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FACULDADE BAIANA DE DIREITO CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO PROCESSUAL CIVIL DIANDRA GRADIN SCHAUN OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVAÇÃO: UM DILEMA ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL À EXECUÇÃO E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO Salvador 2018

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FACULDADE BAIANA DE DIREITO CURSO DE POacuteS-GRADUACcedilAtildeO EM DIREITO PROCESSUAL

CIVIL

DIANDRA GRADIN SCHAUN

OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA

ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE

HUMANA DO EXECUTADO

Salvador

2018

DIANDRA GRADIN SCHAUN

OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA

ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE

HUMANA DO EXECUTADO

Monografia apresentada ao curso de poacutes-graduaccedilatildeo em Direito Processual Civil da Faculdade Baiana de Direito como requisito para obtenccedilatildeo do grau de especialista em Direito Processual Civil

Salvador

2018

DIANDRA GRADIN SCHAUN

OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA

ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE

HUMANA DO EXECUTADO

Monografia aprovada como requisito para obtenccedilatildeo do grau de Especialista em Direito

Processual Civil pela seguinte banca examinadora

Nome _______________________________________________________________

Titulaccedilatildeo e instituiccedilatildeo __________________________________________________

Nome _______________________________________________________________

Titulaccedilatildeo e instituiccedilatildeo __________________________________________________

Nome _______________________________________________________________

Titulaccedilatildeo e instituiccedilatildeo __________________________________________________

Salvador ______2018

RESUMO

A prestaccedilatildeo jurisdicional natildeo se concretiza depois de encerrada a fase de conhecimento Para

que a referida prestaccedilatildeo se consume eacute necessaacuterio que ocorra a satisfaccedilatildeo do deacutebito pelo

devedor que em grande parte soacute se efetiva atraveacutes da tutela executiva Entretanto a execuccedilatildeo

civil sempre sofreu uma crise quanto a sua efetividade e o Coacutedigo de Processo Civil de 2015

com o escopo de dirimir a ineficiecircncia do instituto concebeu novas diretrizes ao processo

executoacuterio Dessa forma o art 139 IV do Coacutedigo de Processo Civil estabeleceu a

possibilidade de o juiz dispor de todas as medidas necessaacuterias para assegurar o cumprimento

de ordem judicial trazendo como grande inovaccedilatildeo a aplicaccedilatildeo dessas medidas tambeacutem nas

obrigaccedilotildees de pagar quantia Todavia eacute necessaacuterio estabelecer criteacuterios limitadores para que a

adoccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo viole a dignidade humana do executado em nome do

direito fundamental agrave execuccedilatildeo

Palavras-chaves Execuccedilatildeo Poder geral de efetivaccedilatildeo Direito fundamental agrave execuccedilatildeo

Dignidade humana do executado

SUMAacuteRIO

1 INTRODUCcedilAtildeO 5

2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL 7

21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL 7

22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL 8

23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL 11

24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO 17

25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO 20

3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 23

31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS 23

311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15 25

32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO 28

33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO 31

34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 36

4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 48

41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO 48

42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 55

5 CONCLUSAtildeO 63

REFEREcircNCIAS 65

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

Art ndash Artigo

CPC15 ndash Coacutedigo de Processo Civil de 2015

CPC73 ndash Coacutedigo de Processo Civil de 1973

ENFAM ndash Escola nacional de formaccedilatildeo e aperfeiccediloamento de magistrados

HC ndash Habeas Corpus

STJ ndash Superior Tribunal de Justiccedila

5

1 INTRODUCcedilAtildeO

A prestaccedilatildeo jurisdicional natildeo costuma se findar apoacutes o encerramento da fase cognitiva

com a prolaccedilatildeo de uma sentenccedila de meacuterito Para que a referida prestaccedilatildeo se concretize eacute

imperioso que haja a satisfaccedilatildeo do deacutebito pelo devedor

Entretanto observa-se em diversos casos o inadimplemento da parte passiva

processual sendo necessaacuterio desenvolver a atividade executiva A referida atividade possui o

escopo de satisfazer direitos

Isso porque o processo natildeo eacute um fim em si mesmo sendo apenas um exerciacutecio da

jurisdiccedilatildeo estatal Dessa forma a razatildeo de ser do processo eacute o atingimento da sua finalidade

almejada que eacute a prestaccedilatildeo da tutela jurisdicional

Todavia como a tutela jurisdicional configura-se na obrigaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio

proteger e reparar os direitos lesionados ou ameaccedilados de lesatildeo muitas vezes a dita tutela

somente consegue ser efetivada atraveacutes da atividade executiva da jurisdiccedilatildeo

Ocorre que a execuccedilatildeo civil sempre foi o ldquocalcanhar de Aquilesrdquo do sistema

processual e de modo geral vinha sofrendo uma crise quanto a sua efetividade Ou seja o

credor obtia ecircxito na fase de conhecimento entretanto natildeo conseguia alcanccedilar o seu direito a

prestaccedilatildeo reconhecida na fase de execuccedilatildeo

Com o fito de tornar a atividade satisfativa mais eficiente e mais ceacutelere o Coacutedigo de

Processo Civil de 2015 concebeu novas diretrizes ao processo no sentindo de harmonizar

suas com os ditames da Constituiccedilatildeo Federal principalmente com os direitos fundamentais

As normas fundamentais do processo civil trazidas pelo CPC15 preocupam-se

primordialmente com a efetividade da tutela jurisdicional

Em conformidade com essa nova sistemaacutetica o legislador no art 139 IV do Coacutedigo

de Processo Civil estabeleceu a possibilidade de o juiz dispor de todas as medidas indutivas

coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o cumprimento de

ordem judicial trazendo como grande novidade a aplicaccedilatildeo dessas medidas executoacuterias

atiacutepicas tambeacutem nas obrigaccedilotildees de pagar dinheiro

6 Entretanto natildeo haacute na legislaccedilatildeo criteacuterios especiacuteficos que auxiliem o oacutergatildeo julgador na

escolha das medidas executivas atiacutepicas que se adotadas sem qualquer baliza podem

acarretar consequecircncias juriacutedicas irreparaacuteveis

Como a famosa decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de

Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-1320138260011 Nessa accedilatildeo

que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo

pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a suspensatildeo da

Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o passaporte e

cancelou os cartotildees de creacutedito como forma de compeli-lo a adimplir com o deacutebito

Decisotildees como esta geram conflitos entre direitos constitucionalmente instituiacutedos De

um lado o direito fundamental agrave tutela jurisdicional e de outro os direitos e garantias

inerentes a todos os indiviacuteduos

Dessa forma a presente monografia tem como escopo de estabelecer criteacuterios

limitadores para que a adoccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo viole a dignidade humana do

executado em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo

7 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO

CIVIL

21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL

A Execuccedilatildeo Civil nasce a partir do direito a uma prestaccedilatildeo conferida a algueacutem de

exigir de outrem o cumprimento de uma conduta de fazer natildeo fazer ou de dar (dinheiro ou

coisa distinta) 1

Para que o direito a uma prestaccedilatildeo se concretize no mundo fiacutesico eacute necessaacuterio que

haja a satisfaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida pelo sujeito passivo Caso contraacuterio fala-se em

inadimplemento ou lesatildeo O titular do direito natildeo tem como agir por si para efetivar o seu

direito a prestaccedilatildeo posto que a autotutela eacute vedada no ordenamento juriacutedico Dessa forma eacute

necessaacuterio que se recorra ao Poder Judiciaacuterio para que se possa ter a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo

devida logo a tutela jurisdicional executiva2

O processualista Fredie Didier et al3 equaciona essa questatildeo da seguinte maneira

Quando se pensa em tutela executiva pensa-se na efetivaccedilatildeo de direitos a uma prestaccedilatildeo fala-se de um conjunto de meios para efetivar a prestaccedilatildeo devida fala-se em execuccedilatildeo de fazer natildeo-fazer dar exatamente os trecircs tipos de prestaccedilatildeo existentes Natildeo eacute por acaso nem por coincidecircncia que a tutela executiva pressupotildee inadimplemento (CPC art 786) - fenocircmeno exclusivo dos direitos a uma prestaccedilatildeo Eacute por isso tambeacutem que se pode falar em prescriccedilatildeo da execuccedilatildeo (CPC art 802 e suacutemula do STF n 150) - prescriccedilatildeo eacute fenocircmeno juriacutedico que se relaciona aos direitos a uma prestaccedilatildeo A execuccedilatildeo forccedilada dirige-se ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo Essa relaccedilatildeo entre direito material e processo eacute fundamental para a compreensatildeo do fenocircmeno executivo

Nesse iacutenterim para o Ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux4 ldquoexecutar eacute

satisfazerrdquo ao passo que o professor Fredie Didier et al5 formulou um conceito mais amplo

ldquoExecutar eacute satisfazer uma prestaccedilatildeo devida A execuccedilatildeo pode ser espontacircnea quando o

devedor cumpre voluntariamente a prestaccedilatildeo ou forccedilada quando o cumprimento da prestaccedilatildeo

eacute obtido por meio de atos executivos pelo Estadordquo

1 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 41 2 Ibid p 42 3 Ibid p 42 4 FUX Luiz Curso de direito processual civil Rio de Janeiro Forense 2001 p 980 5 DIDIER JR Fredie et al Op Cit p 45

8 Dessa forma a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional responsaacutevel pela

concretizaccedilatildeo de um direito subjetivo no plano material obtendo resultado idecircntico ou

equivalente ao atingiacutevel se o devedor cumprisse espontaneamente a prestaccedilatildeo

Todavia essa atividade jurisdicional soacute cabe quando o devedor se recusa a cumprir

com a obrigaccedilatildeo quebrando a expectativa do credor de receber o que lhe eacute devido Por esta

razatildeo que se diz que a execuccedilatildeo civil eacute ldquoforccediladardquo 6

Eacute o que se conclui seguindo os ensinamentos de Leonardo Greco7 para ele execuccedilatildeo eacute

uma

() modalidade de tutela jurisdicional que consiste na praacutetica pelo juiz (ou por outrem sob a sua supervisatildeo) de uma seacuterie de atos coativos concretos sobre o devedor e sobre o seu patrimocircnio a fim de agrave custa dele e independentemente do concurso da sua vontade tornar efetivo o cumprimento de prestaccedilatildeo por ele inadimplida desde que tais atos coativos estejam previamente constituiacutedos em lei

Portanto a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional que tem como escopo obter o

cumprimento de uma prestaccedilatildeo certa e inadimplida mediante atos coativos sobre o devedor e

seus bens

22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL

Vislumbrado o conceito de execuccedilatildeo civil cabe agora empreender a sua classificaccedilatildeo

tendo em vista que a execuccedilatildeo pode se manifestar de diversas formas possuindo diferentes

caracteriacutesticas em cada uma das suas modalidades

Inicialmente cabe destacar que haacute duas teacutecnicas processuais para viabilizar a execuccedilatildeo

civil lato sensu eacute a que divide em processo autocircnomo de execuccedilatildeo e em fase de execuccedilatildeo

dependendo do tiacutetulo executivo que justifica o exerciacutecio da atividade satisfativa

O Coacutedigo Processual Civil de 2015 acertadamente ratificou as reformas promovidas

no CPC73 que consagrava a opccedilatildeo legislativa de oferecimento das tutelas de certificaccedilatildeo e

efetivaccedilatildeo do direito em um mesmo processo Dessa forma as execuccedilotildees de sentenccedilas

6 BASTOS Luiz Fernando Pereira O artigo 139 IV do novo Coacutedigo de Processo Civil a atipicidade

dos meios executivos na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia certa Brasiacutelia 2017 Disponiacutevel em lt httpbdmunbbrbitstream104831866812017_LuizFernandoPereiraBastospdf gt Acesso em 06 de agosto de 2018

7 BASTOS Luiz Fernando Pereira apud GRECO Leonardo O processo de execuccedilatildeo Rio de Janeiro Renovar 1999 p 164

9

passaram a ser uma fase complementar ao de processo de conhecimento e natildeo mais ocorrer

em um processo autocircnomo

No entendimento do professor processualista Fredie Didier et al8 o processo

sincreacutetico simplificou a efetivaccedilatildeo de um direito reconhecido em sentenccedila

A dispensa do ajuizamento de um processo autocircnomo para execuccedilatildeo de sentenccedila natildeo soacute veio diminuir o tempo necessaacuterio agrave prestaccedilatildeo da tutela jurisdicional - afinal o credor natildeo mais precisaria tal como ocorria ateacute entatildeo promover nova citaccedilatildeo pessoal do reacuteudevedor- como tambeacutem veio romper de vez com um velho paradigma segundo o qual a atividade executiva estaria dissociada da precedente atividade jurisdicional cognitiva

Entretanto natildeo soacute as sentenccedilas de meacuterito ensejam uma execuccedilatildeo Por esta razatildeo foi

necessaacuterio manter o processo autocircnomo de execuccedilatildeo para os casos em que o credor tem a seu

favor um documento que natildeo tenha sido proferido por um oacutergatildeo dotado de jurisdiccedilatildeo

Consequentemente se for o titulo executivo judicial o caminho natural eacute o do

cumprimento de sentenccedila Sendo por sua vez extrajudicial o titulo executivo o caminho

correto eacute o processo de execuccedilatildeo

Cabe ainda salientar que toda execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial eacute definitiva Jaacute a

execuccedilatildeo de tiacutetulo judicial (cumprimento de sentenccedila) pode ser definitiva ou provisoacuteria

No primeiro caso isto eacute cumprimento de sentenccedila definitivo ldquoeacute a execuccedilatildeo completa

que vai ateacute a fase final (com a entrega do bem da vida) sem exigecircncias adicionais para o

exequenterdquo 9

Quanto ao segundo caso ldquoo cumprimento provisoacuterio de sentenccedila (fundada em tiacutetulo

provisoacuterio) eacute aquele que exige alguns requisitos extras para que se chegue agrave fase final da

execuccedilatildeordquo 10

Para Fredie Didier11 o criteacuterio para definir se o cumprimento de sentenccedila seraacute

definitivo ou provisoacuterio

() eacute a estabilidade do tiacutetulo executivo em que se funda a execuccedilatildeo se se tratar de decisatildeo acobertada pela coisa julgada material o cumprimento de sentenccedila eacute

8 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 46 9 Ibid p 57 10 Ibid p 57 11 Ibid p 57

10

definitivo se se tratar de decisatildeo judicial ainda passiacutevel de alteraccedilatildeo (reforma ou invalidaccedilatildeo) em razatildeo da pendecircncia de recurso contra ela interposto a que natildeo tenha sido atribuiacutedo efeito suspensivo o cumprimento de sentenccedila eacute provisoacuterio

Ademais a execuccedilatildeo se distingue em procedimentos executivos comuns que satildeo da

execuccedilatildeo civil e que servem a uma generalidade de creacuteditos como eacute o caso do cumprimento

de sentenccedila e o processo de execuccedilatildeo E em procedimentos executivos especiais que servem

agrave satisfaccedilatildeo de creacuteditos peculiares como a execuccedilatildeo de alimentos e a execuccedilatildeo fiscal 12

Por fim cabe mencionar a classificaccedilatildeo que distingue a execuccedilatildeo em direta e indireta

A primeira execuccedilatildeo direita (ou execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo) eacute ldquo() aquela em que o

Poder Judiciaacuterio prescinde da colaboraccedilatildeo do executado para a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida

e pois promove uma substituiccedilatildeo da sua conduta pela conduta do proacuteprio Estado-juiz ou de

terceirordquo 13 Ou seja as medidas executivas satildeo levadas a efeito mesmo contra a vontade do

devedor na execuccedilatildeo direta

Segundo a doutrina a execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo se subdivide da seguinte forma

meios de desapossamento meios de transformaccedilatildeo e meios de expropriaccedilatildeo

Os meios de desapossamento muito comuns nas execuccedilotildees para entrega de coisa eacute a

forma ldquopor meio da qual se retira da posse do executado o bem a ser entregue ao exequente

(p ex despejo busca e apreensatildeo reintegraccedilatildeo de posse)rdquo 14 Ao passo que por meio dos de

transformaccedilatildeo ldquo() o juiz determina que um terceiro pratique a conduta que deveria ser

praticada pelo executado cabendo a este arcar com o pagamento do custo respectivordquo 15 Jaacute

os meios executivos de expropriaccedilatildeo eacute a forma ldquopor meio do qual algum bem do patrimocircnio

do devedor eacute expropriado para pagamento do creacutedito (adjudicaccedilatildeo alienaccedilatildeo judicial ou

apropriaccedilatildeo de frutos e rendimentos de empresa ou de estabelecimentos e de outros bens art

825 CPC)rdquo 16

12 Ibid p 48 13 Ibid p 50 14 Ibid p 51 15 Ibid p 51 16 Ibid p 51

11 Jaacute a execuccedilatildeo indireta (ou mandamental) atua ldquo() na vontade do devedor como forma

de compeli-lo ou incentivaacute-lo a cumprir a ordem judicialrdquo 17 Nesse entendimento ainda

leciona Fredie Didier et al 18

Nesses casos o Estado-juiz busca promover a execuccedilatildeo com a colaboraccedilatildeo do executado forccedilando ou incentivando a que ele proacuteprio cumpra a prestaccedilatildeo devida Em vez de o Estado-juiz tomar as providecircncias que deveriam ser tomadas pelo executado o Estado forccedila por meio de coerccedilatildeo psicoloacutegica ou de promessa de recompensa judicial a que o proacuteprio executado cumpra a prestaccedilatildeo

A execuccedilatildeo indireta pode ser patrimonial como por exemplo a imposiccedilatildeo de multa

coercitiva ou pessoal com a prisatildeo civil do devedor de alimentos Ademais adiciona Didier

et al19que

O estiacutemulo ao cumprimento da prestaccedilatildeo pode dar-se pelo temor (p ex multa coercitiva prisatildeo civil do devedor de alimentos divulgaccedilatildeo de notiacutecia em jornal revelando o descumprimento) ou pelo incentivo (p ex a chamada sanccedilatildeo premial ou sanccedilatildeo positiva de que eacute exemplo a isenccedilatildeo do pagamento de custas em caso de cumprimento do mandado monitoacuterio - art 701 sect 1ordm CPC a reduccedilatildeo pela metade dos honoraacuterios advocatiacutecios fixados inicialmente pelo juiacutezo em caso de pagamento integral do deacutebito pecuniaacuterio na execuccedilatildeo por quantia certa fundada em tiacutetulo extrajudicial - art 827 sect 1ordm CPC)

Por tais razotildees haacute uma tendecircncia em cada vez mais prestigiar os meios executivos

indiretos (coercitivos) posto que satildeo tatildeo eficazes quanto os meios executivos diretos

entretanto menos onerosos Contudo sua aplicaccedilatildeo deve ser fiscalizada a fim de natildeo permitir

que a execuccedilatildeo civil perca sua finalidade visto que eacute uma funccedilatildeo jurisdicional que tem como

escopo efetivar o direito do credor e natildeo de atender os interesses do devedor

23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL

Os princiacutepios juriacutedicos nos uacuteltimos anos passaram a ser munidos de forccedila cogente

normatizando as condutas humanas tanto quanto as regras juriacutedicas Os ditos princiacutepios

ampliaram as margens de atuaccedilatildeo dos aplicadores do direito possibilitando a construccedilatildeo de

soluccedilotildees mais adequadas agraves especificidades das demandas que chegam ao judiciaacuterio

17 Ibid p 51 18 Ibid p 51 19 Ibid p 51-52

12 Dessa forma eacute necessaacuterio aprofundar-se nos princiacutepios norteadores da execuccedilatildeo civil

para que se obtenha uma anaacutelise completa da teoria geral da execuccedilatildeo

A execuccedilatildeo civil tem como um dos seus corolaacuterios o princiacutepio da efetividade este

consiste na exigecircncia de um sistema completo de tutela executiva no qual existam meios

executivos capazes de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor

de tutela executivardquo 20

O referido princiacutepio da efetividade eacute reforccedilado como normal fundamental do processo

civil brasileiro pelo art 4ordm do CPC ldquoArt 4ordm As partes tecircm o direito de obter em prazo razoaacutevel

a soluccedilatildeo integral do meacuterito incluiacuteda a atividade satisfativa

Jaacute o princiacutepio da boa feacute processual corolaacuterio do devido processo legal estaacute previsto

no art 5ordm do CPC ldquoAquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de

acordo com a boa-feacuterdquo Segundo o processualista baiano Fredie Didier21

O princiacutepio da boa-feacute extrai-se de uma claacuteusula geral processual A opccedilatildeo por uma claacuteusula geral de boa-feacute eacute a mais correta Eacute que a infinidade de situaccedilotildees que podem surgir ao longo do processo torna pouco eficaz qualquer enumeraccedilatildeo legal exaustiva das hipoacuteteses de comportamento desleal Daiacute ser correta a opccedilatildeo da legislaccedilatildeo brasileira por uma norma geral que impotildee o comportamento de acordo com a boa-feacute Em verdade natildeo seria necessaacuteria qualquer enumeraccedilatildeo das condutas desleais o art 5deg do CPC eacute bastante exatamente por tratar-se de uma claacuteusula geral

Dessa forma o dito princiacutepio preconiza que diante de um vinculo juriacutedico as pessoas

envolvidas natildeo poderatildeo frustrar a confianccedila do outro devendo comportar-se como se pode

esperar de uma pessoa de boa-feacute

Ademais disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial que ldquosomente o

patrimocircnio do devedor (art 789 CPC) ou de terceiro responsaacutevel pode ser objeto da

atividade executiva do Estadordquo 22

O referido princiacutepio que determina que somente o patrimocircnio submete-se agrave execuccedilatildeo

e natildeo a pessoa foi trazido pela humanizaccedilatildeo do direito Para o professor Didier et al23 o

20 DIDIER JR Freddie et al apud GUERRA Marcelo Lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do

credor na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 21 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte

geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 105 22 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 68

13

desenvolvimento dos meios de execuccedilatildeo indireta ldquoparece relativizar um pouco esse princiacutepio

na medida em que pressionam psicologicamente a pessoa do devedor para que cumpra a

obrigaccedilatildeo com seu comportamentordquo

Complementa ainda que

A responsabilidade executiva parece assumir atualmente caraacuteter hiacutebrido comportando coerccedilatildeo pessoal e sujeiccedilatildeo patrimonial

i) a coerccedilatildeo pessoal incide sobre a vontade do devedor admitindo o uso de medidas coercitivas de execuccedilatildeo indireta para forccedilaacute-lo a cumprir a obrigaccedilatildeo com seu proacuteprio comportamento (ex arts 139 rv 523 sect 1ordm 536 sect 1ordm e 538 sect 3ordm todos do CPC)

ii) descumprida a obrigaccedilatildeo e natildeo sendo possiacuteveladequado o uso de teacutecnica de coerccedilatildeo pessoal tem-se a sujeiccedilatildeo patrimonial que recairaacute sobre os bens do devedor ou de terceiro responsaacutevel - que responderatildeo pela proacutepria prestaccedilatildeo in natura (ex dar coisa ou entregar quantia) ou por perdas e danos24

Dessa forma o referido princiacutepio natildeo tem aplicaccedilatildeo absoluta em razatildeo do principio da

efetividade a qual estimula o uso dos meios de coerccedilatildeo indireta para garantir o cumprimento

da obrigaccedilatildeo pelo devedor

O princiacutepio da primazia da tutela especifica (ou princiacutepio do resultado) assevera que

ldquoA execuccedilatildeo deve ser especiacutefica propiciar ao credor a satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo tal qual

houvesse o cumprimento espontacircneo da prestaccedilatildeo pelo devedorrdquo 25

O CPC de 2015 absorveu todos os avanccedilos legislativos a cerca do mote O caput do

art 497 assegura que na accedilatildeo que tenha por objeto a prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer o

juiz se procedente o pedido concederaacute a tutela especiacutefica ou determinaraacute providecircncias que

assegurem a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico equivalente O art 499 o

complementa a obrigaccedilatildeo somente seraacute convertida em perdas e danos se o autor o requerer

ou se impossiacutevel agrave tutela especiacutefica ou a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico

equivalente

O princiacutepio do contraditoacuterio eacute garantido pela constituiccedilatildeo federal e compreende o

direito de ser ouvido o direito de acompanhar os atos processuais o direito de produzir

provas participar da sua produccedilatildeo manifestar-se sobre a prova produzida e obter do juiz a

23 Ibid p 69-70 24 Ibid p 70 25 Ibid p 71

14

respectiva valoraccedilatildeo o direito de ser informado regularmente dos atos praticados no processo

o direito agrave motivaccedilatildeo das decisotildees o direito de impugnar as decisotildees 26

O contraditoacuterio tem aplicaccedilatildeo em todo processo judicial sendo aplicaacutevel tambeacutem na

execuccedilatildeo No entanto o contraditoacuterio na execuccedilatildeo natildeo ocorre com a mesma intensidade que

no processo ou na fase de conhecimento eacute o que assevera Didier et al 27

O contraditoacuterio no procedimento executivo no aspecto do direito de defesa assegurado agrave parte demandada eacute eventual porquanto depende da provocaccedilatildeo do executado que natildeo eacute chamado ajuiacutezo para defender-se mas sim para cumprir a obrigaccedilatildeo O procedimento executivo adota a teacutecnica monitoacuteria que consiste basicamente na inversatildeo do ocircnus de provocar o contraditoacuterio o reacuteu em vez de citado para manifestar-se sobre a pretensatildeo do autor eacute convocado para cumprir uma determinada obrigaccedilatildeo

Logo haacute o contraditoacuterio no procedimento executivo porem eacute eventual quanto agrave defesa

do executado

Ademais o princiacutepio da menor onerosidade eacute consagrado pelo art 805 do CPC e

dispotildee que ldquoQuando por vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz

mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o executadordquo O referido princiacutepio tem o

escopo de impedir o abuso do direito pelo exequente

O principio da menor onerosidade auxilia o juiz na escolha de um meio executivo

adequado e necessaacuterio que satisfaccedila a prestaccedilatildeo exigida pelo credor Nesse sentido eacute o

entendimento do professor Fredie Didier et al 28

O resultado a ser alcanccedilado eacute aquele estabelecido pelo direito material A maneira de se chegar ateacute esse resultado eacute que deve ser a menos onerosa possiacutevel para o executado Isso significa que a opccedilatildeo pelo meio menos gravoso pressupotildee que os diversos meios considerados sejam igualmente eficazes Assim havendo vaacuterios meios executivos aptos agrave tutela adequada e efetiva do direito de creacutedito escolhe-se a via menos onerosa ao executado

O princiacutepio visa impedir a execuccedilatildeo desnecessariamente onerosa ao executado ou seja a execuccedilatildeo abusiva Em vez de enumerar situaccedilotildees em que a opccedilatildeo mais gravosa revelar-se-ia injusta o legislador valeu-se corretamente de uma claacuteusula geral para reputar abusivo qualquer comportamento do credor que pretender valer-se de meio executivo mais oneroso do que outro igualmente idocircneo agrave satisfaccedilatildeo do seu creacutedito

26 Ibid p 76 27 Ibid p 78 28 Ibid p 79-80

15 O princiacutepio da cooperaccedilatildeo tem como base os princiacutepios do devido processo legal da

boa-feacute processual e do contraditoacuterio O dito princiacutepio avigora a eacutetica processual com o

aprimoramento do diaacutelogo entre as partes reciprocamente e com o oacutergatildeo jurisdicional Eacute o

que preconiza o art 6ordm do CPC Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para

que se obtenha em tempo razoaacutevel decisatildeo de meacuterito justa e efetiva

No procedimento executivo o princiacutepio da cooperaccedilatildeo incide de diversas formas

disciplina Didier et al29 que na execuccedilatildeo

O executado tem o dever de indicar bens agrave penhora (art 774 V CPC) Natildeo encontrados bens penhoraacuteveis e natildeo havendo indicaccedilatildeo de qualquer um deles pelo exequente cabe ao executado declarar quais satildeo seus bens penhoraacuteveis sob pena de se sujeitar a uma sanccedilatildeo pecuniaacuteria compulsoacuteria

Tambeacutem eacute manifestaccedilatildeo do princiacutepio da cooperaccedilatildeo a exigecircncia de que o executado que pretende impugnar o valor da execuccedilatildeo apresente de logo o valor que reputa devido (art 525 sect 4ordm CPC) Seria comportamento natildeo-cooperativo afirmar que a cobranccedila eacute excessiva sem simultaneamente dizer qual eacute o valor correto

Demais disso aplicam-se agrave execuccedilatildeo os deveres que decorrem do princiacutepio da cooperaccedilatildeo e que satildeo imputados ao oacutergatildeo jurisdicional () Assim por exemplo deve o juiz advertir ao executado antes de puni-lo de que seu ato pode vir a caracterizar-se como atentatoacuterio agrave dignidade da jurisdiccedilatildeo ( art 772 II CPC) perceba que se trata de uma conduta compatiacutevel com o dever de prevenccedilatildeo O oacutergatildeo jurisdicional somente pode conhecer da prescriccedilatildeo ex officio dando a oportunidade de o exequente manifestar-se conforme impotildee o dever de consulta ( cf arts 10 487 paraacutegrafo uacutenico e 921 sect 5ordm CPC)

O princiacutepio ou postulado30 da proporcionalidade tem aplicaccedilatildeo muito relevante na

execuccedilatildeo O art 8 do CPC assegura que o oacutergatildeo jurisdicional tem o dever de observar a

proporcionalidade e a razoabilidade ao aplicar o ordenamento juriacutedico inclusive no

procedimento executivo

Ademais o art 805 do CPC eacute categoacuterico ao disciplinar que ldquoArt 805 Quando por

vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo

menos gravoso para o executadordquo O referido artigo jaacute se trata de uma concretizaccedilatildeo da

proporcionalidade

29 Ibid p 82 30 Segundo Fredie Didier et al haacute uma discussatildeo doutrinaacuteria sobre a proporcionalidade Parte da

doutrina acredita que a proporcionalidade eacute um princiacutepio e outra parte acredita que eacute um postulado normativo

16 O principio da adequaccedilatildeo pode ser vislumbrado em dois momentos do Direito

Processual ldquoa) no legislativo como orientador da confecccedilatildeo das leis b) no jurisdicional

autorizando ao juiz diante do caso concreto adaptar procedimento agraves suas peculiaridadesrdquo 31

Para Luceacutelia de Sena Alves e Tiago Retes32

Isso quer dizer que no momento legislativo o devido processo deve ser observado pelo legislador para a confecccedilatildeo das normas de direito processual que iratildeo servir de instrumento efetivo de concretizaccedilatildeo do direito substancial a ser tutelado atendendo a todas as suas finalidades sob pena de falecircncia do proacuteprio direito No momento jurisdicional da mesma forma a via processual escolhida pelo autor tambeacutem deve estar sujeita a este princiacutepio para que natildeo sofra as mesmas consequecircncias da sua inobservacircncia

O ordenamento juriacutedico deve ser aplicado por meio da teacutecnica processual adequada

evitando dessa forma uma tutela ineficaz

Por fim o princiacutepio do autorregramento da vontade na execuccedilatildeo tem o objetivo de

ldquo() preservar um espaccedilo processual para o exerciacutecio da liberdade e da vontade em que

sejam permitidas negociaccedilotildees que envolvam as partes ndash e tambeacutem o juizrdquo33 Didier et al34

assevera que

A rigor o legislador estabelece um regime juriacutedico de autorregramento da vontade processual identificando-se algumas manifestaccedilotildees relevantes para a execuccedilatildeo Na verdade pode-se dizer que poucos satildeo os ambientes mais propiacutecios do que a execuccedilatildeo para a negociaccedilatildeo sobre o processo Todos os institutos e normas processuais relativos agrave execuccedilatildeo devem ser repensados a partir da premissa de que o CPC permite uma ampla margem de liberdade de negociaccedilatildeo sobre o processo (art 190 CPC)

O autorregramento da vontade pode ser vislumbrando na previsatildeo de negoacutecios tiacutepicos

em sede de execuccedilatildeo como por exemplo no acordo das partes sobre o valor do bem que

dispensa a avaliaccedilatildeo disposto no inciso I do art 871 CPC Ademais dentro dos limites do art

190 do CPC eacute possiacutevel na execuccedilatildeo a atribuiccedilatildeo da negociaccedilatildeo atiacutepica aos sujeitos 31 ALVES Luceacutelia de Sena Alves RETES Tiago O poder geral de efetivaccedilatildeo das decisotildees judiciais e

proporcionalidade uma anaacutelise criacutetica acerca do art 139 IV do Novo Coacutedigo de Processo Civil Disponiacutevel em lthttpswwwacademiaedu31752652O_poder_geral_de_efetivaC3A7C3A3o_das_decisC3B5es_judiciais_e_a_proporcionalidade_uma_anC3A1lise_crC3ADtica_acerca_do_art_139_IV_do_Novo_CC3B3digo_de_Processo_Civil gt Acesso em 25 de julho de 2018

32 Ibid natildeo paginado 33 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 85 34 Ibid p 85

17

processuais permitindo que sejam feitas mudanccedilas nos procedimentos e nas situaccedilotildees

juriacutedicas processuais ldquoSatildeo exemplos de negoacutecios processuais atiacutepicos na execuccedilatildeo pacto de

penhorabilidade acordo de ampliaccedilatildeo de prazos das partes de qualquer natureza acordo de

rateio de despesas processuais ()rdquo35

24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO

Sempre houve diversos questionamentos quanto agrave eficaacutecia do Direito processual Civil

e se o mesmo era meio apto a assegurar a tutela jurisdicional dos direitos dos cidadatildeos O

processo de execuccedilatildeo eacute o setor que sofre mais criacuteticas quanto a sua ineficiecircncia afinal a

execuccedilatildeo civil sempre foi o ldquocalcanhar de Aquilesrdquo do sistema processual pela praxe do

ldquoganhou (no processo de conhecimento) mas natildeo levou (na fase de cumprimento ou

execuccedilatildeo)rdquo 36

Essa dificuldade de se efetivar a tutela satisfastiva natildeo se resume a um problema de

mera teacutecnica processual tiacutepico de determinado ordenamento mas representa uma prova de

fogo da capacidade dos instrumentos jurisdicionais O autor Leonardo Greco37 no ano de

2005 atribuiu esse fato as seguintes causas o excesso de processos o custo e a morosidade da

justiccedila a inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios a ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais

um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico e a progressiva volatizaccedilatildeo dos bens

Quanto ao excesso de processos o referido autor aduz que ldquonos grandes centros o

crescimento da maacutequina judiciaacuteria natildeo acompanhou a expansatildeo do nuacutemero de litiacutegiosrdquo 38

O custo e morosidade da justiccedila prejudicam a tutela satisfativa posto que

ldquojaacute desfalcado pelo inadimplemento do devedor o credor ainda tem de arcar com o adiantamento das despesas do processo de execuccedilatildeo e de eventual liquidaccedilatildeo vendo arrastar-se a marcha dos atos executoacuterios facilmente retardada por atos procrastinatoacuterios do devedorrdquo 39

35 Ibid p 86 36 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca

para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018

37 GRECCO Leonardo A Crise do Processo de Execuccedilatildeo in Estudos de direito processual Leonardo Greco ndash Campos dos Goytacazes Ed Faculdade de Direito de Campos 2005 p 7

38 Ibid p 7 39 Ibid p 7-8

18 A inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios contribui para a crise do processo de

execuccedilatildeo tendo em vista que

ldquoo juiz da execuccedilatildeo prisioneiro de ritos que o distanciam das partes e da realidade da vida impulsiona sem qualquer apetite a execuccedilatildeo conduzindo-a ao sabor dos ventos das provocaccedilotildees impacientes do credor e das costumeiras procrastinaccedilotildees do devedorrdquo 40

Jaacute ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais atrapalha a efetivaccedilatildeo da tutela satisfativa ldquoo

devedor natildeo colabora com a execuccedilatildeo e os meios de pressatildeo que a lei estabelece natildeo satildeo

suficientes para intimidaacute-lordquo 41

Com um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico

O espiacuterito empresarial e a sociedade de consumo estimulam o endividamento das pessoas e o inadimplemento das obrigaccedilotildees pelo devedor deixou de ser vexatoacuterio e reprovaacutevel o que multiplica as accedilotildees de cobranccedila e execuccedilotildees atraveacutes das quais o sujeito passivo ainda usufrui vantagens agraves custas do credor 42

Por fim Leonardo Greco elenca a volatizaccedilatildeo dos bens como o uacuteltimo fator que

macula o processo executo tendo em vista que

ldquomudou inteiramente o perfil patrimonial das pessoas antes concentrado em bens de raiz e agora tendencialmente dirigido a investimentos em tiacutetulos e valores facilmente negociaacuteveis o que dificulta a sua localizaccedilatildeo pelo credorrdquo 43

O Coacutedigo de Processo Civil de 1973 introduziu o sistema executivo ao ordenamento

juriacutedico paacutetrio e seguindo os valores liberais da eacutepoca com a proteccedilatildeo de esfera juriacutedica de

liberdade do cidadatildeo contra a possibilidade de arbiacutetrio do Estado e uso indevido do Poder

jurisdicional outorgou o miacutenimo de poder ao juiz Seguindo as regras do CPC de 73 o

devedor soacute poderia ter sua esfera juriacutedica invadida atraveacutes de meios de execuccedilatildeo instituiacutedos

previamente em lei

Diante de tantos obstaacuteculos para se efetivar a tutela satisfativa a execuccedilatildeo estava

fadada ao fracasso o que frustrava a expectativa do jurisdicionado a uma prestaccedilatildeo da tutela

jurisdicional ceacutelere e efetiva Insatisfeitos com o cenaacuterio que se encontrava a atividade

40 Ibid p 8 41 Ibid p8 42 Ibid p 8 43 Ibid p8

19

executiva legisladores e operadores do direito natildeo mediram esforccedilos para promover uma

evoluccedilatildeo significativa buscando mais eficiecircncia e celeridade ao procedimento executoacuterio

Dessa forma no final de 1994 foi introduzido no coacutedigo de processo agrave flexibilizaccedilatildeo

dos poderes executoacuterios do juiz ldquopara que ele pudesse prestar uma tutela efetiva aos direitos

ficando autorizado a determinar a modalidade de execuccedilatildeo adequada a cada hipoacutetese nas

obrigaccedilotildees de fazer e natildeo fazer (art 461 sect5ordm do CPC de 1973)rdquo No ano de 2002 a referida

medida foi estendida para as obrigaccedilotildees de entregar coisa (art 461-A caput e sect3ordm do CPC de

1973)

Com fundamento nos artigos 461 e 461-A em 2005 a Lei nordm 11 23205 unificou o

processo de conhecimento e o processo de execuccedilatildeo de sentenccedila Nesse sentido Maacuterio

Henrique Cavalcanti Gil Rodrigues44 aduz que

A Lei 112322005 reuniu de forma definitiva os processos de conhecimento e de execuccedilatildeo em um uacutenico processo composto por um sistema bifaacutesico Assim passa a existir uma fase inicial (de reconhecimento) e uma fase posterior (de cumprimento de sentenccedila de efetivaccedilatildeo da decisatildeo definitiva) sem contar com a eventual fase intermediaacuteria de liquidaccedilatildeo (RODRIGUES 2010 p 38)

Ademais as alteraccedilotildees realizadas no CPC de 73 inseriu a atipicidade dos meios

executivos nas obrigaccedilotildees de fazer natildeo fazer e dar coisa certa entretanto exercendo papel

subsidiaacuterio aos meios tiacutepicos

Quanto agraves obrigaccedilotildees de pagar quantia havia apenas a possibilidade de se valer da

incidecircncia de multa do art 475-J do CPC de 73 ndash implementada mediante reforma perpetrada

pela Lei nordm 11232 de 2005 em atendimento a doutrina processualista preocupada com a

efetividade das decisotildees ndash e de atos executivos como a penhora de bens e dinheiro

Ainda que a execuccedilatildeo tenha avanccedilado com a inserccedilatildeo das leis posteriores a 1994 no

CPC de 1973 a mesma continuava insuficiente tendo em vista que a burocracia e lentidatildeo

dos atos executivos davam brechas para que o devedor escondesse seu patrimocircnio penhoraacutevel

tornando carente de efetividade e celeridade agrave execuccedilatildeo

44 RODRIGUES Maacuterio Henrique Cavalcanti Gil A evoluccedilatildeo da execuccedilatildeo de sentenccedila no direito

processual civil e o novo regime juriacutedico das sentenccedilas apoacutes a reforma implementada pela Lei 112322005 Revista do Tribunal Regional Federal da 1ordf Regiatildeo v 22 n 2 fev 2010 p 38

20

25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO

A tutela juridiscional eacute um direito fundamental previsto no art 5ordm inciso XXXV da

Carta Magna ldquo() a lei natildeo excluiraacute da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio lesatildeo ou ameaccedila a

direitordquo

Na visatildeo claacutessica o direito de accedilatildeo era efetivado com a prolaccedilatildeo de uma sentenccedila de

meacuterito posiccedilatildeo adotada por grande parte dos processualistas seguidores da doutrina de

Liebman Todavia esse conceito se mostra defasado tendo em vista que o direito de acesso agrave

justiccedila natildeo eacute apenas uma garantia formal de bater as portas do judiciaacuterio mas a garantia de

acesso agrave ordem juriacutedica justa adequada e eficaz45

Acreditar que uma sentenccedila de meacuterito favoraacutevel eacute tutela jurisdicional suficiente para

satisfazer o que se busca com o ajuizamento da accedilatildeo eacute uma visatildeo distorcida da atividade

satisfativa ldquoSob o ponto de vista do direito material a condenaccedilatildeo por si soacute eacute incapaz de

prestar a tutela do direitordquo46

Nessa oacutetica o direito fundamental agrave tutela executiva exige um sistema de tutela

jurisdicional ldquocapaz de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor

de tutela executivardquo47 Dessa forma entende-se que

ldquo() a) a interpretaccedilatildeo das normas que regulamentam a tutela executiva tem de ser feita no sentido de extrair a maior efetividade possiacutevel b) o juiz tem o poder-dever de deixar de aplicar uma norma que imponha uma restriccedilatildeo a um meio executivo sempre que essa restriccedilatildeo natildeo se justificar como forma de proteccedilatildeo a outro direito fundamental c) o juiz tem o poder-dever de adotar os meios executivos que se revelem necessaacuterios agrave prestaccedilatildeo integral de tutela executivardquo48

Egrave imperioso compreender que o direito fundamental agrave tutela executiva ratificado

pelo CPC eacute essencial para dirimir diversos litiacutegios oriundos do procedimento executivo

45 FERREIRA Gabriela Macedo Poder geral de efetivaccedilatildeo em defesa da constitucionalidade da

teacutecnica de execuccedilatildeo dos direitos do art 139 IV do Coacutedigo de Processo Civil Revista Jus Navigandi ISSN 1518-4862 Teresina ano 22 n 5178 4 set 2017 Disponiacutevel em lthttpsjuscombrartigos60190gt Acesso em 11 set 2018

46 Ibid natildeo paginado 47 DIDIER JR Fredie et al apud GUERRA Marcelo lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do credor

na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 48 Ibid p 102-104

21

ldquoprincipalmente aqueles relacionados agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo49

Fredie Didier et al50 cita como exemplo as hipoacuteteses de impenhorabilidade

A impenhorabilidade de certos bens eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa

Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais

Por esta razatildeo o legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do

CPC fazendo um preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses das partes envolvidas

optando pela mitigaccedilatildeo do direito do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado

Quando o oacutergatildeo jurisdicional verificar que a aplicaccedilatildeo das regras de

impenhorabilidade eacute desproporcional para o caso concreto deve afastaacute-la e construir a

soluccedilatildeo adequada para o referido caso Didier et al51 traz um exemplo esclarecedor em sua

obra

O bem imoacutevel que serve de moradia da famiacutelia eacute relativamente impenhoraacutevel Objetiva-se com essa restriccedilatildeo proteger o direito fundamental agrave moradia conteuacutedo do direito agrave proteccedilatildeo da dignidade Imagine-se um imoacutevel de altiacutessimo valor Imagine-se agora um creacutedito que corresponda a 40 do valor do imoacutevel A venda judicial do imoacutevel no caso permitiria natildeo soacute satisfazer o direito do credor como ainda garantir ao executado com a sobra a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel que lhe preserve a dignidade A opccedilatildeo pela interpretaccedilatildeo literal da regra que veda a penhora protegeria exclusivamente o direito do executado de maneira desnecessaacuteria porque a relaccedilatildeo valor executadovalor do bem permitiria a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel apoacutes a entrega do dinheiro ao credor Seria pois interpretaccedilatildeo em desconformidade com os preceitos da contemporacircnea hermenecircutica constitucional que preconiza a necessidade de nos casos de choque entre direitos fundamentais dar a interpretaccedilatildeo que mais adequadamente proteja a ambos

A execuccedilatildeo civil integra o direito fundamental agrave tutela jurisdicional disciplinando

que ldquoos dispositivos devem ser interpretados de modo que se garanta a maior efetividade

49 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66 50 Ibid p 66 51 Ibid p 67

22

possiacutevel agrave execuccedilatildeo desde que respeitados outros direitos fundamentaisrdquo52 Podendo ser

afastada desde que proporcional qualquer obstaacuteculo irrazoaacutevel agrave efetivaccedilatildeo desse direito

52 FERREIRA Gabriela Macedo apud MACEDO Lucas Buril de As eficaacutecias das decisotildees judiciais e

o cumprimento de sentenccedila no CPC15 Novo CPC Doutrina selecionada v 5 Execuccedilatildeo Coordenador geral Fredie Didier Jr organizadores Lucas Buril de Macedo Ravi Peixoto Alexandre Freire ndash Salvador Jus Podivm 2015 p 360361

23

3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO

EXECUTADO

31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS

Como forma de controlar a atividade jurisdicional por muito tempo vigorou o

entendimento de que a execuccedilatildeo somente poderia ser realizada atraveacutes dos meios executivos

tipicamente previstos na legislaccedilatildeo Segundo Luiz Guilherme Marinoni53

O princiacutepio da tipicidade deseja significar que os meios de execuccedilatildeo devem estar previstos na lei e assim que a execuccedilatildeo natildeo pode ocorrer atraveacutes de formas executivas natildeo tipificadas O seu objetivo eacute de um lado impedir que meio executivo natildeo previsto em lei possa ser utilizado e de outro garantir o jurisdicionado contra a possibilidade de arbiacutetrio judicial na fixaccedilatildeo da modalidade executiva Se o jurisdicionado sabe em razatildeo de previsatildeo legal que a sua esfera juriacutedica somente poderaacute ser invadida atraveacutes de determinadas modalidades executivas confere-se a ele a possibilidade de antever a reaccedilatildeo ao seu inadimplemento bem como a garantia de que a jurisdiccedilatildeo natildeo determinaraacute ou permitiraacute a utilizaccedilatildeo de meio executivo diverso daqueles previstos

Dessa forma o princiacutepio da tipicidade disciplina que o oacutergatildeo julgador ao proceder agrave

execuccedilatildeo estaacute limitado aos meios executivos previamente definidos em lei natildeo podendo se

valer de qualquer teacutecnica de efetivaccedilatildeo que natildeo se encaixasse nas hipoacuteteses taxativas da

legislaccedilatildeo

Entretanto o legislador natildeo tem como prever todas as peculiaridades dos direitos

dignos de tutela executiva e preordenar teacutecnicas executivas diversas para cada peculiaridade

Sob esse cenaacuterio o principio da tipicidade foi cedendo lugar ao principio da atipicidade dos

meios executivos

A ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do oacutergatildeo julgador estaacute cada vez mais presente

no ordenamento juriacutedico paacutetrio motivando um poder geral de efetivaccedilatildeo ldquoque permite ao

julgador valer-se dos meios executivos que considerar mais adequado ao caso concreto sejam

eles de coerccedilatildeo direta sejam de coerccedilatildeo indiretardquo 54

53 MARINONI Luiz Guilherme Teacutecnica processual e tutela dos direitos Satildeo Paulo Editora Revista

dos Tribunais 2004 p 212 nota 79 54 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 100

24

Essa tendecircncia de ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do juiz natildeo eacute exclusividade do

ordenamento juriacutedico brasileiro segundo Fredie Didier et al55

Michelle Taruffo jaacute apontava que o direito americano diante da inefetividade dos meios executivos at law comeccedilou a autorizar o magistrado a tomar medidas executivas adequadas ao caso concreto Trata-se afirma o jurista italiano de aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo segundo o qual as regras processuais devem ser adaptadas agraves necessidades do direito material

Os meios executivos atiacutepicos derivam de trecircs enunciados normativos do Coacutedigo de

Processo Civil o art 139 IV o art 297 e o sect1ordm do art 536

O art 139 IV do CPC dispotildee que pertence ao juiz o poder-dever de ldquodeterminar

todas as medidas indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para

assegurar o cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto

prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo

Jaacute o art 297 do CPC cuida da tutela provisoacuteria e garante que ldquoo juiz poderaacute

determinar as medidas que considerar adequadas para a efetivaccedilatildeo da tutela provisoacuteriardquo

Podendo dessa forma a dita tutela ser efetivada atipicamente

Por fim o art 536 sect1ordm do CPC dispotildee que

Para atender ao disposto no caput o juiz poderaacute determinar entre outras medidas a imposiccedilatildeo de multa a busca e apreensatildeo a remoccedilatildeo de pessoas e coisas o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva podendo caso necessaacuterio requisitar o auxilio de forccedila policial

As supracitadas medidas executivas atiacutepicas satildeo entendidas pela doutrina como

claacuteusulas gerais processuais executivas56 Essas claacuteusulas gerais natildeo restringem a sua

aplicaccedilatildeo agraves teacutecnicas de coerccedilatildeo indireta satildeo autorizados tambeacutem o uso de meios de execuccedilatildeo

dieta e indireta

Ademais cumpre salientar que o art 139 IV CPC aplica-se a toda e qualquer

atividade executiva ldquoa) seja fundada em tiacutetulo executivo judicial (provisoacuteria ou definitiva)

55 DIDIER JR Fredie et al apud TARUFFO Michelle A atuaccedilatildeo executiva dos direitos perfis

comparatiacutesticos Revista de Processo Satildeo Paulo RT 1990 n 59 p 78 56 Segundo Fredie Didier et al claacuteusula geral eacute uma espeacutecie de texto normativo cujo antecedente

(hipoacutetese faacutetica) eacute composto por termos vagos e consequente (efeito juriacutedico) eacute indeterminado

25

seja fundada em tiacutetulo executivo extrajudicial b) seja para efetivar prestaccedilatildeo pecuniaacuteria seja

para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer ou dar coisa distinta de dinheirordquo57

Jaacute o art 297 do CPC garante que a tutela provisoacuteria possa ser efetivada tambeacutem

atipicamente ldquoSucede que a atipicidade da tutela provisoacuteria segue necessariamente a

atipicidade da tutela definitivardquo 58

Por fim o comando do sect 1 ordmdo art 536 se aplica

a) inicialmente agrave execuccedilatildeo de fazer e de natildeo fazer fundada em decisatildeo judicial (provisoacuteria ou definitiva) b) por forccedila do sect 3ordm do art 538 tambeacutem se aplica ao cumprimento de sentenccedila para entrega de coisa c) por forccedila do art 771 paraacutegrafo uacutenico o dispositivo tambeacutem se aplica agrave execuccedilatildeo para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer e entregar coisa distinta de dinheiro fundada em tiacutetulo extrajudicial

Claramente o art 139 IV eacute mais amplo do que o sect 1 ordm do art 536 estende-se por

disposiccedilatildeo expressa agrave execuccedilatildeo de pagar quantia Sendo uma grande novidade nas obrigaccedilotildees

que tem por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15

O art 139 IV do CPC apresentou uma novidade agrave atipicidade dos meios executivos

ao disciplinar que cabe ao juiz ldquodeterminar todas as medidas indutivas coercitivas

mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o cumprimento de ordem judicial

inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo

A inovaccedilatildeo estaacute na possibilidade de utilizar os meios atiacutepicos para assegurar o

cumprimento de decisotildees que versam sobre as obrigaccedilotildees pecuniaacuterias sendo admitida a

utilizaccedilatildeo de outros meios ateacute na execuccedilatildeo de titulo judicial de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria aleacutem da

multa de 10 (a que se refere o artigo 523 sect 1ordm do CPC) para forccedilar o devedor a cumprir a

obrigaccedilatildeo pecuniaacuteria

57 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 105 58 Ibid p 105

26

Dessa forma eacute possiacutevel afirmar que ldquoao lado da disciplina tiacutepica do art 523 e

seguintes () o novo CPC inova ao permitir que o sistema de teacutecnicas executivas atiacutepicas

sejam empregadas na execuccedilatildeo monetaacuteriardquo59 (ZARONI VITORELLI 2016 p 66)

Fernando da Fonseca Gajardoni60 denomina a dita medida como a ldquorevoluccedilatildeo

silenciosardquo da execuccedilatildeo por quantia certa posto que

() pelo fato de que a regra natildeo estar propriamente incrustrada nos capiacutetulo e livro atinentes ao cumprimento de sentenccedila e ao processo de execuccedilatildeo ndash o art 139 IV do Novo CPC parece trazer ao paiacutes algo bastante novo cuja aplicaccedilatildeo a depender do comportamento do Judiciaacuterio pode implicar em verdadeira revoluccedilatildeo (positiva ou negativa) na sistemaacutetica executiva ateacute entatildeo vigente

Claramente o dispositivo foi recebido com entusiasmo por parte da doutrina que

anteciparam em afirmar que o princiacutepio da atipicidade dos meios executivos no CPC2015

ldquo() assume a feiccedilatildeo de poder-dever geral conferido ao magistrado de determinar () todas

as medidas coercitivas sub-rogatoacuterias mandamentais e indutivas que entender necessaacuterias

para a tutela justa efetiva e em tempo razoaacutevelrdquo 61

Dessa forma lecionam Luiz Guilherme Marinoni Seacutergio Cruz Arenhart e Daniel

Mitidiero62 que

O juiz a partir do art 139 IV do CPC2015 natildeo estaacute mais adstrito apenas agrave sentenccedila condenatoacuteria ndash que fixa a obrigaccedilatildeo de pagar e daacute ensejo agrave abertura da execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo patrimonial ndash para a tutela de prestaccedilotildees pecuniaacuterias Pode impor essa prestaccedilatildeo por meio de ordem judicial acoplada ao aceno de emprego de medida de induccedilatildeo (coercitiva ou de pressatildeo positiva) ou de medida de sub-rogaccedilatildeo (MARINONI ARENHARDT MITIDIERO 2015 p 703)

Deste modo em razatildeo do art 139 IV do CPC tem-se entendido que o juiz nas

execuccedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria possui a faculdade de adotar qualquer

59 ZARONI Bruno Marzullo VITORELLI Edilson Reforma e efetividade da execuccedilatildeo no novo CPC

In PEIXOTO Ravi FREIRE Alexandre MENDES Aluiacutesio Gonccedilalves de Castro Execuccedilatildeo 2 ed rev e atual Salvador JusPodivm 2016 766 p (Coleccedilatildeo novo CPC doutrina selecionada v 5) p 66

60 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia 24082015 JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Acesso em 23082018

61 LIMA Rafael de Oliveira A atipicidade dos meios executivos no coacutedigo de processo civil brasileiro de 2015 Revista de Processo Jurisdiccedilatildeo e Efetividade da Justiccedila v 2 n 2 juldez 2016 p 11

62 MARINONI Luiz Guilherme ARENHART Seacutergio Cruz MITIDIERO Daniel Novo curso de processo civil tutela dos direitos mediante procedimento comum Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 v 2 p 703

27

medida indutiva coercitiva mandamentais ou sub-rogatoacuterias para efetivar o creacutedito do

exequente natildeo se limitando as medidas tiacutepicas

Alguns doutrinadores se precipitaram ao afirmar que o dito dispositivo ldquo() autoriza o

juiz a utilizar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir ressalvando-se a prisatildeo

civil constitucionalmente limitada ao devedor de alimentosrdquo 63 Acreditam Jorge Bheron

Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa que o entusiasmo por parte da

doutrina abre margem para as mais variadas formas de compelir o devedor a cumprir com a

prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

ldquoE aiacute persistindo no mau vezo de fazer explicaccedilotildees em abstrato ignorando que o sentindo soacute se daacute na aplicaccedilatildeo (situaccedilatildeo concreta real ou fictiacutecia) as sugestatildeo satildeo as mais engenhosas suspensatildeo de CNH retenccedilatildeo de passaporte restriccedilatildeo de fim de semana cancelamento de cartotildees de creacutedito ndash para ficar apenas nestasrdquo 64

Ou seja podendo o juiz natildeo apenas substituir o devedor tomando seu patrimocircnio para

entregar ao credor na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia como tambeacutem poderaacute

pressionaacute-lo psicologicamente a adimplir por conta proacutepria a obrigaccedilatildeo

Ademais o Enunciado nordm 48 do ENFAM avalia expressamente a possibilidade de

imposiccedilatildeo de medidas coercitivas para a efetivaccedilatildeo da execuccedilatildeo pecuniaacuteria Conforme o dito

enunciado

ldquoO art 139 inciso IV traduz um poder geral de efetivaccedilatildeo permitindo a aplicaccedilatildeo de medidas atiacutepicas para garantir o cumprimento de qualquer ordem judicial inclusive no acircmbito do cumprimento de sentenccedila e no processo de execuccedilatildeo baseado em tiacutetulosrdquo

Dessa forma o artigo 139 IV do CPC permite uma gama ampla de interpretaccedilotildees por

parte da doutrina por ser uma claacuteusula geral encontrando limite apenas na imaginaccedilatildeo de

quem o analisa Nesse sentido eacute forccediloso orientar e delimitar o manejo desse artigo legal para

que se extraia seu sentido e alcance revelando assim sobre que situaccedilotildees ele incide de que

modo e o que permite

63 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

64 Ibid sem paginaccedilatildeo

28

32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER

GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO

O artigo 139 IV com a vigecircncia do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 abriu margem

para uma constelaccedilatildeo de decisotildees nas quais o dito dispositivo recebeu diversas interpretaccedilotildees

pelos operadores do direito

Sem duacutevidas por ser uma das pioneiras a decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara

Ciacutevel do Foro Regional de Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-

1320138260011 na data de 25 de agosto de 2016 gerou um enorme rebuliccedilo

Nessa accedilatildeo que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto

uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a

suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o

passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito

Segundo a magistrada o processo tramitava haacute anos sem que nenhum valor tenha sido

pago ao exequente aleacutem do devedor natildeo ter oferecido proposta de acordo e nem ter indicado

bens agrave penhora configurando uma completa desiacutedia com o processo

ldquoO caso tratado nos autos se insere dentre as hipoacuteteses em que eacute cabiacutevel a aplicaccedilatildeo do art 139 inciso IV do Coacutedigo de Processo Civil Isso porque o processo tramita desde 2013 sem que qualquer valor tenha sido pago ao exequente Todas as medidas executivas cabiacuteveis foram tomadas sendo que o executado natildeo paga a diacutevida natildeo indica bens agrave penhora natildeo faz proposta de acordo e sequer cumpre de forma adequada as ordens judiciais frustrando a execuccedilatildeo

Se o executado natildeo tem como solver a presente diacutevida tambeacutem natildeo recursos para viagens internacionais ou para manter um veiacuteculo ou mesmo manter um cartatildeo de creacutedito Se poreacutem mantiver tais atividades poderaacute quitar a diacutevida razatildeo pela qual a medida coercitiva poderaacute se mostrar efetiva

Assim como medida coercitiva objetivando a efetivaccedilatildeo da presente execuccedilatildeo defiro o pedido formulado pelo exequente e suspendo a Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo do executado M A S determinando ainda a apreensatildeo de seu passaporte ateacute o pagamento da presente diacutevida

()

Determino ainda o cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado ateacute o pagamento da presente diacutevida ()rdquo

Foi impetrado Habeas Corpus no Tribunal de Justiccedila do Estado de Satildeo Paulo a favor

do executado sob o fundamento que a coaccedilatildeo era ilegal e afetava o direito de locomoccedilatildeo

29

garantido constitucionalmente Tendo sido concedida a liminar em decisatildeo que ora se

reproduz

Em que pese a nova sistemaacutetica trazida pelo art 139 IV do CPC2015 deve-se considerar que a base estrutural do ordenamento juriacutedico eacute a Constituiccedilatildeo Federal que em seu art 5ordm XV consagra o direito de ir e vir Ademais o art 8ordm do CPC2015 tambeacutem preceitua que ao aplicar o ordenamento juriacutedico o juiz natildeo atentaraacute apenas para a eficiecircncia do processo mas tambeacutem aos fins sociais e agraves exigecircncias do bem comum devendo ainda resguardar e promover a dignidade da pessoa humana observando a proporcionalidade a razoabilidade e a legalidade Por tais motivos concedo a liminar pleiteada65

Cabe destacar aqui o voto vencido da Desembargadora Maria Luacutecia Pizzotti no

julgamento do Habeas Corpus supracitado demonstrando que o debate sobre a abrangecircncia

do artigo 139 IV do CPC ocorre tanto na doutrina quanto no judiciaacuterio

O objetivo do novel dispositivo natildeo eacute impor penas ou restringir direitos natildeo sendo intenccedilatildeo do Judiciaacuterio suspender indefinidamente o direito de dirigir do executado ou sua liberdade de viajar mas sim impor uma restriccedilatildeo tatildeo gravosa caso ele natildeo cumpra a determinaccedilatildeo que escolha cumprir sua obrigaccedilatildeo e dar fim ao problema Em outras palavras mediante as medidas de coerccedilatildeo o Estado procura persuadir o inadimplente impondo-lhe situaccedilotildees tatildeo onerosas e inconvenientes que em algum momento seja para ele mais vantajoso cumprir do que permanecer no inadimplemento

Ao fazecirc-lo o Novo Coacutedigo de Processo Civil rompe com as criacuteticas da ineficiecircncia das execuccedilotildees Natildeo se cogita deferir medidas restritivas agravequeles que demonstram a incapacidade absoluta de solver o deacutebito apenas agravequeles que reconhecidamente se valem de artimanhas e subterfuacutegios para evitar a satisfaccedilatildeo das diacutevidas ldquopreferindordquo outras despesas mais lsquonobresrsquo agindo em nome de terceiros e fazendo escaacuternio dos credores e do proacuteprio Poder Judiciaacuterio (hellip)

Para tanto memoraacutevel a noccedilatildeo de que a medida em comento tem caraacuteter excepcional e encontra limites no plano da proporcionalidade como sustenta o ilustrado Magistrado paulista Fernando da Fonseca Gajardoni Professor Faculdade de Direito de Ribeiratildeo Preto da USP (in httpswwwjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 acesso em 091216 agraves 11h20min) E para anaacutelise da proporcionalidade a ponderaccedilatildeo deve observar os trecircs passos apontados pela doutrina a necessidade a adequaccedilatildeo e a proporcionalidade em sentido estrito

65 TJSP - Habeas Corpus Processo nordm 2183713-8520168260000 30ordf Cacircmara Direito Privado relator

Des Marcos Ramos j 290317

30

Ademais no entendimento de Jorge Amaury Maia Nunes e Guilherme Pupe de

Noacutebrega66 essa decisatildeo releva os perigos trazidos pelo art 139 IV do CPC ao confrontar

direitos constitucionalmente garantidos

De nossa parte entendemos que a liberdade de locomoccedilatildeo inserta no inciso XV do artigo 5ordm que abrange o direito de deixar o territoacuterio nacional sofre embaraccedilo indevido pela apreensatildeo de passaporte ou pela suspensatildeo da carteira nacional de habilitaccedilatildeo

()

Agrave luz da exposiccedilatildeo feita acima e em anaacutelise primeva sustentamos que o artigo 139 IV do CPC de 2015 estaacute a merecer declaraccedilatildeo de inconstitucionalidade sem reduccedilatildeo de texto para o fim de rechaccedilar a apreensatildeo de passaporte a suspensatildeo do direito de dirigir e a vedaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo em concurso ou em licitaccedilatildeo puacuteblicos como medidas passiacuteveis de serem adotadas pelo juiz sob pena de vulneraccedilatildeo aos artigos 1ordm IV 5ordm XV e LIV 37 I 173 sect 3ordm III e 175 todos da Constituiccedilatildeo

Apesar de ter sofrido duras criacuteticas a decisatildeo do processo de nordm 4001386-

1320138260011 serviu de inspiraccedilatildeo para tantas outras decisotildees no mesmo sentido

Foi o caso da decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de Satildeo

Vicente em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 0020724-2620088260590 na data de 21 de

junho de 2017

A supracitada execuccedilatildeo se arrastava por nove (09) anos sem que o devedor tenha

esboccedilado qualquer intenccedilatildeo de pagar a diacutevida O credor requereu a suspensatildeo da Carteira

Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado apreensatildeo do passaporte e cancelamento dos

cartotildees de creacutedito

O magistrado com embasamento no artigo 139 IV do CPC deferiu parcialmente o

pedido sob o fundamento de que a apreensatildeo de passaporte e CNH natildeo viola o direito de ir e

vir do devedor Entretanto o juiz indeferiu o pedido de cancelamento do cartatildeo de creacutedito por

acreditar que a suspensatildeo poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado tendo em

vista que atualmente as pessoas utilizam o referido cartatildeo para pagamento das despesas

diaacuterias

66 NOBREacuteGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139

IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018

31

Eacute evidente que as medidas atiacutepicas de coerccedilatildeo devem ser utilizadas com cautela sempre respeitando a dignidade da pessoa do executado Natildeo se vislumbra contudo que as medidas aqui eleitas sejam capazes de vulnerar os Direitos Fundamentais do indiviacuteduo A uma porque natildeo se trata de restriccedilatildeo ao direito de ir e vir do executado que continua no gozo de plena liberdade de locomoccedilatildeo a duas porque a conduccedilatildeo de veiacuteculo automotor eacute mera comodidade da vida moderna natildeo se tratando de direito absoluto

Com mais razatildeo ainda se admite a suspensatildeo do Passaporte do executado que se natildeo paga a diacutevida da execuccedilatildeo natildeo deve ter o direito de fazer viagem internacional

Tem-se aqui verdadeiro exerciacutecio de ponderaccedilatildeo de interesses juriacutedicos de um lado jaz o direito de creacutedito do exequente que deriva do direito de propriedade e por isso mesmo tem envergadura constitucional de outro giro tem-se o direito do executado agrave autorizaccedilatildeo do Estado para conduzir veiacuteculo automotor e realizar viagens internacionais que natildeo se mostram essenciais agrave dignidade da pessoa humana Natildeo haacute duacutevidas pois de que eacute este uacuteltimo que deve sucumbir

O pedido fica indeferido apenas no tocante agrave suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado Eacute que ao contraacuterio da CNH e do passaporte que trazem consigo certa presunccedilatildeo de riqueza natildeo se pode concluir que o uso de cartatildeo de creacutedito eacute feito por luxo ou simples conveniecircncia

Como eacute cediccedilo os cartotildees de creacutedito oferecem ao seu titular creacutedito raacutepido e rotativo para o pagamento de despesas diaacuterias e certamente exercem funccedilatildeo essencial agravequeles que se encontram em situaccedilatildeo financeira precaacuteria

A suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado portanto se revela medida desproporcional e que inclusive poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado

Pelo exposto defiro em parte o pedido formulado pelo exequente e DETERMINO a suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo e bem como a suspensatildeo da validade (cancelamento temporaacuterio) no sistema SINPA de eventuais passaportes vaacutelidos em nome do executado

Dessa forma o artigo 139 IV do CPC revolucionou completamente a execuccedilatildeo de

obrigaccedilatildeo de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria ao permitir a utilizaccedilatildeo do uso dos meios executivos

atiacutepicos para compelir o executado a satisfazer o creacutedito do exequente

33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE

EFETIVACcedilAtildeO

Era inevitaacutevel que o artigo 139 IV do CPC gerasse todo tipo de reaccedilatildeo entre os

doutrinadores do processo civil e ateacute mesmo de outros ramos do direito devido a sua

capacidade de realizar uma completa inovaccedilatildeo na forma de se executar as obrigaccedilotildees de pagar

quantia Alguns o aplaudiram visualizando nele ldquouma luz no fim do tuacutenelrdquo outros o

criticaram vislumbrando as arbitrariedades que poderiam ser praticadas com embasamento no

referido dispositivo

32

As decisotildees suscitadas em linhas preteacuteritas auxiliaram para fervilhar ainda mais o

debate sobre o tema tendo em vista que por um lado poderia aumentar a efetividade das

execuccedilotildees por quantia no entanto por outro surgiam questionamentos a cerca da sua

constitucionalidade

A doutrina parece que demoraraacute a se pacificar sobre o tema Segundo alguns

doutrinadores seraacute inconstitucional toda restriccedilatildeo que recaia sobre a pessoa do devedor e natildeo

exclusivamente sobre o seu patrimocircnio Jaacute para outros o dispositivo eacute constitucional e o meio

mais eficaz para se resolver o problema da efetivaccedilatildeo das execuccedilotildees de pagar quantia ldquoA

discussatildeo se daacute especialmente no que diz respeito aacutes medidas de suspensatildeo de CNH

apreensatildeo de passaporte e bloqueio de cartotildees de creacutedito do devedorrdquo 67

O professor Thiago Rodovalho analisou detalhadamente a decisatildeo de nordm 4001386-

1320138260011 em seu artigo ldquoO necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na

concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivosrdquo 68 Quanto agrave suspensatildeo da CNH o autor

acredita que tal medida natildeo viola qualquer direito fundamental do devedor posto que ldquodirigir

veiacuteculos automotores eacute direito do cidadatildeo mas natildeo se confunde com os direitos fundamentais

e social de ir-e-vir e ao transporterdquo 69 O professor eacute categoacuterico ao afirmar que

Com relaccedilatildeo agrave suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (suspensatildeo do direito de dirigir restriccedilatildeo de direitos) natildeo nos parece haver qualquer violaccedilatildeo a direito fundamental ou social nem a direito da personalidade ou colocaccedilatildeo do devedor em situaccedilatildeo desproporcionalmente detrimentosa exceccedilatildeo feita aos que usam o veiacuteculo como instrumento de trabalho atraindo a hipoacutetese do NCPC art 833 inc V

()

Outrossim natildeo o consideramos como direito da personalidade Os direitos da personalidade satildeo os valores fundamentais que compotildeem o proacuteprio ser justamente por isso intransmissiacuteveis e irrenunciaacuteveis natildeo podendo o seu exerciacutecio sofrer limitaccedilatildeo voluntaacuteria (CC art 11) Por mais que vivamos num paiacutes que tanto valoriza o carro e que muitas pessoas de fato se compreendam em razatildeo e em funccedilatildeo do carro que dirijam este natildeo nos parece ser um direito que verdadeiramente componha a personalidade do indiviacuteduo70

67 DONTOS Sofia Poderes executoacuterios do juiz que diz a doutrina sobre o art 139 inc IV do CPC

Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigospoderes-executorios-do-juiz-que-diz-a-doutrina-sobre-art-139-inc-iv-do-cpc-23052018 gt Publicado em 23052018 Acesso em 01082018

68 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018

69 Ibid sem paginaccedilatildeo 70 Ibid sem paginaccedilatildeo

33

Quanto ao cancelamento dos cartotildees de credito do devedor o professor Thiago

Rodovalho tambeacutem acredita que natildeo haacute qualquer violaccedilatildeo ao direito fundamental social ou

da personalidade do devedor e acrescenta que

Tanto assim o eacute que ser titular de um cartatildeo de creacutedito pressupotildee ter creacutedito o que eacute analisado e concedido por instituiccedilotildees financeiras mais do que isso se porventura passando por dificuldades financeiras a pessoa deixa de honrar com pagamentos a mesma instituiccedilatildeo financeira concedente do cartatildeo de creacutedito pode sponte propria cancelaacute-lo ou recusar-lhe a concessatildeo Ora parece-me contraditoacuterio que instituiccedilotildees financeiras para sua proteccedilatildeo patrimonial possam ferir esse suposto ldquodireito fundamentalrdquo ou esse suposto ldquodireito da personalidaderdquo mas natildeo possa o Poder Judiciaacuterio igualmente fazecirc-lo contra aquele devedor moroso que instado ao pagamento e frustradas todas as tentativas de constriccedilatildeo patrimonial leva vida luxuosa valendo-se de cartotildees de creacutedito que prescindem de dinheiro em conta eacute dizer podem justamente funcionar como forma de ocultar renda e patrimocircnio71

O autor considera a apreensatildeo de passaporte um tema mais polecircmico e que merece

maior reflexatildeo No entanto crecirc que eacute possiacutevel a apreensatildeo de passaporte sem violar os

direitos fundamentais do devedor por se tratar de um direito de ir e vir de amplitude especial

Agrave primeira vista a possibilidade de apreensatildeo do passaporte tambeacutem nos parece possiacutevel pois tambeacutem se trata de um direito de ir e vir de amplitude especial Assim o eacute pois salvo situaccedilotildees especiais (refugiados p ex) haacute a necessidade de demonstrar condiccedilotildees financeiras de estadia e retorno para ser admitido no paiacutes de destino Ou seja pressupotildee uma condiccedilatildeo financeira que o devedor justamente diz natildeo possuir Sem embargo dessa consideraccedilatildeo esse ainda eacute um ponto que merece uma reflexatildeo mais acurada sendo essa apenas uma primeira impressatildeo72

Outros autores escreveram sobre o tema como eacute o caso do processualista Luiz

Dellore73 que tambeacutem defende que as medidas atiacutepicas como restriccedilatildeo ao direito de dirigir

apreensatildeo de passaporte e cancelamento de cartotildees de creacutedito satildeo permitidas e natildeo violam em

regra os direitos fundamentais do devedor

De minha parte creio que efetivamente haacute inovaccedilatildeo no at 139 IV do NCPC (e natildeo mera repeticcedilatildeo do que jaacute havia no Coacutedigo anterior) que tem o condatildeo de trazer mais efetividade ao processo executivo no Brasil ndash que por deacutecadas centrou sua atenccedilatildeo na defesa do executado (vide a grande quantidade de impenhorabilidades) sem dar maior atenccedilatildeo ao creacutedito do exequente

71 Ibid sem paginaccedilatildeo 72 Ibid sem paginaccedilatildeo 73 DELLORE Luiz NCPC Atipicidade das medidas executivas jaacute eacute realidade Disponiacutevel em lt

httpswwwjotainfoopiniao-e-analisecolunasnovo-cpcncpc-atipicidade-de-medidas-executivas-ja-e-realidade-17042017 gt Publicado em 17042017 Acesso em 03092018

34

Logo a meu ver medidas como (i) restriccedilatildeo ao direito de dirigir (ii) apreensatildeo de passaporte (iii) cancelamento de cartotildees de creacutedito e (iv) vedaccedilatildeo de obtenccedilatildeo de novos empreacutestimos se natildeo vinculados ao pagamento do deacutebito exequendo dentre outras restriccedilotildees que deveratildeo ser observadas a cada caso satildeo permitidas pelo sistema do NCPC e em regra natildeo violam direitos fundamentais do devedor E tecircm o condatildeo de fazer com que o executado que tem recursos diante dessas medidas coercitivas pague o deacutebito trazendo sucesso agrave satisfaccedilatildeo do creacutedito

Nessa linha para Alexandre Fuchs das Neves74 o artigo 139 IV do CPC conferiu ao

juiz poderes coercitivos capazes de ldquotransformar a vida do devedor um infernordquo para compeli-

lo a cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria Entretanto pondera que para que a medida tenha

validade ldquoeacute necessaacuteria uma fundamentaccedilatildeo por evidente uma correlaccedilatildeo temaacutetica entre a

medida adotada e sua efetividade em face ao processo com fundamentaccedilatildeo detalhadardquo

No entendimento de Fernando Gajardoni75 satildeo possiacuteveis as medidas de apreensatildeo de

passaporte bloqueio de cartotildees de creacutedito e suspensatildeo da CNH Para ele o que limita o art

139 IV do CPC eacute o esgotamento dos meios tiacutepicos e a real necessidade da medida

Ilustrativamente natildeo efetuado o pagamento de diacutevida oriunda de multas de tracircnsito e superados os expedientes tradicionais de adimplemento (penhora de dinheiro e bens) seria liacutecito o estabelecimento da medida coercitivaindutiva de suspensatildeo do direito a conduzir veiacuteculo automotor ateacute pagamento do deacutebito (inclusive com apreensatildeo da CNH do devedor) natildeo efetuado pagamento de verbas salariais devidas a funcionaacuterios da empresa possiacutevel o estabelecimento de vedaccedilatildeo agrave contrataccedilatildeo de novos funcionaacuterios ateacute que seja saldada a diacutevida natildeo efetuado o pagamento de financiamento bancaacuterio na forma e no prazo avenccedilados possiacutevel ateacute que se tenha a quitaccedilatildeo que se obstem novos financiamentos ou mesmo a participaccedilatildeo do devedor em licitaccedilotildees (como de ordinaacuterio jaacute acontece com pessoas juriacutedicas em deacutebito tributaacuterio com o Poder Puacuteblico) etc

Teriacuteamos entatildeo no Brasil por assim dizer a adoccedilatildeo do padratildeo da atipicidade das medidas executivas tambeacutem para as obrigaccedilotildees de pagar vistas estas como ordens do EstadoJuiz para que haja prestaccedilatildeo de pagamento em pecuacutenia

()

Por isso ndash a prevalecer a interpretaccedilatildeo potencializada do art 139 IV do CPC2015 ndash o emprego de tais medidas coercitivasindutivas especialmente nas obrigaccedilotildees de pagar encontraraacute limite certo na excepcionalidade da medida (esgotamento dos meios tradicionais de satisfaccedilatildeo do deacutebito) na proporcionalidade (inclusive agrave luz da regra da menor onerosidade ao devedor do art 805 do CPC2015) na necessidade de fundamentaccedilatildeo substancial e especialmente nos direitos e garantias assegurados na Constituiccedilatildeo Federal (vg natildeo parece possiacutevel que se determine o pagamento sob pena de prisatildeo ou de vedaccedilatildeo ao exerciacutecio da profissatildeo do direito de ir e vir etc)

74 NEVES Alexandre Fuchs das Cancelamento de cartotildees de creacutedito e apreensatildeo de CNH e passaporte

do devedor Isso eacute possiacutevel Disponiacutevel em lt httpwwwsinfacspcombrconteudocancelamento-de-cartoes-de-credito-e-apreensao-de-cnh-e-passaporte-do-devedor-isso-e-possivel gt Acesso em 30082018

75 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Publicado em 24082015 Acesso em 30082018

35

Jaacute Fernanda Tartuce76 acredita que tais medidas satildeo problemaacuteticas e devem ser

analisadas com cautela tendo em vista que ao inveacutes de afetarem o patrimocircnio do devedor

atingem a proacutepria pessoa

Sob certo prisma adotar medidas diferenciadas contribui para a efetividade da prestaccedilatildeo jurisdicional Por outro lado o patrimocircnio ndash e natildeo a pessoa do devedor - responde por diacutevidas aleacutem disso o exerciacutecio de amplos poderes pelo juiz sem balizas especiacuteficas pode ensejar medidas inadequadas Nessa linha suspender o direito de dirigir e restringir o uso de passaporte satildeo iniciativas problemaacuteticas por atingirem a pessoa do devedor enquanto a penhora da restituiccedilatildeo de Imposto de Renda soa viaacutevel por afetar seu patrimocircnio Eacute importante que a medida diferenciada se revele proporcional e seja aplicada apoacutes o exaurimento de outros meios previstos no ordenamento Como a proposta do Novo Coacutedigo eacute aumentar a eficiecircncia processual intentar medidas ineficazes inexequiacuteveis eou de difiacutecil fiscalizaccedilatildeo pode acabar ensejando o efeito contraacuterio

Nessa senda Lenio Streck e Dierle Nunes77 entendem que as medidas atiacutepicas de

suspensatildeo da CNH eou apreensatildeo de passaporte satildeo inconstitucionais Afirmam que natildeo se

pode confundir o processo civil e penal ainda que ambos remetam a um ldquoparadigma

constitucional comumrdquo e que o artigo 139 IV do CPC ldquoimpotildee novos desafios interpretativos

que podem conduzir a uma anaacutelise superficial e utilitarista de busca de resultados que

desprezem a necessaacuteria leitura constitucionalrdquo Os autores ainda ponderam que ldquoO perigo eacute o

artigo 139 IV ser transformado em instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com

autorizaccedilatildeo judicialrdquo

O professor Araken de Assis no dia 18 de abril de 2018 em um evento sobre o

Coacutedigo Processual Civil de 2015 que ocorreu em Brasiacutelia na sede do Conselho Federal da

OAB declarou ser contraacuterio aos poderes executoacuterios atiacutepicos ldquoSou contra os poderes

atiacutepicos dos juiacutezes porque seu exerciacutecio redunda em simples arbitrariedadesrdquo78

Acrescentou ainda que

76 IBDFAM ndash Instituto Brasileiro de Famiacutelia O polecircmico inciso IV do artigo 139 do CPC e suas difusas

interpretaccedilotildees Disponiacutevel em lt httpwwwibdfamorgbrnoticias6096O+polC3AAmico+inciso+IV+do+artigo+139+do+CPC+e+suas+difusas+interpretaC3A7C3B5es gt Publicado em 31082016 Acesso em 04092018

77 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018

78 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04092018

36

Eacute evidentemente inconstitucional diante do princiacutepio da dignidade da pessoa humana tirar o passaporte carteira de habilitaccedilatildeo Quecirc que tem isso com diacutevidas Natildeo tem absolutamente nada Natildeo eacute a correlaccedilatildeo instrumental entre o objetivo da execuccedilatildeo e o meio empregado Isso eacute simples vinganccedila simples puniccedilatildeo79

O professor Araken de Assis acredita que tais medidas satildeo inconstitucionais e

violam o principio da dignidade humana do executado numa sociedade como a nossa

sedenta por puniccedilatildeo natildeo me surpreende que essas ideias sejam encaradas com

naturalidade Mas eacute preciso rejeitaacute-las em nome de princiacutepios 80

34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO

A Constituiccedilatildeo Federal de 1988 tem como um dos seus fundamentos a dignidade da

pessoa humana presente no artigo 1ordm inciso III do referido texto constitucional O dito

princiacutepio tem o escopo de nortear o ordenamento juriacutedico como um todo

A inclusatildeo da dignidade da pessoa humana como princiacutepio constitucional obrigou

uma reflexatildeo sobre o papel da pessoa humana no direito e um redimensionamento para

elevaacute-la ao centro do ordenamento juriacutedico81 Eacute necessaacuterio recorrer agrave teoria Kantiana para

que se obtenha uma definiccedilatildeo do princiacutepio ora estudado Para Kant82 o homem eacute um fim

em si mesmo natildeo uma funccedilatildeo do Estado Ou Naccedilatildeo O Estado e o direito devem estar

organizados em benefiacutecio do indiviacuteduo

Agora eu afirmo o homem ndash e de uma maneira geral todo o ser racional ndash existe como fim em si mesmo e natildeo apenas como meio para o uso arbitraacuterio desta ou daquela vontade Em todas as suas accedilotildees pelo contraacuterio tanto nas direcionadas a ele mesmo como nas que o satildeo a outros seres racionais deve ser ele sempre considerado simultaneamente como fim

Partindo da premissa de que para Immanuel Kant o homem eacute o fim em si mesmo

ldquodevemos compreender que a dignidade da pessoa humana eacute a noccedilatildeo o comando a direccedilatildeo

que se deve seguir funcionando como fundamento para a interpretaccedilatildeo de todos os direitos e

garantias conferidos agrave pessoa nos ordenamentos juriacutedicos de cada Estadordquo 83

79 Ibid sem paginaccedilatildeo 80 Ibid sem paginaccedilatildeo 81 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito

fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 461 82 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud KANT Immanuel Fundamentaccedilatildeo da metafiacutesica dos costumes

Satildeo Paulo Martin Claret 2003 p56-59 Coleccedilatildeo A Obra-Prima de Cada Autor 83 SCHIAFIANO Juliana Rocha op cit p 461

37

O princiacutepio constitucional da dignidade da pessoa humana estaacute diretamente ligado ao

conteuacutedo dos direitos fundamentais logo para que se cumpra com os direitos fundamentais

constitucionalmente instituiacutedos eacute necessaacuterio reconhecer e respeitar a dignidade da pessoa

humana conforme disciplina Ingo Sarlet84

Em suma o que se pretende sustentar de modo mais enfaacutetico eacute que a dignidade da pessoa humana na condiccedilatildeo de valor (principio normativo) fundamental que atrai o conteuacutedo de todos os direitos fundamentais exige e pressupotildee o reconhecimento e proteccedilatildeo dos direitos fundamentais de todas as dimensotildees (ou geraccedilotildees se assim preferirmos) Assim sem que se reconheccedilam agrave pessoa humana os direitos fundamentais que lhe satildeo inerentes em verdade estarse-aacute lhe negando a proacutepria dignidade A consagraccedilatildeo constitucional da dignidade da pessoa humana tem o propoacutesito de limitar a atuaccedilatildeo ou a omissatildeo do Estado para garantir os direitos do indiviacuteduo Assim eacute difiacutecil precisar os efeitos da norma que determina a dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado (como acontece com a Constituiccedilatildeo brasileira de 1988) poreacutem quando desrespeitados os direitos fundamentais do cidadatildeo eacute possiacutevel identificar que a dignidade deste foi violada

Logo ldquoteraacute respeitada a sua dignidade o individuo que tiver respeitados os seus

direitos fundamentaisrdquo 85 Os direitos fundamentais estatildeo apresentados na Constituiccedilatildeo

Federal da seguinte forma direitos individuais e coletivos direitos sociais direitos poliacuteticos e

direitos de nacionalidade que tecircm como escopo garantir as liberdades positivas aos

indiviacuteduos ldquoonde foram conquistados direitos agrave liberdade religiosa liberdade civil e

profissional agrave propriedade ao livre acesso ao Judiciaacuterio agrave ampla defesa e ao contraditoacuterio no

processual judicial ao sigilo de dados e informaccedilotildees pessoais entre outros que somados

garantem o cidadatildeo uma vida dignardquo 86

O cidadatildeo na Constituiccedilatildeo Federal de 88 diferente das constituiccedilotildees brasileiras

anteriores passou a ser fundamento e ganhou destaque nos direitos fundamentais tendo

garantida a sua vida a sua dignidade a sua seguranccedila a sua honra a sua liberdade e a sua

propriedade

84 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud SARLET Ingo Wolfgang Dignidade da pessoa humana e

direitos fundamentais na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 2ed Porto Alegre Livraria do Advogado 2002 p87 85 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito

fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 462 86 Ibid p 462

38

Segundo Carmem Luacutecia Antunes Rocha87 para garantir o Estado Democraacutetico de

Direito eacute necessaacuterio que a sua atuaccedilatildeo seja sempre em conformidade com o princiacutepio da

dignidade da pessoa humana

O Estado somente eacute democraacutetico em sua concepccedilatildeo constitucionalizaccedilatildeo e atuaccedilatildeo quando respeita o princiacutepio da dignidade da pessoa humana Natildeo haacute verbo constitucional natildeo haacute verbo governamental que se faccedilam legiacutetimos quando natildeo se voltam ao atendimento daquele princiacutepio Natildeo haacute verdade constitucional natildeo haacute suporte institucional para as poliacuteticas puacuteblicas que natildeo sejam destinadas ao pleno cumprimento daquele valor maior transformado em princiacutepio constitucional

O princiacutepio da dignidade humana constitucionalmente garantido impotildee limites ao

Estado compelindo aos oacutergatildeos e atividades estatais respeitar o ser humano e garanti-lo

condiccedilotildees miacutenimas para uma vida digna Dessa forma eacute niacutetido que o dito princiacutepio eacute

pressuposto e indispensaacutevel para legitimar outras normas constitucionais e

principalmente infraconstitucionais

O Coacutedigo de Processo Civil eacute umas das principais normas infraconstitucionais que

sofre influecircncia dos preceitos valores e princiacutepios esculpidos na Constituiccedilatildeo Federal

Logo como o principio da dignidade humana eacute um dos mais importantes pressupostos

constitucionais ldquoentatildeo eacute tranquilo afirmar-se que o novel ordenamento processual tem

de se render nas resoluccedilotildees dos aspectos processuais e a fim de se atingir uma soluccedilatildeo

justa adequada e efetiva ao postulado da dignidade da pessoa humanardquo 88

Dessa forma o legislador deve formular as normas infraconstitucionais de acordo e a

partir do conteuacutedo constitucional para Marinoni Mitidiero e Arenhart89

() o Coacutedigo de Processo Civil constitui direito constitucional aplicado O Coacutedigo deve ser interpretado de acordo com a Constituiccedilatildeo e com os direitos fundamentais o que significa que as duacutevidas interpretativas devem ser resolvidas a favor da otimizaccedilatildeo do alcance da Constituiccedilatildeo e do processo civil como meio para tutela de direitos

87 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud ROCHA Carmen Luacutecia Antunes O princiacutepio da dignidade da

pessoa humana e a exclusatildeo social Revista Interesse Puacuteblico n4 p23-48 1999 p33 88 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o

novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 367

89 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 14

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Com o escopo de conferir eficaacutecia aos mandamentos constitucionais o CPC15 traz a

previsatildeo e diversas claacuteusulas gerais em seus primeiros artigos em um dos quais se

prestigia o princiacutepio da dignidade da pessoa humana

O referido princiacutepio estaacute disciplinado no artigo 8ordm do CPC15 e atua como um guia

sobre as demais normas do coacutedigo processual Eacute o que entende Nelson Rosenvald90

O maior cuidado do inteacuterprete eacute no sentido de jamais banalizar a dignidade fazendo dela um elixir processual tal como muitas vezes se vecirc na esfera do direito civil Penso que natildeo haacute maiores dificuldades em transpor a noccedilatildeo constitucional do princiacutepio para em seguida adaptaacute-la agraves singularidades do processo

Logo de acordo com o artigo 8ordm do CPC o oacutergatildeo julgador ao aplicar o ordenamento

juriacutedico deve resguardar a dignidade da pessoa humana Para Fredie Didier91 ldquoresguardar

nesse contexto eacute de um lado aplicar corretamente a norma juriacutedica lsquoproteccedilatildeo da dignidade

da pessoa humanarsquo e de outro natildeo violar a dignidaderdquo

O oacutergatildeo julgador deveraacute manter um comportamento ativo com o objetivo de promover

a dignidade da pessoa humana podendo tomar medidas de ofiacutecio para efetivar a dignidade da

pessoa humana Didier assevera que o magistrado poderaacute ainda ldquovaler-se da claacuteusula geral de

atipicidade (art 536 sect 1ordm) para a execuccedilatildeo do direito fundamental agrave dignidaderdquo 92 O autor

ainda traz dois exemplos

a) exigecircncia de respeito agrave ordem cronoloacutegica de conclusatildeo (art 12) caso de grave violaccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana que natildeo se encaixe em um dos incisos que excepcionam a regra de observacircncia da cronologia da conclusatildeo poderia o juiz ldquofurar a filardquo para promover a dignidade da pessoa humana b) prioridade na tramitaccedilatildeo processual pessoa que seja portadora de doenccedila grave mas que natildeo esteja no rol do art 1048 I para promover a dignidade de pessoa humana o juiz poderia determinar o processamento prioritaacuterio93

Essa dupla garantia ndash resguardo e promoccedilatildeo ndash tem como objetivo garantir ao individuo

sua dignidade humana fazendo com que ldquode um lado que o Estado natildeo a viole e de outro

que o Estado a promova e efetiverdquo

90 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud ROSENVALD Nelson A

dignidade da pessoa humana no CPC15 91 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte

geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 75 92 Ibid p 75 93 Ibid p 75

40

Nessa senda o magistrado deveraacute promover a dignidade da pessoa humana quando

perceber a ausecircncia desta no processo ou assegura-la quando for posta em risco Eacute nesse

sentido o entendimento dos professores Marinoni Mitidiero e Arenhart94

() a dignidade da pessoa humana determina a compreensatildeo do processo civil como um meio para tutela dos direitos Vale dizer o processo civil natildeo pode ser visto como um instrumento a serviccedilo do Estado como um instrumento que natildeo se encontre orientado agrave realizaccedilatildeo dos fins da pessoa humana Em outras palavras o processo civil serve para realizaccedilatildeo dos direitos e para orientaccedilatildeo das pessoas a respeito do significado do direito

Nessa senda compete tanto ao juiz quanto as demais partes processuais garantirem ldquoo

valor intriacutenseco de cada vida que eacute trazida ao processordquo nas palavras de Alexandre Freitas

Cacircmara95

() aos sujeitos do processo eacute preciso sempre ter claro que os titulares dos interesses em conflitos satildeo pessoas reais cujas vidas seratildeo afetadas pelo resultado do processo e que por isso mesmo tecircm o direito de estabelecer suas estrateacutegias processuais de acordo com aquilo que lhes pareccedila melhor para suas vidas Eacute inadmissiacutevel tratar as partes como se natildeo fossem pessoas reais meros dados estatiacutesticos Afinal se para o Judiciaacuterio cada processo pode parecer apenas mais um processo para as partes cada processo pode ser o uacutenico o mais relevante aquele em que sua vida seraacute decidida E eacute dever do juiz assegurar que isto seja respeitado

Dessa forma eacute necessaacuterio que um arcabouccedilo normativo para que seja conferida

eficaacutecia e proteccedilatildeo ao principio da dignidade da pessoa humana

Logo o dito princiacutepio deve ser protegido em todas as esferas do ordenamento juriacutedico

inclusive no campo da execuccedilatildeo civil onde sofre grandes riscos de ser violado em nome do

direito fundamental agrave tutela executiva do credor ldquoPartir da premissa de que existe um direito

fundamental agrave tutela executiva ora ratificado pelo CPC eacute indispensaacutevel para a soluccedilatildeo de

diversos problemas oriundos do procedimento executivo principalmente aqueles relacionados

agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo 96

94 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme

MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 25

95 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CAcircMARA Alexandre Freitas O Novo Processo Civil Brasileiro 2 ed Satildeo Paulo Atlas 2016 p 7

96 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66

41

Eacute o caso por exemplo da impenhorabilidade Segundo Fredie Didier et al97 a

impenhorabilidade eacute uma forma de proteger certos bens do devedor do direito fundamental a

execuccedilatildeo do credor

Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa

Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais

O legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do CPC fazendo um

preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses em anaacutelise ao optar pela mitigaccedilatildeo do direito

do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado Afinal ldquoa execuccedilatildeo natildeo pode ser utilizada

como instrumento para causar a ruiacutena a fome e o desabrigo do devedor e sua famiacutelia gerando

situaccedilotildees incompatiacuteveis com a dignidade da pessoa humana 98

Logo a impenhorabilidade de certos bens

[] Eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa99

Eacute nesse sentido que o CPC15 enumera diversos casos de bens patrimoniais que satildeo

impenhoraacuteveis como o salaacuterio e vencimentos utensiacutelios necessaacuterios ao exerciacutecio da

profissatildeo seguro de vida vestuaacuterios e pertences de uso pessoal entre outros

Dessa forma as regras relativas agraves medidas executivas devem ser interpretadas agrave luz

da Constituiccedilatildeo Federal ldquovez que se voltam agrave realizaccedilatildeo de direitos fundamentais e em sua

97 Ibid p 66 98 THEODORO JUacuteNIOR Humberto Novo Coacutedigo de Processo Civil Anotado 20 ed Rio de Janeiro

Forense 2016 p 978 99 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud DIDIER JR Fredie CUNHA

Leonardo Carneiro da BRAGA Paula Sarno OLIVEIRA Rafael Alexandria de Curso de direito processual civil 3 ed Salvador JusPodivm 2011 v 5 p 547

42

realizaccedilatildeo podem atingir direitos fundamentaisrdquo 100 O Superior Tribunal de Justiccedila jaacute decidiu

que

O rol das impenhorabilidades do ordenamento paacutetrio objetiva preservar o miacutenimo patrimonial necessaacuterio agrave existecircncia digna do executado impondo ao processo executoacuterio certos limites Assim a depender das peculiaridades do caso as regras de impenhorabilidade podem ser ampliadas de modo a adequar a tutela aos direitos fundamentais como por exemplo o direito agrave moradia agrave sauacutede ou agrave dignidade da pessoa humana Trata-se portanto da aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo e da necessidade sob o enfoque da proporcionalidade101 (STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014)

Logo a interpretaccedilatildeo dos dispositivos que tratam sobre a penhora no CPC deve estaacute

diretamente ligada aos ditames constitucionais devendo o interprete privilegiar a opccedilatildeo que

esteja mais em sintonia com a Carta Magna para que nem o credor e nem o devedor sejam

lesados

O artigo 833 do CPC elenca uma seacuterie de incisos que expotildeem os bens impenhoraacuteveis

O trecho inicial inciso I do art 833 define como impenhoraacuteveis os bens inalienaacuteveis Este

inciso segue a regra de que ldquose o bem natildeo pode ser alienado tambeacutem natildeo pode ser penhorado

porque a penhora eacute o primeiro ato do procedimento de alienaccedilatildeo judicial do bemrdquo 102

Satildeo exemplos de bens inalienaacuteveis os puacuteblicos cuja alienaccedilatildeo depende de autorizaccedilatildeo

legislativa Eacute inalienaacutevel tambeacutem o capital constituiacutedo para garantir indenizaccedilatildeo de ato iliacutecito

(art 533 sect 1 ordm CPC) que portanto eacute tambeacutem impenhoraacutevel ldquoTodo bem inalienaacutevel eacute

impenhoraacutevel embora nem todo bem impenhoraacutevel seja inalienaacutevelrdquo 103

O inciso I do art 833 CPC tambeacutem consagra a impenhorabilidade dos bens que por

ato voluntaacuterio satildeo excluiacutedos da execuccedilatildeo

Segundo Fredie Didier et al104

Eacute o que ocorre nos casos de bens doados ou alienados com claacuteusula de inalienabilidade que haacute de constar no registro imobiliaacuterio para ser eficaz perante o exequente e minimizar o risco de fraude A propoacutesito eis a redaccedilatildeo do art 1911 do Coacutedigo Civil lsquolsquoA claacuteusula de inalienabilidade imposta aos bens por ato de liberalidade implica impenhorabilidade e incomunicabilidaderdquo

100 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MEDINA Joseacute Miguel Garcia

Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 1 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 p 736 101 STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014 102 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 824 103 Ibid p 824 104 Ibid p 825

43

O inciso II por sua vez estabelece que satildeo impenhoraacuteveis os bens moacuteveis os

pertences e as utilidades domeacutesticas da residecircncia do executado Todavia excepcionam-se os

bens dessa natureza que sejam de elevado valor ou que ultrapassem as necessidades comuns

correspondentes a um meacutedio padratildeo de vida

A jurisprudecircncia natildeo eacute paciacutefica sobre o assunto logo natildeo exista uma relaccedilatildeo de bens

que podem ser atingidos pela penhora Abrindo margem para as mais variadas decisotildees

O STJ jaacute considerou impenhoraacuteveis aparelho de televisatildeo a cores mesa de centro passadeira raacutedio toca-fitas gravador microondas ar-condicionado um freezer um microcomputador com acessoacuterios uma impressora etc Poderatildeo ser penhorados porque ultrapassam o padratildeo-meacutedio aparelhos de TV mais sofisticados o segundo aparelho de televisatildeo a segunda geladeira aparelhos de ar-condicionado que satildeo verdadeiras peccedilas de design moacuteveis antigos que se transformam em peccedilas de decoraccedilatildeo faqueiro de prata adega climatizada etc Em entendimento de caraacuteter ainda mais geneacuterico jaacute restou consignado em determinado precedente que a proteccedilatildeo natildeo abrangeria apenas os bens indispensaacuteveis agrave moradia mas tambeacutem aqueles usualmente encontrados em um lar105

Ademais o inciso III do art 833 do CPC traz a impenhorabilidade dos vestuaacuterios bem

como os pertences de uso pessoal do executado salvo se de elevado valor

Segundo Fredie Didier et al106 o dispositivo possui dois propoacutesitos

de um lado preservar a dignidade do executado com a proteccedilatildeo de bens moacuteveis importantes para a sua sobrevivecircncia digna como o vestuaacuterio aparelho celular reloacutegio e os bens relacionados agrave sua higiene pessoal de outro lado a regra visa prestigiar a boa-feacute processual impedindo a execuccedilatildeo mesquinha e abusiva com a penhora de bens de pequeno ou nenhum valor como um pente ou uma bota

O inciso IV do art 833 do CPC consagra uma das mais importantes modalidades a

impenhorabilidade relativa aos rendimentos de natureza alimentar ldquoTrata-se de regra que

possui o claro propoacutesito de proteger o executado garantindo-lhe o recebimento de valores que

servem ao pagamento das despesas relacionadas agrave sua sobrevivecircncia digna e agrave da sua famiacuteliardquo 107

Jaacute inciso V do art 833 do CPC torna impenhoraacuteveis os livros as maacutequinas as

ferramentas os utensiacutelios os instrumentos ou outros bens moacuteveis necessaacuterios ou uacuteteis ao

exerciacutecio de qualquer profissatildeo 105 Ibid p 826 106 Ibid p 827 107 Ibid p 828

44

Por forccedila do paraacutegrafo 3ordm do art 833 satildeo igualmente impenhoraacuteveis os equipamentos

implementos e maacutequinas agriacutecolas pertencentes agrave pessoa fiacutesica ou a empresa individual

produtora rural Rodrigo Mazzei e Sarah Merccedilon108 esclarecem que

Tem assento na noccedilatildeo de que a dignidade estende-se tambeacutem ao exerciacutecio da profissatildeo em si mesma e tambeacutem por representar a forma por excelecircncia de que dispotildee o executado para continuar a receber sua remuneraccedilatildeo e por conseguinte prover seu sustento e de sua famiacutelia Trata-se tambeacutem de aplicaccedilatildeo pontual da funccedilatildeo social da propriedade jaacute que protege os bens que permitem a circulaccedilatildeo de riquezas para a subsistecircncia do executado e se for o caso de sua famiacutelia

Forccediloso ressaltar ainda que a impenhorabilidade do inc V alcanccedila apenas os bens

moacuteveis de modo que eacute absolutamente possiacutevel que o imoacutevel em que o executado exerccedila sua

atividade profissional seja penhorado conforme a Suacutemula 451 do STJ ldquoEacute legiacutetima a penhora

da sede do estabelecimento comercialrdquo

O inciso VI do art 833 do CPC versa sobre a impenhorabilidade do seguro de vida

ldquoTrata-se de impenhorabilidade em favor do beneficiaacuterio do seguro e natildeo do segurado ateacute

porque o valor do seguro natildeo compotildee nem comporaacute o seu patrimocircnio (art794 do Coacutedigo

Civil1 ordm7)rdquo Dessa forma ldquoem uma execuccedilatildeo contra o segurado natildeo seraacute possiacutevel a penhora

do seguro de vida pois se trata de bem que natildeo lhe pertence nem mesmo em expectativardquo

De acordo com o inciso VII do art 833 do CPC satildeo impenhoraacuteveis os materiais

necessaacuterios para obras em andamento salvo se essas forem penhoradas Logo a obra pode

ser penhorada (art 862 do CPC) ldquoA regra como bem lembrou Araken de Assis lsquoestimula a

penhora da proacutepria obra inconclusa agrave qual os materiais acrescem e conseguintemente

valorizamrsquo 109

O art 833 VIII CPC julga impenhoraacutevel a pequena propriedade rural assim

definida em lei desde que trabalhada pela famiacutelia reproduzindo parte do art 5ordm XXVI CF

88116 que disciplina a impenhorabilidade do referido bem

A proteccedilatildeo do CPC eacute mais ampla do que a garantia prevista na Constituiccedilatildeo Federal

tendo em vista que a impenhorabilidade natildeo se restringe agraves execuccedilotildees de deacutebitos decorrentes

de sua atividade produtiva podendo ser alegada em toda e qualquer execuccedilatildeo ldquoAssim o 108 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CABRAL Antonio Passo

CRAMER Ronaldo (orgs) Comentaacuterios ao Novo Coacutedigo de Processo Civil Rio de Janeiro Forense 2015 p 1194

109 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 835

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imoacutevel natildeo pode ser penhorado na execuccedilatildeo de creacutedito rural concedido para estimular a

produccedilatildeo agriacutecola mas poderaacute ser penhorado na execuccedilatildeo do creacutedito concedido para a

aquisiccedilatildeo do imoacutevelrdquo 110

A nona modalidade de impenhorabilidade trata-se dos recursos puacuteblicos recebidos por

instituiccedilotildees privadas para aplicaccedilatildeo compulsoacuteria em educaccedilatildeo sauacutede ou assistecircncia social ldquoA

proteccedilatildeo eacute louvaacutevel e tutela toda a coletividade ao privilegiar o direito agrave educaccedilatildeo sauacutede e

assistecircncia social em detrimento do direito do credorrdquo

De acordo com o inciso X do art 833 do CPC eacute impenhoraacutevel ateacute o limite de

quarenta salaacuterios miacutenimos a quantia depositada em caderneta de poupanccedila

Eacute uma modalidade de impenhorabilidade relativa (o CPC73 a considerava absoluta)

tendo em vista que essa impenhorabilidade natildeo pode ser oposta na execuccedilatildeo de alimentos

independentemente da sua origem (art 833 sect 2ordm do CPC) Fredie Didier et al cita Araken de

Assis111 ao afirmar que

a regra soacute protege essa aplicaccedilatildeo financeira Se o valor estiver depositado em fundo de investimento por exemplo poderaacute ser penhorado Se o devedor tiver vaacuterias cadernetas de poupanccedila a impenhorabilidade aplica-se agrave soma de todas elas e natildeo a cada uma delas isoladamente do contraacuterio valores expressivos poderiam ser pulverizados em vaacuterias contas burlando a finalidade da regra que eacute a de proteger a populaccedilatildeo de baixa renda

Ademais satildeo tambeacutem impenhoraacuteveis por forccedila do inciso XI os recursos puacuteblicos do

fundo partidaacuterio recebidos por partido poliacutetico nos termos da lei Essa modalidade de

impenhorabilidade ldquose restringe aos recursos puacuteblicos do fundo partidaacuterio Recursos de

origem privada recebidos pelo partido poliacutetico poderatildeo ser penhoradosrdquo 112 O processualista

Fredie Didier et al113 assevera que

Assim a impenhorabilidade foi estabelecida no intuito de impedir que os diretoacuterios nacionais de partidos poliacuteticos respondam por diacutevida dos diretoacuterios

110 Ibid p 836 111 DIDIER JR Fredie et al apud ASSIS Araken de Manual da execuccedilatildeo 11ordm ed cit p 225 Assim

tambeacutem REDONDO Bruno Garcia LOJO Maacuterio Vitor Suarez Penhora cit p 117 BUENO Cassio Scarpinella Curso sistematizado de Direito Processual Civil v 3 cit p 228 GIANNICO Mauriacutecio As novas reformas do CPC e de outras normas processuais Mauriacutecio Giannico e Viacutetor Joseacute de Mello Monteiro (coord) Satildeo Paulo Saraiva 2009 p 1 OS Em sentido diverso estendendo a impenhorabiacutelidade aos depoacutesitos feitos ateacute esse valor em CDB CDI fundos de renda fixa ou de accedilotildees RODRIGUES Marcelo Abelha Manual de execuccedilatildeo civil 3deg ed cit p 101

112 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 839

113 Ibid p 839

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estaduaismunicipais - sobretudo em razatildeo das vaacuterias decisotildees judiciais que determinaram penhora de recursos do fundo partidaacuterio de alguns partidos

Por fim o inciso XII do artigo 833 do CPC trata sobre a impenhorabilidade dos

creacuteditos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias sob o regime de incorporaccedilatildeo imobiliaacuteria

vinculados agrave execuccedilatildeo de obra ldquoO objetivo dessa modalidade eacute evitar que diacutevidas do

incorporador possam consumir os recursos que seriam utilizados na realizaccedilatildeo da obra em

prejuiacutezo dos adquirentes de unidades autocircnomasrdquo 114

O professor Misael Montenegro Filho115 aduz sobre que ldquoao estabelecer a

impenhorabilidade dos creacuteditos oriundos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias o novo CPC

protegeu os valores destinados agrave execuccedilatildeo da obra e agrave entrega das unidades imobiliaacuterias aos

adquirentes assegurando assim a execuccedilatildeo da promessa contratualrdquo

Importante frisar ainda que a Lei nordm 8009 1990 instituiu a impenhorabilidade do

imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar por qualquer diacutevida salvo as exceccedilotildees dos

seus arts 3ordm e 4ordm

A referida lei dispotildee que Para os efeitos de impenhorabilidade considera-se

residecircncia um uacutenico imoacutevel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia

permanente (art 5ordm)

O processualista baiano Fredie Didier et al116 assevera que

A lei propotildee-se a proteger imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar nos termos acima expostos A CF 88 ampliou o conceito de entidade familiar para abranger a famiacutelia monoparental e a uniatildeo estaacutevel Mas deve considerar-se aiacute compreendidos os irmatildeos que vivem juntos e a uniatildeo homossexual Ateacute o solteiro estaacute abrangido pela impenhorabilidade se reside soacute no imoacutevel - isso em nome da proteccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana e da moradia digna Na verdade houve uma mudanccedila de compreensatildeo acerca do sentido da proteccedilatildeo de proteccedilatildeo da famiacutelia agrave proteccedilatildeo da moradia indispensaacutevel agrave preservaccedilatildeo da dignidade da pessoa

114 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o

novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 388

115 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MONTENEGRO FILHO Misael Novo Coacutedigo de Processo Civil Comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Atlas 2016 p 752

116 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 840-841

47

O STJ jaacute consolidou esse entendimento na suacutemula nordm 364 O conceito de

impenhorabilidade de bem de famiacutelia abrange tambeacutem o imoacutevel pertencente a pessoas

solteiras separadas e viuacutevas

Entretanto se o casal ou entidade familiar possuir vaacuterios imoacuteveis utilizados como

residecircncia a impenhorabilidade recairaacute sobre o de menor valor (art 5ordm paraacutegrafo uacutenico) ldquoEacute o

que ocorre por exemplo quando a famiacutelia se divide em mais de uma cidade por motivos

profissionaisrdquo 117

Forccediloso observar ainda que a impenhorabilidade do imoacutevel familiar eacute relativa jaacute que

natildeo pode ser oposta a qualquer creacutedito O art 3ordm da Lei n 8009 1990151 em que pode ser

penhorada a residecircncia da famiacutelia (exemplo execuccedilatildeo de alimentos para cobranccedila de taxas

devidas em funccedilatildeo do imoacutevel familiar etc)

Resta claro que o artigo 833 do CPC ao disciplinar as hipoacuteteses de impenhorabilidade

possui o escopo de proteger o princiacutepio da dignidade humana Entretanto algumas claacuteusulas

natildeo possuem proteccedilatildeo absoluta ldquoa sua relativizaccedilatildeo a depender do caso sob exame deve ser

realccedilada agrave medida que a dignidade resguardada e protegida pelo sistema processual-

constitucional natildeo se limita ao executadordquo 118 Ademais ldquoEacute premente advertidamente que a

dignidade do credor tambeacutem seja garantida em juiacutezo tendo como norte pois os princiacutepios da

proporcionalidade e razoabilidaderdquo 119

117 Ibid p 841 118 Ibid p 752 119 Ibid p 752

48

4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA

ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE

HUMANA DO EXECUTADO

41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE

EFETIVACcedilAtildeO

Como jaacute exposto em linhas preteacuteritas nos meios executivos tiacutepicos as medidas

executivas satildeo determinadas pela lei ou seja o oacutergatildeo pode aplicar somente as medidas

tipificadas no ordenamento juriacutedico No entanto ao se tratar das medidas executivas atiacutepicas

eacute necessaacuterio que haja um limite na atuaccedilatildeo realizada pelo juiz

O poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo poder ser realizado de maneira indiscriminada haacute

pressupostos e premissas a serem observadas Dessa forma a primeira premissa eacute no sentindo

de que a medida executiva atiacutepica natildeo pode ser a primeira medida a ser invocada ldquomuito ao

reveacutes a regra do nosso sistema continua a ser o da tipicidade dos meios executivos soacute que

agora temperado pelo sistema atiacutepicordquo 120 O processualista Thiago Rodovalho explica que

ldquo() os meios atiacutepicos natildeo satildeo prima ratio e sim a ultima ratio eacute dizer esgotados e

frustrados os meios executivos tiacutepicos e ordinaacuterios pode-se em tese valer-se do sistema

atiacutepicordquo121

Dessa forma nos casos de execuccedilatildeo que tenha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

natildeo deve ser aplicado de logo as medidas indutivas e coercitivas Apenas apoacutes frustradas as

medidas ldquonaturaisrdquo pode-se passar agrave aplicaccedilatildeo das medidas atiacutepicas

Uma segunda premissa diz a respeitos dos meios de pressatildeo para compelir o devedor a

adimplir com o seu deacutebito ldquoEssa segunda premissa decorre inclusive de imperiosidade

loacutegica de nada adianta a medida de pressatildeo se a obrigaccedilatildeo natildeo tem como ser adimplida pelo

devedorrdquo 122

Para Thiago Rodovalho123 ldquoIsso quer significar que esgotados e frustrados os meios

tiacutepicos o juiz se valeraacute dos meios atiacutepicos se eles forem potencialmente haacutebeis a estimular ou

120 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da

atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018

121 Ibid sem paginaccedilatildeo 122 Ibid sem paginaccedilatildeo 123 Ibid sem paginaccedilatildeo

49

forccedilar o cumprimento o que pressupotildee sua possibilidade quando entatildeo eles poderatildeo ser

eficazesrdquo

Logo nas obrigaccedilotildees de pagar quantia se houver a real demonstraccedilatildeo da

impossibilidade financeira do devedor seria um constrangimento inuacutetil e desnecessaacuterio a

imposiccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo para forccedilar o cumprimento

Por isso as medidas atiacutepicas devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o

esgotamento das medidas tiacutepicas e a possibilidade de cumprimento de cumprimento da

obrigaccedilatildeo

Ademais superadas as supracitadas premissas e o oacutergatildeo julgador vislumbrando a

necessidade da aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo se faz necessaacuterio que um conjunto de

postulados e princiacutepios rejam a atuaccedilatildeo do oacutergatildeo julgador servindo de norte para a escolha da

medida executiva mais adequada ldquoDe modo geral a escolha deve pautar-se nos postulados da

proporcionalidade da razoabilidade (art8ordm CPC) e da proibiccedilatildeo de excesso bem como nos

princiacutepios da eficiecircncia e da menor onerosidade da execuccedilatildeordquo 124

O professor Fredie Didier et al125 eacute categoacuterico ao citar Humberto Aacutevila

Segundo Humberto Aacutevila o postulado da proporcionalidade se manifesta nas situaccedilotildees em que haacute uma relaccedilatildeo de causalidade entre dois elementos empiricamente discerniacuteveis um meio e um fim de tal sorte que se possa proceder aos trecircs exames fundamentais o da adequaccedilatildeo (o meio promove o fim) o da necessidade (dentre os meios disponiacuteveis e igualmente adequados para promover o fim natildeo haacute outro meio menos restritivo do(s) direito(s) fundamental (is) afetado(s)) e o da proporcionalidade em sentido estrito (as vantagens trazidas pela promoccedilatildeo do fim correspondem agraves desvantagens provocadas pela adoccedilatildeo do meio)

O juiz ao aplicar a medida executiva atiacutepica ao caso concreto deve ter seu

embasamento no princiacutepio da proporcionalidade para saber se a medida a ser tomada eacute a

melhor opccedilatildeo ao caso sub judice ldquoO exame de proporcionalidade aplica-se sempre que

houver uma medida concreta destinada a realizar uma finalidaderdquo 126

Em verdade a aplicaccedilatildeo do princiacutepio da proporcionalidade eacute imprescindiacutevel na adoccedilatildeo

dos meios executivos atiacutepicos tendo em vista que ldquo() tais medidas em especial quando de

124 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111 125 DIDIER JR Fredie et al apud AVILA Humberto Teoria dos princiacutepios da definiccedilatildeo agrave aplicaccedilatildeo

dos princiacutepios juriacutedicos 16 ed Satildeo Paulo Malheiros 2015 p 205 126 DIDIER JR Fredie et al op cit p 111

50

natureza coercitiva podem restringir direitos do devedor e incidir diretamente sobre sua

pessoardquo127 Logo ainda que o princiacutepio da efetividade da tutela executiva seja um direito

fundamental o mesmo ldquo() deve ser compatibilizado com direitos fundamentais do

executado para que a sua dignidade humana seja preservadardquo 128

Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Neves129 afirma que em nome do princiacutepio da

proporcionalidade o juiz deveraacute

() ponderar no caso concreto as vantagens praacuteticas da adoccedilatildeo de cada medida executiva atiacutepica em especial as de natureza coercitiva e as desvantagens de sua adoccedilatildeo levando em conta a possibilidade de a medida criar uma limitaccedilatildeo excessiva ao exerciacutecio de direito fundamental do executado

Outro princiacutepio que o oacutergatildeo julgador deve se ater ao escolher a medida executiva

atiacutepica eacute o da razoabilidade Segundo Fredie Didier et al 130 o princiacutepio (ou postulado)131 se

manifesta de trecircs formas

a) como dever de equidade a exigir a harmonizaccedilatildeo da norma geral com o caso individual impondo a consideraccedilatildeo daquilo que normalmente acontece em detrimento do que eacute extraordinaacuterio e tambeacutem impondo a consideraccedilatildeo das especificidades do caso concreto ante a generalidade da norma b) como dever de congruecircncia a exigir a harmonizaccedilatildeo das normas com suas condiccedilotildees externas de aplicaccedilatildeo (isto eacute com a realidade com base em que foram editadas) c) como dever de equivalecircncia a exigir uma relaccedilatildeo de equivalecircncia entre a medida adotada e o criteacuterio que a dimensiona

Logo ldquo() o princiacutepio da razoabilidade deve nortear a atuaccedilatildeo do juiz na adoccedilatildeo das

medidas executivas atiacutepicas previstas no art 139 IV do Novo CPCrdquo 132 tendo em vista que

ldquo() mesmo medidas que pelo princiacutepio da proporcionalidade podem se mostrar

abstratamente possiacuteveis de adoccedilatildeo no caso concreto podem se mostrar inadequadas e

irrazoaacuteveisrdquo 133

127 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Medidas executivas atiacutepicas na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de

pagar quantia certa art 139 IV do novo CPC Revista de Processo v 42 n 265 mar 2017 p 14 128 Ibid p 14 129 Ibid p 14 130 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111-112 131 Segundo Fredie Didier et al o postulado eacute uma norma que atua sobre a aplicaccedilatildeo de outras normas

A proporcionalidade e a razoabilidade seriam postulados normativos e natildeo princiacutepios segundo essa concepccedilatildeo 132 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo op cit p 14 133 Ibid p 14

51

Ademais conforme dispotildee o postulado da proibiccedilatildeo de excesso ldquoa realizaccedilatildeo de uma

regra ou princiacutepio constitucional natildeo pode conduzir agrave restriccedilatildeo a um direito fundamental que

lhe retire um miacutenimo de eficaacuteciardquo 134

A proibiccedilatildeo de excesso deveraacute sempre ser suscitada quando um direito fundamental

houver sido violado a ponto do direito fundamental sofrer violaccedilatildeo excessiva Ademais ldquoesse

postulado natildeo se confunde com o da proporcionalidade porque ele dispensa os exames da

adequaccedilatildeo (relaccedilatildeo meiofim) da necessidade (exigibilidade) ou da proporcionalidade em

sentido estrito (ponderaccedilatildeo entre vantagens e desvantagens)rdquo 135

Logo ldquopouco importa a relaccedilatildeo meiofim ou a exigibilidade da medida ou ainda a

ponderaccedilatildeo com outro direito fundamental eventualmente em jogo aqui se analisa apenas a

eficaacutecia de um determinado direito fundamentalrdquo 136

O princiacutepio da eficiecircncia tem previsatildeo constitucional no art 37 e previsatildeo

infraconstitucional no art 8ordm do CPC15 O referido princiacutepio determina que o processo seja

conduzido de forma eficiente pelo oacutergatildeo jurisdicional

Entende-se que eficiente eacute a atuaccedilatildeo que utilize adequadamente os meios necessaacuterios

para que se atinjam os fins almejados O oacutergatildeo jurisdicional na escolha dos meios a serem

utilizados para a obtenccedilatildeo dos fins

a) deve escolher aqueles que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo (deve evitar meios que promovam resultados insignificantes) b) deve escolher meios que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado (natildeo se pode escolher um meio de resultado duvidoso) c) natildeo pode escolher um meio que produza muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscado 137

O juiz deveraacute igualmente analisar o princiacutepio da menor onerosidade da execuccedilatildeo que

eacute previsto pelo art 805 do CPC ldquoArt 805 Quando por vaacuterios meios o exequente puder

promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o

executadordquo

134 134 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 112 135 Ibid p 112 136 Ibid p 112 137 Ibid p 112-113

52

Logo ldquohavendo duas opccedilotildees igualmente eficazes para permitir alcanccedilar o resultado

pretendido (satisfaccedilatildeo do creacutedito) deveraacute o oacutergatildeo julgador valer-se daquela que menos onere

a situaccedilatildeo do executadordquo 138

O dito princiacutepio impede o comportamento abusivo do exequente que possa beneficiar-

se do meio mais danoso ao executado protegendo dessa forma a lealdade e a eacutetica

processual

Os postulados e princiacutepios analisados em linhas preteacuteritas impotildeem ao oacutergatildeo julgador a

observacircncia de alguns criteacuterios para a escolha da medida executiva atiacutepicas a ser utilizada no

caso concreto

Primeiramente a medida executiva atiacutepica deveraacute ser adequada ldquoO criteacuterio da

adequaccedilatildeo impotildee que juiz considere abstratamente uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida

executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia

a gerar o resultadordquo 139 Nesse primeiro momento o juiz deveraacute observar sob a perspectiva do

credor qual medida teraacute o condatildeo de gerar o resultado mais efetivo

Segundo Fredie Didier et al140 o criteacuterio da adequaccedilatildeo eacute

() fortemente inspirado pelo postulado da proporcionalidade e pelo princiacutepio da eficiecircncia na parte em que esse princiacutepio determina a escolha de meios que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo e que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado

Ademais a medida adotada pelo oacutergatildeo julgador deveraacute ser necessaacuteria ldquoEsse criteacuterio

impotildee um limite agrave atuaccedilatildeo judicial funcionando como uma espeacutecie de contrapeso ao criteacuterio

da adequaccedilatildeo Aqui deve-se levar em conta a posiccedilatildeo do devedorrdquo141

O juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental agrave execuccedilatildeo e determinar

uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute necessaacuterio que a

medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado O criteacuterio da necessidade

estabelece que ldquonatildeo se pode ir aleacutem do necessaacuterio para alcanccedilar o propoacutesito almejado Deve

138 Ibid p 113 139 Ibid p 113 140 Ibid p 113 141 Ibid p 114

53

pois o oacutergatildeo julgador determinar o meio executivo na medida do estritamente necessaacuterio para

proporcionar a satisfaccedilatildeo do creacutedito ndash nem menos nem maisrdquo 142

O referido criteacuterio possui forte influecircncia dos postulados da proibiccedilatildeo do excesso e da

razoabilidade assim como do princiacutepio da menor onerosidade para o executado Assevera

Fredie Didier et al143 que

Natildeo eacute razoaacutevel por exemplo impor como primeira opccedilatildeo medida coercitiva a ser suportada pelo agente puacuteblico pelo simples fato de o juiz pressupor que o ente puacuteblico ao qual ele eacute vinculado iraacute descumprir determinada ordem judicial - o descumprimento natildeo pode ser visto como algo ordinaacuterio ou cotidiano (razoabilidade como dever de equidade) Tampouco eacute razoaacutevel eleger a prisatildeo civil como meacutetodo prioritaacuterio para compelir o executado ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer (razoabilidade como dever de equivalecircncia) Aleacutem disso eacute vedada por exemplo a imposiccedilatildeo de multa coercitiva para compelir o executado a emitir declaraccedilatildeo de vontade uma vez que haacute previsatildeo expressa de medida tiacutepica capaz de proporcionar o mesmo resultado sem sacrifiacutecio para o devedor (art 501 CPC)

A afirmaccedilatildeo feita por Bonavides144 em 1997 sobre a adequaccedilatildeo e a necessidade

continua atual sobre os motes

O meio empregado pelo legislador deve ser adequado e necessaacuterio para alcanccedilar o objetivo procurado O meio eacute adequado quando com seu auxiacutelio se pode alcanccedilar o resultado desejado eacute necessaacuterio quando o legislador natildeo poderia ter escolhido outro meio igualmente eficaz mas que natildeo limitasse ou limitasse de maneira menos sensiacutevel o direito fundamental

Por fim a medida deve conciliar os interesses contrapostos ldquoO magistrado deve

ponderar os interesses em jogo aplicando a proporcionalidade em sentido estrito de modo

que as vantagens da utilizaccedilatildeo da medida atiacutepica escolhida superem as vantagens de seu usordquo 145

Esse criteacuterio natildeo privilegia nem o credor nem o devedor e sim a soluccedilatildeo mais

equilibrada e que atenda da melhor forma aos valores em conflito ldquoTrata-se de criteacuterio

inspirado nos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade bem como no princiacutepio da

142 Ibid p 114 143 Ibid p 114 144 BONAVIDES Paulo Curso de Direito Constitucional 7ordm ediccedilatildeo Satildeo Paulo Ed Malheiros 1997

p 372 145 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 114-115

54

eficiecircncia na parte em que impotildee ao juiz evitar a escolha do meio executivo que produza

muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscadordquo 146

Cada um dos criteacuterios supracitados devem ser considerados pelo juiz ao aplicar as

medidas executivas atiacutepicas ao caso concreto Para Fredie Didier et al147 as medidas como

retenccedilatildeo de CNH passaporte ou cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado como

forma de pressionaacute-lo ao pagamento da diacutevida pecuniaacuteria natildeo satildeo possiacuteveis

Essas natildeo satildeo medidas adequadas ao atingimento do fim almejado (o pagamento de quantia) - natildeo haacute propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente Tais medidas soam mais como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-lo ao cumprimento da ordem judicial - e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a utilizaccedilatildeo de meios sancionatoacuterios pelo magistrado mas apenas de meios de coerccedilatildeo indireta e sub-rogatoacuterios

Ainda que adequadas fossem a retenccedilatildeo de CNH e do passaporte no corte de fornecimento de aacutegua natildeo parecem ser medidas necessaacuterias (no sentido de exigiacuteveis) uma vez que outras medidas podem em tese ser utilizadas sem causar igual gravame ao executado - como por exemplo a simples restriccedilatildeo do uso de cartotildees de creacutedito A retenccedilatildeo de documentos pessoais eacute medida que termina por restringir a liberdade de ir e vir do executado mostrando-se a princiacutepio natildeo-razoaacutevel por ir de encontro ao dever de equivalecircncia e desproporcional por restringir demais o direito agrave liberdade em favor do direito de creacutedito pecuniaacuterio do exequente

O processualista baiano et al148 cita tambeacutem outro exemplo de medida atiacutepica que natildeo

atingem os criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade

Tampouco parece adequada em princiacutepio determinaccedilatildeo de corte de energia eleacutetrica de todo o preacutedio onde funciona serviccedilo puacuteblico administrativo como forma de pressionar o ente federado a cumprir ordem de nomeaccedilatildeo de candidato em concurso puacuteblico Natildeo parece haver relaccedilatildeo meiofim entre uma coisa e outra Tambeacutem natildeo eacute possiacutevel enxergar essa medida como necessaacuteria no sentido de ser a menos gravosa para o devedor - observe que se trata de medida que uma vez aplicada ensejaria restriccedilatildeo de funcionamento em toda a reparticcedilatildeo puacuteblica em prejuiacutezo de serviccedilos puacuteblicos essenciais ao funcionamento da Administraccedilatildeo o que aleacutem de ser excessivamente gravoso parece natildeo se conformar agrave necessidade de ponderaccedilatildeo dos interesses em jogo - aleacutem de afetar a um sem-nuacutemero de pessoas tomadoras desses serviccedilos

Ademais eacute sabido que toda e qualquer decisatildeo judicial precisa ser fundamentada Ao

se tratar das medidas executivas atiacutepicas o papel da fundamentaccedilatildeo se torna ainda mais

146 Ibid p 115 147 Ibid p 115 148 Ibid p 116

55

importante tendo em vista que eacute pela fundamentaccedilatildeo da decisatildeo que se poderaacute controlar a

adequaccedilatildeo e necessidade da medida atiacutepica

Pelo fato das medidas executivas atiacutepicas derivarem de dispositivos normativos

considerados claacuteusulas gerais propiacutecias as mais variadas interpretaccedilotildees eacute de extrema

importacircncia que o oacutergatildeo julgador fundamente sua decisatildeo

Logo ldquodeve o juiz na fundamentaccedilatildeo decisoacuteria expor racionalmente os motivos da

sua escolha demonstrando com atenccedilatildeo ao art 489 sect 1ordm CPC de que modo a sua opccedilatildeo

atende os criteacuterios da adequaccedilatildeo necessidade e proporcionalidade em sentido estrito ()rdquo 149

Dessa forma os princiacutepios da proporcionalidade e razoabilidade servem para delimitar

o alcance das claacuteusulas gerais de efetivaccedilatildeo fazendo com que o oacutergatildeo julgador se atenha aos

criteacuterios da adequaccedilatildeo e necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao caso

concreto

42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO

EXECUTADO

A entrada em vigor do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 aflorou ainda mais uma

discussatildeo essencial para os processualistas do seacuteculo XXI qual eacute o verdadeiro protagonista do

processo civil

Para os que defendem o ldquoautoritarismo processualrdquo o verdadeiro protagonista do

processo civil eacute o oacutergatildeo judiciaacuterio que em nome do desempenho efetivo de suas funccedilotildees lhes

eacute permitido dilatar os poderes que diga-se de jaacute passagem jaacute compotildeem um vastiacutessimo

arsenal150

Jaacute os ldquogarantistasrdquo 151 do processo civil acreditam que os verdadeiros protagonistas satildeo

as partes do processo e seus direitos e garantias devem ser estritamente preservados

Devido a essa disputa de quem possui maior protagonismo no processo as mudanccedilas

ocorridas no coacutedigo processual vigente quanto agraves medidas executivas atiacutepicas despertaram

149 Ibid p 117 150 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos

atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04102018

151 O processualista Araken de Assis acredita que o termo garantista eacute descabido tendo em vista que remete ao processo penal

56

maior celeuma do que qualquer outra modificaccedilatildeo trazida pelo CPC15 Afinal as referidas

medidas acirravam ainda mais a disputa pelo protagonismo processual

O fato de o CPC15 dispor no art 139 IV que o juiz poderaacute decretar todas as medidas

indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o

cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo

pecuniaacuteria levou boa parte da doutrina e dos juiacutezes a acreditar que teria pleno direito de

aplicar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo Entretanto muitos se esqueceram do outro lado

da moeda esqueceram que a dignidade humana do executado tambeacutem eacute um direito

fundamental e natildeo pode ser violado

Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa152

acreditam que

() natildeo parece producente elencar um rol abstrato das medidas que poderiam ser aplicadas pelo juiz a tiacutetulo do art 139 IV CPC Afinal se busca a efetividade da execuccedilatildeo e esta soacute pode ser identificada agrave luz das especificidades da situaccedilatildeo concreta Ideal eacute enveredar pela loacutegica modular (adequaccedilatildeo ao caso) natildeo pela geneacuterica (soluccedilotildees abstratas de pretensa utilidade universal)

Em razatildeo de o dispositivo apresentar uma gama de poderes tatildeo amplos agrave disposiccedilatildeo do

oacutergatildeo julgador sem nenhuma estipulaccedilatildeo de um procedimento legal previamente definido para

que estabeleccedila as condiccedilotildees de sua aplicaccedilatildeo em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo eacute

necessaacuterio que em razatildeo do princiacutepio da dignidade humana natildeo busque definir o que o

dispositivo permite mas de definir o que ele natildeo permite ldquoOu seja propotildee-se a sua

compreensatildeo por exclusatildeo Afinal se ele tem potencialidade para promover a efetividade da

tutela tambeacutem pode provocar lesotildees E como em direito os fins natildeo justificam os meios

ressalta como prioritaacuteria a necessidade de estabelecer limitesrdquo 153

O art 789 do CPC15 disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial e eacute

categoacuterico ao dispor que ldquoo devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para

152 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

153 Ibid sem paginaccedilatildeo

57

o cumprimento de suas obrigaccedilotildees salvo as restriccedilotildees estabelecidas em leirdquo Logo a

execuccedilatildeo somente poderaacute incidir sobre os bens do devedor e natildeo sobre a sua pessoa

Como eacute sabido a Lex Poetelia Papiria de 326 aC foi o primeiro marco legal da

humanizaccedilatildeo das cobranccedilas de diacutevidas abolindo a imposiccedilatildeo ao devedor de castigos

vexatoacuterios e ateacute da pena de morte154

Afinal no direito romano antigo a cobranccedila de diacutevidas poderia recair sobre a pessoa

do devedor que respondia com sua liberdade e ateacute mesmo com seu proacuteprio corpo permitindo

a lei que repartissem tantos pedaccedilos do corpo do devedor quantos fossem seus credores

Nesse sentindo leciona o professor Guilherme Pupe da Noacutebrega155 que

Vem de longe a evoluccedilatildeo no sentido de fazer a responsabilidade por uma obrigaccedilatildeo migrar da pessoa do devedor para seu patrimocircnio Merecem registro especiacutefico como marcos histoacutericos remotos a Lex Poetelia Papiria de 326 aC que aboliu o nexum e possibilidade de escravidatildeo do devedor como garantia da obrigaccedilatildeo e a pignoris capio ou ldquoaccedilatildeo por tomada de penhorrdquo que instituiu a possibilidade de o credor tomar parcela dos bens do devedor como forma de assegurar o adimplemento da diacutevida Aqueles institutos culminariam seacuteculo depois no artigo 789 do CPC de 2015 a consagrar que o devedor responda pela satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo com seus bens presentes e futuros observadas as restriccedilotildees impostas pelas impenhorabilidades legais

Logo o avanccedilar da civilizaccedilatildeo marcou o deslocamento da responsabilidade por

diacutevidas saindo do corpo do devedor para o seu patrimocircnio tendo em vista que a vida

humana a liberdade e a integridade fiacutesica satildeo valores inalienaacuteveis natildeo podendo ser

sacrificadas em benefiacutecio de obrigaccedilotildees pecuniaacuterias 156

Entretanto eacute sabido que a responsabilidade patrimonial eacute excepcionada pela prisatildeo

civil do devedor de verba alimentiacutecia resquiacutecio da responsabilidade pessoal romana

154 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt

httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018

155 NOacuteBREGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139 IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018

156 Ibid sem paginaccedilatildeo

58

No entanto haacute uma justificativa para isso Segundo o processualista Guilherme Pupe

da Noacutebrega157

Eacute que a par de a prisatildeo civil encontrar previsatildeo constitucional no inciso LXVII do artigo 5ordm o raciociacutenio eacute o de que o direito do alimentante agrave liberdade de locomoccedilatildeo cede diante dos direitos agrave vida e agrave dignidade titularizados pelo alimentando e resguardados pelos alimentos Foi esse mesmo raciociacutenio aliaacutes que justificou no passado a ediccedilatildeo da suacutemula 309 pelo STJ agora positivada pelo artigo 528 sect 7ordm que limita a modalidade coercitiva agraves trecircs uacuteltimas prestaccedilotildees vencidas e agraves prestaccedilotildees vincendas A ideia eacute que tendo o alimentando subsistido a despeito do natildeo-pagamento de prestaccedilotildees mais antigas essas verbas teriam perdido o caraacuteter alimentar que na equaccedilatildeo antes apresentada justificaria a prisatildeo civil do alimentante Daiacute por que aqueles valores antigos remanescem exigiacuteveis mas somente pela via da expropriaccedilatildeo

Essa ressalva eacute necessaacuteria tendo em vista que a adoccedilatildeo de teacutecnica de execuccedilatildeo

indireta para incursatildeo radical na esfera de direitos do executado notadamente direitos

fundamentais quando carente de respaldo constitucional natildeo merece acolhimento sob

risco de se atentar contra o devido processo legal (artigo 5ordm LIV da Constituiccedilatildeo)

Como afirma o autor Bruno Dantas158 ldquoembora inexistam estatiacutesticas que permitam

comparaccedilotildees natildeo eacute desarrazoado intuir que os iacutendices de inadimplecircncia despeccedilam na razatildeo

inversa da incidecircncia das ordens judiciais sobre o corpo e a liberdade do devedorrdquo Entretanto

eacute natildeo possiacutevel adotar toda e qualquer medida executiva atiacutepica em nome da efetividade da

execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que se saiba os limites da sua aplicaccedilatildeo

Dessa forma instrumentos que permitam o cumprimento forccedilado de contratos e o pagamento

de diacutevidas satildeo necessaacuterios contudo eacute preciso equilibrar essa exigecircncia com a liberdade e a

dignidade humana

Como citado alhures o art 139 IV ensejou decisotildees como a que determinou a

suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o

passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito em uma accedilatildeo se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo

extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

Na supracitada decisatildeo o princiacutepio da responsabilidade patrimonial natildeo estaacute sendo

efetivado para o que o devedor responda com os seus bens Afinal qual ligaccedilatildeo entre a

157 Ibid sem paginaccedilatildeo 158 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt

httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018

59

restriccedilatildeo de circulaccedilatildeo que diz com o direito de ir e vir (liberdade) com o pagamento de

diacutevidas que diz com a responsabilidade civil159

Ademais por que quem natildeo tem dinheiro para pagar diacutevidas natildeo pode dirigir Por que

natildeo tem condiccedilotildees para pagar o deacutebito natildeo pode ter passaporte Por que quem natildeo tem como

pagar o deve natildeo pode ter cartatildeo de creacutedito

Ao utilizar meios executivos atiacutepicos como os supracitados para compelir o devedor a

satisfazer a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria quando exauridos sem ecircxito os meios tradicionais de bens

penhoraacuteveis salvo quando existe qualquer indiacutecio concreto de ocultaccedilatildeo ou dissipaccedilatildeo de

bens eacute obrigar o devedor abrir matildeo da proteccedilatildeo da lei que lhe impede que seja tomado agrave forccedila

(art 833 CPC e demais disposiccedilotildees que tratam da impenhorabilidade)

Segundo Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa160

Claramente essa pressatildeo visa dar uma aparecircncia de voluntariedade agrave indicaccedilatildeo de bens impenhoraacuteveis pelo proacuteprio executado que na verdade soacute age assim por ser a uacutenica forma de ver-se livre de um grame imposto por medida indutiva despedida de qualquer necessidade ou adequaccedilatildeo Uma intoleraacutevel perversatildeo

Os autores afirmam ainda que o ldquodireito paacutetrio natildeo admite esta contraditio in terminis

sendo inaceitaacutevel a coexistecircncia de regra protetiva do executado com outra que concede ao

juiz poderes para forccedilar (ainda que indiretamente e veladamente) o executado a abrir matildeo

daquela proteccedilatildeordquo 161

Logo eacute cristalino que a suspensatildeo da CNH eacute uma forma incorreta de aplicar a medida

executiva atiacutepica para efetivar o direito fundamental a execuccedilatildeo tendo em vista que o uacutenico

objetivo da referida eacute pressionar o executado abrir matildeo de algum bem impenhoraacutevel para

levantar o dinheiro e cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

A retenccedilatildeo do passaporte igualmente natildeo possui qualquer relaccedilatildeo com a diacutevida do

executado e eacute somente uma forma de tentar pressiona-lo a dispor de um bem que natildeo pode

ser tomado agrave forccedila e puni-lo por natildeo ter cumprido voluntariamente com a sua obrigaccedilatildeo

159 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

160 Ibid sem paginaccedilatildeo 161 Ibid sem paginaccedilatildeo

60

Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa162

acreditam que tal medida eacute equivocada e se torna excessivamente onerosa ao executado

As mais variadas circunstacircncias relevem o equiacutevoco de tal medida aplicada assim genericamente Com efeito nada justifica reter o passaporte do executado e impedi-lo de viajar para o exterior quando eacute agraciado inclusive com todas as despesas pagas com presente sorteio ou precircmio (por completar tempo de serviccedilo ou atingir metas produtividade na sociedade empresaacuteria em que trabalha) Como todo custo eacute suportado por terceiro e por isso mesmo a sua realizaccedilatildeo pelo executado natildeo traria qualquer prejuiacutezo ao exequente e a retenccedilatildeo do passaporte natildeo seria injustificaacutevel

Paulo Antonio Papini163 acredita que natildeo tem a apreensatildeo de passaporte natildeo possui um

fundamento plausiacutevel tendo em vista que se o devedor natildeo pode viajar para saldar o deacutebito

tambeacutem natildeo poderia exercer atividades cotidianas

Com todo o respeito a quem pensa dessa forma o argumento eacute muito simploacuterio e natildeo precisamos sequer do Direito para derrubaacute-lo Com efeito se considerarmos que ndash ateacute mesmo pelas dimensotildees continentais do Brasil ndash natildeo eacute incomum que uma passagem para o Nordeste custe mais caro que um voo para Miami seria razoaacutevel entatildeo seguindo a linha argumentativa do Magistrado em questatildeo que se oficiasse aos oacutergatildeos reguladores da aviaccedilatildeo civil proibindo-se aquele devedor de fazer ateacute mesmo voos domeacutesticos Poder-se-ia ir mais longe jaacute que natildeo tem dinheiro para pagar suas diacutevidas certamente aquele devedor tambeacutem natildeo teria para comer fora de sua casa porque entatildeo natildeo determinar a expediccedilatildeo de ofiacutecio aos restaurantes proacuteximos agrave sua casa e determinar tambeacutem a proibiccedilatildeo de que ele fosse servidoatendido

O autor se questiona ainda ldquoSeraacute entatildeo que o Princiacutepio da Dignidade da Pessoa

Humana estaacute de mero enfeite em nossa Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ()rdquo 164 Tendo em vista

que ldquoa decisatildeo em comento viola diretamente o art 5ordm incisos XV LIII e LXIII da

Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ndash falamos do Direito de Ir e Virrdquo 165

Ademais o cancelamento do cartatildeo de creacutedito eacute mais uma forma de constranger e

compelir o executado a cumprir com a obrigaccedilatildeo de qualquer forma natildeo importando o que

precise fazer para conseguir saldar o deacutebito tendo em vista que a referida medida apresenta

162 Ibid sem paginaccedilatildeo 163 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo

pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018

164 Ibid sem paginaccedilatildeo 165 Ibid sem paginaccedilatildeo

61

qualquer adequaccedilatildeo com o fim desejado (reverter em pagamento para o exequente) Os

autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa afirmam que166

Reconhece-se que as razotildees da afirmaccedilatildeo ora questionada satildeo ateacute intuitivas mas eacute plenamente possiacutevel problematiza-las Ora natildeo se encontra qualquer justificativa idocircnea para que o juiz possa cancelar o contrato do executado com a administradora do cartatildeo de creacutedito (ou instituiccedilatildeo financeira) que natildeo tem qualquer relaccedilatildeo com o creacutedito exequendo muito menos como isso poderia impactar positivamente na execuccedilatildeo (senatildeo para pressionar o executado a dispor de bens impenhoraacuteveis) Ademais natildeo foram indicados sequer sinais de que o executado realiza gastos supeacuterfluos com o cartatildeo de creacutedito ndash natildeo que isso justificasse a medida pois o correto seria penhorar os esses bens (se duraacuteveis naturalmente) ao inveacutes de cancelar o cartatildeo de creacutedito

Logo as referidas medidas natildeo possuem qualquer relaccedilatildeo com o atingimento do fim

almejado (o pagamento de quantia) tendo em vista que natildeo haacute uma relaccedilatildeo meiofim entre

tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a

restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia

ao exequente

Dessa forma nota-se que as medidas de suspensatildeo da CNH retenccedilatildeo de passaporte e

bloqueio do cartatildeo de credito satildeo completamente inadequadas agrave realizaccedilatildeo a que se prestam

Afinal ldquotais medidas soam como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-

lo ao cumprimento da ordem judicial ndash e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a

utilizaccedilatildeo dos meios sancionatoacuterios pelo magistrado ()rdquo167

Como exposto em linhas preteacuteritas o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades

de aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e

razoaacutevel se atendo aos criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas

executivas atiacutepicas ao caso concreto sob pena de converter a medida em de indutiva para

punitiva

A utilizaccedilatildeo de medidas atiacutepicas como a suspensatildeo da carteira de motorista e o

passaporte do devedor abandona a regra da responsabilidade patrimonial e atingem em cheio

o nuacutecleo de direitos inerentes agrave condiccedilatildeo humana

166 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

167 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 115

62

O limite para a aplicaccedilatildeo de tais medidas deve ser a Constituiccedilatildeo Federal e sobretudo

os Direitos fundamentais nela expressos ldquoCom efeito natildeo haacute saiacuteda tampouco soluccedilatildeo eficaz

de um problema sem que se respeite a Lei e o Devido Processo Legal (por mais nobres que

sejam as intenccedilotildees)rdquo 168

Dessa forma a busca desenfreada pelo cumprimento das decisotildees judiciais em

especial na fase executiva natildeo pode ser realizada em sacrifiacutecio de direitos fundamentais O

Poder Judiciaacuterio natildeo pode resolver a crise do processo executoacuterio utilizando de medidas

arbitraacuterias com o propoacutesito de satisfazer obrigaccedilotildees pecuniaacuterias

Eis o dilema que se coloca diante do poder geral de efetivaccedilatildeo ele pode servir de

potente instrumento em prol da tutela jurisdicional executiva entretanto se manejado de

modo improacuteprio serviraacute de instrumento de puniccedilatildeo e humilhaccedilatildeo do executado169

Eacute notoacuterio que se amplamente aplicado o poder geral de efetivaccedilatildeo reduziria os

iacutendices de inadimplecircncia quiccedilaacute resolveria por completo a crise da execuccedilatildeo civil Entretanto

o retrocesso civilizatoacuterio seria irreparaacutevel

168 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo

pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018

169 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

63

5 CONCLUSAtildeO

Como funccedilatildeo jurisdicional que tem como objeto a efetivaccedilatildeo de direitos a execuccedilatildeo

deve sempre buscar a maior satisfaccedilatildeo possiacutevel concretizando integralmente o creacutedito do

exequente isto eacute realizando o direito fundamental agrave tutela executiva do credor Por isso a

adoccedilatildeo de meios executivos atiacutepicos incorporados pelo Coacutedigo de Processo Civil de 2015 por

meio do art139 IV em um primeiro momento podem ser consideradas vaacutelidas visto que

servem de instrumento para a satisfaccedilatildeo e asseguraccedilatildeo de direitos do credor

Entretanto para o oacutergatildeo julgador natildeo cometa arbitrariedades em nome do direito

fundamental agrave execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que seja definido certos limites na adoccedilatildeo do poder

geral de efetivaccedilatildeo

As medidas executivas atiacutepicas natildeo podem ser aplicadas de maneira indiscriminada

logo devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o esgotamento das medidas tiacutepicas e

a possibilidade de cumprimento da obrigaccedilatildeo

Partindo dessa premissa as medidas a serem adotadas pelo juiz no caso concreto

devem ter como baliza os princiacutepios da proporcionalidade e da razoabilidade para que natildeo

ultrapassem a responsabilidade patrimonial do devedor e incidida diretamente sobre sua

pessoa

Para que natildeo seja atingida a pessoa do executado ou seja para que o devedor natildeo

tenha sua dignidade humana viola eacute necessaacuterio que a medida atiacutepica seja adequada e

necessaacuteria

Logo o juiz deveraacute sempre estabelecer uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida

executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia

a gerar o resultado sem violar a dignidade humana do executado

Dessa o juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental a execuccedilatildeo e

determinar uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute

necessaacuterio que a medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado

As medidas que ultrapassam esses limites como a decisatildeo que apreendeu o

passaporte suspensatildeo a CNH e bloqueou o cartatildeo de creacutedito do devedor satildeo meramente

punitivas posto que essas natildeo satildeo as medidas mais adequadas para se atingir o fim almejado

pois natildeo existe propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado

64

uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo

geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente

Medidas como esta servem de embasamento para decisotildees arbitraacuterias e autoritaacuterias de

violaccedilatildeo dos direitos fundamentais transformando o poder geral de efetivaccedilatildeo em

instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com autorizaccedilatildeo judicial

Em suma o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades de aplicaccedilatildeo do poder

geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e razoaacutevel se atendo aos

criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao

caso concreto sob pena de punir a pessoa do executado violando a sua dignidade humana

em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo

65

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  • 1 INTRODUCcedilAtildeO
  • 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO
    • 25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO
      • 3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
        • 31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS
          • 311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15
            • 32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
            • 33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
            • 34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
              • 4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
                • 41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
                • 42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
                  • 5 CONCLUSAtildeO
                  • REFEREcircNCIAS
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DIANDRA GRADIN SCHAUN

OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA

ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE

HUMANA DO EXECUTADO

Monografia apresentada ao curso de poacutes-graduaccedilatildeo em Direito Processual Civil da Faculdade Baiana de Direito como requisito para obtenccedilatildeo do grau de especialista em Direito Processual Civil

Salvador

2018

DIANDRA GRADIN SCHAUN

OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA

ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE

HUMANA DO EXECUTADO

Monografia aprovada como requisito para obtenccedilatildeo do grau de Especialista em Direito

Processual Civil pela seguinte banca examinadora

Nome _______________________________________________________________

Titulaccedilatildeo e instituiccedilatildeo __________________________________________________

Nome _______________________________________________________________

Titulaccedilatildeo e instituiccedilatildeo __________________________________________________

Nome _______________________________________________________________

Titulaccedilatildeo e instituiccedilatildeo __________________________________________________

Salvador ______2018

RESUMO

A prestaccedilatildeo jurisdicional natildeo se concretiza depois de encerrada a fase de conhecimento Para

que a referida prestaccedilatildeo se consume eacute necessaacuterio que ocorra a satisfaccedilatildeo do deacutebito pelo

devedor que em grande parte soacute se efetiva atraveacutes da tutela executiva Entretanto a execuccedilatildeo

civil sempre sofreu uma crise quanto a sua efetividade e o Coacutedigo de Processo Civil de 2015

com o escopo de dirimir a ineficiecircncia do instituto concebeu novas diretrizes ao processo

executoacuterio Dessa forma o art 139 IV do Coacutedigo de Processo Civil estabeleceu a

possibilidade de o juiz dispor de todas as medidas necessaacuterias para assegurar o cumprimento

de ordem judicial trazendo como grande inovaccedilatildeo a aplicaccedilatildeo dessas medidas tambeacutem nas

obrigaccedilotildees de pagar quantia Todavia eacute necessaacuterio estabelecer criteacuterios limitadores para que a

adoccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo viole a dignidade humana do executado em nome do

direito fundamental agrave execuccedilatildeo

Palavras-chaves Execuccedilatildeo Poder geral de efetivaccedilatildeo Direito fundamental agrave execuccedilatildeo

Dignidade humana do executado

SUMAacuteRIO

1 INTRODUCcedilAtildeO 5

2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL 7

21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL 7

22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL 8

23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL 11

24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO 17

25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO 20

3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 23

31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS 23

311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15 25

32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO 28

33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO 31

34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 36

4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 48

41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO 48

42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 55

5 CONCLUSAtildeO 63

REFEREcircNCIAS 65

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

Art ndash Artigo

CPC15 ndash Coacutedigo de Processo Civil de 2015

CPC73 ndash Coacutedigo de Processo Civil de 1973

ENFAM ndash Escola nacional de formaccedilatildeo e aperfeiccediloamento de magistrados

HC ndash Habeas Corpus

STJ ndash Superior Tribunal de Justiccedila

5

1 INTRODUCcedilAtildeO

A prestaccedilatildeo jurisdicional natildeo costuma se findar apoacutes o encerramento da fase cognitiva

com a prolaccedilatildeo de uma sentenccedila de meacuterito Para que a referida prestaccedilatildeo se concretize eacute

imperioso que haja a satisfaccedilatildeo do deacutebito pelo devedor

Entretanto observa-se em diversos casos o inadimplemento da parte passiva

processual sendo necessaacuterio desenvolver a atividade executiva A referida atividade possui o

escopo de satisfazer direitos

Isso porque o processo natildeo eacute um fim em si mesmo sendo apenas um exerciacutecio da

jurisdiccedilatildeo estatal Dessa forma a razatildeo de ser do processo eacute o atingimento da sua finalidade

almejada que eacute a prestaccedilatildeo da tutela jurisdicional

Todavia como a tutela jurisdicional configura-se na obrigaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio

proteger e reparar os direitos lesionados ou ameaccedilados de lesatildeo muitas vezes a dita tutela

somente consegue ser efetivada atraveacutes da atividade executiva da jurisdiccedilatildeo

Ocorre que a execuccedilatildeo civil sempre foi o ldquocalcanhar de Aquilesrdquo do sistema

processual e de modo geral vinha sofrendo uma crise quanto a sua efetividade Ou seja o

credor obtia ecircxito na fase de conhecimento entretanto natildeo conseguia alcanccedilar o seu direito a

prestaccedilatildeo reconhecida na fase de execuccedilatildeo

Com o fito de tornar a atividade satisfativa mais eficiente e mais ceacutelere o Coacutedigo de

Processo Civil de 2015 concebeu novas diretrizes ao processo no sentindo de harmonizar

suas com os ditames da Constituiccedilatildeo Federal principalmente com os direitos fundamentais

As normas fundamentais do processo civil trazidas pelo CPC15 preocupam-se

primordialmente com a efetividade da tutela jurisdicional

Em conformidade com essa nova sistemaacutetica o legislador no art 139 IV do Coacutedigo

de Processo Civil estabeleceu a possibilidade de o juiz dispor de todas as medidas indutivas

coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o cumprimento de

ordem judicial trazendo como grande novidade a aplicaccedilatildeo dessas medidas executoacuterias

atiacutepicas tambeacutem nas obrigaccedilotildees de pagar dinheiro

6 Entretanto natildeo haacute na legislaccedilatildeo criteacuterios especiacuteficos que auxiliem o oacutergatildeo julgador na

escolha das medidas executivas atiacutepicas que se adotadas sem qualquer baliza podem

acarretar consequecircncias juriacutedicas irreparaacuteveis

Como a famosa decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de

Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-1320138260011 Nessa accedilatildeo

que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo

pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a suspensatildeo da

Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o passaporte e

cancelou os cartotildees de creacutedito como forma de compeli-lo a adimplir com o deacutebito

Decisotildees como esta geram conflitos entre direitos constitucionalmente instituiacutedos De

um lado o direito fundamental agrave tutela jurisdicional e de outro os direitos e garantias

inerentes a todos os indiviacuteduos

Dessa forma a presente monografia tem como escopo de estabelecer criteacuterios

limitadores para que a adoccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo viole a dignidade humana do

executado em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo

7 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO

CIVIL

21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL

A Execuccedilatildeo Civil nasce a partir do direito a uma prestaccedilatildeo conferida a algueacutem de

exigir de outrem o cumprimento de uma conduta de fazer natildeo fazer ou de dar (dinheiro ou

coisa distinta) 1

Para que o direito a uma prestaccedilatildeo se concretize no mundo fiacutesico eacute necessaacuterio que

haja a satisfaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida pelo sujeito passivo Caso contraacuterio fala-se em

inadimplemento ou lesatildeo O titular do direito natildeo tem como agir por si para efetivar o seu

direito a prestaccedilatildeo posto que a autotutela eacute vedada no ordenamento juriacutedico Dessa forma eacute

necessaacuterio que se recorra ao Poder Judiciaacuterio para que se possa ter a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo

devida logo a tutela jurisdicional executiva2

O processualista Fredie Didier et al3 equaciona essa questatildeo da seguinte maneira

Quando se pensa em tutela executiva pensa-se na efetivaccedilatildeo de direitos a uma prestaccedilatildeo fala-se de um conjunto de meios para efetivar a prestaccedilatildeo devida fala-se em execuccedilatildeo de fazer natildeo-fazer dar exatamente os trecircs tipos de prestaccedilatildeo existentes Natildeo eacute por acaso nem por coincidecircncia que a tutela executiva pressupotildee inadimplemento (CPC art 786) - fenocircmeno exclusivo dos direitos a uma prestaccedilatildeo Eacute por isso tambeacutem que se pode falar em prescriccedilatildeo da execuccedilatildeo (CPC art 802 e suacutemula do STF n 150) - prescriccedilatildeo eacute fenocircmeno juriacutedico que se relaciona aos direitos a uma prestaccedilatildeo A execuccedilatildeo forccedilada dirige-se ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo Essa relaccedilatildeo entre direito material e processo eacute fundamental para a compreensatildeo do fenocircmeno executivo

Nesse iacutenterim para o Ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux4 ldquoexecutar eacute

satisfazerrdquo ao passo que o professor Fredie Didier et al5 formulou um conceito mais amplo

ldquoExecutar eacute satisfazer uma prestaccedilatildeo devida A execuccedilatildeo pode ser espontacircnea quando o

devedor cumpre voluntariamente a prestaccedilatildeo ou forccedilada quando o cumprimento da prestaccedilatildeo

eacute obtido por meio de atos executivos pelo Estadordquo

1 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 41 2 Ibid p 42 3 Ibid p 42 4 FUX Luiz Curso de direito processual civil Rio de Janeiro Forense 2001 p 980 5 DIDIER JR Fredie et al Op Cit p 45

8 Dessa forma a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional responsaacutevel pela

concretizaccedilatildeo de um direito subjetivo no plano material obtendo resultado idecircntico ou

equivalente ao atingiacutevel se o devedor cumprisse espontaneamente a prestaccedilatildeo

Todavia essa atividade jurisdicional soacute cabe quando o devedor se recusa a cumprir

com a obrigaccedilatildeo quebrando a expectativa do credor de receber o que lhe eacute devido Por esta

razatildeo que se diz que a execuccedilatildeo civil eacute ldquoforccediladardquo 6

Eacute o que se conclui seguindo os ensinamentos de Leonardo Greco7 para ele execuccedilatildeo eacute

uma

() modalidade de tutela jurisdicional que consiste na praacutetica pelo juiz (ou por outrem sob a sua supervisatildeo) de uma seacuterie de atos coativos concretos sobre o devedor e sobre o seu patrimocircnio a fim de agrave custa dele e independentemente do concurso da sua vontade tornar efetivo o cumprimento de prestaccedilatildeo por ele inadimplida desde que tais atos coativos estejam previamente constituiacutedos em lei

Portanto a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional que tem como escopo obter o

cumprimento de uma prestaccedilatildeo certa e inadimplida mediante atos coativos sobre o devedor e

seus bens

22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL

Vislumbrado o conceito de execuccedilatildeo civil cabe agora empreender a sua classificaccedilatildeo

tendo em vista que a execuccedilatildeo pode se manifestar de diversas formas possuindo diferentes

caracteriacutesticas em cada uma das suas modalidades

Inicialmente cabe destacar que haacute duas teacutecnicas processuais para viabilizar a execuccedilatildeo

civil lato sensu eacute a que divide em processo autocircnomo de execuccedilatildeo e em fase de execuccedilatildeo

dependendo do tiacutetulo executivo que justifica o exerciacutecio da atividade satisfativa

O Coacutedigo Processual Civil de 2015 acertadamente ratificou as reformas promovidas

no CPC73 que consagrava a opccedilatildeo legislativa de oferecimento das tutelas de certificaccedilatildeo e

efetivaccedilatildeo do direito em um mesmo processo Dessa forma as execuccedilotildees de sentenccedilas

6 BASTOS Luiz Fernando Pereira O artigo 139 IV do novo Coacutedigo de Processo Civil a atipicidade

dos meios executivos na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia certa Brasiacutelia 2017 Disponiacutevel em lt httpbdmunbbrbitstream104831866812017_LuizFernandoPereiraBastospdf gt Acesso em 06 de agosto de 2018

7 BASTOS Luiz Fernando Pereira apud GRECO Leonardo O processo de execuccedilatildeo Rio de Janeiro Renovar 1999 p 164

9

passaram a ser uma fase complementar ao de processo de conhecimento e natildeo mais ocorrer

em um processo autocircnomo

No entendimento do professor processualista Fredie Didier et al8 o processo

sincreacutetico simplificou a efetivaccedilatildeo de um direito reconhecido em sentenccedila

A dispensa do ajuizamento de um processo autocircnomo para execuccedilatildeo de sentenccedila natildeo soacute veio diminuir o tempo necessaacuterio agrave prestaccedilatildeo da tutela jurisdicional - afinal o credor natildeo mais precisaria tal como ocorria ateacute entatildeo promover nova citaccedilatildeo pessoal do reacuteudevedor- como tambeacutem veio romper de vez com um velho paradigma segundo o qual a atividade executiva estaria dissociada da precedente atividade jurisdicional cognitiva

Entretanto natildeo soacute as sentenccedilas de meacuterito ensejam uma execuccedilatildeo Por esta razatildeo foi

necessaacuterio manter o processo autocircnomo de execuccedilatildeo para os casos em que o credor tem a seu

favor um documento que natildeo tenha sido proferido por um oacutergatildeo dotado de jurisdiccedilatildeo

Consequentemente se for o titulo executivo judicial o caminho natural eacute o do

cumprimento de sentenccedila Sendo por sua vez extrajudicial o titulo executivo o caminho

correto eacute o processo de execuccedilatildeo

Cabe ainda salientar que toda execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial eacute definitiva Jaacute a

execuccedilatildeo de tiacutetulo judicial (cumprimento de sentenccedila) pode ser definitiva ou provisoacuteria

No primeiro caso isto eacute cumprimento de sentenccedila definitivo ldquoeacute a execuccedilatildeo completa

que vai ateacute a fase final (com a entrega do bem da vida) sem exigecircncias adicionais para o

exequenterdquo 9

Quanto ao segundo caso ldquoo cumprimento provisoacuterio de sentenccedila (fundada em tiacutetulo

provisoacuterio) eacute aquele que exige alguns requisitos extras para que se chegue agrave fase final da

execuccedilatildeordquo 10

Para Fredie Didier11 o criteacuterio para definir se o cumprimento de sentenccedila seraacute

definitivo ou provisoacuterio

() eacute a estabilidade do tiacutetulo executivo em que se funda a execuccedilatildeo se se tratar de decisatildeo acobertada pela coisa julgada material o cumprimento de sentenccedila eacute

8 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 46 9 Ibid p 57 10 Ibid p 57 11 Ibid p 57

10

definitivo se se tratar de decisatildeo judicial ainda passiacutevel de alteraccedilatildeo (reforma ou invalidaccedilatildeo) em razatildeo da pendecircncia de recurso contra ela interposto a que natildeo tenha sido atribuiacutedo efeito suspensivo o cumprimento de sentenccedila eacute provisoacuterio

Ademais a execuccedilatildeo se distingue em procedimentos executivos comuns que satildeo da

execuccedilatildeo civil e que servem a uma generalidade de creacuteditos como eacute o caso do cumprimento

de sentenccedila e o processo de execuccedilatildeo E em procedimentos executivos especiais que servem

agrave satisfaccedilatildeo de creacuteditos peculiares como a execuccedilatildeo de alimentos e a execuccedilatildeo fiscal 12

Por fim cabe mencionar a classificaccedilatildeo que distingue a execuccedilatildeo em direta e indireta

A primeira execuccedilatildeo direita (ou execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo) eacute ldquo() aquela em que o

Poder Judiciaacuterio prescinde da colaboraccedilatildeo do executado para a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida

e pois promove uma substituiccedilatildeo da sua conduta pela conduta do proacuteprio Estado-juiz ou de

terceirordquo 13 Ou seja as medidas executivas satildeo levadas a efeito mesmo contra a vontade do

devedor na execuccedilatildeo direta

Segundo a doutrina a execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo se subdivide da seguinte forma

meios de desapossamento meios de transformaccedilatildeo e meios de expropriaccedilatildeo

Os meios de desapossamento muito comuns nas execuccedilotildees para entrega de coisa eacute a

forma ldquopor meio da qual se retira da posse do executado o bem a ser entregue ao exequente

(p ex despejo busca e apreensatildeo reintegraccedilatildeo de posse)rdquo 14 Ao passo que por meio dos de

transformaccedilatildeo ldquo() o juiz determina que um terceiro pratique a conduta que deveria ser

praticada pelo executado cabendo a este arcar com o pagamento do custo respectivordquo 15 Jaacute

os meios executivos de expropriaccedilatildeo eacute a forma ldquopor meio do qual algum bem do patrimocircnio

do devedor eacute expropriado para pagamento do creacutedito (adjudicaccedilatildeo alienaccedilatildeo judicial ou

apropriaccedilatildeo de frutos e rendimentos de empresa ou de estabelecimentos e de outros bens art

825 CPC)rdquo 16

12 Ibid p 48 13 Ibid p 50 14 Ibid p 51 15 Ibid p 51 16 Ibid p 51

11 Jaacute a execuccedilatildeo indireta (ou mandamental) atua ldquo() na vontade do devedor como forma

de compeli-lo ou incentivaacute-lo a cumprir a ordem judicialrdquo 17 Nesse entendimento ainda

leciona Fredie Didier et al 18

Nesses casos o Estado-juiz busca promover a execuccedilatildeo com a colaboraccedilatildeo do executado forccedilando ou incentivando a que ele proacuteprio cumpra a prestaccedilatildeo devida Em vez de o Estado-juiz tomar as providecircncias que deveriam ser tomadas pelo executado o Estado forccedila por meio de coerccedilatildeo psicoloacutegica ou de promessa de recompensa judicial a que o proacuteprio executado cumpra a prestaccedilatildeo

A execuccedilatildeo indireta pode ser patrimonial como por exemplo a imposiccedilatildeo de multa

coercitiva ou pessoal com a prisatildeo civil do devedor de alimentos Ademais adiciona Didier

et al19que

O estiacutemulo ao cumprimento da prestaccedilatildeo pode dar-se pelo temor (p ex multa coercitiva prisatildeo civil do devedor de alimentos divulgaccedilatildeo de notiacutecia em jornal revelando o descumprimento) ou pelo incentivo (p ex a chamada sanccedilatildeo premial ou sanccedilatildeo positiva de que eacute exemplo a isenccedilatildeo do pagamento de custas em caso de cumprimento do mandado monitoacuterio - art 701 sect 1ordm CPC a reduccedilatildeo pela metade dos honoraacuterios advocatiacutecios fixados inicialmente pelo juiacutezo em caso de pagamento integral do deacutebito pecuniaacuterio na execuccedilatildeo por quantia certa fundada em tiacutetulo extrajudicial - art 827 sect 1ordm CPC)

Por tais razotildees haacute uma tendecircncia em cada vez mais prestigiar os meios executivos

indiretos (coercitivos) posto que satildeo tatildeo eficazes quanto os meios executivos diretos

entretanto menos onerosos Contudo sua aplicaccedilatildeo deve ser fiscalizada a fim de natildeo permitir

que a execuccedilatildeo civil perca sua finalidade visto que eacute uma funccedilatildeo jurisdicional que tem como

escopo efetivar o direito do credor e natildeo de atender os interesses do devedor

23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL

Os princiacutepios juriacutedicos nos uacuteltimos anos passaram a ser munidos de forccedila cogente

normatizando as condutas humanas tanto quanto as regras juriacutedicas Os ditos princiacutepios

ampliaram as margens de atuaccedilatildeo dos aplicadores do direito possibilitando a construccedilatildeo de

soluccedilotildees mais adequadas agraves especificidades das demandas que chegam ao judiciaacuterio

17 Ibid p 51 18 Ibid p 51 19 Ibid p 51-52

12 Dessa forma eacute necessaacuterio aprofundar-se nos princiacutepios norteadores da execuccedilatildeo civil

para que se obtenha uma anaacutelise completa da teoria geral da execuccedilatildeo

A execuccedilatildeo civil tem como um dos seus corolaacuterios o princiacutepio da efetividade este

consiste na exigecircncia de um sistema completo de tutela executiva no qual existam meios

executivos capazes de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor

de tutela executivardquo 20

O referido princiacutepio da efetividade eacute reforccedilado como normal fundamental do processo

civil brasileiro pelo art 4ordm do CPC ldquoArt 4ordm As partes tecircm o direito de obter em prazo razoaacutevel

a soluccedilatildeo integral do meacuterito incluiacuteda a atividade satisfativa

Jaacute o princiacutepio da boa feacute processual corolaacuterio do devido processo legal estaacute previsto

no art 5ordm do CPC ldquoAquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de

acordo com a boa-feacuterdquo Segundo o processualista baiano Fredie Didier21

O princiacutepio da boa-feacute extrai-se de uma claacuteusula geral processual A opccedilatildeo por uma claacuteusula geral de boa-feacute eacute a mais correta Eacute que a infinidade de situaccedilotildees que podem surgir ao longo do processo torna pouco eficaz qualquer enumeraccedilatildeo legal exaustiva das hipoacuteteses de comportamento desleal Daiacute ser correta a opccedilatildeo da legislaccedilatildeo brasileira por uma norma geral que impotildee o comportamento de acordo com a boa-feacute Em verdade natildeo seria necessaacuteria qualquer enumeraccedilatildeo das condutas desleais o art 5deg do CPC eacute bastante exatamente por tratar-se de uma claacuteusula geral

Dessa forma o dito princiacutepio preconiza que diante de um vinculo juriacutedico as pessoas

envolvidas natildeo poderatildeo frustrar a confianccedila do outro devendo comportar-se como se pode

esperar de uma pessoa de boa-feacute

Ademais disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial que ldquosomente o

patrimocircnio do devedor (art 789 CPC) ou de terceiro responsaacutevel pode ser objeto da

atividade executiva do Estadordquo 22

O referido princiacutepio que determina que somente o patrimocircnio submete-se agrave execuccedilatildeo

e natildeo a pessoa foi trazido pela humanizaccedilatildeo do direito Para o professor Didier et al23 o

20 DIDIER JR Freddie et al apud GUERRA Marcelo Lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do

credor na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 21 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte

geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 105 22 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 68

13

desenvolvimento dos meios de execuccedilatildeo indireta ldquoparece relativizar um pouco esse princiacutepio

na medida em que pressionam psicologicamente a pessoa do devedor para que cumpra a

obrigaccedilatildeo com seu comportamentordquo

Complementa ainda que

A responsabilidade executiva parece assumir atualmente caraacuteter hiacutebrido comportando coerccedilatildeo pessoal e sujeiccedilatildeo patrimonial

i) a coerccedilatildeo pessoal incide sobre a vontade do devedor admitindo o uso de medidas coercitivas de execuccedilatildeo indireta para forccedilaacute-lo a cumprir a obrigaccedilatildeo com seu proacuteprio comportamento (ex arts 139 rv 523 sect 1ordm 536 sect 1ordm e 538 sect 3ordm todos do CPC)

ii) descumprida a obrigaccedilatildeo e natildeo sendo possiacuteveladequado o uso de teacutecnica de coerccedilatildeo pessoal tem-se a sujeiccedilatildeo patrimonial que recairaacute sobre os bens do devedor ou de terceiro responsaacutevel - que responderatildeo pela proacutepria prestaccedilatildeo in natura (ex dar coisa ou entregar quantia) ou por perdas e danos24

Dessa forma o referido princiacutepio natildeo tem aplicaccedilatildeo absoluta em razatildeo do principio da

efetividade a qual estimula o uso dos meios de coerccedilatildeo indireta para garantir o cumprimento

da obrigaccedilatildeo pelo devedor

O princiacutepio da primazia da tutela especifica (ou princiacutepio do resultado) assevera que

ldquoA execuccedilatildeo deve ser especiacutefica propiciar ao credor a satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo tal qual

houvesse o cumprimento espontacircneo da prestaccedilatildeo pelo devedorrdquo 25

O CPC de 2015 absorveu todos os avanccedilos legislativos a cerca do mote O caput do

art 497 assegura que na accedilatildeo que tenha por objeto a prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer o

juiz se procedente o pedido concederaacute a tutela especiacutefica ou determinaraacute providecircncias que

assegurem a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico equivalente O art 499 o

complementa a obrigaccedilatildeo somente seraacute convertida em perdas e danos se o autor o requerer

ou se impossiacutevel agrave tutela especiacutefica ou a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico

equivalente

O princiacutepio do contraditoacuterio eacute garantido pela constituiccedilatildeo federal e compreende o

direito de ser ouvido o direito de acompanhar os atos processuais o direito de produzir

provas participar da sua produccedilatildeo manifestar-se sobre a prova produzida e obter do juiz a

23 Ibid p 69-70 24 Ibid p 70 25 Ibid p 71

14

respectiva valoraccedilatildeo o direito de ser informado regularmente dos atos praticados no processo

o direito agrave motivaccedilatildeo das decisotildees o direito de impugnar as decisotildees 26

O contraditoacuterio tem aplicaccedilatildeo em todo processo judicial sendo aplicaacutevel tambeacutem na

execuccedilatildeo No entanto o contraditoacuterio na execuccedilatildeo natildeo ocorre com a mesma intensidade que

no processo ou na fase de conhecimento eacute o que assevera Didier et al 27

O contraditoacuterio no procedimento executivo no aspecto do direito de defesa assegurado agrave parte demandada eacute eventual porquanto depende da provocaccedilatildeo do executado que natildeo eacute chamado ajuiacutezo para defender-se mas sim para cumprir a obrigaccedilatildeo O procedimento executivo adota a teacutecnica monitoacuteria que consiste basicamente na inversatildeo do ocircnus de provocar o contraditoacuterio o reacuteu em vez de citado para manifestar-se sobre a pretensatildeo do autor eacute convocado para cumprir uma determinada obrigaccedilatildeo

Logo haacute o contraditoacuterio no procedimento executivo porem eacute eventual quanto agrave defesa

do executado

Ademais o princiacutepio da menor onerosidade eacute consagrado pelo art 805 do CPC e

dispotildee que ldquoQuando por vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz

mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o executadordquo O referido princiacutepio tem o

escopo de impedir o abuso do direito pelo exequente

O principio da menor onerosidade auxilia o juiz na escolha de um meio executivo

adequado e necessaacuterio que satisfaccedila a prestaccedilatildeo exigida pelo credor Nesse sentido eacute o

entendimento do professor Fredie Didier et al 28

O resultado a ser alcanccedilado eacute aquele estabelecido pelo direito material A maneira de se chegar ateacute esse resultado eacute que deve ser a menos onerosa possiacutevel para o executado Isso significa que a opccedilatildeo pelo meio menos gravoso pressupotildee que os diversos meios considerados sejam igualmente eficazes Assim havendo vaacuterios meios executivos aptos agrave tutela adequada e efetiva do direito de creacutedito escolhe-se a via menos onerosa ao executado

O princiacutepio visa impedir a execuccedilatildeo desnecessariamente onerosa ao executado ou seja a execuccedilatildeo abusiva Em vez de enumerar situaccedilotildees em que a opccedilatildeo mais gravosa revelar-se-ia injusta o legislador valeu-se corretamente de uma claacuteusula geral para reputar abusivo qualquer comportamento do credor que pretender valer-se de meio executivo mais oneroso do que outro igualmente idocircneo agrave satisfaccedilatildeo do seu creacutedito

26 Ibid p 76 27 Ibid p 78 28 Ibid p 79-80

15 O princiacutepio da cooperaccedilatildeo tem como base os princiacutepios do devido processo legal da

boa-feacute processual e do contraditoacuterio O dito princiacutepio avigora a eacutetica processual com o

aprimoramento do diaacutelogo entre as partes reciprocamente e com o oacutergatildeo jurisdicional Eacute o

que preconiza o art 6ordm do CPC Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para

que se obtenha em tempo razoaacutevel decisatildeo de meacuterito justa e efetiva

No procedimento executivo o princiacutepio da cooperaccedilatildeo incide de diversas formas

disciplina Didier et al29 que na execuccedilatildeo

O executado tem o dever de indicar bens agrave penhora (art 774 V CPC) Natildeo encontrados bens penhoraacuteveis e natildeo havendo indicaccedilatildeo de qualquer um deles pelo exequente cabe ao executado declarar quais satildeo seus bens penhoraacuteveis sob pena de se sujeitar a uma sanccedilatildeo pecuniaacuteria compulsoacuteria

Tambeacutem eacute manifestaccedilatildeo do princiacutepio da cooperaccedilatildeo a exigecircncia de que o executado que pretende impugnar o valor da execuccedilatildeo apresente de logo o valor que reputa devido (art 525 sect 4ordm CPC) Seria comportamento natildeo-cooperativo afirmar que a cobranccedila eacute excessiva sem simultaneamente dizer qual eacute o valor correto

Demais disso aplicam-se agrave execuccedilatildeo os deveres que decorrem do princiacutepio da cooperaccedilatildeo e que satildeo imputados ao oacutergatildeo jurisdicional () Assim por exemplo deve o juiz advertir ao executado antes de puni-lo de que seu ato pode vir a caracterizar-se como atentatoacuterio agrave dignidade da jurisdiccedilatildeo ( art 772 II CPC) perceba que se trata de uma conduta compatiacutevel com o dever de prevenccedilatildeo O oacutergatildeo jurisdicional somente pode conhecer da prescriccedilatildeo ex officio dando a oportunidade de o exequente manifestar-se conforme impotildee o dever de consulta ( cf arts 10 487 paraacutegrafo uacutenico e 921 sect 5ordm CPC)

O princiacutepio ou postulado30 da proporcionalidade tem aplicaccedilatildeo muito relevante na

execuccedilatildeo O art 8 do CPC assegura que o oacutergatildeo jurisdicional tem o dever de observar a

proporcionalidade e a razoabilidade ao aplicar o ordenamento juriacutedico inclusive no

procedimento executivo

Ademais o art 805 do CPC eacute categoacuterico ao disciplinar que ldquoArt 805 Quando por

vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo

menos gravoso para o executadordquo O referido artigo jaacute se trata de uma concretizaccedilatildeo da

proporcionalidade

29 Ibid p 82 30 Segundo Fredie Didier et al haacute uma discussatildeo doutrinaacuteria sobre a proporcionalidade Parte da

doutrina acredita que a proporcionalidade eacute um princiacutepio e outra parte acredita que eacute um postulado normativo

16 O principio da adequaccedilatildeo pode ser vislumbrado em dois momentos do Direito

Processual ldquoa) no legislativo como orientador da confecccedilatildeo das leis b) no jurisdicional

autorizando ao juiz diante do caso concreto adaptar procedimento agraves suas peculiaridadesrdquo 31

Para Luceacutelia de Sena Alves e Tiago Retes32

Isso quer dizer que no momento legislativo o devido processo deve ser observado pelo legislador para a confecccedilatildeo das normas de direito processual que iratildeo servir de instrumento efetivo de concretizaccedilatildeo do direito substancial a ser tutelado atendendo a todas as suas finalidades sob pena de falecircncia do proacuteprio direito No momento jurisdicional da mesma forma a via processual escolhida pelo autor tambeacutem deve estar sujeita a este princiacutepio para que natildeo sofra as mesmas consequecircncias da sua inobservacircncia

O ordenamento juriacutedico deve ser aplicado por meio da teacutecnica processual adequada

evitando dessa forma uma tutela ineficaz

Por fim o princiacutepio do autorregramento da vontade na execuccedilatildeo tem o objetivo de

ldquo() preservar um espaccedilo processual para o exerciacutecio da liberdade e da vontade em que

sejam permitidas negociaccedilotildees que envolvam as partes ndash e tambeacutem o juizrdquo33 Didier et al34

assevera que

A rigor o legislador estabelece um regime juriacutedico de autorregramento da vontade processual identificando-se algumas manifestaccedilotildees relevantes para a execuccedilatildeo Na verdade pode-se dizer que poucos satildeo os ambientes mais propiacutecios do que a execuccedilatildeo para a negociaccedilatildeo sobre o processo Todos os institutos e normas processuais relativos agrave execuccedilatildeo devem ser repensados a partir da premissa de que o CPC permite uma ampla margem de liberdade de negociaccedilatildeo sobre o processo (art 190 CPC)

O autorregramento da vontade pode ser vislumbrando na previsatildeo de negoacutecios tiacutepicos

em sede de execuccedilatildeo como por exemplo no acordo das partes sobre o valor do bem que

dispensa a avaliaccedilatildeo disposto no inciso I do art 871 CPC Ademais dentro dos limites do art

190 do CPC eacute possiacutevel na execuccedilatildeo a atribuiccedilatildeo da negociaccedilatildeo atiacutepica aos sujeitos 31 ALVES Luceacutelia de Sena Alves RETES Tiago O poder geral de efetivaccedilatildeo das decisotildees judiciais e

proporcionalidade uma anaacutelise criacutetica acerca do art 139 IV do Novo Coacutedigo de Processo Civil Disponiacutevel em lthttpswwwacademiaedu31752652O_poder_geral_de_efetivaC3A7C3A3o_das_decisC3B5es_judiciais_e_a_proporcionalidade_uma_anC3A1lise_crC3ADtica_acerca_do_art_139_IV_do_Novo_CC3B3digo_de_Processo_Civil gt Acesso em 25 de julho de 2018

32 Ibid natildeo paginado 33 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 85 34 Ibid p 85

17

processuais permitindo que sejam feitas mudanccedilas nos procedimentos e nas situaccedilotildees

juriacutedicas processuais ldquoSatildeo exemplos de negoacutecios processuais atiacutepicos na execuccedilatildeo pacto de

penhorabilidade acordo de ampliaccedilatildeo de prazos das partes de qualquer natureza acordo de

rateio de despesas processuais ()rdquo35

24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO

Sempre houve diversos questionamentos quanto agrave eficaacutecia do Direito processual Civil

e se o mesmo era meio apto a assegurar a tutela jurisdicional dos direitos dos cidadatildeos O

processo de execuccedilatildeo eacute o setor que sofre mais criacuteticas quanto a sua ineficiecircncia afinal a

execuccedilatildeo civil sempre foi o ldquocalcanhar de Aquilesrdquo do sistema processual pela praxe do

ldquoganhou (no processo de conhecimento) mas natildeo levou (na fase de cumprimento ou

execuccedilatildeo)rdquo 36

Essa dificuldade de se efetivar a tutela satisfastiva natildeo se resume a um problema de

mera teacutecnica processual tiacutepico de determinado ordenamento mas representa uma prova de

fogo da capacidade dos instrumentos jurisdicionais O autor Leonardo Greco37 no ano de

2005 atribuiu esse fato as seguintes causas o excesso de processos o custo e a morosidade da

justiccedila a inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios a ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais

um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico e a progressiva volatizaccedilatildeo dos bens

Quanto ao excesso de processos o referido autor aduz que ldquonos grandes centros o

crescimento da maacutequina judiciaacuteria natildeo acompanhou a expansatildeo do nuacutemero de litiacutegiosrdquo 38

O custo e morosidade da justiccedila prejudicam a tutela satisfativa posto que

ldquojaacute desfalcado pelo inadimplemento do devedor o credor ainda tem de arcar com o adiantamento das despesas do processo de execuccedilatildeo e de eventual liquidaccedilatildeo vendo arrastar-se a marcha dos atos executoacuterios facilmente retardada por atos procrastinatoacuterios do devedorrdquo 39

35 Ibid p 86 36 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca

para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018

37 GRECCO Leonardo A Crise do Processo de Execuccedilatildeo in Estudos de direito processual Leonardo Greco ndash Campos dos Goytacazes Ed Faculdade de Direito de Campos 2005 p 7

38 Ibid p 7 39 Ibid p 7-8

18 A inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios contribui para a crise do processo de

execuccedilatildeo tendo em vista que

ldquoo juiz da execuccedilatildeo prisioneiro de ritos que o distanciam das partes e da realidade da vida impulsiona sem qualquer apetite a execuccedilatildeo conduzindo-a ao sabor dos ventos das provocaccedilotildees impacientes do credor e das costumeiras procrastinaccedilotildees do devedorrdquo 40

Jaacute ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais atrapalha a efetivaccedilatildeo da tutela satisfativa ldquoo

devedor natildeo colabora com a execuccedilatildeo e os meios de pressatildeo que a lei estabelece natildeo satildeo

suficientes para intimidaacute-lordquo 41

Com um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico

O espiacuterito empresarial e a sociedade de consumo estimulam o endividamento das pessoas e o inadimplemento das obrigaccedilotildees pelo devedor deixou de ser vexatoacuterio e reprovaacutevel o que multiplica as accedilotildees de cobranccedila e execuccedilotildees atraveacutes das quais o sujeito passivo ainda usufrui vantagens agraves custas do credor 42

Por fim Leonardo Greco elenca a volatizaccedilatildeo dos bens como o uacuteltimo fator que

macula o processo executo tendo em vista que

ldquomudou inteiramente o perfil patrimonial das pessoas antes concentrado em bens de raiz e agora tendencialmente dirigido a investimentos em tiacutetulos e valores facilmente negociaacuteveis o que dificulta a sua localizaccedilatildeo pelo credorrdquo 43

O Coacutedigo de Processo Civil de 1973 introduziu o sistema executivo ao ordenamento

juriacutedico paacutetrio e seguindo os valores liberais da eacutepoca com a proteccedilatildeo de esfera juriacutedica de

liberdade do cidadatildeo contra a possibilidade de arbiacutetrio do Estado e uso indevido do Poder

jurisdicional outorgou o miacutenimo de poder ao juiz Seguindo as regras do CPC de 73 o

devedor soacute poderia ter sua esfera juriacutedica invadida atraveacutes de meios de execuccedilatildeo instituiacutedos

previamente em lei

Diante de tantos obstaacuteculos para se efetivar a tutela satisfativa a execuccedilatildeo estava

fadada ao fracasso o que frustrava a expectativa do jurisdicionado a uma prestaccedilatildeo da tutela

jurisdicional ceacutelere e efetiva Insatisfeitos com o cenaacuterio que se encontrava a atividade

40 Ibid p 8 41 Ibid p8 42 Ibid p 8 43 Ibid p8

19

executiva legisladores e operadores do direito natildeo mediram esforccedilos para promover uma

evoluccedilatildeo significativa buscando mais eficiecircncia e celeridade ao procedimento executoacuterio

Dessa forma no final de 1994 foi introduzido no coacutedigo de processo agrave flexibilizaccedilatildeo

dos poderes executoacuterios do juiz ldquopara que ele pudesse prestar uma tutela efetiva aos direitos

ficando autorizado a determinar a modalidade de execuccedilatildeo adequada a cada hipoacutetese nas

obrigaccedilotildees de fazer e natildeo fazer (art 461 sect5ordm do CPC de 1973)rdquo No ano de 2002 a referida

medida foi estendida para as obrigaccedilotildees de entregar coisa (art 461-A caput e sect3ordm do CPC de

1973)

Com fundamento nos artigos 461 e 461-A em 2005 a Lei nordm 11 23205 unificou o

processo de conhecimento e o processo de execuccedilatildeo de sentenccedila Nesse sentido Maacuterio

Henrique Cavalcanti Gil Rodrigues44 aduz que

A Lei 112322005 reuniu de forma definitiva os processos de conhecimento e de execuccedilatildeo em um uacutenico processo composto por um sistema bifaacutesico Assim passa a existir uma fase inicial (de reconhecimento) e uma fase posterior (de cumprimento de sentenccedila de efetivaccedilatildeo da decisatildeo definitiva) sem contar com a eventual fase intermediaacuteria de liquidaccedilatildeo (RODRIGUES 2010 p 38)

Ademais as alteraccedilotildees realizadas no CPC de 73 inseriu a atipicidade dos meios

executivos nas obrigaccedilotildees de fazer natildeo fazer e dar coisa certa entretanto exercendo papel

subsidiaacuterio aos meios tiacutepicos

Quanto agraves obrigaccedilotildees de pagar quantia havia apenas a possibilidade de se valer da

incidecircncia de multa do art 475-J do CPC de 73 ndash implementada mediante reforma perpetrada

pela Lei nordm 11232 de 2005 em atendimento a doutrina processualista preocupada com a

efetividade das decisotildees ndash e de atos executivos como a penhora de bens e dinheiro

Ainda que a execuccedilatildeo tenha avanccedilado com a inserccedilatildeo das leis posteriores a 1994 no

CPC de 1973 a mesma continuava insuficiente tendo em vista que a burocracia e lentidatildeo

dos atos executivos davam brechas para que o devedor escondesse seu patrimocircnio penhoraacutevel

tornando carente de efetividade e celeridade agrave execuccedilatildeo

44 RODRIGUES Maacuterio Henrique Cavalcanti Gil A evoluccedilatildeo da execuccedilatildeo de sentenccedila no direito

processual civil e o novo regime juriacutedico das sentenccedilas apoacutes a reforma implementada pela Lei 112322005 Revista do Tribunal Regional Federal da 1ordf Regiatildeo v 22 n 2 fev 2010 p 38

20

25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO

A tutela juridiscional eacute um direito fundamental previsto no art 5ordm inciso XXXV da

Carta Magna ldquo() a lei natildeo excluiraacute da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio lesatildeo ou ameaccedila a

direitordquo

Na visatildeo claacutessica o direito de accedilatildeo era efetivado com a prolaccedilatildeo de uma sentenccedila de

meacuterito posiccedilatildeo adotada por grande parte dos processualistas seguidores da doutrina de

Liebman Todavia esse conceito se mostra defasado tendo em vista que o direito de acesso agrave

justiccedila natildeo eacute apenas uma garantia formal de bater as portas do judiciaacuterio mas a garantia de

acesso agrave ordem juriacutedica justa adequada e eficaz45

Acreditar que uma sentenccedila de meacuterito favoraacutevel eacute tutela jurisdicional suficiente para

satisfazer o que se busca com o ajuizamento da accedilatildeo eacute uma visatildeo distorcida da atividade

satisfativa ldquoSob o ponto de vista do direito material a condenaccedilatildeo por si soacute eacute incapaz de

prestar a tutela do direitordquo46

Nessa oacutetica o direito fundamental agrave tutela executiva exige um sistema de tutela

jurisdicional ldquocapaz de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor

de tutela executivardquo47 Dessa forma entende-se que

ldquo() a) a interpretaccedilatildeo das normas que regulamentam a tutela executiva tem de ser feita no sentido de extrair a maior efetividade possiacutevel b) o juiz tem o poder-dever de deixar de aplicar uma norma que imponha uma restriccedilatildeo a um meio executivo sempre que essa restriccedilatildeo natildeo se justificar como forma de proteccedilatildeo a outro direito fundamental c) o juiz tem o poder-dever de adotar os meios executivos que se revelem necessaacuterios agrave prestaccedilatildeo integral de tutela executivardquo48

Egrave imperioso compreender que o direito fundamental agrave tutela executiva ratificado

pelo CPC eacute essencial para dirimir diversos litiacutegios oriundos do procedimento executivo

45 FERREIRA Gabriela Macedo Poder geral de efetivaccedilatildeo em defesa da constitucionalidade da

teacutecnica de execuccedilatildeo dos direitos do art 139 IV do Coacutedigo de Processo Civil Revista Jus Navigandi ISSN 1518-4862 Teresina ano 22 n 5178 4 set 2017 Disponiacutevel em lthttpsjuscombrartigos60190gt Acesso em 11 set 2018

46 Ibid natildeo paginado 47 DIDIER JR Fredie et al apud GUERRA Marcelo lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do credor

na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 48 Ibid p 102-104

21

ldquoprincipalmente aqueles relacionados agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo49

Fredie Didier et al50 cita como exemplo as hipoacuteteses de impenhorabilidade

A impenhorabilidade de certos bens eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa

Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais

Por esta razatildeo o legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do

CPC fazendo um preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses das partes envolvidas

optando pela mitigaccedilatildeo do direito do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado

Quando o oacutergatildeo jurisdicional verificar que a aplicaccedilatildeo das regras de

impenhorabilidade eacute desproporcional para o caso concreto deve afastaacute-la e construir a

soluccedilatildeo adequada para o referido caso Didier et al51 traz um exemplo esclarecedor em sua

obra

O bem imoacutevel que serve de moradia da famiacutelia eacute relativamente impenhoraacutevel Objetiva-se com essa restriccedilatildeo proteger o direito fundamental agrave moradia conteuacutedo do direito agrave proteccedilatildeo da dignidade Imagine-se um imoacutevel de altiacutessimo valor Imagine-se agora um creacutedito que corresponda a 40 do valor do imoacutevel A venda judicial do imoacutevel no caso permitiria natildeo soacute satisfazer o direito do credor como ainda garantir ao executado com a sobra a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel que lhe preserve a dignidade A opccedilatildeo pela interpretaccedilatildeo literal da regra que veda a penhora protegeria exclusivamente o direito do executado de maneira desnecessaacuteria porque a relaccedilatildeo valor executadovalor do bem permitiria a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel apoacutes a entrega do dinheiro ao credor Seria pois interpretaccedilatildeo em desconformidade com os preceitos da contemporacircnea hermenecircutica constitucional que preconiza a necessidade de nos casos de choque entre direitos fundamentais dar a interpretaccedilatildeo que mais adequadamente proteja a ambos

A execuccedilatildeo civil integra o direito fundamental agrave tutela jurisdicional disciplinando

que ldquoos dispositivos devem ser interpretados de modo que se garanta a maior efetividade

49 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66 50 Ibid p 66 51 Ibid p 67

22

possiacutevel agrave execuccedilatildeo desde que respeitados outros direitos fundamentaisrdquo52 Podendo ser

afastada desde que proporcional qualquer obstaacuteculo irrazoaacutevel agrave efetivaccedilatildeo desse direito

52 FERREIRA Gabriela Macedo apud MACEDO Lucas Buril de As eficaacutecias das decisotildees judiciais e

o cumprimento de sentenccedila no CPC15 Novo CPC Doutrina selecionada v 5 Execuccedilatildeo Coordenador geral Fredie Didier Jr organizadores Lucas Buril de Macedo Ravi Peixoto Alexandre Freire ndash Salvador Jus Podivm 2015 p 360361

23

3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO

EXECUTADO

31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS

Como forma de controlar a atividade jurisdicional por muito tempo vigorou o

entendimento de que a execuccedilatildeo somente poderia ser realizada atraveacutes dos meios executivos

tipicamente previstos na legislaccedilatildeo Segundo Luiz Guilherme Marinoni53

O princiacutepio da tipicidade deseja significar que os meios de execuccedilatildeo devem estar previstos na lei e assim que a execuccedilatildeo natildeo pode ocorrer atraveacutes de formas executivas natildeo tipificadas O seu objetivo eacute de um lado impedir que meio executivo natildeo previsto em lei possa ser utilizado e de outro garantir o jurisdicionado contra a possibilidade de arbiacutetrio judicial na fixaccedilatildeo da modalidade executiva Se o jurisdicionado sabe em razatildeo de previsatildeo legal que a sua esfera juriacutedica somente poderaacute ser invadida atraveacutes de determinadas modalidades executivas confere-se a ele a possibilidade de antever a reaccedilatildeo ao seu inadimplemento bem como a garantia de que a jurisdiccedilatildeo natildeo determinaraacute ou permitiraacute a utilizaccedilatildeo de meio executivo diverso daqueles previstos

Dessa forma o princiacutepio da tipicidade disciplina que o oacutergatildeo julgador ao proceder agrave

execuccedilatildeo estaacute limitado aos meios executivos previamente definidos em lei natildeo podendo se

valer de qualquer teacutecnica de efetivaccedilatildeo que natildeo se encaixasse nas hipoacuteteses taxativas da

legislaccedilatildeo

Entretanto o legislador natildeo tem como prever todas as peculiaridades dos direitos

dignos de tutela executiva e preordenar teacutecnicas executivas diversas para cada peculiaridade

Sob esse cenaacuterio o principio da tipicidade foi cedendo lugar ao principio da atipicidade dos

meios executivos

A ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do oacutergatildeo julgador estaacute cada vez mais presente

no ordenamento juriacutedico paacutetrio motivando um poder geral de efetivaccedilatildeo ldquoque permite ao

julgador valer-se dos meios executivos que considerar mais adequado ao caso concreto sejam

eles de coerccedilatildeo direta sejam de coerccedilatildeo indiretardquo 54

53 MARINONI Luiz Guilherme Teacutecnica processual e tutela dos direitos Satildeo Paulo Editora Revista

dos Tribunais 2004 p 212 nota 79 54 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 100

24

Essa tendecircncia de ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do juiz natildeo eacute exclusividade do

ordenamento juriacutedico brasileiro segundo Fredie Didier et al55

Michelle Taruffo jaacute apontava que o direito americano diante da inefetividade dos meios executivos at law comeccedilou a autorizar o magistrado a tomar medidas executivas adequadas ao caso concreto Trata-se afirma o jurista italiano de aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo segundo o qual as regras processuais devem ser adaptadas agraves necessidades do direito material

Os meios executivos atiacutepicos derivam de trecircs enunciados normativos do Coacutedigo de

Processo Civil o art 139 IV o art 297 e o sect1ordm do art 536

O art 139 IV do CPC dispotildee que pertence ao juiz o poder-dever de ldquodeterminar

todas as medidas indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para

assegurar o cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto

prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo

Jaacute o art 297 do CPC cuida da tutela provisoacuteria e garante que ldquoo juiz poderaacute

determinar as medidas que considerar adequadas para a efetivaccedilatildeo da tutela provisoacuteriardquo

Podendo dessa forma a dita tutela ser efetivada atipicamente

Por fim o art 536 sect1ordm do CPC dispotildee que

Para atender ao disposto no caput o juiz poderaacute determinar entre outras medidas a imposiccedilatildeo de multa a busca e apreensatildeo a remoccedilatildeo de pessoas e coisas o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva podendo caso necessaacuterio requisitar o auxilio de forccedila policial

As supracitadas medidas executivas atiacutepicas satildeo entendidas pela doutrina como

claacuteusulas gerais processuais executivas56 Essas claacuteusulas gerais natildeo restringem a sua

aplicaccedilatildeo agraves teacutecnicas de coerccedilatildeo indireta satildeo autorizados tambeacutem o uso de meios de execuccedilatildeo

dieta e indireta

Ademais cumpre salientar que o art 139 IV CPC aplica-se a toda e qualquer

atividade executiva ldquoa) seja fundada em tiacutetulo executivo judicial (provisoacuteria ou definitiva)

55 DIDIER JR Fredie et al apud TARUFFO Michelle A atuaccedilatildeo executiva dos direitos perfis

comparatiacutesticos Revista de Processo Satildeo Paulo RT 1990 n 59 p 78 56 Segundo Fredie Didier et al claacuteusula geral eacute uma espeacutecie de texto normativo cujo antecedente

(hipoacutetese faacutetica) eacute composto por termos vagos e consequente (efeito juriacutedico) eacute indeterminado

25

seja fundada em tiacutetulo executivo extrajudicial b) seja para efetivar prestaccedilatildeo pecuniaacuteria seja

para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer ou dar coisa distinta de dinheirordquo57

Jaacute o art 297 do CPC garante que a tutela provisoacuteria possa ser efetivada tambeacutem

atipicamente ldquoSucede que a atipicidade da tutela provisoacuteria segue necessariamente a

atipicidade da tutela definitivardquo 58

Por fim o comando do sect 1 ordmdo art 536 se aplica

a) inicialmente agrave execuccedilatildeo de fazer e de natildeo fazer fundada em decisatildeo judicial (provisoacuteria ou definitiva) b) por forccedila do sect 3ordm do art 538 tambeacutem se aplica ao cumprimento de sentenccedila para entrega de coisa c) por forccedila do art 771 paraacutegrafo uacutenico o dispositivo tambeacutem se aplica agrave execuccedilatildeo para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer e entregar coisa distinta de dinheiro fundada em tiacutetulo extrajudicial

Claramente o art 139 IV eacute mais amplo do que o sect 1 ordm do art 536 estende-se por

disposiccedilatildeo expressa agrave execuccedilatildeo de pagar quantia Sendo uma grande novidade nas obrigaccedilotildees

que tem por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15

O art 139 IV do CPC apresentou uma novidade agrave atipicidade dos meios executivos

ao disciplinar que cabe ao juiz ldquodeterminar todas as medidas indutivas coercitivas

mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o cumprimento de ordem judicial

inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo

A inovaccedilatildeo estaacute na possibilidade de utilizar os meios atiacutepicos para assegurar o

cumprimento de decisotildees que versam sobre as obrigaccedilotildees pecuniaacuterias sendo admitida a

utilizaccedilatildeo de outros meios ateacute na execuccedilatildeo de titulo judicial de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria aleacutem da

multa de 10 (a que se refere o artigo 523 sect 1ordm do CPC) para forccedilar o devedor a cumprir a

obrigaccedilatildeo pecuniaacuteria

57 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 105 58 Ibid p 105

26

Dessa forma eacute possiacutevel afirmar que ldquoao lado da disciplina tiacutepica do art 523 e

seguintes () o novo CPC inova ao permitir que o sistema de teacutecnicas executivas atiacutepicas

sejam empregadas na execuccedilatildeo monetaacuteriardquo59 (ZARONI VITORELLI 2016 p 66)

Fernando da Fonseca Gajardoni60 denomina a dita medida como a ldquorevoluccedilatildeo

silenciosardquo da execuccedilatildeo por quantia certa posto que

() pelo fato de que a regra natildeo estar propriamente incrustrada nos capiacutetulo e livro atinentes ao cumprimento de sentenccedila e ao processo de execuccedilatildeo ndash o art 139 IV do Novo CPC parece trazer ao paiacutes algo bastante novo cuja aplicaccedilatildeo a depender do comportamento do Judiciaacuterio pode implicar em verdadeira revoluccedilatildeo (positiva ou negativa) na sistemaacutetica executiva ateacute entatildeo vigente

Claramente o dispositivo foi recebido com entusiasmo por parte da doutrina que

anteciparam em afirmar que o princiacutepio da atipicidade dos meios executivos no CPC2015

ldquo() assume a feiccedilatildeo de poder-dever geral conferido ao magistrado de determinar () todas

as medidas coercitivas sub-rogatoacuterias mandamentais e indutivas que entender necessaacuterias

para a tutela justa efetiva e em tempo razoaacutevelrdquo 61

Dessa forma lecionam Luiz Guilherme Marinoni Seacutergio Cruz Arenhart e Daniel

Mitidiero62 que

O juiz a partir do art 139 IV do CPC2015 natildeo estaacute mais adstrito apenas agrave sentenccedila condenatoacuteria ndash que fixa a obrigaccedilatildeo de pagar e daacute ensejo agrave abertura da execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo patrimonial ndash para a tutela de prestaccedilotildees pecuniaacuterias Pode impor essa prestaccedilatildeo por meio de ordem judicial acoplada ao aceno de emprego de medida de induccedilatildeo (coercitiva ou de pressatildeo positiva) ou de medida de sub-rogaccedilatildeo (MARINONI ARENHARDT MITIDIERO 2015 p 703)

Deste modo em razatildeo do art 139 IV do CPC tem-se entendido que o juiz nas

execuccedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria possui a faculdade de adotar qualquer

59 ZARONI Bruno Marzullo VITORELLI Edilson Reforma e efetividade da execuccedilatildeo no novo CPC

In PEIXOTO Ravi FREIRE Alexandre MENDES Aluiacutesio Gonccedilalves de Castro Execuccedilatildeo 2 ed rev e atual Salvador JusPodivm 2016 766 p (Coleccedilatildeo novo CPC doutrina selecionada v 5) p 66

60 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia 24082015 JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Acesso em 23082018

61 LIMA Rafael de Oliveira A atipicidade dos meios executivos no coacutedigo de processo civil brasileiro de 2015 Revista de Processo Jurisdiccedilatildeo e Efetividade da Justiccedila v 2 n 2 juldez 2016 p 11

62 MARINONI Luiz Guilherme ARENHART Seacutergio Cruz MITIDIERO Daniel Novo curso de processo civil tutela dos direitos mediante procedimento comum Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 v 2 p 703

27

medida indutiva coercitiva mandamentais ou sub-rogatoacuterias para efetivar o creacutedito do

exequente natildeo se limitando as medidas tiacutepicas

Alguns doutrinadores se precipitaram ao afirmar que o dito dispositivo ldquo() autoriza o

juiz a utilizar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir ressalvando-se a prisatildeo

civil constitucionalmente limitada ao devedor de alimentosrdquo 63 Acreditam Jorge Bheron

Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa que o entusiasmo por parte da

doutrina abre margem para as mais variadas formas de compelir o devedor a cumprir com a

prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

ldquoE aiacute persistindo no mau vezo de fazer explicaccedilotildees em abstrato ignorando que o sentindo soacute se daacute na aplicaccedilatildeo (situaccedilatildeo concreta real ou fictiacutecia) as sugestatildeo satildeo as mais engenhosas suspensatildeo de CNH retenccedilatildeo de passaporte restriccedilatildeo de fim de semana cancelamento de cartotildees de creacutedito ndash para ficar apenas nestasrdquo 64

Ou seja podendo o juiz natildeo apenas substituir o devedor tomando seu patrimocircnio para

entregar ao credor na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia como tambeacutem poderaacute

pressionaacute-lo psicologicamente a adimplir por conta proacutepria a obrigaccedilatildeo

Ademais o Enunciado nordm 48 do ENFAM avalia expressamente a possibilidade de

imposiccedilatildeo de medidas coercitivas para a efetivaccedilatildeo da execuccedilatildeo pecuniaacuteria Conforme o dito

enunciado

ldquoO art 139 inciso IV traduz um poder geral de efetivaccedilatildeo permitindo a aplicaccedilatildeo de medidas atiacutepicas para garantir o cumprimento de qualquer ordem judicial inclusive no acircmbito do cumprimento de sentenccedila e no processo de execuccedilatildeo baseado em tiacutetulosrdquo

Dessa forma o artigo 139 IV do CPC permite uma gama ampla de interpretaccedilotildees por

parte da doutrina por ser uma claacuteusula geral encontrando limite apenas na imaginaccedilatildeo de

quem o analisa Nesse sentido eacute forccediloso orientar e delimitar o manejo desse artigo legal para

que se extraia seu sentido e alcance revelando assim sobre que situaccedilotildees ele incide de que

modo e o que permite

63 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

64 Ibid sem paginaccedilatildeo

28

32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER

GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO

O artigo 139 IV com a vigecircncia do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 abriu margem

para uma constelaccedilatildeo de decisotildees nas quais o dito dispositivo recebeu diversas interpretaccedilotildees

pelos operadores do direito

Sem duacutevidas por ser uma das pioneiras a decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara

Ciacutevel do Foro Regional de Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-

1320138260011 na data de 25 de agosto de 2016 gerou um enorme rebuliccedilo

Nessa accedilatildeo que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto

uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a

suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o

passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito

Segundo a magistrada o processo tramitava haacute anos sem que nenhum valor tenha sido

pago ao exequente aleacutem do devedor natildeo ter oferecido proposta de acordo e nem ter indicado

bens agrave penhora configurando uma completa desiacutedia com o processo

ldquoO caso tratado nos autos se insere dentre as hipoacuteteses em que eacute cabiacutevel a aplicaccedilatildeo do art 139 inciso IV do Coacutedigo de Processo Civil Isso porque o processo tramita desde 2013 sem que qualquer valor tenha sido pago ao exequente Todas as medidas executivas cabiacuteveis foram tomadas sendo que o executado natildeo paga a diacutevida natildeo indica bens agrave penhora natildeo faz proposta de acordo e sequer cumpre de forma adequada as ordens judiciais frustrando a execuccedilatildeo

Se o executado natildeo tem como solver a presente diacutevida tambeacutem natildeo recursos para viagens internacionais ou para manter um veiacuteculo ou mesmo manter um cartatildeo de creacutedito Se poreacutem mantiver tais atividades poderaacute quitar a diacutevida razatildeo pela qual a medida coercitiva poderaacute se mostrar efetiva

Assim como medida coercitiva objetivando a efetivaccedilatildeo da presente execuccedilatildeo defiro o pedido formulado pelo exequente e suspendo a Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo do executado M A S determinando ainda a apreensatildeo de seu passaporte ateacute o pagamento da presente diacutevida

()

Determino ainda o cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado ateacute o pagamento da presente diacutevida ()rdquo

Foi impetrado Habeas Corpus no Tribunal de Justiccedila do Estado de Satildeo Paulo a favor

do executado sob o fundamento que a coaccedilatildeo era ilegal e afetava o direito de locomoccedilatildeo

29

garantido constitucionalmente Tendo sido concedida a liminar em decisatildeo que ora se

reproduz

Em que pese a nova sistemaacutetica trazida pelo art 139 IV do CPC2015 deve-se considerar que a base estrutural do ordenamento juriacutedico eacute a Constituiccedilatildeo Federal que em seu art 5ordm XV consagra o direito de ir e vir Ademais o art 8ordm do CPC2015 tambeacutem preceitua que ao aplicar o ordenamento juriacutedico o juiz natildeo atentaraacute apenas para a eficiecircncia do processo mas tambeacutem aos fins sociais e agraves exigecircncias do bem comum devendo ainda resguardar e promover a dignidade da pessoa humana observando a proporcionalidade a razoabilidade e a legalidade Por tais motivos concedo a liminar pleiteada65

Cabe destacar aqui o voto vencido da Desembargadora Maria Luacutecia Pizzotti no

julgamento do Habeas Corpus supracitado demonstrando que o debate sobre a abrangecircncia

do artigo 139 IV do CPC ocorre tanto na doutrina quanto no judiciaacuterio

O objetivo do novel dispositivo natildeo eacute impor penas ou restringir direitos natildeo sendo intenccedilatildeo do Judiciaacuterio suspender indefinidamente o direito de dirigir do executado ou sua liberdade de viajar mas sim impor uma restriccedilatildeo tatildeo gravosa caso ele natildeo cumpra a determinaccedilatildeo que escolha cumprir sua obrigaccedilatildeo e dar fim ao problema Em outras palavras mediante as medidas de coerccedilatildeo o Estado procura persuadir o inadimplente impondo-lhe situaccedilotildees tatildeo onerosas e inconvenientes que em algum momento seja para ele mais vantajoso cumprir do que permanecer no inadimplemento

Ao fazecirc-lo o Novo Coacutedigo de Processo Civil rompe com as criacuteticas da ineficiecircncia das execuccedilotildees Natildeo se cogita deferir medidas restritivas agravequeles que demonstram a incapacidade absoluta de solver o deacutebito apenas agravequeles que reconhecidamente se valem de artimanhas e subterfuacutegios para evitar a satisfaccedilatildeo das diacutevidas ldquopreferindordquo outras despesas mais lsquonobresrsquo agindo em nome de terceiros e fazendo escaacuternio dos credores e do proacuteprio Poder Judiciaacuterio (hellip)

Para tanto memoraacutevel a noccedilatildeo de que a medida em comento tem caraacuteter excepcional e encontra limites no plano da proporcionalidade como sustenta o ilustrado Magistrado paulista Fernando da Fonseca Gajardoni Professor Faculdade de Direito de Ribeiratildeo Preto da USP (in httpswwwjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 acesso em 091216 agraves 11h20min) E para anaacutelise da proporcionalidade a ponderaccedilatildeo deve observar os trecircs passos apontados pela doutrina a necessidade a adequaccedilatildeo e a proporcionalidade em sentido estrito

65 TJSP - Habeas Corpus Processo nordm 2183713-8520168260000 30ordf Cacircmara Direito Privado relator

Des Marcos Ramos j 290317

30

Ademais no entendimento de Jorge Amaury Maia Nunes e Guilherme Pupe de

Noacutebrega66 essa decisatildeo releva os perigos trazidos pelo art 139 IV do CPC ao confrontar

direitos constitucionalmente garantidos

De nossa parte entendemos que a liberdade de locomoccedilatildeo inserta no inciso XV do artigo 5ordm que abrange o direito de deixar o territoacuterio nacional sofre embaraccedilo indevido pela apreensatildeo de passaporte ou pela suspensatildeo da carteira nacional de habilitaccedilatildeo

()

Agrave luz da exposiccedilatildeo feita acima e em anaacutelise primeva sustentamos que o artigo 139 IV do CPC de 2015 estaacute a merecer declaraccedilatildeo de inconstitucionalidade sem reduccedilatildeo de texto para o fim de rechaccedilar a apreensatildeo de passaporte a suspensatildeo do direito de dirigir e a vedaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo em concurso ou em licitaccedilatildeo puacuteblicos como medidas passiacuteveis de serem adotadas pelo juiz sob pena de vulneraccedilatildeo aos artigos 1ordm IV 5ordm XV e LIV 37 I 173 sect 3ordm III e 175 todos da Constituiccedilatildeo

Apesar de ter sofrido duras criacuteticas a decisatildeo do processo de nordm 4001386-

1320138260011 serviu de inspiraccedilatildeo para tantas outras decisotildees no mesmo sentido

Foi o caso da decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de Satildeo

Vicente em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 0020724-2620088260590 na data de 21 de

junho de 2017

A supracitada execuccedilatildeo se arrastava por nove (09) anos sem que o devedor tenha

esboccedilado qualquer intenccedilatildeo de pagar a diacutevida O credor requereu a suspensatildeo da Carteira

Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado apreensatildeo do passaporte e cancelamento dos

cartotildees de creacutedito

O magistrado com embasamento no artigo 139 IV do CPC deferiu parcialmente o

pedido sob o fundamento de que a apreensatildeo de passaporte e CNH natildeo viola o direito de ir e

vir do devedor Entretanto o juiz indeferiu o pedido de cancelamento do cartatildeo de creacutedito por

acreditar que a suspensatildeo poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado tendo em

vista que atualmente as pessoas utilizam o referido cartatildeo para pagamento das despesas

diaacuterias

66 NOBREacuteGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139

IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018

31

Eacute evidente que as medidas atiacutepicas de coerccedilatildeo devem ser utilizadas com cautela sempre respeitando a dignidade da pessoa do executado Natildeo se vislumbra contudo que as medidas aqui eleitas sejam capazes de vulnerar os Direitos Fundamentais do indiviacuteduo A uma porque natildeo se trata de restriccedilatildeo ao direito de ir e vir do executado que continua no gozo de plena liberdade de locomoccedilatildeo a duas porque a conduccedilatildeo de veiacuteculo automotor eacute mera comodidade da vida moderna natildeo se tratando de direito absoluto

Com mais razatildeo ainda se admite a suspensatildeo do Passaporte do executado que se natildeo paga a diacutevida da execuccedilatildeo natildeo deve ter o direito de fazer viagem internacional

Tem-se aqui verdadeiro exerciacutecio de ponderaccedilatildeo de interesses juriacutedicos de um lado jaz o direito de creacutedito do exequente que deriva do direito de propriedade e por isso mesmo tem envergadura constitucional de outro giro tem-se o direito do executado agrave autorizaccedilatildeo do Estado para conduzir veiacuteculo automotor e realizar viagens internacionais que natildeo se mostram essenciais agrave dignidade da pessoa humana Natildeo haacute duacutevidas pois de que eacute este uacuteltimo que deve sucumbir

O pedido fica indeferido apenas no tocante agrave suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado Eacute que ao contraacuterio da CNH e do passaporte que trazem consigo certa presunccedilatildeo de riqueza natildeo se pode concluir que o uso de cartatildeo de creacutedito eacute feito por luxo ou simples conveniecircncia

Como eacute cediccedilo os cartotildees de creacutedito oferecem ao seu titular creacutedito raacutepido e rotativo para o pagamento de despesas diaacuterias e certamente exercem funccedilatildeo essencial agravequeles que se encontram em situaccedilatildeo financeira precaacuteria

A suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado portanto se revela medida desproporcional e que inclusive poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado

Pelo exposto defiro em parte o pedido formulado pelo exequente e DETERMINO a suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo e bem como a suspensatildeo da validade (cancelamento temporaacuterio) no sistema SINPA de eventuais passaportes vaacutelidos em nome do executado

Dessa forma o artigo 139 IV do CPC revolucionou completamente a execuccedilatildeo de

obrigaccedilatildeo de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria ao permitir a utilizaccedilatildeo do uso dos meios executivos

atiacutepicos para compelir o executado a satisfazer o creacutedito do exequente

33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE

EFETIVACcedilAtildeO

Era inevitaacutevel que o artigo 139 IV do CPC gerasse todo tipo de reaccedilatildeo entre os

doutrinadores do processo civil e ateacute mesmo de outros ramos do direito devido a sua

capacidade de realizar uma completa inovaccedilatildeo na forma de se executar as obrigaccedilotildees de pagar

quantia Alguns o aplaudiram visualizando nele ldquouma luz no fim do tuacutenelrdquo outros o

criticaram vislumbrando as arbitrariedades que poderiam ser praticadas com embasamento no

referido dispositivo

32

As decisotildees suscitadas em linhas preteacuteritas auxiliaram para fervilhar ainda mais o

debate sobre o tema tendo em vista que por um lado poderia aumentar a efetividade das

execuccedilotildees por quantia no entanto por outro surgiam questionamentos a cerca da sua

constitucionalidade

A doutrina parece que demoraraacute a se pacificar sobre o tema Segundo alguns

doutrinadores seraacute inconstitucional toda restriccedilatildeo que recaia sobre a pessoa do devedor e natildeo

exclusivamente sobre o seu patrimocircnio Jaacute para outros o dispositivo eacute constitucional e o meio

mais eficaz para se resolver o problema da efetivaccedilatildeo das execuccedilotildees de pagar quantia ldquoA

discussatildeo se daacute especialmente no que diz respeito aacutes medidas de suspensatildeo de CNH

apreensatildeo de passaporte e bloqueio de cartotildees de creacutedito do devedorrdquo 67

O professor Thiago Rodovalho analisou detalhadamente a decisatildeo de nordm 4001386-

1320138260011 em seu artigo ldquoO necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na

concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivosrdquo 68 Quanto agrave suspensatildeo da CNH o autor

acredita que tal medida natildeo viola qualquer direito fundamental do devedor posto que ldquodirigir

veiacuteculos automotores eacute direito do cidadatildeo mas natildeo se confunde com os direitos fundamentais

e social de ir-e-vir e ao transporterdquo 69 O professor eacute categoacuterico ao afirmar que

Com relaccedilatildeo agrave suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (suspensatildeo do direito de dirigir restriccedilatildeo de direitos) natildeo nos parece haver qualquer violaccedilatildeo a direito fundamental ou social nem a direito da personalidade ou colocaccedilatildeo do devedor em situaccedilatildeo desproporcionalmente detrimentosa exceccedilatildeo feita aos que usam o veiacuteculo como instrumento de trabalho atraindo a hipoacutetese do NCPC art 833 inc V

()

Outrossim natildeo o consideramos como direito da personalidade Os direitos da personalidade satildeo os valores fundamentais que compotildeem o proacuteprio ser justamente por isso intransmissiacuteveis e irrenunciaacuteveis natildeo podendo o seu exerciacutecio sofrer limitaccedilatildeo voluntaacuteria (CC art 11) Por mais que vivamos num paiacutes que tanto valoriza o carro e que muitas pessoas de fato se compreendam em razatildeo e em funccedilatildeo do carro que dirijam este natildeo nos parece ser um direito que verdadeiramente componha a personalidade do indiviacuteduo70

67 DONTOS Sofia Poderes executoacuterios do juiz que diz a doutrina sobre o art 139 inc IV do CPC

Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigospoderes-executorios-do-juiz-que-diz-a-doutrina-sobre-art-139-inc-iv-do-cpc-23052018 gt Publicado em 23052018 Acesso em 01082018

68 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018

69 Ibid sem paginaccedilatildeo 70 Ibid sem paginaccedilatildeo

33

Quanto ao cancelamento dos cartotildees de credito do devedor o professor Thiago

Rodovalho tambeacutem acredita que natildeo haacute qualquer violaccedilatildeo ao direito fundamental social ou

da personalidade do devedor e acrescenta que

Tanto assim o eacute que ser titular de um cartatildeo de creacutedito pressupotildee ter creacutedito o que eacute analisado e concedido por instituiccedilotildees financeiras mais do que isso se porventura passando por dificuldades financeiras a pessoa deixa de honrar com pagamentos a mesma instituiccedilatildeo financeira concedente do cartatildeo de creacutedito pode sponte propria cancelaacute-lo ou recusar-lhe a concessatildeo Ora parece-me contraditoacuterio que instituiccedilotildees financeiras para sua proteccedilatildeo patrimonial possam ferir esse suposto ldquodireito fundamentalrdquo ou esse suposto ldquodireito da personalidaderdquo mas natildeo possa o Poder Judiciaacuterio igualmente fazecirc-lo contra aquele devedor moroso que instado ao pagamento e frustradas todas as tentativas de constriccedilatildeo patrimonial leva vida luxuosa valendo-se de cartotildees de creacutedito que prescindem de dinheiro em conta eacute dizer podem justamente funcionar como forma de ocultar renda e patrimocircnio71

O autor considera a apreensatildeo de passaporte um tema mais polecircmico e que merece

maior reflexatildeo No entanto crecirc que eacute possiacutevel a apreensatildeo de passaporte sem violar os

direitos fundamentais do devedor por se tratar de um direito de ir e vir de amplitude especial

Agrave primeira vista a possibilidade de apreensatildeo do passaporte tambeacutem nos parece possiacutevel pois tambeacutem se trata de um direito de ir e vir de amplitude especial Assim o eacute pois salvo situaccedilotildees especiais (refugiados p ex) haacute a necessidade de demonstrar condiccedilotildees financeiras de estadia e retorno para ser admitido no paiacutes de destino Ou seja pressupotildee uma condiccedilatildeo financeira que o devedor justamente diz natildeo possuir Sem embargo dessa consideraccedilatildeo esse ainda eacute um ponto que merece uma reflexatildeo mais acurada sendo essa apenas uma primeira impressatildeo72

Outros autores escreveram sobre o tema como eacute o caso do processualista Luiz

Dellore73 que tambeacutem defende que as medidas atiacutepicas como restriccedilatildeo ao direito de dirigir

apreensatildeo de passaporte e cancelamento de cartotildees de creacutedito satildeo permitidas e natildeo violam em

regra os direitos fundamentais do devedor

De minha parte creio que efetivamente haacute inovaccedilatildeo no at 139 IV do NCPC (e natildeo mera repeticcedilatildeo do que jaacute havia no Coacutedigo anterior) que tem o condatildeo de trazer mais efetividade ao processo executivo no Brasil ndash que por deacutecadas centrou sua atenccedilatildeo na defesa do executado (vide a grande quantidade de impenhorabilidades) sem dar maior atenccedilatildeo ao creacutedito do exequente

71 Ibid sem paginaccedilatildeo 72 Ibid sem paginaccedilatildeo 73 DELLORE Luiz NCPC Atipicidade das medidas executivas jaacute eacute realidade Disponiacutevel em lt

httpswwwjotainfoopiniao-e-analisecolunasnovo-cpcncpc-atipicidade-de-medidas-executivas-ja-e-realidade-17042017 gt Publicado em 17042017 Acesso em 03092018

34

Logo a meu ver medidas como (i) restriccedilatildeo ao direito de dirigir (ii) apreensatildeo de passaporte (iii) cancelamento de cartotildees de creacutedito e (iv) vedaccedilatildeo de obtenccedilatildeo de novos empreacutestimos se natildeo vinculados ao pagamento do deacutebito exequendo dentre outras restriccedilotildees que deveratildeo ser observadas a cada caso satildeo permitidas pelo sistema do NCPC e em regra natildeo violam direitos fundamentais do devedor E tecircm o condatildeo de fazer com que o executado que tem recursos diante dessas medidas coercitivas pague o deacutebito trazendo sucesso agrave satisfaccedilatildeo do creacutedito

Nessa linha para Alexandre Fuchs das Neves74 o artigo 139 IV do CPC conferiu ao

juiz poderes coercitivos capazes de ldquotransformar a vida do devedor um infernordquo para compeli-

lo a cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria Entretanto pondera que para que a medida tenha

validade ldquoeacute necessaacuteria uma fundamentaccedilatildeo por evidente uma correlaccedilatildeo temaacutetica entre a

medida adotada e sua efetividade em face ao processo com fundamentaccedilatildeo detalhadardquo

No entendimento de Fernando Gajardoni75 satildeo possiacuteveis as medidas de apreensatildeo de

passaporte bloqueio de cartotildees de creacutedito e suspensatildeo da CNH Para ele o que limita o art

139 IV do CPC eacute o esgotamento dos meios tiacutepicos e a real necessidade da medida

Ilustrativamente natildeo efetuado o pagamento de diacutevida oriunda de multas de tracircnsito e superados os expedientes tradicionais de adimplemento (penhora de dinheiro e bens) seria liacutecito o estabelecimento da medida coercitivaindutiva de suspensatildeo do direito a conduzir veiacuteculo automotor ateacute pagamento do deacutebito (inclusive com apreensatildeo da CNH do devedor) natildeo efetuado pagamento de verbas salariais devidas a funcionaacuterios da empresa possiacutevel o estabelecimento de vedaccedilatildeo agrave contrataccedilatildeo de novos funcionaacuterios ateacute que seja saldada a diacutevida natildeo efetuado o pagamento de financiamento bancaacuterio na forma e no prazo avenccedilados possiacutevel ateacute que se tenha a quitaccedilatildeo que se obstem novos financiamentos ou mesmo a participaccedilatildeo do devedor em licitaccedilotildees (como de ordinaacuterio jaacute acontece com pessoas juriacutedicas em deacutebito tributaacuterio com o Poder Puacuteblico) etc

Teriacuteamos entatildeo no Brasil por assim dizer a adoccedilatildeo do padratildeo da atipicidade das medidas executivas tambeacutem para as obrigaccedilotildees de pagar vistas estas como ordens do EstadoJuiz para que haja prestaccedilatildeo de pagamento em pecuacutenia

()

Por isso ndash a prevalecer a interpretaccedilatildeo potencializada do art 139 IV do CPC2015 ndash o emprego de tais medidas coercitivasindutivas especialmente nas obrigaccedilotildees de pagar encontraraacute limite certo na excepcionalidade da medida (esgotamento dos meios tradicionais de satisfaccedilatildeo do deacutebito) na proporcionalidade (inclusive agrave luz da regra da menor onerosidade ao devedor do art 805 do CPC2015) na necessidade de fundamentaccedilatildeo substancial e especialmente nos direitos e garantias assegurados na Constituiccedilatildeo Federal (vg natildeo parece possiacutevel que se determine o pagamento sob pena de prisatildeo ou de vedaccedilatildeo ao exerciacutecio da profissatildeo do direito de ir e vir etc)

74 NEVES Alexandre Fuchs das Cancelamento de cartotildees de creacutedito e apreensatildeo de CNH e passaporte

do devedor Isso eacute possiacutevel Disponiacutevel em lt httpwwwsinfacspcombrconteudocancelamento-de-cartoes-de-credito-e-apreensao-de-cnh-e-passaporte-do-devedor-isso-e-possivel gt Acesso em 30082018

75 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Publicado em 24082015 Acesso em 30082018

35

Jaacute Fernanda Tartuce76 acredita que tais medidas satildeo problemaacuteticas e devem ser

analisadas com cautela tendo em vista que ao inveacutes de afetarem o patrimocircnio do devedor

atingem a proacutepria pessoa

Sob certo prisma adotar medidas diferenciadas contribui para a efetividade da prestaccedilatildeo jurisdicional Por outro lado o patrimocircnio ndash e natildeo a pessoa do devedor - responde por diacutevidas aleacutem disso o exerciacutecio de amplos poderes pelo juiz sem balizas especiacuteficas pode ensejar medidas inadequadas Nessa linha suspender o direito de dirigir e restringir o uso de passaporte satildeo iniciativas problemaacuteticas por atingirem a pessoa do devedor enquanto a penhora da restituiccedilatildeo de Imposto de Renda soa viaacutevel por afetar seu patrimocircnio Eacute importante que a medida diferenciada se revele proporcional e seja aplicada apoacutes o exaurimento de outros meios previstos no ordenamento Como a proposta do Novo Coacutedigo eacute aumentar a eficiecircncia processual intentar medidas ineficazes inexequiacuteveis eou de difiacutecil fiscalizaccedilatildeo pode acabar ensejando o efeito contraacuterio

Nessa senda Lenio Streck e Dierle Nunes77 entendem que as medidas atiacutepicas de

suspensatildeo da CNH eou apreensatildeo de passaporte satildeo inconstitucionais Afirmam que natildeo se

pode confundir o processo civil e penal ainda que ambos remetam a um ldquoparadigma

constitucional comumrdquo e que o artigo 139 IV do CPC ldquoimpotildee novos desafios interpretativos

que podem conduzir a uma anaacutelise superficial e utilitarista de busca de resultados que

desprezem a necessaacuteria leitura constitucionalrdquo Os autores ainda ponderam que ldquoO perigo eacute o

artigo 139 IV ser transformado em instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com

autorizaccedilatildeo judicialrdquo

O professor Araken de Assis no dia 18 de abril de 2018 em um evento sobre o

Coacutedigo Processual Civil de 2015 que ocorreu em Brasiacutelia na sede do Conselho Federal da

OAB declarou ser contraacuterio aos poderes executoacuterios atiacutepicos ldquoSou contra os poderes

atiacutepicos dos juiacutezes porque seu exerciacutecio redunda em simples arbitrariedadesrdquo78

Acrescentou ainda que

76 IBDFAM ndash Instituto Brasileiro de Famiacutelia O polecircmico inciso IV do artigo 139 do CPC e suas difusas

interpretaccedilotildees Disponiacutevel em lt httpwwwibdfamorgbrnoticias6096O+polC3AAmico+inciso+IV+do+artigo+139+do+CPC+e+suas+difusas+interpretaC3A7C3B5es gt Publicado em 31082016 Acesso em 04092018

77 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018

78 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04092018

36

Eacute evidentemente inconstitucional diante do princiacutepio da dignidade da pessoa humana tirar o passaporte carteira de habilitaccedilatildeo Quecirc que tem isso com diacutevidas Natildeo tem absolutamente nada Natildeo eacute a correlaccedilatildeo instrumental entre o objetivo da execuccedilatildeo e o meio empregado Isso eacute simples vinganccedila simples puniccedilatildeo79

O professor Araken de Assis acredita que tais medidas satildeo inconstitucionais e

violam o principio da dignidade humana do executado numa sociedade como a nossa

sedenta por puniccedilatildeo natildeo me surpreende que essas ideias sejam encaradas com

naturalidade Mas eacute preciso rejeitaacute-las em nome de princiacutepios 80

34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO

A Constituiccedilatildeo Federal de 1988 tem como um dos seus fundamentos a dignidade da

pessoa humana presente no artigo 1ordm inciso III do referido texto constitucional O dito

princiacutepio tem o escopo de nortear o ordenamento juriacutedico como um todo

A inclusatildeo da dignidade da pessoa humana como princiacutepio constitucional obrigou

uma reflexatildeo sobre o papel da pessoa humana no direito e um redimensionamento para

elevaacute-la ao centro do ordenamento juriacutedico81 Eacute necessaacuterio recorrer agrave teoria Kantiana para

que se obtenha uma definiccedilatildeo do princiacutepio ora estudado Para Kant82 o homem eacute um fim

em si mesmo natildeo uma funccedilatildeo do Estado Ou Naccedilatildeo O Estado e o direito devem estar

organizados em benefiacutecio do indiviacuteduo

Agora eu afirmo o homem ndash e de uma maneira geral todo o ser racional ndash existe como fim em si mesmo e natildeo apenas como meio para o uso arbitraacuterio desta ou daquela vontade Em todas as suas accedilotildees pelo contraacuterio tanto nas direcionadas a ele mesmo como nas que o satildeo a outros seres racionais deve ser ele sempre considerado simultaneamente como fim

Partindo da premissa de que para Immanuel Kant o homem eacute o fim em si mesmo

ldquodevemos compreender que a dignidade da pessoa humana eacute a noccedilatildeo o comando a direccedilatildeo

que se deve seguir funcionando como fundamento para a interpretaccedilatildeo de todos os direitos e

garantias conferidos agrave pessoa nos ordenamentos juriacutedicos de cada Estadordquo 83

79 Ibid sem paginaccedilatildeo 80 Ibid sem paginaccedilatildeo 81 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito

fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 461 82 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud KANT Immanuel Fundamentaccedilatildeo da metafiacutesica dos costumes

Satildeo Paulo Martin Claret 2003 p56-59 Coleccedilatildeo A Obra-Prima de Cada Autor 83 SCHIAFIANO Juliana Rocha op cit p 461

37

O princiacutepio constitucional da dignidade da pessoa humana estaacute diretamente ligado ao

conteuacutedo dos direitos fundamentais logo para que se cumpra com os direitos fundamentais

constitucionalmente instituiacutedos eacute necessaacuterio reconhecer e respeitar a dignidade da pessoa

humana conforme disciplina Ingo Sarlet84

Em suma o que se pretende sustentar de modo mais enfaacutetico eacute que a dignidade da pessoa humana na condiccedilatildeo de valor (principio normativo) fundamental que atrai o conteuacutedo de todos os direitos fundamentais exige e pressupotildee o reconhecimento e proteccedilatildeo dos direitos fundamentais de todas as dimensotildees (ou geraccedilotildees se assim preferirmos) Assim sem que se reconheccedilam agrave pessoa humana os direitos fundamentais que lhe satildeo inerentes em verdade estarse-aacute lhe negando a proacutepria dignidade A consagraccedilatildeo constitucional da dignidade da pessoa humana tem o propoacutesito de limitar a atuaccedilatildeo ou a omissatildeo do Estado para garantir os direitos do indiviacuteduo Assim eacute difiacutecil precisar os efeitos da norma que determina a dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado (como acontece com a Constituiccedilatildeo brasileira de 1988) poreacutem quando desrespeitados os direitos fundamentais do cidadatildeo eacute possiacutevel identificar que a dignidade deste foi violada

Logo ldquoteraacute respeitada a sua dignidade o individuo que tiver respeitados os seus

direitos fundamentaisrdquo 85 Os direitos fundamentais estatildeo apresentados na Constituiccedilatildeo

Federal da seguinte forma direitos individuais e coletivos direitos sociais direitos poliacuteticos e

direitos de nacionalidade que tecircm como escopo garantir as liberdades positivas aos

indiviacuteduos ldquoonde foram conquistados direitos agrave liberdade religiosa liberdade civil e

profissional agrave propriedade ao livre acesso ao Judiciaacuterio agrave ampla defesa e ao contraditoacuterio no

processual judicial ao sigilo de dados e informaccedilotildees pessoais entre outros que somados

garantem o cidadatildeo uma vida dignardquo 86

O cidadatildeo na Constituiccedilatildeo Federal de 88 diferente das constituiccedilotildees brasileiras

anteriores passou a ser fundamento e ganhou destaque nos direitos fundamentais tendo

garantida a sua vida a sua dignidade a sua seguranccedila a sua honra a sua liberdade e a sua

propriedade

84 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud SARLET Ingo Wolfgang Dignidade da pessoa humana e

direitos fundamentais na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 2ed Porto Alegre Livraria do Advogado 2002 p87 85 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito

fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 462 86 Ibid p 462

38

Segundo Carmem Luacutecia Antunes Rocha87 para garantir o Estado Democraacutetico de

Direito eacute necessaacuterio que a sua atuaccedilatildeo seja sempre em conformidade com o princiacutepio da

dignidade da pessoa humana

O Estado somente eacute democraacutetico em sua concepccedilatildeo constitucionalizaccedilatildeo e atuaccedilatildeo quando respeita o princiacutepio da dignidade da pessoa humana Natildeo haacute verbo constitucional natildeo haacute verbo governamental que se faccedilam legiacutetimos quando natildeo se voltam ao atendimento daquele princiacutepio Natildeo haacute verdade constitucional natildeo haacute suporte institucional para as poliacuteticas puacuteblicas que natildeo sejam destinadas ao pleno cumprimento daquele valor maior transformado em princiacutepio constitucional

O princiacutepio da dignidade humana constitucionalmente garantido impotildee limites ao

Estado compelindo aos oacutergatildeos e atividades estatais respeitar o ser humano e garanti-lo

condiccedilotildees miacutenimas para uma vida digna Dessa forma eacute niacutetido que o dito princiacutepio eacute

pressuposto e indispensaacutevel para legitimar outras normas constitucionais e

principalmente infraconstitucionais

O Coacutedigo de Processo Civil eacute umas das principais normas infraconstitucionais que

sofre influecircncia dos preceitos valores e princiacutepios esculpidos na Constituiccedilatildeo Federal

Logo como o principio da dignidade humana eacute um dos mais importantes pressupostos

constitucionais ldquoentatildeo eacute tranquilo afirmar-se que o novel ordenamento processual tem

de se render nas resoluccedilotildees dos aspectos processuais e a fim de se atingir uma soluccedilatildeo

justa adequada e efetiva ao postulado da dignidade da pessoa humanardquo 88

Dessa forma o legislador deve formular as normas infraconstitucionais de acordo e a

partir do conteuacutedo constitucional para Marinoni Mitidiero e Arenhart89

() o Coacutedigo de Processo Civil constitui direito constitucional aplicado O Coacutedigo deve ser interpretado de acordo com a Constituiccedilatildeo e com os direitos fundamentais o que significa que as duacutevidas interpretativas devem ser resolvidas a favor da otimizaccedilatildeo do alcance da Constituiccedilatildeo e do processo civil como meio para tutela de direitos

87 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud ROCHA Carmen Luacutecia Antunes O princiacutepio da dignidade da

pessoa humana e a exclusatildeo social Revista Interesse Puacuteblico n4 p23-48 1999 p33 88 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o

novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 367

89 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 14

39

Com o escopo de conferir eficaacutecia aos mandamentos constitucionais o CPC15 traz a

previsatildeo e diversas claacuteusulas gerais em seus primeiros artigos em um dos quais se

prestigia o princiacutepio da dignidade da pessoa humana

O referido princiacutepio estaacute disciplinado no artigo 8ordm do CPC15 e atua como um guia

sobre as demais normas do coacutedigo processual Eacute o que entende Nelson Rosenvald90

O maior cuidado do inteacuterprete eacute no sentido de jamais banalizar a dignidade fazendo dela um elixir processual tal como muitas vezes se vecirc na esfera do direito civil Penso que natildeo haacute maiores dificuldades em transpor a noccedilatildeo constitucional do princiacutepio para em seguida adaptaacute-la agraves singularidades do processo

Logo de acordo com o artigo 8ordm do CPC o oacutergatildeo julgador ao aplicar o ordenamento

juriacutedico deve resguardar a dignidade da pessoa humana Para Fredie Didier91 ldquoresguardar

nesse contexto eacute de um lado aplicar corretamente a norma juriacutedica lsquoproteccedilatildeo da dignidade

da pessoa humanarsquo e de outro natildeo violar a dignidaderdquo

O oacutergatildeo julgador deveraacute manter um comportamento ativo com o objetivo de promover

a dignidade da pessoa humana podendo tomar medidas de ofiacutecio para efetivar a dignidade da

pessoa humana Didier assevera que o magistrado poderaacute ainda ldquovaler-se da claacuteusula geral de

atipicidade (art 536 sect 1ordm) para a execuccedilatildeo do direito fundamental agrave dignidaderdquo 92 O autor

ainda traz dois exemplos

a) exigecircncia de respeito agrave ordem cronoloacutegica de conclusatildeo (art 12) caso de grave violaccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana que natildeo se encaixe em um dos incisos que excepcionam a regra de observacircncia da cronologia da conclusatildeo poderia o juiz ldquofurar a filardquo para promover a dignidade da pessoa humana b) prioridade na tramitaccedilatildeo processual pessoa que seja portadora de doenccedila grave mas que natildeo esteja no rol do art 1048 I para promover a dignidade de pessoa humana o juiz poderia determinar o processamento prioritaacuterio93

Essa dupla garantia ndash resguardo e promoccedilatildeo ndash tem como objetivo garantir ao individuo

sua dignidade humana fazendo com que ldquode um lado que o Estado natildeo a viole e de outro

que o Estado a promova e efetiverdquo

90 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud ROSENVALD Nelson A

dignidade da pessoa humana no CPC15 91 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte

geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 75 92 Ibid p 75 93 Ibid p 75

40

Nessa senda o magistrado deveraacute promover a dignidade da pessoa humana quando

perceber a ausecircncia desta no processo ou assegura-la quando for posta em risco Eacute nesse

sentido o entendimento dos professores Marinoni Mitidiero e Arenhart94

() a dignidade da pessoa humana determina a compreensatildeo do processo civil como um meio para tutela dos direitos Vale dizer o processo civil natildeo pode ser visto como um instrumento a serviccedilo do Estado como um instrumento que natildeo se encontre orientado agrave realizaccedilatildeo dos fins da pessoa humana Em outras palavras o processo civil serve para realizaccedilatildeo dos direitos e para orientaccedilatildeo das pessoas a respeito do significado do direito

Nessa senda compete tanto ao juiz quanto as demais partes processuais garantirem ldquoo

valor intriacutenseco de cada vida que eacute trazida ao processordquo nas palavras de Alexandre Freitas

Cacircmara95

() aos sujeitos do processo eacute preciso sempre ter claro que os titulares dos interesses em conflitos satildeo pessoas reais cujas vidas seratildeo afetadas pelo resultado do processo e que por isso mesmo tecircm o direito de estabelecer suas estrateacutegias processuais de acordo com aquilo que lhes pareccedila melhor para suas vidas Eacute inadmissiacutevel tratar as partes como se natildeo fossem pessoas reais meros dados estatiacutesticos Afinal se para o Judiciaacuterio cada processo pode parecer apenas mais um processo para as partes cada processo pode ser o uacutenico o mais relevante aquele em que sua vida seraacute decidida E eacute dever do juiz assegurar que isto seja respeitado

Dessa forma eacute necessaacuterio que um arcabouccedilo normativo para que seja conferida

eficaacutecia e proteccedilatildeo ao principio da dignidade da pessoa humana

Logo o dito princiacutepio deve ser protegido em todas as esferas do ordenamento juriacutedico

inclusive no campo da execuccedilatildeo civil onde sofre grandes riscos de ser violado em nome do

direito fundamental agrave tutela executiva do credor ldquoPartir da premissa de que existe um direito

fundamental agrave tutela executiva ora ratificado pelo CPC eacute indispensaacutevel para a soluccedilatildeo de

diversos problemas oriundos do procedimento executivo principalmente aqueles relacionados

agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo 96

94 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme

MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 25

95 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CAcircMARA Alexandre Freitas O Novo Processo Civil Brasileiro 2 ed Satildeo Paulo Atlas 2016 p 7

96 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66

41

Eacute o caso por exemplo da impenhorabilidade Segundo Fredie Didier et al97 a

impenhorabilidade eacute uma forma de proteger certos bens do devedor do direito fundamental a

execuccedilatildeo do credor

Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa

Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais

O legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do CPC fazendo um

preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses em anaacutelise ao optar pela mitigaccedilatildeo do direito

do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado Afinal ldquoa execuccedilatildeo natildeo pode ser utilizada

como instrumento para causar a ruiacutena a fome e o desabrigo do devedor e sua famiacutelia gerando

situaccedilotildees incompatiacuteveis com a dignidade da pessoa humana 98

Logo a impenhorabilidade de certos bens

[] Eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa99

Eacute nesse sentido que o CPC15 enumera diversos casos de bens patrimoniais que satildeo

impenhoraacuteveis como o salaacuterio e vencimentos utensiacutelios necessaacuterios ao exerciacutecio da

profissatildeo seguro de vida vestuaacuterios e pertences de uso pessoal entre outros

Dessa forma as regras relativas agraves medidas executivas devem ser interpretadas agrave luz

da Constituiccedilatildeo Federal ldquovez que se voltam agrave realizaccedilatildeo de direitos fundamentais e em sua

97 Ibid p 66 98 THEODORO JUacuteNIOR Humberto Novo Coacutedigo de Processo Civil Anotado 20 ed Rio de Janeiro

Forense 2016 p 978 99 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud DIDIER JR Fredie CUNHA

Leonardo Carneiro da BRAGA Paula Sarno OLIVEIRA Rafael Alexandria de Curso de direito processual civil 3 ed Salvador JusPodivm 2011 v 5 p 547

42

realizaccedilatildeo podem atingir direitos fundamentaisrdquo 100 O Superior Tribunal de Justiccedila jaacute decidiu

que

O rol das impenhorabilidades do ordenamento paacutetrio objetiva preservar o miacutenimo patrimonial necessaacuterio agrave existecircncia digna do executado impondo ao processo executoacuterio certos limites Assim a depender das peculiaridades do caso as regras de impenhorabilidade podem ser ampliadas de modo a adequar a tutela aos direitos fundamentais como por exemplo o direito agrave moradia agrave sauacutede ou agrave dignidade da pessoa humana Trata-se portanto da aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo e da necessidade sob o enfoque da proporcionalidade101 (STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014)

Logo a interpretaccedilatildeo dos dispositivos que tratam sobre a penhora no CPC deve estaacute

diretamente ligada aos ditames constitucionais devendo o interprete privilegiar a opccedilatildeo que

esteja mais em sintonia com a Carta Magna para que nem o credor e nem o devedor sejam

lesados

O artigo 833 do CPC elenca uma seacuterie de incisos que expotildeem os bens impenhoraacuteveis

O trecho inicial inciso I do art 833 define como impenhoraacuteveis os bens inalienaacuteveis Este

inciso segue a regra de que ldquose o bem natildeo pode ser alienado tambeacutem natildeo pode ser penhorado

porque a penhora eacute o primeiro ato do procedimento de alienaccedilatildeo judicial do bemrdquo 102

Satildeo exemplos de bens inalienaacuteveis os puacuteblicos cuja alienaccedilatildeo depende de autorizaccedilatildeo

legislativa Eacute inalienaacutevel tambeacutem o capital constituiacutedo para garantir indenizaccedilatildeo de ato iliacutecito

(art 533 sect 1 ordm CPC) que portanto eacute tambeacutem impenhoraacutevel ldquoTodo bem inalienaacutevel eacute

impenhoraacutevel embora nem todo bem impenhoraacutevel seja inalienaacutevelrdquo 103

O inciso I do art 833 CPC tambeacutem consagra a impenhorabilidade dos bens que por

ato voluntaacuterio satildeo excluiacutedos da execuccedilatildeo

Segundo Fredie Didier et al104

Eacute o que ocorre nos casos de bens doados ou alienados com claacuteusula de inalienabilidade que haacute de constar no registro imobiliaacuterio para ser eficaz perante o exequente e minimizar o risco de fraude A propoacutesito eis a redaccedilatildeo do art 1911 do Coacutedigo Civil lsquolsquoA claacuteusula de inalienabilidade imposta aos bens por ato de liberalidade implica impenhorabilidade e incomunicabilidaderdquo

100 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MEDINA Joseacute Miguel Garcia

Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 1 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 p 736 101 STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014 102 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 824 103 Ibid p 824 104 Ibid p 825

43

O inciso II por sua vez estabelece que satildeo impenhoraacuteveis os bens moacuteveis os

pertences e as utilidades domeacutesticas da residecircncia do executado Todavia excepcionam-se os

bens dessa natureza que sejam de elevado valor ou que ultrapassem as necessidades comuns

correspondentes a um meacutedio padratildeo de vida

A jurisprudecircncia natildeo eacute paciacutefica sobre o assunto logo natildeo exista uma relaccedilatildeo de bens

que podem ser atingidos pela penhora Abrindo margem para as mais variadas decisotildees

O STJ jaacute considerou impenhoraacuteveis aparelho de televisatildeo a cores mesa de centro passadeira raacutedio toca-fitas gravador microondas ar-condicionado um freezer um microcomputador com acessoacuterios uma impressora etc Poderatildeo ser penhorados porque ultrapassam o padratildeo-meacutedio aparelhos de TV mais sofisticados o segundo aparelho de televisatildeo a segunda geladeira aparelhos de ar-condicionado que satildeo verdadeiras peccedilas de design moacuteveis antigos que se transformam em peccedilas de decoraccedilatildeo faqueiro de prata adega climatizada etc Em entendimento de caraacuteter ainda mais geneacuterico jaacute restou consignado em determinado precedente que a proteccedilatildeo natildeo abrangeria apenas os bens indispensaacuteveis agrave moradia mas tambeacutem aqueles usualmente encontrados em um lar105

Ademais o inciso III do art 833 do CPC traz a impenhorabilidade dos vestuaacuterios bem

como os pertences de uso pessoal do executado salvo se de elevado valor

Segundo Fredie Didier et al106 o dispositivo possui dois propoacutesitos

de um lado preservar a dignidade do executado com a proteccedilatildeo de bens moacuteveis importantes para a sua sobrevivecircncia digna como o vestuaacuterio aparelho celular reloacutegio e os bens relacionados agrave sua higiene pessoal de outro lado a regra visa prestigiar a boa-feacute processual impedindo a execuccedilatildeo mesquinha e abusiva com a penhora de bens de pequeno ou nenhum valor como um pente ou uma bota

O inciso IV do art 833 do CPC consagra uma das mais importantes modalidades a

impenhorabilidade relativa aos rendimentos de natureza alimentar ldquoTrata-se de regra que

possui o claro propoacutesito de proteger o executado garantindo-lhe o recebimento de valores que

servem ao pagamento das despesas relacionadas agrave sua sobrevivecircncia digna e agrave da sua famiacuteliardquo 107

Jaacute inciso V do art 833 do CPC torna impenhoraacuteveis os livros as maacutequinas as

ferramentas os utensiacutelios os instrumentos ou outros bens moacuteveis necessaacuterios ou uacuteteis ao

exerciacutecio de qualquer profissatildeo 105 Ibid p 826 106 Ibid p 827 107 Ibid p 828

44

Por forccedila do paraacutegrafo 3ordm do art 833 satildeo igualmente impenhoraacuteveis os equipamentos

implementos e maacutequinas agriacutecolas pertencentes agrave pessoa fiacutesica ou a empresa individual

produtora rural Rodrigo Mazzei e Sarah Merccedilon108 esclarecem que

Tem assento na noccedilatildeo de que a dignidade estende-se tambeacutem ao exerciacutecio da profissatildeo em si mesma e tambeacutem por representar a forma por excelecircncia de que dispotildee o executado para continuar a receber sua remuneraccedilatildeo e por conseguinte prover seu sustento e de sua famiacutelia Trata-se tambeacutem de aplicaccedilatildeo pontual da funccedilatildeo social da propriedade jaacute que protege os bens que permitem a circulaccedilatildeo de riquezas para a subsistecircncia do executado e se for o caso de sua famiacutelia

Forccediloso ressaltar ainda que a impenhorabilidade do inc V alcanccedila apenas os bens

moacuteveis de modo que eacute absolutamente possiacutevel que o imoacutevel em que o executado exerccedila sua

atividade profissional seja penhorado conforme a Suacutemula 451 do STJ ldquoEacute legiacutetima a penhora

da sede do estabelecimento comercialrdquo

O inciso VI do art 833 do CPC versa sobre a impenhorabilidade do seguro de vida

ldquoTrata-se de impenhorabilidade em favor do beneficiaacuterio do seguro e natildeo do segurado ateacute

porque o valor do seguro natildeo compotildee nem comporaacute o seu patrimocircnio (art794 do Coacutedigo

Civil1 ordm7)rdquo Dessa forma ldquoem uma execuccedilatildeo contra o segurado natildeo seraacute possiacutevel a penhora

do seguro de vida pois se trata de bem que natildeo lhe pertence nem mesmo em expectativardquo

De acordo com o inciso VII do art 833 do CPC satildeo impenhoraacuteveis os materiais

necessaacuterios para obras em andamento salvo se essas forem penhoradas Logo a obra pode

ser penhorada (art 862 do CPC) ldquoA regra como bem lembrou Araken de Assis lsquoestimula a

penhora da proacutepria obra inconclusa agrave qual os materiais acrescem e conseguintemente

valorizamrsquo 109

O art 833 VIII CPC julga impenhoraacutevel a pequena propriedade rural assim

definida em lei desde que trabalhada pela famiacutelia reproduzindo parte do art 5ordm XXVI CF

88116 que disciplina a impenhorabilidade do referido bem

A proteccedilatildeo do CPC eacute mais ampla do que a garantia prevista na Constituiccedilatildeo Federal

tendo em vista que a impenhorabilidade natildeo se restringe agraves execuccedilotildees de deacutebitos decorrentes

de sua atividade produtiva podendo ser alegada em toda e qualquer execuccedilatildeo ldquoAssim o 108 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CABRAL Antonio Passo

CRAMER Ronaldo (orgs) Comentaacuterios ao Novo Coacutedigo de Processo Civil Rio de Janeiro Forense 2015 p 1194

109 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 835

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imoacutevel natildeo pode ser penhorado na execuccedilatildeo de creacutedito rural concedido para estimular a

produccedilatildeo agriacutecola mas poderaacute ser penhorado na execuccedilatildeo do creacutedito concedido para a

aquisiccedilatildeo do imoacutevelrdquo 110

A nona modalidade de impenhorabilidade trata-se dos recursos puacuteblicos recebidos por

instituiccedilotildees privadas para aplicaccedilatildeo compulsoacuteria em educaccedilatildeo sauacutede ou assistecircncia social ldquoA

proteccedilatildeo eacute louvaacutevel e tutela toda a coletividade ao privilegiar o direito agrave educaccedilatildeo sauacutede e

assistecircncia social em detrimento do direito do credorrdquo

De acordo com o inciso X do art 833 do CPC eacute impenhoraacutevel ateacute o limite de

quarenta salaacuterios miacutenimos a quantia depositada em caderneta de poupanccedila

Eacute uma modalidade de impenhorabilidade relativa (o CPC73 a considerava absoluta)

tendo em vista que essa impenhorabilidade natildeo pode ser oposta na execuccedilatildeo de alimentos

independentemente da sua origem (art 833 sect 2ordm do CPC) Fredie Didier et al cita Araken de

Assis111 ao afirmar que

a regra soacute protege essa aplicaccedilatildeo financeira Se o valor estiver depositado em fundo de investimento por exemplo poderaacute ser penhorado Se o devedor tiver vaacuterias cadernetas de poupanccedila a impenhorabilidade aplica-se agrave soma de todas elas e natildeo a cada uma delas isoladamente do contraacuterio valores expressivos poderiam ser pulverizados em vaacuterias contas burlando a finalidade da regra que eacute a de proteger a populaccedilatildeo de baixa renda

Ademais satildeo tambeacutem impenhoraacuteveis por forccedila do inciso XI os recursos puacuteblicos do

fundo partidaacuterio recebidos por partido poliacutetico nos termos da lei Essa modalidade de

impenhorabilidade ldquose restringe aos recursos puacuteblicos do fundo partidaacuterio Recursos de

origem privada recebidos pelo partido poliacutetico poderatildeo ser penhoradosrdquo 112 O processualista

Fredie Didier et al113 assevera que

Assim a impenhorabilidade foi estabelecida no intuito de impedir que os diretoacuterios nacionais de partidos poliacuteticos respondam por diacutevida dos diretoacuterios

110 Ibid p 836 111 DIDIER JR Fredie et al apud ASSIS Araken de Manual da execuccedilatildeo 11ordm ed cit p 225 Assim

tambeacutem REDONDO Bruno Garcia LOJO Maacuterio Vitor Suarez Penhora cit p 117 BUENO Cassio Scarpinella Curso sistematizado de Direito Processual Civil v 3 cit p 228 GIANNICO Mauriacutecio As novas reformas do CPC e de outras normas processuais Mauriacutecio Giannico e Viacutetor Joseacute de Mello Monteiro (coord) Satildeo Paulo Saraiva 2009 p 1 OS Em sentido diverso estendendo a impenhorabiacutelidade aos depoacutesitos feitos ateacute esse valor em CDB CDI fundos de renda fixa ou de accedilotildees RODRIGUES Marcelo Abelha Manual de execuccedilatildeo civil 3deg ed cit p 101

112 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 839

113 Ibid p 839

46

estaduaismunicipais - sobretudo em razatildeo das vaacuterias decisotildees judiciais que determinaram penhora de recursos do fundo partidaacuterio de alguns partidos

Por fim o inciso XII do artigo 833 do CPC trata sobre a impenhorabilidade dos

creacuteditos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias sob o regime de incorporaccedilatildeo imobiliaacuteria

vinculados agrave execuccedilatildeo de obra ldquoO objetivo dessa modalidade eacute evitar que diacutevidas do

incorporador possam consumir os recursos que seriam utilizados na realizaccedilatildeo da obra em

prejuiacutezo dos adquirentes de unidades autocircnomasrdquo 114

O professor Misael Montenegro Filho115 aduz sobre que ldquoao estabelecer a

impenhorabilidade dos creacuteditos oriundos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias o novo CPC

protegeu os valores destinados agrave execuccedilatildeo da obra e agrave entrega das unidades imobiliaacuterias aos

adquirentes assegurando assim a execuccedilatildeo da promessa contratualrdquo

Importante frisar ainda que a Lei nordm 8009 1990 instituiu a impenhorabilidade do

imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar por qualquer diacutevida salvo as exceccedilotildees dos

seus arts 3ordm e 4ordm

A referida lei dispotildee que Para os efeitos de impenhorabilidade considera-se

residecircncia um uacutenico imoacutevel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia

permanente (art 5ordm)

O processualista baiano Fredie Didier et al116 assevera que

A lei propotildee-se a proteger imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar nos termos acima expostos A CF 88 ampliou o conceito de entidade familiar para abranger a famiacutelia monoparental e a uniatildeo estaacutevel Mas deve considerar-se aiacute compreendidos os irmatildeos que vivem juntos e a uniatildeo homossexual Ateacute o solteiro estaacute abrangido pela impenhorabilidade se reside soacute no imoacutevel - isso em nome da proteccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana e da moradia digna Na verdade houve uma mudanccedila de compreensatildeo acerca do sentido da proteccedilatildeo de proteccedilatildeo da famiacutelia agrave proteccedilatildeo da moradia indispensaacutevel agrave preservaccedilatildeo da dignidade da pessoa

114 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o

novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 388

115 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MONTENEGRO FILHO Misael Novo Coacutedigo de Processo Civil Comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Atlas 2016 p 752

116 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 840-841

47

O STJ jaacute consolidou esse entendimento na suacutemula nordm 364 O conceito de

impenhorabilidade de bem de famiacutelia abrange tambeacutem o imoacutevel pertencente a pessoas

solteiras separadas e viuacutevas

Entretanto se o casal ou entidade familiar possuir vaacuterios imoacuteveis utilizados como

residecircncia a impenhorabilidade recairaacute sobre o de menor valor (art 5ordm paraacutegrafo uacutenico) ldquoEacute o

que ocorre por exemplo quando a famiacutelia se divide em mais de uma cidade por motivos

profissionaisrdquo 117

Forccediloso observar ainda que a impenhorabilidade do imoacutevel familiar eacute relativa jaacute que

natildeo pode ser oposta a qualquer creacutedito O art 3ordm da Lei n 8009 1990151 em que pode ser

penhorada a residecircncia da famiacutelia (exemplo execuccedilatildeo de alimentos para cobranccedila de taxas

devidas em funccedilatildeo do imoacutevel familiar etc)

Resta claro que o artigo 833 do CPC ao disciplinar as hipoacuteteses de impenhorabilidade

possui o escopo de proteger o princiacutepio da dignidade humana Entretanto algumas claacuteusulas

natildeo possuem proteccedilatildeo absoluta ldquoa sua relativizaccedilatildeo a depender do caso sob exame deve ser

realccedilada agrave medida que a dignidade resguardada e protegida pelo sistema processual-

constitucional natildeo se limita ao executadordquo 118 Ademais ldquoEacute premente advertidamente que a

dignidade do credor tambeacutem seja garantida em juiacutezo tendo como norte pois os princiacutepios da

proporcionalidade e razoabilidaderdquo 119

117 Ibid p 841 118 Ibid p 752 119 Ibid p 752

48

4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA

ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE

HUMANA DO EXECUTADO

41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE

EFETIVACcedilAtildeO

Como jaacute exposto em linhas preteacuteritas nos meios executivos tiacutepicos as medidas

executivas satildeo determinadas pela lei ou seja o oacutergatildeo pode aplicar somente as medidas

tipificadas no ordenamento juriacutedico No entanto ao se tratar das medidas executivas atiacutepicas

eacute necessaacuterio que haja um limite na atuaccedilatildeo realizada pelo juiz

O poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo poder ser realizado de maneira indiscriminada haacute

pressupostos e premissas a serem observadas Dessa forma a primeira premissa eacute no sentindo

de que a medida executiva atiacutepica natildeo pode ser a primeira medida a ser invocada ldquomuito ao

reveacutes a regra do nosso sistema continua a ser o da tipicidade dos meios executivos soacute que

agora temperado pelo sistema atiacutepicordquo 120 O processualista Thiago Rodovalho explica que

ldquo() os meios atiacutepicos natildeo satildeo prima ratio e sim a ultima ratio eacute dizer esgotados e

frustrados os meios executivos tiacutepicos e ordinaacuterios pode-se em tese valer-se do sistema

atiacutepicordquo121

Dessa forma nos casos de execuccedilatildeo que tenha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

natildeo deve ser aplicado de logo as medidas indutivas e coercitivas Apenas apoacutes frustradas as

medidas ldquonaturaisrdquo pode-se passar agrave aplicaccedilatildeo das medidas atiacutepicas

Uma segunda premissa diz a respeitos dos meios de pressatildeo para compelir o devedor a

adimplir com o seu deacutebito ldquoEssa segunda premissa decorre inclusive de imperiosidade

loacutegica de nada adianta a medida de pressatildeo se a obrigaccedilatildeo natildeo tem como ser adimplida pelo

devedorrdquo 122

Para Thiago Rodovalho123 ldquoIsso quer significar que esgotados e frustrados os meios

tiacutepicos o juiz se valeraacute dos meios atiacutepicos se eles forem potencialmente haacutebeis a estimular ou

120 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da

atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018

121 Ibid sem paginaccedilatildeo 122 Ibid sem paginaccedilatildeo 123 Ibid sem paginaccedilatildeo

49

forccedilar o cumprimento o que pressupotildee sua possibilidade quando entatildeo eles poderatildeo ser

eficazesrdquo

Logo nas obrigaccedilotildees de pagar quantia se houver a real demonstraccedilatildeo da

impossibilidade financeira do devedor seria um constrangimento inuacutetil e desnecessaacuterio a

imposiccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo para forccedilar o cumprimento

Por isso as medidas atiacutepicas devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o

esgotamento das medidas tiacutepicas e a possibilidade de cumprimento de cumprimento da

obrigaccedilatildeo

Ademais superadas as supracitadas premissas e o oacutergatildeo julgador vislumbrando a

necessidade da aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo se faz necessaacuterio que um conjunto de

postulados e princiacutepios rejam a atuaccedilatildeo do oacutergatildeo julgador servindo de norte para a escolha da

medida executiva mais adequada ldquoDe modo geral a escolha deve pautar-se nos postulados da

proporcionalidade da razoabilidade (art8ordm CPC) e da proibiccedilatildeo de excesso bem como nos

princiacutepios da eficiecircncia e da menor onerosidade da execuccedilatildeordquo 124

O professor Fredie Didier et al125 eacute categoacuterico ao citar Humberto Aacutevila

Segundo Humberto Aacutevila o postulado da proporcionalidade se manifesta nas situaccedilotildees em que haacute uma relaccedilatildeo de causalidade entre dois elementos empiricamente discerniacuteveis um meio e um fim de tal sorte que se possa proceder aos trecircs exames fundamentais o da adequaccedilatildeo (o meio promove o fim) o da necessidade (dentre os meios disponiacuteveis e igualmente adequados para promover o fim natildeo haacute outro meio menos restritivo do(s) direito(s) fundamental (is) afetado(s)) e o da proporcionalidade em sentido estrito (as vantagens trazidas pela promoccedilatildeo do fim correspondem agraves desvantagens provocadas pela adoccedilatildeo do meio)

O juiz ao aplicar a medida executiva atiacutepica ao caso concreto deve ter seu

embasamento no princiacutepio da proporcionalidade para saber se a medida a ser tomada eacute a

melhor opccedilatildeo ao caso sub judice ldquoO exame de proporcionalidade aplica-se sempre que

houver uma medida concreta destinada a realizar uma finalidaderdquo 126

Em verdade a aplicaccedilatildeo do princiacutepio da proporcionalidade eacute imprescindiacutevel na adoccedilatildeo

dos meios executivos atiacutepicos tendo em vista que ldquo() tais medidas em especial quando de

124 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111 125 DIDIER JR Fredie et al apud AVILA Humberto Teoria dos princiacutepios da definiccedilatildeo agrave aplicaccedilatildeo

dos princiacutepios juriacutedicos 16 ed Satildeo Paulo Malheiros 2015 p 205 126 DIDIER JR Fredie et al op cit p 111

50

natureza coercitiva podem restringir direitos do devedor e incidir diretamente sobre sua

pessoardquo127 Logo ainda que o princiacutepio da efetividade da tutela executiva seja um direito

fundamental o mesmo ldquo() deve ser compatibilizado com direitos fundamentais do

executado para que a sua dignidade humana seja preservadardquo 128

Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Neves129 afirma que em nome do princiacutepio da

proporcionalidade o juiz deveraacute

() ponderar no caso concreto as vantagens praacuteticas da adoccedilatildeo de cada medida executiva atiacutepica em especial as de natureza coercitiva e as desvantagens de sua adoccedilatildeo levando em conta a possibilidade de a medida criar uma limitaccedilatildeo excessiva ao exerciacutecio de direito fundamental do executado

Outro princiacutepio que o oacutergatildeo julgador deve se ater ao escolher a medida executiva

atiacutepica eacute o da razoabilidade Segundo Fredie Didier et al 130 o princiacutepio (ou postulado)131 se

manifesta de trecircs formas

a) como dever de equidade a exigir a harmonizaccedilatildeo da norma geral com o caso individual impondo a consideraccedilatildeo daquilo que normalmente acontece em detrimento do que eacute extraordinaacuterio e tambeacutem impondo a consideraccedilatildeo das especificidades do caso concreto ante a generalidade da norma b) como dever de congruecircncia a exigir a harmonizaccedilatildeo das normas com suas condiccedilotildees externas de aplicaccedilatildeo (isto eacute com a realidade com base em que foram editadas) c) como dever de equivalecircncia a exigir uma relaccedilatildeo de equivalecircncia entre a medida adotada e o criteacuterio que a dimensiona

Logo ldquo() o princiacutepio da razoabilidade deve nortear a atuaccedilatildeo do juiz na adoccedilatildeo das

medidas executivas atiacutepicas previstas no art 139 IV do Novo CPCrdquo 132 tendo em vista que

ldquo() mesmo medidas que pelo princiacutepio da proporcionalidade podem se mostrar

abstratamente possiacuteveis de adoccedilatildeo no caso concreto podem se mostrar inadequadas e

irrazoaacuteveisrdquo 133

127 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Medidas executivas atiacutepicas na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de

pagar quantia certa art 139 IV do novo CPC Revista de Processo v 42 n 265 mar 2017 p 14 128 Ibid p 14 129 Ibid p 14 130 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111-112 131 Segundo Fredie Didier et al o postulado eacute uma norma que atua sobre a aplicaccedilatildeo de outras normas

A proporcionalidade e a razoabilidade seriam postulados normativos e natildeo princiacutepios segundo essa concepccedilatildeo 132 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo op cit p 14 133 Ibid p 14

51

Ademais conforme dispotildee o postulado da proibiccedilatildeo de excesso ldquoa realizaccedilatildeo de uma

regra ou princiacutepio constitucional natildeo pode conduzir agrave restriccedilatildeo a um direito fundamental que

lhe retire um miacutenimo de eficaacuteciardquo 134

A proibiccedilatildeo de excesso deveraacute sempre ser suscitada quando um direito fundamental

houver sido violado a ponto do direito fundamental sofrer violaccedilatildeo excessiva Ademais ldquoesse

postulado natildeo se confunde com o da proporcionalidade porque ele dispensa os exames da

adequaccedilatildeo (relaccedilatildeo meiofim) da necessidade (exigibilidade) ou da proporcionalidade em

sentido estrito (ponderaccedilatildeo entre vantagens e desvantagens)rdquo 135

Logo ldquopouco importa a relaccedilatildeo meiofim ou a exigibilidade da medida ou ainda a

ponderaccedilatildeo com outro direito fundamental eventualmente em jogo aqui se analisa apenas a

eficaacutecia de um determinado direito fundamentalrdquo 136

O princiacutepio da eficiecircncia tem previsatildeo constitucional no art 37 e previsatildeo

infraconstitucional no art 8ordm do CPC15 O referido princiacutepio determina que o processo seja

conduzido de forma eficiente pelo oacutergatildeo jurisdicional

Entende-se que eficiente eacute a atuaccedilatildeo que utilize adequadamente os meios necessaacuterios

para que se atinjam os fins almejados O oacutergatildeo jurisdicional na escolha dos meios a serem

utilizados para a obtenccedilatildeo dos fins

a) deve escolher aqueles que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo (deve evitar meios que promovam resultados insignificantes) b) deve escolher meios que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado (natildeo se pode escolher um meio de resultado duvidoso) c) natildeo pode escolher um meio que produza muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscado 137

O juiz deveraacute igualmente analisar o princiacutepio da menor onerosidade da execuccedilatildeo que

eacute previsto pelo art 805 do CPC ldquoArt 805 Quando por vaacuterios meios o exequente puder

promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o

executadordquo

134 134 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 112 135 Ibid p 112 136 Ibid p 112 137 Ibid p 112-113

52

Logo ldquohavendo duas opccedilotildees igualmente eficazes para permitir alcanccedilar o resultado

pretendido (satisfaccedilatildeo do creacutedito) deveraacute o oacutergatildeo julgador valer-se daquela que menos onere

a situaccedilatildeo do executadordquo 138

O dito princiacutepio impede o comportamento abusivo do exequente que possa beneficiar-

se do meio mais danoso ao executado protegendo dessa forma a lealdade e a eacutetica

processual

Os postulados e princiacutepios analisados em linhas preteacuteritas impotildeem ao oacutergatildeo julgador a

observacircncia de alguns criteacuterios para a escolha da medida executiva atiacutepicas a ser utilizada no

caso concreto

Primeiramente a medida executiva atiacutepica deveraacute ser adequada ldquoO criteacuterio da

adequaccedilatildeo impotildee que juiz considere abstratamente uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida

executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia

a gerar o resultadordquo 139 Nesse primeiro momento o juiz deveraacute observar sob a perspectiva do

credor qual medida teraacute o condatildeo de gerar o resultado mais efetivo

Segundo Fredie Didier et al140 o criteacuterio da adequaccedilatildeo eacute

() fortemente inspirado pelo postulado da proporcionalidade e pelo princiacutepio da eficiecircncia na parte em que esse princiacutepio determina a escolha de meios que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo e que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado

Ademais a medida adotada pelo oacutergatildeo julgador deveraacute ser necessaacuteria ldquoEsse criteacuterio

impotildee um limite agrave atuaccedilatildeo judicial funcionando como uma espeacutecie de contrapeso ao criteacuterio

da adequaccedilatildeo Aqui deve-se levar em conta a posiccedilatildeo do devedorrdquo141

O juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental agrave execuccedilatildeo e determinar

uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute necessaacuterio que a

medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado O criteacuterio da necessidade

estabelece que ldquonatildeo se pode ir aleacutem do necessaacuterio para alcanccedilar o propoacutesito almejado Deve

138 Ibid p 113 139 Ibid p 113 140 Ibid p 113 141 Ibid p 114

53

pois o oacutergatildeo julgador determinar o meio executivo na medida do estritamente necessaacuterio para

proporcionar a satisfaccedilatildeo do creacutedito ndash nem menos nem maisrdquo 142

O referido criteacuterio possui forte influecircncia dos postulados da proibiccedilatildeo do excesso e da

razoabilidade assim como do princiacutepio da menor onerosidade para o executado Assevera

Fredie Didier et al143 que

Natildeo eacute razoaacutevel por exemplo impor como primeira opccedilatildeo medida coercitiva a ser suportada pelo agente puacuteblico pelo simples fato de o juiz pressupor que o ente puacuteblico ao qual ele eacute vinculado iraacute descumprir determinada ordem judicial - o descumprimento natildeo pode ser visto como algo ordinaacuterio ou cotidiano (razoabilidade como dever de equidade) Tampouco eacute razoaacutevel eleger a prisatildeo civil como meacutetodo prioritaacuterio para compelir o executado ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer (razoabilidade como dever de equivalecircncia) Aleacutem disso eacute vedada por exemplo a imposiccedilatildeo de multa coercitiva para compelir o executado a emitir declaraccedilatildeo de vontade uma vez que haacute previsatildeo expressa de medida tiacutepica capaz de proporcionar o mesmo resultado sem sacrifiacutecio para o devedor (art 501 CPC)

A afirmaccedilatildeo feita por Bonavides144 em 1997 sobre a adequaccedilatildeo e a necessidade

continua atual sobre os motes

O meio empregado pelo legislador deve ser adequado e necessaacuterio para alcanccedilar o objetivo procurado O meio eacute adequado quando com seu auxiacutelio se pode alcanccedilar o resultado desejado eacute necessaacuterio quando o legislador natildeo poderia ter escolhido outro meio igualmente eficaz mas que natildeo limitasse ou limitasse de maneira menos sensiacutevel o direito fundamental

Por fim a medida deve conciliar os interesses contrapostos ldquoO magistrado deve

ponderar os interesses em jogo aplicando a proporcionalidade em sentido estrito de modo

que as vantagens da utilizaccedilatildeo da medida atiacutepica escolhida superem as vantagens de seu usordquo 145

Esse criteacuterio natildeo privilegia nem o credor nem o devedor e sim a soluccedilatildeo mais

equilibrada e que atenda da melhor forma aos valores em conflito ldquoTrata-se de criteacuterio

inspirado nos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade bem como no princiacutepio da

142 Ibid p 114 143 Ibid p 114 144 BONAVIDES Paulo Curso de Direito Constitucional 7ordm ediccedilatildeo Satildeo Paulo Ed Malheiros 1997

p 372 145 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 114-115

54

eficiecircncia na parte em que impotildee ao juiz evitar a escolha do meio executivo que produza

muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscadordquo 146

Cada um dos criteacuterios supracitados devem ser considerados pelo juiz ao aplicar as

medidas executivas atiacutepicas ao caso concreto Para Fredie Didier et al147 as medidas como

retenccedilatildeo de CNH passaporte ou cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado como

forma de pressionaacute-lo ao pagamento da diacutevida pecuniaacuteria natildeo satildeo possiacuteveis

Essas natildeo satildeo medidas adequadas ao atingimento do fim almejado (o pagamento de quantia) - natildeo haacute propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente Tais medidas soam mais como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-lo ao cumprimento da ordem judicial - e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a utilizaccedilatildeo de meios sancionatoacuterios pelo magistrado mas apenas de meios de coerccedilatildeo indireta e sub-rogatoacuterios

Ainda que adequadas fossem a retenccedilatildeo de CNH e do passaporte no corte de fornecimento de aacutegua natildeo parecem ser medidas necessaacuterias (no sentido de exigiacuteveis) uma vez que outras medidas podem em tese ser utilizadas sem causar igual gravame ao executado - como por exemplo a simples restriccedilatildeo do uso de cartotildees de creacutedito A retenccedilatildeo de documentos pessoais eacute medida que termina por restringir a liberdade de ir e vir do executado mostrando-se a princiacutepio natildeo-razoaacutevel por ir de encontro ao dever de equivalecircncia e desproporcional por restringir demais o direito agrave liberdade em favor do direito de creacutedito pecuniaacuterio do exequente

O processualista baiano et al148 cita tambeacutem outro exemplo de medida atiacutepica que natildeo

atingem os criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade

Tampouco parece adequada em princiacutepio determinaccedilatildeo de corte de energia eleacutetrica de todo o preacutedio onde funciona serviccedilo puacuteblico administrativo como forma de pressionar o ente federado a cumprir ordem de nomeaccedilatildeo de candidato em concurso puacuteblico Natildeo parece haver relaccedilatildeo meiofim entre uma coisa e outra Tambeacutem natildeo eacute possiacutevel enxergar essa medida como necessaacuteria no sentido de ser a menos gravosa para o devedor - observe que se trata de medida que uma vez aplicada ensejaria restriccedilatildeo de funcionamento em toda a reparticcedilatildeo puacuteblica em prejuiacutezo de serviccedilos puacuteblicos essenciais ao funcionamento da Administraccedilatildeo o que aleacutem de ser excessivamente gravoso parece natildeo se conformar agrave necessidade de ponderaccedilatildeo dos interesses em jogo - aleacutem de afetar a um sem-nuacutemero de pessoas tomadoras desses serviccedilos

Ademais eacute sabido que toda e qualquer decisatildeo judicial precisa ser fundamentada Ao

se tratar das medidas executivas atiacutepicas o papel da fundamentaccedilatildeo se torna ainda mais

146 Ibid p 115 147 Ibid p 115 148 Ibid p 116

55

importante tendo em vista que eacute pela fundamentaccedilatildeo da decisatildeo que se poderaacute controlar a

adequaccedilatildeo e necessidade da medida atiacutepica

Pelo fato das medidas executivas atiacutepicas derivarem de dispositivos normativos

considerados claacuteusulas gerais propiacutecias as mais variadas interpretaccedilotildees eacute de extrema

importacircncia que o oacutergatildeo julgador fundamente sua decisatildeo

Logo ldquodeve o juiz na fundamentaccedilatildeo decisoacuteria expor racionalmente os motivos da

sua escolha demonstrando com atenccedilatildeo ao art 489 sect 1ordm CPC de que modo a sua opccedilatildeo

atende os criteacuterios da adequaccedilatildeo necessidade e proporcionalidade em sentido estrito ()rdquo 149

Dessa forma os princiacutepios da proporcionalidade e razoabilidade servem para delimitar

o alcance das claacuteusulas gerais de efetivaccedilatildeo fazendo com que o oacutergatildeo julgador se atenha aos

criteacuterios da adequaccedilatildeo e necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao caso

concreto

42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO

EXECUTADO

A entrada em vigor do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 aflorou ainda mais uma

discussatildeo essencial para os processualistas do seacuteculo XXI qual eacute o verdadeiro protagonista do

processo civil

Para os que defendem o ldquoautoritarismo processualrdquo o verdadeiro protagonista do

processo civil eacute o oacutergatildeo judiciaacuterio que em nome do desempenho efetivo de suas funccedilotildees lhes

eacute permitido dilatar os poderes que diga-se de jaacute passagem jaacute compotildeem um vastiacutessimo

arsenal150

Jaacute os ldquogarantistasrdquo 151 do processo civil acreditam que os verdadeiros protagonistas satildeo

as partes do processo e seus direitos e garantias devem ser estritamente preservados

Devido a essa disputa de quem possui maior protagonismo no processo as mudanccedilas

ocorridas no coacutedigo processual vigente quanto agraves medidas executivas atiacutepicas despertaram

149 Ibid p 117 150 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos

atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04102018

151 O processualista Araken de Assis acredita que o termo garantista eacute descabido tendo em vista que remete ao processo penal

56

maior celeuma do que qualquer outra modificaccedilatildeo trazida pelo CPC15 Afinal as referidas

medidas acirravam ainda mais a disputa pelo protagonismo processual

O fato de o CPC15 dispor no art 139 IV que o juiz poderaacute decretar todas as medidas

indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o

cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo

pecuniaacuteria levou boa parte da doutrina e dos juiacutezes a acreditar que teria pleno direito de

aplicar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo Entretanto muitos se esqueceram do outro lado

da moeda esqueceram que a dignidade humana do executado tambeacutem eacute um direito

fundamental e natildeo pode ser violado

Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa152

acreditam que

() natildeo parece producente elencar um rol abstrato das medidas que poderiam ser aplicadas pelo juiz a tiacutetulo do art 139 IV CPC Afinal se busca a efetividade da execuccedilatildeo e esta soacute pode ser identificada agrave luz das especificidades da situaccedilatildeo concreta Ideal eacute enveredar pela loacutegica modular (adequaccedilatildeo ao caso) natildeo pela geneacuterica (soluccedilotildees abstratas de pretensa utilidade universal)

Em razatildeo de o dispositivo apresentar uma gama de poderes tatildeo amplos agrave disposiccedilatildeo do

oacutergatildeo julgador sem nenhuma estipulaccedilatildeo de um procedimento legal previamente definido para

que estabeleccedila as condiccedilotildees de sua aplicaccedilatildeo em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo eacute

necessaacuterio que em razatildeo do princiacutepio da dignidade humana natildeo busque definir o que o

dispositivo permite mas de definir o que ele natildeo permite ldquoOu seja propotildee-se a sua

compreensatildeo por exclusatildeo Afinal se ele tem potencialidade para promover a efetividade da

tutela tambeacutem pode provocar lesotildees E como em direito os fins natildeo justificam os meios

ressalta como prioritaacuteria a necessidade de estabelecer limitesrdquo 153

O art 789 do CPC15 disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial e eacute

categoacuterico ao dispor que ldquoo devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para

152 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

153 Ibid sem paginaccedilatildeo

57

o cumprimento de suas obrigaccedilotildees salvo as restriccedilotildees estabelecidas em leirdquo Logo a

execuccedilatildeo somente poderaacute incidir sobre os bens do devedor e natildeo sobre a sua pessoa

Como eacute sabido a Lex Poetelia Papiria de 326 aC foi o primeiro marco legal da

humanizaccedilatildeo das cobranccedilas de diacutevidas abolindo a imposiccedilatildeo ao devedor de castigos

vexatoacuterios e ateacute da pena de morte154

Afinal no direito romano antigo a cobranccedila de diacutevidas poderia recair sobre a pessoa

do devedor que respondia com sua liberdade e ateacute mesmo com seu proacuteprio corpo permitindo

a lei que repartissem tantos pedaccedilos do corpo do devedor quantos fossem seus credores

Nesse sentindo leciona o professor Guilherme Pupe da Noacutebrega155 que

Vem de longe a evoluccedilatildeo no sentido de fazer a responsabilidade por uma obrigaccedilatildeo migrar da pessoa do devedor para seu patrimocircnio Merecem registro especiacutefico como marcos histoacutericos remotos a Lex Poetelia Papiria de 326 aC que aboliu o nexum e possibilidade de escravidatildeo do devedor como garantia da obrigaccedilatildeo e a pignoris capio ou ldquoaccedilatildeo por tomada de penhorrdquo que instituiu a possibilidade de o credor tomar parcela dos bens do devedor como forma de assegurar o adimplemento da diacutevida Aqueles institutos culminariam seacuteculo depois no artigo 789 do CPC de 2015 a consagrar que o devedor responda pela satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo com seus bens presentes e futuros observadas as restriccedilotildees impostas pelas impenhorabilidades legais

Logo o avanccedilar da civilizaccedilatildeo marcou o deslocamento da responsabilidade por

diacutevidas saindo do corpo do devedor para o seu patrimocircnio tendo em vista que a vida

humana a liberdade e a integridade fiacutesica satildeo valores inalienaacuteveis natildeo podendo ser

sacrificadas em benefiacutecio de obrigaccedilotildees pecuniaacuterias 156

Entretanto eacute sabido que a responsabilidade patrimonial eacute excepcionada pela prisatildeo

civil do devedor de verba alimentiacutecia resquiacutecio da responsabilidade pessoal romana

154 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt

httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018

155 NOacuteBREGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139 IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018

156 Ibid sem paginaccedilatildeo

58

No entanto haacute uma justificativa para isso Segundo o processualista Guilherme Pupe

da Noacutebrega157

Eacute que a par de a prisatildeo civil encontrar previsatildeo constitucional no inciso LXVII do artigo 5ordm o raciociacutenio eacute o de que o direito do alimentante agrave liberdade de locomoccedilatildeo cede diante dos direitos agrave vida e agrave dignidade titularizados pelo alimentando e resguardados pelos alimentos Foi esse mesmo raciociacutenio aliaacutes que justificou no passado a ediccedilatildeo da suacutemula 309 pelo STJ agora positivada pelo artigo 528 sect 7ordm que limita a modalidade coercitiva agraves trecircs uacuteltimas prestaccedilotildees vencidas e agraves prestaccedilotildees vincendas A ideia eacute que tendo o alimentando subsistido a despeito do natildeo-pagamento de prestaccedilotildees mais antigas essas verbas teriam perdido o caraacuteter alimentar que na equaccedilatildeo antes apresentada justificaria a prisatildeo civil do alimentante Daiacute por que aqueles valores antigos remanescem exigiacuteveis mas somente pela via da expropriaccedilatildeo

Essa ressalva eacute necessaacuteria tendo em vista que a adoccedilatildeo de teacutecnica de execuccedilatildeo

indireta para incursatildeo radical na esfera de direitos do executado notadamente direitos

fundamentais quando carente de respaldo constitucional natildeo merece acolhimento sob

risco de se atentar contra o devido processo legal (artigo 5ordm LIV da Constituiccedilatildeo)

Como afirma o autor Bruno Dantas158 ldquoembora inexistam estatiacutesticas que permitam

comparaccedilotildees natildeo eacute desarrazoado intuir que os iacutendices de inadimplecircncia despeccedilam na razatildeo

inversa da incidecircncia das ordens judiciais sobre o corpo e a liberdade do devedorrdquo Entretanto

eacute natildeo possiacutevel adotar toda e qualquer medida executiva atiacutepica em nome da efetividade da

execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que se saiba os limites da sua aplicaccedilatildeo

Dessa forma instrumentos que permitam o cumprimento forccedilado de contratos e o pagamento

de diacutevidas satildeo necessaacuterios contudo eacute preciso equilibrar essa exigecircncia com a liberdade e a

dignidade humana

Como citado alhures o art 139 IV ensejou decisotildees como a que determinou a

suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o

passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito em uma accedilatildeo se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo

extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

Na supracitada decisatildeo o princiacutepio da responsabilidade patrimonial natildeo estaacute sendo

efetivado para o que o devedor responda com os seus bens Afinal qual ligaccedilatildeo entre a

157 Ibid sem paginaccedilatildeo 158 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt

httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018

59

restriccedilatildeo de circulaccedilatildeo que diz com o direito de ir e vir (liberdade) com o pagamento de

diacutevidas que diz com a responsabilidade civil159

Ademais por que quem natildeo tem dinheiro para pagar diacutevidas natildeo pode dirigir Por que

natildeo tem condiccedilotildees para pagar o deacutebito natildeo pode ter passaporte Por que quem natildeo tem como

pagar o deve natildeo pode ter cartatildeo de creacutedito

Ao utilizar meios executivos atiacutepicos como os supracitados para compelir o devedor a

satisfazer a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria quando exauridos sem ecircxito os meios tradicionais de bens

penhoraacuteveis salvo quando existe qualquer indiacutecio concreto de ocultaccedilatildeo ou dissipaccedilatildeo de

bens eacute obrigar o devedor abrir matildeo da proteccedilatildeo da lei que lhe impede que seja tomado agrave forccedila

(art 833 CPC e demais disposiccedilotildees que tratam da impenhorabilidade)

Segundo Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa160

Claramente essa pressatildeo visa dar uma aparecircncia de voluntariedade agrave indicaccedilatildeo de bens impenhoraacuteveis pelo proacuteprio executado que na verdade soacute age assim por ser a uacutenica forma de ver-se livre de um grame imposto por medida indutiva despedida de qualquer necessidade ou adequaccedilatildeo Uma intoleraacutevel perversatildeo

Os autores afirmam ainda que o ldquodireito paacutetrio natildeo admite esta contraditio in terminis

sendo inaceitaacutevel a coexistecircncia de regra protetiva do executado com outra que concede ao

juiz poderes para forccedilar (ainda que indiretamente e veladamente) o executado a abrir matildeo

daquela proteccedilatildeordquo 161

Logo eacute cristalino que a suspensatildeo da CNH eacute uma forma incorreta de aplicar a medida

executiva atiacutepica para efetivar o direito fundamental a execuccedilatildeo tendo em vista que o uacutenico

objetivo da referida eacute pressionar o executado abrir matildeo de algum bem impenhoraacutevel para

levantar o dinheiro e cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

A retenccedilatildeo do passaporte igualmente natildeo possui qualquer relaccedilatildeo com a diacutevida do

executado e eacute somente uma forma de tentar pressiona-lo a dispor de um bem que natildeo pode

ser tomado agrave forccedila e puni-lo por natildeo ter cumprido voluntariamente com a sua obrigaccedilatildeo

159 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

160 Ibid sem paginaccedilatildeo 161 Ibid sem paginaccedilatildeo

60

Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa162

acreditam que tal medida eacute equivocada e se torna excessivamente onerosa ao executado

As mais variadas circunstacircncias relevem o equiacutevoco de tal medida aplicada assim genericamente Com efeito nada justifica reter o passaporte do executado e impedi-lo de viajar para o exterior quando eacute agraciado inclusive com todas as despesas pagas com presente sorteio ou precircmio (por completar tempo de serviccedilo ou atingir metas produtividade na sociedade empresaacuteria em que trabalha) Como todo custo eacute suportado por terceiro e por isso mesmo a sua realizaccedilatildeo pelo executado natildeo traria qualquer prejuiacutezo ao exequente e a retenccedilatildeo do passaporte natildeo seria injustificaacutevel

Paulo Antonio Papini163 acredita que natildeo tem a apreensatildeo de passaporte natildeo possui um

fundamento plausiacutevel tendo em vista que se o devedor natildeo pode viajar para saldar o deacutebito

tambeacutem natildeo poderia exercer atividades cotidianas

Com todo o respeito a quem pensa dessa forma o argumento eacute muito simploacuterio e natildeo precisamos sequer do Direito para derrubaacute-lo Com efeito se considerarmos que ndash ateacute mesmo pelas dimensotildees continentais do Brasil ndash natildeo eacute incomum que uma passagem para o Nordeste custe mais caro que um voo para Miami seria razoaacutevel entatildeo seguindo a linha argumentativa do Magistrado em questatildeo que se oficiasse aos oacutergatildeos reguladores da aviaccedilatildeo civil proibindo-se aquele devedor de fazer ateacute mesmo voos domeacutesticos Poder-se-ia ir mais longe jaacute que natildeo tem dinheiro para pagar suas diacutevidas certamente aquele devedor tambeacutem natildeo teria para comer fora de sua casa porque entatildeo natildeo determinar a expediccedilatildeo de ofiacutecio aos restaurantes proacuteximos agrave sua casa e determinar tambeacutem a proibiccedilatildeo de que ele fosse servidoatendido

O autor se questiona ainda ldquoSeraacute entatildeo que o Princiacutepio da Dignidade da Pessoa

Humana estaacute de mero enfeite em nossa Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ()rdquo 164 Tendo em vista

que ldquoa decisatildeo em comento viola diretamente o art 5ordm incisos XV LIII e LXIII da

Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ndash falamos do Direito de Ir e Virrdquo 165

Ademais o cancelamento do cartatildeo de creacutedito eacute mais uma forma de constranger e

compelir o executado a cumprir com a obrigaccedilatildeo de qualquer forma natildeo importando o que

precise fazer para conseguir saldar o deacutebito tendo em vista que a referida medida apresenta

162 Ibid sem paginaccedilatildeo 163 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo

pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018

164 Ibid sem paginaccedilatildeo 165 Ibid sem paginaccedilatildeo

61

qualquer adequaccedilatildeo com o fim desejado (reverter em pagamento para o exequente) Os

autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa afirmam que166

Reconhece-se que as razotildees da afirmaccedilatildeo ora questionada satildeo ateacute intuitivas mas eacute plenamente possiacutevel problematiza-las Ora natildeo se encontra qualquer justificativa idocircnea para que o juiz possa cancelar o contrato do executado com a administradora do cartatildeo de creacutedito (ou instituiccedilatildeo financeira) que natildeo tem qualquer relaccedilatildeo com o creacutedito exequendo muito menos como isso poderia impactar positivamente na execuccedilatildeo (senatildeo para pressionar o executado a dispor de bens impenhoraacuteveis) Ademais natildeo foram indicados sequer sinais de que o executado realiza gastos supeacuterfluos com o cartatildeo de creacutedito ndash natildeo que isso justificasse a medida pois o correto seria penhorar os esses bens (se duraacuteveis naturalmente) ao inveacutes de cancelar o cartatildeo de creacutedito

Logo as referidas medidas natildeo possuem qualquer relaccedilatildeo com o atingimento do fim

almejado (o pagamento de quantia) tendo em vista que natildeo haacute uma relaccedilatildeo meiofim entre

tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a

restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia

ao exequente

Dessa forma nota-se que as medidas de suspensatildeo da CNH retenccedilatildeo de passaporte e

bloqueio do cartatildeo de credito satildeo completamente inadequadas agrave realizaccedilatildeo a que se prestam

Afinal ldquotais medidas soam como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-

lo ao cumprimento da ordem judicial ndash e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a

utilizaccedilatildeo dos meios sancionatoacuterios pelo magistrado ()rdquo167

Como exposto em linhas preteacuteritas o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades

de aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e

razoaacutevel se atendo aos criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas

executivas atiacutepicas ao caso concreto sob pena de converter a medida em de indutiva para

punitiva

A utilizaccedilatildeo de medidas atiacutepicas como a suspensatildeo da carteira de motorista e o

passaporte do devedor abandona a regra da responsabilidade patrimonial e atingem em cheio

o nuacutecleo de direitos inerentes agrave condiccedilatildeo humana

166 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

167 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 115

62

O limite para a aplicaccedilatildeo de tais medidas deve ser a Constituiccedilatildeo Federal e sobretudo

os Direitos fundamentais nela expressos ldquoCom efeito natildeo haacute saiacuteda tampouco soluccedilatildeo eficaz

de um problema sem que se respeite a Lei e o Devido Processo Legal (por mais nobres que

sejam as intenccedilotildees)rdquo 168

Dessa forma a busca desenfreada pelo cumprimento das decisotildees judiciais em

especial na fase executiva natildeo pode ser realizada em sacrifiacutecio de direitos fundamentais O

Poder Judiciaacuterio natildeo pode resolver a crise do processo executoacuterio utilizando de medidas

arbitraacuterias com o propoacutesito de satisfazer obrigaccedilotildees pecuniaacuterias

Eis o dilema que se coloca diante do poder geral de efetivaccedilatildeo ele pode servir de

potente instrumento em prol da tutela jurisdicional executiva entretanto se manejado de

modo improacuteprio serviraacute de instrumento de puniccedilatildeo e humilhaccedilatildeo do executado169

Eacute notoacuterio que se amplamente aplicado o poder geral de efetivaccedilatildeo reduziria os

iacutendices de inadimplecircncia quiccedilaacute resolveria por completo a crise da execuccedilatildeo civil Entretanto

o retrocesso civilizatoacuterio seria irreparaacutevel

168 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo

pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018

169 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

63

5 CONCLUSAtildeO

Como funccedilatildeo jurisdicional que tem como objeto a efetivaccedilatildeo de direitos a execuccedilatildeo

deve sempre buscar a maior satisfaccedilatildeo possiacutevel concretizando integralmente o creacutedito do

exequente isto eacute realizando o direito fundamental agrave tutela executiva do credor Por isso a

adoccedilatildeo de meios executivos atiacutepicos incorporados pelo Coacutedigo de Processo Civil de 2015 por

meio do art139 IV em um primeiro momento podem ser consideradas vaacutelidas visto que

servem de instrumento para a satisfaccedilatildeo e asseguraccedilatildeo de direitos do credor

Entretanto para o oacutergatildeo julgador natildeo cometa arbitrariedades em nome do direito

fundamental agrave execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que seja definido certos limites na adoccedilatildeo do poder

geral de efetivaccedilatildeo

As medidas executivas atiacutepicas natildeo podem ser aplicadas de maneira indiscriminada

logo devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o esgotamento das medidas tiacutepicas e

a possibilidade de cumprimento da obrigaccedilatildeo

Partindo dessa premissa as medidas a serem adotadas pelo juiz no caso concreto

devem ter como baliza os princiacutepios da proporcionalidade e da razoabilidade para que natildeo

ultrapassem a responsabilidade patrimonial do devedor e incidida diretamente sobre sua

pessoa

Para que natildeo seja atingida a pessoa do executado ou seja para que o devedor natildeo

tenha sua dignidade humana viola eacute necessaacuterio que a medida atiacutepica seja adequada e

necessaacuteria

Logo o juiz deveraacute sempre estabelecer uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida

executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia

a gerar o resultado sem violar a dignidade humana do executado

Dessa o juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental a execuccedilatildeo e

determinar uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute

necessaacuterio que a medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado

As medidas que ultrapassam esses limites como a decisatildeo que apreendeu o

passaporte suspensatildeo a CNH e bloqueou o cartatildeo de creacutedito do devedor satildeo meramente

punitivas posto que essas natildeo satildeo as medidas mais adequadas para se atingir o fim almejado

pois natildeo existe propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado

64

uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo

geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente

Medidas como esta servem de embasamento para decisotildees arbitraacuterias e autoritaacuterias de

violaccedilatildeo dos direitos fundamentais transformando o poder geral de efetivaccedilatildeo em

instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com autorizaccedilatildeo judicial

Em suma o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades de aplicaccedilatildeo do poder

geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e razoaacutevel se atendo aos

criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao

caso concreto sob pena de punir a pessoa do executado violando a sua dignidade humana

em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo

65

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  • 1 INTRODUCcedilAtildeO
  • 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO
    • 25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO
      • 3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
        • 31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS
          • 311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15
            • 32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
            • 33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
            • 34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
              • 4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
                • 41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
                • 42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
                  • 5 CONCLUSAtildeO
                  • REFEREcircNCIAS
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DIANDRA GRADIN SCHAUN

OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA

ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE

HUMANA DO EXECUTADO

Monografia aprovada como requisito para obtenccedilatildeo do grau de Especialista em Direito

Processual Civil pela seguinte banca examinadora

Nome _______________________________________________________________

Titulaccedilatildeo e instituiccedilatildeo __________________________________________________

Nome _______________________________________________________________

Titulaccedilatildeo e instituiccedilatildeo __________________________________________________

Nome _______________________________________________________________

Titulaccedilatildeo e instituiccedilatildeo __________________________________________________

Salvador ______2018

RESUMO

A prestaccedilatildeo jurisdicional natildeo se concretiza depois de encerrada a fase de conhecimento Para

que a referida prestaccedilatildeo se consume eacute necessaacuterio que ocorra a satisfaccedilatildeo do deacutebito pelo

devedor que em grande parte soacute se efetiva atraveacutes da tutela executiva Entretanto a execuccedilatildeo

civil sempre sofreu uma crise quanto a sua efetividade e o Coacutedigo de Processo Civil de 2015

com o escopo de dirimir a ineficiecircncia do instituto concebeu novas diretrizes ao processo

executoacuterio Dessa forma o art 139 IV do Coacutedigo de Processo Civil estabeleceu a

possibilidade de o juiz dispor de todas as medidas necessaacuterias para assegurar o cumprimento

de ordem judicial trazendo como grande inovaccedilatildeo a aplicaccedilatildeo dessas medidas tambeacutem nas

obrigaccedilotildees de pagar quantia Todavia eacute necessaacuterio estabelecer criteacuterios limitadores para que a

adoccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo viole a dignidade humana do executado em nome do

direito fundamental agrave execuccedilatildeo

Palavras-chaves Execuccedilatildeo Poder geral de efetivaccedilatildeo Direito fundamental agrave execuccedilatildeo

Dignidade humana do executado

SUMAacuteRIO

1 INTRODUCcedilAtildeO 5

2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL 7

21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL 7

22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL 8

23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL 11

24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO 17

25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO 20

3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 23

31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS 23

311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15 25

32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO 28

33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO 31

34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 36

4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 48

41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO 48

42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 55

5 CONCLUSAtildeO 63

REFEREcircNCIAS 65

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

Art ndash Artigo

CPC15 ndash Coacutedigo de Processo Civil de 2015

CPC73 ndash Coacutedigo de Processo Civil de 1973

ENFAM ndash Escola nacional de formaccedilatildeo e aperfeiccediloamento de magistrados

HC ndash Habeas Corpus

STJ ndash Superior Tribunal de Justiccedila

5

1 INTRODUCcedilAtildeO

A prestaccedilatildeo jurisdicional natildeo costuma se findar apoacutes o encerramento da fase cognitiva

com a prolaccedilatildeo de uma sentenccedila de meacuterito Para que a referida prestaccedilatildeo se concretize eacute

imperioso que haja a satisfaccedilatildeo do deacutebito pelo devedor

Entretanto observa-se em diversos casos o inadimplemento da parte passiva

processual sendo necessaacuterio desenvolver a atividade executiva A referida atividade possui o

escopo de satisfazer direitos

Isso porque o processo natildeo eacute um fim em si mesmo sendo apenas um exerciacutecio da

jurisdiccedilatildeo estatal Dessa forma a razatildeo de ser do processo eacute o atingimento da sua finalidade

almejada que eacute a prestaccedilatildeo da tutela jurisdicional

Todavia como a tutela jurisdicional configura-se na obrigaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio

proteger e reparar os direitos lesionados ou ameaccedilados de lesatildeo muitas vezes a dita tutela

somente consegue ser efetivada atraveacutes da atividade executiva da jurisdiccedilatildeo

Ocorre que a execuccedilatildeo civil sempre foi o ldquocalcanhar de Aquilesrdquo do sistema

processual e de modo geral vinha sofrendo uma crise quanto a sua efetividade Ou seja o

credor obtia ecircxito na fase de conhecimento entretanto natildeo conseguia alcanccedilar o seu direito a

prestaccedilatildeo reconhecida na fase de execuccedilatildeo

Com o fito de tornar a atividade satisfativa mais eficiente e mais ceacutelere o Coacutedigo de

Processo Civil de 2015 concebeu novas diretrizes ao processo no sentindo de harmonizar

suas com os ditames da Constituiccedilatildeo Federal principalmente com os direitos fundamentais

As normas fundamentais do processo civil trazidas pelo CPC15 preocupam-se

primordialmente com a efetividade da tutela jurisdicional

Em conformidade com essa nova sistemaacutetica o legislador no art 139 IV do Coacutedigo

de Processo Civil estabeleceu a possibilidade de o juiz dispor de todas as medidas indutivas

coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o cumprimento de

ordem judicial trazendo como grande novidade a aplicaccedilatildeo dessas medidas executoacuterias

atiacutepicas tambeacutem nas obrigaccedilotildees de pagar dinheiro

6 Entretanto natildeo haacute na legislaccedilatildeo criteacuterios especiacuteficos que auxiliem o oacutergatildeo julgador na

escolha das medidas executivas atiacutepicas que se adotadas sem qualquer baliza podem

acarretar consequecircncias juriacutedicas irreparaacuteveis

Como a famosa decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de

Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-1320138260011 Nessa accedilatildeo

que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo

pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a suspensatildeo da

Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o passaporte e

cancelou os cartotildees de creacutedito como forma de compeli-lo a adimplir com o deacutebito

Decisotildees como esta geram conflitos entre direitos constitucionalmente instituiacutedos De

um lado o direito fundamental agrave tutela jurisdicional e de outro os direitos e garantias

inerentes a todos os indiviacuteduos

Dessa forma a presente monografia tem como escopo de estabelecer criteacuterios

limitadores para que a adoccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo viole a dignidade humana do

executado em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo

7 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO

CIVIL

21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL

A Execuccedilatildeo Civil nasce a partir do direito a uma prestaccedilatildeo conferida a algueacutem de

exigir de outrem o cumprimento de uma conduta de fazer natildeo fazer ou de dar (dinheiro ou

coisa distinta) 1

Para que o direito a uma prestaccedilatildeo se concretize no mundo fiacutesico eacute necessaacuterio que

haja a satisfaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida pelo sujeito passivo Caso contraacuterio fala-se em

inadimplemento ou lesatildeo O titular do direito natildeo tem como agir por si para efetivar o seu

direito a prestaccedilatildeo posto que a autotutela eacute vedada no ordenamento juriacutedico Dessa forma eacute

necessaacuterio que se recorra ao Poder Judiciaacuterio para que se possa ter a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo

devida logo a tutela jurisdicional executiva2

O processualista Fredie Didier et al3 equaciona essa questatildeo da seguinte maneira

Quando se pensa em tutela executiva pensa-se na efetivaccedilatildeo de direitos a uma prestaccedilatildeo fala-se de um conjunto de meios para efetivar a prestaccedilatildeo devida fala-se em execuccedilatildeo de fazer natildeo-fazer dar exatamente os trecircs tipos de prestaccedilatildeo existentes Natildeo eacute por acaso nem por coincidecircncia que a tutela executiva pressupotildee inadimplemento (CPC art 786) - fenocircmeno exclusivo dos direitos a uma prestaccedilatildeo Eacute por isso tambeacutem que se pode falar em prescriccedilatildeo da execuccedilatildeo (CPC art 802 e suacutemula do STF n 150) - prescriccedilatildeo eacute fenocircmeno juriacutedico que se relaciona aos direitos a uma prestaccedilatildeo A execuccedilatildeo forccedilada dirige-se ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo Essa relaccedilatildeo entre direito material e processo eacute fundamental para a compreensatildeo do fenocircmeno executivo

Nesse iacutenterim para o Ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux4 ldquoexecutar eacute

satisfazerrdquo ao passo que o professor Fredie Didier et al5 formulou um conceito mais amplo

ldquoExecutar eacute satisfazer uma prestaccedilatildeo devida A execuccedilatildeo pode ser espontacircnea quando o

devedor cumpre voluntariamente a prestaccedilatildeo ou forccedilada quando o cumprimento da prestaccedilatildeo

eacute obtido por meio de atos executivos pelo Estadordquo

1 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 41 2 Ibid p 42 3 Ibid p 42 4 FUX Luiz Curso de direito processual civil Rio de Janeiro Forense 2001 p 980 5 DIDIER JR Fredie et al Op Cit p 45

8 Dessa forma a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional responsaacutevel pela

concretizaccedilatildeo de um direito subjetivo no plano material obtendo resultado idecircntico ou

equivalente ao atingiacutevel se o devedor cumprisse espontaneamente a prestaccedilatildeo

Todavia essa atividade jurisdicional soacute cabe quando o devedor se recusa a cumprir

com a obrigaccedilatildeo quebrando a expectativa do credor de receber o que lhe eacute devido Por esta

razatildeo que se diz que a execuccedilatildeo civil eacute ldquoforccediladardquo 6

Eacute o que se conclui seguindo os ensinamentos de Leonardo Greco7 para ele execuccedilatildeo eacute

uma

() modalidade de tutela jurisdicional que consiste na praacutetica pelo juiz (ou por outrem sob a sua supervisatildeo) de uma seacuterie de atos coativos concretos sobre o devedor e sobre o seu patrimocircnio a fim de agrave custa dele e independentemente do concurso da sua vontade tornar efetivo o cumprimento de prestaccedilatildeo por ele inadimplida desde que tais atos coativos estejam previamente constituiacutedos em lei

Portanto a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional que tem como escopo obter o

cumprimento de uma prestaccedilatildeo certa e inadimplida mediante atos coativos sobre o devedor e

seus bens

22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL

Vislumbrado o conceito de execuccedilatildeo civil cabe agora empreender a sua classificaccedilatildeo

tendo em vista que a execuccedilatildeo pode se manifestar de diversas formas possuindo diferentes

caracteriacutesticas em cada uma das suas modalidades

Inicialmente cabe destacar que haacute duas teacutecnicas processuais para viabilizar a execuccedilatildeo

civil lato sensu eacute a que divide em processo autocircnomo de execuccedilatildeo e em fase de execuccedilatildeo

dependendo do tiacutetulo executivo que justifica o exerciacutecio da atividade satisfativa

O Coacutedigo Processual Civil de 2015 acertadamente ratificou as reformas promovidas

no CPC73 que consagrava a opccedilatildeo legislativa de oferecimento das tutelas de certificaccedilatildeo e

efetivaccedilatildeo do direito em um mesmo processo Dessa forma as execuccedilotildees de sentenccedilas

6 BASTOS Luiz Fernando Pereira O artigo 139 IV do novo Coacutedigo de Processo Civil a atipicidade

dos meios executivos na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia certa Brasiacutelia 2017 Disponiacutevel em lt httpbdmunbbrbitstream104831866812017_LuizFernandoPereiraBastospdf gt Acesso em 06 de agosto de 2018

7 BASTOS Luiz Fernando Pereira apud GRECO Leonardo O processo de execuccedilatildeo Rio de Janeiro Renovar 1999 p 164

9

passaram a ser uma fase complementar ao de processo de conhecimento e natildeo mais ocorrer

em um processo autocircnomo

No entendimento do professor processualista Fredie Didier et al8 o processo

sincreacutetico simplificou a efetivaccedilatildeo de um direito reconhecido em sentenccedila

A dispensa do ajuizamento de um processo autocircnomo para execuccedilatildeo de sentenccedila natildeo soacute veio diminuir o tempo necessaacuterio agrave prestaccedilatildeo da tutela jurisdicional - afinal o credor natildeo mais precisaria tal como ocorria ateacute entatildeo promover nova citaccedilatildeo pessoal do reacuteudevedor- como tambeacutem veio romper de vez com um velho paradigma segundo o qual a atividade executiva estaria dissociada da precedente atividade jurisdicional cognitiva

Entretanto natildeo soacute as sentenccedilas de meacuterito ensejam uma execuccedilatildeo Por esta razatildeo foi

necessaacuterio manter o processo autocircnomo de execuccedilatildeo para os casos em que o credor tem a seu

favor um documento que natildeo tenha sido proferido por um oacutergatildeo dotado de jurisdiccedilatildeo

Consequentemente se for o titulo executivo judicial o caminho natural eacute o do

cumprimento de sentenccedila Sendo por sua vez extrajudicial o titulo executivo o caminho

correto eacute o processo de execuccedilatildeo

Cabe ainda salientar que toda execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial eacute definitiva Jaacute a

execuccedilatildeo de tiacutetulo judicial (cumprimento de sentenccedila) pode ser definitiva ou provisoacuteria

No primeiro caso isto eacute cumprimento de sentenccedila definitivo ldquoeacute a execuccedilatildeo completa

que vai ateacute a fase final (com a entrega do bem da vida) sem exigecircncias adicionais para o

exequenterdquo 9

Quanto ao segundo caso ldquoo cumprimento provisoacuterio de sentenccedila (fundada em tiacutetulo

provisoacuterio) eacute aquele que exige alguns requisitos extras para que se chegue agrave fase final da

execuccedilatildeordquo 10

Para Fredie Didier11 o criteacuterio para definir se o cumprimento de sentenccedila seraacute

definitivo ou provisoacuterio

() eacute a estabilidade do tiacutetulo executivo em que se funda a execuccedilatildeo se se tratar de decisatildeo acobertada pela coisa julgada material o cumprimento de sentenccedila eacute

8 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 46 9 Ibid p 57 10 Ibid p 57 11 Ibid p 57

10

definitivo se se tratar de decisatildeo judicial ainda passiacutevel de alteraccedilatildeo (reforma ou invalidaccedilatildeo) em razatildeo da pendecircncia de recurso contra ela interposto a que natildeo tenha sido atribuiacutedo efeito suspensivo o cumprimento de sentenccedila eacute provisoacuterio

Ademais a execuccedilatildeo se distingue em procedimentos executivos comuns que satildeo da

execuccedilatildeo civil e que servem a uma generalidade de creacuteditos como eacute o caso do cumprimento

de sentenccedila e o processo de execuccedilatildeo E em procedimentos executivos especiais que servem

agrave satisfaccedilatildeo de creacuteditos peculiares como a execuccedilatildeo de alimentos e a execuccedilatildeo fiscal 12

Por fim cabe mencionar a classificaccedilatildeo que distingue a execuccedilatildeo em direta e indireta

A primeira execuccedilatildeo direita (ou execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo) eacute ldquo() aquela em que o

Poder Judiciaacuterio prescinde da colaboraccedilatildeo do executado para a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida

e pois promove uma substituiccedilatildeo da sua conduta pela conduta do proacuteprio Estado-juiz ou de

terceirordquo 13 Ou seja as medidas executivas satildeo levadas a efeito mesmo contra a vontade do

devedor na execuccedilatildeo direta

Segundo a doutrina a execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo se subdivide da seguinte forma

meios de desapossamento meios de transformaccedilatildeo e meios de expropriaccedilatildeo

Os meios de desapossamento muito comuns nas execuccedilotildees para entrega de coisa eacute a

forma ldquopor meio da qual se retira da posse do executado o bem a ser entregue ao exequente

(p ex despejo busca e apreensatildeo reintegraccedilatildeo de posse)rdquo 14 Ao passo que por meio dos de

transformaccedilatildeo ldquo() o juiz determina que um terceiro pratique a conduta que deveria ser

praticada pelo executado cabendo a este arcar com o pagamento do custo respectivordquo 15 Jaacute

os meios executivos de expropriaccedilatildeo eacute a forma ldquopor meio do qual algum bem do patrimocircnio

do devedor eacute expropriado para pagamento do creacutedito (adjudicaccedilatildeo alienaccedilatildeo judicial ou

apropriaccedilatildeo de frutos e rendimentos de empresa ou de estabelecimentos e de outros bens art

825 CPC)rdquo 16

12 Ibid p 48 13 Ibid p 50 14 Ibid p 51 15 Ibid p 51 16 Ibid p 51

11 Jaacute a execuccedilatildeo indireta (ou mandamental) atua ldquo() na vontade do devedor como forma

de compeli-lo ou incentivaacute-lo a cumprir a ordem judicialrdquo 17 Nesse entendimento ainda

leciona Fredie Didier et al 18

Nesses casos o Estado-juiz busca promover a execuccedilatildeo com a colaboraccedilatildeo do executado forccedilando ou incentivando a que ele proacuteprio cumpra a prestaccedilatildeo devida Em vez de o Estado-juiz tomar as providecircncias que deveriam ser tomadas pelo executado o Estado forccedila por meio de coerccedilatildeo psicoloacutegica ou de promessa de recompensa judicial a que o proacuteprio executado cumpra a prestaccedilatildeo

A execuccedilatildeo indireta pode ser patrimonial como por exemplo a imposiccedilatildeo de multa

coercitiva ou pessoal com a prisatildeo civil do devedor de alimentos Ademais adiciona Didier

et al19que

O estiacutemulo ao cumprimento da prestaccedilatildeo pode dar-se pelo temor (p ex multa coercitiva prisatildeo civil do devedor de alimentos divulgaccedilatildeo de notiacutecia em jornal revelando o descumprimento) ou pelo incentivo (p ex a chamada sanccedilatildeo premial ou sanccedilatildeo positiva de que eacute exemplo a isenccedilatildeo do pagamento de custas em caso de cumprimento do mandado monitoacuterio - art 701 sect 1ordm CPC a reduccedilatildeo pela metade dos honoraacuterios advocatiacutecios fixados inicialmente pelo juiacutezo em caso de pagamento integral do deacutebito pecuniaacuterio na execuccedilatildeo por quantia certa fundada em tiacutetulo extrajudicial - art 827 sect 1ordm CPC)

Por tais razotildees haacute uma tendecircncia em cada vez mais prestigiar os meios executivos

indiretos (coercitivos) posto que satildeo tatildeo eficazes quanto os meios executivos diretos

entretanto menos onerosos Contudo sua aplicaccedilatildeo deve ser fiscalizada a fim de natildeo permitir

que a execuccedilatildeo civil perca sua finalidade visto que eacute uma funccedilatildeo jurisdicional que tem como

escopo efetivar o direito do credor e natildeo de atender os interesses do devedor

23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL

Os princiacutepios juriacutedicos nos uacuteltimos anos passaram a ser munidos de forccedila cogente

normatizando as condutas humanas tanto quanto as regras juriacutedicas Os ditos princiacutepios

ampliaram as margens de atuaccedilatildeo dos aplicadores do direito possibilitando a construccedilatildeo de

soluccedilotildees mais adequadas agraves especificidades das demandas que chegam ao judiciaacuterio

17 Ibid p 51 18 Ibid p 51 19 Ibid p 51-52

12 Dessa forma eacute necessaacuterio aprofundar-se nos princiacutepios norteadores da execuccedilatildeo civil

para que se obtenha uma anaacutelise completa da teoria geral da execuccedilatildeo

A execuccedilatildeo civil tem como um dos seus corolaacuterios o princiacutepio da efetividade este

consiste na exigecircncia de um sistema completo de tutela executiva no qual existam meios

executivos capazes de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor

de tutela executivardquo 20

O referido princiacutepio da efetividade eacute reforccedilado como normal fundamental do processo

civil brasileiro pelo art 4ordm do CPC ldquoArt 4ordm As partes tecircm o direito de obter em prazo razoaacutevel

a soluccedilatildeo integral do meacuterito incluiacuteda a atividade satisfativa

Jaacute o princiacutepio da boa feacute processual corolaacuterio do devido processo legal estaacute previsto

no art 5ordm do CPC ldquoAquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de

acordo com a boa-feacuterdquo Segundo o processualista baiano Fredie Didier21

O princiacutepio da boa-feacute extrai-se de uma claacuteusula geral processual A opccedilatildeo por uma claacuteusula geral de boa-feacute eacute a mais correta Eacute que a infinidade de situaccedilotildees que podem surgir ao longo do processo torna pouco eficaz qualquer enumeraccedilatildeo legal exaustiva das hipoacuteteses de comportamento desleal Daiacute ser correta a opccedilatildeo da legislaccedilatildeo brasileira por uma norma geral que impotildee o comportamento de acordo com a boa-feacute Em verdade natildeo seria necessaacuteria qualquer enumeraccedilatildeo das condutas desleais o art 5deg do CPC eacute bastante exatamente por tratar-se de uma claacuteusula geral

Dessa forma o dito princiacutepio preconiza que diante de um vinculo juriacutedico as pessoas

envolvidas natildeo poderatildeo frustrar a confianccedila do outro devendo comportar-se como se pode

esperar de uma pessoa de boa-feacute

Ademais disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial que ldquosomente o

patrimocircnio do devedor (art 789 CPC) ou de terceiro responsaacutevel pode ser objeto da

atividade executiva do Estadordquo 22

O referido princiacutepio que determina que somente o patrimocircnio submete-se agrave execuccedilatildeo

e natildeo a pessoa foi trazido pela humanizaccedilatildeo do direito Para o professor Didier et al23 o

20 DIDIER JR Freddie et al apud GUERRA Marcelo Lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do

credor na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 21 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte

geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 105 22 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 68

13

desenvolvimento dos meios de execuccedilatildeo indireta ldquoparece relativizar um pouco esse princiacutepio

na medida em que pressionam psicologicamente a pessoa do devedor para que cumpra a

obrigaccedilatildeo com seu comportamentordquo

Complementa ainda que

A responsabilidade executiva parece assumir atualmente caraacuteter hiacutebrido comportando coerccedilatildeo pessoal e sujeiccedilatildeo patrimonial

i) a coerccedilatildeo pessoal incide sobre a vontade do devedor admitindo o uso de medidas coercitivas de execuccedilatildeo indireta para forccedilaacute-lo a cumprir a obrigaccedilatildeo com seu proacuteprio comportamento (ex arts 139 rv 523 sect 1ordm 536 sect 1ordm e 538 sect 3ordm todos do CPC)

ii) descumprida a obrigaccedilatildeo e natildeo sendo possiacuteveladequado o uso de teacutecnica de coerccedilatildeo pessoal tem-se a sujeiccedilatildeo patrimonial que recairaacute sobre os bens do devedor ou de terceiro responsaacutevel - que responderatildeo pela proacutepria prestaccedilatildeo in natura (ex dar coisa ou entregar quantia) ou por perdas e danos24

Dessa forma o referido princiacutepio natildeo tem aplicaccedilatildeo absoluta em razatildeo do principio da

efetividade a qual estimula o uso dos meios de coerccedilatildeo indireta para garantir o cumprimento

da obrigaccedilatildeo pelo devedor

O princiacutepio da primazia da tutela especifica (ou princiacutepio do resultado) assevera que

ldquoA execuccedilatildeo deve ser especiacutefica propiciar ao credor a satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo tal qual

houvesse o cumprimento espontacircneo da prestaccedilatildeo pelo devedorrdquo 25

O CPC de 2015 absorveu todos os avanccedilos legislativos a cerca do mote O caput do

art 497 assegura que na accedilatildeo que tenha por objeto a prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer o

juiz se procedente o pedido concederaacute a tutela especiacutefica ou determinaraacute providecircncias que

assegurem a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico equivalente O art 499 o

complementa a obrigaccedilatildeo somente seraacute convertida em perdas e danos se o autor o requerer

ou se impossiacutevel agrave tutela especiacutefica ou a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico

equivalente

O princiacutepio do contraditoacuterio eacute garantido pela constituiccedilatildeo federal e compreende o

direito de ser ouvido o direito de acompanhar os atos processuais o direito de produzir

provas participar da sua produccedilatildeo manifestar-se sobre a prova produzida e obter do juiz a

23 Ibid p 69-70 24 Ibid p 70 25 Ibid p 71

14

respectiva valoraccedilatildeo o direito de ser informado regularmente dos atos praticados no processo

o direito agrave motivaccedilatildeo das decisotildees o direito de impugnar as decisotildees 26

O contraditoacuterio tem aplicaccedilatildeo em todo processo judicial sendo aplicaacutevel tambeacutem na

execuccedilatildeo No entanto o contraditoacuterio na execuccedilatildeo natildeo ocorre com a mesma intensidade que

no processo ou na fase de conhecimento eacute o que assevera Didier et al 27

O contraditoacuterio no procedimento executivo no aspecto do direito de defesa assegurado agrave parte demandada eacute eventual porquanto depende da provocaccedilatildeo do executado que natildeo eacute chamado ajuiacutezo para defender-se mas sim para cumprir a obrigaccedilatildeo O procedimento executivo adota a teacutecnica monitoacuteria que consiste basicamente na inversatildeo do ocircnus de provocar o contraditoacuterio o reacuteu em vez de citado para manifestar-se sobre a pretensatildeo do autor eacute convocado para cumprir uma determinada obrigaccedilatildeo

Logo haacute o contraditoacuterio no procedimento executivo porem eacute eventual quanto agrave defesa

do executado

Ademais o princiacutepio da menor onerosidade eacute consagrado pelo art 805 do CPC e

dispotildee que ldquoQuando por vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz

mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o executadordquo O referido princiacutepio tem o

escopo de impedir o abuso do direito pelo exequente

O principio da menor onerosidade auxilia o juiz na escolha de um meio executivo

adequado e necessaacuterio que satisfaccedila a prestaccedilatildeo exigida pelo credor Nesse sentido eacute o

entendimento do professor Fredie Didier et al 28

O resultado a ser alcanccedilado eacute aquele estabelecido pelo direito material A maneira de se chegar ateacute esse resultado eacute que deve ser a menos onerosa possiacutevel para o executado Isso significa que a opccedilatildeo pelo meio menos gravoso pressupotildee que os diversos meios considerados sejam igualmente eficazes Assim havendo vaacuterios meios executivos aptos agrave tutela adequada e efetiva do direito de creacutedito escolhe-se a via menos onerosa ao executado

O princiacutepio visa impedir a execuccedilatildeo desnecessariamente onerosa ao executado ou seja a execuccedilatildeo abusiva Em vez de enumerar situaccedilotildees em que a opccedilatildeo mais gravosa revelar-se-ia injusta o legislador valeu-se corretamente de uma claacuteusula geral para reputar abusivo qualquer comportamento do credor que pretender valer-se de meio executivo mais oneroso do que outro igualmente idocircneo agrave satisfaccedilatildeo do seu creacutedito

26 Ibid p 76 27 Ibid p 78 28 Ibid p 79-80

15 O princiacutepio da cooperaccedilatildeo tem como base os princiacutepios do devido processo legal da

boa-feacute processual e do contraditoacuterio O dito princiacutepio avigora a eacutetica processual com o

aprimoramento do diaacutelogo entre as partes reciprocamente e com o oacutergatildeo jurisdicional Eacute o

que preconiza o art 6ordm do CPC Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para

que se obtenha em tempo razoaacutevel decisatildeo de meacuterito justa e efetiva

No procedimento executivo o princiacutepio da cooperaccedilatildeo incide de diversas formas

disciplina Didier et al29 que na execuccedilatildeo

O executado tem o dever de indicar bens agrave penhora (art 774 V CPC) Natildeo encontrados bens penhoraacuteveis e natildeo havendo indicaccedilatildeo de qualquer um deles pelo exequente cabe ao executado declarar quais satildeo seus bens penhoraacuteveis sob pena de se sujeitar a uma sanccedilatildeo pecuniaacuteria compulsoacuteria

Tambeacutem eacute manifestaccedilatildeo do princiacutepio da cooperaccedilatildeo a exigecircncia de que o executado que pretende impugnar o valor da execuccedilatildeo apresente de logo o valor que reputa devido (art 525 sect 4ordm CPC) Seria comportamento natildeo-cooperativo afirmar que a cobranccedila eacute excessiva sem simultaneamente dizer qual eacute o valor correto

Demais disso aplicam-se agrave execuccedilatildeo os deveres que decorrem do princiacutepio da cooperaccedilatildeo e que satildeo imputados ao oacutergatildeo jurisdicional () Assim por exemplo deve o juiz advertir ao executado antes de puni-lo de que seu ato pode vir a caracterizar-se como atentatoacuterio agrave dignidade da jurisdiccedilatildeo ( art 772 II CPC) perceba que se trata de uma conduta compatiacutevel com o dever de prevenccedilatildeo O oacutergatildeo jurisdicional somente pode conhecer da prescriccedilatildeo ex officio dando a oportunidade de o exequente manifestar-se conforme impotildee o dever de consulta ( cf arts 10 487 paraacutegrafo uacutenico e 921 sect 5ordm CPC)

O princiacutepio ou postulado30 da proporcionalidade tem aplicaccedilatildeo muito relevante na

execuccedilatildeo O art 8 do CPC assegura que o oacutergatildeo jurisdicional tem o dever de observar a

proporcionalidade e a razoabilidade ao aplicar o ordenamento juriacutedico inclusive no

procedimento executivo

Ademais o art 805 do CPC eacute categoacuterico ao disciplinar que ldquoArt 805 Quando por

vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo

menos gravoso para o executadordquo O referido artigo jaacute se trata de uma concretizaccedilatildeo da

proporcionalidade

29 Ibid p 82 30 Segundo Fredie Didier et al haacute uma discussatildeo doutrinaacuteria sobre a proporcionalidade Parte da

doutrina acredita que a proporcionalidade eacute um princiacutepio e outra parte acredita que eacute um postulado normativo

16 O principio da adequaccedilatildeo pode ser vislumbrado em dois momentos do Direito

Processual ldquoa) no legislativo como orientador da confecccedilatildeo das leis b) no jurisdicional

autorizando ao juiz diante do caso concreto adaptar procedimento agraves suas peculiaridadesrdquo 31

Para Luceacutelia de Sena Alves e Tiago Retes32

Isso quer dizer que no momento legislativo o devido processo deve ser observado pelo legislador para a confecccedilatildeo das normas de direito processual que iratildeo servir de instrumento efetivo de concretizaccedilatildeo do direito substancial a ser tutelado atendendo a todas as suas finalidades sob pena de falecircncia do proacuteprio direito No momento jurisdicional da mesma forma a via processual escolhida pelo autor tambeacutem deve estar sujeita a este princiacutepio para que natildeo sofra as mesmas consequecircncias da sua inobservacircncia

O ordenamento juriacutedico deve ser aplicado por meio da teacutecnica processual adequada

evitando dessa forma uma tutela ineficaz

Por fim o princiacutepio do autorregramento da vontade na execuccedilatildeo tem o objetivo de

ldquo() preservar um espaccedilo processual para o exerciacutecio da liberdade e da vontade em que

sejam permitidas negociaccedilotildees que envolvam as partes ndash e tambeacutem o juizrdquo33 Didier et al34

assevera que

A rigor o legislador estabelece um regime juriacutedico de autorregramento da vontade processual identificando-se algumas manifestaccedilotildees relevantes para a execuccedilatildeo Na verdade pode-se dizer que poucos satildeo os ambientes mais propiacutecios do que a execuccedilatildeo para a negociaccedilatildeo sobre o processo Todos os institutos e normas processuais relativos agrave execuccedilatildeo devem ser repensados a partir da premissa de que o CPC permite uma ampla margem de liberdade de negociaccedilatildeo sobre o processo (art 190 CPC)

O autorregramento da vontade pode ser vislumbrando na previsatildeo de negoacutecios tiacutepicos

em sede de execuccedilatildeo como por exemplo no acordo das partes sobre o valor do bem que

dispensa a avaliaccedilatildeo disposto no inciso I do art 871 CPC Ademais dentro dos limites do art

190 do CPC eacute possiacutevel na execuccedilatildeo a atribuiccedilatildeo da negociaccedilatildeo atiacutepica aos sujeitos 31 ALVES Luceacutelia de Sena Alves RETES Tiago O poder geral de efetivaccedilatildeo das decisotildees judiciais e

proporcionalidade uma anaacutelise criacutetica acerca do art 139 IV do Novo Coacutedigo de Processo Civil Disponiacutevel em lthttpswwwacademiaedu31752652O_poder_geral_de_efetivaC3A7C3A3o_das_decisC3B5es_judiciais_e_a_proporcionalidade_uma_anC3A1lise_crC3ADtica_acerca_do_art_139_IV_do_Novo_CC3B3digo_de_Processo_Civil gt Acesso em 25 de julho de 2018

32 Ibid natildeo paginado 33 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 85 34 Ibid p 85

17

processuais permitindo que sejam feitas mudanccedilas nos procedimentos e nas situaccedilotildees

juriacutedicas processuais ldquoSatildeo exemplos de negoacutecios processuais atiacutepicos na execuccedilatildeo pacto de

penhorabilidade acordo de ampliaccedilatildeo de prazos das partes de qualquer natureza acordo de

rateio de despesas processuais ()rdquo35

24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO

Sempre houve diversos questionamentos quanto agrave eficaacutecia do Direito processual Civil

e se o mesmo era meio apto a assegurar a tutela jurisdicional dos direitos dos cidadatildeos O

processo de execuccedilatildeo eacute o setor que sofre mais criacuteticas quanto a sua ineficiecircncia afinal a

execuccedilatildeo civil sempre foi o ldquocalcanhar de Aquilesrdquo do sistema processual pela praxe do

ldquoganhou (no processo de conhecimento) mas natildeo levou (na fase de cumprimento ou

execuccedilatildeo)rdquo 36

Essa dificuldade de se efetivar a tutela satisfastiva natildeo se resume a um problema de

mera teacutecnica processual tiacutepico de determinado ordenamento mas representa uma prova de

fogo da capacidade dos instrumentos jurisdicionais O autor Leonardo Greco37 no ano de

2005 atribuiu esse fato as seguintes causas o excesso de processos o custo e a morosidade da

justiccedila a inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios a ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais

um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico e a progressiva volatizaccedilatildeo dos bens

Quanto ao excesso de processos o referido autor aduz que ldquonos grandes centros o

crescimento da maacutequina judiciaacuteria natildeo acompanhou a expansatildeo do nuacutemero de litiacutegiosrdquo 38

O custo e morosidade da justiccedila prejudicam a tutela satisfativa posto que

ldquojaacute desfalcado pelo inadimplemento do devedor o credor ainda tem de arcar com o adiantamento das despesas do processo de execuccedilatildeo e de eventual liquidaccedilatildeo vendo arrastar-se a marcha dos atos executoacuterios facilmente retardada por atos procrastinatoacuterios do devedorrdquo 39

35 Ibid p 86 36 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca

para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018

37 GRECCO Leonardo A Crise do Processo de Execuccedilatildeo in Estudos de direito processual Leonardo Greco ndash Campos dos Goytacazes Ed Faculdade de Direito de Campos 2005 p 7

38 Ibid p 7 39 Ibid p 7-8

18 A inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios contribui para a crise do processo de

execuccedilatildeo tendo em vista que

ldquoo juiz da execuccedilatildeo prisioneiro de ritos que o distanciam das partes e da realidade da vida impulsiona sem qualquer apetite a execuccedilatildeo conduzindo-a ao sabor dos ventos das provocaccedilotildees impacientes do credor e das costumeiras procrastinaccedilotildees do devedorrdquo 40

Jaacute ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais atrapalha a efetivaccedilatildeo da tutela satisfativa ldquoo

devedor natildeo colabora com a execuccedilatildeo e os meios de pressatildeo que a lei estabelece natildeo satildeo

suficientes para intimidaacute-lordquo 41

Com um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico

O espiacuterito empresarial e a sociedade de consumo estimulam o endividamento das pessoas e o inadimplemento das obrigaccedilotildees pelo devedor deixou de ser vexatoacuterio e reprovaacutevel o que multiplica as accedilotildees de cobranccedila e execuccedilotildees atraveacutes das quais o sujeito passivo ainda usufrui vantagens agraves custas do credor 42

Por fim Leonardo Greco elenca a volatizaccedilatildeo dos bens como o uacuteltimo fator que

macula o processo executo tendo em vista que

ldquomudou inteiramente o perfil patrimonial das pessoas antes concentrado em bens de raiz e agora tendencialmente dirigido a investimentos em tiacutetulos e valores facilmente negociaacuteveis o que dificulta a sua localizaccedilatildeo pelo credorrdquo 43

O Coacutedigo de Processo Civil de 1973 introduziu o sistema executivo ao ordenamento

juriacutedico paacutetrio e seguindo os valores liberais da eacutepoca com a proteccedilatildeo de esfera juriacutedica de

liberdade do cidadatildeo contra a possibilidade de arbiacutetrio do Estado e uso indevido do Poder

jurisdicional outorgou o miacutenimo de poder ao juiz Seguindo as regras do CPC de 73 o

devedor soacute poderia ter sua esfera juriacutedica invadida atraveacutes de meios de execuccedilatildeo instituiacutedos

previamente em lei

Diante de tantos obstaacuteculos para se efetivar a tutela satisfativa a execuccedilatildeo estava

fadada ao fracasso o que frustrava a expectativa do jurisdicionado a uma prestaccedilatildeo da tutela

jurisdicional ceacutelere e efetiva Insatisfeitos com o cenaacuterio que se encontrava a atividade

40 Ibid p 8 41 Ibid p8 42 Ibid p 8 43 Ibid p8

19

executiva legisladores e operadores do direito natildeo mediram esforccedilos para promover uma

evoluccedilatildeo significativa buscando mais eficiecircncia e celeridade ao procedimento executoacuterio

Dessa forma no final de 1994 foi introduzido no coacutedigo de processo agrave flexibilizaccedilatildeo

dos poderes executoacuterios do juiz ldquopara que ele pudesse prestar uma tutela efetiva aos direitos

ficando autorizado a determinar a modalidade de execuccedilatildeo adequada a cada hipoacutetese nas

obrigaccedilotildees de fazer e natildeo fazer (art 461 sect5ordm do CPC de 1973)rdquo No ano de 2002 a referida

medida foi estendida para as obrigaccedilotildees de entregar coisa (art 461-A caput e sect3ordm do CPC de

1973)

Com fundamento nos artigos 461 e 461-A em 2005 a Lei nordm 11 23205 unificou o

processo de conhecimento e o processo de execuccedilatildeo de sentenccedila Nesse sentido Maacuterio

Henrique Cavalcanti Gil Rodrigues44 aduz que

A Lei 112322005 reuniu de forma definitiva os processos de conhecimento e de execuccedilatildeo em um uacutenico processo composto por um sistema bifaacutesico Assim passa a existir uma fase inicial (de reconhecimento) e uma fase posterior (de cumprimento de sentenccedila de efetivaccedilatildeo da decisatildeo definitiva) sem contar com a eventual fase intermediaacuteria de liquidaccedilatildeo (RODRIGUES 2010 p 38)

Ademais as alteraccedilotildees realizadas no CPC de 73 inseriu a atipicidade dos meios

executivos nas obrigaccedilotildees de fazer natildeo fazer e dar coisa certa entretanto exercendo papel

subsidiaacuterio aos meios tiacutepicos

Quanto agraves obrigaccedilotildees de pagar quantia havia apenas a possibilidade de se valer da

incidecircncia de multa do art 475-J do CPC de 73 ndash implementada mediante reforma perpetrada

pela Lei nordm 11232 de 2005 em atendimento a doutrina processualista preocupada com a

efetividade das decisotildees ndash e de atos executivos como a penhora de bens e dinheiro

Ainda que a execuccedilatildeo tenha avanccedilado com a inserccedilatildeo das leis posteriores a 1994 no

CPC de 1973 a mesma continuava insuficiente tendo em vista que a burocracia e lentidatildeo

dos atos executivos davam brechas para que o devedor escondesse seu patrimocircnio penhoraacutevel

tornando carente de efetividade e celeridade agrave execuccedilatildeo

44 RODRIGUES Maacuterio Henrique Cavalcanti Gil A evoluccedilatildeo da execuccedilatildeo de sentenccedila no direito

processual civil e o novo regime juriacutedico das sentenccedilas apoacutes a reforma implementada pela Lei 112322005 Revista do Tribunal Regional Federal da 1ordf Regiatildeo v 22 n 2 fev 2010 p 38

20

25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO

A tutela juridiscional eacute um direito fundamental previsto no art 5ordm inciso XXXV da

Carta Magna ldquo() a lei natildeo excluiraacute da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio lesatildeo ou ameaccedila a

direitordquo

Na visatildeo claacutessica o direito de accedilatildeo era efetivado com a prolaccedilatildeo de uma sentenccedila de

meacuterito posiccedilatildeo adotada por grande parte dos processualistas seguidores da doutrina de

Liebman Todavia esse conceito se mostra defasado tendo em vista que o direito de acesso agrave

justiccedila natildeo eacute apenas uma garantia formal de bater as portas do judiciaacuterio mas a garantia de

acesso agrave ordem juriacutedica justa adequada e eficaz45

Acreditar que uma sentenccedila de meacuterito favoraacutevel eacute tutela jurisdicional suficiente para

satisfazer o que se busca com o ajuizamento da accedilatildeo eacute uma visatildeo distorcida da atividade

satisfativa ldquoSob o ponto de vista do direito material a condenaccedilatildeo por si soacute eacute incapaz de

prestar a tutela do direitordquo46

Nessa oacutetica o direito fundamental agrave tutela executiva exige um sistema de tutela

jurisdicional ldquocapaz de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor

de tutela executivardquo47 Dessa forma entende-se que

ldquo() a) a interpretaccedilatildeo das normas que regulamentam a tutela executiva tem de ser feita no sentido de extrair a maior efetividade possiacutevel b) o juiz tem o poder-dever de deixar de aplicar uma norma que imponha uma restriccedilatildeo a um meio executivo sempre que essa restriccedilatildeo natildeo se justificar como forma de proteccedilatildeo a outro direito fundamental c) o juiz tem o poder-dever de adotar os meios executivos que se revelem necessaacuterios agrave prestaccedilatildeo integral de tutela executivardquo48

Egrave imperioso compreender que o direito fundamental agrave tutela executiva ratificado

pelo CPC eacute essencial para dirimir diversos litiacutegios oriundos do procedimento executivo

45 FERREIRA Gabriela Macedo Poder geral de efetivaccedilatildeo em defesa da constitucionalidade da

teacutecnica de execuccedilatildeo dos direitos do art 139 IV do Coacutedigo de Processo Civil Revista Jus Navigandi ISSN 1518-4862 Teresina ano 22 n 5178 4 set 2017 Disponiacutevel em lthttpsjuscombrartigos60190gt Acesso em 11 set 2018

46 Ibid natildeo paginado 47 DIDIER JR Fredie et al apud GUERRA Marcelo lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do credor

na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 48 Ibid p 102-104

21

ldquoprincipalmente aqueles relacionados agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo49

Fredie Didier et al50 cita como exemplo as hipoacuteteses de impenhorabilidade

A impenhorabilidade de certos bens eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa

Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais

Por esta razatildeo o legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do

CPC fazendo um preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses das partes envolvidas

optando pela mitigaccedilatildeo do direito do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado

Quando o oacutergatildeo jurisdicional verificar que a aplicaccedilatildeo das regras de

impenhorabilidade eacute desproporcional para o caso concreto deve afastaacute-la e construir a

soluccedilatildeo adequada para o referido caso Didier et al51 traz um exemplo esclarecedor em sua

obra

O bem imoacutevel que serve de moradia da famiacutelia eacute relativamente impenhoraacutevel Objetiva-se com essa restriccedilatildeo proteger o direito fundamental agrave moradia conteuacutedo do direito agrave proteccedilatildeo da dignidade Imagine-se um imoacutevel de altiacutessimo valor Imagine-se agora um creacutedito que corresponda a 40 do valor do imoacutevel A venda judicial do imoacutevel no caso permitiria natildeo soacute satisfazer o direito do credor como ainda garantir ao executado com a sobra a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel que lhe preserve a dignidade A opccedilatildeo pela interpretaccedilatildeo literal da regra que veda a penhora protegeria exclusivamente o direito do executado de maneira desnecessaacuteria porque a relaccedilatildeo valor executadovalor do bem permitiria a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel apoacutes a entrega do dinheiro ao credor Seria pois interpretaccedilatildeo em desconformidade com os preceitos da contemporacircnea hermenecircutica constitucional que preconiza a necessidade de nos casos de choque entre direitos fundamentais dar a interpretaccedilatildeo que mais adequadamente proteja a ambos

A execuccedilatildeo civil integra o direito fundamental agrave tutela jurisdicional disciplinando

que ldquoos dispositivos devem ser interpretados de modo que se garanta a maior efetividade

49 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66 50 Ibid p 66 51 Ibid p 67

22

possiacutevel agrave execuccedilatildeo desde que respeitados outros direitos fundamentaisrdquo52 Podendo ser

afastada desde que proporcional qualquer obstaacuteculo irrazoaacutevel agrave efetivaccedilatildeo desse direito

52 FERREIRA Gabriela Macedo apud MACEDO Lucas Buril de As eficaacutecias das decisotildees judiciais e

o cumprimento de sentenccedila no CPC15 Novo CPC Doutrina selecionada v 5 Execuccedilatildeo Coordenador geral Fredie Didier Jr organizadores Lucas Buril de Macedo Ravi Peixoto Alexandre Freire ndash Salvador Jus Podivm 2015 p 360361

23

3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO

EXECUTADO

31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS

Como forma de controlar a atividade jurisdicional por muito tempo vigorou o

entendimento de que a execuccedilatildeo somente poderia ser realizada atraveacutes dos meios executivos

tipicamente previstos na legislaccedilatildeo Segundo Luiz Guilherme Marinoni53

O princiacutepio da tipicidade deseja significar que os meios de execuccedilatildeo devem estar previstos na lei e assim que a execuccedilatildeo natildeo pode ocorrer atraveacutes de formas executivas natildeo tipificadas O seu objetivo eacute de um lado impedir que meio executivo natildeo previsto em lei possa ser utilizado e de outro garantir o jurisdicionado contra a possibilidade de arbiacutetrio judicial na fixaccedilatildeo da modalidade executiva Se o jurisdicionado sabe em razatildeo de previsatildeo legal que a sua esfera juriacutedica somente poderaacute ser invadida atraveacutes de determinadas modalidades executivas confere-se a ele a possibilidade de antever a reaccedilatildeo ao seu inadimplemento bem como a garantia de que a jurisdiccedilatildeo natildeo determinaraacute ou permitiraacute a utilizaccedilatildeo de meio executivo diverso daqueles previstos

Dessa forma o princiacutepio da tipicidade disciplina que o oacutergatildeo julgador ao proceder agrave

execuccedilatildeo estaacute limitado aos meios executivos previamente definidos em lei natildeo podendo se

valer de qualquer teacutecnica de efetivaccedilatildeo que natildeo se encaixasse nas hipoacuteteses taxativas da

legislaccedilatildeo

Entretanto o legislador natildeo tem como prever todas as peculiaridades dos direitos

dignos de tutela executiva e preordenar teacutecnicas executivas diversas para cada peculiaridade

Sob esse cenaacuterio o principio da tipicidade foi cedendo lugar ao principio da atipicidade dos

meios executivos

A ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do oacutergatildeo julgador estaacute cada vez mais presente

no ordenamento juriacutedico paacutetrio motivando um poder geral de efetivaccedilatildeo ldquoque permite ao

julgador valer-se dos meios executivos que considerar mais adequado ao caso concreto sejam

eles de coerccedilatildeo direta sejam de coerccedilatildeo indiretardquo 54

53 MARINONI Luiz Guilherme Teacutecnica processual e tutela dos direitos Satildeo Paulo Editora Revista

dos Tribunais 2004 p 212 nota 79 54 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 100

24

Essa tendecircncia de ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do juiz natildeo eacute exclusividade do

ordenamento juriacutedico brasileiro segundo Fredie Didier et al55

Michelle Taruffo jaacute apontava que o direito americano diante da inefetividade dos meios executivos at law comeccedilou a autorizar o magistrado a tomar medidas executivas adequadas ao caso concreto Trata-se afirma o jurista italiano de aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo segundo o qual as regras processuais devem ser adaptadas agraves necessidades do direito material

Os meios executivos atiacutepicos derivam de trecircs enunciados normativos do Coacutedigo de

Processo Civil o art 139 IV o art 297 e o sect1ordm do art 536

O art 139 IV do CPC dispotildee que pertence ao juiz o poder-dever de ldquodeterminar

todas as medidas indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para

assegurar o cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto

prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo

Jaacute o art 297 do CPC cuida da tutela provisoacuteria e garante que ldquoo juiz poderaacute

determinar as medidas que considerar adequadas para a efetivaccedilatildeo da tutela provisoacuteriardquo

Podendo dessa forma a dita tutela ser efetivada atipicamente

Por fim o art 536 sect1ordm do CPC dispotildee que

Para atender ao disposto no caput o juiz poderaacute determinar entre outras medidas a imposiccedilatildeo de multa a busca e apreensatildeo a remoccedilatildeo de pessoas e coisas o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva podendo caso necessaacuterio requisitar o auxilio de forccedila policial

As supracitadas medidas executivas atiacutepicas satildeo entendidas pela doutrina como

claacuteusulas gerais processuais executivas56 Essas claacuteusulas gerais natildeo restringem a sua

aplicaccedilatildeo agraves teacutecnicas de coerccedilatildeo indireta satildeo autorizados tambeacutem o uso de meios de execuccedilatildeo

dieta e indireta

Ademais cumpre salientar que o art 139 IV CPC aplica-se a toda e qualquer

atividade executiva ldquoa) seja fundada em tiacutetulo executivo judicial (provisoacuteria ou definitiva)

55 DIDIER JR Fredie et al apud TARUFFO Michelle A atuaccedilatildeo executiva dos direitos perfis

comparatiacutesticos Revista de Processo Satildeo Paulo RT 1990 n 59 p 78 56 Segundo Fredie Didier et al claacuteusula geral eacute uma espeacutecie de texto normativo cujo antecedente

(hipoacutetese faacutetica) eacute composto por termos vagos e consequente (efeito juriacutedico) eacute indeterminado

25

seja fundada em tiacutetulo executivo extrajudicial b) seja para efetivar prestaccedilatildeo pecuniaacuteria seja

para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer ou dar coisa distinta de dinheirordquo57

Jaacute o art 297 do CPC garante que a tutela provisoacuteria possa ser efetivada tambeacutem

atipicamente ldquoSucede que a atipicidade da tutela provisoacuteria segue necessariamente a

atipicidade da tutela definitivardquo 58

Por fim o comando do sect 1 ordmdo art 536 se aplica

a) inicialmente agrave execuccedilatildeo de fazer e de natildeo fazer fundada em decisatildeo judicial (provisoacuteria ou definitiva) b) por forccedila do sect 3ordm do art 538 tambeacutem se aplica ao cumprimento de sentenccedila para entrega de coisa c) por forccedila do art 771 paraacutegrafo uacutenico o dispositivo tambeacutem se aplica agrave execuccedilatildeo para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer e entregar coisa distinta de dinheiro fundada em tiacutetulo extrajudicial

Claramente o art 139 IV eacute mais amplo do que o sect 1 ordm do art 536 estende-se por

disposiccedilatildeo expressa agrave execuccedilatildeo de pagar quantia Sendo uma grande novidade nas obrigaccedilotildees

que tem por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15

O art 139 IV do CPC apresentou uma novidade agrave atipicidade dos meios executivos

ao disciplinar que cabe ao juiz ldquodeterminar todas as medidas indutivas coercitivas

mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o cumprimento de ordem judicial

inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo

A inovaccedilatildeo estaacute na possibilidade de utilizar os meios atiacutepicos para assegurar o

cumprimento de decisotildees que versam sobre as obrigaccedilotildees pecuniaacuterias sendo admitida a

utilizaccedilatildeo de outros meios ateacute na execuccedilatildeo de titulo judicial de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria aleacutem da

multa de 10 (a que se refere o artigo 523 sect 1ordm do CPC) para forccedilar o devedor a cumprir a

obrigaccedilatildeo pecuniaacuteria

57 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 105 58 Ibid p 105

26

Dessa forma eacute possiacutevel afirmar que ldquoao lado da disciplina tiacutepica do art 523 e

seguintes () o novo CPC inova ao permitir que o sistema de teacutecnicas executivas atiacutepicas

sejam empregadas na execuccedilatildeo monetaacuteriardquo59 (ZARONI VITORELLI 2016 p 66)

Fernando da Fonseca Gajardoni60 denomina a dita medida como a ldquorevoluccedilatildeo

silenciosardquo da execuccedilatildeo por quantia certa posto que

() pelo fato de que a regra natildeo estar propriamente incrustrada nos capiacutetulo e livro atinentes ao cumprimento de sentenccedila e ao processo de execuccedilatildeo ndash o art 139 IV do Novo CPC parece trazer ao paiacutes algo bastante novo cuja aplicaccedilatildeo a depender do comportamento do Judiciaacuterio pode implicar em verdadeira revoluccedilatildeo (positiva ou negativa) na sistemaacutetica executiva ateacute entatildeo vigente

Claramente o dispositivo foi recebido com entusiasmo por parte da doutrina que

anteciparam em afirmar que o princiacutepio da atipicidade dos meios executivos no CPC2015

ldquo() assume a feiccedilatildeo de poder-dever geral conferido ao magistrado de determinar () todas

as medidas coercitivas sub-rogatoacuterias mandamentais e indutivas que entender necessaacuterias

para a tutela justa efetiva e em tempo razoaacutevelrdquo 61

Dessa forma lecionam Luiz Guilherme Marinoni Seacutergio Cruz Arenhart e Daniel

Mitidiero62 que

O juiz a partir do art 139 IV do CPC2015 natildeo estaacute mais adstrito apenas agrave sentenccedila condenatoacuteria ndash que fixa a obrigaccedilatildeo de pagar e daacute ensejo agrave abertura da execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo patrimonial ndash para a tutela de prestaccedilotildees pecuniaacuterias Pode impor essa prestaccedilatildeo por meio de ordem judicial acoplada ao aceno de emprego de medida de induccedilatildeo (coercitiva ou de pressatildeo positiva) ou de medida de sub-rogaccedilatildeo (MARINONI ARENHARDT MITIDIERO 2015 p 703)

Deste modo em razatildeo do art 139 IV do CPC tem-se entendido que o juiz nas

execuccedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria possui a faculdade de adotar qualquer

59 ZARONI Bruno Marzullo VITORELLI Edilson Reforma e efetividade da execuccedilatildeo no novo CPC

In PEIXOTO Ravi FREIRE Alexandre MENDES Aluiacutesio Gonccedilalves de Castro Execuccedilatildeo 2 ed rev e atual Salvador JusPodivm 2016 766 p (Coleccedilatildeo novo CPC doutrina selecionada v 5) p 66

60 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia 24082015 JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Acesso em 23082018

61 LIMA Rafael de Oliveira A atipicidade dos meios executivos no coacutedigo de processo civil brasileiro de 2015 Revista de Processo Jurisdiccedilatildeo e Efetividade da Justiccedila v 2 n 2 juldez 2016 p 11

62 MARINONI Luiz Guilherme ARENHART Seacutergio Cruz MITIDIERO Daniel Novo curso de processo civil tutela dos direitos mediante procedimento comum Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 v 2 p 703

27

medida indutiva coercitiva mandamentais ou sub-rogatoacuterias para efetivar o creacutedito do

exequente natildeo se limitando as medidas tiacutepicas

Alguns doutrinadores se precipitaram ao afirmar que o dito dispositivo ldquo() autoriza o

juiz a utilizar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir ressalvando-se a prisatildeo

civil constitucionalmente limitada ao devedor de alimentosrdquo 63 Acreditam Jorge Bheron

Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa que o entusiasmo por parte da

doutrina abre margem para as mais variadas formas de compelir o devedor a cumprir com a

prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

ldquoE aiacute persistindo no mau vezo de fazer explicaccedilotildees em abstrato ignorando que o sentindo soacute se daacute na aplicaccedilatildeo (situaccedilatildeo concreta real ou fictiacutecia) as sugestatildeo satildeo as mais engenhosas suspensatildeo de CNH retenccedilatildeo de passaporte restriccedilatildeo de fim de semana cancelamento de cartotildees de creacutedito ndash para ficar apenas nestasrdquo 64

Ou seja podendo o juiz natildeo apenas substituir o devedor tomando seu patrimocircnio para

entregar ao credor na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia como tambeacutem poderaacute

pressionaacute-lo psicologicamente a adimplir por conta proacutepria a obrigaccedilatildeo

Ademais o Enunciado nordm 48 do ENFAM avalia expressamente a possibilidade de

imposiccedilatildeo de medidas coercitivas para a efetivaccedilatildeo da execuccedilatildeo pecuniaacuteria Conforme o dito

enunciado

ldquoO art 139 inciso IV traduz um poder geral de efetivaccedilatildeo permitindo a aplicaccedilatildeo de medidas atiacutepicas para garantir o cumprimento de qualquer ordem judicial inclusive no acircmbito do cumprimento de sentenccedila e no processo de execuccedilatildeo baseado em tiacutetulosrdquo

Dessa forma o artigo 139 IV do CPC permite uma gama ampla de interpretaccedilotildees por

parte da doutrina por ser uma claacuteusula geral encontrando limite apenas na imaginaccedilatildeo de

quem o analisa Nesse sentido eacute forccediloso orientar e delimitar o manejo desse artigo legal para

que se extraia seu sentido e alcance revelando assim sobre que situaccedilotildees ele incide de que

modo e o que permite

63 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

64 Ibid sem paginaccedilatildeo

28

32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER

GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO

O artigo 139 IV com a vigecircncia do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 abriu margem

para uma constelaccedilatildeo de decisotildees nas quais o dito dispositivo recebeu diversas interpretaccedilotildees

pelos operadores do direito

Sem duacutevidas por ser uma das pioneiras a decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara

Ciacutevel do Foro Regional de Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-

1320138260011 na data de 25 de agosto de 2016 gerou um enorme rebuliccedilo

Nessa accedilatildeo que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto

uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a

suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o

passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito

Segundo a magistrada o processo tramitava haacute anos sem que nenhum valor tenha sido

pago ao exequente aleacutem do devedor natildeo ter oferecido proposta de acordo e nem ter indicado

bens agrave penhora configurando uma completa desiacutedia com o processo

ldquoO caso tratado nos autos se insere dentre as hipoacuteteses em que eacute cabiacutevel a aplicaccedilatildeo do art 139 inciso IV do Coacutedigo de Processo Civil Isso porque o processo tramita desde 2013 sem que qualquer valor tenha sido pago ao exequente Todas as medidas executivas cabiacuteveis foram tomadas sendo que o executado natildeo paga a diacutevida natildeo indica bens agrave penhora natildeo faz proposta de acordo e sequer cumpre de forma adequada as ordens judiciais frustrando a execuccedilatildeo

Se o executado natildeo tem como solver a presente diacutevida tambeacutem natildeo recursos para viagens internacionais ou para manter um veiacuteculo ou mesmo manter um cartatildeo de creacutedito Se poreacutem mantiver tais atividades poderaacute quitar a diacutevida razatildeo pela qual a medida coercitiva poderaacute se mostrar efetiva

Assim como medida coercitiva objetivando a efetivaccedilatildeo da presente execuccedilatildeo defiro o pedido formulado pelo exequente e suspendo a Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo do executado M A S determinando ainda a apreensatildeo de seu passaporte ateacute o pagamento da presente diacutevida

()

Determino ainda o cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado ateacute o pagamento da presente diacutevida ()rdquo

Foi impetrado Habeas Corpus no Tribunal de Justiccedila do Estado de Satildeo Paulo a favor

do executado sob o fundamento que a coaccedilatildeo era ilegal e afetava o direito de locomoccedilatildeo

29

garantido constitucionalmente Tendo sido concedida a liminar em decisatildeo que ora se

reproduz

Em que pese a nova sistemaacutetica trazida pelo art 139 IV do CPC2015 deve-se considerar que a base estrutural do ordenamento juriacutedico eacute a Constituiccedilatildeo Federal que em seu art 5ordm XV consagra o direito de ir e vir Ademais o art 8ordm do CPC2015 tambeacutem preceitua que ao aplicar o ordenamento juriacutedico o juiz natildeo atentaraacute apenas para a eficiecircncia do processo mas tambeacutem aos fins sociais e agraves exigecircncias do bem comum devendo ainda resguardar e promover a dignidade da pessoa humana observando a proporcionalidade a razoabilidade e a legalidade Por tais motivos concedo a liminar pleiteada65

Cabe destacar aqui o voto vencido da Desembargadora Maria Luacutecia Pizzotti no

julgamento do Habeas Corpus supracitado demonstrando que o debate sobre a abrangecircncia

do artigo 139 IV do CPC ocorre tanto na doutrina quanto no judiciaacuterio

O objetivo do novel dispositivo natildeo eacute impor penas ou restringir direitos natildeo sendo intenccedilatildeo do Judiciaacuterio suspender indefinidamente o direito de dirigir do executado ou sua liberdade de viajar mas sim impor uma restriccedilatildeo tatildeo gravosa caso ele natildeo cumpra a determinaccedilatildeo que escolha cumprir sua obrigaccedilatildeo e dar fim ao problema Em outras palavras mediante as medidas de coerccedilatildeo o Estado procura persuadir o inadimplente impondo-lhe situaccedilotildees tatildeo onerosas e inconvenientes que em algum momento seja para ele mais vantajoso cumprir do que permanecer no inadimplemento

Ao fazecirc-lo o Novo Coacutedigo de Processo Civil rompe com as criacuteticas da ineficiecircncia das execuccedilotildees Natildeo se cogita deferir medidas restritivas agravequeles que demonstram a incapacidade absoluta de solver o deacutebito apenas agravequeles que reconhecidamente se valem de artimanhas e subterfuacutegios para evitar a satisfaccedilatildeo das diacutevidas ldquopreferindordquo outras despesas mais lsquonobresrsquo agindo em nome de terceiros e fazendo escaacuternio dos credores e do proacuteprio Poder Judiciaacuterio (hellip)

Para tanto memoraacutevel a noccedilatildeo de que a medida em comento tem caraacuteter excepcional e encontra limites no plano da proporcionalidade como sustenta o ilustrado Magistrado paulista Fernando da Fonseca Gajardoni Professor Faculdade de Direito de Ribeiratildeo Preto da USP (in httpswwwjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 acesso em 091216 agraves 11h20min) E para anaacutelise da proporcionalidade a ponderaccedilatildeo deve observar os trecircs passos apontados pela doutrina a necessidade a adequaccedilatildeo e a proporcionalidade em sentido estrito

65 TJSP - Habeas Corpus Processo nordm 2183713-8520168260000 30ordf Cacircmara Direito Privado relator

Des Marcos Ramos j 290317

30

Ademais no entendimento de Jorge Amaury Maia Nunes e Guilherme Pupe de

Noacutebrega66 essa decisatildeo releva os perigos trazidos pelo art 139 IV do CPC ao confrontar

direitos constitucionalmente garantidos

De nossa parte entendemos que a liberdade de locomoccedilatildeo inserta no inciso XV do artigo 5ordm que abrange o direito de deixar o territoacuterio nacional sofre embaraccedilo indevido pela apreensatildeo de passaporte ou pela suspensatildeo da carteira nacional de habilitaccedilatildeo

()

Agrave luz da exposiccedilatildeo feita acima e em anaacutelise primeva sustentamos que o artigo 139 IV do CPC de 2015 estaacute a merecer declaraccedilatildeo de inconstitucionalidade sem reduccedilatildeo de texto para o fim de rechaccedilar a apreensatildeo de passaporte a suspensatildeo do direito de dirigir e a vedaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo em concurso ou em licitaccedilatildeo puacuteblicos como medidas passiacuteveis de serem adotadas pelo juiz sob pena de vulneraccedilatildeo aos artigos 1ordm IV 5ordm XV e LIV 37 I 173 sect 3ordm III e 175 todos da Constituiccedilatildeo

Apesar de ter sofrido duras criacuteticas a decisatildeo do processo de nordm 4001386-

1320138260011 serviu de inspiraccedilatildeo para tantas outras decisotildees no mesmo sentido

Foi o caso da decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de Satildeo

Vicente em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 0020724-2620088260590 na data de 21 de

junho de 2017

A supracitada execuccedilatildeo se arrastava por nove (09) anos sem que o devedor tenha

esboccedilado qualquer intenccedilatildeo de pagar a diacutevida O credor requereu a suspensatildeo da Carteira

Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado apreensatildeo do passaporte e cancelamento dos

cartotildees de creacutedito

O magistrado com embasamento no artigo 139 IV do CPC deferiu parcialmente o

pedido sob o fundamento de que a apreensatildeo de passaporte e CNH natildeo viola o direito de ir e

vir do devedor Entretanto o juiz indeferiu o pedido de cancelamento do cartatildeo de creacutedito por

acreditar que a suspensatildeo poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado tendo em

vista que atualmente as pessoas utilizam o referido cartatildeo para pagamento das despesas

diaacuterias

66 NOBREacuteGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139

IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018

31

Eacute evidente que as medidas atiacutepicas de coerccedilatildeo devem ser utilizadas com cautela sempre respeitando a dignidade da pessoa do executado Natildeo se vislumbra contudo que as medidas aqui eleitas sejam capazes de vulnerar os Direitos Fundamentais do indiviacuteduo A uma porque natildeo se trata de restriccedilatildeo ao direito de ir e vir do executado que continua no gozo de plena liberdade de locomoccedilatildeo a duas porque a conduccedilatildeo de veiacuteculo automotor eacute mera comodidade da vida moderna natildeo se tratando de direito absoluto

Com mais razatildeo ainda se admite a suspensatildeo do Passaporte do executado que se natildeo paga a diacutevida da execuccedilatildeo natildeo deve ter o direito de fazer viagem internacional

Tem-se aqui verdadeiro exerciacutecio de ponderaccedilatildeo de interesses juriacutedicos de um lado jaz o direito de creacutedito do exequente que deriva do direito de propriedade e por isso mesmo tem envergadura constitucional de outro giro tem-se o direito do executado agrave autorizaccedilatildeo do Estado para conduzir veiacuteculo automotor e realizar viagens internacionais que natildeo se mostram essenciais agrave dignidade da pessoa humana Natildeo haacute duacutevidas pois de que eacute este uacuteltimo que deve sucumbir

O pedido fica indeferido apenas no tocante agrave suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado Eacute que ao contraacuterio da CNH e do passaporte que trazem consigo certa presunccedilatildeo de riqueza natildeo se pode concluir que o uso de cartatildeo de creacutedito eacute feito por luxo ou simples conveniecircncia

Como eacute cediccedilo os cartotildees de creacutedito oferecem ao seu titular creacutedito raacutepido e rotativo para o pagamento de despesas diaacuterias e certamente exercem funccedilatildeo essencial agravequeles que se encontram em situaccedilatildeo financeira precaacuteria

A suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado portanto se revela medida desproporcional e que inclusive poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado

Pelo exposto defiro em parte o pedido formulado pelo exequente e DETERMINO a suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo e bem como a suspensatildeo da validade (cancelamento temporaacuterio) no sistema SINPA de eventuais passaportes vaacutelidos em nome do executado

Dessa forma o artigo 139 IV do CPC revolucionou completamente a execuccedilatildeo de

obrigaccedilatildeo de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria ao permitir a utilizaccedilatildeo do uso dos meios executivos

atiacutepicos para compelir o executado a satisfazer o creacutedito do exequente

33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE

EFETIVACcedilAtildeO

Era inevitaacutevel que o artigo 139 IV do CPC gerasse todo tipo de reaccedilatildeo entre os

doutrinadores do processo civil e ateacute mesmo de outros ramos do direito devido a sua

capacidade de realizar uma completa inovaccedilatildeo na forma de se executar as obrigaccedilotildees de pagar

quantia Alguns o aplaudiram visualizando nele ldquouma luz no fim do tuacutenelrdquo outros o

criticaram vislumbrando as arbitrariedades que poderiam ser praticadas com embasamento no

referido dispositivo

32

As decisotildees suscitadas em linhas preteacuteritas auxiliaram para fervilhar ainda mais o

debate sobre o tema tendo em vista que por um lado poderia aumentar a efetividade das

execuccedilotildees por quantia no entanto por outro surgiam questionamentos a cerca da sua

constitucionalidade

A doutrina parece que demoraraacute a se pacificar sobre o tema Segundo alguns

doutrinadores seraacute inconstitucional toda restriccedilatildeo que recaia sobre a pessoa do devedor e natildeo

exclusivamente sobre o seu patrimocircnio Jaacute para outros o dispositivo eacute constitucional e o meio

mais eficaz para se resolver o problema da efetivaccedilatildeo das execuccedilotildees de pagar quantia ldquoA

discussatildeo se daacute especialmente no que diz respeito aacutes medidas de suspensatildeo de CNH

apreensatildeo de passaporte e bloqueio de cartotildees de creacutedito do devedorrdquo 67

O professor Thiago Rodovalho analisou detalhadamente a decisatildeo de nordm 4001386-

1320138260011 em seu artigo ldquoO necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na

concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivosrdquo 68 Quanto agrave suspensatildeo da CNH o autor

acredita que tal medida natildeo viola qualquer direito fundamental do devedor posto que ldquodirigir

veiacuteculos automotores eacute direito do cidadatildeo mas natildeo se confunde com os direitos fundamentais

e social de ir-e-vir e ao transporterdquo 69 O professor eacute categoacuterico ao afirmar que

Com relaccedilatildeo agrave suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (suspensatildeo do direito de dirigir restriccedilatildeo de direitos) natildeo nos parece haver qualquer violaccedilatildeo a direito fundamental ou social nem a direito da personalidade ou colocaccedilatildeo do devedor em situaccedilatildeo desproporcionalmente detrimentosa exceccedilatildeo feita aos que usam o veiacuteculo como instrumento de trabalho atraindo a hipoacutetese do NCPC art 833 inc V

()

Outrossim natildeo o consideramos como direito da personalidade Os direitos da personalidade satildeo os valores fundamentais que compotildeem o proacuteprio ser justamente por isso intransmissiacuteveis e irrenunciaacuteveis natildeo podendo o seu exerciacutecio sofrer limitaccedilatildeo voluntaacuteria (CC art 11) Por mais que vivamos num paiacutes que tanto valoriza o carro e que muitas pessoas de fato se compreendam em razatildeo e em funccedilatildeo do carro que dirijam este natildeo nos parece ser um direito que verdadeiramente componha a personalidade do indiviacuteduo70

67 DONTOS Sofia Poderes executoacuterios do juiz que diz a doutrina sobre o art 139 inc IV do CPC

Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigospoderes-executorios-do-juiz-que-diz-a-doutrina-sobre-art-139-inc-iv-do-cpc-23052018 gt Publicado em 23052018 Acesso em 01082018

68 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018

69 Ibid sem paginaccedilatildeo 70 Ibid sem paginaccedilatildeo

33

Quanto ao cancelamento dos cartotildees de credito do devedor o professor Thiago

Rodovalho tambeacutem acredita que natildeo haacute qualquer violaccedilatildeo ao direito fundamental social ou

da personalidade do devedor e acrescenta que

Tanto assim o eacute que ser titular de um cartatildeo de creacutedito pressupotildee ter creacutedito o que eacute analisado e concedido por instituiccedilotildees financeiras mais do que isso se porventura passando por dificuldades financeiras a pessoa deixa de honrar com pagamentos a mesma instituiccedilatildeo financeira concedente do cartatildeo de creacutedito pode sponte propria cancelaacute-lo ou recusar-lhe a concessatildeo Ora parece-me contraditoacuterio que instituiccedilotildees financeiras para sua proteccedilatildeo patrimonial possam ferir esse suposto ldquodireito fundamentalrdquo ou esse suposto ldquodireito da personalidaderdquo mas natildeo possa o Poder Judiciaacuterio igualmente fazecirc-lo contra aquele devedor moroso que instado ao pagamento e frustradas todas as tentativas de constriccedilatildeo patrimonial leva vida luxuosa valendo-se de cartotildees de creacutedito que prescindem de dinheiro em conta eacute dizer podem justamente funcionar como forma de ocultar renda e patrimocircnio71

O autor considera a apreensatildeo de passaporte um tema mais polecircmico e que merece

maior reflexatildeo No entanto crecirc que eacute possiacutevel a apreensatildeo de passaporte sem violar os

direitos fundamentais do devedor por se tratar de um direito de ir e vir de amplitude especial

Agrave primeira vista a possibilidade de apreensatildeo do passaporte tambeacutem nos parece possiacutevel pois tambeacutem se trata de um direito de ir e vir de amplitude especial Assim o eacute pois salvo situaccedilotildees especiais (refugiados p ex) haacute a necessidade de demonstrar condiccedilotildees financeiras de estadia e retorno para ser admitido no paiacutes de destino Ou seja pressupotildee uma condiccedilatildeo financeira que o devedor justamente diz natildeo possuir Sem embargo dessa consideraccedilatildeo esse ainda eacute um ponto que merece uma reflexatildeo mais acurada sendo essa apenas uma primeira impressatildeo72

Outros autores escreveram sobre o tema como eacute o caso do processualista Luiz

Dellore73 que tambeacutem defende que as medidas atiacutepicas como restriccedilatildeo ao direito de dirigir

apreensatildeo de passaporte e cancelamento de cartotildees de creacutedito satildeo permitidas e natildeo violam em

regra os direitos fundamentais do devedor

De minha parte creio que efetivamente haacute inovaccedilatildeo no at 139 IV do NCPC (e natildeo mera repeticcedilatildeo do que jaacute havia no Coacutedigo anterior) que tem o condatildeo de trazer mais efetividade ao processo executivo no Brasil ndash que por deacutecadas centrou sua atenccedilatildeo na defesa do executado (vide a grande quantidade de impenhorabilidades) sem dar maior atenccedilatildeo ao creacutedito do exequente

71 Ibid sem paginaccedilatildeo 72 Ibid sem paginaccedilatildeo 73 DELLORE Luiz NCPC Atipicidade das medidas executivas jaacute eacute realidade Disponiacutevel em lt

httpswwwjotainfoopiniao-e-analisecolunasnovo-cpcncpc-atipicidade-de-medidas-executivas-ja-e-realidade-17042017 gt Publicado em 17042017 Acesso em 03092018

34

Logo a meu ver medidas como (i) restriccedilatildeo ao direito de dirigir (ii) apreensatildeo de passaporte (iii) cancelamento de cartotildees de creacutedito e (iv) vedaccedilatildeo de obtenccedilatildeo de novos empreacutestimos se natildeo vinculados ao pagamento do deacutebito exequendo dentre outras restriccedilotildees que deveratildeo ser observadas a cada caso satildeo permitidas pelo sistema do NCPC e em regra natildeo violam direitos fundamentais do devedor E tecircm o condatildeo de fazer com que o executado que tem recursos diante dessas medidas coercitivas pague o deacutebito trazendo sucesso agrave satisfaccedilatildeo do creacutedito

Nessa linha para Alexandre Fuchs das Neves74 o artigo 139 IV do CPC conferiu ao

juiz poderes coercitivos capazes de ldquotransformar a vida do devedor um infernordquo para compeli-

lo a cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria Entretanto pondera que para que a medida tenha

validade ldquoeacute necessaacuteria uma fundamentaccedilatildeo por evidente uma correlaccedilatildeo temaacutetica entre a

medida adotada e sua efetividade em face ao processo com fundamentaccedilatildeo detalhadardquo

No entendimento de Fernando Gajardoni75 satildeo possiacuteveis as medidas de apreensatildeo de

passaporte bloqueio de cartotildees de creacutedito e suspensatildeo da CNH Para ele o que limita o art

139 IV do CPC eacute o esgotamento dos meios tiacutepicos e a real necessidade da medida

Ilustrativamente natildeo efetuado o pagamento de diacutevida oriunda de multas de tracircnsito e superados os expedientes tradicionais de adimplemento (penhora de dinheiro e bens) seria liacutecito o estabelecimento da medida coercitivaindutiva de suspensatildeo do direito a conduzir veiacuteculo automotor ateacute pagamento do deacutebito (inclusive com apreensatildeo da CNH do devedor) natildeo efetuado pagamento de verbas salariais devidas a funcionaacuterios da empresa possiacutevel o estabelecimento de vedaccedilatildeo agrave contrataccedilatildeo de novos funcionaacuterios ateacute que seja saldada a diacutevida natildeo efetuado o pagamento de financiamento bancaacuterio na forma e no prazo avenccedilados possiacutevel ateacute que se tenha a quitaccedilatildeo que se obstem novos financiamentos ou mesmo a participaccedilatildeo do devedor em licitaccedilotildees (como de ordinaacuterio jaacute acontece com pessoas juriacutedicas em deacutebito tributaacuterio com o Poder Puacuteblico) etc

Teriacuteamos entatildeo no Brasil por assim dizer a adoccedilatildeo do padratildeo da atipicidade das medidas executivas tambeacutem para as obrigaccedilotildees de pagar vistas estas como ordens do EstadoJuiz para que haja prestaccedilatildeo de pagamento em pecuacutenia

()

Por isso ndash a prevalecer a interpretaccedilatildeo potencializada do art 139 IV do CPC2015 ndash o emprego de tais medidas coercitivasindutivas especialmente nas obrigaccedilotildees de pagar encontraraacute limite certo na excepcionalidade da medida (esgotamento dos meios tradicionais de satisfaccedilatildeo do deacutebito) na proporcionalidade (inclusive agrave luz da regra da menor onerosidade ao devedor do art 805 do CPC2015) na necessidade de fundamentaccedilatildeo substancial e especialmente nos direitos e garantias assegurados na Constituiccedilatildeo Federal (vg natildeo parece possiacutevel que se determine o pagamento sob pena de prisatildeo ou de vedaccedilatildeo ao exerciacutecio da profissatildeo do direito de ir e vir etc)

74 NEVES Alexandre Fuchs das Cancelamento de cartotildees de creacutedito e apreensatildeo de CNH e passaporte

do devedor Isso eacute possiacutevel Disponiacutevel em lt httpwwwsinfacspcombrconteudocancelamento-de-cartoes-de-credito-e-apreensao-de-cnh-e-passaporte-do-devedor-isso-e-possivel gt Acesso em 30082018

75 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Publicado em 24082015 Acesso em 30082018

35

Jaacute Fernanda Tartuce76 acredita que tais medidas satildeo problemaacuteticas e devem ser

analisadas com cautela tendo em vista que ao inveacutes de afetarem o patrimocircnio do devedor

atingem a proacutepria pessoa

Sob certo prisma adotar medidas diferenciadas contribui para a efetividade da prestaccedilatildeo jurisdicional Por outro lado o patrimocircnio ndash e natildeo a pessoa do devedor - responde por diacutevidas aleacutem disso o exerciacutecio de amplos poderes pelo juiz sem balizas especiacuteficas pode ensejar medidas inadequadas Nessa linha suspender o direito de dirigir e restringir o uso de passaporte satildeo iniciativas problemaacuteticas por atingirem a pessoa do devedor enquanto a penhora da restituiccedilatildeo de Imposto de Renda soa viaacutevel por afetar seu patrimocircnio Eacute importante que a medida diferenciada se revele proporcional e seja aplicada apoacutes o exaurimento de outros meios previstos no ordenamento Como a proposta do Novo Coacutedigo eacute aumentar a eficiecircncia processual intentar medidas ineficazes inexequiacuteveis eou de difiacutecil fiscalizaccedilatildeo pode acabar ensejando o efeito contraacuterio

Nessa senda Lenio Streck e Dierle Nunes77 entendem que as medidas atiacutepicas de

suspensatildeo da CNH eou apreensatildeo de passaporte satildeo inconstitucionais Afirmam que natildeo se

pode confundir o processo civil e penal ainda que ambos remetam a um ldquoparadigma

constitucional comumrdquo e que o artigo 139 IV do CPC ldquoimpotildee novos desafios interpretativos

que podem conduzir a uma anaacutelise superficial e utilitarista de busca de resultados que

desprezem a necessaacuteria leitura constitucionalrdquo Os autores ainda ponderam que ldquoO perigo eacute o

artigo 139 IV ser transformado em instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com

autorizaccedilatildeo judicialrdquo

O professor Araken de Assis no dia 18 de abril de 2018 em um evento sobre o

Coacutedigo Processual Civil de 2015 que ocorreu em Brasiacutelia na sede do Conselho Federal da

OAB declarou ser contraacuterio aos poderes executoacuterios atiacutepicos ldquoSou contra os poderes

atiacutepicos dos juiacutezes porque seu exerciacutecio redunda em simples arbitrariedadesrdquo78

Acrescentou ainda que

76 IBDFAM ndash Instituto Brasileiro de Famiacutelia O polecircmico inciso IV do artigo 139 do CPC e suas difusas

interpretaccedilotildees Disponiacutevel em lt httpwwwibdfamorgbrnoticias6096O+polC3AAmico+inciso+IV+do+artigo+139+do+CPC+e+suas+difusas+interpretaC3A7C3B5es gt Publicado em 31082016 Acesso em 04092018

77 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018

78 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04092018

36

Eacute evidentemente inconstitucional diante do princiacutepio da dignidade da pessoa humana tirar o passaporte carteira de habilitaccedilatildeo Quecirc que tem isso com diacutevidas Natildeo tem absolutamente nada Natildeo eacute a correlaccedilatildeo instrumental entre o objetivo da execuccedilatildeo e o meio empregado Isso eacute simples vinganccedila simples puniccedilatildeo79

O professor Araken de Assis acredita que tais medidas satildeo inconstitucionais e

violam o principio da dignidade humana do executado numa sociedade como a nossa

sedenta por puniccedilatildeo natildeo me surpreende que essas ideias sejam encaradas com

naturalidade Mas eacute preciso rejeitaacute-las em nome de princiacutepios 80

34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO

A Constituiccedilatildeo Federal de 1988 tem como um dos seus fundamentos a dignidade da

pessoa humana presente no artigo 1ordm inciso III do referido texto constitucional O dito

princiacutepio tem o escopo de nortear o ordenamento juriacutedico como um todo

A inclusatildeo da dignidade da pessoa humana como princiacutepio constitucional obrigou

uma reflexatildeo sobre o papel da pessoa humana no direito e um redimensionamento para

elevaacute-la ao centro do ordenamento juriacutedico81 Eacute necessaacuterio recorrer agrave teoria Kantiana para

que se obtenha uma definiccedilatildeo do princiacutepio ora estudado Para Kant82 o homem eacute um fim

em si mesmo natildeo uma funccedilatildeo do Estado Ou Naccedilatildeo O Estado e o direito devem estar

organizados em benefiacutecio do indiviacuteduo

Agora eu afirmo o homem ndash e de uma maneira geral todo o ser racional ndash existe como fim em si mesmo e natildeo apenas como meio para o uso arbitraacuterio desta ou daquela vontade Em todas as suas accedilotildees pelo contraacuterio tanto nas direcionadas a ele mesmo como nas que o satildeo a outros seres racionais deve ser ele sempre considerado simultaneamente como fim

Partindo da premissa de que para Immanuel Kant o homem eacute o fim em si mesmo

ldquodevemos compreender que a dignidade da pessoa humana eacute a noccedilatildeo o comando a direccedilatildeo

que se deve seguir funcionando como fundamento para a interpretaccedilatildeo de todos os direitos e

garantias conferidos agrave pessoa nos ordenamentos juriacutedicos de cada Estadordquo 83

79 Ibid sem paginaccedilatildeo 80 Ibid sem paginaccedilatildeo 81 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito

fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 461 82 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud KANT Immanuel Fundamentaccedilatildeo da metafiacutesica dos costumes

Satildeo Paulo Martin Claret 2003 p56-59 Coleccedilatildeo A Obra-Prima de Cada Autor 83 SCHIAFIANO Juliana Rocha op cit p 461

37

O princiacutepio constitucional da dignidade da pessoa humana estaacute diretamente ligado ao

conteuacutedo dos direitos fundamentais logo para que se cumpra com os direitos fundamentais

constitucionalmente instituiacutedos eacute necessaacuterio reconhecer e respeitar a dignidade da pessoa

humana conforme disciplina Ingo Sarlet84

Em suma o que se pretende sustentar de modo mais enfaacutetico eacute que a dignidade da pessoa humana na condiccedilatildeo de valor (principio normativo) fundamental que atrai o conteuacutedo de todos os direitos fundamentais exige e pressupotildee o reconhecimento e proteccedilatildeo dos direitos fundamentais de todas as dimensotildees (ou geraccedilotildees se assim preferirmos) Assim sem que se reconheccedilam agrave pessoa humana os direitos fundamentais que lhe satildeo inerentes em verdade estarse-aacute lhe negando a proacutepria dignidade A consagraccedilatildeo constitucional da dignidade da pessoa humana tem o propoacutesito de limitar a atuaccedilatildeo ou a omissatildeo do Estado para garantir os direitos do indiviacuteduo Assim eacute difiacutecil precisar os efeitos da norma que determina a dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado (como acontece com a Constituiccedilatildeo brasileira de 1988) poreacutem quando desrespeitados os direitos fundamentais do cidadatildeo eacute possiacutevel identificar que a dignidade deste foi violada

Logo ldquoteraacute respeitada a sua dignidade o individuo que tiver respeitados os seus

direitos fundamentaisrdquo 85 Os direitos fundamentais estatildeo apresentados na Constituiccedilatildeo

Federal da seguinte forma direitos individuais e coletivos direitos sociais direitos poliacuteticos e

direitos de nacionalidade que tecircm como escopo garantir as liberdades positivas aos

indiviacuteduos ldquoonde foram conquistados direitos agrave liberdade religiosa liberdade civil e

profissional agrave propriedade ao livre acesso ao Judiciaacuterio agrave ampla defesa e ao contraditoacuterio no

processual judicial ao sigilo de dados e informaccedilotildees pessoais entre outros que somados

garantem o cidadatildeo uma vida dignardquo 86

O cidadatildeo na Constituiccedilatildeo Federal de 88 diferente das constituiccedilotildees brasileiras

anteriores passou a ser fundamento e ganhou destaque nos direitos fundamentais tendo

garantida a sua vida a sua dignidade a sua seguranccedila a sua honra a sua liberdade e a sua

propriedade

84 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud SARLET Ingo Wolfgang Dignidade da pessoa humana e

direitos fundamentais na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 2ed Porto Alegre Livraria do Advogado 2002 p87 85 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito

fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 462 86 Ibid p 462

38

Segundo Carmem Luacutecia Antunes Rocha87 para garantir o Estado Democraacutetico de

Direito eacute necessaacuterio que a sua atuaccedilatildeo seja sempre em conformidade com o princiacutepio da

dignidade da pessoa humana

O Estado somente eacute democraacutetico em sua concepccedilatildeo constitucionalizaccedilatildeo e atuaccedilatildeo quando respeita o princiacutepio da dignidade da pessoa humana Natildeo haacute verbo constitucional natildeo haacute verbo governamental que se faccedilam legiacutetimos quando natildeo se voltam ao atendimento daquele princiacutepio Natildeo haacute verdade constitucional natildeo haacute suporte institucional para as poliacuteticas puacuteblicas que natildeo sejam destinadas ao pleno cumprimento daquele valor maior transformado em princiacutepio constitucional

O princiacutepio da dignidade humana constitucionalmente garantido impotildee limites ao

Estado compelindo aos oacutergatildeos e atividades estatais respeitar o ser humano e garanti-lo

condiccedilotildees miacutenimas para uma vida digna Dessa forma eacute niacutetido que o dito princiacutepio eacute

pressuposto e indispensaacutevel para legitimar outras normas constitucionais e

principalmente infraconstitucionais

O Coacutedigo de Processo Civil eacute umas das principais normas infraconstitucionais que

sofre influecircncia dos preceitos valores e princiacutepios esculpidos na Constituiccedilatildeo Federal

Logo como o principio da dignidade humana eacute um dos mais importantes pressupostos

constitucionais ldquoentatildeo eacute tranquilo afirmar-se que o novel ordenamento processual tem

de se render nas resoluccedilotildees dos aspectos processuais e a fim de se atingir uma soluccedilatildeo

justa adequada e efetiva ao postulado da dignidade da pessoa humanardquo 88

Dessa forma o legislador deve formular as normas infraconstitucionais de acordo e a

partir do conteuacutedo constitucional para Marinoni Mitidiero e Arenhart89

() o Coacutedigo de Processo Civil constitui direito constitucional aplicado O Coacutedigo deve ser interpretado de acordo com a Constituiccedilatildeo e com os direitos fundamentais o que significa que as duacutevidas interpretativas devem ser resolvidas a favor da otimizaccedilatildeo do alcance da Constituiccedilatildeo e do processo civil como meio para tutela de direitos

87 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud ROCHA Carmen Luacutecia Antunes O princiacutepio da dignidade da

pessoa humana e a exclusatildeo social Revista Interesse Puacuteblico n4 p23-48 1999 p33 88 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o

novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 367

89 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 14

39

Com o escopo de conferir eficaacutecia aos mandamentos constitucionais o CPC15 traz a

previsatildeo e diversas claacuteusulas gerais em seus primeiros artigos em um dos quais se

prestigia o princiacutepio da dignidade da pessoa humana

O referido princiacutepio estaacute disciplinado no artigo 8ordm do CPC15 e atua como um guia

sobre as demais normas do coacutedigo processual Eacute o que entende Nelson Rosenvald90

O maior cuidado do inteacuterprete eacute no sentido de jamais banalizar a dignidade fazendo dela um elixir processual tal como muitas vezes se vecirc na esfera do direito civil Penso que natildeo haacute maiores dificuldades em transpor a noccedilatildeo constitucional do princiacutepio para em seguida adaptaacute-la agraves singularidades do processo

Logo de acordo com o artigo 8ordm do CPC o oacutergatildeo julgador ao aplicar o ordenamento

juriacutedico deve resguardar a dignidade da pessoa humana Para Fredie Didier91 ldquoresguardar

nesse contexto eacute de um lado aplicar corretamente a norma juriacutedica lsquoproteccedilatildeo da dignidade

da pessoa humanarsquo e de outro natildeo violar a dignidaderdquo

O oacutergatildeo julgador deveraacute manter um comportamento ativo com o objetivo de promover

a dignidade da pessoa humana podendo tomar medidas de ofiacutecio para efetivar a dignidade da

pessoa humana Didier assevera que o magistrado poderaacute ainda ldquovaler-se da claacuteusula geral de

atipicidade (art 536 sect 1ordm) para a execuccedilatildeo do direito fundamental agrave dignidaderdquo 92 O autor

ainda traz dois exemplos

a) exigecircncia de respeito agrave ordem cronoloacutegica de conclusatildeo (art 12) caso de grave violaccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana que natildeo se encaixe em um dos incisos que excepcionam a regra de observacircncia da cronologia da conclusatildeo poderia o juiz ldquofurar a filardquo para promover a dignidade da pessoa humana b) prioridade na tramitaccedilatildeo processual pessoa que seja portadora de doenccedila grave mas que natildeo esteja no rol do art 1048 I para promover a dignidade de pessoa humana o juiz poderia determinar o processamento prioritaacuterio93

Essa dupla garantia ndash resguardo e promoccedilatildeo ndash tem como objetivo garantir ao individuo

sua dignidade humana fazendo com que ldquode um lado que o Estado natildeo a viole e de outro

que o Estado a promova e efetiverdquo

90 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud ROSENVALD Nelson A

dignidade da pessoa humana no CPC15 91 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte

geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 75 92 Ibid p 75 93 Ibid p 75

40

Nessa senda o magistrado deveraacute promover a dignidade da pessoa humana quando

perceber a ausecircncia desta no processo ou assegura-la quando for posta em risco Eacute nesse

sentido o entendimento dos professores Marinoni Mitidiero e Arenhart94

() a dignidade da pessoa humana determina a compreensatildeo do processo civil como um meio para tutela dos direitos Vale dizer o processo civil natildeo pode ser visto como um instrumento a serviccedilo do Estado como um instrumento que natildeo se encontre orientado agrave realizaccedilatildeo dos fins da pessoa humana Em outras palavras o processo civil serve para realizaccedilatildeo dos direitos e para orientaccedilatildeo das pessoas a respeito do significado do direito

Nessa senda compete tanto ao juiz quanto as demais partes processuais garantirem ldquoo

valor intriacutenseco de cada vida que eacute trazida ao processordquo nas palavras de Alexandre Freitas

Cacircmara95

() aos sujeitos do processo eacute preciso sempre ter claro que os titulares dos interesses em conflitos satildeo pessoas reais cujas vidas seratildeo afetadas pelo resultado do processo e que por isso mesmo tecircm o direito de estabelecer suas estrateacutegias processuais de acordo com aquilo que lhes pareccedila melhor para suas vidas Eacute inadmissiacutevel tratar as partes como se natildeo fossem pessoas reais meros dados estatiacutesticos Afinal se para o Judiciaacuterio cada processo pode parecer apenas mais um processo para as partes cada processo pode ser o uacutenico o mais relevante aquele em que sua vida seraacute decidida E eacute dever do juiz assegurar que isto seja respeitado

Dessa forma eacute necessaacuterio que um arcabouccedilo normativo para que seja conferida

eficaacutecia e proteccedilatildeo ao principio da dignidade da pessoa humana

Logo o dito princiacutepio deve ser protegido em todas as esferas do ordenamento juriacutedico

inclusive no campo da execuccedilatildeo civil onde sofre grandes riscos de ser violado em nome do

direito fundamental agrave tutela executiva do credor ldquoPartir da premissa de que existe um direito

fundamental agrave tutela executiva ora ratificado pelo CPC eacute indispensaacutevel para a soluccedilatildeo de

diversos problemas oriundos do procedimento executivo principalmente aqueles relacionados

agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo 96

94 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme

MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 25

95 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CAcircMARA Alexandre Freitas O Novo Processo Civil Brasileiro 2 ed Satildeo Paulo Atlas 2016 p 7

96 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66

41

Eacute o caso por exemplo da impenhorabilidade Segundo Fredie Didier et al97 a

impenhorabilidade eacute uma forma de proteger certos bens do devedor do direito fundamental a

execuccedilatildeo do credor

Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa

Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais

O legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do CPC fazendo um

preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses em anaacutelise ao optar pela mitigaccedilatildeo do direito

do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado Afinal ldquoa execuccedilatildeo natildeo pode ser utilizada

como instrumento para causar a ruiacutena a fome e o desabrigo do devedor e sua famiacutelia gerando

situaccedilotildees incompatiacuteveis com a dignidade da pessoa humana 98

Logo a impenhorabilidade de certos bens

[] Eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa99

Eacute nesse sentido que o CPC15 enumera diversos casos de bens patrimoniais que satildeo

impenhoraacuteveis como o salaacuterio e vencimentos utensiacutelios necessaacuterios ao exerciacutecio da

profissatildeo seguro de vida vestuaacuterios e pertences de uso pessoal entre outros

Dessa forma as regras relativas agraves medidas executivas devem ser interpretadas agrave luz

da Constituiccedilatildeo Federal ldquovez que se voltam agrave realizaccedilatildeo de direitos fundamentais e em sua

97 Ibid p 66 98 THEODORO JUacuteNIOR Humberto Novo Coacutedigo de Processo Civil Anotado 20 ed Rio de Janeiro

Forense 2016 p 978 99 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud DIDIER JR Fredie CUNHA

Leonardo Carneiro da BRAGA Paula Sarno OLIVEIRA Rafael Alexandria de Curso de direito processual civil 3 ed Salvador JusPodivm 2011 v 5 p 547

42

realizaccedilatildeo podem atingir direitos fundamentaisrdquo 100 O Superior Tribunal de Justiccedila jaacute decidiu

que

O rol das impenhorabilidades do ordenamento paacutetrio objetiva preservar o miacutenimo patrimonial necessaacuterio agrave existecircncia digna do executado impondo ao processo executoacuterio certos limites Assim a depender das peculiaridades do caso as regras de impenhorabilidade podem ser ampliadas de modo a adequar a tutela aos direitos fundamentais como por exemplo o direito agrave moradia agrave sauacutede ou agrave dignidade da pessoa humana Trata-se portanto da aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo e da necessidade sob o enfoque da proporcionalidade101 (STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014)

Logo a interpretaccedilatildeo dos dispositivos que tratam sobre a penhora no CPC deve estaacute

diretamente ligada aos ditames constitucionais devendo o interprete privilegiar a opccedilatildeo que

esteja mais em sintonia com a Carta Magna para que nem o credor e nem o devedor sejam

lesados

O artigo 833 do CPC elenca uma seacuterie de incisos que expotildeem os bens impenhoraacuteveis

O trecho inicial inciso I do art 833 define como impenhoraacuteveis os bens inalienaacuteveis Este

inciso segue a regra de que ldquose o bem natildeo pode ser alienado tambeacutem natildeo pode ser penhorado

porque a penhora eacute o primeiro ato do procedimento de alienaccedilatildeo judicial do bemrdquo 102

Satildeo exemplos de bens inalienaacuteveis os puacuteblicos cuja alienaccedilatildeo depende de autorizaccedilatildeo

legislativa Eacute inalienaacutevel tambeacutem o capital constituiacutedo para garantir indenizaccedilatildeo de ato iliacutecito

(art 533 sect 1 ordm CPC) que portanto eacute tambeacutem impenhoraacutevel ldquoTodo bem inalienaacutevel eacute

impenhoraacutevel embora nem todo bem impenhoraacutevel seja inalienaacutevelrdquo 103

O inciso I do art 833 CPC tambeacutem consagra a impenhorabilidade dos bens que por

ato voluntaacuterio satildeo excluiacutedos da execuccedilatildeo

Segundo Fredie Didier et al104

Eacute o que ocorre nos casos de bens doados ou alienados com claacuteusula de inalienabilidade que haacute de constar no registro imobiliaacuterio para ser eficaz perante o exequente e minimizar o risco de fraude A propoacutesito eis a redaccedilatildeo do art 1911 do Coacutedigo Civil lsquolsquoA claacuteusula de inalienabilidade imposta aos bens por ato de liberalidade implica impenhorabilidade e incomunicabilidaderdquo

100 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MEDINA Joseacute Miguel Garcia

Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 1 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 p 736 101 STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014 102 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 824 103 Ibid p 824 104 Ibid p 825

43

O inciso II por sua vez estabelece que satildeo impenhoraacuteveis os bens moacuteveis os

pertences e as utilidades domeacutesticas da residecircncia do executado Todavia excepcionam-se os

bens dessa natureza que sejam de elevado valor ou que ultrapassem as necessidades comuns

correspondentes a um meacutedio padratildeo de vida

A jurisprudecircncia natildeo eacute paciacutefica sobre o assunto logo natildeo exista uma relaccedilatildeo de bens

que podem ser atingidos pela penhora Abrindo margem para as mais variadas decisotildees

O STJ jaacute considerou impenhoraacuteveis aparelho de televisatildeo a cores mesa de centro passadeira raacutedio toca-fitas gravador microondas ar-condicionado um freezer um microcomputador com acessoacuterios uma impressora etc Poderatildeo ser penhorados porque ultrapassam o padratildeo-meacutedio aparelhos de TV mais sofisticados o segundo aparelho de televisatildeo a segunda geladeira aparelhos de ar-condicionado que satildeo verdadeiras peccedilas de design moacuteveis antigos que se transformam em peccedilas de decoraccedilatildeo faqueiro de prata adega climatizada etc Em entendimento de caraacuteter ainda mais geneacuterico jaacute restou consignado em determinado precedente que a proteccedilatildeo natildeo abrangeria apenas os bens indispensaacuteveis agrave moradia mas tambeacutem aqueles usualmente encontrados em um lar105

Ademais o inciso III do art 833 do CPC traz a impenhorabilidade dos vestuaacuterios bem

como os pertences de uso pessoal do executado salvo se de elevado valor

Segundo Fredie Didier et al106 o dispositivo possui dois propoacutesitos

de um lado preservar a dignidade do executado com a proteccedilatildeo de bens moacuteveis importantes para a sua sobrevivecircncia digna como o vestuaacuterio aparelho celular reloacutegio e os bens relacionados agrave sua higiene pessoal de outro lado a regra visa prestigiar a boa-feacute processual impedindo a execuccedilatildeo mesquinha e abusiva com a penhora de bens de pequeno ou nenhum valor como um pente ou uma bota

O inciso IV do art 833 do CPC consagra uma das mais importantes modalidades a

impenhorabilidade relativa aos rendimentos de natureza alimentar ldquoTrata-se de regra que

possui o claro propoacutesito de proteger o executado garantindo-lhe o recebimento de valores que

servem ao pagamento das despesas relacionadas agrave sua sobrevivecircncia digna e agrave da sua famiacuteliardquo 107

Jaacute inciso V do art 833 do CPC torna impenhoraacuteveis os livros as maacutequinas as

ferramentas os utensiacutelios os instrumentos ou outros bens moacuteveis necessaacuterios ou uacuteteis ao

exerciacutecio de qualquer profissatildeo 105 Ibid p 826 106 Ibid p 827 107 Ibid p 828

44

Por forccedila do paraacutegrafo 3ordm do art 833 satildeo igualmente impenhoraacuteveis os equipamentos

implementos e maacutequinas agriacutecolas pertencentes agrave pessoa fiacutesica ou a empresa individual

produtora rural Rodrigo Mazzei e Sarah Merccedilon108 esclarecem que

Tem assento na noccedilatildeo de que a dignidade estende-se tambeacutem ao exerciacutecio da profissatildeo em si mesma e tambeacutem por representar a forma por excelecircncia de que dispotildee o executado para continuar a receber sua remuneraccedilatildeo e por conseguinte prover seu sustento e de sua famiacutelia Trata-se tambeacutem de aplicaccedilatildeo pontual da funccedilatildeo social da propriedade jaacute que protege os bens que permitem a circulaccedilatildeo de riquezas para a subsistecircncia do executado e se for o caso de sua famiacutelia

Forccediloso ressaltar ainda que a impenhorabilidade do inc V alcanccedila apenas os bens

moacuteveis de modo que eacute absolutamente possiacutevel que o imoacutevel em que o executado exerccedila sua

atividade profissional seja penhorado conforme a Suacutemula 451 do STJ ldquoEacute legiacutetima a penhora

da sede do estabelecimento comercialrdquo

O inciso VI do art 833 do CPC versa sobre a impenhorabilidade do seguro de vida

ldquoTrata-se de impenhorabilidade em favor do beneficiaacuterio do seguro e natildeo do segurado ateacute

porque o valor do seguro natildeo compotildee nem comporaacute o seu patrimocircnio (art794 do Coacutedigo

Civil1 ordm7)rdquo Dessa forma ldquoem uma execuccedilatildeo contra o segurado natildeo seraacute possiacutevel a penhora

do seguro de vida pois se trata de bem que natildeo lhe pertence nem mesmo em expectativardquo

De acordo com o inciso VII do art 833 do CPC satildeo impenhoraacuteveis os materiais

necessaacuterios para obras em andamento salvo se essas forem penhoradas Logo a obra pode

ser penhorada (art 862 do CPC) ldquoA regra como bem lembrou Araken de Assis lsquoestimula a

penhora da proacutepria obra inconclusa agrave qual os materiais acrescem e conseguintemente

valorizamrsquo 109

O art 833 VIII CPC julga impenhoraacutevel a pequena propriedade rural assim

definida em lei desde que trabalhada pela famiacutelia reproduzindo parte do art 5ordm XXVI CF

88116 que disciplina a impenhorabilidade do referido bem

A proteccedilatildeo do CPC eacute mais ampla do que a garantia prevista na Constituiccedilatildeo Federal

tendo em vista que a impenhorabilidade natildeo se restringe agraves execuccedilotildees de deacutebitos decorrentes

de sua atividade produtiva podendo ser alegada em toda e qualquer execuccedilatildeo ldquoAssim o 108 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CABRAL Antonio Passo

CRAMER Ronaldo (orgs) Comentaacuterios ao Novo Coacutedigo de Processo Civil Rio de Janeiro Forense 2015 p 1194

109 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 835

45

imoacutevel natildeo pode ser penhorado na execuccedilatildeo de creacutedito rural concedido para estimular a

produccedilatildeo agriacutecola mas poderaacute ser penhorado na execuccedilatildeo do creacutedito concedido para a

aquisiccedilatildeo do imoacutevelrdquo 110

A nona modalidade de impenhorabilidade trata-se dos recursos puacuteblicos recebidos por

instituiccedilotildees privadas para aplicaccedilatildeo compulsoacuteria em educaccedilatildeo sauacutede ou assistecircncia social ldquoA

proteccedilatildeo eacute louvaacutevel e tutela toda a coletividade ao privilegiar o direito agrave educaccedilatildeo sauacutede e

assistecircncia social em detrimento do direito do credorrdquo

De acordo com o inciso X do art 833 do CPC eacute impenhoraacutevel ateacute o limite de

quarenta salaacuterios miacutenimos a quantia depositada em caderneta de poupanccedila

Eacute uma modalidade de impenhorabilidade relativa (o CPC73 a considerava absoluta)

tendo em vista que essa impenhorabilidade natildeo pode ser oposta na execuccedilatildeo de alimentos

independentemente da sua origem (art 833 sect 2ordm do CPC) Fredie Didier et al cita Araken de

Assis111 ao afirmar que

a regra soacute protege essa aplicaccedilatildeo financeira Se o valor estiver depositado em fundo de investimento por exemplo poderaacute ser penhorado Se o devedor tiver vaacuterias cadernetas de poupanccedila a impenhorabilidade aplica-se agrave soma de todas elas e natildeo a cada uma delas isoladamente do contraacuterio valores expressivos poderiam ser pulverizados em vaacuterias contas burlando a finalidade da regra que eacute a de proteger a populaccedilatildeo de baixa renda

Ademais satildeo tambeacutem impenhoraacuteveis por forccedila do inciso XI os recursos puacuteblicos do

fundo partidaacuterio recebidos por partido poliacutetico nos termos da lei Essa modalidade de

impenhorabilidade ldquose restringe aos recursos puacuteblicos do fundo partidaacuterio Recursos de

origem privada recebidos pelo partido poliacutetico poderatildeo ser penhoradosrdquo 112 O processualista

Fredie Didier et al113 assevera que

Assim a impenhorabilidade foi estabelecida no intuito de impedir que os diretoacuterios nacionais de partidos poliacuteticos respondam por diacutevida dos diretoacuterios

110 Ibid p 836 111 DIDIER JR Fredie et al apud ASSIS Araken de Manual da execuccedilatildeo 11ordm ed cit p 225 Assim

tambeacutem REDONDO Bruno Garcia LOJO Maacuterio Vitor Suarez Penhora cit p 117 BUENO Cassio Scarpinella Curso sistematizado de Direito Processual Civil v 3 cit p 228 GIANNICO Mauriacutecio As novas reformas do CPC e de outras normas processuais Mauriacutecio Giannico e Viacutetor Joseacute de Mello Monteiro (coord) Satildeo Paulo Saraiva 2009 p 1 OS Em sentido diverso estendendo a impenhorabiacutelidade aos depoacutesitos feitos ateacute esse valor em CDB CDI fundos de renda fixa ou de accedilotildees RODRIGUES Marcelo Abelha Manual de execuccedilatildeo civil 3deg ed cit p 101

112 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 839

113 Ibid p 839

46

estaduaismunicipais - sobretudo em razatildeo das vaacuterias decisotildees judiciais que determinaram penhora de recursos do fundo partidaacuterio de alguns partidos

Por fim o inciso XII do artigo 833 do CPC trata sobre a impenhorabilidade dos

creacuteditos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias sob o regime de incorporaccedilatildeo imobiliaacuteria

vinculados agrave execuccedilatildeo de obra ldquoO objetivo dessa modalidade eacute evitar que diacutevidas do

incorporador possam consumir os recursos que seriam utilizados na realizaccedilatildeo da obra em

prejuiacutezo dos adquirentes de unidades autocircnomasrdquo 114

O professor Misael Montenegro Filho115 aduz sobre que ldquoao estabelecer a

impenhorabilidade dos creacuteditos oriundos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias o novo CPC

protegeu os valores destinados agrave execuccedilatildeo da obra e agrave entrega das unidades imobiliaacuterias aos

adquirentes assegurando assim a execuccedilatildeo da promessa contratualrdquo

Importante frisar ainda que a Lei nordm 8009 1990 instituiu a impenhorabilidade do

imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar por qualquer diacutevida salvo as exceccedilotildees dos

seus arts 3ordm e 4ordm

A referida lei dispotildee que Para os efeitos de impenhorabilidade considera-se

residecircncia um uacutenico imoacutevel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia

permanente (art 5ordm)

O processualista baiano Fredie Didier et al116 assevera que

A lei propotildee-se a proteger imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar nos termos acima expostos A CF 88 ampliou o conceito de entidade familiar para abranger a famiacutelia monoparental e a uniatildeo estaacutevel Mas deve considerar-se aiacute compreendidos os irmatildeos que vivem juntos e a uniatildeo homossexual Ateacute o solteiro estaacute abrangido pela impenhorabilidade se reside soacute no imoacutevel - isso em nome da proteccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana e da moradia digna Na verdade houve uma mudanccedila de compreensatildeo acerca do sentido da proteccedilatildeo de proteccedilatildeo da famiacutelia agrave proteccedilatildeo da moradia indispensaacutevel agrave preservaccedilatildeo da dignidade da pessoa

114 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o

novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 388

115 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MONTENEGRO FILHO Misael Novo Coacutedigo de Processo Civil Comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Atlas 2016 p 752

116 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 840-841

47

O STJ jaacute consolidou esse entendimento na suacutemula nordm 364 O conceito de

impenhorabilidade de bem de famiacutelia abrange tambeacutem o imoacutevel pertencente a pessoas

solteiras separadas e viuacutevas

Entretanto se o casal ou entidade familiar possuir vaacuterios imoacuteveis utilizados como

residecircncia a impenhorabilidade recairaacute sobre o de menor valor (art 5ordm paraacutegrafo uacutenico) ldquoEacute o

que ocorre por exemplo quando a famiacutelia se divide em mais de uma cidade por motivos

profissionaisrdquo 117

Forccediloso observar ainda que a impenhorabilidade do imoacutevel familiar eacute relativa jaacute que

natildeo pode ser oposta a qualquer creacutedito O art 3ordm da Lei n 8009 1990151 em que pode ser

penhorada a residecircncia da famiacutelia (exemplo execuccedilatildeo de alimentos para cobranccedila de taxas

devidas em funccedilatildeo do imoacutevel familiar etc)

Resta claro que o artigo 833 do CPC ao disciplinar as hipoacuteteses de impenhorabilidade

possui o escopo de proteger o princiacutepio da dignidade humana Entretanto algumas claacuteusulas

natildeo possuem proteccedilatildeo absoluta ldquoa sua relativizaccedilatildeo a depender do caso sob exame deve ser

realccedilada agrave medida que a dignidade resguardada e protegida pelo sistema processual-

constitucional natildeo se limita ao executadordquo 118 Ademais ldquoEacute premente advertidamente que a

dignidade do credor tambeacutem seja garantida em juiacutezo tendo como norte pois os princiacutepios da

proporcionalidade e razoabilidaderdquo 119

117 Ibid p 841 118 Ibid p 752 119 Ibid p 752

48

4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA

ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE

HUMANA DO EXECUTADO

41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE

EFETIVACcedilAtildeO

Como jaacute exposto em linhas preteacuteritas nos meios executivos tiacutepicos as medidas

executivas satildeo determinadas pela lei ou seja o oacutergatildeo pode aplicar somente as medidas

tipificadas no ordenamento juriacutedico No entanto ao se tratar das medidas executivas atiacutepicas

eacute necessaacuterio que haja um limite na atuaccedilatildeo realizada pelo juiz

O poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo poder ser realizado de maneira indiscriminada haacute

pressupostos e premissas a serem observadas Dessa forma a primeira premissa eacute no sentindo

de que a medida executiva atiacutepica natildeo pode ser a primeira medida a ser invocada ldquomuito ao

reveacutes a regra do nosso sistema continua a ser o da tipicidade dos meios executivos soacute que

agora temperado pelo sistema atiacutepicordquo 120 O processualista Thiago Rodovalho explica que

ldquo() os meios atiacutepicos natildeo satildeo prima ratio e sim a ultima ratio eacute dizer esgotados e

frustrados os meios executivos tiacutepicos e ordinaacuterios pode-se em tese valer-se do sistema

atiacutepicordquo121

Dessa forma nos casos de execuccedilatildeo que tenha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

natildeo deve ser aplicado de logo as medidas indutivas e coercitivas Apenas apoacutes frustradas as

medidas ldquonaturaisrdquo pode-se passar agrave aplicaccedilatildeo das medidas atiacutepicas

Uma segunda premissa diz a respeitos dos meios de pressatildeo para compelir o devedor a

adimplir com o seu deacutebito ldquoEssa segunda premissa decorre inclusive de imperiosidade

loacutegica de nada adianta a medida de pressatildeo se a obrigaccedilatildeo natildeo tem como ser adimplida pelo

devedorrdquo 122

Para Thiago Rodovalho123 ldquoIsso quer significar que esgotados e frustrados os meios

tiacutepicos o juiz se valeraacute dos meios atiacutepicos se eles forem potencialmente haacutebeis a estimular ou

120 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da

atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018

121 Ibid sem paginaccedilatildeo 122 Ibid sem paginaccedilatildeo 123 Ibid sem paginaccedilatildeo

49

forccedilar o cumprimento o que pressupotildee sua possibilidade quando entatildeo eles poderatildeo ser

eficazesrdquo

Logo nas obrigaccedilotildees de pagar quantia se houver a real demonstraccedilatildeo da

impossibilidade financeira do devedor seria um constrangimento inuacutetil e desnecessaacuterio a

imposiccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo para forccedilar o cumprimento

Por isso as medidas atiacutepicas devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o

esgotamento das medidas tiacutepicas e a possibilidade de cumprimento de cumprimento da

obrigaccedilatildeo

Ademais superadas as supracitadas premissas e o oacutergatildeo julgador vislumbrando a

necessidade da aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo se faz necessaacuterio que um conjunto de

postulados e princiacutepios rejam a atuaccedilatildeo do oacutergatildeo julgador servindo de norte para a escolha da

medida executiva mais adequada ldquoDe modo geral a escolha deve pautar-se nos postulados da

proporcionalidade da razoabilidade (art8ordm CPC) e da proibiccedilatildeo de excesso bem como nos

princiacutepios da eficiecircncia e da menor onerosidade da execuccedilatildeordquo 124

O professor Fredie Didier et al125 eacute categoacuterico ao citar Humberto Aacutevila

Segundo Humberto Aacutevila o postulado da proporcionalidade se manifesta nas situaccedilotildees em que haacute uma relaccedilatildeo de causalidade entre dois elementos empiricamente discerniacuteveis um meio e um fim de tal sorte que se possa proceder aos trecircs exames fundamentais o da adequaccedilatildeo (o meio promove o fim) o da necessidade (dentre os meios disponiacuteveis e igualmente adequados para promover o fim natildeo haacute outro meio menos restritivo do(s) direito(s) fundamental (is) afetado(s)) e o da proporcionalidade em sentido estrito (as vantagens trazidas pela promoccedilatildeo do fim correspondem agraves desvantagens provocadas pela adoccedilatildeo do meio)

O juiz ao aplicar a medida executiva atiacutepica ao caso concreto deve ter seu

embasamento no princiacutepio da proporcionalidade para saber se a medida a ser tomada eacute a

melhor opccedilatildeo ao caso sub judice ldquoO exame de proporcionalidade aplica-se sempre que

houver uma medida concreta destinada a realizar uma finalidaderdquo 126

Em verdade a aplicaccedilatildeo do princiacutepio da proporcionalidade eacute imprescindiacutevel na adoccedilatildeo

dos meios executivos atiacutepicos tendo em vista que ldquo() tais medidas em especial quando de

124 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111 125 DIDIER JR Fredie et al apud AVILA Humberto Teoria dos princiacutepios da definiccedilatildeo agrave aplicaccedilatildeo

dos princiacutepios juriacutedicos 16 ed Satildeo Paulo Malheiros 2015 p 205 126 DIDIER JR Fredie et al op cit p 111

50

natureza coercitiva podem restringir direitos do devedor e incidir diretamente sobre sua

pessoardquo127 Logo ainda que o princiacutepio da efetividade da tutela executiva seja um direito

fundamental o mesmo ldquo() deve ser compatibilizado com direitos fundamentais do

executado para que a sua dignidade humana seja preservadardquo 128

Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Neves129 afirma que em nome do princiacutepio da

proporcionalidade o juiz deveraacute

() ponderar no caso concreto as vantagens praacuteticas da adoccedilatildeo de cada medida executiva atiacutepica em especial as de natureza coercitiva e as desvantagens de sua adoccedilatildeo levando em conta a possibilidade de a medida criar uma limitaccedilatildeo excessiva ao exerciacutecio de direito fundamental do executado

Outro princiacutepio que o oacutergatildeo julgador deve se ater ao escolher a medida executiva

atiacutepica eacute o da razoabilidade Segundo Fredie Didier et al 130 o princiacutepio (ou postulado)131 se

manifesta de trecircs formas

a) como dever de equidade a exigir a harmonizaccedilatildeo da norma geral com o caso individual impondo a consideraccedilatildeo daquilo que normalmente acontece em detrimento do que eacute extraordinaacuterio e tambeacutem impondo a consideraccedilatildeo das especificidades do caso concreto ante a generalidade da norma b) como dever de congruecircncia a exigir a harmonizaccedilatildeo das normas com suas condiccedilotildees externas de aplicaccedilatildeo (isto eacute com a realidade com base em que foram editadas) c) como dever de equivalecircncia a exigir uma relaccedilatildeo de equivalecircncia entre a medida adotada e o criteacuterio que a dimensiona

Logo ldquo() o princiacutepio da razoabilidade deve nortear a atuaccedilatildeo do juiz na adoccedilatildeo das

medidas executivas atiacutepicas previstas no art 139 IV do Novo CPCrdquo 132 tendo em vista que

ldquo() mesmo medidas que pelo princiacutepio da proporcionalidade podem se mostrar

abstratamente possiacuteveis de adoccedilatildeo no caso concreto podem se mostrar inadequadas e

irrazoaacuteveisrdquo 133

127 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Medidas executivas atiacutepicas na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de

pagar quantia certa art 139 IV do novo CPC Revista de Processo v 42 n 265 mar 2017 p 14 128 Ibid p 14 129 Ibid p 14 130 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111-112 131 Segundo Fredie Didier et al o postulado eacute uma norma que atua sobre a aplicaccedilatildeo de outras normas

A proporcionalidade e a razoabilidade seriam postulados normativos e natildeo princiacutepios segundo essa concepccedilatildeo 132 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo op cit p 14 133 Ibid p 14

51

Ademais conforme dispotildee o postulado da proibiccedilatildeo de excesso ldquoa realizaccedilatildeo de uma

regra ou princiacutepio constitucional natildeo pode conduzir agrave restriccedilatildeo a um direito fundamental que

lhe retire um miacutenimo de eficaacuteciardquo 134

A proibiccedilatildeo de excesso deveraacute sempre ser suscitada quando um direito fundamental

houver sido violado a ponto do direito fundamental sofrer violaccedilatildeo excessiva Ademais ldquoesse

postulado natildeo se confunde com o da proporcionalidade porque ele dispensa os exames da

adequaccedilatildeo (relaccedilatildeo meiofim) da necessidade (exigibilidade) ou da proporcionalidade em

sentido estrito (ponderaccedilatildeo entre vantagens e desvantagens)rdquo 135

Logo ldquopouco importa a relaccedilatildeo meiofim ou a exigibilidade da medida ou ainda a

ponderaccedilatildeo com outro direito fundamental eventualmente em jogo aqui se analisa apenas a

eficaacutecia de um determinado direito fundamentalrdquo 136

O princiacutepio da eficiecircncia tem previsatildeo constitucional no art 37 e previsatildeo

infraconstitucional no art 8ordm do CPC15 O referido princiacutepio determina que o processo seja

conduzido de forma eficiente pelo oacutergatildeo jurisdicional

Entende-se que eficiente eacute a atuaccedilatildeo que utilize adequadamente os meios necessaacuterios

para que se atinjam os fins almejados O oacutergatildeo jurisdicional na escolha dos meios a serem

utilizados para a obtenccedilatildeo dos fins

a) deve escolher aqueles que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo (deve evitar meios que promovam resultados insignificantes) b) deve escolher meios que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado (natildeo se pode escolher um meio de resultado duvidoso) c) natildeo pode escolher um meio que produza muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscado 137

O juiz deveraacute igualmente analisar o princiacutepio da menor onerosidade da execuccedilatildeo que

eacute previsto pelo art 805 do CPC ldquoArt 805 Quando por vaacuterios meios o exequente puder

promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o

executadordquo

134 134 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 112 135 Ibid p 112 136 Ibid p 112 137 Ibid p 112-113

52

Logo ldquohavendo duas opccedilotildees igualmente eficazes para permitir alcanccedilar o resultado

pretendido (satisfaccedilatildeo do creacutedito) deveraacute o oacutergatildeo julgador valer-se daquela que menos onere

a situaccedilatildeo do executadordquo 138

O dito princiacutepio impede o comportamento abusivo do exequente que possa beneficiar-

se do meio mais danoso ao executado protegendo dessa forma a lealdade e a eacutetica

processual

Os postulados e princiacutepios analisados em linhas preteacuteritas impotildeem ao oacutergatildeo julgador a

observacircncia de alguns criteacuterios para a escolha da medida executiva atiacutepicas a ser utilizada no

caso concreto

Primeiramente a medida executiva atiacutepica deveraacute ser adequada ldquoO criteacuterio da

adequaccedilatildeo impotildee que juiz considere abstratamente uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida

executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia

a gerar o resultadordquo 139 Nesse primeiro momento o juiz deveraacute observar sob a perspectiva do

credor qual medida teraacute o condatildeo de gerar o resultado mais efetivo

Segundo Fredie Didier et al140 o criteacuterio da adequaccedilatildeo eacute

() fortemente inspirado pelo postulado da proporcionalidade e pelo princiacutepio da eficiecircncia na parte em que esse princiacutepio determina a escolha de meios que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo e que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado

Ademais a medida adotada pelo oacutergatildeo julgador deveraacute ser necessaacuteria ldquoEsse criteacuterio

impotildee um limite agrave atuaccedilatildeo judicial funcionando como uma espeacutecie de contrapeso ao criteacuterio

da adequaccedilatildeo Aqui deve-se levar em conta a posiccedilatildeo do devedorrdquo141

O juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental agrave execuccedilatildeo e determinar

uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute necessaacuterio que a

medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado O criteacuterio da necessidade

estabelece que ldquonatildeo se pode ir aleacutem do necessaacuterio para alcanccedilar o propoacutesito almejado Deve

138 Ibid p 113 139 Ibid p 113 140 Ibid p 113 141 Ibid p 114

53

pois o oacutergatildeo julgador determinar o meio executivo na medida do estritamente necessaacuterio para

proporcionar a satisfaccedilatildeo do creacutedito ndash nem menos nem maisrdquo 142

O referido criteacuterio possui forte influecircncia dos postulados da proibiccedilatildeo do excesso e da

razoabilidade assim como do princiacutepio da menor onerosidade para o executado Assevera

Fredie Didier et al143 que

Natildeo eacute razoaacutevel por exemplo impor como primeira opccedilatildeo medida coercitiva a ser suportada pelo agente puacuteblico pelo simples fato de o juiz pressupor que o ente puacuteblico ao qual ele eacute vinculado iraacute descumprir determinada ordem judicial - o descumprimento natildeo pode ser visto como algo ordinaacuterio ou cotidiano (razoabilidade como dever de equidade) Tampouco eacute razoaacutevel eleger a prisatildeo civil como meacutetodo prioritaacuterio para compelir o executado ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer (razoabilidade como dever de equivalecircncia) Aleacutem disso eacute vedada por exemplo a imposiccedilatildeo de multa coercitiva para compelir o executado a emitir declaraccedilatildeo de vontade uma vez que haacute previsatildeo expressa de medida tiacutepica capaz de proporcionar o mesmo resultado sem sacrifiacutecio para o devedor (art 501 CPC)

A afirmaccedilatildeo feita por Bonavides144 em 1997 sobre a adequaccedilatildeo e a necessidade

continua atual sobre os motes

O meio empregado pelo legislador deve ser adequado e necessaacuterio para alcanccedilar o objetivo procurado O meio eacute adequado quando com seu auxiacutelio se pode alcanccedilar o resultado desejado eacute necessaacuterio quando o legislador natildeo poderia ter escolhido outro meio igualmente eficaz mas que natildeo limitasse ou limitasse de maneira menos sensiacutevel o direito fundamental

Por fim a medida deve conciliar os interesses contrapostos ldquoO magistrado deve

ponderar os interesses em jogo aplicando a proporcionalidade em sentido estrito de modo

que as vantagens da utilizaccedilatildeo da medida atiacutepica escolhida superem as vantagens de seu usordquo 145

Esse criteacuterio natildeo privilegia nem o credor nem o devedor e sim a soluccedilatildeo mais

equilibrada e que atenda da melhor forma aos valores em conflito ldquoTrata-se de criteacuterio

inspirado nos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade bem como no princiacutepio da

142 Ibid p 114 143 Ibid p 114 144 BONAVIDES Paulo Curso de Direito Constitucional 7ordm ediccedilatildeo Satildeo Paulo Ed Malheiros 1997

p 372 145 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 114-115

54

eficiecircncia na parte em que impotildee ao juiz evitar a escolha do meio executivo que produza

muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscadordquo 146

Cada um dos criteacuterios supracitados devem ser considerados pelo juiz ao aplicar as

medidas executivas atiacutepicas ao caso concreto Para Fredie Didier et al147 as medidas como

retenccedilatildeo de CNH passaporte ou cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado como

forma de pressionaacute-lo ao pagamento da diacutevida pecuniaacuteria natildeo satildeo possiacuteveis

Essas natildeo satildeo medidas adequadas ao atingimento do fim almejado (o pagamento de quantia) - natildeo haacute propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente Tais medidas soam mais como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-lo ao cumprimento da ordem judicial - e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a utilizaccedilatildeo de meios sancionatoacuterios pelo magistrado mas apenas de meios de coerccedilatildeo indireta e sub-rogatoacuterios

Ainda que adequadas fossem a retenccedilatildeo de CNH e do passaporte no corte de fornecimento de aacutegua natildeo parecem ser medidas necessaacuterias (no sentido de exigiacuteveis) uma vez que outras medidas podem em tese ser utilizadas sem causar igual gravame ao executado - como por exemplo a simples restriccedilatildeo do uso de cartotildees de creacutedito A retenccedilatildeo de documentos pessoais eacute medida que termina por restringir a liberdade de ir e vir do executado mostrando-se a princiacutepio natildeo-razoaacutevel por ir de encontro ao dever de equivalecircncia e desproporcional por restringir demais o direito agrave liberdade em favor do direito de creacutedito pecuniaacuterio do exequente

O processualista baiano et al148 cita tambeacutem outro exemplo de medida atiacutepica que natildeo

atingem os criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade

Tampouco parece adequada em princiacutepio determinaccedilatildeo de corte de energia eleacutetrica de todo o preacutedio onde funciona serviccedilo puacuteblico administrativo como forma de pressionar o ente federado a cumprir ordem de nomeaccedilatildeo de candidato em concurso puacuteblico Natildeo parece haver relaccedilatildeo meiofim entre uma coisa e outra Tambeacutem natildeo eacute possiacutevel enxergar essa medida como necessaacuteria no sentido de ser a menos gravosa para o devedor - observe que se trata de medida que uma vez aplicada ensejaria restriccedilatildeo de funcionamento em toda a reparticcedilatildeo puacuteblica em prejuiacutezo de serviccedilos puacuteblicos essenciais ao funcionamento da Administraccedilatildeo o que aleacutem de ser excessivamente gravoso parece natildeo se conformar agrave necessidade de ponderaccedilatildeo dos interesses em jogo - aleacutem de afetar a um sem-nuacutemero de pessoas tomadoras desses serviccedilos

Ademais eacute sabido que toda e qualquer decisatildeo judicial precisa ser fundamentada Ao

se tratar das medidas executivas atiacutepicas o papel da fundamentaccedilatildeo se torna ainda mais

146 Ibid p 115 147 Ibid p 115 148 Ibid p 116

55

importante tendo em vista que eacute pela fundamentaccedilatildeo da decisatildeo que se poderaacute controlar a

adequaccedilatildeo e necessidade da medida atiacutepica

Pelo fato das medidas executivas atiacutepicas derivarem de dispositivos normativos

considerados claacuteusulas gerais propiacutecias as mais variadas interpretaccedilotildees eacute de extrema

importacircncia que o oacutergatildeo julgador fundamente sua decisatildeo

Logo ldquodeve o juiz na fundamentaccedilatildeo decisoacuteria expor racionalmente os motivos da

sua escolha demonstrando com atenccedilatildeo ao art 489 sect 1ordm CPC de que modo a sua opccedilatildeo

atende os criteacuterios da adequaccedilatildeo necessidade e proporcionalidade em sentido estrito ()rdquo 149

Dessa forma os princiacutepios da proporcionalidade e razoabilidade servem para delimitar

o alcance das claacuteusulas gerais de efetivaccedilatildeo fazendo com que o oacutergatildeo julgador se atenha aos

criteacuterios da adequaccedilatildeo e necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao caso

concreto

42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO

EXECUTADO

A entrada em vigor do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 aflorou ainda mais uma

discussatildeo essencial para os processualistas do seacuteculo XXI qual eacute o verdadeiro protagonista do

processo civil

Para os que defendem o ldquoautoritarismo processualrdquo o verdadeiro protagonista do

processo civil eacute o oacutergatildeo judiciaacuterio que em nome do desempenho efetivo de suas funccedilotildees lhes

eacute permitido dilatar os poderes que diga-se de jaacute passagem jaacute compotildeem um vastiacutessimo

arsenal150

Jaacute os ldquogarantistasrdquo 151 do processo civil acreditam que os verdadeiros protagonistas satildeo

as partes do processo e seus direitos e garantias devem ser estritamente preservados

Devido a essa disputa de quem possui maior protagonismo no processo as mudanccedilas

ocorridas no coacutedigo processual vigente quanto agraves medidas executivas atiacutepicas despertaram

149 Ibid p 117 150 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos

atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04102018

151 O processualista Araken de Assis acredita que o termo garantista eacute descabido tendo em vista que remete ao processo penal

56

maior celeuma do que qualquer outra modificaccedilatildeo trazida pelo CPC15 Afinal as referidas

medidas acirravam ainda mais a disputa pelo protagonismo processual

O fato de o CPC15 dispor no art 139 IV que o juiz poderaacute decretar todas as medidas

indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o

cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo

pecuniaacuteria levou boa parte da doutrina e dos juiacutezes a acreditar que teria pleno direito de

aplicar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo Entretanto muitos se esqueceram do outro lado

da moeda esqueceram que a dignidade humana do executado tambeacutem eacute um direito

fundamental e natildeo pode ser violado

Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa152

acreditam que

() natildeo parece producente elencar um rol abstrato das medidas que poderiam ser aplicadas pelo juiz a tiacutetulo do art 139 IV CPC Afinal se busca a efetividade da execuccedilatildeo e esta soacute pode ser identificada agrave luz das especificidades da situaccedilatildeo concreta Ideal eacute enveredar pela loacutegica modular (adequaccedilatildeo ao caso) natildeo pela geneacuterica (soluccedilotildees abstratas de pretensa utilidade universal)

Em razatildeo de o dispositivo apresentar uma gama de poderes tatildeo amplos agrave disposiccedilatildeo do

oacutergatildeo julgador sem nenhuma estipulaccedilatildeo de um procedimento legal previamente definido para

que estabeleccedila as condiccedilotildees de sua aplicaccedilatildeo em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo eacute

necessaacuterio que em razatildeo do princiacutepio da dignidade humana natildeo busque definir o que o

dispositivo permite mas de definir o que ele natildeo permite ldquoOu seja propotildee-se a sua

compreensatildeo por exclusatildeo Afinal se ele tem potencialidade para promover a efetividade da

tutela tambeacutem pode provocar lesotildees E como em direito os fins natildeo justificam os meios

ressalta como prioritaacuteria a necessidade de estabelecer limitesrdquo 153

O art 789 do CPC15 disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial e eacute

categoacuterico ao dispor que ldquoo devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para

152 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

153 Ibid sem paginaccedilatildeo

57

o cumprimento de suas obrigaccedilotildees salvo as restriccedilotildees estabelecidas em leirdquo Logo a

execuccedilatildeo somente poderaacute incidir sobre os bens do devedor e natildeo sobre a sua pessoa

Como eacute sabido a Lex Poetelia Papiria de 326 aC foi o primeiro marco legal da

humanizaccedilatildeo das cobranccedilas de diacutevidas abolindo a imposiccedilatildeo ao devedor de castigos

vexatoacuterios e ateacute da pena de morte154

Afinal no direito romano antigo a cobranccedila de diacutevidas poderia recair sobre a pessoa

do devedor que respondia com sua liberdade e ateacute mesmo com seu proacuteprio corpo permitindo

a lei que repartissem tantos pedaccedilos do corpo do devedor quantos fossem seus credores

Nesse sentindo leciona o professor Guilherme Pupe da Noacutebrega155 que

Vem de longe a evoluccedilatildeo no sentido de fazer a responsabilidade por uma obrigaccedilatildeo migrar da pessoa do devedor para seu patrimocircnio Merecem registro especiacutefico como marcos histoacutericos remotos a Lex Poetelia Papiria de 326 aC que aboliu o nexum e possibilidade de escravidatildeo do devedor como garantia da obrigaccedilatildeo e a pignoris capio ou ldquoaccedilatildeo por tomada de penhorrdquo que instituiu a possibilidade de o credor tomar parcela dos bens do devedor como forma de assegurar o adimplemento da diacutevida Aqueles institutos culminariam seacuteculo depois no artigo 789 do CPC de 2015 a consagrar que o devedor responda pela satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo com seus bens presentes e futuros observadas as restriccedilotildees impostas pelas impenhorabilidades legais

Logo o avanccedilar da civilizaccedilatildeo marcou o deslocamento da responsabilidade por

diacutevidas saindo do corpo do devedor para o seu patrimocircnio tendo em vista que a vida

humana a liberdade e a integridade fiacutesica satildeo valores inalienaacuteveis natildeo podendo ser

sacrificadas em benefiacutecio de obrigaccedilotildees pecuniaacuterias 156

Entretanto eacute sabido que a responsabilidade patrimonial eacute excepcionada pela prisatildeo

civil do devedor de verba alimentiacutecia resquiacutecio da responsabilidade pessoal romana

154 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt

httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018

155 NOacuteBREGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139 IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018

156 Ibid sem paginaccedilatildeo

58

No entanto haacute uma justificativa para isso Segundo o processualista Guilherme Pupe

da Noacutebrega157

Eacute que a par de a prisatildeo civil encontrar previsatildeo constitucional no inciso LXVII do artigo 5ordm o raciociacutenio eacute o de que o direito do alimentante agrave liberdade de locomoccedilatildeo cede diante dos direitos agrave vida e agrave dignidade titularizados pelo alimentando e resguardados pelos alimentos Foi esse mesmo raciociacutenio aliaacutes que justificou no passado a ediccedilatildeo da suacutemula 309 pelo STJ agora positivada pelo artigo 528 sect 7ordm que limita a modalidade coercitiva agraves trecircs uacuteltimas prestaccedilotildees vencidas e agraves prestaccedilotildees vincendas A ideia eacute que tendo o alimentando subsistido a despeito do natildeo-pagamento de prestaccedilotildees mais antigas essas verbas teriam perdido o caraacuteter alimentar que na equaccedilatildeo antes apresentada justificaria a prisatildeo civil do alimentante Daiacute por que aqueles valores antigos remanescem exigiacuteveis mas somente pela via da expropriaccedilatildeo

Essa ressalva eacute necessaacuteria tendo em vista que a adoccedilatildeo de teacutecnica de execuccedilatildeo

indireta para incursatildeo radical na esfera de direitos do executado notadamente direitos

fundamentais quando carente de respaldo constitucional natildeo merece acolhimento sob

risco de se atentar contra o devido processo legal (artigo 5ordm LIV da Constituiccedilatildeo)

Como afirma o autor Bruno Dantas158 ldquoembora inexistam estatiacutesticas que permitam

comparaccedilotildees natildeo eacute desarrazoado intuir que os iacutendices de inadimplecircncia despeccedilam na razatildeo

inversa da incidecircncia das ordens judiciais sobre o corpo e a liberdade do devedorrdquo Entretanto

eacute natildeo possiacutevel adotar toda e qualquer medida executiva atiacutepica em nome da efetividade da

execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que se saiba os limites da sua aplicaccedilatildeo

Dessa forma instrumentos que permitam o cumprimento forccedilado de contratos e o pagamento

de diacutevidas satildeo necessaacuterios contudo eacute preciso equilibrar essa exigecircncia com a liberdade e a

dignidade humana

Como citado alhures o art 139 IV ensejou decisotildees como a que determinou a

suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o

passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito em uma accedilatildeo se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo

extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

Na supracitada decisatildeo o princiacutepio da responsabilidade patrimonial natildeo estaacute sendo

efetivado para o que o devedor responda com os seus bens Afinal qual ligaccedilatildeo entre a

157 Ibid sem paginaccedilatildeo 158 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt

httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018

59

restriccedilatildeo de circulaccedilatildeo que diz com o direito de ir e vir (liberdade) com o pagamento de

diacutevidas que diz com a responsabilidade civil159

Ademais por que quem natildeo tem dinheiro para pagar diacutevidas natildeo pode dirigir Por que

natildeo tem condiccedilotildees para pagar o deacutebito natildeo pode ter passaporte Por que quem natildeo tem como

pagar o deve natildeo pode ter cartatildeo de creacutedito

Ao utilizar meios executivos atiacutepicos como os supracitados para compelir o devedor a

satisfazer a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria quando exauridos sem ecircxito os meios tradicionais de bens

penhoraacuteveis salvo quando existe qualquer indiacutecio concreto de ocultaccedilatildeo ou dissipaccedilatildeo de

bens eacute obrigar o devedor abrir matildeo da proteccedilatildeo da lei que lhe impede que seja tomado agrave forccedila

(art 833 CPC e demais disposiccedilotildees que tratam da impenhorabilidade)

Segundo Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa160

Claramente essa pressatildeo visa dar uma aparecircncia de voluntariedade agrave indicaccedilatildeo de bens impenhoraacuteveis pelo proacuteprio executado que na verdade soacute age assim por ser a uacutenica forma de ver-se livre de um grame imposto por medida indutiva despedida de qualquer necessidade ou adequaccedilatildeo Uma intoleraacutevel perversatildeo

Os autores afirmam ainda que o ldquodireito paacutetrio natildeo admite esta contraditio in terminis

sendo inaceitaacutevel a coexistecircncia de regra protetiva do executado com outra que concede ao

juiz poderes para forccedilar (ainda que indiretamente e veladamente) o executado a abrir matildeo

daquela proteccedilatildeordquo 161

Logo eacute cristalino que a suspensatildeo da CNH eacute uma forma incorreta de aplicar a medida

executiva atiacutepica para efetivar o direito fundamental a execuccedilatildeo tendo em vista que o uacutenico

objetivo da referida eacute pressionar o executado abrir matildeo de algum bem impenhoraacutevel para

levantar o dinheiro e cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

A retenccedilatildeo do passaporte igualmente natildeo possui qualquer relaccedilatildeo com a diacutevida do

executado e eacute somente uma forma de tentar pressiona-lo a dispor de um bem que natildeo pode

ser tomado agrave forccedila e puni-lo por natildeo ter cumprido voluntariamente com a sua obrigaccedilatildeo

159 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

160 Ibid sem paginaccedilatildeo 161 Ibid sem paginaccedilatildeo

60

Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa162

acreditam que tal medida eacute equivocada e se torna excessivamente onerosa ao executado

As mais variadas circunstacircncias relevem o equiacutevoco de tal medida aplicada assim genericamente Com efeito nada justifica reter o passaporte do executado e impedi-lo de viajar para o exterior quando eacute agraciado inclusive com todas as despesas pagas com presente sorteio ou precircmio (por completar tempo de serviccedilo ou atingir metas produtividade na sociedade empresaacuteria em que trabalha) Como todo custo eacute suportado por terceiro e por isso mesmo a sua realizaccedilatildeo pelo executado natildeo traria qualquer prejuiacutezo ao exequente e a retenccedilatildeo do passaporte natildeo seria injustificaacutevel

Paulo Antonio Papini163 acredita que natildeo tem a apreensatildeo de passaporte natildeo possui um

fundamento plausiacutevel tendo em vista que se o devedor natildeo pode viajar para saldar o deacutebito

tambeacutem natildeo poderia exercer atividades cotidianas

Com todo o respeito a quem pensa dessa forma o argumento eacute muito simploacuterio e natildeo precisamos sequer do Direito para derrubaacute-lo Com efeito se considerarmos que ndash ateacute mesmo pelas dimensotildees continentais do Brasil ndash natildeo eacute incomum que uma passagem para o Nordeste custe mais caro que um voo para Miami seria razoaacutevel entatildeo seguindo a linha argumentativa do Magistrado em questatildeo que se oficiasse aos oacutergatildeos reguladores da aviaccedilatildeo civil proibindo-se aquele devedor de fazer ateacute mesmo voos domeacutesticos Poder-se-ia ir mais longe jaacute que natildeo tem dinheiro para pagar suas diacutevidas certamente aquele devedor tambeacutem natildeo teria para comer fora de sua casa porque entatildeo natildeo determinar a expediccedilatildeo de ofiacutecio aos restaurantes proacuteximos agrave sua casa e determinar tambeacutem a proibiccedilatildeo de que ele fosse servidoatendido

O autor se questiona ainda ldquoSeraacute entatildeo que o Princiacutepio da Dignidade da Pessoa

Humana estaacute de mero enfeite em nossa Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ()rdquo 164 Tendo em vista

que ldquoa decisatildeo em comento viola diretamente o art 5ordm incisos XV LIII e LXIII da

Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ndash falamos do Direito de Ir e Virrdquo 165

Ademais o cancelamento do cartatildeo de creacutedito eacute mais uma forma de constranger e

compelir o executado a cumprir com a obrigaccedilatildeo de qualquer forma natildeo importando o que

precise fazer para conseguir saldar o deacutebito tendo em vista que a referida medida apresenta

162 Ibid sem paginaccedilatildeo 163 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo

pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018

164 Ibid sem paginaccedilatildeo 165 Ibid sem paginaccedilatildeo

61

qualquer adequaccedilatildeo com o fim desejado (reverter em pagamento para o exequente) Os

autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa afirmam que166

Reconhece-se que as razotildees da afirmaccedilatildeo ora questionada satildeo ateacute intuitivas mas eacute plenamente possiacutevel problematiza-las Ora natildeo se encontra qualquer justificativa idocircnea para que o juiz possa cancelar o contrato do executado com a administradora do cartatildeo de creacutedito (ou instituiccedilatildeo financeira) que natildeo tem qualquer relaccedilatildeo com o creacutedito exequendo muito menos como isso poderia impactar positivamente na execuccedilatildeo (senatildeo para pressionar o executado a dispor de bens impenhoraacuteveis) Ademais natildeo foram indicados sequer sinais de que o executado realiza gastos supeacuterfluos com o cartatildeo de creacutedito ndash natildeo que isso justificasse a medida pois o correto seria penhorar os esses bens (se duraacuteveis naturalmente) ao inveacutes de cancelar o cartatildeo de creacutedito

Logo as referidas medidas natildeo possuem qualquer relaccedilatildeo com o atingimento do fim

almejado (o pagamento de quantia) tendo em vista que natildeo haacute uma relaccedilatildeo meiofim entre

tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a

restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia

ao exequente

Dessa forma nota-se que as medidas de suspensatildeo da CNH retenccedilatildeo de passaporte e

bloqueio do cartatildeo de credito satildeo completamente inadequadas agrave realizaccedilatildeo a que se prestam

Afinal ldquotais medidas soam como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-

lo ao cumprimento da ordem judicial ndash e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a

utilizaccedilatildeo dos meios sancionatoacuterios pelo magistrado ()rdquo167

Como exposto em linhas preteacuteritas o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades

de aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e

razoaacutevel se atendo aos criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas

executivas atiacutepicas ao caso concreto sob pena de converter a medida em de indutiva para

punitiva

A utilizaccedilatildeo de medidas atiacutepicas como a suspensatildeo da carteira de motorista e o

passaporte do devedor abandona a regra da responsabilidade patrimonial e atingem em cheio

o nuacutecleo de direitos inerentes agrave condiccedilatildeo humana

166 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

167 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 115

62

O limite para a aplicaccedilatildeo de tais medidas deve ser a Constituiccedilatildeo Federal e sobretudo

os Direitos fundamentais nela expressos ldquoCom efeito natildeo haacute saiacuteda tampouco soluccedilatildeo eficaz

de um problema sem que se respeite a Lei e o Devido Processo Legal (por mais nobres que

sejam as intenccedilotildees)rdquo 168

Dessa forma a busca desenfreada pelo cumprimento das decisotildees judiciais em

especial na fase executiva natildeo pode ser realizada em sacrifiacutecio de direitos fundamentais O

Poder Judiciaacuterio natildeo pode resolver a crise do processo executoacuterio utilizando de medidas

arbitraacuterias com o propoacutesito de satisfazer obrigaccedilotildees pecuniaacuterias

Eis o dilema que se coloca diante do poder geral de efetivaccedilatildeo ele pode servir de

potente instrumento em prol da tutela jurisdicional executiva entretanto se manejado de

modo improacuteprio serviraacute de instrumento de puniccedilatildeo e humilhaccedilatildeo do executado169

Eacute notoacuterio que se amplamente aplicado o poder geral de efetivaccedilatildeo reduziria os

iacutendices de inadimplecircncia quiccedilaacute resolveria por completo a crise da execuccedilatildeo civil Entretanto

o retrocesso civilizatoacuterio seria irreparaacutevel

168 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo

pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018

169 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

63

5 CONCLUSAtildeO

Como funccedilatildeo jurisdicional que tem como objeto a efetivaccedilatildeo de direitos a execuccedilatildeo

deve sempre buscar a maior satisfaccedilatildeo possiacutevel concretizando integralmente o creacutedito do

exequente isto eacute realizando o direito fundamental agrave tutela executiva do credor Por isso a

adoccedilatildeo de meios executivos atiacutepicos incorporados pelo Coacutedigo de Processo Civil de 2015 por

meio do art139 IV em um primeiro momento podem ser consideradas vaacutelidas visto que

servem de instrumento para a satisfaccedilatildeo e asseguraccedilatildeo de direitos do credor

Entretanto para o oacutergatildeo julgador natildeo cometa arbitrariedades em nome do direito

fundamental agrave execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que seja definido certos limites na adoccedilatildeo do poder

geral de efetivaccedilatildeo

As medidas executivas atiacutepicas natildeo podem ser aplicadas de maneira indiscriminada

logo devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o esgotamento das medidas tiacutepicas e

a possibilidade de cumprimento da obrigaccedilatildeo

Partindo dessa premissa as medidas a serem adotadas pelo juiz no caso concreto

devem ter como baliza os princiacutepios da proporcionalidade e da razoabilidade para que natildeo

ultrapassem a responsabilidade patrimonial do devedor e incidida diretamente sobre sua

pessoa

Para que natildeo seja atingida a pessoa do executado ou seja para que o devedor natildeo

tenha sua dignidade humana viola eacute necessaacuterio que a medida atiacutepica seja adequada e

necessaacuteria

Logo o juiz deveraacute sempre estabelecer uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida

executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia

a gerar o resultado sem violar a dignidade humana do executado

Dessa o juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental a execuccedilatildeo e

determinar uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute

necessaacuterio que a medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado

As medidas que ultrapassam esses limites como a decisatildeo que apreendeu o

passaporte suspensatildeo a CNH e bloqueou o cartatildeo de creacutedito do devedor satildeo meramente

punitivas posto que essas natildeo satildeo as medidas mais adequadas para se atingir o fim almejado

pois natildeo existe propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado

64

uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo

geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente

Medidas como esta servem de embasamento para decisotildees arbitraacuterias e autoritaacuterias de

violaccedilatildeo dos direitos fundamentais transformando o poder geral de efetivaccedilatildeo em

instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com autorizaccedilatildeo judicial

Em suma o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades de aplicaccedilatildeo do poder

geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e razoaacutevel se atendo aos

criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao

caso concreto sob pena de punir a pessoa do executado violando a sua dignidade humana

em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo

65

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  • 1 INTRODUCcedilAtildeO
  • 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO
    • 25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO
      • 3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
        • 31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS
          • 311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15
            • 32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
            • 33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
            • 34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
              • 4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
                • 41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
                • 42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
                  • 5 CONCLUSAtildeO
                  • REFEREcircNCIAS
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RESUMO

A prestaccedilatildeo jurisdicional natildeo se concretiza depois de encerrada a fase de conhecimento Para

que a referida prestaccedilatildeo se consume eacute necessaacuterio que ocorra a satisfaccedilatildeo do deacutebito pelo

devedor que em grande parte soacute se efetiva atraveacutes da tutela executiva Entretanto a execuccedilatildeo

civil sempre sofreu uma crise quanto a sua efetividade e o Coacutedigo de Processo Civil de 2015

com o escopo de dirimir a ineficiecircncia do instituto concebeu novas diretrizes ao processo

executoacuterio Dessa forma o art 139 IV do Coacutedigo de Processo Civil estabeleceu a

possibilidade de o juiz dispor de todas as medidas necessaacuterias para assegurar o cumprimento

de ordem judicial trazendo como grande inovaccedilatildeo a aplicaccedilatildeo dessas medidas tambeacutem nas

obrigaccedilotildees de pagar quantia Todavia eacute necessaacuterio estabelecer criteacuterios limitadores para que a

adoccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo viole a dignidade humana do executado em nome do

direito fundamental agrave execuccedilatildeo

Palavras-chaves Execuccedilatildeo Poder geral de efetivaccedilatildeo Direito fundamental agrave execuccedilatildeo

Dignidade humana do executado

SUMAacuteRIO

1 INTRODUCcedilAtildeO 5

2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL 7

21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL 7

22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL 8

23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL 11

24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO 17

25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO 20

3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 23

31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS 23

311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15 25

32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO 28

33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO 31

34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 36

4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 48

41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO 48

42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 55

5 CONCLUSAtildeO 63

REFEREcircNCIAS 65

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

Art ndash Artigo

CPC15 ndash Coacutedigo de Processo Civil de 2015

CPC73 ndash Coacutedigo de Processo Civil de 1973

ENFAM ndash Escola nacional de formaccedilatildeo e aperfeiccediloamento de magistrados

HC ndash Habeas Corpus

STJ ndash Superior Tribunal de Justiccedila

5

1 INTRODUCcedilAtildeO

A prestaccedilatildeo jurisdicional natildeo costuma se findar apoacutes o encerramento da fase cognitiva

com a prolaccedilatildeo de uma sentenccedila de meacuterito Para que a referida prestaccedilatildeo se concretize eacute

imperioso que haja a satisfaccedilatildeo do deacutebito pelo devedor

Entretanto observa-se em diversos casos o inadimplemento da parte passiva

processual sendo necessaacuterio desenvolver a atividade executiva A referida atividade possui o

escopo de satisfazer direitos

Isso porque o processo natildeo eacute um fim em si mesmo sendo apenas um exerciacutecio da

jurisdiccedilatildeo estatal Dessa forma a razatildeo de ser do processo eacute o atingimento da sua finalidade

almejada que eacute a prestaccedilatildeo da tutela jurisdicional

Todavia como a tutela jurisdicional configura-se na obrigaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio

proteger e reparar os direitos lesionados ou ameaccedilados de lesatildeo muitas vezes a dita tutela

somente consegue ser efetivada atraveacutes da atividade executiva da jurisdiccedilatildeo

Ocorre que a execuccedilatildeo civil sempre foi o ldquocalcanhar de Aquilesrdquo do sistema

processual e de modo geral vinha sofrendo uma crise quanto a sua efetividade Ou seja o

credor obtia ecircxito na fase de conhecimento entretanto natildeo conseguia alcanccedilar o seu direito a

prestaccedilatildeo reconhecida na fase de execuccedilatildeo

Com o fito de tornar a atividade satisfativa mais eficiente e mais ceacutelere o Coacutedigo de

Processo Civil de 2015 concebeu novas diretrizes ao processo no sentindo de harmonizar

suas com os ditames da Constituiccedilatildeo Federal principalmente com os direitos fundamentais

As normas fundamentais do processo civil trazidas pelo CPC15 preocupam-se

primordialmente com a efetividade da tutela jurisdicional

Em conformidade com essa nova sistemaacutetica o legislador no art 139 IV do Coacutedigo

de Processo Civil estabeleceu a possibilidade de o juiz dispor de todas as medidas indutivas

coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o cumprimento de

ordem judicial trazendo como grande novidade a aplicaccedilatildeo dessas medidas executoacuterias

atiacutepicas tambeacutem nas obrigaccedilotildees de pagar dinheiro

6 Entretanto natildeo haacute na legislaccedilatildeo criteacuterios especiacuteficos que auxiliem o oacutergatildeo julgador na

escolha das medidas executivas atiacutepicas que se adotadas sem qualquer baliza podem

acarretar consequecircncias juriacutedicas irreparaacuteveis

Como a famosa decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de

Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-1320138260011 Nessa accedilatildeo

que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo

pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a suspensatildeo da

Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o passaporte e

cancelou os cartotildees de creacutedito como forma de compeli-lo a adimplir com o deacutebito

Decisotildees como esta geram conflitos entre direitos constitucionalmente instituiacutedos De

um lado o direito fundamental agrave tutela jurisdicional e de outro os direitos e garantias

inerentes a todos os indiviacuteduos

Dessa forma a presente monografia tem como escopo de estabelecer criteacuterios

limitadores para que a adoccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo viole a dignidade humana do

executado em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo

7 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO

CIVIL

21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL

A Execuccedilatildeo Civil nasce a partir do direito a uma prestaccedilatildeo conferida a algueacutem de

exigir de outrem o cumprimento de uma conduta de fazer natildeo fazer ou de dar (dinheiro ou

coisa distinta) 1

Para que o direito a uma prestaccedilatildeo se concretize no mundo fiacutesico eacute necessaacuterio que

haja a satisfaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida pelo sujeito passivo Caso contraacuterio fala-se em

inadimplemento ou lesatildeo O titular do direito natildeo tem como agir por si para efetivar o seu

direito a prestaccedilatildeo posto que a autotutela eacute vedada no ordenamento juriacutedico Dessa forma eacute

necessaacuterio que se recorra ao Poder Judiciaacuterio para que se possa ter a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo

devida logo a tutela jurisdicional executiva2

O processualista Fredie Didier et al3 equaciona essa questatildeo da seguinte maneira

Quando se pensa em tutela executiva pensa-se na efetivaccedilatildeo de direitos a uma prestaccedilatildeo fala-se de um conjunto de meios para efetivar a prestaccedilatildeo devida fala-se em execuccedilatildeo de fazer natildeo-fazer dar exatamente os trecircs tipos de prestaccedilatildeo existentes Natildeo eacute por acaso nem por coincidecircncia que a tutela executiva pressupotildee inadimplemento (CPC art 786) - fenocircmeno exclusivo dos direitos a uma prestaccedilatildeo Eacute por isso tambeacutem que se pode falar em prescriccedilatildeo da execuccedilatildeo (CPC art 802 e suacutemula do STF n 150) - prescriccedilatildeo eacute fenocircmeno juriacutedico que se relaciona aos direitos a uma prestaccedilatildeo A execuccedilatildeo forccedilada dirige-se ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo Essa relaccedilatildeo entre direito material e processo eacute fundamental para a compreensatildeo do fenocircmeno executivo

Nesse iacutenterim para o Ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux4 ldquoexecutar eacute

satisfazerrdquo ao passo que o professor Fredie Didier et al5 formulou um conceito mais amplo

ldquoExecutar eacute satisfazer uma prestaccedilatildeo devida A execuccedilatildeo pode ser espontacircnea quando o

devedor cumpre voluntariamente a prestaccedilatildeo ou forccedilada quando o cumprimento da prestaccedilatildeo

eacute obtido por meio de atos executivos pelo Estadordquo

1 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 41 2 Ibid p 42 3 Ibid p 42 4 FUX Luiz Curso de direito processual civil Rio de Janeiro Forense 2001 p 980 5 DIDIER JR Fredie et al Op Cit p 45

8 Dessa forma a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional responsaacutevel pela

concretizaccedilatildeo de um direito subjetivo no plano material obtendo resultado idecircntico ou

equivalente ao atingiacutevel se o devedor cumprisse espontaneamente a prestaccedilatildeo

Todavia essa atividade jurisdicional soacute cabe quando o devedor se recusa a cumprir

com a obrigaccedilatildeo quebrando a expectativa do credor de receber o que lhe eacute devido Por esta

razatildeo que se diz que a execuccedilatildeo civil eacute ldquoforccediladardquo 6

Eacute o que se conclui seguindo os ensinamentos de Leonardo Greco7 para ele execuccedilatildeo eacute

uma

() modalidade de tutela jurisdicional que consiste na praacutetica pelo juiz (ou por outrem sob a sua supervisatildeo) de uma seacuterie de atos coativos concretos sobre o devedor e sobre o seu patrimocircnio a fim de agrave custa dele e independentemente do concurso da sua vontade tornar efetivo o cumprimento de prestaccedilatildeo por ele inadimplida desde que tais atos coativos estejam previamente constituiacutedos em lei

Portanto a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional que tem como escopo obter o

cumprimento de uma prestaccedilatildeo certa e inadimplida mediante atos coativos sobre o devedor e

seus bens

22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL

Vislumbrado o conceito de execuccedilatildeo civil cabe agora empreender a sua classificaccedilatildeo

tendo em vista que a execuccedilatildeo pode se manifestar de diversas formas possuindo diferentes

caracteriacutesticas em cada uma das suas modalidades

Inicialmente cabe destacar que haacute duas teacutecnicas processuais para viabilizar a execuccedilatildeo

civil lato sensu eacute a que divide em processo autocircnomo de execuccedilatildeo e em fase de execuccedilatildeo

dependendo do tiacutetulo executivo que justifica o exerciacutecio da atividade satisfativa

O Coacutedigo Processual Civil de 2015 acertadamente ratificou as reformas promovidas

no CPC73 que consagrava a opccedilatildeo legislativa de oferecimento das tutelas de certificaccedilatildeo e

efetivaccedilatildeo do direito em um mesmo processo Dessa forma as execuccedilotildees de sentenccedilas

6 BASTOS Luiz Fernando Pereira O artigo 139 IV do novo Coacutedigo de Processo Civil a atipicidade

dos meios executivos na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia certa Brasiacutelia 2017 Disponiacutevel em lt httpbdmunbbrbitstream104831866812017_LuizFernandoPereiraBastospdf gt Acesso em 06 de agosto de 2018

7 BASTOS Luiz Fernando Pereira apud GRECO Leonardo O processo de execuccedilatildeo Rio de Janeiro Renovar 1999 p 164

9

passaram a ser uma fase complementar ao de processo de conhecimento e natildeo mais ocorrer

em um processo autocircnomo

No entendimento do professor processualista Fredie Didier et al8 o processo

sincreacutetico simplificou a efetivaccedilatildeo de um direito reconhecido em sentenccedila

A dispensa do ajuizamento de um processo autocircnomo para execuccedilatildeo de sentenccedila natildeo soacute veio diminuir o tempo necessaacuterio agrave prestaccedilatildeo da tutela jurisdicional - afinal o credor natildeo mais precisaria tal como ocorria ateacute entatildeo promover nova citaccedilatildeo pessoal do reacuteudevedor- como tambeacutem veio romper de vez com um velho paradigma segundo o qual a atividade executiva estaria dissociada da precedente atividade jurisdicional cognitiva

Entretanto natildeo soacute as sentenccedilas de meacuterito ensejam uma execuccedilatildeo Por esta razatildeo foi

necessaacuterio manter o processo autocircnomo de execuccedilatildeo para os casos em que o credor tem a seu

favor um documento que natildeo tenha sido proferido por um oacutergatildeo dotado de jurisdiccedilatildeo

Consequentemente se for o titulo executivo judicial o caminho natural eacute o do

cumprimento de sentenccedila Sendo por sua vez extrajudicial o titulo executivo o caminho

correto eacute o processo de execuccedilatildeo

Cabe ainda salientar que toda execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial eacute definitiva Jaacute a

execuccedilatildeo de tiacutetulo judicial (cumprimento de sentenccedila) pode ser definitiva ou provisoacuteria

No primeiro caso isto eacute cumprimento de sentenccedila definitivo ldquoeacute a execuccedilatildeo completa

que vai ateacute a fase final (com a entrega do bem da vida) sem exigecircncias adicionais para o

exequenterdquo 9

Quanto ao segundo caso ldquoo cumprimento provisoacuterio de sentenccedila (fundada em tiacutetulo

provisoacuterio) eacute aquele que exige alguns requisitos extras para que se chegue agrave fase final da

execuccedilatildeordquo 10

Para Fredie Didier11 o criteacuterio para definir se o cumprimento de sentenccedila seraacute

definitivo ou provisoacuterio

() eacute a estabilidade do tiacutetulo executivo em que se funda a execuccedilatildeo se se tratar de decisatildeo acobertada pela coisa julgada material o cumprimento de sentenccedila eacute

8 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 46 9 Ibid p 57 10 Ibid p 57 11 Ibid p 57

10

definitivo se se tratar de decisatildeo judicial ainda passiacutevel de alteraccedilatildeo (reforma ou invalidaccedilatildeo) em razatildeo da pendecircncia de recurso contra ela interposto a que natildeo tenha sido atribuiacutedo efeito suspensivo o cumprimento de sentenccedila eacute provisoacuterio

Ademais a execuccedilatildeo se distingue em procedimentos executivos comuns que satildeo da

execuccedilatildeo civil e que servem a uma generalidade de creacuteditos como eacute o caso do cumprimento

de sentenccedila e o processo de execuccedilatildeo E em procedimentos executivos especiais que servem

agrave satisfaccedilatildeo de creacuteditos peculiares como a execuccedilatildeo de alimentos e a execuccedilatildeo fiscal 12

Por fim cabe mencionar a classificaccedilatildeo que distingue a execuccedilatildeo em direta e indireta

A primeira execuccedilatildeo direita (ou execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo) eacute ldquo() aquela em que o

Poder Judiciaacuterio prescinde da colaboraccedilatildeo do executado para a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida

e pois promove uma substituiccedilatildeo da sua conduta pela conduta do proacuteprio Estado-juiz ou de

terceirordquo 13 Ou seja as medidas executivas satildeo levadas a efeito mesmo contra a vontade do

devedor na execuccedilatildeo direta

Segundo a doutrina a execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo se subdivide da seguinte forma

meios de desapossamento meios de transformaccedilatildeo e meios de expropriaccedilatildeo

Os meios de desapossamento muito comuns nas execuccedilotildees para entrega de coisa eacute a

forma ldquopor meio da qual se retira da posse do executado o bem a ser entregue ao exequente

(p ex despejo busca e apreensatildeo reintegraccedilatildeo de posse)rdquo 14 Ao passo que por meio dos de

transformaccedilatildeo ldquo() o juiz determina que um terceiro pratique a conduta que deveria ser

praticada pelo executado cabendo a este arcar com o pagamento do custo respectivordquo 15 Jaacute

os meios executivos de expropriaccedilatildeo eacute a forma ldquopor meio do qual algum bem do patrimocircnio

do devedor eacute expropriado para pagamento do creacutedito (adjudicaccedilatildeo alienaccedilatildeo judicial ou

apropriaccedilatildeo de frutos e rendimentos de empresa ou de estabelecimentos e de outros bens art

825 CPC)rdquo 16

12 Ibid p 48 13 Ibid p 50 14 Ibid p 51 15 Ibid p 51 16 Ibid p 51

11 Jaacute a execuccedilatildeo indireta (ou mandamental) atua ldquo() na vontade do devedor como forma

de compeli-lo ou incentivaacute-lo a cumprir a ordem judicialrdquo 17 Nesse entendimento ainda

leciona Fredie Didier et al 18

Nesses casos o Estado-juiz busca promover a execuccedilatildeo com a colaboraccedilatildeo do executado forccedilando ou incentivando a que ele proacuteprio cumpra a prestaccedilatildeo devida Em vez de o Estado-juiz tomar as providecircncias que deveriam ser tomadas pelo executado o Estado forccedila por meio de coerccedilatildeo psicoloacutegica ou de promessa de recompensa judicial a que o proacuteprio executado cumpra a prestaccedilatildeo

A execuccedilatildeo indireta pode ser patrimonial como por exemplo a imposiccedilatildeo de multa

coercitiva ou pessoal com a prisatildeo civil do devedor de alimentos Ademais adiciona Didier

et al19que

O estiacutemulo ao cumprimento da prestaccedilatildeo pode dar-se pelo temor (p ex multa coercitiva prisatildeo civil do devedor de alimentos divulgaccedilatildeo de notiacutecia em jornal revelando o descumprimento) ou pelo incentivo (p ex a chamada sanccedilatildeo premial ou sanccedilatildeo positiva de que eacute exemplo a isenccedilatildeo do pagamento de custas em caso de cumprimento do mandado monitoacuterio - art 701 sect 1ordm CPC a reduccedilatildeo pela metade dos honoraacuterios advocatiacutecios fixados inicialmente pelo juiacutezo em caso de pagamento integral do deacutebito pecuniaacuterio na execuccedilatildeo por quantia certa fundada em tiacutetulo extrajudicial - art 827 sect 1ordm CPC)

Por tais razotildees haacute uma tendecircncia em cada vez mais prestigiar os meios executivos

indiretos (coercitivos) posto que satildeo tatildeo eficazes quanto os meios executivos diretos

entretanto menos onerosos Contudo sua aplicaccedilatildeo deve ser fiscalizada a fim de natildeo permitir

que a execuccedilatildeo civil perca sua finalidade visto que eacute uma funccedilatildeo jurisdicional que tem como

escopo efetivar o direito do credor e natildeo de atender os interesses do devedor

23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL

Os princiacutepios juriacutedicos nos uacuteltimos anos passaram a ser munidos de forccedila cogente

normatizando as condutas humanas tanto quanto as regras juriacutedicas Os ditos princiacutepios

ampliaram as margens de atuaccedilatildeo dos aplicadores do direito possibilitando a construccedilatildeo de

soluccedilotildees mais adequadas agraves especificidades das demandas que chegam ao judiciaacuterio

17 Ibid p 51 18 Ibid p 51 19 Ibid p 51-52

12 Dessa forma eacute necessaacuterio aprofundar-se nos princiacutepios norteadores da execuccedilatildeo civil

para que se obtenha uma anaacutelise completa da teoria geral da execuccedilatildeo

A execuccedilatildeo civil tem como um dos seus corolaacuterios o princiacutepio da efetividade este

consiste na exigecircncia de um sistema completo de tutela executiva no qual existam meios

executivos capazes de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor

de tutela executivardquo 20

O referido princiacutepio da efetividade eacute reforccedilado como normal fundamental do processo

civil brasileiro pelo art 4ordm do CPC ldquoArt 4ordm As partes tecircm o direito de obter em prazo razoaacutevel

a soluccedilatildeo integral do meacuterito incluiacuteda a atividade satisfativa

Jaacute o princiacutepio da boa feacute processual corolaacuterio do devido processo legal estaacute previsto

no art 5ordm do CPC ldquoAquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de

acordo com a boa-feacuterdquo Segundo o processualista baiano Fredie Didier21

O princiacutepio da boa-feacute extrai-se de uma claacuteusula geral processual A opccedilatildeo por uma claacuteusula geral de boa-feacute eacute a mais correta Eacute que a infinidade de situaccedilotildees que podem surgir ao longo do processo torna pouco eficaz qualquer enumeraccedilatildeo legal exaustiva das hipoacuteteses de comportamento desleal Daiacute ser correta a opccedilatildeo da legislaccedilatildeo brasileira por uma norma geral que impotildee o comportamento de acordo com a boa-feacute Em verdade natildeo seria necessaacuteria qualquer enumeraccedilatildeo das condutas desleais o art 5deg do CPC eacute bastante exatamente por tratar-se de uma claacuteusula geral

Dessa forma o dito princiacutepio preconiza que diante de um vinculo juriacutedico as pessoas

envolvidas natildeo poderatildeo frustrar a confianccedila do outro devendo comportar-se como se pode

esperar de uma pessoa de boa-feacute

Ademais disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial que ldquosomente o

patrimocircnio do devedor (art 789 CPC) ou de terceiro responsaacutevel pode ser objeto da

atividade executiva do Estadordquo 22

O referido princiacutepio que determina que somente o patrimocircnio submete-se agrave execuccedilatildeo

e natildeo a pessoa foi trazido pela humanizaccedilatildeo do direito Para o professor Didier et al23 o

20 DIDIER JR Freddie et al apud GUERRA Marcelo Lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do

credor na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 21 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte

geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 105 22 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 68

13

desenvolvimento dos meios de execuccedilatildeo indireta ldquoparece relativizar um pouco esse princiacutepio

na medida em que pressionam psicologicamente a pessoa do devedor para que cumpra a

obrigaccedilatildeo com seu comportamentordquo

Complementa ainda que

A responsabilidade executiva parece assumir atualmente caraacuteter hiacutebrido comportando coerccedilatildeo pessoal e sujeiccedilatildeo patrimonial

i) a coerccedilatildeo pessoal incide sobre a vontade do devedor admitindo o uso de medidas coercitivas de execuccedilatildeo indireta para forccedilaacute-lo a cumprir a obrigaccedilatildeo com seu proacuteprio comportamento (ex arts 139 rv 523 sect 1ordm 536 sect 1ordm e 538 sect 3ordm todos do CPC)

ii) descumprida a obrigaccedilatildeo e natildeo sendo possiacuteveladequado o uso de teacutecnica de coerccedilatildeo pessoal tem-se a sujeiccedilatildeo patrimonial que recairaacute sobre os bens do devedor ou de terceiro responsaacutevel - que responderatildeo pela proacutepria prestaccedilatildeo in natura (ex dar coisa ou entregar quantia) ou por perdas e danos24

Dessa forma o referido princiacutepio natildeo tem aplicaccedilatildeo absoluta em razatildeo do principio da

efetividade a qual estimula o uso dos meios de coerccedilatildeo indireta para garantir o cumprimento

da obrigaccedilatildeo pelo devedor

O princiacutepio da primazia da tutela especifica (ou princiacutepio do resultado) assevera que

ldquoA execuccedilatildeo deve ser especiacutefica propiciar ao credor a satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo tal qual

houvesse o cumprimento espontacircneo da prestaccedilatildeo pelo devedorrdquo 25

O CPC de 2015 absorveu todos os avanccedilos legislativos a cerca do mote O caput do

art 497 assegura que na accedilatildeo que tenha por objeto a prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer o

juiz se procedente o pedido concederaacute a tutela especiacutefica ou determinaraacute providecircncias que

assegurem a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico equivalente O art 499 o

complementa a obrigaccedilatildeo somente seraacute convertida em perdas e danos se o autor o requerer

ou se impossiacutevel agrave tutela especiacutefica ou a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico

equivalente

O princiacutepio do contraditoacuterio eacute garantido pela constituiccedilatildeo federal e compreende o

direito de ser ouvido o direito de acompanhar os atos processuais o direito de produzir

provas participar da sua produccedilatildeo manifestar-se sobre a prova produzida e obter do juiz a

23 Ibid p 69-70 24 Ibid p 70 25 Ibid p 71

14

respectiva valoraccedilatildeo o direito de ser informado regularmente dos atos praticados no processo

o direito agrave motivaccedilatildeo das decisotildees o direito de impugnar as decisotildees 26

O contraditoacuterio tem aplicaccedilatildeo em todo processo judicial sendo aplicaacutevel tambeacutem na

execuccedilatildeo No entanto o contraditoacuterio na execuccedilatildeo natildeo ocorre com a mesma intensidade que

no processo ou na fase de conhecimento eacute o que assevera Didier et al 27

O contraditoacuterio no procedimento executivo no aspecto do direito de defesa assegurado agrave parte demandada eacute eventual porquanto depende da provocaccedilatildeo do executado que natildeo eacute chamado ajuiacutezo para defender-se mas sim para cumprir a obrigaccedilatildeo O procedimento executivo adota a teacutecnica monitoacuteria que consiste basicamente na inversatildeo do ocircnus de provocar o contraditoacuterio o reacuteu em vez de citado para manifestar-se sobre a pretensatildeo do autor eacute convocado para cumprir uma determinada obrigaccedilatildeo

Logo haacute o contraditoacuterio no procedimento executivo porem eacute eventual quanto agrave defesa

do executado

Ademais o princiacutepio da menor onerosidade eacute consagrado pelo art 805 do CPC e

dispotildee que ldquoQuando por vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz

mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o executadordquo O referido princiacutepio tem o

escopo de impedir o abuso do direito pelo exequente

O principio da menor onerosidade auxilia o juiz na escolha de um meio executivo

adequado e necessaacuterio que satisfaccedila a prestaccedilatildeo exigida pelo credor Nesse sentido eacute o

entendimento do professor Fredie Didier et al 28

O resultado a ser alcanccedilado eacute aquele estabelecido pelo direito material A maneira de se chegar ateacute esse resultado eacute que deve ser a menos onerosa possiacutevel para o executado Isso significa que a opccedilatildeo pelo meio menos gravoso pressupotildee que os diversos meios considerados sejam igualmente eficazes Assim havendo vaacuterios meios executivos aptos agrave tutela adequada e efetiva do direito de creacutedito escolhe-se a via menos onerosa ao executado

O princiacutepio visa impedir a execuccedilatildeo desnecessariamente onerosa ao executado ou seja a execuccedilatildeo abusiva Em vez de enumerar situaccedilotildees em que a opccedilatildeo mais gravosa revelar-se-ia injusta o legislador valeu-se corretamente de uma claacuteusula geral para reputar abusivo qualquer comportamento do credor que pretender valer-se de meio executivo mais oneroso do que outro igualmente idocircneo agrave satisfaccedilatildeo do seu creacutedito

26 Ibid p 76 27 Ibid p 78 28 Ibid p 79-80

15 O princiacutepio da cooperaccedilatildeo tem como base os princiacutepios do devido processo legal da

boa-feacute processual e do contraditoacuterio O dito princiacutepio avigora a eacutetica processual com o

aprimoramento do diaacutelogo entre as partes reciprocamente e com o oacutergatildeo jurisdicional Eacute o

que preconiza o art 6ordm do CPC Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para

que se obtenha em tempo razoaacutevel decisatildeo de meacuterito justa e efetiva

No procedimento executivo o princiacutepio da cooperaccedilatildeo incide de diversas formas

disciplina Didier et al29 que na execuccedilatildeo

O executado tem o dever de indicar bens agrave penhora (art 774 V CPC) Natildeo encontrados bens penhoraacuteveis e natildeo havendo indicaccedilatildeo de qualquer um deles pelo exequente cabe ao executado declarar quais satildeo seus bens penhoraacuteveis sob pena de se sujeitar a uma sanccedilatildeo pecuniaacuteria compulsoacuteria

Tambeacutem eacute manifestaccedilatildeo do princiacutepio da cooperaccedilatildeo a exigecircncia de que o executado que pretende impugnar o valor da execuccedilatildeo apresente de logo o valor que reputa devido (art 525 sect 4ordm CPC) Seria comportamento natildeo-cooperativo afirmar que a cobranccedila eacute excessiva sem simultaneamente dizer qual eacute o valor correto

Demais disso aplicam-se agrave execuccedilatildeo os deveres que decorrem do princiacutepio da cooperaccedilatildeo e que satildeo imputados ao oacutergatildeo jurisdicional () Assim por exemplo deve o juiz advertir ao executado antes de puni-lo de que seu ato pode vir a caracterizar-se como atentatoacuterio agrave dignidade da jurisdiccedilatildeo ( art 772 II CPC) perceba que se trata de uma conduta compatiacutevel com o dever de prevenccedilatildeo O oacutergatildeo jurisdicional somente pode conhecer da prescriccedilatildeo ex officio dando a oportunidade de o exequente manifestar-se conforme impotildee o dever de consulta ( cf arts 10 487 paraacutegrafo uacutenico e 921 sect 5ordm CPC)

O princiacutepio ou postulado30 da proporcionalidade tem aplicaccedilatildeo muito relevante na

execuccedilatildeo O art 8 do CPC assegura que o oacutergatildeo jurisdicional tem o dever de observar a

proporcionalidade e a razoabilidade ao aplicar o ordenamento juriacutedico inclusive no

procedimento executivo

Ademais o art 805 do CPC eacute categoacuterico ao disciplinar que ldquoArt 805 Quando por

vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo

menos gravoso para o executadordquo O referido artigo jaacute se trata de uma concretizaccedilatildeo da

proporcionalidade

29 Ibid p 82 30 Segundo Fredie Didier et al haacute uma discussatildeo doutrinaacuteria sobre a proporcionalidade Parte da

doutrina acredita que a proporcionalidade eacute um princiacutepio e outra parte acredita que eacute um postulado normativo

16 O principio da adequaccedilatildeo pode ser vislumbrado em dois momentos do Direito

Processual ldquoa) no legislativo como orientador da confecccedilatildeo das leis b) no jurisdicional

autorizando ao juiz diante do caso concreto adaptar procedimento agraves suas peculiaridadesrdquo 31

Para Luceacutelia de Sena Alves e Tiago Retes32

Isso quer dizer que no momento legislativo o devido processo deve ser observado pelo legislador para a confecccedilatildeo das normas de direito processual que iratildeo servir de instrumento efetivo de concretizaccedilatildeo do direito substancial a ser tutelado atendendo a todas as suas finalidades sob pena de falecircncia do proacuteprio direito No momento jurisdicional da mesma forma a via processual escolhida pelo autor tambeacutem deve estar sujeita a este princiacutepio para que natildeo sofra as mesmas consequecircncias da sua inobservacircncia

O ordenamento juriacutedico deve ser aplicado por meio da teacutecnica processual adequada

evitando dessa forma uma tutela ineficaz

Por fim o princiacutepio do autorregramento da vontade na execuccedilatildeo tem o objetivo de

ldquo() preservar um espaccedilo processual para o exerciacutecio da liberdade e da vontade em que

sejam permitidas negociaccedilotildees que envolvam as partes ndash e tambeacutem o juizrdquo33 Didier et al34

assevera que

A rigor o legislador estabelece um regime juriacutedico de autorregramento da vontade processual identificando-se algumas manifestaccedilotildees relevantes para a execuccedilatildeo Na verdade pode-se dizer que poucos satildeo os ambientes mais propiacutecios do que a execuccedilatildeo para a negociaccedilatildeo sobre o processo Todos os institutos e normas processuais relativos agrave execuccedilatildeo devem ser repensados a partir da premissa de que o CPC permite uma ampla margem de liberdade de negociaccedilatildeo sobre o processo (art 190 CPC)

O autorregramento da vontade pode ser vislumbrando na previsatildeo de negoacutecios tiacutepicos

em sede de execuccedilatildeo como por exemplo no acordo das partes sobre o valor do bem que

dispensa a avaliaccedilatildeo disposto no inciso I do art 871 CPC Ademais dentro dos limites do art

190 do CPC eacute possiacutevel na execuccedilatildeo a atribuiccedilatildeo da negociaccedilatildeo atiacutepica aos sujeitos 31 ALVES Luceacutelia de Sena Alves RETES Tiago O poder geral de efetivaccedilatildeo das decisotildees judiciais e

proporcionalidade uma anaacutelise criacutetica acerca do art 139 IV do Novo Coacutedigo de Processo Civil Disponiacutevel em lthttpswwwacademiaedu31752652O_poder_geral_de_efetivaC3A7C3A3o_das_decisC3B5es_judiciais_e_a_proporcionalidade_uma_anC3A1lise_crC3ADtica_acerca_do_art_139_IV_do_Novo_CC3B3digo_de_Processo_Civil gt Acesso em 25 de julho de 2018

32 Ibid natildeo paginado 33 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 85 34 Ibid p 85

17

processuais permitindo que sejam feitas mudanccedilas nos procedimentos e nas situaccedilotildees

juriacutedicas processuais ldquoSatildeo exemplos de negoacutecios processuais atiacutepicos na execuccedilatildeo pacto de

penhorabilidade acordo de ampliaccedilatildeo de prazos das partes de qualquer natureza acordo de

rateio de despesas processuais ()rdquo35

24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO

Sempre houve diversos questionamentos quanto agrave eficaacutecia do Direito processual Civil

e se o mesmo era meio apto a assegurar a tutela jurisdicional dos direitos dos cidadatildeos O

processo de execuccedilatildeo eacute o setor que sofre mais criacuteticas quanto a sua ineficiecircncia afinal a

execuccedilatildeo civil sempre foi o ldquocalcanhar de Aquilesrdquo do sistema processual pela praxe do

ldquoganhou (no processo de conhecimento) mas natildeo levou (na fase de cumprimento ou

execuccedilatildeo)rdquo 36

Essa dificuldade de se efetivar a tutela satisfastiva natildeo se resume a um problema de

mera teacutecnica processual tiacutepico de determinado ordenamento mas representa uma prova de

fogo da capacidade dos instrumentos jurisdicionais O autor Leonardo Greco37 no ano de

2005 atribuiu esse fato as seguintes causas o excesso de processos o custo e a morosidade da

justiccedila a inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios a ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais

um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico e a progressiva volatizaccedilatildeo dos bens

Quanto ao excesso de processos o referido autor aduz que ldquonos grandes centros o

crescimento da maacutequina judiciaacuteria natildeo acompanhou a expansatildeo do nuacutemero de litiacutegiosrdquo 38

O custo e morosidade da justiccedila prejudicam a tutela satisfativa posto que

ldquojaacute desfalcado pelo inadimplemento do devedor o credor ainda tem de arcar com o adiantamento das despesas do processo de execuccedilatildeo e de eventual liquidaccedilatildeo vendo arrastar-se a marcha dos atos executoacuterios facilmente retardada por atos procrastinatoacuterios do devedorrdquo 39

35 Ibid p 86 36 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca

para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018

37 GRECCO Leonardo A Crise do Processo de Execuccedilatildeo in Estudos de direito processual Leonardo Greco ndash Campos dos Goytacazes Ed Faculdade de Direito de Campos 2005 p 7

38 Ibid p 7 39 Ibid p 7-8

18 A inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios contribui para a crise do processo de

execuccedilatildeo tendo em vista que

ldquoo juiz da execuccedilatildeo prisioneiro de ritos que o distanciam das partes e da realidade da vida impulsiona sem qualquer apetite a execuccedilatildeo conduzindo-a ao sabor dos ventos das provocaccedilotildees impacientes do credor e das costumeiras procrastinaccedilotildees do devedorrdquo 40

Jaacute ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais atrapalha a efetivaccedilatildeo da tutela satisfativa ldquoo

devedor natildeo colabora com a execuccedilatildeo e os meios de pressatildeo que a lei estabelece natildeo satildeo

suficientes para intimidaacute-lordquo 41

Com um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico

O espiacuterito empresarial e a sociedade de consumo estimulam o endividamento das pessoas e o inadimplemento das obrigaccedilotildees pelo devedor deixou de ser vexatoacuterio e reprovaacutevel o que multiplica as accedilotildees de cobranccedila e execuccedilotildees atraveacutes das quais o sujeito passivo ainda usufrui vantagens agraves custas do credor 42

Por fim Leonardo Greco elenca a volatizaccedilatildeo dos bens como o uacuteltimo fator que

macula o processo executo tendo em vista que

ldquomudou inteiramente o perfil patrimonial das pessoas antes concentrado em bens de raiz e agora tendencialmente dirigido a investimentos em tiacutetulos e valores facilmente negociaacuteveis o que dificulta a sua localizaccedilatildeo pelo credorrdquo 43

O Coacutedigo de Processo Civil de 1973 introduziu o sistema executivo ao ordenamento

juriacutedico paacutetrio e seguindo os valores liberais da eacutepoca com a proteccedilatildeo de esfera juriacutedica de

liberdade do cidadatildeo contra a possibilidade de arbiacutetrio do Estado e uso indevido do Poder

jurisdicional outorgou o miacutenimo de poder ao juiz Seguindo as regras do CPC de 73 o

devedor soacute poderia ter sua esfera juriacutedica invadida atraveacutes de meios de execuccedilatildeo instituiacutedos

previamente em lei

Diante de tantos obstaacuteculos para se efetivar a tutela satisfativa a execuccedilatildeo estava

fadada ao fracasso o que frustrava a expectativa do jurisdicionado a uma prestaccedilatildeo da tutela

jurisdicional ceacutelere e efetiva Insatisfeitos com o cenaacuterio que se encontrava a atividade

40 Ibid p 8 41 Ibid p8 42 Ibid p 8 43 Ibid p8

19

executiva legisladores e operadores do direito natildeo mediram esforccedilos para promover uma

evoluccedilatildeo significativa buscando mais eficiecircncia e celeridade ao procedimento executoacuterio

Dessa forma no final de 1994 foi introduzido no coacutedigo de processo agrave flexibilizaccedilatildeo

dos poderes executoacuterios do juiz ldquopara que ele pudesse prestar uma tutela efetiva aos direitos

ficando autorizado a determinar a modalidade de execuccedilatildeo adequada a cada hipoacutetese nas

obrigaccedilotildees de fazer e natildeo fazer (art 461 sect5ordm do CPC de 1973)rdquo No ano de 2002 a referida

medida foi estendida para as obrigaccedilotildees de entregar coisa (art 461-A caput e sect3ordm do CPC de

1973)

Com fundamento nos artigos 461 e 461-A em 2005 a Lei nordm 11 23205 unificou o

processo de conhecimento e o processo de execuccedilatildeo de sentenccedila Nesse sentido Maacuterio

Henrique Cavalcanti Gil Rodrigues44 aduz que

A Lei 112322005 reuniu de forma definitiva os processos de conhecimento e de execuccedilatildeo em um uacutenico processo composto por um sistema bifaacutesico Assim passa a existir uma fase inicial (de reconhecimento) e uma fase posterior (de cumprimento de sentenccedila de efetivaccedilatildeo da decisatildeo definitiva) sem contar com a eventual fase intermediaacuteria de liquidaccedilatildeo (RODRIGUES 2010 p 38)

Ademais as alteraccedilotildees realizadas no CPC de 73 inseriu a atipicidade dos meios

executivos nas obrigaccedilotildees de fazer natildeo fazer e dar coisa certa entretanto exercendo papel

subsidiaacuterio aos meios tiacutepicos

Quanto agraves obrigaccedilotildees de pagar quantia havia apenas a possibilidade de se valer da

incidecircncia de multa do art 475-J do CPC de 73 ndash implementada mediante reforma perpetrada

pela Lei nordm 11232 de 2005 em atendimento a doutrina processualista preocupada com a

efetividade das decisotildees ndash e de atos executivos como a penhora de bens e dinheiro

Ainda que a execuccedilatildeo tenha avanccedilado com a inserccedilatildeo das leis posteriores a 1994 no

CPC de 1973 a mesma continuava insuficiente tendo em vista que a burocracia e lentidatildeo

dos atos executivos davam brechas para que o devedor escondesse seu patrimocircnio penhoraacutevel

tornando carente de efetividade e celeridade agrave execuccedilatildeo

44 RODRIGUES Maacuterio Henrique Cavalcanti Gil A evoluccedilatildeo da execuccedilatildeo de sentenccedila no direito

processual civil e o novo regime juriacutedico das sentenccedilas apoacutes a reforma implementada pela Lei 112322005 Revista do Tribunal Regional Federal da 1ordf Regiatildeo v 22 n 2 fev 2010 p 38

20

25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO

A tutela juridiscional eacute um direito fundamental previsto no art 5ordm inciso XXXV da

Carta Magna ldquo() a lei natildeo excluiraacute da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio lesatildeo ou ameaccedila a

direitordquo

Na visatildeo claacutessica o direito de accedilatildeo era efetivado com a prolaccedilatildeo de uma sentenccedila de

meacuterito posiccedilatildeo adotada por grande parte dos processualistas seguidores da doutrina de

Liebman Todavia esse conceito se mostra defasado tendo em vista que o direito de acesso agrave

justiccedila natildeo eacute apenas uma garantia formal de bater as portas do judiciaacuterio mas a garantia de

acesso agrave ordem juriacutedica justa adequada e eficaz45

Acreditar que uma sentenccedila de meacuterito favoraacutevel eacute tutela jurisdicional suficiente para

satisfazer o que se busca com o ajuizamento da accedilatildeo eacute uma visatildeo distorcida da atividade

satisfativa ldquoSob o ponto de vista do direito material a condenaccedilatildeo por si soacute eacute incapaz de

prestar a tutela do direitordquo46

Nessa oacutetica o direito fundamental agrave tutela executiva exige um sistema de tutela

jurisdicional ldquocapaz de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor

de tutela executivardquo47 Dessa forma entende-se que

ldquo() a) a interpretaccedilatildeo das normas que regulamentam a tutela executiva tem de ser feita no sentido de extrair a maior efetividade possiacutevel b) o juiz tem o poder-dever de deixar de aplicar uma norma que imponha uma restriccedilatildeo a um meio executivo sempre que essa restriccedilatildeo natildeo se justificar como forma de proteccedilatildeo a outro direito fundamental c) o juiz tem o poder-dever de adotar os meios executivos que se revelem necessaacuterios agrave prestaccedilatildeo integral de tutela executivardquo48

Egrave imperioso compreender que o direito fundamental agrave tutela executiva ratificado

pelo CPC eacute essencial para dirimir diversos litiacutegios oriundos do procedimento executivo

45 FERREIRA Gabriela Macedo Poder geral de efetivaccedilatildeo em defesa da constitucionalidade da

teacutecnica de execuccedilatildeo dos direitos do art 139 IV do Coacutedigo de Processo Civil Revista Jus Navigandi ISSN 1518-4862 Teresina ano 22 n 5178 4 set 2017 Disponiacutevel em lthttpsjuscombrartigos60190gt Acesso em 11 set 2018

46 Ibid natildeo paginado 47 DIDIER JR Fredie et al apud GUERRA Marcelo lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do credor

na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 48 Ibid p 102-104

21

ldquoprincipalmente aqueles relacionados agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo49

Fredie Didier et al50 cita como exemplo as hipoacuteteses de impenhorabilidade

A impenhorabilidade de certos bens eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa

Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais

Por esta razatildeo o legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do

CPC fazendo um preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses das partes envolvidas

optando pela mitigaccedilatildeo do direito do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado

Quando o oacutergatildeo jurisdicional verificar que a aplicaccedilatildeo das regras de

impenhorabilidade eacute desproporcional para o caso concreto deve afastaacute-la e construir a

soluccedilatildeo adequada para o referido caso Didier et al51 traz um exemplo esclarecedor em sua

obra

O bem imoacutevel que serve de moradia da famiacutelia eacute relativamente impenhoraacutevel Objetiva-se com essa restriccedilatildeo proteger o direito fundamental agrave moradia conteuacutedo do direito agrave proteccedilatildeo da dignidade Imagine-se um imoacutevel de altiacutessimo valor Imagine-se agora um creacutedito que corresponda a 40 do valor do imoacutevel A venda judicial do imoacutevel no caso permitiria natildeo soacute satisfazer o direito do credor como ainda garantir ao executado com a sobra a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel que lhe preserve a dignidade A opccedilatildeo pela interpretaccedilatildeo literal da regra que veda a penhora protegeria exclusivamente o direito do executado de maneira desnecessaacuteria porque a relaccedilatildeo valor executadovalor do bem permitiria a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel apoacutes a entrega do dinheiro ao credor Seria pois interpretaccedilatildeo em desconformidade com os preceitos da contemporacircnea hermenecircutica constitucional que preconiza a necessidade de nos casos de choque entre direitos fundamentais dar a interpretaccedilatildeo que mais adequadamente proteja a ambos

A execuccedilatildeo civil integra o direito fundamental agrave tutela jurisdicional disciplinando

que ldquoos dispositivos devem ser interpretados de modo que se garanta a maior efetividade

49 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66 50 Ibid p 66 51 Ibid p 67

22

possiacutevel agrave execuccedilatildeo desde que respeitados outros direitos fundamentaisrdquo52 Podendo ser

afastada desde que proporcional qualquer obstaacuteculo irrazoaacutevel agrave efetivaccedilatildeo desse direito

52 FERREIRA Gabriela Macedo apud MACEDO Lucas Buril de As eficaacutecias das decisotildees judiciais e

o cumprimento de sentenccedila no CPC15 Novo CPC Doutrina selecionada v 5 Execuccedilatildeo Coordenador geral Fredie Didier Jr organizadores Lucas Buril de Macedo Ravi Peixoto Alexandre Freire ndash Salvador Jus Podivm 2015 p 360361

23

3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO

EXECUTADO

31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS

Como forma de controlar a atividade jurisdicional por muito tempo vigorou o

entendimento de que a execuccedilatildeo somente poderia ser realizada atraveacutes dos meios executivos

tipicamente previstos na legislaccedilatildeo Segundo Luiz Guilherme Marinoni53

O princiacutepio da tipicidade deseja significar que os meios de execuccedilatildeo devem estar previstos na lei e assim que a execuccedilatildeo natildeo pode ocorrer atraveacutes de formas executivas natildeo tipificadas O seu objetivo eacute de um lado impedir que meio executivo natildeo previsto em lei possa ser utilizado e de outro garantir o jurisdicionado contra a possibilidade de arbiacutetrio judicial na fixaccedilatildeo da modalidade executiva Se o jurisdicionado sabe em razatildeo de previsatildeo legal que a sua esfera juriacutedica somente poderaacute ser invadida atraveacutes de determinadas modalidades executivas confere-se a ele a possibilidade de antever a reaccedilatildeo ao seu inadimplemento bem como a garantia de que a jurisdiccedilatildeo natildeo determinaraacute ou permitiraacute a utilizaccedilatildeo de meio executivo diverso daqueles previstos

Dessa forma o princiacutepio da tipicidade disciplina que o oacutergatildeo julgador ao proceder agrave

execuccedilatildeo estaacute limitado aos meios executivos previamente definidos em lei natildeo podendo se

valer de qualquer teacutecnica de efetivaccedilatildeo que natildeo se encaixasse nas hipoacuteteses taxativas da

legislaccedilatildeo

Entretanto o legislador natildeo tem como prever todas as peculiaridades dos direitos

dignos de tutela executiva e preordenar teacutecnicas executivas diversas para cada peculiaridade

Sob esse cenaacuterio o principio da tipicidade foi cedendo lugar ao principio da atipicidade dos

meios executivos

A ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do oacutergatildeo julgador estaacute cada vez mais presente

no ordenamento juriacutedico paacutetrio motivando um poder geral de efetivaccedilatildeo ldquoque permite ao

julgador valer-se dos meios executivos que considerar mais adequado ao caso concreto sejam

eles de coerccedilatildeo direta sejam de coerccedilatildeo indiretardquo 54

53 MARINONI Luiz Guilherme Teacutecnica processual e tutela dos direitos Satildeo Paulo Editora Revista

dos Tribunais 2004 p 212 nota 79 54 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 100

24

Essa tendecircncia de ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do juiz natildeo eacute exclusividade do

ordenamento juriacutedico brasileiro segundo Fredie Didier et al55

Michelle Taruffo jaacute apontava que o direito americano diante da inefetividade dos meios executivos at law comeccedilou a autorizar o magistrado a tomar medidas executivas adequadas ao caso concreto Trata-se afirma o jurista italiano de aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo segundo o qual as regras processuais devem ser adaptadas agraves necessidades do direito material

Os meios executivos atiacutepicos derivam de trecircs enunciados normativos do Coacutedigo de

Processo Civil o art 139 IV o art 297 e o sect1ordm do art 536

O art 139 IV do CPC dispotildee que pertence ao juiz o poder-dever de ldquodeterminar

todas as medidas indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para

assegurar o cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto

prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo

Jaacute o art 297 do CPC cuida da tutela provisoacuteria e garante que ldquoo juiz poderaacute

determinar as medidas que considerar adequadas para a efetivaccedilatildeo da tutela provisoacuteriardquo

Podendo dessa forma a dita tutela ser efetivada atipicamente

Por fim o art 536 sect1ordm do CPC dispotildee que

Para atender ao disposto no caput o juiz poderaacute determinar entre outras medidas a imposiccedilatildeo de multa a busca e apreensatildeo a remoccedilatildeo de pessoas e coisas o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva podendo caso necessaacuterio requisitar o auxilio de forccedila policial

As supracitadas medidas executivas atiacutepicas satildeo entendidas pela doutrina como

claacuteusulas gerais processuais executivas56 Essas claacuteusulas gerais natildeo restringem a sua

aplicaccedilatildeo agraves teacutecnicas de coerccedilatildeo indireta satildeo autorizados tambeacutem o uso de meios de execuccedilatildeo

dieta e indireta

Ademais cumpre salientar que o art 139 IV CPC aplica-se a toda e qualquer

atividade executiva ldquoa) seja fundada em tiacutetulo executivo judicial (provisoacuteria ou definitiva)

55 DIDIER JR Fredie et al apud TARUFFO Michelle A atuaccedilatildeo executiva dos direitos perfis

comparatiacutesticos Revista de Processo Satildeo Paulo RT 1990 n 59 p 78 56 Segundo Fredie Didier et al claacuteusula geral eacute uma espeacutecie de texto normativo cujo antecedente

(hipoacutetese faacutetica) eacute composto por termos vagos e consequente (efeito juriacutedico) eacute indeterminado

25

seja fundada em tiacutetulo executivo extrajudicial b) seja para efetivar prestaccedilatildeo pecuniaacuteria seja

para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer ou dar coisa distinta de dinheirordquo57

Jaacute o art 297 do CPC garante que a tutela provisoacuteria possa ser efetivada tambeacutem

atipicamente ldquoSucede que a atipicidade da tutela provisoacuteria segue necessariamente a

atipicidade da tutela definitivardquo 58

Por fim o comando do sect 1 ordmdo art 536 se aplica

a) inicialmente agrave execuccedilatildeo de fazer e de natildeo fazer fundada em decisatildeo judicial (provisoacuteria ou definitiva) b) por forccedila do sect 3ordm do art 538 tambeacutem se aplica ao cumprimento de sentenccedila para entrega de coisa c) por forccedila do art 771 paraacutegrafo uacutenico o dispositivo tambeacutem se aplica agrave execuccedilatildeo para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer e entregar coisa distinta de dinheiro fundada em tiacutetulo extrajudicial

Claramente o art 139 IV eacute mais amplo do que o sect 1 ordm do art 536 estende-se por

disposiccedilatildeo expressa agrave execuccedilatildeo de pagar quantia Sendo uma grande novidade nas obrigaccedilotildees

que tem por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15

O art 139 IV do CPC apresentou uma novidade agrave atipicidade dos meios executivos

ao disciplinar que cabe ao juiz ldquodeterminar todas as medidas indutivas coercitivas

mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o cumprimento de ordem judicial

inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo

A inovaccedilatildeo estaacute na possibilidade de utilizar os meios atiacutepicos para assegurar o

cumprimento de decisotildees que versam sobre as obrigaccedilotildees pecuniaacuterias sendo admitida a

utilizaccedilatildeo de outros meios ateacute na execuccedilatildeo de titulo judicial de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria aleacutem da

multa de 10 (a que se refere o artigo 523 sect 1ordm do CPC) para forccedilar o devedor a cumprir a

obrigaccedilatildeo pecuniaacuteria

57 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 105 58 Ibid p 105

26

Dessa forma eacute possiacutevel afirmar que ldquoao lado da disciplina tiacutepica do art 523 e

seguintes () o novo CPC inova ao permitir que o sistema de teacutecnicas executivas atiacutepicas

sejam empregadas na execuccedilatildeo monetaacuteriardquo59 (ZARONI VITORELLI 2016 p 66)

Fernando da Fonseca Gajardoni60 denomina a dita medida como a ldquorevoluccedilatildeo

silenciosardquo da execuccedilatildeo por quantia certa posto que

() pelo fato de que a regra natildeo estar propriamente incrustrada nos capiacutetulo e livro atinentes ao cumprimento de sentenccedila e ao processo de execuccedilatildeo ndash o art 139 IV do Novo CPC parece trazer ao paiacutes algo bastante novo cuja aplicaccedilatildeo a depender do comportamento do Judiciaacuterio pode implicar em verdadeira revoluccedilatildeo (positiva ou negativa) na sistemaacutetica executiva ateacute entatildeo vigente

Claramente o dispositivo foi recebido com entusiasmo por parte da doutrina que

anteciparam em afirmar que o princiacutepio da atipicidade dos meios executivos no CPC2015

ldquo() assume a feiccedilatildeo de poder-dever geral conferido ao magistrado de determinar () todas

as medidas coercitivas sub-rogatoacuterias mandamentais e indutivas que entender necessaacuterias

para a tutela justa efetiva e em tempo razoaacutevelrdquo 61

Dessa forma lecionam Luiz Guilherme Marinoni Seacutergio Cruz Arenhart e Daniel

Mitidiero62 que

O juiz a partir do art 139 IV do CPC2015 natildeo estaacute mais adstrito apenas agrave sentenccedila condenatoacuteria ndash que fixa a obrigaccedilatildeo de pagar e daacute ensejo agrave abertura da execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo patrimonial ndash para a tutela de prestaccedilotildees pecuniaacuterias Pode impor essa prestaccedilatildeo por meio de ordem judicial acoplada ao aceno de emprego de medida de induccedilatildeo (coercitiva ou de pressatildeo positiva) ou de medida de sub-rogaccedilatildeo (MARINONI ARENHARDT MITIDIERO 2015 p 703)

Deste modo em razatildeo do art 139 IV do CPC tem-se entendido que o juiz nas

execuccedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria possui a faculdade de adotar qualquer

59 ZARONI Bruno Marzullo VITORELLI Edilson Reforma e efetividade da execuccedilatildeo no novo CPC

In PEIXOTO Ravi FREIRE Alexandre MENDES Aluiacutesio Gonccedilalves de Castro Execuccedilatildeo 2 ed rev e atual Salvador JusPodivm 2016 766 p (Coleccedilatildeo novo CPC doutrina selecionada v 5) p 66

60 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia 24082015 JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Acesso em 23082018

61 LIMA Rafael de Oliveira A atipicidade dos meios executivos no coacutedigo de processo civil brasileiro de 2015 Revista de Processo Jurisdiccedilatildeo e Efetividade da Justiccedila v 2 n 2 juldez 2016 p 11

62 MARINONI Luiz Guilherme ARENHART Seacutergio Cruz MITIDIERO Daniel Novo curso de processo civil tutela dos direitos mediante procedimento comum Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 v 2 p 703

27

medida indutiva coercitiva mandamentais ou sub-rogatoacuterias para efetivar o creacutedito do

exequente natildeo se limitando as medidas tiacutepicas

Alguns doutrinadores se precipitaram ao afirmar que o dito dispositivo ldquo() autoriza o

juiz a utilizar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir ressalvando-se a prisatildeo

civil constitucionalmente limitada ao devedor de alimentosrdquo 63 Acreditam Jorge Bheron

Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa que o entusiasmo por parte da

doutrina abre margem para as mais variadas formas de compelir o devedor a cumprir com a

prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

ldquoE aiacute persistindo no mau vezo de fazer explicaccedilotildees em abstrato ignorando que o sentindo soacute se daacute na aplicaccedilatildeo (situaccedilatildeo concreta real ou fictiacutecia) as sugestatildeo satildeo as mais engenhosas suspensatildeo de CNH retenccedilatildeo de passaporte restriccedilatildeo de fim de semana cancelamento de cartotildees de creacutedito ndash para ficar apenas nestasrdquo 64

Ou seja podendo o juiz natildeo apenas substituir o devedor tomando seu patrimocircnio para

entregar ao credor na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia como tambeacutem poderaacute

pressionaacute-lo psicologicamente a adimplir por conta proacutepria a obrigaccedilatildeo

Ademais o Enunciado nordm 48 do ENFAM avalia expressamente a possibilidade de

imposiccedilatildeo de medidas coercitivas para a efetivaccedilatildeo da execuccedilatildeo pecuniaacuteria Conforme o dito

enunciado

ldquoO art 139 inciso IV traduz um poder geral de efetivaccedilatildeo permitindo a aplicaccedilatildeo de medidas atiacutepicas para garantir o cumprimento de qualquer ordem judicial inclusive no acircmbito do cumprimento de sentenccedila e no processo de execuccedilatildeo baseado em tiacutetulosrdquo

Dessa forma o artigo 139 IV do CPC permite uma gama ampla de interpretaccedilotildees por

parte da doutrina por ser uma claacuteusula geral encontrando limite apenas na imaginaccedilatildeo de

quem o analisa Nesse sentido eacute forccediloso orientar e delimitar o manejo desse artigo legal para

que se extraia seu sentido e alcance revelando assim sobre que situaccedilotildees ele incide de que

modo e o que permite

63 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

64 Ibid sem paginaccedilatildeo

28

32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER

GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO

O artigo 139 IV com a vigecircncia do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 abriu margem

para uma constelaccedilatildeo de decisotildees nas quais o dito dispositivo recebeu diversas interpretaccedilotildees

pelos operadores do direito

Sem duacutevidas por ser uma das pioneiras a decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara

Ciacutevel do Foro Regional de Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-

1320138260011 na data de 25 de agosto de 2016 gerou um enorme rebuliccedilo

Nessa accedilatildeo que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto

uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a

suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o

passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito

Segundo a magistrada o processo tramitava haacute anos sem que nenhum valor tenha sido

pago ao exequente aleacutem do devedor natildeo ter oferecido proposta de acordo e nem ter indicado

bens agrave penhora configurando uma completa desiacutedia com o processo

ldquoO caso tratado nos autos se insere dentre as hipoacuteteses em que eacute cabiacutevel a aplicaccedilatildeo do art 139 inciso IV do Coacutedigo de Processo Civil Isso porque o processo tramita desde 2013 sem que qualquer valor tenha sido pago ao exequente Todas as medidas executivas cabiacuteveis foram tomadas sendo que o executado natildeo paga a diacutevida natildeo indica bens agrave penhora natildeo faz proposta de acordo e sequer cumpre de forma adequada as ordens judiciais frustrando a execuccedilatildeo

Se o executado natildeo tem como solver a presente diacutevida tambeacutem natildeo recursos para viagens internacionais ou para manter um veiacuteculo ou mesmo manter um cartatildeo de creacutedito Se poreacutem mantiver tais atividades poderaacute quitar a diacutevida razatildeo pela qual a medida coercitiva poderaacute se mostrar efetiva

Assim como medida coercitiva objetivando a efetivaccedilatildeo da presente execuccedilatildeo defiro o pedido formulado pelo exequente e suspendo a Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo do executado M A S determinando ainda a apreensatildeo de seu passaporte ateacute o pagamento da presente diacutevida

()

Determino ainda o cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado ateacute o pagamento da presente diacutevida ()rdquo

Foi impetrado Habeas Corpus no Tribunal de Justiccedila do Estado de Satildeo Paulo a favor

do executado sob o fundamento que a coaccedilatildeo era ilegal e afetava o direito de locomoccedilatildeo

29

garantido constitucionalmente Tendo sido concedida a liminar em decisatildeo que ora se

reproduz

Em que pese a nova sistemaacutetica trazida pelo art 139 IV do CPC2015 deve-se considerar que a base estrutural do ordenamento juriacutedico eacute a Constituiccedilatildeo Federal que em seu art 5ordm XV consagra o direito de ir e vir Ademais o art 8ordm do CPC2015 tambeacutem preceitua que ao aplicar o ordenamento juriacutedico o juiz natildeo atentaraacute apenas para a eficiecircncia do processo mas tambeacutem aos fins sociais e agraves exigecircncias do bem comum devendo ainda resguardar e promover a dignidade da pessoa humana observando a proporcionalidade a razoabilidade e a legalidade Por tais motivos concedo a liminar pleiteada65

Cabe destacar aqui o voto vencido da Desembargadora Maria Luacutecia Pizzotti no

julgamento do Habeas Corpus supracitado demonstrando que o debate sobre a abrangecircncia

do artigo 139 IV do CPC ocorre tanto na doutrina quanto no judiciaacuterio

O objetivo do novel dispositivo natildeo eacute impor penas ou restringir direitos natildeo sendo intenccedilatildeo do Judiciaacuterio suspender indefinidamente o direito de dirigir do executado ou sua liberdade de viajar mas sim impor uma restriccedilatildeo tatildeo gravosa caso ele natildeo cumpra a determinaccedilatildeo que escolha cumprir sua obrigaccedilatildeo e dar fim ao problema Em outras palavras mediante as medidas de coerccedilatildeo o Estado procura persuadir o inadimplente impondo-lhe situaccedilotildees tatildeo onerosas e inconvenientes que em algum momento seja para ele mais vantajoso cumprir do que permanecer no inadimplemento

Ao fazecirc-lo o Novo Coacutedigo de Processo Civil rompe com as criacuteticas da ineficiecircncia das execuccedilotildees Natildeo se cogita deferir medidas restritivas agravequeles que demonstram a incapacidade absoluta de solver o deacutebito apenas agravequeles que reconhecidamente se valem de artimanhas e subterfuacutegios para evitar a satisfaccedilatildeo das diacutevidas ldquopreferindordquo outras despesas mais lsquonobresrsquo agindo em nome de terceiros e fazendo escaacuternio dos credores e do proacuteprio Poder Judiciaacuterio (hellip)

Para tanto memoraacutevel a noccedilatildeo de que a medida em comento tem caraacuteter excepcional e encontra limites no plano da proporcionalidade como sustenta o ilustrado Magistrado paulista Fernando da Fonseca Gajardoni Professor Faculdade de Direito de Ribeiratildeo Preto da USP (in httpswwwjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 acesso em 091216 agraves 11h20min) E para anaacutelise da proporcionalidade a ponderaccedilatildeo deve observar os trecircs passos apontados pela doutrina a necessidade a adequaccedilatildeo e a proporcionalidade em sentido estrito

65 TJSP - Habeas Corpus Processo nordm 2183713-8520168260000 30ordf Cacircmara Direito Privado relator

Des Marcos Ramos j 290317

30

Ademais no entendimento de Jorge Amaury Maia Nunes e Guilherme Pupe de

Noacutebrega66 essa decisatildeo releva os perigos trazidos pelo art 139 IV do CPC ao confrontar

direitos constitucionalmente garantidos

De nossa parte entendemos que a liberdade de locomoccedilatildeo inserta no inciso XV do artigo 5ordm que abrange o direito de deixar o territoacuterio nacional sofre embaraccedilo indevido pela apreensatildeo de passaporte ou pela suspensatildeo da carteira nacional de habilitaccedilatildeo

()

Agrave luz da exposiccedilatildeo feita acima e em anaacutelise primeva sustentamos que o artigo 139 IV do CPC de 2015 estaacute a merecer declaraccedilatildeo de inconstitucionalidade sem reduccedilatildeo de texto para o fim de rechaccedilar a apreensatildeo de passaporte a suspensatildeo do direito de dirigir e a vedaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo em concurso ou em licitaccedilatildeo puacuteblicos como medidas passiacuteveis de serem adotadas pelo juiz sob pena de vulneraccedilatildeo aos artigos 1ordm IV 5ordm XV e LIV 37 I 173 sect 3ordm III e 175 todos da Constituiccedilatildeo

Apesar de ter sofrido duras criacuteticas a decisatildeo do processo de nordm 4001386-

1320138260011 serviu de inspiraccedilatildeo para tantas outras decisotildees no mesmo sentido

Foi o caso da decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de Satildeo

Vicente em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 0020724-2620088260590 na data de 21 de

junho de 2017

A supracitada execuccedilatildeo se arrastava por nove (09) anos sem que o devedor tenha

esboccedilado qualquer intenccedilatildeo de pagar a diacutevida O credor requereu a suspensatildeo da Carteira

Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado apreensatildeo do passaporte e cancelamento dos

cartotildees de creacutedito

O magistrado com embasamento no artigo 139 IV do CPC deferiu parcialmente o

pedido sob o fundamento de que a apreensatildeo de passaporte e CNH natildeo viola o direito de ir e

vir do devedor Entretanto o juiz indeferiu o pedido de cancelamento do cartatildeo de creacutedito por

acreditar que a suspensatildeo poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado tendo em

vista que atualmente as pessoas utilizam o referido cartatildeo para pagamento das despesas

diaacuterias

66 NOBREacuteGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139

IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018

31

Eacute evidente que as medidas atiacutepicas de coerccedilatildeo devem ser utilizadas com cautela sempre respeitando a dignidade da pessoa do executado Natildeo se vislumbra contudo que as medidas aqui eleitas sejam capazes de vulnerar os Direitos Fundamentais do indiviacuteduo A uma porque natildeo se trata de restriccedilatildeo ao direito de ir e vir do executado que continua no gozo de plena liberdade de locomoccedilatildeo a duas porque a conduccedilatildeo de veiacuteculo automotor eacute mera comodidade da vida moderna natildeo se tratando de direito absoluto

Com mais razatildeo ainda se admite a suspensatildeo do Passaporte do executado que se natildeo paga a diacutevida da execuccedilatildeo natildeo deve ter o direito de fazer viagem internacional

Tem-se aqui verdadeiro exerciacutecio de ponderaccedilatildeo de interesses juriacutedicos de um lado jaz o direito de creacutedito do exequente que deriva do direito de propriedade e por isso mesmo tem envergadura constitucional de outro giro tem-se o direito do executado agrave autorizaccedilatildeo do Estado para conduzir veiacuteculo automotor e realizar viagens internacionais que natildeo se mostram essenciais agrave dignidade da pessoa humana Natildeo haacute duacutevidas pois de que eacute este uacuteltimo que deve sucumbir

O pedido fica indeferido apenas no tocante agrave suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado Eacute que ao contraacuterio da CNH e do passaporte que trazem consigo certa presunccedilatildeo de riqueza natildeo se pode concluir que o uso de cartatildeo de creacutedito eacute feito por luxo ou simples conveniecircncia

Como eacute cediccedilo os cartotildees de creacutedito oferecem ao seu titular creacutedito raacutepido e rotativo para o pagamento de despesas diaacuterias e certamente exercem funccedilatildeo essencial agravequeles que se encontram em situaccedilatildeo financeira precaacuteria

A suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado portanto se revela medida desproporcional e que inclusive poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado

Pelo exposto defiro em parte o pedido formulado pelo exequente e DETERMINO a suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo e bem como a suspensatildeo da validade (cancelamento temporaacuterio) no sistema SINPA de eventuais passaportes vaacutelidos em nome do executado

Dessa forma o artigo 139 IV do CPC revolucionou completamente a execuccedilatildeo de

obrigaccedilatildeo de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria ao permitir a utilizaccedilatildeo do uso dos meios executivos

atiacutepicos para compelir o executado a satisfazer o creacutedito do exequente

33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE

EFETIVACcedilAtildeO

Era inevitaacutevel que o artigo 139 IV do CPC gerasse todo tipo de reaccedilatildeo entre os

doutrinadores do processo civil e ateacute mesmo de outros ramos do direito devido a sua

capacidade de realizar uma completa inovaccedilatildeo na forma de se executar as obrigaccedilotildees de pagar

quantia Alguns o aplaudiram visualizando nele ldquouma luz no fim do tuacutenelrdquo outros o

criticaram vislumbrando as arbitrariedades que poderiam ser praticadas com embasamento no

referido dispositivo

32

As decisotildees suscitadas em linhas preteacuteritas auxiliaram para fervilhar ainda mais o

debate sobre o tema tendo em vista que por um lado poderia aumentar a efetividade das

execuccedilotildees por quantia no entanto por outro surgiam questionamentos a cerca da sua

constitucionalidade

A doutrina parece que demoraraacute a se pacificar sobre o tema Segundo alguns

doutrinadores seraacute inconstitucional toda restriccedilatildeo que recaia sobre a pessoa do devedor e natildeo

exclusivamente sobre o seu patrimocircnio Jaacute para outros o dispositivo eacute constitucional e o meio

mais eficaz para se resolver o problema da efetivaccedilatildeo das execuccedilotildees de pagar quantia ldquoA

discussatildeo se daacute especialmente no que diz respeito aacutes medidas de suspensatildeo de CNH

apreensatildeo de passaporte e bloqueio de cartotildees de creacutedito do devedorrdquo 67

O professor Thiago Rodovalho analisou detalhadamente a decisatildeo de nordm 4001386-

1320138260011 em seu artigo ldquoO necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na

concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivosrdquo 68 Quanto agrave suspensatildeo da CNH o autor

acredita que tal medida natildeo viola qualquer direito fundamental do devedor posto que ldquodirigir

veiacuteculos automotores eacute direito do cidadatildeo mas natildeo se confunde com os direitos fundamentais

e social de ir-e-vir e ao transporterdquo 69 O professor eacute categoacuterico ao afirmar que

Com relaccedilatildeo agrave suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (suspensatildeo do direito de dirigir restriccedilatildeo de direitos) natildeo nos parece haver qualquer violaccedilatildeo a direito fundamental ou social nem a direito da personalidade ou colocaccedilatildeo do devedor em situaccedilatildeo desproporcionalmente detrimentosa exceccedilatildeo feita aos que usam o veiacuteculo como instrumento de trabalho atraindo a hipoacutetese do NCPC art 833 inc V

()

Outrossim natildeo o consideramos como direito da personalidade Os direitos da personalidade satildeo os valores fundamentais que compotildeem o proacuteprio ser justamente por isso intransmissiacuteveis e irrenunciaacuteveis natildeo podendo o seu exerciacutecio sofrer limitaccedilatildeo voluntaacuteria (CC art 11) Por mais que vivamos num paiacutes que tanto valoriza o carro e que muitas pessoas de fato se compreendam em razatildeo e em funccedilatildeo do carro que dirijam este natildeo nos parece ser um direito que verdadeiramente componha a personalidade do indiviacuteduo70

67 DONTOS Sofia Poderes executoacuterios do juiz que diz a doutrina sobre o art 139 inc IV do CPC

Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigospoderes-executorios-do-juiz-que-diz-a-doutrina-sobre-art-139-inc-iv-do-cpc-23052018 gt Publicado em 23052018 Acesso em 01082018

68 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018

69 Ibid sem paginaccedilatildeo 70 Ibid sem paginaccedilatildeo

33

Quanto ao cancelamento dos cartotildees de credito do devedor o professor Thiago

Rodovalho tambeacutem acredita que natildeo haacute qualquer violaccedilatildeo ao direito fundamental social ou

da personalidade do devedor e acrescenta que

Tanto assim o eacute que ser titular de um cartatildeo de creacutedito pressupotildee ter creacutedito o que eacute analisado e concedido por instituiccedilotildees financeiras mais do que isso se porventura passando por dificuldades financeiras a pessoa deixa de honrar com pagamentos a mesma instituiccedilatildeo financeira concedente do cartatildeo de creacutedito pode sponte propria cancelaacute-lo ou recusar-lhe a concessatildeo Ora parece-me contraditoacuterio que instituiccedilotildees financeiras para sua proteccedilatildeo patrimonial possam ferir esse suposto ldquodireito fundamentalrdquo ou esse suposto ldquodireito da personalidaderdquo mas natildeo possa o Poder Judiciaacuterio igualmente fazecirc-lo contra aquele devedor moroso que instado ao pagamento e frustradas todas as tentativas de constriccedilatildeo patrimonial leva vida luxuosa valendo-se de cartotildees de creacutedito que prescindem de dinheiro em conta eacute dizer podem justamente funcionar como forma de ocultar renda e patrimocircnio71

O autor considera a apreensatildeo de passaporte um tema mais polecircmico e que merece

maior reflexatildeo No entanto crecirc que eacute possiacutevel a apreensatildeo de passaporte sem violar os

direitos fundamentais do devedor por se tratar de um direito de ir e vir de amplitude especial

Agrave primeira vista a possibilidade de apreensatildeo do passaporte tambeacutem nos parece possiacutevel pois tambeacutem se trata de um direito de ir e vir de amplitude especial Assim o eacute pois salvo situaccedilotildees especiais (refugiados p ex) haacute a necessidade de demonstrar condiccedilotildees financeiras de estadia e retorno para ser admitido no paiacutes de destino Ou seja pressupotildee uma condiccedilatildeo financeira que o devedor justamente diz natildeo possuir Sem embargo dessa consideraccedilatildeo esse ainda eacute um ponto que merece uma reflexatildeo mais acurada sendo essa apenas uma primeira impressatildeo72

Outros autores escreveram sobre o tema como eacute o caso do processualista Luiz

Dellore73 que tambeacutem defende que as medidas atiacutepicas como restriccedilatildeo ao direito de dirigir

apreensatildeo de passaporte e cancelamento de cartotildees de creacutedito satildeo permitidas e natildeo violam em

regra os direitos fundamentais do devedor

De minha parte creio que efetivamente haacute inovaccedilatildeo no at 139 IV do NCPC (e natildeo mera repeticcedilatildeo do que jaacute havia no Coacutedigo anterior) que tem o condatildeo de trazer mais efetividade ao processo executivo no Brasil ndash que por deacutecadas centrou sua atenccedilatildeo na defesa do executado (vide a grande quantidade de impenhorabilidades) sem dar maior atenccedilatildeo ao creacutedito do exequente

71 Ibid sem paginaccedilatildeo 72 Ibid sem paginaccedilatildeo 73 DELLORE Luiz NCPC Atipicidade das medidas executivas jaacute eacute realidade Disponiacutevel em lt

httpswwwjotainfoopiniao-e-analisecolunasnovo-cpcncpc-atipicidade-de-medidas-executivas-ja-e-realidade-17042017 gt Publicado em 17042017 Acesso em 03092018

34

Logo a meu ver medidas como (i) restriccedilatildeo ao direito de dirigir (ii) apreensatildeo de passaporte (iii) cancelamento de cartotildees de creacutedito e (iv) vedaccedilatildeo de obtenccedilatildeo de novos empreacutestimos se natildeo vinculados ao pagamento do deacutebito exequendo dentre outras restriccedilotildees que deveratildeo ser observadas a cada caso satildeo permitidas pelo sistema do NCPC e em regra natildeo violam direitos fundamentais do devedor E tecircm o condatildeo de fazer com que o executado que tem recursos diante dessas medidas coercitivas pague o deacutebito trazendo sucesso agrave satisfaccedilatildeo do creacutedito

Nessa linha para Alexandre Fuchs das Neves74 o artigo 139 IV do CPC conferiu ao

juiz poderes coercitivos capazes de ldquotransformar a vida do devedor um infernordquo para compeli-

lo a cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria Entretanto pondera que para que a medida tenha

validade ldquoeacute necessaacuteria uma fundamentaccedilatildeo por evidente uma correlaccedilatildeo temaacutetica entre a

medida adotada e sua efetividade em face ao processo com fundamentaccedilatildeo detalhadardquo

No entendimento de Fernando Gajardoni75 satildeo possiacuteveis as medidas de apreensatildeo de

passaporte bloqueio de cartotildees de creacutedito e suspensatildeo da CNH Para ele o que limita o art

139 IV do CPC eacute o esgotamento dos meios tiacutepicos e a real necessidade da medida

Ilustrativamente natildeo efetuado o pagamento de diacutevida oriunda de multas de tracircnsito e superados os expedientes tradicionais de adimplemento (penhora de dinheiro e bens) seria liacutecito o estabelecimento da medida coercitivaindutiva de suspensatildeo do direito a conduzir veiacuteculo automotor ateacute pagamento do deacutebito (inclusive com apreensatildeo da CNH do devedor) natildeo efetuado pagamento de verbas salariais devidas a funcionaacuterios da empresa possiacutevel o estabelecimento de vedaccedilatildeo agrave contrataccedilatildeo de novos funcionaacuterios ateacute que seja saldada a diacutevida natildeo efetuado o pagamento de financiamento bancaacuterio na forma e no prazo avenccedilados possiacutevel ateacute que se tenha a quitaccedilatildeo que se obstem novos financiamentos ou mesmo a participaccedilatildeo do devedor em licitaccedilotildees (como de ordinaacuterio jaacute acontece com pessoas juriacutedicas em deacutebito tributaacuterio com o Poder Puacuteblico) etc

Teriacuteamos entatildeo no Brasil por assim dizer a adoccedilatildeo do padratildeo da atipicidade das medidas executivas tambeacutem para as obrigaccedilotildees de pagar vistas estas como ordens do EstadoJuiz para que haja prestaccedilatildeo de pagamento em pecuacutenia

()

Por isso ndash a prevalecer a interpretaccedilatildeo potencializada do art 139 IV do CPC2015 ndash o emprego de tais medidas coercitivasindutivas especialmente nas obrigaccedilotildees de pagar encontraraacute limite certo na excepcionalidade da medida (esgotamento dos meios tradicionais de satisfaccedilatildeo do deacutebito) na proporcionalidade (inclusive agrave luz da regra da menor onerosidade ao devedor do art 805 do CPC2015) na necessidade de fundamentaccedilatildeo substancial e especialmente nos direitos e garantias assegurados na Constituiccedilatildeo Federal (vg natildeo parece possiacutevel que se determine o pagamento sob pena de prisatildeo ou de vedaccedilatildeo ao exerciacutecio da profissatildeo do direito de ir e vir etc)

74 NEVES Alexandre Fuchs das Cancelamento de cartotildees de creacutedito e apreensatildeo de CNH e passaporte

do devedor Isso eacute possiacutevel Disponiacutevel em lt httpwwwsinfacspcombrconteudocancelamento-de-cartoes-de-credito-e-apreensao-de-cnh-e-passaporte-do-devedor-isso-e-possivel gt Acesso em 30082018

75 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Publicado em 24082015 Acesso em 30082018

35

Jaacute Fernanda Tartuce76 acredita que tais medidas satildeo problemaacuteticas e devem ser

analisadas com cautela tendo em vista que ao inveacutes de afetarem o patrimocircnio do devedor

atingem a proacutepria pessoa

Sob certo prisma adotar medidas diferenciadas contribui para a efetividade da prestaccedilatildeo jurisdicional Por outro lado o patrimocircnio ndash e natildeo a pessoa do devedor - responde por diacutevidas aleacutem disso o exerciacutecio de amplos poderes pelo juiz sem balizas especiacuteficas pode ensejar medidas inadequadas Nessa linha suspender o direito de dirigir e restringir o uso de passaporte satildeo iniciativas problemaacuteticas por atingirem a pessoa do devedor enquanto a penhora da restituiccedilatildeo de Imposto de Renda soa viaacutevel por afetar seu patrimocircnio Eacute importante que a medida diferenciada se revele proporcional e seja aplicada apoacutes o exaurimento de outros meios previstos no ordenamento Como a proposta do Novo Coacutedigo eacute aumentar a eficiecircncia processual intentar medidas ineficazes inexequiacuteveis eou de difiacutecil fiscalizaccedilatildeo pode acabar ensejando o efeito contraacuterio

Nessa senda Lenio Streck e Dierle Nunes77 entendem que as medidas atiacutepicas de

suspensatildeo da CNH eou apreensatildeo de passaporte satildeo inconstitucionais Afirmam que natildeo se

pode confundir o processo civil e penal ainda que ambos remetam a um ldquoparadigma

constitucional comumrdquo e que o artigo 139 IV do CPC ldquoimpotildee novos desafios interpretativos

que podem conduzir a uma anaacutelise superficial e utilitarista de busca de resultados que

desprezem a necessaacuteria leitura constitucionalrdquo Os autores ainda ponderam que ldquoO perigo eacute o

artigo 139 IV ser transformado em instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com

autorizaccedilatildeo judicialrdquo

O professor Araken de Assis no dia 18 de abril de 2018 em um evento sobre o

Coacutedigo Processual Civil de 2015 que ocorreu em Brasiacutelia na sede do Conselho Federal da

OAB declarou ser contraacuterio aos poderes executoacuterios atiacutepicos ldquoSou contra os poderes

atiacutepicos dos juiacutezes porque seu exerciacutecio redunda em simples arbitrariedadesrdquo78

Acrescentou ainda que

76 IBDFAM ndash Instituto Brasileiro de Famiacutelia O polecircmico inciso IV do artigo 139 do CPC e suas difusas

interpretaccedilotildees Disponiacutevel em lt httpwwwibdfamorgbrnoticias6096O+polC3AAmico+inciso+IV+do+artigo+139+do+CPC+e+suas+difusas+interpretaC3A7C3B5es gt Publicado em 31082016 Acesso em 04092018

77 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018

78 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04092018

36

Eacute evidentemente inconstitucional diante do princiacutepio da dignidade da pessoa humana tirar o passaporte carteira de habilitaccedilatildeo Quecirc que tem isso com diacutevidas Natildeo tem absolutamente nada Natildeo eacute a correlaccedilatildeo instrumental entre o objetivo da execuccedilatildeo e o meio empregado Isso eacute simples vinganccedila simples puniccedilatildeo79

O professor Araken de Assis acredita que tais medidas satildeo inconstitucionais e

violam o principio da dignidade humana do executado numa sociedade como a nossa

sedenta por puniccedilatildeo natildeo me surpreende que essas ideias sejam encaradas com

naturalidade Mas eacute preciso rejeitaacute-las em nome de princiacutepios 80

34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO

A Constituiccedilatildeo Federal de 1988 tem como um dos seus fundamentos a dignidade da

pessoa humana presente no artigo 1ordm inciso III do referido texto constitucional O dito

princiacutepio tem o escopo de nortear o ordenamento juriacutedico como um todo

A inclusatildeo da dignidade da pessoa humana como princiacutepio constitucional obrigou

uma reflexatildeo sobre o papel da pessoa humana no direito e um redimensionamento para

elevaacute-la ao centro do ordenamento juriacutedico81 Eacute necessaacuterio recorrer agrave teoria Kantiana para

que se obtenha uma definiccedilatildeo do princiacutepio ora estudado Para Kant82 o homem eacute um fim

em si mesmo natildeo uma funccedilatildeo do Estado Ou Naccedilatildeo O Estado e o direito devem estar

organizados em benefiacutecio do indiviacuteduo

Agora eu afirmo o homem ndash e de uma maneira geral todo o ser racional ndash existe como fim em si mesmo e natildeo apenas como meio para o uso arbitraacuterio desta ou daquela vontade Em todas as suas accedilotildees pelo contraacuterio tanto nas direcionadas a ele mesmo como nas que o satildeo a outros seres racionais deve ser ele sempre considerado simultaneamente como fim

Partindo da premissa de que para Immanuel Kant o homem eacute o fim em si mesmo

ldquodevemos compreender que a dignidade da pessoa humana eacute a noccedilatildeo o comando a direccedilatildeo

que se deve seguir funcionando como fundamento para a interpretaccedilatildeo de todos os direitos e

garantias conferidos agrave pessoa nos ordenamentos juriacutedicos de cada Estadordquo 83

79 Ibid sem paginaccedilatildeo 80 Ibid sem paginaccedilatildeo 81 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito

fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 461 82 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud KANT Immanuel Fundamentaccedilatildeo da metafiacutesica dos costumes

Satildeo Paulo Martin Claret 2003 p56-59 Coleccedilatildeo A Obra-Prima de Cada Autor 83 SCHIAFIANO Juliana Rocha op cit p 461

37

O princiacutepio constitucional da dignidade da pessoa humana estaacute diretamente ligado ao

conteuacutedo dos direitos fundamentais logo para que se cumpra com os direitos fundamentais

constitucionalmente instituiacutedos eacute necessaacuterio reconhecer e respeitar a dignidade da pessoa

humana conforme disciplina Ingo Sarlet84

Em suma o que se pretende sustentar de modo mais enfaacutetico eacute que a dignidade da pessoa humana na condiccedilatildeo de valor (principio normativo) fundamental que atrai o conteuacutedo de todos os direitos fundamentais exige e pressupotildee o reconhecimento e proteccedilatildeo dos direitos fundamentais de todas as dimensotildees (ou geraccedilotildees se assim preferirmos) Assim sem que se reconheccedilam agrave pessoa humana os direitos fundamentais que lhe satildeo inerentes em verdade estarse-aacute lhe negando a proacutepria dignidade A consagraccedilatildeo constitucional da dignidade da pessoa humana tem o propoacutesito de limitar a atuaccedilatildeo ou a omissatildeo do Estado para garantir os direitos do indiviacuteduo Assim eacute difiacutecil precisar os efeitos da norma que determina a dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado (como acontece com a Constituiccedilatildeo brasileira de 1988) poreacutem quando desrespeitados os direitos fundamentais do cidadatildeo eacute possiacutevel identificar que a dignidade deste foi violada

Logo ldquoteraacute respeitada a sua dignidade o individuo que tiver respeitados os seus

direitos fundamentaisrdquo 85 Os direitos fundamentais estatildeo apresentados na Constituiccedilatildeo

Federal da seguinte forma direitos individuais e coletivos direitos sociais direitos poliacuteticos e

direitos de nacionalidade que tecircm como escopo garantir as liberdades positivas aos

indiviacuteduos ldquoonde foram conquistados direitos agrave liberdade religiosa liberdade civil e

profissional agrave propriedade ao livre acesso ao Judiciaacuterio agrave ampla defesa e ao contraditoacuterio no

processual judicial ao sigilo de dados e informaccedilotildees pessoais entre outros que somados

garantem o cidadatildeo uma vida dignardquo 86

O cidadatildeo na Constituiccedilatildeo Federal de 88 diferente das constituiccedilotildees brasileiras

anteriores passou a ser fundamento e ganhou destaque nos direitos fundamentais tendo

garantida a sua vida a sua dignidade a sua seguranccedila a sua honra a sua liberdade e a sua

propriedade

84 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud SARLET Ingo Wolfgang Dignidade da pessoa humana e

direitos fundamentais na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 2ed Porto Alegre Livraria do Advogado 2002 p87 85 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito

fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 462 86 Ibid p 462

38

Segundo Carmem Luacutecia Antunes Rocha87 para garantir o Estado Democraacutetico de

Direito eacute necessaacuterio que a sua atuaccedilatildeo seja sempre em conformidade com o princiacutepio da

dignidade da pessoa humana

O Estado somente eacute democraacutetico em sua concepccedilatildeo constitucionalizaccedilatildeo e atuaccedilatildeo quando respeita o princiacutepio da dignidade da pessoa humana Natildeo haacute verbo constitucional natildeo haacute verbo governamental que se faccedilam legiacutetimos quando natildeo se voltam ao atendimento daquele princiacutepio Natildeo haacute verdade constitucional natildeo haacute suporte institucional para as poliacuteticas puacuteblicas que natildeo sejam destinadas ao pleno cumprimento daquele valor maior transformado em princiacutepio constitucional

O princiacutepio da dignidade humana constitucionalmente garantido impotildee limites ao

Estado compelindo aos oacutergatildeos e atividades estatais respeitar o ser humano e garanti-lo

condiccedilotildees miacutenimas para uma vida digna Dessa forma eacute niacutetido que o dito princiacutepio eacute

pressuposto e indispensaacutevel para legitimar outras normas constitucionais e

principalmente infraconstitucionais

O Coacutedigo de Processo Civil eacute umas das principais normas infraconstitucionais que

sofre influecircncia dos preceitos valores e princiacutepios esculpidos na Constituiccedilatildeo Federal

Logo como o principio da dignidade humana eacute um dos mais importantes pressupostos

constitucionais ldquoentatildeo eacute tranquilo afirmar-se que o novel ordenamento processual tem

de se render nas resoluccedilotildees dos aspectos processuais e a fim de se atingir uma soluccedilatildeo

justa adequada e efetiva ao postulado da dignidade da pessoa humanardquo 88

Dessa forma o legislador deve formular as normas infraconstitucionais de acordo e a

partir do conteuacutedo constitucional para Marinoni Mitidiero e Arenhart89

() o Coacutedigo de Processo Civil constitui direito constitucional aplicado O Coacutedigo deve ser interpretado de acordo com a Constituiccedilatildeo e com os direitos fundamentais o que significa que as duacutevidas interpretativas devem ser resolvidas a favor da otimizaccedilatildeo do alcance da Constituiccedilatildeo e do processo civil como meio para tutela de direitos

87 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud ROCHA Carmen Luacutecia Antunes O princiacutepio da dignidade da

pessoa humana e a exclusatildeo social Revista Interesse Puacuteblico n4 p23-48 1999 p33 88 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o

novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 367

89 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 14

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Com o escopo de conferir eficaacutecia aos mandamentos constitucionais o CPC15 traz a

previsatildeo e diversas claacuteusulas gerais em seus primeiros artigos em um dos quais se

prestigia o princiacutepio da dignidade da pessoa humana

O referido princiacutepio estaacute disciplinado no artigo 8ordm do CPC15 e atua como um guia

sobre as demais normas do coacutedigo processual Eacute o que entende Nelson Rosenvald90

O maior cuidado do inteacuterprete eacute no sentido de jamais banalizar a dignidade fazendo dela um elixir processual tal como muitas vezes se vecirc na esfera do direito civil Penso que natildeo haacute maiores dificuldades em transpor a noccedilatildeo constitucional do princiacutepio para em seguida adaptaacute-la agraves singularidades do processo

Logo de acordo com o artigo 8ordm do CPC o oacutergatildeo julgador ao aplicar o ordenamento

juriacutedico deve resguardar a dignidade da pessoa humana Para Fredie Didier91 ldquoresguardar

nesse contexto eacute de um lado aplicar corretamente a norma juriacutedica lsquoproteccedilatildeo da dignidade

da pessoa humanarsquo e de outro natildeo violar a dignidaderdquo

O oacutergatildeo julgador deveraacute manter um comportamento ativo com o objetivo de promover

a dignidade da pessoa humana podendo tomar medidas de ofiacutecio para efetivar a dignidade da

pessoa humana Didier assevera que o magistrado poderaacute ainda ldquovaler-se da claacuteusula geral de

atipicidade (art 536 sect 1ordm) para a execuccedilatildeo do direito fundamental agrave dignidaderdquo 92 O autor

ainda traz dois exemplos

a) exigecircncia de respeito agrave ordem cronoloacutegica de conclusatildeo (art 12) caso de grave violaccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana que natildeo se encaixe em um dos incisos que excepcionam a regra de observacircncia da cronologia da conclusatildeo poderia o juiz ldquofurar a filardquo para promover a dignidade da pessoa humana b) prioridade na tramitaccedilatildeo processual pessoa que seja portadora de doenccedila grave mas que natildeo esteja no rol do art 1048 I para promover a dignidade de pessoa humana o juiz poderia determinar o processamento prioritaacuterio93

Essa dupla garantia ndash resguardo e promoccedilatildeo ndash tem como objetivo garantir ao individuo

sua dignidade humana fazendo com que ldquode um lado que o Estado natildeo a viole e de outro

que o Estado a promova e efetiverdquo

90 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud ROSENVALD Nelson A

dignidade da pessoa humana no CPC15 91 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte

geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 75 92 Ibid p 75 93 Ibid p 75

40

Nessa senda o magistrado deveraacute promover a dignidade da pessoa humana quando

perceber a ausecircncia desta no processo ou assegura-la quando for posta em risco Eacute nesse

sentido o entendimento dos professores Marinoni Mitidiero e Arenhart94

() a dignidade da pessoa humana determina a compreensatildeo do processo civil como um meio para tutela dos direitos Vale dizer o processo civil natildeo pode ser visto como um instrumento a serviccedilo do Estado como um instrumento que natildeo se encontre orientado agrave realizaccedilatildeo dos fins da pessoa humana Em outras palavras o processo civil serve para realizaccedilatildeo dos direitos e para orientaccedilatildeo das pessoas a respeito do significado do direito

Nessa senda compete tanto ao juiz quanto as demais partes processuais garantirem ldquoo

valor intriacutenseco de cada vida que eacute trazida ao processordquo nas palavras de Alexandre Freitas

Cacircmara95

() aos sujeitos do processo eacute preciso sempre ter claro que os titulares dos interesses em conflitos satildeo pessoas reais cujas vidas seratildeo afetadas pelo resultado do processo e que por isso mesmo tecircm o direito de estabelecer suas estrateacutegias processuais de acordo com aquilo que lhes pareccedila melhor para suas vidas Eacute inadmissiacutevel tratar as partes como se natildeo fossem pessoas reais meros dados estatiacutesticos Afinal se para o Judiciaacuterio cada processo pode parecer apenas mais um processo para as partes cada processo pode ser o uacutenico o mais relevante aquele em que sua vida seraacute decidida E eacute dever do juiz assegurar que isto seja respeitado

Dessa forma eacute necessaacuterio que um arcabouccedilo normativo para que seja conferida

eficaacutecia e proteccedilatildeo ao principio da dignidade da pessoa humana

Logo o dito princiacutepio deve ser protegido em todas as esferas do ordenamento juriacutedico

inclusive no campo da execuccedilatildeo civil onde sofre grandes riscos de ser violado em nome do

direito fundamental agrave tutela executiva do credor ldquoPartir da premissa de que existe um direito

fundamental agrave tutela executiva ora ratificado pelo CPC eacute indispensaacutevel para a soluccedilatildeo de

diversos problemas oriundos do procedimento executivo principalmente aqueles relacionados

agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo 96

94 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme

MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 25

95 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CAcircMARA Alexandre Freitas O Novo Processo Civil Brasileiro 2 ed Satildeo Paulo Atlas 2016 p 7

96 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66

41

Eacute o caso por exemplo da impenhorabilidade Segundo Fredie Didier et al97 a

impenhorabilidade eacute uma forma de proteger certos bens do devedor do direito fundamental a

execuccedilatildeo do credor

Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa

Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais

O legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do CPC fazendo um

preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses em anaacutelise ao optar pela mitigaccedilatildeo do direito

do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado Afinal ldquoa execuccedilatildeo natildeo pode ser utilizada

como instrumento para causar a ruiacutena a fome e o desabrigo do devedor e sua famiacutelia gerando

situaccedilotildees incompatiacuteveis com a dignidade da pessoa humana 98

Logo a impenhorabilidade de certos bens

[] Eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa99

Eacute nesse sentido que o CPC15 enumera diversos casos de bens patrimoniais que satildeo

impenhoraacuteveis como o salaacuterio e vencimentos utensiacutelios necessaacuterios ao exerciacutecio da

profissatildeo seguro de vida vestuaacuterios e pertences de uso pessoal entre outros

Dessa forma as regras relativas agraves medidas executivas devem ser interpretadas agrave luz

da Constituiccedilatildeo Federal ldquovez que se voltam agrave realizaccedilatildeo de direitos fundamentais e em sua

97 Ibid p 66 98 THEODORO JUacuteNIOR Humberto Novo Coacutedigo de Processo Civil Anotado 20 ed Rio de Janeiro

Forense 2016 p 978 99 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud DIDIER JR Fredie CUNHA

Leonardo Carneiro da BRAGA Paula Sarno OLIVEIRA Rafael Alexandria de Curso de direito processual civil 3 ed Salvador JusPodivm 2011 v 5 p 547

42

realizaccedilatildeo podem atingir direitos fundamentaisrdquo 100 O Superior Tribunal de Justiccedila jaacute decidiu

que

O rol das impenhorabilidades do ordenamento paacutetrio objetiva preservar o miacutenimo patrimonial necessaacuterio agrave existecircncia digna do executado impondo ao processo executoacuterio certos limites Assim a depender das peculiaridades do caso as regras de impenhorabilidade podem ser ampliadas de modo a adequar a tutela aos direitos fundamentais como por exemplo o direito agrave moradia agrave sauacutede ou agrave dignidade da pessoa humana Trata-se portanto da aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo e da necessidade sob o enfoque da proporcionalidade101 (STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014)

Logo a interpretaccedilatildeo dos dispositivos que tratam sobre a penhora no CPC deve estaacute

diretamente ligada aos ditames constitucionais devendo o interprete privilegiar a opccedilatildeo que

esteja mais em sintonia com a Carta Magna para que nem o credor e nem o devedor sejam

lesados

O artigo 833 do CPC elenca uma seacuterie de incisos que expotildeem os bens impenhoraacuteveis

O trecho inicial inciso I do art 833 define como impenhoraacuteveis os bens inalienaacuteveis Este

inciso segue a regra de que ldquose o bem natildeo pode ser alienado tambeacutem natildeo pode ser penhorado

porque a penhora eacute o primeiro ato do procedimento de alienaccedilatildeo judicial do bemrdquo 102

Satildeo exemplos de bens inalienaacuteveis os puacuteblicos cuja alienaccedilatildeo depende de autorizaccedilatildeo

legislativa Eacute inalienaacutevel tambeacutem o capital constituiacutedo para garantir indenizaccedilatildeo de ato iliacutecito

(art 533 sect 1 ordm CPC) que portanto eacute tambeacutem impenhoraacutevel ldquoTodo bem inalienaacutevel eacute

impenhoraacutevel embora nem todo bem impenhoraacutevel seja inalienaacutevelrdquo 103

O inciso I do art 833 CPC tambeacutem consagra a impenhorabilidade dos bens que por

ato voluntaacuterio satildeo excluiacutedos da execuccedilatildeo

Segundo Fredie Didier et al104

Eacute o que ocorre nos casos de bens doados ou alienados com claacuteusula de inalienabilidade que haacute de constar no registro imobiliaacuterio para ser eficaz perante o exequente e minimizar o risco de fraude A propoacutesito eis a redaccedilatildeo do art 1911 do Coacutedigo Civil lsquolsquoA claacuteusula de inalienabilidade imposta aos bens por ato de liberalidade implica impenhorabilidade e incomunicabilidaderdquo

100 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MEDINA Joseacute Miguel Garcia

Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 1 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 p 736 101 STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014 102 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 824 103 Ibid p 824 104 Ibid p 825

43

O inciso II por sua vez estabelece que satildeo impenhoraacuteveis os bens moacuteveis os

pertences e as utilidades domeacutesticas da residecircncia do executado Todavia excepcionam-se os

bens dessa natureza que sejam de elevado valor ou que ultrapassem as necessidades comuns

correspondentes a um meacutedio padratildeo de vida

A jurisprudecircncia natildeo eacute paciacutefica sobre o assunto logo natildeo exista uma relaccedilatildeo de bens

que podem ser atingidos pela penhora Abrindo margem para as mais variadas decisotildees

O STJ jaacute considerou impenhoraacuteveis aparelho de televisatildeo a cores mesa de centro passadeira raacutedio toca-fitas gravador microondas ar-condicionado um freezer um microcomputador com acessoacuterios uma impressora etc Poderatildeo ser penhorados porque ultrapassam o padratildeo-meacutedio aparelhos de TV mais sofisticados o segundo aparelho de televisatildeo a segunda geladeira aparelhos de ar-condicionado que satildeo verdadeiras peccedilas de design moacuteveis antigos que se transformam em peccedilas de decoraccedilatildeo faqueiro de prata adega climatizada etc Em entendimento de caraacuteter ainda mais geneacuterico jaacute restou consignado em determinado precedente que a proteccedilatildeo natildeo abrangeria apenas os bens indispensaacuteveis agrave moradia mas tambeacutem aqueles usualmente encontrados em um lar105

Ademais o inciso III do art 833 do CPC traz a impenhorabilidade dos vestuaacuterios bem

como os pertences de uso pessoal do executado salvo se de elevado valor

Segundo Fredie Didier et al106 o dispositivo possui dois propoacutesitos

de um lado preservar a dignidade do executado com a proteccedilatildeo de bens moacuteveis importantes para a sua sobrevivecircncia digna como o vestuaacuterio aparelho celular reloacutegio e os bens relacionados agrave sua higiene pessoal de outro lado a regra visa prestigiar a boa-feacute processual impedindo a execuccedilatildeo mesquinha e abusiva com a penhora de bens de pequeno ou nenhum valor como um pente ou uma bota

O inciso IV do art 833 do CPC consagra uma das mais importantes modalidades a

impenhorabilidade relativa aos rendimentos de natureza alimentar ldquoTrata-se de regra que

possui o claro propoacutesito de proteger o executado garantindo-lhe o recebimento de valores que

servem ao pagamento das despesas relacionadas agrave sua sobrevivecircncia digna e agrave da sua famiacuteliardquo 107

Jaacute inciso V do art 833 do CPC torna impenhoraacuteveis os livros as maacutequinas as

ferramentas os utensiacutelios os instrumentos ou outros bens moacuteveis necessaacuterios ou uacuteteis ao

exerciacutecio de qualquer profissatildeo 105 Ibid p 826 106 Ibid p 827 107 Ibid p 828

44

Por forccedila do paraacutegrafo 3ordm do art 833 satildeo igualmente impenhoraacuteveis os equipamentos

implementos e maacutequinas agriacutecolas pertencentes agrave pessoa fiacutesica ou a empresa individual

produtora rural Rodrigo Mazzei e Sarah Merccedilon108 esclarecem que

Tem assento na noccedilatildeo de que a dignidade estende-se tambeacutem ao exerciacutecio da profissatildeo em si mesma e tambeacutem por representar a forma por excelecircncia de que dispotildee o executado para continuar a receber sua remuneraccedilatildeo e por conseguinte prover seu sustento e de sua famiacutelia Trata-se tambeacutem de aplicaccedilatildeo pontual da funccedilatildeo social da propriedade jaacute que protege os bens que permitem a circulaccedilatildeo de riquezas para a subsistecircncia do executado e se for o caso de sua famiacutelia

Forccediloso ressaltar ainda que a impenhorabilidade do inc V alcanccedila apenas os bens

moacuteveis de modo que eacute absolutamente possiacutevel que o imoacutevel em que o executado exerccedila sua

atividade profissional seja penhorado conforme a Suacutemula 451 do STJ ldquoEacute legiacutetima a penhora

da sede do estabelecimento comercialrdquo

O inciso VI do art 833 do CPC versa sobre a impenhorabilidade do seguro de vida

ldquoTrata-se de impenhorabilidade em favor do beneficiaacuterio do seguro e natildeo do segurado ateacute

porque o valor do seguro natildeo compotildee nem comporaacute o seu patrimocircnio (art794 do Coacutedigo

Civil1 ordm7)rdquo Dessa forma ldquoem uma execuccedilatildeo contra o segurado natildeo seraacute possiacutevel a penhora

do seguro de vida pois se trata de bem que natildeo lhe pertence nem mesmo em expectativardquo

De acordo com o inciso VII do art 833 do CPC satildeo impenhoraacuteveis os materiais

necessaacuterios para obras em andamento salvo se essas forem penhoradas Logo a obra pode

ser penhorada (art 862 do CPC) ldquoA regra como bem lembrou Araken de Assis lsquoestimula a

penhora da proacutepria obra inconclusa agrave qual os materiais acrescem e conseguintemente

valorizamrsquo 109

O art 833 VIII CPC julga impenhoraacutevel a pequena propriedade rural assim

definida em lei desde que trabalhada pela famiacutelia reproduzindo parte do art 5ordm XXVI CF

88116 que disciplina a impenhorabilidade do referido bem

A proteccedilatildeo do CPC eacute mais ampla do que a garantia prevista na Constituiccedilatildeo Federal

tendo em vista que a impenhorabilidade natildeo se restringe agraves execuccedilotildees de deacutebitos decorrentes

de sua atividade produtiva podendo ser alegada em toda e qualquer execuccedilatildeo ldquoAssim o 108 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CABRAL Antonio Passo

CRAMER Ronaldo (orgs) Comentaacuterios ao Novo Coacutedigo de Processo Civil Rio de Janeiro Forense 2015 p 1194

109 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 835

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imoacutevel natildeo pode ser penhorado na execuccedilatildeo de creacutedito rural concedido para estimular a

produccedilatildeo agriacutecola mas poderaacute ser penhorado na execuccedilatildeo do creacutedito concedido para a

aquisiccedilatildeo do imoacutevelrdquo 110

A nona modalidade de impenhorabilidade trata-se dos recursos puacuteblicos recebidos por

instituiccedilotildees privadas para aplicaccedilatildeo compulsoacuteria em educaccedilatildeo sauacutede ou assistecircncia social ldquoA

proteccedilatildeo eacute louvaacutevel e tutela toda a coletividade ao privilegiar o direito agrave educaccedilatildeo sauacutede e

assistecircncia social em detrimento do direito do credorrdquo

De acordo com o inciso X do art 833 do CPC eacute impenhoraacutevel ateacute o limite de

quarenta salaacuterios miacutenimos a quantia depositada em caderneta de poupanccedila

Eacute uma modalidade de impenhorabilidade relativa (o CPC73 a considerava absoluta)

tendo em vista que essa impenhorabilidade natildeo pode ser oposta na execuccedilatildeo de alimentos

independentemente da sua origem (art 833 sect 2ordm do CPC) Fredie Didier et al cita Araken de

Assis111 ao afirmar que

a regra soacute protege essa aplicaccedilatildeo financeira Se o valor estiver depositado em fundo de investimento por exemplo poderaacute ser penhorado Se o devedor tiver vaacuterias cadernetas de poupanccedila a impenhorabilidade aplica-se agrave soma de todas elas e natildeo a cada uma delas isoladamente do contraacuterio valores expressivos poderiam ser pulverizados em vaacuterias contas burlando a finalidade da regra que eacute a de proteger a populaccedilatildeo de baixa renda

Ademais satildeo tambeacutem impenhoraacuteveis por forccedila do inciso XI os recursos puacuteblicos do

fundo partidaacuterio recebidos por partido poliacutetico nos termos da lei Essa modalidade de

impenhorabilidade ldquose restringe aos recursos puacuteblicos do fundo partidaacuterio Recursos de

origem privada recebidos pelo partido poliacutetico poderatildeo ser penhoradosrdquo 112 O processualista

Fredie Didier et al113 assevera que

Assim a impenhorabilidade foi estabelecida no intuito de impedir que os diretoacuterios nacionais de partidos poliacuteticos respondam por diacutevida dos diretoacuterios

110 Ibid p 836 111 DIDIER JR Fredie et al apud ASSIS Araken de Manual da execuccedilatildeo 11ordm ed cit p 225 Assim

tambeacutem REDONDO Bruno Garcia LOJO Maacuterio Vitor Suarez Penhora cit p 117 BUENO Cassio Scarpinella Curso sistematizado de Direito Processual Civil v 3 cit p 228 GIANNICO Mauriacutecio As novas reformas do CPC e de outras normas processuais Mauriacutecio Giannico e Viacutetor Joseacute de Mello Monteiro (coord) Satildeo Paulo Saraiva 2009 p 1 OS Em sentido diverso estendendo a impenhorabiacutelidade aos depoacutesitos feitos ateacute esse valor em CDB CDI fundos de renda fixa ou de accedilotildees RODRIGUES Marcelo Abelha Manual de execuccedilatildeo civil 3deg ed cit p 101

112 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 839

113 Ibid p 839

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estaduaismunicipais - sobretudo em razatildeo das vaacuterias decisotildees judiciais que determinaram penhora de recursos do fundo partidaacuterio de alguns partidos

Por fim o inciso XII do artigo 833 do CPC trata sobre a impenhorabilidade dos

creacuteditos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias sob o regime de incorporaccedilatildeo imobiliaacuteria

vinculados agrave execuccedilatildeo de obra ldquoO objetivo dessa modalidade eacute evitar que diacutevidas do

incorporador possam consumir os recursos que seriam utilizados na realizaccedilatildeo da obra em

prejuiacutezo dos adquirentes de unidades autocircnomasrdquo 114

O professor Misael Montenegro Filho115 aduz sobre que ldquoao estabelecer a

impenhorabilidade dos creacuteditos oriundos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias o novo CPC

protegeu os valores destinados agrave execuccedilatildeo da obra e agrave entrega das unidades imobiliaacuterias aos

adquirentes assegurando assim a execuccedilatildeo da promessa contratualrdquo

Importante frisar ainda que a Lei nordm 8009 1990 instituiu a impenhorabilidade do

imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar por qualquer diacutevida salvo as exceccedilotildees dos

seus arts 3ordm e 4ordm

A referida lei dispotildee que Para os efeitos de impenhorabilidade considera-se

residecircncia um uacutenico imoacutevel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia

permanente (art 5ordm)

O processualista baiano Fredie Didier et al116 assevera que

A lei propotildee-se a proteger imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar nos termos acima expostos A CF 88 ampliou o conceito de entidade familiar para abranger a famiacutelia monoparental e a uniatildeo estaacutevel Mas deve considerar-se aiacute compreendidos os irmatildeos que vivem juntos e a uniatildeo homossexual Ateacute o solteiro estaacute abrangido pela impenhorabilidade se reside soacute no imoacutevel - isso em nome da proteccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana e da moradia digna Na verdade houve uma mudanccedila de compreensatildeo acerca do sentido da proteccedilatildeo de proteccedilatildeo da famiacutelia agrave proteccedilatildeo da moradia indispensaacutevel agrave preservaccedilatildeo da dignidade da pessoa

114 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o

novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 388

115 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MONTENEGRO FILHO Misael Novo Coacutedigo de Processo Civil Comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Atlas 2016 p 752

116 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 840-841

47

O STJ jaacute consolidou esse entendimento na suacutemula nordm 364 O conceito de

impenhorabilidade de bem de famiacutelia abrange tambeacutem o imoacutevel pertencente a pessoas

solteiras separadas e viuacutevas

Entretanto se o casal ou entidade familiar possuir vaacuterios imoacuteveis utilizados como

residecircncia a impenhorabilidade recairaacute sobre o de menor valor (art 5ordm paraacutegrafo uacutenico) ldquoEacute o

que ocorre por exemplo quando a famiacutelia se divide em mais de uma cidade por motivos

profissionaisrdquo 117

Forccediloso observar ainda que a impenhorabilidade do imoacutevel familiar eacute relativa jaacute que

natildeo pode ser oposta a qualquer creacutedito O art 3ordm da Lei n 8009 1990151 em que pode ser

penhorada a residecircncia da famiacutelia (exemplo execuccedilatildeo de alimentos para cobranccedila de taxas

devidas em funccedilatildeo do imoacutevel familiar etc)

Resta claro que o artigo 833 do CPC ao disciplinar as hipoacuteteses de impenhorabilidade

possui o escopo de proteger o princiacutepio da dignidade humana Entretanto algumas claacuteusulas

natildeo possuem proteccedilatildeo absoluta ldquoa sua relativizaccedilatildeo a depender do caso sob exame deve ser

realccedilada agrave medida que a dignidade resguardada e protegida pelo sistema processual-

constitucional natildeo se limita ao executadordquo 118 Ademais ldquoEacute premente advertidamente que a

dignidade do credor tambeacutem seja garantida em juiacutezo tendo como norte pois os princiacutepios da

proporcionalidade e razoabilidaderdquo 119

117 Ibid p 841 118 Ibid p 752 119 Ibid p 752

48

4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA

ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE

HUMANA DO EXECUTADO

41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE

EFETIVACcedilAtildeO

Como jaacute exposto em linhas preteacuteritas nos meios executivos tiacutepicos as medidas

executivas satildeo determinadas pela lei ou seja o oacutergatildeo pode aplicar somente as medidas

tipificadas no ordenamento juriacutedico No entanto ao se tratar das medidas executivas atiacutepicas

eacute necessaacuterio que haja um limite na atuaccedilatildeo realizada pelo juiz

O poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo poder ser realizado de maneira indiscriminada haacute

pressupostos e premissas a serem observadas Dessa forma a primeira premissa eacute no sentindo

de que a medida executiva atiacutepica natildeo pode ser a primeira medida a ser invocada ldquomuito ao

reveacutes a regra do nosso sistema continua a ser o da tipicidade dos meios executivos soacute que

agora temperado pelo sistema atiacutepicordquo 120 O processualista Thiago Rodovalho explica que

ldquo() os meios atiacutepicos natildeo satildeo prima ratio e sim a ultima ratio eacute dizer esgotados e

frustrados os meios executivos tiacutepicos e ordinaacuterios pode-se em tese valer-se do sistema

atiacutepicordquo121

Dessa forma nos casos de execuccedilatildeo que tenha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

natildeo deve ser aplicado de logo as medidas indutivas e coercitivas Apenas apoacutes frustradas as

medidas ldquonaturaisrdquo pode-se passar agrave aplicaccedilatildeo das medidas atiacutepicas

Uma segunda premissa diz a respeitos dos meios de pressatildeo para compelir o devedor a

adimplir com o seu deacutebito ldquoEssa segunda premissa decorre inclusive de imperiosidade

loacutegica de nada adianta a medida de pressatildeo se a obrigaccedilatildeo natildeo tem como ser adimplida pelo

devedorrdquo 122

Para Thiago Rodovalho123 ldquoIsso quer significar que esgotados e frustrados os meios

tiacutepicos o juiz se valeraacute dos meios atiacutepicos se eles forem potencialmente haacutebeis a estimular ou

120 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da

atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018

121 Ibid sem paginaccedilatildeo 122 Ibid sem paginaccedilatildeo 123 Ibid sem paginaccedilatildeo

49

forccedilar o cumprimento o que pressupotildee sua possibilidade quando entatildeo eles poderatildeo ser

eficazesrdquo

Logo nas obrigaccedilotildees de pagar quantia se houver a real demonstraccedilatildeo da

impossibilidade financeira do devedor seria um constrangimento inuacutetil e desnecessaacuterio a

imposiccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo para forccedilar o cumprimento

Por isso as medidas atiacutepicas devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o

esgotamento das medidas tiacutepicas e a possibilidade de cumprimento de cumprimento da

obrigaccedilatildeo

Ademais superadas as supracitadas premissas e o oacutergatildeo julgador vislumbrando a

necessidade da aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo se faz necessaacuterio que um conjunto de

postulados e princiacutepios rejam a atuaccedilatildeo do oacutergatildeo julgador servindo de norte para a escolha da

medida executiva mais adequada ldquoDe modo geral a escolha deve pautar-se nos postulados da

proporcionalidade da razoabilidade (art8ordm CPC) e da proibiccedilatildeo de excesso bem como nos

princiacutepios da eficiecircncia e da menor onerosidade da execuccedilatildeordquo 124

O professor Fredie Didier et al125 eacute categoacuterico ao citar Humberto Aacutevila

Segundo Humberto Aacutevila o postulado da proporcionalidade se manifesta nas situaccedilotildees em que haacute uma relaccedilatildeo de causalidade entre dois elementos empiricamente discerniacuteveis um meio e um fim de tal sorte que se possa proceder aos trecircs exames fundamentais o da adequaccedilatildeo (o meio promove o fim) o da necessidade (dentre os meios disponiacuteveis e igualmente adequados para promover o fim natildeo haacute outro meio menos restritivo do(s) direito(s) fundamental (is) afetado(s)) e o da proporcionalidade em sentido estrito (as vantagens trazidas pela promoccedilatildeo do fim correspondem agraves desvantagens provocadas pela adoccedilatildeo do meio)

O juiz ao aplicar a medida executiva atiacutepica ao caso concreto deve ter seu

embasamento no princiacutepio da proporcionalidade para saber se a medida a ser tomada eacute a

melhor opccedilatildeo ao caso sub judice ldquoO exame de proporcionalidade aplica-se sempre que

houver uma medida concreta destinada a realizar uma finalidaderdquo 126

Em verdade a aplicaccedilatildeo do princiacutepio da proporcionalidade eacute imprescindiacutevel na adoccedilatildeo

dos meios executivos atiacutepicos tendo em vista que ldquo() tais medidas em especial quando de

124 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111 125 DIDIER JR Fredie et al apud AVILA Humberto Teoria dos princiacutepios da definiccedilatildeo agrave aplicaccedilatildeo

dos princiacutepios juriacutedicos 16 ed Satildeo Paulo Malheiros 2015 p 205 126 DIDIER JR Fredie et al op cit p 111

50

natureza coercitiva podem restringir direitos do devedor e incidir diretamente sobre sua

pessoardquo127 Logo ainda que o princiacutepio da efetividade da tutela executiva seja um direito

fundamental o mesmo ldquo() deve ser compatibilizado com direitos fundamentais do

executado para que a sua dignidade humana seja preservadardquo 128

Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Neves129 afirma que em nome do princiacutepio da

proporcionalidade o juiz deveraacute

() ponderar no caso concreto as vantagens praacuteticas da adoccedilatildeo de cada medida executiva atiacutepica em especial as de natureza coercitiva e as desvantagens de sua adoccedilatildeo levando em conta a possibilidade de a medida criar uma limitaccedilatildeo excessiva ao exerciacutecio de direito fundamental do executado

Outro princiacutepio que o oacutergatildeo julgador deve se ater ao escolher a medida executiva

atiacutepica eacute o da razoabilidade Segundo Fredie Didier et al 130 o princiacutepio (ou postulado)131 se

manifesta de trecircs formas

a) como dever de equidade a exigir a harmonizaccedilatildeo da norma geral com o caso individual impondo a consideraccedilatildeo daquilo que normalmente acontece em detrimento do que eacute extraordinaacuterio e tambeacutem impondo a consideraccedilatildeo das especificidades do caso concreto ante a generalidade da norma b) como dever de congruecircncia a exigir a harmonizaccedilatildeo das normas com suas condiccedilotildees externas de aplicaccedilatildeo (isto eacute com a realidade com base em que foram editadas) c) como dever de equivalecircncia a exigir uma relaccedilatildeo de equivalecircncia entre a medida adotada e o criteacuterio que a dimensiona

Logo ldquo() o princiacutepio da razoabilidade deve nortear a atuaccedilatildeo do juiz na adoccedilatildeo das

medidas executivas atiacutepicas previstas no art 139 IV do Novo CPCrdquo 132 tendo em vista que

ldquo() mesmo medidas que pelo princiacutepio da proporcionalidade podem se mostrar

abstratamente possiacuteveis de adoccedilatildeo no caso concreto podem se mostrar inadequadas e

irrazoaacuteveisrdquo 133

127 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Medidas executivas atiacutepicas na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de

pagar quantia certa art 139 IV do novo CPC Revista de Processo v 42 n 265 mar 2017 p 14 128 Ibid p 14 129 Ibid p 14 130 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111-112 131 Segundo Fredie Didier et al o postulado eacute uma norma que atua sobre a aplicaccedilatildeo de outras normas

A proporcionalidade e a razoabilidade seriam postulados normativos e natildeo princiacutepios segundo essa concepccedilatildeo 132 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo op cit p 14 133 Ibid p 14

51

Ademais conforme dispotildee o postulado da proibiccedilatildeo de excesso ldquoa realizaccedilatildeo de uma

regra ou princiacutepio constitucional natildeo pode conduzir agrave restriccedilatildeo a um direito fundamental que

lhe retire um miacutenimo de eficaacuteciardquo 134

A proibiccedilatildeo de excesso deveraacute sempre ser suscitada quando um direito fundamental

houver sido violado a ponto do direito fundamental sofrer violaccedilatildeo excessiva Ademais ldquoesse

postulado natildeo se confunde com o da proporcionalidade porque ele dispensa os exames da

adequaccedilatildeo (relaccedilatildeo meiofim) da necessidade (exigibilidade) ou da proporcionalidade em

sentido estrito (ponderaccedilatildeo entre vantagens e desvantagens)rdquo 135

Logo ldquopouco importa a relaccedilatildeo meiofim ou a exigibilidade da medida ou ainda a

ponderaccedilatildeo com outro direito fundamental eventualmente em jogo aqui se analisa apenas a

eficaacutecia de um determinado direito fundamentalrdquo 136

O princiacutepio da eficiecircncia tem previsatildeo constitucional no art 37 e previsatildeo

infraconstitucional no art 8ordm do CPC15 O referido princiacutepio determina que o processo seja

conduzido de forma eficiente pelo oacutergatildeo jurisdicional

Entende-se que eficiente eacute a atuaccedilatildeo que utilize adequadamente os meios necessaacuterios

para que se atinjam os fins almejados O oacutergatildeo jurisdicional na escolha dos meios a serem

utilizados para a obtenccedilatildeo dos fins

a) deve escolher aqueles que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo (deve evitar meios que promovam resultados insignificantes) b) deve escolher meios que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado (natildeo se pode escolher um meio de resultado duvidoso) c) natildeo pode escolher um meio que produza muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscado 137

O juiz deveraacute igualmente analisar o princiacutepio da menor onerosidade da execuccedilatildeo que

eacute previsto pelo art 805 do CPC ldquoArt 805 Quando por vaacuterios meios o exequente puder

promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o

executadordquo

134 134 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 112 135 Ibid p 112 136 Ibid p 112 137 Ibid p 112-113

52

Logo ldquohavendo duas opccedilotildees igualmente eficazes para permitir alcanccedilar o resultado

pretendido (satisfaccedilatildeo do creacutedito) deveraacute o oacutergatildeo julgador valer-se daquela que menos onere

a situaccedilatildeo do executadordquo 138

O dito princiacutepio impede o comportamento abusivo do exequente que possa beneficiar-

se do meio mais danoso ao executado protegendo dessa forma a lealdade e a eacutetica

processual

Os postulados e princiacutepios analisados em linhas preteacuteritas impotildeem ao oacutergatildeo julgador a

observacircncia de alguns criteacuterios para a escolha da medida executiva atiacutepicas a ser utilizada no

caso concreto

Primeiramente a medida executiva atiacutepica deveraacute ser adequada ldquoO criteacuterio da

adequaccedilatildeo impotildee que juiz considere abstratamente uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida

executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia

a gerar o resultadordquo 139 Nesse primeiro momento o juiz deveraacute observar sob a perspectiva do

credor qual medida teraacute o condatildeo de gerar o resultado mais efetivo

Segundo Fredie Didier et al140 o criteacuterio da adequaccedilatildeo eacute

() fortemente inspirado pelo postulado da proporcionalidade e pelo princiacutepio da eficiecircncia na parte em que esse princiacutepio determina a escolha de meios que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo e que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado

Ademais a medida adotada pelo oacutergatildeo julgador deveraacute ser necessaacuteria ldquoEsse criteacuterio

impotildee um limite agrave atuaccedilatildeo judicial funcionando como uma espeacutecie de contrapeso ao criteacuterio

da adequaccedilatildeo Aqui deve-se levar em conta a posiccedilatildeo do devedorrdquo141

O juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental agrave execuccedilatildeo e determinar

uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute necessaacuterio que a

medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado O criteacuterio da necessidade

estabelece que ldquonatildeo se pode ir aleacutem do necessaacuterio para alcanccedilar o propoacutesito almejado Deve

138 Ibid p 113 139 Ibid p 113 140 Ibid p 113 141 Ibid p 114

53

pois o oacutergatildeo julgador determinar o meio executivo na medida do estritamente necessaacuterio para

proporcionar a satisfaccedilatildeo do creacutedito ndash nem menos nem maisrdquo 142

O referido criteacuterio possui forte influecircncia dos postulados da proibiccedilatildeo do excesso e da

razoabilidade assim como do princiacutepio da menor onerosidade para o executado Assevera

Fredie Didier et al143 que

Natildeo eacute razoaacutevel por exemplo impor como primeira opccedilatildeo medida coercitiva a ser suportada pelo agente puacuteblico pelo simples fato de o juiz pressupor que o ente puacuteblico ao qual ele eacute vinculado iraacute descumprir determinada ordem judicial - o descumprimento natildeo pode ser visto como algo ordinaacuterio ou cotidiano (razoabilidade como dever de equidade) Tampouco eacute razoaacutevel eleger a prisatildeo civil como meacutetodo prioritaacuterio para compelir o executado ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer (razoabilidade como dever de equivalecircncia) Aleacutem disso eacute vedada por exemplo a imposiccedilatildeo de multa coercitiva para compelir o executado a emitir declaraccedilatildeo de vontade uma vez que haacute previsatildeo expressa de medida tiacutepica capaz de proporcionar o mesmo resultado sem sacrifiacutecio para o devedor (art 501 CPC)

A afirmaccedilatildeo feita por Bonavides144 em 1997 sobre a adequaccedilatildeo e a necessidade

continua atual sobre os motes

O meio empregado pelo legislador deve ser adequado e necessaacuterio para alcanccedilar o objetivo procurado O meio eacute adequado quando com seu auxiacutelio se pode alcanccedilar o resultado desejado eacute necessaacuterio quando o legislador natildeo poderia ter escolhido outro meio igualmente eficaz mas que natildeo limitasse ou limitasse de maneira menos sensiacutevel o direito fundamental

Por fim a medida deve conciliar os interesses contrapostos ldquoO magistrado deve

ponderar os interesses em jogo aplicando a proporcionalidade em sentido estrito de modo

que as vantagens da utilizaccedilatildeo da medida atiacutepica escolhida superem as vantagens de seu usordquo 145

Esse criteacuterio natildeo privilegia nem o credor nem o devedor e sim a soluccedilatildeo mais

equilibrada e que atenda da melhor forma aos valores em conflito ldquoTrata-se de criteacuterio

inspirado nos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade bem como no princiacutepio da

142 Ibid p 114 143 Ibid p 114 144 BONAVIDES Paulo Curso de Direito Constitucional 7ordm ediccedilatildeo Satildeo Paulo Ed Malheiros 1997

p 372 145 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 114-115

54

eficiecircncia na parte em que impotildee ao juiz evitar a escolha do meio executivo que produza

muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscadordquo 146

Cada um dos criteacuterios supracitados devem ser considerados pelo juiz ao aplicar as

medidas executivas atiacutepicas ao caso concreto Para Fredie Didier et al147 as medidas como

retenccedilatildeo de CNH passaporte ou cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado como

forma de pressionaacute-lo ao pagamento da diacutevida pecuniaacuteria natildeo satildeo possiacuteveis

Essas natildeo satildeo medidas adequadas ao atingimento do fim almejado (o pagamento de quantia) - natildeo haacute propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente Tais medidas soam mais como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-lo ao cumprimento da ordem judicial - e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a utilizaccedilatildeo de meios sancionatoacuterios pelo magistrado mas apenas de meios de coerccedilatildeo indireta e sub-rogatoacuterios

Ainda que adequadas fossem a retenccedilatildeo de CNH e do passaporte no corte de fornecimento de aacutegua natildeo parecem ser medidas necessaacuterias (no sentido de exigiacuteveis) uma vez que outras medidas podem em tese ser utilizadas sem causar igual gravame ao executado - como por exemplo a simples restriccedilatildeo do uso de cartotildees de creacutedito A retenccedilatildeo de documentos pessoais eacute medida que termina por restringir a liberdade de ir e vir do executado mostrando-se a princiacutepio natildeo-razoaacutevel por ir de encontro ao dever de equivalecircncia e desproporcional por restringir demais o direito agrave liberdade em favor do direito de creacutedito pecuniaacuterio do exequente

O processualista baiano et al148 cita tambeacutem outro exemplo de medida atiacutepica que natildeo

atingem os criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade

Tampouco parece adequada em princiacutepio determinaccedilatildeo de corte de energia eleacutetrica de todo o preacutedio onde funciona serviccedilo puacuteblico administrativo como forma de pressionar o ente federado a cumprir ordem de nomeaccedilatildeo de candidato em concurso puacuteblico Natildeo parece haver relaccedilatildeo meiofim entre uma coisa e outra Tambeacutem natildeo eacute possiacutevel enxergar essa medida como necessaacuteria no sentido de ser a menos gravosa para o devedor - observe que se trata de medida que uma vez aplicada ensejaria restriccedilatildeo de funcionamento em toda a reparticcedilatildeo puacuteblica em prejuiacutezo de serviccedilos puacuteblicos essenciais ao funcionamento da Administraccedilatildeo o que aleacutem de ser excessivamente gravoso parece natildeo se conformar agrave necessidade de ponderaccedilatildeo dos interesses em jogo - aleacutem de afetar a um sem-nuacutemero de pessoas tomadoras desses serviccedilos

Ademais eacute sabido que toda e qualquer decisatildeo judicial precisa ser fundamentada Ao

se tratar das medidas executivas atiacutepicas o papel da fundamentaccedilatildeo se torna ainda mais

146 Ibid p 115 147 Ibid p 115 148 Ibid p 116

55

importante tendo em vista que eacute pela fundamentaccedilatildeo da decisatildeo que se poderaacute controlar a

adequaccedilatildeo e necessidade da medida atiacutepica

Pelo fato das medidas executivas atiacutepicas derivarem de dispositivos normativos

considerados claacuteusulas gerais propiacutecias as mais variadas interpretaccedilotildees eacute de extrema

importacircncia que o oacutergatildeo julgador fundamente sua decisatildeo

Logo ldquodeve o juiz na fundamentaccedilatildeo decisoacuteria expor racionalmente os motivos da

sua escolha demonstrando com atenccedilatildeo ao art 489 sect 1ordm CPC de que modo a sua opccedilatildeo

atende os criteacuterios da adequaccedilatildeo necessidade e proporcionalidade em sentido estrito ()rdquo 149

Dessa forma os princiacutepios da proporcionalidade e razoabilidade servem para delimitar

o alcance das claacuteusulas gerais de efetivaccedilatildeo fazendo com que o oacutergatildeo julgador se atenha aos

criteacuterios da adequaccedilatildeo e necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao caso

concreto

42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO

EXECUTADO

A entrada em vigor do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 aflorou ainda mais uma

discussatildeo essencial para os processualistas do seacuteculo XXI qual eacute o verdadeiro protagonista do

processo civil

Para os que defendem o ldquoautoritarismo processualrdquo o verdadeiro protagonista do

processo civil eacute o oacutergatildeo judiciaacuterio que em nome do desempenho efetivo de suas funccedilotildees lhes

eacute permitido dilatar os poderes que diga-se de jaacute passagem jaacute compotildeem um vastiacutessimo

arsenal150

Jaacute os ldquogarantistasrdquo 151 do processo civil acreditam que os verdadeiros protagonistas satildeo

as partes do processo e seus direitos e garantias devem ser estritamente preservados

Devido a essa disputa de quem possui maior protagonismo no processo as mudanccedilas

ocorridas no coacutedigo processual vigente quanto agraves medidas executivas atiacutepicas despertaram

149 Ibid p 117 150 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos

atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04102018

151 O processualista Araken de Assis acredita que o termo garantista eacute descabido tendo em vista que remete ao processo penal

56

maior celeuma do que qualquer outra modificaccedilatildeo trazida pelo CPC15 Afinal as referidas

medidas acirravam ainda mais a disputa pelo protagonismo processual

O fato de o CPC15 dispor no art 139 IV que o juiz poderaacute decretar todas as medidas

indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o

cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo

pecuniaacuteria levou boa parte da doutrina e dos juiacutezes a acreditar que teria pleno direito de

aplicar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo Entretanto muitos se esqueceram do outro lado

da moeda esqueceram que a dignidade humana do executado tambeacutem eacute um direito

fundamental e natildeo pode ser violado

Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa152

acreditam que

() natildeo parece producente elencar um rol abstrato das medidas que poderiam ser aplicadas pelo juiz a tiacutetulo do art 139 IV CPC Afinal se busca a efetividade da execuccedilatildeo e esta soacute pode ser identificada agrave luz das especificidades da situaccedilatildeo concreta Ideal eacute enveredar pela loacutegica modular (adequaccedilatildeo ao caso) natildeo pela geneacuterica (soluccedilotildees abstratas de pretensa utilidade universal)

Em razatildeo de o dispositivo apresentar uma gama de poderes tatildeo amplos agrave disposiccedilatildeo do

oacutergatildeo julgador sem nenhuma estipulaccedilatildeo de um procedimento legal previamente definido para

que estabeleccedila as condiccedilotildees de sua aplicaccedilatildeo em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo eacute

necessaacuterio que em razatildeo do princiacutepio da dignidade humana natildeo busque definir o que o

dispositivo permite mas de definir o que ele natildeo permite ldquoOu seja propotildee-se a sua

compreensatildeo por exclusatildeo Afinal se ele tem potencialidade para promover a efetividade da

tutela tambeacutem pode provocar lesotildees E como em direito os fins natildeo justificam os meios

ressalta como prioritaacuteria a necessidade de estabelecer limitesrdquo 153

O art 789 do CPC15 disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial e eacute

categoacuterico ao dispor que ldquoo devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para

152 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

153 Ibid sem paginaccedilatildeo

57

o cumprimento de suas obrigaccedilotildees salvo as restriccedilotildees estabelecidas em leirdquo Logo a

execuccedilatildeo somente poderaacute incidir sobre os bens do devedor e natildeo sobre a sua pessoa

Como eacute sabido a Lex Poetelia Papiria de 326 aC foi o primeiro marco legal da

humanizaccedilatildeo das cobranccedilas de diacutevidas abolindo a imposiccedilatildeo ao devedor de castigos

vexatoacuterios e ateacute da pena de morte154

Afinal no direito romano antigo a cobranccedila de diacutevidas poderia recair sobre a pessoa

do devedor que respondia com sua liberdade e ateacute mesmo com seu proacuteprio corpo permitindo

a lei que repartissem tantos pedaccedilos do corpo do devedor quantos fossem seus credores

Nesse sentindo leciona o professor Guilherme Pupe da Noacutebrega155 que

Vem de longe a evoluccedilatildeo no sentido de fazer a responsabilidade por uma obrigaccedilatildeo migrar da pessoa do devedor para seu patrimocircnio Merecem registro especiacutefico como marcos histoacutericos remotos a Lex Poetelia Papiria de 326 aC que aboliu o nexum e possibilidade de escravidatildeo do devedor como garantia da obrigaccedilatildeo e a pignoris capio ou ldquoaccedilatildeo por tomada de penhorrdquo que instituiu a possibilidade de o credor tomar parcela dos bens do devedor como forma de assegurar o adimplemento da diacutevida Aqueles institutos culminariam seacuteculo depois no artigo 789 do CPC de 2015 a consagrar que o devedor responda pela satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo com seus bens presentes e futuros observadas as restriccedilotildees impostas pelas impenhorabilidades legais

Logo o avanccedilar da civilizaccedilatildeo marcou o deslocamento da responsabilidade por

diacutevidas saindo do corpo do devedor para o seu patrimocircnio tendo em vista que a vida

humana a liberdade e a integridade fiacutesica satildeo valores inalienaacuteveis natildeo podendo ser

sacrificadas em benefiacutecio de obrigaccedilotildees pecuniaacuterias 156

Entretanto eacute sabido que a responsabilidade patrimonial eacute excepcionada pela prisatildeo

civil do devedor de verba alimentiacutecia resquiacutecio da responsabilidade pessoal romana

154 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt

httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018

155 NOacuteBREGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139 IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018

156 Ibid sem paginaccedilatildeo

58

No entanto haacute uma justificativa para isso Segundo o processualista Guilherme Pupe

da Noacutebrega157

Eacute que a par de a prisatildeo civil encontrar previsatildeo constitucional no inciso LXVII do artigo 5ordm o raciociacutenio eacute o de que o direito do alimentante agrave liberdade de locomoccedilatildeo cede diante dos direitos agrave vida e agrave dignidade titularizados pelo alimentando e resguardados pelos alimentos Foi esse mesmo raciociacutenio aliaacutes que justificou no passado a ediccedilatildeo da suacutemula 309 pelo STJ agora positivada pelo artigo 528 sect 7ordm que limita a modalidade coercitiva agraves trecircs uacuteltimas prestaccedilotildees vencidas e agraves prestaccedilotildees vincendas A ideia eacute que tendo o alimentando subsistido a despeito do natildeo-pagamento de prestaccedilotildees mais antigas essas verbas teriam perdido o caraacuteter alimentar que na equaccedilatildeo antes apresentada justificaria a prisatildeo civil do alimentante Daiacute por que aqueles valores antigos remanescem exigiacuteveis mas somente pela via da expropriaccedilatildeo

Essa ressalva eacute necessaacuteria tendo em vista que a adoccedilatildeo de teacutecnica de execuccedilatildeo

indireta para incursatildeo radical na esfera de direitos do executado notadamente direitos

fundamentais quando carente de respaldo constitucional natildeo merece acolhimento sob

risco de se atentar contra o devido processo legal (artigo 5ordm LIV da Constituiccedilatildeo)

Como afirma o autor Bruno Dantas158 ldquoembora inexistam estatiacutesticas que permitam

comparaccedilotildees natildeo eacute desarrazoado intuir que os iacutendices de inadimplecircncia despeccedilam na razatildeo

inversa da incidecircncia das ordens judiciais sobre o corpo e a liberdade do devedorrdquo Entretanto

eacute natildeo possiacutevel adotar toda e qualquer medida executiva atiacutepica em nome da efetividade da

execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que se saiba os limites da sua aplicaccedilatildeo

Dessa forma instrumentos que permitam o cumprimento forccedilado de contratos e o pagamento

de diacutevidas satildeo necessaacuterios contudo eacute preciso equilibrar essa exigecircncia com a liberdade e a

dignidade humana

Como citado alhures o art 139 IV ensejou decisotildees como a que determinou a

suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o

passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito em uma accedilatildeo se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo

extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

Na supracitada decisatildeo o princiacutepio da responsabilidade patrimonial natildeo estaacute sendo

efetivado para o que o devedor responda com os seus bens Afinal qual ligaccedilatildeo entre a

157 Ibid sem paginaccedilatildeo 158 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt

httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018

59

restriccedilatildeo de circulaccedilatildeo que diz com o direito de ir e vir (liberdade) com o pagamento de

diacutevidas que diz com a responsabilidade civil159

Ademais por que quem natildeo tem dinheiro para pagar diacutevidas natildeo pode dirigir Por que

natildeo tem condiccedilotildees para pagar o deacutebito natildeo pode ter passaporte Por que quem natildeo tem como

pagar o deve natildeo pode ter cartatildeo de creacutedito

Ao utilizar meios executivos atiacutepicos como os supracitados para compelir o devedor a

satisfazer a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria quando exauridos sem ecircxito os meios tradicionais de bens

penhoraacuteveis salvo quando existe qualquer indiacutecio concreto de ocultaccedilatildeo ou dissipaccedilatildeo de

bens eacute obrigar o devedor abrir matildeo da proteccedilatildeo da lei que lhe impede que seja tomado agrave forccedila

(art 833 CPC e demais disposiccedilotildees que tratam da impenhorabilidade)

Segundo Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa160

Claramente essa pressatildeo visa dar uma aparecircncia de voluntariedade agrave indicaccedilatildeo de bens impenhoraacuteveis pelo proacuteprio executado que na verdade soacute age assim por ser a uacutenica forma de ver-se livre de um grame imposto por medida indutiva despedida de qualquer necessidade ou adequaccedilatildeo Uma intoleraacutevel perversatildeo

Os autores afirmam ainda que o ldquodireito paacutetrio natildeo admite esta contraditio in terminis

sendo inaceitaacutevel a coexistecircncia de regra protetiva do executado com outra que concede ao

juiz poderes para forccedilar (ainda que indiretamente e veladamente) o executado a abrir matildeo

daquela proteccedilatildeordquo 161

Logo eacute cristalino que a suspensatildeo da CNH eacute uma forma incorreta de aplicar a medida

executiva atiacutepica para efetivar o direito fundamental a execuccedilatildeo tendo em vista que o uacutenico

objetivo da referida eacute pressionar o executado abrir matildeo de algum bem impenhoraacutevel para

levantar o dinheiro e cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

A retenccedilatildeo do passaporte igualmente natildeo possui qualquer relaccedilatildeo com a diacutevida do

executado e eacute somente uma forma de tentar pressiona-lo a dispor de um bem que natildeo pode

ser tomado agrave forccedila e puni-lo por natildeo ter cumprido voluntariamente com a sua obrigaccedilatildeo

159 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

160 Ibid sem paginaccedilatildeo 161 Ibid sem paginaccedilatildeo

60

Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa162

acreditam que tal medida eacute equivocada e se torna excessivamente onerosa ao executado

As mais variadas circunstacircncias relevem o equiacutevoco de tal medida aplicada assim genericamente Com efeito nada justifica reter o passaporte do executado e impedi-lo de viajar para o exterior quando eacute agraciado inclusive com todas as despesas pagas com presente sorteio ou precircmio (por completar tempo de serviccedilo ou atingir metas produtividade na sociedade empresaacuteria em que trabalha) Como todo custo eacute suportado por terceiro e por isso mesmo a sua realizaccedilatildeo pelo executado natildeo traria qualquer prejuiacutezo ao exequente e a retenccedilatildeo do passaporte natildeo seria injustificaacutevel

Paulo Antonio Papini163 acredita que natildeo tem a apreensatildeo de passaporte natildeo possui um

fundamento plausiacutevel tendo em vista que se o devedor natildeo pode viajar para saldar o deacutebito

tambeacutem natildeo poderia exercer atividades cotidianas

Com todo o respeito a quem pensa dessa forma o argumento eacute muito simploacuterio e natildeo precisamos sequer do Direito para derrubaacute-lo Com efeito se considerarmos que ndash ateacute mesmo pelas dimensotildees continentais do Brasil ndash natildeo eacute incomum que uma passagem para o Nordeste custe mais caro que um voo para Miami seria razoaacutevel entatildeo seguindo a linha argumentativa do Magistrado em questatildeo que se oficiasse aos oacutergatildeos reguladores da aviaccedilatildeo civil proibindo-se aquele devedor de fazer ateacute mesmo voos domeacutesticos Poder-se-ia ir mais longe jaacute que natildeo tem dinheiro para pagar suas diacutevidas certamente aquele devedor tambeacutem natildeo teria para comer fora de sua casa porque entatildeo natildeo determinar a expediccedilatildeo de ofiacutecio aos restaurantes proacuteximos agrave sua casa e determinar tambeacutem a proibiccedilatildeo de que ele fosse servidoatendido

O autor se questiona ainda ldquoSeraacute entatildeo que o Princiacutepio da Dignidade da Pessoa

Humana estaacute de mero enfeite em nossa Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ()rdquo 164 Tendo em vista

que ldquoa decisatildeo em comento viola diretamente o art 5ordm incisos XV LIII e LXIII da

Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ndash falamos do Direito de Ir e Virrdquo 165

Ademais o cancelamento do cartatildeo de creacutedito eacute mais uma forma de constranger e

compelir o executado a cumprir com a obrigaccedilatildeo de qualquer forma natildeo importando o que

precise fazer para conseguir saldar o deacutebito tendo em vista que a referida medida apresenta

162 Ibid sem paginaccedilatildeo 163 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo

pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018

164 Ibid sem paginaccedilatildeo 165 Ibid sem paginaccedilatildeo

61

qualquer adequaccedilatildeo com o fim desejado (reverter em pagamento para o exequente) Os

autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa afirmam que166

Reconhece-se que as razotildees da afirmaccedilatildeo ora questionada satildeo ateacute intuitivas mas eacute plenamente possiacutevel problematiza-las Ora natildeo se encontra qualquer justificativa idocircnea para que o juiz possa cancelar o contrato do executado com a administradora do cartatildeo de creacutedito (ou instituiccedilatildeo financeira) que natildeo tem qualquer relaccedilatildeo com o creacutedito exequendo muito menos como isso poderia impactar positivamente na execuccedilatildeo (senatildeo para pressionar o executado a dispor de bens impenhoraacuteveis) Ademais natildeo foram indicados sequer sinais de que o executado realiza gastos supeacuterfluos com o cartatildeo de creacutedito ndash natildeo que isso justificasse a medida pois o correto seria penhorar os esses bens (se duraacuteveis naturalmente) ao inveacutes de cancelar o cartatildeo de creacutedito

Logo as referidas medidas natildeo possuem qualquer relaccedilatildeo com o atingimento do fim

almejado (o pagamento de quantia) tendo em vista que natildeo haacute uma relaccedilatildeo meiofim entre

tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a

restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia

ao exequente

Dessa forma nota-se que as medidas de suspensatildeo da CNH retenccedilatildeo de passaporte e

bloqueio do cartatildeo de credito satildeo completamente inadequadas agrave realizaccedilatildeo a que se prestam

Afinal ldquotais medidas soam como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-

lo ao cumprimento da ordem judicial ndash e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a

utilizaccedilatildeo dos meios sancionatoacuterios pelo magistrado ()rdquo167

Como exposto em linhas preteacuteritas o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades

de aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e

razoaacutevel se atendo aos criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas

executivas atiacutepicas ao caso concreto sob pena de converter a medida em de indutiva para

punitiva

A utilizaccedilatildeo de medidas atiacutepicas como a suspensatildeo da carteira de motorista e o

passaporte do devedor abandona a regra da responsabilidade patrimonial e atingem em cheio

o nuacutecleo de direitos inerentes agrave condiccedilatildeo humana

166 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

167 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 115

62

O limite para a aplicaccedilatildeo de tais medidas deve ser a Constituiccedilatildeo Federal e sobretudo

os Direitos fundamentais nela expressos ldquoCom efeito natildeo haacute saiacuteda tampouco soluccedilatildeo eficaz

de um problema sem que se respeite a Lei e o Devido Processo Legal (por mais nobres que

sejam as intenccedilotildees)rdquo 168

Dessa forma a busca desenfreada pelo cumprimento das decisotildees judiciais em

especial na fase executiva natildeo pode ser realizada em sacrifiacutecio de direitos fundamentais O

Poder Judiciaacuterio natildeo pode resolver a crise do processo executoacuterio utilizando de medidas

arbitraacuterias com o propoacutesito de satisfazer obrigaccedilotildees pecuniaacuterias

Eis o dilema que se coloca diante do poder geral de efetivaccedilatildeo ele pode servir de

potente instrumento em prol da tutela jurisdicional executiva entretanto se manejado de

modo improacuteprio serviraacute de instrumento de puniccedilatildeo e humilhaccedilatildeo do executado169

Eacute notoacuterio que se amplamente aplicado o poder geral de efetivaccedilatildeo reduziria os

iacutendices de inadimplecircncia quiccedilaacute resolveria por completo a crise da execuccedilatildeo civil Entretanto

o retrocesso civilizatoacuterio seria irreparaacutevel

168 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo

pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018

169 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

63

5 CONCLUSAtildeO

Como funccedilatildeo jurisdicional que tem como objeto a efetivaccedilatildeo de direitos a execuccedilatildeo

deve sempre buscar a maior satisfaccedilatildeo possiacutevel concretizando integralmente o creacutedito do

exequente isto eacute realizando o direito fundamental agrave tutela executiva do credor Por isso a

adoccedilatildeo de meios executivos atiacutepicos incorporados pelo Coacutedigo de Processo Civil de 2015 por

meio do art139 IV em um primeiro momento podem ser consideradas vaacutelidas visto que

servem de instrumento para a satisfaccedilatildeo e asseguraccedilatildeo de direitos do credor

Entretanto para o oacutergatildeo julgador natildeo cometa arbitrariedades em nome do direito

fundamental agrave execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que seja definido certos limites na adoccedilatildeo do poder

geral de efetivaccedilatildeo

As medidas executivas atiacutepicas natildeo podem ser aplicadas de maneira indiscriminada

logo devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o esgotamento das medidas tiacutepicas e

a possibilidade de cumprimento da obrigaccedilatildeo

Partindo dessa premissa as medidas a serem adotadas pelo juiz no caso concreto

devem ter como baliza os princiacutepios da proporcionalidade e da razoabilidade para que natildeo

ultrapassem a responsabilidade patrimonial do devedor e incidida diretamente sobre sua

pessoa

Para que natildeo seja atingida a pessoa do executado ou seja para que o devedor natildeo

tenha sua dignidade humana viola eacute necessaacuterio que a medida atiacutepica seja adequada e

necessaacuteria

Logo o juiz deveraacute sempre estabelecer uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida

executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia

a gerar o resultado sem violar a dignidade humana do executado

Dessa o juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental a execuccedilatildeo e

determinar uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute

necessaacuterio que a medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado

As medidas que ultrapassam esses limites como a decisatildeo que apreendeu o

passaporte suspensatildeo a CNH e bloqueou o cartatildeo de creacutedito do devedor satildeo meramente

punitivas posto que essas natildeo satildeo as medidas mais adequadas para se atingir o fim almejado

pois natildeo existe propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado

64

uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo

geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente

Medidas como esta servem de embasamento para decisotildees arbitraacuterias e autoritaacuterias de

violaccedilatildeo dos direitos fundamentais transformando o poder geral de efetivaccedilatildeo em

instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com autorizaccedilatildeo judicial

Em suma o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades de aplicaccedilatildeo do poder

geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e razoaacutevel se atendo aos

criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao

caso concreto sob pena de punir a pessoa do executado violando a sua dignidade humana

em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo

65

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  • 1 INTRODUCcedilAtildeO
  • 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO
    • 25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO
      • 3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
        • 31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS
          • 311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15
            • 32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
            • 33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
            • 34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
              • 4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
                • 41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
                • 42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
                  • 5 CONCLUSAtildeO
                  • REFEREcircNCIAS
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SUMAacuteRIO

1 INTRODUCcedilAtildeO 5

2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL 7

21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL 7

22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL 8

23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL 11

24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO 17

25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO 20

3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 23

31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS 23

311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15 25

32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO 28

33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO 31

34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 36

4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 48

41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO 48

42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO 55

5 CONCLUSAtildeO 63

REFEREcircNCIAS 65

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

Art ndash Artigo

CPC15 ndash Coacutedigo de Processo Civil de 2015

CPC73 ndash Coacutedigo de Processo Civil de 1973

ENFAM ndash Escola nacional de formaccedilatildeo e aperfeiccediloamento de magistrados

HC ndash Habeas Corpus

STJ ndash Superior Tribunal de Justiccedila

5

1 INTRODUCcedilAtildeO

A prestaccedilatildeo jurisdicional natildeo costuma se findar apoacutes o encerramento da fase cognitiva

com a prolaccedilatildeo de uma sentenccedila de meacuterito Para que a referida prestaccedilatildeo se concretize eacute

imperioso que haja a satisfaccedilatildeo do deacutebito pelo devedor

Entretanto observa-se em diversos casos o inadimplemento da parte passiva

processual sendo necessaacuterio desenvolver a atividade executiva A referida atividade possui o

escopo de satisfazer direitos

Isso porque o processo natildeo eacute um fim em si mesmo sendo apenas um exerciacutecio da

jurisdiccedilatildeo estatal Dessa forma a razatildeo de ser do processo eacute o atingimento da sua finalidade

almejada que eacute a prestaccedilatildeo da tutela jurisdicional

Todavia como a tutela jurisdicional configura-se na obrigaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio

proteger e reparar os direitos lesionados ou ameaccedilados de lesatildeo muitas vezes a dita tutela

somente consegue ser efetivada atraveacutes da atividade executiva da jurisdiccedilatildeo

Ocorre que a execuccedilatildeo civil sempre foi o ldquocalcanhar de Aquilesrdquo do sistema

processual e de modo geral vinha sofrendo uma crise quanto a sua efetividade Ou seja o

credor obtia ecircxito na fase de conhecimento entretanto natildeo conseguia alcanccedilar o seu direito a

prestaccedilatildeo reconhecida na fase de execuccedilatildeo

Com o fito de tornar a atividade satisfativa mais eficiente e mais ceacutelere o Coacutedigo de

Processo Civil de 2015 concebeu novas diretrizes ao processo no sentindo de harmonizar

suas com os ditames da Constituiccedilatildeo Federal principalmente com os direitos fundamentais

As normas fundamentais do processo civil trazidas pelo CPC15 preocupam-se

primordialmente com a efetividade da tutela jurisdicional

Em conformidade com essa nova sistemaacutetica o legislador no art 139 IV do Coacutedigo

de Processo Civil estabeleceu a possibilidade de o juiz dispor de todas as medidas indutivas

coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o cumprimento de

ordem judicial trazendo como grande novidade a aplicaccedilatildeo dessas medidas executoacuterias

atiacutepicas tambeacutem nas obrigaccedilotildees de pagar dinheiro

6 Entretanto natildeo haacute na legislaccedilatildeo criteacuterios especiacuteficos que auxiliem o oacutergatildeo julgador na

escolha das medidas executivas atiacutepicas que se adotadas sem qualquer baliza podem

acarretar consequecircncias juriacutedicas irreparaacuteveis

Como a famosa decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de

Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-1320138260011 Nessa accedilatildeo

que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo

pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a suspensatildeo da

Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o passaporte e

cancelou os cartotildees de creacutedito como forma de compeli-lo a adimplir com o deacutebito

Decisotildees como esta geram conflitos entre direitos constitucionalmente instituiacutedos De

um lado o direito fundamental agrave tutela jurisdicional e de outro os direitos e garantias

inerentes a todos os indiviacuteduos

Dessa forma a presente monografia tem como escopo de estabelecer criteacuterios

limitadores para que a adoccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo viole a dignidade humana do

executado em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo

7 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO

CIVIL

21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL

A Execuccedilatildeo Civil nasce a partir do direito a uma prestaccedilatildeo conferida a algueacutem de

exigir de outrem o cumprimento de uma conduta de fazer natildeo fazer ou de dar (dinheiro ou

coisa distinta) 1

Para que o direito a uma prestaccedilatildeo se concretize no mundo fiacutesico eacute necessaacuterio que

haja a satisfaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida pelo sujeito passivo Caso contraacuterio fala-se em

inadimplemento ou lesatildeo O titular do direito natildeo tem como agir por si para efetivar o seu

direito a prestaccedilatildeo posto que a autotutela eacute vedada no ordenamento juriacutedico Dessa forma eacute

necessaacuterio que se recorra ao Poder Judiciaacuterio para que se possa ter a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo

devida logo a tutela jurisdicional executiva2

O processualista Fredie Didier et al3 equaciona essa questatildeo da seguinte maneira

Quando se pensa em tutela executiva pensa-se na efetivaccedilatildeo de direitos a uma prestaccedilatildeo fala-se de um conjunto de meios para efetivar a prestaccedilatildeo devida fala-se em execuccedilatildeo de fazer natildeo-fazer dar exatamente os trecircs tipos de prestaccedilatildeo existentes Natildeo eacute por acaso nem por coincidecircncia que a tutela executiva pressupotildee inadimplemento (CPC art 786) - fenocircmeno exclusivo dos direitos a uma prestaccedilatildeo Eacute por isso tambeacutem que se pode falar em prescriccedilatildeo da execuccedilatildeo (CPC art 802 e suacutemula do STF n 150) - prescriccedilatildeo eacute fenocircmeno juriacutedico que se relaciona aos direitos a uma prestaccedilatildeo A execuccedilatildeo forccedilada dirige-se ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo Essa relaccedilatildeo entre direito material e processo eacute fundamental para a compreensatildeo do fenocircmeno executivo

Nesse iacutenterim para o Ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux4 ldquoexecutar eacute

satisfazerrdquo ao passo que o professor Fredie Didier et al5 formulou um conceito mais amplo

ldquoExecutar eacute satisfazer uma prestaccedilatildeo devida A execuccedilatildeo pode ser espontacircnea quando o

devedor cumpre voluntariamente a prestaccedilatildeo ou forccedilada quando o cumprimento da prestaccedilatildeo

eacute obtido por meio de atos executivos pelo Estadordquo

1 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 41 2 Ibid p 42 3 Ibid p 42 4 FUX Luiz Curso de direito processual civil Rio de Janeiro Forense 2001 p 980 5 DIDIER JR Fredie et al Op Cit p 45

8 Dessa forma a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional responsaacutevel pela

concretizaccedilatildeo de um direito subjetivo no plano material obtendo resultado idecircntico ou

equivalente ao atingiacutevel se o devedor cumprisse espontaneamente a prestaccedilatildeo

Todavia essa atividade jurisdicional soacute cabe quando o devedor se recusa a cumprir

com a obrigaccedilatildeo quebrando a expectativa do credor de receber o que lhe eacute devido Por esta

razatildeo que se diz que a execuccedilatildeo civil eacute ldquoforccediladardquo 6

Eacute o que se conclui seguindo os ensinamentos de Leonardo Greco7 para ele execuccedilatildeo eacute

uma

() modalidade de tutela jurisdicional que consiste na praacutetica pelo juiz (ou por outrem sob a sua supervisatildeo) de uma seacuterie de atos coativos concretos sobre o devedor e sobre o seu patrimocircnio a fim de agrave custa dele e independentemente do concurso da sua vontade tornar efetivo o cumprimento de prestaccedilatildeo por ele inadimplida desde que tais atos coativos estejam previamente constituiacutedos em lei

Portanto a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional que tem como escopo obter o

cumprimento de uma prestaccedilatildeo certa e inadimplida mediante atos coativos sobre o devedor e

seus bens

22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL

Vislumbrado o conceito de execuccedilatildeo civil cabe agora empreender a sua classificaccedilatildeo

tendo em vista que a execuccedilatildeo pode se manifestar de diversas formas possuindo diferentes

caracteriacutesticas em cada uma das suas modalidades

Inicialmente cabe destacar que haacute duas teacutecnicas processuais para viabilizar a execuccedilatildeo

civil lato sensu eacute a que divide em processo autocircnomo de execuccedilatildeo e em fase de execuccedilatildeo

dependendo do tiacutetulo executivo que justifica o exerciacutecio da atividade satisfativa

O Coacutedigo Processual Civil de 2015 acertadamente ratificou as reformas promovidas

no CPC73 que consagrava a opccedilatildeo legislativa de oferecimento das tutelas de certificaccedilatildeo e

efetivaccedilatildeo do direito em um mesmo processo Dessa forma as execuccedilotildees de sentenccedilas

6 BASTOS Luiz Fernando Pereira O artigo 139 IV do novo Coacutedigo de Processo Civil a atipicidade

dos meios executivos na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia certa Brasiacutelia 2017 Disponiacutevel em lt httpbdmunbbrbitstream104831866812017_LuizFernandoPereiraBastospdf gt Acesso em 06 de agosto de 2018

7 BASTOS Luiz Fernando Pereira apud GRECO Leonardo O processo de execuccedilatildeo Rio de Janeiro Renovar 1999 p 164

9

passaram a ser uma fase complementar ao de processo de conhecimento e natildeo mais ocorrer

em um processo autocircnomo

No entendimento do professor processualista Fredie Didier et al8 o processo

sincreacutetico simplificou a efetivaccedilatildeo de um direito reconhecido em sentenccedila

A dispensa do ajuizamento de um processo autocircnomo para execuccedilatildeo de sentenccedila natildeo soacute veio diminuir o tempo necessaacuterio agrave prestaccedilatildeo da tutela jurisdicional - afinal o credor natildeo mais precisaria tal como ocorria ateacute entatildeo promover nova citaccedilatildeo pessoal do reacuteudevedor- como tambeacutem veio romper de vez com um velho paradigma segundo o qual a atividade executiva estaria dissociada da precedente atividade jurisdicional cognitiva

Entretanto natildeo soacute as sentenccedilas de meacuterito ensejam uma execuccedilatildeo Por esta razatildeo foi

necessaacuterio manter o processo autocircnomo de execuccedilatildeo para os casos em que o credor tem a seu

favor um documento que natildeo tenha sido proferido por um oacutergatildeo dotado de jurisdiccedilatildeo

Consequentemente se for o titulo executivo judicial o caminho natural eacute o do

cumprimento de sentenccedila Sendo por sua vez extrajudicial o titulo executivo o caminho

correto eacute o processo de execuccedilatildeo

Cabe ainda salientar que toda execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial eacute definitiva Jaacute a

execuccedilatildeo de tiacutetulo judicial (cumprimento de sentenccedila) pode ser definitiva ou provisoacuteria

No primeiro caso isto eacute cumprimento de sentenccedila definitivo ldquoeacute a execuccedilatildeo completa

que vai ateacute a fase final (com a entrega do bem da vida) sem exigecircncias adicionais para o

exequenterdquo 9

Quanto ao segundo caso ldquoo cumprimento provisoacuterio de sentenccedila (fundada em tiacutetulo

provisoacuterio) eacute aquele que exige alguns requisitos extras para que se chegue agrave fase final da

execuccedilatildeordquo 10

Para Fredie Didier11 o criteacuterio para definir se o cumprimento de sentenccedila seraacute

definitivo ou provisoacuterio

() eacute a estabilidade do tiacutetulo executivo em que se funda a execuccedilatildeo se se tratar de decisatildeo acobertada pela coisa julgada material o cumprimento de sentenccedila eacute

8 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 46 9 Ibid p 57 10 Ibid p 57 11 Ibid p 57

10

definitivo se se tratar de decisatildeo judicial ainda passiacutevel de alteraccedilatildeo (reforma ou invalidaccedilatildeo) em razatildeo da pendecircncia de recurso contra ela interposto a que natildeo tenha sido atribuiacutedo efeito suspensivo o cumprimento de sentenccedila eacute provisoacuterio

Ademais a execuccedilatildeo se distingue em procedimentos executivos comuns que satildeo da

execuccedilatildeo civil e que servem a uma generalidade de creacuteditos como eacute o caso do cumprimento

de sentenccedila e o processo de execuccedilatildeo E em procedimentos executivos especiais que servem

agrave satisfaccedilatildeo de creacuteditos peculiares como a execuccedilatildeo de alimentos e a execuccedilatildeo fiscal 12

Por fim cabe mencionar a classificaccedilatildeo que distingue a execuccedilatildeo em direta e indireta

A primeira execuccedilatildeo direita (ou execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo) eacute ldquo() aquela em que o

Poder Judiciaacuterio prescinde da colaboraccedilatildeo do executado para a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida

e pois promove uma substituiccedilatildeo da sua conduta pela conduta do proacuteprio Estado-juiz ou de

terceirordquo 13 Ou seja as medidas executivas satildeo levadas a efeito mesmo contra a vontade do

devedor na execuccedilatildeo direta

Segundo a doutrina a execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo se subdivide da seguinte forma

meios de desapossamento meios de transformaccedilatildeo e meios de expropriaccedilatildeo

Os meios de desapossamento muito comuns nas execuccedilotildees para entrega de coisa eacute a

forma ldquopor meio da qual se retira da posse do executado o bem a ser entregue ao exequente

(p ex despejo busca e apreensatildeo reintegraccedilatildeo de posse)rdquo 14 Ao passo que por meio dos de

transformaccedilatildeo ldquo() o juiz determina que um terceiro pratique a conduta que deveria ser

praticada pelo executado cabendo a este arcar com o pagamento do custo respectivordquo 15 Jaacute

os meios executivos de expropriaccedilatildeo eacute a forma ldquopor meio do qual algum bem do patrimocircnio

do devedor eacute expropriado para pagamento do creacutedito (adjudicaccedilatildeo alienaccedilatildeo judicial ou

apropriaccedilatildeo de frutos e rendimentos de empresa ou de estabelecimentos e de outros bens art

825 CPC)rdquo 16

12 Ibid p 48 13 Ibid p 50 14 Ibid p 51 15 Ibid p 51 16 Ibid p 51

11 Jaacute a execuccedilatildeo indireta (ou mandamental) atua ldquo() na vontade do devedor como forma

de compeli-lo ou incentivaacute-lo a cumprir a ordem judicialrdquo 17 Nesse entendimento ainda

leciona Fredie Didier et al 18

Nesses casos o Estado-juiz busca promover a execuccedilatildeo com a colaboraccedilatildeo do executado forccedilando ou incentivando a que ele proacuteprio cumpra a prestaccedilatildeo devida Em vez de o Estado-juiz tomar as providecircncias que deveriam ser tomadas pelo executado o Estado forccedila por meio de coerccedilatildeo psicoloacutegica ou de promessa de recompensa judicial a que o proacuteprio executado cumpra a prestaccedilatildeo

A execuccedilatildeo indireta pode ser patrimonial como por exemplo a imposiccedilatildeo de multa

coercitiva ou pessoal com a prisatildeo civil do devedor de alimentos Ademais adiciona Didier

et al19que

O estiacutemulo ao cumprimento da prestaccedilatildeo pode dar-se pelo temor (p ex multa coercitiva prisatildeo civil do devedor de alimentos divulgaccedilatildeo de notiacutecia em jornal revelando o descumprimento) ou pelo incentivo (p ex a chamada sanccedilatildeo premial ou sanccedilatildeo positiva de que eacute exemplo a isenccedilatildeo do pagamento de custas em caso de cumprimento do mandado monitoacuterio - art 701 sect 1ordm CPC a reduccedilatildeo pela metade dos honoraacuterios advocatiacutecios fixados inicialmente pelo juiacutezo em caso de pagamento integral do deacutebito pecuniaacuterio na execuccedilatildeo por quantia certa fundada em tiacutetulo extrajudicial - art 827 sect 1ordm CPC)

Por tais razotildees haacute uma tendecircncia em cada vez mais prestigiar os meios executivos

indiretos (coercitivos) posto que satildeo tatildeo eficazes quanto os meios executivos diretos

entretanto menos onerosos Contudo sua aplicaccedilatildeo deve ser fiscalizada a fim de natildeo permitir

que a execuccedilatildeo civil perca sua finalidade visto que eacute uma funccedilatildeo jurisdicional que tem como

escopo efetivar o direito do credor e natildeo de atender os interesses do devedor

23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL

Os princiacutepios juriacutedicos nos uacuteltimos anos passaram a ser munidos de forccedila cogente

normatizando as condutas humanas tanto quanto as regras juriacutedicas Os ditos princiacutepios

ampliaram as margens de atuaccedilatildeo dos aplicadores do direito possibilitando a construccedilatildeo de

soluccedilotildees mais adequadas agraves especificidades das demandas que chegam ao judiciaacuterio

17 Ibid p 51 18 Ibid p 51 19 Ibid p 51-52

12 Dessa forma eacute necessaacuterio aprofundar-se nos princiacutepios norteadores da execuccedilatildeo civil

para que se obtenha uma anaacutelise completa da teoria geral da execuccedilatildeo

A execuccedilatildeo civil tem como um dos seus corolaacuterios o princiacutepio da efetividade este

consiste na exigecircncia de um sistema completo de tutela executiva no qual existam meios

executivos capazes de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor

de tutela executivardquo 20

O referido princiacutepio da efetividade eacute reforccedilado como normal fundamental do processo

civil brasileiro pelo art 4ordm do CPC ldquoArt 4ordm As partes tecircm o direito de obter em prazo razoaacutevel

a soluccedilatildeo integral do meacuterito incluiacuteda a atividade satisfativa

Jaacute o princiacutepio da boa feacute processual corolaacuterio do devido processo legal estaacute previsto

no art 5ordm do CPC ldquoAquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de

acordo com a boa-feacuterdquo Segundo o processualista baiano Fredie Didier21

O princiacutepio da boa-feacute extrai-se de uma claacuteusula geral processual A opccedilatildeo por uma claacuteusula geral de boa-feacute eacute a mais correta Eacute que a infinidade de situaccedilotildees que podem surgir ao longo do processo torna pouco eficaz qualquer enumeraccedilatildeo legal exaustiva das hipoacuteteses de comportamento desleal Daiacute ser correta a opccedilatildeo da legislaccedilatildeo brasileira por uma norma geral que impotildee o comportamento de acordo com a boa-feacute Em verdade natildeo seria necessaacuteria qualquer enumeraccedilatildeo das condutas desleais o art 5deg do CPC eacute bastante exatamente por tratar-se de uma claacuteusula geral

Dessa forma o dito princiacutepio preconiza que diante de um vinculo juriacutedico as pessoas

envolvidas natildeo poderatildeo frustrar a confianccedila do outro devendo comportar-se como se pode

esperar de uma pessoa de boa-feacute

Ademais disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial que ldquosomente o

patrimocircnio do devedor (art 789 CPC) ou de terceiro responsaacutevel pode ser objeto da

atividade executiva do Estadordquo 22

O referido princiacutepio que determina que somente o patrimocircnio submete-se agrave execuccedilatildeo

e natildeo a pessoa foi trazido pela humanizaccedilatildeo do direito Para o professor Didier et al23 o

20 DIDIER JR Freddie et al apud GUERRA Marcelo Lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do

credor na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 21 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte

geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 105 22 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 68

13

desenvolvimento dos meios de execuccedilatildeo indireta ldquoparece relativizar um pouco esse princiacutepio

na medida em que pressionam psicologicamente a pessoa do devedor para que cumpra a

obrigaccedilatildeo com seu comportamentordquo

Complementa ainda que

A responsabilidade executiva parece assumir atualmente caraacuteter hiacutebrido comportando coerccedilatildeo pessoal e sujeiccedilatildeo patrimonial

i) a coerccedilatildeo pessoal incide sobre a vontade do devedor admitindo o uso de medidas coercitivas de execuccedilatildeo indireta para forccedilaacute-lo a cumprir a obrigaccedilatildeo com seu proacuteprio comportamento (ex arts 139 rv 523 sect 1ordm 536 sect 1ordm e 538 sect 3ordm todos do CPC)

ii) descumprida a obrigaccedilatildeo e natildeo sendo possiacuteveladequado o uso de teacutecnica de coerccedilatildeo pessoal tem-se a sujeiccedilatildeo patrimonial que recairaacute sobre os bens do devedor ou de terceiro responsaacutevel - que responderatildeo pela proacutepria prestaccedilatildeo in natura (ex dar coisa ou entregar quantia) ou por perdas e danos24

Dessa forma o referido princiacutepio natildeo tem aplicaccedilatildeo absoluta em razatildeo do principio da

efetividade a qual estimula o uso dos meios de coerccedilatildeo indireta para garantir o cumprimento

da obrigaccedilatildeo pelo devedor

O princiacutepio da primazia da tutela especifica (ou princiacutepio do resultado) assevera que

ldquoA execuccedilatildeo deve ser especiacutefica propiciar ao credor a satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo tal qual

houvesse o cumprimento espontacircneo da prestaccedilatildeo pelo devedorrdquo 25

O CPC de 2015 absorveu todos os avanccedilos legislativos a cerca do mote O caput do

art 497 assegura que na accedilatildeo que tenha por objeto a prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer o

juiz se procedente o pedido concederaacute a tutela especiacutefica ou determinaraacute providecircncias que

assegurem a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico equivalente O art 499 o

complementa a obrigaccedilatildeo somente seraacute convertida em perdas e danos se o autor o requerer

ou se impossiacutevel agrave tutela especiacutefica ou a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico

equivalente

O princiacutepio do contraditoacuterio eacute garantido pela constituiccedilatildeo federal e compreende o

direito de ser ouvido o direito de acompanhar os atos processuais o direito de produzir

provas participar da sua produccedilatildeo manifestar-se sobre a prova produzida e obter do juiz a

23 Ibid p 69-70 24 Ibid p 70 25 Ibid p 71

14

respectiva valoraccedilatildeo o direito de ser informado regularmente dos atos praticados no processo

o direito agrave motivaccedilatildeo das decisotildees o direito de impugnar as decisotildees 26

O contraditoacuterio tem aplicaccedilatildeo em todo processo judicial sendo aplicaacutevel tambeacutem na

execuccedilatildeo No entanto o contraditoacuterio na execuccedilatildeo natildeo ocorre com a mesma intensidade que

no processo ou na fase de conhecimento eacute o que assevera Didier et al 27

O contraditoacuterio no procedimento executivo no aspecto do direito de defesa assegurado agrave parte demandada eacute eventual porquanto depende da provocaccedilatildeo do executado que natildeo eacute chamado ajuiacutezo para defender-se mas sim para cumprir a obrigaccedilatildeo O procedimento executivo adota a teacutecnica monitoacuteria que consiste basicamente na inversatildeo do ocircnus de provocar o contraditoacuterio o reacuteu em vez de citado para manifestar-se sobre a pretensatildeo do autor eacute convocado para cumprir uma determinada obrigaccedilatildeo

Logo haacute o contraditoacuterio no procedimento executivo porem eacute eventual quanto agrave defesa

do executado

Ademais o princiacutepio da menor onerosidade eacute consagrado pelo art 805 do CPC e

dispotildee que ldquoQuando por vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz

mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o executadordquo O referido princiacutepio tem o

escopo de impedir o abuso do direito pelo exequente

O principio da menor onerosidade auxilia o juiz na escolha de um meio executivo

adequado e necessaacuterio que satisfaccedila a prestaccedilatildeo exigida pelo credor Nesse sentido eacute o

entendimento do professor Fredie Didier et al 28

O resultado a ser alcanccedilado eacute aquele estabelecido pelo direito material A maneira de se chegar ateacute esse resultado eacute que deve ser a menos onerosa possiacutevel para o executado Isso significa que a opccedilatildeo pelo meio menos gravoso pressupotildee que os diversos meios considerados sejam igualmente eficazes Assim havendo vaacuterios meios executivos aptos agrave tutela adequada e efetiva do direito de creacutedito escolhe-se a via menos onerosa ao executado

O princiacutepio visa impedir a execuccedilatildeo desnecessariamente onerosa ao executado ou seja a execuccedilatildeo abusiva Em vez de enumerar situaccedilotildees em que a opccedilatildeo mais gravosa revelar-se-ia injusta o legislador valeu-se corretamente de uma claacuteusula geral para reputar abusivo qualquer comportamento do credor que pretender valer-se de meio executivo mais oneroso do que outro igualmente idocircneo agrave satisfaccedilatildeo do seu creacutedito

26 Ibid p 76 27 Ibid p 78 28 Ibid p 79-80

15 O princiacutepio da cooperaccedilatildeo tem como base os princiacutepios do devido processo legal da

boa-feacute processual e do contraditoacuterio O dito princiacutepio avigora a eacutetica processual com o

aprimoramento do diaacutelogo entre as partes reciprocamente e com o oacutergatildeo jurisdicional Eacute o

que preconiza o art 6ordm do CPC Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para

que se obtenha em tempo razoaacutevel decisatildeo de meacuterito justa e efetiva

No procedimento executivo o princiacutepio da cooperaccedilatildeo incide de diversas formas

disciplina Didier et al29 que na execuccedilatildeo

O executado tem o dever de indicar bens agrave penhora (art 774 V CPC) Natildeo encontrados bens penhoraacuteveis e natildeo havendo indicaccedilatildeo de qualquer um deles pelo exequente cabe ao executado declarar quais satildeo seus bens penhoraacuteveis sob pena de se sujeitar a uma sanccedilatildeo pecuniaacuteria compulsoacuteria

Tambeacutem eacute manifestaccedilatildeo do princiacutepio da cooperaccedilatildeo a exigecircncia de que o executado que pretende impugnar o valor da execuccedilatildeo apresente de logo o valor que reputa devido (art 525 sect 4ordm CPC) Seria comportamento natildeo-cooperativo afirmar que a cobranccedila eacute excessiva sem simultaneamente dizer qual eacute o valor correto

Demais disso aplicam-se agrave execuccedilatildeo os deveres que decorrem do princiacutepio da cooperaccedilatildeo e que satildeo imputados ao oacutergatildeo jurisdicional () Assim por exemplo deve o juiz advertir ao executado antes de puni-lo de que seu ato pode vir a caracterizar-se como atentatoacuterio agrave dignidade da jurisdiccedilatildeo ( art 772 II CPC) perceba que se trata de uma conduta compatiacutevel com o dever de prevenccedilatildeo O oacutergatildeo jurisdicional somente pode conhecer da prescriccedilatildeo ex officio dando a oportunidade de o exequente manifestar-se conforme impotildee o dever de consulta ( cf arts 10 487 paraacutegrafo uacutenico e 921 sect 5ordm CPC)

O princiacutepio ou postulado30 da proporcionalidade tem aplicaccedilatildeo muito relevante na

execuccedilatildeo O art 8 do CPC assegura que o oacutergatildeo jurisdicional tem o dever de observar a

proporcionalidade e a razoabilidade ao aplicar o ordenamento juriacutedico inclusive no

procedimento executivo

Ademais o art 805 do CPC eacute categoacuterico ao disciplinar que ldquoArt 805 Quando por

vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo

menos gravoso para o executadordquo O referido artigo jaacute se trata de uma concretizaccedilatildeo da

proporcionalidade

29 Ibid p 82 30 Segundo Fredie Didier et al haacute uma discussatildeo doutrinaacuteria sobre a proporcionalidade Parte da

doutrina acredita que a proporcionalidade eacute um princiacutepio e outra parte acredita que eacute um postulado normativo

16 O principio da adequaccedilatildeo pode ser vislumbrado em dois momentos do Direito

Processual ldquoa) no legislativo como orientador da confecccedilatildeo das leis b) no jurisdicional

autorizando ao juiz diante do caso concreto adaptar procedimento agraves suas peculiaridadesrdquo 31

Para Luceacutelia de Sena Alves e Tiago Retes32

Isso quer dizer que no momento legislativo o devido processo deve ser observado pelo legislador para a confecccedilatildeo das normas de direito processual que iratildeo servir de instrumento efetivo de concretizaccedilatildeo do direito substancial a ser tutelado atendendo a todas as suas finalidades sob pena de falecircncia do proacuteprio direito No momento jurisdicional da mesma forma a via processual escolhida pelo autor tambeacutem deve estar sujeita a este princiacutepio para que natildeo sofra as mesmas consequecircncias da sua inobservacircncia

O ordenamento juriacutedico deve ser aplicado por meio da teacutecnica processual adequada

evitando dessa forma uma tutela ineficaz

Por fim o princiacutepio do autorregramento da vontade na execuccedilatildeo tem o objetivo de

ldquo() preservar um espaccedilo processual para o exerciacutecio da liberdade e da vontade em que

sejam permitidas negociaccedilotildees que envolvam as partes ndash e tambeacutem o juizrdquo33 Didier et al34

assevera que

A rigor o legislador estabelece um regime juriacutedico de autorregramento da vontade processual identificando-se algumas manifestaccedilotildees relevantes para a execuccedilatildeo Na verdade pode-se dizer que poucos satildeo os ambientes mais propiacutecios do que a execuccedilatildeo para a negociaccedilatildeo sobre o processo Todos os institutos e normas processuais relativos agrave execuccedilatildeo devem ser repensados a partir da premissa de que o CPC permite uma ampla margem de liberdade de negociaccedilatildeo sobre o processo (art 190 CPC)

O autorregramento da vontade pode ser vislumbrando na previsatildeo de negoacutecios tiacutepicos

em sede de execuccedilatildeo como por exemplo no acordo das partes sobre o valor do bem que

dispensa a avaliaccedilatildeo disposto no inciso I do art 871 CPC Ademais dentro dos limites do art

190 do CPC eacute possiacutevel na execuccedilatildeo a atribuiccedilatildeo da negociaccedilatildeo atiacutepica aos sujeitos 31 ALVES Luceacutelia de Sena Alves RETES Tiago O poder geral de efetivaccedilatildeo das decisotildees judiciais e

proporcionalidade uma anaacutelise criacutetica acerca do art 139 IV do Novo Coacutedigo de Processo Civil Disponiacutevel em lthttpswwwacademiaedu31752652O_poder_geral_de_efetivaC3A7C3A3o_das_decisC3B5es_judiciais_e_a_proporcionalidade_uma_anC3A1lise_crC3ADtica_acerca_do_art_139_IV_do_Novo_CC3B3digo_de_Processo_Civil gt Acesso em 25 de julho de 2018

32 Ibid natildeo paginado 33 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 85 34 Ibid p 85

17

processuais permitindo que sejam feitas mudanccedilas nos procedimentos e nas situaccedilotildees

juriacutedicas processuais ldquoSatildeo exemplos de negoacutecios processuais atiacutepicos na execuccedilatildeo pacto de

penhorabilidade acordo de ampliaccedilatildeo de prazos das partes de qualquer natureza acordo de

rateio de despesas processuais ()rdquo35

24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO

Sempre houve diversos questionamentos quanto agrave eficaacutecia do Direito processual Civil

e se o mesmo era meio apto a assegurar a tutela jurisdicional dos direitos dos cidadatildeos O

processo de execuccedilatildeo eacute o setor que sofre mais criacuteticas quanto a sua ineficiecircncia afinal a

execuccedilatildeo civil sempre foi o ldquocalcanhar de Aquilesrdquo do sistema processual pela praxe do

ldquoganhou (no processo de conhecimento) mas natildeo levou (na fase de cumprimento ou

execuccedilatildeo)rdquo 36

Essa dificuldade de se efetivar a tutela satisfastiva natildeo se resume a um problema de

mera teacutecnica processual tiacutepico de determinado ordenamento mas representa uma prova de

fogo da capacidade dos instrumentos jurisdicionais O autor Leonardo Greco37 no ano de

2005 atribuiu esse fato as seguintes causas o excesso de processos o custo e a morosidade da

justiccedila a inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios a ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais

um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico e a progressiva volatizaccedilatildeo dos bens

Quanto ao excesso de processos o referido autor aduz que ldquonos grandes centros o

crescimento da maacutequina judiciaacuteria natildeo acompanhou a expansatildeo do nuacutemero de litiacutegiosrdquo 38

O custo e morosidade da justiccedila prejudicam a tutela satisfativa posto que

ldquojaacute desfalcado pelo inadimplemento do devedor o credor ainda tem de arcar com o adiantamento das despesas do processo de execuccedilatildeo e de eventual liquidaccedilatildeo vendo arrastar-se a marcha dos atos executoacuterios facilmente retardada por atos procrastinatoacuterios do devedorrdquo 39

35 Ibid p 86 36 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca

para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018

37 GRECCO Leonardo A Crise do Processo de Execuccedilatildeo in Estudos de direito processual Leonardo Greco ndash Campos dos Goytacazes Ed Faculdade de Direito de Campos 2005 p 7

38 Ibid p 7 39 Ibid p 7-8

18 A inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios contribui para a crise do processo de

execuccedilatildeo tendo em vista que

ldquoo juiz da execuccedilatildeo prisioneiro de ritos que o distanciam das partes e da realidade da vida impulsiona sem qualquer apetite a execuccedilatildeo conduzindo-a ao sabor dos ventos das provocaccedilotildees impacientes do credor e das costumeiras procrastinaccedilotildees do devedorrdquo 40

Jaacute ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais atrapalha a efetivaccedilatildeo da tutela satisfativa ldquoo

devedor natildeo colabora com a execuccedilatildeo e os meios de pressatildeo que a lei estabelece natildeo satildeo

suficientes para intimidaacute-lordquo 41

Com um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico

O espiacuterito empresarial e a sociedade de consumo estimulam o endividamento das pessoas e o inadimplemento das obrigaccedilotildees pelo devedor deixou de ser vexatoacuterio e reprovaacutevel o que multiplica as accedilotildees de cobranccedila e execuccedilotildees atraveacutes das quais o sujeito passivo ainda usufrui vantagens agraves custas do credor 42

Por fim Leonardo Greco elenca a volatizaccedilatildeo dos bens como o uacuteltimo fator que

macula o processo executo tendo em vista que

ldquomudou inteiramente o perfil patrimonial das pessoas antes concentrado em bens de raiz e agora tendencialmente dirigido a investimentos em tiacutetulos e valores facilmente negociaacuteveis o que dificulta a sua localizaccedilatildeo pelo credorrdquo 43

O Coacutedigo de Processo Civil de 1973 introduziu o sistema executivo ao ordenamento

juriacutedico paacutetrio e seguindo os valores liberais da eacutepoca com a proteccedilatildeo de esfera juriacutedica de

liberdade do cidadatildeo contra a possibilidade de arbiacutetrio do Estado e uso indevido do Poder

jurisdicional outorgou o miacutenimo de poder ao juiz Seguindo as regras do CPC de 73 o

devedor soacute poderia ter sua esfera juriacutedica invadida atraveacutes de meios de execuccedilatildeo instituiacutedos

previamente em lei

Diante de tantos obstaacuteculos para se efetivar a tutela satisfativa a execuccedilatildeo estava

fadada ao fracasso o que frustrava a expectativa do jurisdicionado a uma prestaccedilatildeo da tutela

jurisdicional ceacutelere e efetiva Insatisfeitos com o cenaacuterio que se encontrava a atividade

40 Ibid p 8 41 Ibid p8 42 Ibid p 8 43 Ibid p8

19

executiva legisladores e operadores do direito natildeo mediram esforccedilos para promover uma

evoluccedilatildeo significativa buscando mais eficiecircncia e celeridade ao procedimento executoacuterio

Dessa forma no final de 1994 foi introduzido no coacutedigo de processo agrave flexibilizaccedilatildeo

dos poderes executoacuterios do juiz ldquopara que ele pudesse prestar uma tutela efetiva aos direitos

ficando autorizado a determinar a modalidade de execuccedilatildeo adequada a cada hipoacutetese nas

obrigaccedilotildees de fazer e natildeo fazer (art 461 sect5ordm do CPC de 1973)rdquo No ano de 2002 a referida

medida foi estendida para as obrigaccedilotildees de entregar coisa (art 461-A caput e sect3ordm do CPC de

1973)

Com fundamento nos artigos 461 e 461-A em 2005 a Lei nordm 11 23205 unificou o

processo de conhecimento e o processo de execuccedilatildeo de sentenccedila Nesse sentido Maacuterio

Henrique Cavalcanti Gil Rodrigues44 aduz que

A Lei 112322005 reuniu de forma definitiva os processos de conhecimento e de execuccedilatildeo em um uacutenico processo composto por um sistema bifaacutesico Assim passa a existir uma fase inicial (de reconhecimento) e uma fase posterior (de cumprimento de sentenccedila de efetivaccedilatildeo da decisatildeo definitiva) sem contar com a eventual fase intermediaacuteria de liquidaccedilatildeo (RODRIGUES 2010 p 38)

Ademais as alteraccedilotildees realizadas no CPC de 73 inseriu a atipicidade dos meios

executivos nas obrigaccedilotildees de fazer natildeo fazer e dar coisa certa entretanto exercendo papel

subsidiaacuterio aos meios tiacutepicos

Quanto agraves obrigaccedilotildees de pagar quantia havia apenas a possibilidade de se valer da

incidecircncia de multa do art 475-J do CPC de 73 ndash implementada mediante reforma perpetrada

pela Lei nordm 11232 de 2005 em atendimento a doutrina processualista preocupada com a

efetividade das decisotildees ndash e de atos executivos como a penhora de bens e dinheiro

Ainda que a execuccedilatildeo tenha avanccedilado com a inserccedilatildeo das leis posteriores a 1994 no

CPC de 1973 a mesma continuava insuficiente tendo em vista que a burocracia e lentidatildeo

dos atos executivos davam brechas para que o devedor escondesse seu patrimocircnio penhoraacutevel

tornando carente de efetividade e celeridade agrave execuccedilatildeo

44 RODRIGUES Maacuterio Henrique Cavalcanti Gil A evoluccedilatildeo da execuccedilatildeo de sentenccedila no direito

processual civil e o novo regime juriacutedico das sentenccedilas apoacutes a reforma implementada pela Lei 112322005 Revista do Tribunal Regional Federal da 1ordf Regiatildeo v 22 n 2 fev 2010 p 38

20

25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO

A tutela juridiscional eacute um direito fundamental previsto no art 5ordm inciso XXXV da

Carta Magna ldquo() a lei natildeo excluiraacute da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio lesatildeo ou ameaccedila a

direitordquo

Na visatildeo claacutessica o direito de accedilatildeo era efetivado com a prolaccedilatildeo de uma sentenccedila de

meacuterito posiccedilatildeo adotada por grande parte dos processualistas seguidores da doutrina de

Liebman Todavia esse conceito se mostra defasado tendo em vista que o direito de acesso agrave

justiccedila natildeo eacute apenas uma garantia formal de bater as portas do judiciaacuterio mas a garantia de

acesso agrave ordem juriacutedica justa adequada e eficaz45

Acreditar que uma sentenccedila de meacuterito favoraacutevel eacute tutela jurisdicional suficiente para

satisfazer o que se busca com o ajuizamento da accedilatildeo eacute uma visatildeo distorcida da atividade

satisfativa ldquoSob o ponto de vista do direito material a condenaccedilatildeo por si soacute eacute incapaz de

prestar a tutela do direitordquo46

Nessa oacutetica o direito fundamental agrave tutela executiva exige um sistema de tutela

jurisdicional ldquocapaz de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor

de tutela executivardquo47 Dessa forma entende-se que

ldquo() a) a interpretaccedilatildeo das normas que regulamentam a tutela executiva tem de ser feita no sentido de extrair a maior efetividade possiacutevel b) o juiz tem o poder-dever de deixar de aplicar uma norma que imponha uma restriccedilatildeo a um meio executivo sempre que essa restriccedilatildeo natildeo se justificar como forma de proteccedilatildeo a outro direito fundamental c) o juiz tem o poder-dever de adotar os meios executivos que se revelem necessaacuterios agrave prestaccedilatildeo integral de tutela executivardquo48

Egrave imperioso compreender que o direito fundamental agrave tutela executiva ratificado

pelo CPC eacute essencial para dirimir diversos litiacutegios oriundos do procedimento executivo

45 FERREIRA Gabriela Macedo Poder geral de efetivaccedilatildeo em defesa da constitucionalidade da

teacutecnica de execuccedilatildeo dos direitos do art 139 IV do Coacutedigo de Processo Civil Revista Jus Navigandi ISSN 1518-4862 Teresina ano 22 n 5178 4 set 2017 Disponiacutevel em lthttpsjuscombrartigos60190gt Acesso em 11 set 2018

46 Ibid natildeo paginado 47 DIDIER JR Fredie et al apud GUERRA Marcelo lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do credor

na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 48 Ibid p 102-104

21

ldquoprincipalmente aqueles relacionados agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo49

Fredie Didier et al50 cita como exemplo as hipoacuteteses de impenhorabilidade

A impenhorabilidade de certos bens eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa

Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais

Por esta razatildeo o legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do

CPC fazendo um preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses das partes envolvidas

optando pela mitigaccedilatildeo do direito do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado

Quando o oacutergatildeo jurisdicional verificar que a aplicaccedilatildeo das regras de

impenhorabilidade eacute desproporcional para o caso concreto deve afastaacute-la e construir a

soluccedilatildeo adequada para o referido caso Didier et al51 traz um exemplo esclarecedor em sua

obra

O bem imoacutevel que serve de moradia da famiacutelia eacute relativamente impenhoraacutevel Objetiva-se com essa restriccedilatildeo proteger o direito fundamental agrave moradia conteuacutedo do direito agrave proteccedilatildeo da dignidade Imagine-se um imoacutevel de altiacutessimo valor Imagine-se agora um creacutedito que corresponda a 40 do valor do imoacutevel A venda judicial do imoacutevel no caso permitiria natildeo soacute satisfazer o direito do credor como ainda garantir ao executado com a sobra a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel que lhe preserve a dignidade A opccedilatildeo pela interpretaccedilatildeo literal da regra que veda a penhora protegeria exclusivamente o direito do executado de maneira desnecessaacuteria porque a relaccedilatildeo valor executadovalor do bem permitiria a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel apoacutes a entrega do dinheiro ao credor Seria pois interpretaccedilatildeo em desconformidade com os preceitos da contemporacircnea hermenecircutica constitucional que preconiza a necessidade de nos casos de choque entre direitos fundamentais dar a interpretaccedilatildeo que mais adequadamente proteja a ambos

A execuccedilatildeo civil integra o direito fundamental agrave tutela jurisdicional disciplinando

que ldquoos dispositivos devem ser interpretados de modo que se garanta a maior efetividade

49 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66 50 Ibid p 66 51 Ibid p 67

22

possiacutevel agrave execuccedilatildeo desde que respeitados outros direitos fundamentaisrdquo52 Podendo ser

afastada desde que proporcional qualquer obstaacuteculo irrazoaacutevel agrave efetivaccedilatildeo desse direito

52 FERREIRA Gabriela Macedo apud MACEDO Lucas Buril de As eficaacutecias das decisotildees judiciais e

o cumprimento de sentenccedila no CPC15 Novo CPC Doutrina selecionada v 5 Execuccedilatildeo Coordenador geral Fredie Didier Jr organizadores Lucas Buril de Macedo Ravi Peixoto Alexandre Freire ndash Salvador Jus Podivm 2015 p 360361

23

3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO

EXECUTADO

31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS

Como forma de controlar a atividade jurisdicional por muito tempo vigorou o

entendimento de que a execuccedilatildeo somente poderia ser realizada atraveacutes dos meios executivos

tipicamente previstos na legislaccedilatildeo Segundo Luiz Guilherme Marinoni53

O princiacutepio da tipicidade deseja significar que os meios de execuccedilatildeo devem estar previstos na lei e assim que a execuccedilatildeo natildeo pode ocorrer atraveacutes de formas executivas natildeo tipificadas O seu objetivo eacute de um lado impedir que meio executivo natildeo previsto em lei possa ser utilizado e de outro garantir o jurisdicionado contra a possibilidade de arbiacutetrio judicial na fixaccedilatildeo da modalidade executiva Se o jurisdicionado sabe em razatildeo de previsatildeo legal que a sua esfera juriacutedica somente poderaacute ser invadida atraveacutes de determinadas modalidades executivas confere-se a ele a possibilidade de antever a reaccedilatildeo ao seu inadimplemento bem como a garantia de que a jurisdiccedilatildeo natildeo determinaraacute ou permitiraacute a utilizaccedilatildeo de meio executivo diverso daqueles previstos

Dessa forma o princiacutepio da tipicidade disciplina que o oacutergatildeo julgador ao proceder agrave

execuccedilatildeo estaacute limitado aos meios executivos previamente definidos em lei natildeo podendo se

valer de qualquer teacutecnica de efetivaccedilatildeo que natildeo se encaixasse nas hipoacuteteses taxativas da

legislaccedilatildeo

Entretanto o legislador natildeo tem como prever todas as peculiaridades dos direitos

dignos de tutela executiva e preordenar teacutecnicas executivas diversas para cada peculiaridade

Sob esse cenaacuterio o principio da tipicidade foi cedendo lugar ao principio da atipicidade dos

meios executivos

A ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do oacutergatildeo julgador estaacute cada vez mais presente

no ordenamento juriacutedico paacutetrio motivando um poder geral de efetivaccedilatildeo ldquoque permite ao

julgador valer-se dos meios executivos que considerar mais adequado ao caso concreto sejam

eles de coerccedilatildeo direta sejam de coerccedilatildeo indiretardquo 54

53 MARINONI Luiz Guilherme Teacutecnica processual e tutela dos direitos Satildeo Paulo Editora Revista

dos Tribunais 2004 p 212 nota 79 54 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 100

24

Essa tendecircncia de ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do juiz natildeo eacute exclusividade do

ordenamento juriacutedico brasileiro segundo Fredie Didier et al55

Michelle Taruffo jaacute apontava que o direito americano diante da inefetividade dos meios executivos at law comeccedilou a autorizar o magistrado a tomar medidas executivas adequadas ao caso concreto Trata-se afirma o jurista italiano de aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo segundo o qual as regras processuais devem ser adaptadas agraves necessidades do direito material

Os meios executivos atiacutepicos derivam de trecircs enunciados normativos do Coacutedigo de

Processo Civil o art 139 IV o art 297 e o sect1ordm do art 536

O art 139 IV do CPC dispotildee que pertence ao juiz o poder-dever de ldquodeterminar

todas as medidas indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para

assegurar o cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto

prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo

Jaacute o art 297 do CPC cuida da tutela provisoacuteria e garante que ldquoo juiz poderaacute

determinar as medidas que considerar adequadas para a efetivaccedilatildeo da tutela provisoacuteriardquo

Podendo dessa forma a dita tutela ser efetivada atipicamente

Por fim o art 536 sect1ordm do CPC dispotildee que

Para atender ao disposto no caput o juiz poderaacute determinar entre outras medidas a imposiccedilatildeo de multa a busca e apreensatildeo a remoccedilatildeo de pessoas e coisas o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva podendo caso necessaacuterio requisitar o auxilio de forccedila policial

As supracitadas medidas executivas atiacutepicas satildeo entendidas pela doutrina como

claacuteusulas gerais processuais executivas56 Essas claacuteusulas gerais natildeo restringem a sua

aplicaccedilatildeo agraves teacutecnicas de coerccedilatildeo indireta satildeo autorizados tambeacutem o uso de meios de execuccedilatildeo

dieta e indireta

Ademais cumpre salientar que o art 139 IV CPC aplica-se a toda e qualquer

atividade executiva ldquoa) seja fundada em tiacutetulo executivo judicial (provisoacuteria ou definitiva)

55 DIDIER JR Fredie et al apud TARUFFO Michelle A atuaccedilatildeo executiva dos direitos perfis

comparatiacutesticos Revista de Processo Satildeo Paulo RT 1990 n 59 p 78 56 Segundo Fredie Didier et al claacuteusula geral eacute uma espeacutecie de texto normativo cujo antecedente

(hipoacutetese faacutetica) eacute composto por termos vagos e consequente (efeito juriacutedico) eacute indeterminado

25

seja fundada em tiacutetulo executivo extrajudicial b) seja para efetivar prestaccedilatildeo pecuniaacuteria seja

para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer ou dar coisa distinta de dinheirordquo57

Jaacute o art 297 do CPC garante que a tutela provisoacuteria possa ser efetivada tambeacutem

atipicamente ldquoSucede que a atipicidade da tutela provisoacuteria segue necessariamente a

atipicidade da tutela definitivardquo 58

Por fim o comando do sect 1 ordmdo art 536 se aplica

a) inicialmente agrave execuccedilatildeo de fazer e de natildeo fazer fundada em decisatildeo judicial (provisoacuteria ou definitiva) b) por forccedila do sect 3ordm do art 538 tambeacutem se aplica ao cumprimento de sentenccedila para entrega de coisa c) por forccedila do art 771 paraacutegrafo uacutenico o dispositivo tambeacutem se aplica agrave execuccedilatildeo para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer e entregar coisa distinta de dinheiro fundada em tiacutetulo extrajudicial

Claramente o art 139 IV eacute mais amplo do que o sect 1 ordm do art 536 estende-se por

disposiccedilatildeo expressa agrave execuccedilatildeo de pagar quantia Sendo uma grande novidade nas obrigaccedilotildees

que tem por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15

O art 139 IV do CPC apresentou uma novidade agrave atipicidade dos meios executivos

ao disciplinar que cabe ao juiz ldquodeterminar todas as medidas indutivas coercitivas

mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o cumprimento de ordem judicial

inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo

A inovaccedilatildeo estaacute na possibilidade de utilizar os meios atiacutepicos para assegurar o

cumprimento de decisotildees que versam sobre as obrigaccedilotildees pecuniaacuterias sendo admitida a

utilizaccedilatildeo de outros meios ateacute na execuccedilatildeo de titulo judicial de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria aleacutem da

multa de 10 (a que se refere o artigo 523 sect 1ordm do CPC) para forccedilar o devedor a cumprir a

obrigaccedilatildeo pecuniaacuteria

57 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 105 58 Ibid p 105

26

Dessa forma eacute possiacutevel afirmar que ldquoao lado da disciplina tiacutepica do art 523 e

seguintes () o novo CPC inova ao permitir que o sistema de teacutecnicas executivas atiacutepicas

sejam empregadas na execuccedilatildeo monetaacuteriardquo59 (ZARONI VITORELLI 2016 p 66)

Fernando da Fonseca Gajardoni60 denomina a dita medida como a ldquorevoluccedilatildeo

silenciosardquo da execuccedilatildeo por quantia certa posto que

() pelo fato de que a regra natildeo estar propriamente incrustrada nos capiacutetulo e livro atinentes ao cumprimento de sentenccedila e ao processo de execuccedilatildeo ndash o art 139 IV do Novo CPC parece trazer ao paiacutes algo bastante novo cuja aplicaccedilatildeo a depender do comportamento do Judiciaacuterio pode implicar em verdadeira revoluccedilatildeo (positiva ou negativa) na sistemaacutetica executiva ateacute entatildeo vigente

Claramente o dispositivo foi recebido com entusiasmo por parte da doutrina que

anteciparam em afirmar que o princiacutepio da atipicidade dos meios executivos no CPC2015

ldquo() assume a feiccedilatildeo de poder-dever geral conferido ao magistrado de determinar () todas

as medidas coercitivas sub-rogatoacuterias mandamentais e indutivas que entender necessaacuterias

para a tutela justa efetiva e em tempo razoaacutevelrdquo 61

Dessa forma lecionam Luiz Guilherme Marinoni Seacutergio Cruz Arenhart e Daniel

Mitidiero62 que

O juiz a partir do art 139 IV do CPC2015 natildeo estaacute mais adstrito apenas agrave sentenccedila condenatoacuteria ndash que fixa a obrigaccedilatildeo de pagar e daacute ensejo agrave abertura da execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo patrimonial ndash para a tutela de prestaccedilotildees pecuniaacuterias Pode impor essa prestaccedilatildeo por meio de ordem judicial acoplada ao aceno de emprego de medida de induccedilatildeo (coercitiva ou de pressatildeo positiva) ou de medida de sub-rogaccedilatildeo (MARINONI ARENHARDT MITIDIERO 2015 p 703)

Deste modo em razatildeo do art 139 IV do CPC tem-se entendido que o juiz nas

execuccedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria possui a faculdade de adotar qualquer

59 ZARONI Bruno Marzullo VITORELLI Edilson Reforma e efetividade da execuccedilatildeo no novo CPC

In PEIXOTO Ravi FREIRE Alexandre MENDES Aluiacutesio Gonccedilalves de Castro Execuccedilatildeo 2 ed rev e atual Salvador JusPodivm 2016 766 p (Coleccedilatildeo novo CPC doutrina selecionada v 5) p 66

60 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia 24082015 JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Acesso em 23082018

61 LIMA Rafael de Oliveira A atipicidade dos meios executivos no coacutedigo de processo civil brasileiro de 2015 Revista de Processo Jurisdiccedilatildeo e Efetividade da Justiccedila v 2 n 2 juldez 2016 p 11

62 MARINONI Luiz Guilherme ARENHART Seacutergio Cruz MITIDIERO Daniel Novo curso de processo civil tutela dos direitos mediante procedimento comum Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 v 2 p 703

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medida indutiva coercitiva mandamentais ou sub-rogatoacuterias para efetivar o creacutedito do

exequente natildeo se limitando as medidas tiacutepicas

Alguns doutrinadores se precipitaram ao afirmar que o dito dispositivo ldquo() autoriza o

juiz a utilizar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir ressalvando-se a prisatildeo

civil constitucionalmente limitada ao devedor de alimentosrdquo 63 Acreditam Jorge Bheron

Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa que o entusiasmo por parte da

doutrina abre margem para as mais variadas formas de compelir o devedor a cumprir com a

prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

ldquoE aiacute persistindo no mau vezo de fazer explicaccedilotildees em abstrato ignorando que o sentindo soacute se daacute na aplicaccedilatildeo (situaccedilatildeo concreta real ou fictiacutecia) as sugestatildeo satildeo as mais engenhosas suspensatildeo de CNH retenccedilatildeo de passaporte restriccedilatildeo de fim de semana cancelamento de cartotildees de creacutedito ndash para ficar apenas nestasrdquo 64

Ou seja podendo o juiz natildeo apenas substituir o devedor tomando seu patrimocircnio para

entregar ao credor na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia como tambeacutem poderaacute

pressionaacute-lo psicologicamente a adimplir por conta proacutepria a obrigaccedilatildeo

Ademais o Enunciado nordm 48 do ENFAM avalia expressamente a possibilidade de

imposiccedilatildeo de medidas coercitivas para a efetivaccedilatildeo da execuccedilatildeo pecuniaacuteria Conforme o dito

enunciado

ldquoO art 139 inciso IV traduz um poder geral de efetivaccedilatildeo permitindo a aplicaccedilatildeo de medidas atiacutepicas para garantir o cumprimento de qualquer ordem judicial inclusive no acircmbito do cumprimento de sentenccedila e no processo de execuccedilatildeo baseado em tiacutetulosrdquo

Dessa forma o artigo 139 IV do CPC permite uma gama ampla de interpretaccedilotildees por

parte da doutrina por ser uma claacuteusula geral encontrando limite apenas na imaginaccedilatildeo de

quem o analisa Nesse sentido eacute forccediloso orientar e delimitar o manejo desse artigo legal para

que se extraia seu sentido e alcance revelando assim sobre que situaccedilotildees ele incide de que

modo e o que permite

63 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

64 Ibid sem paginaccedilatildeo

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32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER

GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO

O artigo 139 IV com a vigecircncia do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 abriu margem

para uma constelaccedilatildeo de decisotildees nas quais o dito dispositivo recebeu diversas interpretaccedilotildees

pelos operadores do direito

Sem duacutevidas por ser uma das pioneiras a decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara

Ciacutevel do Foro Regional de Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-

1320138260011 na data de 25 de agosto de 2016 gerou um enorme rebuliccedilo

Nessa accedilatildeo que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto

uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a

suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o

passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito

Segundo a magistrada o processo tramitava haacute anos sem que nenhum valor tenha sido

pago ao exequente aleacutem do devedor natildeo ter oferecido proposta de acordo e nem ter indicado

bens agrave penhora configurando uma completa desiacutedia com o processo

ldquoO caso tratado nos autos se insere dentre as hipoacuteteses em que eacute cabiacutevel a aplicaccedilatildeo do art 139 inciso IV do Coacutedigo de Processo Civil Isso porque o processo tramita desde 2013 sem que qualquer valor tenha sido pago ao exequente Todas as medidas executivas cabiacuteveis foram tomadas sendo que o executado natildeo paga a diacutevida natildeo indica bens agrave penhora natildeo faz proposta de acordo e sequer cumpre de forma adequada as ordens judiciais frustrando a execuccedilatildeo

Se o executado natildeo tem como solver a presente diacutevida tambeacutem natildeo recursos para viagens internacionais ou para manter um veiacuteculo ou mesmo manter um cartatildeo de creacutedito Se poreacutem mantiver tais atividades poderaacute quitar a diacutevida razatildeo pela qual a medida coercitiva poderaacute se mostrar efetiva

Assim como medida coercitiva objetivando a efetivaccedilatildeo da presente execuccedilatildeo defiro o pedido formulado pelo exequente e suspendo a Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo do executado M A S determinando ainda a apreensatildeo de seu passaporte ateacute o pagamento da presente diacutevida

()

Determino ainda o cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado ateacute o pagamento da presente diacutevida ()rdquo

Foi impetrado Habeas Corpus no Tribunal de Justiccedila do Estado de Satildeo Paulo a favor

do executado sob o fundamento que a coaccedilatildeo era ilegal e afetava o direito de locomoccedilatildeo

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garantido constitucionalmente Tendo sido concedida a liminar em decisatildeo que ora se

reproduz

Em que pese a nova sistemaacutetica trazida pelo art 139 IV do CPC2015 deve-se considerar que a base estrutural do ordenamento juriacutedico eacute a Constituiccedilatildeo Federal que em seu art 5ordm XV consagra o direito de ir e vir Ademais o art 8ordm do CPC2015 tambeacutem preceitua que ao aplicar o ordenamento juriacutedico o juiz natildeo atentaraacute apenas para a eficiecircncia do processo mas tambeacutem aos fins sociais e agraves exigecircncias do bem comum devendo ainda resguardar e promover a dignidade da pessoa humana observando a proporcionalidade a razoabilidade e a legalidade Por tais motivos concedo a liminar pleiteada65

Cabe destacar aqui o voto vencido da Desembargadora Maria Luacutecia Pizzotti no

julgamento do Habeas Corpus supracitado demonstrando que o debate sobre a abrangecircncia

do artigo 139 IV do CPC ocorre tanto na doutrina quanto no judiciaacuterio

O objetivo do novel dispositivo natildeo eacute impor penas ou restringir direitos natildeo sendo intenccedilatildeo do Judiciaacuterio suspender indefinidamente o direito de dirigir do executado ou sua liberdade de viajar mas sim impor uma restriccedilatildeo tatildeo gravosa caso ele natildeo cumpra a determinaccedilatildeo que escolha cumprir sua obrigaccedilatildeo e dar fim ao problema Em outras palavras mediante as medidas de coerccedilatildeo o Estado procura persuadir o inadimplente impondo-lhe situaccedilotildees tatildeo onerosas e inconvenientes que em algum momento seja para ele mais vantajoso cumprir do que permanecer no inadimplemento

Ao fazecirc-lo o Novo Coacutedigo de Processo Civil rompe com as criacuteticas da ineficiecircncia das execuccedilotildees Natildeo se cogita deferir medidas restritivas agravequeles que demonstram a incapacidade absoluta de solver o deacutebito apenas agravequeles que reconhecidamente se valem de artimanhas e subterfuacutegios para evitar a satisfaccedilatildeo das diacutevidas ldquopreferindordquo outras despesas mais lsquonobresrsquo agindo em nome de terceiros e fazendo escaacuternio dos credores e do proacuteprio Poder Judiciaacuterio (hellip)

Para tanto memoraacutevel a noccedilatildeo de que a medida em comento tem caraacuteter excepcional e encontra limites no plano da proporcionalidade como sustenta o ilustrado Magistrado paulista Fernando da Fonseca Gajardoni Professor Faculdade de Direito de Ribeiratildeo Preto da USP (in httpswwwjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 acesso em 091216 agraves 11h20min) E para anaacutelise da proporcionalidade a ponderaccedilatildeo deve observar os trecircs passos apontados pela doutrina a necessidade a adequaccedilatildeo e a proporcionalidade em sentido estrito

65 TJSP - Habeas Corpus Processo nordm 2183713-8520168260000 30ordf Cacircmara Direito Privado relator

Des Marcos Ramos j 290317

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Ademais no entendimento de Jorge Amaury Maia Nunes e Guilherme Pupe de

Noacutebrega66 essa decisatildeo releva os perigos trazidos pelo art 139 IV do CPC ao confrontar

direitos constitucionalmente garantidos

De nossa parte entendemos que a liberdade de locomoccedilatildeo inserta no inciso XV do artigo 5ordm que abrange o direito de deixar o territoacuterio nacional sofre embaraccedilo indevido pela apreensatildeo de passaporte ou pela suspensatildeo da carteira nacional de habilitaccedilatildeo

()

Agrave luz da exposiccedilatildeo feita acima e em anaacutelise primeva sustentamos que o artigo 139 IV do CPC de 2015 estaacute a merecer declaraccedilatildeo de inconstitucionalidade sem reduccedilatildeo de texto para o fim de rechaccedilar a apreensatildeo de passaporte a suspensatildeo do direito de dirigir e a vedaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo em concurso ou em licitaccedilatildeo puacuteblicos como medidas passiacuteveis de serem adotadas pelo juiz sob pena de vulneraccedilatildeo aos artigos 1ordm IV 5ordm XV e LIV 37 I 173 sect 3ordm III e 175 todos da Constituiccedilatildeo

Apesar de ter sofrido duras criacuteticas a decisatildeo do processo de nordm 4001386-

1320138260011 serviu de inspiraccedilatildeo para tantas outras decisotildees no mesmo sentido

Foi o caso da decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de Satildeo

Vicente em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 0020724-2620088260590 na data de 21 de

junho de 2017

A supracitada execuccedilatildeo se arrastava por nove (09) anos sem que o devedor tenha

esboccedilado qualquer intenccedilatildeo de pagar a diacutevida O credor requereu a suspensatildeo da Carteira

Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado apreensatildeo do passaporte e cancelamento dos

cartotildees de creacutedito

O magistrado com embasamento no artigo 139 IV do CPC deferiu parcialmente o

pedido sob o fundamento de que a apreensatildeo de passaporte e CNH natildeo viola o direito de ir e

vir do devedor Entretanto o juiz indeferiu o pedido de cancelamento do cartatildeo de creacutedito por

acreditar que a suspensatildeo poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado tendo em

vista que atualmente as pessoas utilizam o referido cartatildeo para pagamento das despesas

diaacuterias

66 NOBREacuteGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139

IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018

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Eacute evidente que as medidas atiacutepicas de coerccedilatildeo devem ser utilizadas com cautela sempre respeitando a dignidade da pessoa do executado Natildeo se vislumbra contudo que as medidas aqui eleitas sejam capazes de vulnerar os Direitos Fundamentais do indiviacuteduo A uma porque natildeo se trata de restriccedilatildeo ao direito de ir e vir do executado que continua no gozo de plena liberdade de locomoccedilatildeo a duas porque a conduccedilatildeo de veiacuteculo automotor eacute mera comodidade da vida moderna natildeo se tratando de direito absoluto

Com mais razatildeo ainda se admite a suspensatildeo do Passaporte do executado que se natildeo paga a diacutevida da execuccedilatildeo natildeo deve ter o direito de fazer viagem internacional

Tem-se aqui verdadeiro exerciacutecio de ponderaccedilatildeo de interesses juriacutedicos de um lado jaz o direito de creacutedito do exequente que deriva do direito de propriedade e por isso mesmo tem envergadura constitucional de outro giro tem-se o direito do executado agrave autorizaccedilatildeo do Estado para conduzir veiacuteculo automotor e realizar viagens internacionais que natildeo se mostram essenciais agrave dignidade da pessoa humana Natildeo haacute duacutevidas pois de que eacute este uacuteltimo que deve sucumbir

O pedido fica indeferido apenas no tocante agrave suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado Eacute que ao contraacuterio da CNH e do passaporte que trazem consigo certa presunccedilatildeo de riqueza natildeo se pode concluir que o uso de cartatildeo de creacutedito eacute feito por luxo ou simples conveniecircncia

Como eacute cediccedilo os cartotildees de creacutedito oferecem ao seu titular creacutedito raacutepido e rotativo para o pagamento de despesas diaacuterias e certamente exercem funccedilatildeo essencial agravequeles que se encontram em situaccedilatildeo financeira precaacuteria

A suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado portanto se revela medida desproporcional e que inclusive poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado

Pelo exposto defiro em parte o pedido formulado pelo exequente e DETERMINO a suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo e bem como a suspensatildeo da validade (cancelamento temporaacuterio) no sistema SINPA de eventuais passaportes vaacutelidos em nome do executado

Dessa forma o artigo 139 IV do CPC revolucionou completamente a execuccedilatildeo de

obrigaccedilatildeo de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria ao permitir a utilizaccedilatildeo do uso dos meios executivos

atiacutepicos para compelir o executado a satisfazer o creacutedito do exequente

33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE

EFETIVACcedilAtildeO

Era inevitaacutevel que o artigo 139 IV do CPC gerasse todo tipo de reaccedilatildeo entre os

doutrinadores do processo civil e ateacute mesmo de outros ramos do direito devido a sua

capacidade de realizar uma completa inovaccedilatildeo na forma de se executar as obrigaccedilotildees de pagar

quantia Alguns o aplaudiram visualizando nele ldquouma luz no fim do tuacutenelrdquo outros o

criticaram vislumbrando as arbitrariedades que poderiam ser praticadas com embasamento no

referido dispositivo

32

As decisotildees suscitadas em linhas preteacuteritas auxiliaram para fervilhar ainda mais o

debate sobre o tema tendo em vista que por um lado poderia aumentar a efetividade das

execuccedilotildees por quantia no entanto por outro surgiam questionamentos a cerca da sua

constitucionalidade

A doutrina parece que demoraraacute a se pacificar sobre o tema Segundo alguns

doutrinadores seraacute inconstitucional toda restriccedilatildeo que recaia sobre a pessoa do devedor e natildeo

exclusivamente sobre o seu patrimocircnio Jaacute para outros o dispositivo eacute constitucional e o meio

mais eficaz para se resolver o problema da efetivaccedilatildeo das execuccedilotildees de pagar quantia ldquoA

discussatildeo se daacute especialmente no que diz respeito aacutes medidas de suspensatildeo de CNH

apreensatildeo de passaporte e bloqueio de cartotildees de creacutedito do devedorrdquo 67

O professor Thiago Rodovalho analisou detalhadamente a decisatildeo de nordm 4001386-

1320138260011 em seu artigo ldquoO necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na

concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivosrdquo 68 Quanto agrave suspensatildeo da CNH o autor

acredita que tal medida natildeo viola qualquer direito fundamental do devedor posto que ldquodirigir

veiacuteculos automotores eacute direito do cidadatildeo mas natildeo se confunde com os direitos fundamentais

e social de ir-e-vir e ao transporterdquo 69 O professor eacute categoacuterico ao afirmar que

Com relaccedilatildeo agrave suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (suspensatildeo do direito de dirigir restriccedilatildeo de direitos) natildeo nos parece haver qualquer violaccedilatildeo a direito fundamental ou social nem a direito da personalidade ou colocaccedilatildeo do devedor em situaccedilatildeo desproporcionalmente detrimentosa exceccedilatildeo feita aos que usam o veiacuteculo como instrumento de trabalho atraindo a hipoacutetese do NCPC art 833 inc V

()

Outrossim natildeo o consideramos como direito da personalidade Os direitos da personalidade satildeo os valores fundamentais que compotildeem o proacuteprio ser justamente por isso intransmissiacuteveis e irrenunciaacuteveis natildeo podendo o seu exerciacutecio sofrer limitaccedilatildeo voluntaacuteria (CC art 11) Por mais que vivamos num paiacutes que tanto valoriza o carro e que muitas pessoas de fato se compreendam em razatildeo e em funccedilatildeo do carro que dirijam este natildeo nos parece ser um direito que verdadeiramente componha a personalidade do indiviacuteduo70

67 DONTOS Sofia Poderes executoacuterios do juiz que diz a doutrina sobre o art 139 inc IV do CPC

Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigospoderes-executorios-do-juiz-que-diz-a-doutrina-sobre-art-139-inc-iv-do-cpc-23052018 gt Publicado em 23052018 Acesso em 01082018

68 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018

69 Ibid sem paginaccedilatildeo 70 Ibid sem paginaccedilatildeo

33

Quanto ao cancelamento dos cartotildees de credito do devedor o professor Thiago

Rodovalho tambeacutem acredita que natildeo haacute qualquer violaccedilatildeo ao direito fundamental social ou

da personalidade do devedor e acrescenta que

Tanto assim o eacute que ser titular de um cartatildeo de creacutedito pressupotildee ter creacutedito o que eacute analisado e concedido por instituiccedilotildees financeiras mais do que isso se porventura passando por dificuldades financeiras a pessoa deixa de honrar com pagamentos a mesma instituiccedilatildeo financeira concedente do cartatildeo de creacutedito pode sponte propria cancelaacute-lo ou recusar-lhe a concessatildeo Ora parece-me contraditoacuterio que instituiccedilotildees financeiras para sua proteccedilatildeo patrimonial possam ferir esse suposto ldquodireito fundamentalrdquo ou esse suposto ldquodireito da personalidaderdquo mas natildeo possa o Poder Judiciaacuterio igualmente fazecirc-lo contra aquele devedor moroso que instado ao pagamento e frustradas todas as tentativas de constriccedilatildeo patrimonial leva vida luxuosa valendo-se de cartotildees de creacutedito que prescindem de dinheiro em conta eacute dizer podem justamente funcionar como forma de ocultar renda e patrimocircnio71

O autor considera a apreensatildeo de passaporte um tema mais polecircmico e que merece

maior reflexatildeo No entanto crecirc que eacute possiacutevel a apreensatildeo de passaporte sem violar os

direitos fundamentais do devedor por se tratar de um direito de ir e vir de amplitude especial

Agrave primeira vista a possibilidade de apreensatildeo do passaporte tambeacutem nos parece possiacutevel pois tambeacutem se trata de um direito de ir e vir de amplitude especial Assim o eacute pois salvo situaccedilotildees especiais (refugiados p ex) haacute a necessidade de demonstrar condiccedilotildees financeiras de estadia e retorno para ser admitido no paiacutes de destino Ou seja pressupotildee uma condiccedilatildeo financeira que o devedor justamente diz natildeo possuir Sem embargo dessa consideraccedilatildeo esse ainda eacute um ponto que merece uma reflexatildeo mais acurada sendo essa apenas uma primeira impressatildeo72

Outros autores escreveram sobre o tema como eacute o caso do processualista Luiz

Dellore73 que tambeacutem defende que as medidas atiacutepicas como restriccedilatildeo ao direito de dirigir

apreensatildeo de passaporte e cancelamento de cartotildees de creacutedito satildeo permitidas e natildeo violam em

regra os direitos fundamentais do devedor

De minha parte creio que efetivamente haacute inovaccedilatildeo no at 139 IV do NCPC (e natildeo mera repeticcedilatildeo do que jaacute havia no Coacutedigo anterior) que tem o condatildeo de trazer mais efetividade ao processo executivo no Brasil ndash que por deacutecadas centrou sua atenccedilatildeo na defesa do executado (vide a grande quantidade de impenhorabilidades) sem dar maior atenccedilatildeo ao creacutedito do exequente

71 Ibid sem paginaccedilatildeo 72 Ibid sem paginaccedilatildeo 73 DELLORE Luiz NCPC Atipicidade das medidas executivas jaacute eacute realidade Disponiacutevel em lt

httpswwwjotainfoopiniao-e-analisecolunasnovo-cpcncpc-atipicidade-de-medidas-executivas-ja-e-realidade-17042017 gt Publicado em 17042017 Acesso em 03092018

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Logo a meu ver medidas como (i) restriccedilatildeo ao direito de dirigir (ii) apreensatildeo de passaporte (iii) cancelamento de cartotildees de creacutedito e (iv) vedaccedilatildeo de obtenccedilatildeo de novos empreacutestimos se natildeo vinculados ao pagamento do deacutebito exequendo dentre outras restriccedilotildees que deveratildeo ser observadas a cada caso satildeo permitidas pelo sistema do NCPC e em regra natildeo violam direitos fundamentais do devedor E tecircm o condatildeo de fazer com que o executado que tem recursos diante dessas medidas coercitivas pague o deacutebito trazendo sucesso agrave satisfaccedilatildeo do creacutedito

Nessa linha para Alexandre Fuchs das Neves74 o artigo 139 IV do CPC conferiu ao

juiz poderes coercitivos capazes de ldquotransformar a vida do devedor um infernordquo para compeli-

lo a cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria Entretanto pondera que para que a medida tenha

validade ldquoeacute necessaacuteria uma fundamentaccedilatildeo por evidente uma correlaccedilatildeo temaacutetica entre a

medida adotada e sua efetividade em face ao processo com fundamentaccedilatildeo detalhadardquo

No entendimento de Fernando Gajardoni75 satildeo possiacuteveis as medidas de apreensatildeo de

passaporte bloqueio de cartotildees de creacutedito e suspensatildeo da CNH Para ele o que limita o art

139 IV do CPC eacute o esgotamento dos meios tiacutepicos e a real necessidade da medida

Ilustrativamente natildeo efetuado o pagamento de diacutevida oriunda de multas de tracircnsito e superados os expedientes tradicionais de adimplemento (penhora de dinheiro e bens) seria liacutecito o estabelecimento da medida coercitivaindutiva de suspensatildeo do direito a conduzir veiacuteculo automotor ateacute pagamento do deacutebito (inclusive com apreensatildeo da CNH do devedor) natildeo efetuado pagamento de verbas salariais devidas a funcionaacuterios da empresa possiacutevel o estabelecimento de vedaccedilatildeo agrave contrataccedilatildeo de novos funcionaacuterios ateacute que seja saldada a diacutevida natildeo efetuado o pagamento de financiamento bancaacuterio na forma e no prazo avenccedilados possiacutevel ateacute que se tenha a quitaccedilatildeo que se obstem novos financiamentos ou mesmo a participaccedilatildeo do devedor em licitaccedilotildees (como de ordinaacuterio jaacute acontece com pessoas juriacutedicas em deacutebito tributaacuterio com o Poder Puacuteblico) etc

Teriacuteamos entatildeo no Brasil por assim dizer a adoccedilatildeo do padratildeo da atipicidade das medidas executivas tambeacutem para as obrigaccedilotildees de pagar vistas estas como ordens do EstadoJuiz para que haja prestaccedilatildeo de pagamento em pecuacutenia

()

Por isso ndash a prevalecer a interpretaccedilatildeo potencializada do art 139 IV do CPC2015 ndash o emprego de tais medidas coercitivasindutivas especialmente nas obrigaccedilotildees de pagar encontraraacute limite certo na excepcionalidade da medida (esgotamento dos meios tradicionais de satisfaccedilatildeo do deacutebito) na proporcionalidade (inclusive agrave luz da regra da menor onerosidade ao devedor do art 805 do CPC2015) na necessidade de fundamentaccedilatildeo substancial e especialmente nos direitos e garantias assegurados na Constituiccedilatildeo Federal (vg natildeo parece possiacutevel que se determine o pagamento sob pena de prisatildeo ou de vedaccedilatildeo ao exerciacutecio da profissatildeo do direito de ir e vir etc)

74 NEVES Alexandre Fuchs das Cancelamento de cartotildees de creacutedito e apreensatildeo de CNH e passaporte

do devedor Isso eacute possiacutevel Disponiacutevel em lt httpwwwsinfacspcombrconteudocancelamento-de-cartoes-de-credito-e-apreensao-de-cnh-e-passaporte-do-devedor-isso-e-possivel gt Acesso em 30082018

75 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Publicado em 24082015 Acesso em 30082018

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Jaacute Fernanda Tartuce76 acredita que tais medidas satildeo problemaacuteticas e devem ser

analisadas com cautela tendo em vista que ao inveacutes de afetarem o patrimocircnio do devedor

atingem a proacutepria pessoa

Sob certo prisma adotar medidas diferenciadas contribui para a efetividade da prestaccedilatildeo jurisdicional Por outro lado o patrimocircnio ndash e natildeo a pessoa do devedor - responde por diacutevidas aleacutem disso o exerciacutecio de amplos poderes pelo juiz sem balizas especiacuteficas pode ensejar medidas inadequadas Nessa linha suspender o direito de dirigir e restringir o uso de passaporte satildeo iniciativas problemaacuteticas por atingirem a pessoa do devedor enquanto a penhora da restituiccedilatildeo de Imposto de Renda soa viaacutevel por afetar seu patrimocircnio Eacute importante que a medida diferenciada se revele proporcional e seja aplicada apoacutes o exaurimento de outros meios previstos no ordenamento Como a proposta do Novo Coacutedigo eacute aumentar a eficiecircncia processual intentar medidas ineficazes inexequiacuteveis eou de difiacutecil fiscalizaccedilatildeo pode acabar ensejando o efeito contraacuterio

Nessa senda Lenio Streck e Dierle Nunes77 entendem que as medidas atiacutepicas de

suspensatildeo da CNH eou apreensatildeo de passaporte satildeo inconstitucionais Afirmam que natildeo se

pode confundir o processo civil e penal ainda que ambos remetam a um ldquoparadigma

constitucional comumrdquo e que o artigo 139 IV do CPC ldquoimpotildee novos desafios interpretativos

que podem conduzir a uma anaacutelise superficial e utilitarista de busca de resultados que

desprezem a necessaacuteria leitura constitucionalrdquo Os autores ainda ponderam que ldquoO perigo eacute o

artigo 139 IV ser transformado em instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com

autorizaccedilatildeo judicialrdquo

O professor Araken de Assis no dia 18 de abril de 2018 em um evento sobre o

Coacutedigo Processual Civil de 2015 que ocorreu em Brasiacutelia na sede do Conselho Federal da

OAB declarou ser contraacuterio aos poderes executoacuterios atiacutepicos ldquoSou contra os poderes

atiacutepicos dos juiacutezes porque seu exerciacutecio redunda em simples arbitrariedadesrdquo78

Acrescentou ainda que

76 IBDFAM ndash Instituto Brasileiro de Famiacutelia O polecircmico inciso IV do artigo 139 do CPC e suas difusas

interpretaccedilotildees Disponiacutevel em lt httpwwwibdfamorgbrnoticias6096O+polC3AAmico+inciso+IV+do+artigo+139+do+CPC+e+suas+difusas+interpretaC3A7C3B5es gt Publicado em 31082016 Acesso em 04092018

77 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018

78 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04092018

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Eacute evidentemente inconstitucional diante do princiacutepio da dignidade da pessoa humana tirar o passaporte carteira de habilitaccedilatildeo Quecirc que tem isso com diacutevidas Natildeo tem absolutamente nada Natildeo eacute a correlaccedilatildeo instrumental entre o objetivo da execuccedilatildeo e o meio empregado Isso eacute simples vinganccedila simples puniccedilatildeo79

O professor Araken de Assis acredita que tais medidas satildeo inconstitucionais e

violam o principio da dignidade humana do executado numa sociedade como a nossa

sedenta por puniccedilatildeo natildeo me surpreende que essas ideias sejam encaradas com

naturalidade Mas eacute preciso rejeitaacute-las em nome de princiacutepios 80

34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO

A Constituiccedilatildeo Federal de 1988 tem como um dos seus fundamentos a dignidade da

pessoa humana presente no artigo 1ordm inciso III do referido texto constitucional O dito

princiacutepio tem o escopo de nortear o ordenamento juriacutedico como um todo

A inclusatildeo da dignidade da pessoa humana como princiacutepio constitucional obrigou

uma reflexatildeo sobre o papel da pessoa humana no direito e um redimensionamento para

elevaacute-la ao centro do ordenamento juriacutedico81 Eacute necessaacuterio recorrer agrave teoria Kantiana para

que se obtenha uma definiccedilatildeo do princiacutepio ora estudado Para Kant82 o homem eacute um fim

em si mesmo natildeo uma funccedilatildeo do Estado Ou Naccedilatildeo O Estado e o direito devem estar

organizados em benefiacutecio do indiviacuteduo

Agora eu afirmo o homem ndash e de uma maneira geral todo o ser racional ndash existe como fim em si mesmo e natildeo apenas como meio para o uso arbitraacuterio desta ou daquela vontade Em todas as suas accedilotildees pelo contraacuterio tanto nas direcionadas a ele mesmo como nas que o satildeo a outros seres racionais deve ser ele sempre considerado simultaneamente como fim

Partindo da premissa de que para Immanuel Kant o homem eacute o fim em si mesmo

ldquodevemos compreender que a dignidade da pessoa humana eacute a noccedilatildeo o comando a direccedilatildeo

que se deve seguir funcionando como fundamento para a interpretaccedilatildeo de todos os direitos e

garantias conferidos agrave pessoa nos ordenamentos juriacutedicos de cada Estadordquo 83

79 Ibid sem paginaccedilatildeo 80 Ibid sem paginaccedilatildeo 81 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito

fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 461 82 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud KANT Immanuel Fundamentaccedilatildeo da metafiacutesica dos costumes

Satildeo Paulo Martin Claret 2003 p56-59 Coleccedilatildeo A Obra-Prima de Cada Autor 83 SCHIAFIANO Juliana Rocha op cit p 461

37

O princiacutepio constitucional da dignidade da pessoa humana estaacute diretamente ligado ao

conteuacutedo dos direitos fundamentais logo para que se cumpra com os direitos fundamentais

constitucionalmente instituiacutedos eacute necessaacuterio reconhecer e respeitar a dignidade da pessoa

humana conforme disciplina Ingo Sarlet84

Em suma o que se pretende sustentar de modo mais enfaacutetico eacute que a dignidade da pessoa humana na condiccedilatildeo de valor (principio normativo) fundamental que atrai o conteuacutedo de todos os direitos fundamentais exige e pressupotildee o reconhecimento e proteccedilatildeo dos direitos fundamentais de todas as dimensotildees (ou geraccedilotildees se assim preferirmos) Assim sem que se reconheccedilam agrave pessoa humana os direitos fundamentais que lhe satildeo inerentes em verdade estarse-aacute lhe negando a proacutepria dignidade A consagraccedilatildeo constitucional da dignidade da pessoa humana tem o propoacutesito de limitar a atuaccedilatildeo ou a omissatildeo do Estado para garantir os direitos do indiviacuteduo Assim eacute difiacutecil precisar os efeitos da norma que determina a dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado (como acontece com a Constituiccedilatildeo brasileira de 1988) poreacutem quando desrespeitados os direitos fundamentais do cidadatildeo eacute possiacutevel identificar que a dignidade deste foi violada

Logo ldquoteraacute respeitada a sua dignidade o individuo que tiver respeitados os seus

direitos fundamentaisrdquo 85 Os direitos fundamentais estatildeo apresentados na Constituiccedilatildeo

Federal da seguinte forma direitos individuais e coletivos direitos sociais direitos poliacuteticos e

direitos de nacionalidade que tecircm como escopo garantir as liberdades positivas aos

indiviacuteduos ldquoonde foram conquistados direitos agrave liberdade religiosa liberdade civil e

profissional agrave propriedade ao livre acesso ao Judiciaacuterio agrave ampla defesa e ao contraditoacuterio no

processual judicial ao sigilo de dados e informaccedilotildees pessoais entre outros que somados

garantem o cidadatildeo uma vida dignardquo 86

O cidadatildeo na Constituiccedilatildeo Federal de 88 diferente das constituiccedilotildees brasileiras

anteriores passou a ser fundamento e ganhou destaque nos direitos fundamentais tendo

garantida a sua vida a sua dignidade a sua seguranccedila a sua honra a sua liberdade e a sua

propriedade

84 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud SARLET Ingo Wolfgang Dignidade da pessoa humana e

direitos fundamentais na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 2ed Porto Alegre Livraria do Advogado 2002 p87 85 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito

fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 462 86 Ibid p 462

38

Segundo Carmem Luacutecia Antunes Rocha87 para garantir o Estado Democraacutetico de

Direito eacute necessaacuterio que a sua atuaccedilatildeo seja sempre em conformidade com o princiacutepio da

dignidade da pessoa humana

O Estado somente eacute democraacutetico em sua concepccedilatildeo constitucionalizaccedilatildeo e atuaccedilatildeo quando respeita o princiacutepio da dignidade da pessoa humana Natildeo haacute verbo constitucional natildeo haacute verbo governamental que se faccedilam legiacutetimos quando natildeo se voltam ao atendimento daquele princiacutepio Natildeo haacute verdade constitucional natildeo haacute suporte institucional para as poliacuteticas puacuteblicas que natildeo sejam destinadas ao pleno cumprimento daquele valor maior transformado em princiacutepio constitucional

O princiacutepio da dignidade humana constitucionalmente garantido impotildee limites ao

Estado compelindo aos oacutergatildeos e atividades estatais respeitar o ser humano e garanti-lo

condiccedilotildees miacutenimas para uma vida digna Dessa forma eacute niacutetido que o dito princiacutepio eacute

pressuposto e indispensaacutevel para legitimar outras normas constitucionais e

principalmente infraconstitucionais

O Coacutedigo de Processo Civil eacute umas das principais normas infraconstitucionais que

sofre influecircncia dos preceitos valores e princiacutepios esculpidos na Constituiccedilatildeo Federal

Logo como o principio da dignidade humana eacute um dos mais importantes pressupostos

constitucionais ldquoentatildeo eacute tranquilo afirmar-se que o novel ordenamento processual tem

de se render nas resoluccedilotildees dos aspectos processuais e a fim de se atingir uma soluccedilatildeo

justa adequada e efetiva ao postulado da dignidade da pessoa humanardquo 88

Dessa forma o legislador deve formular as normas infraconstitucionais de acordo e a

partir do conteuacutedo constitucional para Marinoni Mitidiero e Arenhart89

() o Coacutedigo de Processo Civil constitui direito constitucional aplicado O Coacutedigo deve ser interpretado de acordo com a Constituiccedilatildeo e com os direitos fundamentais o que significa que as duacutevidas interpretativas devem ser resolvidas a favor da otimizaccedilatildeo do alcance da Constituiccedilatildeo e do processo civil como meio para tutela de direitos

87 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud ROCHA Carmen Luacutecia Antunes O princiacutepio da dignidade da

pessoa humana e a exclusatildeo social Revista Interesse Puacuteblico n4 p23-48 1999 p33 88 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o

novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 367

89 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 14

39

Com o escopo de conferir eficaacutecia aos mandamentos constitucionais o CPC15 traz a

previsatildeo e diversas claacuteusulas gerais em seus primeiros artigos em um dos quais se

prestigia o princiacutepio da dignidade da pessoa humana

O referido princiacutepio estaacute disciplinado no artigo 8ordm do CPC15 e atua como um guia

sobre as demais normas do coacutedigo processual Eacute o que entende Nelson Rosenvald90

O maior cuidado do inteacuterprete eacute no sentido de jamais banalizar a dignidade fazendo dela um elixir processual tal como muitas vezes se vecirc na esfera do direito civil Penso que natildeo haacute maiores dificuldades em transpor a noccedilatildeo constitucional do princiacutepio para em seguida adaptaacute-la agraves singularidades do processo

Logo de acordo com o artigo 8ordm do CPC o oacutergatildeo julgador ao aplicar o ordenamento

juriacutedico deve resguardar a dignidade da pessoa humana Para Fredie Didier91 ldquoresguardar

nesse contexto eacute de um lado aplicar corretamente a norma juriacutedica lsquoproteccedilatildeo da dignidade

da pessoa humanarsquo e de outro natildeo violar a dignidaderdquo

O oacutergatildeo julgador deveraacute manter um comportamento ativo com o objetivo de promover

a dignidade da pessoa humana podendo tomar medidas de ofiacutecio para efetivar a dignidade da

pessoa humana Didier assevera que o magistrado poderaacute ainda ldquovaler-se da claacuteusula geral de

atipicidade (art 536 sect 1ordm) para a execuccedilatildeo do direito fundamental agrave dignidaderdquo 92 O autor

ainda traz dois exemplos

a) exigecircncia de respeito agrave ordem cronoloacutegica de conclusatildeo (art 12) caso de grave violaccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana que natildeo se encaixe em um dos incisos que excepcionam a regra de observacircncia da cronologia da conclusatildeo poderia o juiz ldquofurar a filardquo para promover a dignidade da pessoa humana b) prioridade na tramitaccedilatildeo processual pessoa que seja portadora de doenccedila grave mas que natildeo esteja no rol do art 1048 I para promover a dignidade de pessoa humana o juiz poderia determinar o processamento prioritaacuterio93

Essa dupla garantia ndash resguardo e promoccedilatildeo ndash tem como objetivo garantir ao individuo

sua dignidade humana fazendo com que ldquode um lado que o Estado natildeo a viole e de outro

que o Estado a promova e efetiverdquo

90 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud ROSENVALD Nelson A

dignidade da pessoa humana no CPC15 91 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte

geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 75 92 Ibid p 75 93 Ibid p 75

40

Nessa senda o magistrado deveraacute promover a dignidade da pessoa humana quando

perceber a ausecircncia desta no processo ou assegura-la quando for posta em risco Eacute nesse

sentido o entendimento dos professores Marinoni Mitidiero e Arenhart94

() a dignidade da pessoa humana determina a compreensatildeo do processo civil como um meio para tutela dos direitos Vale dizer o processo civil natildeo pode ser visto como um instrumento a serviccedilo do Estado como um instrumento que natildeo se encontre orientado agrave realizaccedilatildeo dos fins da pessoa humana Em outras palavras o processo civil serve para realizaccedilatildeo dos direitos e para orientaccedilatildeo das pessoas a respeito do significado do direito

Nessa senda compete tanto ao juiz quanto as demais partes processuais garantirem ldquoo

valor intriacutenseco de cada vida que eacute trazida ao processordquo nas palavras de Alexandre Freitas

Cacircmara95

() aos sujeitos do processo eacute preciso sempre ter claro que os titulares dos interesses em conflitos satildeo pessoas reais cujas vidas seratildeo afetadas pelo resultado do processo e que por isso mesmo tecircm o direito de estabelecer suas estrateacutegias processuais de acordo com aquilo que lhes pareccedila melhor para suas vidas Eacute inadmissiacutevel tratar as partes como se natildeo fossem pessoas reais meros dados estatiacutesticos Afinal se para o Judiciaacuterio cada processo pode parecer apenas mais um processo para as partes cada processo pode ser o uacutenico o mais relevante aquele em que sua vida seraacute decidida E eacute dever do juiz assegurar que isto seja respeitado

Dessa forma eacute necessaacuterio que um arcabouccedilo normativo para que seja conferida

eficaacutecia e proteccedilatildeo ao principio da dignidade da pessoa humana

Logo o dito princiacutepio deve ser protegido em todas as esferas do ordenamento juriacutedico

inclusive no campo da execuccedilatildeo civil onde sofre grandes riscos de ser violado em nome do

direito fundamental agrave tutela executiva do credor ldquoPartir da premissa de que existe um direito

fundamental agrave tutela executiva ora ratificado pelo CPC eacute indispensaacutevel para a soluccedilatildeo de

diversos problemas oriundos do procedimento executivo principalmente aqueles relacionados

agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo 96

94 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme

MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 25

95 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CAcircMARA Alexandre Freitas O Novo Processo Civil Brasileiro 2 ed Satildeo Paulo Atlas 2016 p 7

96 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66

41

Eacute o caso por exemplo da impenhorabilidade Segundo Fredie Didier et al97 a

impenhorabilidade eacute uma forma de proteger certos bens do devedor do direito fundamental a

execuccedilatildeo do credor

Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa

Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais

O legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do CPC fazendo um

preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses em anaacutelise ao optar pela mitigaccedilatildeo do direito

do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado Afinal ldquoa execuccedilatildeo natildeo pode ser utilizada

como instrumento para causar a ruiacutena a fome e o desabrigo do devedor e sua famiacutelia gerando

situaccedilotildees incompatiacuteveis com a dignidade da pessoa humana 98

Logo a impenhorabilidade de certos bens

[] Eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa99

Eacute nesse sentido que o CPC15 enumera diversos casos de bens patrimoniais que satildeo

impenhoraacuteveis como o salaacuterio e vencimentos utensiacutelios necessaacuterios ao exerciacutecio da

profissatildeo seguro de vida vestuaacuterios e pertences de uso pessoal entre outros

Dessa forma as regras relativas agraves medidas executivas devem ser interpretadas agrave luz

da Constituiccedilatildeo Federal ldquovez que se voltam agrave realizaccedilatildeo de direitos fundamentais e em sua

97 Ibid p 66 98 THEODORO JUacuteNIOR Humberto Novo Coacutedigo de Processo Civil Anotado 20 ed Rio de Janeiro

Forense 2016 p 978 99 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud DIDIER JR Fredie CUNHA

Leonardo Carneiro da BRAGA Paula Sarno OLIVEIRA Rafael Alexandria de Curso de direito processual civil 3 ed Salvador JusPodivm 2011 v 5 p 547

42

realizaccedilatildeo podem atingir direitos fundamentaisrdquo 100 O Superior Tribunal de Justiccedila jaacute decidiu

que

O rol das impenhorabilidades do ordenamento paacutetrio objetiva preservar o miacutenimo patrimonial necessaacuterio agrave existecircncia digna do executado impondo ao processo executoacuterio certos limites Assim a depender das peculiaridades do caso as regras de impenhorabilidade podem ser ampliadas de modo a adequar a tutela aos direitos fundamentais como por exemplo o direito agrave moradia agrave sauacutede ou agrave dignidade da pessoa humana Trata-se portanto da aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo e da necessidade sob o enfoque da proporcionalidade101 (STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014)

Logo a interpretaccedilatildeo dos dispositivos que tratam sobre a penhora no CPC deve estaacute

diretamente ligada aos ditames constitucionais devendo o interprete privilegiar a opccedilatildeo que

esteja mais em sintonia com a Carta Magna para que nem o credor e nem o devedor sejam

lesados

O artigo 833 do CPC elenca uma seacuterie de incisos que expotildeem os bens impenhoraacuteveis

O trecho inicial inciso I do art 833 define como impenhoraacuteveis os bens inalienaacuteveis Este

inciso segue a regra de que ldquose o bem natildeo pode ser alienado tambeacutem natildeo pode ser penhorado

porque a penhora eacute o primeiro ato do procedimento de alienaccedilatildeo judicial do bemrdquo 102

Satildeo exemplos de bens inalienaacuteveis os puacuteblicos cuja alienaccedilatildeo depende de autorizaccedilatildeo

legislativa Eacute inalienaacutevel tambeacutem o capital constituiacutedo para garantir indenizaccedilatildeo de ato iliacutecito

(art 533 sect 1 ordm CPC) que portanto eacute tambeacutem impenhoraacutevel ldquoTodo bem inalienaacutevel eacute

impenhoraacutevel embora nem todo bem impenhoraacutevel seja inalienaacutevelrdquo 103

O inciso I do art 833 CPC tambeacutem consagra a impenhorabilidade dos bens que por

ato voluntaacuterio satildeo excluiacutedos da execuccedilatildeo

Segundo Fredie Didier et al104

Eacute o que ocorre nos casos de bens doados ou alienados com claacuteusula de inalienabilidade que haacute de constar no registro imobiliaacuterio para ser eficaz perante o exequente e minimizar o risco de fraude A propoacutesito eis a redaccedilatildeo do art 1911 do Coacutedigo Civil lsquolsquoA claacuteusula de inalienabilidade imposta aos bens por ato de liberalidade implica impenhorabilidade e incomunicabilidaderdquo

100 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MEDINA Joseacute Miguel Garcia

Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 1 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 p 736 101 STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014 102 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 824 103 Ibid p 824 104 Ibid p 825

43

O inciso II por sua vez estabelece que satildeo impenhoraacuteveis os bens moacuteveis os

pertences e as utilidades domeacutesticas da residecircncia do executado Todavia excepcionam-se os

bens dessa natureza que sejam de elevado valor ou que ultrapassem as necessidades comuns

correspondentes a um meacutedio padratildeo de vida

A jurisprudecircncia natildeo eacute paciacutefica sobre o assunto logo natildeo exista uma relaccedilatildeo de bens

que podem ser atingidos pela penhora Abrindo margem para as mais variadas decisotildees

O STJ jaacute considerou impenhoraacuteveis aparelho de televisatildeo a cores mesa de centro passadeira raacutedio toca-fitas gravador microondas ar-condicionado um freezer um microcomputador com acessoacuterios uma impressora etc Poderatildeo ser penhorados porque ultrapassam o padratildeo-meacutedio aparelhos de TV mais sofisticados o segundo aparelho de televisatildeo a segunda geladeira aparelhos de ar-condicionado que satildeo verdadeiras peccedilas de design moacuteveis antigos que se transformam em peccedilas de decoraccedilatildeo faqueiro de prata adega climatizada etc Em entendimento de caraacuteter ainda mais geneacuterico jaacute restou consignado em determinado precedente que a proteccedilatildeo natildeo abrangeria apenas os bens indispensaacuteveis agrave moradia mas tambeacutem aqueles usualmente encontrados em um lar105

Ademais o inciso III do art 833 do CPC traz a impenhorabilidade dos vestuaacuterios bem

como os pertences de uso pessoal do executado salvo se de elevado valor

Segundo Fredie Didier et al106 o dispositivo possui dois propoacutesitos

de um lado preservar a dignidade do executado com a proteccedilatildeo de bens moacuteveis importantes para a sua sobrevivecircncia digna como o vestuaacuterio aparelho celular reloacutegio e os bens relacionados agrave sua higiene pessoal de outro lado a regra visa prestigiar a boa-feacute processual impedindo a execuccedilatildeo mesquinha e abusiva com a penhora de bens de pequeno ou nenhum valor como um pente ou uma bota

O inciso IV do art 833 do CPC consagra uma das mais importantes modalidades a

impenhorabilidade relativa aos rendimentos de natureza alimentar ldquoTrata-se de regra que

possui o claro propoacutesito de proteger o executado garantindo-lhe o recebimento de valores que

servem ao pagamento das despesas relacionadas agrave sua sobrevivecircncia digna e agrave da sua famiacuteliardquo 107

Jaacute inciso V do art 833 do CPC torna impenhoraacuteveis os livros as maacutequinas as

ferramentas os utensiacutelios os instrumentos ou outros bens moacuteveis necessaacuterios ou uacuteteis ao

exerciacutecio de qualquer profissatildeo 105 Ibid p 826 106 Ibid p 827 107 Ibid p 828

44

Por forccedila do paraacutegrafo 3ordm do art 833 satildeo igualmente impenhoraacuteveis os equipamentos

implementos e maacutequinas agriacutecolas pertencentes agrave pessoa fiacutesica ou a empresa individual

produtora rural Rodrigo Mazzei e Sarah Merccedilon108 esclarecem que

Tem assento na noccedilatildeo de que a dignidade estende-se tambeacutem ao exerciacutecio da profissatildeo em si mesma e tambeacutem por representar a forma por excelecircncia de que dispotildee o executado para continuar a receber sua remuneraccedilatildeo e por conseguinte prover seu sustento e de sua famiacutelia Trata-se tambeacutem de aplicaccedilatildeo pontual da funccedilatildeo social da propriedade jaacute que protege os bens que permitem a circulaccedilatildeo de riquezas para a subsistecircncia do executado e se for o caso de sua famiacutelia

Forccediloso ressaltar ainda que a impenhorabilidade do inc V alcanccedila apenas os bens

moacuteveis de modo que eacute absolutamente possiacutevel que o imoacutevel em que o executado exerccedila sua

atividade profissional seja penhorado conforme a Suacutemula 451 do STJ ldquoEacute legiacutetima a penhora

da sede do estabelecimento comercialrdquo

O inciso VI do art 833 do CPC versa sobre a impenhorabilidade do seguro de vida

ldquoTrata-se de impenhorabilidade em favor do beneficiaacuterio do seguro e natildeo do segurado ateacute

porque o valor do seguro natildeo compotildee nem comporaacute o seu patrimocircnio (art794 do Coacutedigo

Civil1 ordm7)rdquo Dessa forma ldquoem uma execuccedilatildeo contra o segurado natildeo seraacute possiacutevel a penhora

do seguro de vida pois se trata de bem que natildeo lhe pertence nem mesmo em expectativardquo

De acordo com o inciso VII do art 833 do CPC satildeo impenhoraacuteveis os materiais

necessaacuterios para obras em andamento salvo se essas forem penhoradas Logo a obra pode

ser penhorada (art 862 do CPC) ldquoA regra como bem lembrou Araken de Assis lsquoestimula a

penhora da proacutepria obra inconclusa agrave qual os materiais acrescem e conseguintemente

valorizamrsquo 109

O art 833 VIII CPC julga impenhoraacutevel a pequena propriedade rural assim

definida em lei desde que trabalhada pela famiacutelia reproduzindo parte do art 5ordm XXVI CF

88116 que disciplina a impenhorabilidade do referido bem

A proteccedilatildeo do CPC eacute mais ampla do que a garantia prevista na Constituiccedilatildeo Federal

tendo em vista que a impenhorabilidade natildeo se restringe agraves execuccedilotildees de deacutebitos decorrentes

de sua atividade produtiva podendo ser alegada em toda e qualquer execuccedilatildeo ldquoAssim o 108 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CABRAL Antonio Passo

CRAMER Ronaldo (orgs) Comentaacuterios ao Novo Coacutedigo de Processo Civil Rio de Janeiro Forense 2015 p 1194

109 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 835

45

imoacutevel natildeo pode ser penhorado na execuccedilatildeo de creacutedito rural concedido para estimular a

produccedilatildeo agriacutecola mas poderaacute ser penhorado na execuccedilatildeo do creacutedito concedido para a

aquisiccedilatildeo do imoacutevelrdquo 110

A nona modalidade de impenhorabilidade trata-se dos recursos puacuteblicos recebidos por

instituiccedilotildees privadas para aplicaccedilatildeo compulsoacuteria em educaccedilatildeo sauacutede ou assistecircncia social ldquoA

proteccedilatildeo eacute louvaacutevel e tutela toda a coletividade ao privilegiar o direito agrave educaccedilatildeo sauacutede e

assistecircncia social em detrimento do direito do credorrdquo

De acordo com o inciso X do art 833 do CPC eacute impenhoraacutevel ateacute o limite de

quarenta salaacuterios miacutenimos a quantia depositada em caderneta de poupanccedila

Eacute uma modalidade de impenhorabilidade relativa (o CPC73 a considerava absoluta)

tendo em vista que essa impenhorabilidade natildeo pode ser oposta na execuccedilatildeo de alimentos

independentemente da sua origem (art 833 sect 2ordm do CPC) Fredie Didier et al cita Araken de

Assis111 ao afirmar que

a regra soacute protege essa aplicaccedilatildeo financeira Se o valor estiver depositado em fundo de investimento por exemplo poderaacute ser penhorado Se o devedor tiver vaacuterias cadernetas de poupanccedila a impenhorabilidade aplica-se agrave soma de todas elas e natildeo a cada uma delas isoladamente do contraacuterio valores expressivos poderiam ser pulverizados em vaacuterias contas burlando a finalidade da regra que eacute a de proteger a populaccedilatildeo de baixa renda

Ademais satildeo tambeacutem impenhoraacuteveis por forccedila do inciso XI os recursos puacuteblicos do

fundo partidaacuterio recebidos por partido poliacutetico nos termos da lei Essa modalidade de

impenhorabilidade ldquose restringe aos recursos puacuteblicos do fundo partidaacuterio Recursos de

origem privada recebidos pelo partido poliacutetico poderatildeo ser penhoradosrdquo 112 O processualista

Fredie Didier et al113 assevera que

Assim a impenhorabilidade foi estabelecida no intuito de impedir que os diretoacuterios nacionais de partidos poliacuteticos respondam por diacutevida dos diretoacuterios

110 Ibid p 836 111 DIDIER JR Fredie et al apud ASSIS Araken de Manual da execuccedilatildeo 11ordm ed cit p 225 Assim

tambeacutem REDONDO Bruno Garcia LOJO Maacuterio Vitor Suarez Penhora cit p 117 BUENO Cassio Scarpinella Curso sistematizado de Direito Processual Civil v 3 cit p 228 GIANNICO Mauriacutecio As novas reformas do CPC e de outras normas processuais Mauriacutecio Giannico e Viacutetor Joseacute de Mello Monteiro (coord) Satildeo Paulo Saraiva 2009 p 1 OS Em sentido diverso estendendo a impenhorabiacutelidade aos depoacutesitos feitos ateacute esse valor em CDB CDI fundos de renda fixa ou de accedilotildees RODRIGUES Marcelo Abelha Manual de execuccedilatildeo civil 3deg ed cit p 101

112 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 839

113 Ibid p 839

46

estaduaismunicipais - sobretudo em razatildeo das vaacuterias decisotildees judiciais que determinaram penhora de recursos do fundo partidaacuterio de alguns partidos

Por fim o inciso XII do artigo 833 do CPC trata sobre a impenhorabilidade dos

creacuteditos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias sob o regime de incorporaccedilatildeo imobiliaacuteria

vinculados agrave execuccedilatildeo de obra ldquoO objetivo dessa modalidade eacute evitar que diacutevidas do

incorporador possam consumir os recursos que seriam utilizados na realizaccedilatildeo da obra em

prejuiacutezo dos adquirentes de unidades autocircnomasrdquo 114

O professor Misael Montenegro Filho115 aduz sobre que ldquoao estabelecer a

impenhorabilidade dos creacuteditos oriundos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias o novo CPC

protegeu os valores destinados agrave execuccedilatildeo da obra e agrave entrega das unidades imobiliaacuterias aos

adquirentes assegurando assim a execuccedilatildeo da promessa contratualrdquo

Importante frisar ainda que a Lei nordm 8009 1990 instituiu a impenhorabilidade do

imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar por qualquer diacutevida salvo as exceccedilotildees dos

seus arts 3ordm e 4ordm

A referida lei dispotildee que Para os efeitos de impenhorabilidade considera-se

residecircncia um uacutenico imoacutevel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia

permanente (art 5ordm)

O processualista baiano Fredie Didier et al116 assevera que

A lei propotildee-se a proteger imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar nos termos acima expostos A CF 88 ampliou o conceito de entidade familiar para abranger a famiacutelia monoparental e a uniatildeo estaacutevel Mas deve considerar-se aiacute compreendidos os irmatildeos que vivem juntos e a uniatildeo homossexual Ateacute o solteiro estaacute abrangido pela impenhorabilidade se reside soacute no imoacutevel - isso em nome da proteccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana e da moradia digna Na verdade houve uma mudanccedila de compreensatildeo acerca do sentido da proteccedilatildeo de proteccedilatildeo da famiacutelia agrave proteccedilatildeo da moradia indispensaacutevel agrave preservaccedilatildeo da dignidade da pessoa

114 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o

novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 388

115 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MONTENEGRO FILHO Misael Novo Coacutedigo de Processo Civil Comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Atlas 2016 p 752

116 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 840-841

47

O STJ jaacute consolidou esse entendimento na suacutemula nordm 364 O conceito de

impenhorabilidade de bem de famiacutelia abrange tambeacutem o imoacutevel pertencente a pessoas

solteiras separadas e viuacutevas

Entretanto se o casal ou entidade familiar possuir vaacuterios imoacuteveis utilizados como

residecircncia a impenhorabilidade recairaacute sobre o de menor valor (art 5ordm paraacutegrafo uacutenico) ldquoEacute o

que ocorre por exemplo quando a famiacutelia se divide em mais de uma cidade por motivos

profissionaisrdquo 117

Forccediloso observar ainda que a impenhorabilidade do imoacutevel familiar eacute relativa jaacute que

natildeo pode ser oposta a qualquer creacutedito O art 3ordm da Lei n 8009 1990151 em que pode ser

penhorada a residecircncia da famiacutelia (exemplo execuccedilatildeo de alimentos para cobranccedila de taxas

devidas em funccedilatildeo do imoacutevel familiar etc)

Resta claro que o artigo 833 do CPC ao disciplinar as hipoacuteteses de impenhorabilidade

possui o escopo de proteger o princiacutepio da dignidade humana Entretanto algumas claacuteusulas

natildeo possuem proteccedilatildeo absoluta ldquoa sua relativizaccedilatildeo a depender do caso sob exame deve ser

realccedilada agrave medida que a dignidade resguardada e protegida pelo sistema processual-

constitucional natildeo se limita ao executadordquo 118 Ademais ldquoEacute premente advertidamente que a

dignidade do credor tambeacutem seja garantida em juiacutezo tendo como norte pois os princiacutepios da

proporcionalidade e razoabilidaderdquo 119

117 Ibid p 841 118 Ibid p 752 119 Ibid p 752

48

4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA

ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE

HUMANA DO EXECUTADO

41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE

EFETIVACcedilAtildeO

Como jaacute exposto em linhas preteacuteritas nos meios executivos tiacutepicos as medidas

executivas satildeo determinadas pela lei ou seja o oacutergatildeo pode aplicar somente as medidas

tipificadas no ordenamento juriacutedico No entanto ao se tratar das medidas executivas atiacutepicas

eacute necessaacuterio que haja um limite na atuaccedilatildeo realizada pelo juiz

O poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo poder ser realizado de maneira indiscriminada haacute

pressupostos e premissas a serem observadas Dessa forma a primeira premissa eacute no sentindo

de que a medida executiva atiacutepica natildeo pode ser a primeira medida a ser invocada ldquomuito ao

reveacutes a regra do nosso sistema continua a ser o da tipicidade dos meios executivos soacute que

agora temperado pelo sistema atiacutepicordquo 120 O processualista Thiago Rodovalho explica que

ldquo() os meios atiacutepicos natildeo satildeo prima ratio e sim a ultima ratio eacute dizer esgotados e

frustrados os meios executivos tiacutepicos e ordinaacuterios pode-se em tese valer-se do sistema

atiacutepicordquo121

Dessa forma nos casos de execuccedilatildeo que tenha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

natildeo deve ser aplicado de logo as medidas indutivas e coercitivas Apenas apoacutes frustradas as

medidas ldquonaturaisrdquo pode-se passar agrave aplicaccedilatildeo das medidas atiacutepicas

Uma segunda premissa diz a respeitos dos meios de pressatildeo para compelir o devedor a

adimplir com o seu deacutebito ldquoEssa segunda premissa decorre inclusive de imperiosidade

loacutegica de nada adianta a medida de pressatildeo se a obrigaccedilatildeo natildeo tem como ser adimplida pelo

devedorrdquo 122

Para Thiago Rodovalho123 ldquoIsso quer significar que esgotados e frustrados os meios

tiacutepicos o juiz se valeraacute dos meios atiacutepicos se eles forem potencialmente haacutebeis a estimular ou

120 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da

atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018

121 Ibid sem paginaccedilatildeo 122 Ibid sem paginaccedilatildeo 123 Ibid sem paginaccedilatildeo

49

forccedilar o cumprimento o que pressupotildee sua possibilidade quando entatildeo eles poderatildeo ser

eficazesrdquo

Logo nas obrigaccedilotildees de pagar quantia se houver a real demonstraccedilatildeo da

impossibilidade financeira do devedor seria um constrangimento inuacutetil e desnecessaacuterio a

imposiccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo para forccedilar o cumprimento

Por isso as medidas atiacutepicas devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o

esgotamento das medidas tiacutepicas e a possibilidade de cumprimento de cumprimento da

obrigaccedilatildeo

Ademais superadas as supracitadas premissas e o oacutergatildeo julgador vislumbrando a

necessidade da aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo se faz necessaacuterio que um conjunto de

postulados e princiacutepios rejam a atuaccedilatildeo do oacutergatildeo julgador servindo de norte para a escolha da

medida executiva mais adequada ldquoDe modo geral a escolha deve pautar-se nos postulados da

proporcionalidade da razoabilidade (art8ordm CPC) e da proibiccedilatildeo de excesso bem como nos

princiacutepios da eficiecircncia e da menor onerosidade da execuccedilatildeordquo 124

O professor Fredie Didier et al125 eacute categoacuterico ao citar Humberto Aacutevila

Segundo Humberto Aacutevila o postulado da proporcionalidade se manifesta nas situaccedilotildees em que haacute uma relaccedilatildeo de causalidade entre dois elementos empiricamente discerniacuteveis um meio e um fim de tal sorte que se possa proceder aos trecircs exames fundamentais o da adequaccedilatildeo (o meio promove o fim) o da necessidade (dentre os meios disponiacuteveis e igualmente adequados para promover o fim natildeo haacute outro meio menos restritivo do(s) direito(s) fundamental (is) afetado(s)) e o da proporcionalidade em sentido estrito (as vantagens trazidas pela promoccedilatildeo do fim correspondem agraves desvantagens provocadas pela adoccedilatildeo do meio)

O juiz ao aplicar a medida executiva atiacutepica ao caso concreto deve ter seu

embasamento no princiacutepio da proporcionalidade para saber se a medida a ser tomada eacute a

melhor opccedilatildeo ao caso sub judice ldquoO exame de proporcionalidade aplica-se sempre que

houver uma medida concreta destinada a realizar uma finalidaderdquo 126

Em verdade a aplicaccedilatildeo do princiacutepio da proporcionalidade eacute imprescindiacutevel na adoccedilatildeo

dos meios executivos atiacutepicos tendo em vista que ldquo() tais medidas em especial quando de

124 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111 125 DIDIER JR Fredie et al apud AVILA Humberto Teoria dos princiacutepios da definiccedilatildeo agrave aplicaccedilatildeo

dos princiacutepios juriacutedicos 16 ed Satildeo Paulo Malheiros 2015 p 205 126 DIDIER JR Fredie et al op cit p 111

50

natureza coercitiva podem restringir direitos do devedor e incidir diretamente sobre sua

pessoardquo127 Logo ainda que o princiacutepio da efetividade da tutela executiva seja um direito

fundamental o mesmo ldquo() deve ser compatibilizado com direitos fundamentais do

executado para que a sua dignidade humana seja preservadardquo 128

Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Neves129 afirma que em nome do princiacutepio da

proporcionalidade o juiz deveraacute

() ponderar no caso concreto as vantagens praacuteticas da adoccedilatildeo de cada medida executiva atiacutepica em especial as de natureza coercitiva e as desvantagens de sua adoccedilatildeo levando em conta a possibilidade de a medida criar uma limitaccedilatildeo excessiva ao exerciacutecio de direito fundamental do executado

Outro princiacutepio que o oacutergatildeo julgador deve se ater ao escolher a medida executiva

atiacutepica eacute o da razoabilidade Segundo Fredie Didier et al 130 o princiacutepio (ou postulado)131 se

manifesta de trecircs formas

a) como dever de equidade a exigir a harmonizaccedilatildeo da norma geral com o caso individual impondo a consideraccedilatildeo daquilo que normalmente acontece em detrimento do que eacute extraordinaacuterio e tambeacutem impondo a consideraccedilatildeo das especificidades do caso concreto ante a generalidade da norma b) como dever de congruecircncia a exigir a harmonizaccedilatildeo das normas com suas condiccedilotildees externas de aplicaccedilatildeo (isto eacute com a realidade com base em que foram editadas) c) como dever de equivalecircncia a exigir uma relaccedilatildeo de equivalecircncia entre a medida adotada e o criteacuterio que a dimensiona

Logo ldquo() o princiacutepio da razoabilidade deve nortear a atuaccedilatildeo do juiz na adoccedilatildeo das

medidas executivas atiacutepicas previstas no art 139 IV do Novo CPCrdquo 132 tendo em vista que

ldquo() mesmo medidas que pelo princiacutepio da proporcionalidade podem se mostrar

abstratamente possiacuteveis de adoccedilatildeo no caso concreto podem se mostrar inadequadas e

irrazoaacuteveisrdquo 133

127 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Medidas executivas atiacutepicas na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de

pagar quantia certa art 139 IV do novo CPC Revista de Processo v 42 n 265 mar 2017 p 14 128 Ibid p 14 129 Ibid p 14 130 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111-112 131 Segundo Fredie Didier et al o postulado eacute uma norma que atua sobre a aplicaccedilatildeo de outras normas

A proporcionalidade e a razoabilidade seriam postulados normativos e natildeo princiacutepios segundo essa concepccedilatildeo 132 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo op cit p 14 133 Ibid p 14

51

Ademais conforme dispotildee o postulado da proibiccedilatildeo de excesso ldquoa realizaccedilatildeo de uma

regra ou princiacutepio constitucional natildeo pode conduzir agrave restriccedilatildeo a um direito fundamental que

lhe retire um miacutenimo de eficaacuteciardquo 134

A proibiccedilatildeo de excesso deveraacute sempre ser suscitada quando um direito fundamental

houver sido violado a ponto do direito fundamental sofrer violaccedilatildeo excessiva Ademais ldquoesse

postulado natildeo se confunde com o da proporcionalidade porque ele dispensa os exames da

adequaccedilatildeo (relaccedilatildeo meiofim) da necessidade (exigibilidade) ou da proporcionalidade em

sentido estrito (ponderaccedilatildeo entre vantagens e desvantagens)rdquo 135

Logo ldquopouco importa a relaccedilatildeo meiofim ou a exigibilidade da medida ou ainda a

ponderaccedilatildeo com outro direito fundamental eventualmente em jogo aqui se analisa apenas a

eficaacutecia de um determinado direito fundamentalrdquo 136

O princiacutepio da eficiecircncia tem previsatildeo constitucional no art 37 e previsatildeo

infraconstitucional no art 8ordm do CPC15 O referido princiacutepio determina que o processo seja

conduzido de forma eficiente pelo oacutergatildeo jurisdicional

Entende-se que eficiente eacute a atuaccedilatildeo que utilize adequadamente os meios necessaacuterios

para que se atinjam os fins almejados O oacutergatildeo jurisdicional na escolha dos meios a serem

utilizados para a obtenccedilatildeo dos fins

a) deve escolher aqueles que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo (deve evitar meios que promovam resultados insignificantes) b) deve escolher meios que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado (natildeo se pode escolher um meio de resultado duvidoso) c) natildeo pode escolher um meio que produza muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscado 137

O juiz deveraacute igualmente analisar o princiacutepio da menor onerosidade da execuccedilatildeo que

eacute previsto pelo art 805 do CPC ldquoArt 805 Quando por vaacuterios meios o exequente puder

promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o

executadordquo

134 134 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 112 135 Ibid p 112 136 Ibid p 112 137 Ibid p 112-113

52

Logo ldquohavendo duas opccedilotildees igualmente eficazes para permitir alcanccedilar o resultado

pretendido (satisfaccedilatildeo do creacutedito) deveraacute o oacutergatildeo julgador valer-se daquela que menos onere

a situaccedilatildeo do executadordquo 138

O dito princiacutepio impede o comportamento abusivo do exequente que possa beneficiar-

se do meio mais danoso ao executado protegendo dessa forma a lealdade e a eacutetica

processual

Os postulados e princiacutepios analisados em linhas preteacuteritas impotildeem ao oacutergatildeo julgador a

observacircncia de alguns criteacuterios para a escolha da medida executiva atiacutepicas a ser utilizada no

caso concreto

Primeiramente a medida executiva atiacutepica deveraacute ser adequada ldquoO criteacuterio da

adequaccedilatildeo impotildee que juiz considere abstratamente uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida

executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia

a gerar o resultadordquo 139 Nesse primeiro momento o juiz deveraacute observar sob a perspectiva do

credor qual medida teraacute o condatildeo de gerar o resultado mais efetivo

Segundo Fredie Didier et al140 o criteacuterio da adequaccedilatildeo eacute

() fortemente inspirado pelo postulado da proporcionalidade e pelo princiacutepio da eficiecircncia na parte em que esse princiacutepio determina a escolha de meios que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo e que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado

Ademais a medida adotada pelo oacutergatildeo julgador deveraacute ser necessaacuteria ldquoEsse criteacuterio

impotildee um limite agrave atuaccedilatildeo judicial funcionando como uma espeacutecie de contrapeso ao criteacuterio

da adequaccedilatildeo Aqui deve-se levar em conta a posiccedilatildeo do devedorrdquo141

O juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental agrave execuccedilatildeo e determinar

uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute necessaacuterio que a

medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado O criteacuterio da necessidade

estabelece que ldquonatildeo se pode ir aleacutem do necessaacuterio para alcanccedilar o propoacutesito almejado Deve

138 Ibid p 113 139 Ibid p 113 140 Ibid p 113 141 Ibid p 114

53

pois o oacutergatildeo julgador determinar o meio executivo na medida do estritamente necessaacuterio para

proporcionar a satisfaccedilatildeo do creacutedito ndash nem menos nem maisrdquo 142

O referido criteacuterio possui forte influecircncia dos postulados da proibiccedilatildeo do excesso e da

razoabilidade assim como do princiacutepio da menor onerosidade para o executado Assevera

Fredie Didier et al143 que

Natildeo eacute razoaacutevel por exemplo impor como primeira opccedilatildeo medida coercitiva a ser suportada pelo agente puacuteblico pelo simples fato de o juiz pressupor que o ente puacuteblico ao qual ele eacute vinculado iraacute descumprir determinada ordem judicial - o descumprimento natildeo pode ser visto como algo ordinaacuterio ou cotidiano (razoabilidade como dever de equidade) Tampouco eacute razoaacutevel eleger a prisatildeo civil como meacutetodo prioritaacuterio para compelir o executado ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer (razoabilidade como dever de equivalecircncia) Aleacutem disso eacute vedada por exemplo a imposiccedilatildeo de multa coercitiva para compelir o executado a emitir declaraccedilatildeo de vontade uma vez que haacute previsatildeo expressa de medida tiacutepica capaz de proporcionar o mesmo resultado sem sacrifiacutecio para o devedor (art 501 CPC)

A afirmaccedilatildeo feita por Bonavides144 em 1997 sobre a adequaccedilatildeo e a necessidade

continua atual sobre os motes

O meio empregado pelo legislador deve ser adequado e necessaacuterio para alcanccedilar o objetivo procurado O meio eacute adequado quando com seu auxiacutelio se pode alcanccedilar o resultado desejado eacute necessaacuterio quando o legislador natildeo poderia ter escolhido outro meio igualmente eficaz mas que natildeo limitasse ou limitasse de maneira menos sensiacutevel o direito fundamental

Por fim a medida deve conciliar os interesses contrapostos ldquoO magistrado deve

ponderar os interesses em jogo aplicando a proporcionalidade em sentido estrito de modo

que as vantagens da utilizaccedilatildeo da medida atiacutepica escolhida superem as vantagens de seu usordquo 145

Esse criteacuterio natildeo privilegia nem o credor nem o devedor e sim a soluccedilatildeo mais

equilibrada e que atenda da melhor forma aos valores em conflito ldquoTrata-se de criteacuterio

inspirado nos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade bem como no princiacutepio da

142 Ibid p 114 143 Ibid p 114 144 BONAVIDES Paulo Curso de Direito Constitucional 7ordm ediccedilatildeo Satildeo Paulo Ed Malheiros 1997

p 372 145 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 114-115

54

eficiecircncia na parte em que impotildee ao juiz evitar a escolha do meio executivo que produza

muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscadordquo 146

Cada um dos criteacuterios supracitados devem ser considerados pelo juiz ao aplicar as

medidas executivas atiacutepicas ao caso concreto Para Fredie Didier et al147 as medidas como

retenccedilatildeo de CNH passaporte ou cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado como

forma de pressionaacute-lo ao pagamento da diacutevida pecuniaacuteria natildeo satildeo possiacuteveis

Essas natildeo satildeo medidas adequadas ao atingimento do fim almejado (o pagamento de quantia) - natildeo haacute propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente Tais medidas soam mais como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-lo ao cumprimento da ordem judicial - e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a utilizaccedilatildeo de meios sancionatoacuterios pelo magistrado mas apenas de meios de coerccedilatildeo indireta e sub-rogatoacuterios

Ainda que adequadas fossem a retenccedilatildeo de CNH e do passaporte no corte de fornecimento de aacutegua natildeo parecem ser medidas necessaacuterias (no sentido de exigiacuteveis) uma vez que outras medidas podem em tese ser utilizadas sem causar igual gravame ao executado - como por exemplo a simples restriccedilatildeo do uso de cartotildees de creacutedito A retenccedilatildeo de documentos pessoais eacute medida que termina por restringir a liberdade de ir e vir do executado mostrando-se a princiacutepio natildeo-razoaacutevel por ir de encontro ao dever de equivalecircncia e desproporcional por restringir demais o direito agrave liberdade em favor do direito de creacutedito pecuniaacuterio do exequente

O processualista baiano et al148 cita tambeacutem outro exemplo de medida atiacutepica que natildeo

atingem os criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade

Tampouco parece adequada em princiacutepio determinaccedilatildeo de corte de energia eleacutetrica de todo o preacutedio onde funciona serviccedilo puacuteblico administrativo como forma de pressionar o ente federado a cumprir ordem de nomeaccedilatildeo de candidato em concurso puacuteblico Natildeo parece haver relaccedilatildeo meiofim entre uma coisa e outra Tambeacutem natildeo eacute possiacutevel enxergar essa medida como necessaacuteria no sentido de ser a menos gravosa para o devedor - observe que se trata de medida que uma vez aplicada ensejaria restriccedilatildeo de funcionamento em toda a reparticcedilatildeo puacuteblica em prejuiacutezo de serviccedilos puacuteblicos essenciais ao funcionamento da Administraccedilatildeo o que aleacutem de ser excessivamente gravoso parece natildeo se conformar agrave necessidade de ponderaccedilatildeo dos interesses em jogo - aleacutem de afetar a um sem-nuacutemero de pessoas tomadoras desses serviccedilos

Ademais eacute sabido que toda e qualquer decisatildeo judicial precisa ser fundamentada Ao

se tratar das medidas executivas atiacutepicas o papel da fundamentaccedilatildeo se torna ainda mais

146 Ibid p 115 147 Ibid p 115 148 Ibid p 116

55

importante tendo em vista que eacute pela fundamentaccedilatildeo da decisatildeo que se poderaacute controlar a

adequaccedilatildeo e necessidade da medida atiacutepica

Pelo fato das medidas executivas atiacutepicas derivarem de dispositivos normativos

considerados claacuteusulas gerais propiacutecias as mais variadas interpretaccedilotildees eacute de extrema

importacircncia que o oacutergatildeo julgador fundamente sua decisatildeo

Logo ldquodeve o juiz na fundamentaccedilatildeo decisoacuteria expor racionalmente os motivos da

sua escolha demonstrando com atenccedilatildeo ao art 489 sect 1ordm CPC de que modo a sua opccedilatildeo

atende os criteacuterios da adequaccedilatildeo necessidade e proporcionalidade em sentido estrito ()rdquo 149

Dessa forma os princiacutepios da proporcionalidade e razoabilidade servem para delimitar

o alcance das claacuteusulas gerais de efetivaccedilatildeo fazendo com que o oacutergatildeo julgador se atenha aos

criteacuterios da adequaccedilatildeo e necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao caso

concreto

42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO

EXECUTADO

A entrada em vigor do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 aflorou ainda mais uma

discussatildeo essencial para os processualistas do seacuteculo XXI qual eacute o verdadeiro protagonista do

processo civil

Para os que defendem o ldquoautoritarismo processualrdquo o verdadeiro protagonista do

processo civil eacute o oacutergatildeo judiciaacuterio que em nome do desempenho efetivo de suas funccedilotildees lhes

eacute permitido dilatar os poderes que diga-se de jaacute passagem jaacute compotildeem um vastiacutessimo

arsenal150

Jaacute os ldquogarantistasrdquo 151 do processo civil acreditam que os verdadeiros protagonistas satildeo

as partes do processo e seus direitos e garantias devem ser estritamente preservados

Devido a essa disputa de quem possui maior protagonismo no processo as mudanccedilas

ocorridas no coacutedigo processual vigente quanto agraves medidas executivas atiacutepicas despertaram

149 Ibid p 117 150 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos

atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04102018

151 O processualista Araken de Assis acredita que o termo garantista eacute descabido tendo em vista que remete ao processo penal

56

maior celeuma do que qualquer outra modificaccedilatildeo trazida pelo CPC15 Afinal as referidas

medidas acirravam ainda mais a disputa pelo protagonismo processual

O fato de o CPC15 dispor no art 139 IV que o juiz poderaacute decretar todas as medidas

indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o

cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo

pecuniaacuteria levou boa parte da doutrina e dos juiacutezes a acreditar que teria pleno direito de

aplicar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo Entretanto muitos se esqueceram do outro lado

da moeda esqueceram que a dignidade humana do executado tambeacutem eacute um direito

fundamental e natildeo pode ser violado

Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa152

acreditam que

() natildeo parece producente elencar um rol abstrato das medidas que poderiam ser aplicadas pelo juiz a tiacutetulo do art 139 IV CPC Afinal se busca a efetividade da execuccedilatildeo e esta soacute pode ser identificada agrave luz das especificidades da situaccedilatildeo concreta Ideal eacute enveredar pela loacutegica modular (adequaccedilatildeo ao caso) natildeo pela geneacuterica (soluccedilotildees abstratas de pretensa utilidade universal)

Em razatildeo de o dispositivo apresentar uma gama de poderes tatildeo amplos agrave disposiccedilatildeo do

oacutergatildeo julgador sem nenhuma estipulaccedilatildeo de um procedimento legal previamente definido para

que estabeleccedila as condiccedilotildees de sua aplicaccedilatildeo em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo eacute

necessaacuterio que em razatildeo do princiacutepio da dignidade humana natildeo busque definir o que o

dispositivo permite mas de definir o que ele natildeo permite ldquoOu seja propotildee-se a sua

compreensatildeo por exclusatildeo Afinal se ele tem potencialidade para promover a efetividade da

tutela tambeacutem pode provocar lesotildees E como em direito os fins natildeo justificam os meios

ressalta como prioritaacuteria a necessidade de estabelecer limitesrdquo 153

O art 789 do CPC15 disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial e eacute

categoacuterico ao dispor que ldquoo devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para

152 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

153 Ibid sem paginaccedilatildeo

57

o cumprimento de suas obrigaccedilotildees salvo as restriccedilotildees estabelecidas em leirdquo Logo a

execuccedilatildeo somente poderaacute incidir sobre os bens do devedor e natildeo sobre a sua pessoa

Como eacute sabido a Lex Poetelia Papiria de 326 aC foi o primeiro marco legal da

humanizaccedilatildeo das cobranccedilas de diacutevidas abolindo a imposiccedilatildeo ao devedor de castigos

vexatoacuterios e ateacute da pena de morte154

Afinal no direito romano antigo a cobranccedila de diacutevidas poderia recair sobre a pessoa

do devedor que respondia com sua liberdade e ateacute mesmo com seu proacuteprio corpo permitindo

a lei que repartissem tantos pedaccedilos do corpo do devedor quantos fossem seus credores

Nesse sentindo leciona o professor Guilherme Pupe da Noacutebrega155 que

Vem de longe a evoluccedilatildeo no sentido de fazer a responsabilidade por uma obrigaccedilatildeo migrar da pessoa do devedor para seu patrimocircnio Merecem registro especiacutefico como marcos histoacutericos remotos a Lex Poetelia Papiria de 326 aC que aboliu o nexum e possibilidade de escravidatildeo do devedor como garantia da obrigaccedilatildeo e a pignoris capio ou ldquoaccedilatildeo por tomada de penhorrdquo que instituiu a possibilidade de o credor tomar parcela dos bens do devedor como forma de assegurar o adimplemento da diacutevida Aqueles institutos culminariam seacuteculo depois no artigo 789 do CPC de 2015 a consagrar que o devedor responda pela satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo com seus bens presentes e futuros observadas as restriccedilotildees impostas pelas impenhorabilidades legais

Logo o avanccedilar da civilizaccedilatildeo marcou o deslocamento da responsabilidade por

diacutevidas saindo do corpo do devedor para o seu patrimocircnio tendo em vista que a vida

humana a liberdade e a integridade fiacutesica satildeo valores inalienaacuteveis natildeo podendo ser

sacrificadas em benefiacutecio de obrigaccedilotildees pecuniaacuterias 156

Entretanto eacute sabido que a responsabilidade patrimonial eacute excepcionada pela prisatildeo

civil do devedor de verba alimentiacutecia resquiacutecio da responsabilidade pessoal romana

154 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt

httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018

155 NOacuteBREGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139 IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018

156 Ibid sem paginaccedilatildeo

58

No entanto haacute uma justificativa para isso Segundo o processualista Guilherme Pupe

da Noacutebrega157

Eacute que a par de a prisatildeo civil encontrar previsatildeo constitucional no inciso LXVII do artigo 5ordm o raciociacutenio eacute o de que o direito do alimentante agrave liberdade de locomoccedilatildeo cede diante dos direitos agrave vida e agrave dignidade titularizados pelo alimentando e resguardados pelos alimentos Foi esse mesmo raciociacutenio aliaacutes que justificou no passado a ediccedilatildeo da suacutemula 309 pelo STJ agora positivada pelo artigo 528 sect 7ordm que limita a modalidade coercitiva agraves trecircs uacuteltimas prestaccedilotildees vencidas e agraves prestaccedilotildees vincendas A ideia eacute que tendo o alimentando subsistido a despeito do natildeo-pagamento de prestaccedilotildees mais antigas essas verbas teriam perdido o caraacuteter alimentar que na equaccedilatildeo antes apresentada justificaria a prisatildeo civil do alimentante Daiacute por que aqueles valores antigos remanescem exigiacuteveis mas somente pela via da expropriaccedilatildeo

Essa ressalva eacute necessaacuteria tendo em vista que a adoccedilatildeo de teacutecnica de execuccedilatildeo

indireta para incursatildeo radical na esfera de direitos do executado notadamente direitos

fundamentais quando carente de respaldo constitucional natildeo merece acolhimento sob

risco de se atentar contra o devido processo legal (artigo 5ordm LIV da Constituiccedilatildeo)

Como afirma o autor Bruno Dantas158 ldquoembora inexistam estatiacutesticas que permitam

comparaccedilotildees natildeo eacute desarrazoado intuir que os iacutendices de inadimplecircncia despeccedilam na razatildeo

inversa da incidecircncia das ordens judiciais sobre o corpo e a liberdade do devedorrdquo Entretanto

eacute natildeo possiacutevel adotar toda e qualquer medida executiva atiacutepica em nome da efetividade da

execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que se saiba os limites da sua aplicaccedilatildeo

Dessa forma instrumentos que permitam o cumprimento forccedilado de contratos e o pagamento

de diacutevidas satildeo necessaacuterios contudo eacute preciso equilibrar essa exigecircncia com a liberdade e a

dignidade humana

Como citado alhures o art 139 IV ensejou decisotildees como a que determinou a

suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o

passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito em uma accedilatildeo se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo

extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

Na supracitada decisatildeo o princiacutepio da responsabilidade patrimonial natildeo estaacute sendo

efetivado para o que o devedor responda com os seus bens Afinal qual ligaccedilatildeo entre a

157 Ibid sem paginaccedilatildeo 158 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt

httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018

59

restriccedilatildeo de circulaccedilatildeo que diz com o direito de ir e vir (liberdade) com o pagamento de

diacutevidas que diz com a responsabilidade civil159

Ademais por que quem natildeo tem dinheiro para pagar diacutevidas natildeo pode dirigir Por que

natildeo tem condiccedilotildees para pagar o deacutebito natildeo pode ter passaporte Por que quem natildeo tem como

pagar o deve natildeo pode ter cartatildeo de creacutedito

Ao utilizar meios executivos atiacutepicos como os supracitados para compelir o devedor a

satisfazer a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria quando exauridos sem ecircxito os meios tradicionais de bens

penhoraacuteveis salvo quando existe qualquer indiacutecio concreto de ocultaccedilatildeo ou dissipaccedilatildeo de

bens eacute obrigar o devedor abrir matildeo da proteccedilatildeo da lei que lhe impede que seja tomado agrave forccedila

(art 833 CPC e demais disposiccedilotildees que tratam da impenhorabilidade)

Segundo Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa160

Claramente essa pressatildeo visa dar uma aparecircncia de voluntariedade agrave indicaccedilatildeo de bens impenhoraacuteveis pelo proacuteprio executado que na verdade soacute age assim por ser a uacutenica forma de ver-se livre de um grame imposto por medida indutiva despedida de qualquer necessidade ou adequaccedilatildeo Uma intoleraacutevel perversatildeo

Os autores afirmam ainda que o ldquodireito paacutetrio natildeo admite esta contraditio in terminis

sendo inaceitaacutevel a coexistecircncia de regra protetiva do executado com outra que concede ao

juiz poderes para forccedilar (ainda que indiretamente e veladamente) o executado a abrir matildeo

daquela proteccedilatildeordquo 161

Logo eacute cristalino que a suspensatildeo da CNH eacute uma forma incorreta de aplicar a medida

executiva atiacutepica para efetivar o direito fundamental a execuccedilatildeo tendo em vista que o uacutenico

objetivo da referida eacute pressionar o executado abrir matildeo de algum bem impenhoraacutevel para

levantar o dinheiro e cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

A retenccedilatildeo do passaporte igualmente natildeo possui qualquer relaccedilatildeo com a diacutevida do

executado e eacute somente uma forma de tentar pressiona-lo a dispor de um bem que natildeo pode

ser tomado agrave forccedila e puni-lo por natildeo ter cumprido voluntariamente com a sua obrigaccedilatildeo

159 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

160 Ibid sem paginaccedilatildeo 161 Ibid sem paginaccedilatildeo

60

Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa162

acreditam que tal medida eacute equivocada e se torna excessivamente onerosa ao executado

As mais variadas circunstacircncias relevem o equiacutevoco de tal medida aplicada assim genericamente Com efeito nada justifica reter o passaporte do executado e impedi-lo de viajar para o exterior quando eacute agraciado inclusive com todas as despesas pagas com presente sorteio ou precircmio (por completar tempo de serviccedilo ou atingir metas produtividade na sociedade empresaacuteria em que trabalha) Como todo custo eacute suportado por terceiro e por isso mesmo a sua realizaccedilatildeo pelo executado natildeo traria qualquer prejuiacutezo ao exequente e a retenccedilatildeo do passaporte natildeo seria injustificaacutevel

Paulo Antonio Papini163 acredita que natildeo tem a apreensatildeo de passaporte natildeo possui um

fundamento plausiacutevel tendo em vista que se o devedor natildeo pode viajar para saldar o deacutebito

tambeacutem natildeo poderia exercer atividades cotidianas

Com todo o respeito a quem pensa dessa forma o argumento eacute muito simploacuterio e natildeo precisamos sequer do Direito para derrubaacute-lo Com efeito se considerarmos que ndash ateacute mesmo pelas dimensotildees continentais do Brasil ndash natildeo eacute incomum que uma passagem para o Nordeste custe mais caro que um voo para Miami seria razoaacutevel entatildeo seguindo a linha argumentativa do Magistrado em questatildeo que se oficiasse aos oacutergatildeos reguladores da aviaccedilatildeo civil proibindo-se aquele devedor de fazer ateacute mesmo voos domeacutesticos Poder-se-ia ir mais longe jaacute que natildeo tem dinheiro para pagar suas diacutevidas certamente aquele devedor tambeacutem natildeo teria para comer fora de sua casa porque entatildeo natildeo determinar a expediccedilatildeo de ofiacutecio aos restaurantes proacuteximos agrave sua casa e determinar tambeacutem a proibiccedilatildeo de que ele fosse servidoatendido

O autor se questiona ainda ldquoSeraacute entatildeo que o Princiacutepio da Dignidade da Pessoa

Humana estaacute de mero enfeite em nossa Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ()rdquo 164 Tendo em vista

que ldquoa decisatildeo em comento viola diretamente o art 5ordm incisos XV LIII e LXIII da

Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ndash falamos do Direito de Ir e Virrdquo 165

Ademais o cancelamento do cartatildeo de creacutedito eacute mais uma forma de constranger e

compelir o executado a cumprir com a obrigaccedilatildeo de qualquer forma natildeo importando o que

precise fazer para conseguir saldar o deacutebito tendo em vista que a referida medida apresenta

162 Ibid sem paginaccedilatildeo 163 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo

pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018

164 Ibid sem paginaccedilatildeo 165 Ibid sem paginaccedilatildeo

61

qualquer adequaccedilatildeo com o fim desejado (reverter em pagamento para o exequente) Os

autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa afirmam que166

Reconhece-se que as razotildees da afirmaccedilatildeo ora questionada satildeo ateacute intuitivas mas eacute plenamente possiacutevel problematiza-las Ora natildeo se encontra qualquer justificativa idocircnea para que o juiz possa cancelar o contrato do executado com a administradora do cartatildeo de creacutedito (ou instituiccedilatildeo financeira) que natildeo tem qualquer relaccedilatildeo com o creacutedito exequendo muito menos como isso poderia impactar positivamente na execuccedilatildeo (senatildeo para pressionar o executado a dispor de bens impenhoraacuteveis) Ademais natildeo foram indicados sequer sinais de que o executado realiza gastos supeacuterfluos com o cartatildeo de creacutedito ndash natildeo que isso justificasse a medida pois o correto seria penhorar os esses bens (se duraacuteveis naturalmente) ao inveacutes de cancelar o cartatildeo de creacutedito

Logo as referidas medidas natildeo possuem qualquer relaccedilatildeo com o atingimento do fim

almejado (o pagamento de quantia) tendo em vista que natildeo haacute uma relaccedilatildeo meiofim entre

tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a

restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia

ao exequente

Dessa forma nota-se que as medidas de suspensatildeo da CNH retenccedilatildeo de passaporte e

bloqueio do cartatildeo de credito satildeo completamente inadequadas agrave realizaccedilatildeo a que se prestam

Afinal ldquotais medidas soam como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-

lo ao cumprimento da ordem judicial ndash e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a

utilizaccedilatildeo dos meios sancionatoacuterios pelo magistrado ()rdquo167

Como exposto em linhas preteacuteritas o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades

de aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e

razoaacutevel se atendo aos criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas

executivas atiacutepicas ao caso concreto sob pena de converter a medida em de indutiva para

punitiva

A utilizaccedilatildeo de medidas atiacutepicas como a suspensatildeo da carteira de motorista e o

passaporte do devedor abandona a regra da responsabilidade patrimonial e atingem em cheio

o nuacutecleo de direitos inerentes agrave condiccedilatildeo humana

166 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

167 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 115

62

O limite para a aplicaccedilatildeo de tais medidas deve ser a Constituiccedilatildeo Federal e sobretudo

os Direitos fundamentais nela expressos ldquoCom efeito natildeo haacute saiacuteda tampouco soluccedilatildeo eficaz

de um problema sem que se respeite a Lei e o Devido Processo Legal (por mais nobres que

sejam as intenccedilotildees)rdquo 168

Dessa forma a busca desenfreada pelo cumprimento das decisotildees judiciais em

especial na fase executiva natildeo pode ser realizada em sacrifiacutecio de direitos fundamentais O

Poder Judiciaacuterio natildeo pode resolver a crise do processo executoacuterio utilizando de medidas

arbitraacuterias com o propoacutesito de satisfazer obrigaccedilotildees pecuniaacuterias

Eis o dilema que se coloca diante do poder geral de efetivaccedilatildeo ele pode servir de

potente instrumento em prol da tutela jurisdicional executiva entretanto se manejado de

modo improacuteprio serviraacute de instrumento de puniccedilatildeo e humilhaccedilatildeo do executado169

Eacute notoacuterio que se amplamente aplicado o poder geral de efetivaccedilatildeo reduziria os

iacutendices de inadimplecircncia quiccedilaacute resolveria por completo a crise da execuccedilatildeo civil Entretanto

o retrocesso civilizatoacuterio seria irreparaacutevel

168 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo

pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018

169 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

63

5 CONCLUSAtildeO

Como funccedilatildeo jurisdicional que tem como objeto a efetivaccedilatildeo de direitos a execuccedilatildeo

deve sempre buscar a maior satisfaccedilatildeo possiacutevel concretizando integralmente o creacutedito do

exequente isto eacute realizando o direito fundamental agrave tutela executiva do credor Por isso a

adoccedilatildeo de meios executivos atiacutepicos incorporados pelo Coacutedigo de Processo Civil de 2015 por

meio do art139 IV em um primeiro momento podem ser consideradas vaacutelidas visto que

servem de instrumento para a satisfaccedilatildeo e asseguraccedilatildeo de direitos do credor

Entretanto para o oacutergatildeo julgador natildeo cometa arbitrariedades em nome do direito

fundamental agrave execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que seja definido certos limites na adoccedilatildeo do poder

geral de efetivaccedilatildeo

As medidas executivas atiacutepicas natildeo podem ser aplicadas de maneira indiscriminada

logo devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o esgotamento das medidas tiacutepicas e

a possibilidade de cumprimento da obrigaccedilatildeo

Partindo dessa premissa as medidas a serem adotadas pelo juiz no caso concreto

devem ter como baliza os princiacutepios da proporcionalidade e da razoabilidade para que natildeo

ultrapassem a responsabilidade patrimonial do devedor e incidida diretamente sobre sua

pessoa

Para que natildeo seja atingida a pessoa do executado ou seja para que o devedor natildeo

tenha sua dignidade humana viola eacute necessaacuterio que a medida atiacutepica seja adequada e

necessaacuteria

Logo o juiz deveraacute sempre estabelecer uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida

executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia

a gerar o resultado sem violar a dignidade humana do executado

Dessa o juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental a execuccedilatildeo e

determinar uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute

necessaacuterio que a medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado

As medidas que ultrapassam esses limites como a decisatildeo que apreendeu o

passaporte suspensatildeo a CNH e bloqueou o cartatildeo de creacutedito do devedor satildeo meramente

punitivas posto que essas natildeo satildeo as medidas mais adequadas para se atingir o fim almejado

pois natildeo existe propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado

64

uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo

geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente

Medidas como esta servem de embasamento para decisotildees arbitraacuterias e autoritaacuterias de

violaccedilatildeo dos direitos fundamentais transformando o poder geral de efetivaccedilatildeo em

instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com autorizaccedilatildeo judicial

Em suma o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades de aplicaccedilatildeo do poder

geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e razoaacutevel se atendo aos

criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao

caso concreto sob pena de punir a pessoa do executado violando a sua dignidade humana

em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo

65

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  • 1 INTRODUCcedilAtildeO
  • 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO
    • 25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO
      • 3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
        • 31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS
          • 311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15
            • 32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
            • 33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
            • 34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
              • 4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
                • 41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
                • 42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
                  • 5 CONCLUSAtildeO
                  • REFEREcircNCIAS
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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

Art ndash Artigo

CPC15 ndash Coacutedigo de Processo Civil de 2015

CPC73 ndash Coacutedigo de Processo Civil de 1973

ENFAM ndash Escola nacional de formaccedilatildeo e aperfeiccediloamento de magistrados

HC ndash Habeas Corpus

STJ ndash Superior Tribunal de Justiccedila

5

1 INTRODUCcedilAtildeO

A prestaccedilatildeo jurisdicional natildeo costuma se findar apoacutes o encerramento da fase cognitiva

com a prolaccedilatildeo de uma sentenccedila de meacuterito Para que a referida prestaccedilatildeo se concretize eacute

imperioso que haja a satisfaccedilatildeo do deacutebito pelo devedor

Entretanto observa-se em diversos casos o inadimplemento da parte passiva

processual sendo necessaacuterio desenvolver a atividade executiva A referida atividade possui o

escopo de satisfazer direitos

Isso porque o processo natildeo eacute um fim em si mesmo sendo apenas um exerciacutecio da

jurisdiccedilatildeo estatal Dessa forma a razatildeo de ser do processo eacute o atingimento da sua finalidade

almejada que eacute a prestaccedilatildeo da tutela jurisdicional

Todavia como a tutela jurisdicional configura-se na obrigaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio

proteger e reparar os direitos lesionados ou ameaccedilados de lesatildeo muitas vezes a dita tutela

somente consegue ser efetivada atraveacutes da atividade executiva da jurisdiccedilatildeo

Ocorre que a execuccedilatildeo civil sempre foi o ldquocalcanhar de Aquilesrdquo do sistema

processual e de modo geral vinha sofrendo uma crise quanto a sua efetividade Ou seja o

credor obtia ecircxito na fase de conhecimento entretanto natildeo conseguia alcanccedilar o seu direito a

prestaccedilatildeo reconhecida na fase de execuccedilatildeo

Com o fito de tornar a atividade satisfativa mais eficiente e mais ceacutelere o Coacutedigo de

Processo Civil de 2015 concebeu novas diretrizes ao processo no sentindo de harmonizar

suas com os ditames da Constituiccedilatildeo Federal principalmente com os direitos fundamentais

As normas fundamentais do processo civil trazidas pelo CPC15 preocupam-se

primordialmente com a efetividade da tutela jurisdicional

Em conformidade com essa nova sistemaacutetica o legislador no art 139 IV do Coacutedigo

de Processo Civil estabeleceu a possibilidade de o juiz dispor de todas as medidas indutivas

coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o cumprimento de

ordem judicial trazendo como grande novidade a aplicaccedilatildeo dessas medidas executoacuterias

atiacutepicas tambeacutem nas obrigaccedilotildees de pagar dinheiro

6 Entretanto natildeo haacute na legislaccedilatildeo criteacuterios especiacuteficos que auxiliem o oacutergatildeo julgador na

escolha das medidas executivas atiacutepicas que se adotadas sem qualquer baliza podem

acarretar consequecircncias juriacutedicas irreparaacuteveis

Como a famosa decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de

Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-1320138260011 Nessa accedilatildeo

que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo

pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a suspensatildeo da

Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o passaporte e

cancelou os cartotildees de creacutedito como forma de compeli-lo a adimplir com o deacutebito

Decisotildees como esta geram conflitos entre direitos constitucionalmente instituiacutedos De

um lado o direito fundamental agrave tutela jurisdicional e de outro os direitos e garantias

inerentes a todos os indiviacuteduos

Dessa forma a presente monografia tem como escopo de estabelecer criteacuterios

limitadores para que a adoccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo viole a dignidade humana do

executado em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo

7 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO

CIVIL

21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL

A Execuccedilatildeo Civil nasce a partir do direito a uma prestaccedilatildeo conferida a algueacutem de

exigir de outrem o cumprimento de uma conduta de fazer natildeo fazer ou de dar (dinheiro ou

coisa distinta) 1

Para que o direito a uma prestaccedilatildeo se concretize no mundo fiacutesico eacute necessaacuterio que

haja a satisfaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida pelo sujeito passivo Caso contraacuterio fala-se em

inadimplemento ou lesatildeo O titular do direito natildeo tem como agir por si para efetivar o seu

direito a prestaccedilatildeo posto que a autotutela eacute vedada no ordenamento juriacutedico Dessa forma eacute

necessaacuterio que se recorra ao Poder Judiciaacuterio para que se possa ter a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo

devida logo a tutela jurisdicional executiva2

O processualista Fredie Didier et al3 equaciona essa questatildeo da seguinte maneira

Quando se pensa em tutela executiva pensa-se na efetivaccedilatildeo de direitos a uma prestaccedilatildeo fala-se de um conjunto de meios para efetivar a prestaccedilatildeo devida fala-se em execuccedilatildeo de fazer natildeo-fazer dar exatamente os trecircs tipos de prestaccedilatildeo existentes Natildeo eacute por acaso nem por coincidecircncia que a tutela executiva pressupotildee inadimplemento (CPC art 786) - fenocircmeno exclusivo dos direitos a uma prestaccedilatildeo Eacute por isso tambeacutem que se pode falar em prescriccedilatildeo da execuccedilatildeo (CPC art 802 e suacutemula do STF n 150) - prescriccedilatildeo eacute fenocircmeno juriacutedico que se relaciona aos direitos a uma prestaccedilatildeo A execuccedilatildeo forccedilada dirige-se ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo Essa relaccedilatildeo entre direito material e processo eacute fundamental para a compreensatildeo do fenocircmeno executivo

Nesse iacutenterim para o Ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux4 ldquoexecutar eacute

satisfazerrdquo ao passo que o professor Fredie Didier et al5 formulou um conceito mais amplo

ldquoExecutar eacute satisfazer uma prestaccedilatildeo devida A execuccedilatildeo pode ser espontacircnea quando o

devedor cumpre voluntariamente a prestaccedilatildeo ou forccedilada quando o cumprimento da prestaccedilatildeo

eacute obtido por meio de atos executivos pelo Estadordquo

1 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 41 2 Ibid p 42 3 Ibid p 42 4 FUX Luiz Curso de direito processual civil Rio de Janeiro Forense 2001 p 980 5 DIDIER JR Fredie et al Op Cit p 45

8 Dessa forma a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional responsaacutevel pela

concretizaccedilatildeo de um direito subjetivo no plano material obtendo resultado idecircntico ou

equivalente ao atingiacutevel se o devedor cumprisse espontaneamente a prestaccedilatildeo

Todavia essa atividade jurisdicional soacute cabe quando o devedor se recusa a cumprir

com a obrigaccedilatildeo quebrando a expectativa do credor de receber o que lhe eacute devido Por esta

razatildeo que se diz que a execuccedilatildeo civil eacute ldquoforccediladardquo 6

Eacute o que se conclui seguindo os ensinamentos de Leonardo Greco7 para ele execuccedilatildeo eacute

uma

() modalidade de tutela jurisdicional que consiste na praacutetica pelo juiz (ou por outrem sob a sua supervisatildeo) de uma seacuterie de atos coativos concretos sobre o devedor e sobre o seu patrimocircnio a fim de agrave custa dele e independentemente do concurso da sua vontade tornar efetivo o cumprimento de prestaccedilatildeo por ele inadimplida desde que tais atos coativos estejam previamente constituiacutedos em lei

Portanto a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional que tem como escopo obter o

cumprimento de uma prestaccedilatildeo certa e inadimplida mediante atos coativos sobre o devedor e

seus bens

22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL

Vislumbrado o conceito de execuccedilatildeo civil cabe agora empreender a sua classificaccedilatildeo

tendo em vista que a execuccedilatildeo pode se manifestar de diversas formas possuindo diferentes

caracteriacutesticas em cada uma das suas modalidades

Inicialmente cabe destacar que haacute duas teacutecnicas processuais para viabilizar a execuccedilatildeo

civil lato sensu eacute a que divide em processo autocircnomo de execuccedilatildeo e em fase de execuccedilatildeo

dependendo do tiacutetulo executivo que justifica o exerciacutecio da atividade satisfativa

O Coacutedigo Processual Civil de 2015 acertadamente ratificou as reformas promovidas

no CPC73 que consagrava a opccedilatildeo legislativa de oferecimento das tutelas de certificaccedilatildeo e

efetivaccedilatildeo do direito em um mesmo processo Dessa forma as execuccedilotildees de sentenccedilas

6 BASTOS Luiz Fernando Pereira O artigo 139 IV do novo Coacutedigo de Processo Civil a atipicidade

dos meios executivos na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia certa Brasiacutelia 2017 Disponiacutevel em lt httpbdmunbbrbitstream104831866812017_LuizFernandoPereiraBastospdf gt Acesso em 06 de agosto de 2018

7 BASTOS Luiz Fernando Pereira apud GRECO Leonardo O processo de execuccedilatildeo Rio de Janeiro Renovar 1999 p 164

9

passaram a ser uma fase complementar ao de processo de conhecimento e natildeo mais ocorrer

em um processo autocircnomo

No entendimento do professor processualista Fredie Didier et al8 o processo

sincreacutetico simplificou a efetivaccedilatildeo de um direito reconhecido em sentenccedila

A dispensa do ajuizamento de um processo autocircnomo para execuccedilatildeo de sentenccedila natildeo soacute veio diminuir o tempo necessaacuterio agrave prestaccedilatildeo da tutela jurisdicional - afinal o credor natildeo mais precisaria tal como ocorria ateacute entatildeo promover nova citaccedilatildeo pessoal do reacuteudevedor- como tambeacutem veio romper de vez com um velho paradigma segundo o qual a atividade executiva estaria dissociada da precedente atividade jurisdicional cognitiva

Entretanto natildeo soacute as sentenccedilas de meacuterito ensejam uma execuccedilatildeo Por esta razatildeo foi

necessaacuterio manter o processo autocircnomo de execuccedilatildeo para os casos em que o credor tem a seu

favor um documento que natildeo tenha sido proferido por um oacutergatildeo dotado de jurisdiccedilatildeo

Consequentemente se for o titulo executivo judicial o caminho natural eacute o do

cumprimento de sentenccedila Sendo por sua vez extrajudicial o titulo executivo o caminho

correto eacute o processo de execuccedilatildeo

Cabe ainda salientar que toda execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial eacute definitiva Jaacute a

execuccedilatildeo de tiacutetulo judicial (cumprimento de sentenccedila) pode ser definitiva ou provisoacuteria

No primeiro caso isto eacute cumprimento de sentenccedila definitivo ldquoeacute a execuccedilatildeo completa

que vai ateacute a fase final (com a entrega do bem da vida) sem exigecircncias adicionais para o

exequenterdquo 9

Quanto ao segundo caso ldquoo cumprimento provisoacuterio de sentenccedila (fundada em tiacutetulo

provisoacuterio) eacute aquele que exige alguns requisitos extras para que se chegue agrave fase final da

execuccedilatildeordquo 10

Para Fredie Didier11 o criteacuterio para definir se o cumprimento de sentenccedila seraacute

definitivo ou provisoacuterio

() eacute a estabilidade do tiacutetulo executivo em que se funda a execuccedilatildeo se se tratar de decisatildeo acobertada pela coisa julgada material o cumprimento de sentenccedila eacute

8 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 46 9 Ibid p 57 10 Ibid p 57 11 Ibid p 57

10

definitivo se se tratar de decisatildeo judicial ainda passiacutevel de alteraccedilatildeo (reforma ou invalidaccedilatildeo) em razatildeo da pendecircncia de recurso contra ela interposto a que natildeo tenha sido atribuiacutedo efeito suspensivo o cumprimento de sentenccedila eacute provisoacuterio

Ademais a execuccedilatildeo se distingue em procedimentos executivos comuns que satildeo da

execuccedilatildeo civil e que servem a uma generalidade de creacuteditos como eacute o caso do cumprimento

de sentenccedila e o processo de execuccedilatildeo E em procedimentos executivos especiais que servem

agrave satisfaccedilatildeo de creacuteditos peculiares como a execuccedilatildeo de alimentos e a execuccedilatildeo fiscal 12

Por fim cabe mencionar a classificaccedilatildeo que distingue a execuccedilatildeo em direta e indireta

A primeira execuccedilatildeo direita (ou execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo) eacute ldquo() aquela em que o

Poder Judiciaacuterio prescinde da colaboraccedilatildeo do executado para a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida

e pois promove uma substituiccedilatildeo da sua conduta pela conduta do proacuteprio Estado-juiz ou de

terceirordquo 13 Ou seja as medidas executivas satildeo levadas a efeito mesmo contra a vontade do

devedor na execuccedilatildeo direta

Segundo a doutrina a execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo se subdivide da seguinte forma

meios de desapossamento meios de transformaccedilatildeo e meios de expropriaccedilatildeo

Os meios de desapossamento muito comuns nas execuccedilotildees para entrega de coisa eacute a

forma ldquopor meio da qual se retira da posse do executado o bem a ser entregue ao exequente

(p ex despejo busca e apreensatildeo reintegraccedilatildeo de posse)rdquo 14 Ao passo que por meio dos de

transformaccedilatildeo ldquo() o juiz determina que um terceiro pratique a conduta que deveria ser

praticada pelo executado cabendo a este arcar com o pagamento do custo respectivordquo 15 Jaacute

os meios executivos de expropriaccedilatildeo eacute a forma ldquopor meio do qual algum bem do patrimocircnio

do devedor eacute expropriado para pagamento do creacutedito (adjudicaccedilatildeo alienaccedilatildeo judicial ou

apropriaccedilatildeo de frutos e rendimentos de empresa ou de estabelecimentos e de outros bens art

825 CPC)rdquo 16

12 Ibid p 48 13 Ibid p 50 14 Ibid p 51 15 Ibid p 51 16 Ibid p 51

11 Jaacute a execuccedilatildeo indireta (ou mandamental) atua ldquo() na vontade do devedor como forma

de compeli-lo ou incentivaacute-lo a cumprir a ordem judicialrdquo 17 Nesse entendimento ainda

leciona Fredie Didier et al 18

Nesses casos o Estado-juiz busca promover a execuccedilatildeo com a colaboraccedilatildeo do executado forccedilando ou incentivando a que ele proacuteprio cumpra a prestaccedilatildeo devida Em vez de o Estado-juiz tomar as providecircncias que deveriam ser tomadas pelo executado o Estado forccedila por meio de coerccedilatildeo psicoloacutegica ou de promessa de recompensa judicial a que o proacuteprio executado cumpra a prestaccedilatildeo

A execuccedilatildeo indireta pode ser patrimonial como por exemplo a imposiccedilatildeo de multa

coercitiva ou pessoal com a prisatildeo civil do devedor de alimentos Ademais adiciona Didier

et al19que

O estiacutemulo ao cumprimento da prestaccedilatildeo pode dar-se pelo temor (p ex multa coercitiva prisatildeo civil do devedor de alimentos divulgaccedilatildeo de notiacutecia em jornal revelando o descumprimento) ou pelo incentivo (p ex a chamada sanccedilatildeo premial ou sanccedilatildeo positiva de que eacute exemplo a isenccedilatildeo do pagamento de custas em caso de cumprimento do mandado monitoacuterio - art 701 sect 1ordm CPC a reduccedilatildeo pela metade dos honoraacuterios advocatiacutecios fixados inicialmente pelo juiacutezo em caso de pagamento integral do deacutebito pecuniaacuterio na execuccedilatildeo por quantia certa fundada em tiacutetulo extrajudicial - art 827 sect 1ordm CPC)

Por tais razotildees haacute uma tendecircncia em cada vez mais prestigiar os meios executivos

indiretos (coercitivos) posto que satildeo tatildeo eficazes quanto os meios executivos diretos

entretanto menos onerosos Contudo sua aplicaccedilatildeo deve ser fiscalizada a fim de natildeo permitir

que a execuccedilatildeo civil perca sua finalidade visto que eacute uma funccedilatildeo jurisdicional que tem como

escopo efetivar o direito do credor e natildeo de atender os interesses do devedor

23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL

Os princiacutepios juriacutedicos nos uacuteltimos anos passaram a ser munidos de forccedila cogente

normatizando as condutas humanas tanto quanto as regras juriacutedicas Os ditos princiacutepios

ampliaram as margens de atuaccedilatildeo dos aplicadores do direito possibilitando a construccedilatildeo de

soluccedilotildees mais adequadas agraves especificidades das demandas que chegam ao judiciaacuterio

17 Ibid p 51 18 Ibid p 51 19 Ibid p 51-52

12 Dessa forma eacute necessaacuterio aprofundar-se nos princiacutepios norteadores da execuccedilatildeo civil

para que se obtenha uma anaacutelise completa da teoria geral da execuccedilatildeo

A execuccedilatildeo civil tem como um dos seus corolaacuterios o princiacutepio da efetividade este

consiste na exigecircncia de um sistema completo de tutela executiva no qual existam meios

executivos capazes de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor

de tutela executivardquo 20

O referido princiacutepio da efetividade eacute reforccedilado como normal fundamental do processo

civil brasileiro pelo art 4ordm do CPC ldquoArt 4ordm As partes tecircm o direito de obter em prazo razoaacutevel

a soluccedilatildeo integral do meacuterito incluiacuteda a atividade satisfativa

Jaacute o princiacutepio da boa feacute processual corolaacuterio do devido processo legal estaacute previsto

no art 5ordm do CPC ldquoAquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de

acordo com a boa-feacuterdquo Segundo o processualista baiano Fredie Didier21

O princiacutepio da boa-feacute extrai-se de uma claacuteusula geral processual A opccedilatildeo por uma claacuteusula geral de boa-feacute eacute a mais correta Eacute que a infinidade de situaccedilotildees que podem surgir ao longo do processo torna pouco eficaz qualquer enumeraccedilatildeo legal exaustiva das hipoacuteteses de comportamento desleal Daiacute ser correta a opccedilatildeo da legislaccedilatildeo brasileira por uma norma geral que impotildee o comportamento de acordo com a boa-feacute Em verdade natildeo seria necessaacuteria qualquer enumeraccedilatildeo das condutas desleais o art 5deg do CPC eacute bastante exatamente por tratar-se de uma claacuteusula geral

Dessa forma o dito princiacutepio preconiza que diante de um vinculo juriacutedico as pessoas

envolvidas natildeo poderatildeo frustrar a confianccedila do outro devendo comportar-se como se pode

esperar de uma pessoa de boa-feacute

Ademais disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial que ldquosomente o

patrimocircnio do devedor (art 789 CPC) ou de terceiro responsaacutevel pode ser objeto da

atividade executiva do Estadordquo 22

O referido princiacutepio que determina que somente o patrimocircnio submete-se agrave execuccedilatildeo

e natildeo a pessoa foi trazido pela humanizaccedilatildeo do direito Para o professor Didier et al23 o

20 DIDIER JR Freddie et al apud GUERRA Marcelo Lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do

credor na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 21 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte

geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 105 22 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 68

13

desenvolvimento dos meios de execuccedilatildeo indireta ldquoparece relativizar um pouco esse princiacutepio

na medida em que pressionam psicologicamente a pessoa do devedor para que cumpra a

obrigaccedilatildeo com seu comportamentordquo

Complementa ainda que

A responsabilidade executiva parece assumir atualmente caraacuteter hiacutebrido comportando coerccedilatildeo pessoal e sujeiccedilatildeo patrimonial

i) a coerccedilatildeo pessoal incide sobre a vontade do devedor admitindo o uso de medidas coercitivas de execuccedilatildeo indireta para forccedilaacute-lo a cumprir a obrigaccedilatildeo com seu proacuteprio comportamento (ex arts 139 rv 523 sect 1ordm 536 sect 1ordm e 538 sect 3ordm todos do CPC)

ii) descumprida a obrigaccedilatildeo e natildeo sendo possiacuteveladequado o uso de teacutecnica de coerccedilatildeo pessoal tem-se a sujeiccedilatildeo patrimonial que recairaacute sobre os bens do devedor ou de terceiro responsaacutevel - que responderatildeo pela proacutepria prestaccedilatildeo in natura (ex dar coisa ou entregar quantia) ou por perdas e danos24

Dessa forma o referido princiacutepio natildeo tem aplicaccedilatildeo absoluta em razatildeo do principio da

efetividade a qual estimula o uso dos meios de coerccedilatildeo indireta para garantir o cumprimento

da obrigaccedilatildeo pelo devedor

O princiacutepio da primazia da tutela especifica (ou princiacutepio do resultado) assevera que

ldquoA execuccedilatildeo deve ser especiacutefica propiciar ao credor a satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo tal qual

houvesse o cumprimento espontacircneo da prestaccedilatildeo pelo devedorrdquo 25

O CPC de 2015 absorveu todos os avanccedilos legislativos a cerca do mote O caput do

art 497 assegura que na accedilatildeo que tenha por objeto a prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer o

juiz se procedente o pedido concederaacute a tutela especiacutefica ou determinaraacute providecircncias que

assegurem a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico equivalente O art 499 o

complementa a obrigaccedilatildeo somente seraacute convertida em perdas e danos se o autor o requerer

ou se impossiacutevel agrave tutela especiacutefica ou a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico

equivalente

O princiacutepio do contraditoacuterio eacute garantido pela constituiccedilatildeo federal e compreende o

direito de ser ouvido o direito de acompanhar os atos processuais o direito de produzir

provas participar da sua produccedilatildeo manifestar-se sobre a prova produzida e obter do juiz a

23 Ibid p 69-70 24 Ibid p 70 25 Ibid p 71

14

respectiva valoraccedilatildeo o direito de ser informado regularmente dos atos praticados no processo

o direito agrave motivaccedilatildeo das decisotildees o direito de impugnar as decisotildees 26

O contraditoacuterio tem aplicaccedilatildeo em todo processo judicial sendo aplicaacutevel tambeacutem na

execuccedilatildeo No entanto o contraditoacuterio na execuccedilatildeo natildeo ocorre com a mesma intensidade que

no processo ou na fase de conhecimento eacute o que assevera Didier et al 27

O contraditoacuterio no procedimento executivo no aspecto do direito de defesa assegurado agrave parte demandada eacute eventual porquanto depende da provocaccedilatildeo do executado que natildeo eacute chamado ajuiacutezo para defender-se mas sim para cumprir a obrigaccedilatildeo O procedimento executivo adota a teacutecnica monitoacuteria que consiste basicamente na inversatildeo do ocircnus de provocar o contraditoacuterio o reacuteu em vez de citado para manifestar-se sobre a pretensatildeo do autor eacute convocado para cumprir uma determinada obrigaccedilatildeo

Logo haacute o contraditoacuterio no procedimento executivo porem eacute eventual quanto agrave defesa

do executado

Ademais o princiacutepio da menor onerosidade eacute consagrado pelo art 805 do CPC e

dispotildee que ldquoQuando por vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz

mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o executadordquo O referido princiacutepio tem o

escopo de impedir o abuso do direito pelo exequente

O principio da menor onerosidade auxilia o juiz na escolha de um meio executivo

adequado e necessaacuterio que satisfaccedila a prestaccedilatildeo exigida pelo credor Nesse sentido eacute o

entendimento do professor Fredie Didier et al 28

O resultado a ser alcanccedilado eacute aquele estabelecido pelo direito material A maneira de se chegar ateacute esse resultado eacute que deve ser a menos onerosa possiacutevel para o executado Isso significa que a opccedilatildeo pelo meio menos gravoso pressupotildee que os diversos meios considerados sejam igualmente eficazes Assim havendo vaacuterios meios executivos aptos agrave tutela adequada e efetiva do direito de creacutedito escolhe-se a via menos onerosa ao executado

O princiacutepio visa impedir a execuccedilatildeo desnecessariamente onerosa ao executado ou seja a execuccedilatildeo abusiva Em vez de enumerar situaccedilotildees em que a opccedilatildeo mais gravosa revelar-se-ia injusta o legislador valeu-se corretamente de uma claacuteusula geral para reputar abusivo qualquer comportamento do credor que pretender valer-se de meio executivo mais oneroso do que outro igualmente idocircneo agrave satisfaccedilatildeo do seu creacutedito

26 Ibid p 76 27 Ibid p 78 28 Ibid p 79-80

15 O princiacutepio da cooperaccedilatildeo tem como base os princiacutepios do devido processo legal da

boa-feacute processual e do contraditoacuterio O dito princiacutepio avigora a eacutetica processual com o

aprimoramento do diaacutelogo entre as partes reciprocamente e com o oacutergatildeo jurisdicional Eacute o

que preconiza o art 6ordm do CPC Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para

que se obtenha em tempo razoaacutevel decisatildeo de meacuterito justa e efetiva

No procedimento executivo o princiacutepio da cooperaccedilatildeo incide de diversas formas

disciplina Didier et al29 que na execuccedilatildeo

O executado tem o dever de indicar bens agrave penhora (art 774 V CPC) Natildeo encontrados bens penhoraacuteveis e natildeo havendo indicaccedilatildeo de qualquer um deles pelo exequente cabe ao executado declarar quais satildeo seus bens penhoraacuteveis sob pena de se sujeitar a uma sanccedilatildeo pecuniaacuteria compulsoacuteria

Tambeacutem eacute manifestaccedilatildeo do princiacutepio da cooperaccedilatildeo a exigecircncia de que o executado que pretende impugnar o valor da execuccedilatildeo apresente de logo o valor que reputa devido (art 525 sect 4ordm CPC) Seria comportamento natildeo-cooperativo afirmar que a cobranccedila eacute excessiva sem simultaneamente dizer qual eacute o valor correto

Demais disso aplicam-se agrave execuccedilatildeo os deveres que decorrem do princiacutepio da cooperaccedilatildeo e que satildeo imputados ao oacutergatildeo jurisdicional () Assim por exemplo deve o juiz advertir ao executado antes de puni-lo de que seu ato pode vir a caracterizar-se como atentatoacuterio agrave dignidade da jurisdiccedilatildeo ( art 772 II CPC) perceba que se trata de uma conduta compatiacutevel com o dever de prevenccedilatildeo O oacutergatildeo jurisdicional somente pode conhecer da prescriccedilatildeo ex officio dando a oportunidade de o exequente manifestar-se conforme impotildee o dever de consulta ( cf arts 10 487 paraacutegrafo uacutenico e 921 sect 5ordm CPC)

O princiacutepio ou postulado30 da proporcionalidade tem aplicaccedilatildeo muito relevante na

execuccedilatildeo O art 8 do CPC assegura que o oacutergatildeo jurisdicional tem o dever de observar a

proporcionalidade e a razoabilidade ao aplicar o ordenamento juriacutedico inclusive no

procedimento executivo

Ademais o art 805 do CPC eacute categoacuterico ao disciplinar que ldquoArt 805 Quando por

vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo

menos gravoso para o executadordquo O referido artigo jaacute se trata de uma concretizaccedilatildeo da

proporcionalidade

29 Ibid p 82 30 Segundo Fredie Didier et al haacute uma discussatildeo doutrinaacuteria sobre a proporcionalidade Parte da

doutrina acredita que a proporcionalidade eacute um princiacutepio e outra parte acredita que eacute um postulado normativo

16 O principio da adequaccedilatildeo pode ser vislumbrado em dois momentos do Direito

Processual ldquoa) no legislativo como orientador da confecccedilatildeo das leis b) no jurisdicional

autorizando ao juiz diante do caso concreto adaptar procedimento agraves suas peculiaridadesrdquo 31

Para Luceacutelia de Sena Alves e Tiago Retes32

Isso quer dizer que no momento legislativo o devido processo deve ser observado pelo legislador para a confecccedilatildeo das normas de direito processual que iratildeo servir de instrumento efetivo de concretizaccedilatildeo do direito substancial a ser tutelado atendendo a todas as suas finalidades sob pena de falecircncia do proacuteprio direito No momento jurisdicional da mesma forma a via processual escolhida pelo autor tambeacutem deve estar sujeita a este princiacutepio para que natildeo sofra as mesmas consequecircncias da sua inobservacircncia

O ordenamento juriacutedico deve ser aplicado por meio da teacutecnica processual adequada

evitando dessa forma uma tutela ineficaz

Por fim o princiacutepio do autorregramento da vontade na execuccedilatildeo tem o objetivo de

ldquo() preservar um espaccedilo processual para o exerciacutecio da liberdade e da vontade em que

sejam permitidas negociaccedilotildees que envolvam as partes ndash e tambeacutem o juizrdquo33 Didier et al34

assevera que

A rigor o legislador estabelece um regime juriacutedico de autorregramento da vontade processual identificando-se algumas manifestaccedilotildees relevantes para a execuccedilatildeo Na verdade pode-se dizer que poucos satildeo os ambientes mais propiacutecios do que a execuccedilatildeo para a negociaccedilatildeo sobre o processo Todos os institutos e normas processuais relativos agrave execuccedilatildeo devem ser repensados a partir da premissa de que o CPC permite uma ampla margem de liberdade de negociaccedilatildeo sobre o processo (art 190 CPC)

O autorregramento da vontade pode ser vislumbrando na previsatildeo de negoacutecios tiacutepicos

em sede de execuccedilatildeo como por exemplo no acordo das partes sobre o valor do bem que

dispensa a avaliaccedilatildeo disposto no inciso I do art 871 CPC Ademais dentro dos limites do art

190 do CPC eacute possiacutevel na execuccedilatildeo a atribuiccedilatildeo da negociaccedilatildeo atiacutepica aos sujeitos 31 ALVES Luceacutelia de Sena Alves RETES Tiago O poder geral de efetivaccedilatildeo das decisotildees judiciais e

proporcionalidade uma anaacutelise criacutetica acerca do art 139 IV do Novo Coacutedigo de Processo Civil Disponiacutevel em lthttpswwwacademiaedu31752652O_poder_geral_de_efetivaC3A7C3A3o_das_decisC3B5es_judiciais_e_a_proporcionalidade_uma_anC3A1lise_crC3ADtica_acerca_do_art_139_IV_do_Novo_CC3B3digo_de_Processo_Civil gt Acesso em 25 de julho de 2018

32 Ibid natildeo paginado 33 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 85 34 Ibid p 85

17

processuais permitindo que sejam feitas mudanccedilas nos procedimentos e nas situaccedilotildees

juriacutedicas processuais ldquoSatildeo exemplos de negoacutecios processuais atiacutepicos na execuccedilatildeo pacto de

penhorabilidade acordo de ampliaccedilatildeo de prazos das partes de qualquer natureza acordo de

rateio de despesas processuais ()rdquo35

24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO

Sempre houve diversos questionamentos quanto agrave eficaacutecia do Direito processual Civil

e se o mesmo era meio apto a assegurar a tutela jurisdicional dos direitos dos cidadatildeos O

processo de execuccedilatildeo eacute o setor que sofre mais criacuteticas quanto a sua ineficiecircncia afinal a

execuccedilatildeo civil sempre foi o ldquocalcanhar de Aquilesrdquo do sistema processual pela praxe do

ldquoganhou (no processo de conhecimento) mas natildeo levou (na fase de cumprimento ou

execuccedilatildeo)rdquo 36

Essa dificuldade de se efetivar a tutela satisfastiva natildeo se resume a um problema de

mera teacutecnica processual tiacutepico de determinado ordenamento mas representa uma prova de

fogo da capacidade dos instrumentos jurisdicionais O autor Leonardo Greco37 no ano de

2005 atribuiu esse fato as seguintes causas o excesso de processos o custo e a morosidade da

justiccedila a inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios a ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais

um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico e a progressiva volatizaccedilatildeo dos bens

Quanto ao excesso de processos o referido autor aduz que ldquonos grandes centros o

crescimento da maacutequina judiciaacuteria natildeo acompanhou a expansatildeo do nuacutemero de litiacutegiosrdquo 38

O custo e morosidade da justiccedila prejudicam a tutela satisfativa posto que

ldquojaacute desfalcado pelo inadimplemento do devedor o credor ainda tem de arcar com o adiantamento das despesas do processo de execuccedilatildeo e de eventual liquidaccedilatildeo vendo arrastar-se a marcha dos atos executoacuterios facilmente retardada por atos procrastinatoacuterios do devedorrdquo 39

35 Ibid p 86 36 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca

para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018

37 GRECCO Leonardo A Crise do Processo de Execuccedilatildeo in Estudos de direito processual Leonardo Greco ndash Campos dos Goytacazes Ed Faculdade de Direito de Campos 2005 p 7

38 Ibid p 7 39 Ibid p 7-8

18 A inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios contribui para a crise do processo de

execuccedilatildeo tendo em vista que

ldquoo juiz da execuccedilatildeo prisioneiro de ritos que o distanciam das partes e da realidade da vida impulsiona sem qualquer apetite a execuccedilatildeo conduzindo-a ao sabor dos ventos das provocaccedilotildees impacientes do credor e das costumeiras procrastinaccedilotildees do devedorrdquo 40

Jaacute ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais atrapalha a efetivaccedilatildeo da tutela satisfativa ldquoo

devedor natildeo colabora com a execuccedilatildeo e os meios de pressatildeo que a lei estabelece natildeo satildeo

suficientes para intimidaacute-lordquo 41

Com um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico

O espiacuterito empresarial e a sociedade de consumo estimulam o endividamento das pessoas e o inadimplemento das obrigaccedilotildees pelo devedor deixou de ser vexatoacuterio e reprovaacutevel o que multiplica as accedilotildees de cobranccedila e execuccedilotildees atraveacutes das quais o sujeito passivo ainda usufrui vantagens agraves custas do credor 42

Por fim Leonardo Greco elenca a volatizaccedilatildeo dos bens como o uacuteltimo fator que

macula o processo executo tendo em vista que

ldquomudou inteiramente o perfil patrimonial das pessoas antes concentrado em bens de raiz e agora tendencialmente dirigido a investimentos em tiacutetulos e valores facilmente negociaacuteveis o que dificulta a sua localizaccedilatildeo pelo credorrdquo 43

O Coacutedigo de Processo Civil de 1973 introduziu o sistema executivo ao ordenamento

juriacutedico paacutetrio e seguindo os valores liberais da eacutepoca com a proteccedilatildeo de esfera juriacutedica de

liberdade do cidadatildeo contra a possibilidade de arbiacutetrio do Estado e uso indevido do Poder

jurisdicional outorgou o miacutenimo de poder ao juiz Seguindo as regras do CPC de 73 o

devedor soacute poderia ter sua esfera juriacutedica invadida atraveacutes de meios de execuccedilatildeo instituiacutedos

previamente em lei

Diante de tantos obstaacuteculos para se efetivar a tutela satisfativa a execuccedilatildeo estava

fadada ao fracasso o que frustrava a expectativa do jurisdicionado a uma prestaccedilatildeo da tutela

jurisdicional ceacutelere e efetiva Insatisfeitos com o cenaacuterio que se encontrava a atividade

40 Ibid p 8 41 Ibid p8 42 Ibid p 8 43 Ibid p8

19

executiva legisladores e operadores do direito natildeo mediram esforccedilos para promover uma

evoluccedilatildeo significativa buscando mais eficiecircncia e celeridade ao procedimento executoacuterio

Dessa forma no final de 1994 foi introduzido no coacutedigo de processo agrave flexibilizaccedilatildeo

dos poderes executoacuterios do juiz ldquopara que ele pudesse prestar uma tutela efetiva aos direitos

ficando autorizado a determinar a modalidade de execuccedilatildeo adequada a cada hipoacutetese nas

obrigaccedilotildees de fazer e natildeo fazer (art 461 sect5ordm do CPC de 1973)rdquo No ano de 2002 a referida

medida foi estendida para as obrigaccedilotildees de entregar coisa (art 461-A caput e sect3ordm do CPC de

1973)

Com fundamento nos artigos 461 e 461-A em 2005 a Lei nordm 11 23205 unificou o

processo de conhecimento e o processo de execuccedilatildeo de sentenccedila Nesse sentido Maacuterio

Henrique Cavalcanti Gil Rodrigues44 aduz que

A Lei 112322005 reuniu de forma definitiva os processos de conhecimento e de execuccedilatildeo em um uacutenico processo composto por um sistema bifaacutesico Assim passa a existir uma fase inicial (de reconhecimento) e uma fase posterior (de cumprimento de sentenccedila de efetivaccedilatildeo da decisatildeo definitiva) sem contar com a eventual fase intermediaacuteria de liquidaccedilatildeo (RODRIGUES 2010 p 38)

Ademais as alteraccedilotildees realizadas no CPC de 73 inseriu a atipicidade dos meios

executivos nas obrigaccedilotildees de fazer natildeo fazer e dar coisa certa entretanto exercendo papel

subsidiaacuterio aos meios tiacutepicos

Quanto agraves obrigaccedilotildees de pagar quantia havia apenas a possibilidade de se valer da

incidecircncia de multa do art 475-J do CPC de 73 ndash implementada mediante reforma perpetrada

pela Lei nordm 11232 de 2005 em atendimento a doutrina processualista preocupada com a

efetividade das decisotildees ndash e de atos executivos como a penhora de bens e dinheiro

Ainda que a execuccedilatildeo tenha avanccedilado com a inserccedilatildeo das leis posteriores a 1994 no

CPC de 1973 a mesma continuava insuficiente tendo em vista que a burocracia e lentidatildeo

dos atos executivos davam brechas para que o devedor escondesse seu patrimocircnio penhoraacutevel

tornando carente de efetividade e celeridade agrave execuccedilatildeo

44 RODRIGUES Maacuterio Henrique Cavalcanti Gil A evoluccedilatildeo da execuccedilatildeo de sentenccedila no direito

processual civil e o novo regime juriacutedico das sentenccedilas apoacutes a reforma implementada pela Lei 112322005 Revista do Tribunal Regional Federal da 1ordf Regiatildeo v 22 n 2 fev 2010 p 38

20

25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO

A tutela juridiscional eacute um direito fundamental previsto no art 5ordm inciso XXXV da

Carta Magna ldquo() a lei natildeo excluiraacute da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio lesatildeo ou ameaccedila a

direitordquo

Na visatildeo claacutessica o direito de accedilatildeo era efetivado com a prolaccedilatildeo de uma sentenccedila de

meacuterito posiccedilatildeo adotada por grande parte dos processualistas seguidores da doutrina de

Liebman Todavia esse conceito se mostra defasado tendo em vista que o direito de acesso agrave

justiccedila natildeo eacute apenas uma garantia formal de bater as portas do judiciaacuterio mas a garantia de

acesso agrave ordem juriacutedica justa adequada e eficaz45

Acreditar que uma sentenccedila de meacuterito favoraacutevel eacute tutela jurisdicional suficiente para

satisfazer o que se busca com o ajuizamento da accedilatildeo eacute uma visatildeo distorcida da atividade

satisfativa ldquoSob o ponto de vista do direito material a condenaccedilatildeo por si soacute eacute incapaz de

prestar a tutela do direitordquo46

Nessa oacutetica o direito fundamental agrave tutela executiva exige um sistema de tutela

jurisdicional ldquocapaz de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor

de tutela executivardquo47 Dessa forma entende-se que

ldquo() a) a interpretaccedilatildeo das normas que regulamentam a tutela executiva tem de ser feita no sentido de extrair a maior efetividade possiacutevel b) o juiz tem o poder-dever de deixar de aplicar uma norma que imponha uma restriccedilatildeo a um meio executivo sempre que essa restriccedilatildeo natildeo se justificar como forma de proteccedilatildeo a outro direito fundamental c) o juiz tem o poder-dever de adotar os meios executivos que se revelem necessaacuterios agrave prestaccedilatildeo integral de tutela executivardquo48

Egrave imperioso compreender que o direito fundamental agrave tutela executiva ratificado

pelo CPC eacute essencial para dirimir diversos litiacutegios oriundos do procedimento executivo

45 FERREIRA Gabriela Macedo Poder geral de efetivaccedilatildeo em defesa da constitucionalidade da

teacutecnica de execuccedilatildeo dos direitos do art 139 IV do Coacutedigo de Processo Civil Revista Jus Navigandi ISSN 1518-4862 Teresina ano 22 n 5178 4 set 2017 Disponiacutevel em lthttpsjuscombrartigos60190gt Acesso em 11 set 2018

46 Ibid natildeo paginado 47 DIDIER JR Fredie et al apud GUERRA Marcelo lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do credor

na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 48 Ibid p 102-104

21

ldquoprincipalmente aqueles relacionados agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo49

Fredie Didier et al50 cita como exemplo as hipoacuteteses de impenhorabilidade

A impenhorabilidade de certos bens eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa

Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais

Por esta razatildeo o legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do

CPC fazendo um preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses das partes envolvidas

optando pela mitigaccedilatildeo do direito do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado

Quando o oacutergatildeo jurisdicional verificar que a aplicaccedilatildeo das regras de

impenhorabilidade eacute desproporcional para o caso concreto deve afastaacute-la e construir a

soluccedilatildeo adequada para o referido caso Didier et al51 traz um exemplo esclarecedor em sua

obra

O bem imoacutevel que serve de moradia da famiacutelia eacute relativamente impenhoraacutevel Objetiva-se com essa restriccedilatildeo proteger o direito fundamental agrave moradia conteuacutedo do direito agrave proteccedilatildeo da dignidade Imagine-se um imoacutevel de altiacutessimo valor Imagine-se agora um creacutedito que corresponda a 40 do valor do imoacutevel A venda judicial do imoacutevel no caso permitiria natildeo soacute satisfazer o direito do credor como ainda garantir ao executado com a sobra a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel que lhe preserve a dignidade A opccedilatildeo pela interpretaccedilatildeo literal da regra que veda a penhora protegeria exclusivamente o direito do executado de maneira desnecessaacuteria porque a relaccedilatildeo valor executadovalor do bem permitiria a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel apoacutes a entrega do dinheiro ao credor Seria pois interpretaccedilatildeo em desconformidade com os preceitos da contemporacircnea hermenecircutica constitucional que preconiza a necessidade de nos casos de choque entre direitos fundamentais dar a interpretaccedilatildeo que mais adequadamente proteja a ambos

A execuccedilatildeo civil integra o direito fundamental agrave tutela jurisdicional disciplinando

que ldquoos dispositivos devem ser interpretados de modo que se garanta a maior efetividade

49 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66 50 Ibid p 66 51 Ibid p 67

22

possiacutevel agrave execuccedilatildeo desde que respeitados outros direitos fundamentaisrdquo52 Podendo ser

afastada desde que proporcional qualquer obstaacuteculo irrazoaacutevel agrave efetivaccedilatildeo desse direito

52 FERREIRA Gabriela Macedo apud MACEDO Lucas Buril de As eficaacutecias das decisotildees judiciais e

o cumprimento de sentenccedila no CPC15 Novo CPC Doutrina selecionada v 5 Execuccedilatildeo Coordenador geral Fredie Didier Jr organizadores Lucas Buril de Macedo Ravi Peixoto Alexandre Freire ndash Salvador Jus Podivm 2015 p 360361

23

3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO

EXECUTADO

31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS

Como forma de controlar a atividade jurisdicional por muito tempo vigorou o

entendimento de que a execuccedilatildeo somente poderia ser realizada atraveacutes dos meios executivos

tipicamente previstos na legislaccedilatildeo Segundo Luiz Guilherme Marinoni53

O princiacutepio da tipicidade deseja significar que os meios de execuccedilatildeo devem estar previstos na lei e assim que a execuccedilatildeo natildeo pode ocorrer atraveacutes de formas executivas natildeo tipificadas O seu objetivo eacute de um lado impedir que meio executivo natildeo previsto em lei possa ser utilizado e de outro garantir o jurisdicionado contra a possibilidade de arbiacutetrio judicial na fixaccedilatildeo da modalidade executiva Se o jurisdicionado sabe em razatildeo de previsatildeo legal que a sua esfera juriacutedica somente poderaacute ser invadida atraveacutes de determinadas modalidades executivas confere-se a ele a possibilidade de antever a reaccedilatildeo ao seu inadimplemento bem como a garantia de que a jurisdiccedilatildeo natildeo determinaraacute ou permitiraacute a utilizaccedilatildeo de meio executivo diverso daqueles previstos

Dessa forma o princiacutepio da tipicidade disciplina que o oacutergatildeo julgador ao proceder agrave

execuccedilatildeo estaacute limitado aos meios executivos previamente definidos em lei natildeo podendo se

valer de qualquer teacutecnica de efetivaccedilatildeo que natildeo se encaixasse nas hipoacuteteses taxativas da

legislaccedilatildeo

Entretanto o legislador natildeo tem como prever todas as peculiaridades dos direitos

dignos de tutela executiva e preordenar teacutecnicas executivas diversas para cada peculiaridade

Sob esse cenaacuterio o principio da tipicidade foi cedendo lugar ao principio da atipicidade dos

meios executivos

A ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do oacutergatildeo julgador estaacute cada vez mais presente

no ordenamento juriacutedico paacutetrio motivando um poder geral de efetivaccedilatildeo ldquoque permite ao

julgador valer-se dos meios executivos que considerar mais adequado ao caso concreto sejam

eles de coerccedilatildeo direta sejam de coerccedilatildeo indiretardquo 54

53 MARINONI Luiz Guilherme Teacutecnica processual e tutela dos direitos Satildeo Paulo Editora Revista

dos Tribunais 2004 p 212 nota 79 54 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 100

24

Essa tendecircncia de ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do juiz natildeo eacute exclusividade do

ordenamento juriacutedico brasileiro segundo Fredie Didier et al55

Michelle Taruffo jaacute apontava que o direito americano diante da inefetividade dos meios executivos at law comeccedilou a autorizar o magistrado a tomar medidas executivas adequadas ao caso concreto Trata-se afirma o jurista italiano de aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo segundo o qual as regras processuais devem ser adaptadas agraves necessidades do direito material

Os meios executivos atiacutepicos derivam de trecircs enunciados normativos do Coacutedigo de

Processo Civil o art 139 IV o art 297 e o sect1ordm do art 536

O art 139 IV do CPC dispotildee que pertence ao juiz o poder-dever de ldquodeterminar

todas as medidas indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para

assegurar o cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto

prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo

Jaacute o art 297 do CPC cuida da tutela provisoacuteria e garante que ldquoo juiz poderaacute

determinar as medidas que considerar adequadas para a efetivaccedilatildeo da tutela provisoacuteriardquo

Podendo dessa forma a dita tutela ser efetivada atipicamente

Por fim o art 536 sect1ordm do CPC dispotildee que

Para atender ao disposto no caput o juiz poderaacute determinar entre outras medidas a imposiccedilatildeo de multa a busca e apreensatildeo a remoccedilatildeo de pessoas e coisas o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva podendo caso necessaacuterio requisitar o auxilio de forccedila policial

As supracitadas medidas executivas atiacutepicas satildeo entendidas pela doutrina como

claacuteusulas gerais processuais executivas56 Essas claacuteusulas gerais natildeo restringem a sua

aplicaccedilatildeo agraves teacutecnicas de coerccedilatildeo indireta satildeo autorizados tambeacutem o uso de meios de execuccedilatildeo

dieta e indireta

Ademais cumpre salientar que o art 139 IV CPC aplica-se a toda e qualquer

atividade executiva ldquoa) seja fundada em tiacutetulo executivo judicial (provisoacuteria ou definitiva)

55 DIDIER JR Fredie et al apud TARUFFO Michelle A atuaccedilatildeo executiva dos direitos perfis

comparatiacutesticos Revista de Processo Satildeo Paulo RT 1990 n 59 p 78 56 Segundo Fredie Didier et al claacuteusula geral eacute uma espeacutecie de texto normativo cujo antecedente

(hipoacutetese faacutetica) eacute composto por termos vagos e consequente (efeito juriacutedico) eacute indeterminado

25

seja fundada em tiacutetulo executivo extrajudicial b) seja para efetivar prestaccedilatildeo pecuniaacuteria seja

para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer ou dar coisa distinta de dinheirordquo57

Jaacute o art 297 do CPC garante que a tutela provisoacuteria possa ser efetivada tambeacutem

atipicamente ldquoSucede que a atipicidade da tutela provisoacuteria segue necessariamente a

atipicidade da tutela definitivardquo 58

Por fim o comando do sect 1 ordmdo art 536 se aplica

a) inicialmente agrave execuccedilatildeo de fazer e de natildeo fazer fundada em decisatildeo judicial (provisoacuteria ou definitiva) b) por forccedila do sect 3ordm do art 538 tambeacutem se aplica ao cumprimento de sentenccedila para entrega de coisa c) por forccedila do art 771 paraacutegrafo uacutenico o dispositivo tambeacutem se aplica agrave execuccedilatildeo para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer e entregar coisa distinta de dinheiro fundada em tiacutetulo extrajudicial

Claramente o art 139 IV eacute mais amplo do que o sect 1 ordm do art 536 estende-se por

disposiccedilatildeo expressa agrave execuccedilatildeo de pagar quantia Sendo uma grande novidade nas obrigaccedilotildees

que tem por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15

O art 139 IV do CPC apresentou uma novidade agrave atipicidade dos meios executivos

ao disciplinar que cabe ao juiz ldquodeterminar todas as medidas indutivas coercitivas

mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o cumprimento de ordem judicial

inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo

A inovaccedilatildeo estaacute na possibilidade de utilizar os meios atiacutepicos para assegurar o

cumprimento de decisotildees que versam sobre as obrigaccedilotildees pecuniaacuterias sendo admitida a

utilizaccedilatildeo de outros meios ateacute na execuccedilatildeo de titulo judicial de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria aleacutem da

multa de 10 (a que se refere o artigo 523 sect 1ordm do CPC) para forccedilar o devedor a cumprir a

obrigaccedilatildeo pecuniaacuteria

57 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 105 58 Ibid p 105

26

Dessa forma eacute possiacutevel afirmar que ldquoao lado da disciplina tiacutepica do art 523 e

seguintes () o novo CPC inova ao permitir que o sistema de teacutecnicas executivas atiacutepicas

sejam empregadas na execuccedilatildeo monetaacuteriardquo59 (ZARONI VITORELLI 2016 p 66)

Fernando da Fonseca Gajardoni60 denomina a dita medida como a ldquorevoluccedilatildeo

silenciosardquo da execuccedilatildeo por quantia certa posto que

() pelo fato de que a regra natildeo estar propriamente incrustrada nos capiacutetulo e livro atinentes ao cumprimento de sentenccedila e ao processo de execuccedilatildeo ndash o art 139 IV do Novo CPC parece trazer ao paiacutes algo bastante novo cuja aplicaccedilatildeo a depender do comportamento do Judiciaacuterio pode implicar em verdadeira revoluccedilatildeo (positiva ou negativa) na sistemaacutetica executiva ateacute entatildeo vigente

Claramente o dispositivo foi recebido com entusiasmo por parte da doutrina que

anteciparam em afirmar que o princiacutepio da atipicidade dos meios executivos no CPC2015

ldquo() assume a feiccedilatildeo de poder-dever geral conferido ao magistrado de determinar () todas

as medidas coercitivas sub-rogatoacuterias mandamentais e indutivas que entender necessaacuterias

para a tutela justa efetiva e em tempo razoaacutevelrdquo 61

Dessa forma lecionam Luiz Guilherme Marinoni Seacutergio Cruz Arenhart e Daniel

Mitidiero62 que

O juiz a partir do art 139 IV do CPC2015 natildeo estaacute mais adstrito apenas agrave sentenccedila condenatoacuteria ndash que fixa a obrigaccedilatildeo de pagar e daacute ensejo agrave abertura da execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo patrimonial ndash para a tutela de prestaccedilotildees pecuniaacuterias Pode impor essa prestaccedilatildeo por meio de ordem judicial acoplada ao aceno de emprego de medida de induccedilatildeo (coercitiva ou de pressatildeo positiva) ou de medida de sub-rogaccedilatildeo (MARINONI ARENHARDT MITIDIERO 2015 p 703)

Deste modo em razatildeo do art 139 IV do CPC tem-se entendido que o juiz nas

execuccedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria possui a faculdade de adotar qualquer

59 ZARONI Bruno Marzullo VITORELLI Edilson Reforma e efetividade da execuccedilatildeo no novo CPC

In PEIXOTO Ravi FREIRE Alexandre MENDES Aluiacutesio Gonccedilalves de Castro Execuccedilatildeo 2 ed rev e atual Salvador JusPodivm 2016 766 p (Coleccedilatildeo novo CPC doutrina selecionada v 5) p 66

60 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia 24082015 JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Acesso em 23082018

61 LIMA Rafael de Oliveira A atipicidade dos meios executivos no coacutedigo de processo civil brasileiro de 2015 Revista de Processo Jurisdiccedilatildeo e Efetividade da Justiccedila v 2 n 2 juldez 2016 p 11

62 MARINONI Luiz Guilherme ARENHART Seacutergio Cruz MITIDIERO Daniel Novo curso de processo civil tutela dos direitos mediante procedimento comum Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 v 2 p 703

27

medida indutiva coercitiva mandamentais ou sub-rogatoacuterias para efetivar o creacutedito do

exequente natildeo se limitando as medidas tiacutepicas

Alguns doutrinadores se precipitaram ao afirmar que o dito dispositivo ldquo() autoriza o

juiz a utilizar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir ressalvando-se a prisatildeo

civil constitucionalmente limitada ao devedor de alimentosrdquo 63 Acreditam Jorge Bheron

Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa que o entusiasmo por parte da

doutrina abre margem para as mais variadas formas de compelir o devedor a cumprir com a

prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

ldquoE aiacute persistindo no mau vezo de fazer explicaccedilotildees em abstrato ignorando que o sentindo soacute se daacute na aplicaccedilatildeo (situaccedilatildeo concreta real ou fictiacutecia) as sugestatildeo satildeo as mais engenhosas suspensatildeo de CNH retenccedilatildeo de passaporte restriccedilatildeo de fim de semana cancelamento de cartotildees de creacutedito ndash para ficar apenas nestasrdquo 64

Ou seja podendo o juiz natildeo apenas substituir o devedor tomando seu patrimocircnio para

entregar ao credor na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia como tambeacutem poderaacute

pressionaacute-lo psicologicamente a adimplir por conta proacutepria a obrigaccedilatildeo

Ademais o Enunciado nordm 48 do ENFAM avalia expressamente a possibilidade de

imposiccedilatildeo de medidas coercitivas para a efetivaccedilatildeo da execuccedilatildeo pecuniaacuteria Conforme o dito

enunciado

ldquoO art 139 inciso IV traduz um poder geral de efetivaccedilatildeo permitindo a aplicaccedilatildeo de medidas atiacutepicas para garantir o cumprimento de qualquer ordem judicial inclusive no acircmbito do cumprimento de sentenccedila e no processo de execuccedilatildeo baseado em tiacutetulosrdquo

Dessa forma o artigo 139 IV do CPC permite uma gama ampla de interpretaccedilotildees por

parte da doutrina por ser uma claacuteusula geral encontrando limite apenas na imaginaccedilatildeo de

quem o analisa Nesse sentido eacute forccediloso orientar e delimitar o manejo desse artigo legal para

que se extraia seu sentido e alcance revelando assim sobre que situaccedilotildees ele incide de que

modo e o que permite

63 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

64 Ibid sem paginaccedilatildeo

28

32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER

GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO

O artigo 139 IV com a vigecircncia do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 abriu margem

para uma constelaccedilatildeo de decisotildees nas quais o dito dispositivo recebeu diversas interpretaccedilotildees

pelos operadores do direito

Sem duacutevidas por ser uma das pioneiras a decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara

Ciacutevel do Foro Regional de Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-

1320138260011 na data de 25 de agosto de 2016 gerou um enorme rebuliccedilo

Nessa accedilatildeo que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto

uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a

suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o

passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito

Segundo a magistrada o processo tramitava haacute anos sem que nenhum valor tenha sido

pago ao exequente aleacutem do devedor natildeo ter oferecido proposta de acordo e nem ter indicado

bens agrave penhora configurando uma completa desiacutedia com o processo

ldquoO caso tratado nos autos se insere dentre as hipoacuteteses em que eacute cabiacutevel a aplicaccedilatildeo do art 139 inciso IV do Coacutedigo de Processo Civil Isso porque o processo tramita desde 2013 sem que qualquer valor tenha sido pago ao exequente Todas as medidas executivas cabiacuteveis foram tomadas sendo que o executado natildeo paga a diacutevida natildeo indica bens agrave penhora natildeo faz proposta de acordo e sequer cumpre de forma adequada as ordens judiciais frustrando a execuccedilatildeo

Se o executado natildeo tem como solver a presente diacutevida tambeacutem natildeo recursos para viagens internacionais ou para manter um veiacuteculo ou mesmo manter um cartatildeo de creacutedito Se poreacutem mantiver tais atividades poderaacute quitar a diacutevida razatildeo pela qual a medida coercitiva poderaacute se mostrar efetiva

Assim como medida coercitiva objetivando a efetivaccedilatildeo da presente execuccedilatildeo defiro o pedido formulado pelo exequente e suspendo a Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo do executado M A S determinando ainda a apreensatildeo de seu passaporte ateacute o pagamento da presente diacutevida

()

Determino ainda o cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado ateacute o pagamento da presente diacutevida ()rdquo

Foi impetrado Habeas Corpus no Tribunal de Justiccedila do Estado de Satildeo Paulo a favor

do executado sob o fundamento que a coaccedilatildeo era ilegal e afetava o direito de locomoccedilatildeo

29

garantido constitucionalmente Tendo sido concedida a liminar em decisatildeo que ora se

reproduz

Em que pese a nova sistemaacutetica trazida pelo art 139 IV do CPC2015 deve-se considerar que a base estrutural do ordenamento juriacutedico eacute a Constituiccedilatildeo Federal que em seu art 5ordm XV consagra o direito de ir e vir Ademais o art 8ordm do CPC2015 tambeacutem preceitua que ao aplicar o ordenamento juriacutedico o juiz natildeo atentaraacute apenas para a eficiecircncia do processo mas tambeacutem aos fins sociais e agraves exigecircncias do bem comum devendo ainda resguardar e promover a dignidade da pessoa humana observando a proporcionalidade a razoabilidade e a legalidade Por tais motivos concedo a liminar pleiteada65

Cabe destacar aqui o voto vencido da Desembargadora Maria Luacutecia Pizzotti no

julgamento do Habeas Corpus supracitado demonstrando que o debate sobre a abrangecircncia

do artigo 139 IV do CPC ocorre tanto na doutrina quanto no judiciaacuterio

O objetivo do novel dispositivo natildeo eacute impor penas ou restringir direitos natildeo sendo intenccedilatildeo do Judiciaacuterio suspender indefinidamente o direito de dirigir do executado ou sua liberdade de viajar mas sim impor uma restriccedilatildeo tatildeo gravosa caso ele natildeo cumpra a determinaccedilatildeo que escolha cumprir sua obrigaccedilatildeo e dar fim ao problema Em outras palavras mediante as medidas de coerccedilatildeo o Estado procura persuadir o inadimplente impondo-lhe situaccedilotildees tatildeo onerosas e inconvenientes que em algum momento seja para ele mais vantajoso cumprir do que permanecer no inadimplemento

Ao fazecirc-lo o Novo Coacutedigo de Processo Civil rompe com as criacuteticas da ineficiecircncia das execuccedilotildees Natildeo se cogita deferir medidas restritivas agravequeles que demonstram a incapacidade absoluta de solver o deacutebito apenas agravequeles que reconhecidamente se valem de artimanhas e subterfuacutegios para evitar a satisfaccedilatildeo das diacutevidas ldquopreferindordquo outras despesas mais lsquonobresrsquo agindo em nome de terceiros e fazendo escaacuternio dos credores e do proacuteprio Poder Judiciaacuterio (hellip)

Para tanto memoraacutevel a noccedilatildeo de que a medida em comento tem caraacuteter excepcional e encontra limites no plano da proporcionalidade como sustenta o ilustrado Magistrado paulista Fernando da Fonseca Gajardoni Professor Faculdade de Direito de Ribeiratildeo Preto da USP (in httpswwwjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 acesso em 091216 agraves 11h20min) E para anaacutelise da proporcionalidade a ponderaccedilatildeo deve observar os trecircs passos apontados pela doutrina a necessidade a adequaccedilatildeo e a proporcionalidade em sentido estrito

65 TJSP - Habeas Corpus Processo nordm 2183713-8520168260000 30ordf Cacircmara Direito Privado relator

Des Marcos Ramos j 290317

30

Ademais no entendimento de Jorge Amaury Maia Nunes e Guilherme Pupe de

Noacutebrega66 essa decisatildeo releva os perigos trazidos pelo art 139 IV do CPC ao confrontar

direitos constitucionalmente garantidos

De nossa parte entendemos que a liberdade de locomoccedilatildeo inserta no inciso XV do artigo 5ordm que abrange o direito de deixar o territoacuterio nacional sofre embaraccedilo indevido pela apreensatildeo de passaporte ou pela suspensatildeo da carteira nacional de habilitaccedilatildeo

()

Agrave luz da exposiccedilatildeo feita acima e em anaacutelise primeva sustentamos que o artigo 139 IV do CPC de 2015 estaacute a merecer declaraccedilatildeo de inconstitucionalidade sem reduccedilatildeo de texto para o fim de rechaccedilar a apreensatildeo de passaporte a suspensatildeo do direito de dirigir e a vedaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo em concurso ou em licitaccedilatildeo puacuteblicos como medidas passiacuteveis de serem adotadas pelo juiz sob pena de vulneraccedilatildeo aos artigos 1ordm IV 5ordm XV e LIV 37 I 173 sect 3ordm III e 175 todos da Constituiccedilatildeo

Apesar de ter sofrido duras criacuteticas a decisatildeo do processo de nordm 4001386-

1320138260011 serviu de inspiraccedilatildeo para tantas outras decisotildees no mesmo sentido

Foi o caso da decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de Satildeo

Vicente em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 0020724-2620088260590 na data de 21 de

junho de 2017

A supracitada execuccedilatildeo se arrastava por nove (09) anos sem que o devedor tenha

esboccedilado qualquer intenccedilatildeo de pagar a diacutevida O credor requereu a suspensatildeo da Carteira

Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado apreensatildeo do passaporte e cancelamento dos

cartotildees de creacutedito

O magistrado com embasamento no artigo 139 IV do CPC deferiu parcialmente o

pedido sob o fundamento de que a apreensatildeo de passaporte e CNH natildeo viola o direito de ir e

vir do devedor Entretanto o juiz indeferiu o pedido de cancelamento do cartatildeo de creacutedito por

acreditar que a suspensatildeo poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado tendo em

vista que atualmente as pessoas utilizam o referido cartatildeo para pagamento das despesas

diaacuterias

66 NOBREacuteGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139

IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018

31

Eacute evidente que as medidas atiacutepicas de coerccedilatildeo devem ser utilizadas com cautela sempre respeitando a dignidade da pessoa do executado Natildeo se vislumbra contudo que as medidas aqui eleitas sejam capazes de vulnerar os Direitos Fundamentais do indiviacuteduo A uma porque natildeo se trata de restriccedilatildeo ao direito de ir e vir do executado que continua no gozo de plena liberdade de locomoccedilatildeo a duas porque a conduccedilatildeo de veiacuteculo automotor eacute mera comodidade da vida moderna natildeo se tratando de direito absoluto

Com mais razatildeo ainda se admite a suspensatildeo do Passaporte do executado que se natildeo paga a diacutevida da execuccedilatildeo natildeo deve ter o direito de fazer viagem internacional

Tem-se aqui verdadeiro exerciacutecio de ponderaccedilatildeo de interesses juriacutedicos de um lado jaz o direito de creacutedito do exequente que deriva do direito de propriedade e por isso mesmo tem envergadura constitucional de outro giro tem-se o direito do executado agrave autorizaccedilatildeo do Estado para conduzir veiacuteculo automotor e realizar viagens internacionais que natildeo se mostram essenciais agrave dignidade da pessoa humana Natildeo haacute duacutevidas pois de que eacute este uacuteltimo que deve sucumbir

O pedido fica indeferido apenas no tocante agrave suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado Eacute que ao contraacuterio da CNH e do passaporte que trazem consigo certa presunccedilatildeo de riqueza natildeo se pode concluir que o uso de cartatildeo de creacutedito eacute feito por luxo ou simples conveniecircncia

Como eacute cediccedilo os cartotildees de creacutedito oferecem ao seu titular creacutedito raacutepido e rotativo para o pagamento de despesas diaacuterias e certamente exercem funccedilatildeo essencial agravequeles que se encontram em situaccedilatildeo financeira precaacuteria

A suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado portanto se revela medida desproporcional e que inclusive poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado

Pelo exposto defiro em parte o pedido formulado pelo exequente e DETERMINO a suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo e bem como a suspensatildeo da validade (cancelamento temporaacuterio) no sistema SINPA de eventuais passaportes vaacutelidos em nome do executado

Dessa forma o artigo 139 IV do CPC revolucionou completamente a execuccedilatildeo de

obrigaccedilatildeo de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria ao permitir a utilizaccedilatildeo do uso dos meios executivos

atiacutepicos para compelir o executado a satisfazer o creacutedito do exequente

33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE

EFETIVACcedilAtildeO

Era inevitaacutevel que o artigo 139 IV do CPC gerasse todo tipo de reaccedilatildeo entre os

doutrinadores do processo civil e ateacute mesmo de outros ramos do direito devido a sua

capacidade de realizar uma completa inovaccedilatildeo na forma de se executar as obrigaccedilotildees de pagar

quantia Alguns o aplaudiram visualizando nele ldquouma luz no fim do tuacutenelrdquo outros o

criticaram vislumbrando as arbitrariedades que poderiam ser praticadas com embasamento no

referido dispositivo

32

As decisotildees suscitadas em linhas preteacuteritas auxiliaram para fervilhar ainda mais o

debate sobre o tema tendo em vista que por um lado poderia aumentar a efetividade das

execuccedilotildees por quantia no entanto por outro surgiam questionamentos a cerca da sua

constitucionalidade

A doutrina parece que demoraraacute a se pacificar sobre o tema Segundo alguns

doutrinadores seraacute inconstitucional toda restriccedilatildeo que recaia sobre a pessoa do devedor e natildeo

exclusivamente sobre o seu patrimocircnio Jaacute para outros o dispositivo eacute constitucional e o meio

mais eficaz para se resolver o problema da efetivaccedilatildeo das execuccedilotildees de pagar quantia ldquoA

discussatildeo se daacute especialmente no que diz respeito aacutes medidas de suspensatildeo de CNH

apreensatildeo de passaporte e bloqueio de cartotildees de creacutedito do devedorrdquo 67

O professor Thiago Rodovalho analisou detalhadamente a decisatildeo de nordm 4001386-

1320138260011 em seu artigo ldquoO necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na

concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivosrdquo 68 Quanto agrave suspensatildeo da CNH o autor

acredita que tal medida natildeo viola qualquer direito fundamental do devedor posto que ldquodirigir

veiacuteculos automotores eacute direito do cidadatildeo mas natildeo se confunde com os direitos fundamentais

e social de ir-e-vir e ao transporterdquo 69 O professor eacute categoacuterico ao afirmar que

Com relaccedilatildeo agrave suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (suspensatildeo do direito de dirigir restriccedilatildeo de direitos) natildeo nos parece haver qualquer violaccedilatildeo a direito fundamental ou social nem a direito da personalidade ou colocaccedilatildeo do devedor em situaccedilatildeo desproporcionalmente detrimentosa exceccedilatildeo feita aos que usam o veiacuteculo como instrumento de trabalho atraindo a hipoacutetese do NCPC art 833 inc V

()

Outrossim natildeo o consideramos como direito da personalidade Os direitos da personalidade satildeo os valores fundamentais que compotildeem o proacuteprio ser justamente por isso intransmissiacuteveis e irrenunciaacuteveis natildeo podendo o seu exerciacutecio sofrer limitaccedilatildeo voluntaacuteria (CC art 11) Por mais que vivamos num paiacutes que tanto valoriza o carro e que muitas pessoas de fato se compreendam em razatildeo e em funccedilatildeo do carro que dirijam este natildeo nos parece ser um direito que verdadeiramente componha a personalidade do indiviacuteduo70

67 DONTOS Sofia Poderes executoacuterios do juiz que diz a doutrina sobre o art 139 inc IV do CPC

Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigospoderes-executorios-do-juiz-que-diz-a-doutrina-sobre-art-139-inc-iv-do-cpc-23052018 gt Publicado em 23052018 Acesso em 01082018

68 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018

69 Ibid sem paginaccedilatildeo 70 Ibid sem paginaccedilatildeo

33

Quanto ao cancelamento dos cartotildees de credito do devedor o professor Thiago

Rodovalho tambeacutem acredita que natildeo haacute qualquer violaccedilatildeo ao direito fundamental social ou

da personalidade do devedor e acrescenta que

Tanto assim o eacute que ser titular de um cartatildeo de creacutedito pressupotildee ter creacutedito o que eacute analisado e concedido por instituiccedilotildees financeiras mais do que isso se porventura passando por dificuldades financeiras a pessoa deixa de honrar com pagamentos a mesma instituiccedilatildeo financeira concedente do cartatildeo de creacutedito pode sponte propria cancelaacute-lo ou recusar-lhe a concessatildeo Ora parece-me contraditoacuterio que instituiccedilotildees financeiras para sua proteccedilatildeo patrimonial possam ferir esse suposto ldquodireito fundamentalrdquo ou esse suposto ldquodireito da personalidaderdquo mas natildeo possa o Poder Judiciaacuterio igualmente fazecirc-lo contra aquele devedor moroso que instado ao pagamento e frustradas todas as tentativas de constriccedilatildeo patrimonial leva vida luxuosa valendo-se de cartotildees de creacutedito que prescindem de dinheiro em conta eacute dizer podem justamente funcionar como forma de ocultar renda e patrimocircnio71

O autor considera a apreensatildeo de passaporte um tema mais polecircmico e que merece

maior reflexatildeo No entanto crecirc que eacute possiacutevel a apreensatildeo de passaporte sem violar os

direitos fundamentais do devedor por se tratar de um direito de ir e vir de amplitude especial

Agrave primeira vista a possibilidade de apreensatildeo do passaporte tambeacutem nos parece possiacutevel pois tambeacutem se trata de um direito de ir e vir de amplitude especial Assim o eacute pois salvo situaccedilotildees especiais (refugiados p ex) haacute a necessidade de demonstrar condiccedilotildees financeiras de estadia e retorno para ser admitido no paiacutes de destino Ou seja pressupotildee uma condiccedilatildeo financeira que o devedor justamente diz natildeo possuir Sem embargo dessa consideraccedilatildeo esse ainda eacute um ponto que merece uma reflexatildeo mais acurada sendo essa apenas uma primeira impressatildeo72

Outros autores escreveram sobre o tema como eacute o caso do processualista Luiz

Dellore73 que tambeacutem defende que as medidas atiacutepicas como restriccedilatildeo ao direito de dirigir

apreensatildeo de passaporte e cancelamento de cartotildees de creacutedito satildeo permitidas e natildeo violam em

regra os direitos fundamentais do devedor

De minha parte creio que efetivamente haacute inovaccedilatildeo no at 139 IV do NCPC (e natildeo mera repeticcedilatildeo do que jaacute havia no Coacutedigo anterior) que tem o condatildeo de trazer mais efetividade ao processo executivo no Brasil ndash que por deacutecadas centrou sua atenccedilatildeo na defesa do executado (vide a grande quantidade de impenhorabilidades) sem dar maior atenccedilatildeo ao creacutedito do exequente

71 Ibid sem paginaccedilatildeo 72 Ibid sem paginaccedilatildeo 73 DELLORE Luiz NCPC Atipicidade das medidas executivas jaacute eacute realidade Disponiacutevel em lt

httpswwwjotainfoopiniao-e-analisecolunasnovo-cpcncpc-atipicidade-de-medidas-executivas-ja-e-realidade-17042017 gt Publicado em 17042017 Acesso em 03092018

34

Logo a meu ver medidas como (i) restriccedilatildeo ao direito de dirigir (ii) apreensatildeo de passaporte (iii) cancelamento de cartotildees de creacutedito e (iv) vedaccedilatildeo de obtenccedilatildeo de novos empreacutestimos se natildeo vinculados ao pagamento do deacutebito exequendo dentre outras restriccedilotildees que deveratildeo ser observadas a cada caso satildeo permitidas pelo sistema do NCPC e em regra natildeo violam direitos fundamentais do devedor E tecircm o condatildeo de fazer com que o executado que tem recursos diante dessas medidas coercitivas pague o deacutebito trazendo sucesso agrave satisfaccedilatildeo do creacutedito

Nessa linha para Alexandre Fuchs das Neves74 o artigo 139 IV do CPC conferiu ao

juiz poderes coercitivos capazes de ldquotransformar a vida do devedor um infernordquo para compeli-

lo a cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria Entretanto pondera que para que a medida tenha

validade ldquoeacute necessaacuteria uma fundamentaccedilatildeo por evidente uma correlaccedilatildeo temaacutetica entre a

medida adotada e sua efetividade em face ao processo com fundamentaccedilatildeo detalhadardquo

No entendimento de Fernando Gajardoni75 satildeo possiacuteveis as medidas de apreensatildeo de

passaporte bloqueio de cartotildees de creacutedito e suspensatildeo da CNH Para ele o que limita o art

139 IV do CPC eacute o esgotamento dos meios tiacutepicos e a real necessidade da medida

Ilustrativamente natildeo efetuado o pagamento de diacutevida oriunda de multas de tracircnsito e superados os expedientes tradicionais de adimplemento (penhora de dinheiro e bens) seria liacutecito o estabelecimento da medida coercitivaindutiva de suspensatildeo do direito a conduzir veiacuteculo automotor ateacute pagamento do deacutebito (inclusive com apreensatildeo da CNH do devedor) natildeo efetuado pagamento de verbas salariais devidas a funcionaacuterios da empresa possiacutevel o estabelecimento de vedaccedilatildeo agrave contrataccedilatildeo de novos funcionaacuterios ateacute que seja saldada a diacutevida natildeo efetuado o pagamento de financiamento bancaacuterio na forma e no prazo avenccedilados possiacutevel ateacute que se tenha a quitaccedilatildeo que se obstem novos financiamentos ou mesmo a participaccedilatildeo do devedor em licitaccedilotildees (como de ordinaacuterio jaacute acontece com pessoas juriacutedicas em deacutebito tributaacuterio com o Poder Puacuteblico) etc

Teriacuteamos entatildeo no Brasil por assim dizer a adoccedilatildeo do padratildeo da atipicidade das medidas executivas tambeacutem para as obrigaccedilotildees de pagar vistas estas como ordens do EstadoJuiz para que haja prestaccedilatildeo de pagamento em pecuacutenia

()

Por isso ndash a prevalecer a interpretaccedilatildeo potencializada do art 139 IV do CPC2015 ndash o emprego de tais medidas coercitivasindutivas especialmente nas obrigaccedilotildees de pagar encontraraacute limite certo na excepcionalidade da medida (esgotamento dos meios tradicionais de satisfaccedilatildeo do deacutebito) na proporcionalidade (inclusive agrave luz da regra da menor onerosidade ao devedor do art 805 do CPC2015) na necessidade de fundamentaccedilatildeo substancial e especialmente nos direitos e garantias assegurados na Constituiccedilatildeo Federal (vg natildeo parece possiacutevel que se determine o pagamento sob pena de prisatildeo ou de vedaccedilatildeo ao exerciacutecio da profissatildeo do direito de ir e vir etc)

74 NEVES Alexandre Fuchs das Cancelamento de cartotildees de creacutedito e apreensatildeo de CNH e passaporte

do devedor Isso eacute possiacutevel Disponiacutevel em lt httpwwwsinfacspcombrconteudocancelamento-de-cartoes-de-credito-e-apreensao-de-cnh-e-passaporte-do-devedor-isso-e-possivel gt Acesso em 30082018

75 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Publicado em 24082015 Acesso em 30082018

35

Jaacute Fernanda Tartuce76 acredita que tais medidas satildeo problemaacuteticas e devem ser

analisadas com cautela tendo em vista que ao inveacutes de afetarem o patrimocircnio do devedor

atingem a proacutepria pessoa

Sob certo prisma adotar medidas diferenciadas contribui para a efetividade da prestaccedilatildeo jurisdicional Por outro lado o patrimocircnio ndash e natildeo a pessoa do devedor - responde por diacutevidas aleacutem disso o exerciacutecio de amplos poderes pelo juiz sem balizas especiacuteficas pode ensejar medidas inadequadas Nessa linha suspender o direito de dirigir e restringir o uso de passaporte satildeo iniciativas problemaacuteticas por atingirem a pessoa do devedor enquanto a penhora da restituiccedilatildeo de Imposto de Renda soa viaacutevel por afetar seu patrimocircnio Eacute importante que a medida diferenciada se revele proporcional e seja aplicada apoacutes o exaurimento de outros meios previstos no ordenamento Como a proposta do Novo Coacutedigo eacute aumentar a eficiecircncia processual intentar medidas ineficazes inexequiacuteveis eou de difiacutecil fiscalizaccedilatildeo pode acabar ensejando o efeito contraacuterio

Nessa senda Lenio Streck e Dierle Nunes77 entendem que as medidas atiacutepicas de

suspensatildeo da CNH eou apreensatildeo de passaporte satildeo inconstitucionais Afirmam que natildeo se

pode confundir o processo civil e penal ainda que ambos remetam a um ldquoparadigma

constitucional comumrdquo e que o artigo 139 IV do CPC ldquoimpotildee novos desafios interpretativos

que podem conduzir a uma anaacutelise superficial e utilitarista de busca de resultados que

desprezem a necessaacuteria leitura constitucionalrdquo Os autores ainda ponderam que ldquoO perigo eacute o

artigo 139 IV ser transformado em instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com

autorizaccedilatildeo judicialrdquo

O professor Araken de Assis no dia 18 de abril de 2018 em um evento sobre o

Coacutedigo Processual Civil de 2015 que ocorreu em Brasiacutelia na sede do Conselho Federal da

OAB declarou ser contraacuterio aos poderes executoacuterios atiacutepicos ldquoSou contra os poderes

atiacutepicos dos juiacutezes porque seu exerciacutecio redunda em simples arbitrariedadesrdquo78

Acrescentou ainda que

76 IBDFAM ndash Instituto Brasileiro de Famiacutelia O polecircmico inciso IV do artigo 139 do CPC e suas difusas

interpretaccedilotildees Disponiacutevel em lt httpwwwibdfamorgbrnoticias6096O+polC3AAmico+inciso+IV+do+artigo+139+do+CPC+e+suas+difusas+interpretaC3A7C3B5es gt Publicado em 31082016 Acesso em 04092018

77 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018

78 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04092018

36

Eacute evidentemente inconstitucional diante do princiacutepio da dignidade da pessoa humana tirar o passaporte carteira de habilitaccedilatildeo Quecirc que tem isso com diacutevidas Natildeo tem absolutamente nada Natildeo eacute a correlaccedilatildeo instrumental entre o objetivo da execuccedilatildeo e o meio empregado Isso eacute simples vinganccedila simples puniccedilatildeo79

O professor Araken de Assis acredita que tais medidas satildeo inconstitucionais e

violam o principio da dignidade humana do executado numa sociedade como a nossa

sedenta por puniccedilatildeo natildeo me surpreende que essas ideias sejam encaradas com

naturalidade Mas eacute preciso rejeitaacute-las em nome de princiacutepios 80

34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO

A Constituiccedilatildeo Federal de 1988 tem como um dos seus fundamentos a dignidade da

pessoa humana presente no artigo 1ordm inciso III do referido texto constitucional O dito

princiacutepio tem o escopo de nortear o ordenamento juriacutedico como um todo

A inclusatildeo da dignidade da pessoa humana como princiacutepio constitucional obrigou

uma reflexatildeo sobre o papel da pessoa humana no direito e um redimensionamento para

elevaacute-la ao centro do ordenamento juriacutedico81 Eacute necessaacuterio recorrer agrave teoria Kantiana para

que se obtenha uma definiccedilatildeo do princiacutepio ora estudado Para Kant82 o homem eacute um fim

em si mesmo natildeo uma funccedilatildeo do Estado Ou Naccedilatildeo O Estado e o direito devem estar

organizados em benefiacutecio do indiviacuteduo

Agora eu afirmo o homem ndash e de uma maneira geral todo o ser racional ndash existe como fim em si mesmo e natildeo apenas como meio para o uso arbitraacuterio desta ou daquela vontade Em todas as suas accedilotildees pelo contraacuterio tanto nas direcionadas a ele mesmo como nas que o satildeo a outros seres racionais deve ser ele sempre considerado simultaneamente como fim

Partindo da premissa de que para Immanuel Kant o homem eacute o fim em si mesmo

ldquodevemos compreender que a dignidade da pessoa humana eacute a noccedilatildeo o comando a direccedilatildeo

que se deve seguir funcionando como fundamento para a interpretaccedilatildeo de todos os direitos e

garantias conferidos agrave pessoa nos ordenamentos juriacutedicos de cada Estadordquo 83

79 Ibid sem paginaccedilatildeo 80 Ibid sem paginaccedilatildeo 81 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito

fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 461 82 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud KANT Immanuel Fundamentaccedilatildeo da metafiacutesica dos costumes

Satildeo Paulo Martin Claret 2003 p56-59 Coleccedilatildeo A Obra-Prima de Cada Autor 83 SCHIAFIANO Juliana Rocha op cit p 461

37

O princiacutepio constitucional da dignidade da pessoa humana estaacute diretamente ligado ao

conteuacutedo dos direitos fundamentais logo para que se cumpra com os direitos fundamentais

constitucionalmente instituiacutedos eacute necessaacuterio reconhecer e respeitar a dignidade da pessoa

humana conforme disciplina Ingo Sarlet84

Em suma o que se pretende sustentar de modo mais enfaacutetico eacute que a dignidade da pessoa humana na condiccedilatildeo de valor (principio normativo) fundamental que atrai o conteuacutedo de todos os direitos fundamentais exige e pressupotildee o reconhecimento e proteccedilatildeo dos direitos fundamentais de todas as dimensotildees (ou geraccedilotildees se assim preferirmos) Assim sem que se reconheccedilam agrave pessoa humana os direitos fundamentais que lhe satildeo inerentes em verdade estarse-aacute lhe negando a proacutepria dignidade A consagraccedilatildeo constitucional da dignidade da pessoa humana tem o propoacutesito de limitar a atuaccedilatildeo ou a omissatildeo do Estado para garantir os direitos do indiviacuteduo Assim eacute difiacutecil precisar os efeitos da norma que determina a dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado (como acontece com a Constituiccedilatildeo brasileira de 1988) poreacutem quando desrespeitados os direitos fundamentais do cidadatildeo eacute possiacutevel identificar que a dignidade deste foi violada

Logo ldquoteraacute respeitada a sua dignidade o individuo que tiver respeitados os seus

direitos fundamentaisrdquo 85 Os direitos fundamentais estatildeo apresentados na Constituiccedilatildeo

Federal da seguinte forma direitos individuais e coletivos direitos sociais direitos poliacuteticos e

direitos de nacionalidade que tecircm como escopo garantir as liberdades positivas aos

indiviacuteduos ldquoonde foram conquistados direitos agrave liberdade religiosa liberdade civil e

profissional agrave propriedade ao livre acesso ao Judiciaacuterio agrave ampla defesa e ao contraditoacuterio no

processual judicial ao sigilo de dados e informaccedilotildees pessoais entre outros que somados

garantem o cidadatildeo uma vida dignardquo 86

O cidadatildeo na Constituiccedilatildeo Federal de 88 diferente das constituiccedilotildees brasileiras

anteriores passou a ser fundamento e ganhou destaque nos direitos fundamentais tendo

garantida a sua vida a sua dignidade a sua seguranccedila a sua honra a sua liberdade e a sua

propriedade

84 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud SARLET Ingo Wolfgang Dignidade da pessoa humana e

direitos fundamentais na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 2ed Porto Alegre Livraria do Advogado 2002 p87 85 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito

fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 462 86 Ibid p 462

38

Segundo Carmem Luacutecia Antunes Rocha87 para garantir o Estado Democraacutetico de

Direito eacute necessaacuterio que a sua atuaccedilatildeo seja sempre em conformidade com o princiacutepio da

dignidade da pessoa humana

O Estado somente eacute democraacutetico em sua concepccedilatildeo constitucionalizaccedilatildeo e atuaccedilatildeo quando respeita o princiacutepio da dignidade da pessoa humana Natildeo haacute verbo constitucional natildeo haacute verbo governamental que se faccedilam legiacutetimos quando natildeo se voltam ao atendimento daquele princiacutepio Natildeo haacute verdade constitucional natildeo haacute suporte institucional para as poliacuteticas puacuteblicas que natildeo sejam destinadas ao pleno cumprimento daquele valor maior transformado em princiacutepio constitucional

O princiacutepio da dignidade humana constitucionalmente garantido impotildee limites ao

Estado compelindo aos oacutergatildeos e atividades estatais respeitar o ser humano e garanti-lo

condiccedilotildees miacutenimas para uma vida digna Dessa forma eacute niacutetido que o dito princiacutepio eacute

pressuposto e indispensaacutevel para legitimar outras normas constitucionais e

principalmente infraconstitucionais

O Coacutedigo de Processo Civil eacute umas das principais normas infraconstitucionais que

sofre influecircncia dos preceitos valores e princiacutepios esculpidos na Constituiccedilatildeo Federal

Logo como o principio da dignidade humana eacute um dos mais importantes pressupostos

constitucionais ldquoentatildeo eacute tranquilo afirmar-se que o novel ordenamento processual tem

de se render nas resoluccedilotildees dos aspectos processuais e a fim de se atingir uma soluccedilatildeo

justa adequada e efetiva ao postulado da dignidade da pessoa humanardquo 88

Dessa forma o legislador deve formular as normas infraconstitucionais de acordo e a

partir do conteuacutedo constitucional para Marinoni Mitidiero e Arenhart89

() o Coacutedigo de Processo Civil constitui direito constitucional aplicado O Coacutedigo deve ser interpretado de acordo com a Constituiccedilatildeo e com os direitos fundamentais o que significa que as duacutevidas interpretativas devem ser resolvidas a favor da otimizaccedilatildeo do alcance da Constituiccedilatildeo e do processo civil como meio para tutela de direitos

87 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud ROCHA Carmen Luacutecia Antunes O princiacutepio da dignidade da

pessoa humana e a exclusatildeo social Revista Interesse Puacuteblico n4 p23-48 1999 p33 88 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o

novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 367

89 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 14

39

Com o escopo de conferir eficaacutecia aos mandamentos constitucionais o CPC15 traz a

previsatildeo e diversas claacuteusulas gerais em seus primeiros artigos em um dos quais se

prestigia o princiacutepio da dignidade da pessoa humana

O referido princiacutepio estaacute disciplinado no artigo 8ordm do CPC15 e atua como um guia

sobre as demais normas do coacutedigo processual Eacute o que entende Nelson Rosenvald90

O maior cuidado do inteacuterprete eacute no sentido de jamais banalizar a dignidade fazendo dela um elixir processual tal como muitas vezes se vecirc na esfera do direito civil Penso que natildeo haacute maiores dificuldades em transpor a noccedilatildeo constitucional do princiacutepio para em seguida adaptaacute-la agraves singularidades do processo

Logo de acordo com o artigo 8ordm do CPC o oacutergatildeo julgador ao aplicar o ordenamento

juriacutedico deve resguardar a dignidade da pessoa humana Para Fredie Didier91 ldquoresguardar

nesse contexto eacute de um lado aplicar corretamente a norma juriacutedica lsquoproteccedilatildeo da dignidade

da pessoa humanarsquo e de outro natildeo violar a dignidaderdquo

O oacutergatildeo julgador deveraacute manter um comportamento ativo com o objetivo de promover

a dignidade da pessoa humana podendo tomar medidas de ofiacutecio para efetivar a dignidade da

pessoa humana Didier assevera que o magistrado poderaacute ainda ldquovaler-se da claacuteusula geral de

atipicidade (art 536 sect 1ordm) para a execuccedilatildeo do direito fundamental agrave dignidaderdquo 92 O autor

ainda traz dois exemplos

a) exigecircncia de respeito agrave ordem cronoloacutegica de conclusatildeo (art 12) caso de grave violaccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana que natildeo se encaixe em um dos incisos que excepcionam a regra de observacircncia da cronologia da conclusatildeo poderia o juiz ldquofurar a filardquo para promover a dignidade da pessoa humana b) prioridade na tramitaccedilatildeo processual pessoa que seja portadora de doenccedila grave mas que natildeo esteja no rol do art 1048 I para promover a dignidade de pessoa humana o juiz poderia determinar o processamento prioritaacuterio93

Essa dupla garantia ndash resguardo e promoccedilatildeo ndash tem como objetivo garantir ao individuo

sua dignidade humana fazendo com que ldquode um lado que o Estado natildeo a viole e de outro

que o Estado a promova e efetiverdquo

90 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud ROSENVALD Nelson A

dignidade da pessoa humana no CPC15 91 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte

geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 75 92 Ibid p 75 93 Ibid p 75

40

Nessa senda o magistrado deveraacute promover a dignidade da pessoa humana quando

perceber a ausecircncia desta no processo ou assegura-la quando for posta em risco Eacute nesse

sentido o entendimento dos professores Marinoni Mitidiero e Arenhart94

() a dignidade da pessoa humana determina a compreensatildeo do processo civil como um meio para tutela dos direitos Vale dizer o processo civil natildeo pode ser visto como um instrumento a serviccedilo do Estado como um instrumento que natildeo se encontre orientado agrave realizaccedilatildeo dos fins da pessoa humana Em outras palavras o processo civil serve para realizaccedilatildeo dos direitos e para orientaccedilatildeo das pessoas a respeito do significado do direito

Nessa senda compete tanto ao juiz quanto as demais partes processuais garantirem ldquoo

valor intriacutenseco de cada vida que eacute trazida ao processordquo nas palavras de Alexandre Freitas

Cacircmara95

() aos sujeitos do processo eacute preciso sempre ter claro que os titulares dos interesses em conflitos satildeo pessoas reais cujas vidas seratildeo afetadas pelo resultado do processo e que por isso mesmo tecircm o direito de estabelecer suas estrateacutegias processuais de acordo com aquilo que lhes pareccedila melhor para suas vidas Eacute inadmissiacutevel tratar as partes como se natildeo fossem pessoas reais meros dados estatiacutesticos Afinal se para o Judiciaacuterio cada processo pode parecer apenas mais um processo para as partes cada processo pode ser o uacutenico o mais relevante aquele em que sua vida seraacute decidida E eacute dever do juiz assegurar que isto seja respeitado

Dessa forma eacute necessaacuterio que um arcabouccedilo normativo para que seja conferida

eficaacutecia e proteccedilatildeo ao principio da dignidade da pessoa humana

Logo o dito princiacutepio deve ser protegido em todas as esferas do ordenamento juriacutedico

inclusive no campo da execuccedilatildeo civil onde sofre grandes riscos de ser violado em nome do

direito fundamental agrave tutela executiva do credor ldquoPartir da premissa de que existe um direito

fundamental agrave tutela executiva ora ratificado pelo CPC eacute indispensaacutevel para a soluccedilatildeo de

diversos problemas oriundos do procedimento executivo principalmente aqueles relacionados

agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo 96

94 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme

MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 25

95 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CAcircMARA Alexandre Freitas O Novo Processo Civil Brasileiro 2 ed Satildeo Paulo Atlas 2016 p 7

96 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66

41

Eacute o caso por exemplo da impenhorabilidade Segundo Fredie Didier et al97 a

impenhorabilidade eacute uma forma de proteger certos bens do devedor do direito fundamental a

execuccedilatildeo do credor

Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa

Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais

O legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do CPC fazendo um

preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses em anaacutelise ao optar pela mitigaccedilatildeo do direito

do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado Afinal ldquoa execuccedilatildeo natildeo pode ser utilizada

como instrumento para causar a ruiacutena a fome e o desabrigo do devedor e sua famiacutelia gerando

situaccedilotildees incompatiacuteveis com a dignidade da pessoa humana 98

Logo a impenhorabilidade de certos bens

[] Eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa99

Eacute nesse sentido que o CPC15 enumera diversos casos de bens patrimoniais que satildeo

impenhoraacuteveis como o salaacuterio e vencimentos utensiacutelios necessaacuterios ao exerciacutecio da

profissatildeo seguro de vida vestuaacuterios e pertences de uso pessoal entre outros

Dessa forma as regras relativas agraves medidas executivas devem ser interpretadas agrave luz

da Constituiccedilatildeo Federal ldquovez que se voltam agrave realizaccedilatildeo de direitos fundamentais e em sua

97 Ibid p 66 98 THEODORO JUacuteNIOR Humberto Novo Coacutedigo de Processo Civil Anotado 20 ed Rio de Janeiro

Forense 2016 p 978 99 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud DIDIER JR Fredie CUNHA

Leonardo Carneiro da BRAGA Paula Sarno OLIVEIRA Rafael Alexandria de Curso de direito processual civil 3 ed Salvador JusPodivm 2011 v 5 p 547

42

realizaccedilatildeo podem atingir direitos fundamentaisrdquo 100 O Superior Tribunal de Justiccedila jaacute decidiu

que

O rol das impenhorabilidades do ordenamento paacutetrio objetiva preservar o miacutenimo patrimonial necessaacuterio agrave existecircncia digna do executado impondo ao processo executoacuterio certos limites Assim a depender das peculiaridades do caso as regras de impenhorabilidade podem ser ampliadas de modo a adequar a tutela aos direitos fundamentais como por exemplo o direito agrave moradia agrave sauacutede ou agrave dignidade da pessoa humana Trata-se portanto da aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo e da necessidade sob o enfoque da proporcionalidade101 (STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014)

Logo a interpretaccedilatildeo dos dispositivos que tratam sobre a penhora no CPC deve estaacute

diretamente ligada aos ditames constitucionais devendo o interprete privilegiar a opccedilatildeo que

esteja mais em sintonia com a Carta Magna para que nem o credor e nem o devedor sejam

lesados

O artigo 833 do CPC elenca uma seacuterie de incisos que expotildeem os bens impenhoraacuteveis

O trecho inicial inciso I do art 833 define como impenhoraacuteveis os bens inalienaacuteveis Este

inciso segue a regra de que ldquose o bem natildeo pode ser alienado tambeacutem natildeo pode ser penhorado

porque a penhora eacute o primeiro ato do procedimento de alienaccedilatildeo judicial do bemrdquo 102

Satildeo exemplos de bens inalienaacuteveis os puacuteblicos cuja alienaccedilatildeo depende de autorizaccedilatildeo

legislativa Eacute inalienaacutevel tambeacutem o capital constituiacutedo para garantir indenizaccedilatildeo de ato iliacutecito

(art 533 sect 1 ordm CPC) que portanto eacute tambeacutem impenhoraacutevel ldquoTodo bem inalienaacutevel eacute

impenhoraacutevel embora nem todo bem impenhoraacutevel seja inalienaacutevelrdquo 103

O inciso I do art 833 CPC tambeacutem consagra a impenhorabilidade dos bens que por

ato voluntaacuterio satildeo excluiacutedos da execuccedilatildeo

Segundo Fredie Didier et al104

Eacute o que ocorre nos casos de bens doados ou alienados com claacuteusula de inalienabilidade que haacute de constar no registro imobiliaacuterio para ser eficaz perante o exequente e minimizar o risco de fraude A propoacutesito eis a redaccedilatildeo do art 1911 do Coacutedigo Civil lsquolsquoA claacuteusula de inalienabilidade imposta aos bens por ato de liberalidade implica impenhorabilidade e incomunicabilidaderdquo

100 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MEDINA Joseacute Miguel Garcia

Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 1 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 p 736 101 STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014 102 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 824 103 Ibid p 824 104 Ibid p 825

43

O inciso II por sua vez estabelece que satildeo impenhoraacuteveis os bens moacuteveis os

pertences e as utilidades domeacutesticas da residecircncia do executado Todavia excepcionam-se os

bens dessa natureza que sejam de elevado valor ou que ultrapassem as necessidades comuns

correspondentes a um meacutedio padratildeo de vida

A jurisprudecircncia natildeo eacute paciacutefica sobre o assunto logo natildeo exista uma relaccedilatildeo de bens

que podem ser atingidos pela penhora Abrindo margem para as mais variadas decisotildees

O STJ jaacute considerou impenhoraacuteveis aparelho de televisatildeo a cores mesa de centro passadeira raacutedio toca-fitas gravador microondas ar-condicionado um freezer um microcomputador com acessoacuterios uma impressora etc Poderatildeo ser penhorados porque ultrapassam o padratildeo-meacutedio aparelhos de TV mais sofisticados o segundo aparelho de televisatildeo a segunda geladeira aparelhos de ar-condicionado que satildeo verdadeiras peccedilas de design moacuteveis antigos que se transformam em peccedilas de decoraccedilatildeo faqueiro de prata adega climatizada etc Em entendimento de caraacuteter ainda mais geneacuterico jaacute restou consignado em determinado precedente que a proteccedilatildeo natildeo abrangeria apenas os bens indispensaacuteveis agrave moradia mas tambeacutem aqueles usualmente encontrados em um lar105

Ademais o inciso III do art 833 do CPC traz a impenhorabilidade dos vestuaacuterios bem

como os pertences de uso pessoal do executado salvo se de elevado valor

Segundo Fredie Didier et al106 o dispositivo possui dois propoacutesitos

de um lado preservar a dignidade do executado com a proteccedilatildeo de bens moacuteveis importantes para a sua sobrevivecircncia digna como o vestuaacuterio aparelho celular reloacutegio e os bens relacionados agrave sua higiene pessoal de outro lado a regra visa prestigiar a boa-feacute processual impedindo a execuccedilatildeo mesquinha e abusiva com a penhora de bens de pequeno ou nenhum valor como um pente ou uma bota

O inciso IV do art 833 do CPC consagra uma das mais importantes modalidades a

impenhorabilidade relativa aos rendimentos de natureza alimentar ldquoTrata-se de regra que

possui o claro propoacutesito de proteger o executado garantindo-lhe o recebimento de valores que

servem ao pagamento das despesas relacionadas agrave sua sobrevivecircncia digna e agrave da sua famiacuteliardquo 107

Jaacute inciso V do art 833 do CPC torna impenhoraacuteveis os livros as maacutequinas as

ferramentas os utensiacutelios os instrumentos ou outros bens moacuteveis necessaacuterios ou uacuteteis ao

exerciacutecio de qualquer profissatildeo 105 Ibid p 826 106 Ibid p 827 107 Ibid p 828

44

Por forccedila do paraacutegrafo 3ordm do art 833 satildeo igualmente impenhoraacuteveis os equipamentos

implementos e maacutequinas agriacutecolas pertencentes agrave pessoa fiacutesica ou a empresa individual

produtora rural Rodrigo Mazzei e Sarah Merccedilon108 esclarecem que

Tem assento na noccedilatildeo de que a dignidade estende-se tambeacutem ao exerciacutecio da profissatildeo em si mesma e tambeacutem por representar a forma por excelecircncia de que dispotildee o executado para continuar a receber sua remuneraccedilatildeo e por conseguinte prover seu sustento e de sua famiacutelia Trata-se tambeacutem de aplicaccedilatildeo pontual da funccedilatildeo social da propriedade jaacute que protege os bens que permitem a circulaccedilatildeo de riquezas para a subsistecircncia do executado e se for o caso de sua famiacutelia

Forccediloso ressaltar ainda que a impenhorabilidade do inc V alcanccedila apenas os bens

moacuteveis de modo que eacute absolutamente possiacutevel que o imoacutevel em que o executado exerccedila sua

atividade profissional seja penhorado conforme a Suacutemula 451 do STJ ldquoEacute legiacutetima a penhora

da sede do estabelecimento comercialrdquo

O inciso VI do art 833 do CPC versa sobre a impenhorabilidade do seguro de vida

ldquoTrata-se de impenhorabilidade em favor do beneficiaacuterio do seguro e natildeo do segurado ateacute

porque o valor do seguro natildeo compotildee nem comporaacute o seu patrimocircnio (art794 do Coacutedigo

Civil1 ordm7)rdquo Dessa forma ldquoem uma execuccedilatildeo contra o segurado natildeo seraacute possiacutevel a penhora

do seguro de vida pois se trata de bem que natildeo lhe pertence nem mesmo em expectativardquo

De acordo com o inciso VII do art 833 do CPC satildeo impenhoraacuteveis os materiais

necessaacuterios para obras em andamento salvo se essas forem penhoradas Logo a obra pode

ser penhorada (art 862 do CPC) ldquoA regra como bem lembrou Araken de Assis lsquoestimula a

penhora da proacutepria obra inconclusa agrave qual os materiais acrescem e conseguintemente

valorizamrsquo 109

O art 833 VIII CPC julga impenhoraacutevel a pequena propriedade rural assim

definida em lei desde que trabalhada pela famiacutelia reproduzindo parte do art 5ordm XXVI CF

88116 que disciplina a impenhorabilidade do referido bem

A proteccedilatildeo do CPC eacute mais ampla do que a garantia prevista na Constituiccedilatildeo Federal

tendo em vista que a impenhorabilidade natildeo se restringe agraves execuccedilotildees de deacutebitos decorrentes

de sua atividade produtiva podendo ser alegada em toda e qualquer execuccedilatildeo ldquoAssim o 108 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CABRAL Antonio Passo

CRAMER Ronaldo (orgs) Comentaacuterios ao Novo Coacutedigo de Processo Civil Rio de Janeiro Forense 2015 p 1194

109 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 835

45

imoacutevel natildeo pode ser penhorado na execuccedilatildeo de creacutedito rural concedido para estimular a

produccedilatildeo agriacutecola mas poderaacute ser penhorado na execuccedilatildeo do creacutedito concedido para a

aquisiccedilatildeo do imoacutevelrdquo 110

A nona modalidade de impenhorabilidade trata-se dos recursos puacuteblicos recebidos por

instituiccedilotildees privadas para aplicaccedilatildeo compulsoacuteria em educaccedilatildeo sauacutede ou assistecircncia social ldquoA

proteccedilatildeo eacute louvaacutevel e tutela toda a coletividade ao privilegiar o direito agrave educaccedilatildeo sauacutede e

assistecircncia social em detrimento do direito do credorrdquo

De acordo com o inciso X do art 833 do CPC eacute impenhoraacutevel ateacute o limite de

quarenta salaacuterios miacutenimos a quantia depositada em caderneta de poupanccedila

Eacute uma modalidade de impenhorabilidade relativa (o CPC73 a considerava absoluta)

tendo em vista que essa impenhorabilidade natildeo pode ser oposta na execuccedilatildeo de alimentos

independentemente da sua origem (art 833 sect 2ordm do CPC) Fredie Didier et al cita Araken de

Assis111 ao afirmar que

a regra soacute protege essa aplicaccedilatildeo financeira Se o valor estiver depositado em fundo de investimento por exemplo poderaacute ser penhorado Se o devedor tiver vaacuterias cadernetas de poupanccedila a impenhorabilidade aplica-se agrave soma de todas elas e natildeo a cada uma delas isoladamente do contraacuterio valores expressivos poderiam ser pulverizados em vaacuterias contas burlando a finalidade da regra que eacute a de proteger a populaccedilatildeo de baixa renda

Ademais satildeo tambeacutem impenhoraacuteveis por forccedila do inciso XI os recursos puacuteblicos do

fundo partidaacuterio recebidos por partido poliacutetico nos termos da lei Essa modalidade de

impenhorabilidade ldquose restringe aos recursos puacuteblicos do fundo partidaacuterio Recursos de

origem privada recebidos pelo partido poliacutetico poderatildeo ser penhoradosrdquo 112 O processualista

Fredie Didier et al113 assevera que

Assim a impenhorabilidade foi estabelecida no intuito de impedir que os diretoacuterios nacionais de partidos poliacuteticos respondam por diacutevida dos diretoacuterios

110 Ibid p 836 111 DIDIER JR Fredie et al apud ASSIS Araken de Manual da execuccedilatildeo 11ordm ed cit p 225 Assim

tambeacutem REDONDO Bruno Garcia LOJO Maacuterio Vitor Suarez Penhora cit p 117 BUENO Cassio Scarpinella Curso sistematizado de Direito Processual Civil v 3 cit p 228 GIANNICO Mauriacutecio As novas reformas do CPC e de outras normas processuais Mauriacutecio Giannico e Viacutetor Joseacute de Mello Monteiro (coord) Satildeo Paulo Saraiva 2009 p 1 OS Em sentido diverso estendendo a impenhorabiacutelidade aos depoacutesitos feitos ateacute esse valor em CDB CDI fundos de renda fixa ou de accedilotildees RODRIGUES Marcelo Abelha Manual de execuccedilatildeo civil 3deg ed cit p 101

112 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 839

113 Ibid p 839

46

estaduaismunicipais - sobretudo em razatildeo das vaacuterias decisotildees judiciais que determinaram penhora de recursos do fundo partidaacuterio de alguns partidos

Por fim o inciso XII do artigo 833 do CPC trata sobre a impenhorabilidade dos

creacuteditos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias sob o regime de incorporaccedilatildeo imobiliaacuteria

vinculados agrave execuccedilatildeo de obra ldquoO objetivo dessa modalidade eacute evitar que diacutevidas do

incorporador possam consumir os recursos que seriam utilizados na realizaccedilatildeo da obra em

prejuiacutezo dos adquirentes de unidades autocircnomasrdquo 114

O professor Misael Montenegro Filho115 aduz sobre que ldquoao estabelecer a

impenhorabilidade dos creacuteditos oriundos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias o novo CPC

protegeu os valores destinados agrave execuccedilatildeo da obra e agrave entrega das unidades imobiliaacuterias aos

adquirentes assegurando assim a execuccedilatildeo da promessa contratualrdquo

Importante frisar ainda que a Lei nordm 8009 1990 instituiu a impenhorabilidade do

imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar por qualquer diacutevida salvo as exceccedilotildees dos

seus arts 3ordm e 4ordm

A referida lei dispotildee que Para os efeitos de impenhorabilidade considera-se

residecircncia um uacutenico imoacutevel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia

permanente (art 5ordm)

O processualista baiano Fredie Didier et al116 assevera que

A lei propotildee-se a proteger imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar nos termos acima expostos A CF 88 ampliou o conceito de entidade familiar para abranger a famiacutelia monoparental e a uniatildeo estaacutevel Mas deve considerar-se aiacute compreendidos os irmatildeos que vivem juntos e a uniatildeo homossexual Ateacute o solteiro estaacute abrangido pela impenhorabilidade se reside soacute no imoacutevel - isso em nome da proteccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana e da moradia digna Na verdade houve uma mudanccedila de compreensatildeo acerca do sentido da proteccedilatildeo de proteccedilatildeo da famiacutelia agrave proteccedilatildeo da moradia indispensaacutevel agrave preservaccedilatildeo da dignidade da pessoa

114 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o

novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 388

115 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MONTENEGRO FILHO Misael Novo Coacutedigo de Processo Civil Comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Atlas 2016 p 752

116 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 840-841

47

O STJ jaacute consolidou esse entendimento na suacutemula nordm 364 O conceito de

impenhorabilidade de bem de famiacutelia abrange tambeacutem o imoacutevel pertencente a pessoas

solteiras separadas e viuacutevas

Entretanto se o casal ou entidade familiar possuir vaacuterios imoacuteveis utilizados como

residecircncia a impenhorabilidade recairaacute sobre o de menor valor (art 5ordm paraacutegrafo uacutenico) ldquoEacute o

que ocorre por exemplo quando a famiacutelia se divide em mais de uma cidade por motivos

profissionaisrdquo 117

Forccediloso observar ainda que a impenhorabilidade do imoacutevel familiar eacute relativa jaacute que

natildeo pode ser oposta a qualquer creacutedito O art 3ordm da Lei n 8009 1990151 em que pode ser

penhorada a residecircncia da famiacutelia (exemplo execuccedilatildeo de alimentos para cobranccedila de taxas

devidas em funccedilatildeo do imoacutevel familiar etc)

Resta claro que o artigo 833 do CPC ao disciplinar as hipoacuteteses de impenhorabilidade

possui o escopo de proteger o princiacutepio da dignidade humana Entretanto algumas claacuteusulas

natildeo possuem proteccedilatildeo absoluta ldquoa sua relativizaccedilatildeo a depender do caso sob exame deve ser

realccedilada agrave medida que a dignidade resguardada e protegida pelo sistema processual-

constitucional natildeo se limita ao executadordquo 118 Ademais ldquoEacute premente advertidamente que a

dignidade do credor tambeacutem seja garantida em juiacutezo tendo como norte pois os princiacutepios da

proporcionalidade e razoabilidaderdquo 119

117 Ibid p 841 118 Ibid p 752 119 Ibid p 752

48

4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA

ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE

HUMANA DO EXECUTADO

41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE

EFETIVACcedilAtildeO

Como jaacute exposto em linhas preteacuteritas nos meios executivos tiacutepicos as medidas

executivas satildeo determinadas pela lei ou seja o oacutergatildeo pode aplicar somente as medidas

tipificadas no ordenamento juriacutedico No entanto ao se tratar das medidas executivas atiacutepicas

eacute necessaacuterio que haja um limite na atuaccedilatildeo realizada pelo juiz

O poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo poder ser realizado de maneira indiscriminada haacute

pressupostos e premissas a serem observadas Dessa forma a primeira premissa eacute no sentindo

de que a medida executiva atiacutepica natildeo pode ser a primeira medida a ser invocada ldquomuito ao

reveacutes a regra do nosso sistema continua a ser o da tipicidade dos meios executivos soacute que

agora temperado pelo sistema atiacutepicordquo 120 O processualista Thiago Rodovalho explica que

ldquo() os meios atiacutepicos natildeo satildeo prima ratio e sim a ultima ratio eacute dizer esgotados e

frustrados os meios executivos tiacutepicos e ordinaacuterios pode-se em tese valer-se do sistema

atiacutepicordquo121

Dessa forma nos casos de execuccedilatildeo que tenha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

natildeo deve ser aplicado de logo as medidas indutivas e coercitivas Apenas apoacutes frustradas as

medidas ldquonaturaisrdquo pode-se passar agrave aplicaccedilatildeo das medidas atiacutepicas

Uma segunda premissa diz a respeitos dos meios de pressatildeo para compelir o devedor a

adimplir com o seu deacutebito ldquoEssa segunda premissa decorre inclusive de imperiosidade

loacutegica de nada adianta a medida de pressatildeo se a obrigaccedilatildeo natildeo tem como ser adimplida pelo

devedorrdquo 122

Para Thiago Rodovalho123 ldquoIsso quer significar que esgotados e frustrados os meios

tiacutepicos o juiz se valeraacute dos meios atiacutepicos se eles forem potencialmente haacutebeis a estimular ou

120 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da

atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018

121 Ibid sem paginaccedilatildeo 122 Ibid sem paginaccedilatildeo 123 Ibid sem paginaccedilatildeo

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forccedilar o cumprimento o que pressupotildee sua possibilidade quando entatildeo eles poderatildeo ser

eficazesrdquo

Logo nas obrigaccedilotildees de pagar quantia se houver a real demonstraccedilatildeo da

impossibilidade financeira do devedor seria um constrangimento inuacutetil e desnecessaacuterio a

imposiccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo para forccedilar o cumprimento

Por isso as medidas atiacutepicas devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o

esgotamento das medidas tiacutepicas e a possibilidade de cumprimento de cumprimento da

obrigaccedilatildeo

Ademais superadas as supracitadas premissas e o oacutergatildeo julgador vislumbrando a

necessidade da aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo se faz necessaacuterio que um conjunto de

postulados e princiacutepios rejam a atuaccedilatildeo do oacutergatildeo julgador servindo de norte para a escolha da

medida executiva mais adequada ldquoDe modo geral a escolha deve pautar-se nos postulados da

proporcionalidade da razoabilidade (art8ordm CPC) e da proibiccedilatildeo de excesso bem como nos

princiacutepios da eficiecircncia e da menor onerosidade da execuccedilatildeordquo 124

O professor Fredie Didier et al125 eacute categoacuterico ao citar Humberto Aacutevila

Segundo Humberto Aacutevila o postulado da proporcionalidade se manifesta nas situaccedilotildees em que haacute uma relaccedilatildeo de causalidade entre dois elementos empiricamente discerniacuteveis um meio e um fim de tal sorte que se possa proceder aos trecircs exames fundamentais o da adequaccedilatildeo (o meio promove o fim) o da necessidade (dentre os meios disponiacuteveis e igualmente adequados para promover o fim natildeo haacute outro meio menos restritivo do(s) direito(s) fundamental (is) afetado(s)) e o da proporcionalidade em sentido estrito (as vantagens trazidas pela promoccedilatildeo do fim correspondem agraves desvantagens provocadas pela adoccedilatildeo do meio)

O juiz ao aplicar a medida executiva atiacutepica ao caso concreto deve ter seu

embasamento no princiacutepio da proporcionalidade para saber se a medida a ser tomada eacute a

melhor opccedilatildeo ao caso sub judice ldquoO exame de proporcionalidade aplica-se sempre que

houver uma medida concreta destinada a realizar uma finalidaderdquo 126

Em verdade a aplicaccedilatildeo do princiacutepio da proporcionalidade eacute imprescindiacutevel na adoccedilatildeo

dos meios executivos atiacutepicos tendo em vista que ldquo() tais medidas em especial quando de

124 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111 125 DIDIER JR Fredie et al apud AVILA Humberto Teoria dos princiacutepios da definiccedilatildeo agrave aplicaccedilatildeo

dos princiacutepios juriacutedicos 16 ed Satildeo Paulo Malheiros 2015 p 205 126 DIDIER JR Fredie et al op cit p 111

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natureza coercitiva podem restringir direitos do devedor e incidir diretamente sobre sua

pessoardquo127 Logo ainda que o princiacutepio da efetividade da tutela executiva seja um direito

fundamental o mesmo ldquo() deve ser compatibilizado com direitos fundamentais do

executado para que a sua dignidade humana seja preservadardquo 128

Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Neves129 afirma que em nome do princiacutepio da

proporcionalidade o juiz deveraacute

() ponderar no caso concreto as vantagens praacuteticas da adoccedilatildeo de cada medida executiva atiacutepica em especial as de natureza coercitiva e as desvantagens de sua adoccedilatildeo levando em conta a possibilidade de a medida criar uma limitaccedilatildeo excessiva ao exerciacutecio de direito fundamental do executado

Outro princiacutepio que o oacutergatildeo julgador deve se ater ao escolher a medida executiva

atiacutepica eacute o da razoabilidade Segundo Fredie Didier et al 130 o princiacutepio (ou postulado)131 se

manifesta de trecircs formas

a) como dever de equidade a exigir a harmonizaccedilatildeo da norma geral com o caso individual impondo a consideraccedilatildeo daquilo que normalmente acontece em detrimento do que eacute extraordinaacuterio e tambeacutem impondo a consideraccedilatildeo das especificidades do caso concreto ante a generalidade da norma b) como dever de congruecircncia a exigir a harmonizaccedilatildeo das normas com suas condiccedilotildees externas de aplicaccedilatildeo (isto eacute com a realidade com base em que foram editadas) c) como dever de equivalecircncia a exigir uma relaccedilatildeo de equivalecircncia entre a medida adotada e o criteacuterio que a dimensiona

Logo ldquo() o princiacutepio da razoabilidade deve nortear a atuaccedilatildeo do juiz na adoccedilatildeo das

medidas executivas atiacutepicas previstas no art 139 IV do Novo CPCrdquo 132 tendo em vista que

ldquo() mesmo medidas que pelo princiacutepio da proporcionalidade podem se mostrar

abstratamente possiacuteveis de adoccedilatildeo no caso concreto podem se mostrar inadequadas e

irrazoaacuteveisrdquo 133

127 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Medidas executivas atiacutepicas na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de

pagar quantia certa art 139 IV do novo CPC Revista de Processo v 42 n 265 mar 2017 p 14 128 Ibid p 14 129 Ibid p 14 130 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111-112 131 Segundo Fredie Didier et al o postulado eacute uma norma que atua sobre a aplicaccedilatildeo de outras normas

A proporcionalidade e a razoabilidade seriam postulados normativos e natildeo princiacutepios segundo essa concepccedilatildeo 132 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo op cit p 14 133 Ibid p 14

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Ademais conforme dispotildee o postulado da proibiccedilatildeo de excesso ldquoa realizaccedilatildeo de uma

regra ou princiacutepio constitucional natildeo pode conduzir agrave restriccedilatildeo a um direito fundamental que

lhe retire um miacutenimo de eficaacuteciardquo 134

A proibiccedilatildeo de excesso deveraacute sempre ser suscitada quando um direito fundamental

houver sido violado a ponto do direito fundamental sofrer violaccedilatildeo excessiva Ademais ldquoesse

postulado natildeo se confunde com o da proporcionalidade porque ele dispensa os exames da

adequaccedilatildeo (relaccedilatildeo meiofim) da necessidade (exigibilidade) ou da proporcionalidade em

sentido estrito (ponderaccedilatildeo entre vantagens e desvantagens)rdquo 135

Logo ldquopouco importa a relaccedilatildeo meiofim ou a exigibilidade da medida ou ainda a

ponderaccedilatildeo com outro direito fundamental eventualmente em jogo aqui se analisa apenas a

eficaacutecia de um determinado direito fundamentalrdquo 136

O princiacutepio da eficiecircncia tem previsatildeo constitucional no art 37 e previsatildeo

infraconstitucional no art 8ordm do CPC15 O referido princiacutepio determina que o processo seja

conduzido de forma eficiente pelo oacutergatildeo jurisdicional

Entende-se que eficiente eacute a atuaccedilatildeo que utilize adequadamente os meios necessaacuterios

para que se atinjam os fins almejados O oacutergatildeo jurisdicional na escolha dos meios a serem

utilizados para a obtenccedilatildeo dos fins

a) deve escolher aqueles que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo (deve evitar meios que promovam resultados insignificantes) b) deve escolher meios que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado (natildeo se pode escolher um meio de resultado duvidoso) c) natildeo pode escolher um meio que produza muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscado 137

O juiz deveraacute igualmente analisar o princiacutepio da menor onerosidade da execuccedilatildeo que

eacute previsto pelo art 805 do CPC ldquoArt 805 Quando por vaacuterios meios o exequente puder

promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o

executadordquo

134 134 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 112 135 Ibid p 112 136 Ibid p 112 137 Ibid p 112-113

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Logo ldquohavendo duas opccedilotildees igualmente eficazes para permitir alcanccedilar o resultado

pretendido (satisfaccedilatildeo do creacutedito) deveraacute o oacutergatildeo julgador valer-se daquela que menos onere

a situaccedilatildeo do executadordquo 138

O dito princiacutepio impede o comportamento abusivo do exequente que possa beneficiar-

se do meio mais danoso ao executado protegendo dessa forma a lealdade e a eacutetica

processual

Os postulados e princiacutepios analisados em linhas preteacuteritas impotildeem ao oacutergatildeo julgador a

observacircncia de alguns criteacuterios para a escolha da medida executiva atiacutepicas a ser utilizada no

caso concreto

Primeiramente a medida executiva atiacutepica deveraacute ser adequada ldquoO criteacuterio da

adequaccedilatildeo impotildee que juiz considere abstratamente uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida

executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia

a gerar o resultadordquo 139 Nesse primeiro momento o juiz deveraacute observar sob a perspectiva do

credor qual medida teraacute o condatildeo de gerar o resultado mais efetivo

Segundo Fredie Didier et al140 o criteacuterio da adequaccedilatildeo eacute

() fortemente inspirado pelo postulado da proporcionalidade e pelo princiacutepio da eficiecircncia na parte em que esse princiacutepio determina a escolha de meios que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo e que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado

Ademais a medida adotada pelo oacutergatildeo julgador deveraacute ser necessaacuteria ldquoEsse criteacuterio

impotildee um limite agrave atuaccedilatildeo judicial funcionando como uma espeacutecie de contrapeso ao criteacuterio

da adequaccedilatildeo Aqui deve-se levar em conta a posiccedilatildeo do devedorrdquo141

O juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental agrave execuccedilatildeo e determinar

uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute necessaacuterio que a

medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado O criteacuterio da necessidade

estabelece que ldquonatildeo se pode ir aleacutem do necessaacuterio para alcanccedilar o propoacutesito almejado Deve

138 Ibid p 113 139 Ibid p 113 140 Ibid p 113 141 Ibid p 114

53

pois o oacutergatildeo julgador determinar o meio executivo na medida do estritamente necessaacuterio para

proporcionar a satisfaccedilatildeo do creacutedito ndash nem menos nem maisrdquo 142

O referido criteacuterio possui forte influecircncia dos postulados da proibiccedilatildeo do excesso e da

razoabilidade assim como do princiacutepio da menor onerosidade para o executado Assevera

Fredie Didier et al143 que

Natildeo eacute razoaacutevel por exemplo impor como primeira opccedilatildeo medida coercitiva a ser suportada pelo agente puacuteblico pelo simples fato de o juiz pressupor que o ente puacuteblico ao qual ele eacute vinculado iraacute descumprir determinada ordem judicial - o descumprimento natildeo pode ser visto como algo ordinaacuterio ou cotidiano (razoabilidade como dever de equidade) Tampouco eacute razoaacutevel eleger a prisatildeo civil como meacutetodo prioritaacuterio para compelir o executado ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer (razoabilidade como dever de equivalecircncia) Aleacutem disso eacute vedada por exemplo a imposiccedilatildeo de multa coercitiva para compelir o executado a emitir declaraccedilatildeo de vontade uma vez que haacute previsatildeo expressa de medida tiacutepica capaz de proporcionar o mesmo resultado sem sacrifiacutecio para o devedor (art 501 CPC)

A afirmaccedilatildeo feita por Bonavides144 em 1997 sobre a adequaccedilatildeo e a necessidade

continua atual sobre os motes

O meio empregado pelo legislador deve ser adequado e necessaacuterio para alcanccedilar o objetivo procurado O meio eacute adequado quando com seu auxiacutelio se pode alcanccedilar o resultado desejado eacute necessaacuterio quando o legislador natildeo poderia ter escolhido outro meio igualmente eficaz mas que natildeo limitasse ou limitasse de maneira menos sensiacutevel o direito fundamental

Por fim a medida deve conciliar os interesses contrapostos ldquoO magistrado deve

ponderar os interesses em jogo aplicando a proporcionalidade em sentido estrito de modo

que as vantagens da utilizaccedilatildeo da medida atiacutepica escolhida superem as vantagens de seu usordquo 145

Esse criteacuterio natildeo privilegia nem o credor nem o devedor e sim a soluccedilatildeo mais

equilibrada e que atenda da melhor forma aos valores em conflito ldquoTrata-se de criteacuterio

inspirado nos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade bem como no princiacutepio da

142 Ibid p 114 143 Ibid p 114 144 BONAVIDES Paulo Curso de Direito Constitucional 7ordm ediccedilatildeo Satildeo Paulo Ed Malheiros 1997

p 372 145 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 114-115

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eficiecircncia na parte em que impotildee ao juiz evitar a escolha do meio executivo que produza

muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscadordquo 146

Cada um dos criteacuterios supracitados devem ser considerados pelo juiz ao aplicar as

medidas executivas atiacutepicas ao caso concreto Para Fredie Didier et al147 as medidas como

retenccedilatildeo de CNH passaporte ou cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado como

forma de pressionaacute-lo ao pagamento da diacutevida pecuniaacuteria natildeo satildeo possiacuteveis

Essas natildeo satildeo medidas adequadas ao atingimento do fim almejado (o pagamento de quantia) - natildeo haacute propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente Tais medidas soam mais como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-lo ao cumprimento da ordem judicial - e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a utilizaccedilatildeo de meios sancionatoacuterios pelo magistrado mas apenas de meios de coerccedilatildeo indireta e sub-rogatoacuterios

Ainda que adequadas fossem a retenccedilatildeo de CNH e do passaporte no corte de fornecimento de aacutegua natildeo parecem ser medidas necessaacuterias (no sentido de exigiacuteveis) uma vez que outras medidas podem em tese ser utilizadas sem causar igual gravame ao executado - como por exemplo a simples restriccedilatildeo do uso de cartotildees de creacutedito A retenccedilatildeo de documentos pessoais eacute medida que termina por restringir a liberdade de ir e vir do executado mostrando-se a princiacutepio natildeo-razoaacutevel por ir de encontro ao dever de equivalecircncia e desproporcional por restringir demais o direito agrave liberdade em favor do direito de creacutedito pecuniaacuterio do exequente

O processualista baiano et al148 cita tambeacutem outro exemplo de medida atiacutepica que natildeo

atingem os criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade

Tampouco parece adequada em princiacutepio determinaccedilatildeo de corte de energia eleacutetrica de todo o preacutedio onde funciona serviccedilo puacuteblico administrativo como forma de pressionar o ente federado a cumprir ordem de nomeaccedilatildeo de candidato em concurso puacuteblico Natildeo parece haver relaccedilatildeo meiofim entre uma coisa e outra Tambeacutem natildeo eacute possiacutevel enxergar essa medida como necessaacuteria no sentido de ser a menos gravosa para o devedor - observe que se trata de medida que uma vez aplicada ensejaria restriccedilatildeo de funcionamento em toda a reparticcedilatildeo puacuteblica em prejuiacutezo de serviccedilos puacuteblicos essenciais ao funcionamento da Administraccedilatildeo o que aleacutem de ser excessivamente gravoso parece natildeo se conformar agrave necessidade de ponderaccedilatildeo dos interesses em jogo - aleacutem de afetar a um sem-nuacutemero de pessoas tomadoras desses serviccedilos

Ademais eacute sabido que toda e qualquer decisatildeo judicial precisa ser fundamentada Ao

se tratar das medidas executivas atiacutepicas o papel da fundamentaccedilatildeo se torna ainda mais

146 Ibid p 115 147 Ibid p 115 148 Ibid p 116

55

importante tendo em vista que eacute pela fundamentaccedilatildeo da decisatildeo que se poderaacute controlar a

adequaccedilatildeo e necessidade da medida atiacutepica

Pelo fato das medidas executivas atiacutepicas derivarem de dispositivos normativos

considerados claacuteusulas gerais propiacutecias as mais variadas interpretaccedilotildees eacute de extrema

importacircncia que o oacutergatildeo julgador fundamente sua decisatildeo

Logo ldquodeve o juiz na fundamentaccedilatildeo decisoacuteria expor racionalmente os motivos da

sua escolha demonstrando com atenccedilatildeo ao art 489 sect 1ordm CPC de que modo a sua opccedilatildeo

atende os criteacuterios da adequaccedilatildeo necessidade e proporcionalidade em sentido estrito ()rdquo 149

Dessa forma os princiacutepios da proporcionalidade e razoabilidade servem para delimitar

o alcance das claacuteusulas gerais de efetivaccedilatildeo fazendo com que o oacutergatildeo julgador se atenha aos

criteacuterios da adequaccedilatildeo e necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao caso

concreto

42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO

EXECUTADO

A entrada em vigor do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 aflorou ainda mais uma

discussatildeo essencial para os processualistas do seacuteculo XXI qual eacute o verdadeiro protagonista do

processo civil

Para os que defendem o ldquoautoritarismo processualrdquo o verdadeiro protagonista do

processo civil eacute o oacutergatildeo judiciaacuterio que em nome do desempenho efetivo de suas funccedilotildees lhes

eacute permitido dilatar os poderes que diga-se de jaacute passagem jaacute compotildeem um vastiacutessimo

arsenal150

Jaacute os ldquogarantistasrdquo 151 do processo civil acreditam que os verdadeiros protagonistas satildeo

as partes do processo e seus direitos e garantias devem ser estritamente preservados

Devido a essa disputa de quem possui maior protagonismo no processo as mudanccedilas

ocorridas no coacutedigo processual vigente quanto agraves medidas executivas atiacutepicas despertaram

149 Ibid p 117 150 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos

atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04102018

151 O processualista Araken de Assis acredita que o termo garantista eacute descabido tendo em vista que remete ao processo penal

56

maior celeuma do que qualquer outra modificaccedilatildeo trazida pelo CPC15 Afinal as referidas

medidas acirravam ainda mais a disputa pelo protagonismo processual

O fato de o CPC15 dispor no art 139 IV que o juiz poderaacute decretar todas as medidas

indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o

cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo

pecuniaacuteria levou boa parte da doutrina e dos juiacutezes a acreditar que teria pleno direito de

aplicar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo Entretanto muitos se esqueceram do outro lado

da moeda esqueceram que a dignidade humana do executado tambeacutem eacute um direito

fundamental e natildeo pode ser violado

Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa152

acreditam que

() natildeo parece producente elencar um rol abstrato das medidas que poderiam ser aplicadas pelo juiz a tiacutetulo do art 139 IV CPC Afinal se busca a efetividade da execuccedilatildeo e esta soacute pode ser identificada agrave luz das especificidades da situaccedilatildeo concreta Ideal eacute enveredar pela loacutegica modular (adequaccedilatildeo ao caso) natildeo pela geneacuterica (soluccedilotildees abstratas de pretensa utilidade universal)

Em razatildeo de o dispositivo apresentar uma gama de poderes tatildeo amplos agrave disposiccedilatildeo do

oacutergatildeo julgador sem nenhuma estipulaccedilatildeo de um procedimento legal previamente definido para

que estabeleccedila as condiccedilotildees de sua aplicaccedilatildeo em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo eacute

necessaacuterio que em razatildeo do princiacutepio da dignidade humana natildeo busque definir o que o

dispositivo permite mas de definir o que ele natildeo permite ldquoOu seja propotildee-se a sua

compreensatildeo por exclusatildeo Afinal se ele tem potencialidade para promover a efetividade da

tutela tambeacutem pode provocar lesotildees E como em direito os fins natildeo justificam os meios

ressalta como prioritaacuteria a necessidade de estabelecer limitesrdquo 153

O art 789 do CPC15 disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial e eacute

categoacuterico ao dispor que ldquoo devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para

152 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

153 Ibid sem paginaccedilatildeo

57

o cumprimento de suas obrigaccedilotildees salvo as restriccedilotildees estabelecidas em leirdquo Logo a

execuccedilatildeo somente poderaacute incidir sobre os bens do devedor e natildeo sobre a sua pessoa

Como eacute sabido a Lex Poetelia Papiria de 326 aC foi o primeiro marco legal da

humanizaccedilatildeo das cobranccedilas de diacutevidas abolindo a imposiccedilatildeo ao devedor de castigos

vexatoacuterios e ateacute da pena de morte154

Afinal no direito romano antigo a cobranccedila de diacutevidas poderia recair sobre a pessoa

do devedor que respondia com sua liberdade e ateacute mesmo com seu proacuteprio corpo permitindo

a lei que repartissem tantos pedaccedilos do corpo do devedor quantos fossem seus credores

Nesse sentindo leciona o professor Guilherme Pupe da Noacutebrega155 que

Vem de longe a evoluccedilatildeo no sentido de fazer a responsabilidade por uma obrigaccedilatildeo migrar da pessoa do devedor para seu patrimocircnio Merecem registro especiacutefico como marcos histoacutericos remotos a Lex Poetelia Papiria de 326 aC que aboliu o nexum e possibilidade de escravidatildeo do devedor como garantia da obrigaccedilatildeo e a pignoris capio ou ldquoaccedilatildeo por tomada de penhorrdquo que instituiu a possibilidade de o credor tomar parcela dos bens do devedor como forma de assegurar o adimplemento da diacutevida Aqueles institutos culminariam seacuteculo depois no artigo 789 do CPC de 2015 a consagrar que o devedor responda pela satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo com seus bens presentes e futuros observadas as restriccedilotildees impostas pelas impenhorabilidades legais

Logo o avanccedilar da civilizaccedilatildeo marcou o deslocamento da responsabilidade por

diacutevidas saindo do corpo do devedor para o seu patrimocircnio tendo em vista que a vida

humana a liberdade e a integridade fiacutesica satildeo valores inalienaacuteveis natildeo podendo ser

sacrificadas em benefiacutecio de obrigaccedilotildees pecuniaacuterias 156

Entretanto eacute sabido que a responsabilidade patrimonial eacute excepcionada pela prisatildeo

civil do devedor de verba alimentiacutecia resquiacutecio da responsabilidade pessoal romana

154 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt

httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018

155 NOacuteBREGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139 IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018

156 Ibid sem paginaccedilatildeo

58

No entanto haacute uma justificativa para isso Segundo o processualista Guilherme Pupe

da Noacutebrega157

Eacute que a par de a prisatildeo civil encontrar previsatildeo constitucional no inciso LXVII do artigo 5ordm o raciociacutenio eacute o de que o direito do alimentante agrave liberdade de locomoccedilatildeo cede diante dos direitos agrave vida e agrave dignidade titularizados pelo alimentando e resguardados pelos alimentos Foi esse mesmo raciociacutenio aliaacutes que justificou no passado a ediccedilatildeo da suacutemula 309 pelo STJ agora positivada pelo artigo 528 sect 7ordm que limita a modalidade coercitiva agraves trecircs uacuteltimas prestaccedilotildees vencidas e agraves prestaccedilotildees vincendas A ideia eacute que tendo o alimentando subsistido a despeito do natildeo-pagamento de prestaccedilotildees mais antigas essas verbas teriam perdido o caraacuteter alimentar que na equaccedilatildeo antes apresentada justificaria a prisatildeo civil do alimentante Daiacute por que aqueles valores antigos remanescem exigiacuteveis mas somente pela via da expropriaccedilatildeo

Essa ressalva eacute necessaacuteria tendo em vista que a adoccedilatildeo de teacutecnica de execuccedilatildeo

indireta para incursatildeo radical na esfera de direitos do executado notadamente direitos

fundamentais quando carente de respaldo constitucional natildeo merece acolhimento sob

risco de se atentar contra o devido processo legal (artigo 5ordm LIV da Constituiccedilatildeo)

Como afirma o autor Bruno Dantas158 ldquoembora inexistam estatiacutesticas que permitam

comparaccedilotildees natildeo eacute desarrazoado intuir que os iacutendices de inadimplecircncia despeccedilam na razatildeo

inversa da incidecircncia das ordens judiciais sobre o corpo e a liberdade do devedorrdquo Entretanto

eacute natildeo possiacutevel adotar toda e qualquer medida executiva atiacutepica em nome da efetividade da

execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que se saiba os limites da sua aplicaccedilatildeo

Dessa forma instrumentos que permitam o cumprimento forccedilado de contratos e o pagamento

de diacutevidas satildeo necessaacuterios contudo eacute preciso equilibrar essa exigecircncia com a liberdade e a

dignidade humana

Como citado alhures o art 139 IV ensejou decisotildees como a que determinou a

suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o

passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito em uma accedilatildeo se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo

extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

Na supracitada decisatildeo o princiacutepio da responsabilidade patrimonial natildeo estaacute sendo

efetivado para o que o devedor responda com os seus bens Afinal qual ligaccedilatildeo entre a

157 Ibid sem paginaccedilatildeo 158 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt

httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018

59

restriccedilatildeo de circulaccedilatildeo que diz com o direito de ir e vir (liberdade) com o pagamento de

diacutevidas que diz com a responsabilidade civil159

Ademais por que quem natildeo tem dinheiro para pagar diacutevidas natildeo pode dirigir Por que

natildeo tem condiccedilotildees para pagar o deacutebito natildeo pode ter passaporte Por que quem natildeo tem como

pagar o deve natildeo pode ter cartatildeo de creacutedito

Ao utilizar meios executivos atiacutepicos como os supracitados para compelir o devedor a

satisfazer a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria quando exauridos sem ecircxito os meios tradicionais de bens

penhoraacuteveis salvo quando existe qualquer indiacutecio concreto de ocultaccedilatildeo ou dissipaccedilatildeo de

bens eacute obrigar o devedor abrir matildeo da proteccedilatildeo da lei que lhe impede que seja tomado agrave forccedila

(art 833 CPC e demais disposiccedilotildees que tratam da impenhorabilidade)

Segundo Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa160

Claramente essa pressatildeo visa dar uma aparecircncia de voluntariedade agrave indicaccedilatildeo de bens impenhoraacuteveis pelo proacuteprio executado que na verdade soacute age assim por ser a uacutenica forma de ver-se livre de um grame imposto por medida indutiva despedida de qualquer necessidade ou adequaccedilatildeo Uma intoleraacutevel perversatildeo

Os autores afirmam ainda que o ldquodireito paacutetrio natildeo admite esta contraditio in terminis

sendo inaceitaacutevel a coexistecircncia de regra protetiva do executado com outra que concede ao

juiz poderes para forccedilar (ainda que indiretamente e veladamente) o executado a abrir matildeo

daquela proteccedilatildeordquo 161

Logo eacute cristalino que a suspensatildeo da CNH eacute uma forma incorreta de aplicar a medida

executiva atiacutepica para efetivar o direito fundamental a execuccedilatildeo tendo em vista que o uacutenico

objetivo da referida eacute pressionar o executado abrir matildeo de algum bem impenhoraacutevel para

levantar o dinheiro e cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

A retenccedilatildeo do passaporte igualmente natildeo possui qualquer relaccedilatildeo com a diacutevida do

executado e eacute somente uma forma de tentar pressiona-lo a dispor de um bem que natildeo pode

ser tomado agrave forccedila e puni-lo por natildeo ter cumprido voluntariamente com a sua obrigaccedilatildeo

159 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

160 Ibid sem paginaccedilatildeo 161 Ibid sem paginaccedilatildeo

60

Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa162

acreditam que tal medida eacute equivocada e se torna excessivamente onerosa ao executado

As mais variadas circunstacircncias relevem o equiacutevoco de tal medida aplicada assim genericamente Com efeito nada justifica reter o passaporte do executado e impedi-lo de viajar para o exterior quando eacute agraciado inclusive com todas as despesas pagas com presente sorteio ou precircmio (por completar tempo de serviccedilo ou atingir metas produtividade na sociedade empresaacuteria em que trabalha) Como todo custo eacute suportado por terceiro e por isso mesmo a sua realizaccedilatildeo pelo executado natildeo traria qualquer prejuiacutezo ao exequente e a retenccedilatildeo do passaporte natildeo seria injustificaacutevel

Paulo Antonio Papini163 acredita que natildeo tem a apreensatildeo de passaporte natildeo possui um

fundamento plausiacutevel tendo em vista que se o devedor natildeo pode viajar para saldar o deacutebito

tambeacutem natildeo poderia exercer atividades cotidianas

Com todo o respeito a quem pensa dessa forma o argumento eacute muito simploacuterio e natildeo precisamos sequer do Direito para derrubaacute-lo Com efeito se considerarmos que ndash ateacute mesmo pelas dimensotildees continentais do Brasil ndash natildeo eacute incomum que uma passagem para o Nordeste custe mais caro que um voo para Miami seria razoaacutevel entatildeo seguindo a linha argumentativa do Magistrado em questatildeo que se oficiasse aos oacutergatildeos reguladores da aviaccedilatildeo civil proibindo-se aquele devedor de fazer ateacute mesmo voos domeacutesticos Poder-se-ia ir mais longe jaacute que natildeo tem dinheiro para pagar suas diacutevidas certamente aquele devedor tambeacutem natildeo teria para comer fora de sua casa porque entatildeo natildeo determinar a expediccedilatildeo de ofiacutecio aos restaurantes proacuteximos agrave sua casa e determinar tambeacutem a proibiccedilatildeo de que ele fosse servidoatendido

O autor se questiona ainda ldquoSeraacute entatildeo que o Princiacutepio da Dignidade da Pessoa

Humana estaacute de mero enfeite em nossa Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ()rdquo 164 Tendo em vista

que ldquoa decisatildeo em comento viola diretamente o art 5ordm incisos XV LIII e LXIII da

Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ndash falamos do Direito de Ir e Virrdquo 165

Ademais o cancelamento do cartatildeo de creacutedito eacute mais uma forma de constranger e

compelir o executado a cumprir com a obrigaccedilatildeo de qualquer forma natildeo importando o que

precise fazer para conseguir saldar o deacutebito tendo em vista que a referida medida apresenta

162 Ibid sem paginaccedilatildeo 163 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo

pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018

164 Ibid sem paginaccedilatildeo 165 Ibid sem paginaccedilatildeo

61

qualquer adequaccedilatildeo com o fim desejado (reverter em pagamento para o exequente) Os

autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa afirmam que166

Reconhece-se que as razotildees da afirmaccedilatildeo ora questionada satildeo ateacute intuitivas mas eacute plenamente possiacutevel problematiza-las Ora natildeo se encontra qualquer justificativa idocircnea para que o juiz possa cancelar o contrato do executado com a administradora do cartatildeo de creacutedito (ou instituiccedilatildeo financeira) que natildeo tem qualquer relaccedilatildeo com o creacutedito exequendo muito menos como isso poderia impactar positivamente na execuccedilatildeo (senatildeo para pressionar o executado a dispor de bens impenhoraacuteveis) Ademais natildeo foram indicados sequer sinais de que o executado realiza gastos supeacuterfluos com o cartatildeo de creacutedito ndash natildeo que isso justificasse a medida pois o correto seria penhorar os esses bens (se duraacuteveis naturalmente) ao inveacutes de cancelar o cartatildeo de creacutedito

Logo as referidas medidas natildeo possuem qualquer relaccedilatildeo com o atingimento do fim

almejado (o pagamento de quantia) tendo em vista que natildeo haacute uma relaccedilatildeo meiofim entre

tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a

restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia

ao exequente

Dessa forma nota-se que as medidas de suspensatildeo da CNH retenccedilatildeo de passaporte e

bloqueio do cartatildeo de credito satildeo completamente inadequadas agrave realizaccedilatildeo a que se prestam

Afinal ldquotais medidas soam como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-

lo ao cumprimento da ordem judicial ndash e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a

utilizaccedilatildeo dos meios sancionatoacuterios pelo magistrado ()rdquo167

Como exposto em linhas preteacuteritas o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades

de aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e

razoaacutevel se atendo aos criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas

executivas atiacutepicas ao caso concreto sob pena de converter a medida em de indutiva para

punitiva

A utilizaccedilatildeo de medidas atiacutepicas como a suspensatildeo da carteira de motorista e o

passaporte do devedor abandona a regra da responsabilidade patrimonial e atingem em cheio

o nuacutecleo de direitos inerentes agrave condiccedilatildeo humana

166 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

167 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 115

62

O limite para a aplicaccedilatildeo de tais medidas deve ser a Constituiccedilatildeo Federal e sobretudo

os Direitos fundamentais nela expressos ldquoCom efeito natildeo haacute saiacuteda tampouco soluccedilatildeo eficaz

de um problema sem que se respeite a Lei e o Devido Processo Legal (por mais nobres que

sejam as intenccedilotildees)rdquo 168

Dessa forma a busca desenfreada pelo cumprimento das decisotildees judiciais em

especial na fase executiva natildeo pode ser realizada em sacrifiacutecio de direitos fundamentais O

Poder Judiciaacuterio natildeo pode resolver a crise do processo executoacuterio utilizando de medidas

arbitraacuterias com o propoacutesito de satisfazer obrigaccedilotildees pecuniaacuterias

Eis o dilema que se coloca diante do poder geral de efetivaccedilatildeo ele pode servir de

potente instrumento em prol da tutela jurisdicional executiva entretanto se manejado de

modo improacuteprio serviraacute de instrumento de puniccedilatildeo e humilhaccedilatildeo do executado169

Eacute notoacuterio que se amplamente aplicado o poder geral de efetivaccedilatildeo reduziria os

iacutendices de inadimplecircncia quiccedilaacute resolveria por completo a crise da execuccedilatildeo civil Entretanto

o retrocesso civilizatoacuterio seria irreparaacutevel

168 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo

pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018

169 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

63

5 CONCLUSAtildeO

Como funccedilatildeo jurisdicional que tem como objeto a efetivaccedilatildeo de direitos a execuccedilatildeo

deve sempre buscar a maior satisfaccedilatildeo possiacutevel concretizando integralmente o creacutedito do

exequente isto eacute realizando o direito fundamental agrave tutela executiva do credor Por isso a

adoccedilatildeo de meios executivos atiacutepicos incorporados pelo Coacutedigo de Processo Civil de 2015 por

meio do art139 IV em um primeiro momento podem ser consideradas vaacutelidas visto que

servem de instrumento para a satisfaccedilatildeo e asseguraccedilatildeo de direitos do credor

Entretanto para o oacutergatildeo julgador natildeo cometa arbitrariedades em nome do direito

fundamental agrave execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que seja definido certos limites na adoccedilatildeo do poder

geral de efetivaccedilatildeo

As medidas executivas atiacutepicas natildeo podem ser aplicadas de maneira indiscriminada

logo devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o esgotamento das medidas tiacutepicas e

a possibilidade de cumprimento da obrigaccedilatildeo

Partindo dessa premissa as medidas a serem adotadas pelo juiz no caso concreto

devem ter como baliza os princiacutepios da proporcionalidade e da razoabilidade para que natildeo

ultrapassem a responsabilidade patrimonial do devedor e incidida diretamente sobre sua

pessoa

Para que natildeo seja atingida a pessoa do executado ou seja para que o devedor natildeo

tenha sua dignidade humana viola eacute necessaacuterio que a medida atiacutepica seja adequada e

necessaacuteria

Logo o juiz deveraacute sempre estabelecer uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida

executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia

a gerar o resultado sem violar a dignidade humana do executado

Dessa o juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental a execuccedilatildeo e

determinar uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute

necessaacuterio que a medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado

As medidas que ultrapassam esses limites como a decisatildeo que apreendeu o

passaporte suspensatildeo a CNH e bloqueou o cartatildeo de creacutedito do devedor satildeo meramente

punitivas posto que essas natildeo satildeo as medidas mais adequadas para se atingir o fim almejado

pois natildeo existe propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado

64

uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo

geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente

Medidas como esta servem de embasamento para decisotildees arbitraacuterias e autoritaacuterias de

violaccedilatildeo dos direitos fundamentais transformando o poder geral de efetivaccedilatildeo em

instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com autorizaccedilatildeo judicial

Em suma o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades de aplicaccedilatildeo do poder

geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e razoaacutevel se atendo aos

criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao

caso concreto sob pena de punir a pessoa do executado violando a sua dignidade humana

em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo

65

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THEODORO JUacuteNIOR Humberto Novo Coacutedigo de Processo Civil Anotado 20 ed

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  • 1 INTRODUCcedilAtildeO
  • 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO
    • 25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO
      • 3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
        • 31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS
          • 311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15
            • 32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
            • 33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
            • 34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
              • 4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
                • 41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
                • 42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
                  • 5 CONCLUSAtildeO
                  • REFEREcircNCIAS
Page 7: portal.faculdadebaianadedireito.com.brportal.faculdadebaianadedireito.com.br/portal/monografias...A prestação jurisdicional não se concretiza depois de encerrada afase de conhecimento

5

1 INTRODUCcedilAtildeO

A prestaccedilatildeo jurisdicional natildeo costuma se findar apoacutes o encerramento da fase cognitiva

com a prolaccedilatildeo de uma sentenccedila de meacuterito Para que a referida prestaccedilatildeo se concretize eacute

imperioso que haja a satisfaccedilatildeo do deacutebito pelo devedor

Entretanto observa-se em diversos casos o inadimplemento da parte passiva

processual sendo necessaacuterio desenvolver a atividade executiva A referida atividade possui o

escopo de satisfazer direitos

Isso porque o processo natildeo eacute um fim em si mesmo sendo apenas um exerciacutecio da

jurisdiccedilatildeo estatal Dessa forma a razatildeo de ser do processo eacute o atingimento da sua finalidade

almejada que eacute a prestaccedilatildeo da tutela jurisdicional

Todavia como a tutela jurisdicional configura-se na obrigaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio

proteger e reparar os direitos lesionados ou ameaccedilados de lesatildeo muitas vezes a dita tutela

somente consegue ser efetivada atraveacutes da atividade executiva da jurisdiccedilatildeo

Ocorre que a execuccedilatildeo civil sempre foi o ldquocalcanhar de Aquilesrdquo do sistema

processual e de modo geral vinha sofrendo uma crise quanto a sua efetividade Ou seja o

credor obtia ecircxito na fase de conhecimento entretanto natildeo conseguia alcanccedilar o seu direito a

prestaccedilatildeo reconhecida na fase de execuccedilatildeo

Com o fito de tornar a atividade satisfativa mais eficiente e mais ceacutelere o Coacutedigo de

Processo Civil de 2015 concebeu novas diretrizes ao processo no sentindo de harmonizar

suas com os ditames da Constituiccedilatildeo Federal principalmente com os direitos fundamentais

As normas fundamentais do processo civil trazidas pelo CPC15 preocupam-se

primordialmente com a efetividade da tutela jurisdicional

Em conformidade com essa nova sistemaacutetica o legislador no art 139 IV do Coacutedigo

de Processo Civil estabeleceu a possibilidade de o juiz dispor de todas as medidas indutivas

coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o cumprimento de

ordem judicial trazendo como grande novidade a aplicaccedilatildeo dessas medidas executoacuterias

atiacutepicas tambeacutem nas obrigaccedilotildees de pagar dinheiro

6 Entretanto natildeo haacute na legislaccedilatildeo criteacuterios especiacuteficos que auxiliem o oacutergatildeo julgador na

escolha das medidas executivas atiacutepicas que se adotadas sem qualquer baliza podem

acarretar consequecircncias juriacutedicas irreparaacuteveis

Como a famosa decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de

Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-1320138260011 Nessa accedilatildeo

que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo

pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a suspensatildeo da

Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o passaporte e

cancelou os cartotildees de creacutedito como forma de compeli-lo a adimplir com o deacutebito

Decisotildees como esta geram conflitos entre direitos constitucionalmente instituiacutedos De

um lado o direito fundamental agrave tutela jurisdicional e de outro os direitos e garantias

inerentes a todos os indiviacuteduos

Dessa forma a presente monografia tem como escopo de estabelecer criteacuterios

limitadores para que a adoccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo viole a dignidade humana do

executado em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo

7 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO

CIVIL

21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL

A Execuccedilatildeo Civil nasce a partir do direito a uma prestaccedilatildeo conferida a algueacutem de

exigir de outrem o cumprimento de uma conduta de fazer natildeo fazer ou de dar (dinheiro ou

coisa distinta) 1

Para que o direito a uma prestaccedilatildeo se concretize no mundo fiacutesico eacute necessaacuterio que

haja a satisfaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida pelo sujeito passivo Caso contraacuterio fala-se em

inadimplemento ou lesatildeo O titular do direito natildeo tem como agir por si para efetivar o seu

direito a prestaccedilatildeo posto que a autotutela eacute vedada no ordenamento juriacutedico Dessa forma eacute

necessaacuterio que se recorra ao Poder Judiciaacuterio para que se possa ter a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo

devida logo a tutela jurisdicional executiva2

O processualista Fredie Didier et al3 equaciona essa questatildeo da seguinte maneira

Quando se pensa em tutela executiva pensa-se na efetivaccedilatildeo de direitos a uma prestaccedilatildeo fala-se de um conjunto de meios para efetivar a prestaccedilatildeo devida fala-se em execuccedilatildeo de fazer natildeo-fazer dar exatamente os trecircs tipos de prestaccedilatildeo existentes Natildeo eacute por acaso nem por coincidecircncia que a tutela executiva pressupotildee inadimplemento (CPC art 786) - fenocircmeno exclusivo dos direitos a uma prestaccedilatildeo Eacute por isso tambeacutem que se pode falar em prescriccedilatildeo da execuccedilatildeo (CPC art 802 e suacutemula do STF n 150) - prescriccedilatildeo eacute fenocircmeno juriacutedico que se relaciona aos direitos a uma prestaccedilatildeo A execuccedilatildeo forccedilada dirige-se ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo Essa relaccedilatildeo entre direito material e processo eacute fundamental para a compreensatildeo do fenocircmeno executivo

Nesse iacutenterim para o Ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux4 ldquoexecutar eacute

satisfazerrdquo ao passo que o professor Fredie Didier et al5 formulou um conceito mais amplo

ldquoExecutar eacute satisfazer uma prestaccedilatildeo devida A execuccedilatildeo pode ser espontacircnea quando o

devedor cumpre voluntariamente a prestaccedilatildeo ou forccedilada quando o cumprimento da prestaccedilatildeo

eacute obtido por meio de atos executivos pelo Estadordquo

1 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 41 2 Ibid p 42 3 Ibid p 42 4 FUX Luiz Curso de direito processual civil Rio de Janeiro Forense 2001 p 980 5 DIDIER JR Fredie et al Op Cit p 45

8 Dessa forma a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional responsaacutevel pela

concretizaccedilatildeo de um direito subjetivo no plano material obtendo resultado idecircntico ou

equivalente ao atingiacutevel se o devedor cumprisse espontaneamente a prestaccedilatildeo

Todavia essa atividade jurisdicional soacute cabe quando o devedor se recusa a cumprir

com a obrigaccedilatildeo quebrando a expectativa do credor de receber o que lhe eacute devido Por esta

razatildeo que se diz que a execuccedilatildeo civil eacute ldquoforccediladardquo 6

Eacute o que se conclui seguindo os ensinamentos de Leonardo Greco7 para ele execuccedilatildeo eacute

uma

() modalidade de tutela jurisdicional que consiste na praacutetica pelo juiz (ou por outrem sob a sua supervisatildeo) de uma seacuterie de atos coativos concretos sobre o devedor e sobre o seu patrimocircnio a fim de agrave custa dele e independentemente do concurso da sua vontade tornar efetivo o cumprimento de prestaccedilatildeo por ele inadimplida desde que tais atos coativos estejam previamente constituiacutedos em lei

Portanto a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional que tem como escopo obter o

cumprimento de uma prestaccedilatildeo certa e inadimplida mediante atos coativos sobre o devedor e

seus bens

22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL

Vislumbrado o conceito de execuccedilatildeo civil cabe agora empreender a sua classificaccedilatildeo

tendo em vista que a execuccedilatildeo pode se manifestar de diversas formas possuindo diferentes

caracteriacutesticas em cada uma das suas modalidades

Inicialmente cabe destacar que haacute duas teacutecnicas processuais para viabilizar a execuccedilatildeo

civil lato sensu eacute a que divide em processo autocircnomo de execuccedilatildeo e em fase de execuccedilatildeo

dependendo do tiacutetulo executivo que justifica o exerciacutecio da atividade satisfativa

O Coacutedigo Processual Civil de 2015 acertadamente ratificou as reformas promovidas

no CPC73 que consagrava a opccedilatildeo legislativa de oferecimento das tutelas de certificaccedilatildeo e

efetivaccedilatildeo do direito em um mesmo processo Dessa forma as execuccedilotildees de sentenccedilas

6 BASTOS Luiz Fernando Pereira O artigo 139 IV do novo Coacutedigo de Processo Civil a atipicidade

dos meios executivos na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia certa Brasiacutelia 2017 Disponiacutevel em lt httpbdmunbbrbitstream104831866812017_LuizFernandoPereiraBastospdf gt Acesso em 06 de agosto de 2018

7 BASTOS Luiz Fernando Pereira apud GRECO Leonardo O processo de execuccedilatildeo Rio de Janeiro Renovar 1999 p 164

9

passaram a ser uma fase complementar ao de processo de conhecimento e natildeo mais ocorrer

em um processo autocircnomo

No entendimento do professor processualista Fredie Didier et al8 o processo

sincreacutetico simplificou a efetivaccedilatildeo de um direito reconhecido em sentenccedila

A dispensa do ajuizamento de um processo autocircnomo para execuccedilatildeo de sentenccedila natildeo soacute veio diminuir o tempo necessaacuterio agrave prestaccedilatildeo da tutela jurisdicional - afinal o credor natildeo mais precisaria tal como ocorria ateacute entatildeo promover nova citaccedilatildeo pessoal do reacuteudevedor- como tambeacutem veio romper de vez com um velho paradigma segundo o qual a atividade executiva estaria dissociada da precedente atividade jurisdicional cognitiva

Entretanto natildeo soacute as sentenccedilas de meacuterito ensejam uma execuccedilatildeo Por esta razatildeo foi

necessaacuterio manter o processo autocircnomo de execuccedilatildeo para os casos em que o credor tem a seu

favor um documento que natildeo tenha sido proferido por um oacutergatildeo dotado de jurisdiccedilatildeo

Consequentemente se for o titulo executivo judicial o caminho natural eacute o do

cumprimento de sentenccedila Sendo por sua vez extrajudicial o titulo executivo o caminho

correto eacute o processo de execuccedilatildeo

Cabe ainda salientar que toda execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial eacute definitiva Jaacute a

execuccedilatildeo de tiacutetulo judicial (cumprimento de sentenccedila) pode ser definitiva ou provisoacuteria

No primeiro caso isto eacute cumprimento de sentenccedila definitivo ldquoeacute a execuccedilatildeo completa

que vai ateacute a fase final (com a entrega do bem da vida) sem exigecircncias adicionais para o

exequenterdquo 9

Quanto ao segundo caso ldquoo cumprimento provisoacuterio de sentenccedila (fundada em tiacutetulo

provisoacuterio) eacute aquele que exige alguns requisitos extras para que se chegue agrave fase final da

execuccedilatildeordquo 10

Para Fredie Didier11 o criteacuterio para definir se o cumprimento de sentenccedila seraacute

definitivo ou provisoacuterio

() eacute a estabilidade do tiacutetulo executivo em que se funda a execuccedilatildeo se se tratar de decisatildeo acobertada pela coisa julgada material o cumprimento de sentenccedila eacute

8 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 46 9 Ibid p 57 10 Ibid p 57 11 Ibid p 57

10

definitivo se se tratar de decisatildeo judicial ainda passiacutevel de alteraccedilatildeo (reforma ou invalidaccedilatildeo) em razatildeo da pendecircncia de recurso contra ela interposto a que natildeo tenha sido atribuiacutedo efeito suspensivo o cumprimento de sentenccedila eacute provisoacuterio

Ademais a execuccedilatildeo se distingue em procedimentos executivos comuns que satildeo da

execuccedilatildeo civil e que servem a uma generalidade de creacuteditos como eacute o caso do cumprimento

de sentenccedila e o processo de execuccedilatildeo E em procedimentos executivos especiais que servem

agrave satisfaccedilatildeo de creacuteditos peculiares como a execuccedilatildeo de alimentos e a execuccedilatildeo fiscal 12

Por fim cabe mencionar a classificaccedilatildeo que distingue a execuccedilatildeo em direta e indireta

A primeira execuccedilatildeo direita (ou execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo) eacute ldquo() aquela em que o

Poder Judiciaacuterio prescinde da colaboraccedilatildeo do executado para a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida

e pois promove uma substituiccedilatildeo da sua conduta pela conduta do proacuteprio Estado-juiz ou de

terceirordquo 13 Ou seja as medidas executivas satildeo levadas a efeito mesmo contra a vontade do

devedor na execuccedilatildeo direta

Segundo a doutrina a execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo se subdivide da seguinte forma

meios de desapossamento meios de transformaccedilatildeo e meios de expropriaccedilatildeo

Os meios de desapossamento muito comuns nas execuccedilotildees para entrega de coisa eacute a

forma ldquopor meio da qual se retira da posse do executado o bem a ser entregue ao exequente

(p ex despejo busca e apreensatildeo reintegraccedilatildeo de posse)rdquo 14 Ao passo que por meio dos de

transformaccedilatildeo ldquo() o juiz determina que um terceiro pratique a conduta que deveria ser

praticada pelo executado cabendo a este arcar com o pagamento do custo respectivordquo 15 Jaacute

os meios executivos de expropriaccedilatildeo eacute a forma ldquopor meio do qual algum bem do patrimocircnio

do devedor eacute expropriado para pagamento do creacutedito (adjudicaccedilatildeo alienaccedilatildeo judicial ou

apropriaccedilatildeo de frutos e rendimentos de empresa ou de estabelecimentos e de outros bens art

825 CPC)rdquo 16

12 Ibid p 48 13 Ibid p 50 14 Ibid p 51 15 Ibid p 51 16 Ibid p 51

11 Jaacute a execuccedilatildeo indireta (ou mandamental) atua ldquo() na vontade do devedor como forma

de compeli-lo ou incentivaacute-lo a cumprir a ordem judicialrdquo 17 Nesse entendimento ainda

leciona Fredie Didier et al 18

Nesses casos o Estado-juiz busca promover a execuccedilatildeo com a colaboraccedilatildeo do executado forccedilando ou incentivando a que ele proacuteprio cumpra a prestaccedilatildeo devida Em vez de o Estado-juiz tomar as providecircncias que deveriam ser tomadas pelo executado o Estado forccedila por meio de coerccedilatildeo psicoloacutegica ou de promessa de recompensa judicial a que o proacuteprio executado cumpra a prestaccedilatildeo

A execuccedilatildeo indireta pode ser patrimonial como por exemplo a imposiccedilatildeo de multa

coercitiva ou pessoal com a prisatildeo civil do devedor de alimentos Ademais adiciona Didier

et al19que

O estiacutemulo ao cumprimento da prestaccedilatildeo pode dar-se pelo temor (p ex multa coercitiva prisatildeo civil do devedor de alimentos divulgaccedilatildeo de notiacutecia em jornal revelando o descumprimento) ou pelo incentivo (p ex a chamada sanccedilatildeo premial ou sanccedilatildeo positiva de que eacute exemplo a isenccedilatildeo do pagamento de custas em caso de cumprimento do mandado monitoacuterio - art 701 sect 1ordm CPC a reduccedilatildeo pela metade dos honoraacuterios advocatiacutecios fixados inicialmente pelo juiacutezo em caso de pagamento integral do deacutebito pecuniaacuterio na execuccedilatildeo por quantia certa fundada em tiacutetulo extrajudicial - art 827 sect 1ordm CPC)

Por tais razotildees haacute uma tendecircncia em cada vez mais prestigiar os meios executivos

indiretos (coercitivos) posto que satildeo tatildeo eficazes quanto os meios executivos diretos

entretanto menos onerosos Contudo sua aplicaccedilatildeo deve ser fiscalizada a fim de natildeo permitir

que a execuccedilatildeo civil perca sua finalidade visto que eacute uma funccedilatildeo jurisdicional que tem como

escopo efetivar o direito do credor e natildeo de atender os interesses do devedor

23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL

Os princiacutepios juriacutedicos nos uacuteltimos anos passaram a ser munidos de forccedila cogente

normatizando as condutas humanas tanto quanto as regras juriacutedicas Os ditos princiacutepios

ampliaram as margens de atuaccedilatildeo dos aplicadores do direito possibilitando a construccedilatildeo de

soluccedilotildees mais adequadas agraves especificidades das demandas que chegam ao judiciaacuterio

17 Ibid p 51 18 Ibid p 51 19 Ibid p 51-52

12 Dessa forma eacute necessaacuterio aprofundar-se nos princiacutepios norteadores da execuccedilatildeo civil

para que se obtenha uma anaacutelise completa da teoria geral da execuccedilatildeo

A execuccedilatildeo civil tem como um dos seus corolaacuterios o princiacutepio da efetividade este

consiste na exigecircncia de um sistema completo de tutela executiva no qual existam meios

executivos capazes de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor

de tutela executivardquo 20

O referido princiacutepio da efetividade eacute reforccedilado como normal fundamental do processo

civil brasileiro pelo art 4ordm do CPC ldquoArt 4ordm As partes tecircm o direito de obter em prazo razoaacutevel

a soluccedilatildeo integral do meacuterito incluiacuteda a atividade satisfativa

Jaacute o princiacutepio da boa feacute processual corolaacuterio do devido processo legal estaacute previsto

no art 5ordm do CPC ldquoAquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de

acordo com a boa-feacuterdquo Segundo o processualista baiano Fredie Didier21

O princiacutepio da boa-feacute extrai-se de uma claacuteusula geral processual A opccedilatildeo por uma claacuteusula geral de boa-feacute eacute a mais correta Eacute que a infinidade de situaccedilotildees que podem surgir ao longo do processo torna pouco eficaz qualquer enumeraccedilatildeo legal exaustiva das hipoacuteteses de comportamento desleal Daiacute ser correta a opccedilatildeo da legislaccedilatildeo brasileira por uma norma geral que impotildee o comportamento de acordo com a boa-feacute Em verdade natildeo seria necessaacuteria qualquer enumeraccedilatildeo das condutas desleais o art 5deg do CPC eacute bastante exatamente por tratar-se de uma claacuteusula geral

Dessa forma o dito princiacutepio preconiza que diante de um vinculo juriacutedico as pessoas

envolvidas natildeo poderatildeo frustrar a confianccedila do outro devendo comportar-se como se pode

esperar de uma pessoa de boa-feacute

Ademais disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial que ldquosomente o

patrimocircnio do devedor (art 789 CPC) ou de terceiro responsaacutevel pode ser objeto da

atividade executiva do Estadordquo 22

O referido princiacutepio que determina que somente o patrimocircnio submete-se agrave execuccedilatildeo

e natildeo a pessoa foi trazido pela humanizaccedilatildeo do direito Para o professor Didier et al23 o

20 DIDIER JR Freddie et al apud GUERRA Marcelo Lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do

credor na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 21 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte

geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 105 22 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 68

13

desenvolvimento dos meios de execuccedilatildeo indireta ldquoparece relativizar um pouco esse princiacutepio

na medida em que pressionam psicologicamente a pessoa do devedor para que cumpra a

obrigaccedilatildeo com seu comportamentordquo

Complementa ainda que

A responsabilidade executiva parece assumir atualmente caraacuteter hiacutebrido comportando coerccedilatildeo pessoal e sujeiccedilatildeo patrimonial

i) a coerccedilatildeo pessoal incide sobre a vontade do devedor admitindo o uso de medidas coercitivas de execuccedilatildeo indireta para forccedilaacute-lo a cumprir a obrigaccedilatildeo com seu proacuteprio comportamento (ex arts 139 rv 523 sect 1ordm 536 sect 1ordm e 538 sect 3ordm todos do CPC)

ii) descumprida a obrigaccedilatildeo e natildeo sendo possiacuteveladequado o uso de teacutecnica de coerccedilatildeo pessoal tem-se a sujeiccedilatildeo patrimonial que recairaacute sobre os bens do devedor ou de terceiro responsaacutevel - que responderatildeo pela proacutepria prestaccedilatildeo in natura (ex dar coisa ou entregar quantia) ou por perdas e danos24

Dessa forma o referido princiacutepio natildeo tem aplicaccedilatildeo absoluta em razatildeo do principio da

efetividade a qual estimula o uso dos meios de coerccedilatildeo indireta para garantir o cumprimento

da obrigaccedilatildeo pelo devedor

O princiacutepio da primazia da tutela especifica (ou princiacutepio do resultado) assevera que

ldquoA execuccedilatildeo deve ser especiacutefica propiciar ao credor a satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo tal qual

houvesse o cumprimento espontacircneo da prestaccedilatildeo pelo devedorrdquo 25

O CPC de 2015 absorveu todos os avanccedilos legislativos a cerca do mote O caput do

art 497 assegura que na accedilatildeo que tenha por objeto a prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer o

juiz se procedente o pedido concederaacute a tutela especiacutefica ou determinaraacute providecircncias que

assegurem a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico equivalente O art 499 o

complementa a obrigaccedilatildeo somente seraacute convertida em perdas e danos se o autor o requerer

ou se impossiacutevel agrave tutela especiacutefica ou a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico

equivalente

O princiacutepio do contraditoacuterio eacute garantido pela constituiccedilatildeo federal e compreende o

direito de ser ouvido o direito de acompanhar os atos processuais o direito de produzir

provas participar da sua produccedilatildeo manifestar-se sobre a prova produzida e obter do juiz a

23 Ibid p 69-70 24 Ibid p 70 25 Ibid p 71

14

respectiva valoraccedilatildeo o direito de ser informado regularmente dos atos praticados no processo

o direito agrave motivaccedilatildeo das decisotildees o direito de impugnar as decisotildees 26

O contraditoacuterio tem aplicaccedilatildeo em todo processo judicial sendo aplicaacutevel tambeacutem na

execuccedilatildeo No entanto o contraditoacuterio na execuccedilatildeo natildeo ocorre com a mesma intensidade que

no processo ou na fase de conhecimento eacute o que assevera Didier et al 27

O contraditoacuterio no procedimento executivo no aspecto do direito de defesa assegurado agrave parte demandada eacute eventual porquanto depende da provocaccedilatildeo do executado que natildeo eacute chamado ajuiacutezo para defender-se mas sim para cumprir a obrigaccedilatildeo O procedimento executivo adota a teacutecnica monitoacuteria que consiste basicamente na inversatildeo do ocircnus de provocar o contraditoacuterio o reacuteu em vez de citado para manifestar-se sobre a pretensatildeo do autor eacute convocado para cumprir uma determinada obrigaccedilatildeo

Logo haacute o contraditoacuterio no procedimento executivo porem eacute eventual quanto agrave defesa

do executado

Ademais o princiacutepio da menor onerosidade eacute consagrado pelo art 805 do CPC e

dispotildee que ldquoQuando por vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz

mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o executadordquo O referido princiacutepio tem o

escopo de impedir o abuso do direito pelo exequente

O principio da menor onerosidade auxilia o juiz na escolha de um meio executivo

adequado e necessaacuterio que satisfaccedila a prestaccedilatildeo exigida pelo credor Nesse sentido eacute o

entendimento do professor Fredie Didier et al 28

O resultado a ser alcanccedilado eacute aquele estabelecido pelo direito material A maneira de se chegar ateacute esse resultado eacute que deve ser a menos onerosa possiacutevel para o executado Isso significa que a opccedilatildeo pelo meio menos gravoso pressupotildee que os diversos meios considerados sejam igualmente eficazes Assim havendo vaacuterios meios executivos aptos agrave tutela adequada e efetiva do direito de creacutedito escolhe-se a via menos onerosa ao executado

O princiacutepio visa impedir a execuccedilatildeo desnecessariamente onerosa ao executado ou seja a execuccedilatildeo abusiva Em vez de enumerar situaccedilotildees em que a opccedilatildeo mais gravosa revelar-se-ia injusta o legislador valeu-se corretamente de uma claacuteusula geral para reputar abusivo qualquer comportamento do credor que pretender valer-se de meio executivo mais oneroso do que outro igualmente idocircneo agrave satisfaccedilatildeo do seu creacutedito

26 Ibid p 76 27 Ibid p 78 28 Ibid p 79-80

15 O princiacutepio da cooperaccedilatildeo tem como base os princiacutepios do devido processo legal da

boa-feacute processual e do contraditoacuterio O dito princiacutepio avigora a eacutetica processual com o

aprimoramento do diaacutelogo entre as partes reciprocamente e com o oacutergatildeo jurisdicional Eacute o

que preconiza o art 6ordm do CPC Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para

que se obtenha em tempo razoaacutevel decisatildeo de meacuterito justa e efetiva

No procedimento executivo o princiacutepio da cooperaccedilatildeo incide de diversas formas

disciplina Didier et al29 que na execuccedilatildeo

O executado tem o dever de indicar bens agrave penhora (art 774 V CPC) Natildeo encontrados bens penhoraacuteveis e natildeo havendo indicaccedilatildeo de qualquer um deles pelo exequente cabe ao executado declarar quais satildeo seus bens penhoraacuteveis sob pena de se sujeitar a uma sanccedilatildeo pecuniaacuteria compulsoacuteria

Tambeacutem eacute manifestaccedilatildeo do princiacutepio da cooperaccedilatildeo a exigecircncia de que o executado que pretende impugnar o valor da execuccedilatildeo apresente de logo o valor que reputa devido (art 525 sect 4ordm CPC) Seria comportamento natildeo-cooperativo afirmar que a cobranccedila eacute excessiva sem simultaneamente dizer qual eacute o valor correto

Demais disso aplicam-se agrave execuccedilatildeo os deveres que decorrem do princiacutepio da cooperaccedilatildeo e que satildeo imputados ao oacutergatildeo jurisdicional () Assim por exemplo deve o juiz advertir ao executado antes de puni-lo de que seu ato pode vir a caracterizar-se como atentatoacuterio agrave dignidade da jurisdiccedilatildeo ( art 772 II CPC) perceba que se trata de uma conduta compatiacutevel com o dever de prevenccedilatildeo O oacutergatildeo jurisdicional somente pode conhecer da prescriccedilatildeo ex officio dando a oportunidade de o exequente manifestar-se conforme impotildee o dever de consulta ( cf arts 10 487 paraacutegrafo uacutenico e 921 sect 5ordm CPC)

O princiacutepio ou postulado30 da proporcionalidade tem aplicaccedilatildeo muito relevante na

execuccedilatildeo O art 8 do CPC assegura que o oacutergatildeo jurisdicional tem o dever de observar a

proporcionalidade e a razoabilidade ao aplicar o ordenamento juriacutedico inclusive no

procedimento executivo

Ademais o art 805 do CPC eacute categoacuterico ao disciplinar que ldquoArt 805 Quando por

vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo

menos gravoso para o executadordquo O referido artigo jaacute se trata de uma concretizaccedilatildeo da

proporcionalidade

29 Ibid p 82 30 Segundo Fredie Didier et al haacute uma discussatildeo doutrinaacuteria sobre a proporcionalidade Parte da

doutrina acredita que a proporcionalidade eacute um princiacutepio e outra parte acredita que eacute um postulado normativo

16 O principio da adequaccedilatildeo pode ser vislumbrado em dois momentos do Direito

Processual ldquoa) no legislativo como orientador da confecccedilatildeo das leis b) no jurisdicional

autorizando ao juiz diante do caso concreto adaptar procedimento agraves suas peculiaridadesrdquo 31

Para Luceacutelia de Sena Alves e Tiago Retes32

Isso quer dizer que no momento legislativo o devido processo deve ser observado pelo legislador para a confecccedilatildeo das normas de direito processual que iratildeo servir de instrumento efetivo de concretizaccedilatildeo do direito substancial a ser tutelado atendendo a todas as suas finalidades sob pena de falecircncia do proacuteprio direito No momento jurisdicional da mesma forma a via processual escolhida pelo autor tambeacutem deve estar sujeita a este princiacutepio para que natildeo sofra as mesmas consequecircncias da sua inobservacircncia

O ordenamento juriacutedico deve ser aplicado por meio da teacutecnica processual adequada

evitando dessa forma uma tutela ineficaz

Por fim o princiacutepio do autorregramento da vontade na execuccedilatildeo tem o objetivo de

ldquo() preservar um espaccedilo processual para o exerciacutecio da liberdade e da vontade em que

sejam permitidas negociaccedilotildees que envolvam as partes ndash e tambeacutem o juizrdquo33 Didier et al34

assevera que

A rigor o legislador estabelece um regime juriacutedico de autorregramento da vontade processual identificando-se algumas manifestaccedilotildees relevantes para a execuccedilatildeo Na verdade pode-se dizer que poucos satildeo os ambientes mais propiacutecios do que a execuccedilatildeo para a negociaccedilatildeo sobre o processo Todos os institutos e normas processuais relativos agrave execuccedilatildeo devem ser repensados a partir da premissa de que o CPC permite uma ampla margem de liberdade de negociaccedilatildeo sobre o processo (art 190 CPC)

O autorregramento da vontade pode ser vislumbrando na previsatildeo de negoacutecios tiacutepicos

em sede de execuccedilatildeo como por exemplo no acordo das partes sobre o valor do bem que

dispensa a avaliaccedilatildeo disposto no inciso I do art 871 CPC Ademais dentro dos limites do art

190 do CPC eacute possiacutevel na execuccedilatildeo a atribuiccedilatildeo da negociaccedilatildeo atiacutepica aos sujeitos 31 ALVES Luceacutelia de Sena Alves RETES Tiago O poder geral de efetivaccedilatildeo das decisotildees judiciais e

proporcionalidade uma anaacutelise criacutetica acerca do art 139 IV do Novo Coacutedigo de Processo Civil Disponiacutevel em lthttpswwwacademiaedu31752652O_poder_geral_de_efetivaC3A7C3A3o_das_decisC3B5es_judiciais_e_a_proporcionalidade_uma_anC3A1lise_crC3ADtica_acerca_do_art_139_IV_do_Novo_CC3B3digo_de_Processo_Civil gt Acesso em 25 de julho de 2018

32 Ibid natildeo paginado 33 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 85 34 Ibid p 85

17

processuais permitindo que sejam feitas mudanccedilas nos procedimentos e nas situaccedilotildees

juriacutedicas processuais ldquoSatildeo exemplos de negoacutecios processuais atiacutepicos na execuccedilatildeo pacto de

penhorabilidade acordo de ampliaccedilatildeo de prazos das partes de qualquer natureza acordo de

rateio de despesas processuais ()rdquo35

24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO

Sempre houve diversos questionamentos quanto agrave eficaacutecia do Direito processual Civil

e se o mesmo era meio apto a assegurar a tutela jurisdicional dos direitos dos cidadatildeos O

processo de execuccedilatildeo eacute o setor que sofre mais criacuteticas quanto a sua ineficiecircncia afinal a

execuccedilatildeo civil sempre foi o ldquocalcanhar de Aquilesrdquo do sistema processual pela praxe do

ldquoganhou (no processo de conhecimento) mas natildeo levou (na fase de cumprimento ou

execuccedilatildeo)rdquo 36

Essa dificuldade de se efetivar a tutela satisfastiva natildeo se resume a um problema de

mera teacutecnica processual tiacutepico de determinado ordenamento mas representa uma prova de

fogo da capacidade dos instrumentos jurisdicionais O autor Leonardo Greco37 no ano de

2005 atribuiu esse fato as seguintes causas o excesso de processos o custo e a morosidade da

justiccedila a inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios a ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais

um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico e a progressiva volatizaccedilatildeo dos bens

Quanto ao excesso de processos o referido autor aduz que ldquonos grandes centros o

crescimento da maacutequina judiciaacuteria natildeo acompanhou a expansatildeo do nuacutemero de litiacutegiosrdquo 38

O custo e morosidade da justiccedila prejudicam a tutela satisfativa posto que

ldquojaacute desfalcado pelo inadimplemento do devedor o credor ainda tem de arcar com o adiantamento das despesas do processo de execuccedilatildeo e de eventual liquidaccedilatildeo vendo arrastar-se a marcha dos atos executoacuterios facilmente retardada por atos procrastinatoacuterios do devedorrdquo 39

35 Ibid p 86 36 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca

para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018

37 GRECCO Leonardo A Crise do Processo de Execuccedilatildeo in Estudos de direito processual Leonardo Greco ndash Campos dos Goytacazes Ed Faculdade de Direito de Campos 2005 p 7

38 Ibid p 7 39 Ibid p 7-8

18 A inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios contribui para a crise do processo de

execuccedilatildeo tendo em vista que

ldquoo juiz da execuccedilatildeo prisioneiro de ritos que o distanciam das partes e da realidade da vida impulsiona sem qualquer apetite a execuccedilatildeo conduzindo-a ao sabor dos ventos das provocaccedilotildees impacientes do credor e das costumeiras procrastinaccedilotildees do devedorrdquo 40

Jaacute ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais atrapalha a efetivaccedilatildeo da tutela satisfativa ldquoo

devedor natildeo colabora com a execuccedilatildeo e os meios de pressatildeo que a lei estabelece natildeo satildeo

suficientes para intimidaacute-lordquo 41

Com um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico

O espiacuterito empresarial e a sociedade de consumo estimulam o endividamento das pessoas e o inadimplemento das obrigaccedilotildees pelo devedor deixou de ser vexatoacuterio e reprovaacutevel o que multiplica as accedilotildees de cobranccedila e execuccedilotildees atraveacutes das quais o sujeito passivo ainda usufrui vantagens agraves custas do credor 42

Por fim Leonardo Greco elenca a volatizaccedilatildeo dos bens como o uacuteltimo fator que

macula o processo executo tendo em vista que

ldquomudou inteiramente o perfil patrimonial das pessoas antes concentrado em bens de raiz e agora tendencialmente dirigido a investimentos em tiacutetulos e valores facilmente negociaacuteveis o que dificulta a sua localizaccedilatildeo pelo credorrdquo 43

O Coacutedigo de Processo Civil de 1973 introduziu o sistema executivo ao ordenamento

juriacutedico paacutetrio e seguindo os valores liberais da eacutepoca com a proteccedilatildeo de esfera juriacutedica de

liberdade do cidadatildeo contra a possibilidade de arbiacutetrio do Estado e uso indevido do Poder

jurisdicional outorgou o miacutenimo de poder ao juiz Seguindo as regras do CPC de 73 o

devedor soacute poderia ter sua esfera juriacutedica invadida atraveacutes de meios de execuccedilatildeo instituiacutedos

previamente em lei

Diante de tantos obstaacuteculos para se efetivar a tutela satisfativa a execuccedilatildeo estava

fadada ao fracasso o que frustrava a expectativa do jurisdicionado a uma prestaccedilatildeo da tutela

jurisdicional ceacutelere e efetiva Insatisfeitos com o cenaacuterio que se encontrava a atividade

40 Ibid p 8 41 Ibid p8 42 Ibid p 8 43 Ibid p8

19

executiva legisladores e operadores do direito natildeo mediram esforccedilos para promover uma

evoluccedilatildeo significativa buscando mais eficiecircncia e celeridade ao procedimento executoacuterio

Dessa forma no final de 1994 foi introduzido no coacutedigo de processo agrave flexibilizaccedilatildeo

dos poderes executoacuterios do juiz ldquopara que ele pudesse prestar uma tutela efetiva aos direitos

ficando autorizado a determinar a modalidade de execuccedilatildeo adequada a cada hipoacutetese nas

obrigaccedilotildees de fazer e natildeo fazer (art 461 sect5ordm do CPC de 1973)rdquo No ano de 2002 a referida

medida foi estendida para as obrigaccedilotildees de entregar coisa (art 461-A caput e sect3ordm do CPC de

1973)

Com fundamento nos artigos 461 e 461-A em 2005 a Lei nordm 11 23205 unificou o

processo de conhecimento e o processo de execuccedilatildeo de sentenccedila Nesse sentido Maacuterio

Henrique Cavalcanti Gil Rodrigues44 aduz que

A Lei 112322005 reuniu de forma definitiva os processos de conhecimento e de execuccedilatildeo em um uacutenico processo composto por um sistema bifaacutesico Assim passa a existir uma fase inicial (de reconhecimento) e uma fase posterior (de cumprimento de sentenccedila de efetivaccedilatildeo da decisatildeo definitiva) sem contar com a eventual fase intermediaacuteria de liquidaccedilatildeo (RODRIGUES 2010 p 38)

Ademais as alteraccedilotildees realizadas no CPC de 73 inseriu a atipicidade dos meios

executivos nas obrigaccedilotildees de fazer natildeo fazer e dar coisa certa entretanto exercendo papel

subsidiaacuterio aos meios tiacutepicos

Quanto agraves obrigaccedilotildees de pagar quantia havia apenas a possibilidade de se valer da

incidecircncia de multa do art 475-J do CPC de 73 ndash implementada mediante reforma perpetrada

pela Lei nordm 11232 de 2005 em atendimento a doutrina processualista preocupada com a

efetividade das decisotildees ndash e de atos executivos como a penhora de bens e dinheiro

Ainda que a execuccedilatildeo tenha avanccedilado com a inserccedilatildeo das leis posteriores a 1994 no

CPC de 1973 a mesma continuava insuficiente tendo em vista que a burocracia e lentidatildeo

dos atos executivos davam brechas para que o devedor escondesse seu patrimocircnio penhoraacutevel

tornando carente de efetividade e celeridade agrave execuccedilatildeo

44 RODRIGUES Maacuterio Henrique Cavalcanti Gil A evoluccedilatildeo da execuccedilatildeo de sentenccedila no direito

processual civil e o novo regime juriacutedico das sentenccedilas apoacutes a reforma implementada pela Lei 112322005 Revista do Tribunal Regional Federal da 1ordf Regiatildeo v 22 n 2 fev 2010 p 38

20

25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO

A tutela juridiscional eacute um direito fundamental previsto no art 5ordm inciso XXXV da

Carta Magna ldquo() a lei natildeo excluiraacute da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio lesatildeo ou ameaccedila a

direitordquo

Na visatildeo claacutessica o direito de accedilatildeo era efetivado com a prolaccedilatildeo de uma sentenccedila de

meacuterito posiccedilatildeo adotada por grande parte dos processualistas seguidores da doutrina de

Liebman Todavia esse conceito se mostra defasado tendo em vista que o direito de acesso agrave

justiccedila natildeo eacute apenas uma garantia formal de bater as portas do judiciaacuterio mas a garantia de

acesso agrave ordem juriacutedica justa adequada e eficaz45

Acreditar que uma sentenccedila de meacuterito favoraacutevel eacute tutela jurisdicional suficiente para

satisfazer o que se busca com o ajuizamento da accedilatildeo eacute uma visatildeo distorcida da atividade

satisfativa ldquoSob o ponto de vista do direito material a condenaccedilatildeo por si soacute eacute incapaz de

prestar a tutela do direitordquo46

Nessa oacutetica o direito fundamental agrave tutela executiva exige um sistema de tutela

jurisdicional ldquocapaz de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor

de tutela executivardquo47 Dessa forma entende-se que

ldquo() a) a interpretaccedilatildeo das normas que regulamentam a tutela executiva tem de ser feita no sentido de extrair a maior efetividade possiacutevel b) o juiz tem o poder-dever de deixar de aplicar uma norma que imponha uma restriccedilatildeo a um meio executivo sempre que essa restriccedilatildeo natildeo se justificar como forma de proteccedilatildeo a outro direito fundamental c) o juiz tem o poder-dever de adotar os meios executivos que se revelem necessaacuterios agrave prestaccedilatildeo integral de tutela executivardquo48

Egrave imperioso compreender que o direito fundamental agrave tutela executiva ratificado

pelo CPC eacute essencial para dirimir diversos litiacutegios oriundos do procedimento executivo

45 FERREIRA Gabriela Macedo Poder geral de efetivaccedilatildeo em defesa da constitucionalidade da

teacutecnica de execuccedilatildeo dos direitos do art 139 IV do Coacutedigo de Processo Civil Revista Jus Navigandi ISSN 1518-4862 Teresina ano 22 n 5178 4 set 2017 Disponiacutevel em lthttpsjuscombrartigos60190gt Acesso em 11 set 2018

46 Ibid natildeo paginado 47 DIDIER JR Fredie et al apud GUERRA Marcelo lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do credor

na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 48 Ibid p 102-104

21

ldquoprincipalmente aqueles relacionados agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo49

Fredie Didier et al50 cita como exemplo as hipoacuteteses de impenhorabilidade

A impenhorabilidade de certos bens eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa

Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais

Por esta razatildeo o legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do

CPC fazendo um preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses das partes envolvidas

optando pela mitigaccedilatildeo do direito do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado

Quando o oacutergatildeo jurisdicional verificar que a aplicaccedilatildeo das regras de

impenhorabilidade eacute desproporcional para o caso concreto deve afastaacute-la e construir a

soluccedilatildeo adequada para o referido caso Didier et al51 traz um exemplo esclarecedor em sua

obra

O bem imoacutevel que serve de moradia da famiacutelia eacute relativamente impenhoraacutevel Objetiva-se com essa restriccedilatildeo proteger o direito fundamental agrave moradia conteuacutedo do direito agrave proteccedilatildeo da dignidade Imagine-se um imoacutevel de altiacutessimo valor Imagine-se agora um creacutedito que corresponda a 40 do valor do imoacutevel A venda judicial do imoacutevel no caso permitiria natildeo soacute satisfazer o direito do credor como ainda garantir ao executado com a sobra a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel que lhe preserve a dignidade A opccedilatildeo pela interpretaccedilatildeo literal da regra que veda a penhora protegeria exclusivamente o direito do executado de maneira desnecessaacuteria porque a relaccedilatildeo valor executadovalor do bem permitiria a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel apoacutes a entrega do dinheiro ao credor Seria pois interpretaccedilatildeo em desconformidade com os preceitos da contemporacircnea hermenecircutica constitucional que preconiza a necessidade de nos casos de choque entre direitos fundamentais dar a interpretaccedilatildeo que mais adequadamente proteja a ambos

A execuccedilatildeo civil integra o direito fundamental agrave tutela jurisdicional disciplinando

que ldquoos dispositivos devem ser interpretados de modo que se garanta a maior efetividade

49 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66 50 Ibid p 66 51 Ibid p 67

22

possiacutevel agrave execuccedilatildeo desde que respeitados outros direitos fundamentaisrdquo52 Podendo ser

afastada desde que proporcional qualquer obstaacuteculo irrazoaacutevel agrave efetivaccedilatildeo desse direito

52 FERREIRA Gabriela Macedo apud MACEDO Lucas Buril de As eficaacutecias das decisotildees judiciais e

o cumprimento de sentenccedila no CPC15 Novo CPC Doutrina selecionada v 5 Execuccedilatildeo Coordenador geral Fredie Didier Jr organizadores Lucas Buril de Macedo Ravi Peixoto Alexandre Freire ndash Salvador Jus Podivm 2015 p 360361

23

3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO

EXECUTADO

31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS

Como forma de controlar a atividade jurisdicional por muito tempo vigorou o

entendimento de que a execuccedilatildeo somente poderia ser realizada atraveacutes dos meios executivos

tipicamente previstos na legislaccedilatildeo Segundo Luiz Guilherme Marinoni53

O princiacutepio da tipicidade deseja significar que os meios de execuccedilatildeo devem estar previstos na lei e assim que a execuccedilatildeo natildeo pode ocorrer atraveacutes de formas executivas natildeo tipificadas O seu objetivo eacute de um lado impedir que meio executivo natildeo previsto em lei possa ser utilizado e de outro garantir o jurisdicionado contra a possibilidade de arbiacutetrio judicial na fixaccedilatildeo da modalidade executiva Se o jurisdicionado sabe em razatildeo de previsatildeo legal que a sua esfera juriacutedica somente poderaacute ser invadida atraveacutes de determinadas modalidades executivas confere-se a ele a possibilidade de antever a reaccedilatildeo ao seu inadimplemento bem como a garantia de que a jurisdiccedilatildeo natildeo determinaraacute ou permitiraacute a utilizaccedilatildeo de meio executivo diverso daqueles previstos

Dessa forma o princiacutepio da tipicidade disciplina que o oacutergatildeo julgador ao proceder agrave

execuccedilatildeo estaacute limitado aos meios executivos previamente definidos em lei natildeo podendo se

valer de qualquer teacutecnica de efetivaccedilatildeo que natildeo se encaixasse nas hipoacuteteses taxativas da

legislaccedilatildeo

Entretanto o legislador natildeo tem como prever todas as peculiaridades dos direitos

dignos de tutela executiva e preordenar teacutecnicas executivas diversas para cada peculiaridade

Sob esse cenaacuterio o principio da tipicidade foi cedendo lugar ao principio da atipicidade dos

meios executivos

A ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do oacutergatildeo julgador estaacute cada vez mais presente

no ordenamento juriacutedico paacutetrio motivando um poder geral de efetivaccedilatildeo ldquoque permite ao

julgador valer-se dos meios executivos que considerar mais adequado ao caso concreto sejam

eles de coerccedilatildeo direta sejam de coerccedilatildeo indiretardquo 54

53 MARINONI Luiz Guilherme Teacutecnica processual e tutela dos direitos Satildeo Paulo Editora Revista

dos Tribunais 2004 p 212 nota 79 54 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 100

24

Essa tendecircncia de ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do juiz natildeo eacute exclusividade do

ordenamento juriacutedico brasileiro segundo Fredie Didier et al55

Michelle Taruffo jaacute apontava que o direito americano diante da inefetividade dos meios executivos at law comeccedilou a autorizar o magistrado a tomar medidas executivas adequadas ao caso concreto Trata-se afirma o jurista italiano de aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo segundo o qual as regras processuais devem ser adaptadas agraves necessidades do direito material

Os meios executivos atiacutepicos derivam de trecircs enunciados normativos do Coacutedigo de

Processo Civil o art 139 IV o art 297 e o sect1ordm do art 536

O art 139 IV do CPC dispotildee que pertence ao juiz o poder-dever de ldquodeterminar

todas as medidas indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para

assegurar o cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto

prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo

Jaacute o art 297 do CPC cuida da tutela provisoacuteria e garante que ldquoo juiz poderaacute

determinar as medidas que considerar adequadas para a efetivaccedilatildeo da tutela provisoacuteriardquo

Podendo dessa forma a dita tutela ser efetivada atipicamente

Por fim o art 536 sect1ordm do CPC dispotildee que

Para atender ao disposto no caput o juiz poderaacute determinar entre outras medidas a imposiccedilatildeo de multa a busca e apreensatildeo a remoccedilatildeo de pessoas e coisas o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva podendo caso necessaacuterio requisitar o auxilio de forccedila policial

As supracitadas medidas executivas atiacutepicas satildeo entendidas pela doutrina como

claacuteusulas gerais processuais executivas56 Essas claacuteusulas gerais natildeo restringem a sua

aplicaccedilatildeo agraves teacutecnicas de coerccedilatildeo indireta satildeo autorizados tambeacutem o uso de meios de execuccedilatildeo

dieta e indireta

Ademais cumpre salientar que o art 139 IV CPC aplica-se a toda e qualquer

atividade executiva ldquoa) seja fundada em tiacutetulo executivo judicial (provisoacuteria ou definitiva)

55 DIDIER JR Fredie et al apud TARUFFO Michelle A atuaccedilatildeo executiva dos direitos perfis

comparatiacutesticos Revista de Processo Satildeo Paulo RT 1990 n 59 p 78 56 Segundo Fredie Didier et al claacuteusula geral eacute uma espeacutecie de texto normativo cujo antecedente

(hipoacutetese faacutetica) eacute composto por termos vagos e consequente (efeito juriacutedico) eacute indeterminado

25

seja fundada em tiacutetulo executivo extrajudicial b) seja para efetivar prestaccedilatildeo pecuniaacuteria seja

para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer ou dar coisa distinta de dinheirordquo57

Jaacute o art 297 do CPC garante que a tutela provisoacuteria possa ser efetivada tambeacutem

atipicamente ldquoSucede que a atipicidade da tutela provisoacuteria segue necessariamente a

atipicidade da tutela definitivardquo 58

Por fim o comando do sect 1 ordmdo art 536 se aplica

a) inicialmente agrave execuccedilatildeo de fazer e de natildeo fazer fundada em decisatildeo judicial (provisoacuteria ou definitiva) b) por forccedila do sect 3ordm do art 538 tambeacutem se aplica ao cumprimento de sentenccedila para entrega de coisa c) por forccedila do art 771 paraacutegrafo uacutenico o dispositivo tambeacutem se aplica agrave execuccedilatildeo para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer e entregar coisa distinta de dinheiro fundada em tiacutetulo extrajudicial

Claramente o art 139 IV eacute mais amplo do que o sect 1 ordm do art 536 estende-se por

disposiccedilatildeo expressa agrave execuccedilatildeo de pagar quantia Sendo uma grande novidade nas obrigaccedilotildees

que tem por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15

O art 139 IV do CPC apresentou uma novidade agrave atipicidade dos meios executivos

ao disciplinar que cabe ao juiz ldquodeterminar todas as medidas indutivas coercitivas

mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o cumprimento de ordem judicial

inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo

A inovaccedilatildeo estaacute na possibilidade de utilizar os meios atiacutepicos para assegurar o

cumprimento de decisotildees que versam sobre as obrigaccedilotildees pecuniaacuterias sendo admitida a

utilizaccedilatildeo de outros meios ateacute na execuccedilatildeo de titulo judicial de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria aleacutem da

multa de 10 (a que se refere o artigo 523 sect 1ordm do CPC) para forccedilar o devedor a cumprir a

obrigaccedilatildeo pecuniaacuteria

57 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 105 58 Ibid p 105

26

Dessa forma eacute possiacutevel afirmar que ldquoao lado da disciplina tiacutepica do art 523 e

seguintes () o novo CPC inova ao permitir que o sistema de teacutecnicas executivas atiacutepicas

sejam empregadas na execuccedilatildeo monetaacuteriardquo59 (ZARONI VITORELLI 2016 p 66)

Fernando da Fonseca Gajardoni60 denomina a dita medida como a ldquorevoluccedilatildeo

silenciosardquo da execuccedilatildeo por quantia certa posto que

() pelo fato de que a regra natildeo estar propriamente incrustrada nos capiacutetulo e livro atinentes ao cumprimento de sentenccedila e ao processo de execuccedilatildeo ndash o art 139 IV do Novo CPC parece trazer ao paiacutes algo bastante novo cuja aplicaccedilatildeo a depender do comportamento do Judiciaacuterio pode implicar em verdadeira revoluccedilatildeo (positiva ou negativa) na sistemaacutetica executiva ateacute entatildeo vigente

Claramente o dispositivo foi recebido com entusiasmo por parte da doutrina que

anteciparam em afirmar que o princiacutepio da atipicidade dos meios executivos no CPC2015

ldquo() assume a feiccedilatildeo de poder-dever geral conferido ao magistrado de determinar () todas

as medidas coercitivas sub-rogatoacuterias mandamentais e indutivas que entender necessaacuterias

para a tutela justa efetiva e em tempo razoaacutevelrdquo 61

Dessa forma lecionam Luiz Guilherme Marinoni Seacutergio Cruz Arenhart e Daniel

Mitidiero62 que

O juiz a partir do art 139 IV do CPC2015 natildeo estaacute mais adstrito apenas agrave sentenccedila condenatoacuteria ndash que fixa a obrigaccedilatildeo de pagar e daacute ensejo agrave abertura da execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo patrimonial ndash para a tutela de prestaccedilotildees pecuniaacuterias Pode impor essa prestaccedilatildeo por meio de ordem judicial acoplada ao aceno de emprego de medida de induccedilatildeo (coercitiva ou de pressatildeo positiva) ou de medida de sub-rogaccedilatildeo (MARINONI ARENHARDT MITIDIERO 2015 p 703)

Deste modo em razatildeo do art 139 IV do CPC tem-se entendido que o juiz nas

execuccedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria possui a faculdade de adotar qualquer

59 ZARONI Bruno Marzullo VITORELLI Edilson Reforma e efetividade da execuccedilatildeo no novo CPC

In PEIXOTO Ravi FREIRE Alexandre MENDES Aluiacutesio Gonccedilalves de Castro Execuccedilatildeo 2 ed rev e atual Salvador JusPodivm 2016 766 p (Coleccedilatildeo novo CPC doutrina selecionada v 5) p 66

60 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia 24082015 JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Acesso em 23082018

61 LIMA Rafael de Oliveira A atipicidade dos meios executivos no coacutedigo de processo civil brasileiro de 2015 Revista de Processo Jurisdiccedilatildeo e Efetividade da Justiccedila v 2 n 2 juldez 2016 p 11

62 MARINONI Luiz Guilherme ARENHART Seacutergio Cruz MITIDIERO Daniel Novo curso de processo civil tutela dos direitos mediante procedimento comum Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 v 2 p 703

27

medida indutiva coercitiva mandamentais ou sub-rogatoacuterias para efetivar o creacutedito do

exequente natildeo se limitando as medidas tiacutepicas

Alguns doutrinadores se precipitaram ao afirmar que o dito dispositivo ldquo() autoriza o

juiz a utilizar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir ressalvando-se a prisatildeo

civil constitucionalmente limitada ao devedor de alimentosrdquo 63 Acreditam Jorge Bheron

Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa que o entusiasmo por parte da

doutrina abre margem para as mais variadas formas de compelir o devedor a cumprir com a

prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

ldquoE aiacute persistindo no mau vezo de fazer explicaccedilotildees em abstrato ignorando que o sentindo soacute se daacute na aplicaccedilatildeo (situaccedilatildeo concreta real ou fictiacutecia) as sugestatildeo satildeo as mais engenhosas suspensatildeo de CNH retenccedilatildeo de passaporte restriccedilatildeo de fim de semana cancelamento de cartotildees de creacutedito ndash para ficar apenas nestasrdquo 64

Ou seja podendo o juiz natildeo apenas substituir o devedor tomando seu patrimocircnio para

entregar ao credor na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia como tambeacutem poderaacute

pressionaacute-lo psicologicamente a adimplir por conta proacutepria a obrigaccedilatildeo

Ademais o Enunciado nordm 48 do ENFAM avalia expressamente a possibilidade de

imposiccedilatildeo de medidas coercitivas para a efetivaccedilatildeo da execuccedilatildeo pecuniaacuteria Conforme o dito

enunciado

ldquoO art 139 inciso IV traduz um poder geral de efetivaccedilatildeo permitindo a aplicaccedilatildeo de medidas atiacutepicas para garantir o cumprimento de qualquer ordem judicial inclusive no acircmbito do cumprimento de sentenccedila e no processo de execuccedilatildeo baseado em tiacutetulosrdquo

Dessa forma o artigo 139 IV do CPC permite uma gama ampla de interpretaccedilotildees por

parte da doutrina por ser uma claacuteusula geral encontrando limite apenas na imaginaccedilatildeo de

quem o analisa Nesse sentido eacute forccediloso orientar e delimitar o manejo desse artigo legal para

que se extraia seu sentido e alcance revelando assim sobre que situaccedilotildees ele incide de que

modo e o que permite

63 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

64 Ibid sem paginaccedilatildeo

28

32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER

GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO

O artigo 139 IV com a vigecircncia do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 abriu margem

para uma constelaccedilatildeo de decisotildees nas quais o dito dispositivo recebeu diversas interpretaccedilotildees

pelos operadores do direito

Sem duacutevidas por ser uma das pioneiras a decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara

Ciacutevel do Foro Regional de Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-

1320138260011 na data de 25 de agosto de 2016 gerou um enorme rebuliccedilo

Nessa accedilatildeo que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto

uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a

suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o

passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito

Segundo a magistrada o processo tramitava haacute anos sem que nenhum valor tenha sido

pago ao exequente aleacutem do devedor natildeo ter oferecido proposta de acordo e nem ter indicado

bens agrave penhora configurando uma completa desiacutedia com o processo

ldquoO caso tratado nos autos se insere dentre as hipoacuteteses em que eacute cabiacutevel a aplicaccedilatildeo do art 139 inciso IV do Coacutedigo de Processo Civil Isso porque o processo tramita desde 2013 sem que qualquer valor tenha sido pago ao exequente Todas as medidas executivas cabiacuteveis foram tomadas sendo que o executado natildeo paga a diacutevida natildeo indica bens agrave penhora natildeo faz proposta de acordo e sequer cumpre de forma adequada as ordens judiciais frustrando a execuccedilatildeo

Se o executado natildeo tem como solver a presente diacutevida tambeacutem natildeo recursos para viagens internacionais ou para manter um veiacuteculo ou mesmo manter um cartatildeo de creacutedito Se poreacutem mantiver tais atividades poderaacute quitar a diacutevida razatildeo pela qual a medida coercitiva poderaacute se mostrar efetiva

Assim como medida coercitiva objetivando a efetivaccedilatildeo da presente execuccedilatildeo defiro o pedido formulado pelo exequente e suspendo a Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo do executado M A S determinando ainda a apreensatildeo de seu passaporte ateacute o pagamento da presente diacutevida

()

Determino ainda o cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado ateacute o pagamento da presente diacutevida ()rdquo

Foi impetrado Habeas Corpus no Tribunal de Justiccedila do Estado de Satildeo Paulo a favor

do executado sob o fundamento que a coaccedilatildeo era ilegal e afetava o direito de locomoccedilatildeo

29

garantido constitucionalmente Tendo sido concedida a liminar em decisatildeo que ora se

reproduz

Em que pese a nova sistemaacutetica trazida pelo art 139 IV do CPC2015 deve-se considerar que a base estrutural do ordenamento juriacutedico eacute a Constituiccedilatildeo Federal que em seu art 5ordm XV consagra o direito de ir e vir Ademais o art 8ordm do CPC2015 tambeacutem preceitua que ao aplicar o ordenamento juriacutedico o juiz natildeo atentaraacute apenas para a eficiecircncia do processo mas tambeacutem aos fins sociais e agraves exigecircncias do bem comum devendo ainda resguardar e promover a dignidade da pessoa humana observando a proporcionalidade a razoabilidade e a legalidade Por tais motivos concedo a liminar pleiteada65

Cabe destacar aqui o voto vencido da Desembargadora Maria Luacutecia Pizzotti no

julgamento do Habeas Corpus supracitado demonstrando que o debate sobre a abrangecircncia

do artigo 139 IV do CPC ocorre tanto na doutrina quanto no judiciaacuterio

O objetivo do novel dispositivo natildeo eacute impor penas ou restringir direitos natildeo sendo intenccedilatildeo do Judiciaacuterio suspender indefinidamente o direito de dirigir do executado ou sua liberdade de viajar mas sim impor uma restriccedilatildeo tatildeo gravosa caso ele natildeo cumpra a determinaccedilatildeo que escolha cumprir sua obrigaccedilatildeo e dar fim ao problema Em outras palavras mediante as medidas de coerccedilatildeo o Estado procura persuadir o inadimplente impondo-lhe situaccedilotildees tatildeo onerosas e inconvenientes que em algum momento seja para ele mais vantajoso cumprir do que permanecer no inadimplemento

Ao fazecirc-lo o Novo Coacutedigo de Processo Civil rompe com as criacuteticas da ineficiecircncia das execuccedilotildees Natildeo se cogita deferir medidas restritivas agravequeles que demonstram a incapacidade absoluta de solver o deacutebito apenas agravequeles que reconhecidamente se valem de artimanhas e subterfuacutegios para evitar a satisfaccedilatildeo das diacutevidas ldquopreferindordquo outras despesas mais lsquonobresrsquo agindo em nome de terceiros e fazendo escaacuternio dos credores e do proacuteprio Poder Judiciaacuterio (hellip)

Para tanto memoraacutevel a noccedilatildeo de que a medida em comento tem caraacuteter excepcional e encontra limites no plano da proporcionalidade como sustenta o ilustrado Magistrado paulista Fernando da Fonseca Gajardoni Professor Faculdade de Direito de Ribeiratildeo Preto da USP (in httpswwwjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 acesso em 091216 agraves 11h20min) E para anaacutelise da proporcionalidade a ponderaccedilatildeo deve observar os trecircs passos apontados pela doutrina a necessidade a adequaccedilatildeo e a proporcionalidade em sentido estrito

65 TJSP - Habeas Corpus Processo nordm 2183713-8520168260000 30ordf Cacircmara Direito Privado relator

Des Marcos Ramos j 290317

30

Ademais no entendimento de Jorge Amaury Maia Nunes e Guilherme Pupe de

Noacutebrega66 essa decisatildeo releva os perigos trazidos pelo art 139 IV do CPC ao confrontar

direitos constitucionalmente garantidos

De nossa parte entendemos que a liberdade de locomoccedilatildeo inserta no inciso XV do artigo 5ordm que abrange o direito de deixar o territoacuterio nacional sofre embaraccedilo indevido pela apreensatildeo de passaporte ou pela suspensatildeo da carteira nacional de habilitaccedilatildeo

()

Agrave luz da exposiccedilatildeo feita acima e em anaacutelise primeva sustentamos que o artigo 139 IV do CPC de 2015 estaacute a merecer declaraccedilatildeo de inconstitucionalidade sem reduccedilatildeo de texto para o fim de rechaccedilar a apreensatildeo de passaporte a suspensatildeo do direito de dirigir e a vedaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo em concurso ou em licitaccedilatildeo puacuteblicos como medidas passiacuteveis de serem adotadas pelo juiz sob pena de vulneraccedilatildeo aos artigos 1ordm IV 5ordm XV e LIV 37 I 173 sect 3ordm III e 175 todos da Constituiccedilatildeo

Apesar de ter sofrido duras criacuteticas a decisatildeo do processo de nordm 4001386-

1320138260011 serviu de inspiraccedilatildeo para tantas outras decisotildees no mesmo sentido

Foi o caso da decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de Satildeo

Vicente em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 0020724-2620088260590 na data de 21 de

junho de 2017

A supracitada execuccedilatildeo se arrastava por nove (09) anos sem que o devedor tenha

esboccedilado qualquer intenccedilatildeo de pagar a diacutevida O credor requereu a suspensatildeo da Carteira

Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado apreensatildeo do passaporte e cancelamento dos

cartotildees de creacutedito

O magistrado com embasamento no artigo 139 IV do CPC deferiu parcialmente o

pedido sob o fundamento de que a apreensatildeo de passaporte e CNH natildeo viola o direito de ir e

vir do devedor Entretanto o juiz indeferiu o pedido de cancelamento do cartatildeo de creacutedito por

acreditar que a suspensatildeo poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado tendo em

vista que atualmente as pessoas utilizam o referido cartatildeo para pagamento das despesas

diaacuterias

66 NOBREacuteGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139

IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018

31

Eacute evidente que as medidas atiacutepicas de coerccedilatildeo devem ser utilizadas com cautela sempre respeitando a dignidade da pessoa do executado Natildeo se vislumbra contudo que as medidas aqui eleitas sejam capazes de vulnerar os Direitos Fundamentais do indiviacuteduo A uma porque natildeo se trata de restriccedilatildeo ao direito de ir e vir do executado que continua no gozo de plena liberdade de locomoccedilatildeo a duas porque a conduccedilatildeo de veiacuteculo automotor eacute mera comodidade da vida moderna natildeo se tratando de direito absoluto

Com mais razatildeo ainda se admite a suspensatildeo do Passaporte do executado que se natildeo paga a diacutevida da execuccedilatildeo natildeo deve ter o direito de fazer viagem internacional

Tem-se aqui verdadeiro exerciacutecio de ponderaccedilatildeo de interesses juriacutedicos de um lado jaz o direito de creacutedito do exequente que deriva do direito de propriedade e por isso mesmo tem envergadura constitucional de outro giro tem-se o direito do executado agrave autorizaccedilatildeo do Estado para conduzir veiacuteculo automotor e realizar viagens internacionais que natildeo se mostram essenciais agrave dignidade da pessoa humana Natildeo haacute duacutevidas pois de que eacute este uacuteltimo que deve sucumbir

O pedido fica indeferido apenas no tocante agrave suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado Eacute que ao contraacuterio da CNH e do passaporte que trazem consigo certa presunccedilatildeo de riqueza natildeo se pode concluir que o uso de cartatildeo de creacutedito eacute feito por luxo ou simples conveniecircncia

Como eacute cediccedilo os cartotildees de creacutedito oferecem ao seu titular creacutedito raacutepido e rotativo para o pagamento de despesas diaacuterias e certamente exercem funccedilatildeo essencial agravequeles que se encontram em situaccedilatildeo financeira precaacuteria

A suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado portanto se revela medida desproporcional e que inclusive poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado

Pelo exposto defiro em parte o pedido formulado pelo exequente e DETERMINO a suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo e bem como a suspensatildeo da validade (cancelamento temporaacuterio) no sistema SINPA de eventuais passaportes vaacutelidos em nome do executado

Dessa forma o artigo 139 IV do CPC revolucionou completamente a execuccedilatildeo de

obrigaccedilatildeo de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria ao permitir a utilizaccedilatildeo do uso dos meios executivos

atiacutepicos para compelir o executado a satisfazer o creacutedito do exequente

33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE

EFETIVACcedilAtildeO

Era inevitaacutevel que o artigo 139 IV do CPC gerasse todo tipo de reaccedilatildeo entre os

doutrinadores do processo civil e ateacute mesmo de outros ramos do direito devido a sua

capacidade de realizar uma completa inovaccedilatildeo na forma de se executar as obrigaccedilotildees de pagar

quantia Alguns o aplaudiram visualizando nele ldquouma luz no fim do tuacutenelrdquo outros o

criticaram vislumbrando as arbitrariedades que poderiam ser praticadas com embasamento no

referido dispositivo

32

As decisotildees suscitadas em linhas preteacuteritas auxiliaram para fervilhar ainda mais o

debate sobre o tema tendo em vista que por um lado poderia aumentar a efetividade das

execuccedilotildees por quantia no entanto por outro surgiam questionamentos a cerca da sua

constitucionalidade

A doutrina parece que demoraraacute a se pacificar sobre o tema Segundo alguns

doutrinadores seraacute inconstitucional toda restriccedilatildeo que recaia sobre a pessoa do devedor e natildeo

exclusivamente sobre o seu patrimocircnio Jaacute para outros o dispositivo eacute constitucional e o meio

mais eficaz para se resolver o problema da efetivaccedilatildeo das execuccedilotildees de pagar quantia ldquoA

discussatildeo se daacute especialmente no que diz respeito aacutes medidas de suspensatildeo de CNH

apreensatildeo de passaporte e bloqueio de cartotildees de creacutedito do devedorrdquo 67

O professor Thiago Rodovalho analisou detalhadamente a decisatildeo de nordm 4001386-

1320138260011 em seu artigo ldquoO necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na

concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivosrdquo 68 Quanto agrave suspensatildeo da CNH o autor

acredita que tal medida natildeo viola qualquer direito fundamental do devedor posto que ldquodirigir

veiacuteculos automotores eacute direito do cidadatildeo mas natildeo se confunde com os direitos fundamentais

e social de ir-e-vir e ao transporterdquo 69 O professor eacute categoacuterico ao afirmar que

Com relaccedilatildeo agrave suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (suspensatildeo do direito de dirigir restriccedilatildeo de direitos) natildeo nos parece haver qualquer violaccedilatildeo a direito fundamental ou social nem a direito da personalidade ou colocaccedilatildeo do devedor em situaccedilatildeo desproporcionalmente detrimentosa exceccedilatildeo feita aos que usam o veiacuteculo como instrumento de trabalho atraindo a hipoacutetese do NCPC art 833 inc V

()

Outrossim natildeo o consideramos como direito da personalidade Os direitos da personalidade satildeo os valores fundamentais que compotildeem o proacuteprio ser justamente por isso intransmissiacuteveis e irrenunciaacuteveis natildeo podendo o seu exerciacutecio sofrer limitaccedilatildeo voluntaacuteria (CC art 11) Por mais que vivamos num paiacutes que tanto valoriza o carro e que muitas pessoas de fato se compreendam em razatildeo e em funccedilatildeo do carro que dirijam este natildeo nos parece ser um direito que verdadeiramente componha a personalidade do indiviacuteduo70

67 DONTOS Sofia Poderes executoacuterios do juiz que diz a doutrina sobre o art 139 inc IV do CPC

Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigospoderes-executorios-do-juiz-que-diz-a-doutrina-sobre-art-139-inc-iv-do-cpc-23052018 gt Publicado em 23052018 Acesso em 01082018

68 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018

69 Ibid sem paginaccedilatildeo 70 Ibid sem paginaccedilatildeo

33

Quanto ao cancelamento dos cartotildees de credito do devedor o professor Thiago

Rodovalho tambeacutem acredita que natildeo haacute qualquer violaccedilatildeo ao direito fundamental social ou

da personalidade do devedor e acrescenta que

Tanto assim o eacute que ser titular de um cartatildeo de creacutedito pressupotildee ter creacutedito o que eacute analisado e concedido por instituiccedilotildees financeiras mais do que isso se porventura passando por dificuldades financeiras a pessoa deixa de honrar com pagamentos a mesma instituiccedilatildeo financeira concedente do cartatildeo de creacutedito pode sponte propria cancelaacute-lo ou recusar-lhe a concessatildeo Ora parece-me contraditoacuterio que instituiccedilotildees financeiras para sua proteccedilatildeo patrimonial possam ferir esse suposto ldquodireito fundamentalrdquo ou esse suposto ldquodireito da personalidaderdquo mas natildeo possa o Poder Judiciaacuterio igualmente fazecirc-lo contra aquele devedor moroso que instado ao pagamento e frustradas todas as tentativas de constriccedilatildeo patrimonial leva vida luxuosa valendo-se de cartotildees de creacutedito que prescindem de dinheiro em conta eacute dizer podem justamente funcionar como forma de ocultar renda e patrimocircnio71

O autor considera a apreensatildeo de passaporte um tema mais polecircmico e que merece

maior reflexatildeo No entanto crecirc que eacute possiacutevel a apreensatildeo de passaporte sem violar os

direitos fundamentais do devedor por se tratar de um direito de ir e vir de amplitude especial

Agrave primeira vista a possibilidade de apreensatildeo do passaporte tambeacutem nos parece possiacutevel pois tambeacutem se trata de um direito de ir e vir de amplitude especial Assim o eacute pois salvo situaccedilotildees especiais (refugiados p ex) haacute a necessidade de demonstrar condiccedilotildees financeiras de estadia e retorno para ser admitido no paiacutes de destino Ou seja pressupotildee uma condiccedilatildeo financeira que o devedor justamente diz natildeo possuir Sem embargo dessa consideraccedilatildeo esse ainda eacute um ponto que merece uma reflexatildeo mais acurada sendo essa apenas uma primeira impressatildeo72

Outros autores escreveram sobre o tema como eacute o caso do processualista Luiz

Dellore73 que tambeacutem defende que as medidas atiacutepicas como restriccedilatildeo ao direito de dirigir

apreensatildeo de passaporte e cancelamento de cartotildees de creacutedito satildeo permitidas e natildeo violam em

regra os direitos fundamentais do devedor

De minha parte creio que efetivamente haacute inovaccedilatildeo no at 139 IV do NCPC (e natildeo mera repeticcedilatildeo do que jaacute havia no Coacutedigo anterior) que tem o condatildeo de trazer mais efetividade ao processo executivo no Brasil ndash que por deacutecadas centrou sua atenccedilatildeo na defesa do executado (vide a grande quantidade de impenhorabilidades) sem dar maior atenccedilatildeo ao creacutedito do exequente

71 Ibid sem paginaccedilatildeo 72 Ibid sem paginaccedilatildeo 73 DELLORE Luiz NCPC Atipicidade das medidas executivas jaacute eacute realidade Disponiacutevel em lt

httpswwwjotainfoopiniao-e-analisecolunasnovo-cpcncpc-atipicidade-de-medidas-executivas-ja-e-realidade-17042017 gt Publicado em 17042017 Acesso em 03092018

34

Logo a meu ver medidas como (i) restriccedilatildeo ao direito de dirigir (ii) apreensatildeo de passaporte (iii) cancelamento de cartotildees de creacutedito e (iv) vedaccedilatildeo de obtenccedilatildeo de novos empreacutestimos se natildeo vinculados ao pagamento do deacutebito exequendo dentre outras restriccedilotildees que deveratildeo ser observadas a cada caso satildeo permitidas pelo sistema do NCPC e em regra natildeo violam direitos fundamentais do devedor E tecircm o condatildeo de fazer com que o executado que tem recursos diante dessas medidas coercitivas pague o deacutebito trazendo sucesso agrave satisfaccedilatildeo do creacutedito

Nessa linha para Alexandre Fuchs das Neves74 o artigo 139 IV do CPC conferiu ao

juiz poderes coercitivos capazes de ldquotransformar a vida do devedor um infernordquo para compeli-

lo a cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria Entretanto pondera que para que a medida tenha

validade ldquoeacute necessaacuteria uma fundamentaccedilatildeo por evidente uma correlaccedilatildeo temaacutetica entre a

medida adotada e sua efetividade em face ao processo com fundamentaccedilatildeo detalhadardquo

No entendimento de Fernando Gajardoni75 satildeo possiacuteveis as medidas de apreensatildeo de

passaporte bloqueio de cartotildees de creacutedito e suspensatildeo da CNH Para ele o que limita o art

139 IV do CPC eacute o esgotamento dos meios tiacutepicos e a real necessidade da medida

Ilustrativamente natildeo efetuado o pagamento de diacutevida oriunda de multas de tracircnsito e superados os expedientes tradicionais de adimplemento (penhora de dinheiro e bens) seria liacutecito o estabelecimento da medida coercitivaindutiva de suspensatildeo do direito a conduzir veiacuteculo automotor ateacute pagamento do deacutebito (inclusive com apreensatildeo da CNH do devedor) natildeo efetuado pagamento de verbas salariais devidas a funcionaacuterios da empresa possiacutevel o estabelecimento de vedaccedilatildeo agrave contrataccedilatildeo de novos funcionaacuterios ateacute que seja saldada a diacutevida natildeo efetuado o pagamento de financiamento bancaacuterio na forma e no prazo avenccedilados possiacutevel ateacute que se tenha a quitaccedilatildeo que se obstem novos financiamentos ou mesmo a participaccedilatildeo do devedor em licitaccedilotildees (como de ordinaacuterio jaacute acontece com pessoas juriacutedicas em deacutebito tributaacuterio com o Poder Puacuteblico) etc

Teriacuteamos entatildeo no Brasil por assim dizer a adoccedilatildeo do padratildeo da atipicidade das medidas executivas tambeacutem para as obrigaccedilotildees de pagar vistas estas como ordens do EstadoJuiz para que haja prestaccedilatildeo de pagamento em pecuacutenia

()

Por isso ndash a prevalecer a interpretaccedilatildeo potencializada do art 139 IV do CPC2015 ndash o emprego de tais medidas coercitivasindutivas especialmente nas obrigaccedilotildees de pagar encontraraacute limite certo na excepcionalidade da medida (esgotamento dos meios tradicionais de satisfaccedilatildeo do deacutebito) na proporcionalidade (inclusive agrave luz da regra da menor onerosidade ao devedor do art 805 do CPC2015) na necessidade de fundamentaccedilatildeo substancial e especialmente nos direitos e garantias assegurados na Constituiccedilatildeo Federal (vg natildeo parece possiacutevel que se determine o pagamento sob pena de prisatildeo ou de vedaccedilatildeo ao exerciacutecio da profissatildeo do direito de ir e vir etc)

74 NEVES Alexandre Fuchs das Cancelamento de cartotildees de creacutedito e apreensatildeo de CNH e passaporte

do devedor Isso eacute possiacutevel Disponiacutevel em lt httpwwwsinfacspcombrconteudocancelamento-de-cartoes-de-credito-e-apreensao-de-cnh-e-passaporte-do-devedor-isso-e-possivel gt Acesso em 30082018

75 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Publicado em 24082015 Acesso em 30082018

35

Jaacute Fernanda Tartuce76 acredita que tais medidas satildeo problemaacuteticas e devem ser

analisadas com cautela tendo em vista que ao inveacutes de afetarem o patrimocircnio do devedor

atingem a proacutepria pessoa

Sob certo prisma adotar medidas diferenciadas contribui para a efetividade da prestaccedilatildeo jurisdicional Por outro lado o patrimocircnio ndash e natildeo a pessoa do devedor - responde por diacutevidas aleacutem disso o exerciacutecio de amplos poderes pelo juiz sem balizas especiacuteficas pode ensejar medidas inadequadas Nessa linha suspender o direito de dirigir e restringir o uso de passaporte satildeo iniciativas problemaacuteticas por atingirem a pessoa do devedor enquanto a penhora da restituiccedilatildeo de Imposto de Renda soa viaacutevel por afetar seu patrimocircnio Eacute importante que a medida diferenciada se revele proporcional e seja aplicada apoacutes o exaurimento de outros meios previstos no ordenamento Como a proposta do Novo Coacutedigo eacute aumentar a eficiecircncia processual intentar medidas ineficazes inexequiacuteveis eou de difiacutecil fiscalizaccedilatildeo pode acabar ensejando o efeito contraacuterio

Nessa senda Lenio Streck e Dierle Nunes77 entendem que as medidas atiacutepicas de

suspensatildeo da CNH eou apreensatildeo de passaporte satildeo inconstitucionais Afirmam que natildeo se

pode confundir o processo civil e penal ainda que ambos remetam a um ldquoparadigma

constitucional comumrdquo e que o artigo 139 IV do CPC ldquoimpotildee novos desafios interpretativos

que podem conduzir a uma anaacutelise superficial e utilitarista de busca de resultados que

desprezem a necessaacuteria leitura constitucionalrdquo Os autores ainda ponderam que ldquoO perigo eacute o

artigo 139 IV ser transformado em instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com

autorizaccedilatildeo judicialrdquo

O professor Araken de Assis no dia 18 de abril de 2018 em um evento sobre o

Coacutedigo Processual Civil de 2015 que ocorreu em Brasiacutelia na sede do Conselho Federal da

OAB declarou ser contraacuterio aos poderes executoacuterios atiacutepicos ldquoSou contra os poderes

atiacutepicos dos juiacutezes porque seu exerciacutecio redunda em simples arbitrariedadesrdquo78

Acrescentou ainda que

76 IBDFAM ndash Instituto Brasileiro de Famiacutelia O polecircmico inciso IV do artigo 139 do CPC e suas difusas

interpretaccedilotildees Disponiacutevel em lt httpwwwibdfamorgbrnoticias6096O+polC3AAmico+inciso+IV+do+artigo+139+do+CPC+e+suas+difusas+interpretaC3A7C3B5es gt Publicado em 31082016 Acesso em 04092018

77 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018

78 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04092018

36

Eacute evidentemente inconstitucional diante do princiacutepio da dignidade da pessoa humana tirar o passaporte carteira de habilitaccedilatildeo Quecirc que tem isso com diacutevidas Natildeo tem absolutamente nada Natildeo eacute a correlaccedilatildeo instrumental entre o objetivo da execuccedilatildeo e o meio empregado Isso eacute simples vinganccedila simples puniccedilatildeo79

O professor Araken de Assis acredita que tais medidas satildeo inconstitucionais e

violam o principio da dignidade humana do executado numa sociedade como a nossa

sedenta por puniccedilatildeo natildeo me surpreende que essas ideias sejam encaradas com

naturalidade Mas eacute preciso rejeitaacute-las em nome de princiacutepios 80

34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO

A Constituiccedilatildeo Federal de 1988 tem como um dos seus fundamentos a dignidade da

pessoa humana presente no artigo 1ordm inciso III do referido texto constitucional O dito

princiacutepio tem o escopo de nortear o ordenamento juriacutedico como um todo

A inclusatildeo da dignidade da pessoa humana como princiacutepio constitucional obrigou

uma reflexatildeo sobre o papel da pessoa humana no direito e um redimensionamento para

elevaacute-la ao centro do ordenamento juriacutedico81 Eacute necessaacuterio recorrer agrave teoria Kantiana para

que se obtenha uma definiccedilatildeo do princiacutepio ora estudado Para Kant82 o homem eacute um fim

em si mesmo natildeo uma funccedilatildeo do Estado Ou Naccedilatildeo O Estado e o direito devem estar

organizados em benefiacutecio do indiviacuteduo

Agora eu afirmo o homem ndash e de uma maneira geral todo o ser racional ndash existe como fim em si mesmo e natildeo apenas como meio para o uso arbitraacuterio desta ou daquela vontade Em todas as suas accedilotildees pelo contraacuterio tanto nas direcionadas a ele mesmo como nas que o satildeo a outros seres racionais deve ser ele sempre considerado simultaneamente como fim

Partindo da premissa de que para Immanuel Kant o homem eacute o fim em si mesmo

ldquodevemos compreender que a dignidade da pessoa humana eacute a noccedilatildeo o comando a direccedilatildeo

que se deve seguir funcionando como fundamento para a interpretaccedilatildeo de todos os direitos e

garantias conferidos agrave pessoa nos ordenamentos juriacutedicos de cada Estadordquo 83

79 Ibid sem paginaccedilatildeo 80 Ibid sem paginaccedilatildeo 81 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito

fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 461 82 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud KANT Immanuel Fundamentaccedilatildeo da metafiacutesica dos costumes

Satildeo Paulo Martin Claret 2003 p56-59 Coleccedilatildeo A Obra-Prima de Cada Autor 83 SCHIAFIANO Juliana Rocha op cit p 461

37

O princiacutepio constitucional da dignidade da pessoa humana estaacute diretamente ligado ao

conteuacutedo dos direitos fundamentais logo para que se cumpra com os direitos fundamentais

constitucionalmente instituiacutedos eacute necessaacuterio reconhecer e respeitar a dignidade da pessoa

humana conforme disciplina Ingo Sarlet84

Em suma o que se pretende sustentar de modo mais enfaacutetico eacute que a dignidade da pessoa humana na condiccedilatildeo de valor (principio normativo) fundamental que atrai o conteuacutedo de todos os direitos fundamentais exige e pressupotildee o reconhecimento e proteccedilatildeo dos direitos fundamentais de todas as dimensotildees (ou geraccedilotildees se assim preferirmos) Assim sem que se reconheccedilam agrave pessoa humana os direitos fundamentais que lhe satildeo inerentes em verdade estarse-aacute lhe negando a proacutepria dignidade A consagraccedilatildeo constitucional da dignidade da pessoa humana tem o propoacutesito de limitar a atuaccedilatildeo ou a omissatildeo do Estado para garantir os direitos do indiviacuteduo Assim eacute difiacutecil precisar os efeitos da norma que determina a dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado (como acontece com a Constituiccedilatildeo brasileira de 1988) poreacutem quando desrespeitados os direitos fundamentais do cidadatildeo eacute possiacutevel identificar que a dignidade deste foi violada

Logo ldquoteraacute respeitada a sua dignidade o individuo que tiver respeitados os seus

direitos fundamentaisrdquo 85 Os direitos fundamentais estatildeo apresentados na Constituiccedilatildeo

Federal da seguinte forma direitos individuais e coletivos direitos sociais direitos poliacuteticos e

direitos de nacionalidade que tecircm como escopo garantir as liberdades positivas aos

indiviacuteduos ldquoonde foram conquistados direitos agrave liberdade religiosa liberdade civil e

profissional agrave propriedade ao livre acesso ao Judiciaacuterio agrave ampla defesa e ao contraditoacuterio no

processual judicial ao sigilo de dados e informaccedilotildees pessoais entre outros que somados

garantem o cidadatildeo uma vida dignardquo 86

O cidadatildeo na Constituiccedilatildeo Federal de 88 diferente das constituiccedilotildees brasileiras

anteriores passou a ser fundamento e ganhou destaque nos direitos fundamentais tendo

garantida a sua vida a sua dignidade a sua seguranccedila a sua honra a sua liberdade e a sua

propriedade

84 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud SARLET Ingo Wolfgang Dignidade da pessoa humana e

direitos fundamentais na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 2ed Porto Alegre Livraria do Advogado 2002 p87 85 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito

fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 462 86 Ibid p 462

38

Segundo Carmem Luacutecia Antunes Rocha87 para garantir o Estado Democraacutetico de

Direito eacute necessaacuterio que a sua atuaccedilatildeo seja sempre em conformidade com o princiacutepio da

dignidade da pessoa humana

O Estado somente eacute democraacutetico em sua concepccedilatildeo constitucionalizaccedilatildeo e atuaccedilatildeo quando respeita o princiacutepio da dignidade da pessoa humana Natildeo haacute verbo constitucional natildeo haacute verbo governamental que se faccedilam legiacutetimos quando natildeo se voltam ao atendimento daquele princiacutepio Natildeo haacute verdade constitucional natildeo haacute suporte institucional para as poliacuteticas puacuteblicas que natildeo sejam destinadas ao pleno cumprimento daquele valor maior transformado em princiacutepio constitucional

O princiacutepio da dignidade humana constitucionalmente garantido impotildee limites ao

Estado compelindo aos oacutergatildeos e atividades estatais respeitar o ser humano e garanti-lo

condiccedilotildees miacutenimas para uma vida digna Dessa forma eacute niacutetido que o dito princiacutepio eacute

pressuposto e indispensaacutevel para legitimar outras normas constitucionais e

principalmente infraconstitucionais

O Coacutedigo de Processo Civil eacute umas das principais normas infraconstitucionais que

sofre influecircncia dos preceitos valores e princiacutepios esculpidos na Constituiccedilatildeo Federal

Logo como o principio da dignidade humana eacute um dos mais importantes pressupostos

constitucionais ldquoentatildeo eacute tranquilo afirmar-se que o novel ordenamento processual tem

de se render nas resoluccedilotildees dos aspectos processuais e a fim de se atingir uma soluccedilatildeo

justa adequada e efetiva ao postulado da dignidade da pessoa humanardquo 88

Dessa forma o legislador deve formular as normas infraconstitucionais de acordo e a

partir do conteuacutedo constitucional para Marinoni Mitidiero e Arenhart89

() o Coacutedigo de Processo Civil constitui direito constitucional aplicado O Coacutedigo deve ser interpretado de acordo com a Constituiccedilatildeo e com os direitos fundamentais o que significa que as duacutevidas interpretativas devem ser resolvidas a favor da otimizaccedilatildeo do alcance da Constituiccedilatildeo e do processo civil como meio para tutela de direitos

87 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud ROCHA Carmen Luacutecia Antunes O princiacutepio da dignidade da

pessoa humana e a exclusatildeo social Revista Interesse Puacuteblico n4 p23-48 1999 p33 88 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o

novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 367

89 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 14

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Com o escopo de conferir eficaacutecia aos mandamentos constitucionais o CPC15 traz a

previsatildeo e diversas claacuteusulas gerais em seus primeiros artigos em um dos quais se

prestigia o princiacutepio da dignidade da pessoa humana

O referido princiacutepio estaacute disciplinado no artigo 8ordm do CPC15 e atua como um guia

sobre as demais normas do coacutedigo processual Eacute o que entende Nelson Rosenvald90

O maior cuidado do inteacuterprete eacute no sentido de jamais banalizar a dignidade fazendo dela um elixir processual tal como muitas vezes se vecirc na esfera do direito civil Penso que natildeo haacute maiores dificuldades em transpor a noccedilatildeo constitucional do princiacutepio para em seguida adaptaacute-la agraves singularidades do processo

Logo de acordo com o artigo 8ordm do CPC o oacutergatildeo julgador ao aplicar o ordenamento

juriacutedico deve resguardar a dignidade da pessoa humana Para Fredie Didier91 ldquoresguardar

nesse contexto eacute de um lado aplicar corretamente a norma juriacutedica lsquoproteccedilatildeo da dignidade

da pessoa humanarsquo e de outro natildeo violar a dignidaderdquo

O oacutergatildeo julgador deveraacute manter um comportamento ativo com o objetivo de promover

a dignidade da pessoa humana podendo tomar medidas de ofiacutecio para efetivar a dignidade da

pessoa humana Didier assevera que o magistrado poderaacute ainda ldquovaler-se da claacuteusula geral de

atipicidade (art 536 sect 1ordm) para a execuccedilatildeo do direito fundamental agrave dignidaderdquo 92 O autor

ainda traz dois exemplos

a) exigecircncia de respeito agrave ordem cronoloacutegica de conclusatildeo (art 12) caso de grave violaccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana que natildeo se encaixe em um dos incisos que excepcionam a regra de observacircncia da cronologia da conclusatildeo poderia o juiz ldquofurar a filardquo para promover a dignidade da pessoa humana b) prioridade na tramitaccedilatildeo processual pessoa que seja portadora de doenccedila grave mas que natildeo esteja no rol do art 1048 I para promover a dignidade de pessoa humana o juiz poderia determinar o processamento prioritaacuterio93

Essa dupla garantia ndash resguardo e promoccedilatildeo ndash tem como objetivo garantir ao individuo

sua dignidade humana fazendo com que ldquode um lado que o Estado natildeo a viole e de outro

que o Estado a promova e efetiverdquo

90 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud ROSENVALD Nelson A

dignidade da pessoa humana no CPC15 91 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte

geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 75 92 Ibid p 75 93 Ibid p 75

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Nessa senda o magistrado deveraacute promover a dignidade da pessoa humana quando

perceber a ausecircncia desta no processo ou assegura-la quando for posta em risco Eacute nesse

sentido o entendimento dos professores Marinoni Mitidiero e Arenhart94

() a dignidade da pessoa humana determina a compreensatildeo do processo civil como um meio para tutela dos direitos Vale dizer o processo civil natildeo pode ser visto como um instrumento a serviccedilo do Estado como um instrumento que natildeo se encontre orientado agrave realizaccedilatildeo dos fins da pessoa humana Em outras palavras o processo civil serve para realizaccedilatildeo dos direitos e para orientaccedilatildeo das pessoas a respeito do significado do direito

Nessa senda compete tanto ao juiz quanto as demais partes processuais garantirem ldquoo

valor intriacutenseco de cada vida que eacute trazida ao processordquo nas palavras de Alexandre Freitas

Cacircmara95

() aos sujeitos do processo eacute preciso sempre ter claro que os titulares dos interesses em conflitos satildeo pessoas reais cujas vidas seratildeo afetadas pelo resultado do processo e que por isso mesmo tecircm o direito de estabelecer suas estrateacutegias processuais de acordo com aquilo que lhes pareccedila melhor para suas vidas Eacute inadmissiacutevel tratar as partes como se natildeo fossem pessoas reais meros dados estatiacutesticos Afinal se para o Judiciaacuterio cada processo pode parecer apenas mais um processo para as partes cada processo pode ser o uacutenico o mais relevante aquele em que sua vida seraacute decidida E eacute dever do juiz assegurar que isto seja respeitado

Dessa forma eacute necessaacuterio que um arcabouccedilo normativo para que seja conferida

eficaacutecia e proteccedilatildeo ao principio da dignidade da pessoa humana

Logo o dito princiacutepio deve ser protegido em todas as esferas do ordenamento juriacutedico

inclusive no campo da execuccedilatildeo civil onde sofre grandes riscos de ser violado em nome do

direito fundamental agrave tutela executiva do credor ldquoPartir da premissa de que existe um direito

fundamental agrave tutela executiva ora ratificado pelo CPC eacute indispensaacutevel para a soluccedilatildeo de

diversos problemas oriundos do procedimento executivo principalmente aqueles relacionados

agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo 96

94 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme

MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 25

95 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CAcircMARA Alexandre Freitas O Novo Processo Civil Brasileiro 2 ed Satildeo Paulo Atlas 2016 p 7

96 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66

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Eacute o caso por exemplo da impenhorabilidade Segundo Fredie Didier et al97 a

impenhorabilidade eacute uma forma de proteger certos bens do devedor do direito fundamental a

execuccedilatildeo do credor

Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa

Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais

O legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do CPC fazendo um

preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses em anaacutelise ao optar pela mitigaccedilatildeo do direito

do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado Afinal ldquoa execuccedilatildeo natildeo pode ser utilizada

como instrumento para causar a ruiacutena a fome e o desabrigo do devedor e sua famiacutelia gerando

situaccedilotildees incompatiacuteveis com a dignidade da pessoa humana 98

Logo a impenhorabilidade de certos bens

[] Eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa99

Eacute nesse sentido que o CPC15 enumera diversos casos de bens patrimoniais que satildeo

impenhoraacuteveis como o salaacuterio e vencimentos utensiacutelios necessaacuterios ao exerciacutecio da

profissatildeo seguro de vida vestuaacuterios e pertences de uso pessoal entre outros

Dessa forma as regras relativas agraves medidas executivas devem ser interpretadas agrave luz

da Constituiccedilatildeo Federal ldquovez que se voltam agrave realizaccedilatildeo de direitos fundamentais e em sua

97 Ibid p 66 98 THEODORO JUacuteNIOR Humberto Novo Coacutedigo de Processo Civil Anotado 20 ed Rio de Janeiro

Forense 2016 p 978 99 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud DIDIER JR Fredie CUNHA

Leonardo Carneiro da BRAGA Paula Sarno OLIVEIRA Rafael Alexandria de Curso de direito processual civil 3 ed Salvador JusPodivm 2011 v 5 p 547

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realizaccedilatildeo podem atingir direitos fundamentaisrdquo 100 O Superior Tribunal de Justiccedila jaacute decidiu

que

O rol das impenhorabilidades do ordenamento paacutetrio objetiva preservar o miacutenimo patrimonial necessaacuterio agrave existecircncia digna do executado impondo ao processo executoacuterio certos limites Assim a depender das peculiaridades do caso as regras de impenhorabilidade podem ser ampliadas de modo a adequar a tutela aos direitos fundamentais como por exemplo o direito agrave moradia agrave sauacutede ou agrave dignidade da pessoa humana Trata-se portanto da aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo e da necessidade sob o enfoque da proporcionalidade101 (STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014)

Logo a interpretaccedilatildeo dos dispositivos que tratam sobre a penhora no CPC deve estaacute

diretamente ligada aos ditames constitucionais devendo o interprete privilegiar a opccedilatildeo que

esteja mais em sintonia com a Carta Magna para que nem o credor e nem o devedor sejam

lesados

O artigo 833 do CPC elenca uma seacuterie de incisos que expotildeem os bens impenhoraacuteveis

O trecho inicial inciso I do art 833 define como impenhoraacuteveis os bens inalienaacuteveis Este

inciso segue a regra de que ldquose o bem natildeo pode ser alienado tambeacutem natildeo pode ser penhorado

porque a penhora eacute o primeiro ato do procedimento de alienaccedilatildeo judicial do bemrdquo 102

Satildeo exemplos de bens inalienaacuteveis os puacuteblicos cuja alienaccedilatildeo depende de autorizaccedilatildeo

legislativa Eacute inalienaacutevel tambeacutem o capital constituiacutedo para garantir indenizaccedilatildeo de ato iliacutecito

(art 533 sect 1 ordm CPC) que portanto eacute tambeacutem impenhoraacutevel ldquoTodo bem inalienaacutevel eacute

impenhoraacutevel embora nem todo bem impenhoraacutevel seja inalienaacutevelrdquo 103

O inciso I do art 833 CPC tambeacutem consagra a impenhorabilidade dos bens que por

ato voluntaacuterio satildeo excluiacutedos da execuccedilatildeo

Segundo Fredie Didier et al104

Eacute o que ocorre nos casos de bens doados ou alienados com claacuteusula de inalienabilidade que haacute de constar no registro imobiliaacuterio para ser eficaz perante o exequente e minimizar o risco de fraude A propoacutesito eis a redaccedilatildeo do art 1911 do Coacutedigo Civil lsquolsquoA claacuteusula de inalienabilidade imposta aos bens por ato de liberalidade implica impenhorabilidade e incomunicabilidaderdquo

100 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MEDINA Joseacute Miguel Garcia

Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 1 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 p 736 101 STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014 102 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 824 103 Ibid p 824 104 Ibid p 825

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O inciso II por sua vez estabelece que satildeo impenhoraacuteveis os bens moacuteveis os

pertences e as utilidades domeacutesticas da residecircncia do executado Todavia excepcionam-se os

bens dessa natureza que sejam de elevado valor ou que ultrapassem as necessidades comuns

correspondentes a um meacutedio padratildeo de vida

A jurisprudecircncia natildeo eacute paciacutefica sobre o assunto logo natildeo exista uma relaccedilatildeo de bens

que podem ser atingidos pela penhora Abrindo margem para as mais variadas decisotildees

O STJ jaacute considerou impenhoraacuteveis aparelho de televisatildeo a cores mesa de centro passadeira raacutedio toca-fitas gravador microondas ar-condicionado um freezer um microcomputador com acessoacuterios uma impressora etc Poderatildeo ser penhorados porque ultrapassam o padratildeo-meacutedio aparelhos de TV mais sofisticados o segundo aparelho de televisatildeo a segunda geladeira aparelhos de ar-condicionado que satildeo verdadeiras peccedilas de design moacuteveis antigos que se transformam em peccedilas de decoraccedilatildeo faqueiro de prata adega climatizada etc Em entendimento de caraacuteter ainda mais geneacuterico jaacute restou consignado em determinado precedente que a proteccedilatildeo natildeo abrangeria apenas os bens indispensaacuteveis agrave moradia mas tambeacutem aqueles usualmente encontrados em um lar105

Ademais o inciso III do art 833 do CPC traz a impenhorabilidade dos vestuaacuterios bem

como os pertences de uso pessoal do executado salvo se de elevado valor

Segundo Fredie Didier et al106 o dispositivo possui dois propoacutesitos

de um lado preservar a dignidade do executado com a proteccedilatildeo de bens moacuteveis importantes para a sua sobrevivecircncia digna como o vestuaacuterio aparelho celular reloacutegio e os bens relacionados agrave sua higiene pessoal de outro lado a regra visa prestigiar a boa-feacute processual impedindo a execuccedilatildeo mesquinha e abusiva com a penhora de bens de pequeno ou nenhum valor como um pente ou uma bota

O inciso IV do art 833 do CPC consagra uma das mais importantes modalidades a

impenhorabilidade relativa aos rendimentos de natureza alimentar ldquoTrata-se de regra que

possui o claro propoacutesito de proteger o executado garantindo-lhe o recebimento de valores que

servem ao pagamento das despesas relacionadas agrave sua sobrevivecircncia digna e agrave da sua famiacuteliardquo 107

Jaacute inciso V do art 833 do CPC torna impenhoraacuteveis os livros as maacutequinas as

ferramentas os utensiacutelios os instrumentos ou outros bens moacuteveis necessaacuterios ou uacuteteis ao

exerciacutecio de qualquer profissatildeo 105 Ibid p 826 106 Ibid p 827 107 Ibid p 828

44

Por forccedila do paraacutegrafo 3ordm do art 833 satildeo igualmente impenhoraacuteveis os equipamentos

implementos e maacutequinas agriacutecolas pertencentes agrave pessoa fiacutesica ou a empresa individual

produtora rural Rodrigo Mazzei e Sarah Merccedilon108 esclarecem que

Tem assento na noccedilatildeo de que a dignidade estende-se tambeacutem ao exerciacutecio da profissatildeo em si mesma e tambeacutem por representar a forma por excelecircncia de que dispotildee o executado para continuar a receber sua remuneraccedilatildeo e por conseguinte prover seu sustento e de sua famiacutelia Trata-se tambeacutem de aplicaccedilatildeo pontual da funccedilatildeo social da propriedade jaacute que protege os bens que permitem a circulaccedilatildeo de riquezas para a subsistecircncia do executado e se for o caso de sua famiacutelia

Forccediloso ressaltar ainda que a impenhorabilidade do inc V alcanccedila apenas os bens

moacuteveis de modo que eacute absolutamente possiacutevel que o imoacutevel em que o executado exerccedila sua

atividade profissional seja penhorado conforme a Suacutemula 451 do STJ ldquoEacute legiacutetima a penhora

da sede do estabelecimento comercialrdquo

O inciso VI do art 833 do CPC versa sobre a impenhorabilidade do seguro de vida

ldquoTrata-se de impenhorabilidade em favor do beneficiaacuterio do seguro e natildeo do segurado ateacute

porque o valor do seguro natildeo compotildee nem comporaacute o seu patrimocircnio (art794 do Coacutedigo

Civil1 ordm7)rdquo Dessa forma ldquoem uma execuccedilatildeo contra o segurado natildeo seraacute possiacutevel a penhora

do seguro de vida pois se trata de bem que natildeo lhe pertence nem mesmo em expectativardquo

De acordo com o inciso VII do art 833 do CPC satildeo impenhoraacuteveis os materiais

necessaacuterios para obras em andamento salvo se essas forem penhoradas Logo a obra pode

ser penhorada (art 862 do CPC) ldquoA regra como bem lembrou Araken de Assis lsquoestimula a

penhora da proacutepria obra inconclusa agrave qual os materiais acrescem e conseguintemente

valorizamrsquo 109

O art 833 VIII CPC julga impenhoraacutevel a pequena propriedade rural assim

definida em lei desde que trabalhada pela famiacutelia reproduzindo parte do art 5ordm XXVI CF

88116 que disciplina a impenhorabilidade do referido bem

A proteccedilatildeo do CPC eacute mais ampla do que a garantia prevista na Constituiccedilatildeo Federal

tendo em vista que a impenhorabilidade natildeo se restringe agraves execuccedilotildees de deacutebitos decorrentes

de sua atividade produtiva podendo ser alegada em toda e qualquer execuccedilatildeo ldquoAssim o 108 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CABRAL Antonio Passo

CRAMER Ronaldo (orgs) Comentaacuterios ao Novo Coacutedigo de Processo Civil Rio de Janeiro Forense 2015 p 1194

109 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 835

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imoacutevel natildeo pode ser penhorado na execuccedilatildeo de creacutedito rural concedido para estimular a

produccedilatildeo agriacutecola mas poderaacute ser penhorado na execuccedilatildeo do creacutedito concedido para a

aquisiccedilatildeo do imoacutevelrdquo 110

A nona modalidade de impenhorabilidade trata-se dos recursos puacuteblicos recebidos por

instituiccedilotildees privadas para aplicaccedilatildeo compulsoacuteria em educaccedilatildeo sauacutede ou assistecircncia social ldquoA

proteccedilatildeo eacute louvaacutevel e tutela toda a coletividade ao privilegiar o direito agrave educaccedilatildeo sauacutede e

assistecircncia social em detrimento do direito do credorrdquo

De acordo com o inciso X do art 833 do CPC eacute impenhoraacutevel ateacute o limite de

quarenta salaacuterios miacutenimos a quantia depositada em caderneta de poupanccedila

Eacute uma modalidade de impenhorabilidade relativa (o CPC73 a considerava absoluta)

tendo em vista que essa impenhorabilidade natildeo pode ser oposta na execuccedilatildeo de alimentos

independentemente da sua origem (art 833 sect 2ordm do CPC) Fredie Didier et al cita Araken de

Assis111 ao afirmar que

a regra soacute protege essa aplicaccedilatildeo financeira Se o valor estiver depositado em fundo de investimento por exemplo poderaacute ser penhorado Se o devedor tiver vaacuterias cadernetas de poupanccedila a impenhorabilidade aplica-se agrave soma de todas elas e natildeo a cada uma delas isoladamente do contraacuterio valores expressivos poderiam ser pulverizados em vaacuterias contas burlando a finalidade da regra que eacute a de proteger a populaccedilatildeo de baixa renda

Ademais satildeo tambeacutem impenhoraacuteveis por forccedila do inciso XI os recursos puacuteblicos do

fundo partidaacuterio recebidos por partido poliacutetico nos termos da lei Essa modalidade de

impenhorabilidade ldquose restringe aos recursos puacuteblicos do fundo partidaacuterio Recursos de

origem privada recebidos pelo partido poliacutetico poderatildeo ser penhoradosrdquo 112 O processualista

Fredie Didier et al113 assevera que

Assim a impenhorabilidade foi estabelecida no intuito de impedir que os diretoacuterios nacionais de partidos poliacuteticos respondam por diacutevida dos diretoacuterios

110 Ibid p 836 111 DIDIER JR Fredie et al apud ASSIS Araken de Manual da execuccedilatildeo 11ordm ed cit p 225 Assim

tambeacutem REDONDO Bruno Garcia LOJO Maacuterio Vitor Suarez Penhora cit p 117 BUENO Cassio Scarpinella Curso sistematizado de Direito Processual Civil v 3 cit p 228 GIANNICO Mauriacutecio As novas reformas do CPC e de outras normas processuais Mauriacutecio Giannico e Viacutetor Joseacute de Mello Monteiro (coord) Satildeo Paulo Saraiva 2009 p 1 OS Em sentido diverso estendendo a impenhorabiacutelidade aos depoacutesitos feitos ateacute esse valor em CDB CDI fundos de renda fixa ou de accedilotildees RODRIGUES Marcelo Abelha Manual de execuccedilatildeo civil 3deg ed cit p 101

112 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 839

113 Ibid p 839

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estaduaismunicipais - sobretudo em razatildeo das vaacuterias decisotildees judiciais que determinaram penhora de recursos do fundo partidaacuterio de alguns partidos

Por fim o inciso XII do artigo 833 do CPC trata sobre a impenhorabilidade dos

creacuteditos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias sob o regime de incorporaccedilatildeo imobiliaacuteria

vinculados agrave execuccedilatildeo de obra ldquoO objetivo dessa modalidade eacute evitar que diacutevidas do

incorporador possam consumir os recursos que seriam utilizados na realizaccedilatildeo da obra em

prejuiacutezo dos adquirentes de unidades autocircnomasrdquo 114

O professor Misael Montenegro Filho115 aduz sobre que ldquoao estabelecer a

impenhorabilidade dos creacuteditos oriundos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias o novo CPC

protegeu os valores destinados agrave execuccedilatildeo da obra e agrave entrega das unidades imobiliaacuterias aos

adquirentes assegurando assim a execuccedilatildeo da promessa contratualrdquo

Importante frisar ainda que a Lei nordm 8009 1990 instituiu a impenhorabilidade do

imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar por qualquer diacutevida salvo as exceccedilotildees dos

seus arts 3ordm e 4ordm

A referida lei dispotildee que Para os efeitos de impenhorabilidade considera-se

residecircncia um uacutenico imoacutevel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia

permanente (art 5ordm)

O processualista baiano Fredie Didier et al116 assevera que

A lei propotildee-se a proteger imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar nos termos acima expostos A CF 88 ampliou o conceito de entidade familiar para abranger a famiacutelia monoparental e a uniatildeo estaacutevel Mas deve considerar-se aiacute compreendidos os irmatildeos que vivem juntos e a uniatildeo homossexual Ateacute o solteiro estaacute abrangido pela impenhorabilidade se reside soacute no imoacutevel - isso em nome da proteccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana e da moradia digna Na verdade houve uma mudanccedila de compreensatildeo acerca do sentido da proteccedilatildeo de proteccedilatildeo da famiacutelia agrave proteccedilatildeo da moradia indispensaacutevel agrave preservaccedilatildeo da dignidade da pessoa

114 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o

novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 388

115 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MONTENEGRO FILHO Misael Novo Coacutedigo de Processo Civil Comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Atlas 2016 p 752

116 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 840-841

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O STJ jaacute consolidou esse entendimento na suacutemula nordm 364 O conceito de

impenhorabilidade de bem de famiacutelia abrange tambeacutem o imoacutevel pertencente a pessoas

solteiras separadas e viuacutevas

Entretanto se o casal ou entidade familiar possuir vaacuterios imoacuteveis utilizados como

residecircncia a impenhorabilidade recairaacute sobre o de menor valor (art 5ordm paraacutegrafo uacutenico) ldquoEacute o

que ocorre por exemplo quando a famiacutelia se divide em mais de uma cidade por motivos

profissionaisrdquo 117

Forccediloso observar ainda que a impenhorabilidade do imoacutevel familiar eacute relativa jaacute que

natildeo pode ser oposta a qualquer creacutedito O art 3ordm da Lei n 8009 1990151 em que pode ser

penhorada a residecircncia da famiacutelia (exemplo execuccedilatildeo de alimentos para cobranccedila de taxas

devidas em funccedilatildeo do imoacutevel familiar etc)

Resta claro que o artigo 833 do CPC ao disciplinar as hipoacuteteses de impenhorabilidade

possui o escopo de proteger o princiacutepio da dignidade humana Entretanto algumas claacuteusulas

natildeo possuem proteccedilatildeo absoluta ldquoa sua relativizaccedilatildeo a depender do caso sob exame deve ser

realccedilada agrave medida que a dignidade resguardada e protegida pelo sistema processual-

constitucional natildeo se limita ao executadordquo 118 Ademais ldquoEacute premente advertidamente que a

dignidade do credor tambeacutem seja garantida em juiacutezo tendo como norte pois os princiacutepios da

proporcionalidade e razoabilidaderdquo 119

117 Ibid p 841 118 Ibid p 752 119 Ibid p 752

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4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA

ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE

HUMANA DO EXECUTADO

41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE

EFETIVACcedilAtildeO

Como jaacute exposto em linhas preteacuteritas nos meios executivos tiacutepicos as medidas

executivas satildeo determinadas pela lei ou seja o oacutergatildeo pode aplicar somente as medidas

tipificadas no ordenamento juriacutedico No entanto ao se tratar das medidas executivas atiacutepicas

eacute necessaacuterio que haja um limite na atuaccedilatildeo realizada pelo juiz

O poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo poder ser realizado de maneira indiscriminada haacute

pressupostos e premissas a serem observadas Dessa forma a primeira premissa eacute no sentindo

de que a medida executiva atiacutepica natildeo pode ser a primeira medida a ser invocada ldquomuito ao

reveacutes a regra do nosso sistema continua a ser o da tipicidade dos meios executivos soacute que

agora temperado pelo sistema atiacutepicordquo 120 O processualista Thiago Rodovalho explica que

ldquo() os meios atiacutepicos natildeo satildeo prima ratio e sim a ultima ratio eacute dizer esgotados e

frustrados os meios executivos tiacutepicos e ordinaacuterios pode-se em tese valer-se do sistema

atiacutepicordquo121

Dessa forma nos casos de execuccedilatildeo que tenha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

natildeo deve ser aplicado de logo as medidas indutivas e coercitivas Apenas apoacutes frustradas as

medidas ldquonaturaisrdquo pode-se passar agrave aplicaccedilatildeo das medidas atiacutepicas

Uma segunda premissa diz a respeitos dos meios de pressatildeo para compelir o devedor a

adimplir com o seu deacutebito ldquoEssa segunda premissa decorre inclusive de imperiosidade

loacutegica de nada adianta a medida de pressatildeo se a obrigaccedilatildeo natildeo tem como ser adimplida pelo

devedorrdquo 122

Para Thiago Rodovalho123 ldquoIsso quer significar que esgotados e frustrados os meios

tiacutepicos o juiz se valeraacute dos meios atiacutepicos se eles forem potencialmente haacutebeis a estimular ou

120 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da

atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018

121 Ibid sem paginaccedilatildeo 122 Ibid sem paginaccedilatildeo 123 Ibid sem paginaccedilatildeo

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forccedilar o cumprimento o que pressupotildee sua possibilidade quando entatildeo eles poderatildeo ser

eficazesrdquo

Logo nas obrigaccedilotildees de pagar quantia se houver a real demonstraccedilatildeo da

impossibilidade financeira do devedor seria um constrangimento inuacutetil e desnecessaacuterio a

imposiccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo para forccedilar o cumprimento

Por isso as medidas atiacutepicas devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o

esgotamento das medidas tiacutepicas e a possibilidade de cumprimento de cumprimento da

obrigaccedilatildeo

Ademais superadas as supracitadas premissas e o oacutergatildeo julgador vislumbrando a

necessidade da aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo se faz necessaacuterio que um conjunto de

postulados e princiacutepios rejam a atuaccedilatildeo do oacutergatildeo julgador servindo de norte para a escolha da

medida executiva mais adequada ldquoDe modo geral a escolha deve pautar-se nos postulados da

proporcionalidade da razoabilidade (art8ordm CPC) e da proibiccedilatildeo de excesso bem como nos

princiacutepios da eficiecircncia e da menor onerosidade da execuccedilatildeordquo 124

O professor Fredie Didier et al125 eacute categoacuterico ao citar Humberto Aacutevila

Segundo Humberto Aacutevila o postulado da proporcionalidade se manifesta nas situaccedilotildees em que haacute uma relaccedilatildeo de causalidade entre dois elementos empiricamente discerniacuteveis um meio e um fim de tal sorte que se possa proceder aos trecircs exames fundamentais o da adequaccedilatildeo (o meio promove o fim) o da necessidade (dentre os meios disponiacuteveis e igualmente adequados para promover o fim natildeo haacute outro meio menos restritivo do(s) direito(s) fundamental (is) afetado(s)) e o da proporcionalidade em sentido estrito (as vantagens trazidas pela promoccedilatildeo do fim correspondem agraves desvantagens provocadas pela adoccedilatildeo do meio)

O juiz ao aplicar a medida executiva atiacutepica ao caso concreto deve ter seu

embasamento no princiacutepio da proporcionalidade para saber se a medida a ser tomada eacute a

melhor opccedilatildeo ao caso sub judice ldquoO exame de proporcionalidade aplica-se sempre que

houver uma medida concreta destinada a realizar uma finalidaderdquo 126

Em verdade a aplicaccedilatildeo do princiacutepio da proporcionalidade eacute imprescindiacutevel na adoccedilatildeo

dos meios executivos atiacutepicos tendo em vista que ldquo() tais medidas em especial quando de

124 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111 125 DIDIER JR Fredie et al apud AVILA Humberto Teoria dos princiacutepios da definiccedilatildeo agrave aplicaccedilatildeo

dos princiacutepios juriacutedicos 16 ed Satildeo Paulo Malheiros 2015 p 205 126 DIDIER JR Fredie et al op cit p 111

50

natureza coercitiva podem restringir direitos do devedor e incidir diretamente sobre sua

pessoardquo127 Logo ainda que o princiacutepio da efetividade da tutela executiva seja um direito

fundamental o mesmo ldquo() deve ser compatibilizado com direitos fundamentais do

executado para que a sua dignidade humana seja preservadardquo 128

Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Neves129 afirma que em nome do princiacutepio da

proporcionalidade o juiz deveraacute

() ponderar no caso concreto as vantagens praacuteticas da adoccedilatildeo de cada medida executiva atiacutepica em especial as de natureza coercitiva e as desvantagens de sua adoccedilatildeo levando em conta a possibilidade de a medida criar uma limitaccedilatildeo excessiva ao exerciacutecio de direito fundamental do executado

Outro princiacutepio que o oacutergatildeo julgador deve se ater ao escolher a medida executiva

atiacutepica eacute o da razoabilidade Segundo Fredie Didier et al 130 o princiacutepio (ou postulado)131 se

manifesta de trecircs formas

a) como dever de equidade a exigir a harmonizaccedilatildeo da norma geral com o caso individual impondo a consideraccedilatildeo daquilo que normalmente acontece em detrimento do que eacute extraordinaacuterio e tambeacutem impondo a consideraccedilatildeo das especificidades do caso concreto ante a generalidade da norma b) como dever de congruecircncia a exigir a harmonizaccedilatildeo das normas com suas condiccedilotildees externas de aplicaccedilatildeo (isto eacute com a realidade com base em que foram editadas) c) como dever de equivalecircncia a exigir uma relaccedilatildeo de equivalecircncia entre a medida adotada e o criteacuterio que a dimensiona

Logo ldquo() o princiacutepio da razoabilidade deve nortear a atuaccedilatildeo do juiz na adoccedilatildeo das

medidas executivas atiacutepicas previstas no art 139 IV do Novo CPCrdquo 132 tendo em vista que

ldquo() mesmo medidas que pelo princiacutepio da proporcionalidade podem se mostrar

abstratamente possiacuteveis de adoccedilatildeo no caso concreto podem se mostrar inadequadas e

irrazoaacuteveisrdquo 133

127 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Medidas executivas atiacutepicas na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de

pagar quantia certa art 139 IV do novo CPC Revista de Processo v 42 n 265 mar 2017 p 14 128 Ibid p 14 129 Ibid p 14 130 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111-112 131 Segundo Fredie Didier et al o postulado eacute uma norma que atua sobre a aplicaccedilatildeo de outras normas

A proporcionalidade e a razoabilidade seriam postulados normativos e natildeo princiacutepios segundo essa concepccedilatildeo 132 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo op cit p 14 133 Ibid p 14

51

Ademais conforme dispotildee o postulado da proibiccedilatildeo de excesso ldquoa realizaccedilatildeo de uma

regra ou princiacutepio constitucional natildeo pode conduzir agrave restriccedilatildeo a um direito fundamental que

lhe retire um miacutenimo de eficaacuteciardquo 134

A proibiccedilatildeo de excesso deveraacute sempre ser suscitada quando um direito fundamental

houver sido violado a ponto do direito fundamental sofrer violaccedilatildeo excessiva Ademais ldquoesse

postulado natildeo se confunde com o da proporcionalidade porque ele dispensa os exames da

adequaccedilatildeo (relaccedilatildeo meiofim) da necessidade (exigibilidade) ou da proporcionalidade em

sentido estrito (ponderaccedilatildeo entre vantagens e desvantagens)rdquo 135

Logo ldquopouco importa a relaccedilatildeo meiofim ou a exigibilidade da medida ou ainda a

ponderaccedilatildeo com outro direito fundamental eventualmente em jogo aqui se analisa apenas a

eficaacutecia de um determinado direito fundamentalrdquo 136

O princiacutepio da eficiecircncia tem previsatildeo constitucional no art 37 e previsatildeo

infraconstitucional no art 8ordm do CPC15 O referido princiacutepio determina que o processo seja

conduzido de forma eficiente pelo oacutergatildeo jurisdicional

Entende-se que eficiente eacute a atuaccedilatildeo que utilize adequadamente os meios necessaacuterios

para que se atinjam os fins almejados O oacutergatildeo jurisdicional na escolha dos meios a serem

utilizados para a obtenccedilatildeo dos fins

a) deve escolher aqueles que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo (deve evitar meios que promovam resultados insignificantes) b) deve escolher meios que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado (natildeo se pode escolher um meio de resultado duvidoso) c) natildeo pode escolher um meio que produza muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscado 137

O juiz deveraacute igualmente analisar o princiacutepio da menor onerosidade da execuccedilatildeo que

eacute previsto pelo art 805 do CPC ldquoArt 805 Quando por vaacuterios meios o exequente puder

promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o

executadordquo

134 134 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 112 135 Ibid p 112 136 Ibid p 112 137 Ibid p 112-113

52

Logo ldquohavendo duas opccedilotildees igualmente eficazes para permitir alcanccedilar o resultado

pretendido (satisfaccedilatildeo do creacutedito) deveraacute o oacutergatildeo julgador valer-se daquela que menos onere

a situaccedilatildeo do executadordquo 138

O dito princiacutepio impede o comportamento abusivo do exequente que possa beneficiar-

se do meio mais danoso ao executado protegendo dessa forma a lealdade e a eacutetica

processual

Os postulados e princiacutepios analisados em linhas preteacuteritas impotildeem ao oacutergatildeo julgador a

observacircncia de alguns criteacuterios para a escolha da medida executiva atiacutepicas a ser utilizada no

caso concreto

Primeiramente a medida executiva atiacutepica deveraacute ser adequada ldquoO criteacuterio da

adequaccedilatildeo impotildee que juiz considere abstratamente uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida

executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia

a gerar o resultadordquo 139 Nesse primeiro momento o juiz deveraacute observar sob a perspectiva do

credor qual medida teraacute o condatildeo de gerar o resultado mais efetivo

Segundo Fredie Didier et al140 o criteacuterio da adequaccedilatildeo eacute

() fortemente inspirado pelo postulado da proporcionalidade e pelo princiacutepio da eficiecircncia na parte em que esse princiacutepio determina a escolha de meios que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo e que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado

Ademais a medida adotada pelo oacutergatildeo julgador deveraacute ser necessaacuteria ldquoEsse criteacuterio

impotildee um limite agrave atuaccedilatildeo judicial funcionando como uma espeacutecie de contrapeso ao criteacuterio

da adequaccedilatildeo Aqui deve-se levar em conta a posiccedilatildeo do devedorrdquo141

O juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental agrave execuccedilatildeo e determinar

uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute necessaacuterio que a

medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado O criteacuterio da necessidade

estabelece que ldquonatildeo se pode ir aleacutem do necessaacuterio para alcanccedilar o propoacutesito almejado Deve

138 Ibid p 113 139 Ibid p 113 140 Ibid p 113 141 Ibid p 114

53

pois o oacutergatildeo julgador determinar o meio executivo na medida do estritamente necessaacuterio para

proporcionar a satisfaccedilatildeo do creacutedito ndash nem menos nem maisrdquo 142

O referido criteacuterio possui forte influecircncia dos postulados da proibiccedilatildeo do excesso e da

razoabilidade assim como do princiacutepio da menor onerosidade para o executado Assevera

Fredie Didier et al143 que

Natildeo eacute razoaacutevel por exemplo impor como primeira opccedilatildeo medida coercitiva a ser suportada pelo agente puacuteblico pelo simples fato de o juiz pressupor que o ente puacuteblico ao qual ele eacute vinculado iraacute descumprir determinada ordem judicial - o descumprimento natildeo pode ser visto como algo ordinaacuterio ou cotidiano (razoabilidade como dever de equidade) Tampouco eacute razoaacutevel eleger a prisatildeo civil como meacutetodo prioritaacuterio para compelir o executado ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer (razoabilidade como dever de equivalecircncia) Aleacutem disso eacute vedada por exemplo a imposiccedilatildeo de multa coercitiva para compelir o executado a emitir declaraccedilatildeo de vontade uma vez que haacute previsatildeo expressa de medida tiacutepica capaz de proporcionar o mesmo resultado sem sacrifiacutecio para o devedor (art 501 CPC)

A afirmaccedilatildeo feita por Bonavides144 em 1997 sobre a adequaccedilatildeo e a necessidade

continua atual sobre os motes

O meio empregado pelo legislador deve ser adequado e necessaacuterio para alcanccedilar o objetivo procurado O meio eacute adequado quando com seu auxiacutelio se pode alcanccedilar o resultado desejado eacute necessaacuterio quando o legislador natildeo poderia ter escolhido outro meio igualmente eficaz mas que natildeo limitasse ou limitasse de maneira menos sensiacutevel o direito fundamental

Por fim a medida deve conciliar os interesses contrapostos ldquoO magistrado deve

ponderar os interesses em jogo aplicando a proporcionalidade em sentido estrito de modo

que as vantagens da utilizaccedilatildeo da medida atiacutepica escolhida superem as vantagens de seu usordquo 145

Esse criteacuterio natildeo privilegia nem o credor nem o devedor e sim a soluccedilatildeo mais

equilibrada e que atenda da melhor forma aos valores em conflito ldquoTrata-se de criteacuterio

inspirado nos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade bem como no princiacutepio da

142 Ibid p 114 143 Ibid p 114 144 BONAVIDES Paulo Curso de Direito Constitucional 7ordm ediccedilatildeo Satildeo Paulo Ed Malheiros 1997

p 372 145 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 114-115

54

eficiecircncia na parte em que impotildee ao juiz evitar a escolha do meio executivo que produza

muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscadordquo 146

Cada um dos criteacuterios supracitados devem ser considerados pelo juiz ao aplicar as

medidas executivas atiacutepicas ao caso concreto Para Fredie Didier et al147 as medidas como

retenccedilatildeo de CNH passaporte ou cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado como

forma de pressionaacute-lo ao pagamento da diacutevida pecuniaacuteria natildeo satildeo possiacuteveis

Essas natildeo satildeo medidas adequadas ao atingimento do fim almejado (o pagamento de quantia) - natildeo haacute propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente Tais medidas soam mais como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-lo ao cumprimento da ordem judicial - e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a utilizaccedilatildeo de meios sancionatoacuterios pelo magistrado mas apenas de meios de coerccedilatildeo indireta e sub-rogatoacuterios

Ainda que adequadas fossem a retenccedilatildeo de CNH e do passaporte no corte de fornecimento de aacutegua natildeo parecem ser medidas necessaacuterias (no sentido de exigiacuteveis) uma vez que outras medidas podem em tese ser utilizadas sem causar igual gravame ao executado - como por exemplo a simples restriccedilatildeo do uso de cartotildees de creacutedito A retenccedilatildeo de documentos pessoais eacute medida que termina por restringir a liberdade de ir e vir do executado mostrando-se a princiacutepio natildeo-razoaacutevel por ir de encontro ao dever de equivalecircncia e desproporcional por restringir demais o direito agrave liberdade em favor do direito de creacutedito pecuniaacuterio do exequente

O processualista baiano et al148 cita tambeacutem outro exemplo de medida atiacutepica que natildeo

atingem os criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade

Tampouco parece adequada em princiacutepio determinaccedilatildeo de corte de energia eleacutetrica de todo o preacutedio onde funciona serviccedilo puacuteblico administrativo como forma de pressionar o ente federado a cumprir ordem de nomeaccedilatildeo de candidato em concurso puacuteblico Natildeo parece haver relaccedilatildeo meiofim entre uma coisa e outra Tambeacutem natildeo eacute possiacutevel enxergar essa medida como necessaacuteria no sentido de ser a menos gravosa para o devedor - observe que se trata de medida que uma vez aplicada ensejaria restriccedilatildeo de funcionamento em toda a reparticcedilatildeo puacuteblica em prejuiacutezo de serviccedilos puacuteblicos essenciais ao funcionamento da Administraccedilatildeo o que aleacutem de ser excessivamente gravoso parece natildeo se conformar agrave necessidade de ponderaccedilatildeo dos interesses em jogo - aleacutem de afetar a um sem-nuacutemero de pessoas tomadoras desses serviccedilos

Ademais eacute sabido que toda e qualquer decisatildeo judicial precisa ser fundamentada Ao

se tratar das medidas executivas atiacutepicas o papel da fundamentaccedilatildeo se torna ainda mais

146 Ibid p 115 147 Ibid p 115 148 Ibid p 116

55

importante tendo em vista que eacute pela fundamentaccedilatildeo da decisatildeo que se poderaacute controlar a

adequaccedilatildeo e necessidade da medida atiacutepica

Pelo fato das medidas executivas atiacutepicas derivarem de dispositivos normativos

considerados claacuteusulas gerais propiacutecias as mais variadas interpretaccedilotildees eacute de extrema

importacircncia que o oacutergatildeo julgador fundamente sua decisatildeo

Logo ldquodeve o juiz na fundamentaccedilatildeo decisoacuteria expor racionalmente os motivos da

sua escolha demonstrando com atenccedilatildeo ao art 489 sect 1ordm CPC de que modo a sua opccedilatildeo

atende os criteacuterios da adequaccedilatildeo necessidade e proporcionalidade em sentido estrito ()rdquo 149

Dessa forma os princiacutepios da proporcionalidade e razoabilidade servem para delimitar

o alcance das claacuteusulas gerais de efetivaccedilatildeo fazendo com que o oacutergatildeo julgador se atenha aos

criteacuterios da adequaccedilatildeo e necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao caso

concreto

42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO

EXECUTADO

A entrada em vigor do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 aflorou ainda mais uma

discussatildeo essencial para os processualistas do seacuteculo XXI qual eacute o verdadeiro protagonista do

processo civil

Para os que defendem o ldquoautoritarismo processualrdquo o verdadeiro protagonista do

processo civil eacute o oacutergatildeo judiciaacuterio que em nome do desempenho efetivo de suas funccedilotildees lhes

eacute permitido dilatar os poderes que diga-se de jaacute passagem jaacute compotildeem um vastiacutessimo

arsenal150

Jaacute os ldquogarantistasrdquo 151 do processo civil acreditam que os verdadeiros protagonistas satildeo

as partes do processo e seus direitos e garantias devem ser estritamente preservados

Devido a essa disputa de quem possui maior protagonismo no processo as mudanccedilas

ocorridas no coacutedigo processual vigente quanto agraves medidas executivas atiacutepicas despertaram

149 Ibid p 117 150 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos

atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04102018

151 O processualista Araken de Assis acredita que o termo garantista eacute descabido tendo em vista que remete ao processo penal

56

maior celeuma do que qualquer outra modificaccedilatildeo trazida pelo CPC15 Afinal as referidas

medidas acirravam ainda mais a disputa pelo protagonismo processual

O fato de o CPC15 dispor no art 139 IV que o juiz poderaacute decretar todas as medidas

indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o

cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo

pecuniaacuteria levou boa parte da doutrina e dos juiacutezes a acreditar que teria pleno direito de

aplicar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo Entretanto muitos se esqueceram do outro lado

da moeda esqueceram que a dignidade humana do executado tambeacutem eacute um direito

fundamental e natildeo pode ser violado

Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa152

acreditam que

() natildeo parece producente elencar um rol abstrato das medidas que poderiam ser aplicadas pelo juiz a tiacutetulo do art 139 IV CPC Afinal se busca a efetividade da execuccedilatildeo e esta soacute pode ser identificada agrave luz das especificidades da situaccedilatildeo concreta Ideal eacute enveredar pela loacutegica modular (adequaccedilatildeo ao caso) natildeo pela geneacuterica (soluccedilotildees abstratas de pretensa utilidade universal)

Em razatildeo de o dispositivo apresentar uma gama de poderes tatildeo amplos agrave disposiccedilatildeo do

oacutergatildeo julgador sem nenhuma estipulaccedilatildeo de um procedimento legal previamente definido para

que estabeleccedila as condiccedilotildees de sua aplicaccedilatildeo em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo eacute

necessaacuterio que em razatildeo do princiacutepio da dignidade humana natildeo busque definir o que o

dispositivo permite mas de definir o que ele natildeo permite ldquoOu seja propotildee-se a sua

compreensatildeo por exclusatildeo Afinal se ele tem potencialidade para promover a efetividade da

tutela tambeacutem pode provocar lesotildees E como em direito os fins natildeo justificam os meios

ressalta como prioritaacuteria a necessidade de estabelecer limitesrdquo 153

O art 789 do CPC15 disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial e eacute

categoacuterico ao dispor que ldquoo devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para

152 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

153 Ibid sem paginaccedilatildeo

57

o cumprimento de suas obrigaccedilotildees salvo as restriccedilotildees estabelecidas em leirdquo Logo a

execuccedilatildeo somente poderaacute incidir sobre os bens do devedor e natildeo sobre a sua pessoa

Como eacute sabido a Lex Poetelia Papiria de 326 aC foi o primeiro marco legal da

humanizaccedilatildeo das cobranccedilas de diacutevidas abolindo a imposiccedilatildeo ao devedor de castigos

vexatoacuterios e ateacute da pena de morte154

Afinal no direito romano antigo a cobranccedila de diacutevidas poderia recair sobre a pessoa

do devedor que respondia com sua liberdade e ateacute mesmo com seu proacuteprio corpo permitindo

a lei que repartissem tantos pedaccedilos do corpo do devedor quantos fossem seus credores

Nesse sentindo leciona o professor Guilherme Pupe da Noacutebrega155 que

Vem de longe a evoluccedilatildeo no sentido de fazer a responsabilidade por uma obrigaccedilatildeo migrar da pessoa do devedor para seu patrimocircnio Merecem registro especiacutefico como marcos histoacutericos remotos a Lex Poetelia Papiria de 326 aC que aboliu o nexum e possibilidade de escravidatildeo do devedor como garantia da obrigaccedilatildeo e a pignoris capio ou ldquoaccedilatildeo por tomada de penhorrdquo que instituiu a possibilidade de o credor tomar parcela dos bens do devedor como forma de assegurar o adimplemento da diacutevida Aqueles institutos culminariam seacuteculo depois no artigo 789 do CPC de 2015 a consagrar que o devedor responda pela satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo com seus bens presentes e futuros observadas as restriccedilotildees impostas pelas impenhorabilidades legais

Logo o avanccedilar da civilizaccedilatildeo marcou o deslocamento da responsabilidade por

diacutevidas saindo do corpo do devedor para o seu patrimocircnio tendo em vista que a vida

humana a liberdade e a integridade fiacutesica satildeo valores inalienaacuteveis natildeo podendo ser

sacrificadas em benefiacutecio de obrigaccedilotildees pecuniaacuterias 156

Entretanto eacute sabido que a responsabilidade patrimonial eacute excepcionada pela prisatildeo

civil do devedor de verba alimentiacutecia resquiacutecio da responsabilidade pessoal romana

154 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt

httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018

155 NOacuteBREGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139 IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018

156 Ibid sem paginaccedilatildeo

58

No entanto haacute uma justificativa para isso Segundo o processualista Guilherme Pupe

da Noacutebrega157

Eacute que a par de a prisatildeo civil encontrar previsatildeo constitucional no inciso LXVII do artigo 5ordm o raciociacutenio eacute o de que o direito do alimentante agrave liberdade de locomoccedilatildeo cede diante dos direitos agrave vida e agrave dignidade titularizados pelo alimentando e resguardados pelos alimentos Foi esse mesmo raciociacutenio aliaacutes que justificou no passado a ediccedilatildeo da suacutemula 309 pelo STJ agora positivada pelo artigo 528 sect 7ordm que limita a modalidade coercitiva agraves trecircs uacuteltimas prestaccedilotildees vencidas e agraves prestaccedilotildees vincendas A ideia eacute que tendo o alimentando subsistido a despeito do natildeo-pagamento de prestaccedilotildees mais antigas essas verbas teriam perdido o caraacuteter alimentar que na equaccedilatildeo antes apresentada justificaria a prisatildeo civil do alimentante Daiacute por que aqueles valores antigos remanescem exigiacuteveis mas somente pela via da expropriaccedilatildeo

Essa ressalva eacute necessaacuteria tendo em vista que a adoccedilatildeo de teacutecnica de execuccedilatildeo

indireta para incursatildeo radical na esfera de direitos do executado notadamente direitos

fundamentais quando carente de respaldo constitucional natildeo merece acolhimento sob

risco de se atentar contra o devido processo legal (artigo 5ordm LIV da Constituiccedilatildeo)

Como afirma o autor Bruno Dantas158 ldquoembora inexistam estatiacutesticas que permitam

comparaccedilotildees natildeo eacute desarrazoado intuir que os iacutendices de inadimplecircncia despeccedilam na razatildeo

inversa da incidecircncia das ordens judiciais sobre o corpo e a liberdade do devedorrdquo Entretanto

eacute natildeo possiacutevel adotar toda e qualquer medida executiva atiacutepica em nome da efetividade da

execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que se saiba os limites da sua aplicaccedilatildeo

Dessa forma instrumentos que permitam o cumprimento forccedilado de contratos e o pagamento

de diacutevidas satildeo necessaacuterios contudo eacute preciso equilibrar essa exigecircncia com a liberdade e a

dignidade humana

Como citado alhures o art 139 IV ensejou decisotildees como a que determinou a

suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o

passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito em uma accedilatildeo se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo

extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

Na supracitada decisatildeo o princiacutepio da responsabilidade patrimonial natildeo estaacute sendo

efetivado para o que o devedor responda com os seus bens Afinal qual ligaccedilatildeo entre a

157 Ibid sem paginaccedilatildeo 158 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt

httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018

59

restriccedilatildeo de circulaccedilatildeo que diz com o direito de ir e vir (liberdade) com o pagamento de

diacutevidas que diz com a responsabilidade civil159

Ademais por que quem natildeo tem dinheiro para pagar diacutevidas natildeo pode dirigir Por que

natildeo tem condiccedilotildees para pagar o deacutebito natildeo pode ter passaporte Por que quem natildeo tem como

pagar o deve natildeo pode ter cartatildeo de creacutedito

Ao utilizar meios executivos atiacutepicos como os supracitados para compelir o devedor a

satisfazer a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria quando exauridos sem ecircxito os meios tradicionais de bens

penhoraacuteveis salvo quando existe qualquer indiacutecio concreto de ocultaccedilatildeo ou dissipaccedilatildeo de

bens eacute obrigar o devedor abrir matildeo da proteccedilatildeo da lei que lhe impede que seja tomado agrave forccedila

(art 833 CPC e demais disposiccedilotildees que tratam da impenhorabilidade)

Segundo Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa160

Claramente essa pressatildeo visa dar uma aparecircncia de voluntariedade agrave indicaccedilatildeo de bens impenhoraacuteveis pelo proacuteprio executado que na verdade soacute age assim por ser a uacutenica forma de ver-se livre de um grame imposto por medida indutiva despedida de qualquer necessidade ou adequaccedilatildeo Uma intoleraacutevel perversatildeo

Os autores afirmam ainda que o ldquodireito paacutetrio natildeo admite esta contraditio in terminis

sendo inaceitaacutevel a coexistecircncia de regra protetiva do executado com outra que concede ao

juiz poderes para forccedilar (ainda que indiretamente e veladamente) o executado a abrir matildeo

daquela proteccedilatildeordquo 161

Logo eacute cristalino que a suspensatildeo da CNH eacute uma forma incorreta de aplicar a medida

executiva atiacutepica para efetivar o direito fundamental a execuccedilatildeo tendo em vista que o uacutenico

objetivo da referida eacute pressionar o executado abrir matildeo de algum bem impenhoraacutevel para

levantar o dinheiro e cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

A retenccedilatildeo do passaporte igualmente natildeo possui qualquer relaccedilatildeo com a diacutevida do

executado e eacute somente uma forma de tentar pressiona-lo a dispor de um bem que natildeo pode

ser tomado agrave forccedila e puni-lo por natildeo ter cumprido voluntariamente com a sua obrigaccedilatildeo

159 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

160 Ibid sem paginaccedilatildeo 161 Ibid sem paginaccedilatildeo

60

Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa162

acreditam que tal medida eacute equivocada e se torna excessivamente onerosa ao executado

As mais variadas circunstacircncias relevem o equiacutevoco de tal medida aplicada assim genericamente Com efeito nada justifica reter o passaporte do executado e impedi-lo de viajar para o exterior quando eacute agraciado inclusive com todas as despesas pagas com presente sorteio ou precircmio (por completar tempo de serviccedilo ou atingir metas produtividade na sociedade empresaacuteria em que trabalha) Como todo custo eacute suportado por terceiro e por isso mesmo a sua realizaccedilatildeo pelo executado natildeo traria qualquer prejuiacutezo ao exequente e a retenccedilatildeo do passaporte natildeo seria injustificaacutevel

Paulo Antonio Papini163 acredita que natildeo tem a apreensatildeo de passaporte natildeo possui um

fundamento plausiacutevel tendo em vista que se o devedor natildeo pode viajar para saldar o deacutebito

tambeacutem natildeo poderia exercer atividades cotidianas

Com todo o respeito a quem pensa dessa forma o argumento eacute muito simploacuterio e natildeo precisamos sequer do Direito para derrubaacute-lo Com efeito se considerarmos que ndash ateacute mesmo pelas dimensotildees continentais do Brasil ndash natildeo eacute incomum que uma passagem para o Nordeste custe mais caro que um voo para Miami seria razoaacutevel entatildeo seguindo a linha argumentativa do Magistrado em questatildeo que se oficiasse aos oacutergatildeos reguladores da aviaccedilatildeo civil proibindo-se aquele devedor de fazer ateacute mesmo voos domeacutesticos Poder-se-ia ir mais longe jaacute que natildeo tem dinheiro para pagar suas diacutevidas certamente aquele devedor tambeacutem natildeo teria para comer fora de sua casa porque entatildeo natildeo determinar a expediccedilatildeo de ofiacutecio aos restaurantes proacuteximos agrave sua casa e determinar tambeacutem a proibiccedilatildeo de que ele fosse servidoatendido

O autor se questiona ainda ldquoSeraacute entatildeo que o Princiacutepio da Dignidade da Pessoa

Humana estaacute de mero enfeite em nossa Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ()rdquo 164 Tendo em vista

que ldquoa decisatildeo em comento viola diretamente o art 5ordm incisos XV LIII e LXIII da

Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ndash falamos do Direito de Ir e Virrdquo 165

Ademais o cancelamento do cartatildeo de creacutedito eacute mais uma forma de constranger e

compelir o executado a cumprir com a obrigaccedilatildeo de qualquer forma natildeo importando o que

precise fazer para conseguir saldar o deacutebito tendo em vista que a referida medida apresenta

162 Ibid sem paginaccedilatildeo 163 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo

pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018

164 Ibid sem paginaccedilatildeo 165 Ibid sem paginaccedilatildeo

61

qualquer adequaccedilatildeo com o fim desejado (reverter em pagamento para o exequente) Os

autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa afirmam que166

Reconhece-se que as razotildees da afirmaccedilatildeo ora questionada satildeo ateacute intuitivas mas eacute plenamente possiacutevel problematiza-las Ora natildeo se encontra qualquer justificativa idocircnea para que o juiz possa cancelar o contrato do executado com a administradora do cartatildeo de creacutedito (ou instituiccedilatildeo financeira) que natildeo tem qualquer relaccedilatildeo com o creacutedito exequendo muito menos como isso poderia impactar positivamente na execuccedilatildeo (senatildeo para pressionar o executado a dispor de bens impenhoraacuteveis) Ademais natildeo foram indicados sequer sinais de que o executado realiza gastos supeacuterfluos com o cartatildeo de creacutedito ndash natildeo que isso justificasse a medida pois o correto seria penhorar os esses bens (se duraacuteveis naturalmente) ao inveacutes de cancelar o cartatildeo de creacutedito

Logo as referidas medidas natildeo possuem qualquer relaccedilatildeo com o atingimento do fim

almejado (o pagamento de quantia) tendo em vista que natildeo haacute uma relaccedilatildeo meiofim entre

tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a

restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia

ao exequente

Dessa forma nota-se que as medidas de suspensatildeo da CNH retenccedilatildeo de passaporte e

bloqueio do cartatildeo de credito satildeo completamente inadequadas agrave realizaccedilatildeo a que se prestam

Afinal ldquotais medidas soam como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-

lo ao cumprimento da ordem judicial ndash e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a

utilizaccedilatildeo dos meios sancionatoacuterios pelo magistrado ()rdquo167

Como exposto em linhas preteacuteritas o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades

de aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e

razoaacutevel se atendo aos criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas

executivas atiacutepicas ao caso concreto sob pena de converter a medida em de indutiva para

punitiva

A utilizaccedilatildeo de medidas atiacutepicas como a suspensatildeo da carteira de motorista e o

passaporte do devedor abandona a regra da responsabilidade patrimonial e atingem em cheio

o nuacutecleo de direitos inerentes agrave condiccedilatildeo humana

166 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

167 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 115

62

O limite para a aplicaccedilatildeo de tais medidas deve ser a Constituiccedilatildeo Federal e sobretudo

os Direitos fundamentais nela expressos ldquoCom efeito natildeo haacute saiacuteda tampouco soluccedilatildeo eficaz

de um problema sem que se respeite a Lei e o Devido Processo Legal (por mais nobres que

sejam as intenccedilotildees)rdquo 168

Dessa forma a busca desenfreada pelo cumprimento das decisotildees judiciais em

especial na fase executiva natildeo pode ser realizada em sacrifiacutecio de direitos fundamentais O

Poder Judiciaacuterio natildeo pode resolver a crise do processo executoacuterio utilizando de medidas

arbitraacuterias com o propoacutesito de satisfazer obrigaccedilotildees pecuniaacuterias

Eis o dilema que se coloca diante do poder geral de efetivaccedilatildeo ele pode servir de

potente instrumento em prol da tutela jurisdicional executiva entretanto se manejado de

modo improacuteprio serviraacute de instrumento de puniccedilatildeo e humilhaccedilatildeo do executado169

Eacute notoacuterio que se amplamente aplicado o poder geral de efetivaccedilatildeo reduziria os

iacutendices de inadimplecircncia quiccedilaacute resolveria por completo a crise da execuccedilatildeo civil Entretanto

o retrocesso civilizatoacuterio seria irreparaacutevel

168 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo

pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018

169 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

63

5 CONCLUSAtildeO

Como funccedilatildeo jurisdicional que tem como objeto a efetivaccedilatildeo de direitos a execuccedilatildeo

deve sempre buscar a maior satisfaccedilatildeo possiacutevel concretizando integralmente o creacutedito do

exequente isto eacute realizando o direito fundamental agrave tutela executiva do credor Por isso a

adoccedilatildeo de meios executivos atiacutepicos incorporados pelo Coacutedigo de Processo Civil de 2015 por

meio do art139 IV em um primeiro momento podem ser consideradas vaacutelidas visto que

servem de instrumento para a satisfaccedilatildeo e asseguraccedilatildeo de direitos do credor

Entretanto para o oacutergatildeo julgador natildeo cometa arbitrariedades em nome do direito

fundamental agrave execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que seja definido certos limites na adoccedilatildeo do poder

geral de efetivaccedilatildeo

As medidas executivas atiacutepicas natildeo podem ser aplicadas de maneira indiscriminada

logo devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o esgotamento das medidas tiacutepicas e

a possibilidade de cumprimento da obrigaccedilatildeo

Partindo dessa premissa as medidas a serem adotadas pelo juiz no caso concreto

devem ter como baliza os princiacutepios da proporcionalidade e da razoabilidade para que natildeo

ultrapassem a responsabilidade patrimonial do devedor e incidida diretamente sobre sua

pessoa

Para que natildeo seja atingida a pessoa do executado ou seja para que o devedor natildeo

tenha sua dignidade humana viola eacute necessaacuterio que a medida atiacutepica seja adequada e

necessaacuteria

Logo o juiz deveraacute sempre estabelecer uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida

executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia

a gerar o resultado sem violar a dignidade humana do executado

Dessa o juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental a execuccedilatildeo e

determinar uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute

necessaacuterio que a medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado

As medidas que ultrapassam esses limites como a decisatildeo que apreendeu o

passaporte suspensatildeo a CNH e bloqueou o cartatildeo de creacutedito do devedor satildeo meramente

punitivas posto que essas natildeo satildeo as medidas mais adequadas para se atingir o fim almejado

pois natildeo existe propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado

64

uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo

geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente

Medidas como esta servem de embasamento para decisotildees arbitraacuterias e autoritaacuterias de

violaccedilatildeo dos direitos fundamentais transformando o poder geral de efetivaccedilatildeo em

instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com autorizaccedilatildeo judicial

Em suma o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades de aplicaccedilatildeo do poder

geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e razoaacutevel se atendo aos

criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao

caso concreto sob pena de punir a pessoa do executado violando a sua dignidade humana

em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo

65

REFEREcircNCIAS

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  • 1 INTRODUCcedilAtildeO
  • 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO
    • 25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO
      • 3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
        • 31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS
          • 311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15
            • 32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
            • 33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
            • 34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
              • 4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
                • 41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
                • 42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
                  • 5 CONCLUSAtildeO
                  • REFEREcircNCIAS
Page 8: portal.faculdadebaianadedireito.com.brportal.faculdadebaianadedireito.com.br/portal/monografias...A prestação jurisdicional não se concretiza depois de encerrada afase de conhecimento

6 Entretanto natildeo haacute na legislaccedilatildeo criteacuterios especiacuteficos que auxiliem o oacutergatildeo julgador na

escolha das medidas executivas atiacutepicas que se adotadas sem qualquer baliza podem

acarretar consequecircncias juriacutedicas irreparaacuteveis

Como a famosa decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de

Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-1320138260011 Nessa accedilatildeo

que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo

pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a suspensatildeo da

Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o passaporte e

cancelou os cartotildees de creacutedito como forma de compeli-lo a adimplir com o deacutebito

Decisotildees como esta geram conflitos entre direitos constitucionalmente instituiacutedos De

um lado o direito fundamental agrave tutela jurisdicional e de outro os direitos e garantias

inerentes a todos os indiviacuteduos

Dessa forma a presente monografia tem como escopo de estabelecer criteacuterios

limitadores para que a adoccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo viole a dignidade humana do

executado em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo

7 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO

CIVIL

21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL

A Execuccedilatildeo Civil nasce a partir do direito a uma prestaccedilatildeo conferida a algueacutem de

exigir de outrem o cumprimento de uma conduta de fazer natildeo fazer ou de dar (dinheiro ou

coisa distinta) 1

Para que o direito a uma prestaccedilatildeo se concretize no mundo fiacutesico eacute necessaacuterio que

haja a satisfaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida pelo sujeito passivo Caso contraacuterio fala-se em

inadimplemento ou lesatildeo O titular do direito natildeo tem como agir por si para efetivar o seu

direito a prestaccedilatildeo posto que a autotutela eacute vedada no ordenamento juriacutedico Dessa forma eacute

necessaacuterio que se recorra ao Poder Judiciaacuterio para que se possa ter a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo

devida logo a tutela jurisdicional executiva2

O processualista Fredie Didier et al3 equaciona essa questatildeo da seguinte maneira

Quando se pensa em tutela executiva pensa-se na efetivaccedilatildeo de direitos a uma prestaccedilatildeo fala-se de um conjunto de meios para efetivar a prestaccedilatildeo devida fala-se em execuccedilatildeo de fazer natildeo-fazer dar exatamente os trecircs tipos de prestaccedilatildeo existentes Natildeo eacute por acaso nem por coincidecircncia que a tutela executiva pressupotildee inadimplemento (CPC art 786) - fenocircmeno exclusivo dos direitos a uma prestaccedilatildeo Eacute por isso tambeacutem que se pode falar em prescriccedilatildeo da execuccedilatildeo (CPC art 802 e suacutemula do STF n 150) - prescriccedilatildeo eacute fenocircmeno juriacutedico que se relaciona aos direitos a uma prestaccedilatildeo A execuccedilatildeo forccedilada dirige-se ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo Essa relaccedilatildeo entre direito material e processo eacute fundamental para a compreensatildeo do fenocircmeno executivo

Nesse iacutenterim para o Ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux4 ldquoexecutar eacute

satisfazerrdquo ao passo que o professor Fredie Didier et al5 formulou um conceito mais amplo

ldquoExecutar eacute satisfazer uma prestaccedilatildeo devida A execuccedilatildeo pode ser espontacircnea quando o

devedor cumpre voluntariamente a prestaccedilatildeo ou forccedilada quando o cumprimento da prestaccedilatildeo

eacute obtido por meio de atos executivos pelo Estadordquo

1 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 41 2 Ibid p 42 3 Ibid p 42 4 FUX Luiz Curso de direito processual civil Rio de Janeiro Forense 2001 p 980 5 DIDIER JR Fredie et al Op Cit p 45

8 Dessa forma a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional responsaacutevel pela

concretizaccedilatildeo de um direito subjetivo no plano material obtendo resultado idecircntico ou

equivalente ao atingiacutevel se o devedor cumprisse espontaneamente a prestaccedilatildeo

Todavia essa atividade jurisdicional soacute cabe quando o devedor se recusa a cumprir

com a obrigaccedilatildeo quebrando a expectativa do credor de receber o que lhe eacute devido Por esta

razatildeo que se diz que a execuccedilatildeo civil eacute ldquoforccediladardquo 6

Eacute o que se conclui seguindo os ensinamentos de Leonardo Greco7 para ele execuccedilatildeo eacute

uma

() modalidade de tutela jurisdicional que consiste na praacutetica pelo juiz (ou por outrem sob a sua supervisatildeo) de uma seacuterie de atos coativos concretos sobre o devedor e sobre o seu patrimocircnio a fim de agrave custa dele e independentemente do concurso da sua vontade tornar efetivo o cumprimento de prestaccedilatildeo por ele inadimplida desde que tais atos coativos estejam previamente constituiacutedos em lei

Portanto a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional que tem como escopo obter o

cumprimento de uma prestaccedilatildeo certa e inadimplida mediante atos coativos sobre o devedor e

seus bens

22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL

Vislumbrado o conceito de execuccedilatildeo civil cabe agora empreender a sua classificaccedilatildeo

tendo em vista que a execuccedilatildeo pode se manifestar de diversas formas possuindo diferentes

caracteriacutesticas em cada uma das suas modalidades

Inicialmente cabe destacar que haacute duas teacutecnicas processuais para viabilizar a execuccedilatildeo

civil lato sensu eacute a que divide em processo autocircnomo de execuccedilatildeo e em fase de execuccedilatildeo

dependendo do tiacutetulo executivo que justifica o exerciacutecio da atividade satisfativa

O Coacutedigo Processual Civil de 2015 acertadamente ratificou as reformas promovidas

no CPC73 que consagrava a opccedilatildeo legislativa de oferecimento das tutelas de certificaccedilatildeo e

efetivaccedilatildeo do direito em um mesmo processo Dessa forma as execuccedilotildees de sentenccedilas

6 BASTOS Luiz Fernando Pereira O artigo 139 IV do novo Coacutedigo de Processo Civil a atipicidade

dos meios executivos na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia certa Brasiacutelia 2017 Disponiacutevel em lt httpbdmunbbrbitstream104831866812017_LuizFernandoPereiraBastospdf gt Acesso em 06 de agosto de 2018

7 BASTOS Luiz Fernando Pereira apud GRECO Leonardo O processo de execuccedilatildeo Rio de Janeiro Renovar 1999 p 164

9

passaram a ser uma fase complementar ao de processo de conhecimento e natildeo mais ocorrer

em um processo autocircnomo

No entendimento do professor processualista Fredie Didier et al8 o processo

sincreacutetico simplificou a efetivaccedilatildeo de um direito reconhecido em sentenccedila

A dispensa do ajuizamento de um processo autocircnomo para execuccedilatildeo de sentenccedila natildeo soacute veio diminuir o tempo necessaacuterio agrave prestaccedilatildeo da tutela jurisdicional - afinal o credor natildeo mais precisaria tal como ocorria ateacute entatildeo promover nova citaccedilatildeo pessoal do reacuteudevedor- como tambeacutem veio romper de vez com um velho paradigma segundo o qual a atividade executiva estaria dissociada da precedente atividade jurisdicional cognitiva

Entretanto natildeo soacute as sentenccedilas de meacuterito ensejam uma execuccedilatildeo Por esta razatildeo foi

necessaacuterio manter o processo autocircnomo de execuccedilatildeo para os casos em que o credor tem a seu

favor um documento que natildeo tenha sido proferido por um oacutergatildeo dotado de jurisdiccedilatildeo

Consequentemente se for o titulo executivo judicial o caminho natural eacute o do

cumprimento de sentenccedila Sendo por sua vez extrajudicial o titulo executivo o caminho

correto eacute o processo de execuccedilatildeo

Cabe ainda salientar que toda execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial eacute definitiva Jaacute a

execuccedilatildeo de tiacutetulo judicial (cumprimento de sentenccedila) pode ser definitiva ou provisoacuteria

No primeiro caso isto eacute cumprimento de sentenccedila definitivo ldquoeacute a execuccedilatildeo completa

que vai ateacute a fase final (com a entrega do bem da vida) sem exigecircncias adicionais para o

exequenterdquo 9

Quanto ao segundo caso ldquoo cumprimento provisoacuterio de sentenccedila (fundada em tiacutetulo

provisoacuterio) eacute aquele que exige alguns requisitos extras para que se chegue agrave fase final da

execuccedilatildeordquo 10

Para Fredie Didier11 o criteacuterio para definir se o cumprimento de sentenccedila seraacute

definitivo ou provisoacuterio

() eacute a estabilidade do tiacutetulo executivo em que se funda a execuccedilatildeo se se tratar de decisatildeo acobertada pela coisa julgada material o cumprimento de sentenccedila eacute

8 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 46 9 Ibid p 57 10 Ibid p 57 11 Ibid p 57

10

definitivo se se tratar de decisatildeo judicial ainda passiacutevel de alteraccedilatildeo (reforma ou invalidaccedilatildeo) em razatildeo da pendecircncia de recurso contra ela interposto a que natildeo tenha sido atribuiacutedo efeito suspensivo o cumprimento de sentenccedila eacute provisoacuterio

Ademais a execuccedilatildeo se distingue em procedimentos executivos comuns que satildeo da

execuccedilatildeo civil e que servem a uma generalidade de creacuteditos como eacute o caso do cumprimento

de sentenccedila e o processo de execuccedilatildeo E em procedimentos executivos especiais que servem

agrave satisfaccedilatildeo de creacuteditos peculiares como a execuccedilatildeo de alimentos e a execuccedilatildeo fiscal 12

Por fim cabe mencionar a classificaccedilatildeo que distingue a execuccedilatildeo em direta e indireta

A primeira execuccedilatildeo direita (ou execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo) eacute ldquo() aquela em que o

Poder Judiciaacuterio prescinde da colaboraccedilatildeo do executado para a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida

e pois promove uma substituiccedilatildeo da sua conduta pela conduta do proacuteprio Estado-juiz ou de

terceirordquo 13 Ou seja as medidas executivas satildeo levadas a efeito mesmo contra a vontade do

devedor na execuccedilatildeo direta

Segundo a doutrina a execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo se subdivide da seguinte forma

meios de desapossamento meios de transformaccedilatildeo e meios de expropriaccedilatildeo

Os meios de desapossamento muito comuns nas execuccedilotildees para entrega de coisa eacute a

forma ldquopor meio da qual se retira da posse do executado o bem a ser entregue ao exequente

(p ex despejo busca e apreensatildeo reintegraccedilatildeo de posse)rdquo 14 Ao passo que por meio dos de

transformaccedilatildeo ldquo() o juiz determina que um terceiro pratique a conduta que deveria ser

praticada pelo executado cabendo a este arcar com o pagamento do custo respectivordquo 15 Jaacute

os meios executivos de expropriaccedilatildeo eacute a forma ldquopor meio do qual algum bem do patrimocircnio

do devedor eacute expropriado para pagamento do creacutedito (adjudicaccedilatildeo alienaccedilatildeo judicial ou

apropriaccedilatildeo de frutos e rendimentos de empresa ou de estabelecimentos e de outros bens art

825 CPC)rdquo 16

12 Ibid p 48 13 Ibid p 50 14 Ibid p 51 15 Ibid p 51 16 Ibid p 51

11 Jaacute a execuccedilatildeo indireta (ou mandamental) atua ldquo() na vontade do devedor como forma

de compeli-lo ou incentivaacute-lo a cumprir a ordem judicialrdquo 17 Nesse entendimento ainda

leciona Fredie Didier et al 18

Nesses casos o Estado-juiz busca promover a execuccedilatildeo com a colaboraccedilatildeo do executado forccedilando ou incentivando a que ele proacuteprio cumpra a prestaccedilatildeo devida Em vez de o Estado-juiz tomar as providecircncias que deveriam ser tomadas pelo executado o Estado forccedila por meio de coerccedilatildeo psicoloacutegica ou de promessa de recompensa judicial a que o proacuteprio executado cumpra a prestaccedilatildeo

A execuccedilatildeo indireta pode ser patrimonial como por exemplo a imposiccedilatildeo de multa

coercitiva ou pessoal com a prisatildeo civil do devedor de alimentos Ademais adiciona Didier

et al19que

O estiacutemulo ao cumprimento da prestaccedilatildeo pode dar-se pelo temor (p ex multa coercitiva prisatildeo civil do devedor de alimentos divulgaccedilatildeo de notiacutecia em jornal revelando o descumprimento) ou pelo incentivo (p ex a chamada sanccedilatildeo premial ou sanccedilatildeo positiva de que eacute exemplo a isenccedilatildeo do pagamento de custas em caso de cumprimento do mandado monitoacuterio - art 701 sect 1ordm CPC a reduccedilatildeo pela metade dos honoraacuterios advocatiacutecios fixados inicialmente pelo juiacutezo em caso de pagamento integral do deacutebito pecuniaacuterio na execuccedilatildeo por quantia certa fundada em tiacutetulo extrajudicial - art 827 sect 1ordm CPC)

Por tais razotildees haacute uma tendecircncia em cada vez mais prestigiar os meios executivos

indiretos (coercitivos) posto que satildeo tatildeo eficazes quanto os meios executivos diretos

entretanto menos onerosos Contudo sua aplicaccedilatildeo deve ser fiscalizada a fim de natildeo permitir

que a execuccedilatildeo civil perca sua finalidade visto que eacute uma funccedilatildeo jurisdicional que tem como

escopo efetivar o direito do credor e natildeo de atender os interesses do devedor

23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL

Os princiacutepios juriacutedicos nos uacuteltimos anos passaram a ser munidos de forccedila cogente

normatizando as condutas humanas tanto quanto as regras juriacutedicas Os ditos princiacutepios

ampliaram as margens de atuaccedilatildeo dos aplicadores do direito possibilitando a construccedilatildeo de

soluccedilotildees mais adequadas agraves especificidades das demandas que chegam ao judiciaacuterio

17 Ibid p 51 18 Ibid p 51 19 Ibid p 51-52

12 Dessa forma eacute necessaacuterio aprofundar-se nos princiacutepios norteadores da execuccedilatildeo civil

para que se obtenha uma anaacutelise completa da teoria geral da execuccedilatildeo

A execuccedilatildeo civil tem como um dos seus corolaacuterios o princiacutepio da efetividade este

consiste na exigecircncia de um sistema completo de tutela executiva no qual existam meios

executivos capazes de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor

de tutela executivardquo 20

O referido princiacutepio da efetividade eacute reforccedilado como normal fundamental do processo

civil brasileiro pelo art 4ordm do CPC ldquoArt 4ordm As partes tecircm o direito de obter em prazo razoaacutevel

a soluccedilatildeo integral do meacuterito incluiacuteda a atividade satisfativa

Jaacute o princiacutepio da boa feacute processual corolaacuterio do devido processo legal estaacute previsto

no art 5ordm do CPC ldquoAquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de

acordo com a boa-feacuterdquo Segundo o processualista baiano Fredie Didier21

O princiacutepio da boa-feacute extrai-se de uma claacuteusula geral processual A opccedilatildeo por uma claacuteusula geral de boa-feacute eacute a mais correta Eacute que a infinidade de situaccedilotildees que podem surgir ao longo do processo torna pouco eficaz qualquer enumeraccedilatildeo legal exaustiva das hipoacuteteses de comportamento desleal Daiacute ser correta a opccedilatildeo da legislaccedilatildeo brasileira por uma norma geral que impotildee o comportamento de acordo com a boa-feacute Em verdade natildeo seria necessaacuteria qualquer enumeraccedilatildeo das condutas desleais o art 5deg do CPC eacute bastante exatamente por tratar-se de uma claacuteusula geral

Dessa forma o dito princiacutepio preconiza que diante de um vinculo juriacutedico as pessoas

envolvidas natildeo poderatildeo frustrar a confianccedila do outro devendo comportar-se como se pode

esperar de uma pessoa de boa-feacute

Ademais disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial que ldquosomente o

patrimocircnio do devedor (art 789 CPC) ou de terceiro responsaacutevel pode ser objeto da

atividade executiva do Estadordquo 22

O referido princiacutepio que determina que somente o patrimocircnio submete-se agrave execuccedilatildeo

e natildeo a pessoa foi trazido pela humanizaccedilatildeo do direito Para o professor Didier et al23 o

20 DIDIER JR Freddie et al apud GUERRA Marcelo Lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do

credor na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 21 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte

geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 105 22 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 68

13

desenvolvimento dos meios de execuccedilatildeo indireta ldquoparece relativizar um pouco esse princiacutepio

na medida em que pressionam psicologicamente a pessoa do devedor para que cumpra a

obrigaccedilatildeo com seu comportamentordquo

Complementa ainda que

A responsabilidade executiva parece assumir atualmente caraacuteter hiacutebrido comportando coerccedilatildeo pessoal e sujeiccedilatildeo patrimonial

i) a coerccedilatildeo pessoal incide sobre a vontade do devedor admitindo o uso de medidas coercitivas de execuccedilatildeo indireta para forccedilaacute-lo a cumprir a obrigaccedilatildeo com seu proacuteprio comportamento (ex arts 139 rv 523 sect 1ordm 536 sect 1ordm e 538 sect 3ordm todos do CPC)

ii) descumprida a obrigaccedilatildeo e natildeo sendo possiacuteveladequado o uso de teacutecnica de coerccedilatildeo pessoal tem-se a sujeiccedilatildeo patrimonial que recairaacute sobre os bens do devedor ou de terceiro responsaacutevel - que responderatildeo pela proacutepria prestaccedilatildeo in natura (ex dar coisa ou entregar quantia) ou por perdas e danos24

Dessa forma o referido princiacutepio natildeo tem aplicaccedilatildeo absoluta em razatildeo do principio da

efetividade a qual estimula o uso dos meios de coerccedilatildeo indireta para garantir o cumprimento

da obrigaccedilatildeo pelo devedor

O princiacutepio da primazia da tutela especifica (ou princiacutepio do resultado) assevera que

ldquoA execuccedilatildeo deve ser especiacutefica propiciar ao credor a satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo tal qual

houvesse o cumprimento espontacircneo da prestaccedilatildeo pelo devedorrdquo 25

O CPC de 2015 absorveu todos os avanccedilos legislativos a cerca do mote O caput do

art 497 assegura que na accedilatildeo que tenha por objeto a prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer o

juiz se procedente o pedido concederaacute a tutela especiacutefica ou determinaraacute providecircncias que

assegurem a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico equivalente O art 499 o

complementa a obrigaccedilatildeo somente seraacute convertida em perdas e danos se o autor o requerer

ou se impossiacutevel agrave tutela especiacutefica ou a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico

equivalente

O princiacutepio do contraditoacuterio eacute garantido pela constituiccedilatildeo federal e compreende o

direito de ser ouvido o direito de acompanhar os atos processuais o direito de produzir

provas participar da sua produccedilatildeo manifestar-se sobre a prova produzida e obter do juiz a

23 Ibid p 69-70 24 Ibid p 70 25 Ibid p 71

14

respectiva valoraccedilatildeo o direito de ser informado regularmente dos atos praticados no processo

o direito agrave motivaccedilatildeo das decisotildees o direito de impugnar as decisotildees 26

O contraditoacuterio tem aplicaccedilatildeo em todo processo judicial sendo aplicaacutevel tambeacutem na

execuccedilatildeo No entanto o contraditoacuterio na execuccedilatildeo natildeo ocorre com a mesma intensidade que

no processo ou na fase de conhecimento eacute o que assevera Didier et al 27

O contraditoacuterio no procedimento executivo no aspecto do direito de defesa assegurado agrave parte demandada eacute eventual porquanto depende da provocaccedilatildeo do executado que natildeo eacute chamado ajuiacutezo para defender-se mas sim para cumprir a obrigaccedilatildeo O procedimento executivo adota a teacutecnica monitoacuteria que consiste basicamente na inversatildeo do ocircnus de provocar o contraditoacuterio o reacuteu em vez de citado para manifestar-se sobre a pretensatildeo do autor eacute convocado para cumprir uma determinada obrigaccedilatildeo

Logo haacute o contraditoacuterio no procedimento executivo porem eacute eventual quanto agrave defesa

do executado

Ademais o princiacutepio da menor onerosidade eacute consagrado pelo art 805 do CPC e

dispotildee que ldquoQuando por vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz

mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o executadordquo O referido princiacutepio tem o

escopo de impedir o abuso do direito pelo exequente

O principio da menor onerosidade auxilia o juiz na escolha de um meio executivo

adequado e necessaacuterio que satisfaccedila a prestaccedilatildeo exigida pelo credor Nesse sentido eacute o

entendimento do professor Fredie Didier et al 28

O resultado a ser alcanccedilado eacute aquele estabelecido pelo direito material A maneira de se chegar ateacute esse resultado eacute que deve ser a menos onerosa possiacutevel para o executado Isso significa que a opccedilatildeo pelo meio menos gravoso pressupotildee que os diversos meios considerados sejam igualmente eficazes Assim havendo vaacuterios meios executivos aptos agrave tutela adequada e efetiva do direito de creacutedito escolhe-se a via menos onerosa ao executado

O princiacutepio visa impedir a execuccedilatildeo desnecessariamente onerosa ao executado ou seja a execuccedilatildeo abusiva Em vez de enumerar situaccedilotildees em que a opccedilatildeo mais gravosa revelar-se-ia injusta o legislador valeu-se corretamente de uma claacuteusula geral para reputar abusivo qualquer comportamento do credor que pretender valer-se de meio executivo mais oneroso do que outro igualmente idocircneo agrave satisfaccedilatildeo do seu creacutedito

26 Ibid p 76 27 Ibid p 78 28 Ibid p 79-80

15 O princiacutepio da cooperaccedilatildeo tem como base os princiacutepios do devido processo legal da

boa-feacute processual e do contraditoacuterio O dito princiacutepio avigora a eacutetica processual com o

aprimoramento do diaacutelogo entre as partes reciprocamente e com o oacutergatildeo jurisdicional Eacute o

que preconiza o art 6ordm do CPC Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para

que se obtenha em tempo razoaacutevel decisatildeo de meacuterito justa e efetiva

No procedimento executivo o princiacutepio da cooperaccedilatildeo incide de diversas formas

disciplina Didier et al29 que na execuccedilatildeo

O executado tem o dever de indicar bens agrave penhora (art 774 V CPC) Natildeo encontrados bens penhoraacuteveis e natildeo havendo indicaccedilatildeo de qualquer um deles pelo exequente cabe ao executado declarar quais satildeo seus bens penhoraacuteveis sob pena de se sujeitar a uma sanccedilatildeo pecuniaacuteria compulsoacuteria

Tambeacutem eacute manifestaccedilatildeo do princiacutepio da cooperaccedilatildeo a exigecircncia de que o executado que pretende impugnar o valor da execuccedilatildeo apresente de logo o valor que reputa devido (art 525 sect 4ordm CPC) Seria comportamento natildeo-cooperativo afirmar que a cobranccedila eacute excessiva sem simultaneamente dizer qual eacute o valor correto

Demais disso aplicam-se agrave execuccedilatildeo os deveres que decorrem do princiacutepio da cooperaccedilatildeo e que satildeo imputados ao oacutergatildeo jurisdicional () Assim por exemplo deve o juiz advertir ao executado antes de puni-lo de que seu ato pode vir a caracterizar-se como atentatoacuterio agrave dignidade da jurisdiccedilatildeo ( art 772 II CPC) perceba que se trata de uma conduta compatiacutevel com o dever de prevenccedilatildeo O oacutergatildeo jurisdicional somente pode conhecer da prescriccedilatildeo ex officio dando a oportunidade de o exequente manifestar-se conforme impotildee o dever de consulta ( cf arts 10 487 paraacutegrafo uacutenico e 921 sect 5ordm CPC)

O princiacutepio ou postulado30 da proporcionalidade tem aplicaccedilatildeo muito relevante na

execuccedilatildeo O art 8 do CPC assegura que o oacutergatildeo jurisdicional tem o dever de observar a

proporcionalidade e a razoabilidade ao aplicar o ordenamento juriacutedico inclusive no

procedimento executivo

Ademais o art 805 do CPC eacute categoacuterico ao disciplinar que ldquoArt 805 Quando por

vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo

menos gravoso para o executadordquo O referido artigo jaacute se trata de uma concretizaccedilatildeo da

proporcionalidade

29 Ibid p 82 30 Segundo Fredie Didier et al haacute uma discussatildeo doutrinaacuteria sobre a proporcionalidade Parte da

doutrina acredita que a proporcionalidade eacute um princiacutepio e outra parte acredita que eacute um postulado normativo

16 O principio da adequaccedilatildeo pode ser vislumbrado em dois momentos do Direito

Processual ldquoa) no legislativo como orientador da confecccedilatildeo das leis b) no jurisdicional

autorizando ao juiz diante do caso concreto adaptar procedimento agraves suas peculiaridadesrdquo 31

Para Luceacutelia de Sena Alves e Tiago Retes32

Isso quer dizer que no momento legislativo o devido processo deve ser observado pelo legislador para a confecccedilatildeo das normas de direito processual que iratildeo servir de instrumento efetivo de concretizaccedilatildeo do direito substancial a ser tutelado atendendo a todas as suas finalidades sob pena de falecircncia do proacuteprio direito No momento jurisdicional da mesma forma a via processual escolhida pelo autor tambeacutem deve estar sujeita a este princiacutepio para que natildeo sofra as mesmas consequecircncias da sua inobservacircncia

O ordenamento juriacutedico deve ser aplicado por meio da teacutecnica processual adequada

evitando dessa forma uma tutela ineficaz

Por fim o princiacutepio do autorregramento da vontade na execuccedilatildeo tem o objetivo de

ldquo() preservar um espaccedilo processual para o exerciacutecio da liberdade e da vontade em que

sejam permitidas negociaccedilotildees que envolvam as partes ndash e tambeacutem o juizrdquo33 Didier et al34

assevera que

A rigor o legislador estabelece um regime juriacutedico de autorregramento da vontade processual identificando-se algumas manifestaccedilotildees relevantes para a execuccedilatildeo Na verdade pode-se dizer que poucos satildeo os ambientes mais propiacutecios do que a execuccedilatildeo para a negociaccedilatildeo sobre o processo Todos os institutos e normas processuais relativos agrave execuccedilatildeo devem ser repensados a partir da premissa de que o CPC permite uma ampla margem de liberdade de negociaccedilatildeo sobre o processo (art 190 CPC)

O autorregramento da vontade pode ser vislumbrando na previsatildeo de negoacutecios tiacutepicos

em sede de execuccedilatildeo como por exemplo no acordo das partes sobre o valor do bem que

dispensa a avaliaccedilatildeo disposto no inciso I do art 871 CPC Ademais dentro dos limites do art

190 do CPC eacute possiacutevel na execuccedilatildeo a atribuiccedilatildeo da negociaccedilatildeo atiacutepica aos sujeitos 31 ALVES Luceacutelia de Sena Alves RETES Tiago O poder geral de efetivaccedilatildeo das decisotildees judiciais e

proporcionalidade uma anaacutelise criacutetica acerca do art 139 IV do Novo Coacutedigo de Processo Civil Disponiacutevel em lthttpswwwacademiaedu31752652O_poder_geral_de_efetivaC3A7C3A3o_das_decisC3B5es_judiciais_e_a_proporcionalidade_uma_anC3A1lise_crC3ADtica_acerca_do_art_139_IV_do_Novo_CC3B3digo_de_Processo_Civil gt Acesso em 25 de julho de 2018

32 Ibid natildeo paginado 33 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 85 34 Ibid p 85

17

processuais permitindo que sejam feitas mudanccedilas nos procedimentos e nas situaccedilotildees

juriacutedicas processuais ldquoSatildeo exemplos de negoacutecios processuais atiacutepicos na execuccedilatildeo pacto de

penhorabilidade acordo de ampliaccedilatildeo de prazos das partes de qualquer natureza acordo de

rateio de despesas processuais ()rdquo35

24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO

Sempre houve diversos questionamentos quanto agrave eficaacutecia do Direito processual Civil

e se o mesmo era meio apto a assegurar a tutela jurisdicional dos direitos dos cidadatildeos O

processo de execuccedilatildeo eacute o setor que sofre mais criacuteticas quanto a sua ineficiecircncia afinal a

execuccedilatildeo civil sempre foi o ldquocalcanhar de Aquilesrdquo do sistema processual pela praxe do

ldquoganhou (no processo de conhecimento) mas natildeo levou (na fase de cumprimento ou

execuccedilatildeo)rdquo 36

Essa dificuldade de se efetivar a tutela satisfastiva natildeo se resume a um problema de

mera teacutecnica processual tiacutepico de determinado ordenamento mas representa uma prova de

fogo da capacidade dos instrumentos jurisdicionais O autor Leonardo Greco37 no ano de

2005 atribuiu esse fato as seguintes causas o excesso de processos o custo e a morosidade da

justiccedila a inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios a ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais

um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico e a progressiva volatizaccedilatildeo dos bens

Quanto ao excesso de processos o referido autor aduz que ldquonos grandes centros o

crescimento da maacutequina judiciaacuteria natildeo acompanhou a expansatildeo do nuacutemero de litiacutegiosrdquo 38

O custo e morosidade da justiccedila prejudicam a tutela satisfativa posto que

ldquojaacute desfalcado pelo inadimplemento do devedor o credor ainda tem de arcar com o adiantamento das despesas do processo de execuccedilatildeo e de eventual liquidaccedilatildeo vendo arrastar-se a marcha dos atos executoacuterios facilmente retardada por atos procrastinatoacuterios do devedorrdquo 39

35 Ibid p 86 36 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca

para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018

37 GRECCO Leonardo A Crise do Processo de Execuccedilatildeo in Estudos de direito processual Leonardo Greco ndash Campos dos Goytacazes Ed Faculdade de Direito de Campos 2005 p 7

38 Ibid p 7 39 Ibid p 7-8

18 A inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios contribui para a crise do processo de

execuccedilatildeo tendo em vista que

ldquoo juiz da execuccedilatildeo prisioneiro de ritos que o distanciam das partes e da realidade da vida impulsiona sem qualquer apetite a execuccedilatildeo conduzindo-a ao sabor dos ventos das provocaccedilotildees impacientes do credor e das costumeiras procrastinaccedilotildees do devedorrdquo 40

Jaacute ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais atrapalha a efetivaccedilatildeo da tutela satisfativa ldquoo

devedor natildeo colabora com a execuccedilatildeo e os meios de pressatildeo que a lei estabelece natildeo satildeo

suficientes para intimidaacute-lordquo 41

Com um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico

O espiacuterito empresarial e a sociedade de consumo estimulam o endividamento das pessoas e o inadimplemento das obrigaccedilotildees pelo devedor deixou de ser vexatoacuterio e reprovaacutevel o que multiplica as accedilotildees de cobranccedila e execuccedilotildees atraveacutes das quais o sujeito passivo ainda usufrui vantagens agraves custas do credor 42

Por fim Leonardo Greco elenca a volatizaccedilatildeo dos bens como o uacuteltimo fator que

macula o processo executo tendo em vista que

ldquomudou inteiramente o perfil patrimonial das pessoas antes concentrado em bens de raiz e agora tendencialmente dirigido a investimentos em tiacutetulos e valores facilmente negociaacuteveis o que dificulta a sua localizaccedilatildeo pelo credorrdquo 43

O Coacutedigo de Processo Civil de 1973 introduziu o sistema executivo ao ordenamento

juriacutedico paacutetrio e seguindo os valores liberais da eacutepoca com a proteccedilatildeo de esfera juriacutedica de

liberdade do cidadatildeo contra a possibilidade de arbiacutetrio do Estado e uso indevido do Poder

jurisdicional outorgou o miacutenimo de poder ao juiz Seguindo as regras do CPC de 73 o

devedor soacute poderia ter sua esfera juriacutedica invadida atraveacutes de meios de execuccedilatildeo instituiacutedos

previamente em lei

Diante de tantos obstaacuteculos para se efetivar a tutela satisfativa a execuccedilatildeo estava

fadada ao fracasso o que frustrava a expectativa do jurisdicionado a uma prestaccedilatildeo da tutela

jurisdicional ceacutelere e efetiva Insatisfeitos com o cenaacuterio que se encontrava a atividade

40 Ibid p 8 41 Ibid p8 42 Ibid p 8 43 Ibid p8

19

executiva legisladores e operadores do direito natildeo mediram esforccedilos para promover uma

evoluccedilatildeo significativa buscando mais eficiecircncia e celeridade ao procedimento executoacuterio

Dessa forma no final de 1994 foi introduzido no coacutedigo de processo agrave flexibilizaccedilatildeo

dos poderes executoacuterios do juiz ldquopara que ele pudesse prestar uma tutela efetiva aos direitos

ficando autorizado a determinar a modalidade de execuccedilatildeo adequada a cada hipoacutetese nas

obrigaccedilotildees de fazer e natildeo fazer (art 461 sect5ordm do CPC de 1973)rdquo No ano de 2002 a referida

medida foi estendida para as obrigaccedilotildees de entregar coisa (art 461-A caput e sect3ordm do CPC de

1973)

Com fundamento nos artigos 461 e 461-A em 2005 a Lei nordm 11 23205 unificou o

processo de conhecimento e o processo de execuccedilatildeo de sentenccedila Nesse sentido Maacuterio

Henrique Cavalcanti Gil Rodrigues44 aduz que

A Lei 112322005 reuniu de forma definitiva os processos de conhecimento e de execuccedilatildeo em um uacutenico processo composto por um sistema bifaacutesico Assim passa a existir uma fase inicial (de reconhecimento) e uma fase posterior (de cumprimento de sentenccedila de efetivaccedilatildeo da decisatildeo definitiva) sem contar com a eventual fase intermediaacuteria de liquidaccedilatildeo (RODRIGUES 2010 p 38)

Ademais as alteraccedilotildees realizadas no CPC de 73 inseriu a atipicidade dos meios

executivos nas obrigaccedilotildees de fazer natildeo fazer e dar coisa certa entretanto exercendo papel

subsidiaacuterio aos meios tiacutepicos

Quanto agraves obrigaccedilotildees de pagar quantia havia apenas a possibilidade de se valer da

incidecircncia de multa do art 475-J do CPC de 73 ndash implementada mediante reforma perpetrada

pela Lei nordm 11232 de 2005 em atendimento a doutrina processualista preocupada com a

efetividade das decisotildees ndash e de atos executivos como a penhora de bens e dinheiro

Ainda que a execuccedilatildeo tenha avanccedilado com a inserccedilatildeo das leis posteriores a 1994 no

CPC de 1973 a mesma continuava insuficiente tendo em vista que a burocracia e lentidatildeo

dos atos executivos davam brechas para que o devedor escondesse seu patrimocircnio penhoraacutevel

tornando carente de efetividade e celeridade agrave execuccedilatildeo

44 RODRIGUES Maacuterio Henrique Cavalcanti Gil A evoluccedilatildeo da execuccedilatildeo de sentenccedila no direito

processual civil e o novo regime juriacutedico das sentenccedilas apoacutes a reforma implementada pela Lei 112322005 Revista do Tribunal Regional Federal da 1ordf Regiatildeo v 22 n 2 fev 2010 p 38

20

25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO

A tutela juridiscional eacute um direito fundamental previsto no art 5ordm inciso XXXV da

Carta Magna ldquo() a lei natildeo excluiraacute da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio lesatildeo ou ameaccedila a

direitordquo

Na visatildeo claacutessica o direito de accedilatildeo era efetivado com a prolaccedilatildeo de uma sentenccedila de

meacuterito posiccedilatildeo adotada por grande parte dos processualistas seguidores da doutrina de

Liebman Todavia esse conceito se mostra defasado tendo em vista que o direito de acesso agrave

justiccedila natildeo eacute apenas uma garantia formal de bater as portas do judiciaacuterio mas a garantia de

acesso agrave ordem juriacutedica justa adequada e eficaz45

Acreditar que uma sentenccedila de meacuterito favoraacutevel eacute tutela jurisdicional suficiente para

satisfazer o que se busca com o ajuizamento da accedilatildeo eacute uma visatildeo distorcida da atividade

satisfativa ldquoSob o ponto de vista do direito material a condenaccedilatildeo por si soacute eacute incapaz de

prestar a tutela do direitordquo46

Nessa oacutetica o direito fundamental agrave tutela executiva exige um sistema de tutela

jurisdicional ldquocapaz de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor

de tutela executivardquo47 Dessa forma entende-se que

ldquo() a) a interpretaccedilatildeo das normas que regulamentam a tutela executiva tem de ser feita no sentido de extrair a maior efetividade possiacutevel b) o juiz tem o poder-dever de deixar de aplicar uma norma que imponha uma restriccedilatildeo a um meio executivo sempre que essa restriccedilatildeo natildeo se justificar como forma de proteccedilatildeo a outro direito fundamental c) o juiz tem o poder-dever de adotar os meios executivos que se revelem necessaacuterios agrave prestaccedilatildeo integral de tutela executivardquo48

Egrave imperioso compreender que o direito fundamental agrave tutela executiva ratificado

pelo CPC eacute essencial para dirimir diversos litiacutegios oriundos do procedimento executivo

45 FERREIRA Gabriela Macedo Poder geral de efetivaccedilatildeo em defesa da constitucionalidade da

teacutecnica de execuccedilatildeo dos direitos do art 139 IV do Coacutedigo de Processo Civil Revista Jus Navigandi ISSN 1518-4862 Teresina ano 22 n 5178 4 set 2017 Disponiacutevel em lthttpsjuscombrartigos60190gt Acesso em 11 set 2018

46 Ibid natildeo paginado 47 DIDIER JR Fredie et al apud GUERRA Marcelo lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do credor

na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 48 Ibid p 102-104

21

ldquoprincipalmente aqueles relacionados agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo49

Fredie Didier et al50 cita como exemplo as hipoacuteteses de impenhorabilidade

A impenhorabilidade de certos bens eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa

Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais

Por esta razatildeo o legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do

CPC fazendo um preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses das partes envolvidas

optando pela mitigaccedilatildeo do direito do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado

Quando o oacutergatildeo jurisdicional verificar que a aplicaccedilatildeo das regras de

impenhorabilidade eacute desproporcional para o caso concreto deve afastaacute-la e construir a

soluccedilatildeo adequada para o referido caso Didier et al51 traz um exemplo esclarecedor em sua

obra

O bem imoacutevel que serve de moradia da famiacutelia eacute relativamente impenhoraacutevel Objetiva-se com essa restriccedilatildeo proteger o direito fundamental agrave moradia conteuacutedo do direito agrave proteccedilatildeo da dignidade Imagine-se um imoacutevel de altiacutessimo valor Imagine-se agora um creacutedito que corresponda a 40 do valor do imoacutevel A venda judicial do imoacutevel no caso permitiria natildeo soacute satisfazer o direito do credor como ainda garantir ao executado com a sobra a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel que lhe preserve a dignidade A opccedilatildeo pela interpretaccedilatildeo literal da regra que veda a penhora protegeria exclusivamente o direito do executado de maneira desnecessaacuteria porque a relaccedilatildeo valor executadovalor do bem permitiria a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel apoacutes a entrega do dinheiro ao credor Seria pois interpretaccedilatildeo em desconformidade com os preceitos da contemporacircnea hermenecircutica constitucional que preconiza a necessidade de nos casos de choque entre direitos fundamentais dar a interpretaccedilatildeo que mais adequadamente proteja a ambos

A execuccedilatildeo civil integra o direito fundamental agrave tutela jurisdicional disciplinando

que ldquoos dispositivos devem ser interpretados de modo que se garanta a maior efetividade

49 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66 50 Ibid p 66 51 Ibid p 67

22

possiacutevel agrave execuccedilatildeo desde que respeitados outros direitos fundamentaisrdquo52 Podendo ser

afastada desde que proporcional qualquer obstaacuteculo irrazoaacutevel agrave efetivaccedilatildeo desse direito

52 FERREIRA Gabriela Macedo apud MACEDO Lucas Buril de As eficaacutecias das decisotildees judiciais e

o cumprimento de sentenccedila no CPC15 Novo CPC Doutrina selecionada v 5 Execuccedilatildeo Coordenador geral Fredie Didier Jr organizadores Lucas Buril de Macedo Ravi Peixoto Alexandre Freire ndash Salvador Jus Podivm 2015 p 360361

23

3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO

EXECUTADO

31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS

Como forma de controlar a atividade jurisdicional por muito tempo vigorou o

entendimento de que a execuccedilatildeo somente poderia ser realizada atraveacutes dos meios executivos

tipicamente previstos na legislaccedilatildeo Segundo Luiz Guilherme Marinoni53

O princiacutepio da tipicidade deseja significar que os meios de execuccedilatildeo devem estar previstos na lei e assim que a execuccedilatildeo natildeo pode ocorrer atraveacutes de formas executivas natildeo tipificadas O seu objetivo eacute de um lado impedir que meio executivo natildeo previsto em lei possa ser utilizado e de outro garantir o jurisdicionado contra a possibilidade de arbiacutetrio judicial na fixaccedilatildeo da modalidade executiva Se o jurisdicionado sabe em razatildeo de previsatildeo legal que a sua esfera juriacutedica somente poderaacute ser invadida atraveacutes de determinadas modalidades executivas confere-se a ele a possibilidade de antever a reaccedilatildeo ao seu inadimplemento bem como a garantia de que a jurisdiccedilatildeo natildeo determinaraacute ou permitiraacute a utilizaccedilatildeo de meio executivo diverso daqueles previstos

Dessa forma o princiacutepio da tipicidade disciplina que o oacutergatildeo julgador ao proceder agrave

execuccedilatildeo estaacute limitado aos meios executivos previamente definidos em lei natildeo podendo se

valer de qualquer teacutecnica de efetivaccedilatildeo que natildeo se encaixasse nas hipoacuteteses taxativas da

legislaccedilatildeo

Entretanto o legislador natildeo tem como prever todas as peculiaridades dos direitos

dignos de tutela executiva e preordenar teacutecnicas executivas diversas para cada peculiaridade

Sob esse cenaacuterio o principio da tipicidade foi cedendo lugar ao principio da atipicidade dos

meios executivos

A ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do oacutergatildeo julgador estaacute cada vez mais presente

no ordenamento juriacutedico paacutetrio motivando um poder geral de efetivaccedilatildeo ldquoque permite ao

julgador valer-se dos meios executivos que considerar mais adequado ao caso concreto sejam

eles de coerccedilatildeo direta sejam de coerccedilatildeo indiretardquo 54

53 MARINONI Luiz Guilherme Teacutecnica processual e tutela dos direitos Satildeo Paulo Editora Revista

dos Tribunais 2004 p 212 nota 79 54 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 100

24

Essa tendecircncia de ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do juiz natildeo eacute exclusividade do

ordenamento juriacutedico brasileiro segundo Fredie Didier et al55

Michelle Taruffo jaacute apontava que o direito americano diante da inefetividade dos meios executivos at law comeccedilou a autorizar o magistrado a tomar medidas executivas adequadas ao caso concreto Trata-se afirma o jurista italiano de aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo segundo o qual as regras processuais devem ser adaptadas agraves necessidades do direito material

Os meios executivos atiacutepicos derivam de trecircs enunciados normativos do Coacutedigo de

Processo Civil o art 139 IV o art 297 e o sect1ordm do art 536

O art 139 IV do CPC dispotildee que pertence ao juiz o poder-dever de ldquodeterminar

todas as medidas indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para

assegurar o cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto

prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo

Jaacute o art 297 do CPC cuida da tutela provisoacuteria e garante que ldquoo juiz poderaacute

determinar as medidas que considerar adequadas para a efetivaccedilatildeo da tutela provisoacuteriardquo

Podendo dessa forma a dita tutela ser efetivada atipicamente

Por fim o art 536 sect1ordm do CPC dispotildee que

Para atender ao disposto no caput o juiz poderaacute determinar entre outras medidas a imposiccedilatildeo de multa a busca e apreensatildeo a remoccedilatildeo de pessoas e coisas o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva podendo caso necessaacuterio requisitar o auxilio de forccedila policial

As supracitadas medidas executivas atiacutepicas satildeo entendidas pela doutrina como

claacuteusulas gerais processuais executivas56 Essas claacuteusulas gerais natildeo restringem a sua

aplicaccedilatildeo agraves teacutecnicas de coerccedilatildeo indireta satildeo autorizados tambeacutem o uso de meios de execuccedilatildeo

dieta e indireta

Ademais cumpre salientar que o art 139 IV CPC aplica-se a toda e qualquer

atividade executiva ldquoa) seja fundada em tiacutetulo executivo judicial (provisoacuteria ou definitiva)

55 DIDIER JR Fredie et al apud TARUFFO Michelle A atuaccedilatildeo executiva dos direitos perfis

comparatiacutesticos Revista de Processo Satildeo Paulo RT 1990 n 59 p 78 56 Segundo Fredie Didier et al claacuteusula geral eacute uma espeacutecie de texto normativo cujo antecedente

(hipoacutetese faacutetica) eacute composto por termos vagos e consequente (efeito juriacutedico) eacute indeterminado

25

seja fundada em tiacutetulo executivo extrajudicial b) seja para efetivar prestaccedilatildeo pecuniaacuteria seja

para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer ou dar coisa distinta de dinheirordquo57

Jaacute o art 297 do CPC garante que a tutela provisoacuteria possa ser efetivada tambeacutem

atipicamente ldquoSucede que a atipicidade da tutela provisoacuteria segue necessariamente a

atipicidade da tutela definitivardquo 58

Por fim o comando do sect 1 ordmdo art 536 se aplica

a) inicialmente agrave execuccedilatildeo de fazer e de natildeo fazer fundada em decisatildeo judicial (provisoacuteria ou definitiva) b) por forccedila do sect 3ordm do art 538 tambeacutem se aplica ao cumprimento de sentenccedila para entrega de coisa c) por forccedila do art 771 paraacutegrafo uacutenico o dispositivo tambeacutem se aplica agrave execuccedilatildeo para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer e entregar coisa distinta de dinheiro fundada em tiacutetulo extrajudicial

Claramente o art 139 IV eacute mais amplo do que o sect 1 ordm do art 536 estende-se por

disposiccedilatildeo expressa agrave execuccedilatildeo de pagar quantia Sendo uma grande novidade nas obrigaccedilotildees

que tem por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15

O art 139 IV do CPC apresentou uma novidade agrave atipicidade dos meios executivos

ao disciplinar que cabe ao juiz ldquodeterminar todas as medidas indutivas coercitivas

mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o cumprimento de ordem judicial

inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo

A inovaccedilatildeo estaacute na possibilidade de utilizar os meios atiacutepicos para assegurar o

cumprimento de decisotildees que versam sobre as obrigaccedilotildees pecuniaacuterias sendo admitida a

utilizaccedilatildeo de outros meios ateacute na execuccedilatildeo de titulo judicial de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria aleacutem da

multa de 10 (a que se refere o artigo 523 sect 1ordm do CPC) para forccedilar o devedor a cumprir a

obrigaccedilatildeo pecuniaacuteria

57 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 105 58 Ibid p 105

26

Dessa forma eacute possiacutevel afirmar que ldquoao lado da disciplina tiacutepica do art 523 e

seguintes () o novo CPC inova ao permitir que o sistema de teacutecnicas executivas atiacutepicas

sejam empregadas na execuccedilatildeo monetaacuteriardquo59 (ZARONI VITORELLI 2016 p 66)

Fernando da Fonseca Gajardoni60 denomina a dita medida como a ldquorevoluccedilatildeo

silenciosardquo da execuccedilatildeo por quantia certa posto que

() pelo fato de que a regra natildeo estar propriamente incrustrada nos capiacutetulo e livro atinentes ao cumprimento de sentenccedila e ao processo de execuccedilatildeo ndash o art 139 IV do Novo CPC parece trazer ao paiacutes algo bastante novo cuja aplicaccedilatildeo a depender do comportamento do Judiciaacuterio pode implicar em verdadeira revoluccedilatildeo (positiva ou negativa) na sistemaacutetica executiva ateacute entatildeo vigente

Claramente o dispositivo foi recebido com entusiasmo por parte da doutrina que

anteciparam em afirmar que o princiacutepio da atipicidade dos meios executivos no CPC2015

ldquo() assume a feiccedilatildeo de poder-dever geral conferido ao magistrado de determinar () todas

as medidas coercitivas sub-rogatoacuterias mandamentais e indutivas que entender necessaacuterias

para a tutela justa efetiva e em tempo razoaacutevelrdquo 61

Dessa forma lecionam Luiz Guilherme Marinoni Seacutergio Cruz Arenhart e Daniel

Mitidiero62 que

O juiz a partir do art 139 IV do CPC2015 natildeo estaacute mais adstrito apenas agrave sentenccedila condenatoacuteria ndash que fixa a obrigaccedilatildeo de pagar e daacute ensejo agrave abertura da execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo patrimonial ndash para a tutela de prestaccedilotildees pecuniaacuterias Pode impor essa prestaccedilatildeo por meio de ordem judicial acoplada ao aceno de emprego de medida de induccedilatildeo (coercitiva ou de pressatildeo positiva) ou de medida de sub-rogaccedilatildeo (MARINONI ARENHARDT MITIDIERO 2015 p 703)

Deste modo em razatildeo do art 139 IV do CPC tem-se entendido que o juiz nas

execuccedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria possui a faculdade de adotar qualquer

59 ZARONI Bruno Marzullo VITORELLI Edilson Reforma e efetividade da execuccedilatildeo no novo CPC

In PEIXOTO Ravi FREIRE Alexandre MENDES Aluiacutesio Gonccedilalves de Castro Execuccedilatildeo 2 ed rev e atual Salvador JusPodivm 2016 766 p (Coleccedilatildeo novo CPC doutrina selecionada v 5) p 66

60 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia 24082015 JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Acesso em 23082018

61 LIMA Rafael de Oliveira A atipicidade dos meios executivos no coacutedigo de processo civil brasileiro de 2015 Revista de Processo Jurisdiccedilatildeo e Efetividade da Justiccedila v 2 n 2 juldez 2016 p 11

62 MARINONI Luiz Guilherme ARENHART Seacutergio Cruz MITIDIERO Daniel Novo curso de processo civil tutela dos direitos mediante procedimento comum Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 v 2 p 703

27

medida indutiva coercitiva mandamentais ou sub-rogatoacuterias para efetivar o creacutedito do

exequente natildeo se limitando as medidas tiacutepicas

Alguns doutrinadores se precipitaram ao afirmar que o dito dispositivo ldquo() autoriza o

juiz a utilizar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir ressalvando-se a prisatildeo

civil constitucionalmente limitada ao devedor de alimentosrdquo 63 Acreditam Jorge Bheron

Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa que o entusiasmo por parte da

doutrina abre margem para as mais variadas formas de compelir o devedor a cumprir com a

prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

ldquoE aiacute persistindo no mau vezo de fazer explicaccedilotildees em abstrato ignorando que o sentindo soacute se daacute na aplicaccedilatildeo (situaccedilatildeo concreta real ou fictiacutecia) as sugestatildeo satildeo as mais engenhosas suspensatildeo de CNH retenccedilatildeo de passaporte restriccedilatildeo de fim de semana cancelamento de cartotildees de creacutedito ndash para ficar apenas nestasrdquo 64

Ou seja podendo o juiz natildeo apenas substituir o devedor tomando seu patrimocircnio para

entregar ao credor na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia como tambeacutem poderaacute

pressionaacute-lo psicologicamente a adimplir por conta proacutepria a obrigaccedilatildeo

Ademais o Enunciado nordm 48 do ENFAM avalia expressamente a possibilidade de

imposiccedilatildeo de medidas coercitivas para a efetivaccedilatildeo da execuccedilatildeo pecuniaacuteria Conforme o dito

enunciado

ldquoO art 139 inciso IV traduz um poder geral de efetivaccedilatildeo permitindo a aplicaccedilatildeo de medidas atiacutepicas para garantir o cumprimento de qualquer ordem judicial inclusive no acircmbito do cumprimento de sentenccedila e no processo de execuccedilatildeo baseado em tiacutetulosrdquo

Dessa forma o artigo 139 IV do CPC permite uma gama ampla de interpretaccedilotildees por

parte da doutrina por ser uma claacuteusula geral encontrando limite apenas na imaginaccedilatildeo de

quem o analisa Nesse sentido eacute forccediloso orientar e delimitar o manejo desse artigo legal para

que se extraia seu sentido e alcance revelando assim sobre que situaccedilotildees ele incide de que

modo e o que permite

63 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

64 Ibid sem paginaccedilatildeo

28

32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER

GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO

O artigo 139 IV com a vigecircncia do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 abriu margem

para uma constelaccedilatildeo de decisotildees nas quais o dito dispositivo recebeu diversas interpretaccedilotildees

pelos operadores do direito

Sem duacutevidas por ser uma das pioneiras a decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara

Ciacutevel do Foro Regional de Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-

1320138260011 na data de 25 de agosto de 2016 gerou um enorme rebuliccedilo

Nessa accedilatildeo que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto

uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a

suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o

passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito

Segundo a magistrada o processo tramitava haacute anos sem que nenhum valor tenha sido

pago ao exequente aleacutem do devedor natildeo ter oferecido proposta de acordo e nem ter indicado

bens agrave penhora configurando uma completa desiacutedia com o processo

ldquoO caso tratado nos autos se insere dentre as hipoacuteteses em que eacute cabiacutevel a aplicaccedilatildeo do art 139 inciso IV do Coacutedigo de Processo Civil Isso porque o processo tramita desde 2013 sem que qualquer valor tenha sido pago ao exequente Todas as medidas executivas cabiacuteveis foram tomadas sendo que o executado natildeo paga a diacutevida natildeo indica bens agrave penhora natildeo faz proposta de acordo e sequer cumpre de forma adequada as ordens judiciais frustrando a execuccedilatildeo

Se o executado natildeo tem como solver a presente diacutevida tambeacutem natildeo recursos para viagens internacionais ou para manter um veiacuteculo ou mesmo manter um cartatildeo de creacutedito Se poreacutem mantiver tais atividades poderaacute quitar a diacutevida razatildeo pela qual a medida coercitiva poderaacute se mostrar efetiva

Assim como medida coercitiva objetivando a efetivaccedilatildeo da presente execuccedilatildeo defiro o pedido formulado pelo exequente e suspendo a Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo do executado M A S determinando ainda a apreensatildeo de seu passaporte ateacute o pagamento da presente diacutevida

()

Determino ainda o cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado ateacute o pagamento da presente diacutevida ()rdquo

Foi impetrado Habeas Corpus no Tribunal de Justiccedila do Estado de Satildeo Paulo a favor

do executado sob o fundamento que a coaccedilatildeo era ilegal e afetava o direito de locomoccedilatildeo

29

garantido constitucionalmente Tendo sido concedida a liminar em decisatildeo que ora se

reproduz

Em que pese a nova sistemaacutetica trazida pelo art 139 IV do CPC2015 deve-se considerar que a base estrutural do ordenamento juriacutedico eacute a Constituiccedilatildeo Federal que em seu art 5ordm XV consagra o direito de ir e vir Ademais o art 8ordm do CPC2015 tambeacutem preceitua que ao aplicar o ordenamento juriacutedico o juiz natildeo atentaraacute apenas para a eficiecircncia do processo mas tambeacutem aos fins sociais e agraves exigecircncias do bem comum devendo ainda resguardar e promover a dignidade da pessoa humana observando a proporcionalidade a razoabilidade e a legalidade Por tais motivos concedo a liminar pleiteada65

Cabe destacar aqui o voto vencido da Desembargadora Maria Luacutecia Pizzotti no

julgamento do Habeas Corpus supracitado demonstrando que o debate sobre a abrangecircncia

do artigo 139 IV do CPC ocorre tanto na doutrina quanto no judiciaacuterio

O objetivo do novel dispositivo natildeo eacute impor penas ou restringir direitos natildeo sendo intenccedilatildeo do Judiciaacuterio suspender indefinidamente o direito de dirigir do executado ou sua liberdade de viajar mas sim impor uma restriccedilatildeo tatildeo gravosa caso ele natildeo cumpra a determinaccedilatildeo que escolha cumprir sua obrigaccedilatildeo e dar fim ao problema Em outras palavras mediante as medidas de coerccedilatildeo o Estado procura persuadir o inadimplente impondo-lhe situaccedilotildees tatildeo onerosas e inconvenientes que em algum momento seja para ele mais vantajoso cumprir do que permanecer no inadimplemento

Ao fazecirc-lo o Novo Coacutedigo de Processo Civil rompe com as criacuteticas da ineficiecircncia das execuccedilotildees Natildeo se cogita deferir medidas restritivas agravequeles que demonstram a incapacidade absoluta de solver o deacutebito apenas agravequeles que reconhecidamente se valem de artimanhas e subterfuacutegios para evitar a satisfaccedilatildeo das diacutevidas ldquopreferindordquo outras despesas mais lsquonobresrsquo agindo em nome de terceiros e fazendo escaacuternio dos credores e do proacuteprio Poder Judiciaacuterio (hellip)

Para tanto memoraacutevel a noccedilatildeo de que a medida em comento tem caraacuteter excepcional e encontra limites no plano da proporcionalidade como sustenta o ilustrado Magistrado paulista Fernando da Fonseca Gajardoni Professor Faculdade de Direito de Ribeiratildeo Preto da USP (in httpswwwjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 acesso em 091216 agraves 11h20min) E para anaacutelise da proporcionalidade a ponderaccedilatildeo deve observar os trecircs passos apontados pela doutrina a necessidade a adequaccedilatildeo e a proporcionalidade em sentido estrito

65 TJSP - Habeas Corpus Processo nordm 2183713-8520168260000 30ordf Cacircmara Direito Privado relator

Des Marcos Ramos j 290317

30

Ademais no entendimento de Jorge Amaury Maia Nunes e Guilherme Pupe de

Noacutebrega66 essa decisatildeo releva os perigos trazidos pelo art 139 IV do CPC ao confrontar

direitos constitucionalmente garantidos

De nossa parte entendemos que a liberdade de locomoccedilatildeo inserta no inciso XV do artigo 5ordm que abrange o direito de deixar o territoacuterio nacional sofre embaraccedilo indevido pela apreensatildeo de passaporte ou pela suspensatildeo da carteira nacional de habilitaccedilatildeo

()

Agrave luz da exposiccedilatildeo feita acima e em anaacutelise primeva sustentamos que o artigo 139 IV do CPC de 2015 estaacute a merecer declaraccedilatildeo de inconstitucionalidade sem reduccedilatildeo de texto para o fim de rechaccedilar a apreensatildeo de passaporte a suspensatildeo do direito de dirigir e a vedaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo em concurso ou em licitaccedilatildeo puacuteblicos como medidas passiacuteveis de serem adotadas pelo juiz sob pena de vulneraccedilatildeo aos artigos 1ordm IV 5ordm XV e LIV 37 I 173 sect 3ordm III e 175 todos da Constituiccedilatildeo

Apesar de ter sofrido duras criacuteticas a decisatildeo do processo de nordm 4001386-

1320138260011 serviu de inspiraccedilatildeo para tantas outras decisotildees no mesmo sentido

Foi o caso da decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de Satildeo

Vicente em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 0020724-2620088260590 na data de 21 de

junho de 2017

A supracitada execuccedilatildeo se arrastava por nove (09) anos sem que o devedor tenha

esboccedilado qualquer intenccedilatildeo de pagar a diacutevida O credor requereu a suspensatildeo da Carteira

Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado apreensatildeo do passaporte e cancelamento dos

cartotildees de creacutedito

O magistrado com embasamento no artigo 139 IV do CPC deferiu parcialmente o

pedido sob o fundamento de que a apreensatildeo de passaporte e CNH natildeo viola o direito de ir e

vir do devedor Entretanto o juiz indeferiu o pedido de cancelamento do cartatildeo de creacutedito por

acreditar que a suspensatildeo poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado tendo em

vista que atualmente as pessoas utilizam o referido cartatildeo para pagamento das despesas

diaacuterias

66 NOBREacuteGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139

IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018

31

Eacute evidente que as medidas atiacutepicas de coerccedilatildeo devem ser utilizadas com cautela sempre respeitando a dignidade da pessoa do executado Natildeo se vislumbra contudo que as medidas aqui eleitas sejam capazes de vulnerar os Direitos Fundamentais do indiviacuteduo A uma porque natildeo se trata de restriccedilatildeo ao direito de ir e vir do executado que continua no gozo de plena liberdade de locomoccedilatildeo a duas porque a conduccedilatildeo de veiacuteculo automotor eacute mera comodidade da vida moderna natildeo se tratando de direito absoluto

Com mais razatildeo ainda se admite a suspensatildeo do Passaporte do executado que se natildeo paga a diacutevida da execuccedilatildeo natildeo deve ter o direito de fazer viagem internacional

Tem-se aqui verdadeiro exerciacutecio de ponderaccedilatildeo de interesses juriacutedicos de um lado jaz o direito de creacutedito do exequente que deriva do direito de propriedade e por isso mesmo tem envergadura constitucional de outro giro tem-se o direito do executado agrave autorizaccedilatildeo do Estado para conduzir veiacuteculo automotor e realizar viagens internacionais que natildeo se mostram essenciais agrave dignidade da pessoa humana Natildeo haacute duacutevidas pois de que eacute este uacuteltimo que deve sucumbir

O pedido fica indeferido apenas no tocante agrave suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado Eacute que ao contraacuterio da CNH e do passaporte que trazem consigo certa presunccedilatildeo de riqueza natildeo se pode concluir que o uso de cartatildeo de creacutedito eacute feito por luxo ou simples conveniecircncia

Como eacute cediccedilo os cartotildees de creacutedito oferecem ao seu titular creacutedito raacutepido e rotativo para o pagamento de despesas diaacuterias e certamente exercem funccedilatildeo essencial agravequeles que se encontram em situaccedilatildeo financeira precaacuteria

A suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado portanto se revela medida desproporcional e que inclusive poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado

Pelo exposto defiro em parte o pedido formulado pelo exequente e DETERMINO a suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo e bem como a suspensatildeo da validade (cancelamento temporaacuterio) no sistema SINPA de eventuais passaportes vaacutelidos em nome do executado

Dessa forma o artigo 139 IV do CPC revolucionou completamente a execuccedilatildeo de

obrigaccedilatildeo de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria ao permitir a utilizaccedilatildeo do uso dos meios executivos

atiacutepicos para compelir o executado a satisfazer o creacutedito do exequente

33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE

EFETIVACcedilAtildeO

Era inevitaacutevel que o artigo 139 IV do CPC gerasse todo tipo de reaccedilatildeo entre os

doutrinadores do processo civil e ateacute mesmo de outros ramos do direito devido a sua

capacidade de realizar uma completa inovaccedilatildeo na forma de se executar as obrigaccedilotildees de pagar

quantia Alguns o aplaudiram visualizando nele ldquouma luz no fim do tuacutenelrdquo outros o

criticaram vislumbrando as arbitrariedades que poderiam ser praticadas com embasamento no

referido dispositivo

32

As decisotildees suscitadas em linhas preteacuteritas auxiliaram para fervilhar ainda mais o

debate sobre o tema tendo em vista que por um lado poderia aumentar a efetividade das

execuccedilotildees por quantia no entanto por outro surgiam questionamentos a cerca da sua

constitucionalidade

A doutrina parece que demoraraacute a se pacificar sobre o tema Segundo alguns

doutrinadores seraacute inconstitucional toda restriccedilatildeo que recaia sobre a pessoa do devedor e natildeo

exclusivamente sobre o seu patrimocircnio Jaacute para outros o dispositivo eacute constitucional e o meio

mais eficaz para se resolver o problema da efetivaccedilatildeo das execuccedilotildees de pagar quantia ldquoA

discussatildeo se daacute especialmente no que diz respeito aacutes medidas de suspensatildeo de CNH

apreensatildeo de passaporte e bloqueio de cartotildees de creacutedito do devedorrdquo 67

O professor Thiago Rodovalho analisou detalhadamente a decisatildeo de nordm 4001386-

1320138260011 em seu artigo ldquoO necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na

concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivosrdquo 68 Quanto agrave suspensatildeo da CNH o autor

acredita que tal medida natildeo viola qualquer direito fundamental do devedor posto que ldquodirigir

veiacuteculos automotores eacute direito do cidadatildeo mas natildeo se confunde com os direitos fundamentais

e social de ir-e-vir e ao transporterdquo 69 O professor eacute categoacuterico ao afirmar que

Com relaccedilatildeo agrave suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (suspensatildeo do direito de dirigir restriccedilatildeo de direitos) natildeo nos parece haver qualquer violaccedilatildeo a direito fundamental ou social nem a direito da personalidade ou colocaccedilatildeo do devedor em situaccedilatildeo desproporcionalmente detrimentosa exceccedilatildeo feita aos que usam o veiacuteculo como instrumento de trabalho atraindo a hipoacutetese do NCPC art 833 inc V

()

Outrossim natildeo o consideramos como direito da personalidade Os direitos da personalidade satildeo os valores fundamentais que compotildeem o proacuteprio ser justamente por isso intransmissiacuteveis e irrenunciaacuteveis natildeo podendo o seu exerciacutecio sofrer limitaccedilatildeo voluntaacuteria (CC art 11) Por mais que vivamos num paiacutes que tanto valoriza o carro e que muitas pessoas de fato se compreendam em razatildeo e em funccedilatildeo do carro que dirijam este natildeo nos parece ser um direito que verdadeiramente componha a personalidade do indiviacuteduo70

67 DONTOS Sofia Poderes executoacuterios do juiz que diz a doutrina sobre o art 139 inc IV do CPC

Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigospoderes-executorios-do-juiz-que-diz-a-doutrina-sobre-art-139-inc-iv-do-cpc-23052018 gt Publicado em 23052018 Acesso em 01082018

68 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018

69 Ibid sem paginaccedilatildeo 70 Ibid sem paginaccedilatildeo

33

Quanto ao cancelamento dos cartotildees de credito do devedor o professor Thiago

Rodovalho tambeacutem acredita que natildeo haacute qualquer violaccedilatildeo ao direito fundamental social ou

da personalidade do devedor e acrescenta que

Tanto assim o eacute que ser titular de um cartatildeo de creacutedito pressupotildee ter creacutedito o que eacute analisado e concedido por instituiccedilotildees financeiras mais do que isso se porventura passando por dificuldades financeiras a pessoa deixa de honrar com pagamentos a mesma instituiccedilatildeo financeira concedente do cartatildeo de creacutedito pode sponte propria cancelaacute-lo ou recusar-lhe a concessatildeo Ora parece-me contraditoacuterio que instituiccedilotildees financeiras para sua proteccedilatildeo patrimonial possam ferir esse suposto ldquodireito fundamentalrdquo ou esse suposto ldquodireito da personalidaderdquo mas natildeo possa o Poder Judiciaacuterio igualmente fazecirc-lo contra aquele devedor moroso que instado ao pagamento e frustradas todas as tentativas de constriccedilatildeo patrimonial leva vida luxuosa valendo-se de cartotildees de creacutedito que prescindem de dinheiro em conta eacute dizer podem justamente funcionar como forma de ocultar renda e patrimocircnio71

O autor considera a apreensatildeo de passaporte um tema mais polecircmico e que merece

maior reflexatildeo No entanto crecirc que eacute possiacutevel a apreensatildeo de passaporte sem violar os

direitos fundamentais do devedor por se tratar de um direito de ir e vir de amplitude especial

Agrave primeira vista a possibilidade de apreensatildeo do passaporte tambeacutem nos parece possiacutevel pois tambeacutem se trata de um direito de ir e vir de amplitude especial Assim o eacute pois salvo situaccedilotildees especiais (refugiados p ex) haacute a necessidade de demonstrar condiccedilotildees financeiras de estadia e retorno para ser admitido no paiacutes de destino Ou seja pressupotildee uma condiccedilatildeo financeira que o devedor justamente diz natildeo possuir Sem embargo dessa consideraccedilatildeo esse ainda eacute um ponto que merece uma reflexatildeo mais acurada sendo essa apenas uma primeira impressatildeo72

Outros autores escreveram sobre o tema como eacute o caso do processualista Luiz

Dellore73 que tambeacutem defende que as medidas atiacutepicas como restriccedilatildeo ao direito de dirigir

apreensatildeo de passaporte e cancelamento de cartotildees de creacutedito satildeo permitidas e natildeo violam em

regra os direitos fundamentais do devedor

De minha parte creio que efetivamente haacute inovaccedilatildeo no at 139 IV do NCPC (e natildeo mera repeticcedilatildeo do que jaacute havia no Coacutedigo anterior) que tem o condatildeo de trazer mais efetividade ao processo executivo no Brasil ndash que por deacutecadas centrou sua atenccedilatildeo na defesa do executado (vide a grande quantidade de impenhorabilidades) sem dar maior atenccedilatildeo ao creacutedito do exequente

71 Ibid sem paginaccedilatildeo 72 Ibid sem paginaccedilatildeo 73 DELLORE Luiz NCPC Atipicidade das medidas executivas jaacute eacute realidade Disponiacutevel em lt

httpswwwjotainfoopiniao-e-analisecolunasnovo-cpcncpc-atipicidade-de-medidas-executivas-ja-e-realidade-17042017 gt Publicado em 17042017 Acesso em 03092018

34

Logo a meu ver medidas como (i) restriccedilatildeo ao direito de dirigir (ii) apreensatildeo de passaporte (iii) cancelamento de cartotildees de creacutedito e (iv) vedaccedilatildeo de obtenccedilatildeo de novos empreacutestimos se natildeo vinculados ao pagamento do deacutebito exequendo dentre outras restriccedilotildees que deveratildeo ser observadas a cada caso satildeo permitidas pelo sistema do NCPC e em regra natildeo violam direitos fundamentais do devedor E tecircm o condatildeo de fazer com que o executado que tem recursos diante dessas medidas coercitivas pague o deacutebito trazendo sucesso agrave satisfaccedilatildeo do creacutedito

Nessa linha para Alexandre Fuchs das Neves74 o artigo 139 IV do CPC conferiu ao

juiz poderes coercitivos capazes de ldquotransformar a vida do devedor um infernordquo para compeli-

lo a cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria Entretanto pondera que para que a medida tenha

validade ldquoeacute necessaacuteria uma fundamentaccedilatildeo por evidente uma correlaccedilatildeo temaacutetica entre a

medida adotada e sua efetividade em face ao processo com fundamentaccedilatildeo detalhadardquo

No entendimento de Fernando Gajardoni75 satildeo possiacuteveis as medidas de apreensatildeo de

passaporte bloqueio de cartotildees de creacutedito e suspensatildeo da CNH Para ele o que limita o art

139 IV do CPC eacute o esgotamento dos meios tiacutepicos e a real necessidade da medida

Ilustrativamente natildeo efetuado o pagamento de diacutevida oriunda de multas de tracircnsito e superados os expedientes tradicionais de adimplemento (penhora de dinheiro e bens) seria liacutecito o estabelecimento da medida coercitivaindutiva de suspensatildeo do direito a conduzir veiacuteculo automotor ateacute pagamento do deacutebito (inclusive com apreensatildeo da CNH do devedor) natildeo efetuado pagamento de verbas salariais devidas a funcionaacuterios da empresa possiacutevel o estabelecimento de vedaccedilatildeo agrave contrataccedilatildeo de novos funcionaacuterios ateacute que seja saldada a diacutevida natildeo efetuado o pagamento de financiamento bancaacuterio na forma e no prazo avenccedilados possiacutevel ateacute que se tenha a quitaccedilatildeo que se obstem novos financiamentos ou mesmo a participaccedilatildeo do devedor em licitaccedilotildees (como de ordinaacuterio jaacute acontece com pessoas juriacutedicas em deacutebito tributaacuterio com o Poder Puacuteblico) etc

Teriacuteamos entatildeo no Brasil por assim dizer a adoccedilatildeo do padratildeo da atipicidade das medidas executivas tambeacutem para as obrigaccedilotildees de pagar vistas estas como ordens do EstadoJuiz para que haja prestaccedilatildeo de pagamento em pecuacutenia

()

Por isso ndash a prevalecer a interpretaccedilatildeo potencializada do art 139 IV do CPC2015 ndash o emprego de tais medidas coercitivasindutivas especialmente nas obrigaccedilotildees de pagar encontraraacute limite certo na excepcionalidade da medida (esgotamento dos meios tradicionais de satisfaccedilatildeo do deacutebito) na proporcionalidade (inclusive agrave luz da regra da menor onerosidade ao devedor do art 805 do CPC2015) na necessidade de fundamentaccedilatildeo substancial e especialmente nos direitos e garantias assegurados na Constituiccedilatildeo Federal (vg natildeo parece possiacutevel que se determine o pagamento sob pena de prisatildeo ou de vedaccedilatildeo ao exerciacutecio da profissatildeo do direito de ir e vir etc)

74 NEVES Alexandre Fuchs das Cancelamento de cartotildees de creacutedito e apreensatildeo de CNH e passaporte

do devedor Isso eacute possiacutevel Disponiacutevel em lt httpwwwsinfacspcombrconteudocancelamento-de-cartoes-de-credito-e-apreensao-de-cnh-e-passaporte-do-devedor-isso-e-possivel gt Acesso em 30082018

75 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Publicado em 24082015 Acesso em 30082018

35

Jaacute Fernanda Tartuce76 acredita que tais medidas satildeo problemaacuteticas e devem ser

analisadas com cautela tendo em vista que ao inveacutes de afetarem o patrimocircnio do devedor

atingem a proacutepria pessoa

Sob certo prisma adotar medidas diferenciadas contribui para a efetividade da prestaccedilatildeo jurisdicional Por outro lado o patrimocircnio ndash e natildeo a pessoa do devedor - responde por diacutevidas aleacutem disso o exerciacutecio de amplos poderes pelo juiz sem balizas especiacuteficas pode ensejar medidas inadequadas Nessa linha suspender o direito de dirigir e restringir o uso de passaporte satildeo iniciativas problemaacuteticas por atingirem a pessoa do devedor enquanto a penhora da restituiccedilatildeo de Imposto de Renda soa viaacutevel por afetar seu patrimocircnio Eacute importante que a medida diferenciada se revele proporcional e seja aplicada apoacutes o exaurimento de outros meios previstos no ordenamento Como a proposta do Novo Coacutedigo eacute aumentar a eficiecircncia processual intentar medidas ineficazes inexequiacuteveis eou de difiacutecil fiscalizaccedilatildeo pode acabar ensejando o efeito contraacuterio

Nessa senda Lenio Streck e Dierle Nunes77 entendem que as medidas atiacutepicas de

suspensatildeo da CNH eou apreensatildeo de passaporte satildeo inconstitucionais Afirmam que natildeo se

pode confundir o processo civil e penal ainda que ambos remetam a um ldquoparadigma

constitucional comumrdquo e que o artigo 139 IV do CPC ldquoimpotildee novos desafios interpretativos

que podem conduzir a uma anaacutelise superficial e utilitarista de busca de resultados que

desprezem a necessaacuteria leitura constitucionalrdquo Os autores ainda ponderam que ldquoO perigo eacute o

artigo 139 IV ser transformado em instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com

autorizaccedilatildeo judicialrdquo

O professor Araken de Assis no dia 18 de abril de 2018 em um evento sobre o

Coacutedigo Processual Civil de 2015 que ocorreu em Brasiacutelia na sede do Conselho Federal da

OAB declarou ser contraacuterio aos poderes executoacuterios atiacutepicos ldquoSou contra os poderes

atiacutepicos dos juiacutezes porque seu exerciacutecio redunda em simples arbitrariedadesrdquo78

Acrescentou ainda que

76 IBDFAM ndash Instituto Brasileiro de Famiacutelia O polecircmico inciso IV do artigo 139 do CPC e suas difusas

interpretaccedilotildees Disponiacutevel em lt httpwwwibdfamorgbrnoticias6096O+polC3AAmico+inciso+IV+do+artigo+139+do+CPC+e+suas+difusas+interpretaC3A7C3B5es gt Publicado em 31082016 Acesso em 04092018

77 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018

78 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04092018

36

Eacute evidentemente inconstitucional diante do princiacutepio da dignidade da pessoa humana tirar o passaporte carteira de habilitaccedilatildeo Quecirc que tem isso com diacutevidas Natildeo tem absolutamente nada Natildeo eacute a correlaccedilatildeo instrumental entre o objetivo da execuccedilatildeo e o meio empregado Isso eacute simples vinganccedila simples puniccedilatildeo79

O professor Araken de Assis acredita que tais medidas satildeo inconstitucionais e

violam o principio da dignidade humana do executado numa sociedade como a nossa

sedenta por puniccedilatildeo natildeo me surpreende que essas ideias sejam encaradas com

naturalidade Mas eacute preciso rejeitaacute-las em nome de princiacutepios 80

34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO

A Constituiccedilatildeo Federal de 1988 tem como um dos seus fundamentos a dignidade da

pessoa humana presente no artigo 1ordm inciso III do referido texto constitucional O dito

princiacutepio tem o escopo de nortear o ordenamento juriacutedico como um todo

A inclusatildeo da dignidade da pessoa humana como princiacutepio constitucional obrigou

uma reflexatildeo sobre o papel da pessoa humana no direito e um redimensionamento para

elevaacute-la ao centro do ordenamento juriacutedico81 Eacute necessaacuterio recorrer agrave teoria Kantiana para

que se obtenha uma definiccedilatildeo do princiacutepio ora estudado Para Kant82 o homem eacute um fim

em si mesmo natildeo uma funccedilatildeo do Estado Ou Naccedilatildeo O Estado e o direito devem estar

organizados em benefiacutecio do indiviacuteduo

Agora eu afirmo o homem ndash e de uma maneira geral todo o ser racional ndash existe como fim em si mesmo e natildeo apenas como meio para o uso arbitraacuterio desta ou daquela vontade Em todas as suas accedilotildees pelo contraacuterio tanto nas direcionadas a ele mesmo como nas que o satildeo a outros seres racionais deve ser ele sempre considerado simultaneamente como fim

Partindo da premissa de que para Immanuel Kant o homem eacute o fim em si mesmo

ldquodevemos compreender que a dignidade da pessoa humana eacute a noccedilatildeo o comando a direccedilatildeo

que se deve seguir funcionando como fundamento para a interpretaccedilatildeo de todos os direitos e

garantias conferidos agrave pessoa nos ordenamentos juriacutedicos de cada Estadordquo 83

79 Ibid sem paginaccedilatildeo 80 Ibid sem paginaccedilatildeo 81 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito

fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 461 82 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud KANT Immanuel Fundamentaccedilatildeo da metafiacutesica dos costumes

Satildeo Paulo Martin Claret 2003 p56-59 Coleccedilatildeo A Obra-Prima de Cada Autor 83 SCHIAFIANO Juliana Rocha op cit p 461

37

O princiacutepio constitucional da dignidade da pessoa humana estaacute diretamente ligado ao

conteuacutedo dos direitos fundamentais logo para que se cumpra com os direitos fundamentais

constitucionalmente instituiacutedos eacute necessaacuterio reconhecer e respeitar a dignidade da pessoa

humana conforme disciplina Ingo Sarlet84

Em suma o que se pretende sustentar de modo mais enfaacutetico eacute que a dignidade da pessoa humana na condiccedilatildeo de valor (principio normativo) fundamental que atrai o conteuacutedo de todos os direitos fundamentais exige e pressupotildee o reconhecimento e proteccedilatildeo dos direitos fundamentais de todas as dimensotildees (ou geraccedilotildees se assim preferirmos) Assim sem que se reconheccedilam agrave pessoa humana os direitos fundamentais que lhe satildeo inerentes em verdade estarse-aacute lhe negando a proacutepria dignidade A consagraccedilatildeo constitucional da dignidade da pessoa humana tem o propoacutesito de limitar a atuaccedilatildeo ou a omissatildeo do Estado para garantir os direitos do indiviacuteduo Assim eacute difiacutecil precisar os efeitos da norma que determina a dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado (como acontece com a Constituiccedilatildeo brasileira de 1988) poreacutem quando desrespeitados os direitos fundamentais do cidadatildeo eacute possiacutevel identificar que a dignidade deste foi violada

Logo ldquoteraacute respeitada a sua dignidade o individuo que tiver respeitados os seus

direitos fundamentaisrdquo 85 Os direitos fundamentais estatildeo apresentados na Constituiccedilatildeo

Federal da seguinte forma direitos individuais e coletivos direitos sociais direitos poliacuteticos e

direitos de nacionalidade que tecircm como escopo garantir as liberdades positivas aos

indiviacuteduos ldquoonde foram conquistados direitos agrave liberdade religiosa liberdade civil e

profissional agrave propriedade ao livre acesso ao Judiciaacuterio agrave ampla defesa e ao contraditoacuterio no

processual judicial ao sigilo de dados e informaccedilotildees pessoais entre outros que somados

garantem o cidadatildeo uma vida dignardquo 86

O cidadatildeo na Constituiccedilatildeo Federal de 88 diferente das constituiccedilotildees brasileiras

anteriores passou a ser fundamento e ganhou destaque nos direitos fundamentais tendo

garantida a sua vida a sua dignidade a sua seguranccedila a sua honra a sua liberdade e a sua

propriedade

84 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud SARLET Ingo Wolfgang Dignidade da pessoa humana e

direitos fundamentais na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 2ed Porto Alegre Livraria do Advogado 2002 p87 85 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito

fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 462 86 Ibid p 462

38

Segundo Carmem Luacutecia Antunes Rocha87 para garantir o Estado Democraacutetico de

Direito eacute necessaacuterio que a sua atuaccedilatildeo seja sempre em conformidade com o princiacutepio da

dignidade da pessoa humana

O Estado somente eacute democraacutetico em sua concepccedilatildeo constitucionalizaccedilatildeo e atuaccedilatildeo quando respeita o princiacutepio da dignidade da pessoa humana Natildeo haacute verbo constitucional natildeo haacute verbo governamental que se faccedilam legiacutetimos quando natildeo se voltam ao atendimento daquele princiacutepio Natildeo haacute verdade constitucional natildeo haacute suporte institucional para as poliacuteticas puacuteblicas que natildeo sejam destinadas ao pleno cumprimento daquele valor maior transformado em princiacutepio constitucional

O princiacutepio da dignidade humana constitucionalmente garantido impotildee limites ao

Estado compelindo aos oacutergatildeos e atividades estatais respeitar o ser humano e garanti-lo

condiccedilotildees miacutenimas para uma vida digna Dessa forma eacute niacutetido que o dito princiacutepio eacute

pressuposto e indispensaacutevel para legitimar outras normas constitucionais e

principalmente infraconstitucionais

O Coacutedigo de Processo Civil eacute umas das principais normas infraconstitucionais que

sofre influecircncia dos preceitos valores e princiacutepios esculpidos na Constituiccedilatildeo Federal

Logo como o principio da dignidade humana eacute um dos mais importantes pressupostos

constitucionais ldquoentatildeo eacute tranquilo afirmar-se que o novel ordenamento processual tem

de se render nas resoluccedilotildees dos aspectos processuais e a fim de se atingir uma soluccedilatildeo

justa adequada e efetiva ao postulado da dignidade da pessoa humanardquo 88

Dessa forma o legislador deve formular as normas infraconstitucionais de acordo e a

partir do conteuacutedo constitucional para Marinoni Mitidiero e Arenhart89

() o Coacutedigo de Processo Civil constitui direito constitucional aplicado O Coacutedigo deve ser interpretado de acordo com a Constituiccedilatildeo e com os direitos fundamentais o que significa que as duacutevidas interpretativas devem ser resolvidas a favor da otimizaccedilatildeo do alcance da Constituiccedilatildeo e do processo civil como meio para tutela de direitos

87 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud ROCHA Carmen Luacutecia Antunes O princiacutepio da dignidade da

pessoa humana e a exclusatildeo social Revista Interesse Puacuteblico n4 p23-48 1999 p33 88 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o

novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 367

89 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 14

39

Com o escopo de conferir eficaacutecia aos mandamentos constitucionais o CPC15 traz a

previsatildeo e diversas claacuteusulas gerais em seus primeiros artigos em um dos quais se

prestigia o princiacutepio da dignidade da pessoa humana

O referido princiacutepio estaacute disciplinado no artigo 8ordm do CPC15 e atua como um guia

sobre as demais normas do coacutedigo processual Eacute o que entende Nelson Rosenvald90

O maior cuidado do inteacuterprete eacute no sentido de jamais banalizar a dignidade fazendo dela um elixir processual tal como muitas vezes se vecirc na esfera do direito civil Penso que natildeo haacute maiores dificuldades em transpor a noccedilatildeo constitucional do princiacutepio para em seguida adaptaacute-la agraves singularidades do processo

Logo de acordo com o artigo 8ordm do CPC o oacutergatildeo julgador ao aplicar o ordenamento

juriacutedico deve resguardar a dignidade da pessoa humana Para Fredie Didier91 ldquoresguardar

nesse contexto eacute de um lado aplicar corretamente a norma juriacutedica lsquoproteccedilatildeo da dignidade

da pessoa humanarsquo e de outro natildeo violar a dignidaderdquo

O oacutergatildeo julgador deveraacute manter um comportamento ativo com o objetivo de promover

a dignidade da pessoa humana podendo tomar medidas de ofiacutecio para efetivar a dignidade da

pessoa humana Didier assevera que o magistrado poderaacute ainda ldquovaler-se da claacuteusula geral de

atipicidade (art 536 sect 1ordm) para a execuccedilatildeo do direito fundamental agrave dignidaderdquo 92 O autor

ainda traz dois exemplos

a) exigecircncia de respeito agrave ordem cronoloacutegica de conclusatildeo (art 12) caso de grave violaccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana que natildeo se encaixe em um dos incisos que excepcionam a regra de observacircncia da cronologia da conclusatildeo poderia o juiz ldquofurar a filardquo para promover a dignidade da pessoa humana b) prioridade na tramitaccedilatildeo processual pessoa que seja portadora de doenccedila grave mas que natildeo esteja no rol do art 1048 I para promover a dignidade de pessoa humana o juiz poderia determinar o processamento prioritaacuterio93

Essa dupla garantia ndash resguardo e promoccedilatildeo ndash tem como objetivo garantir ao individuo

sua dignidade humana fazendo com que ldquode um lado que o Estado natildeo a viole e de outro

que o Estado a promova e efetiverdquo

90 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud ROSENVALD Nelson A

dignidade da pessoa humana no CPC15 91 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte

geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 75 92 Ibid p 75 93 Ibid p 75

40

Nessa senda o magistrado deveraacute promover a dignidade da pessoa humana quando

perceber a ausecircncia desta no processo ou assegura-la quando for posta em risco Eacute nesse

sentido o entendimento dos professores Marinoni Mitidiero e Arenhart94

() a dignidade da pessoa humana determina a compreensatildeo do processo civil como um meio para tutela dos direitos Vale dizer o processo civil natildeo pode ser visto como um instrumento a serviccedilo do Estado como um instrumento que natildeo se encontre orientado agrave realizaccedilatildeo dos fins da pessoa humana Em outras palavras o processo civil serve para realizaccedilatildeo dos direitos e para orientaccedilatildeo das pessoas a respeito do significado do direito

Nessa senda compete tanto ao juiz quanto as demais partes processuais garantirem ldquoo

valor intriacutenseco de cada vida que eacute trazida ao processordquo nas palavras de Alexandre Freitas

Cacircmara95

() aos sujeitos do processo eacute preciso sempre ter claro que os titulares dos interesses em conflitos satildeo pessoas reais cujas vidas seratildeo afetadas pelo resultado do processo e que por isso mesmo tecircm o direito de estabelecer suas estrateacutegias processuais de acordo com aquilo que lhes pareccedila melhor para suas vidas Eacute inadmissiacutevel tratar as partes como se natildeo fossem pessoas reais meros dados estatiacutesticos Afinal se para o Judiciaacuterio cada processo pode parecer apenas mais um processo para as partes cada processo pode ser o uacutenico o mais relevante aquele em que sua vida seraacute decidida E eacute dever do juiz assegurar que isto seja respeitado

Dessa forma eacute necessaacuterio que um arcabouccedilo normativo para que seja conferida

eficaacutecia e proteccedilatildeo ao principio da dignidade da pessoa humana

Logo o dito princiacutepio deve ser protegido em todas as esferas do ordenamento juriacutedico

inclusive no campo da execuccedilatildeo civil onde sofre grandes riscos de ser violado em nome do

direito fundamental agrave tutela executiva do credor ldquoPartir da premissa de que existe um direito

fundamental agrave tutela executiva ora ratificado pelo CPC eacute indispensaacutevel para a soluccedilatildeo de

diversos problemas oriundos do procedimento executivo principalmente aqueles relacionados

agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo 96

94 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme

MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 25

95 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CAcircMARA Alexandre Freitas O Novo Processo Civil Brasileiro 2 ed Satildeo Paulo Atlas 2016 p 7

96 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66

41

Eacute o caso por exemplo da impenhorabilidade Segundo Fredie Didier et al97 a

impenhorabilidade eacute uma forma de proteger certos bens do devedor do direito fundamental a

execuccedilatildeo do credor

Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa

Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais

O legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do CPC fazendo um

preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses em anaacutelise ao optar pela mitigaccedilatildeo do direito

do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado Afinal ldquoa execuccedilatildeo natildeo pode ser utilizada

como instrumento para causar a ruiacutena a fome e o desabrigo do devedor e sua famiacutelia gerando

situaccedilotildees incompatiacuteveis com a dignidade da pessoa humana 98

Logo a impenhorabilidade de certos bens

[] Eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa99

Eacute nesse sentido que o CPC15 enumera diversos casos de bens patrimoniais que satildeo

impenhoraacuteveis como o salaacuterio e vencimentos utensiacutelios necessaacuterios ao exerciacutecio da

profissatildeo seguro de vida vestuaacuterios e pertences de uso pessoal entre outros

Dessa forma as regras relativas agraves medidas executivas devem ser interpretadas agrave luz

da Constituiccedilatildeo Federal ldquovez que se voltam agrave realizaccedilatildeo de direitos fundamentais e em sua

97 Ibid p 66 98 THEODORO JUacuteNIOR Humberto Novo Coacutedigo de Processo Civil Anotado 20 ed Rio de Janeiro

Forense 2016 p 978 99 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud DIDIER JR Fredie CUNHA

Leonardo Carneiro da BRAGA Paula Sarno OLIVEIRA Rafael Alexandria de Curso de direito processual civil 3 ed Salvador JusPodivm 2011 v 5 p 547

42

realizaccedilatildeo podem atingir direitos fundamentaisrdquo 100 O Superior Tribunal de Justiccedila jaacute decidiu

que

O rol das impenhorabilidades do ordenamento paacutetrio objetiva preservar o miacutenimo patrimonial necessaacuterio agrave existecircncia digna do executado impondo ao processo executoacuterio certos limites Assim a depender das peculiaridades do caso as regras de impenhorabilidade podem ser ampliadas de modo a adequar a tutela aos direitos fundamentais como por exemplo o direito agrave moradia agrave sauacutede ou agrave dignidade da pessoa humana Trata-se portanto da aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo e da necessidade sob o enfoque da proporcionalidade101 (STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014)

Logo a interpretaccedilatildeo dos dispositivos que tratam sobre a penhora no CPC deve estaacute

diretamente ligada aos ditames constitucionais devendo o interprete privilegiar a opccedilatildeo que

esteja mais em sintonia com a Carta Magna para que nem o credor e nem o devedor sejam

lesados

O artigo 833 do CPC elenca uma seacuterie de incisos que expotildeem os bens impenhoraacuteveis

O trecho inicial inciso I do art 833 define como impenhoraacuteveis os bens inalienaacuteveis Este

inciso segue a regra de que ldquose o bem natildeo pode ser alienado tambeacutem natildeo pode ser penhorado

porque a penhora eacute o primeiro ato do procedimento de alienaccedilatildeo judicial do bemrdquo 102

Satildeo exemplos de bens inalienaacuteveis os puacuteblicos cuja alienaccedilatildeo depende de autorizaccedilatildeo

legislativa Eacute inalienaacutevel tambeacutem o capital constituiacutedo para garantir indenizaccedilatildeo de ato iliacutecito

(art 533 sect 1 ordm CPC) que portanto eacute tambeacutem impenhoraacutevel ldquoTodo bem inalienaacutevel eacute

impenhoraacutevel embora nem todo bem impenhoraacutevel seja inalienaacutevelrdquo 103

O inciso I do art 833 CPC tambeacutem consagra a impenhorabilidade dos bens que por

ato voluntaacuterio satildeo excluiacutedos da execuccedilatildeo

Segundo Fredie Didier et al104

Eacute o que ocorre nos casos de bens doados ou alienados com claacuteusula de inalienabilidade que haacute de constar no registro imobiliaacuterio para ser eficaz perante o exequente e minimizar o risco de fraude A propoacutesito eis a redaccedilatildeo do art 1911 do Coacutedigo Civil lsquolsquoA claacuteusula de inalienabilidade imposta aos bens por ato de liberalidade implica impenhorabilidade e incomunicabilidaderdquo

100 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MEDINA Joseacute Miguel Garcia

Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 1 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 p 736 101 STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014 102 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 824 103 Ibid p 824 104 Ibid p 825

43

O inciso II por sua vez estabelece que satildeo impenhoraacuteveis os bens moacuteveis os

pertences e as utilidades domeacutesticas da residecircncia do executado Todavia excepcionam-se os

bens dessa natureza que sejam de elevado valor ou que ultrapassem as necessidades comuns

correspondentes a um meacutedio padratildeo de vida

A jurisprudecircncia natildeo eacute paciacutefica sobre o assunto logo natildeo exista uma relaccedilatildeo de bens

que podem ser atingidos pela penhora Abrindo margem para as mais variadas decisotildees

O STJ jaacute considerou impenhoraacuteveis aparelho de televisatildeo a cores mesa de centro passadeira raacutedio toca-fitas gravador microondas ar-condicionado um freezer um microcomputador com acessoacuterios uma impressora etc Poderatildeo ser penhorados porque ultrapassam o padratildeo-meacutedio aparelhos de TV mais sofisticados o segundo aparelho de televisatildeo a segunda geladeira aparelhos de ar-condicionado que satildeo verdadeiras peccedilas de design moacuteveis antigos que se transformam em peccedilas de decoraccedilatildeo faqueiro de prata adega climatizada etc Em entendimento de caraacuteter ainda mais geneacuterico jaacute restou consignado em determinado precedente que a proteccedilatildeo natildeo abrangeria apenas os bens indispensaacuteveis agrave moradia mas tambeacutem aqueles usualmente encontrados em um lar105

Ademais o inciso III do art 833 do CPC traz a impenhorabilidade dos vestuaacuterios bem

como os pertences de uso pessoal do executado salvo se de elevado valor

Segundo Fredie Didier et al106 o dispositivo possui dois propoacutesitos

de um lado preservar a dignidade do executado com a proteccedilatildeo de bens moacuteveis importantes para a sua sobrevivecircncia digna como o vestuaacuterio aparelho celular reloacutegio e os bens relacionados agrave sua higiene pessoal de outro lado a regra visa prestigiar a boa-feacute processual impedindo a execuccedilatildeo mesquinha e abusiva com a penhora de bens de pequeno ou nenhum valor como um pente ou uma bota

O inciso IV do art 833 do CPC consagra uma das mais importantes modalidades a

impenhorabilidade relativa aos rendimentos de natureza alimentar ldquoTrata-se de regra que

possui o claro propoacutesito de proteger o executado garantindo-lhe o recebimento de valores que

servem ao pagamento das despesas relacionadas agrave sua sobrevivecircncia digna e agrave da sua famiacuteliardquo 107

Jaacute inciso V do art 833 do CPC torna impenhoraacuteveis os livros as maacutequinas as

ferramentas os utensiacutelios os instrumentos ou outros bens moacuteveis necessaacuterios ou uacuteteis ao

exerciacutecio de qualquer profissatildeo 105 Ibid p 826 106 Ibid p 827 107 Ibid p 828

44

Por forccedila do paraacutegrafo 3ordm do art 833 satildeo igualmente impenhoraacuteveis os equipamentos

implementos e maacutequinas agriacutecolas pertencentes agrave pessoa fiacutesica ou a empresa individual

produtora rural Rodrigo Mazzei e Sarah Merccedilon108 esclarecem que

Tem assento na noccedilatildeo de que a dignidade estende-se tambeacutem ao exerciacutecio da profissatildeo em si mesma e tambeacutem por representar a forma por excelecircncia de que dispotildee o executado para continuar a receber sua remuneraccedilatildeo e por conseguinte prover seu sustento e de sua famiacutelia Trata-se tambeacutem de aplicaccedilatildeo pontual da funccedilatildeo social da propriedade jaacute que protege os bens que permitem a circulaccedilatildeo de riquezas para a subsistecircncia do executado e se for o caso de sua famiacutelia

Forccediloso ressaltar ainda que a impenhorabilidade do inc V alcanccedila apenas os bens

moacuteveis de modo que eacute absolutamente possiacutevel que o imoacutevel em que o executado exerccedila sua

atividade profissional seja penhorado conforme a Suacutemula 451 do STJ ldquoEacute legiacutetima a penhora

da sede do estabelecimento comercialrdquo

O inciso VI do art 833 do CPC versa sobre a impenhorabilidade do seguro de vida

ldquoTrata-se de impenhorabilidade em favor do beneficiaacuterio do seguro e natildeo do segurado ateacute

porque o valor do seguro natildeo compotildee nem comporaacute o seu patrimocircnio (art794 do Coacutedigo

Civil1 ordm7)rdquo Dessa forma ldquoem uma execuccedilatildeo contra o segurado natildeo seraacute possiacutevel a penhora

do seguro de vida pois se trata de bem que natildeo lhe pertence nem mesmo em expectativardquo

De acordo com o inciso VII do art 833 do CPC satildeo impenhoraacuteveis os materiais

necessaacuterios para obras em andamento salvo se essas forem penhoradas Logo a obra pode

ser penhorada (art 862 do CPC) ldquoA regra como bem lembrou Araken de Assis lsquoestimula a

penhora da proacutepria obra inconclusa agrave qual os materiais acrescem e conseguintemente

valorizamrsquo 109

O art 833 VIII CPC julga impenhoraacutevel a pequena propriedade rural assim

definida em lei desde que trabalhada pela famiacutelia reproduzindo parte do art 5ordm XXVI CF

88116 que disciplina a impenhorabilidade do referido bem

A proteccedilatildeo do CPC eacute mais ampla do que a garantia prevista na Constituiccedilatildeo Federal

tendo em vista que a impenhorabilidade natildeo se restringe agraves execuccedilotildees de deacutebitos decorrentes

de sua atividade produtiva podendo ser alegada em toda e qualquer execuccedilatildeo ldquoAssim o 108 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CABRAL Antonio Passo

CRAMER Ronaldo (orgs) Comentaacuterios ao Novo Coacutedigo de Processo Civil Rio de Janeiro Forense 2015 p 1194

109 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 835

45

imoacutevel natildeo pode ser penhorado na execuccedilatildeo de creacutedito rural concedido para estimular a

produccedilatildeo agriacutecola mas poderaacute ser penhorado na execuccedilatildeo do creacutedito concedido para a

aquisiccedilatildeo do imoacutevelrdquo 110

A nona modalidade de impenhorabilidade trata-se dos recursos puacuteblicos recebidos por

instituiccedilotildees privadas para aplicaccedilatildeo compulsoacuteria em educaccedilatildeo sauacutede ou assistecircncia social ldquoA

proteccedilatildeo eacute louvaacutevel e tutela toda a coletividade ao privilegiar o direito agrave educaccedilatildeo sauacutede e

assistecircncia social em detrimento do direito do credorrdquo

De acordo com o inciso X do art 833 do CPC eacute impenhoraacutevel ateacute o limite de

quarenta salaacuterios miacutenimos a quantia depositada em caderneta de poupanccedila

Eacute uma modalidade de impenhorabilidade relativa (o CPC73 a considerava absoluta)

tendo em vista que essa impenhorabilidade natildeo pode ser oposta na execuccedilatildeo de alimentos

independentemente da sua origem (art 833 sect 2ordm do CPC) Fredie Didier et al cita Araken de

Assis111 ao afirmar que

a regra soacute protege essa aplicaccedilatildeo financeira Se o valor estiver depositado em fundo de investimento por exemplo poderaacute ser penhorado Se o devedor tiver vaacuterias cadernetas de poupanccedila a impenhorabilidade aplica-se agrave soma de todas elas e natildeo a cada uma delas isoladamente do contraacuterio valores expressivos poderiam ser pulverizados em vaacuterias contas burlando a finalidade da regra que eacute a de proteger a populaccedilatildeo de baixa renda

Ademais satildeo tambeacutem impenhoraacuteveis por forccedila do inciso XI os recursos puacuteblicos do

fundo partidaacuterio recebidos por partido poliacutetico nos termos da lei Essa modalidade de

impenhorabilidade ldquose restringe aos recursos puacuteblicos do fundo partidaacuterio Recursos de

origem privada recebidos pelo partido poliacutetico poderatildeo ser penhoradosrdquo 112 O processualista

Fredie Didier et al113 assevera que

Assim a impenhorabilidade foi estabelecida no intuito de impedir que os diretoacuterios nacionais de partidos poliacuteticos respondam por diacutevida dos diretoacuterios

110 Ibid p 836 111 DIDIER JR Fredie et al apud ASSIS Araken de Manual da execuccedilatildeo 11ordm ed cit p 225 Assim

tambeacutem REDONDO Bruno Garcia LOJO Maacuterio Vitor Suarez Penhora cit p 117 BUENO Cassio Scarpinella Curso sistematizado de Direito Processual Civil v 3 cit p 228 GIANNICO Mauriacutecio As novas reformas do CPC e de outras normas processuais Mauriacutecio Giannico e Viacutetor Joseacute de Mello Monteiro (coord) Satildeo Paulo Saraiva 2009 p 1 OS Em sentido diverso estendendo a impenhorabiacutelidade aos depoacutesitos feitos ateacute esse valor em CDB CDI fundos de renda fixa ou de accedilotildees RODRIGUES Marcelo Abelha Manual de execuccedilatildeo civil 3deg ed cit p 101

112 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 839

113 Ibid p 839

46

estaduaismunicipais - sobretudo em razatildeo das vaacuterias decisotildees judiciais que determinaram penhora de recursos do fundo partidaacuterio de alguns partidos

Por fim o inciso XII do artigo 833 do CPC trata sobre a impenhorabilidade dos

creacuteditos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias sob o regime de incorporaccedilatildeo imobiliaacuteria

vinculados agrave execuccedilatildeo de obra ldquoO objetivo dessa modalidade eacute evitar que diacutevidas do

incorporador possam consumir os recursos que seriam utilizados na realizaccedilatildeo da obra em

prejuiacutezo dos adquirentes de unidades autocircnomasrdquo 114

O professor Misael Montenegro Filho115 aduz sobre que ldquoao estabelecer a

impenhorabilidade dos creacuteditos oriundos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias o novo CPC

protegeu os valores destinados agrave execuccedilatildeo da obra e agrave entrega das unidades imobiliaacuterias aos

adquirentes assegurando assim a execuccedilatildeo da promessa contratualrdquo

Importante frisar ainda que a Lei nordm 8009 1990 instituiu a impenhorabilidade do

imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar por qualquer diacutevida salvo as exceccedilotildees dos

seus arts 3ordm e 4ordm

A referida lei dispotildee que Para os efeitos de impenhorabilidade considera-se

residecircncia um uacutenico imoacutevel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia

permanente (art 5ordm)

O processualista baiano Fredie Didier et al116 assevera que

A lei propotildee-se a proteger imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar nos termos acima expostos A CF 88 ampliou o conceito de entidade familiar para abranger a famiacutelia monoparental e a uniatildeo estaacutevel Mas deve considerar-se aiacute compreendidos os irmatildeos que vivem juntos e a uniatildeo homossexual Ateacute o solteiro estaacute abrangido pela impenhorabilidade se reside soacute no imoacutevel - isso em nome da proteccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana e da moradia digna Na verdade houve uma mudanccedila de compreensatildeo acerca do sentido da proteccedilatildeo de proteccedilatildeo da famiacutelia agrave proteccedilatildeo da moradia indispensaacutevel agrave preservaccedilatildeo da dignidade da pessoa

114 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o

novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 388

115 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MONTENEGRO FILHO Misael Novo Coacutedigo de Processo Civil Comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Atlas 2016 p 752

116 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 840-841

47

O STJ jaacute consolidou esse entendimento na suacutemula nordm 364 O conceito de

impenhorabilidade de bem de famiacutelia abrange tambeacutem o imoacutevel pertencente a pessoas

solteiras separadas e viuacutevas

Entretanto se o casal ou entidade familiar possuir vaacuterios imoacuteveis utilizados como

residecircncia a impenhorabilidade recairaacute sobre o de menor valor (art 5ordm paraacutegrafo uacutenico) ldquoEacute o

que ocorre por exemplo quando a famiacutelia se divide em mais de uma cidade por motivos

profissionaisrdquo 117

Forccediloso observar ainda que a impenhorabilidade do imoacutevel familiar eacute relativa jaacute que

natildeo pode ser oposta a qualquer creacutedito O art 3ordm da Lei n 8009 1990151 em que pode ser

penhorada a residecircncia da famiacutelia (exemplo execuccedilatildeo de alimentos para cobranccedila de taxas

devidas em funccedilatildeo do imoacutevel familiar etc)

Resta claro que o artigo 833 do CPC ao disciplinar as hipoacuteteses de impenhorabilidade

possui o escopo de proteger o princiacutepio da dignidade humana Entretanto algumas claacuteusulas

natildeo possuem proteccedilatildeo absoluta ldquoa sua relativizaccedilatildeo a depender do caso sob exame deve ser

realccedilada agrave medida que a dignidade resguardada e protegida pelo sistema processual-

constitucional natildeo se limita ao executadordquo 118 Ademais ldquoEacute premente advertidamente que a

dignidade do credor tambeacutem seja garantida em juiacutezo tendo como norte pois os princiacutepios da

proporcionalidade e razoabilidaderdquo 119

117 Ibid p 841 118 Ibid p 752 119 Ibid p 752

48

4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA

ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE

HUMANA DO EXECUTADO

41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE

EFETIVACcedilAtildeO

Como jaacute exposto em linhas preteacuteritas nos meios executivos tiacutepicos as medidas

executivas satildeo determinadas pela lei ou seja o oacutergatildeo pode aplicar somente as medidas

tipificadas no ordenamento juriacutedico No entanto ao se tratar das medidas executivas atiacutepicas

eacute necessaacuterio que haja um limite na atuaccedilatildeo realizada pelo juiz

O poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo poder ser realizado de maneira indiscriminada haacute

pressupostos e premissas a serem observadas Dessa forma a primeira premissa eacute no sentindo

de que a medida executiva atiacutepica natildeo pode ser a primeira medida a ser invocada ldquomuito ao

reveacutes a regra do nosso sistema continua a ser o da tipicidade dos meios executivos soacute que

agora temperado pelo sistema atiacutepicordquo 120 O processualista Thiago Rodovalho explica que

ldquo() os meios atiacutepicos natildeo satildeo prima ratio e sim a ultima ratio eacute dizer esgotados e

frustrados os meios executivos tiacutepicos e ordinaacuterios pode-se em tese valer-se do sistema

atiacutepicordquo121

Dessa forma nos casos de execuccedilatildeo que tenha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

natildeo deve ser aplicado de logo as medidas indutivas e coercitivas Apenas apoacutes frustradas as

medidas ldquonaturaisrdquo pode-se passar agrave aplicaccedilatildeo das medidas atiacutepicas

Uma segunda premissa diz a respeitos dos meios de pressatildeo para compelir o devedor a

adimplir com o seu deacutebito ldquoEssa segunda premissa decorre inclusive de imperiosidade

loacutegica de nada adianta a medida de pressatildeo se a obrigaccedilatildeo natildeo tem como ser adimplida pelo

devedorrdquo 122

Para Thiago Rodovalho123 ldquoIsso quer significar que esgotados e frustrados os meios

tiacutepicos o juiz se valeraacute dos meios atiacutepicos se eles forem potencialmente haacutebeis a estimular ou

120 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da

atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018

121 Ibid sem paginaccedilatildeo 122 Ibid sem paginaccedilatildeo 123 Ibid sem paginaccedilatildeo

49

forccedilar o cumprimento o que pressupotildee sua possibilidade quando entatildeo eles poderatildeo ser

eficazesrdquo

Logo nas obrigaccedilotildees de pagar quantia se houver a real demonstraccedilatildeo da

impossibilidade financeira do devedor seria um constrangimento inuacutetil e desnecessaacuterio a

imposiccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo para forccedilar o cumprimento

Por isso as medidas atiacutepicas devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o

esgotamento das medidas tiacutepicas e a possibilidade de cumprimento de cumprimento da

obrigaccedilatildeo

Ademais superadas as supracitadas premissas e o oacutergatildeo julgador vislumbrando a

necessidade da aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo se faz necessaacuterio que um conjunto de

postulados e princiacutepios rejam a atuaccedilatildeo do oacutergatildeo julgador servindo de norte para a escolha da

medida executiva mais adequada ldquoDe modo geral a escolha deve pautar-se nos postulados da

proporcionalidade da razoabilidade (art8ordm CPC) e da proibiccedilatildeo de excesso bem como nos

princiacutepios da eficiecircncia e da menor onerosidade da execuccedilatildeordquo 124

O professor Fredie Didier et al125 eacute categoacuterico ao citar Humberto Aacutevila

Segundo Humberto Aacutevila o postulado da proporcionalidade se manifesta nas situaccedilotildees em que haacute uma relaccedilatildeo de causalidade entre dois elementos empiricamente discerniacuteveis um meio e um fim de tal sorte que se possa proceder aos trecircs exames fundamentais o da adequaccedilatildeo (o meio promove o fim) o da necessidade (dentre os meios disponiacuteveis e igualmente adequados para promover o fim natildeo haacute outro meio menos restritivo do(s) direito(s) fundamental (is) afetado(s)) e o da proporcionalidade em sentido estrito (as vantagens trazidas pela promoccedilatildeo do fim correspondem agraves desvantagens provocadas pela adoccedilatildeo do meio)

O juiz ao aplicar a medida executiva atiacutepica ao caso concreto deve ter seu

embasamento no princiacutepio da proporcionalidade para saber se a medida a ser tomada eacute a

melhor opccedilatildeo ao caso sub judice ldquoO exame de proporcionalidade aplica-se sempre que

houver uma medida concreta destinada a realizar uma finalidaderdquo 126

Em verdade a aplicaccedilatildeo do princiacutepio da proporcionalidade eacute imprescindiacutevel na adoccedilatildeo

dos meios executivos atiacutepicos tendo em vista que ldquo() tais medidas em especial quando de

124 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111 125 DIDIER JR Fredie et al apud AVILA Humberto Teoria dos princiacutepios da definiccedilatildeo agrave aplicaccedilatildeo

dos princiacutepios juriacutedicos 16 ed Satildeo Paulo Malheiros 2015 p 205 126 DIDIER JR Fredie et al op cit p 111

50

natureza coercitiva podem restringir direitos do devedor e incidir diretamente sobre sua

pessoardquo127 Logo ainda que o princiacutepio da efetividade da tutela executiva seja um direito

fundamental o mesmo ldquo() deve ser compatibilizado com direitos fundamentais do

executado para que a sua dignidade humana seja preservadardquo 128

Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Neves129 afirma que em nome do princiacutepio da

proporcionalidade o juiz deveraacute

() ponderar no caso concreto as vantagens praacuteticas da adoccedilatildeo de cada medida executiva atiacutepica em especial as de natureza coercitiva e as desvantagens de sua adoccedilatildeo levando em conta a possibilidade de a medida criar uma limitaccedilatildeo excessiva ao exerciacutecio de direito fundamental do executado

Outro princiacutepio que o oacutergatildeo julgador deve se ater ao escolher a medida executiva

atiacutepica eacute o da razoabilidade Segundo Fredie Didier et al 130 o princiacutepio (ou postulado)131 se

manifesta de trecircs formas

a) como dever de equidade a exigir a harmonizaccedilatildeo da norma geral com o caso individual impondo a consideraccedilatildeo daquilo que normalmente acontece em detrimento do que eacute extraordinaacuterio e tambeacutem impondo a consideraccedilatildeo das especificidades do caso concreto ante a generalidade da norma b) como dever de congruecircncia a exigir a harmonizaccedilatildeo das normas com suas condiccedilotildees externas de aplicaccedilatildeo (isto eacute com a realidade com base em que foram editadas) c) como dever de equivalecircncia a exigir uma relaccedilatildeo de equivalecircncia entre a medida adotada e o criteacuterio que a dimensiona

Logo ldquo() o princiacutepio da razoabilidade deve nortear a atuaccedilatildeo do juiz na adoccedilatildeo das

medidas executivas atiacutepicas previstas no art 139 IV do Novo CPCrdquo 132 tendo em vista que

ldquo() mesmo medidas que pelo princiacutepio da proporcionalidade podem se mostrar

abstratamente possiacuteveis de adoccedilatildeo no caso concreto podem se mostrar inadequadas e

irrazoaacuteveisrdquo 133

127 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Medidas executivas atiacutepicas na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de

pagar quantia certa art 139 IV do novo CPC Revista de Processo v 42 n 265 mar 2017 p 14 128 Ibid p 14 129 Ibid p 14 130 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111-112 131 Segundo Fredie Didier et al o postulado eacute uma norma que atua sobre a aplicaccedilatildeo de outras normas

A proporcionalidade e a razoabilidade seriam postulados normativos e natildeo princiacutepios segundo essa concepccedilatildeo 132 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo op cit p 14 133 Ibid p 14

51

Ademais conforme dispotildee o postulado da proibiccedilatildeo de excesso ldquoa realizaccedilatildeo de uma

regra ou princiacutepio constitucional natildeo pode conduzir agrave restriccedilatildeo a um direito fundamental que

lhe retire um miacutenimo de eficaacuteciardquo 134

A proibiccedilatildeo de excesso deveraacute sempre ser suscitada quando um direito fundamental

houver sido violado a ponto do direito fundamental sofrer violaccedilatildeo excessiva Ademais ldquoesse

postulado natildeo se confunde com o da proporcionalidade porque ele dispensa os exames da

adequaccedilatildeo (relaccedilatildeo meiofim) da necessidade (exigibilidade) ou da proporcionalidade em

sentido estrito (ponderaccedilatildeo entre vantagens e desvantagens)rdquo 135

Logo ldquopouco importa a relaccedilatildeo meiofim ou a exigibilidade da medida ou ainda a

ponderaccedilatildeo com outro direito fundamental eventualmente em jogo aqui se analisa apenas a

eficaacutecia de um determinado direito fundamentalrdquo 136

O princiacutepio da eficiecircncia tem previsatildeo constitucional no art 37 e previsatildeo

infraconstitucional no art 8ordm do CPC15 O referido princiacutepio determina que o processo seja

conduzido de forma eficiente pelo oacutergatildeo jurisdicional

Entende-se que eficiente eacute a atuaccedilatildeo que utilize adequadamente os meios necessaacuterios

para que se atinjam os fins almejados O oacutergatildeo jurisdicional na escolha dos meios a serem

utilizados para a obtenccedilatildeo dos fins

a) deve escolher aqueles que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo (deve evitar meios que promovam resultados insignificantes) b) deve escolher meios que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado (natildeo se pode escolher um meio de resultado duvidoso) c) natildeo pode escolher um meio que produza muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscado 137

O juiz deveraacute igualmente analisar o princiacutepio da menor onerosidade da execuccedilatildeo que

eacute previsto pelo art 805 do CPC ldquoArt 805 Quando por vaacuterios meios o exequente puder

promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o

executadordquo

134 134 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 112 135 Ibid p 112 136 Ibid p 112 137 Ibid p 112-113

52

Logo ldquohavendo duas opccedilotildees igualmente eficazes para permitir alcanccedilar o resultado

pretendido (satisfaccedilatildeo do creacutedito) deveraacute o oacutergatildeo julgador valer-se daquela que menos onere

a situaccedilatildeo do executadordquo 138

O dito princiacutepio impede o comportamento abusivo do exequente que possa beneficiar-

se do meio mais danoso ao executado protegendo dessa forma a lealdade e a eacutetica

processual

Os postulados e princiacutepios analisados em linhas preteacuteritas impotildeem ao oacutergatildeo julgador a

observacircncia de alguns criteacuterios para a escolha da medida executiva atiacutepicas a ser utilizada no

caso concreto

Primeiramente a medida executiva atiacutepica deveraacute ser adequada ldquoO criteacuterio da

adequaccedilatildeo impotildee que juiz considere abstratamente uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida

executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia

a gerar o resultadordquo 139 Nesse primeiro momento o juiz deveraacute observar sob a perspectiva do

credor qual medida teraacute o condatildeo de gerar o resultado mais efetivo

Segundo Fredie Didier et al140 o criteacuterio da adequaccedilatildeo eacute

() fortemente inspirado pelo postulado da proporcionalidade e pelo princiacutepio da eficiecircncia na parte em que esse princiacutepio determina a escolha de meios que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo e que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado

Ademais a medida adotada pelo oacutergatildeo julgador deveraacute ser necessaacuteria ldquoEsse criteacuterio

impotildee um limite agrave atuaccedilatildeo judicial funcionando como uma espeacutecie de contrapeso ao criteacuterio

da adequaccedilatildeo Aqui deve-se levar em conta a posiccedilatildeo do devedorrdquo141

O juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental agrave execuccedilatildeo e determinar

uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute necessaacuterio que a

medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado O criteacuterio da necessidade

estabelece que ldquonatildeo se pode ir aleacutem do necessaacuterio para alcanccedilar o propoacutesito almejado Deve

138 Ibid p 113 139 Ibid p 113 140 Ibid p 113 141 Ibid p 114

53

pois o oacutergatildeo julgador determinar o meio executivo na medida do estritamente necessaacuterio para

proporcionar a satisfaccedilatildeo do creacutedito ndash nem menos nem maisrdquo 142

O referido criteacuterio possui forte influecircncia dos postulados da proibiccedilatildeo do excesso e da

razoabilidade assim como do princiacutepio da menor onerosidade para o executado Assevera

Fredie Didier et al143 que

Natildeo eacute razoaacutevel por exemplo impor como primeira opccedilatildeo medida coercitiva a ser suportada pelo agente puacuteblico pelo simples fato de o juiz pressupor que o ente puacuteblico ao qual ele eacute vinculado iraacute descumprir determinada ordem judicial - o descumprimento natildeo pode ser visto como algo ordinaacuterio ou cotidiano (razoabilidade como dever de equidade) Tampouco eacute razoaacutevel eleger a prisatildeo civil como meacutetodo prioritaacuterio para compelir o executado ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer (razoabilidade como dever de equivalecircncia) Aleacutem disso eacute vedada por exemplo a imposiccedilatildeo de multa coercitiva para compelir o executado a emitir declaraccedilatildeo de vontade uma vez que haacute previsatildeo expressa de medida tiacutepica capaz de proporcionar o mesmo resultado sem sacrifiacutecio para o devedor (art 501 CPC)

A afirmaccedilatildeo feita por Bonavides144 em 1997 sobre a adequaccedilatildeo e a necessidade

continua atual sobre os motes

O meio empregado pelo legislador deve ser adequado e necessaacuterio para alcanccedilar o objetivo procurado O meio eacute adequado quando com seu auxiacutelio se pode alcanccedilar o resultado desejado eacute necessaacuterio quando o legislador natildeo poderia ter escolhido outro meio igualmente eficaz mas que natildeo limitasse ou limitasse de maneira menos sensiacutevel o direito fundamental

Por fim a medida deve conciliar os interesses contrapostos ldquoO magistrado deve

ponderar os interesses em jogo aplicando a proporcionalidade em sentido estrito de modo

que as vantagens da utilizaccedilatildeo da medida atiacutepica escolhida superem as vantagens de seu usordquo 145

Esse criteacuterio natildeo privilegia nem o credor nem o devedor e sim a soluccedilatildeo mais

equilibrada e que atenda da melhor forma aos valores em conflito ldquoTrata-se de criteacuterio

inspirado nos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade bem como no princiacutepio da

142 Ibid p 114 143 Ibid p 114 144 BONAVIDES Paulo Curso de Direito Constitucional 7ordm ediccedilatildeo Satildeo Paulo Ed Malheiros 1997

p 372 145 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 114-115

54

eficiecircncia na parte em que impotildee ao juiz evitar a escolha do meio executivo que produza

muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscadordquo 146

Cada um dos criteacuterios supracitados devem ser considerados pelo juiz ao aplicar as

medidas executivas atiacutepicas ao caso concreto Para Fredie Didier et al147 as medidas como

retenccedilatildeo de CNH passaporte ou cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado como

forma de pressionaacute-lo ao pagamento da diacutevida pecuniaacuteria natildeo satildeo possiacuteveis

Essas natildeo satildeo medidas adequadas ao atingimento do fim almejado (o pagamento de quantia) - natildeo haacute propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente Tais medidas soam mais como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-lo ao cumprimento da ordem judicial - e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a utilizaccedilatildeo de meios sancionatoacuterios pelo magistrado mas apenas de meios de coerccedilatildeo indireta e sub-rogatoacuterios

Ainda que adequadas fossem a retenccedilatildeo de CNH e do passaporte no corte de fornecimento de aacutegua natildeo parecem ser medidas necessaacuterias (no sentido de exigiacuteveis) uma vez que outras medidas podem em tese ser utilizadas sem causar igual gravame ao executado - como por exemplo a simples restriccedilatildeo do uso de cartotildees de creacutedito A retenccedilatildeo de documentos pessoais eacute medida que termina por restringir a liberdade de ir e vir do executado mostrando-se a princiacutepio natildeo-razoaacutevel por ir de encontro ao dever de equivalecircncia e desproporcional por restringir demais o direito agrave liberdade em favor do direito de creacutedito pecuniaacuterio do exequente

O processualista baiano et al148 cita tambeacutem outro exemplo de medida atiacutepica que natildeo

atingem os criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade

Tampouco parece adequada em princiacutepio determinaccedilatildeo de corte de energia eleacutetrica de todo o preacutedio onde funciona serviccedilo puacuteblico administrativo como forma de pressionar o ente federado a cumprir ordem de nomeaccedilatildeo de candidato em concurso puacuteblico Natildeo parece haver relaccedilatildeo meiofim entre uma coisa e outra Tambeacutem natildeo eacute possiacutevel enxergar essa medida como necessaacuteria no sentido de ser a menos gravosa para o devedor - observe que se trata de medida que uma vez aplicada ensejaria restriccedilatildeo de funcionamento em toda a reparticcedilatildeo puacuteblica em prejuiacutezo de serviccedilos puacuteblicos essenciais ao funcionamento da Administraccedilatildeo o que aleacutem de ser excessivamente gravoso parece natildeo se conformar agrave necessidade de ponderaccedilatildeo dos interesses em jogo - aleacutem de afetar a um sem-nuacutemero de pessoas tomadoras desses serviccedilos

Ademais eacute sabido que toda e qualquer decisatildeo judicial precisa ser fundamentada Ao

se tratar das medidas executivas atiacutepicas o papel da fundamentaccedilatildeo se torna ainda mais

146 Ibid p 115 147 Ibid p 115 148 Ibid p 116

55

importante tendo em vista que eacute pela fundamentaccedilatildeo da decisatildeo que se poderaacute controlar a

adequaccedilatildeo e necessidade da medida atiacutepica

Pelo fato das medidas executivas atiacutepicas derivarem de dispositivos normativos

considerados claacuteusulas gerais propiacutecias as mais variadas interpretaccedilotildees eacute de extrema

importacircncia que o oacutergatildeo julgador fundamente sua decisatildeo

Logo ldquodeve o juiz na fundamentaccedilatildeo decisoacuteria expor racionalmente os motivos da

sua escolha demonstrando com atenccedilatildeo ao art 489 sect 1ordm CPC de que modo a sua opccedilatildeo

atende os criteacuterios da adequaccedilatildeo necessidade e proporcionalidade em sentido estrito ()rdquo 149

Dessa forma os princiacutepios da proporcionalidade e razoabilidade servem para delimitar

o alcance das claacuteusulas gerais de efetivaccedilatildeo fazendo com que o oacutergatildeo julgador se atenha aos

criteacuterios da adequaccedilatildeo e necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao caso

concreto

42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO

EXECUTADO

A entrada em vigor do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 aflorou ainda mais uma

discussatildeo essencial para os processualistas do seacuteculo XXI qual eacute o verdadeiro protagonista do

processo civil

Para os que defendem o ldquoautoritarismo processualrdquo o verdadeiro protagonista do

processo civil eacute o oacutergatildeo judiciaacuterio que em nome do desempenho efetivo de suas funccedilotildees lhes

eacute permitido dilatar os poderes que diga-se de jaacute passagem jaacute compotildeem um vastiacutessimo

arsenal150

Jaacute os ldquogarantistasrdquo 151 do processo civil acreditam que os verdadeiros protagonistas satildeo

as partes do processo e seus direitos e garantias devem ser estritamente preservados

Devido a essa disputa de quem possui maior protagonismo no processo as mudanccedilas

ocorridas no coacutedigo processual vigente quanto agraves medidas executivas atiacutepicas despertaram

149 Ibid p 117 150 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos

atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04102018

151 O processualista Araken de Assis acredita que o termo garantista eacute descabido tendo em vista que remete ao processo penal

56

maior celeuma do que qualquer outra modificaccedilatildeo trazida pelo CPC15 Afinal as referidas

medidas acirravam ainda mais a disputa pelo protagonismo processual

O fato de o CPC15 dispor no art 139 IV que o juiz poderaacute decretar todas as medidas

indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o

cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo

pecuniaacuteria levou boa parte da doutrina e dos juiacutezes a acreditar que teria pleno direito de

aplicar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo Entretanto muitos se esqueceram do outro lado

da moeda esqueceram que a dignidade humana do executado tambeacutem eacute um direito

fundamental e natildeo pode ser violado

Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa152

acreditam que

() natildeo parece producente elencar um rol abstrato das medidas que poderiam ser aplicadas pelo juiz a tiacutetulo do art 139 IV CPC Afinal se busca a efetividade da execuccedilatildeo e esta soacute pode ser identificada agrave luz das especificidades da situaccedilatildeo concreta Ideal eacute enveredar pela loacutegica modular (adequaccedilatildeo ao caso) natildeo pela geneacuterica (soluccedilotildees abstratas de pretensa utilidade universal)

Em razatildeo de o dispositivo apresentar uma gama de poderes tatildeo amplos agrave disposiccedilatildeo do

oacutergatildeo julgador sem nenhuma estipulaccedilatildeo de um procedimento legal previamente definido para

que estabeleccedila as condiccedilotildees de sua aplicaccedilatildeo em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo eacute

necessaacuterio que em razatildeo do princiacutepio da dignidade humana natildeo busque definir o que o

dispositivo permite mas de definir o que ele natildeo permite ldquoOu seja propotildee-se a sua

compreensatildeo por exclusatildeo Afinal se ele tem potencialidade para promover a efetividade da

tutela tambeacutem pode provocar lesotildees E como em direito os fins natildeo justificam os meios

ressalta como prioritaacuteria a necessidade de estabelecer limitesrdquo 153

O art 789 do CPC15 disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial e eacute

categoacuterico ao dispor que ldquoo devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para

152 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

153 Ibid sem paginaccedilatildeo

57

o cumprimento de suas obrigaccedilotildees salvo as restriccedilotildees estabelecidas em leirdquo Logo a

execuccedilatildeo somente poderaacute incidir sobre os bens do devedor e natildeo sobre a sua pessoa

Como eacute sabido a Lex Poetelia Papiria de 326 aC foi o primeiro marco legal da

humanizaccedilatildeo das cobranccedilas de diacutevidas abolindo a imposiccedilatildeo ao devedor de castigos

vexatoacuterios e ateacute da pena de morte154

Afinal no direito romano antigo a cobranccedila de diacutevidas poderia recair sobre a pessoa

do devedor que respondia com sua liberdade e ateacute mesmo com seu proacuteprio corpo permitindo

a lei que repartissem tantos pedaccedilos do corpo do devedor quantos fossem seus credores

Nesse sentindo leciona o professor Guilherme Pupe da Noacutebrega155 que

Vem de longe a evoluccedilatildeo no sentido de fazer a responsabilidade por uma obrigaccedilatildeo migrar da pessoa do devedor para seu patrimocircnio Merecem registro especiacutefico como marcos histoacutericos remotos a Lex Poetelia Papiria de 326 aC que aboliu o nexum e possibilidade de escravidatildeo do devedor como garantia da obrigaccedilatildeo e a pignoris capio ou ldquoaccedilatildeo por tomada de penhorrdquo que instituiu a possibilidade de o credor tomar parcela dos bens do devedor como forma de assegurar o adimplemento da diacutevida Aqueles institutos culminariam seacuteculo depois no artigo 789 do CPC de 2015 a consagrar que o devedor responda pela satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo com seus bens presentes e futuros observadas as restriccedilotildees impostas pelas impenhorabilidades legais

Logo o avanccedilar da civilizaccedilatildeo marcou o deslocamento da responsabilidade por

diacutevidas saindo do corpo do devedor para o seu patrimocircnio tendo em vista que a vida

humana a liberdade e a integridade fiacutesica satildeo valores inalienaacuteveis natildeo podendo ser

sacrificadas em benefiacutecio de obrigaccedilotildees pecuniaacuterias 156

Entretanto eacute sabido que a responsabilidade patrimonial eacute excepcionada pela prisatildeo

civil do devedor de verba alimentiacutecia resquiacutecio da responsabilidade pessoal romana

154 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt

httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018

155 NOacuteBREGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139 IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018

156 Ibid sem paginaccedilatildeo

58

No entanto haacute uma justificativa para isso Segundo o processualista Guilherme Pupe

da Noacutebrega157

Eacute que a par de a prisatildeo civil encontrar previsatildeo constitucional no inciso LXVII do artigo 5ordm o raciociacutenio eacute o de que o direito do alimentante agrave liberdade de locomoccedilatildeo cede diante dos direitos agrave vida e agrave dignidade titularizados pelo alimentando e resguardados pelos alimentos Foi esse mesmo raciociacutenio aliaacutes que justificou no passado a ediccedilatildeo da suacutemula 309 pelo STJ agora positivada pelo artigo 528 sect 7ordm que limita a modalidade coercitiva agraves trecircs uacuteltimas prestaccedilotildees vencidas e agraves prestaccedilotildees vincendas A ideia eacute que tendo o alimentando subsistido a despeito do natildeo-pagamento de prestaccedilotildees mais antigas essas verbas teriam perdido o caraacuteter alimentar que na equaccedilatildeo antes apresentada justificaria a prisatildeo civil do alimentante Daiacute por que aqueles valores antigos remanescem exigiacuteveis mas somente pela via da expropriaccedilatildeo

Essa ressalva eacute necessaacuteria tendo em vista que a adoccedilatildeo de teacutecnica de execuccedilatildeo

indireta para incursatildeo radical na esfera de direitos do executado notadamente direitos

fundamentais quando carente de respaldo constitucional natildeo merece acolhimento sob

risco de se atentar contra o devido processo legal (artigo 5ordm LIV da Constituiccedilatildeo)

Como afirma o autor Bruno Dantas158 ldquoembora inexistam estatiacutesticas que permitam

comparaccedilotildees natildeo eacute desarrazoado intuir que os iacutendices de inadimplecircncia despeccedilam na razatildeo

inversa da incidecircncia das ordens judiciais sobre o corpo e a liberdade do devedorrdquo Entretanto

eacute natildeo possiacutevel adotar toda e qualquer medida executiva atiacutepica em nome da efetividade da

execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que se saiba os limites da sua aplicaccedilatildeo

Dessa forma instrumentos que permitam o cumprimento forccedilado de contratos e o pagamento

de diacutevidas satildeo necessaacuterios contudo eacute preciso equilibrar essa exigecircncia com a liberdade e a

dignidade humana

Como citado alhures o art 139 IV ensejou decisotildees como a que determinou a

suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o

passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito em uma accedilatildeo se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo

extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

Na supracitada decisatildeo o princiacutepio da responsabilidade patrimonial natildeo estaacute sendo

efetivado para o que o devedor responda com os seus bens Afinal qual ligaccedilatildeo entre a

157 Ibid sem paginaccedilatildeo 158 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt

httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018

59

restriccedilatildeo de circulaccedilatildeo que diz com o direito de ir e vir (liberdade) com o pagamento de

diacutevidas que diz com a responsabilidade civil159

Ademais por que quem natildeo tem dinheiro para pagar diacutevidas natildeo pode dirigir Por que

natildeo tem condiccedilotildees para pagar o deacutebito natildeo pode ter passaporte Por que quem natildeo tem como

pagar o deve natildeo pode ter cartatildeo de creacutedito

Ao utilizar meios executivos atiacutepicos como os supracitados para compelir o devedor a

satisfazer a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria quando exauridos sem ecircxito os meios tradicionais de bens

penhoraacuteveis salvo quando existe qualquer indiacutecio concreto de ocultaccedilatildeo ou dissipaccedilatildeo de

bens eacute obrigar o devedor abrir matildeo da proteccedilatildeo da lei que lhe impede que seja tomado agrave forccedila

(art 833 CPC e demais disposiccedilotildees que tratam da impenhorabilidade)

Segundo Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa160

Claramente essa pressatildeo visa dar uma aparecircncia de voluntariedade agrave indicaccedilatildeo de bens impenhoraacuteveis pelo proacuteprio executado que na verdade soacute age assim por ser a uacutenica forma de ver-se livre de um grame imposto por medida indutiva despedida de qualquer necessidade ou adequaccedilatildeo Uma intoleraacutevel perversatildeo

Os autores afirmam ainda que o ldquodireito paacutetrio natildeo admite esta contraditio in terminis

sendo inaceitaacutevel a coexistecircncia de regra protetiva do executado com outra que concede ao

juiz poderes para forccedilar (ainda que indiretamente e veladamente) o executado a abrir matildeo

daquela proteccedilatildeordquo 161

Logo eacute cristalino que a suspensatildeo da CNH eacute uma forma incorreta de aplicar a medida

executiva atiacutepica para efetivar o direito fundamental a execuccedilatildeo tendo em vista que o uacutenico

objetivo da referida eacute pressionar o executado abrir matildeo de algum bem impenhoraacutevel para

levantar o dinheiro e cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

A retenccedilatildeo do passaporte igualmente natildeo possui qualquer relaccedilatildeo com a diacutevida do

executado e eacute somente uma forma de tentar pressiona-lo a dispor de um bem que natildeo pode

ser tomado agrave forccedila e puni-lo por natildeo ter cumprido voluntariamente com a sua obrigaccedilatildeo

159 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

160 Ibid sem paginaccedilatildeo 161 Ibid sem paginaccedilatildeo

60

Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa162

acreditam que tal medida eacute equivocada e se torna excessivamente onerosa ao executado

As mais variadas circunstacircncias relevem o equiacutevoco de tal medida aplicada assim genericamente Com efeito nada justifica reter o passaporte do executado e impedi-lo de viajar para o exterior quando eacute agraciado inclusive com todas as despesas pagas com presente sorteio ou precircmio (por completar tempo de serviccedilo ou atingir metas produtividade na sociedade empresaacuteria em que trabalha) Como todo custo eacute suportado por terceiro e por isso mesmo a sua realizaccedilatildeo pelo executado natildeo traria qualquer prejuiacutezo ao exequente e a retenccedilatildeo do passaporte natildeo seria injustificaacutevel

Paulo Antonio Papini163 acredita que natildeo tem a apreensatildeo de passaporte natildeo possui um

fundamento plausiacutevel tendo em vista que se o devedor natildeo pode viajar para saldar o deacutebito

tambeacutem natildeo poderia exercer atividades cotidianas

Com todo o respeito a quem pensa dessa forma o argumento eacute muito simploacuterio e natildeo precisamos sequer do Direito para derrubaacute-lo Com efeito se considerarmos que ndash ateacute mesmo pelas dimensotildees continentais do Brasil ndash natildeo eacute incomum que uma passagem para o Nordeste custe mais caro que um voo para Miami seria razoaacutevel entatildeo seguindo a linha argumentativa do Magistrado em questatildeo que se oficiasse aos oacutergatildeos reguladores da aviaccedilatildeo civil proibindo-se aquele devedor de fazer ateacute mesmo voos domeacutesticos Poder-se-ia ir mais longe jaacute que natildeo tem dinheiro para pagar suas diacutevidas certamente aquele devedor tambeacutem natildeo teria para comer fora de sua casa porque entatildeo natildeo determinar a expediccedilatildeo de ofiacutecio aos restaurantes proacuteximos agrave sua casa e determinar tambeacutem a proibiccedilatildeo de que ele fosse servidoatendido

O autor se questiona ainda ldquoSeraacute entatildeo que o Princiacutepio da Dignidade da Pessoa

Humana estaacute de mero enfeite em nossa Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ()rdquo 164 Tendo em vista

que ldquoa decisatildeo em comento viola diretamente o art 5ordm incisos XV LIII e LXIII da

Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ndash falamos do Direito de Ir e Virrdquo 165

Ademais o cancelamento do cartatildeo de creacutedito eacute mais uma forma de constranger e

compelir o executado a cumprir com a obrigaccedilatildeo de qualquer forma natildeo importando o que

precise fazer para conseguir saldar o deacutebito tendo em vista que a referida medida apresenta

162 Ibid sem paginaccedilatildeo 163 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo

pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018

164 Ibid sem paginaccedilatildeo 165 Ibid sem paginaccedilatildeo

61

qualquer adequaccedilatildeo com o fim desejado (reverter em pagamento para o exequente) Os

autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa afirmam que166

Reconhece-se que as razotildees da afirmaccedilatildeo ora questionada satildeo ateacute intuitivas mas eacute plenamente possiacutevel problematiza-las Ora natildeo se encontra qualquer justificativa idocircnea para que o juiz possa cancelar o contrato do executado com a administradora do cartatildeo de creacutedito (ou instituiccedilatildeo financeira) que natildeo tem qualquer relaccedilatildeo com o creacutedito exequendo muito menos como isso poderia impactar positivamente na execuccedilatildeo (senatildeo para pressionar o executado a dispor de bens impenhoraacuteveis) Ademais natildeo foram indicados sequer sinais de que o executado realiza gastos supeacuterfluos com o cartatildeo de creacutedito ndash natildeo que isso justificasse a medida pois o correto seria penhorar os esses bens (se duraacuteveis naturalmente) ao inveacutes de cancelar o cartatildeo de creacutedito

Logo as referidas medidas natildeo possuem qualquer relaccedilatildeo com o atingimento do fim

almejado (o pagamento de quantia) tendo em vista que natildeo haacute uma relaccedilatildeo meiofim entre

tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a

restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia

ao exequente

Dessa forma nota-se que as medidas de suspensatildeo da CNH retenccedilatildeo de passaporte e

bloqueio do cartatildeo de credito satildeo completamente inadequadas agrave realizaccedilatildeo a que se prestam

Afinal ldquotais medidas soam como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-

lo ao cumprimento da ordem judicial ndash e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a

utilizaccedilatildeo dos meios sancionatoacuterios pelo magistrado ()rdquo167

Como exposto em linhas preteacuteritas o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades

de aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e

razoaacutevel se atendo aos criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas

executivas atiacutepicas ao caso concreto sob pena de converter a medida em de indutiva para

punitiva

A utilizaccedilatildeo de medidas atiacutepicas como a suspensatildeo da carteira de motorista e o

passaporte do devedor abandona a regra da responsabilidade patrimonial e atingem em cheio

o nuacutecleo de direitos inerentes agrave condiccedilatildeo humana

166 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

167 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 115

62

O limite para a aplicaccedilatildeo de tais medidas deve ser a Constituiccedilatildeo Federal e sobretudo

os Direitos fundamentais nela expressos ldquoCom efeito natildeo haacute saiacuteda tampouco soluccedilatildeo eficaz

de um problema sem que se respeite a Lei e o Devido Processo Legal (por mais nobres que

sejam as intenccedilotildees)rdquo 168

Dessa forma a busca desenfreada pelo cumprimento das decisotildees judiciais em

especial na fase executiva natildeo pode ser realizada em sacrifiacutecio de direitos fundamentais O

Poder Judiciaacuterio natildeo pode resolver a crise do processo executoacuterio utilizando de medidas

arbitraacuterias com o propoacutesito de satisfazer obrigaccedilotildees pecuniaacuterias

Eis o dilema que se coloca diante do poder geral de efetivaccedilatildeo ele pode servir de

potente instrumento em prol da tutela jurisdicional executiva entretanto se manejado de

modo improacuteprio serviraacute de instrumento de puniccedilatildeo e humilhaccedilatildeo do executado169

Eacute notoacuterio que se amplamente aplicado o poder geral de efetivaccedilatildeo reduziria os

iacutendices de inadimplecircncia quiccedilaacute resolveria por completo a crise da execuccedilatildeo civil Entretanto

o retrocesso civilizatoacuterio seria irreparaacutevel

168 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo

pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018

169 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

63

5 CONCLUSAtildeO

Como funccedilatildeo jurisdicional que tem como objeto a efetivaccedilatildeo de direitos a execuccedilatildeo

deve sempre buscar a maior satisfaccedilatildeo possiacutevel concretizando integralmente o creacutedito do

exequente isto eacute realizando o direito fundamental agrave tutela executiva do credor Por isso a

adoccedilatildeo de meios executivos atiacutepicos incorporados pelo Coacutedigo de Processo Civil de 2015 por

meio do art139 IV em um primeiro momento podem ser consideradas vaacutelidas visto que

servem de instrumento para a satisfaccedilatildeo e asseguraccedilatildeo de direitos do credor

Entretanto para o oacutergatildeo julgador natildeo cometa arbitrariedades em nome do direito

fundamental agrave execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que seja definido certos limites na adoccedilatildeo do poder

geral de efetivaccedilatildeo

As medidas executivas atiacutepicas natildeo podem ser aplicadas de maneira indiscriminada

logo devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o esgotamento das medidas tiacutepicas e

a possibilidade de cumprimento da obrigaccedilatildeo

Partindo dessa premissa as medidas a serem adotadas pelo juiz no caso concreto

devem ter como baliza os princiacutepios da proporcionalidade e da razoabilidade para que natildeo

ultrapassem a responsabilidade patrimonial do devedor e incidida diretamente sobre sua

pessoa

Para que natildeo seja atingida a pessoa do executado ou seja para que o devedor natildeo

tenha sua dignidade humana viola eacute necessaacuterio que a medida atiacutepica seja adequada e

necessaacuteria

Logo o juiz deveraacute sempre estabelecer uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida

executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia

a gerar o resultado sem violar a dignidade humana do executado

Dessa o juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental a execuccedilatildeo e

determinar uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute

necessaacuterio que a medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado

As medidas que ultrapassam esses limites como a decisatildeo que apreendeu o

passaporte suspensatildeo a CNH e bloqueou o cartatildeo de creacutedito do devedor satildeo meramente

punitivas posto que essas natildeo satildeo as medidas mais adequadas para se atingir o fim almejado

pois natildeo existe propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado

64

uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo

geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente

Medidas como esta servem de embasamento para decisotildees arbitraacuterias e autoritaacuterias de

violaccedilatildeo dos direitos fundamentais transformando o poder geral de efetivaccedilatildeo em

instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com autorizaccedilatildeo judicial

Em suma o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades de aplicaccedilatildeo do poder

geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e razoaacutevel se atendo aos

criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao

caso concreto sob pena de punir a pessoa do executado violando a sua dignidade humana

em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo

65

REFEREcircNCIAS

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THEODORO JUacuteNIOR Humberto Novo Coacutedigo de Processo Civil Anotado 20 ed

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  • 1 INTRODUCcedilAtildeO
  • 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO
    • 25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO
      • 3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
        • 31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS
          • 311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15
            • 32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
            • 33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
            • 34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
              • 4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
                • 41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
                • 42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
                  • 5 CONCLUSAtildeO
                  • REFEREcircNCIAS
Page 9: portal.faculdadebaianadedireito.com.brportal.faculdadebaianadedireito.com.br/portal/monografias...A prestação jurisdicional não se concretiza depois de encerrada afase de conhecimento

7 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO

CIVIL

21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL

A Execuccedilatildeo Civil nasce a partir do direito a uma prestaccedilatildeo conferida a algueacutem de

exigir de outrem o cumprimento de uma conduta de fazer natildeo fazer ou de dar (dinheiro ou

coisa distinta) 1

Para que o direito a uma prestaccedilatildeo se concretize no mundo fiacutesico eacute necessaacuterio que

haja a satisfaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida pelo sujeito passivo Caso contraacuterio fala-se em

inadimplemento ou lesatildeo O titular do direito natildeo tem como agir por si para efetivar o seu

direito a prestaccedilatildeo posto que a autotutela eacute vedada no ordenamento juriacutedico Dessa forma eacute

necessaacuterio que se recorra ao Poder Judiciaacuterio para que se possa ter a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo

devida logo a tutela jurisdicional executiva2

O processualista Fredie Didier et al3 equaciona essa questatildeo da seguinte maneira

Quando se pensa em tutela executiva pensa-se na efetivaccedilatildeo de direitos a uma prestaccedilatildeo fala-se de um conjunto de meios para efetivar a prestaccedilatildeo devida fala-se em execuccedilatildeo de fazer natildeo-fazer dar exatamente os trecircs tipos de prestaccedilatildeo existentes Natildeo eacute por acaso nem por coincidecircncia que a tutela executiva pressupotildee inadimplemento (CPC art 786) - fenocircmeno exclusivo dos direitos a uma prestaccedilatildeo Eacute por isso tambeacutem que se pode falar em prescriccedilatildeo da execuccedilatildeo (CPC art 802 e suacutemula do STF n 150) - prescriccedilatildeo eacute fenocircmeno juriacutedico que se relaciona aos direitos a uma prestaccedilatildeo A execuccedilatildeo forccedilada dirige-se ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo Essa relaccedilatildeo entre direito material e processo eacute fundamental para a compreensatildeo do fenocircmeno executivo

Nesse iacutenterim para o Ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux4 ldquoexecutar eacute

satisfazerrdquo ao passo que o professor Fredie Didier et al5 formulou um conceito mais amplo

ldquoExecutar eacute satisfazer uma prestaccedilatildeo devida A execuccedilatildeo pode ser espontacircnea quando o

devedor cumpre voluntariamente a prestaccedilatildeo ou forccedilada quando o cumprimento da prestaccedilatildeo

eacute obtido por meio de atos executivos pelo Estadordquo

1 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 41 2 Ibid p 42 3 Ibid p 42 4 FUX Luiz Curso de direito processual civil Rio de Janeiro Forense 2001 p 980 5 DIDIER JR Fredie et al Op Cit p 45

8 Dessa forma a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional responsaacutevel pela

concretizaccedilatildeo de um direito subjetivo no plano material obtendo resultado idecircntico ou

equivalente ao atingiacutevel se o devedor cumprisse espontaneamente a prestaccedilatildeo

Todavia essa atividade jurisdicional soacute cabe quando o devedor se recusa a cumprir

com a obrigaccedilatildeo quebrando a expectativa do credor de receber o que lhe eacute devido Por esta

razatildeo que se diz que a execuccedilatildeo civil eacute ldquoforccediladardquo 6

Eacute o que se conclui seguindo os ensinamentos de Leonardo Greco7 para ele execuccedilatildeo eacute

uma

() modalidade de tutela jurisdicional que consiste na praacutetica pelo juiz (ou por outrem sob a sua supervisatildeo) de uma seacuterie de atos coativos concretos sobre o devedor e sobre o seu patrimocircnio a fim de agrave custa dele e independentemente do concurso da sua vontade tornar efetivo o cumprimento de prestaccedilatildeo por ele inadimplida desde que tais atos coativos estejam previamente constituiacutedos em lei

Portanto a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional que tem como escopo obter o

cumprimento de uma prestaccedilatildeo certa e inadimplida mediante atos coativos sobre o devedor e

seus bens

22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL

Vislumbrado o conceito de execuccedilatildeo civil cabe agora empreender a sua classificaccedilatildeo

tendo em vista que a execuccedilatildeo pode se manifestar de diversas formas possuindo diferentes

caracteriacutesticas em cada uma das suas modalidades

Inicialmente cabe destacar que haacute duas teacutecnicas processuais para viabilizar a execuccedilatildeo

civil lato sensu eacute a que divide em processo autocircnomo de execuccedilatildeo e em fase de execuccedilatildeo

dependendo do tiacutetulo executivo que justifica o exerciacutecio da atividade satisfativa

O Coacutedigo Processual Civil de 2015 acertadamente ratificou as reformas promovidas

no CPC73 que consagrava a opccedilatildeo legislativa de oferecimento das tutelas de certificaccedilatildeo e

efetivaccedilatildeo do direito em um mesmo processo Dessa forma as execuccedilotildees de sentenccedilas

6 BASTOS Luiz Fernando Pereira O artigo 139 IV do novo Coacutedigo de Processo Civil a atipicidade

dos meios executivos na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia certa Brasiacutelia 2017 Disponiacutevel em lt httpbdmunbbrbitstream104831866812017_LuizFernandoPereiraBastospdf gt Acesso em 06 de agosto de 2018

7 BASTOS Luiz Fernando Pereira apud GRECO Leonardo O processo de execuccedilatildeo Rio de Janeiro Renovar 1999 p 164

9

passaram a ser uma fase complementar ao de processo de conhecimento e natildeo mais ocorrer

em um processo autocircnomo

No entendimento do professor processualista Fredie Didier et al8 o processo

sincreacutetico simplificou a efetivaccedilatildeo de um direito reconhecido em sentenccedila

A dispensa do ajuizamento de um processo autocircnomo para execuccedilatildeo de sentenccedila natildeo soacute veio diminuir o tempo necessaacuterio agrave prestaccedilatildeo da tutela jurisdicional - afinal o credor natildeo mais precisaria tal como ocorria ateacute entatildeo promover nova citaccedilatildeo pessoal do reacuteudevedor- como tambeacutem veio romper de vez com um velho paradigma segundo o qual a atividade executiva estaria dissociada da precedente atividade jurisdicional cognitiva

Entretanto natildeo soacute as sentenccedilas de meacuterito ensejam uma execuccedilatildeo Por esta razatildeo foi

necessaacuterio manter o processo autocircnomo de execuccedilatildeo para os casos em que o credor tem a seu

favor um documento que natildeo tenha sido proferido por um oacutergatildeo dotado de jurisdiccedilatildeo

Consequentemente se for o titulo executivo judicial o caminho natural eacute o do

cumprimento de sentenccedila Sendo por sua vez extrajudicial o titulo executivo o caminho

correto eacute o processo de execuccedilatildeo

Cabe ainda salientar que toda execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial eacute definitiva Jaacute a

execuccedilatildeo de tiacutetulo judicial (cumprimento de sentenccedila) pode ser definitiva ou provisoacuteria

No primeiro caso isto eacute cumprimento de sentenccedila definitivo ldquoeacute a execuccedilatildeo completa

que vai ateacute a fase final (com a entrega do bem da vida) sem exigecircncias adicionais para o

exequenterdquo 9

Quanto ao segundo caso ldquoo cumprimento provisoacuterio de sentenccedila (fundada em tiacutetulo

provisoacuterio) eacute aquele que exige alguns requisitos extras para que se chegue agrave fase final da

execuccedilatildeordquo 10

Para Fredie Didier11 o criteacuterio para definir se o cumprimento de sentenccedila seraacute

definitivo ou provisoacuterio

() eacute a estabilidade do tiacutetulo executivo em que se funda a execuccedilatildeo se se tratar de decisatildeo acobertada pela coisa julgada material o cumprimento de sentenccedila eacute

8 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 46 9 Ibid p 57 10 Ibid p 57 11 Ibid p 57

10

definitivo se se tratar de decisatildeo judicial ainda passiacutevel de alteraccedilatildeo (reforma ou invalidaccedilatildeo) em razatildeo da pendecircncia de recurso contra ela interposto a que natildeo tenha sido atribuiacutedo efeito suspensivo o cumprimento de sentenccedila eacute provisoacuterio

Ademais a execuccedilatildeo se distingue em procedimentos executivos comuns que satildeo da

execuccedilatildeo civil e que servem a uma generalidade de creacuteditos como eacute o caso do cumprimento

de sentenccedila e o processo de execuccedilatildeo E em procedimentos executivos especiais que servem

agrave satisfaccedilatildeo de creacuteditos peculiares como a execuccedilatildeo de alimentos e a execuccedilatildeo fiscal 12

Por fim cabe mencionar a classificaccedilatildeo que distingue a execuccedilatildeo em direta e indireta

A primeira execuccedilatildeo direita (ou execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo) eacute ldquo() aquela em que o

Poder Judiciaacuterio prescinde da colaboraccedilatildeo do executado para a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida

e pois promove uma substituiccedilatildeo da sua conduta pela conduta do proacuteprio Estado-juiz ou de

terceirordquo 13 Ou seja as medidas executivas satildeo levadas a efeito mesmo contra a vontade do

devedor na execuccedilatildeo direta

Segundo a doutrina a execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo se subdivide da seguinte forma

meios de desapossamento meios de transformaccedilatildeo e meios de expropriaccedilatildeo

Os meios de desapossamento muito comuns nas execuccedilotildees para entrega de coisa eacute a

forma ldquopor meio da qual se retira da posse do executado o bem a ser entregue ao exequente

(p ex despejo busca e apreensatildeo reintegraccedilatildeo de posse)rdquo 14 Ao passo que por meio dos de

transformaccedilatildeo ldquo() o juiz determina que um terceiro pratique a conduta que deveria ser

praticada pelo executado cabendo a este arcar com o pagamento do custo respectivordquo 15 Jaacute

os meios executivos de expropriaccedilatildeo eacute a forma ldquopor meio do qual algum bem do patrimocircnio

do devedor eacute expropriado para pagamento do creacutedito (adjudicaccedilatildeo alienaccedilatildeo judicial ou

apropriaccedilatildeo de frutos e rendimentos de empresa ou de estabelecimentos e de outros bens art

825 CPC)rdquo 16

12 Ibid p 48 13 Ibid p 50 14 Ibid p 51 15 Ibid p 51 16 Ibid p 51

11 Jaacute a execuccedilatildeo indireta (ou mandamental) atua ldquo() na vontade do devedor como forma

de compeli-lo ou incentivaacute-lo a cumprir a ordem judicialrdquo 17 Nesse entendimento ainda

leciona Fredie Didier et al 18

Nesses casos o Estado-juiz busca promover a execuccedilatildeo com a colaboraccedilatildeo do executado forccedilando ou incentivando a que ele proacuteprio cumpra a prestaccedilatildeo devida Em vez de o Estado-juiz tomar as providecircncias que deveriam ser tomadas pelo executado o Estado forccedila por meio de coerccedilatildeo psicoloacutegica ou de promessa de recompensa judicial a que o proacuteprio executado cumpra a prestaccedilatildeo

A execuccedilatildeo indireta pode ser patrimonial como por exemplo a imposiccedilatildeo de multa

coercitiva ou pessoal com a prisatildeo civil do devedor de alimentos Ademais adiciona Didier

et al19que

O estiacutemulo ao cumprimento da prestaccedilatildeo pode dar-se pelo temor (p ex multa coercitiva prisatildeo civil do devedor de alimentos divulgaccedilatildeo de notiacutecia em jornal revelando o descumprimento) ou pelo incentivo (p ex a chamada sanccedilatildeo premial ou sanccedilatildeo positiva de que eacute exemplo a isenccedilatildeo do pagamento de custas em caso de cumprimento do mandado monitoacuterio - art 701 sect 1ordm CPC a reduccedilatildeo pela metade dos honoraacuterios advocatiacutecios fixados inicialmente pelo juiacutezo em caso de pagamento integral do deacutebito pecuniaacuterio na execuccedilatildeo por quantia certa fundada em tiacutetulo extrajudicial - art 827 sect 1ordm CPC)

Por tais razotildees haacute uma tendecircncia em cada vez mais prestigiar os meios executivos

indiretos (coercitivos) posto que satildeo tatildeo eficazes quanto os meios executivos diretos

entretanto menos onerosos Contudo sua aplicaccedilatildeo deve ser fiscalizada a fim de natildeo permitir

que a execuccedilatildeo civil perca sua finalidade visto que eacute uma funccedilatildeo jurisdicional que tem como

escopo efetivar o direito do credor e natildeo de atender os interesses do devedor

23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL

Os princiacutepios juriacutedicos nos uacuteltimos anos passaram a ser munidos de forccedila cogente

normatizando as condutas humanas tanto quanto as regras juriacutedicas Os ditos princiacutepios

ampliaram as margens de atuaccedilatildeo dos aplicadores do direito possibilitando a construccedilatildeo de

soluccedilotildees mais adequadas agraves especificidades das demandas que chegam ao judiciaacuterio

17 Ibid p 51 18 Ibid p 51 19 Ibid p 51-52

12 Dessa forma eacute necessaacuterio aprofundar-se nos princiacutepios norteadores da execuccedilatildeo civil

para que se obtenha uma anaacutelise completa da teoria geral da execuccedilatildeo

A execuccedilatildeo civil tem como um dos seus corolaacuterios o princiacutepio da efetividade este

consiste na exigecircncia de um sistema completo de tutela executiva no qual existam meios

executivos capazes de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor

de tutela executivardquo 20

O referido princiacutepio da efetividade eacute reforccedilado como normal fundamental do processo

civil brasileiro pelo art 4ordm do CPC ldquoArt 4ordm As partes tecircm o direito de obter em prazo razoaacutevel

a soluccedilatildeo integral do meacuterito incluiacuteda a atividade satisfativa

Jaacute o princiacutepio da boa feacute processual corolaacuterio do devido processo legal estaacute previsto

no art 5ordm do CPC ldquoAquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de

acordo com a boa-feacuterdquo Segundo o processualista baiano Fredie Didier21

O princiacutepio da boa-feacute extrai-se de uma claacuteusula geral processual A opccedilatildeo por uma claacuteusula geral de boa-feacute eacute a mais correta Eacute que a infinidade de situaccedilotildees que podem surgir ao longo do processo torna pouco eficaz qualquer enumeraccedilatildeo legal exaustiva das hipoacuteteses de comportamento desleal Daiacute ser correta a opccedilatildeo da legislaccedilatildeo brasileira por uma norma geral que impotildee o comportamento de acordo com a boa-feacute Em verdade natildeo seria necessaacuteria qualquer enumeraccedilatildeo das condutas desleais o art 5deg do CPC eacute bastante exatamente por tratar-se de uma claacuteusula geral

Dessa forma o dito princiacutepio preconiza que diante de um vinculo juriacutedico as pessoas

envolvidas natildeo poderatildeo frustrar a confianccedila do outro devendo comportar-se como se pode

esperar de uma pessoa de boa-feacute

Ademais disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial que ldquosomente o

patrimocircnio do devedor (art 789 CPC) ou de terceiro responsaacutevel pode ser objeto da

atividade executiva do Estadordquo 22

O referido princiacutepio que determina que somente o patrimocircnio submete-se agrave execuccedilatildeo

e natildeo a pessoa foi trazido pela humanizaccedilatildeo do direito Para o professor Didier et al23 o

20 DIDIER JR Freddie et al apud GUERRA Marcelo Lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do

credor na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 21 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte

geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 105 22 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 68

13

desenvolvimento dos meios de execuccedilatildeo indireta ldquoparece relativizar um pouco esse princiacutepio

na medida em que pressionam psicologicamente a pessoa do devedor para que cumpra a

obrigaccedilatildeo com seu comportamentordquo

Complementa ainda que

A responsabilidade executiva parece assumir atualmente caraacuteter hiacutebrido comportando coerccedilatildeo pessoal e sujeiccedilatildeo patrimonial

i) a coerccedilatildeo pessoal incide sobre a vontade do devedor admitindo o uso de medidas coercitivas de execuccedilatildeo indireta para forccedilaacute-lo a cumprir a obrigaccedilatildeo com seu proacuteprio comportamento (ex arts 139 rv 523 sect 1ordm 536 sect 1ordm e 538 sect 3ordm todos do CPC)

ii) descumprida a obrigaccedilatildeo e natildeo sendo possiacuteveladequado o uso de teacutecnica de coerccedilatildeo pessoal tem-se a sujeiccedilatildeo patrimonial que recairaacute sobre os bens do devedor ou de terceiro responsaacutevel - que responderatildeo pela proacutepria prestaccedilatildeo in natura (ex dar coisa ou entregar quantia) ou por perdas e danos24

Dessa forma o referido princiacutepio natildeo tem aplicaccedilatildeo absoluta em razatildeo do principio da

efetividade a qual estimula o uso dos meios de coerccedilatildeo indireta para garantir o cumprimento

da obrigaccedilatildeo pelo devedor

O princiacutepio da primazia da tutela especifica (ou princiacutepio do resultado) assevera que

ldquoA execuccedilatildeo deve ser especiacutefica propiciar ao credor a satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo tal qual

houvesse o cumprimento espontacircneo da prestaccedilatildeo pelo devedorrdquo 25

O CPC de 2015 absorveu todos os avanccedilos legislativos a cerca do mote O caput do

art 497 assegura que na accedilatildeo que tenha por objeto a prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer o

juiz se procedente o pedido concederaacute a tutela especiacutefica ou determinaraacute providecircncias que

assegurem a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico equivalente O art 499 o

complementa a obrigaccedilatildeo somente seraacute convertida em perdas e danos se o autor o requerer

ou se impossiacutevel agrave tutela especiacutefica ou a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico

equivalente

O princiacutepio do contraditoacuterio eacute garantido pela constituiccedilatildeo federal e compreende o

direito de ser ouvido o direito de acompanhar os atos processuais o direito de produzir

provas participar da sua produccedilatildeo manifestar-se sobre a prova produzida e obter do juiz a

23 Ibid p 69-70 24 Ibid p 70 25 Ibid p 71

14

respectiva valoraccedilatildeo o direito de ser informado regularmente dos atos praticados no processo

o direito agrave motivaccedilatildeo das decisotildees o direito de impugnar as decisotildees 26

O contraditoacuterio tem aplicaccedilatildeo em todo processo judicial sendo aplicaacutevel tambeacutem na

execuccedilatildeo No entanto o contraditoacuterio na execuccedilatildeo natildeo ocorre com a mesma intensidade que

no processo ou na fase de conhecimento eacute o que assevera Didier et al 27

O contraditoacuterio no procedimento executivo no aspecto do direito de defesa assegurado agrave parte demandada eacute eventual porquanto depende da provocaccedilatildeo do executado que natildeo eacute chamado ajuiacutezo para defender-se mas sim para cumprir a obrigaccedilatildeo O procedimento executivo adota a teacutecnica monitoacuteria que consiste basicamente na inversatildeo do ocircnus de provocar o contraditoacuterio o reacuteu em vez de citado para manifestar-se sobre a pretensatildeo do autor eacute convocado para cumprir uma determinada obrigaccedilatildeo

Logo haacute o contraditoacuterio no procedimento executivo porem eacute eventual quanto agrave defesa

do executado

Ademais o princiacutepio da menor onerosidade eacute consagrado pelo art 805 do CPC e

dispotildee que ldquoQuando por vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz

mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o executadordquo O referido princiacutepio tem o

escopo de impedir o abuso do direito pelo exequente

O principio da menor onerosidade auxilia o juiz na escolha de um meio executivo

adequado e necessaacuterio que satisfaccedila a prestaccedilatildeo exigida pelo credor Nesse sentido eacute o

entendimento do professor Fredie Didier et al 28

O resultado a ser alcanccedilado eacute aquele estabelecido pelo direito material A maneira de se chegar ateacute esse resultado eacute que deve ser a menos onerosa possiacutevel para o executado Isso significa que a opccedilatildeo pelo meio menos gravoso pressupotildee que os diversos meios considerados sejam igualmente eficazes Assim havendo vaacuterios meios executivos aptos agrave tutela adequada e efetiva do direito de creacutedito escolhe-se a via menos onerosa ao executado

O princiacutepio visa impedir a execuccedilatildeo desnecessariamente onerosa ao executado ou seja a execuccedilatildeo abusiva Em vez de enumerar situaccedilotildees em que a opccedilatildeo mais gravosa revelar-se-ia injusta o legislador valeu-se corretamente de uma claacuteusula geral para reputar abusivo qualquer comportamento do credor que pretender valer-se de meio executivo mais oneroso do que outro igualmente idocircneo agrave satisfaccedilatildeo do seu creacutedito

26 Ibid p 76 27 Ibid p 78 28 Ibid p 79-80

15 O princiacutepio da cooperaccedilatildeo tem como base os princiacutepios do devido processo legal da

boa-feacute processual e do contraditoacuterio O dito princiacutepio avigora a eacutetica processual com o

aprimoramento do diaacutelogo entre as partes reciprocamente e com o oacutergatildeo jurisdicional Eacute o

que preconiza o art 6ordm do CPC Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para

que se obtenha em tempo razoaacutevel decisatildeo de meacuterito justa e efetiva

No procedimento executivo o princiacutepio da cooperaccedilatildeo incide de diversas formas

disciplina Didier et al29 que na execuccedilatildeo

O executado tem o dever de indicar bens agrave penhora (art 774 V CPC) Natildeo encontrados bens penhoraacuteveis e natildeo havendo indicaccedilatildeo de qualquer um deles pelo exequente cabe ao executado declarar quais satildeo seus bens penhoraacuteveis sob pena de se sujeitar a uma sanccedilatildeo pecuniaacuteria compulsoacuteria

Tambeacutem eacute manifestaccedilatildeo do princiacutepio da cooperaccedilatildeo a exigecircncia de que o executado que pretende impugnar o valor da execuccedilatildeo apresente de logo o valor que reputa devido (art 525 sect 4ordm CPC) Seria comportamento natildeo-cooperativo afirmar que a cobranccedila eacute excessiva sem simultaneamente dizer qual eacute o valor correto

Demais disso aplicam-se agrave execuccedilatildeo os deveres que decorrem do princiacutepio da cooperaccedilatildeo e que satildeo imputados ao oacutergatildeo jurisdicional () Assim por exemplo deve o juiz advertir ao executado antes de puni-lo de que seu ato pode vir a caracterizar-se como atentatoacuterio agrave dignidade da jurisdiccedilatildeo ( art 772 II CPC) perceba que se trata de uma conduta compatiacutevel com o dever de prevenccedilatildeo O oacutergatildeo jurisdicional somente pode conhecer da prescriccedilatildeo ex officio dando a oportunidade de o exequente manifestar-se conforme impotildee o dever de consulta ( cf arts 10 487 paraacutegrafo uacutenico e 921 sect 5ordm CPC)

O princiacutepio ou postulado30 da proporcionalidade tem aplicaccedilatildeo muito relevante na

execuccedilatildeo O art 8 do CPC assegura que o oacutergatildeo jurisdicional tem o dever de observar a

proporcionalidade e a razoabilidade ao aplicar o ordenamento juriacutedico inclusive no

procedimento executivo

Ademais o art 805 do CPC eacute categoacuterico ao disciplinar que ldquoArt 805 Quando por

vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo

menos gravoso para o executadordquo O referido artigo jaacute se trata de uma concretizaccedilatildeo da

proporcionalidade

29 Ibid p 82 30 Segundo Fredie Didier et al haacute uma discussatildeo doutrinaacuteria sobre a proporcionalidade Parte da

doutrina acredita que a proporcionalidade eacute um princiacutepio e outra parte acredita que eacute um postulado normativo

16 O principio da adequaccedilatildeo pode ser vislumbrado em dois momentos do Direito

Processual ldquoa) no legislativo como orientador da confecccedilatildeo das leis b) no jurisdicional

autorizando ao juiz diante do caso concreto adaptar procedimento agraves suas peculiaridadesrdquo 31

Para Luceacutelia de Sena Alves e Tiago Retes32

Isso quer dizer que no momento legislativo o devido processo deve ser observado pelo legislador para a confecccedilatildeo das normas de direito processual que iratildeo servir de instrumento efetivo de concretizaccedilatildeo do direito substancial a ser tutelado atendendo a todas as suas finalidades sob pena de falecircncia do proacuteprio direito No momento jurisdicional da mesma forma a via processual escolhida pelo autor tambeacutem deve estar sujeita a este princiacutepio para que natildeo sofra as mesmas consequecircncias da sua inobservacircncia

O ordenamento juriacutedico deve ser aplicado por meio da teacutecnica processual adequada

evitando dessa forma uma tutela ineficaz

Por fim o princiacutepio do autorregramento da vontade na execuccedilatildeo tem o objetivo de

ldquo() preservar um espaccedilo processual para o exerciacutecio da liberdade e da vontade em que

sejam permitidas negociaccedilotildees que envolvam as partes ndash e tambeacutem o juizrdquo33 Didier et al34

assevera que

A rigor o legislador estabelece um regime juriacutedico de autorregramento da vontade processual identificando-se algumas manifestaccedilotildees relevantes para a execuccedilatildeo Na verdade pode-se dizer que poucos satildeo os ambientes mais propiacutecios do que a execuccedilatildeo para a negociaccedilatildeo sobre o processo Todos os institutos e normas processuais relativos agrave execuccedilatildeo devem ser repensados a partir da premissa de que o CPC permite uma ampla margem de liberdade de negociaccedilatildeo sobre o processo (art 190 CPC)

O autorregramento da vontade pode ser vislumbrando na previsatildeo de negoacutecios tiacutepicos

em sede de execuccedilatildeo como por exemplo no acordo das partes sobre o valor do bem que

dispensa a avaliaccedilatildeo disposto no inciso I do art 871 CPC Ademais dentro dos limites do art

190 do CPC eacute possiacutevel na execuccedilatildeo a atribuiccedilatildeo da negociaccedilatildeo atiacutepica aos sujeitos 31 ALVES Luceacutelia de Sena Alves RETES Tiago O poder geral de efetivaccedilatildeo das decisotildees judiciais e

proporcionalidade uma anaacutelise criacutetica acerca do art 139 IV do Novo Coacutedigo de Processo Civil Disponiacutevel em lthttpswwwacademiaedu31752652O_poder_geral_de_efetivaC3A7C3A3o_das_decisC3B5es_judiciais_e_a_proporcionalidade_uma_anC3A1lise_crC3ADtica_acerca_do_art_139_IV_do_Novo_CC3B3digo_de_Processo_Civil gt Acesso em 25 de julho de 2018

32 Ibid natildeo paginado 33 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 85 34 Ibid p 85

17

processuais permitindo que sejam feitas mudanccedilas nos procedimentos e nas situaccedilotildees

juriacutedicas processuais ldquoSatildeo exemplos de negoacutecios processuais atiacutepicos na execuccedilatildeo pacto de

penhorabilidade acordo de ampliaccedilatildeo de prazos das partes de qualquer natureza acordo de

rateio de despesas processuais ()rdquo35

24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO

Sempre houve diversos questionamentos quanto agrave eficaacutecia do Direito processual Civil

e se o mesmo era meio apto a assegurar a tutela jurisdicional dos direitos dos cidadatildeos O

processo de execuccedilatildeo eacute o setor que sofre mais criacuteticas quanto a sua ineficiecircncia afinal a

execuccedilatildeo civil sempre foi o ldquocalcanhar de Aquilesrdquo do sistema processual pela praxe do

ldquoganhou (no processo de conhecimento) mas natildeo levou (na fase de cumprimento ou

execuccedilatildeo)rdquo 36

Essa dificuldade de se efetivar a tutela satisfastiva natildeo se resume a um problema de

mera teacutecnica processual tiacutepico de determinado ordenamento mas representa uma prova de

fogo da capacidade dos instrumentos jurisdicionais O autor Leonardo Greco37 no ano de

2005 atribuiu esse fato as seguintes causas o excesso de processos o custo e a morosidade da

justiccedila a inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios a ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais

um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico e a progressiva volatizaccedilatildeo dos bens

Quanto ao excesso de processos o referido autor aduz que ldquonos grandes centros o

crescimento da maacutequina judiciaacuteria natildeo acompanhou a expansatildeo do nuacutemero de litiacutegiosrdquo 38

O custo e morosidade da justiccedila prejudicam a tutela satisfativa posto que

ldquojaacute desfalcado pelo inadimplemento do devedor o credor ainda tem de arcar com o adiantamento das despesas do processo de execuccedilatildeo e de eventual liquidaccedilatildeo vendo arrastar-se a marcha dos atos executoacuterios facilmente retardada por atos procrastinatoacuterios do devedorrdquo 39

35 Ibid p 86 36 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca

para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018

37 GRECCO Leonardo A Crise do Processo de Execuccedilatildeo in Estudos de direito processual Leonardo Greco ndash Campos dos Goytacazes Ed Faculdade de Direito de Campos 2005 p 7

38 Ibid p 7 39 Ibid p 7-8

18 A inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios contribui para a crise do processo de

execuccedilatildeo tendo em vista que

ldquoo juiz da execuccedilatildeo prisioneiro de ritos que o distanciam das partes e da realidade da vida impulsiona sem qualquer apetite a execuccedilatildeo conduzindo-a ao sabor dos ventos das provocaccedilotildees impacientes do credor e das costumeiras procrastinaccedilotildees do devedorrdquo 40

Jaacute ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais atrapalha a efetivaccedilatildeo da tutela satisfativa ldquoo

devedor natildeo colabora com a execuccedilatildeo e os meios de pressatildeo que a lei estabelece natildeo satildeo

suficientes para intimidaacute-lordquo 41

Com um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico

O espiacuterito empresarial e a sociedade de consumo estimulam o endividamento das pessoas e o inadimplemento das obrigaccedilotildees pelo devedor deixou de ser vexatoacuterio e reprovaacutevel o que multiplica as accedilotildees de cobranccedila e execuccedilotildees atraveacutes das quais o sujeito passivo ainda usufrui vantagens agraves custas do credor 42

Por fim Leonardo Greco elenca a volatizaccedilatildeo dos bens como o uacuteltimo fator que

macula o processo executo tendo em vista que

ldquomudou inteiramente o perfil patrimonial das pessoas antes concentrado em bens de raiz e agora tendencialmente dirigido a investimentos em tiacutetulos e valores facilmente negociaacuteveis o que dificulta a sua localizaccedilatildeo pelo credorrdquo 43

O Coacutedigo de Processo Civil de 1973 introduziu o sistema executivo ao ordenamento

juriacutedico paacutetrio e seguindo os valores liberais da eacutepoca com a proteccedilatildeo de esfera juriacutedica de

liberdade do cidadatildeo contra a possibilidade de arbiacutetrio do Estado e uso indevido do Poder

jurisdicional outorgou o miacutenimo de poder ao juiz Seguindo as regras do CPC de 73 o

devedor soacute poderia ter sua esfera juriacutedica invadida atraveacutes de meios de execuccedilatildeo instituiacutedos

previamente em lei

Diante de tantos obstaacuteculos para se efetivar a tutela satisfativa a execuccedilatildeo estava

fadada ao fracasso o que frustrava a expectativa do jurisdicionado a uma prestaccedilatildeo da tutela

jurisdicional ceacutelere e efetiva Insatisfeitos com o cenaacuterio que se encontrava a atividade

40 Ibid p 8 41 Ibid p8 42 Ibid p 8 43 Ibid p8

19

executiva legisladores e operadores do direito natildeo mediram esforccedilos para promover uma

evoluccedilatildeo significativa buscando mais eficiecircncia e celeridade ao procedimento executoacuterio

Dessa forma no final de 1994 foi introduzido no coacutedigo de processo agrave flexibilizaccedilatildeo

dos poderes executoacuterios do juiz ldquopara que ele pudesse prestar uma tutela efetiva aos direitos

ficando autorizado a determinar a modalidade de execuccedilatildeo adequada a cada hipoacutetese nas

obrigaccedilotildees de fazer e natildeo fazer (art 461 sect5ordm do CPC de 1973)rdquo No ano de 2002 a referida

medida foi estendida para as obrigaccedilotildees de entregar coisa (art 461-A caput e sect3ordm do CPC de

1973)

Com fundamento nos artigos 461 e 461-A em 2005 a Lei nordm 11 23205 unificou o

processo de conhecimento e o processo de execuccedilatildeo de sentenccedila Nesse sentido Maacuterio

Henrique Cavalcanti Gil Rodrigues44 aduz que

A Lei 112322005 reuniu de forma definitiva os processos de conhecimento e de execuccedilatildeo em um uacutenico processo composto por um sistema bifaacutesico Assim passa a existir uma fase inicial (de reconhecimento) e uma fase posterior (de cumprimento de sentenccedila de efetivaccedilatildeo da decisatildeo definitiva) sem contar com a eventual fase intermediaacuteria de liquidaccedilatildeo (RODRIGUES 2010 p 38)

Ademais as alteraccedilotildees realizadas no CPC de 73 inseriu a atipicidade dos meios

executivos nas obrigaccedilotildees de fazer natildeo fazer e dar coisa certa entretanto exercendo papel

subsidiaacuterio aos meios tiacutepicos

Quanto agraves obrigaccedilotildees de pagar quantia havia apenas a possibilidade de se valer da

incidecircncia de multa do art 475-J do CPC de 73 ndash implementada mediante reforma perpetrada

pela Lei nordm 11232 de 2005 em atendimento a doutrina processualista preocupada com a

efetividade das decisotildees ndash e de atos executivos como a penhora de bens e dinheiro

Ainda que a execuccedilatildeo tenha avanccedilado com a inserccedilatildeo das leis posteriores a 1994 no

CPC de 1973 a mesma continuava insuficiente tendo em vista que a burocracia e lentidatildeo

dos atos executivos davam brechas para que o devedor escondesse seu patrimocircnio penhoraacutevel

tornando carente de efetividade e celeridade agrave execuccedilatildeo

44 RODRIGUES Maacuterio Henrique Cavalcanti Gil A evoluccedilatildeo da execuccedilatildeo de sentenccedila no direito

processual civil e o novo regime juriacutedico das sentenccedilas apoacutes a reforma implementada pela Lei 112322005 Revista do Tribunal Regional Federal da 1ordf Regiatildeo v 22 n 2 fev 2010 p 38

20

25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO

A tutela juridiscional eacute um direito fundamental previsto no art 5ordm inciso XXXV da

Carta Magna ldquo() a lei natildeo excluiraacute da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio lesatildeo ou ameaccedila a

direitordquo

Na visatildeo claacutessica o direito de accedilatildeo era efetivado com a prolaccedilatildeo de uma sentenccedila de

meacuterito posiccedilatildeo adotada por grande parte dos processualistas seguidores da doutrina de

Liebman Todavia esse conceito se mostra defasado tendo em vista que o direito de acesso agrave

justiccedila natildeo eacute apenas uma garantia formal de bater as portas do judiciaacuterio mas a garantia de

acesso agrave ordem juriacutedica justa adequada e eficaz45

Acreditar que uma sentenccedila de meacuterito favoraacutevel eacute tutela jurisdicional suficiente para

satisfazer o que se busca com o ajuizamento da accedilatildeo eacute uma visatildeo distorcida da atividade

satisfativa ldquoSob o ponto de vista do direito material a condenaccedilatildeo por si soacute eacute incapaz de

prestar a tutela do direitordquo46

Nessa oacutetica o direito fundamental agrave tutela executiva exige um sistema de tutela

jurisdicional ldquocapaz de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor

de tutela executivardquo47 Dessa forma entende-se que

ldquo() a) a interpretaccedilatildeo das normas que regulamentam a tutela executiva tem de ser feita no sentido de extrair a maior efetividade possiacutevel b) o juiz tem o poder-dever de deixar de aplicar uma norma que imponha uma restriccedilatildeo a um meio executivo sempre que essa restriccedilatildeo natildeo se justificar como forma de proteccedilatildeo a outro direito fundamental c) o juiz tem o poder-dever de adotar os meios executivos que se revelem necessaacuterios agrave prestaccedilatildeo integral de tutela executivardquo48

Egrave imperioso compreender que o direito fundamental agrave tutela executiva ratificado

pelo CPC eacute essencial para dirimir diversos litiacutegios oriundos do procedimento executivo

45 FERREIRA Gabriela Macedo Poder geral de efetivaccedilatildeo em defesa da constitucionalidade da

teacutecnica de execuccedilatildeo dos direitos do art 139 IV do Coacutedigo de Processo Civil Revista Jus Navigandi ISSN 1518-4862 Teresina ano 22 n 5178 4 set 2017 Disponiacutevel em lthttpsjuscombrartigos60190gt Acesso em 11 set 2018

46 Ibid natildeo paginado 47 DIDIER JR Fredie et al apud GUERRA Marcelo lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do credor

na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 48 Ibid p 102-104

21

ldquoprincipalmente aqueles relacionados agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo49

Fredie Didier et al50 cita como exemplo as hipoacuteteses de impenhorabilidade

A impenhorabilidade de certos bens eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa

Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais

Por esta razatildeo o legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do

CPC fazendo um preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses das partes envolvidas

optando pela mitigaccedilatildeo do direito do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado

Quando o oacutergatildeo jurisdicional verificar que a aplicaccedilatildeo das regras de

impenhorabilidade eacute desproporcional para o caso concreto deve afastaacute-la e construir a

soluccedilatildeo adequada para o referido caso Didier et al51 traz um exemplo esclarecedor em sua

obra

O bem imoacutevel que serve de moradia da famiacutelia eacute relativamente impenhoraacutevel Objetiva-se com essa restriccedilatildeo proteger o direito fundamental agrave moradia conteuacutedo do direito agrave proteccedilatildeo da dignidade Imagine-se um imoacutevel de altiacutessimo valor Imagine-se agora um creacutedito que corresponda a 40 do valor do imoacutevel A venda judicial do imoacutevel no caso permitiria natildeo soacute satisfazer o direito do credor como ainda garantir ao executado com a sobra a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel que lhe preserve a dignidade A opccedilatildeo pela interpretaccedilatildeo literal da regra que veda a penhora protegeria exclusivamente o direito do executado de maneira desnecessaacuteria porque a relaccedilatildeo valor executadovalor do bem permitiria a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel apoacutes a entrega do dinheiro ao credor Seria pois interpretaccedilatildeo em desconformidade com os preceitos da contemporacircnea hermenecircutica constitucional que preconiza a necessidade de nos casos de choque entre direitos fundamentais dar a interpretaccedilatildeo que mais adequadamente proteja a ambos

A execuccedilatildeo civil integra o direito fundamental agrave tutela jurisdicional disciplinando

que ldquoos dispositivos devem ser interpretados de modo que se garanta a maior efetividade

49 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66 50 Ibid p 66 51 Ibid p 67

22

possiacutevel agrave execuccedilatildeo desde que respeitados outros direitos fundamentaisrdquo52 Podendo ser

afastada desde que proporcional qualquer obstaacuteculo irrazoaacutevel agrave efetivaccedilatildeo desse direito

52 FERREIRA Gabriela Macedo apud MACEDO Lucas Buril de As eficaacutecias das decisotildees judiciais e

o cumprimento de sentenccedila no CPC15 Novo CPC Doutrina selecionada v 5 Execuccedilatildeo Coordenador geral Fredie Didier Jr organizadores Lucas Buril de Macedo Ravi Peixoto Alexandre Freire ndash Salvador Jus Podivm 2015 p 360361

23

3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO

EXECUTADO

31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS

Como forma de controlar a atividade jurisdicional por muito tempo vigorou o

entendimento de que a execuccedilatildeo somente poderia ser realizada atraveacutes dos meios executivos

tipicamente previstos na legislaccedilatildeo Segundo Luiz Guilherme Marinoni53

O princiacutepio da tipicidade deseja significar que os meios de execuccedilatildeo devem estar previstos na lei e assim que a execuccedilatildeo natildeo pode ocorrer atraveacutes de formas executivas natildeo tipificadas O seu objetivo eacute de um lado impedir que meio executivo natildeo previsto em lei possa ser utilizado e de outro garantir o jurisdicionado contra a possibilidade de arbiacutetrio judicial na fixaccedilatildeo da modalidade executiva Se o jurisdicionado sabe em razatildeo de previsatildeo legal que a sua esfera juriacutedica somente poderaacute ser invadida atraveacutes de determinadas modalidades executivas confere-se a ele a possibilidade de antever a reaccedilatildeo ao seu inadimplemento bem como a garantia de que a jurisdiccedilatildeo natildeo determinaraacute ou permitiraacute a utilizaccedilatildeo de meio executivo diverso daqueles previstos

Dessa forma o princiacutepio da tipicidade disciplina que o oacutergatildeo julgador ao proceder agrave

execuccedilatildeo estaacute limitado aos meios executivos previamente definidos em lei natildeo podendo se

valer de qualquer teacutecnica de efetivaccedilatildeo que natildeo se encaixasse nas hipoacuteteses taxativas da

legislaccedilatildeo

Entretanto o legislador natildeo tem como prever todas as peculiaridades dos direitos

dignos de tutela executiva e preordenar teacutecnicas executivas diversas para cada peculiaridade

Sob esse cenaacuterio o principio da tipicidade foi cedendo lugar ao principio da atipicidade dos

meios executivos

A ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do oacutergatildeo julgador estaacute cada vez mais presente

no ordenamento juriacutedico paacutetrio motivando um poder geral de efetivaccedilatildeo ldquoque permite ao

julgador valer-se dos meios executivos que considerar mais adequado ao caso concreto sejam

eles de coerccedilatildeo direta sejam de coerccedilatildeo indiretardquo 54

53 MARINONI Luiz Guilherme Teacutecnica processual e tutela dos direitos Satildeo Paulo Editora Revista

dos Tribunais 2004 p 212 nota 79 54 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 100

24

Essa tendecircncia de ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do juiz natildeo eacute exclusividade do

ordenamento juriacutedico brasileiro segundo Fredie Didier et al55

Michelle Taruffo jaacute apontava que o direito americano diante da inefetividade dos meios executivos at law comeccedilou a autorizar o magistrado a tomar medidas executivas adequadas ao caso concreto Trata-se afirma o jurista italiano de aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo segundo o qual as regras processuais devem ser adaptadas agraves necessidades do direito material

Os meios executivos atiacutepicos derivam de trecircs enunciados normativos do Coacutedigo de

Processo Civil o art 139 IV o art 297 e o sect1ordm do art 536

O art 139 IV do CPC dispotildee que pertence ao juiz o poder-dever de ldquodeterminar

todas as medidas indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para

assegurar o cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto

prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo

Jaacute o art 297 do CPC cuida da tutela provisoacuteria e garante que ldquoo juiz poderaacute

determinar as medidas que considerar adequadas para a efetivaccedilatildeo da tutela provisoacuteriardquo

Podendo dessa forma a dita tutela ser efetivada atipicamente

Por fim o art 536 sect1ordm do CPC dispotildee que

Para atender ao disposto no caput o juiz poderaacute determinar entre outras medidas a imposiccedilatildeo de multa a busca e apreensatildeo a remoccedilatildeo de pessoas e coisas o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva podendo caso necessaacuterio requisitar o auxilio de forccedila policial

As supracitadas medidas executivas atiacutepicas satildeo entendidas pela doutrina como

claacuteusulas gerais processuais executivas56 Essas claacuteusulas gerais natildeo restringem a sua

aplicaccedilatildeo agraves teacutecnicas de coerccedilatildeo indireta satildeo autorizados tambeacutem o uso de meios de execuccedilatildeo

dieta e indireta

Ademais cumpre salientar que o art 139 IV CPC aplica-se a toda e qualquer

atividade executiva ldquoa) seja fundada em tiacutetulo executivo judicial (provisoacuteria ou definitiva)

55 DIDIER JR Fredie et al apud TARUFFO Michelle A atuaccedilatildeo executiva dos direitos perfis

comparatiacutesticos Revista de Processo Satildeo Paulo RT 1990 n 59 p 78 56 Segundo Fredie Didier et al claacuteusula geral eacute uma espeacutecie de texto normativo cujo antecedente

(hipoacutetese faacutetica) eacute composto por termos vagos e consequente (efeito juriacutedico) eacute indeterminado

25

seja fundada em tiacutetulo executivo extrajudicial b) seja para efetivar prestaccedilatildeo pecuniaacuteria seja

para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer ou dar coisa distinta de dinheirordquo57

Jaacute o art 297 do CPC garante que a tutela provisoacuteria possa ser efetivada tambeacutem

atipicamente ldquoSucede que a atipicidade da tutela provisoacuteria segue necessariamente a

atipicidade da tutela definitivardquo 58

Por fim o comando do sect 1 ordmdo art 536 se aplica

a) inicialmente agrave execuccedilatildeo de fazer e de natildeo fazer fundada em decisatildeo judicial (provisoacuteria ou definitiva) b) por forccedila do sect 3ordm do art 538 tambeacutem se aplica ao cumprimento de sentenccedila para entrega de coisa c) por forccedila do art 771 paraacutegrafo uacutenico o dispositivo tambeacutem se aplica agrave execuccedilatildeo para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer e entregar coisa distinta de dinheiro fundada em tiacutetulo extrajudicial

Claramente o art 139 IV eacute mais amplo do que o sect 1 ordm do art 536 estende-se por

disposiccedilatildeo expressa agrave execuccedilatildeo de pagar quantia Sendo uma grande novidade nas obrigaccedilotildees

que tem por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15

O art 139 IV do CPC apresentou uma novidade agrave atipicidade dos meios executivos

ao disciplinar que cabe ao juiz ldquodeterminar todas as medidas indutivas coercitivas

mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o cumprimento de ordem judicial

inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo

A inovaccedilatildeo estaacute na possibilidade de utilizar os meios atiacutepicos para assegurar o

cumprimento de decisotildees que versam sobre as obrigaccedilotildees pecuniaacuterias sendo admitida a

utilizaccedilatildeo de outros meios ateacute na execuccedilatildeo de titulo judicial de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria aleacutem da

multa de 10 (a que se refere o artigo 523 sect 1ordm do CPC) para forccedilar o devedor a cumprir a

obrigaccedilatildeo pecuniaacuteria

57 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 105 58 Ibid p 105

26

Dessa forma eacute possiacutevel afirmar que ldquoao lado da disciplina tiacutepica do art 523 e

seguintes () o novo CPC inova ao permitir que o sistema de teacutecnicas executivas atiacutepicas

sejam empregadas na execuccedilatildeo monetaacuteriardquo59 (ZARONI VITORELLI 2016 p 66)

Fernando da Fonseca Gajardoni60 denomina a dita medida como a ldquorevoluccedilatildeo

silenciosardquo da execuccedilatildeo por quantia certa posto que

() pelo fato de que a regra natildeo estar propriamente incrustrada nos capiacutetulo e livro atinentes ao cumprimento de sentenccedila e ao processo de execuccedilatildeo ndash o art 139 IV do Novo CPC parece trazer ao paiacutes algo bastante novo cuja aplicaccedilatildeo a depender do comportamento do Judiciaacuterio pode implicar em verdadeira revoluccedilatildeo (positiva ou negativa) na sistemaacutetica executiva ateacute entatildeo vigente

Claramente o dispositivo foi recebido com entusiasmo por parte da doutrina que

anteciparam em afirmar que o princiacutepio da atipicidade dos meios executivos no CPC2015

ldquo() assume a feiccedilatildeo de poder-dever geral conferido ao magistrado de determinar () todas

as medidas coercitivas sub-rogatoacuterias mandamentais e indutivas que entender necessaacuterias

para a tutela justa efetiva e em tempo razoaacutevelrdquo 61

Dessa forma lecionam Luiz Guilherme Marinoni Seacutergio Cruz Arenhart e Daniel

Mitidiero62 que

O juiz a partir do art 139 IV do CPC2015 natildeo estaacute mais adstrito apenas agrave sentenccedila condenatoacuteria ndash que fixa a obrigaccedilatildeo de pagar e daacute ensejo agrave abertura da execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo patrimonial ndash para a tutela de prestaccedilotildees pecuniaacuterias Pode impor essa prestaccedilatildeo por meio de ordem judicial acoplada ao aceno de emprego de medida de induccedilatildeo (coercitiva ou de pressatildeo positiva) ou de medida de sub-rogaccedilatildeo (MARINONI ARENHARDT MITIDIERO 2015 p 703)

Deste modo em razatildeo do art 139 IV do CPC tem-se entendido que o juiz nas

execuccedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria possui a faculdade de adotar qualquer

59 ZARONI Bruno Marzullo VITORELLI Edilson Reforma e efetividade da execuccedilatildeo no novo CPC

In PEIXOTO Ravi FREIRE Alexandre MENDES Aluiacutesio Gonccedilalves de Castro Execuccedilatildeo 2 ed rev e atual Salvador JusPodivm 2016 766 p (Coleccedilatildeo novo CPC doutrina selecionada v 5) p 66

60 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia 24082015 JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Acesso em 23082018

61 LIMA Rafael de Oliveira A atipicidade dos meios executivos no coacutedigo de processo civil brasileiro de 2015 Revista de Processo Jurisdiccedilatildeo e Efetividade da Justiccedila v 2 n 2 juldez 2016 p 11

62 MARINONI Luiz Guilherme ARENHART Seacutergio Cruz MITIDIERO Daniel Novo curso de processo civil tutela dos direitos mediante procedimento comum Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 v 2 p 703

27

medida indutiva coercitiva mandamentais ou sub-rogatoacuterias para efetivar o creacutedito do

exequente natildeo se limitando as medidas tiacutepicas

Alguns doutrinadores se precipitaram ao afirmar que o dito dispositivo ldquo() autoriza o

juiz a utilizar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir ressalvando-se a prisatildeo

civil constitucionalmente limitada ao devedor de alimentosrdquo 63 Acreditam Jorge Bheron

Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa que o entusiasmo por parte da

doutrina abre margem para as mais variadas formas de compelir o devedor a cumprir com a

prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

ldquoE aiacute persistindo no mau vezo de fazer explicaccedilotildees em abstrato ignorando que o sentindo soacute se daacute na aplicaccedilatildeo (situaccedilatildeo concreta real ou fictiacutecia) as sugestatildeo satildeo as mais engenhosas suspensatildeo de CNH retenccedilatildeo de passaporte restriccedilatildeo de fim de semana cancelamento de cartotildees de creacutedito ndash para ficar apenas nestasrdquo 64

Ou seja podendo o juiz natildeo apenas substituir o devedor tomando seu patrimocircnio para

entregar ao credor na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia como tambeacutem poderaacute

pressionaacute-lo psicologicamente a adimplir por conta proacutepria a obrigaccedilatildeo

Ademais o Enunciado nordm 48 do ENFAM avalia expressamente a possibilidade de

imposiccedilatildeo de medidas coercitivas para a efetivaccedilatildeo da execuccedilatildeo pecuniaacuteria Conforme o dito

enunciado

ldquoO art 139 inciso IV traduz um poder geral de efetivaccedilatildeo permitindo a aplicaccedilatildeo de medidas atiacutepicas para garantir o cumprimento de qualquer ordem judicial inclusive no acircmbito do cumprimento de sentenccedila e no processo de execuccedilatildeo baseado em tiacutetulosrdquo

Dessa forma o artigo 139 IV do CPC permite uma gama ampla de interpretaccedilotildees por

parte da doutrina por ser uma claacuteusula geral encontrando limite apenas na imaginaccedilatildeo de

quem o analisa Nesse sentido eacute forccediloso orientar e delimitar o manejo desse artigo legal para

que se extraia seu sentido e alcance revelando assim sobre que situaccedilotildees ele incide de que

modo e o que permite

63 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

64 Ibid sem paginaccedilatildeo

28

32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER

GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO

O artigo 139 IV com a vigecircncia do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 abriu margem

para uma constelaccedilatildeo de decisotildees nas quais o dito dispositivo recebeu diversas interpretaccedilotildees

pelos operadores do direito

Sem duacutevidas por ser uma das pioneiras a decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara

Ciacutevel do Foro Regional de Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-

1320138260011 na data de 25 de agosto de 2016 gerou um enorme rebuliccedilo

Nessa accedilatildeo que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto

uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a

suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o

passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito

Segundo a magistrada o processo tramitava haacute anos sem que nenhum valor tenha sido

pago ao exequente aleacutem do devedor natildeo ter oferecido proposta de acordo e nem ter indicado

bens agrave penhora configurando uma completa desiacutedia com o processo

ldquoO caso tratado nos autos se insere dentre as hipoacuteteses em que eacute cabiacutevel a aplicaccedilatildeo do art 139 inciso IV do Coacutedigo de Processo Civil Isso porque o processo tramita desde 2013 sem que qualquer valor tenha sido pago ao exequente Todas as medidas executivas cabiacuteveis foram tomadas sendo que o executado natildeo paga a diacutevida natildeo indica bens agrave penhora natildeo faz proposta de acordo e sequer cumpre de forma adequada as ordens judiciais frustrando a execuccedilatildeo

Se o executado natildeo tem como solver a presente diacutevida tambeacutem natildeo recursos para viagens internacionais ou para manter um veiacuteculo ou mesmo manter um cartatildeo de creacutedito Se poreacutem mantiver tais atividades poderaacute quitar a diacutevida razatildeo pela qual a medida coercitiva poderaacute se mostrar efetiva

Assim como medida coercitiva objetivando a efetivaccedilatildeo da presente execuccedilatildeo defiro o pedido formulado pelo exequente e suspendo a Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo do executado M A S determinando ainda a apreensatildeo de seu passaporte ateacute o pagamento da presente diacutevida

()

Determino ainda o cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado ateacute o pagamento da presente diacutevida ()rdquo

Foi impetrado Habeas Corpus no Tribunal de Justiccedila do Estado de Satildeo Paulo a favor

do executado sob o fundamento que a coaccedilatildeo era ilegal e afetava o direito de locomoccedilatildeo

29

garantido constitucionalmente Tendo sido concedida a liminar em decisatildeo que ora se

reproduz

Em que pese a nova sistemaacutetica trazida pelo art 139 IV do CPC2015 deve-se considerar que a base estrutural do ordenamento juriacutedico eacute a Constituiccedilatildeo Federal que em seu art 5ordm XV consagra o direito de ir e vir Ademais o art 8ordm do CPC2015 tambeacutem preceitua que ao aplicar o ordenamento juriacutedico o juiz natildeo atentaraacute apenas para a eficiecircncia do processo mas tambeacutem aos fins sociais e agraves exigecircncias do bem comum devendo ainda resguardar e promover a dignidade da pessoa humana observando a proporcionalidade a razoabilidade e a legalidade Por tais motivos concedo a liminar pleiteada65

Cabe destacar aqui o voto vencido da Desembargadora Maria Luacutecia Pizzotti no

julgamento do Habeas Corpus supracitado demonstrando que o debate sobre a abrangecircncia

do artigo 139 IV do CPC ocorre tanto na doutrina quanto no judiciaacuterio

O objetivo do novel dispositivo natildeo eacute impor penas ou restringir direitos natildeo sendo intenccedilatildeo do Judiciaacuterio suspender indefinidamente o direito de dirigir do executado ou sua liberdade de viajar mas sim impor uma restriccedilatildeo tatildeo gravosa caso ele natildeo cumpra a determinaccedilatildeo que escolha cumprir sua obrigaccedilatildeo e dar fim ao problema Em outras palavras mediante as medidas de coerccedilatildeo o Estado procura persuadir o inadimplente impondo-lhe situaccedilotildees tatildeo onerosas e inconvenientes que em algum momento seja para ele mais vantajoso cumprir do que permanecer no inadimplemento

Ao fazecirc-lo o Novo Coacutedigo de Processo Civil rompe com as criacuteticas da ineficiecircncia das execuccedilotildees Natildeo se cogita deferir medidas restritivas agravequeles que demonstram a incapacidade absoluta de solver o deacutebito apenas agravequeles que reconhecidamente se valem de artimanhas e subterfuacutegios para evitar a satisfaccedilatildeo das diacutevidas ldquopreferindordquo outras despesas mais lsquonobresrsquo agindo em nome de terceiros e fazendo escaacuternio dos credores e do proacuteprio Poder Judiciaacuterio (hellip)

Para tanto memoraacutevel a noccedilatildeo de que a medida em comento tem caraacuteter excepcional e encontra limites no plano da proporcionalidade como sustenta o ilustrado Magistrado paulista Fernando da Fonseca Gajardoni Professor Faculdade de Direito de Ribeiratildeo Preto da USP (in httpswwwjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 acesso em 091216 agraves 11h20min) E para anaacutelise da proporcionalidade a ponderaccedilatildeo deve observar os trecircs passos apontados pela doutrina a necessidade a adequaccedilatildeo e a proporcionalidade em sentido estrito

65 TJSP - Habeas Corpus Processo nordm 2183713-8520168260000 30ordf Cacircmara Direito Privado relator

Des Marcos Ramos j 290317

30

Ademais no entendimento de Jorge Amaury Maia Nunes e Guilherme Pupe de

Noacutebrega66 essa decisatildeo releva os perigos trazidos pelo art 139 IV do CPC ao confrontar

direitos constitucionalmente garantidos

De nossa parte entendemos que a liberdade de locomoccedilatildeo inserta no inciso XV do artigo 5ordm que abrange o direito de deixar o territoacuterio nacional sofre embaraccedilo indevido pela apreensatildeo de passaporte ou pela suspensatildeo da carteira nacional de habilitaccedilatildeo

()

Agrave luz da exposiccedilatildeo feita acima e em anaacutelise primeva sustentamos que o artigo 139 IV do CPC de 2015 estaacute a merecer declaraccedilatildeo de inconstitucionalidade sem reduccedilatildeo de texto para o fim de rechaccedilar a apreensatildeo de passaporte a suspensatildeo do direito de dirigir e a vedaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo em concurso ou em licitaccedilatildeo puacuteblicos como medidas passiacuteveis de serem adotadas pelo juiz sob pena de vulneraccedilatildeo aos artigos 1ordm IV 5ordm XV e LIV 37 I 173 sect 3ordm III e 175 todos da Constituiccedilatildeo

Apesar de ter sofrido duras criacuteticas a decisatildeo do processo de nordm 4001386-

1320138260011 serviu de inspiraccedilatildeo para tantas outras decisotildees no mesmo sentido

Foi o caso da decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de Satildeo

Vicente em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 0020724-2620088260590 na data de 21 de

junho de 2017

A supracitada execuccedilatildeo se arrastava por nove (09) anos sem que o devedor tenha

esboccedilado qualquer intenccedilatildeo de pagar a diacutevida O credor requereu a suspensatildeo da Carteira

Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado apreensatildeo do passaporte e cancelamento dos

cartotildees de creacutedito

O magistrado com embasamento no artigo 139 IV do CPC deferiu parcialmente o

pedido sob o fundamento de que a apreensatildeo de passaporte e CNH natildeo viola o direito de ir e

vir do devedor Entretanto o juiz indeferiu o pedido de cancelamento do cartatildeo de creacutedito por

acreditar que a suspensatildeo poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado tendo em

vista que atualmente as pessoas utilizam o referido cartatildeo para pagamento das despesas

diaacuterias

66 NOBREacuteGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139

IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018

31

Eacute evidente que as medidas atiacutepicas de coerccedilatildeo devem ser utilizadas com cautela sempre respeitando a dignidade da pessoa do executado Natildeo se vislumbra contudo que as medidas aqui eleitas sejam capazes de vulnerar os Direitos Fundamentais do indiviacuteduo A uma porque natildeo se trata de restriccedilatildeo ao direito de ir e vir do executado que continua no gozo de plena liberdade de locomoccedilatildeo a duas porque a conduccedilatildeo de veiacuteculo automotor eacute mera comodidade da vida moderna natildeo se tratando de direito absoluto

Com mais razatildeo ainda se admite a suspensatildeo do Passaporte do executado que se natildeo paga a diacutevida da execuccedilatildeo natildeo deve ter o direito de fazer viagem internacional

Tem-se aqui verdadeiro exerciacutecio de ponderaccedilatildeo de interesses juriacutedicos de um lado jaz o direito de creacutedito do exequente que deriva do direito de propriedade e por isso mesmo tem envergadura constitucional de outro giro tem-se o direito do executado agrave autorizaccedilatildeo do Estado para conduzir veiacuteculo automotor e realizar viagens internacionais que natildeo se mostram essenciais agrave dignidade da pessoa humana Natildeo haacute duacutevidas pois de que eacute este uacuteltimo que deve sucumbir

O pedido fica indeferido apenas no tocante agrave suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado Eacute que ao contraacuterio da CNH e do passaporte que trazem consigo certa presunccedilatildeo de riqueza natildeo se pode concluir que o uso de cartatildeo de creacutedito eacute feito por luxo ou simples conveniecircncia

Como eacute cediccedilo os cartotildees de creacutedito oferecem ao seu titular creacutedito raacutepido e rotativo para o pagamento de despesas diaacuterias e certamente exercem funccedilatildeo essencial agravequeles que se encontram em situaccedilatildeo financeira precaacuteria

A suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado portanto se revela medida desproporcional e que inclusive poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado

Pelo exposto defiro em parte o pedido formulado pelo exequente e DETERMINO a suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo e bem como a suspensatildeo da validade (cancelamento temporaacuterio) no sistema SINPA de eventuais passaportes vaacutelidos em nome do executado

Dessa forma o artigo 139 IV do CPC revolucionou completamente a execuccedilatildeo de

obrigaccedilatildeo de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria ao permitir a utilizaccedilatildeo do uso dos meios executivos

atiacutepicos para compelir o executado a satisfazer o creacutedito do exequente

33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE

EFETIVACcedilAtildeO

Era inevitaacutevel que o artigo 139 IV do CPC gerasse todo tipo de reaccedilatildeo entre os

doutrinadores do processo civil e ateacute mesmo de outros ramos do direito devido a sua

capacidade de realizar uma completa inovaccedilatildeo na forma de se executar as obrigaccedilotildees de pagar

quantia Alguns o aplaudiram visualizando nele ldquouma luz no fim do tuacutenelrdquo outros o

criticaram vislumbrando as arbitrariedades que poderiam ser praticadas com embasamento no

referido dispositivo

32

As decisotildees suscitadas em linhas preteacuteritas auxiliaram para fervilhar ainda mais o

debate sobre o tema tendo em vista que por um lado poderia aumentar a efetividade das

execuccedilotildees por quantia no entanto por outro surgiam questionamentos a cerca da sua

constitucionalidade

A doutrina parece que demoraraacute a se pacificar sobre o tema Segundo alguns

doutrinadores seraacute inconstitucional toda restriccedilatildeo que recaia sobre a pessoa do devedor e natildeo

exclusivamente sobre o seu patrimocircnio Jaacute para outros o dispositivo eacute constitucional e o meio

mais eficaz para se resolver o problema da efetivaccedilatildeo das execuccedilotildees de pagar quantia ldquoA

discussatildeo se daacute especialmente no que diz respeito aacutes medidas de suspensatildeo de CNH

apreensatildeo de passaporte e bloqueio de cartotildees de creacutedito do devedorrdquo 67

O professor Thiago Rodovalho analisou detalhadamente a decisatildeo de nordm 4001386-

1320138260011 em seu artigo ldquoO necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na

concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivosrdquo 68 Quanto agrave suspensatildeo da CNH o autor

acredita que tal medida natildeo viola qualquer direito fundamental do devedor posto que ldquodirigir

veiacuteculos automotores eacute direito do cidadatildeo mas natildeo se confunde com os direitos fundamentais

e social de ir-e-vir e ao transporterdquo 69 O professor eacute categoacuterico ao afirmar que

Com relaccedilatildeo agrave suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (suspensatildeo do direito de dirigir restriccedilatildeo de direitos) natildeo nos parece haver qualquer violaccedilatildeo a direito fundamental ou social nem a direito da personalidade ou colocaccedilatildeo do devedor em situaccedilatildeo desproporcionalmente detrimentosa exceccedilatildeo feita aos que usam o veiacuteculo como instrumento de trabalho atraindo a hipoacutetese do NCPC art 833 inc V

()

Outrossim natildeo o consideramos como direito da personalidade Os direitos da personalidade satildeo os valores fundamentais que compotildeem o proacuteprio ser justamente por isso intransmissiacuteveis e irrenunciaacuteveis natildeo podendo o seu exerciacutecio sofrer limitaccedilatildeo voluntaacuteria (CC art 11) Por mais que vivamos num paiacutes que tanto valoriza o carro e que muitas pessoas de fato se compreendam em razatildeo e em funccedilatildeo do carro que dirijam este natildeo nos parece ser um direito que verdadeiramente componha a personalidade do indiviacuteduo70

67 DONTOS Sofia Poderes executoacuterios do juiz que diz a doutrina sobre o art 139 inc IV do CPC

Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigospoderes-executorios-do-juiz-que-diz-a-doutrina-sobre-art-139-inc-iv-do-cpc-23052018 gt Publicado em 23052018 Acesso em 01082018

68 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018

69 Ibid sem paginaccedilatildeo 70 Ibid sem paginaccedilatildeo

33

Quanto ao cancelamento dos cartotildees de credito do devedor o professor Thiago

Rodovalho tambeacutem acredita que natildeo haacute qualquer violaccedilatildeo ao direito fundamental social ou

da personalidade do devedor e acrescenta que

Tanto assim o eacute que ser titular de um cartatildeo de creacutedito pressupotildee ter creacutedito o que eacute analisado e concedido por instituiccedilotildees financeiras mais do que isso se porventura passando por dificuldades financeiras a pessoa deixa de honrar com pagamentos a mesma instituiccedilatildeo financeira concedente do cartatildeo de creacutedito pode sponte propria cancelaacute-lo ou recusar-lhe a concessatildeo Ora parece-me contraditoacuterio que instituiccedilotildees financeiras para sua proteccedilatildeo patrimonial possam ferir esse suposto ldquodireito fundamentalrdquo ou esse suposto ldquodireito da personalidaderdquo mas natildeo possa o Poder Judiciaacuterio igualmente fazecirc-lo contra aquele devedor moroso que instado ao pagamento e frustradas todas as tentativas de constriccedilatildeo patrimonial leva vida luxuosa valendo-se de cartotildees de creacutedito que prescindem de dinheiro em conta eacute dizer podem justamente funcionar como forma de ocultar renda e patrimocircnio71

O autor considera a apreensatildeo de passaporte um tema mais polecircmico e que merece

maior reflexatildeo No entanto crecirc que eacute possiacutevel a apreensatildeo de passaporte sem violar os

direitos fundamentais do devedor por se tratar de um direito de ir e vir de amplitude especial

Agrave primeira vista a possibilidade de apreensatildeo do passaporte tambeacutem nos parece possiacutevel pois tambeacutem se trata de um direito de ir e vir de amplitude especial Assim o eacute pois salvo situaccedilotildees especiais (refugiados p ex) haacute a necessidade de demonstrar condiccedilotildees financeiras de estadia e retorno para ser admitido no paiacutes de destino Ou seja pressupotildee uma condiccedilatildeo financeira que o devedor justamente diz natildeo possuir Sem embargo dessa consideraccedilatildeo esse ainda eacute um ponto que merece uma reflexatildeo mais acurada sendo essa apenas uma primeira impressatildeo72

Outros autores escreveram sobre o tema como eacute o caso do processualista Luiz

Dellore73 que tambeacutem defende que as medidas atiacutepicas como restriccedilatildeo ao direito de dirigir

apreensatildeo de passaporte e cancelamento de cartotildees de creacutedito satildeo permitidas e natildeo violam em

regra os direitos fundamentais do devedor

De minha parte creio que efetivamente haacute inovaccedilatildeo no at 139 IV do NCPC (e natildeo mera repeticcedilatildeo do que jaacute havia no Coacutedigo anterior) que tem o condatildeo de trazer mais efetividade ao processo executivo no Brasil ndash que por deacutecadas centrou sua atenccedilatildeo na defesa do executado (vide a grande quantidade de impenhorabilidades) sem dar maior atenccedilatildeo ao creacutedito do exequente

71 Ibid sem paginaccedilatildeo 72 Ibid sem paginaccedilatildeo 73 DELLORE Luiz NCPC Atipicidade das medidas executivas jaacute eacute realidade Disponiacutevel em lt

httpswwwjotainfoopiniao-e-analisecolunasnovo-cpcncpc-atipicidade-de-medidas-executivas-ja-e-realidade-17042017 gt Publicado em 17042017 Acesso em 03092018

34

Logo a meu ver medidas como (i) restriccedilatildeo ao direito de dirigir (ii) apreensatildeo de passaporte (iii) cancelamento de cartotildees de creacutedito e (iv) vedaccedilatildeo de obtenccedilatildeo de novos empreacutestimos se natildeo vinculados ao pagamento do deacutebito exequendo dentre outras restriccedilotildees que deveratildeo ser observadas a cada caso satildeo permitidas pelo sistema do NCPC e em regra natildeo violam direitos fundamentais do devedor E tecircm o condatildeo de fazer com que o executado que tem recursos diante dessas medidas coercitivas pague o deacutebito trazendo sucesso agrave satisfaccedilatildeo do creacutedito

Nessa linha para Alexandre Fuchs das Neves74 o artigo 139 IV do CPC conferiu ao

juiz poderes coercitivos capazes de ldquotransformar a vida do devedor um infernordquo para compeli-

lo a cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria Entretanto pondera que para que a medida tenha

validade ldquoeacute necessaacuteria uma fundamentaccedilatildeo por evidente uma correlaccedilatildeo temaacutetica entre a

medida adotada e sua efetividade em face ao processo com fundamentaccedilatildeo detalhadardquo

No entendimento de Fernando Gajardoni75 satildeo possiacuteveis as medidas de apreensatildeo de

passaporte bloqueio de cartotildees de creacutedito e suspensatildeo da CNH Para ele o que limita o art

139 IV do CPC eacute o esgotamento dos meios tiacutepicos e a real necessidade da medida

Ilustrativamente natildeo efetuado o pagamento de diacutevida oriunda de multas de tracircnsito e superados os expedientes tradicionais de adimplemento (penhora de dinheiro e bens) seria liacutecito o estabelecimento da medida coercitivaindutiva de suspensatildeo do direito a conduzir veiacuteculo automotor ateacute pagamento do deacutebito (inclusive com apreensatildeo da CNH do devedor) natildeo efetuado pagamento de verbas salariais devidas a funcionaacuterios da empresa possiacutevel o estabelecimento de vedaccedilatildeo agrave contrataccedilatildeo de novos funcionaacuterios ateacute que seja saldada a diacutevida natildeo efetuado o pagamento de financiamento bancaacuterio na forma e no prazo avenccedilados possiacutevel ateacute que se tenha a quitaccedilatildeo que se obstem novos financiamentos ou mesmo a participaccedilatildeo do devedor em licitaccedilotildees (como de ordinaacuterio jaacute acontece com pessoas juriacutedicas em deacutebito tributaacuterio com o Poder Puacuteblico) etc

Teriacuteamos entatildeo no Brasil por assim dizer a adoccedilatildeo do padratildeo da atipicidade das medidas executivas tambeacutem para as obrigaccedilotildees de pagar vistas estas como ordens do EstadoJuiz para que haja prestaccedilatildeo de pagamento em pecuacutenia

()

Por isso ndash a prevalecer a interpretaccedilatildeo potencializada do art 139 IV do CPC2015 ndash o emprego de tais medidas coercitivasindutivas especialmente nas obrigaccedilotildees de pagar encontraraacute limite certo na excepcionalidade da medida (esgotamento dos meios tradicionais de satisfaccedilatildeo do deacutebito) na proporcionalidade (inclusive agrave luz da regra da menor onerosidade ao devedor do art 805 do CPC2015) na necessidade de fundamentaccedilatildeo substancial e especialmente nos direitos e garantias assegurados na Constituiccedilatildeo Federal (vg natildeo parece possiacutevel que se determine o pagamento sob pena de prisatildeo ou de vedaccedilatildeo ao exerciacutecio da profissatildeo do direito de ir e vir etc)

74 NEVES Alexandre Fuchs das Cancelamento de cartotildees de creacutedito e apreensatildeo de CNH e passaporte

do devedor Isso eacute possiacutevel Disponiacutevel em lt httpwwwsinfacspcombrconteudocancelamento-de-cartoes-de-credito-e-apreensao-de-cnh-e-passaporte-do-devedor-isso-e-possivel gt Acesso em 30082018

75 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Publicado em 24082015 Acesso em 30082018

35

Jaacute Fernanda Tartuce76 acredita que tais medidas satildeo problemaacuteticas e devem ser

analisadas com cautela tendo em vista que ao inveacutes de afetarem o patrimocircnio do devedor

atingem a proacutepria pessoa

Sob certo prisma adotar medidas diferenciadas contribui para a efetividade da prestaccedilatildeo jurisdicional Por outro lado o patrimocircnio ndash e natildeo a pessoa do devedor - responde por diacutevidas aleacutem disso o exerciacutecio de amplos poderes pelo juiz sem balizas especiacuteficas pode ensejar medidas inadequadas Nessa linha suspender o direito de dirigir e restringir o uso de passaporte satildeo iniciativas problemaacuteticas por atingirem a pessoa do devedor enquanto a penhora da restituiccedilatildeo de Imposto de Renda soa viaacutevel por afetar seu patrimocircnio Eacute importante que a medida diferenciada se revele proporcional e seja aplicada apoacutes o exaurimento de outros meios previstos no ordenamento Como a proposta do Novo Coacutedigo eacute aumentar a eficiecircncia processual intentar medidas ineficazes inexequiacuteveis eou de difiacutecil fiscalizaccedilatildeo pode acabar ensejando o efeito contraacuterio

Nessa senda Lenio Streck e Dierle Nunes77 entendem que as medidas atiacutepicas de

suspensatildeo da CNH eou apreensatildeo de passaporte satildeo inconstitucionais Afirmam que natildeo se

pode confundir o processo civil e penal ainda que ambos remetam a um ldquoparadigma

constitucional comumrdquo e que o artigo 139 IV do CPC ldquoimpotildee novos desafios interpretativos

que podem conduzir a uma anaacutelise superficial e utilitarista de busca de resultados que

desprezem a necessaacuteria leitura constitucionalrdquo Os autores ainda ponderam que ldquoO perigo eacute o

artigo 139 IV ser transformado em instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com

autorizaccedilatildeo judicialrdquo

O professor Araken de Assis no dia 18 de abril de 2018 em um evento sobre o

Coacutedigo Processual Civil de 2015 que ocorreu em Brasiacutelia na sede do Conselho Federal da

OAB declarou ser contraacuterio aos poderes executoacuterios atiacutepicos ldquoSou contra os poderes

atiacutepicos dos juiacutezes porque seu exerciacutecio redunda em simples arbitrariedadesrdquo78

Acrescentou ainda que

76 IBDFAM ndash Instituto Brasileiro de Famiacutelia O polecircmico inciso IV do artigo 139 do CPC e suas difusas

interpretaccedilotildees Disponiacutevel em lt httpwwwibdfamorgbrnoticias6096O+polC3AAmico+inciso+IV+do+artigo+139+do+CPC+e+suas+difusas+interpretaC3A7C3B5es gt Publicado em 31082016 Acesso em 04092018

77 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018

78 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04092018

36

Eacute evidentemente inconstitucional diante do princiacutepio da dignidade da pessoa humana tirar o passaporte carteira de habilitaccedilatildeo Quecirc que tem isso com diacutevidas Natildeo tem absolutamente nada Natildeo eacute a correlaccedilatildeo instrumental entre o objetivo da execuccedilatildeo e o meio empregado Isso eacute simples vinganccedila simples puniccedilatildeo79

O professor Araken de Assis acredita que tais medidas satildeo inconstitucionais e

violam o principio da dignidade humana do executado numa sociedade como a nossa

sedenta por puniccedilatildeo natildeo me surpreende que essas ideias sejam encaradas com

naturalidade Mas eacute preciso rejeitaacute-las em nome de princiacutepios 80

34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO

A Constituiccedilatildeo Federal de 1988 tem como um dos seus fundamentos a dignidade da

pessoa humana presente no artigo 1ordm inciso III do referido texto constitucional O dito

princiacutepio tem o escopo de nortear o ordenamento juriacutedico como um todo

A inclusatildeo da dignidade da pessoa humana como princiacutepio constitucional obrigou

uma reflexatildeo sobre o papel da pessoa humana no direito e um redimensionamento para

elevaacute-la ao centro do ordenamento juriacutedico81 Eacute necessaacuterio recorrer agrave teoria Kantiana para

que se obtenha uma definiccedilatildeo do princiacutepio ora estudado Para Kant82 o homem eacute um fim

em si mesmo natildeo uma funccedilatildeo do Estado Ou Naccedilatildeo O Estado e o direito devem estar

organizados em benefiacutecio do indiviacuteduo

Agora eu afirmo o homem ndash e de uma maneira geral todo o ser racional ndash existe como fim em si mesmo e natildeo apenas como meio para o uso arbitraacuterio desta ou daquela vontade Em todas as suas accedilotildees pelo contraacuterio tanto nas direcionadas a ele mesmo como nas que o satildeo a outros seres racionais deve ser ele sempre considerado simultaneamente como fim

Partindo da premissa de que para Immanuel Kant o homem eacute o fim em si mesmo

ldquodevemos compreender que a dignidade da pessoa humana eacute a noccedilatildeo o comando a direccedilatildeo

que se deve seguir funcionando como fundamento para a interpretaccedilatildeo de todos os direitos e

garantias conferidos agrave pessoa nos ordenamentos juriacutedicos de cada Estadordquo 83

79 Ibid sem paginaccedilatildeo 80 Ibid sem paginaccedilatildeo 81 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito

fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 461 82 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud KANT Immanuel Fundamentaccedilatildeo da metafiacutesica dos costumes

Satildeo Paulo Martin Claret 2003 p56-59 Coleccedilatildeo A Obra-Prima de Cada Autor 83 SCHIAFIANO Juliana Rocha op cit p 461

37

O princiacutepio constitucional da dignidade da pessoa humana estaacute diretamente ligado ao

conteuacutedo dos direitos fundamentais logo para que se cumpra com os direitos fundamentais

constitucionalmente instituiacutedos eacute necessaacuterio reconhecer e respeitar a dignidade da pessoa

humana conforme disciplina Ingo Sarlet84

Em suma o que se pretende sustentar de modo mais enfaacutetico eacute que a dignidade da pessoa humana na condiccedilatildeo de valor (principio normativo) fundamental que atrai o conteuacutedo de todos os direitos fundamentais exige e pressupotildee o reconhecimento e proteccedilatildeo dos direitos fundamentais de todas as dimensotildees (ou geraccedilotildees se assim preferirmos) Assim sem que se reconheccedilam agrave pessoa humana os direitos fundamentais que lhe satildeo inerentes em verdade estarse-aacute lhe negando a proacutepria dignidade A consagraccedilatildeo constitucional da dignidade da pessoa humana tem o propoacutesito de limitar a atuaccedilatildeo ou a omissatildeo do Estado para garantir os direitos do indiviacuteduo Assim eacute difiacutecil precisar os efeitos da norma que determina a dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado (como acontece com a Constituiccedilatildeo brasileira de 1988) poreacutem quando desrespeitados os direitos fundamentais do cidadatildeo eacute possiacutevel identificar que a dignidade deste foi violada

Logo ldquoteraacute respeitada a sua dignidade o individuo que tiver respeitados os seus

direitos fundamentaisrdquo 85 Os direitos fundamentais estatildeo apresentados na Constituiccedilatildeo

Federal da seguinte forma direitos individuais e coletivos direitos sociais direitos poliacuteticos e

direitos de nacionalidade que tecircm como escopo garantir as liberdades positivas aos

indiviacuteduos ldquoonde foram conquistados direitos agrave liberdade religiosa liberdade civil e

profissional agrave propriedade ao livre acesso ao Judiciaacuterio agrave ampla defesa e ao contraditoacuterio no

processual judicial ao sigilo de dados e informaccedilotildees pessoais entre outros que somados

garantem o cidadatildeo uma vida dignardquo 86

O cidadatildeo na Constituiccedilatildeo Federal de 88 diferente das constituiccedilotildees brasileiras

anteriores passou a ser fundamento e ganhou destaque nos direitos fundamentais tendo

garantida a sua vida a sua dignidade a sua seguranccedila a sua honra a sua liberdade e a sua

propriedade

84 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud SARLET Ingo Wolfgang Dignidade da pessoa humana e

direitos fundamentais na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 2ed Porto Alegre Livraria do Advogado 2002 p87 85 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito

fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 462 86 Ibid p 462

38

Segundo Carmem Luacutecia Antunes Rocha87 para garantir o Estado Democraacutetico de

Direito eacute necessaacuterio que a sua atuaccedilatildeo seja sempre em conformidade com o princiacutepio da

dignidade da pessoa humana

O Estado somente eacute democraacutetico em sua concepccedilatildeo constitucionalizaccedilatildeo e atuaccedilatildeo quando respeita o princiacutepio da dignidade da pessoa humana Natildeo haacute verbo constitucional natildeo haacute verbo governamental que se faccedilam legiacutetimos quando natildeo se voltam ao atendimento daquele princiacutepio Natildeo haacute verdade constitucional natildeo haacute suporte institucional para as poliacuteticas puacuteblicas que natildeo sejam destinadas ao pleno cumprimento daquele valor maior transformado em princiacutepio constitucional

O princiacutepio da dignidade humana constitucionalmente garantido impotildee limites ao

Estado compelindo aos oacutergatildeos e atividades estatais respeitar o ser humano e garanti-lo

condiccedilotildees miacutenimas para uma vida digna Dessa forma eacute niacutetido que o dito princiacutepio eacute

pressuposto e indispensaacutevel para legitimar outras normas constitucionais e

principalmente infraconstitucionais

O Coacutedigo de Processo Civil eacute umas das principais normas infraconstitucionais que

sofre influecircncia dos preceitos valores e princiacutepios esculpidos na Constituiccedilatildeo Federal

Logo como o principio da dignidade humana eacute um dos mais importantes pressupostos

constitucionais ldquoentatildeo eacute tranquilo afirmar-se que o novel ordenamento processual tem

de se render nas resoluccedilotildees dos aspectos processuais e a fim de se atingir uma soluccedilatildeo

justa adequada e efetiva ao postulado da dignidade da pessoa humanardquo 88

Dessa forma o legislador deve formular as normas infraconstitucionais de acordo e a

partir do conteuacutedo constitucional para Marinoni Mitidiero e Arenhart89

() o Coacutedigo de Processo Civil constitui direito constitucional aplicado O Coacutedigo deve ser interpretado de acordo com a Constituiccedilatildeo e com os direitos fundamentais o que significa que as duacutevidas interpretativas devem ser resolvidas a favor da otimizaccedilatildeo do alcance da Constituiccedilatildeo e do processo civil como meio para tutela de direitos

87 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud ROCHA Carmen Luacutecia Antunes O princiacutepio da dignidade da

pessoa humana e a exclusatildeo social Revista Interesse Puacuteblico n4 p23-48 1999 p33 88 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o

novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 367

89 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 14

39

Com o escopo de conferir eficaacutecia aos mandamentos constitucionais o CPC15 traz a

previsatildeo e diversas claacuteusulas gerais em seus primeiros artigos em um dos quais se

prestigia o princiacutepio da dignidade da pessoa humana

O referido princiacutepio estaacute disciplinado no artigo 8ordm do CPC15 e atua como um guia

sobre as demais normas do coacutedigo processual Eacute o que entende Nelson Rosenvald90

O maior cuidado do inteacuterprete eacute no sentido de jamais banalizar a dignidade fazendo dela um elixir processual tal como muitas vezes se vecirc na esfera do direito civil Penso que natildeo haacute maiores dificuldades em transpor a noccedilatildeo constitucional do princiacutepio para em seguida adaptaacute-la agraves singularidades do processo

Logo de acordo com o artigo 8ordm do CPC o oacutergatildeo julgador ao aplicar o ordenamento

juriacutedico deve resguardar a dignidade da pessoa humana Para Fredie Didier91 ldquoresguardar

nesse contexto eacute de um lado aplicar corretamente a norma juriacutedica lsquoproteccedilatildeo da dignidade

da pessoa humanarsquo e de outro natildeo violar a dignidaderdquo

O oacutergatildeo julgador deveraacute manter um comportamento ativo com o objetivo de promover

a dignidade da pessoa humana podendo tomar medidas de ofiacutecio para efetivar a dignidade da

pessoa humana Didier assevera que o magistrado poderaacute ainda ldquovaler-se da claacuteusula geral de

atipicidade (art 536 sect 1ordm) para a execuccedilatildeo do direito fundamental agrave dignidaderdquo 92 O autor

ainda traz dois exemplos

a) exigecircncia de respeito agrave ordem cronoloacutegica de conclusatildeo (art 12) caso de grave violaccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana que natildeo se encaixe em um dos incisos que excepcionam a regra de observacircncia da cronologia da conclusatildeo poderia o juiz ldquofurar a filardquo para promover a dignidade da pessoa humana b) prioridade na tramitaccedilatildeo processual pessoa que seja portadora de doenccedila grave mas que natildeo esteja no rol do art 1048 I para promover a dignidade de pessoa humana o juiz poderia determinar o processamento prioritaacuterio93

Essa dupla garantia ndash resguardo e promoccedilatildeo ndash tem como objetivo garantir ao individuo

sua dignidade humana fazendo com que ldquode um lado que o Estado natildeo a viole e de outro

que o Estado a promova e efetiverdquo

90 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud ROSENVALD Nelson A

dignidade da pessoa humana no CPC15 91 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte

geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 75 92 Ibid p 75 93 Ibid p 75

40

Nessa senda o magistrado deveraacute promover a dignidade da pessoa humana quando

perceber a ausecircncia desta no processo ou assegura-la quando for posta em risco Eacute nesse

sentido o entendimento dos professores Marinoni Mitidiero e Arenhart94

() a dignidade da pessoa humana determina a compreensatildeo do processo civil como um meio para tutela dos direitos Vale dizer o processo civil natildeo pode ser visto como um instrumento a serviccedilo do Estado como um instrumento que natildeo se encontre orientado agrave realizaccedilatildeo dos fins da pessoa humana Em outras palavras o processo civil serve para realizaccedilatildeo dos direitos e para orientaccedilatildeo das pessoas a respeito do significado do direito

Nessa senda compete tanto ao juiz quanto as demais partes processuais garantirem ldquoo

valor intriacutenseco de cada vida que eacute trazida ao processordquo nas palavras de Alexandre Freitas

Cacircmara95

() aos sujeitos do processo eacute preciso sempre ter claro que os titulares dos interesses em conflitos satildeo pessoas reais cujas vidas seratildeo afetadas pelo resultado do processo e que por isso mesmo tecircm o direito de estabelecer suas estrateacutegias processuais de acordo com aquilo que lhes pareccedila melhor para suas vidas Eacute inadmissiacutevel tratar as partes como se natildeo fossem pessoas reais meros dados estatiacutesticos Afinal se para o Judiciaacuterio cada processo pode parecer apenas mais um processo para as partes cada processo pode ser o uacutenico o mais relevante aquele em que sua vida seraacute decidida E eacute dever do juiz assegurar que isto seja respeitado

Dessa forma eacute necessaacuterio que um arcabouccedilo normativo para que seja conferida

eficaacutecia e proteccedilatildeo ao principio da dignidade da pessoa humana

Logo o dito princiacutepio deve ser protegido em todas as esferas do ordenamento juriacutedico

inclusive no campo da execuccedilatildeo civil onde sofre grandes riscos de ser violado em nome do

direito fundamental agrave tutela executiva do credor ldquoPartir da premissa de que existe um direito

fundamental agrave tutela executiva ora ratificado pelo CPC eacute indispensaacutevel para a soluccedilatildeo de

diversos problemas oriundos do procedimento executivo principalmente aqueles relacionados

agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo 96

94 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme

MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 25

95 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CAcircMARA Alexandre Freitas O Novo Processo Civil Brasileiro 2 ed Satildeo Paulo Atlas 2016 p 7

96 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66

41

Eacute o caso por exemplo da impenhorabilidade Segundo Fredie Didier et al97 a

impenhorabilidade eacute uma forma de proteger certos bens do devedor do direito fundamental a

execuccedilatildeo do credor

Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa

Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais

O legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do CPC fazendo um

preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses em anaacutelise ao optar pela mitigaccedilatildeo do direito

do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado Afinal ldquoa execuccedilatildeo natildeo pode ser utilizada

como instrumento para causar a ruiacutena a fome e o desabrigo do devedor e sua famiacutelia gerando

situaccedilotildees incompatiacuteveis com a dignidade da pessoa humana 98

Logo a impenhorabilidade de certos bens

[] Eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa99

Eacute nesse sentido que o CPC15 enumera diversos casos de bens patrimoniais que satildeo

impenhoraacuteveis como o salaacuterio e vencimentos utensiacutelios necessaacuterios ao exerciacutecio da

profissatildeo seguro de vida vestuaacuterios e pertences de uso pessoal entre outros

Dessa forma as regras relativas agraves medidas executivas devem ser interpretadas agrave luz

da Constituiccedilatildeo Federal ldquovez que se voltam agrave realizaccedilatildeo de direitos fundamentais e em sua

97 Ibid p 66 98 THEODORO JUacuteNIOR Humberto Novo Coacutedigo de Processo Civil Anotado 20 ed Rio de Janeiro

Forense 2016 p 978 99 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud DIDIER JR Fredie CUNHA

Leonardo Carneiro da BRAGA Paula Sarno OLIVEIRA Rafael Alexandria de Curso de direito processual civil 3 ed Salvador JusPodivm 2011 v 5 p 547

42

realizaccedilatildeo podem atingir direitos fundamentaisrdquo 100 O Superior Tribunal de Justiccedila jaacute decidiu

que

O rol das impenhorabilidades do ordenamento paacutetrio objetiva preservar o miacutenimo patrimonial necessaacuterio agrave existecircncia digna do executado impondo ao processo executoacuterio certos limites Assim a depender das peculiaridades do caso as regras de impenhorabilidade podem ser ampliadas de modo a adequar a tutela aos direitos fundamentais como por exemplo o direito agrave moradia agrave sauacutede ou agrave dignidade da pessoa humana Trata-se portanto da aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo e da necessidade sob o enfoque da proporcionalidade101 (STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014)

Logo a interpretaccedilatildeo dos dispositivos que tratam sobre a penhora no CPC deve estaacute

diretamente ligada aos ditames constitucionais devendo o interprete privilegiar a opccedilatildeo que

esteja mais em sintonia com a Carta Magna para que nem o credor e nem o devedor sejam

lesados

O artigo 833 do CPC elenca uma seacuterie de incisos que expotildeem os bens impenhoraacuteveis

O trecho inicial inciso I do art 833 define como impenhoraacuteveis os bens inalienaacuteveis Este

inciso segue a regra de que ldquose o bem natildeo pode ser alienado tambeacutem natildeo pode ser penhorado

porque a penhora eacute o primeiro ato do procedimento de alienaccedilatildeo judicial do bemrdquo 102

Satildeo exemplos de bens inalienaacuteveis os puacuteblicos cuja alienaccedilatildeo depende de autorizaccedilatildeo

legislativa Eacute inalienaacutevel tambeacutem o capital constituiacutedo para garantir indenizaccedilatildeo de ato iliacutecito

(art 533 sect 1 ordm CPC) que portanto eacute tambeacutem impenhoraacutevel ldquoTodo bem inalienaacutevel eacute

impenhoraacutevel embora nem todo bem impenhoraacutevel seja inalienaacutevelrdquo 103

O inciso I do art 833 CPC tambeacutem consagra a impenhorabilidade dos bens que por

ato voluntaacuterio satildeo excluiacutedos da execuccedilatildeo

Segundo Fredie Didier et al104

Eacute o que ocorre nos casos de bens doados ou alienados com claacuteusula de inalienabilidade que haacute de constar no registro imobiliaacuterio para ser eficaz perante o exequente e minimizar o risco de fraude A propoacutesito eis a redaccedilatildeo do art 1911 do Coacutedigo Civil lsquolsquoA claacuteusula de inalienabilidade imposta aos bens por ato de liberalidade implica impenhorabilidade e incomunicabilidaderdquo

100 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MEDINA Joseacute Miguel Garcia

Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 1 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 p 736 101 STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014 102 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 824 103 Ibid p 824 104 Ibid p 825

43

O inciso II por sua vez estabelece que satildeo impenhoraacuteveis os bens moacuteveis os

pertences e as utilidades domeacutesticas da residecircncia do executado Todavia excepcionam-se os

bens dessa natureza que sejam de elevado valor ou que ultrapassem as necessidades comuns

correspondentes a um meacutedio padratildeo de vida

A jurisprudecircncia natildeo eacute paciacutefica sobre o assunto logo natildeo exista uma relaccedilatildeo de bens

que podem ser atingidos pela penhora Abrindo margem para as mais variadas decisotildees

O STJ jaacute considerou impenhoraacuteveis aparelho de televisatildeo a cores mesa de centro passadeira raacutedio toca-fitas gravador microondas ar-condicionado um freezer um microcomputador com acessoacuterios uma impressora etc Poderatildeo ser penhorados porque ultrapassam o padratildeo-meacutedio aparelhos de TV mais sofisticados o segundo aparelho de televisatildeo a segunda geladeira aparelhos de ar-condicionado que satildeo verdadeiras peccedilas de design moacuteveis antigos que se transformam em peccedilas de decoraccedilatildeo faqueiro de prata adega climatizada etc Em entendimento de caraacuteter ainda mais geneacuterico jaacute restou consignado em determinado precedente que a proteccedilatildeo natildeo abrangeria apenas os bens indispensaacuteveis agrave moradia mas tambeacutem aqueles usualmente encontrados em um lar105

Ademais o inciso III do art 833 do CPC traz a impenhorabilidade dos vestuaacuterios bem

como os pertences de uso pessoal do executado salvo se de elevado valor

Segundo Fredie Didier et al106 o dispositivo possui dois propoacutesitos

de um lado preservar a dignidade do executado com a proteccedilatildeo de bens moacuteveis importantes para a sua sobrevivecircncia digna como o vestuaacuterio aparelho celular reloacutegio e os bens relacionados agrave sua higiene pessoal de outro lado a regra visa prestigiar a boa-feacute processual impedindo a execuccedilatildeo mesquinha e abusiva com a penhora de bens de pequeno ou nenhum valor como um pente ou uma bota

O inciso IV do art 833 do CPC consagra uma das mais importantes modalidades a

impenhorabilidade relativa aos rendimentos de natureza alimentar ldquoTrata-se de regra que

possui o claro propoacutesito de proteger o executado garantindo-lhe o recebimento de valores que

servem ao pagamento das despesas relacionadas agrave sua sobrevivecircncia digna e agrave da sua famiacuteliardquo 107

Jaacute inciso V do art 833 do CPC torna impenhoraacuteveis os livros as maacutequinas as

ferramentas os utensiacutelios os instrumentos ou outros bens moacuteveis necessaacuterios ou uacuteteis ao

exerciacutecio de qualquer profissatildeo 105 Ibid p 826 106 Ibid p 827 107 Ibid p 828

44

Por forccedila do paraacutegrafo 3ordm do art 833 satildeo igualmente impenhoraacuteveis os equipamentos

implementos e maacutequinas agriacutecolas pertencentes agrave pessoa fiacutesica ou a empresa individual

produtora rural Rodrigo Mazzei e Sarah Merccedilon108 esclarecem que

Tem assento na noccedilatildeo de que a dignidade estende-se tambeacutem ao exerciacutecio da profissatildeo em si mesma e tambeacutem por representar a forma por excelecircncia de que dispotildee o executado para continuar a receber sua remuneraccedilatildeo e por conseguinte prover seu sustento e de sua famiacutelia Trata-se tambeacutem de aplicaccedilatildeo pontual da funccedilatildeo social da propriedade jaacute que protege os bens que permitem a circulaccedilatildeo de riquezas para a subsistecircncia do executado e se for o caso de sua famiacutelia

Forccediloso ressaltar ainda que a impenhorabilidade do inc V alcanccedila apenas os bens

moacuteveis de modo que eacute absolutamente possiacutevel que o imoacutevel em que o executado exerccedila sua

atividade profissional seja penhorado conforme a Suacutemula 451 do STJ ldquoEacute legiacutetima a penhora

da sede do estabelecimento comercialrdquo

O inciso VI do art 833 do CPC versa sobre a impenhorabilidade do seguro de vida

ldquoTrata-se de impenhorabilidade em favor do beneficiaacuterio do seguro e natildeo do segurado ateacute

porque o valor do seguro natildeo compotildee nem comporaacute o seu patrimocircnio (art794 do Coacutedigo

Civil1 ordm7)rdquo Dessa forma ldquoem uma execuccedilatildeo contra o segurado natildeo seraacute possiacutevel a penhora

do seguro de vida pois se trata de bem que natildeo lhe pertence nem mesmo em expectativardquo

De acordo com o inciso VII do art 833 do CPC satildeo impenhoraacuteveis os materiais

necessaacuterios para obras em andamento salvo se essas forem penhoradas Logo a obra pode

ser penhorada (art 862 do CPC) ldquoA regra como bem lembrou Araken de Assis lsquoestimula a

penhora da proacutepria obra inconclusa agrave qual os materiais acrescem e conseguintemente

valorizamrsquo 109

O art 833 VIII CPC julga impenhoraacutevel a pequena propriedade rural assim

definida em lei desde que trabalhada pela famiacutelia reproduzindo parte do art 5ordm XXVI CF

88116 que disciplina a impenhorabilidade do referido bem

A proteccedilatildeo do CPC eacute mais ampla do que a garantia prevista na Constituiccedilatildeo Federal

tendo em vista que a impenhorabilidade natildeo se restringe agraves execuccedilotildees de deacutebitos decorrentes

de sua atividade produtiva podendo ser alegada em toda e qualquer execuccedilatildeo ldquoAssim o 108 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CABRAL Antonio Passo

CRAMER Ronaldo (orgs) Comentaacuterios ao Novo Coacutedigo de Processo Civil Rio de Janeiro Forense 2015 p 1194

109 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 835

45

imoacutevel natildeo pode ser penhorado na execuccedilatildeo de creacutedito rural concedido para estimular a

produccedilatildeo agriacutecola mas poderaacute ser penhorado na execuccedilatildeo do creacutedito concedido para a

aquisiccedilatildeo do imoacutevelrdquo 110

A nona modalidade de impenhorabilidade trata-se dos recursos puacuteblicos recebidos por

instituiccedilotildees privadas para aplicaccedilatildeo compulsoacuteria em educaccedilatildeo sauacutede ou assistecircncia social ldquoA

proteccedilatildeo eacute louvaacutevel e tutela toda a coletividade ao privilegiar o direito agrave educaccedilatildeo sauacutede e

assistecircncia social em detrimento do direito do credorrdquo

De acordo com o inciso X do art 833 do CPC eacute impenhoraacutevel ateacute o limite de

quarenta salaacuterios miacutenimos a quantia depositada em caderneta de poupanccedila

Eacute uma modalidade de impenhorabilidade relativa (o CPC73 a considerava absoluta)

tendo em vista que essa impenhorabilidade natildeo pode ser oposta na execuccedilatildeo de alimentos

independentemente da sua origem (art 833 sect 2ordm do CPC) Fredie Didier et al cita Araken de

Assis111 ao afirmar que

a regra soacute protege essa aplicaccedilatildeo financeira Se o valor estiver depositado em fundo de investimento por exemplo poderaacute ser penhorado Se o devedor tiver vaacuterias cadernetas de poupanccedila a impenhorabilidade aplica-se agrave soma de todas elas e natildeo a cada uma delas isoladamente do contraacuterio valores expressivos poderiam ser pulverizados em vaacuterias contas burlando a finalidade da regra que eacute a de proteger a populaccedilatildeo de baixa renda

Ademais satildeo tambeacutem impenhoraacuteveis por forccedila do inciso XI os recursos puacuteblicos do

fundo partidaacuterio recebidos por partido poliacutetico nos termos da lei Essa modalidade de

impenhorabilidade ldquose restringe aos recursos puacuteblicos do fundo partidaacuterio Recursos de

origem privada recebidos pelo partido poliacutetico poderatildeo ser penhoradosrdquo 112 O processualista

Fredie Didier et al113 assevera que

Assim a impenhorabilidade foi estabelecida no intuito de impedir que os diretoacuterios nacionais de partidos poliacuteticos respondam por diacutevida dos diretoacuterios

110 Ibid p 836 111 DIDIER JR Fredie et al apud ASSIS Araken de Manual da execuccedilatildeo 11ordm ed cit p 225 Assim

tambeacutem REDONDO Bruno Garcia LOJO Maacuterio Vitor Suarez Penhora cit p 117 BUENO Cassio Scarpinella Curso sistematizado de Direito Processual Civil v 3 cit p 228 GIANNICO Mauriacutecio As novas reformas do CPC e de outras normas processuais Mauriacutecio Giannico e Viacutetor Joseacute de Mello Monteiro (coord) Satildeo Paulo Saraiva 2009 p 1 OS Em sentido diverso estendendo a impenhorabiacutelidade aos depoacutesitos feitos ateacute esse valor em CDB CDI fundos de renda fixa ou de accedilotildees RODRIGUES Marcelo Abelha Manual de execuccedilatildeo civil 3deg ed cit p 101

112 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 839

113 Ibid p 839

46

estaduaismunicipais - sobretudo em razatildeo das vaacuterias decisotildees judiciais que determinaram penhora de recursos do fundo partidaacuterio de alguns partidos

Por fim o inciso XII do artigo 833 do CPC trata sobre a impenhorabilidade dos

creacuteditos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias sob o regime de incorporaccedilatildeo imobiliaacuteria

vinculados agrave execuccedilatildeo de obra ldquoO objetivo dessa modalidade eacute evitar que diacutevidas do

incorporador possam consumir os recursos que seriam utilizados na realizaccedilatildeo da obra em

prejuiacutezo dos adquirentes de unidades autocircnomasrdquo 114

O professor Misael Montenegro Filho115 aduz sobre que ldquoao estabelecer a

impenhorabilidade dos creacuteditos oriundos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias o novo CPC

protegeu os valores destinados agrave execuccedilatildeo da obra e agrave entrega das unidades imobiliaacuterias aos

adquirentes assegurando assim a execuccedilatildeo da promessa contratualrdquo

Importante frisar ainda que a Lei nordm 8009 1990 instituiu a impenhorabilidade do

imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar por qualquer diacutevida salvo as exceccedilotildees dos

seus arts 3ordm e 4ordm

A referida lei dispotildee que Para os efeitos de impenhorabilidade considera-se

residecircncia um uacutenico imoacutevel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia

permanente (art 5ordm)

O processualista baiano Fredie Didier et al116 assevera que

A lei propotildee-se a proteger imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar nos termos acima expostos A CF 88 ampliou o conceito de entidade familiar para abranger a famiacutelia monoparental e a uniatildeo estaacutevel Mas deve considerar-se aiacute compreendidos os irmatildeos que vivem juntos e a uniatildeo homossexual Ateacute o solteiro estaacute abrangido pela impenhorabilidade se reside soacute no imoacutevel - isso em nome da proteccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana e da moradia digna Na verdade houve uma mudanccedila de compreensatildeo acerca do sentido da proteccedilatildeo de proteccedilatildeo da famiacutelia agrave proteccedilatildeo da moradia indispensaacutevel agrave preservaccedilatildeo da dignidade da pessoa

114 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o

novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 388

115 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MONTENEGRO FILHO Misael Novo Coacutedigo de Processo Civil Comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Atlas 2016 p 752

116 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 840-841

47

O STJ jaacute consolidou esse entendimento na suacutemula nordm 364 O conceito de

impenhorabilidade de bem de famiacutelia abrange tambeacutem o imoacutevel pertencente a pessoas

solteiras separadas e viuacutevas

Entretanto se o casal ou entidade familiar possuir vaacuterios imoacuteveis utilizados como

residecircncia a impenhorabilidade recairaacute sobre o de menor valor (art 5ordm paraacutegrafo uacutenico) ldquoEacute o

que ocorre por exemplo quando a famiacutelia se divide em mais de uma cidade por motivos

profissionaisrdquo 117

Forccediloso observar ainda que a impenhorabilidade do imoacutevel familiar eacute relativa jaacute que

natildeo pode ser oposta a qualquer creacutedito O art 3ordm da Lei n 8009 1990151 em que pode ser

penhorada a residecircncia da famiacutelia (exemplo execuccedilatildeo de alimentos para cobranccedila de taxas

devidas em funccedilatildeo do imoacutevel familiar etc)

Resta claro que o artigo 833 do CPC ao disciplinar as hipoacuteteses de impenhorabilidade

possui o escopo de proteger o princiacutepio da dignidade humana Entretanto algumas claacuteusulas

natildeo possuem proteccedilatildeo absoluta ldquoa sua relativizaccedilatildeo a depender do caso sob exame deve ser

realccedilada agrave medida que a dignidade resguardada e protegida pelo sistema processual-

constitucional natildeo se limita ao executadordquo 118 Ademais ldquoEacute premente advertidamente que a

dignidade do credor tambeacutem seja garantida em juiacutezo tendo como norte pois os princiacutepios da

proporcionalidade e razoabilidaderdquo 119

117 Ibid p 841 118 Ibid p 752 119 Ibid p 752

48

4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA

ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE

HUMANA DO EXECUTADO

41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE

EFETIVACcedilAtildeO

Como jaacute exposto em linhas preteacuteritas nos meios executivos tiacutepicos as medidas

executivas satildeo determinadas pela lei ou seja o oacutergatildeo pode aplicar somente as medidas

tipificadas no ordenamento juriacutedico No entanto ao se tratar das medidas executivas atiacutepicas

eacute necessaacuterio que haja um limite na atuaccedilatildeo realizada pelo juiz

O poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo poder ser realizado de maneira indiscriminada haacute

pressupostos e premissas a serem observadas Dessa forma a primeira premissa eacute no sentindo

de que a medida executiva atiacutepica natildeo pode ser a primeira medida a ser invocada ldquomuito ao

reveacutes a regra do nosso sistema continua a ser o da tipicidade dos meios executivos soacute que

agora temperado pelo sistema atiacutepicordquo 120 O processualista Thiago Rodovalho explica que

ldquo() os meios atiacutepicos natildeo satildeo prima ratio e sim a ultima ratio eacute dizer esgotados e

frustrados os meios executivos tiacutepicos e ordinaacuterios pode-se em tese valer-se do sistema

atiacutepicordquo121

Dessa forma nos casos de execuccedilatildeo que tenha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

natildeo deve ser aplicado de logo as medidas indutivas e coercitivas Apenas apoacutes frustradas as

medidas ldquonaturaisrdquo pode-se passar agrave aplicaccedilatildeo das medidas atiacutepicas

Uma segunda premissa diz a respeitos dos meios de pressatildeo para compelir o devedor a

adimplir com o seu deacutebito ldquoEssa segunda premissa decorre inclusive de imperiosidade

loacutegica de nada adianta a medida de pressatildeo se a obrigaccedilatildeo natildeo tem como ser adimplida pelo

devedorrdquo 122

Para Thiago Rodovalho123 ldquoIsso quer significar que esgotados e frustrados os meios

tiacutepicos o juiz se valeraacute dos meios atiacutepicos se eles forem potencialmente haacutebeis a estimular ou

120 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da

atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018

121 Ibid sem paginaccedilatildeo 122 Ibid sem paginaccedilatildeo 123 Ibid sem paginaccedilatildeo

49

forccedilar o cumprimento o que pressupotildee sua possibilidade quando entatildeo eles poderatildeo ser

eficazesrdquo

Logo nas obrigaccedilotildees de pagar quantia se houver a real demonstraccedilatildeo da

impossibilidade financeira do devedor seria um constrangimento inuacutetil e desnecessaacuterio a

imposiccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo para forccedilar o cumprimento

Por isso as medidas atiacutepicas devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o

esgotamento das medidas tiacutepicas e a possibilidade de cumprimento de cumprimento da

obrigaccedilatildeo

Ademais superadas as supracitadas premissas e o oacutergatildeo julgador vislumbrando a

necessidade da aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo se faz necessaacuterio que um conjunto de

postulados e princiacutepios rejam a atuaccedilatildeo do oacutergatildeo julgador servindo de norte para a escolha da

medida executiva mais adequada ldquoDe modo geral a escolha deve pautar-se nos postulados da

proporcionalidade da razoabilidade (art8ordm CPC) e da proibiccedilatildeo de excesso bem como nos

princiacutepios da eficiecircncia e da menor onerosidade da execuccedilatildeordquo 124

O professor Fredie Didier et al125 eacute categoacuterico ao citar Humberto Aacutevila

Segundo Humberto Aacutevila o postulado da proporcionalidade se manifesta nas situaccedilotildees em que haacute uma relaccedilatildeo de causalidade entre dois elementos empiricamente discerniacuteveis um meio e um fim de tal sorte que se possa proceder aos trecircs exames fundamentais o da adequaccedilatildeo (o meio promove o fim) o da necessidade (dentre os meios disponiacuteveis e igualmente adequados para promover o fim natildeo haacute outro meio menos restritivo do(s) direito(s) fundamental (is) afetado(s)) e o da proporcionalidade em sentido estrito (as vantagens trazidas pela promoccedilatildeo do fim correspondem agraves desvantagens provocadas pela adoccedilatildeo do meio)

O juiz ao aplicar a medida executiva atiacutepica ao caso concreto deve ter seu

embasamento no princiacutepio da proporcionalidade para saber se a medida a ser tomada eacute a

melhor opccedilatildeo ao caso sub judice ldquoO exame de proporcionalidade aplica-se sempre que

houver uma medida concreta destinada a realizar uma finalidaderdquo 126

Em verdade a aplicaccedilatildeo do princiacutepio da proporcionalidade eacute imprescindiacutevel na adoccedilatildeo

dos meios executivos atiacutepicos tendo em vista que ldquo() tais medidas em especial quando de

124 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111 125 DIDIER JR Fredie et al apud AVILA Humberto Teoria dos princiacutepios da definiccedilatildeo agrave aplicaccedilatildeo

dos princiacutepios juriacutedicos 16 ed Satildeo Paulo Malheiros 2015 p 205 126 DIDIER JR Fredie et al op cit p 111

50

natureza coercitiva podem restringir direitos do devedor e incidir diretamente sobre sua

pessoardquo127 Logo ainda que o princiacutepio da efetividade da tutela executiva seja um direito

fundamental o mesmo ldquo() deve ser compatibilizado com direitos fundamentais do

executado para que a sua dignidade humana seja preservadardquo 128

Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Neves129 afirma que em nome do princiacutepio da

proporcionalidade o juiz deveraacute

() ponderar no caso concreto as vantagens praacuteticas da adoccedilatildeo de cada medida executiva atiacutepica em especial as de natureza coercitiva e as desvantagens de sua adoccedilatildeo levando em conta a possibilidade de a medida criar uma limitaccedilatildeo excessiva ao exerciacutecio de direito fundamental do executado

Outro princiacutepio que o oacutergatildeo julgador deve se ater ao escolher a medida executiva

atiacutepica eacute o da razoabilidade Segundo Fredie Didier et al 130 o princiacutepio (ou postulado)131 se

manifesta de trecircs formas

a) como dever de equidade a exigir a harmonizaccedilatildeo da norma geral com o caso individual impondo a consideraccedilatildeo daquilo que normalmente acontece em detrimento do que eacute extraordinaacuterio e tambeacutem impondo a consideraccedilatildeo das especificidades do caso concreto ante a generalidade da norma b) como dever de congruecircncia a exigir a harmonizaccedilatildeo das normas com suas condiccedilotildees externas de aplicaccedilatildeo (isto eacute com a realidade com base em que foram editadas) c) como dever de equivalecircncia a exigir uma relaccedilatildeo de equivalecircncia entre a medida adotada e o criteacuterio que a dimensiona

Logo ldquo() o princiacutepio da razoabilidade deve nortear a atuaccedilatildeo do juiz na adoccedilatildeo das

medidas executivas atiacutepicas previstas no art 139 IV do Novo CPCrdquo 132 tendo em vista que

ldquo() mesmo medidas que pelo princiacutepio da proporcionalidade podem se mostrar

abstratamente possiacuteveis de adoccedilatildeo no caso concreto podem se mostrar inadequadas e

irrazoaacuteveisrdquo 133

127 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Medidas executivas atiacutepicas na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de

pagar quantia certa art 139 IV do novo CPC Revista de Processo v 42 n 265 mar 2017 p 14 128 Ibid p 14 129 Ibid p 14 130 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111-112 131 Segundo Fredie Didier et al o postulado eacute uma norma que atua sobre a aplicaccedilatildeo de outras normas

A proporcionalidade e a razoabilidade seriam postulados normativos e natildeo princiacutepios segundo essa concepccedilatildeo 132 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo op cit p 14 133 Ibid p 14

51

Ademais conforme dispotildee o postulado da proibiccedilatildeo de excesso ldquoa realizaccedilatildeo de uma

regra ou princiacutepio constitucional natildeo pode conduzir agrave restriccedilatildeo a um direito fundamental que

lhe retire um miacutenimo de eficaacuteciardquo 134

A proibiccedilatildeo de excesso deveraacute sempre ser suscitada quando um direito fundamental

houver sido violado a ponto do direito fundamental sofrer violaccedilatildeo excessiva Ademais ldquoesse

postulado natildeo se confunde com o da proporcionalidade porque ele dispensa os exames da

adequaccedilatildeo (relaccedilatildeo meiofim) da necessidade (exigibilidade) ou da proporcionalidade em

sentido estrito (ponderaccedilatildeo entre vantagens e desvantagens)rdquo 135

Logo ldquopouco importa a relaccedilatildeo meiofim ou a exigibilidade da medida ou ainda a

ponderaccedilatildeo com outro direito fundamental eventualmente em jogo aqui se analisa apenas a

eficaacutecia de um determinado direito fundamentalrdquo 136

O princiacutepio da eficiecircncia tem previsatildeo constitucional no art 37 e previsatildeo

infraconstitucional no art 8ordm do CPC15 O referido princiacutepio determina que o processo seja

conduzido de forma eficiente pelo oacutergatildeo jurisdicional

Entende-se que eficiente eacute a atuaccedilatildeo que utilize adequadamente os meios necessaacuterios

para que se atinjam os fins almejados O oacutergatildeo jurisdicional na escolha dos meios a serem

utilizados para a obtenccedilatildeo dos fins

a) deve escolher aqueles que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo (deve evitar meios que promovam resultados insignificantes) b) deve escolher meios que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado (natildeo se pode escolher um meio de resultado duvidoso) c) natildeo pode escolher um meio que produza muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscado 137

O juiz deveraacute igualmente analisar o princiacutepio da menor onerosidade da execuccedilatildeo que

eacute previsto pelo art 805 do CPC ldquoArt 805 Quando por vaacuterios meios o exequente puder

promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o

executadordquo

134 134 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 112 135 Ibid p 112 136 Ibid p 112 137 Ibid p 112-113

52

Logo ldquohavendo duas opccedilotildees igualmente eficazes para permitir alcanccedilar o resultado

pretendido (satisfaccedilatildeo do creacutedito) deveraacute o oacutergatildeo julgador valer-se daquela que menos onere

a situaccedilatildeo do executadordquo 138

O dito princiacutepio impede o comportamento abusivo do exequente que possa beneficiar-

se do meio mais danoso ao executado protegendo dessa forma a lealdade e a eacutetica

processual

Os postulados e princiacutepios analisados em linhas preteacuteritas impotildeem ao oacutergatildeo julgador a

observacircncia de alguns criteacuterios para a escolha da medida executiva atiacutepicas a ser utilizada no

caso concreto

Primeiramente a medida executiva atiacutepica deveraacute ser adequada ldquoO criteacuterio da

adequaccedilatildeo impotildee que juiz considere abstratamente uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida

executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia

a gerar o resultadordquo 139 Nesse primeiro momento o juiz deveraacute observar sob a perspectiva do

credor qual medida teraacute o condatildeo de gerar o resultado mais efetivo

Segundo Fredie Didier et al140 o criteacuterio da adequaccedilatildeo eacute

() fortemente inspirado pelo postulado da proporcionalidade e pelo princiacutepio da eficiecircncia na parte em que esse princiacutepio determina a escolha de meios que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo e que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado

Ademais a medida adotada pelo oacutergatildeo julgador deveraacute ser necessaacuteria ldquoEsse criteacuterio

impotildee um limite agrave atuaccedilatildeo judicial funcionando como uma espeacutecie de contrapeso ao criteacuterio

da adequaccedilatildeo Aqui deve-se levar em conta a posiccedilatildeo do devedorrdquo141

O juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental agrave execuccedilatildeo e determinar

uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute necessaacuterio que a

medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado O criteacuterio da necessidade

estabelece que ldquonatildeo se pode ir aleacutem do necessaacuterio para alcanccedilar o propoacutesito almejado Deve

138 Ibid p 113 139 Ibid p 113 140 Ibid p 113 141 Ibid p 114

53

pois o oacutergatildeo julgador determinar o meio executivo na medida do estritamente necessaacuterio para

proporcionar a satisfaccedilatildeo do creacutedito ndash nem menos nem maisrdquo 142

O referido criteacuterio possui forte influecircncia dos postulados da proibiccedilatildeo do excesso e da

razoabilidade assim como do princiacutepio da menor onerosidade para o executado Assevera

Fredie Didier et al143 que

Natildeo eacute razoaacutevel por exemplo impor como primeira opccedilatildeo medida coercitiva a ser suportada pelo agente puacuteblico pelo simples fato de o juiz pressupor que o ente puacuteblico ao qual ele eacute vinculado iraacute descumprir determinada ordem judicial - o descumprimento natildeo pode ser visto como algo ordinaacuterio ou cotidiano (razoabilidade como dever de equidade) Tampouco eacute razoaacutevel eleger a prisatildeo civil como meacutetodo prioritaacuterio para compelir o executado ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer (razoabilidade como dever de equivalecircncia) Aleacutem disso eacute vedada por exemplo a imposiccedilatildeo de multa coercitiva para compelir o executado a emitir declaraccedilatildeo de vontade uma vez que haacute previsatildeo expressa de medida tiacutepica capaz de proporcionar o mesmo resultado sem sacrifiacutecio para o devedor (art 501 CPC)

A afirmaccedilatildeo feita por Bonavides144 em 1997 sobre a adequaccedilatildeo e a necessidade

continua atual sobre os motes

O meio empregado pelo legislador deve ser adequado e necessaacuterio para alcanccedilar o objetivo procurado O meio eacute adequado quando com seu auxiacutelio se pode alcanccedilar o resultado desejado eacute necessaacuterio quando o legislador natildeo poderia ter escolhido outro meio igualmente eficaz mas que natildeo limitasse ou limitasse de maneira menos sensiacutevel o direito fundamental

Por fim a medida deve conciliar os interesses contrapostos ldquoO magistrado deve

ponderar os interesses em jogo aplicando a proporcionalidade em sentido estrito de modo

que as vantagens da utilizaccedilatildeo da medida atiacutepica escolhida superem as vantagens de seu usordquo 145

Esse criteacuterio natildeo privilegia nem o credor nem o devedor e sim a soluccedilatildeo mais

equilibrada e que atenda da melhor forma aos valores em conflito ldquoTrata-se de criteacuterio

inspirado nos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade bem como no princiacutepio da

142 Ibid p 114 143 Ibid p 114 144 BONAVIDES Paulo Curso de Direito Constitucional 7ordm ediccedilatildeo Satildeo Paulo Ed Malheiros 1997

p 372 145 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 114-115

54

eficiecircncia na parte em que impotildee ao juiz evitar a escolha do meio executivo que produza

muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscadordquo 146

Cada um dos criteacuterios supracitados devem ser considerados pelo juiz ao aplicar as

medidas executivas atiacutepicas ao caso concreto Para Fredie Didier et al147 as medidas como

retenccedilatildeo de CNH passaporte ou cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado como

forma de pressionaacute-lo ao pagamento da diacutevida pecuniaacuteria natildeo satildeo possiacuteveis

Essas natildeo satildeo medidas adequadas ao atingimento do fim almejado (o pagamento de quantia) - natildeo haacute propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente Tais medidas soam mais como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-lo ao cumprimento da ordem judicial - e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a utilizaccedilatildeo de meios sancionatoacuterios pelo magistrado mas apenas de meios de coerccedilatildeo indireta e sub-rogatoacuterios

Ainda que adequadas fossem a retenccedilatildeo de CNH e do passaporte no corte de fornecimento de aacutegua natildeo parecem ser medidas necessaacuterias (no sentido de exigiacuteveis) uma vez que outras medidas podem em tese ser utilizadas sem causar igual gravame ao executado - como por exemplo a simples restriccedilatildeo do uso de cartotildees de creacutedito A retenccedilatildeo de documentos pessoais eacute medida que termina por restringir a liberdade de ir e vir do executado mostrando-se a princiacutepio natildeo-razoaacutevel por ir de encontro ao dever de equivalecircncia e desproporcional por restringir demais o direito agrave liberdade em favor do direito de creacutedito pecuniaacuterio do exequente

O processualista baiano et al148 cita tambeacutem outro exemplo de medida atiacutepica que natildeo

atingem os criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade

Tampouco parece adequada em princiacutepio determinaccedilatildeo de corte de energia eleacutetrica de todo o preacutedio onde funciona serviccedilo puacuteblico administrativo como forma de pressionar o ente federado a cumprir ordem de nomeaccedilatildeo de candidato em concurso puacuteblico Natildeo parece haver relaccedilatildeo meiofim entre uma coisa e outra Tambeacutem natildeo eacute possiacutevel enxergar essa medida como necessaacuteria no sentido de ser a menos gravosa para o devedor - observe que se trata de medida que uma vez aplicada ensejaria restriccedilatildeo de funcionamento em toda a reparticcedilatildeo puacuteblica em prejuiacutezo de serviccedilos puacuteblicos essenciais ao funcionamento da Administraccedilatildeo o que aleacutem de ser excessivamente gravoso parece natildeo se conformar agrave necessidade de ponderaccedilatildeo dos interesses em jogo - aleacutem de afetar a um sem-nuacutemero de pessoas tomadoras desses serviccedilos

Ademais eacute sabido que toda e qualquer decisatildeo judicial precisa ser fundamentada Ao

se tratar das medidas executivas atiacutepicas o papel da fundamentaccedilatildeo se torna ainda mais

146 Ibid p 115 147 Ibid p 115 148 Ibid p 116

55

importante tendo em vista que eacute pela fundamentaccedilatildeo da decisatildeo que se poderaacute controlar a

adequaccedilatildeo e necessidade da medida atiacutepica

Pelo fato das medidas executivas atiacutepicas derivarem de dispositivos normativos

considerados claacuteusulas gerais propiacutecias as mais variadas interpretaccedilotildees eacute de extrema

importacircncia que o oacutergatildeo julgador fundamente sua decisatildeo

Logo ldquodeve o juiz na fundamentaccedilatildeo decisoacuteria expor racionalmente os motivos da

sua escolha demonstrando com atenccedilatildeo ao art 489 sect 1ordm CPC de que modo a sua opccedilatildeo

atende os criteacuterios da adequaccedilatildeo necessidade e proporcionalidade em sentido estrito ()rdquo 149

Dessa forma os princiacutepios da proporcionalidade e razoabilidade servem para delimitar

o alcance das claacuteusulas gerais de efetivaccedilatildeo fazendo com que o oacutergatildeo julgador se atenha aos

criteacuterios da adequaccedilatildeo e necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao caso

concreto

42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO

EXECUTADO

A entrada em vigor do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 aflorou ainda mais uma

discussatildeo essencial para os processualistas do seacuteculo XXI qual eacute o verdadeiro protagonista do

processo civil

Para os que defendem o ldquoautoritarismo processualrdquo o verdadeiro protagonista do

processo civil eacute o oacutergatildeo judiciaacuterio que em nome do desempenho efetivo de suas funccedilotildees lhes

eacute permitido dilatar os poderes que diga-se de jaacute passagem jaacute compotildeem um vastiacutessimo

arsenal150

Jaacute os ldquogarantistasrdquo 151 do processo civil acreditam que os verdadeiros protagonistas satildeo

as partes do processo e seus direitos e garantias devem ser estritamente preservados

Devido a essa disputa de quem possui maior protagonismo no processo as mudanccedilas

ocorridas no coacutedigo processual vigente quanto agraves medidas executivas atiacutepicas despertaram

149 Ibid p 117 150 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos

atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04102018

151 O processualista Araken de Assis acredita que o termo garantista eacute descabido tendo em vista que remete ao processo penal

56

maior celeuma do que qualquer outra modificaccedilatildeo trazida pelo CPC15 Afinal as referidas

medidas acirravam ainda mais a disputa pelo protagonismo processual

O fato de o CPC15 dispor no art 139 IV que o juiz poderaacute decretar todas as medidas

indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o

cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo

pecuniaacuteria levou boa parte da doutrina e dos juiacutezes a acreditar que teria pleno direito de

aplicar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo Entretanto muitos se esqueceram do outro lado

da moeda esqueceram que a dignidade humana do executado tambeacutem eacute um direito

fundamental e natildeo pode ser violado

Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa152

acreditam que

() natildeo parece producente elencar um rol abstrato das medidas que poderiam ser aplicadas pelo juiz a tiacutetulo do art 139 IV CPC Afinal se busca a efetividade da execuccedilatildeo e esta soacute pode ser identificada agrave luz das especificidades da situaccedilatildeo concreta Ideal eacute enveredar pela loacutegica modular (adequaccedilatildeo ao caso) natildeo pela geneacuterica (soluccedilotildees abstratas de pretensa utilidade universal)

Em razatildeo de o dispositivo apresentar uma gama de poderes tatildeo amplos agrave disposiccedilatildeo do

oacutergatildeo julgador sem nenhuma estipulaccedilatildeo de um procedimento legal previamente definido para

que estabeleccedila as condiccedilotildees de sua aplicaccedilatildeo em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo eacute

necessaacuterio que em razatildeo do princiacutepio da dignidade humana natildeo busque definir o que o

dispositivo permite mas de definir o que ele natildeo permite ldquoOu seja propotildee-se a sua

compreensatildeo por exclusatildeo Afinal se ele tem potencialidade para promover a efetividade da

tutela tambeacutem pode provocar lesotildees E como em direito os fins natildeo justificam os meios

ressalta como prioritaacuteria a necessidade de estabelecer limitesrdquo 153

O art 789 do CPC15 disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial e eacute

categoacuterico ao dispor que ldquoo devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para

152 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

153 Ibid sem paginaccedilatildeo

57

o cumprimento de suas obrigaccedilotildees salvo as restriccedilotildees estabelecidas em leirdquo Logo a

execuccedilatildeo somente poderaacute incidir sobre os bens do devedor e natildeo sobre a sua pessoa

Como eacute sabido a Lex Poetelia Papiria de 326 aC foi o primeiro marco legal da

humanizaccedilatildeo das cobranccedilas de diacutevidas abolindo a imposiccedilatildeo ao devedor de castigos

vexatoacuterios e ateacute da pena de morte154

Afinal no direito romano antigo a cobranccedila de diacutevidas poderia recair sobre a pessoa

do devedor que respondia com sua liberdade e ateacute mesmo com seu proacuteprio corpo permitindo

a lei que repartissem tantos pedaccedilos do corpo do devedor quantos fossem seus credores

Nesse sentindo leciona o professor Guilherme Pupe da Noacutebrega155 que

Vem de longe a evoluccedilatildeo no sentido de fazer a responsabilidade por uma obrigaccedilatildeo migrar da pessoa do devedor para seu patrimocircnio Merecem registro especiacutefico como marcos histoacutericos remotos a Lex Poetelia Papiria de 326 aC que aboliu o nexum e possibilidade de escravidatildeo do devedor como garantia da obrigaccedilatildeo e a pignoris capio ou ldquoaccedilatildeo por tomada de penhorrdquo que instituiu a possibilidade de o credor tomar parcela dos bens do devedor como forma de assegurar o adimplemento da diacutevida Aqueles institutos culminariam seacuteculo depois no artigo 789 do CPC de 2015 a consagrar que o devedor responda pela satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo com seus bens presentes e futuros observadas as restriccedilotildees impostas pelas impenhorabilidades legais

Logo o avanccedilar da civilizaccedilatildeo marcou o deslocamento da responsabilidade por

diacutevidas saindo do corpo do devedor para o seu patrimocircnio tendo em vista que a vida

humana a liberdade e a integridade fiacutesica satildeo valores inalienaacuteveis natildeo podendo ser

sacrificadas em benefiacutecio de obrigaccedilotildees pecuniaacuterias 156

Entretanto eacute sabido que a responsabilidade patrimonial eacute excepcionada pela prisatildeo

civil do devedor de verba alimentiacutecia resquiacutecio da responsabilidade pessoal romana

154 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt

httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018

155 NOacuteBREGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139 IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018

156 Ibid sem paginaccedilatildeo

58

No entanto haacute uma justificativa para isso Segundo o processualista Guilherme Pupe

da Noacutebrega157

Eacute que a par de a prisatildeo civil encontrar previsatildeo constitucional no inciso LXVII do artigo 5ordm o raciociacutenio eacute o de que o direito do alimentante agrave liberdade de locomoccedilatildeo cede diante dos direitos agrave vida e agrave dignidade titularizados pelo alimentando e resguardados pelos alimentos Foi esse mesmo raciociacutenio aliaacutes que justificou no passado a ediccedilatildeo da suacutemula 309 pelo STJ agora positivada pelo artigo 528 sect 7ordm que limita a modalidade coercitiva agraves trecircs uacuteltimas prestaccedilotildees vencidas e agraves prestaccedilotildees vincendas A ideia eacute que tendo o alimentando subsistido a despeito do natildeo-pagamento de prestaccedilotildees mais antigas essas verbas teriam perdido o caraacuteter alimentar que na equaccedilatildeo antes apresentada justificaria a prisatildeo civil do alimentante Daiacute por que aqueles valores antigos remanescem exigiacuteveis mas somente pela via da expropriaccedilatildeo

Essa ressalva eacute necessaacuteria tendo em vista que a adoccedilatildeo de teacutecnica de execuccedilatildeo

indireta para incursatildeo radical na esfera de direitos do executado notadamente direitos

fundamentais quando carente de respaldo constitucional natildeo merece acolhimento sob

risco de se atentar contra o devido processo legal (artigo 5ordm LIV da Constituiccedilatildeo)

Como afirma o autor Bruno Dantas158 ldquoembora inexistam estatiacutesticas que permitam

comparaccedilotildees natildeo eacute desarrazoado intuir que os iacutendices de inadimplecircncia despeccedilam na razatildeo

inversa da incidecircncia das ordens judiciais sobre o corpo e a liberdade do devedorrdquo Entretanto

eacute natildeo possiacutevel adotar toda e qualquer medida executiva atiacutepica em nome da efetividade da

execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que se saiba os limites da sua aplicaccedilatildeo

Dessa forma instrumentos que permitam o cumprimento forccedilado de contratos e o pagamento

de diacutevidas satildeo necessaacuterios contudo eacute preciso equilibrar essa exigecircncia com a liberdade e a

dignidade humana

Como citado alhures o art 139 IV ensejou decisotildees como a que determinou a

suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o

passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito em uma accedilatildeo se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo

extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

Na supracitada decisatildeo o princiacutepio da responsabilidade patrimonial natildeo estaacute sendo

efetivado para o que o devedor responda com os seus bens Afinal qual ligaccedilatildeo entre a

157 Ibid sem paginaccedilatildeo 158 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt

httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018

59

restriccedilatildeo de circulaccedilatildeo que diz com o direito de ir e vir (liberdade) com o pagamento de

diacutevidas que diz com a responsabilidade civil159

Ademais por que quem natildeo tem dinheiro para pagar diacutevidas natildeo pode dirigir Por que

natildeo tem condiccedilotildees para pagar o deacutebito natildeo pode ter passaporte Por que quem natildeo tem como

pagar o deve natildeo pode ter cartatildeo de creacutedito

Ao utilizar meios executivos atiacutepicos como os supracitados para compelir o devedor a

satisfazer a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria quando exauridos sem ecircxito os meios tradicionais de bens

penhoraacuteveis salvo quando existe qualquer indiacutecio concreto de ocultaccedilatildeo ou dissipaccedilatildeo de

bens eacute obrigar o devedor abrir matildeo da proteccedilatildeo da lei que lhe impede que seja tomado agrave forccedila

(art 833 CPC e demais disposiccedilotildees que tratam da impenhorabilidade)

Segundo Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa160

Claramente essa pressatildeo visa dar uma aparecircncia de voluntariedade agrave indicaccedilatildeo de bens impenhoraacuteveis pelo proacuteprio executado que na verdade soacute age assim por ser a uacutenica forma de ver-se livre de um grame imposto por medida indutiva despedida de qualquer necessidade ou adequaccedilatildeo Uma intoleraacutevel perversatildeo

Os autores afirmam ainda que o ldquodireito paacutetrio natildeo admite esta contraditio in terminis

sendo inaceitaacutevel a coexistecircncia de regra protetiva do executado com outra que concede ao

juiz poderes para forccedilar (ainda que indiretamente e veladamente) o executado a abrir matildeo

daquela proteccedilatildeordquo 161

Logo eacute cristalino que a suspensatildeo da CNH eacute uma forma incorreta de aplicar a medida

executiva atiacutepica para efetivar o direito fundamental a execuccedilatildeo tendo em vista que o uacutenico

objetivo da referida eacute pressionar o executado abrir matildeo de algum bem impenhoraacutevel para

levantar o dinheiro e cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

A retenccedilatildeo do passaporte igualmente natildeo possui qualquer relaccedilatildeo com a diacutevida do

executado e eacute somente uma forma de tentar pressiona-lo a dispor de um bem que natildeo pode

ser tomado agrave forccedila e puni-lo por natildeo ter cumprido voluntariamente com a sua obrigaccedilatildeo

159 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

160 Ibid sem paginaccedilatildeo 161 Ibid sem paginaccedilatildeo

60

Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa162

acreditam que tal medida eacute equivocada e se torna excessivamente onerosa ao executado

As mais variadas circunstacircncias relevem o equiacutevoco de tal medida aplicada assim genericamente Com efeito nada justifica reter o passaporte do executado e impedi-lo de viajar para o exterior quando eacute agraciado inclusive com todas as despesas pagas com presente sorteio ou precircmio (por completar tempo de serviccedilo ou atingir metas produtividade na sociedade empresaacuteria em que trabalha) Como todo custo eacute suportado por terceiro e por isso mesmo a sua realizaccedilatildeo pelo executado natildeo traria qualquer prejuiacutezo ao exequente e a retenccedilatildeo do passaporte natildeo seria injustificaacutevel

Paulo Antonio Papini163 acredita que natildeo tem a apreensatildeo de passaporte natildeo possui um

fundamento plausiacutevel tendo em vista que se o devedor natildeo pode viajar para saldar o deacutebito

tambeacutem natildeo poderia exercer atividades cotidianas

Com todo o respeito a quem pensa dessa forma o argumento eacute muito simploacuterio e natildeo precisamos sequer do Direito para derrubaacute-lo Com efeito se considerarmos que ndash ateacute mesmo pelas dimensotildees continentais do Brasil ndash natildeo eacute incomum que uma passagem para o Nordeste custe mais caro que um voo para Miami seria razoaacutevel entatildeo seguindo a linha argumentativa do Magistrado em questatildeo que se oficiasse aos oacutergatildeos reguladores da aviaccedilatildeo civil proibindo-se aquele devedor de fazer ateacute mesmo voos domeacutesticos Poder-se-ia ir mais longe jaacute que natildeo tem dinheiro para pagar suas diacutevidas certamente aquele devedor tambeacutem natildeo teria para comer fora de sua casa porque entatildeo natildeo determinar a expediccedilatildeo de ofiacutecio aos restaurantes proacuteximos agrave sua casa e determinar tambeacutem a proibiccedilatildeo de que ele fosse servidoatendido

O autor se questiona ainda ldquoSeraacute entatildeo que o Princiacutepio da Dignidade da Pessoa

Humana estaacute de mero enfeite em nossa Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ()rdquo 164 Tendo em vista

que ldquoa decisatildeo em comento viola diretamente o art 5ordm incisos XV LIII e LXIII da

Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ndash falamos do Direito de Ir e Virrdquo 165

Ademais o cancelamento do cartatildeo de creacutedito eacute mais uma forma de constranger e

compelir o executado a cumprir com a obrigaccedilatildeo de qualquer forma natildeo importando o que

precise fazer para conseguir saldar o deacutebito tendo em vista que a referida medida apresenta

162 Ibid sem paginaccedilatildeo 163 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo

pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018

164 Ibid sem paginaccedilatildeo 165 Ibid sem paginaccedilatildeo

61

qualquer adequaccedilatildeo com o fim desejado (reverter em pagamento para o exequente) Os

autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa afirmam que166

Reconhece-se que as razotildees da afirmaccedilatildeo ora questionada satildeo ateacute intuitivas mas eacute plenamente possiacutevel problematiza-las Ora natildeo se encontra qualquer justificativa idocircnea para que o juiz possa cancelar o contrato do executado com a administradora do cartatildeo de creacutedito (ou instituiccedilatildeo financeira) que natildeo tem qualquer relaccedilatildeo com o creacutedito exequendo muito menos como isso poderia impactar positivamente na execuccedilatildeo (senatildeo para pressionar o executado a dispor de bens impenhoraacuteveis) Ademais natildeo foram indicados sequer sinais de que o executado realiza gastos supeacuterfluos com o cartatildeo de creacutedito ndash natildeo que isso justificasse a medida pois o correto seria penhorar os esses bens (se duraacuteveis naturalmente) ao inveacutes de cancelar o cartatildeo de creacutedito

Logo as referidas medidas natildeo possuem qualquer relaccedilatildeo com o atingimento do fim

almejado (o pagamento de quantia) tendo em vista que natildeo haacute uma relaccedilatildeo meiofim entre

tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a

restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia

ao exequente

Dessa forma nota-se que as medidas de suspensatildeo da CNH retenccedilatildeo de passaporte e

bloqueio do cartatildeo de credito satildeo completamente inadequadas agrave realizaccedilatildeo a que se prestam

Afinal ldquotais medidas soam como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-

lo ao cumprimento da ordem judicial ndash e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a

utilizaccedilatildeo dos meios sancionatoacuterios pelo magistrado ()rdquo167

Como exposto em linhas preteacuteritas o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades

de aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e

razoaacutevel se atendo aos criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas

executivas atiacutepicas ao caso concreto sob pena de converter a medida em de indutiva para

punitiva

A utilizaccedilatildeo de medidas atiacutepicas como a suspensatildeo da carteira de motorista e o

passaporte do devedor abandona a regra da responsabilidade patrimonial e atingem em cheio

o nuacutecleo de direitos inerentes agrave condiccedilatildeo humana

166 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

167 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 115

62

O limite para a aplicaccedilatildeo de tais medidas deve ser a Constituiccedilatildeo Federal e sobretudo

os Direitos fundamentais nela expressos ldquoCom efeito natildeo haacute saiacuteda tampouco soluccedilatildeo eficaz

de um problema sem que se respeite a Lei e o Devido Processo Legal (por mais nobres que

sejam as intenccedilotildees)rdquo 168

Dessa forma a busca desenfreada pelo cumprimento das decisotildees judiciais em

especial na fase executiva natildeo pode ser realizada em sacrifiacutecio de direitos fundamentais O

Poder Judiciaacuterio natildeo pode resolver a crise do processo executoacuterio utilizando de medidas

arbitraacuterias com o propoacutesito de satisfazer obrigaccedilotildees pecuniaacuterias

Eis o dilema que se coloca diante do poder geral de efetivaccedilatildeo ele pode servir de

potente instrumento em prol da tutela jurisdicional executiva entretanto se manejado de

modo improacuteprio serviraacute de instrumento de puniccedilatildeo e humilhaccedilatildeo do executado169

Eacute notoacuterio que se amplamente aplicado o poder geral de efetivaccedilatildeo reduziria os

iacutendices de inadimplecircncia quiccedilaacute resolveria por completo a crise da execuccedilatildeo civil Entretanto

o retrocesso civilizatoacuterio seria irreparaacutevel

168 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo

pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018

169 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

63

5 CONCLUSAtildeO

Como funccedilatildeo jurisdicional que tem como objeto a efetivaccedilatildeo de direitos a execuccedilatildeo

deve sempre buscar a maior satisfaccedilatildeo possiacutevel concretizando integralmente o creacutedito do

exequente isto eacute realizando o direito fundamental agrave tutela executiva do credor Por isso a

adoccedilatildeo de meios executivos atiacutepicos incorporados pelo Coacutedigo de Processo Civil de 2015 por

meio do art139 IV em um primeiro momento podem ser consideradas vaacutelidas visto que

servem de instrumento para a satisfaccedilatildeo e asseguraccedilatildeo de direitos do credor

Entretanto para o oacutergatildeo julgador natildeo cometa arbitrariedades em nome do direito

fundamental agrave execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que seja definido certos limites na adoccedilatildeo do poder

geral de efetivaccedilatildeo

As medidas executivas atiacutepicas natildeo podem ser aplicadas de maneira indiscriminada

logo devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o esgotamento das medidas tiacutepicas e

a possibilidade de cumprimento da obrigaccedilatildeo

Partindo dessa premissa as medidas a serem adotadas pelo juiz no caso concreto

devem ter como baliza os princiacutepios da proporcionalidade e da razoabilidade para que natildeo

ultrapassem a responsabilidade patrimonial do devedor e incidida diretamente sobre sua

pessoa

Para que natildeo seja atingida a pessoa do executado ou seja para que o devedor natildeo

tenha sua dignidade humana viola eacute necessaacuterio que a medida atiacutepica seja adequada e

necessaacuteria

Logo o juiz deveraacute sempre estabelecer uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida

executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia

a gerar o resultado sem violar a dignidade humana do executado

Dessa o juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental a execuccedilatildeo e

determinar uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute

necessaacuterio que a medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado

As medidas que ultrapassam esses limites como a decisatildeo que apreendeu o

passaporte suspensatildeo a CNH e bloqueou o cartatildeo de creacutedito do devedor satildeo meramente

punitivas posto que essas natildeo satildeo as medidas mais adequadas para se atingir o fim almejado

pois natildeo existe propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado

64

uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo

geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente

Medidas como esta servem de embasamento para decisotildees arbitraacuterias e autoritaacuterias de

violaccedilatildeo dos direitos fundamentais transformando o poder geral de efetivaccedilatildeo em

instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com autorizaccedilatildeo judicial

Em suma o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades de aplicaccedilatildeo do poder

geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e razoaacutevel se atendo aos

criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao

caso concreto sob pena de punir a pessoa do executado violando a sua dignidade humana

em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo

65

REFEREcircNCIAS

ALVES Luceacutelia de Sena Alves RETES Tiago O poder geral de efetivaccedilatildeo das

decisotildees judiciais e proporcionalidade uma anaacutelise criacutetica acerca do art 139 IV do

Novo Coacutedigo de Processo Civil Disponiacutevel em

lthttpswwwacademiaedu31752652O_poder_geral_de_efetivaC3A7C3A3o_das_

decisC3B5es_judiciais_e_a_proporcionalidade_uma_anC3A1lise_crC3ADtica_a

cerca_do_art_139_IV_do_Novo_CC3B3digo_de_Processo_Civil gt Acesso em 2507

2018

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THEODORO JUacuteNIOR Humberto Novo Coacutedigo de Processo Civil Anotado 20 ed

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  • 1 INTRODUCcedilAtildeO
  • 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO
    • 25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO
      • 3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
        • 31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS
          • 311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15
            • 32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
            • 33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
            • 34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
              • 4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
                • 41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
                • 42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
                  • 5 CONCLUSAtildeO
                  • REFEREcircNCIAS
Page 10: portal.faculdadebaianadedireito.com.brportal.faculdadebaianadedireito.com.br/portal/monografias...A prestação jurisdicional não se concretiza depois de encerrada afase de conhecimento

8 Dessa forma a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional responsaacutevel pela

concretizaccedilatildeo de um direito subjetivo no plano material obtendo resultado idecircntico ou

equivalente ao atingiacutevel se o devedor cumprisse espontaneamente a prestaccedilatildeo

Todavia essa atividade jurisdicional soacute cabe quando o devedor se recusa a cumprir

com a obrigaccedilatildeo quebrando a expectativa do credor de receber o que lhe eacute devido Por esta

razatildeo que se diz que a execuccedilatildeo civil eacute ldquoforccediladardquo 6

Eacute o que se conclui seguindo os ensinamentos de Leonardo Greco7 para ele execuccedilatildeo eacute

uma

() modalidade de tutela jurisdicional que consiste na praacutetica pelo juiz (ou por outrem sob a sua supervisatildeo) de uma seacuterie de atos coativos concretos sobre o devedor e sobre o seu patrimocircnio a fim de agrave custa dele e independentemente do concurso da sua vontade tornar efetivo o cumprimento de prestaccedilatildeo por ele inadimplida desde que tais atos coativos estejam previamente constituiacutedos em lei

Portanto a execuccedilatildeo civil eacute a atividade jurisdicional que tem como escopo obter o

cumprimento de uma prestaccedilatildeo certa e inadimplida mediante atos coativos sobre o devedor e

seus bens

22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL

Vislumbrado o conceito de execuccedilatildeo civil cabe agora empreender a sua classificaccedilatildeo

tendo em vista que a execuccedilatildeo pode se manifestar de diversas formas possuindo diferentes

caracteriacutesticas em cada uma das suas modalidades

Inicialmente cabe destacar que haacute duas teacutecnicas processuais para viabilizar a execuccedilatildeo

civil lato sensu eacute a que divide em processo autocircnomo de execuccedilatildeo e em fase de execuccedilatildeo

dependendo do tiacutetulo executivo que justifica o exerciacutecio da atividade satisfativa

O Coacutedigo Processual Civil de 2015 acertadamente ratificou as reformas promovidas

no CPC73 que consagrava a opccedilatildeo legislativa de oferecimento das tutelas de certificaccedilatildeo e

efetivaccedilatildeo do direito em um mesmo processo Dessa forma as execuccedilotildees de sentenccedilas

6 BASTOS Luiz Fernando Pereira O artigo 139 IV do novo Coacutedigo de Processo Civil a atipicidade

dos meios executivos na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia certa Brasiacutelia 2017 Disponiacutevel em lt httpbdmunbbrbitstream104831866812017_LuizFernandoPereiraBastospdf gt Acesso em 06 de agosto de 2018

7 BASTOS Luiz Fernando Pereira apud GRECO Leonardo O processo de execuccedilatildeo Rio de Janeiro Renovar 1999 p 164

9

passaram a ser uma fase complementar ao de processo de conhecimento e natildeo mais ocorrer

em um processo autocircnomo

No entendimento do professor processualista Fredie Didier et al8 o processo

sincreacutetico simplificou a efetivaccedilatildeo de um direito reconhecido em sentenccedila

A dispensa do ajuizamento de um processo autocircnomo para execuccedilatildeo de sentenccedila natildeo soacute veio diminuir o tempo necessaacuterio agrave prestaccedilatildeo da tutela jurisdicional - afinal o credor natildeo mais precisaria tal como ocorria ateacute entatildeo promover nova citaccedilatildeo pessoal do reacuteudevedor- como tambeacutem veio romper de vez com um velho paradigma segundo o qual a atividade executiva estaria dissociada da precedente atividade jurisdicional cognitiva

Entretanto natildeo soacute as sentenccedilas de meacuterito ensejam uma execuccedilatildeo Por esta razatildeo foi

necessaacuterio manter o processo autocircnomo de execuccedilatildeo para os casos em que o credor tem a seu

favor um documento que natildeo tenha sido proferido por um oacutergatildeo dotado de jurisdiccedilatildeo

Consequentemente se for o titulo executivo judicial o caminho natural eacute o do

cumprimento de sentenccedila Sendo por sua vez extrajudicial o titulo executivo o caminho

correto eacute o processo de execuccedilatildeo

Cabe ainda salientar que toda execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial eacute definitiva Jaacute a

execuccedilatildeo de tiacutetulo judicial (cumprimento de sentenccedila) pode ser definitiva ou provisoacuteria

No primeiro caso isto eacute cumprimento de sentenccedila definitivo ldquoeacute a execuccedilatildeo completa

que vai ateacute a fase final (com a entrega do bem da vida) sem exigecircncias adicionais para o

exequenterdquo 9

Quanto ao segundo caso ldquoo cumprimento provisoacuterio de sentenccedila (fundada em tiacutetulo

provisoacuterio) eacute aquele que exige alguns requisitos extras para que se chegue agrave fase final da

execuccedilatildeordquo 10

Para Fredie Didier11 o criteacuterio para definir se o cumprimento de sentenccedila seraacute

definitivo ou provisoacuterio

() eacute a estabilidade do tiacutetulo executivo em que se funda a execuccedilatildeo se se tratar de decisatildeo acobertada pela coisa julgada material o cumprimento de sentenccedila eacute

8 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 46 9 Ibid p 57 10 Ibid p 57 11 Ibid p 57

10

definitivo se se tratar de decisatildeo judicial ainda passiacutevel de alteraccedilatildeo (reforma ou invalidaccedilatildeo) em razatildeo da pendecircncia de recurso contra ela interposto a que natildeo tenha sido atribuiacutedo efeito suspensivo o cumprimento de sentenccedila eacute provisoacuterio

Ademais a execuccedilatildeo se distingue em procedimentos executivos comuns que satildeo da

execuccedilatildeo civil e que servem a uma generalidade de creacuteditos como eacute o caso do cumprimento

de sentenccedila e o processo de execuccedilatildeo E em procedimentos executivos especiais que servem

agrave satisfaccedilatildeo de creacuteditos peculiares como a execuccedilatildeo de alimentos e a execuccedilatildeo fiscal 12

Por fim cabe mencionar a classificaccedilatildeo que distingue a execuccedilatildeo em direta e indireta

A primeira execuccedilatildeo direita (ou execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo) eacute ldquo() aquela em que o

Poder Judiciaacuterio prescinde da colaboraccedilatildeo do executado para a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida

e pois promove uma substituiccedilatildeo da sua conduta pela conduta do proacuteprio Estado-juiz ou de

terceirordquo 13 Ou seja as medidas executivas satildeo levadas a efeito mesmo contra a vontade do

devedor na execuccedilatildeo direta

Segundo a doutrina a execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo se subdivide da seguinte forma

meios de desapossamento meios de transformaccedilatildeo e meios de expropriaccedilatildeo

Os meios de desapossamento muito comuns nas execuccedilotildees para entrega de coisa eacute a

forma ldquopor meio da qual se retira da posse do executado o bem a ser entregue ao exequente

(p ex despejo busca e apreensatildeo reintegraccedilatildeo de posse)rdquo 14 Ao passo que por meio dos de

transformaccedilatildeo ldquo() o juiz determina que um terceiro pratique a conduta que deveria ser

praticada pelo executado cabendo a este arcar com o pagamento do custo respectivordquo 15 Jaacute

os meios executivos de expropriaccedilatildeo eacute a forma ldquopor meio do qual algum bem do patrimocircnio

do devedor eacute expropriado para pagamento do creacutedito (adjudicaccedilatildeo alienaccedilatildeo judicial ou

apropriaccedilatildeo de frutos e rendimentos de empresa ou de estabelecimentos e de outros bens art

825 CPC)rdquo 16

12 Ibid p 48 13 Ibid p 50 14 Ibid p 51 15 Ibid p 51 16 Ibid p 51

11 Jaacute a execuccedilatildeo indireta (ou mandamental) atua ldquo() na vontade do devedor como forma

de compeli-lo ou incentivaacute-lo a cumprir a ordem judicialrdquo 17 Nesse entendimento ainda

leciona Fredie Didier et al 18

Nesses casos o Estado-juiz busca promover a execuccedilatildeo com a colaboraccedilatildeo do executado forccedilando ou incentivando a que ele proacuteprio cumpra a prestaccedilatildeo devida Em vez de o Estado-juiz tomar as providecircncias que deveriam ser tomadas pelo executado o Estado forccedila por meio de coerccedilatildeo psicoloacutegica ou de promessa de recompensa judicial a que o proacuteprio executado cumpra a prestaccedilatildeo

A execuccedilatildeo indireta pode ser patrimonial como por exemplo a imposiccedilatildeo de multa

coercitiva ou pessoal com a prisatildeo civil do devedor de alimentos Ademais adiciona Didier

et al19que

O estiacutemulo ao cumprimento da prestaccedilatildeo pode dar-se pelo temor (p ex multa coercitiva prisatildeo civil do devedor de alimentos divulgaccedilatildeo de notiacutecia em jornal revelando o descumprimento) ou pelo incentivo (p ex a chamada sanccedilatildeo premial ou sanccedilatildeo positiva de que eacute exemplo a isenccedilatildeo do pagamento de custas em caso de cumprimento do mandado monitoacuterio - art 701 sect 1ordm CPC a reduccedilatildeo pela metade dos honoraacuterios advocatiacutecios fixados inicialmente pelo juiacutezo em caso de pagamento integral do deacutebito pecuniaacuterio na execuccedilatildeo por quantia certa fundada em tiacutetulo extrajudicial - art 827 sect 1ordm CPC)

Por tais razotildees haacute uma tendecircncia em cada vez mais prestigiar os meios executivos

indiretos (coercitivos) posto que satildeo tatildeo eficazes quanto os meios executivos diretos

entretanto menos onerosos Contudo sua aplicaccedilatildeo deve ser fiscalizada a fim de natildeo permitir

que a execuccedilatildeo civil perca sua finalidade visto que eacute uma funccedilatildeo jurisdicional que tem como

escopo efetivar o direito do credor e natildeo de atender os interesses do devedor

23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL

Os princiacutepios juriacutedicos nos uacuteltimos anos passaram a ser munidos de forccedila cogente

normatizando as condutas humanas tanto quanto as regras juriacutedicas Os ditos princiacutepios

ampliaram as margens de atuaccedilatildeo dos aplicadores do direito possibilitando a construccedilatildeo de

soluccedilotildees mais adequadas agraves especificidades das demandas que chegam ao judiciaacuterio

17 Ibid p 51 18 Ibid p 51 19 Ibid p 51-52

12 Dessa forma eacute necessaacuterio aprofundar-se nos princiacutepios norteadores da execuccedilatildeo civil

para que se obtenha uma anaacutelise completa da teoria geral da execuccedilatildeo

A execuccedilatildeo civil tem como um dos seus corolaacuterios o princiacutepio da efetividade este

consiste na exigecircncia de um sistema completo de tutela executiva no qual existam meios

executivos capazes de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor

de tutela executivardquo 20

O referido princiacutepio da efetividade eacute reforccedilado como normal fundamental do processo

civil brasileiro pelo art 4ordm do CPC ldquoArt 4ordm As partes tecircm o direito de obter em prazo razoaacutevel

a soluccedilatildeo integral do meacuterito incluiacuteda a atividade satisfativa

Jaacute o princiacutepio da boa feacute processual corolaacuterio do devido processo legal estaacute previsto

no art 5ordm do CPC ldquoAquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de

acordo com a boa-feacuterdquo Segundo o processualista baiano Fredie Didier21

O princiacutepio da boa-feacute extrai-se de uma claacuteusula geral processual A opccedilatildeo por uma claacuteusula geral de boa-feacute eacute a mais correta Eacute que a infinidade de situaccedilotildees que podem surgir ao longo do processo torna pouco eficaz qualquer enumeraccedilatildeo legal exaustiva das hipoacuteteses de comportamento desleal Daiacute ser correta a opccedilatildeo da legislaccedilatildeo brasileira por uma norma geral que impotildee o comportamento de acordo com a boa-feacute Em verdade natildeo seria necessaacuteria qualquer enumeraccedilatildeo das condutas desleais o art 5deg do CPC eacute bastante exatamente por tratar-se de uma claacuteusula geral

Dessa forma o dito princiacutepio preconiza que diante de um vinculo juriacutedico as pessoas

envolvidas natildeo poderatildeo frustrar a confianccedila do outro devendo comportar-se como se pode

esperar de uma pessoa de boa-feacute

Ademais disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial que ldquosomente o

patrimocircnio do devedor (art 789 CPC) ou de terceiro responsaacutevel pode ser objeto da

atividade executiva do Estadordquo 22

O referido princiacutepio que determina que somente o patrimocircnio submete-se agrave execuccedilatildeo

e natildeo a pessoa foi trazido pela humanizaccedilatildeo do direito Para o professor Didier et al23 o

20 DIDIER JR Freddie et al apud GUERRA Marcelo Lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do

credor na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 21 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte

geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 105 22 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 68

13

desenvolvimento dos meios de execuccedilatildeo indireta ldquoparece relativizar um pouco esse princiacutepio

na medida em que pressionam psicologicamente a pessoa do devedor para que cumpra a

obrigaccedilatildeo com seu comportamentordquo

Complementa ainda que

A responsabilidade executiva parece assumir atualmente caraacuteter hiacutebrido comportando coerccedilatildeo pessoal e sujeiccedilatildeo patrimonial

i) a coerccedilatildeo pessoal incide sobre a vontade do devedor admitindo o uso de medidas coercitivas de execuccedilatildeo indireta para forccedilaacute-lo a cumprir a obrigaccedilatildeo com seu proacuteprio comportamento (ex arts 139 rv 523 sect 1ordm 536 sect 1ordm e 538 sect 3ordm todos do CPC)

ii) descumprida a obrigaccedilatildeo e natildeo sendo possiacuteveladequado o uso de teacutecnica de coerccedilatildeo pessoal tem-se a sujeiccedilatildeo patrimonial que recairaacute sobre os bens do devedor ou de terceiro responsaacutevel - que responderatildeo pela proacutepria prestaccedilatildeo in natura (ex dar coisa ou entregar quantia) ou por perdas e danos24

Dessa forma o referido princiacutepio natildeo tem aplicaccedilatildeo absoluta em razatildeo do principio da

efetividade a qual estimula o uso dos meios de coerccedilatildeo indireta para garantir o cumprimento

da obrigaccedilatildeo pelo devedor

O princiacutepio da primazia da tutela especifica (ou princiacutepio do resultado) assevera que

ldquoA execuccedilatildeo deve ser especiacutefica propiciar ao credor a satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo tal qual

houvesse o cumprimento espontacircneo da prestaccedilatildeo pelo devedorrdquo 25

O CPC de 2015 absorveu todos os avanccedilos legislativos a cerca do mote O caput do

art 497 assegura que na accedilatildeo que tenha por objeto a prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer o

juiz se procedente o pedido concederaacute a tutela especiacutefica ou determinaraacute providecircncias que

assegurem a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico equivalente O art 499 o

complementa a obrigaccedilatildeo somente seraacute convertida em perdas e danos se o autor o requerer

ou se impossiacutevel agrave tutela especiacutefica ou a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico

equivalente

O princiacutepio do contraditoacuterio eacute garantido pela constituiccedilatildeo federal e compreende o

direito de ser ouvido o direito de acompanhar os atos processuais o direito de produzir

provas participar da sua produccedilatildeo manifestar-se sobre a prova produzida e obter do juiz a

23 Ibid p 69-70 24 Ibid p 70 25 Ibid p 71

14

respectiva valoraccedilatildeo o direito de ser informado regularmente dos atos praticados no processo

o direito agrave motivaccedilatildeo das decisotildees o direito de impugnar as decisotildees 26

O contraditoacuterio tem aplicaccedilatildeo em todo processo judicial sendo aplicaacutevel tambeacutem na

execuccedilatildeo No entanto o contraditoacuterio na execuccedilatildeo natildeo ocorre com a mesma intensidade que

no processo ou na fase de conhecimento eacute o que assevera Didier et al 27

O contraditoacuterio no procedimento executivo no aspecto do direito de defesa assegurado agrave parte demandada eacute eventual porquanto depende da provocaccedilatildeo do executado que natildeo eacute chamado ajuiacutezo para defender-se mas sim para cumprir a obrigaccedilatildeo O procedimento executivo adota a teacutecnica monitoacuteria que consiste basicamente na inversatildeo do ocircnus de provocar o contraditoacuterio o reacuteu em vez de citado para manifestar-se sobre a pretensatildeo do autor eacute convocado para cumprir uma determinada obrigaccedilatildeo

Logo haacute o contraditoacuterio no procedimento executivo porem eacute eventual quanto agrave defesa

do executado

Ademais o princiacutepio da menor onerosidade eacute consagrado pelo art 805 do CPC e

dispotildee que ldquoQuando por vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz

mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o executadordquo O referido princiacutepio tem o

escopo de impedir o abuso do direito pelo exequente

O principio da menor onerosidade auxilia o juiz na escolha de um meio executivo

adequado e necessaacuterio que satisfaccedila a prestaccedilatildeo exigida pelo credor Nesse sentido eacute o

entendimento do professor Fredie Didier et al 28

O resultado a ser alcanccedilado eacute aquele estabelecido pelo direito material A maneira de se chegar ateacute esse resultado eacute que deve ser a menos onerosa possiacutevel para o executado Isso significa que a opccedilatildeo pelo meio menos gravoso pressupotildee que os diversos meios considerados sejam igualmente eficazes Assim havendo vaacuterios meios executivos aptos agrave tutela adequada e efetiva do direito de creacutedito escolhe-se a via menos onerosa ao executado

O princiacutepio visa impedir a execuccedilatildeo desnecessariamente onerosa ao executado ou seja a execuccedilatildeo abusiva Em vez de enumerar situaccedilotildees em que a opccedilatildeo mais gravosa revelar-se-ia injusta o legislador valeu-se corretamente de uma claacuteusula geral para reputar abusivo qualquer comportamento do credor que pretender valer-se de meio executivo mais oneroso do que outro igualmente idocircneo agrave satisfaccedilatildeo do seu creacutedito

26 Ibid p 76 27 Ibid p 78 28 Ibid p 79-80

15 O princiacutepio da cooperaccedilatildeo tem como base os princiacutepios do devido processo legal da

boa-feacute processual e do contraditoacuterio O dito princiacutepio avigora a eacutetica processual com o

aprimoramento do diaacutelogo entre as partes reciprocamente e com o oacutergatildeo jurisdicional Eacute o

que preconiza o art 6ordm do CPC Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para

que se obtenha em tempo razoaacutevel decisatildeo de meacuterito justa e efetiva

No procedimento executivo o princiacutepio da cooperaccedilatildeo incide de diversas formas

disciplina Didier et al29 que na execuccedilatildeo

O executado tem o dever de indicar bens agrave penhora (art 774 V CPC) Natildeo encontrados bens penhoraacuteveis e natildeo havendo indicaccedilatildeo de qualquer um deles pelo exequente cabe ao executado declarar quais satildeo seus bens penhoraacuteveis sob pena de se sujeitar a uma sanccedilatildeo pecuniaacuteria compulsoacuteria

Tambeacutem eacute manifestaccedilatildeo do princiacutepio da cooperaccedilatildeo a exigecircncia de que o executado que pretende impugnar o valor da execuccedilatildeo apresente de logo o valor que reputa devido (art 525 sect 4ordm CPC) Seria comportamento natildeo-cooperativo afirmar que a cobranccedila eacute excessiva sem simultaneamente dizer qual eacute o valor correto

Demais disso aplicam-se agrave execuccedilatildeo os deveres que decorrem do princiacutepio da cooperaccedilatildeo e que satildeo imputados ao oacutergatildeo jurisdicional () Assim por exemplo deve o juiz advertir ao executado antes de puni-lo de que seu ato pode vir a caracterizar-se como atentatoacuterio agrave dignidade da jurisdiccedilatildeo ( art 772 II CPC) perceba que se trata de uma conduta compatiacutevel com o dever de prevenccedilatildeo O oacutergatildeo jurisdicional somente pode conhecer da prescriccedilatildeo ex officio dando a oportunidade de o exequente manifestar-se conforme impotildee o dever de consulta ( cf arts 10 487 paraacutegrafo uacutenico e 921 sect 5ordm CPC)

O princiacutepio ou postulado30 da proporcionalidade tem aplicaccedilatildeo muito relevante na

execuccedilatildeo O art 8 do CPC assegura que o oacutergatildeo jurisdicional tem o dever de observar a

proporcionalidade e a razoabilidade ao aplicar o ordenamento juriacutedico inclusive no

procedimento executivo

Ademais o art 805 do CPC eacute categoacuterico ao disciplinar que ldquoArt 805 Quando por

vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo

menos gravoso para o executadordquo O referido artigo jaacute se trata de uma concretizaccedilatildeo da

proporcionalidade

29 Ibid p 82 30 Segundo Fredie Didier et al haacute uma discussatildeo doutrinaacuteria sobre a proporcionalidade Parte da

doutrina acredita que a proporcionalidade eacute um princiacutepio e outra parte acredita que eacute um postulado normativo

16 O principio da adequaccedilatildeo pode ser vislumbrado em dois momentos do Direito

Processual ldquoa) no legislativo como orientador da confecccedilatildeo das leis b) no jurisdicional

autorizando ao juiz diante do caso concreto adaptar procedimento agraves suas peculiaridadesrdquo 31

Para Luceacutelia de Sena Alves e Tiago Retes32

Isso quer dizer que no momento legislativo o devido processo deve ser observado pelo legislador para a confecccedilatildeo das normas de direito processual que iratildeo servir de instrumento efetivo de concretizaccedilatildeo do direito substancial a ser tutelado atendendo a todas as suas finalidades sob pena de falecircncia do proacuteprio direito No momento jurisdicional da mesma forma a via processual escolhida pelo autor tambeacutem deve estar sujeita a este princiacutepio para que natildeo sofra as mesmas consequecircncias da sua inobservacircncia

O ordenamento juriacutedico deve ser aplicado por meio da teacutecnica processual adequada

evitando dessa forma uma tutela ineficaz

Por fim o princiacutepio do autorregramento da vontade na execuccedilatildeo tem o objetivo de

ldquo() preservar um espaccedilo processual para o exerciacutecio da liberdade e da vontade em que

sejam permitidas negociaccedilotildees que envolvam as partes ndash e tambeacutem o juizrdquo33 Didier et al34

assevera que

A rigor o legislador estabelece um regime juriacutedico de autorregramento da vontade processual identificando-se algumas manifestaccedilotildees relevantes para a execuccedilatildeo Na verdade pode-se dizer que poucos satildeo os ambientes mais propiacutecios do que a execuccedilatildeo para a negociaccedilatildeo sobre o processo Todos os institutos e normas processuais relativos agrave execuccedilatildeo devem ser repensados a partir da premissa de que o CPC permite uma ampla margem de liberdade de negociaccedilatildeo sobre o processo (art 190 CPC)

O autorregramento da vontade pode ser vislumbrando na previsatildeo de negoacutecios tiacutepicos

em sede de execuccedilatildeo como por exemplo no acordo das partes sobre o valor do bem que

dispensa a avaliaccedilatildeo disposto no inciso I do art 871 CPC Ademais dentro dos limites do art

190 do CPC eacute possiacutevel na execuccedilatildeo a atribuiccedilatildeo da negociaccedilatildeo atiacutepica aos sujeitos 31 ALVES Luceacutelia de Sena Alves RETES Tiago O poder geral de efetivaccedilatildeo das decisotildees judiciais e

proporcionalidade uma anaacutelise criacutetica acerca do art 139 IV do Novo Coacutedigo de Processo Civil Disponiacutevel em lthttpswwwacademiaedu31752652O_poder_geral_de_efetivaC3A7C3A3o_das_decisC3B5es_judiciais_e_a_proporcionalidade_uma_anC3A1lise_crC3ADtica_acerca_do_art_139_IV_do_Novo_CC3B3digo_de_Processo_Civil gt Acesso em 25 de julho de 2018

32 Ibid natildeo paginado 33 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 85 34 Ibid p 85

17

processuais permitindo que sejam feitas mudanccedilas nos procedimentos e nas situaccedilotildees

juriacutedicas processuais ldquoSatildeo exemplos de negoacutecios processuais atiacutepicos na execuccedilatildeo pacto de

penhorabilidade acordo de ampliaccedilatildeo de prazos das partes de qualquer natureza acordo de

rateio de despesas processuais ()rdquo35

24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO

Sempre houve diversos questionamentos quanto agrave eficaacutecia do Direito processual Civil

e se o mesmo era meio apto a assegurar a tutela jurisdicional dos direitos dos cidadatildeos O

processo de execuccedilatildeo eacute o setor que sofre mais criacuteticas quanto a sua ineficiecircncia afinal a

execuccedilatildeo civil sempre foi o ldquocalcanhar de Aquilesrdquo do sistema processual pela praxe do

ldquoganhou (no processo de conhecimento) mas natildeo levou (na fase de cumprimento ou

execuccedilatildeo)rdquo 36

Essa dificuldade de se efetivar a tutela satisfastiva natildeo se resume a um problema de

mera teacutecnica processual tiacutepico de determinado ordenamento mas representa uma prova de

fogo da capacidade dos instrumentos jurisdicionais O autor Leonardo Greco37 no ano de

2005 atribuiu esse fato as seguintes causas o excesso de processos o custo e a morosidade da

justiccedila a inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios a ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais

um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico e a progressiva volatizaccedilatildeo dos bens

Quanto ao excesso de processos o referido autor aduz que ldquonos grandes centros o

crescimento da maacutequina judiciaacuteria natildeo acompanhou a expansatildeo do nuacutemero de litiacutegiosrdquo 38

O custo e morosidade da justiccedila prejudicam a tutela satisfativa posto que

ldquojaacute desfalcado pelo inadimplemento do devedor o credor ainda tem de arcar com o adiantamento das despesas do processo de execuccedilatildeo e de eventual liquidaccedilatildeo vendo arrastar-se a marcha dos atos executoacuterios facilmente retardada por atos procrastinatoacuterios do devedorrdquo 39

35 Ibid p 86 36 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca

para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018

37 GRECCO Leonardo A Crise do Processo de Execuccedilatildeo in Estudos de direito processual Leonardo Greco ndash Campos dos Goytacazes Ed Faculdade de Direito de Campos 2005 p 7

38 Ibid p 7 39 Ibid p 7-8

18 A inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios contribui para a crise do processo de

execuccedilatildeo tendo em vista que

ldquoo juiz da execuccedilatildeo prisioneiro de ritos que o distanciam das partes e da realidade da vida impulsiona sem qualquer apetite a execuccedilatildeo conduzindo-a ao sabor dos ventos das provocaccedilotildees impacientes do credor e das costumeiras procrastinaccedilotildees do devedorrdquo 40

Jaacute ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais atrapalha a efetivaccedilatildeo da tutela satisfativa ldquoo

devedor natildeo colabora com a execuccedilatildeo e os meios de pressatildeo que a lei estabelece natildeo satildeo

suficientes para intimidaacute-lordquo 41

Com um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico

O espiacuterito empresarial e a sociedade de consumo estimulam o endividamento das pessoas e o inadimplemento das obrigaccedilotildees pelo devedor deixou de ser vexatoacuterio e reprovaacutevel o que multiplica as accedilotildees de cobranccedila e execuccedilotildees atraveacutes das quais o sujeito passivo ainda usufrui vantagens agraves custas do credor 42

Por fim Leonardo Greco elenca a volatizaccedilatildeo dos bens como o uacuteltimo fator que

macula o processo executo tendo em vista que

ldquomudou inteiramente o perfil patrimonial das pessoas antes concentrado em bens de raiz e agora tendencialmente dirigido a investimentos em tiacutetulos e valores facilmente negociaacuteveis o que dificulta a sua localizaccedilatildeo pelo credorrdquo 43

O Coacutedigo de Processo Civil de 1973 introduziu o sistema executivo ao ordenamento

juriacutedico paacutetrio e seguindo os valores liberais da eacutepoca com a proteccedilatildeo de esfera juriacutedica de

liberdade do cidadatildeo contra a possibilidade de arbiacutetrio do Estado e uso indevido do Poder

jurisdicional outorgou o miacutenimo de poder ao juiz Seguindo as regras do CPC de 73 o

devedor soacute poderia ter sua esfera juriacutedica invadida atraveacutes de meios de execuccedilatildeo instituiacutedos

previamente em lei

Diante de tantos obstaacuteculos para se efetivar a tutela satisfativa a execuccedilatildeo estava

fadada ao fracasso o que frustrava a expectativa do jurisdicionado a uma prestaccedilatildeo da tutela

jurisdicional ceacutelere e efetiva Insatisfeitos com o cenaacuterio que se encontrava a atividade

40 Ibid p 8 41 Ibid p8 42 Ibid p 8 43 Ibid p8

19

executiva legisladores e operadores do direito natildeo mediram esforccedilos para promover uma

evoluccedilatildeo significativa buscando mais eficiecircncia e celeridade ao procedimento executoacuterio

Dessa forma no final de 1994 foi introduzido no coacutedigo de processo agrave flexibilizaccedilatildeo

dos poderes executoacuterios do juiz ldquopara que ele pudesse prestar uma tutela efetiva aos direitos

ficando autorizado a determinar a modalidade de execuccedilatildeo adequada a cada hipoacutetese nas

obrigaccedilotildees de fazer e natildeo fazer (art 461 sect5ordm do CPC de 1973)rdquo No ano de 2002 a referida

medida foi estendida para as obrigaccedilotildees de entregar coisa (art 461-A caput e sect3ordm do CPC de

1973)

Com fundamento nos artigos 461 e 461-A em 2005 a Lei nordm 11 23205 unificou o

processo de conhecimento e o processo de execuccedilatildeo de sentenccedila Nesse sentido Maacuterio

Henrique Cavalcanti Gil Rodrigues44 aduz que

A Lei 112322005 reuniu de forma definitiva os processos de conhecimento e de execuccedilatildeo em um uacutenico processo composto por um sistema bifaacutesico Assim passa a existir uma fase inicial (de reconhecimento) e uma fase posterior (de cumprimento de sentenccedila de efetivaccedilatildeo da decisatildeo definitiva) sem contar com a eventual fase intermediaacuteria de liquidaccedilatildeo (RODRIGUES 2010 p 38)

Ademais as alteraccedilotildees realizadas no CPC de 73 inseriu a atipicidade dos meios

executivos nas obrigaccedilotildees de fazer natildeo fazer e dar coisa certa entretanto exercendo papel

subsidiaacuterio aos meios tiacutepicos

Quanto agraves obrigaccedilotildees de pagar quantia havia apenas a possibilidade de se valer da

incidecircncia de multa do art 475-J do CPC de 73 ndash implementada mediante reforma perpetrada

pela Lei nordm 11232 de 2005 em atendimento a doutrina processualista preocupada com a

efetividade das decisotildees ndash e de atos executivos como a penhora de bens e dinheiro

Ainda que a execuccedilatildeo tenha avanccedilado com a inserccedilatildeo das leis posteriores a 1994 no

CPC de 1973 a mesma continuava insuficiente tendo em vista que a burocracia e lentidatildeo

dos atos executivos davam brechas para que o devedor escondesse seu patrimocircnio penhoraacutevel

tornando carente de efetividade e celeridade agrave execuccedilatildeo

44 RODRIGUES Maacuterio Henrique Cavalcanti Gil A evoluccedilatildeo da execuccedilatildeo de sentenccedila no direito

processual civil e o novo regime juriacutedico das sentenccedilas apoacutes a reforma implementada pela Lei 112322005 Revista do Tribunal Regional Federal da 1ordf Regiatildeo v 22 n 2 fev 2010 p 38

20

25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO

A tutela juridiscional eacute um direito fundamental previsto no art 5ordm inciso XXXV da

Carta Magna ldquo() a lei natildeo excluiraacute da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio lesatildeo ou ameaccedila a

direitordquo

Na visatildeo claacutessica o direito de accedilatildeo era efetivado com a prolaccedilatildeo de uma sentenccedila de

meacuterito posiccedilatildeo adotada por grande parte dos processualistas seguidores da doutrina de

Liebman Todavia esse conceito se mostra defasado tendo em vista que o direito de acesso agrave

justiccedila natildeo eacute apenas uma garantia formal de bater as portas do judiciaacuterio mas a garantia de

acesso agrave ordem juriacutedica justa adequada e eficaz45

Acreditar que uma sentenccedila de meacuterito favoraacutevel eacute tutela jurisdicional suficiente para

satisfazer o que se busca com o ajuizamento da accedilatildeo eacute uma visatildeo distorcida da atividade

satisfativa ldquoSob o ponto de vista do direito material a condenaccedilatildeo por si soacute eacute incapaz de

prestar a tutela do direitordquo46

Nessa oacutetica o direito fundamental agrave tutela executiva exige um sistema de tutela

jurisdicional ldquocapaz de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor

de tutela executivardquo47 Dessa forma entende-se que

ldquo() a) a interpretaccedilatildeo das normas que regulamentam a tutela executiva tem de ser feita no sentido de extrair a maior efetividade possiacutevel b) o juiz tem o poder-dever de deixar de aplicar uma norma que imponha uma restriccedilatildeo a um meio executivo sempre que essa restriccedilatildeo natildeo se justificar como forma de proteccedilatildeo a outro direito fundamental c) o juiz tem o poder-dever de adotar os meios executivos que se revelem necessaacuterios agrave prestaccedilatildeo integral de tutela executivardquo48

Egrave imperioso compreender que o direito fundamental agrave tutela executiva ratificado

pelo CPC eacute essencial para dirimir diversos litiacutegios oriundos do procedimento executivo

45 FERREIRA Gabriela Macedo Poder geral de efetivaccedilatildeo em defesa da constitucionalidade da

teacutecnica de execuccedilatildeo dos direitos do art 139 IV do Coacutedigo de Processo Civil Revista Jus Navigandi ISSN 1518-4862 Teresina ano 22 n 5178 4 set 2017 Disponiacutevel em lthttpsjuscombrartigos60190gt Acesso em 11 set 2018

46 Ibid natildeo paginado 47 DIDIER JR Fredie et al apud GUERRA Marcelo lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do credor

na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 48 Ibid p 102-104

21

ldquoprincipalmente aqueles relacionados agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo49

Fredie Didier et al50 cita como exemplo as hipoacuteteses de impenhorabilidade

A impenhorabilidade de certos bens eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa

Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais

Por esta razatildeo o legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do

CPC fazendo um preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses das partes envolvidas

optando pela mitigaccedilatildeo do direito do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado

Quando o oacutergatildeo jurisdicional verificar que a aplicaccedilatildeo das regras de

impenhorabilidade eacute desproporcional para o caso concreto deve afastaacute-la e construir a

soluccedilatildeo adequada para o referido caso Didier et al51 traz um exemplo esclarecedor em sua

obra

O bem imoacutevel que serve de moradia da famiacutelia eacute relativamente impenhoraacutevel Objetiva-se com essa restriccedilatildeo proteger o direito fundamental agrave moradia conteuacutedo do direito agrave proteccedilatildeo da dignidade Imagine-se um imoacutevel de altiacutessimo valor Imagine-se agora um creacutedito que corresponda a 40 do valor do imoacutevel A venda judicial do imoacutevel no caso permitiria natildeo soacute satisfazer o direito do credor como ainda garantir ao executado com a sobra a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel que lhe preserve a dignidade A opccedilatildeo pela interpretaccedilatildeo literal da regra que veda a penhora protegeria exclusivamente o direito do executado de maneira desnecessaacuteria porque a relaccedilatildeo valor executadovalor do bem permitiria a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel apoacutes a entrega do dinheiro ao credor Seria pois interpretaccedilatildeo em desconformidade com os preceitos da contemporacircnea hermenecircutica constitucional que preconiza a necessidade de nos casos de choque entre direitos fundamentais dar a interpretaccedilatildeo que mais adequadamente proteja a ambos

A execuccedilatildeo civil integra o direito fundamental agrave tutela jurisdicional disciplinando

que ldquoos dispositivos devem ser interpretados de modo que se garanta a maior efetividade

49 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66 50 Ibid p 66 51 Ibid p 67

22

possiacutevel agrave execuccedilatildeo desde que respeitados outros direitos fundamentaisrdquo52 Podendo ser

afastada desde que proporcional qualquer obstaacuteculo irrazoaacutevel agrave efetivaccedilatildeo desse direito

52 FERREIRA Gabriela Macedo apud MACEDO Lucas Buril de As eficaacutecias das decisotildees judiciais e

o cumprimento de sentenccedila no CPC15 Novo CPC Doutrina selecionada v 5 Execuccedilatildeo Coordenador geral Fredie Didier Jr organizadores Lucas Buril de Macedo Ravi Peixoto Alexandre Freire ndash Salvador Jus Podivm 2015 p 360361

23

3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO

EXECUTADO

31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS

Como forma de controlar a atividade jurisdicional por muito tempo vigorou o

entendimento de que a execuccedilatildeo somente poderia ser realizada atraveacutes dos meios executivos

tipicamente previstos na legislaccedilatildeo Segundo Luiz Guilherme Marinoni53

O princiacutepio da tipicidade deseja significar que os meios de execuccedilatildeo devem estar previstos na lei e assim que a execuccedilatildeo natildeo pode ocorrer atraveacutes de formas executivas natildeo tipificadas O seu objetivo eacute de um lado impedir que meio executivo natildeo previsto em lei possa ser utilizado e de outro garantir o jurisdicionado contra a possibilidade de arbiacutetrio judicial na fixaccedilatildeo da modalidade executiva Se o jurisdicionado sabe em razatildeo de previsatildeo legal que a sua esfera juriacutedica somente poderaacute ser invadida atraveacutes de determinadas modalidades executivas confere-se a ele a possibilidade de antever a reaccedilatildeo ao seu inadimplemento bem como a garantia de que a jurisdiccedilatildeo natildeo determinaraacute ou permitiraacute a utilizaccedilatildeo de meio executivo diverso daqueles previstos

Dessa forma o princiacutepio da tipicidade disciplina que o oacutergatildeo julgador ao proceder agrave

execuccedilatildeo estaacute limitado aos meios executivos previamente definidos em lei natildeo podendo se

valer de qualquer teacutecnica de efetivaccedilatildeo que natildeo se encaixasse nas hipoacuteteses taxativas da

legislaccedilatildeo

Entretanto o legislador natildeo tem como prever todas as peculiaridades dos direitos

dignos de tutela executiva e preordenar teacutecnicas executivas diversas para cada peculiaridade

Sob esse cenaacuterio o principio da tipicidade foi cedendo lugar ao principio da atipicidade dos

meios executivos

A ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do oacutergatildeo julgador estaacute cada vez mais presente

no ordenamento juriacutedico paacutetrio motivando um poder geral de efetivaccedilatildeo ldquoque permite ao

julgador valer-se dos meios executivos que considerar mais adequado ao caso concreto sejam

eles de coerccedilatildeo direta sejam de coerccedilatildeo indiretardquo 54

53 MARINONI Luiz Guilherme Teacutecnica processual e tutela dos direitos Satildeo Paulo Editora Revista

dos Tribunais 2004 p 212 nota 79 54 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 100

24

Essa tendecircncia de ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do juiz natildeo eacute exclusividade do

ordenamento juriacutedico brasileiro segundo Fredie Didier et al55

Michelle Taruffo jaacute apontava que o direito americano diante da inefetividade dos meios executivos at law comeccedilou a autorizar o magistrado a tomar medidas executivas adequadas ao caso concreto Trata-se afirma o jurista italiano de aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo segundo o qual as regras processuais devem ser adaptadas agraves necessidades do direito material

Os meios executivos atiacutepicos derivam de trecircs enunciados normativos do Coacutedigo de

Processo Civil o art 139 IV o art 297 e o sect1ordm do art 536

O art 139 IV do CPC dispotildee que pertence ao juiz o poder-dever de ldquodeterminar

todas as medidas indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para

assegurar o cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto

prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo

Jaacute o art 297 do CPC cuida da tutela provisoacuteria e garante que ldquoo juiz poderaacute

determinar as medidas que considerar adequadas para a efetivaccedilatildeo da tutela provisoacuteriardquo

Podendo dessa forma a dita tutela ser efetivada atipicamente

Por fim o art 536 sect1ordm do CPC dispotildee que

Para atender ao disposto no caput o juiz poderaacute determinar entre outras medidas a imposiccedilatildeo de multa a busca e apreensatildeo a remoccedilatildeo de pessoas e coisas o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva podendo caso necessaacuterio requisitar o auxilio de forccedila policial

As supracitadas medidas executivas atiacutepicas satildeo entendidas pela doutrina como

claacuteusulas gerais processuais executivas56 Essas claacuteusulas gerais natildeo restringem a sua

aplicaccedilatildeo agraves teacutecnicas de coerccedilatildeo indireta satildeo autorizados tambeacutem o uso de meios de execuccedilatildeo

dieta e indireta

Ademais cumpre salientar que o art 139 IV CPC aplica-se a toda e qualquer

atividade executiva ldquoa) seja fundada em tiacutetulo executivo judicial (provisoacuteria ou definitiva)

55 DIDIER JR Fredie et al apud TARUFFO Michelle A atuaccedilatildeo executiva dos direitos perfis

comparatiacutesticos Revista de Processo Satildeo Paulo RT 1990 n 59 p 78 56 Segundo Fredie Didier et al claacuteusula geral eacute uma espeacutecie de texto normativo cujo antecedente

(hipoacutetese faacutetica) eacute composto por termos vagos e consequente (efeito juriacutedico) eacute indeterminado

25

seja fundada em tiacutetulo executivo extrajudicial b) seja para efetivar prestaccedilatildeo pecuniaacuteria seja

para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer ou dar coisa distinta de dinheirordquo57

Jaacute o art 297 do CPC garante que a tutela provisoacuteria possa ser efetivada tambeacutem

atipicamente ldquoSucede que a atipicidade da tutela provisoacuteria segue necessariamente a

atipicidade da tutela definitivardquo 58

Por fim o comando do sect 1 ordmdo art 536 se aplica

a) inicialmente agrave execuccedilatildeo de fazer e de natildeo fazer fundada em decisatildeo judicial (provisoacuteria ou definitiva) b) por forccedila do sect 3ordm do art 538 tambeacutem se aplica ao cumprimento de sentenccedila para entrega de coisa c) por forccedila do art 771 paraacutegrafo uacutenico o dispositivo tambeacutem se aplica agrave execuccedilatildeo para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer e entregar coisa distinta de dinheiro fundada em tiacutetulo extrajudicial

Claramente o art 139 IV eacute mais amplo do que o sect 1 ordm do art 536 estende-se por

disposiccedilatildeo expressa agrave execuccedilatildeo de pagar quantia Sendo uma grande novidade nas obrigaccedilotildees

que tem por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15

O art 139 IV do CPC apresentou uma novidade agrave atipicidade dos meios executivos

ao disciplinar que cabe ao juiz ldquodeterminar todas as medidas indutivas coercitivas

mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o cumprimento de ordem judicial

inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo

A inovaccedilatildeo estaacute na possibilidade de utilizar os meios atiacutepicos para assegurar o

cumprimento de decisotildees que versam sobre as obrigaccedilotildees pecuniaacuterias sendo admitida a

utilizaccedilatildeo de outros meios ateacute na execuccedilatildeo de titulo judicial de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria aleacutem da

multa de 10 (a que se refere o artigo 523 sect 1ordm do CPC) para forccedilar o devedor a cumprir a

obrigaccedilatildeo pecuniaacuteria

57 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 105 58 Ibid p 105

26

Dessa forma eacute possiacutevel afirmar que ldquoao lado da disciplina tiacutepica do art 523 e

seguintes () o novo CPC inova ao permitir que o sistema de teacutecnicas executivas atiacutepicas

sejam empregadas na execuccedilatildeo monetaacuteriardquo59 (ZARONI VITORELLI 2016 p 66)

Fernando da Fonseca Gajardoni60 denomina a dita medida como a ldquorevoluccedilatildeo

silenciosardquo da execuccedilatildeo por quantia certa posto que

() pelo fato de que a regra natildeo estar propriamente incrustrada nos capiacutetulo e livro atinentes ao cumprimento de sentenccedila e ao processo de execuccedilatildeo ndash o art 139 IV do Novo CPC parece trazer ao paiacutes algo bastante novo cuja aplicaccedilatildeo a depender do comportamento do Judiciaacuterio pode implicar em verdadeira revoluccedilatildeo (positiva ou negativa) na sistemaacutetica executiva ateacute entatildeo vigente

Claramente o dispositivo foi recebido com entusiasmo por parte da doutrina que

anteciparam em afirmar que o princiacutepio da atipicidade dos meios executivos no CPC2015

ldquo() assume a feiccedilatildeo de poder-dever geral conferido ao magistrado de determinar () todas

as medidas coercitivas sub-rogatoacuterias mandamentais e indutivas que entender necessaacuterias

para a tutela justa efetiva e em tempo razoaacutevelrdquo 61

Dessa forma lecionam Luiz Guilherme Marinoni Seacutergio Cruz Arenhart e Daniel

Mitidiero62 que

O juiz a partir do art 139 IV do CPC2015 natildeo estaacute mais adstrito apenas agrave sentenccedila condenatoacuteria ndash que fixa a obrigaccedilatildeo de pagar e daacute ensejo agrave abertura da execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo patrimonial ndash para a tutela de prestaccedilotildees pecuniaacuterias Pode impor essa prestaccedilatildeo por meio de ordem judicial acoplada ao aceno de emprego de medida de induccedilatildeo (coercitiva ou de pressatildeo positiva) ou de medida de sub-rogaccedilatildeo (MARINONI ARENHARDT MITIDIERO 2015 p 703)

Deste modo em razatildeo do art 139 IV do CPC tem-se entendido que o juiz nas

execuccedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria possui a faculdade de adotar qualquer

59 ZARONI Bruno Marzullo VITORELLI Edilson Reforma e efetividade da execuccedilatildeo no novo CPC

In PEIXOTO Ravi FREIRE Alexandre MENDES Aluiacutesio Gonccedilalves de Castro Execuccedilatildeo 2 ed rev e atual Salvador JusPodivm 2016 766 p (Coleccedilatildeo novo CPC doutrina selecionada v 5) p 66

60 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia 24082015 JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Acesso em 23082018

61 LIMA Rafael de Oliveira A atipicidade dos meios executivos no coacutedigo de processo civil brasileiro de 2015 Revista de Processo Jurisdiccedilatildeo e Efetividade da Justiccedila v 2 n 2 juldez 2016 p 11

62 MARINONI Luiz Guilherme ARENHART Seacutergio Cruz MITIDIERO Daniel Novo curso de processo civil tutela dos direitos mediante procedimento comum Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 v 2 p 703

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medida indutiva coercitiva mandamentais ou sub-rogatoacuterias para efetivar o creacutedito do

exequente natildeo se limitando as medidas tiacutepicas

Alguns doutrinadores se precipitaram ao afirmar que o dito dispositivo ldquo() autoriza o

juiz a utilizar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir ressalvando-se a prisatildeo

civil constitucionalmente limitada ao devedor de alimentosrdquo 63 Acreditam Jorge Bheron

Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa que o entusiasmo por parte da

doutrina abre margem para as mais variadas formas de compelir o devedor a cumprir com a

prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

ldquoE aiacute persistindo no mau vezo de fazer explicaccedilotildees em abstrato ignorando que o sentindo soacute se daacute na aplicaccedilatildeo (situaccedilatildeo concreta real ou fictiacutecia) as sugestatildeo satildeo as mais engenhosas suspensatildeo de CNH retenccedilatildeo de passaporte restriccedilatildeo de fim de semana cancelamento de cartotildees de creacutedito ndash para ficar apenas nestasrdquo 64

Ou seja podendo o juiz natildeo apenas substituir o devedor tomando seu patrimocircnio para

entregar ao credor na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia como tambeacutem poderaacute

pressionaacute-lo psicologicamente a adimplir por conta proacutepria a obrigaccedilatildeo

Ademais o Enunciado nordm 48 do ENFAM avalia expressamente a possibilidade de

imposiccedilatildeo de medidas coercitivas para a efetivaccedilatildeo da execuccedilatildeo pecuniaacuteria Conforme o dito

enunciado

ldquoO art 139 inciso IV traduz um poder geral de efetivaccedilatildeo permitindo a aplicaccedilatildeo de medidas atiacutepicas para garantir o cumprimento de qualquer ordem judicial inclusive no acircmbito do cumprimento de sentenccedila e no processo de execuccedilatildeo baseado em tiacutetulosrdquo

Dessa forma o artigo 139 IV do CPC permite uma gama ampla de interpretaccedilotildees por

parte da doutrina por ser uma claacuteusula geral encontrando limite apenas na imaginaccedilatildeo de

quem o analisa Nesse sentido eacute forccediloso orientar e delimitar o manejo desse artigo legal para

que se extraia seu sentido e alcance revelando assim sobre que situaccedilotildees ele incide de que

modo e o que permite

63 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

64 Ibid sem paginaccedilatildeo

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32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER

GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO

O artigo 139 IV com a vigecircncia do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 abriu margem

para uma constelaccedilatildeo de decisotildees nas quais o dito dispositivo recebeu diversas interpretaccedilotildees

pelos operadores do direito

Sem duacutevidas por ser uma das pioneiras a decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara

Ciacutevel do Foro Regional de Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-

1320138260011 na data de 25 de agosto de 2016 gerou um enorme rebuliccedilo

Nessa accedilatildeo que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto

uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a

suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o

passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito

Segundo a magistrada o processo tramitava haacute anos sem que nenhum valor tenha sido

pago ao exequente aleacutem do devedor natildeo ter oferecido proposta de acordo e nem ter indicado

bens agrave penhora configurando uma completa desiacutedia com o processo

ldquoO caso tratado nos autos se insere dentre as hipoacuteteses em que eacute cabiacutevel a aplicaccedilatildeo do art 139 inciso IV do Coacutedigo de Processo Civil Isso porque o processo tramita desde 2013 sem que qualquer valor tenha sido pago ao exequente Todas as medidas executivas cabiacuteveis foram tomadas sendo que o executado natildeo paga a diacutevida natildeo indica bens agrave penhora natildeo faz proposta de acordo e sequer cumpre de forma adequada as ordens judiciais frustrando a execuccedilatildeo

Se o executado natildeo tem como solver a presente diacutevida tambeacutem natildeo recursos para viagens internacionais ou para manter um veiacuteculo ou mesmo manter um cartatildeo de creacutedito Se poreacutem mantiver tais atividades poderaacute quitar a diacutevida razatildeo pela qual a medida coercitiva poderaacute se mostrar efetiva

Assim como medida coercitiva objetivando a efetivaccedilatildeo da presente execuccedilatildeo defiro o pedido formulado pelo exequente e suspendo a Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo do executado M A S determinando ainda a apreensatildeo de seu passaporte ateacute o pagamento da presente diacutevida

()

Determino ainda o cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado ateacute o pagamento da presente diacutevida ()rdquo

Foi impetrado Habeas Corpus no Tribunal de Justiccedila do Estado de Satildeo Paulo a favor

do executado sob o fundamento que a coaccedilatildeo era ilegal e afetava o direito de locomoccedilatildeo

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garantido constitucionalmente Tendo sido concedida a liminar em decisatildeo que ora se

reproduz

Em que pese a nova sistemaacutetica trazida pelo art 139 IV do CPC2015 deve-se considerar que a base estrutural do ordenamento juriacutedico eacute a Constituiccedilatildeo Federal que em seu art 5ordm XV consagra o direito de ir e vir Ademais o art 8ordm do CPC2015 tambeacutem preceitua que ao aplicar o ordenamento juriacutedico o juiz natildeo atentaraacute apenas para a eficiecircncia do processo mas tambeacutem aos fins sociais e agraves exigecircncias do bem comum devendo ainda resguardar e promover a dignidade da pessoa humana observando a proporcionalidade a razoabilidade e a legalidade Por tais motivos concedo a liminar pleiteada65

Cabe destacar aqui o voto vencido da Desembargadora Maria Luacutecia Pizzotti no

julgamento do Habeas Corpus supracitado demonstrando que o debate sobre a abrangecircncia

do artigo 139 IV do CPC ocorre tanto na doutrina quanto no judiciaacuterio

O objetivo do novel dispositivo natildeo eacute impor penas ou restringir direitos natildeo sendo intenccedilatildeo do Judiciaacuterio suspender indefinidamente o direito de dirigir do executado ou sua liberdade de viajar mas sim impor uma restriccedilatildeo tatildeo gravosa caso ele natildeo cumpra a determinaccedilatildeo que escolha cumprir sua obrigaccedilatildeo e dar fim ao problema Em outras palavras mediante as medidas de coerccedilatildeo o Estado procura persuadir o inadimplente impondo-lhe situaccedilotildees tatildeo onerosas e inconvenientes que em algum momento seja para ele mais vantajoso cumprir do que permanecer no inadimplemento

Ao fazecirc-lo o Novo Coacutedigo de Processo Civil rompe com as criacuteticas da ineficiecircncia das execuccedilotildees Natildeo se cogita deferir medidas restritivas agravequeles que demonstram a incapacidade absoluta de solver o deacutebito apenas agravequeles que reconhecidamente se valem de artimanhas e subterfuacutegios para evitar a satisfaccedilatildeo das diacutevidas ldquopreferindordquo outras despesas mais lsquonobresrsquo agindo em nome de terceiros e fazendo escaacuternio dos credores e do proacuteprio Poder Judiciaacuterio (hellip)

Para tanto memoraacutevel a noccedilatildeo de que a medida em comento tem caraacuteter excepcional e encontra limites no plano da proporcionalidade como sustenta o ilustrado Magistrado paulista Fernando da Fonseca Gajardoni Professor Faculdade de Direito de Ribeiratildeo Preto da USP (in httpswwwjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 acesso em 091216 agraves 11h20min) E para anaacutelise da proporcionalidade a ponderaccedilatildeo deve observar os trecircs passos apontados pela doutrina a necessidade a adequaccedilatildeo e a proporcionalidade em sentido estrito

65 TJSP - Habeas Corpus Processo nordm 2183713-8520168260000 30ordf Cacircmara Direito Privado relator

Des Marcos Ramos j 290317

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Ademais no entendimento de Jorge Amaury Maia Nunes e Guilherme Pupe de

Noacutebrega66 essa decisatildeo releva os perigos trazidos pelo art 139 IV do CPC ao confrontar

direitos constitucionalmente garantidos

De nossa parte entendemos que a liberdade de locomoccedilatildeo inserta no inciso XV do artigo 5ordm que abrange o direito de deixar o territoacuterio nacional sofre embaraccedilo indevido pela apreensatildeo de passaporte ou pela suspensatildeo da carteira nacional de habilitaccedilatildeo

()

Agrave luz da exposiccedilatildeo feita acima e em anaacutelise primeva sustentamos que o artigo 139 IV do CPC de 2015 estaacute a merecer declaraccedilatildeo de inconstitucionalidade sem reduccedilatildeo de texto para o fim de rechaccedilar a apreensatildeo de passaporte a suspensatildeo do direito de dirigir e a vedaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo em concurso ou em licitaccedilatildeo puacuteblicos como medidas passiacuteveis de serem adotadas pelo juiz sob pena de vulneraccedilatildeo aos artigos 1ordm IV 5ordm XV e LIV 37 I 173 sect 3ordm III e 175 todos da Constituiccedilatildeo

Apesar de ter sofrido duras criacuteticas a decisatildeo do processo de nordm 4001386-

1320138260011 serviu de inspiraccedilatildeo para tantas outras decisotildees no mesmo sentido

Foi o caso da decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de Satildeo

Vicente em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 0020724-2620088260590 na data de 21 de

junho de 2017

A supracitada execuccedilatildeo se arrastava por nove (09) anos sem que o devedor tenha

esboccedilado qualquer intenccedilatildeo de pagar a diacutevida O credor requereu a suspensatildeo da Carteira

Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado apreensatildeo do passaporte e cancelamento dos

cartotildees de creacutedito

O magistrado com embasamento no artigo 139 IV do CPC deferiu parcialmente o

pedido sob o fundamento de que a apreensatildeo de passaporte e CNH natildeo viola o direito de ir e

vir do devedor Entretanto o juiz indeferiu o pedido de cancelamento do cartatildeo de creacutedito por

acreditar que a suspensatildeo poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado tendo em

vista que atualmente as pessoas utilizam o referido cartatildeo para pagamento das despesas

diaacuterias

66 NOBREacuteGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139

IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018

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Eacute evidente que as medidas atiacutepicas de coerccedilatildeo devem ser utilizadas com cautela sempre respeitando a dignidade da pessoa do executado Natildeo se vislumbra contudo que as medidas aqui eleitas sejam capazes de vulnerar os Direitos Fundamentais do indiviacuteduo A uma porque natildeo se trata de restriccedilatildeo ao direito de ir e vir do executado que continua no gozo de plena liberdade de locomoccedilatildeo a duas porque a conduccedilatildeo de veiacuteculo automotor eacute mera comodidade da vida moderna natildeo se tratando de direito absoluto

Com mais razatildeo ainda se admite a suspensatildeo do Passaporte do executado que se natildeo paga a diacutevida da execuccedilatildeo natildeo deve ter o direito de fazer viagem internacional

Tem-se aqui verdadeiro exerciacutecio de ponderaccedilatildeo de interesses juriacutedicos de um lado jaz o direito de creacutedito do exequente que deriva do direito de propriedade e por isso mesmo tem envergadura constitucional de outro giro tem-se o direito do executado agrave autorizaccedilatildeo do Estado para conduzir veiacuteculo automotor e realizar viagens internacionais que natildeo se mostram essenciais agrave dignidade da pessoa humana Natildeo haacute duacutevidas pois de que eacute este uacuteltimo que deve sucumbir

O pedido fica indeferido apenas no tocante agrave suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado Eacute que ao contraacuterio da CNH e do passaporte que trazem consigo certa presunccedilatildeo de riqueza natildeo se pode concluir que o uso de cartatildeo de creacutedito eacute feito por luxo ou simples conveniecircncia

Como eacute cediccedilo os cartotildees de creacutedito oferecem ao seu titular creacutedito raacutepido e rotativo para o pagamento de despesas diaacuterias e certamente exercem funccedilatildeo essencial agravequeles que se encontram em situaccedilatildeo financeira precaacuteria

A suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado portanto se revela medida desproporcional e que inclusive poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado

Pelo exposto defiro em parte o pedido formulado pelo exequente e DETERMINO a suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo e bem como a suspensatildeo da validade (cancelamento temporaacuterio) no sistema SINPA de eventuais passaportes vaacutelidos em nome do executado

Dessa forma o artigo 139 IV do CPC revolucionou completamente a execuccedilatildeo de

obrigaccedilatildeo de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria ao permitir a utilizaccedilatildeo do uso dos meios executivos

atiacutepicos para compelir o executado a satisfazer o creacutedito do exequente

33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE

EFETIVACcedilAtildeO

Era inevitaacutevel que o artigo 139 IV do CPC gerasse todo tipo de reaccedilatildeo entre os

doutrinadores do processo civil e ateacute mesmo de outros ramos do direito devido a sua

capacidade de realizar uma completa inovaccedilatildeo na forma de se executar as obrigaccedilotildees de pagar

quantia Alguns o aplaudiram visualizando nele ldquouma luz no fim do tuacutenelrdquo outros o

criticaram vislumbrando as arbitrariedades que poderiam ser praticadas com embasamento no

referido dispositivo

32

As decisotildees suscitadas em linhas preteacuteritas auxiliaram para fervilhar ainda mais o

debate sobre o tema tendo em vista que por um lado poderia aumentar a efetividade das

execuccedilotildees por quantia no entanto por outro surgiam questionamentos a cerca da sua

constitucionalidade

A doutrina parece que demoraraacute a se pacificar sobre o tema Segundo alguns

doutrinadores seraacute inconstitucional toda restriccedilatildeo que recaia sobre a pessoa do devedor e natildeo

exclusivamente sobre o seu patrimocircnio Jaacute para outros o dispositivo eacute constitucional e o meio

mais eficaz para se resolver o problema da efetivaccedilatildeo das execuccedilotildees de pagar quantia ldquoA

discussatildeo se daacute especialmente no que diz respeito aacutes medidas de suspensatildeo de CNH

apreensatildeo de passaporte e bloqueio de cartotildees de creacutedito do devedorrdquo 67

O professor Thiago Rodovalho analisou detalhadamente a decisatildeo de nordm 4001386-

1320138260011 em seu artigo ldquoO necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na

concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivosrdquo 68 Quanto agrave suspensatildeo da CNH o autor

acredita que tal medida natildeo viola qualquer direito fundamental do devedor posto que ldquodirigir

veiacuteculos automotores eacute direito do cidadatildeo mas natildeo se confunde com os direitos fundamentais

e social de ir-e-vir e ao transporterdquo 69 O professor eacute categoacuterico ao afirmar que

Com relaccedilatildeo agrave suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (suspensatildeo do direito de dirigir restriccedilatildeo de direitos) natildeo nos parece haver qualquer violaccedilatildeo a direito fundamental ou social nem a direito da personalidade ou colocaccedilatildeo do devedor em situaccedilatildeo desproporcionalmente detrimentosa exceccedilatildeo feita aos que usam o veiacuteculo como instrumento de trabalho atraindo a hipoacutetese do NCPC art 833 inc V

()

Outrossim natildeo o consideramos como direito da personalidade Os direitos da personalidade satildeo os valores fundamentais que compotildeem o proacuteprio ser justamente por isso intransmissiacuteveis e irrenunciaacuteveis natildeo podendo o seu exerciacutecio sofrer limitaccedilatildeo voluntaacuteria (CC art 11) Por mais que vivamos num paiacutes que tanto valoriza o carro e que muitas pessoas de fato se compreendam em razatildeo e em funccedilatildeo do carro que dirijam este natildeo nos parece ser um direito que verdadeiramente componha a personalidade do indiviacuteduo70

67 DONTOS Sofia Poderes executoacuterios do juiz que diz a doutrina sobre o art 139 inc IV do CPC

Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigospoderes-executorios-do-juiz-que-diz-a-doutrina-sobre-art-139-inc-iv-do-cpc-23052018 gt Publicado em 23052018 Acesso em 01082018

68 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018

69 Ibid sem paginaccedilatildeo 70 Ibid sem paginaccedilatildeo

33

Quanto ao cancelamento dos cartotildees de credito do devedor o professor Thiago

Rodovalho tambeacutem acredita que natildeo haacute qualquer violaccedilatildeo ao direito fundamental social ou

da personalidade do devedor e acrescenta que

Tanto assim o eacute que ser titular de um cartatildeo de creacutedito pressupotildee ter creacutedito o que eacute analisado e concedido por instituiccedilotildees financeiras mais do que isso se porventura passando por dificuldades financeiras a pessoa deixa de honrar com pagamentos a mesma instituiccedilatildeo financeira concedente do cartatildeo de creacutedito pode sponte propria cancelaacute-lo ou recusar-lhe a concessatildeo Ora parece-me contraditoacuterio que instituiccedilotildees financeiras para sua proteccedilatildeo patrimonial possam ferir esse suposto ldquodireito fundamentalrdquo ou esse suposto ldquodireito da personalidaderdquo mas natildeo possa o Poder Judiciaacuterio igualmente fazecirc-lo contra aquele devedor moroso que instado ao pagamento e frustradas todas as tentativas de constriccedilatildeo patrimonial leva vida luxuosa valendo-se de cartotildees de creacutedito que prescindem de dinheiro em conta eacute dizer podem justamente funcionar como forma de ocultar renda e patrimocircnio71

O autor considera a apreensatildeo de passaporte um tema mais polecircmico e que merece

maior reflexatildeo No entanto crecirc que eacute possiacutevel a apreensatildeo de passaporte sem violar os

direitos fundamentais do devedor por se tratar de um direito de ir e vir de amplitude especial

Agrave primeira vista a possibilidade de apreensatildeo do passaporte tambeacutem nos parece possiacutevel pois tambeacutem se trata de um direito de ir e vir de amplitude especial Assim o eacute pois salvo situaccedilotildees especiais (refugiados p ex) haacute a necessidade de demonstrar condiccedilotildees financeiras de estadia e retorno para ser admitido no paiacutes de destino Ou seja pressupotildee uma condiccedilatildeo financeira que o devedor justamente diz natildeo possuir Sem embargo dessa consideraccedilatildeo esse ainda eacute um ponto que merece uma reflexatildeo mais acurada sendo essa apenas uma primeira impressatildeo72

Outros autores escreveram sobre o tema como eacute o caso do processualista Luiz

Dellore73 que tambeacutem defende que as medidas atiacutepicas como restriccedilatildeo ao direito de dirigir

apreensatildeo de passaporte e cancelamento de cartotildees de creacutedito satildeo permitidas e natildeo violam em

regra os direitos fundamentais do devedor

De minha parte creio que efetivamente haacute inovaccedilatildeo no at 139 IV do NCPC (e natildeo mera repeticcedilatildeo do que jaacute havia no Coacutedigo anterior) que tem o condatildeo de trazer mais efetividade ao processo executivo no Brasil ndash que por deacutecadas centrou sua atenccedilatildeo na defesa do executado (vide a grande quantidade de impenhorabilidades) sem dar maior atenccedilatildeo ao creacutedito do exequente

71 Ibid sem paginaccedilatildeo 72 Ibid sem paginaccedilatildeo 73 DELLORE Luiz NCPC Atipicidade das medidas executivas jaacute eacute realidade Disponiacutevel em lt

httpswwwjotainfoopiniao-e-analisecolunasnovo-cpcncpc-atipicidade-de-medidas-executivas-ja-e-realidade-17042017 gt Publicado em 17042017 Acesso em 03092018

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Logo a meu ver medidas como (i) restriccedilatildeo ao direito de dirigir (ii) apreensatildeo de passaporte (iii) cancelamento de cartotildees de creacutedito e (iv) vedaccedilatildeo de obtenccedilatildeo de novos empreacutestimos se natildeo vinculados ao pagamento do deacutebito exequendo dentre outras restriccedilotildees que deveratildeo ser observadas a cada caso satildeo permitidas pelo sistema do NCPC e em regra natildeo violam direitos fundamentais do devedor E tecircm o condatildeo de fazer com que o executado que tem recursos diante dessas medidas coercitivas pague o deacutebito trazendo sucesso agrave satisfaccedilatildeo do creacutedito

Nessa linha para Alexandre Fuchs das Neves74 o artigo 139 IV do CPC conferiu ao

juiz poderes coercitivos capazes de ldquotransformar a vida do devedor um infernordquo para compeli-

lo a cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria Entretanto pondera que para que a medida tenha

validade ldquoeacute necessaacuteria uma fundamentaccedilatildeo por evidente uma correlaccedilatildeo temaacutetica entre a

medida adotada e sua efetividade em face ao processo com fundamentaccedilatildeo detalhadardquo

No entendimento de Fernando Gajardoni75 satildeo possiacuteveis as medidas de apreensatildeo de

passaporte bloqueio de cartotildees de creacutedito e suspensatildeo da CNH Para ele o que limita o art

139 IV do CPC eacute o esgotamento dos meios tiacutepicos e a real necessidade da medida

Ilustrativamente natildeo efetuado o pagamento de diacutevida oriunda de multas de tracircnsito e superados os expedientes tradicionais de adimplemento (penhora de dinheiro e bens) seria liacutecito o estabelecimento da medida coercitivaindutiva de suspensatildeo do direito a conduzir veiacuteculo automotor ateacute pagamento do deacutebito (inclusive com apreensatildeo da CNH do devedor) natildeo efetuado pagamento de verbas salariais devidas a funcionaacuterios da empresa possiacutevel o estabelecimento de vedaccedilatildeo agrave contrataccedilatildeo de novos funcionaacuterios ateacute que seja saldada a diacutevida natildeo efetuado o pagamento de financiamento bancaacuterio na forma e no prazo avenccedilados possiacutevel ateacute que se tenha a quitaccedilatildeo que se obstem novos financiamentos ou mesmo a participaccedilatildeo do devedor em licitaccedilotildees (como de ordinaacuterio jaacute acontece com pessoas juriacutedicas em deacutebito tributaacuterio com o Poder Puacuteblico) etc

Teriacuteamos entatildeo no Brasil por assim dizer a adoccedilatildeo do padratildeo da atipicidade das medidas executivas tambeacutem para as obrigaccedilotildees de pagar vistas estas como ordens do EstadoJuiz para que haja prestaccedilatildeo de pagamento em pecuacutenia

()

Por isso ndash a prevalecer a interpretaccedilatildeo potencializada do art 139 IV do CPC2015 ndash o emprego de tais medidas coercitivasindutivas especialmente nas obrigaccedilotildees de pagar encontraraacute limite certo na excepcionalidade da medida (esgotamento dos meios tradicionais de satisfaccedilatildeo do deacutebito) na proporcionalidade (inclusive agrave luz da regra da menor onerosidade ao devedor do art 805 do CPC2015) na necessidade de fundamentaccedilatildeo substancial e especialmente nos direitos e garantias assegurados na Constituiccedilatildeo Federal (vg natildeo parece possiacutevel que se determine o pagamento sob pena de prisatildeo ou de vedaccedilatildeo ao exerciacutecio da profissatildeo do direito de ir e vir etc)

74 NEVES Alexandre Fuchs das Cancelamento de cartotildees de creacutedito e apreensatildeo de CNH e passaporte

do devedor Isso eacute possiacutevel Disponiacutevel em lt httpwwwsinfacspcombrconteudocancelamento-de-cartoes-de-credito-e-apreensao-de-cnh-e-passaporte-do-devedor-isso-e-possivel gt Acesso em 30082018

75 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Publicado em 24082015 Acesso em 30082018

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Jaacute Fernanda Tartuce76 acredita que tais medidas satildeo problemaacuteticas e devem ser

analisadas com cautela tendo em vista que ao inveacutes de afetarem o patrimocircnio do devedor

atingem a proacutepria pessoa

Sob certo prisma adotar medidas diferenciadas contribui para a efetividade da prestaccedilatildeo jurisdicional Por outro lado o patrimocircnio ndash e natildeo a pessoa do devedor - responde por diacutevidas aleacutem disso o exerciacutecio de amplos poderes pelo juiz sem balizas especiacuteficas pode ensejar medidas inadequadas Nessa linha suspender o direito de dirigir e restringir o uso de passaporte satildeo iniciativas problemaacuteticas por atingirem a pessoa do devedor enquanto a penhora da restituiccedilatildeo de Imposto de Renda soa viaacutevel por afetar seu patrimocircnio Eacute importante que a medida diferenciada se revele proporcional e seja aplicada apoacutes o exaurimento de outros meios previstos no ordenamento Como a proposta do Novo Coacutedigo eacute aumentar a eficiecircncia processual intentar medidas ineficazes inexequiacuteveis eou de difiacutecil fiscalizaccedilatildeo pode acabar ensejando o efeito contraacuterio

Nessa senda Lenio Streck e Dierle Nunes77 entendem que as medidas atiacutepicas de

suspensatildeo da CNH eou apreensatildeo de passaporte satildeo inconstitucionais Afirmam que natildeo se

pode confundir o processo civil e penal ainda que ambos remetam a um ldquoparadigma

constitucional comumrdquo e que o artigo 139 IV do CPC ldquoimpotildee novos desafios interpretativos

que podem conduzir a uma anaacutelise superficial e utilitarista de busca de resultados que

desprezem a necessaacuteria leitura constitucionalrdquo Os autores ainda ponderam que ldquoO perigo eacute o

artigo 139 IV ser transformado em instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com

autorizaccedilatildeo judicialrdquo

O professor Araken de Assis no dia 18 de abril de 2018 em um evento sobre o

Coacutedigo Processual Civil de 2015 que ocorreu em Brasiacutelia na sede do Conselho Federal da

OAB declarou ser contraacuterio aos poderes executoacuterios atiacutepicos ldquoSou contra os poderes

atiacutepicos dos juiacutezes porque seu exerciacutecio redunda em simples arbitrariedadesrdquo78

Acrescentou ainda que

76 IBDFAM ndash Instituto Brasileiro de Famiacutelia O polecircmico inciso IV do artigo 139 do CPC e suas difusas

interpretaccedilotildees Disponiacutevel em lt httpwwwibdfamorgbrnoticias6096O+polC3AAmico+inciso+IV+do+artigo+139+do+CPC+e+suas+difusas+interpretaC3A7C3B5es gt Publicado em 31082016 Acesso em 04092018

77 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018

78 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04092018

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Eacute evidentemente inconstitucional diante do princiacutepio da dignidade da pessoa humana tirar o passaporte carteira de habilitaccedilatildeo Quecirc que tem isso com diacutevidas Natildeo tem absolutamente nada Natildeo eacute a correlaccedilatildeo instrumental entre o objetivo da execuccedilatildeo e o meio empregado Isso eacute simples vinganccedila simples puniccedilatildeo79

O professor Araken de Assis acredita que tais medidas satildeo inconstitucionais e

violam o principio da dignidade humana do executado numa sociedade como a nossa

sedenta por puniccedilatildeo natildeo me surpreende que essas ideias sejam encaradas com

naturalidade Mas eacute preciso rejeitaacute-las em nome de princiacutepios 80

34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO

A Constituiccedilatildeo Federal de 1988 tem como um dos seus fundamentos a dignidade da

pessoa humana presente no artigo 1ordm inciso III do referido texto constitucional O dito

princiacutepio tem o escopo de nortear o ordenamento juriacutedico como um todo

A inclusatildeo da dignidade da pessoa humana como princiacutepio constitucional obrigou

uma reflexatildeo sobre o papel da pessoa humana no direito e um redimensionamento para

elevaacute-la ao centro do ordenamento juriacutedico81 Eacute necessaacuterio recorrer agrave teoria Kantiana para

que se obtenha uma definiccedilatildeo do princiacutepio ora estudado Para Kant82 o homem eacute um fim

em si mesmo natildeo uma funccedilatildeo do Estado Ou Naccedilatildeo O Estado e o direito devem estar

organizados em benefiacutecio do indiviacuteduo

Agora eu afirmo o homem ndash e de uma maneira geral todo o ser racional ndash existe como fim em si mesmo e natildeo apenas como meio para o uso arbitraacuterio desta ou daquela vontade Em todas as suas accedilotildees pelo contraacuterio tanto nas direcionadas a ele mesmo como nas que o satildeo a outros seres racionais deve ser ele sempre considerado simultaneamente como fim

Partindo da premissa de que para Immanuel Kant o homem eacute o fim em si mesmo

ldquodevemos compreender que a dignidade da pessoa humana eacute a noccedilatildeo o comando a direccedilatildeo

que se deve seguir funcionando como fundamento para a interpretaccedilatildeo de todos os direitos e

garantias conferidos agrave pessoa nos ordenamentos juriacutedicos de cada Estadordquo 83

79 Ibid sem paginaccedilatildeo 80 Ibid sem paginaccedilatildeo 81 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito

fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 461 82 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud KANT Immanuel Fundamentaccedilatildeo da metafiacutesica dos costumes

Satildeo Paulo Martin Claret 2003 p56-59 Coleccedilatildeo A Obra-Prima de Cada Autor 83 SCHIAFIANO Juliana Rocha op cit p 461

37

O princiacutepio constitucional da dignidade da pessoa humana estaacute diretamente ligado ao

conteuacutedo dos direitos fundamentais logo para que se cumpra com os direitos fundamentais

constitucionalmente instituiacutedos eacute necessaacuterio reconhecer e respeitar a dignidade da pessoa

humana conforme disciplina Ingo Sarlet84

Em suma o que se pretende sustentar de modo mais enfaacutetico eacute que a dignidade da pessoa humana na condiccedilatildeo de valor (principio normativo) fundamental que atrai o conteuacutedo de todos os direitos fundamentais exige e pressupotildee o reconhecimento e proteccedilatildeo dos direitos fundamentais de todas as dimensotildees (ou geraccedilotildees se assim preferirmos) Assim sem que se reconheccedilam agrave pessoa humana os direitos fundamentais que lhe satildeo inerentes em verdade estarse-aacute lhe negando a proacutepria dignidade A consagraccedilatildeo constitucional da dignidade da pessoa humana tem o propoacutesito de limitar a atuaccedilatildeo ou a omissatildeo do Estado para garantir os direitos do indiviacuteduo Assim eacute difiacutecil precisar os efeitos da norma que determina a dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado (como acontece com a Constituiccedilatildeo brasileira de 1988) poreacutem quando desrespeitados os direitos fundamentais do cidadatildeo eacute possiacutevel identificar que a dignidade deste foi violada

Logo ldquoteraacute respeitada a sua dignidade o individuo que tiver respeitados os seus

direitos fundamentaisrdquo 85 Os direitos fundamentais estatildeo apresentados na Constituiccedilatildeo

Federal da seguinte forma direitos individuais e coletivos direitos sociais direitos poliacuteticos e

direitos de nacionalidade que tecircm como escopo garantir as liberdades positivas aos

indiviacuteduos ldquoonde foram conquistados direitos agrave liberdade religiosa liberdade civil e

profissional agrave propriedade ao livre acesso ao Judiciaacuterio agrave ampla defesa e ao contraditoacuterio no

processual judicial ao sigilo de dados e informaccedilotildees pessoais entre outros que somados

garantem o cidadatildeo uma vida dignardquo 86

O cidadatildeo na Constituiccedilatildeo Federal de 88 diferente das constituiccedilotildees brasileiras

anteriores passou a ser fundamento e ganhou destaque nos direitos fundamentais tendo

garantida a sua vida a sua dignidade a sua seguranccedila a sua honra a sua liberdade e a sua

propriedade

84 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud SARLET Ingo Wolfgang Dignidade da pessoa humana e

direitos fundamentais na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 2ed Porto Alegre Livraria do Advogado 2002 p87 85 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito

fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 462 86 Ibid p 462

38

Segundo Carmem Luacutecia Antunes Rocha87 para garantir o Estado Democraacutetico de

Direito eacute necessaacuterio que a sua atuaccedilatildeo seja sempre em conformidade com o princiacutepio da

dignidade da pessoa humana

O Estado somente eacute democraacutetico em sua concepccedilatildeo constitucionalizaccedilatildeo e atuaccedilatildeo quando respeita o princiacutepio da dignidade da pessoa humana Natildeo haacute verbo constitucional natildeo haacute verbo governamental que se faccedilam legiacutetimos quando natildeo se voltam ao atendimento daquele princiacutepio Natildeo haacute verdade constitucional natildeo haacute suporte institucional para as poliacuteticas puacuteblicas que natildeo sejam destinadas ao pleno cumprimento daquele valor maior transformado em princiacutepio constitucional

O princiacutepio da dignidade humana constitucionalmente garantido impotildee limites ao

Estado compelindo aos oacutergatildeos e atividades estatais respeitar o ser humano e garanti-lo

condiccedilotildees miacutenimas para uma vida digna Dessa forma eacute niacutetido que o dito princiacutepio eacute

pressuposto e indispensaacutevel para legitimar outras normas constitucionais e

principalmente infraconstitucionais

O Coacutedigo de Processo Civil eacute umas das principais normas infraconstitucionais que

sofre influecircncia dos preceitos valores e princiacutepios esculpidos na Constituiccedilatildeo Federal

Logo como o principio da dignidade humana eacute um dos mais importantes pressupostos

constitucionais ldquoentatildeo eacute tranquilo afirmar-se que o novel ordenamento processual tem

de se render nas resoluccedilotildees dos aspectos processuais e a fim de se atingir uma soluccedilatildeo

justa adequada e efetiva ao postulado da dignidade da pessoa humanardquo 88

Dessa forma o legislador deve formular as normas infraconstitucionais de acordo e a

partir do conteuacutedo constitucional para Marinoni Mitidiero e Arenhart89

() o Coacutedigo de Processo Civil constitui direito constitucional aplicado O Coacutedigo deve ser interpretado de acordo com a Constituiccedilatildeo e com os direitos fundamentais o que significa que as duacutevidas interpretativas devem ser resolvidas a favor da otimizaccedilatildeo do alcance da Constituiccedilatildeo e do processo civil como meio para tutela de direitos

87 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud ROCHA Carmen Luacutecia Antunes O princiacutepio da dignidade da

pessoa humana e a exclusatildeo social Revista Interesse Puacuteblico n4 p23-48 1999 p33 88 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o

novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 367

89 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 14

39

Com o escopo de conferir eficaacutecia aos mandamentos constitucionais o CPC15 traz a

previsatildeo e diversas claacuteusulas gerais em seus primeiros artigos em um dos quais se

prestigia o princiacutepio da dignidade da pessoa humana

O referido princiacutepio estaacute disciplinado no artigo 8ordm do CPC15 e atua como um guia

sobre as demais normas do coacutedigo processual Eacute o que entende Nelson Rosenvald90

O maior cuidado do inteacuterprete eacute no sentido de jamais banalizar a dignidade fazendo dela um elixir processual tal como muitas vezes se vecirc na esfera do direito civil Penso que natildeo haacute maiores dificuldades em transpor a noccedilatildeo constitucional do princiacutepio para em seguida adaptaacute-la agraves singularidades do processo

Logo de acordo com o artigo 8ordm do CPC o oacutergatildeo julgador ao aplicar o ordenamento

juriacutedico deve resguardar a dignidade da pessoa humana Para Fredie Didier91 ldquoresguardar

nesse contexto eacute de um lado aplicar corretamente a norma juriacutedica lsquoproteccedilatildeo da dignidade

da pessoa humanarsquo e de outro natildeo violar a dignidaderdquo

O oacutergatildeo julgador deveraacute manter um comportamento ativo com o objetivo de promover

a dignidade da pessoa humana podendo tomar medidas de ofiacutecio para efetivar a dignidade da

pessoa humana Didier assevera que o magistrado poderaacute ainda ldquovaler-se da claacuteusula geral de

atipicidade (art 536 sect 1ordm) para a execuccedilatildeo do direito fundamental agrave dignidaderdquo 92 O autor

ainda traz dois exemplos

a) exigecircncia de respeito agrave ordem cronoloacutegica de conclusatildeo (art 12) caso de grave violaccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana que natildeo se encaixe em um dos incisos que excepcionam a regra de observacircncia da cronologia da conclusatildeo poderia o juiz ldquofurar a filardquo para promover a dignidade da pessoa humana b) prioridade na tramitaccedilatildeo processual pessoa que seja portadora de doenccedila grave mas que natildeo esteja no rol do art 1048 I para promover a dignidade de pessoa humana o juiz poderia determinar o processamento prioritaacuterio93

Essa dupla garantia ndash resguardo e promoccedilatildeo ndash tem como objetivo garantir ao individuo

sua dignidade humana fazendo com que ldquode um lado que o Estado natildeo a viole e de outro

que o Estado a promova e efetiverdquo

90 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud ROSENVALD Nelson A

dignidade da pessoa humana no CPC15 91 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte

geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 75 92 Ibid p 75 93 Ibid p 75

40

Nessa senda o magistrado deveraacute promover a dignidade da pessoa humana quando

perceber a ausecircncia desta no processo ou assegura-la quando for posta em risco Eacute nesse

sentido o entendimento dos professores Marinoni Mitidiero e Arenhart94

() a dignidade da pessoa humana determina a compreensatildeo do processo civil como um meio para tutela dos direitos Vale dizer o processo civil natildeo pode ser visto como um instrumento a serviccedilo do Estado como um instrumento que natildeo se encontre orientado agrave realizaccedilatildeo dos fins da pessoa humana Em outras palavras o processo civil serve para realizaccedilatildeo dos direitos e para orientaccedilatildeo das pessoas a respeito do significado do direito

Nessa senda compete tanto ao juiz quanto as demais partes processuais garantirem ldquoo

valor intriacutenseco de cada vida que eacute trazida ao processordquo nas palavras de Alexandre Freitas

Cacircmara95

() aos sujeitos do processo eacute preciso sempre ter claro que os titulares dos interesses em conflitos satildeo pessoas reais cujas vidas seratildeo afetadas pelo resultado do processo e que por isso mesmo tecircm o direito de estabelecer suas estrateacutegias processuais de acordo com aquilo que lhes pareccedila melhor para suas vidas Eacute inadmissiacutevel tratar as partes como se natildeo fossem pessoas reais meros dados estatiacutesticos Afinal se para o Judiciaacuterio cada processo pode parecer apenas mais um processo para as partes cada processo pode ser o uacutenico o mais relevante aquele em que sua vida seraacute decidida E eacute dever do juiz assegurar que isto seja respeitado

Dessa forma eacute necessaacuterio que um arcabouccedilo normativo para que seja conferida

eficaacutecia e proteccedilatildeo ao principio da dignidade da pessoa humana

Logo o dito princiacutepio deve ser protegido em todas as esferas do ordenamento juriacutedico

inclusive no campo da execuccedilatildeo civil onde sofre grandes riscos de ser violado em nome do

direito fundamental agrave tutela executiva do credor ldquoPartir da premissa de que existe um direito

fundamental agrave tutela executiva ora ratificado pelo CPC eacute indispensaacutevel para a soluccedilatildeo de

diversos problemas oriundos do procedimento executivo principalmente aqueles relacionados

agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo 96

94 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme

MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 25

95 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CAcircMARA Alexandre Freitas O Novo Processo Civil Brasileiro 2 ed Satildeo Paulo Atlas 2016 p 7

96 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66

41

Eacute o caso por exemplo da impenhorabilidade Segundo Fredie Didier et al97 a

impenhorabilidade eacute uma forma de proteger certos bens do devedor do direito fundamental a

execuccedilatildeo do credor

Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa

Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais

O legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do CPC fazendo um

preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses em anaacutelise ao optar pela mitigaccedilatildeo do direito

do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado Afinal ldquoa execuccedilatildeo natildeo pode ser utilizada

como instrumento para causar a ruiacutena a fome e o desabrigo do devedor e sua famiacutelia gerando

situaccedilotildees incompatiacuteveis com a dignidade da pessoa humana 98

Logo a impenhorabilidade de certos bens

[] Eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa99

Eacute nesse sentido que o CPC15 enumera diversos casos de bens patrimoniais que satildeo

impenhoraacuteveis como o salaacuterio e vencimentos utensiacutelios necessaacuterios ao exerciacutecio da

profissatildeo seguro de vida vestuaacuterios e pertences de uso pessoal entre outros

Dessa forma as regras relativas agraves medidas executivas devem ser interpretadas agrave luz

da Constituiccedilatildeo Federal ldquovez que se voltam agrave realizaccedilatildeo de direitos fundamentais e em sua

97 Ibid p 66 98 THEODORO JUacuteNIOR Humberto Novo Coacutedigo de Processo Civil Anotado 20 ed Rio de Janeiro

Forense 2016 p 978 99 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud DIDIER JR Fredie CUNHA

Leonardo Carneiro da BRAGA Paula Sarno OLIVEIRA Rafael Alexandria de Curso de direito processual civil 3 ed Salvador JusPodivm 2011 v 5 p 547

42

realizaccedilatildeo podem atingir direitos fundamentaisrdquo 100 O Superior Tribunal de Justiccedila jaacute decidiu

que

O rol das impenhorabilidades do ordenamento paacutetrio objetiva preservar o miacutenimo patrimonial necessaacuterio agrave existecircncia digna do executado impondo ao processo executoacuterio certos limites Assim a depender das peculiaridades do caso as regras de impenhorabilidade podem ser ampliadas de modo a adequar a tutela aos direitos fundamentais como por exemplo o direito agrave moradia agrave sauacutede ou agrave dignidade da pessoa humana Trata-se portanto da aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo e da necessidade sob o enfoque da proporcionalidade101 (STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014)

Logo a interpretaccedilatildeo dos dispositivos que tratam sobre a penhora no CPC deve estaacute

diretamente ligada aos ditames constitucionais devendo o interprete privilegiar a opccedilatildeo que

esteja mais em sintonia com a Carta Magna para que nem o credor e nem o devedor sejam

lesados

O artigo 833 do CPC elenca uma seacuterie de incisos que expotildeem os bens impenhoraacuteveis

O trecho inicial inciso I do art 833 define como impenhoraacuteveis os bens inalienaacuteveis Este

inciso segue a regra de que ldquose o bem natildeo pode ser alienado tambeacutem natildeo pode ser penhorado

porque a penhora eacute o primeiro ato do procedimento de alienaccedilatildeo judicial do bemrdquo 102

Satildeo exemplos de bens inalienaacuteveis os puacuteblicos cuja alienaccedilatildeo depende de autorizaccedilatildeo

legislativa Eacute inalienaacutevel tambeacutem o capital constituiacutedo para garantir indenizaccedilatildeo de ato iliacutecito

(art 533 sect 1 ordm CPC) que portanto eacute tambeacutem impenhoraacutevel ldquoTodo bem inalienaacutevel eacute

impenhoraacutevel embora nem todo bem impenhoraacutevel seja inalienaacutevelrdquo 103

O inciso I do art 833 CPC tambeacutem consagra a impenhorabilidade dos bens que por

ato voluntaacuterio satildeo excluiacutedos da execuccedilatildeo

Segundo Fredie Didier et al104

Eacute o que ocorre nos casos de bens doados ou alienados com claacuteusula de inalienabilidade que haacute de constar no registro imobiliaacuterio para ser eficaz perante o exequente e minimizar o risco de fraude A propoacutesito eis a redaccedilatildeo do art 1911 do Coacutedigo Civil lsquolsquoA claacuteusula de inalienabilidade imposta aos bens por ato de liberalidade implica impenhorabilidade e incomunicabilidaderdquo

100 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MEDINA Joseacute Miguel Garcia

Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 1 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 p 736 101 STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014 102 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 824 103 Ibid p 824 104 Ibid p 825

43

O inciso II por sua vez estabelece que satildeo impenhoraacuteveis os bens moacuteveis os

pertences e as utilidades domeacutesticas da residecircncia do executado Todavia excepcionam-se os

bens dessa natureza que sejam de elevado valor ou que ultrapassem as necessidades comuns

correspondentes a um meacutedio padratildeo de vida

A jurisprudecircncia natildeo eacute paciacutefica sobre o assunto logo natildeo exista uma relaccedilatildeo de bens

que podem ser atingidos pela penhora Abrindo margem para as mais variadas decisotildees

O STJ jaacute considerou impenhoraacuteveis aparelho de televisatildeo a cores mesa de centro passadeira raacutedio toca-fitas gravador microondas ar-condicionado um freezer um microcomputador com acessoacuterios uma impressora etc Poderatildeo ser penhorados porque ultrapassam o padratildeo-meacutedio aparelhos de TV mais sofisticados o segundo aparelho de televisatildeo a segunda geladeira aparelhos de ar-condicionado que satildeo verdadeiras peccedilas de design moacuteveis antigos que se transformam em peccedilas de decoraccedilatildeo faqueiro de prata adega climatizada etc Em entendimento de caraacuteter ainda mais geneacuterico jaacute restou consignado em determinado precedente que a proteccedilatildeo natildeo abrangeria apenas os bens indispensaacuteveis agrave moradia mas tambeacutem aqueles usualmente encontrados em um lar105

Ademais o inciso III do art 833 do CPC traz a impenhorabilidade dos vestuaacuterios bem

como os pertences de uso pessoal do executado salvo se de elevado valor

Segundo Fredie Didier et al106 o dispositivo possui dois propoacutesitos

de um lado preservar a dignidade do executado com a proteccedilatildeo de bens moacuteveis importantes para a sua sobrevivecircncia digna como o vestuaacuterio aparelho celular reloacutegio e os bens relacionados agrave sua higiene pessoal de outro lado a regra visa prestigiar a boa-feacute processual impedindo a execuccedilatildeo mesquinha e abusiva com a penhora de bens de pequeno ou nenhum valor como um pente ou uma bota

O inciso IV do art 833 do CPC consagra uma das mais importantes modalidades a

impenhorabilidade relativa aos rendimentos de natureza alimentar ldquoTrata-se de regra que

possui o claro propoacutesito de proteger o executado garantindo-lhe o recebimento de valores que

servem ao pagamento das despesas relacionadas agrave sua sobrevivecircncia digna e agrave da sua famiacuteliardquo 107

Jaacute inciso V do art 833 do CPC torna impenhoraacuteveis os livros as maacutequinas as

ferramentas os utensiacutelios os instrumentos ou outros bens moacuteveis necessaacuterios ou uacuteteis ao

exerciacutecio de qualquer profissatildeo 105 Ibid p 826 106 Ibid p 827 107 Ibid p 828

44

Por forccedila do paraacutegrafo 3ordm do art 833 satildeo igualmente impenhoraacuteveis os equipamentos

implementos e maacutequinas agriacutecolas pertencentes agrave pessoa fiacutesica ou a empresa individual

produtora rural Rodrigo Mazzei e Sarah Merccedilon108 esclarecem que

Tem assento na noccedilatildeo de que a dignidade estende-se tambeacutem ao exerciacutecio da profissatildeo em si mesma e tambeacutem por representar a forma por excelecircncia de que dispotildee o executado para continuar a receber sua remuneraccedilatildeo e por conseguinte prover seu sustento e de sua famiacutelia Trata-se tambeacutem de aplicaccedilatildeo pontual da funccedilatildeo social da propriedade jaacute que protege os bens que permitem a circulaccedilatildeo de riquezas para a subsistecircncia do executado e se for o caso de sua famiacutelia

Forccediloso ressaltar ainda que a impenhorabilidade do inc V alcanccedila apenas os bens

moacuteveis de modo que eacute absolutamente possiacutevel que o imoacutevel em que o executado exerccedila sua

atividade profissional seja penhorado conforme a Suacutemula 451 do STJ ldquoEacute legiacutetima a penhora

da sede do estabelecimento comercialrdquo

O inciso VI do art 833 do CPC versa sobre a impenhorabilidade do seguro de vida

ldquoTrata-se de impenhorabilidade em favor do beneficiaacuterio do seguro e natildeo do segurado ateacute

porque o valor do seguro natildeo compotildee nem comporaacute o seu patrimocircnio (art794 do Coacutedigo

Civil1 ordm7)rdquo Dessa forma ldquoem uma execuccedilatildeo contra o segurado natildeo seraacute possiacutevel a penhora

do seguro de vida pois se trata de bem que natildeo lhe pertence nem mesmo em expectativardquo

De acordo com o inciso VII do art 833 do CPC satildeo impenhoraacuteveis os materiais

necessaacuterios para obras em andamento salvo se essas forem penhoradas Logo a obra pode

ser penhorada (art 862 do CPC) ldquoA regra como bem lembrou Araken de Assis lsquoestimula a

penhora da proacutepria obra inconclusa agrave qual os materiais acrescem e conseguintemente

valorizamrsquo 109

O art 833 VIII CPC julga impenhoraacutevel a pequena propriedade rural assim

definida em lei desde que trabalhada pela famiacutelia reproduzindo parte do art 5ordm XXVI CF

88116 que disciplina a impenhorabilidade do referido bem

A proteccedilatildeo do CPC eacute mais ampla do que a garantia prevista na Constituiccedilatildeo Federal

tendo em vista que a impenhorabilidade natildeo se restringe agraves execuccedilotildees de deacutebitos decorrentes

de sua atividade produtiva podendo ser alegada em toda e qualquer execuccedilatildeo ldquoAssim o 108 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CABRAL Antonio Passo

CRAMER Ronaldo (orgs) Comentaacuterios ao Novo Coacutedigo de Processo Civil Rio de Janeiro Forense 2015 p 1194

109 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 835

45

imoacutevel natildeo pode ser penhorado na execuccedilatildeo de creacutedito rural concedido para estimular a

produccedilatildeo agriacutecola mas poderaacute ser penhorado na execuccedilatildeo do creacutedito concedido para a

aquisiccedilatildeo do imoacutevelrdquo 110

A nona modalidade de impenhorabilidade trata-se dos recursos puacuteblicos recebidos por

instituiccedilotildees privadas para aplicaccedilatildeo compulsoacuteria em educaccedilatildeo sauacutede ou assistecircncia social ldquoA

proteccedilatildeo eacute louvaacutevel e tutela toda a coletividade ao privilegiar o direito agrave educaccedilatildeo sauacutede e

assistecircncia social em detrimento do direito do credorrdquo

De acordo com o inciso X do art 833 do CPC eacute impenhoraacutevel ateacute o limite de

quarenta salaacuterios miacutenimos a quantia depositada em caderneta de poupanccedila

Eacute uma modalidade de impenhorabilidade relativa (o CPC73 a considerava absoluta)

tendo em vista que essa impenhorabilidade natildeo pode ser oposta na execuccedilatildeo de alimentos

independentemente da sua origem (art 833 sect 2ordm do CPC) Fredie Didier et al cita Araken de

Assis111 ao afirmar que

a regra soacute protege essa aplicaccedilatildeo financeira Se o valor estiver depositado em fundo de investimento por exemplo poderaacute ser penhorado Se o devedor tiver vaacuterias cadernetas de poupanccedila a impenhorabilidade aplica-se agrave soma de todas elas e natildeo a cada uma delas isoladamente do contraacuterio valores expressivos poderiam ser pulverizados em vaacuterias contas burlando a finalidade da regra que eacute a de proteger a populaccedilatildeo de baixa renda

Ademais satildeo tambeacutem impenhoraacuteveis por forccedila do inciso XI os recursos puacuteblicos do

fundo partidaacuterio recebidos por partido poliacutetico nos termos da lei Essa modalidade de

impenhorabilidade ldquose restringe aos recursos puacuteblicos do fundo partidaacuterio Recursos de

origem privada recebidos pelo partido poliacutetico poderatildeo ser penhoradosrdquo 112 O processualista

Fredie Didier et al113 assevera que

Assim a impenhorabilidade foi estabelecida no intuito de impedir que os diretoacuterios nacionais de partidos poliacuteticos respondam por diacutevida dos diretoacuterios

110 Ibid p 836 111 DIDIER JR Fredie et al apud ASSIS Araken de Manual da execuccedilatildeo 11ordm ed cit p 225 Assim

tambeacutem REDONDO Bruno Garcia LOJO Maacuterio Vitor Suarez Penhora cit p 117 BUENO Cassio Scarpinella Curso sistematizado de Direito Processual Civil v 3 cit p 228 GIANNICO Mauriacutecio As novas reformas do CPC e de outras normas processuais Mauriacutecio Giannico e Viacutetor Joseacute de Mello Monteiro (coord) Satildeo Paulo Saraiva 2009 p 1 OS Em sentido diverso estendendo a impenhorabiacutelidade aos depoacutesitos feitos ateacute esse valor em CDB CDI fundos de renda fixa ou de accedilotildees RODRIGUES Marcelo Abelha Manual de execuccedilatildeo civil 3deg ed cit p 101

112 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 839

113 Ibid p 839

46

estaduaismunicipais - sobretudo em razatildeo das vaacuterias decisotildees judiciais que determinaram penhora de recursos do fundo partidaacuterio de alguns partidos

Por fim o inciso XII do artigo 833 do CPC trata sobre a impenhorabilidade dos

creacuteditos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias sob o regime de incorporaccedilatildeo imobiliaacuteria

vinculados agrave execuccedilatildeo de obra ldquoO objetivo dessa modalidade eacute evitar que diacutevidas do

incorporador possam consumir os recursos que seriam utilizados na realizaccedilatildeo da obra em

prejuiacutezo dos adquirentes de unidades autocircnomasrdquo 114

O professor Misael Montenegro Filho115 aduz sobre que ldquoao estabelecer a

impenhorabilidade dos creacuteditos oriundos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias o novo CPC

protegeu os valores destinados agrave execuccedilatildeo da obra e agrave entrega das unidades imobiliaacuterias aos

adquirentes assegurando assim a execuccedilatildeo da promessa contratualrdquo

Importante frisar ainda que a Lei nordm 8009 1990 instituiu a impenhorabilidade do

imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar por qualquer diacutevida salvo as exceccedilotildees dos

seus arts 3ordm e 4ordm

A referida lei dispotildee que Para os efeitos de impenhorabilidade considera-se

residecircncia um uacutenico imoacutevel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia

permanente (art 5ordm)

O processualista baiano Fredie Didier et al116 assevera que

A lei propotildee-se a proteger imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar nos termos acima expostos A CF 88 ampliou o conceito de entidade familiar para abranger a famiacutelia monoparental e a uniatildeo estaacutevel Mas deve considerar-se aiacute compreendidos os irmatildeos que vivem juntos e a uniatildeo homossexual Ateacute o solteiro estaacute abrangido pela impenhorabilidade se reside soacute no imoacutevel - isso em nome da proteccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana e da moradia digna Na verdade houve uma mudanccedila de compreensatildeo acerca do sentido da proteccedilatildeo de proteccedilatildeo da famiacutelia agrave proteccedilatildeo da moradia indispensaacutevel agrave preservaccedilatildeo da dignidade da pessoa

114 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o

novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 388

115 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MONTENEGRO FILHO Misael Novo Coacutedigo de Processo Civil Comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Atlas 2016 p 752

116 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 840-841

47

O STJ jaacute consolidou esse entendimento na suacutemula nordm 364 O conceito de

impenhorabilidade de bem de famiacutelia abrange tambeacutem o imoacutevel pertencente a pessoas

solteiras separadas e viuacutevas

Entretanto se o casal ou entidade familiar possuir vaacuterios imoacuteveis utilizados como

residecircncia a impenhorabilidade recairaacute sobre o de menor valor (art 5ordm paraacutegrafo uacutenico) ldquoEacute o

que ocorre por exemplo quando a famiacutelia se divide em mais de uma cidade por motivos

profissionaisrdquo 117

Forccediloso observar ainda que a impenhorabilidade do imoacutevel familiar eacute relativa jaacute que

natildeo pode ser oposta a qualquer creacutedito O art 3ordm da Lei n 8009 1990151 em que pode ser

penhorada a residecircncia da famiacutelia (exemplo execuccedilatildeo de alimentos para cobranccedila de taxas

devidas em funccedilatildeo do imoacutevel familiar etc)

Resta claro que o artigo 833 do CPC ao disciplinar as hipoacuteteses de impenhorabilidade

possui o escopo de proteger o princiacutepio da dignidade humana Entretanto algumas claacuteusulas

natildeo possuem proteccedilatildeo absoluta ldquoa sua relativizaccedilatildeo a depender do caso sob exame deve ser

realccedilada agrave medida que a dignidade resguardada e protegida pelo sistema processual-

constitucional natildeo se limita ao executadordquo 118 Ademais ldquoEacute premente advertidamente que a

dignidade do credor tambeacutem seja garantida em juiacutezo tendo como norte pois os princiacutepios da

proporcionalidade e razoabilidaderdquo 119

117 Ibid p 841 118 Ibid p 752 119 Ibid p 752

48

4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA

ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE

HUMANA DO EXECUTADO

41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE

EFETIVACcedilAtildeO

Como jaacute exposto em linhas preteacuteritas nos meios executivos tiacutepicos as medidas

executivas satildeo determinadas pela lei ou seja o oacutergatildeo pode aplicar somente as medidas

tipificadas no ordenamento juriacutedico No entanto ao se tratar das medidas executivas atiacutepicas

eacute necessaacuterio que haja um limite na atuaccedilatildeo realizada pelo juiz

O poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo poder ser realizado de maneira indiscriminada haacute

pressupostos e premissas a serem observadas Dessa forma a primeira premissa eacute no sentindo

de que a medida executiva atiacutepica natildeo pode ser a primeira medida a ser invocada ldquomuito ao

reveacutes a regra do nosso sistema continua a ser o da tipicidade dos meios executivos soacute que

agora temperado pelo sistema atiacutepicordquo 120 O processualista Thiago Rodovalho explica que

ldquo() os meios atiacutepicos natildeo satildeo prima ratio e sim a ultima ratio eacute dizer esgotados e

frustrados os meios executivos tiacutepicos e ordinaacuterios pode-se em tese valer-se do sistema

atiacutepicordquo121

Dessa forma nos casos de execuccedilatildeo que tenha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

natildeo deve ser aplicado de logo as medidas indutivas e coercitivas Apenas apoacutes frustradas as

medidas ldquonaturaisrdquo pode-se passar agrave aplicaccedilatildeo das medidas atiacutepicas

Uma segunda premissa diz a respeitos dos meios de pressatildeo para compelir o devedor a

adimplir com o seu deacutebito ldquoEssa segunda premissa decorre inclusive de imperiosidade

loacutegica de nada adianta a medida de pressatildeo se a obrigaccedilatildeo natildeo tem como ser adimplida pelo

devedorrdquo 122

Para Thiago Rodovalho123 ldquoIsso quer significar que esgotados e frustrados os meios

tiacutepicos o juiz se valeraacute dos meios atiacutepicos se eles forem potencialmente haacutebeis a estimular ou

120 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da

atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018

121 Ibid sem paginaccedilatildeo 122 Ibid sem paginaccedilatildeo 123 Ibid sem paginaccedilatildeo

49

forccedilar o cumprimento o que pressupotildee sua possibilidade quando entatildeo eles poderatildeo ser

eficazesrdquo

Logo nas obrigaccedilotildees de pagar quantia se houver a real demonstraccedilatildeo da

impossibilidade financeira do devedor seria um constrangimento inuacutetil e desnecessaacuterio a

imposiccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo para forccedilar o cumprimento

Por isso as medidas atiacutepicas devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o

esgotamento das medidas tiacutepicas e a possibilidade de cumprimento de cumprimento da

obrigaccedilatildeo

Ademais superadas as supracitadas premissas e o oacutergatildeo julgador vislumbrando a

necessidade da aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo se faz necessaacuterio que um conjunto de

postulados e princiacutepios rejam a atuaccedilatildeo do oacutergatildeo julgador servindo de norte para a escolha da

medida executiva mais adequada ldquoDe modo geral a escolha deve pautar-se nos postulados da

proporcionalidade da razoabilidade (art8ordm CPC) e da proibiccedilatildeo de excesso bem como nos

princiacutepios da eficiecircncia e da menor onerosidade da execuccedilatildeordquo 124

O professor Fredie Didier et al125 eacute categoacuterico ao citar Humberto Aacutevila

Segundo Humberto Aacutevila o postulado da proporcionalidade se manifesta nas situaccedilotildees em que haacute uma relaccedilatildeo de causalidade entre dois elementos empiricamente discerniacuteveis um meio e um fim de tal sorte que se possa proceder aos trecircs exames fundamentais o da adequaccedilatildeo (o meio promove o fim) o da necessidade (dentre os meios disponiacuteveis e igualmente adequados para promover o fim natildeo haacute outro meio menos restritivo do(s) direito(s) fundamental (is) afetado(s)) e o da proporcionalidade em sentido estrito (as vantagens trazidas pela promoccedilatildeo do fim correspondem agraves desvantagens provocadas pela adoccedilatildeo do meio)

O juiz ao aplicar a medida executiva atiacutepica ao caso concreto deve ter seu

embasamento no princiacutepio da proporcionalidade para saber se a medida a ser tomada eacute a

melhor opccedilatildeo ao caso sub judice ldquoO exame de proporcionalidade aplica-se sempre que

houver uma medida concreta destinada a realizar uma finalidaderdquo 126

Em verdade a aplicaccedilatildeo do princiacutepio da proporcionalidade eacute imprescindiacutevel na adoccedilatildeo

dos meios executivos atiacutepicos tendo em vista que ldquo() tais medidas em especial quando de

124 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111 125 DIDIER JR Fredie et al apud AVILA Humberto Teoria dos princiacutepios da definiccedilatildeo agrave aplicaccedilatildeo

dos princiacutepios juriacutedicos 16 ed Satildeo Paulo Malheiros 2015 p 205 126 DIDIER JR Fredie et al op cit p 111

50

natureza coercitiva podem restringir direitos do devedor e incidir diretamente sobre sua

pessoardquo127 Logo ainda que o princiacutepio da efetividade da tutela executiva seja um direito

fundamental o mesmo ldquo() deve ser compatibilizado com direitos fundamentais do

executado para que a sua dignidade humana seja preservadardquo 128

Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Neves129 afirma que em nome do princiacutepio da

proporcionalidade o juiz deveraacute

() ponderar no caso concreto as vantagens praacuteticas da adoccedilatildeo de cada medida executiva atiacutepica em especial as de natureza coercitiva e as desvantagens de sua adoccedilatildeo levando em conta a possibilidade de a medida criar uma limitaccedilatildeo excessiva ao exerciacutecio de direito fundamental do executado

Outro princiacutepio que o oacutergatildeo julgador deve se ater ao escolher a medida executiva

atiacutepica eacute o da razoabilidade Segundo Fredie Didier et al 130 o princiacutepio (ou postulado)131 se

manifesta de trecircs formas

a) como dever de equidade a exigir a harmonizaccedilatildeo da norma geral com o caso individual impondo a consideraccedilatildeo daquilo que normalmente acontece em detrimento do que eacute extraordinaacuterio e tambeacutem impondo a consideraccedilatildeo das especificidades do caso concreto ante a generalidade da norma b) como dever de congruecircncia a exigir a harmonizaccedilatildeo das normas com suas condiccedilotildees externas de aplicaccedilatildeo (isto eacute com a realidade com base em que foram editadas) c) como dever de equivalecircncia a exigir uma relaccedilatildeo de equivalecircncia entre a medida adotada e o criteacuterio que a dimensiona

Logo ldquo() o princiacutepio da razoabilidade deve nortear a atuaccedilatildeo do juiz na adoccedilatildeo das

medidas executivas atiacutepicas previstas no art 139 IV do Novo CPCrdquo 132 tendo em vista que

ldquo() mesmo medidas que pelo princiacutepio da proporcionalidade podem se mostrar

abstratamente possiacuteveis de adoccedilatildeo no caso concreto podem se mostrar inadequadas e

irrazoaacuteveisrdquo 133

127 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Medidas executivas atiacutepicas na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de

pagar quantia certa art 139 IV do novo CPC Revista de Processo v 42 n 265 mar 2017 p 14 128 Ibid p 14 129 Ibid p 14 130 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111-112 131 Segundo Fredie Didier et al o postulado eacute uma norma que atua sobre a aplicaccedilatildeo de outras normas

A proporcionalidade e a razoabilidade seriam postulados normativos e natildeo princiacutepios segundo essa concepccedilatildeo 132 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo op cit p 14 133 Ibid p 14

51

Ademais conforme dispotildee o postulado da proibiccedilatildeo de excesso ldquoa realizaccedilatildeo de uma

regra ou princiacutepio constitucional natildeo pode conduzir agrave restriccedilatildeo a um direito fundamental que

lhe retire um miacutenimo de eficaacuteciardquo 134

A proibiccedilatildeo de excesso deveraacute sempre ser suscitada quando um direito fundamental

houver sido violado a ponto do direito fundamental sofrer violaccedilatildeo excessiva Ademais ldquoesse

postulado natildeo se confunde com o da proporcionalidade porque ele dispensa os exames da

adequaccedilatildeo (relaccedilatildeo meiofim) da necessidade (exigibilidade) ou da proporcionalidade em

sentido estrito (ponderaccedilatildeo entre vantagens e desvantagens)rdquo 135

Logo ldquopouco importa a relaccedilatildeo meiofim ou a exigibilidade da medida ou ainda a

ponderaccedilatildeo com outro direito fundamental eventualmente em jogo aqui se analisa apenas a

eficaacutecia de um determinado direito fundamentalrdquo 136

O princiacutepio da eficiecircncia tem previsatildeo constitucional no art 37 e previsatildeo

infraconstitucional no art 8ordm do CPC15 O referido princiacutepio determina que o processo seja

conduzido de forma eficiente pelo oacutergatildeo jurisdicional

Entende-se que eficiente eacute a atuaccedilatildeo que utilize adequadamente os meios necessaacuterios

para que se atinjam os fins almejados O oacutergatildeo jurisdicional na escolha dos meios a serem

utilizados para a obtenccedilatildeo dos fins

a) deve escolher aqueles que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo (deve evitar meios que promovam resultados insignificantes) b) deve escolher meios que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado (natildeo se pode escolher um meio de resultado duvidoso) c) natildeo pode escolher um meio que produza muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscado 137

O juiz deveraacute igualmente analisar o princiacutepio da menor onerosidade da execuccedilatildeo que

eacute previsto pelo art 805 do CPC ldquoArt 805 Quando por vaacuterios meios o exequente puder

promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o

executadordquo

134 134 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 112 135 Ibid p 112 136 Ibid p 112 137 Ibid p 112-113

52

Logo ldquohavendo duas opccedilotildees igualmente eficazes para permitir alcanccedilar o resultado

pretendido (satisfaccedilatildeo do creacutedito) deveraacute o oacutergatildeo julgador valer-se daquela que menos onere

a situaccedilatildeo do executadordquo 138

O dito princiacutepio impede o comportamento abusivo do exequente que possa beneficiar-

se do meio mais danoso ao executado protegendo dessa forma a lealdade e a eacutetica

processual

Os postulados e princiacutepios analisados em linhas preteacuteritas impotildeem ao oacutergatildeo julgador a

observacircncia de alguns criteacuterios para a escolha da medida executiva atiacutepicas a ser utilizada no

caso concreto

Primeiramente a medida executiva atiacutepica deveraacute ser adequada ldquoO criteacuterio da

adequaccedilatildeo impotildee que juiz considere abstratamente uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida

executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia

a gerar o resultadordquo 139 Nesse primeiro momento o juiz deveraacute observar sob a perspectiva do

credor qual medida teraacute o condatildeo de gerar o resultado mais efetivo

Segundo Fredie Didier et al140 o criteacuterio da adequaccedilatildeo eacute

() fortemente inspirado pelo postulado da proporcionalidade e pelo princiacutepio da eficiecircncia na parte em que esse princiacutepio determina a escolha de meios que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo e que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado

Ademais a medida adotada pelo oacutergatildeo julgador deveraacute ser necessaacuteria ldquoEsse criteacuterio

impotildee um limite agrave atuaccedilatildeo judicial funcionando como uma espeacutecie de contrapeso ao criteacuterio

da adequaccedilatildeo Aqui deve-se levar em conta a posiccedilatildeo do devedorrdquo141

O juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental agrave execuccedilatildeo e determinar

uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute necessaacuterio que a

medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado O criteacuterio da necessidade

estabelece que ldquonatildeo se pode ir aleacutem do necessaacuterio para alcanccedilar o propoacutesito almejado Deve

138 Ibid p 113 139 Ibid p 113 140 Ibid p 113 141 Ibid p 114

53

pois o oacutergatildeo julgador determinar o meio executivo na medida do estritamente necessaacuterio para

proporcionar a satisfaccedilatildeo do creacutedito ndash nem menos nem maisrdquo 142

O referido criteacuterio possui forte influecircncia dos postulados da proibiccedilatildeo do excesso e da

razoabilidade assim como do princiacutepio da menor onerosidade para o executado Assevera

Fredie Didier et al143 que

Natildeo eacute razoaacutevel por exemplo impor como primeira opccedilatildeo medida coercitiva a ser suportada pelo agente puacuteblico pelo simples fato de o juiz pressupor que o ente puacuteblico ao qual ele eacute vinculado iraacute descumprir determinada ordem judicial - o descumprimento natildeo pode ser visto como algo ordinaacuterio ou cotidiano (razoabilidade como dever de equidade) Tampouco eacute razoaacutevel eleger a prisatildeo civil como meacutetodo prioritaacuterio para compelir o executado ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer (razoabilidade como dever de equivalecircncia) Aleacutem disso eacute vedada por exemplo a imposiccedilatildeo de multa coercitiva para compelir o executado a emitir declaraccedilatildeo de vontade uma vez que haacute previsatildeo expressa de medida tiacutepica capaz de proporcionar o mesmo resultado sem sacrifiacutecio para o devedor (art 501 CPC)

A afirmaccedilatildeo feita por Bonavides144 em 1997 sobre a adequaccedilatildeo e a necessidade

continua atual sobre os motes

O meio empregado pelo legislador deve ser adequado e necessaacuterio para alcanccedilar o objetivo procurado O meio eacute adequado quando com seu auxiacutelio se pode alcanccedilar o resultado desejado eacute necessaacuterio quando o legislador natildeo poderia ter escolhido outro meio igualmente eficaz mas que natildeo limitasse ou limitasse de maneira menos sensiacutevel o direito fundamental

Por fim a medida deve conciliar os interesses contrapostos ldquoO magistrado deve

ponderar os interesses em jogo aplicando a proporcionalidade em sentido estrito de modo

que as vantagens da utilizaccedilatildeo da medida atiacutepica escolhida superem as vantagens de seu usordquo 145

Esse criteacuterio natildeo privilegia nem o credor nem o devedor e sim a soluccedilatildeo mais

equilibrada e que atenda da melhor forma aos valores em conflito ldquoTrata-se de criteacuterio

inspirado nos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade bem como no princiacutepio da

142 Ibid p 114 143 Ibid p 114 144 BONAVIDES Paulo Curso de Direito Constitucional 7ordm ediccedilatildeo Satildeo Paulo Ed Malheiros 1997

p 372 145 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 114-115

54

eficiecircncia na parte em que impotildee ao juiz evitar a escolha do meio executivo que produza

muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscadordquo 146

Cada um dos criteacuterios supracitados devem ser considerados pelo juiz ao aplicar as

medidas executivas atiacutepicas ao caso concreto Para Fredie Didier et al147 as medidas como

retenccedilatildeo de CNH passaporte ou cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado como

forma de pressionaacute-lo ao pagamento da diacutevida pecuniaacuteria natildeo satildeo possiacuteveis

Essas natildeo satildeo medidas adequadas ao atingimento do fim almejado (o pagamento de quantia) - natildeo haacute propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente Tais medidas soam mais como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-lo ao cumprimento da ordem judicial - e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a utilizaccedilatildeo de meios sancionatoacuterios pelo magistrado mas apenas de meios de coerccedilatildeo indireta e sub-rogatoacuterios

Ainda que adequadas fossem a retenccedilatildeo de CNH e do passaporte no corte de fornecimento de aacutegua natildeo parecem ser medidas necessaacuterias (no sentido de exigiacuteveis) uma vez que outras medidas podem em tese ser utilizadas sem causar igual gravame ao executado - como por exemplo a simples restriccedilatildeo do uso de cartotildees de creacutedito A retenccedilatildeo de documentos pessoais eacute medida que termina por restringir a liberdade de ir e vir do executado mostrando-se a princiacutepio natildeo-razoaacutevel por ir de encontro ao dever de equivalecircncia e desproporcional por restringir demais o direito agrave liberdade em favor do direito de creacutedito pecuniaacuterio do exequente

O processualista baiano et al148 cita tambeacutem outro exemplo de medida atiacutepica que natildeo

atingem os criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade

Tampouco parece adequada em princiacutepio determinaccedilatildeo de corte de energia eleacutetrica de todo o preacutedio onde funciona serviccedilo puacuteblico administrativo como forma de pressionar o ente federado a cumprir ordem de nomeaccedilatildeo de candidato em concurso puacuteblico Natildeo parece haver relaccedilatildeo meiofim entre uma coisa e outra Tambeacutem natildeo eacute possiacutevel enxergar essa medida como necessaacuteria no sentido de ser a menos gravosa para o devedor - observe que se trata de medida que uma vez aplicada ensejaria restriccedilatildeo de funcionamento em toda a reparticcedilatildeo puacuteblica em prejuiacutezo de serviccedilos puacuteblicos essenciais ao funcionamento da Administraccedilatildeo o que aleacutem de ser excessivamente gravoso parece natildeo se conformar agrave necessidade de ponderaccedilatildeo dos interesses em jogo - aleacutem de afetar a um sem-nuacutemero de pessoas tomadoras desses serviccedilos

Ademais eacute sabido que toda e qualquer decisatildeo judicial precisa ser fundamentada Ao

se tratar das medidas executivas atiacutepicas o papel da fundamentaccedilatildeo se torna ainda mais

146 Ibid p 115 147 Ibid p 115 148 Ibid p 116

55

importante tendo em vista que eacute pela fundamentaccedilatildeo da decisatildeo que se poderaacute controlar a

adequaccedilatildeo e necessidade da medida atiacutepica

Pelo fato das medidas executivas atiacutepicas derivarem de dispositivos normativos

considerados claacuteusulas gerais propiacutecias as mais variadas interpretaccedilotildees eacute de extrema

importacircncia que o oacutergatildeo julgador fundamente sua decisatildeo

Logo ldquodeve o juiz na fundamentaccedilatildeo decisoacuteria expor racionalmente os motivos da

sua escolha demonstrando com atenccedilatildeo ao art 489 sect 1ordm CPC de que modo a sua opccedilatildeo

atende os criteacuterios da adequaccedilatildeo necessidade e proporcionalidade em sentido estrito ()rdquo 149

Dessa forma os princiacutepios da proporcionalidade e razoabilidade servem para delimitar

o alcance das claacuteusulas gerais de efetivaccedilatildeo fazendo com que o oacutergatildeo julgador se atenha aos

criteacuterios da adequaccedilatildeo e necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao caso

concreto

42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO

EXECUTADO

A entrada em vigor do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 aflorou ainda mais uma

discussatildeo essencial para os processualistas do seacuteculo XXI qual eacute o verdadeiro protagonista do

processo civil

Para os que defendem o ldquoautoritarismo processualrdquo o verdadeiro protagonista do

processo civil eacute o oacutergatildeo judiciaacuterio que em nome do desempenho efetivo de suas funccedilotildees lhes

eacute permitido dilatar os poderes que diga-se de jaacute passagem jaacute compotildeem um vastiacutessimo

arsenal150

Jaacute os ldquogarantistasrdquo 151 do processo civil acreditam que os verdadeiros protagonistas satildeo

as partes do processo e seus direitos e garantias devem ser estritamente preservados

Devido a essa disputa de quem possui maior protagonismo no processo as mudanccedilas

ocorridas no coacutedigo processual vigente quanto agraves medidas executivas atiacutepicas despertaram

149 Ibid p 117 150 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos

atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04102018

151 O processualista Araken de Assis acredita que o termo garantista eacute descabido tendo em vista que remete ao processo penal

56

maior celeuma do que qualquer outra modificaccedilatildeo trazida pelo CPC15 Afinal as referidas

medidas acirravam ainda mais a disputa pelo protagonismo processual

O fato de o CPC15 dispor no art 139 IV que o juiz poderaacute decretar todas as medidas

indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o

cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo

pecuniaacuteria levou boa parte da doutrina e dos juiacutezes a acreditar que teria pleno direito de

aplicar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo Entretanto muitos se esqueceram do outro lado

da moeda esqueceram que a dignidade humana do executado tambeacutem eacute um direito

fundamental e natildeo pode ser violado

Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa152

acreditam que

() natildeo parece producente elencar um rol abstrato das medidas que poderiam ser aplicadas pelo juiz a tiacutetulo do art 139 IV CPC Afinal se busca a efetividade da execuccedilatildeo e esta soacute pode ser identificada agrave luz das especificidades da situaccedilatildeo concreta Ideal eacute enveredar pela loacutegica modular (adequaccedilatildeo ao caso) natildeo pela geneacuterica (soluccedilotildees abstratas de pretensa utilidade universal)

Em razatildeo de o dispositivo apresentar uma gama de poderes tatildeo amplos agrave disposiccedilatildeo do

oacutergatildeo julgador sem nenhuma estipulaccedilatildeo de um procedimento legal previamente definido para

que estabeleccedila as condiccedilotildees de sua aplicaccedilatildeo em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo eacute

necessaacuterio que em razatildeo do princiacutepio da dignidade humana natildeo busque definir o que o

dispositivo permite mas de definir o que ele natildeo permite ldquoOu seja propotildee-se a sua

compreensatildeo por exclusatildeo Afinal se ele tem potencialidade para promover a efetividade da

tutela tambeacutem pode provocar lesotildees E como em direito os fins natildeo justificam os meios

ressalta como prioritaacuteria a necessidade de estabelecer limitesrdquo 153

O art 789 do CPC15 disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial e eacute

categoacuterico ao dispor que ldquoo devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para

152 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

153 Ibid sem paginaccedilatildeo

57

o cumprimento de suas obrigaccedilotildees salvo as restriccedilotildees estabelecidas em leirdquo Logo a

execuccedilatildeo somente poderaacute incidir sobre os bens do devedor e natildeo sobre a sua pessoa

Como eacute sabido a Lex Poetelia Papiria de 326 aC foi o primeiro marco legal da

humanizaccedilatildeo das cobranccedilas de diacutevidas abolindo a imposiccedilatildeo ao devedor de castigos

vexatoacuterios e ateacute da pena de morte154

Afinal no direito romano antigo a cobranccedila de diacutevidas poderia recair sobre a pessoa

do devedor que respondia com sua liberdade e ateacute mesmo com seu proacuteprio corpo permitindo

a lei que repartissem tantos pedaccedilos do corpo do devedor quantos fossem seus credores

Nesse sentindo leciona o professor Guilherme Pupe da Noacutebrega155 que

Vem de longe a evoluccedilatildeo no sentido de fazer a responsabilidade por uma obrigaccedilatildeo migrar da pessoa do devedor para seu patrimocircnio Merecem registro especiacutefico como marcos histoacutericos remotos a Lex Poetelia Papiria de 326 aC que aboliu o nexum e possibilidade de escravidatildeo do devedor como garantia da obrigaccedilatildeo e a pignoris capio ou ldquoaccedilatildeo por tomada de penhorrdquo que instituiu a possibilidade de o credor tomar parcela dos bens do devedor como forma de assegurar o adimplemento da diacutevida Aqueles institutos culminariam seacuteculo depois no artigo 789 do CPC de 2015 a consagrar que o devedor responda pela satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo com seus bens presentes e futuros observadas as restriccedilotildees impostas pelas impenhorabilidades legais

Logo o avanccedilar da civilizaccedilatildeo marcou o deslocamento da responsabilidade por

diacutevidas saindo do corpo do devedor para o seu patrimocircnio tendo em vista que a vida

humana a liberdade e a integridade fiacutesica satildeo valores inalienaacuteveis natildeo podendo ser

sacrificadas em benefiacutecio de obrigaccedilotildees pecuniaacuterias 156

Entretanto eacute sabido que a responsabilidade patrimonial eacute excepcionada pela prisatildeo

civil do devedor de verba alimentiacutecia resquiacutecio da responsabilidade pessoal romana

154 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt

httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018

155 NOacuteBREGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139 IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018

156 Ibid sem paginaccedilatildeo

58

No entanto haacute uma justificativa para isso Segundo o processualista Guilherme Pupe

da Noacutebrega157

Eacute que a par de a prisatildeo civil encontrar previsatildeo constitucional no inciso LXVII do artigo 5ordm o raciociacutenio eacute o de que o direito do alimentante agrave liberdade de locomoccedilatildeo cede diante dos direitos agrave vida e agrave dignidade titularizados pelo alimentando e resguardados pelos alimentos Foi esse mesmo raciociacutenio aliaacutes que justificou no passado a ediccedilatildeo da suacutemula 309 pelo STJ agora positivada pelo artigo 528 sect 7ordm que limita a modalidade coercitiva agraves trecircs uacuteltimas prestaccedilotildees vencidas e agraves prestaccedilotildees vincendas A ideia eacute que tendo o alimentando subsistido a despeito do natildeo-pagamento de prestaccedilotildees mais antigas essas verbas teriam perdido o caraacuteter alimentar que na equaccedilatildeo antes apresentada justificaria a prisatildeo civil do alimentante Daiacute por que aqueles valores antigos remanescem exigiacuteveis mas somente pela via da expropriaccedilatildeo

Essa ressalva eacute necessaacuteria tendo em vista que a adoccedilatildeo de teacutecnica de execuccedilatildeo

indireta para incursatildeo radical na esfera de direitos do executado notadamente direitos

fundamentais quando carente de respaldo constitucional natildeo merece acolhimento sob

risco de se atentar contra o devido processo legal (artigo 5ordm LIV da Constituiccedilatildeo)

Como afirma o autor Bruno Dantas158 ldquoembora inexistam estatiacutesticas que permitam

comparaccedilotildees natildeo eacute desarrazoado intuir que os iacutendices de inadimplecircncia despeccedilam na razatildeo

inversa da incidecircncia das ordens judiciais sobre o corpo e a liberdade do devedorrdquo Entretanto

eacute natildeo possiacutevel adotar toda e qualquer medida executiva atiacutepica em nome da efetividade da

execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que se saiba os limites da sua aplicaccedilatildeo

Dessa forma instrumentos que permitam o cumprimento forccedilado de contratos e o pagamento

de diacutevidas satildeo necessaacuterios contudo eacute preciso equilibrar essa exigecircncia com a liberdade e a

dignidade humana

Como citado alhures o art 139 IV ensejou decisotildees como a que determinou a

suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o

passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito em uma accedilatildeo se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo

extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

Na supracitada decisatildeo o princiacutepio da responsabilidade patrimonial natildeo estaacute sendo

efetivado para o que o devedor responda com os seus bens Afinal qual ligaccedilatildeo entre a

157 Ibid sem paginaccedilatildeo 158 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt

httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018

59

restriccedilatildeo de circulaccedilatildeo que diz com o direito de ir e vir (liberdade) com o pagamento de

diacutevidas que diz com a responsabilidade civil159

Ademais por que quem natildeo tem dinheiro para pagar diacutevidas natildeo pode dirigir Por que

natildeo tem condiccedilotildees para pagar o deacutebito natildeo pode ter passaporte Por que quem natildeo tem como

pagar o deve natildeo pode ter cartatildeo de creacutedito

Ao utilizar meios executivos atiacutepicos como os supracitados para compelir o devedor a

satisfazer a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria quando exauridos sem ecircxito os meios tradicionais de bens

penhoraacuteveis salvo quando existe qualquer indiacutecio concreto de ocultaccedilatildeo ou dissipaccedilatildeo de

bens eacute obrigar o devedor abrir matildeo da proteccedilatildeo da lei que lhe impede que seja tomado agrave forccedila

(art 833 CPC e demais disposiccedilotildees que tratam da impenhorabilidade)

Segundo Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa160

Claramente essa pressatildeo visa dar uma aparecircncia de voluntariedade agrave indicaccedilatildeo de bens impenhoraacuteveis pelo proacuteprio executado que na verdade soacute age assim por ser a uacutenica forma de ver-se livre de um grame imposto por medida indutiva despedida de qualquer necessidade ou adequaccedilatildeo Uma intoleraacutevel perversatildeo

Os autores afirmam ainda que o ldquodireito paacutetrio natildeo admite esta contraditio in terminis

sendo inaceitaacutevel a coexistecircncia de regra protetiva do executado com outra que concede ao

juiz poderes para forccedilar (ainda que indiretamente e veladamente) o executado a abrir matildeo

daquela proteccedilatildeordquo 161

Logo eacute cristalino que a suspensatildeo da CNH eacute uma forma incorreta de aplicar a medida

executiva atiacutepica para efetivar o direito fundamental a execuccedilatildeo tendo em vista que o uacutenico

objetivo da referida eacute pressionar o executado abrir matildeo de algum bem impenhoraacutevel para

levantar o dinheiro e cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

A retenccedilatildeo do passaporte igualmente natildeo possui qualquer relaccedilatildeo com a diacutevida do

executado e eacute somente uma forma de tentar pressiona-lo a dispor de um bem que natildeo pode

ser tomado agrave forccedila e puni-lo por natildeo ter cumprido voluntariamente com a sua obrigaccedilatildeo

159 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

160 Ibid sem paginaccedilatildeo 161 Ibid sem paginaccedilatildeo

60

Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa162

acreditam que tal medida eacute equivocada e se torna excessivamente onerosa ao executado

As mais variadas circunstacircncias relevem o equiacutevoco de tal medida aplicada assim genericamente Com efeito nada justifica reter o passaporte do executado e impedi-lo de viajar para o exterior quando eacute agraciado inclusive com todas as despesas pagas com presente sorteio ou precircmio (por completar tempo de serviccedilo ou atingir metas produtividade na sociedade empresaacuteria em que trabalha) Como todo custo eacute suportado por terceiro e por isso mesmo a sua realizaccedilatildeo pelo executado natildeo traria qualquer prejuiacutezo ao exequente e a retenccedilatildeo do passaporte natildeo seria injustificaacutevel

Paulo Antonio Papini163 acredita que natildeo tem a apreensatildeo de passaporte natildeo possui um

fundamento plausiacutevel tendo em vista que se o devedor natildeo pode viajar para saldar o deacutebito

tambeacutem natildeo poderia exercer atividades cotidianas

Com todo o respeito a quem pensa dessa forma o argumento eacute muito simploacuterio e natildeo precisamos sequer do Direito para derrubaacute-lo Com efeito se considerarmos que ndash ateacute mesmo pelas dimensotildees continentais do Brasil ndash natildeo eacute incomum que uma passagem para o Nordeste custe mais caro que um voo para Miami seria razoaacutevel entatildeo seguindo a linha argumentativa do Magistrado em questatildeo que se oficiasse aos oacutergatildeos reguladores da aviaccedilatildeo civil proibindo-se aquele devedor de fazer ateacute mesmo voos domeacutesticos Poder-se-ia ir mais longe jaacute que natildeo tem dinheiro para pagar suas diacutevidas certamente aquele devedor tambeacutem natildeo teria para comer fora de sua casa porque entatildeo natildeo determinar a expediccedilatildeo de ofiacutecio aos restaurantes proacuteximos agrave sua casa e determinar tambeacutem a proibiccedilatildeo de que ele fosse servidoatendido

O autor se questiona ainda ldquoSeraacute entatildeo que o Princiacutepio da Dignidade da Pessoa

Humana estaacute de mero enfeite em nossa Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ()rdquo 164 Tendo em vista

que ldquoa decisatildeo em comento viola diretamente o art 5ordm incisos XV LIII e LXIII da

Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ndash falamos do Direito de Ir e Virrdquo 165

Ademais o cancelamento do cartatildeo de creacutedito eacute mais uma forma de constranger e

compelir o executado a cumprir com a obrigaccedilatildeo de qualquer forma natildeo importando o que

precise fazer para conseguir saldar o deacutebito tendo em vista que a referida medida apresenta

162 Ibid sem paginaccedilatildeo 163 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo

pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018

164 Ibid sem paginaccedilatildeo 165 Ibid sem paginaccedilatildeo

61

qualquer adequaccedilatildeo com o fim desejado (reverter em pagamento para o exequente) Os

autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa afirmam que166

Reconhece-se que as razotildees da afirmaccedilatildeo ora questionada satildeo ateacute intuitivas mas eacute plenamente possiacutevel problematiza-las Ora natildeo se encontra qualquer justificativa idocircnea para que o juiz possa cancelar o contrato do executado com a administradora do cartatildeo de creacutedito (ou instituiccedilatildeo financeira) que natildeo tem qualquer relaccedilatildeo com o creacutedito exequendo muito menos como isso poderia impactar positivamente na execuccedilatildeo (senatildeo para pressionar o executado a dispor de bens impenhoraacuteveis) Ademais natildeo foram indicados sequer sinais de que o executado realiza gastos supeacuterfluos com o cartatildeo de creacutedito ndash natildeo que isso justificasse a medida pois o correto seria penhorar os esses bens (se duraacuteveis naturalmente) ao inveacutes de cancelar o cartatildeo de creacutedito

Logo as referidas medidas natildeo possuem qualquer relaccedilatildeo com o atingimento do fim

almejado (o pagamento de quantia) tendo em vista que natildeo haacute uma relaccedilatildeo meiofim entre

tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a

restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia

ao exequente

Dessa forma nota-se que as medidas de suspensatildeo da CNH retenccedilatildeo de passaporte e

bloqueio do cartatildeo de credito satildeo completamente inadequadas agrave realizaccedilatildeo a que se prestam

Afinal ldquotais medidas soam como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-

lo ao cumprimento da ordem judicial ndash e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a

utilizaccedilatildeo dos meios sancionatoacuterios pelo magistrado ()rdquo167

Como exposto em linhas preteacuteritas o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades

de aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e

razoaacutevel se atendo aos criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas

executivas atiacutepicas ao caso concreto sob pena de converter a medida em de indutiva para

punitiva

A utilizaccedilatildeo de medidas atiacutepicas como a suspensatildeo da carteira de motorista e o

passaporte do devedor abandona a regra da responsabilidade patrimonial e atingem em cheio

o nuacutecleo de direitos inerentes agrave condiccedilatildeo humana

166 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

167 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 115

62

O limite para a aplicaccedilatildeo de tais medidas deve ser a Constituiccedilatildeo Federal e sobretudo

os Direitos fundamentais nela expressos ldquoCom efeito natildeo haacute saiacuteda tampouco soluccedilatildeo eficaz

de um problema sem que se respeite a Lei e o Devido Processo Legal (por mais nobres que

sejam as intenccedilotildees)rdquo 168

Dessa forma a busca desenfreada pelo cumprimento das decisotildees judiciais em

especial na fase executiva natildeo pode ser realizada em sacrifiacutecio de direitos fundamentais O

Poder Judiciaacuterio natildeo pode resolver a crise do processo executoacuterio utilizando de medidas

arbitraacuterias com o propoacutesito de satisfazer obrigaccedilotildees pecuniaacuterias

Eis o dilema que se coloca diante do poder geral de efetivaccedilatildeo ele pode servir de

potente instrumento em prol da tutela jurisdicional executiva entretanto se manejado de

modo improacuteprio serviraacute de instrumento de puniccedilatildeo e humilhaccedilatildeo do executado169

Eacute notoacuterio que se amplamente aplicado o poder geral de efetivaccedilatildeo reduziria os

iacutendices de inadimplecircncia quiccedilaacute resolveria por completo a crise da execuccedilatildeo civil Entretanto

o retrocesso civilizatoacuterio seria irreparaacutevel

168 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo

pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018

169 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

63

5 CONCLUSAtildeO

Como funccedilatildeo jurisdicional que tem como objeto a efetivaccedilatildeo de direitos a execuccedilatildeo

deve sempre buscar a maior satisfaccedilatildeo possiacutevel concretizando integralmente o creacutedito do

exequente isto eacute realizando o direito fundamental agrave tutela executiva do credor Por isso a

adoccedilatildeo de meios executivos atiacutepicos incorporados pelo Coacutedigo de Processo Civil de 2015 por

meio do art139 IV em um primeiro momento podem ser consideradas vaacutelidas visto que

servem de instrumento para a satisfaccedilatildeo e asseguraccedilatildeo de direitos do credor

Entretanto para o oacutergatildeo julgador natildeo cometa arbitrariedades em nome do direito

fundamental agrave execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que seja definido certos limites na adoccedilatildeo do poder

geral de efetivaccedilatildeo

As medidas executivas atiacutepicas natildeo podem ser aplicadas de maneira indiscriminada

logo devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o esgotamento das medidas tiacutepicas e

a possibilidade de cumprimento da obrigaccedilatildeo

Partindo dessa premissa as medidas a serem adotadas pelo juiz no caso concreto

devem ter como baliza os princiacutepios da proporcionalidade e da razoabilidade para que natildeo

ultrapassem a responsabilidade patrimonial do devedor e incidida diretamente sobre sua

pessoa

Para que natildeo seja atingida a pessoa do executado ou seja para que o devedor natildeo

tenha sua dignidade humana viola eacute necessaacuterio que a medida atiacutepica seja adequada e

necessaacuteria

Logo o juiz deveraacute sempre estabelecer uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida

executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia

a gerar o resultado sem violar a dignidade humana do executado

Dessa o juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental a execuccedilatildeo e

determinar uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute

necessaacuterio que a medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado

As medidas que ultrapassam esses limites como a decisatildeo que apreendeu o

passaporte suspensatildeo a CNH e bloqueou o cartatildeo de creacutedito do devedor satildeo meramente

punitivas posto que essas natildeo satildeo as medidas mais adequadas para se atingir o fim almejado

pois natildeo existe propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado

64

uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo

geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente

Medidas como esta servem de embasamento para decisotildees arbitraacuterias e autoritaacuterias de

violaccedilatildeo dos direitos fundamentais transformando o poder geral de efetivaccedilatildeo em

instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com autorizaccedilatildeo judicial

Em suma o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades de aplicaccedilatildeo do poder

geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e razoaacutevel se atendo aos

criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao

caso concreto sob pena de punir a pessoa do executado violando a sua dignidade humana

em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo

65

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  • 1 INTRODUCcedilAtildeO
  • 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO
    • 25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO
      • 3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
        • 31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS
          • 311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15
            • 32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
            • 33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
            • 34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
              • 4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
                • 41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
                • 42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
                  • 5 CONCLUSAtildeO
                  • REFEREcircNCIAS
Page 11: portal.faculdadebaianadedireito.com.brportal.faculdadebaianadedireito.com.br/portal/monografias...A prestação jurisdicional não se concretiza depois de encerrada afase de conhecimento

9

passaram a ser uma fase complementar ao de processo de conhecimento e natildeo mais ocorrer

em um processo autocircnomo

No entendimento do professor processualista Fredie Didier et al8 o processo

sincreacutetico simplificou a efetivaccedilatildeo de um direito reconhecido em sentenccedila

A dispensa do ajuizamento de um processo autocircnomo para execuccedilatildeo de sentenccedila natildeo soacute veio diminuir o tempo necessaacuterio agrave prestaccedilatildeo da tutela jurisdicional - afinal o credor natildeo mais precisaria tal como ocorria ateacute entatildeo promover nova citaccedilatildeo pessoal do reacuteudevedor- como tambeacutem veio romper de vez com um velho paradigma segundo o qual a atividade executiva estaria dissociada da precedente atividade jurisdicional cognitiva

Entretanto natildeo soacute as sentenccedilas de meacuterito ensejam uma execuccedilatildeo Por esta razatildeo foi

necessaacuterio manter o processo autocircnomo de execuccedilatildeo para os casos em que o credor tem a seu

favor um documento que natildeo tenha sido proferido por um oacutergatildeo dotado de jurisdiccedilatildeo

Consequentemente se for o titulo executivo judicial o caminho natural eacute o do

cumprimento de sentenccedila Sendo por sua vez extrajudicial o titulo executivo o caminho

correto eacute o processo de execuccedilatildeo

Cabe ainda salientar que toda execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial eacute definitiva Jaacute a

execuccedilatildeo de tiacutetulo judicial (cumprimento de sentenccedila) pode ser definitiva ou provisoacuteria

No primeiro caso isto eacute cumprimento de sentenccedila definitivo ldquoeacute a execuccedilatildeo completa

que vai ateacute a fase final (com a entrega do bem da vida) sem exigecircncias adicionais para o

exequenterdquo 9

Quanto ao segundo caso ldquoo cumprimento provisoacuterio de sentenccedila (fundada em tiacutetulo

provisoacuterio) eacute aquele que exige alguns requisitos extras para que se chegue agrave fase final da

execuccedilatildeordquo 10

Para Fredie Didier11 o criteacuterio para definir se o cumprimento de sentenccedila seraacute

definitivo ou provisoacuterio

() eacute a estabilidade do tiacutetulo executivo em que se funda a execuccedilatildeo se se tratar de decisatildeo acobertada pela coisa julgada material o cumprimento de sentenccedila eacute

8 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 46 9 Ibid p 57 10 Ibid p 57 11 Ibid p 57

10

definitivo se se tratar de decisatildeo judicial ainda passiacutevel de alteraccedilatildeo (reforma ou invalidaccedilatildeo) em razatildeo da pendecircncia de recurso contra ela interposto a que natildeo tenha sido atribuiacutedo efeito suspensivo o cumprimento de sentenccedila eacute provisoacuterio

Ademais a execuccedilatildeo se distingue em procedimentos executivos comuns que satildeo da

execuccedilatildeo civil e que servem a uma generalidade de creacuteditos como eacute o caso do cumprimento

de sentenccedila e o processo de execuccedilatildeo E em procedimentos executivos especiais que servem

agrave satisfaccedilatildeo de creacuteditos peculiares como a execuccedilatildeo de alimentos e a execuccedilatildeo fiscal 12

Por fim cabe mencionar a classificaccedilatildeo que distingue a execuccedilatildeo em direta e indireta

A primeira execuccedilatildeo direita (ou execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo) eacute ldquo() aquela em que o

Poder Judiciaacuterio prescinde da colaboraccedilatildeo do executado para a efetivaccedilatildeo da prestaccedilatildeo devida

e pois promove uma substituiccedilatildeo da sua conduta pela conduta do proacuteprio Estado-juiz ou de

terceirordquo 13 Ou seja as medidas executivas satildeo levadas a efeito mesmo contra a vontade do

devedor na execuccedilatildeo direta

Segundo a doutrina a execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo se subdivide da seguinte forma

meios de desapossamento meios de transformaccedilatildeo e meios de expropriaccedilatildeo

Os meios de desapossamento muito comuns nas execuccedilotildees para entrega de coisa eacute a

forma ldquopor meio da qual se retira da posse do executado o bem a ser entregue ao exequente

(p ex despejo busca e apreensatildeo reintegraccedilatildeo de posse)rdquo 14 Ao passo que por meio dos de

transformaccedilatildeo ldquo() o juiz determina que um terceiro pratique a conduta que deveria ser

praticada pelo executado cabendo a este arcar com o pagamento do custo respectivordquo 15 Jaacute

os meios executivos de expropriaccedilatildeo eacute a forma ldquopor meio do qual algum bem do patrimocircnio

do devedor eacute expropriado para pagamento do creacutedito (adjudicaccedilatildeo alienaccedilatildeo judicial ou

apropriaccedilatildeo de frutos e rendimentos de empresa ou de estabelecimentos e de outros bens art

825 CPC)rdquo 16

12 Ibid p 48 13 Ibid p 50 14 Ibid p 51 15 Ibid p 51 16 Ibid p 51

11 Jaacute a execuccedilatildeo indireta (ou mandamental) atua ldquo() na vontade do devedor como forma

de compeli-lo ou incentivaacute-lo a cumprir a ordem judicialrdquo 17 Nesse entendimento ainda

leciona Fredie Didier et al 18

Nesses casos o Estado-juiz busca promover a execuccedilatildeo com a colaboraccedilatildeo do executado forccedilando ou incentivando a que ele proacuteprio cumpra a prestaccedilatildeo devida Em vez de o Estado-juiz tomar as providecircncias que deveriam ser tomadas pelo executado o Estado forccedila por meio de coerccedilatildeo psicoloacutegica ou de promessa de recompensa judicial a que o proacuteprio executado cumpra a prestaccedilatildeo

A execuccedilatildeo indireta pode ser patrimonial como por exemplo a imposiccedilatildeo de multa

coercitiva ou pessoal com a prisatildeo civil do devedor de alimentos Ademais adiciona Didier

et al19que

O estiacutemulo ao cumprimento da prestaccedilatildeo pode dar-se pelo temor (p ex multa coercitiva prisatildeo civil do devedor de alimentos divulgaccedilatildeo de notiacutecia em jornal revelando o descumprimento) ou pelo incentivo (p ex a chamada sanccedilatildeo premial ou sanccedilatildeo positiva de que eacute exemplo a isenccedilatildeo do pagamento de custas em caso de cumprimento do mandado monitoacuterio - art 701 sect 1ordm CPC a reduccedilatildeo pela metade dos honoraacuterios advocatiacutecios fixados inicialmente pelo juiacutezo em caso de pagamento integral do deacutebito pecuniaacuterio na execuccedilatildeo por quantia certa fundada em tiacutetulo extrajudicial - art 827 sect 1ordm CPC)

Por tais razotildees haacute uma tendecircncia em cada vez mais prestigiar os meios executivos

indiretos (coercitivos) posto que satildeo tatildeo eficazes quanto os meios executivos diretos

entretanto menos onerosos Contudo sua aplicaccedilatildeo deve ser fiscalizada a fim de natildeo permitir

que a execuccedilatildeo civil perca sua finalidade visto que eacute uma funccedilatildeo jurisdicional que tem como

escopo efetivar o direito do credor e natildeo de atender os interesses do devedor

23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL

Os princiacutepios juriacutedicos nos uacuteltimos anos passaram a ser munidos de forccedila cogente

normatizando as condutas humanas tanto quanto as regras juriacutedicas Os ditos princiacutepios

ampliaram as margens de atuaccedilatildeo dos aplicadores do direito possibilitando a construccedilatildeo de

soluccedilotildees mais adequadas agraves especificidades das demandas que chegam ao judiciaacuterio

17 Ibid p 51 18 Ibid p 51 19 Ibid p 51-52

12 Dessa forma eacute necessaacuterio aprofundar-se nos princiacutepios norteadores da execuccedilatildeo civil

para que se obtenha uma anaacutelise completa da teoria geral da execuccedilatildeo

A execuccedilatildeo civil tem como um dos seus corolaacuterios o princiacutepio da efetividade este

consiste na exigecircncia de um sistema completo de tutela executiva no qual existam meios

executivos capazes de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor

de tutela executivardquo 20

O referido princiacutepio da efetividade eacute reforccedilado como normal fundamental do processo

civil brasileiro pelo art 4ordm do CPC ldquoArt 4ordm As partes tecircm o direito de obter em prazo razoaacutevel

a soluccedilatildeo integral do meacuterito incluiacuteda a atividade satisfativa

Jaacute o princiacutepio da boa feacute processual corolaacuterio do devido processo legal estaacute previsto

no art 5ordm do CPC ldquoAquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de

acordo com a boa-feacuterdquo Segundo o processualista baiano Fredie Didier21

O princiacutepio da boa-feacute extrai-se de uma claacuteusula geral processual A opccedilatildeo por uma claacuteusula geral de boa-feacute eacute a mais correta Eacute que a infinidade de situaccedilotildees que podem surgir ao longo do processo torna pouco eficaz qualquer enumeraccedilatildeo legal exaustiva das hipoacuteteses de comportamento desleal Daiacute ser correta a opccedilatildeo da legislaccedilatildeo brasileira por uma norma geral que impotildee o comportamento de acordo com a boa-feacute Em verdade natildeo seria necessaacuteria qualquer enumeraccedilatildeo das condutas desleais o art 5deg do CPC eacute bastante exatamente por tratar-se de uma claacuteusula geral

Dessa forma o dito princiacutepio preconiza que diante de um vinculo juriacutedico as pessoas

envolvidas natildeo poderatildeo frustrar a confianccedila do outro devendo comportar-se como se pode

esperar de uma pessoa de boa-feacute

Ademais disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial que ldquosomente o

patrimocircnio do devedor (art 789 CPC) ou de terceiro responsaacutevel pode ser objeto da

atividade executiva do Estadordquo 22

O referido princiacutepio que determina que somente o patrimocircnio submete-se agrave execuccedilatildeo

e natildeo a pessoa foi trazido pela humanizaccedilatildeo do direito Para o professor Didier et al23 o

20 DIDIER JR Freddie et al apud GUERRA Marcelo Lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do

credor na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 21 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte

geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 105 22 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 68

13

desenvolvimento dos meios de execuccedilatildeo indireta ldquoparece relativizar um pouco esse princiacutepio

na medida em que pressionam psicologicamente a pessoa do devedor para que cumpra a

obrigaccedilatildeo com seu comportamentordquo

Complementa ainda que

A responsabilidade executiva parece assumir atualmente caraacuteter hiacutebrido comportando coerccedilatildeo pessoal e sujeiccedilatildeo patrimonial

i) a coerccedilatildeo pessoal incide sobre a vontade do devedor admitindo o uso de medidas coercitivas de execuccedilatildeo indireta para forccedilaacute-lo a cumprir a obrigaccedilatildeo com seu proacuteprio comportamento (ex arts 139 rv 523 sect 1ordm 536 sect 1ordm e 538 sect 3ordm todos do CPC)

ii) descumprida a obrigaccedilatildeo e natildeo sendo possiacuteveladequado o uso de teacutecnica de coerccedilatildeo pessoal tem-se a sujeiccedilatildeo patrimonial que recairaacute sobre os bens do devedor ou de terceiro responsaacutevel - que responderatildeo pela proacutepria prestaccedilatildeo in natura (ex dar coisa ou entregar quantia) ou por perdas e danos24

Dessa forma o referido princiacutepio natildeo tem aplicaccedilatildeo absoluta em razatildeo do principio da

efetividade a qual estimula o uso dos meios de coerccedilatildeo indireta para garantir o cumprimento

da obrigaccedilatildeo pelo devedor

O princiacutepio da primazia da tutela especifica (ou princiacutepio do resultado) assevera que

ldquoA execuccedilatildeo deve ser especiacutefica propiciar ao credor a satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo tal qual

houvesse o cumprimento espontacircneo da prestaccedilatildeo pelo devedorrdquo 25

O CPC de 2015 absorveu todos os avanccedilos legislativos a cerca do mote O caput do

art 497 assegura que na accedilatildeo que tenha por objeto a prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer o

juiz se procedente o pedido concederaacute a tutela especiacutefica ou determinaraacute providecircncias que

assegurem a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico equivalente O art 499 o

complementa a obrigaccedilatildeo somente seraacute convertida em perdas e danos se o autor o requerer

ou se impossiacutevel agrave tutela especiacutefica ou a obtenccedilatildeo de tutela pelo resultado praacutetico

equivalente

O princiacutepio do contraditoacuterio eacute garantido pela constituiccedilatildeo federal e compreende o

direito de ser ouvido o direito de acompanhar os atos processuais o direito de produzir

provas participar da sua produccedilatildeo manifestar-se sobre a prova produzida e obter do juiz a

23 Ibid p 69-70 24 Ibid p 70 25 Ibid p 71

14

respectiva valoraccedilatildeo o direito de ser informado regularmente dos atos praticados no processo

o direito agrave motivaccedilatildeo das decisotildees o direito de impugnar as decisotildees 26

O contraditoacuterio tem aplicaccedilatildeo em todo processo judicial sendo aplicaacutevel tambeacutem na

execuccedilatildeo No entanto o contraditoacuterio na execuccedilatildeo natildeo ocorre com a mesma intensidade que

no processo ou na fase de conhecimento eacute o que assevera Didier et al 27

O contraditoacuterio no procedimento executivo no aspecto do direito de defesa assegurado agrave parte demandada eacute eventual porquanto depende da provocaccedilatildeo do executado que natildeo eacute chamado ajuiacutezo para defender-se mas sim para cumprir a obrigaccedilatildeo O procedimento executivo adota a teacutecnica monitoacuteria que consiste basicamente na inversatildeo do ocircnus de provocar o contraditoacuterio o reacuteu em vez de citado para manifestar-se sobre a pretensatildeo do autor eacute convocado para cumprir uma determinada obrigaccedilatildeo

Logo haacute o contraditoacuterio no procedimento executivo porem eacute eventual quanto agrave defesa

do executado

Ademais o princiacutepio da menor onerosidade eacute consagrado pelo art 805 do CPC e

dispotildee que ldquoQuando por vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz

mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o executadordquo O referido princiacutepio tem o

escopo de impedir o abuso do direito pelo exequente

O principio da menor onerosidade auxilia o juiz na escolha de um meio executivo

adequado e necessaacuterio que satisfaccedila a prestaccedilatildeo exigida pelo credor Nesse sentido eacute o

entendimento do professor Fredie Didier et al 28

O resultado a ser alcanccedilado eacute aquele estabelecido pelo direito material A maneira de se chegar ateacute esse resultado eacute que deve ser a menos onerosa possiacutevel para o executado Isso significa que a opccedilatildeo pelo meio menos gravoso pressupotildee que os diversos meios considerados sejam igualmente eficazes Assim havendo vaacuterios meios executivos aptos agrave tutela adequada e efetiva do direito de creacutedito escolhe-se a via menos onerosa ao executado

O princiacutepio visa impedir a execuccedilatildeo desnecessariamente onerosa ao executado ou seja a execuccedilatildeo abusiva Em vez de enumerar situaccedilotildees em que a opccedilatildeo mais gravosa revelar-se-ia injusta o legislador valeu-se corretamente de uma claacuteusula geral para reputar abusivo qualquer comportamento do credor que pretender valer-se de meio executivo mais oneroso do que outro igualmente idocircneo agrave satisfaccedilatildeo do seu creacutedito

26 Ibid p 76 27 Ibid p 78 28 Ibid p 79-80

15 O princiacutepio da cooperaccedilatildeo tem como base os princiacutepios do devido processo legal da

boa-feacute processual e do contraditoacuterio O dito princiacutepio avigora a eacutetica processual com o

aprimoramento do diaacutelogo entre as partes reciprocamente e com o oacutergatildeo jurisdicional Eacute o

que preconiza o art 6ordm do CPC Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para

que se obtenha em tempo razoaacutevel decisatildeo de meacuterito justa e efetiva

No procedimento executivo o princiacutepio da cooperaccedilatildeo incide de diversas formas

disciplina Didier et al29 que na execuccedilatildeo

O executado tem o dever de indicar bens agrave penhora (art 774 V CPC) Natildeo encontrados bens penhoraacuteveis e natildeo havendo indicaccedilatildeo de qualquer um deles pelo exequente cabe ao executado declarar quais satildeo seus bens penhoraacuteveis sob pena de se sujeitar a uma sanccedilatildeo pecuniaacuteria compulsoacuteria

Tambeacutem eacute manifestaccedilatildeo do princiacutepio da cooperaccedilatildeo a exigecircncia de que o executado que pretende impugnar o valor da execuccedilatildeo apresente de logo o valor que reputa devido (art 525 sect 4ordm CPC) Seria comportamento natildeo-cooperativo afirmar que a cobranccedila eacute excessiva sem simultaneamente dizer qual eacute o valor correto

Demais disso aplicam-se agrave execuccedilatildeo os deveres que decorrem do princiacutepio da cooperaccedilatildeo e que satildeo imputados ao oacutergatildeo jurisdicional () Assim por exemplo deve o juiz advertir ao executado antes de puni-lo de que seu ato pode vir a caracterizar-se como atentatoacuterio agrave dignidade da jurisdiccedilatildeo ( art 772 II CPC) perceba que se trata de uma conduta compatiacutevel com o dever de prevenccedilatildeo O oacutergatildeo jurisdicional somente pode conhecer da prescriccedilatildeo ex officio dando a oportunidade de o exequente manifestar-se conforme impotildee o dever de consulta ( cf arts 10 487 paraacutegrafo uacutenico e 921 sect 5ordm CPC)

O princiacutepio ou postulado30 da proporcionalidade tem aplicaccedilatildeo muito relevante na

execuccedilatildeo O art 8 do CPC assegura que o oacutergatildeo jurisdicional tem o dever de observar a

proporcionalidade e a razoabilidade ao aplicar o ordenamento juriacutedico inclusive no

procedimento executivo

Ademais o art 805 do CPC eacute categoacuterico ao disciplinar que ldquoArt 805 Quando por

vaacuterios meios o exequente puder promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo

menos gravoso para o executadordquo O referido artigo jaacute se trata de uma concretizaccedilatildeo da

proporcionalidade

29 Ibid p 82 30 Segundo Fredie Didier et al haacute uma discussatildeo doutrinaacuteria sobre a proporcionalidade Parte da

doutrina acredita que a proporcionalidade eacute um princiacutepio e outra parte acredita que eacute um postulado normativo

16 O principio da adequaccedilatildeo pode ser vislumbrado em dois momentos do Direito

Processual ldquoa) no legislativo como orientador da confecccedilatildeo das leis b) no jurisdicional

autorizando ao juiz diante do caso concreto adaptar procedimento agraves suas peculiaridadesrdquo 31

Para Luceacutelia de Sena Alves e Tiago Retes32

Isso quer dizer que no momento legislativo o devido processo deve ser observado pelo legislador para a confecccedilatildeo das normas de direito processual que iratildeo servir de instrumento efetivo de concretizaccedilatildeo do direito substancial a ser tutelado atendendo a todas as suas finalidades sob pena de falecircncia do proacuteprio direito No momento jurisdicional da mesma forma a via processual escolhida pelo autor tambeacutem deve estar sujeita a este princiacutepio para que natildeo sofra as mesmas consequecircncias da sua inobservacircncia

O ordenamento juriacutedico deve ser aplicado por meio da teacutecnica processual adequada

evitando dessa forma uma tutela ineficaz

Por fim o princiacutepio do autorregramento da vontade na execuccedilatildeo tem o objetivo de

ldquo() preservar um espaccedilo processual para o exerciacutecio da liberdade e da vontade em que

sejam permitidas negociaccedilotildees que envolvam as partes ndash e tambeacutem o juizrdquo33 Didier et al34

assevera que

A rigor o legislador estabelece um regime juriacutedico de autorregramento da vontade processual identificando-se algumas manifestaccedilotildees relevantes para a execuccedilatildeo Na verdade pode-se dizer que poucos satildeo os ambientes mais propiacutecios do que a execuccedilatildeo para a negociaccedilatildeo sobre o processo Todos os institutos e normas processuais relativos agrave execuccedilatildeo devem ser repensados a partir da premissa de que o CPC permite uma ampla margem de liberdade de negociaccedilatildeo sobre o processo (art 190 CPC)

O autorregramento da vontade pode ser vislumbrando na previsatildeo de negoacutecios tiacutepicos

em sede de execuccedilatildeo como por exemplo no acordo das partes sobre o valor do bem que

dispensa a avaliaccedilatildeo disposto no inciso I do art 871 CPC Ademais dentro dos limites do art

190 do CPC eacute possiacutevel na execuccedilatildeo a atribuiccedilatildeo da negociaccedilatildeo atiacutepica aos sujeitos 31 ALVES Luceacutelia de Sena Alves RETES Tiago O poder geral de efetivaccedilatildeo das decisotildees judiciais e

proporcionalidade uma anaacutelise criacutetica acerca do art 139 IV do Novo Coacutedigo de Processo Civil Disponiacutevel em lthttpswwwacademiaedu31752652O_poder_geral_de_efetivaC3A7C3A3o_das_decisC3B5es_judiciais_e_a_proporcionalidade_uma_anC3A1lise_crC3ADtica_acerca_do_art_139_IV_do_Novo_CC3B3digo_de_Processo_Civil gt Acesso em 25 de julho de 2018

32 Ibid natildeo paginado 33 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 85 34 Ibid p 85

17

processuais permitindo que sejam feitas mudanccedilas nos procedimentos e nas situaccedilotildees

juriacutedicas processuais ldquoSatildeo exemplos de negoacutecios processuais atiacutepicos na execuccedilatildeo pacto de

penhorabilidade acordo de ampliaccedilatildeo de prazos das partes de qualquer natureza acordo de

rateio de despesas processuais ()rdquo35

24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO

Sempre houve diversos questionamentos quanto agrave eficaacutecia do Direito processual Civil

e se o mesmo era meio apto a assegurar a tutela jurisdicional dos direitos dos cidadatildeos O

processo de execuccedilatildeo eacute o setor que sofre mais criacuteticas quanto a sua ineficiecircncia afinal a

execuccedilatildeo civil sempre foi o ldquocalcanhar de Aquilesrdquo do sistema processual pela praxe do

ldquoganhou (no processo de conhecimento) mas natildeo levou (na fase de cumprimento ou

execuccedilatildeo)rdquo 36

Essa dificuldade de se efetivar a tutela satisfastiva natildeo se resume a um problema de

mera teacutecnica processual tiacutepico de determinado ordenamento mas representa uma prova de

fogo da capacidade dos instrumentos jurisdicionais O autor Leonardo Greco37 no ano de

2005 atribuiu esse fato as seguintes causas o excesso de processos o custo e a morosidade da

justiccedila a inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios a ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais

um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico e a progressiva volatizaccedilatildeo dos bens

Quanto ao excesso de processos o referido autor aduz que ldquonos grandes centros o

crescimento da maacutequina judiciaacuteria natildeo acompanhou a expansatildeo do nuacutemero de litiacutegiosrdquo 38

O custo e morosidade da justiccedila prejudicam a tutela satisfativa posto que

ldquojaacute desfalcado pelo inadimplemento do devedor o credor ainda tem de arcar com o adiantamento das despesas do processo de execuccedilatildeo e de eventual liquidaccedilatildeo vendo arrastar-se a marcha dos atos executoacuterios facilmente retardada por atos procrastinatoacuterios do devedorrdquo 39

35 Ibid p 86 36 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca

para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018

37 GRECCO Leonardo A Crise do Processo de Execuccedilatildeo in Estudos de direito processual Leonardo Greco ndash Campos dos Goytacazes Ed Faculdade de Direito de Campos 2005 p 7

38 Ibid p 7 39 Ibid p 7-8

18 A inadequaccedilatildeo dos procedimentos executoacuterios contribui para a crise do processo de

execuccedilatildeo tendo em vista que

ldquoo juiz da execuccedilatildeo prisioneiro de ritos que o distanciam das partes e da realidade da vida impulsiona sem qualquer apetite a execuccedilatildeo conduzindo-a ao sabor dos ventos das provocaccedilotildees impacientes do credor e das costumeiras procrastinaccedilotildees do devedorrdquo 40

Jaacute ineficaacutecia das coaccedilotildees processuais atrapalha a efetivaccedilatildeo da tutela satisfativa ldquoo

devedor natildeo colabora com a execuccedilatildeo e os meios de pressatildeo que a lei estabelece natildeo satildeo

suficientes para intimidaacute-lordquo 41

Com um novo ambiente econocircmico e socioloacutegico

O espiacuterito empresarial e a sociedade de consumo estimulam o endividamento das pessoas e o inadimplemento das obrigaccedilotildees pelo devedor deixou de ser vexatoacuterio e reprovaacutevel o que multiplica as accedilotildees de cobranccedila e execuccedilotildees atraveacutes das quais o sujeito passivo ainda usufrui vantagens agraves custas do credor 42

Por fim Leonardo Greco elenca a volatizaccedilatildeo dos bens como o uacuteltimo fator que

macula o processo executo tendo em vista que

ldquomudou inteiramente o perfil patrimonial das pessoas antes concentrado em bens de raiz e agora tendencialmente dirigido a investimentos em tiacutetulos e valores facilmente negociaacuteveis o que dificulta a sua localizaccedilatildeo pelo credorrdquo 43

O Coacutedigo de Processo Civil de 1973 introduziu o sistema executivo ao ordenamento

juriacutedico paacutetrio e seguindo os valores liberais da eacutepoca com a proteccedilatildeo de esfera juriacutedica de

liberdade do cidadatildeo contra a possibilidade de arbiacutetrio do Estado e uso indevido do Poder

jurisdicional outorgou o miacutenimo de poder ao juiz Seguindo as regras do CPC de 73 o

devedor soacute poderia ter sua esfera juriacutedica invadida atraveacutes de meios de execuccedilatildeo instituiacutedos

previamente em lei

Diante de tantos obstaacuteculos para se efetivar a tutela satisfativa a execuccedilatildeo estava

fadada ao fracasso o que frustrava a expectativa do jurisdicionado a uma prestaccedilatildeo da tutela

jurisdicional ceacutelere e efetiva Insatisfeitos com o cenaacuterio que se encontrava a atividade

40 Ibid p 8 41 Ibid p8 42 Ibid p 8 43 Ibid p8

19

executiva legisladores e operadores do direito natildeo mediram esforccedilos para promover uma

evoluccedilatildeo significativa buscando mais eficiecircncia e celeridade ao procedimento executoacuterio

Dessa forma no final de 1994 foi introduzido no coacutedigo de processo agrave flexibilizaccedilatildeo

dos poderes executoacuterios do juiz ldquopara que ele pudesse prestar uma tutela efetiva aos direitos

ficando autorizado a determinar a modalidade de execuccedilatildeo adequada a cada hipoacutetese nas

obrigaccedilotildees de fazer e natildeo fazer (art 461 sect5ordm do CPC de 1973)rdquo No ano de 2002 a referida

medida foi estendida para as obrigaccedilotildees de entregar coisa (art 461-A caput e sect3ordm do CPC de

1973)

Com fundamento nos artigos 461 e 461-A em 2005 a Lei nordm 11 23205 unificou o

processo de conhecimento e o processo de execuccedilatildeo de sentenccedila Nesse sentido Maacuterio

Henrique Cavalcanti Gil Rodrigues44 aduz que

A Lei 112322005 reuniu de forma definitiva os processos de conhecimento e de execuccedilatildeo em um uacutenico processo composto por um sistema bifaacutesico Assim passa a existir uma fase inicial (de reconhecimento) e uma fase posterior (de cumprimento de sentenccedila de efetivaccedilatildeo da decisatildeo definitiva) sem contar com a eventual fase intermediaacuteria de liquidaccedilatildeo (RODRIGUES 2010 p 38)

Ademais as alteraccedilotildees realizadas no CPC de 73 inseriu a atipicidade dos meios

executivos nas obrigaccedilotildees de fazer natildeo fazer e dar coisa certa entretanto exercendo papel

subsidiaacuterio aos meios tiacutepicos

Quanto agraves obrigaccedilotildees de pagar quantia havia apenas a possibilidade de se valer da

incidecircncia de multa do art 475-J do CPC de 73 ndash implementada mediante reforma perpetrada

pela Lei nordm 11232 de 2005 em atendimento a doutrina processualista preocupada com a

efetividade das decisotildees ndash e de atos executivos como a penhora de bens e dinheiro

Ainda que a execuccedilatildeo tenha avanccedilado com a inserccedilatildeo das leis posteriores a 1994 no

CPC de 1973 a mesma continuava insuficiente tendo em vista que a burocracia e lentidatildeo

dos atos executivos davam brechas para que o devedor escondesse seu patrimocircnio penhoraacutevel

tornando carente de efetividade e celeridade agrave execuccedilatildeo

44 RODRIGUES Maacuterio Henrique Cavalcanti Gil A evoluccedilatildeo da execuccedilatildeo de sentenccedila no direito

processual civil e o novo regime juriacutedico das sentenccedilas apoacutes a reforma implementada pela Lei 112322005 Revista do Tribunal Regional Federal da 1ordf Regiatildeo v 22 n 2 fev 2010 p 38

20

25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO

A tutela juridiscional eacute um direito fundamental previsto no art 5ordm inciso XXXV da

Carta Magna ldquo() a lei natildeo excluiraacute da apreciaccedilatildeo do Poder Judiciaacuterio lesatildeo ou ameaccedila a

direitordquo

Na visatildeo claacutessica o direito de accedilatildeo era efetivado com a prolaccedilatildeo de uma sentenccedila de

meacuterito posiccedilatildeo adotada por grande parte dos processualistas seguidores da doutrina de

Liebman Todavia esse conceito se mostra defasado tendo em vista que o direito de acesso agrave

justiccedila natildeo eacute apenas uma garantia formal de bater as portas do judiciaacuterio mas a garantia de

acesso agrave ordem juriacutedica justa adequada e eficaz45

Acreditar que uma sentenccedila de meacuterito favoraacutevel eacute tutela jurisdicional suficiente para

satisfazer o que se busca com o ajuizamento da accedilatildeo eacute uma visatildeo distorcida da atividade

satisfativa ldquoSob o ponto de vista do direito material a condenaccedilatildeo por si soacute eacute incapaz de

prestar a tutela do direitordquo46

Nessa oacutetica o direito fundamental agrave tutela executiva exige um sistema de tutela

jurisdicional ldquocapaz de proporcionar pronta e integral satisfaccedilatildeo a qualquer direito merecedor

de tutela executivardquo47 Dessa forma entende-se que

ldquo() a) a interpretaccedilatildeo das normas que regulamentam a tutela executiva tem de ser feita no sentido de extrair a maior efetividade possiacutevel b) o juiz tem o poder-dever de deixar de aplicar uma norma que imponha uma restriccedilatildeo a um meio executivo sempre que essa restriccedilatildeo natildeo se justificar como forma de proteccedilatildeo a outro direito fundamental c) o juiz tem o poder-dever de adotar os meios executivos que se revelem necessaacuterios agrave prestaccedilatildeo integral de tutela executivardquo48

Egrave imperioso compreender que o direito fundamental agrave tutela executiva ratificado

pelo CPC eacute essencial para dirimir diversos litiacutegios oriundos do procedimento executivo

45 FERREIRA Gabriela Macedo Poder geral de efetivaccedilatildeo em defesa da constitucionalidade da

teacutecnica de execuccedilatildeo dos direitos do art 139 IV do Coacutedigo de Processo Civil Revista Jus Navigandi ISSN 1518-4862 Teresina ano 22 n 5178 4 set 2017 Disponiacutevel em lthttpsjuscombrartigos60190gt Acesso em 11 set 2018

46 Ibid natildeo paginado 47 DIDIER JR Fredie et al apud GUERRA Marcelo lima Direitos fundamentais e a proteccedilatildeo do credor

na execuccedilatildeo civil Satildeo Paulo RT 2002 p 102 48 Ibid p 102-104

21

ldquoprincipalmente aqueles relacionados agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo49

Fredie Didier et al50 cita como exemplo as hipoacuteteses de impenhorabilidade

A impenhorabilidade de certos bens eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa

Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais

Por esta razatildeo o legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do

CPC fazendo um preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses das partes envolvidas

optando pela mitigaccedilatildeo do direito do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado

Quando o oacutergatildeo jurisdicional verificar que a aplicaccedilatildeo das regras de

impenhorabilidade eacute desproporcional para o caso concreto deve afastaacute-la e construir a

soluccedilatildeo adequada para o referido caso Didier et al51 traz um exemplo esclarecedor em sua

obra

O bem imoacutevel que serve de moradia da famiacutelia eacute relativamente impenhoraacutevel Objetiva-se com essa restriccedilatildeo proteger o direito fundamental agrave moradia conteuacutedo do direito agrave proteccedilatildeo da dignidade Imagine-se um imoacutevel de altiacutessimo valor Imagine-se agora um creacutedito que corresponda a 40 do valor do imoacutevel A venda judicial do imoacutevel no caso permitiria natildeo soacute satisfazer o direito do credor como ainda garantir ao executado com a sobra a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel que lhe preserve a dignidade A opccedilatildeo pela interpretaccedilatildeo literal da regra que veda a penhora protegeria exclusivamente o direito do executado de maneira desnecessaacuteria porque a relaccedilatildeo valor executadovalor do bem permitiria a aquisiccedilatildeo de outro imoacutevel apoacutes a entrega do dinheiro ao credor Seria pois interpretaccedilatildeo em desconformidade com os preceitos da contemporacircnea hermenecircutica constitucional que preconiza a necessidade de nos casos de choque entre direitos fundamentais dar a interpretaccedilatildeo que mais adequadamente proteja a ambos

A execuccedilatildeo civil integra o direito fundamental agrave tutela jurisdicional disciplinando

que ldquoos dispositivos devem ser interpretados de modo que se garanta a maior efetividade

49 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66 50 Ibid p 66 51 Ibid p 67

22

possiacutevel agrave execuccedilatildeo desde que respeitados outros direitos fundamentaisrdquo52 Podendo ser

afastada desde que proporcional qualquer obstaacuteculo irrazoaacutevel agrave efetivaccedilatildeo desse direito

52 FERREIRA Gabriela Macedo apud MACEDO Lucas Buril de As eficaacutecias das decisotildees judiciais e

o cumprimento de sentenccedila no CPC15 Novo CPC Doutrina selecionada v 5 Execuccedilatildeo Coordenador geral Fredie Didier Jr organizadores Lucas Buril de Macedo Ravi Peixoto Alexandre Freire ndash Salvador Jus Podivm 2015 p 360361

23

3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO

EXECUTADO

31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS

Como forma de controlar a atividade jurisdicional por muito tempo vigorou o

entendimento de que a execuccedilatildeo somente poderia ser realizada atraveacutes dos meios executivos

tipicamente previstos na legislaccedilatildeo Segundo Luiz Guilherme Marinoni53

O princiacutepio da tipicidade deseja significar que os meios de execuccedilatildeo devem estar previstos na lei e assim que a execuccedilatildeo natildeo pode ocorrer atraveacutes de formas executivas natildeo tipificadas O seu objetivo eacute de um lado impedir que meio executivo natildeo previsto em lei possa ser utilizado e de outro garantir o jurisdicionado contra a possibilidade de arbiacutetrio judicial na fixaccedilatildeo da modalidade executiva Se o jurisdicionado sabe em razatildeo de previsatildeo legal que a sua esfera juriacutedica somente poderaacute ser invadida atraveacutes de determinadas modalidades executivas confere-se a ele a possibilidade de antever a reaccedilatildeo ao seu inadimplemento bem como a garantia de que a jurisdiccedilatildeo natildeo determinaraacute ou permitiraacute a utilizaccedilatildeo de meio executivo diverso daqueles previstos

Dessa forma o princiacutepio da tipicidade disciplina que o oacutergatildeo julgador ao proceder agrave

execuccedilatildeo estaacute limitado aos meios executivos previamente definidos em lei natildeo podendo se

valer de qualquer teacutecnica de efetivaccedilatildeo que natildeo se encaixasse nas hipoacuteteses taxativas da

legislaccedilatildeo

Entretanto o legislador natildeo tem como prever todas as peculiaridades dos direitos

dignos de tutela executiva e preordenar teacutecnicas executivas diversas para cada peculiaridade

Sob esse cenaacuterio o principio da tipicidade foi cedendo lugar ao principio da atipicidade dos

meios executivos

A ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do oacutergatildeo julgador estaacute cada vez mais presente

no ordenamento juriacutedico paacutetrio motivando um poder geral de efetivaccedilatildeo ldquoque permite ao

julgador valer-se dos meios executivos que considerar mais adequado ao caso concreto sejam

eles de coerccedilatildeo direta sejam de coerccedilatildeo indiretardquo 54

53 MARINONI Luiz Guilherme Teacutecnica processual e tutela dos direitos Satildeo Paulo Editora Revista

dos Tribunais 2004 p 212 nota 79 54 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 100

24

Essa tendecircncia de ampliaccedilatildeo dos poderes executivos do juiz natildeo eacute exclusividade do

ordenamento juriacutedico brasileiro segundo Fredie Didier et al55

Michelle Taruffo jaacute apontava que o direito americano diante da inefetividade dos meios executivos at law comeccedilou a autorizar o magistrado a tomar medidas executivas adequadas ao caso concreto Trata-se afirma o jurista italiano de aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo segundo o qual as regras processuais devem ser adaptadas agraves necessidades do direito material

Os meios executivos atiacutepicos derivam de trecircs enunciados normativos do Coacutedigo de

Processo Civil o art 139 IV o art 297 e o sect1ordm do art 536

O art 139 IV do CPC dispotildee que pertence ao juiz o poder-dever de ldquodeterminar

todas as medidas indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para

assegurar o cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto

prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo

Jaacute o art 297 do CPC cuida da tutela provisoacuteria e garante que ldquoo juiz poderaacute

determinar as medidas que considerar adequadas para a efetivaccedilatildeo da tutela provisoacuteriardquo

Podendo dessa forma a dita tutela ser efetivada atipicamente

Por fim o art 536 sect1ordm do CPC dispotildee que

Para atender ao disposto no caput o juiz poderaacute determinar entre outras medidas a imposiccedilatildeo de multa a busca e apreensatildeo a remoccedilatildeo de pessoas e coisas o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva podendo caso necessaacuterio requisitar o auxilio de forccedila policial

As supracitadas medidas executivas atiacutepicas satildeo entendidas pela doutrina como

claacuteusulas gerais processuais executivas56 Essas claacuteusulas gerais natildeo restringem a sua

aplicaccedilatildeo agraves teacutecnicas de coerccedilatildeo indireta satildeo autorizados tambeacutem o uso de meios de execuccedilatildeo

dieta e indireta

Ademais cumpre salientar que o art 139 IV CPC aplica-se a toda e qualquer

atividade executiva ldquoa) seja fundada em tiacutetulo executivo judicial (provisoacuteria ou definitiva)

55 DIDIER JR Fredie et al apud TARUFFO Michelle A atuaccedilatildeo executiva dos direitos perfis

comparatiacutesticos Revista de Processo Satildeo Paulo RT 1990 n 59 p 78 56 Segundo Fredie Didier et al claacuteusula geral eacute uma espeacutecie de texto normativo cujo antecedente

(hipoacutetese faacutetica) eacute composto por termos vagos e consequente (efeito juriacutedico) eacute indeterminado

25

seja fundada em tiacutetulo executivo extrajudicial b) seja para efetivar prestaccedilatildeo pecuniaacuteria seja

para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer ou dar coisa distinta de dinheirordquo57

Jaacute o art 297 do CPC garante que a tutela provisoacuteria possa ser efetivada tambeacutem

atipicamente ldquoSucede que a atipicidade da tutela provisoacuteria segue necessariamente a

atipicidade da tutela definitivardquo 58

Por fim o comando do sect 1 ordmdo art 536 se aplica

a) inicialmente agrave execuccedilatildeo de fazer e de natildeo fazer fundada em decisatildeo judicial (provisoacuteria ou definitiva) b) por forccedila do sect 3ordm do art 538 tambeacutem se aplica ao cumprimento de sentenccedila para entrega de coisa c) por forccedila do art 771 paraacutegrafo uacutenico o dispositivo tambeacutem se aplica agrave execuccedilatildeo para efetivar prestaccedilatildeo de fazer natildeo fazer e entregar coisa distinta de dinheiro fundada em tiacutetulo extrajudicial

Claramente o art 139 IV eacute mais amplo do que o sect 1 ordm do art 536 estende-se por

disposiccedilatildeo expressa agrave execuccedilatildeo de pagar quantia Sendo uma grande novidade nas obrigaccedilotildees

que tem por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15

O art 139 IV do CPC apresentou uma novidade agrave atipicidade dos meios executivos

ao disciplinar que cabe ao juiz ldquodeterminar todas as medidas indutivas coercitivas

mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o cumprimento de ordem judicial

inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteriardquo

A inovaccedilatildeo estaacute na possibilidade de utilizar os meios atiacutepicos para assegurar o

cumprimento de decisotildees que versam sobre as obrigaccedilotildees pecuniaacuterias sendo admitida a

utilizaccedilatildeo de outros meios ateacute na execuccedilatildeo de titulo judicial de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria aleacutem da

multa de 10 (a que se refere o artigo 523 sect 1ordm do CPC) para forccedilar o devedor a cumprir a

obrigaccedilatildeo pecuniaacuteria

57 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 105 58 Ibid p 105

26

Dessa forma eacute possiacutevel afirmar que ldquoao lado da disciplina tiacutepica do art 523 e

seguintes () o novo CPC inova ao permitir que o sistema de teacutecnicas executivas atiacutepicas

sejam empregadas na execuccedilatildeo monetaacuteriardquo59 (ZARONI VITORELLI 2016 p 66)

Fernando da Fonseca Gajardoni60 denomina a dita medida como a ldquorevoluccedilatildeo

silenciosardquo da execuccedilatildeo por quantia certa posto que

() pelo fato de que a regra natildeo estar propriamente incrustrada nos capiacutetulo e livro atinentes ao cumprimento de sentenccedila e ao processo de execuccedilatildeo ndash o art 139 IV do Novo CPC parece trazer ao paiacutes algo bastante novo cuja aplicaccedilatildeo a depender do comportamento do Judiciaacuterio pode implicar em verdadeira revoluccedilatildeo (positiva ou negativa) na sistemaacutetica executiva ateacute entatildeo vigente

Claramente o dispositivo foi recebido com entusiasmo por parte da doutrina que

anteciparam em afirmar que o princiacutepio da atipicidade dos meios executivos no CPC2015

ldquo() assume a feiccedilatildeo de poder-dever geral conferido ao magistrado de determinar () todas

as medidas coercitivas sub-rogatoacuterias mandamentais e indutivas que entender necessaacuterias

para a tutela justa efetiva e em tempo razoaacutevelrdquo 61

Dessa forma lecionam Luiz Guilherme Marinoni Seacutergio Cruz Arenhart e Daniel

Mitidiero62 que

O juiz a partir do art 139 IV do CPC2015 natildeo estaacute mais adstrito apenas agrave sentenccedila condenatoacuteria ndash que fixa a obrigaccedilatildeo de pagar e daacute ensejo agrave abertura da execuccedilatildeo por sub-rogaccedilatildeo patrimonial ndash para a tutela de prestaccedilotildees pecuniaacuterias Pode impor essa prestaccedilatildeo por meio de ordem judicial acoplada ao aceno de emprego de medida de induccedilatildeo (coercitiva ou de pressatildeo positiva) ou de medida de sub-rogaccedilatildeo (MARINONI ARENHARDT MITIDIERO 2015 p 703)

Deste modo em razatildeo do art 139 IV do CPC tem-se entendido que o juiz nas

execuccedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo pecuniaacuteria possui a faculdade de adotar qualquer

59 ZARONI Bruno Marzullo VITORELLI Edilson Reforma e efetividade da execuccedilatildeo no novo CPC

In PEIXOTO Ravi FREIRE Alexandre MENDES Aluiacutesio Gonccedilalves de Castro Execuccedilatildeo 2 ed rev e atual Salvador JusPodivm 2016 766 p (Coleccedilatildeo novo CPC doutrina selecionada v 5) p 66

60 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia 24082015 JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Acesso em 23082018

61 LIMA Rafael de Oliveira A atipicidade dos meios executivos no coacutedigo de processo civil brasileiro de 2015 Revista de Processo Jurisdiccedilatildeo e Efetividade da Justiccedila v 2 n 2 juldez 2016 p 11

62 MARINONI Luiz Guilherme ARENHART Seacutergio Cruz MITIDIERO Daniel Novo curso de processo civil tutela dos direitos mediante procedimento comum Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 v 2 p 703

27

medida indutiva coercitiva mandamentais ou sub-rogatoacuterias para efetivar o creacutedito do

exequente natildeo se limitando as medidas tiacutepicas

Alguns doutrinadores se precipitaram ao afirmar que o dito dispositivo ldquo() autoriza o

juiz a utilizar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir ressalvando-se a prisatildeo

civil constitucionalmente limitada ao devedor de alimentosrdquo 63 Acreditam Jorge Bheron

Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa que o entusiasmo por parte da

doutrina abre margem para as mais variadas formas de compelir o devedor a cumprir com a

prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

ldquoE aiacute persistindo no mau vezo de fazer explicaccedilotildees em abstrato ignorando que o sentindo soacute se daacute na aplicaccedilatildeo (situaccedilatildeo concreta real ou fictiacutecia) as sugestatildeo satildeo as mais engenhosas suspensatildeo de CNH retenccedilatildeo de passaporte restriccedilatildeo de fim de semana cancelamento de cartotildees de creacutedito ndash para ficar apenas nestasrdquo 64

Ou seja podendo o juiz natildeo apenas substituir o devedor tomando seu patrimocircnio para

entregar ao credor na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de pagar quantia como tambeacutem poderaacute

pressionaacute-lo psicologicamente a adimplir por conta proacutepria a obrigaccedilatildeo

Ademais o Enunciado nordm 48 do ENFAM avalia expressamente a possibilidade de

imposiccedilatildeo de medidas coercitivas para a efetivaccedilatildeo da execuccedilatildeo pecuniaacuteria Conforme o dito

enunciado

ldquoO art 139 inciso IV traduz um poder geral de efetivaccedilatildeo permitindo a aplicaccedilatildeo de medidas atiacutepicas para garantir o cumprimento de qualquer ordem judicial inclusive no acircmbito do cumprimento de sentenccedila e no processo de execuccedilatildeo baseado em tiacutetulosrdquo

Dessa forma o artigo 139 IV do CPC permite uma gama ampla de interpretaccedilotildees por

parte da doutrina por ser uma claacuteusula geral encontrando limite apenas na imaginaccedilatildeo de

quem o analisa Nesse sentido eacute forccediloso orientar e delimitar o manejo desse artigo legal para

que se extraia seu sentido e alcance revelando assim sobre que situaccedilotildees ele incide de que

modo e o que permite

63 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

64 Ibid sem paginaccedilatildeo

28

32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER

GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO

O artigo 139 IV com a vigecircncia do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 abriu margem

para uma constelaccedilatildeo de decisotildees nas quais o dito dispositivo recebeu diversas interpretaccedilotildees

pelos operadores do direito

Sem duacutevidas por ser uma das pioneiras a decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara

Ciacutevel do Foro Regional de Pinheiros em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 4001386-

1320138260011 na data de 25 de agosto de 2016 gerou um enorme rebuliccedilo

Nessa accedilatildeo que se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo extrajudicial que tinha por objeto

uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria o juiacutezo ao aplicar o art 139 IV do CPC2015 determinou a

suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o

passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito

Segundo a magistrada o processo tramitava haacute anos sem que nenhum valor tenha sido

pago ao exequente aleacutem do devedor natildeo ter oferecido proposta de acordo e nem ter indicado

bens agrave penhora configurando uma completa desiacutedia com o processo

ldquoO caso tratado nos autos se insere dentre as hipoacuteteses em que eacute cabiacutevel a aplicaccedilatildeo do art 139 inciso IV do Coacutedigo de Processo Civil Isso porque o processo tramita desde 2013 sem que qualquer valor tenha sido pago ao exequente Todas as medidas executivas cabiacuteveis foram tomadas sendo que o executado natildeo paga a diacutevida natildeo indica bens agrave penhora natildeo faz proposta de acordo e sequer cumpre de forma adequada as ordens judiciais frustrando a execuccedilatildeo

Se o executado natildeo tem como solver a presente diacutevida tambeacutem natildeo recursos para viagens internacionais ou para manter um veiacuteculo ou mesmo manter um cartatildeo de creacutedito Se poreacutem mantiver tais atividades poderaacute quitar a diacutevida razatildeo pela qual a medida coercitiva poderaacute se mostrar efetiva

Assim como medida coercitiva objetivando a efetivaccedilatildeo da presente execuccedilatildeo defiro o pedido formulado pelo exequente e suspendo a Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo do executado M A S determinando ainda a apreensatildeo de seu passaporte ateacute o pagamento da presente diacutevida

()

Determino ainda o cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado ateacute o pagamento da presente diacutevida ()rdquo

Foi impetrado Habeas Corpus no Tribunal de Justiccedila do Estado de Satildeo Paulo a favor

do executado sob o fundamento que a coaccedilatildeo era ilegal e afetava o direito de locomoccedilatildeo

29

garantido constitucionalmente Tendo sido concedida a liminar em decisatildeo que ora se

reproduz

Em que pese a nova sistemaacutetica trazida pelo art 139 IV do CPC2015 deve-se considerar que a base estrutural do ordenamento juriacutedico eacute a Constituiccedilatildeo Federal que em seu art 5ordm XV consagra o direito de ir e vir Ademais o art 8ordm do CPC2015 tambeacutem preceitua que ao aplicar o ordenamento juriacutedico o juiz natildeo atentaraacute apenas para a eficiecircncia do processo mas tambeacutem aos fins sociais e agraves exigecircncias do bem comum devendo ainda resguardar e promover a dignidade da pessoa humana observando a proporcionalidade a razoabilidade e a legalidade Por tais motivos concedo a liminar pleiteada65

Cabe destacar aqui o voto vencido da Desembargadora Maria Luacutecia Pizzotti no

julgamento do Habeas Corpus supracitado demonstrando que o debate sobre a abrangecircncia

do artigo 139 IV do CPC ocorre tanto na doutrina quanto no judiciaacuterio

O objetivo do novel dispositivo natildeo eacute impor penas ou restringir direitos natildeo sendo intenccedilatildeo do Judiciaacuterio suspender indefinidamente o direito de dirigir do executado ou sua liberdade de viajar mas sim impor uma restriccedilatildeo tatildeo gravosa caso ele natildeo cumpra a determinaccedilatildeo que escolha cumprir sua obrigaccedilatildeo e dar fim ao problema Em outras palavras mediante as medidas de coerccedilatildeo o Estado procura persuadir o inadimplente impondo-lhe situaccedilotildees tatildeo onerosas e inconvenientes que em algum momento seja para ele mais vantajoso cumprir do que permanecer no inadimplemento

Ao fazecirc-lo o Novo Coacutedigo de Processo Civil rompe com as criacuteticas da ineficiecircncia das execuccedilotildees Natildeo se cogita deferir medidas restritivas agravequeles que demonstram a incapacidade absoluta de solver o deacutebito apenas agravequeles que reconhecidamente se valem de artimanhas e subterfuacutegios para evitar a satisfaccedilatildeo das diacutevidas ldquopreferindordquo outras despesas mais lsquonobresrsquo agindo em nome de terceiros e fazendo escaacuternio dos credores e do proacuteprio Poder Judiciaacuterio (hellip)

Para tanto memoraacutevel a noccedilatildeo de que a medida em comento tem caraacuteter excepcional e encontra limites no plano da proporcionalidade como sustenta o ilustrado Magistrado paulista Fernando da Fonseca Gajardoni Professor Faculdade de Direito de Ribeiratildeo Preto da USP (in httpswwwjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 acesso em 091216 agraves 11h20min) E para anaacutelise da proporcionalidade a ponderaccedilatildeo deve observar os trecircs passos apontados pela doutrina a necessidade a adequaccedilatildeo e a proporcionalidade em sentido estrito

65 TJSP - Habeas Corpus Processo nordm 2183713-8520168260000 30ordf Cacircmara Direito Privado relator

Des Marcos Ramos j 290317

30

Ademais no entendimento de Jorge Amaury Maia Nunes e Guilherme Pupe de

Noacutebrega66 essa decisatildeo releva os perigos trazidos pelo art 139 IV do CPC ao confrontar

direitos constitucionalmente garantidos

De nossa parte entendemos que a liberdade de locomoccedilatildeo inserta no inciso XV do artigo 5ordm que abrange o direito de deixar o territoacuterio nacional sofre embaraccedilo indevido pela apreensatildeo de passaporte ou pela suspensatildeo da carteira nacional de habilitaccedilatildeo

()

Agrave luz da exposiccedilatildeo feita acima e em anaacutelise primeva sustentamos que o artigo 139 IV do CPC de 2015 estaacute a merecer declaraccedilatildeo de inconstitucionalidade sem reduccedilatildeo de texto para o fim de rechaccedilar a apreensatildeo de passaporte a suspensatildeo do direito de dirigir e a vedaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo em concurso ou em licitaccedilatildeo puacuteblicos como medidas passiacuteveis de serem adotadas pelo juiz sob pena de vulneraccedilatildeo aos artigos 1ordm IV 5ordm XV e LIV 37 I 173 sect 3ordm III e 175 todos da Constituiccedilatildeo

Apesar de ter sofrido duras criacuteticas a decisatildeo do processo de nordm 4001386-

1320138260011 serviu de inspiraccedilatildeo para tantas outras decisotildees no mesmo sentido

Foi o caso da decisatildeo proferida pelo juiacutezo da 2ordf Vara Ciacutevel do Foro Regional de Satildeo

Vicente em Satildeo Paulo no bojo do processo nordm 0020724-2620088260590 na data de 21 de

junho de 2017

A supracitada execuccedilatildeo se arrastava por nove (09) anos sem que o devedor tenha

esboccedilado qualquer intenccedilatildeo de pagar a diacutevida O credor requereu a suspensatildeo da Carteira

Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado apreensatildeo do passaporte e cancelamento dos

cartotildees de creacutedito

O magistrado com embasamento no artigo 139 IV do CPC deferiu parcialmente o

pedido sob o fundamento de que a apreensatildeo de passaporte e CNH natildeo viola o direito de ir e

vir do devedor Entretanto o juiz indeferiu o pedido de cancelamento do cartatildeo de creacutedito por

acreditar que a suspensatildeo poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado tendo em

vista que atualmente as pessoas utilizam o referido cartatildeo para pagamento das despesas

diaacuterias

66 NOBREacuteGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139

IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018

31

Eacute evidente que as medidas atiacutepicas de coerccedilatildeo devem ser utilizadas com cautela sempre respeitando a dignidade da pessoa do executado Natildeo se vislumbra contudo que as medidas aqui eleitas sejam capazes de vulnerar os Direitos Fundamentais do indiviacuteduo A uma porque natildeo se trata de restriccedilatildeo ao direito de ir e vir do executado que continua no gozo de plena liberdade de locomoccedilatildeo a duas porque a conduccedilatildeo de veiacuteculo automotor eacute mera comodidade da vida moderna natildeo se tratando de direito absoluto

Com mais razatildeo ainda se admite a suspensatildeo do Passaporte do executado que se natildeo paga a diacutevida da execuccedilatildeo natildeo deve ter o direito de fazer viagem internacional

Tem-se aqui verdadeiro exerciacutecio de ponderaccedilatildeo de interesses juriacutedicos de um lado jaz o direito de creacutedito do exequente que deriva do direito de propriedade e por isso mesmo tem envergadura constitucional de outro giro tem-se o direito do executado agrave autorizaccedilatildeo do Estado para conduzir veiacuteculo automotor e realizar viagens internacionais que natildeo se mostram essenciais agrave dignidade da pessoa humana Natildeo haacute duacutevidas pois de que eacute este uacuteltimo que deve sucumbir

O pedido fica indeferido apenas no tocante agrave suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado Eacute que ao contraacuterio da CNH e do passaporte que trazem consigo certa presunccedilatildeo de riqueza natildeo se pode concluir que o uso de cartatildeo de creacutedito eacute feito por luxo ou simples conveniecircncia

Como eacute cediccedilo os cartotildees de creacutedito oferecem ao seu titular creacutedito raacutepido e rotativo para o pagamento de despesas diaacuterias e certamente exercem funccedilatildeo essencial agravequeles que se encontram em situaccedilatildeo financeira precaacuteria

A suspensatildeo dos cartotildees de creacutedito do executado portanto se revela medida desproporcional e que inclusive poderia colocar em risco a subsistecircncia do executado

Pelo exposto defiro em parte o pedido formulado pelo exequente e DETERMINO a suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo e bem como a suspensatildeo da validade (cancelamento temporaacuterio) no sistema SINPA de eventuais passaportes vaacutelidos em nome do executado

Dessa forma o artigo 139 IV do CPC revolucionou completamente a execuccedilatildeo de

obrigaccedilatildeo de prestaccedilatildeo pecuniaacuteria ao permitir a utilizaccedilatildeo do uso dos meios executivos

atiacutepicos para compelir o executado a satisfazer o creacutedito do exequente

33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE

EFETIVACcedilAtildeO

Era inevitaacutevel que o artigo 139 IV do CPC gerasse todo tipo de reaccedilatildeo entre os

doutrinadores do processo civil e ateacute mesmo de outros ramos do direito devido a sua

capacidade de realizar uma completa inovaccedilatildeo na forma de se executar as obrigaccedilotildees de pagar

quantia Alguns o aplaudiram visualizando nele ldquouma luz no fim do tuacutenelrdquo outros o

criticaram vislumbrando as arbitrariedades que poderiam ser praticadas com embasamento no

referido dispositivo

32

As decisotildees suscitadas em linhas preteacuteritas auxiliaram para fervilhar ainda mais o

debate sobre o tema tendo em vista que por um lado poderia aumentar a efetividade das

execuccedilotildees por quantia no entanto por outro surgiam questionamentos a cerca da sua

constitucionalidade

A doutrina parece que demoraraacute a se pacificar sobre o tema Segundo alguns

doutrinadores seraacute inconstitucional toda restriccedilatildeo que recaia sobre a pessoa do devedor e natildeo

exclusivamente sobre o seu patrimocircnio Jaacute para outros o dispositivo eacute constitucional e o meio

mais eficaz para se resolver o problema da efetivaccedilatildeo das execuccedilotildees de pagar quantia ldquoA

discussatildeo se daacute especialmente no que diz respeito aacutes medidas de suspensatildeo de CNH

apreensatildeo de passaporte e bloqueio de cartotildees de creacutedito do devedorrdquo 67

O professor Thiago Rodovalho analisou detalhadamente a decisatildeo de nordm 4001386-

1320138260011 em seu artigo ldquoO necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na

concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivosrdquo 68 Quanto agrave suspensatildeo da CNH o autor

acredita que tal medida natildeo viola qualquer direito fundamental do devedor posto que ldquodirigir

veiacuteculos automotores eacute direito do cidadatildeo mas natildeo se confunde com os direitos fundamentais

e social de ir-e-vir e ao transporterdquo 69 O professor eacute categoacuterico ao afirmar que

Com relaccedilatildeo agrave suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (suspensatildeo do direito de dirigir restriccedilatildeo de direitos) natildeo nos parece haver qualquer violaccedilatildeo a direito fundamental ou social nem a direito da personalidade ou colocaccedilatildeo do devedor em situaccedilatildeo desproporcionalmente detrimentosa exceccedilatildeo feita aos que usam o veiacuteculo como instrumento de trabalho atraindo a hipoacutetese do NCPC art 833 inc V

()

Outrossim natildeo o consideramos como direito da personalidade Os direitos da personalidade satildeo os valores fundamentais que compotildeem o proacuteprio ser justamente por isso intransmissiacuteveis e irrenunciaacuteveis natildeo podendo o seu exerciacutecio sofrer limitaccedilatildeo voluntaacuteria (CC art 11) Por mais que vivamos num paiacutes que tanto valoriza o carro e que muitas pessoas de fato se compreendam em razatildeo e em funccedilatildeo do carro que dirijam este natildeo nos parece ser um direito que verdadeiramente componha a personalidade do indiviacuteduo70

67 DONTOS Sofia Poderes executoacuterios do juiz que diz a doutrina sobre o art 139 inc IV do CPC

Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigospoderes-executorios-do-juiz-que-diz-a-doutrina-sobre-art-139-inc-iv-do-cpc-23052018 gt Publicado em 23052018 Acesso em 01082018

68 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018

69 Ibid sem paginaccedilatildeo 70 Ibid sem paginaccedilatildeo

33

Quanto ao cancelamento dos cartotildees de credito do devedor o professor Thiago

Rodovalho tambeacutem acredita que natildeo haacute qualquer violaccedilatildeo ao direito fundamental social ou

da personalidade do devedor e acrescenta que

Tanto assim o eacute que ser titular de um cartatildeo de creacutedito pressupotildee ter creacutedito o que eacute analisado e concedido por instituiccedilotildees financeiras mais do que isso se porventura passando por dificuldades financeiras a pessoa deixa de honrar com pagamentos a mesma instituiccedilatildeo financeira concedente do cartatildeo de creacutedito pode sponte propria cancelaacute-lo ou recusar-lhe a concessatildeo Ora parece-me contraditoacuterio que instituiccedilotildees financeiras para sua proteccedilatildeo patrimonial possam ferir esse suposto ldquodireito fundamentalrdquo ou esse suposto ldquodireito da personalidaderdquo mas natildeo possa o Poder Judiciaacuterio igualmente fazecirc-lo contra aquele devedor moroso que instado ao pagamento e frustradas todas as tentativas de constriccedilatildeo patrimonial leva vida luxuosa valendo-se de cartotildees de creacutedito que prescindem de dinheiro em conta eacute dizer podem justamente funcionar como forma de ocultar renda e patrimocircnio71

O autor considera a apreensatildeo de passaporte um tema mais polecircmico e que merece

maior reflexatildeo No entanto crecirc que eacute possiacutevel a apreensatildeo de passaporte sem violar os

direitos fundamentais do devedor por se tratar de um direito de ir e vir de amplitude especial

Agrave primeira vista a possibilidade de apreensatildeo do passaporte tambeacutem nos parece possiacutevel pois tambeacutem se trata de um direito de ir e vir de amplitude especial Assim o eacute pois salvo situaccedilotildees especiais (refugiados p ex) haacute a necessidade de demonstrar condiccedilotildees financeiras de estadia e retorno para ser admitido no paiacutes de destino Ou seja pressupotildee uma condiccedilatildeo financeira que o devedor justamente diz natildeo possuir Sem embargo dessa consideraccedilatildeo esse ainda eacute um ponto que merece uma reflexatildeo mais acurada sendo essa apenas uma primeira impressatildeo72

Outros autores escreveram sobre o tema como eacute o caso do processualista Luiz

Dellore73 que tambeacutem defende que as medidas atiacutepicas como restriccedilatildeo ao direito de dirigir

apreensatildeo de passaporte e cancelamento de cartotildees de creacutedito satildeo permitidas e natildeo violam em

regra os direitos fundamentais do devedor

De minha parte creio que efetivamente haacute inovaccedilatildeo no at 139 IV do NCPC (e natildeo mera repeticcedilatildeo do que jaacute havia no Coacutedigo anterior) que tem o condatildeo de trazer mais efetividade ao processo executivo no Brasil ndash que por deacutecadas centrou sua atenccedilatildeo na defesa do executado (vide a grande quantidade de impenhorabilidades) sem dar maior atenccedilatildeo ao creacutedito do exequente

71 Ibid sem paginaccedilatildeo 72 Ibid sem paginaccedilatildeo 73 DELLORE Luiz NCPC Atipicidade das medidas executivas jaacute eacute realidade Disponiacutevel em lt

httpswwwjotainfoopiniao-e-analisecolunasnovo-cpcncpc-atipicidade-de-medidas-executivas-ja-e-realidade-17042017 gt Publicado em 17042017 Acesso em 03092018

34

Logo a meu ver medidas como (i) restriccedilatildeo ao direito de dirigir (ii) apreensatildeo de passaporte (iii) cancelamento de cartotildees de creacutedito e (iv) vedaccedilatildeo de obtenccedilatildeo de novos empreacutestimos se natildeo vinculados ao pagamento do deacutebito exequendo dentre outras restriccedilotildees que deveratildeo ser observadas a cada caso satildeo permitidas pelo sistema do NCPC e em regra natildeo violam direitos fundamentais do devedor E tecircm o condatildeo de fazer com que o executado que tem recursos diante dessas medidas coercitivas pague o deacutebito trazendo sucesso agrave satisfaccedilatildeo do creacutedito

Nessa linha para Alexandre Fuchs das Neves74 o artigo 139 IV do CPC conferiu ao

juiz poderes coercitivos capazes de ldquotransformar a vida do devedor um infernordquo para compeli-

lo a cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria Entretanto pondera que para que a medida tenha

validade ldquoeacute necessaacuteria uma fundamentaccedilatildeo por evidente uma correlaccedilatildeo temaacutetica entre a

medida adotada e sua efetividade em face ao processo com fundamentaccedilatildeo detalhadardquo

No entendimento de Fernando Gajardoni75 satildeo possiacuteveis as medidas de apreensatildeo de

passaporte bloqueio de cartotildees de creacutedito e suspensatildeo da CNH Para ele o que limita o art

139 IV do CPC eacute o esgotamento dos meios tiacutepicos e a real necessidade da medida

Ilustrativamente natildeo efetuado o pagamento de diacutevida oriunda de multas de tracircnsito e superados os expedientes tradicionais de adimplemento (penhora de dinheiro e bens) seria liacutecito o estabelecimento da medida coercitivaindutiva de suspensatildeo do direito a conduzir veiacuteculo automotor ateacute pagamento do deacutebito (inclusive com apreensatildeo da CNH do devedor) natildeo efetuado pagamento de verbas salariais devidas a funcionaacuterios da empresa possiacutevel o estabelecimento de vedaccedilatildeo agrave contrataccedilatildeo de novos funcionaacuterios ateacute que seja saldada a diacutevida natildeo efetuado o pagamento de financiamento bancaacuterio na forma e no prazo avenccedilados possiacutevel ateacute que se tenha a quitaccedilatildeo que se obstem novos financiamentos ou mesmo a participaccedilatildeo do devedor em licitaccedilotildees (como de ordinaacuterio jaacute acontece com pessoas juriacutedicas em deacutebito tributaacuterio com o Poder Puacuteblico) etc

Teriacuteamos entatildeo no Brasil por assim dizer a adoccedilatildeo do padratildeo da atipicidade das medidas executivas tambeacutem para as obrigaccedilotildees de pagar vistas estas como ordens do EstadoJuiz para que haja prestaccedilatildeo de pagamento em pecuacutenia

()

Por isso ndash a prevalecer a interpretaccedilatildeo potencializada do art 139 IV do CPC2015 ndash o emprego de tais medidas coercitivasindutivas especialmente nas obrigaccedilotildees de pagar encontraraacute limite certo na excepcionalidade da medida (esgotamento dos meios tradicionais de satisfaccedilatildeo do deacutebito) na proporcionalidade (inclusive agrave luz da regra da menor onerosidade ao devedor do art 805 do CPC2015) na necessidade de fundamentaccedilatildeo substancial e especialmente nos direitos e garantias assegurados na Constituiccedilatildeo Federal (vg natildeo parece possiacutevel que se determine o pagamento sob pena de prisatildeo ou de vedaccedilatildeo ao exerciacutecio da profissatildeo do direito de ir e vir etc)

74 NEVES Alexandre Fuchs das Cancelamento de cartotildees de creacutedito e apreensatildeo de CNH e passaporte

do devedor Isso eacute possiacutevel Disponiacutevel em lt httpwwwsinfacspcombrconteudocancelamento-de-cartoes-de-credito-e-apreensao-de-cnh-e-passaporte-do-devedor-isso-e-possivel gt Acesso em 30082018

75 GAJARDONI Fernando da Fonseca A revoluccedilatildeo silenciosa da execuccedilatildeo por quantia JOTA Disponiacutevel em lthttpjotainfoartigosa-revolucao-silenciosa-da-execucao-por-quantia-24082015 gt Publicado em 24082015 Acesso em 30082018

35

Jaacute Fernanda Tartuce76 acredita que tais medidas satildeo problemaacuteticas e devem ser

analisadas com cautela tendo em vista que ao inveacutes de afetarem o patrimocircnio do devedor

atingem a proacutepria pessoa

Sob certo prisma adotar medidas diferenciadas contribui para a efetividade da prestaccedilatildeo jurisdicional Por outro lado o patrimocircnio ndash e natildeo a pessoa do devedor - responde por diacutevidas aleacutem disso o exerciacutecio de amplos poderes pelo juiz sem balizas especiacuteficas pode ensejar medidas inadequadas Nessa linha suspender o direito de dirigir e restringir o uso de passaporte satildeo iniciativas problemaacuteticas por atingirem a pessoa do devedor enquanto a penhora da restituiccedilatildeo de Imposto de Renda soa viaacutevel por afetar seu patrimocircnio Eacute importante que a medida diferenciada se revele proporcional e seja aplicada apoacutes o exaurimento de outros meios previstos no ordenamento Como a proposta do Novo Coacutedigo eacute aumentar a eficiecircncia processual intentar medidas ineficazes inexequiacuteveis eou de difiacutecil fiscalizaccedilatildeo pode acabar ensejando o efeito contraacuterio

Nessa senda Lenio Streck e Dierle Nunes77 entendem que as medidas atiacutepicas de

suspensatildeo da CNH eou apreensatildeo de passaporte satildeo inconstitucionais Afirmam que natildeo se

pode confundir o processo civil e penal ainda que ambos remetam a um ldquoparadigma

constitucional comumrdquo e que o artigo 139 IV do CPC ldquoimpotildee novos desafios interpretativos

que podem conduzir a uma anaacutelise superficial e utilitarista de busca de resultados que

desprezem a necessaacuteria leitura constitucionalrdquo Os autores ainda ponderam que ldquoO perigo eacute o

artigo 139 IV ser transformado em instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com

autorizaccedilatildeo judicialrdquo

O professor Araken de Assis no dia 18 de abril de 2018 em um evento sobre o

Coacutedigo Processual Civil de 2015 que ocorreu em Brasiacutelia na sede do Conselho Federal da

OAB declarou ser contraacuterio aos poderes executoacuterios atiacutepicos ldquoSou contra os poderes

atiacutepicos dos juiacutezes porque seu exerciacutecio redunda em simples arbitrariedadesrdquo78

Acrescentou ainda que

76 IBDFAM ndash Instituto Brasileiro de Famiacutelia O polecircmico inciso IV do artigo 139 do CPC e suas difusas

interpretaccedilotildees Disponiacutevel em lt httpwwwibdfamorgbrnoticias6096O+polC3AAmico+inciso+IV+do+artigo+139+do+CPC+e+suas+difusas+interpretaC3A7C3B5es gt Publicado em 31082016 Acesso em 04092018

77 STRECK Lenio Luiz NUNES Dierle Como interpretar o artigo 139 IV do CPC Carta branca para o arbiacutetrio Disponiacutevel em lthttpwwwconjurcombr2016-ago-25senso-incomum-interpretar-art-139-ivcpc-carta-branca-arbitriogt publicado em 2582016 Acesso em 1008 2018

78 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04092018

36

Eacute evidentemente inconstitucional diante do princiacutepio da dignidade da pessoa humana tirar o passaporte carteira de habilitaccedilatildeo Quecirc que tem isso com diacutevidas Natildeo tem absolutamente nada Natildeo eacute a correlaccedilatildeo instrumental entre o objetivo da execuccedilatildeo e o meio empregado Isso eacute simples vinganccedila simples puniccedilatildeo79

O professor Araken de Assis acredita que tais medidas satildeo inconstitucionais e

violam o principio da dignidade humana do executado numa sociedade como a nossa

sedenta por puniccedilatildeo natildeo me surpreende que essas ideias sejam encaradas com

naturalidade Mas eacute preciso rejeitaacute-las em nome de princiacutepios 80

34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO

A Constituiccedilatildeo Federal de 1988 tem como um dos seus fundamentos a dignidade da

pessoa humana presente no artigo 1ordm inciso III do referido texto constitucional O dito

princiacutepio tem o escopo de nortear o ordenamento juriacutedico como um todo

A inclusatildeo da dignidade da pessoa humana como princiacutepio constitucional obrigou

uma reflexatildeo sobre o papel da pessoa humana no direito e um redimensionamento para

elevaacute-la ao centro do ordenamento juriacutedico81 Eacute necessaacuterio recorrer agrave teoria Kantiana para

que se obtenha uma definiccedilatildeo do princiacutepio ora estudado Para Kant82 o homem eacute um fim

em si mesmo natildeo uma funccedilatildeo do Estado Ou Naccedilatildeo O Estado e o direito devem estar

organizados em benefiacutecio do indiviacuteduo

Agora eu afirmo o homem ndash e de uma maneira geral todo o ser racional ndash existe como fim em si mesmo e natildeo apenas como meio para o uso arbitraacuterio desta ou daquela vontade Em todas as suas accedilotildees pelo contraacuterio tanto nas direcionadas a ele mesmo como nas que o satildeo a outros seres racionais deve ser ele sempre considerado simultaneamente como fim

Partindo da premissa de que para Immanuel Kant o homem eacute o fim em si mesmo

ldquodevemos compreender que a dignidade da pessoa humana eacute a noccedilatildeo o comando a direccedilatildeo

que se deve seguir funcionando como fundamento para a interpretaccedilatildeo de todos os direitos e

garantias conferidos agrave pessoa nos ordenamentos juriacutedicos de cada Estadordquo 83

79 Ibid sem paginaccedilatildeo 80 Ibid sem paginaccedilatildeo 81 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito

fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 461 82 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud KANT Immanuel Fundamentaccedilatildeo da metafiacutesica dos costumes

Satildeo Paulo Martin Claret 2003 p56-59 Coleccedilatildeo A Obra-Prima de Cada Autor 83 SCHIAFIANO Juliana Rocha op cit p 461

37

O princiacutepio constitucional da dignidade da pessoa humana estaacute diretamente ligado ao

conteuacutedo dos direitos fundamentais logo para que se cumpra com os direitos fundamentais

constitucionalmente instituiacutedos eacute necessaacuterio reconhecer e respeitar a dignidade da pessoa

humana conforme disciplina Ingo Sarlet84

Em suma o que se pretende sustentar de modo mais enfaacutetico eacute que a dignidade da pessoa humana na condiccedilatildeo de valor (principio normativo) fundamental que atrai o conteuacutedo de todos os direitos fundamentais exige e pressupotildee o reconhecimento e proteccedilatildeo dos direitos fundamentais de todas as dimensotildees (ou geraccedilotildees se assim preferirmos) Assim sem que se reconheccedilam agrave pessoa humana os direitos fundamentais que lhe satildeo inerentes em verdade estarse-aacute lhe negando a proacutepria dignidade A consagraccedilatildeo constitucional da dignidade da pessoa humana tem o propoacutesito de limitar a atuaccedilatildeo ou a omissatildeo do Estado para garantir os direitos do indiviacuteduo Assim eacute difiacutecil precisar os efeitos da norma que determina a dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado (como acontece com a Constituiccedilatildeo brasileira de 1988) poreacutem quando desrespeitados os direitos fundamentais do cidadatildeo eacute possiacutevel identificar que a dignidade deste foi violada

Logo ldquoteraacute respeitada a sua dignidade o individuo que tiver respeitados os seus

direitos fundamentaisrdquo 85 Os direitos fundamentais estatildeo apresentados na Constituiccedilatildeo

Federal da seguinte forma direitos individuais e coletivos direitos sociais direitos poliacuteticos e

direitos de nacionalidade que tecircm como escopo garantir as liberdades positivas aos

indiviacuteduos ldquoonde foram conquistados direitos agrave liberdade religiosa liberdade civil e

profissional agrave propriedade ao livre acesso ao Judiciaacuterio agrave ampla defesa e ao contraditoacuterio no

processual judicial ao sigilo de dados e informaccedilotildees pessoais entre outros que somados

garantem o cidadatildeo uma vida dignardquo 86

O cidadatildeo na Constituiccedilatildeo Federal de 88 diferente das constituiccedilotildees brasileiras

anteriores passou a ser fundamento e ganhou destaque nos direitos fundamentais tendo

garantida a sua vida a sua dignidade a sua seguranccedila a sua honra a sua liberdade e a sua

propriedade

84 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud SARLET Ingo Wolfgang Dignidade da pessoa humana e

direitos fundamentais na Constituiccedilatildeo Federal de 1988 2ed Porto Alegre Livraria do Advogado 2002 p87 85 SCHIAFIANO Juliana Rocha O princiacutepio da dignidade da pessoa humana e a execuccedilatildeo de creacutedito

fiscal uma proposta de reflexatildeo Direito e Economia Canoas v 7 n 2 2ordm sem 2006 p 462 86 Ibid p 462

38

Segundo Carmem Luacutecia Antunes Rocha87 para garantir o Estado Democraacutetico de

Direito eacute necessaacuterio que a sua atuaccedilatildeo seja sempre em conformidade com o princiacutepio da

dignidade da pessoa humana

O Estado somente eacute democraacutetico em sua concepccedilatildeo constitucionalizaccedilatildeo e atuaccedilatildeo quando respeita o princiacutepio da dignidade da pessoa humana Natildeo haacute verbo constitucional natildeo haacute verbo governamental que se faccedilam legiacutetimos quando natildeo se voltam ao atendimento daquele princiacutepio Natildeo haacute verdade constitucional natildeo haacute suporte institucional para as poliacuteticas puacuteblicas que natildeo sejam destinadas ao pleno cumprimento daquele valor maior transformado em princiacutepio constitucional

O princiacutepio da dignidade humana constitucionalmente garantido impotildee limites ao

Estado compelindo aos oacutergatildeos e atividades estatais respeitar o ser humano e garanti-lo

condiccedilotildees miacutenimas para uma vida digna Dessa forma eacute niacutetido que o dito princiacutepio eacute

pressuposto e indispensaacutevel para legitimar outras normas constitucionais e

principalmente infraconstitucionais

O Coacutedigo de Processo Civil eacute umas das principais normas infraconstitucionais que

sofre influecircncia dos preceitos valores e princiacutepios esculpidos na Constituiccedilatildeo Federal

Logo como o principio da dignidade humana eacute um dos mais importantes pressupostos

constitucionais ldquoentatildeo eacute tranquilo afirmar-se que o novel ordenamento processual tem

de se render nas resoluccedilotildees dos aspectos processuais e a fim de se atingir uma soluccedilatildeo

justa adequada e efetiva ao postulado da dignidade da pessoa humanardquo 88

Dessa forma o legislador deve formular as normas infraconstitucionais de acordo e a

partir do conteuacutedo constitucional para Marinoni Mitidiero e Arenhart89

() o Coacutedigo de Processo Civil constitui direito constitucional aplicado O Coacutedigo deve ser interpretado de acordo com a Constituiccedilatildeo e com os direitos fundamentais o que significa que as duacutevidas interpretativas devem ser resolvidas a favor da otimizaccedilatildeo do alcance da Constituiccedilatildeo e do processo civil como meio para tutela de direitos

87 SCHIAFIANO Juliana Rocha apud ROCHA Carmen Luacutecia Antunes O princiacutepio da dignidade da

pessoa humana e a exclusatildeo social Revista Interesse Puacuteblico n4 p23-48 1999 p33 88 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o

novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 367

89 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 14

39

Com o escopo de conferir eficaacutecia aos mandamentos constitucionais o CPC15 traz a

previsatildeo e diversas claacuteusulas gerais em seus primeiros artigos em um dos quais se

prestigia o princiacutepio da dignidade da pessoa humana

O referido princiacutepio estaacute disciplinado no artigo 8ordm do CPC15 e atua como um guia

sobre as demais normas do coacutedigo processual Eacute o que entende Nelson Rosenvald90

O maior cuidado do inteacuterprete eacute no sentido de jamais banalizar a dignidade fazendo dela um elixir processual tal como muitas vezes se vecirc na esfera do direito civil Penso que natildeo haacute maiores dificuldades em transpor a noccedilatildeo constitucional do princiacutepio para em seguida adaptaacute-la agraves singularidades do processo

Logo de acordo com o artigo 8ordm do CPC o oacutergatildeo julgador ao aplicar o ordenamento

juriacutedico deve resguardar a dignidade da pessoa humana Para Fredie Didier91 ldquoresguardar

nesse contexto eacute de um lado aplicar corretamente a norma juriacutedica lsquoproteccedilatildeo da dignidade

da pessoa humanarsquo e de outro natildeo violar a dignidaderdquo

O oacutergatildeo julgador deveraacute manter um comportamento ativo com o objetivo de promover

a dignidade da pessoa humana podendo tomar medidas de ofiacutecio para efetivar a dignidade da

pessoa humana Didier assevera que o magistrado poderaacute ainda ldquovaler-se da claacuteusula geral de

atipicidade (art 536 sect 1ordm) para a execuccedilatildeo do direito fundamental agrave dignidaderdquo 92 O autor

ainda traz dois exemplos

a) exigecircncia de respeito agrave ordem cronoloacutegica de conclusatildeo (art 12) caso de grave violaccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana que natildeo se encaixe em um dos incisos que excepcionam a regra de observacircncia da cronologia da conclusatildeo poderia o juiz ldquofurar a filardquo para promover a dignidade da pessoa humana b) prioridade na tramitaccedilatildeo processual pessoa que seja portadora de doenccedila grave mas que natildeo esteja no rol do art 1048 I para promover a dignidade de pessoa humana o juiz poderia determinar o processamento prioritaacuterio93

Essa dupla garantia ndash resguardo e promoccedilatildeo ndash tem como objetivo garantir ao individuo

sua dignidade humana fazendo com que ldquode um lado que o Estado natildeo a viole e de outro

que o Estado a promova e efetiverdquo

90 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud ROSENVALD Nelson A

dignidade da pessoa humana no CPC15 91 DIDIER JR Fredie Curso de direito processual civil Introduccedilatildeo ao direito processual civil parte

geral e processo de conhecimento 17ordm ed Salvador JusPodiwn 2015 p 75 92 Ibid p 75 93 Ibid p 75

40

Nessa senda o magistrado deveraacute promover a dignidade da pessoa humana quando

perceber a ausecircncia desta no processo ou assegura-la quando for posta em risco Eacute nesse

sentido o entendimento dos professores Marinoni Mitidiero e Arenhart94

() a dignidade da pessoa humana determina a compreensatildeo do processo civil como um meio para tutela dos direitos Vale dizer o processo civil natildeo pode ser visto como um instrumento a serviccedilo do Estado como um instrumento que natildeo se encontre orientado agrave realizaccedilatildeo dos fins da pessoa humana Em outras palavras o processo civil serve para realizaccedilatildeo dos direitos e para orientaccedilatildeo das pessoas a respeito do significado do direito

Nessa senda compete tanto ao juiz quanto as demais partes processuais garantirem ldquoo

valor intriacutenseco de cada vida que eacute trazida ao processordquo nas palavras de Alexandre Freitas

Cacircmara95

() aos sujeitos do processo eacute preciso sempre ter claro que os titulares dos interesses em conflitos satildeo pessoas reais cujas vidas seratildeo afetadas pelo resultado do processo e que por isso mesmo tecircm o direito de estabelecer suas estrateacutegias processuais de acordo com aquilo que lhes pareccedila melhor para suas vidas Eacute inadmissiacutevel tratar as partes como se natildeo fossem pessoas reais meros dados estatiacutesticos Afinal se para o Judiciaacuterio cada processo pode parecer apenas mais um processo para as partes cada processo pode ser o uacutenico o mais relevante aquele em que sua vida seraacute decidida E eacute dever do juiz assegurar que isto seja respeitado

Dessa forma eacute necessaacuterio que um arcabouccedilo normativo para que seja conferida

eficaacutecia e proteccedilatildeo ao principio da dignidade da pessoa humana

Logo o dito princiacutepio deve ser protegido em todas as esferas do ordenamento juriacutedico

inclusive no campo da execuccedilatildeo civil onde sofre grandes riscos de ser violado em nome do

direito fundamental agrave tutela executiva do credor ldquoPartir da premissa de que existe um direito

fundamental agrave tutela executiva ora ratificado pelo CPC eacute indispensaacutevel para a soluccedilatildeo de

diversos problemas oriundos do procedimento executivo principalmente aqueles relacionados

agrave aplicaccedilatildeo das regras de proteccedilatildeo do executadordquo 96

94 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MARINONI Luiz Guilherme

MITIDIERO Daniel ARENHART Seacutergio Cruz Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2016 p 25

95 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CAcircMARA Alexandre Freitas O Novo Processo Civil Brasileiro 2 ed Satildeo Paulo Atlas 2016 p 7

96 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 66

41

Eacute o caso por exemplo da impenhorabilidade Segundo Fredie Didier et al97 a

impenhorabilidade eacute uma forma de proteger certos bens do devedor do direito fundamental a

execuccedilatildeo do credor

Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa

Exatamente por tratar-se de uma teacutecnica de restriccedilatildeo a um direito fundamental eacute preciso que sua aplicaccedilatildeo se submeta ao meacutetodo da ponderaccedilatildeo a partir da anaacutelise das circunstacircncias do caso concreto As regras de impenhorabilidade devem ser aplicadas de acordo com a metodologia de aplicaccedilatildeo das normas de direitos fundamentais

O legislador estabelece o rol dos bens impenhoraacuteveis no art 833 do CPC fazendo um

preacutevio juiacutezo de ponderaccedilatildeo entre os interesses em anaacutelise ao optar pela mitigaccedilatildeo do direito

do exequente em favor da proteccedilatildeo do executado Afinal ldquoa execuccedilatildeo natildeo pode ser utilizada

como instrumento para causar a ruiacutena a fome e o desabrigo do devedor e sua famiacutelia gerando

situaccedilotildees incompatiacuteveis com a dignidade da pessoa humana 98

Logo a impenhorabilidade de certos bens

[] Eacute uma restriccedilatildeo ao direito fundamental agrave tutela executiva Eacute teacutecnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteccedilatildeo de alguns bens juriacutedicos relevantes como a dignidade do executado o direito ao patrimocircnio miacutenimo e a funccedilatildeo social da empresa99

Eacute nesse sentido que o CPC15 enumera diversos casos de bens patrimoniais que satildeo

impenhoraacuteveis como o salaacuterio e vencimentos utensiacutelios necessaacuterios ao exerciacutecio da

profissatildeo seguro de vida vestuaacuterios e pertences de uso pessoal entre outros

Dessa forma as regras relativas agraves medidas executivas devem ser interpretadas agrave luz

da Constituiccedilatildeo Federal ldquovez que se voltam agrave realizaccedilatildeo de direitos fundamentais e em sua

97 Ibid p 66 98 THEODORO JUacuteNIOR Humberto Novo Coacutedigo de Processo Civil Anotado 20 ed Rio de Janeiro

Forense 2016 p 978 99 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud DIDIER JR Fredie CUNHA

Leonardo Carneiro da BRAGA Paula Sarno OLIVEIRA Rafael Alexandria de Curso de direito processual civil 3 ed Salvador JusPodivm 2011 v 5 p 547

42

realizaccedilatildeo podem atingir direitos fundamentaisrdquo 100 O Superior Tribunal de Justiccedila jaacute decidiu

que

O rol das impenhorabilidades do ordenamento paacutetrio objetiva preservar o miacutenimo patrimonial necessaacuterio agrave existecircncia digna do executado impondo ao processo executoacuterio certos limites Assim a depender das peculiaridades do caso as regras de impenhorabilidade podem ser ampliadas de modo a adequar a tutela aos direitos fundamentais como por exemplo o direito agrave moradia agrave sauacutede ou agrave dignidade da pessoa humana Trata-se portanto da aplicaccedilatildeo do princiacutepio da adequaccedilatildeo e da necessidade sob o enfoque da proporcionalidade101 (STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014)

Logo a interpretaccedilatildeo dos dispositivos que tratam sobre a penhora no CPC deve estaacute

diretamente ligada aos ditames constitucionais devendo o interprete privilegiar a opccedilatildeo que

esteja mais em sintonia com a Carta Magna para que nem o credor e nem o devedor sejam

lesados

O artigo 833 do CPC elenca uma seacuterie de incisos que expotildeem os bens impenhoraacuteveis

O trecho inicial inciso I do art 833 define como impenhoraacuteveis os bens inalienaacuteveis Este

inciso segue a regra de que ldquose o bem natildeo pode ser alienado tambeacutem natildeo pode ser penhorado

porque a penhora eacute o primeiro ato do procedimento de alienaccedilatildeo judicial do bemrdquo 102

Satildeo exemplos de bens inalienaacuteveis os puacuteblicos cuja alienaccedilatildeo depende de autorizaccedilatildeo

legislativa Eacute inalienaacutevel tambeacutem o capital constituiacutedo para garantir indenizaccedilatildeo de ato iliacutecito

(art 533 sect 1 ordm CPC) que portanto eacute tambeacutem impenhoraacutevel ldquoTodo bem inalienaacutevel eacute

impenhoraacutevel embora nem todo bem impenhoraacutevel seja inalienaacutevelrdquo 103

O inciso I do art 833 CPC tambeacutem consagra a impenhorabilidade dos bens que por

ato voluntaacuterio satildeo excluiacutedos da execuccedilatildeo

Segundo Fredie Didier et al104

Eacute o que ocorre nos casos de bens doados ou alienados com claacuteusula de inalienabilidade que haacute de constar no registro imobiliaacuterio para ser eficaz perante o exequente e minimizar o risco de fraude A propoacutesito eis a redaccedilatildeo do art 1911 do Coacutedigo Civil lsquolsquoA claacuteusula de inalienabilidade imposta aos bens por ato de liberalidade implica impenhorabilidade e incomunicabilidaderdquo

100 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MEDINA Joseacute Miguel Garcia

Novo Coacutedigo de Processo Civil comentado 1 ed Satildeo Paulo Editora Revista dos Tribunais 2015 p 736 101 STJ REsp 1436739PR rel Min Humberto Martins 2ordf T j 27032014 102 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 824 103 Ibid p 824 104 Ibid p 825

43

O inciso II por sua vez estabelece que satildeo impenhoraacuteveis os bens moacuteveis os

pertences e as utilidades domeacutesticas da residecircncia do executado Todavia excepcionam-se os

bens dessa natureza que sejam de elevado valor ou que ultrapassem as necessidades comuns

correspondentes a um meacutedio padratildeo de vida

A jurisprudecircncia natildeo eacute paciacutefica sobre o assunto logo natildeo exista uma relaccedilatildeo de bens

que podem ser atingidos pela penhora Abrindo margem para as mais variadas decisotildees

O STJ jaacute considerou impenhoraacuteveis aparelho de televisatildeo a cores mesa de centro passadeira raacutedio toca-fitas gravador microondas ar-condicionado um freezer um microcomputador com acessoacuterios uma impressora etc Poderatildeo ser penhorados porque ultrapassam o padratildeo-meacutedio aparelhos de TV mais sofisticados o segundo aparelho de televisatildeo a segunda geladeira aparelhos de ar-condicionado que satildeo verdadeiras peccedilas de design moacuteveis antigos que se transformam em peccedilas de decoraccedilatildeo faqueiro de prata adega climatizada etc Em entendimento de caraacuteter ainda mais geneacuterico jaacute restou consignado em determinado precedente que a proteccedilatildeo natildeo abrangeria apenas os bens indispensaacuteveis agrave moradia mas tambeacutem aqueles usualmente encontrados em um lar105

Ademais o inciso III do art 833 do CPC traz a impenhorabilidade dos vestuaacuterios bem

como os pertences de uso pessoal do executado salvo se de elevado valor

Segundo Fredie Didier et al106 o dispositivo possui dois propoacutesitos

de um lado preservar a dignidade do executado com a proteccedilatildeo de bens moacuteveis importantes para a sua sobrevivecircncia digna como o vestuaacuterio aparelho celular reloacutegio e os bens relacionados agrave sua higiene pessoal de outro lado a regra visa prestigiar a boa-feacute processual impedindo a execuccedilatildeo mesquinha e abusiva com a penhora de bens de pequeno ou nenhum valor como um pente ou uma bota

O inciso IV do art 833 do CPC consagra uma das mais importantes modalidades a

impenhorabilidade relativa aos rendimentos de natureza alimentar ldquoTrata-se de regra que

possui o claro propoacutesito de proteger o executado garantindo-lhe o recebimento de valores que

servem ao pagamento das despesas relacionadas agrave sua sobrevivecircncia digna e agrave da sua famiacuteliardquo 107

Jaacute inciso V do art 833 do CPC torna impenhoraacuteveis os livros as maacutequinas as

ferramentas os utensiacutelios os instrumentos ou outros bens moacuteveis necessaacuterios ou uacuteteis ao

exerciacutecio de qualquer profissatildeo 105 Ibid p 826 106 Ibid p 827 107 Ibid p 828

44

Por forccedila do paraacutegrafo 3ordm do art 833 satildeo igualmente impenhoraacuteveis os equipamentos

implementos e maacutequinas agriacutecolas pertencentes agrave pessoa fiacutesica ou a empresa individual

produtora rural Rodrigo Mazzei e Sarah Merccedilon108 esclarecem que

Tem assento na noccedilatildeo de que a dignidade estende-se tambeacutem ao exerciacutecio da profissatildeo em si mesma e tambeacutem por representar a forma por excelecircncia de que dispotildee o executado para continuar a receber sua remuneraccedilatildeo e por conseguinte prover seu sustento e de sua famiacutelia Trata-se tambeacutem de aplicaccedilatildeo pontual da funccedilatildeo social da propriedade jaacute que protege os bens que permitem a circulaccedilatildeo de riquezas para a subsistecircncia do executado e se for o caso de sua famiacutelia

Forccediloso ressaltar ainda que a impenhorabilidade do inc V alcanccedila apenas os bens

moacuteveis de modo que eacute absolutamente possiacutevel que o imoacutevel em que o executado exerccedila sua

atividade profissional seja penhorado conforme a Suacutemula 451 do STJ ldquoEacute legiacutetima a penhora

da sede do estabelecimento comercialrdquo

O inciso VI do art 833 do CPC versa sobre a impenhorabilidade do seguro de vida

ldquoTrata-se de impenhorabilidade em favor do beneficiaacuterio do seguro e natildeo do segurado ateacute

porque o valor do seguro natildeo compotildee nem comporaacute o seu patrimocircnio (art794 do Coacutedigo

Civil1 ordm7)rdquo Dessa forma ldquoem uma execuccedilatildeo contra o segurado natildeo seraacute possiacutevel a penhora

do seguro de vida pois se trata de bem que natildeo lhe pertence nem mesmo em expectativardquo

De acordo com o inciso VII do art 833 do CPC satildeo impenhoraacuteveis os materiais

necessaacuterios para obras em andamento salvo se essas forem penhoradas Logo a obra pode

ser penhorada (art 862 do CPC) ldquoA regra como bem lembrou Araken de Assis lsquoestimula a

penhora da proacutepria obra inconclusa agrave qual os materiais acrescem e conseguintemente

valorizamrsquo 109

O art 833 VIII CPC julga impenhoraacutevel a pequena propriedade rural assim

definida em lei desde que trabalhada pela famiacutelia reproduzindo parte do art 5ordm XXVI CF

88116 que disciplina a impenhorabilidade do referido bem

A proteccedilatildeo do CPC eacute mais ampla do que a garantia prevista na Constituiccedilatildeo Federal

tendo em vista que a impenhorabilidade natildeo se restringe agraves execuccedilotildees de deacutebitos decorrentes

de sua atividade produtiva podendo ser alegada em toda e qualquer execuccedilatildeo ldquoAssim o 108 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud CABRAL Antonio Passo

CRAMER Ronaldo (orgs) Comentaacuterios ao Novo Coacutedigo de Processo Civil Rio de Janeiro Forense 2015 p 1194

109 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 835

45

imoacutevel natildeo pode ser penhorado na execuccedilatildeo de creacutedito rural concedido para estimular a

produccedilatildeo agriacutecola mas poderaacute ser penhorado na execuccedilatildeo do creacutedito concedido para a

aquisiccedilatildeo do imoacutevelrdquo 110

A nona modalidade de impenhorabilidade trata-se dos recursos puacuteblicos recebidos por

instituiccedilotildees privadas para aplicaccedilatildeo compulsoacuteria em educaccedilatildeo sauacutede ou assistecircncia social ldquoA

proteccedilatildeo eacute louvaacutevel e tutela toda a coletividade ao privilegiar o direito agrave educaccedilatildeo sauacutede e

assistecircncia social em detrimento do direito do credorrdquo

De acordo com o inciso X do art 833 do CPC eacute impenhoraacutevel ateacute o limite de

quarenta salaacuterios miacutenimos a quantia depositada em caderneta de poupanccedila

Eacute uma modalidade de impenhorabilidade relativa (o CPC73 a considerava absoluta)

tendo em vista que essa impenhorabilidade natildeo pode ser oposta na execuccedilatildeo de alimentos

independentemente da sua origem (art 833 sect 2ordm do CPC) Fredie Didier et al cita Araken de

Assis111 ao afirmar que

a regra soacute protege essa aplicaccedilatildeo financeira Se o valor estiver depositado em fundo de investimento por exemplo poderaacute ser penhorado Se o devedor tiver vaacuterias cadernetas de poupanccedila a impenhorabilidade aplica-se agrave soma de todas elas e natildeo a cada uma delas isoladamente do contraacuterio valores expressivos poderiam ser pulverizados em vaacuterias contas burlando a finalidade da regra que eacute a de proteger a populaccedilatildeo de baixa renda

Ademais satildeo tambeacutem impenhoraacuteveis por forccedila do inciso XI os recursos puacuteblicos do

fundo partidaacuterio recebidos por partido poliacutetico nos termos da lei Essa modalidade de

impenhorabilidade ldquose restringe aos recursos puacuteblicos do fundo partidaacuterio Recursos de

origem privada recebidos pelo partido poliacutetico poderatildeo ser penhoradosrdquo 112 O processualista

Fredie Didier et al113 assevera que

Assim a impenhorabilidade foi estabelecida no intuito de impedir que os diretoacuterios nacionais de partidos poliacuteticos respondam por diacutevida dos diretoacuterios

110 Ibid p 836 111 DIDIER JR Fredie et al apud ASSIS Araken de Manual da execuccedilatildeo 11ordm ed cit p 225 Assim

tambeacutem REDONDO Bruno Garcia LOJO Maacuterio Vitor Suarez Penhora cit p 117 BUENO Cassio Scarpinella Curso sistematizado de Direito Processual Civil v 3 cit p 228 GIANNICO Mauriacutecio As novas reformas do CPC e de outras normas processuais Mauriacutecio Giannico e Viacutetor Joseacute de Mello Monteiro (coord) Satildeo Paulo Saraiva 2009 p 1 OS Em sentido diverso estendendo a impenhorabiacutelidade aos depoacutesitos feitos ateacute esse valor em CDB CDI fundos de renda fixa ou de accedilotildees RODRIGUES Marcelo Abelha Manual de execuccedilatildeo civil 3deg ed cit p 101

112 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 839

113 Ibid p 839

46

estaduaismunicipais - sobretudo em razatildeo das vaacuterias decisotildees judiciais que determinaram penhora de recursos do fundo partidaacuterio de alguns partidos

Por fim o inciso XII do artigo 833 do CPC trata sobre a impenhorabilidade dos

creacuteditos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias sob o regime de incorporaccedilatildeo imobiliaacuteria

vinculados agrave execuccedilatildeo de obra ldquoO objetivo dessa modalidade eacute evitar que diacutevidas do

incorporador possam consumir os recursos que seriam utilizados na realizaccedilatildeo da obra em

prejuiacutezo dos adquirentes de unidades autocircnomasrdquo 114

O professor Misael Montenegro Filho115 aduz sobre que ldquoao estabelecer a

impenhorabilidade dos creacuteditos oriundos de alienaccedilatildeo de unidades imobiliaacuterias o novo CPC

protegeu os valores destinados agrave execuccedilatildeo da obra e agrave entrega das unidades imobiliaacuterias aos

adquirentes assegurando assim a execuccedilatildeo da promessa contratualrdquo

Importante frisar ainda que a Lei nordm 8009 1990 instituiu a impenhorabilidade do

imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar por qualquer diacutevida salvo as exceccedilotildees dos

seus arts 3ordm e 4ordm

A referida lei dispotildee que Para os efeitos de impenhorabilidade considera-se

residecircncia um uacutenico imoacutevel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia

permanente (art 5ordm)

O processualista baiano Fredie Didier et al116 assevera que

A lei propotildee-se a proteger imoacutevel residencial do casal ou da entidade familiar nos termos acima expostos A CF 88 ampliou o conceito de entidade familiar para abranger a famiacutelia monoparental e a uniatildeo estaacutevel Mas deve considerar-se aiacute compreendidos os irmatildeos que vivem juntos e a uniatildeo homossexual Ateacute o solteiro estaacute abrangido pela impenhorabilidade se reside soacute no imoacutevel - isso em nome da proteccedilatildeo agrave dignidade da pessoa humana e da moradia digna Na verdade houve uma mudanccedila de compreensatildeo acerca do sentido da proteccedilatildeo de proteccedilatildeo da famiacutelia agrave proteccedilatildeo da moradia indispensaacutevel agrave preservaccedilatildeo da dignidade da pessoa

114 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros A dignidade da pessoa humana e o

novo coacutedigo de processo civil Cadernos de Direito Piracicaba v 17 (32) 357-407 jan-jun 2017 ISSN Impresso 1676-529-X p 388

115 NETO Elias Marques Medeiros TODELO Andreacute Medeiros apud MONTENEGRO FILHO Misael Novo Coacutedigo de Processo Civil Comentado 2 ed Satildeo Paulo Editora Atlas 2016 p 752

116 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 840-841

47

O STJ jaacute consolidou esse entendimento na suacutemula nordm 364 O conceito de

impenhorabilidade de bem de famiacutelia abrange tambeacutem o imoacutevel pertencente a pessoas

solteiras separadas e viuacutevas

Entretanto se o casal ou entidade familiar possuir vaacuterios imoacuteveis utilizados como

residecircncia a impenhorabilidade recairaacute sobre o de menor valor (art 5ordm paraacutegrafo uacutenico) ldquoEacute o

que ocorre por exemplo quando a famiacutelia se divide em mais de uma cidade por motivos

profissionaisrdquo 117

Forccediloso observar ainda que a impenhorabilidade do imoacutevel familiar eacute relativa jaacute que

natildeo pode ser oposta a qualquer creacutedito O art 3ordm da Lei n 8009 1990151 em que pode ser

penhorada a residecircncia da famiacutelia (exemplo execuccedilatildeo de alimentos para cobranccedila de taxas

devidas em funccedilatildeo do imoacutevel familiar etc)

Resta claro que o artigo 833 do CPC ao disciplinar as hipoacuteteses de impenhorabilidade

possui o escopo de proteger o princiacutepio da dignidade humana Entretanto algumas claacuteusulas

natildeo possuem proteccedilatildeo absoluta ldquoa sua relativizaccedilatildeo a depender do caso sob exame deve ser

realccedilada agrave medida que a dignidade resguardada e protegida pelo sistema processual-

constitucional natildeo se limita ao executadordquo 118 Ademais ldquoEacute premente advertidamente que a

dignidade do credor tambeacutem seja garantida em juiacutezo tendo como norte pois os princiacutepios da

proporcionalidade e razoabilidaderdquo 119

117 Ibid p 841 118 Ibid p 752 119 Ibid p 752

48

4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA

ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE

HUMANA DO EXECUTADO

41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE

EFETIVACcedilAtildeO

Como jaacute exposto em linhas preteacuteritas nos meios executivos tiacutepicos as medidas

executivas satildeo determinadas pela lei ou seja o oacutergatildeo pode aplicar somente as medidas

tipificadas no ordenamento juriacutedico No entanto ao se tratar das medidas executivas atiacutepicas

eacute necessaacuterio que haja um limite na atuaccedilatildeo realizada pelo juiz

O poder geral de efetivaccedilatildeo natildeo poder ser realizado de maneira indiscriminada haacute

pressupostos e premissas a serem observadas Dessa forma a primeira premissa eacute no sentindo

de que a medida executiva atiacutepica natildeo pode ser a primeira medida a ser invocada ldquomuito ao

reveacutes a regra do nosso sistema continua a ser o da tipicidade dos meios executivos soacute que

agora temperado pelo sistema atiacutepicordquo 120 O processualista Thiago Rodovalho explica que

ldquo() os meios atiacutepicos natildeo satildeo prima ratio e sim a ultima ratio eacute dizer esgotados e

frustrados os meios executivos tiacutepicos e ordinaacuterios pode-se em tese valer-se do sistema

atiacutepicordquo121

Dessa forma nos casos de execuccedilatildeo que tenha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

natildeo deve ser aplicado de logo as medidas indutivas e coercitivas Apenas apoacutes frustradas as

medidas ldquonaturaisrdquo pode-se passar agrave aplicaccedilatildeo das medidas atiacutepicas

Uma segunda premissa diz a respeitos dos meios de pressatildeo para compelir o devedor a

adimplir com o seu deacutebito ldquoEssa segunda premissa decorre inclusive de imperiosidade

loacutegica de nada adianta a medida de pressatildeo se a obrigaccedilatildeo natildeo tem como ser adimplida pelo

devedorrdquo 122

Para Thiago Rodovalho123 ldquoIsso quer significar que esgotados e frustrados os meios

tiacutepicos o juiz se valeraacute dos meios atiacutepicos se eles forem potencialmente haacutebeis a estimular ou

120 RODOVALHO Thiago O necessaacuterio diaacutelogo entre a doutrina e a jurisprudecircncia na concretizaccedilatildeo da

atipicidade dos meios executivos Uma reflexatildeo sobre a decisatildeo que determinou a apreensatildeo de passaporte e o cancelamento de cartotildees Disponiacutevel em lt httpsjotainfoartigoso-necessario-dialogoentre-doutrina-e-jurisprudencia-na-concretizacao-da-atipicidade-dos-meios-executivos-21092016gt publicado em 21092016 Acessado em 10082018

121 Ibid sem paginaccedilatildeo 122 Ibid sem paginaccedilatildeo 123 Ibid sem paginaccedilatildeo

49

forccedilar o cumprimento o que pressupotildee sua possibilidade quando entatildeo eles poderatildeo ser

eficazesrdquo

Logo nas obrigaccedilotildees de pagar quantia se houver a real demonstraccedilatildeo da

impossibilidade financeira do devedor seria um constrangimento inuacutetil e desnecessaacuterio a

imposiccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo para forccedilar o cumprimento

Por isso as medidas atiacutepicas devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o

esgotamento das medidas tiacutepicas e a possibilidade de cumprimento de cumprimento da

obrigaccedilatildeo

Ademais superadas as supracitadas premissas e o oacutergatildeo julgador vislumbrando a

necessidade da aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo se faz necessaacuterio que um conjunto de

postulados e princiacutepios rejam a atuaccedilatildeo do oacutergatildeo julgador servindo de norte para a escolha da

medida executiva mais adequada ldquoDe modo geral a escolha deve pautar-se nos postulados da

proporcionalidade da razoabilidade (art8ordm CPC) e da proibiccedilatildeo de excesso bem como nos

princiacutepios da eficiecircncia e da menor onerosidade da execuccedilatildeordquo 124

O professor Fredie Didier et al125 eacute categoacuterico ao citar Humberto Aacutevila

Segundo Humberto Aacutevila o postulado da proporcionalidade se manifesta nas situaccedilotildees em que haacute uma relaccedilatildeo de causalidade entre dois elementos empiricamente discerniacuteveis um meio e um fim de tal sorte que se possa proceder aos trecircs exames fundamentais o da adequaccedilatildeo (o meio promove o fim) o da necessidade (dentre os meios disponiacuteveis e igualmente adequados para promover o fim natildeo haacute outro meio menos restritivo do(s) direito(s) fundamental (is) afetado(s)) e o da proporcionalidade em sentido estrito (as vantagens trazidas pela promoccedilatildeo do fim correspondem agraves desvantagens provocadas pela adoccedilatildeo do meio)

O juiz ao aplicar a medida executiva atiacutepica ao caso concreto deve ter seu

embasamento no princiacutepio da proporcionalidade para saber se a medida a ser tomada eacute a

melhor opccedilatildeo ao caso sub judice ldquoO exame de proporcionalidade aplica-se sempre que

houver uma medida concreta destinada a realizar uma finalidaderdquo 126

Em verdade a aplicaccedilatildeo do princiacutepio da proporcionalidade eacute imprescindiacutevel na adoccedilatildeo

dos meios executivos atiacutepicos tendo em vista que ldquo() tais medidas em especial quando de

124 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111 125 DIDIER JR Fredie et al apud AVILA Humberto Teoria dos princiacutepios da definiccedilatildeo agrave aplicaccedilatildeo

dos princiacutepios juriacutedicos 16 ed Satildeo Paulo Malheiros 2015 p 205 126 DIDIER JR Fredie et al op cit p 111

50

natureza coercitiva podem restringir direitos do devedor e incidir diretamente sobre sua

pessoardquo127 Logo ainda que o princiacutepio da efetividade da tutela executiva seja um direito

fundamental o mesmo ldquo() deve ser compatibilizado com direitos fundamentais do

executado para que a sua dignidade humana seja preservadardquo 128

Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Neves129 afirma que em nome do princiacutepio da

proporcionalidade o juiz deveraacute

() ponderar no caso concreto as vantagens praacuteticas da adoccedilatildeo de cada medida executiva atiacutepica em especial as de natureza coercitiva e as desvantagens de sua adoccedilatildeo levando em conta a possibilidade de a medida criar uma limitaccedilatildeo excessiva ao exerciacutecio de direito fundamental do executado

Outro princiacutepio que o oacutergatildeo julgador deve se ater ao escolher a medida executiva

atiacutepica eacute o da razoabilidade Segundo Fredie Didier et al 130 o princiacutepio (ou postulado)131 se

manifesta de trecircs formas

a) como dever de equidade a exigir a harmonizaccedilatildeo da norma geral com o caso individual impondo a consideraccedilatildeo daquilo que normalmente acontece em detrimento do que eacute extraordinaacuterio e tambeacutem impondo a consideraccedilatildeo das especificidades do caso concreto ante a generalidade da norma b) como dever de congruecircncia a exigir a harmonizaccedilatildeo das normas com suas condiccedilotildees externas de aplicaccedilatildeo (isto eacute com a realidade com base em que foram editadas) c) como dever de equivalecircncia a exigir uma relaccedilatildeo de equivalecircncia entre a medida adotada e o criteacuterio que a dimensiona

Logo ldquo() o princiacutepio da razoabilidade deve nortear a atuaccedilatildeo do juiz na adoccedilatildeo das

medidas executivas atiacutepicas previstas no art 139 IV do Novo CPCrdquo 132 tendo em vista que

ldquo() mesmo medidas que pelo princiacutepio da proporcionalidade podem se mostrar

abstratamente possiacuteveis de adoccedilatildeo no caso concreto podem se mostrar inadequadas e

irrazoaacuteveisrdquo 133

127 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo Medidas executivas atiacutepicas na execuccedilatildeo de obrigaccedilatildeo de

pagar quantia certa art 139 IV do novo CPC Revista de Processo v 42 n 265 mar 2017 p 14 128 Ibid p 14 129 Ibid p 14 130 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 111-112 131 Segundo Fredie Didier et al o postulado eacute uma norma que atua sobre a aplicaccedilatildeo de outras normas

A proporcionalidade e a razoabilidade seriam postulados normativos e natildeo princiacutepios segundo essa concepccedilatildeo 132 NEVES Daniel Amorim Assumpccedilatildeo op cit p 14 133 Ibid p 14

51

Ademais conforme dispotildee o postulado da proibiccedilatildeo de excesso ldquoa realizaccedilatildeo de uma

regra ou princiacutepio constitucional natildeo pode conduzir agrave restriccedilatildeo a um direito fundamental que

lhe retire um miacutenimo de eficaacuteciardquo 134

A proibiccedilatildeo de excesso deveraacute sempre ser suscitada quando um direito fundamental

houver sido violado a ponto do direito fundamental sofrer violaccedilatildeo excessiva Ademais ldquoesse

postulado natildeo se confunde com o da proporcionalidade porque ele dispensa os exames da

adequaccedilatildeo (relaccedilatildeo meiofim) da necessidade (exigibilidade) ou da proporcionalidade em

sentido estrito (ponderaccedilatildeo entre vantagens e desvantagens)rdquo 135

Logo ldquopouco importa a relaccedilatildeo meiofim ou a exigibilidade da medida ou ainda a

ponderaccedilatildeo com outro direito fundamental eventualmente em jogo aqui se analisa apenas a

eficaacutecia de um determinado direito fundamentalrdquo 136

O princiacutepio da eficiecircncia tem previsatildeo constitucional no art 37 e previsatildeo

infraconstitucional no art 8ordm do CPC15 O referido princiacutepio determina que o processo seja

conduzido de forma eficiente pelo oacutergatildeo jurisdicional

Entende-se que eficiente eacute a atuaccedilatildeo que utilize adequadamente os meios necessaacuterios

para que se atinjam os fins almejados O oacutergatildeo jurisdicional na escolha dos meios a serem

utilizados para a obtenccedilatildeo dos fins

a) deve escolher aqueles que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo (deve evitar meios que promovam resultados insignificantes) b) deve escolher meios que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado (natildeo se pode escolher um meio de resultado duvidoso) c) natildeo pode escolher um meio que produza muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscado 137

O juiz deveraacute igualmente analisar o princiacutepio da menor onerosidade da execuccedilatildeo que

eacute previsto pelo art 805 do CPC ldquoArt 805 Quando por vaacuterios meios o exequente puder

promover a execuccedilatildeo o juiz mandaraacute que se faccedila pelo modo menos gravoso para o

executadordquo

134 134 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 112 135 Ibid p 112 136 Ibid p 112 137 Ibid p 112-113

52

Logo ldquohavendo duas opccedilotildees igualmente eficazes para permitir alcanccedilar o resultado

pretendido (satisfaccedilatildeo do creacutedito) deveraacute o oacutergatildeo julgador valer-se daquela que menos onere

a situaccedilatildeo do executadordquo 138

O dito princiacutepio impede o comportamento abusivo do exequente que possa beneficiar-

se do meio mais danoso ao executado protegendo dessa forma a lealdade e a eacutetica

processual

Os postulados e princiacutepios analisados em linhas preteacuteritas impotildeem ao oacutergatildeo julgador a

observacircncia de alguns criteacuterios para a escolha da medida executiva atiacutepicas a ser utilizada no

caso concreto

Primeiramente a medida executiva atiacutepica deveraacute ser adequada ldquoO criteacuterio da

adequaccedilatildeo impotildee que juiz considere abstratamente uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida

executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia

a gerar o resultadordquo 139 Nesse primeiro momento o juiz deveraacute observar sob a perspectiva do

credor qual medida teraacute o condatildeo de gerar o resultado mais efetivo

Segundo Fredie Didier et al140 o criteacuterio da adequaccedilatildeo eacute

() fortemente inspirado pelo postulado da proporcionalidade e pelo princiacutepio da eficiecircncia na parte em que esse princiacutepio determina a escolha de meios que tenham condiccedilotildees de promover algum resultado significativo e que permitam alcanccedilar com certo grau de probabilidade o resultado almejado

Ademais a medida adotada pelo oacutergatildeo julgador deveraacute ser necessaacuteria ldquoEsse criteacuterio

impotildee um limite agrave atuaccedilatildeo judicial funcionando como uma espeacutecie de contrapeso ao criteacuterio

da adequaccedilatildeo Aqui deve-se levar em conta a posiccedilatildeo do devedorrdquo141

O juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental agrave execuccedilatildeo e determinar

uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute necessaacuterio que a

medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado O criteacuterio da necessidade

estabelece que ldquonatildeo se pode ir aleacutem do necessaacuterio para alcanccedilar o propoacutesito almejado Deve

138 Ibid p 113 139 Ibid p 113 140 Ibid p 113 141 Ibid p 114

53

pois o oacutergatildeo julgador determinar o meio executivo na medida do estritamente necessaacuterio para

proporcionar a satisfaccedilatildeo do creacutedito ndash nem menos nem maisrdquo 142

O referido criteacuterio possui forte influecircncia dos postulados da proibiccedilatildeo do excesso e da

razoabilidade assim como do princiacutepio da menor onerosidade para o executado Assevera

Fredie Didier et al143 que

Natildeo eacute razoaacutevel por exemplo impor como primeira opccedilatildeo medida coercitiva a ser suportada pelo agente puacuteblico pelo simples fato de o juiz pressupor que o ente puacuteblico ao qual ele eacute vinculado iraacute descumprir determinada ordem judicial - o descumprimento natildeo pode ser visto como algo ordinaacuterio ou cotidiano (razoabilidade como dever de equidade) Tampouco eacute razoaacutevel eleger a prisatildeo civil como meacutetodo prioritaacuterio para compelir o executado ao cumprimento de uma prestaccedilatildeo de fazer ou de natildeo fazer (razoabilidade como dever de equivalecircncia) Aleacutem disso eacute vedada por exemplo a imposiccedilatildeo de multa coercitiva para compelir o executado a emitir declaraccedilatildeo de vontade uma vez que haacute previsatildeo expressa de medida tiacutepica capaz de proporcionar o mesmo resultado sem sacrifiacutecio para o devedor (art 501 CPC)

A afirmaccedilatildeo feita por Bonavides144 em 1997 sobre a adequaccedilatildeo e a necessidade

continua atual sobre os motes

O meio empregado pelo legislador deve ser adequado e necessaacuterio para alcanccedilar o objetivo procurado O meio eacute adequado quando com seu auxiacutelio se pode alcanccedilar o resultado desejado eacute necessaacuterio quando o legislador natildeo poderia ter escolhido outro meio igualmente eficaz mas que natildeo limitasse ou limitasse de maneira menos sensiacutevel o direito fundamental

Por fim a medida deve conciliar os interesses contrapostos ldquoO magistrado deve

ponderar os interesses em jogo aplicando a proporcionalidade em sentido estrito de modo

que as vantagens da utilizaccedilatildeo da medida atiacutepica escolhida superem as vantagens de seu usordquo 145

Esse criteacuterio natildeo privilegia nem o credor nem o devedor e sim a soluccedilatildeo mais

equilibrada e que atenda da melhor forma aos valores em conflito ldquoTrata-se de criteacuterio

inspirado nos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade bem como no princiacutepio da

142 Ibid p 114 143 Ibid p 114 144 BONAVIDES Paulo Curso de Direito Constitucional 7ordm ediccedilatildeo Satildeo Paulo Ed Malheiros 1997

p 372 145 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual

Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 114-115

54

eficiecircncia na parte em que impotildee ao juiz evitar a escolha do meio executivo que produza

muitos efeitos negativos paralelamente ao resultado buscadordquo 146

Cada um dos criteacuterios supracitados devem ser considerados pelo juiz ao aplicar as

medidas executivas atiacutepicas ao caso concreto Para Fredie Didier et al147 as medidas como

retenccedilatildeo de CNH passaporte ou cancelamento dos cartotildees de creacutedito do executado como

forma de pressionaacute-lo ao pagamento da diacutevida pecuniaacuteria natildeo satildeo possiacuteveis

Essas natildeo satildeo medidas adequadas ao atingimento do fim almejado (o pagamento de quantia) - natildeo haacute propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente Tais medidas soam mais como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-lo ao cumprimento da ordem judicial - e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a utilizaccedilatildeo de meios sancionatoacuterios pelo magistrado mas apenas de meios de coerccedilatildeo indireta e sub-rogatoacuterios

Ainda que adequadas fossem a retenccedilatildeo de CNH e do passaporte no corte de fornecimento de aacutegua natildeo parecem ser medidas necessaacuterias (no sentido de exigiacuteveis) uma vez que outras medidas podem em tese ser utilizadas sem causar igual gravame ao executado - como por exemplo a simples restriccedilatildeo do uso de cartotildees de creacutedito A retenccedilatildeo de documentos pessoais eacute medida que termina por restringir a liberdade de ir e vir do executado mostrando-se a princiacutepio natildeo-razoaacutevel por ir de encontro ao dever de equivalecircncia e desproporcional por restringir demais o direito agrave liberdade em favor do direito de creacutedito pecuniaacuterio do exequente

O processualista baiano et al148 cita tambeacutem outro exemplo de medida atiacutepica que natildeo

atingem os criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade

Tampouco parece adequada em princiacutepio determinaccedilatildeo de corte de energia eleacutetrica de todo o preacutedio onde funciona serviccedilo puacuteblico administrativo como forma de pressionar o ente federado a cumprir ordem de nomeaccedilatildeo de candidato em concurso puacuteblico Natildeo parece haver relaccedilatildeo meiofim entre uma coisa e outra Tambeacutem natildeo eacute possiacutevel enxergar essa medida como necessaacuteria no sentido de ser a menos gravosa para o devedor - observe que se trata de medida que uma vez aplicada ensejaria restriccedilatildeo de funcionamento em toda a reparticcedilatildeo puacuteblica em prejuiacutezo de serviccedilos puacuteblicos essenciais ao funcionamento da Administraccedilatildeo o que aleacutem de ser excessivamente gravoso parece natildeo se conformar agrave necessidade de ponderaccedilatildeo dos interesses em jogo - aleacutem de afetar a um sem-nuacutemero de pessoas tomadoras desses serviccedilos

Ademais eacute sabido que toda e qualquer decisatildeo judicial precisa ser fundamentada Ao

se tratar das medidas executivas atiacutepicas o papel da fundamentaccedilatildeo se torna ainda mais

146 Ibid p 115 147 Ibid p 115 148 Ibid p 116

55

importante tendo em vista que eacute pela fundamentaccedilatildeo da decisatildeo que se poderaacute controlar a

adequaccedilatildeo e necessidade da medida atiacutepica

Pelo fato das medidas executivas atiacutepicas derivarem de dispositivos normativos

considerados claacuteusulas gerais propiacutecias as mais variadas interpretaccedilotildees eacute de extrema

importacircncia que o oacutergatildeo julgador fundamente sua decisatildeo

Logo ldquodeve o juiz na fundamentaccedilatildeo decisoacuteria expor racionalmente os motivos da

sua escolha demonstrando com atenccedilatildeo ao art 489 sect 1ordm CPC de que modo a sua opccedilatildeo

atende os criteacuterios da adequaccedilatildeo necessidade e proporcionalidade em sentido estrito ()rdquo 149

Dessa forma os princiacutepios da proporcionalidade e razoabilidade servem para delimitar

o alcance das claacuteusulas gerais de efetivaccedilatildeo fazendo com que o oacutergatildeo julgador se atenha aos

criteacuterios da adequaccedilatildeo e necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao caso

concreto

42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO

EXECUTADO

A entrada em vigor do Coacutedigo de Processo Civil de 2015 aflorou ainda mais uma

discussatildeo essencial para os processualistas do seacuteculo XXI qual eacute o verdadeiro protagonista do

processo civil

Para os que defendem o ldquoautoritarismo processualrdquo o verdadeiro protagonista do

processo civil eacute o oacutergatildeo judiciaacuterio que em nome do desempenho efetivo de suas funccedilotildees lhes

eacute permitido dilatar os poderes que diga-se de jaacute passagem jaacute compotildeem um vastiacutessimo

arsenal150

Jaacute os ldquogarantistasrdquo 151 do processo civil acreditam que os verdadeiros protagonistas satildeo

as partes do processo e seus direitos e garantias devem ser estritamente preservados

Devido a essa disputa de quem possui maior protagonismo no processo as mudanccedilas

ocorridas no coacutedigo processual vigente quanto agraves medidas executivas atiacutepicas despertaram

149 Ibid p 117 150 MIGALHAS Professor Araken de Assis afirma ser totalmente contraacuterio aos poderes executivos

atiacutepicos Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrQuentes17MI27871111049-Professor+Araken+de+Assis+afirma+ser+totalmente+contrario+aos+poderes gt Publicado em 19042018 Acesso em 04102018

151 O processualista Araken de Assis acredita que o termo garantista eacute descabido tendo em vista que remete ao processo penal

56

maior celeuma do que qualquer outra modificaccedilatildeo trazida pelo CPC15 Afinal as referidas

medidas acirravam ainda mais a disputa pelo protagonismo processual

O fato de o CPC15 dispor no art 139 IV que o juiz poderaacute decretar todas as medidas

indutivas coercitivas mandamentais ou sub-rogatoacuterias necessaacuterias para assegurar o

cumprimento de ordem judicial inclusive nas accedilotildees que tenham por objeto prestaccedilatildeo

pecuniaacuteria levou boa parte da doutrina e dos juiacutezes a acreditar que teria pleno direito de

aplicar qualquer medida capaz de forccedilar o executado a adimplir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo Entretanto muitos se esqueceram do outro lado

da moeda esqueceram que a dignidade humana do executado tambeacutem eacute um direito

fundamental e natildeo pode ser violado

Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa152

acreditam que

() natildeo parece producente elencar um rol abstrato das medidas que poderiam ser aplicadas pelo juiz a tiacutetulo do art 139 IV CPC Afinal se busca a efetividade da execuccedilatildeo e esta soacute pode ser identificada agrave luz das especificidades da situaccedilatildeo concreta Ideal eacute enveredar pela loacutegica modular (adequaccedilatildeo ao caso) natildeo pela geneacuterica (soluccedilotildees abstratas de pretensa utilidade universal)

Em razatildeo de o dispositivo apresentar uma gama de poderes tatildeo amplos agrave disposiccedilatildeo do

oacutergatildeo julgador sem nenhuma estipulaccedilatildeo de um procedimento legal previamente definido para

que estabeleccedila as condiccedilotildees de sua aplicaccedilatildeo em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo eacute

necessaacuterio que em razatildeo do princiacutepio da dignidade humana natildeo busque definir o que o

dispositivo permite mas de definir o que ele natildeo permite ldquoOu seja propotildee-se a sua

compreensatildeo por exclusatildeo Afinal se ele tem potencialidade para promover a efetividade da

tutela tambeacutem pode provocar lesotildees E como em direito os fins natildeo justificam os meios

ressalta como prioritaacuteria a necessidade de estabelecer limitesrdquo 153

O art 789 do CPC15 disciplina o princiacutepio da responsabilidade patrimonial e eacute

categoacuterico ao dispor que ldquoo devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para

152 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

153 Ibid sem paginaccedilatildeo

57

o cumprimento de suas obrigaccedilotildees salvo as restriccedilotildees estabelecidas em leirdquo Logo a

execuccedilatildeo somente poderaacute incidir sobre os bens do devedor e natildeo sobre a sua pessoa

Como eacute sabido a Lex Poetelia Papiria de 326 aC foi o primeiro marco legal da

humanizaccedilatildeo das cobranccedilas de diacutevidas abolindo a imposiccedilatildeo ao devedor de castigos

vexatoacuterios e ateacute da pena de morte154

Afinal no direito romano antigo a cobranccedila de diacutevidas poderia recair sobre a pessoa

do devedor que respondia com sua liberdade e ateacute mesmo com seu proacuteprio corpo permitindo

a lei que repartissem tantos pedaccedilos do corpo do devedor quantos fossem seus credores

Nesse sentindo leciona o professor Guilherme Pupe da Noacutebrega155 que

Vem de longe a evoluccedilatildeo no sentido de fazer a responsabilidade por uma obrigaccedilatildeo migrar da pessoa do devedor para seu patrimocircnio Merecem registro especiacutefico como marcos histoacutericos remotos a Lex Poetelia Papiria de 326 aC que aboliu o nexum e possibilidade de escravidatildeo do devedor como garantia da obrigaccedilatildeo e a pignoris capio ou ldquoaccedilatildeo por tomada de penhorrdquo que instituiu a possibilidade de o credor tomar parcela dos bens do devedor como forma de assegurar o adimplemento da diacutevida Aqueles institutos culminariam seacuteculo depois no artigo 789 do CPC de 2015 a consagrar que o devedor responda pela satisfaccedilatildeo da obrigaccedilatildeo com seus bens presentes e futuros observadas as restriccedilotildees impostas pelas impenhorabilidades legais

Logo o avanccedilar da civilizaccedilatildeo marcou o deslocamento da responsabilidade por

diacutevidas saindo do corpo do devedor para o seu patrimocircnio tendo em vista que a vida

humana a liberdade e a integridade fiacutesica satildeo valores inalienaacuteveis natildeo podendo ser

sacrificadas em benefiacutecio de obrigaccedilotildees pecuniaacuterias 156

Entretanto eacute sabido que a responsabilidade patrimonial eacute excepcionada pela prisatildeo

civil do devedor de verba alimentiacutecia resquiacutecio da responsabilidade pessoal romana

154 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt

httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018

155 NOacuteBREGA Guilherme Pupe da Reflexotildees sobre a atipicidade das teacutecnicas executivas e o art 139 IV do CPC de 2015 Disponiacutevel em lt httpwwwmigalhascombrProcessoeProcedimento106MI24374621048-Reflexoes+sobre+a+atipicidade+das+tecnicas+executivas+e+o+artigo+139 gt Publicado em 11082016 Acesso em 25082018

156 Ibid sem paginaccedilatildeo

58

No entanto haacute uma justificativa para isso Segundo o processualista Guilherme Pupe

da Noacutebrega157

Eacute que a par de a prisatildeo civil encontrar previsatildeo constitucional no inciso LXVII do artigo 5ordm o raciociacutenio eacute o de que o direito do alimentante agrave liberdade de locomoccedilatildeo cede diante dos direitos agrave vida e agrave dignidade titularizados pelo alimentando e resguardados pelos alimentos Foi esse mesmo raciociacutenio aliaacutes que justificou no passado a ediccedilatildeo da suacutemula 309 pelo STJ agora positivada pelo artigo 528 sect 7ordm que limita a modalidade coercitiva agraves trecircs uacuteltimas prestaccedilotildees vencidas e agraves prestaccedilotildees vincendas A ideia eacute que tendo o alimentando subsistido a despeito do natildeo-pagamento de prestaccedilotildees mais antigas essas verbas teriam perdido o caraacuteter alimentar que na equaccedilatildeo antes apresentada justificaria a prisatildeo civil do alimentante Daiacute por que aqueles valores antigos remanescem exigiacuteveis mas somente pela via da expropriaccedilatildeo

Essa ressalva eacute necessaacuteria tendo em vista que a adoccedilatildeo de teacutecnica de execuccedilatildeo

indireta para incursatildeo radical na esfera de direitos do executado notadamente direitos

fundamentais quando carente de respaldo constitucional natildeo merece acolhimento sob

risco de se atentar contra o devido processo legal (artigo 5ordm LIV da Constituiccedilatildeo)

Como afirma o autor Bruno Dantas158 ldquoembora inexistam estatiacutesticas que permitam

comparaccedilotildees natildeo eacute desarrazoado intuir que os iacutendices de inadimplecircncia despeccedilam na razatildeo

inversa da incidecircncia das ordens judiciais sobre o corpo e a liberdade do devedorrdquo Entretanto

eacute natildeo possiacutevel adotar toda e qualquer medida executiva atiacutepica em nome da efetividade da

execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que se saiba os limites da sua aplicaccedilatildeo

Dessa forma instrumentos que permitam o cumprimento forccedilado de contratos e o pagamento

de diacutevidas satildeo necessaacuterios contudo eacute preciso equilibrar essa exigecircncia com a liberdade e a

dignidade humana

Como citado alhures o art 139 IV ensejou decisotildees como a que determinou a

suspensatildeo da Carteira Nacional de Habilitaccedilatildeo (CNH) do executado bem como apreendeu o

passaporte e cancelou os cartotildees de creacutedito em uma accedilatildeo se tratava de uma execuccedilatildeo de tiacutetulo

extrajudicial que tinha por objeto uma prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

Na supracitada decisatildeo o princiacutepio da responsabilidade patrimonial natildeo estaacute sendo

efetivado para o que o devedor responda com os seus bens Afinal qual ligaccedilatildeo entre a

157 Ibid sem paginaccedilatildeo 158 DANTAS Bruno Cobranccedila de diacutevidas natildeo pode afrontar a dignidade humana Disponiacutevel em lt

httpswwwconjurcombr2016-out-07bruno-dantas-cobranca-dividas-nao-afrontar-dignidade-humana gt Publicado em 07102016 acesso em 10092018

59

restriccedilatildeo de circulaccedilatildeo que diz com o direito de ir e vir (liberdade) com o pagamento de

diacutevidas que diz com a responsabilidade civil159

Ademais por que quem natildeo tem dinheiro para pagar diacutevidas natildeo pode dirigir Por que

natildeo tem condiccedilotildees para pagar o deacutebito natildeo pode ter passaporte Por que quem natildeo tem como

pagar o deve natildeo pode ter cartatildeo de creacutedito

Ao utilizar meios executivos atiacutepicos como os supracitados para compelir o devedor a

satisfazer a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria quando exauridos sem ecircxito os meios tradicionais de bens

penhoraacuteveis salvo quando existe qualquer indiacutecio concreto de ocultaccedilatildeo ou dissipaccedilatildeo de

bens eacute obrigar o devedor abrir matildeo da proteccedilatildeo da lei que lhe impede que seja tomado agrave forccedila

(art 833 CPC e demais disposiccedilotildees que tratam da impenhorabilidade)

Segundo Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa160

Claramente essa pressatildeo visa dar uma aparecircncia de voluntariedade agrave indicaccedilatildeo de bens impenhoraacuteveis pelo proacuteprio executado que na verdade soacute age assim por ser a uacutenica forma de ver-se livre de um grame imposto por medida indutiva despedida de qualquer necessidade ou adequaccedilatildeo Uma intoleraacutevel perversatildeo

Os autores afirmam ainda que o ldquodireito paacutetrio natildeo admite esta contraditio in terminis

sendo inaceitaacutevel a coexistecircncia de regra protetiva do executado com outra que concede ao

juiz poderes para forccedilar (ainda que indiretamente e veladamente) o executado a abrir matildeo

daquela proteccedilatildeordquo 161

Logo eacute cristalino que a suspensatildeo da CNH eacute uma forma incorreta de aplicar a medida

executiva atiacutepica para efetivar o direito fundamental a execuccedilatildeo tendo em vista que o uacutenico

objetivo da referida eacute pressionar o executado abrir matildeo de algum bem impenhoraacutevel para

levantar o dinheiro e cumprir com a prestaccedilatildeo pecuniaacuteria

A retenccedilatildeo do passaporte igualmente natildeo possui qualquer relaccedilatildeo com a diacutevida do

executado e eacute somente uma forma de tentar pressiona-lo a dispor de um bem que natildeo pode

ser tomado agrave forccedila e puni-lo por natildeo ter cumprido voluntariamente com a sua obrigaccedilatildeo

159 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

160 Ibid sem paginaccedilatildeo 161 Ibid sem paginaccedilatildeo

60

Os autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa162

acreditam que tal medida eacute equivocada e se torna excessivamente onerosa ao executado

As mais variadas circunstacircncias relevem o equiacutevoco de tal medida aplicada assim genericamente Com efeito nada justifica reter o passaporte do executado e impedi-lo de viajar para o exterior quando eacute agraciado inclusive com todas as despesas pagas com presente sorteio ou precircmio (por completar tempo de serviccedilo ou atingir metas produtividade na sociedade empresaacuteria em que trabalha) Como todo custo eacute suportado por terceiro e por isso mesmo a sua realizaccedilatildeo pelo executado natildeo traria qualquer prejuiacutezo ao exequente e a retenccedilatildeo do passaporte natildeo seria injustificaacutevel

Paulo Antonio Papini163 acredita que natildeo tem a apreensatildeo de passaporte natildeo possui um

fundamento plausiacutevel tendo em vista que se o devedor natildeo pode viajar para saldar o deacutebito

tambeacutem natildeo poderia exercer atividades cotidianas

Com todo o respeito a quem pensa dessa forma o argumento eacute muito simploacuterio e natildeo precisamos sequer do Direito para derrubaacute-lo Com efeito se considerarmos que ndash ateacute mesmo pelas dimensotildees continentais do Brasil ndash natildeo eacute incomum que uma passagem para o Nordeste custe mais caro que um voo para Miami seria razoaacutevel entatildeo seguindo a linha argumentativa do Magistrado em questatildeo que se oficiasse aos oacutergatildeos reguladores da aviaccedilatildeo civil proibindo-se aquele devedor de fazer ateacute mesmo voos domeacutesticos Poder-se-ia ir mais longe jaacute que natildeo tem dinheiro para pagar suas diacutevidas certamente aquele devedor tambeacutem natildeo teria para comer fora de sua casa porque entatildeo natildeo determinar a expediccedilatildeo de ofiacutecio aos restaurantes proacuteximos agrave sua casa e determinar tambeacutem a proibiccedilatildeo de que ele fosse servidoatendido

O autor se questiona ainda ldquoSeraacute entatildeo que o Princiacutepio da Dignidade da Pessoa

Humana estaacute de mero enfeite em nossa Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ()rdquo 164 Tendo em vista

que ldquoa decisatildeo em comento viola diretamente o art 5ordm incisos XV LIII e LXIII da

Constituiccedilatildeo da Repuacuteblica ndash falamos do Direito de Ir e Virrdquo 165

Ademais o cancelamento do cartatildeo de creacutedito eacute mais uma forma de constranger e

compelir o executado a cumprir com a obrigaccedilatildeo de qualquer forma natildeo importando o que

precise fazer para conseguir saldar o deacutebito tendo em vista que a referida medida apresenta

162 Ibid sem paginaccedilatildeo 163 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo

pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018

164 Ibid sem paginaccedilatildeo 165 Ibid sem paginaccedilatildeo

61

qualquer adequaccedilatildeo com o fim desejado (reverter em pagamento para o exequente) Os

autores Jorge Bheron Rocha Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa afirmam que166

Reconhece-se que as razotildees da afirmaccedilatildeo ora questionada satildeo ateacute intuitivas mas eacute plenamente possiacutevel problematiza-las Ora natildeo se encontra qualquer justificativa idocircnea para que o juiz possa cancelar o contrato do executado com a administradora do cartatildeo de creacutedito (ou instituiccedilatildeo financeira) que natildeo tem qualquer relaccedilatildeo com o creacutedito exequendo muito menos como isso poderia impactar positivamente na execuccedilatildeo (senatildeo para pressionar o executado a dispor de bens impenhoraacuteveis) Ademais natildeo foram indicados sequer sinais de que o executado realiza gastos supeacuterfluos com o cartatildeo de creacutedito ndash natildeo que isso justificasse a medida pois o correto seria penhorar os esses bens (se duraacuteveis naturalmente) ao inveacutes de cancelar o cartatildeo de creacutedito

Logo as referidas medidas natildeo possuem qualquer relaccedilatildeo com o atingimento do fim

almejado (o pagamento de quantia) tendo em vista que natildeo haacute uma relaccedilatildeo meiofim entre

tais medidas e o objetivo buscado uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a

restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia

ao exequente

Dessa forma nota-se que as medidas de suspensatildeo da CNH retenccedilatildeo de passaporte e

bloqueio do cartatildeo de credito satildeo completamente inadequadas agrave realizaccedilatildeo a que se prestam

Afinal ldquotais medidas soam como forma de puniccedilatildeo do devedor natildeo como forma de compeli-

lo ao cumprimento da ordem judicial ndash e as claacuteusulas gerais executivas natildeo autorizam a

utilizaccedilatildeo dos meios sancionatoacuterios pelo magistrado ()rdquo167

Como exposto em linhas preteacuteritas o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades

de aplicaccedilatildeo do poder geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e

razoaacutevel se atendo aos criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas

executivas atiacutepicas ao caso concreto sob pena de converter a medida em de indutiva para

punitiva

A utilizaccedilatildeo de medidas atiacutepicas como a suspensatildeo da carteira de motorista e o

passaporte do devedor abandona a regra da responsabilidade patrimonial e atingem em cheio

o nuacutecleo de direitos inerentes agrave condiccedilatildeo humana

166 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

167 DIDIER JR Fredie et alCurso de direito processual civil Execuccedilatildeo 7ordm ed rev ampl e atual Salvador Ed JusPodiwm 2017 p 115

62

O limite para a aplicaccedilatildeo de tais medidas deve ser a Constituiccedilatildeo Federal e sobretudo

os Direitos fundamentais nela expressos ldquoCom efeito natildeo haacute saiacuteda tampouco soluccedilatildeo eficaz

de um problema sem que se respeite a Lei e o Devido Processo Legal (por mais nobres que

sejam as intenccedilotildees)rdquo 168

Dessa forma a busca desenfreada pelo cumprimento das decisotildees judiciais em

especial na fase executiva natildeo pode ser realizada em sacrifiacutecio de direitos fundamentais O

Poder Judiciaacuterio natildeo pode resolver a crise do processo executoacuterio utilizando de medidas

arbitraacuterias com o propoacutesito de satisfazer obrigaccedilotildees pecuniaacuterias

Eis o dilema que se coloca diante do poder geral de efetivaccedilatildeo ele pode servir de

potente instrumento em prol da tutela jurisdicional executiva entretanto se manejado de

modo improacuteprio serviraacute de instrumento de puniccedilatildeo e humilhaccedilatildeo do executado169

Eacute notoacuterio que se amplamente aplicado o poder geral de efetivaccedilatildeo reduziria os

iacutendices de inadimplecircncia quiccedilaacute resolveria por completo a crise da execuccedilatildeo civil Entretanto

o retrocesso civilizatoacuterio seria irreparaacutevel

168 PAPINI Paulo Antonio Criacuteticas as medidas indutivas do novo CPC passaporte de devedor natildeo

pode ser apreendido Disponiacutevel em lt httpswwwjotainfoopiniao-e-analiseartigosequivocada-leitura-artigo-139-inciso-iv-novo-cpc-e-os-limites-constitucionais-da-norma-15092016 gt Publicado em 15092016 Acesso em 10092018

169 ROCHA Jorge Bheron SILVA Bruno Campos SOUSA Diego Crevelin Medidas indutivas

inominadas o cuidado com o fator Shylokiano do art 139 IV CPC 26092016 Disponiacutevel em lt httpemporiododireitocombrleituramedidas-indutivas-inominadas-o-cuidado-com-o-fator-shylokiano-do-art-139-iv-cpc gt Acesso em 20082018

63

5 CONCLUSAtildeO

Como funccedilatildeo jurisdicional que tem como objeto a efetivaccedilatildeo de direitos a execuccedilatildeo

deve sempre buscar a maior satisfaccedilatildeo possiacutevel concretizando integralmente o creacutedito do

exequente isto eacute realizando o direito fundamental agrave tutela executiva do credor Por isso a

adoccedilatildeo de meios executivos atiacutepicos incorporados pelo Coacutedigo de Processo Civil de 2015 por

meio do art139 IV em um primeiro momento podem ser consideradas vaacutelidas visto que

servem de instrumento para a satisfaccedilatildeo e asseguraccedilatildeo de direitos do credor

Entretanto para o oacutergatildeo julgador natildeo cometa arbitrariedades em nome do direito

fundamental agrave execuccedilatildeo eacute necessaacuterio que seja definido certos limites na adoccedilatildeo do poder

geral de efetivaccedilatildeo

As medidas executivas atiacutepicas natildeo podem ser aplicadas de maneira indiscriminada

logo devem ser subsidiaacuterias e excepcionais pressupondo o esgotamento das medidas tiacutepicas e

a possibilidade de cumprimento da obrigaccedilatildeo

Partindo dessa premissa as medidas a serem adotadas pelo juiz no caso concreto

devem ter como baliza os princiacutepios da proporcionalidade e da razoabilidade para que natildeo

ultrapassem a responsabilidade patrimonial do devedor e incidida diretamente sobre sua

pessoa

Para que natildeo seja atingida a pessoa do executado ou seja para que o devedor natildeo

tenha sua dignidade humana viola eacute necessaacuterio que a medida atiacutepica seja adequada e

necessaacuteria

Logo o juiz deveraacute sempre estabelecer uma relaccedilatildeo de meiofim entre a medida

executiva e o resultado a ser obtido determinando a providecircncia que se mostre mais propiacutecia

a gerar o resultado sem violar a dignidade humana do executado

Dessa o juiz natildeo poderaacute apenas visar proteger o direito fundamental a execuccedilatildeo e

determinar uma medida que permita alcanccedilar a tutela satisfativa a ldquoqualquer preccedilordquo Eacute

necessaacuterio que a medida escolhida gere o menor sacrifiacutecio possiacutevel ao executado

As medidas que ultrapassam esses limites como a decisatildeo que apreendeu o

passaporte suspensatildeo a CNH e bloqueou o cartatildeo de creacutedito do devedor satildeo meramente

punitivas posto que essas natildeo satildeo as medidas mais adequadas para se atingir o fim almejado

pois natildeo existe propriamente uma relaccedilatildeo meio fim entre tais medidas e o objetivo buscado

64

uma vez que a retenccedilatildeo de documentos pessoais ou a restriccedilatildeo de creacutedito do executado natildeo

geram por consequecircncia direta o pagamento da quantia devida ao exequente

Medidas como esta servem de embasamento para decisotildees arbitraacuterias e autoritaacuterias de

violaccedilatildeo dos direitos fundamentais transformando o poder geral de efetivaccedilatildeo em

instrumento de um quase desforccedilo fiacutesico soacute que com autorizaccedilatildeo judicial

Em suma o oacutergatildeo julgador diante das diversas possibilidades de aplicaccedilatildeo do poder

geral de efetivaccedilatildeo deveraacute verificar se a medida eacute proporcional e razoaacutevel se atendo aos

criteacuterios da adequaccedilatildeo e da necessidade na hora de aplicar as medidas executivas atiacutepicas ao

caso concreto sob pena de punir a pessoa do executado violando a sua dignidade humana

em nome do direito fundamental agrave execuccedilatildeo

65

REFEREcircNCIAS

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THEODORO JUacuteNIOR Humberto Novo Coacutedigo de Processo Civil Anotado 20 ed

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  • 1 INTRODUCcedilAtildeO
  • 2 UMA BREVE ANAacuteLISE SOBRE A TEORIA GERAL DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 21 CONCEITO DE EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 22 CLASSIFICACcedilOtildeES DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 23 PRINCIacutePIOS DA EXECUCcedilAtildeO CIVIL
    • 24 A CRISE DO PROCESSO DE EXECUCcedilAtildeO
    • 25 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO
      • 3 MEIOS EXECUTIVOS ATIacutePICOS E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
        • 31 MEIOS EXECUTIVOS TIacutePICOS E ATIacutePICOS
          • 311 Uma breve anaacutelise sobre o art 139 IV do CPC15
            • 32 AS PRIMEIRAS MANIFESTACcedilOtildeES JURISPRUDEcircNCIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
            • 33 MANIFESTACcedilOtildeES DOUTRINAacuteRIAS SOBRE O PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
            • 34 DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
              • 4 OS LIMITES DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO UM DILEMA ENTRE O DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO E A DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
                • 41 CRITEacuteRIOS LIMITADORES PARA FIXACcedilAtildeO DO PODER GERAL DE EFETIVACcedilAtildeO
                • 42 DIREITO FUNDAMENTAL Agrave EXECUCcedilAtildeO X DIGNIDADE HUMANA DO EXECUTADO
                  • 5 CONCLUSAtildeO
                  • REFEREcircNCIAS
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