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A estabilização da tutela antecipada requerida em caráter antecedente Herbert Viana de Faria Vasconcelos Disciplina: Processo Civil IV Resumo O presente estudo visa debater sobre o instituto da estabilização da tutela antecipada requerida em caráter antecedente, novidade traga pelo novo Código de Processo Civil brasileiro, que entrou em vigor no dia 18 de março de 2016. Palavras-chave: Tutela de urgência. Tutela antecipada requerida em caráter antecedente. Estabilização de tutela. 1. Introdução Apesar da nomenclatura “tutela antecipada”, é preciso esclarecer que o objetivo da antecipação não é tutela jurisdicional em si, mas sim os efeitos práticos que seriam produzidos com a concessão definitiva da tutela pretendida pela parte autora da ação. Grosseiramente falando, seria um ato de arrastar parte da sentença (ato processual) para o início do processo, cujos efeitos já seriam produzidos no começo da ação.

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A estabilização da tutela antecipada requerida em caráter antecedenteHerbert Viana de Faria Vasconcelos

Disciplina: Processo Civil IV

ResumoO presente estudo visa debater sobre o instituto da estabilização da tutela

antecipada requerida em caráter antecedente, novidade traga pelo novo Código de

Processo Civil brasileiro, que entrou em vigor no dia 18 de março de 2016.

Palavras-chave: Tutela de urgência. Tutela antecipada requerida em caráter

antecedente. Estabilização de tutela.

1. Introdução

Apesar da nomenclatura “tutela antecipada”, é preciso esclarecer que o

objetivo da antecipação não é tutela jurisdicional em si, mas sim os efeitos práticos

que seriam produzidos com a concessão definitiva da tutela pretendida pela parte

autora da ação. Grosseiramente falando, seria um ato de arrastar parte da sentença

(ato processual) para o início do processo, cujos efeitos já seriam produzidos no

começo da ação.

O principal objetivo de uma tutela antecipada requerida em caráter

antecedente é a satisfatividade. Ainda que de forma provisória, é uma forma de

evitar todo o longo caminho processual até a prolação de uma sentença fundada em

cognição exauriente, onde de fato haverá a satisfação plena da medida. Isso se

deve pelo fato que determinado processo pode perder o seu objeto se houver uma

grande demora na prestação jurisdicional.

A tutela antecipada está prevista no capítulo II, do título II (Da tutela de

urgência), do capítulo V (Da tutela provisória), mais precisamente no art. 304 do

Código de Processo Civil. Por ser prevista no capítulo das tutelas provisórias, desde

já fica claro que se trata de algo temporário, e, se é temporário, está passível de

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mudança. Será que efetivamente sempre conseguimos modificar as tutelas

provisórias? E no caso de estabilização desta tutela?

2. Tutela de urgência

Por ser a tutela antecipada uma espécie de tutela de urgência, antes de pedir

a antecipação é preciso atender primeiro os requisitos do art. 300 do Código de

Processo Civil. O autor, ao elaborar a sua inicial, precisa demostrar a existência de

dois elementos:

• probabilidade do direito: é a plausibilidade de existência do direito, o

conhecido fumus boni iuris. É necessária a visualização de uma verdade provável

sobre os fatos, independentemente da produção de provas (DIDIER JR.; BRAGA;

OLIVEIRA, 2015, p. 595);

• perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo: “perigo que a

demora no oferecimento da prestação jurisdicional (periculum in mora) representa

para a efetividade da jurisdição e a eficaz realização do direito.” (DIDIER JR.;

BRAGA; OLIVEIRA, 2015, p. 597).

Interessante pontuar que o réu também pode formular pedido para obtenção

de uma tutela antecipada, como é o caso da reconvenção. Da mesma forma que o

autor, deverá o réu reconvinte atender todos os requisitos do art. 300 do Código de

Processo Civil.

Ao analisar a petição inicial, se o magistrado encontrar fundamentos que

motivem o seu livre convencimento, poderá ele de plano conceder liminarmente a

liminar inaudita altera parte. Se restar dúvidas sobre algum ponto, poderá o juiz

marcar audiência de justificação para que ele seja esclarecido; isto pode ser feito por

meio da oitiva de uma testemunha, por exemplo. Esta é a disposição do art. 300, §2º

do Código de Processo Civil.

Somente depois deste ato será feita a citação do sujeito passivo do processo,

para que ele tome conhecimento do feito e, querendo, intervenha no mesmo. Sobre

o tema, as lições de Humberto Theodoro Junior são precisas:

A concessão de liminar, todavia, não depende apenas de estar o requerente na iminência de suportar ato do requerido que venha a provocar a consumação do dano temido. O perigo tanto pode derivar de condutado

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demandado como de fato natural. O que justifica a liminar é simplesmente a possibilidade de o dano consumar-se antes da citação, qualquer que seja o motivo. Impõe-se o provimento imediato, porque, se se tiver de aguardar a citação, o perigo se converterá em dano, tornando tardia a medida cuja finalidade é, essencialmente, preveni-lo. (THEODORO JUNIOR, 2015, p. 814).

Quando houver perigo de irreversibilidade da tutela antecipada, o juiz não

deverá concedê-la, uma vez que estamos falando de sobre algo de caráter

transitório e não sobre o pedido final do processo. Sobre este tema, os

ensinamentos de DIDIER JR., BRAGA e OLIVEIRA são de grande valia:

Exige-se que os efeitos da tutela provisória satisfativa (ou antecipada) sejam reversíveis, que seja possível retornar-se ao status quo ante caso se constate, no curso do processo, que deve ser alterada ou revogada. Essa é a marca da provisoriedade/precariedade da referida tutela. Já que a tutela provisória satisfativa (antecipada) é concedida com base em cognição sumária, em juízo de verossimilhança - sendo passível de revogação ou modificação -, é prudente que seus efeitos sejam reversíveis. Afinal, caso ela não seja confirmada ao final do processo, o ideal é que se retorne ao status quo ante, sem prejuízo para a parte adversária. Conceder uma tutela provisória satisfativa irreversível seria conceder a própria tutela definitiva - uma contradição em termos. Equivaleria a antecipar a própria vitória definitiva do autor, sem assegurar ao réu o devido processo legal e o contraditório, cujo exercício, ante a irreversibilidade da situação de fato, tornar-se-ia absolutamente, inútil, como inútil seria, nestes casos, o prosseguimento do próprio processo. (DIDIER JR.; BRAGA; OLIVEIRA, 2015, p. 599-600).

Essa exigência legal do §3º do art. 300 deve ser observada com cuidado,

porque mesmo sendo irreversível, a tutela antecipada pode ser essencial para o

caso concreto. Deve o magistrado fazer uso então do princípio da proporcionalidade

- é o caso por exemplo de conflitos de interesses. DIDIER JR., BRAGA e OLIVEIRA

continuam versando sobre o tema:

Mas essa exigência legal deve ser lida com temperamentos, pois, se levada às últimas consequências, pode conduzir à inutilização da tutela provisória satisfativa (antecipada). Deve ser abrandada, de forma a que se preserve o instituto. Isso porque, em muitos casos, mesmo sendo irreversível a tutela provisória satisfativa - ex.: cirurgia em paciente terminal, despoluição de águas fluviais etc.-, o seu deferimento é essencial para que se evite um "mal maior" para a parte/requerente. Se o seu deferimento é fadado à produção de efeitos irreversíveis desfavoráveis ao requerido, o seu indeferimento também implica consequências irreversíveis em desfavor do requerente. Nesse contexto, existe, pois, o perigo da irreversibilidade decorrente da não-concessão da medida. Não conceder a tutela provisória satisfativa (antecipada) para a efetivação do direito à saúde pode, por exemplo, muitas vezes, implicar a consequência irreversível da morte do demandante. Existe, em tais situações, um conflito de interesses. Em razão da urgência e da probabilidade do direito da parte/requerente, é imprescindível que se

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conceda a tutela provisória satisfativa (antecipada), entregando-lhe, de imediato, o bem da vida, de forma a resguardar seu direito fundamental à efetividade da jurisdição. Diante desses direitos fundamentais em choque - efetividade versus segurança -, deve-se invocar a proporcionalidade, para que sejam devidamente compatibilizados. (DIDIER JR.; BRAGA; OLIVEIRA, 2015, p. 600-601).

Sobre a atuação do magistrado e a sua responsabilidade social, ASSIS

explana muito bem ao apontar situações que podem ser encontradas por quem está

investido no cargo público e a utilização do princípio da proporcionalidade para

resolver as questões de urgência:

O art. 300, § 3.º, reclama interpretação consentânea à CF/1988. Não representa veto absoluto, mas convite ao órgão judiciário para ponderar os direitos fundamentais dos litigantes em contraste em caso específico, e, principalmente, não impede a emissão de liminar, feita tal ponderação, nos casos em que a restituição em natura do autor não se mostre, a priori, viável. (...) Cabe ao juiz empregar, nesses casos, e nos que a rica criação social leva ao seu conhecimento, o princípio da proporcionalidade (art. 8.º do NCPC), aquilatando os interesses em jogo, e optando por sacrificar o menos valioso. Assim, chamado a decidir se autoriza a demolição de prédio de imenso valor histórico, mas que ameaça a segurança das edificações lindeiras, também relevantes do ponto de vista arquitetônico, o juiz depara-se com situação para a qual inexiste solução satisfatória, à primeira vista, invariavelmente implicando sacrifício para um dos valores em jogo. E avulta o fato de um dos polos de interesse encontrar respaldo em organização social sincera em seus propósitos, mas radical no uso dos meios, propondo-se a exercer pressão sobre a pessoa do juiz por intermédio de manifestações na porta da sede do juízo. A tudo o juiz sopesará, a fim de emitir a solução adequada. A vida profissional do homem e da mulher investidos na função judicante não raro traz opções dramáticas. Em determinado caso, particular acometido de grave enfermidade, cujo único paliativo consistiria em cirurgia de alto risco na capital do Estado-membro, requereu transporte aéreo da cidade de origem, sob pena de precipitação do óbito; porém, simultaneamente, a pessoa jurídica de direito público produziu prova convincente da impraticabilidade do traslado, por idêntico motivo: fatalmente provocaria o óbito. Situações desse naipe não tem solução à luz do ordenamento jurídico, mas demonstra imensa responsabilidade social da autoridade judiciária. (...) Exemplo mais evidente de medida de urgência satisfativa alheia ao alcance da proibição legal reponta, outra vez, no fornecimento de medicamentos, ou na realização de cirurgia. Em tais casos, passa à frente de outras considerações patrimoniais o princípio da dignidade da pessoa humana e o direito à vida. (ASSIS, 2015, p. 1614-1618).

Quando se trata de conflitos significativos de direitos fundamentais, um terá

que prevalecer sobre o outro, havendo um inevitável sacrifício. Nesse sentido,

ZAVASCKI apresenta um exemplo esclarecedor, vejamos:

Na justiça Federal, por exemplo, não são incomuns pedidos para liberação de mercadorias perecíveis, retidas na alfândega para exame sanitário que, por alguma razão (greve dos servidores, por exemplo), não é realizado.

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Nesses casos, a concessão liminar da tutela pedida compromete irremediavelmente o direito à segurança jurídica a que faz jus o demandado (liberada e comercializada a mercadoria, já não há que se falar em seu exame fitossanitário); seu indeferimento torna letra morta o direito à efetividade do processo, porque, deteriorando-se o produto, inútil será sua posterior liberação. Em casos dessa natureza, um dos direitos fundamentais colidentes será sacrificado, não por vontade do juiz, mas pela própria natureza das coisas. Ad impossibilia nemotenetur. Caberá ao juiz, com redobrada prudência, ponderar adequadamente os bens e valores colidentes e tomar a decisão em favor dos que, em cada caso, puderem ser considerados prevalentes à luz do direito. A decisão que tomar, em tais circunstâncias, é, no plano dos fatos, mais que antecipação provisória; é concessão ou denegação de tutela em caráter definitivo. (DIDIER JR.; BRAGA; OLIVEIRA, 2015, p. 602 apud ZAVASCKI, 1999, p.98).

2. Tutela de urgência antecipada requerida em caráter antecedenteEstando os dois elementos da tutela de urgência presentes, passemos agora

para a análise da tutela antecipada requerida em caráter antecedente. A tutela

antecipada antecedente será requerida dentro do processo onde se pedirá a tutela

final (definitiva). O seu principal objetivo é a antecipação dos seus efeitos, antes do

pedido de tutela final. (DIDIER JR.; BRAGA; OLIVEIRA, 2015, p. 602).

O art. 303, caput, do Código de Processo Civil estabelece que, quando a

urgência já existir no momento da propositura da ação, a petição inicial poderá

limitar-se a apenas ao pedido de antecipação da tutela (exposição do direito que se

busca alcançar e o perigo na demora) e a indicação do pedido final, que será

formulado posteriormente em um momento oportuno. Os parágrafos do mesmo

artigo ainda exigem que o autor indique o valor da causa, considerando o pedido da

tutela definitiva que ele pretende formular (§3º) e que ele comunique ao juiz que

“pretende valer-se do benefício da formulação do requerimento de tutela antecipada

em caráter antecedente, nos moldes do caput do art. 303, CPC (art. 303, §5°, CPC).”

(DIDIER JR.; BRAGA; OLIVEIRA, 2015, p. 603).

O legislador entendeu que por serem questões de urgência, a princípio, não e

necessário preencher todos os requisitos da petição inicial listados no art. 319 do

Código de Processo Civil. O autor pode então limitar a sua inicial apresentando o

fato e o direito que ele necessita de forma imediata, aquilo que será objeto da

antecipação.

Ao receber a tutela antecipada, o juiz tem duas opções: concedê-la ou não.

No caso de não concessão da tutela satisfativa antecedente por ausência de

preenchimento dos pressupostos, o juiz determinará a intimação do autor para que,

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no prazo de 5 (cinco) dias emende a sua inicial, sob pena de indeferimento e

extinção do processo sem resolução de mérito. Sobre a opção do legislador de

utilizar o termo “emenda da inicial”, no art. 303, §6º, MARINONI, ARENHART e

MITIDIERO tecem suas críticas:

O legislador fala em emenda à petição inicial. E certo, porém, que não se trata propriamente da emenda à petição inicial que se refere o art. 329: trata-se de aditamento da petição inicial a fim de que o processo, em sendo o caso, desenvolva-se regularmente. Em suma: é o aditamento a que se refere o art. 303, §1°, I. (MARINONI; ARENHART; MITIDIERO, 2015, p. 215).

Indeferido o pedido de antecipação da tutela satisfativa, caso o autor não

queira apresentar o pedido principal, basta ficar inerte e não emendar a sua inicial.

“O processo será extinto sem prejuízo econômico ao autor, já que tudo ocorrerá

antes da citação do réu e por isso não se justifica condenação ao pagamento de

verbas honorárias.” (NEVES, 2016, p. 447).

A decisão que indefere a tutela antecipada requerida em caráter antecedente

pode ser impugnável por agravo de instrumento, nos termos do art. 1015, I, do

Código de Processo Civil. Nesse caso, o agravante deve requerer a concessão do

feito suspensivo, com o objetivo de evitar a extinção do processo em primeiro grau.

(NEVES, 2016, p. 447).

No caso da concessão da tutela antecipada requerida em caráter

antecedente, que é o que mais nos interessa, o juiz deverá adotar algumas

providências, conforme previsão do art. 303, §§ 1º, 2º e 3º do Código de Processo

Civil. A primeira delas é determinar a intimação do autor para que este, no prazo de

15 dias (ou em outro maior, fixado pelo juiz), adite a sua petição inicial,

complementando a sua argumentação (causa de pedir), junte novos documentos

para a apreciação da demanda e a confirme o pedido de tutela final. O aditamento

da petição inicial dar-se-á nos mesmos autos, sem incidência de novas custas

processuais (art. 303, §3°).

Em seguida, o juiz determinará a intimação do réu para o comparecimento em

audiência de conciliação ou mediação, conforme a previsão do art. 334 do Código

de Processo Civil. Importante ressaltar que “ao autor grava o ônus de ministrar os

meios para realizar a citação do réu, no prazo de cinco dias, sob pena de indenizar

objetivamente o réu (art. 302, II).” (ASSIS, 2015, p. 1595).

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Não havendo autocomposição, o prazo para a contestação será contado

conforme a previsão do art. 335 do Código de Processo Civil. Contudo, DIDIER JR.,

BRAGA e OLIVEIRA fazem importante observação sobre o prazo para o réu

responder à demanda, vejamos:

É necessário que se observe, contudo, que o prazo de resposta do réu não poderá começar a ser contado antes da sua ciência inequívoca do aditamento da petição inicial do autor, para que se garanta a ele, réu, o lapso temporal mínimo de quinze dias para resposta à demanda do autor em sua inteireza. Por exemplo, se a causa não admitir autocomposição, não sendo cabível a designação da audiência de conciliação ou de mediação (art. 334, §4°, II, CPC), o réu será citado de imediato, mas o prazo de resposta só deverá correr da data em que for intimado do aditamento da petição inicial. (DIDIER JR.; BRAGA; OLIVEIRA, 2015, p. 603-604).

Apresentando a contestação ou recorrendo da decisão que concedeu a tutela

antecipada satisfativa, o procedimento comum será desenvolvido normalmente,

seguindo todas as suas fases. Caso o réu permaneça inerte nos autos, a demanda

poderá tomar outros rumos, havendo a possibilidade da estabilização da tutela

antecipada requerida em caráter antecedente e, em ato contínuo, a extinção do

processo.

3. Estabilização da tutela de urgência antecipada requerida em caráter antecedente

O art. 304 do Código de Processo Civil traz uma relevante mudança no

instituto das tutelas de urgência: a estabilização da tutela satisfativa antecipada. Nos

termos do caput do antigo mencionado, a tutela antecipada requerida em caráter

antecedente se estabilizará se contra a decisão que a conceder o réu não interpuser

o respectivo recurso (agravo de instrumento).

Concedida a tutela satisfativa e o réu não agravar da decisão interlocutória

que a concedeu, o processo será extinto, conforme previsão do §1º do art. 304. Para

isto é necessário que autor não tenha deixado expresso na sua inicial a sua intenção

de dar prosseguimento no feito após a concessão da tutela. Se o autor tiver a

intenção de apresentar o pedido principal para buscar uma tutela definitiva, capaz de

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gerar coisa julgada material, deve deixar isto expresso na sua inicial, hipótese em

que o processo prosseguirá normalmente, sendo inaplicável, desta forma, o art. 304.

O autor, ao realizar o pedido de tutela satisfativa antecedente, pode adotar

duas posturas: (a) requerer apenas a concessão da medida antecedente e o seu

“procedimento especial” previsto nos arts. 303 e 304, informando ao juízo a escolha

por esta opção (art. 303, §5º); ou (b) pedir a medida antecedente e indicar ao

magistrado a sua intenção de posteriormente apresentar o pedido principal, quando

lhe for oportunizado prazo para aditar a inicial. A tutela antecipada antecedente

estará sujeita a estabilização apenas na primeira hipótese, na segunda. autor e réu

prosseguirão com a demanda até que no final seja concedida ou não a tutela

definitiva por meio de sentença judicial.

Por que essa exigência do autor deixar expresso na inicial se pretende

somente a concessão da tutela antecipada, ou se tem a intenção prosseguir com o

feito? Simples: o réu precisa saber quais as intenções do autor na demanda para

não ter o seu direito de defesa restringido. Há uma vantagem para o réu permanecer

inerte: a diminuição dos gastos com o processo. Para entender melhor esta

situação, DIDIER JR., BRAGA e OLIVEIRA apresentam um exemplo bem claro de

como esta técnica pode ser útil:

Imagine um caso em que um estudante, que ainda não havia concluído o ensino médio, tenha sido aprovado no vestibular para um curso superior. A instituição de ensino, seguindo determinação do Ministério da Educação, não realizou a matrícula. O estudante vai a juízo e obtém uma tutela satisfativa liminar, ordenando a matrícula. Para a instituição de ensino, pode ser que não haja qualquer interesse em contestar a medida - ela somente não matriculara o aluno, porque o Ministério da Educação proibia. Outro exemplo. Imagine, agora, o caso de um consumidor que vai a juízo pleiteando a retirada de seu nome de um cadastro de proteção de crédito. Apenas isso. Obteve a liminar. É muito provável que o réu não queira mais discutir o assunto e deixe a decisão estabilizar-se. (DIDIER JR.; BRAGA; OLIVEIRA, 2015, p. 605).

Para isto, o réu precisa ter uma segurança de que a sua inércia nos autos,

quanto à decisão que concedeu a tutela satisfativa antecedente, gerará apenas a

estabilização da tutela e a extinção do processo. Desta forma, não seria viável que o

autor manifestasse sobre a intenção de apresentar ou não o pedido principal no

aditamento da inicial. DIDIER JR., BRAGA e OLIVEIRA são precisos quanto ao

assunto:

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(...) pode ele, réu, confiando na estabilização, simplesmente aceitara decisão antecipatória, eximindo-se de impugná-la. Mas isso só fará sentido, somente lhe trará a vantagem da diminuição do custo do processo, se a inércia efetivamente gerar a estabilização de que fala o art. 304. O réu precisa, então, saber, de antemão, qual a intenção do autor. Se o autor expressamente declara a sua opção pelo benefício do art. 303 (nos termos do art.303, §5°, CPC), subentende-se que ele estará satisfeito com a estabilização da tutela antecipada, caso ela ocorra. Se, porém, desde a inicial, o autor já manifesta a sua intenção de dar prosseguimento ao processo, o réu ficará sabendo que a sua inércia não dará ensejo à estabilização do art. 304. (DIDIER JR.; BRAGA; OLIVEIRA, 2015, p. 607).

O entendimento dos doutrinadores DIDIER JR., BRAGA e OLIVEIRA sobre a

redução das custas processuais para o réu vai ao encontro do enunciado 18 da

ENFAM, ipsis litteris: “Na estabilização da tutela antecipada, o réu ficará isento do

pagamento das custas e os honorários deverão ser fixados no percentual de 5%

sobre o valor da causa (art. 304, caput, c/c o art. 701, caput, do CPC/2015).”.

NEVES, porém não concorda com tal situação:

Questiona-se qual o motivo que levaria o réu a passivamente admitir a estabilização da tutela antecipada, sabendo que basta a ele recorrer, numa interpretação literal do art. 304, caput, do Novo CPC, ou tão somente se insurgir contra a decisão concessiva da tutela antecipada. Realmente não é presumível que, sem alguma espécie de incentivo, o réu permita a estabilização da tutela antecipada. Há doutrina que defende a aplicação subsidiária das regras do processo monitório, com a isenção do pagamento de custas e pagamento apenas de 5% do valor da ação a título de honorários advocatícios, com aplicação por analogia do art. 701, caput, do Novo CPC. Não concordo com a premissa do pensamento porque para mim há diferenças inconciliáveis entre a tutela antecipada estabilizada e a tutela monitória, em especial quanto à formação do título executivo judicial. De qualquer forma, entendo que não é preciso recorrer a interpretações por analogia para se justificar a concessão no caso concreto de incentivo a não se insurgir contra a concessão de tutela antecipada antecedente. Esses incentivos são formas de execução indireta, e, como tais, podem ser aplicados pelo juiz de ofício, sendo possível, portanto, que o juiz isente o réu do pagamento de custas processuais e até mesmo do pagamento dos honorários advocatícios, independentemente de previsão legal expressa nesse sentido, como forma de pressionar o réu a deixar de fazer (no caso evitar a estabilidade da tutela antecipada). (NEVES, 2016, p. 453).

O caput do art. 304 do Código de Processo Civil traz a expressão “respectivo

recurso”, indicando que a parte que pretende evitar a estabilização da tutela

satisfativa deverá recorrer (no caso, apresentando um agravo de instrumento). Essa

redação é de certa forma é um tanto peculiar: se um dos preceitos do novo Código

de Processo Civil é a diminuição do número de recursos nos Tribunais, não deveria

o legislador ter optado pelo termo impugnação ao invés de respectivo recurso?

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A doutrina entende que o afastamento da estabilização da tutela antecipada

satisfativa é feito por qualquer meio de impugnação do réu, seja ele recursal ou não.

Como o réu será citado e intimado para a audiência de conciliação ou mediação,

pode ele contestar o pedido de tutela antecipada antecedente antes mesmo da

audiência e do seu prazo de defesa, evitando-se desta forma a sua estabilização.

Nesse sentido, NEVES doutrina:

Há entendimento doutrinário no sentido de ser afastada a estabilização ora analisada havendo impugnação da decisão concessiva da tutela antecipada por qualquer forma, recursal ou não. Também a contestação do réu é apontada como hábil a evitar a estabilização da tutela antecipada. Nesse caso é preciso lembrar que o art. 303, II, do Novo CPC, prevê que no pedido de tutela antecipada antecedente o réu será citado e intimado para a audiência de conciliação ou de mediação prevista no art. 334 do Novo CPC. Significa dizer que o réu não será intimado para contestar, sendo que, tecnicamente, seu prazo para a apresentação de defesa nem terá se iniciado. É natural que se o réu se adiantar e já contestar o pedido a tutela antecipada não se estabilizará. Mas também não deve ser descartada a possibilidade de o réu simplesmente peticionar nos autos expressando o desejo de participar de tal audiência, o que demonstrará, de forma clara, sua intenção de que o procedimento siga seu rumo regular. Tenho um entendimento ainda mais amplo, admitindo que qualquer forma de manifestação de inconformismo do réu, ainda que não seja voltado à impugnação da decisão concessiva de tutela antecipada antecedente, é o suficiente para se afastar a estabilização prevista no art. 304 do Novo CPC. O réu pode, por exemplo, peticionar perante o próprio juízo que concedeu a tutela antecipada afirmando que embora não se oponha à tutela antecipada concedida não concorda com a estabilização, e que pretende a continuidade do processo com futura prolação de decisão de mérito fundada em cognição exauriente, passível de formação de coisa julgada material. (...) O entendimento defendido, portanto, é mais amplo do que aquele que defende a não ocorrência da estabilização se o réu, por qualquer modo, se valer de expediente processual para cassar a decisão concessiva da tutela antecipada. Na realidade, entendo que a mera irresignação em primeiro grau, ainda que não acompanhada de pedido expresso de reforma ou anulação da decisão já será o suficiente para se afastar a aplicação do art. 304 do Novo CPC. (NEVES, 2016, p. 452-453).

Apresentando o agravo de instrumento, não há dúvidas quanto a não

estabilização da tutela. E no caso de o réu ter apresentado recurso formalmente

imperfeito? Seguindo a mesma linha de raciocínio, entendo que mesmo havendo

vícios na peça recursal, o simples fato do réu se opor a decisão do juízo já é

suficiente para afastar a aplicação do art. 304 do Código de Processo Civil.

Existem ainda hipóteses que impedem a estabilização da tutela antecipada

satisfativa: quando o réu inerte foi citado/intimado por edital ou hora certa; quando o

réu estiver preso; ou for incapaz, sem representante ou em conflito com ele. Neste

último caso, deverá ser nomeado um curador especial que deverá promover a sua

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defesa, ainda que de forma genérica, com o objetivo de impugnar a tutela

concedida. (DIDIER JR., BRAGA e OLIVEIRA, 2015, p. 609).

E no caso de formulação de pedido de tutela antecipada antecedente feito

pelo réu em uma reconvenção, como atuaria a estabilização neste caso? Fica claro

que para que haja a estabilização da tutela, deve o requerente optar pelo

“processamento especial” do art. 303, informando ao juízo esta escolha (ou seja,

não apresentará o pedido principal), o que causará a sua extinção, conforme a

previsão do art. 304, se o réu não impugnar a decisão concessiva da tutela.

No caso da reconvenção, não vejo cabimento para aplicação do instituto da

estabilidade, uma vez que o processo não será extinto. Mesmo que o autor

reconvindo não apresente nenhum tipo de impugnação contra a decisão que

conceder a tutela, o processo prosseguirá até o fim, onde será proferida uma

decisão de cognição exauriente. Isso não quer dizer que o juiz não antecipará a

tutela: estando a petição com todos os requisitos do art. 300 do Código de Processo

Civil, e, o magistrado nela encontrar elementos que motivem o seu livre

convencimento, poderá conceder a tutela antecipada. Esta tutela somente não

adquirirá estabilidade, uma vez que aqui os pedidos principais, tanto da inicial

quanto da reconvenção, ainda serão discutidos, sendo que no final haverá a

prolação de uma sentença, que formará coisa julgada.

4. Extinção do processo

Como vimos anteriormente, caso o réu não impugne a decisão que concedeu

a tutela antecipada satisfativa, seja por meio do agravo de instrumento, contestação

ou outro meio de refutar a decisão, o processo será extinto.

A decisão que extingue o processo será uma sentença, conforme estabelece

o art. 203, § 1º do Código de Processo Civil. A primeira vista é indiscutível que

nesta sentença não há resolução do mérito, uma vez que o pedido principal não foi

objeto do processo (não houve o aditamento da petição inicial). A tutela antecipada

antecedente, conforme já foi abordado anteriormente, não exige que o autor elabore

o seu pedido principal, só sendo dele exigido quando a tutela antecipada for

convertida em processo principal, casos em que o autor deixou claro na inicial a sua

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intenção de prosseguir com o feito, ou quando há impugnação por parte do réu

contra a decisão que conceder a tutela satisfativa.

A questão sobre o esta sentença ser ou não de mérito pode gerar algumas

dúvidas. Vejamos o que aponta NEVES:

Pode se afirmar que, ainda que o pedido definitivo não tenha sido objeto de decisão, o mérito foi decidido na concessão da tutela antecipada, ainda que provisoriamente em razão da cognição sumária presente no momento da prolação da decisão. Concordo com esse entendimento, mas nem por isso é correto, como afirma parcela da doutrina, entender que a sentença que extingue o processo nesse caso é um julgamento provisório de mérito, devendo ser fundada no art. 487, I, do Novo CPC. A decisão que concede a tutela antecipada não se confunde coma sentença que, depois dela, extingue o processo. Se a primeira é indubitavelmente uma decisão de mérito, a segunda certamente não o é, já que não acolhe ou rejeita qualquer pedido do autor, limitando-se a extinguir o processo. A sentença nesse caso é terminativa, devendo ser fundada no art. 485, X, do Novo CPC. (NEVES, 2016, p. 455).

Parece-me correto o entendimento do doutrinador, uma vez que a questão do

mérito já foi discutida na concessão da tutela, ainda que por meio de uma cognição

sumária. Estabilizando-se a tutela, a sentença aqui é um mero ato formal para

extinguir o processo, porque desta forma estabeleceu o legislador no art. 304, § 1º

do Código de Processo Civil.

5. Inexistência de coisa julgada

O art. 304, § 6º do Código de Processo Civil deixa expresso que a decisão

que conceder a tutela antecipada antecedente não fará coisa julgada, mesmo que a

seus efeitos se estabilizem devido à omissão do réu em não impugná-la.

A opção do legislador foi acertada em manter o instituto da coisa julgada

restrito às decisões que forem concedidas mediante juízo de cognição exauriente.

Não faria sentido adotar critérios como a imutabilidade e indiscutibilidade em uma

decisão que não é proferida mediante cognição exauriente. Nesse sentido,

THEODORO JUNIOR enriquece ainda mais esse debate:

Percebe-se que foi acolhida a ideia denominada genericamente de tutela sumária, em que se admite que a decisão de cognição não exauriente, que contém a antecipação de tutela, possa ter força para resolver a crise de direito material por si só, independentemente do desenvolvimento do pedido

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principal ou da ação principal em sede de processo de conhecimento de cognição plena. Com isso, a decisão proferida por meio de antecipação de tutela, no âmbito do procedimento preparatório, por opção dos próprios interessados, pode produzir seus efeitos sem depender de instauração do processo de conhecimento de cognição plena. São as partes mesmas que se mostram não interessadas no efeito da coisa julgada material. Se ficam satisfeitas com a decisão antecipatória, baseada em cognição sumária, sem força de coisa julgada, mas com potencial para resolver a crise de direito material, não se mostra conveniente obrigá-las a prosseguir no processo, para obter a decisão de cognição plena. Colocam-se à disposição das partes, ao lado do processo de conhecimento clássico, mais longo e hábil a operar a coisa julgada, procedimentos mais céleres, fundados em forma diversa de cognição, como a sumária, e voltados para a solução da crise de direito material, mas sem cogitar da definitividade da res iudicata. (THEODORO JUNIOR, 2015, p. 874).

Após a extinção do processo, as partes ainda possuem um prazo de 2 anos

para propor uma nova ação para rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada

antecedente estabilizada. Ocorre que após o decurso deste prazo, a tutela

antecipada se torna indiscutível e imutável. “Pode se dizer que não se trata de coisa

julgada material, mas de um fenômeno processual assemelhado, mas a estabilidade

e a satisfação jurídica da pretensão do autor estarão presentes em ambas.”

(NEVES, 2016, p. 456).

6. Propositura de nova ação para rediscutir a tutela antecipada requerida em caráter antecedente

Conforme já foi apontado no tópico anterior, qualquer uma das partes

envolvidas no processo tem um prazo decadencial de dois anos, contados da data

da intimação da sentença, para propor uma ação autônoma para revisar, reformar

ou invalidar essa decisão (art. 304, §§ 2º e 5º do Código de Processo Civil).

Daniel Amorim Assumpção Neves tece severas críticas sobre esta questão,

vejamos:

O dispositivo legal não deve ser elogiado porque ao mesmo tempo que dá legitimidade ativa para ambas das partes do processo extinto em razão da estabilização da tutela antecipada, prevê que esse processo se presta a rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada estabilizada. Exatamente qual seria o interesse do autor, satisfeito no plano prático em razão da tutela antecipada concedida e estabilizada, ao pretender rever, reformar ou invalidar tal tutela? E o que é mais lamentável é que, sem os indevidos limites consagrados no § 2º do art. 304 do Novo CPC, é plenamente possível vislumbrar o interesse do autor em ingressar com processo após a

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estabilização para obter a tutela definitiva que ainda não conseguiu. Mas nesse caso, não buscará rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada, mas sim confirmá-la por meio de uma decisão definitiva fundada em cognição exauriente e juízo de certeza. É claro que não será um processo frequente, até porque se o autor do processo originário pretender obter a tutela definitiva basta pedi-la de forma expressa (...), mas ainda assim haverá interesse de agir. Como entendo inconstitucional impedir ao autor a propositura da ação versada no § 2º, do art. 304, do Novo CPC, entendo ser necessária a interpretação ampliativa do rol previsto em tal dispositivo, que deve, portanto, ser considerado meramente exemplificativo. Independentemente da consequência do pedido dessa ação com relação à estabilização da tutela antecipada, o importante é que ela tenha como objeto o mesmo bem da vida do processo extinto pela tutela antecipada estabilizada. (NEVES, 2016, p. 456).

Neste ponto, DIDIER JR., BRAGA e OLIVEIRA novamente divergem de

NEVES quanto a possibilidade do autor propor a nova ação para obter a tutela final:

O autor, por exemplo, poderá propor ação no simples intuito de confirmar a decisão, agora com cognição exauriente e aptidão para fazer coisa julgada. Isso tem especial relevância naqueles casos em que ele, demandante, poderia ter manifestado interesse no prosseguimento do processo em que fora deferida a tutela provisória antecedente, mas não o fez, de modo que, com a superveniente inércia do réu, houve estabilização da tutela antecipada. Já o réu que se manteve inerte (por descuido ou por vislumbrar nisso alguma vantagem) pode também retomar a discussão, deflagrando nova demanda. (DIDIER JR.; BRAGA; OLIVEIRA, 2015, p. 611).

Seguindo a mesma linha de raciocínio dos autores anteriores, THEODORO

JUNIOR apresenta a seguinte lição:

A estabilização da tutela satisfativa provisória não impede que qualquer das partes promova, ulteriormente, a propositura da ação principal de cognição plena, visando revisão, reforma ou invalidação da medida provisória estabilizada (NCPC, art. 304, § 2º). Sua tramitação observará o procedimento comum. Dessa demanda advirá, não uma nova regulação provisória do litígio, mas um julgamento definitivo de mérito, que substituirá a tutela provisória até então em vigor (art. 304, § 3º). A pretensão em tela será deduzida em juízo como nova ação, diretamente voltada para a composição definitiva do litígio, mediante cognição plena e exauriente, capaz de revestir-se da autoridade da coisa julgada material. Esse novo julgamento poderá rever, reformar ou invalidar a tutela primitiva, ou seja, poderá confirmá-la, modificá-la ou cassá-la. (THEODORO JUNIOR, 2015, p. 875).

Esta ação deverá ser proposta no mesmo juízo que concedeu a tutela

antecipada antecedente, que se estabilizou pela inércia do réu. Conforme a previsão

expressa do art. 304, § 4º do Código de Processo Civil, o juiz que conduziu o

processo originário se torna prevento para julgar a nova ação. O mesmo dispositivo

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legal estabelece que caso seja necessário, poderá a parte requerer o

desarquivamento dos autos em que foi concedida a medida antecipatória para

instruir a inicial da nova ação, com os documentos que forem necessários.

A tutela estabilizada manterá os seus efeitos até que a decisão que a

concedeu seja revista, reformada ou invalidada pelo juiz. Essa possibilidade de

continuidade da medida provisória ou o aperfeiçoamento posterior do processo de

mérito de cognição exauriente, afasta qualquer raciocínio de inconstitucionalidade da

tutela provisória fundado na violação da garantia de defesa ou do acesso à

jurisdição. (THEODORO JUNIOR, 2015, p. 874).

7. Flexibilização na aplicação da ação rescisória

A questão mais polêmica sobre a estabilização da tutela antecipada

antecedente se encontra no prazo para propositura da ação para revisar, reformar

ou invalidar a decisão que concedeu a medida. Após o decurso do prazo

decadencial de dois anos, os efeitos de uma tutela concedida por um juízo de

cognição sumária conservaria para sempre os seus efeitos no tempo? Entendo que

não.

Conforme a previsão expressa do art. 304, § 6º do Código de Processo Civil,

não há formação de coisa julgada, afastando desta forma a propositura da ação

rescisória para rediscutir esta decisão. Nesse sentido, NEVES aponta que:

Se a parte quiser alegar um dos vícios previstos no art. 966 do Novo CPC, poderá se valer da ação prevista no § 2.º do art. 304, do Novo CPC. Entretanto, após esse prazo, os vícios, que só poderiam ser alegados por meio de ação rescisória, já não podem mais sê-los porque essa espécie de meio de impugnação depende de coisa julgada. E o § 6º do art. 304, do Novo CPC, não deixa dúvida sobre não existir coisa julgada na decisão concessiva de tutela antecipada antecedente. (NEVES, 2016, p. 458).

Diante de tal questão, a única saída possível seria adotarmos uma

flexibilização dos requisitos da ação rescisória. Para isto, é necessário uma

interpretação extensiva do art. 966, § 2º do Código de Processo Civil. O dispositivo

legal aponta que cabe ação rescisória contra decisão transitada em julgado que,

embora não seja de mérito, impede a propositura de uma nova demanda ou a

admissibilidade do recurso correspondente.

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Conforme já foi discutido anteriormente, a decisão que concede a tutela é de

mérito, mas não forma coisa julgada. Apesar do art. 966, § 2º tratar de situação

diversa desta, poderia esta decisão terminativa ser impugnável por meio de ação

rescisória, alegado a parte que, embora seja de mérito, não faz coisa julgada,

impedindo ainda a propositura de uma nova ação, após o prazo de dois anos.

Para encerrar tal raciocínio, NEVES traz um importante apontamento:

A ausência de coisa julgada, portanto, teria deixado de ser condição sine qua non para a admissão de ação rescisória, o que poderia liberar o caminho para a conclusão de cabimento de tal ação contra a decisão que concede tutela antecipada estabilizada depois de dois anos de seu trânsito em julgado. (NEVES, 2016, p. 458).

8. ConclusãoA intenção do legislador em criar o instituto da estabilização da tutela

antecipada requerida em caráter antecedente no Código de Processo Civil de 2015

é louvável e ao mesmo tempo um tanto polêmica. O “procedimento especial” dos

arts. 303 e 304 é uma via interessante para resolver questões de urgência sem

haver a necessidade de ficar anos no poder judiciário discutindo tal questão.

A principal crítica que se deve ser feita é quanto ao prazo decadencial de 2

anos para a propositura de uma nova ação para rediscutir uma tutela antecipada

antecedente estabilizada. Uma decisão baseada em juízo de cognição sumária não

pode conservar para sempre os seus efeitos no tempo, uma vez que estamos

tratando de algo provisório e que não há formação de coisa julgada. Não se pode

privar a outra parte de futuramente rediscutir uma questão concedida com base

probabilidade de direito, onde não houve o efetivo contraditório. Peca o legislador

por não oferecer os caminhos necessários para a questão. Uma solução para a

questão é realizar uma interpretação extensiva dos requisitos da ação rescisória,

possibilitando desta forma a rediscussão da tutela estabilizada.

9. Referências

NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil. 8 ed. Salvador: JusPodivm, 2016.

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DIDIER JR., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandre de. Curso de direito processual civil volume 2: teoria da prova, direito probatório, decisão, precedente, coisa julgada e tutela provisória. 10 ed. Salvador: JusPodivm, 2015.

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil volume 1: teoria geral do direito processual civil, processo de conhecimento e procedimento comum. 56 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015.

ASSIS, Araken de. Processo civil brasileiro volume II: parte geral: institutos fundamentais. 1 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015.

MARINONI , Luiz Guilherme; ARENHART , Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo curso de processo civil volume 2: tutela dos direitos mediante procedimento comum. 1 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015.

ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação de Tutela, 2 ed., 1999, p. 98.

BRASIL. Código de Processo Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acessado em: 13 mai. 2016.

ENFAM. Seminário - o poder judiciário e o novo código de processo civil: enunciados aprovados. Disponível em: <http://www.enfam.jus.br/wp-content/uploads/2015/09/ENUNCIADOS-VERS%C3%83O-DEFINITIVA-.pdf> Acessado em: 20 mai. 2016.