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FACULDADE BAIANA DE DIREITO CURSO DE POacuteS-GRADUACcedilAtildeO EM DIREITO PROCESSUAL
CIVIL
DIANDRA GRADIN SCHAUN
OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA
ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE
HUMANA DO EXECUTADO
Salvador
2018
DIANDRA GRADIN SCHAUN
OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA
ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE
HUMANA DO EXECUTADO
Monografia apresentada ao curso de poacutes-graduaccedilatildeo em Direito Processual Civil da Faculdade Baiana de Direito como requisito para obtenccedilatildeo do grau de especialista em Direito Processual Civil
Salvador
2018
DIANDRA GRADIN SCHAUN
OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA
ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE
HUMANA DO EXECUTADO
Monografia aprovada como requisito para obtenccedilatildeo do grau de Especialista em Direito
Processual Civil pela seguinte banca examinadora
Nome _______________________________________________________________
Titulaccedilatildeo e instituiccedilatildeo __________________________________________________
Nome _______________________________________________________________
Titulaccedilatildeo e instituiccedilatildeo __________________________________________________
Nome _______________________________________________________________
Titulaccedilatildeo e instituiccedilatildeo __________________________________________________
Salvador ______2018
RESUMO
A prestaccedilatildeo jurisdicional natildeo se concretiza depois de encerrada a fase de conhecimento Para
que a referida prestaccedilatildeo se consume eacute necessaacuterio que ocorra a satisfaccedilatildeo do deacutebito pelo
devedor que em grande parte soacute se efetiva atraveacutes da tutela executiva Entretanto a execuccedilatildeo
civil sempre sofreu uma crise quanto a sua efetividade e o Coacutedigo de Processo Civil de 2015
com o escopo de dirimir a ineficiecircncia do instituto concebeu novas diretrizes ao processo
executoacuterio Dessa forma o art 139 IV do Coacutedigo de Processo Civil estabeleceu a
possibilidade de o juiz dispor de todas as medidas necessaacuterias para assegurar o cumprimento
de ordem judicial trazendo como grande inovaccedilatildeo a aplicaccedilatildeo dessas medidas tambeacutem nas
obrigaccedilotildees de pagar quantia Todavia eacute necessaacuterio estabelecer criteacuterios limitadores para que a
adoccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo viole a dignidade humana do executado em nome do
direito fundamental agrave execuccedilatildeo
Palavras-chaves Execuccedilatildeo Poder geral de efetivaccedilatildeo Direito fundamental agrave execuccedilatildeo
Dignidade humana do executado
SUMAacuteRIO
1 INTRODUCcedilAtildeO 5
2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL 7
21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL 7
22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL 8
23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL 11
24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO 17
25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO 20
3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 23
31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS 23
311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15 25
32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO 28
33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO 31
34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 36
4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 48
41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO 48
42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 55
5 CONCLUSAtildeO 63
REFEREcircNCIAS 65
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
Art ndash Artigo
CPC15 ndash Coacutedigo de Processo Civil de 2015
CPC73 ndash Coacutedigo de Processo Civil de 1973
ENFAM ndash Escola nacional de formaccedilatildeo e aperfeiccediloamento de magistrados
HC ndash Habeas Corpus
STJ ndash Superior Tribunal de Justiccedila
5
1 INTRODUCcedilAtildeO
A prestaccedilatildeo jurisdicional natildeo costuma se findar apoacutes o encerramento da fase cognitiva
com a prolaccedilatildeo de uma sentenccedila de meacuterito Para que a referida prestaccedilatildeo se concretize eacute
imperioso que haja a satisfaccedilatildeo do deacutebito pelo devedor
Entretanto observa-se em diversos casos o inadimplemento da parte passiva
processual sendo necessaacuterio desenvolver a atividade executiva A referida atividade possui o
escopo de satisfazer direitos
Isso porque o processo natildeo eacute um fim em si mesmo sendo apenas um exerciacutecio da
jurisdiccedilatildeo estatal Dessa forma a razatildeo de ser do processo eacute o atingimento da sua finalidade
almejada que eacute a prestaccedilatildeo da tutela jurisdicional
Todavia como a tutela jurisdicional configura-se na obrigaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio
proteger e reparar os direitos lesionados ou ameaccedilados de lesatildeo muitas vezes a dita tutela
somente consegue ser efetivada atraveacutes da atividade executiva da jurisdiccedilatildeo
Ocorre que a execuccedilatildeo civil sempre foi o ldquocalcanhar de Aquilesrdquo do sistema
processual e de modo geral vinha sofrendo uma crise quanto a sua efetividade Ou seja o
credor obtia ecircxito na fase de conhecimento entretanto natildeo conseguia alcanccedilar o seu direito a
prestaccedilatildeo reconhecida na fase de execuccedilatildeo
Com o fito de tornar a atividade satisfativa mais eficiente e mais ceacutelere o Coacutedigo de
Processo Civil de 2015 concebeu novas diretrizes ao processo no sentindo de harmonizar
suas com os ditames da Constituiccedilatildeo Federal principalmente com os direitos fundamentais
As normas fundamentais do processo civil trazidas pelo CPC15 preocupam-se
primordialmente com a efetividade da tutela jurisdicional
Em conformidade com essa nova sistemaacutetica o legislador no art 139 IV do Coacutedigo
de Processo Civil estabeleceu a possibilidade de o juiz dispor de todas as medidas indutivas
coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o cumprimento de
ordem judicial trazendo como grande novidade a aplicaccedilatildeo dessas medidas executoacuterias
atiacutepicas tambeacutem nas obrigaccedilotildees de pagar dinheiro
6 Entretanto natildeo haacute na legislaccedilatildeo criteacuterios especiacuteficos que auxiliem o oacutergatildeo julgador na
escolha das medidas executivas atiacutepicas que se adotadas sem qualquer baliza podem
acarretar consequecircncias juriacutedicas irreparaacuteveis
Como a famosa decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de
Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-1320138260011 Nessa accedilatildeo
que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo
pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a suspensatildeo da
Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o passaporte e
cancelou os cartotildees de creacutedito como forma de compeli-lo a adimplir com o deacutebito
Decisotildees como esta geram conflitos entre direitos constitucionalmente instituiacutedos De
um lado o direito fundamental agrave tutela jurisdicional e de outro os direitos e garantias
inerentes a todos os indiviacuteduos
Dessa forma a presente monografia tem como escopo de estabelecer criteacuterios
limitadores para que a adoccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo viole a dignidade humana do
executado em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo
7 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO
CIVIL
21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL
A Execuccedilatildeo Civil nasce a partir do direito a uma prestaccedilatildeo conferida a algueacutem de
exigir de outrem o cumprimento de uma conduta de fazer natildeo fazer ou de dar (dinheiro ou
coisa distinta) 1
Para que o direito a uma prestaccedilatildeo se concretize no mundo fiacutesico eacute necessaacuterio que
haja a satisfaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida pelo sujeito passivo Caso contraacuterio fala-se em
inadimplemento ou lesatildeo O titular do direito natildeo tem como agir por si para efetivar o seu
direito a prestaccedilatildeo posto que a autotutela eacute vedada no ordenamento juriacutedico Dessa forma eacute
necessaacuterio que se recorra ao Poder Judiciaacuterio para que se possa ter a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo
devida logo a tutela jurisdicional executiva2
O processualista Fredie Didier et al3 equaciona essa questatildeo da seguinte maneira
Quando se pensa em tutela executiva pensa-se na efetivaccedilatildeo de direitos a uma prestaccedilatildeo fala-se de um conjunto de meios para efetivar a prestaccedilatildeo devida fala-se em execuccedilatildeo de fazer natildeo-fazer dar exatamente os trecircs tipos de prestaccedilatildeo existentes Natildeo eacute por acaso nem por coincidecircncia que a tutela executiva pressupotildee inadimplemento (CPC art 786) - fenocircmeno exclusivo dos direitos a uma prestaccedilatildeo Eacute por isso tambeacutem que se pode falar em prescriccedilatildeo da execuccedilatildeo (CPC art 802 e suacutemula do STF n 150) - prescriccedilatildeo eacute fenocircmeno juriacutedico que se relaciona aos direitos a uma prestaccedilatildeo A execuccedilatildeo forccedilada dirige-se ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo Essa relaccedilatildeo entre direito material e processo eacute fundamental para a compreensatildeo do fenocircmeno executivo
Nesse iacutenterim para o Ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux4 ldquoexecutar eacute
satisfazerrdquo ao passo que o professor Fredie Didier et al5 formulou um conceito mais amplo
ldquoExecutar eacute satisfazer uma prestaccedilatildeo devida A execuccedilatildeo pode ser espontacircnea quando o
devedor cumpre voluntariamente a prestaccedilatildeo ou forccedilada quando o cumprimento da prestaccedilatildeo
eacute obtido por meio de atos executivos pelo Estadordquo
1 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 41 2 Ibid p 42 3 Ibid p 42 4 FUX Luiz Curso de direito processual civil Rio de Janeiro Forense 2001 p 980 5 DIDIER JR Fredie et al Op Cit p 45
8 Dessa forma a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional responsaacutevel pela
concretizaccedilatildeo de um direito subjetivo no plano material obtendo resultado idecircntico ou
equivalente ao atingiacutevel se o devedor cumprisse espontaneamente a prestaccedilatildeo
Todavia essa atividade jurisdicional soacute cabe quando o devedor se recusa a cumprir
com a obrigaccedilatildeo quebrando a expectativa do credor de receber o que lhe eacute devido Por esta
razatildeo que se diz que a execuccedilatildeo civil eacute ldquoforccediladardquo 6
Eacute o que se conclui seguindo os ensinamentos de Leonardo Greco7 para ele execuccedilatildeo eacute
uma
() modalidade de tutela jurisdicional que consiste na praacutetica pelo juiz (ou por outrem sob a sua supervisatildeo) de uma seacuterie de atos coativos concretos sobre o devedor e sobre o seu patrimocircnio a fim de agrave custa dele e independentemente do concurso da sua vontade tornar efetivo o cumprimento de prestaccedilatildeo por ele inadimplida desde que tais atos coativos estejam previamente constituiacutedos em lei
Portanto a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional que tem como escopo obter o
cumprimento de uma prestaccedilatildeo certa e inadimplida mediante atos coativos sobre o devedor e
seus bens
22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
Vislumbrado o conceito de execuccedilatildeo civil cabe agora empreender a sua classificaccedilatildeo
tendo em vista que a execuccedilatildeo pode se manifestar de diversas formas possuindo diferentes
caracteriacutesticas em cada uma das suas modalidades
Inicialmente cabe destacar que haacute duas teacutecnicas processuais para viabilizar a execuccedilatildeo
civil lato sensu eacute a que divide em processo autocircnomo de execuccedilatildeo e em fase de execuccedilatildeo
dependendo do tiacutetulo executivo que justifica o exerciacutecio da atividade satisfativa
O Coacutedigo Processual Civil de 2015 acertadamente ratificou as reformas promovidas
no CPC73 que consagrava a opccedilatildeo legislativa de oferecimento das tutelas de certificaccedilatildeo e
efetivaccedilatildeo do direito em um mesmo processo Dessa forma as execuccedilotildees de sentenccedilas
6 BASTOS Luiz Fernando Pereira O artigo 139 IV do novo Coacutedigo de Processo Civil a atipicidade
dos meios executivos na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia certa Brasiacutelia 2017 Disponiacutevel em lt httpbdmunbbrbitstream104831866812017_LuizFernandoPereiraBastospdf gt Acesso em 06 de agosto de 2018
7 BASTOS Luiz Fernando Pereira apud GRECO Leonardo O processo de execuccedilatildeo Rio de Janeiro Renovar 1999 p 164
9
passaram a ser uma fase complementar ao de processo de conhecimento e natildeo mais ocorrer
em um processo autocircnomo
No entendimento do professor processualista Fredie Didier et al8 o processo
sincreacutetico simplificou a efetivaccedilatildeo de um direito reconhecido em sentenccedila
A dispensa do ajuizamento de um processo autocircnomo para execuccedilatildeo de sentenccedila natildeo soacute veio diminuir o tempo necessaacuterio agrave prestaccedilatildeo da tutela jurisdicional - afinal o credor natildeo mais precisaria tal como ocorria ateacute entatildeo promover nova citaccedilatildeo pessoal do reacuteudevedor- como tambeacutem veio romper de vez com um velho paradigma segundo o qual a atividade executiva estaria dissociada da precedente atividade jurisdicional cognitiva
Entretanto natildeo soacute as sentenccedilas de meacuterito ensejam uma execuccedilatildeo Por esta razatildeo foi
necessaacuterio manter o processo autocircnomo de execuccedilatildeo para os casos em que o credor tem a seu
favor um documento que natildeo tenha sido proferido por um oacutergatildeo dotado de jurisdiccedilatildeo
Consequentemente se for o titulo executivo judicial o caminho natural eacute o do
cumprimento de sentenccedila Sendo por sua vez extrajudicial o titulo executivo o caminho
correto eacute o processo de execuccedilatildeo
Cabe ainda salientar que toda execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial eacute definitiva Jaacute a
execuccedilatildeo de tiacutetulo judicial (cumprimento de sentenccedila) pode ser definitiva ou provisoacuteria
No primeiro caso isto eacute cumprimento de sentenccedila definitivo ldquoeacute a execuccedilatildeo completa
que vai ateacute a fase final (com a entrega do bem da vida) sem exigecircncias adicionais para o
exequenterdquo 9
Quanto ao segundo caso ldquoo cumprimento provisoacuterio de sentenccedila (fundada em tiacutetulo
provisoacuterio) eacute aquele que exige alguns requisitos extras para que se chegue agrave fase final da
execuccedilatildeordquo 10
Para Fredie Didier11 o criteacuterio para definir se o cumprimento de sentenccedila seraacute
definitivo ou provisoacuterio
() eacute a estabilidade do tiacutetulo executivo em que se funda a execuccedilatildeo se se tratar de decisatildeo acobertada pela coisa julgada material o cumprimento de sentenccedila eacute
8 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 46 9 Ibid p 57 10 Ibid p 57 11 Ibid p 57
10
definitivo se se tratar de decisatildeo judicial ainda passiacutevel de alteraccedilatildeo (reforma ou invalidaccedilatildeo) em razatildeo da pendecircncia de recurso contra ela interposto a que natildeo tenha sido atribuiacutedo efeito suspensivo o cumprimento de sentenccedila eacute provisoacuterio
Ademais a execuccedilatildeo se distingue em procedimentos executivos comuns que satildeo da
execuccedilatildeo civil e que servem a uma generalidade de creacuteditos como eacute o caso do cumprimento
de sentenccedila e o processo de execuccedilatildeo E em procedimentos executivos especiais que servem
agrave satisfaccedilatildeo de creacuteditos peculiares como a execuccedilatildeo de alimentos e a execuccedilatildeo fiscal 12
Por fim cabe mencionar a classificaccedilatildeo que distingue a execuccedilatildeo em direta e indireta
A primeira execuccedilatildeo direita (ou execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo) eacute ldquo() aquela em que o
Poder Judiciaacuterio prescinde da colaboraccedilatildeo do executado para a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida
e pois promove uma substituiccedilatildeo da sua conduta pela conduta do proacuteprio Estado-juiz ou de
terceirordquo 13 Ou seja as medidas executivas satildeo levadas a efeito mesmo contra a vontade do
devedor na execuccedilatildeo direta
Segundo a doutrina a execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo se subdivide da seguinte forma
meios de desapossamento meios de transformaccedilatildeo e meios de expropriaccedilatildeo
Os meios de desapossamento muito comuns nas execuccedilotildees para entrega de coisa eacute a
forma ldquopor meio da qual se retira da posse do executado o bem a ser entregue ao exequente
(p ex despejo busca e apreensatildeo reintegraccedilatildeo de posse)rdquo 14 Ao passo que por meio dos de
transformaccedilatildeo ldquo() o juiz determina que um terceiro pratique a conduta que deveria ser
praticada pelo executado cabendo a este arcar com o pagamento do custo respectivordquo 15 Jaacute
os meios executivos de expropriaccedilatildeo eacute a forma ldquopor meio do qual algum bem do patrimocircnio
do devedor eacute expropriado para pagamento do creacutedito (adjudicaccedilatildeo alienaccedilatildeo judicial ou
apropriaccedilatildeo de frutos e rendimentos de empresa ou de estabelecimentos e de outros bens art
825 CPC)rdquo 16
12 Ibid p 48 13 Ibid p 50 14 Ibid p 51 15 Ibid p 51 16 Ibid p 51
11 Jaacute a execuccedilatildeo indireta (ou mandamental) atua ldquo() na vontade do devedor como forma
de compeli-lo ou incentivaacute-lo a cumprir a ordem judicialrdquo 17 Nesse entendimento ainda
leciona Fredie Didier et al 18
Nesses casos o Estado-juiz busca promover a execuccedilatildeo com a colaboraccedilatildeo do executado forccedilando ou incentivando a que ele proacuteprio cumpra a prestaccedilatildeo devida Em vez de o Estado-juiz tomar as providecircncias que deveriam ser tomadas pelo executado o Estado forccedila por meio de coerccedilatildeo psicoloacutegica ou de promessa de recompensa judicial a que o proacuteprio executado cumpra a prestaccedilatildeo
A execuccedilatildeo indireta pode ser patrimonial como por exemplo a imposiccedilatildeo de multa
coercitiva ou pessoal com a prisatildeo civil do devedor de alimentos Ademais adiciona Didier
et al19que
O estiacutemulo ao cumprimento da prestaccedilatildeo pode dar-se pelo temor (p ex multa coercitiva prisatildeo civil do devedor de alimentos divulgaccedilatildeo de notiacutecia em jornal revelando o descumprimento) ou pelo incentivo (p ex a chamada sanccedilatildeo premial ou sanccedilatildeo positiva de que eacute exemplo a isenccedilatildeo do pagamento de custas em caso de cumprimento do mandado monitoacuterio - art 701 sect 1ordm CPC a reduccedilatildeo pela metade dos honoraacuterios advocatiacutecios fixados inicialmente pelo juiacutezo em caso de pagamento integral do deacutebito pecuniaacuterio na execuccedilatildeo por quantia certa fundada em tiacutetulo extrajudicial - art 827 sect 1ordm CPC)
Por tais razotildees haacute uma tendecircncia em cada vez mais prestigiar os meios executivos
indiretos (coercitivos) posto que satildeo tatildeo eficazes quanto os meios executivos diretos
entretanto menos onerosos Contudo sua aplicaccedilatildeo deve ser fiscalizada a fim de natildeo permitir
que a execuccedilatildeo civil perca sua finalidade visto que eacute uma funccedilatildeo jurisdicional que tem como
escopo efetivar o direito do credor e natildeo de atender os interesses do devedor
23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
Os princiacutepios juriacutedicos nos uacuteltimos anos passaram a ser munidos de forccedila cogente
normatizando as condutas humanas tanto quanto as regras juriacutedicas Os ditos princiacutepios
ampliaram as margens de atuaccedilatildeo dos aplicadores do direito possibilitando a construccedilatildeo de
soluccedilotildees mais adequadas agraves especificidades das demandas que chegam ao judiciaacuterio
17 Ibid p 51 18 Ibid p 51 19 Ibid p 51-52
12 Dessa forma eacute necessaacuterio aprofundar-se nos princiacutepios norteadores da execuccedilatildeo civil
para que se obtenha uma anaacutelise completa da teoria geral da execuccedilatildeo
A execuccedilatildeo civil tem como um dos seus corolaacuterios o princiacutepio da efetividade este
consiste na exigecircncia de um sistema completo de tutela executiva no qual existam meios
executivos capazes de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor
de tutela executivardquo 20
O referido princiacutepio da efetividade eacute reforccedilado como normal fundamental do processo
civil brasileiro pelo art 4ordm do CPC ldquoArt 4ordm As partes tecircm o direito de obter em prazo razoaacutevel
a soluccedilatildeo integral do meacuterito incluiacuteda a atividade satisfativa
Jaacute o princiacutepio da boa feacute processual corolaacuterio do devido processo legal estaacute previsto
no art 5ordm do CPC ldquoAquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de
acordo com a boa-feacuterdquo Segundo o processualista baiano Fredie Didier21
O princiacutepio da boa-feacute extrai-se de uma claacuteusula geral processual A opccedilatildeo por uma claacuteusula geral de boa-feacute eacute a mais correta Eacute que a infinidade de situaccedilotildees que podem surgir ao longo do processo torna pouco eficaz qualquer enumeraccedilatildeo legal exaustiva das hipoacuteteses de comportamento desleal Daiacute ser correta a opccedilatildeo da legislaccedilatildeo brasileira por uma norma geral que impotildee o comportamento de acordo com a boa-feacute Em verdade natildeo seria necessaacuteria qualquer enumeraccedilatildeo das condutas desleais o art 5deg do CPC eacute bastante exatamente por tratar-se de uma claacuteusula geral
Dessa forma o dito princiacutepio preconiza que diante de um vinculo juriacutedico as pessoas
envolvidas natildeo poderatildeo frustrar a confianccedila do outro devendo comportar-se como se pode
esperar de uma pessoa de boa-feacute
Ademais disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial que ldquosomente o
patrimocircnio do devedor (art 789 CPC) ou de terceiro responsaacutevel pode ser objeto da
atividade executiva do Estadordquo 22
O referido princiacutepio que determina que somente o patrimocircnio submete-se agrave execuccedilatildeo
e natildeo a pessoa foi trazido pela humanizaccedilatildeo do direito Para o professor Didier et al23 o
20 DIDIER JR Freddie et al apud GUERRA Marcelo Lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do
credor na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 21 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte
geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 105 22 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 68
13
desenvolvimento dos meios de execuccedilatildeo indireta ldquoparece relativizar um pouco esse princiacutepio
na medida em que pressionam psicologicamente a pessoa do devedor para que cumpra a
obrigaccedilatildeo com seu comportamentordquo
Complementa ainda que
A responsabilidade executiva parece assumir atualmente caraacuteter hiacutebrido comportando coerccedilatildeo pessoal e sujeiccedilatildeo patrimonial
i) a coerccedilatildeo pessoal incide sobre a vontade do devedor admitindo o uso de medidas coercitivas de execuccedilatildeo indireta para forccedilaacute-lo a cumprir a obrigaccedilatildeo com seu proacuteprio comportamento (ex arts 139 rv 523 sect 1ordm 536 sect 1ordm e 538 sect 3ordm todos do CPC)
ii) descumprida a obrigaccedilatildeo e natildeo sendo possiacuteveladequado o uso de teacutecnica de coerccedilatildeo pessoal tem-se a sujeiccedilatildeo patrimonial que recairaacute sobre os bens do devedor ou de terceiro responsaacutevel - que responderatildeo pela proacutepria prestaccedilatildeo in natura (ex dar coisa ou entregar quantia) ou por perdas e danos24
Dessa forma o referido princiacutepio natildeo tem aplicaccedilatildeo absoluta em razatildeo do principio da
efetividade a qual estimula o uso dos meios de coerccedilatildeo indireta para garantir o cumprimento
da obrigaccedilatildeo pelo devedor
O princiacutepio da primazia da tutela especifica (ou princiacutepio do resultado) assevera que
ldquoA execuccedilatildeo deve ser especiacutefica propiciar ao credor a satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo tal qual
houvesse o cumprimento espontacircneo da prestaccedilatildeo pelo devedorrdquo 25
O CPC de 2015 absorveu todos os avanccedilos legislativos a cerca do mote O caput do
art 497 assegura que na accedilatildeo que tenha por objeto a prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer o
juiz se procedente o pedido concederaacute a tutela especiacutefica ou determinaraacute providecircncias que
assegurem a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico equivalente O art 499 o
complementa a obrigaccedilatildeo somente seraacute convertida em perdas e danos se o autor o requerer
ou se impossiacutevel agrave tutela especiacutefica ou a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico
equivalente
O princiacutepio do contraditoacuterio eacute garantido pela constituiccedilatildeo federal e compreende o
direito de ser ouvido o direito de acompanhar os atos processuais o direito de produzir
provas participar da sua produccedilatildeo manifestar-se sobre a prova produzida e obter do juiz a
23 Ibid p 69-70 24 Ibid p 70 25 Ibid p 71
14
respectiva valoraccedilatildeo o direito de ser informado regularmente dos atos praticados no processo
o direito agrave motivaccedilatildeo das decisotildees o direito de impugnar as decisotildees 26
O contraditoacuterio tem aplicaccedilatildeo em todo processo judicial sendo aplicaacutevel tambeacutem na
execuccedilatildeo No entanto o contraditoacuterio na execuccedilatildeo natildeo ocorre com a mesma intensidade que
no processo ou na fase de conhecimento eacute o que assevera Didier et al 27
O contraditoacuterio no procedimento executivo no aspecto do direito de defesa assegurado agrave parte demandada eacute eventual porquanto depende da provocaccedilatildeo do executado que natildeo eacute chamado ajuiacutezo para defender-se mas sim para cumprir a obrigaccedilatildeo O procedimento executivo adota a teacutecnica monitoacuteria que consiste basicamente na inversatildeo do ocircnus de provocar o contraditoacuterio o reacuteu em vez de citado para manifestar-se sobre a pretensatildeo do autor eacute convocado para cumprir uma determinada obrigaccedilatildeo
Logo haacute o contraditoacuterio no procedimento executivo porem eacute eventual quanto agrave defesa
do executado
Ademais o princiacutepio da menor onerosidade eacute consagrado pelo art 805 do CPC e
dispotildee que ldquoQuando por vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz
mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o executadordquo O referido princiacutepio tem o
escopo de impedir o abuso do direito pelo exequente
O principio da menor onerosidade auxilia o juiz na escolha de um meio executivo
adequado e necessaacuterio que satisfaccedila a prestaccedilatildeo exigida pelo credor Nesse sentido eacute o
entendimento do professor Fredie Didier et al 28
O resultado a ser alcanccedilado eacute aquele estabelecido pelo direito material A maneira de se chegar ateacute esse resultado eacute que deve ser a menos onerosa possiacutevel para o executado Isso significa que a opccedilatildeo pelo meio menos gravoso pressupotildee que os diversos meios considerados sejam igualmente eficazes Assim havendo vaacuterios meios executivos aptos agrave tutela adequada e efetiva do direito de creacutedito escolhe-se a via menos onerosa ao executado
O princiacutepio visa impedir a execuccedilatildeo desnecessariamente onerosa ao executado ou seja a execuccedilatildeo abusiva Em vez de enumerar situaccedilotildees em que a opccedilatildeo mais gravosa revelar-se-ia injusta o legislador valeu-se corretamente de uma claacuteusula geral para reputar abusivo qualquer comportamento do credor que pretender valer-se de meio executivo mais oneroso do que outro igualmente idocircneo agrave satisfaccedilatildeo do seu creacutedito
26 Ibid p 76 27 Ibid p 78 28 Ibid p 79-80
15 O princiacutepio da cooperaccedilatildeo tem como base os princiacutepios do devido processo legal da
boa-feacute processual e do contraditoacuterio O dito princiacutepio avigora a eacutetica processual com o
aprimoramento do diaacutelogo entre as partes reciprocamente e com o oacutergatildeo jurisdicional Eacute o
que preconiza o art 6ordm do CPC Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para
que se obtenha em tempo razoaacutevel decisatildeo de meacuterito justa e efetiva
No procedimento executivo o princiacutepio da cooperaccedilatildeo incide de diversas formas
disciplina Didier et al29 que na execuccedilatildeo
O executado tem o dever de indicar bens agrave penhora (art 774 V CPC) Natildeo encontrados bens penhoraacuteveis e natildeo havendo indicaccedilatildeo de qualquer um deles pelo exequente cabe ao executado declarar quais satildeo seus bens penhoraacuteveis sob pena de se sujeitar a uma sanccedilatildeo pecuniaacuteria compulsoacuteria
Tambeacutem eacute manifestaccedilatildeo do princiacutepio da cooperaccedilatildeo a exigecircncia de que o executado que pretende impugnar o valor da execuccedilatildeo apresente de logo o valor que reputa devido (art 525 sect 4ordm CPC) Seria comportamento natildeo-cooperativo afirmar que a cobranccedila eacute excessiva sem simultaneamente dizer qual eacute o valor correto
Demais disso aplicam-se agrave execuccedilatildeo os deveres que decorrem do princiacutepio da cooperaccedilatildeo e que satildeo imputados ao oacutergatildeo jurisdicional () Assim por exemplo deve o juiz advertir ao executado antes de puni-lo de que seu ato pode vir a caracterizar-se como atentatoacuterio agrave dignidade da jurisdiccedilatildeo ( art 772 II CPC) perceba que se trata de uma conduta compatiacutevel com o dever de prevenccedilatildeo O oacutergatildeo jurisdicional somente pode conhecer da prescriccedilatildeo ex officio dando a oportunidade de o exequente manifestar-se conforme impotildee o dever de consulta ( cf arts 10 487 paraacutegrafo uacutenico e 921 sect 5ordm CPC)
O princiacutepio ou postulado30 da proporcionalidade tem aplicaccedilatildeo muito relevante na
execuccedilatildeo O art 8 do CPC assegura que o oacutergatildeo jurisdicional tem o dever de observar a
proporcionalidade e a razoabilidade ao aplicar o ordenamento juriacutedico inclusive no
procedimento executivo
Ademais o art 805 do CPC eacute categoacuterico ao disciplinar que ldquoArt 805 Quando por
vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo
menos gravoso para o executadordquo O referido artigo jaacute se trata de uma concretizaccedilatildeo da
proporcionalidade
29 Ibid p 82 30 Segundo Fredie Didier et al haacute uma discussatildeo doutrinaacuteria sobre a proporcionalidade Parte da
doutrina acredita que a proporcionalidade eacute um princiacutepio e outra parte acredita que eacute um postulado normativo
16 O principio da adequaccedilatildeo pode ser vislumbrado em dois momentos do Direito
Processual ldquoa) no legislativo como orientador da confecccedilatildeo das leis b) no jurisdicional
autorizando ao juiz diante do caso concreto adaptar procedimento agraves suas peculiaridadesrdquo 31
Para Luceacutelia de Sena Alves e Tiago Retes32
Isso quer dizer que no momento legislativo o devido processo deve ser observado pelo legislador para a confecccedilatildeo das normas de direito processual que iratildeo servir de instrumento efetivo de concretizaccedilatildeo do direito substancial a ser tutelado atendendo a todas as suas finalidades sob pena de falecircncia do proacuteprio direito No momento jurisdicional da mesma forma a via processual escolhida pelo autor tambeacutem deve estar sujeita a este princiacutepio para que natildeo sofra as mesmas consequecircncias da sua inobservacircncia
O ordenamento juriacutedico deve ser aplicado por meio da teacutecnica processual adequada
evitando dessa forma uma tutela ineficaz
Por fim o princiacutepio do autorregramento da vontade na execuccedilatildeo tem o objetivo de
ldquo() preservar um espaccedilo processual para o exerciacutecio da liberdade e da vontade em que
sejam permitidas negociaccedilotildees que envolvam as partes ndash e tambeacutem o juizrdquo33 Didier et al34
assevera que
A rigor o legislador estabelece um regime juriacutedico de autorregramento da vontade processual identificando-se algumas manifestaccedilotildees relevantes para a execuccedilatildeo Na verdade pode-se dizer que poucos satildeo os ambientes mais propiacutecios do que a execuccedilatildeo para a negociaccedilatildeo sobre o processo Todos os institutos e normas processuais relativos agrave execuccedilatildeo devem ser repensados a partir da premissa de que o CPC permite uma ampla margem de liberdade de negociaccedilatildeo sobre o processo (art 190 CPC)
O autorregramento da vontade pode ser vislumbrando na previsatildeo de negoacutecios tiacutepicos
em sede de execuccedilatildeo como por exemplo no acordo das partes sobre o valor do bem que
dispensa a avaliaccedilatildeo disposto no inciso I do art 871 CPC Ademais dentro dos limites do art
190 do CPC eacute possiacutevel na execuccedilatildeo a atribuiccedilatildeo da negociaccedilatildeo atiacutepica aos sujeitos 31 ALVES Luceacutelia de Sena Alves RETES Tiago O poder geral de efetivaccedilatildeo das decisotildees judiciais e
proporcionalidade uma anaacutelise criacutetica acerca do art 139 IV do Novo Coacutedigo de Processo Civil Disponiacutevel em lthttpswwwacademiaedu31752652O_poder_geral_de_efetivaC3A7C3A3o_das_decisC3B5es_judiciais_e_a_proporcionalidade_uma_anC3A1lise_crC3ADtica_acerca_do_art_139_IV_do_Novo_CC3B3digo_de_Processo_Civil gt Acesso em 25 de julho de 2018
32 Ibid natildeo paginado 33 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 85 34 Ibid p 85
17
processuais permitindo que sejam feitas mudanccedilas nos procedimentos e nas situaccedilotildees
juriacutedicas processuais ldquoSatildeo exemplos de negoacutecios processuais atiacutepicos na execuccedilatildeo pacto de
penhorabilidade acordo de ampliaccedilatildeo de prazos das partes de qualquer natureza acordo de
rateio de despesas processuais ()rdquo35
24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO
Sempre houve diversos questionamentos quanto agrave eficaacutecia do Direito processual Civil
e se o mesmo era meio apto a assegurar a tutela jurisdicional dos direitos dos cidadatildeos O
processo de execuccedilatildeo eacute o setor que sofre mais criacuteticas quanto a sua ineficiecircncia afinal a
execuccedilatildeo civil sempre foi o ldquocalcanhar de Aquilesrdquo do sistema processual pela praxe do
ldquoganhou (no processo de conhecimento) mas natildeo levou (na fase de cumprimento ou
execuccedilatildeo)rdquo 36
Essa dificuldade de se efetivar a tutela satisfastiva natildeo se resume a um problema de
mera teacutecnica processual tiacutepico de determinado ordenamento mas representa uma prova de
fogo da capacidade dos instrumentos jurisdicionais O autor Leonardo Greco37 no ano de
2005 atribuiu esse fato as seguintes causas o excesso de processos o custo e a morosidade da
justiccedila a inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios a ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais
um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico e a progressiva volatizaccedilatildeo dos bens
Quanto ao excesso de processos o referido autor aduz que ldquonos grandes centros o
crescimento da maacutequina judiciaacuteria natildeo acompanhou a expansatildeo do nuacutemero de litiacutegiosrdquo 38
O custo e morosidade da justiccedila prejudicam a tutela satisfativa posto que
ldquojaacute desfalcado pelo inadimplemento do devedor o credor ainda tem de arcar com o adiantamento das despesas do processo de execuccedilatildeo e de eventual liquidaccedilatildeo vendo arrastar-se a marcha dos atos executoacuterios facilmente retardada por atos procrastinatoacuterios do devedorrdquo 39
35 Ibid p 86 36 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca
para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018
37 GRECCO Leonardo A Crise do Processo de Execuccedilatildeo in Estudos de direito processual Leonardo Greco ndash Campos dos Goytacazes Ed Faculdade de Direito de Campos 2005 p 7
38 Ibid p 7 39 Ibid p 7-8
18 A inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios contribui para a crise do processo de
execuccedilatildeo tendo em vista que
ldquoo juiz da execuccedilatildeo prisioneiro de ritos que o distanciam das partes e da realidade da vida impulsiona sem qualquer apetite a execuccedilatildeo conduzindo-a ao sabor dos ventos das provocaccedilotildees impacientes do credor e das costumeiras procrastinaccedilotildees do devedorrdquo 40
Jaacute ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais atrapalha a efetivaccedilatildeo da tutela satisfativa ldquoo
devedor natildeo colabora com a execuccedilatildeo e os meios de pressatildeo que a lei estabelece natildeo satildeo
suficientes para intimidaacute-lordquo 41
Com um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico
O espiacuterito empresarial e a sociedade de consumo estimulam o endividamento das pessoas e o inadimplemento das obrigaccedilotildees pelo devedor deixou de ser vexatoacuterio e reprovaacutevel o que multiplica as accedilotildees de cobranccedila e execuccedilotildees atraveacutes das quais o sujeito passivo ainda usufrui vantagens agraves custas do credor 42
Por fim Leonardo Greco elenca a volatizaccedilatildeo dos bens como o uacuteltimo fator que
macula o processo executo tendo em vista que
ldquomudou inteiramente o perfil patrimonial das pessoas antes concentrado em bens de raiz e agora tendencialmente dirigido a investimentos em tiacutetulos e valores facilmente negociaacuteveis o que dificulta a sua localizaccedilatildeo pelo credorrdquo 43
O Coacutedigo de Processo Civil de 1973 introduziu o sistema executivo ao ordenamento
juriacutedico paacutetrio e seguindo os valores liberais da eacutepoca com a proteccedilatildeo de esfera juriacutedica de
liberdade do cidadatildeo contra a possibilidade de arbiacutetrio do Estado e uso indevido do Poder
jurisdicional outorgou o miacutenimo de poder ao juiz Seguindo as regras do CPC de 73 o
devedor soacute poderia ter sua esfera juriacutedica invadida atraveacutes de meios de execuccedilatildeo instituiacutedos
previamente em lei
Diante de tantos obstaacuteculos para se efetivar a tutela satisfativa a execuccedilatildeo estava
fadada ao fracasso o que frustrava a expectativa do jurisdicionado a uma prestaccedilatildeo da tutela
jurisdicional ceacutelere e efetiva Insatisfeitos com o cenaacuterio que se encontrava a atividade
40 Ibid p 8 41 Ibid p8 42 Ibid p 8 43 Ibid p8
19
executiva legisladores e operadores do direito natildeo mediram esforccedilos para promover uma
evoluccedilatildeo significativa buscando mais eficiecircncia e celeridade ao procedimento executoacuterio
Dessa forma no final de 1994 foi introduzido no coacutedigo de processo agrave flexibilizaccedilatildeo
dos poderes executoacuterios do juiz ldquopara que ele pudesse prestar uma tutela efetiva aos direitos
ficando autorizado a determinar a modalidade de execuccedilatildeo adequada a cada hipoacutetese nas
obrigaccedilotildees de fazer e natildeo fazer (art 461 sect5ordm do CPC de 1973)rdquo No ano de 2002 a referida
medida foi estendida para as obrigaccedilotildees de entregar coisa (art 461-A caput e sect3ordm do CPC de
1973)
Com fundamento nos artigos 461 e 461-A em 2005 a Lei nordm 11 23205 unificou o
processo de conhecimento e o processo de execuccedilatildeo de sentenccedila Nesse sentido Maacuterio
Henrique Cavalcanti Gil Rodrigues44 aduz que
A Lei 112322005 reuniu de forma definitiva os processos de conhecimento e de execuccedilatildeo em um uacutenico processo composto por um sistema bifaacutesico Assim passa a existir uma fase inicial (de reconhecimento) e uma fase posterior (de cumprimento de sentenccedila de efetivaccedilatildeo da decisatildeo definitiva) sem contar com a eventual fase intermediaacuteria de liquidaccedilatildeo (RODRIGUES 2010 p 38)
Ademais as alteraccedilotildees realizadas no CPC de 73 inseriu a atipicidade dos meios
executivos nas obrigaccedilotildees de fazer natildeo fazer e dar coisa certa entretanto exercendo papel
subsidiaacuterio aos meios tiacutepicos
Quanto agraves obrigaccedilotildees de pagar quantia havia apenas a possibilidade de se valer da
incidecircncia de multa do art 475-J do CPC de 73 ndash implementada mediante reforma perpetrada
pela Lei nordm 11232 de 2005 em atendimento a doutrina processualista preocupada com a
efetividade das decisotildees ndash e de atos executivos como a penhora de bens e dinheiro
Ainda que a execuccedilatildeo tenha avanccedilado com a inserccedilatildeo das leis posteriores a 1994 no
CPC de 1973 a mesma continuava insuficiente tendo em vista que a burocracia e lentidatildeo
dos atos executivos davam brechas para que o devedor escondesse seu patrimocircnio penhoraacutevel
tornando carente de efetividade e celeridade agrave execuccedilatildeo
44 RODRIGUES Maacuterio Henrique Cavalcanti Gil A evoluccedilatildeo da execuccedilatildeo de sentenccedila no direito
processual civil e o novo regime juriacutedico das sentenccedilas apoacutes a reforma implementada pela Lei 112322005 Revista do Tribunal Regional Federal da 1ordf Regiatildeo v 22 n 2 fev 2010 p 38
20
25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO
A tutela juridiscional eacute um direito fundamental previsto no art 5ordm inciso XXXV da
Carta Magna ldquo() a lei natildeo excluiraacute da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio lesatildeo ou ameaccedila a
direitordquo
Na visatildeo claacutessica o direito de accedilatildeo era efetivado com a prolaccedilatildeo de uma sentenccedila de
meacuterito posiccedilatildeo adotada por grande parte dos processualistas seguidores da doutrina de
Liebman Todavia esse conceito se mostra defasado tendo em vista que o direito de acesso agrave
justiccedila natildeo eacute apenas uma garantia formal de bater as portas do judiciaacuterio mas a garantia de
acesso agrave ordem juriacutedica justa adequada e eficaz45
Acreditar que uma sentenccedila de meacuterito favoraacutevel eacute tutela jurisdicional suficiente para
satisfazer o que se busca com o ajuizamento da accedilatildeo eacute uma visatildeo distorcida da atividade
satisfativa ldquoSob o ponto de vista do direito material a condenaccedilatildeo por si soacute eacute incapaz de
prestar a tutela do direitordquo46
Nessa oacutetica o direito fundamental agrave tutela executiva exige um sistema de tutela
jurisdicional ldquocapaz de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor
de tutela executivardquo47 Dessa forma entende-se que
ldquo() a) a interpretaccedilatildeo das normas que regulamentam a tutela executiva tem de ser feita no sentido de extrair a maior efetividade possiacutevel b) o juiz tem o poder-dever de deixar de aplicar uma norma que imponha uma restriccedilatildeo a um meio executivo sempre que essa restriccedilatildeo natildeo se justificar como forma de proteccedilatildeo a outro direito fundamental c) o juiz tem o poder-dever de adotar os meios executivos que se revelem necessaacuterios agrave prestaccedilatildeo integral de tutela executivardquo48
Egrave imperioso compreender que o direito fundamental agrave tutela executiva ratificado
pelo CPC eacute essencial para dirimir diversos litiacutegios oriundos do procedimento executivo
45 FERREIRA Gabriela Macedo Poder geral de efetivaccedilatildeo em defesa da constitucionalidade da
teacutecnica de execuccedilatildeo dos direitos do art 139 IV do Coacutedigo de Processo Civil Revista Jus Navigandi ISSN 1518-4862 Teresina ano 22 n 5178 4 set 2017 Disponiacutevel em lthttpsjuscombrartigos60190gt Acesso em 11 set 2018
46 Ibid natildeo paginado 47 DIDIER JR Fredie et al apud GUERRA Marcelo lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do credor
na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 48 Ibid p 102-104
21
ldquoprincipalmente aqueles relacionados agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo49
Fredie Didier et al50 cita como exemplo as hipoacuteteses de impenhorabilidade
A impenhorabilidade de certos bens eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa
Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais
Por esta razatildeo o legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do
CPC fazendo um preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses das partes envolvidas
optando pela mitigaccedilatildeo do direito do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado
Quando o oacutergatildeo jurisdicional verificar que a aplicaccedilatildeo das regras de
impenhorabilidade eacute desproporcional para o caso concreto deve afastaacute-la e construir a
soluccedilatildeo adequada para o referido caso Didier et al51 traz um exemplo esclarecedor em sua
obra
O bem imoacutevel que serve de moradia da famiacutelia eacute relativamente impenhoraacutevel Objetiva-se com essa restriccedilatildeo proteger o direito fundamental agrave moradia conteuacutedo do direito agrave proteccedilatildeo da dignidade Imagine-se um imoacutevel de altiacutessimo valor Imagine-se agora um creacutedito que corresponda a 40 do valor do imoacutevel A venda judicial do imoacutevel no caso permitiria natildeo soacute satisfazer o direito do credor como ainda garantir ao executado com a sobra a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel que lhe preserve a dignidade A opccedilatildeo pela interpretaccedilatildeo literal da regra que veda a penhora protegeria exclusivamente o direito do executado de maneira desnecessaacuteria porque a relaccedilatildeo valor executadovalor do bem permitiria a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel apoacutes a entrega do dinheiro ao credor Seria pois interpretaccedilatildeo em desconformidade com os preceitos da contemporacircnea hermenecircutica constitucional que preconiza a necessidade de nos casos de choque entre direitos fundamentais dar a interpretaccedilatildeo que mais adequadamente proteja a ambos
A execuccedilatildeo civil integra o direito fundamental agrave tutela jurisdicional disciplinando
que ldquoos dispositivos devem ser interpretados de modo que se garanta a maior efetividade
49 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66 50 Ibid p 66 51 Ibid p 67
22
possiacutevel agrave execuccedilatildeo desde que respeitados outros direitos fundamentaisrdquo52 Podendo ser
afastada desde que proporcional qualquer obstaacuteculo irrazoaacutevel agrave efetivaccedilatildeo desse direito
52 FERREIRA Gabriela Macedo apud MACEDO Lucas Buril de As eficaacutecias das decisotildees judiciais e
o cumprimento de sentenccedila no CPC15 Novo CPC Doutrina selecionada v 5 Execuccedilatildeo Coordenador geral Fredie Didier Jr organizadores Lucas Buril de Macedo Ravi Peixoto Alexandre Freire ndash Salvador Jus Podivm 2015 p 360361
23
3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO
EXECUTADO
31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS
Como forma de controlar a atividade jurisdicional por muito tempo vigorou o
entendimento de que a execuccedilatildeo somente poderia ser realizada atraveacutes dos meios executivos
tipicamente previstos na legislaccedilatildeo Segundo Luiz Guilherme Marinoni53
O princiacutepio da tipicidade deseja significar que os meios de execuccedilatildeo devem estar previstos na lei e assim que a execuccedilatildeo natildeo pode ocorrer atraveacutes de formas executivas natildeo tipificadas O seu objetivo eacute de um lado impedir que meio executivo natildeo previsto em lei possa ser utilizado e de outro garantir o jurisdicionado contra a possibilidade de arbiacutetrio judicial na fixaccedilatildeo da modalidade executiva Se o jurisdicionado sabe em razatildeo de previsatildeo legal que a sua esfera juriacutedica somente poderaacute ser invadida atraveacutes de determinadas modalidades executivas confere-se a ele a possibilidade de antever a reaccedilatildeo ao seu inadimplemento bem como a garantia de que a jurisdiccedilatildeo natildeo determinaraacute ou permitiraacute a utilizaccedilatildeo de meio executivo diverso daqueles previstos
Dessa forma o princiacutepio da tipicidade disciplina que o oacutergatildeo julgador ao proceder agrave
execuccedilatildeo estaacute limitado aos meios executivos previamente definidos em lei natildeo podendo se
valer de qualquer teacutecnica de efetivaccedilatildeo que natildeo se encaixasse nas hipoacuteteses taxativas da
legislaccedilatildeo
Entretanto o legislador natildeo tem como prever todas as peculiaridades dos direitos
dignos de tutela executiva e preordenar teacutecnicas executivas diversas para cada peculiaridade
Sob esse cenaacuterio o principio da tipicidade foi cedendo lugar ao principio da atipicidade dos
meios executivos
A ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do oacutergatildeo julgador estaacute cada vez mais presente
no ordenamento juriacutedico paacutetrio motivando um poder geral de efetivaccedilatildeo ldquoque permite ao
julgador valer-se dos meios executivos que considerar mais adequado ao caso concreto sejam
eles de coerccedilatildeo direta sejam de coerccedilatildeo indiretardquo 54
53 MARINONI Luiz Guilherme Teacutecnica processual e tutela dos direitos Satildeo Paulo Editora Revista
dos Tribunais 2004 p 212 nota 79 54 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 100
24
Essa tendecircncia de ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do juiz natildeo eacute exclusividade do
ordenamento juriacutedico brasileiro segundo Fredie Didier et al55
Michelle Taruffo jaacute apontava que o direito americano diante da inefetividade dos meios executivos at law comeccedilou a autorizar o magistrado a tomar medidas executivas adequadas ao caso concreto Trata-se afirma o jurista italiano de aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo segundo o qual as regras processuais devem ser adaptadas agraves necessidades do direito material
Os meios executivos atiacutepicos derivam de trecircs enunciados normativos do Coacutedigo de
Processo Civil o art 139 IV o art 297 e o sect1ordm do art 536
O art 139 IV do CPC dispotildee que pertence ao juiz o poder-dever de ldquodeterminar
todas as medidas indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para
assegurar o cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto
prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo
Jaacute o art 297 do CPC cuida da tutela provisoacuteria e garante que ldquoo juiz poderaacute
determinar as medidas que considerar adequadas para a efetivaccedilatildeo da tutela provisoacuteriardquo
Podendo dessa forma a dita tutela ser efetivada atipicamente
Por fim o art 536 sect1ordm do CPC dispotildee que
Para atender ao disposto no caput o juiz poderaacute determinar entre outras medidas a imposiccedilatildeo de multa a busca e apreensatildeo a remoccedilatildeo de pessoas e coisas o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva podendo caso necessaacuterio requisitar o auxilio de forccedila policial
As supracitadas medidas executivas atiacutepicas satildeo entendidas pela doutrina como
claacuteusulas gerais processuais executivas56 Essas claacuteusulas gerais natildeo restringem a sua
aplicaccedilatildeo agraves teacutecnicas de coerccedilatildeo indireta satildeo autorizados tambeacutem o uso de meios de execuccedilatildeo
dieta e indireta
Ademais cumpre salientar que o art 139 IV CPC aplica-se a toda e qualquer
atividade executiva ldquoa) seja fundada em tiacutetulo executivo judicial (provisoacuteria ou definitiva)
55 DIDIER JR Fredie et al apud TARUFFO Michelle A atuaccedilatildeo executiva dos direitos perfis
comparatiacutesticos Revista de Processo Satildeo Paulo RT 1990 n 59 p 78 56 Segundo Fredie Didier et al claacuteusula geral eacute uma espeacutecie de texto normativo cujo antecedente
(hipoacutetese faacutetica) eacute composto por termos vagos e consequente (efeito juriacutedico) eacute indeterminado
25
seja fundada em tiacutetulo executivo extrajudicial b) seja para efetivar prestaccedilatildeo pecuniaacuteria seja
para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer ou dar coisa distinta de dinheirordquo57
Jaacute o art 297 do CPC garante que a tutela provisoacuteria possa ser efetivada tambeacutem
atipicamente ldquoSucede que a atipicidade da tutela provisoacuteria segue necessariamente a
atipicidade da tutela definitivardquo 58
Por fim o comando do sect 1 ordmdo art 536 se aplica
a) inicialmente agrave execuccedilatildeo de fazer e de natildeo fazer fundada em decisatildeo judicial (provisoacuteria ou definitiva) b) por forccedila do sect 3ordm do art 538 tambeacutem se aplica ao cumprimento de sentenccedila para entrega de coisa c) por forccedila do art 771 paraacutegrafo uacutenico o dispositivo tambeacutem se aplica agrave execuccedilatildeo para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer e entregar coisa distinta de dinheiro fundada em tiacutetulo extrajudicial
Claramente o art 139 IV eacute mais amplo do que o sect 1 ordm do art 536 estende-se por
disposiccedilatildeo expressa agrave execuccedilatildeo de pagar quantia Sendo uma grande novidade nas obrigaccedilotildees
que tem por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15
O art 139 IV do CPC apresentou uma novidade agrave atipicidade dos meios executivos
ao disciplinar que cabe ao juiz ldquodeterminar todas as medidas indutivas coercitivas
mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o cumprimento de ordem judicial
inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo
A inovaccedilatildeo estaacute na possibilidade de utilizar os meios atiacutepicos para assegurar o
cumprimento de decisotildees que versam sobre as obrigaccedilotildees pecuniaacuterias sendo admitida a
utilizaccedilatildeo de outros meios ateacute na execuccedilatildeo de titulo judicial de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria aleacutem da
multa de 10 (a que se refere o artigo 523 sect 1ordm do CPC) para forccedilar o devedor a cumprir a
obrigaccedilatildeo pecuniaacuteria
57 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 105 58 Ibid p 105
26
Dessa forma eacute possiacutevel afirmar que ldquoao lado da disciplina tiacutepica do art 523 e
seguintes () o novo CPC inova ao permitir que o sistema de teacutecnicas executivas atiacutepicas
sejam empregadas na execuccedilatildeo monetaacuteriardquo59 (ZARONI VITORELLI 2016 p 66)
Fernando da Fonseca Gajardoni60 denomina a dita medida como a ldquorevoluccedilatildeo
silenciosardquo da execuccedilatildeo por quantia certa posto que
() pelo fato de que a regra natildeo estar propriamente incrustrada nos capiacutetulo e livro atinentes ao cumprimento de sentenccedila e ao processo de execuccedilatildeo ndash o art 139 IV do Novo CPC parece trazer ao paiacutes algo bastante novo cuja aplicaccedilatildeo a depender do comportamento do Judiciaacuterio pode implicar em verdadeira revoluccedilatildeo (positiva ou negativa) na sistemaacutetica executiva ateacute entatildeo vigente
Claramente o dispositivo foi recebido com entusiasmo por parte da doutrina que
anteciparam em afirmar que o princiacutepio da atipicidade dos meios executivos no CPC2015
ldquo() assume a feiccedilatildeo de poder-dever geral conferido ao magistrado de determinar () todas
as medidas coercitivas sub-rogatoacuterias mandamentais e indutivas que entender necessaacuterias
para a tutela justa efetiva e em tempo razoaacutevelrdquo 61
Dessa forma lecionam Luiz Guilherme Marinoni Seacutergio Cruz Arenhart e Daniel
Mitidiero62 que
O juiz a partir do art 139 IV do CPC2015 natildeo estaacute mais adstrito apenas agrave sentenccedila condenatoacuteria ndash que fixa a obrigaccedilatildeo de pagar e daacute ensejo agrave abertura da execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo patrimonial ndash para a tutela de prestaccedilotildees pecuniaacuterias Pode impor essa prestaccedilatildeo por meio de ordem judicial acoplada ao aceno de emprego de medida de induccedilatildeo (coercitiva ou de pressatildeo positiva) ou de medida de sub-rogaccedilatildeo (MARINONI ARENHARDT MITIDIERO 2015 p 703)
Deste modo em razatildeo do art 139 IV do CPC tem-se entendido que o juiz nas
execuccedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria possui a faculdade de adotar qualquer
59 ZARONI Bruno Marzullo VITORELLI Edilson Reforma e efetividade da execuccedilatildeo no novo CPC
In PEIXOTO Ravi FREIRE Alexandre MENDES Aluiacutesio Gonccedilalves de Castro Execuccedilatildeo 2 ed rev e atual Salvador JusPodivm 2016 766 p (Coleccedilatildeo novo CPC doutrina selecionada v 5) p 66
60 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia 24082015 JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Acesso em 23082018
61 LIMA Rafael de Oliveira A atipicidade dos meios executivos no coacutedigo de processo civil brasileiro de 2015 Revista de Processo Jurisdiccedilatildeo e Efetividade da Justiccedila v 2 n 2 juldez 2016 p 11
62 MARINONI Luiz Guilherme ARENHART Seacutergio Cruz MITIDIERO Daniel Novo curso de processo civil tutela dos direitos mediante procedimento comum Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 v 2 p 703
27
medida indutiva coercitiva mandamentais ou sub-rogatoacuterias para efetivar o creacutedito do
exequente natildeo se limitando as medidas tiacutepicas
Alguns doutrinadores se precipitaram ao afirmar que o dito dispositivo ldquo() autoriza o
juiz a utilizar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir ressalvando-se a prisatildeo
civil constitucionalmente limitada ao devedor de alimentosrdquo 63 Acreditam Jorge Bheron
Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa que o entusiasmo por parte da
doutrina abre margem para as mais variadas formas de compelir o devedor a cumprir com a
prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
ldquoE aiacute persistindo no mau vezo de fazer explicaccedilotildees em abstrato ignorando que o sentindo soacute se daacute na aplicaccedilatildeo (situaccedilatildeo concreta real ou fictiacutecia) as sugestatildeo satildeo as mais engenhosas suspensatildeo de CNH retenccedilatildeo de passaporte restriccedilatildeo de fim de semana cancelamento de cartotildees de creacutedito ndash para ficar apenas nestasrdquo 64
Ou seja podendo o juiz natildeo apenas substituir o devedor tomando seu patrimocircnio para
entregar ao credor na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia como tambeacutem poderaacute
pressionaacute-lo psicologicamente a adimplir por conta proacutepria a obrigaccedilatildeo
Ademais o Enunciado nordm 48 do ENFAM avalia expressamente a possibilidade de
imposiccedilatildeo de medidas coercitivas para a efetivaccedilatildeo da execuccedilatildeo pecuniaacuteria Conforme o dito
enunciado
ldquoO art 139 inciso IV traduz um poder geral de efetivaccedilatildeo permitindo a aplicaccedilatildeo de medidas atiacutepicas para garantir o cumprimento de qualquer ordem judicial inclusive no acircmbito do cumprimento de sentenccedila e no processo de execuccedilatildeo baseado em tiacutetulosrdquo
Dessa forma o artigo 139 IV do CPC permite uma gama ampla de interpretaccedilotildees por
parte da doutrina por ser uma claacuteusula geral encontrando limite apenas na imaginaccedilatildeo de
quem o analisa Nesse sentido eacute forccediloso orientar e delimitar o manejo desse artigo legal para
que se extraia seu sentido e alcance revelando assim sobre que situaccedilotildees ele incide de que
modo e o que permite
63 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
64 Ibid sem paginaccedilatildeo
28
32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER
GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
O artigo 139 IV com a vigecircncia do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 abriu margem
para uma constelaccedilatildeo de decisotildees nas quais o dito dispositivo recebeu diversas interpretaccedilotildees
pelos operadores do direito
Sem duacutevidas por ser uma das pioneiras a decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara
Ciacutevel do Foro Regional de Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-
1320138260011 na data de 25 de agosto de 2016 gerou um enorme rebuliccedilo
Nessa accedilatildeo que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto
uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a
suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o
passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito
Segundo a magistrada o processo tramitava haacute anos sem que nenhum valor tenha sido
pago ao exequente aleacutem do devedor natildeo ter oferecido proposta de acordo e nem ter indicado
bens agrave penhora configurando uma completa desiacutedia com o processo
ldquoO caso tratado nos autos se insere dentre as hipoacuteteses em que eacute cabiacutevel a aplicaccedilatildeo do art 139 inciso IV do Coacutedigo de Processo Civil Isso porque o processo tramita desde 2013 sem que qualquer valor tenha sido pago ao exequente Todas as medidas executivas cabiacuteveis foram tomadas sendo que o executado natildeo paga a diacutevida natildeo indica bens agrave penhora natildeo faz proposta de acordo e sequer cumpre de forma adequada as ordens judiciais frustrando a execuccedilatildeo
Se o executado natildeo tem como solver a presente diacutevida tambeacutem natildeo recursos para viagens internacionais ou para manter um veiacuteculo ou mesmo manter um cartatildeo de creacutedito Se poreacutem mantiver tais atividades poderaacute quitar a diacutevida razatildeo pela qual a medida coercitiva poderaacute se mostrar efetiva
Assim como medida coercitiva objetivando a efetivaccedilatildeo da presente execuccedilatildeo defiro o pedido formulado pelo exequente e suspendo a Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo do executado M A S determinando ainda a apreensatildeo de seu passaporte ateacute o pagamento da presente diacutevida
()
Determino ainda o cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado ateacute o pagamento da presente diacutevida ()rdquo
Foi impetrado Habeas Corpus no Tribunal de Justiccedila do Estado de Satildeo Paulo a favor
do executado sob o fundamento que a coaccedilatildeo era ilegal e afetava o direito de locomoccedilatildeo
29
garantido constitucionalmente Tendo sido concedida a liminar em decisatildeo que ora se
reproduz
Em que pese a nova sistemaacutetica trazida pelo art 139 IV do CPC2015 deve-se considerar que a base estrutural do ordenamento juriacutedico eacute a Constituiccedilatildeo Federal que em seu art 5ordm XV consagra o direito de ir e vir Ademais o art 8ordm do CPC2015 tambeacutem preceitua que ao aplicar o ordenamento juriacutedico o juiz natildeo atentaraacute apenas para a eficiecircncia do processo mas tambeacutem aos fins sociais e agraves exigecircncias do bem comum devendo ainda resguardar e promover a dignidade da pessoa humana observando a proporcionalidade a razoabilidade e a legalidade Por tais motivos concedo a liminar pleiteada65
Cabe destacar aqui o voto vencido da Desembargadora Maria Luacutecia Pizzotti no
julgamento do Habeas Corpus supracitado demonstrando que o debate sobre a abrangecircncia
do artigo 139 IV do CPC ocorre tanto na doutrina quanto no judiciaacuterio
O objetivo do novel dispositivo natildeo eacute impor penas ou restringir direitos natildeo sendo intenccedilatildeo do Judiciaacuterio suspender indefinidamente o direito de dirigir do executado ou sua liberdade de viajar mas sim impor uma restriccedilatildeo tatildeo gravosa caso ele natildeo cumpra a determinaccedilatildeo que escolha cumprir sua obrigaccedilatildeo e dar fim ao problema Em outras palavras mediante as medidas de coerccedilatildeo o Estado procura persuadir o inadimplente impondo-lhe situaccedilotildees tatildeo onerosas e inconvenientes que em algum momento seja para ele mais vantajoso cumprir do que permanecer no inadimplemento
Ao fazecirc-lo o Novo Coacutedigo de Processo Civil rompe com as criacuteticas da ineficiecircncia das execuccedilotildees Natildeo se cogita deferir medidas restritivas agravequeles que demonstram a incapacidade absoluta de solver o deacutebito apenas agravequeles que reconhecidamente se valem de artimanhas e subterfuacutegios para evitar a satisfaccedilatildeo das diacutevidas ldquopreferindordquo outras despesas mais lsquonobresrsquo agindo em nome de terceiros e fazendo escaacuternio dos credores e do proacuteprio Poder Judiciaacuterio (hellip)
Para tanto memoraacutevel a noccedilatildeo de que a medida em comento tem caraacuteter excepcional e encontra limites no plano da proporcionalidade como sustenta o ilustrado Magistrado paulista Fernando da Fonseca Gajardoni Professor Faculdade de Direito de Ribeiratildeo Preto da USP (in httpswwwjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 acesso em 091216 agraves 11h20min) E para anaacutelise da proporcionalidade a ponderaccedilatildeo deve observar os trecircs passos apontados pela doutrina a necessidade a adequaccedilatildeo e a proporcionalidade em sentido estrito
65 TJSP - Habeas Corpus Processo nordm 2183713-8520168260000 30ordf Cacircmara Direito Privado relator
Des Marcos Ramos j 290317
30
Ademais no entendimento de Jorge Amaury Maia Nunes e Guilherme Pupe de
Noacutebrega66 essa decisatildeo releva os perigos trazidos pelo art 139 IV do CPC ao confrontar
direitos constitucionalmente garantidos
De nossa parte entendemos que a liberdade de locomoccedilatildeo inserta no inciso XV do artigo 5ordm que abrange o direito de deixar o territoacuterio nacional sofre embaraccedilo indevido pela apreensatildeo de passaporte ou pela suspensatildeo da carteira nacional de habilitaccedilatildeo
()
Agrave luz da exposiccedilatildeo feita acima e em anaacutelise primeva sustentamos que o artigo 139 IV do CPC de 2015 estaacute a merecer declaraccedilatildeo de inconstitucionalidade sem reduccedilatildeo de texto para o fim de rechaccedilar a apreensatildeo de passaporte a suspensatildeo do direito de dirigir e a vedaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo em concurso ou em licitaccedilatildeo puacuteblicos como medidas passiacuteveis de serem adotadas pelo juiz sob pena de vulneraccedilatildeo aos artigos 1ordm IV 5ordm XV e LIV 37 I 173 sect 3ordm III e 175 todos da Constituiccedilatildeo
Apesar de ter sofrido duras criacuteticas a decisatildeo do processo de nordm 4001386-
1320138260011 serviu de inspiraccedilatildeo para tantas outras decisotildees no mesmo sentido
Foi o caso da decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de Satildeo
Vicente em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 0020724-2620088260590 na data de 21 de
junho de 2017
A supracitada execuccedilatildeo se arrastava por nove (09) anos sem que o devedor tenha
esboccedilado qualquer intenccedilatildeo de pagar a diacutevida O credor requereu a suspensatildeo da Carteira
Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado apreensatildeo do passaporte e cancelamento dos
cartotildees de creacutedito
O magistrado com embasamento no artigo 139 IV do CPC deferiu parcialmente o
pedido sob o fundamento de que a apreensatildeo de passaporte e CNH natildeo viola o direito de ir e
vir do devedor Entretanto o juiz indeferiu o pedido de cancelamento do cartatildeo de creacutedito por
acreditar que a suspensatildeo poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado tendo em
vista que atualmente as pessoas utilizam o referido cartatildeo para pagamento das despesas
diaacuterias
66 NOBREacuteGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139
IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018
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Eacute evidente que as medidas atiacutepicas de coerccedilatildeo devem ser utilizadas com cautela sempre respeitando a dignidade da pessoa do executado Natildeo se vislumbra contudo que as medidas aqui eleitas sejam capazes de vulnerar os Direitos Fundamentais do indiviacuteduo A uma porque natildeo se trata de restriccedilatildeo ao direito de ir e vir do executado que continua no gozo de plena liberdade de locomoccedilatildeo a duas porque a conduccedilatildeo de veiacuteculo automotor eacute mera comodidade da vida moderna natildeo se tratando de direito absoluto
Com mais razatildeo ainda se admite a suspensatildeo do Passaporte do executado que se natildeo paga a diacutevida da execuccedilatildeo natildeo deve ter o direito de fazer viagem internacional
Tem-se aqui verdadeiro exerciacutecio de ponderaccedilatildeo de interesses juriacutedicos de um lado jaz o direito de creacutedito do exequente que deriva do direito de propriedade e por isso mesmo tem envergadura constitucional de outro giro tem-se o direito do executado agrave autorizaccedilatildeo do Estado para conduzir veiacuteculo automotor e realizar viagens internacionais que natildeo se mostram essenciais agrave dignidade da pessoa humana Natildeo haacute duacutevidas pois de que eacute este uacuteltimo que deve sucumbir
O pedido fica indeferido apenas no tocante agrave suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado Eacute que ao contraacuterio da CNH e do passaporte que trazem consigo certa presunccedilatildeo de riqueza natildeo se pode concluir que o uso de cartatildeo de creacutedito eacute feito por luxo ou simples conveniecircncia
Como eacute cediccedilo os cartotildees de creacutedito oferecem ao seu titular creacutedito raacutepido e rotativo para o pagamento de despesas diaacuterias e certamente exercem funccedilatildeo essencial agravequeles que se encontram em situaccedilatildeo financeira precaacuteria
A suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado portanto se revela medida desproporcional e que inclusive poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado
Pelo exposto defiro em parte o pedido formulado pelo exequente e DETERMINO a suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo e bem como a suspensatildeo da validade (cancelamento temporaacuterio) no sistema SINPA de eventuais passaportes vaacutelidos em nome do executado
Dessa forma o artigo 139 IV do CPC revolucionou completamente a execuccedilatildeo de
obrigaccedilatildeo de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria ao permitir a utilizaccedilatildeo do uso dos meios executivos
atiacutepicos para compelir o executado a satisfazer o creacutedito do exequente
33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE
EFETIVACcedilAtildeO
Era inevitaacutevel que o artigo 139 IV do CPC gerasse todo tipo de reaccedilatildeo entre os
doutrinadores do processo civil e ateacute mesmo de outros ramos do direito devido a sua
capacidade de realizar uma completa inovaccedilatildeo na forma de se executar as obrigaccedilotildees de pagar
quantia Alguns o aplaudiram visualizando nele ldquouma luz no fim do tuacutenelrdquo outros o
criticaram vislumbrando as arbitrariedades que poderiam ser praticadas com embasamento no
referido dispositivo
32
As decisotildees suscitadas em linhas preteacuteritas auxiliaram para fervilhar ainda mais o
debate sobre o tema tendo em vista que por um lado poderia aumentar a efetividade das
execuccedilotildees por quantia no entanto por outro surgiam questionamentos a cerca da sua
constitucionalidade
A doutrina parece que demoraraacute a se pacificar sobre o tema Segundo alguns
doutrinadores seraacute inconstitucional toda restriccedilatildeo que recaia sobre a pessoa do devedor e natildeo
exclusivamente sobre o seu patrimocircnio Jaacute para outros o dispositivo eacute constitucional e o meio
mais eficaz para se resolver o problema da efetivaccedilatildeo das execuccedilotildees de pagar quantia ldquoA
discussatildeo se daacute especialmente no que diz respeito aacutes medidas de suspensatildeo de CNH
apreensatildeo de passaporte e bloqueio de cartotildees de creacutedito do devedorrdquo 67
O professor Thiago Rodovalho analisou detalhadamente a decisatildeo de nordm 4001386-
1320138260011 em seu artigo ldquoO necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na
concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivosrdquo 68 Quanto agrave suspensatildeo da CNH o autor
acredita que tal medida natildeo viola qualquer direito fundamental do devedor posto que ldquodirigir
veiacuteculos automotores eacute direito do cidadatildeo mas natildeo se confunde com os direitos fundamentais
e social de ir-e-vir e ao transporterdquo 69 O professor eacute categoacuterico ao afirmar que
Com relaccedilatildeo agrave suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (suspensatildeo do direito de dirigir restriccedilatildeo de direitos) natildeo nos parece haver qualquer violaccedilatildeo a direito fundamental ou social nem a direito da personalidade ou colocaccedilatildeo do devedor em situaccedilatildeo desproporcionalmente detrimentosa exceccedilatildeo feita aos que usam o veiacuteculo como instrumento de trabalho atraindo a hipoacutetese do NCPC art 833 inc V
()
Outrossim natildeo o consideramos como direito da personalidade Os direitos da personalidade satildeo os valores fundamentais que compotildeem o proacuteprio ser justamente por isso intransmissiacuteveis e irrenunciaacuteveis natildeo podendo o seu exerciacutecio sofrer limitaccedilatildeo voluntaacuteria (CC art 11) Por mais que vivamos num paiacutes que tanto valoriza o carro e que muitas pessoas de fato se compreendam em razatildeo e em funccedilatildeo do carro que dirijam este natildeo nos parece ser um direito que verdadeiramente componha a personalidade do indiviacuteduo70
67 DONTOS Sofia Poderes executoacuterios do juiz que diz a doutrina sobre o art 139 inc IV do CPC
Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigospoderes-executorios-do-juiz-que-diz-a-doutrina-sobre-art-139-inc-iv-do-cpc-23052018 gt Publicado em 23052018 Acesso em 01082018
68 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018
69 Ibid sem paginaccedilatildeo 70 Ibid sem paginaccedilatildeo
33
Quanto ao cancelamento dos cartotildees de credito do devedor o professor Thiago
Rodovalho tambeacutem acredita que natildeo haacute qualquer violaccedilatildeo ao direito fundamental social ou
da personalidade do devedor e acrescenta que
Tanto assim o eacute que ser titular de um cartatildeo de creacutedito pressupotildee ter creacutedito o que eacute analisado e concedido por instituiccedilotildees financeiras mais do que isso se porventura passando por dificuldades financeiras a pessoa deixa de honrar com pagamentos a mesma instituiccedilatildeo financeira concedente do cartatildeo de creacutedito pode sponte propria cancelaacute-lo ou recusar-lhe a concessatildeo Ora parece-me contraditoacuterio que instituiccedilotildees financeiras para sua proteccedilatildeo patrimonial possam ferir esse suposto ldquodireito fundamentalrdquo ou esse suposto ldquodireito da personalidaderdquo mas natildeo possa o Poder Judiciaacuterio igualmente fazecirc-lo contra aquele devedor moroso que instado ao pagamento e frustradas todas as tentativas de constriccedilatildeo patrimonial leva vida luxuosa valendo-se de cartotildees de creacutedito que prescindem de dinheiro em conta eacute dizer podem justamente funcionar como forma de ocultar renda e patrimocircnio71
O autor considera a apreensatildeo de passaporte um tema mais polecircmico e que merece
maior reflexatildeo No entanto crecirc que eacute possiacutevel a apreensatildeo de passaporte sem violar os
direitos fundamentais do devedor por se tratar de um direito de ir e vir de amplitude especial
Agrave primeira vista a possibilidade de apreensatildeo do passaporte tambeacutem nos parece possiacutevel pois tambeacutem se trata de um direito de ir e vir de amplitude especial Assim o eacute pois salvo situaccedilotildees especiais (refugiados p ex) haacute a necessidade de demonstrar condiccedilotildees financeiras de estadia e retorno para ser admitido no paiacutes de destino Ou seja pressupotildee uma condiccedilatildeo financeira que o devedor justamente diz natildeo possuir Sem embargo dessa consideraccedilatildeo esse ainda eacute um ponto que merece uma reflexatildeo mais acurada sendo essa apenas uma primeira impressatildeo72
Outros autores escreveram sobre o tema como eacute o caso do processualista Luiz
Dellore73 que tambeacutem defende que as medidas atiacutepicas como restriccedilatildeo ao direito de dirigir
apreensatildeo de passaporte e cancelamento de cartotildees de creacutedito satildeo permitidas e natildeo violam em
regra os direitos fundamentais do devedor
De minha parte creio que efetivamente haacute inovaccedilatildeo no at 139 IV do NCPC (e natildeo mera repeticcedilatildeo do que jaacute havia no Coacutedigo anterior) que tem o condatildeo de trazer mais efetividade ao processo executivo no Brasil ndash que por deacutecadas centrou sua atenccedilatildeo na defesa do executado (vide a grande quantidade de impenhorabilidades) sem dar maior atenccedilatildeo ao creacutedito do exequente
71 Ibid sem paginaccedilatildeo 72 Ibid sem paginaccedilatildeo 73 DELLORE Luiz NCPC Atipicidade das medidas executivas jaacute eacute realidade Disponiacutevel em lt
httpswwwjotainfoopiniao-e-analisecolunasnovo-cpcncpc-atipicidade-de-medidas-executivas-ja-e-realidade-17042017 gt Publicado em 17042017 Acesso em 03092018
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Logo a meu ver medidas como (i) restriccedilatildeo ao direito de dirigir (ii) apreensatildeo de passaporte (iii) cancelamento de cartotildees de creacutedito e (iv) vedaccedilatildeo de obtenccedilatildeo de novos empreacutestimos se natildeo vinculados ao pagamento do deacutebito exequendo dentre outras restriccedilotildees que deveratildeo ser observadas a cada caso satildeo permitidas pelo sistema do NCPC e em regra natildeo violam direitos fundamentais do devedor E tecircm o condatildeo de fazer com que o executado que tem recursos diante dessas medidas coercitivas pague o deacutebito trazendo sucesso agrave satisfaccedilatildeo do creacutedito
Nessa linha para Alexandre Fuchs das Neves74 o artigo 139 IV do CPC conferiu ao
juiz poderes coercitivos capazes de ldquotransformar a vida do devedor um infernordquo para compeli-
lo a cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria Entretanto pondera que para que a medida tenha
validade ldquoeacute necessaacuteria uma fundamentaccedilatildeo por evidente uma correlaccedilatildeo temaacutetica entre a
medida adotada e sua efetividade em face ao processo com fundamentaccedilatildeo detalhadardquo
No entendimento de Fernando Gajardoni75 satildeo possiacuteveis as medidas de apreensatildeo de
passaporte bloqueio de cartotildees de creacutedito e suspensatildeo da CNH Para ele o que limita o art
139 IV do CPC eacute o esgotamento dos meios tiacutepicos e a real necessidade da medida
Ilustrativamente natildeo efetuado o pagamento de diacutevida oriunda de multas de tracircnsito e superados os expedientes tradicionais de adimplemento (penhora de dinheiro e bens) seria liacutecito o estabelecimento da medida coercitivaindutiva de suspensatildeo do direito a conduzir veiacuteculo automotor ateacute pagamento do deacutebito (inclusive com apreensatildeo da CNH do devedor) natildeo efetuado pagamento de verbas salariais devidas a funcionaacuterios da empresa possiacutevel o estabelecimento de vedaccedilatildeo agrave contrataccedilatildeo de novos funcionaacuterios ateacute que seja saldada a diacutevida natildeo efetuado o pagamento de financiamento bancaacuterio na forma e no prazo avenccedilados possiacutevel ateacute que se tenha a quitaccedilatildeo que se obstem novos financiamentos ou mesmo a participaccedilatildeo do devedor em licitaccedilotildees (como de ordinaacuterio jaacute acontece com pessoas juriacutedicas em deacutebito tributaacuterio com o Poder Puacuteblico) etc
Teriacuteamos entatildeo no Brasil por assim dizer a adoccedilatildeo do padratildeo da atipicidade das medidas executivas tambeacutem para as obrigaccedilotildees de pagar vistas estas como ordens do EstadoJuiz para que haja prestaccedilatildeo de pagamento em pecuacutenia
()
Por isso ndash a prevalecer a interpretaccedilatildeo potencializada do art 139 IV do CPC2015 ndash o emprego de tais medidas coercitivasindutivas especialmente nas obrigaccedilotildees de pagar encontraraacute limite certo na excepcionalidade da medida (esgotamento dos meios tradicionais de satisfaccedilatildeo do deacutebito) na proporcionalidade (inclusive agrave luz da regra da menor onerosidade ao devedor do art 805 do CPC2015) na necessidade de fundamentaccedilatildeo substancial e especialmente nos direitos e garantias assegurados na Constituiccedilatildeo Federal (vg natildeo parece possiacutevel que se determine o pagamento sob pena de prisatildeo ou de vedaccedilatildeo ao exerciacutecio da profissatildeo do direito de ir e vir etc)
74 NEVES Alexandre Fuchs das Cancelamento de cartotildees de creacutedito e apreensatildeo de CNH e passaporte
do devedor Isso eacute possiacutevel Disponiacutevel em lt httpwwwsinfacspcombrconteudocancelamento-de-cartoes-de-credito-e-apreensao-de-cnh-e-passaporte-do-devedor-isso-e-possivel gt Acesso em 30082018
75 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Publicado em 24082015 Acesso em 30082018
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Jaacute Fernanda Tartuce76 acredita que tais medidas satildeo problemaacuteticas e devem ser
analisadas com cautela tendo em vista que ao inveacutes de afetarem o patrimocircnio do devedor
atingem a proacutepria pessoa
Sob certo prisma adotar medidas diferenciadas contribui para a efetividade da prestaccedilatildeo jurisdicional Por outro lado o patrimocircnio ndash e natildeo a pessoa do devedor - responde por diacutevidas aleacutem disso o exerciacutecio de amplos poderes pelo juiz sem balizas especiacuteficas pode ensejar medidas inadequadas Nessa linha suspender o direito de dirigir e restringir o uso de passaporte satildeo iniciativas problemaacuteticas por atingirem a pessoa do devedor enquanto a penhora da restituiccedilatildeo de Imposto de Renda soa viaacutevel por afetar seu patrimocircnio Eacute importante que a medida diferenciada se revele proporcional e seja aplicada apoacutes o exaurimento de outros meios previstos no ordenamento Como a proposta do Novo Coacutedigo eacute aumentar a eficiecircncia processual intentar medidas ineficazes inexequiacuteveis eou de difiacutecil fiscalizaccedilatildeo pode acabar ensejando o efeito contraacuterio
Nessa senda Lenio Streck e Dierle Nunes77 entendem que as medidas atiacutepicas de
suspensatildeo da CNH eou apreensatildeo de passaporte satildeo inconstitucionais Afirmam que natildeo se
pode confundir o processo civil e penal ainda que ambos remetam a um ldquoparadigma
constitucional comumrdquo e que o artigo 139 IV do CPC ldquoimpotildee novos desafios interpretativos
que podem conduzir a uma anaacutelise superficial e utilitarista de busca de resultados que
desprezem a necessaacuteria leitura constitucionalrdquo Os autores ainda ponderam que ldquoO perigo eacute o
artigo 139 IV ser transformado em instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com
autorizaccedilatildeo judicialrdquo
O professor Araken de Assis no dia 18 de abril de 2018 em um evento sobre o
Coacutedigo Processual Civil de 2015 que ocorreu em Brasiacutelia na sede do Conselho Federal da
OAB declarou ser contraacuterio aos poderes executoacuterios atiacutepicos ldquoSou contra os poderes
atiacutepicos dos juiacutezes porque seu exerciacutecio redunda em simples arbitrariedadesrdquo78
Acrescentou ainda que
76 IBDFAM ndash Instituto Brasileiro de Famiacutelia O polecircmico inciso IV do artigo 139 do CPC e suas difusas
interpretaccedilotildees Disponiacutevel em lt httpwwwibdfamorgbrnoticias6096O+polC3AAmico+inciso+IV+do+artigo+139+do+CPC+e+suas+difusas+interpretaC3A7C3B5es gt Publicado em 31082016 Acesso em 04092018
77 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018
78 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04092018
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Eacute evidentemente inconstitucional diante do princiacutepio da dignidade da pessoa humana tirar o passaporte carteira de habilitaccedilatildeo Quecirc que tem isso com diacutevidas Natildeo tem absolutamente nada Natildeo eacute a correlaccedilatildeo instrumental entre o objetivo da execuccedilatildeo e o meio empregado Isso eacute simples vinganccedila simples puniccedilatildeo79
O professor Araken de Assis acredita que tais medidas satildeo inconstitucionais e
violam o principio da dignidade humana do executado numa sociedade como a nossa
sedenta por puniccedilatildeo natildeo me surpreende que essas ideias sejam encaradas com
naturalidade Mas eacute preciso rejeitaacute-las em nome de princiacutepios 80
34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
A Constituiccedilatildeo Federal de 1988 tem como um dos seus fundamentos a dignidade da
pessoa humana presente no artigo 1ordm inciso III do referido texto constitucional O dito
princiacutepio tem o escopo de nortear o ordenamento juriacutedico como um todo
A inclusatildeo da dignidade da pessoa humana como princiacutepio constitucional obrigou
uma reflexatildeo sobre o papel da pessoa humana no direito e um redimensionamento para
elevaacute-la ao centro do ordenamento juriacutedico81 Eacute necessaacuterio recorrer agrave teoria Kantiana para
que se obtenha uma definiccedilatildeo do princiacutepio ora estudado Para Kant82 o homem eacute um fim
em si mesmo natildeo uma funccedilatildeo do Estado Ou Naccedilatildeo O Estado e o direito devem estar
organizados em benefiacutecio do indiviacuteduo
Agora eu afirmo o homem ndash e de uma maneira geral todo o ser racional ndash existe como fim em si mesmo e natildeo apenas como meio para o uso arbitraacuterio desta ou daquela vontade Em todas as suas accedilotildees pelo contraacuterio tanto nas direcionadas a ele mesmo como nas que o satildeo a outros seres racionais deve ser ele sempre considerado simultaneamente como fim
Partindo da premissa de que para Immanuel Kant o homem eacute o fim em si mesmo
ldquodevemos compreender que a dignidade da pessoa humana eacute a noccedilatildeo o comando a direccedilatildeo
que se deve seguir funcionando como fundamento para a interpretaccedilatildeo de todos os direitos e
garantias conferidos agrave pessoa nos ordenamentos juriacutedicos de cada Estadordquo 83
79 Ibid sem paginaccedilatildeo 80 Ibid sem paginaccedilatildeo 81 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito
fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 461 82 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud KANT Immanuel Fundamentaccedilatildeo da metafiacutesica dos costumes
Satildeo Paulo Martin Claret 2003 p56-59 Coleccedilatildeo A Obra-Prima de Cada Autor 83 SCHIAFIANO Juliana Rocha op cit p 461
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O princiacutepio constitucional da dignidade da pessoa humana estaacute diretamente ligado ao
conteuacutedo dos direitos fundamentais logo para que se cumpra com os direitos fundamentais
constitucionalmente instituiacutedos eacute necessaacuterio reconhecer e respeitar a dignidade da pessoa
humana conforme disciplina Ingo Sarlet84
Em suma o que se pretende sustentar de modo mais enfaacutetico eacute que a dignidade da pessoa humana na condiccedilatildeo de valor (principio normativo) fundamental que atrai o conteuacutedo de todos os direitos fundamentais exige e pressupotildee o reconhecimento e proteccedilatildeo dos direitos fundamentais de todas as dimensotildees (ou geraccedilotildees se assim preferirmos) Assim sem que se reconheccedilam agrave pessoa humana os direitos fundamentais que lhe satildeo inerentes em verdade estarse-aacute lhe negando a proacutepria dignidade A consagraccedilatildeo constitucional da dignidade da pessoa humana tem o propoacutesito de limitar a atuaccedilatildeo ou a omissatildeo do Estado para garantir os direitos do indiviacuteduo Assim eacute difiacutecil precisar os efeitos da norma que determina a dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado (como acontece com a Constituiccedilatildeo brasileira de 1988) poreacutem quando desrespeitados os direitos fundamentais do cidadatildeo eacute possiacutevel identificar que a dignidade deste foi violada
Logo ldquoteraacute respeitada a sua dignidade o individuo que tiver respeitados os seus
direitos fundamentaisrdquo 85 Os direitos fundamentais estatildeo apresentados na Constituiccedilatildeo
Federal da seguinte forma direitos individuais e coletivos direitos sociais direitos poliacuteticos e
direitos de nacionalidade que tecircm como escopo garantir as liberdades positivas aos
indiviacuteduos ldquoonde foram conquistados direitos agrave liberdade religiosa liberdade civil e
profissional agrave propriedade ao livre acesso ao Judiciaacuterio agrave ampla defesa e ao contraditoacuterio no
processual judicial ao sigilo de dados e informaccedilotildees pessoais entre outros que somados
garantem o cidadatildeo uma vida dignardquo 86
O cidadatildeo na Constituiccedilatildeo Federal de 88 diferente das constituiccedilotildees brasileiras
anteriores passou a ser fundamento e ganhou destaque nos direitos fundamentais tendo
garantida a sua vida a sua dignidade a sua seguranccedila a sua honra a sua liberdade e a sua
propriedade
84 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud SARLET Ingo Wolfgang Dignidade da pessoa humana e
direitos fundamentais na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 2ed Porto Alegre Livraria do Advogado 2002 p87 85 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito
fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 462 86 Ibid p 462
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Segundo Carmem Luacutecia Antunes Rocha87 para garantir o Estado Democraacutetico de
Direito eacute necessaacuterio que a sua atuaccedilatildeo seja sempre em conformidade com o princiacutepio da
dignidade da pessoa humana
O Estado somente eacute democraacutetico em sua concepccedilatildeo constitucionalizaccedilatildeo e atuaccedilatildeo quando respeita o princiacutepio da dignidade da pessoa humana Natildeo haacute verbo constitucional natildeo haacute verbo governamental que se faccedilam legiacutetimos quando natildeo se voltam ao atendimento daquele princiacutepio Natildeo haacute verdade constitucional natildeo haacute suporte institucional para as poliacuteticas puacuteblicas que natildeo sejam destinadas ao pleno cumprimento daquele valor maior transformado em princiacutepio constitucional
O princiacutepio da dignidade humana constitucionalmente garantido impotildee limites ao
Estado compelindo aos oacutergatildeos e atividades estatais respeitar o ser humano e garanti-lo
condiccedilotildees miacutenimas para uma vida digna Dessa forma eacute niacutetido que o dito princiacutepio eacute
pressuposto e indispensaacutevel para legitimar outras normas constitucionais e
principalmente infraconstitucionais
O Coacutedigo de Processo Civil eacute umas das principais normas infraconstitucionais que
sofre influecircncia dos preceitos valores e princiacutepios esculpidos na Constituiccedilatildeo Federal
Logo como o principio da dignidade humana eacute um dos mais importantes pressupostos
constitucionais ldquoentatildeo eacute tranquilo afirmar-se que o novel ordenamento processual tem
de se render nas resoluccedilotildees dos aspectos processuais e a fim de se atingir uma soluccedilatildeo
justa adequada e efetiva ao postulado da dignidade da pessoa humanardquo 88
Dessa forma o legislador deve formular as normas infraconstitucionais de acordo e a
partir do conteuacutedo constitucional para Marinoni Mitidiero e Arenhart89
() o Coacutedigo de Processo Civil constitui direito constitucional aplicado O Coacutedigo deve ser interpretado de acordo com a Constituiccedilatildeo e com os direitos fundamentais o que significa que as duacutevidas interpretativas devem ser resolvidas a favor da otimizaccedilatildeo do alcance da Constituiccedilatildeo e do processo civil como meio para tutela de direitos
87 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud ROCHA Carmen Luacutecia Antunes O princiacutepio da dignidade da
pessoa humana e a exclusatildeo social Revista Interesse Puacuteblico n4 p23-48 1999 p33 88 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o
novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 367
89 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 14
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Com o escopo de conferir eficaacutecia aos mandamentos constitucionais o CPC15 traz a
previsatildeo e diversas claacuteusulas gerais em seus primeiros artigos em um dos quais se
prestigia o princiacutepio da dignidade da pessoa humana
O referido princiacutepio estaacute disciplinado no artigo 8ordm do CPC15 e atua como um guia
sobre as demais normas do coacutedigo processual Eacute o que entende Nelson Rosenvald90
O maior cuidado do inteacuterprete eacute no sentido de jamais banalizar a dignidade fazendo dela um elixir processual tal como muitas vezes se vecirc na esfera do direito civil Penso que natildeo haacute maiores dificuldades em transpor a noccedilatildeo constitucional do princiacutepio para em seguida adaptaacute-la agraves singularidades do processo
Logo de acordo com o artigo 8ordm do CPC o oacutergatildeo julgador ao aplicar o ordenamento
juriacutedico deve resguardar a dignidade da pessoa humana Para Fredie Didier91 ldquoresguardar
nesse contexto eacute de um lado aplicar corretamente a norma juriacutedica lsquoproteccedilatildeo da dignidade
da pessoa humanarsquo e de outro natildeo violar a dignidaderdquo
O oacutergatildeo julgador deveraacute manter um comportamento ativo com o objetivo de promover
a dignidade da pessoa humana podendo tomar medidas de ofiacutecio para efetivar a dignidade da
pessoa humana Didier assevera que o magistrado poderaacute ainda ldquovaler-se da claacuteusula geral de
atipicidade (art 536 sect 1ordm) para a execuccedilatildeo do direito fundamental agrave dignidaderdquo 92 O autor
ainda traz dois exemplos
a) exigecircncia de respeito agrave ordem cronoloacutegica de conclusatildeo (art 12) caso de grave violaccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana que natildeo se encaixe em um dos incisos que excepcionam a regra de observacircncia da cronologia da conclusatildeo poderia o juiz ldquofurar a filardquo para promover a dignidade da pessoa humana b) prioridade na tramitaccedilatildeo processual pessoa que seja portadora de doenccedila grave mas que natildeo esteja no rol do art 1048 I para promover a dignidade de pessoa humana o juiz poderia determinar o processamento prioritaacuterio93
Essa dupla garantia ndash resguardo e promoccedilatildeo ndash tem como objetivo garantir ao individuo
sua dignidade humana fazendo com que ldquode um lado que o Estado natildeo a viole e de outro
que o Estado a promova e efetiverdquo
90 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud ROSENVALD Nelson A
dignidade da pessoa humana no CPC15 91 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte
geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 75 92 Ibid p 75 93 Ibid p 75
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Nessa senda o magistrado deveraacute promover a dignidade da pessoa humana quando
perceber a ausecircncia desta no processo ou assegura-la quando for posta em risco Eacute nesse
sentido o entendimento dos professores Marinoni Mitidiero e Arenhart94
() a dignidade da pessoa humana determina a compreensatildeo do processo civil como um meio para tutela dos direitos Vale dizer o processo civil natildeo pode ser visto como um instrumento a serviccedilo do Estado como um instrumento que natildeo se encontre orientado agrave realizaccedilatildeo dos fins da pessoa humana Em outras palavras o processo civil serve para realizaccedilatildeo dos direitos e para orientaccedilatildeo das pessoas a respeito do significado do direito
Nessa senda compete tanto ao juiz quanto as demais partes processuais garantirem ldquoo
valor intriacutenseco de cada vida que eacute trazida ao processordquo nas palavras de Alexandre Freitas
Cacircmara95
() aos sujeitos do processo eacute preciso sempre ter claro que os titulares dos interesses em conflitos satildeo pessoas reais cujas vidas seratildeo afetadas pelo resultado do processo e que por isso mesmo tecircm o direito de estabelecer suas estrateacutegias processuais de acordo com aquilo que lhes pareccedila melhor para suas vidas Eacute inadmissiacutevel tratar as partes como se natildeo fossem pessoas reais meros dados estatiacutesticos Afinal se para o Judiciaacuterio cada processo pode parecer apenas mais um processo para as partes cada processo pode ser o uacutenico o mais relevante aquele em que sua vida seraacute decidida E eacute dever do juiz assegurar que isto seja respeitado
Dessa forma eacute necessaacuterio que um arcabouccedilo normativo para que seja conferida
eficaacutecia e proteccedilatildeo ao principio da dignidade da pessoa humana
Logo o dito princiacutepio deve ser protegido em todas as esferas do ordenamento juriacutedico
inclusive no campo da execuccedilatildeo civil onde sofre grandes riscos de ser violado em nome do
direito fundamental agrave tutela executiva do credor ldquoPartir da premissa de que existe um direito
fundamental agrave tutela executiva ora ratificado pelo CPC eacute indispensaacutevel para a soluccedilatildeo de
diversos problemas oriundos do procedimento executivo principalmente aqueles relacionados
agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo 96
94 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme
MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 25
95 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CAcircMARA Alexandre Freitas O Novo Processo Civil Brasileiro 2 ed Satildeo Paulo Atlas 2016 p 7
96 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66
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Eacute o caso por exemplo da impenhorabilidade Segundo Fredie Didier et al97 a
impenhorabilidade eacute uma forma de proteger certos bens do devedor do direito fundamental a
execuccedilatildeo do credor
Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa
Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais
O legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do CPC fazendo um
preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses em anaacutelise ao optar pela mitigaccedilatildeo do direito
do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado Afinal ldquoa execuccedilatildeo natildeo pode ser utilizada
como instrumento para causar a ruiacutena a fome e o desabrigo do devedor e sua famiacutelia gerando
situaccedilotildees incompatiacuteveis com a dignidade da pessoa humana 98
Logo a impenhorabilidade de certos bens
[] Eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa99
Eacute nesse sentido que o CPC15 enumera diversos casos de bens patrimoniais que satildeo
impenhoraacuteveis como o salaacuterio e vencimentos utensiacutelios necessaacuterios ao exerciacutecio da
profissatildeo seguro de vida vestuaacuterios e pertences de uso pessoal entre outros
Dessa forma as regras relativas agraves medidas executivas devem ser interpretadas agrave luz
da Constituiccedilatildeo Federal ldquovez que se voltam agrave realizaccedilatildeo de direitos fundamentais e em sua
97 Ibid p 66 98 THEODORO JUacuteNIOR Humberto Novo Coacutedigo de Processo Civil Anotado 20 ed Rio de Janeiro
Forense 2016 p 978 99 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud DIDIER JR Fredie CUNHA
Leonardo Carneiro da BRAGA Paula Sarno OLIVEIRA Rafael Alexandria de Curso de direito processual civil 3 ed Salvador JusPodivm 2011 v 5 p 547
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realizaccedilatildeo podem atingir direitos fundamentaisrdquo 100 O Superior Tribunal de Justiccedila jaacute decidiu
que
O rol das impenhorabilidades do ordenamento paacutetrio objetiva preservar o miacutenimo patrimonial necessaacuterio agrave existecircncia digna do executado impondo ao processo executoacuterio certos limites Assim a depender das peculiaridades do caso as regras de impenhorabilidade podem ser ampliadas de modo a adequar a tutela aos direitos fundamentais como por exemplo o direito agrave moradia agrave sauacutede ou agrave dignidade da pessoa humana Trata-se portanto da aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo e da necessidade sob o enfoque da proporcionalidade101 (STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014)
Logo a interpretaccedilatildeo dos dispositivos que tratam sobre a penhora no CPC deve estaacute
diretamente ligada aos ditames constitucionais devendo o interprete privilegiar a opccedilatildeo que
esteja mais em sintonia com a Carta Magna para que nem o credor e nem o devedor sejam
lesados
O artigo 833 do CPC elenca uma seacuterie de incisos que expotildeem os bens impenhoraacuteveis
O trecho inicial inciso I do art 833 define como impenhoraacuteveis os bens inalienaacuteveis Este
inciso segue a regra de que ldquose o bem natildeo pode ser alienado tambeacutem natildeo pode ser penhorado
porque a penhora eacute o primeiro ato do procedimento de alienaccedilatildeo judicial do bemrdquo 102
Satildeo exemplos de bens inalienaacuteveis os puacuteblicos cuja alienaccedilatildeo depende de autorizaccedilatildeo
legislativa Eacute inalienaacutevel tambeacutem o capital constituiacutedo para garantir indenizaccedilatildeo de ato iliacutecito
(art 533 sect 1 ordm CPC) que portanto eacute tambeacutem impenhoraacutevel ldquoTodo bem inalienaacutevel eacute
impenhoraacutevel embora nem todo bem impenhoraacutevel seja inalienaacutevelrdquo 103
O inciso I do art 833 CPC tambeacutem consagra a impenhorabilidade dos bens que por
ato voluntaacuterio satildeo excluiacutedos da execuccedilatildeo
Segundo Fredie Didier et al104
Eacute o que ocorre nos casos de bens doados ou alienados com claacuteusula de inalienabilidade que haacute de constar no registro imobiliaacuterio para ser eficaz perante o exequente e minimizar o risco de fraude A propoacutesito eis a redaccedilatildeo do art 1911 do Coacutedigo Civil lsquolsquoA claacuteusula de inalienabilidade imposta aos bens por ato de liberalidade implica impenhorabilidade e incomunicabilidaderdquo
100 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MEDINA Joseacute Miguel Garcia
Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 1 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 p 736 101 STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014 102 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 824 103 Ibid p 824 104 Ibid p 825
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O inciso II por sua vez estabelece que satildeo impenhoraacuteveis os bens moacuteveis os
pertences e as utilidades domeacutesticas da residecircncia do executado Todavia excepcionam-se os
bens dessa natureza que sejam de elevado valor ou que ultrapassem as necessidades comuns
correspondentes a um meacutedio padratildeo de vida
A jurisprudecircncia natildeo eacute paciacutefica sobre o assunto logo natildeo exista uma relaccedilatildeo de bens
que podem ser atingidos pela penhora Abrindo margem para as mais variadas decisotildees
O STJ jaacute considerou impenhoraacuteveis aparelho de televisatildeo a cores mesa de centro passadeira raacutedio toca-fitas gravador microondas ar-condicionado um freezer um microcomputador com acessoacuterios uma impressora etc Poderatildeo ser penhorados porque ultrapassam o padratildeo-meacutedio aparelhos de TV mais sofisticados o segundo aparelho de televisatildeo a segunda geladeira aparelhos de ar-condicionado que satildeo verdadeiras peccedilas de design moacuteveis antigos que se transformam em peccedilas de decoraccedilatildeo faqueiro de prata adega climatizada etc Em entendimento de caraacuteter ainda mais geneacuterico jaacute restou consignado em determinado precedente que a proteccedilatildeo natildeo abrangeria apenas os bens indispensaacuteveis agrave moradia mas tambeacutem aqueles usualmente encontrados em um lar105
Ademais o inciso III do art 833 do CPC traz a impenhorabilidade dos vestuaacuterios bem
como os pertences de uso pessoal do executado salvo se de elevado valor
Segundo Fredie Didier et al106 o dispositivo possui dois propoacutesitos
de um lado preservar a dignidade do executado com a proteccedilatildeo de bens moacuteveis importantes para a sua sobrevivecircncia digna como o vestuaacuterio aparelho celular reloacutegio e os bens relacionados agrave sua higiene pessoal de outro lado a regra visa prestigiar a boa-feacute processual impedindo a execuccedilatildeo mesquinha e abusiva com a penhora de bens de pequeno ou nenhum valor como um pente ou uma bota
O inciso IV do art 833 do CPC consagra uma das mais importantes modalidades a
impenhorabilidade relativa aos rendimentos de natureza alimentar ldquoTrata-se de regra que
possui o claro propoacutesito de proteger o executado garantindo-lhe o recebimento de valores que
servem ao pagamento das despesas relacionadas agrave sua sobrevivecircncia digna e agrave da sua famiacuteliardquo 107
Jaacute inciso V do art 833 do CPC torna impenhoraacuteveis os livros as maacutequinas as
ferramentas os utensiacutelios os instrumentos ou outros bens moacuteveis necessaacuterios ou uacuteteis ao
exerciacutecio de qualquer profissatildeo 105 Ibid p 826 106 Ibid p 827 107 Ibid p 828
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Por forccedila do paraacutegrafo 3ordm do art 833 satildeo igualmente impenhoraacuteveis os equipamentos
implementos e maacutequinas agriacutecolas pertencentes agrave pessoa fiacutesica ou a empresa individual
produtora rural Rodrigo Mazzei e Sarah Merccedilon108 esclarecem que
Tem assento na noccedilatildeo de que a dignidade estende-se tambeacutem ao exerciacutecio da profissatildeo em si mesma e tambeacutem por representar a forma por excelecircncia de que dispotildee o executado para continuar a receber sua remuneraccedilatildeo e por conseguinte prover seu sustento e de sua famiacutelia Trata-se tambeacutem de aplicaccedilatildeo pontual da funccedilatildeo social da propriedade jaacute que protege os bens que permitem a circulaccedilatildeo de riquezas para a subsistecircncia do executado e se for o caso de sua famiacutelia
Forccediloso ressaltar ainda que a impenhorabilidade do inc V alcanccedila apenas os bens
moacuteveis de modo que eacute absolutamente possiacutevel que o imoacutevel em que o executado exerccedila sua
atividade profissional seja penhorado conforme a Suacutemula 451 do STJ ldquoEacute legiacutetima a penhora
da sede do estabelecimento comercialrdquo
O inciso VI do art 833 do CPC versa sobre a impenhorabilidade do seguro de vida
ldquoTrata-se de impenhorabilidade em favor do beneficiaacuterio do seguro e natildeo do segurado ateacute
porque o valor do seguro natildeo compotildee nem comporaacute o seu patrimocircnio (art794 do Coacutedigo
Civil1 ordm7)rdquo Dessa forma ldquoem uma execuccedilatildeo contra o segurado natildeo seraacute possiacutevel a penhora
do seguro de vida pois se trata de bem que natildeo lhe pertence nem mesmo em expectativardquo
De acordo com o inciso VII do art 833 do CPC satildeo impenhoraacuteveis os materiais
necessaacuterios para obras em andamento salvo se essas forem penhoradas Logo a obra pode
ser penhorada (art 862 do CPC) ldquoA regra como bem lembrou Araken de Assis lsquoestimula a
penhora da proacutepria obra inconclusa agrave qual os materiais acrescem e conseguintemente
valorizamrsquo 109
O art 833 VIII CPC julga impenhoraacutevel a pequena propriedade rural assim
definida em lei desde que trabalhada pela famiacutelia reproduzindo parte do art 5ordm XXVI CF
88116 que disciplina a impenhorabilidade do referido bem
A proteccedilatildeo do CPC eacute mais ampla do que a garantia prevista na Constituiccedilatildeo Federal
tendo em vista que a impenhorabilidade natildeo se restringe agraves execuccedilotildees de deacutebitos decorrentes
de sua atividade produtiva podendo ser alegada em toda e qualquer execuccedilatildeo ldquoAssim o 108 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CABRAL Antonio Passo
CRAMER Ronaldo (orgs) Comentaacuterios ao Novo Coacutedigo de Processo Civil Rio de Janeiro Forense 2015 p 1194
109 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 835
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imoacutevel natildeo pode ser penhorado na execuccedilatildeo de creacutedito rural concedido para estimular a
produccedilatildeo agriacutecola mas poderaacute ser penhorado na execuccedilatildeo do creacutedito concedido para a
aquisiccedilatildeo do imoacutevelrdquo 110
A nona modalidade de impenhorabilidade trata-se dos recursos puacuteblicos recebidos por
instituiccedilotildees privadas para aplicaccedilatildeo compulsoacuteria em educaccedilatildeo sauacutede ou assistecircncia social ldquoA
proteccedilatildeo eacute louvaacutevel e tutela toda a coletividade ao privilegiar o direito agrave educaccedilatildeo sauacutede e
assistecircncia social em detrimento do direito do credorrdquo
De acordo com o inciso X do art 833 do CPC eacute impenhoraacutevel ateacute o limite de
quarenta salaacuterios miacutenimos a quantia depositada em caderneta de poupanccedila
Eacute uma modalidade de impenhorabilidade relativa (o CPC73 a considerava absoluta)
tendo em vista que essa impenhorabilidade natildeo pode ser oposta na execuccedilatildeo de alimentos
independentemente da sua origem (art 833 sect 2ordm do CPC) Fredie Didier et al cita Araken de
Assis111 ao afirmar que
a regra soacute protege essa aplicaccedilatildeo financeira Se o valor estiver depositado em fundo de investimento por exemplo poderaacute ser penhorado Se o devedor tiver vaacuterias cadernetas de poupanccedila a impenhorabilidade aplica-se agrave soma de todas elas e natildeo a cada uma delas isoladamente do contraacuterio valores expressivos poderiam ser pulverizados em vaacuterias contas burlando a finalidade da regra que eacute a de proteger a populaccedilatildeo de baixa renda
Ademais satildeo tambeacutem impenhoraacuteveis por forccedila do inciso XI os recursos puacuteblicos do
fundo partidaacuterio recebidos por partido poliacutetico nos termos da lei Essa modalidade de
impenhorabilidade ldquose restringe aos recursos puacuteblicos do fundo partidaacuterio Recursos de
origem privada recebidos pelo partido poliacutetico poderatildeo ser penhoradosrdquo 112 O processualista
Fredie Didier et al113 assevera que
Assim a impenhorabilidade foi estabelecida no intuito de impedir que os diretoacuterios nacionais de partidos poliacuteticos respondam por diacutevida dos diretoacuterios
110 Ibid p 836 111 DIDIER JR Fredie et al apud ASSIS Araken de Manual da execuccedilatildeo 11ordm ed cit p 225 Assim
tambeacutem REDONDO Bruno Garcia LOJO Maacuterio Vitor Suarez Penhora cit p 117 BUENO Cassio Scarpinella Curso sistematizado de Direito Processual Civil v 3 cit p 228 GIANNICO Mauriacutecio As novas reformas do CPC e de outras normas processuais Mauriacutecio Giannico e Viacutetor Joseacute de Mello Monteiro (coord) Satildeo Paulo Saraiva 2009 p 1 OS Em sentido diverso estendendo a impenhorabiacutelidade aos depoacutesitos feitos ateacute esse valor em CDB CDI fundos de renda fixa ou de accedilotildees RODRIGUES Marcelo Abelha Manual de execuccedilatildeo civil 3deg ed cit p 101
112 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 839
113 Ibid p 839
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estaduaismunicipais - sobretudo em razatildeo das vaacuterias decisotildees judiciais que determinaram penhora de recursos do fundo partidaacuterio de alguns partidos
Por fim o inciso XII do artigo 833 do CPC trata sobre a impenhorabilidade dos
creacuteditos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias sob o regime de incorporaccedilatildeo imobiliaacuteria
vinculados agrave execuccedilatildeo de obra ldquoO objetivo dessa modalidade eacute evitar que diacutevidas do
incorporador possam consumir os recursos que seriam utilizados na realizaccedilatildeo da obra em
prejuiacutezo dos adquirentes de unidades autocircnomasrdquo 114
O professor Misael Montenegro Filho115 aduz sobre que ldquoao estabelecer a
impenhorabilidade dos creacuteditos oriundos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias o novo CPC
protegeu os valores destinados agrave execuccedilatildeo da obra e agrave entrega das unidades imobiliaacuterias aos
adquirentes assegurando assim a execuccedilatildeo da promessa contratualrdquo
Importante frisar ainda que a Lei nordm 8009 1990 instituiu a impenhorabilidade do
imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar por qualquer diacutevida salvo as exceccedilotildees dos
seus arts 3ordm e 4ordm
A referida lei dispotildee que Para os efeitos de impenhorabilidade considera-se
residecircncia um uacutenico imoacutevel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia
permanente (art 5ordm)
O processualista baiano Fredie Didier et al116 assevera que
A lei propotildee-se a proteger imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar nos termos acima expostos A CF 88 ampliou o conceito de entidade familiar para abranger a famiacutelia monoparental e a uniatildeo estaacutevel Mas deve considerar-se aiacute compreendidos os irmatildeos que vivem juntos e a uniatildeo homossexual Ateacute o solteiro estaacute abrangido pela impenhorabilidade se reside soacute no imoacutevel - isso em nome da proteccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana e da moradia digna Na verdade houve uma mudanccedila de compreensatildeo acerca do sentido da proteccedilatildeo de proteccedilatildeo da famiacutelia agrave proteccedilatildeo da moradia indispensaacutevel agrave preservaccedilatildeo da dignidade da pessoa
114 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o
novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 388
115 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MONTENEGRO FILHO Misael Novo Coacutedigo de Processo Civil Comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Atlas 2016 p 752
116 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 840-841
47
O STJ jaacute consolidou esse entendimento na suacutemula nordm 364 O conceito de
impenhorabilidade de bem de famiacutelia abrange tambeacutem o imoacutevel pertencente a pessoas
solteiras separadas e viuacutevas
Entretanto se o casal ou entidade familiar possuir vaacuterios imoacuteveis utilizados como
residecircncia a impenhorabilidade recairaacute sobre o de menor valor (art 5ordm paraacutegrafo uacutenico) ldquoEacute o
que ocorre por exemplo quando a famiacutelia se divide em mais de uma cidade por motivos
profissionaisrdquo 117
Forccediloso observar ainda que a impenhorabilidade do imoacutevel familiar eacute relativa jaacute que
natildeo pode ser oposta a qualquer creacutedito O art 3ordm da Lei n 8009 1990151 em que pode ser
penhorada a residecircncia da famiacutelia (exemplo execuccedilatildeo de alimentos para cobranccedila de taxas
devidas em funccedilatildeo do imoacutevel familiar etc)
Resta claro que o artigo 833 do CPC ao disciplinar as hipoacuteteses de impenhorabilidade
possui o escopo de proteger o princiacutepio da dignidade humana Entretanto algumas claacuteusulas
natildeo possuem proteccedilatildeo absoluta ldquoa sua relativizaccedilatildeo a depender do caso sob exame deve ser
realccedilada agrave medida que a dignidade resguardada e protegida pelo sistema processual-
constitucional natildeo se limita ao executadordquo 118 Ademais ldquoEacute premente advertidamente que a
dignidade do credor tambeacutem seja garantida em juiacutezo tendo como norte pois os princiacutepios da
proporcionalidade e razoabilidaderdquo 119
117 Ibid p 841 118 Ibid p 752 119 Ibid p 752
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4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA
ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE
HUMANA DO EXECUTADO
41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE
EFETIVACcedilAtildeO
Como jaacute exposto em linhas preteacuteritas nos meios executivos tiacutepicos as medidas
executivas satildeo determinadas pela lei ou seja o oacutergatildeo pode aplicar somente as medidas
tipificadas no ordenamento juriacutedico No entanto ao se tratar das medidas executivas atiacutepicas
eacute necessaacuterio que haja um limite na atuaccedilatildeo realizada pelo juiz
O poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo poder ser realizado de maneira indiscriminada haacute
pressupostos e premissas a serem observadas Dessa forma a primeira premissa eacute no sentindo
de que a medida executiva atiacutepica natildeo pode ser a primeira medida a ser invocada ldquomuito ao
reveacutes a regra do nosso sistema continua a ser o da tipicidade dos meios executivos soacute que
agora temperado pelo sistema atiacutepicordquo 120 O processualista Thiago Rodovalho explica que
ldquo() os meios atiacutepicos natildeo satildeo prima ratio e sim a ultima ratio eacute dizer esgotados e
frustrados os meios executivos tiacutepicos e ordinaacuterios pode-se em tese valer-se do sistema
atiacutepicordquo121
Dessa forma nos casos de execuccedilatildeo que tenha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
natildeo deve ser aplicado de logo as medidas indutivas e coercitivas Apenas apoacutes frustradas as
medidas ldquonaturaisrdquo pode-se passar agrave aplicaccedilatildeo das medidas atiacutepicas
Uma segunda premissa diz a respeitos dos meios de pressatildeo para compelir o devedor a
adimplir com o seu deacutebito ldquoEssa segunda premissa decorre inclusive de imperiosidade
loacutegica de nada adianta a medida de pressatildeo se a obrigaccedilatildeo natildeo tem como ser adimplida pelo
devedorrdquo 122
Para Thiago Rodovalho123 ldquoIsso quer significar que esgotados e frustrados os meios
tiacutepicos o juiz se valeraacute dos meios atiacutepicos se eles forem potencialmente haacutebeis a estimular ou
120 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da
atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018
121 Ibid sem paginaccedilatildeo 122 Ibid sem paginaccedilatildeo 123 Ibid sem paginaccedilatildeo
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forccedilar o cumprimento o que pressupotildee sua possibilidade quando entatildeo eles poderatildeo ser
eficazesrdquo
Logo nas obrigaccedilotildees de pagar quantia se houver a real demonstraccedilatildeo da
impossibilidade financeira do devedor seria um constrangimento inuacutetil e desnecessaacuterio a
imposiccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo para forccedilar o cumprimento
Por isso as medidas atiacutepicas devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o
esgotamento das medidas tiacutepicas e a possibilidade de cumprimento de cumprimento da
obrigaccedilatildeo
Ademais superadas as supracitadas premissas e o oacutergatildeo julgador vislumbrando a
necessidade da aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo se faz necessaacuterio que um conjunto de
postulados e princiacutepios rejam a atuaccedilatildeo do oacutergatildeo julgador servindo de norte para a escolha da
medida executiva mais adequada ldquoDe modo geral a escolha deve pautar-se nos postulados da
proporcionalidade da razoabilidade (art8ordm CPC) e da proibiccedilatildeo de excesso bem como nos
princiacutepios da eficiecircncia e da menor onerosidade da execuccedilatildeordquo 124
O professor Fredie Didier et al125 eacute categoacuterico ao citar Humberto Aacutevila
Segundo Humberto Aacutevila o postulado da proporcionalidade se manifesta nas situaccedilotildees em que haacute uma relaccedilatildeo de causalidade entre dois elementos empiricamente discerniacuteveis um meio e um fim de tal sorte que se possa proceder aos trecircs exames fundamentais o da adequaccedilatildeo (o meio promove o fim) o da necessidade (dentre os meios disponiacuteveis e igualmente adequados para promover o fim natildeo haacute outro meio menos restritivo do(s) direito(s) fundamental (is) afetado(s)) e o da proporcionalidade em sentido estrito (as vantagens trazidas pela promoccedilatildeo do fim correspondem agraves desvantagens provocadas pela adoccedilatildeo do meio)
O juiz ao aplicar a medida executiva atiacutepica ao caso concreto deve ter seu
embasamento no princiacutepio da proporcionalidade para saber se a medida a ser tomada eacute a
melhor opccedilatildeo ao caso sub judice ldquoO exame de proporcionalidade aplica-se sempre que
houver uma medida concreta destinada a realizar uma finalidaderdquo 126
Em verdade a aplicaccedilatildeo do princiacutepio da proporcionalidade eacute imprescindiacutevel na adoccedilatildeo
dos meios executivos atiacutepicos tendo em vista que ldquo() tais medidas em especial quando de
124 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111 125 DIDIER JR Fredie et al apud AVILA Humberto Teoria dos princiacutepios da definiccedilatildeo agrave aplicaccedilatildeo
dos princiacutepios juriacutedicos 16 ed Satildeo Paulo Malheiros 2015 p 205 126 DIDIER JR Fredie et al op cit p 111
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natureza coercitiva podem restringir direitos do devedor e incidir diretamente sobre sua
pessoardquo127 Logo ainda que o princiacutepio da efetividade da tutela executiva seja um direito
fundamental o mesmo ldquo() deve ser compatibilizado com direitos fundamentais do
executado para que a sua dignidade humana seja preservadardquo 128
Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Neves129 afirma que em nome do princiacutepio da
proporcionalidade o juiz deveraacute
() ponderar no caso concreto as vantagens praacuteticas da adoccedilatildeo de cada medida executiva atiacutepica em especial as de natureza coercitiva e as desvantagens de sua adoccedilatildeo levando em conta a possibilidade de a medida criar uma limitaccedilatildeo excessiva ao exerciacutecio de direito fundamental do executado
Outro princiacutepio que o oacutergatildeo julgador deve se ater ao escolher a medida executiva
atiacutepica eacute o da razoabilidade Segundo Fredie Didier et al 130 o princiacutepio (ou postulado)131 se
manifesta de trecircs formas
a) como dever de equidade a exigir a harmonizaccedilatildeo da norma geral com o caso individual impondo a consideraccedilatildeo daquilo que normalmente acontece em detrimento do que eacute extraordinaacuterio e tambeacutem impondo a consideraccedilatildeo das especificidades do caso concreto ante a generalidade da norma b) como dever de congruecircncia a exigir a harmonizaccedilatildeo das normas com suas condiccedilotildees externas de aplicaccedilatildeo (isto eacute com a realidade com base em que foram editadas) c) como dever de equivalecircncia a exigir uma relaccedilatildeo de equivalecircncia entre a medida adotada e o criteacuterio que a dimensiona
Logo ldquo() o princiacutepio da razoabilidade deve nortear a atuaccedilatildeo do juiz na adoccedilatildeo das
medidas executivas atiacutepicas previstas no art 139 IV do Novo CPCrdquo 132 tendo em vista que
ldquo() mesmo medidas que pelo princiacutepio da proporcionalidade podem se mostrar
abstratamente possiacuteveis de adoccedilatildeo no caso concreto podem se mostrar inadequadas e
irrazoaacuteveisrdquo 133
127 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Medidas executivas atiacutepicas na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de
pagar quantia certa art 139 IV do novo CPC Revista de Processo v 42 n 265 mar 2017 p 14 128 Ibid p 14 129 Ibid p 14 130 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111-112 131 Segundo Fredie Didier et al o postulado eacute uma norma que atua sobre a aplicaccedilatildeo de outras normas
A proporcionalidade e a razoabilidade seriam postulados normativos e natildeo princiacutepios segundo essa concepccedilatildeo 132 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo op cit p 14 133 Ibid p 14
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Ademais conforme dispotildee o postulado da proibiccedilatildeo de excesso ldquoa realizaccedilatildeo de uma
regra ou princiacutepio constitucional natildeo pode conduzir agrave restriccedilatildeo a um direito fundamental que
lhe retire um miacutenimo de eficaacuteciardquo 134
A proibiccedilatildeo de excesso deveraacute sempre ser suscitada quando um direito fundamental
houver sido violado a ponto do direito fundamental sofrer violaccedilatildeo excessiva Ademais ldquoesse
postulado natildeo se confunde com o da proporcionalidade porque ele dispensa os exames da
adequaccedilatildeo (relaccedilatildeo meiofim) da necessidade (exigibilidade) ou da proporcionalidade em
sentido estrito (ponderaccedilatildeo entre vantagens e desvantagens)rdquo 135
Logo ldquopouco importa a relaccedilatildeo meiofim ou a exigibilidade da medida ou ainda a
ponderaccedilatildeo com outro direito fundamental eventualmente em jogo aqui se analisa apenas a
eficaacutecia de um determinado direito fundamentalrdquo 136
O princiacutepio da eficiecircncia tem previsatildeo constitucional no art 37 e previsatildeo
infraconstitucional no art 8ordm do CPC15 O referido princiacutepio determina que o processo seja
conduzido de forma eficiente pelo oacutergatildeo jurisdicional
Entende-se que eficiente eacute a atuaccedilatildeo que utilize adequadamente os meios necessaacuterios
para que se atinjam os fins almejados O oacutergatildeo jurisdicional na escolha dos meios a serem
utilizados para a obtenccedilatildeo dos fins
a) deve escolher aqueles que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo (deve evitar meios que promovam resultados insignificantes) b) deve escolher meios que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado (natildeo se pode escolher um meio de resultado duvidoso) c) natildeo pode escolher um meio que produza muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscado 137
O juiz deveraacute igualmente analisar o princiacutepio da menor onerosidade da execuccedilatildeo que
eacute previsto pelo art 805 do CPC ldquoArt 805 Quando por vaacuterios meios o exequente puder
promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o
executadordquo
134 134 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 112 135 Ibid p 112 136 Ibid p 112 137 Ibid p 112-113
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Logo ldquohavendo duas opccedilotildees igualmente eficazes para permitir alcanccedilar o resultado
pretendido (satisfaccedilatildeo do creacutedito) deveraacute o oacutergatildeo julgador valer-se daquela que menos onere
a situaccedilatildeo do executadordquo 138
O dito princiacutepio impede o comportamento abusivo do exequente que possa beneficiar-
se do meio mais danoso ao executado protegendo dessa forma a lealdade e a eacutetica
processual
Os postulados e princiacutepios analisados em linhas preteacuteritas impotildeem ao oacutergatildeo julgador a
observacircncia de alguns criteacuterios para a escolha da medida executiva atiacutepicas a ser utilizada no
caso concreto
Primeiramente a medida executiva atiacutepica deveraacute ser adequada ldquoO criteacuterio da
adequaccedilatildeo impotildee que juiz considere abstratamente uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida
executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia
a gerar o resultadordquo 139 Nesse primeiro momento o juiz deveraacute observar sob a perspectiva do
credor qual medida teraacute o condatildeo de gerar o resultado mais efetivo
Segundo Fredie Didier et al140 o criteacuterio da adequaccedilatildeo eacute
() fortemente inspirado pelo postulado da proporcionalidade e pelo princiacutepio da eficiecircncia na parte em que esse princiacutepio determina a escolha de meios que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo e que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado
Ademais a medida adotada pelo oacutergatildeo julgador deveraacute ser necessaacuteria ldquoEsse criteacuterio
impotildee um limite agrave atuaccedilatildeo judicial funcionando como uma espeacutecie de contrapeso ao criteacuterio
da adequaccedilatildeo Aqui deve-se levar em conta a posiccedilatildeo do devedorrdquo141
O juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental agrave execuccedilatildeo e determinar
uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute necessaacuterio que a
medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado O criteacuterio da necessidade
estabelece que ldquonatildeo se pode ir aleacutem do necessaacuterio para alcanccedilar o propoacutesito almejado Deve
138 Ibid p 113 139 Ibid p 113 140 Ibid p 113 141 Ibid p 114
53
pois o oacutergatildeo julgador determinar o meio executivo na medida do estritamente necessaacuterio para
proporcionar a satisfaccedilatildeo do creacutedito ndash nem menos nem maisrdquo 142
O referido criteacuterio possui forte influecircncia dos postulados da proibiccedilatildeo do excesso e da
razoabilidade assim como do princiacutepio da menor onerosidade para o executado Assevera
Fredie Didier et al143 que
Natildeo eacute razoaacutevel por exemplo impor como primeira opccedilatildeo medida coercitiva a ser suportada pelo agente puacuteblico pelo simples fato de o juiz pressupor que o ente puacuteblico ao qual ele eacute vinculado iraacute descumprir determinada ordem judicial - o descumprimento natildeo pode ser visto como algo ordinaacuterio ou cotidiano (razoabilidade como dever de equidade) Tampouco eacute razoaacutevel eleger a prisatildeo civil como meacutetodo prioritaacuterio para compelir o executado ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer (razoabilidade como dever de equivalecircncia) Aleacutem disso eacute vedada por exemplo a imposiccedilatildeo de multa coercitiva para compelir o executado a emitir declaraccedilatildeo de vontade uma vez que haacute previsatildeo expressa de medida tiacutepica capaz de proporcionar o mesmo resultado sem sacrifiacutecio para o devedor (art 501 CPC)
A afirmaccedilatildeo feita por Bonavides144 em 1997 sobre a adequaccedilatildeo e a necessidade
continua atual sobre os motes
O meio empregado pelo legislador deve ser adequado e necessaacuterio para alcanccedilar o objetivo procurado O meio eacute adequado quando com seu auxiacutelio se pode alcanccedilar o resultado desejado eacute necessaacuterio quando o legislador natildeo poderia ter escolhido outro meio igualmente eficaz mas que natildeo limitasse ou limitasse de maneira menos sensiacutevel o direito fundamental
Por fim a medida deve conciliar os interesses contrapostos ldquoO magistrado deve
ponderar os interesses em jogo aplicando a proporcionalidade em sentido estrito de modo
que as vantagens da utilizaccedilatildeo da medida atiacutepica escolhida superem as vantagens de seu usordquo 145
Esse criteacuterio natildeo privilegia nem o credor nem o devedor e sim a soluccedilatildeo mais
equilibrada e que atenda da melhor forma aos valores em conflito ldquoTrata-se de criteacuterio
inspirado nos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade bem como no princiacutepio da
142 Ibid p 114 143 Ibid p 114 144 BONAVIDES Paulo Curso de Direito Constitucional 7ordm ediccedilatildeo Satildeo Paulo Ed Malheiros 1997
p 372 145 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 114-115
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eficiecircncia na parte em que impotildee ao juiz evitar a escolha do meio executivo que produza
muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscadordquo 146
Cada um dos criteacuterios supracitados devem ser considerados pelo juiz ao aplicar as
medidas executivas atiacutepicas ao caso concreto Para Fredie Didier et al147 as medidas como
retenccedilatildeo de CNH passaporte ou cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado como
forma de pressionaacute-lo ao pagamento da diacutevida pecuniaacuteria natildeo satildeo possiacuteveis
Essas natildeo satildeo medidas adequadas ao atingimento do fim almejado (o pagamento de quantia) - natildeo haacute propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente Tais medidas soam mais como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-lo ao cumprimento da ordem judicial - e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a utilizaccedilatildeo de meios sancionatoacuterios pelo magistrado mas apenas de meios de coerccedilatildeo indireta e sub-rogatoacuterios
Ainda que adequadas fossem a retenccedilatildeo de CNH e do passaporte no corte de fornecimento de aacutegua natildeo parecem ser medidas necessaacuterias (no sentido de exigiacuteveis) uma vez que outras medidas podem em tese ser utilizadas sem causar igual gravame ao executado - como por exemplo a simples restriccedilatildeo do uso de cartotildees de creacutedito A retenccedilatildeo de documentos pessoais eacute medida que termina por restringir a liberdade de ir e vir do executado mostrando-se a princiacutepio natildeo-razoaacutevel por ir de encontro ao dever de equivalecircncia e desproporcional por restringir demais o direito agrave liberdade em favor do direito de creacutedito pecuniaacuterio do exequente
O processualista baiano et al148 cita tambeacutem outro exemplo de medida atiacutepica que natildeo
atingem os criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade
Tampouco parece adequada em princiacutepio determinaccedilatildeo de corte de energia eleacutetrica de todo o preacutedio onde funciona serviccedilo puacuteblico administrativo como forma de pressionar o ente federado a cumprir ordem de nomeaccedilatildeo de candidato em concurso puacuteblico Natildeo parece haver relaccedilatildeo meiofim entre uma coisa e outra Tambeacutem natildeo eacute possiacutevel enxergar essa medida como necessaacuteria no sentido de ser a menos gravosa para o devedor - observe que se trata de medida que uma vez aplicada ensejaria restriccedilatildeo de funcionamento em toda a reparticcedilatildeo puacuteblica em prejuiacutezo de serviccedilos puacuteblicos essenciais ao funcionamento da Administraccedilatildeo o que aleacutem de ser excessivamente gravoso parece natildeo se conformar agrave necessidade de ponderaccedilatildeo dos interesses em jogo - aleacutem de afetar a um sem-nuacutemero de pessoas tomadoras desses serviccedilos
Ademais eacute sabido que toda e qualquer decisatildeo judicial precisa ser fundamentada Ao
se tratar das medidas executivas atiacutepicas o papel da fundamentaccedilatildeo se torna ainda mais
146 Ibid p 115 147 Ibid p 115 148 Ibid p 116
55
importante tendo em vista que eacute pela fundamentaccedilatildeo da decisatildeo que se poderaacute controlar a
adequaccedilatildeo e necessidade da medida atiacutepica
Pelo fato das medidas executivas atiacutepicas derivarem de dispositivos normativos
considerados claacuteusulas gerais propiacutecias as mais variadas interpretaccedilotildees eacute de extrema
importacircncia que o oacutergatildeo julgador fundamente sua decisatildeo
Logo ldquodeve o juiz na fundamentaccedilatildeo decisoacuteria expor racionalmente os motivos da
sua escolha demonstrando com atenccedilatildeo ao art 489 sect 1ordm CPC de que modo a sua opccedilatildeo
atende os criteacuterios da adequaccedilatildeo necessidade e proporcionalidade em sentido estrito ()rdquo 149
Dessa forma os princiacutepios da proporcionalidade e razoabilidade servem para delimitar
o alcance das claacuteusulas gerais de efetivaccedilatildeo fazendo com que o oacutergatildeo julgador se atenha aos
criteacuterios da adequaccedilatildeo e necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao caso
concreto
42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO
EXECUTADO
A entrada em vigor do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 aflorou ainda mais uma
discussatildeo essencial para os processualistas do seacuteculo XXI qual eacute o verdadeiro protagonista do
processo civil
Para os que defendem o ldquoautoritarismo processualrdquo o verdadeiro protagonista do
processo civil eacute o oacutergatildeo judiciaacuterio que em nome do desempenho efetivo de suas funccedilotildees lhes
eacute permitido dilatar os poderes que diga-se de jaacute passagem jaacute compotildeem um vastiacutessimo
arsenal150
Jaacute os ldquogarantistasrdquo 151 do processo civil acreditam que os verdadeiros protagonistas satildeo
as partes do processo e seus direitos e garantias devem ser estritamente preservados
Devido a essa disputa de quem possui maior protagonismo no processo as mudanccedilas
ocorridas no coacutedigo processual vigente quanto agraves medidas executivas atiacutepicas despertaram
149 Ibid p 117 150 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos
atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04102018
151 O processualista Araken de Assis acredita que o termo garantista eacute descabido tendo em vista que remete ao processo penal
56
maior celeuma do que qualquer outra modificaccedilatildeo trazida pelo CPC15 Afinal as referidas
medidas acirravam ainda mais a disputa pelo protagonismo processual
O fato de o CPC15 dispor no art 139 IV que o juiz poderaacute decretar todas as medidas
indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o
cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo
pecuniaacuteria levou boa parte da doutrina e dos juiacutezes a acreditar que teria pleno direito de
aplicar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo Entretanto muitos se esqueceram do outro lado
da moeda esqueceram que a dignidade humana do executado tambeacutem eacute um direito
fundamental e natildeo pode ser violado
Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa152
acreditam que
() natildeo parece producente elencar um rol abstrato das medidas que poderiam ser aplicadas pelo juiz a tiacutetulo do art 139 IV CPC Afinal se busca a efetividade da execuccedilatildeo e esta soacute pode ser identificada agrave luz das especificidades da situaccedilatildeo concreta Ideal eacute enveredar pela loacutegica modular (adequaccedilatildeo ao caso) natildeo pela geneacuterica (soluccedilotildees abstratas de pretensa utilidade universal)
Em razatildeo de o dispositivo apresentar uma gama de poderes tatildeo amplos agrave disposiccedilatildeo do
oacutergatildeo julgador sem nenhuma estipulaccedilatildeo de um procedimento legal previamente definido para
que estabeleccedila as condiccedilotildees de sua aplicaccedilatildeo em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo eacute
necessaacuterio que em razatildeo do princiacutepio da dignidade humana natildeo busque definir o que o
dispositivo permite mas de definir o que ele natildeo permite ldquoOu seja propotildee-se a sua
compreensatildeo por exclusatildeo Afinal se ele tem potencialidade para promover a efetividade da
tutela tambeacutem pode provocar lesotildees E como em direito os fins natildeo justificam os meios
ressalta como prioritaacuteria a necessidade de estabelecer limitesrdquo 153
O art 789 do CPC15 disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial e eacute
categoacuterico ao dispor que ldquoo devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para
152 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
153 Ibid sem paginaccedilatildeo
57
o cumprimento de suas obrigaccedilotildees salvo as restriccedilotildees estabelecidas em leirdquo Logo a
execuccedilatildeo somente poderaacute incidir sobre os bens do devedor e natildeo sobre a sua pessoa
Como eacute sabido a Lex Poetelia Papiria de 326 aC foi o primeiro marco legal da
humanizaccedilatildeo das cobranccedilas de diacutevidas abolindo a imposiccedilatildeo ao devedor de castigos
vexatoacuterios e ateacute da pena de morte154
Afinal no direito romano antigo a cobranccedila de diacutevidas poderia recair sobre a pessoa
do devedor que respondia com sua liberdade e ateacute mesmo com seu proacuteprio corpo permitindo
a lei que repartissem tantos pedaccedilos do corpo do devedor quantos fossem seus credores
Nesse sentindo leciona o professor Guilherme Pupe da Noacutebrega155 que
Vem de longe a evoluccedilatildeo no sentido de fazer a responsabilidade por uma obrigaccedilatildeo migrar da pessoa do devedor para seu patrimocircnio Merecem registro especiacutefico como marcos histoacutericos remotos a Lex Poetelia Papiria de 326 aC que aboliu o nexum e possibilidade de escravidatildeo do devedor como garantia da obrigaccedilatildeo e a pignoris capio ou ldquoaccedilatildeo por tomada de penhorrdquo que instituiu a possibilidade de o credor tomar parcela dos bens do devedor como forma de assegurar o adimplemento da diacutevida Aqueles institutos culminariam seacuteculo depois no artigo 789 do CPC de 2015 a consagrar que o devedor responda pela satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo com seus bens presentes e futuros observadas as restriccedilotildees impostas pelas impenhorabilidades legais
Logo o avanccedilar da civilizaccedilatildeo marcou o deslocamento da responsabilidade por
diacutevidas saindo do corpo do devedor para o seu patrimocircnio tendo em vista que a vida
humana a liberdade e a integridade fiacutesica satildeo valores inalienaacuteveis natildeo podendo ser
sacrificadas em benefiacutecio de obrigaccedilotildees pecuniaacuterias 156
Entretanto eacute sabido que a responsabilidade patrimonial eacute excepcionada pela prisatildeo
civil do devedor de verba alimentiacutecia resquiacutecio da responsabilidade pessoal romana
154 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt
httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018
155 NOacuteBREGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139 IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018
156 Ibid sem paginaccedilatildeo
58
No entanto haacute uma justificativa para isso Segundo o processualista Guilherme Pupe
da Noacutebrega157
Eacute que a par de a prisatildeo civil encontrar previsatildeo constitucional no inciso LXVII do artigo 5ordm o raciociacutenio eacute o de que o direito do alimentante agrave liberdade de locomoccedilatildeo cede diante dos direitos agrave vida e agrave dignidade titularizados pelo alimentando e resguardados pelos alimentos Foi esse mesmo raciociacutenio aliaacutes que justificou no passado a ediccedilatildeo da suacutemula 309 pelo STJ agora positivada pelo artigo 528 sect 7ordm que limita a modalidade coercitiva agraves trecircs uacuteltimas prestaccedilotildees vencidas e agraves prestaccedilotildees vincendas A ideia eacute que tendo o alimentando subsistido a despeito do natildeo-pagamento de prestaccedilotildees mais antigas essas verbas teriam perdido o caraacuteter alimentar que na equaccedilatildeo antes apresentada justificaria a prisatildeo civil do alimentante Daiacute por que aqueles valores antigos remanescem exigiacuteveis mas somente pela via da expropriaccedilatildeo
Essa ressalva eacute necessaacuteria tendo em vista que a adoccedilatildeo de teacutecnica de execuccedilatildeo
indireta para incursatildeo radical na esfera de direitos do executado notadamente direitos
fundamentais quando carente de respaldo constitucional natildeo merece acolhimento sob
risco de se atentar contra o devido processo legal (artigo 5ordm LIV da Constituiccedilatildeo)
Como afirma o autor Bruno Dantas158 ldquoembora inexistam estatiacutesticas que permitam
comparaccedilotildees natildeo eacute desarrazoado intuir que os iacutendices de inadimplecircncia despeccedilam na razatildeo
inversa da incidecircncia das ordens judiciais sobre o corpo e a liberdade do devedorrdquo Entretanto
eacute natildeo possiacutevel adotar toda e qualquer medida executiva atiacutepica em nome da efetividade da
execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que se saiba os limites da sua aplicaccedilatildeo
Dessa forma instrumentos que permitam o cumprimento forccedilado de contratos e o pagamento
de diacutevidas satildeo necessaacuterios contudo eacute preciso equilibrar essa exigecircncia com a liberdade e a
dignidade humana
Como citado alhures o art 139 IV ensejou decisotildees como a que determinou a
suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o
passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito em uma accedilatildeo se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo
extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
Na supracitada decisatildeo o princiacutepio da responsabilidade patrimonial natildeo estaacute sendo
efetivado para o que o devedor responda com os seus bens Afinal qual ligaccedilatildeo entre a
157 Ibid sem paginaccedilatildeo 158 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt
httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018
59
restriccedilatildeo de circulaccedilatildeo que diz com o direito de ir e vir (liberdade) com o pagamento de
diacutevidas que diz com a responsabilidade civil159
Ademais por que quem natildeo tem dinheiro para pagar diacutevidas natildeo pode dirigir Por que
natildeo tem condiccedilotildees para pagar o deacutebito natildeo pode ter passaporte Por que quem natildeo tem como
pagar o deve natildeo pode ter cartatildeo de creacutedito
Ao utilizar meios executivos atiacutepicos como os supracitados para compelir o devedor a
satisfazer a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria quando exauridos sem ecircxito os meios tradicionais de bens
penhoraacuteveis salvo quando existe qualquer indiacutecio concreto de ocultaccedilatildeo ou dissipaccedilatildeo de
bens eacute obrigar o devedor abrir matildeo da proteccedilatildeo da lei que lhe impede que seja tomado agrave forccedila
(art 833 CPC e demais disposiccedilotildees que tratam da impenhorabilidade)
Segundo Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa160
Claramente essa pressatildeo visa dar uma aparecircncia de voluntariedade agrave indicaccedilatildeo de bens impenhoraacuteveis pelo proacuteprio executado que na verdade soacute age assim por ser a uacutenica forma de ver-se livre de um grame imposto por medida indutiva despedida de qualquer necessidade ou adequaccedilatildeo Uma intoleraacutevel perversatildeo
Os autores afirmam ainda que o ldquodireito paacutetrio natildeo admite esta contraditio in terminis
sendo inaceitaacutevel a coexistecircncia de regra protetiva do executado com outra que concede ao
juiz poderes para forccedilar (ainda que indiretamente e veladamente) o executado a abrir matildeo
daquela proteccedilatildeordquo 161
Logo eacute cristalino que a suspensatildeo da CNH eacute uma forma incorreta de aplicar a medida
executiva atiacutepica para efetivar o direito fundamental a execuccedilatildeo tendo em vista que o uacutenico
objetivo da referida eacute pressionar o executado abrir matildeo de algum bem impenhoraacutevel para
levantar o dinheiro e cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
A retenccedilatildeo do passaporte igualmente natildeo possui qualquer relaccedilatildeo com a diacutevida do
executado e eacute somente uma forma de tentar pressiona-lo a dispor de um bem que natildeo pode
ser tomado agrave forccedila e puni-lo por natildeo ter cumprido voluntariamente com a sua obrigaccedilatildeo
159 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
160 Ibid sem paginaccedilatildeo 161 Ibid sem paginaccedilatildeo
60
Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa162
acreditam que tal medida eacute equivocada e se torna excessivamente onerosa ao executado
As mais variadas circunstacircncias relevem o equiacutevoco de tal medida aplicada assim genericamente Com efeito nada justifica reter o passaporte do executado e impedi-lo de viajar para o exterior quando eacute agraciado inclusive com todas as despesas pagas com presente sorteio ou precircmio (por completar tempo de serviccedilo ou atingir metas produtividade na sociedade empresaacuteria em que trabalha) Como todo custo eacute suportado por terceiro e por isso mesmo a sua realizaccedilatildeo pelo executado natildeo traria qualquer prejuiacutezo ao exequente e a retenccedilatildeo do passaporte natildeo seria injustificaacutevel
Paulo Antonio Papini163 acredita que natildeo tem a apreensatildeo de passaporte natildeo possui um
fundamento plausiacutevel tendo em vista que se o devedor natildeo pode viajar para saldar o deacutebito
tambeacutem natildeo poderia exercer atividades cotidianas
Com todo o respeito a quem pensa dessa forma o argumento eacute muito simploacuterio e natildeo precisamos sequer do Direito para derrubaacute-lo Com efeito se considerarmos que ndash ateacute mesmo pelas dimensotildees continentais do Brasil ndash natildeo eacute incomum que uma passagem para o Nordeste custe mais caro que um voo para Miami seria razoaacutevel entatildeo seguindo a linha argumentativa do Magistrado em questatildeo que se oficiasse aos oacutergatildeos reguladores da aviaccedilatildeo civil proibindo-se aquele devedor de fazer ateacute mesmo voos domeacutesticos Poder-se-ia ir mais longe jaacute que natildeo tem dinheiro para pagar suas diacutevidas certamente aquele devedor tambeacutem natildeo teria para comer fora de sua casa porque entatildeo natildeo determinar a expediccedilatildeo de ofiacutecio aos restaurantes proacuteximos agrave sua casa e determinar tambeacutem a proibiccedilatildeo de que ele fosse servidoatendido
O autor se questiona ainda ldquoSeraacute entatildeo que o Princiacutepio da Dignidade da Pessoa
Humana estaacute de mero enfeite em nossa Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ()rdquo 164 Tendo em vista
que ldquoa decisatildeo em comento viola diretamente o art 5ordm incisos XV LIII e LXIII da
Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ndash falamos do Direito de Ir e Virrdquo 165
Ademais o cancelamento do cartatildeo de creacutedito eacute mais uma forma de constranger e
compelir o executado a cumprir com a obrigaccedilatildeo de qualquer forma natildeo importando o que
precise fazer para conseguir saldar o deacutebito tendo em vista que a referida medida apresenta
162 Ibid sem paginaccedilatildeo 163 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo
pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018
164 Ibid sem paginaccedilatildeo 165 Ibid sem paginaccedilatildeo
61
qualquer adequaccedilatildeo com o fim desejado (reverter em pagamento para o exequente) Os
autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa afirmam que166
Reconhece-se que as razotildees da afirmaccedilatildeo ora questionada satildeo ateacute intuitivas mas eacute plenamente possiacutevel problematiza-las Ora natildeo se encontra qualquer justificativa idocircnea para que o juiz possa cancelar o contrato do executado com a administradora do cartatildeo de creacutedito (ou instituiccedilatildeo financeira) que natildeo tem qualquer relaccedilatildeo com o creacutedito exequendo muito menos como isso poderia impactar positivamente na execuccedilatildeo (senatildeo para pressionar o executado a dispor de bens impenhoraacuteveis) Ademais natildeo foram indicados sequer sinais de que o executado realiza gastos supeacuterfluos com o cartatildeo de creacutedito ndash natildeo que isso justificasse a medida pois o correto seria penhorar os esses bens (se duraacuteveis naturalmente) ao inveacutes de cancelar o cartatildeo de creacutedito
Logo as referidas medidas natildeo possuem qualquer relaccedilatildeo com o atingimento do fim
almejado (o pagamento de quantia) tendo em vista que natildeo haacute uma relaccedilatildeo meiofim entre
tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a
restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia
ao exequente
Dessa forma nota-se que as medidas de suspensatildeo da CNH retenccedilatildeo de passaporte e
bloqueio do cartatildeo de credito satildeo completamente inadequadas agrave realizaccedilatildeo a que se prestam
Afinal ldquotais medidas soam como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-
lo ao cumprimento da ordem judicial ndash e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a
utilizaccedilatildeo dos meios sancionatoacuterios pelo magistrado ()rdquo167
Como exposto em linhas preteacuteritas o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades
de aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e
razoaacutevel se atendo aos criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas
executivas atiacutepicas ao caso concreto sob pena de converter a medida em de indutiva para
punitiva
A utilizaccedilatildeo de medidas atiacutepicas como a suspensatildeo da carteira de motorista e o
passaporte do devedor abandona a regra da responsabilidade patrimonial e atingem em cheio
o nuacutecleo de direitos inerentes agrave condiccedilatildeo humana
166 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
167 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 115
62
O limite para a aplicaccedilatildeo de tais medidas deve ser a Constituiccedilatildeo Federal e sobretudo
os Direitos fundamentais nela expressos ldquoCom efeito natildeo haacute saiacuteda tampouco soluccedilatildeo eficaz
de um problema sem que se respeite a Lei e o Devido Processo Legal (por mais nobres que
sejam as intenccedilotildees)rdquo 168
Dessa forma a busca desenfreada pelo cumprimento das decisotildees judiciais em
especial na fase executiva natildeo pode ser realizada em sacrifiacutecio de direitos fundamentais O
Poder Judiciaacuterio natildeo pode resolver a crise do processo executoacuterio utilizando de medidas
arbitraacuterias com o propoacutesito de satisfazer obrigaccedilotildees pecuniaacuterias
Eis o dilema que se coloca diante do poder geral de efetivaccedilatildeo ele pode servir de
potente instrumento em prol da tutela jurisdicional executiva entretanto se manejado de
modo improacuteprio serviraacute de instrumento de puniccedilatildeo e humilhaccedilatildeo do executado169
Eacute notoacuterio que se amplamente aplicado o poder geral de efetivaccedilatildeo reduziria os
iacutendices de inadimplecircncia quiccedilaacute resolveria por completo a crise da execuccedilatildeo civil Entretanto
o retrocesso civilizatoacuterio seria irreparaacutevel
168 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo
pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018
169 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
63
5 CONCLUSAtildeO
Como funccedilatildeo jurisdicional que tem como objeto a efetivaccedilatildeo de direitos a execuccedilatildeo
deve sempre buscar a maior satisfaccedilatildeo possiacutevel concretizando integralmente o creacutedito do
exequente isto eacute realizando o direito fundamental agrave tutela executiva do credor Por isso a
adoccedilatildeo de meios executivos atiacutepicos incorporados pelo Coacutedigo de Processo Civil de 2015 por
meio do art139 IV em um primeiro momento podem ser consideradas vaacutelidas visto que
servem de instrumento para a satisfaccedilatildeo e asseguraccedilatildeo de direitos do credor
Entretanto para o oacutergatildeo julgador natildeo cometa arbitrariedades em nome do direito
fundamental agrave execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que seja definido certos limites na adoccedilatildeo do poder
geral de efetivaccedilatildeo
As medidas executivas atiacutepicas natildeo podem ser aplicadas de maneira indiscriminada
logo devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o esgotamento das medidas tiacutepicas e
a possibilidade de cumprimento da obrigaccedilatildeo
Partindo dessa premissa as medidas a serem adotadas pelo juiz no caso concreto
devem ter como baliza os princiacutepios da proporcionalidade e da razoabilidade para que natildeo
ultrapassem a responsabilidade patrimonial do devedor e incidida diretamente sobre sua
pessoa
Para que natildeo seja atingida a pessoa do executado ou seja para que o devedor natildeo
tenha sua dignidade humana viola eacute necessaacuterio que a medida atiacutepica seja adequada e
necessaacuteria
Logo o juiz deveraacute sempre estabelecer uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida
executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia
a gerar o resultado sem violar a dignidade humana do executado
Dessa o juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental a execuccedilatildeo e
determinar uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute
necessaacuterio que a medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado
As medidas que ultrapassam esses limites como a decisatildeo que apreendeu o
passaporte suspensatildeo a CNH e bloqueou o cartatildeo de creacutedito do devedor satildeo meramente
punitivas posto que essas natildeo satildeo as medidas mais adequadas para se atingir o fim almejado
pois natildeo existe propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado
64
uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo
geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente
Medidas como esta servem de embasamento para decisotildees arbitraacuterias e autoritaacuterias de
violaccedilatildeo dos direitos fundamentais transformando o poder geral de efetivaccedilatildeo em
instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com autorizaccedilatildeo judicial
Em suma o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades de aplicaccedilatildeo do poder
geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e razoaacutevel se atendo aos
criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao
caso concreto sob pena de punir a pessoa do executado violando a sua dignidade humana
em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo
65
REFEREcircNCIAS
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- 1 INTRODUCcedilAtildeO
- 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
-
- 21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL
- 22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
- 23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
- 24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO
- 25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO
-
- 3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
-
- 31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS
-
- 311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15
-
- 32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
- 33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
- 34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
-
- 4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
-
- 41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
- 42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
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- 5 CONCLUSAtildeO
- REFEREcircNCIAS
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DIANDRA GRADIN SCHAUN
OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA
ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE
HUMANA DO EXECUTADO
Monografia apresentada ao curso de poacutes-graduaccedilatildeo em Direito Processual Civil da Faculdade Baiana de Direito como requisito para obtenccedilatildeo do grau de especialista em Direito Processual Civil
Salvador
2018
DIANDRA GRADIN SCHAUN
OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA
ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE
HUMANA DO EXECUTADO
Monografia aprovada como requisito para obtenccedilatildeo do grau de Especialista em Direito
Processual Civil pela seguinte banca examinadora
Nome _______________________________________________________________
Titulaccedilatildeo e instituiccedilatildeo __________________________________________________
Nome _______________________________________________________________
Titulaccedilatildeo e instituiccedilatildeo __________________________________________________
Nome _______________________________________________________________
Titulaccedilatildeo e instituiccedilatildeo __________________________________________________
Salvador ______2018
RESUMO
A prestaccedilatildeo jurisdicional natildeo se concretiza depois de encerrada a fase de conhecimento Para
que a referida prestaccedilatildeo se consume eacute necessaacuterio que ocorra a satisfaccedilatildeo do deacutebito pelo
devedor que em grande parte soacute se efetiva atraveacutes da tutela executiva Entretanto a execuccedilatildeo
civil sempre sofreu uma crise quanto a sua efetividade e o Coacutedigo de Processo Civil de 2015
com o escopo de dirimir a ineficiecircncia do instituto concebeu novas diretrizes ao processo
executoacuterio Dessa forma o art 139 IV do Coacutedigo de Processo Civil estabeleceu a
possibilidade de o juiz dispor de todas as medidas necessaacuterias para assegurar o cumprimento
de ordem judicial trazendo como grande inovaccedilatildeo a aplicaccedilatildeo dessas medidas tambeacutem nas
obrigaccedilotildees de pagar quantia Todavia eacute necessaacuterio estabelecer criteacuterios limitadores para que a
adoccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo viole a dignidade humana do executado em nome do
direito fundamental agrave execuccedilatildeo
Palavras-chaves Execuccedilatildeo Poder geral de efetivaccedilatildeo Direito fundamental agrave execuccedilatildeo
Dignidade humana do executado
SUMAacuteRIO
1 INTRODUCcedilAtildeO 5
2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL 7
21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL 7
22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL 8
23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL 11
24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO 17
25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO 20
3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 23
31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS 23
311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15 25
32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO 28
33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO 31
34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 36
4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 48
41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO 48
42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 55
5 CONCLUSAtildeO 63
REFEREcircNCIAS 65
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
Art ndash Artigo
CPC15 ndash Coacutedigo de Processo Civil de 2015
CPC73 ndash Coacutedigo de Processo Civil de 1973
ENFAM ndash Escola nacional de formaccedilatildeo e aperfeiccediloamento de magistrados
HC ndash Habeas Corpus
STJ ndash Superior Tribunal de Justiccedila
5
1 INTRODUCcedilAtildeO
A prestaccedilatildeo jurisdicional natildeo costuma se findar apoacutes o encerramento da fase cognitiva
com a prolaccedilatildeo de uma sentenccedila de meacuterito Para que a referida prestaccedilatildeo se concretize eacute
imperioso que haja a satisfaccedilatildeo do deacutebito pelo devedor
Entretanto observa-se em diversos casos o inadimplemento da parte passiva
processual sendo necessaacuterio desenvolver a atividade executiva A referida atividade possui o
escopo de satisfazer direitos
Isso porque o processo natildeo eacute um fim em si mesmo sendo apenas um exerciacutecio da
jurisdiccedilatildeo estatal Dessa forma a razatildeo de ser do processo eacute o atingimento da sua finalidade
almejada que eacute a prestaccedilatildeo da tutela jurisdicional
Todavia como a tutela jurisdicional configura-se na obrigaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio
proteger e reparar os direitos lesionados ou ameaccedilados de lesatildeo muitas vezes a dita tutela
somente consegue ser efetivada atraveacutes da atividade executiva da jurisdiccedilatildeo
Ocorre que a execuccedilatildeo civil sempre foi o ldquocalcanhar de Aquilesrdquo do sistema
processual e de modo geral vinha sofrendo uma crise quanto a sua efetividade Ou seja o
credor obtia ecircxito na fase de conhecimento entretanto natildeo conseguia alcanccedilar o seu direito a
prestaccedilatildeo reconhecida na fase de execuccedilatildeo
Com o fito de tornar a atividade satisfativa mais eficiente e mais ceacutelere o Coacutedigo de
Processo Civil de 2015 concebeu novas diretrizes ao processo no sentindo de harmonizar
suas com os ditames da Constituiccedilatildeo Federal principalmente com os direitos fundamentais
As normas fundamentais do processo civil trazidas pelo CPC15 preocupam-se
primordialmente com a efetividade da tutela jurisdicional
Em conformidade com essa nova sistemaacutetica o legislador no art 139 IV do Coacutedigo
de Processo Civil estabeleceu a possibilidade de o juiz dispor de todas as medidas indutivas
coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o cumprimento de
ordem judicial trazendo como grande novidade a aplicaccedilatildeo dessas medidas executoacuterias
atiacutepicas tambeacutem nas obrigaccedilotildees de pagar dinheiro
6 Entretanto natildeo haacute na legislaccedilatildeo criteacuterios especiacuteficos que auxiliem o oacutergatildeo julgador na
escolha das medidas executivas atiacutepicas que se adotadas sem qualquer baliza podem
acarretar consequecircncias juriacutedicas irreparaacuteveis
Como a famosa decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de
Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-1320138260011 Nessa accedilatildeo
que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo
pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a suspensatildeo da
Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o passaporte e
cancelou os cartotildees de creacutedito como forma de compeli-lo a adimplir com o deacutebito
Decisotildees como esta geram conflitos entre direitos constitucionalmente instituiacutedos De
um lado o direito fundamental agrave tutela jurisdicional e de outro os direitos e garantias
inerentes a todos os indiviacuteduos
Dessa forma a presente monografia tem como escopo de estabelecer criteacuterios
limitadores para que a adoccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo viole a dignidade humana do
executado em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo
7 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO
CIVIL
21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL
A Execuccedilatildeo Civil nasce a partir do direito a uma prestaccedilatildeo conferida a algueacutem de
exigir de outrem o cumprimento de uma conduta de fazer natildeo fazer ou de dar (dinheiro ou
coisa distinta) 1
Para que o direito a uma prestaccedilatildeo se concretize no mundo fiacutesico eacute necessaacuterio que
haja a satisfaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida pelo sujeito passivo Caso contraacuterio fala-se em
inadimplemento ou lesatildeo O titular do direito natildeo tem como agir por si para efetivar o seu
direito a prestaccedilatildeo posto que a autotutela eacute vedada no ordenamento juriacutedico Dessa forma eacute
necessaacuterio que se recorra ao Poder Judiciaacuterio para que se possa ter a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo
devida logo a tutela jurisdicional executiva2
O processualista Fredie Didier et al3 equaciona essa questatildeo da seguinte maneira
Quando se pensa em tutela executiva pensa-se na efetivaccedilatildeo de direitos a uma prestaccedilatildeo fala-se de um conjunto de meios para efetivar a prestaccedilatildeo devida fala-se em execuccedilatildeo de fazer natildeo-fazer dar exatamente os trecircs tipos de prestaccedilatildeo existentes Natildeo eacute por acaso nem por coincidecircncia que a tutela executiva pressupotildee inadimplemento (CPC art 786) - fenocircmeno exclusivo dos direitos a uma prestaccedilatildeo Eacute por isso tambeacutem que se pode falar em prescriccedilatildeo da execuccedilatildeo (CPC art 802 e suacutemula do STF n 150) - prescriccedilatildeo eacute fenocircmeno juriacutedico que se relaciona aos direitos a uma prestaccedilatildeo A execuccedilatildeo forccedilada dirige-se ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo Essa relaccedilatildeo entre direito material e processo eacute fundamental para a compreensatildeo do fenocircmeno executivo
Nesse iacutenterim para o Ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux4 ldquoexecutar eacute
satisfazerrdquo ao passo que o professor Fredie Didier et al5 formulou um conceito mais amplo
ldquoExecutar eacute satisfazer uma prestaccedilatildeo devida A execuccedilatildeo pode ser espontacircnea quando o
devedor cumpre voluntariamente a prestaccedilatildeo ou forccedilada quando o cumprimento da prestaccedilatildeo
eacute obtido por meio de atos executivos pelo Estadordquo
1 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 41 2 Ibid p 42 3 Ibid p 42 4 FUX Luiz Curso de direito processual civil Rio de Janeiro Forense 2001 p 980 5 DIDIER JR Fredie et al Op Cit p 45
8 Dessa forma a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional responsaacutevel pela
concretizaccedilatildeo de um direito subjetivo no plano material obtendo resultado idecircntico ou
equivalente ao atingiacutevel se o devedor cumprisse espontaneamente a prestaccedilatildeo
Todavia essa atividade jurisdicional soacute cabe quando o devedor se recusa a cumprir
com a obrigaccedilatildeo quebrando a expectativa do credor de receber o que lhe eacute devido Por esta
razatildeo que se diz que a execuccedilatildeo civil eacute ldquoforccediladardquo 6
Eacute o que se conclui seguindo os ensinamentos de Leonardo Greco7 para ele execuccedilatildeo eacute
uma
() modalidade de tutela jurisdicional que consiste na praacutetica pelo juiz (ou por outrem sob a sua supervisatildeo) de uma seacuterie de atos coativos concretos sobre o devedor e sobre o seu patrimocircnio a fim de agrave custa dele e independentemente do concurso da sua vontade tornar efetivo o cumprimento de prestaccedilatildeo por ele inadimplida desde que tais atos coativos estejam previamente constituiacutedos em lei
Portanto a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional que tem como escopo obter o
cumprimento de uma prestaccedilatildeo certa e inadimplida mediante atos coativos sobre o devedor e
seus bens
22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
Vislumbrado o conceito de execuccedilatildeo civil cabe agora empreender a sua classificaccedilatildeo
tendo em vista que a execuccedilatildeo pode se manifestar de diversas formas possuindo diferentes
caracteriacutesticas em cada uma das suas modalidades
Inicialmente cabe destacar que haacute duas teacutecnicas processuais para viabilizar a execuccedilatildeo
civil lato sensu eacute a que divide em processo autocircnomo de execuccedilatildeo e em fase de execuccedilatildeo
dependendo do tiacutetulo executivo que justifica o exerciacutecio da atividade satisfativa
O Coacutedigo Processual Civil de 2015 acertadamente ratificou as reformas promovidas
no CPC73 que consagrava a opccedilatildeo legislativa de oferecimento das tutelas de certificaccedilatildeo e
efetivaccedilatildeo do direito em um mesmo processo Dessa forma as execuccedilotildees de sentenccedilas
6 BASTOS Luiz Fernando Pereira O artigo 139 IV do novo Coacutedigo de Processo Civil a atipicidade
dos meios executivos na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia certa Brasiacutelia 2017 Disponiacutevel em lt httpbdmunbbrbitstream104831866812017_LuizFernandoPereiraBastospdf gt Acesso em 06 de agosto de 2018
7 BASTOS Luiz Fernando Pereira apud GRECO Leonardo O processo de execuccedilatildeo Rio de Janeiro Renovar 1999 p 164
9
passaram a ser uma fase complementar ao de processo de conhecimento e natildeo mais ocorrer
em um processo autocircnomo
No entendimento do professor processualista Fredie Didier et al8 o processo
sincreacutetico simplificou a efetivaccedilatildeo de um direito reconhecido em sentenccedila
A dispensa do ajuizamento de um processo autocircnomo para execuccedilatildeo de sentenccedila natildeo soacute veio diminuir o tempo necessaacuterio agrave prestaccedilatildeo da tutela jurisdicional - afinal o credor natildeo mais precisaria tal como ocorria ateacute entatildeo promover nova citaccedilatildeo pessoal do reacuteudevedor- como tambeacutem veio romper de vez com um velho paradigma segundo o qual a atividade executiva estaria dissociada da precedente atividade jurisdicional cognitiva
Entretanto natildeo soacute as sentenccedilas de meacuterito ensejam uma execuccedilatildeo Por esta razatildeo foi
necessaacuterio manter o processo autocircnomo de execuccedilatildeo para os casos em que o credor tem a seu
favor um documento que natildeo tenha sido proferido por um oacutergatildeo dotado de jurisdiccedilatildeo
Consequentemente se for o titulo executivo judicial o caminho natural eacute o do
cumprimento de sentenccedila Sendo por sua vez extrajudicial o titulo executivo o caminho
correto eacute o processo de execuccedilatildeo
Cabe ainda salientar que toda execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial eacute definitiva Jaacute a
execuccedilatildeo de tiacutetulo judicial (cumprimento de sentenccedila) pode ser definitiva ou provisoacuteria
No primeiro caso isto eacute cumprimento de sentenccedila definitivo ldquoeacute a execuccedilatildeo completa
que vai ateacute a fase final (com a entrega do bem da vida) sem exigecircncias adicionais para o
exequenterdquo 9
Quanto ao segundo caso ldquoo cumprimento provisoacuterio de sentenccedila (fundada em tiacutetulo
provisoacuterio) eacute aquele que exige alguns requisitos extras para que se chegue agrave fase final da
execuccedilatildeordquo 10
Para Fredie Didier11 o criteacuterio para definir se o cumprimento de sentenccedila seraacute
definitivo ou provisoacuterio
() eacute a estabilidade do tiacutetulo executivo em que se funda a execuccedilatildeo se se tratar de decisatildeo acobertada pela coisa julgada material o cumprimento de sentenccedila eacute
8 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 46 9 Ibid p 57 10 Ibid p 57 11 Ibid p 57
10
definitivo se se tratar de decisatildeo judicial ainda passiacutevel de alteraccedilatildeo (reforma ou invalidaccedilatildeo) em razatildeo da pendecircncia de recurso contra ela interposto a que natildeo tenha sido atribuiacutedo efeito suspensivo o cumprimento de sentenccedila eacute provisoacuterio
Ademais a execuccedilatildeo se distingue em procedimentos executivos comuns que satildeo da
execuccedilatildeo civil e que servem a uma generalidade de creacuteditos como eacute o caso do cumprimento
de sentenccedila e o processo de execuccedilatildeo E em procedimentos executivos especiais que servem
agrave satisfaccedilatildeo de creacuteditos peculiares como a execuccedilatildeo de alimentos e a execuccedilatildeo fiscal 12
Por fim cabe mencionar a classificaccedilatildeo que distingue a execuccedilatildeo em direta e indireta
A primeira execuccedilatildeo direita (ou execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo) eacute ldquo() aquela em que o
Poder Judiciaacuterio prescinde da colaboraccedilatildeo do executado para a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida
e pois promove uma substituiccedilatildeo da sua conduta pela conduta do proacuteprio Estado-juiz ou de
terceirordquo 13 Ou seja as medidas executivas satildeo levadas a efeito mesmo contra a vontade do
devedor na execuccedilatildeo direta
Segundo a doutrina a execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo se subdivide da seguinte forma
meios de desapossamento meios de transformaccedilatildeo e meios de expropriaccedilatildeo
Os meios de desapossamento muito comuns nas execuccedilotildees para entrega de coisa eacute a
forma ldquopor meio da qual se retira da posse do executado o bem a ser entregue ao exequente
(p ex despejo busca e apreensatildeo reintegraccedilatildeo de posse)rdquo 14 Ao passo que por meio dos de
transformaccedilatildeo ldquo() o juiz determina que um terceiro pratique a conduta que deveria ser
praticada pelo executado cabendo a este arcar com o pagamento do custo respectivordquo 15 Jaacute
os meios executivos de expropriaccedilatildeo eacute a forma ldquopor meio do qual algum bem do patrimocircnio
do devedor eacute expropriado para pagamento do creacutedito (adjudicaccedilatildeo alienaccedilatildeo judicial ou
apropriaccedilatildeo de frutos e rendimentos de empresa ou de estabelecimentos e de outros bens art
825 CPC)rdquo 16
12 Ibid p 48 13 Ibid p 50 14 Ibid p 51 15 Ibid p 51 16 Ibid p 51
11 Jaacute a execuccedilatildeo indireta (ou mandamental) atua ldquo() na vontade do devedor como forma
de compeli-lo ou incentivaacute-lo a cumprir a ordem judicialrdquo 17 Nesse entendimento ainda
leciona Fredie Didier et al 18
Nesses casos o Estado-juiz busca promover a execuccedilatildeo com a colaboraccedilatildeo do executado forccedilando ou incentivando a que ele proacuteprio cumpra a prestaccedilatildeo devida Em vez de o Estado-juiz tomar as providecircncias que deveriam ser tomadas pelo executado o Estado forccedila por meio de coerccedilatildeo psicoloacutegica ou de promessa de recompensa judicial a que o proacuteprio executado cumpra a prestaccedilatildeo
A execuccedilatildeo indireta pode ser patrimonial como por exemplo a imposiccedilatildeo de multa
coercitiva ou pessoal com a prisatildeo civil do devedor de alimentos Ademais adiciona Didier
et al19que
O estiacutemulo ao cumprimento da prestaccedilatildeo pode dar-se pelo temor (p ex multa coercitiva prisatildeo civil do devedor de alimentos divulgaccedilatildeo de notiacutecia em jornal revelando o descumprimento) ou pelo incentivo (p ex a chamada sanccedilatildeo premial ou sanccedilatildeo positiva de que eacute exemplo a isenccedilatildeo do pagamento de custas em caso de cumprimento do mandado monitoacuterio - art 701 sect 1ordm CPC a reduccedilatildeo pela metade dos honoraacuterios advocatiacutecios fixados inicialmente pelo juiacutezo em caso de pagamento integral do deacutebito pecuniaacuterio na execuccedilatildeo por quantia certa fundada em tiacutetulo extrajudicial - art 827 sect 1ordm CPC)
Por tais razotildees haacute uma tendecircncia em cada vez mais prestigiar os meios executivos
indiretos (coercitivos) posto que satildeo tatildeo eficazes quanto os meios executivos diretos
entretanto menos onerosos Contudo sua aplicaccedilatildeo deve ser fiscalizada a fim de natildeo permitir
que a execuccedilatildeo civil perca sua finalidade visto que eacute uma funccedilatildeo jurisdicional que tem como
escopo efetivar o direito do credor e natildeo de atender os interesses do devedor
23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
Os princiacutepios juriacutedicos nos uacuteltimos anos passaram a ser munidos de forccedila cogente
normatizando as condutas humanas tanto quanto as regras juriacutedicas Os ditos princiacutepios
ampliaram as margens de atuaccedilatildeo dos aplicadores do direito possibilitando a construccedilatildeo de
soluccedilotildees mais adequadas agraves especificidades das demandas que chegam ao judiciaacuterio
17 Ibid p 51 18 Ibid p 51 19 Ibid p 51-52
12 Dessa forma eacute necessaacuterio aprofundar-se nos princiacutepios norteadores da execuccedilatildeo civil
para que se obtenha uma anaacutelise completa da teoria geral da execuccedilatildeo
A execuccedilatildeo civil tem como um dos seus corolaacuterios o princiacutepio da efetividade este
consiste na exigecircncia de um sistema completo de tutela executiva no qual existam meios
executivos capazes de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor
de tutela executivardquo 20
O referido princiacutepio da efetividade eacute reforccedilado como normal fundamental do processo
civil brasileiro pelo art 4ordm do CPC ldquoArt 4ordm As partes tecircm o direito de obter em prazo razoaacutevel
a soluccedilatildeo integral do meacuterito incluiacuteda a atividade satisfativa
Jaacute o princiacutepio da boa feacute processual corolaacuterio do devido processo legal estaacute previsto
no art 5ordm do CPC ldquoAquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de
acordo com a boa-feacuterdquo Segundo o processualista baiano Fredie Didier21
O princiacutepio da boa-feacute extrai-se de uma claacuteusula geral processual A opccedilatildeo por uma claacuteusula geral de boa-feacute eacute a mais correta Eacute que a infinidade de situaccedilotildees que podem surgir ao longo do processo torna pouco eficaz qualquer enumeraccedilatildeo legal exaustiva das hipoacuteteses de comportamento desleal Daiacute ser correta a opccedilatildeo da legislaccedilatildeo brasileira por uma norma geral que impotildee o comportamento de acordo com a boa-feacute Em verdade natildeo seria necessaacuteria qualquer enumeraccedilatildeo das condutas desleais o art 5deg do CPC eacute bastante exatamente por tratar-se de uma claacuteusula geral
Dessa forma o dito princiacutepio preconiza que diante de um vinculo juriacutedico as pessoas
envolvidas natildeo poderatildeo frustrar a confianccedila do outro devendo comportar-se como se pode
esperar de uma pessoa de boa-feacute
Ademais disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial que ldquosomente o
patrimocircnio do devedor (art 789 CPC) ou de terceiro responsaacutevel pode ser objeto da
atividade executiva do Estadordquo 22
O referido princiacutepio que determina que somente o patrimocircnio submete-se agrave execuccedilatildeo
e natildeo a pessoa foi trazido pela humanizaccedilatildeo do direito Para o professor Didier et al23 o
20 DIDIER JR Freddie et al apud GUERRA Marcelo Lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do
credor na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 21 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte
geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 105 22 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 68
13
desenvolvimento dos meios de execuccedilatildeo indireta ldquoparece relativizar um pouco esse princiacutepio
na medida em que pressionam psicologicamente a pessoa do devedor para que cumpra a
obrigaccedilatildeo com seu comportamentordquo
Complementa ainda que
A responsabilidade executiva parece assumir atualmente caraacuteter hiacutebrido comportando coerccedilatildeo pessoal e sujeiccedilatildeo patrimonial
i) a coerccedilatildeo pessoal incide sobre a vontade do devedor admitindo o uso de medidas coercitivas de execuccedilatildeo indireta para forccedilaacute-lo a cumprir a obrigaccedilatildeo com seu proacuteprio comportamento (ex arts 139 rv 523 sect 1ordm 536 sect 1ordm e 538 sect 3ordm todos do CPC)
ii) descumprida a obrigaccedilatildeo e natildeo sendo possiacuteveladequado o uso de teacutecnica de coerccedilatildeo pessoal tem-se a sujeiccedilatildeo patrimonial que recairaacute sobre os bens do devedor ou de terceiro responsaacutevel - que responderatildeo pela proacutepria prestaccedilatildeo in natura (ex dar coisa ou entregar quantia) ou por perdas e danos24
Dessa forma o referido princiacutepio natildeo tem aplicaccedilatildeo absoluta em razatildeo do principio da
efetividade a qual estimula o uso dos meios de coerccedilatildeo indireta para garantir o cumprimento
da obrigaccedilatildeo pelo devedor
O princiacutepio da primazia da tutela especifica (ou princiacutepio do resultado) assevera que
ldquoA execuccedilatildeo deve ser especiacutefica propiciar ao credor a satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo tal qual
houvesse o cumprimento espontacircneo da prestaccedilatildeo pelo devedorrdquo 25
O CPC de 2015 absorveu todos os avanccedilos legislativos a cerca do mote O caput do
art 497 assegura que na accedilatildeo que tenha por objeto a prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer o
juiz se procedente o pedido concederaacute a tutela especiacutefica ou determinaraacute providecircncias que
assegurem a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico equivalente O art 499 o
complementa a obrigaccedilatildeo somente seraacute convertida em perdas e danos se o autor o requerer
ou se impossiacutevel agrave tutela especiacutefica ou a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico
equivalente
O princiacutepio do contraditoacuterio eacute garantido pela constituiccedilatildeo federal e compreende o
direito de ser ouvido o direito de acompanhar os atos processuais o direito de produzir
provas participar da sua produccedilatildeo manifestar-se sobre a prova produzida e obter do juiz a
23 Ibid p 69-70 24 Ibid p 70 25 Ibid p 71
14
respectiva valoraccedilatildeo o direito de ser informado regularmente dos atos praticados no processo
o direito agrave motivaccedilatildeo das decisotildees o direito de impugnar as decisotildees 26
O contraditoacuterio tem aplicaccedilatildeo em todo processo judicial sendo aplicaacutevel tambeacutem na
execuccedilatildeo No entanto o contraditoacuterio na execuccedilatildeo natildeo ocorre com a mesma intensidade que
no processo ou na fase de conhecimento eacute o que assevera Didier et al 27
O contraditoacuterio no procedimento executivo no aspecto do direito de defesa assegurado agrave parte demandada eacute eventual porquanto depende da provocaccedilatildeo do executado que natildeo eacute chamado ajuiacutezo para defender-se mas sim para cumprir a obrigaccedilatildeo O procedimento executivo adota a teacutecnica monitoacuteria que consiste basicamente na inversatildeo do ocircnus de provocar o contraditoacuterio o reacuteu em vez de citado para manifestar-se sobre a pretensatildeo do autor eacute convocado para cumprir uma determinada obrigaccedilatildeo
Logo haacute o contraditoacuterio no procedimento executivo porem eacute eventual quanto agrave defesa
do executado
Ademais o princiacutepio da menor onerosidade eacute consagrado pelo art 805 do CPC e
dispotildee que ldquoQuando por vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz
mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o executadordquo O referido princiacutepio tem o
escopo de impedir o abuso do direito pelo exequente
O principio da menor onerosidade auxilia o juiz na escolha de um meio executivo
adequado e necessaacuterio que satisfaccedila a prestaccedilatildeo exigida pelo credor Nesse sentido eacute o
entendimento do professor Fredie Didier et al 28
O resultado a ser alcanccedilado eacute aquele estabelecido pelo direito material A maneira de se chegar ateacute esse resultado eacute que deve ser a menos onerosa possiacutevel para o executado Isso significa que a opccedilatildeo pelo meio menos gravoso pressupotildee que os diversos meios considerados sejam igualmente eficazes Assim havendo vaacuterios meios executivos aptos agrave tutela adequada e efetiva do direito de creacutedito escolhe-se a via menos onerosa ao executado
O princiacutepio visa impedir a execuccedilatildeo desnecessariamente onerosa ao executado ou seja a execuccedilatildeo abusiva Em vez de enumerar situaccedilotildees em que a opccedilatildeo mais gravosa revelar-se-ia injusta o legislador valeu-se corretamente de uma claacuteusula geral para reputar abusivo qualquer comportamento do credor que pretender valer-se de meio executivo mais oneroso do que outro igualmente idocircneo agrave satisfaccedilatildeo do seu creacutedito
26 Ibid p 76 27 Ibid p 78 28 Ibid p 79-80
15 O princiacutepio da cooperaccedilatildeo tem como base os princiacutepios do devido processo legal da
boa-feacute processual e do contraditoacuterio O dito princiacutepio avigora a eacutetica processual com o
aprimoramento do diaacutelogo entre as partes reciprocamente e com o oacutergatildeo jurisdicional Eacute o
que preconiza o art 6ordm do CPC Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para
que se obtenha em tempo razoaacutevel decisatildeo de meacuterito justa e efetiva
No procedimento executivo o princiacutepio da cooperaccedilatildeo incide de diversas formas
disciplina Didier et al29 que na execuccedilatildeo
O executado tem o dever de indicar bens agrave penhora (art 774 V CPC) Natildeo encontrados bens penhoraacuteveis e natildeo havendo indicaccedilatildeo de qualquer um deles pelo exequente cabe ao executado declarar quais satildeo seus bens penhoraacuteveis sob pena de se sujeitar a uma sanccedilatildeo pecuniaacuteria compulsoacuteria
Tambeacutem eacute manifestaccedilatildeo do princiacutepio da cooperaccedilatildeo a exigecircncia de que o executado que pretende impugnar o valor da execuccedilatildeo apresente de logo o valor que reputa devido (art 525 sect 4ordm CPC) Seria comportamento natildeo-cooperativo afirmar que a cobranccedila eacute excessiva sem simultaneamente dizer qual eacute o valor correto
Demais disso aplicam-se agrave execuccedilatildeo os deveres que decorrem do princiacutepio da cooperaccedilatildeo e que satildeo imputados ao oacutergatildeo jurisdicional () Assim por exemplo deve o juiz advertir ao executado antes de puni-lo de que seu ato pode vir a caracterizar-se como atentatoacuterio agrave dignidade da jurisdiccedilatildeo ( art 772 II CPC) perceba que se trata de uma conduta compatiacutevel com o dever de prevenccedilatildeo O oacutergatildeo jurisdicional somente pode conhecer da prescriccedilatildeo ex officio dando a oportunidade de o exequente manifestar-se conforme impotildee o dever de consulta ( cf arts 10 487 paraacutegrafo uacutenico e 921 sect 5ordm CPC)
O princiacutepio ou postulado30 da proporcionalidade tem aplicaccedilatildeo muito relevante na
execuccedilatildeo O art 8 do CPC assegura que o oacutergatildeo jurisdicional tem o dever de observar a
proporcionalidade e a razoabilidade ao aplicar o ordenamento juriacutedico inclusive no
procedimento executivo
Ademais o art 805 do CPC eacute categoacuterico ao disciplinar que ldquoArt 805 Quando por
vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo
menos gravoso para o executadordquo O referido artigo jaacute se trata de uma concretizaccedilatildeo da
proporcionalidade
29 Ibid p 82 30 Segundo Fredie Didier et al haacute uma discussatildeo doutrinaacuteria sobre a proporcionalidade Parte da
doutrina acredita que a proporcionalidade eacute um princiacutepio e outra parte acredita que eacute um postulado normativo
16 O principio da adequaccedilatildeo pode ser vislumbrado em dois momentos do Direito
Processual ldquoa) no legislativo como orientador da confecccedilatildeo das leis b) no jurisdicional
autorizando ao juiz diante do caso concreto adaptar procedimento agraves suas peculiaridadesrdquo 31
Para Luceacutelia de Sena Alves e Tiago Retes32
Isso quer dizer que no momento legislativo o devido processo deve ser observado pelo legislador para a confecccedilatildeo das normas de direito processual que iratildeo servir de instrumento efetivo de concretizaccedilatildeo do direito substancial a ser tutelado atendendo a todas as suas finalidades sob pena de falecircncia do proacuteprio direito No momento jurisdicional da mesma forma a via processual escolhida pelo autor tambeacutem deve estar sujeita a este princiacutepio para que natildeo sofra as mesmas consequecircncias da sua inobservacircncia
O ordenamento juriacutedico deve ser aplicado por meio da teacutecnica processual adequada
evitando dessa forma uma tutela ineficaz
Por fim o princiacutepio do autorregramento da vontade na execuccedilatildeo tem o objetivo de
ldquo() preservar um espaccedilo processual para o exerciacutecio da liberdade e da vontade em que
sejam permitidas negociaccedilotildees que envolvam as partes ndash e tambeacutem o juizrdquo33 Didier et al34
assevera que
A rigor o legislador estabelece um regime juriacutedico de autorregramento da vontade processual identificando-se algumas manifestaccedilotildees relevantes para a execuccedilatildeo Na verdade pode-se dizer que poucos satildeo os ambientes mais propiacutecios do que a execuccedilatildeo para a negociaccedilatildeo sobre o processo Todos os institutos e normas processuais relativos agrave execuccedilatildeo devem ser repensados a partir da premissa de que o CPC permite uma ampla margem de liberdade de negociaccedilatildeo sobre o processo (art 190 CPC)
O autorregramento da vontade pode ser vislumbrando na previsatildeo de negoacutecios tiacutepicos
em sede de execuccedilatildeo como por exemplo no acordo das partes sobre o valor do bem que
dispensa a avaliaccedilatildeo disposto no inciso I do art 871 CPC Ademais dentro dos limites do art
190 do CPC eacute possiacutevel na execuccedilatildeo a atribuiccedilatildeo da negociaccedilatildeo atiacutepica aos sujeitos 31 ALVES Luceacutelia de Sena Alves RETES Tiago O poder geral de efetivaccedilatildeo das decisotildees judiciais e
proporcionalidade uma anaacutelise criacutetica acerca do art 139 IV do Novo Coacutedigo de Processo Civil Disponiacutevel em lthttpswwwacademiaedu31752652O_poder_geral_de_efetivaC3A7C3A3o_das_decisC3B5es_judiciais_e_a_proporcionalidade_uma_anC3A1lise_crC3ADtica_acerca_do_art_139_IV_do_Novo_CC3B3digo_de_Processo_Civil gt Acesso em 25 de julho de 2018
32 Ibid natildeo paginado 33 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 85 34 Ibid p 85
17
processuais permitindo que sejam feitas mudanccedilas nos procedimentos e nas situaccedilotildees
juriacutedicas processuais ldquoSatildeo exemplos de negoacutecios processuais atiacutepicos na execuccedilatildeo pacto de
penhorabilidade acordo de ampliaccedilatildeo de prazos das partes de qualquer natureza acordo de
rateio de despesas processuais ()rdquo35
24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO
Sempre houve diversos questionamentos quanto agrave eficaacutecia do Direito processual Civil
e se o mesmo era meio apto a assegurar a tutela jurisdicional dos direitos dos cidadatildeos O
processo de execuccedilatildeo eacute o setor que sofre mais criacuteticas quanto a sua ineficiecircncia afinal a
execuccedilatildeo civil sempre foi o ldquocalcanhar de Aquilesrdquo do sistema processual pela praxe do
ldquoganhou (no processo de conhecimento) mas natildeo levou (na fase de cumprimento ou
execuccedilatildeo)rdquo 36
Essa dificuldade de se efetivar a tutela satisfastiva natildeo se resume a um problema de
mera teacutecnica processual tiacutepico de determinado ordenamento mas representa uma prova de
fogo da capacidade dos instrumentos jurisdicionais O autor Leonardo Greco37 no ano de
2005 atribuiu esse fato as seguintes causas o excesso de processos o custo e a morosidade da
justiccedila a inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios a ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais
um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico e a progressiva volatizaccedilatildeo dos bens
Quanto ao excesso de processos o referido autor aduz que ldquonos grandes centros o
crescimento da maacutequina judiciaacuteria natildeo acompanhou a expansatildeo do nuacutemero de litiacutegiosrdquo 38
O custo e morosidade da justiccedila prejudicam a tutela satisfativa posto que
ldquojaacute desfalcado pelo inadimplemento do devedor o credor ainda tem de arcar com o adiantamento das despesas do processo de execuccedilatildeo e de eventual liquidaccedilatildeo vendo arrastar-se a marcha dos atos executoacuterios facilmente retardada por atos procrastinatoacuterios do devedorrdquo 39
35 Ibid p 86 36 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca
para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018
37 GRECCO Leonardo A Crise do Processo de Execuccedilatildeo in Estudos de direito processual Leonardo Greco ndash Campos dos Goytacazes Ed Faculdade de Direito de Campos 2005 p 7
38 Ibid p 7 39 Ibid p 7-8
18 A inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios contribui para a crise do processo de
execuccedilatildeo tendo em vista que
ldquoo juiz da execuccedilatildeo prisioneiro de ritos que o distanciam das partes e da realidade da vida impulsiona sem qualquer apetite a execuccedilatildeo conduzindo-a ao sabor dos ventos das provocaccedilotildees impacientes do credor e das costumeiras procrastinaccedilotildees do devedorrdquo 40
Jaacute ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais atrapalha a efetivaccedilatildeo da tutela satisfativa ldquoo
devedor natildeo colabora com a execuccedilatildeo e os meios de pressatildeo que a lei estabelece natildeo satildeo
suficientes para intimidaacute-lordquo 41
Com um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico
O espiacuterito empresarial e a sociedade de consumo estimulam o endividamento das pessoas e o inadimplemento das obrigaccedilotildees pelo devedor deixou de ser vexatoacuterio e reprovaacutevel o que multiplica as accedilotildees de cobranccedila e execuccedilotildees atraveacutes das quais o sujeito passivo ainda usufrui vantagens agraves custas do credor 42
Por fim Leonardo Greco elenca a volatizaccedilatildeo dos bens como o uacuteltimo fator que
macula o processo executo tendo em vista que
ldquomudou inteiramente o perfil patrimonial das pessoas antes concentrado em bens de raiz e agora tendencialmente dirigido a investimentos em tiacutetulos e valores facilmente negociaacuteveis o que dificulta a sua localizaccedilatildeo pelo credorrdquo 43
O Coacutedigo de Processo Civil de 1973 introduziu o sistema executivo ao ordenamento
juriacutedico paacutetrio e seguindo os valores liberais da eacutepoca com a proteccedilatildeo de esfera juriacutedica de
liberdade do cidadatildeo contra a possibilidade de arbiacutetrio do Estado e uso indevido do Poder
jurisdicional outorgou o miacutenimo de poder ao juiz Seguindo as regras do CPC de 73 o
devedor soacute poderia ter sua esfera juriacutedica invadida atraveacutes de meios de execuccedilatildeo instituiacutedos
previamente em lei
Diante de tantos obstaacuteculos para se efetivar a tutela satisfativa a execuccedilatildeo estava
fadada ao fracasso o que frustrava a expectativa do jurisdicionado a uma prestaccedilatildeo da tutela
jurisdicional ceacutelere e efetiva Insatisfeitos com o cenaacuterio que se encontrava a atividade
40 Ibid p 8 41 Ibid p8 42 Ibid p 8 43 Ibid p8
19
executiva legisladores e operadores do direito natildeo mediram esforccedilos para promover uma
evoluccedilatildeo significativa buscando mais eficiecircncia e celeridade ao procedimento executoacuterio
Dessa forma no final de 1994 foi introduzido no coacutedigo de processo agrave flexibilizaccedilatildeo
dos poderes executoacuterios do juiz ldquopara que ele pudesse prestar uma tutela efetiva aos direitos
ficando autorizado a determinar a modalidade de execuccedilatildeo adequada a cada hipoacutetese nas
obrigaccedilotildees de fazer e natildeo fazer (art 461 sect5ordm do CPC de 1973)rdquo No ano de 2002 a referida
medida foi estendida para as obrigaccedilotildees de entregar coisa (art 461-A caput e sect3ordm do CPC de
1973)
Com fundamento nos artigos 461 e 461-A em 2005 a Lei nordm 11 23205 unificou o
processo de conhecimento e o processo de execuccedilatildeo de sentenccedila Nesse sentido Maacuterio
Henrique Cavalcanti Gil Rodrigues44 aduz que
A Lei 112322005 reuniu de forma definitiva os processos de conhecimento e de execuccedilatildeo em um uacutenico processo composto por um sistema bifaacutesico Assim passa a existir uma fase inicial (de reconhecimento) e uma fase posterior (de cumprimento de sentenccedila de efetivaccedilatildeo da decisatildeo definitiva) sem contar com a eventual fase intermediaacuteria de liquidaccedilatildeo (RODRIGUES 2010 p 38)
Ademais as alteraccedilotildees realizadas no CPC de 73 inseriu a atipicidade dos meios
executivos nas obrigaccedilotildees de fazer natildeo fazer e dar coisa certa entretanto exercendo papel
subsidiaacuterio aos meios tiacutepicos
Quanto agraves obrigaccedilotildees de pagar quantia havia apenas a possibilidade de se valer da
incidecircncia de multa do art 475-J do CPC de 73 ndash implementada mediante reforma perpetrada
pela Lei nordm 11232 de 2005 em atendimento a doutrina processualista preocupada com a
efetividade das decisotildees ndash e de atos executivos como a penhora de bens e dinheiro
Ainda que a execuccedilatildeo tenha avanccedilado com a inserccedilatildeo das leis posteriores a 1994 no
CPC de 1973 a mesma continuava insuficiente tendo em vista que a burocracia e lentidatildeo
dos atos executivos davam brechas para que o devedor escondesse seu patrimocircnio penhoraacutevel
tornando carente de efetividade e celeridade agrave execuccedilatildeo
44 RODRIGUES Maacuterio Henrique Cavalcanti Gil A evoluccedilatildeo da execuccedilatildeo de sentenccedila no direito
processual civil e o novo regime juriacutedico das sentenccedilas apoacutes a reforma implementada pela Lei 112322005 Revista do Tribunal Regional Federal da 1ordf Regiatildeo v 22 n 2 fev 2010 p 38
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25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO
A tutela juridiscional eacute um direito fundamental previsto no art 5ordm inciso XXXV da
Carta Magna ldquo() a lei natildeo excluiraacute da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio lesatildeo ou ameaccedila a
direitordquo
Na visatildeo claacutessica o direito de accedilatildeo era efetivado com a prolaccedilatildeo de uma sentenccedila de
meacuterito posiccedilatildeo adotada por grande parte dos processualistas seguidores da doutrina de
Liebman Todavia esse conceito se mostra defasado tendo em vista que o direito de acesso agrave
justiccedila natildeo eacute apenas uma garantia formal de bater as portas do judiciaacuterio mas a garantia de
acesso agrave ordem juriacutedica justa adequada e eficaz45
Acreditar que uma sentenccedila de meacuterito favoraacutevel eacute tutela jurisdicional suficiente para
satisfazer o que se busca com o ajuizamento da accedilatildeo eacute uma visatildeo distorcida da atividade
satisfativa ldquoSob o ponto de vista do direito material a condenaccedilatildeo por si soacute eacute incapaz de
prestar a tutela do direitordquo46
Nessa oacutetica o direito fundamental agrave tutela executiva exige um sistema de tutela
jurisdicional ldquocapaz de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor
de tutela executivardquo47 Dessa forma entende-se que
ldquo() a) a interpretaccedilatildeo das normas que regulamentam a tutela executiva tem de ser feita no sentido de extrair a maior efetividade possiacutevel b) o juiz tem o poder-dever de deixar de aplicar uma norma que imponha uma restriccedilatildeo a um meio executivo sempre que essa restriccedilatildeo natildeo se justificar como forma de proteccedilatildeo a outro direito fundamental c) o juiz tem o poder-dever de adotar os meios executivos que se revelem necessaacuterios agrave prestaccedilatildeo integral de tutela executivardquo48
Egrave imperioso compreender que o direito fundamental agrave tutela executiva ratificado
pelo CPC eacute essencial para dirimir diversos litiacutegios oriundos do procedimento executivo
45 FERREIRA Gabriela Macedo Poder geral de efetivaccedilatildeo em defesa da constitucionalidade da
teacutecnica de execuccedilatildeo dos direitos do art 139 IV do Coacutedigo de Processo Civil Revista Jus Navigandi ISSN 1518-4862 Teresina ano 22 n 5178 4 set 2017 Disponiacutevel em lthttpsjuscombrartigos60190gt Acesso em 11 set 2018
46 Ibid natildeo paginado 47 DIDIER JR Fredie et al apud GUERRA Marcelo lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do credor
na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 48 Ibid p 102-104
21
ldquoprincipalmente aqueles relacionados agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo49
Fredie Didier et al50 cita como exemplo as hipoacuteteses de impenhorabilidade
A impenhorabilidade de certos bens eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa
Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais
Por esta razatildeo o legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do
CPC fazendo um preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses das partes envolvidas
optando pela mitigaccedilatildeo do direito do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado
Quando o oacutergatildeo jurisdicional verificar que a aplicaccedilatildeo das regras de
impenhorabilidade eacute desproporcional para o caso concreto deve afastaacute-la e construir a
soluccedilatildeo adequada para o referido caso Didier et al51 traz um exemplo esclarecedor em sua
obra
O bem imoacutevel que serve de moradia da famiacutelia eacute relativamente impenhoraacutevel Objetiva-se com essa restriccedilatildeo proteger o direito fundamental agrave moradia conteuacutedo do direito agrave proteccedilatildeo da dignidade Imagine-se um imoacutevel de altiacutessimo valor Imagine-se agora um creacutedito que corresponda a 40 do valor do imoacutevel A venda judicial do imoacutevel no caso permitiria natildeo soacute satisfazer o direito do credor como ainda garantir ao executado com a sobra a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel que lhe preserve a dignidade A opccedilatildeo pela interpretaccedilatildeo literal da regra que veda a penhora protegeria exclusivamente o direito do executado de maneira desnecessaacuteria porque a relaccedilatildeo valor executadovalor do bem permitiria a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel apoacutes a entrega do dinheiro ao credor Seria pois interpretaccedilatildeo em desconformidade com os preceitos da contemporacircnea hermenecircutica constitucional que preconiza a necessidade de nos casos de choque entre direitos fundamentais dar a interpretaccedilatildeo que mais adequadamente proteja a ambos
A execuccedilatildeo civil integra o direito fundamental agrave tutela jurisdicional disciplinando
que ldquoos dispositivos devem ser interpretados de modo que se garanta a maior efetividade
49 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66 50 Ibid p 66 51 Ibid p 67
22
possiacutevel agrave execuccedilatildeo desde que respeitados outros direitos fundamentaisrdquo52 Podendo ser
afastada desde que proporcional qualquer obstaacuteculo irrazoaacutevel agrave efetivaccedilatildeo desse direito
52 FERREIRA Gabriela Macedo apud MACEDO Lucas Buril de As eficaacutecias das decisotildees judiciais e
o cumprimento de sentenccedila no CPC15 Novo CPC Doutrina selecionada v 5 Execuccedilatildeo Coordenador geral Fredie Didier Jr organizadores Lucas Buril de Macedo Ravi Peixoto Alexandre Freire ndash Salvador Jus Podivm 2015 p 360361
23
3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO
EXECUTADO
31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS
Como forma de controlar a atividade jurisdicional por muito tempo vigorou o
entendimento de que a execuccedilatildeo somente poderia ser realizada atraveacutes dos meios executivos
tipicamente previstos na legislaccedilatildeo Segundo Luiz Guilherme Marinoni53
O princiacutepio da tipicidade deseja significar que os meios de execuccedilatildeo devem estar previstos na lei e assim que a execuccedilatildeo natildeo pode ocorrer atraveacutes de formas executivas natildeo tipificadas O seu objetivo eacute de um lado impedir que meio executivo natildeo previsto em lei possa ser utilizado e de outro garantir o jurisdicionado contra a possibilidade de arbiacutetrio judicial na fixaccedilatildeo da modalidade executiva Se o jurisdicionado sabe em razatildeo de previsatildeo legal que a sua esfera juriacutedica somente poderaacute ser invadida atraveacutes de determinadas modalidades executivas confere-se a ele a possibilidade de antever a reaccedilatildeo ao seu inadimplemento bem como a garantia de que a jurisdiccedilatildeo natildeo determinaraacute ou permitiraacute a utilizaccedilatildeo de meio executivo diverso daqueles previstos
Dessa forma o princiacutepio da tipicidade disciplina que o oacutergatildeo julgador ao proceder agrave
execuccedilatildeo estaacute limitado aos meios executivos previamente definidos em lei natildeo podendo se
valer de qualquer teacutecnica de efetivaccedilatildeo que natildeo se encaixasse nas hipoacuteteses taxativas da
legislaccedilatildeo
Entretanto o legislador natildeo tem como prever todas as peculiaridades dos direitos
dignos de tutela executiva e preordenar teacutecnicas executivas diversas para cada peculiaridade
Sob esse cenaacuterio o principio da tipicidade foi cedendo lugar ao principio da atipicidade dos
meios executivos
A ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do oacutergatildeo julgador estaacute cada vez mais presente
no ordenamento juriacutedico paacutetrio motivando um poder geral de efetivaccedilatildeo ldquoque permite ao
julgador valer-se dos meios executivos que considerar mais adequado ao caso concreto sejam
eles de coerccedilatildeo direta sejam de coerccedilatildeo indiretardquo 54
53 MARINONI Luiz Guilherme Teacutecnica processual e tutela dos direitos Satildeo Paulo Editora Revista
dos Tribunais 2004 p 212 nota 79 54 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 100
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Essa tendecircncia de ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do juiz natildeo eacute exclusividade do
ordenamento juriacutedico brasileiro segundo Fredie Didier et al55
Michelle Taruffo jaacute apontava que o direito americano diante da inefetividade dos meios executivos at law comeccedilou a autorizar o magistrado a tomar medidas executivas adequadas ao caso concreto Trata-se afirma o jurista italiano de aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo segundo o qual as regras processuais devem ser adaptadas agraves necessidades do direito material
Os meios executivos atiacutepicos derivam de trecircs enunciados normativos do Coacutedigo de
Processo Civil o art 139 IV o art 297 e o sect1ordm do art 536
O art 139 IV do CPC dispotildee que pertence ao juiz o poder-dever de ldquodeterminar
todas as medidas indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para
assegurar o cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto
prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo
Jaacute o art 297 do CPC cuida da tutela provisoacuteria e garante que ldquoo juiz poderaacute
determinar as medidas que considerar adequadas para a efetivaccedilatildeo da tutela provisoacuteriardquo
Podendo dessa forma a dita tutela ser efetivada atipicamente
Por fim o art 536 sect1ordm do CPC dispotildee que
Para atender ao disposto no caput o juiz poderaacute determinar entre outras medidas a imposiccedilatildeo de multa a busca e apreensatildeo a remoccedilatildeo de pessoas e coisas o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva podendo caso necessaacuterio requisitar o auxilio de forccedila policial
As supracitadas medidas executivas atiacutepicas satildeo entendidas pela doutrina como
claacuteusulas gerais processuais executivas56 Essas claacuteusulas gerais natildeo restringem a sua
aplicaccedilatildeo agraves teacutecnicas de coerccedilatildeo indireta satildeo autorizados tambeacutem o uso de meios de execuccedilatildeo
dieta e indireta
Ademais cumpre salientar que o art 139 IV CPC aplica-se a toda e qualquer
atividade executiva ldquoa) seja fundada em tiacutetulo executivo judicial (provisoacuteria ou definitiva)
55 DIDIER JR Fredie et al apud TARUFFO Michelle A atuaccedilatildeo executiva dos direitos perfis
comparatiacutesticos Revista de Processo Satildeo Paulo RT 1990 n 59 p 78 56 Segundo Fredie Didier et al claacuteusula geral eacute uma espeacutecie de texto normativo cujo antecedente
(hipoacutetese faacutetica) eacute composto por termos vagos e consequente (efeito juriacutedico) eacute indeterminado
25
seja fundada em tiacutetulo executivo extrajudicial b) seja para efetivar prestaccedilatildeo pecuniaacuteria seja
para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer ou dar coisa distinta de dinheirordquo57
Jaacute o art 297 do CPC garante que a tutela provisoacuteria possa ser efetivada tambeacutem
atipicamente ldquoSucede que a atipicidade da tutela provisoacuteria segue necessariamente a
atipicidade da tutela definitivardquo 58
Por fim o comando do sect 1 ordmdo art 536 se aplica
a) inicialmente agrave execuccedilatildeo de fazer e de natildeo fazer fundada em decisatildeo judicial (provisoacuteria ou definitiva) b) por forccedila do sect 3ordm do art 538 tambeacutem se aplica ao cumprimento de sentenccedila para entrega de coisa c) por forccedila do art 771 paraacutegrafo uacutenico o dispositivo tambeacutem se aplica agrave execuccedilatildeo para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer e entregar coisa distinta de dinheiro fundada em tiacutetulo extrajudicial
Claramente o art 139 IV eacute mais amplo do que o sect 1 ordm do art 536 estende-se por
disposiccedilatildeo expressa agrave execuccedilatildeo de pagar quantia Sendo uma grande novidade nas obrigaccedilotildees
que tem por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15
O art 139 IV do CPC apresentou uma novidade agrave atipicidade dos meios executivos
ao disciplinar que cabe ao juiz ldquodeterminar todas as medidas indutivas coercitivas
mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o cumprimento de ordem judicial
inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo
A inovaccedilatildeo estaacute na possibilidade de utilizar os meios atiacutepicos para assegurar o
cumprimento de decisotildees que versam sobre as obrigaccedilotildees pecuniaacuterias sendo admitida a
utilizaccedilatildeo de outros meios ateacute na execuccedilatildeo de titulo judicial de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria aleacutem da
multa de 10 (a que se refere o artigo 523 sect 1ordm do CPC) para forccedilar o devedor a cumprir a
obrigaccedilatildeo pecuniaacuteria
57 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 105 58 Ibid p 105
26
Dessa forma eacute possiacutevel afirmar que ldquoao lado da disciplina tiacutepica do art 523 e
seguintes () o novo CPC inova ao permitir que o sistema de teacutecnicas executivas atiacutepicas
sejam empregadas na execuccedilatildeo monetaacuteriardquo59 (ZARONI VITORELLI 2016 p 66)
Fernando da Fonseca Gajardoni60 denomina a dita medida como a ldquorevoluccedilatildeo
silenciosardquo da execuccedilatildeo por quantia certa posto que
() pelo fato de que a regra natildeo estar propriamente incrustrada nos capiacutetulo e livro atinentes ao cumprimento de sentenccedila e ao processo de execuccedilatildeo ndash o art 139 IV do Novo CPC parece trazer ao paiacutes algo bastante novo cuja aplicaccedilatildeo a depender do comportamento do Judiciaacuterio pode implicar em verdadeira revoluccedilatildeo (positiva ou negativa) na sistemaacutetica executiva ateacute entatildeo vigente
Claramente o dispositivo foi recebido com entusiasmo por parte da doutrina que
anteciparam em afirmar que o princiacutepio da atipicidade dos meios executivos no CPC2015
ldquo() assume a feiccedilatildeo de poder-dever geral conferido ao magistrado de determinar () todas
as medidas coercitivas sub-rogatoacuterias mandamentais e indutivas que entender necessaacuterias
para a tutela justa efetiva e em tempo razoaacutevelrdquo 61
Dessa forma lecionam Luiz Guilherme Marinoni Seacutergio Cruz Arenhart e Daniel
Mitidiero62 que
O juiz a partir do art 139 IV do CPC2015 natildeo estaacute mais adstrito apenas agrave sentenccedila condenatoacuteria ndash que fixa a obrigaccedilatildeo de pagar e daacute ensejo agrave abertura da execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo patrimonial ndash para a tutela de prestaccedilotildees pecuniaacuterias Pode impor essa prestaccedilatildeo por meio de ordem judicial acoplada ao aceno de emprego de medida de induccedilatildeo (coercitiva ou de pressatildeo positiva) ou de medida de sub-rogaccedilatildeo (MARINONI ARENHARDT MITIDIERO 2015 p 703)
Deste modo em razatildeo do art 139 IV do CPC tem-se entendido que o juiz nas
execuccedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria possui a faculdade de adotar qualquer
59 ZARONI Bruno Marzullo VITORELLI Edilson Reforma e efetividade da execuccedilatildeo no novo CPC
In PEIXOTO Ravi FREIRE Alexandre MENDES Aluiacutesio Gonccedilalves de Castro Execuccedilatildeo 2 ed rev e atual Salvador JusPodivm 2016 766 p (Coleccedilatildeo novo CPC doutrina selecionada v 5) p 66
60 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia 24082015 JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Acesso em 23082018
61 LIMA Rafael de Oliveira A atipicidade dos meios executivos no coacutedigo de processo civil brasileiro de 2015 Revista de Processo Jurisdiccedilatildeo e Efetividade da Justiccedila v 2 n 2 juldez 2016 p 11
62 MARINONI Luiz Guilherme ARENHART Seacutergio Cruz MITIDIERO Daniel Novo curso de processo civil tutela dos direitos mediante procedimento comum Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 v 2 p 703
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medida indutiva coercitiva mandamentais ou sub-rogatoacuterias para efetivar o creacutedito do
exequente natildeo se limitando as medidas tiacutepicas
Alguns doutrinadores se precipitaram ao afirmar que o dito dispositivo ldquo() autoriza o
juiz a utilizar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir ressalvando-se a prisatildeo
civil constitucionalmente limitada ao devedor de alimentosrdquo 63 Acreditam Jorge Bheron
Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa que o entusiasmo por parte da
doutrina abre margem para as mais variadas formas de compelir o devedor a cumprir com a
prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
ldquoE aiacute persistindo no mau vezo de fazer explicaccedilotildees em abstrato ignorando que o sentindo soacute se daacute na aplicaccedilatildeo (situaccedilatildeo concreta real ou fictiacutecia) as sugestatildeo satildeo as mais engenhosas suspensatildeo de CNH retenccedilatildeo de passaporte restriccedilatildeo de fim de semana cancelamento de cartotildees de creacutedito ndash para ficar apenas nestasrdquo 64
Ou seja podendo o juiz natildeo apenas substituir o devedor tomando seu patrimocircnio para
entregar ao credor na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia como tambeacutem poderaacute
pressionaacute-lo psicologicamente a adimplir por conta proacutepria a obrigaccedilatildeo
Ademais o Enunciado nordm 48 do ENFAM avalia expressamente a possibilidade de
imposiccedilatildeo de medidas coercitivas para a efetivaccedilatildeo da execuccedilatildeo pecuniaacuteria Conforme o dito
enunciado
ldquoO art 139 inciso IV traduz um poder geral de efetivaccedilatildeo permitindo a aplicaccedilatildeo de medidas atiacutepicas para garantir o cumprimento de qualquer ordem judicial inclusive no acircmbito do cumprimento de sentenccedila e no processo de execuccedilatildeo baseado em tiacutetulosrdquo
Dessa forma o artigo 139 IV do CPC permite uma gama ampla de interpretaccedilotildees por
parte da doutrina por ser uma claacuteusula geral encontrando limite apenas na imaginaccedilatildeo de
quem o analisa Nesse sentido eacute forccediloso orientar e delimitar o manejo desse artigo legal para
que se extraia seu sentido e alcance revelando assim sobre que situaccedilotildees ele incide de que
modo e o que permite
63 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
64 Ibid sem paginaccedilatildeo
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32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER
GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
O artigo 139 IV com a vigecircncia do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 abriu margem
para uma constelaccedilatildeo de decisotildees nas quais o dito dispositivo recebeu diversas interpretaccedilotildees
pelos operadores do direito
Sem duacutevidas por ser uma das pioneiras a decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara
Ciacutevel do Foro Regional de Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-
1320138260011 na data de 25 de agosto de 2016 gerou um enorme rebuliccedilo
Nessa accedilatildeo que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto
uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a
suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o
passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito
Segundo a magistrada o processo tramitava haacute anos sem que nenhum valor tenha sido
pago ao exequente aleacutem do devedor natildeo ter oferecido proposta de acordo e nem ter indicado
bens agrave penhora configurando uma completa desiacutedia com o processo
ldquoO caso tratado nos autos se insere dentre as hipoacuteteses em que eacute cabiacutevel a aplicaccedilatildeo do art 139 inciso IV do Coacutedigo de Processo Civil Isso porque o processo tramita desde 2013 sem que qualquer valor tenha sido pago ao exequente Todas as medidas executivas cabiacuteveis foram tomadas sendo que o executado natildeo paga a diacutevida natildeo indica bens agrave penhora natildeo faz proposta de acordo e sequer cumpre de forma adequada as ordens judiciais frustrando a execuccedilatildeo
Se o executado natildeo tem como solver a presente diacutevida tambeacutem natildeo recursos para viagens internacionais ou para manter um veiacuteculo ou mesmo manter um cartatildeo de creacutedito Se poreacutem mantiver tais atividades poderaacute quitar a diacutevida razatildeo pela qual a medida coercitiva poderaacute se mostrar efetiva
Assim como medida coercitiva objetivando a efetivaccedilatildeo da presente execuccedilatildeo defiro o pedido formulado pelo exequente e suspendo a Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo do executado M A S determinando ainda a apreensatildeo de seu passaporte ateacute o pagamento da presente diacutevida
()
Determino ainda o cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado ateacute o pagamento da presente diacutevida ()rdquo
Foi impetrado Habeas Corpus no Tribunal de Justiccedila do Estado de Satildeo Paulo a favor
do executado sob o fundamento que a coaccedilatildeo era ilegal e afetava o direito de locomoccedilatildeo
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garantido constitucionalmente Tendo sido concedida a liminar em decisatildeo que ora se
reproduz
Em que pese a nova sistemaacutetica trazida pelo art 139 IV do CPC2015 deve-se considerar que a base estrutural do ordenamento juriacutedico eacute a Constituiccedilatildeo Federal que em seu art 5ordm XV consagra o direito de ir e vir Ademais o art 8ordm do CPC2015 tambeacutem preceitua que ao aplicar o ordenamento juriacutedico o juiz natildeo atentaraacute apenas para a eficiecircncia do processo mas tambeacutem aos fins sociais e agraves exigecircncias do bem comum devendo ainda resguardar e promover a dignidade da pessoa humana observando a proporcionalidade a razoabilidade e a legalidade Por tais motivos concedo a liminar pleiteada65
Cabe destacar aqui o voto vencido da Desembargadora Maria Luacutecia Pizzotti no
julgamento do Habeas Corpus supracitado demonstrando que o debate sobre a abrangecircncia
do artigo 139 IV do CPC ocorre tanto na doutrina quanto no judiciaacuterio
O objetivo do novel dispositivo natildeo eacute impor penas ou restringir direitos natildeo sendo intenccedilatildeo do Judiciaacuterio suspender indefinidamente o direito de dirigir do executado ou sua liberdade de viajar mas sim impor uma restriccedilatildeo tatildeo gravosa caso ele natildeo cumpra a determinaccedilatildeo que escolha cumprir sua obrigaccedilatildeo e dar fim ao problema Em outras palavras mediante as medidas de coerccedilatildeo o Estado procura persuadir o inadimplente impondo-lhe situaccedilotildees tatildeo onerosas e inconvenientes que em algum momento seja para ele mais vantajoso cumprir do que permanecer no inadimplemento
Ao fazecirc-lo o Novo Coacutedigo de Processo Civil rompe com as criacuteticas da ineficiecircncia das execuccedilotildees Natildeo se cogita deferir medidas restritivas agravequeles que demonstram a incapacidade absoluta de solver o deacutebito apenas agravequeles que reconhecidamente se valem de artimanhas e subterfuacutegios para evitar a satisfaccedilatildeo das diacutevidas ldquopreferindordquo outras despesas mais lsquonobresrsquo agindo em nome de terceiros e fazendo escaacuternio dos credores e do proacuteprio Poder Judiciaacuterio (hellip)
Para tanto memoraacutevel a noccedilatildeo de que a medida em comento tem caraacuteter excepcional e encontra limites no plano da proporcionalidade como sustenta o ilustrado Magistrado paulista Fernando da Fonseca Gajardoni Professor Faculdade de Direito de Ribeiratildeo Preto da USP (in httpswwwjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 acesso em 091216 agraves 11h20min) E para anaacutelise da proporcionalidade a ponderaccedilatildeo deve observar os trecircs passos apontados pela doutrina a necessidade a adequaccedilatildeo e a proporcionalidade em sentido estrito
65 TJSP - Habeas Corpus Processo nordm 2183713-8520168260000 30ordf Cacircmara Direito Privado relator
Des Marcos Ramos j 290317
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Ademais no entendimento de Jorge Amaury Maia Nunes e Guilherme Pupe de
Noacutebrega66 essa decisatildeo releva os perigos trazidos pelo art 139 IV do CPC ao confrontar
direitos constitucionalmente garantidos
De nossa parte entendemos que a liberdade de locomoccedilatildeo inserta no inciso XV do artigo 5ordm que abrange o direito de deixar o territoacuterio nacional sofre embaraccedilo indevido pela apreensatildeo de passaporte ou pela suspensatildeo da carteira nacional de habilitaccedilatildeo
()
Agrave luz da exposiccedilatildeo feita acima e em anaacutelise primeva sustentamos que o artigo 139 IV do CPC de 2015 estaacute a merecer declaraccedilatildeo de inconstitucionalidade sem reduccedilatildeo de texto para o fim de rechaccedilar a apreensatildeo de passaporte a suspensatildeo do direito de dirigir e a vedaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo em concurso ou em licitaccedilatildeo puacuteblicos como medidas passiacuteveis de serem adotadas pelo juiz sob pena de vulneraccedilatildeo aos artigos 1ordm IV 5ordm XV e LIV 37 I 173 sect 3ordm III e 175 todos da Constituiccedilatildeo
Apesar de ter sofrido duras criacuteticas a decisatildeo do processo de nordm 4001386-
1320138260011 serviu de inspiraccedilatildeo para tantas outras decisotildees no mesmo sentido
Foi o caso da decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de Satildeo
Vicente em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 0020724-2620088260590 na data de 21 de
junho de 2017
A supracitada execuccedilatildeo se arrastava por nove (09) anos sem que o devedor tenha
esboccedilado qualquer intenccedilatildeo de pagar a diacutevida O credor requereu a suspensatildeo da Carteira
Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado apreensatildeo do passaporte e cancelamento dos
cartotildees de creacutedito
O magistrado com embasamento no artigo 139 IV do CPC deferiu parcialmente o
pedido sob o fundamento de que a apreensatildeo de passaporte e CNH natildeo viola o direito de ir e
vir do devedor Entretanto o juiz indeferiu o pedido de cancelamento do cartatildeo de creacutedito por
acreditar que a suspensatildeo poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado tendo em
vista que atualmente as pessoas utilizam o referido cartatildeo para pagamento das despesas
diaacuterias
66 NOBREacuteGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139
IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018
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Eacute evidente que as medidas atiacutepicas de coerccedilatildeo devem ser utilizadas com cautela sempre respeitando a dignidade da pessoa do executado Natildeo se vislumbra contudo que as medidas aqui eleitas sejam capazes de vulnerar os Direitos Fundamentais do indiviacuteduo A uma porque natildeo se trata de restriccedilatildeo ao direito de ir e vir do executado que continua no gozo de plena liberdade de locomoccedilatildeo a duas porque a conduccedilatildeo de veiacuteculo automotor eacute mera comodidade da vida moderna natildeo se tratando de direito absoluto
Com mais razatildeo ainda se admite a suspensatildeo do Passaporte do executado que se natildeo paga a diacutevida da execuccedilatildeo natildeo deve ter o direito de fazer viagem internacional
Tem-se aqui verdadeiro exerciacutecio de ponderaccedilatildeo de interesses juriacutedicos de um lado jaz o direito de creacutedito do exequente que deriva do direito de propriedade e por isso mesmo tem envergadura constitucional de outro giro tem-se o direito do executado agrave autorizaccedilatildeo do Estado para conduzir veiacuteculo automotor e realizar viagens internacionais que natildeo se mostram essenciais agrave dignidade da pessoa humana Natildeo haacute duacutevidas pois de que eacute este uacuteltimo que deve sucumbir
O pedido fica indeferido apenas no tocante agrave suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado Eacute que ao contraacuterio da CNH e do passaporte que trazem consigo certa presunccedilatildeo de riqueza natildeo se pode concluir que o uso de cartatildeo de creacutedito eacute feito por luxo ou simples conveniecircncia
Como eacute cediccedilo os cartotildees de creacutedito oferecem ao seu titular creacutedito raacutepido e rotativo para o pagamento de despesas diaacuterias e certamente exercem funccedilatildeo essencial agravequeles que se encontram em situaccedilatildeo financeira precaacuteria
A suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado portanto se revela medida desproporcional e que inclusive poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado
Pelo exposto defiro em parte o pedido formulado pelo exequente e DETERMINO a suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo e bem como a suspensatildeo da validade (cancelamento temporaacuterio) no sistema SINPA de eventuais passaportes vaacutelidos em nome do executado
Dessa forma o artigo 139 IV do CPC revolucionou completamente a execuccedilatildeo de
obrigaccedilatildeo de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria ao permitir a utilizaccedilatildeo do uso dos meios executivos
atiacutepicos para compelir o executado a satisfazer o creacutedito do exequente
33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE
EFETIVACcedilAtildeO
Era inevitaacutevel que o artigo 139 IV do CPC gerasse todo tipo de reaccedilatildeo entre os
doutrinadores do processo civil e ateacute mesmo de outros ramos do direito devido a sua
capacidade de realizar uma completa inovaccedilatildeo na forma de se executar as obrigaccedilotildees de pagar
quantia Alguns o aplaudiram visualizando nele ldquouma luz no fim do tuacutenelrdquo outros o
criticaram vislumbrando as arbitrariedades que poderiam ser praticadas com embasamento no
referido dispositivo
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As decisotildees suscitadas em linhas preteacuteritas auxiliaram para fervilhar ainda mais o
debate sobre o tema tendo em vista que por um lado poderia aumentar a efetividade das
execuccedilotildees por quantia no entanto por outro surgiam questionamentos a cerca da sua
constitucionalidade
A doutrina parece que demoraraacute a se pacificar sobre o tema Segundo alguns
doutrinadores seraacute inconstitucional toda restriccedilatildeo que recaia sobre a pessoa do devedor e natildeo
exclusivamente sobre o seu patrimocircnio Jaacute para outros o dispositivo eacute constitucional e o meio
mais eficaz para se resolver o problema da efetivaccedilatildeo das execuccedilotildees de pagar quantia ldquoA
discussatildeo se daacute especialmente no que diz respeito aacutes medidas de suspensatildeo de CNH
apreensatildeo de passaporte e bloqueio de cartotildees de creacutedito do devedorrdquo 67
O professor Thiago Rodovalho analisou detalhadamente a decisatildeo de nordm 4001386-
1320138260011 em seu artigo ldquoO necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na
concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivosrdquo 68 Quanto agrave suspensatildeo da CNH o autor
acredita que tal medida natildeo viola qualquer direito fundamental do devedor posto que ldquodirigir
veiacuteculos automotores eacute direito do cidadatildeo mas natildeo se confunde com os direitos fundamentais
e social de ir-e-vir e ao transporterdquo 69 O professor eacute categoacuterico ao afirmar que
Com relaccedilatildeo agrave suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (suspensatildeo do direito de dirigir restriccedilatildeo de direitos) natildeo nos parece haver qualquer violaccedilatildeo a direito fundamental ou social nem a direito da personalidade ou colocaccedilatildeo do devedor em situaccedilatildeo desproporcionalmente detrimentosa exceccedilatildeo feita aos que usam o veiacuteculo como instrumento de trabalho atraindo a hipoacutetese do NCPC art 833 inc V
()
Outrossim natildeo o consideramos como direito da personalidade Os direitos da personalidade satildeo os valores fundamentais que compotildeem o proacuteprio ser justamente por isso intransmissiacuteveis e irrenunciaacuteveis natildeo podendo o seu exerciacutecio sofrer limitaccedilatildeo voluntaacuteria (CC art 11) Por mais que vivamos num paiacutes que tanto valoriza o carro e que muitas pessoas de fato se compreendam em razatildeo e em funccedilatildeo do carro que dirijam este natildeo nos parece ser um direito que verdadeiramente componha a personalidade do indiviacuteduo70
67 DONTOS Sofia Poderes executoacuterios do juiz que diz a doutrina sobre o art 139 inc IV do CPC
Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigospoderes-executorios-do-juiz-que-diz-a-doutrina-sobre-art-139-inc-iv-do-cpc-23052018 gt Publicado em 23052018 Acesso em 01082018
68 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018
69 Ibid sem paginaccedilatildeo 70 Ibid sem paginaccedilatildeo
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Quanto ao cancelamento dos cartotildees de credito do devedor o professor Thiago
Rodovalho tambeacutem acredita que natildeo haacute qualquer violaccedilatildeo ao direito fundamental social ou
da personalidade do devedor e acrescenta que
Tanto assim o eacute que ser titular de um cartatildeo de creacutedito pressupotildee ter creacutedito o que eacute analisado e concedido por instituiccedilotildees financeiras mais do que isso se porventura passando por dificuldades financeiras a pessoa deixa de honrar com pagamentos a mesma instituiccedilatildeo financeira concedente do cartatildeo de creacutedito pode sponte propria cancelaacute-lo ou recusar-lhe a concessatildeo Ora parece-me contraditoacuterio que instituiccedilotildees financeiras para sua proteccedilatildeo patrimonial possam ferir esse suposto ldquodireito fundamentalrdquo ou esse suposto ldquodireito da personalidaderdquo mas natildeo possa o Poder Judiciaacuterio igualmente fazecirc-lo contra aquele devedor moroso que instado ao pagamento e frustradas todas as tentativas de constriccedilatildeo patrimonial leva vida luxuosa valendo-se de cartotildees de creacutedito que prescindem de dinheiro em conta eacute dizer podem justamente funcionar como forma de ocultar renda e patrimocircnio71
O autor considera a apreensatildeo de passaporte um tema mais polecircmico e que merece
maior reflexatildeo No entanto crecirc que eacute possiacutevel a apreensatildeo de passaporte sem violar os
direitos fundamentais do devedor por se tratar de um direito de ir e vir de amplitude especial
Agrave primeira vista a possibilidade de apreensatildeo do passaporte tambeacutem nos parece possiacutevel pois tambeacutem se trata de um direito de ir e vir de amplitude especial Assim o eacute pois salvo situaccedilotildees especiais (refugiados p ex) haacute a necessidade de demonstrar condiccedilotildees financeiras de estadia e retorno para ser admitido no paiacutes de destino Ou seja pressupotildee uma condiccedilatildeo financeira que o devedor justamente diz natildeo possuir Sem embargo dessa consideraccedilatildeo esse ainda eacute um ponto que merece uma reflexatildeo mais acurada sendo essa apenas uma primeira impressatildeo72
Outros autores escreveram sobre o tema como eacute o caso do processualista Luiz
Dellore73 que tambeacutem defende que as medidas atiacutepicas como restriccedilatildeo ao direito de dirigir
apreensatildeo de passaporte e cancelamento de cartotildees de creacutedito satildeo permitidas e natildeo violam em
regra os direitos fundamentais do devedor
De minha parte creio que efetivamente haacute inovaccedilatildeo no at 139 IV do NCPC (e natildeo mera repeticcedilatildeo do que jaacute havia no Coacutedigo anterior) que tem o condatildeo de trazer mais efetividade ao processo executivo no Brasil ndash que por deacutecadas centrou sua atenccedilatildeo na defesa do executado (vide a grande quantidade de impenhorabilidades) sem dar maior atenccedilatildeo ao creacutedito do exequente
71 Ibid sem paginaccedilatildeo 72 Ibid sem paginaccedilatildeo 73 DELLORE Luiz NCPC Atipicidade das medidas executivas jaacute eacute realidade Disponiacutevel em lt
httpswwwjotainfoopiniao-e-analisecolunasnovo-cpcncpc-atipicidade-de-medidas-executivas-ja-e-realidade-17042017 gt Publicado em 17042017 Acesso em 03092018
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Logo a meu ver medidas como (i) restriccedilatildeo ao direito de dirigir (ii) apreensatildeo de passaporte (iii) cancelamento de cartotildees de creacutedito e (iv) vedaccedilatildeo de obtenccedilatildeo de novos empreacutestimos se natildeo vinculados ao pagamento do deacutebito exequendo dentre outras restriccedilotildees que deveratildeo ser observadas a cada caso satildeo permitidas pelo sistema do NCPC e em regra natildeo violam direitos fundamentais do devedor E tecircm o condatildeo de fazer com que o executado que tem recursos diante dessas medidas coercitivas pague o deacutebito trazendo sucesso agrave satisfaccedilatildeo do creacutedito
Nessa linha para Alexandre Fuchs das Neves74 o artigo 139 IV do CPC conferiu ao
juiz poderes coercitivos capazes de ldquotransformar a vida do devedor um infernordquo para compeli-
lo a cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria Entretanto pondera que para que a medida tenha
validade ldquoeacute necessaacuteria uma fundamentaccedilatildeo por evidente uma correlaccedilatildeo temaacutetica entre a
medida adotada e sua efetividade em face ao processo com fundamentaccedilatildeo detalhadardquo
No entendimento de Fernando Gajardoni75 satildeo possiacuteveis as medidas de apreensatildeo de
passaporte bloqueio de cartotildees de creacutedito e suspensatildeo da CNH Para ele o que limita o art
139 IV do CPC eacute o esgotamento dos meios tiacutepicos e a real necessidade da medida
Ilustrativamente natildeo efetuado o pagamento de diacutevida oriunda de multas de tracircnsito e superados os expedientes tradicionais de adimplemento (penhora de dinheiro e bens) seria liacutecito o estabelecimento da medida coercitivaindutiva de suspensatildeo do direito a conduzir veiacuteculo automotor ateacute pagamento do deacutebito (inclusive com apreensatildeo da CNH do devedor) natildeo efetuado pagamento de verbas salariais devidas a funcionaacuterios da empresa possiacutevel o estabelecimento de vedaccedilatildeo agrave contrataccedilatildeo de novos funcionaacuterios ateacute que seja saldada a diacutevida natildeo efetuado o pagamento de financiamento bancaacuterio na forma e no prazo avenccedilados possiacutevel ateacute que se tenha a quitaccedilatildeo que se obstem novos financiamentos ou mesmo a participaccedilatildeo do devedor em licitaccedilotildees (como de ordinaacuterio jaacute acontece com pessoas juriacutedicas em deacutebito tributaacuterio com o Poder Puacuteblico) etc
Teriacuteamos entatildeo no Brasil por assim dizer a adoccedilatildeo do padratildeo da atipicidade das medidas executivas tambeacutem para as obrigaccedilotildees de pagar vistas estas como ordens do EstadoJuiz para que haja prestaccedilatildeo de pagamento em pecuacutenia
()
Por isso ndash a prevalecer a interpretaccedilatildeo potencializada do art 139 IV do CPC2015 ndash o emprego de tais medidas coercitivasindutivas especialmente nas obrigaccedilotildees de pagar encontraraacute limite certo na excepcionalidade da medida (esgotamento dos meios tradicionais de satisfaccedilatildeo do deacutebito) na proporcionalidade (inclusive agrave luz da regra da menor onerosidade ao devedor do art 805 do CPC2015) na necessidade de fundamentaccedilatildeo substancial e especialmente nos direitos e garantias assegurados na Constituiccedilatildeo Federal (vg natildeo parece possiacutevel que se determine o pagamento sob pena de prisatildeo ou de vedaccedilatildeo ao exerciacutecio da profissatildeo do direito de ir e vir etc)
74 NEVES Alexandre Fuchs das Cancelamento de cartotildees de creacutedito e apreensatildeo de CNH e passaporte
do devedor Isso eacute possiacutevel Disponiacutevel em lt httpwwwsinfacspcombrconteudocancelamento-de-cartoes-de-credito-e-apreensao-de-cnh-e-passaporte-do-devedor-isso-e-possivel gt Acesso em 30082018
75 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Publicado em 24082015 Acesso em 30082018
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Jaacute Fernanda Tartuce76 acredita que tais medidas satildeo problemaacuteticas e devem ser
analisadas com cautela tendo em vista que ao inveacutes de afetarem o patrimocircnio do devedor
atingem a proacutepria pessoa
Sob certo prisma adotar medidas diferenciadas contribui para a efetividade da prestaccedilatildeo jurisdicional Por outro lado o patrimocircnio ndash e natildeo a pessoa do devedor - responde por diacutevidas aleacutem disso o exerciacutecio de amplos poderes pelo juiz sem balizas especiacuteficas pode ensejar medidas inadequadas Nessa linha suspender o direito de dirigir e restringir o uso de passaporte satildeo iniciativas problemaacuteticas por atingirem a pessoa do devedor enquanto a penhora da restituiccedilatildeo de Imposto de Renda soa viaacutevel por afetar seu patrimocircnio Eacute importante que a medida diferenciada se revele proporcional e seja aplicada apoacutes o exaurimento de outros meios previstos no ordenamento Como a proposta do Novo Coacutedigo eacute aumentar a eficiecircncia processual intentar medidas ineficazes inexequiacuteveis eou de difiacutecil fiscalizaccedilatildeo pode acabar ensejando o efeito contraacuterio
Nessa senda Lenio Streck e Dierle Nunes77 entendem que as medidas atiacutepicas de
suspensatildeo da CNH eou apreensatildeo de passaporte satildeo inconstitucionais Afirmam que natildeo se
pode confundir o processo civil e penal ainda que ambos remetam a um ldquoparadigma
constitucional comumrdquo e que o artigo 139 IV do CPC ldquoimpotildee novos desafios interpretativos
que podem conduzir a uma anaacutelise superficial e utilitarista de busca de resultados que
desprezem a necessaacuteria leitura constitucionalrdquo Os autores ainda ponderam que ldquoO perigo eacute o
artigo 139 IV ser transformado em instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com
autorizaccedilatildeo judicialrdquo
O professor Araken de Assis no dia 18 de abril de 2018 em um evento sobre o
Coacutedigo Processual Civil de 2015 que ocorreu em Brasiacutelia na sede do Conselho Federal da
OAB declarou ser contraacuterio aos poderes executoacuterios atiacutepicos ldquoSou contra os poderes
atiacutepicos dos juiacutezes porque seu exerciacutecio redunda em simples arbitrariedadesrdquo78
Acrescentou ainda que
76 IBDFAM ndash Instituto Brasileiro de Famiacutelia O polecircmico inciso IV do artigo 139 do CPC e suas difusas
interpretaccedilotildees Disponiacutevel em lt httpwwwibdfamorgbrnoticias6096O+polC3AAmico+inciso+IV+do+artigo+139+do+CPC+e+suas+difusas+interpretaC3A7C3B5es gt Publicado em 31082016 Acesso em 04092018
77 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018
78 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04092018
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Eacute evidentemente inconstitucional diante do princiacutepio da dignidade da pessoa humana tirar o passaporte carteira de habilitaccedilatildeo Quecirc que tem isso com diacutevidas Natildeo tem absolutamente nada Natildeo eacute a correlaccedilatildeo instrumental entre o objetivo da execuccedilatildeo e o meio empregado Isso eacute simples vinganccedila simples puniccedilatildeo79
O professor Araken de Assis acredita que tais medidas satildeo inconstitucionais e
violam o principio da dignidade humana do executado numa sociedade como a nossa
sedenta por puniccedilatildeo natildeo me surpreende que essas ideias sejam encaradas com
naturalidade Mas eacute preciso rejeitaacute-las em nome de princiacutepios 80
34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
A Constituiccedilatildeo Federal de 1988 tem como um dos seus fundamentos a dignidade da
pessoa humana presente no artigo 1ordm inciso III do referido texto constitucional O dito
princiacutepio tem o escopo de nortear o ordenamento juriacutedico como um todo
A inclusatildeo da dignidade da pessoa humana como princiacutepio constitucional obrigou
uma reflexatildeo sobre o papel da pessoa humana no direito e um redimensionamento para
elevaacute-la ao centro do ordenamento juriacutedico81 Eacute necessaacuterio recorrer agrave teoria Kantiana para
que se obtenha uma definiccedilatildeo do princiacutepio ora estudado Para Kant82 o homem eacute um fim
em si mesmo natildeo uma funccedilatildeo do Estado Ou Naccedilatildeo O Estado e o direito devem estar
organizados em benefiacutecio do indiviacuteduo
Agora eu afirmo o homem ndash e de uma maneira geral todo o ser racional ndash existe como fim em si mesmo e natildeo apenas como meio para o uso arbitraacuterio desta ou daquela vontade Em todas as suas accedilotildees pelo contraacuterio tanto nas direcionadas a ele mesmo como nas que o satildeo a outros seres racionais deve ser ele sempre considerado simultaneamente como fim
Partindo da premissa de que para Immanuel Kant o homem eacute o fim em si mesmo
ldquodevemos compreender que a dignidade da pessoa humana eacute a noccedilatildeo o comando a direccedilatildeo
que se deve seguir funcionando como fundamento para a interpretaccedilatildeo de todos os direitos e
garantias conferidos agrave pessoa nos ordenamentos juriacutedicos de cada Estadordquo 83
79 Ibid sem paginaccedilatildeo 80 Ibid sem paginaccedilatildeo 81 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito
fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 461 82 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud KANT Immanuel Fundamentaccedilatildeo da metafiacutesica dos costumes
Satildeo Paulo Martin Claret 2003 p56-59 Coleccedilatildeo A Obra-Prima de Cada Autor 83 SCHIAFIANO Juliana Rocha op cit p 461
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O princiacutepio constitucional da dignidade da pessoa humana estaacute diretamente ligado ao
conteuacutedo dos direitos fundamentais logo para que se cumpra com os direitos fundamentais
constitucionalmente instituiacutedos eacute necessaacuterio reconhecer e respeitar a dignidade da pessoa
humana conforme disciplina Ingo Sarlet84
Em suma o que se pretende sustentar de modo mais enfaacutetico eacute que a dignidade da pessoa humana na condiccedilatildeo de valor (principio normativo) fundamental que atrai o conteuacutedo de todos os direitos fundamentais exige e pressupotildee o reconhecimento e proteccedilatildeo dos direitos fundamentais de todas as dimensotildees (ou geraccedilotildees se assim preferirmos) Assim sem que se reconheccedilam agrave pessoa humana os direitos fundamentais que lhe satildeo inerentes em verdade estarse-aacute lhe negando a proacutepria dignidade A consagraccedilatildeo constitucional da dignidade da pessoa humana tem o propoacutesito de limitar a atuaccedilatildeo ou a omissatildeo do Estado para garantir os direitos do indiviacuteduo Assim eacute difiacutecil precisar os efeitos da norma que determina a dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado (como acontece com a Constituiccedilatildeo brasileira de 1988) poreacutem quando desrespeitados os direitos fundamentais do cidadatildeo eacute possiacutevel identificar que a dignidade deste foi violada
Logo ldquoteraacute respeitada a sua dignidade o individuo que tiver respeitados os seus
direitos fundamentaisrdquo 85 Os direitos fundamentais estatildeo apresentados na Constituiccedilatildeo
Federal da seguinte forma direitos individuais e coletivos direitos sociais direitos poliacuteticos e
direitos de nacionalidade que tecircm como escopo garantir as liberdades positivas aos
indiviacuteduos ldquoonde foram conquistados direitos agrave liberdade religiosa liberdade civil e
profissional agrave propriedade ao livre acesso ao Judiciaacuterio agrave ampla defesa e ao contraditoacuterio no
processual judicial ao sigilo de dados e informaccedilotildees pessoais entre outros que somados
garantem o cidadatildeo uma vida dignardquo 86
O cidadatildeo na Constituiccedilatildeo Federal de 88 diferente das constituiccedilotildees brasileiras
anteriores passou a ser fundamento e ganhou destaque nos direitos fundamentais tendo
garantida a sua vida a sua dignidade a sua seguranccedila a sua honra a sua liberdade e a sua
propriedade
84 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud SARLET Ingo Wolfgang Dignidade da pessoa humana e
direitos fundamentais na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 2ed Porto Alegre Livraria do Advogado 2002 p87 85 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito
fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 462 86 Ibid p 462
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Segundo Carmem Luacutecia Antunes Rocha87 para garantir o Estado Democraacutetico de
Direito eacute necessaacuterio que a sua atuaccedilatildeo seja sempre em conformidade com o princiacutepio da
dignidade da pessoa humana
O Estado somente eacute democraacutetico em sua concepccedilatildeo constitucionalizaccedilatildeo e atuaccedilatildeo quando respeita o princiacutepio da dignidade da pessoa humana Natildeo haacute verbo constitucional natildeo haacute verbo governamental que se faccedilam legiacutetimos quando natildeo se voltam ao atendimento daquele princiacutepio Natildeo haacute verdade constitucional natildeo haacute suporte institucional para as poliacuteticas puacuteblicas que natildeo sejam destinadas ao pleno cumprimento daquele valor maior transformado em princiacutepio constitucional
O princiacutepio da dignidade humana constitucionalmente garantido impotildee limites ao
Estado compelindo aos oacutergatildeos e atividades estatais respeitar o ser humano e garanti-lo
condiccedilotildees miacutenimas para uma vida digna Dessa forma eacute niacutetido que o dito princiacutepio eacute
pressuposto e indispensaacutevel para legitimar outras normas constitucionais e
principalmente infraconstitucionais
O Coacutedigo de Processo Civil eacute umas das principais normas infraconstitucionais que
sofre influecircncia dos preceitos valores e princiacutepios esculpidos na Constituiccedilatildeo Federal
Logo como o principio da dignidade humana eacute um dos mais importantes pressupostos
constitucionais ldquoentatildeo eacute tranquilo afirmar-se que o novel ordenamento processual tem
de se render nas resoluccedilotildees dos aspectos processuais e a fim de se atingir uma soluccedilatildeo
justa adequada e efetiva ao postulado da dignidade da pessoa humanardquo 88
Dessa forma o legislador deve formular as normas infraconstitucionais de acordo e a
partir do conteuacutedo constitucional para Marinoni Mitidiero e Arenhart89
() o Coacutedigo de Processo Civil constitui direito constitucional aplicado O Coacutedigo deve ser interpretado de acordo com a Constituiccedilatildeo e com os direitos fundamentais o que significa que as duacutevidas interpretativas devem ser resolvidas a favor da otimizaccedilatildeo do alcance da Constituiccedilatildeo e do processo civil como meio para tutela de direitos
87 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud ROCHA Carmen Luacutecia Antunes O princiacutepio da dignidade da
pessoa humana e a exclusatildeo social Revista Interesse Puacuteblico n4 p23-48 1999 p33 88 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o
novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 367
89 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 14
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Com o escopo de conferir eficaacutecia aos mandamentos constitucionais o CPC15 traz a
previsatildeo e diversas claacuteusulas gerais em seus primeiros artigos em um dos quais se
prestigia o princiacutepio da dignidade da pessoa humana
O referido princiacutepio estaacute disciplinado no artigo 8ordm do CPC15 e atua como um guia
sobre as demais normas do coacutedigo processual Eacute o que entende Nelson Rosenvald90
O maior cuidado do inteacuterprete eacute no sentido de jamais banalizar a dignidade fazendo dela um elixir processual tal como muitas vezes se vecirc na esfera do direito civil Penso que natildeo haacute maiores dificuldades em transpor a noccedilatildeo constitucional do princiacutepio para em seguida adaptaacute-la agraves singularidades do processo
Logo de acordo com o artigo 8ordm do CPC o oacutergatildeo julgador ao aplicar o ordenamento
juriacutedico deve resguardar a dignidade da pessoa humana Para Fredie Didier91 ldquoresguardar
nesse contexto eacute de um lado aplicar corretamente a norma juriacutedica lsquoproteccedilatildeo da dignidade
da pessoa humanarsquo e de outro natildeo violar a dignidaderdquo
O oacutergatildeo julgador deveraacute manter um comportamento ativo com o objetivo de promover
a dignidade da pessoa humana podendo tomar medidas de ofiacutecio para efetivar a dignidade da
pessoa humana Didier assevera que o magistrado poderaacute ainda ldquovaler-se da claacuteusula geral de
atipicidade (art 536 sect 1ordm) para a execuccedilatildeo do direito fundamental agrave dignidaderdquo 92 O autor
ainda traz dois exemplos
a) exigecircncia de respeito agrave ordem cronoloacutegica de conclusatildeo (art 12) caso de grave violaccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana que natildeo se encaixe em um dos incisos que excepcionam a regra de observacircncia da cronologia da conclusatildeo poderia o juiz ldquofurar a filardquo para promover a dignidade da pessoa humana b) prioridade na tramitaccedilatildeo processual pessoa que seja portadora de doenccedila grave mas que natildeo esteja no rol do art 1048 I para promover a dignidade de pessoa humana o juiz poderia determinar o processamento prioritaacuterio93
Essa dupla garantia ndash resguardo e promoccedilatildeo ndash tem como objetivo garantir ao individuo
sua dignidade humana fazendo com que ldquode um lado que o Estado natildeo a viole e de outro
que o Estado a promova e efetiverdquo
90 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud ROSENVALD Nelson A
dignidade da pessoa humana no CPC15 91 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte
geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 75 92 Ibid p 75 93 Ibid p 75
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Nessa senda o magistrado deveraacute promover a dignidade da pessoa humana quando
perceber a ausecircncia desta no processo ou assegura-la quando for posta em risco Eacute nesse
sentido o entendimento dos professores Marinoni Mitidiero e Arenhart94
() a dignidade da pessoa humana determina a compreensatildeo do processo civil como um meio para tutela dos direitos Vale dizer o processo civil natildeo pode ser visto como um instrumento a serviccedilo do Estado como um instrumento que natildeo se encontre orientado agrave realizaccedilatildeo dos fins da pessoa humana Em outras palavras o processo civil serve para realizaccedilatildeo dos direitos e para orientaccedilatildeo das pessoas a respeito do significado do direito
Nessa senda compete tanto ao juiz quanto as demais partes processuais garantirem ldquoo
valor intriacutenseco de cada vida que eacute trazida ao processordquo nas palavras de Alexandre Freitas
Cacircmara95
() aos sujeitos do processo eacute preciso sempre ter claro que os titulares dos interesses em conflitos satildeo pessoas reais cujas vidas seratildeo afetadas pelo resultado do processo e que por isso mesmo tecircm o direito de estabelecer suas estrateacutegias processuais de acordo com aquilo que lhes pareccedila melhor para suas vidas Eacute inadmissiacutevel tratar as partes como se natildeo fossem pessoas reais meros dados estatiacutesticos Afinal se para o Judiciaacuterio cada processo pode parecer apenas mais um processo para as partes cada processo pode ser o uacutenico o mais relevante aquele em que sua vida seraacute decidida E eacute dever do juiz assegurar que isto seja respeitado
Dessa forma eacute necessaacuterio que um arcabouccedilo normativo para que seja conferida
eficaacutecia e proteccedilatildeo ao principio da dignidade da pessoa humana
Logo o dito princiacutepio deve ser protegido em todas as esferas do ordenamento juriacutedico
inclusive no campo da execuccedilatildeo civil onde sofre grandes riscos de ser violado em nome do
direito fundamental agrave tutela executiva do credor ldquoPartir da premissa de que existe um direito
fundamental agrave tutela executiva ora ratificado pelo CPC eacute indispensaacutevel para a soluccedilatildeo de
diversos problemas oriundos do procedimento executivo principalmente aqueles relacionados
agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo 96
94 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme
MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 25
95 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CAcircMARA Alexandre Freitas O Novo Processo Civil Brasileiro 2 ed Satildeo Paulo Atlas 2016 p 7
96 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66
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Eacute o caso por exemplo da impenhorabilidade Segundo Fredie Didier et al97 a
impenhorabilidade eacute uma forma de proteger certos bens do devedor do direito fundamental a
execuccedilatildeo do credor
Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa
Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais
O legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do CPC fazendo um
preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses em anaacutelise ao optar pela mitigaccedilatildeo do direito
do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado Afinal ldquoa execuccedilatildeo natildeo pode ser utilizada
como instrumento para causar a ruiacutena a fome e o desabrigo do devedor e sua famiacutelia gerando
situaccedilotildees incompatiacuteveis com a dignidade da pessoa humana 98
Logo a impenhorabilidade de certos bens
[] Eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa99
Eacute nesse sentido que o CPC15 enumera diversos casos de bens patrimoniais que satildeo
impenhoraacuteveis como o salaacuterio e vencimentos utensiacutelios necessaacuterios ao exerciacutecio da
profissatildeo seguro de vida vestuaacuterios e pertences de uso pessoal entre outros
Dessa forma as regras relativas agraves medidas executivas devem ser interpretadas agrave luz
da Constituiccedilatildeo Federal ldquovez que se voltam agrave realizaccedilatildeo de direitos fundamentais e em sua
97 Ibid p 66 98 THEODORO JUacuteNIOR Humberto Novo Coacutedigo de Processo Civil Anotado 20 ed Rio de Janeiro
Forense 2016 p 978 99 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud DIDIER JR Fredie CUNHA
Leonardo Carneiro da BRAGA Paula Sarno OLIVEIRA Rafael Alexandria de Curso de direito processual civil 3 ed Salvador JusPodivm 2011 v 5 p 547
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realizaccedilatildeo podem atingir direitos fundamentaisrdquo 100 O Superior Tribunal de Justiccedila jaacute decidiu
que
O rol das impenhorabilidades do ordenamento paacutetrio objetiva preservar o miacutenimo patrimonial necessaacuterio agrave existecircncia digna do executado impondo ao processo executoacuterio certos limites Assim a depender das peculiaridades do caso as regras de impenhorabilidade podem ser ampliadas de modo a adequar a tutela aos direitos fundamentais como por exemplo o direito agrave moradia agrave sauacutede ou agrave dignidade da pessoa humana Trata-se portanto da aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo e da necessidade sob o enfoque da proporcionalidade101 (STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014)
Logo a interpretaccedilatildeo dos dispositivos que tratam sobre a penhora no CPC deve estaacute
diretamente ligada aos ditames constitucionais devendo o interprete privilegiar a opccedilatildeo que
esteja mais em sintonia com a Carta Magna para que nem o credor e nem o devedor sejam
lesados
O artigo 833 do CPC elenca uma seacuterie de incisos que expotildeem os bens impenhoraacuteveis
O trecho inicial inciso I do art 833 define como impenhoraacuteveis os bens inalienaacuteveis Este
inciso segue a regra de que ldquose o bem natildeo pode ser alienado tambeacutem natildeo pode ser penhorado
porque a penhora eacute o primeiro ato do procedimento de alienaccedilatildeo judicial do bemrdquo 102
Satildeo exemplos de bens inalienaacuteveis os puacuteblicos cuja alienaccedilatildeo depende de autorizaccedilatildeo
legislativa Eacute inalienaacutevel tambeacutem o capital constituiacutedo para garantir indenizaccedilatildeo de ato iliacutecito
(art 533 sect 1 ordm CPC) que portanto eacute tambeacutem impenhoraacutevel ldquoTodo bem inalienaacutevel eacute
impenhoraacutevel embora nem todo bem impenhoraacutevel seja inalienaacutevelrdquo 103
O inciso I do art 833 CPC tambeacutem consagra a impenhorabilidade dos bens que por
ato voluntaacuterio satildeo excluiacutedos da execuccedilatildeo
Segundo Fredie Didier et al104
Eacute o que ocorre nos casos de bens doados ou alienados com claacuteusula de inalienabilidade que haacute de constar no registro imobiliaacuterio para ser eficaz perante o exequente e minimizar o risco de fraude A propoacutesito eis a redaccedilatildeo do art 1911 do Coacutedigo Civil lsquolsquoA claacuteusula de inalienabilidade imposta aos bens por ato de liberalidade implica impenhorabilidade e incomunicabilidaderdquo
100 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MEDINA Joseacute Miguel Garcia
Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 1 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 p 736 101 STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014 102 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 824 103 Ibid p 824 104 Ibid p 825
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O inciso II por sua vez estabelece que satildeo impenhoraacuteveis os bens moacuteveis os
pertences e as utilidades domeacutesticas da residecircncia do executado Todavia excepcionam-se os
bens dessa natureza que sejam de elevado valor ou que ultrapassem as necessidades comuns
correspondentes a um meacutedio padratildeo de vida
A jurisprudecircncia natildeo eacute paciacutefica sobre o assunto logo natildeo exista uma relaccedilatildeo de bens
que podem ser atingidos pela penhora Abrindo margem para as mais variadas decisotildees
O STJ jaacute considerou impenhoraacuteveis aparelho de televisatildeo a cores mesa de centro passadeira raacutedio toca-fitas gravador microondas ar-condicionado um freezer um microcomputador com acessoacuterios uma impressora etc Poderatildeo ser penhorados porque ultrapassam o padratildeo-meacutedio aparelhos de TV mais sofisticados o segundo aparelho de televisatildeo a segunda geladeira aparelhos de ar-condicionado que satildeo verdadeiras peccedilas de design moacuteveis antigos que se transformam em peccedilas de decoraccedilatildeo faqueiro de prata adega climatizada etc Em entendimento de caraacuteter ainda mais geneacuterico jaacute restou consignado em determinado precedente que a proteccedilatildeo natildeo abrangeria apenas os bens indispensaacuteveis agrave moradia mas tambeacutem aqueles usualmente encontrados em um lar105
Ademais o inciso III do art 833 do CPC traz a impenhorabilidade dos vestuaacuterios bem
como os pertences de uso pessoal do executado salvo se de elevado valor
Segundo Fredie Didier et al106 o dispositivo possui dois propoacutesitos
de um lado preservar a dignidade do executado com a proteccedilatildeo de bens moacuteveis importantes para a sua sobrevivecircncia digna como o vestuaacuterio aparelho celular reloacutegio e os bens relacionados agrave sua higiene pessoal de outro lado a regra visa prestigiar a boa-feacute processual impedindo a execuccedilatildeo mesquinha e abusiva com a penhora de bens de pequeno ou nenhum valor como um pente ou uma bota
O inciso IV do art 833 do CPC consagra uma das mais importantes modalidades a
impenhorabilidade relativa aos rendimentos de natureza alimentar ldquoTrata-se de regra que
possui o claro propoacutesito de proteger o executado garantindo-lhe o recebimento de valores que
servem ao pagamento das despesas relacionadas agrave sua sobrevivecircncia digna e agrave da sua famiacuteliardquo 107
Jaacute inciso V do art 833 do CPC torna impenhoraacuteveis os livros as maacutequinas as
ferramentas os utensiacutelios os instrumentos ou outros bens moacuteveis necessaacuterios ou uacuteteis ao
exerciacutecio de qualquer profissatildeo 105 Ibid p 826 106 Ibid p 827 107 Ibid p 828
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Por forccedila do paraacutegrafo 3ordm do art 833 satildeo igualmente impenhoraacuteveis os equipamentos
implementos e maacutequinas agriacutecolas pertencentes agrave pessoa fiacutesica ou a empresa individual
produtora rural Rodrigo Mazzei e Sarah Merccedilon108 esclarecem que
Tem assento na noccedilatildeo de que a dignidade estende-se tambeacutem ao exerciacutecio da profissatildeo em si mesma e tambeacutem por representar a forma por excelecircncia de que dispotildee o executado para continuar a receber sua remuneraccedilatildeo e por conseguinte prover seu sustento e de sua famiacutelia Trata-se tambeacutem de aplicaccedilatildeo pontual da funccedilatildeo social da propriedade jaacute que protege os bens que permitem a circulaccedilatildeo de riquezas para a subsistecircncia do executado e se for o caso de sua famiacutelia
Forccediloso ressaltar ainda que a impenhorabilidade do inc V alcanccedila apenas os bens
moacuteveis de modo que eacute absolutamente possiacutevel que o imoacutevel em que o executado exerccedila sua
atividade profissional seja penhorado conforme a Suacutemula 451 do STJ ldquoEacute legiacutetima a penhora
da sede do estabelecimento comercialrdquo
O inciso VI do art 833 do CPC versa sobre a impenhorabilidade do seguro de vida
ldquoTrata-se de impenhorabilidade em favor do beneficiaacuterio do seguro e natildeo do segurado ateacute
porque o valor do seguro natildeo compotildee nem comporaacute o seu patrimocircnio (art794 do Coacutedigo
Civil1 ordm7)rdquo Dessa forma ldquoem uma execuccedilatildeo contra o segurado natildeo seraacute possiacutevel a penhora
do seguro de vida pois se trata de bem que natildeo lhe pertence nem mesmo em expectativardquo
De acordo com o inciso VII do art 833 do CPC satildeo impenhoraacuteveis os materiais
necessaacuterios para obras em andamento salvo se essas forem penhoradas Logo a obra pode
ser penhorada (art 862 do CPC) ldquoA regra como bem lembrou Araken de Assis lsquoestimula a
penhora da proacutepria obra inconclusa agrave qual os materiais acrescem e conseguintemente
valorizamrsquo 109
O art 833 VIII CPC julga impenhoraacutevel a pequena propriedade rural assim
definida em lei desde que trabalhada pela famiacutelia reproduzindo parte do art 5ordm XXVI CF
88116 que disciplina a impenhorabilidade do referido bem
A proteccedilatildeo do CPC eacute mais ampla do que a garantia prevista na Constituiccedilatildeo Federal
tendo em vista que a impenhorabilidade natildeo se restringe agraves execuccedilotildees de deacutebitos decorrentes
de sua atividade produtiva podendo ser alegada em toda e qualquer execuccedilatildeo ldquoAssim o 108 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CABRAL Antonio Passo
CRAMER Ronaldo (orgs) Comentaacuterios ao Novo Coacutedigo de Processo Civil Rio de Janeiro Forense 2015 p 1194
109 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 835
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imoacutevel natildeo pode ser penhorado na execuccedilatildeo de creacutedito rural concedido para estimular a
produccedilatildeo agriacutecola mas poderaacute ser penhorado na execuccedilatildeo do creacutedito concedido para a
aquisiccedilatildeo do imoacutevelrdquo 110
A nona modalidade de impenhorabilidade trata-se dos recursos puacuteblicos recebidos por
instituiccedilotildees privadas para aplicaccedilatildeo compulsoacuteria em educaccedilatildeo sauacutede ou assistecircncia social ldquoA
proteccedilatildeo eacute louvaacutevel e tutela toda a coletividade ao privilegiar o direito agrave educaccedilatildeo sauacutede e
assistecircncia social em detrimento do direito do credorrdquo
De acordo com o inciso X do art 833 do CPC eacute impenhoraacutevel ateacute o limite de
quarenta salaacuterios miacutenimos a quantia depositada em caderneta de poupanccedila
Eacute uma modalidade de impenhorabilidade relativa (o CPC73 a considerava absoluta)
tendo em vista que essa impenhorabilidade natildeo pode ser oposta na execuccedilatildeo de alimentos
independentemente da sua origem (art 833 sect 2ordm do CPC) Fredie Didier et al cita Araken de
Assis111 ao afirmar que
a regra soacute protege essa aplicaccedilatildeo financeira Se o valor estiver depositado em fundo de investimento por exemplo poderaacute ser penhorado Se o devedor tiver vaacuterias cadernetas de poupanccedila a impenhorabilidade aplica-se agrave soma de todas elas e natildeo a cada uma delas isoladamente do contraacuterio valores expressivos poderiam ser pulverizados em vaacuterias contas burlando a finalidade da regra que eacute a de proteger a populaccedilatildeo de baixa renda
Ademais satildeo tambeacutem impenhoraacuteveis por forccedila do inciso XI os recursos puacuteblicos do
fundo partidaacuterio recebidos por partido poliacutetico nos termos da lei Essa modalidade de
impenhorabilidade ldquose restringe aos recursos puacuteblicos do fundo partidaacuterio Recursos de
origem privada recebidos pelo partido poliacutetico poderatildeo ser penhoradosrdquo 112 O processualista
Fredie Didier et al113 assevera que
Assim a impenhorabilidade foi estabelecida no intuito de impedir que os diretoacuterios nacionais de partidos poliacuteticos respondam por diacutevida dos diretoacuterios
110 Ibid p 836 111 DIDIER JR Fredie et al apud ASSIS Araken de Manual da execuccedilatildeo 11ordm ed cit p 225 Assim
tambeacutem REDONDO Bruno Garcia LOJO Maacuterio Vitor Suarez Penhora cit p 117 BUENO Cassio Scarpinella Curso sistematizado de Direito Processual Civil v 3 cit p 228 GIANNICO Mauriacutecio As novas reformas do CPC e de outras normas processuais Mauriacutecio Giannico e Viacutetor Joseacute de Mello Monteiro (coord) Satildeo Paulo Saraiva 2009 p 1 OS Em sentido diverso estendendo a impenhorabiacutelidade aos depoacutesitos feitos ateacute esse valor em CDB CDI fundos de renda fixa ou de accedilotildees RODRIGUES Marcelo Abelha Manual de execuccedilatildeo civil 3deg ed cit p 101
112 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 839
113 Ibid p 839
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estaduaismunicipais - sobretudo em razatildeo das vaacuterias decisotildees judiciais que determinaram penhora de recursos do fundo partidaacuterio de alguns partidos
Por fim o inciso XII do artigo 833 do CPC trata sobre a impenhorabilidade dos
creacuteditos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias sob o regime de incorporaccedilatildeo imobiliaacuteria
vinculados agrave execuccedilatildeo de obra ldquoO objetivo dessa modalidade eacute evitar que diacutevidas do
incorporador possam consumir os recursos que seriam utilizados na realizaccedilatildeo da obra em
prejuiacutezo dos adquirentes de unidades autocircnomasrdquo 114
O professor Misael Montenegro Filho115 aduz sobre que ldquoao estabelecer a
impenhorabilidade dos creacuteditos oriundos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias o novo CPC
protegeu os valores destinados agrave execuccedilatildeo da obra e agrave entrega das unidades imobiliaacuterias aos
adquirentes assegurando assim a execuccedilatildeo da promessa contratualrdquo
Importante frisar ainda que a Lei nordm 8009 1990 instituiu a impenhorabilidade do
imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar por qualquer diacutevida salvo as exceccedilotildees dos
seus arts 3ordm e 4ordm
A referida lei dispotildee que Para os efeitos de impenhorabilidade considera-se
residecircncia um uacutenico imoacutevel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia
permanente (art 5ordm)
O processualista baiano Fredie Didier et al116 assevera que
A lei propotildee-se a proteger imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar nos termos acima expostos A CF 88 ampliou o conceito de entidade familiar para abranger a famiacutelia monoparental e a uniatildeo estaacutevel Mas deve considerar-se aiacute compreendidos os irmatildeos que vivem juntos e a uniatildeo homossexual Ateacute o solteiro estaacute abrangido pela impenhorabilidade se reside soacute no imoacutevel - isso em nome da proteccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana e da moradia digna Na verdade houve uma mudanccedila de compreensatildeo acerca do sentido da proteccedilatildeo de proteccedilatildeo da famiacutelia agrave proteccedilatildeo da moradia indispensaacutevel agrave preservaccedilatildeo da dignidade da pessoa
114 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o
novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 388
115 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MONTENEGRO FILHO Misael Novo Coacutedigo de Processo Civil Comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Atlas 2016 p 752
116 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 840-841
47
O STJ jaacute consolidou esse entendimento na suacutemula nordm 364 O conceito de
impenhorabilidade de bem de famiacutelia abrange tambeacutem o imoacutevel pertencente a pessoas
solteiras separadas e viuacutevas
Entretanto se o casal ou entidade familiar possuir vaacuterios imoacuteveis utilizados como
residecircncia a impenhorabilidade recairaacute sobre o de menor valor (art 5ordm paraacutegrafo uacutenico) ldquoEacute o
que ocorre por exemplo quando a famiacutelia se divide em mais de uma cidade por motivos
profissionaisrdquo 117
Forccediloso observar ainda que a impenhorabilidade do imoacutevel familiar eacute relativa jaacute que
natildeo pode ser oposta a qualquer creacutedito O art 3ordm da Lei n 8009 1990151 em que pode ser
penhorada a residecircncia da famiacutelia (exemplo execuccedilatildeo de alimentos para cobranccedila de taxas
devidas em funccedilatildeo do imoacutevel familiar etc)
Resta claro que o artigo 833 do CPC ao disciplinar as hipoacuteteses de impenhorabilidade
possui o escopo de proteger o princiacutepio da dignidade humana Entretanto algumas claacuteusulas
natildeo possuem proteccedilatildeo absoluta ldquoa sua relativizaccedilatildeo a depender do caso sob exame deve ser
realccedilada agrave medida que a dignidade resguardada e protegida pelo sistema processual-
constitucional natildeo se limita ao executadordquo 118 Ademais ldquoEacute premente advertidamente que a
dignidade do credor tambeacutem seja garantida em juiacutezo tendo como norte pois os princiacutepios da
proporcionalidade e razoabilidaderdquo 119
117 Ibid p 841 118 Ibid p 752 119 Ibid p 752
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4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA
ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE
HUMANA DO EXECUTADO
41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE
EFETIVACcedilAtildeO
Como jaacute exposto em linhas preteacuteritas nos meios executivos tiacutepicos as medidas
executivas satildeo determinadas pela lei ou seja o oacutergatildeo pode aplicar somente as medidas
tipificadas no ordenamento juriacutedico No entanto ao se tratar das medidas executivas atiacutepicas
eacute necessaacuterio que haja um limite na atuaccedilatildeo realizada pelo juiz
O poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo poder ser realizado de maneira indiscriminada haacute
pressupostos e premissas a serem observadas Dessa forma a primeira premissa eacute no sentindo
de que a medida executiva atiacutepica natildeo pode ser a primeira medida a ser invocada ldquomuito ao
reveacutes a regra do nosso sistema continua a ser o da tipicidade dos meios executivos soacute que
agora temperado pelo sistema atiacutepicordquo 120 O processualista Thiago Rodovalho explica que
ldquo() os meios atiacutepicos natildeo satildeo prima ratio e sim a ultima ratio eacute dizer esgotados e
frustrados os meios executivos tiacutepicos e ordinaacuterios pode-se em tese valer-se do sistema
atiacutepicordquo121
Dessa forma nos casos de execuccedilatildeo que tenha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
natildeo deve ser aplicado de logo as medidas indutivas e coercitivas Apenas apoacutes frustradas as
medidas ldquonaturaisrdquo pode-se passar agrave aplicaccedilatildeo das medidas atiacutepicas
Uma segunda premissa diz a respeitos dos meios de pressatildeo para compelir o devedor a
adimplir com o seu deacutebito ldquoEssa segunda premissa decorre inclusive de imperiosidade
loacutegica de nada adianta a medida de pressatildeo se a obrigaccedilatildeo natildeo tem como ser adimplida pelo
devedorrdquo 122
Para Thiago Rodovalho123 ldquoIsso quer significar que esgotados e frustrados os meios
tiacutepicos o juiz se valeraacute dos meios atiacutepicos se eles forem potencialmente haacutebeis a estimular ou
120 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da
atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018
121 Ibid sem paginaccedilatildeo 122 Ibid sem paginaccedilatildeo 123 Ibid sem paginaccedilatildeo
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forccedilar o cumprimento o que pressupotildee sua possibilidade quando entatildeo eles poderatildeo ser
eficazesrdquo
Logo nas obrigaccedilotildees de pagar quantia se houver a real demonstraccedilatildeo da
impossibilidade financeira do devedor seria um constrangimento inuacutetil e desnecessaacuterio a
imposiccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo para forccedilar o cumprimento
Por isso as medidas atiacutepicas devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o
esgotamento das medidas tiacutepicas e a possibilidade de cumprimento de cumprimento da
obrigaccedilatildeo
Ademais superadas as supracitadas premissas e o oacutergatildeo julgador vislumbrando a
necessidade da aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo se faz necessaacuterio que um conjunto de
postulados e princiacutepios rejam a atuaccedilatildeo do oacutergatildeo julgador servindo de norte para a escolha da
medida executiva mais adequada ldquoDe modo geral a escolha deve pautar-se nos postulados da
proporcionalidade da razoabilidade (art8ordm CPC) e da proibiccedilatildeo de excesso bem como nos
princiacutepios da eficiecircncia e da menor onerosidade da execuccedilatildeordquo 124
O professor Fredie Didier et al125 eacute categoacuterico ao citar Humberto Aacutevila
Segundo Humberto Aacutevila o postulado da proporcionalidade se manifesta nas situaccedilotildees em que haacute uma relaccedilatildeo de causalidade entre dois elementos empiricamente discerniacuteveis um meio e um fim de tal sorte que se possa proceder aos trecircs exames fundamentais o da adequaccedilatildeo (o meio promove o fim) o da necessidade (dentre os meios disponiacuteveis e igualmente adequados para promover o fim natildeo haacute outro meio menos restritivo do(s) direito(s) fundamental (is) afetado(s)) e o da proporcionalidade em sentido estrito (as vantagens trazidas pela promoccedilatildeo do fim correspondem agraves desvantagens provocadas pela adoccedilatildeo do meio)
O juiz ao aplicar a medida executiva atiacutepica ao caso concreto deve ter seu
embasamento no princiacutepio da proporcionalidade para saber se a medida a ser tomada eacute a
melhor opccedilatildeo ao caso sub judice ldquoO exame de proporcionalidade aplica-se sempre que
houver uma medida concreta destinada a realizar uma finalidaderdquo 126
Em verdade a aplicaccedilatildeo do princiacutepio da proporcionalidade eacute imprescindiacutevel na adoccedilatildeo
dos meios executivos atiacutepicos tendo em vista que ldquo() tais medidas em especial quando de
124 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111 125 DIDIER JR Fredie et al apud AVILA Humberto Teoria dos princiacutepios da definiccedilatildeo agrave aplicaccedilatildeo
dos princiacutepios juriacutedicos 16 ed Satildeo Paulo Malheiros 2015 p 205 126 DIDIER JR Fredie et al op cit p 111
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natureza coercitiva podem restringir direitos do devedor e incidir diretamente sobre sua
pessoardquo127 Logo ainda que o princiacutepio da efetividade da tutela executiva seja um direito
fundamental o mesmo ldquo() deve ser compatibilizado com direitos fundamentais do
executado para que a sua dignidade humana seja preservadardquo 128
Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Neves129 afirma que em nome do princiacutepio da
proporcionalidade o juiz deveraacute
() ponderar no caso concreto as vantagens praacuteticas da adoccedilatildeo de cada medida executiva atiacutepica em especial as de natureza coercitiva e as desvantagens de sua adoccedilatildeo levando em conta a possibilidade de a medida criar uma limitaccedilatildeo excessiva ao exerciacutecio de direito fundamental do executado
Outro princiacutepio que o oacutergatildeo julgador deve se ater ao escolher a medida executiva
atiacutepica eacute o da razoabilidade Segundo Fredie Didier et al 130 o princiacutepio (ou postulado)131 se
manifesta de trecircs formas
a) como dever de equidade a exigir a harmonizaccedilatildeo da norma geral com o caso individual impondo a consideraccedilatildeo daquilo que normalmente acontece em detrimento do que eacute extraordinaacuterio e tambeacutem impondo a consideraccedilatildeo das especificidades do caso concreto ante a generalidade da norma b) como dever de congruecircncia a exigir a harmonizaccedilatildeo das normas com suas condiccedilotildees externas de aplicaccedilatildeo (isto eacute com a realidade com base em que foram editadas) c) como dever de equivalecircncia a exigir uma relaccedilatildeo de equivalecircncia entre a medida adotada e o criteacuterio que a dimensiona
Logo ldquo() o princiacutepio da razoabilidade deve nortear a atuaccedilatildeo do juiz na adoccedilatildeo das
medidas executivas atiacutepicas previstas no art 139 IV do Novo CPCrdquo 132 tendo em vista que
ldquo() mesmo medidas que pelo princiacutepio da proporcionalidade podem se mostrar
abstratamente possiacuteveis de adoccedilatildeo no caso concreto podem se mostrar inadequadas e
irrazoaacuteveisrdquo 133
127 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Medidas executivas atiacutepicas na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de
pagar quantia certa art 139 IV do novo CPC Revista de Processo v 42 n 265 mar 2017 p 14 128 Ibid p 14 129 Ibid p 14 130 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111-112 131 Segundo Fredie Didier et al o postulado eacute uma norma que atua sobre a aplicaccedilatildeo de outras normas
A proporcionalidade e a razoabilidade seriam postulados normativos e natildeo princiacutepios segundo essa concepccedilatildeo 132 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo op cit p 14 133 Ibid p 14
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Ademais conforme dispotildee o postulado da proibiccedilatildeo de excesso ldquoa realizaccedilatildeo de uma
regra ou princiacutepio constitucional natildeo pode conduzir agrave restriccedilatildeo a um direito fundamental que
lhe retire um miacutenimo de eficaacuteciardquo 134
A proibiccedilatildeo de excesso deveraacute sempre ser suscitada quando um direito fundamental
houver sido violado a ponto do direito fundamental sofrer violaccedilatildeo excessiva Ademais ldquoesse
postulado natildeo se confunde com o da proporcionalidade porque ele dispensa os exames da
adequaccedilatildeo (relaccedilatildeo meiofim) da necessidade (exigibilidade) ou da proporcionalidade em
sentido estrito (ponderaccedilatildeo entre vantagens e desvantagens)rdquo 135
Logo ldquopouco importa a relaccedilatildeo meiofim ou a exigibilidade da medida ou ainda a
ponderaccedilatildeo com outro direito fundamental eventualmente em jogo aqui se analisa apenas a
eficaacutecia de um determinado direito fundamentalrdquo 136
O princiacutepio da eficiecircncia tem previsatildeo constitucional no art 37 e previsatildeo
infraconstitucional no art 8ordm do CPC15 O referido princiacutepio determina que o processo seja
conduzido de forma eficiente pelo oacutergatildeo jurisdicional
Entende-se que eficiente eacute a atuaccedilatildeo que utilize adequadamente os meios necessaacuterios
para que se atinjam os fins almejados O oacutergatildeo jurisdicional na escolha dos meios a serem
utilizados para a obtenccedilatildeo dos fins
a) deve escolher aqueles que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo (deve evitar meios que promovam resultados insignificantes) b) deve escolher meios que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado (natildeo se pode escolher um meio de resultado duvidoso) c) natildeo pode escolher um meio que produza muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscado 137
O juiz deveraacute igualmente analisar o princiacutepio da menor onerosidade da execuccedilatildeo que
eacute previsto pelo art 805 do CPC ldquoArt 805 Quando por vaacuterios meios o exequente puder
promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o
executadordquo
134 134 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 112 135 Ibid p 112 136 Ibid p 112 137 Ibid p 112-113
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Logo ldquohavendo duas opccedilotildees igualmente eficazes para permitir alcanccedilar o resultado
pretendido (satisfaccedilatildeo do creacutedito) deveraacute o oacutergatildeo julgador valer-se daquela que menos onere
a situaccedilatildeo do executadordquo 138
O dito princiacutepio impede o comportamento abusivo do exequente que possa beneficiar-
se do meio mais danoso ao executado protegendo dessa forma a lealdade e a eacutetica
processual
Os postulados e princiacutepios analisados em linhas preteacuteritas impotildeem ao oacutergatildeo julgador a
observacircncia de alguns criteacuterios para a escolha da medida executiva atiacutepicas a ser utilizada no
caso concreto
Primeiramente a medida executiva atiacutepica deveraacute ser adequada ldquoO criteacuterio da
adequaccedilatildeo impotildee que juiz considere abstratamente uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida
executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia
a gerar o resultadordquo 139 Nesse primeiro momento o juiz deveraacute observar sob a perspectiva do
credor qual medida teraacute o condatildeo de gerar o resultado mais efetivo
Segundo Fredie Didier et al140 o criteacuterio da adequaccedilatildeo eacute
() fortemente inspirado pelo postulado da proporcionalidade e pelo princiacutepio da eficiecircncia na parte em que esse princiacutepio determina a escolha de meios que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo e que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado
Ademais a medida adotada pelo oacutergatildeo julgador deveraacute ser necessaacuteria ldquoEsse criteacuterio
impotildee um limite agrave atuaccedilatildeo judicial funcionando como uma espeacutecie de contrapeso ao criteacuterio
da adequaccedilatildeo Aqui deve-se levar em conta a posiccedilatildeo do devedorrdquo141
O juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental agrave execuccedilatildeo e determinar
uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute necessaacuterio que a
medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado O criteacuterio da necessidade
estabelece que ldquonatildeo se pode ir aleacutem do necessaacuterio para alcanccedilar o propoacutesito almejado Deve
138 Ibid p 113 139 Ibid p 113 140 Ibid p 113 141 Ibid p 114
53
pois o oacutergatildeo julgador determinar o meio executivo na medida do estritamente necessaacuterio para
proporcionar a satisfaccedilatildeo do creacutedito ndash nem menos nem maisrdquo 142
O referido criteacuterio possui forte influecircncia dos postulados da proibiccedilatildeo do excesso e da
razoabilidade assim como do princiacutepio da menor onerosidade para o executado Assevera
Fredie Didier et al143 que
Natildeo eacute razoaacutevel por exemplo impor como primeira opccedilatildeo medida coercitiva a ser suportada pelo agente puacuteblico pelo simples fato de o juiz pressupor que o ente puacuteblico ao qual ele eacute vinculado iraacute descumprir determinada ordem judicial - o descumprimento natildeo pode ser visto como algo ordinaacuterio ou cotidiano (razoabilidade como dever de equidade) Tampouco eacute razoaacutevel eleger a prisatildeo civil como meacutetodo prioritaacuterio para compelir o executado ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer (razoabilidade como dever de equivalecircncia) Aleacutem disso eacute vedada por exemplo a imposiccedilatildeo de multa coercitiva para compelir o executado a emitir declaraccedilatildeo de vontade uma vez que haacute previsatildeo expressa de medida tiacutepica capaz de proporcionar o mesmo resultado sem sacrifiacutecio para o devedor (art 501 CPC)
A afirmaccedilatildeo feita por Bonavides144 em 1997 sobre a adequaccedilatildeo e a necessidade
continua atual sobre os motes
O meio empregado pelo legislador deve ser adequado e necessaacuterio para alcanccedilar o objetivo procurado O meio eacute adequado quando com seu auxiacutelio se pode alcanccedilar o resultado desejado eacute necessaacuterio quando o legislador natildeo poderia ter escolhido outro meio igualmente eficaz mas que natildeo limitasse ou limitasse de maneira menos sensiacutevel o direito fundamental
Por fim a medida deve conciliar os interesses contrapostos ldquoO magistrado deve
ponderar os interesses em jogo aplicando a proporcionalidade em sentido estrito de modo
que as vantagens da utilizaccedilatildeo da medida atiacutepica escolhida superem as vantagens de seu usordquo 145
Esse criteacuterio natildeo privilegia nem o credor nem o devedor e sim a soluccedilatildeo mais
equilibrada e que atenda da melhor forma aos valores em conflito ldquoTrata-se de criteacuterio
inspirado nos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade bem como no princiacutepio da
142 Ibid p 114 143 Ibid p 114 144 BONAVIDES Paulo Curso de Direito Constitucional 7ordm ediccedilatildeo Satildeo Paulo Ed Malheiros 1997
p 372 145 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 114-115
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eficiecircncia na parte em que impotildee ao juiz evitar a escolha do meio executivo que produza
muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscadordquo 146
Cada um dos criteacuterios supracitados devem ser considerados pelo juiz ao aplicar as
medidas executivas atiacutepicas ao caso concreto Para Fredie Didier et al147 as medidas como
retenccedilatildeo de CNH passaporte ou cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado como
forma de pressionaacute-lo ao pagamento da diacutevida pecuniaacuteria natildeo satildeo possiacuteveis
Essas natildeo satildeo medidas adequadas ao atingimento do fim almejado (o pagamento de quantia) - natildeo haacute propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente Tais medidas soam mais como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-lo ao cumprimento da ordem judicial - e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a utilizaccedilatildeo de meios sancionatoacuterios pelo magistrado mas apenas de meios de coerccedilatildeo indireta e sub-rogatoacuterios
Ainda que adequadas fossem a retenccedilatildeo de CNH e do passaporte no corte de fornecimento de aacutegua natildeo parecem ser medidas necessaacuterias (no sentido de exigiacuteveis) uma vez que outras medidas podem em tese ser utilizadas sem causar igual gravame ao executado - como por exemplo a simples restriccedilatildeo do uso de cartotildees de creacutedito A retenccedilatildeo de documentos pessoais eacute medida que termina por restringir a liberdade de ir e vir do executado mostrando-se a princiacutepio natildeo-razoaacutevel por ir de encontro ao dever de equivalecircncia e desproporcional por restringir demais o direito agrave liberdade em favor do direito de creacutedito pecuniaacuterio do exequente
O processualista baiano et al148 cita tambeacutem outro exemplo de medida atiacutepica que natildeo
atingem os criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade
Tampouco parece adequada em princiacutepio determinaccedilatildeo de corte de energia eleacutetrica de todo o preacutedio onde funciona serviccedilo puacuteblico administrativo como forma de pressionar o ente federado a cumprir ordem de nomeaccedilatildeo de candidato em concurso puacuteblico Natildeo parece haver relaccedilatildeo meiofim entre uma coisa e outra Tambeacutem natildeo eacute possiacutevel enxergar essa medida como necessaacuteria no sentido de ser a menos gravosa para o devedor - observe que se trata de medida que uma vez aplicada ensejaria restriccedilatildeo de funcionamento em toda a reparticcedilatildeo puacuteblica em prejuiacutezo de serviccedilos puacuteblicos essenciais ao funcionamento da Administraccedilatildeo o que aleacutem de ser excessivamente gravoso parece natildeo se conformar agrave necessidade de ponderaccedilatildeo dos interesses em jogo - aleacutem de afetar a um sem-nuacutemero de pessoas tomadoras desses serviccedilos
Ademais eacute sabido que toda e qualquer decisatildeo judicial precisa ser fundamentada Ao
se tratar das medidas executivas atiacutepicas o papel da fundamentaccedilatildeo se torna ainda mais
146 Ibid p 115 147 Ibid p 115 148 Ibid p 116
55
importante tendo em vista que eacute pela fundamentaccedilatildeo da decisatildeo que se poderaacute controlar a
adequaccedilatildeo e necessidade da medida atiacutepica
Pelo fato das medidas executivas atiacutepicas derivarem de dispositivos normativos
considerados claacuteusulas gerais propiacutecias as mais variadas interpretaccedilotildees eacute de extrema
importacircncia que o oacutergatildeo julgador fundamente sua decisatildeo
Logo ldquodeve o juiz na fundamentaccedilatildeo decisoacuteria expor racionalmente os motivos da
sua escolha demonstrando com atenccedilatildeo ao art 489 sect 1ordm CPC de que modo a sua opccedilatildeo
atende os criteacuterios da adequaccedilatildeo necessidade e proporcionalidade em sentido estrito ()rdquo 149
Dessa forma os princiacutepios da proporcionalidade e razoabilidade servem para delimitar
o alcance das claacuteusulas gerais de efetivaccedilatildeo fazendo com que o oacutergatildeo julgador se atenha aos
criteacuterios da adequaccedilatildeo e necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao caso
concreto
42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO
EXECUTADO
A entrada em vigor do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 aflorou ainda mais uma
discussatildeo essencial para os processualistas do seacuteculo XXI qual eacute o verdadeiro protagonista do
processo civil
Para os que defendem o ldquoautoritarismo processualrdquo o verdadeiro protagonista do
processo civil eacute o oacutergatildeo judiciaacuterio que em nome do desempenho efetivo de suas funccedilotildees lhes
eacute permitido dilatar os poderes que diga-se de jaacute passagem jaacute compotildeem um vastiacutessimo
arsenal150
Jaacute os ldquogarantistasrdquo 151 do processo civil acreditam que os verdadeiros protagonistas satildeo
as partes do processo e seus direitos e garantias devem ser estritamente preservados
Devido a essa disputa de quem possui maior protagonismo no processo as mudanccedilas
ocorridas no coacutedigo processual vigente quanto agraves medidas executivas atiacutepicas despertaram
149 Ibid p 117 150 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos
atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04102018
151 O processualista Araken de Assis acredita que o termo garantista eacute descabido tendo em vista que remete ao processo penal
56
maior celeuma do que qualquer outra modificaccedilatildeo trazida pelo CPC15 Afinal as referidas
medidas acirravam ainda mais a disputa pelo protagonismo processual
O fato de o CPC15 dispor no art 139 IV que o juiz poderaacute decretar todas as medidas
indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o
cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo
pecuniaacuteria levou boa parte da doutrina e dos juiacutezes a acreditar que teria pleno direito de
aplicar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo Entretanto muitos se esqueceram do outro lado
da moeda esqueceram que a dignidade humana do executado tambeacutem eacute um direito
fundamental e natildeo pode ser violado
Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa152
acreditam que
() natildeo parece producente elencar um rol abstrato das medidas que poderiam ser aplicadas pelo juiz a tiacutetulo do art 139 IV CPC Afinal se busca a efetividade da execuccedilatildeo e esta soacute pode ser identificada agrave luz das especificidades da situaccedilatildeo concreta Ideal eacute enveredar pela loacutegica modular (adequaccedilatildeo ao caso) natildeo pela geneacuterica (soluccedilotildees abstratas de pretensa utilidade universal)
Em razatildeo de o dispositivo apresentar uma gama de poderes tatildeo amplos agrave disposiccedilatildeo do
oacutergatildeo julgador sem nenhuma estipulaccedilatildeo de um procedimento legal previamente definido para
que estabeleccedila as condiccedilotildees de sua aplicaccedilatildeo em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo eacute
necessaacuterio que em razatildeo do princiacutepio da dignidade humana natildeo busque definir o que o
dispositivo permite mas de definir o que ele natildeo permite ldquoOu seja propotildee-se a sua
compreensatildeo por exclusatildeo Afinal se ele tem potencialidade para promover a efetividade da
tutela tambeacutem pode provocar lesotildees E como em direito os fins natildeo justificam os meios
ressalta como prioritaacuteria a necessidade de estabelecer limitesrdquo 153
O art 789 do CPC15 disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial e eacute
categoacuterico ao dispor que ldquoo devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para
152 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
153 Ibid sem paginaccedilatildeo
57
o cumprimento de suas obrigaccedilotildees salvo as restriccedilotildees estabelecidas em leirdquo Logo a
execuccedilatildeo somente poderaacute incidir sobre os bens do devedor e natildeo sobre a sua pessoa
Como eacute sabido a Lex Poetelia Papiria de 326 aC foi o primeiro marco legal da
humanizaccedilatildeo das cobranccedilas de diacutevidas abolindo a imposiccedilatildeo ao devedor de castigos
vexatoacuterios e ateacute da pena de morte154
Afinal no direito romano antigo a cobranccedila de diacutevidas poderia recair sobre a pessoa
do devedor que respondia com sua liberdade e ateacute mesmo com seu proacuteprio corpo permitindo
a lei que repartissem tantos pedaccedilos do corpo do devedor quantos fossem seus credores
Nesse sentindo leciona o professor Guilherme Pupe da Noacutebrega155 que
Vem de longe a evoluccedilatildeo no sentido de fazer a responsabilidade por uma obrigaccedilatildeo migrar da pessoa do devedor para seu patrimocircnio Merecem registro especiacutefico como marcos histoacutericos remotos a Lex Poetelia Papiria de 326 aC que aboliu o nexum e possibilidade de escravidatildeo do devedor como garantia da obrigaccedilatildeo e a pignoris capio ou ldquoaccedilatildeo por tomada de penhorrdquo que instituiu a possibilidade de o credor tomar parcela dos bens do devedor como forma de assegurar o adimplemento da diacutevida Aqueles institutos culminariam seacuteculo depois no artigo 789 do CPC de 2015 a consagrar que o devedor responda pela satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo com seus bens presentes e futuros observadas as restriccedilotildees impostas pelas impenhorabilidades legais
Logo o avanccedilar da civilizaccedilatildeo marcou o deslocamento da responsabilidade por
diacutevidas saindo do corpo do devedor para o seu patrimocircnio tendo em vista que a vida
humana a liberdade e a integridade fiacutesica satildeo valores inalienaacuteveis natildeo podendo ser
sacrificadas em benefiacutecio de obrigaccedilotildees pecuniaacuterias 156
Entretanto eacute sabido que a responsabilidade patrimonial eacute excepcionada pela prisatildeo
civil do devedor de verba alimentiacutecia resquiacutecio da responsabilidade pessoal romana
154 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt
httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018
155 NOacuteBREGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139 IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018
156 Ibid sem paginaccedilatildeo
58
No entanto haacute uma justificativa para isso Segundo o processualista Guilherme Pupe
da Noacutebrega157
Eacute que a par de a prisatildeo civil encontrar previsatildeo constitucional no inciso LXVII do artigo 5ordm o raciociacutenio eacute o de que o direito do alimentante agrave liberdade de locomoccedilatildeo cede diante dos direitos agrave vida e agrave dignidade titularizados pelo alimentando e resguardados pelos alimentos Foi esse mesmo raciociacutenio aliaacutes que justificou no passado a ediccedilatildeo da suacutemula 309 pelo STJ agora positivada pelo artigo 528 sect 7ordm que limita a modalidade coercitiva agraves trecircs uacuteltimas prestaccedilotildees vencidas e agraves prestaccedilotildees vincendas A ideia eacute que tendo o alimentando subsistido a despeito do natildeo-pagamento de prestaccedilotildees mais antigas essas verbas teriam perdido o caraacuteter alimentar que na equaccedilatildeo antes apresentada justificaria a prisatildeo civil do alimentante Daiacute por que aqueles valores antigos remanescem exigiacuteveis mas somente pela via da expropriaccedilatildeo
Essa ressalva eacute necessaacuteria tendo em vista que a adoccedilatildeo de teacutecnica de execuccedilatildeo
indireta para incursatildeo radical na esfera de direitos do executado notadamente direitos
fundamentais quando carente de respaldo constitucional natildeo merece acolhimento sob
risco de se atentar contra o devido processo legal (artigo 5ordm LIV da Constituiccedilatildeo)
Como afirma o autor Bruno Dantas158 ldquoembora inexistam estatiacutesticas que permitam
comparaccedilotildees natildeo eacute desarrazoado intuir que os iacutendices de inadimplecircncia despeccedilam na razatildeo
inversa da incidecircncia das ordens judiciais sobre o corpo e a liberdade do devedorrdquo Entretanto
eacute natildeo possiacutevel adotar toda e qualquer medida executiva atiacutepica em nome da efetividade da
execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que se saiba os limites da sua aplicaccedilatildeo
Dessa forma instrumentos que permitam o cumprimento forccedilado de contratos e o pagamento
de diacutevidas satildeo necessaacuterios contudo eacute preciso equilibrar essa exigecircncia com a liberdade e a
dignidade humana
Como citado alhures o art 139 IV ensejou decisotildees como a que determinou a
suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o
passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito em uma accedilatildeo se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo
extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
Na supracitada decisatildeo o princiacutepio da responsabilidade patrimonial natildeo estaacute sendo
efetivado para o que o devedor responda com os seus bens Afinal qual ligaccedilatildeo entre a
157 Ibid sem paginaccedilatildeo 158 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt
httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018
59
restriccedilatildeo de circulaccedilatildeo que diz com o direito de ir e vir (liberdade) com o pagamento de
diacutevidas que diz com a responsabilidade civil159
Ademais por que quem natildeo tem dinheiro para pagar diacutevidas natildeo pode dirigir Por que
natildeo tem condiccedilotildees para pagar o deacutebito natildeo pode ter passaporte Por que quem natildeo tem como
pagar o deve natildeo pode ter cartatildeo de creacutedito
Ao utilizar meios executivos atiacutepicos como os supracitados para compelir o devedor a
satisfazer a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria quando exauridos sem ecircxito os meios tradicionais de bens
penhoraacuteveis salvo quando existe qualquer indiacutecio concreto de ocultaccedilatildeo ou dissipaccedilatildeo de
bens eacute obrigar o devedor abrir matildeo da proteccedilatildeo da lei que lhe impede que seja tomado agrave forccedila
(art 833 CPC e demais disposiccedilotildees que tratam da impenhorabilidade)
Segundo Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa160
Claramente essa pressatildeo visa dar uma aparecircncia de voluntariedade agrave indicaccedilatildeo de bens impenhoraacuteveis pelo proacuteprio executado que na verdade soacute age assim por ser a uacutenica forma de ver-se livre de um grame imposto por medida indutiva despedida de qualquer necessidade ou adequaccedilatildeo Uma intoleraacutevel perversatildeo
Os autores afirmam ainda que o ldquodireito paacutetrio natildeo admite esta contraditio in terminis
sendo inaceitaacutevel a coexistecircncia de regra protetiva do executado com outra que concede ao
juiz poderes para forccedilar (ainda que indiretamente e veladamente) o executado a abrir matildeo
daquela proteccedilatildeordquo 161
Logo eacute cristalino que a suspensatildeo da CNH eacute uma forma incorreta de aplicar a medida
executiva atiacutepica para efetivar o direito fundamental a execuccedilatildeo tendo em vista que o uacutenico
objetivo da referida eacute pressionar o executado abrir matildeo de algum bem impenhoraacutevel para
levantar o dinheiro e cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
A retenccedilatildeo do passaporte igualmente natildeo possui qualquer relaccedilatildeo com a diacutevida do
executado e eacute somente uma forma de tentar pressiona-lo a dispor de um bem que natildeo pode
ser tomado agrave forccedila e puni-lo por natildeo ter cumprido voluntariamente com a sua obrigaccedilatildeo
159 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
160 Ibid sem paginaccedilatildeo 161 Ibid sem paginaccedilatildeo
60
Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa162
acreditam que tal medida eacute equivocada e se torna excessivamente onerosa ao executado
As mais variadas circunstacircncias relevem o equiacutevoco de tal medida aplicada assim genericamente Com efeito nada justifica reter o passaporte do executado e impedi-lo de viajar para o exterior quando eacute agraciado inclusive com todas as despesas pagas com presente sorteio ou precircmio (por completar tempo de serviccedilo ou atingir metas produtividade na sociedade empresaacuteria em que trabalha) Como todo custo eacute suportado por terceiro e por isso mesmo a sua realizaccedilatildeo pelo executado natildeo traria qualquer prejuiacutezo ao exequente e a retenccedilatildeo do passaporte natildeo seria injustificaacutevel
Paulo Antonio Papini163 acredita que natildeo tem a apreensatildeo de passaporte natildeo possui um
fundamento plausiacutevel tendo em vista que se o devedor natildeo pode viajar para saldar o deacutebito
tambeacutem natildeo poderia exercer atividades cotidianas
Com todo o respeito a quem pensa dessa forma o argumento eacute muito simploacuterio e natildeo precisamos sequer do Direito para derrubaacute-lo Com efeito se considerarmos que ndash ateacute mesmo pelas dimensotildees continentais do Brasil ndash natildeo eacute incomum que uma passagem para o Nordeste custe mais caro que um voo para Miami seria razoaacutevel entatildeo seguindo a linha argumentativa do Magistrado em questatildeo que se oficiasse aos oacutergatildeos reguladores da aviaccedilatildeo civil proibindo-se aquele devedor de fazer ateacute mesmo voos domeacutesticos Poder-se-ia ir mais longe jaacute que natildeo tem dinheiro para pagar suas diacutevidas certamente aquele devedor tambeacutem natildeo teria para comer fora de sua casa porque entatildeo natildeo determinar a expediccedilatildeo de ofiacutecio aos restaurantes proacuteximos agrave sua casa e determinar tambeacutem a proibiccedilatildeo de que ele fosse servidoatendido
O autor se questiona ainda ldquoSeraacute entatildeo que o Princiacutepio da Dignidade da Pessoa
Humana estaacute de mero enfeite em nossa Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ()rdquo 164 Tendo em vista
que ldquoa decisatildeo em comento viola diretamente o art 5ordm incisos XV LIII e LXIII da
Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ndash falamos do Direito de Ir e Virrdquo 165
Ademais o cancelamento do cartatildeo de creacutedito eacute mais uma forma de constranger e
compelir o executado a cumprir com a obrigaccedilatildeo de qualquer forma natildeo importando o que
precise fazer para conseguir saldar o deacutebito tendo em vista que a referida medida apresenta
162 Ibid sem paginaccedilatildeo 163 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo
pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018
164 Ibid sem paginaccedilatildeo 165 Ibid sem paginaccedilatildeo
61
qualquer adequaccedilatildeo com o fim desejado (reverter em pagamento para o exequente) Os
autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa afirmam que166
Reconhece-se que as razotildees da afirmaccedilatildeo ora questionada satildeo ateacute intuitivas mas eacute plenamente possiacutevel problematiza-las Ora natildeo se encontra qualquer justificativa idocircnea para que o juiz possa cancelar o contrato do executado com a administradora do cartatildeo de creacutedito (ou instituiccedilatildeo financeira) que natildeo tem qualquer relaccedilatildeo com o creacutedito exequendo muito menos como isso poderia impactar positivamente na execuccedilatildeo (senatildeo para pressionar o executado a dispor de bens impenhoraacuteveis) Ademais natildeo foram indicados sequer sinais de que o executado realiza gastos supeacuterfluos com o cartatildeo de creacutedito ndash natildeo que isso justificasse a medida pois o correto seria penhorar os esses bens (se duraacuteveis naturalmente) ao inveacutes de cancelar o cartatildeo de creacutedito
Logo as referidas medidas natildeo possuem qualquer relaccedilatildeo com o atingimento do fim
almejado (o pagamento de quantia) tendo em vista que natildeo haacute uma relaccedilatildeo meiofim entre
tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a
restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia
ao exequente
Dessa forma nota-se que as medidas de suspensatildeo da CNH retenccedilatildeo de passaporte e
bloqueio do cartatildeo de credito satildeo completamente inadequadas agrave realizaccedilatildeo a que se prestam
Afinal ldquotais medidas soam como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-
lo ao cumprimento da ordem judicial ndash e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a
utilizaccedilatildeo dos meios sancionatoacuterios pelo magistrado ()rdquo167
Como exposto em linhas preteacuteritas o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades
de aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e
razoaacutevel se atendo aos criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas
executivas atiacutepicas ao caso concreto sob pena de converter a medida em de indutiva para
punitiva
A utilizaccedilatildeo de medidas atiacutepicas como a suspensatildeo da carteira de motorista e o
passaporte do devedor abandona a regra da responsabilidade patrimonial e atingem em cheio
o nuacutecleo de direitos inerentes agrave condiccedilatildeo humana
166 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
167 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 115
62
O limite para a aplicaccedilatildeo de tais medidas deve ser a Constituiccedilatildeo Federal e sobretudo
os Direitos fundamentais nela expressos ldquoCom efeito natildeo haacute saiacuteda tampouco soluccedilatildeo eficaz
de um problema sem que se respeite a Lei e o Devido Processo Legal (por mais nobres que
sejam as intenccedilotildees)rdquo 168
Dessa forma a busca desenfreada pelo cumprimento das decisotildees judiciais em
especial na fase executiva natildeo pode ser realizada em sacrifiacutecio de direitos fundamentais O
Poder Judiciaacuterio natildeo pode resolver a crise do processo executoacuterio utilizando de medidas
arbitraacuterias com o propoacutesito de satisfazer obrigaccedilotildees pecuniaacuterias
Eis o dilema que se coloca diante do poder geral de efetivaccedilatildeo ele pode servir de
potente instrumento em prol da tutela jurisdicional executiva entretanto se manejado de
modo improacuteprio serviraacute de instrumento de puniccedilatildeo e humilhaccedilatildeo do executado169
Eacute notoacuterio que se amplamente aplicado o poder geral de efetivaccedilatildeo reduziria os
iacutendices de inadimplecircncia quiccedilaacute resolveria por completo a crise da execuccedilatildeo civil Entretanto
o retrocesso civilizatoacuterio seria irreparaacutevel
168 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo
pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018
169 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
63
5 CONCLUSAtildeO
Como funccedilatildeo jurisdicional que tem como objeto a efetivaccedilatildeo de direitos a execuccedilatildeo
deve sempre buscar a maior satisfaccedilatildeo possiacutevel concretizando integralmente o creacutedito do
exequente isto eacute realizando o direito fundamental agrave tutela executiva do credor Por isso a
adoccedilatildeo de meios executivos atiacutepicos incorporados pelo Coacutedigo de Processo Civil de 2015 por
meio do art139 IV em um primeiro momento podem ser consideradas vaacutelidas visto que
servem de instrumento para a satisfaccedilatildeo e asseguraccedilatildeo de direitos do credor
Entretanto para o oacutergatildeo julgador natildeo cometa arbitrariedades em nome do direito
fundamental agrave execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que seja definido certos limites na adoccedilatildeo do poder
geral de efetivaccedilatildeo
As medidas executivas atiacutepicas natildeo podem ser aplicadas de maneira indiscriminada
logo devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o esgotamento das medidas tiacutepicas e
a possibilidade de cumprimento da obrigaccedilatildeo
Partindo dessa premissa as medidas a serem adotadas pelo juiz no caso concreto
devem ter como baliza os princiacutepios da proporcionalidade e da razoabilidade para que natildeo
ultrapassem a responsabilidade patrimonial do devedor e incidida diretamente sobre sua
pessoa
Para que natildeo seja atingida a pessoa do executado ou seja para que o devedor natildeo
tenha sua dignidade humana viola eacute necessaacuterio que a medida atiacutepica seja adequada e
necessaacuteria
Logo o juiz deveraacute sempre estabelecer uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida
executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia
a gerar o resultado sem violar a dignidade humana do executado
Dessa o juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental a execuccedilatildeo e
determinar uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute
necessaacuterio que a medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado
As medidas que ultrapassam esses limites como a decisatildeo que apreendeu o
passaporte suspensatildeo a CNH e bloqueou o cartatildeo de creacutedito do devedor satildeo meramente
punitivas posto que essas natildeo satildeo as medidas mais adequadas para se atingir o fim almejado
pois natildeo existe propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado
64
uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo
geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente
Medidas como esta servem de embasamento para decisotildees arbitraacuterias e autoritaacuterias de
violaccedilatildeo dos direitos fundamentais transformando o poder geral de efetivaccedilatildeo em
instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com autorizaccedilatildeo judicial
Em suma o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades de aplicaccedilatildeo do poder
geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e razoaacutevel se atendo aos
criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao
caso concreto sob pena de punir a pessoa do executado violando a sua dignidade humana
em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo
65
REFEREcircNCIAS
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- 1 INTRODUCcedilAtildeO
- 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
-
- 21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL
- 22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
- 23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
- 24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO
- 25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO
-
- 3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
-
- 31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS
-
- 311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15
-
- 32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
- 33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
- 34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
-
- 4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
-
- 41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
- 42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
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- 5 CONCLUSAtildeO
- REFEREcircNCIAS
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DIANDRA GRADIN SCHAUN
OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA
ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE
HUMANA DO EXECUTADO
Monografia aprovada como requisito para obtenccedilatildeo do grau de Especialista em Direito
Processual Civil pela seguinte banca examinadora
Nome _______________________________________________________________
Titulaccedilatildeo e instituiccedilatildeo __________________________________________________
Nome _______________________________________________________________
Titulaccedilatildeo e instituiccedilatildeo __________________________________________________
Nome _______________________________________________________________
Titulaccedilatildeo e instituiccedilatildeo __________________________________________________
Salvador ______2018
RESUMO
A prestaccedilatildeo jurisdicional natildeo se concretiza depois de encerrada a fase de conhecimento Para
que a referida prestaccedilatildeo se consume eacute necessaacuterio que ocorra a satisfaccedilatildeo do deacutebito pelo
devedor que em grande parte soacute se efetiva atraveacutes da tutela executiva Entretanto a execuccedilatildeo
civil sempre sofreu uma crise quanto a sua efetividade e o Coacutedigo de Processo Civil de 2015
com o escopo de dirimir a ineficiecircncia do instituto concebeu novas diretrizes ao processo
executoacuterio Dessa forma o art 139 IV do Coacutedigo de Processo Civil estabeleceu a
possibilidade de o juiz dispor de todas as medidas necessaacuterias para assegurar o cumprimento
de ordem judicial trazendo como grande inovaccedilatildeo a aplicaccedilatildeo dessas medidas tambeacutem nas
obrigaccedilotildees de pagar quantia Todavia eacute necessaacuterio estabelecer criteacuterios limitadores para que a
adoccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo viole a dignidade humana do executado em nome do
direito fundamental agrave execuccedilatildeo
Palavras-chaves Execuccedilatildeo Poder geral de efetivaccedilatildeo Direito fundamental agrave execuccedilatildeo
Dignidade humana do executado
SUMAacuteRIO
1 INTRODUCcedilAtildeO 5
2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL 7
21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL 7
22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL 8
23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL 11
24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO 17
25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO 20
3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 23
31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS 23
311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15 25
32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO 28
33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO 31
34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 36
4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 48
41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO 48
42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 55
5 CONCLUSAtildeO 63
REFEREcircNCIAS 65
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
Art ndash Artigo
CPC15 ndash Coacutedigo de Processo Civil de 2015
CPC73 ndash Coacutedigo de Processo Civil de 1973
ENFAM ndash Escola nacional de formaccedilatildeo e aperfeiccediloamento de magistrados
HC ndash Habeas Corpus
STJ ndash Superior Tribunal de Justiccedila
5
1 INTRODUCcedilAtildeO
A prestaccedilatildeo jurisdicional natildeo costuma se findar apoacutes o encerramento da fase cognitiva
com a prolaccedilatildeo de uma sentenccedila de meacuterito Para que a referida prestaccedilatildeo se concretize eacute
imperioso que haja a satisfaccedilatildeo do deacutebito pelo devedor
Entretanto observa-se em diversos casos o inadimplemento da parte passiva
processual sendo necessaacuterio desenvolver a atividade executiva A referida atividade possui o
escopo de satisfazer direitos
Isso porque o processo natildeo eacute um fim em si mesmo sendo apenas um exerciacutecio da
jurisdiccedilatildeo estatal Dessa forma a razatildeo de ser do processo eacute o atingimento da sua finalidade
almejada que eacute a prestaccedilatildeo da tutela jurisdicional
Todavia como a tutela jurisdicional configura-se na obrigaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio
proteger e reparar os direitos lesionados ou ameaccedilados de lesatildeo muitas vezes a dita tutela
somente consegue ser efetivada atraveacutes da atividade executiva da jurisdiccedilatildeo
Ocorre que a execuccedilatildeo civil sempre foi o ldquocalcanhar de Aquilesrdquo do sistema
processual e de modo geral vinha sofrendo uma crise quanto a sua efetividade Ou seja o
credor obtia ecircxito na fase de conhecimento entretanto natildeo conseguia alcanccedilar o seu direito a
prestaccedilatildeo reconhecida na fase de execuccedilatildeo
Com o fito de tornar a atividade satisfativa mais eficiente e mais ceacutelere o Coacutedigo de
Processo Civil de 2015 concebeu novas diretrizes ao processo no sentindo de harmonizar
suas com os ditames da Constituiccedilatildeo Federal principalmente com os direitos fundamentais
As normas fundamentais do processo civil trazidas pelo CPC15 preocupam-se
primordialmente com a efetividade da tutela jurisdicional
Em conformidade com essa nova sistemaacutetica o legislador no art 139 IV do Coacutedigo
de Processo Civil estabeleceu a possibilidade de o juiz dispor de todas as medidas indutivas
coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o cumprimento de
ordem judicial trazendo como grande novidade a aplicaccedilatildeo dessas medidas executoacuterias
atiacutepicas tambeacutem nas obrigaccedilotildees de pagar dinheiro
6 Entretanto natildeo haacute na legislaccedilatildeo criteacuterios especiacuteficos que auxiliem o oacutergatildeo julgador na
escolha das medidas executivas atiacutepicas que se adotadas sem qualquer baliza podem
acarretar consequecircncias juriacutedicas irreparaacuteveis
Como a famosa decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de
Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-1320138260011 Nessa accedilatildeo
que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo
pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a suspensatildeo da
Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o passaporte e
cancelou os cartotildees de creacutedito como forma de compeli-lo a adimplir com o deacutebito
Decisotildees como esta geram conflitos entre direitos constitucionalmente instituiacutedos De
um lado o direito fundamental agrave tutela jurisdicional e de outro os direitos e garantias
inerentes a todos os indiviacuteduos
Dessa forma a presente monografia tem como escopo de estabelecer criteacuterios
limitadores para que a adoccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo viole a dignidade humana do
executado em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo
7 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO
CIVIL
21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL
A Execuccedilatildeo Civil nasce a partir do direito a uma prestaccedilatildeo conferida a algueacutem de
exigir de outrem o cumprimento de uma conduta de fazer natildeo fazer ou de dar (dinheiro ou
coisa distinta) 1
Para que o direito a uma prestaccedilatildeo se concretize no mundo fiacutesico eacute necessaacuterio que
haja a satisfaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida pelo sujeito passivo Caso contraacuterio fala-se em
inadimplemento ou lesatildeo O titular do direito natildeo tem como agir por si para efetivar o seu
direito a prestaccedilatildeo posto que a autotutela eacute vedada no ordenamento juriacutedico Dessa forma eacute
necessaacuterio que se recorra ao Poder Judiciaacuterio para que se possa ter a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo
devida logo a tutela jurisdicional executiva2
O processualista Fredie Didier et al3 equaciona essa questatildeo da seguinte maneira
Quando se pensa em tutela executiva pensa-se na efetivaccedilatildeo de direitos a uma prestaccedilatildeo fala-se de um conjunto de meios para efetivar a prestaccedilatildeo devida fala-se em execuccedilatildeo de fazer natildeo-fazer dar exatamente os trecircs tipos de prestaccedilatildeo existentes Natildeo eacute por acaso nem por coincidecircncia que a tutela executiva pressupotildee inadimplemento (CPC art 786) - fenocircmeno exclusivo dos direitos a uma prestaccedilatildeo Eacute por isso tambeacutem que se pode falar em prescriccedilatildeo da execuccedilatildeo (CPC art 802 e suacutemula do STF n 150) - prescriccedilatildeo eacute fenocircmeno juriacutedico que se relaciona aos direitos a uma prestaccedilatildeo A execuccedilatildeo forccedilada dirige-se ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo Essa relaccedilatildeo entre direito material e processo eacute fundamental para a compreensatildeo do fenocircmeno executivo
Nesse iacutenterim para o Ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux4 ldquoexecutar eacute
satisfazerrdquo ao passo que o professor Fredie Didier et al5 formulou um conceito mais amplo
ldquoExecutar eacute satisfazer uma prestaccedilatildeo devida A execuccedilatildeo pode ser espontacircnea quando o
devedor cumpre voluntariamente a prestaccedilatildeo ou forccedilada quando o cumprimento da prestaccedilatildeo
eacute obtido por meio de atos executivos pelo Estadordquo
1 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 41 2 Ibid p 42 3 Ibid p 42 4 FUX Luiz Curso de direito processual civil Rio de Janeiro Forense 2001 p 980 5 DIDIER JR Fredie et al Op Cit p 45
8 Dessa forma a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional responsaacutevel pela
concretizaccedilatildeo de um direito subjetivo no plano material obtendo resultado idecircntico ou
equivalente ao atingiacutevel se o devedor cumprisse espontaneamente a prestaccedilatildeo
Todavia essa atividade jurisdicional soacute cabe quando o devedor se recusa a cumprir
com a obrigaccedilatildeo quebrando a expectativa do credor de receber o que lhe eacute devido Por esta
razatildeo que se diz que a execuccedilatildeo civil eacute ldquoforccediladardquo 6
Eacute o que se conclui seguindo os ensinamentos de Leonardo Greco7 para ele execuccedilatildeo eacute
uma
() modalidade de tutela jurisdicional que consiste na praacutetica pelo juiz (ou por outrem sob a sua supervisatildeo) de uma seacuterie de atos coativos concretos sobre o devedor e sobre o seu patrimocircnio a fim de agrave custa dele e independentemente do concurso da sua vontade tornar efetivo o cumprimento de prestaccedilatildeo por ele inadimplida desde que tais atos coativos estejam previamente constituiacutedos em lei
Portanto a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional que tem como escopo obter o
cumprimento de uma prestaccedilatildeo certa e inadimplida mediante atos coativos sobre o devedor e
seus bens
22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
Vislumbrado o conceito de execuccedilatildeo civil cabe agora empreender a sua classificaccedilatildeo
tendo em vista que a execuccedilatildeo pode se manifestar de diversas formas possuindo diferentes
caracteriacutesticas em cada uma das suas modalidades
Inicialmente cabe destacar que haacute duas teacutecnicas processuais para viabilizar a execuccedilatildeo
civil lato sensu eacute a que divide em processo autocircnomo de execuccedilatildeo e em fase de execuccedilatildeo
dependendo do tiacutetulo executivo que justifica o exerciacutecio da atividade satisfativa
O Coacutedigo Processual Civil de 2015 acertadamente ratificou as reformas promovidas
no CPC73 que consagrava a opccedilatildeo legislativa de oferecimento das tutelas de certificaccedilatildeo e
efetivaccedilatildeo do direito em um mesmo processo Dessa forma as execuccedilotildees de sentenccedilas
6 BASTOS Luiz Fernando Pereira O artigo 139 IV do novo Coacutedigo de Processo Civil a atipicidade
dos meios executivos na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia certa Brasiacutelia 2017 Disponiacutevel em lt httpbdmunbbrbitstream104831866812017_LuizFernandoPereiraBastospdf gt Acesso em 06 de agosto de 2018
7 BASTOS Luiz Fernando Pereira apud GRECO Leonardo O processo de execuccedilatildeo Rio de Janeiro Renovar 1999 p 164
9
passaram a ser uma fase complementar ao de processo de conhecimento e natildeo mais ocorrer
em um processo autocircnomo
No entendimento do professor processualista Fredie Didier et al8 o processo
sincreacutetico simplificou a efetivaccedilatildeo de um direito reconhecido em sentenccedila
A dispensa do ajuizamento de um processo autocircnomo para execuccedilatildeo de sentenccedila natildeo soacute veio diminuir o tempo necessaacuterio agrave prestaccedilatildeo da tutela jurisdicional - afinal o credor natildeo mais precisaria tal como ocorria ateacute entatildeo promover nova citaccedilatildeo pessoal do reacuteudevedor- como tambeacutem veio romper de vez com um velho paradigma segundo o qual a atividade executiva estaria dissociada da precedente atividade jurisdicional cognitiva
Entretanto natildeo soacute as sentenccedilas de meacuterito ensejam uma execuccedilatildeo Por esta razatildeo foi
necessaacuterio manter o processo autocircnomo de execuccedilatildeo para os casos em que o credor tem a seu
favor um documento que natildeo tenha sido proferido por um oacutergatildeo dotado de jurisdiccedilatildeo
Consequentemente se for o titulo executivo judicial o caminho natural eacute o do
cumprimento de sentenccedila Sendo por sua vez extrajudicial o titulo executivo o caminho
correto eacute o processo de execuccedilatildeo
Cabe ainda salientar que toda execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial eacute definitiva Jaacute a
execuccedilatildeo de tiacutetulo judicial (cumprimento de sentenccedila) pode ser definitiva ou provisoacuteria
No primeiro caso isto eacute cumprimento de sentenccedila definitivo ldquoeacute a execuccedilatildeo completa
que vai ateacute a fase final (com a entrega do bem da vida) sem exigecircncias adicionais para o
exequenterdquo 9
Quanto ao segundo caso ldquoo cumprimento provisoacuterio de sentenccedila (fundada em tiacutetulo
provisoacuterio) eacute aquele que exige alguns requisitos extras para que se chegue agrave fase final da
execuccedilatildeordquo 10
Para Fredie Didier11 o criteacuterio para definir se o cumprimento de sentenccedila seraacute
definitivo ou provisoacuterio
() eacute a estabilidade do tiacutetulo executivo em que se funda a execuccedilatildeo se se tratar de decisatildeo acobertada pela coisa julgada material o cumprimento de sentenccedila eacute
8 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 46 9 Ibid p 57 10 Ibid p 57 11 Ibid p 57
10
definitivo se se tratar de decisatildeo judicial ainda passiacutevel de alteraccedilatildeo (reforma ou invalidaccedilatildeo) em razatildeo da pendecircncia de recurso contra ela interposto a que natildeo tenha sido atribuiacutedo efeito suspensivo o cumprimento de sentenccedila eacute provisoacuterio
Ademais a execuccedilatildeo se distingue em procedimentos executivos comuns que satildeo da
execuccedilatildeo civil e que servem a uma generalidade de creacuteditos como eacute o caso do cumprimento
de sentenccedila e o processo de execuccedilatildeo E em procedimentos executivos especiais que servem
agrave satisfaccedilatildeo de creacuteditos peculiares como a execuccedilatildeo de alimentos e a execuccedilatildeo fiscal 12
Por fim cabe mencionar a classificaccedilatildeo que distingue a execuccedilatildeo em direta e indireta
A primeira execuccedilatildeo direita (ou execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo) eacute ldquo() aquela em que o
Poder Judiciaacuterio prescinde da colaboraccedilatildeo do executado para a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida
e pois promove uma substituiccedilatildeo da sua conduta pela conduta do proacuteprio Estado-juiz ou de
terceirordquo 13 Ou seja as medidas executivas satildeo levadas a efeito mesmo contra a vontade do
devedor na execuccedilatildeo direta
Segundo a doutrina a execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo se subdivide da seguinte forma
meios de desapossamento meios de transformaccedilatildeo e meios de expropriaccedilatildeo
Os meios de desapossamento muito comuns nas execuccedilotildees para entrega de coisa eacute a
forma ldquopor meio da qual se retira da posse do executado o bem a ser entregue ao exequente
(p ex despejo busca e apreensatildeo reintegraccedilatildeo de posse)rdquo 14 Ao passo que por meio dos de
transformaccedilatildeo ldquo() o juiz determina que um terceiro pratique a conduta que deveria ser
praticada pelo executado cabendo a este arcar com o pagamento do custo respectivordquo 15 Jaacute
os meios executivos de expropriaccedilatildeo eacute a forma ldquopor meio do qual algum bem do patrimocircnio
do devedor eacute expropriado para pagamento do creacutedito (adjudicaccedilatildeo alienaccedilatildeo judicial ou
apropriaccedilatildeo de frutos e rendimentos de empresa ou de estabelecimentos e de outros bens art
825 CPC)rdquo 16
12 Ibid p 48 13 Ibid p 50 14 Ibid p 51 15 Ibid p 51 16 Ibid p 51
11 Jaacute a execuccedilatildeo indireta (ou mandamental) atua ldquo() na vontade do devedor como forma
de compeli-lo ou incentivaacute-lo a cumprir a ordem judicialrdquo 17 Nesse entendimento ainda
leciona Fredie Didier et al 18
Nesses casos o Estado-juiz busca promover a execuccedilatildeo com a colaboraccedilatildeo do executado forccedilando ou incentivando a que ele proacuteprio cumpra a prestaccedilatildeo devida Em vez de o Estado-juiz tomar as providecircncias que deveriam ser tomadas pelo executado o Estado forccedila por meio de coerccedilatildeo psicoloacutegica ou de promessa de recompensa judicial a que o proacuteprio executado cumpra a prestaccedilatildeo
A execuccedilatildeo indireta pode ser patrimonial como por exemplo a imposiccedilatildeo de multa
coercitiva ou pessoal com a prisatildeo civil do devedor de alimentos Ademais adiciona Didier
et al19que
O estiacutemulo ao cumprimento da prestaccedilatildeo pode dar-se pelo temor (p ex multa coercitiva prisatildeo civil do devedor de alimentos divulgaccedilatildeo de notiacutecia em jornal revelando o descumprimento) ou pelo incentivo (p ex a chamada sanccedilatildeo premial ou sanccedilatildeo positiva de que eacute exemplo a isenccedilatildeo do pagamento de custas em caso de cumprimento do mandado monitoacuterio - art 701 sect 1ordm CPC a reduccedilatildeo pela metade dos honoraacuterios advocatiacutecios fixados inicialmente pelo juiacutezo em caso de pagamento integral do deacutebito pecuniaacuterio na execuccedilatildeo por quantia certa fundada em tiacutetulo extrajudicial - art 827 sect 1ordm CPC)
Por tais razotildees haacute uma tendecircncia em cada vez mais prestigiar os meios executivos
indiretos (coercitivos) posto que satildeo tatildeo eficazes quanto os meios executivos diretos
entretanto menos onerosos Contudo sua aplicaccedilatildeo deve ser fiscalizada a fim de natildeo permitir
que a execuccedilatildeo civil perca sua finalidade visto que eacute uma funccedilatildeo jurisdicional que tem como
escopo efetivar o direito do credor e natildeo de atender os interesses do devedor
23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
Os princiacutepios juriacutedicos nos uacuteltimos anos passaram a ser munidos de forccedila cogente
normatizando as condutas humanas tanto quanto as regras juriacutedicas Os ditos princiacutepios
ampliaram as margens de atuaccedilatildeo dos aplicadores do direito possibilitando a construccedilatildeo de
soluccedilotildees mais adequadas agraves especificidades das demandas que chegam ao judiciaacuterio
17 Ibid p 51 18 Ibid p 51 19 Ibid p 51-52
12 Dessa forma eacute necessaacuterio aprofundar-se nos princiacutepios norteadores da execuccedilatildeo civil
para que se obtenha uma anaacutelise completa da teoria geral da execuccedilatildeo
A execuccedilatildeo civil tem como um dos seus corolaacuterios o princiacutepio da efetividade este
consiste na exigecircncia de um sistema completo de tutela executiva no qual existam meios
executivos capazes de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor
de tutela executivardquo 20
O referido princiacutepio da efetividade eacute reforccedilado como normal fundamental do processo
civil brasileiro pelo art 4ordm do CPC ldquoArt 4ordm As partes tecircm o direito de obter em prazo razoaacutevel
a soluccedilatildeo integral do meacuterito incluiacuteda a atividade satisfativa
Jaacute o princiacutepio da boa feacute processual corolaacuterio do devido processo legal estaacute previsto
no art 5ordm do CPC ldquoAquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de
acordo com a boa-feacuterdquo Segundo o processualista baiano Fredie Didier21
O princiacutepio da boa-feacute extrai-se de uma claacuteusula geral processual A opccedilatildeo por uma claacuteusula geral de boa-feacute eacute a mais correta Eacute que a infinidade de situaccedilotildees que podem surgir ao longo do processo torna pouco eficaz qualquer enumeraccedilatildeo legal exaustiva das hipoacuteteses de comportamento desleal Daiacute ser correta a opccedilatildeo da legislaccedilatildeo brasileira por uma norma geral que impotildee o comportamento de acordo com a boa-feacute Em verdade natildeo seria necessaacuteria qualquer enumeraccedilatildeo das condutas desleais o art 5deg do CPC eacute bastante exatamente por tratar-se de uma claacuteusula geral
Dessa forma o dito princiacutepio preconiza que diante de um vinculo juriacutedico as pessoas
envolvidas natildeo poderatildeo frustrar a confianccedila do outro devendo comportar-se como se pode
esperar de uma pessoa de boa-feacute
Ademais disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial que ldquosomente o
patrimocircnio do devedor (art 789 CPC) ou de terceiro responsaacutevel pode ser objeto da
atividade executiva do Estadordquo 22
O referido princiacutepio que determina que somente o patrimocircnio submete-se agrave execuccedilatildeo
e natildeo a pessoa foi trazido pela humanizaccedilatildeo do direito Para o professor Didier et al23 o
20 DIDIER JR Freddie et al apud GUERRA Marcelo Lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do
credor na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 21 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte
geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 105 22 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 68
13
desenvolvimento dos meios de execuccedilatildeo indireta ldquoparece relativizar um pouco esse princiacutepio
na medida em que pressionam psicologicamente a pessoa do devedor para que cumpra a
obrigaccedilatildeo com seu comportamentordquo
Complementa ainda que
A responsabilidade executiva parece assumir atualmente caraacuteter hiacutebrido comportando coerccedilatildeo pessoal e sujeiccedilatildeo patrimonial
i) a coerccedilatildeo pessoal incide sobre a vontade do devedor admitindo o uso de medidas coercitivas de execuccedilatildeo indireta para forccedilaacute-lo a cumprir a obrigaccedilatildeo com seu proacuteprio comportamento (ex arts 139 rv 523 sect 1ordm 536 sect 1ordm e 538 sect 3ordm todos do CPC)
ii) descumprida a obrigaccedilatildeo e natildeo sendo possiacuteveladequado o uso de teacutecnica de coerccedilatildeo pessoal tem-se a sujeiccedilatildeo patrimonial que recairaacute sobre os bens do devedor ou de terceiro responsaacutevel - que responderatildeo pela proacutepria prestaccedilatildeo in natura (ex dar coisa ou entregar quantia) ou por perdas e danos24
Dessa forma o referido princiacutepio natildeo tem aplicaccedilatildeo absoluta em razatildeo do principio da
efetividade a qual estimula o uso dos meios de coerccedilatildeo indireta para garantir o cumprimento
da obrigaccedilatildeo pelo devedor
O princiacutepio da primazia da tutela especifica (ou princiacutepio do resultado) assevera que
ldquoA execuccedilatildeo deve ser especiacutefica propiciar ao credor a satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo tal qual
houvesse o cumprimento espontacircneo da prestaccedilatildeo pelo devedorrdquo 25
O CPC de 2015 absorveu todos os avanccedilos legislativos a cerca do mote O caput do
art 497 assegura que na accedilatildeo que tenha por objeto a prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer o
juiz se procedente o pedido concederaacute a tutela especiacutefica ou determinaraacute providecircncias que
assegurem a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico equivalente O art 499 o
complementa a obrigaccedilatildeo somente seraacute convertida em perdas e danos se o autor o requerer
ou se impossiacutevel agrave tutela especiacutefica ou a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico
equivalente
O princiacutepio do contraditoacuterio eacute garantido pela constituiccedilatildeo federal e compreende o
direito de ser ouvido o direito de acompanhar os atos processuais o direito de produzir
provas participar da sua produccedilatildeo manifestar-se sobre a prova produzida e obter do juiz a
23 Ibid p 69-70 24 Ibid p 70 25 Ibid p 71
14
respectiva valoraccedilatildeo o direito de ser informado regularmente dos atos praticados no processo
o direito agrave motivaccedilatildeo das decisotildees o direito de impugnar as decisotildees 26
O contraditoacuterio tem aplicaccedilatildeo em todo processo judicial sendo aplicaacutevel tambeacutem na
execuccedilatildeo No entanto o contraditoacuterio na execuccedilatildeo natildeo ocorre com a mesma intensidade que
no processo ou na fase de conhecimento eacute o que assevera Didier et al 27
O contraditoacuterio no procedimento executivo no aspecto do direito de defesa assegurado agrave parte demandada eacute eventual porquanto depende da provocaccedilatildeo do executado que natildeo eacute chamado ajuiacutezo para defender-se mas sim para cumprir a obrigaccedilatildeo O procedimento executivo adota a teacutecnica monitoacuteria que consiste basicamente na inversatildeo do ocircnus de provocar o contraditoacuterio o reacuteu em vez de citado para manifestar-se sobre a pretensatildeo do autor eacute convocado para cumprir uma determinada obrigaccedilatildeo
Logo haacute o contraditoacuterio no procedimento executivo porem eacute eventual quanto agrave defesa
do executado
Ademais o princiacutepio da menor onerosidade eacute consagrado pelo art 805 do CPC e
dispotildee que ldquoQuando por vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz
mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o executadordquo O referido princiacutepio tem o
escopo de impedir o abuso do direito pelo exequente
O principio da menor onerosidade auxilia o juiz na escolha de um meio executivo
adequado e necessaacuterio que satisfaccedila a prestaccedilatildeo exigida pelo credor Nesse sentido eacute o
entendimento do professor Fredie Didier et al 28
O resultado a ser alcanccedilado eacute aquele estabelecido pelo direito material A maneira de se chegar ateacute esse resultado eacute que deve ser a menos onerosa possiacutevel para o executado Isso significa que a opccedilatildeo pelo meio menos gravoso pressupotildee que os diversos meios considerados sejam igualmente eficazes Assim havendo vaacuterios meios executivos aptos agrave tutela adequada e efetiva do direito de creacutedito escolhe-se a via menos onerosa ao executado
O princiacutepio visa impedir a execuccedilatildeo desnecessariamente onerosa ao executado ou seja a execuccedilatildeo abusiva Em vez de enumerar situaccedilotildees em que a opccedilatildeo mais gravosa revelar-se-ia injusta o legislador valeu-se corretamente de uma claacuteusula geral para reputar abusivo qualquer comportamento do credor que pretender valer-se de meio executivo mais oneroso do que outro igualmente idocircneo agrave satisfaccedilatildeo do seu creacutedito
26 Ibid p 76 27 Ibid p 78 28 Ibid p 79-80
15 O princiacutepio da cooperaccedilatildeo tem como base os princiacutepios do devido processo legal da
boa-feacute processual e do contraditoacuterio O dito princiacutepio avigora a eacutetica processual com o
aprimoramento do diaacutelogo entre as partes reciprocamente e com o oacutergatildeo jurisdicional Eacute o
que preconiza o art 6ordm do CPC Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para
que se obtenha em tempo razoaacutevel decisatildeo de meacuterito justa e efetiva
No procedimento executivo o princiacutepio da cooperaccedilatildeo incide de diversas formas
disciplina Didier et al29 que na execuccedilatildeo
O executado tem o dever de indicar bens agrave penhora (art 774 V CPC) Natildeo encontrados bens penhoraacuteveis e natildeo havendo indicaccedilatildeo de qualquer um deles pelo exequente cabe ao executado declarar quais satildeo seus bens penhoraacuteveis sob pena de se sujeitar a uma sanccedilatildeo pecuniaacuteria compulsoacuteria
Tambeacutem eacute manifestaccedilatildeo do princiacutepio da cooperaccedilatildeo a exigecircncia de que o executado que pretende impugnar o valor da execuccedilatildeo apresente de logo o valor que reputa devido (art 525 sect 4ordm CPC) Seria comportamento natildeo-cooperativo afirmar que a cobranccedila eacute excessiva sem simultaneamente dizer qual eacute o valor correto
Demais disso aplicam-se agrave execuccedilatildeo os deveres que decorrem do princiacutepio da cooperaccedilatildeo e que satildeo imputados ao oacutergatildeo jurisdicional () Assim por exemplo deve o juiz advertir ao executado antes de puni-lo de que seu ato pode vir a caracterizar-se como atentatoacuterio agrave dignidade da jurisdiccedilatildeo ( art 772 II CPC) perceba que se trata de uma conduta compatiacutevel com o dever de prevenccedilatildeo O oacutergatildeo jurisdicional somente pode conhecer da prescriccedilatildeo ex officio dando a oportunidade de o exequente manifestar-se conforme impotildee o dever de consulta ( cf arts 10 487 paraacutegrafo uacutenico e 921 sect 5ordm CPC)
O princiacutepio ou postulado30 da proporcionalidade tem aplicaccedilatildeo muito relevante na
execuccedilatildeo O art 8 do CPC assegura que o oacutergatildeo jurisdicional tem o dever de observar a
proporcionalidade e a razoabilidade ao aplicar o ordenamento juriacutedico inclusive no
procedimento executivo
Ademais o art 805 do CPC eacute categoacuterico ao disciplinar que ldquoArt 805 Quando por
vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo
menos gravoso para o executadordquo O referido artigo jaacute se trata de uma concretizaccedilatildeo da
proporcionalidade
29 Ibid p 82 30 Segundo Fredie Didier et al haacute uma discussatildeo doutrinaacuteria sobre a proporcionalidade Parte da
doutrina acredita que a proporcionalidade eacute um princiacutepio e outra parte acredita que eacute um postulado normativo
16 O principio da adequaccedilatildeo pode ser vislumbrado em dois momentos do Direito
Processual ldquoa) no legislativo como orientador da confecccedilatildeo das leis b) no jurisdicional
autorizando ao juiz diante do caso concreto adaptar procedimento agraves suas peculiaridadesrdquo 31
Para Luceacutelia de Sena Alves e Tiago Retes32
Isso quer dizer que no momento legislativo o devido processo deve ser observado pelo legislador para a confecccedilatildeo das normas de direito processual que iratildeo servir de instrumento efetivo de concretizaccedilatildeo do direito substancial a ser tutelado atendendo a todas as suas finalidades sob pena de falecircncia do proacuteprio direito No momento jurisdicional da mesma forma a via processual escolhida pelo autor tambeacutem deve estar sujeita a este princiacutepio para que natildeo sofra as mesmas consequecircncias da sua inobservacircncia
O ordenamento juriacutedico deve ser aplicado por meio da teacutecnica processual adequada
evitando dessa forma uma tutela ineficaz
Por fim o princiacutepio do autorregramento da vontade na execuccedilatildeo tem o objetivo de
ldquo() preservar um espaccedilo processual para o exerciacutecio da liberdade e da vontade em que
sejam permitidas negociaccedilotildees que envolvam as partes ndash e tambeacutem o juizrdquo33 Didier et al34
assevera que
A rigor o legislador estabelece um regime juriacutedico de autorregramento da vontade processual identificando-se algumas manifestaccedilotildees relevantes para a execuccedilatildeo Na verdade pode-se dizer que poucos satildeo os ambientes mais propiacutecios do que a execuccedilatildeo para a negociaccedilatildeo sobre o processo Todos os institutos e normas processuais relativos agrave execuccedilatildeo devem ser repensados a partir da premissa de que o CPC permite uma ampla margem de liberdade de negociaccedilatildeo sobre o processo (art 190 CPC)
O autorregramento da vontade pode ser vislumbrando na previsatildeo de negoacutecios tiacutepicos
em sede de execuccedilatildeo como por exemplo no acordo das partes sobre o valor do bem que
dispensa a avaliaccedilatildeo disposto no inciso I do art 871 CPC Ademais dentro dos limites do art
190 do CPC eacute possiacutevel na execuccedilatildeo a atribuiccedilatildeo da negociaccedilatildeo atiacutepica aos sujeitos 31 ALVES Luceacutelia de Sena Alves RETES Tiago O poder geral de efetivaccedilatildeo das decisotildees judiciais e
proporcionalidade uma anaacutelise criacutetica acerca do art 139 IV do Novo Coacutedigo de Processo Civil Disponiacutevel em lthttpswwwacademiaedu31752652O_poder_geral_de_efetivaC3A7C3A3o_das_decisC3B5es_judiciais_e_a_proporcionalidade_uma_anC3A1lise_crC3ADtica_acerca_do_art_139_IV_do_Novo_CC3B3digo_de_Processo_Civil gt Acesso em 25 de julho de 2018
32 Ibid natildeo paginado 33 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 85 34 Ibid p 85
17
processuais permitindo que sejam feitas mudanccedilas nos procedimentos e nas situaccedilotildees
juriacutedicas processuais ldquoSatildeo exemplos de negoacutecios processuais atiacutepicos na execuccedilatildeo pacto de
penhorabilidade acordo de ampliaccedilatildeo de prazos das partes de qualquer natureza acordo de
rateio de despesas processuais ()rdquo35
24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO
Sempre houve diversos questionamentos quanto agrave eficaacutecia do Direito processual Civil
e se o mesmo era meio apto a assegurar a tutela jurisdicional dos direitos dos cidadatildeos O
processo de execuccedilatildeo eacute o setor que sofre mais criacuteticas quanto a sua ineficiecircncia afinal a
execuccedilatildeo civil sempre foi o ldquocalcanhar de Aquilesrdquo do sistema processual pela praxe do
ldquoganhou (no processo de conhecimento) mas natildeo levou (na fase de cumprimento ou
execuccedilatildeo)rdquo 36
Essa dificuldade de se efetivar a tutela satisfastiva natildeo se resume a um problema de
mera teacutecnica processual tiacutepico de determinado ordenamento mas representa uma prova de
fogo da capacidade dos instrumentos jurisdicionais O autor Leonardo Greco37 no ano de
2005 atribuiu esse fato as seguintes causas o excesso de processos o custo e a morosidade da
justiccedila a inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios a ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais
um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico e a progressiva volatizaccedilatildeo dos bens
Quanto ao excesso de processos o referido autor aduz que ldquonos grandes centros o
crescimento da maacutequina judiciaacuteria natildeo acompanhou a expansatildeo do nuacutemero de litiacutegiosrdquo 38
O custo e morosidade da justiccedila prejudicam a tutela satisfativa posto que
ldquojaacute desfalcado pelo inadimplemento do devedor o credor ainda tem de arcar com o adiantamento das despesas do processo de execuccedilatildeo e de eventual liquidaccedilatildeo vendo arrastar-se a marcha dos atos executoacuterios facilmente retardada por atos procrastinatoacuterios do devedorrdquo 39
35 Ibid p 86 36 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca
para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018
37 GRECCO Leonardo A Crise do Processo de Execuccedilatildeo in Estudos de direito processual Leonardo Greco ndash Campos dos Goytacazes Ed Faculdade de Direito de Campos 2005 p 7
38 Ibid p 7 39 Ibid p 7-8
18 A inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios contribui para a crise do processo de
execuccedilatildeo tendo em vista que
ldquoo juiz da execuccedilatildeo prisioneiro de ritos que o distanciam das partes e da realidade da vida impulsiona sem qualquer apetite a execuccedilatildeo conduzindo-a ao sabor dos ventos das provocaccedilotildees impacientes do credor e das costumeiras procrastinaccedilotildees do devedorrdquo 40
Jaacute ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais atrapalha a efetivaccedilatildeo da tutela satisfativa ldquoo
devedor natildeo colabora com a execuccedilatildeo e os meios de pressatildeo que a lei estabelece natildeo satildeo
suficientes para intimidaacute-lordquo 41
Com um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico
O espiacuterito empresarial e a sociedade de consumo estimulam o endividamento das pessoas e o inadimplemento das obrigaccedilotildees pelo devedor deixou de ser vexatoacuterio e reprovaacutevel o que multiplica as accedilotildees de cobranccedila e execuccedilotildees atraveacutes das quais o sujeito passivo ainda usufrui vantagens agraves custas do credor 42
Por fim Leonardo Greco elenca a volatizaccedilatildeo dos bens como o uacuteltimo fator que
macula o processo executo tendo em vista que
ldquomudou inteiramente o perfil patrimonial das pessoas antes concentrado em bens de raiz e agora tendencialmente dirigido a investimentos em tiacutetulos e valores facilmente negociaacuteveis o que dificulta a sua localizaccedilatildeo pelo credorrdquo 43
O Coacutedigo de Processo Civil de 1973 introduziu o sistema executivo ao ordenamento
juriacutedico paacutetrio e seguindo os valores liberais da eacutepoca com a proteccedilatildeo de esfera juriacutedica de
liberdade do cidadatildeo contra a possibilidade de arbiacutetrio do Estado e uso indevido do Poder
jurisdicional outorgou o miacutenimo de poder ao juiz Seguindo as regras do CPC de 73 o
devedor soacute poderia ter sua esfera juriacutedica invadida atraveacutes de meios de execuccedilatildeo instituiacutedos
previamente em lei
Diante de tantos obstaacuteculos para se efetivar a tutela satisfativa a execuccedilatildeo estava
fadada ao fracasso o que frustrava a expectativa do jurisdicionado a uma prestaccedilatildeo da tutela
jurisdicional ceacutelere e efetiva Insatisfeitos com o cenaacuterio que se encontrava a atividade
40 Ibid p 8 41 Ibid p8 42 Ibid p 8 43 Ibid p8
19
executiva legisladores e operadores do direito natildeo mediram esforccedilos para promover uma
evoluccedilatildeo significativa buscando mais eficiecircncia e celeridade ao procedimento executoacuterio
Dessa forma no final de 1994 foi introduzido no coacutedigo de processo agrave flexibilizaccedilatildeo
dos poderes executoacuterios do juiz ldquopara que ele pudesse prestar uma tutela efetiva aos direitos
ficando autorizado a determinar a modalidade de execuccedilatildeo adequada a cada hipoacutetese nas
obrigaccedilotildees de fazer e natildeo fazer (art 461 sect5ordm do CPC de 1973)rdquo No ano de 2002 a referida
medida foi estendida para as obrigaccedilotildees de entregar coisa (art 461-A caput e sect3ordm do CPC de
1973)
Com fundamento nos artigos 461 e 461-A em 2005 a Lei nordm 11 23205 unificou o
processo de conhecimento e o processo de execuccedilatildeo de sentenccedila Nesse sentido Maacuterio
Henrique Cavalcanti Gil Rodrigues44 aduz que
A Lei 112322005 reuniu de forma definitiva os processos de conhecimento e de execuccedilatildeo em um uacutenico processo composto por um sistema bifaacutesico Assim passa a existir uma fase inicial (de reconhecimento) e uma fase posterior (de cumprimento de sentenccedila de efetivaccedilatildeo da decisatildeo definitiva) sem contar com a eventual fase intermediaacuteria de liquidaccedilatildeo (RODRIGUES 2010 p 38)
Ademais as alteraccedilotildees realizadas no CPC de 73 inseriu a atipicidade dos meios
executivos nas obrigaccedilotildees de fazer natildeo fazer e dar coisa certa entretanto exercendo papel
subsidiaacuterio aos meios tiacutepicos
Quanto agraves obrigaccedilotildees de pagar quantia havia apenas a possibilidade de se valer da
incidecircncia de multa do art 475-J do CPC de 73 ndash implementada mediante reforma perpetrada
pela Lei nordm 11232 de 2005 em atendimento a doutrina processualista preocupada com a
efetividade das decisotildees ndash e de atos executivos como a penhora de bens e dinheiro
Ainda que a execuccedilatildeo tenha avanccedilado com a inserccedilatildeo das leis posteriores a 1994 no
CPC de 1973 a mesma continuava insuficiente tendo em vista que a burocracia e lentidatildeo
dos atos executivos davam brechas para que o devedor escondesse seu patrimocircnio penhoraacutevel
tornando carente de efetividade e celeridade agrave execuccedilatildeo
44 RODRIGUES Maacuterio Henrique Cavalcanti Gil A evoluccedilatildeo da execuccedilatildeo de sentenccedila no direito
processual civil e o novo regime juriacutedico das sentenccedilas apoacutes a reforma implementada pela Lei 112322005 Revista do Tribunal Regional Federal da 1ordf Regiatildeo v 22 n 2 fev 2010 p 38
20
25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO
A tutela juridiscional eacute um direito fundamental previsto no art 5ordm inciso XXXV da
Carta Magna ldquo() a lei natildeo excluiraacute da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio lesatildeo ou ameaccedila a
direitordquo
Na visatildeo claacutessica o direito de accedilatildeo era efetivado com a prolaccedilatildeo de uma sentenccedila de
meacuterito posiccedilatildeo adotada por grande parte dos processualistas seguidores da doutrina de
Liebman Todavia esse conceito se mostra defasado tendo em vista que o direito de acesso agrave
justiccedila natildeo eacute apenas uma garantia formal de bater as portas do judiciaacuterio mas a garantia de
acesso agrave ordem juriacutedica justa adequada e eficaz45
Acreditar que uma sentenccedila de meacuterito favoraacutevel eacute tutela jurisdicional suficiente para
satisfazer o que se busca com o ajuizamento da accedilatildeo eacute uma visatildeo distorcida da atividade
satisfativa ldquoSob o ponto de vista do direito material a condenaccedilatildeo por si soacute eacute incapaz de
prestar a tutela do direitordquo46
Nessa oacutetica o direito fundamental agrave tutela executiva exige um sistema de tutela
jurisdicional ldquocapaz de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor
de tutela executivardquo47 Dessa forma entende-se que
ldquo() a) a interpretaccedilatildeo das normas que regulamentam a tutela executiva tem de ser feita no sentido de extrair a maior efetividade possiacutevel b) o juiz tem o poder-dever de deixar de aplicar uma norma que imponha uma restriccedilatildeo a um meio executivo sempre que essa restriccedilatildeo natildeo se justificar como forma de proteccedilatildeo a outro direito fundamental c) o juiz tem o poder-dever de adotar os meios executivos que se revelem necessaacuterios agrave prestaccedilatildeo integral de tutela executivardquo48
Egrave imperioso compreender que o direito fundamental agrave tutela executiva ratificado
pelo CPC eacute essencial para dirimir diversos litiacutegios oriundos do procedimento executivo
45 FERREIRA Gabriela Macedo Poder geral de efetivaccedilatildeo em defesa da constitucionalidade da
teacutecnica de execuccedilatildeo dos direitos do art 139 IV do Coacutedigo de Processo Civil Revista Jus Navigandi ISSN 1518-4862 Teresina ano 22 n 5178 4 set 2017 Disponiacutevel em lthttpsjuscombrartigos60190gt Acesso em 11 set 2018
46 Ibid natildeo paginado 47 DIDIER JR Fredie et al apud GUERRA Marcelo lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do credor
na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 48 Ibid p 102-104
21
ldquoprincipalmente aqueles relacionados agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo49
Fredie Didier et al50 cita como exemplo as hipoacuteteses de impenhorabilidade
A impenhorabilidade de certos bens eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa
Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais
Por esta razatildeo o legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do
CPC fazendo um preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses das partes envolvidas
optando pela mitigaccedilatildeo do direito do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado
Quando o oacutergatildeo jurisdicional verificar que a aplicaccedilatildeo das regras de
impenhorabilidade eacute desproporcional para o caso concreto deve afastaacute-la e construir a
soluccedilatildeo adequada para o referido caso Didier et al51 traz um exemplo esclarecedor em sua
obra
O bem imoacutevel que serve de moradia da famiacutelia eacute relativamente impenhoraacutevel Objetiva-se com essa restriccedilatildeo proteger o direito fundamental agrave moradia conteuacutedo do direito agrave proteccedilatildeo da dignidade Imagine-se um imoacutevel de altiacutessimo valor Imagine-se agora um creacutedito que corresponda a 40 do valor do imoacutevel A venda judicial do imoacutevel no caso permitiria natildeo soacute satisfazer o direito do credor como ainda garantir ao executado com a sobra a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel que lhe preserve a dignidade A opccedilatildeo pela interpretaccedilatildeo literal da regra que veda a penhora protegeria exclusivamente o direito do executado de maneira desnecessaacuteria porque a relaccedilatildeo valor executadovalor do bem permitiria a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel apoacutes a entrega do dinheiro ao credor Seria pois interpretaccedilatildeo em desconformidade com os preceitos da contemporacircnea hermenecircutica constitucional que preconiza a necessidade de nos casos de choque entre direitos fundamentais dar a interpretaccedilatildeo que mais adequadamente proteja a ambos
A execuccedilatildeo civil integra o direito fundamental agrave tutela jurisdicional disciplinando
que ldquoos dispositivos devem ser interpretados de modo que se garanta a maior efetividade
49 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66 50 Ibid p 66 51 Ibid p 67
22
possiacutevel agrave execuccedilatildeo desde que respeitados outros direitos fundamentaisrdquo52 Podendo ser
afastada desde que proporcional qualquer obstaacuteculo irrazoaacutevel agrave efetivaccedilatildeo desse direito
52 FERREIRA Gabriela Macedo apud MACEDO Lucas Buril de As eficaacutecias das decisotildees judiciais e
o cumprimento de sentenccedila no CPC15 Novo CPC Doutrina selecionada v 5 Execuccedilatildeo Coordenador geral Fredie Didier Jr organizadores Lucas Buril de Macedo Ravi Peixoto Alexandre Freire ndash Salvador Jus Podivm 2015 p 360361
23
3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO
EXECUTADO
31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS
Como forma de controlar a atividade jurisdicional por muito tempo vigorou o
entendimento de que a execuccedilatildeo somente poderia ser realizada atraveacutes dos meios executivos
tipicamente previstos na legislaccedilatildeo Segundo Luiz Guilherme Marinoni53
O princiacutepio da tipicidade deseja significar que os meios de execuccedilatildeo devem estar previstos na lei e assim que a execuccedilatildeo natildeo pode ocorrer atraveacutes de formas executivas natildeo tipificadas O seu objetivo eacute de um lado impedir que meio executivo natildeo previsto em lei possa ser utilizado e de outro garantir o jurisdicionado contra a possibilidade de arbiacutetrio judicial na fixaccedilatildeo da modalidade executiva Se o jurisdicionado sabe em razatildeo de previsatildeo legal que a sua esfera juriacutedica somente poderaacute ser invadida atraveacutes de determinadas modalidades executivas confere-se a ele a possibilidade de antever a reaccedilatildeo ao seu inadimplemento bem como a garantia de que a jurisdiccedilatildeo natildeo determinaraacute ou permitiraacute a utilizaccedilatildeo de meio executivo diverso daqueles previstos
Dessa forma o princiacutepio da tipicidade disciplina que o oacutergatildeo julgador ao proceder agrave
execuccedilatildeo estaacute limitado aos meios executivos previamente definidos em lei natildeo podendo se
valer de qualquer teacutecnica de efetivaccedilatildeo que natildeo se encaixasse nas hipoacuteteses taxativas da
legislaccedilatildeo
Entretanto o legislador natildeo tem como prever todas as peculiaridades dos direitos
dignos de tutela executiva e preordenar teacutecnicas executivas diversas para cada peculiaridade
Sob esse cenaacuterio o principio da tipicidade foi cedendo lugar ao principio da atipicidade dos
meios executivos
A ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do oacutergatildeo julgador estaacute cada vez mais presente
no ordenamento juriacutedico paacutetrio motivando um poder geral de efetivaccedilatildeo ldquoque permite ao
julgador valer-se dos meios executivos que considerar mais adequado ao caso concreto sejam
eles de coerccedilatildeo direta sejam de coerccedilatildeo indiretardquo 54
53 MARINONI Luiz Guilherme Teacutecnica processual e tutela dos direitos Satildeo Paulo Editora Revista
dos Tribunais 2004 p 212 nota 79 54 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 100
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Essa tendecircncia de ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do juiz natildeo eacute exclusividade do
ordenamento juriacutedico brasileiro segundo Fredie Didier et al55
Michelle Taruffo jaacute apontava que o direito americano diante da inefetividade dos meios executivos at law comeccedilou a autorizar o magistrado a tomar medidas executivas adequadas ao caso concreto Trata-se afirma o jurista italiano de aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo segundo o qual as regras processuais devem ser adaptadas agraves necessidades do direito material
Os meios executivos atiacutepicos derivam de trecircs enunciados normativos do Coacutedigo de
Processo Civil o art 139 IV o art 297 e o sect1ordm do art 536
O art 139 IV do CPC dispotildee que pertence ao juiz o poder-dever de ldquodeterminar
todas as medidas indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para
assegurar o cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto
prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo
Jaacute o art 297 do CPC cuida da tutela provisoacuteria e garante que ldquoo juiz poderaacute
determinar as medidas que considerar adequadas para a efetivaccedilatildeo da tutela provisoacuteriardquo
Podendo dessa forma a dita tutela ser efetivada atipicamente
Por fim o art 536 sect1ordm do CPC dispotildee que
Para atender ao disposto no caput o juiz poderaacute determinar entre outras medidas a imposiccedilatildeo de multa a busca e apreensatildeo a remoccedilatildeo de pessoas e coisas o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva podendo caso necessaacuterio requisitar o auxilio de forccedila policial
As supracitadas medidas executivas atiacutepicas satildeo entendidas pela doutrina como
claacuteusulas gerais processuais executivas56 Essas claacuteusulas gerais natildeo restringem a sua
aplicaccedilatildeo agraves teacutecnicas de coerccedilatildeo indireta satildeo autorizados tambeacutem o uso de meios de execuccedilatildeo
dieta e indireta
Ademais cumpre salientar que o art 139 IV CPC aplica-se a toda e qualquer
atividade executiva ldquoa) seja fundada em tiacutetulo executivo judicial (provisoacuteria ou definitiva)
55 DIDIER JR Fredie et al apud TARUFFO Michelle A atuaccedilatildeo executiva dos direitos perfis
comparatiacutesticos Revista de Processo Satildeo Paulo RT 1990 n 59 p 78 56 Segundo Fredie Didier et al claacuteusula geral eacute uma espeacutecie de texto normativo cujo antecedente
(hipoacutetese faacutetica) eacute composto por termos vagos e consequente (efeito juriacutedico) eacute indeterminado
25
seja fundada em tiacutetulo executivo extrajudicial b) seja para efetivar prestaccedilatildeo pecuniaacuteria seja
para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer ou dar coisa distinta de dinheirordquo57
Jaacute o art 297 do CPC garante que a tutela provisoacuteria possa ser efetivada tambeacutem
atipicamente ldquoSucede que a atipicidade da tutela provisoacuteria segue necessariamente a
atipicidade da tutela definitivardquo 58
Por fim o comando do sect 1 ordmdo art 536 se aplica
a) inicialmente agrave execuccedilatildeo de fazer e de natildeo fazer fundada em decisatildeo judicial (provisoacuteria ou definitiva) b) por forccedila do sect 3ordm do art 538 tambeacutem se aplica ao cumprimento de sentenccedila para entrega de coisa c) por forccedila do art 771 paraacutegrafo uacutenico o dispositivo tambeacutem se aplica agrave execuccedilatildeo para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer e entregar coisa distinta de dinheiro fundada em tiacutetulo extrajudicial
Claramente o art 139 IV eacute mais amplo do que o sect 1 ordm do art 536 estende-se por
disposiccedilatildeo expressa agrave execuccedilatildeo de pagar quantia Sendo uma grande novidade nas obrigaccedilotildees
que tem por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15
O art 139 IV do CPC apresentou uma novidade agrave atipicidade dos meios executivos
ao disciplinar que cabe ao juiz ldquodeterminar todas as medidas indutivas coercitivas
mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o cumprimento de ordem judicial
inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo
A inovaccedilatildeo estaacute na possibilidade de utilizar os meios atiacutepicos para assegurar o
cumprimento de decisotildees que versam sobre as obrigaccedilotildees pecuniaacuterias sendo admitida a
utilizaccedilatildeo de outros meios ateacute na execuccedilatildeo de titulo judicial de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria aleacutem da
multa de 10 (a que se refere o artigo 523 sect 1ordm do CPC) para forccedilar o devedor a cumprir a
obrigaccedilatildeo pecuniaacuteria
57 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 105 58 Ibid p 105
26
Dessa forma eacute possiacutevel afirmar que ldquoao lado da disciplina tiacutepica do art 523 e
seguintes () o novo CPC inova ao permitir que o sistema de teacutecnicas executivas atiacutepicas
sejam empregadas na execuccedilatildeo monetaacuteriardquo59 (ZARONI VITORELLI 2016 p 66)
Fernando da Fonseca Gajardoni60 denomina a dita medida como a ldquorevoluccedilatildeo
silenciosardquo da execuccedilatildeo por quantia certa posto que
() pelo fato de que a regra natildeo estar propriamente incrustrada nos capiacutetulo e livro atinentes ao cumprimento de sentenccedila e ao processo de execuccedilatildeo ndash o art 139 IV do Novo CPC parece trazer ao paiacutes algo bastante novo cuja aplicaccedilatildeo a depender do comportamento do Judiciaacuterio pode implicar em verdadeira revoluccedilatildeo (positiva ou negativa) na sistemaacutetica executiva ateacute entatildeo vigente
Claramente o dispositivo foi recebido com entusiasmo por parte da doutrina que
anteciparam em afirmar que o princiacutepio da atipicidade dos meios executivos no CPC2015
ldquo() assume a feiccedilatildeo de poder-dever geral conferido ao magistrado de determinar () todas
as medidas coercitivas sub-rogatoacuterias mandamentais e indutivas que entender necessaacuterias
para a tutela justa efetiva e em tempo razoaacutevelrdquo 61
Dessa forma lecionam Luiz Guilherme Marinoni Seacutergio Cruz Arenhart e Daniel
Mitidiero62 que
O juiz a partir do art 139 IV do CPC2015 natildeo estaacute mais adstrito apenas agrave sentenccedila condenatoacuteria ndash que fixa a obrigaccedilatildeo de pagar e daacute ensejo agrave abertura da execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo patrimonial ndash para a tutela de prestaccedilotildees pecuniaacuterias Pode impor essa prestaccedilatildeo por meio de ordem judicial acoplada ao aceno de emprego de medida de induccedilatildeo (coercitiva ou de pressatildeo positiva) ou de medida de sub-rogaccedilatildeo (MARINONI ARENHARDT MITIDIERO 2015 p 703)
Deste modo em razatildeo do art 139 IV do CPC tem-se entendido que o juiz nas
execuccedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria possui a faculdade de adotar qualquer
59 ZARONI Bruno Marzullo VITORELLI Edilson Reforma e efetividade da execuccedilatildeo no novo CPC
In PEIXOTO Ravi FREIRE Alexandre MENDES Aluiacutesio Gonccedilalves de Castro Execuccedilatildeo 2 ed rev e atual Salvador JusPodivm 2016 766 p (Coleccedilatildeo novo CPC doutrina selecionada v 5) p 66
60 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia 24082015 JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Acesso em 23082018
61 LIMA Rafael de Oliveira A atipicidade dos meios executivos no coacutedigo de processo civil brasileiro de 2015 Revista de Processo Jurisdiccedilatildeo e Efetividade da Justiccedila v 2 n 2 juldez 2016 p 11
62 MARINONI Luiz Guilherme ARENHART Seacutergio Cruz MITIDIERO Daniel Novo curso de processo civil tutela dos direitos mediante procedimento comum Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 v 2 p 703
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medida indutiva coercitiva mandamentais ou sub-rogatoacuterias para efetivar o creacutedito do
exequente natildeo se limitando as medidas tiacutepicas
Alguns doutrinadores se precipitaram ao afirmar que o dito dispositivo ldquo() autoriza o
juiz a utilizar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir ressalvando-se a prisatildeo
civil constitucionalmente limitada ao devedor de alimentosrdquo 63 Acreditam Jorge Bheron
Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa que o entusiasmo por parte da
doutrina abre margem para as mais variadas formas de compelir o devedor a cumprir com a
prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
ldquoE aiacute persistindo no mau vezo de fazer explicaccedilotildees em abstrato ignorando que o sentindo soacute se daacute na aplicaccedilatildeo (situaccedilatildeo concreta real ou fictiacutecia) as sugestatildeo satildeo as mais engenhosas suspensatildeo de CNH retenccedilatildeo de passaporte restriccedilatildeo de fim de semana cancelamento de cartotildees de creacutedito ndash para ficar apenas nestasrdquo 64
Ou seja podendo o juiz natildeo apenas substituir o devedor tomando seu patrimocircnio para
entregar ao credor na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia como tambeacutem poderaacute
pressionaacute-lo psicologicamente a adimplir por conta proacutepria a obrigaccedilatildeo
Ademais o Enunciado nordm 48 do ENFAM avalia expressamente a possibilidade de
imposiccedilatildeo de medidas coercitivas para a efetivaccedilatildeo da execuccedilatildeo pecuniaacuteria Conforme o dito
enunciado
ldquoO art 139 inciso IV traduz um poder geral de efetivaccedilatildeo permitindo a aplicaccedilatildeo de medidas atiacutepicas para garantir o cumprimento de qualquer ordem judicial inclusive no acircmbito do cumprimento de sentenccedila e no processo de execuccedilatildeo baseado em tiacutetulosrdquo
Dessa forma o artigo 139 IV do CPC permite uma gama ampla de interpretaccedilotildees por
parte da doutrina por ser uma claacuteusula geral encontrando limite apenas na imaginaccedilatildeo de
quem o analisa Nesse sentido eacute forccediloso orientar e delimitar o manejo desse artigo legal para
que se extraia seu sentido e alcance revelando assim sobre que situaccedilotildees ele incide de que
modo e o que permite
63 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
64 Ibid sem paginaccedilatildeo
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32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER
GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
O artigo 139 IV com a vigecircncia do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 abriu margem
para uma constelaccedilatildeo de decisotildees nas quais o dito dispositivo recebeu diversas interpretaccedilotildees
pelos operadores do direito
Sem duacutevidas por ser uma das pioneiras a decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara
Ciacutevel do Foro Regional de Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-
1320138260011 na data de 25 de agosto de 2016 gerou um enorme rebuliccedilo
Nessa accedilatildeo que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto
uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a
suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o
passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito
Segundo a magistrada o processo tramitava haacute anos sem que nenhum valor tenha sido
pago ao exequente aleacutem do devedor natildeo ter oferecido proposta de acordo e nem ter indicado
bens agrave penhora configurando uma completa desiacutedia com o processo
ldquoO caso tratado nos autos se insere dentre as hipoacuteteses em que eacute cabiacutevel a aplicaccedilatildeo do art 139 inciso IV do Coacutedigo de Processo Civil Isso porque o processo tramita desde 2013 sem que qualquer valor tenha sido pago ao exequente Todas as medidas executivas cabiacuteveis foram tomadas sendo que o executado natildeo paga a diacutevida natildeo indica bens agrave penhora natildeo faz proposta de acordo e sequer cumpre de forma adequada as ordens judiciais frustrando a execuccedilatildeo
Se o executado natildeo tem como solver a presente diacutevida tambeacutem natildeo recursos para viagens internacionais ou para manter um veiacuteculo ou mesmo manter um cartatildeo de creacutedito Se poreacutem mantiver tais atividades poderaacute quitar a diacutevida razatildeo pela qual a medida coercitiva poderaacute se mostrar efetiva
Assim como medida coercitiva objetivando a efetivaccedilatildeo da presente execuccedilatildeo defiro o pedido formulado pelo exequente e suspendo a Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo do executado M A S determinando ainda a apreensatildeo de seu passaporte ateacute o pagamento da presente diacutevida
()
Determino ainda o cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado ateacute o pagamento da presente diacutevida ()rdquo
Foi impetrado Habeas Corpus no Tribunal de Justiccedila do Estado de Satildeo Paulo a favor
do executado sob o fundamento que a coaccedilatildeo era ilegal e afetava o direito de locomoccedilatildeo
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garantido constitucionalmente Tendo sido concedida a liminar em decisatildeo que ora se
reproduz
Em que pese a nova sistemaacutetica trazida pelo art 139 IV do CPC2015 deve-se considerar que a base estrutural do ordenamento juriacutedico eacute a Constituiccedilatildeo Federal que em seu art 5ordm XV consagra o direito de ir e vir Ademais o art 8ordm do CPC2015 tambeacutem preceitua que ao aplicar o ordenamento juriacutedico o juiz natildeo atentaraacute apenas para a eficiecircncia do processo mas tambeacutem aos fins sociais e agraves exigecircncias do bem comum devendo ainda resguardar e promover a dignidade da pessoa humana observando a proporcionalidade a razoabilidade e a legalidade Por tais motivos concedo a liminar pleiteada65
Cabe destacar aqui o voto vencido da Desembargadora Maria Luacutecia Pizzotti no
julgamento do Habeas Corpus supracitado demonstrando que o debate sobre a abrangecircncia
do artigo 139 IV do CPC ocorre tanto na doutrina quanto no judiciaacuterio
O objetivo do novel dispositivo natildeo eacute impor penas ou restringir direitos natildeo sendo intenccedilatildeo do Judiciaacuterio suspender indefinidamente o direito de dirigir do executado ou sua liberdade de viajar mas sim impor uma restriccedilatildeo tatildeo gravosa caso ele natildeo cumpra a determinaccedilatildeo que escolha cumprir sua obrigaccedilatildeo e dar fim ao problema Em outras palavras mediante as medidas de coerccedilatildeo o Estado procura persuadir o inadimplente impondo-lhe situaccedilotildees tatildeo onerosas e inconvenientes que em algum momento seja para ele mais vantajoso cumprir do que permanecer no inadimplemento
Ao fazecirc-lo o Novo Coacutedigo de Processo Civil rompe com as criacuteticas da ineficiecircncia das execuccedilotildees Natildeo se cogita deferir medidas restritivas agravequeles que demonstram a incapacidade absoluta de solver o deacutebito apenas agravequeles que reconhecidamente se valem de artimanhas e subterfuacutegios para evitar a satisfaccedilatildeo das diacutevidas ldquopreferindordquo outras despesas mais lsquonobresrsquo agindo em nome de terceiros e fazendo escaacuternio dos credores e do proacuteprio Poder Judiciaacuterio (hellip)
Para tanto memoraacutevel a noccedilatildeo de que a medida em comento tem caraacuteter excepcional e encontra limites no plano da proporcionalidade como sustenta o ilustrado Magistrado paulista Fernando da Fonseca Gajardoni Professor Faculdade de Direito de Ribeiratildeo Preto da USP (in httpswwwjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 acesso em 091216 agraves 11h20min) E para anaacutelise da proporcionalidade a ponderaccedilatildeo deve observar os trecircs passos apontados pela doutrina a necessidade a adequaccedilatildeo e a proporcionalidade em sentido estrito
65 TJSP - Habeas Corpus Processo nordm 2183713-8520168260000 30ordf Cacircmara Direito Privado relator
Des Marcos Ramos j 290317
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Ademais no entendimento de Jorge Amaury Maia Nunes e Guilherme Pupe de
Noacutebrega66 essa decisatildeo releva os perigos trazidos pelo art 139 IV do CPC ao confrontar
direitos constitucionalmente garantidos
De nossa parte entendemos que a liberdade de locomoccedilatildeo inserta no inciso XV do artigo 5ordm que abrange o direito de deixar o territoacuterio nacional sofre embaraccedilo indevido pela apreensatildeo de passaporte ou pela suspensatildeo da carteira nacional de habilitaccedilatildeo
()
Agrave luz da exposiccedilatildeo feita acima e em anaacutelise primeva sustentamos que o artigo 139 IV do CPC de 2015 estaacute a merecer declaraccedilatildeo de inconstitucionalidade sem reduccedilatildeo de texto para o fim de rechaccedilar a apreensatildeo de passaporte a suspensatildeo do direito de dirigir e a vedaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo em concurso ou em licitaccedilatildeo puacuteblicos como medidas passiacuteveis de serem adotadas pelo juiz sob pena de vulneraccedilatildeo aos artigos 1ordm IV 5ordm XV e LIV 37 I 173 sect 3ordm III e 175 todos da Constituiccedilatildeo
Apesar de ter sofrido duras criacuteticas a decisatildeo do processo de nordm 4001386-
1320138260011 serviu de inspiraccedilatildeo para tantas outras decisotildees no mesmo sentido
Foi o caso da decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de Satildeo
Vicente em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 0020724-2620088260590 na data de 21 de
junho de 2017
A supracitada execuccedilatildeo se arrastava por nove (09) anos sem que o devedor tenha
esboccedilado qualquer intenccedilatildeo de pagar a diacutevida O credor requereu a suspensatildeo da Carteira
Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado apreensatildeo do passaporte e cancelamento dos
cartotildees de creacutedito
O magistrado com embasamento no artigo 139 IV do CPC deferiu parcialmente o
pedido sob o fundamento de que a apreensatildeo de passaporte e CNH natildeo viola o direito de ir e
vir do devedor Entretanto o juiz indeferiu o pedido de cancelamento do cartatildeo de creacutedito por
acreditar que a suspensatildeo poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado tendo em
vista que atualmente as pessoas utilizam o referido cartatildeo para pagamento das despesas
diaacuterias
66 NOBREacuteGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139
IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018
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Eacute evidente que as medidas atiacutepicas de coerccedilatildeo devem ser utilizadas com cautela sempre respeitando a dignidade da pessoa do executado Natildeo se vislumbra contudo que as medidas aqui eleitas sejam capazes de vulnerar os Direitos Fundamentais do indiviacuteduo A uma porque natildeo se trata de restriccedilatildeo ao direito de ir e vir do executado que continua no gozo de plena liberdade de locomoccedilatildeo a duas porque a conduccedilatildeo de veiacuteculo automotor eacute mera comodidade da vida moderna natildeo se tratando de direito absoluto
Com mais razatildeo ainda se admite a suspensatildeo do Passaporte do executado que se natildeo paga a diacutevida da execuccedilatildeo natildeo deve ter o direito de fazer viagem internacional
Tem-se aqui verdadeiro exerciacutecio de ponderaccedilatildeo de interesses juriacutedicos de um lado jaz o direito de creacutedito do exequente que deriva do direito de propriedade e por isso mesmo tem envergadura constitucional de outro giro tem-se o direito do executado agrave autorizaccedilatildeo do Estado para conduzir veiacuteculo automotor e realizar viagens internacionais que natildeo se mostram essenciais agrave dignidade da pessoa humana Natildeo haacute duacutevidas pois de que eacute este uacuteltimo que deve sucumbir
O pedido fica indeferido apenas no tocante agrave suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado Eacute que ao contraacuterio da CNH e do passaporte que trazem consigo certa presunccedilatildeo de riqueza natildeo se pode concluir que o uso de cartatildeo de creacutedito eacute feito por luxo ou simples conveniecircncia
Como eacute cediccedilo os cartotildees de creacutedito oferecem ao seu titular creacutedito raacutepido e rotativo para o pagamento de despesas diaacuterias e certamente exercem funccedilatildeo essencial agravequeles que se encontram em situaccedilatildeo financeira precaacuteria
A suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado portanto se revela medida desproporcional e que inclusive poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado
Pelo exposto defiro em parte o pedido formulado pelo exequente e DETERMINO a suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo e bem como a suspensatildeo da validade (cancelamento temporaacuterio) no sistema SINPA de eventuais passaportes vaacutelidos em nome do executado
Dessa forma o artigo 139 IV do CPC revolucionou completamente a execuccedilatildeo de
obrigaccedilatildeo de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria ao permitir a utilizaccedilatildeo do uso dos meios executivos
atiacutepicos para compelir o executado a satisfazer o creacutedito do exequente
33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE
EFETIVACcedilAtildeO
Era inevitaacutevel que o artigo 139 IV do CPC gerasse todo tipo de reaccedilatildeo entre os
doutrinadores do processo civil e ateacute mesmo de outros ramos do direito devido a sua
capacidade de realizar uma completa inovaccedilatildeo na forma de se executar as obrigaccedilotildees de pagar
quantia Alguns o aplaudiram visualizando nele ldquouma luz no fim do tuacutenelrdquo outros o
criticaram vislumbrando as arbitrariedades que poderiam ser praticadas com embasamento no
referido dispositivo
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As decisotildees suscitadas em linhas preteacuteritas auxiliaram para fervilhar ainda mais o
debate sobre o tema tendo em vista que por um lado poderia aumentar a efetividade das
execuccedilotildees por quantia no entanto por outro surgiam questionamentos a cerca da sua
constitucionalidade
A doutrina parece que demoraraacute a se pacificar sobre o tema Segundo alguns
doutrinadores seraacute inconstitucional toda restriccedilatildeo que recaia sobre a pessoa do devedor e natildeo
exclusivamente sobre o seu patrimocircnio Jaacute para outros o dispositivo eacute constitucional e o meio
mais eficaz para se resolver o problema da efetivaccedilatildeo das execuccedilotildees de pagar quantia ldquoA
discussatildeo se daacute especialmente no que diz respeito aacutes medidas de suspensatildeo de CNH
apreensatildeo de passaporte e bloqueio de cartotildees de creacutedito do devedorrdquo 67
O professor Thiago Rodovalho analisou detalhadamente a decisatildeo de nordm 4001386-
1320138260011 em seu artigo ldquoO necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na
concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivosrdquo 68 Quanto agrave suspensatildeo da CNH o autor
acredita que tal medida natildeo viola qualquer direito fundamental do devedor posto que ldquodirigir
veiacuteculos automotores eacute direito do cidadatildeo mas natildeo se confunde com os direitos fundamentais
e social de ir-e-vir e ao transporterdquo 69 O professor eacute categoacuterico ao afirmar que
Com relaccedilatildeo agrave suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (suspensatildeo do direito de dirigir restriccedilatildeo de direitos) natildeo nos parece haver qualquer violaccedilatildeo a direito fundamental ou social nem a direito da personalidade ou colocaccedilatildeo do devedor em situaccedilatildeo desproporcionalmente detrimentosa exceccedilatildeo feita aos que usam o veiacuteculo como instrumento de trabalho atraindo a hipoacutetese do NCPC art 833 inc V
()
Outrossim natildeo o consideramos como direito da personalidade Os direitos da personalidade satildeo os valores fundamentais que compotildeem o proacuteprio ser justamente por isso intransmissiacuteveis e irrenunciaacuteveis natildeo podendo o seu exerciacutecio sofrer limitaccedilatildeo voluntaacuteria (CC art 11) Por mais que vivamos num paiacutes que tanto valoriza o carro e que muitas pessoas de fato se compreendam em razatildeo e em funccedilatildeo do carro que dirijam este natildeo nos parece ser um direito que verdadeiramente componha a personalidade do indiviacuteduo70
67 DONTOS Sofia Poderes executoacuterios do juiz que diz a doutrina sobre o art 139 inc IV do CPC
Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigospoderes-executorios-do-juiz-que-diz-a-doutrina-sobre-art-139-inc-iv-do-cpc-23052018 gt Publicado em 23052018 Acesso em 01082018
68 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018
69 Ibid sem paginaccedilatildeo 70 Ibid sem paginaccedilatildeo
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Quanto ao cancelamento dos cartotildees de credito do devedor o professor Thiago
Rodovalho tambeacutem acredita que natildeo haacute qualquer violaccedilatildeo ao direito fundamental social ou
da personalidade do devedor e acrescenta que
Tanto assim o eacute que ser titular de um cartatildeo de creacutedito pressupotildee ter creacutedito o que eacute analisado e concedido por instituiccedilotildees financeiras mais do que isso se porventura passando por dificuldades financeiras a pessoa deixa de honrar com pagamentos a mesma instituiccedilatildeo financeira concedente do cartatildeo de creacutedito pode sponte propria cancelaacute-lo ou recusar-lhe a concessatildeo Ora parece-me contraditoacuterio que instituiccedilotildees financeiras para sua proteccedilatildeo patrimonial possam ferir esse suposto ldquodireito fundamentalrdquo ou esse suposto ldquodireito da personalidaderdquo mas natildeo possa o Poder Judiciaacuterio igualmente fazecirc-lo contra aquele devedor moroso que instado ao pagamento e frustradas todas as tentativas de constriccedilatildeo patrimonial leva vida luxuosa valendo-se de cartotildees de creacutedito que prescindem de dinheiro em conta eacute dizer podem justamente funcionar como forma de ocultar renda e patrimocircnio71
O autor considera a apreensatildeo de passaporte um tema mais polecircmico e que merece
maior reflexatildeo No entanto crecirc que eacute possiacutevel a apreensatildeo de passaporte sem violar os
direitos fundamentais do devedor por se tratar de um direito de ir e vir de amplitude especial
Agrave primeira vista a possibilidade de apreensatildeo do passaporte tambeacutem nos parece possiacutevel pois tambeacutem se trata de um direito de ir e vir de amplitude especial Assim o eacute pois salvo situaccedilotildees especiais (refugiados p ex) haacute a necessidade de demonstrar condiccedilotildees financeiras de estadia e retorno para ser admitido no paiacutes de destino Ou seja pressupotildee uma condiccedilatildeo financeira que o devedor justamente diz natildeo possuir Sem embargo dessa consideraccedilatildeo esse ainda eacute um ponto que merece uma reflexatildeo mais acurada sendo essa apenas uma primeira impressatildeo72
Outros autores escreveram sobre o tema como eacute o caso do processualista Luiz
Dellore73 que tambeacutem defende que as medidas atiacutepicas como restriccedilatildeo ao direito de dirigir
apreensatildeo de passaporte e cancelamento de cartotildees de creacutedito satildeo permitidas e natildeo violam em
regra os direitos fundamentais do devedor
De minha parte creio que efetivamente haacute inovaccedilatildeo no at 139 IV do NCPC (e natildeo mera repeticcedilatildeo do que jaacute havia no Coacutedigo anterior) que tem o condatildeo de trazer mais efetividade ao processo executivo no Brasil ndash que por deacutecadas centrou sua atenccedilatildeo na defesa do executado (vide a grande quantidade de impenhorabilidades) sem dar maior atenccedilatildeo ao creacutedito do exequente
71 Ibid sem paginaccedilatildeo 72 Ibid sem paginaccedilatildeo 73 DELLORE Luiz NCPC Atipicidade das medidas executivas jaacute eacute realidade Disponiacutevel em lt
httpswwwjotainfoopiniao-e-analisecolunasnovo-cpcncpc-atipicidade-de-medidas-executivas-ja-e-realidade-17042017 gt Publicado em 17042017 Acesso em 03092018
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Logo a meu ver medidas como (i) restriccedilatildeo ao direito de dirigir (ii) apreensatildeo de passaporte (iii) cancelamento de cartotildees de creacutedito e (iv) vedaccedilatildeo de obtenccedilatildeo de novos empreacutestimos se natildeo vinculados ao pagamento do deacutebito exequendo dentre outras restriccedilotildees que deveratildeo ser observadas a cada caso satildeo permitidas pelo sistema do NCPC e em regra natildeo violam direitos fundamentais do devedor E tecircm o condatildeo de fazer com que o executado que tem recursos diante dessas medidas coercitivas pague o deacutebito trazendo sucesso agrave satisfaccedilatildeo do creacutedito
Nessa linha para Alexandre Fuchs das Neves74 o artigo 139 IV do CPC conferiu ao
juiz poderes coercitivos capazes de ldquotransformar a vida do devedor um infernordquo para compeli-
lo a cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria Entretanto pondera que para que a medida tenha
validade ldquoeacute necessaacuteria uma fundamentaccedilatildeo por evidente uma correlaccedilatildeo temaacutetica entre a
medida adotada e sua efetividade em face ao processo com fundamentaccedilatildeo detalhadardquo
No entendimento de Fernando Gajardoni75 satildeo possiacuteveis as medidas de apreensatildeo de
passaporte bloqueio de cartotildees de creacutedito e suspensatildeo da CNH Para ele o que limita o art
139 IV do CPC eacute o esgotamento dos meios tiacutepicos e a real necessidade da medida
Ilustrativamente natildeo efetuado o pagamento de diacutevida oriunda de multas de tracircnsito e superados os expedientes tradicionais de adimplemento (penhora de dinheiro e bens) seria liacutecito o estabelecimento da medida coercitivaindutiva de suspensatildeo do direito a conduzir veiacuteculo automotor ateacute pagamento do deacutebito (inclusive com apreensatildeo da CNH do devedor) natildeo efetuado pagamento de verbas salariais devidas a funcionaacuterios da empresa possiacutevel o estabelecimento de vedaccedilatildeo agrave contrataccedilatildeo de novos funcionaacuterios ateacute que seja saldada a diacutevida natildeo efetuado o pagamento de financiamento bancaacuterio na forma e no prazo avenccedilados possiacutevel ateacute que se tenha a quitaccedilatildeo que se obstem novos financiamentos ou mesmo a participaccedilatildeo do devedor em licitaccedilotildees (como de ordinaacuterio jaacute acontece com pessoas juriacutedicas em deacutebito tributaacuterio com o Poder Puacuteblico) etc
Teriacuteamos entatildeo no Brasil por assim dizer a adoccedilatildeo do padratildeo da atipicidade das medidas executivas tambeacutem para as obrigaccedilotildees de pagar vistas estas como ordens do EstadoJuiz para que haja prestaccedilatildeo de pagamento em pecuacutenia
()
Por isso ndash a prevalecer a interpretaccedilatildeo potencializada do art 139 IV do CPC2015 ndash o emprego de tais medidas coercitivasindutivas especialmente nas obrigaccedilotildees de pagar encontraraacute limite certo na excepcionalidade da medida (esgotamento dos meios tradicionais de satisfaccedilatildeo do deacutebito) na proporcionalidade (inclusive agrave luz da regra da menor onerosidade ao devedor do art 805 do CPC2015) na necessidade de fundamentaccedilatildeo substancial e especialmente nos direitos e garantias assegurados na Constituiccedilatildeo Federal (vg natildeo parece possiacutevel que se determine o pagamento sob pena de prisatildeo ou de vedaccedilatildeo ao exerciacutecio da profissatildeo do direito de ir e vir etc)
74 NEVES Alexandre Fuchs das Cancelamento de cartotildees de creacutedito e apreensatildeo de CNH e passaporte
do devedor Isso eacute possiacutevel Disponiacutevel em lt httpwwwsinfacspcombrconteudocancelamento-de-cartoes-de-credito-e-apreensao-de-cnh-e-passaporte-do-devedor-isso-e-possivel gt Acesso em 30082018
75 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Publicado em 24082015 Acesso em 30082018
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Jaacute Fernanda Tartuce76 acredita que tais medidas satildeo problemaacuteticas e devem ser
analisadas com cautela tendo em vista que ao inveacutes de afetarem o patrimocircnio do devedor
atingem a proacutepria pessoa
Sob certo prisma adotar medidas diferenciadas contribui para a efetividade da prestaccedilatildeo jurisdicional Por outro lado o patrimocircnio ndash e natildeo a pessoa do devedor - responde por diacutevidas aleacutem disso o exerciacutecio de amplos poderes pelo juiz sem balizas especiacuteficas pode ensejar medidas inadequadas Nessa linha suspender o direito de dirigir e restringir o uso de passaporte satildeo iniciativas problemaacuteticas por atingirem a pessoa do devedor enquanto a penhora da restituiccedilatildeo de Imposto de Renda soa viaacutevel por afetar seu patrimocircnio Eacute importante que a medida diferenciada se revele proporcional e seja aplicada apoacutes o exaurimento de outros meios previstos no ordenamento Como a proposta do Novo Coacutedigo eacute aumentar a eficiecircncia processual intentar medidas ineficazes inexequiacuteveis eou de difiacutecil fiscalizaccedilatildeo pode acabar ensejando o efeito contraacuterio
Nessa senda Lenio Streck e Dierle Nunes77 entendem que as medidas atiacutepicas de
suspensatildeo da CNH eou apreensatildeo de passaporte satildeo inconstitucionais Afirmam que natildeo se
pode confundir o processo civil e penal ainda que ambos remetam a um ldquoparadigma
constitucional comumrdquo e que o artigo 139 IV do CPC ldquoimpotildee novos desafios interpretativos
que podem conduzir a uma anaacutelise superficial e utilitarista de busca de resultados que
desprezem a necessaacuteria leitura constitucionalrdquo Os autores ainda ponderam que ldquoO perigo eacute o
artigo 139 IV ser transformado em instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com
autorizaccedilatildeo judicialrdquo
O professor Araken de Assis no dia 18 de abril de 2018 em um evento sobre o
Coacutedigo Processual Civil de 2015 que ocorreu em Brasiacutelia na sede do Conselho Federal da
OAB declarou ser contraacuterio aos poderes executoacuterios atiacutepicos ldquoSou contra os poderes
atiacutepicos dos juiacutezes porque seu exerciacutecio redunda em simples arbitrariedadesrdquo78
Acrescentou ainda que
76 IBDFAM ndash Instituto Brasileiro de Famiacutelia O polecircmico inciso IV do artigo 139 do CPC e suas difusas
interpretaccedilotildees Disponiacutevel em lt httpwwwibdfamorgbrnoticias6096O+polC3AAmico+inciso+IV+do+artigo+139+do+CPC+e+suas+difusas+interpretaC3A7C3B5es gt Publicado em 31082016 Acesso em 04092018
77 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018
78 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04092018
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Eacute evidentemente inconstitucional diante do princiacutepio da dignidade da pessoa humana tirar o passaporte carteira de habilitaccedilatildeo Quecirc que tem isso com diacutevidas Natildeo tem absolutamente nada Natildeo eacute a correlaccedilatildeo instrumental entre o objetivo da execuccedilatildeo e o meio empregado Isso eacute simples vinganccedila simples puniccedilatildeo79
O professor Araken de Assis acredita que tais medidas satildeo inconstitucionais e
violam o principio da dignidade humana do executado numa sociedade como a nossa
sedenta por puniccedilatildeo natildeo me surpreende que essas ideias sejam encaradas com
naturalidade Mas eacute preciso rejeitaacute-las em nome de princiacutepios 80
34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
A Constituiccedilatildeo Federal de 1988 tem como um dos seus fundamentos a dignidade da
pessoa humana presente no artigo 1ordm inciso III do referido texto constitucional O dito
princiacutepio tem o escopo de nortear o ordenamento juriacutedico como um todo
A inclusatildeo da dignidade da pessoa humana como princiacutepio constitucional obrigou
uma reflexatildeo sobre o papel da pessoa humana no direito e um redimensionamento para
elevaacute-la ao centro do ordenamento juriacutedico81 Eacute necessaacuterio recorrer agrave teoria Kantiana para
que se obtenha uma definiccedilatildeo do princiacutepio ora estudado Para Kant82 o homem eacute um fim
em si mesmo natildeo uma funccedilatildeo do Estado Ou Naccedilatildeo O Estado e o direito devem estar
organizados em benefiacutecio do indiviacuteduo
Agora eu afirmo o homem ndash e de uma maneira geral todo o ser racional ndash existe como fim em si mesmo e natildeo apenas como meio para o uso arbitraacuterio desta ou daquela vontade Em todas as suas accedilotildees pelo contraacuterio tanto nas direcionadas a ele mesmo como nas que o satildeo a outros seres racionais deve ser ele sempre considerado simultaneamente como fim
Partindo da premissa de que para Immanuel Kant o homem eacute o fim em si mesmo
ldquodevemos compreender que a dignidade da pessoa humana eacute a noccedilatildeo o comando a direccedilatildeo
que se deve seguir funcionando como fundamento para a interpretaccedilatildeo de todos os direitos e
garantias conferidos agrave pessoa nos ordenamentos juriacutedicos de cada Estadordquo 83
79 Ibid sem paginaccedilatildeo 80 Ibid sem paginaccedilatildeo 81 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito
fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 461 82 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud KANT Immanuel Fundamentaccedilatildeo da metafiacutesica dos costumes
Satildeo Paulo Martin Claret 2003 p56-59 Coleccedilatildeo A Obra-Prima de Cada Autor 83 SCHIAFIANO Juliana Rocha op cit p 461
37
O princiacutepio constitucional da dignidade da pessoa humana estaacute diretamente ligado ao
conteuacutedo dos direitos fundamentais logo para que se cumpra com os direitos fundamentais
constitucionalmente instituiacutedos eacute necessaacuterio reconhecer e respeitar a dignidade da pessoa
humana conforme disciplina Ingo Sarlet84
Em suma o que se pretende sustentar de modo mais enfaacutetico eacute que a dignidade da pessoa humana na condiccedilatildeo de valor (principio normativo) fundamental que atrai o conteuacutedo de todos os direitos fundamentais exige e pressupotildee o reconhecimento e proteccedilatildeo dos direitos fundamentais de todas as dimensotildees (ou geraccedilotildees se assim preferirmos) Assim sem que se reconheccedilam agrave pessoa humana os direitos fundamentais que lhe satildeo inerentes em verdade estarse-aacute lhe negando a proacutepria dignidade A consagraccedilatildeo constitucional da dignidade da pessoa humana tem o propoacutesito de limitar a atuaccedilatildeo ou a omissatildeo do Estado para garantir os direitos do indiviacuteduo Assim eacute difiacutecil precisar os efeitos da norma que determina a dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado (como acontece com a Constituiccedilatildeo brasileira de 1988) poreacutem quando desrespeitados os direitos fundamentais do cidadatildeo eacute possiacutevel identificar que a dignidade deste foi violada
Logo ldquoteraacute respeitada a sua dignidade o individuo que tiver respeitados os seus
direitos fundamentaisrdquo 85 Os direitos fundamentais estatildeo apresentados na Constituiccedilatildeo
Federal da seguinte forma direitos individuais e coletivos direitos sociais direitos poliacuteticos e
direitos de nacionalidade que tecircm como escopo garantir as liberdades positivas aos
indiviacuteduos ldquoonde foram conquistados direitos agrave liberdade religiosa liberdade civil e
profissional agrave propriedade ao livre acesso ao Judiciaacuterio agrave ampla defesa e ao contraditoacuterio no
processual judicial ao sigilo de dados e informaccedilotildees pessoais entre outros que somados
garantem o cidadatildeo uma vida dignardquo 86
O cidadatildeo na Constituiccedilatildeo Federal de 88 diferente das constituiccedilotildees brasileiras
anteriores passou a ser fundamento e ganhou destaque nos direitos fundamentais tendo
garantida a sua vida a sua dignidade a sua seguranccedila a sua honra a sua liberdade e a sua
propriedade
84 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud SARLET Ingo Wolfgang Dignidade da pessoa humana e
direitos fundamentais na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 2ed Porto Alegre Livraria do Advogado 2002 p87 85 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito
fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 462 86 Ibid p 462
38
Segundo Carmem Luacutecia Antunes Rocha87 para garantir o Estado Democraacutetico de
Direito eacute necessaacuterio que a sua atuaccedilatildeo seja sempre em conformidade com o princiacutepio da
dignidade da pessoa humana
O Estado somente eacute democraacutetico em sua concepccedilatildeo constitucionalizaccedilatildeo e atuaccedilatildeo quando respeita o princiacutepio da dignidade da pessoa humana Natildeo haacute verbo constitucional natildeo haacute verbo governamental que se faccedilam legiacutetimos quando natildeo se voltam ao atendimento daquele princiacutepio Natildeo haacute verdade constitucional natildeo haacute suporte institucional para as poliacuteticas puacuteblicas que natildeo sejam destinadas ao pleno cumprimento daquele valor maior transformado em princiacutepio constitucional
O princiacutepio da dignidade humana constitucionalmente garantido impotildee limites ao
Estado compelindo aos oacutergatildeos e atividades estatais respeitar o ser humano e garanti-lo
condiccedilotildees miacutenimas para uma vida digna Dessa forma eacute niacutetido que o dito princiacutepio eacute
pressuposto e indispensaacutevel para legitimar outras normas constitucionais e
principalmente infraconstitucionais
O Coacutedigo de Processo Civil eacute umas das principais normas infraconstitucionais que
sofre influecircncia dos preceitos valores e princiacutepios esculpidos na Constituiccedilatildeo Federal
Logo como o principio da dignidade humana eacute um dos mais importantes pressupostos
constitucionais ldquoentatildeo eacute tranquilo afirmar-se que o novel ordenamento processual tem
de se render nas resoluccedilotildees dos aspectos processuais e a fim de se atingir uma soluccedilatildeo
justa adequada e efetiva ao postulado da dignidade da pessoa humanardquo 88
Dessa forma o legislador deve formular as normas infraconstitucionais de acordo e a
partir do conteuacutedo constitucional para Marinoni Mitidiero e Arenhart89
() o Coacutedigo de Processo Civil constitui direito constitucional aplicado O Coacutedigo deve ser interpretado de acordo com a Constituiccedilatildeo e com os direitos fundamentais o que significa que as duacutevidas interpretativas devem ser resolvidas a favor da otimizaccedilatildeo do alcance da Constituiccedilatildeo e do processo civil como meio para tutela de direitos
87 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud ROCHA Carmen Luacutecia Antunes O princiacutepio da dignidade da
pessoa humana e a exclusatildeo social Revista Interesse Puacuteblico n4 p23-48 1999 p33 88 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o
novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 367
89 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 14
39
Com o escopo de conferir eficaacutecia aos mandamentos constitucionais o CPC15 traz a
previsatildeo e diversas claacuteusulas gerais em seus primeiros artigos em um dos quais se
prestigia o princiacutepio da dignidade da pessoa humana
O referido princiacutepio estaacute disciplinado no artigo 8ordm do CPC15 e atua como um guia
sobre as demais normas do coacutedigo processual Eacute o que entende Nelson Rosenvald90
O maior cuidado do inteacuterprete eacute no sentido de jamais banalizar a dignidade fazendo dela um elixir processual tal como muitas vezes se vecirc na esfera do direito civil Penso que natildeo haacute maiores dificuldades em transpor a noccedilatildeo constitucional do princiacutepio para em seguida adaptaacute-la agraves singularidades do processo
Logo de acordo com o artigo 8ordm do CPC o oacutergatildeo julgador ao aplicar o ordenamento
juriacutedico deve resguardar a dignidade da pessoa humana Para Fredie Didier91 ldquoresguardar
nesse contexto eacute de um lado aplicar corretamente a norma juriacutedica lsquoproteccedilatildeo da dignidade
da pessoa humanarsquo e de outro natildeo violar a dignidaderdquo
O oacutergatildeo julgador deveraacute manter um comportamento ativo com o objetivo de promover
a dignidade da pessoa humana podendo tomar medidas de ofiacutecio para efetivar a dignidade da
pessoa humana Didier assevera que o magistrado poderaacute ainda ldquovaler-se da claacuteusula geral de
atipicidade (art 536 sect 1ordm) para a execuccedilatildeo do direito fundamental agrave dignidaderdquo 92 O autor
ainda traz dois exemplos
a) exigecircncia de respeito agrave ordem cronoloacutegica de conclusatildeo (art 12) caso de grave violaccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana que natildeo se encaixe em um dos incisos que excepcionam a regra de observacircncia da cronologia da conclusatildeo poderia o juiz ldquofurar a filardquo para promover a dignidade da pessoa humana b) prioridade na tramitaccedilatildeo processual pessoa que seja portadora de doenccedila grave mas que natildeo esteja no rol do art 1048 I para promover a dignidade de pessoa humana o juiz poderia determinar o processamento prioritaacuterio93
Essa dupla garantia ndash resguardo e promoccedilatildeo ndash tem como objetivo garantir ao individuo
sua dignidade humana fazendo com que ldquode um lado que o Estado natildeo a viole e de outro
que o Estado a promova e efetiverdquo
90 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud ROSENVALD Nelson A
dignidade da pessoa humana no CPC15 91 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte
geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 75 92 Ibid p 75 93 Ibid p 75
40
Nessa senda o magistrado deveraacute promover a dignidade da pessoa humana quando
perceber a ausecircncia desta no processo ou assegura-la quando for posta em risco Eacute nesse
sentido o entendimento dos professores Marinoni Mitidiero e Arenhart94
() a dignidade da pessoa humana determina a compreensatildeo do processo civil como um meio para tutela dos direitos Vale dizer o processo civil natildeo pode ser visto como um instrumento a serviccedilo do Estado como um instrumento que natildeo se encontre orientado agrave realizaccedilatildeo dos fins da pessoa humana Em outras palavras o processo civil serve para realizaccedilatildeo dos direitos e para orientaccedilatildeo das pessoas a respeito do significado do direito
Nessa senda compete tanto ao juiz quanto as demais partes processuais garantirem ldquoo
valor intriacutenseco de cada vida que eacute trazida ao processordquo nas palavras de Alexandre Freitas
Cacircmara95
() aos sujeitos do processo eacute preciso sempre ter claro que os titulares dos interesses em conflitos satildeo pessoas reais cujas vidas seratildeo afetadas pelo resultado do processo e que por isso mesmo tecircm o direito de estabelecer suas estrateacutegias processuais de acordo com aquilo que lhes pareccedila melhor para suas vidas Eacute inadmissiacutevel tratar as partes como se natildeo fossem pessoas reais meros dados estatiacutesticos Afinal se para o Judiciaacuterio cada processo pode parecer apenas mais um processo para as partes cada processo pode ser o uacutenico o mais relevante aquele em que sua vida seraacute decidida E eacute dever do juiz assegurar que isto seja respeitado
Dessa forma eacute necessaacuterio que um arcabouccedilo normativo para que seja conferida
eficaacutecia e proteccedilatildeo ao principio da dignidade da pessoa humana
Logo o dito princiacutepio deve ser protegido em todas as esferas do ordenamento juriacutedico
inclusive no campo da execuccedilatildeo civil onde sofre grandes riscos de ser violado em nome do
direito fundamental agrave tutela executiva do credor ldquoPartir da premissa de que existe um direito
fundamental agrave tutela executiva ora ratificado pelo CPC eacute indispensaacutevel para a soluccedilatildeo de
diversos problemas oriundos do procedimento executivo principalmente aqueles relacionados
agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo 96
94 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme
MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 25
95 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CAcircMARA Alexandre Freitas O Novo Processo Civil Brasileiro 2 ed Satildeo Paulo Atlas 2016 p 7
96 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66
41
Eacute o caso por exemplo da impenhorabilidade Segundo Fredie Didier et al97 a
impenhorabilidade eacute uma forma de proteger certos bens do devedor do direito fundamental a
execuccedilatildeo do credor
Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa
Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais
O legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do CPC fazendo um
preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses em anaacutelise ao optar pela mitigaccedilatildeo do direito
do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado Afinal ldquoa execuccedilatildeo natildeo pode ser utilizada
como instrumento para causar a ruiacutena a fome e o desabrigo do devedor e sua famiacutelia gerando
situaccedilotildees incompatiacuteveis com a dignidade da pessoa humana 98
Logo a impenhorabilidade de certos bens
[] Eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa99
Eacute nesse sentido que o CPC15 enumera diversos casos de bens patrimoniais que satildeo
impenhoraacuteveis como o salaacuterio e vencimentos utensiacutelios necessaacuterios ao exerciacutecio da
profissatildeo seguro de vida vestuaacuterios e pertences de uso pessoal entre outros
Dessa forma as regras relativas agraves medidas executivas devem ser interpretadas agrave luz
da Constituiccedilatildeo Federal ldquovez que se voltam agrave realizaccedilatildeo de direitos fundamentais e em sua
97 Ibid p 66 98 THEODORO JUacuteNIOR Humberto Novo Coacutedigo de Processo Civil Anotado 20 ed Rio de Janeiro
Forense 2016 p 978 99 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud DIDIER JR Fredie CUNHA
Leonardo Carneiro da BRAGA Paula Sarno OLIVEIRA Rafael Alexandria de Curso de direito processual civil 3 ed Salvador JusPodivm 2011 v 5 p 547
42
realizaccedilatildeo podem atingir direitos fundamentaisrdquo 100 O Superior Tribunal de Justiccedila jaacute decidiu
que
O rol das impenhorabilidades do ordenamento paacutetrio objetiva preservar o miacutenimo patrimonial necessaacuterio agrave existecircncia digna do executado impondo ao processo executoacuterio certos limites Assim a depender das peculiaridades do caso as regras de impenhorabilidade podem ser ampliadas de modo a adequar a tutela aos direitos fundamentais como por exemplo o direito agrave moradia agrave sauacutede ou agrave dignidade da pessoa humana Trata-se portanto da aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo e da necessidade sob o enfoque da proporcionalidade101 (STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014)
Logo a interpretaccedilatildeo dos dispositivos que tratam sobre a penhora no CPC deve estaacute
diretamente ligada aos ditames constitucionais devendo o interprete privilegiar a opccedilatildeo que
esteja mais em sintonia com a Carta Magna para que nem o credor e nem o devedor sejam
lesados
O artigo 833 do CPC elenca uma seacuterie de incisos que expotildeem os bens impenhoraacuteveis
O trecho inicial inciso I do art 833 define como impenhoraacuteveis os bens inalienaacuteveis Este
inciso segue a regra de que ldquose o bem natildeo pode ser alienado tambeacutem natildeo pode ser penhorado
porque a penhora eacute o primeiro ato do procedimento de alienaccedilatildeo judicial do bemrdquo 102
Satildeo exemplos de bens inalienaacuteveis os puacuteblicos cuja alienaccedilatildeo depende de autorizaccedilatildeo
legislativa Eacute inalienaacutevel tambeacutem o capital constituiacutedo para garantir indenizaccedilatildeo de ato iliacutecito
(art 533 sect 1 ordm CPC) que portanto eacute tambeacutem impenhoraacutevel ldquoTodo bem inalienaacutevel eacute
impenhoraacutevel embora nem todo bem impenhoraacutevel seja inalienaacutevelrdquo 103
O inciso I do art 833 CPC tambeacutem consagra a impenhorabilidade dos bens que por
ato voluntaacuterio satildeo excluiacutedos da execuccedilatildeo
Segundo Fredie Didier et al104
Eacute o que ocorre nos casos de bens doados ou alienados com claacuteusula de inalienabilidade que haacute de constar no registro imobiliaacuterio para ser eficaz perante o exequente e minimizar o risco de fraude A propoacutesito eis a redaccedilatildeo do art 1911 do Coacutedigo Civil lsquolsquoA claacuteusula de inalienabilidade imposta aos bens por ato de liberalidade implica impenhorabilidade e incomunicabilidaderdquo
100 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MEDINA Joseacute Miguel Garcia
Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 1 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 p 736 101 STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014 102 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 824 103 Ibid p 824 104 Ibid p 825
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O inciso II por sua vez estabelece que satildeo impenhoraacuteveis os bens moacuteveis os
pertences e as utilidades domeacutesticas da residecircncia do executado Todavia excepcionam-se os
bens dessa natureza que sejam de elevado valor ou que ultrapassem as necessidades comuns
correspondentes a um meacutedio padratildeo de vida
A jurisprudecircncia natildeo eacute paciacutefica sobre o assunto logo natildeo exista uma relaccedilatildeo de bens
que podem ser atingidos pela penhora Abrindo margem para as mais variadas decisotildees
O STJ jaacute considerou impenhoraacuteveis aparelho de televisatildeo a cores mesa de centro passadeira raacutedio toca-fitas gravador microondas ar-condicionado um freezer um microcomputador com acessoacuterios uma impressora etc Poderatildeo ser penhorados porque ultrapassam o padratildeo-meacutedio aparelhos de TV mais sofisticados o segundo aparelho de televisatildeo a segunda geladeira aparelhos de ar-condicionado que satildeo verdadeiras peccedilas de design moacuteveis antigos que se transformam em peccedilas de decoraccedilatildeo faqueiro de prata adega climatizada etc Em entendimento de caraacuteter ainda mais geneacuterico jaacute restou consignado em determinado precedente que a proteccedilatildeo natildeo abrangeria apenas os bens indispensaacuteveis agrave moradia mas tambeacutem aqueles usualmente encontrados em um lar105
Ademais o inciso III do art 833 do CPC traz a impenhorabilidade dos vestuaacuterios bem
como os pertences de uso pessoal do executado salvo se de elevado valor
Segundo Fredie Didier et al106 o dispositivo possui dois propoacutesitos
de um lado preservar a dignidade do executado com a proteccedilatildeo de bens moacuteveis importantes para a sua sobrevivecircncia digna como o vestuaacuterio aparelho celular reloacutegio e os bens relacionados agrave sua higiene pessoal de outro lado a regra visa prestigiar a boa-feacute processual impedindo a execuccedilatildeo mesquinha e abusiva com a penhora de bens de pequeno ou nenhum valor como um pente ou uma bota
O inciso IV do art 833 do CPC consagra uma das mais importantes modalidades a
impenhorabilidade relativa aos rendimentos de natureza alimentar ldquoTrata-se de regra que
possui o claro propoacutesito de proteger o executado garantindo-lhe o recebimento de valores que
servem ao pagamento das despesas relacionadas agrave sua sobrevivecircncia digna e agrave da sua famiacuteliardquo 107
Jaacute inciso V do art 833 do CPC torna impenhoraacuteveis os livros as maacutequinas as
ferramentas os utensiacutelios os instrumentos ou outros bens moacuteveis necessaacuterios ou uacuteteis ao
exerciacutecio de qualquer profissatildeo 105 Ibid p 826 106 Ibid p 827 107 Ibid p 828
44
Por forccedila do paraacutegrafo 3ordm do art 833 satildeo igualmente impenhoraacuteveis os equipamentos
implementos e maacutequinas agriacutecolas pertencentes agrave pessoa fiacutesica ou a empresa individual
produtora rural Rodrigo Mazzei e Sarah Merccedilon108 esclarecem que
Tem assento na noccedilatildeo de que a dignidade estende-se tambeacutem ao exerciacutecio da profissatildeo em si mesma e tambeacutem por representar a forma por excelecircncia de que dispotildee o executado para continuar a receber sua remuneraccedilatildeo e por conseguinte prover seu sustento e de sua famiacutelia Trata-se tambeacutem de aplicaccedilatildeo pontual da funccedilatildeo social da propriedade jaacute que protege os bens que permitem a circulaccedilatildeo de riquezas para a subsistecircncia do executado e se for o caso de sua famiacutelia
Forccediloso ressaltar ainda que a impenhorabilidade do inc V alcanccedila apenas os bens
moacuteveis de modo que eacute absolutamente possiacutevel que o imoacutevel em que o executado exerccedila sua
atividade profissional seja penhorado conforme a Suacutemula 451 do STJ ldquoEacute legiacutetima a penhora
da sede do estabelecimento comercialrdquo
O inciso VI do art 833 do CPC versa sobre a impenhorabilidade do seguro de vida
ldquoTrata-se de impenhorabilidade em favor do beneficiaacuterio do seguro e natildeo do segurado ateacute
porque o valor do seguro natildeo compotildee nem comporaacute o seu patrimocircnio (art794 do Coacutedigo
Civil1 ordm7)rdquo Dessa forma ldquoem uma execuccedilatildeo contra o segurado natildeo seraacute possiacutevel a penhora
do seguro de vida pois se trata de bem que natildeo lhe pertence nem mesmo em expectativardquo
De acordo com o inciso VII do art 833 do CPC satildeo impenhoraacuteveis os materiais
necessaacuterios para obras em andamento salvo se essas forem penhoradas Logo a obra pode
ser penhorada (art 862 do CPC) ldquoA regra como bem lembrou Araken de Assis lsquoestimula a
penhora da proacutepria obra inconclusa agrave qual os materiais acrescem e conseguintemente
valorizamrsquo 109
O art 833 VIII CPC julga impenhoraacutevel a pequena propriedade rural assim
definida em lei desde que trabalhada pela famiacutelia reproduzindo parte do art 5ordm XXVI CF
88116 que disciplina a impenhorabilidade do referido bem
A proteccedilatildeo do CPC eacute mais ampla do que a garantia prevista na Constituiccedilatildeo Federal
tendo em vista que a impenhorabilidade natildeo se restringe agraves execuccedilotildees de deacutebitos decorrentes
de sua atividade produtiva podendo ser alegada em toda e qualquer execuccedilatildeo ldquoAssim o 108 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CABRAL Antonio Passo
CRAMER Ronaldo (orgs) Comentaacuterios ao Novo Coacutedigo de Processo Civil Rio de Janeiro Forense 2015 p 1194
109 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 835
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imoacutevel natildeo pode ser penhorado na execuccedilatildeo de creacutedito rural concedido para estimular a
produccedilatildeo agriacutecola mas poderaacute ser penhorado na execuccedilatildeo do creacutedito concedido para a
aquisiccedilatildeo do imoacutevelrdquo 110
A nona modalidade de impenhorabilidade trata-se dos recursos puacuteblicos recebidos por
instituiccedilotildees privadas para aplicaccedilatildeo compulsoacuteria em educaccedilatildeo sauacutede ou assistecircncia social ldquoA
proteccedilatildeo eacute louvaacutevel e tutela toda a coletividade ao privilegiar o direito agrave educaccedilatildeo sauacutede e
assistecircncia social em detrimento do direito do credorrdquo
De acordo com o inciso X do art 833 do CPC eacute impenhoraacutevel ateacute o limite de
quarenta salaacuterios miacutenimos a quantia depositada em caderneta de poupanccedila
Eacute uma modalidade de impenhorabilidade relativa (o CPC73 a considerava absoluta)
tendo em vista que essa impenhorabilidade natildeo pode ser oposta na execuccedilatildeo de alimentos
independentemente da sua origem (art 833 sect 2ordm do CPC) Fredie Didier et al cita Araken de
Assis111 ao afirmar que
a regra soacute protege essa aplicaccedilatildeo financeira Se o valor estiver depositado em fundo de investimento por exemplo poderaacute ser penhorado Se o devedor tiver vaacuterias cadernetas de poupanccedila a impenhorabilidade aplica-se agrave soma de todas elas e natildeo a cada uma delas isoladamente do contraacuterio valores expressivos poderiam ser pulverizados em vaacuterias contas burlando a finalidade da regra que eacute a de proteger a populaccedilatildeo de baixa renda
Ademais satildeo tambeacutem impenhoraacuteveis por forccedila do inciso XI os recursos puacuteblicos do
fundo partidaacuterio recebidos por partido poliacutetico nos termos da lei Essa modalidade de
impenhorabilidade ldquose restringe aos recursos puacuteblicos do fundo partidaacuterio Recursos de
origem privada recebidos pelo partido poliacutetico poderatildeo ser penhoradosrdquo 112 O processualista
Fredie Didier et al113 assevera que
Assim a impenhorabilidade foi estabelecida no intuito de impedir que os diretoacuterios nacionais de partidos poliacuteticos respondam por diacutevida dos diretoacuterios
110 Ibid p 836 111 DIDIER JR Fredie et al apud ASSIS Araken de Manual da execuccedilatildeo 11ordm ed cit p 225 Assim
tambeacutem REDONDO Bruno Garcia LOJO Maacuterio Vitor Suarez Penhora cit p 117 BUENO Cassio Scarpinella Curso sistematizado de Direito Processual Civil v 3 cit p 228 GIANNICO Mauriacutecio As novas reformas do CPC e de outras normas processuais Mauriacutecio Giannico e Viacutetor Joseacute de Mello Monteiro (coord) Satildeo Paulo Saraiva 2009 p 1 OS Em sentido diverso estendendo a impenhorabiacutelidade aos depoacutesitos feitos ateacute esse valor em CDB CDI fundos de renda fixa ou de accedilotildees RODRIGUES Marcelo Abelha Manual de execuccedilatildeo civil 3deg ed cit p 101
112 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 839
113 Ibid p 839
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estaduaismunicipais - sobretudo em razatildeo das vaacuterias decisotildees judiciais que determinaram penhora de recursos do fundo partidaacuterio de alguns partidos
Por fim o inciso XII do artigo 833 do CPC trata sobre a impenhorabilidade dos
creacuteditos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias sob o regime de incorporaccedilatildeo imobiliaacuteria
vinculados agrave execuccedilatildeo de obra ldquoO objetivo dessa modalidade eacute evitar que diacutevidas do
incorporador possam consumir os recursos que seriam utilizados na realizaccedilatildeo da obra em
prejuiacutezo dos adquirentes de unidades autocircnomasrdquo 114
O professor Misael Montenegro Filho115 aduz sobre que ldquoao estabelecer a
impenhorabilidade dos creacuteditos oriundos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias o novo CPC
protegeu os valores destinados agrave execuccedilatildeo da obra e agrave entrega das unidades imobiliaacuterias aos
adquirentes assegurando assim a execuccedilatildeo da promessa contratualrdquo
Importante frisar ainda que a Lei nordm 8009 1990 instituiu a impenhorabilidade do
imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar por qualquer diacutevida salvo as exceccedilotildees dos
seus arts 3ordm e 4ordm
A referida lei dispotildee que Para os efeitos de impenhorabilidade considera-se
residecircncia um uacutenico imoacutevel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia
permanente (art 5ordm)
O processualista baiano Fredie Didier et al116 assevera que
A lei propotildee-se a proteger imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar nos termos acima expostos A CF 88 ampliou o conceito de entidade familiar para abranger a famiacutelia monoparental e a uniatildeo estaacutevel Mas deve considerar-se aiacute compreendidos os irmatildeos que vivem juntos e a uniatildeo homossexual Ateacute o solteiro estaacute abrangido pela impenhorabilidade se reside soacute no imoacutevel - isso em nome da proteccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana e da moradia digna Na verdade houve uma mudanccedila de compreensatildeo acerca do sentido da proteccedilatildeo de proteccedilatildeo da famiacutelia agrave proteccedilatildeo da moradia indispensaacutevel agrave preservaccedilatildeo da dignidade da pessoa
114 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o
novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 388
115 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MONTENEGRO FILHO Misael Novo Coacutedigo de Processo Civil Comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Atlas 2016 p 752
116 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 840-841
47
O STJ jaacute consolidou esse entendimento na suacutemula nordm 364 O conceito de
impenhorabilidade de bem de famiacutelia abrange tambeacutem o imoacutevel pertencente a pessoas
solteiras separadas e viuacutevas
Entretanto se o casal ou entidade familiar possuir vaacuterios imoacuteveis utilizados como
residecircncia a impenhorabilidade recairaacute sobre o de menor valor (art 5ordm paraacutegrafo uacutenico) ldquoEacute o
que ocorre por exemplo quando a famiacutelia se divide em mais de uma cidade por motivos
profissionaisrdquo 117
Forccediloso observar ainda que a impenhorabilidade do imoacutevel familiar eacute relativa jaacute que
natildeo pode ser oposta a qualquer creacutedito O art 3ordm da Lei n 8009 1990151 em que pode ser
penhorada a residecircncia da famiacutelia (exemplo execuccedilatildeo de alimentos para cobranccedila de taxas
devidas em funccedilatildeo do imoacutevel familiar etc)
Resta claro que o artigo 833 do CPC ao disciplinar as hipoacuteteses de impenhorabilidade
possui o escopo de proteger o princiacutepio da dignidade humana Entretanto algumas claacuteusulas
natildeo possuem proteccedilatildeo absoluta ldquoa sua relativizaccedilatildeo a depender do caso sob exame deve ser
realccedilada agrave medida que a dignidade resguardada e protegida pelo sistema processual-
constitucional natildeo se limita ao executadordquo 118 Ademais ldquoEacute premente advertidamente que a
dignidade do credor tambeacutem seja garantida em juiacutezo tendo como norte pois os princiacutepios da
proporcionalidade e razoabilidaderdquo 119
117 Ibid p 841 118 Ibid p 752 119 Ibid p 752
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4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA
ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE
HUMANA DO EXECUTADO
41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE
EFETIVACcedilAtildeO
Como jaacute exposto em linhas preteacuteritas nos meios executivos tiacutepicos as medidas
executivas satildeo determinadas pela lei ou seja o oacutergatildeo pode aplicar somente as medidas
tipificadas no ordenamento juriacutedico No entanto ao se tratar das medidas executivas atiacutepicas
eacute necessaacuterio que haja um limite na atuaccedilatildeo realizada pelo juiz
O poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo poder ser realizado de maneira indiscriminada haacute
pressupostos e premissas a serem observadas Dessa forma a primeira premissa eacute no sentindo
de que a medida executiva atiacutepica natildeo pode ser a primeira medida a ser invocada ldquomuito ao
reveacutes a regra do nosso sistema continua a ser o da tipicidade dos meios executivos soacute que
agora temperado pelo sistema atiacutepicordquo 120 O processualista Thiago Rodovalho explica que
ldquo() os meios atiacutepicos natildeo satildeo prima ratio e sim a ultima ratio eacute dizer esgotados e
frustrados os meios executivos tiacutepicos e ordinaacuterios pode-se em tese valer-se do sistema
atiacutepicordquo121
Dessa forma nos casos de execuccedilatildeo que tenha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
natildeo deve ser aplicado de logo as medidas indutivas e coercitivas Apenas apoacutes frustradas as
medidas ldquonaturaisrdquo pode-se passar agrave aplicaccedilatildeo das medidas atiacutepicas
Uma segunda premissa diz a respeitos dos meios de pressatildeo para compelir o devedor a
adimplir com o seu deacutebito ldquoEssa segunda premissa decorre inclusive de imperiosidade
loacutegica de nada adianta a medida de pressatildeo se a obrigaccedilatildeo natildeo tem como ser adimplida pelo
devedorrdquo 122
Para Thiago Rodovalho123 ldquoIsso quer significar que esgotados e frustrados os meios
tiacutepicos o juiz se valeraacute dos meios atiacutepicos se eles forem potencialmente haacutebeis a estimular ou
120 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da
atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018
121 Ibid sem paginaccedilatildeo 122 Ibid sem paginaccedilatildeo 123 Ibid sem paginaccedilatildeo
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forccedilar o cumprimento o que pressupotildee sua possibilidade quando entatildeo eles poderatildeo ser
eficazesrdquo
Logo nas obrigaccedilotildees de pagar quantia se houver a real demonstraccedilatildeo da
impossibilidade financeira do devedor seria um constrangimento inuacutetil e desnecessaacuterio a
imposiccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo para forccedilar o cumprimento
Por isso as medidas atiacutepicas devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o
esgotamento das medidas tiacutepicas e a possibilidade de cumprimento de cumprimento da
obrigaccedilatildeo
Ademais superadas as supracitadas premissas e o oacutergatildeo julgador vislumbrando a
necessidade da aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo se faz necessaacuterio que um conjunto de
postulados e princiacutepios rejam a atuaccedilatildeo do oacutergatildeo julgador servindo de norte para a escolha da
medida executiva mais adequada ldquoDe modo geral a escolha deve pautar-se nos postulados da
proporcionalidade da razoabilidade (art8ordm CPC) e da proibiccedilatildeo de excesso bem como nos
princiacutepios da eficiecircncia e da menor onerosidade da execuccedilatildeordquo 124
O professor Fredie Didier et al125 eacute categoacuterico ao citar Humberto Aacutevila
Segundo Humberto Aacutevila o postulado da proporcionalidade se manifesta nas situaccedilotildees em que haacute uma relaccedilatildeo de causalidade entre dois elementos empiricamente discerniacuteveis um meio e um fim de tal sorte que se possa proceder aos trecircs exames fundamentais o da adequaccedilatildeo (o meio promove o fim) o da necessidade (dentre os meios disponiacuteveis e igualmente adequados para promover o fim natildeo haacute outro meio menos restritivo do(s) direito(s) fundamental (is) afetado(s)) e o da proporcionalidade em sentido estrito (as vantagens trazidas pela promoccedilatildeo do fim correspondem agraves desvantagens provocadas pela adoccedilatildeo do meio)
O juiz ao aplicar a medida executiva atiacutepica ao caso concreto deve ter seu
embasamento no princiacutepio da proporcionalidade para saber se a medida a ser tomada eacute a
melhor opccedilatildeo ao caso sub judice ldquoO exame de proporcionalidade aplica-se sempre que
houver uma medida concreta destinada a realizar uma finalidaderdquo 126
Em verdade a aplicaccedilatildeo do princiacutepio da proporcionalidade eacute imprescindiacutevel na adoccedilatildeo
dos meios executivos atiacutepicos tendo em vista que ldquo() tais medidas em especial quando de
124 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111 125 DIDIER JR Fredie et al apud AVILA Humberto Teoria dos princiacutepios da definiccedilatildeo agrave aplicaccedilatildeo
dos princiacutepios juriacutedicos 16 ed Satildeo Paulo Malheiros 2015 p 205 126 DIDIER JR Fredie et al op cit p 111
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natureza coercitiva podem restringir direitos do devedor e incidir diretamente sobre sua
pessoardquo127 Logo ainda que o princiacutepio da efetividade da tutela executiva seja um direito
fundamental o mesmo ldquo() deve ser compatibilizado com direitos fundamentais do
executado para que a sua dignidade humana seja preservadardquo 128
Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Neves129 afirma que em nome do princiacutepio da
proporcionalidade o juiz deveraacute
() ponderar no caso concreto as vantagens praacuteticas da adoccedilatildeo de cada medida executiva atiacutepica em especial as de natureza coercitiva e as desvantagens de sua adoccedilatildeo levando em conta a possibilidade de a medida criar uma limitaccedilatildeo excessiva ao exerciacutecio de direito fundamental do executado
Outro princiacutepio que o oacutergatildeo julgador deve se ater ao escolher a medida executiva
atiacutepica eacute o da razoabilidade Segundo Fredie Didier et al 130 o princiacutepio (ou postulado)131 se
manifesta de trecircs formas
a) como dever de equidade a exigir a harmonizaccedilatildeo da norma geral com o caso individual impondo a consideraccedilatildeo daquilo que normalmente acontece em detrimento do que eacute extraordinaacuterio e tambeacutem impondo a consideraccedilatildeo das especificidades do caso concreto ante a generalidade da norma b) como dever de congruecircncia a exigir a harmonizaccedilatildeo das normas com suas condiccedilotildees externas de aplicaccedilatildeo (isto eacute com a realidade com base em que foram editadas) c) como dever de equivalecircncia a exigir uma relaccedilatildeo de equivalecircncia entre a medida adotada e o criteacuterio que a dimensiona
Logo ldquo() o princiacutepio da razoabilidade deve nortear a atuaccedilatildeo do juiz na adoccedilatildeo das
medidas executivas atiacutepicas previstas no art 139 IV do Novo CPCrdquo 132 tendo em vista que
ldquo() mesmo medidas que pelo princiacutepio da proporcionalidade podem se mostrar
abstratamente possiacuteveis de adoccedilatildeo no caso concreto podem se mostrar inadequadas e
irrazoaacuteveisrdquo 133
127 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Medidas executivas atiacutepicas na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de
pagar quantia certa art 139 IV do novo CPC Revista de Processo v 42 n 265 mar 2017 p 14 128 Ibid p 14 129 Ibid p 14 130 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111-112 131 Segundo Fredie Didier et al o postulado eacute uma norma que atua sobre a aplicaccedilatildeo de outras normas
A proporcionalidade e a razoabilidade seriam postulados normativos e natildeo princiacutepios segundo essa concepccedilatildeo 132 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo op cit p 14 133 Ibid p 14
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Ademais conforme dispotildee o postulado da proibiccedilatildeo de excesso ldquoa realizaccedilatildeo de uma
regra ou princiacutepio constitucional natildeo pode conduzir agrave restriccedilatildeo a um direito fundamental que
lhe retire um miacutenimo de eficaacuteciardquo 134
A proibiccedilatildeo de excesso deveraacute sempre ser suscitada quando um direito fundamental
houver sido violado a ponto do direito fundamental sofrer violaccedilatildeo excessiva Ademais ldquoesse
postulado natildeo se confunde com o da proporcionalidade porque ele dispensa os exames da
adequaccedilatildeo (relaccedilatildeo meiofim) da necessidade (exigibilidade) ou da proporcionalidade em
sentido estrito (ponderaccedilatildeo entre vantagens e desvantagens)rdquo 135
Logo ldquopouco importa a relaccedilatildeo meiofim ou a exigibilidade da medida ou ainda a
ponderaccedilatildeo com outro direito fundamental eventualmente em jogo aqui se analisa apenas a
eficaacutecia de um determinado direito fundamentalrdquo 136
O princiacutepio da eficiecircncia tem previsatildeo constitucional no art 37 e previsatildeo
infraconstitucional no art 8ordm do CPC15 O referido princiacutepio determina que o processo seja
conduzido de forma eficiente pelo oacutergatildeo jurisdicional
Entende-se que eficiente eacute a atuaccedilatildeo que utilize adequadamente os meios necessaacuterios
para que se atinjam os fins almejados O oacutergatildeo jurisdicional na escolha dos meios a serem
utilizados para a obtenccedilatildeo dos fins
a) deve escolher aqueles que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo (deve evitar meios que promovam resultados insignificantes) b) deve escolher meios que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado (natildeo se pode escolher um meio de resultado duvidoso) c) natildeo pode escolher um meio que produza muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscado 137
O juiz deveraacute igualmente analisar o princiacutepio da menor onerosidade da execuccedilatildeo que
eacute previsto pelo art 805 do CPC ldquoArt 805 Quando por vaacuterios meios o exequente puder
promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o
executadordquo
134 134 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 112 135 Ibid p 112 136 Ibid p 112 137 Ibid p 112-113
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Logo ldquohavendo duas opccedilotildees igualmente eficazes para permitir alcanccedilar o resultado
pretendido (satisfaccedilatildeo do creacutedito) deveraacute o oacutergatildeo julgador valer-se daquela que menos onere
a situaccedilatildeo do executadordquo 138
O dito princiacutepio impede o comportamento abusivo do exequente que possa beneficiar-
se do meio mais danoso ao executado protegendo dessa forma a lealdade e a eacutetica
processual
Os postulados e princiacutepios analisados em linhas preteacuteritas impotildeem ao oacutergatildeo julgador a
observacircncia de alguns criteacuterios para a escolha da medida executiva atiacutepicas a ser utilizada no
caso concreto
Primeiramente a medida executiva atiacutepica deveraacute ser adequada ldquoO criteacuterio da
adequaccedilatildeo impotildee que juiz considere abstratamente uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida
executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia
a gerar o resultadordquo 139 Nesse primeiro momento o juiz deveraacute observar sob a perspectiva do
credor qual medida teraacute o condatildeo de gerar o resultado mais efetivo
Segundo Fredie Didier et al140 o criteacuterio da adequaccedilatildeo eacute
() fortemente inspirado pelo postulado da proporcionalidade e pelo princiacutepio da eficiecircncia na parte em que esse princiacutepio determina a escolha de meios que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo e que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado
Ademais a medida adotada pelo oacutergatildeo julgador deveraacute ser necessaacuteria ldquoEsse criteacuterio
impotildee um limite agrave atuaccedilatildeo judicial funcionando como uma espeacutecie de contrapeso ao criteacuterio
da adequaccedilatildeo Aqui deve-se levar em conta a posiccedilatildeo do devedorrdquo141
O juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental agrave execuccedilatildeo e determinar
uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute necessaacuterio que a
medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado O criteacuterio da necessidade
estabelece que ldquonatildeo se pode ir aleacutem do necessaacuterio para alcanccedilar o propoacutesito almejado Deve
138 Ibid p 113 139 Ibid p 113 140 Ibid p 113 141 Ibid p 114
53
pois o oacutergatildeo julgador determinar o meio executivo na medida do estritamente necessaacuterio para
proporcionar a satisfaccedilatildeo do creacutedito ndash nem menos nem maisrdquo 142
O referido criteacuterio possui forte influecircncia dos postulados da proibiccedilatildeo do excesso e da
razoabilidade assim como do princiacutepio da menor onerosidade para o executado Assevera
Fredie Didier et al143 que
Natildeo eacute razoaacutevel por exemplo impor como primeira opccedilatildeo medida coercitiva a ser suportada pelo agente puacuteblico pelo simples fato de o juiz pressupor que o ente puacuteblico ao qual ele eacute vinculado iraacute descumprir determinada ordem judicial - o descumprimento natildeo pode ser visto como algo ordinaacuterio ou cotidiano (razoabilidade como dever de equidade) Tampouco eacute razoaacutevel eleger a prisatildeo civil como meacutetodo prioritaacuterio para compelir o executado ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer (razoabilidade como dever de equivalecircncia) Aleacutem disso eacute vedada por exemplo a imposiccedilatildeo de multa coercitiva para compelir o executado a emitir declaraccedilatildeo de vontade uma vez que haacute previsatildeo expressa de medida tiacutepica capaz de proporcionar o mesmo resultado sem sacrifiacutecio para o devedor (art 501 CPC)
A afirmaccedilatildeo feita por Bonavides144 em 1997 sobre a adequaccedilatildeo e a necessidade
continua atual sobre os motes
O meio empregado pelo legislador deve ser adequado e necessaacuterio para alcanccedilar o objetivo procurado O meio eacute adequado quando com seu auxiacutelio se pode alcanccedilar o resultado desejado eacute necessaacuterio quando o legislador natildeo poderia ter escolhido outro meio igualmente eficaz mas que natildeo limitasse ou limitasse de maneira menos sensiacutevel o direito fundamental
Por fim a medida deve conciliar os interesses contrapostos ldquoO magistrado deve
ponderar os interesses em jogo aplicando a proporcionalidade em sentido estrito de modo
que as vantagens da utilizaccedilatildeo da medida atiacutepica escolhida superem as vantagens de seu usordquo 145
Esse criteacuterio natildeo privilegia nem o credor nem o devedor e sim a soluccedilatildeo mais
equilibrada e que atenda da melhor forma aos valores em conflito ldquoTrata-se de criteacuterio
inspirado nos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade bem como no princiacutepio da
142 Ibid p 114 143 Ibid p 114 144 BONAVIDES Paulo Curso de Direito Constitucional 7ordm ediccedilatildeo Satildeo Paulo Ed Malheiros 1997
p 372 145 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 114-115
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eficiecircncia na parte em que impotildee ao juiz evitar a escolha do meio executivo que produza
muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscadordquo 146
Cada um dos criteacuterios supracitados devem ser considerados pelo juiz ao aplicar as
medidas executivas atiacutepicas ao caso concreto Para Fredie Didier et al147 as medidas como
retenccedilatildeo de CNH passaporte ou cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado como
forma de pressionaacute-lo ao pagamento da diacutevida pecuniaacuteria natildeo satildeo possiacuteveis
Essas natildeo satildeo medidas adequadas ao atingimento do fim almejado (o pagamento de quantia) - natildeo haacute propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente Tais medidas soam mais como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-lo ao cumprimento da ordem judicial - e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a utilizaccedilatildeo de meios sancionatoacuterios pelo magistrado mas apenas de meios de coerccedilatildeo indireta e sub-rogatoacuterios
Ainda que adequadas fossem a retenccedilatildeo de CNH e do passaporte no corte de fornecimento de aacutegua natildeo parecem ser medidas necessaacuterias (no sentido de exigiacuteveis) uma vez que outras medidas podem em tese ser utilizadas sem causar igual gravame ao executado - como por exemplo a simples restriccedilatildeo do uso de cartotildees de creacutedito A retenccedilatildeo de documentos pessoais eacute medida que termina por restringir a liberdade de ir e vir do executado mostrando-se a princiacutepio natildeo-razoaacutevel por ir de encontro ao dever de equivalecircncia e desproporcional por restringir demais o direito agrave liberdade em favor do direito de creacutedito pecuniaacuterio do exequente
O processualista baiano et al148 cita tambeacutem outro exemplo de medida atiacutepica que natildeo
atingem os criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade
Tampouco parece adequada em princiacutepio determinaccedilatildeo de corte de energia eleacutetrica de todo o preacutedio onde funciona serviccedilo puacuteblico administrativo como forma de pressionar o ente federado a cumprir ordem de nomeaccedilatildeo de candidato em concurso puacuteblico Natildeo parece haver relaccedilatildeo meiofim entre uma coisa e outra Tambeacutem natildeo eacute possiacutevel enxergar essa medida como necessaacuteria no sentido de ser a menos gravosa para o devedor - observe que se trata de medida que uma vez aplicada ensejaria restriccedilatildeo de funcionamento em toda a reparticcedilatildeo puacuteblica em prejuiacutezo de serviccedilos puacuteblicos essenciais ao funcionamento da Administraccedilatildeo o que aleacutem de ser excessivamente gravoso parece natildeo se conformar agrave necessidade de ponderaccedilatildeo dos interesses em jogo - aleacutem de afetar a um sem-nuacutemero de pessoas tomadoras desses serviccedilos
Ademais eacute sabido que toda e qualquer decisatildeo judicial precisa ser fundamentada Ao
se tratar das medidas executivas atiacutepicas o papel da fundamentaccedilatildeo se torna ainda mais
146 Ibid p 115 147 Ibid p 115 148 Ibid p 116
55
importante tendo em vista que eacute pela fundamentaccedilatildeo da decisatildeo que se poderaacute controlar a
adequaccedilatildeo e necessidade da medida atiacutepica
Pelo fato das medidas executivas atiacutepicas derivarem de dispositivos normativos
considerados claacuteusulas gerais propiacutecias as mais variadas interpretaccedilotildees eacute de extrema
importacircncia que o oacutergatildeo julgador fundamente sua decisatildeo
Logo ldquodeve o juiz na fundamentaccedilatildeo decisoacuteria expor racionalmente os motivos da
sua escolha demonstrando com atenccedilatildeo ao art 489 sect 1ordm CPC de que modo a sua opccedilatildeo
atende os criteacuterios da adequaccedilatildeo necessidade e proporcionalidade em sentido estrito ()rdquo 149
Dessa forma os princiacutepios da proporcionalidade e razoabilidade servem para delimitar
o alcance das claacuteusulas gerais de efetivaccedilatildeo fazendo com que o oacutergatildeo julgador se atenha aos
criteacuterios da adequaccedilatildeo e necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao caso
concreto
42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO
EXECUTADO
A entrada em vigor do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 aflorou ainda mais uma
discussatildeo essencial para os processualistas do seacuteculo XXI qual eacute o verdadeiro protagonista do
processo civil
Para os que defendem o ldquoautoritarismo processualrdquo o verdadeiro protagonista do
processo civil eacute o oacutergatildeo judiciaacuterio que em nome do desempenho efetivo de suas funccedilotildees lhes
eacute permitido dilatar os poderes que diga-se de jaacute passagem jaacute compotildeem um vastiacutessimo
arsenal150
Jaacute os ldquogarantistasrdquo 151 do processo civil acreditam que os verdadeiros protagonistas satildeo
as partes do processo e seus direitos e garantias devem ser estritamente preservados
Devido a essa disputa de quem possui maior protagonismo no processo as mudanccedilas
ocorridas no coacutedigo processual vigente quanto agraves medidas executivas atiacutepicas despertaram
149 Ibid p 117 150 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos
atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04102018
151 O processualista Araken de Assis acredita que o termo garantista eacute descabido tendo em vista que remete ao processo penal
56
maior celeuma do que qualquer outra modificaccedilatildeo trazida pelo CPC15 Afinal as referidas
medidas acirravam ainda mais a disputa pelo protagonismo processual
O fato de o CPC15 dispor no art 139 IV que o juiz poderaacute decretar todas as medidas
indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o
cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo
pecuniaacuteria levou boa parte da doutrina e dos juiacutezes a acreditar que teria pleno direito de
aplicar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo Entretanto muitos se esqueceram do outro lado
da moeda esqueceram que a dignidade humana do executado tambeacutem eacute um direito
fundamental e natildeo pode ser violado
Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa152
acreditam que
() natildeo parece producente elencar um rol abstrato das medidas que poderiam ser aplicadas pelo juiz a tiacutetulo do art 139 IV CPC Afinal se busca a efetividade da execuccedilatildeo e esta soacute pode ser identificada agrave luz das especificidades da situaccedilatildeo concreta Ideal eacute enveredar pela loacutegica modular (adequaccedilatildeo ao caso) natildeo pela geneacuterica (soluccedilotildees abstratas de pretensa utilidade universal)
Em razatildeo de o dispositivo apresentar uma gama de poderes tatildeo amplos agrave disposiccedilatildeo do
oacutergatildeo julgador sem nenhuma estipulaccedilatildeo de um procedimento legal previamente definido para
que estabeleccedila as condiccedilotildees de sua aplicaccedilatildeo em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo eacute
necessaacuterio que em razatildeo do princiacutepio da dignidade humana natildeo busque definir o que o
dispositivo permite mas de definir o que ele natildeo permite ldquoOu seja propotildee-se a sua
compreensatildeo por exclusatildeo Afinal se ele tem potencialidade para promover a efetividade da
tutela tambeacutem pode provocar lesotildees E como em direito os fins natildeo justificam os meios
ressalta como prioritaacuteria a necessidade de estabelecer limitesrdquo 153
O art 789 do CPC15 disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial e eacute
categoacuterico ao dispor que ldquoo devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para
152 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
153 Ibid sem paginaccedilatildeo
57
o cumprimento de suas obrigaccedilotildees salvo as restriccedilotildees estabelecidas em leirdquo Logo a
execuccedilatildeo somente poderaacute incidir sobre os bens do devedor e natildeo sobre a sua pessoa
Como eacute sabido a Lex Poetelia Papiria de 326 aC foi o primeiro marco legal da
humanizaccedilatildeo das cobranccedilas de diacutevidas abolindo a imposiccedilatildeo ao devedor de castigos
vexatoacuterios e ateacute da pena de morte154
Afinal no direito romano antigo a cobranccedila de diacutevidas poderia recair sobre a pessoa
do devedor que respondia com sua liberdade e ateacute mesmo com seu proacuteprio corpo permitindo
a lei que repartissem tantos pedaccedilos do corpo do devedor quantos fossem seus credores
Nesse sentindo leciona o professor Guilherme Pupe da Noacutebrega155 que
Vem de longe a evoluccedilatildeo no sentido de fazer a responsabilidade por uma obrigaccedilatildeo migrar da pessoa do devedor para seu patrimocircnio Merecem registro especiacutefico como marcos histoacutericos remotos a Lex Poetelia Papiria de 326 aC que aboliu o nexum e possibilidade de escravidatildeo do devedor como garantia da obrigaccedilatildeo e a pignoris capio ou ldquoaccedilatildeo por tomada de penhorrdquo que instituiu a possibilidade de o credor tomar parcela dos bens do devedor como forma de assegurar o adimplemento da diacutevida Aqueles institutos culminariam seacuteculo depois no artigo 789 do CPC de 2015 a consagrar que o devedor responda pela satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo com seus bens presentes e futuros observadas as restriccedilotildees impostas pelas impenhorabilidades legais
Logo o avanccedilar da civilizaccedilatildeo marcou o deslocamento da responsabilidade por
diacutevidas saindo do corpo do devedor para o seu patrimocircnio tendo em vista que a vida
humana a liberdade e a integridade fiacutesica satildeo valores inalienaacuteveis natildeo podendo ser
sacrificadas em benefiacutecio de obrigaccedilotildees pecuniaacuterias 156
Entretanto eacute sabido que a responsabilidade patrimonial eacute excepcionada pela prisatildeo
civil do devedor de verba alimentiacutecia resquiacutecio da responsabilidade pessoal romana
154 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt
httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018
155 NOacuteBREGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139 IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018
156 Ibid sem paginaccedilatildeo
58
No entanto haacute uma justificativa para isso Segundo o processualista Guilherme Pupe
da Noacutebrega157
Eacute que a par de a prisatildeo civil encontrar previsatildeo constitucional no inciso LXVII do artigo 5ordm o raciociacutenio eacute o de que o direito do alimentante agrave liberdade de locomoccedilatildeo cede diante dos direitos agrave vida e agrave dignidade titularizados pelo alimentando e resguardados pelos alimentos Foi esse mesmo raciociacutenio aliaacutes que justificou no passado a ediccedilatildeo da suacutemula 309 pelo STJ agora positivada pelo artigo 528 sect 7ordm que limita a modalidade coercitiva agraves trecircs uacuteltimas prestaccedilotildees vencidas e agraves prestaccedilotildees vincendas A ideia eacute que tendo o alimentando subsistido a despeito do natildeo-pagamento de prestaccedilotildees mais antigas essas verbas teriam perdido o caraacuteter alimentar que na equaccedilatildeo antes apresentada justificaria a prisatildeo civil do alimentante Daiacute por que aqueles valores antigos remanescem exigiacuteveis mas somente pela via da expropriaccedilatildeo
Essa ressalva eacute necessaacuteria tendo em vista que a adoccedilatildeo de teacutecnica de execuccedilatildeo
indireta para incursatildeo radical na esfera de direitos do executado notadamente direitos
fundamentais quando carente de respaldo constitucional natildeo merece acolhimento sob
risco de se atentar contra o devido processo legal (artigo 5ordm LIV da Constituiccedilatildeo)
Como afirma o autor Bruno Dantas158 ldquoembora inexistam estatiacutesticas que permitam
comparaccedilotildees natildeo eacute desarrazoado intuir que os iacutendices de inadimplecircncia despeccedilam na razatildeo
inversa da incidecircncia das ordens judiciais sobre o corpo e a liberdade do devedorrdquo Entretanto
eacute natildeo possiacutevel adotar toda e qualquer medida executiva atiacutepica em nome da efetividade da
execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que se saiba os limites da sua aplicaccedilatildeo
Dessa forma instrumentos que permitam o cumprimento forccedilado de contratos e o pagamento
de diacutevidas satildeo necessaacuterios contudo eacute preciso equilibrar essa exigecircncia com a liberdade e a
dignidade humana
Como citado alhures o art 139 IV ensejou decisotildees como a que determinou a
suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o
passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito em uma accedilatildeo se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo
extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
Na supracitada decisatildeo o princiacutepio da responsabilidade patrimonial natildeo estaacute sendo
efetivado para o que o devedor responda com os seus bens Afinal qual ligaccedilatildeo entre a
157 Ibid sem paginaccedilatildeo 158 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt
httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018
59
restriccedilatildeo de circulaccedilatildeo que diz com o direito de ir e vir (liberdade) com o pagamento de
diacutevidas que diz com a responsabilidade civil159
Ademais por que quem natildeo tem dinheiro para pagar diacutevidas natildeo pode dirigir Por que
natildeo tem condiccedilotildees para pagar o deacutebito natildeo pode ter passaporte Por que quem natildeo tem como
pagar o deve natildeo pode ter cartatildeo de creacutedito
Ao utilizar meios executivos atiacutepicos como os supracitados para compelir o devedor a
satisfazer a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria quando exauridos sem ecircxito os meios tradicionais de bens
penhoraacuteveis salvo quando existe qualquer indiacutecio concreto de ocultaccedilatildeo ou dissipaccedilatildeo de
bens eacute obrigar o devedor abrir matildeo da proteccedilatildeo da lei que lhe impede que seja tomado agrave forccedila
(art 833 CPC e demais disposiccedilotildees que tratam da impenhorabilidade)
Segundo Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa160
Claramente essa pressatildeo visa dar uma aparecircncia de voluntariedade agrave indicaccedilatildeo de bens impenhoraacuteveis pelo proacuteprio executado que na verdade soacute age assim por ser a uacutenica forma de ver-se livre de um grame imposto por medida indutiva despedida de qualquer necessidade ou adequaccedilatildeo Uma intoleraacutevel perversatildeo
Os autores afirmam ainda que o ldquodireito paacutetrio natildeo admite esta contraditio in terminis
sendo inaceitaacutevel a coexistecircncia de regra protetiva do executado com outra que concede ao
juiz poderes para forccedilar (ainda que indiretamente e veladamente) o executado a abrir matildeo
daquela proteccedilatildeordquo 161
Logo eacute cristalino que a suspensatildeo da CNH eacute uma forma incorreta de aplicar a medida
executiva atiacutepica para efetivar o direito fundamental a execuccedilatildeo tendo em vista que o uacutenico
objetivo da referida eacute pressionar o executado abrir matildeo de algum bem impenhoraacutevel para
levantar o dinheiro e cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
A retenccedilatildeo do passaporte igualmente natildeo possui qualquer relaccedilatildeo com a diacutevida do
executado e eacute somente uma forma de tentar pressiona-lo a dispor de um bem que natildeo pode
ser tomado agrave forccedila e puni-lo por natildeo ter cumprido voluntariamente com a sua obrigaccedilatildeo
159 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
160 Ibid sem paginaccedilatildeo 161 Ibid sem paginaccedilatildeo
60
Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa162
acreditam que tal medida eacute equivocada e se torna excessivamente onerosa ao executado
As mais variadas circunstacircncias relevem o equiacutevoco de tal medida aplicada assim genericamente Com efeito nada justifica reter o passaporte do executado e impedi-lo de viajar para o exterior quando eacute agraciado inclusive com todas as despesas pagas com presente sorteio ou precircmio (por completar tempo de serviccedilo ou atingir metas produtividade na sociedade empresaacuteria em que trabalha) Como todo custo eacute suportado por terceiro e por isso mesmo a sua realizaccedilatildeo pelo executado natildeo traria qualquer prejuiacutezo ao exequente e a retenccedilatildeo do passaporte natildeo seria injustificaacutevel
Paulo Antonio Papini163 acredita que natildeo tem a apreensatildeo de passaporte natildeo possui um
fundamento plausiacutevel tendo em vista que se o devedor natildeo pode viajar para saldar o deacutebito
tambeacutem natildeo poderia exercer atividades cotidianas
Com todo o respeito a quem pensa dessa forma o argumento eacute muito simploacuterio e natildeo precisamos sequer do Direito para derrubaacute-lo Com efeito se considerarmos que ndash ateacute mesmo pelas dimensotildees continentais do Brasil ndash natildeo eacute incomum que uma passagem para o Nordeste custe mais caro que um voo para Miami seria razoaacutevel entatildeo seguindo a linha argumentativa do Magistrado em questatildeo que se oficiasse aos oacutergatildeos reguladores da aviaccedilatildeo civil proibindo-se aquele devedor de fazer ateacute mesmo voos domeacutesticos Poder-se-ia ir mais longe jaacute que natildeo tem dinheiro para pagar suas diacutevidas certamente aquele devedor tambeacutem natildeo teria para comer fora de sua casa porque entatildeo natildeo determinar a expediccedilatildeo de ofiacutecio aos restaurantes proacuteximos agrave sua casa e determinar tambeacutem a proibiccedilatildeo de que ele fosse servidoatendido
O autor se questiona ainda ldquoSeraacute entatildeo que o Princiacutepio da Dignidade da Pessoa
Humana estaacute de mero enfeite em nossa Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ()rdquo 164 Tendo em vista
que ldquoa decisatildeo em comento viola diretamente o art 5ordm incisos XV LIII e LXIII da
Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ndash falamos do Direito de Ir e Virrdquo 165
Ademais o cancelamento do cartatildeo de creacutedito eacute mais uma forma de constranger e
compelir o executado a cumprir com a obrigaccedilatildeo de qualquer forma natildeo importando o que
precise fazer para conseguir saldar o deacutebito tendo em vista que a referida medida apresenta
162 Ibid sem paginaccedilatildeo 163 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo
pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018
164 Ibid sem paginaccedilatildeo 165 Ibid sem paginaccedilatildeo
61
qualquer adequaccedilatildeo com o fim desejado (reverter em pagamento para o exequente) Os
autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa afirmam que166
Reconhece-se que as razotildees da afirmaccedilatildeo ora questionada satildeo ateacute intuitivas mas eacute plenamente possiacutevel problematiza-las Ora natildeo se encontra qualquer justificativa idocircnea para que o juiz possa cancelar o contrato do executado com a administradora do cartatildeo de creacutedito (ou instituiccedilatildeo financeira) que natildeo tem qualquer relaccedilatildeo com o creacutedito exequendo muito menos como isso poderia impactar positivamente na execuccedilatildeo (senatildeo para pressionar o executado a dispor de bens impenhoraacuteveis) Ademais natildeo foram indicados sequer sinais de que o executado realiza gastos supeacuterfluos com o cartatildeo de creacutedito ndash natildeo que isso justificasse a medida pois o correto seria penhorar os esses bens (se duraacuteveis naturalmente) ao inveacutes de cancelar o cartatildeo de creacutedito
Logo as referidas medidas natildeo possuem qualquer relaccedilatildeo com o atingimento do fim
almejado (o pagamento de quantia) tendo em vista que natildeo haacute uma relaccedilatildeo meiofim entre
tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a
restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia
ao exequente
Dessa forma nota-se que as medidas de suspensatildeo da CNH retenccedilatildeo de passaporte e
bloqueio do cartatildeo de credito satildeo completamente inadequadas agrave realizaccedilatildeo a que se prestam
Afinal ldquotais medidas soam como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-
lo ao cumprimento da ordem judicial ndash e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a
utilizaccedilatildeo dos meios sancionatoacuterios pelo magistrado ()rdquo167
Como exposto em linhas preteacuteritas o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades
de aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e
razoaacutevel se atendo aos criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas
executivas atiacutepicas ao caso concreto sob pena de converter a medida em de indutiva para
punitiva
A utilizaccedilatildeo de medidas atiacutepicas como a suspensatildeo da carteira de motorista e o
passaporte do devedor abandona a regra da responsabilidade patrimonial e atingem em cheio
o nuacutecleo de direitos inerentes agrave condiccedilatildeo humana
166 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
167 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 115
62
O limite para a aplicaccedilatildeo de tais medidas deve ser a Constituiccedilatildeo Federal e sobretudo
os Direitos fundamentais nela expressos ldquoCom efeito natildeo haacute saiacuteda tampouco soluccedilatildeo eficaz
de um problema sem que se respeite a Lei e o Devido Processo Legal (por mais nobres que
sejam as intenccedilotildees)rdquo 168
Dessa forma a busca desenfreada pelo cumprimento das decisotildees judiciais em
especial na fase executiva natildeo pode ser realizada em sacrifiacutecio de direitos fundamentais O
Poder Judiciaacuterio natildeo pode resolver a crise do processo executoacuterio utilizando de medidas
arbitraacuterias com o propoacutesito de satisfazer obrigaccedilotildees pecuniaacuterias
Eis o dilema que se coloca diante do poder geral de efetivaccedilatildeo ele pode servir de
potente instrumento em prol da tutela jurisdicional executiva entretanto se manejado de
modo improacuteprio serviraacute de instrumento de puniccedilatildeo e humilhaccedilatildeo do executado169
Eacute notoacuterio que se amplamente aplicado o poder geral de efetivaccedilatildeo reduziria os
iacutendices de inadimplecircncia quiccedilaacute resolveria por completo a crise da execuccedilatildeo civil Entretanto
o retrocesso civilizatoacuterio seria irreparaacutevel
168 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo
pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018
169 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
63
5 CONCLUSAtildeO
Como funccedilatildeo jurisdicional que tem como objeto a efetivaccedilatildeo de direitos a execuccedilatildeo
deve sempre buscar a maior satisfaccedilatildeo possiacutevel concretizando integralmente o creacutedito do
exequente isto eacute realizando o direito fundamental agrave tutela executiva do credor Por isso a
adoccedilatildeo de meios executivos atiacutepicos incorporados pelo Coacutedigo de Processo Civil de 2015 por
meio do art139 IV em um primeiro momento podem ser consideradas vaacutelidas visto que
servem de instrumento para a satisfaccedilatildeo e asseguraccedilatildeo de direitos do credor
Entretanto para o oacutergatildeo julgador natildeo cometa arbitrariedades em nome do direito
fundamental agrave execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que seja definido certos limites na adoccedilatildeo do poder
geral de efetivaccedilatildeo
As medidas executivas atiacutepicas natildeo podem ser aplicadas de maneira indiscriminada
logo devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o esgotamento das medidas tiacutepicas e
a possibilidade de cumprimento da obrigaccedilatildeo
Partindo dessa premissa as medidas a serem adotadas pelo juiz no caso concreto
devem ter como baliza os princiacutepios da proporcionalidade e da razoabilidade para que natildeo
ultrapassem a responsabilidade patrimonial do devedor e incidida diretamente sobre sua
pessoa
Para que natildeo seja atingida a pessoa do executado ou seja para que o devedor natildeo
tenha sua dignidade humana viola eacute necessaacuterio que a medida atiacutepica seja adequada e
necessaacuteria
Logo o juiz deveraacute sempre estabelecer uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida
executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia
a gerar o resultado sem violar a dignidade humana do executado
Dessa o juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental a execuccedilatildeo e
determinar uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute
necessaacuterio que a medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado
As medidas que ultrapassam esses limites como a decisatildeo que apreendeu o
passaporte suspensatildeo a CNH e bloqueou o cartatildeo de creacutedito do devedor satildeo meramente
punitivas posto que essas natildeo satildeo as medidas mais adequadas para se atingir o fim almejado
pois natildeo existe propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado
64
uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo
geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente
Medidas como esta servem de embasamento para decisotildees arbitraacuterias e autoritaacuterias de
violaccedilatildeo dos direitos fundamentais transformando o poder geral de efetivaccedilatildeo em
instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com autorizaccedilatildeo judicial
Em suma o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades de aplicaccedilatildeo do poder
geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e razoaacutevel se atendo aos
criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao
caso concreto sob pena de punir a pessoa do executado violando a sua dignidade humana
em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo
65
REFEREcircNCIAS
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- 1 INTRODUCcedilAtildeO
- 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
-
- 21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL
- 22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
- 23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
- 24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO
- 25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO
-
- 3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
-
- 31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS
-
- 311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15
-
- 32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
- 33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
- 34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
-
- 4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
-
- 41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
- 42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
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- 5 CONCLUSAtildeO
- REFEREcircNCIAS
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RESUMO
A prestaccedilatildeo jurisdicional natildeo se concretiza depois de encerrada a fase de conhecimento Para
que a referida prestaccedilatildeo se consume eacute necessaacuterio que ocorra a satisfaccedilatildeo do deacutebito pelo
devedor que em grande parte soacute se efetiva atraveacutes da tutela executiva Entretanto a execuccedilatildeo
civil sempre sofreu uma crise quanto a sua efetividade e o Coacutedigo de Processo Civil de 2015
com o escopo de dirimir a ineficiecircncia do instituto concebeu novas diretrizes ao processo
executoacuterio Dessa forma o art 139 IV do Coacutedigo de Processo Civil estabeleceu a
possibilidade de o juiz dispor de todas as medidas necessaacuterias para assegurar o cumprimento
de ordem judicial trazendo como grande inovaccedilatildeo a aplicaccedilatildeo dessas medidas tambeacutem nas
obrigaccedilotildees de pagar quantia Todavia eacute necessaacuterio estabelecer criteacuterios limitadores para que a
adoccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo viole a dignidade humana do executado em nome do
direito fundamental agrave execuccedilatildeo
Palavras-chaves Execuccedilatildeo Poder geral de efetivaccedilatildeo Direito fundamental agrave execuccedilatildeo
Dignidade humana do executado
SUMAacuteRIO
1 INTRODUCcedilAtildeO 5
2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL 7
21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL 7
22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL 8
23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL 11
24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO 17
25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO 20
3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 23
31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS 23
311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15 25
32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO 28
33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO 31
34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 36
4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 48
41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO 48
42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 55
5 CONCLUSAtildeO 63
REFEREcircNCIAS 65
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
Art ndash Artigo
CPC15 ndash Coacutedigo de Processo Civil de 2015
CPC73 ndash Coacutedigo de Processo Civil de 1973
ENFAM ndash Escola nacional de formaccedilatildeo e aperfeiccediloamento de magistrados
HC ndash Habeas Corpus
STJ ndash Superior Tribunal de Justiccedila
5
1 INTRODUCcedilAtildeO
A prestaccedilatildeo jurisdicional natildeo costuma se findar apoacutes o encerramento da fase cognitiva
com a prolaccedilatildeo de uma sentenccedila de meacuterito Para que a referida prestaccedilatildeo se concretize eacute
imperioso que haja a satisfaccedilatildeo do deacutebito pelo devedor
Entretanto observa-se em diversos casos o inadimplemento da parte passiva
processual sendo necessaacuterio desenvolver a atividade executiva A referida atividade possui o
escopo de satisfazer direitos
Isso porque o processo natildeo eacute um fim em si mesmo sendo apenas um exerciacutecio da
jurisdiccedilatildeo estatal Dessa forma a razatildeo de ser do processo eacute o atingimento da sua finalidade
almejada que eacute a prestaccedilatildeo da tutela jurisdicional
Todavia como a tutela jurisdicional configura-se na obrigaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio
proteger e reparar os direitos lesionados ou ameaccedilados de lesatildeo muitas vezes a dita tutela
somente consegue ser efetivada atraveacutes da atividade executiva da jurisdiccedilatildeo
Ocorre que a execuccedilatildeo civil sempre foi o ldquocalcanhar de Aquilesrdquo do sistema
processual e de modo geral vinha sofrendo uma crise quanto a sua efetividade Ou seja o
credor obtia ecircxito na fase de conhecimento entretanto natildeo conseguia alcanccedilar o seu direito a
prestaccedilatildeo reconhecida na fase de execuccedilatildeo
Com o fito de tornar a atividade satisfativa mais eficiente e mais ceacutelere o Coacutedigo de
Processo Civil de 2015 concebeu novas diretrizes ao processo no sentindo de harmonizar
suas com os ditames da Constituiccedilatildeo Federal principalmente com os direitos fundamentais
As normas fundamentais do processo civil trazidas pelo CPC15 preocupam-se
primordialmente com a efetividade da tutela jurisdicional
Em conformidade com essa nova sistemaacutetica o legislador no art 139 IV do Coacutedigo
de Processo Civil estabeleceu a possibilidade de o juiz dispor de todas as medidas indutivas
coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o cumprimento de
ordem judicial trazendo como grande novidade a aplicaccedilatildeo dessas medidas executoacuterias
atiacutepicas tambeacutem nas obrigaccedilotildees de pagar dinheiro
6 Entretanto natildeo haacute na legislaccedilatildeo criteacuterios especiacuteficos que auxiliem o oacutergatildeo julgador na
escolha das medidas executivas atiacutepicas que se adotadas sem qualquer baliza podem
acarretar consequecircncias juriacutedicas irreparaacuteveis
Como a famosa decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de
Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-1320138260011 Nessa accedilatildeo
que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo
pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a suspensatildeo da
Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o passaporte e
cancelou os cartotildees de creacutedito como forma de compeli-lo a adimplir com o deacutebito
Decisotildees como esta geram conflitos entre direitos constitucionalmente instituiacutedos De
um lado o direito fundamental agrave tutela jurisdicional e de outro os direitos e garantias
inerentes a todos os indiviacuteduos
Dessa forma a presente monografia tem como escopo de estabelecer criteacuterios
limitadores para que a adoccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo viole a dignidade humana do
executado em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo
7 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO
CIVIL
21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL
A Execuccedilatildeo Civil nasce a partir do direito a uma prestaccedilatildeo conferida a algueacutem de
exigir de outrem o cumprimento de uma conduta de fazer natildeo fazer ou de dar (dinheiro ou
coisa distinta) 1
Para que o direito a uma prestaccedilatildeo se concretize no mundo fiacutesico eacute necessaacuterio que
haja a satisfaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida pelo sujeito passivo Caso contraacuterio fala-se em
inadimplemento ou lesatildeo O titular do direito natildeo tem como agir por si para efetivar o seu
direito a prestaccedilatildeo posto que a autotutela eacute vedada no ordenamento juriacutedico Dessa forma eacute
necessaacuterio que se recorra ao Poder Judiciaacuterio para que se possa ter a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo
devida logo a tutela jurisdicional executiva2
O processualista Fredie Didier et al3 equaciona essa questatildeo da seguinte maneira
Quando se pensa em tutela executiva pensa-se na efetivaccedilatildeo de direitos a uma prestaccedilatildeo fala-se de um conjunto de meios para efetivar a prestaccedilatildeo devida fala-se em execuccedilatildeo de fazer natildeo-fazer dar exatamente os trecircs tipos de prestaccedilatildeo existentes Natildeo eacute por acaso nem por coincidecircncia que a tutela executiva pressupotildee inadimplemento (CPC art 786) - fenocircmeno exclusivo dos direitos a uma prestaccedilatildeo Eacute por isso tambeacutem que se pode falar em prescriccedilatildeo da execuccedilatildeo (CPC art 802 e suacutemula do STF n 150) - prescriccedilatildeo eacute fenocircmeno juriacutedico que se relaciona aos direitos a uma prestaccedilatildeo A execuccedilatildeo forccedilada dirige-se ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo Essa relaccedilatildeo entre direito material e processo eacute fundamental para a compreensatildeo do fenocircmeno executivo
Nesse iacutenterim para o Ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux4 ldquoexecutar eacute
satisfazerrdquo ao passo que o professor Fredie Didier et al5 formulou um conceito mais amplo
ldquoExecutar eacute satisfazer uma prestaccedilatildeo devida A execuccedilatildeo pode ser espontacircnea quando o
devedor cumpre voluntariamente a prestaccedilatildeo ou forccedilada quando o cumprimento da prestaccedilatildeo
eacute obtido por meio de atos executivos pelo Estadordquo
1 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 41 2 Ibid p 42 3 Ibid p 42 4 FUX Luiz Curso de direito processual civil Rio de Janeiro Forense 2001 p 980 5 DIDIER JR Fredie et al Op Cit p 45
8 Dessa forma a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional responsaacutevel pela
concretizaccedilatildeo de um direito subjetivo no plano material obtendo resultado idecircntico ou
equivalente ao atingiacutevel se o devedor cumprisse espontaneamente a prestaccedilatildeo
Todavia essa atividade jurisdicional soacute cabe quando o devedor se recusa a cumprir
com a obrigaccedilatildeo quebrando a expectativa do credor de receber o que lhe eacute devido Por esta
razatildeo que se diz que a execuccedilatildeo civil eacute ldquoforccediladardquo 6
Eacute o que se conclui seguindo os ensinamentos de Leonardo Greco7 para ele execuccedilatildeo eacute
uma
() modalidade de tutela jurisdicional que consiste na praacutetica pelo juiz (ou por outrem sob a sua supervisatildeo) de uma seacuterie de atos coativos concretos sobre o devedor e sobre o seu patrimocircnio a fim de agrave custa dele e independentemente do concurso da sua vontade tornar efetivo o cumprimento de prestaccedilatildeo por ele inadimplida desde que tais atos coativos estejam previamente constituiacutedos em lei
Portanto a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional que tem como escopo obter o
cumprimento de uma prestaccedilatildeo certa e inadimplida mediante atos coativos sobre o devedor e
seus bens
22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
Vislumbrado o conceito de execuccedilatildeo civil cabe agora empreender a sua classificaccedilatildeo
tendo em vista que a execuccedilatildeo pode se manifestar de diversas formas possuindo diferentes
caracteriacutesticas em cada uma das suas modalidades
Inicialmente cabe destacar que haacute duas teacutecnicas processuais para viabilizar a execuccedilatildeo
civil lato sensu eacute a que divide em processo autocircnomo de execuccedilatildeo e em fase de execuccedilatildeo
dependendo do tiacutetulo executivo que justifica o exerciacutecio da atividade satisfativa
O Coacutedigo Processual Civil de 2015 acertadamente ratificou as reformas promovidas
no CPC73 que consagrava a opccedilatildeo legislativa de oferecimento das tutelas de certificaccedilatildeo e
efetivaccedilatildeo do direito em um mesmo processo Dessa forma as execuccedilotildees de sentenccedilas
6 BASTOS Luiz Fernando Pereira O artigo 139 IV do novo Coacutedigo de Processo Civil a atipicidade
dos meios executivos na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia certa Brasiacutelia 2017 Disponiacutevel em lt httpbdmunbbrbitstream104831866812017_LuizFernandoPereiraBastospdf gt Acesso em 06 de agosto de 2018
7 BASTOS Luiz Fernando Pereira apud GRECO Leonardo O processo de execuccedilatildeo Rio de Janeiro Renovar 1999 p 164
9
passaram a ser uma fase complementar ao de processo de conhecimento e natildeo mais ocorrer
em um processo autocircnomo
No entendimento do professor processualista Fredie Didier et al8 o processo
sincreacutetico simplificou a efetivaccedilatildeo de um direito reconhecido em sentenccedila
A dispensa do ajuizamento de um processo autocircnomo para execuccedilatildeo de sentenccedila natildeo soacute veio diminuir o tempo necessaacuterio agrave prestaccedilatildeo da tutela jurisdicional - afinal o credor natildeo mais precisaria tal como ocorria ateacute entatildeo promover nova citaccedilatildeo pessoal do reacuteudevedor- como tambeacutem veio romper de vez com um velho paradigma segundo o qual a atividade executiva estaria dissociada da precedente atividade jurisdicional cognitiva
Entretanto natildeo soacute as sentenccedilas de meacuterito ensejam uma execuccedilatildeo Por esta razatildeo foi
necessaacuterio manter o processo autocircnomo de execuccedilatildeo para os casos em que o credor tem a seu
favor um documento que natildeo tenha sido proferido por um oacutergatildeo dotado de jurisdiccedilatildeo
Consequentemente se for o titulo executivo judicial o caminho natural eacute o do
cumprimento de sentenccedila Sendo por sua vez extrajudicial o titulo executivo o caminho
correto eacute o processo de execuccedilatildeo
Cabe ainda salientar que toda execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial eacute definitiva Jaacute a
execuccedilatildeo de tiacutetulo judicial (cumprimento de sentenccedila) pode ser definitiva ou provisoacuteria
No primeiro caso isto eacute cumprimento de sentenccedila definitivo ldquoeacute a execuccedilatildeo completa
que vai ateacute a fase final (com a entrega do bem da vida) sem exigecircncias adicionais para o
exequenterdquo 9
Quanto ao segundo caso ldquoo cumprimento provisoacuterio de sentenccedila (fundada em tiacutetulo
provisoacuterio) eacute aquele que exige alguns requisitos extras para que se chegue agrave fase final da
execuccedilatildeordquo 10
Para Fredie Didier11 o criteacuterio para definir se o cumprimento de sentenccedila seraacute
definitivo ou provisoacuterio
() eacute a estabilidade do tiacutetulo executivo em que se funda a execuccedilatildeo se se tratar de decisatildeo acobertada pela coisa julgada material o cumprimento de sentenccedila eacute
8 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 46 9 Ibid p 57 10 Ibid p 57 11 Ibid p 57
10
definitivo se se tratar de decisatildeo judicial ainda passiacutevel de alteraccedilatildeo (reforma ou invalidaccedilatildeo) em razatildeo da pendecircncia de recurso contra ela interposto a que natildeo tenha sido atribuiacutedo efeito suspensivo o cumprimento de sentenccedila eacute provisoacuterio
Ademais a execuccedilatildeo se distingue em procedimentos executivos comuns que satildeo da
execuccedilatildeo civil e que servem a uma generalidade de creacuteditos como eacute o caso do cumprimento
de sentenccedila e o processo de execuccedilatildeo E em procedimentos executivos especiais que servem
agrave satisfaccedilatildeo de creacuteditos peculiares como a execuccedilatildeo de alimentos e a execuccedilatildeo fiscal 12
Por fim cabe mencionar a classificaccedilatildeo que distingue a execuccedilatildeo em direta e indireta
A primeira execuccedilatildeo direita (ou execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo) eacute ldquo() aquela em que o
Poder Judiciaacuterio prescinde da colaboraccedilatildeo do executado para a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida
e pois promove uma substituiccedilatildeo da sua conduta pela conduta do proacuteprio Estado-juiz ou de
terceirordquo 13 Ou seja as medidas executivas satildeo levadas a efeito mesmo contra a vontade do
devedor na execuccedilatildeo direta
Segundo a doutrina a execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo se subdivide da seguinte forma
meios de desapossamento meios de transformaccedilatildeo e meios de expropriaccedilatildeo
Os meios de desapossamento muito comuns nas execuccedilotildees para entrega de coisa eacute a
forma ldquopor meio da qual se retira da posse do executado o bem a ser entregue ao exequente
(p ex despejo busca e apreensatildeo reintegraccedilatildeo de posse)rdquo 14 Ao passo que por meio dos de
transformaccedilatildeo ldquo() o juiz determina que um terceiro pratique a conduta que deveria ser
praticada pelo executado cabendo a este arcar com o pagamento do custo respectivordquo 15 Jaacute
os meios executivos de expropriaccedilatildeo eacute a forma ldquopor meio do qual algum bem do patrimocircnio
do devedor eacute expropriado para pagamento do creacutedito (adjudicaccedilatildeo alienaccedilatildeo judicial ou
apropriaccedilatildeo de frutos e rendimentos de empresa ou de estabelecimentos e de outros bens art
825 CPC)rdquo 16
12 Ibid p 48 13 Ibid p 50 14 Ibid p 51 15 Ibid p 51 16 Ibid p 51
11 Jaacute a execuccedilatildeo indireta (ou mandamental) atua ldquo() na vontade do devedor como forma
de compeli-lo ou incentivaacute-lo a cumprir a ordem judicialrdquo 17 Nesse entendimento ainda
leciona Fredie Didier et al 18
Nesses casos o Estado-juiz busca promover a execuccedilatildeo com a colaboraccedilatildeo do executado forccedilando ou incentivando a que ele proacuteprio cumpra a prestaccedilatildeo devida Em vez de o Estado-juiz tomar as providecircncias que deveriam ser tomadas pelo executado o Estado forccedila por meio de coerccedilatildeo psicoloacutegica ou de promessa de recompensa judicial a que o proacuteprio executado cumpra a prestaccedilatildeo
A execuccedilatildeo indireta pode ser patrimonial como por exemplo a imposiccedilatildeo de multa
coercitiva ou pessoal com a prisatildeo civil do devedor de alimentos Ademais adiciona Didier
et al19que
O estiacutemulo ao cumprimento da prestaccedilatildeo pode dar-se pelo temor (p ex multa coercitiva prisatildeo civil do devedor de alimentos divulgaccedilatildeo de notiacutecia em jornal revelando o descumprimento) ou pelo incentivo (p ex a chamada sanccedilatildeo premial ou sanccedilatildeo positiva de que eacute exemplo a isenccedilatildeo do pagamento de custas em caso de cumprimento do mandado monitoacuterio - art 701 sect 1ordm CPC a reduccedilatildeo pela metade dos honoraacuterios advocatiacutecios fixados inicialmente pelo juiacutezo em caso de pagamento integral do deacutebito pecuniaacuterio na execuccedilatildeo por quantia certa fundada em tiacutetulo extrajudicial - art 827 sect 1ordm CPC)
Por tais razotildees haacute uma tendecircncia em cada vez mais prestigiar os meios executivos
indiretos (coercitivos) posto que satildeo tatildeo eficazes quanto os meios executivos diretos
entretanto menos onerosos Contudo sua aplicaccedilatildeo deve ser fiscalizada a fim de natildeo permitir
que a execuccedilatildeo civil perca sua finalidade visto que eacute uma funccedilatildeo jurisdicional que tem como
escopo efetivar o direito do credor e natildeo de atender os interesses do devedor
23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
Os princiacutepios juriacutedicos nos uacuteltimos anos passaram a ser munidos de forccedila cogente
normatizando as condutas humanas tanto quanto as regras juriacutedicas Os ditos princiacutepios
ampliaram as margens de atuaccedilatildeo dos aplicadores do direito possibilitando a construccedilatildeo de
soluccedilotildees mais adequadas agraves especificidades das demandas que chegam ao judiciaacuterio
17 Ibid p 51 18 Ibid p 51 19 Ibid p 51-52
12 Dessa forma eacute necessaacuterio aprofundar-se nos princiacutepios norteadores da execuccedilatildeo civil
para que se obtenha uma anaacutelise completa da teoria geral da execuccedilatildeo
A execuccedilatildeo civil tem como um dos seus corolaacuterios o princiacutepio da efetividade este
consiste na exigecircncia de um sistema completo de tutela executiva no qual existam meios
executivos capazes de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor
de tutela executivardquo 20
O referido princiacutepio da efetividade eacute reforccedilado como normal fundamental do processo
civil brasileiro pelo art 4ordm do CPC ldquoArt 4ordm As partes tecircm o direito de obter em prazo razoaacutevel
a soluccedilatildeo integral do meacuterito incluiacuteda a atividade satisfativa
Jaacute o princiacutepio da boa feacute processual corolaacuterio do devido processo legal estaacute previsto
no art 5ordm do CPC ldquoAquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de
acordo com a boa-feacuterdquo Segundo o processualista baiano Fredie Didier21
O princiacutepio da boa-feacute extrai-se de uma claacuteusula geral processual A opccedilatildeo por uma claacuteusula geral de boa-feacute eacute a mais correta Eacute que a infinidade de situaccedilotildees que podem surgir ao longo do processo torna pouco eficaz qualquer enumeraccedilatildeo legal exaustiva das hipoacuteteses de comportamento desleal Daiacute ser correta a opccedilatildeo da legislaccedilatildeo brasileira por uma norma geral que impotildee o comportamento de acordo com a boa-feacute Em verdade natildeo seria necessaacuteria qualquer enumeraccedilatildeo das condutas desleais o art 5deg do CPC eacute bastante exatamente por tratar-se de uma claacuteusula geral
Dessa forma o dito princiacutepio preconiza que diante de um vinculo juriacutedico as pessoas
envolvidas natildeo poderatildeo frustrar a confianccedila do outro devendo comportar-se como se pode
esperar de uma pessoa de boa-feacute
Ademais disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial que ldquosomente o
patrimocircnio do devedor (art 789 CPC) ou de terceiro responsaacutevel pode ser objeto da
atividade executiva do Estadordquo 22
O referido princiacutepio que determina que somente o patrimocircnio submete-se agrave execuccedilatildeo
e natildeo a pessoa foi trazido pela humanizaccedilatildeo do direito Para o professor Didier et al23 o
20 DIDIER JR Freddie et al apud GUERRA Marcelo Lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do
credor na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 21 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte
geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 105 22 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 68
13
desenvolvimento dos meios de execuccedilatildeo indireta ldquoparece relativizar um pouco esse princiacutepio
na medida em que pressionam psicologicamente a pessoa do devedor para que cumpra a
obrigaccedilatildeo com seu comportamentordquo
Complementa ainda que
A responsabilidade executiva parece assumir atualmente caraacuteter hiacutebrido comportando coerccedilatildeo pessoal e sujeiccedilatildeo patrimonial
i) a coerccedilatildeo pessoal incide sobre a vontade do devedor admitindo o uso de medidas coercitivas de execuccedilatildeo indireta para forccedilaacute-lo a cumprir a obrigaccedilatildeo com seu proacuteprio comportamento (ex arts 139 rv 523 sect 1ordm 536 sect 1ordm e 538 sect 3ordm todos do CPC)
ii) descumprida a obrigaccedilatildeo e natildeo sendo possiacuteveladequado o uso de teacutecnica de coerccedilatildeo pessoal tem-se a sujeiccedilatildeo patrimonial que recairaacute sobre os bens do devedor ou de terceiro responsaacutevel - que responderatildeo pela proacutepria prestaccedilatildeo in natura (ex dar coisa ou entregar quantia) ou por perdas e danos24
Dessa forma o referido princiacutepio natildeo tem aplicaccedilatildeo absoluta em razatildeo do principio da
efetividade a qual estimula o uso dos meios de coerccedilatildeo indireta para garantir o cumprimento
da obrigaccedilatildeo pelo devedor
O princiacutepio da primazia da tutela especifica (ou princiacutepio do resultado) assevera que
ldquoA execuccedilatildeo deve ser especiacutefica propiciar ao credor a satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo tal qual
houvesse o cumprimento espontacircneo da prestaccedilatildeo pelo devedorrdquo 25
O CPC de 2015 absorveu todos os avanccedilos legislativos a cerca do mote O caput do
art 497 assegura que na accedilatildeo que tenha por objeto a prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer o
juiz se procedente o pedido concederaacute a tutela especiacutefica ou determinaraacute providecircncias que
assegurem a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico equivalente O art 499 o
complementa a obrigaccedilatildeo somente seraacute convertida em perdas e danos se o autor o requerer
ou se impossiacutevel agrave tutela especiacutefica ou a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico
equivalente
O princiacutepio do contraditoacuterio eacute garantido pela constituiccedilatildeo federal e compreende o
direito de ser ouvido o direito de acompanhar os atos processuais o direito de produzir
provas participar da sua produccedilatildeo manifestar-se sobre a prova produzida e obter do juiz a
23 Ibid p 69-70 24 Ibid p 70 25 Ibid p 71
14
respectiva valoraccedilatildeo o direito de ser informado regularmente dos atos praticados no processo
o direito agrave motivaccedilatildeo das decisotildees o direito de impugnar as decisotildees 26
O contraditoacuterio tem aplicaccedilatildeo em todo processo judicial sendo aplicaacutevel tambeacutem na
execuccedilatildeo No entanto o contraditoacuterio na execuccedilatildeo natildeo ocorre com a mesma intensidade que
no processo ou na fase de conhecimento eacute o que assevera Didier et al 27
O contraditoacuterio no procedimento executivo no aspecto do direito de defesa assegurado agrave parte demandada eacute eventual porquanto depende da provocaccedilatildeo do executado que natildeo eacute chamado ajuiacutezo para defender-se mas sim para cumprir a obrigaccedilatildeo O procedimento executivo adota a teacutecnica monitoacuteria que consiste basicamente na inversatildeo do ocircnus de provocar o contraditoacuterio o reacuteu em vez de citado para manifestar-se sobre a pretensatildeo do autor eacute convocado para cumprir uma determinada obrigaccedilatildeo
Logo haacute o contraditoacuterio no procedimento executivo porem eacute eventual quanto agrave defesa
do executado
Ademais o princiacutepio da menor onerosidade eacute consagrado pelo art 805 do CPC e
dispotildee que ldquoQuando por vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz
mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o executadordquo O referido princiacutepio tem o
escopo de impedir o abuso do direito pelo exequente
O principio da menor onerosidade auxilia o juiz na escolha de um meio executivo
adequado e necessaacuterio que satisfaccedila a prestaccedilatildeo exigida pelo credor Nesse sentido eacute o
entendimento do professor Fredie Didier et al 28
O resultado a ser alcanccedilado eacute aquele estabelecido pelo direito material A maneira de se chegar ateacute esse resultado eacute que deve ser a menos onerosa possiacutevel para o executado Isso significa que a opccedilatildeo pelo meio menos gravoso pressupotildee que os diversos meios considerados sejam igualmente eficazes Assim havendo vaacuterios meios executivos aptos agrave tutela adequada e efetiva do direito de creacutedito escolhe-se a via menos onerosa ao executado
O princiacutepio visa impedir a execuccedilatildeo desnecessariamente onerosa ao executado ou seja a execuccedilatildeo abusiva Em vez de enumerar situaccedilotildees em que a opccedilatildeo mais gravosa revelar-se-ia injusta o legislador valeu-se corretamente de uma claacuteusula geral para reputar abusivo qualquer comportamento do credor que pretender valer-se de meio executivo mais oneroso do que outro igualmente idocircneo agrave satisfaccedilatildeo do seu creacutedito
26 Ibid p 76 27 Ibid p 78 28 Ibid p 79-80
15 O princiacutepio da cooperaccedilatildeo tem como base os princiacutepios do devido processo legal da
boa-feacute processual e do contraditoacuterio O dito princiacutepio avigora a eacutetica processual com o
aprimoramento do diaacutelogo entre as partes reciprocamente e com o oacutergatildeo jurisdicional Eacute o
que preconiza o art 6ordm do CPC Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para
que se obtenha em tempo razoaacutevel decisatildeo de meacuterito justa e efetiva
No procedimento executivo o princiacutepio da cooperaccedilatildeo incide de diversas formas
disciplina Didier et al29 que na execuccedilatildeo
O executado tem o dever de indicar bens agrave penhora (art 774 V CPC) Natildeo encontrados bens penhoraacuteveis e natildeo havendo indicaccedilatildeo de qualquer um deles pelo exequente cabe ao executado declarar quais satildeo seus bens penhoraacuteveis sob pena de se sujeitar a uma sanccedilatildeo pecuniaacuteria compulsoacuteria
Tambeacutem eacute manifestaccedilatildeo do princiacutepio da cooperaccedilatildeo a exigecircncia de que o executado que pretende impugnar o valor da execuccedilatildeo apresente de logo o valor que reputa devido (art 525 sect 4ordm CPC) Seria comportamento natildeo-cooperativo afirmar que a cobranccedila eacute excessiva sem simultaneamente dizer qual eacute o valor correto
Demais disso aplicam-se agrave execuccedilatildeo os deveres que decorrem do princiacutepio da cooperaccedilatildeo e que satildeo imputados ao oacutergatildeo jurisdicional () Assim por exemplo deve o juiz advertir ao executado antes de puni-lo de que seu ato pode vir a caracterizar-se como atentatoacuterio agrave dignidade da jurisdiccedilatildeo ( art 772 II CPC) perceba que se trata de uma conduta compatiacutevel com o dever de prevenccedilatildeo O oacutergatildeo jurisdicional somente pode conhecer da prescriccedilatildeo ex officio dando a oportunidade de o exequente manifestar-se conforme impotildee o dever de consulta ( cf arts 10 487 paraacutegrafo uacutenico e 921 sect 5ordm CPC)
O princiacutepio ou postulado30 da proporcionalidade tem aplicaccedilatildeo muito relevante na
execuccedilatildeo O art 8 do CPC assegura que o oacutergatildeo jurisdicional tem o dever de observar a
proporcionalidade e a razoabilidade ao aplicar o ordenamento juriacutedico inclusive no
procedimento executivo
Ademais o art 805 do CPC eacute categoacuterico ao disciplinar que ldquoArt 805 Quando por
vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo
menos gravoso para o executadordquo O referido artigo jaacute se trata de uma concretizaccedilatildeo da
proporcionalidade
29 Ibid p 82 30 Segundo Fredie Didier et al haacute uma discussatildeo doutrinaacuteria sobre a proporcionalidade Parte da
doutrina acredita que a proporcionalidade eacute um princiacutepio e outra parte acredita que eacute um postulado normativo
16 O principio da adequaccedilatildeo pode ser vislumbrado em dois momentos do Direito
Processual ldquoa) no legislativo como orientador da confecccedilatildeo das leis b) no jurisdicional
autorizando ao juiz diante do caso concreto adaptar procedimento agraves suas peculiaridadesrdquo 31
Para Luceacutelia de Sena Alves e Tiago Retes32
Isso quer dizer que no momento legislativo o devido processo deve ser observado pelo legislador para a confecccedilatildeo das normas de direito processual que iratildeo servir de instrumento efetivo de concretizaccedilatildeo do direito substancial a ser tutelado atendendo a todas as suas finalidades sob pena de falecircncia do proacuteprio direito No momento jurisdicional da mesma forma a via processual escolhida pelo autor tambeacutem deve estar sujeita a este princiacutepio para que natildeo sofra as mesmas consequecircncias da sua inobservacircncia
O ordenamento juriacutedico deve ser aplicado por meio da teacutecnica processual adequada
evitando dessa forma uma tutela ineficaz
Por fim o princiacutepio do autorregramento da vontade na execuccedilatildeo tem o objetivo de
ldquo() preservar um espaccedilo processual para o exerciacutecio da liberdade e da vontade em que
sejam permitidas negociaccedilotildees que envolvam as partes ndash e tambeacutem o juizrdquo33 Didier et al34
assevera que
A rigor o legislador estabelece um regime juriacutedico de autorregramento da vontade processual identificando-se algumas manifestaccedilotildees relevantes para a execuccedilatildeo Na verdade pode-se dizer que poucos satildeo os ambientes mais propiacutecios do que a execuccedilatildeo para a negociaccedilatildeo sobre o processo Todos os institutos e normas processuais relativos agrave execuccedilatildeo devem ser repensados a partir da premissa de que o CPC permite uma ampla margem de liberdade de negociaccedilatildeo sobre o processo (art 190 CPC)
O autorregramento da vontade pode ser vislumbrando na previsatildeo de negoacutecios tiacutepicos
em sede de execuccedilatildeo como por exemplo no acordo das partes sobre o valor do bem que
dispensa a avaliaccedilatildeo disposto no inciso I do art 871 CPC Ademais dentro dos limites do art
190 do CPC eacute possiacutevel na execuccedilatildeo a atribuiccedilatildeo da negociaccedilatildeo atiacutepica aos sujeitos 31 ALVES Luceacutelia de Sena Alves RETES Tiago O poder geral de efetivaccedilatildeo das decisotildees judiciais e
proporcionalidade uma anaacutelise criacutetica acerca do art 139 IV do Novo Coacutedigo de Processo Civil Disponiacutevel em lthttpswwwacademiaedu31752652O_poder_geral_de_efetivaC3A7C3A3o_das_decisC3B5es_judiciais_e_a_proporcionalidade_uma_anC3A1lise_crC3ADtica_acerca_do_art_139_IV_do_Novo_CC3B3digo_de_Processo_Civil gt Acesso em 25 de julho de 2018
32 Ibid natildeo paginado 33 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 85 34 Ibid p 85
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processuais permitindo que sejam feitas mudanccedilas nos procedimentos e nas situaccedilotildees
juriacutedicas processuais ldquoSatildeo exemplos de negoacutecios processuais atiacutepicos na execuccedilatildeo pacto de
penhorabilidade acordo de ampliaccedilatildeo de prazos das partes de qualquer natureza acordo de
rateio de despesas processuais ()rdquo35
24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO
Sempre houve diversos questionamentos quanto agrave eficaacutecia do Direito processual Civil
e se o mesmo era meio apto a assegurar a tutela jurisdicional dos direitos dos cidadatildeos O
processo de execuccedilatildeo eacute o setor que sofre mais criacuteticas quanto a sua ineficiecircncia afinal a
execuccedilatildeo civil sempre foi o ldquocalcanhar de Aquilesrdquo do sistema processual pela praxe do
ldquoganhou (no processo de conhecimento) mas natildeo levou (na fase de cumprimento ou
execuccedilatildeo)rdquo 36
Essa dificuldade de se efetivar a tutela satisfastiva natildeo se resume a um problema de
mera teacutecnica processual tiacutepico de determinado ordenamento mas representa uma prova de
fogo da capacidade dos instrumentos jurisdicionais O autor Leonardo Greco37 no ano de
2005 atribuiu esse fato as seguintes causas o excesso de processos o custo e a morosidade da
justiccedila a inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios a ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais
um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico e a progressiva volatizaccedilatildeo dos bens
Quanto ao excesso de processos o referido autor aduz que ldquonos grandes centros o
crescimento da maacutequina judiciaacuteria natildeo acompanhou a expansatildeo do nuacutemero de litiacutegiosrdquo 38
O custo e morosidade da justiccedila prejudicam a tutela satisfativa posto que
ldquojaacute desfalcado pelo inadimplemento do devedor o credor ainda tem de arcar com o adiantamento das despesas do processo de execuccedilatildeo e de eventual liquidaccedilatildeo vendo arrastar-se a marcha dos atos executoacuterios facilmente retardada por atos procrastinatoacuterios do devedorrdquo 39
35 Ibid p 86 36 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca
para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018
37 GRECCO Leonardo A Crise do Processo de Execuccedilatildeo in Estudos de direito processual Leonardo Greco ndash Campos dos Goytacazes Ed Faculdade de Direito de Campos 2005 p 7
38 Ibid p 7 39 Ibid p 7-8
18 A inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios contribui para a crise do processo de
execuccedilatildeo tendo em vista que
ldquoo juiz da execuccedilatildeo prisioneiro de ritos que o distanciam das partes e da realidade da vida impulsiona sem qualquer apetite a execuccedilatildeo conduzindo-a ao sabor dos ventos das provocaccedilotildees impacientes do credor e das costumeiras procrastinaccedilotildees do devedorrdquo 40
Jaacute ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais atrapalha a efetivaccedilatildeo da tutela satisfativa ldquoo
devedor natildeo colabora com a execuccedilatildeo e os meios de pressatildeo que a lei estabelece natildeo satildeo
suficientes para intimidaacute-lordquo 41
Com um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico
O espiacuterito empresarial e a sociedade de consumo estimulam o endividamento das pessoas e o inadimplemento das obrigaccedilotildees pelo devedor deixou de ser vexatoacuterio e reprovaacutevel o que multiplica as accedilotildees de cobranccedila e execuccedilotildees atraveacutes das quais o sujeito passivo ainda usufrui vantagens agraves custas do credor 42
Por fim Leonardo Greco elenca a volatizaccedilatildeo dos bens como o uacuteltimo fator que
macula o processo executo tendo em vista que
ldquomudou inteiramente o perfil patrimonial das pessoas antes concentrado em bens de raiz e agora tendencialmente dirigido a investimentos em tiacutetulos e valores facilmente negociaacuteveis o que dificulta a sua localizaccedilatildeo pelo credorrdquo 43
O Coacutedigo de Processo Civil de 1973 introduziu o sistema executivo ao ordenamento
juriacutedico paacutetrio e seguindo os valores liberais da eacutepoca com a proteccedilatildeo de esfera juriacutedica de
liberdade do cidadatildeo contra a possibilidade de arbiacutetrio do Estado e uso indevido do Poder
jurisdicional outorgou o miacutenimo de poder ao juiz Seguindo as regras do CPC de 73 o
devedor soacute poderia ter sua esfera juriacutedica invadida atraveacutes de meios de execuccedilatildeo instituiacutedos
previamente em lei
Diante de tantos obstaacuteculos para se efetivar a tutela satisfativa a execuccedilatildeo estava
fadada ao fracasso o que frustrava a expectativa do jurisdicionado a uma prestaccedilatildeo da tutela
jurisdicional ceacutelere e efetiva Insatisfeitos com o cenaacuterio que se encontrava a atividade
40 Ibid p 8 41 Ibid p8 42 Ibid p 8 43 Ibid p8
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executiva legisladores e operadores do direito natildeo mediram esforccedilos para promover uma
evoluccedilatildeo significativa buscando mais eficiecircncia e celeridade ao procedimento executoacuterio
Dessa forma no final de 1994 foi introduzido no coacutedigo de processo agrave flexibilizaccedilatildeo
dos poderes executoacuterios do juiz ldquopara que ele pudesse prestar uma tutela efetiva aos direitos
ficando autorizado a determinar a modalidade de execuccedilatildeo adequada a cada hipoacutetese nas
obrigaccedilotildees de fazer e natildeo fazer (art 461 sect5ordm do CPC de 1973)rdquo No ano de 2002 a referida
medida foi estendida para as obrigaccedilotildees de entregar coisa (art 461-A caput e sect3ordm do CPC de
1973)
Com fundamento nos artigos 461 e 461-A em 2005 a Lei nordm 11 23205 unificou o
processo de conhecimento e o processo de execuccedilatildeo de sentenccedila Nesse sentido Maacuterio
Henrique Cavalcanti Gil Rodrigues44 aduz que
A Lei 112322005 reuniu de forma definitiva os processos de conhecimento e de execuccedilatildeo em um uacutenico processo composto por um sistema bifaacutesico Assim passa a existir uma fase inicial (de reconhecimento) e uma fase posterior (de cumprimento de sentenccedila de efetivaccedilatildeo da decisatildeo definitiva) sem contar com a eventual fase intermediaacuteria de liquidaccedilatildeo (RODRIGUES 2010 p 38)
Ademais as alteraccedilotildees realizadas no CPC de 73 inseriu a atipicidade dos meios
executivos nas obrigaccedilotildees de fazer natildeo fazer e dar coisa certa entretanto exercendo papel
subsidiaacuterio aos meios tiacutepicos
Quanto agraves obrigaccedilotildees de pagar quantia havia apenas a possibilidade de se valer da
incidecircncia de multa do art 475-J do CPC de 73 ndash implementada mediante reforma perpetrada
pela Lei nordm 11232 de 2005 em atendimento a doutrina processualista preocupada com a
efetividade das decisotildees ndash e de atos executivos como a penhora de bens e dinheiro
Ainda que a execuccedilatildeo tenha avanccedilado com a inserccedilatildeo das leis posteriores a 1994 no
CPC de 1973 a mesma continuava insuficiente tendo em vista que a burocracia e lentidatildeo
dos atos executivos davam brechas para que o devedor escondesse seu patrimocircnio penhoraacutevel
tornando carente de efetividade e celeridade agrave execuccedilatildeo
44 RODRIGUES Maacuterio Henrique Cavalcanti Gil A evoluccedilatildeo da execuccedilatildeo de sentenccedila no direito
processual civil e o novo regime juriacutedico das sentenccedilas apoacutes a reforma implementada pela Lei 112322005 Revista do Tribunal Regional Federal da 1ordf Regiatildeo v 22 n 2 fev 2010 p 38
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25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO
A tutela juridiscional eacute um direito fundamental previsto no art 5ordm inciso XXXV da
Carta Magna ldquo() a lei natildeo excluiraacute da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio lesatildeo ou ameaccedila a
direitordquo
Na visatildeo claacutessica o direito de accedilatildeo era efetivado com a prolaccedilatildeo de uma sentenccedila de
meacuterito posiccedilatildeo adotada por grande parte dos processualistas seguidores da doutrina de
Liebman Todavia esse conceito se mostra defasado tendo em vista que o direito de acesso agrave
justiccedila natildeo eacute apenas uma garantia formal de bater as portas do judiciaacuterio mas a garantia de
acesso agrave ordem juriacutedica justa adequada e eficaz45
Acreditar que uma sentenccedila de meacuterito favoraacutevel eacute tutela jurisdicional suficiente para
satisfazer o que se busca com o ajuizamento da accedilatildeo eacute uma visatildeo distorcida da atividade
satisfativa ldquoSob o ponto de vista do direito material a condenaccedilatildeo por si soacute eacute incapaz de
prestar a tutela do direitordquo46
Nessa oacutetica o direito fundamental agrave tutela executiva exige um sistema de tutela
jurisdicional ldquocapaz de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor
de tutela executivardquo47 Dessa forma entende-se que
ldquo() a) a interpretaccedilatildeo das normas que regulamentam a tutela executiva tem de ser feita no sentido de extrair a maior efetividade possiacutevel b) o juiz tem o poder-dever de deixar de aplicar uma norma que imponha uma restriccedilatildeo a um meio executivo sempre que essa restriccedilatildeo natildeo se justificar como forma de proteccedilatildeo a outro direito fundamental c) o juiz tem o poder-dever de adotar os meios executivos que se revelem necessaacuterios agrave prestaccedilatildeo integral de tutela executivardquo48
Egrave imperioso compreender que o direito fundamental agrave tutela executiva ratificado
pelo CPC eacute essencial para dirimir diversos litiacutegios oriundos do procedimento executivo
45 FERREIRA Gabriela Macedo Poder geral de efetivaccedilatildeo em defesa da constitucionalidade da
teacutecnica de execuccedilatildeo dos direitos do art 139 IV do Coacutedigo de Processo Civil Revista Jus Navigandi ISSN 1518-4862 Teresina ano 22 n 5178 4 set 2017 Disponiacutevel em lthttpsjuscombrartigos60190gt Acesso em 11 set 2018
46 Ibid natildeo paginado 47 DIDIER JR Fredie et al apud GUERRA Marcelo lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do credor
na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 48 Ibid p 102-104
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ldquoprincipalmente aqueles relacionados agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo49
Fredie Didier et al50 cita como exemplo as hipoacuteteses de impenhorabilidade
A impenhorabilidade de certos bens eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa
Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais
Por esta razatildeo o legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do
CPC fazendo um preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses das partes envolvidas
optando pela mitigaccedilatildeo do direito do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado
Quando o oacutergatildeo jurisdicional verificar que a aplicaccedilatildeo das regras de
impenhorabilidade eacute desproporcional para o caso concreto deve afastaacute-la e construir a
soluccedilatildeo adequada para o referido caso Didier et al51 traz um exemplo esclarecedor em sua
obra
O bem imoacutevel que serve de moradia da famiacutelia eacute relativamente impenhoraacutevel Objetiva-se com essa restriccedilatildeo proteger o direito fundamental agrave moradia conteuacutedo do direito agrave proteccedilatildeo da dignidade Imagine-se um imoacutevel de altiacutessimo valor Imagine-se agora um creacutedito que corresponda a 40 do valor do imoacutevel A venda judicial do imoacutevel no caso permitiria natildeo soacute satisfazer o direito do credor como ainda garantir ao executado com a sobra a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel que lhe preserve a dignidade A opccedilatildeo pela interpretaccedilatildeo literal da regra que veda a penhora protegeria exclusivamente o direito do executado de maneira desnecessaacuteria porque a relaccedilatildeo valor executadovalor do bem permitiria a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel apoacutes a entrega do dinheiro ao credor Seria pois interpretaccedilatildeo em desconformidade com os preceitos da contemporacircnea hermenecircutica constitucional que preconiza a necessidade de nos casos de choque entre direitos fundamentais dar a interpretaccedilatildeo que mais adequadamente proteja a ambos
A execuccedilatildeo civil integra o direito fundamental agrave tutela jurisdicional disciplinando
que ldquoos dispositivos devem ser interpretados de modo que se garanta a maior efetividade
49 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66 50 Ibid p 66 51 Ibid p 67
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possiacutevel agrave execuccedilatildeo desde que respeitados outros direitos fundamentaisrdquo52 Podendo ser
afastada desde que proporcional qualquer obstaacuteculo irrazoaacutevel agrave efetivaccedilatildeo desse direito
52 FERREIRA Gabriela Macedo apud MACEDO Lucas Buril de As eficaacutecias das decisotildees judiciais e
o cumprimento de sentenccedila no CPC15 Novo CPC Doutrina selecionada v 5 Execuccedilatildeo Coordenador geral Fredie Didier Jr organizadores Lucas Buril de Macedo Ravi Peixoto Alexandre Freire ndash Salvador Jus Podivm 2015 p 360361
23
3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO
EXECUTADO
31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS
Como forma de controlar a atividade jurisdicional por muito tempo vigorou o
entendimento de que a execuccedilatildeo somente poderia ser realizada atraveacutes dos meios executivos
tipicamente previstos na legislaccedilatildeo Segundo Luiz Guilherme Marinoni53
O princiacutepio da tipicidade deseja significar que os meios de execuccedilatildeo devem estar previstos na lei e assim que a execuccedilatildeo natildeo pode ocorrer atraveacutes de formas executivas natildeo tipificadas O seu objetivo eacute de um lado impedir que meio executivo natildeo previsto em lei possa ser utilizado e de outro garantir o jurisdicionado contra a possibilidade de arbiacutetrio judicial na fixaccedilatildeo da modalidade executiva Se o jurisdicionado sabe em razatildeo de previsatildeo legal que a sua esfera juriacutedica somente poderaacute ser invadida atraveacutes de determinadas modalidades executivas confere-se a ele a possibilidade de antever a reaccedilatildeo ao seu inadimplemento bem como a garantia de que a jurisdiccedilatildeo natildeo determinaraacute ou permitiraacute a utilizaccedilatildeo de meio executivo diverso daqueles previstos
Dessa forma o princiacutepio da tipicidade disciplina que o oacutergatildeo julgador ao proceder agrave
execuccedilatildeo estaacute limitado aos meios executivos previamente definidos em lei natildeo podendo se
valer de qualquer teacutecnica de efetivaccedilatildeo que natildeo se encaixasse nas hipoacuteteses taxativas da
legislaccedilatildeo
Entretanto o legislador natildeo tem como prever todas as peculiaridades dos direitos
dignos de tutela executiva e preordenar teacutecnicas executivas diversas para cada peculiaridade
Sob esse cenaacuterio o principio da tipicidade foi cedendo lugar ao principio da atipicidade dos
meios executivos
A ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do oacutergatildeo julgador estaacute cada vez mais presente
no ordenamento juriacutedico paacutetrio motivando um poder geral de efetivaccedilatildeo ldquoque permite ao
julgador valer-se dos meios executivos que considerar mais adequado ao caso concreto sejam
eles de coerccedilatildeo direta sejam de coerccedilatildeo indiretardquo 54
53 MARINONI Luiz Guilherme Teacutecnica processual e tutela dos direitos Satildeo Paulo Editora Revista
dos Tribunais 2004 p 212 nota 79 54 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 100
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Essa tendecircncia de ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do juiz natildeo eacute exclusividade do
ordenamento juriacutedico brasileiro segundo Fredie Didier et al55
Michelle Taruffo jaacute apontava que o direito americano diante da inefetividade dos meios executivos at law comeccedilou a autorizar o magistrado a tomar medidas executivas adequadas ao caso concreto Trata-se afirma o jurista italiano de aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo segundo o qual as regras processuais devem ser adaptadas agraves necessidades do direito material
Os meios executivos atiacutepicos derivam de trecircs enunciados normativos do Coacutedigo de
Processo Civil o art 139 IV o art 297 e o sect1ordm do art 536
O art 139 IV do CPC dispotildee que pertence ao juiz o poder-dever de ldquodeterminar
todas as medidas indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para
assegurar o cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto
prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo
Jaacute o art 297 do CPC cuida da tutela provisoacuteria e garante que ldquoo juiz poderaacute
determinar as medidas que considerar adequadas para a efetivaccedilatildeo da tutela provisoacuteriardquo
Podendo dessa forma a dita tutela ser efetivada atipicamente
Por fim o art 536 sect1ordm do CPC dispotildee que
Para atender ao disposto no caput o juiz poderaacute determinar entre outras medidas a imposiccedilatildeo de multa a busca e apreensatildeo a remoccedilatildeo de pessoas e coisas o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva podendo caso necessaacuterio requisitar o auxilio de forccedila policial
As supracitadas medidas executivas atiacutepicas satildeo entendidas pela doutrina como
claacuteusulas gerais processuais executivas56 Essas claacuteusulas gerais natildeo restringem a sua
aplicaccedilatildeo agraves teacutecnicas de coerccedilatildeo indireta satildeo autorizados tambeacutem o uso de meios de execuccedilatildeo
dieta e indireta
Ademais cumpre salientar que o art 139 IV CPC aplica-se a toda e qualquer
atividade executiva ldquoa) seja fundada em tiacutetulo executivo judicial (provisoacuteria ou definitiva)
55 DIDIER JR Fredie et al apud TARUFFO Michelle A atuaccedilatildeo executiva dos direitos perfis
comparatiacutesticos Revista de Processo Satildeo Paulo RT 1990 n 59 p 78 56 Segundo Fredie Didier et al claacuteusula geral eacute uma espeacutecie de texto normativo cujo antecedente
(hipoacutetese faacutetica) eacute composto por termos vagos e consequente (efeito juriacutedico) eacute indeterminado
25
seja fundada em tiacutetulo executivo extrajudicial b) seja para efetivar prestaccedilatildeo pecuniaacuteria seja
para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer ou dar coisa distinta de dinheirordquo57
Jaacute o art 297 do CPC garante que a tutela provisoacuteria possa ser efetivada tambeacutem
atipicamente ldquoSucede que a atipicidade da tutela provisoacuteria segue necessariamente a
atipicidade da tutela definitivardquo 58
Por fim o comando do sect 1 ordmdo art 536 se aplica
a) inicialmente agrave execuccedilatildeo de fazer e de natildeo fazer fundada em decisatildeo judicial (provisoacuteria ou definitiva) b) por forccedila do sect 3ordm do art 538 tambeacutem se aplica ao cumprimento de sentenccedila para entrega de coisa c) por forccedila do art 771 paraacutegrafo uacutenico o dispositivo tambeacutem se aplica agrave execuccedilatildeo para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer e entregar coisa distinta de dinheiro fundada em tiacutetulo extrajudicial
Claramente o art 139 IV eacute mais amplo do que o sect 1 ordm do art 536 estende-se por
disposiccedilatildeo expressa agrave execuccedilatildeo de pagar quantia Sendo uma grande novidade nas obrigaccedilotildees
que tem por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15
O art 139 IV do CPC apresentou uma novidade agrave atipicidade dos meios executivos
ao disciplinar que cabe ao juiz ldquodeterminar todas as medidas indutivas coercitivas
mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o cumprimento de ordem judicial
inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo
A inovaccedilatildeo estaacute na possibilidade de utilizar os meios atiacutepicos para assegurar o
cumprimento de decisotildees que versam sobre as obrigaccedilotildees pecuniaacuterias sendo admitida a
utilizaccedilatildeo de outros meios ateacute na execuccedilatildeo de titulo judicial de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria aleacutem da
multa de 10 (a que se refere o artigo 523 sect 1ordm do CPC) para forccedilar o devedor a cumprir a
obrigaccedilatildeo pecuniaacuteria
57 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 105 58 Ibid p 105
26
Dessa forma eacute possiacutevel afirmar que ldquoao lado da disciplina tiacutepica do art 523 e
seguintes () o novo CPC inova ao permitir que o sistema de teacutecnicas executivas atiacutepicas
sejam empregadas na execuccedilatildeo monetaacuteriardquo59 (ZARONI VITORELLI 2016 p 66)
Fernando da Fonseca Gajardoni60 denomina a dita medida como a ldquorevoluccedilatildeo
silenciosardquo da execuccedilatildeo por quantia certa posto que
() pelo fato de que a regra natildeo estar propriamente incrustrada nos capiacutetulo e livro atinentes ao cumprimento de sentenccedila e ao processo de execuccedilatildeo ndash o art 139 IV do Novo CPC parece trazer ao paiacutes algo bastante novo cuja aplicaccedilatildeo a depender do comportamento do Judiciaacuterio pode implicar em verdadeira revoluccedilatildeo (positiva ou negativa) na sistemaacutetica executiva ateacute entatildeo vigente
Claramente o dispositivo foi recebido com entusiasmo por parte da doutrina que
anteciparam em afirmar que o princiacutepio da atipicidade dos meios executivos no CPC2015
ldquo() assume a feiccedilatildeo de poder-dever geral conferido ao magistrado de determinar () todas
as medidas coercitivas sub-rogatoacuterias mandamentais e indutivas que entender necessaacuterias
para a tutela justa efetiva e em tempo razoaacutevelrdquo 61
Dessa forma lecionam Luiz Guilherme Marinoni Seacutergio Cruz Arenhart e Daniel
Mitidiero62 que
O juiz a partir do art 139 IV do CPC2015 natildeo estaacute mais adstrito apenas agrave sentenccedila condenatoacuteria ndash que fixa a obrigaccedilatildeo de pagar e daacute ensejo agrave abertura da execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo patrimonial ndash para a tutela de prestaccedilotildees pecuniaacuterias Pode impor essa prestaccedilatildeo por meio de ordem judicial acoplada ao aceno de emprego de medida de induccedilatildeo (coercitiva ou de pressatildeo positiva) ou de medida de sub-rogaccedilatildeo (MARINONI ARENHARDT MITIDIERO 2015 p 703)
Deste modo em razatildeo do art 139 IV do CPC tem-se entendido que o juiz nas
execuccedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria possui a faculdade de adotar qualquer
59 ZARONI Bruno Marzullo VITORELLI Edilson Reforma e efetividade da execuccedilatildeo no novo CPC
In PEIXOTO Ravi FREIRE Alexandre MENDES Aluiacutesio Gonccedilalves de Castro Execuccedilatildeo 2 ed rev e atual Salvador JusPodivm 2016 766 p (Coleccedilatildeo novo CPC doutrina selecionada v 5) p 66
60 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia 24082015 JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Acesso em 23082018
61 LIMA Rafael de Oliveira A atipicidade dos meios executivos no coacutedigo de processo civil brasileiro de 2015 Revista de Processo Jurisdiccedilatildeo e Efetividade da Justiccedila v 2 n 2 juldez 2016 p 11
62 MARINONI Luiz Guilherme ARENHART Seacutergio Cruz MITIDIERO Daniel Novo curso de processo civil tutela dos direitos mediante procedimento comum Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 v 2 p 703
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medida indutiva coercitiva mandamentais ou sub-rogatoacuterias para efetivar o creacutedito do
exequente natildeo se limitando as medidas tiacutepicas
Alguns doutrinadores se precipitaram ao afirmar que o dito dispositivo ldquo() autoriza o
juiz a utilizar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir ressalvando-se a prisatildeo
civil constitucionalmente limitada ao devedor de alimentosrdquo 63 Acreditam Jorge Bheron
Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa que o entusiasmo por parte da
doutrina abre margem para as mais variadas formas de compelir o devedor a cumprir com a
prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
ldquoE aiacute persistindo no mau vezo de fazer explicaccedilotildees em abstrato ignorando que o sentindo soacute se daacute na aplicaccedilatildeo (situaccedilatildeo concreta real ou fictiacutecia) as sugestatildeo satildeo as mais engenhosas suspensatildeo de CNH retenccedilatildeo de passaporte restriccedilatildeo de fim de semana cancelamento de cartotildees de creacutedito ndash para ficar apenas nestasrdquo 64
Ou seja podendo o juiz natildeo apenas substituir o devedor tomando seu patrimocircnio para
entregar ao credor na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia como tambeacutem poderaacute
pressionaacute-lo psicologicamente a adimplir por conta proacutepria a obrigaccedilatildeo
Ademais o Enunciado nordm 48 do ENFAM avalia expressamente a possibilidade de
imposiccedilatildeo de medidas coercitivas para a efetivaccedilatildeo da execuccedilatildeo pecuniaacuteria Conforme o dito
enunciado
ldquoO art 139 inciso IV traduz um poder geral de efetivaccedilatildeo permitindo a aplicaccedilatildeo de medidas atiacutepicas para garantir o cumprimento de qualquer ordem judicial inclusive no acircmbito do cumprimento de sentenccedila e no processo de execuccedilatildeo baseado em tiacutetulosrdquo
Dessa forma o artigo 139 IV do CPC permite uma gama ampla de interpretaccedilotildees por
parte da doutrina por ser uma claacuteusula geral encontrando limite apenas na imaginaccedilatildeo de
quem o analisa Nesse sentido eacute forccediloso orientar e delimitar o manejo desse artigo legal para
que se extraia seu sentido e alcance revelando assim sobre que situaccedilotildees ele incide de que
modo e o que permite
63 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
64 Ibid sem paginaccedilatildeo
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32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER
GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
O artigo 139 IV com a vigecircncia do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 abriu margem
para uma constelaccedilatildeo de decisotildees nas quais o dito dispositivo recebeu diversas interpretaccedilotildees
pelos operadores do direito
Sem duacutevidas por ser uma das pioneiras a decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara
Ciacutevel do Foro Regional de Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-
1320138260011 na data de 25 de agosto de 2016 gerou um enorme rebuliccedilo
Nessa accedilatildeo que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto
uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a
suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o
passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito
Segundo a magistrada o processo tramitava haacute anos sem que nenhum valor tenha sido
pago ao exequente aleacutem do devedor natildeo ter oferecido proposta de acordo e nem ter indicado
bens agrave penhora configurando uma completa desiacutedia com o processo
ldquoO caso tratado nos autos se insere dentre as hipoacuteteses em que eacute cabiacutevel a aplicaccedilatildeo do art 139 inciso IV do Coacutedigo de Processo Civil Isso porque o processo tramita desde 2013 sem que qualquer valor tenha sido pago ao exequente Todas as medidas executivas cabiacuteveis foram tomadas sendo que o executado natildeo paga a diacutevida natildeo indica bens agrave penhora natildeo faz proposta de acordo e sequer cumpre de forma adequada as ordens judiciais frustrando a execuccedilatildeo
Se o executado natildeo tem como solver a presente diacutevida tambeacutem natildeo recursos para viagens internacionais ou para manter um veiacuteculo ou mesmo manter um cartatildeo de creacutedito Se poreacutem mantiver tais atividades poderaacute quitar a diacutevida razatildeo pela qual a medida coercitiva poderaacute se mostrar efetiva
Assim como medida coercitiva objetivando a efetivaccedilatildeo da presente execuccedilatildeo defiro o pedido formulado pelo exequente e suspendo a Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo do executado M A S determinando ainda a apreensatildeo de seu passaporte ateacute o pagamento da presente diacutevida
()
Determino ainda o cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado ateacute o pagamento da presente diacutevida ()rdquo
Foi impetrado Habeas Corpus no Tribunal de Justiccedila do Estado de Satildeo Paulo a favor
do executado sob o fundamento que a coaccedilatildeo era ilegal e afetava o direito de locomoccedilatildeo
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garantido constitucionalmente Tendo sido concedida a liminar em decisatildeo que ora se
reproduz
Em que pese a nova sistemaacutetica trazida pelo art 139 IV do CPC2015 deve-se considerar que a base estrutural do ordenamento juriacutedico eacute a Constituiccedilatildeo Federal que em seu art 5ordm XV consagra o direito de ir e vir Ademais o art 8ordm do CPC2015 tambeacutem preceitua que ao aplicar o ordenamento juriacutedico o juiz natildeo atentaraacute apenas para a eficiecircncia do processo mas tambeacutem aos fins sociais e agraves exigecircncias do bem comum devendo ainda resguardar e promover a dignidade da pessoa humana observando a proporcionalidade a razoabilidade e a legalidade Por tais motivos concedo a liminar pleiteada65
Cabe destacar aqui o voto vencido da Desembargadora Maria Luacutecia Pizzotti no
julgamento do Habeas Corpus supracitado demonstrando que o debate sobre a abrangecircncia
do artigo 139 IV do CPC ocorre tanto na doutrina quanto no judiciaacuterio
O objetivo do novel dispositivo natildeo eacute impor penas ou restringir direitos natildeo sendo intenccedilatildeo do Judiciaacuterio suspender indefinidamente o direito de dirigir do executado ou sua liberdade de viajar mas sim impor uma restriccedilatildeo tatildeo gravosa caso ele natildeo cumpra a determinaccedilatildeo que escolha cumprir sua obrigaccedilatildeo e dar fim ao problema Em outras palavras mediante as medidas de coerccedilatildeo o Estado procura persuadir o inadimplente impondo-lhe situaccedilotildees tatildeo onerosas e inconvenientes que em algum momento seja para ele mais vantajoso cumprir do que permanecer no inadimplemento
Ao fazecirc-lo o Novo Coacutedigo de Processo Civil rompe com as criacuteticas da ineficiecircncia das execuccedilotildees Natildeo se cogita deferir medidas restritivas agravequeles que demonstram a incapacidade absoluta de solver o deacutebito apenas agravequeles que reconhecidamente se valem de artimanhas e subterfuacutegios para evitar a satisfaccedilatildeo das diacutevidas ldquopreferindordquo outras despesas mais lsquonobresrsquo agindo em nome de terceiros e fazendo escaacuternio dos credores e do proacuteprio Poder Judiciaacuterio (hellip)
Para tanto memoraacutevel a noccedilatildeo de que a medida em comento tem caraacuteter excepcional e encontra limites no plano da proporcionalidade como sustenta o ilustrado Magistrado paulista Fernando da Fonseca Gajardoni Professor Faculdade de Direito de Ribeiratildeo Preto da USP (in httpswwwjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 acesso em 091216 agraves 11h20min) E para anaacutelise da proporcionalidade a ponderaccedilatildeo deve observar os trecircs passos apontados pela doutrina a necessidade a adequaccedilatildeo e a proporcionalidade em sentido estrito
65 TJSP - Habeas Corpus Processo nordm 2183713-8520168260000 30ordf Cacircmara Direito Privado relator
Des Marcos Ramos j 290317
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Ademais no entendimento de Jorge Amaury Maia Nunes e Guilherme Pupe de
Noacutebrega66 essa decisatildeo releva os perigos trazidos pelo art 139 IV do CPC ao confrontar
direitos constitucionalmente garantidos
De nossa parte entendemos que a liberdade de locomoccedilatildeo inserta no inciso XV do artigo 5ordm que abrange o direito de deixar o territoacuterio nacional sofre embaraccedilo indevido pela apreensatildeo de passaporte ou pela suspensatildeo da carteira nacional de habilitaccedilatildeo
()
Agrave luz da exposiccedilatildeo feita acima e em anaacutelise primeva sustentamos que o artigo 139 IV do CPC de 2015 estaacute a merecer declaraccedilatildeo de inconstitucionalidade sem reduccedilatildeo de texto para o fim de rechaccedilar a apreensatildeo de passaporte a suspensatildeo do direito de dirigir e a vedaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo em concurso ou em licitaccedilatildeo puacuteblicos como medidas passiacuteveis de serem adotadas pelo juiz sob pena de vulneraccedilatildeo aos artigos 1ordm IV 5ordm XV e LIV 37 I 173 sect 3ordm III e 175 todos da Constituiccedilatildeo
Apesar de ter sofrido duras criacuteticas a decisatildeo do processo de nordm 4001386-
1320138260011 serviu de inspiraccedilatildeo para tantas outras decisotildees no mesmo sentido
Foi o caso da decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de Satildeo
Vicente em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 0020724-2620088260590 na data de 21 de
junho de 2017
A supracitada execuccedilatildeo se arrastava por nove (09) anos sem que o devedor tenha
esboccedilado qualquer intenccedilatildeo de pagar a diacutevida O credor requereu a suspensatildeo da Carteira
Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado apreensatildeo do passaporte e cancelamento dos
cartotildees de creacutedito
O magistrado com embasamento no artigo 139 IV do CPC deferiu parcialmente o
pedido sob o fundamento de que a apreensatildeo de passaporte e CNH natildeo viola o direito de ir e
vir do devedor Entretanto o juiz indeferiu o pedido de cancelamento do cartatildeo de creacutedito por
acreditar que a suspensatildeo poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado tendo em
vista que atualmente as pessoas utilizam o referido cartatildeo para pagamento das despesas
diaacuterias
66 NOBREacuteGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139
IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018
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Eacute evidente que as medidas atiacutepicas de coerccedilatildeo devem ser utilizadas com cautela sempre respeitando a dignidade da pessoa do executado Natildeo se vislumbra contudo que as medidas aqui eleitas sejam capazes de vulnerar os Direitos Fundamentais do indiviacuteduo A uma porque natildeo se trata de restriccedilatildeo ao direito de ir e vir do executado que continua no gozo de plena liberdade de locomoccedilatildeo a duas porque a conduccedilatildeo de veiacuteculo automotor eacute mera comodidade da vida moderna natildeo se tratando de direito absoluto
Com mais razatildeo ainda se admite a suspensatildeo do Passaporte do executado que se natildeo paga a diacutevida da execuccedilatildeo natildeo deve ter o direito de fazer viagem internacional
Tem-se aqui verdadeiro exerciacutecio de ponderaccedilatildeo de interesses juriacutedicos de um lado jaz o direito de creacutedito do exequente que deriva do direito de propriedade e por isso mesmo tem envergadura constitucional de outro giro tem-se o direito do executado agrave autorizaccedilatildeo do Estado para conduzir veiacuteculo automotor e realizar viagens internacionais que natildeo se mostram essenciais agrave dignidade da pessoa humana Natildeo haacute duacutevidas pois de que eacute este uacuteltimo que deve sucumbir
O pedido fica indeferido apenas no tocante agrave suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado Eacute que ao contraacuterio da CNH e do passaporte que trazem consigo certa presunccedilatildeo de riqueza natildeo se pode concluir que o uso de cartatildeo de creacutedito eacute feito por luxo ou simples conveniecircncia
Como eacute cediccedilo os cartotildees de creacutedito oferecem ao seu titular creacutedito raacutepido e rotativo para o pagamento de despesas diaacuterias e certamente exercem funccedilatildeo essencial agravequeles que se encontram em situaccedilatildeo financeira precaacuteria
A suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado portanto se revela medida desproporcional e que inclusive poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado
Pelo exposto defiro em parte o pedido formulado pelo exequente e DETERMINO a suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo e bem como a suspensatildeo da validade (cancelamento temporaacuterio) no sistema SINPA de eventuais passaportes vaacutelidos em nome do executado
Dessa forma o artigo 139 IV do CPC revolucionou completamente a execuccedilatildeo de
obrigaccedilatildeo de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria ao permitir a utilizaccedilatildeo do uso dos meios executivos
atiacutepicos para compelir o executado a satisfazer o creacutedito do exequente
33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE
EFETIVACcedilAtildeO
Era inevitaacutevel que o artigo 139 IV do CPC gerasse todo tipo de reaccedilatildeo entre os
doutrinadores do processo civil e ateacute mesmo de outros ramos do direito devido a sua
capacidade de realizar uma completa inovaccedilatildeo na forma de se executar as obrigaccedilotildees de pagar
quantia Alguns o aplaudiram visualizando nele ldquouma luz no fim do tuacutenelrdquo outros o
criticaram vislumbrando as arbitrariedades que poderiam ser praticadas com embasamento no
referido dispositivo
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As decisotildees suscitadas em linhas preteacuteritas auxiliaram para fervilhar ainda mais o
debate sobre o tema tendo em vista que por um lado poderia aumentar a efetividade das
execuccedilotildees por quantia no entanto por outro surgiam questionamentos a cerca da sua
constitucionalidade
A doutrina parece que demoraraacute a se pacificar sobre o tema Segundo alguns
doutrinadores seraacute inconstitucional toda restriccedilatildeo que recaia sobre a pessoa do devedor e natildeo
exclusivamente sobre o seu patrimocircnio Jaacute para outros o dispositivo eacute constitucional e o meio
mais eficaz para se resolver o problema da efetivaccedilatildeo das execuccedilotildees de pagar quantia ldquoA
discussatildeo se daacute especialmente no que diz respeito aacutes medidas de suspensatildeo de CNH
apreensatildeo de passaporte e bloqueio de cartotildees de creacutedito do devedorrdquo 67
O professor Thiago Rodovalho analisou detalhadamente a decisatildeo de nordm 4001386-
1320138260011 em seu artigo ldquoO necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na
concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivosrdquo 68 Quanto agrave suspensatildeo da CNH o autor
acredita que tal medida natildeo viola qualquer direito fundamental do devedor posto que ldquodirigir
veiacuteculos automotores eacute direito do cidadatildeo mas natildeo se confunde com os direitos fundamentais
e social de ir-e-vir e ao transporterdquo 69 O professor eacute categoacuterico ao afirmar que
Com relaccedilatildeo agrave suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (suspensatildeo do direito de dirigir restriccedilatildeo de direitos) natildeo nos parece haver qualquer violaccedilatildeo a direito fundamental ou social nem a direito da personalidade ou colocaccedilatildeo do devedor em situaccedilatildeo desproporcionalmente detrimentosa exceccedilatildeo feita aos que usam o veiacuteculo como instrumento de trabalho atraindo a hipoacutetese do NCPC art 833 inc V
()
Outrossim natildeo o consideramos como direito da personalidade Os direitos da personalidade satildeo os valores fundamentais que compotildeem o proacuteprio ser justamente por isso intransmissiacuteveis e irrenunciaacuteveis natildeo podendo o seu exerciacutecio sofrer limitaccedilatildeo voluntaacuteria (CC art 11) Por mais que vivamos num paiacutes que tanto valoriza o carro e que muitas pessoas de fato se compreendam em razatildeo e em funccedilatildeo do carro que dirijam este natildeo nos parece ser um direito que verdadeiramente componha a personalidade do indiviacuteduo70
67 DONTOS Sofia Poderes executoacuterios do juiz que diz a doutrina sobre o art 139 inc IV do CPC
Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigospoderes-executorios-do-juiz-que-diz-a-doutrina-sobre-art-139-inc-iv-do-cpc-23052018 gt Publicado em 23052018 Acesso em 01082018
68 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018
69 Ibid sem paginaccedilatildeo 70 Ibid sem paginaccedilatildeo
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Quanto ao cancelamento dos cartotildees de credito do devedor o professor Thiago
Rodovalho tambeacutem acredita que natildeo haacute qualquer violaccedilatildeo ao direito fundamental social ou
da personalidade do devedor e acrescenta que
Tanto assim o eacute que ser titular de um cartatildeo de creacutedito pressupotildee ter creacutedito o que eacute analisado e concedido por instituiccedilotildees financeiras mais do que isso se porventura passando por dificuldades financeiras a pessoa deixa de honrar com pagamentos a mesma instituiccedilatildeo financeira concedente do cartatildeo de creacutedito pode sponte propria cancelaacute-lo ou recusar-lhe a concessatildeo Ora parece-me contraditoacuterio que instituiccedilotildees financeiras para sua proteccedilatildeo patrimonial possam ferir esse suposto ldquodireito fundamentalrdquo ou esse suposto ldquodireito da personalidaderdquo mas natildeo possa o Poder Judiciaacuterio igualmente fazecirc-lo contra aquele devedor moroso que instado ao pagamento e frustradas todas as tentativas de constriccedilatildeo patrimonial leva vida luxuosa valendo-se de cartotildees de creacutedito que prescindem de dinheiro em conta eacute dizer podem justamente funcionar como forma de ocultar renda e patrimocircnio71
O autor considera a apreensatildeo de passaporte um tema mais polecircmico e que merece
maior reflexatildeo No entanto crecirc que eacute possiacutevel a apreensatildeo de passaporte sem violar os
direitos fundamentais do devedor por se tratar de um direito de ir e vir de amplitude especial
Agrave primeira vista a possibilidade de apreensatildeo do passaporte tambeacutem nos parece possiacutevel pois tambeacutem se trata de um direito de ir e vir de amplitude especial Assim o eacute pois salvo situaccedilotildees especiais (refugiados p ex) haacute a necessidade de demonstrar condiccedilotildees financeiras de estadia e retorno para ser admitido no paiacutes de destino Ou seja pressupotildee uma condiccedilatildeo financeira que o devedor justamente diz natildeo possuir Sem embargo dessa consideraccedilatildeo esse ainda eacute um ponto que merece uma reflexatildeo mais acurada sendo essa apenas uma primeira impressatildeo72
Outros autores escreveram sobre o tema como eacute o caso do processualista Luiz
Dellore73 que tambeacutem defende que as medidas atiacutepicas como restriccedilatildeo ao direito de dirigir
apreensatildeo de passaporte e cancelamento de cartotildees de creacutedito satildeo permitidas e natildeo violam em
regra os direitos fundamentais do devedor
De minha parte creio que efetivamente haacute inovaccedilatildeo no at 139 IV do NCPC (e natildeo mera repeticcedilatildeo do que jaacute havia no Coacutedigo anterior) que tem o condatildeo de trazer mais efetividade ao processo executivo no Brasil ndash que por deacutecadas centrou sua atenccedilatildeo na defesa do executado (vide a grande quantidade de impenhorabilidades) sem dar maior atenccedilatildeo ao creacutedito do exequente
71 Ibid sem paginaccedilatildeo 72 Ibid sem paginaccedilatildeo 73 DELLORE Luiz NCPC Atipicidade das medidas executivas jaacute eacute realidade Disponiacutevel em lt
httpswwwjotainfoopiniao-e-analisecolunasnovo-cpcncpc-atipicidade-de-medidas-executivas-ja-e-realidade-17042017 gt Publicado em 17042017 Acesso em 03092018
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Logo a meu ver medidas como (i) restriccedilatildeo ao direito de dirigir (ii) apreensatildeo de passaporte (iii) cancelamento de cartotildees de creacutedito e (iv) vedaccedilatildeo de obtenccedilatildeo de novos empreacutestimos se natildeo vinculados ao pagamento do deacutebito exequendo dentre outras restriccedilotildees que deveratildeo ser observadas a cada caso satildeo permitidas pelo sistema do NCPC e em regra natildeo violam direitos fundamentais do devedor E tecircm o condatildeo de fazer com que o executado que tem recursos diante dessas medidas coercitivas pague o deacutebito trazendo sucesso agrave satisfaccedilatildeo do creacutedito
Nessa linha para Alexandre Fuchs das Neves74 o artigo 139 IV do CPC conferiu ao
juiz poderes coercitivos capazes de ldquotransformar a vida do devedor um infernordquo para compeli-
lo a cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria Entretanto pondera que para que a medida tenha
validade ldquoeacute necessaacuteria uma fundamentaccedilatildeo por evidente uma correlaccedilatildeo temaacutetica entre a
medida adotada e sua efetividade em face ao processo com fundamentaccedilatildeo detalhadardquo
No entendimento de Fernando Gajardoni75 satildeo possiacuteveis as medidas de apreensatildeo de
passaporte bloqueio de cartotildees de creacutedito e suspensatildeo da CNH Para ele o que limita o art
139 IV do CPC eacute o esgotamento dos meios tiacutepicos e a real necessidade da medida
Ilustrativamente natildeo efetuado o pagamento de diacutevida oriunda de multas de tracircnsito e superados os expedientes tradicionais de adimplemento (penhora de dinheiro e bens) seria liacutecito o estabelecimento da medida coercitivaindutiva de suspensatildeo do direito a conduzir veiacuteculo automotor ateacute pagamento do deacutebito (inclusive com apreensatildeo da CNH do devedor) natildeo efetuado pagamento de verbas salariais devidas a funcionaacuterios da empresa possiacutevel o estabelecimento de vedaccedilatildeo agrave contrataccedilatildeo de novos funcionaacuterios ateacute que seja saldada a diacutevida natildeo efetuado o pagamento de financiamento bancaacuterio na forma e no prazo avenccedilados possiacutevel ateacute que se tenha a quitaccedilatildeo que se obstem novos financiamentos ou mesmo a participaccedilatildeo do devedor em licitaccedilotildees (como de ordinaacuterio jaacute acontece com pessoas juriacutedicas em deacutebito tributaacuterio com o Poder Puacuteblico) etc
Teriacuteamos entatildeo no Brasil por assim dizer a adoccedilatildeo do padratildeo da atipicidade das medidas executivas tambeacutem para as obrigaccedilotildees de pagar vistas estas como ordens do EstadoJuiz para que haja prestaccedilatildeo de pagamento em pecuacutenia
()
Por isso ndash a prevalecer a interpretaccedilatildeo potencializada do art 139 IV do CPC2015 ndash o emprego de tais medidas coercitivasindutivas especialmente nas obrigaccedilotildees de pagar encontraraacute limite certo na excepcionalidade da medida (esgotamento dos meios tradicionais de satisfaccedilatildeo do deacutebito) na proporcionalidade (inclusive agrave luz da regra da menor onerosidade ao devedor do art 805 do CPC2015) na necessidade de fundamentaccedilatildeo substancial e especialmente nos direitos e garantias assegurados na Constituiccedilatildeo Federal (vg natildeo parece possiacutevel que se determine o pagamento sob pena de prisatildeo ou de vedaccedilatildeo ao exerciacutecio da profissatildeo do direito de ir e vir etc)
74 NEVES Alexandre Fuchs das Cancelamento de cartotildees de creacutedito e apreensatildeo de CNH e passaporte
do devedor Isso eacute possiacutevel Disponiacutevel em lt httpwwwsinfacspcombrconteudocancelamento-de-cartoes-de-credito-e-apreensao-de-cnh-e-passaporte-do-devedor-isso-e-possivel gt Acesso em 30082018
75 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Publicado em 24082015 Acesso em 30082018
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Jaacute Fernanda Tartuce76 acredita que tais medidas satildeo problemaacuteticas e devem ser
analisadas com cautela tendo em vista que ao inveacutes de afetarem o patrimocircnio do devedor
atingem a proacutepria pessoa
Sob certo prisma adotar medidas diferenciadas contribui para a efetividade da prestaccedilatildeo jurisdicional Por outro lado o patrimocircnio ndash e natildeo a pessoa do devedor - responde por diacutevidas aleacutem disso o exerciacutecio de amplos poderes pelo juiz sem balizas especiacuteficas pode ensejar medidas inadequadas Nessa linha suspender o direito de dirigir e restringir o uso de passaporte satildeo iniciativas problemaacuteticas por atingirem a pessoa do devedor enquanto a penhora da restituiccedilatildeo de Imposto de Renda soa viaacutevel por afetar seu patrimocircnio Eacute importante que a medida diferenciada se revele proporcional e seja aplicada apoacutes o exaurimento de outros meios previstos no ordenamento Como a proposta do Novo Coacutedigo eacute aumentar a eficiecircncia processual intentar medidas ineficazes inexequiacuteveis eou de difiacutecil fiscalizaccedilatildeo pode acabar ensejando o efeito contraacuterio
Nessa senda Lenio Streck e Dierle Nunes77 entendem que as medidas atiacutepicas de
suspensatildeo da CNH eou apreensatildeo de passaporte satildeo inconstitucionais Afirmam que natildeo se
pode confundir o processo civil e penal ainda que ambos remetam a um ldquoparadigma
constitucional comumrdquo e que o artigo 139 IV do CPC ldquoimpotildee novos desafios interpretativos
que podem conduzir a uma anaacutelise superficial e utilitarista de busca de resultados que
desprezem a necessaacuteria leitura constitucionalrdquo Os autores ainda ponderam que ldquoO perigo eacute o
artigo 139 IV ser transformado em instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com
autorizaccedilatildeo judicialrdquo
O professor Araken de Assis no dia 18 de abril de 2018 em um evento sobre o
Coacutedigo Processual Civil de 2015 que ocorreu em Brasiacutelia na sede do Conselho Federal da
OAB declarou ser contraacuterio aos poderes executoacuterios atiacutepicos ldquoSou contra os poderes
atiacutepicos dos juiacutezes porque seu exerciacutecio redunda em simples arbitrariedadesrdquo78
Acrescentou ainda que
76 IBDFAM ndash Instituto Brasileiro de Famiacutelia O polecircmico inciso IV do artigo 139 do CPC e suas difusas
interpretaccedilotildees Disponiacutevel em lt httpwwwibdfamorgbrnoticias6096O+polC3AAmico+inciso+IV+do+artigo+139+do+CPC+e+suas+difusas+interpretaC3A7C3B5es gt Publicado em 31082016 Acesso em 04092018
77 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018
78 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04092018
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Eacute evidentemente inconstitucional diante do princiacutepio da dignidade da pessoa humana tirar o passaporte carteira de habilitaccedilatildeo Quecirc que tem isso com diacutevidas Natildeo tem absolutamente nada Natildeo eacute a correlaccedilatildeo instrumental entre o objetivo da execuccedilatildeo e o meio empregado Isso eacute simples vinganccedila simples puniccedilatildeo79
O professor Araken de Assis acredita que tais medidas satildeo inconstitucionais e
violam o principio da dignidade humana do executado numa sociedade como a nossa
sedenta por puniccedilatildeo natildeo me surpreende que essas ideias sejam encaradas com
naturalidade Mas eacute preciso rejeitaacute-las em nome de princiacutepios 80
34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
A Constituiccedilatildeo Federal de 1988 tem como um dos seus fundamentos a dignidade da
pessoa humana presente no artigo 1ordm inciso III do referido texto constitucional O dito
princiacutepio tem o escopo de nortear o ordenamento juriacutedico como um todo
A inclusatildeo da dignidade da pessoa humana como princiacutepio constitucional obrigou
uma reflexatildeo sobre o papel da pessoa humana no direito e um redimensionamento para
elevaacute-la ao centro do ordenamento juriacutedico81 Eacute necessaacuterio recorrer agrave teoria Kantiana para
que se obtenha uma definiccedilatildeo do princiacutepio ora estudado Para Kant82 o homem eacute um fim
em si mesmo natildeo uma funccedilatildeo do Estado Ou Naccedilatildeo O Estado e o direito devem estar
organizados em benefiacutecio do indiviacuteduo
Agora eu afirmo o homem ndash e de uma maneira geral todo o ser racional ndash existe como fim em si mesmo e natildeo apenas como meio para o uso arbitraacuterio desta ou daquela vontade Em todas as suas accedilotildees pelo contraacuterio tanto nas direcionadas a ele mesmo como nas que o satildeo a outros seres racionais deve ser ele sempre considerado simultaneamente como fim
Partindo da premissa de que para Immanuel Kant o homem eacute o fim em si mesmo
ldquodevemos compreender que a dignidade da pessoa humana eacute a noccedilatildeo o comando a direccedilatildeo
que se deve seguir funcionando como fundamento para a interpretaccedilatildeo de todos os direitos e
garantias conferidos agrave pessoa nos ordenamentos juriacutedicos de cada Estadordquo 83
79 Ibid sem paginaccedilatildeo 80 Ibid sem paginaccedilatildeo 81 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito
fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 461 82 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud KANT Immanuel Fundamentaccedilatildeo da metafiacutesica dos costumes
Satildeo Paulo Martin Claret 2003 p56-59 Coleccedilatildeo A Obra-Prima de Cada Autor 83 SCHIAFIANO Juliana Rocha op cit p 461
37
O princiacutepio constitucional da dignidade da pessoa humana estaacute diretamente ligado ao
conteuacutedo dos direitos fundamentais logo para que se cumpra com os direitos fundamentais
constitucionalmente instituiacutedos eacute necessaacuterio reconhecer e respeitar a dignidade da pessoa
humana conforme disciplina Ingo Sarlet84
Em suma o que se pretende sustentar de modo mais enfaacutetico eacute que a dignidade da pessoa humana na condiccedilatildeo de valor (principio normativo) fundamental que atrai o conteuacutedo de todos os direitos fundamentais exige e pressupotildee o reconhecimento e proteccedilatildeo dos direitos fundamentais de todas as dimensotildees (ou geraccedilotildees se assim preferirmos) Assim sem que se reconheccedilam agrave pessoa humana os direitos fundamentais que lhe satildeo inerentes em verdade estarse-aacute lhe negando a proacutepria dignidade A consagraccedilatildeo constitucional da dignidade da pessoa humana tem o propoacutesito de limitar a atuaccedilatildeo ou a omissatildeo do Estado para garantir os direitos do indiviacuteduo Assim eacute difiacutecil precisar os efeitos da norma que determina a dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado (como acontece com a Constituiccedilatildeo brasileira de 1988) poreacutem quando desrespeitados os direitos fundamentais do cidadatildeo eacute possiacutevel identificar que a dignidade deste foi violada
Logo ldquoteraacute respeitada a sua dignidade o individuo que tiver respeitados os seus
direitos fundamentaisrdquo 85 Os direitos fundamentais estatildeo apresentados na Constituiccedilatildeo
Federal da seguinte forma direitos individuais e coletivos direitos sociais direitos poliacuteticos e
direitos de nacionalidade que tecircm como escopo garantir as liberdades positivas aos
indiviacuteduos ldquoonde foram conquistados direitos agrave liberdade religiosa liberdade civil e
profissional agrave propriedade ao livre acesso ao Judiciaacuterio agrave ampla defesa e ao contraditoacuterio no
processual judicial ao sigilo de dados e informaccedilotildees pessoais entre outros que somados
garantem o cidadatildeo uma vida dignardquo 86
O cidadatildeo na Constituiccedilatildeo Federal de 88 diferente das constituiccedilotildees brasileiras
anteriores passou a ser fundamento e ganhou destaque nos direitos fundamentais tendo
garantida a sua vida a sua dignidade a sua seguranccedila a sua honra a sua liberdade e a sua
propriedade
84 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud SARLET Ingo Wolfgang Dignidade da pessoa humana e
direitos fundamentais na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 2ed Porto Alegre Livraria do Advogado 2002 p87 85 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito
fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 462 86 Ibid p 462
38
Segundo Carmem Luacutecia Antunes Rocha87 para garantir o Estado Democraacutetico de
Direito eacute necessaacuterio que a sua atuaccedilatildeo seja sempre em conformidade com o princiacutepio da
dignidade da pessoa humana
O Estado somente eacute democraacutetico em sua concepccedilatildeo constitucionalizaccedilatildeo e atuaccedilatildeo quando respeita o princiacutepio da dignidade da pessoa humana Natildeo haacute verbo constitucional natildeo haacute verbo governamental que se faccedilam legiacutetimos quando natildeo se voltam ao atendimento daquele princiacutepio Natildeo haacute verdade constitucional natildeo haacute suporte institucional para as poliacuteticas puacuteblicas que natildeo sejam destinadas ao pleno cumprimento daquele valor maior transformado em princiacutepio constitucional
O princiacutepio da dignidade humana constitucionalmente garantido impotildee limites ao
Estado compelindo aos oacutergatildeos e atividades estatais respeitar o ser humano e garanti-lo
condiccedilotildees miacutenimas para uma vida digna Dessa forma eacute niacutetido que o dito princiacutepio eacute
pressuposto e indispensaacutevel para legitimar outras normas constitucionais e
principalmente infraconstitucionais
O Coacutedigo de Processo Civil eacute umas das principais normas infraconstitucionais que
sofre influecircncia dos preceitos valores e princiacutepios esculpidos na Constituiccedilatildeo Federal
Logo como o principio da dignidade humana eacute um dos mais importantes pressupostos
constitucionais ldquoentatildeo eacute tranquilo afirmar-se que o novel ordenamento processual tem
de se render nas resoluccedilotildees dos aspectos processuais e a fim de se atingir uma soluccedilatildeo
justa adequada e efetiva ao postulado da dignidade da pessoa humanardquo 88
Dessa forma o legislador deve formular as normas infraconstitucionais de acordo e a
partir do conteuacutedo constitucional para Marinoni Mitidiero e Arenhart89
() o Coacutedigo de Processo Civil constitui direito constitucional aplicado O Coacutedigo deve ser interpretado de acordo com a Constituiccedilatildeo e com os direitos fundamentais o que significa que as duacutevidas interpretativas devem ser resolvidas a favor da otimizaccedilatildeo do alcance da Constituiccedilatildeo e do processo civil como meio para tutela de direitos
87 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud ROCHA Carmen Luacutecia Antunes O princiacutepio da dignidade da
pessoa humana e a exclusatildeo social Revista Interesse Puacuteblico n4 p23-48 1999 p33 88 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o
novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 367
89 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 14
39
Com o escopo de conferir eficaacutecia aos mandamentos constitucionais o CPC15 traz a
previsatildeo e diversas claacuteusulas gerais em seus primeiros artigos em um dos quais se
prestigia o princiacutepio da dignidade da pessoa humana
O referido princiacutepio estaacute disciplinado no artigo 8ordm do CPC15 e atua como um guia
sobre as demais normas do coacutedigo processual Eacute o que entende Nelson Rosenvald90
O maior cuidado do inteacuterprete eacute no sentido de jamais banalizar a dignidade fazendo dela um elixir processual tal como muitas vezes se vecirc na esfera do direito civil Penso que natildeo haacute maiores dificuldades em transpor a noccedilatildeo constitucional do princiacutepio para em seguida adaptaacute-la agraves singularidades do processo
Logo de acordo com o artigo 8ordm do CPC o oacutergatildeo julgador ao aplicar o ordenamento
juriacutedico deve resguardar a dignidade da pessoa humana Para Fredie Didier91 ldquoresguardar
nesse contexto eacute de um lado aplicar corretamente a norma juriacutedica lsquoproteccedilatildeo da dignidade
da pessoa humanarsquo e de outro natildeo violar a dignidaderdquo
O oacutergatildeo julgador deveraacute manter um comportamento ativo com o objetivo de promover
a dignidade da pessoa humana podendo tomar medidas de ofiacutecio para efetivar a dignidade da
pessoa humana Didier assevera que o magistrado poderaacute ainda ldquovaler-se da claacuteusula geral de
atipicidade (art 536 sect 1ordm) para a execuccedilatildeo do direito fundamental agrave dignidaderdquo 92 O autor
ainda traz dois exemplos
a) exigecircncia de respeito agrave ordem cronoloacutegica de conclusatildeo (art 12) caso de grave violaccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana que natildeo se encaixe em um dos incisos que excepcionam a regra de observacircncia da cronologia da conclusatildeo poderia o juiz ldquofurar a filardquo para promover a dignidade da pessoa humana b) prioridade na tramitaccedilatildeo processual pessoa que seja portadora de doenccedila grave mas que natildeo esteja no rol do art 1048 I para promover a dignidade de pessoa humana o juiz poderia determinar o processamento prioritaacuterio93
Essa dupla garantia ndash resguardo e promoccedilatildeo ndash tem como objetivo garantir ao individuo
sua dignidade humana fazendo com que ldquode um lado que o Estado natildeo a viole e de outro
que o Estado a promova e efetiverdquo
90 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud ROSENVALD Nelson A
dignidade da pessoa humana no CPC15 91 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte
geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 75 92 Ibid p 75 93 Ibid p 75
40
Nessa senda o magistrado deveraacute promover a dignidade da pessoa humana quando
perceber a ausecircncia desta no processo ou assegura-la quando for posta em risco Eacute nesse
sentido o entendimento dos professores Marinoni Mitidiero e Arenhart94
() a dignidade da pessoa humana determina a compreensatildeo do processo civil como um meio para tutela dos direitos Vale dizer o processo civil natildeo pode ser visto como um instrumento a serviccedilo do Estado como um instrumento que natildeo se encontre orientado agrave realizaccedilatildeo dos fins da pessoa humana Em outras palavras o processo civil serve para realizaccedilatildeo dos direitos e para orientaccedilatildeo das pessoas a respeito do significado do direito
Nessa senda compete tanto ao juiz quanto as demais partes processuais garantirem ldquoo
valor intriacutenseco de cada vida que eacute trazida ao processordquo nas palavras de Alexandre Freitas
Cacircmara95
() aos sujeitos do processo eacute preciso sempre ter claro que os titulares dos interesses em conflitos satildeo pessoas reais cujas vidas seratildeo afetadas pelo resultado do processo e que por isso mesmo tecircm o direito de estabelecer suas estrateacutegias processuais de acordo com aquilo que lhes pareccedila melhor para suas vidas Eacute inadmissiacutevel tratar as partes como se natildeo fossem pessoas reais meros dados estatiacutesticos Afinal se para o Judiciaacuterio cada processo pode parecer apenas mais um processo para as partes cada processo pode ser o uacutenico o mais relevante aquele em que sua vida seraacute decidida E eacute dever do juiz assegurar que isto seja respeitado
Dessa forma eacute necessaacuterio que um arcabouccedilo normativo para que seja conferida
eficaacutecia e proteccedilatildeo ao principio da dignidade da pessoa humana
Logo o dito princiacutepio deve ser protegido em todas as esferas do ordenamento juriacutedico
inclusive no campo da execuccedilatildeo civil onde sofre grandes riscos de ser violado em nome do
direito fundamental agrave tutela executiva do credor ldquoPartir da premissa de que existe um direito
fundamental agrave tutela executiva ora ratificado pelo CPC eacute indispensaacutevel para a soluccedilatildeo de
diversos problemas oriundos do procedimento executivo principalmente aqueles relacionados
agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo 96
94 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme
MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 25
95 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CAcircMARA Alexandre Freitas O Novo Processo Civil Brasileiro 2 ed Satildeo Paulo Atlas 2016 p 7
96 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66
41
Eacute o caso por exemplo da impenhorabilidade Segundo Fredie Didier et al97 a
impenhorabilidade eacute uma forma de proteger certos bens do devedor do direito fundamental a
execuccedilatildeo do credor
Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa
Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais
O legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do CPC fazendo um
preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses em anaacutelise ao optar pela mitigaccedilatildeo do direito
do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado Afinal ldquoa execuccedilatildeo natildeo pode ser utilizada
como instrumento para causar a ruiacutena a fome e o desabrigo do devedor e sua famiacutelia gerando
situaccedilotildees incompatiacuteveis com a dignidade da pessoa humana 98
Logo a impenhorabilidade de certos bens
[] Eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa99
Eacute nesse sentido que o CPC15 enumera diversos casos de bens patrimoniais que satildeo
impenhoraacuteveis como o salaacuterio e vencimentos utensiacutelios necessaacuterios ao exerciacutecio da
profissatildeo seguro de vida vestuaacuterios e pertences de uso pessoal entre outros
Dessa forma as regras relativas agraves medidas executivas devem ser interpretadas agrave luz
da Constituiccedilatildeo Federal ldquovez que se voltam agrave realizaccedilatildeo de direitos fundamentais e em sua
97 Ibid p 66 98 THEODORO JUacuteNIOR Humberto Novo Coacutedigo de Processo Civil Anotado 20 ed Rio de Janeiro
Forense 2016 p 978 99 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud DIDIER JR Fredie CUNHA
Leonardo Carneiro da BRAGA Paula Sarno OLIVEIRA Rafael Alexandria de Curso de direito processual civil 3 ed Salvador JusPodivm 2011 v 5 p 547
42
realizaccedilatildeo podem atingir direitos fundamentaisrdquo 100 O Superior Tribunal de Justiccedila jaacute decidiu
que
O rol das impenhorabilidades do ordenamento paacutetrio objetiva preservar o miacutenimo patrimonial necessaacuterio agrave existecircncia digna do executado impondo ao processo executoacuterio certos limites Assim a depender das peculiaridades do caso as regras de impenhorabilidade podem ser ampliadas de modo a adequar a tutela aos direitos fundamentais como por exemplo o direito agrave moradia agrave sauacutede ou agrave dignidade da pessoa humana Trata-se portanto da aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo e da necessidade sob o enfoque da proporcionalidade101 (STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014)
Logo a interpretaccedilatildeo dos dispositivos que tratam sobre a penhora no CPC deve estaacute
diretamente ligada aos ditames constitucionais devendo o interprete privilegiar a opccedilatildeo que
esteja mais em sintonia com a Carta Magna para que nem o credor e nem o devedor sejam
lesados
O artigo 833 do CPC elenca uma seacuterie de incisos que expotildeem os bens impenhoraacuteveis
O trecho inicial inciso I do art 833 define como impenhoraacuteveis os bens inalienaacuteveis Este
inciso segue a regra de que ldquose o bem natildeo pode ser alienado tambeacutem natildeo pode ser penhorado
porque a penhora eacute o primeiro ato do procedimento de alienaccedilatildeo judicial do bemrdquo 102
Satildeo exemplos de bens inalienaacuteveis os puacuteblicos cuja alienaccedilatildeo depende de autorizaccedilatildeo
legislativa Eacute inalienaacutevel tambeacutem o capital constituiacutedo para garantir indenizaccedilatildeo de ato iliacutecito
(art 533 sect 1 ordm CPC) que portanto eacute tambeacutem impenhoraacutevel ldquoTodo bem inalienaacutevel eacute
impenhoraacutevel embora nem todo bem impenhoraacutevel seja inalienaacutevelrdquo 103
O inciso I do art 833 CPC tambeacutem consagra a impenhorabilidade dos bens que por
ato voluntaacuterio satildeo excluiacutedos da execuccedilatildeo
Segundo Fredie Didier et al104
Eacute o que ocorre nos casos de bens doados ou alienados com claacuteusula de inalienabilidade que haacute de constar no registro imobiliaacuterio para ser eficaz perante o exequente e minimizar o risco de fraude A propoacutesito eis a redaccedilatildeo do art 1911 do Coacutedigo Civil lsquolsquoA claacuteusula de inalienabilidade imposta aos bens por ato de liberalidade implica impenhorabilidade e incomunicabilidaderdquo
100 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MEDINA Joseacute Miguel Garcia
Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 1 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 p 736 101 STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014 102 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 824 103 Ibid p 824 104 Ibid p 825
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O inciso II por sua vez estabelece que satildeo impenhoraacuteveis os bens moacuteveis os
pertences e as utilidades domeacutesticas da residecircncia do executado Todavia excepcionam-se os
bens dessa natureza que sejam de elevado valor ou que ultrapassem as necessidades comuns
correspondentes a um meacutedio padratildeo de vida
A jurisprudecircncia natildeo eacute paciacutefica sobre o assunto logo natildeo exista uma relaccedilatildeo de bens
que podem ser atingidos pela penhora Abrindo margem para as mais variadas decisotildees
O STJ jaacute considerou impenhoraacuteveis aparelho de televisatildeo a cores mesa de centro passadeira raacutedio toca-fitas gravador microondas ar-condicionado um freezer um microcomputador com acessoacuterios uma impressora etc Poderatildeo ser penhorados porque ultrapassam o padratildeo-meacutedio aparelhos de TV mais sofisticados o segundo aparelho de televisatildeo a segunda geladeira aparelhos de ar-condicionado que satildeo verdadeiras peccedilas de design moacuteveis antigos que se transformam em peccedilas de decoraccedilatildeo faqueiro de prata adega climatizada etc Em entendimento de caraacuteter ainda mais geneacuterico jaacute restou consignado em determinado precedente que a proteccedilatildeo natildeo abrangeria apenas os bens indispensaacuteveis agrave moradia mas tambeacutem aqueles usualmente encontrados em um lar105
Ademais o inciso III do art 833 do CPC traz a impenhorabilidade dos vestuaacuterios bem
como os pertences de uso pessoal do executado salvo se de elevado valor
Segundo Fredie Didier et al106 o dispositivo possui dois propoacutesitos
de um lado preservar a dignidade do executado com a proteccedilatildeo de bens moacuteveis importantes para a sua sobrevivecircncia digna como o vestuaacuterio aparelho celular reloacutegio e os bens relacionados agrave sua higiene pessoal de outro lado a regra visa prestigiar a boa-feacute processual impedindo a execuccedilatildeo mesquinha e abusiva com a penhora de bens de pequeno ou nenhum valor como um pente ou uma bota
O inciso IV do art 833 do CPC consagra uma das mais importantes modalidades a
impenhorabilidade relativa aos rendimentos de natureza alimentar ldquoTrata-se de regra que
possui o claro propoacutesito de proteger o executado garantindo-lhe o recebimento de valores que
servem ao pagamento das despesas relacionadas agrave sua sobrevivecircncia digna e agrave da sua famiacuteliardquo 107
Jaacute inciso V do art 833 do CPC torna impenhoraacuteveis os livros as maacutequinas as
ferramentas os utensiacutelios os instrumentos ou outros bens moacuteveis necessaacuterios ou uacuteteis ao
exerciacutecio de qualquer profissatildeo 105 Ibid p 826 106 Ibid p 827 107 Ibid p 828
44
Por forccedila do paraacutegrafo 3ordm do art 833 satildeo igualmente impenhoraacuteveis os equipamentos
implementos e maacutequinas agriacutecolas pertencentes agrave pessoa fiacutesica ou a empresa individual
produtora rural Rodrigo Mazzei e Sarah Merccedilon108 esclarecem que
Tem assento na noccedilatildeo de que a dignidade estende-se tambeacutem ao exerciacutecio da profissatildeo em si mesma e tambeacutem por representar a forma por excelecircncia de que dispotildee o executado para continuar a receber sua remuneraccedilatildeo e por conseguinte prover seu sustento e de sua famiacutelia Trata-se tambeacutem de aplicaccedilatildeo pontual da funccedilatildeo social da propriedade jaacute que protege os bens que permitem a circulaccedilatildeo de riquezas para a subsistecircncia do executado e se for o caso de sua famiacutelia
Forccediloso ressaltar ainda que a impenhorabilidade do inc V alcanccedila apenas os bens
moacuteveis de modo que eacute absolutamente possiacutevel que o imoacutevel em que o executado exerccedila sua
atividade profissional seja penhorado conforme a Suacutemula 451 do STJ ldquoEacute legiacutetima a penhora
da sede do estabelecimento comercialrdquo
O inciso VI do art 833 do CPC versa sobre a impenhorabilidade do seguro de vida
ldquoTrata-se de impenhorabilidade em favor do beneficiaacuterio do seguro e natildeo do segurado ateacute
porque o valor do seguro natildeo compotildee nem comporaacute o seu patrimocircnio (art794 do Coacutedigo
Civil1 ordm7)rdquo Dessa forma ldquoem uma execuccedilatildeo contra o segurado natildeo seraacute possiacutevel a penhora
do seguro de vida pois se trata de bem que natildeo lhe pertence nem mesmo em expectativardquo
De acordo com o inciso VII do art 833 do CPC satildeo impenhoraacuteveis os materiais
necessaacuterios para obras em andamento salvo se essas forem penhoradas Logo a obra pode
ser penhorada (art 862 do CPC) ldquoA regra como bem lembrou Araken de Assis lsquoestimula a
penhora da proacutepria obra inconclusa agrave qual os materiais acrescem e conseguintemente
valorizamrsquo 109
O art 833 VIII CPC julga impenhoraacutevel a pequena propriedade rural assim
definida em lei desde que trabalhada pela famiacutelia reproduzindo parte do art 5ordm XXVI CF
88116 que disciplina a impenhorabilidade do referido bem
A proteccedilatildeo do CPC eacute mais ampla do que a garantia prevista na Constituiccedilatildeo Federal
tendo em vista que a impenhorabilidade natildeo se restringe agraves execuccedilotildees de deacutebitos decorrentes
de sua atividade produtiva podendo ser alegada em toda e qualquer execuccedilatildeo ldquoAssim o 108 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CABRAL Antonio Passo
CRAMER Ronaldo (orgs) Comentaacuterios ao Novo Coacutedigo de Processo Civil Rio de Janeiro Forense 2015 p 1194
109 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 835
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imoacutevel natildeo pode ser penhorado na execuccedilatildeo de creacutedito rural concedido para estimular a
produccedilatildeo agriacutecola mas poderaacute ser penhorado na execuccedilatildeo do creacutedito concedido para a
aquisiccedilatildeo do imoacutevelrdquo 110
A nona modalidade de impenhorabilidade trata-se dos recursos puacuteblicos recebidos por
instituiccedilotildees privadas para aplicaccedilatildeo compulsoacuteria em educaccedilatildeo sauacutede ou assistecircncia social ldquoA
proteccedilatildeo eacute louvaacutevel e tutela toda a coletividade ao privilegiar o direito agrave educaccedilatildeo sauacutede e
assistecircncia social em detrimento do direito do credorrdquo
De acordo com o inciso X do art 833 do CPC eacute impenhoraacutevel ateacute o limite de
quarenta salaacuterios miacutenimos a quantia depositada em caderneta de poupanccedila
Eacute uma modalidade de impenhorabilidade relativa (o CPC73 a considerava absoluta)
tendo em vista que essa impenhorabilidade natildeo pode ser oposta na execuccedilatildeo de alimentos
independentemente da sua origem (art 833 sect 2ordm do CPC) Fredie Didier et al cita Araken de
Assis111 ao afirmar que
a regra soacute protege essa aplicaccedilatildeo financeira Se o valor estiver depositado em fundo de investimento por exemplo poderaacute ser penhorado Se o devedor tiver vaacuterias cadernetas de poupanccedila a impenhorabilidade aplica-se agrave soma de todas elas e natildeo a cada uma delas isoladamente do contraacuterio valores expressivos poderiam ser pulverizados em vaacuterias contas burlando a finalidade da regra que eacute a de proteger a populaccedilatildeo de baixa renda
Ademais satildeo tambeacutem impenhoraacuteveis por forccedila do inciso XI os recursos puacuteblicos do
fundo partidaacuterio recebidos por partido poliacutetico nos termos da lei Essa modalidade de
impenhorabilidade ldquose restringe aos recursos puacuteblicos do fundo partidaacuterio Recursos de
origem privada recebidos pelo partido poliacutetico poderatildeo ser penhoradosrdquo 112 O processualista
Fredie Didier et al113 assevera que
Assim a impenhorabilidade foi estabelecida no intuito de impedir que os diretoacuterios nacionais de partidos poliacuteticos respondam por diacutevida dos diretoacuterios
110 Ibid p 836 111 DIDIER JR Fredie et al apud ASSIS Araken de Manual da execuccedilatildeo 11ordm ed cit p 225 Assim
tambeacutem REDONDO Bruno Garcia LOJO Maacuterio Vitor Suarez Penhora cit p 117 BUENO Cassio Scarpinella Curso sistematizado de Direito Processual Civil v 3 cit p 228 GIANNICO Mauriacutecio As novas reformas do CPC e de outras normas processuais Mauriacutecio Giannico e Viacutetor Joseacute de Mello Monteiro (coord) Satildeo Paulo Saraiva 2009 p 1 OS Em sentido diverso estendendo a impenhorabiacutelidade aos depoacutesitos feitos ateacute esse valor em CDB CDI fundos de renda fixa ou de accedilotildees RODRIGUES Marcelo Abelha Manual de execuccedilatildeo civil 3deg ed cit p 101
112 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 839
113 Ibid p 839
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estaduaismunicipais - sobretudo em razatildeo das vaacuterias decisotildees judiciais que determinaram penhora de recursos do fundo partidaacuterio de alguns partidos
Por fim o inciso XII do artigo 833 do CPC trata sobre a impenhorabilidade dos
creacuteditos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias sob o regime de incorporaccedilatildeo imobiliaacuteria
vinculados agrave execuccedilatildeo de obra ldquoO objetivo dessa modalidade eacute evitar que diacutevidas do
incorporador possam consumir os recursos que seriam utilizados na realizaccedilatildeo da obra em
prejuiacutezo dos adquirentes de unidades autocircnomasrdquo 114
O professor Misael Montenegro Filho115 aduz sobre que ldquoao estabelecer a
impenhorabilidade dos creacuteditos oriundos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias o novo CPC
protegeu os valores destinados agrave execuccedilatildeo da obra e agrave entrega das unidades imobiliaacuterias aos
adquirentes assegurando assim a execuccedilatildeo da promessa contratualrdquo
Importante frisar ainda que a Lei nordm 8009 1990 instituiu a impenhorabilidade do
imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar por qualquer diacutevida salvo as exceccedilotildees dos
seus arts 3ordm e 4ordm
A referida lei dispotildee que Para os efeitos de impenhorabilidade considera-se
residecircncia um uacutenico imoacutevel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia
permanente (art 5ordm)
O processualista baiano Fredie Didier et al116 assevera que
A lei propotildee-se a proteger imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar nos termos acima expostos A CF 88 ampliou o conceito de entidade familiar para abranger a famiacutelia monoparental e a uniatildeo estaacutevel Mas deve considerar-se aiacute compreendidos os irmatildeos que vivem juntos e a uniatildeo homossexual Ateacute o solteiro estaacute abrangido pela impenhorabilidade se reside soacute no imoacutevel - isso em nome da proteccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana e da moradia digna Na verdade houve uma mudanccedila de compreensatildeo acerca do sentido da proteccedilatildeo de proteccedilatildeo da famiacutelia agrave proteccedilatildeo da moradia indispensaacutevel agrave preservaccedilatildeo da dignidade da pessoa
114 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o
novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 388
115 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MONTENEGRO FILHO Misael Novo Coacutedigo de Processo Civil Comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Atlas 2016 p 752
116 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 840-841
47
O STJ jaacute consolidou esse entendimento na suacutemula nordm 364 O conceito de
impenhorabilidade de bem de famiacutelia abrange tambeacutem o imoacutevel pertencente a pessoas
solteiras separadas e viuacutevas
Entretanto se o casal ou entidade familiar possuir vaacuterios imoacuteveis utilizados como
residecircncia a impenhorabilidade recairaacute sobre o de menor valor (art 5ordm paraacutegrafo uacutenico) ldquoEacute o
que ocorre por exemplo quando a famiacutelia se divide em mais de uma cidade por motivos
profissionaisrdquo 117
Forccediloso observar ainda que a impenhorabilidade do imoacutevel familiar eacute relativa jaacute que
natildeo pode ser oposta a qualquer creacutedito O art 3ordm da Lei n 8009 1990151 em que pode ser
penhorada a residecircncia da famiacutelia (exemplo execuccedilatildeo de alimentos para cobranccedila de taxas
devidas em funccedilatildeo do imoacutevel familiar etc)
Resta claro que o artigo 833 do CPC ao disciplinar as hipoacuteteses de impenhorabilidade
possui o escopo de proteger o princiacutepio da dignidade humana Entretanto algumas claacuteusulas
natildeo possuem proteccedilatildeo absoluta ldquoa sua relativizaccedilatildeo a depender do caso sob exame deve ser
realccedilada agrave medida que a dignidade resguardada e protegida pelo sistema processual-
constitucional natildeo se limita ao executadordquo 118 Ademais ldquoEacute premente advertidamente que a
dignidade do credor tambeacutem seja garantida em juiacutezo tendo como norte pois os princiacutepios da
proporcionalidade e razoabilidaderdquo 119
117 Ibid p 841 118 Ibid p 752 119 Ibid p 752
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4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA
ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE
HUMANA DO EXECUTADO
41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE
EFETIVACcedilAtildeO
Como jaacute exposto em linhas preteacuteritas nos meios executivos tiacutepicos as medidas
executivas satildeo determinadas pela lei ou seja o oacutergatildeo pode aplicar somente as medidas
tipificadas no ordenamento juriacutedico No entanto ao se tratar das medidas executivas atiacutepicas
eacute necessaacuterio que haja um limite na atuaccedilatildeo realizada pelo juiz
O poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo poder ser realizado de maneira indiscriminada haacute
pressupostos e premissas a serem observadas Dessa forma a primeira premissa eacute no sentindo
de que a medida executiva atiacutepica natildeo pode ser a primeira medida a ser invocada ldquomuito ao
reveacutes a regra do nosso sistema continua a ser o da tipicidade dos meios executivos soacute que
agora temperado pelo sistema atiacutepicordquo 120 O processualista Thiago Rodovalho explica que
ldquo() os meios atiacutepicos natildeo satildeo prima ratio e sim a ultima ratio eacute dizer esgotados e
frustrados os meios executivos tiacutepicos e ordinaacuterios pode-se em tese valer-se do sistema
atiacutepicordquo121
Dessa forma nos casos de execuccedilatildeo que tenha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
natildeo deve ser aplicado de logo as medidas indutivas e coercitivas Apenas apoacutes frustradas as
medidas ldquonaturaisrdquo pode-se passar agrave aplicaccedilatildeo das medidas atiacutepicas
Uma segunda premissa diz a respeitos dos meios de pressatildeo para compelir o devedor a
adimplir com o seu deacutebito ldquoEssa segunda premissa decorre inclusive de imperiosidade
loacutegica de nada adianta a medida de pressatildeo se a obrigaccedilatildeo natildeo tem como ser adimplida pelo
devedorrdquo 122
Para Thiago Rodovalho123 ldquoIsso quer significar que esgotados e frustrados os meios
tiacutepicos o juiz se valeraacute dos meios atiacutepicos se eles forem potencialmente haacutebeis a estimular ou
120 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da
atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018
121 Ibid sem paginaccedilatildeo 122 Ibid sem paginaccedilatildeo 123 Ibid sem paginaccedilatildeo
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forccedilar o cumprimento o que pressupotildee sua possibilidade quando entatildeo eles poderatildeo ser
eficazesrdquo
Logo nas obrigaccedilotildees de pagar quantia se houver a real demonstraccedilatildeo da
impossibilidade financeira do devedor seria um constrangimento inuacutetil e desnecessaacuterio a
imposiccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo para forccedilar o cumprimento
Por isso as medidas atiacutepicas devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o
esgotamento das medidas tiacutepicas e a possibilidade de cumprimento de cumprimento da
obrigaccedilatildeo
Ademais superadas as supracitadas premissas e o oacutergatildeo julgador vislumbrando a
necessidade da aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo se faz necessaacuterio que um conjunto de
postulados e princiacutepios rejam a atuaccedilatildeo do oacutergatildeo julgador servindo de norte para a escolha da
medida executiva mais adequada ldquoDe modo geral a escolha deve pautar-se nos postulados da
proporcionalidade da razoabilidade (art8ordm CPC) e da proibiccedilatildeo de excesso bem como nos
princiacutepios da eficiecircncia e da menor onerosidade da execuccedilatildeordquo 124
O professor Fredie Didier et al125 eacute categoacuterico ao citar Humberto Aacutevila
Segundo Humberto Aacutevila o postulado da proporcionalidade se manifesta nas situaccedilotildees em que haacute uma relaccedilatildeo de causalidade entre dois elementos empiricamente discerniacuteveis um meio e um fim de tal sorte que se possa proceder aos trecircs exames fundamentais o da adequaccedilatildeo (o meio promove o fim) o da necessidade (dentre os meios disponiacuteveis e igualmente adequados para promover o fim natildeo haacute outro meio menos restritivo do(s) direito(s) fundamental (is) afetado(s)) e o da proporcionalidade em sentido estrito (as vantagens trazidas pela promoccedilatildeo do fim correspondem agraves desvantagens provocadas pela adoccedilatildeo do meio)
O juiz ao aplicar a medida executiva atiacutepica ao caso concreto deve ter seu
embasamento no princiacutepio da proporcionalidade para saber se a medida a ser tomada eacute a
melhor opccedilatildeo ao caso sub judice ldquoO exame de proporcionalidade aplica-se sempre que
houver uma medida concreta destinada a realizar uma finalidaderdquo 126
Em verdade a aplicaccedilatildeo do princiacutepio da proporcionalidade eacute imprescindiacutevel na adoccedilatildeo
dos meios executivos atiacutepicos tendo em vista que ldquo() tais medidas em especial quando de
124 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111 125 DIDIER JR Fredie et al apud AVILA Humberto Teoria dos princiacutepios da definiccedilatildeo agrave aplicaccedilatildeo
dos princiacutepios juriacutedicos 16 ed Satildeo Paulo Malheiros 2015 p 205 126 DIDIER JR Fredie et al op cit p 111
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natureza coercitiva podem restringir direitos do devedor e incidir diretamente sobre sua
pessoardquo127 Logo ainda que o princiacutepio da efetividade da tutela executiva seja um direito
fundamental o mesmo ldquo() deve ser compatibilizado com direitos fundamentais do
executado para que a sua dignidade humana seja preservadardquo 128
Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Neves129 afirma que em nome do princiacutepio da
proporcionalidade o juiz deveraacute
() ponderar no caso concreto as vantagens praacuteticas da adoccedilatildeo de cada medida executiva atiacutepica em especial as de natureza coercitiva e as desvantagens de sua adoccedilatildeo levando em conta a possibilidade de a medida criar uma limitaccedilatildeo excessiva ao exerciacutecio de direito fundamental do executado
Outro princiacutepio que o oacutergatildeo julgador deve se ater ao escolher a medida executiva
atiacutepica eacute o da razoabilidade Segundo Fredie Didier et al 130 o princiacutepio (ou postulado)131 se
manifesta de trecircs formas
a) como dever de equidade a exigir a harmonizaccedilatildeo da norma geral com o caso individual impondo a consideraccedilatildeo daquilo que normalmente acontece em detrimento do que eacute extraordinaacuterio e tambeacutem impondo a consideraccedilatildeo das especificidades do caso concreto ante a generalidade da norma b) como dever de congruecircncia a exigir a harmonizaccedilatildeo das normas com suas condiccedilotildees externas de aplicaccedilatildeo (isto eacute com a realidade com base em que foram editadas) c) como dever de equivalecircncia a exigir uma relaccedilatildeo de equivalecircncia entre a medida adotada e o criteacuterio que a dimensiona
Logo ldquo() o princiacutepio da razoabilidade deve nortear a atuaccedilatildeo do juiz na adoccedilatildeo das
medidas executivas atiacutepicas previstas no art 139 IV do Novo CPCrdquo 132 tendo em vista que
ldquo() mesmo medidas que pelo princiacutepio da proporcionalidade podem se mostrar
abstratamente possiacuteveis de adoccedilatildeo no caso concreto podem se mostrar inadequadas e
irrazoaacuteveisrdquo 133
127 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Medidas executivas atiacutepicas na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de
pagar quantia certa art 139 IV do novo CPC Revista de Processo v 42 n 265 mar 2017 p 14 128 Ibid p 14 129 Ibid p 14 130 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111-112 131 Segundo Fredie Didier et al o postulado eacute uma norma que atua sobre a aplicaccedilatildeo de outras normas
A proporcionalidade e a razoabilidade seriam postulados normativos e natildeo princiacutepios segundo essa concepccedilatildeo 132 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo op cit p 14 133 Ibid p 14
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Ademais conforme dispotildee o postulado da proibiccedilatildeo de excesso ldquoa realizaccedilatildeo de uma
regra ou princiacutepio constitucional natildeo pode conduzir agrave restriccedilatildeo a um direito fundamental que
lhe retire um miacutenimo de eficaacuteciardquo 134
A proibiccedilatildeo de excesso deveraacute sempre ser suscitada quando um direito fundamental
houver sido violado a ponto do direito fundamental sofrer violaccedilatildeo excessiva Ademais ldquoesse
postulado natildeo se confunde com o da proporcionalidade porque ele dispensa os exames da
adequaccedilatildeo (relaccedilatildeo meiofim) da necessidade (exigibilidade) ou da proporcionalidade em
sentido estrito (ponderaccedilatildeo entre vantagens e desvantagens)rdquo 135
Logo ldquopouco importa a relaccedilatildeo meiofim ou a exigibilidade da medida ou ainda a
ponderaccedilatildeo com outro direito fundamental eventualmente em jogo aqui se analisa apenas a
eficaacutecia de um determinado direito fundamentalrdquo 136
O princiacutepio da eficiecircncia tem previsatildeo constitucional no art 37 e previsatildeo
infraconstitucional no art 8ordm do CPC15 O referido princiacutepio determina que o processo seja
conduzido de forma eficiente pelo oacutergatildeo jurisdicional
Entende-se que eficiente eacute a atuaccedilatildeo que utilize adequadamente os meios necessaacuterios
para que se atinjam os fins almejados O oacutergatildeo jurisdicional na escolha dos meios a serem
utilizados para a obtenccedilatildeo dos fins
a) deve escolher aqueles que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo (deve evitar meios que promovam resultados insignificantes) b) deve escolher meios que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado (natildeo se pode escolher um meio de resultado duvidoso) c) natildeo pode escolher um meio que produza muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscado 137
O juiz deveraacute igualmente analisar o princiacutepio da menor onerosidade da execuccedilatildeo que
eacute previsto pelo art 805 do CPC ldquoArt 805 Quando por vaacuterios meios o exequente puder
promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o
executadordquo
134 134 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 112 135 Ibid p 112 136 Ibid p 112 137 Ibid p 112-113
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Logo ldquohavendo duas opccedilotildees igualmente eficazes para permitir alcanccedilar o resultado
pretendido (satisfaccedilatildeo do creacutedito) deveraacute o oacutergatildeo julgador valer-se daquela que menos onere
a situaccedilatildeo do executadordquo 138
O dito princiacutepio impede o comportamento abusivo do exequente que possa beneficiar-
se do meio mais danoso ao executado protegendo dessa forma a lealdade e a eacutetica
processual
Os postulados e princiacutepios analisados em linhas preteacuteritas impotildeem ao oacutergatildeo julgador a
observacircncia de alguns criteacuterios para a escolha da medida executiva atiacutepicas a ser utilizada no
caso concreto
Primeiramente a medida executiva atiacutepica deveraacute ser adequada ldquoO criteacuterio da
adequaccedilatildeo impotildee que juiz considere abstratamente uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida
executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia
a gerar o resultadordquo 139 Nesse primeiro momento o juiz deveraacute observar sob a perspectiva do
credor qual medida teraacute o condatildeo de gerar o resultado mais efetivo
Segundo Fredie Didier et al140 o criteacuterio da adequaccedilatildeo eacute
() fortemente inspirado pelo postulado da proporcionalidade e pelo princiacutepio da eficiecircncia na parte em que esse princiacutepio determina a escolha de meios que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo e que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado
Ademais a medida adotada pelo oacutergatildeo julgador deveraacute ser necessaacuteria ldquoEsse criteacuterio
impotildee um limite agrave atuaccedilatildeo judicial funcionando como uma espeacutecie de contrapeso ao criteacuterio
da adequaccedilatildeo Aqui deve-se levar em conta a posiccedilatildeo do devedorrdquo141
O juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental agrave execuccedilatildeo e determinar
uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute necessaacuterio que a
medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado O criteacuterio da necessidade
estabelece que ldquonatildeo se pode ir aleacutem do necessaacuterio para alcanccedilar o propoacutesito almejado Deve
138 Ibid p 113 139 Ibid p 113 140 Ibid p 113 141 Ibid p 114
53
pois o oacutergatildeo julgador determinar o meio executivo na medida do estritamente necessaacuterio para
proporcionar a satisfaccedilatildeo do creacutedito ndash nem menos nem maisrdquo 142
O referido criteacuterio possui forte influecircncia dos postulados da proibiccedilatildeo do excesso e da
razoabilidade assim como do princiacutepio da menor onerosidade para o executado Assevera
Fredie Didier et al143 que
Natildeo eacute razoaacutevel por exemplo impor como primeira opccedilatildeo medida coercitiva a ser suportada pelo agente puacuteblico pelo simples fato de o juiz pressupor que o ente puacuteblico ao qual ele eacute vinculado iraacute descumprir determinada ordem judicial - o descumprimento natildeo pode ser visto como algo ordinaacuterio ou cotidiano (razoabilidade como dever de equidade) Tampouco eacute razoaacutevel eleger a prisatildeo civil como meacutetodo prioritaacuterio para compelir o executado ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer (razoabilidade como dever de equivalecircncia) Aleacutem disso eacute vedada por exemplo a imposiccedilatildeo de multa coercitiva para compelir o executado a emitir declaraccedilatildeo de vontade uma vez que haacute previsatildeo expressa de medida tiacutepica capaz de proporcionar o mesmo resultado sem sacrifiacutecio para o devedor (art 501 CPC)
A afirmaccedilatildeo feita por Bonavides144 em 1997 sobre a adequaccedilatildeo e a necessidade
continua atual sobre os motes
O meio empregado pelo legislador deve ser adequado e necessaacuterio para alcanccedilar o objetivo procurado O meio eacute adequado quando com seu auxiacutelio se pode alcanccedilar o resultado desejado eacute necessaacuterio quando o legislador natildeo poderia ter escolhido outro meio igualmente eficaz mas que natildeo limitasse ou limitasse de maneira menos sensiacutevel o direito fundamental
Por fim a medida deve conciliar os interesses contrapostos ldquoO magistrado deve
ponderar os interesses em jogo aplicando a proporcionalidade em sentido estrito de modo
que as vantagens da utilizaccedilatildeo da medida atiacutepica escolhida superem as vantagens de seu usordquo 145
Esse criteacuterio natildeo privilegia nem o credor nem o devedor e sim a soluccedilatildeo mais
equilibrada e que atenda da melhor forma aos valores em conflito ldquoTrata-se de criteacuterio
inspirado nos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade bem como no princiacutepio da
142 Ibid p 114 143 Ibid p 114 144 BONAVIDES Paulo Curso de Direito Constitucional 7ordm ediccedilatildeo Satildeo Paulo Ed Malheiros 1997
p 372 145 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 114-115
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eficiecircncia na parte em que impotildee ao juiz evitar a escolha do meio executivo que produza
muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscadordquo 146
Cada um dos criteacuterios supracitados devem ser considerados pelo juiz ao aplicar as
medidas executivas atiacutepicas ao caso concreto Para Fredie Didier et al147 as medidas como
retenccedilatildeo de CNH passaporte ou cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado como
forma de pressionaacute-lo ao pagamento da diacutevida pecuniaacuteria natildeo satildeo possiacuteveis
Essas natildeo satildeo medidas adequadas ao atingimento do fim almejado (o pagamento de quantia) - natildeo haacute propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente Tais medidas soam mais como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-lo ao cumprimento da ordem judicial - e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a utilizaccedilatildeo de meios sancionatoacuterios pelo magistrado mas apenas de meios de coerccedilatildeo indireta e sub-rogatoacuterios
Ainda que adequadas fossem a retenccedilatildeo de CNH e do passaporte no corte de fornecimento de aacutegua natildeo parecem ser medidas necessaacuterias (no sentido de exigiacuteveis) uma vez que outras medidas podem em tese ser utilizadas sem causar igual gravame ao executado - como por exemplo a simples restriccedilatildeo do uso de cartotildees de creacutedito A retenccedilatildeo de documentos pessoais eacute medida que termina por restringir a liberdade de ir e vir do executado mostrando-se a princiacutepio natildeo-razoaacutevel por ir de encontro ao dever de equivalecircncia e desproporcional por restringir demais o direito agrave liberdade em favor do direito de creacutedito pecuniaacuterio do exequente
O processualista baiano et al148 cita tambeacutem outro exemplo de medida atiacutepica que natildeo
atingem os criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade
Tampouco parece adequada em princiacutepio determinaccedilatildeo de corte de energia eleacutetrica de todo o preacutedio onde funciona serviccedilo puacuteblico administrativo como forma de pressionar o ente federado a cumprir ordem de nomeaccedilatildeo de candidato em concurso puacuteblico Natildeo parece haver relaccedilatildeo meiofim entre uma coisa e outra Tambeacutem natildeo eacute possiacutevel enxergar essa medida como necessaacuteria no sentido de ser a menos gravosa para o devedor - observe que se trata de medida que uma vez aplicada ensejaria restriccedilatildeo de funcionamento em toda a reparticcedilatildeo puacuteblica em prejuiacutezo de serviccedilos puacuteblicos essenciais ao funcionamento da Administraccedilatildeo o que aleacutem de ser excessivamente gravoso parece natildeo se conformar agrave necessidade de ponderaccedilatildeo dos interesses em jogo - aleacutem de afetar a um sem-nuacutemero de pessoas tomadoras desses serviccedilos
Ademais eacute sabido que toda e qualquer decisatildeo judicial precisa ser fundamentada Ao
se tratar das medidas executivas atiacutepicas o papel da fundamentaccedilatildeo se torna ainda mais
146 Ibid p 115 147 Ibid p 115 148 Ibid p 116
55
importante tendo em vista que eacute pela fundamentaccedilatildeo da decisatildeo que se poderaacute controlar a
adequaccedilatildeo e necessidade da medida atiacutepica
Pelo fato das medidas executivas atiacutepicas derivarem de dispositivos normativos
considerados claacuteusulas gerais propiacutecias as mais variadas interpretaccedilotildees eacute de extrema
importacircncia que o oacutergatildeo julgador fundamente sua decisatildeo
Logo ldquodeve o juiz na fundamentaccedilatildeo decisoacuteria expor racionalmente os motivos da
sua escolha demonstrando com atenccedilatildeo ao art 489 sect 1ordm CPC de que modo a sua opccedilatildeo
atende os criteacuterios da adequaccedilatildeo necessidade e proporcionalidade em sentido estrito ()rdquo 149
Dessa forma os princiacutepios da proporcionalidade e razoabilidade servem para delimitar
o alcance das claacuteusulas gerais de efetivaccedilatildeo fazendo com que o oacutergatildeo julgador se atenha aos
criteacuterios da adequaccedilatildeo e necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao caso
concreto
42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO
EXECUTADO
A entrada em vigor do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 aflorou ainda mais uma
discussatildeo essencial para os processualistas do seacuteculo XXI qual eacute o verdadeiro protagonista do
processo civil
Para os que defendem o ldquoautoritarismo processualrdquo o verdadeiro protagonista do
processo civil eacute o oacutergatildeo judiciaacuterio que em nome do desempenho efetivo de suas funccedilotildees lhes
eacute permitido dilatar os poderes que diga-se de jaacute passagem jaacute compotildeem um vastiacutessimo
arsenal150
Jaacute os ldquogarantistasrdquo 151 do processo civil acreditam que os verdadeiros protagonistas satildeo
as partes do processo e seus direitos e garantias devem ser estritamente preservados
Devido a essa disputa de quem possui maior protagonismo no processo as mudanccedilas
ocorridas no coacutedigo processual vigente quanto agraves medidas executivas atiacutepicas despertaram
149 Ibid p 117 150 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos
atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04102018
151 O processualista Araken de Assis acredita que o termo garantista eacute descabido tendo em vista que remete ao processo penal
56
maior celeuma do que qualquer outra modificaccedilatildeo trazida pelo CPC15 Afinal as referidas
medidas acirravam ainda mais a disputa pelo protagonismo processual
O fato de o CPC15 dispor no art 139 IV que o juiz poderaacute decretar todas as medidas
indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o
cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo
pecuniaacuteria levou boa parte da doutrina e dos juiacutezes a acreditar que teria pleno direito de
aplicar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo Entretanto muitos se esqueceram do outro lado
da moeda esqueceram que a dignidade humana do executado tambeacutem eacute um direito
fundamental e natildeo pode ser violado
Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa152
acreditam que
() natildeo parece producente elencar um rol abstrato das medidas que poderiam ser aplicadas pelo juiz a tiacutetulo do art 139 IV CPC Afinal se busca a efetividade da execuccedilatildeo e esta soacute pode ser identificada agrave luz das especificidades da situaccedilatildeo concreta Ideal eacute enveredar pela loacutegica modular (adequaccedilatildeo ao caso) natildeo pela geneacuterica (soluccedilotildees abstratas de pretensa utilidade universal)
Em razatildeo de o dispositivo apresentar uma gama de poderes tatildeo amplos agrave disposiccedilatildeo do
oacutergatildeo julgador sem nenhuma estipulaccedilatildeo de um procedimento legal previamente definido para
que estabeleccedila as condiccedilotildees de sua aplicaccedilatildeo em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo eacute
necessaacuterio que em razatildeo do princiacutepio da dignidade humana natildeo busque definir o que o
dispositivo permite mas de definir o que ele natildeo permite ldquoOu seja propotildee-se a sua
compreensatildeo por exclusatildeo Afinal se ele tem potencialidade para promover a efetividade da
tutela tambeacutem pode provocar lesotildees E como em direito os fins natildeo justificam os meios
ressalta como prioritaacuteria a necessidade de estabelecer limitesrdquo 153
O art 789 do CPC15 disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial e eacute
categoacuterico ao dispor que ldquoo devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para
152 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
153 Ibid sem paginaccedilatildeo
57
o cumprimento de suas obrigaccedilotildees salvo as restriccedilotildees estabelecidas em leirdquo Logo a
execuccedilatildeo somente poderaacute incidir sobre os bens do devedor e natildeo sobre a sua pessoa
Como eacute sabido a Lex Poetelia Papiria de 326 aC foi o primeiro marco legal da
humanizaccedilatildeo das cobranccedilas de diacutevidas abolindo a imposiccedilatildeo ao devedor de castigos
vexatoacuterios e ateacute da pena de morte154
Afinal no direito romano antigo a cobranccedila de diacutevidas poderia recair sobre a pessoa
do devedor que respondia com sua liberdade e ateacute mesmo com seu proacuteprio corpo permitindo
a lei que repartissem tantos pedaccedilos do corpo do devedor quantos fossem seus credores
Nesse sentindo leciona o professor Guilherme Pupe da Noacutebrega155 que
Vem de longe a evoluccedilatildeo no sentido de fazer a responsabilidade por uma obrigaccedilatildeo migrar da pessoa do devedor para seu patrimocircnio Merecem registro especiacutefico como marcos histoacutericos remotos a Lex Poetelia Papiria de 326 aC que aboliu o nexum e possibilidade de escravidatildeo do devedor como garantia da obrigaccedilatildeo e a pignoris capio ou ldquoaccedilatildeo por tomada de penhorrdquo que instituiu a possibilidade de o credor tomar parcela dos bens do devedor como forma de assegurar o adimplemento da diacutevida Aqueles institutos culminariam seacuteculo depois no artigo 789 do CPC de 2015 a consagrar que o devedor responda pela satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo com seus bens presentes e futuros observadas as restriccedilotildees impostas pelas impenhorabilidades legais
Logo o avanccedilar da civilizaccedilatildeo marcou o deslocamento da responsabilidade por
diacutevidas saindo do corpo do devedor para o seu patrimocircnio tendo em vista que a vida
humana a liberdade e a integridade fiacutesica satildeo valores inalienaacuteveis natildeo podendo ser
sacrificadas em benefiacutecio de obrigaccedilotildees pecuniaacuterias 156
Entretanto eacute sabido que a responsabilidade patrimonial eacute excepcionada pela prisatildeo
civil do devedor de verba alimentiacutecia resquiacutecio da responsabilidade pessoal romana
154 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt
httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018
155 NOacuteBREGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139 IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018
156 Ibid sem paginaccedilatildeo
58
No entanto haacute uma justificativa para isso Segundo o processualista Guilherme Pupe
da Noacutebrega157
Eacute que a par de a prisatildeo civil encontrar previsatildeo constitucional no inciso LXVII do artigo 5ordm o raciociacutenio eacute o de que o direito do alimentante agrave liberdade de locomoccedilatildeo cede diante dos direitos agrave vida e agrave dignidade titularizados pelo alimentando e resguardados pelos alimentos Foi esse mesmo raciociacutenio aliaacutes que justificou no passado a ediccedilatildeo da suacutemula 309 pelo STJ agora positivada pelo artigo 528 sect 7ordm que limita a modalidade coercitiva agraves trecircs uacuteltimas prestaccedilotildees vencidas e agraves prestaccedilotildees vincendas A ideia eacute que tendo o alimentando subsistido a despeito do natildeo-pagamento de prestaccedilotildees mais antigas essas verbas teriam perdido o caraacuteter alimentar que na equaccedilatildeo antes apresentada justificaria a prisatildeo civil do alimentante Daiacute por que aqueles valores antigos remanescem exigiacuteveis mas somente pela via da expropriaccedilatildeo
Essa ressalva eacute necessaacuteria tendo em vista que a adoccedilatildeo de teacutecnica de execuccedilatildeo
indireta para incursatildeo radical na esfera de direitos do executado notadamente direitos
fundamentais quando carente de respaldo constitucional natildeo merece acolhimento sob
risco de se atentar contra o devido processo legal (artigo 5ordm LIV da Constituiccedilatildeo)
Como afirma o autor Bruno Dantas158 ldquoembora inexistam estatiacutesticas que permitam
comparaccedilotildees natildeo eacute desarrazoado intuir que os iacutendices de inadimplecircncia despeccedilam na razatildeo
inversa da incidecircncia das ordens judiciais sobre o corpo e a liberdade do devedorrdquo Entretanto
eacute natildeo possiacutevel adotar toda e qualquer medida executiva atiacutepica em nome da efetividade da
execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que se saiba os limites da sua aplicaccedilatildeo
Dessa forma instrumentos que permitam o cumprimento forccedilado de contratos e o pagamento
de diacutevidas satildeo necessaacuterios contudo eacute preciso equilibrar essa exigecircncia com a liberdade e a
dignidade humana
Como citado alhures o art 139 IV ensejou decisotildees como a que determinou a
suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o
passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito em uma accedilatildeo se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo
extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
Na supracitada decisatildeo o princiacutepio da responsabilidade patrimonial natildeo estaacute sendo
efetivado para o que o devedor responda com os seus bens Afinal qual ligaccedilatildeo entre a
157 Ibid sem paginaccedilatildeo 158 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt
httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018
59
restriccedilatildeo de circulaccedilatildeo que diz com o direito de ir e vir (liberdade) com o pagamento de
diacutevidas que diz com a responsabilidade civil159
Ademais por que quem natildeo tem dinheiro para pagar diacutevidas natildeo pode dirigir Por que
natildeo tem condiccedilotildees para pagar o deacutebito natildeo pode ter passaporte Por que quem natildeo tem como
pagar o deve natildeo pode ter cartatildeo de creacutedito
Ao utilizar meios executivos atiacutepicos como os supracitados para compelir o devedor a
satisfazer a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria quando exauridos sem ecircxito os meios tradicionais de bens
penhoraacuteveis salvo quando existe qualquer indiacutecio concreto de ocultaccedilatildeo ou dissipaccedilatildeo de
bens eacute obrigar o devedor abrir matildeo da proteccedilatildeo da lei que lhe impede que seja tomado agrave forccedila
(art 833 CPC e demais disposiccedilotildees que tratam da impenhorabilidade)
Segundo Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa160
Claramente essa pressatildeo visa dar uma aparecircncia de voluntariedade agrave indicaccedilatildeo de bens impenhoraacuteveis pelo proacuteprio executado que na verdade soacute age assim por ser a uacutenica forma de ver-se livre de um grame imposto por medida indutiva despedida de qualquer necessidade ou adequaccedilatildeo Uma intoleraacutevel perversatildeo
Os autores afirmam ainda que o ldquodireito paacutetrio natildeo admite esta contraditio in terminis
sendo inaceitaacutevel a coexistecircncia de regra protetiva do executado com outra que concede ao
juiz poderes para forccedilar (ainda que indiretamente e veladamente) o executado a abrir matildeo
daquela proteccedilatildeordquo 161
Logo eacute cristalino que a suspensatildeo da CNH eacute uma forma incorreta de aplicar a medida
executiva atiacutepica para efetivar o direito fundamental a execuccedilatildeo tendo em vista que o uacutenico
objetivo da referida eacute pressionar o executado abrir matildeo de algum bem impenhoraacutevel para
levantar o dinheiro e cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
A retenccedilatildeo do passaporte igualmente natildeo possui qualquer relaccedilatildeo com a diacutevida do
executado e eacute somente uma forma de tentar pressiona-lo a dispor de um bem que natildeo pode
ser tomado agrave forccedila e puni-lo por natildeo ter cumprido voluntariamente com a sua obrigaccedilatildeo
159 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
160 Ibid sem paginaccedilatildeo 161 Ibid sem paginaccedilatildeo
60
Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa162
acreditam que tal medida eacute equivocada e se torna excessivamente onerosa ao executado
As mais variadas circunstacircncias relevem o equiacutevoco de tal medida aplicada assim genericamente Com efeito nada justifica reter o passaporte do executado e impedi-lo de viajar para o exterior quando eacute agraciado inclusive com todas as despesas pagas com presente sorteio ou precircmio (por completar tempo de serviccedilo ou atingir metas produtividade na sociedade empresaacuteria em que trabalha) Como todo custo eacute suportado por terceiro e por isso mesmo a sua realizaccedilatildeo pelo executado natildeo traria qualquer prejuiacutezo ao exequente e a retenccedilatildeo do passaporte natildeo seria injustificaacutevel
Paulo Antonio Papini163 acredita que natildeo tem a apreensatildeo de passaporte natildeo possui um
fundamento plausiacutevel tendo em vista que se o devedor natildeo pode viajar para saldar o deacutebito
tambeacutem natildeo poderia exercer atividades cotidianas
Com todo o respeito a quem pensa dessa forma o argumento eacute muito simploacuterio e natildeo precisamos sequer do Direito para derrubaacute-lo Com efeito se considerarmos que ndash ateacute mesmo pelas dimensotildees continentais do Brasil ndash natildeo eacute incomum que uma passagem para o Nordeste custe mais caro que um voo para Miami seria razoaacutevel entatildeo seguindo a linha argumentativa do Magistrado em questatildeo que se oficiasse aos oacutergatildeos reguladores da aviaccedilatildeo civil proibindo-se aquele devedor de fazer ateacute mesmo voos domeacutesticos Poder-se-ia ir mais longe jaacute que natildeo tem dinheiro para pagar suas diacutevidas certamente aquele devedor tambeacutem natildeo teria para comer fora de sua casa porque entatildeo natildeo determinar a expediccedilatildeo de ofiacutecio aos restaurantes proacuteximos agrave sua casa e determinar tambeacutem a proibiccedilatildeo de que ele fosse servidoatendido
O autor se questiona ainda ldquoSeraacute entatildeo que o Princiacutepio da Dignidade da Pessoa
Humana estaacute de mero enfeite em nossa Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ()rdquo 164 Tendo em vista
que ldquoa decisatildeo em comento viola diretamente o art 5ordm incisos XV LIII e LXIII da
Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ndash falamos do Direito de Ir e Virrdquo 165
Ademais o cancelamento do cartatildeo de creacutedito eacute mais uma forma de constranger e
compelir o executado a cumprir com a obrigaccedilatildeo de qualquer forma natildeo importando o que
precise fazer para conseguir saldar o deacutebito tendo em vista que a referida medida apresenta
162 Ibid sem paginaccedilatildeo 163 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo
pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018
164 Ibid sem paginaccedilatildeo 165 Ibid sem paginaccedilatildeo
61
qualquer adequaccedilatildeo com o fim desejado (reverter em pagamento para o exequente) Os
autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa afirmam que166
Reconhece-se que as razotildees da afirmaccedilatildeo ora questionada satildeo ateacute intuitivas mas eacute plenamente possiacutevel problematiza-las Ora natildeo se encontra qualquer justificativa idocircnea para que o juiz possa cancelar o contrato do executado com a administradora do cartatildeo de creacutedito (ou instituiccedilatildeo financeira) que natildeo tem qualquer relaccedilatildeo com o creacutedito exequendo muito menos como isso poderia impactar positivamente na execuccedilatildeo (senatildeo para pressionar o executado a dispor de bens impenhoraacuteveis) Ademais natildeo foram indicados sequer sinais de que o executado realiza gastos supeacuterfluos com o cartatildeo de creacutedito ndash natildeo que isso justificasse a medida pois o correto seria penhorar os esses bens (se duraacuteveis naturalmente) ao inveacutes de cancelar o cartatildeo de creacutedito
Logo as referidas medidas natildeo possuem qualquer relaccedilatildeo com o atingimento do fim
almejado (o pagamento de quantia) tendo em vista que natildeo haacute uma relaccedilatildeo meiofim entre
tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a
restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia
ao exequente
Dessa forma nota-se que as medidas de suspensatildeo da CNH retenccedilatildeo de passaporte e
bloqueio do cartatildeo de credito satildeo completamente inadequadas agrave realizaccedilatildeo a que se prestam
Afinal ldquotais medidas soam como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-
lo ao cumprimento da ordem judicial ndash e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a
utilizaccedilatildeo dos meios sancionatoacuterios pelo magistrado ()rdquo167
Como exposto em linhas preteacuteritas o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades
de aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e
razoaacutevel se atendo aos criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas
executivas atiacutepicas ao caso concreto sob pena de converter a medida em de indutiva para
punitiva
A utilizaccedilatildeo de medidas atiacutepicas como a suspensatildeo da carteira de motorista e o
passaporte do devedor abandona a regra da responsabilidade patrimonial e atingem em cheio
o nuacutecleo de direitos inerentes agrave condiccedilatildeo humana
166 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
167 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 115
62
O limite para a aplicaccedilatildeo de tais medidas deve ser a Constituiccedilatildeo Federal e sobretudo
os Direitos fundamentais nela expressos ldquoCom efeito natildeo haacute saiacuteda tampouco soluccedilatildeo eficaz
de um problema sem que se respeite a Lei e o Devido Processo Legal (por mais nobres que
sejam as intenccedilotildees)rdquo 168
Dessa forma a busca desenfreada pelo cumprimento das decisotildees judiciais em
especial na fase executiva natildeo pode ser realizada em sacrifiacutecio de direitos fundamentais O
Poder Judiciaacuterio natildeo pode resolver a crise do processo executoacuterio utilizando de medidas
arbitraacuterias com o propoacutesito de satisfazer obrigaccedilotildees pecuniaacuterias
Eis o dilema que se coloca diante do poder geral de efetivaccedilatildeo ele pode servir de
potente instrumento em prol da tutela jurisdicional executiva entretanto se manejado de
modo improacuteprio serviraacute de instrumento de puniccedilatildeo e humilhaccedilatildeo do executado169
Eacute notoacuterio que se amplamente aplicado o poder geral de efetivaccedilatildeo reduziria os
iacutendices de inadimplecircncia quiccedilaacute resolveria por completo a crise da execuccedilatildeo civil Entretanto
o retrocesso civilizatoacuterio seria irreparaacutevel
168 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo
pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018
169 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
63
5 CONCLUSAtildeO
Como funccedilatildeo jurisdicional que tem como objeto a efetivaccedilatildeo de direitos a execuccedilatildeo
deve sempre buscar a maior satisfaccedilatildeo possiacutevel concretizando integralmente o creacutedito do
exequente isto eacute realizando o direito fundamental agrave tutela executiva do credor Por isso a
adoccedilatildeo de meios executivos atiacutepicos incorporados pelo Coacutedigo de Processo Civil de 2015 por
meio do art139 IV em um primeiro momento podem ser consideradas vaacutelidas visto que
servem de instrumento para a satisfaccedilatildeo e asseguraccedilatildeo de direitos do credor
Entretanto para o oacutergatildeo julgador natildeo cometa arbitrariedades em nome do direito
fundamental agrave execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que seja definido certos limites na adoccedilatildeo do poder
geral de efetivaccedilatildeo
As medidas executivas atiacutepicas natildeo podem ser aplicadas de maneira indiscriminada
logo devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o esgotamento das medidas tiacutepicas e
a possibilidade de cumprimento da obrigaccedilatildeo
Partindo dessa premissa as medidas a serem adotadas pelo juiz no caso concreto
devem ter como baliza os princiacutepios da proporcionalidade e da razoabilidade para que natildeo
ultrapassem a responsabilidade patrimonial do devedor e incidida diretamente sobre sua
pessoa
Para que natildeo seja atingida a pessoa do executado ou seja para que o devedor natildeo
tenha sua dignidade humana viola eacute necessaacuterio que a medida atiacutepica seja adequada e
necessaacuteria
Logo o juiz deveraacute sempre estabelecer uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida
executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia
a gerar o resultado sem violar a dignidade humana do executado
Dessa o juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental a execuccedilatildeo e
determinar uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute
necessaacuterio que a medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado
As medidas que ultrapassam esses limites como a decisatildeo que apreendeu o
passaporte suspensatildeo a CNH e bloqueou o cartatildeo de creacutedito do devedor satildeo meramente
punitivas posto que essas natildeo satildeo as medidas mais adequadas para se atingir o fim almejado
pois natildeo existe propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado
64
uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo
geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente
Medidas como esta servem de embasamento para decisotildees arbitraacuterias e autoritaacuterias de
violaccedilatildeo dos direitos fundamentais transformando o poder geral de efetivaccedilatildeo em
instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com autorizaccedilatildeo judicial
Em suma o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades de aplicaccedilatildeo do poder
geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e razoaacutevel se atendo aos
criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao
caso concreto sob pena de punir a pessoa do executado violando a sua dignidade humana
em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo
65
REFEREcircNCIAS
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- 1 INTRODUCcedilAtildeO
- 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
-
- 21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL
- 22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
- 23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
- 24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO
- 25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO
-
- 3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
-
- 31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS
-
- 311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15
-
- 32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
- 33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
- 34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
-
- 4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
-
- 41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
- 42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
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- 5 CONCLUSAtildeO
- REFEREcircNCIAS
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SUMAacuteRIO
1 INTRODUCcedilAtildeO 5
2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL 7
21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL 7
22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL 8
23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL 11
24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO 17
25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO 20
3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 23
31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS 23
311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15 25
32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO 28
33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO 31
34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 36
4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 48
41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO 48
42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 55
5 CONCLUSAtildeO 63
REFEREcircNCIAS 65
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
Art ndash Artigo
CPC15 ndash Coacutedigo de Processo Civil de 2015
CPC73 ndash Coacutedigo de Processo Civil de 1973
ENFAM ndash Escola nacional de formaccedilatildeo e aperfeiccediloamento de magistrados
HC ndash Habeas Corpus
STJ ndash Superior Tribunal de Justiccedila
5
1 INTRODUCcedilAtildeO
A prestaccedilatildeo jurisdicional natildeo costuma se findar apoacutes o encerramento da fase cognitiva
com a prolaccedilatildeo de uma sentenccedila de meacuterito Para que a referida prestaccedilatildeo se concretize eacute
imperioso que haja a satisfaccedilatildeo do deacutebito pelo devedor
Entretanto observa-se em diversos casos o inadimplemento da parte passiva
processual sendo necessaacuterio desenvolver a atividade executiva A referida atividade possui o
escopo de satisfazer direitos
Isso porque o processo natildeo eacute um fim em si mesmo sendo apenas um exerciacutecio da
jurisdiccedilatildeo estatal Dessa forma a razatildeo de ser do processo eacute o atingimento da sua finalidade
almejada que eacute a prestaccedilatildeo da tutela jurisdicional
Todavia como a tutela jurisdicional configura-se na obrigaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio
proteger e reparar os direitos lesionados ou ameaccedilados de lesatildeo muitas vezes a dita tutela
somente consegue ser efetivada atraveacutes da atividade executiva da jurisdiccedilatildeo
Ocorre que a execuccedilatildeo civil sempre foi o ldquocalcanhar de Aquilesrdquo do sistema
processual e de modo geral vinha sofrendo uma crise quanto a sua efetividade Ou seja o
credor obtia ecircxito na fase de conhecimento entretanto natildeo conseguia alcanccedilar o seu direito a
prestaccedilatildeo reconhecida na fase de execuccedilatildeo
Com o fito de tornar a atividade satisfativa mais eficiente e mais ceacutelere o Coacutedigo de
Processo Civil de 2015 concebeu novas diretrizes ao processo no sentindo de harmonizar
suas com os ditames da Constituiccedilatildeo Federal principalmente com os direitos fundamentais
As normas fundamentais do processo civil trazidas pelo CPC15 preocupam-se
primordialmente com a efetividade da tutela jurisdicional
Em conformidade com essa nova sistemaacutetica o legislador no art 139 IV do Coacutedigo
de Processo Civil estabeleceu a possibilidade de o juiz dispor de todas as medidas indutivas
coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o cumprimento de
ordem judicial trazendo como grande novidade a aplicaccedilatildeo dessas medidas executoacuterias
atiacutepicas tambeacutem nas obrigaccedilotildees de pagar dinheiro
6 Entretanto natildeo haacute na legislaccedilatildeo criteacuterios especiacuteficos que auxiliem o oacutergatildeo julgador na
escolha das medidas executivas atiacutepicas que se adotadas sem qualquer baliza podem
acarretar consequecircncias juriacutedicas irreparaacuteveis
Como a famosa decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de
Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-1320138260011 Nessa accedilatildeo
que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo
pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a suspensatildeo da
Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o passaporte e
cancelou os cartotildees de creacutedito como forma de compeli-lo a adimplir com o deacutebito
Decisotildees como esta geram conflitos entre direitos constitucionalmente instituiacutedos De
um lado o direito fundamental agrave tutela jurisdicional e de outro os direitos e garantias
inerentes a todos os indiviacuteduos
Dessa forma a presente monografia tem como escopo de estabelecer criteacuterios
limitadores para que a adoccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo viole a dignidade humana do
executado em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo
7 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO
CIVIL
21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL
A Execuccedilatildeo Civil nasce a partir do direito a uma prestaccedilatildeo conferida a algueacutem de
exigir de outrem o cumprimento de uma conduta de fazer natildeo fazer ou de dar (dinheiro ou
coisa distinta) 1
Para que o direito a uma prestaccedilatildeo se concretize no mundo fiacutesico eacute necessaacuterio que
haja a satisfaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida pelo sujeito passivo Caso contraacuterio fala-se em
inadimplemento ou lesatildeo O titular do direito natildeo tem como agir por si para efetivar o seu
direito a prestaccedilatildeo posto que a autotutela eacute vedada no ordenamento juriacutedico Dessa forma eacute
necessaacuterio que se recorra ao Poder Judiciaacuterio para que se possa ter a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo
devida logo a tutela jurisdicional executiva2
O processualista Fredie Didier et al3 equaciona essa questatildeo da seguinte maneira
Quando se pensa em tutela executiva pensa-se na efetivaccedilatildeo de direitos a uma prestaccedilatildeo fala-se de um conjunto de meios para efetivar a prestaccedilatildeo devida fala-se em execuccedilatildeo de fazer natildeo-fazer dar exatamente os trecircs tipos de prestaccedilatildeo existentes Natildeo eacute por acaso nem por coincidecircncia que a tutela executiva pressupotildee inadimplemento (CPC art 786) - fenocircmeno exclusivo dos direitos a uma prestaccedilatildeo Eacute por isso tambeacutem que se pode falar em prescriccedilatildeo da execuccedilatildeo (CPC art 802 e suacutemula do STF n 150) - prescriccedilatildeo eacute fenocircmeno juriacutedico que se relaciona aos direitos a uma prestaccedilatildeo A execuccedilatildeo forccedilada dirige-se ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo Essa relaccedilatildeo entre direito material e processo eacute fundamental para a compreensatildeo do fenocircmeno executivo
Nesse iacutenterim para o Ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux4 ldquoexecutar eacute
satisfazerrdquo ao passo que o professor Fredie Didier et al5 formulou um conceito mais amplo
ldquoExecutar eacute satisfazer uma prestaccedilatildeo devida A execuccedilatildeo pode ser espontacircnea quando o
devedor cumpre voluntariamente a prestaccedilatildeo ou forccedilada quando o cumprimento da prestaccedilatildeo
eacute obtido por meio de atos executivos pelo Estadordquo
1 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 41 2 Ibid p 42 3 Ibid p 42 4 FUX Luiz Curso de direito processual civil Rio de Janeiro Forense 2001 p 980 5 DIDIER JR Fredie et al Op Cit p 45
8 Dessa forma a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional responsaacutevel pela
concretizaccedilatildeo de um direito subjetivo no plano material obtendo resultado idecircntico ou
equivalente ao atingiacutevel se o devedor cumprisse espontaneamente a prestaccedilatildeo
Todavia essa atividade jurisdicional soacute cabe quando o devedor se recusa a cumprir
com a obrigaccedilatildeo quebrando a expectativa do credor de receber o que lhe eacute devido Por esta
razatildeo que se diz que a execuccedilatildeo civil eacute ldquoforccediladardquo 6
Eacute o que se conclui seguindo os ensinamentos de Leonardo Greco7 para ele execuccedilatildeo eacute
uma
() modalidade de tutela jurisdicional que consiste na praacutetica pelo juiz (ou por outrem sob a sua supervisatildeo) de uma seacuterie de atos coativos concretos sobre o devedor e sobre o seu patrimocircnio a fim de agrave custa dele e independentemente do concurso da sua vontade tornar efetivo o cumprimento de prestaccedilatildeo por ele inadimplida desde que tais atos coativos estejam previamente constituiacutedos em lei
Portanto a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional que tem como escopo obter o
cumprimento de uma prestaccedilatildeo certa e inadimplida mediante atos coativos sobre o devedor e
seus bens
22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
Vislumbrado o conceito de execuccedilatildeo civil cabe agora empreender a sua classificaccedilatildeo
tendo em vista que a execuccedilatildeo pode se manifestar de diversas formas possuindo diferentes
caracteriacutesticas em cada uma das suas modalidades
Inicialmente cabe destacar que haacute duas teacutecnicas processuais para viabilizar a execuccedilatildeo
civil lato sensu eacute a que divide em processo autocircnomo de execuccedilatildeo e em fase de execuccedilatildeo
dependendo do tiacutetulo executivo que justifica o exerciacutecio da atividade satisfativa
O Coacutedigo Processual Civil de 2015 acertadamente ratificou as reformas promovidas
no CPC73 que consagrava a opccedilatildeo legislativa de oferecimento das tutelas de certificaccedilatildeo e
efetivaccedilatildeo do direito em um mesmo processo Dessa forma as execuccedilotildees de sentenccedilas
6 BASTOS Luiz Fernando Pereira O artigo 139 IV do novo Coacutedigo de Processo Civil a atipicidade
dos meios executivos na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia certa Brasiacutelia 2017 Disponiacutevel em lt httpbdmunbbrbitstream104831866812017_LuizFernandoPereiraBastospdf gt Acesso em 06 de agosto de 2018
7 BASTOS Luiz Fernando Pereira apud GRECO Leonardo O processo de execuccedilatildeo Rio de Janeiro Renovar 1999 p 164
9
passaram a ser uma fase complementar ao de processo de conhecimento e natildeo mais ocorrer
em um processo autocircnomo
No entendimento do professor processualista Fredie Didier et al8 o processo
sincreacutetico simplificou a efetivaccedilatildeo de um direito reconhecido em sentenccedila
A dispensa do ajuizamento de um processo autocircnomo para execuccedilatildeo de sentenccedila natildeo soacute veio diminuir o tempo necessaacuterio agrave prestaccedilatildeo da tutela jurisdicional - afinal o credor natildeo mais precisaria tal como ocorria ateacute entatildeo promover nova citaccedilatildeo pessoal do reacuteudevedor- como tambeacutem veio romper de vez com um velho paradigma segundo o qual a atividade executiva estaria dissociada da precedente atividade jurisdicional cognitiva
Entretanto natildeo soacute as sentenccedilas de meacuterito ensejam uma execuccedilatildeo Por esta razatildeo foi
necessaacuterio manter o processo autocircnomo de execuccedilatildeo para os casos em que o credor tem a seu
favor um documento que natildeo tenha sido proferido por um oacutergatildeo dotado de jurisdiccedilatildeo
Consequentemente se for o titulo executivo judicial o caminho natural eacute o do
cumprimento de sentenccedila Sendo por sua vez extrajudicial o titulo executivo o caminho
correto eacute o processo de execuccedilatildeo
Cabe ainda salientar que toda execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial eacute definitiva Jaacute a
execuccedilatildeo de tiacutetulo judicial (cumprimento de sentenccedila) pode ser definitiva ou provisoacuteria
No primeiro caso isto eacute cumprimento de sentenccedila definitivo ldquoeacute a execuccedilatildeo completa
que vai ateacute a fase final (com a entrega do bem da vida) sem exigecircncias adicionais para o
exequenterdquo 9
Quanto ao segundo caso ldquoo cumprimento provisoacuterio de sentenccedila (fundada em tiacutetulo
provisoacuterio) eacute aquele que exige alguns requisitos extras para que se chegue agrave fase final da
execuccedilatildeordquo 10
Para Fredie Didier11 o criteacuterio para definir se o cumprimento de sentenccedila seraacute
definitivo ou provisoacuterio
() eacute a estabilidade do tiacutetulo executivo em que se funda a execuccedilatildeo se se tratar de decisatildeo acobertada pela coisa julgada material o cumprimento de sentenccedila eacute
8 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 46 9 Ibid p 57 10 Ibid p 57 11 Ibid p 57
10
definitivo se se tratar de decisatildeo judicial ainda passiacutevel de alteraccedilatildeo (reforma ou invalidaccedilatildeo) em razatildeo da pendecircncia de recurso contra ela interposto a que natildeo tenha sido atribuiacutedo efeito suspensivo o cumprimento de sentenccedila eacute provisoacuterio
Ademais a execuccedilatildeo se distingue em procedimentos executivos comuns que satildeo da
execuccedilatildeo civil e que servem a uma generalidade de creacuteditos como eacute o caso do cumprimento
de sentenccedila e o processo de execuccedilatildeo E em procedimentos executivos especiais que servem
agrave satisfaccedilatildeo de creacuteditos peculiares como a execuccedilatildeo de alimentos e a execuccedilatildeo fiscal 12
Por fim cabe mencionar a classificaccedilatildeo que distingue a execuccedilatildeo em direta e indireta
A primeira execuccedilatildeo direita (ou execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo) eacute ldquo() aquela em que o
Poder Judiciaacuterio prescinde da colaboraccedilatildeo do executado para a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida
e pois promove uma substituiccedilatildeo da sua conduta pela conduta do proacuteprio Estado-juiz ou de
terceirordquo 13 Ou seja as medidas executivas satildeo levadas a efeito mesmo contra a vontade do
devedor na execuccedilatildeo direta
Segundo a doutrina a execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo se subdivide da seguinte forma
meios de desapossamento meios de transformaccedilatildeo e meios de expropriaccedilatildeo
Os meios de desapossamento muito comuns nas execuccedilotildees para entrega de coisa eacute a
forma ldquopor meio da qual se retira da posse do executado o bem a ser entregue ao exequente
(p ex despejo busca e apreensatildeo reintegraccedilatildeo de posse)rdquo 14 Ao passo que por meio dos de
transformaccedilatildeo ldquo() o juiz determina que um terceiro pratique a conduta que deveria ser
praticada pelo executado cabendo a este arcar com o pagamento do custo respectivordquo 15 Jaacute
os meios executivos de expropriaccedilatildeo eacute a forma ldquopor meio do qual algum bem do patrimocircnio
do devedor eacute expropriado para pagamento do creacutedito (adjudicaccedilatildeo alienaccedilatildeo judicial ou
apropriaccedilatildeo de frutos e rendimentos de empresa ou de estabelecimentos e de outros bens art
825 CPC)rdquo 16
12 Ibid p 48 13 Ibid p 50 14 Ibid p 51 15 Ibid p 51 16 Ibid p 51
11 Jaacute a execuccedilatildeo indireta (ou mandamental) atua ldquo() na vontade do devedor como forma
de compeli-lo ou incentivaacute-lo a cumprir a ordem judicialrdquo 17 Nesse entendimento ainda
leciona Fredie Didier et al 18
Nesses casos o Estado-juiz busca promover a execuccedilatildeo com a colaboraccedilatildeo do executado forccedilando ou incentivando a que ele proacuteprio cumpra a prestaccedilatildeo devida Em vez de o Estado-juiz tomar as providecircncias que deveriam ser tomadas pelo executado o Estado forccedila por meio de coerccedilatildeo psicoloacutegica ou de promessa de recompensa judicial a que o proacuteprio executado cumpra a prestaccedilatildeo
A execuccedilatildeo indireta pode ser patrimonial como por exemplo a imposiccedilatildeo de multa
coercitiva ou pessoal com a prisatildeo civil do devedor de alimentos Ademais adiciona Didier
et al19que
O estiacutemulo ao cumprimento da prestaccedilatildeo pode dar-se pelo temor (p ex multa coercitiva prisatildeo civil do devedor de alimentos divulgaccedilatildeo de notiacutecia em jornal revelando o descumprimento) ou pelo incentivo (p ex a chamada sanccedilatildeo premial ou sanccedilatildeo positiva de que eacute exemplo a isenccedilatildeo do pagamento de custas em caso de cumprimento do mandado monitoacuterio - art 701 sect 1ordm CPC a reduccedilatildeo pela metade dos honoraacuterios advocatiacutecios fixados inicialmente pelo juiacutezo em caso de pagamento integral do deacutebito pecuniaacuterio na execuccedilatildeo por quantia certa fundada em tiacutetulo extrajudicial - art 827 sect 1ordm CPC)
Por tais razotildees haacute uma tendecircncia em cada vez mais prestigiar os meios executivos
indiretos (coercitivos) posto que satildeo tatildeo eficazes quanto os meios executivos diretos
entretanto menos onerosos Contudo sua aplicaccedilatildeo deve ser fiscalizada a fim de natildeo permitir
que a execuccedilatildeo civil perca sua finalidade visto que eacute uma funccedilatildeo jurisdicional que tem como
escopo efetivar o direito do credor e natildeo de atender os interesses do devedor
23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
Os princiacutepios juriacutedicos nos uacuteltimos anos passaram a ser munidos de forccedila cogente
normatizando as condutas humanas tanto quanto as regras juriacutedicas Os ditos princiacutepios
ampliaram as margens de atuaccedilatildeo dos aplicadores do direito possibilitando a construccedilatildeo de
soluccedilotildees mais adequadas agraves especificidades das demandas que chegam ao judiciaacuterio
17 Ibid p 51 18 Ibid p 51 19 Ibid p 51-52
12 Dessa forma eacute necessaacuterio aprofundar-se nos princiacutepios norteadores da execuccedilatildeo civil
para que se obtenha uma anaacutelise completa da teoria geral da execuccedilatildeo
A execuccedilatildeo civil tem como um dos seus corolaacuterios o princiacutepio da efetividade este
consiste na exigecircncia de um sistema completo de tutela executiva no qual existam meios
executivos capazes de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor
de tutela executivardquo 20
O referido princiacutepio da efetividade eacute reforccedilado como normal fundamental do processo
civil brasileiro pelo art 4ordm do CPC ldquoArt 4ordm As partes tecircm o direito de obter em prazo razoaacutevel
a soluccedilatildeo integral do meacuterito incluiacuteda a atividade satisfativa
Jaacute o princiacutepio da boa feacute processual corolaacuterio do devido processo legal estaacute previsto
no art 5ordm do CPC ldquoAquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de
acordo com a boa-feacuterdquo Segundo o processualista baiano Fredie Didier21
O princiacutepio da boa-feacute extrai-se de uma claacuteusula geral processual A opccedilatildeo por uma claacuteusula geral de boa-feacute eacute a mais correta Eacute que a infinidade de situaccedilotildees que podem surgir ao longo do processo torna pouco eficaz qualquer enumeraccedilatildeo legal exaustiva das hipoacuteteses de comportamento desleal Daiacute ser correta a opccedilatildeo da legislaccedilatildeo brasileira por uma norma geral que impotildee o comportamento de acordo com a boa-feacute Em verdade natildeo seria necessaacuteria qualquer enumeraccedilatildeo das condutas desleais o art 5deg do CPC eacute bastante exatamente por tratar-se de uma claacuteusula geral
Dessa forma o dito princiacutepio preconiza que diante de um vinculo juriacutedico as pessoas
envolvidas natildeo poderatildeo frustrar a confianccedila do outro devendo comportar-se como se pode
esperar de uma pessoa de boa-feacute
Ademais disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial que ldquosomente o
patrimocircnio do devedor (art 789 CPC) ou de terceiro responsaacutevel pode ser objeto da
atividade executiva do Estadordquo 22
O referido princiacutepio que determina que somente o patrimocircnio submete-se agrave execuccedilatildeo
e natildeo a pessoa foi trazido pela humanizaccedilatildeo do direito Para o professor Didier et al23 o
20 DIDIER JR Freddie et al apud GUERRA Marcelo Lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do
credor na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 21 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte
geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 105 22 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 68
13
desenvolvimento dos meios de execuccedilatildeo indireta ldquoparece relativizar um pouco esse princiacutepio
na medida em que pressionam psicologicamente a pessoa do devedor para que cumpra a
obrigaccedilatildeo com seu comportamentordquo
Complementa ainda que
A responsabilidade executiva parece assumir atualmente caraacuteter hiacutebrido comportando coerccedilatildeo pessoal e sujeiccedilatildeo patrimonial
i) a coerccedilatildeo pessoal incide sobre a vontade do devedor admitindo o uso de medidas coercitivas de execuccedilatildeo indireta para forccedilaacute-lo a cumprir a obrigaccedilatildeo com seu proacuteprio comportamento (ex arts 139 rv 523 sect 1ordm 536 sect 1ordm e 538 sect 3ordm todos do CPC)
ii) descumprida a obrigaccedilatildeo e natildeo sendo possiacuteveladequado o uso de teacutecnica de coerccedilatildeo pessoal tem-se a sujeiccedilatildeo patrimonial que recairaacute sobre os bens do devedor ou de terceiro responsaacutevel - que responderatildeo pela proacutepria prestaccedilatildeo in natura (ex dar coisa ou entregar quantia) ou por perdas e danos24
Dessa forma o referido princiacutepio natildeo tem aplicaccedilatildeo absoluta em razatildeo do principio da
efetividade a qual estimula o uso dos meios de coerccedilatildeo indireta para garantir o cumprimento
da obrigaccedilatildeo pelo devedor
O princiacutepio da primazia da tutela especifica (ou princiacutepio do resultado) assevera que
ldquoA execuccedilatildeo deve ser especiacutefica propiciar ao credor a satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo tal qual
houvesse o cumprimento espontacircneo da prestaccedilatildeo pelo devedorrdquo 25
O CPC de 2015 absorveu todos os avanccedilos legislativos a cerca do mote O caput do
art 497 assegura que na accedilatildeo que tenha por objeto a prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer o
juiz se procedente o pedido concederaacute a tutela especiacutefica ou determinaraacute providecircncias que
assegurem a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico equivalente O art 499 o
complementa a obrigaccedilatildeo somente seraacute convertida em perdas e danos se o autor o requerer
ou se impossiacutevel agrave tutela especiacutefica ou a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico
equivalente
O princiacutepio do contraditoacuterio eacute garantido pela constituiccedilatildeo federal e compreende o
direito de ser ouvido o direito de acompanhar os atos processuais o direito de produzir
provas participar da sua produccedilatildeo manifestar-se sobre a prova produzida e obter do juiz a
23 Ibid p 69-70 24 Ibid p 70 25 Ibid p 71
14
respectiva valoraccedilatildeo o direito de ser informado regularmente dos atos praticados no processo
o direito agrave motivaccedilatildeo das decisotildees o direito de impugnar as decisotildees 26
O contraditoacuterio tem aplicaccedilatildeo em todo processo judicial sendo aplicaacutevel tambeacutem na
execuccedilatildeo No entanto o contraditoacuterio na execuccedilatildeo natildeo ocorre com a mesma intensidade que
no processo ou na fase de conhecimento eacute o que assevera Didier et al 27
O contraditoacuterio no procedimento executivo no aspecto do direito de defesa assegurado agrave parte demandada eacute eventual porquanto depende da provocaccedilatildeo do executado que natildeo eacute chamado ajuiacutezo para defender-se mas sim para cumprir a obrigaccedilatildeo O procedimento executivo adota a teacutecnica monitoacuteria que consiste basicamente na inversatildeo do ocircnus de provocar o contraditoacuterio o reacuteu em vez de citado para manifestar-se sobre a pretensatildeo do autor eacute convocado para cumprir uma determinada obrigaccedilatildeo
Logo haacute o contraditoacuterio no procedimento executivo porem eacute eventual quanto agrave defesa
do executado
Ademais o princiacutepio da menor onerosidade eacute consagrado pelo art 805 do CPC e
dispotildee que ldquoQuando por vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz
mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o executadordquo O referido princiacutepio tem o
escopo de impedir o abuso do direito pelo exequente
O principio da menor onerosidade auxilia o juiz na escolha de um meio executivo
adequado e necessaacuterio que satisfaccedila a prestaccedilatildeo exigida pelo credor Nesse sentido eacute o
entendimento do professor Fredie Didier et al 28
O resultado a ser alcanccedilado eacute aquele estabelecido pelo direito material A maneira de se chegar ateacute esse resultado eacute que deve ser a menos onerosa possiacutevel para o executado Isso significa que a opccedilatildeo pelo meio menos gravoso pressupotildee que os diversos meios considerados sejam igualmente eficazes Assim havendo vaacuterios meios executivos aptos agrave tutela adequada e efetiva do direito de creacutedito escolhe-se a via menos onerosa ao executado
O princiacutepio visa impedir a execuccedilatildeo desnecessariamente onerosa ao executado ou seja a execuccedilatildeo abusiva Em vez de enumerar situaccedilotildees em que a opccedilatildeo mais gravosa revelar-se-ia injusta o legislador valeu-se corretamente de uma claacuteusula geral para reputar abusivo qualquer comportamento do credor que pretender valer-se de meio executivo mais oneroso do que outro igualmente idocircneo agrave satisfaccedilatildeo do seu creacutedito
26 Ibid p 76 27 Ibid p 78 28 Ibid p 79-80
15 O princiacutepio da cooperaccedilatildeo tem como base os princiacutepios do devido processo legal da
boa-feacute processual e do contraditoacuterio O dito princiacutepio avigora a eacutetica processual com o
aprimoramento do diaacutelogo entre as partes reciprocamente e com o oacutergatildeo jurisdicional Eacute o
que preconiza o art 6ordm do CPC Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para
que se obtenha em tempo razoaacutevel decisatildeo de meacuterito justa e efetiva
No procedimento executivo o princiacutepio da cooperaccedilatildeo incide de diversas formas
disciplina Didier et al29 que na execuccedilatildeo
O executado tem o dever de indicar bens agrave penhora (art 774 V CPC) Natildeo encontrados bens penhoraacuteveis e natildeo havendo indicaccedilatildeo de qualquer um deles pelo exequente cabe ao executado declarar quais satildeo seus bens penhoraacuteveis sob pena de se sujeitar a uma sanccedilatildeo pecuniaacuteria compulsoacuteria
Tambeacutem eacute manifestaccedilatildeo do princiacutepio da cooperaccedilatildeo a exigecircncia de que o executado que pretende impugnar o valor da execuccedilatildeo apresente de logo o valor que reputa devido (art 525 sect 4ordm CPC) Seria comportamento natildeo-cooperativo afirmar que a cobranccedila eacute excessiva sem simultaneamente dizer qual eacute o valor correto
Demais disso aplicam-se agrave execuccedilatildeo os deveres que decorrem do princiacutepio da cooperaccedilatildeo e que satildeo imputados ao oacutergatildeo jurisdicional () Assim por exemplo deve o juiz advertir ao executado antes de puni-lo de que seu ato pode vir a caracterizar-se como atentatoacuterio agrave dignidade da jurisdiccedilatildeo ( art 772 II CPC) perceba que se trata de uma conduta compatiacutevel com o dever de prevenccedilatildeo O oacutergatildeo jurisdicional somente pode conhecer da prescriccedilatildeo ex officio dando a oportunidade de o exequente manifestar-se conforme impotildee o dever de consulta ( cf arts 10 487 paraacutegrafo uacutenico e 921 sect 5ordm CPC)
O princiacutepio ou postulado30 da proporcionalidade tem aplicaccedilatildeo muito relevante na
execuccedilatildeo O art 8 do CPC assegura que o oacutergatildeo jurisdicional tem o dever de observar a
proporcionalidade e a razoabilidade ao aplicar o ordenamento juriacutedico inclusive no
procedimento executivo
Ademais o art 805 do CPC eacute categoacuterico ao disciplinar que ldquoArt 805 Quando por
vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo
menos gravoso para o executadordquo O referido artigo jaacute se trata de uma concretizaccedilatildeo da
proporcionalidade
29 Ibid p 82 30 Segundo Fredie Didier et al haacute uma discussatildeo doutrinaacuteria sobre a proporcionalidade Parte da
doutrina acredita que a proporcionalidade eacute um princiacutepio e outra parte acredita que eacute um postulado normativo
16 O principio da adequaccedilatildeo pode ser vislumbrado em dois momentos do Direito
Processual ldquoa) no legislativo como orientador da confecccedilatildeo das leis b) no jurisdicional
autorizando ao juiz diante do caso concreto adaptar procedimento agraves suas peculiaridadesrdquo 31
Para Luceacutelia de Sena Alves e Tiago Retes32
Isso quer dizer que no momento legislativo o devido processo deve ser observado pelo legislador para a confecccedilatildeo das normas de direito processual que iratildeo servir de instrumento efetivo de concretizaccedilatildeo do direito substancial a ser tutelado atendendo a todas as suas finalidades sob pena de falecircncia do proacuteprio direito No momento jurisdicional da mesma forma a via processual escolhida pelo autor tambeacutem deve estar sujeita a este princiacutepio para que natildeo sofra as mesmas consequecircncias da sua inobservacircncia
O ordenamento juriacutedico deve ser aplicado por meio da teacutecnica processual adequada
evitando dessa forma uma tutela ineficaz
Por fim o princiacutepio do autorregramento da vontade na execuccedilatildeo tem o objetivo de
ldquo() preservar um espaccedilo processual para o exerciacutecio da liberdade e da vontade em que
sejam permitidas negociaccedilotildees que envolvam as partes ndash e tambeacutem o juizrdquo33 Didier et al34
assevera que
A rigor o legislador estabelece um regime juriacutedico de autorregramento da vontade processual identificando-se algumas manifestaccedilotildees relevantes para a execuccedilatildeo Na verdade pode-se dizer que poucos satildeo os ambientes mais propiacutecios do que a execuccedilatildeo para a negociaccedilatildeo sobre o processo Todos os institutos e normas processuais relativos agrave execuccedilatildeo devem ser repensados a partir da premissa de que o CPC permite uma ampla margem de liberdade de negociaccedilatildeo sobre o processo (art 190 CPC)
O autorregramento da vontade pode ser vislumbrando na previsatildeo de negoacutecios tiacutepicos
em sede de execuccedilatildeo como por exemplo no acordo das partes sobre o valor do bem que
dispensa a avaliaccedilatildeo disposto no inciso I do art 871 CPC Ademais dentro dos limites do art
190 do CPC eacute possiacutevel na execuccedilatildeo a atribuiccedilatildeo da negociaccedilatildeo atiacutepica aos sujeitos 31 ALVES Luceacutelia de Sena Alves RETES Tiago O poder geral de efetivaccedilatildeo das decisotildees judiciais e
proporcionalidade uma anaacutelise criacutetica acerca do art 139 IV do Novo Coacutedigo de Processo Civil Disponiacutevel em lthttpswwwacademiaedu31752652O_poder_geral_de_efetivaC3A7C3A3o_das_decisC3B5es_judiciais_e_a_proporcionalidade_uma_anC3A1lise_crC3ADtica_acerca_do_art_139_IV_do_Novo_CC3B3digo_de_Processo_Civil gt Acesso em 25 de julho de 2018
32 Ibid natildeo paginado 33 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 85 34 Ibid p 85
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processuais permitindo que sejam feitas mudanccedilas nos procedimentos e nas situaccedilotildees
juriacutedicas processuais ldquoSatildeo exemplos de negoacutecios processuais atiacutepicos na execuccedilatildeo pacto de
penhorabilidade acordo de ampliaccedilatildeo de prazos das partes de qualquer natureza acordo de
rateio de despesas processuais ()rdquo35
24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO
Sempre houve diversos questionamentos quanto agrave eficaacutecia do Direito processual Civil
e se o mesmo era meio apto a assegurar a tutela jurisdicional dos direitos dos cidadatildeos O
processo de execuccedilatildeo eacute o setor que sofre mais criacuteticas quanto a sua ineficiecircncia afinal a
execuccedilatildeo civil sempre foi o ldquocalcanhar de Aquilesrdquo do sistema processual pela praxe do
ldquoganhou (no processo de conhecimento) mas natildeo levou (na fase de cumprimento ou
execuccedilatildeo)rdquo 36
Essa dificuldade de se efetivar a tutela satisfastiva natildeo se resume a um problema de
mera teacutecnica processual tiacutepico de determinado ordenamento mas representa uma prova de
fogo da capacidade dos instrumentos jurisdicionais O autor Leonardo Greco37 no ano de
2005 atribuiu esse fato as seguintes causas o excesso de processos o custo e a morosidade da
justiccedila a inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios a ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais
um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico e a progressiva volatizaccedilatildeo dos bens
Quanto ao excesso de processos o referido autor aduz que ldquonos grandes centros o
crescimento da maacutequina judiciaacuteria natildeo acompanhou a expansatildeo do nuacutemero de litiacutegiosrdquo 38
O custo e morosidade da justiccedila prejudicam a tutela satisfativa posto que
ldquojaacute desfalcado pelo inadimplemento do devedor o credor ainda tem de arcar com o adiantamento das despesas do processo de execuccedilatildeo e de eventual liquidaccedilatildeo vendo arrastar-se a marcha dos atos executoacuterios facilmente retardada por atos procrastinatoacuterios do devedorrdquo 39
35 Ibid p 86 36 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca
para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018
37 GRECCO Leonardo A Crise do Processo de Execuccedilatildeo in Estudos de direito processual Leonardo Greco ndash Campos dos Goytacazes Ed Faculdade de Direito de Campos 2005 p 7
38 Ibid p 7 39 Ibid p 7-8
18 A inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios contribui para a crise do processo de
execuccedilatildeo tendo em vista que
ldquoo juiz da execuccedilatildeo prisioneiro de ritos que o distanciam das partes e da realidade da vida impulsiona sem qualquer apetite a execuccedilatildeo conduzindo-a ao sabor dos ventos das provocaccedilotildees impacientes do credor e das costumeiras procrastinaccedilotildees do devedorrdquo 40
Jaacute ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais atrapalha a efetivaccedilatildeo da tutela satisfativa ldquoo
devedor natildeo colabora com a execuccedilatildeo e os meios de pressatildeo que a lei estabelece natildeo satildeo
suficientes para intimidaacute-lordquo 41
Com um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico
O espiacuterito empresarial e a sociedade de consumo estimulam o endividamento das pessoas e o inadimplemento das obrigaccedilotildees pelo devedor deixou de ser vexatoacuterio e reprovaacutevel o que multiplica as accedilotildees de cobranccedila e execuccedilotildees atraveacutes das quais o sujeito passivo ainda usufrui vantagens agraves custas do credor 42
Por fim Leonardo Greco elenca a volatizaccedilatildeo dos bens como o uacuteltimo fator que
macula o processo executo tendo em vista que
ldquomudou inteiramente o perfil patrimonial das pessoas antes concentrado em bens de raiz e agora tendencialmente dirigido a investimentos em tiacutetulos e valores facilmente negociaacuteveis o que dificulta a sua localizaccedilatildeo pelo credorrdquo 43
O Coacutedigo de Processo Civil de 1973 introduziu o sistema executivo ao ordenamento
juriacutedico paacutetrio e seguindo os valores liberais da eacutepoca com a proteccedilatildeo de esfera juriacutedica de
liberdade do cidadatildeo contra a possibilidade de arbiacutetrio do Estado e uso indevido do Poder
jurisdicional outorgou o miacutenimo de poder ao juiz Seguindo as regras do CPC de 73 o
devedor soacute poderia ter sua esfera juriacutedica invadida atraveacutes de meios de execuccedilatildeo instituiacutedos
previamente em lei
Diante de tantos obstaacuteculos para se efetivar a tutela satisfativa a execuccedilatildeo estava
fadada ao fracasso o que frustrava a expectativa do jurisdicionado a uma prestaccedilatildeo da tutela
jurisdicional ceacutelere e efetiva Insatisfeitos com o cenaacuterio que se encontrava a atividade
40 Ibid p 8 41 Ibid p8 42 Ibid p 8 43 Ibid p8
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executiva legisladores e operadores do direito natildeo mediram esforccedilos para promover uma
evoluccedilatildeo significativa buscando mais eficiecircncia e celeridade ao procedimento executoacuterio
Dessa forma no final de 1994 foi introduzido no coacutedigo de processo agrave flexibilizaccedilatildeo
dos poderes executoacuterios do juiz ldquopara que ele pudesse prestar uma tutela efetiva aos direitos
ficando autorizado a determinar a modalidade de execuccedilatildeo adequada a cada hipoacutetese nas
obrigaccedilotildees de fazer e natildeo fazer (art 461 sect5ordm do CPC de 1973)rdquo No ano de 2002 a referida
medida foi estendida para as obrigaccedilotildees de entregar coisa (art 461-A caput e sect3ordm do CPC de
1973)
Com fundamento nos artigos 461 e 461-A em 2005 a Lei nordm 11 23205 unificou o
processo de conhecimento e o processo de execuccedilatildeo de sentenccedila Nesse sentido Maacuterio
Henrique Cavalcanti Gil Rodrigues44 aduz que
A Lei 112322005 reuniu de forma definitiva os processos de conhecimento e de execuccedilatildeo em um uacutenico processo composto por um sistema bifaacutesico Assim passa a existir uma fase inicial (de reconhecimento) e uma fase posterior (de cumprimento de sentenccedila de efetivaccedilatildeo da decisatildeo definitiva) sem contar com a eventual fase intermediaacuteria de liquidaccedilatildeo (RODRIGUES 2010 p 38)
Ademais as alteraccedilotildees realizadas no CPC de 73 inseriu a atipicidade dos meios
executivos nas obrigaccedilotildees de fazer natildeo fazer e dar coisa certa entretanto exercendo papel
subsidiaacuterio aos meios tiacutepicos
Quanto agraves obrigaccedilotildees de pagar quantia havia apenas a possibilidade de se valer da
incidecircncia de multa do art 475-J do CPC de 73 ndash implementada mediante reforma perpetrada
pela Lei nordm 11232 de 2005 em atendimento a doutrina processualista preocupada com a
efetividade das decisotildees ndash e de atos executivos como a penhora de bens e dinheiro
Ainda que a execuccedilatildeo tenha avanccedilado com a inserccedilatildeo das leis posteriores a 1994 no
CPC de 1973 a mesma continuava insuficiente tendo em vista que a burocracia e lentidatildeo
dos atos executivos davam brechas para que o devedor escondesse seu patrimocircnio penhoraacutevel
tornando carente de efetividade e celeridade agrave execuccedilatildeo
44 RODRIGUES Maacuterio Henrique Cavalcanti Gil A evoluccedilatildeo da execuccedilatildeo de sentenccedila no direito
processual civil e o novo regime juriacutedico das sentenccedilas apoacutes a reforma implementada pela Lei 112322005 Revista do Tribunal Regional Federal da 1ordf Regiatildeo v 22 n 2 fev 2010 p 38
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25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO
A tutela juridiscional eacute um direito fundamental previsto no art 5ordm inciso XXXV da
Carta Magna ldquo() a lei natildeo excluiraacute da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio lesatildeo ou ameaccedila a
direitordquo
Na visatildeo claacutessica o direito de accedilatildeo era efetivado com a prolaccedilatildeo de uma sentenccedila de
meacuterito posiccedilatildeo adotada por grande parte dos processualistas seguidores da doutrina de
Liebman Todavia esse conceito se mostra defasado tendo em vista que o direito de acesso agrave
justiccedila natildeo eacute apenas uma garantia formal de bater as portas do judiciaacuterio mas a garantia de
acesso agrave ordem juriacutedica justa adequada e eficaz45
Acreditar que uma sentenccedila de meacuterito favoraacutevel eacute tutela jurisdicional suficiente para
satisfazer o que se busca com o ajuizamento da accedilatildeo eacute uma visatildeo distorcida da atividade
satisfativa ldquoSob o ponto de vista do direito material a condenaccedilatildeo por si soacute eacute incapaz de
prestar a tutela do direitordquo46
Nessa oacutetica o direito fundamental agrave tutela executiva exige um sistema de tutela
jurisdicional ldquocapaz de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor
de tutela executivardquo47 Dessa forma entende-se que
ldquo() a) a interpretaccedilatildeo das normas que regulamentam a tutela executiva tem de ser feita no sentido de extrair a maior efetividade possiacutevel b) o juiz tem o poder-dever de deixar de aplicar uma norma que imponha uma restriccedilatildeo a um meio executivo sempre que essa restriccedilatildeo natildeo se justificar como forma de proteccedilatildeo a outro direito fundamental c) o juiz tem o poder-dever de adotar os meios executivos que se revelem necessaacuterios agrave prestaccedilatildeo integral de tutela executivardquo48
Egrave imperioso compreender que o direito fundamental agrave tutela executiva ratificado
pelo CPC eacute essencial para dirimir diversos litiacutegios oriundos do procedimento executivo
45 FERREIRA Gabriela Macedo Poder geral de efetivaccedilatildeo em defesa da constitucionalidade da
teacutecnica de execuccedilatildeo dos direitos do art 139 IV do Coacutedigo de Processo Civil Revista Jus Navigandi ISSN 1518-4862 Teresina ano 22 n 5178 4 set 2017 Disponiacutevel em lthttpsjuscombrartigos60190gt Acesso em 11 set 2018
46 Ibid natildeo paginado 47 DIDIER JR Fredie et al apud GUERRA Marcelo lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do credor
na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 48 Ibid p 102-104
21
ldquoprincipalmente aqueles relacionados agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo49
Fredie Didier et al50 cita como exemplo as hipoacuteteses de impenhorabilidade
A impenhorabilidade de certos bens eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa
Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais
Por esta razatildeo o legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do
CPC fazendo um preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses das partes envolvidas
optando pela mitigaccedilatildeo do direito do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado
Quando o oacutergatildeo jurisdicional verificar que a aplicaccedilatildeo das regras de
impenhorabilidade eacute desproporcional para o caso concreto deve afastaacute-la e construir a
soluccedilatildeo adequada para o referido caso Didier et al51 traz um exemplo esclarecedor em sua
obra
O bem imoacutevel que serve de moradia da famiacutelia eacute relativamente impenhoraacutevel Objetiva-se com essa restriccedilatildeo proteger o direito fundamental agrave moradia conteuacutedo do direito agrave proteccedilatildeo da dignidade Imagine-se um imoacutevel de altiacutessimo valor Imagine-se agora um creacutedito que corresponda a 40 do valor do imoacutevel A venda judicial do imoacutevel no caso permitiria natildeo soacute satisfazer o direito do credor como ainda garantir ao executado com a sobra a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel que lhe preserve a dignidade A opccedilatildeo pela interpretaccedilatildeo literal da regra que veda a penhora protegeria exclusivamente o direito do executado de maneira desnecessaacuteria porque a relaccedilatildeo valor executadovalor do bem permitiria a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel apoacutes a entrega do dinheiro ao credor Seria pois interpretaccedilatildeo em desconformidade com os preceitos da contemporacircnea hermenecircutica constitucional que preconiza a necessidade de nos casos de choque entre direitos fundamentais dar a interpretaccedilatildeo que mais adequadamente proteja a ambos
A execuccedilatildeo civil integra o direito fundamental agrave tutela jurisdicional disciplinando
que ldquoos dispositivos devem ser interpretados de modo que se garanta a maior efetividade
49 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66 50 Ibid p 66 51 Ibid p 67
22
possiacutevel agrave execuccedilatildeo desde que respeitados outros direitos fundamentaisrdquo52 Podendo ser
afastada desde que proporcional qualquer obstaacuteculo irrazoaacutevel agrave efetivaccedilatildeo desse direito
52 FERREIRA Gabriela Macedo apud MACEDO Lucas Buril de As eficaacutecias das decisotildees judiciais e
o cumprimento de sentenccedila no CPC15 Novo CPC Doutrina selecionada v 5 Execuccedilatildeo Coordenador geral Fredie Didier Jr organizadores Lucas Buril de Macedo Ravi Peixoto Alexandre Freire ndash Salvador Jus Podivm 2015 p 360361
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3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO
EXECUTADO
31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS
Como forma de controlar a atividade jurisdicional por muito tempo vigorou o
entendimento de que a execuccedilatildeo somente poderia ser realizada atraveacutes dos meios executivos
tipicamente previstos na legislaccedilatildeo Segundo Luiz Guilherme Marinoni53
O princiacutepio da tipicidade deseja significar que os meios de execuccedilatildeo devem estar previstos na lei e assim que a execuccedilatildeo natildeo pode ocorrer atraveacutes de formas executivas natildeo tipificadas O seu objetivo eacute de um lado impedir que meio executivo natildeo previsto em lei possa ser utilizado e de outro garantir o jurisdicionado contra a possibilidade de arbiacutetrio judicial na fixaccedilatildeo da modalidade executiva Se o jurisdicionado sabe em razatildeo de previsatildeo legal que a sua esfera juriacutedica somente poderaacute ser invadida atraveacutes de determinadas modalidades executivas confere-se a ele a possibilidade de antever a reaccedilatildeo ao seu inadimplemento bem como a garantia de que a jurisdiccedilatildeo natildeo determinaraacute ou permitiraacute a utilizaccedilatildeo de meio executivo diverso daqueles previstos
Dessa forma o princiacutepio da tipicidade disciplina que o oacutergatildeo julgador ao proceder agrave
execuccedilatildeo estaacute limitado aos meios executivos previamente definidos em lei natildeo podendo se
valer de qualquer teacutecnica de efetivaccedilatildeo que natildeo se encaixasse nas hipoacuteteses taxativas da
legislaccedilatildeo
Entretanto o legislador natildeo tem como prever todas as peculiaridades dos direitos
dignos de tutela executiva e preordenar teacutecnicas executivas diversas para cada peculiaridade
Sob esse cenaacuterio o principio da tipicidade foi cedendo lugar ao principio da atipicidade dos
meios executivos
A ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do oacutergatildeo julgador estaacute cada vez mais presente
no ordenamento juriacutedico paacutetrio motivando um poder geral de efetivaccedilatildeo ldquoque permite ao
julgador valer-se dos meios executivos que considerar mais adequado ao caso concreto sejam
eles de coerccedilatildeo direta sejam de coerccedilatildeo indiretardquo 54
53 MARINONI Luiz Guilherme Teacutecnica processual e tutela dos direitos Satildeo Paulo Editora Revista
dos Tribunais 2004 p 212 nota 79 54 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 100
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Essa tendecircncia de ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do juiz natildeo eacute exclusividade do
ordenamento juriacutedico brasileiro segundo Fredie Didier et al55
Michelle Taruffo jaacute apontava que o direito americano diante da inefetividade dos meios executivos at law comeccedilou a autorizar o magistrado a tomar medidas executivas adequadas ao caso concreto Trata-se afirma o jurista italiano de aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo segundo o qual as regras processuais devem ser adaptadas agraves necessidades do direito material
Os meios executivos atiacutepicos derivam de trecircs enunciados normativos do Coacutedigo de
Processo Civil o art 139 IV o art 297 e o sect1ordm do art 536
O art 139 IV do CPC dispotildee que pertence ao juiz o poder-dever de ldquodeterminar
todas as medidas indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para
assegurar o cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto
prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo
Jaacute o art 297 do CPC cuida da tutela provisoacuteria e garante que ldquoo juiz poderaacute
determinar as medidas que considerar adequadas para a efetivaccedilatildeo da tutela provisoacuteriardquo
Podendo dessa forma a dita tutela ser efetivada atipicamente
Por fim o art 536 sect1ordm do CPC dispotildee que
Para atender ao disposto no caput o juiz poderaacute determinar entre outras medidas a imposiccedilatildeo de multa a busca e apreensatildeo a remoccedilatildeo de pessoas e coisas o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva podendo caso necessaacuterio requisitar o auxilio de forccedila policial
As supracitadas medidas executivas atiacutepicas satildeo entendidas pela doutrina como
claacuteusulas gerais processuais executivas56 Essas claacuteusulas gerais natildeo restringem a sua
aplicaccedilatildeo agraves teacutecnicas de coerccedilatildeo indireta satildeo autorizados tambeacutem o uso de meios de execuccedilatildeo
dieta e indireta
Ademais cumpre salientar que o art 139 IV CPC aplica-se a toda e qualquer
atividade executiva ldquoa) seja fundada em tiacutetulo executivo judicial (provisoacuteria ou definitiva)
55 DIDIER JR Fredie et al apud TARUFFO Michelle A atuaccedilatildeo executiva dos direitos perfis
comparatiacutesticos Revista de Processo Satildeo Paulo RT 1990 n 59 p 78 56 Segundo Fredie Didier et al claacuteusula geral eacute uma espeacutecie de texto normativo cujo antecedente
(hipoacutetese faacutetica) eacute composto por termos vagos e consequente (efeito juriacutedico) eacute indeterminado
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seja fundada em tiacutetulo executivo extrajudicial b) seja para efetivar prestaccedilatildeo pecuniaacuteria seja
para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer ou dar coisa distinta de dinheirordquo57
Jaacute o art 297 do CPC garante que a tutela provisoacuteria possa ser efetivada tambeacutem
atipicamente ldquoSucede que a atipicidade da tutela provisoacuteria segue necessariamente a
atipicidade da tutela definitivardquo 58
Por fim o comando do sect 1 ordmdo art 536 se aplica
a) inicialmente agrave execuccedilatildeo de fazer e de natildeo fazer fundada em decisatildeo judicial (provisoacuteria ou definitiva) b) por forccedila do sect 3ordm do art 538 tambeacutem se aplica ao cumprimento de sentenccedila para entrega de coisa c) por forccedila do art 771 paraacutegrafo uacutenico o dispositivo tambeacutem se aplica agrave execuccedilatildeo para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer e entregar coisa distinta de dinheiro fundada em tiacutetulo extrajudicial
Claramente o art 139 IV eacute mais amplo do que o sect 1 ordm do art 536 estende-se por
disposiccedilatildeo expressa agrave execuccedilatildeo de pagar quantia Sendo uma grande novidade nas obrigaccedilotildees
que tem por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15
O art 139 IV do CPC apresentou uma novidade agrave atipicidade dos meios executivos
ao disciplinar que cabe ao juiz ldquodeterminar todas as medidas indutivas coercitivas
mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o cumprimento de ordem judicial
inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo
A inovaccedilatildeo estaacute na possibilidade de utilizar os meios atiacutepicos para assegurar o
cumprimento de decisotildees que versam sobre as obrigaccedilotildees pecuniaacuterias sendo admitida a
utilizaccedilatildeo de outros meios ateacute na execuccedilatildeo de titulo judicial de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria aleacutem da
multa de 10 (a que se refere o artigo 523 sect 1ordm do CPC) para forccedilar o devedor a cumprir a
obrigaccedilatildeo pecuniaacuteria
57 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 105 58 Ibid p 105
26
Dessa forma eacute possiacutevel afirmar que ldquoao lado da disciplina tiacutepica do art 523 e
seguintes () o novo CPC inova ao permitir que o sistema de teacutecnicas executivas atiacutepicas
sejam empregadas na execuccedilatildeo monetaacuteriardquo59 (ZARONI VITORELLI 2016 p 66)
Fernando da Fonseca Gajardoni60 denomina a dita medida como a ldquorevoluccedilatildeo
silenciosardquo da execuccedilatildeo por quantia certa posto que
() pelo fato de que a regra natildeo estar propriamente incrustrada nos capiacutetulo e livro atinentes ao cumprimento de sentenccedila e ao processo de execuccedilatildeo ndash o art 139 IV do Novo CPC parece trazer ao paiacutes algo bastante novo cuja aplicaccedilatildeo a depender do comportamento do Judiciaacuterio pode implicar em verdadeira revoluccedilatildeo (positiva ou negativa) na sistemaacutetica executiva ateacute entatildeo vigente
Claramente o dispositivo foi recebido com entusiasmo por parte da doutrina que
anteciparam em afirmar que o princiacutepio da atipicidade dos meios executivos no CPC2015
ldquo() assume a feiccedilatildeo de poder-dever geral conferido ao magistrado de determinar () todas
as medidas coercitivas sub-rogatoacuterias mandamentais e indutivas que entender necessaacuterias
para a tutela justa efetiva e em tempo razoaacutevelrdquo 61
Dessa forma lecionam Luiz Guilherme Marinoni Seacutergio Cruz Arenhart e Daniel
Mitidiero62 que
O juiz a partir do art 139 IV do CPC2015 natildeo estaacute mais adstrito apenas agrave sentenccedila condenatoacuteria ndash que fixa a obrigaccedilatildeo de pagar e daacute ensejo agrave abertura da execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo patrimonial ndash para a tutela de prestaccedilotildees pecuniaacuterias Pode impor essa prestaccedilatildeo por meio de ordem judicial acoplada ao aceno de emprego de medida de induccedilatildeo (coercitiva ou de pressatildeo positiva) ou de medida de sub-rogaccedilatildeo (MARINONI ARENHARDT MITIDIERO 2015 p 703)
Deste modo em razatildeo do art 139 IV do CPC tem-se entendido que o juiz nas
execuccedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria possui a faculdade de adotar qualquer
59 ZARONI Bruno Marzullo VITORELLI Edilson Reforma e efetividade da execuccedilatildeo no novo CPC
In PEIXOTO Ravi FREIRE Alexandre MENDES Aluiacutesio Gonccedilalves de Castro Execuccedilatildeo 2 ed rev e atual Salvador JusPodivm 2016 766 p (Coleccedilatildeo novo CPC doutrina selecionada v 5) p 66
60 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia 24082015 JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Acesso em 23082018
61 LIMA Rafael de Oliveira A atipicidade dos meios executivos no coacutedigo de processo civil brasileiro de 2015 Revista de Processo Jurisdiccedilatildeo e Efetividade da Justiccedila v 2 n 2 juldez 2016 p 11
62 MARINONI Luiz Guilherme ARENHART Seacutergio Cruz MITIDIERO Daniel Novo curso de processo civil tutela dos direitos mediante procedimento comum Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 v 2 p 703
27
medida indutiva coercitiva mandamentais ou sub-rogatoacuterias para efetivar o creacutedito do
exequente natildeo se limitando as medidas tiacutepicas
Alguns doutrinadores se precipitaram ao afirmar que o dito dispositivo ldquo() autoriza o
juiz a utilizar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir ressalvando-se a prisatildeo
civil constitucionalmente limitada ao devedor de alimentosrdquo 63 Acreditam Jorge Bheron
Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa que o entusiasmo por parte da
doutrina abre margem para as mais variadas formas de compelir o devedor a cumprir com a
prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
ldquoE aiacute persistindo no mau vezo de fazer explicaccedilotildees em abstrato ignorando que o sentindo soacute se daacute na aplicaccedilatildeo (situaccedilatildeo concreta real ou fictiacutecia) as sugestatildeo satildeo as mais engenhosas suspensatildeo de CNH retenccedilatildeo de passaporte restriccedilatildeo de fim de semana cancelamento de cartotildees de creacutedito ndash para ficar apenas nestasrdquo 64
Ou seja podendo o juiz natildeo apenas substituir o devedor tomando seu patrimocircnio para
entregar ao credor na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia como tambeacutem poderaacute
pressionaacute-lo psicologicamente a adimplir por conta proacutepria a obrigaccedilatildeo
Ademais o Enunciado nordm 48 do ENFAM avalia expressamente a possibilidade de
imposiccedilatildeo de medidas coercitivas para a efetivaccedilatildeo da execuccedilatildeo pecuniaacuteria Conforme o dito
enunciado
ldquoO art 139 inciso IV traduz um poder geral de efetivaccedilatildeo permitindo a aplicaccedilatildeo de medidas atiacutepicas para garantir o cumprimento de qualquer ordem judicial inclusive no acircmbito do cumprimento de sentenccedila e no processo de execuccedilatildeo baseado em tiacutetulosrdquo
Dessa forma o artigo 139 IV do CPC permite uma gama ampla de interpretaccedilotildees por
parte da doutrina por ser uma claacuteusula geral encontrando limite apenas na imaginaccedilatildeo de
quem o analisa Nesse sentido eacute forccediloso orientar e delimitar o manejo desse artigo legal para
que se extraia seu sentido e alcance revelando assim sobre que situaccedilotildees ele incide de que
modo e o que permite
63 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
64 Ibid sem paginaccedilatildeo
28
32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER
GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
O artigo 139 IV com a vigecircncia do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 abriu margem
para uma constelaccedilatildeo de decisotildees nas quais o dito dispositivo recebeu diversas interpretaccedilotildees
pelos operadores do direito
Sem duacutevidas por ser uma das pioneiras a decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara
Ciacutevel do Foro Regional de Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-
1320138260011 na data de 25 de agosto de 2016 gerou um enorme rebuliccedilo
Nessa accedilatildeo que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto
uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a
suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o
passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito
Segundo a magistrada o processo tramitava haacute anos sem que nenhum valor tenha sido
pago ao exequente aleacutem do devedor natildeo ter oferecido proposta de acordo e nem ter indicado
bens agrave penhora configurando uma completa desiacutedia com o processo
ldquoO caso tratado nos autos se insere dentre as hipoacuteteses em que eacute cabiacutevel a aplicaccedilatildeo do art 139 inciso IV do Coacutedigo de Processo Civil Isso porque o processo tramita desde 2013 sem que qualquer valor tenha sido pago ao exequente Todas as medidas executivas cabiacuteveis foram tomadas sendo que o executado natildeo paga a diacutevida natildeo indica bens agrave penhora natildeo faz proposta de acordo e sequer cumpre de forma adequada as ordens judiciais frustrando a execuccedilatildeo
Se o executado natildeo tem como solver a presente diacutevida tambeacutem natildeo recursos para viagens internacionais ou para manter um veiacuteculo ou mesmo manter um cartatildeo de creacutedito Se poreacutem mantiver tais atividades poderaacute quitar a diacutevida razatildeo pela qual a medida coercitiva poderaacute se mostrar efetiva
Assim como medida coercitiva objetivando a efetivaccedilatildeo da presente execuccedilatildeo defiro o pedido formulado pelo exequente e suspendo a Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo do executado M A S determinando ainda a apreensatildeo de seu passaporte ateacute o pagamento da presente diacutevida
()
Determino ainda o cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado ateacute o pagamento da presente diacutevida ()rdquo
Foi impetrado Habeas Corpus no Tribunal de Justiccedila do Estado de Satildeo Paulo a favor
do executado sob o fundamento que a coaccedilatildeo era ilegal e afetava o direito de locomoccedilatildeo
29
garantido constitucionalmente Tendo sido concedida a liminar em decisatildeo que ora se
reproduz
Em que pese a nova sistemaacutetica trazida pelo art 139 IV do CPC2015 deve-se considerar que a base estrutural do ordenamento juriacutedico eacute a Constituiccedilatildeo Federal que em seu art 5ordm XV consagra o direito de ir e vir Ademais o art 8ordm do CPC2015 tambeacutem preceitua que ao aplicar o ordenamento juriacutedico o juiz natildeo atentaraacute apenas para a eficiecircncia do processo mas tambeacutem aos fins sociais e agraves exigecircncias do bem comum devendo ainda resguardar e promover a dignidade da pessoa humana observando a proporcionalidade a razoabilidade e a legalidade Por tais motivos concedo a liminar pleiteada65
Cabe destacar aqui o voto vencido da Desembargadora Maria Luacutecia Pizzotti no
julgamento do Habeas Corpus supracitado demonstrando que o debate sobre a abrangecircncia
do artigo 139 IV do CPC ocorre tanto na doutrina quanto no judiciaacuterio
O objetivo do novel dispositivo natildeo eacute impor penas ou restringir direitos natildeo sendo intenccedilatildeo do Judiciaacuterio suspender indefinidamente o direito de dirigir do executado ou sua liberdade de viajar mas sim impor uma restriccedilatildeo tatildeo gravosa caso ele natildeo cumpra a determinaccedilatildeo que escolha cumprir sua obrigaccedilatildeo e dar fim ao problema Em outras palavras mediante as medidas de coerccedilatildeo o Estado procura persuadir o inadimplente impondo-lhe situaccedilotildees tatildeo onerosas e inconvenientes que em algum momento seja para ele mais vantajoso cumprir do que permanecer no inadimplemento
Ao fazecirc-lo o Novo Coacutedigo de Processo Civil rompe com as criacuteticas da ineficiecircncia das execuccedilotildees Natildeo se cogita deferir medidas restritivas agravequeles que demonstram a incapacidade absoluta de solver o deacutebito apenas agravequeles que reconhecidamente se valem de artimanhas e subterfuacutegios para evitar a satisfaccedilatildeo das diacutevidas ldquopreferindordquo outras despesas mais lsquonobresrsquo agindo em nome de terceiros e fazendo escaacuternio dos credores e do proacuteprio Poder Judiciaacuterio (hellip)
Para tanto memoraacutevel a noccedilatildeo de que a medida em comento tem caraacuteter excepcional e encontra limites no plano da proporcionalidade como sustenta o ilustrado Magistrado paulista Fernando da Fonseca Gajardoni Professor Faculdade de Direito de Ribeiratildeo Preto da USP (in httpswwwjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 acesso em 091216 agraves 11h20min) E para anaacutelise da proporcionalidade a ponderaccedilatildeo deve observar os trecircs passos apontados pela doutrina a necessidade a adequaccedilatildeo e a proporcionalidade em sentido estrito
65 TJSP - Habeas Corpus Processo nordm 2183713-8520168260000 30ordf Cacircmara Direito Privado relator
Des Marcos Ramos j 290317
30
Ademais no entendimento de Jorge Amaury Maia Nunes e Guilherme Pupe de
Noacutebrega66 essa decisatildeo releva os perigos trazidos pelo art 139 IV do CPC ao confrontar
direitos constitucionalmente garantidos
De nossa parte entendemos que a liberdade de locomoccedilatildeo inserta no inciso XV do artigo 5ordm que abrange o direito de deixar o territoacuterio nacional sofre embaraccedilo indevido pela apreensatildeo de passaporte ou pela suspensatildeo da carteira nacional de habilitaccedilatildeo
()
Agrave luz da exposiccedilatildeo feita acima e em anaacutelise primeva sustentamos que o artigo 139 IV do CPC de 2015 estaacute a merecer declaraccedilatildeo de inconstitucionalidade sem reduccedilatildeo de texto para o fim de rechaccedilar a apreensatildeo de passaporte a suspensatildeo do direito de dirigir e a vedaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo em concurso ou em licitaccedilatildeo puacuteblicos como medidas passiacuteveis de serem adotadas pelo juiz sob pena de vulneraccedilatildeo aos artigos 1ordm IV 5ordm XV e LIV 37 I 173 sect 3ordm III e 175 todos da Constituiccedilatildeo
Apesar de ter sofrido duras criacuteticas a decisatildeo do processo de nordm 4001386-
1320138260011 serviu de inspiraccedilatildeo para tantas outras decisotildees no mesmo sentido
Foi o caso da decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de Satildeo
Vicente em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 0020724-2620088260590 na data de 21 de
junho de 2017
A supracitada execuccedilatildeo se arrastava por nove (09) anos sem que o devedor tenha
esboccedilado qualquer intenccedilatildeo de pagar a diacutevida O credor requereu a suspensatildeo da Carteira
Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado apreensatildeo do passaporte e cancelamento dos
cartotildees de creacutedito
O magistrado com embasamento no artigo 139 IV do CPC deferiu parcialmente o
pedido sob o fundamento de que a apreensatildeo de passaporte e CNH natildeo viola o direito de ir e
vir do devedor Entretanto o juiz indeferiu o pedido de cancelamento do cartatildeo de creacutedito por
acreditar que a suspensatildeo poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado tendo em
vista que atualmente as pessoas utilizam o referido cartatildeo para pagamento das despesas
diaacuterias
66 NOBREacuteGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139
IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018
31
Eacute evidente que as medidas atiacutepicas de coerccedilatildeo devem ser utilizadas com cautela sempre respeitando a dignidade da pessoa do executado Natildeo se vislumbra contudo que as medidas aqui eleitas sejam capazes de vulnerar os Direitos Fundamentais do indiviacuteduo A uma porque natildeo se trata de restriccedilatildeo ao direito de ir e vir do executado que continua no gozo de plena liberdade de locomoccedilatildeo a duas porque a conduccedilatildeo de veiacuteculo automotor eacute mera comodidade da vida moderna natildeo se tratando de direito absoluto
Com mais razatildeo ainda se admite a suspensatildeo do Passaporte do executado que se natildeo paga a diacutevida da execuccedilatildeo natildeo deve ter o direito de fazer viagem internacional
Tem-se aqui verdadeiro exerciacutecio de ponderaccedilatildeo de interesses juriacutedicos de um lado jaz o direito de creacutedito do exequente que deriva do direito de propriedade e por isso mesmo tem envergadura constitucional de outro giro tem-se o direito do executado agrave autorizaccedilatildeo do Estado para conduzir veiacuteculo automotor e realizar viagens internacionais que natildeo se mostram essenciais agrave dignidade da pessoa humana Natildeo haacute duacutevidas pois de que eacute este uacuteltimo que deve sucumbir
O pedido fica indeferido apenas no tocante agrave suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado Eacute que ao contraacuterio da CNH e do passaporte que trazem consigo certa presunccedilatildeo de riqueza natildeo se pode concluir que o uso de cartatildeo de creacutedito eacute feito por luxo ou simples conveniecircncia
Como eacute cediccedilo os cartotildees de creacutedito oferecem ao seu titular creacutedito raacutepido e rotativo para o pagamento de despesas diaacuterias e certamente exercem funccedilatildeo essencial agravequeles que se encontram em situaccedilatildeo financeira precaacuteria
A suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado portanto se revela medida desproporcional e que inclusive poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado
Pelo exposto defiro em parte o pedido formulado pelo exequente e DETERMINO a suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo e bem como a suspensatildeo da validade (cancelamento temporaacuterio) no sistema SINPA de eventuais passaportes vaacutelidos em nome do executado
Dessa forma o artigo 139 IV do CPC revolucionou completamente a execuccedilatildeo de
obrigaccedilatildeo de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria ao permitir a utilizaccedilatildeo do uso dos meios executivos
atiacutepicos para compelir o executado a satisfazer o creacutedito do exequente
33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE
EFETIVACcedilAtildeO
Era inevitaacutevel que o artigo 139 IV do CPC gerasse todo tipo de reaccedilatildeo entre os
doutrinadores do processo civil e ateacute mesmo de outros ramos do direito devido a sua
capacidade de realizar uma completa inovaccedilatildeo na forma de se executar as obrigaccedilotildees de pagar
quantia Alguns o aplaudiram visualizando nele ldquouma luz no fim do tuacutenelrdquo outros o
criticaram vislumbrando as arbitrariedades que poderiam ser praticadas com embasamento no
referido dispositivo
32
As decisotildees suscitadas em linhas preteacuteritas auxiliaram para fervilhar ainda mais o
debate sobre o tema tendo em vista que por um lado poderia aumentar a efetividade das
execuccedilotildees por quantia no entanto por outro surgiam questionamentos a cerca da sua
constitucionalidade
A doutrina parece que demoraraacute a se pacificar sobre o tema Segundo alguns
doutrinadores seraacute inconstitucional toda restriccedilatildeo que recaia sobre a pessoa do devedor e natildeo
exclusivamente sobre o seu patrimocircnio Jaacute para outros o dispositivo eacute constitucional e o meio
mais eficaz para se resolver o problema da efetivaccedilatildeo das execuccedilotildees de pagar quantia ldquoA
discussatildeo se daacute especialmente no que diz respeito aacutes medidas de suspensatildeo de CNH
apreensatildeo de passaporte e bloqueio de cartotildees de creacutedito do devedorrdquo 67
O professor Thiago Rodovalho analisou detalhadamente a decisatildeo de nordm 4001386-
1320138260011 em seu artigo ldquoO necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na
concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivosrdquo 68 Quanto agrave suspensatildeo da CNH o autor
acredita que tal medida natildeo viola qualquer direito fundamental do devedor posto que ldquodirigir
veiacuteculos automotores eacute direito do cidadatildeo mas natildeo se confunde com os direitos fundamentais
e social de ir-e-vir e ao transporterdquo 69 O professor eacute categoacuterico ao afirmar que
Com relaccedilatildeo agrave suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (suspensatildeo do direito de dirigir restriccedilatildeo de direitos) natildeo nos parece haver qualquer violaccedilatildeo a direito fundamental ou social nem a direito da personalidade ou colocaccedilatildeo do devedor em situaccedilatildeo desproporcionalmente detrimentosa exceccedilatildeo feita aos que usam o veiacuteculo como instrumento de trabalho atraindo a hipoacutetese do NCPC art 833 inc V
()
Outrossim natildeo o consideramos como direito da personalidade Os direitos da personalidade satildeo os valores fundamentais que compotildeem o proacuteprio ser justamente por isso intransmissiacuteveis e irrenunciaacuteveis natildeo podendo o seu exerciacutecio sofrer limitaccedilatildeo voluntaacuteria (CC art 11) Por mais que vivamos num paiacutes que tanto valoriza o carro e que muitas pessoas de fato se compreendam em razatildeo e em funccedilatildeo do carro que dirijam este natildeo nos parece ser um direito que verdadeiramente componha a personalidade do indiviacuteduo70
67 DONTOS Sofia Poderes executoacuterios do juiz que diz a doutrina sobre o art 139 inc IV do CPC
Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigospoderes-executorios-do-juiz-que-diz-a-doutrina-sobre-art-139-inc-iv-do-cpc-23052018 gt Publicado em 23052018 Acesso em 01082018
68 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018
69 Ibid sem paginaccedilatildeo 70 Ibid sem paginaccedilatildeo
33
Quanto ao cancelamento dos cartotildees de credito do devedor o professor Thiago
Rodovalho tambeacutem acredita que natildeo haacute qualquer violaccedilatildeo ao direito fundamental social ou
da personalidade do devedor e acrescenta que
Tanto assim o eacute que ser titular de um cartatildeo de creacutedito pressupotildee ter creacutedito o que eacute analisado e concedido por instituiccedilotildees financeiras mais do que isso se porventura passando por dificuldades financeiras a pessoa deixa de honrar com pagamentos a mesma instituiccedilatildeo financeira concedente do cartatildeo de creacutedito pode sponte propria cancelaacute-lo ou recusar-lhe a concessatildeo Ora parece-me contraditoacuterio que instituiccedilotildees financeiras para sua proteccedilatildeo patrimonial possam ferir esse suposto ldquodireito fundamentalrdquo ou esse suposto ldquodireito da personalidaderdquo mas natildeo possa o Poder Judiciaacuterio igualmente fazecirc-lo contra aquele devedor moroso que instado ao pagamento e frustradas todas as tentativas de constriccedilatildeo patrimonial leva vida luxuosa valendo-se de cartotildees de creacutedito que prescindem de dinheiro em conta eacute dizer podem justamente funcionar como forma de ocultar renda e patrimocircnio71
O autor considera a apreensatildeo de passaporte um tema mais polecircmico e que merece
maior reflexatildeo No entanto crecirc que eacute possiacutevel a apreensatildeo de passaporte sem violar os
direitos fundamentais do devedor por se tratar de um direito de ir e vir de amplitude especial
Agrave primeira vista a possibilidade de apreensatildeo do passaporte tambeacutem nos parece possiacutevel pois tambeacutem se trata de um direito de ir e vir de amplitude especial Assim o eacute pois salvo situaccedilotildees especiais (refugiados p ex) haacute a necessidade de demonstrar condiccedilotildees financeiras de estadia e retorno para ser admitido no paiacutes de destino Ou seja pressupotildee uma condiccedilatildeo financeira que o devedor justamente diz natildeo possuir Sem embargo dessa consideraccedilatildeo esse ainda eacute um ponto que merece uma reflexatildeo mais acurada sendo essa apenas uma primeira impressatildeo72
Outros autores escreveram sobre o tema como eacute o caso do processualista Luiz
Dellore73 que tambeacutem defende que as medidas atiacutepicas como restriccedilatildeo ao direito de dirigir
apreensatildeo de passaporte e cancelamento de cartotildees de creacutedito satildeo permitidas e natildeo violam em
regra os direitos fundamentais do devedor
De minha parte creio que efetivamente haacute inovaccedilatildeo no at 139 IV do NCPC (e natildeo mera repeticcedilatildeo do que jaacute havia no Coacutedigo anterior) que tem o condatildeo de trazer mais efetividade ao processo executivo no Brasil ndash que por deacutecadas centrou sua atenccedilatildeo na defesa do executado (vide a grande quantidade de impenhorabilidades) sem dar maior atenccedilatildeo ao creacutedito do exequente
71 Ibid sem paginaccedilatildeo 72 Ibid sem paginaccedilatildeo 73 DELLORE Luiz NCPC Atipicidade das medidas executivas jaacute eacute realidade Disponiacutevel em lt
httpswwwjotainfoopiniao-e-analisecolunasnovo-cpcncpc-atipicidade-de-medidas-executivas-ja-e-realidade-17042017 gt Publicado em 17042017 Acesso em 03092018
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Logo a meu ver medidas como (i) restriccedilatildeo ao direito de dirigir (ii) apreensatildeo de passaporte (iii) cancelamento de cartotildees de creacutedito e (iv) vedaccedilatildeo de obtenccedilatildeo de novos empreacutestimos se natildeo vinculados ao pagamento do deacutebito exequendo dentre outras restriccedilotildees que deveratildeo ser observadas a cada caso satildeo permitidas pelo sistema do NCPC e em regra natildeo violam direitos fundamentais do devedor E tecircm o condatildeo de fazer com que o executado que tem recursos diante dessas medidas coercitivas pague o deacutebito trazendo sucesso agrave satisfaccedilatildeo do creacutedito
Nessa linha para Alexandre Fuchs das Neves74 o artigo 139 IV do CPC conferiu ao
juiz poderes coercitivos capazes de ldquotransformar a vida do devedor um infernordquo para compeli-
lo a cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria Entretanto pondera que para que a medida tenha
validade ldquoeacute necessaacuteria uma fundamentaccedilatildeo por evidente uma correlaccedilatildeo temaacutetica entre a
medida adotada e sua efetividade em face ao processo com fundamentaccedilatildeo detalhadardquo
No entendimento de Fernando Gajardoni75 satildeo possiacuteveis as medidas de apreensatildeo de
passaporte bloqueio de cartotildees de creacutedito e suspensatildeo da CNH Para ele o que limita o art
139 IV do CPC eacute o esgotamento dos meios tiacutepicos e a real necessidade da medida
Ilustrativamente natildeo efetuado o pagamento de diacutevida oriunda de multas de tracircnsito e superados os expedientes tradicionais de adimplemento (penhora de dinheiro e bens) seria liacutecito o estabelecimento da medida coercitivaindutiva de suspensatildeo do direito a conduzir veiacuteculo automotor ateacute pagamento do deacutebito (inclusive com apreensatildeo da CNH do devedor) natildeo efetuado pagamento de verbas salariais devidas a funcionaacuterios da empresa possiacutevel o estabelecimento de vedaccedilatildeo agrave contrataccedilatildeo de novos funcionaacuterios ateacute que seja saldada a diacutevida natildeo efetuado o pagamento de financiamento bancaacuterio na forma e no prazo avenccedilados possiacutevel ateacute que se tenha a quitaccedilatildeo que se obstem novos financiamentos ou mesmo a participaccedilatildeo do devedor em licitaccedilotildees (como de ordinaacuterio jaacute acontece com pessoas juriacutedicas em deacutebito tributaacuterio com o Poder Puacuteblico) etc
Teriacuteamos entatildeo no Brasil por assim dizer a adoccedilatildeo do padratildeo da atipicidade das medidas executivas tambeacutem para as obrigaccedilotildees de pagar vistas estas como ordens do EstadoJuiz para que haja prestaccedilatildeo de pagamento em pecuacutenia
()
Por isso ndash a prevalecer a interpretaccedilatildeo potencializada do art 139 IV do CPC2015 ndash o emprego de tais medidas coercitivasindutivas especialmente nas obrigaccedilotildees de pagar encontraraacute limite certo na excepcionalidade da medida (esgotamento dos meios tradicionais de satisfaccedilatildeo do deacutebito) na proporcionalidade (inclusive agrave luz da regra da menor onerosidade ao devedor do art 805 do CPC2015) na necessidade de fundamentaccedilatildeo substancial e especialmente nos direitos e garantias assegurados na Constituiccedilatildeo Federal (vg natildeo parece possiacutevel que se determine o pagamento sob pena de prisatildeo ou de vedaccedilatildeo ao exerciacutecio da profissatildeo do direito de ir e vir etc)
74 NEVES Alexandre Fuchs das Cancelamento de cartotildees de creacutedito e apreensatildeo de CNH e passaporte
do devedor Isso eacute possiacutevel Disponiacutevel em lt httpwwwsinfacspcombrconteudocancelamento-de-cartoes-de-credito-e-apreensao-de-cnh-e-passaporte-do-devedor-isso-e-possivel gt Acesso em 30082018
75 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Publicado em 24082015 Acesso em 30082018
35
Jaacute Fernanda Tartuce76 acredita que tais medidas satildeo problemaacuteticas e devem ser
analisadas com cautela tendo em vista que ao inveacutes de afetarem o patrimocircnio do devedor
atingem a proacutepria pessoa
Sob certo prisma adotar medidas diferenciadas contribui para a efetividade da prestaccedilatildeo jurisdicional Por outro lado o patrimocircnio ndash e natildeo a pessoa do devedor - responde por diacutevidas aleacutem disso o exerciacutecio de amplos poderes pelo juiz sem balizas especiacuteficas pode ensejar medidas inadequadas Nessa linha suspender o direito de dirigir e restringir o uso de passaporte satildeo iniciativas problemaacuteticas por atingirem a pessoa do devedor enquanto a penhora da restituiccedilatildeo de Imposto de Renda soa viaacutevel por afetar seu patrimocircnio Eacute importante que a medida diferenciada se revele proporcional e seja aplicada apoacutes o exaurimento de outros meios previstos no ordenamento Como a proposta do Novo Coacutedigo eacute aumentar a eficiecircncia processual intentar medidas ineficazes inexequiacuteveis eou de difiacutecil fiscalizaccedilatildeo pode acabar ensejando o efeito contraacuterio
Nessa senda Lenio Streck e Dierle Nunes77 entendem que as medidas atiacutepicas de
suspensatildeo da CNH eou apreensatildeo de passaporte satildeo inconstitucionais Afirmam que natildeo se
pode confundir o processo civil e penal ainda que ambos remetam a um ldquoparadigma
constitucional comumrdquo e que o artigo 139 IV do CPC ldquoimpotildee novos desafios interpretativos
que podem conduzir a uma anaacutelise superficial e utilitarista de busca de resultados que
desprezem a necessaacuteria leitura constitucionalrdquo Os autores ainda ponderam que ldquoO perigo eacute o
artigo 139 IV ser transformado em instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com
autorizaccedilatildeo judicialrdquo
O professor Araken de Assis no dia 18 de abril de 2018 em um evento sobre o
Coacutedigo Processual Civil de 2015 que ocorreu em Brasiacutelia na sede do Conselho Federal da
OAB declarou ser contraacuterio aos poderes executoacuterios atiacutepicos ldquoSou contra os poderes
atiacutepicos dos juiacutezes porque seu exerciacutecio redunda em simples arbitrariedadesrdquo78
Acrescentou ainda que
76 IBDFAM ndash Instituto Brasileiro de Famiacutelia O polecircmico inciso IV do artigo 139 do CPC e suas difusas
interpretaccedilotildees Disponiacutevel em lt httpwwwibdfamorgbrnoticias6096O+polC3AAmico+inciso+IV+do+artigo+139+do+CPC+e+suas+difusas+interpretaC3A7C3B5es gt Publicado em 31082016 Acesso em 04092018
77 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018
78 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04092018
36
Eacute evidentemente inconstitucional diante do princiacutepio da dignidade da pessoa humana tirar o passaporte carteira de habilitaccedilatildeo Quecirc que tem isso com diacutevidas Natildeo tem absolutamente nada Natildeo eacute a correlaccedilatildeo instrumental entre o objetivo da execuccedilatildeo e o meio empregado Isso eacute simples vinganccedila simples puniccedilatildeo79
O professor Araken de Assis acredita que tais medidas satildeo inconstitucionais e
violam o principio da dignidade humana do executado numa sociedade como a nossa
sedenta por puniccedilatildeo natildeo me surpreende que essas ideias sejam encaradas com
naturalidade Mas eacute preciso rejeitaacute-las em nome de princiacutepios 80
34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
A Constituiccedilatildeo Federal de 1988 tem como um dos seus fundamentos a dignidade da
pessoa humana presente no artigo 1ordm inciso III do referido texto constitucional O dito
princiacutepio tem o escopo de nortear o ordenamento juriacutedico como um todo
A inclusatildeo da dignidade da pessoa humana como princiacutepio constitucional obrigou
uma reflexatildeo sobre o papel da pessoa humana no direito e um redimensionamento para
elevaacute-la ao centro do ordenamento juriacutedico81 Eacute necessaacuterio recorrer agrave teoria Kantiana para
que se obtenha uma definiccedilatildeo do princiacutepio ora estudado Para Kant82 o homem eacute um fim
em si mesmo natildeo uma funccedilatildeo do Estado Ou Naccedilatildeo O Estado e o direito devem estar
organizados em benefiacutecio do indiviacuteduo
Agora eu afirmo o homem ndash e de uma maneira geral todo o ser racional ndash existe como fim em si mesmo e natildeo apenas como meio para o uso arbitraacuterio desta ou daquela vontade Em todas as suas accedilotildees pelo contraacuterio tanto nas direcionadas a ele mesmo como nas que o satildeo a outros seres racionais deve ser ele sempre considerado simultaneamente como fim
Partindo da premissa de que para Immanuel Kant o homem eacute o fim em si mesmo
ldquodevemos compreender que a dignidade da pessoa humana eacute a noccedilatildeo o comando a direccedilatildeo
que se deve seguir funcionando como fundamento para a interpretaccedilatildeo de todos os direitos e
garantias conferidos agrave pessoa nos ordenamentos juriacutedicos de cada Estadordquo 83
79 Ibid sem paginaccedilatildeo 80 Ibid sem paginaccedilatildeo 81 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito
fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 461 82 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud KANT Immanuel Fundamentaccedilatildeo da metafiacutesica dos costumes
Satildeo Paulo Martin Claret 2003 p56-59 Coleccedilatildeo A Obra-Prima de Cada Autor 83 SCHIAFIANO Juliana Rocha op cit p 461
37
O princiacutepio constitucional da dignidade da pessoa humana estaacute diretamente ligado ao
conteuacutedo dos direitos fundamentais logo para que se cumpra com os direitos fundamentais
constitucionalmente instituiacutedos eacute necessaacuterio reconhecer e respeitar a dignidade da pessoa
humana conforme disciplina Ingo Sarlet84
Em suma o que se pretende sustentar de modo mais enfaacutetico eacute que a dignidade da pessoa humana na condiccedilatildeo de valor (principio normativo) fundamental que atrai o conteuacutedo de todos os direitos fundamentais exige e pressupotildee o reconhecimento e proteccedilatildeo dos direitos fundamentais de todas as dimensotildees (ou geraccedilotildees se assim preferirmos) Assim sem que se reconheccedilam agrave pessoa humana os direitos fundamentais que lhe satildeo inerentes em verdade estarse-aacute lhe negando a proacutepria dignidade A consagraccedilatildeo constitucional da dignidade da pessoa humana tem o propoacutesito de limitar a atuaccedilatildeo ou a omissatildeo do Estado para garantir os direitos do indiviacuteduo Assim eacute difiacutecil precisar os efeitos da norma que determina a dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado (como acontece com a Constituiccedilatildeo brasileira de 1988) poreacutem quando desrespeitados os direitos fundamentais do cidadatildeo eacute possiacutevel identificar que a dignidade deste foi violada
Logo ldquoteraacute respeitada a sua dignidade o individuo que tiver respeitados os seus
direitos fundamentaisrdquo 85 Os direitos fundamentais estatildeo apresentados na Constituiccedilatildeo
Federal da seguinte forma direitos individuais e coletivos direitos sociais direitos poliacuteticos e
direitos de nacionalidade que tecircm como escopo garantir as liberdades positivas aos
indiviacuteduos ldquoonde foram conquistados direitos agrave liberdade religiosa liberdade civil e
profissional agrave propriedade ao livre acesso ao Judiciaacuterio agrave ampla defesa e ao contraditoacuterio no
processual judicial ao sigilo de dados e informaccedilotildees pessoais entre outros que somados
garantem o cidadatildeo uma vida dignardquo 86
O cidadatildeo na Constituiccedilatildeo Federal de 88 diferente das constituiccedilotildees brasileiras
anteriores passou a ser fundamento e ganhou destaque nos direitos fundamentais tendo
garantida a sua vida a sua dignidade a sua seguranccedila a sua honra a sua liberdade e a sua
propriedade
84 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud SARLET Ingo Wolfgang Dignidade da pessoa humana e
direitos fundamentais na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 2ed Porto Alegre Livraria do Advogado 2002 p87 85 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito
fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 462 86 Ibid p 462
38
Segundo Carmem Luacutecia Antunes Rocha87 para garantir o Estado Democraacutetico de
Direito eacute necessaacuterio que a sua atuaccedilatildeo seja sempre em conformidade com o princiacutepio da
dignidade da pessoa humana
O Estado somente eacute democraacutetico em sua concepccedilatildeo constitucionalizaccedilatildeo e atuaccedilatildeo quando respeita o princiacutepio da dignidade da pessoa humana Natildeo haacute verbo constitucional natildeo haacute verbo governamental que se faccedilam legiacutetimos quando natildeo se voltam ao atendimento daquele princiacutepio Natildeo haacute verdade constitucional natildeo haacute suporte institucional para as poliacuteticas puacuteblicas que natildeo sejam destinadas ao pleno cumprimento daquele valor maior transformado em princiacutepio constitucional
O princiacutepio da dignidade humana constitucionalmente garantido impotildee limites ao
Estado compelindo aos oacutergatildeos e atividades estatais respeitar o ser humano e garanti-lo
condiccedilotildees miacutenimas para uma vida digna Dessa forma eacute niacutetido que o dito princiacutepio eacute
pressuposto e indispensaacutevel para legitimar outras normas constitucionais e
principalmente infraconstitucionais
O Coacutedigo de Processo Civil eacute umas das principais normas infraconstitucionais que
sofre influecircncia dos preceitos valores e princiacutepios esculpidos na Constituiccedilatildeo Federal
Logo como o principio da dignidade humana eacute um dos mais importantes pressupostos
constitucionais ldquoentatildeo eacute tranquilo afirmar-se que o novel ordenamento processual tem
de se render nas resoluccedilotildees dos aspectos processuais e a fim de se atingir uma soluccedilatildeo
justa adequada e efetiva ao postulado da dignidade da pessoa humanardquo 88
Dessa forma o legislador deve formular as normas infraconstitucionais de acordo e a
partir do conteuacutedo constitucional para Marinoni Mitidiero e Arenhart89
() o Coacutedigo de Processo Civil constitui direito constitucional aplicado O Coacutedigo deve ser interpretado de acordo com a Constituiccedilatildeo e com os direitos fundamentais o que significa que as duacutevidas interpretativas devem ser resolvidas a favor da otimizaccedilatildeo do alcance da Constituiccedilatildeo e do processo civil como meio para tutela de direitos
87 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud ROCHA Carmen Luacutecia Antunes O princiacutepio da dignidade da
pessoa humana e a exclusatildeo social Revista Interesse Puacuteblico n4 p23-48 1999 p33 88 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o
novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 367
89 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 14
39
Com o escopo de conferir eficaacutecia aos mandamentos constitucionais o CPC15 traz a
previsatildeo e diversas claacuteusulas gerais em seus primeiros artigos em um dos quais se
prestigia o princiacutepio da dignidade da pessoa humana
O referido princiacutepio estaacute disciplinado no artigo 8ordm do CPC15 e atua como um guia
sobre as demais normas do coacutedigo processual Eacute o que entende Nelson Rosenvald90
O maior cuidado do inteacuterprete eacute no sentido de jamais banalizar a dignidade fazendo dela um elixir processual tal como muitas vezes se vecirc na esfera do direito civil Penso que natildeo haacute maiores dificuldades em transpor a noccedilatildeo constitucional do princiacutepio para em seguida adaptaacute-la agraves singularidades do processo
Logo de acordo com o artigo 8ordm do CPC o oacutergatildeo julgador ao aplicar o ordenamento
juriacutedico deve resguardar a dignidade da pessoa humana Para Fredie Didier91 ldquoresguardar
nesse contexto eacute de um lado aplicar corretamente a norma juriacutedica lsquoproteccedilatildeo da dignidade
da pessoa humanarsquo e de outro natildeo violar a dignidaderdquo
O oacutergatildeo julgador deveraacute manter um comportamento ativo com o objetivo de promover
a dignidade da pessoa humana podendo tomar medidas de ofiacutecio para efetivar a dignidade da
pessoa humana Didier assevera que o magistrado poderaacute ainda ldquovaler-se da claacuteusula geral de
atipicidade (art 536 sect 1ordm) para a execuccedilatildeo do direito fundamental agrave dignidaderdquo 92 O autor
ainda traz dois exemplos
a) exigecircncia de respeito agrave ordem cronoloacutegica de conclusatildeo (art 12) caso de grave violaccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana que natildeo se encaixe em um dos incisos que excepcionam a regra de observacircncia da cronologia da conclusatildeo poderia o juiz ldquofurar a filardquo para promover a dignidade da pessoa humana b) prioridade na tramitaccedilatildeo processual pessoa que seja portadora de doenccedila grave mas que natildeo esteja no rol do art 1048 I para promover a dignidade de pessoa humana o juiz poderia determinar o processamento prioritaacuterio93
Essa dupla garantia ndash resguardo e promoccedilatildeo ndash tem como objetivo garantir ao individuo
sua dignidade humana fazendo com que ldquode um lado que o Estado natildeo a viole e de outro
que o Estado a promova e efetiverdquo
90 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud ROSENVALD Nelson A
dignidade da pessoa humana no CPC15 91 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte
geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 75 92 Ibid p 75 93 Ibid p 75
40
Nessa senda o magistrado deveraacute promover a dignidade da pessoa humana quando
perceber a ausecircncia desta no processo ou assegura-la quando for posta em risco Eacute nesse
sentido o entendimento dos professores Marinoni Mitidiero e Arenhart94
() a dignidade da pessoa humana determina a compreensatildeo do processo civil como um meio para tutela dos direitos Vale dizer o processo civil natildeo pode ser visto como um instrumento a serviccedilo do Estado como um instrumento que natildeo se encontre orientado agrave realizaccedilatildeo dos fins da pessoa humana Em outras palavras o processo civil serve para realizaccedilatildeo dos direitos e para orientaccedilatildeo das pessoas a respeito do significado do direito
Nessa senda compete tanto ao juiz quanto as demais partes processuais garantirem ldquoo
valor intriacutenseco de cada vida que eacute trazida ao processordquo nas palavras de Alexandre Freitas
Cacircmara95
() aos sujeitos do processo eacute preciso sempre ter claro que os titulares dos interesses em conflitos satildeo pessoas reais cujas vidas seratildeo afetadas pelo resultado do processo e que por isso mesmo tecircm o direito de estabelecer suas estrateacutegias processuais de acordo com aquilo que lhes pareccedila melhor para suas vidas Eacute inadmissiacutevel tratar as partes como se natildeo fossem pessoas reais meros dados estatiacutesticos Afinal se para o Judiciaacuterio cada processo pode parecer apenas mais um processo para as partes cada processo pode ser o uacutenico o mais relevante aquele em que sua vida seraacute decidida E eacute dever do juiz assegurar que isto seja respeitado
Dessa forma eacute necessaacuterio que um arcabouccedilo normativo para que seja conferida
eficaacutecia e proteccedilatildeo ao principio da dignidade da pessoa humana
Logo o dito princiacutepio deve ser protegido em todas as esferas do ordenamento juriacutedico
inclusive no campo da execuccedilatildeo civil onde sofre grandes riscos de ser violado em nome do
direito fundamental agrave tutela executiva do credor ldquoPartir da premissa de que existe um direito
fundamental agrave tutela executiva ora ratificado pelo CPC eacute indispensaacutevel para a soluccedilatildeo de
diversos problemas oriundos do procedimento executivo principalmente aqueles relacionados
agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo 96
94 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme
MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 25
95 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CAcircMARA Alexandre Freitas O Novo Processo Civil Brasileiro 2 ed Satildeo Paulo Atlas 2016 p 7
96 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66
41
Eacute o caso por exemplo da impenhorabilidade Segundo Fredie Didier et al97 a
impenhorabilidade eacute uma forma de proteger certos bens do devedor do direito fundamental a
execuccedilatildeo do credor
Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa
Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais
O legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do CPC fazendo um
preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses em anaacutelise ao optar pela mitigaccedilatildeo do direito
do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado Afinal ldquoa execuccedilatildeo natildeo pode ser utilizada
como instrumento para causar a ruiacutena a fome e o desabrigo do devedor e sua famiacutelia gerando
situaccedilotildees incompatiacuteveis com a dignidade da pessoa humana 98
Logo a impenhorabilidade de certos bens
[] Eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa99
Eacute nesse sentido que o CPC15 enumera diversos casos de bens patrimoniais que satildeo
impenhoraacuteveis como o salaacuterio e vencimentos utensiacutelios necessaacuterios ao exerciacutecio da
profissatildeo seguro de vida vestuaacuterios e pertences de uso pessoal entre outros
Dessa forma as regras relativas agraves medidas executivas devem ser interpretadas agrave luz
da Constituiccedilatildeo Federal ldquovez que se voltam agrave realizaccedilatildeo de direitos fundamentais e em sua
97 Ibid p 66 98 THEODORO JUacuteNIOR Humberto Novo Coacutedigo de Processo Civil Anotado 20 ed Rio de Janeiro
Forense 2016 p 978 99 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud DIDIER JR Fredie CUNHA
Leonardo Carneiro da BRAGA Paula Sarno OLIVEIRA Rafael Alexandria de Curso de direito processual civil 3 ed Salvador JusPodivm 2011 v 5 p 547
42
realizaccedilatildeo podem atingir direitos fundamentaisrdquo 100 O Superior Tribunal de Justiccedila jaacute decidiu
que
O rol das impenhorabilidades do ordenamento paacutetrio objetiva preservar o miacutenimo patrimonial necessaacuterio agrave existecircncia digna do executado impondo ao processo executoacuterio certos limites Assim a depender das peculiaridades do caso as regras de impenhorabilidade podem ser ampliadas de modo a adequar a tutela aos direitos fundamentais como por exemplo o direito agrave moradia agrave sauacutede ou agrave dignidade da pessoa humana Trata-se portanto da aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo e da necessidade sob o enfoque da proporcionalidade101 (STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014)
Logo a interpretaccedilatildeo dos dispositivos que tratam sobre a penhora no CPC deve estaacute
diretamente ligada aos ditames constitucionais devendo o interprete privilegiar a opccedilatildeo que
esteja mais em sintonia com a Carta Magna para que nem o credor e nem o devedor sejam
lesados
O artigo 833 do CPC elenca uma seacuterie de incisos que expotildeem os bens impenhoraacuteveis
O trecho inicial inciso I do art 833 define como impenhoraacuteveis os bens inalienaacuteveis Este
inciso segue a regra de que ldquose o bem natildeo pode ser alienado tambeacutem natildeo pode ser penhorado
porque a penhora eacute o primeiro ato do procedimento de alienaccedilatildeo judicial do bemrdquo 102
Satildeo exemplos de bens inalienaacuteveis os puacuteblicos cuja alienaccedilatildeo depende de autorizaccedilatildeo
legislativa Eacute inalienaacutevel tambeacutem o capital constituiacutedo para garantir indenizaccedilatildeo de ato iliacutecito
(art 533 sect 1 ordm CPC) que portanto eacute tambeacutem impenhoraacutevel ldquoTodo bem inalienaacutevel eacute
impenhoraacutevel embora nem todo bem impenhoraacutevel seja inalienaacutevelrdquo 103
O inciso I do art 833 CPC tambeacutem consagra a impenhorabilidade dos bens que por
ato voluntaacuterio satildeo excluiacutedos da execuccedilatildeo
Segundo Fredie Didier et al104
Eacute o que ocorre nos casos de bens doados ou alienados com claacuteusula de inalienabilidade que haacute de constar no registro imobiliaacuterio para ser eficaz perante o exequente e minimizar o risco de fraude A propoacutesito eis a redaccedilatildeo do art 1911 do Coacutedigo Civil lsquolsquoA claacuteusula de inalienabilidade imposta aos bens por ato de liberalidade implica impenhorabilidade e incomunicabilidaderdquo
100 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MEDINA Joseacute Miguel Garcia
Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 1 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 p 736 101 STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014 102 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 824 103 Ibid p 824 104 Ibid p 825
43
O inciso II por sua vez estabelece que satildeo impenhoraacuteveis os bens moacuteveis os
pertences e as utilidades domeacutesticas da residecircncia do executado Todavia excepcionam-se os
bens dessa natureza que sejam de elevado valor ou que ultrapassem as necessidades comuns
correspondentes a um meacutedio padratildeo de vida
A jurisprudecircncia natildeo eacute paciacutefica sobre o assunto logo natildeo exista uma relaccedilatildeo de bens
que podem ser atingidos pela penhora Abrindo margem para as mais variadas decisotildees
O STJ jaacute considerou impenhoraacuteveis aparelho de televisatildeo a cores mesa de centro passadeira raacutedio toca-fitas gravador microondas ar-condicionado um freezer um microcomputador com acessoacuterios uma impressora etc Poderatildeo ser penhorados porque ultrapassam o padratildeo-meacutedio aparelhos de TV mais sofisticados o segundo aparelho de televisatildeo a segunda geladeira aparelhos de ar-condicionado que satildeo verdadeiras peccedilas de design moacuteveis antigos que se transformam em peccedilas de decoraccedilatildeo faqueiro de prata adega climatizada etc Em entendimento de caraacuteter ainda mais geneacuterico jaacute restou consignado em determinado precedente que a proteccedilatildeo natildeo abrangeria apenas os bens indispensaacuteveis agrave moradia mas tambeacutem aqueles usualmente encontrados em um lar105
Ademais o inciso III do art 833 do CPC traz a impenhorabilidade dos vestuaacuterios bem
como os pertences de uso pessoal do executado salvo se de elevado valor
Segundo Fredie Didier et al106 o dispositivo possui dois propoacutesitos
de um lado preservar a dignidade do executado com a proteccedilatildeo de bens moacuteveis importantes para a sua sobrevivecircncia digna como o vestuaacuterio aparelho celular reloacutegio e os bens relacionados agrave sua higiene pessoal de outro lado a regra visa prestigiar a boa-feacute processual impedindo a execuccedilatildeo mesquinha e abusiva com a penhora de bens de pequeno ou nenhum valor como um pente ou uma bota
O inciso IV do art 833 do CPC consagra uma das mais importantes modalidades a
impenhorabilidade relativa aos rendimentos de natureza alimentar ldquoTrata-se de regra que
possui o claro propoacutesito de proteger o executado garantindo-lhe o recebimento de valores que
servem ao pagamento das despesas relacionadas agrave sua sobrevivecircncia digna e agrave da sua famiacuteliardquo 107
Jaacute inciso V do art 833 do CPC torna impenhoraacuteveis os livros as maacutequinas as
ferramentas os utensiacutelios os instrumentos ou outros bens moacuteveis necessaacuterios ou uacuteteis ao
exerciacutecio de qualquer profissatildeo 105 Ibid p 826 106 Ibid p 827 107 Ibid p 828
44
Por forccedila do paraacutegrafo 3ordm do art 833 satildeo igualmente impenhoraacuteveis os equipamentos
implementos e maacutequinas agriacutecolas pertencentes agrave pessoa fiacutesica ou a empresa individual
produtora rural Rodrigo Mazzei e Sarah Merccedilon108 esclarecem que
Tem assento na noccedilatildeo de que a dignidade estende-se tambeacutem ao exerciacutecio da profissatildeo em si mesma e tambeacutem por representar a forma por excelecircncia de que dispotildee o executado para continuar a receber sua remuneraccedilatildeo e por conseguinte prover seu sustento e de sua famiacutelia Trata-se tambeacutem de aplicaccedilatildeo pontual da funccedilatildeo social da propriedade jaacute que protege os bens que permitem a circulaccedilatildeo de riquezas para a subsistecircncia do executado e se for o caso de sua famiacutelia
Forccediloso ressaltar ainda que a impenhorabilidade do inc V alcanccedila apenas os bens
moacuteveis de modo que eacute absolutamente possiacutevel que o imoacutevel em que o executado exerccedila sua
atividade profissional seja penhorado conforme a Suacutemula 451 do STJ ldquoEacute legiacutetima a penhora
da sede do estabelecimento comercialrdquo
O inciso VI do art 833 do CPC versa sobre a impenhorabilidade do seguro de vida
ldquoTrata-se de impenhorabilidade em favor do beneficiaacuterio do seguro e natildeo do segurado ateacute
porque o valor do seguro natildeo compotildee nem comporaacute o seu patrimocircnio (art794 do Coacutedigo
Civil1 ordm7)rdquo Dessa forma ldquoem uma execuccedilatildeo contra o segurado natildeo seraacute possiacutevel a penhora
do seguro de vida pois se trata de bem que natildeo lhe pertence nem mesmo em expectativardquo
De acordo com o inciso VII do art 833 do CPC satildeo impenhoraacuteveis os materiais
necessaacuterios para obras em andamento salvo se essas forem penhoradas Logo a obra pode
ser penhorada (art 862 do CPC) ldquoA regra como bem lembrou Araken de Assis lsquoestimula a
penhora da proacutepria obra inconclusa agrave qual os materiais acrescem e conseguintemente
valorizamrsquo 109
O art 833 VIII CPC julga impenhoraacutevel a pequena propriedade rural assim
definida em lei desde que trabalhada pela famiacutelia reproduzindo parte do art 5ordm XXVI CF
88116 que disciplina a impenhorabilidade do referido bem
A proteccedilatildeo do CPC eacute mais ampla do que a garantia prevista na Constituiccedilatildeo Federal
tendo em vista que a impenhorabilidade natildeo se restringe agraves execuccedilotildees de deacutebitos decorrentes
de sua atividade produtiva podendo ser alegada em toda e qualquer execuccedilatildeo ldquoAssim o 108 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CABRAL Antonio Passo
CRAMER Ronaldo (orgs) Comentaacuterios ao Novo Coacutedigo de Processo Civil Rio de Janeiro Forense 2015 p 1194
109 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 835
45
imoacutevel natildeo pode ser penhorado na execuccedilatildeo de creacutedito rural concedido para estimular a
produccedilatildeo agriacutecola mas poderaacute ser penhorado na execuccedilatildeo do creacutedito concedido para a
aquisiccedilatildeo do imoacutevelrdquo 110
A nona modalidade de impenhorabilidade trata-se dos recursos puacuteblicos recebidos por
instituiccedilotildees privadas para aplicaccedilatildeo compulsoacuteria em educaccedilatildeo sauacutede ou assistecircncia social ldquoA
proteccedilatildeo eacute louvaacutevel e tutela toda a coletividade ao privilegiar o direito agrave educaccedilatildeo sauacutede e
assistecircncia social em detrimento do direito do credorrdquo
De acordo com o inciso X do art 833 do CPC eacute impenhoraacutevel ateacute o limite de
quarenta salaacuterios miacutenimos a quantia depositada em caderneta de poupanccedila
Eacute uma modalidade de impenhorabilidade relativa (o CPC73 a considerava absoluta)
tendo em vista que essa impenhorabilidade natildeo pode ser oposta na execuccedilatildeo de alimentos
independentemente da sua origem (art 833 sect 2ordm do CPC) Fredie Didier et al cita Araken de
Assis111 ao afirmar que
a regra soacute protege essa aplicaccedilatildeo financeira Se o valor estiver depositado em fundo de investimento por exemplo poderaacute ser penhorado Se o devedor tiver vaacuterias cadernetas de poupanccedila a impenhorabilidade aplica-se agrave soma de todas elas e natildeo a cada uma delas isoladamente do contraacuterio valores expressivos poderiam ser pulverizados em vaacuterias contas burlando a finalidade da regra que eacute a de proteger a populaccedilatildeo de baixa renda
Ademais satildeo tambeacutem impenhoraacuteveis por forccedila do inciso XI os recursos puacuteblicos do
fundo partidaacuterio recebidos por partido poliacutetico nos termos da lei Essa modalidade de
impenhorabilidade ldquose restringe aos recursos puacuteblicos do fundo partidaacuterio Recursos de
origem privada recebidos pelo partido poliacutetico poderatildeo ser penhoradosrdquo 112 O processualista
Fredie Didier et al113 assevera que
Assim a impenhorabilidade foi estabelecida no intuito de impedir que os diretoacuterios nacionais de partidos poliacuteticos respondam por diacutevida dos diretoacuterios
110 Ibid p 836 111 DIDIER JR Fredie et al apud ASSIS Araken de Manual da execuccedilatildeo 11ordm ed cit p 225 Assim
tambeacutem REDONDO Bruno Garcia LOJO Maacuterio Vitor Suarez Penhora cit p 117 BUENO Cassio Scarpinella Curso sistematizado de Direito Processual Civil v 3 cit p 228 GIANNICO Mauriacutecio As novas reformas do CPC e de outras normas processuais Mauriacutecio Giannico e Viacutetor Joseacute de Mello Monteiro (coord) Satildeo Paulo Saraiva 2009 p 1 OS Em sentido diverso estendendo a impenhorabiacutelidade aos depoacutesitos feitos ateacute esse valor em CDB CDI fundos de renda fixa ou de accedilotildees RODRIGUES Marcelo Abelha Manual de execuccedilatildeo civil 3deg ed cit p 101
112 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 839
113 Ibid p 839
46
estaduaismunicipais - sobretudo em razatildeo das vaacuterias decisotildees judiciais que determinaram penhora de recursos do fundo partidaacuterio de alguns partidos
Por fim o inciso XII do artigo 833 do CPC trata sobre a impenhorabilidade dos
creacuteditos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias sob o regime de incorporaccedilatildeo imobiliaacuteria
vinculados agrave execuccedilatildeo de obra ldquoO objetivo dessa modalidade eacute evitar que diacutevidas do
incorporador possam consumir os recursos que seriam utilizados na realizaccedilatildeo da obra em
prejuiacutezo dos adquirentes de unidades autocircnomasrdquo 114
O professor Misael Montenegro Filho115 aduz sobre que ldquoao estabelecer a
impenhorabilidade dos creacuteditos oriundos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias o novo CPC
protegeu os valores destinados agrave execuccedilatildeo da obra e agrave entrega das unidades imobiliaacuterias aos
adquirentes assegurando assim a execuccedilatildeo da promessa contratualrdquo
Importante frisar ainda que a Lei nordm 8009 1990 instituiu a impenhorabilidade do
imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar por qualquer diacutevida salvo as exceccedilotildees dos
seus arts 3ordm e 4ordm
A referida lei dispotildee que Para os efeitos de impenhorabilidade considera-se
residecircncia um uacutenico imoacutevel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia
permanente (art 5ordm)
O processualista baiano Fredie Didier et al116 assevera que
A lei propotildee-se a proteger imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar nos termos acima expostos A CF 88 ampliou o conceito de entidade familiar para abranger a famiacutelia monoparental e a uniatildeo estaacutevel Mas deve considerar-se aiacute compreendidos os irmatildeos que vivem juntos e a uniatildeo homossexual Ateacute o solteiro estaacute abrangido pela impenhorabilidade se reside soacute no imoacutevel - isso em nome da proteccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana e da moradia digna Na verdade houve uma mudanccedila de compreensatildeo acerca do sentido da proteccedilatildeo de proteccedilatildeo da famiacutelia agrave proteccedilatildeo da moradia indispensaacutevel agrave preservaccedilatildeo da dignidade da pessoa
114 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o
novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 388
115 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MONTENEGRO FILHO Misael Novo Coacutedigo de Processo Civil Comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Atlas 2016 p 752
116 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 840-841
47
O STJ jaacute consolidou esse entendimento na suacutemula nordm 364 O conceito de
impenhorabilidade de bem de famiacutelia abrange tambeacutem o imoacutevel pertencente a pessoas
solteiras separadas e viuacutevas
Entretanto se o casal ou entidade familiar possuir vaacuterios imoacuteveis utilizados como
residecircncia a impenhorabilidade recairaacute sobre o de menor valor (art 5ordm paraacutegrafo uacutenico) ldquoEacute o
que ocorre por exemplo quando a famiacutelia se divide em mais de uma cidade por motivos
profissionaisrdquo 117
Forccediloso observar ainda que a impenhorabilidade do imoacutevel familiar eacute relativa jaacute que
natildeo pode ser oposta a qualquer creacutedito O art 3ordm da Lei n 8009 1990151 em que pode ser
penhorada a residecircncia da famiacutelia (exemplo execuccedilatildeo de alimentos para cobranccedila de taxas
devidas em funccedilatildeo do imoacutevel familiar etc)
Resta claro que o artigo 833 do CPC ao disciplinar as hipoacuteteses de impenhorabilidade
possui o escopo de proteger o princiacutepio da dignidade humana Entretanto algumas claacuteusulas
natildeo possuem proteccedilatildeo absoluta ldquoa sua relativizaccedilatildeo a depender do caso sob exame deve ser
realccedilada agrave medida que a dignidade resguardada e protegida pelo sistema processual-
constitucional natildeo se limita ao executadordquo 118 Ademais ldquoEacute premente advertidamente que a
dignidade do credor tambeacutem seja garantida em juiacutezo tendo como norte pois os princiacutepios da
proporcionalidade e razoabilidaderdquo 119
117 Ibid p 841 118 Ibid p 752 119 Ibid p 752
48
4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA
ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE
HUMANA DO EXECUTADO
41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE
EFETIVACcedilAtildeO
Como jaacute exposto em linhas preteacuteritas nos meios executivos tiacutepicos as medidas
executivas satildeo determinadas pela lei ou seja o oacutergatildeo pode aplicar somente as medidas
tipificadas no ordenamento juriacutedico No entanto ao se tratar das medidas executivas atiacutepicas
eacute necessaacuterio que haja um limite na atuaccedilatildeo realizada pelo juiz
O poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo poder ser realizado de maneira indiscriminada haacute
pressupostos e premissas a serem observadas Dessa forma a primeira premissa eacute no sentindo
de que a medida executiva atiacutepica natildeo pode ser a primeira medida a ser invocada ldquomuito ao
reveacutes a regra do nosso sistema continua a ser o da tipicidade dos meios executivos soacute que
agora temperado pelo sistema atiacutepicordquo 120 O processualista Thiago Rodovalho explica que
ldquo() os meios atiacutepicos natildeo satildeo prima ratio e sim a ultima ratio eacute dizer esgotados e
frustrados os meios executivos tiacutepicos e ordinaacuterios pode-se em tese valer-se do sistema
atiacutepicordquo121
Dessa forma nos casos de execuccedilatildeo que tenha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
natildeo deve ser aplicado de logo as medidas indutivas e coercitivas Apenas apoacutes frustradas as
medidas ldquonaturaisrdquo pode-se passar agrave aplicaccedilatildeo das medidas atiacutepicas
Uma segunda premissa diz a respeitos dos meios de pressatildeo para compelir o devedor a
adimplir com o seu deacutebito ldquoEssa segunda premissa decorre inclusive de imperiosidade
loacutegica de nada adianta a medida de pressatildeo se a obrigaccedilatildeo natildeo tem como ser adimplida pelo
devedorrdquo 122
Para Thiago Rodovalho123 ldquoIsso quer significar que esgotados e frustrados os meios
tiacutepicos o juiz se valeraacute dos meios atiacutepicos se eles forem potencialmente haacutebeis a estimular ou
120 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da
atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018
121 Ibid sem paginaccedilatildeo 122 Ibid sem paginaccedilatildeo 123 Ibid sem paginaccedilatildeo
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forccedilar o cumprimento o que pressupotildee sua possibilidade quando entatildeo eles poderatildeo ser
eficazesrdquo
Logo nas obrigaccedilotildees de pagar quantia se houver a real demonstraccedilatildeo da
impossibilidade financeira do devedor seria um constrangimento inuacutetil e desnecessaacuterio a
imposiccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo para forccedilar o cumprimento
Por isso as medidas atiacutepicas devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o
esgotamento das medidas tiacutepicas e a possibilidade de cumprimento de cumprimento da
obrigaccedilatildeo
Ademais superadas as supracitadas premissas e o oacutergatildeo julgador vislumbrando a
necessidade da aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo se faz necessaacuterio que um conjunto de
postulados e princiacutepios rejam a atuaccedilatildeo do oacutergatildeo julgador servindo de norte para a escolha da
medida executiva mais adequada ldquoDe modo geral a escolha deve pautar-se nos postulados da
proporcionalidade da razoabilidade (art8ordm CPC) e da proibiccedilatildeo de excesso bem como nos
princiacutepios da eficiecircncia e da menor onerosidade da execuccedilatildeordquo 124
O professor Fredie Didier et al125 eacute categoacuterico ao citar Humberto Aacutevila
Segundo Humberto Aacutevila o postulado da proporcionalidade se manifesta nas situaccedilotildees em que haacute uma relaccedilatildeo de causalidade entre dois elementos empiricamente discerniacuteveis um meio e um fim de tal sorte que se possa proceder aos trecircs exames fundamentais o da adequaccedilatildeo (o meio promove o fim) o da necessidade (dentre os meios disponiacuteveis e igualmente adequados para promover o fim natildeo haacute outro meio menos restritivo do(s) direito(s) fundamental (is) afetado(s)) e o da proporcionalidade em sentido estrito (as vantagens trazidas pela promoccedilatildeo do fim correspondem agraves desvantagens provocadas pela adoccedilatildeo do meio)
O juiz ao aplicar a medida executiva atiacutepica ao caso concreto deve ter seu
embasamento no princiacutepio da proporcionalidade para saber se a medida a ser tomada eacute a
melhor opccedilatildeo ao caso sub judice ldquoO exame de proporcionalidade aplica-se sempre que
houver uma medida concreta destinada a realizar uma finalidaderdquo 126
Em verdade a aplicaccedilatildeo do princiacutepio da proporcionalidade eacute imprescindiacutevel na adoccedilatildeo
dos meios executivos atiacutepicos tendo em vista que ldquo() tais medidas em especial quando de
124 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111 125 DIDIER JR Fredie et al apud AVILA Humberto Teoria dos princiacutepios da definiccedilatildeo agrave aplicaccedilatildeo
dos princiacutepios juriacutedicos 16 ed Satildeo Paulo Malheiros 2015 p 205 126 DIDIER JR Fredie et al op cit p 111
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natureza coercitiva podem restringir direitos do devedor e incidir diretamente sobre sua
pessoardquo127 Logo ainda que o princiacutepio da efetividade da tutela executiva seja um direito
fundamental o mesmo ldquo() deve ser compatibilizado com direitos fundamentais do
executado para que a sua dignidade humana seja preservadardquo 128
Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Neves129 afirma que em nome do princiacutepio da
proporcionalidade o juiz deveraacute
() ponderar no caso concreto as vantagens praacuteticas da adoccedilatildeo de cada medida executiva atiacutepica em especial as de natureza coercitiva e as desvantagens de sua adoccedilatildeo levando em conta a possibilidade de a medida criar uma limitaccedilatildeo excessiva ao exerciacutecio de direito fundamental do executado
Outro princiacutepio que o oacutergatildeo julgador deve se ater ao escolher a medida executiva
atiacutepica eacute o da razoabilidade Segundo Fredie Didier et al 130 o princiacutepio (ou postulado)131 se
manifesta de trecircs formas
a) como dever de equidade a exigir a harmonizaccedilatildeo da norma geral com o caso individual impondo a consideraccedilatildeo daquilo que normalmente acontece em detrimento do que eacute extraordinaacuterio e tambeacutem impondo a consideraccedilatildeo das especificidades do caso concreto ante a generalidade da norma b) como dever de congruecircncia a exigir a harmonizaccedilatildeo das normas com suas condiccedilotildees externas de aplicaccedilatildeo (isto eacute com a realidade com base em que foram editadas) c) como dever de equivalecircncia a exigir uma relaccedilatildeo de equivalecircncia entre a medida adotada e o criteacuterio que a dimensiona
Logo ldquo() o princiacutepio da razoabilidade deve nortear a atuaccedilatildeo do juiz na adoccedilatildeo das
medidas executivas atiacutepicas previstas no art 139 IV do Novo CPCrdquo 132 tendo em vista que
ldquo() mesmo medidas que pelo princiacutepio da proporcionalidade podem se mostrar
abstratamente possiacuteveis de adoccedilatildeo no caso concreto podem se mostrar inadequadas e
irrazoaacuteveisrdquo 133
127 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Medidas executivas atiacutepicas na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de
pagar quantia certa art 139 IV do novo CPC Revista de Processo v 42 n 265 mar 2017 p 14 128 Ibid p 14 129 Ibid p 14 130 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111-112 131 Segundo Fredie Didier et al o postulado eacute uma norma que atua sobre a aplicaccedilatildeo de outras normas
A proporcionalidade e a razoabilidade seriam postulados normativos e natildeo princiacutepios segundo essa concepccedilatildeo 132 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo op cit p 14 133 Ibid p 14
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Ademais conforme dispotildee o postulado da proibiccedilatildeo de excesso ldquoa realizaccedilatildeo de uma
regra ou princiacutepio constitucional natildeo pode conduzir agrave restriccedilatildeo a um direito fundamental que
lhe retire um miacutenimo de eficaacuteciardquo 134
A proibiccedilatildeo de excesso deveraacute sempre ser suscitada quando um direito fundamental
houver sido violado a ponto do direito fundamental sofrer violaccedilatildeo excessiva Ademais ldquoesse
postulado natildeo se confunde com o da proporcionalidade porque ele dispensa os exames da
adequaccedilatildeo (relaccedilatildeo meiofim) da necessidade (exigibilidade) ou da proporcionalidade em
sentido estrito (ponderaccedilatildeo entre vantagens e desvantagens)rdquo 135
Logo ldquopouco importa a relaccedilatildeo meiofim ou a exigibilidade da medida ou ainda a
ponderaccedilatildeo com outro direito fundamental eventualmente em jogo aqui se analisa apenas a
eficaacutecia de um determinado direito fundamentalrdquo 136
O princiacutepio da eficiecircncia tem previsatildeo constitucional no art 37 e previsatildeo
infraconstitucional no art 8ordm do CPC15 O referido princiacutepio determina que o processo seja
conduzido de forma eficiente pelo oacutergatildeo jurisdicional
Entende-se que eficiente eacute a atuaccedilatildeo que utilize adequadamente os meios necessaacuterios
para que se atinjam os fins almejados O oacutergatildeo jurisdicional na escolha dos meios a serem
utilizados para a obtenccedilatildeo dos fins
a) deve escolher aqueles que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo (deve evitar meios que promovam resultados insignificantes) b) deve escolher meios que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado (natildeo se pode escolher um meio de resultado duvidoso) c) natildeo pode escolher um meio que produza muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscado 137
O juiz deveraacute igualmente analisar o princiacutepio da menor onerosidade da execuccedilatildeo que
eacute previsto pelo art 805 do CPC ldquoArt 805 Quando por vaacuterios meios o exequente puder
promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o
executadordquo
134 134 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 112 135 Ibid p 112 136 Ibid p 112 137 Ibid p 112-113
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Logo ldquohavendo duas opccedilotildees igualmente eficazes para permitir alcanccedilar o resultado
pretendido (satisfaccedilatildeo do creacutedito) deveraacute o oacutergatildeo julgador valer-se daquela que menos onere
a situaccedilatildeo do executadordquo 138
O dito princiacutepio impede o comportamento abusivo do exequente que possa beneficiar-
se do meio mais danoso ao executado protegendo dessa forma a lealdade e a eacutetica
processual
Os postulados e princiacutepios analisados em linhas preteacuteritas impotildeem ao oacutergatildeo julgador a
observacircncia de alguns criteacuterios para a escolha da medida executiva atiacutepicas a ser utilizada no
caso concreto
Primeiramente a medida executiva atiacutepica deveraacute ser adequada ldquoO criteacuterio da
adequaccedilatildeo impotildee que juiz considere abstratamente uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida
executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia
a gerar o resultadordquo 139 Nesse primeiro momento o juiz deveraacute observar sob a perspectiva do
credor qual medida teraacute o condatildeo de gerar o resultado mais efetivo
Segundo Fredie Didier et al140 o criteacuterio da adequaccedilatildeo eacute
() fortemente inspirado pelo postulado da proporcionalidade e pelo princiacutepio da eficiecircncia na parte em que esse princiacutepio determina a escolha de meios que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo e que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado
Ademais a medida adotada pelo oacutergatildeo julgador deveraacute ser necessaacuteria ldquoEsse criteacuterio
impotildee um limite agrave atuaccedilatildeo judicial funcionando como uma espeacutecie de contrapeso ao criteacuterio
da adequaccedilatildeo Aqui deve-se levar em conta a posiccedilatildeo do devedorrdquo141
O juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental agrave execuccedilatildeo e determinar
uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute necessaacuterio que a
medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado O criteacuterio da necessidade
estabelece que ldquonatildeo se pode ir aleacutem do necessaacuterio para alcanccedilar o propoacutesito almejado Deve
138 Ibid p 113 139 Ibid p 113 140 Ibid p 113 141 Ibid p 114
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pois o oacutergatildeo julgador determinar o meio executivo na medida do estritamente necessaacuterio para
proporcionar a satisfaccedilatildeo do creacutedito ndash nem menos nem maisrdquo 142
O referido criteacuterio possui forte influecircncia dos postulados da proibiccedilatildeo do excesso e da
razoabilidade assim como do princiacutepio da menor onerosidade para o executado Assevera
Fredie Didier et al143 que
Natildeo eacute razoaacutevel por exemplo impor como primeira opccedilatildeo medida coercitiva a ser suportada pelo agente puacuteblico pelo simples fato de o juiz pressupor que o ente puacuteblico ao qual ele eacute vinculado iraacute descumprir determinada ordem judicial - o descumprimento natildeo pode ser visto como algo ordinaacuterio ou cotidiano (razoabilidade como dever de equidade) Tampouco eacute razoaacutevel eleger a prisatildeo civil como meacutetodo prioritaacuterio para compelir o executado ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer (razoabilidade como dever de equivalecircncia) Aleacutem disso eacute vedada por exemplo a imposiccedilatildeo de multa coercitiva para compelir o executado a emitir declaraccedilatildeo de vontade uma vez que haacute previsatildeo expressa de medida tiacutepica capaz de proporcionar o mesmo resultado sem sacrifiacutecio para o devedor (art 501 CPC)
A afirmaccedilatildeo feita por Bonavides144 em 1997 sobre a adequaccedilatildeo e a necessidade
continua atual sobre os motes
O meio empregado pelo legislador deve ser adequado e necessaacuterio para alcanccedilar o objetivo procurado O meio eacute adequado quando com seu auxiacutelio se pode alcanccedilar o resultado desejado eacute necessaacuterio quando o legislador natildeo poderia ter escolhido outro meio igualmente eficaz mas que natildeo limitasse ou limitasse de maneira menos sensiacutevel o direito fundamental
Por fim a medida deve conciliar os interesses contrapostos ldquoO magistrado deve
ponderar os interesses em jogo aplicando a proporcionalidade em sentido estrito de modo
que as vantagens da utilizaccedilatildeo da medida atiacutepica escolhida superem as vantagens de seu usordquo 145
Esse criteacuterio natildeo privilegia nem o credor nem o devedor e sim a soluccedilatildeo mais
equilibrada e que atenda da melhor forma aos valores em conflito ldquoTrata-se de criteacuterio
inspirado nos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade bem como no princiacutepio da
142 Ibid p 114 143 Ibid p 114 144 BONAVIDES Paulo Curso de Direito Constitucional 7ordm ediccedilatildeo Satildeo Paulo Ed Malheiros 1997
p 372 145 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 114-115
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eficiecircncia na parte em que impotildee ao juiz evitar a escolha do meio executivo que produza
muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscadordquo 146
Cada um dos criteacuterios supracitados devem ser considerados pelo juiz ao aplicar as
medidas executivas atiacutepicas ao caso concreto Para Fredie Didier et al147 as medidas como
retenccedilatildeo de CNH passaporte ou cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado como
forma de pressionaacute-lo ao pagamento da diacutevida pecuniaacuteria natildeo satildeo possiacuteveis
Essas natildeo satildeo medidas adequadas ao atingimento do fim almejado (o pagamento de quantia) - natildeo haacute propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente Tais medidas soam mais como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-lo ao cumprimento da ordem judicial - e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a utilizaccedilatildeo de meios sancionatoacuterios pelo magistrado mas apenas de meios de coerccedilatildeo indireta e sub-rogatoacuterios
Ainda que adequadas fossem a retenccedilatildeo de CNH e do passaporte no corte de fornecimento de aacutegua natildeo parecem ser medidas necessaacuterias (no sentido de exigiacuteveis) uma vez que outras medidas podem em tese ser utilizadas sem causar igual gravame ao executado - como por exemplo a simples restriccedilatildeo do uso de cartotildees de creacutedito A retenccedilatildeo de documentos pessoais eacute medida que termina por restringir a liberdade de ir e vir do executado mostrando-se a princiacutepio natildeo-razoaacutevel por ir de encontro ao dever de equivalecircncia e desproporcional por restringir demais o direito agrave liberdade em favor do direito de creacutedito pecuniaacuterio do exequente
O processualista baiano et al148 cita tambeacutem outro exemplo de medida atiacutepica que natildeo
atingem os criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade
Tampouco parece adequada em princiacutepio determinaccedilatildeo de corte de energia eleacutetrica de todo o preacutedio onde funciona serviccedilo puacuteblico administrativo como forma de pressionar o ente federado a cumprir ordem de nomeaccedilatildeo de candidato em concurso puacuteblico Natildeo parece haver relaccedilatildeo meiofim entre uma coisa e outra Tambeacutem natildeo eacute possiacutevel enxergar essa medida como necessaacuteria no sentido de ser a menos gravosa para o devedor - observe que se trata de medida que uma vez aplicada ensejaria restriccedilatildeo de funcionamento em toda a reparticcedilatildeo puacuteblica em prejuiacutezo de serviccedilos puacuteblicos essenciais ao funcionamento da Administraccedilatildeo o que aleacutem de ser excessivamente gravoso parece natildeo se conformar agrave necessidade de ponderaccedilatildeo dos interesses em jogo - aleacutem de afetar a um sem-nuacutemero de pessoas tomadoras desses serviccedilos
Ademais eacute sabido que toda e qualquer decisatildeo judicial precisa ser fundamentada Ao
se tratar das medidas executivas atiacutepicas o papel da fundamentaccedilatildeo se torna ainda mais
146 Ibid p 115 147 Ibid p 115 148 Ibid p 116
55
importante tendo em vista que eacute pela fundamentaccedilatildeo da decisatildeo que se poderaacute controlar a
adequaccedilatildeo e necessidade da medida atiacutepica
Pelo fato das medidas executivas atiacutepicas derivarem de dispositivos normativos
considerados claacuteusulas gerais propiacutecias as mais variadas interpretaccedilotildees eacute de extrema
importacircncia que o oacutergatildeo julgador fundamente sua decisatildeo
Logo ldquodeve o juiz na fundamentaccedilatildeo decisoacuteria expor racionalmente os motivos da
sua escolha demonstrando com atenccedilatildeo ao art 489 sect 1ordm CPC de que modo a sua opccedilatildeo
atende os criteacuterios da adequaccedilatildeo necessidade e proporcionalidade em sentido estrito ()rdquo 149
Dessa forma os princiacutepios da proporcionalidade e razoabilidade servem para delimitar
o alcance das claacuteusulas gerais de efetivaccedilatildeo fazendo com que o oacutergatildeo julgador se atenha aos
criteacuterios da adequaccedilatildeo e necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao caso
concreto
42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO
EXECUTADO
A entrada em vigor do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 aflorou ainda mais uma
discussatildeo essencial para os processualistas do seacuteculo XXI qual eacute o verdadeiro protagonista do
processo civil
Para os que defendem o ldquoautoritarismo processualrdquo o verdadeiro protagonista do
processo civil eacute o oacutergatildeo judiciaacuterio que em nome do desempenho efetivo de suas funccedilotildees lhes
eacute permitido dilatar os poderes que diga-se de jaacute passagem jaacute compotildeem um vastiacutessimo
arsenal150
Jaacute os ldquogarantistasrdquo 151 do processo civil acreditam que os verdadeiros protagonistas satildeo
as partes do processo e seus direitos e garantias devem ser estritamente preservados
Devido a essa disputa de quem possui maior protagonismo no processo as mudanccedilas
ocorridas no coacutedigo processual vigente quanto agraves medidas executivas atiacutepicas despertaram
149 Ibid p 117 150 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos
atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04102018
151 O processualista Araken de Assis acredita que o termo garantista eacute descabido tendo em vista que remete ao processo penal
56
maior celeuma do que qualquer outra modificaccedilatildeo trazida pelo CPC15 Afinal as referidas
medidas acirravam ainda mais a disputa pelo protagonismo processual
O fato de o CPC15 dispor no art 139 IV que o juiz poderaacute decretar todas as medidas
indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o
cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo
pecuniaacuteria levou boa parte da doutrina e dos juiacutezes a acreditar que teria pleno direito de
aplicar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo Entretanto muitos se esqueceram do outro lado
da moeda esqueceram que a dignidade humana do executado tambeacutem eacute um direito
fundamental e natildeo pode ser violado
Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa152
acreditam que
() natildeo parece producente elencar um rol abstrato das medidas que poderiam ser aplicadas pelo juiz a tiacutetulo do art 139 IV CPC Afinal se busca a efetividade da execuccedilatildeo e esta soacute pode ser identificada agrave luz das especificidades da situaccedilatildeo concreta Ideal eacute enveredar pela loacutegica modular (adequaccedilatildeo ao caso) natildeo pela geneacuterica (soluccedilotildees abstratas de pretensa utilidade universal)
Em razatildeo de o dispositivo apresentar uma gama de poderes tatildeo amplos agrave disposiccedilatildeo do
oacutergatildeo julgador sem nenhuma estipulaccedilatildeo de um procedimento legal previamente definido para
que estabeleccedila as condiccedilotildees de sua aplicaccedilatildeo em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo eacute
necessaacuterio que em razatildeo do princiacutepio da dignidade humana natildeo busque definir o que o
dispositivo permite mas de definir o que ele natildeo permite ldquoOu seja propotildee-se a sua
compreensatildeo por exclusatildeo Afinal se ele tem potencialidade para promover a efetividade da
tutela tambeacutem pode provocar lesotildees E como em direito os fins natildeo justificam os meios
ressalta como prioritaacuteria a necessidade de estabelecer limitesrdquo 153
O art 789 do CPC15 disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial e eacute
categoacuterico ao dispor que ldquoo devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para
152 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
153 Ibid sem paginaccedilatildeo
57
o cumprimento de suas obrigaccedilotildees salvo as restriccedilotildees estabelecidas em leirdquo Logo a
execuccedilatildeo somente poderaacute incidir sobre os bens do devedor e natildeo sobre a sua pessoa
Como eacute sabido a Lex Poetelia Papiria de 326 aC foi o primeiro marco legal da
humanizaccedilatildeo das cobranccedilas de diacutevidas abolindo a imposiccedilatildeo ao devedor de castigos
vexatoacuterios e ateacute da pena de morte154
Afinal no direito romano antigo a cobranccedila de diacutevidas poderia recair sobre a pessoa
do devedor que respondia com sua liberdade e ateacute mesmo com seu proacuteprio corpo permitindo
a lei que repartissem tantos pedaccedilos do corpo do devedor quantos fossem seus credores
Nesse sentindo leciona o professor Guilherme Pupe da Noacutebrega155 que
Vem de longe a evoluccedilatildeo no sentido de fazer a responsabilidade por uma obrigaccedilatildeo migrar da pessoa do devedor para seu patrimocircnio Merecem registro especiacutefico como marcos histoacutericos remotos a Lex Poetelia Papiria de 326 aC que aboliu o nexum e possibilidade de escravidatildeo do devedor como garantia da obrigaccedilatildeo e a pignoris capio ou ldquoaccedilatildeo por tomada de penhorrdquo que instituiu a possibilidade de o credor tomar parcela dos bens do devedor como forma de assegurar o adimplemento da diacutevida Aqueles institutos culminariam seacuteculo depois no artigo 789 do CPC de 2015 a consagrar que o devedor responda pela satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo com seus bens presentes e futuros observadas as restriccedilotildees impostas pelas impenhorabilidades legais
Logo o avanccedilar da civilizaccedilatildeo marcou o deslocamento da responsabilidade por
diacutevidas saindo do corpo do devedor para o seu patrimocircnio tendo em vista que a vida
humana a liberdade e a integridade fiacutesica satildeo valores inalienaacuteveis natildeo podendo ser
sacrificadas em benefiacutecio de obrigaccedilotildees pecuniaacuterias 156
Entretanto eacute sabido que a responsabilidade patrimonial eacute excepcionada pela prisatildeo
civil do devedor de verba alimentiacutecia resquiacutecio da responsabilidade pessoal romana
154 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt
httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018
155 NOacuteBREGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139 IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018
156 Ibid sem paginaccedilatildeo
58
No entanto haacute uma justificativa para isso Segundo o processualista Guilherme Pupe
da Noacutebrega157
Eacute que a par de a prisatildeo civil encontrar previsatildeo constitucional no inciso LXVII do artigo 5ordm o raciociacutenio eacute o de que o direito do alimentante agrave liberdade de locomoccedilatildeo cede diante dos direitos agrave vida e agrave dignidade titularizados pelo alimentando e resguardados pelos alimentos Foi esse mesmo raciociacutenio aliaacutes que justificou no passado a ediccedilatildeo da suacutemula 309 pelo STJ agora positivada pelo artigo 528 sect 7ordm que limita a modalidade coercitiva agraves trecircs uacuteltimas prestaccedilotildees vencidas e agraves prestaccedilotildees vincendas A ideia eacute que tendo o alimentando subsistido a despeito do natildeo-pagamento de prestaccedilotildees mais antigas essas verbas teriam perdido o caraacuteter alimentar que na equaccedilatildeo antes apresentada justificaria a prisatildeo civil do alimentante Daiacute por que aqueles valores antigos remanescem exigiacuteveis mas somente pela via da expropriaccedilatildeo
Essa ressalva eacute necessaacuteria tendo em vista que a adoccedilatildeo de teacutecnica de execuccedilatildeo
indireta para incursatildeo radical na esfera de direitos do executado notadamente direitos
fundamentais quando carente de respaldo constitucional natildeo merece acolhimento sob
risco de se atentar contra o devido processo legal (artigo 5ordm LIV da Constituiccedilatildeo)
Como afirma o autor Bruno Dantas158 ldquoembora inexistam estatiacutesticas que permitam
comparaccedilotildees natildeo eacute desarrazoado intuir que os iacutendices de inadimplecircncia despeccedilam na razatildeo
inversa da incidecircncia das ordens judiciais sobre o corpo e a liberdade do devedorrdquo Entretanto
eacute natildeo possiacutevel adotar toda e qualquer medida executiva atiacutepica em nome da efetividade da
execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que se saiba os limites da sua aplicaccedilatildeo
Dessa forma instrumentos que permitam o cumprimento forccedilado de contratos e o pagamento
de diacutevidas satildeo necessaacuterios contudo eacute preciso equilibrar essa exigecircncia com a liberdade e a
dignidade humana
Como citado alhures o art 139 IV ensejou decisotildees como a que determinou a
suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o
passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito em uma accedilatildeo se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo
extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
Na supracitada decisatildeo o princiacutepio da responsabilidade patrimonial natildeo estaacute sendo
efetivado para o que o devedor responda com os seus bens Afinal qual ligaccedilatildeo entre a
157 Ibid sem paginaccedilatildeo 158 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt
httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018
59
restriccedilatildeo de circulaccedilatildeo que diz com o direito de ir e vir (liberdade) com o pagamento de
diacutevidas que diz com a responsabilidade civil159
Ademais por que quem natildeo tem dinheiro para pagar diacutevidas natildeo pode dirigir Por que
natildeo tem condiccedilotildees para pagar o deacutebito natildeo pode ter passaporte Por que quem natildeo tem como
pagar o deve natildeo pode ter cartatildeo de creacutedito
Ao utilizar meios executivos atiacutepicos como os supracitados para compelir o devedor a
satisfazer a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria quando exauridos sem ecircxito os meios tradicionais de bens
penhoraacuteveis salvo quando existe qualquer indiacutecio concreto de ocultaccedilatildeo ou dissipaccedilatildeo de
bens eacute obrigar o devedor abrir matildeo da proteccedilatildeo da lei que lhe impede que seja tomado agrave forccedila
(art 833 CPC e demais disposiccedilotildees que tratam da impenhorabilidade)
Segundo Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa160
Claramente essa pressatildeo visa dar uma aparecircncia de voluntariedade agrave indicaccedilatildeo de bens impenhoraacuteveis pelo proacuteprio executado que na verdade soacute age assim por ser a uacutenica forma de ver-se livre de um grame imposto por medida indutiva despedida de qualquer necessidade ou adequaccedilatildeo Uma intoleraacutevel perversatildeo
Os autores afirmam ainda que o ldquodireito paacutetrio natildeo admite esta contraditio in terminis
sendo inaceitaacutevel a coexistecircncia de regra protetiva do executado com outra que concede ao
juiz poderes para forccedilar (ainda que indiretamente e veladamente) o executado a abrir matildeo
daquela proteccedilatildeordquo 161
Logo eacute cristalino que a suspensatildeo da CNH eacute uma forma incorreta de aplicar a medida
executiva atiacutepica para efetivar o direito fundamental a execuccedilatildeo tendo em vista que o uacutenico
objetivo da referida eacute pressionar o executado abrir matildeo de algum bem impenhoraacutevel para
levantar o dinheiro e cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
A retenccedilatildeo do passaporte igualmente natildeo possui qualquer relaccedilatildeo com a diacutevida do
executado e eacute somente uma forma de tentar pressiona-lo a dispor de um bem que natildeo pode
ser tomado agrave forccedila e puni-lo por natildeo ter cumprido voluntariamente com a sua obrigaccedilatildeo
159 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
160 Ibid sem paginaccedilatildeo 161 Ibid sem paginaccedilatildeo
60
Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa162
acreditam que tal medida eacute equivocada e se torna excessivamente onerosa ao executado
As mais variadas circunstacircncias relevem o equiacutevoco de tal medida aplicada assim genericamente Com efeito nada justifica reter o passaporte do executado e impedi-lo de viajar para o exterior quando eacute agraciado inclusive com todas as despesas pagas com presente sorteio ou precircmio (por completar tempo de serviccedilo ou atingir metas produtividade na sociedade empresaacuteria em que trabalha) Como todo custo eacute suportado por terceiro e por isso mesmo a sua realizaccedilatildeo pelo executado natildeo traria qualquer prejuiacutezo ao exequente e a retenccedilatildeo do passaporte natildeo seria injustificaacutevel
Paulo Antonio Papini163 acredita que natildeo tem a apreensatildeo de passaporte natildeo possui um
fundamento plausiacutevel tendo em vista que se o devedor natildeo pode viajar para saldar o deacutebito
tambeacutem natildeo poderia exercer atividades cotidianas
Com todo o respeito a quem pensa dessa forma o argumento eacute muito simploacuterio e natildeo precisamos sequer do Direito para derrubaacute-lo Com efeito se considerarmos que ndash ateacute mesmo pelas dimensotildees continentais do Brasil ndash natildeo eacute incomum que uma passagem para o Nordeste custe mais caro que um voo para Miami seria razoaacutevel entatildeo seguindo a linha argumentativa do Magistrado em questatildeo que se oficiasse aos oacutergatildeos reguladores da aviaccedilatildeo civil proibindo-se aquele devedor de fazer ateacute mesmo voos domeacutesticos Poder-se-ia ir mais longe jaacute que natildeo tem dinheiro para pagar suas diacutevidas certamente aquele devedor tambeacutem natildeo teria para comer fora de sua casa porque entatildeo natildeo determinar a expediccedilatildeo de ofiacutecio aos restaurantes proacuteximos agrave sua casa e determinar tambeacutem a proibiccedilatildeo de que ele fosse servidoatendido
O autor se questiona ainda ldquoSeraacute entatildeo que o Princiacutepio da Dignidade da Pessoa
Humana estaacute de mero enfeite em nossa Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ()rdquo 164 Tendo em vista
que ldquoa decisatildeo em comento viola diretamente o art 5ordm incisos XV LIII e LXIII da
Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ndash falamos do Direito de Ir e Virrdquo 165
Ademais o cancelamento do cartatildeo de creacutedito eacute mais uma forma de constranger e
compelir o executado a cumprir com a obrigaccedilatildeo de qualquer forma natildeo importando o que
precise fazer para conseguir saldar o deacutebito tendo em vista que a referida medida apresenta
162 Ibid sem paginaccedilatildeo 163 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo
pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018
164 Ibid sem paginaccedilatildeo 165 Ibid sem paginaccedilatildeo
61
qualquer adequaccedilatildeo com o fim desejado (reverter em pagamento para o exequente) Os
autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa afirmam que166
Reconhece-se que as razotildees da afirmaccedilatildeo ora questionada satildeo ateacute intuitivas mas eacute plenamente possiacutevel problematiza-las Ora natildeo se encontra qualquer justificativa idocircnea para que o juiz possa cancelar o contrato do executado com a administradora do cartatildeo de creacutedito (ou instituiccedilatildeo financeira) que natildeo tem qualquer relaccedilatildeo com o creacutedito exequendo muito menos como isso poderia impactar positivamente na execuccedilatildeo (senatildeo para pressionar o executado a dispor de bens impenhoraacuteveis) Ademais natildeo foram indicados sequer sinais de que o executado realiza gastos supeacuterfluos com o cartatildeo de creacutedito ndash natildeo que isso justificasse a medida pois o correto seria penhorar os esses bens (se duraacuteveis naturalmente) ao inveacutes de cancelar o cartatildeo de creacutedito
Logo as referidas medidas natildeo possuem qualquer relaccedilatildeo com o atingimento do fim
almejado (o pagamento de quantia) tendo em vista que natildeo haacute uma relaccedilatildeo meiofim entre
tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a
restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia
ao exequente
Dessa forma nota-se que as medidas de suspensatildeo da CNH retenccedilatildeo de passaporte e
bloqueio do cartatildeo de credito satildeo completamente inadequadas agrave realizaccedilatildeo a que se prestam
Afinal ldquotais medidas soam como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-
lo ao cumprimento da ordem judicial ndash e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a
utilizaccedilatildeo dos meios sancionatoacuterios pelo magistrado ()rdquo167
Como exposto em linhas preteacuteritas o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades
de aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e
razoaacutevel se atendo aos criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas
executivas atiacutepicas ao caso concreto sob pena de converter a medida em de indutiva para
punitiva
A utilizaccedilatildeo de medidas atiacutepicas como a suspensatildeo da carteira de motorista e o
passaporte do devedor abandona a regra da responsabilidade patrimonial e atingem em cheio
o nuacutecleo de direitos inerentes agrave condiccedilatildeo humana
166 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
167 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 115
62
O limite para a aplicaccedilatildeo de tais medidas deve ser a Constituiccedilatildeo Federal e sobretudo
os Direitos fundamentais nela expressos ldquoCom efeito natildeo haacute saiacuteda tampouco soluccedilatildeo eficaz
de um problema sem que se respeite a Lei e o Devido Processo Legal (por mais nobres que
sejam as intenccedilotildees)rdquo 168
Dessa forma a busca desenfreada pelo cumprimento das decisotildees judiciais em
especial na fase executiva natildeo pode ser realizada em sacrifiacutecio de direitos fundamentais O
Poder Judiciaacuterio natildeo pode resolver a crise do processo executoacuterio utilizando de medidas
arbitraacuterias com o propoacutesito de satisfazer obrigaccedilotildees pecuniaacuterias
Eis o dilema que se coloca diante do poder geral de efetivaccedilatildeo ele pode servir de
potente instrumento em prol da tutela jurisdicional executiva entretanto se manejado de
modo improacuteprio serviraacute de instrumento de puniccedilatildeo e humilhaccedilatildeo do executado169
Eacute notoacuterio que se amplamente aplicado o poder geral de efetivaccedilatildeo reduziria os
iacutendices de inadimplecircncia quiccedilaacute resolveria por completo a crise da execuccedilatildeo civil Entretanto
o retrocesso civilizatoacuterio seria irreparaacutevel
168 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo
pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018
169 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
63
5 CONCLUSAtildeO
Como funccedilatildeo jurisdicional que tem como objeto a efetivaccedilatildeo de direitos a execuccedilatildeo
deve sempre buscar a maior satisfaccedilatildeo possiacutevel concretizando integralmente o creacutedito do
exequente isto eacute realizando o direito fundamental agrave tutela executiva do credor Por isso a
adoccedilatildeo de meios executivos atiacutepicos incorporados pelo Coacutedigo de Processo Civil de 2015 por
meio do art139 IV em um primeiro momento podem ser consideradas vaacutelidas visto que
servem de instrumento para a satisfaccedilatildeo e asseguraccedilatildeo de direitos do credor
Entretanto para o oacutergatildeo julgador natildeo cometa arbitrariedades em nome do direito
fundamental agrave execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que seja definido certos limites na adoccedilatildeo do poder
geral de efetivaccedilatildeo
As medidas executivas atiacutepicas natildeo podem ser aplicadas de maneira indiscriminada
logo devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o esgotamento das medidas tiacutepicas e
a possibilidade de cumprimento da obrigaccedilatildeo
Partindo dessa premissa as medidas a serem adotadas pelo juiz no caso concreto
devem ter como baliza os princiacutepios da proporcionalidade e da razoabilidade para que natildeo
ultrapassem a responsabilidade patrimonial do devedor e incidida diretamente sobre sua
pessoa
Para que natildeo seja atingida a pessoa do executado ou seja para que o devedor natildeo
tenha sua dignidade humana viola eacute necessaacuterio que a medida atiacutepica seja adequada e
necessaacuteria
Logo o juiz deveraacute sempre estabelecer uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida
executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia
a gerar o resultado sem violar a dignidade humana do executado
Dessa o juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental a execuccedilatildeo e
determinar uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute
necessaacuterio que a medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado
As medidas que ultrapassam esses limites como a decisatildeo que apreendeu o
passaporte suspensatildeo a CNH e bloqueou o cartatildeo de creacutedito do devedor satildeo meramente
punitivas posto que essas natildeo satildeo as medidas mais adequadas para se atingir o fim almejado
pois natildeo existe propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado
64
uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo
geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente
Medidas como esta servem de embasamento para decisotildees arbitraacuterias e autoritaacuterias de
violaccedilatildeo dos direitos fundamentais transformando o poder geral de efetivaccedilatildeo em
instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com autorizaccedilatildeo judicial
Em suma o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades de aplicaccedilatildeo do poder
geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e razoaacutevel se atendo aos
criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao
caso concreto sob pena de punir a pessoa do executado violando a sua dignidade humana
em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo
65
REFEREcircNCIAS
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2 2ordm sem 2006
THEODORO JUacuteNIOR Humberto Novo Coacutedigo de Processo Civil Anotado 20 ed
Rio de Janeiro Ed Forense 2016
- 1 INTRODUCcedilAtildeO
- 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
-
- 21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL
- 22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
- 23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
- 24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO
- 25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO
-
- 3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
-
- 31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS
-
- 311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15
-
- 32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
- 33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
- 34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
-
- 4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
-
- 41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
- 42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
-
- 5 CONCLUSAtildeO
- REFEREcircNCIAS
-
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
Art ndash Artigo
CPC15 ndash Coacutedigo de Processo Civil de 2015
CPC73 ndash Coacutedigo de Processo Civil de 1973
ENFAM ndash Escola nacional de formaccedilatildeo e aperfeiccediloamento de magistrados
HC ndash Habeas Corpus
STJ ndash Superior Tribunal de Justiccedila
5
1 INTRODUCcedilAtildeO
A prestaccedilatildeo jurisdicional natildeo costuma se findar apoacutes o encerramento da fase cognitiva
com a prolaccedilatildeo de uma sentenccedila de meacuterito Para que a referida prestaccedilatildeo se concretize eacute
imperioso que haja a satisfaccedilatildeo do deacutebito pelo devedor
Entretanto observa-se em diversos casos o inadimplemento da parte passiva
processual sendo necessaacuterio desenvolver a atividade executiva A referida atividade possui o
escopo de satisfazer direitos
Isso porque o processo natildeo eacute um fim em si mesmo sendo apenas um exerciacutecio da
jurisdiccedilatildeo estatal Dessa forma a razatildeo de ser do processo eacute o atingimento da sua finalidade
almejada que eacute a prestaccedilatildeo da tutela jurisdicional
Todavia como a tutela jurisdicional configura-se na obrigaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio
proteger e reparar os direitos lesionados ou ameaccedilados de lesatildeo muitas vezes a dita tutela
somente consegue ser efetivada atraveacutes da atividade executiva da jurisdiccedilatildeo
Ocorre que a execuccedilatildeo civil sempre foi o ldquocalcanhar de Aquilesrdquo do sistema
processual e de modo geral vinha sofrendo uma crise quanto a sua efetividade Ou seja o
credor obtia ecircxito na fase de conhecimento entretanto natildeo conseguia alcanccedilar o seu direito a
prestaccedilatildeo reconhecida na fase de execuccedilatildeo
Com o fito de tornar a atividade satisfativa mais eficiente e mais ceacutelere o Coacutedigo de
Processo Civil de 2015 concebeu novas diretrizes ao processo no sentindo de harmonizar
suas com os ditames da Constituiccedilatildeo Federal principalmente com os direitos fundamentais
As normas fundamentais do processo civil trazidas pelo CPC15 preocupam-se
primordialmente com a efetividade da tutela jurisdicional
Em conformidade com essa nova sistemaacutetica o legislador no art 139 IV do Coacutedigo
de Processo Civil estabeleceu a possibilidade de o juiz dispor de todas as medidas indutivas
coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o cumprimento de
ordem judicial trazendo como grande novidade a aplicaccedilatildeo dessas medidas executoacuterias
atiacutepicas tambeacutem nas obrigaccedilotildees de pagar dinheiro
6 Entretanto natildeo haacute na legislaccedilatildeo criteacuterios especiacuteficos que auxiliem o oacutergatildeo julgador na
escolha das medidas executivas atiacutepicas que se adotadas sem qualquer baliza podem
acarretar consequecircncias juriacutedicas irreparaacuteveis
Como a famosa decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de
Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-1320138260011 Nessa accedilatildeo
que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo
pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a suspensatildeo da
Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o passaporte e
cancelou os cartotildees de creacutedito como forma de compeli-lo a adimplir com o deacutebito
Decisotildees como esta geram conflitos entre direitos constitucionalmente instituiacutedos De
um lado o direito fundamental agrave tutela jurisdicional e de outro os direitos e garantias
inerentes a todos os indiviacuteduos
Dessa forma a presente monografia tem como escopo de estabelecer criteacuterios
limitadores para que a adoccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo viole a dignidade humana do
executado em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo
7 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO
CIVIL
21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL
A Execuccedilatildeo Civil nasce a partir do direito a uma prestaccedilatildeo conferida a algueacutem de
exigir de outrem o cumprimento de uma conduta de fazer natildeo fazer ou de dar (dinheiro ou
coisa distinta) 1
Para que o direito a uma prestaccedilatildeo se concretize no mundo fiacutesico eacute necessaacuterio que
haja a satisfaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida pelo sujeito passivo Caso contraacuterio fala-se em
inadimplemento ou lesatildeo O titular do direito natildeo tem como agir por si para efetivar o seu
direito a prestaccedilatildeo posto que a autotutela eacute vedada no ordenamento juriacutedico Dessa forma eacute
necessaacuterio que se recorra ao Poder Judiciaacuterio para que se possa ter a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo
devida logo a tutela jurisdicional executiva2
O processualista Fredie Didier et al3 equaciona essa questatildeo da seguinte maneira
Quando se pensa em tutela executiva pensa-se na efetivaccedilatildeo de direitos a uma prestaccedilatildeo fala-se de um conjunto de meios para efetivar a prestaccedilatildeo devida fala-se em execuccedilatildeo de fazer natildeo-fazer dar exatamente os trecircs tipos de prestaccedilatildeo existentes Natildeo eacute por acaso nem por coincidecircncia que a tutela executiva pressupotildee inadimplemento (CPC art 786) - fenocircmeno exclusivo dos direitos a uma prestaccedilatildeo Eacute por isso tambeacutem que se pode falar em prescriccedilatildeo da execuccedilatildeo (CPC art 802 e suacutemula do STF n 150) - prescriccedilatildeo eacute fenocircmeno juriacutedico que se relaciona aos direitos a uma prestaccedilatildeo A execuccedilatildeo forccedilada dirige-se ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo Essa relaccedilatildeo entre direito material e processo eacute fundamental para a compreensatildeo do fenocircmeno executivo
Nesse iacutenterim para o Ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux4 ldquoexecutar eacute
satisfazerrdquo ao passo que o professor Fredie Didier et al5 formulou um conceito mais amplo
ldquoExecutar eacute satisfazer uma prestaccedilatildeo devida A execuccedilatildeo pode ser espontacircnea quando o
devedor cumpre voluntariamente a prestaccedilatildeo ou forccedilada quando o cumprimento da prestaccedilatildeo
eacute obtido por meio de atos executivos pelo Estadordquo
1 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 41 2 Ibid p 42 3 Ibid p 42 4 FUX Luiz Curso de direito processual civil Rio de Janeiro Forense 2001 p 980 5 DIDIER JR Fredie et al Op Cit p 45
8 Dessa forma a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional responsaacutevel pela
concretizaccedilatildeo de um direito subjetivo no plano material obtendo resultado idecircntico ou
equivalente ao atingiacutevel se o devedor cumprisse espontaneamente a prestaccedilatildeo
Todavia essa atividade jurisdicional soacute cabe quando o devedor se recusa a cumprir
com a obrigaccedilatildeo quebrando a expectativa do credor de receber o que lhe eacute devido Por esta
razatildeo que se diz que a execuccedilatildeo civil eacute ldquoforccediladardquo 6
Eacute o que se conclui seguindo os ensinamentos de Leonardo Greco7 para ele execuccedilatildeo eacute
uma
() modalidade de tutela jurisdicional que consiste na praacutetica pelo juiz (ou por outrem sob a sua supervisatildeo) de uma seacuterie de atos coativos concretos sobre o devedor e sobre o seu patrimocircnio a fim de agrave custa dele e independentemente do concurso da sua vontade tornar efetivo o cumprimento de prestaccedilatildeo por ele inadimplida desde que tais atos coativos estejam previamente constituiacutedos em lei
Portanto a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional que tem como escopo obter o
cumprimento de uma prestaccedilatildeo certa e inadimplida mediante atos coativos sobre o devedor e
seus bens
22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
Vislumbrado o conceito de execuccedilatildeo civil cabe agora empreender a sua classificaccedilatildeo
tendo em vista que a execuccedilatildeo pode se manifestar de diversas formas possuindo diferentes
caracteriacutesticas em cada uma das suas modalidades
Inicialmente cabe destacar que haacute duas teacutecnicas processuais para viabilizar a execuccedilatildeo
civil lato sensu eacute a que divide em processo autocircnomo de execuccedilatildeo e em fase de execuccedilatildeo
dependendo do tiacutetulo executivo que justifica o exerciacutecio da atividade satisfativa
O Coacutedigo Processual Civil de 2015 acertadamente ratificou as reformas promovidas
no CPC73 que consagrava a opccedilatildeo legislativa de oferecimento das tutelas de certificaccedilatildeo e
efetivaccedilatildeo do direito em um mesmo processo Dessa forma as execuccedilotildees de sentenccedilas
6 BASTOS Luiz Fernando Pereira O artigo 139 IV do novo Coacutedigo de Processo Civil a atipicidade
dos meios executivos na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia certa Brasiacutelia 2017 Disponiacutevel em lt httpbdmunbbrbitstream104831866812017_LuizFernandoPereiraBastospdf gt Acesso em 06 de agosto de 2018
7 BASTOS Luiz Fernando Pereira apud GRECO Leonardo O processo de execuccedilatildeo Rio de Janeiro Renovar 1999 p 164
9
passaram a ser uma fase complementar ao de processo de conhecimento e natildeo mais ocorrer
em um processo autocircnomo
No entendimento do professor processualista Fredie Didier et al8 o processo
sincreacutetico simplificou a efetivaccedilatildeo de um direito reconhecido em sentenccedila
A dispensa do ajuizamento de um processo autocircnomo para execuccedilatildeo de sentenccedila natildeo soacute veio diminuir o tempo necessaacuterio agrave prestaccedilatildeo da tutela jurisdicional - afinal o credor natildeo mais precisaria tal como ocorria ateacute entatildeo promover nova citaccedilatildeo pessoal do reacuteudevedor- como tambeacutem veio romper de vez com um velho paradigma segundo o qual a atividade executiva estaria dissociada da precedente atividade jurisdicional cognitiva
Entretanto natildeo soacute as sentenccedilas de meacuterito ensejam uma execuccedilatildeo Por esta razatildeo foi
necessaacuterio manter o processo autocircnomo de execuccedilatildeo para os casos em que o credor tem a seu
favor um documento que natildeo tenha sido proferido por um oacutergatildeo dotado de jurisdiccedilatildeo
Consequentemente se for o titulo executivo judicial o caminho natural eacute o do
cumprimento de sentenccedila Sendo por sua vez extrajudicial o titulo executivo o caminho
correto eacute o processo de execuccedilatildeo
Cabe ainda salientar que toda execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial eacute definitiva Jaacute a
execuccedilatildeo de tiacutetulo judicial (cumprimento de sentenccedila) pode ser definitiva ou provisoacuteria
No primeiro caso isto eacute cumprimento de sentenccedila definitivo ldquoeacute a execuccedilatildeo completa
que vai ateacute a fase final (com a entrega do bem da vida) sem exigecircncias adicionais para o
exequenterdquo 9
Quanto ao segundo caso ldquoo cumprimento provisoacuterio de sentenccedila (fundada em tiacutetulo
provisoacuterio) eacute aquele que exige alguns requisitos extras para que se chegue agrave fase final da
execuccedilatildeordquo 10
Para Fredie Didier11 o criteacuterio para definir se o cumprimento de sentenccedila seraacute
definitivo ou provisoacuterio
() eacute a estabilidade do tiacutetulo executivo em que se funda a execuccedilatildeo se se tratar de decisatildeo acobertada pela coisa julgada material o cumprimento de sentenccedila eacute
8 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 46 9 Ibid p 57 10 Ibid p 57 11 Ibid p 57
10
definitivo se se tratar de decisatildeo judicial ainda passiacutevel de alteraccedilatildeo (reforma ou invalidaccedilatildeo) em razatildeo da pendecircncia de recurso contra ela interposto a que natildeo tenha sido atribuiacutedo efeito suspensivo o cumprimento de sentenccedila eacute provisoacuterio
Ademais a execuccedilatildeo se distingue em procedimentos executivos comuns que satildeo da
execuccedilatildeo civil e que servem a uma generalidade de creacuteditos como eacute o caso do cumprimento
de sentenccedila e o processo de execuccedilatildeo E em procedimentos executivos especiais que servem
agrave satisfaccedilatildeo de creacuteditos peculiares como a execuccedilatildeo de alimentos e a execuccedilatildeo fiscal 12
Por fim cabe mencionar a classificaccedilatildeo que distingue a execuccedilatildeo em direta e indireta
A primeira execuccedilatildeo direita (ou execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo) eacute ldquo() aquela em que o
Poder Judiciaacuterio prescinde da colaboraccedilatildeo do executado para a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida
e pois promove uma substituiccedilatildeo da sua conduta pela conduta do proacuteprio Estado-juiz ou de
terceirordquo 13 Ou seja as medidas executivas satildeo levadas a efeito mesmo contra a vontade do
devedor na execuccedilatildeo direta
Segundo a doutrina a execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo se subdivide da seguinte forma
meios de desapossamento meios de transformaccedilatildeo e meios de expropriaccedilatildeo
Os meios de desapossamento muito comuns nas execuccedilotildees para entrega de coisa eacute a
forma ldquopor meio da qual se retira da posse do executado o bem a ser entregue ao exequente
(p ex despejo busca e apreensatildeo reintegraccedilatildeo de posse)rdquo 14 Ao passo que por meio dos de
transformaccedilatildeo ldquo() o juiz determina que um terceiro pratique a conduta que deveria ser
praticada pelo executado cabendo a este arcar com o pagamento do custo respectivordquo 15 Jaacute
os meios executivos de expropriaccedilatildeo eacute a forma ldquopor meio do qual algum bem do patrimocircnio
do devedor eacute expropriado para pagamento do creacutedito (adjudicaccedilatildeo alienaccedilatildeo judicial ou
apropriaccedilatildeo de frutos e rendimentos de empresa ou de estabelecimentos e de outros bens art
825 CPC)rdquo 16
12 Ibid p 48 13 Ibid p 50 14 Ibid p 51 15 Ibid p 51 16 Ibid p 51
11 Jaacute a execuccedilatildeo indireta (ou mandamental) atua ldquo() na vontade do devedor como forma
de compeli-lo ou incentivaacute-lo a cumprir a ordem judicialrdquo 17 Nesse entendimento ainda
leciona Fredie Didier et al 18
Nesses casos o Estado-juiz busca promover a execuccedilatildeo com a colaboraccedilatildeo do executado forccedilando ou incentivando a que ele proacuteprio cumpra a prestaccedilatildeo devida Em vez de o Estado-juiz tomar as providecircncias que deveriam ser tomadas pelo executado o Estado forccedila por meio de coerccedilatildeo psicoloacutegica ou de promessa de recompensa judicial a que o proacuteprio executado cumpra a prestaccedilatildeo
A execuccedilatildeo indireta pode ser patrimonial como por exemplo a imposiccedilatildeo de multa
coercitiva ou pessoal com a prisatildeo civil do devedor de alimentos Ademais adiciona Didier
et al19que
O estiacutemulo ao cumprimento da prestaccedilatildeo pode dar-se pelo temor (p ex multa coercitiva prisatildeo civil do devedor de alimentos divulgaccedilatildeo de notiacutecia em jornal revelando o descumprimento) ou pelo incentivo (p ex a chamada sanccedilatildeo premial ou sanccedilatildeo positiva de que eacute exemplo a isenccedilatildeo do pagamento de custas em caso de cumprimento do mandado monitoacuterio - art 701 sect 1ordm CPC a reduccedilatildeo pela metade dos honoraacuterios advocatiacutecios fixados inicialmente pelo juiacutezo em caso de pagamento integral do deacutebito pecuniaacuterio na execuccedilatildeo por quantia certa fundada em tiacutetulo extrajudicial - art 827 sect 1ordm CPC)
Por tais razotildees haacute uma tendecircncia em cada vez mais prestigiar os meios executivos
indiretos (coercitivos) posto que satildeo tatildeo eficazes quanto os meios executivos diretos
entretanto menos onerosos Contudo sua aplicaccedilatildeo deve ser fiscalizada a fim de natildeo permitir
que a execuccedilatildeo civil perca sua finalidade visto que eacute uma funccedilatildeo jurisdicional que tem como
escopo efetivar o direito do credor e natildeo de atender os interesses do devedor
23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
Os princiacutepios juriacutedicos nos uacuteltimos anos passaram a ser munidos de forccedila cogente
normatizando as condutas humanas tanto quanto as regras juriacutedicas Os ditos princiacutepios
ampliaram as margens de atuaccedilatildeo dos aplicadores do direito possibilitando a construccedilatildeo de
soluccedilotildees mais adequadas agraves especificidades das demandas que chegam ao judiciaacuterio
17 Ibid p 51 18 Ibid p 51 19 Ibid p 51-52
12 Dessa forma eacute necessaacuterio aprofundar-se nos princiacutepios norteadores da execuccedilatildeo civil
para que se obtenha uma anaacutelise completa da teoria geral da execuccedilatildeo
A execuccedilatildeo civil tem como um dos seus corolaacuterios o princiacutepio da efetividade este
consiste na exigecircncia de um sistema completo de tutela executiva no qual existam meios
executivos capazes de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor
de tutela executivardquo 20
O referido princiacutepio da efetividade eacute reforccedilado como normal fundamental do processo
civil brasileiro pelo art 4ordm do CPC ldquoArt 4ordm As partes tecircm o direito de obter em prazo razoaacutevel
a soluccedilatildeo integral do meacuterito incluiacuteda a atividade satisfativa
Jaacute o princiacutepio da boa feacute processual corolaacuterio do devido processo legal estaacute previsto
no art 5ordm do CPC ldquoAquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de
acordo com a boa-feacuterdquo Segundo o processualista baiano Fredie Didier21
O princiacutepio da boa-feacute extrai-se de uma claacuteusula geral processual A opccedilatildeo por uma claacuteusula geral de boa-feacute eacute a mais correta Eacute que a infinidade de situaccedilotildees que podem surgir ao longo do processo torna pouco eficaz qualquer enumeraccedilatildeo legal exaustiva das hipoacuteteses de comportamento desleal Daiacute ser correta a opccedilatildeo da legislaccedilatildeo brasileira por uma norma geral que impotildee o comportamento de acordo com a boa-feacute Em verdade natildeo seria necessaacuteria qualquer enumeraccedilatildeo das condutas desleais o art 5deg do CPC eacute bastante exatamente por tratar-se de uma claacuteusula geral
Dessa forma o dito princiacutepio preconiza que diante de um vinculo juriacutedico as pessoas
envolvidas natildeo poderatildeo frustrar a confianccedila do outro devendo comportar-se como se pode
esperar de uma pessoa de boa-feacute
Ademais disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial que ldquosomente o
patrimocircnio do devedor (art 789 CPC) ou de terceiro responsaacutevel pode ser objeto da
atividade executiva do Estadordquo 22
O referido princiacutepio que determina que somente o patrimocircnio submete-se agrave execuccedilatildeo
e natildeo a pessoa foi trazido pela humanizaccedilatildeo do direito Para o professor Didier et al23 o
20 DIDIER JR Freddie et al apud GUERRA Marcelo Lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do
credor na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 21 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte
geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 105 22 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 68
13
desenvolvimento dos meios de execuccedilatildeo indireta ldquoparece relativizar um pouco esse princiacutepio
na medida em que pressionam psicologicamente a pessoa do devedor para que cumpra a
obrigaccedilatildeo com seu comportamentordquo
Complementa ainda que
A responsabilidade executiva parece assumir atualmente caraacuteter hiacutebrido comportando coerccedilatildeo pessoal e sujeiccedilatildeo patrimonial
i) a coerccedilatildeo pessoal incide sobre a vontade do devedor admitindo o uso de medidas coercitivas de execuccedilatildeo indireta para forccedilaacute-lo a cumprir a obrigaccedilatildeo com seu proacuteprio comportamento (ex arts 139 rv 523 sect 1ordm 536 sect 1ordm e 538 sect 3ordm todos do CPC)
ii) descumprida a obrigaccedilatildeo e natildeo sendo possiacuteveladequado o uso de teacutecnica de coerccedilatildeo pessoal tem-se a sujeiccedilatildeo patrimonial que recairaacute sobre os bens do devedor ou de terceiro responsaacutevel - que responderatildeo pela proacutepria prestaccedilatildeo in natura (ex dar coisa ou entregar quantia) ou por perdas e danos24
Dessa forma o referido princiacutepio natildeo tem aplicaccedilatildeo absoluta em razatildeo do principio da
efetividade a qual estimula o uso dos meios de coerccedilatildeo indireta para garantir o cumprimento
da obrigaccedilatildeo pelo devedor
O princiacutepio da primazia da tutela especifica (ou princiacutepio do resultado) assevera que
ldquoA execuccedilatildeo deve ser especiacutefica propiciar ao credor a satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo tal qual
houvesse o cumprimento espontacircneo da prestaccedilatildeo pelo devedorrdquo 25
O CPC de 2015 absorveu todos os avanccedilos legislativos a cerca do mote O caput do
art 497 assegura que na accedilatildeo que tenha por objeto a prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer o
juiz se procedente o pedido concederaacute a tutela especiacutefica ou determinaraacute providecircncias que
assegurem a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico equivalente O art 499 o
complementa a obrigaccedilatildeo somente seraacute convertida em perdas e danos se o autor o requerer
ou se impossiacutevel agrave tutela especiacutefica ou a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico
equivalente
O princiacutepio do contraditoacuterio eacute garantido pela constituiccedilatildeo federal e compreende o
direito de ser ouvido o direito de acompanhar os atos processuais o direito de produzir
provas participar da sua produccedilatildeo manifestar-se sobre a prova produzida e obter do juiz a
23 Ibid p 69-70 24 Ibid p 70 25 Ibid p 71
14
respectiva valoraccedilatildeo o direito de ser informado regularmente dos atos praticados no processo
o direito agrave motivaccedilatildeo das decisotildees o direito de impugnar as decisotildees 26
O contraditoacuterio tem aplicaccedilatildeo em todo processo judicial sendo aplicaacutevel tambeacutem na
execuccedilatildeo No entanto o contraditoacuterio na execuccedilatildeo natildeo ocorre com a mesma intensidade que
no processo ou na fase de conhecimento eacute o que assevera Didier et al 27
O contraditoacuterio no procedimento executivo no aspecto do direito de defesa assegurado agrave parte demandada eacute eventual porquanto depende da provocaccedilatildeo do executado que natildeo eacute chamado ajuiacutezo para defender-se mas sim para cumprir a obrigaccedilatildeo O procedimento executivo adota a teacutecnica monitoacuteria que consiste basicamente na inversatildeo do ocircnus de provocar o contraditoacuterio o reacuteu em vez de citado para manifestar-se sobre a pretensatildeo do autor eacute convocado para cumprir uma determinada obrigaccedilatildeo
Logo haacute o contraditoacuterio no procedimento executivo porem eacute eventual quanto agrave defesa
do executado
Ademais o princiacutepio da menor onerosidade eacute consagrado pelo art 805 do CPC e
dispotildee que ldquoQuando por vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz
mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o executadordquo O referido princiacutepio tem o
escopo de impedir o abuso do direito pelo exequente
O principio da menor onerosidade auxilia o juiz na escolha de um meio executivo
adequado e necessaacuterio que satisfaccedila a prestaccedilatildeo exigida pelo credor Nesse sentido eacute o
entendimento do professor Fredie Didier et al 28
O resultado a ser alcanccedilado eacute aquele estabelecido pelo direito material A maneira de se chegar ateacute esse resultado eacute que deve ser a menos onerosa possiacutevel para o executado Isso significa que a opccedilatildeo pelo meio menos gravoso pressupotildee que os diversos meios considerados sejam igualmente eficazes Assim havendo vaacuterios meios executivos aptos agrave tutela adequada e efetiva do direito de creacutedito escolhe-se a via menos onerosa ao executado
O princiacutepio visa impedir a execuccedilatildeo desnecessariamente onerosa ao executado ou seja a execuccedilatildeo abusiva Em vez de enumerar situaccedilotildees em que a opccedilatildeo mais gravosa revelar-se-ia injusta o legislador valeu-se corretamente de uma claacuteusula geral para reputar abusivo qualquer comportamento do credor que pretender valer-se de meio executivo mais oneroso do que outro igualmente idocircneo agrave satisfaccedilatildeo do seu creacutedito
26 Ibid p 76 27 Ibid p 78 28 Ibid p 79-80
15 O princiacutepio da cooperaccedilatildeo tem como base os princiacutepios do devido processo legal da
boa-feacute processual e do contraditoacuterio O dito princiacutepio avigora a eacutetica processual com o
aprimoramento do diaacutelogo entre as partes reciprocamente e com o oacutergatildeo jurisdicional Eacute o
que preconiza o art 6ordm do CPC Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para
que se obtenha em tempo razoaacutevel decisatildeo de meacuterito justa e efetiva
No procedimento executivo o princiacutepio da cooperaccedilatildeo incide de diversas formas
disciplina Didier et al29 que na execuccedilatildeo
O executado tem o dever de indicar bens agrave penhora (art 774 V CPC) Natildeo encontrados bens penhoraacuteveis e natildeo havendo indicaccedilatildeo de qualquer um deles pelo exequente cabe ao executado declarar quais satildeo seus bens penhoraacuteveis sob pena de se sujeitar a uma sanccedilatildeo pecuniaacuteria compulsoacuteria
Tambeacutem eacute manifestaccedilatildeo do princiacutepio da cooperaccedilatildeo a exigecircncia de que o executado que pretende impugnar o valor da execuccedilatildeo apresente de logo o valor que reputa devido (art 525 sect 4ordm CPC) Seria comportamento natildeo-cooperativo afirmar que a cobranccedila eacute excessiva sem simultaneamente dizer qual eacute o valor correto
Demais disso aplicam-se agrave execuccedilatildeo os deveres que decorrem do princiacutepio da cooperaccedilatildeo e que satildeo imputados ao oacutergatildeo jurisdicional () Assim por exemplo deve o juiz advertir ao executado antes de puni-lo de que seu ato pode vir a caracterizar-se como atentatoacuterio agrave dignidade da jurisdiccedilatildeo ( art 772 II CPC) perceba que se trata de uma conduta compatiacutevel com o dever de prevenccedilatildeo O oacutergatildeo jurisdicional somente pode conhecer da prescriccedilatildeo ex officio dando a oportunidade de o exequente manifestar-se conforme impotildee o dever de consulta ( cf arts 10 487 paraacutegrafo uacutenico e 921 sect 5ordm CPC)
O princiacutepio ou postulado30 da proporcionalidade tem aplicaccedilatildeo muito relevante na
execuccedilatildeo O art 8 do CPC assegura que o oacutergatildeo jurisdicional tem o dever de observar a
proporcionalidade e a razoabilidade ao aplicar o ordenamento juriacutedico inclusive no
procedimento executivo
Ademais o art 805 do CPC eacute categoacuterico ao disciplinar que ldquoArt 805 Quando por
vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo
menos gravoso para o executadordquo O referido artigo jaacute se trata de uma concretizaccedilatildeo da
proporcionalidade
29 Ibid p 82 30 Segundo Fredie Didier et al haacute uma discussatildeo doutrinaacuteria sobre a proporcionalidade Parte da
doutrina acredita que a proporcionalidade eacute um princiacutepio e outra parte acredita que eacute um postulado normativo
16 O principio da adequaccedilatildeo pode ser vislumbrado em dois momentos do Direito
Processual ldquoa) no legislativo como orientador da confecccedilatildeo das leis b) no jurisdicional
autorizando ao juiz diante do caso concreto adaptar procedimento agraves suas peculiaridadesrdquo 31
Para Luceacutelia de Sena Alves e Tiago Retes32
Isso quer dizer que no momento legislativo o devido processo deve ser observado pelo legislador para a confecccedilatildeo das normas de direito processual que iratildeo servir de instrumento efetivo de concretizaccedilatildeo do direito substancial a ser tutelado atendendo a todas as suas finalidades sob pena de falecircncia do proacuteprio direito No momento jurisdicional da mesma forma a via processual escolhida pelo autor tambeacutem deve estar sujeita a este princiacutepio para que natildeo sofra as mesmas consequecircncias da sua inobservacircncia
O ordenamento juriacutedico deve ser aplicado por meio da teacutecnica processual adequada
evitando dessa forma uma tutela ineficaz
Por fim o princiacutepio do autorregramento da vontade na execuccedilatildeo tem o objetivo de
ldquo() preservar um espaccedilo processual para o exerciacutecio da liberdade e da vontade em que
sejam permitidas negociaccedilotildees que envolvam as partes ndash e tambeacutem o juizrdquo33 Didier et al34
assevera que
A rigor o legislador estabelece um regime juriacutedico de autorregramento da vontade processual identificando-se algumas manifestaccedilotildees relevantes para a execuccedilatildeo Na verdade pode-se dizer que poucos satildeo os ambientes mais propiacutecios do que a execuccedilatildeo para a negociaccedilatildeo sobre o processo Todos os institutos e normas processuais relativos agrave execuccedilatildeo devem ser repensados a partir da premissa de que o CPC permite uma ampla margem de liberdade de negociaccedilatildeo sobre o processo (art 190 CPC)
O autorregramento da vontade pode ser vislumbrando na previsatildeo de negoacutecios tiacutepicos
em sede de execuccedilatildeo como por exemplo no acordo das partes sobre o valor do bem que
dispensa a avaliaccedilatildeo disposto no inciso I do art 871 CPC Ademais dentro dos limites do art
190 do CPC eacute possiacutevel na execuccedilatildeo a atribuiccedilatildeo da negociaccedilatildeo atiacutepica aos sujeitos 31 ALVES Luceacutelia de Sena Alves RETES Tiago O poder geral de efetivaccedilatildeo das decisotildees judiciais e
proporcionalidade uma anaacutelise criacutetica acerca do art 139 IV do Novo Coacutedigo de Processo Civil Disponiacutevel em lthttpswwwacademiaedu31752652O_poder_geral_de_efetivaC3A7C3A3o_das_decisC3B5es_judiciais_e_a_proporcionalidade_uma_anC3A1lise_crC3ADtica_acerca_do_art_139_IV_do_Novo_CC3B3digo_de_Processo_Civil gt Acesso em 25 de julho de 2018
32 Ibid natildeo paginado 33 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 85 34 Ibid p 85
17
processuais permitindo que sejam feitas mudanccedilas nos procedimentos e nas situaccedilotildees
juriacutedicas processuais ldquoSatildeo exemplos de negoacutecios processuais atiacutepicos na execuccedilatildeo pacto de
penhorabilidade acordo de ampliaccedilatildeo de prazos das partes de qualquer natureza acordo de
rateio de despesas processuais ()rdquo35
24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO
Sempre houve diversos questionamentos quanto agrave eficaacutecia do Direito processual Civil
e se o mesmo era meio apto a assegurar a tutela jurisdicional dos direitos dos cidadatildeos O
processo de execuccedilatildeo eacute o setor que sofre mais criacuteticas quanto a sua ineficiecircncia afinal a
execuccedilatildeo civil sempre foi o ldquocalcanhar de Aquilesrdquo do sistema processual pela praxe do
ldquoganhou (no processo de conhecimento) mas natildeo levou (na fase de cumprimento ou
execuccedilatildeo)rdquo 36
Essa dificuldade de se efetivar a tutela satisfastiva natildeo se resume a um problema de
mera teacutecnica processual tiacutepico de determinado ordenamento mas representa uma prova de
fogo da capacidade dos instrumentos jurisdicionais O autor Leonardo Greco37 no ano de
2005 atribuiu esse fato as seguintes causas o excesso de processos o custo e a morosidade da
justiccedila a inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios a ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais
um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico e a progressiva volatizaccedilatildeo dos bens
Quanto ao excesso de processos o referido autor aduz que ldquonos grandes centros o
crescimento da maacutequina judiciaacuteria natildeo acompanhou a expansatildeo do nuacutemero de litiacutegiosrdquo 38
O custo e morosidade da justiccedila prejudicam a tutela satisfativa posto que
ldquojaacute desfalcado pelo inadimplemento do devedor o credor ainda tem de arcar com o adiantamento das despesas do processo de execuccedilatildeo e de eventual liquidaccedilatildeo vendo arrastar-se a marcha dos atos executoacuterios facilmente retardada por atos procrastinatoacuterios do devedorrdquo 39
35 Ibid p 86 36 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca
para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018
37 GRECCO Leonardo A Crise do Processo de Execuccedilatildeo in Estudos de direito processual Leonardo Greco ndash Campos dos Goytacazes Ed Faculdade de Direito de Campos 2005 p 7
38 Ibid p 7 39 Ibid p 7-8
18 A inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios contribui para a crise do processo de
execuccedilatildeo tendo em vista que
ldquoo juiz da execuccedilatildeo prisioneiro de ritos que o distanciam das partes e da realidade da vida impulsiona sem qualquer apetite a execuccedilatildeo conduzindo-a ao sabor dos ventos das provocaccedilotildees impacientes do credor e das costumeiras procrastinaccedilotildees do devedorrdquo 40
Jaacute ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais atrapalha a efetivaccedilatildeo da tutela satisfativa ldquoo
devedor natildeo colabora com a execuccedilatildeo e os meios de pressatildeo que a lei estabelece natildeo satildeo
suficientes para intimidaacute-lordquo 41
Com um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico
O espiacuterito empresarial e a sociedade de consumo estimulam o endividamento das pessoas e o inadimplemento das obrigaccedilotildees pelo devedor deixou de ser vexatoacuterio e reprovaacutevel o que multiplica as accedilotildees de cobranccedila e execuccedilotildees atraveacutes das quais o sujeito passivo ainda usufrui vantagens agraves custas do credor 42
Por fim Leonardo Greco elenca a volatizaccedilatildeo dos bens como o uacuteltimo fator que
macula o processo executo tendo em vista que
ldquomudou inteiramente o perfil patrimonial das pessoas antes concentrado em bens de raiz e agora tendencialmente dirigido a investimentos em tiacutetulos e valores facilmente negociaacuteveis o que dificulta a sua localizaccedilatildeo pelo credorrdquo 43
O Coacutedigo de Processo Civil de 1973 introduziu o sistema executivo ao ordenamento
juriacutedico paacutetrio e seguindo os valores liberais da eacutepoca com a proteccedilatildeo de esfera juriacutedica de
liberdade do cidadatildeo contra a possibilidade de arbiacutetrio do Estado e uso indevido do Poder
jurisdicional outorgou o miacutenimo de poder ao juiz Seguindo as regras do CPC de 73 o
devedor soacute poderia ter sua esfera juriacutedica invadida atraveacutes de meios de execuccedilatildeo instituiacutedos
previamente em lei
Diante de tantos obstaacuteculos para se efetivar a tutela satisfativa a execuccedilatildeo estava
fadada ao fracasso o que frustrava a expectativa do jurisdicionado a uma prestaccedilatildeo da tutela
jurisdicional ceacutelere e efetiva Insatisfeitos com o cenaacuterio que se encontrava a atividade
40 Ibid p 8 41 Ibid p8 42 Ibid p 8 43 Ibid p8
19
executiva legisladores e operadores do direito natildeo mediram esforccedilos para promover uma
evoluccedilatildeo significativa buscando mais eficiecircncia e celeridade ao procedimento executoacuterio
Dessa forma no final de 1994 foi introduzido no coacutedigo de processo agrave flexibilizaccedilatildeo
dos poderes executoacuterios do juiz ldquopara que ele pudesse prestar uma tutela efetiva aos direitos
ficando autorizado a determinar a modalidade de execuccedilatildeo adequada a cada hipoacutetese nas
obrigaccedilotildees de fazer e natildeo fazer (art 461 sect5ordm do CPC de 1973)rdquo No ano de 2002 a referida
medida foi estendida para as obrigaccedilotildees de entregar coisa (art 461-A caput e sect3ordm do CPC de
1973)
Com fundamento nos artigos 461 e 461-A em 2005 a Lei nordm 11 23205 unificou o
processo de conhecimento e o processo de execuccedilatildeo de sentenccedila Nesse sentido Maacuterio
Henrique Cavalcanti Gil Rodrigues44 aduz que
A Lei 112322005 reuniu de forma definitiva os processos de conhecimento e de execuccedilatildeo em um uacutenico processo composto por um sistema bifaacutesico Assim passa a existir uma fase inicial (de reconhecimento) e uma fase posterior (de cumprimento de sentenccedila de efetivaccedilatildeo da decisatildeo definitiva) sem contar com a eventual fase intermediaacuteria de liquidaccedilatildeo (RODRIGUES 2010 p 38)
Ademais as alteraccedilotildees realizadas no CPC de 73 inseriu a atipicidade dos meios
executivos nas obrigaccedilotildees de fazer natildeo fazer e dar coisa certa entretanto exercendo papel
subsidiaacuterio aos meios tiacutepicos
Quanto agraves obrigaccedilotildees de pagar quantia havia apenas a possibilidade de se valer da
incidecircncia de multa do art 475-J do CPC de 73 ndash implementada mediante reforma perpetrada
pela Lei nordm 11232 de 2005 em atendimento a doutrina processualista preocupada com a
efetividade das decisotildees ndash e de atos executivos como a penhora de bens e dinheiro
Ainda que a execuccedilatildeo tenha avanccedilado com a inserccedilatildeo das leis posteriores a 1994 no
CPC de 1973 a mesma continuava insuficiente tendo em vista que a burocracia e lentidatildeo
dos atos executivos davam brechas para que o devedor escondesse seu patrimocircnio penhoraacutevel
tornando carente de efetividade e celeridade agrave execuccedilatildeo
44 RODRIGUES Maacuterio Henrique Cavalcanti Gil A evoluccedilatildeo da execuccedilatildeo de sentenccedila no direito
processual civil e o novo regime juriacutedico das sentenccedilas apoacutes a reforma implementada pela Lei 112322005 Revista do Tribunal Regional Federal da 1ordf Regiatildeo v 22 n 2 fev 2010 p 38
20
25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO
A tutela juridiscional eacute um direito fundamental previsto no art 5ordm inciso XXXV da
Carta Magna ldquo() a lei natildeo excluiraacute da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio lesatildeo ou ameaccedila a
direitordquo
Na visatildeo claacutessica o direito de accedilatildeo era efetivado com a prolaccedilatildeo de uma sentenccedila de
meacuterito posiccedilatildeo adotada por grande parte dos processualistas seguidores da doutrina de
Liebman Todavia esse conceito se mostra defasado tendo em vista que o direito de acesso agrave
justiccedila natildeo eacute apenas uma garantia formal de bater as portas do judiciaacuterio mas a garantia de
acesso agrave ordem juriacutedica justa adequada e eficaz45
Acreditar que uma sentenccedila de meacuterito favoraacutevel eacute tutela jurisdicional suficiente para
satisfazer o que se busca com o ajuizamento da accedilatildeo eacute uma visatildeo distorcida da atividade
satisfativa ldquoSob o ponto de vista do direito material a condenaccedilatildeo por si soacute eacute incapaz de
prestar a tutela do direitordquo46
Nessa oacutetica o direito fundamental agrave tutela executiva exige um sistema de tutela
jurisdicional ldquocapaz de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor
de tutela executivardquo47 Dessa forma entende-se que
ldquo() a) a interpretaccedilatildeo das normas que regulamentam a tutela executiva tem de ser feita no sentido de extrair a maior efetividade possiacutevel b) o juiz tem o poder-dever de deixar de aplicar uma norma que imponha uma restriccedilatildeo a um meio executivo sempre que essa restriccedilatildeo natildeo se justificar como forma de proteccedilatildeo a outro direito fundamental c) o juiz tem o poder-dever de adotar os meios executivos que se revelem necessaacuterios agrave prestaccedilatildeo integral de tutela executivardquo48
Egrave imperioso compreender que o direito fundamental agrave tutela executiva ratificado
pelo CPC eacute essencial para dirimir diversos litiacutegios oriundos do procedimento executivo
45 FERREIRA Gabriela Macedo Poder geral de efetivaccedilatildeo em defesa da constitucionalidade da
teacutecnica de execuccedilatildeo dos direitos do art 139 IV do Coacutedigo de Processo Civil Revista Jus Navigandi ISSN 1518-4862 Teresina ano 22 n 5178 4 set 2017 Disponiacutevel em lthttpsjuscombrartigos60190gt Acesso em 11 set 2018
46 Ibid natildeo paginado 47 DIDIER JR Fredie et al apud GUERRA Marcelo lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do credor
na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 48 Ibid p 102-104
21
ldquoprincipalmente aqueles relacionados agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo49
Fredie Didier et al50 cita como exemplo as hipoacuteteses de impenhorabilidade
A impenhorabilidade de certos bens eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa
Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais
Por esta razatildeo o legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do
CPC fazendo um preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses das partes envolvidas
optando pela mitigaccedilatildeo do direito do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado
Quando o oacutergatildeo jurisdicional verificar que a aplicaccedilatildeo das regras de
impenhorabilidade eacute desproporcional para o caso concreto deve afastaacute-la e construir a
soluccedilatildeo adequada para o referido caso Didier et al51 traz um exemplo esclarecedor em sua
obra
O bem imoacutevel que serve de moradia da famiacutelia eacute relativamente impenhoraacutevel Objetiva-se com essa restriccedilatildeo proteger o direito fundamental agrave moradia conteuacutedo do direito agrave proteccedilatildeo da dignidade Imagine-se um imoacutevel de altiacutessimo valor Imagine-se agora um creacutedito que corresponda a 40 do valor do imoacutevel A venda judicial do imoacutevel no caso permitiria natildeo soacute satisfazer o direito do credor como ainda garantir ao executado com a sobra a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel que lhe preserve a dignidade A opccedilatildeo pela interpretaccedilatildeo literal da regra que veda a penhora protegeria exclusivamente o direito do executado de maneira desnecessaacuteria porque a relaccedilatildeo valor executadovalor do bem permitiria a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel apoacutes a entrega do dinheiro ao credor Seria pois interpretaccedilatildeo em desconformidade com os preceitos da contemporacircnea hermenecircutica constitucional que preconiza a necessidade de nos casos de choque entre direitos fundamentais dar a interpretaccedilatildeo que mais adequadamente proteja a ambos
A execuccedilatildeo civil integra o direito fundamental agrave tutela jurisdicional disciplinando
que ldquoos dispositivos devem ser interpretados de modo que se garanta a maior efetividade
49 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66 50 Ibid p 66 51 Ibid p 67
22
possiacutevel agrave execuccedilatildeo desde que respeitados outros direitos fundamentaisrdquo52 Podendo ser
afastada desde que proporcional qualquer obstaacuteculo irrazoaacutevel agrave efetivaccedilatildeo desse direito
52 FERREIRA Gabriela Macedo apud MACEDO Lucas Buril de As eficaacutecias das decisotildees judiciais e
o cumprimento de sentenccedila no CPC15 Novo CPC Doutrina selecionada v 5 Execuccedilatildeo Coordenador geral Fredie Didier Jr organizadores Lucas Buril de Macedo Ravi Peixoto Alexandre Freire ndash Salvador Jus Podivm 2015 p 360361
23
3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO
EXECUTADO
31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS
Como forma de controlar a atividade jurisdicional por muito tempo vigorou o
entendimento de que a execuccedilatildeo somente poderia ser realizada atraveacutes dos meios executivos
tipicamente previstos na legislaccedilatildeo Segundo Luiz Guilherme Marinoni53
O princiacutepio da tipicidade deseja significar que os meios de execuccedilatildeo devem estar previstos na lei e assim que a execuccedilatildeo natildeo pode ocorrer atraveacutes de formas executivas natildeo tipificadas O seu objetivo eacute de um lado impedir que meio executivo natildeo previsto em lei possa ser utilizado e de outro garantir o jurisdicionado contra a possibilidade de arbiacutetrio judicial na fixaccedilatildeo da modalidade executiva Se o jurisdicionado sabe em razatildeo de previsatildeo legal que a sua esfera juriacutedica somente poderaacute ser invadida atraveacutes de determinadas modalidades executivas confere-se a ele a possibilidade de antever a reaccedilatildeo ao seu inadimplemento bem como a garantia de que a jurisdiccedilatildeo natildeo determinaraacute ou permitiraacute a utilizaccedilatildeo de meio executivo diverso daqueles previstos
Dessa forma o princiacutepio da tipicidade disciplina que o oacutergatildeo julgador ao proceder agrave
execuccedilatildeo estaacute limitado aos meios executivos previamente definidos em lei natildeo podendo se
valer de qualquer teacutecnica de efetivaccedilatildeo que natildeo se encaixasse nas hipoacuteteses taxativas da
legislaccedilatildeo
Entretanto o legislador natildeo tem como prever todas as peculiaridades dos direitos
dignos de tutela executiva e preordenar teacutecnicas executivas diversas para cada peculiaridade
Sob esse cenaacuterio o principio da tipicidade foi cedendo lugar ao principio da atipicidade dos
meios executivos
A ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do oacutergatildeo julgador estaacute cada vez mais presente
no ordenamento juriacutedico paacutetrio motivando um poder geral de efetivaccedilatildeo ldquoque permite ao
julgador valer-se dos meios executivos que considerar mais adequado ao caso concreto sejam
eles de coerccedilatildeo direta sejam de coerccedilatildeo indiretardquo 54
53 MARINONI Luiz Guilherme Teacutecnica processual e tutela dos direitos Satildeo Paulo Editora Revista
dos Tribunais 2004 p 212 nota 79 54 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 100
24
Essa tendecircncia de ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do juiz natildeo eacute exclusividade do
ordenamento juriacutedico brasileiro segundo Fredie Didier et al55
Michelle Taruffo jaacute apontava que o direito americano diante da inefetividade dos meios executivos at law comeccedilou a autorizar o magistrado a tomar medidas executivas adequadas ao caso concreto Trata-se afirma o jurista italiano de aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo segundo o qual as regras processuais devem ser adaptadas agraves necessidades do direito material
Os meios executivos atiacutepicos derivam de trecircs enunciados normativos do Coacutedigo de
Processo Civil o art 139 IV o art 297 e o sect1ordm do art 536
O art 139 IV do CPC dispotildee que pertence ao juiz o poder-dever de ldquodeterminar
todas as medidas indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para
assegurar o cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto
prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo
Jaacute o art 297 do CPC cuida da tutela provisoacuteria e garante que ldquoo juiz poderaacute
determinar as medidas que considerar adequadas para a efetivaccedilatildeo da tutela provisoacuteriardquo
Podendo dessa forma a dita tutela ser efetivada atipicamente
Por fim o art 536 sect1ordm do CPC dispotildee que
Para atender ao disposto no caput o juiz poderaacute determinar entre outras medidas a imposiccedilatildeo de multa a busca e apreensatildeo a remoccedilatildeo de pessoas e coisas o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva podendo caso necessaacuterio requisitar o auxilio de forccedila policial
As supracitadas medidas executivas atiacutepicas satildeo entendidas pela doutrina como
claacuteusulas gerais processuais executivas56 Essas claacuteusulas gerais natildeo restringem a sua
aplicaccedilatildeo agraves teacutecnicas de coerccedilatildeo indireta satildeo autorizados tambeacutem o uso de meios de execuccedilatildeo
dieta e indireta
Ademais cumpre salientar que o art 139 IV CPC aplica-se a toda e qualquer
atividade executiva ldquoa) seja fundada em tiacutetulo executivo judicial (provisoacuteria ou definitiva)
55 DIDIER JR Fredie et al apud TARUFFO Michelle A atuaccedilatildeo executiva dos direitos perfis
comparatiacutesticos Revista de Processo Satildeo Paulo RT 1990 n 59 p 78 56 Segundo Fredie Didier et al claacuteusula geral eacute uma espeacutecie de texto normativo cujo antecedente
(hipoacutetese faacutetica) eacute composto por termos vagos e consequente (efeito juriacutedico) eacute indeterminado
25
seja fundada em tiacutetulo executivo extrajudicial b) seja para efetivar prestaccedilatildeo pecuniaacuteria seja
para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer ou dar coisa distinta de dinheirordquo57
Jaacute o art 297 do CPC garante que a tutela provisoacuteria possa ser efetivada tambeacutem
atipicamente ldquoSucede que a atipicidade da tutela provisoacuteria segue necessariamente a
atipicidade da tutela definitivardquo 58
Por fim o comando do sect 1 ordmdo art 536 se aplica
a) inicialmente agrave execuccedilatildeo de fazer e de natildeo fazer fundada em decisatildeo judicial (provisoacuteria ou definitiva) b) por forccedila do sect 3ordm do art 538 tambeacutem se aplica ao cumprimento de sentenccedila para entrega de coisa c) por forccedila do art 771 paraacutegrafo uacutenico o dispositivo tambeacutem se aplica agrave execuccedilatildeo para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer e entregar coisa distinta de dinheiro fundada em tiacutetulo extrajudicial
Claramente o art 139 IV eacute mais amplo do que o sect 1 ordm do art 536 estende-se por
disposiccedilatildeo expressa agrave execuccedilatildeo de pagar quantia Sendo uma grande novidade nas obrigaccedilotildees
que tem por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15
O art 139 IV do CPC apresentou uma novidade agrave atipicidade dos meios executivos
ao disciplinar que cabe ao juiz ldquodeterminar todas as medidas indutivas coercitivas
mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o cumprimento de ordem judicial
inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo
A inovaccedilatildeo estaacute na possibilidade de utilizar os meios atiacutepicos para assegurar o
cumprimento de decisotildees que versam sobre as obrigaccedilotildees pecuniaacuterias sendo admitida a
utilizaccedilatildeo de outros meios ateacute na execuccedilatildeo de titulo judicial de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria aleacutem da
multa de 10 (a que se refere o artigo 523 sect 1ordm do CPC) para forccedilar o devedor a cumprir a
obrigaccedilatildeo pecuniaacuteria
57 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 105 58 Ibid p 105
26
Dessa forma eacute possiacutevel afirmar que ldquoao lado da disciplina tiacutepica do art 523 e
seguintes () o novo CPC inova ao permitir que o sistema de teacutecnicas executivas atiacutepicas
sejam empregadas na execuccedilatildeo monetaacuteriardquo59 (ZARONI VITORELLI 2016 p 66)
Fernando da Fonseca Gajardoni60 denomina a dita medida como a ldquorevoluccedilatildeo
silenciosardquo da execuccedilatildeo por quantia certa posto que
() pelo fato de que a regra natildeo estar propriamente incrustrada nos capiacutetulo e livro atinentes ao cumprimento de sentenccedila e ao processo de execuccedilatildeo ndash o art 139 IV do Novo CPC parece trazer ao paiacutes algo bastante novo cuja aplicaccedilatildeo a depender do comportamento do Judiciaacuterio pode implicar em verdadeira revoluccedilatildeo (positiva ou negativa) na sistemaacutetica executiva ateacute entatildeo vigente
Claramente o dispositivo foi recebido com entusiasmo por parte da doutrina que
anteciparam em afirmar que o princiacutepio da atipicidade dos meios executivos no CPC2015
ldquo() assume a feiccedilatildeo de poder-dever geral conferido ao magistrado de determinar () todas
as medidas coercitivas sub-rogatoacuterias mandamentais e indutivas que entender necessaacuterias
para a tutela justa efetiva e em tempo razoaacutevelrdquo 61
Dessa forma lecionam Luiz Guilherme Marinoni Seacutergio Cruz Arenhart e Daniel
Mitidiero62 que
O juiz a partir do art 139 IV do CPC2015 natildeo estaacute mais adstrito apenas agrave sentenccedila condenatoacuteria ndash que fixa a obrigaccedilatildeo de pagar e daacute ensejo agrave abertura da execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo patrimonial ndash para a tutela de prestaccedilotildees pecuniaacuterias Pode impor essa prestaccedilatildeo por meio de ordem judicial acoplada ao aceno de emprego de medida de induccedilatildeo (coercitiva ou de pressatildeo positiva) ou de medida de sub-rogaccedilatildeo (MARINONI ARENHARDT MITIDIERO 2015 p 703)
Deste modo em razatildeo do art 139 IV do CPC tem-se entendido que o juiz nas
execuccedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria possui a faculdade de adotar qualquer
59 ZARONI Bruno Marzullo VITORELLI Edilson Reforma e efetividade da execuccedilatildeo no novo CPC
In PEIXOTO Ravi FREIRE Alexandre MENDES Aluiacutesio Gonccedilalves de Castro Execuccedilatildeo 2 ed rev e atual Salvador JusPodivm 2016 766 p (Coleccedilatildeo novo CPC doutrina selecionada v 5) p 66
60 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia 24082015 JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Acesso em 23082018
61 LIMA Rafael de Oliveira A atipicidade dos meios executivos no coacutedigo de processo civil brasileiro de 2015 Revista de Processo Jurisdiccedilatildeo e Efetividade da Justiccedila v 2 n 2 juldez 2016 p 11
62 MARINONI Luiz Guilherme ARENHART Seacutergio Cruz MITIDIERO Daniel Novo curso de processo civil tutela dos direitos mediante procedimento comum Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 v 2 p 703
27
medida indutiva coercitiva mandamentais ou sub-rogatoacuterias para efetivar o creacutedito do
exequente natildeo se limitando as medidas tiacutepicas
Alguns doutrinadores se precipitaram ao afirmar que o dito dispositivo ldquo() autoriza o
juiz a utilizar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir ressalvando-se a prisatildeo
civil constitucionalmente limitada ao devedor de alimentosrdquo 63 Acreditam Jorge Bheron
Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa que o entusiasmo por parte da
doutrina abre margem para as mais variadas formas de compelir o devedor a cumprir com a
prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
ldquoE aiacute persistindo no mau vezo de fazer explicaccedilotildees em abstrato ignorando que o sentindo soacute se daacute na aplicaccedilatildeo (situaccedilatildeo concreta real ou fictiacutecia) as sugestatildeo satildeo as mais engenhosas suspensatildeo de CNH retenccedilatildeo de passaporte restriccedilatildeo de fim de semana cancelamento de cartotildees de creacutedito ndash para ficar apenas nestasrdquo 64
Ou seja podendo o juiz natildeo apenas substituir o devedor tomando seu patrimocircnio para
entregar ao credor na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia como tambeacutem poderaacute
pressionaacute-lo psicologicamente a adimplir por conta proacutepria a obrigaccedilatildeo
Ademais o Enunciado nordm 48 do ENFAM avalia expressamente a possibilidade de
imposiccedilatildeo de medidas coercitivas para a efetivaccedilatildeo da execuccedilatildeo pecuniaacuteria Conforme o dito
enunciado
ldquoO art 139 inciso IV traduz um poder geral de efetivaccedilatildeo permitindo a aplicaccedilatildeo de medidas atiacutepicas para garantir o cumprimento de qualquer ordem judicial inclusive no acircmbito do cumprimento de sentenccedila e no processo de execuccedilatildeo baseado em tiacutetulosrdquo
Dessa forma o artigo 139 IV do CPC permite uma gama ampla de interpretaccedilotildees por
parte da doutrina por ser uma claacuteusula geral encontrando limite apenas na imaginaccedilatildeo de
quem o analisa Nesse sentido eacute forccediloso orientar e delimitar o manejo desse artigo legal para
que se extraia seu sentido e alcance revelando assim sobre que situaccedilotildees ele incide de que
modo e o que permite
63 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
64 Ibid sem paginaccedilatildeo
28
32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER
GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
O artigo 139 IV com a vigecircncia do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 abriu margem
para uma constelaccedilatildeo de decisotildees nas quais o dito dispositivo recebeu diversas interpretaccedilotildees
pelos operadores do direito
Sem duacutevidas por ser uma das pioneiras a decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara
Ciacutevel do Foro Regional de Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-
1320138260011 na data de 25 de agosto de 2016 gerou um enorme rebuliccedilo
Nessa accedilatildeo que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto
uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a
suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o
passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito
Segundo a magistrada o processo tramitava haacute anos sem que nenhum valor tenha sido
pago ao exequente aleacutem do devedor natildeo ter oferecido proposta de acordo e nem ter indicado
bens agrave penhora configurando uma completa desiacutedia com o processo
ldquoO caso tratado nos autos se insere dentre as hipoacuteteses em que eacute cabiacutevel a aplicaccedilatildeo do art 139 inciso IV do Coacutedigo de Processo Civil Isso porque o processo tramita desde 2013 sem que qualquer valor tenha sido pago ao exequente Todas as medidas executivas cabiacuteveis foram tomadas sendo que o executado natildeo paga a diacutevida natildeo indica bens agrave penhora natildeo faz proposta de acordo e sequer cumpre de forma adequada as ordens judiciais frustrando a execuccedilatildeo
Se o executado natildeo tem como solver a presente diacutevida tambeacutem natildeo recursos para viagens internacionais ou para manter um veiacuteculo ou mesmo manter um cartatildeo de creacutedito Se poreacutem mantiver tais atividades poderaacute quitar a diacutevida razatildeo pela qual a medida coercitiva poderaacute se mostrar efetiva
Assim como medida coercitiva objetivando a efetivaccedilatildeo da presente execuccedilatildeo defiro o pedido formulado pelo exequente e suspendo a Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo do executado M A S determinando ainda a apreensatildeo de seu passaporte ateacute o pagamento da presente diacutevida
()
Determino ainda o cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado ateacute o pagamento da presente diacutevida ()rdquo
Foi impetrado Habeas Corpus no Tribunal de Justiccedila do Estado de Satildeo Paulo a favor
do executado sob o fundamento que a coaccedilatildeo era ilegal e afetava o direito de locomoccedilatildeo
29
garantido constitucionalmente Tendo sido concedida a liminar em decisatildeo que ora se
reproduz
Em que pese a nova sistemaacutetica trazida pelo art 139 IV do CPC2015 deve-se considerar que a base estrutural do ordenamento juriacutedico eacute a Constituiccedilatildeo Federal que em seu art 5ordm XV consagra o direito de ir e vir Ademais o art 8ordm do CPC2015 tambeacutem preceitua que ao aplicar o ordenamento juriacutedico o juiz natildeo atentaraacute apenas para a eficiecircncia do processo mas tambeacutem aos fins sociais e agraves exigecircncias do bem comum devendo ainda resguardar e promover a dignidade da pessoa humana observando a proporcionalidade a razoabilidade e a legalidade Por tais motivos concedo a liminar pleiteada65
Cabe destacar aqui o voto vencido da Desembargadora Maria Luacutecia Pizzotti no
julgamento do Habeas Corpus supracitado demonstrando que o debate sobre a abrangecircncia
do artigo 139 IV do CPC ocorre tanto na doutrina quanto no judiciaacuterio
O objetivo do novel dispositivo natildeo eacute impor penas ou restringir direitos natildeo sendo intenccedilatildeo do Judiciaacuterio suspender indefinidamente o direito de dirigir do executado ou sua liberdade de viajar mas sim impor uma restriccedilatildeo tatildeo gravosa caso ele natildeo cumpra a determinaccedilatildeo que escolha cumprir sua obrigaccedilatildeo e dar fim ao problema Em outras palavras mediante as medidas de coerccedilatildeo o Estado procura persuadir o inadimplente impondo-lhe situaccedilotildees tatildeo onerosas e inconvenientes que em algum momento seja para ele mais vantajoso cumprir do que permanecer no inadimplemento
Ao fazecirc-lo o Novo Coacutedigo de Processo Civil rompe com as criacuteticas da ineficiecircncia das execuccedilotildees Natildeo se cogita deferir medidas restritivas agravequeles que demonstram a incapacidade absoluta de solver o deacutebito apenas agravequeles que reconhecidamente se valem de artimanhas e subterfuacutegios para evitar a satisfaccedilatildeo das diacutevidas ldquopreferindordquo outras despesas mais lsquonobresrsquo agindo em nome de terceiros e fazendo escaacuternio dos credores e do proacuteprio Poder Judiciaacuterio (hellip)
Para tanto memoraacutevel a noccedilatildeo de que a medida em comento tem caraacuteter excepcional e encontra limites no plano da proporcionalidade como sustenta o ilustrado Magistrado paulista Fernando da Fonseca Gajardoni Professor Faculdade de Direito de Ribeiratildeo Preto da USP (in httpswwwjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 acesso em 091216 agraves 11h20min) E para anaacutelise da proporcionalidade a ponderaccedilatildeo deve observar os trecircs passos apontados pela doutrina a necessidade a adequaccedilatildeo e a proporcionalidade em sentido estrito
65 TJSP - Habeas Corpus Processo nordm 2183713-8520168260000 30ordf Cacircmara Direito Privado relator
Des Marcos Ramos j 290317
30
Ademais no entendimento de Jorge Amaury Maia Nunes e Guilherme Pupe de
Noacutebrega66 essa decisatildeo releva os perigos trazidos pelo art 139 IV do CPC ao confrontar
direitos constitucionalmente garantidos
De nossa parte entendemos que a liberdade de locomoccedilatildeo inserta no inciso XV do artigo 5ordm que abrange o direito de deixar o territoacuterio nacional sofre embaraccedilo indevido pela apreensatildeo de passaporte ou pela suspensatildeo da carteira nacional de habilitaccedilatildeo
()
Agrave luz da exposiccedilatildeo feita acima e em anaacutelise primeva sustentamos que o artigo 139 IV do CPC de 2015 estaacute a merecer declaraccedilatildeo de inconstitucionalidade sem reduccedilatildeo de texto para o fim de rechaccedilar a apreensatildeo de passaporte a suspensatildeo do direito de dirigir e a vedaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo em concurso ou em licitaccedilatildeo puacuteblicos como medidas passiacuteveis de serem adotadas pelo juiz sob pena de vulneraccedilatildeo aos artigos 1ordm IV 5ordm XV e LIV 37 I 173 sect 3ordm III e 175 todos da Constituiccedilatildeo
Apesar de ter sofrido duras criacuteticas a decisatildeo do processo de nordm 4001386-
1320138260011 serviu de inspiraccedilatildeo para tantas outras decisotildees no mesmo sentido
Foi o caso da decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de Satildeo
Vicente em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 0020724-2620088260590 na data de 21 de
junho de 2017
A supracitada execuccedilatildeo se arrastava por nove (09) anos sem que o devedor tenha
esboccedilado qualquer intenccedilatildeo de pagar a diacutevida O credor requereu a suspensatildeo da Carteira
Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado apreensatildeo do passaporte e cancelamento dos
cartotildees de creacutedito
O magistrado com embasamento no artigo 139 IV do CPC deferiu parcialmente o
pedido sob o fundamento de que a apreensatildeo de passaporte e CNH natildeo viola o direito de ir e
vir do devedor Entretanto o juiz indeferiu o pedido de cancelamento do cartatildeo de creacutedito por
acreditar que a suspensatildeo poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado tendo em
vista que atualmente as pessoas utilizam o referido cartatildeo para pagamento das despesas
diaacuterias
66 NOBREacuteGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139
IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018
31
Eacute evidente que as medidas atiacutepicas de coerccedilatildeo devem ser utilizadas com cautela sempre respeitando a dignidade da pessoa do executado Natildeo se vislumbra contudo que as medidas aqui eleitas sejam capazes de vulnerar os Direitos Fundamentais do indiviacuteduo A uma porque natildeo se trata de restriccedilatildeo ao direito de ir e vir do executado que continua no gozo de plena liberdade de locomoccedilatildeo a duas porque a conduccedilatildeo de veiacuteculo automotor eacute mera comodidade da vida moderna natildeo se tratando de direito absoluto
Com mais razatildeo ainda se admite a suspensatildeo do Passaporte do executado que se natildeo paga a diacutevida da execuccedilatildeo natildeo deve ter o direito de fazer viagem internacional
Tem-se aqui verdadeiro exerciacutecio de ponderaccedilatildeo de interesses juriacutedicos de um lado jaz o direito de creacutedito do exequente que deriva do direito de propriedade e por isso mesmo tem envergadura constitucional de outro giro tem-se o direito do executado agrave autorizaccedilatildeo do Estado para conduzir veiacuteculo automotor e realizar viagens internacionais que natildeo se mostram essenciais agrave dignidade da pessoa humana Natildeo haacute duacutevidas pois de que eacute este uacuteltimo que deve sucumbir
O pedido fica indeferido apenas no tocante agrave suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado Eacute que ao contraacuterio da CNH e do passaporte que trazem consigo certa presunccedilatildeo de riqueza natildeo se pode concluir que o uso de cartatildeo de creacutedito eacute feito por luxo ou simples conveniecircncia
Como eacute cediccedilo os cartotildees de creacutedito oferecem ao seu titular creacutedito raacutepido e rotativo para o pagamento de despesas diaacuterias e certamente exercem funccedilatildeo essencial agravequeles que se encontram em situaccedilatildeo financeira precaacuteria
A suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado portanto se revela medida desproporcional e que inclusive poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado
Pelo exposto defiro em parte o pedido formulado pelo exequente e DETERMINO a suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo e bem como a suspensatildeo da validade (cancelamento temporaacuterio) no sistema SINPA de eventuais passaportes vaacutelidos em nome do executado
Dessa forma o artigo 139 IV do CPC revolucionou completamente a execuccedilatildeo de
obrigaccedilatildeo de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria ao permitir a utilizaccedilatildeo do uso dos meios executivos
atiacutepicos para compelir o executado a satisfazer o creacutedito do exequente
33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE
EFETIVACcedilAtildeO
Era inevitaacutevel que o artigo 139 IV do CPC gerasse todo tipo de reaccedilatildeo entre os
doutrinadores do processo civil e ateacute mesmo de outros ramos do direito devido a sua
capacidade de realizar uma completa inovaccedilatildeo na forma de se executar as obrigaccedilotildees de pagar
quantia Alguns o aplaudiram visualizando nele ldquouma luz no fim do tuacutenelrdquo outros o
criticaram vislumbrando as arbitrariedades que poderiam ser praticadas com embasamento no
referido dispositivo
32
As decisotildees suscitadas em linhas preteacuteritas auxiliaram para fervilhar ainda mais o
debate sobre o tema tendo em vista que por um lado poderia aumentar a efetividade das
execuccedilotildees por quantia no entanto por outro surgiam questionamentos a cerca da sua
constitucionalidade
A doutrina parece que demoraraacute a se pacificar sobre o tema Segundo alguns
doutrinadores seraacute inconstitucional toda restriccedilatildeo que recaia sobre a pessoa do devedor e natildeo
exclusivamente sobre o seu patrimocircnio Jaacute para outros o dispositivo eacute constitucional e o meio
mais eficaz para se resolver o problema da efetivaccedilatildeo das execuccedilotildees de pagar quantia ldquoA
discussatildeo se daacute especialmente no que diz respeito aacutes medidas de suspensatildeo de CNH
apreensatildeo de passaporte e bloqueio de cartotildees de creacutedito do devedorrdquo 67
O professor Thiago Rodovalho analisou detalhadamente a decisatildeo de nordm 4001386-
1320138260011 em seu artigo ldquoO necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na
concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivosrdquo 68 Quanto agrave suspensatildeo da CNH o autor
acredita que tal medida natildeo viola qualquer direito fundamental do devedor posto que ldquodirigir
veiacuteculos automotores eacute direito do cidadatildeo mas natildeo se confunde com os direitos fundamentais
e social de ir-e-vir e ao transporterdquo 69 O professor eacute categoacuterico ao afirmar que
Com relaccedilatildeo agrave suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (suspensatildeo do direito de dirigir restriccedilatildeo de direitos) natildeo nos parece haver qualquer violaccedilatildeo a direito fundamental ou social nem a direito da personalidade ou colocaccedilatildeo do devedor em situaccedilatildeo desproporcionalmente detrimentosa exceccedilatildeo feita aos que usam o veiacuteculo como instrumento de trabalho atraindo a hipoacutetese do NCPC art 833 inc V
()
Outrossim natildeo o consideramos como direito da personalidade Os direitos da personalidade satildeo os valores fundamentais que compotildeem o proacuteprio ser justamente por isso intransmissiacuteveis e irrenunciaacuteveis natildeo podendo o seu exerciacutecio sofrer limitaccedilatildeo voluntaacuteria (CC art 11) Por mais que vivamos num paiacutes que tanto valoriza o carro e que muitas pessoas de fato se compreendam em razatildeo e em funccedilatildeo do carro que dirijam este natildeo nos parece ser um direito que verdadeiramente componha a personalidade do indiviacuteduo70
67 DONTOS Sofia Poderes executoacuterios do juiz que diz a doutrina sobre o art 139 inc IV do CPC
Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigospoderes-executorios-do-juiz-que-diz-a-doutrina-sobre-art-139-inc-iv-do-cpc-23052018 gt Publicado em 23052018 Acesso em 01082018
68 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018
69 Ibid sem paginaccedilatildeo 70 Ibid sem paginaccedilatildeo
33
Quanto ao cancelamento dos cartotildees de credito do devedor o professor Thiago
Rodovalho tambeacutem acredita que natildeo haacute qualquer violaccedilatildeo ao direito fundamental social ou
da personalidade do devedor e acrescenta que
Tanto assim o eacute que ser titular de um cartatildeo de creacutedito pressupotildee ter creacutedito o que eacute analisado e concedido por instituiccedilotildees financeiras mais do que isso se porventura passando por dificuldades financeiras a pessoa deixa de honrar com pagamentos a mesma instituiccedilatildeo financeira concedente do cartatildeo de creacutedito pode sponte propria cancelaacute-lo ou recusar-lhe a concessatildeo Ora parece-me contraditoacuterio que instituiccedilotildees financeiras para sua proteccedilatildeo patrimonial possam ferir esse suposto ldquodireito fundamentalrdquo ou esse suposto ldquodireito da personalidaderdquo mas natildeo possa o Poder Judiciaacuterio igualmente fazecirc-lo contra aquele devedor moroso que instado ao pagamento e frustradas todas as tentativas de constriccedilatildeo patrimonial leva vida luxuosa valendo-se de cartotildees de creacutedito que prescindem de dinheiro em conta eacute dizer podem justamente funcionar como forma de ocultar renda e patrimocircnio71
O autor considera a apreensatildeo de passaporte um tema mais polecircmico e que merece
maior reflexatildeo No entanto crecirc que eacute possiacutevel a apreensatildeo de passaporte sem violar os
direitos fundamentais do devedor por se tratar de um direito de ir e vir de amplitude especial
Agrave primeira vista a possibilidade de apreensatildeo do passaporte tambeacutem nos parece possiacutevel pois tambeacutem se trata de um direito de ir e vir de amplitude especial Assim o eacute pois salvo situaccedilotildees especiais (refugiados p ex) haacute a necessidade de demonstrar condiccedilotildees financeiras de estadia e retorno para ser admitido no paiacutes de destino Ou seja pressupotildee uma condiccedilatildeo financeira que o devedor justamente diz natildeo possuir Sem embargo dessa consideraccedilatildeo esse ainda eacute um ponto que merece uma reflexatildeo mais acurada sendo essa apenas uma primeira impressatildeo72
Outros autores escreveram sobre o tema como eacute o caso do processualista Luiz
Dellore73 que tambeacutem defende que as medidas atiacutepicas como restriccedilatildeo ao direito de dirigir
apreensatildeo de passaporte e cancelamento de cartotildees de creacutedito satildeo permitidas e natildeo violam em
regra os direitos fundamentais do devedor
De minha parte creio que efetivamente haacute inovaccedilatildeo no at 139 IV do NCPC (e natildeo mera repeticcedilatildeo do que jaacute havia no Coacutedigo anterior) que tem o condatildeo de trazer mais efetividade ao processo executivo no Brasil ndash que por deacutecadas centrou sua atenccedilatildeo na defesa do executado (vide a grande quantidade de impenhorabilidades) sem dar maior atenccedilatildeo ao creacutedito do exequente
71 Ibid sem paginaccedilatildeo 72 Ibid sem paginaccedilatildeo 73 DELLORE Luiz NCPC Atipicidade das medidas executivas jaacute eacute realidade Disponiacutevel em lt
httpswwwjotainfoopiniao-e-analisecolunasnovo-cpcncpc-atipicidade-de-medidas-executivas-ja-e-realidade-17042017 gt Publicado em 17042017 Acesso em 03092018
34
Logo a meu ver medidas como (i) restriccedilatildeo ao direito de dirigir (ii) apreensatildeo de passaporte (iii) cancelamento de cartotildees de creacutedito e (iv) vedaccedilatildeo de obtenccedilatildeo de novos empreacutestimos se natildeo vinculados ao pagamento do deacutebito exequendo dentre outras restriccedilotildees que deveratildeo ser observadas a cada caso satildeo permitidas pelo sistema do NCPC e em regra natildeo violam direitos fundamentais do devedor E tecircm o condatildeo de fazer com que o executado que tem recursos diante dessas medidas coercitivas pague o deacutebito trazendo sucesso agrave satisfaccedilatildeo do creacutedito
Nessa linha para Alexandre Fuchs das Neves74 o artigo 139 IV do CPC conferiu ao
juiz poderes coercitivos capazes de ldquotransformar a vida do devedor um infernordquo para compeli-
lo a cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria Entretanto pondera que para que a medida tenha
validade ldquoeacute necessaacuteria uma fundamentaccedilatildeo por evidente uma correlaccedilatildeo temaacutetica entre a
medida adotada e sua efetividade em face ao processo com fundamentaccedilatildeo detalhadardquo
No entendimento de Fernando Gajardoni75 satildeo possiacuteveis as medidas de apreensatildeo de
passaporte bloqueio de cartotildees de creacutedito e suspensatildeo da CNH Para ele o que limita o art
139 IV do CPC eacute o esgotamento dos meios tiacutepicos e a real necessidade da medida
Ilustrativamente natildeo efetuado o pagamento de diacutevida oriunda de multas de tracircnsito e superados os expedientes tradicionais de adimplemento (penhora de dinheiro e bens) seria liacutecito o estabelecimento da medida coercitivaindutiva de suspensatildeo do direito a conduzir veiacuteculo automotor ateacute pagamento do deacutebito (inclusive com apreensatildeo da CNH do devedor) natildeo efetuado pagamento de verbas salariais devidas a funcionaacuterios da empresa possiacutevel o estabelecimento de vedaccedilatildeo agrave contrataccedilatildeo de novos funcionaacuterios ateacute que seja saldada a diacutevida natildeo efetuado o pagamento de financiamento bancaacuterio na forma e no prazo avenccedilados possiacutevel ateacute que se tenha a quitaccedilatildeo que se obstem novos financiamentos ou mesmo a participaccedilatildeo do devedor em licitaccedilotildees (como de ordinaacuterio jaacute acontece com pessoas juriacutedicas em deacutebito tributaacuterio com o Poder Puacuteblico) etc
Teriacuteamos entatildeo no Brasil por assim dizer a adoccedilatildeo do padratildeo da atipicidade das medidas executivas tambeacutem para as obrigaccedilotildees de pagar vistas estas como ordens do EstadoJuiz para que haja prestaccedilatildeo de pagamento em pecuacutenia
()
Por isso ndash a prevalecer a interpretaccedilatildeo potencializada do art 139 IV do CPC2015 ndash o emprego de tais medidas coercitivasindutivas especialmente nas obrigaccedilotildees de pagar encontraraacute limite certo na excepcionalidade da medida (esgotamento dos meios tradicionais de satisfaccedilatildeo do deacutebito) na proporcionalidade (inclusive agrave luz da regra da menor onerosidade ao devedor do art 805 do CPC2015) na necessidade de fundamentaccedilatildeo substancial e especialmente nos direitos e garantias assegurados na Constituiccedilatildeo Federal (vg natildeo parece possiacutevel que se determine o pagamento sob pena de prisatildeo ou de vedaccedilatildeo ao exerciacutecio da profissatildeo do direito de ir e vir etc)
74 NEVES Alexandre Fuchs das Cancelamento de cartotildees de creacutedito e apreensatildeo de CNH e passaporte
do devedor Isso eacute possiacutevel Disponiacutevel em lt httpwwwsinfacspcombrconteudocancelamento-de-cartoes-de-credito-e-apreensao-de-cnh-e-passaporte-do-devedor-isso-e-possivel gt Acesso em 30082018
75 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Publicado em 24082015 Acesso em 30082018
35
Jaacute Fernanda Tartuce76 acredita que tais medidas satildeo problemaacuteticas e devem ser
analisadas com cautela tendo em vista que ao inveacutes de afetarem o patrimocircnio do devedor
atingem a proacutepria pessoa
Sob certo prisma adotar medidas diferenciadas contribui para a efetividade da prestaccedilatildeo jurisdicional Por outro lado o patrimocircnio ndash e natildeo a pessoa do devedor - responde por diacutevidas aleacutem disso o exerciacutecio de amplos poderes pelo juiz sem balizas especiacuteficas pode ensejar medidas inadequadas Nessa linha suspender o direito de dirigir e restringir o uso de passaporte satildeo iniciativas problemaacuteticas por atingirem a pessoa do devedor enquanto a penhora da restituiccedilatildeo de Imposto de Renda soa viaacutevel por afetar seu patrimocircnio Eacute importante que a medida diferenciada se revele proporcional e seja aplicada apoacutes o exaurimento de outros meios previstos no ordenamento Como a proposta do Novo Coacutedigo eacute aumentar a eficiecircncia processual intentar medidas ineficazes inexequiacuteveis eou de difiacutecil fiscalizaccedilatildeo pode acabar ensejando o efeito contraacuterio
Nessa senda Lenio Streck e Dierle Nunes77 entendem que as medidas atiacutepicas de
suspensatildeo da CNH eou apreensatildeo de passaporte satildeo inconstitucionais Afirmam que natildeo se
pode confundir o processo civil e penal ainda que ambos remetam a um ldquoparadigma
constitucional comumrdquo e que o artigo 139 IV do CPC ldquoimpotildee novos desafios interpretativos
que podem conduzir a uma anaacutelise superficial e utilitarista de busca de resultados que
desprezem a necessaacuteria leitura constitucionalrdquo Os autores ainda ponderam que ldquoO perigo eacute o
artigo 139 IV ser transformado em instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com
autorizaccedilatildeo judicialrdquo
O professor Araken de Assis no dia 18 de abril de 2018 em um evento sobre o
Coacutedigo Processual Civil de 2015 que ocorreu em Brasiacutelia na sede do Conselho Federal da
OAB declarou ser contraacuterio aos poderes executoacuterios atiacutepicos ldquoSou contra os poderes
atiacutepicos dos juiacutezes porque seu exerciacutecio redunda em simples arbitrariedadesrdquo78
Acrescentou ainda que
76 IBDFAM ndash Instituto Brasileiro de Famiacutelia O polecircmico inciso IV do artigo 139 do CPC e suas difusas
interpretaccedilotildees Disponiacutevel em lt httpwwwibdfamorgbrnoticias6096O+polC3AAmico+inciso+IV+do+artigo+139+do+CPC+e+suas+difusas+interpretaC3A7C3B5es gt Publicado em 31082016 Acesso em 04092018
77 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018
78 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04092018
36
Eacute evidentemente inconstitucional diante do princiacutepio da dignidade da pessoa humana tirar o passaporte carteira de habilitaccedilatildeo Quecirc que tem isso com diacutevidas Natildeo tem absolutamente nada Natildeo eacute a correlaccedilatildeo instrumental entre o objetivo da execuccedilatildeo e o meio empregado Isso eacute simples vinganccedila simples puniccedilatildeo79
O professor Araken de Assis acredita que tais medidas satildeo inconstitucionais e
violam o principio da dignidade humana do executado numa sociedade como a nossa
sedenta por puniccedilatildeo natildeo me surpreende que essas ideias sejam encaradas com
naturalidade Mas eacute preciso rejeitaacute-las em nome de princiacutepios 80
34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
A Constituiccedilatildeo Federal de 1988 tem como um dos seus fundamentos a dignidade da
pessoa humana presente no artigo 1ordm inciso III do referido texto constitucional O dito
princiacutepio tem o escopo de nortear o ordenamento juriacutedico como um todo
A inclusatildeo da dignidade da pessoa humana como princiacutepio constitucional obrigou
uma reflexatildeo sobre o papel da pessoa humana no direito e um redimensionamento para
elevaacute-la ao centro do ordenamento juriacutedico81 Eacute necessaacuterio recorrer agrave teoria Kantiana para
que se obtenha uma definiccedilatildeo do princiacutepio ora estudado Para Kant82 o homem eacute um fim
em si mesmo natildeo uma funccedilatildeo do Estado Ou Naccedilatildeo O Estado e o direito devem estar
organizados em benefiacutecio do indiviacuteduo
Agora eu afirmo o homem ndash e de uma maneira geral todo o ser racional ndash existe como fim em si mesmo e natildeo apenas como meio para o uso arbitraacuterio desta ou daquela vontade Em todas as suas accedilotildees pelo contraacuterio tanto nas direcionadas a ele mesmo como nas que o satildeo a outros seres racionais deve ser ele sempre considerado simultaneamente como fim
Partindo da premissa de que para Immanuel Kant o homem eacute o fim em si mesmo
ldquodevemos compreender que a dignidade da pessoa humana eacute a noccedilatildeo o comando a direccedilatildeo
que se deve seguir funcionando como fundamento para a interpretaccedilatildeo de todos os direitos e
garantias conferidos agrave pessoa nos ordenamentos juriacutedicos de cada Estadordquo 83
79 Ibid sem paginaccedilatildeo 80 Ibid sem paginaccedilatildeo 81 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito
fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 461 82 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud KANT Immanuel Fundamentaccedilatildeo da metafiacutesica dos costumes
Satildeo Paulo Martin Claret 2003 p56-59 Coleccedilatildeo A Obra-Prima de Cada Autor 83 SCHIAFIANO Juliana Rocha op cit p 461
37
O princiacutepio constitucional da dignidade da pessoa humana estaacute diretamente ligado ao
conteuacutedo dos direitos fundamentais logo para que se cumpra com os direitos fundamentais
constitucionalmente instituiacutedos eacute necessaacuterio reconhecer e respeitar a dignidade da pessoa
humana conforme disciplina Ingo Sarlet84
Em suma o que se pretende sustentar de modo mais enfaacutetico eacute que a dignidade da pessoa humana na condiccedilatildeo de valor (principio normativo) fundamental que atrai o conteuacutedo de todos os direitos fundamentais exige e pressupotildee o reconhecimento e proteccedilatildeo dos direitos fundamentais de todas as dimensotildees (ou geraccedilotildees se assim preferirmos) Assim sem que se reconheccedilam agrave pessoa humana os direitos fundamentais que lhe satildeo inerentes em verdade estarse-aacute lhe negando a proacutepria dignidade A consagraccedilatildeo constitucional da dignidade da pessoa humana tem o propoacutesito de limitar a atuaccedilatildeo ou a omissatildeo do Estado para garantir os direitos do indiviacuteduo Assim eacute difiacutecil precisar os efeitos da norma que determina a dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado (como acontece com a Constituiccedilatildeo brasileira de 1988) poreacutem quando desrespeitados os direitos fundamentais do cidadatildeo eacute possiacutevel identificar que a dignidade deste foi violada
Logo ldquoteraacute respeitada a sua dignidade o individuo que tiver respeitados os seus
direitos fundamentaisrdquo 85 Os direitos fundamentais estatildeo apresentados na Constituiccedilatildeo
Federal da seguinte forma direitos individuais e coletivos direitos sociais direitos poliacuteticos e
direitos de nacionalidade que tecircm como escopo garantir as liberdades positivas aos
indiviacuteduos ldquoonde foram conquistados direitos agrave liberdade religiosa liberdade civil e
profissional agrave propriedade ao livre acesso ao Judiciaacuterio agrave ampla defesa e ao contraditoacuterio no
processual judicial ao sigilo de dados e informaccedilotildees pessoais entre outros que somados
garantem o cidadatildeo uma vida dignardquo 86
O cidadatildeo na Constituiccedilatildeo Federal de 88 diferente das constituiccedilotildees brasileiras
anteriores passou a ser fundamento e ganhou destaque nos direitos fundamentais tendo
garantida a sua vida a sua dignidade a sua seguranccedila a sua honra a sua liberdade e a sua
propriedade
84 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud SARLET Ingo Wolfgang Dignidade da pessoa humana e
direitos fundamentais na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 2ed Porto Alegre Livraria do Advogado 2002 p87 85 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito
fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 462 86 Ibid p 462
38
Segundo Carmem Luacutecia Antunes Rocha87 para garantir o Estado Democraacutetico de
Direito eacute necessaacuterio que a sua atuaccedilatildeo seja sempre em conformidade com o princiacutepio da
dignidade da pessoa humana
O Estado somente eacute democraacutetico em sua concepccedilatildeo constitucionalizaccedilatildeo e atuaccedilatildeo quando respeita o princiacutepio da dignidade da pessoa humana Natildeo haacute verbo constitucional natildeo haacute verbo governamental que se faccedilam legiacutetimos quando natildeo se voltam ao atendimento daquele princiacutepio Natildeo haacute verdade constitucional natildeo haacute suporte institucional para as poliacuteticas puacuteblicas que natildeo sejam destinadas ao pleno cumprimento daquele valor maior transformado em princiacutepio constitucional
O princiacutepio da dignidade humana constitucionalmente garantido impotildee limites ao
Estado compelindo aos oacutergatildeos e atividades estatais respeitar o ser humano e garanti-lo
condiccedilotildees miacutenimas para uma vida digna Dessa forma eacute niacutetido que o dito princiacutepio eacute
pressuposto e indispensaacutevel para legitimar outras normas constitucionais e
principalmente infraconstitucionais
O Coacutedigo de Processo Civil eacute umas das principais normas infraconstitucionais que
sofre influecircncia dos preceitos valores e princiacutepios esculpidos na Constituiccedilatildeo Federal
Logo como o principio da dignidade humana eacute um dos mais importantes pressupostos
constitucionais ldquoentatildeo eacute tranquilo afirmar-se que o novel ordenamento processual tem
de se render nas resoluccedilotildees dos aspectos processuais e a fim de se atingir uma soluccedilatildeo
justa adequada e efetiva ao postulado da dignidade da pessoa humanardquo 88
Dessa forma o legislador deve formular as normas infraconstitucionais de acordo e a
partir do conteuacutedo constitucional para Marinoni Mitidiero e Arenhart89
() o Coacutedigo de Processo Civil constitui direito constitucional aplicado O Coacutedigo deve ser interpretado de acordo com a Constituiccedilatildeo e com os direitos fundamentais o que significa que as duacutevidas interpretativas devem ser resolvidas a favor da otimizaccedilatildeo do alcance da Constituiccedilatildeo e do processo civil como meio para tutela de direitos
87 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud ROCHA Carmen Luacutecia Antunes O princiacutepio da dignidade da
pessoa humana e a exclusatildeo social Revista Interesse Puacuteblico n4 p23-48 1999 p33 88 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o
novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 367
89 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 14
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Com o escopo de conferir eficaacutecia aos mandamentos constitucionais o CPC15 traz a
previsatildeo e diversas claacuteusulas gerais em seus primeiros artigos em um dos quais se
prestigia o princiacutepio da dignidade da pessoa humana
O referido princiacutepio estaacute disciplinado no artigo 8ordm do CPC15 e atua como um guia
sobre as demais normas do coacutedigo processual Eacute o que entende Nelson Rosenvald90
O maior cuidado do inteacuterprete eacute no sentido de jamais banalizar a dignidade fazendo dela um elixir processual tal como muitas vezes se vecirc na esfera do direito civil Penso que natildeo haacute maiores dificuldades em transpor a noccedilatildeo constitucional do princiacutepio para em seguida adaptaacute-la agraves singularidades do processo
Logo de acordo com o artigo 8ordm do CPC o oacutergatildeo julgador ao aplicar o ordenamento
juriacutedico deve resguardar a dignidade da pessoa humana Para Fredie Didier91 ldquoresguardar
nesse contexto eacute de um lado aplicar corretamente a norma juriacutedica lsquoproteccedilatildeo da dignidade
da pessoa humanarsquo e de outro natildeo violar a dignidaderdquo
O oacutergatildeo julgador deveraacute manter um comportamento ativo com o objetivo de promover
a dignidade da pessoa humana podendo tomar medidas de ofiacutecio para efetivar a dignidade da
pessoa humana Didier assevera que o magistrado poderaacute ainda ldquovaler-se da claacuteusula geral de
atipicidade (art 536 sect 1ordm) para a execuccedilatildeo do direito fundamental agrave dignidaderdquo 92 O autor
ainda traz dois exemplos
a) exigecircncia de respeito agrave ordem cronoloacutegica de conclusatildeo (art 12) caso de grave violaccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana que natildeo se encaixe em um dos incisos que excepcionam a regra de observacircncia da cronologia da conclusatildeo poderia o juiz ldquofurar a filardquo para promover a dignidade da pessoa humana b) prioridade na tramitaccedilatildeo processual pessoa que seja portadora de doenccedila grave mas que natildeo esteja no rol do art 1048 I para promover a dignidade de pessoa humana o juiz poderia determinar o processamento prioritaacuterio93
Essa dupla garantia ndash resguardo e promoccedilatildeo ndash tem como objetivo garantir ao individuo
sua dignidade humana fazendo com que ldquode um lado que o Estado natildeo a viole e de outro
que o Estado a promova e efetiverdquo
90 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud ROSENVALD Nelson A
dignidade da pessoa humana no CPC15 91 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte
geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 75 92 Ibid p 75 93 Ibid p 75
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Nessa senda o magistrado deveraacute promover a dignidade da pessoa humana quando
perceber a ausecircncia desta no processo ou assegura-la quando for posta em risco Eacute nesse
sentido o entendimento dos professores Marinoni Mitidiero e Arenhart94
() a dignidade da pessoa humana determina a compreensatildeo do processo civil como um meio para tutela dos direitos Vale dizer o processo civil natildeo pode ser visto como um instrumento a serviccedilo do Estado como um instrumento que natildeo se encontre orientado agrave realizaccedilatildeo dos fins da pessoa humana Em outras palavras o processo civil serve para realizaccedilatildeo dos direitos e para orientaccedilatildeo das pessoas a respeito do significado do direito
Nessa senda compete tanto ao juiz quanto as demais partes processuais garantirem ldquoo
valor intriacutenseco de cada vida que eacute trazida ao processordquo nas palavras de Alexandre Freitas
Cacircmara95
() aos sujeitos do processo eacute preciso sempre ter claro que os titulares dos interesses em conflitos satildeo pessoas reais cujas vidas seratildeo afetadas pelo resultado do processo e que por isso mesmo tecircm o direito de estabelecer suas estrateacutegias processuais de acordo com aquilo que lhes pareccedila melhor para suas vidas Eacute inadmissiacutevel tratar as partes como se natildeo fossem pessoas reais meros dados estatiacutesticos Afinal se para o Judiciaacuterio cada processo pode parecer apenas mais um processo para as partes cada processo pode ser o uacutenico o mais relevante aquele em que sua vida seraacute decidida E eacute dever do juiz assegurar que isto seja respeitado
Dessa forma eacute necessaacuterio que um arcabouccedilo normativo para que seja conferida
eficaacutecia e proteccedilatildeo ao principio da dignidade da pessoa humana
Logo o dito princiacutepio deve ser protegido em todas as esferas do ordenamento juriacutedico
inclusive no campo da execuccedilatildeo civil onde sofre grandes riscos de ser violado em nome do
direito fundamental agrave tutela executiva do credor ldquoPartir da premissa de que existe um direito
fundamental agrave tutela executiva ora ratificado pelo CPC eacute indispensaacutevel para a soluccedilatildeo de
diversos problemas oriundos do procedimento executivo principalmente aqueles relacionados
agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo 96
94 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme
MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 25
95 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CAcircMARA Alexandre Freitas O Novo Processo Civil Brasileiro 2 ed Satildeo Paulo Atlas 2016 p 7
96 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66
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Eacute o caso por exemplo da impenhorabilidade Segundo Fredie Didier et al97 a
impenhorabilidade eacute uma forma de proteger certos bens do devedor do direito fundamental a
execuccedilatildeo do credor
Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa
Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais
O legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do CPC fazendo um
preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses em anaacutelise ao optar pela mitigaccedilatildeo do direito
do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado Afinal ldquoa execuccedilatildeo natildeo pode ser utilizada
como instrumento para causar a ruiacutena a fome e o desabrigo do devedor e sua famiacutelia gerando
situaccedilotildees incompatiacuteveis com a dignidade da pessoa humana 98
Logo a impenhorabilidade de certos bens
[] Eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa99
Eacute nesse sentido que o CPC15 enumera diversos casos de bens patrimoniais que satildeo
impenhoraacuteveis como o salaacuterio e vencimentos utensiacutelios necessaacuterios ao exerciacutecio da
profissatildeo seguro de vida vestuaacuterios e pertences de uso pessoal entre outros
Dessa forma as regras relativas agraves medidas executivas devem ser interpretadas agrave luz
da Constituiccedilatildeo Federal ldquovez que se voltam agrave realizaccedilatildeo de direitos fundamentais e em sua
97 Ibid p 66 98 THEODORO JUacuteNIOR Humberto Novo Coacutedigo de Processo Civil Anotado 20 ed Rio de Janeiro
Forense 2016 p 978 99 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud DIDIER JR Fredie CUNHA
Leonardo Carneiro da BRAGA Paula Sarno OLIVEIRA Rafael Alexandria de Curso de direito processual civil 3 ed Salvador JusPodivm 2011 v 5 p 547
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realizaccedilatildeo podem atingir direitos fundamentaisrdquo 100 O Superior Tribunal de Justiccedila jaacute decidiu
que
O rol das impenhorabilidades do ordenamento paacutetrio objetiva preservar o miacutenimo patrimonial necessaacuterio agrave existecircncia digna do executado impondo ao processo executoacuterio certos limites Assim a depender das peculiaridades do caso as regras de impenhorabilidade podem ser ampliadas de modo a adequar a tutela aos direitos fundamentais como por exemplo o direito agrave moradia agrave sauacutede ou agrave dignidade da pessoa humana Trata-se portanto da aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo e da necessidade sob o enfoque da proporcionalidade101 (STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014)
Logo a interpretaccedilatildeo dos dispositivos que tratam sobre a penhora no CPC deve estaacute
diretamente ligada aos ditames constitucionais devendo o interprete privilegiar a opccedilatildeo que
esteja mais em sintonia com a Carta Magna para que nem o credor e nem o devedor sejam
lesados
O artigo 833 do CPC elenca uma seacuterie de incisos que expotildeem os bens impenhoraacuteveis
O trecho inicial inciso I do art 833 define como impenhoraacuteveis os bens inalienaacuteveis Este
inciso segue a regra de que ldquose o bem natildeo pode ser alienado tambeacutem natildeo pode ser penhorado
porque a penhora eacute o primeiro ato do procedimento de alienaccedilatildeo judicial do bemrdquo 102
Satildeo exemplos de bens inalienaacuteveis os puacuteblicos cuja alienaccedilatildeo depende de autorizaccedilatildeo
legislativa Eacute inalienaacutevel tambeacutem o capital constituiacutedo para garantir indenizaccedilatildeo de ato iliacutecito
(art 533 sect 1 ordm CPC) que portanto eacute tambeacutem impenhoraacutevel ldquoTodo bem inalienaacutevel eacute
impenhoraacutevel embora nem todo bem impenhoraacutevel seja inalienaacutevelrdquo 103
O inciso I do art 833 CPC tambeacutem consagra a impenhorabilidade dos bens que por
ato voluntaacuterio satildeo excluiacutedos da execuccedilatildeo
Segundo Fredie Didier et al104
Eacute o que ocorre nos casos de bens doados ou alienados com claacuteusula de inalienabilidade que haacute de constar no registro imobiliaacuterio para ser eficaz perante o exequente e minimizar o risco de fraude A propoacutesito eis a redaccedilatildeo do art 1911 do Coacutedigo Civil lsquolsquoA claacuteusula de inalienabilidade imposta aos bens por ato de liberalidade implica impenhorabilidade e incomunicabilidaderdquo
100 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MEDINA Joseacute Miguel Garcia
Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 1 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 p 736 101 STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014 102 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 824 103 Ibid p 824 104 Ibid p 825
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O inciso II por sua vez estabelece que satildeo impenhoraacuteveis os bens moacuteveis os
pertences e as utilidades domeacutesticas da residecircncia do executado Todavia excepcionam-se os
bens dessa natureza que sejam de elevado valor ou que ultrapassem as necessidades comuns
correspondentes a um meacutedio padratildeo de vida
A jurisprudecircncia natildeo eacute paciacutefica sobre o assunto logo natildeo exista uma relaccedilatildeo de bens
que podem ser atingidos pela penhora Abrindo margem para as mais variadas decisotildees
O STJ jaacute considerou impenhoraacuteveis aparelho de televisatildeo a cores mesa de centro passadeira raacutedio toca-fitas gravador microondas ar-condicionado um freezer um microcomputador com acessoacuterios uma impressora etc Poderatildeo ser penhorados porque ultrapassam o padratildeo-meacutedio aparelhos de TV mais sofisticados o segundo aparelho de televisatildeo a segunda geladeira aparelhos de ar-condicionado que satildeo verdadeiras peccedilas de design moacuteveis antigos que se transformam em peccedilas de decoraccedilatildeo faqueiro de prata adega climatizada etc Em entendimento de caraacuteter ainda mais geneacuterico jaacute restou consignado em determinado precedente que a proteccedilatildeo natildeo abrangeria apenas os bens indispensaacuteveis agrave moradia mas tambeacutem aqueles usualmente encontrados em um lar105
Ademais o inciso III do art 833 do CPC traz a impenhorabilidade dos vestuaacuterios bem
como os pertences de uso pessoal do executado salvo se de elevado valor
Segundo Fredie Didier et al106 o dispositivo possui dois propoacutesitos
de um lado preservar a dignidade do executado com a proteccedilatildeo de bens moacuteveis importantes para a sua sobrevivecircncia digna como o vestuaacuterio aparelho celular reloacutegio e os bens relacionados agrave sua higiene pessoal de outro lado a regra visa prestigiar a boa-feacute processual impedindo a execuccedilatildeo mesquinha e abusiva com a penhora de bens de pequeno ou nenhum valor como um pente ou uma bota
O inciso IV do art 833 do CPC consagra uma das mais importantes modalidades a
impenhorabilidade relativa aos rendimentos de natureza alimentar ldquoTrata-se de regra que
possui o claro propoacutesito de proteger o executado garantindo-lhe o recebimento de valores que
servem ao pagamento das despesas relacionadas agrave sua sobrevivecircncia digna e agrave da sua famiacuteliardquo 107
Jaacute inciso V do art 833 do CPC torna impenhoraacuteveis os livros as maacutequinas as
ferramentas os utensiacutelios os instrumentos ou outros bens moacuteveis necessaacuterios ou uacuteteis ao
exerciacutecio de qualquer profissatildeo 105 Ibid p 826 106 Ibid p 827 107 Ibid p 828
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Por forccedila do paraacutegrafo 3ordm do art 833 satildeo igualmente impenhoraacuteveis os equipamentos
implementos e maacutequinas agriacutecolas pertencentes agrave pessoa fiacutesica ou a empresa individual
produtora rural Rodrigo Mazzei e Sarah Merccedilon108 esclarecem que
Tem assento na noccedilatildeo de que a dignidade estende-se tambeacutem ao exerciacutecio da profissatildeo em si mesma e tambeacutem por representar a forma por excelecircncia de que dispotildee o executado para continuar a receber sua remuneraccedilatildeo e por conseguinte prover seu sustento e de sua famiacutelia Trata-se tambeacutem de aplicaccedilatildeo pontual da funccedilatildeo social da propriedade jaacute que protege os bens que permitem a circulaccedilatildeo de riquezas para a subsistecircncia do executado e se for o caso de sua famiacutelia
Forccediloso ressaltar ainda que a impenhorabilidade do inc V alcanccedila apenas os bens
moacuteveis de modo que eacute absolutamente possiacutevel que o imoacutevel em que o executado exerccedila sua
atividade profissional seja penhorado conforme a Suacutemula 451 do STJ ldquoEacute legiacutetima a penhora
da sede do estabelecimento comercialrdquo
O inciso VI do art 833 do CPC versa sobre a impenhorabilidade do seguro de vida
ldquoTrata-se de impenhorabilidade em favor do beneficiaacuterio do seguro e natildeo do segurado ateacute
porque o valor do seguro natildeo compotildee nem comporaacute o seu patrimocircnio (art794 do Coacutedigo
Civil1 ordm7)rdquo Dessa forma ldquoem uma execuccedilatildeo contra o segurado natildeo seraacute possiacutevel a penhora
do seguro de vida pois se trata de bem que natildeo lhe pertence nem mesmo em expectativardquo
De acordo com o inciso VII do art 833 do CPC satildeo impenhoraacuteveis os materiais
necessaacuterios para obras em andamento salvo se essas forem penhoradas Logo a obra pode
ser penhorada (art 862 do CPC) ldquoA regra como bem lembrou Araken de Assis lsquoestimula a
penhora da proacutepria obra inconclusa agrave qual os materiais acrescem e conseguintemente
valorizamrsquo 109
O art 833 VIII CPC julga impenhoraacutevel a pequena propriedade rural assim
definida em lei desde que trabalhada pela famiacutelia reproduzindo parte do art 5ordm XXVI CF
88116 que disciplina a impenhorabilidade do referido bem
A proteccedilatildeo do CPC eacute mais ampla do que a garantia prevista na Constituiccedilatildeo Federal
tendo em vista que a impenhorabilidade natildeo se restringe agraves execuccedilotildees de deacutebitos decorrentes
de sua atividade produtiva podendo ser alegada em toda e qualquer execuccedilatildeo ldquoAssim o 108 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CABRAL Antonio Passo
CRAMER Ronaldo (orgs) Comentaacuterios ao Novo Coacutedigo de Processo Civil Rio de Janeiro Forense 2015 p 1194
109 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 835
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imoacutevel natildeo pode ser penhorado na execuccedilatildeo de creacutedito rural concedido para estimular a
produccedilatildeo agriacutecola mas poderaacute ser penhorado na execuccedilatildeo do creacutedito concedido para a
aquisiccedilatildeo do imoacutevelrdquo 110
A nona modalidade de impenhorabilidade trata-se dos recursos puacuteblicos recebidos por
instituiccedilotildees privadas para aplicaccedilatildeo compulsoacuteria em educaccedilatildeo sauacutede ou assistecircncia social ldquoA
proteccedilatildeo eacute louvaacutevel e tutela toda a coletividade ao privilegiar o direito agrave educaccedilatildeo sauacutede e
assistecircncia social em detrimento do direito do credorrdquo
De acordo com o inciso X do art 833 do CPC eacute impenhoraacutevel ateacute o limite de
quarenta salaacuterios miacutenimos a quantia depositada em caderneta de poupanccedila
Eacute uma modalidade de impenhorabilidade relativa (o CPC73 a considerava absoluta)
tendo em vista que essa impenhorabilidade natildeo pode ser oposta na execuccedilatildeo de alimentos
independentemente da sua origem (art 833 sect 2ordm do CPC) Fredie Didier et al cita Araken de
Assis111 ao afirmar que
a regra soacute protege essa aplicaccedilatildeo financeira Se o valor estiver depositado em fundo de investimento por exemplo poderaacute ser penhorado Se o devedor tiver vaacuterias cadernetas de poupanccedila a impenhorabilidade aplica-se agrave soma de todas elas e natildeo a cada uma delas isoladamente do contraacuterio valores expressivos poderiam ser pulverizados em vaacuterias contas burlando a finalidade da regra que eacute a de proteger a populaccedilatildeo de baixa renda
Ademais satildeo tambeacutem impenhoraacuteveis por forccedila do inciso XI os recursos puacuteblicos do
fundo partidaacuterio recebidos por partido poliacutetico nos termos da lei Essa modalidade de
impenhorabilidade ldquose restringe aos recursos puacuteblicos do fundo partidaacuterio Recursos de
origem privada recebidos pelo partido poliacutetico poderatildeo ser penhoradosrdquo 112 O processualista
Fredie Didier et al113 assevera que
Assim a impenhorabilidade foi estabelecida no intuito de impedir que os diretoacuterios nacionais de partidos poliacuteticos respondam por diacutevida dos diretoacuterios
110 Ibid p 836 111 DIDIER JR Fredie et al apud ASSIS Araken de Manual da execuccedilatildeo 11ordm ed cit p 225 Assim
tambeacutem REDONDO Bruno Garcia LOJO Maacuterio Vitor Suarez Penhora cit p 117 BUENO Cassio Scarpinella Curso sistematizado de Direito Processual Civil v 3 cit p 228 GIANNICO Mauriacutecio As novas reformas do CPC e de outras normas processuais Mauriacutecio Giannico e Viacutetor Joseacute de Mello Monteiro (coord) Satildeo Paulo Saraiva 2009 p 1 OS Em sentido diverso estendendo a impenhorabiacutelidade aos depoacutesitos feitos ateacute esse valor em CDB CDI fundos de renda fixa ou de accedilotildees RODRIGUES Marcelo Abelha Manual de execuccedilatildeo civil 3deg ed cit p 101
112 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 839
113 Ibid p 839
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estaduaismunicipais - sobretudo em razatildeo das vaacuterias decisotildees judiciais que determinaram penhora de recursos do fundo partidaacuterio de alguns partidos
Por fim o inciso XII do artigo 833 do CPC trata sobre a impenhorabilidade dos
creacuteditos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias sob o regime de incorporaccedilatildeo imobiliaacuteria
vinculados agrave execuccedilatildeo de obra ldquoO objetivo dessa modalidade eacute evitar que diacutevidas do
incorporador possam consumir os recursos que seriam utilizados na realizaccedilatildeo da obra em
prejuiacutezo dos adquirentes de unidades autocircnomasrdquo 114
O professor Misael Montenegro Filho115 aduz sobre que ldquoao estabelecer a
impenhorabilidade dos creacuteditos oriundos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias o novo CPC
protegeu os valores destinados agrave execuccedilatildeo da obra e agrave entrega das unidades imobiliaacuterias aos
adquirentes assegurando assim a execuccedilatildeo da promessa contratualrdquo
Importante frisar ainda que a Lei nordm 8009 1990 instituiu a impenhorabilidade do
imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar por qualquer diacutevida salvo as exceccedilotildees dos
seus arts 3ordm e 4ordm
A referida lei dispotildee que Para os efeitos de impenhorabilidade considera-se
residecircncia um uacutenico imoacutevel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia
permanente (art 5ordm)
O processualista baiano Fredie Didier et al116 assevera que
A lei propotildee-se a proteger imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar nos termos acima expostos A CF 88 ampliou o conceito de entidade familiar para abranger a famiacutelia monoparental e a uniatildeo estaacutevel Mas deve considerar-se aiacute compreendidos os irmatildeos que vivem juntos e a uniatildeo homossexual Ateacute o solteiro estaacute abrangido pela impenhorabilidade se reside soacute no imoacutevel - isso em nome da proteccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana e da moradia digna Na verdade houve uma mudanccedila de compreensatildeo acerca do sentido da proteccedilatildeo de proteccedilatildeo da famiacutelia agrave proteccedilatildeo da moradia indispensaacutevel agrave preservaccedilatildeo da dignidade da pessoa
114 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o
novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 388
115 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MONTENEGRO FILHO Misael Novo Coacutedigo de Processo Civil Comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Atlas 2016 p 752
116 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 840-841
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O STJ jaacute consolidou esse entendimento na suacutemula nordm 364 O conceito de
impenhorabilidade de bem de famiacutelia abrange tambeacutem o imoacutevel pertencente a pessoas
solteiras separadas e viuacutevas
Entretanto se o casal ou entidade familiar possuir vaacuterios imoacuteveis utilizados como
residecircncia a impenhorabilidade recairaacute sobre o de menor valor (art 5ordm paraacutegrafo uacutenico) ldquoEacute o
que ocorre por exemplo quando a famiacutelia se divide em mais de uma cidade por motivos
profissionaisrdquo 117
Forccediloso observar ainda que a impenhorabilidade do imoacutevel familiar eacute relativa jaacute que
natildeo pode ser oposta a qualquer creacutedito O art 3ordm da Lei n 8009 1990151 em que pode ser
penhorada a residecircncia da famiacutelia (exemplo execuccedilatildeo de alimentos para cobranccedila de taxas
devidas em funccedilatildeo do imoacutevel familiar etc)
Resta claro que o artigo 833 do CPC ao disciplinar as hipoacuteteses de impenhorabilidade
possui o escopo de proteger o princiacutepio da dignidade humana Entretanto algumas claacuteusulas
natildeo possuem proteccedilatildeo absoluta ldquoa sua relativizaccedilatildeo a depender do caso sob exame deve ser
realccedilada agrave medida que a dignidade resguardada e protegida pelo sistema processual-
constitucional natildeo se limita ao executadordquo 118 Ademais ldquoEacute premente advertidamente que a
dignidade do credor tambeacutem seja garantida em juiacutezo tendo como norte pois os princiacutepios da
proporcionalidade e razoabilidaderdquo 119
117 Ibid p 841 118 Ibid p 752 119 Ibid p 752
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4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA
ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE
HUMANA DO EXECUTADO
41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE
EFETIVACcedilAtildeO
Como jaacute exposto em linhas preteacuteritas nos meios executivos tiacutepicos as medidas
executivas satildeo determinadas pela lei ou seja o oacutergatildeo pode aplicar somente as medidas
tipificadas no ordenamento juriacutedico No entanto ao se tratar das medidas executivas atiacutepicas
eacute necessaacuterio que haja um limite na atuaccedilatildeo realizada pelo juiz
O poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo poder ser realizado de maneira indiscriminada haacute
pressupostos e premissas a serem observadas Dessa forma a primeira premissa eacute no sentindo
de que a medida executiva atiacutepica natildeo pode ser a primeira medida a ser invocada ldquomuito ao
reveacutes a regra do nosso sistema continua a ser o da tipicidade dos meios executivos soacute que
agora temperado pelo sistema atiacutepicordquo 120 O processualista Thiago Rodovalho explica que
ldquo() os meios atiacutepicos natildeo satildeo prima ratio e sim a ultima ratio eacute dizer esgotados e
frustrados os meios executivos tiacutepicos e ordinaacuterios pode-se em tese valer-se do sistema
atiacutepicordquo121
Dessa forma nos casos de execuccedilatildeo que tenha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
natildeo deve ser aplicado de logo as medidas indutivas e coercitivas Apenas apoacutes frustradas as
medidas ldquonaturaisrdquo pode-se passar agrave aplicaccedilatildeo das medidas atiacutepicas
Uma segunda premissa diz a respeitos dos meios de pressatildeo para compelir o devedor a
adimplir com o seu deacutebito ldquoEssa segunda premissa decorre inclusive de imperiosidade
loacutegica de nada adianta a medida de pressatildeo se a obrigaccedilatildeo natildeo tem como ser adimplida pelo
devedorrdquo 122
Para Thiago Rodovalho123 ldquoIsso quer significar que esgotados e frustrados os meios
tiacutepicos o juiz se valeraacute dos meios atiacutepicos se eles forem potencialmente haacutebeis a estimular ou
120 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da
atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018
121 Ibid sem paginaccedilatildeo 122 Ibid sem paginaccedilatildeo 123 Ibid sem paginaccedilatildeo
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forccedilar o cumprimento o que pressupotildee sua possibilidade quando entatildeo eles poderatildeo ser
eficazesrdquo
Logo nas obrigaccedilotildees de pagar quantia se houver a real demonstraccedilatildeo da
impossibilidade financeira do devedor seria um constrangimento inuacutetil e desnecessaacuterio a
imposiccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo para forccedilar o cumprimento
Por isso as medidas atiacutepicas devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o
esgotamento das medidas tiacutepicas e a possibilidade de cumprimento de cumprimento da
obrigaccedilatildeo
Ademais superadas as supracitadas premissas e o oacutergatildeo julgador vislumbrando a
necessidade da aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo se faz necessaacuterio que um conjunto de
postulados e princiacutepios rejam a atuaccedilatildeo do oacutergatildeo julgador servindo de norte para a escolha da
medida executiva mais adequada ldquoDe modo geral a escolha deve pautar-se nos postulados da
proporcionalidade da razoabilidade (art8ordm CPC) e da proibiccedilatildeo de excesso bem como nos
princiacutepios da eficiecircncia e da menor onerosidade da execuccedilatildeordquo 124
O professor Fredie Didier et al125 eacute categoacuterico ao citar Humberto Aacutevila
Segundo Humberto Aacutevila o postulado da proporcionalidade se manifesta nas situaccedilotildees em que haacute uma relaccedilatildeo de causalidade entre dois elementos empiricamente discerniacuteveis um meio e um fim de tal sorte que se possa proceder aos trecircs exames fundamentais o da adequaccedilatildeo (o meio promove o fim) o da necessidade (dentre os meios disponiacuteveis e igualmente adequados para promover o fim natildeo haacute outro meio menos restritivo do(s) direito(s) fundamental (is) afetado(s)) e o da proporcionalidade em sentido estrito (as vantagens trazidas pela promoccedilatildeo do fim correspondem agraves desvantagens provocadas pela adoccedilatildeo do meio)
O juiz ao aplicar a medida executiva atiacutepica ao caso concreto deve ter seu
embasamento no princiacutepio da proporcionalidade para saber se a medida a ser tomada eacute a
melhor opccedilatildeo ao caso sub judice ldquoO exame de proporcionalidade aplica-se sempre que
houver uma medida concreta destinada a realizar uma finalidaderdquo 126
Em verdade a aplicaccedilatildeo do princiacutepio da proporcionalidade eacute imprescindiacutevel na adoccedilatildeo
dos meios executivos atiacutepicos tendo em vista que ldquo() tais medidas em especial quando de
124 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111 125 DIDIER JR Fredie et al apud AVILA Humberto Teoria dos princiacutepios da definiccedilatildeo agrave aplicaccedilatildeo
dos princiacutepios juriacutedicos 16 ed Satildeo Paulo Malheiros 2015 p 205 126 DIDIER JR Fredie et al op cit p 111
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natureza coercitiva podem restringir direitos do devedor e incidir diretamente sobre sua
pessoardquo127 Logo ainda que o princiacutepio da efetividade da tutela executiva seja um direito
fundamental o mesmo ldquo() deve ser compatibilizado com direitos fundamentais do
executado para que a sua dignidade humana seja preservadardquo 128
Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Neves129 afirma que em nome do princiacutepio da
proporcionalidade o juiz deveraacute
() ponderar no caso concreto as vantagens praacuteticas da adoccedilatildeo de cada medida executiva atiacutepica em especial as de natureza coercitiva e as desvantagens de sua adoccedilatildeo levando em conta a possibilidade de a medida criar uma limitaccedilatildeo excessiva ao exerciacutecio de direito fundamental do executado
Outro princiacutepio que o oacutergatildeo julgador deve se ater ao escolher a medida executiva
atiacutepica eacute o da razoabilidade Segundo Fredie Didier et al 130 o princiacutepio (ou postulado)131 se
manifesta de trecircs formas
a) como dever de equidade a exigir a harmonizaccedilatildeo da norma geral com o caso individual impondo a consideraccedilatildeo daquilo que normalmente acontece em detrimento do que eacute extraordinaacuterio e tambeacutem impondo a consideraccedilatildeo das especificidades do caso concreto ante a generalidade da norma b) como dever de congruecircncia a exigir a harmonizaccedilatildeo das normas com suas condiccedilotildees externas de aplicaccedilatildeo (isto eacute com a realidade com base em que foram editadas) c) como dever de equivalecircncia a exigir uma relaccedilatildeo de equivalecircncia entre a medida adotada e o criteacuterio que a dimensiona
Logo ldquo() o princiacutepio da razoabilidade deve nortear a atuaccedilatildeo do juiz na adoccedilatildeo das
medidas executivas atiacutepicas previstas no art 139 IV do Novo CPCrdquo 132 tendo em vista que
ldquo() mesmo medidas que pelo princiacutepio da proporcionalidade podem se mostrar
abstratamente possiacuteveis de adoccedilatildeo no caso concreto podem se mostrar inadequadas e
irrazoaacuteveisrdquo 133
127 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Medidas executivas atiacutepicas na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de
pagar quantia certa art 139 IV do novo CPC Revista de Processo v 42 n 265 mar 2017 p 14 128 Ibid p 14 129 Ibid p 14 130 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111-112 131 Segundo Fredie Didier et al o postulado eacute uma norma que atua sobre a aplicaccedilatildeo de outras normas
A proporcionalidade e a razoabilidade seriam postulados normativos e natildeo princiacutepios segundo essa concepccedilatildeo 132 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo op cit p 14 133 Ibid p 14
51
Ademais conforme dispotildee o postulado da proibiccedilatildeo de excesso ldquoa realizaccedilatildeo de uma
regra ou princiacutepio constitucional natildeo pode conduzir agrave restriccedilatildeo a um direito fundamental que
lhe retire um miacutenimo de eficaacuteciardquo 134
A proibiccedilatildeo de excesso deveraacute sempre ser suscitada quando um direito fundamental
houver sido violado a ponto do direito fundamental sofrer violaccedilatildeo excessiva Ademais ldquoesse
postulado natildeo se confunde com o da proporcionalidade porque ele dispensa os exames da
adequaccedilatildeo (relaccedilatildeo meiofim) da necessidade (exigibilidade) ou da proporcionalidade em
sentido estrito (ponderaccedilatildeo entre vantagens e desvantagens)rdquo 135
Logo ldquopouco importa a relaccedilatildeo meiofim ou a exigibilidade da medida ou ainda a
ponderaccedilatildeo com outro direito fundamental eventualmente em jogo aqui se analisa apenas a
eficaacutecia de um determinado direito fundamentalrdquo 136
O princiacutepio da eficiecircncia tem previsatildeo constitucional no art 37 e previsatildeo
infraconstitucional no art 8ordm do CPC15 O referido princiacutepio determina que o processo seja
conduzido de forma eficiente pelo oacutergatildeo jurisdicional
Entende-se que eficiente eacute a atuaccedilatildeo que utilize adequadamente os meios necessaacuterios
para que se atinjam os fins almejados O oacutergatildeo jurisdicional na escolha dos meios a serem
utilizados para a obtenccedilatildeo dos fins
a) deve escolher aqueles que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo (deve evitar meios que promovam resultados insignificantes) b) deve escolher meios que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado (natildeo se pode escolher um meio de resultado duvidoso) c) natildeo pode escolher um meio que produza muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscado 137
O juiz deveraacute igualmente analisar o princiacutepio da menor onerosidade da execuccedilatildeo que
eacute previsto pelo art 805 do CPC ldquoArt 805 Quando por vaacuterios meios o exequente puder
promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o
executadordquo
134 134 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 112 135 Ibid p 112 136 Ibid p 112 137 Ibid p 112-113
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Logo ldquohavendo duas opccedilotildees igualmente eficazes para permitir alcanccedilar o resultado
pretendido (satisfaccedilatildeo do creacutedito) deveraacute o oacutergatildeo julgador valer-se daquela que menos onere
a situaccedilatildeo do executadordquo 138
O dito princiacutepio impede o comportamento abusivo do exequente que possa beneficiar-
se do meio mais danoso ao executado protegendo dessa forma a lealdade e a eacutetica
processual
Os postulados e princiacutepios analisados em linhas preteacuteritas impotildeem ao oacutergatildeo julgador a
observacircncia de alguns criteacuterios para a escolha da medida executiva atiacutepicas a ser utilizada no
caso concreto
Primeiramente a medida executiva atiacutepica deveraacute ser adequada ldquoO criteacuterio da
adequaccedilatildeo impotildee que juiz considere abstratamente uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida
executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia
a gerar o resultadordquo 139 Nesse primeiro momento o juiz deveraacute observar sob a perspectiva do
credor qual medida teraacute o condatildeo de gerar o resultado mais efetivo
Segundo Fredie Didier et al140 o criteacuterio da adequaccedilatildeo eacute
() fortemente inspirado pelo postulado da proporcionalidade e pelo princiacutepio da eficiecircncia na parte em que esse princiacutepio determina a escolha de meios que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo e que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado
Ademais a medida adotada pelo oacutergatildeo julgador deveraacute ser necessaacuteria ldquoEsse criteacuterio
impotildee um limite agrave atuaccedilatildeo judicial funcionando como uma espeacutecie de contrapeso ao criteacuterio
da adequaccedilatildeo Aqui deve-se levar em conta a posiccedilatildeo do devedorrdquo141
O juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental agrave execuccedilatildeo e determinar
uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute necessaacuterio que a
medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado O criteacuterio da necessidade
estabelece que ldquonatildeo se pode ir aleacutem do necessaacuterio para alcanccedilar o propoacutesito almejado Deve
138 Ibid p 113 139 Ibid p 113 140 Ibid p 113 141 Ibid p 114
53
pois o oacutergatildeo julgador determinar o meio executivo na medida do estritamente necessaacuterio para
proporcionar a satisfaccedilatildeo do creacutedito ndash nem menos nem maisrdquo 142
O referido criteacuterio possui forte influecircncia dos postulados da proibiccedilatildeo do excesso e da
razoabilidade assim como do princiacutepio da menor onerosidade para o executado Assevera
Fredie Didier et al143 que
Natildeo eacute razoaacutevel por exemplo impor como primeira opccedilatildeo medida coercitiva a ser suportada pelo agente puacuteblico pelo simples fato de o juiz pressupor que o ente puacuteblico ao qual ele eacute vinculado iraacute descumprir determinada ordem judicial - o descumprimento natildeo pode ser visto como algo ordinaacuterio ou cotidiano (razoabilidade como dever de equidade) Tampouco eacute razoaacutevel eleger a prisatildeo civil como meacutetodo prioritaacuterio para compelir o executado ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer (razoabilidade como dever de equivalecircncia) Aleacutem disso eacute vedada por exemplo a imposiccedilatildeo de multa coercitiva para compelir o executado a emitir declaraccedilatildeo de vontade uma vez que haacute previsatildeo expressa de medida tiacutepica capaz de proporcionar o mesmo resultado sem sacrifiacutecio para o devedor (art 501 CPC)
A afirmaccedilatildeo feita por Bonavides144 em 1997 sobre a adequaccedilatildeo e a necessidade
continua atual sobre os motes
O meio empregado pelo legislador deve ser adequado e necessaacuterio para alcanccedilar o objetivo procurado O meio eacute adequado quando com seu auxiacutelio se pode alcanccedilar o resultado desejado eacute necessaacuterio quando o legislador natildeo poderia ter escolhido outro meio igualmente eficaz mas que natildeo limitasse ou limitasse de maneira menos sensiacutevel o direito fundamental
Por fim a medida deve conciliar os interesses contrapostos ldquoO magistrado deve
ponderar os interesses em jogo aplicando a proporcionalidade em sentido estrito de modo
que as vantagens da utilizaccedilatildeo da medida atiacutepica escolhida superem as vantagens de seu usordquo 145
Esse criteacuterio natildeo privilegia nem o credor nem o devedor e sim a soluccedilatildeo mais
equilibrada e que atenda da melhor forma aos valores em conflito ldquoTrata-se de criteacuterio
inspirado nos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade bem como no princiacutepio da
142 Ibid p 114 143 Ibid p 114 144 BONAVIDES Paulo Curso de Direito Constitucional 7ordm ediccedilatildeo Satildeo Paulo Ed Malheiros 1997
p 372 145 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 114-115
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eficiecircncia na parte em que impotildee ao juiz evitar a escolha do meio executivo que produza
muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscadordquo 146
Cada um dos criteacuterios supracitados devem ser considerados pelo juiz ao aplicar as
medidas executivas atiacutepicas ao caso concreto Para Fredie Didier et al147 as medidas como
retenccedilatildeo de CNH passaporte ou cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado como
forma de pressionaacute-lo ao pagamento da diacutevida pecuniaacuteria natildeo satildeo possiacuteveis
Essas natildeo satildeo medidas adequadas ao atingimento do fim almejado (o pagamento de quantia) - natildeo haacute propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente Tais medidas soam mais como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-lo ao cumprimento da ordem judicial - e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a utilizaccedilatildeo de meios sancionatoacuterios pelo magistrado mas apenas de meios de coerccedilatildeo indireta e sub-rogatoacuterios
Ainda que adequadas fossem a retenccedilatildeo de CNH e do passaporte no corte de fornecimento de aacutegua natildeo parecem ser medidas necessaacuterias (no sentido de exigiacuteveis) uma vez que outras medidas podem em tese ser utilizadas sem causar igual gravame ao executado - como por exemplo a simples restriccedilatildeo do uso de cartotildees de creacutedito A retenccedilatildeo de documentos pessoais eacute medida que termina por restringir a liberdade de ir e vir do executado mostrando-se a princiacutepio natildeo-razoaacutevel por ir de encontro ao dever de equivalecircncia e desproporcional por restringir demais o direito agrave liberdade em favor do direito de creacutedito pecuniaacuterio do exequente
O processualista baiano et al148 cita tambeacutem outro exemplo de medida atiacutepica que natildeo
atingem os criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade
Tampouco parece adequada em princiacutepio determinaccedilatildeo de corte de energia eleacutetrica de todo o preacutedio onde funciona serviccedilo puacuteblico administrativo como forma de pressionar o ente federado a cumprir ordem de nomeaccedilatildeo de candidato em concurso puacuteblico Natildeo parece haver relaccedilatildeo meiofim entre uma coisa e outra Tambeacutem natildeo eacute possiacutevel enxergar essa medida como necessaacuteria no sentido de ser a menos gravosa para o devedor - observe que se trata de medida que uma vez aplicada ensejaria restriccedilatildeo de funcionamento em toda a reparticcedilatildeo puacuteblica em prejuiacutezo de serviccedilos puacuteblicos essenciais ao funcionamento da Administraccedilatildeo o que aleacutem de ser excessivamente gravoso parece natildeo se conformar agrave necessidade de ponderaccedilatildeo dos interesses em jogo - aleacutem de afetar a um sem-nuacutemero de pessoas tomadoras desses serviccedilos
Ademais eacute sabido que toda e qualquer decisatildeo judicial precisa ser fundamentada Ao
se tratar das medidas executivas atiacutepicas o papel da fundamentaccedilatildeo se torna ainda mais
146 Ibid p 115 147 Ibid p 115 148 Ibid p 116
55
importante tendo em vista que eacute pela fundamentaccedilatildeo da decisatildeo que se poderaacute controlar a
adequaccedilatildeo e necessidade da medida atiacutepica
Pelo fato das medidas executivas atiacutepicas derivarem de dispositivos normativos
considerados claacuteusulas gerais propiacutecias as mais variadas interpretaccedilotildees eacute de extrema
importacircncia que o oacutergatildeo julgador fundamente sua decisatildeo
Logo ldquodeve o juiz na fundamentaccedilatildeo decisoacuteria expor racionalmente os motivos da
sua escolha demonstrando com atenccedilatildeo ao art 489 sect 1ordm CPC de que modo a sua opccedilatildeo
atende os criteacuterios da adequaccedilatildeo necessidade e proporcionalidade em sentido estrito ()rdquo 149
Dessa forma os princiacutepios da proporcionalidade e razoabilidade servem para delimitar
o alcance das claacuteusulas gerais de efetivaccedilatildeo fazendo com que o oacutergatildeo julgador se atenha aos
criteacuterios da adequaccedilatildeo e necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao caso
concreto
42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO
EXECUTADO
A entrada em vigor do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 aflorou ainda mais uma
discussatildeo essencial para os processualistas do seacuteculo XXI qual eacute o verdadeiro protagonista do
processo civil
Para os que defendem o ldquoautoritarismo processualrdquo o verdadeiro protagonista do
processo civil eacute o oacutergatildeo judiciaacuterio que em nome do desempenho efetivo de suas funccedilotildees lhes
eacute permitido dilatar os poderes que diga-se de jaacute passagem jaacute compotildeem um vastiacutessimo
arsenal150
Jaacute os ldquogarantistasrdquo 151 do processo civil acreditam que os verdadeiros protagonistas satildeo
as partes do processo e seus direitos e garantias devem ser estritamente preservados
Devido a essa disputa de quem possui maior protagonismo no processo as mudanccedilas
ocorridas no coacutedigo processual vigente quanto agraves medidas executivas atiacutepicas despertaram
149 Ibid p 117 150 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos
atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04102018
151 O processualista Araken de Assis acredita que o termo garantista eacute descabido tendo em vista que remete ao processo penal
56
maior celeuma do que qualquer outra modificaccedilatildeo trazida pelo CPC15 Afinal as referidas
medidas acirravam ainda mais a disputa pelo protagonismo processual
O fato de o CPC15 dispor no art 139 IV que o juiz poderaacute decretar todas as medidas
indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o
cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo
pecuniaacuteria levou boa parte da doutrina e dos juiacutezes a acreditar que teria pleno direito de
aplicar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo Entretanto muitos se esqueceram do outro lado
da moeda esqueceram que a dignidade humana do executado tambeacutem eacute um direito
fundamental e natildeo pode ser violado
Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa152
acreditam que
() natildeo parece producente elencar um rol abstrato das medidas que poderiam ser aplicadas pelo juiz a tiacutetulo do art 139 IV CPC Afinal se busca a efetividade da execuccedilatildeo e esta soacute pode ser identificada agrave luz das especificidades da situaccedilatildeo concreta Ideal eacute enveredar pela loacutegica modular (adequaccedilatildeo ao caso) natildeo pela geneacuterica (soluccedilotildees abstratas de pretensa utilidade universal)
Em razatildeo de o dispositivo apresentar uma gama de poderes tatildeo amplos agrave disposiccedilatildeo do
oacutergatildeo julgador sem nenhuma estipulaccedilatildeo de um procedimento legal previamente definido para
que estabeleccedila as condiccedilotildees de sua aplicaccedilatildeo em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo eacute
necessaacuterio que em razatildeo do princiacutepio da dignidade humana natildeo busque definir o que o
dispositivo permite mas de definir o que ele natildeo permite ldquoOu seja propotildee-se a sua
compreensatildeo por exclusatildeo Afinal se ele tem potencialidade para promover a efetividade da
tutela tambeacutem pode provocar lesotildees E como em direito os fins natildeo justificam os meios
ressalta como prioritaacuteria a necessidade de estabelecer limitesrdquo 153
O art 789 do CPC15 disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial e eacute
categoacuterico ao dispor que ldquoo devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para
152 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
153 Ibid sem paginaccedilatildeo
57
o cumprimento de suas obrigaccedilotildees salvo as restriccedilotildees estabelecidas em leirdquo Logo a
execuccedilatildeo somente poderaacute incidir sobre os bens do devedor e natildeo sobre a sua pessoa
Como eacute sabido a Lex Poetelia Papiria de 326 aC foi o primeiro marco legal da
humanizaccedilatildeo das cobranccedilas de diacutevidas abolindo a imposiccedilatildeo ao devedor de castigos
vexatoacuterios e ateacute da pena de morte154
Afinal no direito romano antigo a cobranccedila de diacutevidas poderia recair sobre a pessoa
do devedor que respondia com sua liberdade e ateacute mesmo com seu proacuteprio corpo permitindo
a lei que repartissem tantos pedaccedilos do corpo do devedor quantos fossem seus credores
Nesse sentindo leciona o professor Guilherme Pupe da Noacutebrega155 que
Vem de longe a evoluccedilatildeo no sentido de fazer a responsabilidade por uma obrigaccedilatildeo migrar da pessoa do devedor para seu patrimocircnio Merecem registro especiacutefico como marcos histoacutericos remotos a Lex Poetelia Papiria de 326 aC que aboliu o nexum e possibilidade de escravidatildeo do devedor como garantia da obrigaccedilatildeo e a pignoris capio ou ldquoaccedilatildeo por tomada de penhorrdquo que instituiu a possibilidade de o credor tomar parcela dos bens do devedor como forma de assegurar o adimplemento da diacutevida Aqueles institutos culminariam seacuteculo depois no artigo 789 do CPC de 2015 a consagrar que o devedor responda pela satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo com seus bens presentes e futuros observadas as restriccedilotildees impostas pelas impenhorabilidades legais
Logo o avanccedilar da civilizaccedilatildeo marcou o deslocamento da responsabilidade por
diacutevidas saindo do corpo do devedor para o seu patrimocircnio tendo em vista que a vida
humana a liberdade e a integridade fiacutesica satildeo valores inalienaacuteveis natildeo podendo ser
sacrificadas em benefiacutecio de obrigaccedilotildees pecuniaacuterias 156
Entretanto eacute sabido que a responsabilidade patrimonial eacute excepcionada pela prisatildeo
civil do devedor de verba alimentiacutecia resquiacutecio da responsabilidade pessoal romana
154 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt
httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018
155 NOacuteBREGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139 IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018
156 Ibid sem paginaccedilatildeo
58
No entanto haacute uma justificativa para isso Segundo o processualista Guilherme Pupe
da Noacutebrega157
Eacute que a par de a prisatildeo civil encontrar previsatildeo constitucional no inciso LXVII do artigo 5ordm o raciociacutenio eacute o de que o direito do alimentante agrave liberdade de locomoccedilatildeo cede diante dos direitos agrave vida e agrave dignidade titularizados pelo alimentando e resguardados pelos alimentos Foi esse mesmo raciociacutenio aliaacutes que justificou no passado a ediccedilatildeo da suacutemula 309 pelo STJ agora positivada pelo artigo 528 sect 7ordm que limita a modalidade coercitiva agraves trecircs uacuteltimas prestaccedilotildees vencidas e agraves prestaccedilotildees vincendas A ideia eacute que tendo o alimentando subsistido a despeito do natildeo-pagamento de prestaccedilotildees mais antigas essas verbas teriam perdido o caraacuteter alimentar que na equaccedilatildeo antes apresentada justificaria a prisatildeo civil do alimentante Daiacute por que aqueles valores antigos remanescem exigiacuteveis mas somente pela via da expropriaccedilatildeo
Essa ressalva eacute necessaacuteria tendo em vista que a adoccedilatildeo de teacutecnica de execuccedilatildeo
indireta para incursatildeo radical na esfera de direitos do executado notadamente direitos
fundamentais quando carente de respaldo constitucional natildeo merece acolhimento sob
risco de se atentar contra o devido processo legal (artigo 5ordm LIV da Constituiccedilatildeo)
Como afirma o autor Bruno Dantas158 ldquoembora inexistam estatiacutesticas que permitam
comparaccedilotildees natildeo eacute desarrazoado intuir que os iacutendices de inadimplecircncia despeccedilam na razatildeo
inversa da incidecircncia das ordens judiciais sobre o corpo e a liberdade do devedorrdquo Entretanto
eacute natildeo possiacutevel adotar toda e qualquer medida executiva atiacutepica em nome da efetividade da
execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que se saiba os limites da sua aplicaccedilatildeo
Dessa forma instrumentos que permitam o cumprimento forccedilado de contratos e o pagamento
de diacutevidas satildeo necessaacuterios contudo eacute preciso equilibrar essa exigecircncia com a liberdade e a
dignidade humana
Como citado alhures o art 139 IV ensejou decisotildees como a que determinou a
suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o
passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito em uma accedilatildeo se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo
extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
Na supracitada decisatildeo o princiacutepio da responsabilidade patrimonial natildeo estaacute sendo
efetivado para o que o devedor responda com os seus bens Afinal qual ligaccedilatildeo entre a
157 Ibid sem paginaccedilatildeo 158 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt
httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018
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restriccedilatildeo de circulaccedilatildeo que diz com o direito de ir e vir (liberdade) com o pagamento de
diacutevidas que diz com a responsabilidade civil159
Ademais por que quem natildeo tem dinheiro para pagar diacutevidas natildeo pode dirigir Por que
natildeo tem condiccedilotildees para pagar o deacutebito natildeo pode ter passaporte Por que quem natildeo tem como
pagar o deve natildeo pode ter cartatildeo de creacutedito
Ao utilizar meios executivos atiacutepicos como os supracitados para compelir o devedor a
satisfazer a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria quando exauridos sem ecircxito os meios tradicionais de bens
penhoraacuteveis salvo quando existe qualquer indiacutecio concreto de ocultaccedilatildeo ou dissipaccedilatildeo de
bens eacute obrigar o devedor abrir matildeo da proteccedilatildeo da lei que lhe impede que seja tomado agrave forccedila
(art 833 CPC e demais disposiccedilotildees que tratam da impenhorabilidade)
Segundo Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa160
Claramente essa pressatildeo visa dar uma aparecircncia de voluntariedade agrave indicaccedilatildeo de bens impenhoraacuteveis pelo proacuteprio executado que na verdade soacute age assim por ser a uacutenica forma de ver-se livre de um grame imposto por medida indutiva despedida de qualquer necessidade ou adequaccedilatildeo Uma intoleraacutevel perversatildeo
Os autores afirmam ainda que o ldquodireito paacutetrio natildeo admite esta contraditio in terminis
sendo inaceitaacutevel a coexistecircncia de regra protetiva do executado com outra que concede ao
juiz poderes para forccedilar (ainda que indiretamente e veladamente) o executado a abrir matildeo
daquela proteccedilatildeordquo 161
Logo eacute cristalino que a suspensatildeo da CNH eacute uma forma incorreta de aplicar a medida
executiva atiacutepica para efetivar o direito fundamental a execuccedilatildeo tendo em vista que o uacutenico
objetivo da referida eacute pressionar o executado abrir matildeo de algum bem impenhoraacutevel para
levantar o dinheiro e cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
A retenccedilatildeo do passaporte igualmente natildeo possui qualquer relaccedilatildeo com a diacutevida do
executado e eacute somente uma forma de tentar pressiona-lo a dispor de um bem que natildeo pode
ser tomado agrave forccedila e puni-lo por natildeo ter cumprido voluntariamente com a sua obrigaccedilatildeo
159 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
160 Ibid sem paginaccedilatildeo 161 Ibid sem paginaccedilatildeo
60
Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa162
acreditam que tal medida eacute equivocada e se torna excessivamente onerosa ao executado
As mais variadas circunstacircncias relevem o equiacutevoco de tal medida aplicada assim genericamente Com efeito nada justifica reter o passaporte do executado e impedi-lo de viajar para o exterior quando eacute agraciado inclusive com todas as despesas pagas com presente sorteio ou precircmio (por completar tempo de serviccedilo ou atingir metas produtividade na sociedade empresaacuteria em que trabalha) Como todo custo eacute suportado por terceiro e por isso mesmo a sua realizaccedilatildeo pelo executado natildeo traria qualquer prejuiacutezo ao exequente e a retenccedilatildeo do passaporte natildeo seria injustificaacutevel
Paulo Antonio Papini163 acredita que natildeo tem a apreensatildeo de passaporte natildeo possui um
fundamento plausiacutevel tendo em vista que se o devedor natildeo pode viajar para saldar o deacutebito
tambeacutem natildeo poderia exercer atividades cotidianas
Com todo o respeito a quem pensa dessa forma o argumento eacute muito simploacuterio e natildeo precisamos sequer do Direito para derrubaacute-lo Com efeito se considerarmos que ndash ateacute mesmo pelas dimensotildees continentais do Brasil ndash natildeo eacute incomum que uma passagem para o Nordeste custe mais caro que um voo para Miami seria razoaacutevel entatildeo seguindo a linha argumentativa do Magistrado em questatildeo que se oficiasse aos oacutergatildeos reguladores da aviaccedilatildeo civil proibindo-se aquele devedor de fazer ateacute mesmo voos domeacutesticos Poder-se-ia ir mais longe jaacute que natildeo tem dinheiro para pagar suas diacutevidas certamente aquele devedor tambeacutem natildeo teria para comer fora de sua casa porque entatildeo natildeo determinar a expediccedilatildeo de ofiacutecio aos restaurantes proacuteximos agrave sua casa e determinar tambeacutem a proibiccedilatildeo de que ele fosse servidoatendido
O autor se questiona ainda ldquoSeraacute entatildeo que o Princiacutepio da Dignidade da Pessoa
Humana estaacute de mero enfeite em nossa Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ()rdquo 164 Tendo em vista
que ldquoa decisatildeo em comento viola diretamente o art 5ordm incisos XV LIII e LXIII da
Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ndash falamos do Direito de Ir e Virrdquo 165
Ademais o cancelamento do cartatildeo de creacutedito eacute mais uma forma de constranger e
compelir o executado a cumprir com a obrigaccedilatildeo de qualquer forma natildeo importando o que
precise fazer para conseguir saldar o deacutebito tendo em vista que a referida medida apresenta
162 Ibid sem paginaccedilatildeo 163 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo
pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018
164 Ibid sem paginaccedilatildeo 165 Ibid sem paginaccedilatildeo
61
qualquer adequaccedilatildeo com o fim desejado (reverter em pagamento para o exequente) Os
autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa afirmam que166
Reconhece-se que as razotildees da afirmaccedilatildeo ora questionada satildeo ateacute intuitivas mas eacute plenamente possiacutevel problematiza-las Ora natildeo se encontra qualquer justificativa idocircnea para que o juiz possa cancelar o contrato do executado com a administradora do cartatildeo de creacutedito (ou instituiccedilatildeo financeira) que natildeo tem qualquer relaccedilatildeo com o creacutedito exequendo muito menos como isso poderia impactar positivamente na execuccedilatildeo (senatildeo para pressionar o executado a dispor de bens impenhoraacuteveis) Ademais natildeo foram indicados sequer sinais de que o executado realiza gastos supeacuterfluos com o cartatildeo de creacutedito ndash natildeo que isso justificasse a medida pois o correto seria penhorar os esses bens (se duraacuteveis naturalmente) ao inveacutes de cancelar o cartatildeo de creacutedito
Logo as referidas medidas natildeo possuem qualquer relaccedilatildeo com o atingimento do fim
almejado (o pagamento de quantia) tendo em vista que natildeo haacute uma relaccedilatildeo meiofim entre
tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a
restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia
ao exequente
Dessa forma nota-se que as medidas de suspensatildeo da CNH retenccedilatildeo de passaporte e
bloqueio do cartatildeo de credito satildeo completamente inadequadas agrave realizaccedilatildeo a que se prestam
Afinal ldquotais medidas soam como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-
lo ao cumprimento da ordem judicial ndash e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a
utilizaccedilatildeo dos meios sancionatoacuterios pelo magistrado ()rdquo167
Como exposto em linhas preteacuteritas o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades
de aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e
razoaacutevel se atendo aos criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas
executivas atiacutepicas ao caso concreto sob pena de converter a medida em de indutiva para
punitiva
A utilizaccedilatildeo de medidas atiacutepicas como a suspensatildeo da carteira de motorista e o
passaporte do devedor abandona a regra da responsabilidade patrimonial e atingem em cheio
o nuacutecleo de direitos inerentes agrave condiccedilatildeo humana
166 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
167 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 115
62
O limite para a aplicaccedilatildeo de tais medidas deve ser a Constituiccedilatildeo Federal e sobretudo
os Direitos fundamentais nela expressos ldquoCom efeito natildeo haacute saiacuteda tampouco soluccedilatildeo eficaz
de um problema sem que se respeite a Lei e o Devido Processo Legal (por mais nobres que
sejam as intenccedilotildees)rdquo 168
Dessa forma a busca desenfreada pelo cumprimento das decisotildees judiciais em
especial na fase executiva natildeo pode ser realizada em sacrifiacutecio de direitos fundamentais O
Poder Judiciaacuterio natildeo pode resolver a crise do processo executoacuterio utilizando de medidas
arbitraacuterias com o propoacutesito de satisfazer obrigaccedilotildees pecuniaacuterias
Eis o dilema que se coloca diante do poder geral de efetivaccedilatildeo ele pode servir de
potente instrumento em prol da tutela jurisdicional executiva entretanto se manejado de
modo improacuteprio serviraacute de instrumento de puniccedilatildeo e humilhaccedilatildeo do executado169
Eacute notoacuterio que se amplamente aplicado o poder geral de efetivaccedilatildeo reduziria os
iacutendices de inadimplecircncia quiccedilaacute resolveria por completo a crise da execuccedilatildeo civil Entretanto
o retrocesso civilizatoacuterio seria irreparaacutevel
168 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo
pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018
169 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
63
5 CONCLUSAtildeO
Como funccedilatildeo jurisdicional que tem como objeto a efetivaccedilatildeo de direitos a execuccedilatildeo
deve sempre buscar a maior satisfaccedilatildeo possiacutevel concretizando integralmente o creacutedito do
exequente isto eacute realizando o direito fundamental agrave tutela executiva do credor Por isso a
adoccedilatildeo de meios executivos atiacutepicos incorporados pelo Coacutedigo de Processo Civil de 2015 por
meio do art139 IV em um primeiro momento podem ser consideradas vaacutelidas visto que
servem de instrumento para a satisfaccedilatildeo e asseguraccedilatildeo de direitos do credor
Entretanto para o oacutergatildeo julgador natildeo cometa arbitrariedades em nome do direito
fundamental agrave execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que seja definido certos limites na adoccedilatildeo do poder
geral de efetivaccedilatildeo
As medidas executivas atiacutepicas natildeo podem ser aplicadas de maneira indiscriminada
logo devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o esgotamento das medidas tiacutepicas e
a possibilidade de cumprimento da obrigaccedilatildeo
Partindo dessa premissa as medidas a serem adotadas pelo juiz no caso concreto
devem ter como baliza os princiacutepios da proporcionalidade e da razoabilidade para que natildeo
ultrapassem a responsabilidade patrimonial do devedor e incidida diretamente sobre sua
pessoa
Para que natildeo seja atingida a pessoa do executado ou seja para que o devedor natildeo
tenha sua dignidade humana viola eacute necessaacuterio que a medida atiacutepica seja adequada e
necessaacuteria
Logo o juiz deveraacute sempre estabelecer uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida
executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia
a gerar o resultado sem violar a dignidade humana do executado
Dessa o juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental a execuccedilatildeo e
determinar uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute
necessaacuterio que a medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado
As medidas que ultrapassam esses limites como a decisatildeo que apreendeu o
passaporte suspensatildeo a CNH e bloqueou o cartatildeo de creacutedito do devedor satildeo meramente
punitivas posto que essas natildeo satildeo as medidas mais adequadas para se atingir o fim almejado
pois natildeo existe propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado
64
uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo
geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente
Medidas como esta servem de embasamento para decisotildees arbitraacuterias e autoritaacuterias de
violaccedilatildeo dos direitos fundamentais transformando o poder geral de efetivaccedilatildeo em
instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com autorizaccedilatildeo judicial
Em suma o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades de aplicaccedilatildeo do poder
geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e razoaacutevel se atendo aos
criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao
caso concreto sob pena de punir a pessoa do executado violando a sua dignidade humana
em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo
65
REFEREcircNCIAS
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- 1 INTRODUCcedilAtildeO
- 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
-
- 21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL
- 22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
- 23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
- 24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO
- 25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO
-
- 3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
-
- 31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS
-
- 311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15
-
- 32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
- 33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
- 34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
-
- 4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
-
- 41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
- 42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
-
- 5 CONCLUSAtildeO
- REFEREcircNCIAS
-
5
1 INTRODUCcedilAtildeO
A prestaccedilatildeo jurisdicional natildeo costuma se findar apoacutes o encerramento da fase cognitiva
com a prolaccedilatildeo de uma sentenccedila de meacuterito Para que a referida prestaccedilatildeo se concretize eacute
imperioso que haja a satisfaccedilatildeo do deacutebito pelo devedor
Entretanto observa-se em diversos casos o inadimplemento da parte passiva
processual sendo necessaacuterio desenvolver a atividade executiva A referida atividade possui o
escopo de satisfazer direitos
Isso porque o processo natildeo eacute um fim em si mesmo sendo apenas um exerciacutecio da
jurisdiccedilatildeo estatal Dessa forma a razatildeo de ser do processo eacute o atingimento da sua finalidade
almejada que eacute a prestaccedilatildeo da tutela jurisdicional
Todavia como a tutela jurisdicional configura-se na obrigaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio
proteger e reparar os direitos lesionados ou ameaccedilados de lesatildeo muitas vezes a dita tutela
somente consegue ser efetivada atraveacutes da atividade executiva da jurisdiccedilatildeo
Ocorre que a execuccedilatildeo civil sempre foi o ldquocalcanhar de Aquilesrdquo do sistema
processual e de modo geral vinha sofrendo uma crise quanto a sua efetividade Ou seja o
credor obtia ecircxito na fase de conhecimento entretanto natildeo conseguia alcanccedilar o seu direito a
prestaccedilatildeo reconhecida na fase de execuccedilatildeo
Com o fito de tornar a atividade satisfativa mais eficiente e mais ceacutelere o Coacutedigo de
Processo Civil de 2015 concebeu novas diretrizes ao processo no sentindo de harmonizar
suas com os ditames da Constituiccedilatildeo Federal principalmente com os direitos fundamentais
As normas fundamentais do processo civil trazidas pelo CPC15 preocupam-se
primordialmente com a efetividade da tutela jurisdicional
Em conformidade com essa nova sistemaacutetica o legislador no art 139 IV do Coacutedigo
de Processo Civil estabeleceu a possibilidade de o juiz dispor de todas as medidas indutivas
coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o cumprimento de
ordem judicial trazendo como grande novidade a aplicaccedilatildeo dessas medidas executoacuterias
atiacutepicas tambeacutem nas obrigaccedilotildees de pagar dinheiro
6 Entretanto natildeo haacute na legislaccedilatildeo criteacuterios especiacuteficos que auxiliem o oacutergatildeo julgador na
escolha das medidas executivas atiacutepicas que se adotadas sem qualquer baliza podem
acarretar consequecircncias juriacutedicas irreparaacuteveis
Como a famosa decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de
Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-1320138260011 Nessa accedilatildeo
que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo
pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a suspensatildeo da
Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o passaporte e
cancelou os cartotildees de creacutedito como forma de compeli-lo a adimplir com o deacutebito
Decisotildees como esta geram conflitos entre direitos constitucionalmente instituiacutedos De
um lado o direito fundamental agrave tutela jurisdicional e de outro os direitos e garantias
inerentes a todos os indiviacuteduos
Dessa forma a presente monografia tem como escopo de estabelecer criteacuterios
limitadores para que a adoccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo viole a dignidade humana do
executado em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo
7 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO
CIVIL
21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL
A Execuccedilatildeo Civil nasce a partir do direito a uma prestaccedilatildeo conferida a algueacutem de
exigir de outrem o cumprimento de uma conduta de fazer natildeo fazer ou de dar (dinheiro ou
coisa distinta) 1
Para que o direito a uma prestaccedilatildeo se concretize no mundo fiacutesico eacute necessaacuterio que
haja a satisfaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida pelo sujeito passivo Caso contraacuterio fala-se em
inadimplemento ou lesatildeo O titular do direito natildeo tem como agir por si para efetivar o seu
direito a prestaccedilatildeo posto que a autotutela eacute vedada no ordenamento juriacutedico Dessa forma eacute
necessaacuterio que se recorra ao Poder Judiciaacuterio para que se possa ter a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo
devida logo a tutela jurisdicional executiva2
O processualista Fredie Didier et al3 equaciona essa questatildeo da seguinte maneira
Quando se pensa em tutela executiva pensa-se na efetivaccedilatildeo de direitos a uma prestaccedilatildeo fala-se de um conjunto de meios para efetivar a prestaccedilatildeo devida fala-se em execuccedilatildeo de fazer natildeo-fazer dar exatamente os trecircs tipos de prestaccedilatildeo existentes Natildeo eacute por acaso nem por coincidecircncia que a tutela executiva pressupotildee inadimplemento (CPC art 786) - fenocircmeno exclusivo dos direitos a uma prestaccedilatildeo Eacute por isso tambeacutem que se pode falar em prescriccedilatildeo da execuccedilatildeo (CPC art 802 e suacutemula do STF n 150) - prescriccedilatildeo eacute fenocircmeno juriacutedico que se relaciona aos direitos a uma prestaccedilatildeo A execuccedilatildeo forccedilada dirige-se ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo Essa relaccedilatildeo entre direito material e processo eacute fundamental para a compreensatildeo do fenocircmeno executivo
Nesse iacutenterim para o Ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux4 ldquoexecutar eacute
satisfazerrdquo ao passo que o professor Fredie Didier et al5 formulou um conceito mais amplo
ldquoExecutar eacute satisfazer uma prestaccedilatildeo devida A execuccedilatildeo pode ser espontacircnea quando o
devedor cumpre voluntariamente a prestaccedilatildeo ou forccedilada quando o cumprimento da prestaccedilatildeo
eacute obtido por meio de atos executivos pelo Estadordquo
1 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 41 2 Ibid p 42 3 Ibid p 42 4 FUX Luiz Curso de direito processual civil Rio de Janeiro Forense 2001 p 980 5 DIDIER JR Fredie et al Op Cit p 45
8 Dessa forma a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional responsaacutevel pela
concretizaccedilatildeo de um direito subjetivo no plano material obtendo resultado idecircntico ou
equivalente ao atingiacutevel se o devedor cumprisse espontaneamente a prestaccedilatildeo
Todavia essa atividade jurisdicional soacute cabe quando o devedor se recusa a cumprir
com a obrigaccedilatildeo quebrando a expectativa do credor de receber o que lhe eacute devido Por esta
razatildeo que se diz que a execuccedilatildeo civil eacute ldquoforccediladardquo 6
Eacute o que se conclui seguindo os ensinamentos de Leonardo Greco7 para ele execuccedilatildeo eacute
uma
() modalidade de tutela jurisdicional que consiste na praacutetica pelo juiz (ou por outrem sob a sua supervisatildeo) de uma seacuterie de atos coativos concretos sobre o devedor e sobre o seu patrimocircnio a fim de agrave custa dele e independentemente do concurso da sua vontade tornar efetivo o cumprimento de prestaccedilatildeo por ele inadimplida desde que tais atos coativos estejam previamente constituiacutedos em lei
Portanto a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional que tem como escopo obter o
cumprimento de uma prestaccedilatildeo certa e inadimplida mediante atos coativos sobre o devedor e
seus bens
22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
Vislumbrado o conceito de execuccedilatildeo civil cabe agora empreender a sua classificaccedilatildeo
tendo em vista que a execuccedilatildeo pode se manifestar de diversas formas possuindo diferentes
caracteriacutesticas em cada uma das suas modalidades
Inicialmente cabe destacar que haacute duas teacutecnicas processuais para viabilizar a execuccedilatildeo
civil lato sensu eacute a que divide em processo autocircnomo de execuccedilatildeo e em fase de execuccedilatildeo
dependendo do tiacutetulo executivo que justifica o exerciacutecio da atividade satisfativa
O Coacutedigo Processual Civil de 2015 acertadamente ratificou as reformas promovidas
no CPC73 que consagrava a opccedilatildeo legislativa de oferecimento das tutelas de certificaccedilatildeo e
efetivaccedilatildeo do direito em um mesmo processo Dessa forma as execuccedilotildees de sentenccedilas
6 BASTOS Luiz Fernando Pereira O artigo 139 IV do novo Coacutedigo de Processo Civil a atipicidade
dos meios executivos na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia certa Brasiacutelia 2017 Disponiacutevel em lt httpbdmunbbrbitstream104831866812017_LuizFernandoPereiraBastospdf gt Acesso em 06 de agosto de 2018
7 BASTOS Luiz Fernando Pereira apud GRECO Leonardo O processo de execuccedilatildeo Rio de Janeiro Renovar 1999 p 164
9
passaram a ser uma fase complementar ao de processo de conhecimento e natildeo mais ocorrer
em um processo autocircnomo
No entendimento do professor processualista Fredie Didier et al8 o processo
sincreacutetico simplificou a efetivaccedilatildeo de um direito reconhecido em sentenccedila
A dispensa do ajuizamento de um processo autocircnomo para execuccedilatildeo de sentenccedila natildeo soacute veio diminuir o tempo necessaacuterio agrave prestaccedilatildeo da tutela jurisdicional - afinal o credor natildeo mais precisaria tal como ocorria ateacute entatildeo promover nova citaccedilatildeo pessoal do reacuteudevedor- como tambeacutem veio romper de vez com um velho paradigma segundo o qual a atividade executiva estaria dissociada da precedente atividade jurisdicional cognitiva
Entretanto natildeo soacute as sentenccedilas de meacuterito ensejam uma execuccedilatildeo Por esta razatildeo foi
necessaacuterio manter o processo autocircnomo de execuccedilatildeo para os casos em que o credor tem a seu
favor um documento que natildeo tenha sido proferido por um oacutergatildeo dotado de jurisdiccedilatildeo
Consequentemente se for o titulo executivo judicial o caminho natural eacute o do
cumprimento de sentenccedila Sendo por sua vez extrajudicial o titulo executivo o caminho
correto eacute o processo de execuccedilatildeo
Cabe ainda salientar que toda execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial eacute definitiva Jaacute a
execuccedilatildeo de tiacutetulo judicial (cumprimento de sentenccedila) pode ser definitiva ou provisoacuteria
No primeiro caso isto eacute cumprimento de sentenccedila definitivo ldquoeacute a execuccedilatildeo completa
que vai ateacute a fase final (com a entrega do bem da vida) sem exigecircncias adicionais para o
exequenterdquo 9
Quanto ao segundo caso ldquoo cumprimento provisoacuterio de sentenccedila (fundada em tiacutetulo
provisoacuterio) eacute aquele que exige alguns requisitos extras para que se chegue agrave fase final da
execuccedilatildeordquo 10
Para Fredie Didier11 o criteacuterio para definir se o cumprimento de sentenccedila seraacute
definitivo ou provisoacuterio
() eacute a estabilidade do tiacutetulo executivo em que se funda a execuccedilatildeo se se tratar de decisatildeo acobertada pela coisa julgada material o cumprimento de sentenccedila eacute
8 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 46 9 Ibid p 57 10 Ibid p 57 11 Ibid p 57
10
definitivo se se tratar de decisatildeo judicial ainda passiacutevel de alteraccedilatildeo (reforma ou invalidaccedilatildeo) em razatildeo da pendecircncia de recurso contra ela interposto a que natildeo tenha sido atribuiacutedo efeito suspensivo o cumprimento de sentenccedila eacute provisoacuterio
Ademais a execuccedilatildeo se distingue em procedimentos executivos comuns que satildeo da
execuccedilatildeo civil e que servem a uma generalidade de creacuteditos como eacute o caso do cumprimento
de sentenccedila e o processo de execuccedilatildeo E em procedimentos executivos especiais que servem
agrave satisfaccedilatildeo de creacuteditos peculiares como a execuccedilatildeo de alimentos e a execuccedilatildeo fiscal 12
Por fim cabe mencionar a classificaccedilatildeo que distingue a execuccedilatildeo em direta e indireta
A primeira execuccedilatildeo direita (ou execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo) eacute ldquo() aquela em que o
Poder Judiciaacuterio prescinde da colaboraccedilatildeo do executado para a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida
e pois promove uma substituiccedilatildeo da sua conduta pela conduta do proacuteprio Estado-juiz ou de
terceirordquo 13 Ou seja as medidas executivas satildeo levadas a efeito mesmo contra a vontade do
devedor na execuccedilatildeo direta
Segundo a doutrina a execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo se subdivide da seguinte forma
meios de desapossamento meios de transformaccedilatildeo e meios de expropriaccedilatildeo
Os meios de desapossamento muito comuns nas execuccedilotildees para entrega de coisa eacute a
forma ldquopor meio da qual se retira da posse do executado o bem a ser entregue ao exequente
(p ex despejo busca e apreensatildeo reintegraccedilatildeo de posse)rdquo 14 Ao passo que por meio dos de
transformaccedilatildeo ldquo() o juiz determina que um terceiro pratique a conduta que deveria ser
praticada pelo executado cabendo a este arcar com o pagamento do custo respectivordquo 15 Jaacute
os meios executivos de expropriaccedilatildeo eacute a forma ldquopor meio do qual algum bem do patrimocircnio
do devedor eacute expropriado para pagamento do creacutedito (adjudicaccedilatildeo alienaccedilatildeo judicial ou
apropriaccedilatildeo de frutos e rendimentos de empresa ou de estabelecimentos e de outros bens art
825 CPC)rdquo 16
12 Ibid p 48 13 Ibid p 50 14 Ibid p 51 15 Ibid p 51 16 Ibid p 51
11 Jaacute a execuccedilatildeo indireta (ou mandamental) atua ldquo() na vontade do devedor como forma
de compeli-lo ou incentivaacute-lo a cumprir a ordem judicialrdquo 17 Nesse entendimento ainda
leciona Fredie Didier et al 18
Nesses casos o Estado-juiz busca promover a execuccedilatildeo com a colaboraccedilatildeo do executado forccedilando ou incentivando a que ele proacuteprio cumpra a prestaccedilatildeo devida Em vez de o Estado-juiz tomar as providecircncias que deveriam ser tomadas pelo executado o Estado forccedila por meio de coerccedilatildeo psicoloacutegica ou de promessa de recompensa judicial a que o proacuteprio executado cumpra a prestaccedilatildeo
A execuccedilatildeo indireta pode ser patrimonial como por exemplo a imposiccedilatildeo de multa
coercitiva ou pessoal com a prisatildeo civil do devedor de alimentos Ademais adiciona Didier
et al19que
O estiacutemulo ao cumprimento da prestaccedilatildeo pode dar-se pelo temor (p ex multa coercitiva prisatildeo civil do devedor de alimentos divulgaccedilatildeo de notiacutecia em jornal revelando o descumprimento) ou pelo incentivo (p ex a chamada sanccedilatildeo premial ou sanccedilatildeo positiva de que eacute exemplo a isenccedilatildeo do pagamento de custas em caso de cumprimento do mandado monitoacuterio - art 701 sect 1ordm CPC a reduccedilatildeo pela metade dos honoraacuterios advocatiacutecios fixados inicialmente pelo juiacutezo em caso de pagamento integral do deacutebito pecuniaacuterio na execuccedilatildeo por quantia certa fundada em tiacutetulo extrajudicial - art 827 sect 1ordm CPC)
Por tais razotildees haacute uma tendecircncia em cada vez mais prestigiar os meios executivos
indiretos (coercitivos) posto que satildeo tatildeo eficazes quanto os meios executivos diretos
entretanto menos onerosos Contudo sua aplicaccedilatildeo deve ser fiscalizada a fim de natildeo permitir
que a execuccedilatildeo civil perca sua finalidade visto que eacute uma funccedilatildeo jurisdicional que tem como
escopo efetivar o direito do credor e natildeo de atender os interesses do devedor
23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
Os princiacutepios juriacutedicos nos uacuteltimos anos passaram a ser munidos de forccedila cogente
normatizando as condutas humanas tanto quanto as regras juriacutedicas Os ditos princiacutepios
ampliaram as margens de atuaccedilatildeo dos aplicadores do direito possibilitando a construccedilatildeo de
soluccedilotildees mais adequadas agraves especificidades das demandas que chegam ao judiciaacuterio
17 Ibid p 51 18 Ibid p 51 19 Ibid p 51-52
12 Dessa forma eacute necessaacuterio aprofundar-se nos princiacutepios norteadores da execuccedilatildeo civil
para que se obtenha uma anaacutelise completa da teoria geral da execuccedilatildeo
A execuccedilatildeo civil tem como um dos seus corolaacuterios o princiacutepio da efetividade este
consiste na exigecircncia de um sistema completo de tutela executiva no qual existam meios
executivos capazes de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor
de tutela executivardquo 20
O referido princiacutepio da efetividade eacute reforccedilado como normal fundamental do processo
civil brasileiro pelo art 4ordm do CPC ldquoArt 4ordm As partes tecircm o direito de obter em prazo razoaacutevel
a soluccedilatildeo integral do meacuterito incluiacuteda a atividade satisfativa
Jaacute o princiacutepio da boa feacute processual corolaacuterio do devido processo legal estaacute previsto
no art 5ordm do CPC ldquoAquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de
acordo com a boa-feacuterdquo Segundo o processualista baiano Fredie Didier21
O princiacutepio da boa-feacute extrai-se de uma claacuteusula geral processual A opccedilatildeo por uma claacuteusula geral de boa-feacute eacute a mais correta Eacute que a infinidade de situaccedilotildees que podem surgir ao longo do processo torna pouco eficaz qualquer enumeraccedilatildeo legal exaustiva das hipoacuteteses de comportamento desleal Daiacute ser correta a opccedilatildeo da legislaccedilatildeo brasileira por uma norma geral que impotildee o comportamento de acordo com a boa-feacute Em verdade natildeo seria necessaacuteria qualquer enumeraccedilatildeo das condutas desleais o art 5deg do CPC eacute bastante exatamente por tratar-se de uma claacuteusula geral
Dessa forma o dito princiacutepio preconiza que diante de um vinculo juriacutedico as pessoas
envolvidas natildeo poderatildeo frustrar a confianccedila do outro devendo comportar-se como se pode
esperar de uma pessoa de boa-feacute
Ademais disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial que ldquosomente o
patrimocircnio do devedor (art 789 CPC) ou de terceiro responsaacutevel pode ser objeto da
atividade executiva do Estadordquo 22
O referido princiacutepio que determina que somente o patrimocircnio submete-se agrave execuccedilatildeo
e natildeo a pessoa foi trazido pela humanizaccedilatildeo do direito Para o professor Didier et al23 o
20 DIDIER JR Freddie et al apud GUERRA Marcelo Lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do
credor na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 21 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte
geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 105 22 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 68
13
desenvolvimento dos meios de execuccedilatildeo indireta ldquoparece relativizar um pouco esse princiacutepio
na medida em que pressionam psicologicamente a pessoa do devedor para que cumpra a
obrigaccedilatildeo com seu comportamentordquo
Complementa ainda que
A responsabilidade executiva parece assumir atualmente caraacuteter hiacutebrido comportando coerccedilatildeo pessoal e sujeiccedilatildeo patrimonial
i) a coerccedilatildeo pessoal incide sobre a vontade do devedor admitindo o uso de medidas coercitivas de execuccedilatildeo indireta para forccedilaacute-lo a cumprir a obrigaccedilatildeo com seu proacuteprio comportamento (ex arts 139 rv 523 sect 1ordm 536 sect 1ordm e 538 sect 3ordm todos do CPC)
ii) descumprida a obrigaccedilatildeo e natildeo sendo possiacuteveladequado o uso de teacutecnica de coerccedilatildeo pessoal tem-se a sujeiccedilatildeo patrimonial que recairaacute sobre os bens do devedor ou de terceiro responsaacutevel - que responderatildeo pela proacutepria prestaccedilatildeo in natura (ex dar coisa ou entregar quantia) ou por perdas e danos24
Dessa forma o referido princiacutepio natildeo tem aplicaccedilatildeo absoluta em razatildeo do principio da
efetividade a qual estimula o uso dos meios de coerccedilatildeo indireta para garantir o cumprimento
da obrigaccedilatildeo pelo devedor
O princiacutepio da primazia da tutela especifica (ou princiacutepio do resultado) assevera que
ldquoA execuccedilatildeo deve ser especiacutefica propiciar ao credor a satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo tal qual
houvesse o cumprimento espontacircneo da prestaccedilatildeo pelo devedorrdquo 25
O CPC de 2015 absorveu todos os avanccedilos legislativos a cerca do mote O caput do
art 497 assegura que na accedilatildeo que tenha por objeto a prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer o
juiz se procedente o pedido concederaacute a tutela especiacutefica ou determinaraacute providecircncias que
assegurem a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico equivalente O art 499 o
complementa a obrigaccedilatildeo somente seraacute convertida em perdas e danos se o autor o requerer
ou se impossiacutevel agrave tutela especiacutefica ou a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico
equivalente
O princiacutepio do contraditoacuterio eacute garantido pela constituiccedilatildeo federal e compreende o
direito de ser ouvido o direito de acompanhar os atos processuais o direito de produzir
provas participar da sua produccedilatildeo manifestar-se sobre a prova produzida e obter do juiz a
23 Ibid p 69-70 24 Ibid p 70 25 Ibid p 71
14
respectiva valoraccedilatildeo o direito de ser informado regularmente dos atos praticados no processo
o direito agrave motivaccedilatildeo das decisotildees o direito de impugnar as decisotildees 26
O contraditoacuterio tem aplicaccedilatildeo em todo processo judicial sendo aplicaacutevel tambeacutem na
execuccedilatildeo No entanto o contraditoacuterio na execuccedilatildeo natildeo ocorre com a mesma intensidade que
no processo ou na fase de conhecimento eacute o que assevera Didier et al 27
O contraditoacuterio no procedimento executivo no aspecto do direito de defesa assegurado agrave parte demandada eacute eventual porquanto depende da provocaccedilatildeo do executado que natildeo eacute chamado ajuiacutezo para defender-se mas sim para cumprir a obrigaccedilatildeo O procedimento executivo adota a teacutecnica monitoacuteria que consiste basicamente na inversatildeo do ocircnus de provocar o contraditoacuterio o reacuteu em vez de citado para manifestar-se sobre a pretensatildeo do autor eacute convocado para cumprir uma determinada obrigaccedilatildeo
Logo haacute o contraditoacuterio no procedimento executivo porem eacute eventual quanto agrave defesa
do executado
Ademais o princiacutepio da menor onerosidade eacute consagrado pelo art 805 do CPC e
dispotildee que ldquoQuando por vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz
mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o executadordquo O referido princiacutepio tem o
escopo de impedir o abuso do direito pelo exequente
O principio da menor onerosidade auxilia o juiz na escolha de um meio executivo
adequado e necessaacuterio que satisfaccedila a prestaccedilatildeo exigida pelo credor Nesse sentido eacute o
entendimento do professor Fredie Didier et al 28
O resultado a ser alcanccedilado eacute aquele estabelecido pelo direito material A maneira de se chegar ateacute esse resultado eacute que deve ser a menos onerosa possiacutevel para o executado Isso significa que a opccedilatildeo pelo meio menos gravoso pressupotildee que os diversos meios considerados sejam igualmente eficazes Assim havendo vaacuterios meios executivos aptos agrave tutela adequada e efetiva do direito de creacutedito escolhe-se a via menos onerosa ao executado
O princiacutepio visa impedir a execuccedilatildeo desnecessariamente onerosa ao executado ou seja a execuccedilatildeo abusiva Em vez de enumerar situaccedilotildees em que a opccedilatildeo mais gravosa revelar-se-ia injusta o legislador valeu-se corretamente de uma claacuteusula geral para reputar abusivo qualquer comportamento do credor que pretender valer-se de meio executivo mais oneroso do que outro igualmente idocircneo agrave satisfaccedilatildeo do seu creacutedito
26 Ibid p 76 27 Ibid p 78 28 Ibid p 79-80
15 O princiacutepio da cooperaccedilatildeo tem como base os princiacutepios do devido processo legal da
boa-feacute processual e do contraditoacuterio O dito princiacutepio avigora a eacutetica processual com o
aprimoramento do diaacutelogo entre as partes reciprocamente e com o oacutergatildeo jurisdicional Eacute o
que preconiza o art 6ordm do CPC Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para
que se obtenha em tempo razoaacutevel decisatildeo de meacuterito justa e efetiva
No procedimento executivo o princiacutepio da cooperaccedilatildeo incide de diversas formas
disciplina Didier et al29 que na execuccedilatildeo
O executado tem o dever de indicar bens agrave penhora (art 774 V CPC) Natildeo encontrados bens penhoraacuteveis e natildeo havendo indicaccedilatildeo de qualquer um deles pelo exequente cabe ao executado declarar quais satildeo seus bens penhoraacuteveis sob pena de se sujeitar a uma sanccedilatildeo pecuniaacuteria compulsoacuteria
Tambeacutem eacute manifestaccedilatildeo do princiacutepio da cooperaccedilatildeo a exigecircncia de que o executado que pretende impugnar o valor da execuccedilatildeo apresente de logo o valor que reputa devido (art 525 sect 4ordm CPC) Seria comportamento natildeo-cooperativo afirmar que a cobranccedila eacute excessiva sem simultaneamente dizer qual eacute o valor correto
Demais disso aplicam-se agrave execuccedilatildeo os deveres que decorrem do princiacutepio da cooperaccedilatildeo e que satildeo imputados ao oacutergatildeo jurisdicional () Assim por exemplo deve o juiz advertir ao executado antes de puni-lo de que seu ato pode vir a caracterizar-se como atentatoacuterio agrave dignidade da jurisdiccedilatildeo ( art 772 II CPC) perceba que se trata de uma conduta compatiacutevel com o dever de prevenccedilatildeo O oacutergatildeo jurisdicional somente pode conhecer da prescriccedilatildeo ex officio dando a oportunidade de o exequente manifestar-se conforme impotildee o dever de consulta ( cf arts 10 487 paraacutegrafo uacutenico e 921 sect 5ordm CPC)
O princiacutepio ou postulado30 da proporcionalidade tem aplicaccedilatildeo muito relevante na
execuccedilatildeo O art 8 do CPC assegura que o oacutergatildeo jurisdicional tem o dever de observar a
proporcionalidade e a razoabilidade ao aplicar o ordenamento juriacutedico inclusive no
procedimento executivo
Ademais o art 805 do CPC eacute categoacuterico ao disciplinar que ldquoArt 805 Quando por
vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo
menos gravoso para o executadordquo O referido artigo jaacute se trata de uma concretizaccedilatildeo da
proporcionalidade
29 Ibid p 82 30 Segundo Fredie Didier et al haacute uma discussatildeo doutrinaacuteria sobre a proporcionalidade Parte da
doutrina acredita que a proporcionalidade eacute um princiacutepio e outra parte acredita que eacute um postulado normativo
16 O principio da adequaccedilatildeo pode ser vislumbrado em dois momentos do Direito
Processual ldquoa) no legislativo como orientador da confecccedilatildeo das leis b) no jurisdicional
autorizando ao juiz diante do caso concreto adaptar procedimento agraves suas peculiaridadesrdquo 31
Para Luceacutelia de Sena Alves e Tiago Retes32
Isso quer dizer que no momento legislativo o devido processo deve ser observado pelo legislador para a confecccedilatildeo das normas de direito processual que iratildeo servir de instrumento efetivo de concretizaccedilatildeo do direito substancial a ser tutelado atendendo a todas as suas finalidades sob pena de falecircncia do proacuteprio direito No momento jurisdicional da mesma forma a via processual escolhida pelo autor tambeacutem deve estar sujeita a este princiacutepio para que natildeo sofra as mesmas consequecircncias da sua inobservacircncia
O ordenamento juriacutedico deve ser aplicado por meio da teacutecnica processual adequada
evitando dessa forma uma tutela ineficaz
Por fim o princiacutepio do autorregramento da vontade na execuccedilatildeo tem o objetivo de
ldquo() preservar um espaccedilo processual para o exerciacutecio da liberdade e da vontade em que
sejam permitidas negociaccedilotildees que envolvam as partes ndash e tambeacutem o juizrdquo33 Didier et al34
assevera que
A rigor o legislador estabelece um regime juriacutedico de autorregramento da vontade processual identificando-se algumas manifestaccedilotildees relevantes para a execuccedilatildeo Na verdade pode-se dizer que poucos satildeo os ambientes mais propiacutecios do que a execuccedilatildeo para a negociaccedilatildeo sobre o processo Todos os institutos e normas processuais relativos agrave execuccedilatildeo devem ser repensados a partir da premissa de que o CPC permite uma ampla margem de liberdade de negociaccedilatildeo sobre o processo (art 190 CPC)
O autorregramento da vontade pode ser vislumbrando na previsatildeo de negoacutecios tiacutepicos
em sede de execuccedilatildeo como por exemplo no acordo das partes sobre o valor do bem que
dispensa a avaliaccedilatildeo disposto no inciso I do art 871 CPC Ademais dentro dos limites do art
190 do CPC eacute possiacutevel na execuccedilatildeo a atribuiccedilatildeo da negociaccedilatildeo atiacutepica aos sujeitos 31 ALVES Luceacutelia de Sena Alves RETES Tiago O poder geral de efetivaccedilatildeo das decisotildees judiciais e
proporcionalidade uma anaacutelise criacutetica acerca do art 139 IV do Novo Coacutedigo de Processo Civil Disponiacutevel em lthttpswwwacademiaedu31752652O_poder_geral_de_efetivaC3A7C3A3o_das_decisC3B5es_judiciais_e_a_proporcionalidade_uma_anC3A1lise_crC3ADtica_acerca_do_art_139_IV_do_Novo_CC3B3digo_de_Processo_Civil gt Acesso em 25 de julho de 2018
32 Ibid natildeo paginado 33 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 85 34 Ibid p 85
17
processuais permitindo que sejam feitas mudanccedilas nos procedimentos e nas situaccedilotildees
juriacutedicas processuais ldquoSatildeo exemplos de negoacutecios processuais atiacutepicos na execuccedilatildeo pacto de
penhorabilidade acordo de ampliaccedilatildeo de prazos das partes de qualquer natureza acordo de
rateio de despesas processuais ()rdquo35
24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO
Sempre houve diversos questionamentos quanto agrave eficaacutecia do Direito processual Civil
e se o mesmo era meio apto a assegurar a tutela jurisdicional dos direitos dos cidadatildeos O
processo de execuccedilatildeo eacute o setor que sofre mais criacuteticas quanto a sua ineficiecircncia afinal a
execuccedilatildeo civil sempre foi o ldquocalcanhar de Aquilesrdquo do sistema processual pela praxe do
ldquoganhou (no processo de conhecimento) mas natildeo levou (na fase de cumprimento ou
execuccedilatildeo)rdquo 36
Essa dificuldade de se efetivar a tutela satisfastiva natildeo se resume a um problema de
mera teacutecnica processual tiacutepico de determinado ordenamento mas representa uma prova de
fogo da capacidade dos instrumentos jurisdicionais O autor Leonardo Greco37 no ano de
2005 atribuiu esse fato as seguintes causas o excesso de processos o custo e a morosidade da
justiccedila a inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios a ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais
um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico e a progressiva volatizaccedilatildeo dos bens
Quanto ao excesso de processos o referido autor aduz que ldquonos grandes centros o
crescimento da maacutequina judiciaacuteria natildeo acompanhou a expansatildeo do nuacutemero de litiacutegiosrdquo 38
O custo e morosidade da justiccedila prejudicam a tutela satisfativa posto que
ldquojaacute desfalcado pelo inadimplemento do devedor o credor ainda tem de arcar com o adiantamento das despesas do processo de execuccedilatildeo e de eventual liquidaccedilatildeo vendo arrastar-se a marcha dos atos executoacuterios facilmente retardada por atos procrastinatoacuterios do devedorrdquo 39
35 Ibid p 86 36 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca
para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018
37 GRECCO Leonardo A Crise do Processo de Execuccedilatildeo in Estudos de direito processual Leonardo Greco ndash Campos dos Goytacazes Ed Faculdade de Direito de Campos 2005 p 7
38 Ibid p 7 39 Ibid p 7-8
18 A inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios contribui para a crise do processo de
execuccedilatildeo tendo em vista que
ldquoo juiz da execuccedilatildeo prisioneiro de ritos que o distanciam das partes e da realidade da vida impulsiona sem qualquer apetite a execuccedilatildeo conduzindo-a ao sabor dos ventos das provocaccedilotildees impacientes do credor e das costumeiras procrastinaccedilotildees do devedorrdquo 40
Jaacute ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais atrapalha a efetivaccedilatildeo da tutela satisfativa ldquoo
devedor natildeo colabora com a execuccedilatildeo e os meios de pressatildeo que a lei estabelece natildeo satildeo
suficientes para intimidaacute-lordquo 41
Com um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico
O espiacuterito empresarial e a sociedade de consumo estimulam o endividamento das pessoas e o inadimplemento das obrigaccedilotildees pelo devedor deixou de ser vexatoacuterio e reprovaacutevel o que multiplica as accedilotildees de cobranccedila e execuccedilotildees atraveacutes das quais o sujeito passivo ainda usufrui vantagens agraves custas do credor 42
Por fim Leonardo Greco elenca a volatizaccedilatildeo dos bens como o uacuteltimo fator que
macula o processo executo tendo em vista que
ldquomudou inteiramente o perfil patrimonial das pessoas antes concentrado em bens de raiz e agora tendencialmente dirigido a investimentos em tiacutetulos e valores facilmente negociaacuteveis o que dificulta a sua localizaccedilatildeo pelo credorrdquo 43
O Coacutedigo de Processo Civil de 1973 introduziu o sistema executivo ao ordenamento
juriacutedico paacutetrio e seguindo os valores liberais da eacutepoca com a proteccedilatildeo de esfera juriacutedica de
liberdade do cidadatildeo contra a possibilidade de arbiacutetrio do Estado e uso indevido do Poder
jurisdicional outorgou o miacutenimo de poder ao juiz Seguindo as regras do CPC de 73 o
devedor soacute poderia ter sua esfera juriacutedica invadida atraveacutes de meios de execuccedilatildeo instituiacutedos
previamente em lei
Diante de tantos obstaacuteculos para se efetivar a tutela satisfativa a execuccedilatildeo estava
fadada ao fracasso o que frustrava a expectativa do jurisdicionado a uma prestaccedilatildeo da tutela
jurisdicional ceacutelere e efetiva Insatisfeitos com o cenaacuterio que se encontrava a atividade
40 Ibid p 8 41 Ibid p8 42 Ibid p 8 43 Ibid p8
19
executiva legisladores e operadores do direito natildeo mediram esforccedilos para promover uma
evoluccedilatildeo significativa buscando mais eficiecircncia e celeridade ao procedimento executoacuterio
Dessa forma no final de 1994 foi introduzido no coacutedigo de processo agrave flexibilizaccedilatildeo
dos poderes executoacuterios do juiz ldquopara que ele pudesse prestar uma tutela efetiva aos direitos
ficando autorizado a determinar a modalidade de execuccedilatildeo adequada a cada hipoacutetese nas
obrigaccedilotildees de fazer e natildeo fazer (art 461 sect5ordm do CPC de 1973)rdquo No ano de 2002 a referida
medida foi estendida para as obrigaccedilotildees de entregar coisa (art 461-A caput e sect3ordm do CPC de
1973)
Com fundamento nos artigos 461 e 461-A em 2005 a Lei nordm 11 23205 unificou o
processo de conhecimento e o processo de execuccedilatildeo de sentenccedila Nesse sentido Maacuterio
Henrique Cavalcanti Gil Rodrigues44 aduz que
A Lei 112322005 reuniu de forma definitiva os processos de conhecimento e de execuccedilatildeo em um uacutenico processo composto por um sistema bifaacutesico Assim passa a existir uma fase inicial (de reconhecimento) e uma fase posterior (de cumprimento de sentenccedila de efetivaccedilatildeo da decisatildeo definitiva) sem contar com a eventual fase intermediaacuteria de liquidaccedilatildeo (RODRIGUES 2010 p 38)
Ademais as alteraccedilotildees realizadas no CPC de 73 inseriu a atipicidade dos meios
executivos nas obrigaccedilotildees de fazer natildeo fazer e dar coisa certa entretanto exercendo papel
subsidiaacuterio aos meios tiacutepicos
Quanto agraves obrigaccedilotildees de pagar quantia havia apenas a possibilidade de se valer da
incidecircncia de multa do art 475-J do CPC de 73 ndash implementada mediante reforma perpetrada
pela Lei nordm 11232 de 2005 em atendimento a doutrina processualista preocupada com a
efetividade das decisotildees ndash e de atos executivos como a penhora de bens e dinheiro
Ainda que a execuccedilatildeo tenha avanccedilado com a inserccedilatildeo das leis posteriores a 1994 no
CPC de 1973 a mesma continuava insuficiente tendo em vista que a burocracia e lentidatildeo
dos atos executivos davam brechas para que o devedor escondesse seu patrimocircnio penhoraacutevel
tornando carente de efetividade e celeridade agrave execuccedilatildeo
44 RODRIGUES Maacuterio Henrique Cavalcanti Gil A evoluccedilatildeo da execuccedilatildeo de sentenccedila no direito
processual civil e o novo regime juriacutedico das sentenccedilas apoacutes a reforma implementada pela Lei 112322005 Revista do Tribunal Regional Federal da 1ordf Regiatildeo v 22 n 2 fev 2010 p 38
20
25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO
A tutela juridiscional eacute um direito fundamental previsto no art 5ordm inciso XXXV da
Carta Magna ldquo() a lei natildeo excluiraacute da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio lesatildeo ou ameaccedila a
direitordquo
Na visatildeo claacutessica o direito de accedilatildeo era efetivado com a prolaccedilatildeo de uma sentenccedila de
meacuterito posiccedilatildeo adotada por grande parte dos processualistas seguidores da doutrina de
Liebman Todavia esse conceito se mostra defasado tendo em vista que o direito de acesso agrave
justiccedila natildeo eacute apenas uma garantia formal de bater as portas do judiciaacuterio mas a garantia de
acesso agrave ordem juriacutedica justa adequada e eficaz45
Acreditar que uma sentenccedila de meacuterito favoraacutevel eacute tutela jurisdicional suficiente para
satisfazer o que se busca com o ajuizamento da accedilatildeo eacute uma visatildeo distorcida da atividade
satisfativa ldquoSob o ponto de vista do direito material a condenaccedilatildeo por si soacute eacute incapaz de
prestar a tutela do direitordquo46
Nessa oacutetica o direito fundamental agrave tutela executiva exige um sistema de tutela
jurisdicional ldquocapaz de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor
de tutela executivardquo47 Dessa forma entende-se que
ldquo() a) a interpretaccedilatildeo das normas que regulamentam a tutela executiva tem de ser feita no sentido de extrair a maior efetividade possiacutevel b) o juiz tem o poder-dever de deixar de aplicar uma norma que imponha uma restriccedilatildeo a um meio executivo sempre que essa restriccedilatildeo natildeo se justificar como forma de proteccedilatildeo a outro direito fundamental c) o juiz tem o poder-dever de adotar os meios executivos que se revelem necessaacuterios agrave prestaccedilatildeo integral de tutela executivardquo48
Egrave imperioso compreender que o direito fundamental agrave tutela executiva ratificado
pelo CPC eacute essencial para dirimir diversos litiacutegios oriundos do procedimento executivo
45 FERREIRA Gabriela Macedo Poder geral de efetivaccedilatildeo em defesa da constitucionalidade da
teacutecnica de execuccedilatildeo dos direitos do art 139 IV do Coacutedigo de Processo Civil Revista Jus Navigandi ISSN 1518-4862 Teresina ano 22 n 5178 4 set 2017 Disponiacutevel em lthttpsjuscombrartigos60190gt Acesso em 11 set 2018
46 Ibid natildeo paginado 47 DIDIER JR Fredie et al apud GUERRA Marcelo lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do credor
na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 48 Ibid p 102-104
21
ldquoprincipalmente aqueles relacionados agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo49
Fredie Didier et al50 cita como exemplo as hipoacuteteses de impenhorabilidade
A impenhorabilidade de certos bens eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa
Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais
Por esta razatildeo o legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do
CPC fazendo um preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses das partes envolvidas
optando pela mitigaccedilatildeo do direito do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado
Quando o oacutergatildeo jurisdicional verificar que a aplicaccedilatildeo das regras de
impenhorabilidade eacute desproporcional para o caso concreto deve afastaacute-la e construir a
soluccedilatildeo adequada para o referido caso Didier et al51 traz um exemplo esclarecedor em sua
obra
O bem imoacutevel que serve de moradia da famiacutelia eacute relativamente impenhoraacutevel Objetiva-se com essa restriccedilatildeo proteger o direito fundamental agrave moradia conteuacutedo do direito agrave proteccedilatildeo da dignidade Imagine-se um imoacutevel de altiacutessimo valor Imagine-se agora um creacutedito que corresponda a 40 do valor do imoacutevel A venda judicial do imoacutevel no caso permitiria natildeo soacute satisfazer o direito do credor como ainda garantir ao executado com a sobra a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel que lhe preserve a dignidade A opccedilatildeo pela interpretaccedilatildeo literal da regra que veda a penhora protegeria exclusivamente o direito do executado de maneira desnecessaacuteria porque a relaccedilatildeo valor executadovalor do bem permitiria a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel apoacutes a entrega do dinheiro ao credor Seria pois interpretaccedilatildeo em desconformidade com os preceitos da contemporacircnea hermenecircutica constitucional que preconiza a necessidade de nos casos de choque entre direitos fundamentais dar a interpretaccedilatildeo que mais adequadamente proteja a ambos
A execuccedilatildeo civil integra o direito fundamental agrave tutela jurisdicional disciplinando
que ldquoos dispositivos devem ser interpretados de modo que se garanta a maior efetividade
49 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66 50 Ibid p 66 51 Ibid p 67
22
possiacutevel agrave execuccedilatildeo desde que respeitados outros direitos fundamentaisrdquo52 Podendo ser
afastada desde que proporcional qualquer obstaacuteculo irrazoaacutevel agrave efetivaccedilatildeo desse direito
52 FERREIRA Gabriela Macedo apud MACEDO Lucas Buril de As eficaacutecias das decisotildees judiciais e
o cumprimento de sentenccedila no CPC15 Novo CPC Doutrina selecionada v 5 Execuccedilatildeo Coordenador geral Fredie Didier Jr organizadores Lucas Buril de Macedo Ravi Peixoto Alexandre Freire ndash Salvador Jus Podivm 2015 p 360361
23
3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO
EXECUTADO
31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS
Como forma de controlar a atividade jurisdicional por muito tempo vigorou o
entendimento de que a execuccedilatildeo somente poderia ser realizada atraveacutes dos meios executivos
tipicamente previstos na legislaccedilatildeo Segundo Luiz Guilherme Marinoni53
O princiacutepio da tipicidade deseja significar que os meios de execuccedilatildeo devem estar previstos na lei e assim que a execuccedilatildeo natildeo pode ocorrer atraveacutes de formas executivas natildeo tipificadas O seu objetivo eacute de um lado impedir que meio executivo natildeo previsto em lei possa ser utilizado e de outro garantir o jurisdicionado contra a possibilidade de arbiacutetrio judicial na fixaccedilatildeo da modalidade executiva Se o jurisdicionado sabe em razatildeo de previsatildeo legal que a sua esfera juriacutedica somente poderaacute ser invadida atraveacutes de determinadas modalidades executivas confere-se a ele a possibilidade de antever a reaccedilatildeo ao seu inadimplemento bem como a garantia de que a jurisdiccedilatildeo natildeo determinaraacute ou permitiraacute a utilizaccedilatildeo de meio executivo diverso daqueles previstos
Dessa forma o princiacutepio da tipicidade disciplina que o oacutergatildeo julgador ao proceder agrave
execuccedilatildeo estaacute limitado aos meios executivos previamente definidos em lei natildeo podendo se
valer de qualquer teacutecnica de efetivaccedilatildeo que natildeo se encaixasse nas hipoacuteteses taxativas da
legislaccedilatildeo
Entretanto o legislador natildeo tem como prever todas as peculiaridades dos direitos
dignos de tutela executiva e preordenar teacutecnicas executivas diversas para cada peculiaridade
Sob esse cenaacuterio o principio da tipicidade foi cedendo lugar ao principio da atipicidade dos
meios executivos
A ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do oacutergatildeo julgador estaacute cada vez mais presente
no ordenamento juriacutedico paacutetrio motivando um poder geral de efetivaccedilatildeo ldquoque permite ao
julgador valer-se dos meios executivos que considerar mais adequado ao caso concreto sejam
eles de coerccedilatildeo direta sejam de coerccedilatildeo indiretardquo 54
53 MARINONI Luiz Guilherme Teacutecnica processual e tutela dos direitos Satildeo Paulo Editora Revista
dos Tribunais 2004 p 212 nota 79 54 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 100
24
Essa tendecircncia de ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do juiz natildeo eacute exclusividade do
ordenamento juriacutedico brasileiro segundo Fredie Didier et al55
Michelle Taruffo jaacute apontava que o direito americano diante da inefetividade dos meios executivos at law comeccedilou a autorizar o magistrado a tomar medidas executivas adequadas ao caso concreto Trata-se afirma o jurista italiano de aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo segundo o qual as regras processuais devem ser adaptadas agraves necessidades do direito material
Os meios executivos atiacutepicos derivam de trecircs enunciados normativos do Coacutedigo de
Processo Civil o art 139 IV o art 297 e o sect1ordm do art 536
O art 139 IV do CPC dispotildee que pertence ao juiz o poder-dever de ldquodeterminar
todas as medidas indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para
assegurar o cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto
prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo
Jaacute o art 297 do CPC cuida da tutela provisoacuteria e garante que ldquoo juiz poderaacute
determinar as medidas que considerar adequadas para a efetivaccedilatildeo da tutela provisoacuteriardquo
Podendo dessa forma a dita tutela ser efetivada atipicamente
Por fim o art 536 sect1ordm do CPC dispotildee que
Para atender ao disposto no caput o juiz poderaacute determinar entre outras medidas a imposiccedilatildeo de multa a busca e apreensatildeo a remoccedilatildeo de pessoas e coisas o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva podendo caso necessaacuterio requisitar o auxilio de forccedila policial
As supracitadas medidas executivas atiacutepicas satildeo entendidas pela doutrina como
claacuteusulas gerais processuais executivas56 Essas claacuteusulas gerais natildeo restringem a sua
aplicaccedilatildeo agraves teacutecnicas de coerccedilatildeo indireta satildeo autorizados tambeacutem o uso de meios de execuccedilatildeo
dieta e indireta
Ademais cumpre salientar que o art 139 IV CPC aplica-se a toda e qualquer
atividade executiva ldquoa) seja fundada em tiacutetulo executivo judicial (provisoacuteria ou definitiva)
55 DIDIER JR Fredie et al apud TARUFFO Michelle A atuaccedilatildeo executiva dos direitos perfis
comparatiacutesticos Revista de Processo Satildeo Paulo RT 1990 n 59 p 78 56 Segundo Fredie Didier et al claacuteusula geral eacute uma espeacutecie de texto normativo cujo antecedente
(hipoacutetese faacutetica) eacute composto por termos vagos e consequente (efeito juriacutedico) eacute indeterminado
25
seja fundada em tiacutetulo executivo extrajudicial b) seja para efetivar prestaccedilatildeo pecuniaacuteria seja
para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer ou dar coisa distinta de dinheirordquo57
Jaacute o art 297 do CPC garante que a tutela provisoacuteria possa ser efetivada tambeacutem
atipicamente ldquoSucede que a atipicidade da tutela provisoacuteria segue necessariamente a
atipicidade da tutela definitivardquo 58
Por fim o comando do sect 1 ordmdo art 536 se aplica
a) inicialmente agrave execuccedilatildeo de fazer e de natildeo fazer fundada em decisatildeo judicial (provisoacuteria ou definitiva) b) por forccedila do sect 3ordm do art 538 tambeacutem se aplica ao cumprimento de sentenccedila para entrega de coisa c) por forccedila do art 771 paraacutegrafo uacutenico o dispositivo tambeacutem se aplica agrave execuccedilatildeo para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer e entregar coisa distinta de dinheiro fundada em tiacutetulo extrajudicial
Claramente o art 139 IV eacute mais amplo do que o sect 1 ordm do art 536 estende-se por
disposiccedilatildeo expressa agrave execuccedilatildeo de pagar quantia Sendo uma grande novidade nas obrigaccedilotildees
que tem por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15
O art 139 IV do CPC apresentou uma novidade agrave atipicidade dos meios executivos
ao disciplinar que cabe ao juiz ldquodeterminar todas as medidas indutivas coercitivas
mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o cumprimento de ordem judicial
inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo
A inovaccedilatildeo estaacute na possibilidade de utilizar os meios atiacutepicos para assegurar o
cumprimento de decisotildees que versam sobre as obrigaccedilotildees pecuniaacuterias sendo admitida a
utilizaccedilatildeo de outros meios ateacute na execuccedilatildeo de titulo judicial de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria aleacutem da
multa de 10 (a que se refere o artigo 523 sect 1ordm do CPC) para forccedilar o devedor a cumprir a
obrigaccedilatildeo pecuniaacuteria
57 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 105 58 Ibid p 105
26
Dessa forma eacute possiacutevel afirmar que ldquoao lado da disciplina tiacutepica do art 523 e
seguintes () o novo CPC inova ao permitir que o sistema de teacutecnicas executivas atiacutepicas
sejam empregadas na execuccedilatildeo monetaacuteriardquo59 (ZARONI VITORELLI 2016 p 66)
Fernando da Fonseca Gajardoni60 denomina a dita medida como a ldquorevoluccedilatildeo
silenciosardquo da execuccedilatildeo por quantia certa posto que
() pelo fato de que a regra natildeo estar propriamente incrustrada nos capiacutetulo e livro atinentes ao cumprimento de sentenccedila e ao processo de execuccedilatildeo ndash o art 139 IV do Novo CPC parece trazer ao paiacutes algo bastante novo cuja aplicaccedilatildeo a depender do comportamento do Judiciaacuterio pode implicar em verdadeira revoluccedilatildeo (positiva ou negativa) na sistemaacutetica executiva ateacute entatildeo vigente
Claramente o dispositivo foi recebido com entusiasmo por parte da doutrina que
anteciparam em afirmar que o princiacutepio da atipicidade dos meios executivos no CPC2015
ldquo() assume a feiccedilatildeo de poder-dever geral conferido ao magistrado de determinar () todas
as medidas coercitivas sub-rogatoacuterias mandamentais e indutivas que entender necessaacuterias
para a tutela justa efetiva e em tempo razoaacutevelrdquo 61
Dessa forma lecionam Luiz Guilherme Marinoni Seacutergio Cruz Arenhart e Daniel
Mitidiero62 que
O juiz a partir do art 139 IV do CPC2015 natildeo estaacute mais adstrito apenas agrave sentenccedila condenatoacuteria ndash que fixa a obrigaccedilatildeo de pagar e daacute ensejo agrave abertura da execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo patrimonial ndash para a tutela de prestaccedilotildees pecuniaacuterias Pode impor essa prestaccedilatildeo por meio de ordem judicial acoplada ao aceno de emprego de medida de induccedilatildeo (coercitiva ou de pressatildeo positiva) ou de medida de sub-rogaccedilatildeo (MARINONI ARENHARDT MITIDIERO 2015 p 703)
Deste modo em razatildeo do art 139 IV do CPC tem-se entendido que o juiz nas
execuccedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria possui a faculdade de adotar qualquer
59 ZARONI Bruno Marzullo VITORELLI Edilson Reforma e efetividade da execuccedilatildeo no novo CPC
In PEIXOTO Ravi FREIRE Alexandre MENDES Aluiacutesio Gonccedilalves de Castro Execuccedilatildeo 2 ed rev e atual Salvador JusPodivm 2016 766 p (Coleccedilatildeo novo CPC doutrina selecionada v 5) p 66
60 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia 24082015 JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Acesso em 23082018
61 LIMA Rafael de Oliveira A atipicidade dos meios executivos no coacutedigo de processo civil brasileiro de 2015 Revista de Processo Jurisdiccedilatildeo e Efetividade da Justiccedila v 2 n 2 juldez 2016 p 11
62 MARINONI Luiz Guilherme ARENHART Seacutergio Cruz MITIDIERO Daniel Novo curso de processo civil tutela dos direitos mediante procedimento comum Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 v 2 p 703
27
medida indutiva coercitiva mandamentais ou sub-rogatoacuterias para efetivar o creacutedito do
exequente natildeo se limitando as medidas tiacutepicas
Alguns doutrinadores se precipitaram ao afirmar que o dito dispositivo ldquo() autoriza o
juiz a utilizar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir ressalvando-se a prisatildeo
civil constitucionalmente limitada ao devedor de alimentosrdquo 63 Acreditam Jorge Bheron
Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa que o entusiasmo por parte da
doutrina abre margem para as mais variadas formas de compelir o devedor a cumprir com a
prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
ldquoE aiacute persistindo no mau vezo de fazer explicaccedilotildees em abstrato ignorando que o sentindo soacute se daacute na aplicaccedilatildeo (situaccedilatildeo concreta real ou fictiacutecia) as sugestatildeo satildeo as mais engenhosas suspensatildeo de CNH retenccedilatildeo de passaporte restriccedilatildeo de fim de semana cancelamento de cartotildees de creacutedito ndash para ficar apenas nestasrdquo 64
Ou seja podendo o juiz natildeo apenas substituir o devedor tomando seu patrimocircnio para
entregar ao credor na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia como tambeacutem poderaacute
pressionaacute-lo psicologicamente a adimplir por conta proacutepria a obrigaccedilatildeo
Ademais o Enunciado nordm 48 do ENFAM avalia expressamente a possibilidade de
imposiccedilatildeo de medidas coercitivas para a efetivaccedilatildeo da execuccedilatildeo pecuniaacuteria Conforme o dito
enunciado
ldquoO art 139 inciso IV traduz um poder geral de efetivaccedilatildeo permitindo a aplicaccedilatildeo de medidas atiacutepicas para garantir o cumprimento de qualquer ordem judicial inclusive no acircmbito do cumprimento de sentenccedila e no processo de execuccedilatildeo baseado em tiacutetulosrdquo
Dessa forma o artigo 139 IV do CPC permite uma gama ampla de interpretaccedilotildees por
parte da doutrina por ser uma claacuteusula geral encontrando limite apenas na imaginaccedilatildeo de
quem o analisa Nesse sentido eacute forccediloso orientar e delimitar o manejo desse artigo legal para
que se extraia seu sentido e alcance revelando assim sobre que situaccedilotildees ele incide de que
modo e o que permite
63 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
64 Ibid sem paginaccedilatildeo
28
32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER
GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
O artigo 139 IV com a vigecircncia do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 abriu margem
para uma constelaccedilatildeo de decisotildees nas quais o dito dispositivo recebeu diversas interpretaccedilotildees
pelos operadores do direito
Sem duacutevidas por ser uma das pioneiras a decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara
Ciacutevel do Foro Regional de Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-
1320138260011 na data de 25 de agosto de 2016 gerou um enorme rebuliccedilo
Nessa accedilatildeo que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto
uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a
suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o
passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito
Segundo a magistrada o processo tramitava haacute anos sem que nenhum valor tenha sido
pago ao exequente aleacutem do devedor natildeo ter oferecido proposta de acordo e nem ter indicado
bens agrave penhora configurando uma completa desiacutedia com o processo
ldquoO caso tratado nos autos se insere dentre as hipoacuteteses em que eacute cabiacutevel a aplicaccedilatildeo do art 139 inciso IV do Coacutedigo de Processo Civil Isso porque o processo tramita desde 2013 sem que qualquer valor tenha sido pago ao exequente Todas as medidas executivas cabiacuteveis foram tomadas sendo que o executado natildeo paga a diacutevida natildeo indica bens agrave penhora natildeo faz proposta de acordo e sequer cumpre de forma adequada as ordens judiciais frustrando a execuccedilatildeo
Se o executado natildeo tem como solver a presente diacutevida tambeacutem natildeo recursos para viagens internacionais ou para manter um veiacuteculo ou mesmo manter um cartatildeo de creacutedito Se poreacutem mantiver tais atividades poderaacute quitar a diacutevida razatildeo pela qual a medida coercitiva poderaacute se mostrar efetiva
Assim como medida coercitiva objetivando a efetivaccedilatildeo da presente execuccedilatildeo defiro o pedido formulado pelo exequente e suspendo a Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo do executado M A S determinando ainda a apreensatildeo de seu passaporte ateacute o pagamento da presente diacutevida
()
Determino ainda o cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado ateacute o pagamento da presente diacutevida ()rdquo
Foi impetrado Habeas Corpus no Tribunal de Justiccedila do Estado de Satildeo Paulo a favor
do executado sob o fundamento que a coaccedilatildeo era ilegal e afetava o direito de locomoccedilatildeo
29
garantido constitucionalmente Tendo sido concedida a liminar em decisatildeo que ora se
reproduz
Em que pese a nova sistemaacutetica trazida pelo art 139 IV do CPC2015 deve-se considerar que a base estrutural do ordenamento juriacutedico eacute a Constituiccedilatildeo Federal que em seu art 5ordm XV consagra o direito de ir e vir Ademais o art 8ordm do CPC2015 tambeacutem preceitua que ao aplicar o ordenamento juriacutedico o juiz natildeo atentaraacute apenas para a eficiecircncia do processo mas tambeacutem aos fins sociais e agraves exigecircncias do bem comum devendo ainda resguardar e promover a dignidade da pessoa humana observando a proporcionalidade a razoabilidade e a legalidade Por tais motivos concedo a liminar pleiteada65
Cabe destacar aqui o voto vencido da Desembargadora Maria Luacutecia Pizzotti no
julgamento do Habeas Corpus supracitado demonstrando que o debate sobre a abrangecircncia
do artigo 139 IV do CPC ocorre tanto na doutrina quanto no judiciaacuterio
O objetivo do novel dispositivo natildeo eacute impor penas ou restringir direitos natildeo sendo intenccedilatildeo do Judiciaacuterio suspender indefinidamente o direito de dirigir do executado ou sua liberdade de viajar mas sim impor uma restriccedilatildeo tatildeo gravosa caso ele natildeo cumpra a determinaccedilatildeo que escolha cumprir sua obrigaccedilatildeo e dar fim ao problema Em outras palavras mediante as medidas de coerccedilatildeo o Estado procura persuadir o inadimplente impondo-lhe situaccedilotildees tatildeo onerosas e inconvenientes que em algum momento seja para ele mais vantajoso cumprir do que permanecer no inadimplemento
Ao fazecirc-lo o Novo Coacutedigo de Processo Civil rompe com as criacuteticas da ineficiecircncia das execuccedilotildees Natildeo se cogita deferir medidas restritivas agravequeles que demonstram a incapacidade absoluta de solver o deacutebito apenas agravequeles que reconhecidamente se valem de artimanhas e subterfuacutegios para evitar a satisfaccedilatildeo das diacutevidas ldquopreferindordquo outras despesas mais lsquonobresrsquo agindo em nome de terceiros e fazendo escaacuternio dos credores e do proacuteprio Poder Judiciaacuterio (hellip)
Para tanto memoraacutevel a noccedilatildeo de que a medida em comento tem caraacuteter excepcional e encontra limites no plano da proporcionalidade como sustenta o ilustrado Magistrado paulista Fernando da Fonseca Gajardoni Professor Faculdade de Direito de Ribeiratildeo Preto da USP (in httpswwwjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 acesso em 091216 agraves 11h20min) E para anaacutelise da proporcionalidade a ponderaccedilatildeo deve observar os trecircs passos apontados pela doutrina a necessidade a adequaccedilatildeo e a proporcionalidade em sentido estrito
65 TJSP - Habeas Corpus Processo nordm 2183713-8520168260000 30ordf Cacircmara Direito Privado relator
Des Marcos Ramos j 290317
30
Ademais no entendimento de Jorge Amaury Maia Nunes e Guilherme Pupe de
Noacutebrega66 essa decisatildeo releva os perigos trazidos pelo art 139 IV do CPC ao confrontar
direitos constitucionalmente garantidos
De nossa parte entendemos que a liberdade de locomoccedilatildeo inserta no inciso XV do artigo 5ordm que abrange o direito de deixar o territoacuterio nacional sofre embaraccedilo indevido pela apreensatildeo de passaporte ou pela suspensatildeo da carteira nacional de habilitaccedilatildeo
()
Agrave luz da exposiccedilatildeo feita acima e em anaacutelise primeva sustentamos que o artigo 139 IV do CPC de 2015 estaacute a merecer declaraccedilatildeo de inconstitucionalidade sem reduccedilatildeo de texto para o fim de rechaccedilar a apreensatildeo de passaporte a suspensatildeo do direito de dirigir e a vedaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo em concurso ou em licitaccedilatildeo puacuteblicos como medidas passiacuteveis de serem adotadas pelo juiz sob pena de vulneraccedilatildeo aos artigos 1ordm IV 5ordm XV e LIV 37 I 173 sect 3ordm III e 175 todos da Constituiccedilatildeo
Apesar de ter sofrido duras criacuteticas a decisatildeo do processo de nordm 4001386-
1320138260011 serviu de inspiraccedilatildeo para tantas outras decisotildees no mesmo sentido
Foi o caso da decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de Satildeo
Vicente em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 0020724-2620088260590 na data de 21 de
junho de 2017
A supracitada execuccedilatildeo se arrastava por nove (09) anos sem que o devedor tenha
esboccedilado qualquer intenccedilatildeo de pagar a diacutevida O credor requereu a suspensatildeo da Carteira
Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado apreensatildeo do passaporte e cancelamento dos
cartotildees de creacutedito
O magistrado com embasamento no artigo 139 IV do CPC deferiu parcialmente o
pedido sob o fundamento de que a apreensatildeo de passaporte e CNH natildeo viola o direito de ir e
vir do devedor Entretanto o juiz indeferiu o pedido de cancelamento do cartatildeo de creacutedito por
acreditar que a suspensatildeo poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado tendo em
vista que atualmente as pessoas utilizam o referido cartatildeo para pagamento das despesas
diaacuterias
66 NOBREacuteGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139
IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018
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Eacute evidente que as medidas atiacutepicas de coerccedilatildeo devem ser utilizadas com cautela sempre respeitando a dignidade da pessoa do executado Natildeo se vislumbra contudo que as medidas aqui eleitas sejam capazes de vulnerar os Direitos Fundamentais do indiviacuteduo A uma porque natildeo se trata de restriccedilatildeo ao direito de ir e vir do executado que continua no gozo de plena liberdade de locomoccedilatildeo a duas porque a conduccedilatildeo de veiacuteculo automotor eacute mera comodidade da vida moderna natildeo se tratando de direito absoluto
Com mais razatildeo ainda se admite a suspensatildeo do Passaporte do executado que se natildeo paga a diacutevida da execuccedilatildeo natildeo deve ter o direito de fazer viagem internacional
Tem-se aqui verdadeiro exerciacutecio de ponderaccedilatildeo de interesses juriacutedicos de um lado jaz o direito de creacutedito do exequente que deriva do direito de propriedade e por isso mesmo tem envergadura constitucional de outro giro tem-se o direito do executado agrave autorizaccedilatildeo do Estado para conduzir veiacuteculo automotor e realizar viagens internacionais que natildeo se mostram essenciais agrave dignidade da pessoa humana Natildeo haacute duacutevidas pois de que eacute este uacuteltimo que deve sucumbir
O pedido fica indeferido apenas no tocante agrave suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado Eacute que ao contraacuterio da CNH e do passaporte que trazem consigo certa presunccedilatildeo de riqueza natildeo se pode concluir que o uso de cartatildeo de creacutedito eacute feito por luxo ou simples conveniecircncia
Como eacute cediccedilo os cartotildees de creacutedito oferecem ao seu titular creacutedito raacutepido e rotativo para o pagamento de despesas diaacuterias e certamente exercem funccedilatildeo essencial agravequeles que se encontram em situaccedilatildeo financeira precaacuteria
A suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado portanto se revela medida desproporcional e que inclusive poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado
Pelo exposto defiro em parte o pedido formulado pelo exequente e DETERMINO a suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo e bem como a suspensatildeo da validade (cancelamento temporaacuterio) no sistema SINPA de eventuais passaportes vaacutelidos em nome do executado
Dessa forma o artigo 139 IV do CPC revolucionou completamente a execuccedilatildeo de
obrigaccedilatildeo de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria ao permitir a utilizaccedilatildeo do uso dos meios executivos
atiacutepicos para compelir o executado a satisfazer o creacutedito do exequente
33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE
EFETIVACcedilAtildeO
Era inevitaacutevel que o artigo 139 IV do CPC gerasse todo tipo de reaccedilatildeo entre os
doutrinadores do processo civil e ateacute mesmo de outros ramos do direito devido a sua
capacidade de realizar uma completa inovaccedilatildeo na forma de se executar as obrigaccedilotildees de pagar
quantia Alguns o aplaudiram visualizando nele ldquouma luz no fim do tuacutenelrdquo outros o
criticaram vislumbrando as arbitrariedades que poderiam ser praticadas com embasamento no
referido dispositivo
32
As decisotildees suscitadas em linhas preteacuteritas auxiliaram para fervilhar ainda mais o
debate sobre o tema tendo em vista que por um lado poderia aumentar a efetividade das
execuccedilotildees por quantia no entanto por outro surgiam questionamentos a cerca da sua
constitucionalidade
A doutrina parece que demoraraacute a se pacificar sobre o tema Segundo alguns
doutrinadores seraacute inconstitucional toda restriccedilatildeo que recaia sobre a pessoa do devedor e natildeo
exclusivamente sobre o seu patrimocircnio Jaacute para outros o dispositivo eacute constitucional e o meio
mais eficaz para se resolver o problema da efetivaccedilatildeo das execuccedilotildees de pagar quantia ldquoA
discussatildeo se daacute especialmente no que diz respeito aacutes medidas de suspensatildeo de CNH
apreensatildeo de passaporte e bloqueio de cartotildees de creacutedito do devedorrdquo 67
O professor Thiago Rodovalho analisou detalhadamente a decisatildeo de nordm 4001386-
1320138260011 em seu artigo ldquoO necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na
concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivosrdquo 68 Quanto agrave suspensatildeo da CNH o autor
acredita que tal medida natildeo viola qualquer direito fundamental do devedor posto que ldquodirigir
veiacuteculos automotores eacute direito do cidadatildeo mas natildeo se confunde com os direitos fundamentais
e social de ir-e-vir e ao transporterdquo 69 O professor eacute categoacuterico ao afirmar que
Com relaccedilatildeo agrave suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (suspensatildeo do direito de dirigir restriccedilatildeo de direitos) natildeo nos parece haver qualquer violaccedilatildeo a direito fundamental ou social nem a direito da personalidade ou colocaccedilatildeo do devedor em situaccedilatildeo desproporcionalmente detrimentosa exceccedilatildeo feita aos que usam o veiacuteculo como instrumento de trabalho atraindo a hipoacutetese do NCPC art 833 inc V
()
Outrossim natildeo o consideramos como direito da personalidade Os direitos da personalidade satildeo os valores fundamentais que compotildeem o proacuteprio ser justamente por isso intransmissiacuteveis e irrenunciaacuteveis natildeo podendo o seu exerciacutecio sofrer limitaccedilatildeo voluntaacuteria (CC art 11) Por mais que vivamos num paiacutes que tanto valoriza o carro e que muitas pessoas de fato se compreendam em razatildeo e em funccedilatildeo do carro que dirijam este natildeo nos parece ser um direito que verdadeiramente componha a personalidade do indiviacuteduo70
67 DONTOS Sofia Poderes executoacuterios do juiz que diz a doutrina sobre o art 139 inc IV do CPC
Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigospoderes-executorios-do-juiz-que-diz-a-doutrina-sobre-art-139-inc-iv-do-cpc-23052018 gt Publicado em 23052018 Acesso em 01082018
68 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018
69 Ibid sem paginaccedilatildeo 70 Ibid sem paginaccedilatildeo
33
Quanto ao cancelamento dos cartotildees de credito do devedor o professor Thiago
Rodovalho tambeacutem acredita que natildeo haacute qualquer violaccedilatildeo ao direito fundamental social ou
da personalidade do devedor e acrescenta que
Tanto assim o eacute que ser titular de um cartatildeo de creacutedito pressupotildee ter creacutedito o que eacute analisado e concedido por instituiccedilotildees financeiras mais do que isso se porventura passando por dificuldades financeiras a pessoa deixa de honrar com pagamentos a mesma instituiccedilatildeo financeira concedente do cartatildeo de creacutedito pode sponte propria cancelaacute-lo ou recusar-lhe a concessatildeo Ora parece-me contraditoacuterio que instituiccedilotildees financeiras para sua proteccedilatildeo patrimonial possam ferir esse suposto ldquodireito fundamentalrdquo ou esse suposto ldquodireito da personalidaderdquo mas natildeo possa o Poder Judiciaacuterio igualmente fazecirc-lo contra aquele devedor moroso que instado ao pagamento e frustradas todas as tentativas de constriccedilatildeo patrimonial leva vida luxuosa valendo-se de cartotildees de creacutedito que prescindem de dinheiro em conta eacute dizer podem justamente funcionar como forma de ocultar renda e patrimocircnio71
O autor considera a apreensatildeo de passaporte um tema mais polecircmico e que merece
maior reflexatildeo No entanto crecirc que eacute possiacutevel a apreensatildeo de passaporte sem violar os
direitos fundamentais do devedor por se tratar de um direito de ir e vir de amplitude especial
Agrave primeira vista a possibilidade de apreensatildeo do passaporte tambeacutem nos parece possiacutevel pois tambeacutem se trata de um direito de ir e vir de amplitude especial Assim o eacute pois salvo situaccedilotildees especiais (refugiados p ex) haacute a necessidade de demonstrar condiccedilotildees financeiras de estadia e retorno para ser admitido no paiacutes de destino Ou seja pressupotildee uma condiccedilatildeo financeira que o devedor justamente diz natildeo possuir Sem embargo dessa consideraccedilatildeo esse ainda eacute um ponto que merece uma reflexatildeo mais acurada sendo essa apenas uma primeira impressatildeo72
Outros autores escreveram sobre o tema como eacute o caso do processualista Luiz
Dellore73 que tambeacutem defende que as medidas atiacutepicas como restriccedilatildeo ao direito de dirigir
apreensatildeo de passaporte e cancelamento de cartotildees de creacutedito satildeo permitidas e natildeo violam em
regra os direitos fundamentais do devedor
De minha parte creio que efetivamente haacute inovaccedilatildeo no at 139 IV do NCPC (e natildeo mera repeticcedilatildeo do que jaacute havia no Coacutedigo anterior) que tem o condatildeo de trazer mais efetividade ao processo executivo no Brasil ndash que por deacutecadas centrou sua atenccedilatildeo na defesa do executado (vide a grande quantidade de impenhorabilidades) sem dar maior atenccedilatildeo ao creacutedito do exequente
71 Ibid sem paginaccedilatildeo 72 Ibid sem paginaccedilatildeo 73 DELLORE Luiz NCPC Atipicidade das medidas executivas jaacute eacute realidade Disponiacutevel em lt
httpswwwjotainfoopiniao-e-analisecolunasnovo-cpcncpc-atipicidade-de-medidas-executivas-ja-e-realidade-17042017 gt Publicado em 17042017 Acesso em 03092018
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Logo a meu ver medidas como (i) restriccedilatildeo ao direito de dirigir (ii) apreensatildeo de passaporte (iii) cancelamento de cartotildees de creacutedito e (iv) vedaccedilatildeo de obtenccedilatildeo de novos empreacutestimos se natildeo vinculados ao pagamento do deacutebito exequendo dentre outras restriccedilotildees que deveratildeo ser observadas a cada caso satildeo permitidas pelo sistema do NCPC e em regra natildeo violam direitos fundamentais do devedor E tecircm o condatildeo de fazer com que o executado que tem recursos diante dessas medidas coercitivas pague o deacutebito trazendo sucesso agrave satisfaccedilatildeo do creacutedito
Nessa linha para Alexandre Fuchs das Neves74 o artigo 139 IV do CPC conferiu ao
juiz poderes coercitivos capazes de ldquotransformar a vida do devedor um infernordquo para compeli-
lo a cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria Entretanto pondera que para que a medida tenha
validade ldquoeacute necessaacuteria uma fundamentaccedilatildeo por evidente uma correlaccedilatildeo temaacutetica entre a
medida adotada e sua efetividade em face ao processo com fundamentaccedilatildeo detalhadardquo
No entendimento de Fernando Gajardoni75 satildeo possiacuteveis as medidas de apreensatildeo de
passaporte bloqueio de cartotildees de creacutedito e suspensatildeo da CNH Para ele o que limita o art
139 IV do CPC eacute o esgotamento dos meios tiacutepicos e a real necessidade da medida
Ilustrativamente natildeo efetuado o pagamento de diacutevida oriunda de multas de tracircnsito e superados os expedientes tradicionais de adimplemento (penhora de dinheiro e bens) seria liacutecito o estabelecimento da medida coercitivaindutiva de suspensatildeo do direito a conduzir veiacuteculo automotor ateacute pagamento do deacutebito (inclusive com apreensatildeo da CNH do devedor) natildeo efetuado pagamento de verbas salariais devidas a funcionaacuterios da empresa possiacutevel o estabelecimento de vedaccedilatildeo agrave contrataccedilatildeo de novos funcionaacuterios ateacute que seja saldada a diacutevida natildeo efetuado o pagamento de financiamento bancaacuterio na forma e no prazo avenccedilados possiacutevel ateacute que se tenha a quitaccedilatildeo que se obstem novos financiamentos ou mesmo a participaccedilatildeo do devedor em licitaccedilotildees (como de ordinaacuterio jaacute acontece com pessoas juriacutedicas em deacutebito tributaacuterio com o Poder Puacuteblico) etc
Teriacuteamos entatildeo no Brasil por assim dizer a adoccedilatildeo do padratildeo da atipicidade das medidas executivas tambeacutem para as obrigaccedilotildees de pagar vistas estas como ordens do EstadoJuiz para que haja prestaccedilatildeo de pagamento em pecuacutenia
()
Por isso ndash a prevalecer a interpretaccedilatildeo potencializada do art 139 IV do CPC2015 ndash o emprego de tais medidas coercitivasindutivas especialmente nas obrigaccedilotildees de pagar encontraraacute limite certo na excepcionalidade da medida (esgotamento dos meios tradicionais de satisfaccedilatildeo do deacutebito) na proporcionalidade (inclusive agrave luz da regra da menor onerosidade ao devedor do art 805 do CPC2015) na necessidade de fundamentaccedilatildeo substancial e especialmente nos direitos e garantias assegurados na Constituiccedilatildeo Federal (vg natildeo parece possiacutevel que se determine o pagamento sob pena de prisatildeo ou de vedaccedilatildeo ao exerciacutecio da profissatildeo do direito de ir e vir etc)
74 NEVES Alexandre Fuchs das Cancelamento de cartotildees de creacutedito e apreensatildeo de CNH e passaporte
do devedor Isso eacute possiacutevel Disponiacutevel em lt httpwwwsinfacspcombrconteudocancelamento-de-cartoes-de-credito-e-apreensao-de-cnh-e-passaporte-do-devedor-isso-e-possivel gt Acesso em 30082018
75 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Publicado em 24082015 Acesso em 30082018
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Jaacute Fernanda Tartuce76 acredita que tais medidas satildeo problemaacuteticas e devem ser
analisadas com cautela tendo em vista que ao inveacutes de afetarem o patrimocircnio do devedor
atingem a proacutepria pessoa
Sob certo prisma adotar medidas diferenciadas contribui para a efetividade da prestaccedilatildeo jurisdicional Por outro lado o patrimocircnio ndash e natildeo a pessoa do devedor - responde por diacutevidas aleacutem disso o exerciacutecio de amplos poderes pelo juiz sem balizas especiacuteficas pode ensejar medidas inadequadas Nessa linha suspender o direito de dirigir e restringir o uso de passaporte satildeo iniciativas problemaacuteticas por atingirem a pessoa do devedor enquanto a penhora da restituiccedilatildeo de Imposto de Renda soa viaacutevel por afetar seu patrimocircnio Eacute importante que a medida diferenciada se revele proporcional e seja aplicada apoacutes o exaurimento de outros meios previstos no ordenamento Como a proposta do Novo Coacutedigo eacute aumentar a eficiecircncia processual intentar medidas ineficazes inexequiacuteveis eou de difiacutecil fiscalizaccedilatildeo pode acabar ensejando o efeito contraacuterio
Nessa senda Lenio Streck e Dierle Nunes77 entendem que as medidas atiacutepicas de
suspensatildeo da CNH eou apreensatildeo de passaporte satildeo inconstitucionais Afirmam que natildeo se
pode confundir o processo civil e penal ainda que ambos remetam a um ldquoparadigma
constitucional comumrdquo e que o artigo 139 IV do CPC ldquoimpotildee novos desafios interpretativos
que podem conduzir a uma anaacutelise superficial e utilitarista de busca de resultados que
desprezem a necessaacuteria leitura constitucionalrdquo Os autores ainda ponderam que ldquoO perigo eacute o
artigo 139 IV ser transformado em instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com
autorizaccedilatildeo judicialrdquo
O professor Araken de Assis no dia 18 de abril de 2018 em um evento sobre o
Coacutedigo Processual Civil de 2015 que ocorreu em Brasiacutelia na sede do Conselho Federal da
OAB declarou ser contraacuterio aos poderes executoacuterios atiacutepicos ldquoSou contra os poderes
atiacutepicos dos juiacutezes porque seu exerciacutecio redunda em simples arbitrariedadesrdquo78
Acrescentou ainda que
76 IBDFAM ndash Instituto Brasileiro de Famiacutelia O polecircmico inciso IV do artigo 139 do CPC e suas difusas
interpretaccedilotildees Disponiacutevel em lt httpwwwibdfamorgbrnoticias6096O+polC3AAmico+inciso+IV+do+artigo+139+do+CPC+e+suas+difusas+interpretaC3A7C3B5es gt Publicado em 31082016 Acesso em 04092018
77 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018
78 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04092018
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Eacute evidentemente inconstitucional diante do princiacutepio da dignidade da pessoa humana tirar o passaporte carteira de habilitaccedilatildeo Quecirc que tem isso com diacutevidas Natildeo tem absolutamente nada Natildeo eacute a correlaccedilatildeo instrumental entre o objetivo da execuccedilatildeo e o meio empregado Isso eacute simples vinganccedila simples puniccedilatildeo79
O professor Araken de Assis acredita que tais medidas satildeo inconstitucionais e
violam o principio da dignidade humana do executado numa sociedade como a nossa
sedenta por puniccedilatildeo natildeo me surpreende que essas ideias sejam encaradas com
naturalidade Mas eacute preciso rejeitaacute-las em nome de princiacutepios 80
34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
A Constituiccedilatildeo Federal de 1988 tem como um dos seus fundamentos a dignidade da
pessoa humana presente no artigo 1ordm inciso III do referido texto constitucional O dito
princiacutepio tem o escopo de nortear o ordenamento juriacutedico como um todo
A inclusatildeo da dignidade da pessoa humana como princiacutepio constitucional obrigou
uma reflexatildeo sobre o papel da pessoa humana no direito e um redimensionamento para
elevaacute-la ao centro do ordenamento juriacutedico81 Eacute necessaacuterio recorrer agrave teoria Kantiana para
que se obtenha uma definiccedilatildeo do princiacutepio ora estudado Para Kant82 o homem eacute um fim
em si mesmo natildeo uma funccedilatildeo do Estado Ou Naccedilatildeo O Estado e o direito devem estar
organizados em benefiacutecio do indiviacuteduo
Agora eu afirmo o homem ndash e de uma maneira geral todo o ser racional ndash existe como fim em si mesmo e natildeo apenas como meio para o uso arbitraacuterio desta ou daquela vontade Em todas as suas accedilotildees pelo contraacuterio tanto nas direcionadas a ele mesmo como nas que o satildeo a outros seres racionais deve ser ele sempre considerado simultaneamente como fim
Partindo da premissa de que para Immanuel Kant o homem eacute o fim em si mesmo
ldquodevemos compreender que a dignidade da pessoa humana eacute a noccedilatildeo o comando a direccedilatildeo
que se deve seguir funcionando como fundamento para a interpretaccedilatildeo de todos os direitos e
garantias conferidos agrave pessoa nos ordenamentos juriacutedicos de cada Estadordquo 83
79 Ibid sem paginaccedilatildeo 80 Ibid sem paginaccedilatildeo 81 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito
fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 461 82 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud KANT Immanuel Fundamentaccedilatildeo da metafiacutesica dos costumes
Satildeo Paulo Martin Claret 2003 p56-59 Coleccedilatildeo A Obra-Prima de Cada Autor 83 SCHIAFIANO Juliana Rocha op cit p 461
37
O princiacutepio constitucional da dignidade da pessoa humana estaacute diretamente ligado ao
conteuacutedo dos direitos fundamentais logo para que se cumpra com os direitos fundamentais
constitucionalmente instituiacutedos eacute necessaacuterio reconhecer e respeitar a dignidade da pessoa
humana conforme disciplina Ingo Sarlet84
Em suma o que se pretende sustentar de modo mais enfaacutetico eacute que a dignidade da pessoa humana na condiccedilatildeo de valor (principio normativo) fundamental que atrai o conteuacutedo de todos os direitos fundamentais exige e pressupotildee o reconhecimento e proteccedilatildeo dos direitos fundamentais de todas as dimensotildees (ou geraccedilotildees se assim preferirmos) Assim sem que se reconheccedilam agrave pessoa humana os direitos fundamentais que lhe satildeo inerentes em verdade estarse-aacute lhe negando a proacutepria dignidade A consagraccedilatildeo constitucional da dignidade da pessoa humana tem o propoacutesito de limitar a atuaccedilatildeo ou a omissatildeo do Estado para garantir os direitos do indiviacuteduo Assim eacute difiacutecil precisar os efeitos da norma que determina a dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado (como acontece com a Constituiccedilatildeo brasileira de 1988) poreacutem quando desrespeitados os direitos fundamentais do cidadatildeo eacute possiacutevel identificar que a dignidade deste foi violada
Logo ldquoteraacute respeitada a sua dignidade o individuo que tiver respeitados os seus
direitos fundamentaisrdquo 85 Os direitos fundamentais estatildeo apresentados na Constituiccedilatildeo
Federal da seguinte forma direitos individuais e coletivos direitos sociais direitos poliacuteticos e
direitos de nacionalidade que tecircm como escopo garantir as liberdades positivas aos
indiviacuteduos ldquoonde foram conquistados direitos agrave liberdade religiosa liberdade civil e
profissional agrave propriedade ao livre acesso ao Judiciaacuterio agrave ampla defesa e ao contraditoacuterio no
processual judicial ao sigilo de dados e informaccedilotildees pessoais entre outros que somados
garantem o cidadatildeo uma vida dignardquo 86
O cidadatildeo na Constituiccedilatildeo Federal de 88 diferente das constituiccedilotildees brasileiras
anteriores passou a ser fundamento e ganhou destaque nos direitos fundamentais tendo
garantida a sua vida a sua dignidade a sua seguranccedila a sua honra a sua liberdade e a sua
propriedade
84 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud SARLET Ingo Wolfgang Dignidade da pessoa humana e
direitos fundamentais na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 2ed Porto Alegre Livraria do Advogado 2002 p87 85 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito
fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 462 86 Ibid p 462
38
Segundo Carmem Luacutecia Antunes Rocha87 para garantir o Estado Democraacutetico de
Direito eacute necessaacuterio que a sua atuaccedilatildeo seja sempre em conformidade com o princiacutepio da
dignidade da pessoa humana
O Estado somente eacute democraacutetico em sua concepccedilatildeo constitucionalizaccedilatildeo e atuaccedilatildeo quando respeita o princiacutepio da dignidade da pessoa humana Natildeo haacute verbo constitucional natildeo haacute verbo governamental que se faccedilam legiacutetimos quando natildeo se voltam ao atendimento daquele princiacutepio Natildeo haacute verdade constitucional natildeo haacute suporte institucional para as poliacuteticas puacuteblicas que natildeo sejam destinadas ao pleno cumprimento daquele valor maior transformado em princiacutepio constitucional
O princiacutepio da dignidade humana constitucionalmente garantido impotildee limites ao
Estado compelindo aos oacutergatildeos e atividades estatais respeitar o ser humano e garanti-lo
condiccedilotildees miacutenimas para uma vida digna Dessa forma eacute niacutetido que o dito princiacutepio eacute
pressuposto e indispensaacutevel para legitimar outras normas constitucionais e
principalmente infraconstitucionais
O Coacutedigo de Processo Civil eacute umas das principais normas infraconstitucionais que
sofre influecircncia dos preceitos valores e princiacutepios esculpidos na Constituiccedilatildeo Federal
Logo como o principio da dignidade humana eacute um dos mais importantes pressupostos
constitucionais ldquoentatildeo eacute tranquilo afirmar-se que o novel ordenamento processual tem
de se render nas resoluccedilotildees dos aspectos processuais e a fim de se atingir uma soluccedilatildeo
justa adequada e efetiva ao postulado da dignidade da pessoa humanardquo 88
Dessa forma o legislador deve formular as normas infraconstitucionais de acordo e a
partir do conteuacutedo constitucional para Marinoni Mitidiero e Arenhart89
() o Coacutedigo de Processo Civil constitui direito constitucional aplicado O Coacutedigo deve ser interpretado de acordo com a Constituiccedilatildeo e com os direitos fundamentais o que significa que as duacutevidas interpretativas devem ser resolvidas a favor da otimizaccedilatildeo do alcance da Constituiccedilatildeo e do processo civil como meio para tutela de direitos
87 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud ROCHA Carmen Luacutecia Antunes O princiacutepio da dignidade da
pessoa humana e a exclusatildeo social Revista Interesse Puacuteblico n4 p23-48 1999 p33 88 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o
novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 367
89 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 14
39
Com o escopo de conferir eficaacutecia aos mandamentos constitucionais o CPC15 traz a
previsatildeo e diversas claacuteusulas gerais em seus primeiros artigos em um dos quais se
prestigia o princiacutepio da dignidade da pessoa humana
O referido princiacutepio estaacute disciplinado no artigo 8ordm do CPC15 e atua como um guia
sobre as demais normas do coacutedigo processual Eacute o que entende Nelson Rosenvald90
O maior cuidado do inteacuterprete eacute no sentido de jamais banalizar a dignidade fazendo dela um elixir processual tal como muitas vezes se vecirc na esfera do direito civil Penso que natildeo haacute maiores dificuldades em transpor a noccedilatildeo constitucional do princiacutepio para em seguida adaptaacute-la agraves singularidades do processo
Logo de acordo com o artigo 8ordm do CPC o oacutergatildeo julgador ao aplicar o ordenamento
juriacutedico deve resguardar a dignidade da pessoa humana Para Fredie Didier91 ldquoresguardar
nesse contexto eacute de um lado aplicar corretamente a norma juriacutedica lsquoproteccedilatildeo da dignidade
da pessoa humanarsquo e de outro natildeo violar a dignidaderdquo
O oacutergatildeo julgador deveraacute manter um comportamento ativo com o objetivo de promover
a dignidade da pessoa humana podendo tomar medidas de ofiacutecio para efetivar a dignidade da
pessoa humana Didier assevera que o magistrado poderaacute ainda ldquovaler-se da claacuteusula geral de
atipicidade (art 536 sect 1ordm) para a execuccedilatildeo do direito fundamental agrave dignidaderdquo 92 O autor
ainda traz dois exemplos
a) exigecircncia de respeito agrave ordem cronoloacutegica de conclusatildeo (art 12) caso de grave violaccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana que natildeo se encaixe em um dos incisos que excepcionam a regra de observacircncia da cronologia da conclusatildeo poderia o juiz ldquofurar a filardquo para promover a dignidade da pessoa humana b) prioridade na tramitaccedilatildeo processual pessoa que seja portadora de doenccedila grave mas que natildeo esteja no rol do art 1048 I para promover a dignidade de pessoa humana o juiz poderia determinar o processamento prioritaacuterio93
Essa dupla garantia ndash resguardo e promoccedilatildeo ndash tem como objetivo garantir ao individuo
sua dignidade humana fazendo com que ldquode um lado que o Estado natildeo a viole e de outro
que o Estado a promova e efetiverdquo
90 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud ROSENVALD Nelson A
dignidade da pessoa humana no CPC15 91 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte
geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 75 92 Ibid p 75 93 Ibid p 75
40
Nessa senda o magistrado deveraacute promover a dignidade da pessoa humana quando
perceber a ausecircncia desta no processo ou assegura-la quando for posta em risco Eacute nesse
sentido o entendimento dos professores Marinoni Mitidiero e Arenhart94
() a dignidade da pessoa humana determina a compreensatildeo do processo civil como um meio para tutela dos direitos Vale dizer o processo civil natildeo pode ser visto como um instrumento a serviccedilo do Estado como um instrumento que natildeo se encontre orientado agrave realizaccedilatildeo dos fins da pessoa humana Em outras palavras o processo civil serve para realizaccedilatildeo dos direitos e para orientaccedilatildeo das pessoas a respeito do significado do direito
Nessa senda compete tanto ao juiz quanto as demais partes processuais garantirem ldquoo
valor intriacutenseco de cada vida que eacute trazida ao processordquo nas palavras de Alexandre Freitas
Cacircmara95
() aos sujeitos do processo eacute preciso sempre ter claro que os titulares dos interesses em conflitos satildeo pessoas reais cujas vidas seratildeo afetadas pelo resultado do processo e que por isso mesmo tecircm o direito de estabelecer suas estrateacutegias processuais de acordo com aquilo que lhes pareccedila melhor para suas vidas Eacute inadmissiacutevel tratar as partes como se natildeo fossem pessoas reais meros dados estatiacutesticos Afinal se para o Judiciaacuterio cada processo pode parecer apenas mais um processo para as partes cada processo pode ser o uacutenico o mais relevante aquele em que sua vida seraacute decidida E eacute dever do juiz assegurar que isto seja respeitado
Dessa forma eacute necessaacuterio que um arcabouccedilo normativo para que seja conferida
eficaacutecia e proteccedilatildeo ao principio da dignidade da pessoa humana
Logo o dito princiacutepio deve ser protegido em todas as esferas do ordenamento juriacutedico
inclusive no campo da execuccedilatildeo civil onde sofre grandes riscos de ser violado em nome do
direito fundamental agrave tutela executiva do credor ldquoPartir da premissa de que existe um direito
fundamental agrave tutela executiva ora ratificado pelo CPC eacute indispensaacutevel para a soluccedilatildeo de
diversos problemas oriundos do procedimento executivo principalmente aqueles relacionados
agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo 96
94 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme
MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 25
95 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CAcircMARA Alexandre Freitas O Novo Processo Civil Brasileiro 2 ed Satildeo Paulo Atlas 2016 p 7
96 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66
41
Eacute o caso por exemplo da impenhorabilidade Segundo Fredie Didier et al97 a
impenhorabilidade eacute uma forma de proteger certos bens do devedor do direito fundamental a
execuccedilatildeo do credor
Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa
Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais
O legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do CPC fazendo um
preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses em anaacutelise ao optar pela mitigaccedilatildeo do direito
do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado Afinal ldquoa execuccedilatildeo natildeo pode ser utilizada
como instrumento para causar a ruiacutena a fome e o desabrigo do devedor e sua famiacutelia gerando
situaccedilotildees incompatiacuteveis com a dignidade da pessoa humana 98
Logo a impenhorabilidade de certos bens
[] Eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa99
Eacute nesse sentido que o CPC15 enumera diversos casos de bens patrimoniais que satildeo
impenhoraacuteveis como o salaacuterio e vencimentos utensiacutelios necessaacuterios ao exerciacutecio da
profissatildeo seguro de vida vestuaacuterios e pertences de uso pessoal entre outros
Dessa forma as regras relativas agraves medidas executivas devem ser interpretadas agrave luz
da Constituiccedilatildeo Federal ldquovez que se voltam agrave realizaccedilatildeo de direitos fundamentais e em sua
97 Ibid p 66 98 THEODORO JUacuteNIOR Humberto Novo Coacutedigo de Processo Civil Anotado 20 ed Rio de Janeiro
Forense 2016 p 978 99 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud DIDIER JR Fredie CUNHA
Leonardo Carneiro da BRAGA Paula Sarno OLIVEIRA Rafael Alexandria de Curso de direito processual civil 3 ed Salvador JusPodivm 2011 v 5 p 547
42
realizaccedilatildeo podem atingir direitos fundamentaisrdquo 100 O Superior Tribunal de Justiccedila jaacute decidiu
que
O rol das impenhorabilidades do ordenamento paacutetrio objetiva preservar o miacutenimo patrimonial necessaacuterio agrave existecircncia digna do executado impondo ao processo executoacuterio certos limites Assim a depender das peculiaridades do caso as regras de impenhorabilidade podem ser ampliadas de modo a adequar a tutela aos direitos fundamentais como por exemplo o direito agrave moradia agrave sauacutede ou agrave dignidade da pessoa humana Trata-se portanto da aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo e da necessidade sob o enfoque da proporcionalidade101 (STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014)
Logo a interpretaccedilatildeo dos dispositivos que tratam sobre a penhora no CPC deve estaacute
diretamente ligada aos ditames constitucionais devendo o interprete privilegiar a opccedilatildeo que
esteja mais em sintonia com a Carta Magna para que nem o credor e nem o devedor sejam
lesados
O artigo 833 do CPC elenca uma seacuterie de incisos que expotildeem os bens impenhoraacuteveis
O trecho inicial inciso I do art 833 define como impenhoraacuteveis os bens inalienaacuteveis Este
inciso segue a regra de que ldquose o bem natildeo pode ser alienado tambeacutem natildeo pode ser penhorado
porque a penhora eacute o primeiro ato do procedimento de alienaccedilatildeo judicial do bemrdquo 102
Satildeo exemplos de bens inalienaacuteveis os puacuteblicos cuja alienaccedilatildeo depende de autorizaccedilatildeo
legislativa Eacute inalienaacutevel tambeacutem o capital constituiacutedo para garantir indenizaccedilatildeo de ato iliacutecito
(art 533 sect 1 ordm CPC) que portanto eacute tambeacutem impenhoraacutevel ldquoTodo bem inalienaacutevel eacute
impenhoraacutevel embora nem todo bem impenhoraacutevel seja inalienaacutevelrdquo 103
O inciso I do art 833 CPC tambeacutem consagra a impenhorabilidade dos bens que por
ato voluntaacuterio satildeo excluiacutedos da execuccedilatildeo
Segundo Fredie Didier et al104
Eacute o que ocorre nos casos de bens doados ou alienados com claacuteusula de inalienabilidade que haacute de constar no registro imobiliaacuterio para ser eficaz perante o exequente e minimizar o risco de fraude A propoacutesito eis a redaccedilatildeo do art 1911 do Coacutedigo Civil lsquolsquoA claacuteusula de inalienabilidade imposta aos bens por ato de liberalidade implica impenhorabilidade e incomunicabilidaderdquo
100 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MEDINA Joseacute Miguel Garcia
Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 1 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 p 736 101 STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014 102 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 824 103 Ibid p 824 104 Ibid p 825
43
O inciso II por sua vez estabelece que satildeo impenhoraacuteveis os bens moacuteveis os
pertences e as utilidades domeacutesticas da residecircncia do executado Todavia excepcionam-se os
bens dessa natureza que sejam de elevado valor ou que ultrapassem as necessidades comuns
correspondentes a um meacutedio padratildeo de vida
A jurisprudecircncia natildeo eacute paciacutefica sobre o assunto logo natildeo exista uma relaccedilatildeo de bens
que podem ser atingidos pela penhora Abrindo margem para as mais variadas decisotildees
O STJ jaacute considerou impenhoraacuteveis aparelho de televisatildeo a cores mesa de centro passadeira raacutedio toca-fitas gravador microondas ar-condicionado um freezer um microcomputador com acessoacuterios uma impressora etc Poderatildeo ser penhorados porque ultrapassam o padratildeo-meacutedio aparelhos de TV mais sofisticados o segundo aparelho de televisatildeo a segunda geladeira aparelhos de ar-condicionado que satildeo verdadeiras peccedilas de design moacuteveis antigos que se transformam em peccedilas de decoraccedilatildeo faqueiro de prata adega climatizada etc Em entendimento de caraacuteter ainda mais geneacuterico jaacute restou consignado em determinado precedente que a proteccedilatildeo natildeo abrangeria apenas os bens indispensaacuteveis agrave moradia mas tambeacutem aqueles usualmente encontrados em um lar105
Ademais o inciso III do art 833 do CPC traz a impenhorabilidade dos vestuaacuterios bem
como os pertences de uso pessoal do executado salvo se de elevado valor
Segundo Fredie Didier et al106 o dispositivo possui dois propoacutesitos
de um lado preservar a dignidade do executado com a proteccedilatildeo de bens moacuteveis importantes para a sua sobrevivecircncia digna como o vestuaacuterio aparelho celular reloacutegio e os bens relacionados agrave sua higiene pessoal de outro lado a regra visa prestigiar a boa-feacute processual impedindo a execuccedilatildeo mesquinha e abusiva com a penhora de bens de pequeno ou nenhum valor como um pente ou uma bota
O inciso IV do art 833 do CPC consagra uma das mais importantes modalidades a
impenhorabilidade relativa aos rendimentos de natureza alimentar ldquoTrata-se de regra que
possui o claro propoacutesito de proteger o executado garantindo-lhe o recebimento de valores que
servem ao pagamento das despesas relacionadas agrave sua sobrevivecircncia digna e agrave da sua famiacuteliardquo 107
Jaacute inciso V do art 833 do CPC torna impenhoraacuteveis os livros as maacutequinas as
ferramentas os utensiacutelios os instrumentos ou outros bens moacuteveis necessaacuterios ou uacuteteis ao
exerciacutecio de qualquer profissatildeo 105 Ibid p 826 106 Ibid p 827 107 Ibid p 828
44
Por forccedila do paraacutegrafo 3ordm do art 833 satildeo igualmente impenhoraacuteveis os equipamentos
implementos e maacutequinas agriacutecolas pertencentes agrave pessoa fiacutesica ou a empresa individual
produtora rural Rodrigo Mazzei e Sarah Merccedilon108 esclarecem que
Tem assento na noccedilatildeo de que a dignidade estende-se tambeacutem ao exerciacutecio da profissatildeo em si mesma e tambeacutem por representar a forma por excelecircncia de que dispotildee o executado para continuar a receber sua remuneraccedilatildeo e por conseguinte prover seu sustento e de sua famiacutelia Trata-se tambeacutem de aplicaccedilatildeo pontual da funccedilatildeo social da propriedade jaacute que protege os bens que permitem a circulaccedilatildeo de riquezas para a subsistecircncia do executado e se for o caso de sua famiacutelia
Forccediloso ressaltar ainda que a impenhorabilidade do inc V alcanccedila apenas os bens
moacuteveis de modo que eacute absolutamente possiacutevel que o imoacutevel em que o executado exerccedila sua
atividade profissional seja penhorado conforme a Suacutemula 451 do STJ ldquoEacute legiacutetima a penhora
da sede do estabelecimento comercialrdquo
O inciso VI do art 833 do CPC versa sobre a impenhorabilidade do seguro de vida
ldquoTrata-se de impenhorabilidade em favor do beneficiaacuterio do seguro e natildeo do segurado ateacute
porque o valor do seguro natildeo compotildee nem comporaacute o seu patrimocircnio (art794 do Coacutedigo
Civil1 ordm7)rdquo Dessa forma ldquoem uma execuccedilatildeo contra o segurado natildeo seraacute possiacutevel a penhora
do seguro de vida pois se trata de bem que natildeo lhe pertence nem mesmo em expectativardquo
De acordo com o inciso VII do art 833 do CPC satildeo impenhoraacuteveis os materiais
necessaacuterios para obras em andamento salvo se essas forem penhoradas Logo a obra pode
ser penhorada (art 862 do CPC) ldquoA regra como bem lembrou Araken de Assis lsquoestimula a
penhora da proacutepria obra inconclusa agrave qual os materiais acrescem e conseguintemente
valorizamrsquo 109
O art 833 VIII CPC julga impenhoraacutevel a pequena propriedade rural assim
definida em lei desde que trabalhada pela famiacutelia reproduzindo parte do art 5ordm XXVI CF
88116 que disciplina a impenhorabilidade do referido bem
A proteccedilatildeo do CPC eacute mais ampla do que a garantia prevista na Constituiccedilatildeo Federal
tendo em vista que a impenhorabilidade natildeo se restringe agraves execuccedilotildees de deacutebitos decorrentes
de sua atividade produtiva podendo ser alegada em toda e qualquer execuccedilatildeo ldquoAssim o 108 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CABRAL Antonio Passo
CRAMER Ronaldo (orgs) Comentaacuterios ao Novo Coacutedigo de Processo Civil Rio de Janeiro Forense 2015 p 1194
109 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 835
45
imoacutevel natildeo pode ser penhorado na execuccedilatildeo de creacutedito rural concedido para estimular a
produccedilatildeo agriacutecola mas poderaacute ser penhorado na execuccedilatildeo do creacutedito concedido para a
aquisiccedilatildeo do imoacutevelrdquo 110
A nona modalidade de impenhorabilidade trata-se dos recursos puacuteblicos recebidos por
instituiccedilotildees privadas para aplicaccedilatildeo compulsoacuteria em educaccedilatildeo sauacutede ou assistecircncia social ldquoA
proteccedilatildeo eacute louvaacutevel e tutela toda a coletividade ao privilegiar o direito agrave educaccedilatildeo sauacutede e
assistecircncia social em detrimento do direito do credorrdquo
De acordo com o inciso X do art 833 do CPC eacute impenhoraacutevel ateacute o limite de
quarenta salaacuterios miacutenimos a quantia depositada em caderneta de poupanccedila
Eacute uma modalidade de impenhorabilidade relativa (o CPC73 a considerava absoluta)
tendo em vista que essa impenhorabilidade natildeo pode ser oposta na execuccedilatildeo de alimentos
independentemente da sua origem (art 833 sect 2ordm do CPC) Fredie Didier et al cita Araken de
Assis111 ao afirmar que
a regra soacute protege essa aplicaccedilatildeo financeira Se o valor estiver depositado em fundo de investimento por exemplo poderaacute ser penhorado Se o devedor tiver vaacuterias cadernetas de poupanccedila a impenhorabilidade aplica-se agrave soma de todas elas e natildeo a cada uma delas isoladamente do contraacuterio valores expressivos poderiam ser pulverizados em vaacuterias contas burlando a finalidade da regra que eacute a de proteger a populaccedilatildeo de baixa renda
Ademais satildeo tambeacutem impenhoraacuteveis por forccedila do inciso XI os recursos puacuteblicos do
fundo partidaacuterio recebidos por partido poliacutetico nos termos da lei Essa modalidade de
impenhorabilidade ldquose restringe aos recursos puacuteblicos do fundo partidaacuterio Recursos de
origem privada recebidos pelo partido poliacutetico poderatildeo ser penhoradosrdquo 112 O processualista
Fredie Didier et al113 assevera que
Assim a impenhorabilidade foi estabelecida no intuito de impedir que os diretoacuterios nacionais de partidos poliacuteticos respondam por diacutevida dos diretoacuterios
110 Ibid p 836 111 DIDIER JR Fredie et al apud ASSIS Araken de Manual da execuccedilatildeo 11ordm ed cit p 225 Assim
tambeacutem REDONDO Bruno Garcia LOJO Maacuterio Vitor Suarez Penhora cit p 117 BUENO Cassio Scarpinella Curso sistematizado de Direito Processual Civil v 3 cit p 228 GIANNICO Mauriacutecio As novas reformas do CPC e de outras normas processuais Mauriacutecio Giannico e Viacutetor Joseacute de Mello Monteiro (coord) Satildeo Paulo Saraiva 2009 p 1 OS Em sentido diverso estendendo a impenhorabiacutelidade aos depoacutesitos feitos ateacute esse valor em CDB CDI fundos de renda fixa ou de accedilotildees RODRIGUES Marcelo Abelha Manual de execuccedilatildeo civil 3deg ed cit p 101
112 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 839
113 Ibid p 839
46
estaduaismunicipais - sobretudo em razatildeo das vaacuterias decisotildees judiciais que determinaram penhora de recursos do fundo partidaacuterio de alguns partidos
Por fim o inciso XII do artigo 833 do CPC trata sobre a impenhorabilidade dos
creacuteditos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias sob o regime de incorporaccedilatildeo imobiliaacuteria
vinculados agrave execuccedilatildeo de obra ldquoO objetivo dessa modalidade eacute evitar que diacutevidas do
incorporador possam consumir os recursos que seriam utilizados na realizaccedilatildeo da obra em
prejuiacutezo dos adquirentes de unidades autocircnomasrdquo 114
O professor Misael Montenegro Filho115 aduz sobre que ldquoao estabelecer a
impenhorabilidade dos creacuteditos oriundos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias o novo CPC
protegeu os valores destinados agrave execuccedilatildeo da obra e agrave entrega das unidades imobiliaacuterias aos
adquirentes assegurando assim a execuccedilatildeo da promessa contratualrdquo
Importante frisar ainda que a Lei nordm 8009 1990 instituiu a impenhorabilidade do
imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar por qualquer diacutevida salvo as exceccedilotildees dos
seus arts 3ordm e 4ordm
A referida lei dispotildee que Para os efeitos de impenhorabilidade considera-se
residecircncia um uacutenico imoacutevel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia
permanente (art 5ordm)
O processualista baiano Fredie Didier et al116 assevera que
A lei propotildee-se a proteger imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar nos termos acima expostos A CF 88 ampliou o conceito de entidade familiar para abranger a famiacutelia monoparental e a uniatildeo estaacutevel Mas deve considerar-se aiacute compreendidos os irmatildeos que vivem juntos e a uniatildeo homossexual Ateacute o solteiro estaacute abrangido pela impenhorabilidade se reside soacute no imoacutevel - isso em nome da proteccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana e da moradia digna Na verdade houve uma mudanccedila de compreensatildeo acerca do sentido da proteccedilatildeo de proteccedilatildeo da famiacutelia agrave proteccedilatildeo da moradia indispensaacutevel agrave preservaccedilatildeo da dignidade da pessoa
114 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o
novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 388
115 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MONTENEGRO FILHO Misael Novo Coacutedigo de Processo Civil Comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Atlas 2016 p 752
116 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 840-841
47
O STJ jaacute consolidou esse entendimento na suacutemula nordm 364 O conceito de
impenhorabilidade de bem de famiacutelia abrange tambeacutem o imoacutevel pertencente a pessoas
solteiras separadas e viuacutevas
Entretanto se o casal ou entidade familiar possuir vaacuterios imoacuteveis utilizados como
residecircncia a impenhorabilidade recairaacute sobre o de menor valor (art 5ordm paraacutegrafo uacutenico) ldquoEacute o
que ocorre por exemplo quando a famiacutelia se divide em mais de uma cidade por motivos
profissionaisrdquo 117
Forccediloso observar ainda que a impenhorabilidade do imoacutevel familiar eacute relativa jaacute que
natildeo pode ser oposta a qualquer creacutedito O art 3ordm da Lei n 8009 1990151 em que pode ser
penhorada a residecircncia da famiacutelia (exemplo execuccedilatildeo de alimentos para cobranccedila de taxas
devidas em funccedilatildeo do imoacutevel familiar etc)
Resta claro que o artigo 833 do CPC ao disciplinar as hipoacuteteses de impenhorabilidade
possui o escopo de proteger o princiacutepio da dignidade humana Entretanto algumas claacuteusulas
natildeo possuem proteccedilatildeo absoluta ldquoa sua relativizaccedilatildeo a depender do caso sob exame deve ser
realccedilada agrave medida que a dignidade resguardada e protegida pelo sistema processual-
constitucional natildeo se limita ao executadordquo 118 Ademais ldquoEacute premente advertidamente que a
dignidade do credor tambeacutem seja garantida em juiacutezo tendo como norte pois os princiacutepios da
proporcionalidade e razoabilidaderdquo 119
117 Ibid p 841 118 Ibid p 752 119 Ibid p 752
48
4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA
ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE
HUMANA DO EXECUTADO
41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE
EFETIVACcedilAtildeO
Como jaacute exposto em linhas preteacuteritas nos meios executivos tiacutepicos as medidas
executivas satildeo determinadas pela lei ou seja o oacutergatildeo pode aplicar somente as medidas
tipificadas no ordenamento juriacutedico No entanto ao se tratar das medidas executivas atiacutepicas
eacute necessaacuterio que haja um limite na atuaccedilatildeo realizada pelo juiz
O poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo poder ser realizado de maneira indiscriminada haacute
pressupostos e premissas a serem observadas Dessa forma a primeira premissa eacute no sentindo
de que a medida executiva atiacutepica natildeo pode ser a primeira medida a ser invocada ldquomuito ao
reveacutes a regra do nosso sistema continua a ser o da tipicidade dos meios executivos soacute que
agora temperado pelo sistema atiacutepicordquo 120 O processualista Thiago Rodovalho explica que
ldquo() os meios atiacutepicos natildeo satildeo prima ratio e sim a ultima ratio eacute dizer esgotados e
frustrados os meios executivos tiacutepicos e ordinaacuterios pode-se em tese valer-se do sistema
atiacutepicordquo121
Dessa forma nos casos de execuccedilatildeo que tenha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
natildeo deve ser aplicado de logo as medidas indutivas e coercitivas Apenas apoacutes frustradas as
medidas ldquonaturaisrdquo pode-se passar agrave aplicaccedilatildeo das medidas atiacutepicas
Uma segunda premissa diz a respeitos dos meios de pressatildeo para compelir o devedor a
adimplir com o seu deacutebito ldquoEssa segunda premissa decorre inclusive de imperiosidade
loacutegica de nada adianta a medida de pressatildeo se a obrigaccedilatildeo natildeo tem como ser adimplida pelo
devedorrdquo 122
Para Thiago Rodovalho123 ldquoIsso quer significar que esgotados e frustrados os meios
tiacutepicos o juiz se valeraacute dos meios atiacutepicos se eles forem potencialmente haacutebeis a estimular ou
120 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da
atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018
121 Ibid sem paginaccedilatildeo 122 Ibid sem paginaccedilatildeo 123 Ibid sem paginaccedilatildeo
49
forccedilar o cumprimento o que pressupotildee sua possibilidade quando entatildeo eles poderatildeo ser
eficazesrdquo
Logo nas obrigaccedilotildees de pagar quantia se houver a real demonstraccedilatildeo da
impossibilidade financeira do devedor seria um constrangimento inuacutetil e desnecessaacuterio a
imposiccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo para forccedilar o cumprimento
Por isso as medidas atiacutepicas devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o
esgotamento das medidas tiacutepicas e a possibilidade de cumprimento de cumprimento da
obrigaccedilatildeo
Ademais superadas as supracitadas premissas e o oacutergatildeo julgador vislumbrando a
necessidade da aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo se faz necessaacuterio que um conjunto de
postulados e princiacutepios rejam a atuaccedilatildeo do oacutergatildeo julgador servindo de norte para a escolha da
medida executiva mais adequada ldquoDe modo geral a escolha deve pautar-se nos postulados da
proporcionalidade da razoabilidade (art8ordm CPC) e da proibiccedilatildeo de excesso bem como nos
princiacutepios da eficiecircncia e da menor onerosidade da execuccedilatildeordquo 124
O professor Fredie Didier et al125 eacute categoacuterico ao citar Humberto Aacutevila
Segundo Humberto Aacutevila o postulado da proporcionalidade se manifesta nas situaccedilotildees em que haacute uma relaccedilatildeo de causalidade entre dois elementos empiricamente discerniacuteveis um meio e um fim de tal sorte que se possa proceder aos trecircs exames fundamentais o da adequaccedilatildeo (o meio promove o fim) o da necessidade (dentre os meios disponiacuteveis e igualmente adequados para promover o fim natildeo haacute outro meio menos restritivo do(s) direito(s) fundamental (is) afetado(s)) e o da proporcionalidade em sentido estrito (as vantagens trazidas pela promoccedilatildeo do fim correspondem agraves desvantagens provocadas pela adoccedilatildeo do meio)
O juiz ao aplicar a medida executiva atiacutepica ao caso concreto deve ter seu
embasamento no princiacutepio da proporcionalidade para saber se a medida a ser tomada eacute a
melhor opccedilatildeo ao caso sub judice ldquoO exame de proporcionalidade aplica-se sempre que
houver uma medida concreta destinada a realizar uma finalidaderdquo 126
Em verdade a aplicaccedilatildeo do princiacutepio da proporcionalidade eacute imprescindiacutevel na adoccedilatildeo
dos meios executivos atiacutepicos tendo em vista que ldquo() tais medidas em especial quando de
124 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111 125 DIDIER JR Fredie et al apud AVILA Humberto Teoria dos princiacutepios da definiccedilatildeo agrave aplicaccedilatildeo
dos princiacutepios juriacutedicos 16 ed Satildeo Paulo Malheiros 2015 p 205 126 DIDIER JR Fredie et al op cit p 111
50
natureza coercitiva podem restringir direitos do devedor e incidir diretamente sobre sua
pessoardquo127 Logo ainda que o princiacutepio da efetividade da tutela executiva seja um direito
fundamental o mesmo ldquo() deve ser compatibilizado com direitos fundamentais do
executado para que a sua dignidade humana seja preservadardquo 128
Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Neves129 afirma que em nome do princiacutepio da
proporcionalidade o juiz deveraacute
() ponderar no caso concreto as vantagens praacuteticas da adoccedilatildeo de cada medida executiva atiacutepica em especial as de natureza coercitiva e as desvantagens de sua adoccedilatildeo levando em conta a possibilidade de a medida criar uma limitaccedilatildeo excessiva ao exerciacutecio de direito fundamental do executado
Outro princiacutepio que o oacutergatildeo julgador deve se ater ao escolher a medida executiva
atiacutepica eacute o da razoabilidade Segundo Fredie Didier et al 130 o princiacutepio (ou postulado)131 se
manifesta de trecircs formas
a) como dever de equidade a exigir a harmonizaccedilatildeo da norma geral com o caso individual impondo a consideraccedilatildeo daquilo que normalmente acontece em detrimento do que eacute extraordinaacuterio e tambeacutem impondo a consideraccedilatildeo das especificidades do caso concreto ante a generalidade da norma b) como dever de congruecircncia a exigir a harmonizaccedilatildeo das normas com suas condiccedilotildees externas de aplicaccedilatildeo (isto eacute com a realidade com base em que foram editadas) c) como dever de equivalecircncia a exigir uma relaccedilatildeo de equivalecircncia entre a medida adotada e o criteacuterio que a dimensiona
Logo ldquo() o princiacutepio da razoabilidade deve nortear a atuaccedilatildeo do juiz na adoccedilatildeo das
medidas executivas atiacutepicas previstas no art 139 IV do Novo CPCrdquo 132 tendo em vista que
ldquo() mesmo medidas que pelo princiacutepio da proporcionalidade podem se mostrar
abstratamente possiacuteveis de adoccedilatildeo no caso concreto podem se mostrar inadequadas e
irrazoaacuteveisrdquo 133
127 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Medidas executivas atiacutepicas na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de
pagar quantia certa art 139 IV do novo CPC Revista de Processo v 42 n 265 mar 2017 p 14 128 Ibid p 14 129 Ibid p 14 130 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111-112 131 Segundo Fredie Didier et al o postulado eacute uma norma que atua sobre a aplicaccedilatildeo de outras normas
A proporcionalidade e a razoabilidade seriam postulados normativos e natildeo princiacutepios segundo essa concepccedilatildeo 132 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo op cit p 14 133 Ibid p 14
51
Ademais conforme dispotildee o postulado da proibiccedilatildeo de excesso ldquoa realizaccedilatildeo de uma
regra ou princiacutepio constitucional natildeo pode conduzir agrave restriccedilatildeo a um direito fundamental que
lhe retire um miacutenimo de eficaacuteciardquo 134
A proibiccedilatildeo de excesso deveraacute sempre ser suscitada quando um direito fundamental
houver sido violado a ponto do direito fundamental sofrer violaccedilatildeo excessiva Ademais ldquoesse
postulado natildeo se confunde com o da proporcionalidade porque ele dispensa os exames da
adequaccedilatildeo (relaccedilatildeo meiofim) da necessidade (exigibilidade) ou da proporcionalidade em
sentido estrito (ponderaccedilatildeo entre vantagens e desvantagens)rdquo 135
Logo ldquopouco importa a relaccedilatildeo meiofim ou a exigibilidade da medida ou ainda a
ponderaccedilatildeo com outro direito fundamental eventualmente em jogo aqui se analisa apenas a
eficaacutecia de um determinado direito fundamentalrdquo 136
O princiacutepio da eficiecircncia tem previsatildeo constitucional no art 37 e previsatildeo
infraconstitucional no art 8ordm do CPC15 O referido princiacutepio determina que o processo seja
conduzido de forma eficiente pelo oacutergatildeo jurisdicional
Entende-se que eficiente eacute a atuaccedilatildeo que utilize adequadamente os meios necessaacuterios
para que se atinjam os fins almejados O oacutergatildeo jurisdicional na escolha dos meios a serem
utilizados para a obtenccedilatildeo dos fins
a) deve escolher aqueles que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo (deve evitar meios que promovam resultados insignificantes) b) deve escolher meios que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado (natildeo se pode escolher um meio de resultado duvidoso) c) natildeo pode escolher um meio que produza muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscado 137
O juiz deveraacute igualmente analisar o princiacutepio da menor onerosidade da execuccedilatildeo que
eacute previsto pelo art 805 do CPC ldquoArt 805 Quando por vaacuterios meios o exequente puder
promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o
executadordquo
134 134 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 112 135 Ibid p 112 136 Ibid p 112 137 Ibid p 112-113
52
Logo ldquohavendo duas opccedilotildees igualmente eficazes para permitir alcanccedilar o resultado
pretendido (satisfaccedilatildeo do creacutedito) deveraacute o oacutergatildeo julgador valer-se daquela que menos onere
a situaccedilatildeo do executadordquo 138
O dito princiacutepio impede o comportamento abusivo do exequente que possa beneficiar-
se do meio mais danoso ao executado protegendo dessa forma a lealdade e a eacutetica
processual
Os postulados e princiacutepios analisados em linhas preteacuteritas impotildeem ao oacutergatildeo julgador a
observacircncia de alguns criteacuterios para a escolha da medida executiva atiacutepicas a ser utilizada no
caso concreto
Primeiramente a medida executiva atiacutepica deveraacute ser adequada ldquoO criteacuterio da
adequaccedilatildeo impotildee que juiz considere abstratamente uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida
executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia
a gerar o resultadordquo 139 Nesse primeiro momento o juiz deveraacute observar sob a perspectiva do
credor qual medida teraacute o condatildeo de gerar o resultado mais efetivo
Segundo Fredie Didier et al140 o criteacuterio da adequaccedilatildeo eacute
() fortemente inspirado pelo postulado da proporcionalidade e pelo princiacutepio da eficiecircncia na parte em que esse princiacutepio determina a escolha de meios que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo e que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado
Ademais a medida adotada pelo oacutergatildeo julgador deveraacute ser necessaacuteria ldquoEsse criteacuterio
impotildee um limite agrave atuaccedilatildeo judicial funcionando como uma espeacutecie de contrapeso ao criteacuterio
da adequaccedilatildeo Aqui deve-se levar em conta a posiccedilatildeo do devedorrdquo141
O juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental agrave execuccedilatildeo e determinar
uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute necessaacuterio que a
medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado O criteacuterio da necessidade
estabelece que ldquonatildeo se pode ir aleacutem do necessaacuterio para alcanccedilar o propoacutesito almejado Deve
138 Ibid p 113 139 Ibid p 113 140 Ibid p 113 141 Ibid p 114
53
pois o oacutergatildeo julgador determinar o meio executivo na medida do estritamente necessaacuterio para
proporcionar a satisfaccedilatildeo do creacutedito ndash nem menos nem maisrdquo 142
O referido criteacuterio possui forte influecircncia dos postulados da proibiccedilatildeo do excesso e da
razoabilidade assim como do princiacutepio da menor onerosidade para o executado Assevera
Fredie Didier et al143 que
Natildeo eacute razoaacutevel por exemplo impor como primeira opccedilatildeo medida coercitiva a ser suportada pelo agente puacuteblico pelo simples fato de o juiz pressupor que o ente puacuteblico ao qual ele eacute vinculado iraacute descumprir determinada ordem judicial - o descumprimento natildeo pode ser visto como algo ordinaacuterio ou cotidiano (razoabilidade como dever de equidade) Tampouco eacute razoaacutevel eleger a prisatildeo civil como meacutetodo prioritaacuterio para compelir o executado ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer (razoabilidade como dever de equivalecircncia) Aleacutem disso eacute vedada por exemplo a imposiccedilatildeo de multa coercitiva para compelir o executado a emitir declaraccedilatildeo de vontade uma vez que haacute previsatildeo expressa de medida tiacutepica capaz de proporcionar o mesmo resultado sem sacrifiacutecio para o devedor (art 501 CPC)
A afirmaccedilatildeo feita por Bonavides144 em 1997 sobre a adequaccedilatildeo e a necessidade
continua atual sobre os motes
O meio empregado pelo legislador deve ser adequado e necessaacuterio para alcanccedilar o objetivo procurado O meio eacute adequado quando com seu auxiacutelio se pode alcanccedilar o resultado desejado eacute necessaacuterio quando o legislador natildeo poderia ter escolhido outro meio igualmente eficaz mas que natildeo limitasse ou limitasse de maneira menos sensiacutevel o direito fundamental
Por fim a medida deve conciliar os interesses contrapostos ldquoO magistrado deve
ponderar os interesses em jogo aplicando a proporcionalidade em sentido estrito de modo
que as vantagens da utilizaccedilatildeo da medida atiacutepica escolhida superem as vantagens de seu usordquo 145
Esse criteacuterio natildeo privilegia nem o credor nem o devedor e sim a soluccedilatildeo mais
equilibrada e que atenda da melhor forma aos valores em conflito ldquoTrata-se de criteacuterio
inspirado nos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade bem como no princiacutepio da
142 Ibid p 114 143 Ibid p 114 144 BONAVIDES Paulo Curso de Direito Constitucional 7ordm ediccedilatildeo Satildeo Paulo Ed Malheiros 1997
p 372 145 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 114-115
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eficiecircncia na parte em que impotildee ao juiz evitar a escolha do meio executivo que produza
muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscadordquo 146
Cada um dos criteacuterios supracitados devem ser considerados pelo juiz ao aplicar as
medidas executivas atiacutepicas ao caso concreto Para Fredie Didier et al147 as medidas como
retenccedilatildeo de CNH passaporte ou cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado como
forma de pressionaacute-lo ao pagamento da diacutevida pecuniaacuteria natildeo satildeo possiacuteveis
Essas natildeo satildeo medidas adequadas ao atingimento do fim almejado (o pagamento de quantia) - natildeo haacute propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente Tais medidas soam mais como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-lo ao cumprimento da ordem judicial - e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a utilizaccedilatildeo de meios sancionatoacuterios pelo magistrado mas apenas de meios de coerccedilatildeo indireta e sub-rogatoacuterios
Ainda que adequadas fossem a retenccedilatildeo de CNH e do passaporte no corte de fornecimento de aacutegua natildeo parecem ser medidas necessaacuterias (no sentido de exigiacuteveis) uma vez que outras medidas podem em tese ser utilizadas sem causar igual gravame ao executado - como por exemplo a simples restriccedilatildeo do uso de cartotildees de creacutedito A retenccedilatildeo de documentos pessoais eacute medida que termina por restringir a liberdade de ir e vir do executado mostrando-se a princiacutepio natildeo-razoaacutevel por ir de encontro ao dever de equivalecircncia e desproporcional por restringir demais o direito agrave liberdade em favor do direito de creacutedito pecuniaacuterio do exequente
O processualista baiano et al148 cita tambeacutem outro exemplo de medida atiacutepica que natildeo
atingem os criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade
Tampouco parece adequada em princiacutepio determinaccedilatildeo de corte de energia eleacutetrica de todo o preacutedio onde funciona serviccedilo puacuteblico administrativo como forma de pressionar o ente federado a cumprir ordem de nomeaccedilatildeo de candidato em concurso puacuteblico Natildeo parece haver relaccedilatildeo meiofim entre uma coisa e outra Tambeacutem natildeo eacute possiacutevel enxergar essa medida como necessaacuteria no sentido de ser a menos gravosa para o devedor - observe que se trata de medida que uma vez aplicada ensejaria restriccedilatildeo de funcionamento em toda a reparticcedilatildeo puacuteblica em prejuiacutezo de serviccedilos puacuteblicos essenciais ao funcionamento da Administraccedilatildeo o que aleacutem de ser excessivamente gravoso parece natildeo se conformar agrave necessidade de ponderaccedilatildeo dos interesses em jogo - aleacutem de afetar a um sem-nuacutemero de pessoas tomadoras desses serviccedilos
Ademais eacute sabido que toda e qualquer decisatildeo judicial precisa ser fundamentada Ao
se tratar das medidas executivas atiacutepicas o papel da fundamentaccedilatildeo se torna ainda mais
146 Ibid p 115 147 Ibid p 115 148 Ibid p 116
55
importante tendo em vista que eacute pela fundamentaccedilatildeo da decisatildeo que se poderaacute controlar a
adequaccedilatildeo e necessidade da medida atiacutepica
Pelo fato das medidas executivas atiacutepicas derivarem de dispositivos normativos
considerados claacuteusulas gerais propiacutecias as mais variadas interpretaccedilotildees eacute de extrema
importacircncia que o oacutergatildeo julgador fundamente sua decisatildeo
Logo ldquodeve o juiz na fundamentaccedilatildeo decisoacuteria expor racionalmente os motivos da
sua escolha demonstrando com atenccedilatildeo ao art 489 sect 1ordm CPC de que modo a sua opccedilatildeo
atende os criteacuterios da adequaccedilatildeo necessidade e proporcionalidade em sentido estrito ()rdquo 149
Dessa forma os princiacutepios da proporcionalidade e razoabilidade servem para delimitar
o alcance das claacuteusulas gerais de efetivaccedilatildeo fazendo com que o oacutergatildeo julgador se atenha aos
criteacuterios da adequaccedilatildeo e necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao caso
concreto
42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO
EXECUTADO
A entrada em vigor do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 aflorou ainda mais uma
discussatildeo essencial para os processualistas do seacuteculo XXI qual eacute o verdadeiro protagonista do
processo civil
Para os que defendem o ldquoautoritarismo processualrdquo o verdadeiro protagonista do
processo civil eacute o oacutergatildeo judiciaacuterio que em nome do desempenho efetivo de suas funccedilotildees lhes
eacute permitido dilatar os poderes que diga-se de jaacute passagem jaacute compotildeem um vastiacutessimo
arsenal150
Jaacute os ldquogarantistasrdquo 151 do processo civil acreditam que os verdadeiros protagonistas satildeo
as partes do processo e seus direitos e garantias devem ser estritamente preservados
Devido a essa disputa de quem possui maior protagonismo no processo as mudanccedilas
ocorridas no coacutedigo processual vigente quanto agraves medidas executivas atiacutepicas despertaram
149 Ibid p 117 150 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos
atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04102018
151 O processualista Araken de Assis acredita que o termo garantista eacute descabido tendo em vista que remete ao processo penal
56
maior celeuma do que qualquer outra modificaccedilatildeo trazida pelo CPC15 Afinal as referidas
medidas acirravam ainda mais a disputa pelo protagonismo processual
O fato de o CPC15 dispor no art 139 IV que o juiz poderaacute decretar todas as medidas
indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o
cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo
pecuniaacuteria levou boa parte da doutrina e dos juiacutezes a acreditar que teria pleno direito de
aplicar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo Entretanto muitos se esqueceram do outro lado
da moeda esqueceram que a dignidade humana do executado tambeacutem eacute um direito
fundamental e natildeo pode ser violado
Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa152
acreditam que
() natildeo parece producente elencar um rol abstrato das medidas que poderiam ser aplicadas pelo juiz a tiacutetulo do art 139 IV CPC Afinal se busca a efetividade da execuccedilatildeo e esta soacute pode ser identificada agrave luz das especificidades da situaccedilatildeo concreta Ideal eacute enveredar pela loacutegica modular (adequaccedilatildeo ao caso) natildeo pela geneacuterica (soluccedilotildees abstratas de pretensa utilidade universal)
Em razatildeo de o dispositivo apresentar uma gama de poderes tatildeo amplos agrave disposiccedilatildeo do
oacutergatildeo julgador sem nenhuma estipulaccedilatildeo de um procedimento legal previamente definido para
que estabeleccedila as condiccedilotildees de sua aplicaccedilatildeo em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo eacute
necessaacuterio que em razatildeo do princiacutepio da dignidade humana natildeo busque definir o que o
dispositivo permite mas de definir o que ele natildeo permite ldquoOu seja propotildee-se a sua
compreensatildeo por exclusatildeo Afinal se ele tem potencialidade para promover a efetividade da
tutela tambeacutem pode provocar lesotildees E como em direito os fins natildeo justificam os meios
ressalta como prioritaacuteria a necessidade de estabelecer limitesrdquo 153
O art 789 do CPC15 disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial e eacute
categoacuterico ao dispor que ldquoo devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para
152 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
153 Ibid sem paginaccedilatildeo
57
o cumprimento de suas obrigaccedilotildees salvo as restriccedilotildees estabelecidas em leirdquo Logo a
execuccedilatildeo somente poderaacute incidir sobre os bens do devedor e natildeo sobre a sua pessoa
Como eacute sabido a Lex Poetelia Papiria de 326 aC foi o primeiro marco legal da
humanizaccedilatildeo das cobranccedilas de diacutevidas abolindo a imposiccedilatildeo ao devedor de castigos
vexatoacuterios e ateacute da pena de morte154
Afinal no direito romano antigo a cobranccedila de diacutevidas poderia recair sobre a pessoa
do devedor que respondia com sua liberdade e ateacute mesmo com seu proacuteprio corpo permitindo
a lei que repartissem tantos pedaccedilos do corpo do devedor quantos fossem seus credores
Nesse sentindo leciona o professor Guilherme Pupe da Noacutebrega155 que
Vem de longe a evoluccedilatildeo no sentido de fazer a responsabilidade por uma obrigaccedilatildeo migrar da pessoa do devedor para seu patrimocircnio Merecem registro especiacutefico como marcos histoacutericos remotos a Lex Poetelia Papiria de 326 aC que aboliu o nexum e possibilidade de escravidatildeo do devedor como garantia da obrigaccedilatildeo e a pignoris capio ou ldquoaccedilatildeo por tomada de penhorrdquo que instituiu a possibilidade de o credor tomar parcela dos bens do devedor como forma de assegurar o adimplemento da diacutevida Aqueles institutos culminariam seacuteculo depois no artigo 789 do CPC de 2015 a consagrar que o devedor responda pela satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo com seus bens presentes e futuros observadas as restriccedilotildees impostas pelas impenhorabilidades legais
Logo o avanccedilar da civilizaccedilatildeo marcou o deslocamento da responsabilidade por
diacutevidas saindo do corpo do devedor para o seu patrimocircnio tendo em vista que a vida
humana a liberdade e a integridade fiacutesica satildeo valores inalienaacuteveis natildeo podendo ser
sacrificadas em benefiacutecio de obrigaccedilotildees pecuniaacuterias 156
Entretanto eacute sabido que a responsabilidade patrimonial eacute excepcionada pela prisatildeo
civil do devedor de verba alimentiacutecia resquiacutecio da responsabilidade pessoal romana
154 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt
httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018
155 NOacuteBREGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139 IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018
156 Ibid sem paginaccedilatildeo
58
No entanto haacute uma justificativa para isso Segundo o processualista Guilherme Pupe
da Noacutebrega157
Eacute que a par de a prisatildeo civil encontrar previsatildeo constitucional no inciso LXVII do artigo 5ordm o raciociacutenio eacute o de que o direito do alimentante agrave liberdade de locomoccedilatildeo cede diante dos direitos agrave vida e agrave dignidade titularizados pelo alimentando e resguardados pelos alimentos Foi esse mesmo raciociacutenio aliaacutes que justificou no passado a ediccedilatildeo da suacutemula 309 pelo STJ agora positivada pelo artigo 528 sect 7ordm que limita a modalidade coercitiva agraves trecircs uacuteltimas prestaccedilotildees vencidas e agraves prestaccedilotildees vincendas A ideia eacute que tendo o alimentando subsistido a despeito do natildeo-pagamento de prestaccedilotildees mais antigas essas verbas teriam perdido o caraacuteter alimentar que na equaccedilatildeo antes apresentada justificaria a prisatildeo civil do alimentante Daiacute por que aqueles valores antigos remanescem exigiacuteveis mas somente pela via da expropriaccedilatildeo
Essa ressalva eacute necessaacuteria tendo em vista que a adoccedilatildeo de teacutecnica de execuccedilatildeo
indireta para incursatildeo radical na esfera de direitos do executado notadamente direitos
fundamentais quando carente de respaldo constitucional natildeo merece acolhimento sob
risco de se atentar contra o devido processo legal (artigo 5ordm LIV da Constituiccedilatildeo)
Como afirma o autor Bruno Dantas158 ldquoembora inexistam estatiacutesticas que permitam
comparaccedilotildees natildeo eacute desarrazoado intuir que os iacutendices de inadimplecircncia despeccedilam na razatildeo
inversa da incidecircncia das ordens judiciais sobre o corpo e a liberdade do devedorrdquo Entretanto
eacute natildeo possiacutevel adotar toda e qualquer medida executiva atiacutepica em nome da efetividade da
execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que se saiba os limites da sua aplicaccedilatildeo
Dessa forma instrumentos que permitam o cumprimento forccedilado de contratos e o pagamento
de diacutevidas satildeo necessaacuterios contudo eacute preciso equilibrar essa exigecircncia com a liberdade e a
dignidade humana
Como citado alhures o art 139 IV ensejou decisotildees como a que determinou a
suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o
passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito em uma accedilatildeo se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo
extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
Na supracitada decisatildeo o princiacutepio da responsabilidade patrimonial natildeo estaacute sendo
efetivado para o que o devedor responda com os seus bens Afinal qual ligaccedilatildeo entre a
157 Ibid sem paginaccedilatildeo 158 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt
httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018
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restriccedilatildeo de circulaccedilatildeo que diz com o direito de ir e vir (liberdade) com o pagamento de
diacutevidas que diz com a responsabilidade civil159
Ademais por que quem natildeo tem dinheiro para pagar diacutevidas natildeo pode dirigir Por que
natildeo tem condiccedilotildees para pagar o deacutebito natildeo pode ter passaporte Por que quem natildeo tem como
pagar o deve natildeo pode ter cartatildeo de creacutedito
Ao utilizar meios executivos atiacutepicos como os supracitados para compelir o devedor a
satisfazer a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria quando exauridos sem ecircxito os meios tradicionais de bens
penhoraacuteveis salvo quando existe qualquer indiacutecio concreto de ocultaccedilatildeo ou dissipaccedilatildeo de
bens eacute obrigar o devedor abrir matildeo da proteccedilatildeo da lei que lhe impede que seja tomado agrave forccedila
(art 833 CPC e demais disposiccedilotildees que tratam da impenhorabilidade)
Segundo Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa160
Claramente essa pressatildeo visa dar uma aparecircncia de voluntariedade agrave indicaccedilatildeo de bens impenhoraacuteveis pelo proacuteprio executado que na verdade soacute age assim por ser a uacutenica forma de ver-se livre de um grame imposto por medida indutiva despedida de qualquer necessidade ou adequaccedilatildeo Uma intoleraacutevel perversatildeo
Os autores afirmam ainda que o ldquodireito paacutetrio natildeo admite esta contraditio in terminis
sendo inaceitaacutevel a coexistecircncia de regra protetiva do executado com outra que concede ao
juiz poderes para forccedilar (ainda que indiretamente e veladamente) o executado a abrir matildeo
daquela proteccedilatildeordquo 161
Logo eacute cristalino que a suspensatildeo da CNH eacute uma forma incorreta de aplicar a medida
executiva atiacutepica para efetivar o direito fundamental a execuccedilatildeo tendo em vista que o uacutenico
objetivo da referida eacute pressionar o executado abrir matildeo de algum bem impenhoraacutevel para
levantar o dinheiro e cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
A retenccedilatildeo do passaporte igualmente natildeo possui qualquer relaccedilatildeo com a diacutevida do
executado e eacute somente uma forma de tentar pressiona-lo a dispor de um bem que natildeo pode
ser tomado agrave forccedila e puni-lo por natildeo ter cumprido voluntariamente com a sua obrigaccedilatildeo
159 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
160 Ibid sem paginaccedilatildeo 161 Ibid sem paginaccedilatildeo
60
Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa162
acreditam que tal medida eacute equivocada e se torna excessivamente onerosa ao executado
As mais variadas circunstacircncias relevem o equiacutevoco de tal medida aplicada assim genericamente Com efeito nada justifica reter o passaporte do executado e impedi-lo de viajar para o exterior quando eacute agraciado inclusive com todas as despesas pagas com presente sorteio ou precircmio (por completar tempo de serviccedilo ou atingir metas produtividade na sociedade empresaacuteria em que trabalha) Como todo custo eacute suportado por terceiro e por isso mesmo a sua realizaccedilatildeo pelo executado natildeo traria qualquer prejuiacutezo ao exequente e a retenccedilatildeo do passaporte natildeo seria injustificaacutevel
Paulo Antonio Papini163 acredita que natildeo tem a apreensatildeo de passaporte natildeo possui um
fundamento plausiacutevel tendo em vista que se o devedor natildeo pode viajar para saldar o deacutebito
tambeacutem natildeo poderia exercer atividades cotidianas
Com todo o respeito a quem pensa dessa forma o argumento eacute muito simploacuterio e natildeo precisamos sequer do Direito para derrubaacute-lo Com efeito se considerarmos que ndash ateacute mesmo pelas dimensotildees continentais do Brasil ndash natildeo eacute incomum que uma passagem para o Nordeste custe mais caro que um voo para Miami seria razoaacutevel entatildeo seguindo a linha argumentativa do Magistrado em questatildeo que se oficiasse aos oacutergatildeos reguladores da aviaccedilatildeo civil proibindo-se aquele devedor de fazer ateacute mesmo voos domeacutesticos Poder-se-ia ir mais longe jaacute que natildeo tem dinheiro para pagar suas diacutevidas certamente aquele devedor tambeacutem natildeo teria para comer fora de sua casa porque entatildeo natildeo determinar a expediccedilatildeo de ofiacutecio aos restaurantes proacuteximos agrave sua casa e determinar tambeacutem a proibiccedilatildeo de que ele fosse servidoatendido
O autor se questiona ainda ldquoSeraacute entatildeo que o Princiacutepio da Dignidade da Pessoa
Humana estaacute de mero enfeite em nossa Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ()rdquo 164 Tendo em vista
que ldquoa decisatildeo em comento viola diretamente o art 5ordm incisos XV LIII e LXIII da
Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ndash falamos do Direito de Ir e Virrdquo 165
Ademais o cancelamento do cartatildeo de creacutedito eacute mais uma forma de constranger e
compelir o executado a cumprir com a obrigaccedilatildeo de qualquer forma natildeo importando o que
precise fazer para conseguir saldar o deacutebito tendo em vista que a referida medida apresenta
162 Ibid sem paginaccedilatildeo 163 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo
pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018
164 Ibid sem paginaccedilatildeo 165 Ibid sem paginaccedilatildeo
61
qualquer adequaccedilatildeo com o fim desejado (reverter em pagamento para o exequente) Os
autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa afirmam que166
Reconhece-se que as razotildees da afirmaccedilatildeo ora questionada satildeo ateacute intuitivas mas eacute plenamente possiacutevel problematiza-las Ora natildeo se encontra qualquer justificativa idocircnea para que o juiz possa cancelar o contrato do executado com a administradora do cartatildeo de creacutedito (ou instituiccedilatildeo financeira) que natildeo tem qualquer relaccedilatildeo com o creacutedito exequendo muito menos como isso poderia impactar positivamente na execuccedilatildeo (senatildeo para pressionar o executado a dispor de bens impenhoraacuteveis) Ademais natildeo foram indicados sequer sinais de que o executado realiza gastos supeacuterfluos com o cartatildeo de creacutedito ndash natildeo que isso justificasse a medida pois o correto seria penhorar os esses bens (se duraacuteveis naturalmente) ao inveacutes de cancelar o cartatildeo de creacutedito
Logo as referidas medidas natildeo possuem qualquer relaccedilatildeo com o atingimento do fim
almejado (o pagamento de quantia) tendo em vista que natildeo haacute uma relaccedilatildeo meiofim entre
tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a
restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia
ao exequente
Dessa forma nota-se que as medidas de suspensatildeo da CNH retenccedilatildeo de passaporte e
bloqueio do cartatildeo de credito satildeo completamente inadequadas agrave realizaccedilatildeo a que se prestam
Afinal ldquotais medidas soam como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-
lo ao cumprimento da ordem judicial ndash e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a
utilizaccedilatildeo dos meios sancionatoacuterios pelo magistrado ()rdquo167
Como exposto em linhas preteacuteritas o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades
de aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e
razoaacutevel se atendo aos criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas
executivas atiacutepicas ao caso concreto sob pena de converter a medida em de indutiva para
punitiva
A utilizaccedilatildeo de medidas atiacutepicas como a suspensatildeo da carteira de motorista e o
passaporte do devedor abandona a regra da responsabilidade patrimonial e atingem em cheio
o nuacutecleo de direitos inerentes agrave condiccedilatildeo humana
166 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
167 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 115
62
O limite para a aplicaccedilatildeo de tais medidas deve ser a Constituiccedilatildeo Federal e sobretudo
os Direitos fundamentais nela expressos ldquoCom efeito natildeo haacute saiacuteda tampouco soluccedilatildeo eficaz
de um problema sem que se respeite a Lei e o Devido Processo Legal (por mais nobres que
sejam as intenccedilotildees)rdquo 168
Dessa forma a busca desenfreada pelo cumprimento das decisotildees judiciais em
especial na fase executiva natildeo pode ser realizada em sacrifiacutecio de direitos fundamentais O
Poder Judiciaacuterio natildeo pode resolver a crise do processo executoacuterio utilizando de medidas
arbitraacuterias com o propoacutesito de satisfazer obrigaccedilotildees pecuniaacuterias
Eis o dilema que se coloca diante do poder geral de efetivaccedilatildeo ele pode servir de
potente instrumento em prol da tutela jurisdicional executiva entretanto se manejado de
modo improacuteprio serviraacute de instrumento de puniccedilatildeo e humilhaccedilatildeo do executado169
Eacute notoacuterio que se amplamente aplicado o poder geral de efetivaccedilatildeo reduziria os
iacutendices de inadimplecircncia quiccedilaacute resolveria por completo a crise da execuccedilatildeo civil Entretanto
o retrocesso civilizatoacuterio seria irreparaacutevel
168 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo
pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018
169 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
63
5 CONCLUSAtildeO
Como funccedilatildeo jurisdicional que tem como objeto a efetivaccedilatildeo de direitos a execuccedilatildeo
deve sempre buscar a maior satisfaccedilatildeo possiacutevel concretizando integralmente o creacutedito do
exequente isto eacute realizando o direito fundamental agrave tutela executiva do credor Por isso a
adoccedilatildeo de meios executivos atiacutepicos incorporados pelo Coacutedigo de Processo Civil de 2015 por
meio do art139 IV em um primeiro momento podem ser consideradas vaacutelidas visto que
servem de instrumento para a satisfaccedilatildeo e asseguraccedilatildeo de direitos do credor
Entretanto para o oacutergatildeo julgador natildeo cometa arbitrariedades em nome do direito
fundamental agrave execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que seja definido certos limites na adoccedilatildeo do poder
geral de efetivaccedilatildeo
As medidas executivas atiacutepicas natildeo podem ser aplicadas de maneira indiscriminada
logo devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o esgotamento das medidas tiacutepicas e
a possibilidade de cumprimento da obrigaccedilatildeo
Partindo dessa premissa as medidas a serem adotadas pelo juiz no caso concreto
devem ter como baliza os princiacutepios da proporcionalidade e da razoabilidade para que natildeo
ultrapassem a responsabilidade patrimonial do devedor e incidida diretamente sobre sua
pessoa
Para que natildeo seja atingida a pessoa do executado ou seja para que o devedor natildeo
tenha sua dignidade humana viola eacute necessaacuterio que a medida atiacutepica seja adequada e
necessaacuteria
Logo o juiz deveraacute sempre estabelecer uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida
executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia
a gerar o resultado sem violar a dignidade humana do executado
Dessa o juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental a execuccedilatildeo e
determinar uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute
necessaacuterio que a medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado
As medidas que ultrapassam esses limites como a decisatildeo que apreendeu o
passaporte suspensatildeo a CNH e bloqueou o cartatildeo de creacutedito do devedor satildeo meramente
punitivas posto que essas natildeo satildeo as medidas mais adequadas para se atingir o fim almejado
pois natildeo existe propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado
64
uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo
geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente
Medidas como esta servem de embasamento para decisotildees arbitraacuterias e autoritaacuterias de
violaccedilatildeo dos direitos fundamentais transformando o poder geral de efetivaccedilatildeo em
instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com autorizaccedilatildeo judicial
Em suma o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades de aplicaccedilatildeo do poder
geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e razoaacutevel se atendo aos
criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao
caso concreto sob pena de punir a pessoa do executado violando a sua dignidade humana
em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo
65
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THEODORO JUacuteNIOR Humberto Novo Coacutedigo de Processo Civil Anotado 20 ed
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- 1 INTRODUCcedilAtildeO
- 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
-
- 21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL
- 22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
- 23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
- 24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO
- 25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO
-
- 3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
-
- 31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS
-
- 311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15
-
- 32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
- 33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
- 34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
-
- 4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
-
- 41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
- 42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
-
- 5 CONCLUSAtildeO
- REFEREcircNCIAS
-
6 Entretanto natildeo haacute na legislaccedilatildeo criteacuterios especiacuteficos que auxiliem o oacutergatildeo julgador na
escolha das medidas executivas atiacutepicas que se adotadas sem qualquer baliza podem
acarretar consequecircncias juriacutedicas irreparaacuteveis
Como a famosa decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de
Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-1320138260011 Nessa accedilatildeo
que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo
pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a suspensatildeo da
Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o passaporte e
cancelou os cartotildees de creacutedito como forma de compeli-lo a adimplir com o deacutebito
Decisotildees como esta geram conflitos entre direitos constitucionalmente instituiacutedos De
um lado o direito fundamental agrave tutela jurisdicional e de outro os direitos e garantias
inerentes a todos os indiviacuteduos
Dessa forma a presente monografia tem como escopo de estabelecer criteacuterios
limitadores para que a adoccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo viole a dignidade humana do
executado em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo
7 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO
CIVIL
21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL
A Execuccedilatildeo Civil nasce a partir do direito a uma prestaccedilatildeo conferida a algueacutem de
exigir de outrem o cumprimento de uma conduta de fazer natildeo fazer ou de dar (dinheiro ou
coisa distinta) 1
Para que o direito a uma prestaccedilatildeo se concretize no mundo fiacutesico eacute necessaacuterio que
haja a satisfaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida pelo sujeito passivo Caso contraacuterio fala-se em
inadimplemento ou lesatildeo O titular do direito natildeo tem como agir por si para efetivar o seu
direito a prestaccedilatildeo posto que a autotutela eacute vedada no ordenamento juriacutedico Dessa forma eacute
necessaacuterio que se recorra ao Poder Judiciaacuterio para que se possa ter a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo
devida logo a tutela jurisdicional executiva2
O processualista Fredie Didier et al3 equaciona essa questatildeo da seguinte maneira
Quando se pensa em tutela executiva pensa-se na efetivaccedilatildeo de direitos a uma prestaccedilatildeo fala-se de um conjunto de meios para efetivar a prestaccedilatildeo devida fala-se em execuccedilatildeo de fazer natildeo-fazer dar exatamente os trecircs tipos de prestaccedilatildeo existentes Natildeo eacute por acaso nem por coincidecircncia que a tutela executiva pressupotildee inadimplemento (CPC art 786) - fenocircmeno exclusivo dos direitos a uma prestaccedilatildeo Eacute por isso tambeacutem que se pode falar em prescriccedilatildeo da execuccedilatildeo (CPC art 802 e suacutemula do STF n 150) - prescriccedilatildeo eacute fenocircmeno juriacutedico que se relaciona aos direitos a uma prestaccedilatildeo A execuccedilatildeo forccedilada dirige-se ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo Essa relaccedilatildeo entre direito material e processo eacute fundamental para a compreensatildeo do fenocircmeno executivo
Nesse iacutenterim para o Ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux4 ldquoexecutar eacute
satisfazerrdquo ao passo que o professor Fredie Didier et al5 formulou um conceito mais amplo
ldquoExecutar eacute satisfazer uma prestaccedilatildeo devida A execuccedilatildeo pode ser espontacircnea quando o
devedor cumpre voluntariamente a prestaccedilatildeo ou forccedilada quando o cumprimento da prestaccedilatildeo
eacute obtido por meio de atos executivos pelo Estadordquo
1 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 41 2 Ibid p 42 3 Ibid p 42 4 FUX Luiz Curso de direito processual civil Rio de Janeiro Forense 2001 p 980 5 DIDIER JR Fredie et al Op Cit p 45
8 Dessa forma a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional responsaacutevel pela
concretizaccedilatildeo de um direito subjetivo no plano material obtendo resultado idecircntico ou
equivalente ao atingiacutevel se o devedor cumprisse espontaneamente a prestaccedilatildeo
Todavia essa atividade jurisdicional soacute cabe quando o devedor se recusa a cumprir
com a obrigaccedilatildeo quebrando a expectativa do credor de receber o que lhe eacute devido Por esta
razatildeo que se diz que a execuccedilatildeo civil eacute ldquoforccediladardquo 6
Eacute o que se conclui seguindo os ensinamentos de Leonardo Greco7 para ele execuccedilatildeo eacute
uma
() modalidade de tutela jurisdicional que consiste na praacutetica pelo juiz (ou por outrem sob a sua supervisatildeo) de uma seacuterie de atos coativos concretos sobre o devedor e sobre o seu patrimocircnio a fim de agrave custa dele e independentemente do concurso da sua vontade tornar efetivo o cumprimento de prestaccedilatildeo por ele inadimplida desde que tais atos coativos estejam previamente constituiacutedos em lei
Portanto a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional que tem como escopo obter o
cumprimento de uma prestaccedilatildeo certa e inadimplida mediante atos coativos sobre o devedor e
seus bens
22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
Vislumbrado o conceito de execuccedilatildeo civil cabe agora empreender a sua classificaccedilatildeo
tendo em vista que a execuccedilatildeo pode se manifestar de diversas formas possuindo diferentes
caracteriacutesticas em cada uma das suas modalidades
Inicialmente cabe destacar que haacute duas teacutecnicas processuais para viabilizar a execuccedilatildeo
civil lato sensu eacute a que divide em processo autocircnomo de execuccedilatildeo e em fase de execuccedilatildeo
dependendo do tiacutetulo executivo que justifica o exerciacutecio da atividade satisfativa
O Coacutedigo Processual Civil de 2015 acertadamente ratificou as reformas promovidas
no CPC73 que consagrava a opccedilatildeo legislativa de oferecimento das tutelas de certificaccedilatildeo e
efetivaccedilatildeo do direito em um mesmo processo Dessa forma as execuccedilotildees de sentenccedilas
6 BASTOS Luiz Fernando Pereira O artigo 139 IV do novo Coacutedigo de Processo Civil a atipicidade
dos meios executivos na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia certa Brasiacutelia 2017 Disponiacutevel em lt httpbdmunbbrbitstream104831866812017_LuizFernandoPereiraBastospdf gt Acesso em 06 de agosto de 2018
7 BASTOS Luiz Fernando Pereira apud GRECO Leonardo O processo de execuccedilatildeo Rio de Janeiro Renovar 1999 p 164
9
passaram a ser uma fase complementar ao de processo de conhecimento e natildeo mais ocorrer
em um processo autocircnomo
No entendimento do professor processualista Fredie Didier et al8 o processo
sincreacutetico simplificou a efetivaccedilatildeo de um direito reconhecido em sentenccedila
A dispensa do ajuizamento de um processo autocircnomo para execuccedilatildeo de sentenccedila natildeo soacute veio diminuir o tempo necessaacuterio agrave prestaccedilatildeo da tutela jurisdicional - afinal o credor natildeo mais precisaria tal como ocorria ateacute entatildeo promover nova citaccedilatildeo pessoal do reacuteudevedor- como tambeacutem veio romper de vez com um velho paradigma segundo o qual a atividade executiva estaria dissociada da precedente atividade jurisdicional cognitiva
Entretanto natildeo soacute as sentenccedilas de meacuterito ensejam uma execuccedilatildeo Por esta razatildeo foi
necessaacuterio manter o processo autocircnomo de execuccedilatildeo para os casos em que o credor tem a seu
favor um documento que natildeo tenha sido proferido por um oacutergatildeo dotado de jurisdiccedilatildeo
Consequentemente se for o titulo executivo judicial o caminho natural eacute o do
cumprimento de sentenccedila Sendo por sua vez extrajudicial o titulo executivo o caminho
correto eacute o processo de execuccedilatildeo
Cabe ainda salientar que toda execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial eacute definitiva Jaacute a
execuccedilatildeo de tiacutetulo judicial (cumprimento de sentenccedila) pode ser definitiva ou provisoacuteria
No primeiro caso isto eacute cumprimento de sentenccedila definitivo ldquoeacute a execuccedilatildeo completa
que vai ateacute a fase final (com a entrega do bem da vida) sem exigecircncias adicionais para o
exequenterdquo 9
Quanto ao segundo caso ldquoo cumprimento provisoacuterio de sentenccedila (fundada em tiacutetulo
provisoacuterio) eacute aquele que exige alguns requisitos extras para que se chegue agrave fase final da
execuccedilatildeordquo 10
Para Fredie Didier11 o criteacuterio para definir se o cumprimento de sentenccedila seraacute
definitivo ou provisoacuterio
() eacute a estabilidade do tiacutetulo executivo em que se funda a execuccedilatildeo se se tratar de decisatildeo acobertada pela coisa julgada material o cumprimento de sentenccedila eacute
8 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 46 9 Ibid p 57 10 Ibid p 57 11 Ibid p 57
10
definitivo se se tratar de decisatildeo judicial ainda passiacutevel de alteraccedilatildeo (reforma ou invalidaccedilatildeo) em razatildeo da pendecircncia de recurso contra ela interposto a que natildeo tenha sido atribuiacutedo efeito suspensivo o cumprimento de sentenccedila eacute provisoacuterio
Ademais a execuccedilatildeo se distingue em procedimentos executivos comuns que satildeo da
execuccedilatildeo civil e que servem a uma generalidade de creacuteditos como eacute o caso do cumprimento
de sentenccedila e o processo de execuccedilatildeo E em procedimentos executivos especiais que servem
agrave satisfaccedilatildeo de creacuteditos peculiares como a execuccedilatildeo de alimentos e a execuccedilatildeo fiscal 12
Por fim cabe mencionar a classificaccedilatildeo que distingue a execuccedilatildeo em direta e indireta
A primeira execuccedilatildeo direita (ou execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo) eacute ldquo() aquela em que o
Poder Judiciaacuterio prescinde da colaboraccedilatildeo do executado para a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida
e pois promove uma substituiccedilatildeo da sua conduta pela conduta do proacuteprio Estado-juiz ou de
terceirordquo 13 Ou seja as medidas executivas satildeo levadas a efeito mesmo contra a vontade do
devedor na execuccedilatildeo direta
Segundo a doutrina a execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo se subdivide da seguinte forma
meios de desapossamento meios de transformaccedilatildeo e meios de expropriaccedilatildeo
Os meios de desapossamento muito comuns nas execuccedilotildees para entrega de coisa eacute a
forma ldquopor meio da qual se retira da posse do executado o bem a ser entregue ao exequente
(p ex despejo busca e apreensatildeo reintegraccedilatildeo de posse)rdquo 14 Ao passo que por meio dos de
transformaccedilatildeo ldquo() o juiz determina que um terceiro pratique a conduta que deveria ser
praticada pelo executado cabendo a este arcar com o pagamento do custo respectivordquo 15 Jaacute
os meios executivos de expropriaccedilatildeo eacute a forma ldquopor meio do qual algum bem do patrimocircnio
do devedor eacute expropriado para pagamento do creacutedito (adjudicaccedilatildeo alienaccedilatildeo judicial ou
apropriaccedilatildeo de frutos e rendimentos de empresa ou de estabelecimentos e de outros bens art
825 CPC)rdquo 16
12 Ibid p 48 13 Ibid p 50 14 Ibid p 51 15 Ibid p 51 16 Ibid p 51
11 Jaacute a execuccedilatildeo indireta (ou mandamental) atua ldquo() na vontade do devedor como forma
de compeli-lo ou incentivaacute-lo a cumprir a ordem judicialrdquo 17 Nesse entendimento ainda
leciona Fredie Didier et al 18
Nesses casos o Estado-juiz busca promover a execuccedilatildeo com a colaboraccedilatildeo do executado forccedilando ou incentivando a que ele proacuteprio cumpra a prestaccedilatildeo devida Em vez de o Estado-juiz tomar as providecircncias que deveriam ser tomadas pelo executado o Estado forccedila por meio de coerccedilatildeo psicoloacutegica ou de promessa de recompensa judicial a que o proacuteprio executado cumpra a prestaccedilatildeo
A execuccedilatildeo indireta pode ser patrimonial como por exemplo a imposiccedilatildeo de multa
coercitiva ou pessoal com a prisatildeo civil do devedor de alimentos Ademais adiciona Didier
et al19que
O estiacutemulo ao cumprimento da prestaccedilatildeo pode dar-se pelo temor (p ex multa coercitiva prisatildeo civil do devedor de alimentos divulgaccedilatildeo de notiacutecia em jornal revelando o descumprimento) ou pelo incentivo (p ex a chamada sanccedilatildeo premial ou sanccedilatildeo positiva de que eacute exemplo a isenccedilatildeo do pagamento de custas em caso de cumprimento do mandado monitoacuterio - art 701 sect 1ordm CPC a reduccedilatildeo pela metade dos honoraacuterios advocatiacutecios fixados inicialmente pelo juiacutezo em caso de pagamento integral do deacutebito pecuniaacuterio na execuccedilatildeo por quantia certa fundada em tiacutetulo extrajudicial - art 827 sect 1ordm CPC)
Por tais razotildees haacute uma tendecircncia em cada vez mais prestigiar os meios executivos
indiretos (coercitivos) posto que satildeo tatildeo eficazes quanto os meios executivos diretos
entretanto menos onerosos Contudo sua aplicaccedilatildeo deve ser fiscalizada a fim de natildeo permitir
que a execuccedilatildeo civil perca sua finalidade visto que eacute uma funccedilatildeo jurisdicional que tem como
escopo efetivar o direito do credor e natildeo de atender os interesses do devedor
23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
Os princiacutepios juriacutedicos nos uacuteltimos anos passaram a ser munidos de forccedila cogente
normatizando as condutas humanas tanto quanto as regras juriacutedicas Os ditos princiacutepios
ampliaram as margens de atuaccedilatildeo dos aplicadores do direito possibilitando a construccedilatildeo de
soluccedilotildees mais adequadas agraves especificidades das demandas que chegam ao judiciaacuterio
17 Ibid p 51 18 Ibid p 51 19 Ibid p 51-52
12 Dessa forma eacute necessaacuterio aprofundar-se nos princiacutepios norteadores da execuccedilatildeo civil
para que se obtenha uma anaacutelise completa da teoria geral da execuccedilatildeo
A execuccedilatildeo civil tem como um dos seus corolaacuterios o princiacutepio da efetividade este
consiste na exigecircncia de um sistema completo de tutela executiva no qual existam meios
executivos capazes de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor
de tutela executivardquo 20
O referido princiacutepio da efetividade eacute reforccedilado como normal fundamental do processo
civil brasileiro pelo art 4ordm do CPC ldquoArt 4ordm As partes tecircm o direito de obter em prazo razoaacutevel
a soluccedilatildeo integral do meacuterito incluiacuteda a atividade satisfativa
Jaacute o princiacutepio da boa feacute processual corolaacuterio do devido processo legal estaacute previsto
no art 5ordm do CPC ldquoAquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de
acordo com a boa-feacuterdquo Segundo o processualista baiano Fredie Didier21
O princiacutepio da boa-feacute extrai-se de uma claacuteusula geral processual A opccedilatildeo por uma claacuteusula geral de boa-feacute eacute a mais correta Eacute que a infinidade de situaccedilotildees que podem surgir ao longo do processo torna pouco eficaz qualquer enumeraccedilatildeo legal exaustiva das hipoacuteteses de comportamento desleal Daiacute ser correta a opccedilatildeo da legislaccedilatildeo brasileira por uma norma geral que impotildee o comportamento de acordo com a boa-feacute Em verdade natildeo seria necessaacuteria qualquer enumeraccedilatildeo das condutas desleais o art 5deg do CPC eacute bastante exatamente por tratar-se de uma claacuteusula geral
Dessa forma o dito princiacutepio preconiza que diante de um vinculo juriacutedico as pessoas
envolvidas natildeo poderatildeo frustrar a confianccedila do outro devendo comportar-se como se pode
esperar de uma pessoa de boa-feacute
Ademais disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial que ldquosomente o
patrimocircnio do devedor (art 789 CPC) ou de terceiro responsaacutevel pode ser objeto da
atividade executiva do Estadordquo 22
O referido princiacutepio que determina que somente o patrimocircnio submete-se agrave execuccedilatildeo
e natildeo a pessoa foi trazido pela humanizaccedilatildeo do direito Para o professor Didier et al23 o
20 DIDIER JR Freddie et al apud GUERRA Marcelo Lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do
credor na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 21 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte
geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 105 22 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 68
13
desenvolvimento dos meios de execuccedilatildeo indireta ldquoparece relativizar um pouco esse princiacutepio
na medida em que pressionam psicologicamente a pessoa do devedor para que cumpra a
obrigaccedilatildeo com seu comportamentordquo
Complementa ainda que
A responsabilidade executiva parece assumir atualmente caraacuteter hiacutebrido comportando coerccedilatildeo pessoal e sujeiccedilatildeo patrimonial
i) a coerccedilatildeo pessoal incide sobre a vontade do devedor admitindo o uso de medidas coercitivas de execuccedilatildeo indireta para forccedilaacute-lo a cumprir a obrigaccedilatildeo com seu proacuteprio comportamento (ex arts 139 rv 523 sect 1ordm 536 sect 1ordm e 538 sect 3ordm todos do CPC)
ii) descumprida a obrigaccedilatildeo e natildeo sendo possiacuteveladequado o uso de teacutecnica de coerccedilatildeo pessoal tem-se a sujeiccedilatildeo patrimonial que recairaacute sobre os bens do devedor ou de terceiro responsaacutevel - que responderatildeo pela proacutepria prestaccedilatildeo in natura (ex dar coisa ou entregar quantia) ou por perdas e danos24
Dessa forma o referido princiacutepio natildeo tem aplicaccedilatildeo absoluta em razatildeo do principio da
efetividade a qual estimula o uso dos meios de coerccedilatildeo indireta para garantir o cumprimento
da obrigaccedilatildeo pelo devedor
O princiacutepio da primazia da tutela especifica (ou princiacutepio do resultado) assevera que
ldquoA execuccedilatildeo deve ser especiacutefica propiciar ao credor a satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo tal qual
houvesse o cumprimento espontacircneo da prestaccedilatildeo pelo devedorrdquo 25
O CPC de 2015 absorveu todos os avanccedilos legislativos a cerca do mote O caput do
art 497 assegura que na accedilatildeo que tenha por objeto a prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer o
juiz se procedente o pedido concederaacute a tutela especiacutefica ou determinaraacute providecircncias que
assegurem a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico equivalente O art 499 o
complementa a obrigaccedilatildeo somente seraacute convertida em perdas e danos se o autor o requerer
ou se impossiacutevel agrave tutela especiacutefica ou a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico
equivalente
O princiacutepio do contraditoacuterio eacute garantido pela constituiccedilatildeo federal e compreende o
direito de ser ouvido o direito de acompanhar os atos processuais o direito de produzir
provas participar da sua produccedilatildeo manifestar-se sobre a prova produzida e obter do juiz a
23 Ibid p 69-70 24 Ibid p 70 25 Ibid p 71
14
respectiva valoraccedilatildeo o direito de ser informado regularmente dos atos praticados no processo
o direito agrave motivaccedilatildeo das decisotildees o direito de impugnar as decisotildees 26
O contraditoacuterio tem aplicaccedilatildeo em todo processo judicial sendo aplicaacutevel tambeacutem na
execuccedilatildeo No entanto o contraditoacuterio na execuccedilatildeo natildeo ocorre com a mesma intensidade que
no processo ou na fase de conhecimento eacute o que assevera Didier et al 27
O contraditoacuterio no procedimento executivo no aspecto do direito de defesa assegurado agrave parte demandada eacute eventual porquanto depende da provocaccedilatildeo do executado que natildeo eacute chamado ajuiacutezo para defender-se mas sim para cumprir a obrigaccedilatildeo O procedimento executivo adota a teacutecnica monitoacuteria que consiste basicamente na inversatildeo do ocircnus de provocar o contraditoacuterio o reacuteu em vez de citado para manifestar-se sobre a pretensatildeo do autor eacute convocado para cumprir uma determinada obrigaccedilatildeo
Logo haacute o contraditoacuterio no procedimento executivo porem eacute eventual quanto agrave defesa
do executado
Ademais o princiacutepio da menor onerosidade eacute consagrado pelo art 805 do CPC e
dispotildee que ldquoQuando por vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz
mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o executadordquo O referido princiacutepio tem o
escopo de impedir o abuso do direito pelo exequente
O principio da menor onerosidade auxilia o juiz na escolha de um meio executivo
adequado e necessaacuterio que satisfaccedila a prestaccedilatildeo exigida pelo credor Nesse sentido eacute o
entendimento do professor Fredie Didier et al 28
O resultado a ser alcanccedilado eacute aquele estabelecido pelo direito material A maneira de se chegar ateacute esse resultado eacute que deve ser a menos onerosa possiacutevel para o executado Isso significa que a opccedilatildeo pelo meio menos gravoso pressupotildee que os diversos meios considerados sejam igualmente eficazes Assim havendo vaacuterios meios executivos aptos agrave tutela adequada e efetiva do direito de creacutedito escolhe-se a via menos onerosa ao executado
O princiacutepio visa impedir a execuccedilatildeo desnecessariamente onerosa ao executado ou seja a execuccedilatildeo abusiva Em vez de enumerar situaccedilotildees em que a opccedilatildeo mais gravosa revelar-se-ia injusta o legislador valeu-se corretamente de uma claacuteusula geral para reputar abusivo qualquer comportamento do credor que pretender valer-se de meio executivo mais oneroso do que outro igualmente idocircneo agrave satisfaccedilatildeo do seu creacutedito
26 Ibid p 76 27 Ibid p 78 28 Ibid p 79-80
15 O princiacutepio da cooperaccedilatildeo tem como base os princiacutepios do devido processo legal da
boa-feacute processual e do contraditoacuterio O dito princiacutepio avigora a eacutetica processual com o
aprimoramento do diaacutelogo entre as partes reciprocamente e com o oacutergatildeo jurisdicional Eacute o
que preconiza o art 6ordm do CPC Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para
que se obtenha em tempo razoaacutevel decisatildeo de meacuterito justa e efetiva
No procedimento executivo o princiacutepio da cooperaccedilatildeo incide de diversas formas
disciplina Didier et al29 que na execuccedilatildeo
O executado tem o dever de indicar bens agrave penhora (art 774 V CPC) Natildeo encontrados bens penhoraacuteveis e natildeo havendo indicaccedilatildeo de qualquer um deles pelo exequente cabe ao executado declarar quais satildeo seus bens penhoraacuteveis sob pena de se sujeitar a uma sanccedilatildeo pecuniaacuteria compulsoacuteria
Tambeacutem eacute manifestaccedilatildeo do princiacutepio da cooperaccedilatildeo a exigecircncia de que o executado que pretende impugnar o valor da execuccedilatildeo apresente de logo o valor que reputa devido (art 525 sect 4ordm CPC) Seria comportamento natildeo-cooperativo afirmar que a cobranccedila eacute excessiva sem simultaneamente dizer qual eacute o valor correto
Demais disso aplicam-se agrave execuccedilatildeo os deveres que decorrem do princiacutepio da cooperaccedilatildeo e que satildeo imputados ao oacutergatildeo jurisdicional () Assim por exemplo deve o juiz advertir ao executado antes de puni-lo de que seu ato pode vir a caracterizar-se como atentatoacuterio agrave dignidade da jurisdiccedilatildeo ( art 772 II CPC) perceba que se trata de uma conduta compatiacutevel com o dever de prevenccedilatildeo O oacutergatildeo jurisdicional somente pode conhecer da prescriccedilatildeo ex officio dando a oportunidade de o exequente manifestar-se conforme impotildee o dever de consulta ( cf arts 10 487 paraacutegrafo uacutenico e 921 sect 5ordm CPC)
O princiacutepio ou postulado30 da proporcionalidade tem aplicaccedilatildeo muito relevante na
execuccedilatildeo O art 8 do CPC assegura que o oacutergatildeo jurisdicional tem o dever de observar a
proporcionalidade e a razoabilidade ao aplicar o ordenamento juriacutedico inclusive no
procedimento executivo
Ademais o art 805 do CPC eacute categoacuterico ao disciplinar que ldquoArt 805 Quando por
vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo
menos gravoso para o executadordquo O referido artigo jaacute se trata de uma concretizaccedilatildeo da
proporcionalidade
29 Ibid p 82 30 Segundo Fredie Didier et al haacute uma discussatildeo doutrinaacuteria sobre a proporcionalidade Parte da
doutrina acredita que a proporcionalidade eacute um princiacutepio e outra parte acredita que eacute um postulado normativo
16 O principio da adequaccedilatildeo pode ser vislumbrado em dois momentos do Direito
Processual ldquoa) no legislativo como orientador da confecccedilatildeo das leis b) no jurisdicional
autorizando ao juiz diante do caso concreto adaptar procedimento agraves suas peculiaridadesrdquo 31
Para Luceacutelia de Sena Alves e Tiago Retes32
Isso quer dizer que no momento legislativo o devido processo deve ser observado pelo legislador para a confecccedilatildeo das normas de direito processual que iratildeo servir de instrumento efetivo de concretizaccedilatildeo do direito substancial a ser tutelado atendendo a todas as suas finalidades sob pena de falecircncia do proacuteprio direito No momento jurisdicional da mesma forma a via processual escolhida pelo autor tambeacutem deve estar sujeita a este princiacutepio para que natildeo sofra as mesmas consequecircncias da sua inobservacircncia
O ordenamento juriacutedico deve ser aplicado por meio da teacutecnica processual adequada
evitando dessa forma uma tutela ineficaz
Por fim o princiacutepio do autorregramento da vontade na execuccedilatildeo tem o objetivo de
ldquo() preservar um espaccedilo processual para o exerciacutecio da liberdade e da vontade em que
sejam permitidas negociaccedilotildees que envolvam as partes ndash e tambeacutem o juizrdquo33 Didier et al34
assevera que
A rigor o legislador estabelece um regime juriacutedico de autorregramento da vontade processual identificando-se algumas manifestaccedilotildees relevantes para a execuccedilatildeo Na verdade pode-se dizer que poucos satildeo os ambientes mais propiacutecios do que a execuccedilatildeo para a negociaccedilatildeo sobre o processo Todos os institutos e normas processuais relativos agrave execuccedilatildeo devem ser repensados a partir da premissa de que o CPC permite uma ampla margem de liberdade de negociaccedilatildeo sobre o processo (art 190 CPC)
O autorregramento da vontade pode ser vislumbrando na previsatildeo de negoacutecios tiacutepicos
em sede de execuccedilatildeo como por exemplo no acordo das partes sobre o valor do bem que
dispensa a avaliaccedilatildeo disposto no inciso I do art 871 CPC Ademais dentro dos limites do art
190 do CPC eacute possiacutevel na execuccedilatildeo a atribuiccedilatildeo da negociaccedilatildeo atiacutepica aos sujeitos 31 ALVES Luceacutelia de Sena Alves RETES Tiago O poder geral de efetivaccedilatildeo das decisotildees judiciais e
proporcionalidade uma anaacutelise criacutetica acerca do art 139 IV do Novo Coacutedigo de Processo Civil Disponiacutevel em lthttpswwwacademiaedu31752652O_poder_geral_de_efetivaC3A7C3A3o_das_decisC3B5es_judiciais_e_a_proporcionalidade_uma_anC3A1lise_crC3ADtica_acerca_do_art_139_IV_do_Novo_CC3B3digo_de_Processo_Civil gt Acesso em 25 de julho de 2018
32 Ibid natildeo paginado 33 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 85 34 Ibid p 85
17
processuais permitindo que sejam feitas mudanccedilas nos procedimentos e nas situaccedilotildees
juriacutedicas processuais ldquoSatildeo exemplos de negoacutecios processuais atiacutepicos na execuccedilatildeo pacto de
penhorabilidade acordo de ampliaccedilatildeo de prazos das partes de qualquer natureza acordo de
rateio de despesas processuais ()rdquo35
24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO
Sempre houve diversos questionamentos quanto agrave eficaacutecia do Direito processual Civil
e se o mesmo era meio apto a assegurar a tutela jurisdicional dos direitos dos cidadatildeos O
processo de execuccedilatildeo eacute o setor que sofre mais criacuteticas quanto a sua ineficiecircncia afinal a
execuccedilatildeo civil sempre foi o ldquocalcanhar de Aquilesrdquo do sistema processual pela praxe do
ldquoganhou (no processo de conhecimento) mas natildeo levou (na fase de cumprimento ou
execuccedilatildeo)rdquo 36
Essa dificuldade de se efetivar a tutela satisfastiva natildeo se resume a um problema de
mera teacutecnica processual tiacutepico de determinado ordenamento mas representa uma prova de
fogo da capacidade dos instrumentos jurisdicionais O autor Leonardo Greco37 no ano de
2005 atribuiu esse fato as seguintes causas o excesso de processos o custo e a morosidade da
justiccedila a inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios a ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais
um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico e a progressiva volatizaccedilatildeo dos bens
Quanto ao excesso de processos o referido autor aduz que ldquonos grandes centros o
crescimento da maacutequina judiciaacuteria natildeo acompanhou a expansatildeo do nuacutemero de litiacutegiosrdquo 38
O custo e morosidade da justiccedila prejudicam a tutela satisfativa posto que
ldquojaacute desfalcado pelo inadimplemento do devedor o credor ainda tem de arcar com o adiantamento das despesas do processo de execuccedilatildeo e de eventual liquidaccedilatildeo vendo arrastar-se a marcha dos atos executoacuterios facilmente retardada por atos procrastinatoacuterios do devedorrdquo 39
35 Ibid p 86 36 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca
para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018
37 GRECCO Leonardo A Crise do Processo de Execuccedilatildeo in Estudos de direito processual Leonardo Greco ndash Campos dos Goytacazes Ed Faculdade de Direito de Campos 2005 p 7
38 Ibid p 7 39 Ibid p 7-8
18 A inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios contribui para a crise do processo de
execuccedilatildeo tendo em vista que
ldquoo juiz da execuccedilatildeo prisioneiro de ritos que o distanciam das partes e da realidade da vida impulsiona sem qualquer apetite a execuccedilatildeo conduzindo-a ao sabor dos ventos das provocaccedilotildees impacientes do credor e das costumeiras procrastinaccedilotildees do devedorrdquo 40
Jaacute ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais atrapalha a efetivaccedilatildeo da tutela satisfativa ldquoo
devedor natildeo colabora com a execuccedilatildeo e os meios de pressatildeo que a lei estabelece natildeo satildeo
suficientes para intimidaacute-lordquo 41
Com um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico
O espiacuterito empresarial e a sociedade de consumo estimulam o endividamento das pessoas e o inadimplemento das obrigaccedilotildees pelo devedor deixou de ser vexatoacuterio e reprovaacutevel o que multiplica as accedilotildees de cobranccedila e execuccedilotildees atraveacutes das quais o sujeito passivo ainda usufrui vantagens agraves custas do credor 42
Por fim Leonardo Greco elenca a volatizaccedilatildeo dos bens como o uacuteltimo fator que
macula o processo executo tendo em vista que
ldquomudou inteiramente o perfil patrimonial das pessoas antes concentrado em bens de raiz e agora tendencialmente dirigido a investimentos em tiacutetulos e valores facilmente negociaacuteveis o que dificulta a sua localizaccedilatildeo pelo credorrdquo 43
O Coacutedigo de Processo Civil de 1973 introduziu o sistema executivo ao ordenamento
juriacutedico paacutetrio e seguindo os valores liberais da eacutepoca com a proteccedilatildeo de esfera juriacutedica de
liberdade do cidadatildeo contra a possibilidade de arbiacutetrio do Estado e uso indevido do Poder
jurisdicional outorgou o miacutenimo de poder ao juiz Seguindo as regras do CPC de 73 o
devedor soacute poderia ter sua esfera juriacutedica invadida atraveacutes de meios de execuccedilatildeo instituiacutedos
previamente em lei
Diante de tantos obstaacuteculos para se efetivar a tutela satisfativa a execuccedilatildeo estava
fadada ao fracasso o que frustrava a expectativa do jurisdicionado a uma prestaccedilatildeo da tutela
jurisdicional ceacutelere e efetiva Insatisfeitos com o cenaacuterio que se encontrava a atividade
40 Ibid p 8 41 Ibid p8 42 Ibid p 8 43 Ibid p8
19
executiva legisladores e operadores do direito natildeo mediram esforccedilos para promover uma
evoluccedilatildeo significativa buscando mais eficiecircncia e celeridade ao procedimento executoacuterio
Dessa forma no final de 1994 foi introduzido no coacutedigo de processo agrave flexibilizaccedilatildeo
dos poderes executoacuterios do juiz ldquopara que ele pudesse prestar uma tutela efetiva aos direitos
ficando autorizado a determinar a modalidade de execuccedilatildeo adequada a cada hipoacutetese nas
obrigaccedilotildees de fazer e natildeo fazer (art 461 sect5ordm do CPC de 1973)rdquo No ano de 2002 a referida
medida foi estendida para as obrigaccedilotildees de entregar coisa (art 461-A caput e sect3ordm do CPC de
1973)
Com fundamento nos artigos 461 e 461-A em 2005 a Lei nordm 11 23205 unificou o
processo de conhecimento e o processo de execuccedilatildeo de sentenccedila Nesse sentido Maacuterio
Henrique Cavalcanti Gil Rodrigues44 aduz que
A Lei 112322005 reuniu de forma definitiva os processos de conhecimento e de execuccedilatildeo em um uacutenico processo composto por um sistema bifaacutesico Assim passa a existir uma fase inicial (de reconhecimento) e uma fase posterior (de cumprimento de sentenccedila de efetivaccedilatildeo da decisatildeo definitiva) sem contar com a eventual fase intermediaacuteria de liquidaccedilatildeo (RODRIGUES 2010 p 38)
Ademais as alteraccedilotildees realizadas no CPC de 73 inseriu a atipicidade dos meios
executivos nas obrigaccedilotildees de fazer natildeo fazer e dar coisa certa entretanto exercendo papel
subsidiaacuterio aos meios tiacutepicos
Quanto agraves obrigaccedilotildees de pagar quantia havia apenas a possibilidade de se valer da
incidecircncia de multa do art 475-J do CPC de 73 ndash implementada mediante reforma perpetrada
pela Lei nordm 11232 de 2005 em atendimento a doutrina processualista preocupada com a
efetividade das decisotildees ndash e de atos executivos como a penhora de bens e dinheiro
Ainda que a execuccedilatildeo tenha avanccedilado com a inserccedilatildeo das leis posteriores a 1994 no
CPC de 1973 a mesma continuava insuficiente tendo em vista que a burocracia e lentidatildeo
dos atos executivos davam brechas para que o devedor escondesse seu patrimocircnio penhoraacutevel
tornando carente de efetividade e celeridade agrave execuccedilatildeo
44 RODRIGUES Maacuterio Henrique Cavalcanti Gil A evoluccedilatildeo da execuccedilatildeo de sentenccedila no direito
processual civil e o novo regime juriacutedico das sentenccedilas apoacutes a reforma implementada pela Lei 112322005 Revista do Tribunal Regional Federal da 1ordf Regiatildeo v 22 n 2 fev 2010 p 38
20
25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO
A tutela juridiscional eacute um direito fundamental previsto no art 5ordm inciso XXXV da
Carta Magna ldquo() a lei natildeo excluiraacute da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio lesatildeo ou ameaccedila a
direitordquo
Na visatildeo claacutessica o direito de accedilatildeo era efetivado com a prolaccedilatildeo de uma sentenccedila de
meacuterito posiccedilatildeo adotada por grande parte dos processualistas seguidores da doutrina de
Liebman Todavia esse conceito se mostra defasado tendo em vista que o direito de acesso agrave
justiccedila natildeo eacute apenas uma garantia formal de bater as portas do judiciaacuterio mas a garantia de
acesso agrave ordem juriacutedica justa adequada e eficaz45
Acreditar que uma sentenccedila de meacuterito favoraacutevel eacute tutela jurisdicional suficiente para
satisfazer o que se busca com o ajuizamento da accedilatildeo eacute uma visatildeo distorcida da atividade
satisfativa ldquoSob o ponto de vista do direito material a condenaccedilatildeo por si soacute eacute incapaz de
prestar a tutela do direitordquo46
Nessa oacutetica o direito fundamental agrave tutela executiva exige um sistema de tutela
jurisdicional ldquocapaz de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor
de tutela executivardquo47 Dessa forma entende-se que
ldquo() a) a interpretaccedilatildeo das normas que regulamentam a tutela executiva tem de ser feita no sentido de extrair a maior efetividade possiacutevel b) o juiz tem o poder-dever de deixar de aplicar uma norma que imponha uma restriccedilatildeo a um meio executivo sempre que essa restriccedilatildeo natildeo se justificar como forma de proteccedilatildeo a outro direito fundamental c) o juiz tem o poder-dever de adotar os meios executivos que se revelem necessaacuterios agrave prestaccedilatildeo integral de tutela executivardquo48
Egrave imperioso compreender que o direito fundamental agrave tutela executiva ratificado
pelo CPC eacute essencial para dirimir diversos litiacutegios oriundos do procedimento executivo
45 FERREIRA Gabriela Macedo Poder geral de efetivaccedilatildeo em defesa da constitucionalidade da
teacutecnica de execuccedilatildeo dos direitos do art 139 IV do Coacutedigo de Processo Civil Revista Jus Navigandi ISSN 1518-4862 Teresina ano 22 n 5178 4 set 2017 Disponiacutevel em lthttpsjuscombrartigos60190gt Acesso em 11 set 2018
46 Ibid natildeo paginado 47 DIDIER JR Fredie et al apud GUERRA Marcelo lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do credor
na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 48 Ibid p 102-104
21
ldquoprincipalmente aqueles relacionados agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo49
Fredie Didier et al50 cita como exemplo as hipoacuteteses de impenhorabilidade
A impenhorabilidade de certos bens eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa
Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais
Por esta razatildeo o legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do
CPC fazendo um preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses das partes envolvidas
optando pela mitigaccedilatildeo do direito do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado
Quando o oacutergatildeo jurisdicional verificar que a aplicaccedilatildeo das regras de
impenhorabilidade eacute desproporcional para o caso concreto deve afastaacute-la e construir a
soluccedilatildeo adequada para o referido caso Didier et al51 traz um exemplo esclarecedor em sua
obra
O bem imoacutevel que serve de moradia da famiacutelia eacute relativamente impenhoraacutevel Objetiva-se com essa restriccedilatildeo proteger o direito fundamental agrave moradia conteuacutedo do direito agrave proteccedilatildeo da dignidade Imagine-se um imoacutevel de altiacutessimo valor Imagine-se agora um creacutedito que corresponda a 40 do valor do imoacutevel A venda judicial do imoacutevel no caso permitiria natildeo soacute satisfazer o direito do credor como ainda garantir ao executado com a sobra a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel que lhe preserve a dignidade A opccedilatildeo pela interpretaccedilatildeo literal da regra que veda a penhora protegeria exclusivamente o direito do executado de maneira desnecessaacuteria porque a relaccedilatildeo valor executadovalor do bem permitiria a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel apoacutes a entrega do dinheiro ao credor Seria pois interpretaccedilatildeo em desconformidade com os preceitos da contemporacircnea hermenecircutica constitucional que preconiza a necessidade de nos casos de choque entre direitos fundamentais dar a interpretaccedilatildeo que mais adequadamente proteja a ambos
A execuccedilatildeo civil integra o direito fundamental agrave tutela jurisdicional disciplinando
que ldquoos dispositivos devem ser interpretados de modo que se garanta a maior efetividade
49 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66 50 Ibid p 66 51 Ibid p 67
22
possiacutevel agrave execuccedilatildeo desde que respeitados outros direitos fundamentaisrdquo52 Podendo ser
afastada desde que proporcional qualquer obstaacuteculo irrazoaacutevel agrave efetivaccedilatildeo desse direito
52 FERREIRA Gabriela Macedo apud MACEDO Lucas Buril de As eficaacutecias das decisotildees judiciais e
o cumprimento de sentenccedila no CPC15 Novo CPC Doutrina selecionada v 5 Execuccedilatildeo Coordenador geral Fredie Didier Jr organizadores Lucas Buril de Macedo Ravi Peixoto Alexandre Freire ndash Salvador Jus Podivm 2015 p 360361
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3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO
EXECUTADO
31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS
Como forma de controlar a atividade jurisdicional por muito tempo vigorou o
entendimento de que a execuccedilatildeo somente poderia ser realizada atraveacutes dos meios executivos
tipicamente previstos na legislaccedilatildeo Segundo Luiz Guilherme Marinoni53
O princiacutepio da tipicidade deseja significar que os meios de execuccedilatildeo devem estar previstos na lei e assim que a execuccedilatildeo natildeo pode ocorrer atraveacutes de formas executivas natildeo tipificadas O seu objetivo eacute de um lado impedir que meio executivo natildeo previsto em lei possa ser utilizado e de outro garantir o jurisdicionado contra a possibilidade de arbiacutetrio judicial na fixaccedilatildeo da modalidade executiva Se o jurisdicionado sabe em razatildeo de previsatildeo legal que a sua esfera juriacutedica somente poderaacute ser invadida atraveacutes de determinadas modalidades executivas confere-se a ele a possibilidade de antever a reaccedilatildeo ao seu inadimplemento bem como a garantia de que a jurisdiccedilatildeo natildeo determinaraacute ou permitiraacute a utilizaccedilatildeo de meio executivo diverso daqueles previstos
Dessa forma o princiacutepio da tipicidade disciplina que o oacutergatildeo julgador ao proceder agrave
execuccedilatildeo estaacute limitado aos meios executivos previamente definidos em lei natildeo podendo se
valer de qualquer teacutecnica de efetivaccedilatildeo que natildeo se encaixasse nas hipoacuteteses taxativas da
legislaccedilatildeo
Entretanto o legislador natildeo tem como prever todas as peculiaridades dos direitos
dignos de tutela executiva e preordenar teacutecnicas executivas diversas para cada peculiaridade
Sob esse cenaacuterio o principio da tipicidade foi cedendo lugar ao principio da atipicidade dos
meios executivos
A ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do oacutergatildeo julgador estaacute cada vez mais presente
no ordenamento juriacutedico paacutetrio motivando um poder geral de efetivaccedilatildeo ldquoque permite ao
julgador valer-se dos meios executivos que considerar mais adequado ao caso concreto sejam
eles de coerccedilatildeo direta sejam de coerccedilatildeo indiretardquo 54
53 MARINONI Luiz Guilherme Teacutecnica processual e tutela dos direitos Satildeo Paulo Editora Revista
dos Tribunais 2004 p 212 nota 79 54 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 100
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Essa tendecircncia de ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do juiz natildeo eacute exclusividade do
ordenamento juriacutedico brasileiro segundo Fredie Didier et al55
Michelle Taruffo jaacute apontava que o direito americano diante da inefetividade dos meios executivos at law comeccedilou a autorizar o magistrado a tomar medidas executivas adequadas ao caso concreto Trata-se afirma o jurista italiano de aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo segundo o qual as regras processuais devem ser adaptadas agraves necessidades do direito material
Os meios executivos atiacutepicos derivam de trecircs enunciados normativos do Coacutedigo de
Processo Civil o art 139 IV o art 297 e o sect1ordm do art 536
O art 139 IV do CPC dispotildee que pertence ao juiz o poder-dever de ldquodeterminar
todas as medidas indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para
assegurar o cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto
prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo
Jaacute o art 297 do CPC cuida da tutela provisoacuteria e garante que ldquoo juiz poderaacute
determinar as medidas que considerar adequadas para a efetivaccedilatildeo da tutela provisoacuteriardquo
Podendo dessa forma a dita tutela ser efetivada atipicamente
Por fim o art 536 sect1ordm do CPC dispotildee que
Para atender ao disposto no caput o juiz poderaacute determinar entre outras medidas a imposiccedilatildeo de multa a busca e apreensatildeo a remoccedilatildeo de pessoas e coisas o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva podendo caso necessaacuterio requisitar o auxilio de forccedila policial
As supracitadas medidas executivas atiacutepicas satildeo entendidas pela doutrina como
claacuteusulas gerais processuais executivas56 Essas claacuteusulas gerais natildeo restringem a sua
aplicaccedilatildeo agraves teacutecnicas de coerccedilatildeo indireta satildeo autorizados tambeacutem o uso de meios de execuccedilatildeo
dieta e indireta
Ademais cumpre salientar que o art 139 IV CPC aplica-se a toda e qualquer
atividade executiva ldquoa) seja fundada em tiacutetulo executivo judicial (provisoacuteria ou definitiva)
55 DIDIER JR Fredie et al apud TARUFFO Michelle A atuaccedilatildeo executiva dos direitos perfis
comparatiacutesticos Revista de Processo Satildeo Paulo RT 1990 n 59 p 78 56 Segundo Fredie Didier et al claacuteusula geral eacute uma espeacutecie de texto normativo cujo antecedente
(hipoacutetese faacutetica) eacute composto por termos vagos e consequente (efeito juriacutedico) eacute indeterminado
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seja fundada em tiacutetulo executivo extrajudicial b) seja para efetivar prestaccedilatildeo pecuniaacuteria seja
para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer ou dar coisa distinta de dinheirordquo57
Jaacute o art 297 do CPC garante que a tutela provisoacuteria possa ser efetivada tambeacutem
atipicamente ldquoSucede que a atipicidade da tutela provisoacuteria segue necessariamente a
atipicidade da tutela definitivardquo 58
Por fim o comando do sect 1 ordmdo art 536 se aplica
a) inicialmente agrave execuccedilatildeo de fazer e de natildeo fazer fundada em decisatildeo judicial (provisoacuteria ou definitiva) b) por forccedila do sect 3ordm do art 538 tambeacutem se aplica ao cumprimento de sentenccedila para entrega de coisa c) por forccedila do art 771 paraacutegrafo uacutenico o dispositivo tambeacutem se aplica agrave execuccedilatildeo para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer e entregar coisa distinta de dinheiro fundada em tiacutetulo extrajudicial
Claramente o art 139 IV eacute mais amplo do que o sect 1 ordm do art 536 estende-se por
disposiccedilatildeo expressa agrave execuccedilatildeo de pagar quantia Sendo uma grande novidade nas obrigaccedilotildees
que tem por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15
O art 139 IV do CPC apresentou uma novidade agrave atipicidade dos meios executivos
ao disciplinar que cabe ao juiz ldquodeterminar todas as medidas indutivas coercitivas
mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o cumprimento de ordem judicial
inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo
A inovaccedilatildeo estaacute na possibilidade de utilizar os meios atiacutepicos para assegurar o
cumprimento de decisotildees que versam sobre as obrigaccedilotildees pecuniaacuterias sendo admitida a
utilizaccedilatildeo de outros meios ateacute na execuccedilatildeo de titulo judicial de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria aleacutem da
multa de 10 (a que se refere o artigo 523 sect 1ordm do CPC) para forccedilar o devedor a cumprir a
obrigaccedilatildeo pecuniaacuteria
57 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 105 58 Ibid p 105
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Dessa forma eacute possiacutevel afirmar que ldquoao lado da disciplina tiacutepica do art 523 e
seguintes () o novo CPC inova ao permitir que o sistema de teacutecnicas executivas atiacutepicas
sejam empregadas na execuccedilatildeo monetaacuteriardquo59 (ZARONI VITORELLI 2016 p 66)
Fernando da Fonseca Gajardoni60 denomina a dita medida como a ldquorevoluccedilatildeo
silenciosardquo da execuccedilatildeo por quantia certa posto que
() pelo fato de que a regra natildeo estar propriamente incrustrada nos capiacutetulo e livro atinentes ao cumprimento de sentenccedila e ao processo de execuccedilatildeo ndash o art 139 IV do Novo CPC parece trazer ao paiacutes algo bastante novo cuja aplicaccedilatildeo a depender do comportamento do Judiciaacuterio pode implicar em verdadeira revoluccedilatildeo (positiva ou negativa) na sistemaacutetica executiva ateacute entatildeo vigente
Claramente o dispositivo foi recebido com entusiasmo por parte da doutrina que
anteciparam em afirmar que o princiacutepio da atipicidade dos meios executivos no CPC2015
ldquo() assume a feiccedilatildeo de poder-dever geral conferido ao magistrado de determinar () todas
as medidas coercitivas sub-rogatoacuterias mandamentais e indutivas que entender necessaacuterias
para a tutela justa efetiva e em tempo razoaacutevelrdquo 61
Dessa forma lecionam Luiz Guilherme Marinoni Seacutergio Cruz Arenhart e Daniel
Mitidiero62 que
O juiz a partir do art 139 IV do CPC2015 natildeo estaacute mais adstrito apenas agrave sentenccedila condenatoacuteria ndash que fixa a obrigaccedilatildeo de pagar e daacute ensejo agrave abertura da execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo patrimonial ndash para a tutela de prestaccedilotildees pecuniaacuterias Pode impor essa prestaccedilatildeo por meio de ordem judicial acoplada ao aceno de emprego de medida de induccedilatildeo (coercitiva ou de pressatildeo positiva) ou de medida de sub-rogaccedilatildeo (MARINONI ARENHARDT MITIDIERO 2015 p 703)
Deste modo em razatildeo do art 139 IV do CPC tem-se entendido que o juiz nas
execuccedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria possui a faculdade de adotar qualquer
59 ZARONI Bruno Marzullo VITORELLI Edilson Reforma e efetividade da execuccedilatildeo no novo CPC
In PEIXOTO Ravi FREIRE Alexandre MENDES Aluiacutesio Gonccedilalves de Castro Execuccedilatildeo 2 ed rev e atual Salvador JusPodivm 2016 766 p (Coleccedilatildeo novo CPC doutrina selecionada v 5) p 66
60 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia 24082015 JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Acesso em 23082018
61 LIMA Rafael de Oliveira A atipicidade dos meios executivos no coacutedigo de processo civil brasileiro de 2015 Revista de Processo Jurisdiccedilatildeo e Efetividade da Justiccedila v 2 n 2 juldez 2016 p 11
62 MARINONI Luiz Guilherme ARENHART Seacutergio Cruz MITIDIERO Daniel Novo curso de processo civil tutela dos direitos mediante procedimento comum Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 v 2 p 703
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medida indutiva coercitiva mandamentais ou sub-rogatoacuterias para efetivar o creacutedito do
exequente natildeo se limitando as medidas tiacutepicas
Alguns doutrinadores se precipitaram ao afirmar que o dito dispositivo ldquo() autoriza o
juiz a utilizar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir ressalvando-se a prisatildeo
civil constitucionalmente limitada ao devedor de alimentosrdquo 63 Acreditam Jorge Bheron
Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa que o entusiasmo por parte da
doutrina abre margem para as mais variadas formas de compelir o devedor a cumprir com a
prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
ldquoE aiacute persistindo no mau vezo de fazer explicaccedilotildees em abstrato ignorando que o sentindo soacute se daacute na aplicaccedilatildeo (situaccedilatildeo concreta real ou fictiacutecia) as sugestatildeo satildeo as mais engenhosas suspensatildeo de CNH retenccedilatildeo de passaporte restriccedilatildeo de fim de semana cancelamento de cartotildees de creacutedito ndash para ficar apenas nestasrdquo 64
Ou seja podendo o juiz natildeo apenas substituir o devedor tomando seu patrimocircnio para
entregar ao credor na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia como tambeacutem poderaacute
pressionaacute-lo psicologicamente a adimplir por conta proacutepria a obrigaccedilatildeo
Ademais o Enunciado nordm 48 do ENFAM avalia expressamente a possibilidade de
imposiccedilatildeo de medidas coercitivas para a efetivaccedilatildeo da execuccedilatildeo pecuniaacuteria Conforme o dito
enunciado
ldquoO art 139 inciso IV traduz um poder geral de efetivaccedilatildeo permitindo a aplicaccedilatildeo de medidas atiacutepicas para garantir o cumprimento de qualquer ordem judicial inclusive no acircmbito do cumprimento de sentenccedila e no processo de execuccedilatildeo baseado em tiacutetulosrdquo
Dessa forma o artigo 139 IV do CPC permite uma gama ampla de interpretaccedilotildees por
parte da doutrina por ser uma claacuteusula geral encontrando limite apenas na imaginaccedilatildeo de
quem o analisa Nesse sentido eacute forccediloso orientar e delimitar o manejo desse artigo legal para
que se extraia seu sentido e alcance revelando assim sobre que situaccedilotildees ele incide de que
modo e o que permite
63 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
64 Ibid sem paginaccedilatildeo
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32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER
GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
O artigo 139 IV com a vigecircncia do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 abriu margem
para uma constelaccedilatildeo de decisotildees nas quais o dito dispositivo recebeu diversas interpretaccedilotildees
pelos operadores do direito
Sem duacutevidas por ser uma das pioneiras a decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara
Ciacutevel do Foro Regional de Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-
1320138260011 na data de 25 de agosto de 2016 gerou um enorme rebuliccedilo
Nessa accedilatildeo que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto
uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a
suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o
passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito
Segundo a magistrada o processo tramitava haacute anos sem que nenhum valor tenha sido
pago ao exequente aleacutem do devedor natildeo ter oferecido proposta de acordo e nem ter indicado
bens agrave penhora configurando uma completa desiacutedia com o processo
ldquoO caso tratado nos autos se insere dentre as hipoacuteteses em que eacute cabiacutevel a aplicaccedilatildeo do art 139 inciso IV do Coacutedigo de Processo Civil Isso porque o processo tramita desde 2013 sem que qualquer valor tenha sido pago ao exequente Todas as medidas executivas cabiacuteveis foram tomadas sendo que o executado natildeo paga a diacutevida natildeo indica bens agrave penhora natildeo faz proposta de acordo e sequer cumpre de forma adequada as ordens judiciais frustrando a execuccedilatildeo
Se o executado natildeo tem como solver a presente diacutevida tambeacutem natildeo recursos para viagens internacionais ou para manter um veiacuteculo ou mesmo manter um cartatildeo de creacutedito Se poreacutem mantiver tais atividades poderaacute quitar a diacutevida razatildeo pela qual a medida coercitiva poderaacute se mostrar efetiva
Assim como medida coercitiva objetivando a efetivaccedilatildeo da presente execuccedilatildeo defiro o pedido formulado pelo exequente e suspendo a Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo do executado M A S determinando ainda a apreensatildeo de seu passaporte ateacute o pagamento da presente diacutevida
()
Determino ainda o cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado ateacute o pagamento da presente diacutevida ()rdquo
Foi impetrado Habeas Corpus no Tribunal de Justiccedila do Estado de Satildeo Paulo a favor
do executado sob o fundamento que a coaccedilatildeo era ilegal e afetava o direito de locomoccedilatildeo
29
garantido constitucionalmente Tendo sido concedida a liminar em decisatildeo que ora se
reproduz
Em que pese a nova sistemaacutetica trazida pelo art 139 IV do CPC2015 deve-se considerar que a base estrutural do ordenamento juriacutedico eacute a Constituiccedilatildeo Federal que em seu art 5ordm XV consagra o direito de ir e vir Ademais o art 8ordm do CPC2015 tambeacutem preceitua que ao aplicar o ordenamento juriacutedico o juiz natildeo atentaraacute apenas para a eficiecircncia do processo mas tambeacutem aos fins sociais e agraves exigecircncias do bem comum devendo ainda resguardar e promover a dignidade da pessoa humana observando a proporcionalidade a razoabilidade e a legalidade Por tais motivos concedo a liminar pleiteada65
Cabe destacar aqui o voto vencido da Desembargadora Maria Luacutecia Pizzotti no
julgamento do Habeas Corpus supracitado demonstrando que o debate sobre a abrangecircncia
do artigo 139 IV do CPC ocorre tanto na doutrina quanto no judiciaacuterio
O objetivo do novel dispositivo natildeo eacute impor penas ou restringir direitos natildeo sendo intenccedilatildeo do Judiciaacuterio suspender indefinidamente o direito de dirigir do executado ou sua liberdade de viajar mas sim impor uma restriccedilatildeo tatildeo gravosa caso ele natildeo cumpra a determinaccedilatildeo que escolha cumprir sua obrigaccedilatildeo e dar fim ao problema Em outras palavras mediante as medidas de coerccedilatildeo o Estado procura persuadir o inadimplente impondo-lhe situaccedilotildees tatildeo onerosas e inconvenientes que em algum momento seja para ele mais vantajoso cumprir do que permanecer no inadimplemento
Ao fazecirc-lo o Novo Coacutedigo de Processo Civil rompe com as criacuteticas da ineficiecircncia das execuccedilotildees Natildeo se cogita deferir medidas restritivas agravequeles que demonstram a incapacidade absoluta de solver o deacutebito apenas agravequeles que reconhecidamente se valem de artimanhas e subterfuacutegios para evitar a satisfaccedilatildeo das diacutevidas ldquopreferindordquo outras despesas mais lsquonobresrsquo agindo em nome de terceiros e fazendo escaacuternio dos credores e do proacuteprio Poder Judiciaacuterio (hellip)
Para tanto memoraacutevel a noccedilatildeo de que a medida em comento tem caraacuteter excepcional e encontra limites no plano da proporcionalidade como sustenta o ilustrado Magistrado paulista Fernando da Fonseca Gajardoni Professor Faculdade de Direito de Ribeiratildeo Preto da USP (in httpswwwjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 acesso em 091216 agraves 11h20min) E para anaacutelise da proporcionalidade a ponderaccedilatildeo deve observar os trecircs passos apontados pela doutrina a necessidade a adequaccedilatildeo e a proporcionalidade em sentido estrito
65 TJSP - Habeas Corpus Processo nordm 2183713-8520168260000 30ordf Cacircmara Direito Privado relator
Des Marcos Ramos j 290317
30
Ademais no entendimento de Jorge Amaury Maia Nunes e Guilherme Pupe de
Noacutebrega66 essa decisatildeo releva os perigos trazidos pelo art 139 IV do CPC ao confrontar
direitos constitucionalmente garantidos
De nossa parte entendemos que a liberdade de locomoccedilatildeo inserta no inciso XV do artigo 5ordm que abrange o direito de deixar o territoacuterio nacional sofre embaraccedilo indevido pela apreensatildeo de passaporte ou pela suspensatildeo da carteira nacional de habilitaccedilatildeo
()
Agrave luz da exposiccedilatildeo feita acima e em anaacutelise primeva sustentamos que o artigo 139 IV do CPC de 2015 estaacute a merecer declaraccedilatildeo de inconstitucionalidade sem reduccedilatildeo de texto para o fim de rechaccedilar a apreensatildeo de passaporte a suspensatildeo do direito de dirigir e a vedaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo em concurso ou em licitaccedilatildeo puacuteblicos como medidas passiacuteveis de serem adotadas pelo juiz sob pena de vulneraccedilatildeo aos artigos 1ordm IV 5ordm XV e LIV 37 I 173 sect 3ordm III e 175 todos da Constituiccedilatildeo
Apesar de ter sofrido duras criacuteticas a decisatildeo do processo de nordm 4001386-
1320138260011 serviu de inspiraccedilatildeo para tantas outras decisotildees no mesmo sentido
Foi o caso da decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de Satildeo
Vicente em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 0020724-2620088260590 na data de 21 de
junho de 2017
A supracitada execuccedilatildeo se arrastava por nove (09) anos sem que o devedor tenha
esboccedilado qualquer intenccedilatildeo de pagar a diacutevida O credor requereu a suspensatildeo da Carteira
Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado apreensatildeo do passaporte e cancelamento dos
cartotildees de creacutedito
O magistrado com embasamento no artigo 139 IV do CPC deferiu parcialmente o
pedido sob o fundamento de que a apreensatildeo de passaporte e CNH natildeo viola o direito de ir e
vir do devedor Entretanto o juiz indeferiu o pedido de cancelamento do cartatildeo de creacutedito por
acreditar que a suspensatildeo poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado tendo em
vista que atualmente as pessoas utilizam o referido cartatildeo para pagamento das despesas
diaacuterias
66 NOBREacuteGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139
IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018
31
Eacute evidente que as medidas atiacutepicas de coerccedilatildeo devem ser utilizadas com cautela sempre respeitando a dignidade da pessoa do executado Natildeo se vislumbra contudo que as medidas aqui eleitas sejam capazes de vulnerar os Direitos Fundamentais do indiviacuteduo A uma porque natildeo se trata de restriccedilatildeo ao direito de ir e vir do executado que continua no gozo de plena liberdade de locomoccedilatildeo a duas porque a conduccedilatildeo de veiacuteculo automotor eacute mera comodidade da vida moderna natildeo se tratando de direito absoluto
Com mais razatildeo ainda se admite a suspensatildeo do Passaporte do executado que se natildeo paga a diacutevida da execuccedilatildeo natildeo deve ter o direito de fazer viagem internacional
Tem-se aqui verdadeiro exerciacutecio de ponderaccedilatildeo de interesses juriacutedicos de um lado jaz o direito de creacutedito do exequente que deriva do direito de propriedade e por isso mesmo tem envergadura constitucional de outro giro tem-se o direito do executado agrave autorizaccedilatildeo do Estado para conduzir veiacuteculo automotor e realizar viagens internacionais que natildeo se mostram essenciais agrave dignidade da pessoa humana Natildeo haacute duacutevidas pois de que eacute este uacuteltimo que deve sucumbir
O pedido fica indeferido apenas no tocante agrave suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado Eacute que ao contraacuterio da CNH e do passaporte que trazem consigo certa presunccedilatildeo de riqueza natildeo se pode concluir que o uso de cartatildeo de creacutedito eacute feito por luxo ou simples conveniecircncia
Como eacute cediccedilo os cartotildees de creacutedito oferecem ao seu titular creacutedito raacutepido e rotativo para o pagamento de despesas diaacuterias e certamente exercem funccedilatildeo essencial agravequeles que se encontram em situaccedilatildeo financeira precaacuteria
A suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado portanto se revela medida desproporcional e que inclusive poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado
Pelo exposto defiro em parte o pedido formulado pelo exequente e DETERMINO a suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo e bem como a suspensatildeo da validade (cancelamento temporaacuterio) no sistema SINPA de eventuais passaportes vaacutelidos em nome do executado
Dessa forma o artigo 139 IV do CPC revolucionou completamente a execuccedilatildeo de
obrigaccedilatildeo de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria ao permitir a utilizaccedilatildeo do uso dos meios executivos
atiacutepicos para compelir o executado a satisfazer o creacutedito do exequente
33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE
EFETIVACcedilAtildeO
Era inevitaacutevel que o artigo 139 IV do CPC gerasse todo tipo de reaccedilatildeo entre os
doutrinadores do processo civil e ateacute mesmo de outros ramos do direito devido a sua
capacidade de realizar uma completa inovaccedilatildeo na forma de se executar as obrigaccedilotildees de pagar
quantia Alguns o aplaudiram visualizando nele ldquouma luz no fim do tuacutenelrdquo outros o
criticaram vislumbrando as arbitrariedades que poderiam ser praticadas com embasamento no
referido dispositivo
32
As decisotildees suscitadas em linhas preteacuteritas auxiliaram para fervilhar ainda mais o
debate sobre o tema tendo em vista que por um lado poderia aumentar a efetividade das
execuccedilotildees por quantia no entanto por outro surgiam questionamentos a cerca da sua
constitucionalidade
A doutrina parece que demoraraacute a se pacificar sobre o tema Segundo alguns
doutrinadores seraacute inconstitucional toda restriccedilatildeo que recaia sobre a pessoa do devedor e natildeo
exclusivamente sobre o seu patrimocircnio Jaacute para outros o dispositivo eacute constitucional e o meio
mais eficaz para se resolver o problema da efetivaccedilatildeo das execuccedilotildees de pagar quantia ldquoA
discussatildeo se daacute especialmente no que diz respeito aacutes medidas de suspensatildeo de CNH
apreensatildeo de passaporte e bloqueio de cartotildees de creacutedito do devedorrdquo 67
O professor Thiago Rodovalho analisou detalhadamente a decisatildeo de nordm 4001386-
1320138260011 em seu artigo ldquoO necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na
concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivosrdquo 68 Quanto agrave suspensatildeo da CNH o autor
acredita que tal medida natildeo viola qualquer direito fundamental do devedor posto que ldquodirigir
veiacuteculos automotores eacute direito do cidadatildeo mas natildeo se confunde com os direitos fundamentais
e social de ir-e-vir e ao transporterdquo 69 O professor eacute categoacuterico ao afirmar que
Com relaccedilatildeo agrave suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (suspensatildeo do direito de dirigir restriccedilatildeo de direitos) natildeo nos parece haver qualquer violaccedilatildeo a direito fundamental ou social nem a direito da personalidade ou colocaccedilatildeo do devedor em situaccedilatildeo desproporcionalmente detrimentosa exceccedilatildeo feita aos que usam o veiacuteculo como instrumento de trabalho atraindo a hipoacutetese do NCPC art 833 inc V
()
Outrossim natildeo o consideramos como direito da personalidade Os direitos da personalidade satildeo os valores fundamentais que compotildeem o proacuteprio ser justamente por isso intransmissiacuteveis e irrenunciaacuteveis natildeo podendo o seu exerciacutecio sofrer limitaccedilatildeo voluntaacuteria (CC art 11) Por mais que vivamos num paiacutes que tanto valoriza o carro e que muitas pessoas de fato se compreendam em razatildeo e em funccedilatildeo do carro que dirijam este natildeo nos parece ser um direito que verdadeiramente componha a personalidade do indiviacuteduo70
67 DONTOS Sofia Poderes executoacuterios do juiz que diz a doutrina sobre o art 139 inc IV do CPC
Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigospoderes-executorios-do-juiz-que-diz-a-doutrina-sobre-art-139-inc-iv-do-cpc-23052018 gt Publicado em 23052018 Acesso em 01082018
68 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018
69 Ibid sem paginaccedilatildeo 70 Ibid sem paginaccedilatildeo
33
Quanto ao cancelamento dos cartotildees de credito do devedor o professor Thiago
Rodovalho tambeacutem acredita que natildeo haacute qualquer violaccedilatildeo ao direito fundamental social ou
da personalidade do devedor e acrescenta que
Tanto assim o eacute que ser titular de um cartatildeo de creacutedito pressupotildee ter creacutedito o que eacute analisado e concedido por instituiccedilotildees financeiras mais do que isso se porventura passando por dificuldades financeiras a pessoa deixa de honrar com pagamentos a mesma instituiccedilatildeo financeira concedente do cartatildeo de creacutedito pode sponte propria cancelaacute-lo ou recusar-lhe a concessatildeo Ora parece-me contraditoacuterio que instituiccedilotildees financeiras para sua proteccedilatildeo patrimonial possam ferir esse suposto ldquodireito fundamentalrdquo ou esse suposto ldquodireito da personalidaderdquo mas natildeo possa o Poder Judiciaacuterio igualmente fazecirc-lo contra aquele devedor moroso que instado ao pagamento e frustradas todas as tentativas de constriccedilatildeo patrimonial leva vida luxuosa valendo-se de cartotildees de creacutedito que prescindem de dinheiro em conta eacute dizer podem justamente funcionar como forma de ocultar renda e patrimocircnio71
O autor considera a apreensatildeo de passaporte um tema mais polecircmico e que merece
maior reflexatildeo No entanto crecirc que eacute possiacutevel a apreensatildeo de passaporte sem violar os
direitos fundamentais do devedor por se tratar de um direito de ir e vir de amplitude especial
Agrave primeira vista a possibilidade de apreensatildeo do passaporte tambeacutem nos parece possiacutevel pois tambeacutem se trata de um direito de ir e vir de amplitude especial Assim o eacute pois salvo situaccedilotildees especiais (refugiados p ex) haacute a necessidade de demonstrar condiccedilotildees financeiras de estadia e retorno para ser admitido no paiacutes de destino Ou seja pressupotildee uma condiccedilatildeo financeira que o devedor justamente diz natildeo possuir Sem embargo dessa consideraccedilatildeo esse ainda eacute um ponto que merece uma reflexatildeo mais acurada sendo essa apenas uma primeira impressatildeo72
Outros autores escreveram sobre o tema como eacute o caso do processualista Luiz
Dellore73 que tambeacutem defende que as medidas atiacutepicas como restriccedilatildeo ao direito de dirigir
apreensatildeo de passaporte e cancelamento de cartotildees de creacutedito satildeo permitidas e natildeo violam em
regra os direitos fundamentais do devedor
De minha parte creio que efetivamente haacute inovaccedilatildeo no at 139 IV do NCPC (e natildeo mera repeticcedilatildeo do que jaacute havia no Coacutedigo anterior) que tem o condatildeo de trazer mais efetividade ao processo executivo no Brasil ndash que por deacutecadas centrou sua atenccedilatildeo na defesa do executado (vide a grande quantidade de impenhorabilidades) sem dar maior atenccedilatildeo ao creacutedito do exequente
71 Ibid sem paginaccedilatildeo 72 Ibid sem paginaccedilatildeo 73 DELLORE Luiz NCPC Atipicidade das medidas executivas jaacute eacute realidade Disponiacutevel em lt
httpswwwjotainfoopiniao-e-analisecolunasnovo-cpcncpc-atipicidade-de-medidas-executivas-ja-e-realidade-17042017 gt Publicado em 17042017 Acesso em 03092018
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Logo a meu ver medidas como (i) restriccedilatildeo ao direito de dirigir (ii) apreensatildeo de passaporte (iii) cancelamento de cartotildees de creacutedito e (iv) vedaccedilatildeo de obtenccedilatildeo de novos empreacutestimos se natildeo vinculados ao pagamento do deacutebito exequendo dentre outras restriccedilotildees que deveratildeo ser observadas a cada caso satildeo permitidas pelo sistema do NCPC e em regra natildeo violam direitos fundamentais do devedor E tecircm o condatildeo de fazer com que o executado que tem recursos diante dessas medidas coercitivas pague o deacutebito trazendo sucesso agrave satisfaccedilatildeo do creacutedito
Nessa linha para Alexandre Fuchs das Neves74 o artigo 139 IV do CPC conferiu ao
juiz poderes coercitivos capazes de ldquotransformar a vida do devedor um infernordquo para compeli-
lo a cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria Entretanto pondera que para que a medida tenha
validade ldquoeacute necessaacuteria uma fundamentaccedilatildeo por evidente uma correlaccedilatildeo temaacutetica entre a
medida adotada e sua efetividade em face ao processo com fundamentaccedilatildeo detalhadardquo
No entendimento de Fernando Gajardoni75 satildeo possiacuteveis as medidas de apreensatildeo de
passaporte bloqueio de cartotildees de creacutedito e suspensatildeo da CNH Para ele o que limita o art
139 IV do CPC eacute o esgotamento dos meios tiacutepicos e a real necessidade da medida
Ilustrativamente natildeo efetuado o pagamento de diacutevida oriunda de multas de tracircnsito e superados os expedientes tradicionais de adimplemento (penhora de dinheiro e bens) seria liacutecito o estabelecimento da medida coercitivaindutiva de suspensatildeo do direito a conduzir veiacuteculo automotor ateacute pagamento do deacutebito (inclusive com apreensatildeo da CNH do devedor) natildeo efetuado pagamento de verbas salariais devidas a funcionaacuterios da empresa possiacutevel o estabelecimento de vedaccedilatildeo agrave contrataccedilatildeo de novos funcionaacuterios ateacute que seja saldada a diacutevida natildeo efetuado o pagamento de financiamento bancaacuterio na forma e no prazo avenccedilados possiacutevel ateacute que se tenha a quitaccedilatildeo que se obstem novos financiamentos ou mesmo a participaccedilatildeo do devedor em licitaccedilotildees (como de ordinaacuterio jaacute acontece com pessoas juriacutedicas em deacutebito tributaacuterio com o Poder Puacuteblico) etc
Teriacuteamos entatildeo no Brasil por assim dizer a adoccedilatildeo do padratildeo da atipicidade das medidas executivas tambeacutem para as obrigaccedilotildees de pagar vistas estas como ordens do EstadoJuiz para que haja prestaccedilatildeo de pagamento em pecuacutenia
()
Por isso ndash a prevalecer a interpretaccedilatildeo potencializada do art 139 IV do CPC2015 ndash o emprego de tais medidas coercitivasindutivas especialmente nas obrigaccedilotildees de pagar encontraraacute limite certo na excepcionalidade da medida (esgotamento dos meios tradicionais de satisfaccedilatildeo do deacutebito) na proporcionalidade (inclusive agrave luz da regra da menor onerosidade ao devedor do art 805 do CPC2015) na necessidade de fundamentaccedilatildeo substancial e especialmente nos direitos e garantias assegurados na Constituiccedilatildeo Federal (vg natildeo parece possiacutevel que se determine o pagamento sob pena de prisatildeo ou de vedaccedilatildeo ao exerciacutecio da profissatildeo do direito de ir e vir etc)
74 NEVES Alexandre Fuchs das Cancelamento de cartotildees de creacutedito e apreensatildeo de CNH e passaporte
do devedor Isso eacute possiacutevel Disponiacutevel em lt httpwwwsinfacspcombrconteudocancelamento-de-cartoes-de-credito-e-apreensao-de-cnh-e-passaporte-do-devedor-isso-e-possivel gt Acesso em 30082018
75 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Publicado em 24082015 Acesso em 30082018
35
Jaacute Fernanda Tartuce76 acredita que tais medidas satildeo problemaacuteticas e devem ser
analisadas com cautela tendo em vista que ao inveacutes de afetarem o patrimocircnio do devedor
atingem a proacutepria pessoa
Sob certo prisma adotar medidas diferenciadas contribui para a efetividade da prestaccedilatildeo jurisdicional Por outro lado o patrimocircnio ndash e natildeo a pessoa do devedor - responde por diacutevidas aleacutem disso o exerciacutecio de amplos poderes pelo juiz sem balizas especiacuteficas pode ensejar medidas inadequadas Nessa linha suspender o direito de dirigir e restringir o uso de passaporte satildeo iniciativas problemaacuteticas por atingirem a pessoa do devedor enquanto a penhora da restituiccedilatildeo de Imposto de Renda soa viaacutevel por afetar seu patrimocircnio Eacute importante que a medida diferenciada se revele proporcional e seja aplicada apoacutes o exaurimento de outros meios previstos no ordenamento Como a proposta do Novo Coacutedigo eacute aumentar a eficiecircncia processual intentar medidas ineficazes inexequiacuteveis eou de difiacutecil fiscalizaccedilatildeo pode acabar ensejando o efeito contraacuterio
Nessa senda Lenio Streck e Dierle Nunes77 entendem que as medidas atiacutepicas de
suspensatildeo da CNH eou apreensatildeo de passaporte satildeo inconstitucionais Afirmam que natildeo se
pode confundir o processo civil e penal ainda que ambos remetam a um ldquoparadigma
constitucional comumrdquo e que o artigo 139 IV do CPC ldquoimpotildee novos desafios interpretativos
que podem conduzir a uma anaacutelise superficial e utilitarista de busca de resultados que
desprezem a necessaacuteria leitura constitucionalrdquo Os autores ainda ponderam que ldquoO perigo eacute o
artigo 139 IV ser transformado em instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com
autorizaccedilatildeo judicialrdquo
O professor Araken de Assis no dia 18 de abril de 2018 em um evento sobre o
Coacutedigo Processual Civil de 2015 que ocorreu em Brasiacutelia na sede do Conselho Federal da
OAB declarou ser contraacuterio aos poderes executoacuterios atiacutepicos ldquoSou contra os poderes
atiacutepicos dos juiacutezes porque seu exerciacutecio redunda em simples arbitrariedadesrdquo78
Acrescentou ainda que
76 IBDFAM ndash Instituto Brasileiro de Famiacutelia O polecircmico inciso IV do artigo 139 do CPC e suas difusas
interpretaccedilotildees Disponiacutevel em lt httpwwwibdfamorgbrnoticias6096O+polC3AAmico+inciso+IV+do+artigo+139+do+CPC+e+suas+difusas+interpretaC3A7C3B5es gt Publicado em 31082016 Acesso em 04092018
77 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018
78 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04092018
36
Eacute evidentemente inconstitucional diante do princiacutepio da dignidade da pessoa humana tirar o passaporte carteira de habilitaccedilatildeo Quecirc que tem isso com diacutevidas Natildeo tem absolutamente nada Natildeo eacute a correlaccedilatildeo instrumental entre o objetivo da execuccedilatildeo e o meio empregado Isso eacute simples vinganccedila simples puniccedilatildeo79
O professor Araken de Assis acredita que tais medidas satildeo inconstitucionais e
violam o principio da dignidade humana do executado numa sociedade como a nossa
sedenta por puniccedilatildeo natildeo me surpreende que essas ideias sejam encaradas com
naturalidade Mas eacute preciso rejeitaacute-las em nome de princiacutepios 80
34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
A Constituiccedilatildeo Federal de 1988 tem como um dos seus fundamentos a dignidade da
pessoa humana presente no artigo 1ordm inciso III do referido texto constitucional O dito
princiacutepio tem o escopo de nortear o ordenamento juriacutedico como um todo
A inclusatildeo da dignidade da pessoa humana como princiacutepio constitucional obrigou
uma reflexatildeo sobre o papel da pessoa humana no direito e um redimensionamento para
elevaacute-la ao centro do ordenamento juriacutedico81 Eacute necessaacuterio recorrer agrave teoria Kantiana para
que se obtenha uma definiccedilatildeo do princiacutepio ora estudado Para Kant82 o homem eacute um fim
em si mesmo natildeo uma funccedilatildeo do Estado Ou Naccedilatildeo O Estado e o direito devem estar
organizados em benefiacutecio do indiviacuteduo
Agora eu afirmo o homem ndash e de uma maneira geral todo o ser racional ndash existe como fim em si mesmo e natildeo apenas como meio para o uso arbitraacuterio desta ou daquela vontade Em todas as suas accedilotildees pelo contraacuterio tanto nas direcionadas a ele mesmo como nas que o satildeo a outros seres racionais deve ser ele sempre considerado simultaneamente como fim
Partindo da premissa de que para Immanuel Kant o homem eacute o fim em si mesmo
ldquodevemos compreender que a dignidade da pessoa humana eacute a noccedilatildeo o comando a direccedilatildeo
que se deve seguir funcionando como fundamento para a interpretaccedilatildeo de todos os direitos e
garantias conferidos agrave pessoa nos ordenamentos juriacutedicos de cada Estadordquo 83
79 Ibid sem paginaccedilatildeo 80 Ibid sem paginaccedilatildeo 81 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito
fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 461 82 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud KANT Immanuel Fundamentaccedilatildeo da metafiacutesica dos costumes
Satildeo Paulo Martin Claret 2003 p56-59 Coleccedilatildeo A Obra-Prima de Cada Autor 83 SCHIAFIANO Juliana Rocha op cit p 461
37
O princiacutepio constitucional da dignidade da pessoa humana estaacute diretamente ligado ao
conteuacutedo dos direitos fundamentais logo para que se cumpra com os direitos fundamentais
constitucionalmente instituiacutedos eacute necessaacuterio reconhecer e respeitar a dignidade da pessoa
humana conforme disciplina Ingo Sarlet84
Em suma o que se pretende sustentar de modo mais enfaacutetico eacute que a dignidade da pessoa humana na condiccedilatildeo de valor (principio normativo) fundamental que atrai o conteuacutedo de todos os direitos fundamentais exige e pressupotildee o reconhecimento e proteccedilatildeo dos direitos fundamentais de todas as dimensotildees (ou geraccedilotildees se assim preferirmos) Assim sem que se reconheccedilam agrave pessoa humana os direitos fundamentais que lhe satildeo inerentes em verdade estarse-aacute lhe negando a proacutepria dignidade A consagraccedilatildeo constitucional da dignidade da pessoa humana tem o propoacutesito de limitar a atuaccedilatildeo ou a omissatildeo do Estado para garantir os direitos do indiviacuteduo Assim eacute difiacutecil precisar os efeitos da norma que determina a dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado (como acontece com a Constituiccedilatildeo brasileira de 1988) poreacutem quando desrespeitados os direitos fundamentais do cidadatildeo eacute possiacutevel identificar que a dignidade deste foi violada
Logo ldquoteraacute respeitada a sua dignidade o individuo que tiver respeitados os seus
direitos fundamentaisrdquo 85 Os direitos fundamentais estatildeo apresentados na Constituiccedilatildeo
Federal da seguinte forma direitos individuais e coletivos direitos sociais direitos poliacuteticos e
direitos de nacionalidade que tecircm como escopo garantir as liberdades positivas aos
indiviacuteduos ldquoonde foram conquistados direitos agrave liberdade religiosa liberdade civil e
profissional agrave propriedade ao livre acesso ao Judiciaacuterio agrave ampla defesa e ao contraditoacuterio no
processual judicial ao sigilo de dados e informaccedilotildees pessoais entre outros que somados
garantem o cidadatildeo uma vida dignardquo 86
O cidadatildeo na Constituiccedilatildeo Federal de 88 diferente das constituiccedilotildees brasileiras
anteriores passou a ser fundamento e ganhou destaque nos direitos fundamentais tendo
garantida a sua vida a sua dignidade a sua seguranccedila a sua honra a sua liberdade e a sua
propriedade
84 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud SARLET Ingo Wolfgang Dignidade da pessoa humana e
direitos fundamentais na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 2ed Porto Alegre Livraria do Advogado 2002 p87 85 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito
fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 462 86 Ibid p 462
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Segundo Carmem Luacutecia Antunes Rocha87 para garantir o Estado Democraacutetico de
Direito eacute necessaacuterio que a sua atuaccedilatildeo seja sempre em conformidade com o princiacutepio da
dignidade da pessoa humana
O Estado somente eacute democraacutetico em sua concepccedilatildeo constitucionalizaccedilatildeo e atuaccedilatildeo quando respeita o princiacutepio da dignidade da pessoa humana Natildeo haacute verbo constitucional natildeo haacute verbo governamental que se faccedilam legiacutetimos quando natildeo se voltam ao atendimento daquele princiacutepio Natildeo haacute verdade constitucional natildeo haacute suporte institucional para as poliacuteticas puacuteblicas que natildeo sejam destinadas ao pleno cumprimento daquele valor maior transformado em princiacutepio constitucional
O princiacutepio da dignidade humana constitucionalmente garantido impotildee limites ao
Estado compelindo aos oacutergatildeos e atividades estatais respeitar o ser humano e garanti-lo
condiccedilotildees miacutenimas para uma vida digna Dessa forma eacute niacutetido que o dito princiacutepio eacute
pressuposto e indispensaacutevel para legitimar outras normas constitucionais e
principalmente infraconstitucionais
O Coacutedigo de Processo Civil eacute umas das principais normas infraconstitucionais que
sofre influecircncia dos preceitos valores e princiacutepios esculpidos na Constituiccedilatildeo Federal
Logo como o principio da dignidade humana eacute um dos mais importantes pressupostos
constitucionais ldquoentatildeo eacute tranquilo afirmar-se que o novel ordenamento processual tem
de se render nas resoluccedilotildees dos aspectos processuais e a fim de se atingir uma soluccedilatildeo
justa adequada e efetiva ao postulado da dignidade da pessoa humanardquo 88
Dessa forma o legislador deve formular as normas infraconstitucionais de acordo e a
partir do conteuacutedo constitucional para Marinoni Mitidiero e Arenhart89
() o Coacutedigo de Processo Civil constitui direito constitucional aplicado O Coacutedigo deve ser interpretado de acordo com a Constituiccedilatildeo e com os direitos fundamentais o que significa que as duacutevidas interpretativas devem ser resolvidas a favor da otimizaccedilatildeo do alcance da Constituiccedilatildeo e do processo civil como meio para tutela de direitos
87 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud ROCHA Carmen Luacutecia Antunes O princiacutepio da dignidade da
pessoa humana e a exclusatildeo social Revista Interesse Puacuteblico n4 p23-48 1999 p33 88 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o
novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 367
89 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 14
39
Com o escopo de conferir eficaacutecia aos mandamentos constitucionais o CPC15 traz a
previsatildeo e diversas claacuteusulas gerais em seus primeiros artigos em um dos quais se
prestigia o princiacutepio da dignidade da pessoa humana
O referido princiacutepio estaacute disciplinado no artigo 8ordm do CPC15 e atua como um guia
sobre as demais normas do coacutedigo processual Eacute o que entende Nelson Rosenvald90
O maior cuidado do inteacuterprete eacute no sentido de jamais banalizar a dignidade fazendo dela um elixir processual tal como muitas vezes se vecirc na esfera do direito civil Penso que natildeo haacute maiores dificuldades em transpor a noccedilatildeo constitucional do princiacutepio para em seguida adaptaacute-la agraves singularidades do processo
Logo de acordo com o artigo 8ordm do CPC o oacutergatildeo julgador ao aplicar o ordenamento
juriacutedico deve resguardar a dignidade da pessoa humana Para Fredie Didier91 ldquoresguardar
nesse contexto eacute de um lado aplicar corretamente a norma juriacutedica lsquoproteccedilatildeo da dignidade
da pessoa humanarsquo e de outro natildeo violar a dignidaderdquo
O oacutergatildeo julgador deveraacute manter um comportamento ativo com o objetivo de promover
a dignidade da pessoa humana podendo tomar medidas de ofiacutecio para efetivar a dignidade da
pessoa humana Didier assevera que o magistrado poderaacute ainda ldquovaler-se da claacuteusula geral de
atipicidade (art 536 sect 1ordm) para a execuccedilatildeo do direito fundamental agrave dignidaderdquo 92 O autor
ainda traz dois exemplos
a) exigecircncia de respeito agrave ordem cronoloacutegica de conclusatildeo (art 12) caso de grave violaccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana que natildeo se encaixe em um dos incisos que excepcionam a regra de observacircncia da cronologia da conclusatildeo poderia o juiz ldquofurar a filardquo para promover a dignidade da pessoa humana b) prioridade na tramitaccedilatildeo processual pessoa que seja portadora de doenccedila grave mas que natildeo esteja no rol do art 1048 I para promover a dignidade de pessoa humana o juiz poderia determinar o processamento prioritaacuterio93
Essa dupla garantia ndash resguardo e promoccedilatildeo ndash tem como objetivo garantir ao individuo
sua dignidade humana fazendo com que ldquode um lado que o Estado natildeo a viole e de outro
que o Estado a promova e efetiverdquo
90 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud ROSENVALD Nelson A
dignidade da pessoa humana no CPC15 91 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte
geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 75 92 Ibid p 75 93 Ibid p 75
40
Nessa senda o magistrado deveraacute promover a dignidade da pessoa humana quando
perceber a ausecircncia desta no processo ou assegura-la quando for posta em risco Eacute nesse
sentido o entendimento dos professores Marinoni Mitidiero e Arenhart94
() a dignidade da pessoa humana determina a compreensatildeo do processo civil como um meio para tutela dos direitos Vale dizer o processo civil natildeo pode ser visto como um instrumento a serviccedilo do Estado como um instrumento que natildeo se encontre orientado agrave realizaccedilatildeo dos fins da pessoa humana Em outras palavras o processo civil serve para realizaccedilatildeo dos direitos e para orientaccedilatildeo das pessoas a respeito do significado do direito
Nessa senda compete tanto ao juiz quanto as demais partes processuais garantirem ldquoo
valor intriacutenseco de cada vida que eacute trazida ao processordquo nas palavras de Alexandre Freitas
Cacircmara95
() aos sujeitos do processo eacute preciso sempre ter claro que os titulares dos interesses em conflitos satildeo pessoas reais cujas vidas seratildeo afetadas pelo resultado do processo e que por isso mesmo tecircm o direito de estabelecer suas estrateacutegias processuais de acordo com aquilo que lhes pareccedila melhor para suas vidas Eacute inadmissiacutevel tratar as partes como se natildeo fossem pessoas reais meros dados estatiacutesticos Afinal se para o Judiciaacuterio cada processo pode parecer apenas mais um processo para as partes cada processo pode ser o uacutenico o mais relevante aquele em que sua vida seraacute decidida E eacute dever do juiz assegurar que isto seja respeitado
Dessa forma eacute necessaacuterio que um arcabouccedilo normativo para que seja conferida
eficaacutecia e proteccedilatildeo ao principio da dignidade da pessoa humana
Logo o dito princiacutepio deve ser protegido em todas as esferas do ordenamento juriacutedico
inclusive no campo da execuccedilatildeo civil onde sofre grandes riscos de ser violado em nome do
direito fundamental agrave tutela executiva do credor ldquoPartir da premissa de que existe um direito
fundamental agrave tutela executiva ora ratificado pelo CPC eacute indispensaacutevel para a soluccedilatildeo de
diversos problemas oriundos do procedimento executivo principalmente aqueles relacionados
agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo 96
94 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme
MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 25
95 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CAcircMARA Alexandre Freitas O Novo Processo Civil Brasileiro 2 ed Satildeo Paulo Atlas 2016 p 7
96 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66
41
Eacute o caso por exemplo da impenhorabilidade Segundo Fredie Didier et al97 a
impenhorabilidade eacute uma forma de proteger certos bens do devedor do direito fundamental a
execuccedilatildeo do credor
Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa
Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais
O legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do CPC fazendo um
preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses em anaacutelise ao optar pela mitigaccedilatildeo do direito
do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado Afinal ldquoa execuccedilatildeo natildeo pode ser utilizada
como instrumento para causar a ruiacutena a fome e o desabrigo do devedor e sua famiacutelia gerando
situaccedilotildees incompatiacuteveis com a dignidade da pessoa humana 98
Logo a impenhorabilidade de certos bens
[] Eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa99
Eacute nesse sentido que o CPC15 enumera diversos casos de bens patrimoniais que satildeo
impenhoraacuteveis como o salaacuterio e vencimentos utensiacutelios necessaacuterios ao exerciacutecio da
profissatildeo seguro de vida vestuaacuterios e pertences de uso pessoal entre outros
Dessa forma as regras relativas agraves medidas executivas devem ser interpretadas agrave luz
da Constituiccedilatildeo Federal ldquovez que se voltam agrave realizaccedilatildeo de direitos fundamentais e em sua
97 Ibid p 66 98 THEODORO JUacuteNIOR Humberto Novo Coacutedigo de Processo Civil Anotado 20 ed Rio de Janeiro
Forense 2016 p 978 99 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud DIDIER JR Fredie CUNHA
Leonardo Carneiro da BRAGA Paula Sarno OLIVEIRA Rafael Alexandria de Curso de direito processual civil 3 ed Salvador JusPodivm 2011 v 5 p 547
42
realizaccedilatildeo podem atingir direitos fundamentaisrdquo 100 O Superior Tribunal de Justiccedila jaacute decidiu
que
O rol das impenhorabilidades do ordenamento paacutetrio objetiva preservar o miacutenimo patrimonial necessaacuterio agrave existecircncia digna do executado impondo ao processo executoacuterio certos limites Assim a depender das peculiaridades do caso as regras de impenhorabilidade podem ser ampliadas de modo a adequar a tutela aos direitos fundamentais como por exemplo o direito agrave moradia agrave sauacutede ou agrave dignidade da pessoa humana Trata-se portanto da aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo e da necessidade sob o enfoque da proporcionalidade101 (STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014)
Logo a interpretaccedilatildeo dos dispositivos que tratam sobre a penhora no CPC deve estaacute
diretamente ligada aos ditames constitucionais devendo o interprete privilegiar a opccedilatildeo que
esteja mais em sintonia com a Carta Magna para que nem o credor e nem o devedor sejam
lesados
O artigo 833 do CPC elenca uma seacuterie de incisos que expotildeem os bens impenhoraacuteveis
O trecho inicial inciso I do art 833 define como impenhoraacuteveis os bens inalienaacuteveis Este
inciso segue a regra de que ldquose o bem natildeo pode ser alienado tambeacutem natildeo pode ser penhorado
porque a penhora eacute o primeiro ato do procedimento de alienaccedilatildeo judicial do bemrdquo 102
Satildeo exemplos de bens inalienaacuteveis os puacuteblicos cuja alienaccedilatildeo depende de autorizaccedilatildeo
legislativa Eacute inalienaacutevel tambeacutem o capital constituiacutedo para garantir indenizaccedilatildeo de ato iliacutecito
(art 533 sect 1 ordm CPC) que portanto eacute tambeacutem impenhoraacutevel ldquoTodo bem inalienaacutevel eacute
impenhoraacutevel embora nem todo bem impenhoraacutevel seja inalienaacutevelrdquo 103
O inciso I do art 833 CPC tambeacutem consagra a impenhorabilidade dos bens que por
ato voluntaacuterio satildeo excluiacutedos da execuccedilatildeo
Segundo Fredie Didier et al104
Eacute o que ocorre nos casos de bens doados ou alienados com claacuteusula de inalienabilidade que haacute de constar no registro imobiliaacuterio para ser eficaz perante o exequente e minimizar o risco de fraude A propoacutesito eis a redaccedilatildeo do art 1911 do Coacutedigo Civil lsquolsquoA claacuteusula de inalienabilidade imposta aos bens por ato de liberalidade implica impenhorabilidade e incomunicabilidaderdquo
100 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MEDINA Joseacute Miguel Garcia
Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 1 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 p 736 101 STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014 102 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 824 103 Ibid p 824 104 Ibid p 825
43
O inciso II por sua vez estabelece que satildeo impenhoraacuteveis os bens moacuteveis os
pertences e as utilidades domeacutesticas da residecircncia do executado Todavia excepcionam-se os
bens dessa natureza que sejam de elevado valor ou que ultrapassem as necessidades comuns
correspondentes a um meacutedio padratildeo de vida
A jurisprudecircncia natildeo eacute paciacutefica sobre o assunto logo natildeo exista uma relaccedilatildeo de bens
que podem ser atingidos pela penhora Abrindo margem para as mais variadas decisotildees
O STJ jaacute considerou impenhoraacuteveis aparelho de televisatildeo a cores mesa de centro passadeira raacutedio toca-fitas gravador microondas ar-condicionado um freezer um microcomputador com acessoacuterios uma impressora etc Poderatildeo ser penhorados porque ultrapassam o padratildeo-meacutedio aparelhos de TV mais sofisticados o segundo aparelho de televisatildeo a segunda geladeira aparelhos de ar-condicionado que satildeo verdadeiras peccedilas de design moacuteveis antigos que se transformam em peccedilas de decoraccedilatildeo faqueiro de prata adega climatizada etc Em entendimento de caraacuteter ainda mais geneacuterico jaacute restou consignado em determinado precedente que a proteccedilatildeo natildeo abrangeria apenas os bens indispensaacuteveis agrave moradia mas tambeacutem aqueles usualmente encontrados em um lar105
Ademais o inciso III do art 833 do CPC traz a impenhorabilidade dos vestuaacuterios bem
como os pertences de uso pessoal do executado salvo se de elevado valor
Segundo Fredie Didier et al106 o dispositivo possui dois propoacutesitos
de um lado preservar a dignidade do executado com a proteccedilatildeo de bens moacuteveis importantes para a sua sobrevivecircncia digna como o vestuaacuterio aparelho celular reloacutegio e os bens relacionados agrave sua higiene pessoal de outro lado a regra visa prestigiar a boa-feacute processual impedindo a execuccedilatildeo mesquinha e abusiva com a penhora de bens de pequeno ou nenhum valor como um pente ou uma bota
O inciso IV do art 833 do CPC consagra uma das mais importantes modalidades a
impenhorabilidade relativa aos rendimentos de natureza alimentar ldquoTrata-se de regra que
possui o claro propoacutesito de proteger o executado garantindo-lhe o recebimento de valores que
servem ao pagamento das despesas relacionadas agrave sua sobrevivecircncia digna e agrave da sua famiacuteliardquo 107
Jaacute inciso V do art 833 do CPC torna impenhoraacuteveis os livros as maacutequinas as
ferramentas os utensiacutelios os instrumentos ou outros bens moacuteveis necessaacuterios ou uacuteteis ao
exerciacutecio de qualquer profissatildeo 105 Ibid p 826 106 Ibid p 827 107 Ibid p 828
44
Por forccedila do paraacutegrafo 3ordm do art 833 satildeo igualmente impenhoraacuteveis os equipamentos
implementos e maacutequinas agriacutecolas pertencentes agrave pessoa fiacutesica ou a empresa individual
produtora rural Rodrigo Mazzei e Sarah Merccedilon108 esclarecem que
Tem assento na noccedilatildeo de que a dignidade estende-se tambeacutem ao exerciacutecio da profissatildeo em si mesma e tambeacutem por representar a forma por excelecircncia de que dispotildee o executado para continuar a receber sua remuneraccedilatildeo e por conseguinte prover seu sustento e de sua famiacutelia Trata-se tambeacutem de aplicaccedilatildeo pontual da funccedilatildeo social da propriedade jaacute que protege os bens que permitem a circulaccedilatildeo de riquezas para a subsistecircncia do executado e se for o caso de sua famiacutelia
Forccediloso ressaltar ainda que a impenhorabilidade do inc V alcanccedila apenas os bens
moacuteveis de modo que eacute absolutamente possiacutevel que o imoacutevel em que o executado exerccedila sua
atividade profissional seja penhorado conforme a Suacutemula 451 do STJ ldquoEacute legiacutetima a penhora
da sede do estabelecimento comercialrdquo
O inciso VI do art 833 do CPC versa sobre a impenhorabilidade do seguro de vida
ldquoTrata-se de impenhorabilidade em favor do beneficiaacuterio do seguro e natildeo do segurado ateacute
porque o valor do seguro natildeo compotildee nem comporaacute o seu patrimocircnio (art794 do Coacutedigo
Civil1 ordm7)rdquo Dessa forma ldquoem uma execuccedilatildeo contra o segurado natildeo seraacute possiacutevel a penhora
do seguro de vida pois se trata de bem que natildeo lhe pertence nem mesmo em expectativardquo
De acordo com o inciso VII do art 833 do CPC satildeo impenhoraacuteveis os materiais
necessaacuterios para obras em andamento salvo se essas forem penhoradas Logo a obra pode
ser penhorada (art 862 do CPC) ldquoA regra como bem lembrou Araken de Assis lsquoestimula a
penhora da proacutepria obra inconclusa agrave qual os materiais acrescem e conseguintemente
valorizamrsquo 109
O art 833 VIII CPC julga impenhoraacutevel a pequena propriedade rural assim
definida em lei desde que trabalhada pela famiacutelia reproduzindo parte do art 5ordm XXVI CF
88116 que disciplina a impenhorabilidade do referido bem
A proteccedilatildeo do CPC eacute mais ampla do que a garantia prevista na Constituiccedilatildeo Federal
tendo em vista que a impenhorabilidade natildeo se restringe agraves execuccedilotildees de deacutebitos decorrentes
de sua atividade produtiva podendo ser alegada em toda e qualquer execuccedilatildeo ldquoAssim o 108 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CABRAL Antonio Passo
CRAMER Ronaldo (orgs) Comentaacuterios ao Novo Coacutedigo de Processo Civil Rio de Janeiro Forense 2015 p 1194
109 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 835
45
imoacutevel natildeo pode ser penhorado na execuccedilatildeo de creacutedito rural concedido para estimular a
produccedilatildeo agriacutecola mas poderaacute ser penhorado na execuccedilatildeo do creacutedito concedido para a
aquisiccedilatildeo do imoacutevelrdquo 110
A nona modalidade de impenhorabilidade trata-se dos recursos puacuteblicos recebidos por
instituiccedilotildees privadas para aplicaccedilatildeo compulsoacuteria em educaccedilatildeo sauacutede ou assistecircncia social ldquoA
proteccedilatildeo eacute louvaacutevel e tutela toda a coletividade ao privilegiar o direito agrave educaccedilatildeo sauacutede e
assistecircncia social em detrimento do direito do credorrdquo
De acordo com o inciso X do art 833 do CPC eacute impenhoraacutevel ateacute o limite de
quarenta salaacuterios miacutenimos a quantia depositada em caderneta de poupanccedila
Eacute uma modalidade de impenhorabilidade relativa (o CPC73 a considerava absoluta)
tendo em vista que essa impenhorabilidade natildeo pode ser oposta na execuccedilatildeo de alimentos
independentemente da sua origem (art 833 sect 2ordm do CPC) Fredie Didier et al cita Araken de
Assis111 ao afirmar que
a regra soacute protege essa aplicaccedilatildeo financeira Se o valor estiver depositado em fundo de investimento por exemplo poderaacute ser penhorado Se o devedor tiver vaacuterias cadernetas de poupanccedila a impenhorabilidade aplica-se agrave soma de todas elas e natildeo a cada uma delas isoladamente do contraacuterio valores expressivos poderiam ser pulverizados em vaacuterias contas burlando a finalidade da regra que eacute a de proteger a populaccedilatildeo de baixa renda
Ademais satildeo tambeacutem impenhoraacuteveis por forccedila do inciso XI os recursos puacuteblicos do
fundo partidaacuterio recebidos por partido poliacutetico nos termos da lei Essa modalidade de
impenhorabilidade ldquose restringe aos recursos puacuteblicos do fundo partidaacuterio Recursos de
origem privada recebidos pelo partido poliacutetico poderatildeo ser penhoradosrdquo 112 O processualista
Fredie Didier et al113 assevera que
Assim a impenhorabilidade foi estabelecida no intuito de impedir que os diretoacuterios nacionais de partidos poliacuteticos respondam por diacutevida dos diretoacuterios
110 Ibid p 836 111 DIDIER JR Fredie et al apud ASSIS Araken de Manual da execuccedilatildeo 11ordm ed cit p 225 Assim
tambeacutem REDONDO Bruno Garcia LOJO Maacuterio Vitor Suarez Penhora cit p 117 BUENO Cassio Scarpinella Curso sistematizado de Direito Processual Civil v 3 cit p 228 GIANNICO Mauriacutecio As novas reformas do CPC e de outras normas processuais Mauriacutecio Giannico e Viacutetor Joseacute de Mello Monteiro (coord) Satildeo Paulo Saraiva 2009 p 1 OS Em sentido diverso estendendo a impenhorabiacutelidade aos depoacutesitos feitos ateacute esse valor em CDB CDI fundos de renda fixa ou de accedilotildees RODRIGUES Marcelo Abelha Manual de execuccedilatildeo civil 3deg ed cit p 101
112 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 839
113 Ibid p 839
46
estaduaismunicipais - sobretudo em razatildeo das vaacuterias decisotildees judiciais que determinaram penhora de recursos do fundo partidaacuterio de alguns partidos
Por fim o inciso XII do artigo 833 do CPC trata sobre a impenhorabilidade dos
creacuteditos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias sob o regime de incorporaccedilatildeo imobiliaacuteria
vinculados agrave execuccedilatildeo de obra ldquoO objetivo dessa modalidade eacute evitar que diacutevidas do
incorporador possam consumir os recursos que seriam utilizados na realizaccedilatildeo da obra em
prejuiacutezo dos adquirentes de unidades autocircnomasrdquo 114
O professor Misael Montenegro Filho115 aduz sobre que ldquoao estabelecer a
impenhorabilidade dos creacuteditos oriundos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias o novo CPC
protegeu os valores destinados agrave execuccedilatildeo da obra e agrave entrega das unidades imobiliaacuterias aos
adquirentes assegurando assim a execuccedilatildeo da promessa contratualrdquo
Importante frisar ainda que a Lei nordm 8009 1990 instituiu a impenhorabilidade do
imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar por qualquer diacutevida salvo as exceccedilotildees dos
seus arts 3ordm e 4ordm
A referida lei dispotildee que Para os efeitos de impenhorabilidade considera-se
residecircncia um uacutenico imoacutevel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia
permanente (art 5ordm)
O processualista baiano Fredie Didier et al116 assevera que
A lei propotildee-se a proteger imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar nos termos acima expostos A CF 88 ampliou o conceito de entidade familiar para abranger a famiacutelia monoparental e a uniatildeo estaacutevel Mas deve considerar-se aiacute compreendidos os irmatildeos que vivem juntos e a uniatildeo homossexual Ateacute o solteiro estaacute abrangido pela impenhorabilidade se reside soacute no imoacutevel - isso em nome da proteccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana e da moradia digna Na verdade houve uma mudanccedila de compreensatildeo acerca do sentido da proteccedilatildeo de proteccedilatildeo da famiacutelia agrave proteccedilatildeo da moradia indispensaacutevel agrave preservaccedilatildeo da dignidade da pessoa
114 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o
novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 388
115 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MONTENEGRO FILHO Misael Novo Coacutedigo de Processo Civil Comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Atlas 2016 p 752
116 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 840-841
47
O STJ jaacute consolidou esse entendimento na suacutemula nordm 364 O conceito de
impenhorabilidade de bem de famiacutelia abrange tambeacutem o imoacutevel pertencente a pessoas
solteiras separadas e viuacutevas
Entretanto se o casal ou entidade familiar possuir vaacuterios imoacuteveis utilizados como
residecircncia a impenhorabilidade recairaacute sobre o de menor valor (art 5ordm paraacutegrafo uacutenico) ldquoEacute o
que ocorre por exemplo quando a famiacutelia se divide em mais de uma cidade por motivos
profissionaisrdquo 117
Forccediloso observar ainda que a impenhorabilidade do imoacutevel familiar eacute relativa jaacute que
natildeo pode ser oposta a qualquer creacutedito O art 3ordm da Lei n 8009 1990151 em que pode ser
penhorada a residecircncia da famiacutelia (exemplo execuccedilatildeo de alimentos para cobranccedila de taxas
devidas em funccedilatildeo do imoacutevel familiar etc)
Resta claro que o artigo 833 do CPC ao disciplinar as hipoacuteteses de impenhorabilidade
possui o escopo de proteger o princiacutepio da dignidade humana Entretanto algumas claacuteusulas
natildeo possuem proteccedilatildeo absoluta ldquoa sua relativizaccedilatildeo a depender do caso sob exame deve ser
realccedilada agrave medida que a dignidade resguardada e protegida pelo sistema processual-
constitucional natildeo se limita ao executadordquo 118 Ademais ldquoEacute premente advertidamente que a
dignidade do credor tambeacutem seja garantida em juiacutezo tendo como norte pois os princiacutepios da
proporcionalidade e razoabilidaderdquo 119
117 Ibid p 841 118 Ibid p 752 119 Ibid p 752
48
4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA
ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE
HUMANA DO EXECUTADO
41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE
EFETIVACcedilAtildeO
Como jaacute exposto em linhas preteacuteritas nos meios executivos tiacutepicos as medidas
executivas satildeo determinadas pela lei ou seja o oacutergatildeo pode aplicar somente as medidas
tipificadas no ordenamento juriacutedico No entanto ao se tratar das medidas executivas atiacutepicas
eacute necessaacuterio que haja um limite na atuaccedilatildeo realizada pelo juiz
O poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo poder ser realizado de maneira indiscriminada haacute
pressupostos e premissas a serem observadas Dessa forma a primeira premissa eacute no sentindo
de que a medida executiva atiacutepica natildeo pode ser a primeira medida a ser invocada ldquomuito ao
reveacutes a regra do nosso sistema continua a ser o da tipicidade dos meios executivos soacute que
agora temperado pelo sistema atiacutepicordquo 120 O processualista Thiago Rodovalho explica que
ldquo() os meios atiacutepicos natildeo satildeo prima ratio e sim a ultima ratio eacute dizer esgotados e
frustrados os meios executivos tiacutepicos e ordinaacuterios pode-se em tese valer-se do sistema
atiacutepicordquo121
Dessa forma nos casos de execuccedilatildeo que tenha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
natildeo deve ser aplicado de logo as medidas indutivas e coercitivas Apenas apoacutes frustradas as
medidas ldquonaturaisrdquo pode-se passar agrave aplicaccedilatildeo das medidas atiacutepicas
Uma segunda premissa diz a respeitos dos meios de pressatildeo para compelir o devedor a
adimplir com o seu deacutebito ldquoEssa segunda premissa decorre inclusive de imperiosidade
loacutegica de nada adianta a medida de pressatildeo se a obrigaccedilatildeo natildeo tem como ser adimplida pelo
devedorrdquo 122
Para Thiago Rodovalho123 ldquoIsso quer significar que esgotados e frustrados os meios
tiacutepicos o juiz se valeraacute dos meios atiacutepicos se eles forem potencialmente haacutebeis a estimular ou
120 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da
atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018
121 Ibid sem paginaccedilatildeo 122 Ibid sem paginaccedilatildeo 123 Ibid sem paginaccedilatildeo
49
forccedilar o cumprimento o que pressupotildee sua possibilidade quando entatildeo eles poderatildeo ser
eficazesrdquo
Logo nas obrigaccedilotildees de pagar quantia se houver a real demonstraccedilatildeo da
impossibilidade financeira do devedor seria um constrangimento inuacutetil e desnecessaacuterio a
imposiccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo para forccedilar o cumprimento
Por isso as medidas atiacutepicas devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o
esgotamento das medidas tiacutepicas e a possibilidade de cumprimento de cumprimento da
obrigaccedilatildeo
Ademais superadas as supracitadas premissas e o oacutergatildeo julgador vislumbrando a
necessidade da aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo se faz necessaacuterio que um conjunto de
postulados e princiacutepios rejam a atuaccedilatildeo do oacutergatildeo julgador servindo de norte para a escolha da
medida executiva mais adequada ldquoDe modo geral a escolha deve pautar-se nos postulados da
proporcionalidade da razoabilidade (art8ordm CPC) e da proibiccedilatildeo de excesso bem como nos
princiacutepios da eficiecircncia e da menor onerosidade da execuccedilatildeordquo 124
O professor Fredie Didier et al125 eacute categoacuterico ao citar Humberto Aacutevila
Segundo Humberto Aacutevila o postulado da proporcionalidade se manifesta nas situaccedilotildees em que haacute uma relaccedilatildeo de causalidade entre dois elementos empiricamente discerniacuteveis um meio e um fim de tal sorte que se possa proceder aos trecircs exames fundamentais o da adequaccedilatildeo (o meio promove o fim) o da necessidade (dentre os meios disponiacuteveis e igualmente adequados para promover o fim natildeo haacute outro meio menos restritivo do(s) direito(s) fundamental (is) afetado(s)) e o da proporcionalidade em sentido estrito (as vantagens trazidas pela promoccedilatildeo do fim correspondem agraves desvantagens provocadas pela adoccedilatildeo do meio)
O juiz ao aplicar a medida executiva atiacutepica ao caso concreto deve ter seu
embasamento no princiacutepio da proporcionalidade para saber se a medida a ser tomada eacute a
melhor opccedilatildeo ao caso sub judice ldquoO exame de proporcionalidade aplica-se sempre que
houver uma medida concreta destinada a realizar uma finalidaderdquo 126
Em verdade a aplicaccedilatildeo do princiacutepio da proporcionalidade eacute imprescindiacutevel na adoccedilatildeo
dos meios executivos atiacutepicos tendo em vista que ldquo() tais medidas em especial quando de
124 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111 125 DIDIER JR Fredie et al apud AVILA Humberto Teoria dos princiacutepios da definiccedilatildeo agrave aplicaccedilatildeo
dos princiacutepios juriacutedicos 16 ed Satildeo Paulo Malheiros 2015 p 205 126 DIDIER JR Fredie et al op cit p 111
50
natureza coercitiva podem restringir direitos do devedor e incidir diretamente sobre sua
pessoardquo127 Logo ainda que o princiacutepio da efetividade da tutela executiva seja um direito
fundamental o mesmo ldquo() deve ser compatibilizado com direitos fundamentais do
executado para que a sua dignidade humana seja preservadardquo 128
Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Neves129 afirma que em nome do princiacutepio da
proporcionalidade o juiz deveraacute
() ponderar no caso concreto as vantagens praacuteticas da adoccedilatildeo de cada medida executiva atiacutepica em especial as de natureza coercitiva e as desvantagens de sua adoccedilatildeo levando em conta a possibilidade de a medida criar uma limitaccedilatildeo excessiva ao exerciacutecio de direito fundamental do executado
Outro princiacutepio que o oacutergatildeo julgador deve se ater ao escolher a medida executiva
atiacutepica eacute o da razoabilidade Segundo Fredie Didier et al 130 o princiacutepio (ou postulado)131 se
manifesta de trecircs formas
a) como dever de equidade a exigir a harmonizaccedilatildeo da norma geral com o caso individual impondo a consideraccedilatildeo daquilo que normalmente acontece em detrimento do que eacute extraordinaacuterio e tambeacutem impondo a consideraccedilatildeo das especificidades do caso concreto ante a generalidade da norma b) como dever de congruecircncia a exigir a harmonizaccedilatildeo das normas com suas condiccedilotildees externas de aplicaccedilatildeo (isto eacute com a realidade com base em que foram editadas) c) como dever de equivalecircncia a exigir uma relaccedilatildeo de equivalecircncia entre a medida adotada e o criteacuterio que a dimensiona
Logo ldquo() o princiacutepio da razoabilidade deve nortear a atuaccedilatildeo do juiz na adoccedilatildeo das
medidas executivas atiacutepicas previstas no art 139 IV do Novo CPCrdquo 132 tendo em vista que
ldquo() mesmo medidas que pelo princiacutepio da proporcionalidade podem se mostrar
abstratamente possiacuteveis de adoccedilatildeo no caso concreto podem se mostrar inadequadas e
irrazoaacuteveisrdquo 133
127 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Medidas executivas atiacutepicas na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de
pagar quantia certa art 139 IV do novo CPC Revista de Processo v 42 n 265 mar 2017 p 14 128 Ibid p 14 129 Ibid p 14 130 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111-112 131 Segundo Fredie Didier et al o postulado eacute uma norma que atua sobre a aplicaccedilatildeo de outras normas
A proporcionalidade e a razoabilidade seriam postulados normativos e natildeo princiacutepios segundo essa concepccedilatildeo 132 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo op cit p 14 133 Ibid p 14
51
Ademais conforme dispotildee o postulado da proibiccedilatildeo de excesso ldquoa realizaccedilatildeo de uma
regra ou princiacutepio constitucional natildeo pode conduzir agrave restriccedilatildeo a um direito fundamental que
lhe retire um miacutenimo de eficaacuteciardquo 134
A proibiccedilatildeo de excesso deveraacute sempre ser suscitada quando um direito fundamental
houver sido violado a ponto do direito fundamental sofrer violaccedilatildeo excessiva Ademais ldquoesse
postulado natildeo se confunde com o da proporcionalidade porque ele dispensa os exames da
adequaccedilatildeo (relaccedilatildeo meiofim) da necessidade (exigibilidade) ou da proporcionalidade em
sentido estrito (ponderaccedilatildeo entre vantagens e desvantagens)rdquo 135
Logo ldquopouco importa a relaccedilatildeo meiofim ou a exigibilidade da medida ou ainda a
ponderaccedilatildeo com outro direito fundamental eventualmente em jogo aqui se analisa apenas a
eficaacutecia de um determinado direito fundamentalrdquo 136
O princiacutepio da eficiecircncia tem previsatildeo constitucional no art 37 e previsatildeo
infraconstitucional no art 8ordm do CPC15 O referido princiacutepio determina que o processo seja
conduzido de forma eficiente pelo oacutergatildeo jurisdicional
Entende-se que eficiente eacute a atuaccedilatildeo que utilize adequadamente os meios necessaacuterios
para que se atinjam os fins almejados O oacutergatildeo jurisdicional na escolha dos meios a serem
utilizados para a obtenccedilatildeo dos fins
a) deve escolher aqueles que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo (deve evitar meios que promovam resultados insignificantes) b) deve escolher meios que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado (natildeo se pode escolher um meio de resultado duvidoso) c) natildeo pode escolher um meio que produza muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscado 137
O juiz deveraacute igualmente analisar o princiacutepio da menor onerosidade da execuccedilatildeo que
eacute previsto pelo art 805 do CPC ldquoArt 805 Quando por vaacuterios meios o exequente puder
promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o
executadordquo
134 134 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 112 135 Ibid p 112 136 Ibid p 112 137 Ibid p 112-113
52
Logo ldquohavendo duas opccedilotildees igualmente eficazes para permitir alcanccedilar o resultado
pretendido (satisfaccedilatildeo do creacutedito) deveraacute o oacutergatildeo julgador valer-se daquela que menos onere
a situaccedilatildeo do executadordquo 138
O dito princiacutepio impede o comportamento abusivo do exequente que possa beneficiar-
se do meio mais danoso ao executado protegendo dessa forma a lealdade e a eacutetica
processual
Os postulados e princiacutepios analisados em linhas preteacuteritas impotildeem ao oacutergatildeo julgador a
observacircncia de alguns criteacuterios para a escolha da medida executiva atiacutepicas a ser utilizada no
caso concreto
Primeiramente a medida executiva atiacutepica deveraacute ser adequada ldquoO criteacuterio da
adequaccedilatildeo impotildee que juiz considere abstratamente uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida
executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia
a gerar o resultadordquo 139 Nesse primeiro momento o juiz deveraacute observar sob a perspectiva do
credor qual medida teraacute o condatildeo de gerar o resultado mais efetivo
Segundo Fredie Didier et al140 o criteacuterio da adequaccedilatildeo eacute
() fortemente inspirado pelo postulado da proporcionalidade e pelo princiacutepio da eficiecircncia na parte em que esse princiacutepio determina a escolha de meios que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo e que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado
Ademais a medida adotada pelo oacutergatildeo julgador deveraacute ser necessaacuteria ldquoEsse criteacuterio
impotildee um limite agrave atuaccedilatildeo judicial funcionando como uma espeacutecie de contrapeso ao criteacuterio
da adequaccedilatildeo Aqui deve-se levar em conta a posiccedilatildeo do devedorrdquo141
O juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental agrave execuccedilatildeo e determinar
uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute necessaacuterio que a
medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado O criteacuterio da necessidade
estabelece que ldquonatildeo se pode ir aleacutem do necessaacuterio para alcanccedilar o propoacutesito almejado Deve
138 Ibid p 113 139 Ibid p 113 140 Ibid p 113 141 Ibid p 114
53
pois o oacutergatildeo julgador determinar o meio executivo na medida do estritamente necessaacuterio para
proporcionar a satisfaccedilatildeo do creacutedito ndash nem menos nem maisrdquo 142
O referido criteacuterio possui forte influecircncia dos postulados da proibiccedilatildeo do excesso e da
razoabilidade assim como do princiacutepio da menor onerosidade para o executado Assevera
Fredie Didier et al143 que
Natildeo eacute razoaacutevel por exemplo impor como primeira opccedilatildeo medida coercitiva a ser suportada pelo agente puacuteblico pelo simples fato de o juiz pressupor que o ente puacuteblico ao qual ele eacute vinculado iraacute descumprir determinada ordem judicial - o descumprimento natildeo pode ser visto como algo ordinaacuterio ou cotidiano (razoabilidade como dever de equidade) Tampouco eacute razoaacutevel eleger a prisatildeo civil como meacutetodo prioritaacuterio para compelir o executado ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer (razoabilidade como dever de equivalecircncia) Aleacutem disso eacute vedada por exemplo a imposiccedilatildeo de multa coercitiva para compelir o executado a emitir declaraccedilatildeo de vontade uma vez que haacute previsatildeo expressa de medida tiacutepica capaz de proporcionar o mesmo resultado sem sacrifiacutecio para o devedor (art 501 CPC)
A afirmaccedilatildeo feita por Bonavides144 em 1997 sobre a adequaccedilatildeo e a necessidade
continua atual sobre os motes
O meio empregado pelo legislador deve ser adequado e necessaacuterio para alcanccedilar o objetivo procurado O meio eacute adequado quando com seu auxiacutelio se pode alcanccedilar o resultado desejado eacute necessaacuterio quando o legislador natildeo poderia ter escolhido outro meio igualmente eficaz mas que natildeo limitasse ou limitasse de maneira menos sensiacutevel o direito fundamental
Por fim a medida deve conciliar os interesses contrapostos ldquoO magistrado deve
ponderar os interesses em jogo aplicando a proporcionalidade em sentido estrito de modo
que as vantagens da utilizaccedilatildeo da medida atiacutepica escolhida superem as vantagens de seu usordquo 145
Esse criteacuterio natildeo privilegia nem o credor nem o devedor e sim a soluccedilatildeo mais
equilibrada e que atenda da melhor forma aos valores em conflito ldquoTrata-se de criteacuterio
inspirado nos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade bem como no princiacutepio da
142 Ibid p 114 143 Ibid p 114 144 BONAVIDES Paulo Curso de Direito Constitucional 7ordm ediccedilatildeo Satildeo Paulo Ed Malheiros 1997
p 372 145 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 114-115
54
eficiecircncia na parte em que impotildee ao juiz evitar a escolha do meio executivo que produza
muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscadordquo 146
Cada um dos criteacuterios supracitados devem ser considerados pelo juiz ao aplicar as
medidas executivas atiacutepicas ao caso concreto Para Fredie Didier et al147 as medidas como
retenccedilatildeo de CNH passaporte ou cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado como
forma de pressionaacute-lo ao pagamento da diacutevida pecuniaacuteria natildeo satildeo possiacuteveis
Essas natildeo satildeo medidas adequadas ao atingimento do fim almejado (o pagamento de quantia) - natildeo haacute propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente Tais medidas soam mais como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-lo ao cumprimento da ordem judicial - e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a utilizaccedilatildeo de meios sancionatoacuterios pelo magistrado mas apenas de meios de coerccedilatildeo indireta e sub-rogatoacuterios
Ainda que adequadas fossem a retenccedilatildeo de CNH e do passaporte no corte de fornecimento de aacutegua natildeo parecem ser medidas necessaacuterias (no sentido de exigiacuteveis) uma vez que outras medidas podem em tese ser utilizadas sem causar igual gravame ao executado - como por exemplo a simples restriccedilatildeo do uso de cartotildees de creacutedito A retenccedilatildeo de documentos pessoais eacute medida que termina por restringir a liberdade de ir e vir do executado mostrando-se a princiacutepio natildeo-razoaacutevel por ir de encontro ao dever de equivalecircncia e desproporcional por restringir demais o direito agrave liberdade em favor do direito de creacutedito pecuniaacuterio do exequente
O processualista baiano et al148 cita tambeacutem outro exemplo de medida atiacutepica que natildeo
atingem os criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade
Tampouco parece adequada em princiacutepio determinaccedilatildeo de corte de energia eleacutetrica de todo o preacutedio onde funciona serviccedilo puacuteblico administrativo como forma de pressionar o ente federado a cumprir ordem de nomeaccedilatildeo de candidato em concurso puacuteblico Natildeo parece haver relaccedilatildeo meiofim entre uma coisa e outra Tambeacutem natildeo eacute possiacutevel enxergar essa medida como necessaacuteria no sentido de ser a menos gravosa para o devedor - observe que se trata de medida que uma vez aplicada ensejaria restriccedilatildeo de funcionamento em toda a reparticcedilatildeo puacuteblica em prejuiacutezo de serviccedilos puacuteblicos essenciais ao funcionamento da Administraccedilatildeo o que aleacutem de ser excessivamente gravoso parece natildeo se conformar agrave necessidade de ponderaccedilatildeo dos interesses em jogo - aleacutem de afetar a um sem-nuacutemero de pessoas tomadoras desses serviccedilos
Ademais eacute sabido que toda e qualquer decisatildeo judicial precisa ser fundamentada Ao
se tratar das medidas executivas atiacutepicas o papel da fundamentaccedilatildeo se torna ainda mais
146 Ibid p 115 147 Ibid p 115 148 Ibid p 116
55
importante tendo em vista que eacute pela fundamentaccedilatildeo da decisatildeo que se poderaacute controlar a
adequaccedilatildeo e necessidade da medida atiacutepica
Pelo fato das medidas executivas atiacutepicas derivarem de dispositivos normativos
considerados claacuteusulas gerais propiacutecias as mais variadas interpretaccedilotildees eacute de extrema
importacircncia que o oacutergatildeo julgador fundamente sua decisatildeo
Logo ldquodeve o juiz na fundamentaccedilatildeo decisoacuteria expor racionalmente os motivos da
sua escolha demonstrando com atenccedilatildeo ao art 489 sect 1ordm CPC de que modo a sua opccedilatildeo
atende os criteacuterios da adequaccedilatildeo necessidade e proporcionalidade em sentido estrito ()rdquo 149
Dessa forma os princiacutepios da proporcionalidade e razoabilidade servem para delimitar
o alcance das claacuteusulas gerais de efetivaccedilatildeo fazendo com que o oacutergatildeo julgador se atenha aos
criteacuterios da adequaccedilatildeo e necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao caso
concreto
42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO
EXECUTADO
A entrada em vigor do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 aflorou ainda mais uma
discussatildeo essencial para os processualistas do seacuteculo XXI qual eacute o verdadeiro protagonista do
processo civil
Para os que defendem o ldquoautoritarismo processualrdquo o verdadeiro protagonista do
processo civil eacute o oacutergatildeo judiciaacuterio que em nome do desempenho efetivo de suas funccedilotildees lhes
eacute permitido dilatar os poderes que diga-se de jaacute passagem jaacute compotildeem um vastiacutessimo
arsenal150
Jaacute os ldquogarantistasrdquo 151 do processo civil acreditam que os verdadeiros protagonistas satildeo
as partes do processo e seus direitos e garantias devem ser estritamente preservados
Devido a essa disputa de quem possui maior protagonismo no processo as mudanccedilas
ocorridas no coacutedigo processual vigente quanto agraves medidas executivas atiacutepicas despertaram
149 Ibid p 117 150 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos
atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04102018
151 O processualista Araken de Assis acredita que o termo garantista eacute descabido tendo em vista que remete ao processo penal
56
maior celeuma do que qualquer outra modificaccedilatildeo trazida pelo CPC15 Afinal as referidas
medidas acirravam ainda mais a disputa pelo protagonismo processual
O fato de o CPC15 dispor no art 139 IV que o juiz poderaacute decretar todas as medidas
indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o
cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo
pecuniaacuteria levou boa parte da doutrina e dos juiacutezes a acreditar que teria pleno direito de
aplicar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo Entretanto muitos se esqueceram do outro lado
da moeda esqueceram que a dignidade humana do executado tambeacutem eacute um direito
fundamental e natildeo pode ser violado
Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa152
acreditam que
() natildeo parece producente elencar um rol abstrato das medidas que poderiam ser aplicadas pelo juiz a tiacutetulo do art 139 IV CPC Afinal se busca a efetividade da execuccedilatildeo e esta soacute pode ser identificada agrave luz das especificidades da situaccedilatildeo concreta Ideal eacute enveredar pela loacutegica modular (adequaccedilatildeo ao caso) natildeo pela geneacuterica (soluccedilotildees abstratas de pretensa utilidade universal)
Em razatildeo de o dispositivo apresentar uma gama de poderes tatildeo amplos agrave disposiccedilatildeo do
oacutergatildeo julgador sem nenhuma estipulaccedilatildeo de um procedimento legal previamente definido para
que estabeleccedila as condiccedilotildees de sua aplicaccedilatildeo em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo eacute
necessaacuterio que em razatildeo do princiacutepio da dignidade humana natildeo busque definir o que o
dispositivo permite mas de definir o que ele natildeo permite ldquoOu seja propotildee-se a sua
compreensatildeo por exclusatildeo Afinal se ele tem potencialidade para promover a efetividade da
tutela tambeacutem pode provocar lesotildees E como em direito os fins natildeo justificam os meios
ressalta como prioritaacuteria a necessidade de estabelecer limitesrdquo 153
O art 789 do CPC15 disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial e eacute
categoacuterico ao dispor que ldquoo devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para
152 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
153 Ibid sem paginaccedilatildeo
57
o cumprimento de suas obrigaccedilotildees salvo as restriccedilotildees estabelecidas em leirdquo Logo a
execuccedilatildeo somente poderaacute incidir sobre os bens do devedor e natildeo sobre a sua pessoa
Como eacute sabido a Lex Poetelia Papiria de 326 aC foi o primeiro marco legal da
humanizaccedilatildeo das cobranccedilas de diacutevidas abolindo a imposiccedilatildeo ao devedor de castigos
vexatoacuterios e ateacute da pena de morte154
Afinal no direito romano antigo a cobranccedila de diacutevidas poderia recair sobre a pessoa
do devedor que respondia com sua liberdade e ateacute mesmo com seu proacuteprio corpo permitindo
a lei que repartissem tantos pedaccedilos do corpo do devedor quantos fossem seus credores
Nesse sentindo leciona o professor Guilherme Pupe da Noacutebrega155 que
Vem de longe a evoluccedilatildeo no sentido de fazer a responsabilidade por uma obrigaccedilatildeo migrar da pessoa do devedor para seu patrimocircnio Merecem registro especiacutefico como marcos histoacutericos remotos a Lex Poetelia Papiria de 326 aC que aboliu o nexum e possibilidade de escravidatildeo do devedor como garantia da obrigaccedilatildeo e a pignoris capio ou ldquoaccedilatildeo por tomada de penhorrdquo que instituiu a possibilidade de o credor tomar parcela dos bens do devedor como forma de assegurar o adimplemento da diacutevida Aqueles institutos culminariam seacuteculo depois no artigo 789 do CPC de 2015 a consagrar que o devedor responda pela satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo com seus bens presentes e futuros observadas as restriccedilotildees impostas pelas impenhorabilidades legais
Logo o avanccedilar da civilizaccedilatildeo marcou o deslocamento da responsabilidade por
diacutevidas saindo do corpo do devedor para o seu patrimocircnio tendo em vista que a vida
humana a liberdade e a integridade fiacutesica satildeo valores inalienaacuteveis natildeo podendo ser
sacrificadas em benefiacutecio de obrigaccedilotildees pecuniaacuterias 156
Entretanto eacute sabido que a responsabilidade patrimonial eacute excepcionada pela prisatildeo
civil do devedor de verba alimentiacutecia resquiacutecio da responsabilidade pessoal romana
154 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt
httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018
155 NOacuteBREGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139 IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018
156 Ibid sem paginaccedilatildeo
58
No entanto haacute uma justificativa para isso Segundo o processualista Guilherme Pupe
da Noacutebrega157
Eacute que a par de a prisatildeo civil encontrar previsatildeo constitucional no inciso LXVII do artigo 5ordm o raciociacutenio eacute o de que o direito do alimentante agrave liberdade de locomoccedilatildeo cede diante dos direitos agrave vida e agrave dignidade titularizados pelo alimentando e resguardados pelos alimentos Foi esse mesmo raciociacutenio aliaacutes que justificou no passado a ediccedilatildeo da suacutemula 309 pelo STJ agora positivada pelo artigo 528 sect 7ordm que limita a modalidade coercitiva agraves trecircs uacuteltimas prestaccedilotildees vencidas e agraves prestaccedilotildees vincendas A ideia eacute que tendo o alimentando subsistido a despeito do natildeo-pagamento de prestaccedilotildees mais antigas essas verbas teriam perdido o caraacuteter alimentar que na equaccedilatildeo antes apresentada justificaria a prisatildeo civil do alimentante Daiacute por que aqueles valores antigos remanescem exigiacuteveis mas somente pela via da expropriaccedilatildeo
Essa ressalva eacute necessaacuteria tendo em vista que a adoccedilatildeo de teacutecnica de execuccedilatildeo
indireta para incursatildeo radical na esfera de direitos do executado notadamente direitos
fundamentais quando carente de respaldo constitucional natildeo merece acolhimento sob
risco de se atentar contra o devido processo legal (artigo 5ordm LIV da Constituiccedilatildeo)
Como afirma o autor Bruno Dantas158 ldquoembora inexistam estatiacutesticas que permitam
comparaccedilotildees natildeo eacute desarrazoado intuir que os iacutendices de inadimplecircncia despeccedilam na razatildeo
inversa da incidecircncia das ordens judiciais sobre o corpo e a liberdade do devedorrdquo Entretanto
eacute natildeo possiacutevel adotar toda e qualquer medida executiva atiacutepica em nome da efetividade da
execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que se saiba os limites da sua aplicaccedilatildeo
Dessa forma instrumentos que permitam o cumprimento forccedilado de contratos e o pagamento
de diacutevidas satildeo necessaacuterios contudo eacute preciso equilibrar essa exigecircncia com a liberdade e a
dignidade humana
Como citado alhures o art 139 IV ensejou decisotildees como a que determinou a
suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o
passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito em uma accedilatildeo se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo
extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
Na supracitada decisatildeo o princiacutepio da responsabilidade patrimonial natildeo estaacute sendo
efetivado para o que o devedor responda com os seus bens Afinal qual ligaccedilatildeo entre a
157 Ibid sem paginaccedilatildeo 158 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt
httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018
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restriccedilatildeo de circulaccedilatildeo que diz com o direito de ir e vir (liberdade) com o pagamento de
diacutevidas que diz com a responsabilidade civil159
Ademais por que quem natildeo tem dinheiro para pagar diacutevidas natildeo pode dirigir Por que
natildeo tem condiccedilotildees para pagar o deacutebito natildeo pode ter passaporte Por que quem natildeo tem como
pagar o deve natildeo pode ter cartatildeo de creacutedito
Ao utilizar meios executivos atiacutepicos como os supracitados para compelir o devedor a
satisfazer a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria quando exauridos sem ecircxito os meios tradicionais de bens
penhoraacuteveis salvo quando existe qualquer indiacutecio concreto de ocultaccedilatildeo ou dissipaccedilatildeo de
bens eacute obrigar o devedor abrir matildeo da proteccedilatildeo da lei que lhe impede que seja tomado agrave forccedila
(art 833 CPC e demais disposiccedilotildees que tratam da impenhorabilidade)
Segundo Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa160
Claramente essa pressatildeo visa dar uma aparecircncia de voluntariedade agrave indicaccedilatildeo de bens impenhoraacuteveis pelo proacuteprio executado que na verdade soacute age assim por ser a uacutenica forma de ver-se livre de um grame imposto por medida indutiva despedida de qualquer necessidade ou adequaccedilatildeo Uma intoleraacutevel perversatildeo
Os autores afirmam ainda que o ldquodireito paacutetrio natildeo admite esta contraditio in terminis
sendo inaceitaacutevel a coexistecircncia de regra protetiva do executado com outra que concede ao
juiz poderes para forccedilar (ainda que indiretamente e veladamente) o executado a abrir matildeo
daquela proteccedilatildeordquo 161
Logo eacute cristalino que a suspensatildeo da CNH eacute uma forma incorreta de aplicar a medida
executiva atiacutepica para efetivar o direito fundamental a execuccedilatildeo tendo em vista que o uacutenico
objetivo da referida eacute pressionar o executado abrir matildeo de algum bem impenhoraacutevel para
levantar o dinheiro e cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
A retenccedilatildeo do passaporte igualmente natildeo possui qualquer relaccedilatildeo com a diacutevida do
executado e eacute somente uma forma de tentar pressiona-lo a dispor de um bem que natildeo pode
ser tomado agrave forccedila e puni-lo por natildeo ter cumprido voluntariamente com a sua obrigaccedilatildeo
159 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
160 Ibid sem paginaccedilatildeo 161 Ibid sem paginaccedilatildeo
60
Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa162
acreditam que tal medida eacute equivocada e se torna excessivamente onerosa ao executado
As mais variadas circunstacircncias relevem o equiacutevoco de tal medida aplicada assim genericamente Com efeito nada justifica reter o passaporte do executado e impedi-lo de viajar para o exterior quando eacute agraciado inclusive com todas as despesas pagas com presente sorteio ou precircmio (por completar tempo de serviccedilo ou atingir metas produtividade na sociedade empresaacuteria em que trabalha) Como todo custo eacute suportado por terceiro e por isso mesmo a sua realizaccedilatildeo pelo executado natildeo traria qualquer prejuiacutezo ao exequente e a retenccedilatildeo do passaporte natildeo seria injustificaacutevel
Paulo Antonio Papini163 acredita que natildeo tem a apreensatildeo de passaporte natildeo possui um
fundamento plausiacutevel tendo em vista que se o devedor natildeo pode viajar para saldar o deacutebito
tambeacutem natildeo poderia exercer atividades cotidianas
Com todo o respeito a quem pensa dessa forma o argumento eacute muito simploacuterio e natildeo precisamos sequer do Direito para derrubaacute-lo Com efeito se considerarmos que ndash ateacute mesmo pelas dimensotildees continentais do Brasil ndash natildeo eacute incomum que uma passagem para o Nordeste custe mais caro que um voo para Miami seria razoaacutevel entatildeo seguindo a linha argumentativa do Magistrado em questatildeo que se oficiasse aos oacutergatildeos reguladores da aviaccedilatildeo civil proibindo-se aquele devedor de fazer ateacute mesmo voos domeacutesticos Poder-se-ia ir mais longe jaacute que natildeo tem dinheiro para pagar suas diacutevidas certamente aquele devedor tambeacutem natildeo teria para comer fora de sua casa porque entatildeo natildeo determinar a expediccedilatildeo de ofiacutecio aos restaurantes proacuteximos agrave sua casa e determinar tambeacutem a proibiccedilatildeo de que ele fosse servidoatendido
O autor se questiona ainda ldquoSeraacute entatildeo que o Princiacutepio da Dignidade da Pessoa
Humana estaacute de mero enfeite em nossa Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ()rdquo 164 Tendo em vista
que ldquoa decisatildeo em comento viola diretamente o art 5ordm incisos XV LIII e LXIII da
Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ndash falamos do Direito de Ir e Virrdquo 165
Ademais o cancelamento do cartatildeo de creacutedito eacute mais uma forma de constranger e
compelir o executado a cumprir com a obrigaccedilatildeo de qualquer forma natildeo importando o que
precise fazer para conseguir saldar o deacutebito tendo em vista que a referida medida apresenta
162 Ibid sem paginaccedilatildeo 163 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo
pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018
164 Ibid sem paginaccedilatildeo 165 Ibid sem paginaccedilatildeo
61
qualquer adequaccedilatildeo com o fim desejado (reverter em pagamento para o exequente) Os
autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa afirmam que166
Reconhece-se que as razotildees da afirmaccedilatildeo ora questionada satildeo ateacute intuitivas mas eacute plenamente possiacutevel problematiza-las Ora natildeo se encontra qualquer justificativa idocircnea para que o juiz possa cancelar o contrato do executado com a administradora do cartatildeo de creacutedito (ou instituiccedilatildeo financeira) que natildeo tem qualquer relaccedilatildeo com o creacutedito exequendo muito menos como isso poderia impactar positivamente na execuccedilatildeo (senatildeo para pressionar o executado a dispor de bens impenhoraacuteveis) Ademais natildeo foram indicados sequer sinais de que o executado realiza gastos supeacuterfluos com o cartatildeo de creacutedito ndash natildeo que isso justificasse a medida pois o correto seria penhorar os esses bens (se duraacuteveis naturalmente) ao inveacutes de cancelar o cartatildeo de creacutedito
Logo as referidas medidas natildeo possuem qualquer relaccedilatildeo com o atingimento do fim
almejado (o pagamento de quantia) tendo em vista que natildeo haacute uma relaccedilatildeo meiofim entre
tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a
restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia
ao exequente
Dessa forma nota-se que as medidas de suspensatildeo da CNH retenccedilatildeo de passaporte e
bloqueio do cartatildeo de credito satildeo completamente inadequadas agrave realizaccedilatildeo a que se prestam
Afinal ldquotais medidas soam como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-
lo ao cumprimento da ordem judicial ndash e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a
utilizaccedilatildeo dos meios sancionatoacuterios pelo magistrado ()rdquo167
Como exposto em linhas preteacuteritas o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades
de aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e
razoaacutevel se atendo aos criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas
executivas atiacutepicas ao caso concreto sob pena de converter a medida em de indutiva para
punitiva
A utilizaccedilatildeo de medidas atiacutepicas como a suspensatildeo da carteira de motorista e o
passaporte do devedor abandona a regra da responsabilidade patrimonial e atingem em cheio
o nuacutecleo de direitos inerentes agrave condiccedilatildeo humana
166 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
167 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 115
62
O limite para a aplicaccedilatildeo de tais medidas deve ser a Constituiccedilatildeo Federal e sobretudo
os Direitos fundamentais nela expressos ldquoCom efeito natildeo haacute saiacuteda tampouco soluccedilatildeo eficaz
de um problema sem que se respeite a Lei e o Devido Processo Legal (por mais nobres que
sejam as intenccedilotildees)rdquo 168
Dessa forma a busca desenfreada pelo cumprimento das decisotildees judiciais em
especial na fase executiva natildeo pode ser realizada em sacrifiacutecio de direitos fundamentais O
Poder Judiciaacuterio natildeo pode resolver a crise do processo executoacuterio utilizando de medidas
arbitraacuterias com o propoacutesito de satisfazer obrigaccedilotildees pecuniaacuterias
Eis o dilema que se coloca diante do poder geral de efetivaccedilatildeo ele pode servir de
potente instrumento em prol da tutela jurisdicional executiva entretanto se manejado de
modo improacuteprio serviraacute de instrumento de puniccedilatildeo e humilhaccedilatildeo do executado169
Eacute notoacuterio que se amplamente aplicado o poder geral de efetivaccedilatildeo reduziria os
iacutendices de inadimplecircncia quiccedilaacute resolveria por completo a crise da execuccedilatildeo civil Entretanto
o retrocesso civilizatoacuterio seria irreparaacutevel
168 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo
pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018
169 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
63
5 CONCLUSAtildeO
Como funccedilatildeo jurisdicional que tem como objeto a efetivaccedilatildeo de direitos a execuccedilatildeo
deve sempre buscar a maior satisfaccedilatildeo possiacutevel concretizando integralmente o creacutedito do
exequente isto eacute realizando o direito fundamental agrave tutela executiva do credor Por isso a
adoccedilatildeo de meios executivos atiacutepicos incorporados pelo Coacutedigo de Processo Civil de 2015 por
meio do art139 IV em um primeiro momento podem ser consideradas vaacutelidas visto que
servem de instrumento para a satisfaccedilatildeo e asseguraccedilatildeo de direitos do credor
Entretanto para o oacutergatildeo julgador natildeo cometa arbitrariedades em nome do direito
fundamental agrave execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que seja definido certos limites na adoccedilatildeo do poder
geral de efetivaccedilatildeo
As medidas executivas atiacutepicas natildeo podem ser aplicadas de maneira indiscriminada
logo devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o esgotamento das medidas tiacutepicas e
a possibilidade de cumprimento da obrigaccedilatildeo
Partindo dessa premissa as medidas a serem adotadas pelo juiz no caso concreto
devem ter como baliza os princiacutepios da proporcionalidade e da razoabilidade para que natildeo
ultrapassem a responsabilidade patrimonial do devedor e incidida diretamente sobre sua
pessoa
Para que natildeo seja atingida a pessoa do executado ou seja para que o devedor natildeo
tenha sua dignidade humana viola eacute necessaacuterio que a medida atiacutepica seja adequada e
necessaacuteria
Logo o juiz deveraacute sempre estabelecer uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida
executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia
a gerar o resultado sem violar a dignidade humana do executado
Dessa o juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental a execuccedilatildeo e
determinar uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute
necessaacuterio que a medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado
As medidas que ultrapassam esses limites como a decisatildeo que apreendeu o
passaporte suspensatildeo a CNH e bloqueou o cartatildeo de creacutedito do devedor satildeo meramente
punitivas posto que essas natildeo satildeo as medidas mais adequadas para se atingir o fim almejado
pois natildeo existe propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado
64
uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo
geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente
Medidas como esta servem de embasamento para decisotildees arbitraacuterias e autoritaacuterias de
violaccedilatildeo dos direitos fundamentais transformando o poder geral de efetivaccedilatildeo em
instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com autorizaccedilatildeo judicial
Em suma o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades de aplicaccedilatildeo do poder
geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e razoaacutevel se atendo aos
criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao
caso concreto sob pena de punir a pessoa do executado violando a sua dignidade humana
em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo
65
REFEREcircNCIAS
ALVES Luceacutelia de Sena Alves RETES Tiago O poder geral de efetivaccedilatildeo das
decisotildees judiciais e proporcionalidade uma anaacutelise criacutetica acerca do art 139 IV do
Novo Coacutedigo de Processo Civil Disponiacutevel em
lthttpswwwacademiaedu31752652O_poder_geral_de_efetivaC3A7C3A3o_das_
decisC3B5es_judiciais_e_a_proporcionalidade_uma_anC3A1lise_crC3ADtica_a
cerca_do_art_139_IV_do_Novo_CC3B3digo_de_Processo_Civil gt Acesso em 2507
2018
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- 1 INTRODUCcedilAtildeO
- 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
-
- 21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL
- 22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
- 23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
- 24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO
- 25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO
-
- 3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
-
- 31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS
-
- 311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15
-
- 32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
- 33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
- 34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
-
- 4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
-
- 41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
- 42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
-
- 5 CONCLUSAtildeO
- REFEREcircNCIAS
-
7 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO
CIVIL
21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL
A Execuccedilatildeo Civil nasce a partir do direito a uma prestaccedilatildeo conferida a algueacutem de
exigir de outrem o cumprimento de uma conduta de fazer natildeo fazer ou de dar (dinheiro ou
coisa distinta) 1
Para que o direito a uma prestaccedilatildeo se concretize no mundo fiacutesico eacute necessaacuterio que
haja a satisfaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida pelo sujeito passivo Caso contraacuterio fala-se em
inadimplemento ou lesatildeo O titular do direito natildeo tem como agir por si para efetivar o seu
direito a prestaccedilatildeo posto que a autotutela eacute vedada no ordenamento juriacutedico Dessa forma eacute
necessaacuterio que se recorra ao Poder Judiciaacuterio para que se possa ter a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo
devida logo a tutela jurisdicional executiva2
O processualista Fredie Didier et al3 equaciona essa questatildeo da seguinte maneira
Quando se pensa em tutela executiva pensa-se na efetivaccedilatildeo de direitos a uma prestaccedilatildeo fala-se de um conjunto de meios para efetivar a prestaccedilatildeo devida fala-se em execuccedilatildeo de fazer natildeo-fazer dar exatamente os trecircs tipos de prestaccedilatildeo existentes Natildeo eacute por acaso nem por coincidecircncia que a tutela executiva pressupotildee inadimplemento (CPC art 786) - fenocircmeno exclusivo dos direitos a uma prestaccedilatildeo Eacute por isso tambeacutem que se pode falar em prescriccedilatildeo da execuccedilatildeo (CPC art 802 e suacutemula do STF n 150) - prescriccedilatildeo eacute fenocircmeno juriacutedico que se relaciona aos direitos a uma prestaccedilatildeo A execuccedilatildeo forccedilada dirige-se ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo Essa relaccedilatildeo entre direito material e processo eacute fundamental para a compreensatildeo do fenocircmeno executivo
Nesse iacutenterim para o Ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux4 ldquoexecutar eacute
satisfazerrdquo ao passo que o professor Fredie Didier et al5 formulou um conceito mais amplo
ldquoExecutar eacute satisfazer uma prestaccedilatildeo devida A execuccedilatildeo pode ser espontacircnea quando o
devedor cumpre voluntariamente a prestaccedilatildeo ou forccedilada quando o cumprimento da prestaccedilatildeo
eacute obtido por meio de atos executivos pelo Estadordquo
1 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 41 2 Ibid p 42 3 Ibid p 42 4 FUX Luiz Curso de direito processual civil Rio de Janeiro Forense 2001 p 980 5 DIDIER JR Fredie et al Op Cit p 45
8 Dessa forma a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional responsaacutevel pela
concretizaccedilatildeo de um direito subjetivo no plano material obtendo resultado idecircntico ou
equivalente ao atingiacutevel se o devedor cumprisse espontaneamente a prestaccedilatildeo
Todavia essa atividade jurisdicional soacute cabe quando o devedor se recusa a cumprir
com a obrigaccedilatildeo quebrando a expectativa do credor de receber o que lhe eacute devido Por esta
razatildeo que se diz que a execuccedilatildeo civil eacute ldquoforccediladardquo 6
Eacute o que se conclui seguindo os ensinamentos de Leonardo Greco7 para ele execuccedilatildeo eacute
uma
() modalidade de tutela jurisdicional que consiste na praacutetica pelo juiz (ou por outrem sob a sua supervisatildeo) de uma seacuterie de atos coativos concretos sobre o devedor e sobre o seu patrimocircnio a fim de agrave custa dele e independentemente do concurso da sua vontade tornar efetivo o cumprimento de prestaccedilatildeo por ele inadimplida desde que tais atos coativos estejam previamente constituiacutedos em lei
Portanto a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional que tem como escopo obter o
cumprimento de uma prestaccedilatildeo certa e inadimplida mediante atos coativos sobre o devedor e
seus bens
22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
Vislumbrado o conceito de execuccedilatildeo civil cabe agora empreender a sua classificaccedilatildeo
tendo em vista que a execuccedilatildeo pode se manifestar de diversas formas possuindo diferentes
caracteriacutesticas em cada uma das suas modalidades
Inicialmente cabe destacar que haacute duas teacutecnicas processuais para viabilizar a execuccedilatildeo
civil lato sensu eacute a que divide em processo autocircnomo de execuccedilatildeo e em fase de execuccedilatildeo
dependendo do tiacutetulo executivo que justifica o exerciacutecio da atividade satisfativa
O Coacutedigo Processual Civil de 2015 acertadamente ratificou as reformas promovidas
no CPC73 que consagrava a opccedilatildeo legislativa de oferecimento das tutelas de certificaccedilatildeo e
efetivaccedilatildeo do direito em um mesmo processo Dessa forma as execuccedilotildees de sentenccedilas
6 BASTOS Luiz Fernando Pereira O artigo 139 IV do novo Coacutedigo de Processo Civil a atipicidade
dos meios executivos na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia certa Brasiacutelia 2017 Disponiacutevel em lt httpbdmunbbrbitstream104831866812017_LuizFernandoPereiraBastospdf gt Acesso em 06 de agosto de 2018
7 BASTOS Luiz Fernando Pereira apud GRECO Leonardo O processo de execuccedilatildeo Rio de Janeiro Renovar 1999 p 164
9
passaram a ser uma fase complementar ao de processo de conhecimento e natildeo mais ocorrer
em um processo autocircnomo
No entendimento do professor processualista Fredie Didier et al8 o processo
sincreacutetico simplificou a efetivaccedilatildeo de um direito reconhecido em sentenccedila
A dispensa do ajuizamento de um processo autocircnomo para execuccedilatildeo de sentenccedila natildeo soacute veio diminuir o tempo necessaacuterio agrave prestaccedilatildeo da tutela jurisdicional - afinal o credor natildeo mais precisaria tal como ocorria ateacute entatildeo promover nova citaccedilatildeo pessoal do reacuteudevedor- como tambeacutem veio romper de vez com um velho paradigma segundo o qual a atividade executiva estaria dissociada da precedente atividade jurisdicional cognitiva
Entretanto natildeo soacute as sentenccedilas de meacuterito ensejam uma execuccedilatildeo Por esta razatildeo foi
necessaacuterio manter o processo autocircnomo de execuccedilatildeo para os casos em que o credor tem a seu
favor um documento que natildeo tenha sido proferido por um oacutergatildeo dotado de jurisdiccedilatildeo
Consequentemente se for o titulo executivo judicial o caminho natural eacute o do
cumprimento de sentenccedila Sendo por sua vez extrajudicial o titulo executivo o caminho
correto eacute o processo de execuccedilatildeo
Cabe ainda salientar que toda execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial eacute definitiva Jaacute a
execuccedilatildeo de tiacutetulo judicial (cumprimento de sentenccedila) pode ser definitiva ou provisoacuteria
No primeiro caso isto eacute cumprimento de sentenccedila definitivo ldquoeacute a execuccedilatildeo completa
que vai ateacute a fase final (com a entrega do bem da vida) sem exigecircncias adicionais para o
exequenterdquo 9
Quanto ao segundo caso ldquoo cumprimento provisoacuterio de sentenccedila (fundada em tiacutetulo
provisoacuterio) eacute aquele que exige alguns requisitos extras para que se chegue agrave fase final da
execuccedilatildeordquo 10
Para Fredie Didier11 o criteacuterio para definir se o cumprimento de sentenccedila seraacute
definitivo ou provisoacuterio
() eacute a estabilidade do tiacutetulo executivo em que se funda a execuccedilatildeo se se tratar de decisatildeo acobertada pela coisa julgada material o cumprimento de sentenccedila eacute
8 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 46 9 Ibid p 57 10 Ibid p 57 11 Ibid p 57
10
definitivo se se tratar de decisatildeo judicial ainda passiacutevel de alteraccedilatildeo (reforma ou invalidaccedilatildeo) em razatildeo da pendecircncia de recurso contra ela interposto a que natildeo tenha sido atribuiacutedo efeito suspensivo o cumprimento de sentenccedila eacute provisoacuterio
Ademais a execuccedilatildeo se distingue em procedimentos executivos comuns que satildeo da
execuccedilatildeo civil e que servem a uma generalidade de creacuteditos como eacute o caso do cumprimento
de sentenccedila e o processo de execuccedilatildeo E em procedimentos executivos especiais que servem
agrave satisfaccedilatildeo de creacuteditos peculiares como a execuccedilatildeo de alimentos e a execuccedilatildeo fiscal 12
Por fim cabe mencionar a classificaccedilatildeo que distingue a execuccedilatildeo em direta e indireta
A primeira execuccedilatildeo direita (ou execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo) eacute ldquo() aquela em que o
Poder Judiciaacuterio prescinde da colaboraccedilatildeo do executado para a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida
e pois promove uma substituiccedilatildeo da sua conduta pela conduta do proacuteprio Estado-juiz ou de
terceirordquo 13 Ou seja as medidas executivas satildeo levadas a efeito mesmo contra a vontade do
devedor na execuccedilatildeo direta
Segundo a doutrina a execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo se subdivide da seguinte forma
meios de desapossamento meios de transformaccedilatildeo e meios de expropriaccedilatildeo
Os meios de desapossamento muito comuns nas execuccedilotildees para entrega de coisa eacute a
forma ldquopor meio da qual se retira da posse do executado o bem a ser entregue ao exequente
(p ex despejo busca e apreensatildeo reintegraccedilatildeo de posse)rdquo 14 Ao passo que por meio dos de
transformaccedilatildeo ldquo() o juiz determina que um terceiro pratique a conduta que deveria ser
praticada pelo executado cabendo a este arcar com o pagamento do custo respectivordquo 15 Jaacute
os meios executivos de expropriaccedilatildeo eacute a forma ldquopor meio do qual algum bem do patrimocircnio
do devedor eacute expropriado para pagamento do creacutedito (adjudicaccedilatildeo alienaccedilatildeo judicial ou
apropriaccedilatildeo de frutos e rendimentos de empresa ou de estabelecimentos e de outros bens art
825 CPC)rdquo 16
12 Ibid p 48 13 Ibid p 50 14 Ibid p 51 15 Ibid p 51 16 Ibid p 51
11 Jaacute a execuccedilatildeo indireta (ou mandamental) atua ldquo() na vontade do devedor como forma
de compeli-lo ou incentivaacute-lo a cumprir a ordem judicialrdquo 17 Nesse entendimento ainda
leciona Fredie Didier et al 18
Nesses casos o Estado-juiz busca promover a execuccedilatildeo com a colaboraccedilatildeo do executado forccedilando ou incentivando a que ele proacuteprio cumpra a prestaccedilatildeo devida Em vez de o Estado-juiz tomar as providecircncias que deveriam ser tomadas pelo executado o Estado forccedila por meio de coerccedilatildeo psicoloacutegica ou de promessa de recompensa judicial a que o proacuteprio executado cumpra a prestaccedilatildeo
A execuccedilatildeo indireta pode ser patrimonial como por exemplo a imposiccedilatildeo de multa
coercitiva ou pessoal com a prisatildeo civil do devedor de alimentos Ademais adiciona Didier
et al19que
O estiacutemulo ao cumprimento da prestaccedilatildeo pode dar-se pelo temor (p ex multa coercitiva prisatildeo civil do devedor de alimentos divulgaccedilatildeo de notiacutecia em jornal revelando o descumprimento) ou pelo incentivo (p ex a chamada sanccedilatildeo premial ou sanccedilatildeo positiva de que eacute exemplo a isenccedilatildeo do pagamento de custas em caso de cumprimento do mandado monitoacuterio - art 701 sect 1ordm CPC a reduccedilatildeo pela metade dos honoraacuterios advocatiacutecios fixados inicialmente pelo juiacutezo em caso de pagamento integral do deacutebito pecuniaacuterio na execuccedilatildeo por quantia certa fundada em tiacutetulo extrajudicial - art 827 sect 1ordm CPC)
Por tais razotildees haacute uma tendecircncia em cada vez mais prestigiar os meios executivos
indiretos (coercitivos) posto que satildeo tatildeo eficazes quanto os meios executivos diretos
entretanto menos onerosos Contudo sua aplicaccedilatildeo deve ser fiscalizada a fim de natildeo permitir
que a execuccedilatildeo civil perca sua finalidade visto que eacute uma funccedilatildeo jurisdicional que tem como
escopo efetivar o direito do credor e natildeo de atender os interesses do devedor
23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
Os princiacutepios juriacutedicos nos uacuteltimos anos passaram a ser munidos de forccedila cogente
normatizando as condutas humanas tanto quanto as regras juriacutedicas Os ditos princiacutepios
ampliaram as margens de atuaccedilatildeo dos aplicadores do direito possibilitando a construccedilatildeo de
soluccedilotildees mais adequadas agraves especificidades das demandas que chegam ao judiciaacuterio
17 Ibid p 51 18 Ibid p 51 19 Ibid p 51-52
12 Dessa forma eacute necessaacuterio aprofundar-se nos princiacutepios norteadores da execuccedilatildeo civil
para que se obtenha uma anaacutelise completa da teoria geral da execuccedilatildeo
A execuccedilatildeo civil tem como um dos seus corolaacuterios o princiacutepio da efetividade este
consiste na exigecircncia de um sistema completo de tutela executiva no qual existam meios
executivos capazes de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor
de tutela executivardquo 20
O referido princiacutepio da efetividade eacute reforccedilado como normal fundamental do processo
civil brasileiro pelo art 4ordm do CPC ldquoArt 4ordm As partes tecircm o direito de obter em prazo razoaacutevel
a soluccedilatildeo integral do meacuterito incluiacuteda a atividade satisfativa
Jaacute o princiacutepio da boa feacute processual corolaacuterio do devido processo legal estaacute previsto
no art 5ordm do CPC ldquoAquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de
acordo com a boa-feacuterdquo Segundo o processualista baiano Fredie Didier21
O princiacutepio da boa-feacute extrai-se de uma claacuteusula geral processual A opccedilatildeo por uma claacuteusula geral de boa-feacute eacute a mais correta Eacute que a infinidade de situaccedilotildees que podem surgir ao longo do processo torna pouco eficaz qualquer enumeraccedilatildeo legal exaustiva das hipoacuteteses de comportamento desleal Daiacute ser correta a opccedilatildeo da legislaccedilatildeo brasileira por uma norma geral que impotildee o comportamento de acordo com a boa-feacute Em verdade natildeo seria necessaacuteria qualquer enumeraccedilatildeo das condutas desleais o art 5deg do CPC eacute bastante exatamente por tratar-se de uma claacuteusula geral
Dessa forma o dito princiacutepio preconiza que diante de um vinculo juriacutedico as pessoas
envolvidas natildeo poderatildeo frustrar a confianccedila do outro devendo comportar-se como se pode
esperar de uma pessoa de boa-feacute
Ademais disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial que ldquosomente o
patrimocircnio do devedor (art 789 CPC) ou de terceiro responsaacutevel pode ser objeto da
atividade executiva do Estadordquo 22
O referido princiacutepio que determina que somente o patrimocircnio submete-se agrave execuccedilatildeo
e natildeo a pessoa foi trazido pela humanizaccedilatildeo do direito Para o professor Didier et al23 o
20 DIDIER JR Freddie et al apud GUERRA Marcelo Lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do
credor na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 21 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte
geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 105 22 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 68
13
desenvolvimento dos meios de execuccedilatildeo indireta ldquoparece relativizar um pouco esse princiacutepio
na medida em que pressionam psicologicamente a pessoa do devedor para que cumpra a
obrigaccedilatildeo com seu comportamentordquo
Complementa ainda que
A responsabilidade executiva parece assumir atualmente caraacuteter hiacutebrido comportando coerccedilatildeo pessoal e sujeiccedilatildeo patrimonial
i) a coerccedilatildeo pessoal incide sobre a vontade do devedor admitindo o uso de medidas coercitivas de execuccedilatildeo indireta para forccedilaacute-lo a cumprir a obrigaccedilatildeo com seu proacuteprio comportamento (ex arts 139 rv 523 sect 1ordm 536 sect 1ordm e 538 sect 3ordm todos do CPC)
ii) descumprida a obrigaccedilatildeo e natildeo sendo possiacuteveladequado o uso de teacutecnica de coerccedilatildeo pessoal tem-se a sujeiccedilatildeo patrimonial que recairaacute sobre os bens do devedor ou de terceiro responsaacutevel - que responderatildeo pela proacutepria prestaccedilatildeo in natura (ex dar coisa ou entregar quantia) ou por perdas e danos24
Dessa forma o referido princiacutepio natildeo tem aplicaccedilatildeo absoluta em razatildeo do principio da
efetividade a qual estimula o uso dos meios de coerccedilatildeo indireta para garantir o cumprimento
da obrigaccedilatildeo pelo devedor
O princiacutepio da primazia da tutela especifica (ou princiacutepio do resultado) assevera que
ldquoA execuccedilatildeo deve ser especiacutefica propiciar ao credor a satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo tal qual
houvesse o cumprimento espontacircneo da prestaccedilatildeo pelo devedorrdquo 25
O CPC de 2015 absorveu todos os avanccedilos legislativos a cerca do mote O caput do
art 497 assegura que na accedilatildeo que tenha por objeto a prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer o
juiz se procedente o pedido concederaacute a tutela especiacutefica ou determinaraacute providecircncias que
assegurem a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico equivalente O art 499 o
complementa a obrigaccedilatildeo somente seraacute convertida em perdas e danos se o autor o requerer
ou se impossiacutevel agrave tutela especiacutefica ou a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico
equivalente
O princiacutepio do contraditoacuterio eacute garantido pela constituiccedilatildeo federal e compreende o
direito de ser ouvido o direito de acompanhar os atos processuais o direito de produzir
provas participar da sua produccedilatildeo manifestar-se sobre a prova produzida e obter do juiz a
23 Ibid p 69-70 24 Ibid p 70 25 Ibid p 71
14
respectiva valoraccedilatildeo o direito de ser informado regularmente dos atos praticados no processo
o direito agrave motivaccedilatildeo das decisotildees o direito de impugnar as decisotildees 26
O contraditoacuterio tem aplicaccedilatildeo em todo processo judicial sendo aplicaacutevel tambeacutem na
execuccedilatildeo No entanto o contraditoacuterio na execuccedilatildeo natildeo ocorre com a mesma intensidade que
no processo ou na fase de conhecimento eacute o que assevera Didier et al 27
O contraditoacuterio no procedimento executivo no aspecto do direito de defesa assegurado agrave parte demandada eacute eventual porquanto depende da provocaccedilatildeo do executado que natildeo eacute chamado ajuiacutezo para defender-se mas sim para cumprir a obrigaccedilatildeo O procedimento executivo adota a teacutecnica monitoacuteria que consiste basicamente na inversatildeo do ocircnus de provocar o contraditoacuterio o reacuteu em vez de citado para manifestar-se sobre a pretensatildeo do autor eacute convocado para cumprir uma determinada obrigaccedilatildeo
Logo haacute o contraditoacuterio no procedimento executivo porem eacute eventual quanto agrave defesa
do executado
Ademais o princiacutepio da menor onerosidade eacute consagrado pelo art 805 do CPC e
dispotildee que ldquoQuando por vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz
mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o executadordquo O referido princiacutepio tem o
escopo de impedir o abuso do direito pelo exequente
O principio da menor onerosidade auxilia o juiz na escolha de um meio executivo
adequado e necessaacuterio que satisfaccedila a prestaccedilatildeo exigida pelo credor Nesse sentido eacute o
entendimento do professor Fredie Didier et al 28
O resultado a ser alcanccedilado eacute aquele estabelecido pelo direito material A maneira de se chegar ateacute esse resultado eacute que deve ser a menos onerosa possiacutevel para o executado Isso significa que a opccedilatildeo pelo meio menos gravoso pressupotildee que os diversos meios considerados sejam igualmente eficazes Assim havendo vaacuterios meios executivos aptos agrave tutela adequada e efetiva do direito de creacutedito escolhe-se a via menos onerosa ao executado
O princiacutepio visa impedir a execuccedilatildeo desnecessariamente onerosa ao executado ou seja a execuccedilatildeo abusiva Em vez de enumerar situaccedilotildees em que a opccedilatildeo mais gravosa revelar-se-ia injusta o legislador valeu-se corretamente de uma claacuteusula geral para reputar abusivo qualquer comportamento do credor que pretender valer-se de meio executivo mais oneroso do que outro igualmente idocircneo agrave satisfaccedilatildeo do seu creacutedito
26 Ibid p 76 27 Ibid p 78 28 Ibid p 79-80
15 O princiacutepio da cooperaccedilatildeo tem como base os princiacutepios do devido processo legal da
boa-feacute processual e do contraditoacuterio O dito princiacutepio avigora a eacutetica processual com o
aprimoramento do diaacutelogo entre as partes reciprocamente e com o oacutergatildeo jurisdicional Eacute o
que preconiza o art 6ordm do CPC Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para
que se obtenha em tempo razoaacutevel decisatildeo de meacuterito justa e efetiva
No procedimento executivo o princiacutepio da cooperaccedilatildeo incide de diversas formas
disciplina Didier et al29 que na execuccedilatildeo
O executado tem o dever de indicar bens agrave penhora (art 774 V CPC) Natildeo encontrados bens penhoraacuteveis e natildeo havendo indicaccedilatildeo de qualquer um deles pelo exequente cabe ao executado declarar quais satildeo seus bens penhoraacuteveis sob pena de se sujeitar a uma sanccedilatildeo pecuniaacuteria compulsoacuteria
Tambeacutem eacute manifestaccedilatildeo do princiacutepio da cooperaccedilatildeo a exigecircncia de que o executado que pretende impugnar o valor da execuccedilatildeo apresente de logo o valor que reputa devido (art 525 sect 4ordm CPC) Seria comportamento natildeo-cooperativo afirmar que a cobranccedila eacute excessiva sem simultaneamente dizer qual eacute o valor correto
Demais disso aplicam-se agrave execuccedilatildeo os deveres que decorrem do princiacutepio da cooperaccedilatildeo e que satildeo imputados ao oacutergatildeo jurisdicional () Assim por exemplo deve o juiz advertir ao executado antes de puni-lo de que seu ato pode vir a caracterizar-se como atentatoacuterio agrave dignidade da jurisdiccedilatildeo ( art 772 II CPC) perceba que se trata de uma conduta compatiacutevel com o dever de prevenccedilatildeo O oacutergatildeo jurisdicional somente pode conhecer da prescriccedilatildeo ex officio dando a oportunidade de o exequente manifestar-se conforme impotildee o dever de consulta ( cf arts 10 487 paraacutegrafo uacutenico e 921 sect 5ordm CPC)
O princiacutepio ou postulado30 da proporcionalidade tem aplicaccedilatildeo muito relevante na
execuccedilatildeo O art 8 do CPC assegura que o oacutergatildeo jurisdicional tem o dever de observar a
proporcionalidade e a razoabilidade ao aplicar o ordenamento juriacutedico inclusive no
procedimento executivo
Ademais o art 805 do CPC eacute categoacuterico ao disciplinar que ldquoArt 805 Quando por
vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo
menos gravoso para o executadordquo O referido artigo jaacute se trata de uma concretizaccedilatildeo da
proporcionalidade
29 Ibid p 82 30 Segundo Fredie Didier et al haacute uma discussatildeo doutrinaacuteria sobre a proporcionalidade Parte da
doutrina acredita que a proporcionalidade eacute um princiacutepio e outra parte acredita que eacute um postulado normativo
16 O principio da adequaccedilatildeo pode ser vislumbrado em dois momentos do Direito
Processual ldquoa) no legislativo como orientador da confecccedilatildeo das leis b) no jurisdicional
autorizando ao juiz diante do caso concreto adaptar procedimento agraves suas peculiaridadesrdquo 31
Para Luceacutelia de Sena Alves e Tiago Retes32
Isso quer dizer que no momento legislativo o devido processo deve ser observado pelo legislador para a confecccedilatildeo das normas de direito processual que iratildeo servir de instrumento efetivo de concretizaccedilatildeo do direito substancial a ser tutelado atendendo a todas as suas finalidades sob pena de falecircncia do proacuteprio direito No momento jurisdicional da mesma forma a via processual escolhida pelo autor tambeacutem deve estar sujeita a este princiacutepio para que natildeo sofra as mesmas consequecircncias da sua inobservacircncia
O ordenamento juriacutedico deve ser aplicado por meio da teacutecnica processual adequada
evitando dessa forma uma tutela ineficaz
Por fim o princiacutepio do autorregramento da vontade na execuccedilatildeo tem o objetivo de
ldquo() preservar um espaccedilo processual para o exerciacutecio da liberdade e da vontade em que
sejam permitidas negociaccedilotildees que envolvam as partes ndash e tambeacutem o juizrdquo33 Didier et al34
assevera que
A rigor o legislador estabelece um regime juriacutedico de autorregramento da vontade processual identificando-se algumas manifestaccedilotildees relevantes para a execuccedilatildeo Na verdade pode-se dizer que poucos satildeo os ambientes mais propiacutecios do que a execuccedilatildeo para a negociaccedilatildeo sobre o processo Todos os institutos e normas processuais relativos agrave execuccedilatildeo devem ser repensados a partir da premissa de que o CPC permite uma ampla margem de liberdade de negociaccedilatildeo sobre o processo (art 190 CPC)
O autorregramento da vontade pode ser vislumbrando na previsatildeo de negoacutecios tiacutepicos
em sede de execuccedilatildeo como por exemplo no acordo das partes sobre o valor do bem que
dispensa a avaliaccedilatildeo disposto no inciso I do art 871 CPC Ademais dentro dos limites do art
190 do CPC eacute possiacutevel na execuccedilatildeo a atribuiccedilatildeo da negociaccedilatildeo atiacutepica aos sujeitos 31 ALVES Luceacutelia de Sena Alves RETES Tiago O poder geral de efetivaccedilatildeo das decisotildees judiciais e
proporcionalidade uma anaacutelise criacutetica acerca do art 139 IV do Novo Coacutedigo de Processo Civil Disponiacutevel em lthttpswwwacademiaedu31752652O_poder_geral_de_efetivaC3A7C3A3o_das_decisC3B5es_judiciais_e_a_proporcionalidade_uma_anC3A1lise_crC3ADtica_acerca_do_art_139_IV_do_Novo_CC3B3digo_de_Processo_Civil gt Acesso em 25 de julho de 2018
32 Ibid natildeo paginado 33 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 85 34 Ibid p 85
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processuais permitindo que sejam feitas mudanccedilas nos procedimentos e nas situaccedilotildees
juriacutedicas processuais ldquoSatildeo exemplos de negoacutecios processuais atiacutepicos na execuccedilatildeo pacto de
penhorabilidade acordo de ampliaccedilatildeo de prazos das partes de qualquer natureza acordo de
rateio de despesas processuais ()rdquo35
24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO
Sempre houve diversos questionamentos quanto agrave eficaacutecia do Direito processual Civil
e se o mesmo era meio apto a assegurar a tutela jurisdicional dos direitos dos cidadatildeos O
processo de execuccedilatildeo eacute o setor que sofre mais criacuteticas quanto a sua ineficiecircncia afinal a
execuccedilatildeo civil sempre foi o ldquocalcanhar de Aquilesrdquo do sistema processual pela praxe do
ldquoganhou (no processo de conhecimento) mas natildeo levou (na fase de cumprimento ou
execuccedilatildeo)rdquo 36
Essa dificuldade de se efetivar a tutela satisfastiva natildeo se resume a um problema de
mera teacutecnica processual tiacutepico de determinado ordenamento mas representa uma prova de
fogo da capacidade dos instrumentos jurisdicionais O autor Leonardo Greco37 no ano de
2005 atribuiu esse fato as seguintes causas o excesso de processos o custo e a morosidade da
justiccedila a inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios a ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais
um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico e a progressiva volatizaccedilatildeo dos bens
Quanto ao excesso de processos o referido autor aduz que ldquonos grandes centros o
crescimento da maacutequina judiciaacuteria natildeo acompanhou a expansatildeo do nuacutemero de litiacutegiosrdquo 38
O custo e morosidade da justiccedila prejudicam a tutela satisfativa posto que
ldquojaacute desfalcado pelo inadimplemento do devedor o credor ainda tem de arcar com o adiantamento das despesas do processo de execuccedilatildeo e de eventual liquidaccedilatildeo vendo arrastar-se a marcha dos atos executoacuterios facilmente retardada por atos procrastinatoacuterios do devedorrdquo 39
35 Ibid p 86 36 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca
para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018
37 GRECCO Leonardo A Crise do Processo de Execuccedilatildeo in Estudos de direito processual Leonardo Greco ndash Campos dos Goytacazes Ed Faculdade de Direito de Campos 2005 p 7
38 Ibid p 7 39 Ibid p 7-8
18 A inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios contribui para a crise do processo de
execuccedilatildeo tendo em vista que
ldquoo juiz da execuccedilatildeo prisioneiro de ritos que o distanciam das partes e da realidade da vida impulsiona sem qualquer apetite a execuccedilatildeo conduzindo-a ao sabor dos ventos das provocaccedilotildees impacientes do credor e das costumeiras procrastinaccedilotildees do devedorrdquo 40
Jaacute ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais atrapalha a efetivaccedilatildeo da tutela satisfativa ldquoo
devedor natildeo colabora com a execuccedilatildeo e os meios de pressatildeo que a lei estabelece natildeo satildeo
suficientes para intimidaacute-lordquo 41
Com um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico
O espiacuterito empresarial e a sociedade de consumo estimulam o endividamento das pessoas e o inadimplemento das obrigaccedilotildees pelo devedor deixou de ser vexatoacuterio e reprovaacutevel o que multiplica as accedilotildees de cobranccedila e execuccedilotildees atraveacutes das quais o sujeito passivo ainda usufrui vantagens agraves custas do credor 42
Por fim Leonardo Greco elenca a volatizaccedilatildeo dos bens como o uacuteltimo fator que
macula o processo executo tendo em vista que
ldquomudou inteiramente o perfil patrimonial das pessoas antes concentrado em bens de raiz e agora tendencialmente dirigido a investimentos em tiacutetulos e valores facilmente negociaacuteveis o que dificulta a sua localizaccedilatildeo pelo credorrdquo 43
O Coacutedigo de Processo Civil de 1973 introduziu o sistema executivo ao ordenamento
juriacutedico paacutetrio e seguindo os valores liberais da eacutepoca com a proteccedilatildeo de esfera juriacutedica de
liberdade do cidadatildeo contra a possibilidade de arbiacutetrio do Estado e uso indevido do Poder
jurisdicional outorgou o miacutenimo de poder ao juiz Seguindo as regras do CPC de 73 o
devedor soacute poderia ter sua esfera juriacutedica invadida atraveacutes de meios de execuccedilatildeo instituiacutedos
previamente em lei
Diante de tantos obstaacuteculos para se efetivar a tutela satisfativa a execuccedilatildeo estava
fadada ao fracasso o que frustrava a expectativa do jurisdicionado a uma prestaccedilatildeo da tutela
jurisdicional ceacutelere e efetiva Insatisfeitos com o cenaacuterio que se encontrava a atividade
40 Ibid p 8 41 Ibid p8 42 Ibid p 8 43 Ibid p8
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executiva legisladores e operadores do direito natildeo mediram esforccedilos para promover uma
evoluccedilatildeo significativa buscando mais eficiecircncia e celeridade ao procedimento executoacuterio
Dessa forma no final de 1994 foi introduzido no coacutedigo de processo agrave flexibilizaccedilatildeo
dos poderes executoacuterios do juiz ldquopara que ele pudesse prestar uma tutela efetiva aos direitos
ficando autorizado a determinar a modalidade de execuccedilatildeo adequada a cada hipoacutetese nas
obrigaccedilotildees de fazer e natildeo fazer (art 461 sect5ordm do CPC de 1973)rdquo No ano de 2002 a referida
medida foi estendida para as obrigaccedilotildees de entregar coisa (art 461-A caput e sect3ordm do CPC de
1973)
Com fundamento nos artigos 461 e 461-A em 2005 a Lei nordm 11 23205 unificou o
processo de conhecimento e o processo de execuccedilatildeo de sentenccedila Nesse sentido Maacuterio
Henrique Cavalcanti Gil Rodrigues44 aduz que
A Lei 112322005 reuniu de forma definitiva os processos de conhecimento e de execuccedilatildeo em um uacutenico processo composto por um sistema bifaacutesico Assim passa a existir uma fase inicial (de reconhecimento) e uma fase posterior (de cumprimento de sentenccedila de efetivaccedilatildeo da decisatildeo definitiva) sem contar com a eventual fase intermediaacuteria de liquidaccedilatildeo (RODRIGUES 2010 p 38)
Ademais as alteraccedilotildees realizadas no CPC de 73 inseriu a atipicidade dos meios
executivos nas obrigaccedilotildees de fazer natildeo fazer e dar coisa certa entretanto exercendo papel
subsidiaacuterio aos meios tiacutepicos
Quanto agraves obrigaccedilotildees de pagar quantia havia apenas a possibilidade de se valer da
incidecircncia de multa do art 475-J do CPC de 73 ndash implementada mediante reforma perpetrada
pela Lei nordm 11232 de 2005 em atendimento a doutrina processualista preocupada com a
efetividade das decisotildees ndash e de atos executivos como a penhora de bens e dinheiro
Ainda que a execuccedilatildeo tenha avanccedilado com a inserccedilatildeo das leis posteriores a 1994 no
CPC de 1973 a mesma continuava insuficiente tendo em vista que a burocracia e lentidatildeo
dos atos executivos davam brechas para que o devedor escondesse seu patrimocircnio penhoraacutevel
tornando carente de efetividade e celeridade agrave execuccedilatildeo
44 RODRIGUES Maacuterio Henrique Cavalcanti Gil A evoluccedilatildeo da execuccedilatildeo de sentenccedila no direito
processual civil e o novo regime juriacutedico das sentenccedilas apoacutes a reforma implementada pela Lei 112322005 Revista do Tribunal Regional Federal da 1ordf Regiatildeo v 22 n 2 fev 2010 p 38
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25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO
A tutela juridiscional eacute um direito fundamental previsto no art 5ordm inciso XXXV da
Carta Magna ldquo() a lei natildeo excluiraacute da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio lesatildeo ou ameaccedila a
direitordquo
Na visatildeo claacutessica o direito de accedilatildeo era efetivado com a prolaccedilatildeo de uma sentenccedila de
meacuterito posiccedilatildeo adotada por grande parte dos processualistas seguidores da doutrina de
Liebman Todavia esse conceito se mostra defasado tendo em vista que o direito de acesso agrave
justiccedila natildeo eacute apenas uma garantia formal de bater as portas do judiciaacuterio mas a garantia de
acesso agrave ordem juriacutedica justa adequada e eficaz45
Acreditar que uma sentenccedila de meacuterito favoraacutevel eacute tutela jurisdicional suficiente para
satisfazer o que se busca com o ajuizamento da accedilatildeo eacute uma visatildeo distorcida da atividade
satisfativa ldquoSob o ponto de vista do direito material a condenaccedilatildeo por si soacute eacute incapaz de
prestar a tutela do direitordquo46
Nessa oacutetica o direito fundamental agrave tutela executiva exige um sistema de tutela
jurisdicional ldquocapaz de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor
de tutela executivardquo47 Dessa forma entende-se que
ldquo() a) a interpretaccedilatildeo das normas que regulamentam a tutela executiva tem de ser feita no sentido de extrair a maior efetividade possiacutevel b) o juiz tem o poder-dever de deixar de aplicar uma norma que imponha uma restriccedilatildeo a um meio executivo sempre que essa restriccedilatildeo natildeo se justificar como forma de proteccedilatildeo a outro direito fundamental c) o juiz tem o poder-dever de adotar os meios executivos que se revelem necessaacuterios agrave prestaccedilatildeo integral de tutela executivardquo48
Egrave imperioso compreender que o direito fundamental agrave tutela executiva ratificado
pelo CPC eacute essencial para dirimir diversos litiacutegios oriundos do procedimento executivo
45 FERREIRA Gabriela Macedo Poder geral de efetivaccedilatildeo em defesa da constitucionalidade da
teacutecnica de execuccedilatildeo dos direitos do art 139 IV do Coacutedigo de Processo Civil Revista Jus Navigandi ISSN 1518-4862 Teresina ano 22 n 5178 4 set 2017 Disponiacutevel em lthttpsjuscombrartigos60190gt Acesso em 11 set 2018
46 Ibid natildeo paginado 47 DIDIER JR Fredie et al apud GUERRA Marcelo lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do credor
na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 48 Ibid p 102-104
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ldquoprincipalmente aqueles relacionados agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo49
Fredie Didier et al50 cita como exemplo as hipoacuteteses de impenhorabilidade
A impenhorabilidade de certos bens eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa
Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais
Por esta razatildeo o legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do
CPC fazendo um preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses das partes envolvidas
optando pela mitigaccedilatildeo do direito do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado
Quando o oacutergatildeo jurisdicional verificar que a aplicaccedilatildeo das regras de
impenhorabilidade eacute desproporcional para o caso concreto deve afastaacute-la e construir a
soluccedilatildeo adequada para o referido caso Didier et al51 traz um exemplo esclarecedor em sua
obra
O bem imoacutevel que serve de moradia da famiacutelia eacute relativamente impenhoraacutevel Objetiva-se com essa restriccedilatildeo proteger o direito fundamental agrave moradia conteuacutedo do direito agrave proteccedilatildeo da dignidade Imagine-se um imoacutevel de altiacutessimo valor Imagine-se agora um creacutedito que corresponda a 40 do valor do imoacutevel A venda judicial do imoacutevel no caso permitiria natildeo soacute satisfazer o direito do credor como ainda garantir ao executado com a sobra a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel que lhe preserve a dignidade A opccedilatildeo pela interpretaccedilatildeo literal da regra que veda a penhora protegeria exclusivamente o direito do executado de maneira desnecessaacuteria porque a relaccedilatildeo valor executadovalor do bem permitiria a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel apoacutes a entrega do dinheiro ao credor Seria pois interpretaccedilatildeo em desconformidade com os preceitos da contemporacircnea hermenecircutica constitucional que preconiza a necessidade de nos casos de choque entre direitos fundamentais dar a interpretaccedilatildeo que mais adequadamente proteja a ambos
A execuccedilatildeo civil integra o direito fundamental agrave tutela jurisdicional disciplinando
que ldquoos dispositivos devem ser interpretados de modo que se garanta a maior efetividade
49 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66 50 Ibid p 66 51 Ibid p 67
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possiacutevel agrave execuccedilatildeo desde que respeitados outros direitos fundamentaisrdquo52 Podendo ser
afastada desde que proporcional qualquer obstaacuteculo irrazoaacutevel agrave efetivaccedilatildeo desse direito
52 FERREIRA Gabriela Macedo apud MACEDO Lucas Buril de As eficaacutecias das decisotildees judiciais e
o cumprimento de sentenccedila no CPC15 Novo CPC Doutrina selecionada v 5 Execuccedilatildeo Coordenador geral Fredie Didier Jr organizadores Lucas Buril de Macedo Ravi Peixoto Alexandre Freire ndash Salvador Jus Podivm 2015 p 360361
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3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO
EXECUTADO
31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS
Como forma de controlar a atividade jurisdicional por muito tempo vigorou o
entendimento de que a execuccedilatildeo somente poderia ser realizada atraveacutes dos meios executivos
tipicamente previstos na legislaccedilatildeo Segundo Luiz Guilherme Marinoni53
O princiacutepio da tipicidade deseja significar que os meios de execuccedilatildeo devem estar previstos na lei e assim que a execuccedilatildeo natildeo pode ocorrer atraveacutes de formas executivas natildeo tipificadas O seu objetivo eacute de um lado impedir que meio executivo natildeo previsto em lei possa ser utilizado e de outro garantir o jurisdicionado contra a possibilidade de arbiacutetrio judicial na fixaccedilatildeo da modalidade executiva Se o jurisdicionado sabe em razatildeo de previsatildeo legal que a sua esfera juriacutedica somente poderaacute ser invadida atraveacutes de determinadas modalidades executivas confere-se a ele a possibilidade de antever a reaccedilatildeo ao seu inadimplemento bem como a garantia de que a jurisdiccedilatildeo natildeo determinaraacute ou permitiraacute a utilizaccedilatildeo de meio executivo diverso daqueles previstos
Dessa forma o princiacutepio da tipicidade disciplina que o oacutergatildeo julgador ao proceder agrave
execuccedilatildeo estaacute limitado aos meios executivos previamente definidos em lei natildeo podendo se
valer de qualquer teacutecnica de efetivaccedilatildeo que natildeo se encaixasse nas hipoacuteteses taxativas da
legislaccedilatildeo
Entretanto o legislador natildeo tem como prever todas as peculiaridades dos direitos
dignos de tutela executiva e preordenar teacutecnicas executivas diversas para cada peculiaridade
Sob esse cenaacuterio o principio da tipicidade foi cedendo lugar ao principio da atipicidade dos
meios executivos
A ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do oacutergatildeo julgador estaacute cada vez mais presente
no ordenamento juriacutedico paacutetrio motivando um poder geral de efetivaccedilatildeo ldquoque permite ao
julgador valer-se dos meios executivos que considerar mais adequado ao caso concreto sejam
eles de coerccedilatildeo direta sejam de coerccedilatildeo indiretardquo 54
53 MARINONI Luiz Guilherme Teacutecnica processual e tutela dos direitos Satildeo Paulo Editora Revista
dos Tribunais 2004 p 212 nota 79 54 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 100
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Essa tendecircncia de ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do juiz natildeo eacute exclusividade do
ordenamento juriacutedico brasileiro segundo Fredie Didier et al55
Michelle Taruffo jaacute apontava que o direito americano diante da inefetividade dos meios executivos at law comeccedilou a autorizar o magistrado a tomar medidas executivas adequadas ao caso concreto Trata-se afirma o jurista italiano de aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo segundo o qual as regras processuais devem ser adaptadas agraves necessidades do direito material
Os meios executivos atiacutepicos derivam de trecircs enunciados normativos do Coacutedigo de
Processo Civil o art 139 IV o art 297 e o sect1ordm do art 536
O art 139 IV do CPC dispotildee que pertence ao juiz o poder-dever de ldquodeterminar
todas as medidas indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para
assegurar o cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto
prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo
Jaacute o art 297 do CPC cuida da tutela provisoacuteria e garante que ldquoo juiz poderaacute
determinar as medidas que considerar adequadas para a efetivaccedilatildeo da tutela provisoacuteriardquo
Podendo dessa forma a dita tutela ser efetivada atipicamente
Por fim o art 536 sect1ordm do CPC dispotildee que
Para atender ao disposto no caput o juiz poderaacute determinar entre outras medidas a imposiccedilatildeo de multa a busca e apreensatildeo a remoccedilatildeo de pessoas e coisas o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva podendo caso necessaacuterio requisitar o auxilio de forccedila policial
As supracitadas medidas executivas atiacutepicas satildeo entendidas pela doutrina como
claacuteusulas gerais processuais executivas56 Essas claacuteusulas gerais natildeo restringem a sua
aplicaccedilatildeo agraves teacutecnicas de coerccedilatildeo indireta satildeo autorizados tambeacutem o uso de meios de execuccedilatildeo
dieta e indireta
Ademais cumpre salientar que o art 139 IV CPC aplica-se a toda e qualquer
atividade executiva ldquoa) seja fundada em tiacutetulo executivo judicial (provisoacuteria ou definitiva)
55 DIDIER JR Fredie et al apud TARUFFO Michelle A atuaccedilatildeo executiva dos direitos perfis
comparatiacutesticos Revista de Processo Satildeo Paulo RT 1990 n 59 p 78 56 Segundo Fredie Didier et al claacuteusula geral eacute uma espeacutecie de texto normativo cujo antecedente
(hipoacutetese faacutetica) eacute composto por termos vagos e consequente (efeito juriacutedico) eacute indeterminado
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seja fundada em tiacutetulo executivo extrajudicial b) seja para efetivar prestaccedilatildeo pecuniaacuteria seja
para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer ou dar coisa distinta de dinheirordquo57
Jaacute o art 297 do CPC garante que a tutela provisoacuteria possa ser efetivada tambeacutem
atipicamente ldquoSucede que a atipicidade da tutela provisoacuteria segue necessariamente a
atipicidade da tutela definitivardquo 58
Por fim o comando do sect 1 ordmdo art 536 se aplica
a) inicialmente agrave execuccedilatildeo de fazer e de natildeo fazer fundada em decisatildeo judicial (provisoacuteria ou definitiva) b) por forccedila do sect 3ordm do art 538 tambeacutem se aplica ao cumprimento de sentenccedila para entrega de coisa c) por forccedila do art 771 paraacutegrafo uacutenico o dispositivo tambeacutem se aplica agrave execuccedilatildeo para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer e entregar coisa distinta de dinheiro fundada em tiacutetulo extrajudicial
Claramente o art 139 IV eacute mais amplo do que o sect 1 ordm do art 536 estende-se por
disposiccedilatildeo expressa agrave execuccedilatildeo de pagar quantia Sendo uma grande novidade nas obrigaccedilotildees
que tem por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15
O art 139 IV do CPC apresentou uma novidade agrave atipicidade dos meios executivos
ao disciplinar que cabe ao juiz ldquodeterminar todas as medidas indutivas coercitivas
mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o cumprimento de ordem judicial
inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo
A inovaccedilatildeo estaacute na possibilidade de utilizar os meios atiacutepicos para assegurar o
cumprimento de decisotildees que versam sobre as obrigaccedilotildees pecuniaacuterias sendo admitida a
utilizaccedilatildeo de outros meios ateacute na execuccedilatildeo de titulo judicial de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria aleacutem da
multa de 10 (a que se refere o artigo 523 sect 1ordm do CPC) para forccedilar o devedor a cumprir a
obrigaccedilatildeo pecuniaacuteria
57 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 105 58 Ibid p 105
26
Dessa forma eacute possiacutevel afirmar que ldquoao lado da disciplina tiacutepica do art 523 e
seguintes () o novo CPC inova ao permitir que o sistema de teacutecnicas executivas atiacutepicas
sejam empregadas na execuccedilatildeo monetaacuteriardquo59 (ZARONI VITORELLI 2016 p 66)
Fernando da Fonseca Gajardoni60 denomina a dita medida como a ldquorevoluccedilatildeo
silenciosardquo da execuccedilatildeo por quantia certa posto que
() pelo fato de que a regra natildeo estar propriamente incrustrada nos capiacutetulo e livro atinentes ao cumprimento de sentenccedila e ao processo de execuccedilatildeo ndash o art 139 IV do Novo CPC parece trazer ao paiacutes algo bastante novo cuja aplicaccedilatildeo a depender do comportamento do Judiciaacuterio pode implicar em verdadeira revoluccedilatildeo (positiva ou negativa) na sistemaacutetica executiva ateacute entatildeo vigente
Claramente o dispositivo foi recebido com entusiasmo por parte da doutrina que
anteciparam em afirmar que o princiacutepio da atipicidade dos meios executivos no CPC2015
ldquo() assume a feiccedilatildeo de poder-dever geral conferido ao magistrado de determinar () todas
as medidas coercitivas sub-rogatoacuterias mandamentais e indutivas que entender necessaacuterias
para a tutela justa efetiva e em tempo razoaacutevelrdquo 61
Dessa forma lecionam Luiz Guilherme Marinoni Seacutergio Cruz Arenhart e Daniel
Mitidiero62 que
O juiz a partir do art 139 IV do CPC2015 natildeo estaacute mais adstrito apenas agrave sentenccedila condenatoacuteria ndash que fixa a obrigaccedilatildeo de pagar e daacute ensejo agrave abertura da execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo patrimonial ndash para a tutela de prestaccedilotildees pecuniaacuterias Pode impor essa prestaccedilatildeo por meio de ordem judicial acoplada ao aceno de emprego de medida de induccedilatildeo (coercitiva ou de pressatildeo positiva) ou de medida de sub-rogaccedilatildeo (MARINONI ARENHARDT MITIDIERO 2015 p 703)
Deste modo em razatildeo do art 139 IV do CPC tem-se entendido que o juiz nas
execuccedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria possui a faculdade de adotar qualquer
59 ZARONI Bruno Marzullo VITORELLI Edilson Reforma e efetividade da execuccedilatildeo no novo CPC
In PEIXOTO Ravi FREIRE Alexandre MENDES Aluiacutesio Gonccedilalves de Castro Execuccedilatildeo 2 ed rev e atual Salvador JusPodivm 2016 766 p (Coleccedilatildeo novo CPC doutrina selecionada v 5) p 66
60 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia 24082015 JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Acesso em 23082018
61 LIMA Rafael de Oliveira A atipicidade dos meios executivos no coacutedigo de processo civil brasileiro de 2015 Revista de Processo Jurisdiccedilatildeo e Efetividade da Justiccedila v 2 n 2 juldez 2016 p 11
62 MARINONI Luiz Guilherme ARENHART Seacutergio Cruz MITIDIERO Daniel Novo curso de processo civil tutela dos direitos mediante procedimento comum Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 v 2 p 703
27
medida indutiva coercitiva mandamentais ou sub-rogatoacuterias para efetivar o creacutedito do
exequente natildeo se limitando as medidas tiacutepicas
Alguns doutrinadores se precipitaram ao afirmar que o dito dispositivo ldquo() autoriza o
juiz a utilizar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir ressalvando-se a prisatildeo
civil constitucionalmente limitada ao devedor de alimentosrdquo 63 Acreditam Jorge Bheron
Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa que o entusiasmo por parte da
doutrina abre margem para as mais variadas formas de compelir o devedor a cumprir com a
prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
ldquoE aiacute persistindo no mau vezo de fazer explicaccedilotildees em abstrato ignorando que o sentindo soacute se daacute na aplicaccedilatildeo (situaccedilatildeo concreta real ou fictiacutecia) as sugestatildeo satildeo as mais engenhosas suspensatildeo de CNH retenccedilatildeo de passaporte restriccedilatildeo de fim de semana cancelamento de cartotildees de creacutedito ndash para ficar apenas nestasrdquo 64
Ou seja podendo o juiz natildeo apenas substituir o devedor tomando seu patrimocircnio para
entregar ao credor na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia como tambeacutem poderaacute
pressionaacute-lo psicologicamente a adimplir por conta proacutepria a obrigaccedilatildeo
Ademais o Enunciado nordm 48 do ENFAM avalia expressamente a possibilidade de
imposiccedilatildeo de medidas coercitivas para a efetivaccedilatildeo da execuccedilatildeo pecuniaacuteria Conforme o dito
enunciado
ldquoO art 139 inciso IV traduz um poder geral de efetivaccedilatildeo permitindo a aplicaccedilatildeo de medidas atiacutepicas para garantir o cumprimento de qualquer ordem judicial inclusive no acircmbito do cumprimento de sentenccedila e no processo de execuccedilatildeo baseado em tiacutetulosrdquo
Dessa forma o artigo 139 IV do CPC permite uma gama ampla de interpretaccedilotildees por
parte da doutrina por ser uma claacuteusula geral encontrando limite apenas na imaginaccedilatildeo de
quem o analisa Nesse sentido eacute forccediloso orientar e delimitar o manejo desse artigo legal para
que se extraia seu sentido e alcance revelando assim sobre que situaccedilotildees ele incide de que
modo e o que permite
63 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
64 Ibid sem paginaccedilatildeo
28
32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER
GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
O artigo 139 IV com a vigecircncia do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 abriu margem
para uma constelaccedilatildeo de decisotildees nas quais o dito dispositivo recebeu diversas interpretaccedilotildees
pelos operadores do direito
Sem duacutevidas por ser uma das pioneiras a decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara
Ciacutevel do Foro Regional de Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-
1320138260011 na data de 25 de agosto de 2016 gerou um enorme rebuliccedilo
Nessa accedilatildeo que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto
uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a
suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o
passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito
Segundo a magistrada o processo tramitava haacute anos sem que nenhum valor tenha sido
pago ao exequente aleacutem do devedor natildeo ter oferecido proposta de acordo e nem ter indicado
bens agrave penhora configurando uma completa desiacutedia com o processo
ldquoO caso tratado nos autos se insere dentre as hipoacuteteses em que eacute cabiacutevel a aplicaccedilatildeo do art 139 inciso IV do Coacutedigo de Processo Civil Isso porque o processo tramita desde 2013 sem que qualquer valor tenha sido pago ao exequente Todas as medidas executivas cabiacuteveis foram tomadas sendo que o executado natildeo paga a diacutevida natildeo indica bens agrave penhora natildeo faz proposta de acordo e sequer cumpre de forma adequada as ordens judiciais frustrando a execuccedilatildeo
Se o executado natildeo tem como solver a presente diacutevida tambeacutem natildeo recursos para viagens internacionais ou para manter um veiacuteculo ou mesmo manter um cartatildeo de creacutedito Se poreacutem mantiver tais atividades poderaacute quitar a diacutevida razatildeo pela qual a medida coercitiva poderaacute se mostrar efetiva
Assim como medida coercitiva objetivando a efetivaccedilatildeo da presente execuccedilatildeo defiro o pedido formulado pelo exequente e suspendo a Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo do executado M A S determinando ainda a apreensatildeo de seu passaporte ateacute o pagamento da presente diacutevida
()
Determino ainda o cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado ateacute o pagamento da presente diacutevida ()rdquo
Foi impetrado Habeas Corpus no Tribunal de Justiccedila do Estado de Satildeo Paulo a favor
do executado sob o fundamento que a coaccedilatildeo era ilegal e afetava o direito de locomoccedilatildeo
29
garantido constitucionalmente Tendo sido concedida a liminar em decisatildeo que ora se
reproduz
Em que pese a nova sistemaacutetica trazida pelo art 139 IV do CPC2015 deve-se considerar que a base estrutural do ordenamento juriacutedico eacute a Constituiccedilatildeo Federal que em seu art 5ordm XV consagra o direito de ir e vir Ademais o art 8ordm do CPC2015 tambeacutem preceitua que ao aplicar o ordenamento juriacutedico o juiz natildeo atentaraacute apenas para a eficiecircncia do processo mas tambeacutem aos fins sociais e agraves exigecircncias do bem comum devendo ainda resguardar e promover a dignidade da pessoa humana observando a proporcionalidade a razoabilidade e a legalidade Por tais motivos concedo a liminar pleiteada65
Cabe destacar aqui o voto vencido da Desembargadora Maria Luacutecia Pizzotti no
julgamento do Habeas Corpus supracitado demonstrando que o debate sobre a abrangecircncia
do artigo 139 IV do CPC ocorre tanto na doutrina quanto no judiciaacuterio
O objetivo do novel dispositivo natildeo eacute impor penas ou restringir direitos natildeo sendo intenccedilatildeo do Judiciaacuterio suspender indefinidamente o direito de dirigir do executado ou sua liberdade de viajar mas sim impor uma restriccedilatildeo tatildeo gravosa caso ele natildeo cumpra a determinaccedilatildeo que escolha cumprir sua obrigaccedilatildeo e dar fim ao problema Em outras palavras mediante as medidas de coerccedilatildeo o Estado procura persuadir o inadimplente impondo-lhe situaccedilotildees tatildeo onerosas e inconvenientes que em algum momento seja para ele mais vantajoso cumprir do que permanecer no inadimplemento
Ao fazecirc-lo o Novo Coacutedigo de Processo Civil rompe com as criacuteticas da ineficiecircncia das execuccedilotildees Natildeo se cogita deferir medidas restritivas agravequeles que demonstram a incapacidade absoluta de solver o deacutebito apenas agravequeles que reconhecidamente se valem de artimanhas e subterfuacutegios para evitar a satisfaccedilatildeo das diacutevidas ldquopreferindordquo outras despesas mais lsquonobresrsquo agindo em nome de terceiros e fazendo escaacuternio dos credores e do proacuteprio Poder Judiciaacuterio (hellip)
Para tanto memoraacutevel a noccedilatildeo de que a medida em comento tem caraacuteter excepcional e encontra limites no plano da proporcionalidade como sustenta o ilustrado Magistrado paulista Fernando da Fonseca Gajardoni Professor Faculdade de Direito de Ribeiratildeo Preto da USP (in httpswwwjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 acesso em 091216 agraves 11h20min) E para anaacutelise da proporcionalidade a ponderaccedilatildeo deve observar os trecircs passos apontados pela doutrina a necessidade a adequaccedilatildeo e a proporcionalidade em sentido estrito
65 TJSP - Habeas Corpus Processo nordm 2183713-8520168260000 30ordf Cacircmara Direito Privado relator
Des Marcos Ramos j 290317
30
Ademais no entendimento de Jorge Amaury Maia Nunes e Guilherme Pupe de
Noacutebrega66 essa decisatildeo releva os perigos trazidos pelo art 139 IV do CPC ao confrontar
direitos constitucionalmente garantidos
De nossa parte entendemos que a liberdade de locomoccedilatildeo inserta no inciso XV do artigo 5ordm que abrange o direito de deixar o territoacuterio nacional sofre embaraccedilo indevido pela apreensatildeo de passaporte ou pela suspensatildeo da carteira nacional de habilitaccedilatildeo
()
Agrave luz da exposiccedilatildeo feita acima e em anaacutelise primeva sustentamos que o artigo 139 IV do CPC de 2015 estaacute a merecer declaraccedilatildeo de inconstitucionalidade sem reduccedilatildeo de texto para o fim de rechaccedilar a apreensatildeo de passaporte a suspensatildeo do direito de dirigir e a vedaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo em concurso ou em licitaccedilatildeo puacuteblicos como medidas passiacuteveis de serem adotadas pelo juiz sob pena de vulneraccedilatildeo aos artigos 1ordm IV 5ordm XV e LIV 37 I 173 sect 3ordm III e 175 todos da Constituiccedilatildeo
Apesar de ter sofrido duras criacuteticas a decisatildeo do processo de nordm 4001386-
1320138260011 serviu de inspiraccedilatildeo para tantas outras decisotildees no mesmo sentido
Foi o caso da decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de Satildeo
Vicente em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 0020724-2620088260590 na data de 21 de
junho de 2017
A supracitada execuccedilatildeo se arrastava por nove (09) anos sem que o devedor tenha
esboccedilado qualquer intenccedilatildeo de pagar a diacutevida O credor requereu a suspensatildeo da Carteira
Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado apreensatildeo do passaporte e cancelamento dos
cartotildees de creacutedito
O magistrado com embasamento no artigo 139 IV do CPC deferiu parcialmente o
pedido sob o fundamento de que a apreensatildeo de passaporte e CNH natildeo viola o direito de ir e
vir do devedor Entretanto o juiz indeferiu o pedido de cancelamento do cartatildeo de creacutedito por
acreditar que a suspensatildeo poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado tendo em
vista que atualmente as pessoas utilizam o referido cartatildeo para pagamento das despesas
diaacuterias
66 NOBREacuteGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139
IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018
31
Eacute evidente que as medidas atiacutepicas de coerccedilatildeo devem ser utilizadas com cautela sempre respeitando a dignidade da pessoa do executado Natildeo se vislumbra contudo que as medidas aqui eleitas sejam capazes de vulnerar os Direitos Fundamentais do indiviacuteduo A uma porque natildeo se trata de restriccedilatildeo ao direito de ir e vir do executado que continua no gozo de plena liberdade de locomoccedilatildeo a duas porque a conduccedilatildeo de veiacuteculo automotor eacute mera comodidade da vida moderna natildeo se tratando de direito absoluto
Com mais razatildeo ainda se admite a suspensatildeo do Passaporte do executado que se natildeo paga a diacutevida da execuccedilatildeo natildeo deve ter o direito de fazer viagem internacional
Tem-se aqui verdadeiro exerciacutecio de ponderaccedilatildeo de interesses juriacutedicos de um lado jaz o direito de creacutedito do exequente que deriva do direito de propriedade e por isso mesmo tem envergadura constitucional de outro giro tem-se o direito do executado agrave autorizaccedilatildeo do Estado para conduzir veiacuteculo automotor e realizar viagens internacionais que natildeo se mostram essenciais agrave dignidade da pessoa humana Natildeo haacute duacutevidas pois de que eacute este uacuteltimo que deve sucumbir
O pedido fica indeferido apenas no tocante agrave suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado Eacute que ao contraacuterio da CNH e do passaporte que trazem consigo certa presunccedilatildeo de riqueza natildeo se pode concluir que o uso de cartatildeo de creacutedito eacute feito por luxo ou simples conveniecircncia
Como eacute cediccedilo os cartotildees de creacutedito oferecem ao seu titular creacutedito raacutepido e rotativo para o pagamento de despesas diaacuterias e certamente exercem funccedilatildeo essencial agravequeles que se encontram em situaccedilatildeo financeira precaacuteria
A suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado portanto se revela medida desproporcional e que inclusive poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado
Pelo exposto defiro em parte o pedido formulado pelo exequente e DETERMINO a suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo e bem como a suspensatildeo da validade (cancelamento temporaacuterio) no sistema SINPA de eventuais passaportes vaacutelidos em nome do executado
Dessa forma o artigo 139 IV do CPC revolucionou completamente a execuccedilatildeo de
obrigaccedilatildeo de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria ao permitir a utilizaccedilatildeo do uso dos meios executivos
atiacutepicos para compelir o executado a satisfazer o creacutedito do exequente
33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE
EFETIVACcedilAtildeO
Era inevitaacutevel que o artigo 139 IV do CPC gerasse todo tipo de reaccedilatildeo entre os
doutrinadores do processo civil e ateacute mesmo de outros ramos do direito devido a sua
capacidade de realizar uma completa inovaccedilatildeo na forma de se executar as obrigaccedilotildees de pagar
quantia Alguns o aplaudiram visualizando nele ldquouma luz no fim do tuacutenelrdquo outros o
criticaram vislumbrando as arbitrariedades que poderiam ser praticadas com embasamento no
referido dispositivo
32
As decisotildees suscitadas em linhas preteacuteritas auxiliaram para fervilhar ainda mais o
debate sobre o tema tendo em vista que por um lado poderia aumentar a efetividade das
execuccedilotildees por quantia no entanto por outro surgiam questionamentos a cerca da sua
constitucionalidade
A doutrina parece que demoraraacute a se pacificar sobre o tema Segundo alguns
doutrinadores seraacute inconstitucional toda restriccedilatildeo que recaia sobre a pessoa do devedor e natildeo
exclusivamente sobre o seu patrimocircnio Jaacute para outros o dispositivo eacute constitucional e o meio
mais eficaz para se resolver o problema da efetivaccedilatildeo das execuccedilotildees de pagar quantia ldquoA
discussatildeo se daacute especialmente no que diz respeito aacutes medidas de suspensatildeo de CNH
apreensatildeo de passaporte e bloqueio de cartotildees de creacutedito do devedorrdquo 67
O professor Thiago Rodovalho analisou detalhadamente a decisatildeo de nordm 4001386-
1320138260011 em seu artigo ldquoO necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na
concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivosrdquo 68 Quanto agrave suspensatildeo da CNH o autor
acredita que tal medida natildeo viola qualquer direito fundamental do devedor posto que ldquodirigir
veiacuteculos automotores eacute direito do cidadatildeo mas natildeo se confunde com os direitos fundamentais
e social de ir-e-vir e ao transporterdquo 69 O professor eacute categoacuterico ao afirmar que
Com relaccedilatildeo agrave suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (suspensatildeo do direito de dirigir restriccedilatildeo de direitos) natildeo nos parece haver qualquer violaccedilatildeo a direito fundamental ou social nem a direito da personalidade ou colocaccedilatildeo do devedor em situaccedilatildeo desproporcionalmente detrimentosa exceccedilatildeo feita aos que usam o veiacuteculo como instrumento de trabalho atraindo a hipoacutetese do NCPC art 833 inc V
()
Outrossim natildeo o consideramos como direito da personalidade Os direitos da personalidade satildeo os valores fundamentais que compotildeem o proacuteprio ser justamente por isso intransmissiacuteveis e irrenunciaacuteveis natildeo podendo o seu exerciacutecio sofrer limitaccedilatildeo voluntaacuteria (CC art 11) Por mais que vivamos num paiacutes que tanto valoriza o carro e que muitas pessoas de fato se compreendam em razatildeo e em funccedilatildeo do carro que dirijam este natildeo nos parece ser um direito que verdadeiramente componha a personalidade do indiviacuteduo70
67 DONTOS Sofia Poderes executoacuterios do juiz que diz a doutrina sobre o art 139 inc IV do CPC
Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigospoderes-executorios-do-juiz-que-diz-a-doutrina-sobre-art-139-inc-iv-do-cpc-23052018 gt Publicado em 23052018 Acesso em 01082018
68 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018
69 Ibid sem paginaccedilatildeo 70 Ibid sem paginaccedilatildeo
33
Quanto ao cancelamento dos cartotildees de credito do devedor o professor Thiago
Rodovalho tambeacutem acredita que natildeo haacute qualquer violaccedilatildeo ao direito fundamental social ou
da personalidade do devedor e acrescenta que
Tanto assim o eacute que ser titular de um cartatildeo de creacutedito pressupotildee ter creacutedito o que eacute analisado e concedido por instituiccedilotildees financeiras mais do que isso se porventura passando por dificuldades financeiras a pessoa deixa de honrar com pagamentos a mesma instituiccedilatildeo financeira concedente do cartatildeo de creacutedito pode sponte propria cancelaacute-lo ou recusar-lhe a concessatildeo Ora parece-me contraditoacuterio que instituiccedilotildees financeiras para sua proteccedilatildeo patrimonial possam ferir esse suposto ldquodireito fundamentalrdquo ou esse suposto ldquodireito da personalidaderdquo mas natildeo possa o Poder Judiciaacuterio igualmente fazecirc-lo contra aquele devedor moroso que instado ao pagamento e frustradas todas as tentativas de constriccedilatildeo patrimonial leva vida luxuosa valendo-se de cartotildees de creacutedito que prescindem de dinheiro em conta eacute dizer podem justamente funcionar como forma de ocultar renda e patrimocircnio71
O autor considera a apreensatildeo de passaporte um tema mais polecircmico e que merece
maior reflexatildeo No entanto crecirc que eacute possiacutevel a apreensatildeo de passaporte sem violar os
direitos fundamentais do devedor por se tratar de um direito de ir e vir de amplitude especial
Agrave primeira vista a possibilidade de apreensatildeo do passaporte tambeacutem nos parece possiacutevel pois tambeacutem se trata de um direito de ir e vir de amplitude especial Assim o eacute pois salvo situaccedilotildees especiais (refugiados p ex) haacute a necessidade de demonstrar condiccedilotildees financeiras de estadia e retorno para ser admitido no paiacutes de destino Ou seja pressupotildee uma condiccedilatildeo financeira que o devedor justamente diz natildeo possuir Sem embargo dessa consideraccedilatildeo esse ainda eacute um ponto que merece uma reflexatildeo mais acurada sendo essa apenas uma primeira impressatildeo72
Outros autores escreveram sobre o tema como eacute o caso do processualista Luiz
Dellore73 que tambeacutem defende que as medidas atiacutepicas como restriccedilatildeo ao direito de dirigir
apreensatildeo de passaporte e cancelamento de cartotildees de creacutedito satildeo permitidas e natildeo violam em
regra os direitos fundamentais do devedor
De minha parte creio que efetivamente haacute inovaccedilatildeo no at 139 IV do NCPC (e natildeo mera repeticcedilatildeo do que jaacute havia no Coacutedigo anterior) que tem o condatildeo de trazer mais efetividade ao processo executivo no Brasil ndash que por deacutecadas centrou sua atenccedilatildeo na defesa do executado (vide a grande quantidade de impenhorabilidades) sem dar maior atenccedilatildeo ao creacutedito do exequente
71 Ibid sem paginaccedilatildeo 72 Ibid sem paginaccedilatildeo 73 DELLORE Luiz NCPC Atipicidade das medidas executivas jaacute eacute realidade Disponiacutevel em lt
httpswwwjotainfoopiniao-e-analisecolunasnovo-cpcncpc-atipicidade-de-medidas-executivas-ja-e-realidade-17042017 gt Publicado em 17042017 Acesso em 03092018
34
Logo a meu ver medidas como (i) restriccedilatildeo ao direito de dirigir (ii) apreensatildeo de passaporte (iii) cancelamento de cartotildees de creacutedito e (iv) vedaccedilatildeo de obtenccedilatildeo de novos empreacutestimos se natildeo vinculados ao pagamento do deacutebito exequendo dentre outras restriccedilotildees que deveratildeo ser observadas a cada caso satildeo permitidas pelo sistema do NCPC e em regra natildeo violam direitos fundamentais do devedor E tecircm o condatildeo de fazer com que o executado que tem recursos diante dessas medidas coercitivas pague o deacutebito trazendo sucesso agrave satisfaccedilatildeo do creacutedito
Nessa linha para Alexandre Fuchs das Neves74 o artigo 139 IV do CPC conferiu ao
juiz poderes coercitivos capazes de ldquotransformar a vida do devedor um infernordquo para compeli-
lo a cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria Entretanto pondera que para que a medida tenha
validade ldquoeacute necessaacuteria uma fundamentaccedilatildeo por evidente uma correlaccedilatildeo temaacutetica entre a
medida adotada e sua efetividade em face ao processo com fundamentaccedilatildeo detalhadardquo
No entendimento de Fernando Gajardoni75 satildeo possiacuteveis as medidas de apreensatildeo de
passaporte bloqueio de cartotildees de creacutedito e suspensatildeo da CNH Para ele o que limita o art
139 IV do CPC eacute o esgotamento dos meios tiacutepicos e a real necessidade da medida
Ilustrativamente natildeo efetuado o pagamento de diacutevida oriunda de multas de tracircnsito e superados os expedientes tradicionais de adimplemento (penhora de dinheiro e bens) seria liacutecito o estabelecimento da medida coercitivaindutiva de suspensatildeo do direito a conduzir veiacuteculo automotor ateacute pagamento do deacutebito (inclusive com apreensatildeo da CNH do devedor) natildeo efetuado pagamento de verbas salariais devidas a funcionaacuterios da empresa possiacutevel o estabelecimento de vedaccedilatildeo agrave contrataccedilatildeo de novos funcionaacuterios ateacute que seja saldada a diacutevida natildeo efetuado o pagamento de financiamento bancaacuterio na forma e no prazo avenccedilados possiacutevel ateacute que se tenha a quitaccedilatildeo que se obstem novos financiamentos ou mesmo a participaccedilatildeo do devedor em licitaccedilotildees (como de ordinaacuterio jaacute acontece com pessoas juriacutedicas em deacutebito tributaacuterio com o Poder Puacuteblico) etc
Teriacuteamos entatildeo no Brasil por assim dizer a adoccedilatildeo do padratildeo da atipicidade das medidas executivas tambeacutem para as obrigaccedilotildees de pagar vistas estas como ordens do EstadoJuiz para que haja prestaccedilatildeo de pagamento em pecuacutenia
()
Por isso ndash a prevalecer a interpretaccedilatildeo potencializada do art 139 IV do CPC2015 ndash o emprego de tais medidas coercitivasindutivas especialmente nas obrigaccedilotildees de pagar encontraraacute limite certo na excepcionalidade da medida (esgotamento dos meios tradicionais de satisfaccedilatildeo do deacutebito) na proporcionalidade (inclusive agrave luz da regra da menor onerosidade ao devedor do art 805 do CPC2015) na necessidade de fundamentaccedilatildeo substancial e especialmente nos direitos e garantias assegurados na Constituiccedilatildeo Federal (vg natildeo parece possiacutevel que se determine o pagamento sob pena de prisatildeo ou de vedaccedilatildeo ao exerciacutecio da profissatildeo do direito de ir e vir etc)
74 NEVES Alexandre Fuchs das Cancelamento de cartotildees de creacutedito e apreensatildeo de CNH e passaporte
do devedor Isso eacute possiacutevel Disponiacutevel em lt httpwwwsinfacspcombrconteudocancelamento-de-cartoes-de-credito-e-apreensao-de-cnh-e-passaporte-do-devedor-isso-e-possivel gt Acesso em 30082018
75 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Publicado em 24082015 Acesso em 30082018
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Jaacute Fernanda Tartuce76 acredita que tais medidas satildeo problemaacuteticas e devem ser
analisadas com cautela tendo em vista que ao inveacutes de afetarem o patrimocircnio do devedor
atingem a proacutepria pessoa
Sob certo prisma adotar medidas diferenciadas contribui para a efetividade da prestaccedilatildeo jurisdicional Por outro lado o patrimocircnio ndash e natildeo a pessoa do devedor - responde por diacutevidas aleacutem disso o exerciacutecio de amplos poderes pelo juiz sem balizas especiacuteficas pode ensejar medidas inadequadas Nessa linha suspender o direito de dirigir e restringir o uso de passaporte satildeo iniciativas problemaacuteticas por atingirem a pessoa do devedor enquanto a penhora da restituiccedilatildeo de Imposto de Renda soa viaacutevel por afetar seu patrimocircnio Eacute importante que a medida diferenciada se revele proporcional e seja aplicada apoacutes o exaurimento de outros meios previstos no ordenamento Como a proposta do Novo Coacutedigo eacute aumentar a eficiecircncia processual intentar medidas ineficazes inexequiacuteveis eou de difiacutecil fiscalizaccedilatildeo pode acabar ensejando o efeito contraacuterio
Nessa senda Lenio Streck e Dierle Nunes77 entendem que as medidas atiacutepicas de
suspensatildeo da CNH eou apreensatildeo de passaporte satildeo inconstitucionais Afirmam que natildeo se
pode confundir o processo civil e penal ainda que ambos remetam a um ldquoparadigma
constitucional comumrdquo e que o artigo 139 IV do CPC ldquoimpotildee novos desafios interpretativos
que podem conduzir a uma anaacutelise superficial e utilitarista de busca de resultados que
desprezem a necessaacuteria leitura constitucionalrdquo Os autores ainda ponderam que ldquoO perigo eacute o
artigo 139 IV ser transformado em instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com
autorizaccedilatildeo judicialrdquo
O professor Araken de Assis no dia 18 de abril de 2018 em um evento sobre o
Coacutedigo Processual Civil de 2015 que ocorreu em Brasiacutelia na sede do Conselho Federal da
OAB declarou ser contraacuterio aos poderes executoacuterios atiacutepicos ldquoSou contra os poderes
atiacutepicos dos juiacutezes porque seu exerciacutecio redunda em simples arbitrariedadesrdquo78
Acrescentou ainda que
76 IBDFAM ndash Instituto Brasileiro de Famiacutelia O polecircmico inciso IV do artigo 139 do CPC e suas difusas
interpretaccedilotildees Disponiacutevel em lt httpwwwibdfamorgbrnoticias6096O+polC3AAmico+inciso+IV+do+artigo+139+do+CPC+e+suas+difusas+interpretaC3A7C3B5es gt Publicado em 31082016 Acesso em 04092018
77 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018
78 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04092018
36
Eacute evidentemente inconstitucional diante do princiacutepio da dignidade da pessoa humana tirar o passaporte carteira de habilitaccedilatildeo Quecirc que tem isso com diacutevidas Natildeo tem absolutamente nada Natildeo eacute a correlaccedilatildeo instrumental entre o objetivo da execuccedilatildeo e o meio empregado Isso eacute simples vinganccedila simples puniccedilatildeo79
O professor Araken de Assis acredita que tais medidas satildeo inconstitucionais e
violam o principio da dignidade humana do executado numa sociedade como a nossa
sedenta por puniccedilatildeo natildeo me surpreende que essas ideias sejam encaradas com
naturalidade Mas eacute preciso rejeitaacute-las em nome de princiacutepios 80
34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
A Constituiccedilatildeo Federal de 1988 tem como um dos seus fundamentos a dignidade da
pessoa humana presente no artigo 1ordm inciso III do referido texto constitucional O dito
princiacutepio tem o escopo de nortear o ordenamento juriacutedico como um todo
A inclusatildeo da dignidade da pessoa humana como princiacutepio constitucional obrigou
uma reflexatildeo sobre o papel da pessoa humana no direito e um redimensionamento para
elevaacute-la ao centro do ordenamento juriacutedico81 Eacute necessaacuterio recorrer agrave teoria Kantiana para
que se obtenha uma definiccedilatildeo do princiacutepio ora estudado Para Kant82 o homem eacute um fim
em si mesmo natildeo uma funccedilatildeo do Estado Ou Naccedilatildeo O Estado e o direito devem estar
organizados em benefiacutecio do indiviacuteduo
Agora eu afirmo o homem ndash e de uma maneira geral todo o ser racional ndash existe como fim em si mesmo e natildeo apenas como meio para o uso arbitraacuterio desta ou daquela vontade Em todas as suas accedilotildees pelo contraacuterio tanto nas direcionadas a ele mesmo como nas que o satildeo a outros seres racionais deve ser ele sempre considerado simultaneamente como fim
Partindo da premissa de que para Immanuel Kant o homem eacute o fim em si mesmo
ldquodevemos compreender que a dignidade da pessoa humana eacute a noccedilatildeo o comando a direccedilatildeo
que se deve seguir funcionando como fundamento para a interpretaccedilatildeo de todos os direitos e
garantias conferidos agrave pessoa nos ordenamentos juriacutedicos de cada Estadordquo 83
79 Ibid sem paginaccedilatildeo 80 Ibid sem paginaccedilatildeo 81 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito
fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 461 82 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud KANT Immanuel Fundamentaccedilatildeo da metafiacutesica dos costumes
Satildeo Paulo Martin Claret 2003 p56-59 Coleccedilatildeo A Obra-Prima de Cada Autor 83 SCHIAFIANO Juliana Rocha op cit p 461
37
O princiacutepio constitucional da dignidade da pessoa humana estaacute diretamente ligado ao
conteuacutedo dos direitos fundamentais logo para que se cumpra com os direitos fundamentais
constitucionalmente instituiacutedos eacute necessaacuterio reconhecer e respeitar a dignidade da pessoa
humana conforme disciplina Ingo Sarlet84
Em suma o que se pretende sustentar de modo mais enfaacutetico eacute que a dignidade da pessoa humana na condiccedilatildeo de valor (principio normativo) fundamental que atrai o conteuacutedo de todos os direitos fundamentais exige e pressupotildee o reconhecimento e proteccedilatildeo dos direitos fundamentais de todas as dimensotildees (ou geraccedilotildees se assim preferirmos) Assim sem que se reconheccedilam agrave pessoa humana os direitos fundamentais que lhe satildeo inerentes em verdade estarse-aacute lhe negando a proacutepria dignidade A consagraccedilatildeo constitucional da dignidade da pessoa humana tem o propoacutesito de limitar a atuaccedilatildeo ou a omissatildeo do Estado para garantir os direitos do indiviacuteduo Assim eacute difiacutecil precisar os efeitos da norma que determina a dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado (como acontece com a Constituiccedilatildeo brasileira de 1988) poreacutem quando desrespeitados os direitos fundamentais do cidadatildeo eacute possiacutevel identificar que a dignidade deste foi violada
Logo ldquoteraacute respeitada a sua dignidade o individuo que tiver respeitados os seus
direitos fundamentaisrdquo 85 Os direitos fundamentais estatildeo apresentados na Constituiccedilatildeo
Federal da seguinte forma direitos individuais e coletivos direitos sociais direitos poliacuteticos e
direitos de nacionalidade que tecircm como escopo garantir as liberdades positivas aos
indiviacuteduos ldquoonde foram conquistados direitos agrave liberdade religiosa liberdade civil e
profissional agrave propriedade ao livre acesso ao Judiciaacuterio agrave ampla defesa e ao contraditoacuterio no
processual judicial ao sigilo de dados e informaccedilotildees pessoais entre outros que somados
garantem o cidadatildeo uma vida dignardquo 86
O cidadatildeo na Constituiccedilatildeo Federal de 88 diferente das constituiccedilotildees brasileiras
anteriores passou a ser fundamento e ganhou destaque nos direitos fundamentais tendo
garantida a sua vida a sua dignidade a sua seguranccedila a sua honra a sua liberdade e a sua
propriedade
84 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud SARLET Ingo Wolfgang Dignidade da pessoa humana e
direitos fundamentais na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 2ed Porto Alegre Livraria do Advogado 2002 p87 85 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito
fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 462 86 Ibid p 462
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Segundo Carmem Luacutecia Antunes Rocha87 para garantir o Estado Democraacutetico de
Direito eacute necessaacuterio que a sua atuaccedilatildeo seja sempre em conformidade com o princiacutepio da
dignidade da pessoa humana
O Estado somente eacute democraacutetico em sua concepccedilatildeo constitucionalizaccedilatildeo e atuaccedilatildeo quando respeita o princiacutepio da dignidade da pessoa humana Natildeo haacute verbo constitucional natildeo haacute verbo governamental que se faccedilam legiacutetimos quando natildeo se voltam ao atendimento daquele princiacutepio Natildeo haacute verdade constitucional natildeo haacute suporte institucional para as poliacuteticas puacuteblicas que natildeo sejam destinadas ao pleno cumprimento daquele valor maior transformado em princiacutepio constitucional
O princiacutepio da dignidade humana constitucionalmente garantido impotildee limites ao
Estado compelindo aos oacutergatildeos e atividades estatais respeitar o ser humano e garanti-lo
condiccedilotildees miacutenimas para uma vida digna Dessa forma eacute niacutetido que o dito princiacutepio eacute
pressuposto e indispensaacutevel para legitimar outras normas constitucionais e
principalmente infraconstitucionais
O Coacutedigo de Processo Civil eacute umas das principais normas infraconstitucionais que
sofre influecircncia dos preceitos valores e princiacutepios esculpidos na Constituiccedilatildeo Federal
Logo como o principio da dignidade humana eacute um dos mais importantes pressupostos
constitucionais ldquoentatildeo eacute tranquilo afirmar-se que o novel ordenamento processual tem
de se render nas resoluccedilotildees dos aspectos processuais e a fim de se atingir uma soluccedilatildeo
justa adequada e efetiva ao postulado da dignidade da pessoa humanardquo 88
Dessa forma o legislador deve formular as normas infraconstitucionais de acordo e a
partir do conteuacutedo constitucional para Marinoni Mitidiero e Arenhart89
() o Coacutedigo de Processo Civil constitui direito constitucional aplicado O Coacutedigo deve ser interpretado de acordo com a Constituiccedilatildeo e com os direitos fundamentais o que significa que as duacutevidas interpretativas devem ser resolvidas a favor da otimizaccedilatildeo do alcance da Constituiccedilatildeo e do processo civil como meio para tutela de direitos
87 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud ROCHA Carmen Luacutecia Antunes O princiacutepio da dignidade da
pessoa humana e a exclusatildeo social Revista Interesse Puacuteblico n4 p23-48 1999 p33 88 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o
novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 367
89 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 14
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Com o escopo de conferir eficaacutecia aos mandamentos constitucionais o CPC15 traz a
previsatildeo e diversas claacuteusulas gerais em seus primeiros artigos em um dos quais se
prestigia o princiacutepio da dignidade da pessoa humana
O referido princiacutepio estaacute disciplinado no artigo 8ordm do CPC15 e atua como um guia
sobre as demais normas do coacutedigo processual Eacute o que entende Nelson Rosenvald90
O maior cuidado do inteacuterprete eacute no sentido de jamais banalizar a dignidade fazendo dela um elixir processual tal como muitas vezes se vecirc na esfera do direito civil Penso que natildeo haacute maiores dificuldades em transpor a noccedilatildeo constitucional do princiacutepio para em seguida adaptaacute-la agraves singularidades do processo
Logo de acordo com o artigo 8ordm do CPC o oacutergatildeo julgador ao aplicar o ordenamento
juriacutedico deve resguardar a dignidade da pessoa humana Para Fredie Didier91 ldquoresguardar
nesse contexto eacute de um lado aplicar corretamente a norma juriacutedica lsquoproteccedilatildeo da dignidade
da pessoa humanarsquo e de outro natildeo violar a dignidaderdquo
O oacutergatildeo julgador deveraacute manter um comportamento ativo com o objetivo de promover
a dignidade da pessoa humana podendo tomar medidas de ofiacutecio para efetivar a dignidade da
pessoa humana Didier assevera que o magistrado poderaacute ainda ldquovaler-se da claacuteusula geral de
atipicidade (art 536 sect 1ordm) para a execuccedilatildeo do direito fundamental agrave dignidaderdquo 92 O autor
ainda traz dois exemplos
a) exigecircncia de respeito agrave ordem cronoloacutegica de conclusatildeo (art 12) caso de grave violaccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana que natildeo se encaixe em um dos incisos que excepcionam a regra de observacircncia da cronologia da conclusatildeo poderia o juiz ldquofurar a filardquo para promover a dignidade da pessoa humana b) prioridade na tramitaccedilatildeo processual pessoa que seja portadora de doenccedila grave mas que natildeo esteja no rol do art 1048 I para promover a dignidade de pessoa humana o juiz poderia determinar o processamento prioritaacuterio93
Essa dupla garantia ndash resguardo e promoccedilatildeo ndash tem como objetivo garantir ao individuo
sua dignidade humana fazendo com que ldquode um lado que o Estado natildeo a viole e de outro
que o Estado a promova e efetiverdquo
90 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud ROSENVALD Nelson A
dignidade da pessoa humana no CPC15 91 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte
geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 75 92 Ibid p 75 93 Ibid p 75
40
Nessa senda o magistrado deveraacute promover a dignidade da pessoa humana quando
perceber a ausecircncia desta no processo ou assegura-la quando for posta em risco Eacute nesse
sentido o entendimento dos professores Marinoni Mitidiero e Arenhart94
() a dignidade da pessoa humana determina a compreensatildeo do processo civil como um meio para tutela dos direitos Vale dizer o processo civil natildeo pode ser visto como um instrumento a serviccedilo do Estado como um instrumento que natildeo se encontre orientado agrave realizaccedilatildeo dos fins da pessoa humana Em outras palavras o processo civil serve para realizaccedilatildeo dos direitos e para orientaccedilatildeo das pessoas a respeito do significado do direito
Nessa senda compete tanto ao juiz quanto as demais partes processuais garantirem ldquoo
valor intriacutenseco de cada vida que eacute trazida ao processordquo nas palavras de Alexandre Freitas
Cacircmara95
() aos sujeitos do processo eacute preciso sempre ter claro que os titulares dos interesses em conflitos satildeo pessoas reais cujas vidas seratildeo afetadas pelo resultado do processo e que por isso mesmo tecircm o direito de estabelecer suas estrateacutegias processuais de acordo com aquilo que lhes pareccedila melhor para suas vidas Eacute inadmissiacutevel tratar as partes como se natildeo fossem pessoas reais meros dados estatiacutesticos Afinal se para o Judiciaacuterio cada processo pode parecer apenas mais um processo para as partes cada processo pode ser o uacutenico o mais relevante aquele em que sua vida seraacute decidida E eacute dever do juiz assegurar que isto seja respeitado
Dessa forma eacute necessaacuterio que um arcabouccedilo normativo para que seja conferida
eficaacutecia e proteccedilatildeo ao principio da dignidade da pessoa humana
Logo o dito princiacutepio deve ser protegido em todas as esferas do ordenamento juriacutedico
inclusive no campo da execuccedilatildeo civil onde sofre grandes riscos de ser violado em nome do
direito fundamental agrave tutela executiva do credor ldquoPartir da premissa de que existe um direito
fundamental agrave tutela executiva ora ratificado pelo CPC eacute indispensaacutevel para a soluccedilatildeo de
diversos problemas oriundos do procedimento executivo principalmente aqueles relacionados
agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo 96
94 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme
MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 25
95 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CAcircMARA Alexandre Freitas O Novo Processo Civil Brasileiro 2 ed Satildeo Paulo Atlas 2016 p 7
96 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66
41
Eacute o caso por exemplo da impenhorabilidade Segundo Fredie Didier et al97 a
impenhorabilidade eacute uma forma de proteger certos bens do devedor do direito fundamental a
execuccedilatildeo do credor
Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa
Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais
O legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do CPC fazendo um
preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses em anaacutelise ao optar pela mitigaccedilatildeo do direito
do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado Afinal ldquoa execuccedilatildeo natildeo pode ser utilizada
como instrumento para causar a ruiacutena a fome e o desabrigo do devedor e sua famiacutelia gerando
situaccedilotildees incompatiacuteveis com a dignidade da pessoa humana 98
Logo a impenhorabilidade de certos bens
[] Eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa99
Eacute nesse sentido que o CPC15 enumera diversos casos de bens patrimoniais que satildeo
impenhoraacuteveis como o salaacuterio e vencimentos utensiacutelios necessaacuterios ao exerciacutecio da
profissatildeo seguro de vida vestuaacuterios e pertences de uso pessoal entre outros
Dessa forma as regras relativas agraves medidas executivas devem ser interpretadas agrave luz
da Constituiccedilatildeo Federal ldquovez que se voltam agrave realizaccedilatildeo de direitos fundamentais e em sua
97 Ibid p 66 98 THEODORO JUacuteNIOR Humberto Novo Coacutedigo de Processo Civil Anotado 20 ed Rio de Janeiro
Forense 2016 p 978 99 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud DIDIER JR Fredie CUNHA
Leonardo Carneiro da BRAGA Paula Sarno OLIVEIRA Rafael Alexandria de Curso de direito processual civil 3 ed Salvador JusPodivm 2011 v 5 p 547
42
realizaccedilatildeo podem atingir direitos fundamentaisrdquo 100 O Superior Tribunal de Justiccedila jaacute decidiu
que
O rol das impenhorabilidades do ordenamento paacutetrio objetiva preservar o miacutenimo patrimonial necessaacuterio agrave existecircncia digna do executado impondo ao processo executoacuterio certos limites Assim a depender das peculiaridades do caso as regras de impenhorabilidade podem ser ampliadas de modo a adequar a tutela aos direitos fundamentais como por exemplo o direito agrave moradia agrave sauacutede ou agrave dignidade da pessoa humana Trata-se portanto da aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo e da necessidade sob o enfoque da proporcionalidade101 (STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014)
Logo a interpretaccedilatildeo dos dispositivos que tratam sobre a penhora no CPC deve estaacute
diretamente ligada aos ditames constitucionais devendo o interprete privilegiar a opccedilatildeo que
esteja mais em sintonia com a Carta Magna para que nem o credor e nem o devedor sejam
lesados
O artigo 833 do CPC elenca uma seacuterie de incisos que expotildeem os bens impenhoraacuteveis
O trecho inicial inciso I do art 833 define como impenhoraacuteveis os bens inalienaacuteveis Este
inciso segue a regra de que ldquose o bem natildeo pode ser alienado tambeacutem natildeo pode ser penhorado
porque a penhora eacute o primeiro ato do procedimento de alienaccedilatildeo judicial do bemrdquo 102
Satildeo exemplos de bens inalienaacuteveis os puacuteblicos cuja alienaccedilatildeo depende de autorizaccedilatildeo
legislativa Eacute inalienaacutevel tambeacutem o capital constituiacutedo para garantir indenizaccedilatildeo de ato iliacutecito
(art 533 sect 1 ordm CPC) que portanto eacute tambeacutem impenhoraacutevel ldquoTodo bem inalienaacutevel eacute
impenhoraacutevel embora nem todo bem impenhoraacutevel seja inalienaacutevelrdquo 103
O inciso I do art 833 CPC tambeacutem consagra a impenhorabilidade dos bens que por
ato voluntaacuterio satildeo excluiacutedos da execuccedilatildeo
Segundo Fredie Didier et al104
Eacute o que ocorre nos casos de bens doados ou alienados com claacuteusula de inalienabilidade que haacute de constar no registro imobiliaacuterio para ser eficaz perante o exequente e minimizar o risco de fraude A propoacutesito eis a redaccedilatildeo do art 1911 do Coacutedigo Civil lsquolsquoA claacuteusula de inalienabilidade imposta aos bens por ato de liberalidade implica impenhorabilidade e incomunicabilidaderdquo
100 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MEDINA Joseacute Miguel Garcia
Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 1 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 p 736 101 STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014 102 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 824 103 Ibid p 824 104 Ibid p 825
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O inciso II por sua vez estabelece que satildeo impenhoraacuteveis os bens moacuteveis os
pertences e as utilidades domeacutesticas da residecircncia do executado Todavia excepcionam-se os
bens dessa natureza que sejam de elevado valor ou que ultrapassem as necessidades comuns
correspondentes a um meacutedio padratildeo de vida
A jurisprudecircncia natildeo eacute paciacutefica sobre o assunto logo natildeo exista uma relaccedilatildeo de bens
que podem ser atingidos pela penhora Abrindo margem para as mais variadas decisotildees
O STJ jaacute considerou impenhoraacuteveis aparelho de televisatildeo a cores mesa de centro passadeira raacutedio toca-fitas gravador microondas ar-condicionado um freezer um microcomputador com acessoacuterios uma impressora etc Poderatildeo ser penhorados porque ultrapassam o padratildeo-meacutedio aparelhos de TV mais sofisticados o segundo aparelho de televisatildeo a segunda geladeira aparelhos de ar-condicionado que satildeo verdadeiras peccedilas de design moacuteveis antigos que se transformam em peccedilas de decoraccedilatildeo faqueiro de prata adega climatizada etc Em entendimento de caraacuteter ainda mais geneacuterico jaacute restou consignado em determinado precedente que a proteccedilatildeo natildeo abrangeria apenas os bens indispensaacuteveis agrave moradia mas tambeacutem aqueles usualmente encontrados em um lar105
Ademais o inciso III do art 833 do CPC traz a impenhorabilidade dos vestuaacuterios bem
como os pertences de uso pessoal do executado salvo se de elevado valor
Segundo Fredie Didier et al106 o dispositivo possui dois propoacutesitos
de um lado preservar a dignidade do executado com a proteccedilatildeo de bens moacuteveis importantes para a sua sobrevivecircncia digna como o vestuaacuterio aparelho celular reloacutegio e os bens relacionados agrave sua higiene pessoal de outro lado a regra visa prestigiar a boa-feacute processual impedindo a execuccedilatildeo mesquinha e abusiva com a penhora de bens de pequeno ou nenhum valor como um pente ou uma bota
O inciso IV do art 833 do CPC consagra uma das mais importantes modalidades a
impenhorabilidade relativa aos rendimentos de natureza alimentar ldquoTrata-se de regra que
possui o claro propoacutesito de proteger o executado garantindo-lhe o recebimento de valores que
servem ao pagamento das despesas relacionadas agrave sua sobrevivecircncia digna e agrave da sua famiacuteliardquo 107
Jaacute inciso V do art 833 do CPC torna impenhoraacuteveis os livros as maacutequinas as
ferramentas os utensiacutelios os instrumentos ou outros bens moacuteveis necessaacuterios ou uacuteteis ao
exerciacutecio de qualquer profissatildeo 105 Ibid p 826 106 Ibid p 827 107 Ibid p 828
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Por forccedila do paraacutegrafo 3ordm do art 833 satildeo igualmente impenhoraacuteveis os equipamentos
implementos e maacutequinas agriacutecolas pertencentes agrave pessoa fiacutesica ou a empresa individual
produtora rural Rodrigo Mazzei e Sarah Merccedilon108 esclarecem que
Tem assento na noccedilatildeo de que a dignidade estende-se tambeacutem ao exerciacutecio da profissatildeo em si mesma e tambeacutem por representar a forma por excelecircncia de que dispotildee o executado para continuar a receber sua remuneraccedilatildeo e por conseguinte prover seu sustento e de sua famiacutelia Trata-se tambeacutem de aplicaccedilatildeo pontual da funccedilatildeo social da propriedade jaacute que protege os bens que permitem a circulaccedilatildeo de riquezas para a subsistecircncia do executado e se for o caso de sua famiacutelia
Forccediloso ressaltar ainda que a impenhorabilidade do inc V alcanccedila apenas os bens
moacuteveis de modo que eacute absolutamente possiacutevel que o imoacutevel em que o executado exerccedila sua
atividade profissional seja penhorado conforme a Suacutemula 451 do STJ ldquoEacute legiacutetima a penhora
da sede do estabelecimento comercialrdquo
O inciso VI do art 833 do CPC versa sobre a impenhorabilidade do seguro de vida
ldquoTrata-se de impenhorabilidade em favor do beneficiaacuterio do seguro e natildeo do segurado ateacute
porque o valor do seguro natildeo compotildee nem comporaacute o seu patrimocircnio (art794 do Coacutedigo
Civil1 ordm7)rdquo Dessa forma ldquoem uma execuccedilatildeo contra o segurado natildeo seraacute possiacutevel a penhora
do seguro de vida pois se trata de bem que natildeo lhe pertence nem mesmo em expectativardquo
De acordo com o inciso VII do art 833 do CPC satildeo impenhoraacuteveis os materiais
necessaacuterios para obras em andamento salvo se essas forem penhoradas Logo a obra pode
ser penhorada (art 862 do CPC) ldquoA regra como bem lembrou Araken de Assis lsquoestimula a
penhora da proacutepria obra inconclusa agrave qual os materiais acrescem e conseguintemente
valorizamrsquo 109
O art 833 VIII CPC julga impenhoraacutevel a pequena propriedade rural assim
definida em lei desde que trabalhada pela famiacutelia reproduzindo parte do art 5ordm XXVI CF
88116 que disciplina a impenhorabilidade do referido bem
A proteccedilatildeo do CPC eacute mais ampla do que a garantia prevista na Constituiccedilatildeo Federal
tendo em vista que a impenhorabilidade natildeo se restringe agraves execuccedilotildees de deacutebitos decorrentes
de sua atividade produtiva podendo ser alegada em toda e qualquer execuccedilatildeo ldquoAssim o 108 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CABRAL Antonio Passo
CRAMER Ronaldo (orgs) Comentaacuterios ao Novo Coacutedigo de Processo Civil Rio de Janeiro Forense 2015 p 1194
109 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 835
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imoacutevel natildeo pode ser penhorado na execuccedilatildeo de creacutedito rural concedido para estimular a
produccedilatildeo agriacutecola mas poderaacute ser penhorado na execuccedilatildeo do creacutedito concedido para a
aquisiccedilatildeo do imoacutevelrdquo 110
A nona modalidade de impenhorabilidade trata-se dos recursos puacuteblicos recebidos por
instituiccedilotildees privadas para aplicaccedilatildeo compulsoacuteria em educaccedilatildeo sauacutede ou assistecircncia social ldquoA
proteccedilatildeo eacute louvaacutevel e tutela toda a coletividade ao privilegiar o direito agrave educaccedilatildeo sauacutede e
assistecircncia social em detrimento do direito do credorrdquo
De acordo com o inciso X do art 833 do CPC eacute impenhoraacutevel ateacute o limite de
quarenta salaacuterios miacutenimos a quantia depositada em caderneta de poupanccedila
Eacute uma modalidade de impenhorabilidade relativa (o CPC73 a considerava absoluta)
tendo em vista que essa impenhorabilidade natildeo pode ser oposta na execuccedilatildeo de alimentos
independentemente da sua origem (art 833 sect 2ordm do CPC) Fredie Didier et al cita Araken de
Assis111 ao afirmar que
a regra soacute protege essa aplicaccedilatildeo financeira Se o valor estiver depositado em fundo de investimento por exemplo poderaacute ser penhorado Se o devedor tiver vaacuterias cadernetas de poupanccedila a impenhorabilidade aplica-se agrave soma de todas elas e natildeo a cada uma delas isoladamente do contraacuterio valores expressivos poderiam ser pulverizados em vaacuterias contas burlando a finalidade da regra que eacute a de proteger a populaccedilatildeo de baixa renda
Ademais satildeo tambeacutem impenhoraacuteveis por forccedila do inciso XI os recursos puacuteblicos do
fundo partidaacuterio recebidos por partido poliacutetico nos termos da lei Essa modalidade de
impenhorabilidade ldquose restringe aos recursos puacuteblicos do fundo partidaacuterio Recursos de
origem privada recebidos pelo partido poliacutetico poderatildeo ser penhoradosrdquo 112 O processualista
Fredie Didier et al113 assevera que
Assim a impenhorabilidade foi estabelecida no intuito de impedir que os diretoacuterios nacionais de partidos poliacuteticos respondam por diacutevida dos diretoacuterios
110 Ibid p 836 111 DIDIER JR Fredie et al apud ASSIS Araken de Manual da execuccedilatildeo 11ordm ed cit p 225 Assim
tambeacutem REDONDO Bruno Garcia LOJO Maacuterio Vitor Suarez Penhora cit p 117 BUENO Cassio Scarpinella Curso sistematizado de Direito Processual Civil v 3 cit p 228 GIANNICO Mauriacutecio As novas reformas do CPC e de outras normas processuais Mauriacutecio Giannico e Viacutetor Joseacute de Mello Monteiro (coord) Satildeo Paulo Saraiva 2009 p 1 OS Em sentido diverso estendendo a impenhorabiacutelidade aos depoacutesitos feitos ateacute esse valor em CDB CDI fundos de renda fixa ou de accedilotildees RODRIGUES Marcelo Abelha Manual de execuccedilatildeo civil 3deg ed cit p 101
112 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 839
113 Ibid p 839
46
estaduaismunicipais - sobretudo em razatildeo das vaacuterias decisotildees judiciais que determinaram penhora de recursos do fundo partidaacuterio de alguns partidos
Por fim o inciso XII do artigo 833 do CPC trata sobre a impenhorabilidade dos
creacuteditos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias sob o regime de incorporaccedilatildeo imobiliaacuteria
vinculados agrave execuccedilatildeo de obra ldquoO objetivo dessa modalidade eacute evitar que diacutevidas do
incorporador possam consumir os recursos que seriam utilizados na realizaccedilatildeo da obra em
prejuiacutezo dos adquirentes de unidades autocircnomasrdquo 114
O professor Misael Montenegro Filho115 aduz sobre que ldquoao estabelecer a
impenhorabilidade dos creacuteditos oriundos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias o novo CPC
protegeu os valores destinados agrave execuccedilatildeo da obra e agrave entrega das unidades imobiliaacuterias aos
adquirentes assegurando assim a execuccedilatildeo da promessa contratualrdquo
Importante frisar ainda que a Lei nordm 8009 1990 instituiu a impenhorabilidade do
imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar por qualquer diacutevida salvo as exceccedilotildees dos
seus arts 3ordm e 4ordm
A referida lei dispotildee que Para os efeitos de impenhorabilidade considera-se
residecircncia um uacutenico imoacutevel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia
permanente (art 5ordm)
O processualista baiano Fredie Didier et al116 assevera que
A lei propotildee-se a proteger imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar nos termos acima expostos A CF 88 ampliou o conceito de entidade familiar para abranger a famiacutelia monoparental e a uniatildeo estaacutevel Mas deve considerar-se aiacute compreendidos os irmatildeos que vivem juntos e a uniatildeo homossexual Ateacute o solteiro estaacute abrangido pela impenhorabilidade se reside soacute no imoacutevel - isso em nome da proteccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana e da moradia digna Na verdade houve uma mudanccedila de compreensatildeo acerca do sentido da proteccedilatildeo de proteccedilatildeo da famiacutelia agrave proteccedilatildeo da moradia indispensaacutevel agrave preservaccedilatildeo da dignidade da pessoa
114 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o
novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 388
115 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MONTENEGRO FILHO Misael Novo Coacutedigo de Processo Civil Comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Atlas 2016 p 752
116 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 840-841
47
O STJ jaacute consolidou esse entendimento na suacutemula nordm 364 O conceito de
impenhorabilidade de bem de famiacutelia abrange tambeacutem o imoacutevel pertencente a pessoas
solteiras separadas e viuacutevas
Entretanto se o casal ou entidade familiar possuir vaacuterios imoacuteveis utilizados como
residecircncia a impenhorabilidade recairaacute sobre o de menor valor (art 5ordm paraacutegrafo uacutenico) ldquoEacute o
que ocorre por exemplo quando a famiacutelia se divide em mais de uma cidade por motivos
profissionaisrdquo 117
Forccediloso observar ainda que a impenhorabilidade do imoacutevel familiar eacute relativa jaacute que
natildeo pode ser oposta a qualquer creacutedito O art 3ordm da Lei n 8009 1990151 em que pode ser
penhorada a residecircncia da famiacutelia (exemplo execuccedilatildeo de alimentos para cobranccedila de taxas
devidas em funccedilatildeo do imoacutevel familiar etc)
Resta claro que o artigo 833 do CPC ao disciplinar as hipoacuteteses de impenhorabilidade
possui o escopo de proteger o princiacutepio da dignidade humana Entretanto algumas claacuteusulas
natildeo possuem proteccedilatildeo absoluta ldquoa sua relativizaccedilatildeo a depender do caso sob exame deve ser
realccedilada agrave medida que a dignidade resguardada e protegida pelo sistema processual-
constitucional natildeo se limita ao executadordquo 118 Ademais ldquoEacute premente advertidamente que a
dignidade do credor tambeacutem seja garantida em juiacutezo tendo como norte pois os princiacutepios da
proporcionalidade e razoabilidaderdquo 119
117 Ibid p 841 118 Ibid p 752 119 Ibid p 752
48
4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA
ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE
HUMANA DO EXECUTADO
41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE
EFETIVACcedilAtildeO
Como jaacute exposto em linhas preteacuteritas nos meios executivos tiacutepicos as medidas
executivas satildeo determinadas pela lei ou seja o oacutergatildeo pode aplicar somente as medidas
tipificadas no ordenamento juriacutedico No entanto ao se tratar das medidas executivas atiacutepicas
eacute necessaacuterio que haja um limite na atuaccedilatildeo realizada pelo juiz
O poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo poder ser realizado de maneira indiscriminada haacute
pressupostos e premissas a serem observadas Dessa forma a primeira premissa eacute no sentindo
de que a medida executiva atiacutepica natildeo pode ser a primeira medida a ser invocada ldquomuito ao
reveacutes a regra do nosso sistema continua a ser o da tipicidade dos meios executivos soacute que
agora temperado pelo sistema atiacutepicordquo 120 O processualista Thiago Rodovalho explica que
ldquo() os meios atiacutepicos natildeo satildeo prima ratio e sim a ultima ratio eacute dizer esgotados e
frustrados os meios executivos tiacutepicos e ordinaacuterios pode-se em tese valer-se do sistema
atiacutepicordquo121
Dessa forma nos casos de execuccedilatildeo que tenha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
natildeo deve ser aplicado de logo as medidas indutivas e coercitivas Apenas apoacutes frustradas as
medidas ldquonaturaisrdquo pode-se passar agrave aplicaccedilatildeo das medidas atiacutepicas
Uma segunda premissa diz a respeitos dos meios de pressatildeo para compelir o devedor a
adimplir com o seu deacutebito ldquoEssa segunda premissa decorre inclusive de imperiosidade
loacutegica de nada adianta a medida de pressatildeo se a obrigaccedilatildeo natildeo tem como ser adimplida pelo
devedorrdquo 122
Para Thiago Rodovalho123 ldquoIsso quer significar que esgotados e frustrados os meios
tiacutepicos o juiz se valeraacute dos meios atiacutepicos se eles forem potencialmente haacutebeis a estimular ou
120 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da
atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018
121 Ibid sem paginaccedilatildeo 122 Ibid sem paginaccedilatildeo 123 Ibid sem paginaccedilatildeo
49
forccedilar o cumprimento o que pressupotildee sua possibilidade quando entatildeo eles poderatildeo ser
eficazesrdquo
Logo nas obrigaccedilotildees de pagar quantia se houver a real demonstraccedilatildeo da
impossibilidade financeira do devedor seria um constrangimento inuacutetil e desnecessaacuterio a
imposiccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo para forccedilar o cumprimento
Por isso as medidas atiacutepicas devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o
esgotamento das medidas tiacutepicas e a possibilidade de cumprimento de cumprimento da
obrigaccedilatildeo
Ademais superadas as supracitadas premissas e o oacutergatildeo julgador vislumbrando a
necessidade da aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo se faz necessaacuterio que um conjunto de
postulados e princiacutepios rejam a atuaccedilatildeo do oacutergatildeo julgador servindo de norte para a escolha da
medida executiva mais adequada ldquoDe modo geral a escolha deve pautar-se nos postulados da
proporcionalidade da razoabilidade (art8ordm CPC) e da proibiccedilatildeo de excesso bem como nos
princiacutepios da eficiecircncia e da menor onerosidade da execuccedilatildeordquo 124
O professor Fredie Didier et al125 eacute categoacuterico ao citar Humberto Aacutevila
Segundo Humberto Aacutevila o postulado da proporcionalidade se manifesta nas situaccedilotildees em que haacute uma relaccedilatildeo de causalidade entre dois elementos empiricamente discerniacuteveis um meio e um fim de tal sorte que se possa proceder aos trecircs exames fundamentais o da adequaccedilatildeo (o meio promove o fim) o da necessidade (dentre os meios disponiacuteveis e igualmente adequados para promover o fim natildeo haacute outro meio menos restritivo do(s) direito(s) fundamental (is) afetado(s)) e o da proporcionalidade em sentido estrito (as vantagens trazidas pela promoccedilatildeo do fim correspondem agraves desvantagens provocadas pela adoccedilatildeo do meio)
O juiz ao aplicar a medida executiva atiacutepica ao caso concreto deve ter seu
embasamento no princiacutepio da proporcionalidade para saber se a medida a ser tomada eacute a
melhor opccedilatildeo ao caso sub judice ldquoO exame de proporcionalidade aplica-se sempre que
houver uma medida concreta destinada a realizar uma finalidaderdquo 126
Em verdade a aplicaccedilatildeo do princiacutepio da proporcionalidade eacute imprescindiacutevel na adoccedilatildeo
dos meios executivos atiacutepicos tendo em vista que ldquo() tais medidas em especial quando de
124 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111 125 DIDIER JR Fredie et al apud AVILA Humberto Teoria dos princiacutepios da definiccedilatildeo agrave aplicaccedilatildeo
dos princiacutepios juriacutedicos 16 ed Satildeo Paulo Malheiros 2015 p 205 126 DIDIER JR Fredie et al op cit p 111
50
natureza coercitiva podem restringir direitos do devedor e incidir diretamente sobre sua
pessoardquo127 Logo ainda que o princiacutepio da efetividade da tutela executiva seja um direito
fundamental o mesmo ldquo() deve ser compatibilizado com direitos fundamentais do
executado para que a sua dignidade humana seja preservadardquo 128
Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Neves129 afirma que em nome do princiacutepio da
proporcionalidade o juiz deveraacute
() ponderar no caso concreto as vantagens praacuteticas da adoccedilatildeo de cada medida executiva atiacutepica em especial as de natureza coercitiva e as desvantagens de sua adoccedilatildeo levando em conta a possibilidade de a medida criar uma limitaccedilatildeo excessiva ao exerciacutecio de direito fundamental do executado
Outro princiacutepio que o oacutergatildeo julgador deve se ater ao escolher a medida executiva
atiacutepica eacute o da razoabilidade Segundo Fredie Didier et al 130 o princiacutepio (ou postulado)131 se
manifesta de trecircs formas
a) como dever de equidade a exigir a harmonizaccedilatildeo da norma geral com o caso individual impondo a consideraccedilatildeo daquilo que normalmente acontece em detrimento do que eacute extraordinaacuterio e tambeacutem impondo a consideraccedilatildeo das especificidades do caso concreto ante a generalidade da norma b) como dever de congruecircncia a exigir a harmonizaccedilatildeo das normas com suas condiccedilotildees externas de aplicaccedilatildeo (isto eacute com a realidade com base em que foram editadas) c) como dever de equivalecircncia a exigir uma relaccedilatildeo de equivalecircncia entre a medida adotada e o criteacuterio que a dimensiona
Logo ldquo() o princiacutepio da razoabilidade deve nortear a atuaccedilatildeo do juiz na adoccedilatildeo das
medidas executivas atiacutepicas previstas no art 139 IV do Novo CPCrdquo 132 tendo em vista que
ldquo() mesmo medidas que pelo princiacutepio da proporcionalidade podem se mostrar
abstratamente possiacuteveis de adoccedilatildeo no caso concreto podem se mostrar inadequadas e
irrazoaacuteveisrdquo 133
127 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Medidas executivas atiacutepicas na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de
pagar quantia certa art 139 IV do novo CPC Revista de Processo v 42 n 265 mar 2017 p 14 128 Ibid p 14 129 Ibid p 14 130 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111-112 131 Segundo Fredie Didier et al o postulado eacute uma norma que atua sobre a aplicaccedilatildeo de outras normas
A proporcionalidade e a razoabilidade seriam postulados normativos e natildeo princiacutepios segundo essa concepccedilatildeo 132 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo op cit p 14 133 Ibid p 14
51
Ademais conforme dispotildee o postulado da proibiccedilatildeo de excesso ldquoa realizaccedilatildeo de uma
regra ou princiacutepio constitucional natildeo pode conduzir agrave restriccedilatildeo a um direito fundamental que
lhe retire um miacutenimo de eficaacuteciardquo 134
A proibiccedilatildeo de excesso deveraacute sempre ser suscitada quando um direito fundamental
houver sido violado a ponto do direito fundamental sofrer violaccedilatildeo excessiva Ademais ldquoesse
postulado natildeo se confunde com o da proporcionalidade porque ele dispensa os exames da
adequaccedilatildeo (relaccedilatildeo meiofim) da necessidade (exigibilidade) ou da proporcionalidade em
sentido estrito (ponderaccedilatildeo entre vantagens e desvantagens)rdquo 135
Logo ldquopouco importa a relaccedilatildeo meiofim ou a exigibilidade da medida ou ainda a
ponderaccedilatildeo com outro direito fundamental eventualmente em jogo aqui se analisa apenas a
eficaacutecia de um determinado direito fundamentalrdquo 136
O princiacutepio da eficiecircncia tem previsatildeo constitucional no art 37 e previsatildeo
infraconstitucional no art 8ordm do CPC15 O referido princiacutepio determina que o processo seja
conduzido de forma eficiente pelo oacutergatildeo jurisdicional
Entende-se que eficiente eacute a atuaccedilatildeo que utilize adequadamente os meios necessaacuterios
para que se atinjam os fins almejados O oacutergatildeo jurisdicional na escolha dos meios a serem
utilizados para a obtenccedilatildeo dos fins
a) deve escolher aqueles que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo (deve evitar meios que promovam resultados insignificantes) b) deve escolher meios que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado (natildeo se pode escolher um meio de resultado duvidoso) c) natildeo pode escolher um meio que produza muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscado 137
O juiz deveraacute igualmente analisar o princiacutepio da menor onerosidade da execuccedilatildeo que
eacute previsto pelo art 805 do CPC ldquoArt 805 Quando por vaacuterios meios o exequente puder
promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o
executadordquo
134 134 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 112 135 Ibid p 112 136 Ibid p 112 137 Ibid p 112-113
52
Logo ldquohavendo duas opccedilotildees igualmente eficazes para permitir alcanccedilar o resultado
pretendido (satisfaccedilatildeo do creacutedito) deveraacute o oacutergatildeo julgador valer-se daquela que menos onere
a situaccedilatildeo do executadordquo 138
O dito princiacutepio impede o comportamento abusivo do exequente que possa beneficiar-
se do meio mais danoso ao executado protegendo dessa forma a lealdade e a eacutetica
processual
Os postulados e princiacutepios analisados em linhas preteacuteritas impotildeem ao oacutergatildeo julgador a
observacircncia de alguns criteacuterios para a escolha da medida executiva atiacutepicas a ser utilizada no
caso concreto
Primeiramente a medida executiva atiacutepica deveraacute ser adequada ldquoO criteacuterio da
adequaccedilatildeo impotildee que juiz considere abstratamente uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida
executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia
a gerar o resultadordquo 139 Nesse primeiro momento o juiz deveraacute observar sob a perspectiva do
credor qual medida teraacute o condatildeo de gerar o resultado mais efetivo
Segundo Fredie Didier et al140 o criteacuterio da adequaccedilatildeo eacute
() fortemente inspirado pelo postulado da proporcionalidade e pelo princiacutepio da eficiecircncia na parte em que esse princiacutepio determina a escolha de meios que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo e que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado
Ademais a medida adotada pelo oacutergatildeo julgador deveraacute ser necessaacuteria ldquoEsse criteacuterio
impotildee um limite agrave atuaccedilatildeo judicial funcionando como uma espeacutecie de contrapeso ao criteacuterio
da adequaccedilatildeo Aqui deve-se levar em conta a posiccedilatildeo do devedorrdquo141
O juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental agrave execuccedilatildeo e determinar
uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute necessaacuterio que a
medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado O criteacuterio da necessidade
estabelece que ldquonatildeo se pode ir aleacutem do necessaacuterio para alcanccedilar o propoacutesito almejado Deve
138 Ibid p 113 139 Ibid p 113 140 Ibid p 113 141 Ibid p 114
53
pois o oacutergatildeo julgador determinar o meio executivo na medida do estritamente necessaacuterio para
proporcionar a satisfaccedilatildeo do creacutedito ndash nem menos nem maisrdquo 142
O referido criteacuterio possui forte influecircncia dos postulados da proibiccedilatildeo do excesso e da
razoabilidade assim como do princiacutepio da menor onerosidade para o executado Assevera
Fredie Didier et al143 que
Natildeo eacute razoaacutevel por exemplo impor como primeira opccedilatildeo medida coercitiva a ser suportada pelo agente puacuteblico pelo simples fato de o juiz pressupor que o ente puacuteblico ao qual ele eacute vinculado iraacute descumprir determinada ordem judicial - o descumprimento natildeo pode ser visto como algo ordinaacuterio ou cotidiano (razoabilidade como dever de equidade) Tampouco eacute razoaacutevel eleger a prisatildeo civil como meacutetodo prioritaacuterio para compelir o executado ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer (razoabilidade como dever de equivalecircncia) Aleacutem disso eacute vedada por exemplo a imposiccedilatildeo de multa coercitiva para compelir o executado a emitir declaraccedilatildeo de vontade uma vez que haacute previsatildeo expressa de medida tiacutepica capaz de proporcionar o mesmo resultado sem sacrifiacutecio para o devedor (art 501 CPC)
A afirmaccedilatildeo feita por Bonavides144 em 1997 sobre a adequaccedilatildeo e a necessidade
continua atual sobre os motes
O meio empregado pelo legislador deve ser adequado e necessaacuterio para alcanccedilar o objetivo procurado O meio eacute adequado quando com seu auxiacutelio se pode alcanccedilar o resultado desejado eacute necessaacuterio quando o legislador natildeo poderia ter escolhido outro meio igualmente eficaz mas que natildeo limitasse ou limitasse de maneira menos sensiacutevel o direito fundamental
Por fim a medida deve conciliar os interesses contrapostos ldquoO magistrado deve
ponderar os interesses em jogo aplicando a proporcionalidade em sentido estrito de modo
que as vantagens da utilizaccedilatildeo da medida atiacutepica escolhida superem as vantagens de seu usordquo 145
Esse criteacuterio natildeo privilegia nem o credor nem o devedor e sim a soluccedilatildeo mais
equilibrada e que atenda da melhor forma aos valores em conflito ldquoTrata-se de criteacuterio
inspirado nos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade bem como no princiacutepio da
142 Ibid p 114 143 Ibid p 114 144 BONAVIDES Paulo Curso de Direito Constitucional 7ordm ediccedilatildeo Satildeo Paulo Ed Malheiros 1997
p 372 145 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 114-115
54
eficiecircncia na parte em que impotildee ao juiz evitar a escolha do meio executivo que produza
muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscadordquo 146
Cada um dos criteacuterios supracitados devem ser considerados pelo juiz ao aplicar as
medidas executivas atiacutepicas ao caso concreto Para Fredie Didier et al147 as medidas como
retenccedilatildeo de CNH passaporte ou cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado como
forma de pressionaacute-lo ao pagamento da diacutevida pecuniaacuteria natildeo satildeo possiacuteveis
Essas natildeo satildeo medidas adequadas ao atingimento do fim almejado (o pagamento de quantia) - natildeo haacute propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente Tais medidas soam mais como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-lo ao cumprimento da ordem judicial - e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a utilizaccedilatildeo de meios sancionatoacuterios pelo magistrado mas apenas de meios de coerccedilatildeo indireta e sub-rogatoacuterios
Ainda que adequadas fossem a retenccedilatildeo de CNH e do passaporte no corte de fornecimento de aacutegua natildeo parecem ser medidas necessaacuterias (no sentido de exigiacuteveis) uma vez que outras medidas podem em tese ser utilizadas sem causar igual gravame ao executado - como por exemplo a simples restriccedilatildeo do uso de cartotildees de creacutedito A retenccedilatildeo de documentos pessoais eacute medida que termina por restringir a liberdade de ir e vir do executado mostrando-se a princiacutepio natildeo-razoaacutevel por ir de encontro ao dever de equivalecircncia e desproporcional por restringir demais o direito agrave liberdade em favor do direito de creacutedito pecuniaacuterio do exequente
O processualista baiano et al148 cita tambeacutem outro exemplo de medida atiacutepica que natildeo
atingem os criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade
Tampouco parece adequada em princiacutepio determinaccedilatildeo de corte de energia eleacutetrica de todo o preacutedio onde funciona serviccedilo puacuteblico administrativo como forma de pressionar o ente federado a cumprir ordem de nomeaccedilatildeo de candidato em concurso puacuteblico Natildeo parece haver relaccedilatildeo meiofim entre uma coisa e outra Tambeacutem natildeo eacute possiacutevel enxergar essa medida como necessaacuteria no sentido de ser a menos gravosa para o devedor - observe que se trata de medida que uma vez aplicada ensejaria restriccedilatildeo de funcionamento em toda a reparticcedilatildeo puacuteblica em prejuiacutezo de serviccedilos puacuteblicos essenciais ao funcionamento da Administraccedilatildeo o que aleacutem de ser excessivamente gravoso parece natildeo se conformar agrave necessidade de ponderaccedilatildeo dos interesses em jogo - aleacutem de afetar a um sem-nuacutemero de pessoas tomadoras desses serviccedilos
Ademais eacute sabido que toda e qualquer decisatildeo judicial precisa ser fundamentada Ao
se tratar das medidas executivas atiacutepicas o papel da fundamentaccedilatildeo se torna ainda mais
146 Ibid p 115 147 Ibid p 115 148 Ibid p 116
55
importante tendo em vista que eacute pela fundamentaccedilatildeo da decisatildeo que se poderaacute controlar a
adequaccedilatildeo e necessidade da medida atiacutepica
Pelo fato das medidas executivas atiacutepicas derivarem de dispositivos normativos
considerados claacuteusulas gerais propiacutecias as mais variadas interpretaccedilotildees eacute de extrema
importacircncia que o oacutergatildeo julgador fundamente sua decisatildeo
Logo ldquodeve o juiz na fundamentaccedilatildeo decisoacuteria expor racionalmente os motivos da
sua escolha demonstrando com atenccedilatildeo ao art 489 sect 1ordm CPC de que modo a sua opccedilatildeo
atende os criteacuterios da adequaccedilatildeo necessidade e proporcionalidade em sentido estrito ()rdquo 149
Dessa forma os princiacutepios da proporcionalidade e razoabilidade servem para delimitar
o alcance das claacuteusulas gerais de efetivaccedilatildeo fazendo com que o oacutergatildeo julgador se atenha aos
criteacuterios da adequaccedilatildeo e necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao caso
concreto
42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO
EXECUTADO
A entrada em vigor do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 aflorou ainda mais uma
discussatildeo essencial para os processualistas do seacuteculo XXI qual eacute o verdadeiro protagonista do
processo civil
Para os que defendem o ldquoautoritarismo processualrdquo o verdadeiro protagonista do
processo civil eacute o oacutergatildeo judiciaacuterio que em nome do desempenho efetivo de suas funccedilotildees lhes
eacute permitido dilatar os poderes que diga-se de jaacute passagem jaacute compotildeem um vastiacutessimo
arsenal150
Jaacute os ldquogarantistasrdquo 151 do processo civil acreditam que os verdadeiros protagonistas satildeo
as partes do processo e seus direitos e garantias devem ser estritamente preservados
Devido a essa disputa de quem possui maior protagonismo no processo as mudanccedilas
ocorridas no coacutedigo processual vigente quanto agraves medidas executivas atiacutepicas despertaram
149 Ibid p 117 150 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos
atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04102018
151 O processualista Araken de Assis acredita que o termo garantista eacute descabido tendo em vista que remete ao processo penal
56
maior celeuma do que qualquer outra modificaccedilatildeo trazida pelo CPC15 Afinal as referidas
medidas acirravam ainda mais a disputa pelo protagonismo processual
O fato de o CPC15 dispor no art 139 IV que o juiz poderaacute decretar todas as medidas
indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o
cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo
pecuniaacuteria levou boa parte da doutrina e dos juiacutezes a acreditar que teria pleno direito de
aplicar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo Entretanto muitos se esqueceram do outro lado
da moeda esqueceram que a dignidade humana do executado tambeacutem eacute um direito
fundamental e natildeo pode ser violado
Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa152
acreditam que
() natildeo parece producente elencar um rol abstrato das medidas que poderiam ser aplicadas pelo juiz a tiacutetulo do art 139 IV CPC Afinal se busca a efetividade da execuccedilatildeo e esta soacute pode ser identificada agrave luz das especificidades da situaccedilatildeo concreta Ideal eacute enveredar pela loacutegica modular (adequaccedilatildeo ao caso) natildeo pela geneacuterica (soluccedilotildees abstratas de pretensa utilidade universal)
Em razatildeo de o dispositivo apresentar uma gama de poderes tatildeo amplos agrave disposiccedilatildeo do
oacutergatildeo julgador sem nenhuma estipulaccedilatildeo de um procedimento legal previamente definido para
que estabeleccedila as condiccedilotildees de sua aplicaccedilatildeo em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo eacute
necessaacuterio que em razatildeo do princiacutepio da dignidade humana natildeo busque definir o que o
dispositivo permite mas de definir o que ele natildeo permite ldquoOu seja propotildee-se a sua
compreensatildeo por exclusatildeo Afinal se ele tem potencialidade para promover a efetividade da
tutela tambeacutem pode provocar lesotildees E como em direito os fins natildeo justificam os meios
ressalta como prioritaacuteria a necessidade de estabelecer limitesrdquo 153
O art 789 do CPC15 disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial e eacute
categoacuterico ao dispor que ldquoo devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para
152 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
153 Ibid sem paginaccedilatildeo
57
o cumprimento de suas obrigaccedilotildees salvo as restriccedilotildees estabelecidas em leirdquo Logo a
execuccedilatildeo somente poderaacute incidir sobre os bens do devedor e natildeo sobre a sua pessoa
Como eacute sabido a Lex Poetelia Papiria de 326 aC foi o primeiro marco legal da
humanizaccedilatildeo das cobranccedilas de diacutevidas abolindo a imposiccedilatildeo ao devedor de castigos
vexatoacuterios e ateacute da pena de morte154
Afinal no direito romano antigo a cobranccedila de diacutevidas poderia recair sobre a pessoa
do devedor que respondia com sua liberdade e ateacute mesmo com seu proacuteprio corpo permitindo
a lei que repartissem tantos pedaccedilos do corpo do devedor quantos fossem seus credores
Nesse sentindo leciona o professor Guilherme Pupe da Noacutebrega155 que
Vem de longe a evoluccedilatildeo no sentido de fazer a responsabilidade por uma obrigaccedilatildeo migrar da pessoa do devedor para seu patrimocircnio Merecem registro especiacutefico como marcos histoacutericos remotos a Lex Poetelia Papiria de 326 aC que aboliu o nexum e possibilidade de escravidatildeo do devedor como garantia da obrigaccedilatildeo e a pignoris capio ou ldquoaccedilatildeo por tomada de penhorrdquo que instituiu a possibilidade de o credor tomar parcela dos bens do devedor como forma de assegurar o adimplemento da diacutevida Aqueles institutos culminariam seacuteculo depois no artigo 789 do CPC de 2015 a consagrar que o devedor responda pela satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo com seus bens presentes e futuros observadas as restriccedilotildees impostas pelas impenhorabilidades legais
Logo o avanccedilar da civilizaccedilatildeo marcou o deslocamento da responsabilidade por
diacutevidas saindo do corpo do devedor para o seu patrimocircnio tendo em vista que a vida
humana a liberdade e a integridade fiacutesica satildeo valores inalienaacuteveis natildeo podendo ser
sacrificadas em benefiacutecio de obrigaccedilotildees pecuniaacuterias 156
Entretanto eacute sabido que a responsabilidade patrimonial eacute excepcionada pela prisatildeo
civil do devedor de verba alimentiacutecia resquiacutecio da responsabilidade pessoal romana
154 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt
httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018
155 NOacuteBREGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139 IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018
156 Ibid sem paginaccedilatildeo
58
No entanto haacute uma justificativa para isso Segundo o processualista Guilherme Pupe
da Noacutebrega157
Eacute que a par de a prisatildeo civil encontrar previsatildeo constitucional no inciso LXVII do artigo 5ordm o raciociacutenio eacute o de que o direito do alimentante agrave liberdade de locomoccedilatildeo cede diante dos direitos agrave vida e agrave dignidade titularizados pelo alimentando e resguardados pelos alimentos Foi esse mesmo raciociacutenio aliaacutes que justificou no passado a ediccedilatildeo da suacutemula 309 pelo STJ agora positivada pelo artigo 528 sect 7ordm que limita a modalidade coercitiva agraves trecircs uacuteltimas prestaccedilotildees vencidas e agraves prestaccedilotildees vincendas A ideia eacute que tendo o alimentando subsistido a despeito do natildeo-pagamento de prestaccedilotildees mais antigas essas verbas teriam perdido o caraacuteter alimentar que na equaccedilatildeo antes apresentada justificaria a prisatildeo civil do alimentante Daiacute por que aqueles valores antigos remanescem exigiacuteveis mas somente pela via da expropriaccedilatildeo
Essa ressalva eacute necessaacuteria tendo em vista que a adoccedilatildeo de teacutecnica de execuccedilatildeo
indireta para incursatildeo radical na esfera de direitos do executado notadamente direitos
fundamentais quando carente de respaldo constitucional natildeo merece acolhimento sob
risco de se atentar contra o devido processo legal (artigo 5ordm LIV da Constituiccedilatildeo)
Como afirma o autor Bruno Dantas158 ldquoembora inexistam estatiacutesticas que permitam
comparaccedilotildees natildeo eacute desarrazoado intuir que os iacutendices de inadimplecircncia despeccedilam na razatildeo
inversa da incidecircncia das ordens judiciais sobre o corpo e a liberdade do devedorrdquo Entretanto
eacute natildeo possiacutevel adotar toda e qualquer medida executiva atiacutepica em nome da efetividade da
execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que se saiba os limites da sua aplicaccedilatildeo
Dessa forma instrumentos que permitam o cumprimento forccedilado de contratos e o pagamento
de diacutevidas satildeo necessaacuterios contudo eacute preciso equilibrar essa exigecircncia com a liberdade e a
dignidade humana
Como citado alhures o art 139 IV ensejou decisotildees como a que determinou a
suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o
passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito em uma accedilatildeo se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo
extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
Na supracitada decisatildeo o princiacutepio da responsabilidade patrimonial natildeo estaacute sendo
efetivado para o que o devedor responda com os seus bens Afinal qual ligaccedilatildeo entre a
157 Ibid sem paginaccedilatildeo 158 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt
httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018
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restriccedilatildeo de circulaccedilatildeo que diz com o direito de ir e vir (liberdade) com o pagamento de
diacutevidas que diz com a responsabilidade civil159
Ademais por que quem natildeo tem dinheiro para pagar diacutevidas natildeo pode dirigir Por que
natildeo tem condiccedilotildees para pagar o deacutebito natildeo pode ter passaporte Por que quem natildeo tem como
pagar o deve natildeo pode ter cartatildeo de creacutedito
Ao utilizar meios executivos atiacutepicos como os supracitados para compelir o devedor a
satisfazer a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria quando exauridos sem ecircxito os meios tradicionais de bens
penhoraacuteveis salvo quando existe qualquer indiacutecio concreto de ocultaccedilatildeo ou dissipaccedilatildeo de
bens eacute obrigar o devedor abrir matildeo da proteccedilatildeo da lei que lhe impede que seja tomado agrave forccedila
(art 833 CPC e demais disposiccedilotildees que tratam da impenhorabilidade)
Segundo Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa160
Claramente essa pressatildeo visa dar uma aparecircncia de voluntariedade agrave indicaccedilatildeo de bens impenhoraacuteveis pelo proacuteprio executado que na verdade soacute age assim por ser a uacutenica forma de ver-se livre de um grame imposto por medida indutiva despedida de qualquer necessidade ou adequaccedilatildeo Uma intoleraacutevel perversatildeo
Os autores afirmam ainda que o ldquodireito paacutetrio natildeo admite esta contraditio in terminis
sendo inaceitaacutevel a coexistecircncia de regra protetiva do executado com outra que concede ao
juiz poderes para forccedilar (ainda que indiretamente e veladamente) o executado a abrir matildeo
daquela proteccedilatildeordquo 161
Logo eacute cristalino que a suspensatildeo da CNH eacute uma forma incorreta de aplicar a medida
executiva atiacutepica para efetivar o direito fundamental a execuccedilatildeo tendo em vista que o uacutenico
objetivo da referida eacute pressionar o executado abrir matildeo de algum bem impenhoraacutevel para
levantar o dinheiro e cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
A retenccedilatildeo do passaporte igualmente natildeo possui qualquer relaccedilatildeo com a diacutevida do
executado e eacute somente uma forma de tentar pressiona-lo a dispor de um bem que natildeo pode
ser tomado agrave forccedila e puni-lo por natildeo ter cumprido voluntariamente com a sua obrigaccedilatildeo
159 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
160 Ibid sem paginaccedilatildeo 161 Ibid sem paginaccedilatildeo
60
Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa162
acreditam que tal medida eacute equivocada e se torna excessivamente onerosa ao executado
As mais variadas circunstacircncias relevem o equiacutevoco de tal medida aplicada assim genericamente Com efeito nada justifica reter o passaporte do executado e impedi-lo de viajar para o exterior quando eacute agraciado inclusive com todas as despesas pagas com presente sorteio ou precircmio (por completar tempo de serviccedilo ou atingir metas produtividade na sociedade empresaacuteria em que trabalha) Como todo custo eacute suportado por terceiro e por isso mesmo a sua realizaccedilatildeo pelo executado natildeo traria qualquer prejuiacutezo ao exequente e a retenccedilatildeo do passaporte natildeo seria injustificaacutevel
Paulo Antonio Papini163 acredita que natildeo tem a apreensatildeo de passaporte natildeo possui um
fundamento plausiacutevel tendo em vista que se o devedor natildeo pode viajar para saldar o deacutebito
tambeacutem natildeo poderia exercer atividades cotidianas
Com todo o respeito a quem pensa dessa forma o argumento eacute muito simploacuterio e natildeo precisamos sequer do Direito para derrubaacute-lo Com efeito se considerarmos que ndash ateacute mesmo pelas dimensotildees continentais do Brasil ndash natildeo eacute incomum que uma passagem para o Nordeste custe mais caro que um voo para Miami seria razoaacutevel entatildeo seguindo a linha argumentativa do Magistrado em questatildeo que se oficiasse aos oacutergatildeos reguladores da aviaccedilatildeo civil proibindo-se aquele devedor de fazer ateacute mesmo voos domeacutesticos Poder-se-ia ir mais longe jaacute que natildeo tem dinheiro para pagar suas diacutevidas certamente aquele devedor tambeacutem natildeo teria para comer fora de sua casa porque entatildeo natildeo determinar a expediccedilatildeo de ofiacutecio aos restaurantes proacuteximos agrave sua casa e determinar tambeacutem a proibiccedilatildeo de que ele fosse servidoatendido
O autor se questiona ainda ldquoSeraacute entatildeo que o Princiacutepio da Dignidade da Pessoa
Humana estaacute de mero enfeite em nossa Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ()rdquo 164 Tendo em vista
que ldquoa decisatildeo em comento viola diretamente o art 5ordm incisos XV LIII e LXIII da
Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ndash falamos do Direito de Ir e Virrdquo 165
Ademais o cancelamento do cartatildeo de creacutedito eacute mais uma forma de constranger e
compelir o executado a cumprir com a obrigaccedilatildeo de qualquer forma natildeo importando o que
precise fazer para conseguir saldar o deacutebito tendo em vista que a referida medida apresenta
162 Ibid sem paginaccedilatildeo 163 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo
pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018
164 Ibid sem paginaccedilatildeo 165 Ibid sem paginaccedilatildeo
61
qualquer adequaccedilatildeo com o fim desejado (reverter em pagamento para o exequente) Os
autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa afirmam que166
Reconhece-se que as razotildees da afirmaccedilatildeo ora questionada satildeo ateacute intuitivas mas eacute plenamente possiacutevel problematiza-las Ora natildeo se encontra qualquer justificativa idocircnea para que o juiz possa cancelar o contrato do executado com a administradora do cartatildeo de creacutedito (ou instituiccedilatildeo financeira) que natildeo tem qualquer relaccedilatildeo com o creacutedito exequendo muito menos como isso poderia impactar positivamente na execuccedilatildeo (senatildeo para pressionar o executado a dispor de bens impenhoraacuteveis) Ademais natildeo foram indicados sequer sinais de que o executado realiza gastos supeacuterfluos com o cartatildeo de creacutedito ndash natildeo que isso justificasse a medida pois o correto seria penhorar os esses bens (se duraacuteveis naturalmente) ao inveacutes de cancelar o cartatildeo de creacutedito
Logo as referidas medidas natildeo possuem qualquer relaccedilatildeo com o atingimento do fim
almejado (o pagamento de quantia) tendo em vista que natildeo haacute uma relaccedilatildeo meiofim entre
tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a
restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia
ao exequente
Dessa forma nota-se que as medidas de suspensatildeo da CNH retenccedilatildeo de passaporte e
bloqueio do cartatildeo de credito satildeo completamente inadequadas agrave realizaccedilatildeo a que se prestam
Afinal ldquotais medidas soam como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-
lo ao cumprimento da ordem judicial ndash e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a
utilizaccedilatildeo dos meios sancionatoacuterios pelo magistrado ()rdquo167
Como exposto em linhas preteacuteritas o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades
de aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e
razoaacutevel se atendo aos criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas
executivas atiacutepicas ao caso concreto sob pena de converter a medida em de indutiva para
punitiva
A utilizaccedilatildeo de medidas atiacutepicas como a suspensatildeo da carteira de motorista e o
passaporte do devedor abandona a regra da responsabilidade patrimonial e atingem em cheio
o nuacutecleo de direitos inerentes agrave condiccedilatildeo humana
166 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
167 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 115
62
O limite para a aplicaccedilatildeo de tais medidas deve ser a Constituiccedilatildeo Federal e sobretudo
os Direitos fundamentais nela expressos ldquoCom efeito natildeo haacute saiacuteda tampouco soluccedilatildeo eficaz
de um problema sem que se respeite a Lei e o Devido Processo Legal (por mais nobres que
sejam as intenccedilotildees)rdquo 168
Dessa forma a busca desenfreada pelo cumprimento das decisotildees judiciais em
especial na fase executiva natildeo pode ser realizada em sacrifiacutecio de direitos fundamentais O
Poder Judiciaacuterio natildeo pode resolver a crise do processo executoacuterio utilizando de medidas
arbitraacuterias com o propoacutesito de satisfazer obrigaccedilotildees pecuniaacuterias
Eis o dilema que se coloca diante do poder geral de efetivaccedilatildeo ele pode servir de
potente instrumento em prol da tutela jurisdicional executiva entretanto se manejado de
modo improacuteprio serviraacute de instrumento de puniccedilatildeo e humilhaccedilatildeo do executado169
Eacute notoacuterio que se amplamente aplicado o poder geral de efetivaccedilatildeo reduziria os
iacutendices de inadimplecircncia quiccedilaacute resolveria por completo a crise da execuccedilatildeo civil Entretanto
o retrocesso civilizatoacuterio seria irreparaacutevel
168 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo
pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018
169 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
63
5 CONCLUSAtildeO
Como funccedilatildeo jurisdicional que tem como objeto a efetivaccedilatildeo de direitos a execuccedilatildeo
deve sempre buscar a maior satisfaccedilatildeo possiacutevel concretizando integralmente o creacutedito do
exequente isto eacute realizando o direito fundamental agrave tutela executiva do credor Por isso a
adoccedilatildeo de meios executivos atiacutepicos incorporados pelo Coacutedigo de Processo Civil de 2015 por
meio do art139 IV em um primeiro momento podem ser consideradas vaacutelidas visto que
servem de instrumento para a satisfaccedilatildeo e asseguraccedilatildeo de direitos do credor
Entretanto para o oacutergatildeo julgador natildeo cometa arbitrariedades em nome do direito
fundamental agrave execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que seja definido certos limites na adoccedilatildeo do poder
geral de efetivaccedilatildeo
As medidas executivas atiacutepicas natildeo podem ser aplicadas de maneira indiscriminada
logo devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o esgotamento das medidas tiacutepicas e
a possibilidade de cumprimento da obrigaccedilatildeo
Partindo dessa premissa as medidas a serem adotadas pelo juiz no caso concreto
devem ter como baliza os princiacutepios da proporcionalidade e da razoabilidade para que natildeo
ultrapassem a responsabilidade patrimonial do devedor e incidida diretamente sobre sua
pessoa
Para que natildeo seja atingida a pessoa do executado ou seja para que o devedor natildeo
tenha sua dignidade humana viola eacute necessaacuterio que a medida atiacutepica seja adequada e
necessaacuteria
Logo o juiz deveraacute sempre estabelecer uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida
executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia
a gerar o resultado sem violar a dignidade humana do executado
Dessa o juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental a execuccedilatildeo e
determinar uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute
necessaacuterio que a medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado
As medidas que ultrapassam esses limites como a decisatildeo que apreendeu o
passaporte suspensatildeo a CNH e bloqueou o cartatildeo de creacutedito do devedor satildeo meramente
punitivas posto que essas natildeo satildeo as medidas mais adequadas para se atingir o fim almejado
pois natildeo existe propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado
64
uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo
geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente
Medidas como esta servem de embasamento para decisotildees arbitraacuterias e autoritaacuterias de
violaccedilatildeo dos direitos fundamentais transformando o poder geral de efetivaccedilatildeo em
instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com autorizaccedilatildeo judicial
Em suma o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades de aplicaccedilatildeo do poder
geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e razoaacutevel se atendo aos
criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao
caso concreto sob pena de punir a pessoa do executado violando a sua dignidade humana
em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo
65
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- 1 INTRODUCcedilAtildeO
- 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
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- 21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL
- 22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
- 23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
- 24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO
- 25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO
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- 3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
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- 31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS
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- 311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15
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- 32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
- 33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
- 34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
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- 4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
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- 41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
- 42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
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- 5 CONCLUSAtildeO
- REFEREcircNCIAS
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8 Dessa forma a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional responsaacutevel pela
concretizaccedilatildeo de um direito subjetivo no plano material obtendo resultado idecircntico ou
equivalente ao atingiacutevel se o devedor cumprisse espontaneamente a prestaccedilatildeo
Todavia essa atividade jurisdicional soacute cabe quando o devedor se recusa a cumprir
com a obrigaccedilatildeo quebrando a expectativa do credor de receber o que lhe eacute devido Por esta
razatildeo que se diz que a execuccedilatildeo civil eacute ldquoforccediladardquo 6
Eacute o que se conclui seguindo os ensinamentos de Leonardo Greco7 para ele execuccedilatildeo eacute
uma
() modalidade de tutela jurisdicional que consiste na praacutetica pelo juiz (ou por outrem sob a sua supervisatildeo) de uma seacuterie de atos coativos concretos sobre o devedor e sobre o seu patrimocircnio a fim de agrave custa dele e independentemente do concurso da sua vontade tornar efetivo o cumprimento de prestaccedilatildeo por ele inadimplida desde que tais atos coativos estejam previamente constituiacutedos em lei
Portanto a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional que tem como escopo obter o
cumprimento de uma prestaccedilatildeo certa e inadimplida mediante atos coativos sobre o devedor e
seus bens
22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
Vislumbrado o conceito de execuccedilatildeo civil cabe agora empreender a sua classificaccedilatildeo
tendo em vista que a execuccedilatildeo pode se manifestar de diversas formas possuindo diferentes
caracteriacutesticas em cada uma das suas modalidades
Inicialmente cabe destacar que haacute duas teacutecnicas processuais para viabilizar a execuccedilatildeo
civil lato sensu eacute a que divide em processo autocircnomo de execuccedilatildeo e em fase de execuccedilatildeo
dependendo do tiacutetulo executivo que justifica o exerciacutecio da atividade satisfativa
O Coacutedigo Processual Civil de 2015 acertadamente ratificou as reformas promovidas
no CPC73 que consagrava a opccedilatildeo legislativa de oferecimento das tutelas de certificaccedilatildeo e
efetivaccedilatildeo do direito em um mesmo processo Dessa forma as execuccedilotildees de sentenccedilas
6 BASTOS Luiz Fernando Pereira O artigo 139 IV do novo Coacutedigo de Processo Civil a atipicidade
dos meios executivos na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia certa Brasiacutelia 2017 Disponiacutevel em lt httpbdmunbbrbitstream104831866812017_LuizFernandoPereiraBastospdf gt Acesso em 06 de agosto de 2018
7 BASTOS Luiz Fernando Pereira apud GRECO Leonardo O processo de execuccedilatildeo Rio de Janeiro Renovar 1999 p 164
9
passaram a ser uma fase complementar ao de processo de conhecimento e natildeo mais ocorrer
em um processo autocircnomo
No entendimento do professor processualista Fredie Didier et al8 o processo
sincreacutetico simplificou a efetivaccedilatildeo de um direito reconhecido em sentenccedila
A dispensa do ajuizamento de um processo autocircnomo para execuccedilatildeo de sentenccedila natildeo soacute veio diminuir o tempo necessaacuterio agrave prestaccedilatildeo da tutela jurisdicional - afinal o credor natildeo mais precisaria tal como ocorria ateacute entatildeo promover nova citaccedilatildeo pessoal do reacuteudevedor- como tambeacutem veio romper de vez com um velho paradigma segundo o qual a atividade executiva estaria dissociada da precedente atividade jurisdicional cognitiva
Entretanto natildeo soacute as sentenccedilas de meacuterito ensejam uma execuccedilatildeo Por esta razatildeo foi
necessaacuterio manter o processo autocircnomo de execuccedilatildeo para os casos em que o credor tem a seu
favor um documento que natildeo tenha sido proferido por um oacutergatildeo dotado de jurisdiccedilatildeo
Consequentemente se for o titulo executivo judicial o caminho natural eacute o do
cumprimento de sentenccedila Sendo por sua vez extrajudicial o titulo executivo o caminho
correto eacute o processo de execuccedilatildeo
Cabe ainda salientar que toda execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial eacute definitiva Jaacute a
execuccedilatildeo de tiacutetulo judicial (cumprimento de sentenccedila) pode ser definitiva ou provisoacuteria
No primeiro caso isto eacute cumprimento de sentenccedila definitivo ldquoeacute a execuccedilatildeo completa
que vai ateacute a fase final (com a entrega do bem da vida) sem exigecircncias adicionais para o
exequenterdquo 9
Quanto ao segundo caso ldquoo cumprimento provisoacuterio de sentenccedila (fundada em tiacutetulo
provisoacuterio) eacute aquele que exige alguns requisitos extras para que se chegue agrave fase final da
execuccedilatildeordquo 10
Para Fredie Didier11 o criteacuterio para definir se o cumprimento de sentenccedila seraacute
definitivo ou provisoacuterio
() eacute a estabilidade do tiacutetulo executivo em que se funda a execuccedilatildeo se se tratar de decisatildeo acobertada pela coisa julgada material o cumprimento de sentenccedila eacute
8 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 46 9 Ibid p 57 10 Ibid p 57 11 Ibid p 57
10
definitivo se se tratar de decisatildeo judicial ainda passiacutevel de alteraccedilatildeo (reforma ou invalidaccedilatildeo) em razatildeo da pendecircncia de recurso contra ela interposto a que natildeo tenha sido atribuiacutedo efeito suspensivo o cumprimento de sentenccedila eacute provisoacuterio
Ademais a execuccedilatildeo se distingue em procedimentos executivos comuns que satildeo da
execuccedilatildeo civil e que servem a uma generalidade de creacuteditos como eacute o caso do cumprimento
de sentenccedila e o processo de execuccedilatildeo E em procedimentos executivos especiais que servem
agrave satisfaccedilatildeo de creacuteditos peculiares como a execuccedilatildeo de alimentos e a execuccedilatildeo fiscal 12
Por fim cabe mencionar a classificaccedilatildeo que distingue a execuccedilatildeo em direta e indireta
A primeira execuccedilatildeo direita (ou execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo) eacute ldquo() aquela em que o
Poder Judiciaacuterio prescinde da colaboraccedilatildeo do executado para a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida
e pois promove uma substituiccedilatildeo da sua conduta pela conduta do proacuteprio Estado-juiz ou de
terceirordquo 13 Ou seja as medidas executivas satildeo levadas a efeito mesmo contra a vontade do
devedor na execuccedilatildeo direta
Segundo a doutrina a execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo se subdivide da seguinte forma
meios de desapossamento meios de transformaccedilatildeo e meios de expropriaccedilatildeo
Os meios de desapossamento muito comuns nas execuccedilotildees para entrega de coisa eacute a
forma ldquopor meio da qual se retira da posse do executado o bem a ser entregue ao exequente
(p ex despejo busca e apreensatildeo reintegraccedilatildeo de posse)rdquo 14 Ao passo que por meio dos de
transformaccedilatildeo ldquo() o juiz determina que um terceiro pratique a conduta que deveria ser
praticada pelo executado cabendo a este arcar com o pagamento do custo respectivordquo 15 Jaacute
os meios executivos de expropriaccedilatildeo eacute a forma ldquopor meio do qual algum bem do patrimocircnio
do devedor eacute expropriado para pagamento do creacutedito (adjudicaccedilatildeo alienaccedilatildeo judicial ou
apropriaccedilatildeo de frutos e rendimentos de empresa ou de estabelecimentos e de outros bens art
825 CPC)rdquo 16
12 Ibid p 48 13 Ibid p 50 14 Ibid p 51 15 Ibid p 51 16 Ibid p 51
11 Jaacute a execuccedilatildeo indireta (ou mandamental) atua ldquo() na vontade do devedor como forma
de compeli-lo ou incentivaacute-lo a cumprir a ordem judicialrdquo 17 Nesse entendimento ainda
leciona Fredie Didier et al 18
Nesses casos o Estado-juiz busca promover a execuccedilatildeo com a colaboraccedilatildeo do executado forccedilando ou incentivando a que ele proacuteprio cumpra a prestaccedilatildeo devida Em vez de o Estado-juiz tomar as providecircncias que deveriam ser tomadas pelo executado o Estado forccedila por meio de coerccedilatildeo psicoloacutegica ou de promessa de recompensa judicial a que o proacuteprio executado cumpra a prestaccedilatildeo
A execuccedilatildeo indireta pode ser patrimonial como por exemplo a imposiccedilatildeo de multa
coercitiva ou pessoal com a prisatildeo civil do devedor de alimentos Ademais adiciona Didier
et al19que
O estiacutemulo ao cumprimento da prestaccedilatildeo pode dar-se pelo temor (p ex multa coercitiva prisatildeo civil do devedor de alimentos divulgaccedilatildeo de notiacutecia em jornal revelando o descumprimento) ou pelo incentivo (p ex a chamada sanccedilatildeo premial ou sanccedilatildeo positiva de que eacute exemplo a isenccedilatildeo do pagamento de custas em caso de cumprimento do mandado monitoacuterio - art 701 sect 1ordm CPC a reduccedilatildeo pela metade dos honoraacuterios advocatiacutecios fixados inicialmente pelo juiacutezo em caso de pagamento integral do deacutebito pecuniaacuterio na execuccedilatildeo por quantia certa fundada em tiacutetulo extrajudicial - art 827 sect 1ordm CPC)
Por tais razotildees haacute uma tendecircncia em cada vez mais prestigiar os meios executivos
indiretos (coercitivos) posto que satildeo tatildeo eficazes quanto os meios executivos diretos
entretanto menos onerosos Contudo sua aplicaccedilatildeo deve ser fiscalizada a fim de natildeo permitir
que a execuccedilatildeo civil perca sua finalidade visto que eacute uma funccedilatildeo jurisdicional que tem como
escopo efetivar o direito do credor e natildeo de atender os interesses do devedor
23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
Os princiacutepios juriacutedicos nos uacuteltimos anos passaram a ser munidos de forccedila cogente
normatizando as condutas humanas tanto quanto as regras juriacutedicas Os ditos princiacutepios
ampliaram as margens de atuaccedilatildeo dos aplicadores do direito possibilitando a construccedilatildeo de
soluccedilotildees mais adequadas agraves especificidades das demandas que chegam ao judiciaacuterio
17 Ibid p 51 18 Ibid p 51 19 Ibid p 51-52
12 Dessa forma eacute necessaacuterio aprofundar-se nos princiacutepios norteadores da execuccedilatildeo civil
para que se obtenha uma anaacutelise completa da teoria geral da execuccedilatildeo
A execuccedilatildeo civil tem como um dos seus corolaacuterios o princiacutepio da efetividade este
consiste na exigecircncia de um sistema completo de tutela executiva no qual existam meios
executivos capazes de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor
de tutela executivardquo 20
O referido princiacutepio da efetividade eacute reforccedilado como normal fundamental do processo
civil brasileiro pelo art 4ordm do CPC ldquoArt 4ordm As partes tecircm o direito de obter em prazo razoaacutevel
a soluccedilatildeo integral do meacuterito incluiacuteda a atividade satisfativa
Jaacute o princiacutepio da boa feacute processual corolaacuterio do devido processo legal estaacute previsto
no art 5ordm do CPC ldquoAquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de
acordo com a boa-feacuterdquo Segundo o processualista baiano Fredie Didier21
O princiacutepio da boa-feacute extrai-se de uma claacuteusula geral processual A opccedilatildeo por uma claacuteusula geral de boa-feacute eacute a mais correta Eacute que a infinidade de situaccedilotildees que podem surgir ao longo do processo torna pouco eficaz qualquer enumeraccedilatildeo legal exaustiva das hipoacuteteses de comportamento desleal Daiacute ser correta a opccedilatildeo da legislaccedilatildeo brasileira por uma norma geral que impotildee o comportamento de acordo com a boa-feacute Em verdade natildeo seria necessaacuteria qualquer enumeraccedilatildeo das condutas desleais o art 5deg do CPC eacute bastante exatamente por tratar-se de uma claacuteusula geral
Dessa forma o dito princiacutepio preconiza que diante de um vinculo juriacutedico as pessoas
envolvidas natildeo poderatildeo frustrar a confianccedila do outro devendo comportar-se como se pode
esperar de uma pessoa de boa-feacute
Ademais disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial que ldquosomente o
patrimocircnio do devedor (art 789 CPC) ou de terceiro responsaacutevel pode ser objeto da
atividade executiva do Estadordquo 22
O referido princiacutepio que determina que somente o patrimocircnio submete-se agrave execuccedilatildeo
e natildeo a pessoa foi trazido pela humanizaccedilatildeo do direito Para o professor Didier et al23 o
20 DIDIER JR Freddie et al apud GUERRA Marcelo Lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do
credor na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 21 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte
geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 105 22 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 68
13
desenvolvimento dos meios de execuccedilatildeo indireta ldquoparece relativizar um pouco esse princiacutepio
na medida em que pressionam psicologicamente a pessoa do devedor para que cumpra a
obrigaccedilatildeo com seu comportamentordquo
Complementa ainda que
A responsabilidade executiva parece assumir atualmente caraacuteter hiacutebrido comportando coerccedilatildeo pessoal e sujeiccedilatildeo patrimonial
i) a coerccedilatildeo pessoal incide sobre a vontade do devedor admitindo o uso de medidas coercitivas de execuccedilatildeo indireta para forccedilaacute-lo a cumprir a obrigaccedilatildeo com seu proacuteprio comportamento (ex arts 139 rv 523 sect 1ordm 536 sect 1ordm e 538 sect 3ordm todos do CPC)
ii) descumprida a obrigaccedilatildeo e natildeo sendo possiacuteveladequado o uso de teacutecnica de coerccedilatildeo pessoal tem-se a sujeiccedilatildeo patrimonial que recairaacute sobre os bens do devedor ou de terceiro responsaacutevel - que responderatildeo pela proacutepria prestaccedilatildeo in natura (ex dar coisa ou entregar quantia) ou por perdas e danos24
Dessa forma o referido princiacutepio natildeo tem aplicaccedilatildeo absoluta em razatildeo do principio da
efetividade a qual estimula o uso dos meios de coerccedilatildeo indireta para garantir o cumprimento
da obrigaccedilatildeo pelo devedor
O princiacutepio da primazia da tutela especifica (ou princiacutepio do resultado) assevera que
ldquoA execuccedilatildeo deve ser especiacutefica propiciar ao credor a satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo tal qual
houvesse o cumprimento espontacircneo da prestaccedilatildeo pelo devedorrdquo 25
O CPC de 2015 absorveu todos os avanccedilos legislativos a cerca do mote O caput do
art 497 assegura que na accedilatildeo que tenha por objeto a prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer o
juiz se procedente o pedido concederaacute a tutela especiacutefica ou determinaraacute providecircncias que
assegurem a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico equivalente O art 499 o
complementa a obrigaccedilatildeo somente seraacute convertida em perdas e danos se o autor o requerer
ou se impossiacutevel agrave tutela especiacutefica ou a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico
equivalente
O princiacutepio do contraditoacuterio eacute garantido pela constituiccedilatildeo federal e compreende o
direito de ser ouvido o direito de acompanhar os atos processuais o direito de produzir
provas participar da sua produccedilatildeo manifestar-se sobre a prova produzida e obter do juiz a
23 Ibid p 69-70 24 Ibid p 70 25 Ibid p 71
14
respectiva valoraccedilatildeo o direito de ser informado regularmente dos atos praticados no processo
o direito agrave motivaccedilatildeo das decisotildees o direito de impugnar as decisotildees 26
O contraditoacuterio tem aplicaccedilatildeo em todo processo judicial sendo aplicaacutevel tambeacutem na
execuccedilatildeo No entanto o contraditoacuterio na execuccedilatildeo natildeo ocorre com a mesma intensidade que
no processo ou na fase de conhecimento eacute o que assevera Didier et al 27
O contraditoacuterio no procedimento executivo no aspecto do direito de defesa assegurado agrave parte demandada eacute eventual porquanto depende da provocaccedilatildeo do executado que natildeo eacute chamado ajuiacutezo para defender-se mas sim para cumprir a obrigaccedilatildeo O procedimento executivo adota a teacutecnica monitoacuteria que consiste basicamente na inversatildeo do ocircnus de provocar o contraditoacuterio o reacuteu em vez de citado para manifestar-se sobre a pretensatildeo do autor eacute convocado para cumprir uma determinada obrigaccedilatildeo
Logo haacute o contraditoacuterio no procedimento executivo porem eacute eventual quanto agrave defesa
do executado
Ademais o princiacutepio da menor onerosidade eacute consagrado pelo art 805 do CPC e
dispotildee que ldquoQuando por vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz
mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o executadordquo O referido princiacutepio tem o
escopo de impedir o abuso do direito pelo exequente
O principio da menor onerosidade auxilia o juiz na escolha de um meio executivo
adequado e necessaacuterio que satisfaccedila a prestaccedilatildeo exigida pelo credor Nesse sentido eacute o
entendimento do professor Fredie Didier et al 28
O resultado a ser alcanccedilado eacute aquele estabelecido pelo direito material A maneira de se chegar ateacute esse resultado eacute que deve ser a menos onerosa possiacutevel para o executado Isso significa que a opccedilatildeo pelo meio menos gravoso pressupotildee que os diversos meios considerados sejam igualmente eficazes Assim havendo vaacuterios meios executivos aptos agrave tutela adequada e efetiva do direito de creacutedito escolhe-se a via menos onerosa ao executado
O princiacutepio visa impedir a execuccedilatildeo desnecessariamente onerosa ao executado ou seja a execuccedilatildeo abusiva Em vez de enumerar situaccedilotildees em que a opccedilatildeo mais gravosa revelar-se-ia injusta o legislador valeu-se corretamente de uma claacuteusula geral para reputar abusivo qualquer comportamento do credor que pretender valer-se de meio executivo mais oneroso do que outro igualmente idocircneo agrave satisfaccedilatildeo do seu creacutedito
26 Ibid p 76 27 Ibid p 78 28 Ibid p 79-80
15 O princiacutepio da cooperaccedilatildeo tem como base os princiacutepios do devido processo legal da
boa-feacute processual e do contraditoacuterio O dito princiacutepio avigora a eacutetica processual com o
aprimoramento do diaacutelogo entre as partes reciprocamente e com o oacutergatildeo jurisdicional Eacute o
que preconiza o art 6ordm do CPC Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para
que se obtenha em tempo razoaacutevel decisatildeo de meacuterito justa e efetiva
No procedimento executivo o princiacutepio da cooperaccedilatildeo incide de diversas formas
disciplina Didier et al29 que na execuccedilatildeo
O executado tem o dever de indicar bens agrave penhora (art 774 V CPC) Natildeo encontrados bens penhoraacuteveis e natildeo havendo indicaccedilatildeo de qualquer um deles pelo exequente cabe ao executado declarar quais satildeo seus bens penhoraacuteveis sob pena de se sujeitar a uma sanccedilatildeo pecuniaacuteria compulsoacuteria
Tambeacutem eacute manifestaccedilatildeo do princiacutepio da cooperaccedilatildeo a exigecircncia de que o executado que pretende impugnar o valor da execuccedilatildeo apresente de logo o valor que reputa devido (art 525 sect 4ordm CPC) Seria comportamento natildeo-cooperativo afirmar que a cobranccedila eacute excessiva sem simultaneamente dizer qual eacute o valor correto
Demais disso aplicam-se agrave execuccedilatildeo os deveres que decorrem do princiacutepio da cooperaccedilatildeo e que satildeo imputados ao oacutergatildeo jurisdicional () Assim por exemplo deve o juiz advertir ao executado antes de puni-lo de que seu ato pode vir a caracterizar-se como atentatoacuterio agrave dignidade da jurisdiccedilatildeo ( art 772 II CPC) perceba que se trata de uma conduta compatiacutevel com o dever de prevenccedilatildeo O oacutergatildeo jurisdicional somente pode conhecer da prescriccedilatildeo ex officio dando a oportunidade de o exequente manifestar-se conforme impotildee o dever de consulta ( cf arts 10 487 paraacutegrafo uacutenico e 921 sect 5ordm CPC)
O princiacutepio ou postulado30 da proporcionalidade tem aplicaccedilatildeo muito relevante na
execuccedilatildeo O art 8 do CPC assegura que o oacutergatildeo jurisdicional tem o dever de observar a
proporcionalidade e a razoabilidade ao aplicar o ordenamento juriacutedico inclusive no
procedimento executivo
Ademais o art 805 do CPC eacute categoacuterico ao disciplinar que ldquoArt 805 Quando por
vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo
menos gravoso para o executadordquo O referido artigo jaacute se trata de uma concretizaccedilatildeo da
proporcionalidade
29 Ibid p 82 30 Segundo Fredie Didier et al haacute uma discussatildeo doutrinaacuteria sobre a proporcionalidade Parte da
doutrina acredita que a proporcionalidade eacute um princiacutepio e outra parte acredita que eacute um postulado normativo
16 O principio da adequaccedilatildeo pode ser vislumbrado em dois momentos do Direito
Processual ldquoa) no legislativo como orientador da confecccedilatildeo das leis b) no jurisdicional
autorizando ao juiz diante do caso concreto adaptar procedimento agraves suas peculiaridadesrdquo 31
Para Luceacutelia de Sena Alves e Tiago Retes32
Isso quer dizer que no momento legislativo o devido processo deve ser observado pelo legislador para a confecccedilatildeo das normas de direito processual que iratildeo servir de instrumento efetivo de concretizaccedilatildeo do direito substancial a ser tutelado atendendo a todas as suas finalidades sob pena de falecircncia do proacuteprio direito No momento jurisdicional da mesma forma a via processual escolhida pelo autor tambeacutem deve estar sujeita a este princiacutepio para que natildeo sofra as mesmas consequecircncias da sua inobservacircncia
O ordenamento juriacutedico deve ser aplicado por meio da teacutecnica processual adequada
evitando dessa forma uma tutela ineficaz
Por fim o princiacutepio do autorregramento da vontade na execuccedilatildeo tem o objetivo de
ldquo() preservar um espaccedilo processual para o exerciacutecio da liberdade e da vontade em que
sejam permitidas negociaccedilotildees que envolvam as partes ndash e tambeacutem o juizrdquo33 Didier et al34
assevera que
A rigor o legislador estabelece um regime juriacutedico de autorregramento da vontade processual identificando-se algumas manifestaccedilotildees relevantes para a execuccedilatildeo Na verdade pode-se dizer que poucos satildeo os ambientes mais propiacutecios do que a execuccedilatildeo para a negociaccedilatildeo sobre o processo Todos os institutos e normas processuais relativos agrave execuccedilatildeo devem ser repensados a partir da premissa de que o CPC permite uma ampla margem de liberdade de negociaccedilatildeo sobre o processo (art 190 CPC)
O autorregramento da vontade pode ser vislumbrando na previsatildeo de negoacutecios tiacutepicos
em sede de execuccedilatildeo como por exemplo no acordo das partes sobre o valor do bem que
dispensa a avaliaccedilatildeo disposto no inciso I do art 871 CPC Ademais dentro dos limites do art
190 do CPC eacute possiacutevel na execuccedilatildeo a atribuiccedilatildeo da negociaccedilatildeo atiacutepica aos sujeitos 31 ALVES Luceacutelia de Sena Alves RETES Tiago O poder geral de efetivaccedilatildeo das decisotildees judiciais e
proporcionalidade uma anaacutelise criacutetica acerca do art 139 IV do Novo Coacutedigo de Processo Civil Disponiacutevel em lthttpswwwacademiaedu31752652O_poder_geral_de_efetivaC3A7C3A3o_das_decisC3B5es_judiciais_e_a_proporcionalidade_uma_anC3A1lise_crC3ADtica_acerca_do_art_139_IV_do_Novo_CC3B3digo_de_Processo_Civil gt Acesso em 25 de julho de 2018
32 Ibid natildeo paginado 33 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 85 34 Ibid p 85
17
processuais permitindo que sejam feitas mudanccedilas nos procedimentos e nas situaccedilotildees
juriacutedicas processuais ldquoSatildeo exemplos de negoacutecios processuais atiacutepicos na execuccedilatildeo pacto de
penhorabilidade acordo de ampliaccedilatildeo de prazos das partes de qualquer natureza acordo de
rateio de despesas processuais ()rdquo35
24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO
Sempre houve diversos questionamentos quanto agrave eficaacutecia do Direito processual Civil
e se o mesmo era meio apto a assegurar a tutela jurisdicional dos direitos dos cidadatildeos O
processo de execuccedilatildeo eacute o setor que sofre mais criacuteticas quanto a sua ineficiecircncia afinal a
execuccedilatildeo civil sempre foi o ldquocalcanhar de Aquilesrdquo do sistema processual pela praxe do
ldquoganhou (no processo de conhecimento) mas natildeo levou (na fase de cumprimento ou
execuccedilatildeo)rdquo 36
Essa dificuldade de se efetivar a tutela satisfastiva natildeo se resume a um problema de
mera teacutecnica processual tiacutepico de determinado ordenamento mas representa uma prova de
fogo da capacidade dos instrumentos jurisdicionais O autor Leonardo Greco37 no ano de
2005 atribuiu esse fato as seguintes causas o excesso de processos o custo e a morosidade da
justiccedila a inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios a ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais
um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico e a progressiva volatizaccedilatildeo dos bens
Quanto ao excesso de processos o referido autor aduz que ldquonos grandes centros o
crescimento da maacutequina judiciaacuteria natildeo acompanhou a expansatildeo do nuacutemero de litiacutegiosrdquo 38
O custo e morosidade da justiccedila prejudicam a tutela satisfativa posto que
ldquojaacute desfalcado pelo inadimplemento do devedor o credor ainda tem de arcar com o adiantamento das despesas do processo de execuccedilatildeo e de eventual liquidaccedilatildeo vendo arrastar-se a marcha dos atos executoacuterios facilmente retardada por atos procrastinatoacuterios do devedorrdquo 39
35 Ibid p 86 36 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca
para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018
37 GRECCO Leonardo A Crise do Processo de Execuccedilatildeo in Estudos de direito processual Leonardo Greco ndash Campos dos Goytacazes Ed Faculdade de Direito de Campos 2005 p 7
38 Ibid p 7 39 Ibid p 7-8
18 A inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios contribui para a crise do processo de
execuccedilatildeo tendo em vista que
ldquoo juiz da execuccedilatildeo prisioneiro de ritos que o distanciam das partes e da realidade da vida impulsiona sem qualquer apetite a execuccedilatildeo conduzindo-a ao sabor dos ventos das provocaccedilotildees impacientes do credor e das costumeiras procrastinaccedilotildees do devedorrdquo 40
Jaacute ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais atrapalha a efetivaccedilatildeo da tutela satisfativa ldquoo
devedor natildeo colabora com a execuccedilatildeo e os meios de pressatildeo que a lei estabelece natildeo satildeo
suficientes para intimidaacute-lordquo 41
Com um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico
O espiacuterito empresarial e a sociedade de consumo estimulam o endividamento das pessoas e o inadimplemento das obrigaccedilotildees pelo devedor deixou de ser vexatoacuterio e reprovaacutevel o que multiplica as accedilotildees de cobranccedila e execuccedilotildees atraveacutes das quais o sujeito passivo ainda usufrui vantagens agraves custas do credor 42
Por fim Leonardo Greco elenca a volatizaccedilatildeo dos bens como o uacuteltimo fator que
macula o processo executo tendo em vista que
ldquomudou inteiramente o perfil patrimonial das pessoas antes concentrado em bens de raiz e agora tendencialmente dirigido a investimentos em tiacutetulos e valores facilmente negociaacuteveis o que dificulta a sua localizaccedilatildeo pelo credorrdquo 43
O Coacutedigo de Processo Civil de 1973 introduziu o sistema executivo ao ordenamento
juriacutedico paacutetrio e seguindo os valores liberais da eacutepoca com a proteccedilatildeo de esfera juriacutedica de
liberdade do cidadatildeo contra a possibilidade de arbiacutetrio do Estado e uso indevido do Poder
jurisdicional outorgou o miacutenimo de poder ao juiz Seguindo as regras do CPC de 73 o
devedor soacute poderia ter sua esfera juriacutedica invadida atraveacutes de meios de execuccedilatildeo instituiacutedos
previamente em lei
Diante de tantos obstaacuteculos para se efetivar a tutela satisfativa a execuccedilatildeo estava
fadada ao fracasso o que frustrava a expectativa do jurisdicionado a uma prestaccedilatildeo da tutela
jurisdicional ceacutelere e efetiva Insatisfeitos com o cenaacuterio que se encontrava a atividade
40 Ibid p 8 41 Ibid p8 42 Ibid p 8 43 Ibid p8
19
executiva legisladores e operadores do direito natildeo mediram esforccedilos para promover uma
evoluccedilatildeo significativa buscando mais eficiecircncia e celeridade ao procedimento executoacuterio
Dessa forma no final de 1994 foi introduzido no coacutedigo de processo agrave flexibilizaccedilatildeo
dos poderes executoacuterios do juiz ldquopara que ele pudesse prestar uma tutela efetiva aos direitos
ficando autorizado a determinar a modalidade de execuccedilatildeo adequada a cada hipoacutetese nas
obrigaccedilotildees de fazer e natildeo fazer (art 461 sect5ordm do CPC de 1973)rdquo No ano de 2002 a referida
medida foi estendida para as obrigaccedilotildees de entregar coisa (art 461-A caput e sect3ordm do CPC de
1973)
Com fundamento nos artigos 461 e 461-A em 2005 a Lei nordm 11 23205 unificou o
processo de conhecimento e o processo de execuccedilatildeo de sentenccedila Nesse sentido Maacuterio
Henrique Cavalcanti Gil Rodrigues44 aduz que
A Lei 112322005 reuniu de forma definitiva os processos de conhecimento e de execuccedilatildeo em um uacutenico processo composto por um sistema bifaacutesico Assim passa a existir uma fase inicial (de reconhecimento) e uma fase posterior (de cumprimento de sentenccedila de efetivaccedilatildeo da decisatildeo definitiva) sem contar com a eventual fase intermediaacuteria de liquidaccedilatildeo (RODRIGUES 2010 p 38)
Ademais as alteraccedilotildees realizadas no CPC de 73 inseriu a atipicidade dos meios
executivos nas obrigaccedilotildees de fazer natildeo fazer e dar coisa certa entretanto exercendo papel
subsidiaacuterio aos meios tiacutepicos
Quanto agraves obrigaccedilotildees de pagar quantia havia apenas a possibilidade de se valer da
incidecircncia de multa do art 475-J do CPC de 73 ndash implementada mediante reforma perpetrada
pela Lei nordm 11232 de 2005 em atendimento a doutrina processualista preocupada com a
efetividade das decisotildees ndash e de atos executivos como a penhora de bens e dinheiro
Ainda que a execuccedilatildeo tenha avanccedilado com a inserccedilatildeo das leis posteriores a 1994 no
CPC de 1973 a mesma continuava insuficiente tendo em vista que a burocracia e lentidatildeo
dos atos executivos davam brechas para que o devedor escondesse seu patrimocircnio penhoraacutevel
tornando carente de efetividade e celeridade agrave execuccedilatildeo
44 RODRIGUES Maacuterio Henrique Cavalcanti Gil A evoluccedilatildeo da execuccedilatildeo de sentenccedila no direito
processual civil e o novo regime juriacutedico das sentenccedilas apoacutes a reforma implementada pela Lei 112322005 Revista do Tribunal Regional Federal da 1ordf Regiatildeo v 22 n 2 fev 2010 p 38
20
25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO
A tutela juridiscional eacute um direito fundamental previsto no art 5ordm inciso XXXV da
Carta Magna ldquo() a lei natildeo excluiraacute da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio lesatildeo ou ameaccedila a
direitordquo
Na visatildeo claacutessica o direito de accedilatildeo era efetivado com a prolaccedilatildeo de uma sentenccedila de
meacuterito posiccedilatildeo adotada por grande parte dos processualistas seguidores da doutrina de
Liebman Todavia esse conceito se mostra defasado tendo em vista que o direito de acesso agrave
justiccedila natildeo eacute apenas uma garantia formal de bater as portas do judiciaacuterio mas a garantia de
acesso agrave ordem juriacutedica justa adequada e eficaz45
Acreditar que uma sentenccedila de meacuterito favoraacutevel eacute tutela jurisdicional suficiente para
satisfazer o que se busca com o ajuizamento da accedilatildeo eacute uma visatildeo distorcida da atividade
satisfativa ldquoSob o ponto de vista do direito material a condenaccedilatildeo por si soacute eacute incapaz de
prestar a tutela do direitordquo46
Nessa oacutetica o direito fundamental agrave tutela executiva exige um sistema de tutela
jurisdicional ldquocapaz de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor
de tutela executivardquo47 Dessa forma entende-se que
ldquo() a) a interpretaccedilatildeo das normas que regulamentam a tutela executiva tem de ser feita no sentido de extrair a maior efetividade possiacutevel b) o juiz tem o poder-dever de deixar de aplicar uma norma que imponha uma restriccedilatildeo a um meio executivo sempre que essa restriccedilatildeo natildeo se justificar como forma de proteccedilatildeo a outro direito fundamental c) o juiz tem o poder-dever de adotar os meios executivos que se revelem necessaacuterios agrave prestaccedilatildeo integral de tutela executivardquo48
Egrave imperioso compreender que o direito fundamental agrave tutela executiva ratificado
pelo CPC eacute essencial para dirimir diversos litiacutegios oriundos do procedimento executivo
45 FERREIRA Gabriela Macedo Poder geral de efetivaccedilatildeo em defesa da constitucionalidade da
teacutecnica de execuccedilatildeo dos direitos do art 139 IV do Coacutedigo de Processo Civil Revista Jus Navigandi ISSN 1518-4862 Teresina ano 22 n 5178 4 set 2017 Disponiacutevel em lthttpsjuscombrartigos60190gt Acesso em 11 set 2018
46 Ibid natildeo paginado 47 DIDIER JR Fredie et al apud GUERRA Marcelo lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do credor
na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 48 Ibid p 102-104
21
ldquoprincipalmente aqueles relacionados agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo49
Fredie Didier et al50 cita como exemplo as hipoacuteteses de impenhorabilidade
A impenhorabilidade de certos bens eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa
Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais
Por esta razatildeo o legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do
CPC fazendo um preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses das partes envolvidas
optando pela mitigaccedilatildeo do direito do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado
Quando o oacutergatildeo jurisdicional verificar que a aplicaccedilatildeo das regras de
impenhorabilidade eacute desproporcional para o caso concreto deve afastaacute-la e construir a
soluccedilatildeo adequada para o referido caso Didier et al51 traz um exemplo esclarecedor em sua
obra
O bem imoacutevel que serve de moradia da famiacutelia eacute relativamente impenhoraacutevel Objetiva-se com essa restriccedilatildeo proteger o direito fundamental agrave moradia conteuacutedo do direito agrave proteccedilatildeo da dignidade Imagine-se um imoacutevel de altiacutessimo valor Imagine-se agora um creacutedito que corresponda a 40 do valor do imoacutevel A venda judicial do imoacutevel no caso permitiria natildeo soacute satisfazer o direito do credor como ainda garantir ao executado com a sobra a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel que lhe preserve a dignidade A opccedilatildeo pela interpretaccedilatildeo literal da regra que veda a penhora protegeria exclusivamente o direito do executado de maneira desnecessaacuteria porque a relaccedilatildeo valor executadovalor do bem permitiria a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel apoacutes a entrega do dinheiro ao credor Seria pois interpretaccedilatildeo em desconformidade com os preceitos da contemporacircnea hermenecircutica constitucional que preconiza a necessidade de nos casos de choque entre direitos fundamentais dar a interpretaccedilatildeo que mais adequadamente proteja a ambos
A execuccedilatildeo civil integra o direito fundamental agrave tutela jurisdicional disciplinando
que ldquoos dispositivos devem ser interpretados de modo que se garanta a maior efetividade
49 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66 50 Ibid p 66 51 Ibid p 67
22
possiacutevel agrave execuccedilatildeo desde que respeitados outros direitos fundamentaisrdquo52 Podendo ser
afastada desde que proporcional qualquer obstaacuteculo irrazoaacutevel agrave efetivaccedilatildeo desse direito
52 FERREIRA Gabriela Macedo apud MACEDO Lucas Buril de As eficaacutecias das decisotildees judiciais e
o cumprimento de sentenccedila no CPC15 Novo CPC Doutrina selecionada v 5 Execuccedilatildeo Coordenador geral Fredie Didier Jr organizadores Lucas Buril de Macedo Ravi Peixoto Alexandre Freire ndash Salvador Jus Podivm 2015 p 360361
23
3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO
EXECUTADO
31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS
Como forma de controlar a atividade jurisdicional por muito tempo vigorou o
entendimento de que a execuccedilatildeo somente poderia ser realizada atraveacutes dos meios executivos
tipicamente previstos na legislaccedilatildeo Segundo Luiz Guilherme Marinoni53
O princiacutepio da tipicidade deseja significar que os meios de execuccedilatildeo devem estar previstos na lei e assim que a execuccedilatildeo natildeo pode ocorrer atraveacutes de formas executivas natildeo tipificadas O seu objetivo eacute de um lado impedir que meio executivo natildeo previsto em lei possa ser utilizado e de outro garantir o jurisdicionado contra a possibilidade de arbiacutetrio judicial na fixaccedilatildeo da modalidade executiva Se o jurisdicionado sabe em razatildeo de previsatildeo legal que a sua esfera juriacutedica somente poderaacute ser invadida atraveacutes de determinadas modalidades executivas confere-se a ele a possibilidade de antever a reaccedilatildeo ao seu inadimplemento bem como a garantia de que a jurisdiccedilatildeo natildeo determinaraacute ou permitiraacute a utilizaccedilatildeo de meio executivo diverso daqueles previstos
Dessa forma o princiacutepio da tipicidade disciplina que o oacutergatildeo julgador ao proceder agrave
execuccedilatildeo estaacute limitado aos meios executivos previamente definidos em lei natildeo podendo se
valer de qualquer teacutecnica de efetivaccedilatildeo que natildeo se encaixasse nas hipoacuteteses taxativas da
legislaccedilatildeo
Entretanto o legislador natildeo tem como prever todas as peculiaridades dos direitos
dignos de tutela executiva e preordenar teacutecnicas executivas diversas para cada peculiaridade
Sob esse cenaacuterio o principio da tipicidade foi cedendo lugar ao principio da atipicidade dos
meios executivos
A ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do oacutergatildeo julgador estaacute cada vez mais presente
no ordenamento juriacutedico paacutetrio motivando um poder geral de efetivaccedilatildeo ldquoque permite ao
julgador valer-se dos meios executivos que considerar mais adequado ao caso concreto sejam
eles de coerccedilatildeo direta sejam de coerccedilatildeo indiretardquo 54
53 MARINONI Luiz Guilherme Teacutecnica processual e tutela dos direitos Satildeo Paulo Editora Revista
dos Tribunais 2004 p 212 nota 79 54 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 100
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Essa tendecircncia de ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do juiz natildeo eacute exclusividade do
ordenamento juriacutedico brasileiro segundo Fredie Didier et al55
Michelle Taruffo jaacute apontava que o direito americano diante da inefetividade dos meios executivos at law comeccedilou a autorizar o magistrado a tomar medidas executivas adequadas ao caso concreto Trata-se afirma o jurista italiano de aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo segundo o qual as regras processuais devem ser adaptadas agraves necessidades do direito material
Os meios executivos atiacutepicos derivam de trecircs enunciados normativos do Coacutedigo de
Processo Civil o art 139 IV o art 297 e o sect1ordm do art 536
O art 139 IV do CPC dispotildee que pertence ao juiz o poder-dever de ldquodeterminar
todas as medidas indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para
assegurar o cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto
prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo
Jaacute o art 297 do CPC cuida da tutela provisoacuteria e garante que ldquoo juiz poderaacute
determinar as medidas que considerar adequadas para a efetivaccedilatildeo da tutela provisoacuteriardquo
Podendo dessa forma a dita tutela ser efetivada atipicamente
Por fim o art 536 sect1ordm do CPC dispotildee que
Para atender ao disposto no caput o juiz poderaacute determinar entre outras medidas a imposiccedilatildeo de multa a busca e apreensatildeo a remoccedilatildeo de pessoas e coisas o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva podendo caso necessaacuterio requisitar o auxilio de forccedila policial
As supracitadas medidas executivas atiacutepicas satildeo entendidas pela doutrina como
claacuteusulas gerais processuais executivas56 Essas claacuteusulas gerais natildeo restringem a sua
aplicaccedilatildeo agraves teacutecnicas de coerccedilatildeo indireta satildeo autorizados tambeacutem o uso de meios de execuccedilatildeo
dieta e indireta
Ademais cumpre salientar que o art 139 IV CPC aplica-se a toda e qualquer
atividade executiva ldquoa) seja fundada em tiacutetulo executivo judicial (provisoacuteria ou definitiva)
55 DIDIER JR Fredie et al apud TARUFFO Michelle A atuaccedilatildeo executiva dos direitos perfis
comparatiacutesticos Revista de Processo Satildeo Paulo RT 1990 n 59 p 78 56 Segundo Fredie Didier et al claacuteusula geral eacute uma espeacutecie de texto normativo cujo antecedente
(hipoacutetese faacutetica) eacute composto por termos vagos e consequente (efeito juriacutedico) eacute indeterminado
25
seja fundada em tiacutetulo executivo extrajudicial b) seja para efetivar prestaccedilatildeo pecuniaacuteria seja
para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer ou dar coisa distinta de dinheirordquo57
Jaacute o art 297 do CPC garante que a tutela provisoacuteria possa ser efetivada tambeacutem
atipicamente ldquoSucede que a atipicidade da tutela provisoacuteria segue necessariamente a
atipicidade da tutela definitivardquo 58
Por fim o comando do sect 1 ordmdo art 536 se aplica
a) inicialmente agrave execuccedilatildeo de fazer e de natildeo fazer fundada em decisatildeo judicial (provisoacuteria ou definitiva) b) por forccedila do sect 3ordm do art 538 tambeacutem se aplica ao cumprimento de sentenccedila para entrega de coisa c) por forccedila do art 771 paraacutegrafo uacutenico o dispositivo tambeacutem se aplica agrave execuccedilatildeo para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer e entregar coisa distinta de dinheiro fundada em tiacutetulo extrajudicial
Claramente o art 139 IV eacute mais amplo do que o sect 1 ordm do art 536 estende-se por
disposiccedilatildeo expressa agrave execuccedilatildeo de pagar quantia Sendo uma grande novidade nas obrigaccedilotildees
que tem por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15
O art 139 IV do CPC apresentou uma novidade agrave atipicidade dos meios executivos
ao disciplinar que cabe ao juiz ldquodeterminar todas as medidas indutivas coercitivas
mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o cumprimento de ordem judicial
inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo
A inovaccedilatildeo estaacute na possibilidade de utilizar os meios atiacutepicos para assegurar o
cumprimento de decisotildees que versam sobre as obrigaccedilotildees pecuniaacuterias sendo admitida a
utilizaccedilatildeo de outros meios ateacute na execuccedilatildeo de titulo judicial de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria aleacutem da
multa de 10 (a que se refere o artigo 523 sect 1ordm do CPC) para forccedilar o devedor a cumprir a
obrigaccedilatildeo pecuniaacuteria
57 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 105 58 Ibid p 105
26
Dessa forma eacute possiacutevel afirmar que ldquoao lado da disciplina tiacutepica do art 523 e
seguintes () o novo CPC inova ao permitir que o sistema de teacutecnicas executivas atiacutepicas
sejam empregadas na execuccedilatildeo monetaacuteriardquo59 (ZARONI VITORELLI 2016 p 66)
Fernando da Fonseca Gajardoni60 denomina a dita medida como a ldquorevoluccedilatildeo
silenciosardquo da execuccedilatildeo por quantia certa posto que
() pelo fato de que a regra natildeo estar propriamente incrustrada nos capiacutetulo e livro atinentes ao cumprimento de sentenccedila e ao processo de execuccedilatildeo ndash o art 139 IV do Novo CPC parece trazer ao paiacutes algo bastante novo cuja aplicaccedilatildeo a depender do comportamento do Judiciaacuterio pode implicar em verdadeira revoluccedilatildeo (positiva ou negativa) na sistemaacutetica executiva ateacute entatildeo vigente
Claramente o dispositivo foi recebido com entusiasmo por parte da doutrina que
anteciparam em afirmar que o princiacutepio da atipicidade dos meios executivos no CPC2015
ldquo() assume a feiccedilatildeo de poder-dever geral conferido ao magistrado de determinar () todas
as medidas coercitivas sub-rogatoacuterias mandamentais e indutivas que entender necessaacuterias
para a tutela justa efetiva e em tempo razoaacutevelrdquo 61
Dessa forma lecionam Luiz Guilherme Marinoni Seacutergio Cruz Arenhart e Daniel
Mitidiero62 que
O juiz a partir do art 139 IV do CPC2015 natildeo estaacute mais adstrito apenas agrave sentenccedila condenatoacuteria ndash que fixa a obrigaccedilatildeo de pagar e daacute ensejo agrave abertura da execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo patrimonial ndash para a tutela de prestaccedilotildees pecuniaacuterias Pode impor essa prestaccedilatildeo por meio de ordem judicial acoplada ao aceno de emprego de medida de induccedilatildeo (coercitiva ou de pressatildeo positiva) ou de medida de sub-rogaccedilatildeo (MARINONI ARENHARDT MITIDIERO 2015 p 703)
Deste modo em razatildeo do art 139 IV do CPC tem-se entendido que o juiz nas
execuccedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria possui a faculdade de adotar qualquer
59 ZARONI Bruno Marzullo VITORELLI Edilson Reforma e efetividade da execuccedilatildeo no novo CPC
In PEIXOTO Ravi FREIRE Alexandre MENDES Aluiacutesio Gonccedilalves de Castro Execuccedilatildeo 2 ed rev e atual Salvador JusPodivm 2016 766 p (Coleccedilatildeo novo CPC doutrina selecionada v 5) p 66
60 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia 24082015 JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Acesso em 23082018
61 LIMA Rafael de Oliveira A atipicidade dos meios executivos no coacutedigo de processo civil brasileiro de 2015 Revista de Processo Jurisdiccedilatildeo e Efetividade da Justiccedila v 2 n 2 juldez 2016 p 11
62 MARINONI Luiz Guilherme ARENHART Seacutergio Cruz MITIDIERO Daniel Novo curso de processo civil tutela dos direitos mediante procedimento comum Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 v 2 p 703
27
medida indutiva coercitiva mandamentais ou sub-rogatoacuterias para efetivar o creacutedito do
exequente natildeo se limitando as medidas tiacutepicas
Alguns doutrinadores se precipitaram ao afirmar que o dito dispositivo ldquo() autoriza o
juiz a utilizar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir ressalvando-se a prisatildeo
civil constitucionalmente limitada ao devedor de alimentosrdquo 63 Acreditam Jorge Bheron
Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa que o entusiasmo por parte da
doutrina abre margem para as mais variadas formas de compelir o devedor a cumprir com a
prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
ldquoE aiacute persistindo no mau vezo de fazer explicaccedilotildees em abstrato ignorando que o sentindo soacute se daacute na aplicaccedilatildeo (situaccedilatildeo concreta real ou fictiacutecia) as sugestatildeo satildeo as mais engenhosas suspensatildeo de CNH retenccedilatildeo de passaporte restriccedilatildeo de fim de semana cancelamento de cartotildees de creacutedito ndash para ficar apenas nestasrdquo 64
Ou seja podendo o juiz natildeo apenas substituir o devedor tomando seu patrimocircnio para
entregar ao credor na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia como tambeacutem poderaacute
pressionaacute-lo psicologicamente a adimplir por conta proacutepria a obrigaccedilatildeo
Ademais o Enunciado nordm 48 do ENFAM avalia expressamente a possibilidade de
imposiccedilatildeo de medidas coercitivas para a efetivaccedilatildeo da execuccedilatildeo pecuniaacuteria Conforme o dito
enunciado
ldquoO art 139 inciso IV traduz um poder geral de efetivaccedilatildeo permitindo a aplicaccedilatildeo de medidas atiacutepicas para garantir o cumprimento de qualquer ordem judicial inclusive no acircmbito do cumprimento de sentenccedila e no processo de execuccedilatildeo baseado em tiacutetulosrdquo
Dessa forma o artigo 139 IV do CPC permite uma gama ampla de interpretaccedilotildees por
parte da doutrina por ser uma claacuteusula geral encontrando limite apenas na imaginaccedilatildeo de
quem o analisa Nesse sentido eacute forccediloso orientar e delimitar o manejo desse artigo legal para
que se extraia seu sentido e alcance revelando assim sobre que situaccedilotildees ele incide de que
modo e o que permite
63 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
64 Ibid sem paginaccedilatildeo
28
32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER
GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
O artigo 139 IV com a vigecircncia do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 abriu margem
para uma constelaccedilatildeo de decisotildees nas quais o dito dispositivo recebeu diversas interpretaccedilotildees
pelos operadores do direito
Sem duacutevidas por ser uma das pioneiras a decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara
Ciacutevel do Foro Regional de Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-
1320138260011 na data de 25 de agosto de 2016 gerou um enorme rebuliccedilo
Nessa accedilatildeo que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto
uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a
suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o
passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito
Segundo a magistrada o processo tramitava haacute anos sem que nenhum valor tenha sido
pago ao exequente aleacutem do devedor natildeo ter oferecido proposta de acordo e nem ter indicado
bens agrave penhora configurando uma completa desiacutedia com o processo
ldquoO caso tratado nos autos se insere dentre as hipoacuteteses em que eacute cabiacutevel a aplicaccedilatildeo do art 139 inciso IV do Coacutedigo de Processo Civil Isso porque o processo tramita desde 2013 sem que qualquer valor tenha sido pago ao exequente Todas as medidas executivas cabiacuteveis foram tomadas sendo que o executado natildeo paga a diacutevida natildeo indica bens agrave penhora natildeo faz proposta de acordo e sequer cumpre de forma adequada as ordens judiciais frustrando a execuccedilatildeo
Se o executado natildeo tem como solver a presente diacutevida tambeacutem natildeo recursos para viagens internacionais ou para manter um veiacuteculo ou mesmo manter um cartatildeo de creacutedito Se poreacutem mantiver tais atividades poderaacute quitar a diacutevida razatildeo pela qual a medida coercitiva poderaacute se mostrar efetiva
Assim como medida coercitiva objetivando a efetivaccedilatildeo da presente execuccedilatildeo defiro o pedido formulado pelo exequente e suspendo a Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo do executado M A S determinando ainda a apreensatildeo de seu passaporte ateacute o pagamento da presente diacutevida
()
Determino ainda o cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado ateacute o pagamento da presente diacutevida ()rdquo
Foi impetrado Habeas Corpus no Tribunal de Justiccedila do Estado de Satildeo Paulo a favor
do executado sob o fundamento que a coaccedilatildeo era ilegal e afetava o direito de locomoccedilatildeo
29
garantido constitucionalmente Tendo sido concedida a liminar em decisatildeo que ora se
reproduz
Em que pese a nova sistemaacutetica trazida pelo art 139 IV do CPC2015 deve-se considerar que a base estrutural do ordenamento juriacutedico eacute a Constituiccedilatildeo Federal que em seu art 5ordm XV consagra o direito de ir e vir Ademais o art 8ordm do CPC2015 tambeacutem preceitua que ao aplicar o ordenamento juriacutedico o juiz natildeo atentaraacute apenas para a eficiecircncia do processo mas tambeacutem aos fins sociais e agraves exigecircncias do bem comum devendo ainda resguardar e promover a dignidade da pessoa humana observando a proporcionalidade a razoabilidade e a legalidade Por tais motivos concedo a liminar pleiteada65
Cabe destacar aqui o voto vencido da Desembargadora Maria Luacutecia Pizzotti no
julgamento do Habeas Corpus supracitado demonstrando que o debate sobre a abrangecircncia
do artigo 139 IV do CPC ocorre tanto na doutrina quanto no judiciaacuterio
O objetivo do novel dispositivo natildeo eacute impor penas ou restringir direitos natildeo sendo intenccedilatildeo do Judiciaacuterio suspender indefinidamente o direito de dirigir do executado ou sua liberdade de viajar mas sim impor uma restriccedilatildeo tatildeo gravosa caso ele natildeo cumpra a determinaccedilatildeo que escolha cumprir sua obrigaccedilatildeo e dar fim ao problema Em outras palavras mediante as medidas de coerccedilatildeo o Estado procura persuadir o inadimplente impondo-lhe situaccedilotildees tatildeo onerosas e inconvenientes que em algum momento seja para ele mais vantajoso cumprir do que permanecer no inadimplemento
Ao fazecirc-lo o Novo Coacutedigo de Processo Civil rompe com as criacuteticas da ineficiecircncia das execuccedilotildees Natildeo se cogita deferir medidas restritivas agravequeles que demonstram a incapacidade absoluta de solver o deacutebito apenas agravequeles que reconhecidamente se valem de artimanhas e subterfuacutegios para evitar a satisfaccedilatildeo das diacutevidas ldquopreferindordquo outras despesas mais lsquonobresrsquo agindo em nome de terceiros e fazendo escaacuternio dos credores e do proacuteprio Poder Judiciaacuterio (hellip)
Para tanto memoraacutevel a noccedilatildeo de que a medida em comento tem caraacuteter excepcional e encontra limites no plano da proporcionalidade como sustenta o ilustrado Magistrado paulista Fernando da Fonseca Gajardoni Professor Faculdade de Direito de Ribeiratildeo Preto da USP (in httpswwwjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 acesso em 091216 agraves 11h20min) E para anaacutelise da proporcionalidade a ponderaccedilatildeo deve observar os trecircs passos apontados pela doutrina a necessidade a adequaccedilatildeo e a proporcionalidade em sentido estrito
65 TJSP - Habeas Corpus Processo nordm 2183713-8520168260000 30ordf Cacircmara Direito Privado relator
Des Marcos Ramos j 290317
30
Ademais no entendimento de Jorge Amaury Maia Nunes e Guilherme Pupe de
Noacutebrega66 essa decisatildeo releva os perigos trazidos pelo art 139 IV do CPC ao confrontar
direitos constitucionalmente garantidos
De nossa parte entendemos que a liberdade de locomoccedilatildeo inserta no inciso XV do artigo 5ordm que abrange o direito de deixar o territoacuterio nacional sofre embaraccedilo indevido pela apreensatildeo de passaporte ou pela suspensatildeo da carteira nacional de habilitaccedilatildeo
()
Agrave luz da exposiccedilatildeo feita acima e em anaacutelise primeva sustentamos que o artigo 139 IV do CPC de 2015 estaacute a merecer declaraccedilatildeo de inconstitucionalidade sem reduccedilatildeo de texto para o fim de rechaccedilar a apreensatildeo de passaporte a suspensatildeo do direito de dirigir e a vedaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo em concurso ou em licitaccedilatildeo puacuteblicos como medidas passiacuteveis de serem adotadas pelo juiz sob pena de vulneraccedilatildeo aos artigos 1ordm IV 5ordm XV e LIV 37 I 173 sect 3ordm III e 175 todos da Constituiccedilatildeo
Apesar de ter sofrido duras criacuteticas a decisatildeo do processo de nordm 4001386-
1320138260011 serviu de inspiraccedilatildeo para tantas outras decisotildees no mesmo sentido
Foi o caso da decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de Satildeo
Vicente em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 0020724-2620088260590 na data de 21 de
junho de 2017
A supracitada execuccedilatildeo se arrastava por nove (09) anos sem que o devedor tenha
esboccedilado qualquer intenccedilatildeo de pagar a diacutevida O credor requereu a suspensatildeo da Carteira
Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado apreensatildeo do passaporte e cancelamento dos
cartotildees de creacutedito
O magistrado com embasamento no artigo 139 IV do CPC deferiu parcialmente o
pedido sob o fundamento de que a apreensatildeo de passaporte e CNH natildeo viola o direito de ir e
vir do devedor Entretanto o juiz indeferiu o pedido de cancelamento do cartatildeo de creacutedito por
acreditar que a suspensatildeo poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado tendo em
vista que atualmente as pessoas utilizam o referido cartatildeo para pagamento das despesas
diaacuterias
66 NOBREacuteGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139
IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018
31
Eacute evidente que as medidas atiacutepicas de coerccedilatildeo devem ser utilizadas com cautela sempre respeitando a dignidade da pessoa do executado Natildeo se vislumbra contudo que as medidas aqui eleitas sejam capazes de vulnerar os Direitos Fundamentais do indiviacuteduo A uma porque natildeo se trata de restriccedilatildeo ao direito de ir e vir do executado que continua no gozo de plena liberdade de locomoccedilatildeo a duas porque a conduccedilatildeo de veiacuteculo automotor eacute mera comodidade da vida moderna natildeo se tratando de direito absoluto
Com mais razatildeo ainda se admite a suspensatildeo do Passaporte do executado que se natildeo paga a diacutevida da execuccedilatildeo natildeo deve ter o direito de fazer viagem internacional
Tem-se aqui verdadeiro exerciacutecio de ponderaccedilatildeo de interesses juriacutedicos de um lado jaz o direito de creacutedito do exequente que deriva do direito de propriedade e por isso mesmo tem envergadura constitucional de outro giro tem-se o direito do executado agrave autorizaccedilatildeo do Estado para conduzir veiacuteculo automotor e realizar viagens internacionais que natildeo se mostram essenciais agrave dignidade da pessoa humana Natildeo haacute duacutevidas pois de que eacute este uacuteltimo que deve sucumbir
O pedido fica indeferido apenas no tocante agrave suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado Eacute que ao contraacuterio da CNH e do passaporte que trazem consigo certa presunccedilatildeo de riqueza natildeo se pode concluir que o uso de cartatildeo de creacutedito eacute feito por luxo ou simples conveniecircncia
Como eacute cediccedilo os cartotildees de creacutedito oferecem ao seu titular creacutedito raacutepido e rotativo para o pagamento de despesas diaacuterias e certamente exercem funccedilatildeo essencial agravequeles que se encontram em situaccedilatildeo financeira precaacuteria
A suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado portanto se revela medida desproporcional e que inclusive poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado
Pelo exposto defiro em parte o pedido formulado pelo exequente e DETERMINO a suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo e bem como a suspensatildeo da validade (cancelamento temporaacuterio) no sistema SINPA de eventuais passaportes vaacutelidos em nome do executado
Dessa forma o artigo 139 IV do CPC revolucionou completamente a execuccedilatildeo de
obrigaccedilatildeo de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria ao permitir a utilizaccedilatildeo do uso dos meios executivos
atiacutepicos para compelir o executado a satisfazer o creacutedito do exequente
33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE
EFETIVACcedilAtildeO
Era inevitaacutevel que o artigo 139 IV do CPC gerasse todo tipo de reaccedilatildeo entre os
doutrinadores do processo civil e ateacute mesmo de outros ramos do direito devido a sua
capacidade de realizar uma completa inovaccedilatildeo na forma de se executar as obrigaccedilotildees de pagar
quantia Alguns o aplaudiram visualizando nele ldquouma luz no fim do tuacutenelrdquo outros o
criticaram vislumbrando as arbitrariedades que poderiam ser praticadas com embasamento no
referido dispositivo
32
As decisotildees suscitadas em linhas preteacuteritas auxiliaram para fervilhar ainda mais o
debate sobre o tema tendo em vista que por um lado poderia aumentar a efetividade das
execuccedilotildees por quantia no entanto por outro surgiam questionamentos a cerca da sua
constitucionalidade
A doutrina parece que demoraraacute a se pacificar sobre o tema Segundo alguns
doutrinadores seraacute inconstitucional toda restriccedilatildeo que recaia sobre a pessoa do devedor e natildeo
exclusivamente sobre o seu patrimocircnio Jaacute para outros o dispositivo eacute constitucional e o meio
mais eficaz para se resolver o problema da efetivaccedilatildeo das execuccedilotildees de pagar quantia ldquoA
discussatildeo se daacute especialmente no que diz respeito aacutes medidas de suspensatildeo de CNH
apreensatildeo de passaporte e bloqueio de cartotildees de creacutedito do devedorrdquo 67
O professor Thiago Rodovalho analisou detalhadamente a decisatildeo de nordm 4001386-
1320138260011 em seu artigo ldquoO necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na
concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivosrdquo 68 Quanto agrave suspensatildeo da CNH o autor
acredita que tal medida natildeo viola qualquer direito fundamental do devedor posto que ldquodirigir
veiacuteculos automotores eacute direito do cidadatildeo mas natildeo se confunde com os direitos fundamentais
e social de ir-e-vir e ao transporterdquo 69 O professor eacute categoacuterico ao afirmar que
Com relaccedilatildeo agrave suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (suspensatildeo do direito de dirigir restriccedilatildeo de direitos) natildeo nos parece haver qualquer violaccedilatildeo a direito fundamental ou social nem a direito da personalidade ou colocaccedilatildeo do devedor em situaccedilatildeo desproporcionalmente detrimentosa exceccedilatildeo feita aos que usam o veiacuteculo como instrumento de trabalho atraindo a hipoacutetese do NCPC art 833 inc V
()
Outrossim natildeo o consideramos como direito da personalidade Os direitos da personalidade satildeo os valores fundamentais que compotildeem o proacuteprio ser justamente por isso intransmissiacuteveis e irrenunciaacuteveis natildeo podendo o seu exerciacutecio sofrer limitaccedilatildeo voluntaacuteria (CC art 11) Por mais que vivamos num paiacutes que tanto valoriza o carro e que muitas pessoas de fato se compreendam em razatildeo e em funccedilatildeo do carro que dirijam este natildeo nos parece ser um direito que verdadeiramente componha a personalidade do indiviacuteduo70
67 DONTOS Sofia Poderes executoacuterios do juiz que diz a doutrina sobre o art 139 inc IV do CPC
Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigospoderes-executorios-do-juiz-que-diz-a-doutrina-sobre-art-139-inc-iv-do-cpc-23052018 gt Publicado em 23052018 Acesso em 01082018
68 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018
69 Ibid sem paginaccedilatildeo 70 Ibid sem paginaccedilatildeo
33
Quanto ao cancelamento dos cartotildees de credito do devedor o professor Thiago
Rodovalho tambeacutem acredita que natildeo haacute qualquer violaccedilatildeo ao direito fundamental social ou
da personalidade do devedor e acrescenta que
Tanto assim o eacute que ser titular de um cartatildeo de creacutedito pressupotildee ter creacutedito o que eacute analisado e concedido por instituiccedilotildees financeiras mais do que isso se porventura passando por dificuldades financeiras a pessoa deixa de honrar com pagamentos a mesma instituiccedilatildeo financeira concedente do cartatildeo de creacutedito pode sponte propria cancelaacute-lo ou recusar-lhe a concessatildeo Ora parece-me contraditoacuterio que instituiccedilotildees financeiras para sua proteccedilatildeo patrimonial possam ferir esse suposto ldquodireito fundamentalrdquo ou esse suposto ldquodireito da personalidaderdquo mas natildeo possa o Poder Judiciaacuterio igualmente fazecirc-lo contra aquele devedor moroso que instado ao pagamento e frustradas todas as tentativas de constriccedilatildeo patrimonial leva vida luxuosa valendo-se de cartotildees de creacutedito que prescindem de dinheiro em conta eacute dizer podem justamente funcionar como forma de ocultar renda e patrimocircnio71
O autor considera a apreensatildeo de passaporte um tema mais polecircmico e que merece
maior reflexatildeo No entanto crecirc que eacute possiacutevel a apreensatildeo de passaporte sem violar os
direitos fundamentais do devedor por se tratar de um direito de ir e vir de amplitude especial
Agrave primeira vista a possibilidade de apreensatildeo do passaporte tambeacutem nos parece possiacutevel pois tambeacutem se trata de um direito de ir e vir de amplitude especial Assim o eacute pois salvo situaccedilotildees especiais (refugiados p ex) haacute a necessidade de demonstrar condiccedilotildees financeiras de estadia e retorno para ser admitido no paiacutes de destino Ou seja pressupotildee uma condiccedilatildeo financeira que o devedor justamente diz natildeo possuir Sem embargo dessa consideraccedilatildeo esse ainda eacute um ponto que merece uma reflexatildeo mais acurada sendo essa apenas uma primeira impressatildeo72
Outros autores escreveram sobre o tema como eacute o caso do processualista Luiz
Dellore73 que tambeacutem defende que as medidas atiacutepicas como restriccedilatildeo ao direito de dirigir
apreensatildeo de passaporte e cancelamento de cartotildees de creacutedito satildeo permitidas e natildeo violam em
regra os direitos fundamentais do devedor
De minha parte creio que efetivamente haacute inovaccedilatildeo no at 139 IV do NCPC (e natildeo mera repeticcedilatildeo do que jaacute havia no Coacutedigo anterior) que tem o condatildeo de trazer mais efetividade ao processo executivo no Brasil ndash que por deacutecadas centrou sua atenccedilatildeo na defesa do executado (vide a grande quantidade de impenhorabilidades) sem dar maior atenccedilatildeo ao creacutedito do exequente
71 Ibid sem paginaccedilatildeo 72 Ibid sem paginaccedilatildeo 73 DELLORE Luiz NCPC Atipicidade das medidas executivas jaacute eacute realidade Disponiacutevel em lt
httpswwwjotainfoopiniao-e-analisecolunasnovo-cpcncpc-atipicidade-de-medidas-executivas-ja-e-realidade-17042017 gt Publicado em 17042017 Acesso em 03092018
34
Logo a meu ver medidas como (i) restriccedilatildeo ao direito de dirigir (ii) apreensatildeo de passaporte (iii) cancelamento de cartotildees de creacutedito e (iv) vedaccedilatildeo de obtenccedilatildeo de novos empreacutestimos se natildeo vinculados ao pagamento do deacutebito exequendo dentre outras restriccedilotildees que deveratildeo ser observadas a cada caso satildeo permitidas pelo sistema do NCPC e em regra natildeo violam direitos fundamentais do devedor E tecircm o condatildeo de fazer com que o executado que tem recursos diante dessas medidas coercitivas pague o deacutebito trazendo sucesso agrave satisfaccedilatildeo do creacutedito
Nessa linha para Alexandre Fuchs das Neves74 o artigo 139 IV do CPC conferiu ao
juiz poderes coercitivos capazes de ldquotransformar a vida do devedor um infernordquo para compeli-
lo a cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria Entretanto pondera que para que a medida tenha
validade ldquoeacute necessaacuteria uma fundamentaccedilatildeo por evidente uma correlaccedilatildeo temaacutetica entre a
medida adotada e sua efetividade em face ao processo com fundamentaccedilatildeo detalhadardquo
No entendimento de Fernando Gajardoni75 satildeo possiacuteveis as medidas de apreensatildeo de
passaporte bloqueio de cartotildees de creacutedito e suspensatildeo da CNH Para ele o que limita o art
139 IV do CPC eacute o esgotamento dos meios tiacutepicos e a real necessidade da medida
Ilustrativamente natildeo efetuado o pagamento de diacutevida oriunda de multas de tracircnsito e superados os expedientes tradicionais de adimplemento (penhora de dinheiro e bens) seria liacutecito o estabelecimento da medida coercitivaindutiva de suspensatildeo do direito a conduzir veiacuteculo automotor ateacute pagamento do deacutebito (inclusive com apreensatildeo da CNH do devedor) natildeo efetuado pagamento de verbas salariais devidas a funcionaacuterios da empresa possiacutevel o estabelecimento de vedaccedilatildeo agrave contrataccedilatildeo de novos funcionaacuterios ateacute que seja saldada a diacutevida natildeo efetuado o pagamento de financiamento bancaacuterio na forma e no prazo avenccedilados possiacutevel ateacute que se tenha a quitaccedilatildeo que se obstem novos financiamentos ou mesmo a participaccedilatildeo do devedor em licitaccedilotildees (como de ordinaacuterio jaacute acontece com pessoas juriacutedicas em deacutebito tributaacuterio com o Poder Puacuteblico) etc
Teriacuteamos entatildeo no Brasil por assim dizer a adoccedilatildeo do padratildeo da atipicidade das medidas executivas tambeacutem para as obrigaccedilotildees de pagar vistas estas como ordens do EstadoJuiz para que haja prestaccedilatildeo de pagamento em pecuacutenia
()
Por isso ndash a prevalecer a interpretaccedilatildeo potencializada do art 139 IV do CPC2015 ndash o emprego de tais medidas coercitivasindutivas especialmente nas obrigaccedilotildees de pagar encontraraacute limite certo na excepcionalidade da medida (esgotamento dos meios tradicionais de satisfaccedilatildeo do deacutebito) na proporcionalidade (inclusive agrave luz da regra da menor onerosidade ao devedor do art 805 do CPC2015) na necessidade de fundamentaccedilatildeo substancial e especialmente nos direitos e garantias assegurados na Constituiccedilatildeo Federal (vg natildeo parece possiacutevel que se determine o pagamento sob pena de prisatildeo ou de vedaccedilatildeo ao exerciacutecio da profissatildeo do direito de ir e vir etc)
74 NEVES Alexandre Fuchs das Cancelamento de cartotildees de creacutedito e apreensatildeo de CNH e passaporte
do devedor Isso eacute possiacutevel Disponiacutevel em lt httpwwwsinfacspcombrconteudocancelamento-de-cartoes-de-credito-e-apreensao-de-cnh-e-passaporte-do-devedor-isso-e-possivel gt Acesso em 30082018
75 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Publicado em 24082015 Acesso em 30082018
35
Jaacute Fernanda Tartuce76 acredita que tais medidas satildeo problemaacuteticas e devem ser
analisadas com cautela tendo em vista que ao inveacutes de afetarem o patrimocircnio do devedor
atingem a proacutepria pessoa
Sob certo prisma adotar medidas diferenciadas contribui para a efetividade da prestaccedilatildeo jurisdicional Por outro lado o patrimocircnio ndash e natildeo a pessoa do devedor - responde por diacutevidas aleacutem disso o exerciacutecio de amplos poderes pelo juiz sem balizas especiacuteficas pode ensejar medidas inadequadas Nessa linha suspender o direito de dirigir e restringir o uso de passaporte satildeo iniciativas problemaacuteticas por atingirem a pessoa do devedor enquanto a penhora da restituiccedilatildeo de Imposto de Renda soa viaacutevel por afetar seu patrimocircnio Eacute importante que a medida diferenciada se revele proporcional e seja aplicada apoacutes o exaurimento de outros meios previstos no ordenamento Como a proposta do Novo Coacutedigo eacute aumentar a eficiecircncia processual intentar medidas ineficazes inexequiacuteveis eou de difiacutecil fiscalizaccedilatildeo pode acabar ensejando o efeito contraacuterio
Nessa senda Lenio Streck e Dierle Nunes77 entendem que as medidas atiacutepicas de
suspensatildeo da CNH eou apreensatildeo de passaporte satildeo inconstitucionais Afirmam que natildeo se
pode confundir o processo civil e penal ainda que ambos remetam a um ldquoparadigma
constitucional comumrdquo e que o artigo 139 IV do CPC ldquoimpotildee novos desafios interpretativos
que podem conduzir a uma anaacutelise superficial e utilitarista de busca de resultados que
desprezem a necessaacuteria leitura constitucionalrdquo Os autores ainda ponderam que ldquoO perigo eacute o
artigo 139 IV ser transformado em instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com
autorizaccedilatildeo judicialrdquo
O professor Araken de Assis no dia 18 de abril de 2018 em um evento sobre o
Coacutedigo Processual Civil de 2015 que ocorreu em Brasiacutelia na sede do Conselho Federal da
OAB declarou ser contraacuterio aos poderes executoacuterios atiacutepicos ldquoSou contra os poderes
atiacutepicos dos juiacutezes porque seu exerciacutecio redunda em simples arbitrariedadesrdquo78
Acrescentou ainda que
76 IBDFAM ndash Instituto Brasileiro de Famiacutelia O polecircmico inciso IV do artigo 139 do CPC e suas difusas
interpretaccedilotildees Disponiacutevel em lt httpwwwibdfamorgbrnoticias6096O+polC3AAmico+inciso+IV+do+artigo+139+do+CPC+e+suas+difusas+interpretaC3A7C3B5es gt Publicado em 31082016 Acesso em 04092018
77 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018
78 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04092018
36
Eacute evidentemente inconstitucional diante do princiacutepio da dignidade da pessoa humana tirar o passaporte carteira de habilitaccedilatildeo Quecirc que tem isso com diacutevidas Natildeo tem absolutamente nada Natildeo eacute a correlaccedilatildeo instrumental entre o objetivo da execuccedilatildeo e o meio empregado Isso eacute simples vinganccedila simples puniccedilatildeo79
O professor Araken de Assis acredita que tais medidas satildeo inconstitucionais e
violam o principio da dignidade humana do executado numa sociedade como a nossa
sedenta por puniccedilatildeo natildeo me surpreende que essas ideias sejam encaradas com
naturalidade Mas eacute preciso rejeitaacute-las em nome de princiacutepios 80
34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
A Constituiccedilatildeo Federal de 1988 tem como um dos seus fundamentos a dignidade da
pessoa humana presente no artigo 1ordm inciso III do referido texto constitucional O dito
princiacutepio tem o escopo de nortear o ordenamento juriacutedico como um todo
A inclusatildeo da dignidade da pessoa humana como princiacutepio constitucional obrigou
uma reflexatildeo sobre o papel da pessoa humana no direito e um redimensionamento para
elevaacute-la ao centro do ordenamento juriacutedico81 Eacute necessaacuterio recorrer agrave teoria Kantiana para
que se obtenha uma definiccedilatildeo do princiacutepio ora estudado Para Kant82 o homem eacute um fim
em si mesmo natildeo uma funccedilatildeo do Estado Ou Naccedilatildeo O Estado e o direito devem estar
organizados em benefiacutecio do indiviacuteduo
Agora eu afirmo o homem ndash e de uma maneira geral todo o ser racional ndash existe como fim em si mesmo e natildeo apenas como meio para o uso arbitraacuterio desta ou daquela vontade Em todas as suas accedilotildees pelo contraacuterio tanto nas direcionadas a ele mesmo como nas que o satildeo a outros seres racionais deve ser ele sempre considerado simultaneamente como fim
Partindo da premissa de que para Immanuel Kant o homem eacute o fim em si mesmo
ldquodevemos compreender que a dignidade da pessoa humana eacute a noccedilatildeo o comando a direccedilatildeo
que se deve seguir funcionando como fundamento para a interpretaccedilatildeo de todos os direitos e
garantias conferidos agrave pessoa nos ordenamentos juriacutedicos de cada Estadordquo 83
79 Ibid sem paginaccedilatildeo 80 Ibid sem paginaccedilatildeo 81 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito
fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 461 82 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud KANT Immanuel Fundamentaccedilatildeo da metafiacutesica dos costumes
Satildeo Paulo Martin Claret 2003 p56-59 Coleccedilatildeo A Obra-Prima de Cada Autor 83 SCHIAFIANO Juliana Rocha op cit p 461
37
O princiacutepio constitucional da dignidade da pessoa humana estaacute diretamente ligado ao
conteuacutedo dos direitos fundamentais logo para que se cumpra com os direitos fundamentais
constitucionalmente instituiacutedos eacute necessaacuterio reconhecer e respeitar a dignidade da pessoa
humana conforme disciplina Ingo Sarlet84
Em suma o que se pretende sustentar de modo mais enfaacutetico eacute que a dignidade da pessoa humana na condiccedilatildeo de valor (principio normativo) fundamental que atrai o conteuacutedo de todos os direitos fundamentais exige e pressupotildee o reconhecimento e proteccedilatildeo dos direitos fundamentais de todas as dimensotildees (ou geraccedilotildees se assim preferirmos) Assim sem que se reconheccedilam agrave pessoa humana os direitos fundamentais que lhe satildeo inerentes em verdade estarse-aacute lhe negando a proacutepria dignidade A consagraccedilatildeo constitucional da dignidade da pessoa humana tem o propoacutesito de limitar a atuaccedilatildeo ou a omissatildeo do Estado para garantir os direitos do indiviacuteduo Assim eacute difiacutecil precisar os efeitos da norma que determina a dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado (como acontece com a Constituiccedilatildeo brasileira de 1988) poreacutem quando desrespeitados os direitos fundamentais do cidadatildeo eacute possiacutevel identificar que a dignidade deste foi violada
Logo ldquoteraacute respeitada a sua dignidade o individuo que tiver respeitados os seus
direitos fundamentaisrdquo 85 Os direitos fundamentais estatildeo apresentados na Constituiccedilatildeo
Federal da seguinte forma direitos individuais e coletivos direitos sociais direitos poliacuteticos e
direitos de nacionalidade que tecircm como escopo garantir as liberdades positivas aos
indiviacuteduos ldquoonde foram conquistados direitos agrave liberdade religiosa liberdade civil e
profissional agrave propriedade ao livre acesso ao Judiciaacuterio agrave ampla defesa e ao contraditoacuterio no
processual judicial ao sigilo de dados e informaccedilotildees pessoais entre outros que somados
garantem o cidadatildeo uma vida dignardquo 86
O cidadatildeo na Constituiccedilatildeo Federal de 88 diferente das constituiccedilotildees brasileiras
anteriores passou a ser fundamento e ganhou destaque nos direitos fundamentais tendo
garantida a sua vida a sua dignidade a sua seguranccedila a sua honra a sua liberdade e a sua
propriedade
84 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud SARLET Ingo Wolfgang Dignidade da pessoa humana e
direitos fundamentais na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 2ed Porto Alegre Livraria do Advogado 2002 p87 85 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito
fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 462 86 Ibid p 462
38
Segundo Carmem Luacutecia Antunes Rocha87 para garantir o Estado Democraacutetico de
Direito eacute necessaacuterio que a sua atuaccedilatildeo seja sempre em conformidade com o princiacutepio da
dignidade da pessoa humana
O Estado somente eacute democraacutetico em sua concepccedilatildeo constitucionalizaccedilatildeo e atuaccedilatildeo quando respeita o princiacutepio da dignidade da pessoa humana Natildeo haacute verbo constitucional natildeo haacute verbo governamental que se faccedilam legiacutetimos quando natildeo se voltam ao atendimento daquele princiacutepio Natildeo haacute verdade constitucional natildeo haacute suporte institucional para as poliacuteticas puacuteblicas que natildeo sejam destinadas ao pleno cumprimento daquele valor maior transformado em princiacutepio constitucional
O princiacutepio da dignidade humana constitucionalmente garantido impotildee limites ao
Estado compelindo aos oacutergatildeos e atividades estatais respeitar o ser humano e garanti-lo
condiccedilotildees miacutenimas para uma vida digna Dessa forma eacute niacutetido que o dito princiacutepio eacute
pressuposto e indispensaacutevel para legitimar outras normas constitucionais e
principalmente infraconstitucionais
O Coacutedigo de Processo Civil eacute umas das principais normas infraconstitucionais que
sofre influecircncia dos preceitos valores e princiacutepios esculpidos na Constituiccedilatildeo Federal
Logo como o principio da dignidade humana eacute um dos mais importantes pressupostos
constitucionais ldquoentatildeo eacute tranquilo afirmar-se que o novel ordenamento processual tem
de se render nas resoluccedilotildees dos aspectos processuais e a fim de se atingir uma soluccedilatildeo
justa adequada e efetiva ao postulado da dignidade da pessoa humanardquo 88
Dessa forma o legislador deve formular as normas infraconstitucionais de acordo e a
partir do conteuacutedo constitucional para Marinoni Mitidiero e Arenhart89
() o Coacutedigo de Processo Civil constitui direito constitucional aplicado O Coacutedigo deve ser interpretado de acordo com a Constituiccedilatildeo e com os direitos fundamentais o que significa que as duacutevidas interpretativas devem ser resolvidas a favor da otimizaccedilatildeo do alcance da Constituiccedilatildeo e do processo civil como meio para tutela de direitos
87 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud ROCHA Carmen Luacutecia Antunes O princiacutepio da dignidade da
pessoa humana e a exclusatildeo social Revista Interesse Puacuteblico n4 p23-48 1999 p33 88 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o
novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 367
89 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 14
39
Com o escopo de conferir eficaacutecia aos mandamentos constitucionais o CPC15 traz a
previsatildeo e diversas claacuteusulas gerais em seus primeiros artigos em um dos quais se
prestigia o princiacutepio da dignidade da pessoa humana
O referido princiacutepio estaacute disciplinado no artigo 8ordm do CPC15 e atua como um guia
sobre as demais normas do coacutedigo processual Eacute o que entende Nelson Rosenvald90
O maior cuidado do inteacuterprete eacute no sentido de jamais banalizar a dignidade fazendo dela um elixir processual tal como muitas vezes se vecirc na esfera do direito civil Penso que natildeo haacute maiores dificuldades em transpor a noccedilatildeo constitucional do princiacutepio para em seguida adaptaacute-la agraves singularidades do processo
Logo de acordo com o artigo 8ordm do CPC o oacutergatildeo julgador ao aplicar o ordenamento
juriacutedico deve resguardar a dignidade da pessoa humana Para Fredie Didier91 ldquoresguardar
nesse contexto eacute de um lado aplicar corretamente a norma juriacutedica lsquoproteccedilatildeo da dignidade
da pessoa humanarsquo e de outro natildeo violar a dignidaderdquo
O oacutergatildeo julgador deveraacute manter um comportamento ativo com o objetivo de promover
a dignidade da pessoa humana podendo tomar medidas de ofiacutecio para efetivar a dignidade da
pessoa humana Didier assevera que o magistrado poderaacute ainda ldquovaler-se da claacuteusula geral de
atipicidade (art 536 sect 1ordm) para a execuccedilatildeo do direito fundamental agrave dignidaderdquo 92 O autor
ainda traz dois exemplos
a) exigecircncia de respeito agrave ordem cronoloacutegica de conclusatildeo (art 12) caso de grave violaccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana que natildeo se encaixe em um dos incisos que excepcionam a regra de observacircncia da cronologia da conclusatildeo poderia o juiz ldquofurar a filardquo para promover a dignidade da pessoa humana b) prioridade na tramitaccedilatildeo processual pessoa que seja portadora de doenccedila grave mas que natildeo esteja no rol do art 1048 I para promover a dignidade de pessoa humana o juiz poderia determinar o processamento prioritaacuterio93
Essa dupla garantia ndash resguardo e promoccedilatildeo ndash tem como objetivo garantir ao individuo
sua dignidade humana fazendo com que ldquode um lado que o Estado natildeo a viole e de outro
que o Estado a promova e efetiverdquo
90 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud ROSENVALD Nelson A
dignidade da pessoa humana no CPC15 91 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte
geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 75 92 Ibid p 75 93 Ibid p 75
40
Nessa senda o magistrado deveraacute promover a dignidade da pessoa humana quando
perceber a ausecircncia desta no processo ou assegura-la quando for posta em risco Eacute nesse
sentido o entendimento dos professores Marinoni Mitidiero e Arenhart94
() a dignidade da pessoa humana determina a compreensatildeo do processo civil como um meio para tutela dos direitos Vale dizer o processo civil natildeo pode ser visto como um instrumento a serviccedilo do Estado como um instrumento que natildeo se encontre orientado agrave realizaccedilatildeo dos fins da pessoa humana Em outras palavras o processo civil serve para realizaccedilatildeo dos direitos e para orientaccedilatildeo das pessoas a respeito do significado do direito
Nessa senda compete tanto ao juiz quanto as demais partes processuais garantirem ldquoo
valor intriacutenseco de cada vida que eacute trazida ao processordquo nas palavras de Alexandre Freitas
Cacircmara95
() aos sujeitos do processo eacute preciso sempre ter claro que os titulares dos interesses em conflitos satildeo pessoas reais cujas vidas seratildeo afetadas pelo resultado do processo e que por isso mesmo tecircm o direito de estabelecer suas estrateacutegias processuais de acordo com aquilo que lhes pareccedila melhor para suas vidas Eacute inadmissiacutevel tratar as partes como se natildeo fossem pessoas reais meros dados estatiacutesticos Afinal se para o Judiciaacuterio cada processo pode parecer apenas mais um processo para as partes cada processo pode ser o uacutenico o mais relevante aquele em que sua vida seraacute decidida E eacute dever do juiz assegurar que isto seja respeitado
Dessa forma eacute necessaacuterio que um arcabouccedilo normativo para que seja conferida
eficaacutecia e proteccedilatildeo ao principio da dignidade da pessoa humana
Logo o dito princiacutepio deve ser protegido em todas as esferas do ordenamento juriacutedico
inclusive no campo da execuccedilatildeo civil onde sofre grandes riscos de ser violado em nome do
direito fundamental agrave tutela executiva do credor ldquoPartir da premissa de que existe um direito
fundamental agrave tutela executiva ora ratificado pelo CPC eacute indispensaacutevel para a soluccedilatildeo de
diversos problemas oriundos do procedimento executivo principalmente aqueles relacionados
agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo 96
94 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme
MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 25
95 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CAcircMARA Alexandre Freitas O Novo Processo Civil Brasileiro 2 ed Satildeo Paulo Atlas 2016 p 7
96 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66
41
Eacute o caso por exemplo da impenhorabilidade Segundo Fredie Didier et al97 a
impenhorabilidade eacute uma forma de proteger certos bens do devedor do direito fundamental a
execuccedilatildeo do credor
Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa
Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais
O legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do CPC fazendo um
preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses em anaacutelise ao optar pela mitigaccedilatildeo do direito
do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado Afinal ldquoa execuccedilatildeo natildeo pode ser utilizada
como instrumento para causar a ruiacutena a fome e o desabrigo do devedor e sua famiacutelia gerando
situaccedilotildees incompatiacuteveis com a dignidade da pessoa humana 98
Logo a impenhorabilidade de certos bens
[] Eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa99
Eacute nesse sentido que o CPC15 enumera diversos casos de bens patrimoniais que satildeo
impenhoraacuteveis como o salaacuterio e vencimentos utensiacutelios necessaacuterios ao exerciacutecio da
profissatildeo seguro de vida vestuaacuterios e pertences de uso pessoal entre outros
Dessa forma as regras relativas agraves medidas executivas devem ser interpretadas agrave luz
da Constituiccedilatildeo Federal ldquovez que se voltam agrave realizaccedilatildeo de direitos fundamentais e em sua
97 Ibid p 66 98 THEODORO JUacuteNIOR Humberto Novo Coacutedigo de Processo Civil Anotado 20 ed Rio de Janeiro
Forense 2016 p 978 99 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud DIDIER JR Fredie CUNHA
Leonardo Carneiro da BRAGA Paula Sarno OLIVEIRA Rafael Alexandria de Curso de direito processual civil 3 ed Salvador JusPodivm 2011 v 5 p 547
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realizaccedilatildeo podem atingir direitos fundamentaisrdquo 100 O Superior Tribunal de Justiccedila jaacute decidiu
que
O rol das impenhorabilidades do ordenamento paacutetrio objetiva preservar o miacutenimo patrimonial necessaacuterio agrave existecircncia digna do executado impondo ao processo executoacuterio certos limites Assim a depender das peculiaridades do caso as regras de impenhorabilidade podem ser ampliadas de modo a adequar a tutela aos direitos fundamentais como por exemplo o direito agrave moradia agrave sauacutede ou agrave dignidade da pessoa humana Trata-se portanto da aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo e da necessidade sob o enfoque da proporcionalidade101 (STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014)
Logo a interpretaccedilatildeo dos dispositivos que tratam sobre a penhora no CPC deve estaacute
diretamente ligada aos ditames constitucionais devendo o interprete privilegiar a opccedilatildeo que
esteja mais em sintonia com a Carta Magna para que nem o credor e nem o devedor sejam
lesados
O artigo 833 do CPC elenca uma seacuterie de incisos que expotildeem os bens impenhoraacuteveis
O trecho inicial inciso I do art 833 define como impenhoraacuteveis os bens inalienaacuteveis Este
inciso segue a regra de que ldquose o bem natildeo pode ser alienado tambeacutem natildeo pode ser penhorado
porque a penhora eacute o primeiro ato do procedimento de alienaccedilatildeo judicial do bemrdquo 102
Satildeo exemplos de bens inalienaacuteveis os puacuteblicos cuja alienaccedilatildeo depende de autorizaccedilatildeo
legislativa Eacute inalienaacutevel tambeacutem o capital constituiacutedo para garantir indenizaccedilatildeo de ato iliacutecito
(art 533 sect 1 ordm CPC) que portanto eacute tambeacutem impenhoraacutevel ldquoTodo bem inalienaacutevel eacute
impenhoraacutevel embora nem todo bem impenhoraacutevel seja inalienaacutevelrdquo 103
O inciso I do art 833 CPC tambeacutem consagra a impenhorabilidade dos bens que por
ato voluntaacuterio satildeo excluiacutedos da execuccedilatildeo
Segundo Fredie Didier et al104
Eacute o que ocorre nos casos de bens doados ou alienados com claacuteusula de inalienabilidade que haacute de constar no registro imobiliaacuterio para ser eficaz perante o exequente e minimizar o risco de fraude A propoacutesito eis a redaccedilatildeo do art 1911 do Coacutedigo Civil lsquolsquoA claacuteusula de inalienabilidade imposta aos bens por ato de liberalidade implica impenhorabilidade e incomunicabilidaderdquo
100 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MEDINA Joseacute Miguel Garcia
Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 1 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 p 736 101 STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014 102 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 824 103 Ibid p 824 104 Ibid p 825
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O inciso II por sua vez estabelece que satildeo impenhoraacuteveis os bens moacuteveis os
pertences e as utilidades domeacutesticas da residecircncia do executado Todavia excepcionam-se os
bens dessa natureza que sejam de elevado valor ou que ultrapassem as necessidades comuns
correspondentes a um meacutedio padratildeo de vida
A jurisprudecircncia natildeo eacute paciacutefica sobre o assunto logo natildeo exista uma relaccedilatildeo de bens
que podem ser atingidos pela penhora Abrindo margem para as mais variadas decisotildees
O STJ jaacute considerou impenhoraacuteveis aparelho de televisatildeo a cores mesa de centro passadeira raacutedio toca-fitas gravador microondas ar-condicionado um freezer um microcomputador com acessoacuterios uma impressora etc Poderatildeo ser penhorados porque ultrapassam o padratildeo-meacutedio aparelhos de TV mais sofisticados o segundo aparelho de televisatildeo a segunda geladeira aparelhos de ar-condicionado que satildeo verdadeiras peccedilas de design moacuteveis antigos que se transformam em peccedilas de decoraccedilatildeo faqueiro de prata adega climatizada etc Em entendimento de caraacuteter ainda mais geneacuterico jaacute restou consignado em determinado precedente que a proteccedilatildeo natildeo abrangeria apenas os bens indispensaacuteveis agrave moradia mas tambeacutem aqueles usualmente encontrados em um lar105
Ademais o inciso III do art 833 do CPC traz a impenhorabilidade dos vestuaacuterios bem
como os pertences de uso pessoal do executado salvo se de elevado valor
Segundo Fredie Didier et al106 o dispositivo possui dois propoacutesitos
de um lado preservar a dignidade do executado com a proteccedilatildeo de bens moacuteveis importantes para a sua sobrevivecircncia digna como o vestuaacuterio aparelho celular reloacutegio e os bens relacionados agrave sua higiene pessoal de outro lado a regra visa prestigiar a boa-feacute processual impedindo a execuccedilatildeo mesquinha e abusiva com a penhora de bens de pequeno ou nenhum valor como um pente ou uma bota
O inciso IV do art 833 do CPC consagra uma das mais importantes modalidades a
impenhorabilidade relativa aos rendimentos de natureza alimentar ldquoTrata-se de regra que
possui o claro propoacutesito de proteger o executado garantindo-lhe o recebimento de valores que
servem ao pagamento das despesas relacionadas agrave sua sobrevivecircncia digna e agrave da sua famiacuteliardquo 107
Jaacute inciso V do art 833 do CPC torna impenhoraacuteveis os livros as maacutequinas as
ferramentas os utensiacutelios os instrumentos ou outros bens moacuteveis necessaacuterios ou uacuteteis ao
exerciacutecio de qualquer profissatildeo 105 Ibid p 826 106 Ibid p 827 107 Ibid p 828
44
Por forccedila do paraacutegrafo 3ordm do art 833 satildeo igualmente impenhoraacuteveis os equipamentos
implementos e maacutequinas agriacutecolas pertencentes agrave pessoa fiacutesica ou a empresa individual
produtora rural Rodrigo Mazzei e Sarah Merccedilon108 esclarecem que
Tem assento na noccedilatildeo de que a dignidade estende-se tambeacutem ao exerciacutecio da profissatildeo em si mesma e tambeacutem por representar a forma por excelecircncia de que dispotildee o executado para continuar a receber sua remuneraccedilatildeo e por conseguinte prover seu sustento e de sua famiacutelia Trata-se tambeacutem de aplicaccedilatildeo pontual da funccedilatildeo social da propriedade jaacute que protege os bens que permitem a circulaccedilatildeo de riquezas para a subsistecircncia do executado e se for o caso de sua famiacutelia
Forccediloso ressaltar ainda que a impenhorabilidade do inc V alcanccedila apenas os bens
moacuteveis de modo que eacute absolutamente possiacutevel que o imoacutevel em que o executado exerccedila sua
atividade profissional seja penhorado conforme a Suacutemula 451 do STJ ldquoEacute legiacutetima a penhora
da sede do estabelecimento comercialrdquo
O inciso VI do art 833 do CPC versa sobre a impenhorabilidade do seguro de vida
ldquoTrata-se de impenhorabilidade em favor do beneficiaacuterio do seguro e natildeo do segurado ateacute
porque o valor do seguro natildeo compotildee nem comporaacute o seu patrimocircnio (art794 do Coacutedigo
Civil1 ordm7)rdquo Dessa forma ldquoem uma execuccedilatildeo contra o segurado natildeo seraacute possiacutevel a penhora
do seguro de vida pois se trata de bem que natildeo lhe pertence nem mesmo em expectativardquo
De acordo com o inciso VII do art 833 do CPC satildeo impenhoraacuteveis os materiais
necessaacuterios para obras em andamento salvo se essas forem penhoradas Logo a obra pode
ser penhorada (art 862 do CPC) ldquoA regra como bem lembrou Araken de Assis lsquoestimula a
penhora da proacutepria obra inconclusa agrave qual os materiais acrescem e conseguintemente
valorizamrsquo 109
O art 833 VIII CPC julga impenhoraacutevel a pequena propriedade rural assim
definida em lei desde que trabalhada pela famiacutelia reproduzindo parte do art 5ordm XXVI CF
88116 que disciplina a impenhorabilidade do referido bem
A proteccedilatildeo do CPC eacute mais ampla do que a garantia prevista na Constituiccedilatildeo Federal
tendo em vista que a impenhorabilidade natildeo se restringe agraves execuccedilotildees de deacutebitos decorrentes
de sua atividade produtiva podendo ser alegada em toda e qualquer execuccedilatildeo ldquoAssim o 108 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CABRAL Antonio Passo
CRAMER Ronaldo (orgs) Comentaacuterios ao Novo Coacutedigo de Processo Civil Rio de Janeiro Forense 2015 p 1194
109 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 835
45
imoacutevel natildeo pode ser penhorado na execuccedilatildeo de creacutedito rural concedido para estimular a
produccedilatildeo agriacutecola mas poderaacute ser penhorado na execuccedilatildeo do creacutedito concedido para a
aquisiccedilatildeo do imoacutevelrdquo 110
A nona modalidade de impenhorabilidade trata-se dos recursos puacuteblicos recebidos por
instituiccedilotildees privadas para aplicaccedilatildeo compulsoacuteria em educaccedilatildeo sauacutede ou assistecircncia social ldquoA
proteccedilatildeo eacute louvaacutevel e tutela toda a coletividade ao privilegiar o direito agrave educaccedilatildeo sauacutede e
assistecircncia social em detrimento do direito do credorrdquo
De acordo com o inciso X do art 833 do CPC eacute impenhoraacutevel ateacute o limite de
quarenta salaacuterios miacutenimos a quantia depositada em caderneta de poupanccedila
Eacute uma modalidade de impenhorabilidade relativa (o CPC73 a considerava absoluta)
tendo em vista que essa impenhorabilidade natildeo pode ser oposta na execuccedilatildeo de alimentos
independentemente da sua origem (art 833 sect 2ordm do CPC) Fredie Didier et al cita Araken de
Assis111 ao afirmar que
a regra soacute protege essa aplicaccedilatildeo financeira Se o valor estiver depositado em fundo de investimento por exemplo poderaacute ser penhorado Se o devedor tiver vaacuterias cadernetas de poupanccedila a impenhorabilidade aplica-se agrave soma de todas elas e natildeo a cada uma delas isoladamente do contraacuterio valores expressivos poderiam ser pulverizados em vaacuterias contas burlando a finalidade da regra que eacute a de proteger a populaccedilatildeo de baixa renda
Ademais satildeo tambeacutem impenhoraacuteveis por forccedila do inciso XI os recursos puacuteblicos do
fundo partidaacuterio recebidos por partido poliacutetico nos termos da lei Essa modalidade de
impenhorabilidade ldquose restringe aos recursos puacuteblicos do fundo partidaacuterio Recursos de
origem privada recebidos pelo partido poliacutetico poderatildeo ser penhoradosrdquo 112 O processualista
Fredie Didier et al113 assevera que
Assim a impenhorabilidade foi estabelecida no intuito de impedir que os diretoacuterios nacionais de partidos poliacuteticos respondam por diacutevida dos diretoacuterios
110 Ibid p 836 111 DIDIER JR Fredie et al apud ASSIS Araken de Manual da execuccedilatildeo 11ordm ed cit p 225 Assim
tambeacutem REDONDO Bruno Garcia LOJO Maacuterio Vitor Suarez Penhora cit p 117 BUENO Cassio Scarpinella Curso sistematizado de Direito Processual Civil v 3 cit p 228 GIANNICO Mauriacutecio As novas reformas do CPC e de outras normas processuais Mauriacutecio Giannico e Viacutetor Joseacute de Mello Monteiro (coord) Satildeo Paulo Saraiva 2009 p 1 OS Em sentido diverso estendendo a impenhorabiacutelidade aos depoacutesitos feitos ateacute esse valor em CDB CDI fundos de renda fixa ou de accedilotildees RODRIGUES Marcelo Abelha Manual de execuccedilatildeo civil 3deg ed cit p 101
112 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 839
113 Ibid p 839
46
estaduaismunicipais - sobretudo em razatildeo das vaacuterias decisotildees judiciais que determinaram penhora de recursos do fundo partidaacuterio de alguns partidos
Por fim o inciso XII do artigo 833 do CPC trata sobre a impenhorabilidade dos
creacuteditos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias sob o regime de incorporaccedilatildeo imobiliaacuteria
vinculados agrave execuccedilatildeo de obra ldquoO objetivo dessa modalidade eacute evitar que diacutevidas do
incorporador possam consumir os recursos que seriam utilizados na realizaccedilatildeo da obra em
prejuiacutezo dos adquirentes de unidades autocircnomasrdquo 114
O professor Misael Montenegro Filho115 aduz sobre que ldquoao estabelecer a
impenhorabilidade dos creacuteditos oriundos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias o novo CPC
protegeu os valores destinados agrave execuccedilatildeo da obra e agrave entrega das unidades imobiliaacuterias aos
adquirentes assegurando assim a execuccedilatildeo da promessa contratualrdquo
Importante frisar ainda que a Lei nordm 8009 1990 instituiu a impenhorabilidade do
imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar por qualquer diacutevida salvo as exceccedilotildees dos
seus arts 3ordm e 4ordm
A referida lei dispotildee que Para os efeitos de impenhorabilidade considera-se
residecircncia um uacutenico imoacutevel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia
permanente (art 5ordm)
O processualista baiano Fredie Didier et al116 assevera que
A lei propotildee-se a proteger imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar nos termos acima expostos A CF 88 ampliou o conceito de entidade familiar para abranger a famiacutelia monoparental e a uniatildeo estaacutevel Mas deve considerar-se aiacute compreendidos os irmatildeos que vivem juntos e a uniatildeo homossexual Ateacute o solteiro estaacute abrangido pela impenhorabilidade se reside soacute no imoacutevel - isso em nome da proteccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana e da moradia digna Na verdade houve uma mudanccedila de compreensatildeo acerca do sentido da proteccedilatildeo de proteccedilatildeo da famiacutelia agrave proteccedilatildeo da moradia indispensaacutevel agrave preservaccedilatildeo da dignidade da pessoa
114 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o
novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 388
115 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MONTENEGRO FILHO Misael Novo Coacutedigo de Processo Civil Comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Atlas 2016 p 752
116 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 840-841
47
O STJ jaacute consolidou esse entendimento na suacutemula nordm 364 O conceito de
impenhorabilidade de bem de famiacutelia abrange tambeacutem o imoacutevel pertencente a pessoas
solteiras separadas e viuacutevas
Entretanto se o casal ou entidade familiar possuir vaacuterios imoacuteveis utilizados como
residecircncia a impenhorabilidade recairaacute sobre o de menor valor (art 5ordm paraacutegrafo uacutenico) ldquoEacute o
que ocorre por exemplo quando a famiacutelia se divide em mais de uma cidade por motivos
profissionaisrdquo 117
Forccediloso observar ainda que a impenhorabilidade do imoacutevel familiar eacute relativa jaacute que
natildeo pode ser oposta a qualquer creacutedito O art 3ordm da Lei n 8009 1990151 em que pode ser
penhorada a residecircncia da famiacutelia (exemplo execuccedilatildeo de alimentos para cobranccedila de taxas
devidas em funccedilatildeo do imoacutevel familiar etc)
Resta claro que o artigo 833 do CPC ao disciplinar as hipoacuteteses de impenhorabilidade
possui o escopo de proteger o princiacutepio da dignidade humana Entretanto algumas claacuteusulas
natildeo possuem proteccedilatildeo absoluta ldquoa sua relativizaccedilatildeo a depender do caso sob exame deve ser
realccedilada agrave medida que a dignidade resguardada e protegida pelo sistema processual-
constitucional natildeo se limita ao executadordquo 118 Ademais ldquoEacute premente advertidamente que a
dignidade do credor tambeacutem seja garantida em juiacutezo tendo como norte pois os princiacutepios da
proporcionalidade e razoabilidaderdquo 119
117 Ibid p 841 118 Ibid p 752 119 Ibid p 752
48
4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA
ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE
HUMANA DO EXECUTADO
41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE
EFETIVACcedilAtildeO
Como jaacute exposto em linhas preteacuteritas nos meios executivos tiacutepicos as medidas
executivas satildeo determinadas pela lei ou seja o oacutergatildeo pode aplicar somente as medidas
tipificadas no ordenamento juriacutedico No entanto ao se tratar das medidas executivas atiacutepicas
eacute necessaacuterio que haja um limite na atuaccedilatildeo realizada pelo juiz
O poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo poder ser realizado de maneira indiscriminada haacute
pressupostos e premissas a serem observadas Dessa forma a primeira premissa eacute no sentindo
de que a medida executiva atiacutepica natildeo pode ser a primeira medida a ser invocada ldquomuito ao
reveacutes a regra do nosso sistema continua a ser o da tipicidade dos meios executivos soacute que
agora temperado pelo sistema atiacutepicordquo 120 O processualista Thiago Rodovalho explica que
ldquo() os meios atiacutepicos natildeo satildeo prima ratio e sim a ultima ratio eacute dizer esgotados e
frustrados os meios executivos tiacutepicos e ordinaacuterios pode-se em tese valer-se do sistema
atiacutepicordquo121
Dessa forma nos casos de execuccedilatildeo que tenha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
natildeo deve ser aplicado de logo as medidas indutivas e coercitivas Apenas apoacutes frustradas as
medidas ldquonaturaisrdquo pode-se passar agrave aplicaccedilatildeo das medidas atiacutepicas
Uma segunda premissa diz a respeitos dos meios de pressatildeo para compelir o devedor a
adimplir com o seu deacutebito ldquoEssa segunda premissa decorre inclusive de imperiosidade
loacutegica de nada adianta a medida de pressatildeo se a obrigaccedilatildeo natildeo tem como ser adimplida pelo
devedorrdquo 122
Para Thiago Rodovalho123 ldquoIsso quer significar que esgotados e frustrados os meios
tiacutepicos o juiz se valeraacute dos meios atiacutepicos se eles forem potencialmente haacutebeis a estimular ou
120 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da
atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018
121 Ibid sem paginaccedilatildeo 122 Ibid sem paginaccedilatildeo 123 Ibid sem paginaccedilatildeo
49
forccedilar o cumprimento o que pressupotildee sua possibilidade quando entatildeo eles poderatildeo ser
eficazesrdquo
Logo nas obrigaccedilotildees de pagar quantia se houver a real demonstraccedilatildeo da
impossibilidade financeira do devedor seria um constrangimento inuacutetil e desnecessaacuterio a
imposiccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo para forccedilar o cumprimento
Por isso as medidas atiacutepicas devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o
esgotamento das medidas tiacutepicas e a possibilidade de cumprimento de cumprimento da
obrigaccedilatildeo
Ademais superadas as supracitadas premissas e o oacutergatildeo julgador vislumbrando a
necessidade da aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo se faz necessaacuterio que um conjunto de
postulados e princiacutepios rejam a atuaccedilatildeo do oacutergatildeo julgador servindo de norte para a escolha da
medida executiva mais adequada ldquoDe modo geral a escolha deve pautar-se nos postulados da
proporcionalidade da razoabilidade (art8ordm CPC) e da proibiccedilatildeo de excesso bem como nos
princiacutepios da eficiecircncia e da menor onerosidade da execuccedilatildeordquo 124
O professor Fredie Didier et al125 eacute categoacuterico ao citar Humberto Aacutevila
Segundo Humberto Aacutevila o postulado da proporcionalidade se manifesta nas situaccedilotildees em que haacute uma relaccedilatildeo de causalidade entre dois elementos empiricamente discerniacuteveis um meio e um fim de tal sorte que se possa proceder aos trecircs exames fundamentais o da adequaccedilatildeo (o meio promove o fim) o da necessidade (dentre os meios disponiacuteveis e igualmente adequados para promover o fim natildeo haacute outro meio menos restritivo do(s) direito(s) fundamental (is) afetado(s)) e o da proporcionalidade em sentido estrito (as vantagens trazidas pela promoccedilatildeo do fim correspondem agraves desvantagens provocadas pela adoccedilatildeo do meio)
O juiz ao aplicar a medida executiva atiacutepica ao caso concreto deve ter seu
embasamento no princiacutepio da proporcionalidade para saber se a medida a ser tomada eacute a
melhor opccedilatildeo ao caso sub judice ldquoO exame de proporcionalidade aplica-se sempre que
houver uma medida concreta destinada a realizar uma finalidaderdquo 126
Em verdade a aplicaccedilatildeo do princiacutepio da proporcionalidade eacute imprescindiacutevel na adoccedilatildeo
dos meios executivos atiacutepicos tendo em vista que ldquo() tais medidas em especial quando de
124 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111 125 DIDIER JR Fredie et al apud AVILA Humberto Teoria dos princiacutepios da definiccedilatildeo agrave aplicaccedilatildeo
dos princiacutepios juriacutedicos 16 ed Satildeo Paulo Malheiros 2015 p 205 126 DIDIER JR Fredie et al op cit p 111
50
natureza coercitiva podem restringir direitos do devedor e incidir diretamente sobre sua
pessoardquo127 Logo ainda que o princiacutepio da efetividade da tutela executiva seja um direito
fundamental o mesmo ldquo() deve ser compatibilizado com direitos fundamentais do
executado para que a sua dignidade humana seja preservadardquo 128
Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Neves129 afirma que em nome do princiacutepio da
proporcionalidade o juiz deveraacute
() ponderar no caso concreto as vantagens praacuteticas da adoccedilatildeo de cada medida executiva atiacutepica em especial as de natureza coercitiva e as desvantagens de sua adoccedilatildeo levando em conta a possibilidade de a medida criar uma limitaccedilatildeo excessiva ao exerciacutecio de direito fundamental do executado
Outro princiacutepio que o oacutergatildeo julgador deve se ater ao escolher a medida executiva
atiacutepica eacute o da razoabilidade Segundo Fredie Didier et al 130 o princiacutepio (ou postulado)131 se
manifesta de trecircs formas
a) como dever de equidade a exigir a harmonizaccedilatildeo da norma geral com o caso individual impondo a consideraccedilatildeo daquilo que normalmente acontece em detrimento do que eacute extraordinaacuterio e tambeacutem impondo a consideraccedilatildeo das especificidades do caso concreto ante a generalidade da norma b) como dever de congruecircncia a exigir a harmonizaccedilatildeo das normas com suas condiccedilotildees externas de aplicaccedilatildeo (isto eacute com a realidade com base em que foram editadas) c) como dever de equivalecircncia a exigir uma relaccedilatildeo de equivalecircncia entre a medida adotada e o criteacuterio que a dimensiona
Logo ldquo() o princiacutepio da razoabilidade deve nortear a atuaccedilatildeo do juiz na adoccedilatildeo das
medidas executivas atiacutepicas previstas no art 139 IV do Novo CPCrdquo 132 tendo em vista que
ldquo() mesmo medidas que pelo princiacutepio da proporcionalidade podem se mostrar
abstratamente possiacuteveis de adoccedilatildeo no caso concreto podem se mostrar inadequadas e
irrazoaacuteveisrdquo 133
127 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Medidas executivas atiacutepicas na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de
pagar quantia certa art 139 IV do novo CPC Revista de Processo v 42 n 265 mar 2017 p 14 128 Ibid p 14 129 Ibid p 14 130 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111-112 131 Segundo Fredie Didier et al o postulado eacute uma norma que atua sobre a aplicaccedilatildeo de outras normas
A proporcionalidade e a razoabilidade seriam postulados normativos e natildeo princiacutepios segundo essa concepccedilatildeo 132 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo op cit p 14 133 Ibid p 14
51
Ademais conforme dispotildee o postulado da proibiccedilatildeo de excesso ldquoa realizaccedilatildeo de uma
regra ou princiacutepio constitucional natildeo pode conduzir agrave restriccedilatildeo a um direito fundamental que
lhe retire um miacutenimo de eficaacuteciardquo 134
A proibiccedilatildeo de excesso deveraacute sempre ser suscitada quando um direito fundamental
houver sido violado a ponto do direito fundamental sofrer violaccedilatildeo excessiva Ademais ldquoesse
postulado natildeo se confunde com o da proporcionalidade porque ele dispensa os exames da
adequaccedilatildeo (relaccedilatildeo meiofim) da necessidade (exigibilidade) ou da proporcionalidade em
sentido estrito (ponderaccedilatildeo entre vantagens e desvantagens)rdquo 135
Logo ldquopouco importa a relaccedilatildeo meiofim ou a exigibilidade da medida ou ainda a
ponderaccedilatildeo com outro direito fundamental eventualmente em jogo aqui se analisa apenas a
eficaacutecia de um determinado direito fundamentalrdquo 136
O princiacutepio da eficiecircncia tem previsatildeo constitucional no art 37 e previsatildeo
infraconstitucional no art 8ordm do CPC15 O referido princiacutepio determina que o processo seja
conduzido de forma eficiente pelo oacutergatildeo jurisdicional
Entende-se que eficiente eacute a atuaccedilatildeo que utilize adequadamente os meios necessaacuterios
para que se atinjam os fins almejados O oacutergatildeo jurisdicional na escolha dos meios a serem
utilizados para a obtenccedilatildeo dos fins
a) deve escolher aqueles que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo (deve evitar meios que promovam resultados insignificantes) b) deve escolher meios que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado (natildeo se pode escolher um meio de resultado duvidoso) c) natildeo pode escolher um meio que produza muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscado 137
O juiz deveraacute igualmente analisar o princiacutepio da menor onerosidade da execuccedilatildeo que
eacute previsto pelo art 805 do CPC ldquoArt 805 Quando por vaacuterios meios o exequente puder
promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o
executadordquo
134 134 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 112 135 Ibid p 112 136 Ibid p 112 137 Ibid p 112-113
52
Logo ldquohavendo duas opccedilotildees igualmente eficazes para permitir alcanccedilar o resultado
pretendido (satisfaccedilatildeo do creacutedito) deveraacute o oacutergatildeo julgador valer-se daquela que menos onere
a situaccedilatildeo do executadordquo 138
O dito princiacutepio impede o comportamento abusivo do exequente que possa beneficiar-
se do meio mais danoso ao executado protegendo dessa forma a lealdade e a eacutetica
processual
Os postulados e princiacutepios analisados em linhas preteacuteritas impotildeem ao oacutergatildeo julgador a
observacircncia de alguns criteacuterios para a escolha da medida executiva atiacutepicas a ser utilizada no
caso concreto
Primeiramente a medida executiva atiacutepica deveraacute ser adequada ldquoO criteacuterio da
adequaccedilatildeo impotildee que juiz considere abstratamente uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida
executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia
a gerar o resultadordquo 139 Nesse primeiro momento o juiz deveraacute observar sob a perspectiva do
credor qual medida teraacute o condatildeo de gerar o resultado mais efetivo
Segundo Fredie Didier et al140 o criteacuterio da adequaccedilatildeo eacute
() fortemente inspirado pelo postulado da proporcionalidade e pelo princiacutepio da eficiecircncia na parte em que esse princiacutepio determina a escolha de meios que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo e que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado
Ademais a medida adotada pelo oacutergatildeo julgador deveraacute ser necessaacuteria ldquoEsse criteacuterio
impotildee um limite agrave atuaccedilatildeo judicial funcionando como uma espeacutecie de contrapeso ao criteacuterio
da adequaccedilatildeo Aqui deve-se levar em conta a posiccedilatildeo do devedorrdquo141
O juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental agrave execuccedilatildeo e determinar
uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute necessaacuterio que a
medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado O criteacuterio da necessidade
estabelece que ldquonatildeo se pode ir aleacutem do necessaacuterio para alcanccedilar o propoacutesito almejado Deve
138 Ibid p 113 139 Ibid p 113 140 Ibid p 113 141 Ibid p 114
53
pois o oacutergatildeo julgador determinar o meio executivo na medida do estritamente necessaacuterio para
proporcionar a satisfaccedilatildeo do creacutedito ndash nem menos nem maisrdquo 142
O referido criteacuterio possui forte influecircncia dos postulados da proibiccedilatildeo do excesso e da
razoabilidade assim como do princiacutepio da menor onerosidade para o executado Assevera
Fredie Didier et al143 que
Natildeo eacute razoaacutevel por exemplo impor como primeira opccedilatildeo medida coercitiva a ser suportada pelo agente puacuteblico pelo simples fato de o juiz pressupor que o ente puacuteblico ao qual ele eacute vinculado iraacute descumprir determinada ordem judicial - o descumprimento natildeo pode ser visto como algo ordinaacuterio ou cotidiano (razoabilidade como dever de equidade) Tampouco eacute razoaacutevel eleger a prisatildeo civil como meacutetodo prioritaacuterio para compelir o executado ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer (razoabilidade como dever de equivalecircncia) Aleacutem disso eacute vedada por exemplo a imposiccedilatildeo de multa coercitiva para compelir o executado a emitir declaraccedilatildeo de vontade uma vez que haacute previsatildeo expressa de medida tiacutepica capaz de proporcionar o mesmo resultado sem sacrifiacutecio para o devedor (art 501 CPC)
A afirmaccedilatildeo feita por Bonavides144 em 1997 sobre a adequaccedilatildeo e a necessidade
continua atual sobre os motes
O meio empregado pelo legislador deve ser adequado e necessaacuterio para alcanccedilar o objetivo procurado O meio eacute adequado quando com seu auxiacutelio se pode alcanccedilar o resultado desejado eacute necessaacuterio quando o legislador natildeo poderia ter escolhido outro meio igualmente eficaz mas que natildeo limitasse ou limitasse de maneira menos sensiacutevel o direito fundamental
Por fim a medida deve conciliar os interesses contrapostos ldquoO magistrado deve
ponderar os interesses em jogo aplicando a proporcionalidade em sentido estrito de modo
que as vantagens da utilizaccedilatildeo da medida atiacutepica escolhida superem as vantagens de seu usordquo 145
Esse criteacuterio natildeo privilegia nem o credor nem o devedor e sim a soluccedilatildeo mais
equilibrada e que atenda da melhor forma aos valores em conflito ldquoTrata-se de criteacuterio
inspirado nos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade bem como no princiacutepio da
142 Ibid p 114 143 Ibid p 114 144 BONAVIDES Paulo Curso de Direito Constitucional 7ordm ediccedilatildeo Satildeo Paulo Ed Malheiros 1997
p 372 145 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 114-115
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eficiecircncia na parte em que impotildee ao juiz evitar a escolha do meio executivo que produza
muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscadordquo 146
Cada um dos criteacuterios supracitados devem ser considerados pelo juiz ao aplicar as
medidas executivas atiacutepicas ao caso concreto Para Fredie Didier et al147 as medidas como
retenccedilatildeo de CNH passaporte ou cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado como
forma de pressionaacute-lo ao pagamento da diacutevida pecuniaacuteria natildeo satildeo possiacuteveis
Essas natildeo satildeo medidas adequadas ao atingimento do fim almejado (o pagamento de quantia) - natildeo haacute propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente Tais medidas soam mais como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-lo ao cumprimento da ordem judicial - e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a utilizaccedilatildeo de meios sancionatoacuterios pelo magistrado mas apenas de meios de coerccedilatildeo indireta e sub-rogatoacuterios
Ainda que adequadas fossem a retenccedilatildeo de CNH e do passaporte no corte de fornecimento de aacutegua natildeo parecem ser medidas necessaacuterias (no sentido de exigiacuteveis) uma vez que outras medidas podem em tese ser utilizadas sem causar igual gravame ao executado - como por exemplo a simples restriccedilatildeo do uso de cartotildees de creacutedito A retenccedilatildeo de documentos pessoais eacute medida que termina por restringir a liberdade de ir e vir do executado mostrando-se a princiacutepio natildeo-razoaacutevel por ir de encontro ao dever de equivalecircncia e desproporcional por restringir demais o direito agrave liberdade em favor do direito de creacutedito pecuniaacuterio do exequente
O processualista baiano et al148 cita tambeacutem outro exemplo de medida atiacutepica que natildeo
atingem os criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade
Tampouco parece adequada em princiacutepio determinaccedilatildeo de corte de energia eleacutetrica de todo o preacutedio onde funciona serviccedilo puacuteblico administrativo como forma de pressionar o ente federado a cumprir ordem de nomeaccedilatildeo de candidato em concurso puacuteblico Natildeo parece haver relaccedilatildeo meiofim entre uma coisa e outra Tambeacutem natildeo eacute possiacutevel enxergar essa medida como necessaacuteria no sentido de ser a menos gravosa para o devedor - observe que se trata de medida que uma vez aplicada ensejaria restriccedilatildeo de funcionamento em toda a reparticcedilatildeo puacuteblica em prejuiacutezo de serviccedilos puacuteblicos essenciais ao funcionamento da Administraccedilatildeo o que aleacutem de ser excessivamente gravoso parece natildeo se conformar agrave necessidade de ponderaccedilatildeo dos interesses em jogo - aleacutem de afetar a um sem-nuacutemero de pessoas tomadoras desses serviccedilos
Ademais eacute sabido que toda e qualquer decisatildeo judicial precisa ser fundamentada Ao
se tratar das medidas executivas atiacutepicas o papel da fundamentaccedilatildeo se torna ainda mais
146 Ibid p 115 147 Ibid p 115 148 Ibid p 116
55
importante tendo em vista que eacute pela fundamentaccedilatildeo da decisatildeo que se poderaacute controlar a
adequaccedilatildeo e necessidade da medida atiacutepica
Pelo fato das medidas executivas atiacutepicas derivarem de dispositivos normativos
considerados claacuteusulas gerais propiacutecias as mais variadas interpretaccedilotildees eacute de extrema
importacircncia que o oacutergatildeo julgador fundamente sua decisatildeo
Logo ldquodeve o juiz na fundamentaccedilatildeo decisoacuteria expor racionalmente os motivos da
sua escolha demonstrando com atenccedilatildeo ao art 489 sect 1ordm CPC de que modo a sua opccedilatildeo
atende os criteacuterios da adequaccedilatildeo necessidade e proporcionalidade em sentido estrito ()rdquo 149
Dessa forma os princiacutepios da proporcionalidade e razoabilidade servem para delimitar
o alcance das claacuteusulas gerais de efetivaccedilatildeo fazendo com que o oacutergatildeo julgador se atenha aos
criteacuterios da adequaccedilatildeo e necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao caso
concreto
42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO
EXECUTADO
A entrada em vigor do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 aflorou ainda mais uma
discussatildeo essencial para os processualistas do seacuteculo XXI qual eacute o verdadeiro protagonista do
processo civil
Para os que defendem o ldquoautoritarismo processualrdquo o verdadeiro protagonista do
processo civil eacute o oacutergatildeo judiciaacuterio que em nome do desempenho efetivo de suas funccedilotildees lhes
eacute permitido dilatar os poderes que diga-se de jaacute passagem jaacute compotildeem um vastiacutessimo
arsenal150
Jaacute os ldquogarantistasrdquo 151 do processo civil acreditam que os verdadeiros protagonistas satildeo
as partes do processo e seus direitos e garantias devem ser estritamente preservados
Devido a essa disputa de quem possui maior protagonismo no processo as mudanccedilas
ocorridas no coacutedigo processual vigente quanto agraves medidas executivas atiacutepicas despertaram
149 Ibid p 117 150 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos
atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04102018
151 O processualista Araken de Assis acredita que o termo garantista eacute descabido tendo em vista que remete ao processo penal
56
maior celeuma do que qualquer outra modificaccedilatildeo trazida pelo CPC15 Afinal as referidas
medidas acirravam ainda mais a disputa pelo protagonismo processual
O fato de o CPC15 dispor no art 139 IV que o juiz poderaacute decretar todas as medidas
indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o
cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo
pecuniaacuteria levou boa parte da doutrina e dos juiacutezes a acreditar que teria pleno direito de
aplicar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo Entretanto muitos se esqueceram do outro lado
da moeda esqueceram que a dignidade humana do executado tambeacutem eacute um direito
fundamental e natildeo pode ser violado
Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa152
acreditam que
() natildeo parece producente elencar um rol abstrato das medidas que poderiam ser aplicadas pelo juiz a tiacutetulo do art 139 IV CPC Afinal se busca a efetividade da execuccedilatildeo e esta soacute pode ser identificada agrave luz das especificidades da situaccedilatildeo concreta Ideal eacute enveredar pela loacutegica modular (adequaccedilatildeo ao caso) natildeo pela geneacuterica (soluccedilotildees abstratas de pretensa utilidade universal)
Em razatildeo de o dispositivo apresentar uma gama de poderes tatildeo amplos agrave disposiccedilatildeo do
oacutergatildeo julgador sem nenhuma estipulaccedilatildeo de um procedimento legal previamente definido para
que estabeleccedila as condiccedilotildees de sua aplicaccedilatildeo em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo eacute
necessaacuterio que em razatildeo do princiacutepio da dignidade humana natildeo busque definir o que o
dispositivo permite mas de definir o que ele natildeo permite ldquoOu seja propotildee-se a sua
compreensatildeo por exclusatildeo Afinal se ele tem potencialidade para promover a efetividade da
tutela tambeacutem pode provocar lesotildees E como em direito os fins natildeo justificam os meios
ressalta como prioritaacuteria a necessidade de estabelecer limitesrdquo 153
O art 789 do CPC15 disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial e eacute
categoacuterico ao dispor que ldquoo devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para
152 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
153 Ibid sem paginaccedilatildeo
57
o cumprimento de suas obrigaccedilotildees salvo as restriccedilotildees estabelecidas em leirdquo Logo a
execuccedilatildeo somente poderaacute incidir sobre os bens do devedor e natildeo sobre a sua pessoa
Como eacute sabido a Lex Poetelia Papiria de 326 aC foi o primeiro marco legal da
humanizaccedilatildeo das cobranccedilas de diacutevidas abolindo a imposiccedilatildeo ao devedor de castigos
vexatoacuterios e ateacute da pena de morte154
Afinal no direito romano antigo a cobranccedila de diacutevidas poderia recair sobre a pessoa
do devedor que respondia com sua liberdade e ateacute mesmo com seu proacuteprio corpo permitindo
a lei que repartissem tantos pedaccedilos do corpo do devedor quantos fossem seus credores
Nesse sentindo leciona o professor Guilherme Pupe da Noacutebrega155 que
Vem de longe a evoluccedilatildeo no sentido de fazer a responsabilidade por uma obrigaccedilatildeo migrar da pessoa do devedor para seu patrimocircnio Merecem registro especiacutefico como marcos histoacutericos remotos a Lex Poetelia Papiria de 326 aC que aboliu o nexum e possibilidade de escravidatildeo do devedor como garantia da obrigaccedilatildeo e a pignoris capio ou ldquoaccedilatildeo por tomada de penhorrdquo que instituiu a possibilidade de o credor tomar parcela dos bens do devedor como forma de assegurar o adimplemento da diacutevida Aqueles institutos culminariam seacuteculo depois no artigo 789 do CPC de 2015 a consagrar que o devedor responda pela satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo com seus bens presentes e futuros observadas as restriccedilotildees impostas pelas impenhorabilidades legais
Logo o avanccedilar da civilizaccedilatildeo marcou o deslocamento da responsabilidade por
diacutevidas saindo do corpo do devedor para o seu patrimocircnio tendo em vista que a vida
humana a liberdade e a integridade fiacutesica satildeo valores inalienaacuteveis natildeo podendo ser
sacrificadas em benefiacutecio de obrigaccedilotildees pecuniaacuterias 156
Entretanto eacute sabido que a responsabilidade patrimonial eacute excepcionada pela prisatildeo
civil do devedor de verba alimentiacutecia resquiacutecio da responsabilidade pessoal romana
154 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt
httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018
155 NOacuteBREGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139 IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018
156 Ibid sem paginaccedilatildeo
58
No entanto haacute uma justificativa para isso Segundo o processualista Guilherme Pupe
da Noacutebrega157
Eacute que a par de a prisatildeo civil encontrar previsatildeo constitucional no inciso LXVII do artigo 5ordm o raciociacutenio eacute o de que o direito do alimentante agrave liberdade de locomoccedilatildeo cede diante dos direitos agrave vida e agrave dignidade titularizados pelo alimentando e resguardados pelos alimentos Foi esse mesmo raciociacutenio aliaacutes que justificou no passado a ediccedilatildeo da suacutemula 309 pelo STJ agora positivada pelo artigo 528 sect 7ordm que limita a modalidade coercitiva agraves trecircs uacuteltimas prestaccedilotildees vencidas e agraves prestaccedilotildees vincendas A ideia eacute que tendo o alimentando subsistido a despeito do natildeo-pagamento de prestaccedilotildees mais antigas essas verbas teriam perdido o caraacuteter alimentar que na equaccedilatildeo antes apresentada justificaria a prisatildeo civil do alimentante Daiacute por que aqueles valores antigos remanescem exigiacuteveis mas somente pela via da expropriaccedilatildeo
Essa ressalva eacute necessaacuteria tendo em vista que a adoccedilatildeo de teacutecnica de execuccedilatildeo
indireta para incursatildeo radical na esfera de direitos do executado notadamente direitos
fundamentais quando carente de respaldo constitucional natildeo merece acolhimento sob
risco de se atentar contra o devido processo legal (artigo 5ordm LIV da Constituiccedilatildeo)
Como afirma o autor Bruno Dantas158 ldquoembora inexistam estatiacutesticas que permitam
comparaccedilotildees natildeo eacute desarrazoado intuir que os iacutendices de inadimplecircncia despeccedilam na razatildeo
inversa da incidecircncia das ordens judiciais sobre o corpo e a liberdade do devedorrdquo Entretanto
eacute natildeo possiacutevel adotar toda e qualquer medida executiva atiacutepica em nome da efetividade da
execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que se saiba os limites da sua aplicaccedilatildeo
Dessa forma instrumentos que permitam o cumprimento forccedilado de contratos e o pagamento
de diacutevidas satildeo necessaacuterios contudo eacute preciso equilibrar essa exigecircncia com a liberdade e a
dignidade humana
Como citado alhures o art 139 IV ensejou decisotildees como a que determinou a
suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o
passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito em uma accedilatildeo se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo
extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
Na supracitada decisatildeo o princiacutepio da responsabilidade patrimonial natildeo estaacute sendo
efetivado para o que o devedor responda com os seus bens Afinal qual ligaccedilatildeo entre a
157 Ibid sem paginaccedilatildeo 158 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt
httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018
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restriccedilatildeo de circulaccedilatildeo que diz com o direito de ir e vir (liberdade) com o pagamento de
diacutevidas que diz com a responsabilidade civil159
Ademais por que quem natildeo tem dinheiro para pagar diacutevidas natildeo pode dirigir Por que
natildeo tem condiccedilotildees para pagar o deacutebito natildeo pode ter passaporte Por que quem natildeo tem como
pagar o deve natildeo pode ter cartatildeo de creacutedito
Ao utilizar meios executivos atiacutepicos como os supracitados para compelir o devedor a
satisfazer a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria quando exauridos sem ecircxito os meios tradicionais de bens
penhoraacuteveis salvo quando existe qualquer indiacutecio concreto de ocultaccedilatildeo ou dissipaccedilatildeo de
bens eacute obrigar o devedor abrir matildeo da proteccedilatildeo da lei que lhe impede que seja tomado agrave forccedila
(art 833 CPC e demais disposiccedilotildees que tratam da impenhorabilidade)
Segundo Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa160
Claramente essa pressatildeo visa dar uma aparecircncia de voluntariedade agrave indicaccedilatildeo de bens impenhoraacuteveis pelo proacuteprio executado que na verdade soacute age assim por ser a uacutenica forma de ver-se livre de um grame imposto por medida indutiva despedida de qualquer necessidade ou adequaccedilatildeo Uma intoleraacutevel perversatildeo
Os autores afirmam ainda que o ldquodireito paacutetrio natildeo admite esta contraditio in terminis
sendo inaceitaacutevel a coexistecircncia de regra protetiva do executado com outra que concede ao
juiz poderes para forccedilar (ainda que indiretamente e veladamente) o executado a abrir matildeo
daquela proteccedilatildeordquo 161
Logo eacute cristalino que a suspensatildeo da CNH eacute uma forma incorreta de aplicar a medida
executiva atiacutepica para efetivar o direito fundamental a execuccedilatildeo tendo em vista que o uacutenico
objetivo da referida eacute pressionar o executado abrir matildeo de algum bem impenhoraacutevel para
levantar o dinheiro e cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
A retenccedilatildeo do passaporte igualmente natildeo possui qualquer relaccedilatildeo com a diacutevida do
executado e eacute somente uma forma de tentar pressiona-lo a dispor de um bem que natildeo pode
ser tomado agrave forccedila e puni-lo por natildeo ter cumprido voluntariamente com a sua obrigaccedilatildeo
159 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
160 Ibid sem paginaccedilatildeo 161 Ibid sem paginaccedilatildeo
60
Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa162
acreditam que tal medida eacute equivocada e se torna excessivamente onerosa ao executado
As mais variadas circunstacircncias relevem o equiacutevoco de tal medida aplicada assim genericamente Com efeito nada justifica reter o passaporte do executado e impedi-lo de viajar para o exterior quando eacute agraciado inclusive com todas as despesas pagas com presente sorteio ou precircmio (por completar tempo de serviccedilo ou atingir metas produtividade na sociedade empresaacuteria em que trabalha) Como todo custo eacute suportado por terceiro e por isso mesmo a sua realizaccedilatildeo pelo executado natildeo traria qualquer prejuiacutezo ao exequente e a retenccedilatildeo do passaporte natildeo seria injustificaacutevel
Paulo Antonio Papini163 acredita que natildeo tem a apreensatildeo de passaporte natildeo possui um
fundamento plausiacutevel tendo em vista que se o devedor natildeo pode viajar para saldar o deacutebito
tambeacutem natildeo poderia exercer atividades cotidianas
Com todo o respeito a quem pensa dessa forma o argumento eacute muito simploacuterio e natildeo precisamos sequer do Direito para derrubaacute-lo Com efeito se considerarmos que ndash ateacute mesmo pelas dimensotildees continentais do Brasil ndash natildeo eacute incomum que uma passagem para o Nordeste custe mais caro que um voo para Miami seria razoaacutevel entatildeo seguindo a linha argumentativa do Magistrado em questatildeo que se oficiasse aos oacutergatildeos reguladores da aviaccedilatildeo civil proibindo-se aquele devedor de fazer ateacute mesmo voos domeacutesticos Poder-se-ia ir mais longe jaacute que natildeo tem dinheiro para pagar suas diacutevidas certamente aquele devedor tambeacutem natildeo teria para comer fora de sua casa porque entatildeo natildeo determinar a expediccedilatildeo de ofiacutecio aos restaurantes proacuteximos agrave sua casa e determinar tambeacutem a proibiccedilatildeo de que ele fosse servidoatendido
O autor se questiona ainda ldquoSeraacute entatildeo que o Princiacutepio da Dignidade da Pessoa
Humana estaacute de mero enfeite em nossa Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ()rdquo 164 Tendo em vista
que ldquoa decisatildeo em comento viola diretamente o art 5ordm incisos XV LIII e LXIII da
Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ndash falamos do Direito de Ir e Virrdquo 165
Ademais o cancelamento do cartatildeo de creacutedito eacute mais uma forma de constranger e
compelir o executado a cumprir com a obrigaccedilatildeo de qualquer forma natildeo importando o que
precise fazer para conseguir saldar o deacutebito tendo em vista que a referida medida apresenta
162 Ibid sem paginaccedilatildeo 163 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo
pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018
164 Ibid sem paginaccedilatildeo 165 Ibid sem paginaccedilatildeo
61
qualquer adequaccedilatildeo com o fim desejado (reverter em pagamento para o exequente) Os
autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa afirmam que166
Reconhece-se que as razotildees da afirmaccedilatildeo ora questionada satildeo ateacute intuitivas mas eacute plenamente possiacutevel problematiza-las Ora natildeo se encontra qualquer justificativa idocircnea para que o juiz possa cancelar o contrato do executado com a administradora do cartatildeo de creacutedito (ou instituiccedilatildeo financeira) que natildeo tem qualquer relaccedilatildeo com o creacutedito exequendo muito menos como isso poderia impactar positivamente na execuccedilatildeo (senatildeo para pressionar o executado a dispor de bens impenhoraacuteveis) Ademais natildeo foram indicados sequer sinais de que o executado realiza gastos supeacuterfluos com o cartatildeo de creacutedito ndash natildeo que isso justificasse a medida pois o correto seria penhorar os esses bens (se duraacuteveis naturalmente) ao inveacutes de cancelar o cartatildeo de creacutedito
Logo as referidas medidas natildeo possuem qualquer relaccedilatildeo com o atingimento do fim
almejado (o pagamento de quantia) tendo em vista que natildeo haacute uma relaccedilatildeo meiofim entre
tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a
restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia
ao exequente
Dessa forma nota-se que as medidas de suspensatildeo da CNH retenccedilatildeo de passaporte e
bloqueio do cartatildeo de credito satildeo completamente inadequadas agrave realizaccedilatildeo a que se prestam
Afinal ldquotais medidas soam como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-
lo ao cumprimento da ordem judicial ndash e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a
utilizaccedilatildeo dos meios sancionatoacuterios pelo magistrado ()rdquo167
Como exposto em linhas preteacuteritas o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades
de aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e
razoaacutevel se atendo aos criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas
executivas atiacutepicas ao caso concreto sob pena de converter a medida em de indutiva para
punitiva
A utilizaccedilatildeo de medidas atiacutepicas como a suspensatildeo da carteira de motorista e o
passaporte do devedor abandona a regra da responsabilidade patrimonial e atingem em cheio
o nuacutecleo de direitos inerentes agrave condiccedilatildeo humana
166 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
167 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 115
62
O limite para a aplicaccedilatildeo de tais medidas deve ser a Constituiccedilatildeo Federal e sobretudo
os Direitos fundamentais nela expressos ldquoCom efeito natildeo haacute saiacuteda tampouco soluccedilatildeo eficaz
de um problema sem que se respeite a Lei e o Devido Processo Legal (por mais nobres que
sejam as intenccedilotildees)rdquo 168
Dessa forma a busca desenfreada pelo cumprimento das decisotildees judiciais em
especial na fase executiva natildeo pode ser realizada em sacrifiacutecio de direitos fundamentais O
Poder Judiciaacuterio natildeo pode resolver a crise do processo executoacuterio utilizando de medidas
arbitraacuterias com o propoacutesito de satisfazer obrigaccedilotildees pecuniaacuterias
Eis o dilema que se coloca diante do poder geral de efetivaccedilatildeo ele pode servir de
potente instrumento em prol da tutela jurisdicional executiva entretanto se manejado de
modo improacuteprio serviraacute de instrumento de puniccedilatildeo e humilhaccedilatildeo do executado169
Eacute notoacuterio que se amplamente aplicado o poder geral de efetivaccedilatildeo reduziria os
iacutendices de inadimplecircncia quiccedilaacute resolveria por completo a crise da execuccedilatildeo civil Entretanto
o retrocesso civilizatoacuterio seria irreparaacutevel
168 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo
pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018
169 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
63
5 CONCLUSAtildeO
Como funccedilatildeo jurisdicional que tem como objeto a efetivaccedilatildeo de direitos a execuccedilatildeo
deve sempre buscar a maior satisfaccedilatildeo possiacutevel concretizando integralmente o creacutedito do
exequente isto eacute realizando o direito fundamental agrave tutela executiva do credor Por isso a
adoccedilatildeo de meios executivos atiacutepicos incorporados pelo Coacutedigo de Processo Civil de 2015 por
meio do art139 IV em um primeiro momento podem ser consideradas vaacutelidas visto que
servem de instrumento para a satisfaccedilatildeo e asseguraccedilatildeo de direitos do credor
Entretanto para o oacutergatildeo julgador natildeo cometa arbitrariedades em nome do direito
fundamental agrave execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que seja definido certos limites na adoccedilatildeo do poder
geral de efetivaccedilatildeo
As medidas executivas atiacutepicas natildeo podem ser aplicadas de maneira indiscriminada
logo devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o esgotamento das medidas tiacutepicas e
a possibilidade de cumprimento da obrigaccedilatildeo
Partindo dessa premissa as medidas a serem adotadas pelo juiz no caso concreto
devem ter como baliza os princiacutepios da proporcionalidade e da razoabilidade para que natildeo
ultrapassem a responsabilidade patrimonial do devedor e incidida diretamente sobre sua
pessoa
Para que natildeo seja atingida a pessoa do executado ou seja para que o devedor natildeo
tenha sua dignidade humana viola eacute necessaacuterio que a medida atiacutepica seja adequada e
necessaacuteria
Logo o juiz deveraacute sempre estabelecer uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida
executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia
a gerar o resultado sem violar a dignidade humana do executado
Dessa o juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental a execuccedilatildeo e
determinar uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute
necessaacuterio que a medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado
As medidas que ultrapassam esses limites como a decisatildeo que apreendeu o
passaporte suspensatildeo a CNH e bloqueou o cartatildeo de creacutedito do devedor satildeo meramente
punitivas posto que essas natildeo satildeo as medidas mais adequadas para se atingir o fim almejado
pois natildeo existe propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado
64
uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo
geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente
Medidas como esta servem de embasamento para decisotildees arbitraacuterias e autoritaacuterias de
violaccedilatildeo dos direitos fundamentais transformando o poder geral de efetivaccedilatildeo em
instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com autorizaccedilatildeo judicial
Em suma o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades de aplicaccedilatildeo do poder
geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e razoaacutevel se atendo aos
criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao
caso concreto sob pena de punir a pessoa do executado violando a sua dignidade humana
em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo
65
REFEREcircNCIAS
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THEODORO JUacuteNIOR Humberto Novo Coacutedigo de Processo Civil Anotado 20 ed
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- 1 INTRODUCcedilAtildeO
- 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
-
- 21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL
- 22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
- 23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
- 24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO
- 25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO
-
- 3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
-
- 31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS
-
- 311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15
-
- 32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
- 33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
- 34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
-
- 4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
-
- 41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
- 42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
-
- 5 CONCLUSAtildeO
- REFEREcircNCIAS
-
9
passaram a ser uma fase complementar ao de processo de conhecimento e natildeo mais ocorrer
em um processo autocircnomo
No entendimento do professor processualista Fredie Didier et al8 o processo
sincreacutetico simplificou a efetivaccedilatildeo de um direito reconhecido em sentenccedila
A dispensa do ajuizamento de um processo autocircnomo para execuccedilatildeo de sentenccedila natildeo soacute veio diminuir o tempo necessaacuterio agrave prestaccedilatildeo da tutela jurisdicional - afinal o credor natildeo mais precisaria tal como ocorria ateacute entatildeo promover nova citaccedilatildeo pessoal do reacuteudevedor- como tambeacutem veio romper de vez com um velho paradigma segundo o qual a atividade executiva estaria dissociada da precedente atividade jurisdicional cognitiva
Entretanto natildeo soacute as sentenccedilas de meacuterito ensejam uma execuccedilatildeo Por esta razatildeo foi
necessaacuterio manter o processo autocircnomo de execuccedilatildeo para os casos em que o credor tem a seu
favor um documento que natildeo tenha sido proferido por um oacutergatildeo dotado de jurisdiccedilatildeo
Consequentemente se for o titulo executivo judicial o caminho natural eacute o do
cumprimento de sentenccedila Sendo por sua vez extrajudicial o titulo executivo o caminho
correto eacute o processo de execuccedilatildeo
Cabe ainda salientar que toda execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial eacute definitiva Jaacute a
execuccedilatildeo de tiacutetulo judicial (cumprimento de sentenccedila) pode ser definitiva ou provisoacuteria
No primeiro caso isto eacute cumprimento de sentenccedila definitivo ldquoeacute a execuccedilatildeo completa
que vai ateacute a fase final (com a entrega do bem da vida) sem exigecircncias adicionais para o
exequenterdquo 9
Quanto ao segundo caso ldquoo cumprimento provisoacuterio de sentenccedila (fundada em tiacutetulo
provisoacuterio) eacute aquele que exige alguns requisitos extras para que se chegue agrave fase final da
execuccedilatildeordquo 10
Para Fredie Didier11 o criteacuterio para definir se o cumprimento de sentenccedila seraacute
definitivo ou provisoacuterio
() eacute a estabilidade do tiacutetulo executivo em que se funda a execuccedilatildeo se se tratar de decisatildeo acobertada pela coisa julgada material o cumprimento de sentenccedila eacute
8 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 46 9 Ibid p 57 10 Ibid p 57 11 Ibid p 57
10
definitivo se se tratar de decisatildeo judicial ainda passiacutevel de alteraccedilatildeo (reforma ou invalidaccedilatildeo) em razatildeo da pendecircncia de recurso contra ela interposto a que natildeo tenha sido atribuiacutedo efeito suspensivo o cumprimento de sentenccedila eacute provisoacuterio
Ademais a execuccedilatildeo se distingue em procedimentos executivos comuns que satildeo da
execuccedilatildeo civil e que servem a uma generalidade de creacuteditos como eacute o caso do cumprimento
de sentenccedila e o processo de execuccedilatildeo E em procedimentos executivos especiais que servem
agrave satisfaccedilatildeo de creacuteditos peculiares como a execuccedilatildeo de alimentos e a execuccedilatildeo fiscal 12
Por fim cabe mencionar a classificaccedilatildeo que distingue a execuccedilatildeo em direta e indireta
A primeira execuccedilatildeo direita (ou execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo) eacute ldquo() aquela em que o
Poder Judiciaacuterio prescinde da colaboraccedilatildeo do executado para a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida
e pois promove uma substituiccedilatildeo da sua conduta pela conduta do proacuteprio Estado-juiz ou de
terceirordquo 13 Ou seja as medidas executivas satildeo levadas a efeito mesmo contra a vontade do
devedor na execuccedilatildeo direta
Segundo a doutrina a execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo se subdivide da seguinte forma
meios de desapossamento meios de transformaccedilatildeo e meios de expropriaccedilatildeo
Os meios de desapossamento muito comuns nas execuccedilotildees para entrega de coisa eacute a
forma ldquopor meio da qual se retira da posse do executado o bem a ser entregue ao exequente
(p ex despejo busca e apreensatildeo reintegraccedilatildeo de posse)rdquo 14 Ao passo que por meio dos de
transformaccedilatildeo ldquo() o juiz determina que um terceiro pratique a conduta que deveria ser
praticada pelo executado cabendo a este arcar com o pagamento do custo respectivordquo 15 Jaacute
os meios executivos de expropriaccedilatildeo eacute a forma ldquopor meio do qual algum bem do patrimocircnio
do devedor eacute expropriado para pagamento do creacutedito (adjudicaccedilatildeo alienaccedilatildeo judicial ou
apropriaccedilatildeo de frutos e rendimentos de empresa ou de estabelecimentos e de outros bens art
825 CPC)rdquo 16
12 Ibid p 48 13 Ibid p 50 14 Ibid p 51 15 Ibid p 51 16 Ibid p 51
11 Jaacute a execuccedilatildeo indireta (ou mandamental) atua ldquo() na vontade do devedor como forma
de compeli-lo ou incentivaacute-lo a cumprir a ordem judicialrdquo 17 Nesse entendimento ainda
leciona Fredie Didier et al 18
Nesses casos o Estado-juiz busca promover a execuccedilatildeo com a colaboraccedilatildeo do executado forccedilando ou incentivando a que ele proacuteprio cumpra a prestaccedilatildeo devida Em vez de o Estado-juiz tomar as providecircncias que deveriam ser tomadas pelo executado o Estado forccedila por meio de coerccedilatildeo psicoloacutegica ou de promessa de recompensa judicial a que o proacuteprio executado cumpra a prestaccedilatildeo
A execuccedilatildeo indireta pode ser patrimonial como por exemplo a imposiccedilatildeo de multa
coercitiva ou pessoal com a prisatildeo civil do devedor de alimentos Ademais adiciona Didier
et al19que
O estiacutemulo ao cumprimento da prestaccedilatildeo pode dar-se pelo temor (p ex multa coercitiva prisatildeo civil do devedor de alimentos divulgaccedilatildeo de notiacutecia em jornal revelando o descumprimento) ou pelo incentivo (p ex a chamada sanccedilatildeo premial ou sanccedilatildeo positiva de que eacute exemplo a isenccedilatildeo do pagamento de custas em caso de cumprimento do mandado monitoacuterio - art 701 sect 1ordm CPC a reduccedilatildeo pela metade dos honoraacuterios advocatiacutecios fixados inicialmente pelo juiacutezo em caso de pagamento integral do deacutebito pecuniaacuterio na execuccedilatildeo por quantia certa fundada em tiacutetulo extrajudicial - art 827 sect 1ordm CPC)
Por tais razotildees haacute uma tendecircncia em cada vez mais prestigiar os meios executivos
indiretos (coercitivos) posto que satildeo tatildeo eficazes quanto os meios executivos diretos
entretanto menos onerosos Contudo sua aplicaccedilatildeo deve ser fiscalizada a fim de natildeo permitir
que a execuccedilatildeo civil perca sua finalidade visto que eacute uma funccedilatildeo jurisdicional que tem como
escopo efetivar o direito do credor e natildeo de atender os interesses do devedor
23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
Os princiacutepios juriacutedicos nos uacuteltimos anos passaram a ser munidos de forccedila cogente
normatizando as condutas humanas tanto quanto as regras juriacutedicas Os ditos princiacutepios
ampliaram as margens de atuaccedilatildeo dos aplicadores do direito possibilitando a construccedilatildeo de
soluccedilotildees mais adequadas agraves especificidades das demandas que chegam ao judiciaacuterio
17 Ibid p 51 18 Ibid p 51 19 Ibid p 51-52
12 Dessa forma eacute necessaacuterio aprofundar-se nos princiacutepios norteadores da execuccedilatildeo civil
para que se obtenha uma anaacutelise completa da teoria geral da execuccedilatildeo
A execuccedilatildeo civil tem como um dos seus corolaacuterios o princiacutepio da efetividade este
consiste na exigecircncia de um sistema completo de tutela executiva no qual existam meios
executivos capazes de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor
de tutela executivardquo 20
O referido princiacutepio da efetividade eacute reforccedilado como normal fundamental do processo
civil brasileiro pelo art 4ordm do CPC ldquoArt 4ordm As partes tecircm o direito de obter em prazo razoaacutevel
a soluccedilatildeo integral do meacuterito incluiacuteda a atividade satisfativa
Jaacute o princiacutepio da boa feacute processual corolaacuterio do devido processo legal estaacute previsto
no art 5ordm do CPC ldquoAquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de
acordo com a boa-feacuterdquo Segundo o processualista baiano Fredie Didier21
O princiacutepio da boa-feacute extrai-se de uma claacuteusula geral processual A opccedilatildeo por uma claacuteusula geral de boa-feacute eacute a mais correta Eacute que a infinidade de situaccedilotildees que podem surgir ao longo do processo torna pouco eficaz qualquer enumeraccedilatildeo legal exaustiva das hipoacuteteses de comportamento desleal Daiacute ser correta a opccedilatildeo da legislaccedilatildeo brasileira por uma norma geral que impotildee o comportamento de acordo com a boa-feacute Em verdade natildeo seria necessaacuteria qualquer enumeraccedilatildeo das condutas desleais o art 5deg do CPC eacute bastante exatamente por tratar-se de uma claacuteusula geral
Dessa forma o dito princiacutepio preconiza que diante de um vinculo juriacutedico as pessoas
envolvidas natildeo poderatildeo frustrar a confianccedila do outro devendo comportar-se como se pode
esperar de uma pessoa de boa-feacute
Ademais disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial que ldquosomente o
patrimocircnio do devedor (art 789 CPC) ou de terceiro responsaacutevel pode ser objeto da
atividade executiva do Estadordquo 22
O referido princiacutepio que determina que somente o patrimocircnio submete-se agrave execuccedilatildeo
e natildeo a pessoa foi trazido pela humanizaccedilatildeo do direito Para o professor Didier et al23 o
20 DIDIER JR Freddie et al apud GUERRA Marcelo Lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do
credor na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 21 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte
geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 105 22 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 68
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desenvolvimento dos meios de execuccedilatildeo indireta ldquoparece relativizar um pouco esse princiacutepio
na medida em que pressionam psicologicamente a pessoa do devedor para que cumpra a
obrigaccedilatildeo com seu comportamentordquo
Complementa ainda que
A responsabilidade executiva parece assumir atualmente caraacuteter hiacutebrido comportando coerccedilatildeo pessoal e sujeiccedilatildeo patrimonial
i) a coerccedilatildeo pessoal incide sobre a vontade do devedor admitindo o uso de medidas coercitivas de execuccedilatildeo indireta para forccedilaacute-lo a cumprir a obrigaccedilatildeo com seu proacuteprio comportamento (ex arts 139 rv 523 sect 1ordm 536 sect 1ordm e 538 sect 3ordm todos do CPC)
ii) descumprida a obrigaccedilatildeo e natildeo sendo possiacuteveladequado o uso de teacutecnica de coerccedilatildeo pessoal tem-se a sujeiccedilatildeo patrimonial que recairaacute sobre os bens do devedor ou de terceiro responsaacutevel - que responderatildeo pela proacutepria prestaccedilatildeo in natura (ex dar coisa ou entregar quantia) ou por perdas e danos24
Dessa forma o referido princiacutepio natildeo tem aplicaccedilatildeo absoluta em razatildeo do principio da
efetividade a qual estimula o uso dos meios de coerccedilatildeo indireta para garantir o cumprimento
da obrigaccedilatildeo pelo devedor
O princiacutepio da primazia da tutela especifica (ou princiacutepio do resultado) assevera que
ldquoA execuccedilatildeo deve ser especiacutefica propiciar ao credor a satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo tal qual
houvesse o cumprimento espontacircneo da prestaccedilatildeo pelo devedorrdquo 25
O CPC de 2015 absorveu todos os avanccedilos legislativos a cerca do mote O caput do
art 497 assegura que na accedilatildeo que tenha por objeto a prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer o
juiz se procedente o pedido concederaacute a tutela especiacutefica ou determinaraacute providecircncias que
assegurem a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico equivalente O art 499 o
complementa a obrigaccedilatildeo somente seraacute convertida em perdas e danos se o autor o requerer
ou se impossiacutevel agrave tutela especiacutefica ou a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico
equivalente
O princiacutepio do contraditoacuterio eacute garantido pela constituiccedilatildeo federal e compreende o
direito de ser ouvido o direito de acompanhar os atos processuais o direito de produzir
provas participar da sua produccedilatildeo manifestar-se sobre a prova produzida e obter do juiz a
23 Ibid p 69-70 24 Ibid p 70 25 Ibid p 71
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respectiva valoraccedilatildeo o direito de ser informado regularmente dos atos praticados no processo
o direito agrave motivaccedilatildeo das decisotildees o direito de impugnar as decisotildees 26
O contraditoacuterio tem aplicaccedilatildeo em todo processo judicial sendo aplicaacutevel tambeacutem na
execuccedilatildeo No entanto o contraditoacuterio na execuccedilatildeo natildeo ocorre com a mesma intensidade que
no processo ou na fase de conhecimento eacute o que assevera Didier et al 27
O contraditoacuterio no procedimento executivo no aspecto do direito de defesa assegurado agrave parte demandada eacute eventual porquanto depende da provocaccedilatildeo do executado que natildeo eacute chamado ajuiacutezo para defender-se mas sim para cumprir a obrigaccedilatildeo O procedimento executivo adota a teacutecnica monitoacuteria que consiste basicamente na inversatildeo do ocircnus de provocar o contraditoacuterio o reacuteu em vez de citado para manifestar-se sobre a pretensatildeo do autor eacute convocado para cumprir uma determinada obrigaccedilatildeo
Logo haacute o contraditoacuterio no procedimento executivo porem eacute eventual quanto agrave defesa
do executado
Ademais o princiacutepio da menor onerosidade eacute consagrado pelo art 805 do CPC e
dispotildee que ldquoQuando por vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz
mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o executadordquo O referido princiacutepio tem o
escopo de impedir o abuso do direito pelo exequente
O principio da menor onerosidade auxilia o juiz na escolha de um meio executivo
adequado e necessaacuterio que satisfaccedila a prestaccedilatildeo exigida pelo credor Nesse sentido eacute o
entendimento do professor Fredie Didier et al 28
O resultado a ser alcanccedilado eacute aquele estabelecido pelo direito material A maneira de se chegar ateacute esse resultado eacute que deve ser a menos onerosa possiacutevel para o executado Isso significa que a opccedilatildeo pelo meio menos gravoso pressupotildee que os diversos meios considerados sejam igualmente eficazes Assim havendo vaacuterios meios executivos aptos agrave tutela adequada e efetiva do direito de creacutedito escolhe-se a via menos onerosa ao executado
O princiacutepio visa impedir a execuccedilatildeo desnecessariamente onerosa ao executado ou seja a execuccedilatildeo abusiva Em vez de enumerar situaccedilotildees em que a opccedilatildeo mais gravosa revelar-se-ia injusta o legislador valeu-se corretamente de uma claacuteusula geral para reputar abusivo qualquer comportamento do credor que pretender valer-se de meio executivo mais oneroso do que outro igualmente idocircneo agrave satisfaccedilatildeo do seu creacutedito
26 Ibid p 76 27 Ibid p 78 28 Ibid p 79-80
15 O princiacutepio da cooperaccedilatildeo tem como base os princiacutepios do devido processo legal da
boa-feacute processual e do contraditoacuterio O dito princiacutepio avigora a eacutetica processual com o
aprimoramento do diaacutelogo entre as partes reciprocamente e com o oacutergatildeo jurisdicional Eacute o
que preconiza o art 6ordm do CPC Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para
que se obtenha em tempo razoaacutevel decisatildeo de meacuterito justa e efetiva
No procedimento executivo o princiacutepio da cooperaccedilatildeo incide de diversas formas
disciplina Didier et al29 que na execuccedilatildeo
O executado tem o dever de indicar bens agrave penhora (art 774 V CPC) Natildeo encontrados bens penhoraacuteveis e natildeo havendo indicaccedilatildeo de qualquer um deles pelo exequente cabe ao executado declarar quais satildeo seus bens penhoraacuteveis sob pena de se sujeitar a uma sanccedilatildeo pecuniaacuteria compulsoacuteria
Tambeacutem eacute manifestaccedilatildeo do princiacutepio da cooperaccedilatildeo a exigecircncia de que o executado que pretende impugnar o valor da execuccedilatildeo apresente de logo o valor que reputa devido (art 525 sect 4ordm CPC) Seria comportamento natildeo-cooperativo afirmar que a cobranccedila eacute excessiva sem simultaneamente dizer qual eacute o valor correto
Demais disso aplicam-se agrave execuccedilatildeo os deveres que decorrem do princiacutepio da cooperaccedilatildeo e que satildeo imputados ao oacutergatildeo jurisdicional () Assim por exemplo deve o juiz advertir ao executado antes de puni-lo de que seu ato pode vir a caracterizar-se como atentatoacuterio agrave dignidade da jurisdiccedilatildeo ( art 772 II CPC) perceba que se trata de uma conduta compatiacutevel com o dever de prevenccedilatildeo O oacutergatildeo jurisdicional somente pode conhecer da prescriccedilatildeo ex officio dando a oportunidade de o exequente manifestar-se conforme impotildee o dever de consulta ( cf arts 10 487 paraacutegrafo uacutenico e 921 sect 5ordm CPC)
O princiacutepio ou postulado30 da proporcionalidade tem aplicaccedilatildeo muito relevante na
execuccedilatildeo O art 8 do CPC assegura que o oacutergatildeo jurisdicional tem o dever de observar a
proporcionalidade e a razoabilidade ao aplicar o ordenamento juriacutedico inclusive no
procedimento executivo
Ademais o art 805 do CPC eacute categoacuterico ao disciplinar que ldquoArt 805 Quando por
vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo
menos gravoso para o executadordquo O referido artigo jaacute se trata de uma concretizaccedilatildeo da
proporcionalidade
29 Ibid p 82 30 Segundo Fredie Didier et al haacute uma discussatildeo doutrinaacuteria sobre a proporcionalidade Parte da
doutrina acredita que a proporcionalidade eacute um princiacutepio e outra parte acredita que eacute um postulado normativo
16 O principio da adequaccedilatildeo pode ser vislumbrado em dois momentos do Direito
Processual ldquoa) no legislativo como orientador da confecccedilatildeo das leis b) no jurisdicional
autorizando ao juiz diante do caso concreto adaptar procedimento agraves suas peculiaridadesrdquo 31
Para Luceacutelia de Sena Alves e Tiago Retes32
Isso quer dizer que no momento legislativo o devido processo deve ser observado pelo legislador para a confecccedilatildeo das normas de direito processual que iratildeo servir de instrumento efetivo de concretizaccedilatildeo do direito substancial a ser tutelado atendendo a todas as suas finalidades sob pena de falecircncia do proacuteprio direito No momento jurisdicional da mesma forma a via processual escolhida pelo autor tambeacutem deve estar sujeita a este princiacutepio para que natildeo sofra as mesmas consequecircncias da sua inobservacircncia
O ordenamento juriacutedico deve ser aplicado por meio da teacutecnica processual adequada
evitando dessa forma uma tutela ineficaz
Por fim o princiacutepio do autorregramento da vontade na execuccedilatildeo tem o objetivo de
ldquo() preservar um espaccedilo processual para o exerciacutecio da liberdade e da vontade em que
sejam permitidas negociaccedilotildees que envolvam as partes ndash e tambeacutem o juizrdquo33 Didier et al34
assevera que
A rigor o legislador estabelece um regime juriacutedico de autorregramento da vontade processual identificando-se algumas manifestaccedilotildees relevantes para a execuccedilatildeo Na verdade pode-se dizer que poucos satildeo os ambientes mais propiacutecios do que a execuccedilatildeo para a negociaccedilatildeo sobre o processo Todos os institutos e normas processuais relativos agrave execuccedilatildeo devem ser repensados a partir da premissa de que o CPC permite uma ampla margem de liberdade de negociaccedilatildeo sobre o processo (art 190 CPC)
O autorregramento da vontade pode ser vislumbrando na previsatildeo de negoacutecios tiacutepicos
em sede de execuccedilatildeo como por exemplo no acordo das partes sobre o valor do bem que
dispensa a avaliaccedilatildeo disposto no inciso I do art 871 CPC Ademais dentro dos limites do art
190 do CPC eacute possiacutevel na execuccedilatildeo a atribuiccedilatildeo da negociaccedilatildeo atiacutepica aos sujeitos 31 ALVES Luceacutelia de Sena Alves RETES Tiago O poder geral de efetivaccedilatildeo das decisotildees judiciais e
proporcionalidade uma anaacutelise criacutetica acerca do art 139 IV do Novo Coacutedigo de Processo Civil Disponiacutevel em lthttpswwwacademiaedu31752652O_poder_geral_de_efetivaC3A7C3A3o_das_decisC3B5es_judiciais_e_a_proporcionalidade_uma_anC3A1lise_crC3ADtica_acerca_do_art_139_IV_do_Novo_CC3B3digo_de_Processo_Civil gt Acesso em 25 de julho de 2018
32 Ibid natildeo paginado 33 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 85 34 Ibid p 85
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processuais permitindo que sejam feitas mudanccedilas nos procedimentos e nas situaccedilotildees
juriacutedicas processuais ldquoSatildeo exemplos de negoacutecios processuais atiacutepicos na execuccedilatildeo pacto de
penhorabilidade acordo de ampliaccedilatildeo de prazos das partes de qualquer natureza acordo de
rateio de despesas processuais ()rdquo35
24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO
Sempre houve diversos questionamentos quanto agrave eficaacutecia do Direito processual Civil
e se o mesmo era meio apto a assegurar a tutela jurisdicional dos direitos dos cidadatildeos O
processo de execuccedilatildeo eacute o setor que sofre mais criacuteticas quanto a sua ineficiecircncia afinal a
execuccedilatildeo civil sempre foi o ldquocalcanhar de Aquilesrdquo do sistema processual pela praxe do
ldquoganhou (no processo de conhecimento) mas natildeo levou (na fase de cumprimento ou
execuccedilatildeo)rdquo 36
Essa dificuldade de se efetivar a tutela satisfastiva natildeo se resume a um problema de
mera teacutecnica processual tiacutepico de determinado ordenamento mas representa uma prova de
fogo da capacidade dos instrumentos jurisdicionais O autor Leonardo Greco37 no ano de
2005 atribuiu esse fato as seguintes causas o excesso de processos o custo e a morosidade da
justiccedila a inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios a ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais
um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico e a progressiva volatizaccedilatildeo dos bens
Quanto ao excesso de processos o referido autor aduz que ldquonos grandes centros o
crescimento da maacutequina judiciaacuteria natildeo acompanhou a expansatildeo do nuacutemero de litiacutegiosrdquo 38
O custo e morosidade da justiccedila prejudicam a tutela satisfativa posto que
ldquojaacute desfalcado pelo inadimplemento do devedor o credor ainda tem de arcar com o adiantamento das despesas do processo de execuccedilatildeo e de eventual liquidaccedilatildeo vendo arrastar-se a marcha dos atos executoacuterios facilmente retardada por atos procrastinatoacuterios do devedorrdquo 39
35 Ibid p 86 36 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca
para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018
37 GRECCO Leonardo A Crise do Processo de Execuccedilatildeo in Estudos de direito processual Leonardo Greco ndash Campos dos Goytacazes Ed Faculdade de Direito de Campos 2005 p 7
38 Ibid p 7 39 Ibid p 7-8
18 A inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios contribui para a crise do processo de
execuccedilatildeo tendo em vista que
ldquoo juiz da execuccedilatildeo prisioneiro de ritos que o distanciam das partes e da realidade da vida impulsiona sem qualquer apetite a execuccedilatildeo conduzindo-a ao sabor dos ventos das provocaccedilotildees impacientes do credor e das costumeiras procrastinaccedilotildees do devedorrdquo 40
Jaacute ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais atrapalha a efetivaccedilatildeo da tutela satisfativa ldquoo
devedor natildeo colabora com a execuccedilatildeo e os meios de pressatildeo que a lei estabelece natildeo satildeo
suficientes para intimidaacute-lordquo 41
Com um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico
O espiacuterito empresarial e a sociedade de consumo estimulam o endividamento das pessoas e o inadimplemento das obrigaccedilotildees pelo devedor deixou de ser vexatoacuterio e reprovaacutevel o que multiplica as accedilotildees de cobranccedila e execuccedilotildees atraveacutes das quais o sujeito passivo ainda usufrui vantagens agraves custas do credor 42
Por fim Leonardo Greco elenca a volatizaccedilatildeo dos bens como o uacuteltimo fator que
macula o processo executo tendo em vista que
ldquomudou inteiramente o perfil patrimonial das pessoas antes concentrado em bens de raiz e agora tendencialmente dirigido a investimentos em tiacutetulos e valores facilmente negociaacuteveis o que dificulta a sua localizaccedilatildeo pelo credorrdquo 43
O Coacutedigo de Processo Civil de 1973 introduziu o sistema executivo ao ordenamento
juriacutedico paacutetrio e seguindo os valores liberais da eacutepoca com a proteccedilatildeo de esfera juriacutedica de
liberdade do cidadatildeo contra a possibilidade de arbiacutetrio do Estado e uso indevido do Poder
jurisdicional outorgou o miacutenimo de poder ao juiz Seguindo as regras do CPC de 73 o
devedor soacute poderia ter sua esfera juriacutedica invadida atraveacutes de meios de execuccedilatildeo instituiacutedos
previamente em lei
Diante de tantos obstaacuteculos para se efetivar a tutela satisfativa a execuccedilatildeo estava
fadada ao fracasso o que frustrava a expectativa do jurisdicionado a uma prestaccedilatildeo da tutela
jurisdicional ceacutelere e efetiva Insatisfeitos com o cenaacuterio que se encontrava a atividade
40 Ibid p 8 41 Ibid p8 42 Ibid p 8 43 Ibid p8
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executiva legisladores e operadores do direito natildeo mediram esforccedilos para promover uma
evoluccedilatildeo significativa buscando mais eficiecircncia e celeridade ao procedimento executoacuterio
Dessa forma no final de 1994 foi introduzido no coacutedigo de processo agrave flexibilizaccedilatildeo
dos poderes executoacuterios do juiz ldquopara que ele pudesse prestar uma tutela efetiva aos direitos
ficando autorizado a determinar a modalidade de execuccedilatildeo adequada a cada hipoacutetese nas
obrigaccedilotildees de fazer e natildeo fazer (art 461 sect5ordm do CPC de 1973)rdquo No ano de 2002 a referida
medida foi estendida para as obrigaccedilotildees de entregar coisa (art 461-A caput e sect3ordm do CPC de
1973)
Com fundamento nos artigos 461 e 461-A em 2005 a Lei nordm 11 23205 unificou o
processo de conhecimento e o processo de execuccedilatildeo de sentenccedila Nesse sentido Maacuterio
Henrique Cavalcanti Gil Rodrigues44 aduz que
A Lei 112322005 reuniu de forma definitiva os processos de conhecimento e de execuccedilatildeo em um uacutenico processo composto por um sistema bifaacutesico Assim passa a existir uma fase inicial (de reconhecimento) e uma fase posterior (de cumprimento de sentenccedila de efetivaccedilatildeo da decisatildeo definitiva) sem contar com a eventual fase intermediaacuteria de liquidaccedilatildeo (RODRIGUES 2010 p 38)
Ademais as alteraccedilotildees realizadas no CPC de 73 inseriu a atipicidade dos meios
executivos nas obrigaccedilotildees de fazer natildeo fazer e dar coisa certa entretanto exercendo papel
subsidiaacuterio aos meios tiacutepicos
Quanto agraves obrigaccedilotildees de pagar quantia havia apenas a possibilidade de se valer da
incidecircncia de multa do art 475-J do CPC de 73 ndash implementada mediante reforma perpetrada
pela Lei nordm 11232 de 2005 em atendimento a doutrina processualista preocupada com a
efetividade das decisotildees ndash e de atos executivos como a penhora de bens e dinheiro
Ainda que a execuccedilatildeo tenha avanccedilado com a inserccedilatildeo das leis posteriores a 1994 no
CPC de 1973 a mesma continuava insuficiente tendo em vista que a burocracia e lentidatildeo
dos atos executivos davam brechas para que o devedor escondesse seu patrimocircnio penhoraacutevel
tornando carente de efetividade e celeridade agrave execuccedilatildeo
44 RODRIGUES Maacuterio Henrique Cavalcanti Gil A evoluccedilatildeo da execuccedilatildeo de sentenccedila no direito
processual civil e o novo regime juriacutedico das sentenccedilas apoacutes a reforma implementada pela Lei 112322005 Revista do Tribunal Regional Federal da 1ordf Regiatildeo v 22 n 2 fev 2010 p 38
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25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO
A tutela juridiscional eacute um direito fundamental previsto no art 5ordm inciso XXXV da
Carta Magna ldquo() a lei natildeo excluiraacute da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio lesatildeo ou ameaccedila a
direitordquo
Na visatildeo claacutessica o direito de accedilatildeo era efetivado com a prolaccedilatildeo de uma sentenccedila de
meacuterito posiccedilatildeo adotada por grande parte dos processualistas seguidores da doutrina de
Liebman Todavia esse conceito se mostra defasado tendo em vista que o direito de acesso agrave
justiccedila natildeo eacute apenas uma garantia formal de bater as portas do judiciaacuterio mas a garantia de
acesso agrave ordem juriacutedica justa adequada e eficaz45
Acreditar que uma sentenccedila de meacuterito favoraacutevel eacute tutela jurisdicional suficiente para
satisfazer o que se busca com o ajuizamento da accedilatildeo eacute uma visatildeo distorcida da atividade
satisfativa ldquoSob o ponto de vista do direito material a condenaccedilatildeo por si soacute eacute incapaz de
prestar a tutela do direitordquo46
Nessa oacutetica o direito fundamental agrave tutela executiva exige um sistema de tutela
jurisdicional ldquocapaz de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor
de tutela executivardquo47 Dessa forma entende-se que
ldquo() a) a interpretaccedilatildeo das normas que regulamentam a tutela executiva tem de ser feita no sentido de extrair a maior efetividade possiacutevel b) o juiz tem o poder-dever de deixar de aplicar uma norma que imponha uma restriccedilatildeo a um meio executivo sempre que essa restriccedilatildeo natildeo se justificar como forma de proteccedilatildeo a outro direito fundamental c) o juiz tem o poder-dever de adotar os meios executivos que se revelem necessaacuterios agrave prestaccedilatildeo integral de tutela executivardquo48
Egrave imperioso compreender que o direito fundamental agrave tutela executiva ratificado
pelo CPC eacute essencial para dirimir diversos litiacutegios oriundos do procedimento executivo
45 FERREIRA Gabriela Macedo Poder geral de efetivaccedilatildeo em defesa da constitucionalidade da
teacutecnica de execuccedilatildeo dos direitos do art 139 IV do Coacutedigo de Processo Civil Revista Jus Navigandi ISSN 1518-4862 Teresina ano 22 n 5178 4 set 2017 Disponiacutevel em lthttpsjuscombrartigos60190gt Acesso em 11 set 2018
46 Ibid natildeo paginado 47 DIDIER JR Fredie et al apud GUERRA Marcelo lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do credor
na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 48 Ibid p 102-104
21
ldquoprincipalmente aqueles relacionados agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo49
Fredie Didier et al50 cita como exemplo as hipoacuteteses de impenhorabilidade
A impenhorabilidade de certos bens eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa
Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais
Por esta razatildeo o legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do
CPC fazendo um preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses das partes envolvidas
optando pela mitigaccedilatildeo do direito do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado
Quando o oacutergatildeo jurisdicional verificar que a aplicaccedilatildeo das regras de
impenhorabilidade eacute desproporcional para o caso concreto deve afastaacute-la e construir a
soluccedilatildeo adequada para o referido caso Didier et al51 traz um exemplo esclarecedor em sua
obra
O bem imoacutevel que serve de moradia da famiacutelia eacute relativamente impenhoraacutevel Objetiva-se com essa restriccedilatildeo proteger o direito fundamental agrave moradia conteuacutedo do direito agrave proteccedilatildeo da dignidade Imagine-se um imoacutevel de altiacutessimo valor Imagine-se agora um creacutedito que corresponda a 40 do valor do imoacutevel A venda judicial do imoacutevel no caso permitiria natildeo soacute satisfazer o direito do credor como ainda garantir ao executado com a sobra a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel que lhe preserve a dignidade A opccedilatildeo pela interpretaccedilatildeo literal da regra que veda a penhora protegeria exclusivamente o direito do executado de maneira desnecessaacuteria porque a relaccedilatildeo valor executadovalor do bem permitiria a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel apoacutes a entrega do dinheiro ao credor Seria pois interpretaccedilatildeo em desconformidade com os preceitos da contemporacircnea hermenecircutica constitucional que preconiza a necessidade de nos casos de choque entre direitos fundamentais dar a interpretaccedilatildeo que mais adequadamente proteja a ambos
A execuccedilatildeo civil integra o direito fundamental agrave tutela jurisdicional disciplinando
que ldquoos dispositivos devem ser interpretados de modo que se garanta a maior efetividade
49 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66 50 Ibid p 66 51 Ibid p 67
22
possiacutevel agrave execuccedilatildeo desde que respeitados outros direitos fundamentaisrdquo52 Podendo ser
afastada desde que proporcional qualquer obstaacuteculo irrazoaacutevel agrave efetivaccedilatildeo desse direito
52 FERREIRA Gabriela Macedo apud MACEDO Lucas Buril de As eficaacutecias das decisotildees judiciais e
o cumprimento de sentenccedila no CPC15 Novo CPC Doutrina selecionada v 5 Execuccedilatildeo Coordenador geral Fredie Didier Jr organizadores Lucas Buril de Macedo Ravi Peixoto Alexandre Freire ndash Salvador Jus Podivm 2015 p 360361
23
3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO
EXECUTADO
31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS
Como forma de controlar a atividade jurisdicional por muito tempo vigorou o
entendimento de que a execuccedilatildeo somente poderia ser realizada atraveacutes dos meios executivos
tipicamente previstos na legislaccedilatildeo Segundo Luiz Guilherme Marinoni53
O princiacutepio da tipicidade deseja significar que os meios de execuccedilatildeo devem estar previstos na lei e assim que a execuccedilatildeo natildeo pode ocorrer atraveacutes de formas executivas natildeo tipificadas O seu objetivo eacute de um lado impedir que meio executivo natildeo previsto em lei possa ser utilizado e de outro garantir o jurisdicionado contra a possibilidade de arbiacutetrio judicial na fixaccedilatildeo da modalidade executiva Se o jurisdicionado sabe em razatildeo de previsatildeo legal que a sua esfera juriacutedica somente poderaacute ser invadida atraveacutes de determinadas modalidades executivas confere-se a ele a possibilidade de antever a reaccedilatildeo ao seu inadimplemento bem como a garantia de que a jurisdiccedilatildeo natildeo determinaraacute ou permitiraacute a utilizaccedilatildeo de meio executivo diverso daqueles previstos
Dessa forma o princiacutepio da tipicidade disciplina que o oacutergatildeo julgador ao proceder agrave
execuccedilatildeo estaacute limitado aos meios executivos previamente definidos em lei natildeo podendo se
valer de qualquer teacutecnica de efetivaccedilatildeo que natildeo se encaixasse nas hipoacuteteses taxativas da
legislaccedilatildeo
Entretanto o legislador natildeo tem como prever todas as peculiaridades dos direitos
dignos de tutela executiva e preordenar teacutecnicas executivas diversas para cada peculiaridade
Sob esse cenaacuterio o principio da tipicidade foi cedendo lugar ao principio da atipicidade dos
meios executivos
A ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do oacutergatildeo julgador estaacute cada vez mais presente
no ordenamento juriacutedico paacutetrio motivando um poder geral de efetivaccedilatildeo ldquoque permite ao
julgador valer-se dos meios executivos que considerar mais adequado ao caso concreto sejam
eles de coerccedilatildeo direta sejam de coerccedilatildeo indiretardquo 54
53 MARINONI Luiz Guilherme Teacutecnica processual e tutela dos direitos Satildeo Paulo Editora Revista
dos Tribunais 2004 p 212 nota 79 54 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 100
24
Essa tendecircncia de ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do juiz natildeo eacute exclusividade do
ordenamento juriacutedico brasileiro segundo Fredie Didier et al55
Michelle Taruffo jaacute apontava que o direito americano diante da inefetividade dos meios executivos at law comeccedilou a autorizar o magistrado a tomar medidas executivas adequadas ao caso concreto Trata-se afirma o jurista italiano de aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo segundo o qual as regras processuais devem ser adaptadas agraves necessidades do direito material
Os meios executivos atiacutepicos derivam de trecircs enunciados normativos do Coacutedigo de
Processo Civil o art 139 IV o art 297 e o sect1ordm do art 536
O art 139 IV do CPC dispotildee que pertence ao juiz o poder-dever de ldquodeterminar
todas as medidas indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para
assegurar o cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto
prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo
Jaacute o art 297 do CPC cuida da tutela provisoacuteria e garante que ldquoo juiz poderaacute
determinar as medidas que considerar adequadas para a efetivaccedilatildeo da tutela provisoacuteriardquo
Podendo dessa forma a dita tutela ser efetivada atipicamente
Por fim o art 536 sect1ordm do CPC dispotildee que
Para atender ao disposto no caput o juiz poderaacute determinar entre outras medidas a imposiccedilatildeo de multa a busca e apreensatildeo a remoccedilatildeo de pessoas e coisas o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva podendo caso necessaacuterio requisitar o auxilio de forccedila policial
As supracitadas medidas executivas atiacutepicas satildeo entendidas pela doutrina como
claacuteusulas gerais processuais executivas56 Essas claacuteusulas gerais natildeo restringem a sua
aplicaccedilatildeo agraves teacutecnicas de coerccedilatildeo indireta satildeo autorizados tambeacutem o uso de meios de execuccedilatildeo
dieta e indireta
Ademais cumpre salientar que o art 139 IV CPC aplica-se a toda e qualquer
atividade executiva ldquoa) seja fundada em tiacutetulo executivo judicial (provisoacuteria ou definitiva)
55 DIDIER JR Fredie et al apud TARUFFO Michelle A atuaccedilatildeo executiva dos direitos perfis
comparatiacutesticos Revista de Processo Satildeo Paulo RT 1990 n 59 p 78 56 Segundo Fredie Didier et al claacuteusula geral eacute uma espeacutecie de texto normativo cujo antecedente
(hipoacutetese faacutetica) eacute composto por termos vagos e consequente (efeito juriacutedico) eacute indeterminado
25
seja fundada em tiacutetulo executivo extrajudicial b) seja para efetivar prestaccedilatildeo pecuniaacuteria seja
para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer ou dar coisa distinta de dinheirordquo57
Jaacute o art 297 do CPC garante que a tutela provisoacuteria possa ser efetivada tambeacutem
atipicamente ldquoSucede que a atipicidade da tutela provisoacuteria segue necessariamente a
atipicidade da tutela definitivardquo 58
Por fim o comando do sect 1 ordmdo art 536 se aplica
a) inicialmente agrave execuccedilatildeo de fazer e de natildeo fazer fundada em decisatildeo judicial (provisoacuteria ou definitiva) b) por forccedila do sect 3ordm do art 538 tambeacutem se aplica ao cumprimento de sentenccedila para entrega de coisa c) por forccedila do art 771 paraacutegrafo uacutenico o dispositivo tambeacutem se aplica agrave execuccedilatildeo para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer e entregar coisa distinta de dinheiro fundada em tiacutetulo extrajudicial
Claramente o art 139 IV eacute mais amplo do que o sect 1 ordm do art 536 estende-se por
disposiccedilatildeo expressa agrave execuccedilatildeo de pagar quantia Sendo uma grande novidade nas obrigaccedilotildees
que tem por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15
O art 139 IV do CPC apresentou uma novidade agrave atipicidade dos meios executivos
ao disciplinar que cabe ao juiz ldquodeterminar todas as medidas indutivas coercitivas
mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o cumprimento de ordem judicial
inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo
A inovaccedilatildeo estaacute na possibilidade de utilizar os meios atiacutepicos para assegurar o
cumprimento de decisotildees que versam sobre as obrigaccedilotildees pecuniaacuterias sendo admitida a
utilizaccedilatildeo de outros meios ateacute na execuccedilatildeo de titulo judicial de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria aleacutem da
multa de 10 (a que se refere o artigo 523 sect 1ordm do CPC) para forccedilar o devedor a cumprir a
obrigaccedilatildeo pecuniaacuteria
57 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 105 58 Ibid p 105
26
Dessa forma eacute possiacutevel afirmar que ldquoao lado da disciplina tiacutepica do art 523 e
seguintes () o novo CPC inova ao permitir que o sistema de teacutecnicas executivas atiacutepicas
sejam empregadas na execuccedilatildeo monetaacuteriardquo59 (ZARONI VITORELLI 2016 p 66)
Fernando da Fonseca Gajardoni60 denomina a dita medida como a ldquorevoluccedilatildeo
silenciosardquo da execuccedilatildeo por quantia certa posto que
() pelo fato de que a regra natildeo estar propriamente incrustrada nos capiacutetulo e livro atinentes ao cumprimento de sentenccedila e ao processo de execuccedilatildeo ndash o art 139 IV do Novo CPC parece trazer ao paiacutes algo bastante novo cuja aplicaccedilatildeo a depender do comportamento do Judiciaacuterio pode implicar em verdadeira revoluccedilatildeo (positiva ou negativa) na sistemaacutetica executiva ateacute entatildeo vigente
Claramente o dispositivo foi recebido com entusiasmo por parte da doutrina que
anteciparam em afirmar que o princiacutepio da atipicidade dos meios executivos no CPC2015
ldquo() assume a feiccedilatildeo de poder-dever geral conferido ao magistrado de determinar () todas
as medidas coercitivas sub-rogatoacuterias mandamentais e indutivas que entender necessaacuterias
para a tutela justa efetiva e em tempo razoaacutevelrdquo 61
Dessa forma lecionam Luiz Guilherme Marinoni Seacutergio Cruz Arenhart e Daniel
Mitidiero62 que
O juiz a partir do art 139 IV do CPC2015 natildeo estaacute mais adstrito apenas agrave sentenccedila condenatoacuteria ndash que fixa a obrigaccedilatildeo de pagar e daacute ensejo agrave abertura da execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo patrimonial ndash para a tutela de prestaccedilotildees pecuniaacuterias Pode impor essa prestaccedilatildeo por meio de ordem judicial acoplada ao aceno de emprego de medida de induccedilatildeo (coercitiva ou de pressatildeo positiva) ou de medida de sub-rogaccedilatildeo (MARINONI ARENHARDT MITIDIERO 2015 p 703)
Deste modo em razatildeo do art 139 IV do CPC tem-se entendido que o juiz nas
execuccedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria possui a faculdade de adotar qualquer
59 ZARONI Bruno Marzullo VITORELLI Edilson Reforma e efetividade da execuccedilatildeo no novo CPC
In PEIXOTO Ravi FREIRE Alexandre MENDES Aluiacutesio Gonccedilalves de Castro Execuccedilatildeo 2 ed rev e atual Salvador JusPodivm 2016 766 p (Coleccedilatildeo novo CPC doutrina selecionada v 5) p 66
60 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia 24082015 JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Acesso em 23082018
61 LIMA Rafael de Oliveira A atipicidade dos meios executivos no coacutedigo de processo civil brasileiro de 2015 Revista de Processo Jurisdiccedilatildeo e Efetividade da Justiccedila v 2 n 2 juldez 2016 p 11
62 MARINONI Luiz Guilherme ARENHART Seacutergio Cruz MITIDIERO Daniel Novo curso de processo civil tutela dos direitos mediante procedimento comum Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 v 2 p 703
27
medida indutiva coercitiva mandamentais ou sub-rogatoacuterias para efetivar o creacutedito do
exequente natildeo se limitando as medidas tiacutepicas
Alguns doutrinadores se precipitaram ao afirmar que o dito dispositivo ldquo() autoriza o
juiz a utilizar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir ressalvando-se a prisatildeo
civil constitucionalmente limitada ao devedor de alimentosrdquo 63 Acreditam Jorge Bheron
Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa que o entusiasmo por parte da
doutrina abre margem para as mais variadas formas de compelir o devedor a cumprir com a
prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
ldquoE aiacute persistindo no mau vezo de fazer explicaccedilotildees em abstrato ignorando que o sentindo soacute se daacute na aplicaccedilatildeo (situaccedilatildeo concreta real ou fictiacutecia) as sugestatildeo satildeo as mais engenhosas suspensatildeo de CNH retenccedilatildeo de passaporte restriccedilatildeo de fim de semana cancelamento de cartotildees de creacutedito ndash para ficar apenas nestasrdquo 64
Ou seja podendo o juiz natildeo apenas substituir o devedor tomando seu patrimocircnio para
entregar ao credor na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia como tambeacutem poderaacute
pressionaacute-lo psicologicamente a adimplir por conta proacutepria a obrigaccedilatildeo
Ademais o Enunciado nordm 48 do ENFAM avalia expressamente a possibilidade de
imposiccedilatildeo de medidas coercitivas para a efetivaccedilatildeo da execuccedilatildeo pecuniaacuteria Conforme o dito
enunciado
ldquoO art 139 inciso IV traduz um poder geral de efetivaccedilatildeo permitindo a aplicaccedilatildeo de medidas atiacutepicas para garantir o cumprimento de qualquer ordem judicial inclusive no acircmbito do cumprimento de sentenccedila e no processo de execuccedilatildeo baseado em tiacutetulosrdquo
Dessa forma o artigo 139 IV do CPC permite uma gama ampla de interpretaccedilotildees por
parte da doutrina por ser uma claacuteusula geral encontrando limite apenas na imaginaccedilatildeo de
quem o analisa Nesse sentido eacute forccediloso orientar e delimitar o manejo desse artigo legal para
que se extraia seu sentido e alcance revelando assim sobre que situaccedilotildees ele incide de que
modo e o que permite
63 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
64 Ibid sem paginaccedilatildeo
28
32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER
GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
O artigo 139 IV com a vigecircncia do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 abriu margem
para uma constelaccedilatildeo de decisotildees nas quais o dito dispositivo recebeu diversas interpretaccedilotildees
pelos operadores do direito
Sem duacutevidas por ser uma das pioneiras a decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara
Ciacutevel do Foro Regional de Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-
1320138260011 na data de 25 de agosto de 2016 gerou um enorme rebuliccedilo
Nessa accedilatildeo que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto
uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a
suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o
passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito
Segundo a magistrada o processo tramitava haacute anos sem que nenhum valor tenha sido
pago ao exequente aleacutem do devedor natildeo ter oferecido proposta de acordo e nem ter indicado
bens agrave penhora configurando uma completa desiacutedia com o processo
ldquoO caso tratado nos autos se insere dentre as hipoacuteteses em que eacute cabiacutevel a aplicaccedilatildeo do art 139 inciso IV do Coacutedigo de Processo Civil Isso porque o processo tramita desde 2013 sem que qualquer valor tenha sido pago ao exequente Todas as medidas executivas cabiacuteveis foram tomadas sendo que o executado natildeo paga a diacutevida natildeo indica bens agrave penhora natildeo faz proposta de acordo e sequer cumpre de forma adequada as ordens judiciais frustrando a execuccedilatildeo
Se o executado natildeo tem como solver a presente diacutevida tambeacutem natildeo recursos para viagens internacionais ou para manter um veiacuteculo ou mesmo manter um cartatildeo de creacutedito Se poreacutem mantiver tais atividades poderaacute quitar a diacutevida razatildeo pela qual a medida coercitiva poderaacute se mostrar efetiva
Assim como medida coercitiva objetivando a efetivaccedilatildeo da presente execuccedilatildeo defiro o pedido formulado pelo exequente e suspendo a Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo do executado M A S determinando ainda a apreensatildeo de seu passaporte ateacute o pagamento da presente diacutevida
()
Determino ainda o cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado ateacute o pagamento da presente diacutevida ()rdquo
Foi impetrado Habeas Corpus no Tribunal de Justiccedila do Estado de Satildeo Paulo a favor
do executado sob o fundamento que a coaccedilatildeo era ilegal e afetava o direito de locomoccedilatildeo
29
garantido constitucionalmente Tendo sido concedida a liminar em decisatildeo que ora se
reproduz
Em que pese a nova sistemaacutetica trazida pelo art 139 IV do CPC2015 deve-se considerar que a base estrutural do ordenamento juriacutedico eacute a Constituiccedilatildeo Federal que em seu art 5ordm XV consagra o direito de ir e vir Ademais o art 8ordm do CPC2015 tambeacutem preceitua que ao aplicar o ordenamento juriacutedico o juiz natildeo atentaraacute apenas para a eficiecircncia do processo mas tambeacutem aos fins sociais e agraves exigecircncias do bem comum devendo ainda resguardar e promover a dignidade da pessoa humana observando a proporcionalidade a razoabilidade e a legalidade Por tais motivos concedo a liminar pleiteada65
Cabe destacar aqui o voto vencido da Desembargadora Maria Luacutecia Pizzotti no
julgamento do Habeas Corpus supracitado demonstrando que o debate sobre a abrangecircncia
do artigo 139 IV do CPC ocorre tanto na doutrina quanto no judiciaacuterio
O objetivo do novel dispositivo natildeo eacute impor penas ou restringir direitos natildeo sendo intenccedilatildeo do Judiciaacuterio suspender indefinidamente o direito de dirigir do executado ou sua liberdade de viajar mas sim impor uma restriccedilatildeo tatildeo gravosa caso ele natildeo cumpra a determinaccedilatildeo que escolha cumprir sua obrigaccedilatildeo e dar fim ao problema Em outras palavras mediante as medidas de coerccedilatildeo o Estado procura persuadir o inadimplente impondo-lhe situaccedilotildees tatildeo onerosas e inconvenientes que em algum momento seja para ele mais vantajoso cumprir do que permanecer no inadimplemento
Ao fazecirc-lo o Novo Coacutedigo de Processo Civil rompe com as criacuteticas da ineficiecircncia das execuccedilotildees Natildeo se cogita deferir medidas restritivas agravequeles que demonstram a incapacidade absoluta de solver o deacutebito apenas agravequeles que reconhecidamente se valem de artimanhas e subterfuacutegios para evitar a satisfaccedilatildeo das diacutevidas ldquopreferindordquo outras despesas mais lsquonobresrsquo agindo em nome de terceiros e fazendo escaacuternio dos credores e do proacuteprio Poder Judiciaacuterio (hellip)
Para tanto memoraacutevel a noccedilatildeo de que a medida em comento tem caraacuteter excepcional e encontra limites no plano da proporcionalidade como sustenta o ilustrado Magistrado paulista Fernando da Fonseca Gajardoni Professor Faculdade de Direito de Ribeiratildeo Preto da USP (in httpswwwjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 acesso em 091216 agraves 11h20min) E para anaacutelise da proporcionalidade a ponderaccedilatildeo deve observar os trecircs passos apontados pela doutrina a necessidade a adequaccedilatildeo e a proporcionalidade em sentido estrito
65 TJSP - Habeas Corpus Processo nordm 2183713-8520168260000 30ordf Cacircmara Direito Privado relator
Des Marcos Ramos j 290317
30
Ademais no entendimento de Jorge Amaury Maia Nunes e Guilherme Pupe de
Noacutebrega66 essa decisatildeo releva os perigos trazidos pelo art 139 IV do CPC ao confrontar
direitos constitucionalmente garantidos
De nossa parte entendemos que a liberdade de locomoccedilatildeo inserta no inciso XV do artigo 5ordm que abrange o direito de deixar o territoacuterio nacional sofre embaraccedilo indevido pela apreensatildeo de passaporte ou pela suspensatildeo da carteira nacional de habilitaccedilatildeo
()
Agrave luz da exposiccedilatildeo feita acima e em anaacutelise primeva sustentamos que o artigo 139 IV do CPC de 2015 estaacute a merecer declaraccedilatildeo de inconstitucionalidade sem reduccedilatildeo de texto para o fim de rechaccedilar a apreensatildeo de passaporte a suspensatildeo do direito de dirigir e a vedaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo em concurso ou em licitaccedilatildeo puacuteblicos como medidas passiacuteveis de serem adotadas pelo juiz sob pena de vulneraccedilatildeo aos artigos 1ordm IV 5ordm XV e LIV 37 I 173 sect 3ordm III e 175 todos da Constituiccedilatildeo
Apesar de ter sofrido duras criacuteticas a decisatildeo do processo de nordm 4001386-
1320138260011 serviu de inspiraccedilatildeo para tantas outras decisotildees no mesmo sentido
Foi o caso da decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de Satildeo
Vicente em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 0020724-2620088260590 na data de 21 de
junho de 2017
A supracitada execuccedilatildeo se arrastava por nove (09) anos sem que o devedor tenha
esboccedilado qualquer intenccedilatildeo de pagar a diacutevida O credor requereu a suspensatildeo da Carteira
Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado apreensatildeo do passaporte e cancelamento dos
cartotildees de creacutedito
O magistrado com embasamento no artigo 139 IV do CPC deferiu parcialmente o
pedido sob o fundamento de que a apreensatildeo de passaporte e CNH natildeo viola o direito de ir e
vir do devedor Entretanto o juiz indeferiu o pedido de cancelamento do cartatildeo de creacutedito por
acreditar que a suspensatildeo poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado tendo em
vista que atualmente as pessoas utilizam o referido cartatildeo para pagamento das despesas
diaacuterias
66 NOBREacuteGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139
IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018
31
Eacute evidente que as medidas atiacutepicas de coerccedilatildeo devem ser utilizadas com cautela sempre respeitando a dignidade da pessoa do executado Natildeo se vislumbra contudo que as medidas aqui eleitas sejam capazes de vulnerar os Direitos Fundamentais do indiviacuteduo A uma porque natildeo se trata de restriccedilatildeo ao direito de ir e vir do executado que continua no gozo de plena liberdade de locomoccedilatildeo a duas porque a conduccedilatildeo de veiacuteculo automotor eacute mera comodidade da vida moderna natildeo se tratando de direito absoluto
Com mais razatildeo ainda se admite a suspensatildeo do Passaporte do executado que se natildeo paga a diacutevida da execuccedilatildeo natildeo deve ter o direito de fazer viagem internacional
Tem-se aqui verdadeiro exerciacutecio de ponderaccedilatildeo de interesses juriacutedicos de um lado jaz o direito de creacutedito do exequente que deriva do direito de propriedade e por isso mesmo tem envergadura constitucional de outro giro tem-se o direito do executado agrave autorizaccedilatildeo do Estado para conduzir veiacuteculo automotor e realizar viagens internacionais que natildeo se mostram essenciais agrave dignidade da pessoa humana Natildeo haacute duacutevidas pois de que eacute este uacuteltimo que deve sucumbir
O pedido fica indeferido apenas no tocante agrave suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado Eacute que ao contraacuterio da CNH e do passaporte que trazem consigo certa presunccedilatildeo de riqueza natildeo se pode concluir que o uso de cartatildeo de creacutedito eacute feito por luxo ou simples conveniecircncia
Como eacute cediccedilo os cartotildees de creacutedito oferecem ao seu titular creacutedito raacutepido e rotativo para o pagamento de despesas diaacuterias e certamente exercem funccedilatildeo essencial agravequeles que se encontram em situaccedilatildeo financeira precaacuteria
A suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado portanto se revela medida desproporcional e que inclusive poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado
Pelo exposto defiro em parte o pedido formulado pelo exequente e DETERMINO a suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo e bem como a suspensatildeo da validade (cancelamento temporaacuterio) no sistema SINPA de eventuais passaportes vaacutelidos em nome do executado
Dessa forma o artigo 139 IV do CPC revolucionou completamente a execuccedilatildeo de
obrigaccedilatildeo de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria ao permitir a utilizaccedilatildeo do uso dos meios executivos
atiacutepicos para compelir o executado a satisfazer o creacutedito do exequente
33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE
EFETIVACcedilAtildeO
Era inevitaacutevel que o artigo 139 IV do CPC gerasse todo tipo de reaccedilatildeo entre os
doutrinadores do processo civil e ateacute mesmo de outros ramos do direito devido a sua
capacidade de realizar uma completa inovaccedilatildeo na forma de se executar as obrigaccedilotildees de pagar
quantia Alguns o aplaudiram visualizando nele ldquouma luz no fim do tuacutenelrdquo outros o
criticaram vislumbrando as arbitrariedades que poderiam ser praticadas com embasamento no
referido dispositivo
32
As decisotildees suscitadas em linhas preteacuteritas auxiliaram para fervilhar ainda mais o
debate sobre o tema tendo em vista que por um lado poderia aumentar a efetividade das
execuccedilotildees por quantia no entanto por outro surgiam questionamentos a cerca da sua
constitucionalidade
A doutrina parece que demoraraacute a se pacificar sobre o tema Segundo alguns
doutrinadores seraacute inconstitucional toda restriccedilatildeo que recaia sobre a pessoa do devedor e natildeo
exclusivamente sobre o seu patrimocircnio Jaacute para outros o dispositivo eacute constitucional e o meio
mais eficaz para se resolver o problema da efetivaccedilatildeo das execuccedilotildees de pagar quantia ldquoA
discussatildeo se daacute especialmente no que diz respeito aacutes medidas de suspensatildeo de CNH
apreensatildeo de passaporte e bloqueio de cartotildees de creacutedito do devedorrdquo 67
O professor Thiago Rodovalho analisou detalhadamente a decisatildeo de nordm 4001386-
1320138260011 em seu artigo ldquoO necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na
concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivosrdquo 68 Quanto agrave suspensatildeo da CNH o autor
acredita que tal medida natildeo viola qualquer direito fundamental do devedor posto que ldquodirigir
veiacuteculos automotores eacute direito do cidadatildeo mas natildeo se confunde com os direitos fundamentais
e social de ir-e-vir e ao transporterdquo 69 O professor eacute categoacuterico ao afirmar que
Com relaccedilatildeo agrave suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (suspensatildeo do direito de dirigir restriccedilatildeo de direitos) natildeo nos parece haver qualquer violaccedilatildeo a direito fundamental ou social nem a direito da personalidade ou colocaccedilatildeo do devedor em situaccedilatildeo desproporcionalmente detrimentosa exceccedilatildeo feita aos que usam o veiacuteculo como instrumento de trabalho atraindo a hipoacutetese do NCPC art 833 inc V
()
Outrossim natildeo o consideramos como direito da personalidade Os direitos da personalidade satildeo os valores fundamentais que compotildeem o proacuteprio ser justamente por isso intransmissiacuteveis e irrenunciaacuteveis natildeo podendo o seu exerciacutecio sofrer limitaccedilatildeo voluntaacuteria (CC art 11) Por mais que vivamos num paiacutes que tanto valoriza o carro e que muitas pessoas de fato se compreendam em razatildeo e em funccedilatildeo do carro que dirijam este natildeo nos parece ser um direito que verdadeiramente componha a personalidade do indiviacuteduo70
67 DONTOS Sofia Poderes executoacuterios do juiz que diz a doutrina sobre o art 139 inc IV do CPC
Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigospoderes-executorios-do-juiz-que-diz-a-doutrina-sobre-art-139-inc-iv-do-cpc-23052018 gt Publicado em 23052018 Acesso em 01082018
68 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018
69 Ibid sem paginaccedilatildeo 70 Ibid sem paginaccedilatildeo
33
Quanto ao cancelamento dos cartotildees de credito do devedor o professor Thiago
Rodovalho tambeacutem acredita que natildeo haacute qualquer violaccedilatildeo ao direito fundamental social ou
da personalidade do devedor e acrescenta que
Tanto assim o eacute que ser titular de um cartatildeo de creacutedito pressupotildee ter creacutedito o que eacute analisado e concedido por instituiccedilotildees financeiras mais do que isso se porventura passando por dificuldades financeiras a pessoa deixa de honrar com pagamentos a mesma instituiccedilatildeo financeira concedente do cartatildeo de creacutedito pode sponte propria cancelaacute-lo ou recusar-lhe a concessatildeo Ora parece-me contraditoacuterio que instituiccedilotildees financeiras para sua proteccedilatildeo patrimonial possam ferir esse suposto ldquodireito fundamentalrdquo ou esse suposto ldquodireito da personalidaderdquo mas natildeo possa o Poder Judiciaacuterio igualmente fazecirc-lo contra aquele devedor moroso que instado ao pagamento e frustradas todas as tentativas de constriccedilatildeo patrimonial leva vida luxuosa valendo-se de cartotildees de creacutedito que prescindem de dinheiro em conta eacute dizer podem justamente funcionar como forma de ocultar renda e patrimocircnio71
O autor considera a apreensatildeo de passaporte um tema mais polecircmico e que merece
maior reflexatildeo No entanto crecirc que eacute possiacutevel a apreensatildeo de passaporte sem violar os
direitos fundamentais do devedor por se tratar de um direito de ir e vir de amplitude especial
Agrave primeira vista a possibilidade de apreensatildeo do passaporte tambeacutem nos parece possiacutevel pois tambeacutem se trata de um direito de ir e vir de amplitude especial Assim o eacute pois salvo situaccedilotildees especiais (refugiados p ex) haacute a necessidade de demonstrar condiccedilotildees financeiras de estadia e retorno para ser admitido no paiacutes de destino Ou seja pressupotildee uma condiccedilatildeo financeira que o devedor justamente diz natildeo possuir Sem embargo dessa consideraccedilatildeo esse ainda eacute um ponto que merece uma reflexatildeo mais acurada sendo essa apenas uma primeira impressatildeo72
Outros autores escreveram sobre o tema como eacute o caso do processualista Luiz
Dellore73 que tambeacutem defende que as medidas atiacutepicas como restriccedilatildeo ao direito de dirigir
apreensatildeo de passaporte e cancelamento de cartotildees de creacutedito satildeo permitidas e natildeo violam em
regra os direitos fundamentais do devedor
De minha parte creio que efetivamente haacute inovaccedilatildeo no at 139 IV do NCPC (e natildeo mera repeticcedilatildeo do que jaacute havia no Coacutedigo anterior) que tem o condatildeo de trazer mais efetividade ao processo executivo no Brasil ndash que por deacutecadas centrou sua atenccedilatildeo na defesa do executado (vide a grande quantidade de impenhorabilidades) sem dar maior atenccedilatildeo ao creacutedito do exequente
71 Ibid sem paginaccedilatildeo 72 Ibid sem paginaccedilatildeo 73 DELLORE Luiz NCPC Atipicidade das medidas executivas jaacute eacute realidade Disponiacutevel em lt
httpswwwjotainfoopiniao-e-analisecolunasnovo-cpcncpc-atipicidade-de-medidas-executivas-ja-e-realidade-17042017 gt Publicado em 17042017 Acesso em 03092018
34
Logo a meu ver medidas como (i) restriccedilatildeo ao direito de dirigir (ii) apreensatildeo de passaporte (iii) cancelamento de cartotildees de creacutedito e (iv) vedaccedilatildeo de obtenccedilatildeo de novos empreacutestimos se natildeo vinculados ao pagamento do deacutebito exequendo dentre outras restriccedilotildees que deveratildeo ser observadas a cada caso satildeo permitidas pelo sistema do NCPC e em regra natildeo violam direitos fundamentais do devedor E tecircm o condatildeo de fazer com que o executado que tem recursos diante dessas medidas coercitivas pague o deacutebito trazendo sucesso agrave satisfaccedilatildeo do creacutedito
Nessa linha para Alexandre Fuchs das Neves74 o artigo 139 IV do CPC conferiu ao
juiz poderes coercitivos capazes de ldquotransformar a vida do devedor um infernordquo para compeli-
lo a cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria Entretanto pondera que para que a medida tenha
validade ldquoeacute necessaacuteria uma fundamentaccedilatildeo por evidente uma correlaccedilatildeo temaacutetica entre a
medida adotada e sua efetividade em face ao processo com fundamentaccedilatildeo detalhadardquo
No entendimento de Fernando Gajardoni75 satildeo possiacuteveis as medidas de apreensatildeo de
passaporte bloqueio de cartotildees de creacutedito e suspensatildeo da CNH Para ele o que limita o art
139 IV do CPC eacute o esgotamento dos meios tiacutepicos e a real necessidade da medida
Ilustrativamente natildeo efetuado o pagamento de diacutevida oriunda de multas de tracircnsito e superados os expedientes tradicionais de adimplemento (penhora de dinheiro e bens) seria liacutecito o estabelecimento da medida coercitivaindutiva de suspensatildeo do direito a conduzir veiacuteculo automotor ateacute pagamento do deacutebito (inclusive com apreensatildeo da CNH do devedor) natildeo efetuado pagamento de verbas salariais devidas a funcionaacuterios da empresa possiacutevel o estabelecimento de vedaccedilatildeo agrave contrataccedilatildeo de novos funcionaacuterios ateacute que seja saldada a diacutevida natildeo efetuado o pagamento de financiamento bancaacuterio na forma e no prazo avenccedilados possiacutevel ateacute que se tenha a quitaccedilatildeo que se obstem novos financiamentos ou mesmo a participaccedilatildeo do devedor em licitaccedilotildees (como de ordinaacuterio jaacute acontece com pessoas juriacutedicas em deacutebito tributaacuterio com o Poder Puacuteblico) etc
Teriacuteamos entatildeo no Brasil por assim dizer a adoccedilatildeo do padratildeo da atipicidade das medidas executivas tambeacutem para as obrigaccedilotildees de pagar vistas estas como ordens do EstadoJuiz para que haja prestaccedilatildeo de pagamento em pecuacutenia
()
Por isso ndash a prevalecer a interpretaccedilatildeo potencializada do art 139 IV do CPC2015 ndash o emprego de tais medidas coercitivasindutivas especialmente nas obrigaccedilotildees de pagar encontraraacute limite certo na excepcionalidade da medida (esgotamento dos meios tradicionais de satisfaccedilatildeo do deacutebito) na proporcionalidade (inclusive agrave luz da regra da menor onerosidade ao devedor do art 805 do CPC2015) na necessidade de fundamentaccedilatildeo substancial e especialmente nos direitos e garantias assegurados na Constituiccedilatildeo Federal (vg natildeo parece possiacutevel que se determine o pagamento sob pena de prisatildeo ou de vedaccedilatildeo ao exerciacutecio da profissatildeo do direito de ir e vir etc)
74 NEVES Alexandre Fuchs das Cancelamento de cartotildees de creacutedito e apreensatildeo de CNH e passaporte
do devedor Isso eacute possiacutevel Disponiacutevel em lt httpwwwsinfacspcombrconteudocancelamento-de-cartoes-de-credito-e-apreensao-de-cnh-e-passaporte-do-devedor-isso-e-possivel gt Acesso em 30082018
75 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Publicado em 24082015 Acesso em 30082018
35
Jaacute Fernanda Tartuce76 acredita que tais medidas satildeo problemaacuteticas e devem ser
analisadas com cautela tendo em vista que ao inveacutes de afetarem o patrimocircnio do devedor
atingem a proacutepria pessoa
Sob certo prisma adotar medidas diferenciadas contribui para a efetividade da prestaccedilatildeo jurisdicional Por outro lado o patrimocircnio ndash e natildeo a pessoa do devedor - responde por diacutevidas aleacutem disso o exerciacutecio de amplos poderes pelo juiz sem balizas especiacuteficas pode ensejar medidas inadequadas Nessa linha suspender o direito de dirigir e restringir o uso de passaporte satildeo iniciativas problemaacuteticas por atingirem a pessoa do devedor enquanto a penhora da restituiccedilatildeo de Imposto de Renda soa viaacutevel por afetar seu patrimocircnio Eacute importante que a medida diferenciada se revele proporcional e seja aplicada apoacutes o exaurimento de outros meios previstos no ordenamento Como a proposta do Novo Coacutedigo eacute aumentar a eficiecircncia processual intentar medidas ineficazes inexequiacuteveis eou de difiacutecil fiscalizaccedilatildeo pode acabar ensejando o efeito contraacuterio
Nessa senda Lenio Streck e Dierle Nunes77 entendem que as medidas atiacutepicas de
suspensatildeo da CNH eou apreensatildeo de passaporte satildeo inconstitucionais Afirmam que natildeo se
pode confundir o processo civil e penal ainda que ambos remetam a um ldquoparadigma
constitucional comumrdquo e que o artigo 139 IV do CPC ldquoimpotildee novos desafios interpretativos
que podem conduzir a uma anaacutelise superficial e utilitarista de busca de resultados que
desprezem a necessaacuteria leitura constitucionalrdquo Os autores ainda ponderam que ldquoO perigo eacute o
artigo 139 IV ser transformado em instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com
autorizaccedilatildeo judicialrdquo
O professor Araken de Assis no dia 18 de abril de 2018 em um evento sobre o
Coacutedigo Processual Civil de 2015 que ocorreu em Brasiacutelia na sede do Conselho Federal da
OAB declarou ser contraacuterio aos poderes executoacuterios atiacutepicos ldquoSou contra os poderes
atiacutepicos dos juiacutezes porque seu exerciacutecio redunda em simples arbitrariedadesrdquo78
Acrescentou ainda que
76 IBDFAM ndash Instituto Brasileiro de Famiacutelia O polecircmico inciso IV do artigo 139 do CPC e suas difusas
interpretaccedilotildees Disponiacutevel em lt httpwwwibdfamorgbrnoticias6096O+polC3AAmico+inciso+IV+do+artigo+139+do+CPC+e+suas+difusas+interpretaC3A7C3B5es gt Publicado em 31082016 Acesso em 04092018
77 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018
78 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04092018
36
Eacute evidentemente inconstitucional diante do princiacutepio da dignidade da pessoa humana tirar o passaporte carteira de habilitaccedilatildeo Quecirc que tem isso com diacutevidas Natildeo tem absolutamente nada Natildeo eacute a correlaccedilatildeo instrumental entre o objetivo da execuccedilatildeo e o meio empregado Isso eacute simples vinganccedila simples puniccedilatildeo79
O professor Araken de Assis acredita que tais medidas satildeo inconstitucionais e
violam o principio da dignidade humana do executado numa sociedade como a nossa
sedenta por puniccedilatildeo natildeo me surpreende que essas ideias sejam encaradas com
naturalidade Mas eacute preciso rejeitaacute-las em nome de princiacutepios 80
34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
A Constituiccedilatildeo Federal de 1988 tem como um dos seus fundamentos a dignidade da
pessoa humana presente no artigo 1ordm inciso III do referido texto constitucional O dito
princiacutepio tem o escopo de nortear o ordenamento juriacutedico como um todo
A inclusatildeo da dignidade da pessoa humana como princiacutepio constitucional obrigou
uma reflexatildeo sobre o papel da pessoa humana no direito e um redimensionamento para
elevaacute-la ao centro do ordenamento juriacutedico81 Eacute necessaacuterio recorrer agrave teoria Kantiana para
que se obtenha uma definiccedilatildeo do princiacutepio ora estudado Para Kant82 o homem eacute um fim
em si mesmo natildeo uma funccedilatildeo do Estado Ou Naccedilatildeo O Estado e o direito devem estar
organizados em benefiacutecio do indiviacuteduo
Agora eu afirmo o homem ndash e de uma maneira geral todo o ser racional ndash existe como fim em si mesmo e natildeo apenas como meio para o uso arbitraacuterio desta ou daquela vontade Em todas as suas accedilotildees pelo contraacuterio tanto nas direcionadas a ele mesmo como nas que o satildeo a outros seres racionais deve ser ele sempre considerado simultaneamente como fim
Partindo da premissa de que para Immanuel Kant o homem eacute o fim em si mesmo
ldquodevemos compreender que a dignidade da pessoa humana eacute a noccedilatildeo o comando a direccedilatildeo
que se deve seguir funcionando como fundamento para a interpretaccedilatildeo de todos os direitos e
garantias conferidos agrave pessoa nos ordenamentos juriacutedicos de cada Estadordquo 83
79 Ibid sem paginaccedilatildeo 80 Ibid sem paginaccedilatildeo 81 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito
fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 461 82 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud KANT Immanuel Fundamentaccedilatildeo da metafiacutesica dos costumes
Satildeo Paulo Martin Claret 2003 p56-59 Coleccedilatildeo A Obra-Prima de Cada Autor 83 SCHIAFIANO Juliana Rocha op cit p 461
37
O princiacutepio constitucional da dignidade da pessoa humana estaacute diretamente ligado ao
conteuacutedo dos direitos fundamentais logo para que se cumpra com os direitos fundamentais
constitucionalmente instituiacutedos eacute necessaacuterio reconhecer e respeitar a dignidade da pessoa
humana conforme disciplina Ingo Sarlet84
Em suma o que se pretende sustentar de modo mais enfaacutetico eacute que a dignidade da pessoa humana na condiccedilatildeo de valor (principio normativo) fundamental que atrai o conteuacutedo de todos os direitos fundamentais exige e pressupotildee o reconhecimento e proteccedilatildeo dos direitos fundamentais de todas as dimensotildees (ou geraccedilotildees se assim preferirmos) Assim sem que se reconheccedilam agrave pessoa humana os direitos fundamentais que lhe satildeo inerentes em verdade estarse-aacute lhe negando a proacutepria dignidade A consagraccedilatildeo constitucional da dignidade da pessoa humana tem o propoacutesito de limitar a atuaccedilatildeo ou a omissatildeo do Estado para garantir os direitos do indiviacuteduo Assim eacute difiacutecil precisar os efeitos da norma que determina a dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado (como acontece com a Constituiccedilatildeo brasileira de 1988) poreacutem quando desrespeitados os direitos fundamentais do cidadatildeo eacute possiacutevel identificar que a dignidade deste foi violada
Logo ldquoteraacute respeitada a sua dignidade o individuo que tiver respeitados os seus
direitos fundamentaisrdquo 85 Os direitos fundamentais estatildeo apresentados na Constituiccedilatildeo
Federal da seguinte forma direitos individuais e coletivos direitos sociais direitos poliacuteticos e
direitos de nacionalidade que tecircm como escopo garantir as liberdades positivas aos
indiviacuteduos ldquoonde foram conquistados direitos agrave liberdade religiosa liberdade civil e
profissional agrave propriedade ao livre acesso ao Judiciaacuterio agrave ampla defesa e ao contraditoacuterio no
processual judicial ao sigilo de dados e informaccedilotildees pessoais entre outros que somados
garantem o cidadatildeo uma vida dignardquo 86
O cidadatildeo na Constituiccedilatildeo Federal de 88 diferente das constituiccedilotildees brasileiras
anteriores passou a ser fundamento e ganhou destaque nos direitos fundamentais tendo
garantida a sua vida a sua dignidade a sua seguranccedila a sua honra a sua liberdade e a sua
propriedade
84 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud SARLET Ingo Wolfgang Dignidade da pessoa humana e
direitos fundamentais na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 2ed Porto Alegre Livraria do Advogado 2002 p87 85 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito
fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 462 86 Ibid p 462
38
Segundo Carmem Luacutecia Antunes Rocha87 para garantir o Estado Democraacutetico de
Direito eacute necessaacuterio que a sua atuaccedilatildeo seja sempre em conformidade com o princiacutepio da
dignidade da pessoa humana
O Estado somente eacute democraacutetico em sua concepccedilatildeo constitucionalizaccedilatildeo e atuaccedilatildeo quando respeita o princiacutepio da dignidade da pessoa humana Natildeo haacute verbo constitucional natildeo haacute verbo governamental que se faccedilam legiacutetimos quando natildeo se voltam ao atendimento daquele princiacutepio Natildeo haacute verdade constitucional natildeo haacute suporte institucional para as poliacuteticas puacuteblicas que natildeo sejam destinadas ao pleno cumprimento daquele valor maior transformado em princiacutepio constitucional
O princiacutepio da dignidade humana constitucionalmente garantido impotildee limites ao
Estado compelindo aos oacutergatildeos e atividades estatais respeitar o ser humano e garanti-lo
condiccedilotildees miacutenimas para uma vida digna Dessa forma eacute niacutetido que o dito princiacutepio eacute
pressuposto e indispensaacutevel para legitimar outras normas constitucionais e
principalmente infraconstitucionais
O Coacutedigo de Processo Civil eacute umas das principais normas infraconstitucionais que
sofre influecircncia dos preceitos valores e princiacutepios esculpidos na Constituiccedilatildeo Federal
Logo como o principio da dignidade humana eacute um dos mais importantes pressupostos
constitucionais ldquoentatildeo eacute tranquilo afirmar-se que o novel ordenamento processual tem
de se render nas resoluccedilotildees dos aspectos processuais e a fim de se atingir uma soluccedilatildeo
justa adequada e efetiva ao postulado da dignidade da pessoa humanardquo 88
Dessa forma o legislador deve formular as normas infraconstitucionais de acordo e a
partir do conteuacutedo constitucional para Marinoni Mitidiero e Arenhart89
() o Coacutedigo de Processo Civil constitui direito constitucional aplicado O Coacutedigo deve ser interpretado de acordo com a Constituiccedilatildeo e com os direitos fundamentais o que significa que as duacutevidas interpretativas devem ser resolvidas a favor da otimizaccedilatildeo do alcance da Constituiccedilatildeo e do processo civil como meio para tutela de direitos
87 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud ROCHA Carmen Luacutecia Antunes O princiacutepio da dignidade da
pessoa humana e a exclusatildeo social Revista Interesse Puacuteblico n4 p23-48 1999 p33 88 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o
novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 367
89 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 14
39
Com o escopo de conferir eficaacutecia aos mandamentos constitucionais o CPC15 traz a
previsatildeo e diversas claacuteusulas gerais em seus primeiros artigos em um dos quais se
prestigia o princiacutepio da dignidade da pessoa humana
O referido princiacutepio estaacute disciplinado no artigo 8ordm do CPC15 e atua como um guia
sobre as demais normas do coacutedigo processual Eacute o que entende Nelson Rosenvald90
O maior cuidado do inteacuterprete eacute no sentido de jamais banalizar a dignidade fazendo dela um elixir processual tal como muitas vezes se vecirc na esfera do direito civil Penso que natildeo haacute maiores dificuldades em transpor a noccedilatildeo constitucional do princiacutepio para em seguida adaptaacute-la agraves singularidades do processo
Logo de acordo com o artigo 8ordm do CPC o oacutergatildeo julgador ao aplicar o ordenamento
juriacutedico deve resguardar a dignidade da pessoa humana Para Fredie Didier91 ldquoresguardar
nesse contexto eacute de um lado aplicar corretamente a norma juriacutedica lsquoproteccedilatildeo da dignidade
da pessoa humanarsquo e de outro natildeo violar a dignidaderdquo
O oacutergatildeo julgador deveraacute manter um comportamento ativo com o objetivo de promover
a dignidade da pessoa humana podendo tomar medidas de ofiacutecio para efetivar a dignidade da
pessoa humana Didier assevera que o magistrado poderaacute ainda ldquovaler-se da claacuteusula geral de
atipicidade (art 536 sect 1ordm) para a execuccedilatildeo do direito fundamental agrave dignidaderdquo 92 O autor
ainda traz dois exemplos
a) exigecircncia de respeito agrave ordem cronoloacutegica de conclusatildeo (art 12) caso de grave violaccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana que natildeo se encaixe em um dos incisos que excepcionam a regra de observacircncia da cronologia da conclusatildeo poderia o juiz ldquofurar a filardquo para promover a dignidade da pessoa humana b) prioridade na tramitaccedilatildeo processual pessoa que seja portadora de doenccedila grave mas que natildeo esteja no rol do art 1048 I para promover a dignidade de pessoa humana o juiz poderia determinar o processamento prioritaacuterio93
Essa dupla garantia ndash resguardo e promoccedilatildeo ndash tem como objetivo garantir ao individuo
sua dignidade humana fazendo com que ldquode um lado que o Estado natildeo a viole e de outro
que o Estado a promova e efetiverdquo
90 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud ROSENVALD Nelson A
dignidade da pessoa humana no CPC15 91 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte
geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 75 92 Ibid p 75 93 Ibid p 75
40
Nessa senda o magistrado deveraacute promover a dignidade da pessoa humana quando
perceber a ausecircncia desta no processo ou assegura-la quando for posta em risco Eacute nesse
sentido o entendimento dos professores Marinoni Mitidiero e Arenhart94
() a dignidade da pessoa humana determina a compreensatildeo do processo civil como um meio para tutela dos direitos Vale dizer o processo civil natildeo pode ser visto como um instrumento a serviccedilo do Estado como um instrumento que natildeo se encontre orientado agrave realizaccedilatildeo dos fins da pessoa humana Em outras palavras o processo civil serve para realizaccedilatildeo dos direitos e para orientaccedilatildeo das pessoas a respeito do significado do direito
Nessa senda compete tanto ao juiz quanto as demais partes processuais garantirem ldquoo
valor intriacutenseco de cada vida que eacute trazida ao processordquo nas palavras de Alexandre Freitas
Cacircmara95
() aos sujeitos do processo eacute preciso sempre ter claro que os titulares dos interesses em conflitos satildeo pessoas reais cujas vidas seratildeo afetadas pelo resultado do processo e que por isso mesmo tecircm o direito de estabelecer suas estrateacutegias processuais de acordo com aquilo que lhes pareccedila melhor para suas vidas Eacute inadmissiacutevel tratar as partes como se natildeo fossem pessoas reais meros dados estatiacutesticos Afinal se para o Judiciaacuterio cada processo pode parecer apenas mais um processo para as partes cada processo pode ser o uacutenico o mais relevante aquele em que sua vida seraacute decidida E eacute dever do juiz assegurar que isto seja respeitado
Dessa forma eacute necessaacuterio que um arcabouccedilo normativo para que seja conferida
eficaacutecia e proteccedilatildeo ao principio da dignidade da pessoa humana
Logo o dito princiacutepio deve ser protegido em todas as esferas do ordenamento juriacutedico
inclusive no campo da execuccedilatildeo civil onde sofre grandes riscos de ser violado em nome do
direito fundamental agrave tutela executiva do credor ldquoPartir da premissa de que existe um direito
fundamental agrave tutela executiva ora ratificado pelo CPC eacute indispensaacutevel para a soluccedilatildeo de
diversos problemas oriundos do procedimento executivo principalmente aqueles relacionados
agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo 96
94 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme
MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 25
95 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CAcircMARA Alexandre Freitas O Novo Processo Civil Brasileiro 2 ed Satildeo Paulo Atlas 2016 p 7
96 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66
41
Eacute o caso por exemplo da impenhorabilidade Segundo Fredie Didier et al97 a
impenhorabilidade eacute uma forma de proteger certos bens do devedor do direito fundamental a
execuccedilatildeo do credor
Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa
Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais
O legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do CPC fazendo um
preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses em anaacutelise ao optar pela mitigaccedilatildeo do direito
do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado Afinal ldquoa execuccedilatildeo natildeo pode ser utilizada
como instrumento para causar a ruiacutena a fome e o desabrigo do devedor e sua famiacutelia gerando
situaccedilotildees incompatiacuteveis com a dignidade da pessoa humana 98
Logo a impenhorabilidade de certos bens
[] Eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa99
Eacute nesse sentido que o CPC15 enumera diversos casos de bens patrimoniais que satildeo
impenhoraacuteveis como o salaacuterio e vencimentos utensiacutelios necessaacuterios ao exerciacutecio da
profissatildeo seguro de vida vestuaacuterios e pertences de uso pessoal entre outros
Dessa forma as regras relativas agraves medidas executivas devem ser interpretadas agrave luz
da Constituiccedilatildeo Federal ldquovez que se voltam agrave realizaccedilatildeo de direitos fundamentais e em sua
97 Ibid p 66 98 THEODORO JUacuteNIOR Humberto Novo Coacutedigo de Processo Civil Anotado 20 ed Rio de Janeiro
Forense 2016 p 978 99 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud DIDIER JR Fredie CUNHA
Leonardo Carneiro da BRAGA Paula Sarno OLIVEIRA Rafael Alexandria de Curso de direito processual civil 3 ed Salvador JusPodivm 2011 v 5 p 547
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realizaccedilatildeo podem atingir direitos fundamentaisrdquo 100 O Superior Tribunal de Justiccedila jaacute decidiu
que
O rol das impenhorabilidades do ordenamento paacutetrio objetiva preservar o miacutenimo patrimonial necessaacuterio agrave existecircncia digna do executado impondo ao processo executoacuterio certos limites Assim a depender das peculiaridades do caso as regras de impenhorabilidade podem ser ampliadas de modo a adequar a tutela aos direitos fundamentais como por exemplo o direito agrave moradia agrave sauacutede ou agrave dignidade da pessoa humana Trata-se portanto da aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo e da necessidade sob o enfoque da proporcionalidade101 (STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014)
Logo a interpretaccedilatildeo dos dispositivos que tratam sobre a penhora no CPC deve estaacute
diretamente ligada aos ditames constitucionais devendo o interprete privilegiar a opccedilatildeo que
esteja mais em sintonia com a Carta Magna para que nem o credor e nem o devedor sejam
lesados
O artigo 833 do CPC elenca uma seacuterie de incisos que expotildeem os bens impenhoraacuteveis
O trecho inicial inciso I do art 833 define como impenhoraacuteveis os bens inalienaacuteveis Este
inciso segue a regra de que ldquose o bem natildeo pode ser alienado tambeacutem natildeo pode ser penhorado
porque a penhora eacute o primeiro ato do procedimento de alienaccedilatildeo judicial do bemrdquo 102
Satildeo exemplos de bens inalienaacuteveis os puacuteblicos cuja alienaccedilatildeo depende de autorizaccedilatildeo
legislativa Eacute inalienaacutevel tambeacutem o capital constituiacutedo para garantir indenizaccedilatildeo de ato iliacutecito
(art 533 sect 1 ordm CPC) que portanto eacute tambeacutem impenhoraacutevel ldquoTodo bem inalienaacutevel eacute
impenhoraacutevel embora nem todo bem impenhoraacutevel seja inalienaacutevelrdquo 103
O inciso I do art 833 CPC tambeacutem consagra a impenhorabilidade dos bens que por
ato voluntaacuterio satildeo excluiacutedos da execuccedilatildeo
Segundo Fredie Didier et al104
Eacute o que ocorre nos casos de bens doados ou alienados com claacuteusula de inalienabilidade que haacute de constar no registro imobiliaacuterio para ser eficaz perante o exequente e minimizar o risco de fraude A propoacutesito eis a redaccedilatildeo do art 1911 do Coacutedigo Civil lsquolsquoA claacuteusula de inalienabilidade imposta aos bens por ato de liberalidade implica impenhorabilidade e incomunicabilidaderdquo
100 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MEDINA Joseacute Miguel Garcia
Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 1 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 p 736 101 STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014 102 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 824 103 Ibid p 824 104 Ibid p 825
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O inciso II por sua vez estabelece que satildeo impenhoraacuteveis os bens moacuteveis os
pertences e as utilidades domeacutesticas da residecircncia do executado Todavia excepcionam-se os
bens dessa natureza que sejam de elevado valor ou que ultrapassem as necessidades comuns
correspondentes a um meacutedio padratildeo de vida
A jurisprudecircncia natildeo eacute paciacutefica sobre o assunto logo natildeo exista uma relaccedilatildeo de bens
que podem ser atingidos pela penhora Abrindo margem para as mais variadas decisotildees
O STJ jaacute considerou impenhoraacuteveis aparelho de televisatildeo a cores mesa de centro passadeira raacutedio toca-fitas gravador microondas ar-condicionado um freezer um microcomputador com acessoacuterios uma impressora etc Poderatildeo ser penhorados porque ultrapassam o padratildeo-meacutedio aparelhos de TV mais sofisticados o segundo aparelho de televisatildeo a segunda geladeira aparelhos de ar-condicionado que satildeo verdadeiras peccedilas de design moacuteveis antigos que se transformam em peccedilas de decoraccedilatildeo faqueiro de prata adega climatizada etc Em entendimento de caraacuteter ainda mais geneacuterico jaacute restou consignado em determinado precedente que a proteccedilatildeo natildeo abrangeria apenas os bens indispensaacuteveis agrave moradia mas tambeacutem aqueles usualmente encontrados em um lar105
Ademais o inciso III do art 833 do CPC traz a impenhorabilidade dos vestuaacuterios bem
como os pertences de uso pessoal do executado salvo se de elevado valor
Segundo Fredie Didier et al106 o dispositivo possui dois propoacutesitos
de um lado preservar a dignidade do executado com a proteccedilatildeo de bens moacuteveis importantes para a sua sobrevivecircncia digna como o vestuaacuterio aparelho celular reloacutegio e os bens relacionados agrave sua higiene pessoal de outro lado a regra visa prestigiar a boa-feacute processual impedindo a execuccedilatildeo mesquinha e abusiva com a penhora de bens de pequeno ou nenhum valor como um pente ou uma bota
O inciso IV do art 833 do CPC consagra uma das mais importantes modalidades a
impenhorabilidade relativa aos rendimentos de natureza alimentar ldquoTrata-se de regra que
possui o claro propoacutesito de proteger o executado garantindo-lhe o recebimento de valores que
servem ao pagamento das despesas relacionadas agrave sua sobrevivecircncia digna e agrave da sua famiacuteliardquo 107
Jaacute inciso V do art 833 do CPC torna impenhoraacuteveis os livros as maacutequinas as
ferramentas os utensiacutelios os instrumentos ou outros bens moacuteveis necessaacuterios ou uacuteteis ao
exerciacutecio de qualquer profissatildeo 105 Ibid p 826 106 Ibid p 827 107 Ibid p 828
44
Por forccedila do paraacutegrafo 3ordm do art 833 satildeo igualmente impenhoraacuteveis os equipamentos
implementos e maacutequinas agriacutecolas pertencentes agrave pessoa fiacutesica ou a empresa individual
produtora rural Rodrigo Mazzei e Sarah Merccedilon108 esclarecem que
Tem assento na noccedilatildeo de que a dignidade estende-se tambeacutem ao exerciacutecio da profissatildeo em si mesma e tambeacutem por representar a forma por excelecircncia de que dispotildee o executado para continuar a receber sua remuneraccedilatildeo e por conseguinte prover seu sustento e de sua famiacutelia Trata-se tambeacutem de aplicaccedilatildeo pontual da funccedilatildeo social da propriedade jaacute que protege os bens que permitem a circulaccedilatildeo de riquezas para a subsistecircncia do executado e se for o caso de sua famiacutelia
Forccediloso ressaltar ainda que a impenhorabilidade do inc V alcanccedila apenas os bens
moacuteveis de modo que eacute absolutamente possiacutevel que o imoacutevel em que o executado exerccedila sua
atividade profissional seja penhorado conforme a Suacutemula 451 do STJ ldquoEacute legiacutetima a penhora
da sede do estabelecimento comercialrdquo
O inciso VI do art 833 do CPC versa sobre a impenhorabilidade do seguro de vida
ldquoTrata-se de impenhorabilidade em favor do beneficiaacuterio do seguro e natildeo do segurado ateacute
porque o valor do seguro natildeo compotildee nem comporaacute o seu patrimocircnio (art794 do Coacutedigo
Civil1 ordm7)rdquo Dessa forma ldquoem uma execuccedilatildeo contra o segurado natildeo seraacute possiacutevel a penhora
do seguro de vida pois se trata de bem que natildeo lhe pertence nem mesmo em expectativardquo
De acordo com o inciso VII do art 833 do CPC satildeo impenhoraacuteveis os materiais
necessaacuterios para obras em andamento salvo se essas forem penhoradas Logo a obra pode
ser penhorada (art 862 do CPC) ldquoA regra como bem lembrou Araken de Assis lsquoestimula a
penhora da proacutepria obra inconclusa agrave qual os materiais acrescem e conseguintemente
valorizamrsquo 109
O art 833 VIII CPC julga impenhoraacutevel a pequena propriedade rural assim
definida em lei desde que trabalhada pela famiacutelia reproduzindo parte do art 5ordm XXVI CF
88116 que disciplina a impenhorabilidade do referido bem
A proteccedilatildeo do CPC eacute mais ampla do que a garantia prevista na Constituiccedilatildeo Federal
tendo em vista que a impenhorabilidade natildeo se restringe agraves execuccedilotildees de deacutebitos decorrentes
de sua atividade produtiva podendo ser alegada em toda e qualquer execuccedilatildeo ldquoAssim o 108 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CABRAL Antonio Passo
CRAMER Ronaldo (orgs) Comentaacuterios ao Novo Coacutedigo de Processo Civil Rio de Janeiro Forense 2015 p 1194
109 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 835
45
imoacutevel natildeo pode ser penhorado na execuccedilatildeo de creacutedito rural concedido para estimular a
produccedilatildeo agriacutecola mas poderaacute ser penhorado na execuccedilatildeo do creacutedito concedido para a
aquisiccedilatildeo do imoacutevelrdquo 110
A nona modalidade de impenhorabilidade trata-se dos recursos puacuteblicos recebidos por
instituiccedilotildees privadas para aplicaccedilatildeo compulsoacuteria em educaccedilatildeo sauacutede ou assistecircncia social ldquoA
proteccedilatildeo eacute louvaacutevel e tutela toda a coletividade ao privilegiar o direito agrave educaccedilatildeo sauacutede e
assistecircncia social em detrimento do direito do credorrdquo
De acordo com o inciso X do art 833 do CPC eacute impenhoraacutevel ateacute o limite de
quarenta salaacuterios miacutenimos a quantia depositada em caderneta de poupanccedila
Eacute uma modalidade de impenhorabilidade relativa (o CPC73 a considerava absoluta)
tendo em vista que essa impenhorabilidade natildeo pode ser oposta na execuccedilatildeo de alimentos
independentemente da sua origem (art 833 sect 2ordm do CPC) Fredie Didier et al cita Araken de
Assis111 ao afirmar que
a regra soacute protege essa aplicaccedilatildeo financeira Se o valor estiver depositado em fundo de investimento por exemplo poderaacute ser penhorado Se o devedor tiver vaacuterias cadernetas de poupanccedila a impenhorabilidade aplica-se agrave soma de todas elas e natildeo a cada uma delas isoladamente do contraacuterio valores expressivos poderiam ser pulverizados em vaacuterias contas burlando a finalidade da regra que eacute a de proteger a populaccedilatildeo de baixa renda
Ademais satildeo tambeacutem impenhoraacuteveis por forccedila do inciso XI os recursos puacuteblicos do
fundo partidaacuterio recebidos por partido poliacutetico nos termos da lei Essa modalidade de
impenhorabilidade ldquose restringe aos recursos puacuteblicos do fundo partidaacuterio Recursos de
origem privada recebidos pelo partido poliacutetico poderatildeo ser penhoradosrdquo 112 O processualista
Fredie Didier et al113 assevera que
Assim a impenhorabilidade foi estabelecida no intuito de impedir que os diretoacuterios nacionais de partidos poliacuteticos respondam por diacutevida dos diretoacuterios
110 Ibid p 836 111 DIDIER JR Fredie et al apud ASSIS Araken de Manual da execuccedilatildeo 11ordm ed cit p 225 Assim
tambeacutem REDONDO Bruno Garcia LOJO Maacuterio Vitor Suarez Penhora cit p 117 BUENO Cassio Scarpinella Curso sistematizado de Direito Processual Civil v 3 cit p 228 GIANNICO Mauriacutecio As novas reformas do CPC e de outras normas processuais Mauriacutecio Giannico e Viacutetor Joseacute de Mello Monteiro (coord) Satildeo Paulo Saraiva 2009 p 1 OS Em sentido diverso estendendo a impenhorabiacutelidade aos depoacutesitos feitos ateacute esse valor em CDB CDI fundos de renda fixa ou de accedilotildees RODRIGUES Marcelo Abelha Manual de execuccedilatildeo civil 3deg ed cit p 101
112 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 839
113 Ibid p 839
46
estaduaismunicipais - sobretudo em razatildeo das vaacuterias decisotildees judiciais que determinaram penhora de recursos do fundo partidaacuterio de alguns partidos
Por fim o inciso XII do artigo 833 do CPC trata sobre a impenhorabilidade dos
creacuteditos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias sob o regime de incorporaccedilatildeo imobiliaacuteria
vinculados agrave execuccedilatildeo de obra ldquoO objetivo dessa modalidade eacute evitar que diacutevidas do
incorporador possam consumir os recursos que seriam utilizados na realizaccedilatildeo da obra em
prejuiacutezo dos adquirentes de unidades autocircnomasrdquo 114
O professor Misael Montenegro Filho115 aduz sobre que ldquoao estabelecer a
impenhorabilidade dos creacuteditos oriundos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias o novo CPC
protegeu os valores destinados agrave execuccedilatildeo da obra e agrave entrega das unidades imobiliaacuterias aos
adquirentes assegurando assim a execuccedilatildeo da promessa contratualrdquo
Importante frisar ainda que a Lei nordm 8009 1990 instituiu a impenhorabilidade do
imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar por qualquer diacutevida salvo as exceccedilotildees dos
seus arts 3ordm e 4ordm
A referida lei dispotildee que Para os efeitos de impenhorabilidade considera-se
residecircncia um uacutenico imoacutevel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia
permanente (art 5ordm)
O processualista baiano Fredie Didier et al116 assevera que
A lei propotildee-se a proteger imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar nos termos acima expostos A CF 88 ampliou o conceito de entidade familiar para abranger a famiacutelia monoparental e a uniatildeo estaacutevel Mas deve considerar-se aiacute compreendidos os irmatildeos que vivem juntos e a uniatildeo homossexual Ateacute o solteiro estaacute abrangido pela impenhorabilidade se reside soacute no imoacutevel - isso em nome da proteccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana e da moradia digna Na verdade houve uma mudanccedila de compreensatildeo acerca do sentido da proteccedilatildeo de proteccedilatildeo da famiacutelia agrave proteccedilatildeo da moradia indispensaacutevel agrave preservaccedilatildeo da dignidade da pessoa
114 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o
novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 388
115 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MONTENEGRO FILHO Misael Novo Coacutedigo de Processo Civil Comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Atlas 2016 p 752
116 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 840-841
47
O STJ jaacute consolidou esse entendimento na suacutemula nordm 364 O conceito de
impenhorabilidade de bem de famiacutelia abrange tambeacutem o imoacutevel pertencente a pessoas
solteiras separadas e viuacutevas
Entretanto se o casal ou entidade familiar possuir vaacuterios imoacuteveis utilizados como
residecircncia a impenhorabilidade recairaacute sobre o de menor valor (art 5ordm paraacutegrafo uacutenico) ldquoEacute o
que ocorre por exemplo quando a famiacutelia se divide em mais de uma cidade por motivos
profissionaisrdquo 117
Forccediloso observar ainda que a impenhorabilidade do imoacutevel familiar eacute relativa jaacute que
natildeo pode ser oposta a qualquer creacutedito O art 3ordm da Lei n 8009 1990151 em que pode ser
penhorada a residecircncia da famiacutelia (exemplo execuccedilatildeo de alimentos para cobranccedila de taxas
devidas em funccedilatildeo do imoacutevel familiar etc)
Resta claro que o artigo 833 do CPC ao disciplinar as hipoacuteteses de impenhorabilidade
possui o escopo de proteger o princiacutepio da dignidade humana Entretanto algumas claacuteusulas
natildeo possuem proteccedilatildeo absoluta ldquoa sua relativizaccedilatildeo a depender do caso sob exame deve ser
realccedilada agrave medida que a dignidade resguardada e protegida pelo sistema processual-
constitucional natildeo se limita ao executadordquo 118 Ademais ldquoEacute premente advertidamente que a
dignidade do credor tambeacutem seja garantida em juiacutezo tendo como norte pois os princiacutepios da
proporcionalidade e razoabilidaderdquo 119
117 Ibid p 841 118 Ibid p 752 119 Ibid p 752
48
4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA
ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE
HUMANA DO EXECUTADO
41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE
EFETIVACcedilAtildeO
Como jaacute exposto em linhas preteacuteritas nos meios executivos tiacutepicos as medidas
executivas satildeo determinadas pela lei ou seja o oacutergatildeo pode aplicar somente as medidas
tipificadas no ordenamento juriacutedico No entanto ao se tratar das medidas executivas atiacutepicas
eacute necessaacuterio que haja um limite na atuaccedilatildeo realizada pelo juiz
O poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo poder ser realizado de maneira indiscriminada haacute
pressupostos e premissas a serem observadas Dessa forma a primeira premissa eacute no sentindo
de que a medida executiva atiacutepica natildeo pode ser a primeira medida a ser invocada ldquomuito ao
reveacutes a regra do nosso sistema continua a ser o da tipicidade dos meios executivos soacute que
agora temperado pelo sistema atiacutepicordquo 120 O processualista Thiago Rodovalho explica que
ldquo() os meios atiacutepicos natildeo satildeo prima ratio e sim a ultima ratio eacute dizer esgotados e
frustrados os meios executivos tiacutepicos e ordinaacuterios pode-se em tese valer-se do sistema
atiacutepicordquo121
Dessa forma nos casos de execuccedilatildeo que tenha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
natildeo deve ser aplicado de logo as medidas indutivas e coercitivas Apenas apoacutes frustradas as
medidas ldquonaturaisrdquo pode-se passar agrave aplicaccedilatildeo das medidas atiacutepicas
Uma segunda premissa diz a respeitos dos meios de pressatildeo para compelir o devedor a
adimplir com o seu deacutebito ldquoEssa segunda premissa decorre inclusive de imperiosidade
loacutegica de nada adianta a medida de pressatildeo se a obrigaccedilatildeo natildeo tem como ser adimplida pelo
devedorrdquo 122
Para Thiago Rodovalho123 ldquoIsso quer significar que esgotados e frustrados os meios
tiacutepicos o juiz se valeraacute dos meios atiacutepicos se eles forem potencialmente haacutebeis a estimular ou
120 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da
atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018
121 Ibid sem paginaccedilatildeo 122 Ibid sem paginaccedilatildeo 123 Ibid sem paginaccedilatildeo
49
forccedilar o cumprimento o que pressupotildee sua possibilidade quando entatildeo eles poderatildeo ser
eficazesrdquo
Logo nas obrigaccedilotildees de pagar quantia se houver a real demonstraccedilatildeo da
impossibilidade financeira do devedor seria um constrangimento inuacutetil e desnecessaacuterio a
imposiccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo para forccedilar o cumprimento
Por isso as medidas atiacutepicas devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o
esgotamento das medidas tiacutepicas e a possibilidade de cumprimento de cumprimento da
obrigaccedilatildeo
Ademais superadas as supracitadas premissas e o oacutergatildeo julgador vislumbrando a
necessidade da aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo se faz necessaacuterio que um conjunto de
postulados e princiacutepios rejam a atuaccedilatildeo do oacutergatildeo julgador servindo de norte para a escolha da
medida executiva mais adequada ldquoDe modo geral a escolha deve pautar-se nos postulados da
proporcionalidade da razoabilidade (art8ordm CPC) e da proibiccedilatildeo de excesso bem como nos
princiacutepios da eficiecircncia e da menor onerosidade da execuccedilatildeordquo 124
O professor Fredie Didier et al125 eacute categoacuterico ao citar Humberto Aacutevila
Segundo Humberto Aacutevila o postulado da proporcionalidade se manifesta nas situaccedilotildees em que haacute uma relaccedilatildeo de causalidade entre dois elementos empiricamente discerniacuteveis um meio e um fim de tal sorte que se possa proceder aos trecircs exames fundamentais o da adequaccedilatildeo (o meio promove o fim) o da necessidade (dentre os meios disponiacuteveis e igualmente adequados para promover o fim natildeo haacute outro meio menos restritivo do(s) direito(s) fundamental (is) afetado(s)) e o da proporcionalidade em sentido estrito (as vantagens trazidas pela promoccedilatildeo do fim correspondem agraves desvantagens provocadas pela adoccedilatildeo do meio)
O juiz ao aplicar a medida executiva atiacutepica ao caso concreto deve ter seu
embasamento no princiacutepio da proporcionalidade para saber se a medida a ser tomada eacute a
melhor opccedilatildeo ao caso sub judice ldquoO exame de proporcionalidade aplica-se sempre que
houver uma medida concreta destinada a realizar uma finalidaderdquo 126
Em verdade a aplicaccedilatildeo do princiacutepio da proporcionalidade eacute imprescindiacutevel na adoccedilatildeo
dos meios executivos atiacutepicos tendo em vista que ldquo() tais medidas em especial quando de
124 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111 125 DIDIER JR Fredie et al apud AVILA Humberto Teoria dos princiacutepios da definiccedilatildeo agrave aplicaccedilatildeo
dos princiacutepios juriacutedicos 16 ed Satildeo Paulo Malheiros 2015 p 205 126 DIDIER JR Fredie et al op cit p 111
50
natureza coercitiva podem restringir direitos do devedor e incidir diretamente sobre sua
pessoardquo127 Logo ainda que o princiacutepio da efetividade da tutela executiva seja um direito
fundamental o mesmo ldquo() deve ser compatibilizado com direitos fundamentais do
executado para que a sua dignidade humana seja preservadardquo 128
Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Neves129 afirma que em nome do princiacutepio da
proporcionalidade o juiz deveraacute
() ponderar no caso concreto as vantagens praacuteticas da adoccedilatildeo de cada medida executiva atiacutepica em especial as de natureza coercitiva e as desvantagens de sua adoccedilatildeo levando em conta a possibilidade de a medida criar uma limitaccedilatildeo excessiva ao exerciacutecio de direito fundamental do executado
Outro princiacutepio que o oacutergatildeo julgador deve se ater ao escolher a medida executiva
atiacutepica eacute o da razoabilidade Segundo Fredie Didier et al 130 o princiacutepio (ou postulado)131 se
manifesta de trecircs formas
a) como dever de equidade a exigir a harmonizaccedilatildeo da norma geral com o caso individual impondo a consideraccedilatildeo daquilo que normalmente acontece em detrimento do que eacute extraordinaacuterio e tambeacutem impondo a consideraccedilatildeo das especificidades do caso concreto ante a generalidade da norma b) como dever de congruecircncia a exigir a harmonizaccedilatildeo das normas com suas condiccedilotildees externas de aplicaccedilatildeo (isto eacute com a realidade com base em que foram editadas) c) como dever de equivalecircncia a exigir uma relaccedilatildeo de equivalecircncia entre a medida adotada e o criteacuterio que a dimensiona
Logo ldquo() o princiacutepio da razoabilidade deve nortear a atuaccedilatildeo do juiz na adoccedilatildeo das
medidas executivas atiacutepicas previstas no art 139 IV do Novo CPCrdquo 132 tendo em vista que
ldquo() mesmo medidas que pelo princiacutepio da proporcionalidade podem se mostrar
abstratamente possiacuteveis de adoccedilatildeo no caso concreto podem se mostrar inadequadas e
irrazoaacuteveisrdquo 133
127 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Medidas executivas atiacutepicas na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de
pagar quantia certa art 139 IV do novo CPC Revista de Processo v 42 n 265 mar 2017 p 14 128 Ibid p 14 129 Ibid p 14 130 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111-112 131 Segundo Fredie Didier et al o postulado eacute uma norma que atua sobre a aplicaccedilatildeo de outras normas
A proporcionalidade e a razoabilidade seriam postulados normativos e natildeo princiacutepios segundo essa concepccedilatildeo 132 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo op cit p 14 133 Ibid p 14
51
Ademais conforme dispotildee o postulado da proibiccedilatildeo de excesso ldquoa realizaccedilatildeo de uma
regra ou princiacutepio constitucional natildeo pode conduzir agrave restriccedilatildeo a um direito fundamental que
lhe retire um miacutenimo de eficaacuteciardquo 134
A proibiccedilatildeo de excesso deveraacute sempre ser suscitada quando um direito fundamental
houver sido violado a ponto do direito fundamental sofrer violaccedilatildeo excessiva Ademais ldquoesse
postulado natildeo se confunde com o da proporcionalidade porque ele dispensa os exames da
adequaccedilatildeo (relaccedilatildeo meiofim) da necessidade (exigibilidade) ou da proporcionalidade em
sentido estrito (ponderaccedilatildeo entre vantagens e desvantagens)rdquo 135
Logo ldquopouco importa a relaccedilatildeo meiofim ou a exigibilidade da medida ou ainda a
ponderaccedilatildeo com outro direito fundamental eventualmente em jogo aqui se analisa apenas a
eficaacutecia de um determinado direito fundamentalrdquo 136
O princiacutepio da eficiecircncia tem previsatildeo constitucional no art 37 e previsatildeo
infraconstitucional no art 8ordm do CPC15 O referido princiacutepio determina que o processo seja
conduzido de forma eficiente pelo oacutergatildeo jurisdicional
Entende-se que eficiente eacute a atuaccedilatildeo que utilize adequadamente os meios necessaacuterios
para que se atinjam os fins almejados O oacutergatildeo jurisdicional na escolha dos meios a serem
utilizados para a obtenccedilatildeo dos fins
a) deve escolher aqueles que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo (deve evitar meios que promovam resultados insignificantes) b) deve escolher meios que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado (natildeo se pode escolher um meio de resultado duvidoso) c) natildeo pode escolher um meio que produza muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscado 137
O juiz deveraacute igualmente analisar o princiacutepio da menor onerosidade da execuccedilatildeo que
eacute previsto pelo art 805 do CPC ldquoArt 805 Quando por vaacuterios meios o exequente puder
promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o
executadordquo
134 134 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 112 135 Ibid p 112 136 Ibid p 112 137 Ibid p 112-113
52
Logo ldquohavendo duas opccedilotildees igualmente eficazes para permitir alcanccedilar o resultado
pretendido (satisfaccedilatildeo do creacutedito) deveraacute o oacutergatildeo julgador valer-se daquela que menos onere
a situaccedilatildeo do executadordquo 138
O dito princiacutepio impede o comportamento abusivo do exequente que possa beneficiar-
se do meio mais danoso ao executado protegendo dessa forma a lealdade e a eacutetica
processual
Os postulados e princiacutepios analisados em linhas preteacuteritas impotildeem ao oacutergatildeo julgador a
observacircncia de alguns criteacuterios para a escolha da medida executiva atiacutepicas a ser utilizada no
caso concreto
Primeiramente a medida executiva atiacutepica deveraacute ser adequada ldquoO criteacuterio da
adequaccedilatildeo impotildee que juiz considere abstratamente uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida
executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia
a gerar o resultadordquo 139 Nesse primeiro momento o juiz deveraacute observar sob a perspectiva do
credor qual medida teraacute o condatildeo de gerar o resultado mais efetivo
Segundo Fredie Didier et al140 o criteacuterio da adequaccedilatildeo eacute
() fortemente inspirado pelo postulado da proporcionalidade e pelo princiacutepio da eficiecircncia na parte em que esse princiacutepio determina a escolha de meios que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo e que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado
Ademais a medida adotada pelo oacutergatildeo julgador deveraacute ser necessaacuteria ldquoEsse criteacuterio
impotildee um limite agrave atuaccedilatildeo judicial funcionando como uma espeacutecie de contrapeso ao criteacuterio
da adequaccedilatildeo Aqui deve-se levar em conta a posiccedilatildeo do devedorrdquo141
O juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental agrave execuccedilatildeo e determinar
uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute necessaacuterio que a
medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado O criteacuterio da necessidade
estabelece que ldquonatildeo se pode ir aleacutem do necessaacuterio para alcanccedilar o propoacutesito almejado Deve
138 Ibid p 113 139 Ibid p 113 140 Ibid p 113 141 Ibid p 114
53
pois o oacutergatildeo julgador determinar o meio executivo na medida do estritamente necessaacuterio para
proporcionar a satisfaccedilatildeo do creacutedito ndash nem menos nem maisrdquo 142
O referido criteacuterio possui forte influecircncia dos postulados da proibiccedilatildeo do excesso e da
razoabilidade assim como do princiacutepio da menor onerosidade para o executado Assevera
Fredie Didier et al143 que
Natildeo eacute razoaacutevel por exemplo impor como primeira opccedilatildeo medida coercitiva a ser suportada pelo agente puacuteblico pelo simples fato de o juiz pressupor que o ente puacuteblico ao qual ele eacute vinculado iraacute descumprir determinada ordem judicial - o descumprimento natildeo pode ser visto como algo ordinaacuterio ou cotidiano (razoabilidade como dever de equidade) Tampouco eacute razoaacutevel eleger a prisatildeo civil como meacutetodo prioritaacuterio para compelir o executado ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer (razoabilidade como dever de equivalecircncia) Aleacutem disso eacute vedada por exemplo a imposiccedilatildeo de multa coercitiva para compelir o executado a emitir declaraccedilatildeo de vontade uma vez que haacute previsatildeo expressa de medida tiacutepica capaz de proporcionar o mesmo resultado sem sacrifiacutecio para o devedor (art 501 CPC)
A afirmaccedilatildeo feita por Bonavides144 em 1997 sobre a adequaccedilatildeo e a necessidade
continua atual sobre os motes
O meio empregado pelo legislador deve ser adequado e necessaacuterio para alcanccedilar o objetivo procurado O meio eacute adequado quando com seu auxiacutelio se pode alcanccedilar o resultado desejado eacute necessaacuterio quando o legislador natildeo poderia ter escolhido outro meio igualmente eficaz mas que natildeo limitasse ou limitasse de maneira menos sensiacutevel o direito fundamental
Por fim a medida deve conciliar os interesses contrapostos ldquoO magistrado deve
ponderar os interesses em jogo aplicando a proporcionalidade em sentido estrito de modo
que as vantagens da utilizaccedilatildeo da medida atiacutepica escolhida superem as vantagens de seu usordquo 145
Esse criteacuterio natildeo privilegia nem o credor nem o devedor e sim a soluccedilatildeo mais
equilibrada e que atenda da melhor forma aos valores em conflito ldquoTrata-se de criteacuterio
inspirado nos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade bem como no princiacutepio da
142 Ibid p 114 143 Ibid p 114 144 BONAVIDES Paulo Curso de Direito Constitucional 7ordm ediccedilatildeo Satildeo Paulo Ed Malheiros 1997
p 372 145 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual
Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 114-115
54
eficiecircncia na parte em que impotildee ao juiz evitar a escolha do meio executivo que produza
muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscadordquo 146
Cada um dos criteacuterios supracitados devem ser considerados pelo juiz ao aplicar as
medidas executivas atiacutepicas ao caso concreto Para Fredie Didier et al147 as medidas como
retenccedilatildeo de CNH passaporte ou cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado como
forma de pressionaacute-lo ao pagamento da diacutevida pecuniaacuteria natildeo satildeo possiacuteveis
Essas natildeo satildeo medidas adequadas ao atingimento do fim almejado (o pagamento de quantia) - natildeo haacute propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente Tais medidas soam mais como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-lo ao cumprimento da ordem judicial - e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a utilizaccedilatildeo de meios sancionatoacuterios pelo magistrado mas apenas de meios de coerccedilatildeo indireta e sub-rogatoacuterios
Ainda que adequadas fossem a retenccedilatildeo de CNH e do passaporte no corte de fornecimento de aacutegua natildeo parecem ser medidas necessaacuterias (no sentido de exigiacuteveis) uma vez que outras medidas podem em tese ser utilizadas sem causar igual gravame ao executado - como por exemplo a simples restriccedilatildeo do uso de cartotildees de creacutedito A retenccedilatildeo de documentos pessoais eacute medida que termina por restringir a liberdade de ir e vir do executado mostrando-se a princiacutepio natildeo-razoaacutevel por ir de encontro ao dever de equivalecircncia e desproporcional por restringir demais o direito agrave liberdade em favor do direito de creacutedito pecuniaacuterio do exequente
O processualista baiano et al148 cita tambeacutem outro exemplo de medida atiacutepica que natildeo
atingem os criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade
Tampouco parece adequada em princiacutepio determinaccedilatildeo de corte de energia eleacutetrica de todo o preacutedio onde funciona serviccedilo puacuteblico administrativo como forma de pressionar o ente federado a cumprir ordem de nomeaccedilatildeo de candidato em concurso puacuteblico Natildeo parece haver relaccedilatildeo meiofim entre uma coisa e outra Tambeacutem natildeo eacute possiacutevel enxergar essa medida como necessaacuteria no sentido de ser a menos gravosa para o devedor - observe que se trata de medida que uma vez aplicada ensejaria restriccedilatildeo de funcionamento em toda a reparticcedilatildeo puacuteblica em prejuiacutezo de serviccedilos puacuteblicos essenciais ao funcionamento da Administraccedilatildeo o que aleacutem de ser excessivamente gravoso parece natildeo se conformar agrave necessidade de ponderaccedilatildeo dos interesses em jogo - aleacutem de afetar a um sem-nuacutemero de pessoas tomadoras desses serviccedilos
Ademais eacute sabido que toda e qualquer decisatildeo judicial precisa ser fundamentada Ao
se tratar das medidas executivas atiacutepicas o papel da fundamentaccedilatildeo se torna ainda mais
146 Ibid p 115 147 Ibid p 115 148 Ibid p 116
55
importante tendo em vista que eacute pela fundamentaccedilatildeo da decisatildeo que se poderaacute controlar a
adequaccedilatildeo e necessidade da medida atiacutepica
Pelo fato das medidas executivas atiacutepicas derivarem de dispositivos normativos
considerados claacuteusulas gerais propiacutecias as mais variadas interpretaccedilotildees eacute de extrema
importacircncia que o oacutergatildeo julgador fundamente sua decisatildeo
Logo ldquodeve o juiz na fundamentaccedilatildeo decisoacuteria expor racionalmente os motivos da
sua escolha demonstrando com atenccedilatildeo ao art 489 sect 1ordm CPC de que modo a sua opccedilatildeo
atende os criteacuterios da adequaccedilatildeo necessidade e proporcionalidade em sentido estrito ()rdquo 149
Dessa forma os princiacutepios da proporcionalidade e razoabilidade servem para delimitar
o alcance das claacuteusulas gerais de efetivaccedilatildeo fazendo com que o oacutergatildeo julgador se atenha aos
criteacuterios da adequaccedilatildeo e necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao caso
concreto
42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO
EXECUTADO
A entrada em vigor do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 aflorou ainda mais uma
discussatildeo essencial para os processualistas do seacuteculo XXI qual eacute o verdadeiro protagonista do
processo civil
Para os que defendem o ldquoautoritarismo processualrdquo o verdadeiro protagonista do
processo civil eacute o oacutergatildeo judiciaacuterio que em nome do desempenho efetivo de suas funccedilotildees lhes
eacute permitido dilatar os poderes que diga-se de jaacute passagem jaacute compotildeem um vastiacutessimo
arsenal150
Jaacute os ldquogarantistasrdquo 151 do processo civil acreditam que os verdadeiros protagonistas satildeo
as partes do processo e seus direitos e garantias devem ser estritamente preservados
Devido a essa disputa de quem possui maior protagonismo no processo as mudanccedilas
ocorridas no coacutedigo processual vigente quanto agraves medidas executivas atiacutepicas despertaram
149 Ibid p 117 150 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos
atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04102018
151 O processualista Araken de Assis acredita que o termo garantista eacute descabido tendo em vista que remete ao processo penal
56
maior celeuma do que qualquer outra modificaccedilatildeo trazida pelo CPC15 Afinal as referidas
medidas acirravam ainda mais a disputa pelo protagonismo processual
O fato de o CPC15 dispor no art 139 IV que o juiz poderaacute decretar todas as medidas
indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o
cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo
pecuniaacuteria levou boa parte da doutrina e dos juiacutezes a acreditar que teria pleno direito de
aplicar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo Entretanto muitos se esqueceram do outro lado
da moeda esqueceram que a dignidade humana do executado tambeacutem eacute um direito
fundamental e natildeo pode ser violado
Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa152
acreditam que
() natildeo parece producente elencar um rol abstrato das medidas que poderiam ser aplicadas pelo juiz a tiacutetulo do art 139 IV CPC Afinal se busca a efetividade da execuccedilatildeo e esta soacute pode ser identificada agrave luz das especificidades da situaccedilatildeo concreta Ideal eacute enveredar pela loacutegica modular (adequaccedilatildeo ao caso) natildeo pela geneacuterica (soluccedilotildees abstratas de pretensa utilidade universal)
Em razatildeo de o dispositivo apresentar uma gama de poderes tatildeo amplos agrave disposiccedilatildeo do
oacutergatildeo julgador sem nenhuma estipulaccedilatildeo de um procedimento legal previamente definido para
que estabeleccedila as condiccedilotildees de sua aplicaccedilatildeo em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo eacute
necessaacuterio que em razatildeo do princiacutepio da dignidade humana natildeo busque definir o que o
dispositivo permite mas de definir o que ele natildeo permite ldquoOu seja propotildee-se a sua
compreensatildeo por exclusatildeo Afinal se ele tem potencialidade para promover a efetividade da
tutela tambeacutem pode provocar lesotildees E como em direito os fins natildeo justificam os meios
ressalta como prioritaacuteria a necessidade de estabelecer limitesrdquo 153
O art 789 do CPC15 disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial e eacute
categoacuterico ao dispor que ldquoo devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para
152 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
153 Ibid sem paginaccedilatildeo
57
o cumprimento de suas obrigaccedilotildees salvo as restriccedilotildees estabelecidas em leirdquo Logo a
execuccedilatildeo somente poderaacute incidir sobre os bens do devedor e natildeo sobre a sua pessoa
Como eacute sabido a Lex Poetelia Papiria de 326 aC foi o primeiro marco legal da
humanizaccedilatildeo das cobranccedilas de diacutevidas abolindo a imposiccedilatildeo ao devedor de castigos
vexatoacuterios e ateacute da pena de morte154
Afinal no direito romano antigo a cobranccedila de diacutevidas poderia recair sobre a pessoa
do devedor que respondia com sua liberdade e ateacute mesmo com seu proacuteprio corpo permitindo
a lei que repartissem tantos pedaccedilos do corpo do devedor quantos fossem seus credores
Nesse sentindo leciona o professor Guilherme Pupe da Noacutebrega155 que
Vem de longe a evoluccedilatildeo no sentido de fazer a responsabilidade por uma obrigaccedilatildeo migrar da pessoa do devedor para seu patrimocircnio Merecem registro especiacutefico como marcos histoacutericos remotos a Lex Poetelia Papiria de 326 aC que aboliu o nexum e possibilidade de escravidatildeo do devedor como garantia da obrigaccedilatildeo e a pignoris capio ou ldquoaccedilatildeo por tomada de penhorrdquo que instituiu a possibilidade de o credor tomar parcela dos bens do devedor como forma de assegurar o adimplemento da diacutevida Aqueles institutos culminariam seacuteculo depois no artigo 789 do CPC de 2015 a consagrar que o devedor responda pela satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo com seus bens presentes e futuros observadas as restriccedilotildees impostas pelas impenhorabilidades legais
Logo o avanccedilar da civilizaccedilatildeo marcou o deslocamento da responsabilidade por
diacutevidas saindo do corpo do devedor para o seu patrimocircnio tendo em vista que a vida
humana a liberdade e a integridade fiacutesica satildeo valores inalienaacuteveis natildeo podendo ser
sacrificadas em benefiacutecio de obrigaccedilotildees pecuniaacuterias 156
Entretanto eacute sabido que a responsabilidade patrimonial eacute excepcionada pela prisatildeo
civil do devedor de verba alimentiacutecia resquiacutecio da responsabilidade pessoal romana
154 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt
httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018
155 NOacuteBREGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139 IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018
156 Ibid sem paginaccedilatildeo
58
No entanto haacute uma justificativa para isso Segundo o processualista Guilherme Pupe
da Noacutebrega157
Eacute que a par de a prisatildeo civil encontrar previsatildeo constitucional no inciso LXVII do artigo 5ordm o raciociacutenio eacute o de que o direito do alimentante agrave liberdade de locomoccedilatildeo cede diante dos direitos agrave vida e agrave dignidade titularizados pelo alimentando e resguardados pelos alimentos Foi esse mesmo raciociacutenio aliaacutes que justificou no passado a ediccedilatildeo da suacutemula 309 pelo STJ agora positivada pelo artigo 528 sect 7ordm que limita a modalidade coercitiva agraves trecircs uacuteltimas prestaccedilotildees vencidas e agraves prestaccedilotildees vincendas A ideia eacute que tendo o alimentando subsistido a despeito do natildeo-pagamento de prestaccedilotildees mais antigas essas verbas teriam perdido o caraacuteter alimentar que na equaccedilatildeo antes apresentada justificaria a prisatildeo civil do alimentante Daiacute por que aqueles valores antigos remanescem exigiacuteveis mas somente pela via da expropriaccedilatildeo
Essa ressalva eacute necessaacuteria tendo em vista que a adoccedilatildeo de teacutecnica de execuccedilatildeo
indireta para incursatildeo radical na esfera de direitos do executado notadamente direitos
fundamentais quando carente de respaldo constitucional natildeo merece acolhimento sob
risco de se atentar contra o devido processo legal (artigo 5ordm LIV da Constituiccedilatildeo)
Como afirma o autor Bruno Dantas158 ldquoembora inexistam estatiacutesticas que permitam
comparaccedilotildees natildeo eacute desarrazoado intuir que os iacutendices de inadimplecircncia despeccedilam na razatildeo
inversa da incidecircncia das ordens judiciais sobre o corpo e a liberdade do devedorrdquo Entretanto
eacute natildeo possiacutevel adotar toda e qualquer medida executiva atiacutepica em nome da efetividade da
execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que se saiba os limites da sua aplicaccedilatildeo
Dessa forma instrumentos que permitam o cumprimento forccedilado de contratos e o pagamento
de diacutevidas satildeo necessaacuterios contudo eacute preciso equilibrar essa exigecircncia com a liberdade e a
dignidade humana
Como citado alhures o art 139 IV ensejou decisotildees como a que determinou a
suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o
passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito em uma accedilatildeo se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo
extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
Na supracitada decisatildeo o princiacutepio da responsabilidade patrimonial natildeo estaacute sendo
efetivado para o que o devedor responda com os seus bens Afinal qual ligaccedilatildeo entre a
157 Ibid sem paginaccedilatildeo 158 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt
httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018
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restriccedilatildeo de circulaccedilatildeo que diz com o direito de ir e vir (liberdade) com o pagamento de
diacutevidas que diz com a responsabilidade civil159
Ademais por que quem natildeo tem dinheiro para pagar diacutevidas natildeo pode dirigir Por que
natildeo tem condiccedilotildees para pagar o deacutebito natildeo pode ter passaporte Por que quem natildeo tem como
pagar o deve natildeo pode ter cartatildeo de creacutedito
Ao utilizar meios executivos atiacutepicos como os supracitados para compelir o devedor a
satisfazer a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria quando exauridos sem ecircxito os meios tradicionais de bens
penhoraacuteveis salvo quando existe qualquer indiacutecio concreto de ocultaccedilatildeo ou dissipaccedilatildeo de
bens eacute obrigar o devedor abrir matildeo da proteccedilatildeo da lei que lhe impede que seja tomado agrave forccedila
(art 833 CPC e demais disposiccedilotildees que tratam da impenhorabilidade)
Segundo Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa160
Claramente essa pressatildeo visa dar uma aparecircncia de voluntariedade agrave indicaccedilatildeo de bens impenhoraacuteveis pelo proacuteprio executado que na verdade soacute age assim por ser a uacutenica forma de ver-se livre de um grame imposto por medida indutiva despedida de qualquer necessidade ou adequaccedilatildeo Uma intoleraacutevel perversatildeo
Os autores afirmam ainda que o ldquodireito paacutetrio natildeo admite esta contraditio in terminis
sendo inaceitaacutevel a coexistecircncia de regra protetiva do executado com outra que concede ao
juiz poderes para forccedilar (ainda que indiretamente e veladamente) o executado a abrir matildeo
daquela proteccedilatildeordquo 161
Logo eacute cristalino que a suspensatildeo da CNH eacute uma forma incorreta de aplicar a medida
executiva atiacutepica para efetivar o direito fundamental a execuccedilatildeo tendo em vista que o uacutenico
objetivo da referida eacute pressionar o executado abrir matildeo de algum bem impenhoraacutevel para
levantar o dinheiro e cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria
A retenccedilatildeo do passaporte igualmente natildeo possui qualquer relaccedilatildeo com a diacutevida do
executado e eacute somente uma forma de tentar pressiona-lo a dispor de um bem que natildeo pode
ser tomado agrave forccedila e puni-lo por natildeo ter cumprido voluntariamente com a sua obrigaccedilatildeo
159 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
160 Ibid sem paginaccedilatildeo 161 Ibid sem paginaccedilatildeo
60
Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa162
acreditam que tal medida eacute equivocada e se torna excessivamente onerosa ao executado
As mais variadas circunstacircncias relevem o equiacutevoco de tal medida aplicada assim genericamente Com efeito nada justifica reter o passaporte do executado e impedi-lo de viajar para o exterior quando eacute agraciado inclusive com todas as despesas pagas com presente sorteio ou precircmio (por completar tempo de serviccedilo ou atingir metas produtividade na sociedade empresaacuteria em que trabalha) Como todo custo eacute suportado por terceiro e por isso mesmo a sua realizaccedilatildeo pelo executado natildeo traria qualquer prejuiacutezo ao exequente e a retenccedilatildeo do passaporte natildeo seria injustificaacutevel
Paulo Antonio Papini163 acredita que natildeo tem a apreensatildeo de passaporte natildeo possui um
fundamento plausiacutevel tendo em vista que se o devedor natildeo pode viajar para saldar o deacutebito
tambeacutem natildeo poderia exercer atividades cotidianas
Com todo o respeito a quem pensa dessa forma o argumento eacute muito simploacuterio e natildeo precisamos sequer do Direito para derrubaacute-lo Com efeito se considerarmos que ndash ateacute mesmo pelas dimensotildees continentais do Brasil ndash natildeo eacute incomum que uma passagem para o Nordeste custe mais caro que um voo para Miami seria razoaacutevel entatildeo seguindo a linha argumentativa do Magistrado em questatildeo que se oficiasse aos oacutergatildeos reguladores da aviaccedilatildeo civil proibindo-se aquele devedor de fazer ateacute mesmo voos domeacutesticos Poder-se-ia ir mais longe jaacute que natildeo tem dinheiro para pagar suas diacutevidas certamente aquele devedor tambeacutem natildeo teria para comer fora de sua casa porque entatildeo natildeo determinar a expediccedilatildeo de ofiacutecio aos restaurantes proacuteximos agrave sua casa e determinar tambeacutem a proibiccedilatildeo de que ele fosse servidoatendido
O autor se questiona ainda ldquoSeraacute entatildeo que o Princiacutepio da Dignidade da Pessoa
Humana estaacute de mero enfeite em nossa Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ()rdquo 164 Tendo em vista
que ldquoa decisatildeo em comento viola diretamente o art 5ordm incisos XV LIII e LXIII da
Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ndash falamos do Direito de Ir e Virrdquo 165
Ademais o cancelamento do cartatildeo de creacutedito eacute mais uma forma de constranger e
compelir o executado a cumprir com a obrigaccedilatildeo de qualquer forma natildeo importando o que
precise fazer para conseguir saldar o deacutebito tendo em vista que a referida medida apresenta
162 Ibid sem paginaccedilatildeo 163 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo
pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018
164 Ibid sem paginaccedilatildeo 165 Ibid sem paginaccedilatildeo
61
qualquer adequaccedilatildeo com o fim desejado (reverter em pagamento para o exequente) Os
autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa afirmam que166
Reconhece-se que as razotildees da afirmaccedilatildeo ora questionada satildeo ateacute intuitivas mas eacute plenamente possiacutevel problematiza-las Ora natildeo se encontra qualquer justificativa idocircnea para que o juiz possa cancelar o contrato do executado com a administradora do cartatildeo de creacutedito (ou instituiccedilatildeo financeira) que natildeo tem qualquer relaccedilatildeo com o creacutedito exequendo muito menos como isso poderia impactar positivamente na execuccedilatildeo (senatildeo para pressionar o executado a dispor de bens impenhoraacuteveis) Ademais natildeo foram indicados sequer sinais de que o executado realiza gastos supeacuterfluos com o cartatildeo de creacutedito ndash natildeo que isso justificasse a medida pois o correto seria penhorar os esses bens (se duraacuteveis naturalmente) ao inveacutes de cancelar o cartatildeo de creacutedito
Logo as referidas medidas natildeo possuem qualquer relaccedilatildeo com o atingimento do fim
almejado (o pagamento de quantia) tendo em vista que natildeo haacute uma relaccedilatildeo meiofim entre
tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a
restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia
ao exequente
Dessa forma nota-se que as medidas de suspensatildeo da CNH retenccedilatildeo de passaporte e
bloqueio do cartatildeo de credito satildeo completamente inadequadas agrave realizaccedilatildeo a que se prestam
Afinal ldquotais medidas soam como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-
lo ao cumprimento da ordem judicial ndash e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a
utilizaccedilatildeo dos meios sancionatoacuterios pelo magistrado ()rdquo167
Como exposto em linhas preteacuteritas o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades
de aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e
razoaacutevel se atendo aos criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas
executivas atiacutepicas ao caso concreto sob pena de converter a medida em de indutiva para
punitiva
A utilizaccedilatildeo de medidas atiacutepicas como a suspensatildeo da carteira de motorista e o
passaporte do devedor abandona a regra da responsabilidade patrimonial e atingem em cheio
o nuacutecleo de direitos inerentes agrave condiccedilatildeo humana
166 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
167 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 115
62
O limite para a aplicaccedilatildeo de tais medidas deve ser a Constituiccedilatildeo Federal e sobretudo
os Direitos fundamentais nela expressos ldquoCom efeito natildeo haacute saiacuteda tampouco soluccedilatildeo eficaz
de um problema sem que se respeite a Lei e o Devido Processo Legal (por mais nobres que
sejam as intenccedilotildees)rdquo 168
Dessa forma a busca desenfreada pelo cumprimento das decisotildees judiciais em
especial na fase executiva natildeo pode ser realizada em sacrifiacutecio de direitos fundamentais O
Poder Judiciaacuterio natildeo pode resolver a crise do processo executoacuterio utilizando de medidas
arbitraacuterias com o propoacutesito de satisfazer obrigaccedilotildees pecuniaacuterias
Eis o dilema que se coloca diante do poder geral de efetivaccedilatildeo ele pode servir de
potente instrumento em prol da tutela jurisdicional executiva entretanto se manejado de
modo improacuteprio serviraacute de instrumento de puniccedilatildeo e humilhaccedilatildeo do executado169
Eacute notoacuterio que se amplamente aplicado o poder geral de efetivaccedilatildeo reduziria os
iacutendices de inadimplecircncia quiccedilaacute resolveria por completo a crise da execuccedilatildeo civil Entretanto
o retrocesso civilizatoacuterio seria irreparaacutevel
168 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo
pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018
169 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas
inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
63
5 CONCLUSAtildeO
Como funccedilatildeo jurisdicional que tem como objeto a efetivaccedilatildeo de direitos a execuccedilatildeo
deve sempre buscar a maior satisfaccedilatildeo possiacutevel concretizando integralmente o creacutedito do
exequente isto eacute realizando o direito fundamental agrave tutela executiva do credor Por isso a
adoccedilatildeo de meios executivos atiacutepicos incorporados pelo Coacutedigo de Processo Civil de 2015 por
meio do art139 IV em um primeiro momento podem ser consideradas vaacutelidas visto que
servem de instrumento para a satisfaccedilatildeo e asseguraccedilatildeo de direitos do credor
Entretanto para o oacutergatildeo julgador natildeo cometa arbitrariedades em nome do direito
fundamental agrave execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que seja definido certos limites na adoccedilatildeo do poder
geral de efetivaccedilatildeo
As medidas executivas atiacutepicas natildeo podem ser aplicadas de maneira indiscriminada
logo devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o esgotamento das medidas tiacutepicas e
a possibilidade de cumprimento da obrigaccedilatildeo
Partindo dessa premissa as medidas a serem adotadas pelo juiz no caso concreto
devem ter como baliza os princiacutepios da proporcionalidade e da razoabilidade para que natildeo
ultrapassem a responsabilidade patrimonial do devedor e incidida diretamente sobre sua
pessoa
Para que natildeo seja atingida a pessoa do executado ou seja para que o devedor natildeo
tenha sua dignidade humana viola eacute necessaacuterio que a medida atiacutepica seja adequada e
necessaacuteria
Logo o juiz deveraacute sempre estabelecer uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida
executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia
a gerar o resultado sem violar a dignidade humana do executado
Dessa o juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental a execuccedilatildeo e
determinar uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute
necessaacuterio que a medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado
As medidas que ultrapassam esses limites como a decisatildeo que apreendeu o
passaporte suspensatildeo a CNH e bloqueou o cartatildeo de creacutedito do devedor satildeo meramente
punitivas posto que essas natildeo satildeo as medidas mais adequadas para se atingir o fim almejado
pois natildeo existe propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado
64
uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo
geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente
Medidas como esta servem de embasamento para decisotildees arbitraacuterias e autoritaacuterias de
violaccedilatildeo dos direitos fundamentais transformando o poder geral de efetivaccedilatildeo em
instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com autorizaccedilatildeo judicial
Em suma o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades de aplicaccedilatildeo do poder
geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e razoaacutevel se atendo aos
criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao
caso concreto sob pena de punir a pessoa do executado violando a sua dignidade humana
em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo
65
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Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em
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NOBREacuteGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas
executivas e o art 139 IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt
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Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139gt Publicado em
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NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa
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NEVES Alexandre Fuchs das Cancelamento de cartotildees de creacutedito e apreensatildeo de
CNH e passaporte do devedor Isso eacute possiacutevel Disponiacutevel em lt
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NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Medidas executivas atiacutepicas na execuccedilatildeo de
obrigaccedilatildeo de pagar quantia certa art 139 IV do novo CPC Revista de Processo v 42
n 265 mar 2017
68
PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte
de devedor natildeo pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-
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da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018
ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas
indutivas inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC
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inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018
RODRIGUES Maacuterio Henrique Cavalcanti Gil A evoluccedilatildeo da execuccedilatildeo de sentenccedila
no direito processual civil e o novo regime juriacutedico das sentenccedilas apoacutes a reforma
implementada pela Lei 112322005 Revista do Tribunal Regional Federal da 1ordf Regiatildeo v
22 n 2 fev 2010
RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia
na concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que
determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt
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STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do
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SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a
execuccedilatildeo de creacutedito fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n
2 2ordm sem 2006
THEODORO JUacuteNIOR Humberto Novo Coacutedigo de Processo Civil Anotado 20 ed
Rio de Janeiro Ed Forense 2016
- 1 INTRODUCcedilAtildeO
- 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
-
- 21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL
- 22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
- 23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
- 24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO
- 25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO
-
- 3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
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- 31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS
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- 311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15
-
- 32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
- 33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
- 34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
-
- 4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
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- 41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
- 42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
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- 5 CONCLUSAtildeO
- REFEREcircNCIAS
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