impregnada pela ideologia da

    segurana nacional. Criou um Conselho de Segurana Nacional e a possibilidade de civis serem

    julgados pela Justia militar em casos de crimes contra a segurana nacional. Centralizou os

    poderes polticos na Unio, especialmente nas mos do Presidente da Repblica, com iniciativa de

    lei em qualquer rea, tendo campos de iniciativa exclusiva, aprovao de leis por decurso de prazo

    e expedio de decretos-leis em casos de relevncia e urgncia. Reduziu-se os direitos individuais,

    admitindo-se a possibilidade de suspenso desses direitos.

    7 Constituio de 1969

    Embora o Texto Constitucional de 1967 tenha sido promulgado em

    poca de desenvolvimento econmico, em razo da reorganizao do sistema financeiro e

    produtivo, bem como da entrada macia de capital estrangeiro no Pas, a poca era de grande

    radicalizao poltica. De um lado, o cerceamento das liberdade democrticas e a prtica

    sistemtica de tortura e perseguio poltica, com prises ilegais, mortes e exlios. De outro, em

    resposta ao acirramento poltico-ideolgico, guerrilha urbana e rural, assaltos a bancos, seqestros

    de embaixadores, etc.

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    O governo militar, com a edio do Ato Institucional n. 5, de dezembro

    de 1968, concentrou ainda mais poderes nas mos do Presidente da Repblica, com a

    conseqente restrio de direitos individuais e polticos. Com a enfermidade do Presidente Costa

    e Silva, assumiu o poder uma Junta Militar composta dos Ministros da Marinha, do Exrcito e da

    Aeronutica, pois os militares no aceitavam a posse de um civil, o Vice-Presidente Pedro Aleixo,

    ultimando-se, assim, os preparativos para a modificao do Texto de 1967.O fortalecimento da

    ditadura foi motivado pelo crescimento da oposio, que reuniu o movimento estudantil, os

    trabalhadores e o clero progressista.

    O Ato Institucional n. 5 , pela intensidade de suas disposies, entrava

    em contradio com vrias regulamentaes da Carta de 1967. Essa antinomia precisava ser

    superada e o foi pela construo de uma extensa emenda constitucional, promulgada pela Junta

    Militar sob o pretexto jurdico de que, nos perodos de recesso do Congresso Nacional, competia

    ao Poder Executivo legislar sobre todas as matrias.

    A Emenda Constitucional n. 1 Constituio de 1967 considerada

    nova Constituio, tantas as modificaes introduzidas por ela na lei de organizao bsica doEstado brasileiro. Permitiu ao Chefe do Executivo fechar o Congresso Nacional, as Assemblias

    Legislativas Estaduais e as Cmaras de Vereadores, exercendo em seu lugar as suas prerrogativas;

    suspender o mandato de parlamentares, incluindo o direito de suspender as prerrogativas polticas

    de qualquer cidado por dez anos; cercear as garantias da magistratura, como a vitaliciedade e a

    inamovibilidade; intervir na estabilidade dos funcionrios pblicos; retirar da esfera de apreciao

    do Poder Judicirio algumas matrias que versassem sobre segurana nacional, podendo at

    mesmo ser impedido o habeas corpusnos casos de crimes contra a segurana nacional, a ordem

    econmica e social e a economia popular.

    Houve uma diminuio da autonomia dos Estados e Municpios, com a

    conseqente centralizao do poder nas mos do Presidente da Repblica. A concentrao

    tributria pela Unio ressuscitou a poltica de pires na mo, realizada pela Primeira Repblica. O

    Presidente da Repblica poderia legislar fartamente, por meio de decreto-lei.

    Os direitos e garantias constitucionais se tornaram deleites formais para

    estudiosos, predominando na realidade o autoritarismo, a censura e a tortura. Aqueles que

    tivessem a ousadia de discordar do regime eram perseguidos; o direito de reunio e de liberdade

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    de expresso foram arrefecidos. As suspenses dos direitos e garantias fundamentais eram feitas

    em nome da segurana nacional.

    Formalmente, as eleies foram mantidas. Estabeleceu-se um

    bipartidarismo (Ato Institucional n. 2), composto pela ARENA, o maior partido do Ocidente, e

    o MDB, que reunia os opositores ao regime. O Presidente era escolhido de forma indireta pelo

    Congresso Nacional, e sempre era um general o escolhido para um mandato determinado, e, a

    cada eleio que a oposio ameaava ganhar, havia uma modificao nas regras do jogo, que o

    impedia.

    O Congresso Nacional era constantemente constrangido nas sua

    votaes. Vrias vezes pairou ameaa contra os parlamentares, tendo sido o Poder Legislativo em

    algumas ocasies fechado compulsoriamente por ordem do General Presidente de planto.

    Um dos poucos avanos nessa Carta foi o de possibilitar a

    desapropriao das terras improdutivas, para fins de reforma agrria, utilizando-se como

    indenizao ttulos da dvida pblica.

    A principal caracterstica dessa Constituio era o art. 182, estabelecendo

    que continuavam em vigor o Ato Institucional n. 5 e os demais atos institucionais

    posteriormente baixados. Assim, alguns doutrinadores a consideram a anticonstituio, pois o

    prprio Texto Constitucional admitia a existncia de duas ordens, uma constitucional e outra

    institucional, com a subordinao da primeira segunda. Pela ordem institucional o Presidente da

    Repblica poderia, como fez, sem qualquer controle judicial, fechar o Congresso Nacional,

    intervir em Estados e Municpios, suspender direitos, cassar mandatos legislativos, confiscar bens

    e sustar garantias de funcionrios, sobrepondo-se a direitos nominalmente tutelados pela ordem

    constitucional.

    8 Constituio de 1988

    A gnese da atual Carta reside tanto na falncia do modelo econmico,

    imposto desde a implantao da ditadura, amparado no endividamento externo, quanto na

    campanha das diretas j, que empolgou de forma inaudita a populao brasileira, sepultando de

    vez o regime autoritrio instaurado em 1964. Na verdade, os prprios militares preparavam o

    retorno para o regime democrtico desde a distenso lenta e gradual do governo Geisel, a anistia

    poltica, o processo de abertura do governo Figueiredo e a eleio indireta de Tancredo Neves e

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    Jos Sarney pelo Congresso Nacional para os cargos de Presidente e Vice-Presidente da

    Repblica. Por outro lado, as foras oposicionistas conseguiram obter sucessivas vitrias nas

    eleies realizadas e mobilizar a opinio pblica e as foras da sociedade civil para o processo de

    redemocratizao do Estado brasileiro. A capacidade de negociao dos lderes oposicionistas e a

    existncia de divergncias no partido de sustentao do governo contriburam para a vitria das

    foras democrticas na eleio indireta realizada pelo Congresso.

    A convocao de um Poder Constituinte foi realizada pela Emenda n.

    26 Constituio de 1967, encaminhada pelo Presidente Jos Sarney ao Congresso Nacional em

    1985, o que no retira o carter de inicialidade do seu Texto. Alguns autores, como Manoel

    Gonalves Ferreira Filho, alegam que a Constituio de 1988 foi um projeto realizado por um

    Poder Reformador e, portanto, poderia ser alterado em sua totalidade por emendas

    constitucionais. A maioria, no entanto, entende que, mesmo chamada a ser realizada por emenda,

    a Constituinte de 1988 exerceu plenipotenciariamente os seus poderes, graas legitimao

    popular de que estava imbuda. De todos os Textos Constitucionais, foi o que mais apresentou

    legitimidade por parte da populao. A maior evidncia de que a constituio atual fruto de um

    poder constituinte originrio foi a realizao do plebiscito pelo qual o povo pde escolher a

    forma de governo a ser adotada pelo estado brasileiro: Repblica ou Monarquia. A Repblica era

    uma das clusulas ptreas de todas as Constituies republicanas; s foi possvel a realizao da

    consulta popular em razo de a Assemblia Nacional Constituinte possuir poderes prprios de

    um constituinte originrio, no estando subordinado a limitaes anteriormente existentes.

    Com a posse do governo de transio, seu objetivo imediato foi o de

    convocar uma Assemblia Nacional Constituinte que elaborasse um novo Texto Constitucional,

    arejando com bafejo democrtico as normas jurdicas e pavimentando o caminho para surgimento

    de um Estado Democrtico de Direito.

    A eleio dos deputados constituintes foi precedida por uma intensa

    mobilizao popular, que perdurou durante os trabalhos da Assemblia Constituinte. Repita-se:

    dentre todas as Constituies, foi a que contou com maior apoio popular. Com isso, a feitura de

    suas normas atendeu aos interesses da maioria da populao, promulgando-se em 5 de outubro de

    1988 a Constituio Cidad, na feliz expresso de Ulysses Guimares, Presidente da Assemblia

    Nacional Constituinte, em razo de ser amplamente voltada para a defesa dos direitos dos

    cidados.

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    O ambiente social que a respaldou ensejou que a Constituio de 1988

    seguisse os parmetros mais avanados dos Textos Constitucionais contemporneos. Vrios

    institutos jurdicos foram alados em nvel constitucional pela primeira vez, como o mandado de

    segurana coletivo, o habeas data, o mandado de injuno e a ao de inconstitucionalidade por

    omisso. Igualmente foram disciplinadas pela primeira vez na Constituio matrias de relevante

    respaldo social, como um captulo especfico sobre o meio ambiente.

    A acusao de que a Constituio Cidad tornaria o Pas ingovernvel

    no prosperou, mas h falta de efetividade em diversas de suas normas. Ainda assim, foi a melhor

    Constituio at agora elaborada.

    ESTRUTURA

    A instalao da Assemblia Nacional Constituinte, praticamente

    descartado o trabalho da Comisso Provisria de Estudos Constitucionais comandada por Afonso

    Arinos de Melo Franco entre 1985 e 1986, ocorreu em primeiro de fevereiro de 1987, sob a

    presidncia do Ministro Jos Carlos Moreira Alves, ento presidente do Supremo TribunalFederal. No dia seguinte, o Deputado Ulysses Guimares foi eleito presidente da Constituinte, e

    elaborou o seu regimento interno, aprovado no dia 24 de maro. Foram formadas 24 (vinte e

    quatro) subcomisses incumbidas de elaborar a nova Constituio, em trabalho findo em 25 de

    maio, aperfeioado por 8 (oito) comisses temticas, que encaminharam o anteprojeto

    Comisso de Sistematizao. O relator dessa comisso, Bernardo Cabral, apresentou um trabalho

    unificado em uma pea de 551 artigos. Tal projeto recebeu 5.615 emendas, passando depois a

    Plenrio. No dia 26 de agosto, com base em 20.790 emendas do Plenrio e 122 emendas

    populares, Bernardo Cabral apresentou um substitutivo com 374 artigos na Comisso. Ainda nodia 15 de setembro foram examinadas 14.320 emendas ao substitutivo, sendo elaborado outro

    anteprojeto com 336 artigos. O trabalho foi para o Plenrio, que no havia sido ainda ouvido,

    uma vez que se decidira que nada seria aprovado sem a maioria absoluta do Congresso

    Constituinte, mesmo que j aprovado na Comisso. No dia 10 de novembro, o grupo chamado

    Centro, de parlamentares de carter interpartidrio e contrrio aos critrios regimentais,

    apresentou em Plenrio projeto de alterao do regimento com 319 assinaturas, permitindo

    apresentao de emendas ao projeto da Comisso de Sistematizao, para atender ao disposto na

    Ementa Convocatria da Assemblia Nacional Constituinte. O Plenrio adotou esse

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    posicionamento. Os trabalhos prosseguiram lentamente em dois turnos de votao, dando

    margem promulgao em 5 de outubro de 19887.

    O processo que formulou a Constituio de 1988 incentivou a

    participao das mais diversas foras polticas existentes no Pas, realizando um texto que no tem

    uma clara linha ideolgica. Para que a Carta Magna possa ter eficcia concretiva integral,

    impedindo que as normas constitucionais se choquem, provocando antinomias normativas,

    necessrio interpret-las de maneira sistmica, compatibilizando os princpios com os valores

    sociais que vo sendo sedimentados paulatinamente no inconsciente da populao. Essa viso

    sistmica da constituio impede a existncia de antinomias e de hierarquizaes de suas normas.

    Inexistindo hierarquizao jurdica, o que h so divises por espaos de incidncia, em que cada

    norma ocupa uma determinada funo. A maior atuao de determinados mandamentos decorre

    no de uma valorao pr-fixada no texto Maior, mas da valorao que as foras sociais vo

    imprimindo em relao a determinados princpios, que passam a ganhar maior ou menor respaldo

    na sociedade.

    A ausncia de uma linha ideolgica nica no retira valor ou mrito nossa Lei Suprema, que tem 344 (trezentos e quarenta e quatro) artigos (250 + 94 do ADCT),

    sendo analtica e uma das maiores do mundo. J sofreu 45 (quarenta e cinco) emendas

    constitucionais, alm de 6 (seis) emendas de reviso, nos termos do seu art. 60, combinado com o

    art. 3.odo Ato das Disposies Constitucionais Transitrias.

    IMPORTNCIA E DISPOSIES ESPECFICAS NOS RELACIONAMENTOS:

    Nao/Estado

    Nao termo que se refere ao agrupamento humano, em geral

    numeroso, cujos membros, fixados em um territrio, so ligados por laos histricos, culturais,

    econmicos e lingsticos. Conforme ensina A. Dardeau de Carvalho, a complexidade do fenmeno

    nao, sem dvida, resulta da multiplicidade de fatores que entram na sua composio, uns de natureza objetiva,

    outros de natureza subjetiva. A raa, a religio, a lngua, os hbitos e costumes, so os fatores objetivos que

    7FERREIRA, Pinto. Curso de Direito Constitucional. 11.a. ed. So Paulo: Saraiva, 2001, pp. 66-7.

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    permitem distinguir as naes entre si. A conscincia coletiva, o sentimento da comunidade de origem, fator

    subjetivo da distino.8

    Por sua vez, Estado uma ordenao que tem por fim especfico e

    essencial a regulamentao global das relaes sociais entre os membros de uma dada populao

    sobre um dado territrio, na qual a palavra ordenao expressa a idia de poder soberano,

    institucionalizado. O Estadoconstitui-se de quatro elementos essenciais: umpoder soberanode

    umpovosituado num territriocom certas finalidades(a constituio o conjunto de normas

    que organizam esses elementos constitutivos do Estado: povo, territrio, poder e fins).

    Assim, haveria falta de juridicidade no termo nacionalidade, que,

    partindo da idia de nao, englobaria somente os indivduos que pertencessem a determinado

    grupo ligado pela raa, religio, hbitos e costumes. De fato, em um contexto sociolgico,

    utilizando lio do portugus Marcelo Caetano, nacionais seriam todos quantos nascem num certo

    ambiente cultural feito de tradies e costumes, geralmente expresso numa lngua comum, actualizado num idntico

    conceito de vida e dinamizado pelas mesmas aspiraes de futuro e os mesmos ideais coletivos.

    Bobbio j o define afirmando que normalmente nao concebida como umagrupo de pessoas unidas por laos naturais e portanto eternos ou pelo menos existentes ab immemorabili e

    que, por causa destes laos, se torna a base necessria para a organizao do poder sob a forma do Estado

    nacional9. Fato que tal terminologia encontra-se generalizada em diversos ordenamentos

    jurdicos, sendo nacionalidade ovnculo jurdico poltico que liga um indivduo a um certo e

    determinado Estado, fazendo deste indivduo um componente do povo, da dimenso pessoal

    deste Estado, capacitando-o a exigir sua proteo e sujeitando-o ao cumprimento de deveres

    impostos.

    A competncia para legislar sobre nacionalidade exclusiva do prprioEstado, sendo incontroversa a total impossibilidade de ingerncia normativa de direito

    estrangeiro.

    Doutrinariamente, distinguem-se a nacionalidade primria, originria

    ou de origem, que resulta do nascimento, sendo estabelecida por critrios sangneos, territoriais

    ou mistos, e a nacionalidade secundriaou adquiridapor vontade prpria, aps o nascimento

    e, em regra, pela naturalizao.

    8

    CARVALHO, Alusio Dardeau de. Direito Constitucional. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1987, v. 2, p. 159.9. BOBBIO, Norberto et alii. Dicionrio de Poltica. V. 2. p. 796.

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    A Constituio Federal prev exaustiva e taxativamente as hipteses de

    aquisio da nacionalidade originria no seu art. 12, inc. I, adotando a regra dojus soli( nacional

    o nascido no territrio do Estado, independente da nacionalidade da sua ascendncia, desde que

    os pais estrangeiros no estejam a servio de seu pas), mitigada pela adoo do jus sanguinis

    somado a determinados requisitos (nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou me brasileira,

    desde que qualquer deles esteja a servio da Repblica Federativa do Brasil, ou desde que venham

    a residir no Brasil e optem pela nacionalidade brasileira). Na redao original da Constituio

    havia, ainda, a hiptese de jus sanguinis cumulada ao registro em repartio brasileira competente

    (embaixada ou consulado), suprimida pela Emenda Constitucional de Reviso n. 3, de 7 de junho

    de 1994.

    A naturalizao, meio derivado de aquisio da nacionalidade, seja pelo

    estrangeiro, seja pelo aptrida, ato de soberania estatal, discricionrio do Chefe do Poder

    Executivo, no havendo direito subjetivo sua obteno.

    H quatro hipteses constitucionais de tratamento diferenciado entre

    brasileiros natos e naturalizados, como excees taxativas ao princpio da igualdade: cargos(CF, art. 12, 3.), sendo privativos de brasileiros natos os cargos na linha sucessria do

    Presidente da Repblica (Presidente e Vice-Presidente da Repblica, Presidente da Cmara dos

    Deputados; Presidente do Senado Federal; Ministro do Supremo Tribunal Federal) e funes

    estratgicas ligadas aos negcios do Estado e segurana nacional (carreira diplomtica, oficial das

    Foras Armadas e Ministro de Estado da Defesa; observe-se que o cargo de Ministro das

    Relaes Exteriores no privativo de brasileiro nato); funo (CF, art. 89, VII), sendo

    reservados a brasileiros natos os seis assentos reservados a cidados no Conselho da Repblica (o

    brasileiro naturalizado pode fazer parte do Conselho como lder da maioria ou da minoria da

    Cmara dos Deputados e no Senado Federal ou como Ministro da Justia); extradio(CF, art.

    5., LI), pois enquanto o brasileiro nato nunca ser extraditado, o brasileiro naturalizado pode s-

    lo em duas hipteses: por crime comum, praticado antes da naturalizao, e quando da

    participao comprovada em trfico ilcito de entorpecentes e drogas afins, na forma da lei,

    independentemente do momento do fato; e direito de propriedade (CF, art. 222), sendo

    privativa de brasileiros natos ou naturalizados h mais de 10 (dez) anos ou de pessoas jurdicas

    constitudas sob as leis brasileiras e que tenham sede no Pas a propriedade de empresa

    jornalstica e de radiodifuso sonora e de sons e imagens.

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    H hipteses constitucionais taxativas de perda do direito de

    nacionalidade, seja quando o brasileiro tiver sua naturalizao cancelada, por sentena judicial em

    virtude de atividade nociva ao interesse nacional; seja quando voluntariamente adquirir outra

    nacionalidade, salvo nos casos de reconhecimento de nacionalidade originria pela lei estrangeira,

    e de imposio de naturalizao, pela norma estrangeira, ao brasileiro residente em Estado

    estrangeiro, como condio para permanncia em seu territrio ou para o exerccio de direitos

    civis.

    Aquele que teve a naturalizao cancelada nunca poder recuperar a

    nacionalidade brasileira perdida, salvo se o cancelamento for desfeito em ao rescisria. O que a

    perdeu por naturalizao voluntria poder readquiri-la por decreto do Presidente da Repblica,

    se estiver domiciliado no Brasil (Lei n. 818/49, art. 36), sem efeito retroativo e nas condies de

    antes da perda. Aquele que, eventualmente, a tenha perdido, nos termos de constituies

    anteriores, por ter aceitado comisso, emprego ou penso de governo estrangeiro, sem licena do

    Presidente da Repblica, poder agora recuper-la sem mesmo renunci-los, como se exigia antes,

    porquanto o fato no constitui mais causa de perda da nacionalidade.

    Federao/Unidades Federais

    A Constituio Federal de 1988 adotou como forma de Estado o

    federalismo, que na conceituao de Dalmo de Abreu Dallari uma aliana ou unio de Estados,

    baseada em uma Constituio e onde os Estados que ingressam da federao perdem sua soberania no

    momento mesmo do ingresso, preservando, contudo, uma autonomia poltica limitada.10Dessa forma, difere

    do Estado Unitrio, que rigorosamente centralizado e identifica um mesmo poder, para um

    mesmo povo, num mesmo territrio, caracterizando-se pela centralizao poltico-administrativa

    em um s centro produtor de decises. Igualmente difere da Confederao, que consiste na uniode Estados-soberanos por meio de um tratado internacional indissolvel.

    A adoo da espcie federal de Estado gravita em torno do princpio da

    autonomia e da participao poltica e pressupe a consagrao de certas regras constitucionais,

    tendentes no-somente sua configurao, mas tambm sua manuteno e indissolubilidade.

    Como ressaltado por Geraldo Ataliba, exsurge a Federao como a associao

    de Estados (foedus, foederis) para formao de novo Estado (o federal) com repartio rgida de atributos da

    10DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado.11. ed. So Paulo: Saraiva, 1985. p. 227.

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    soberania entre eles. Informa-se seu relacionamento pela autonomia recproca da Unio e dos Estados, sob a gide

    da Constituio Federal (Sampaio Dria), caracterizadora dessa igualdade jurdica (Ruy Barbosa), dado que

    ambos extraem suas competncias da mesma norma (Kelsen). Da cada um ser supremo em sua esfera, tal como

    disposto no Pacto Federal (Victor Nunes).11

    O mnimo necessrio para a caracterizao da organizao constitucional

    federalista exige, inicialmente, a deciso do legislador constituinte, por meio da edio de uma

    constituio, em criar o Estado Federal e suas partes indissociveis, a Federao ou Unio, e os

    Estados-membros, pois a criao de um governo geral pressupe a renncia e o abandono

    de certas pores de competncias administrativas, legislativas e tributrias por parte dos

    governos locais. Essa deciso est consubstanciada nos arts. 1. e 18 da Constituio de 1988.

    Alm disso, a constituio deve estabelecer os seguintes princpios:

    - os cidados dos diversos Estados-membros aderentes Federao devempossuir a nacionalidade nica dessa;

    - repartio constitucional de competncias entre a Unio, Estados-membros,Distrito Federal e municpio;

    - necessidade de que cada ente federativo possua uma esfera de competnciatributria que lhe garanta renda prpria;

    - poder de auto-organizao dos Estados-membros, Distrito Federal emunicpios, atribuindo-lhes autonomia constitucional;

    - possibilidade constitucional excepcional e taxativa de interveno federal, paramanuteno do equilbrio federativo;

    - participao dos Estados no Poder Legislativo Federal, de forma a permitir-se a ingerncia da sua vontade na formao da legislao federal;

    - possibilidade de criao de novo Estado ou modificao territorial de Estado

    existente dependendo da aquiescncia da populao do Estado afetado;- a existncia de um rgo de cpula do Poder Judicirio para interpretao e

    proteo da Constituio Federal.12

    Note-se que, expressamente, o legislador constituinte determinou a

    impossibilidade de qualquer proposta de emenda constitucional tendente a abolir a Federao

    (CF, art. 60, 4., I).

    11

    ATALIBA, Geraldo. Repblica e Constituio. So Paulo: Revista dos Tribunais, 1985, p. 10.12MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 14. ed. So Paulo: Atlas, 2003, p. 267.

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    O artigo 1.da Constituio Federal afirma que a Repblica Federativa

    do Brasil formada pela unio indissolveldos Estados e municpios e do Distrito Federal;

    sendo completado pelo artigo 18, que prev que a organizao poltico-administrativa da

    Repblica Federativa do Brasil compreende a Unio, os Estados, o Distrito Federal e os

    municpios, todos autnomos e possuidores da trplice capacidade de auto-organizao e

    normatizao prpria, autogoverno e auto-administrao.

    Tendo o princpio da indissolubilidade do vnculo federativo dupla

    finalidade (de unio nacional e necessidade descentralizadora), inadmissvel qualquer pretenso

    de separao de um Estado-membro, do Distrito Federal ou de qualquer municpio, inexistindo

    em nosso ordenamento jurdico o denominado direito de secesso. A mera tentativa de

    secesso do Estado-membro permitir a decretao de interveno federal (CF, art. 34, I),

    devendo sempre a Constituio ser interpretada de sorte que no ameace a organizao federal

    por ela instituda, ou ponha em risco a coexistncia harmoniosa e solidria da Unio, Estados e

    municpios.

    A Constituio determina que Braslia a Capital Federal (CF, art. 18, 1.), tratando-se de inovao do constituinte de 1988, que no mais definiu o Distrito Federal

    como a Capital, pois esse o ente federativo que engloba aquela, ao qual vedado dividir-se em

    municpios (CF, art. 32, caput). Distinguem-se, assim, a Capital Federal do Pas, civitas civitatum,

    cidade-centro, de onde partem aos governados as decises mais graves e onde acontecem os fatos

    decisivos para os destinos do Pas, da circunscrio territorial representada na Federao pelo

    Distrito Federal.

    A Unio entidade federativa autnoma em relao aos Estados-

    membros e municpios, constituindo pessoa jurdica de Direito Pblico Interno, cabendo-lheexercer as atribuies da soberania do Estado brasileiro. No se confunde com o Estado Federal,

    este sim pessoa jurdica de Direito Internacional e formado pelo conjunto de Unio, Estados-

    membros, Distrito Federal e municpios.

    A autonomia dos Estados-membros caracteriza-se pela denominada

    trplice capacidade de auto-organizao e normatizao prpria, autogoverno e auto-

    administrao.

    Os Estados-membros se auto-organizampor meio do exerccio de seu

    poder constituinte derivado-decorrente, consubstanciando-se na edio das respectivas

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    Constituies Estaduais e, posteriormente, de sua prpria legislao (CF, art. 25, caput), sempre,

    porm, respeitando os princpios constitucionais sensveis (que do margem interveno

    federal CF, art. 34, VII), princpios federais extensveis (normas centrais comuns Unio,

    Estados, Distrito Federal e municpios, de observncia obrigatria no poder de organizao do

    Estado) e princpios constitucionais estabelecidos (normas que se encontram espalhadas pelo

    texto constitucional, que organizam a prpria federao e estabelecem preceitos centrais de

    observncia obrigatria aos Estados-membros em sua organizao, dividindo-se em normas de

    competncia(arts. 23; 24; 25; 27, 3.0., 75; 96, I, a-f; 96, II, a-d, III; 98, I e II; 125, 4.; 144,

    4., 5. e 6.; 145, I, II e III; 155, I, a, b, c, II) e normas de preordenao(arts. 27; 28; 37, I a

    XXI, 1. a 6.; 39 a 41; 42, 1. a 11; 75; 95, I, II e III; 95, ; 235, I a XI)).

    A autonomia estadual tambm se caracteriza pelo autogoverno, uma vez

    que o prprio povo do Estado quem escolhe diretamente seus representantes nos Poderes

    Legislativo e Executivo locais, sem que haja qualquer vnculo de subordinao ou tutela por parte

    da Unio. A Constituio Federal prev expressamente a existncia dos Poderes Legislativo (CF,

    art. 27), Executivo (CF, art. 28) e Judicirio (CF, art. 125) estaduais.

    Completando a trplice capacidade garantidora da autonomia dos entes

    federados, os Estados-membros se auto-administram no exerccio de suas competncias

    administrativas, legislativas e tributrias definidas constitucionalmente, devendo-se destacar que

    est implcito no exerccio da competncia tributria a existncia de um mnimo de recursos

    financeiros, obtidos diretamente por meio de sua prpria competncia tributria.

    A Constituio Federal de 1988 consagrou o municpiocomo entidade

    federativa indispensvel ao nosso sistema federativo, integrando-o na organizao poltico-

    administrativa e garantindo-lhe plena autonomia, como se nota da anlise dos arts. 1., 18, 29, 30e 34, VII, c, da Constituio. Ressalta Paulo Bonavides que no conhecemos uma nica forma de unio

    federativa contempornea onde o princpio da autonomia municipal tenha alcanado grau de caracterizao poltica

    e jurdica to alto e expressivo quanto aquele que consta da definio do novo modelo implantado no Pas com a

    Carta de 198813

    Doutrinariamente, no entanto, discute-se a posio dos municpios em

    nossa federao, havendo autores de peso, como Hely Lopes Meirelles, que defendem serem

    entidades integrantes e necessrias ao nosso sistema federativo, e alguns poucos, como Jos

    13BONAVIDES, Paulo.Curso de Direito Constitucional. 6. ed. So Paulo: Malheiros, 1996, p. 314.

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    Afonso da Silva, que sustentam que h apenas uma autonomia poltico-constitucional, que no

    leva sua integrao ao conceito de entidade federativa.14

    A autonomia municipal, da mesma forma que a dos Estados-membros,

    configura-se pela trplice capacidade de auto-organizao e normatizao prpria,

    autogovernoe autoadministrao. Dessa forma, o municpio auto-organiza-sepor meio de

    sua Lei Orgnica Municipal e, posteriormente, por intermdio da edio de leis municipais;

    autogoverna-se mediante a eleio direta de seu prefeito, vice-prefeito e vereadores, sem

    qualquer ingerncia dos governos federal e estadual; e, finalmente, auto-administra-se, no

    exerccio de suas competncias administrativas, tributrias e legislativas, diretamente conferidas

    pela Constituio Federal.

    O Distrito Federal tem a natureza de ente federativo autnomo, em

    virtude da presena de sua trplice capacidade de auto-organizao, autogoverno e

    autoadministrao (CF, arts. 1., 18, 32, 34), sendo-lhe vedada a possibilidade de subdividir-se

    em municpios. No Estado-membro, nem tampouco municpio, tendo, porm, em regra, todas

    as competncias legislativas e tributrias reservadas aos Estados e municpios (CF, arts. 32 e 147),excetuando-se somente a regra prevista no art. 22, XVII, da Constituio Federal (Compete

    privativamente Unio legislar sobre organizao judiciria, do Ministrio Pblico e da Defensoria Pblica do

    Distrito Federal e dos Territrios, bem como organizao administrativa destes).

    Os Territrios Federais integram a Unio, e sua criao, transformao

    em Estado ou reintegrao ao Estado de origem sero reguladas em lei complementar (CF, art.

    18, 2.). Dessa forma, no so componentes do Estado Federal, pois constituem simples

    descentralizaes administrativas-territoriais da prpria Unio, no dotados de capacidade

    poltica. Atualmente, no h territrios federais, embora a prpria Constituio Federal permita asua criao (CF, art. 18, 3.).

    H vedaes constitucionais de natureza federativa Unio, aos Estados,

    ao Distrito Federal e aos municpios, que no podem (CF, art. 19):

    - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencion-las, embaraar-

    lhes o funcionamento ou manter com eles ou com seus representantes relaes de dependncia

    ou aliana, ressalvada, na forma da lei, a colaborao de interesse pblico. O Estado leigo ou

    14SILVA, Jos Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 18. ed. So Paulo: Malheiros, 2000, p.477.

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    laico, totalmente separado da Igreja, no havendo religio oficial. corolrio deste princpio a

    vedao constitucional de instituio de impostos sobre templos de qualquer culto (CF, art. 150,

    VI, b);

    - recusar f aos documentos pblicos;

    - criar distines entre brasileiros princpio da isonomia federativa;

    - criar preferncias entre si. Como corolrio desse princpio h a

    vedao Unio, Estados, Distrito Federal e municpios de instituio de impostos sobre

    patrimnio, renda ou servios, uns dos outros (CF, art. 150, VI, a), sendo a imunidade recproca

    da prpria essncia do pacto federal, posto que entes que se encontram no mesmo plano no tm

    relaes de poder recproco. A imunidade tributria recproca refora a idia central da Federao,

    baseada na diviso de poderes e partilha de competncias entre os diversos entes federativos,

    todos autnomos, e tem sido consagrada no direito constitucional brasileiro como uma dos

    dogmas bsicos do nosso Estado Federal, intangvel em face da expressa previso do art. 60, 4.,

    inciso I, da Constituio Federal.

    A autonomia das entidades federativas pressupe repartio de

    competncias legislativas, administrativas e tributrias, sendo, pois, um dos pontos

    caracterizadores e asseguradores do convvio no Estado Federal.

    Na definio de Jos Afonso da Silva, competncia a faculdade

    juridicamente atribuda a uma entidade ou a um rgo ou agente do Poder Pblico para emitir decises.

    Competncias so as diversas modalidades de poder de que se servem os rgos ou entidades estatais para realizar

    suas funes15.

    A prpria Constituio estabelece as matrias prprias de cada um dosentes federativos, Unio, Estados-membros, Distrito Federal e municpios, a partir disso

    acentuando a centralizao de poder no ente que desejar.

    No entanto, embora o princpio federativo seja uma das vigas mestras

    sobre as quais se eleva o travejamento constitucional, a realidade no confirma a significao dada

    federao, sendo muito provvel que, como conclui Celso Ribeiro Bastos, nenhum princpio

    tenha sido to fortemente degradado quanto o federativo16. Sob muitos aspectos, a autonomia

    15

    SILVA, Jos Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 18. ed. So Paulo: Malheiros, 2000, p.481.16BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. 20. ed. So Paulo: Saraiva, 1999, p. 281.

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    estadual uma irriso. Fatores diversos tm demonstrado que muitos Estados-membros no tm

    condies de sobreviver financeiramente se lhes faltar o apoio do governo federal. Por outro

    lado, a partilha constitucional de competncias, como veremos a seguir, no aquinhoa

    devidamente Estados e Municpios, centralizando, ainda, nas mos da Unio, a determinao, ao

    menos nos seus princpios gerais, das diretrizes a prevalecerem em todos os campos legislativos.

    No intuito de fornecer aos Estados e Municpios os recursos necessrios

    ao desempenho de suas atribuies, a Constituio complementou a repartio de competncia

    tributria com um sistema de quotas de participao. O sistema de repartio da competncia

    tributria em crculos exclusivos tem a vantagem de assegurar a autonomia dos Estados e

    Municpios, j que lhes assegura renda tributria independente de qualquer condicionamento.

    Tem, porm, uma desvantagem pondervel. No serve para a distribuio de rendas ou para a

    igualizao de recursos, pois os tributos privativos apenas rendem onde h matria econmica

    para tributar e nas regies pobres falta o substrato econmico. Esse sistema tende a estimular a

    acentuao dos desnveis econmicos, muito pronunciados no Brasil. Da a convenincia de

    estabelecer um sistema de quotas de participao, pelas quais se assegura s unidades mais pobres

    recursos que atenuem os desnveis. O produto de certos tributos partilhado entre quem tem

    competncia para cri-lo, lan-lo e arrecad-lo, e outras entidades, redistribuindo esse produto,

    em funo de diferentes critrios17.

    A propsito da Federao na Constituio de 1988, continua Bastos18,

    O trao principal que marca profundamente a nossa j capenga estruturafederativa o fortalecimento da Unio relativamente s demais pessoas integrantes dosistema. lamentvel que o constituinte no tenha aproveitado a oportunidade paraatender ao que era o grande clamor nacional no sentido de uma revitalizao do nosso

    princpio federativo. O Estado brasileiro na nova Constituio ganha nveis decentralizao superiores maioria dos Estados que se consideram unitrios e que, pelavia de uma descentralizao por regies ou por provncias consegue um nvel detransferncia das competncias tanto legislativas quanto de execuo muito superiorquele alcanado pelo Estado brasileiro. Continuamos, pois, sob uma Constituioeminentemente centralizadora, e se alguma diferena existe relativamente anterior no sentido de que esse mal (para aqueles que entendem ser um mal) se agravousensivelmente.

    17FERREIRA FILHO, Manoel Gonalves. Curso de Direito Constitucional. 30 .a.ed. So Paulo: Saraiva, 2003, p. 63.18

    BASTOS, Celso Ribeiro. Op. cit. p.p. 293 e294.

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    De qualquer forma, o princpio geral que norteia a repartio de

    competncia entre as entidades componentes do Estado Federal o da predominncia do

    interesse, segundo o qual Unio caber aquelas matrias e questes de predominncia do

    interesse geral, ao passo que aos Estados referem-se as matrias de predominante interesse

    regional, e aos municpios concernem os assuntos de interesse local. Em relao ao Distrito

    Federal, por expressa disposio constitucional (CF, art. 32, 1.), acumulam-se, em regra, as

    competncias estaduais e municipais, com a exceo prevista no art. 22, XVII, da Constituio.

    O legislador constituinte, adotando o referido princpio, estabeleceu

    quatro pontos bsicos no regramento constitucional para a diviso de competncias

    administrativas e legislativas:

    1. Reserva de campos especficos de competncia administrativa e

    legislativa:

    Unio Poderes enumerados (CF, arts. 21 e 22)

    Estados Poderes remanescentes (CF, art. 25, 1.). A competncia

    remanescente dos Estados-membros a tcnica clssica adotada originariamente pela

    Constituio norte-americana e por todas as Constituies brasileiras desde a Repblica, e que

    presumia o benefcio e a preservao de autonomia desses em relao Unio, uma vez que a

    regra o governo dos Estados e a exceo o Governo Federal, sendo o poder reservado ao

    governo local mais extenso por ser indefinido e decorrer da soberania do povo enquanto o poder

    geral limitado e se compe de excees taxativas. No modelo brasileiro, no entanto, as

    competncias da Unio so bastante extensas, tornando a diviso bastante centralizadora,

    sobretudo em matria legislativa, tendo em vista a relevncia das disposies dos incisos do art.

    22. A Carta anterior continha uma preocupao de se apartarem competncias de maneira maisou menos ntida, de forma que os Estados e Municpios desfrutassem de uma competncia

    privativa, exclusiva. H, no entanto, grandes possibilidades de atuao dos Estados nos campos

    da segurana, da sade e da educao.

    Municpios Poderes enumerados (CF, art. 30)

    Distrito Federal Estados + Municpios (CF, art. 32, 1., com a

    exceo do art. 22, XVII)

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    2. Possibilidade de delegao (CF, art. 22, pargrafo nico) Lei

    complementar federal poder autorizar os Estados a legislar sobre questes especficas das

    matrias de competncia privativa da Unio.

    3. reas comuns de atuao administrativa paralela (CF, art. 23).

    4. reas de atuao legislativa concorrentes (CF, art. 24). A

    Constituio brasileira adotou a competncia concorrente no-cumulativa ou vertical, de

    forma que a competncia da Unio est adstrita ao estabelecimento de normas gerais, devendo osEstados e o Distrito Federal especific-las, por meio de suas respectivas leis. a chamada

    competncia suplementardos Estados-membros e do Distrito Federal (CF, art. 24, 2.). H

    tambm a competncia supletiva desses entes, que aparece em virtude da inrcia da Unio em

    editar a lei federal, adquirindo os Estados e o Distrito Federal, temporariamente, competncia

    plena tanto para a edio das normas de carter geral, quanto para normas especficas (CF, art. 24,

    3. e 4.). A supervenincia de lei federal sobre normas gerais suspende a eficcia da lei

    estadual, no que lhe for contrrio.

    Por fim, sendo regra a autonomia dos entes federativos, admite-se,excepcionalmente, o afastamento da autonomia poltica, com a finalidade de preservao da

    existncia e unidade da prpria Federao, por meio dainterveno.Esta se trata de ato poltico,

    consiste em medida excepcional de incurso da entidade interventora nos negcios da entidade

    que a suporta, com a supresso temporria da autonomia de determinado ente federativo,

    fundada em hipteses taxativamente previstas no texto constitucional (arts. 34 e 35), visando

    unidade e preservao da soberania do Estado federal e das autonomias da Unio, dos Estados,

    do Distrito Federal e dos Municpios. So pressupostos da interveno situaes crticas que

    pem em risco a segurana do Estado, o equilbrio federativo, as finanas do ente que sofre ainterveno e a estabilidade da ordem constitucional. A Unio, em regra, somente poder intervir

    nos Estados-membros e no Distrito Federal (ou municpios existentes dentro de Territrio

    Federal CF, art. 35, caput), enquanto os Estados somente podero intervir nos Municpios

    integrantes de seu territrio.

    Partido/Governo

    O partido poltico uma associao de pessoas, organizadas tendo em

    vista participar, de modo permanente, do funcionamento das instituies e buscar acesso ao

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    Poder, ou ao menos influenciar no seu exerccio, para fazer prevalecer as idias e os interesses de

    seus membros. Estas idias e estes interesses, reputados os mais convenientes para a comunidade,

    se pretende sejam convertidos em lei, ou em linhas de ao poltica do governo19.

    Os partidos originaram-se, como nota Maurice Duverger, em primeiro

    lugar, da criao de grupos parlamentares; depois, da apario dos comits eleitorais; finalmente,

    do estabelecimento da ligao permanentes entre esses dois elementos; a partir da universalizao

    do sufrgio, que requer entidade permanente que organize e coordene a vontade popular, foram-

    se firmando como instituies polticas indispensveis na estrutura do Estado contemporneo.

    Hoje, de fato ou de direito, no exagero afirmar que so os partidos que disputam, na Europa, na Amrica do

    Norte, as eleies. Sem a sua organizao e seus fundos difcil que um candidato possa eleger-se20.

    No Brasil, desconhecidos pela Constituio e Legislao Imperial, os

    partidos atuavam como associaes inorgnicas formadas com base nos interesses de grupos.

    Havia dois partidos: o Liberal e o Conservador, que apresentavam poucas diferenas. A

    Constituio Republicana de 1891 tambm os ignorou, no passando de instrumentos de

    expresso e dominao das oligarquias estaduais. A partir de 1930, comeam as transformaesem matria partidria. A primeira manifestao nesse sentido surgiu com o Cdigo Eleitoral

    expedido pelo Governo Provisrio em 1932, que instituiu a representao proporcional, o voto

    secreto e a Justia Eleitoral. Mas na Constituio de 1946 que eles comeam a firmar sua

    institucionalizao jurdica, pois nela feita explcita consignao dos Partidos Nacionais aos

    quais seria assegurada a representao proporcional nas Comisses Parlamentares. At 1965,

    houve um processo constante de fortalecimento dos partidos, resultando em uma maior

    identificao entre as cpulas e as bases partidrias. Houve, entretanto, uma queda brusca nesta

    ascenso com a edio do Ato Institucional n. 2, que extinguiu os partidos polticos existentes,

    exigindo condies que viabilizaram a existncia de apenas dois partidos: Arena e MDB21.

    A Constituio Federal de 1988 regulamentou os partidos polticos (CF,

    art. 17) como instrumentos necessrios e importantes para a preservao do Estado Democrtico

    de Direito, afirmando a liberdade de criao, fuso, incorporao e extino de partidos polticos,

    resguardados a soberania nacional, o regime democrtico, o pluripartidarismo, os direitos

    fundamentais da pessoa humana e observados os preceitos de carter nacional, proibio de

    19MOREIRA REIS, Palhares. Cinco Estudos sobre Partidos Polticos. Recife: Universitria UFPE, 1999, p. 19.20

    FERREIRA FILHO, Manoel Gonalves. Curso de Direito Constitucional. 30.a.

    ed. So Paulo: Saraiva, 2003, p. 87.21BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. 20. ed. So Paulo: Saraiva, 1999, p. 278.

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    recebimento de recursos financeiros de entidade ou governo estrangeiros ou de subordinao a

    estes, prestao de contas Justia Eleitoral e funcionamento parlamentar de acordo com a lei.

    A Carta assegura aos partidos polticos autonomia para definir sua

    estrutura interna, organizao e funcionamento, devendo seus estatutos estabelecer normas de

    fidelidade e disciplina partidrias, sendo vedada a utilizao pelos partidos polticos de

    organizao paramilitar.

    Aps adquirirem personalidade jurdica, na forma da lei civil, os partidosregistram seus estatutos no Tribunal Superior Eleitoral e passam a ter direito a recursos do fundo

    partidrio e acesso gratuito ao rdio e televiso, na forma da lei.

    O constituinte fortaleceu a autonomia dos partidos polticos visando criar

    ou fortalecer partidos polticos slidos, comprometidos com determinada ideologia poltico-

    administrativa, uma vez que o partido h de ser o canal percorrido por parcela da opinio pblica

    para chegar ao governo e aplicar seu programa.

    De outra parte, o Estado, como estrutura social, carece de vontade real e

    prpria. Manifesta-se por seus rgos, supremos (constitucionais) ou dependentes

    (administrativos), que no exprimem seno vontade exclusivamente humana. O governo o

    conjunto de rgos mediante os quais a vontade do Estado formulada, expressada e realizada,

    ou o conjunto de rgos supremos a quem incumbe o exerccio das funes do poder poltico.

    Nesse contexto, vale examinar a questo do papel dos partidos na

    oposio. Se a Constituio pe a democracia e o pluralismo como princpios fundamentais,

    elencando ainda o pluripartidarismo como princpio de organizao partidria, segue-se o

    acolhimento de um sistema de partidos que, implicando um consenso fundamental, reconhece o

    dissenso e a previsibilidade da alternncia de poder, pois pluralismo envolve debates e

    divergncias na soluo dos problemas de governo. Pressupe maioria governante e minoria

    discordante e proteo desta.

    O partido ou partidos da situao, alm das funes prprias de todo

    partido, desempenham a funo governamental, procurando exercer o poder segundo a

    concepo de governo que informa seu programa. Enquanto isso, o partido ou os partidos de

    oposio, tambm, ademais daquelas funes assinaladas a todo partido, desenvolvem a funo

    de oposio, consistente em controlar a funo governamental, constituindo-se, alm disso, em

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    alternativa vlida para substituir o partido majoritrio na conduo do Estado, devendo para tanto

    ter garantido o direito de crtica e o acesso a toda informao estatal.

    Por fim, consideremos que os partidos exercem decisiva influncia no

    governo dos Estados contemporneos. Da, na lio de Jos Afonso da Silva22, nasce a concepo

    do Estado de Partido, que melhor se diria governo de partido, para denotar o primado dos

    partidos na organizao governamental de nossos dias. que o fenmeno partidrio permeia

    todas as instituies poltico-governamentais, como o princpio da separao de poderes, o

    sistema eleitoral, a tcnica de representao poltica. Segundo nosso direito positivo, os partidos

    destinam-se a assegurar a autenticidade do sistema representativo. So canais por onde se realiza a

    representao poltica do povo, desde que, no sistema ptrio, no se admitem candidaturas

    avulsas, ningum podendo concorrer a eleies se no for registrado por um partido. Isso

    explcito no art. 14, 3., V, da Constituio Federal, que exige a filiao partidriacomo uma

    das condies de elegibilidade.

    A reforma poltica em tramitao no Congresso Nacional est buscando

    o fortalecimento dos partidos polticos como forma de consagrao da democracia.O tempo no rdio e na televiso tem servido de moeda de barganha

    sobretudo para partidos pequenos, utilizada para obter vantagens para seus candidatos em

    acordos de escolha de candidatos. Alm disso, embora a Constituio habilite os estatutos

    partidrios a estabelecer normas de disciplina e fidelidade partidria, na realidade no impede que

    o eleito por um partido o deixe por outro, quando bem lhe parecer, ou que vote contra as

    diretrizes do seu programa. Segundo Manoel Gonalves Ferreira Filho, um dos problemas que

    afetam a governabilidade do Pas deriva das normas do estatuto constitucional dos partidos que,

    no fundo, de nada serve, pois no protege a democracia contra os grupos antidemocrticos, no serve valorizaodos programas de governos (e no da personalidade dos candidatos), no contribui para a formao de uma base

    estvel de governo, com a contrapartida de um ncleo coerente de oposio23.

    22SILVA, Jos Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 18. ed. So Paulo: Malheiros, 2000, p. 411.23

    FERREIRA FILHO, Manoel Gonalves. Curso de Direito Constitucional. 30.a.

    ed. So Paulo: Saraiva, 2003, pp.127-8.

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    Indivduo/Coletividade

    Na viso ocidental de democracia, governo pelo povo e limitao de

    poder esto indissoluvelmente combinados.24 O povo escolhe seus representantes que, agindo

    como mandatrios, decidem os destinos da nao. O poder delegado pelo povo a seus

    representantes no , no entanto, absoluto, conhecendo vrias limitaes, inclusive pela previso

    de direitos e garantias individuais e coletivas, do cidado em relao aos demais cidados e ao

    prprio Estado. No dizer de Canotilho, os direitos individuais cumprem a funo de direitos dedefesa dos cidados sob uma dupla perspectiva: (1) constituem, num plano jurdico-objectivo, normas de competncia

    negativa para os poderes pblicos, proibindo fundamentalmente as ingerncias destes na esfera jurdica individual;

    (2) implicam, num plano jurdico-subjectivo, o poder de exercer positivamente direitos fundamentais (liberdade

    positiva) e de exigir omisses dos poderes pblicos, de forma a evitar agresses lesivas por partes dos mesmos

    (liberdade negativa)25.

    O estabelecimento de constituies escritas est diretamente ligado

    edio de declaraes de direitos do homem, com a finalidade de estabelecimento de limites ao

    poder poltico, ocorrendo a incorporao de direitos subjetivos do homem em normasformalmente bsicas, subtraindo-se seu reconhecimento e garantia disponibilidade do legislador

    ordinrio.

    Enquanto os direitos de primeira gerao (direitos civis e polticos) que

    compreendem as liberdades clssicas, negativas ou formais realam o princpio da liberdade e os

    direitos de segunda gerao (direitos econmicos, sociais e culturais) que se identificam com as

    liberdades positivas, reais ou concretas acentuam o princpio da igualdade, os direitos de terceira

    gerao, que materializam poderes de titularidade coletiva atribudos genericamente a todas as

    formaes sociais, consagram o princpio da solidariedade e constituem um momento importanteno processo de desenvolvimento, expanso e reconhecimento dos direitos humanos,

    caracterizados enquanto valores fundamentais indisponveis, pela nota de uma essencial

    inexauribilidade.

    Assim, os direitos fundamentais de primeira geraoso os direitos e

    garantias individuais e polticos clssicos (liberdades pblicas), surgidos institucionalmente a partir

    da Magna Carta, na resistncia contra o Estado opressor, os privilgios da realeza, o modelo

    24

    FERREIRA FILHO, Manoel Gonalves. Estado de direito e Constituio. So Paulo: Saraiva, a988, p. 16.25CANOTILHO, J. J. Gomes. Direi