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 X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                            p.1         CONFIGURAÇÕES DO FRACASSO ESCOLAR NA ESCOLA PÚBLICA: UM ESTUDO A PARTIR DO DISCURSO DO PROFESSOR DA EDUCAÇÃO BÁSICA     Resumo O presente trabalho trata do levantamento e discussão das principais características do fracasso escolar de acordo com professores da Educação Básica da rede pública de ensino do Paraná, para conhecer como este fenômeno vem se configurando na atualidade. Realizouse a pesquisa a partir da aplicação de questionários e entrevistas abertas com professores da rede. Os profissionais que responderam as questões foram majoritários ao afirmar que houve um aumento no número de alunos que vivenciam o fracasso escolar na rede estadual e que  uma necessidade de mudança no sistema educacional para diminuir ou acabar com esta queda vertiginosa no desempenho acadêmico, ou, mais especificamente, na apropriação dos saberes escolares dos estudantes da Educação Básica. Para fins de esclarecimento metodológico nos apropriamos do conceito de fracasso escolar a partir da dificuldade estudantil de internalizar os conteúdos trabalhados em sala, revelados por meio de avaliações formais.   Palavraschave: racasso escolar, meritocracia, democratização do ensino, escola pública   Tatiana Pires Escobar Universidade Federal de Santa Catarina [email protected]          

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X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.1 

 

 

 

 

    CONFIGURAÇÕES DO FRACASSO ESCOLAR NA ESCOLA PÚBLICA: UM ESTUDO A PARTIR DO DISCURSO DO PROFESSOR DA EDUCAÇÃO BÁSICA    

 

Resumo O presente trabalho trata do levantamento e discussão das principais características do fracasso escolar de acordo com professores da Educação Básica da  rede pública de ensino do  Paraná,  para  conhecer  como  este  fenômeno  vem  se configurando na atualidade. Realizou‐se a pesquisa a partir da  aplicação  de  questionários  e  entrevistas  abertas  com professores da  rede. Os profissionais que  responderam as questões  foram  majoritários  ao  afirmar  que  houve  um aumento  no  número  de  alunos  que  vivenciam  o  fracasso escolar  na  rede  estadual  e  que  há  uma  necessidade  de mudança  no  sistema  educacional  para  diminuir  ou  acabar com esta queda vertiginosa no desempenho acadêmico, ou, mais especificamente, na apropriação dos saberes escolares dos  estudantes  da  Educação  Básica.  Para  fins  de esclarecimento metodológico nos apropriamos do conceito de  fracasso  escolar  a  partir  da  dificuldade  estudantil  de internalizar  os  conteúdos  trabalhados  em  sala,  revelados por meio de avaliações formais.   Palavras‐chave: racasso escolar, meritocracia, democratização do ensino, escola pública  

 Tatiana Pires Escobar 

Universidade Federal de Santa Catarina [email protected] 

     

 

 

 

 

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INTRODUÇÃO 

Ao  longo da História  a  humanidade  transforma,  cria  e  recria  conceitos,  significações  e 

estruturas  políticas,  econômicas,  sociais  e  culturais,  adaptando‐se  às  novas  realidades 

materiais por ela mesma engendradas. Assim o foi na Antiguidade, na época Medieval, na 

Modernidade  e  na  Contemporaneidade.  Estruturas,  valores,  crenças  e  racionalidades 

foram destruídas,  recriadas, divinizadas  junto a  formas  inéditas e variadas de produzir, 

pensar e agir.  

A Era do capitalismo global, traz consigo uma infinidade de processos, fenômenos nunca 

imaginados pelo homem, a não ser no terreno da ficção científica. Com a emergência e 

consolidação da denominada Terceira Revolução Industrial, que a tudo e a todos atinge, 

com igual intensidade. A evolução tecnológica não encontra precedentes na História, seja 

pela sua dinâmica, seja pela amplitude de seu alcance e seus múltiplos usos. A evolução 

nas comunicações e nos  transportes,  tornando‐os mais ágeis, eficientes e oferecedores 

de  inúmeras  possibilidades,  acarreta  uma  intercomunicação  em  escala  global  –  via 

Internet,  por  exemplo  –  e  uma  compressão  dos  espaços  territoriais  e  do  tempo 

radicalmente  nova,  em  função  principalmente  da  velocidade.  A  circulação  de  capitais, 

informações, pessoas, culturas e  tecnologias  tornam‐se uma constante no processo de 

globalização.  Junto  com  estes  avanços  encontra‐se  uma  série  de  problemas  sociais 

tornados, agora, globais. Pode‐se citar como exemplo claro desta política o aumento da 

desigualdade social. Sobre isso IANNI (2008, p.145) nos diz que: 

Acontece que a globalização em curso produz e reproduz desigualdades e antagonismos, nos quais polarizam‐se grupos, classes, etnias, minorias e  outros  setores  das  sociedades  nacionais  e  da  sociedade  global.  Na forma pela qual está se realizando, a globalização do mundo ao mesmo tempo  que  integra  e  articula,  desagrega  e  tensiona,  reproduzindo  e acentuando desigualdades em todos os quadrantes.   

O processo de globalização trouxe falsa esperança de desenvolvimento, emprego, renda, 

ascensão  social.  Sobressaiu‐se  com  um  discurso  ilusório  de  que  o  acesso  aos  bens 

dependeria apenas do esforço pessoal (princípio meritocrático), porém estas esperanças 

aos  poucos  foram  sendo  diluídas  com  o  aumento  das  disparidades  sociais.  A  falta  de 

trabalho para absorver toda mão de obra, a não expansão econômica e a falta de renda 

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fizeram com que a classe média se aproximasse dos setores mais pobres e estes “viram 

sua  própria  pobreza  se  converter  em  dado  natural,  incontornável.  As  sociedades 

declinaram  em  termos  sociais,  urbanos,  cívicos  e  políticos”  (NOGUEIRA,  2004,  p.48). 

Contudo  a presença do discurso meritocrático  continuou permeando nossas  crenças  e 

valores,  se  fazendo  presente  em  nossa  legislação  e  fortalecida  no  interior  de  nossas 

escolas.  

A  concepção  meritocrática  ganha  novo  fôlego  com  a  entrada1  de  determinadas 

categorias  sociais no  jogo escolar,  categorias estas que  até então  se  consideravam ou 

estavam praticamente excluídas da escola.  Intensificou‐se a concorrência e aumentou o 

crescimento  dos  investimentos  educativos  entre  aqueles  que  já  usavam  o  sistema 

educacional  para  a  manutenção  de  seus  status  ou  para  a  elevação  dos  mesmos. 

(BORDIEU, 1980a). 

BORDIEU  (1980)  aponta  que  inicialmente  a  entrada maciça  das  classes  populares    no 

sistema de ensino foi percebido como uma oportunidade de mudança da condição social 

e  econômica. Contudo, progressivamente, os  novos beneficiários  compreenderam que 

elevar seus anos de escolaridade não garantiria acesso às posições sociais que antes da 

“democratização  do  ensino”    poderia  ser  alcançada  com  a  conquista  dos  títulos 

escolares.   

A compreensão desta nova configuração social e escolar  leva ao questionamento sobre 

os fatores sociais do êxito e do fracasso escolar:  

com efeito, apesar de  retornar, muitas vezes, aos princípios de visão e divisão mais  profundamente  escondidos,  a  vulgata  pedagógica  e  todo seu  arsenal    de  vagas  noções  sociologizantes  ‐  “handicap  social”, “obstáculos  culturais” ou “insuficiências pedagógicas”‐ difundiu a  ideia de que o fracasso escolar não é mais ou, não unicamente,  imputável às deficiências  pessoais  ,  ou  seja,  naturais,  dos  excluídos.  A  lógica  da responsabilidade coletiva  tende, assim pouco a pouco, a  suplantar, nas mentes, a lógica da responsabilidade individual que leva a “repreender a vítima”, as causas de aparência natural, como o dom ou o gosto, cedem o lugar  a  fatores  sociais  mal  definidos,  como  a  insuficiência  dos  meios utilizados  pela  Escola,  ou  a  incapacidade  e  a  incompetência  dos 

                                                            1  Entrada esta que, no caso brasileiro, ocorreu devido a obrigatoriedade do Ensino Fundamental e a 

necessidade do mercado de mão de obra qualificada. 

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professores ou mesmo, mais confusamente ainda, a lógica de um sistema globalmente deficiente que é preciso reformar. (Bourdieu  1980 a, p.220)  

Na  colocação  acima  percebe‐se  mudanças  sobre  as  reflexões  em  torno  do  fracasso 

escolar,   contudo os dados do  Índice do Desenvolvimento da Educação Básica e outros 

mecanismos nacionais de avaliação de desempenho acadêmico   apontam que ainda são 

os  indivíduos  provindos  de  estratos  sociais  inferiores,  matriculados  na  rede  pública 

(municipal/estadual)    os  que  mais  vivenciam  o  fracasso  escolar  e  nossas  políticas 

educacionais e cultura escolar indicam que ainda foca‐se no sujeito a responsabilidade de 

seu sucesso ou fracasso social/escolar. 

A  partir  das  reflexões  acima,  nos  propomos  a  conhecer  as  configurações  do  fracasso 

escolar na atualidade, dentro da  realidade da  rede estadual de ensino do Paraná, para 

desta forma conseguirmos analisar as problemáticas que o envolvem e (re) pensar este 

fenômeno  diante  dos  princípios  políticos  e  filosóficos  que  regem  nosso  sistema 

educacional2  Para  alcançar  o  objetivo  exposto  acima  adotamos  alguns  procedimentos 

metodológico, explicitados a seguir. 

 

METODOLOGIA 

Na organização desse tópico sobre a metodologia de pesquisa, estabelecemos um 

diálogo  inspirador  com  o  livro:  “Itinerário  de  pesquisa  –  perspectivas  qualitativas  em 

Sociologia  da  Educação”  de  Nadir  Zago.  A  leitura  contribuiu  muito  na  busca  de  um 

caminho que pudesse estabelecer um norte para a pesquisa na área  da educação. Ver os 

fios  que  devem  tecer  os  objetos,  fatos  e  tempos  nessa  arquitetura  de  pesquisa.  A 

metodologia  é  sempre  um  espaço  de  possibilidades,  “representa  um  procedimento 

necessário para permitir que outros possam acompanhar e entender como e em que base o 

pesquisador chegou – ou pretende chegar – às suas conclusões” (ZAGO, 2003, p.9). Não há 

caminhos certeiros, mas sem eles, é  impossível estabelecer um projeto de pesquisa, um 

                                                            2  Neste contexto trabalhamos mais especificamente com princípio como justiça escolar, democratização 

do ensino, meritocracia e equidade social 

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lugar onde se  idealize chegar.   Essa construção teórica que é a arquitetura de pesquisa, 

não pode se reduzir a um amontoado de ideias recheadas de citações.  

Trata‐se,  sim, de um procedimento e esforço  intelectual no  sentido de arquitetar, de montar o objeto de estudo, recortando‐o, constituindo‐o, construindo‐o, deslindando suas dimensões, trazendo à  luz e à reflexão os  aspectos  e  processos  que  lhe  dão  conteúdo,  forma  e  movimento (ZAGO, 2003, p. 83).  

Desta forma  iniciamos a exposição da proposta metodológica afirmando que trata‐se de 

uma pesquisa de cunho qualitativo, mas com dados quantitativos que orientam nossas 

leituras e análises. 

 Optamos  por  realizar  a  pesquisa  a  partir  de  dois  pontos.  Primeiramente  realizamos 

entrevistas  abertas  sobre  o  fracasso  escolar  com  15  professores  que  atuam  na  Escola 

Estadual X que atende anos finais do Ensino Fundamental, EJA e Ensino Médio Noturno, 

após estas entrevistas construímos categorias de análise para a elaboração do segundo 

momento de nossas coletas de dados: um questionário online referente às características 

atuais  do  fracasso  escolar.  Este  questionário  fora  respondido  por  62  professores  que 

atuam na Educação Básica do Estado do Paraná e a partir das  respostas dos docentes 

levantamos algumas discussões no que se refere as características do fracasso escolar na 

atualidade, no  intuito de  refletirmos  sua  relação  com os  conceitos de  justiça escolar e 

princípio meritocrático que permeiam nosso sistema educacional 

Ressaltamos que este trabalho parte do princípio de que  o conceito de fracasso escolar 

abrange  um  alto  número  de  possibilidades,  estando  interligado  com  questões  como  

evasão  escolar,  baixo desempenho  acadêmico,  indisciplina,  dispedagogia  entre  outros. 

No entanto para fins de esclarecimento metodológico trabalhamos este conceito a partir 

da dificuldade de apropriação  dos conteúdos trabalhados em sala, revelados por meio de 

avaliações formais e maquiado por estratégias diversas que fazem o aluno aumentar sua 

nota sem realmente ter se apropriado do conhecimento escolar (informação esta colhida 

com a análise e discurso   do/sobre processo avaliativo dos docentes entrevistados). Os 

professores que responderam o questionário foram informados sobre a perspectiva que 

esta pesquisa trabalha.   

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Por  fim os dados  coletados  foram  analisados  sobre   perspectiva  relacional e dialógica, 

com o  intuito de compreender sua atual configuração no Estado do Paraná, diante dos 

princípios  políticos e filosóficos que regem a educação brasileira. 

 

TEORIAS  DO  FRACASSO  ESCOLAR:  A  PRESENÇA  HISTÓRICA  DA  CONCEPÇÃO 

MERITOCRÁTICA E INATISTA 

 

Na discussão histórica sobre as diferenças sociais, Sócrates afirmava que os cidadãos da 

República deveriam ser educados e depois classificados, de acordo com seus méritos, em 

três  classes:    governantes,  auxiliares  e  artesãos.  Na  busca  por  justificar  seu 

posicionamento,  forjou o mito de que Deus criou   homens   de ouro,   outros de prata e 

ainda  os  de  latão    e  ferro,  separando‐os  na  sociedade  de  acordo  com  seus  valores 

mercadológicos. O filósofo duvidava de que alguém pudesse crer em sua fábula, mas seu 

discípulo Glauco afirmou que se não acreditassem por ora, mais tarde as futuras gerações 

viriam a crer (A Falsa Medida do Homem – Stephen Jay Gould).  

Ao aprofundarmos na  literatura sobre as teorias de base que buscaram explicar por que 

alguns alcançam estratos sociais superiores e outros são rebaixados ou não conseguem 

superar  sua  própria  condição  social,  percebemos  que  estas  variam  de  acordo  com  o 

momento na História e características da sociedade. Em determinado momento histórico 

os metais apontados por Sócrates para explicar as desigualdades sociais/escolares   dão 

espaço para explicações que envolvem o genes,  diferenciações culturais, superioridades 

étnicas entre outros. 

 Durante a Idade Moderna, por exemplo, a ascensão da ciência, do pensamento racional e 

da centralização/valorização humana  (antropocentrismo)    já não permitiam a crença de 

explicações  divinizadas,  contudo  a  presença  do  inatismo  ainda  era  muito  presente. 

Mesmo não sendo feito de metais diferenciados, os homens carregavam em si diferenças 

substanciais que explicavam a dissonância  intelectual entre eles. Duas  fontes principais 

baseavam a explicação científica para essa  tese: a craniometria e certos  tipos de  testes 

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psicológicos.  Contudo  era  alarmante  a  relação  direta  encontrada  entre  baixo QI  e  ou 

medida  de  crânio  inadequada  entre  os  grupos  dissociado  da  grande  elite:  negros  ,  

pobres, e, em alguns momentos, as mulheres. (GOULD, 1999 – PATTO, 2000)     

Desta  forma, de  acordo  com GOULD  (1999), o determinismo biológico  fora de grande 

utilidade para os detentores do poder, pois esta base teórica  

 tem se associado a  ideologias conservadoras e até mesmo reacionárias. Durante  sua  longa  hegemonia,  a  tendência  tem  sido  aceitar  a inquestionável  causalidade  biológica  e  admitir  as  explicações  sociais somente  nos  casos  em  que  as  provas  eram  tão  fortes  que  não  havia outra  saída...ou  como  dizia  Condorcet  de maneira mais  suscinta:  elas fazem  da  própria  natureza  um  cúmplice  do  crime  da  desigualdade política. (GOULD, 1999, p. 5)  

No  século  XX  o  determinismo  biológico  para  explicar  as  diferenças  intelectuais  dera 

espaço para  teorias de cunho social. A deficiência cultural  fora a mais utilizada e,   mais 

uma  vez  a  ciência  serviu  aos  interesses de  um determinado  grupo, detentor do poder 

econômico, cultural, intelectual e político.  

E não é pertinente perder de vista que a  entrada da grande massa dentro das escolas se 

dera por uma  imposição   da economia do país. O crescimento das  indústrias e do êxodo 

rural  criou    a  necessidade  de  alfabetizar  seus  trabalhadores  e,  por  conseguinte,  seus 

filhos. Sem contar que a escola governamental sempre estivera a serviço do Estado, como 

instituição capaz de controlar e  formar  (colocar na  fôrma) para o mercado  (restrito) de 

trabalho os pequenos jovens pertencentes aos estratos sociais inferiores(LEONEL, 1994).  

Contudo, a maior parte destes  jovens não conseguiam seguir os ditames escolares (não 

conseguiam apreender os conteúdos escolares) e abandonavam a  instituição durante o 

processo  de  alfabetização.  Com  o  fracasso  escolar  generalizado  dentro  deste  grupo 

social, a ciência viera dar novas justificativas e, como já mencionado, a deficiência cultural 

destes  sujeitos  ganhou  destaque  para  explicar  o  fenômeno  do  fracasso  dentro  das 

instituições acadêmicas.  

De acordo com os estudos de PATTO (2000) estas teorias apontavam que as crianças não 

aprendiam pois não  tinham  sido    estimuladas  adequadamente  antes da  entrada  à  vida 

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escolar.  Não  conseguiam  se  apropriar  dos  saberes  escolares  por  serem  culturalmente 

pobres.  A  desnutrição  infantil,  a  família  desestruturada  também  vinham  a  compor  as 

principais justificativas para o fracasso escolar até meados do século XX.  

Até  o  presente momento  percebemos  que  a mesma  base  que  justificou  a    fábula  dos 

metais  de  Sócrates  ainda  servia  para  a    argumentação  das  distinções  intelectuais:  o 

determinismo, o sujeito   nasce com uma marca de nascença  (genética ou econômica) e 

isto determina seu destino social. 

Somente na década de 1960 (no Brasil mais fortemente no final de 1970 e início dos anos 

80) que a questão do  fracasso escolar comum em determinados estratos sociais ganha 

outros  fundamentos  que  não  seja  a  culpabilização      inata  do  indivíduo  .  A  teoria  da 

Reprodução de Pierre Bourdieu e Passeron (1975) abriu uma nova perspectiva, colocando 

a escola, até então considerada neutra e até mesmo equalizadora das diferenças sociais, 

como principal  responsável do  fracasso escolar. Com   diferentes mecanismos  a escola, 

segundo estes autores, reproduziria a ordem social e excluía do sistema escolar aqueles 

alunos que não atendiam suas exigências: os ditos fracassados. Daí a relação direta entre 

a quantidade de anos frequentados no sistema escolar  e a classe social: quanto mais alta 

a classe, maior o tempo escolarizado3. 

Em  uma  tentativa  de  modificar  esta  realidade  e  dar  a  todos  os  mesmos  direitos  à 

educação  formal,    em  1988  foi  promulgada  a  Carta Magna  onde  a  obrigatoriedade  do 

Ensino Fundamental  fora sancionada e pais que não cumprissem a lei estariam sujeitos às 

penalidades  previstas  na  Constituição  Federal.    Desde  então  a  o  número  de  crianças 

matriculados em nossas escolas  só  fez aumentar e atualmente  chegamos  com mais de 

98%   dos brasileiros em  idade escolar  frequentando o Ensino Fundamental. Este avanço 

tem se mostrado  positivo na medida que possibilita o acesso de maior parte dos cidadãos 

aos bancos escolares, contudo as facilidades deste acesso tem levado ao crescimento da 

concepção meritocrática,  pela  qual  responsabiliza‐se  o  indivíduo  pelo  seu  sucesso  ou 

fracasso social já que agora todos, supostamente, tem as mesmas condições para superar 

as desigualdades.  

                                                            3  Vide http://ideb.inep.gov.br/ 

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X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.9 

 

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 A meritocracia  em  seu  plano  ideal  leva  a  todos  alcançarem melhores  posições  sociais 

devido sua própria conquista/esforço, contudo no plano real em uma sociedade desigual 

este princípio é cruel, pois nem todos saem do mesmo  lugar social, alguns entram nesta 

corrida com mais vantagens que outros‐  DUBET (2003, 2004) BOURDIEU (1980, 1980a).  

Com  a    obrigatoriedade  do  ensino    surgiram    outros  problemas  que  até  então  não 

estavam  previstas  na  reforma  educacional,  problemas  estruturais  como  o  excesso  de 

alunos por  sala,    escolas  em péssimas  condições materiais, professores despreparados 

para  lidar  com  uma  diversidade  cultural  cada  vez maior.  Junto  a  isso  enfrentamos  as 

consequências  de    ter  o  mesmo  molde  escolar  para  uma  nova  configuração  de 

estudantes. A escola ainda está estruturada de forma departamentalizada e uniformizada, 

isto é, pronta para atender o aluno ideal e excluir aqueles que não se encaixam. Mas com 

a  obrigatoriedade  da  educação  formal,    não  é mais  possível  “excluir”  abertamente  os 

estudantes que não se enquadram.   Estes tem passado cada vez mais anos nas escolas, 

contudo,    nem  todos  alcançam  o  conhecimento  compatível  aos  seus  anos  de 

escolarização (de acordo com os professores entrevistados, aqueles que alcançam ainda 

são  a minoria) e muitos mecanismos  são  criados para que estes  completem o período 

escolar  sem  grandes  exigências  intelectuais,  o  próprio  processo  avaliativo  vem  sendo 

maquiado  nas  escolas para que os  estudantes  avancem  em  seus  anos  escolares  e  não 

necessariamente para evoluírem intelecto e cognitivamente.  Estamos vivendo uma nova 

onda de fracassados escolares, um número assustador de crianças estão tendo seu direito 

a verdadeira educação negados e saindo da escola sem terem o conhecimento condizente 

com seus anos de estudo4  

Desta  forma a ciência precisa adentrar nesta  realidade para conhecer   as características 

que  permeiam  este  fracasso  escolar  tão  evidente  e  visto mais  fortemente  nas  escolas 

públicas.  Quais  as  explicações  hoje  dado  pelos  agentes  educacionais  para  explicar  o 

grande número de alunos que não se apropriam adequadamente dos saberes escolares? 

Quais as mudanças destas justificativas em relação aquelas vistas no início deste capítulo? 

                                                            4 Vide pesquisas sobre Letramento de Ferraro (2002) e Ribeiro (2006) referenciados no final deste trabalho. 

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De que forma as características atuais do fracasso escolar se relacionam com os princípios 

de meritocracia e justiça escolar? 

Em uma  tentativa de expressar minimamente a opinião dos professores que vivenciam 

este dito fracasso no dia a dia de seu trabalho, faremos a seguir a análise do questionário 

respondido pelos mesmos e, para  finalizar a discussão deste artigo  faremos uma breve 

reflexão das questões ali apresentadas sob a  luz de   princípios    tais quais: meritocracia,  

justiça escolar e equidade social. 

 

 O  QUE  PENSA  O  PROFESSOR  DA  REDE  PÚBLICA  DO  PARANÁ  SOBRE  O FRACASSO ESCOLAR NA ATUALIDADE. 

Neste ponto do nosso  trabalho  apresentaremos os dados da pesquisa online  realizado 

com 62 docentes. Primeiramente traçaremos um perfil dos participantes e na sequência 

analisaremos os pontos relacionados à proposta nuclear deste artigo que é conhecer, de 

acordo  com  a  opinião  dos  educadores,  como  se  caracteriza  o  fracasso  escolar  na 

atualidade. Como forma de enriquecimento dos dados da pesquisa faremos referências às 

entrevistas  abertas  realizadas  com  os  15  professores  da  Escola  Estadual  X  que  nos 

auxiliaram na elaboração do questionário.  

Desta forma, a primeira questão que propomos via online aos docentes fora conhecer seu 

nível de escolaridade, quase 80% dos professores que participaram da pesquisa possuem 

escolaridade mínima de pós‐graduação, em sua  maioria dentro da área educacional. Este 

fato  indica  uma  necessidade  de  ampliação  dos  conhecimentos  e  preocupação  com  a 

formação continuada. Não e possível negar que estes números vem ao encontro da teoria 

de PIERRE BOURDIEU (1980) , onde o autor afirma que quanto mais pessoas tem acesso a 

educação  formal, mais acirrada  fica a disputa por um  lugar no mercado e o caminho de 

acúmulos de diplomas se torna chave essencial para alcançar este objetivo.  

 

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Independente dos motivos que levaram os professores a procurarem ampliar seus 

estudos  para  além  da  graduação,  sabemos  com  este  dado  que  as  pessoas  que 

responderam  nosso  questionário  são  profissionais  que  vivenciam  e  refletem  sobre  as 

questões que permeiam a educação deste país. 

Outro ponto que achamos conveniente tratar neste trabalho é o tempo que estes 

docentes  atuam  no  magistério.    De  acordo  com  os  dados  levantados  70%  dos 

participantes estão há mais de cinco anos na área, portanto são capazes de perceber as 

mudanças recentes no que se refere a aprendizagem dos estudantes.  

A união entre a teoria e prática dos professores que responderam ao questionário 

tornam nossa pesquisa bastante relevante, pois suas percepções estão além do olhar do 

senso  comum  e  desprovidos  do  encanto  habitual  aos  docentes  recém  saídos  das 

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faculdades. Estes professores  já se depararam com a realidade escolar e perceberam os 

limites  das  teorias  dentro  destes  espaços  e  a  continuidade  em  busca  pela  formação 

demonstra que não estão totalmente descrentes de seu papel social dentro da instituição 

educativa. 

Após  o  levantamento  do  perfil  dos  questionados,  apresentamos  as  questões 

referentes ao fracasso escolar na atualidade.  

De acordo com a pesquisa 75% dos professores perceberam aumento no número 

de alunos com dificuldade para aprender nos últimos cinco anos. Esta mesma impressão 

fora levantada  pelos 15 professores participantes das entrevistas abertas. Eles, de modo 

geral, afirmam que estamos vivendo uma crise na educação, como se os alunos realmente 

não conseguissem aprender. 

 

“Eu não sei mais o que fazer, chego a dar a resposta minutos antes da prova e mesmo assim eles tiram notas horríveis”‐ Professora R‐ Inglês    “Eu falo mil vezes a mesma coisa, chega na hora de fazerem eles não têm ideia do que eu estou pedindo” Professora S‐ Língua Portuguesa  “Às vezes eu chego a pensar que o problema está comigo, mas estas crianças  tem  dificuldade  até  para  somar  e  diminuir,  não  sei  como chegaram ao nono ano”‐ Professor M.A. ‐ Matemática.  “Se a gente fosse ver de verdade, mais da metade da turma tinha que estar em sala de recursos ou com psicopedagogo, ninguém consegue aprender, são raras as excessões”‐ Professora I. ‐ Geografia   

A próxima questão que trazemos para os docentes foi sobre o principal fato que 

leva os alunos não aprenderem dentro do ritmo esperado. 

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O desinteresse pela educação  formal, motivado pelo  fato de não ver sentido em 

aprender os conteúdos escolares foi apresentado como a principal razão da dificuldade 

para aprender. Este ponto nos traz alguns questionamentos  inevitáveis: sendo a criança 

um ser curioso por natureza, como explicar a falta de motivação para aprender? Na era da 

internet, da  geração 144 caracteres5, da informação ágil e excesso de motivações visuais, 

auditivas  e  cinestésicas  o  que  tem  feito  a  escola  se  tornar  um  espaço  tão  pouco 

motivador?  O que faz  alguns estudantes  se apropriarem mais ou menos dos conteúdos 

escolares  já que não apresentam desordens   genéticas, distúrbios e  transtornos que as 

diferenciem? Seriam as condições econômicas, sociais e culturais? Mas pensar assim não 

seria  um  retrocesso  ao  tentar  relacionar  determinada  classe  social  com  defasagem 

acadêmica?   

As  questões  acima  não  encontrarão  respostas  neste  trabalho,  contudo  elas 

permeiam  a  discussão  em  torno  do  fracasso  escolar  e  abrem  espaços  para  futuras 

pesquisas no campo educacional. No entanto o que se pode afirmar até este momento é 

que, de acordo com nosso estudo, percebemos que as escolas públicas estão sofrendo 

uma grande crise de identidade, cada dia mais exigências lhe são feitas e maior perda de 

autonomia ela vem tendo. A rotatividade de professores é alta, fato este   que contribui 

para a construção de uma não identidade escolar, cada um trabalha de acordo com o que 

acredita ou como consegue, sem ter direcionamento e nem regras claras6. Toda criança  

                                                            5  Alusão ao Twiter, rede social em que o participante tem que dar sua mensagem utilizando no máximo 

144 caracteres, sem perda de tempo e sem aprofundamento argumentativo.  6  As afirmações deste parágrafo são frutos das entrevistas abertas realizadas com os professores da rede 

estadual, assim como observações da dinâmica escolar. 

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em idade escolar reconhece as regras de comportamento exigidos nos espaços públicos, 

mas  na  escola  os  limites  são  cada  vez mais  flexíveis  e muitas  linguagens  são  faladas, 

deixando os alunos perdidos e se portando de acordo com o perfil do professor. Quanto a 

aprendizagem acadêmica, se não há regras claras nem espaço e nem material para tornar 

a escola um  local atraente, de pesquisa e descobertas   pouco ou nada haverá para os 

alunos se motivarem e, por conseguinte, pouco ou nada haverá para este professor se 

motivar também. 

A família pouco presente na vida escolar dos filhos foi o segundo principal motivo 

apontado pela aprendizagem fora do ritmo esperado. Para além da presença da família, 

os professores entrevistados apontaram a  falta de apoio da  família à escola, afirmando 

que   muitos pais  se  fazem presente mas  super protegem  seus  filhos, discutem com os 

professores  e  tiram  toda  a  autoridade  do  profissional,  que  já  tem,  segundo  os 

entrevistados, pouca autonomia no processo ensino/aprendizagem. 

De qualquer forma não podemos deixar de questionar aqui de que família estamos 

falando e de qual papel os profissionais da educação esperam que esta desempenhe na 

aprendizagem de seus  filhos. De acordo com SINGLY (2007)   as últimas décadas trouxe 

para o Ocidente a aceitação geral do divórcio, do declínio da  instituição do casamento e  

da  queda  da  fecundidade,  com  isso  surgiram  discussões  sobre  o  enfraquecimento  da 

família  e  mais  recentemente  sobre  a  formação  de  novas  configurações  familiares, 

caracterizada por sua vez pelas mudanças das relações entre sexos, entrada massiva da 

mulher no mercado de  trabalho, questionamento da autoridade dos pais entre outras. 

Todas estas mudanças no  seio  familiar  são  reflexões das  transformações da  sociedade 

moderna. O autor afirma que o espaço familiar é o espaço reservado para a privacidade, 

contudo  esta  instituição  sofre  intervenção  direta  do  Estado,  tendo  sua  própria 

privacidade modelada  pelas  exigências  estatais.  A  obrigatoriedade  do  ensino    é  uma 

destas exigências, travestida como direito à educação.  

A reflexão que fazemos é qual modelo de família nossos professores abarcam quando 

falam que as mesmas estão pouco presentes na educação dos filhos? E qual papel esta família 

espera que a escola exerça? Pontos como estes exigem pesquisas mais profundas no  interior 

de cada colégio para que o diálogo aberto e franco possa ocorrer, e que as funções   de cada 

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uma  destas  instituições  se  torne  clara  para  todas  as  partes  envolvidas. O  embate  família  x 

escola não é novidade no setor educacional, em outros momentos a família fora culpabilizada 

pela  não  aprendizagem  de  seus  filhos  e  é  perceptível  que  com  as  atuais  configurações 

familiares  talvez os papéis no  interior desta  instituição não  sejam  tão  inflexíveis  como até a 

década de  1950  (SINGLY, 2007). Contudo, ARIÈS  (1981) aborda de que a preocupação com o 

crescimento  social do grupo  familiar  é uma  característica da  família moderna,  considerando 

que  a  escola  tem  papel  crucial  neste  crescimento  é  possível  traçar  um  diálogo  entre  estes 

grupos  em  prol  de  uma  educação  de maior  qualidade  aos  seus  filhos, melhorando,    desta 

forma, a aprendizagem dos mesmos.  

Outra  questão  abrangida  pelo  nosso  estudo  fora  sobre  os  pontos  em  que  os 

alunos    com  defasagem  escolar  apresentam  maior  dificuldade.  Elencamos  as  bases 

referentes  a  uma  alfabetização  plena  por  percebermos  nos  discursos  dos  professores 

entrevistados uma constante angústia sobre a qualidade deste período educacional.  

 

Observamos que majoritariamente os participantes da pesquisa  apontam que o 

problema é generalizado, isto é, os estudantes tem apresentado dificuldade em todos os 

itens apresentados. 

Apesar de não existir um padrões e definições universais sobre a alfabetização, ao 

analisarmos  sobre  a  perspectiva  da  conquista  desta  competência  dentro  do  período 

esperado para a faixa etária, observamos que o nosso país, apesar dos grandes avanços 

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industriais  e  em  termos  de  políticas  educacionais,  amarga  a  colocação  de  95°,  ficando 

muito abaixo do esperado para quantidade de riqueza produzida no país7,  

Ao  pesquisarmos  os  critérios  para  indicar  o  nível  de  letramento  do  brasileiro, 

observamos que  indivíduos que conseguem escrever e compreender um bilhete simples 

com apenas um ano de escolaridade  já é considerado  letrado, contudo a medida que os 

anos de  estudos  crescem pesquisas  apontam que  cai  consideravelmente o número de 

sujeitos  letrados,  pois  o  critério  se  expande  para  o mínimo  operacional8.  Em  pesquisa 

baseada no Censo Demográfico, FERRARO (2002) aponta que aproximadamente 65% das 

pessoas com menos de 10 anos de idade não são letradas, apesar de já terem ou estarem 

concluindo o período de alfabetização, entre os sujeitos com 15 anos ou mais que tenham 

completado o Ensino Fundamental este número sobe para 67%. 

Os dados não são recentes, contudo a percepção dos professores participantes da 

pesquisa corroboram com o apontado por FERRARO (2002),  indicando não ser este um 

problema isolado, mas que abrange o Brasil como um todo. 

Ainda questionando sobre as configurações do fracasso escolar na atualidade, os 

professores que responderam a questão sobre a principal característica deste nos últimos 

cinco  anos  se  dividiram  entre  dois  pontos  centrais  que  vem  ao  encontro  das  outras 

discussões sociais e econômicas que vem sendo discutido ao longo deste trabalho. 

 

 

 

 

 

 

                                                            7  Dado  retirado  do  site  Programa  das  Nações  Unidas  para  o  Desenvolvimento(PNUD): http://www.pnud.org.br/ 8 Entendido como a competência mínima para operar, na vida cotidiana, com a leitura, a escrita e o cálculo, mesmo antes do ingresso no mercado de trabalho e independentemente da função que cada um(a) nele venha a exercer 

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X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.17 

 

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Primeiramente  o  aumento  no  número  de  laudos, maquiando  um  problema  que 

envolve  família, políticas públicas e  formação de professores,  indica que os professores 

estão descrentes dos  laudos que  chegam  até eles. São  tantos  alunos  com  transtornos 

variados  e  com  avaliações  psicológicas,  psicopedagógicas  e médicas  que  acaba  sendo 

bastante  viável  a  desconfiança  da  seriedade  dos  mesmo.  Ressaltamos  que  apenas  3 

professores  mostraram  acreditar  que  são  realmente  os  distúrbios  que  levam  à 

dificuldade. 

A  questão dos  laudos  e medicamentalização  escolar  em  número  crescente  tem 

surtido muitas discussões em diferentes áreas do conhecimento, FREITAS resume que: 

  Quando  nos  perguntamos  por  que  há  um  excesso  de  diagnósticos,                                    

surge uma variedade de razões. Por um lado, existe toda esta tendência à biologização por parte 

dos médicos. Por outro, uma tendência das escolas em encontrar explicações rápidas sobre o que 

não entendem. A escola, muitas vezes, busca “diagnosticar patologias” nos alunos, quando estes 

não aprendem ou  têm problemas de conduta. Não mais  se questionam métodos educacionais, 

condições  de  ensinagem  ou  de  aprendizagem, mas  se  busca  na  criança,  em  seu  cérebro,  seu 

comportamento, as causas das dificuldades. (Freitas, 2013, p.11) 

 

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X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.18 

 

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As colocações da autora nos  levam a pensar  sobre as  teorias biologizantes, que 

visavam explicar as dificuldades de aprendizagem e que discutimos no capítulo anterior. 

Será  este  excesso  de  laudos    um  indicativo  de  retorno  à  visão  que  acreditávamos  ter 

superado? Não propomos neste artigo discutir a veracidade dos laudos, por ser um tema 

bastante  complexo  e  que  foge  de  nossa  alçada,  nosso  trabalho  propõe  conhecer  a 

opinião dos professores  sobre as configurações do  fracasso escolar na atualidade para 

desta  forma  (re)  pensarmos  as  concepções  como  meritocracia  e  justiça  escolar  que 

permeiam  os  objetivos  da  Educação  Básica  nacional.    Dito  isto  a  outra  característica 

apontada do fracasso fora a queda da autonomia do professor para reprovar os alunos, 

gerando desta forma alunos cada vez mais fracos para as próximas séries/anos escolares.  

Este ponto indica que a escola continua trabalhando sobre os mesmos moldes do 

início  do  século  XX,  como  também  fora  discutido  no  início  deste  trabalho,  métodos 

tradicionais,  focados  no  conteúdo  e  na  lógica  de  aprovação/reprovação  superando  a 

preocupação com a aprendizagem plena.   

 Contudo  a  avaliação  que  ontem  fazia  alunos  reféns  do  sistema  escolar,  faz  na 

atualidade os professores se sentirem  lesados,   pois o  instrumento avaliativo deixara de 

cumprir sua função de diagnosticar para (re)planejar o trabalho docente e torna‐se cada 

vez   mais apenas uma parte do processo ensino x aprendizagem   utilizada/manobrada  

para melhorar os índices do governo no que tange a “qualidade” educacional9  

 Instrumentos avaliativos estatais são necessários para dar luz a alguns problemas 

da educação brasileira e colaboram na elaboração das futuras políticas educacionais, no 

entanto  escutar  como  esses  estão  sendo  recebidos  e  utilizados    em  nossas  escolas  é 

necessário  para  melhorar  seus  critérios  e  fortalecer  ações  que  promovam 

verdadeiramente a qualidade educacional. 

Por  fim,  nossa  última  questão  refere‐se    como  o  professor  se  coloca  frente  a 

questão  do  aumento  da  dificuldade  de  apropriação  dos  conhecimentos  escolares 

apresentada pelos estudantes das escolas públicas.  

                                                            9  Colocação  recorrente nas entrevistas abertas realizadas com os professores, a aprovação escolar é um 

dos critérios para melhorar a nota do IDEB de cada escola  

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Observamos  a  forte distinção  entre dois grupos:  aqueles que  se  colocam  como 

protagonistas do processo de ensino x aprendizagem , quando afirmam estarem sempre 

em busca de melhorar sua formação para atender diferentes demandas de estudantes e 

um outro grupo que responsabiliza diretamente o sistema educacional, não acreditando 

que possa haver qualquer  transformação na aprendizagem das  crianças  se não houver 

mudança no sistema.  

Esta  dicotomia  parece  fazer  parte  do  corpo  educacional  tendo  em  vista  a 

complexidade que o tema aqui trabalhado suscita, contudo é importante ressaltar que as 

questões cernes de nosso questionário apontaram que grande parte dos professores tem 

vivenciado  as  mesmas  impressões  e  sentido  as  mesmas  angústias  em  relação  a 

aprendizagem de  seus alunos. A partir deste contexto e  sobre a perspectiva de alguns 

dos   pontos aqui  levantados  realizaremos algumas considerações sobre a problemática 

do fracasso escolar na atualidade e sua relação com alguns princípios que regem nosso 

projeto de democratização do ensino 

 

 

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CONSIDERAÇÕES FINAIS POSSÍVEIS 

O  presente  estudo  apresentou  algumas  reflexões  sobre  o  fracasso  escolar  na 

atualidade de acordo com a opinião de professores da rede estadual de ensino do Paraná. 

Em suas falas percebe‐se que a escola pública vem enfrentando uma série de problemas 

estruturais, muitos deles diretamente relacionados com o constante aumento do número 

de  alunos  matriculados  e  toda  a  complexa  diversidade  cultural  que  os  mesmos 

representam e que, nem sempre, vem ao encontro dos moldes e exigências escolares em 

que estão  inseridos. Ao afirmarem que a maior parte dos alunos não estão aprendendo 

conforme  a  intencionalidade  dos  objetivos  escolares,  os  professores  nos  indicam  uma 

séria  crise  na  instituição  educativa,  na  qual  a  escola  já  não  tem mais  clara  sua  função 

central  e  assume  não  estar  dando  conta  das  exigências  surgidas  com  o  processo  de 

massificação escolar. 

Contudo, não houve nenhuma fala ou colocação dos docentes entrevistados que 

indicassem a descrença no direito de educação para todos. Suas manifestações estavam 

fortemente  permeadas  por  questões  pontuais  (família,  medicamentalização, 

analfabetismo funcional), desta forma o questionamento do projeto de democratização 

escolar não aparecera em seus discursos.   É possível com  isto  inferir que há uma crença 

no poder da função social da escola, porém fica evidente que a percepção do poder do 

professor no cumprimento desta função encontra‐se atrelado a fatores que fogem a sua 

alçada. Neste sentido a classe professoral sente‐se desmobilizada para arcar com o papel 

social que lhe é compelido a partir de políticas e diretrizes da educação nacional.  

A  justiça  social por meio do  acesso  a escola parece uma  realidade  longe de  ser 

atingida, já que o fato de estar na escola não tem levado aos alunos a terem pleno acesso 

aos  bens  escolares. Ao  apontarem  que  há  um  problema  generalizado  no  que  tange  a 

letramento dos estudantes das escolas públicas estaduais, os professores nos  levam  a 

refletir sobre o futuro destes jovens quando entrarem na acirrada  disputa do mercado de 

empregos  mais  qualificados.  O  acesso  ao  mesmo  nível  de  escolaridade    garantirá 

equidade na disputa entre estudantes provindos das escolas públicas menos preparadas 

e  aqueles que  tiveram uma educação básica mais elitizada? DUBET  (2004)    afirma que 

esta  equidade  é  ilusória  tendo  em  vista  que  as  diferenças  existentes  entre  escolas, 

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(algumas (mal)estruturadas para atender estratos sociais inferiores e outras organizadas 

para  atender  a  classe mais  abastada)    levam  a  uma  exclusão  social mais  cruel,  pois 

culpabiliza o sujeito pelo seu  insucesso, pois  já que todos estão tendo oportunidade de 

qualificar‐se por meio da escola, só não “sobe na vida quem não quer”.   

Esta falácia da meritocracia é bastante recorrente no discurso dos professores ao 

pensarem  as configurações  do fracasso escolar na atualidade. Mesmo reconhecendo as 

limitações da instituição educacional, ainda o que mais fortemente aparece nas falas dos 

professores não é a estrutura escolar, mas sim o grupo familiar ao qual este aluno provém 

e  o  desinteresse  individual  do  estudante  pelos  estudos.  Estes  ambos  pontos  se 

relacionam diretamente com os princípios meritocráticos. 

 Contudo,  apesar  de  percebermos  a  força  do  discurso  meritocrático  nas 

concepções dos professores sobre o fracasso escolar na atualidade, também observamos 

que  a maior  parte  dos  participantes  da  pesquisa  desenvolveram  um  olhar mais  crítico 

sobre  o  tema,  e  estão  compreendendo  este  fenômeno  como  consequência  da 

estruturação do sistema social e educacional que foge da competência escolar. Esta visão  

entra,  em  alguns  aspectos,  em  contradição  com    os  apontamentos  sobre  a  família  e 

interesse  do  aluno  em  relação  a  aprendizagem,  contradições  estas  características  em 

temas com alto grau de complexidade  como é a questão do fracasso escolar.  

No  entanto,  apesar  das  contradições  expostas  acima,  está  velado  no  discurso 

docente  a  ideia de neutralidade escolar. Todos os problemas  apontados que  levam  ao 

fracasso escolar  são provindas do exterior da escola (família, desinteresse por aprender, 

sistema educacional,  laudos  indicando problemas de aprendizagem), não houve na  fala 

docente  nenhum mecanismos  escolar  que  levasse  ao  processo  de  exclusão    do  jogo 

acadêmico. 

Por  fim,  quando  se  trata  de  analisar  as  configurações  do  fracasso  escolar  na 

atualidade de acordo com os professores da rede estadual do Paraná, é possível afirmar 

que a base das diferenças entre os metais apontadas por Sócrates ainda se faz presente 

nestes discursos. Segundo estes há diferenças inatas aos indivíduos que levam ao sucesso 

ou ao  insucesso acadêmico, este  inatismo pode vir de questões biologizantes  (como o 

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crescente número de  laudos,  indicando um aumento em “doenças” da aprendizagem10) 

ou questões culturais (a família em que o sujeito nasce). No entanto diferentemente da 

fala  de  Sócrates  e  de  alguns  teorias  de  base  supostamente  científicas  que  tentaram 

explicar  a  (não)aprendizagem escolar por questões étnicas, de gênero ou  constituição 

física,  atualmente  não  é  possível  pensar  o  fracasso  escolar  sobre  um  prisma  único,  é 

preciso  um  olhar  mais  amplo  que  considere  as  diferentes    áreas  do  conhecimento 

humano,  mas  sobretudo  perceba  que  o  fracasso,  como  um  fenômeno  social  e 

generalizado  da  não  apreensão  de  conteúdos/saberes  escolares  por  jovens  da  rede 

pública, é uma consequência da forma de organização histórica das instituições e,  como 

fenômeno histórico,  fora engendrado pelos homens, portanto, pelos homens pode  ser 

modificado. 

 

REFERÊNCIAS 

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                                                            10  Mesmo maior parte dos professores não acreditando na veracidade destes laudos de saúde, indicando 

transtornos e déficits,  não é possível negar seu crescimento na última década, relacionando o problema do fracasso com aspectos biológicos. 

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X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.23 

 

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FREITAS. C.R. A medicalização escolar – epidemia de nosso tempo: o conceito de TDAH em debate  – UFRGS‐ 36a Reunião Nacional da ANPEd – 29 de setembro a 02 de outubro de 2013, Goiânia‐GO.    GOULD, S. J. A falsa medida do homem. São Paulo: Martins Fontes, 1999.  IANNI, O. A sociedade global. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008.  LEONEL, Z. Contribuição à história da escola pública: elementos para a crítica de teoria liberal da educação. Tese (Doutorado em Educação) – Faculdade de Educação Unicamp, Campinas, 1994.  NOGUEIRA, M.A. Um estado para sociedade civil. São Paulo: Cortez, 2004.  PATTO, M. H. S. A produção do fracasso escolar. Histórias de submissão e rebeldia. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2000.  RIBEIRO,  V.M;    VÓVIO,  C.L; MOURA, M.P.  Letramento  no Brasil:  alguns  resultados  do indicador  nacional  de  alfabetismo  funcional.  In:  Revista  Educação  e  Sociedade, Campinas,  vol.  23,  n.  81,  p.  49‐70,  dez.  2002  .  Disponível  em <http://www.cedes.unicamp.br>  SINGLY,  F..  Sociologia  da  família  contemporânea.  Trad.  Clarice  Ehlers  Peixoto.  Rio  de  Janeiro: Editora FGV, 2007.  ZAGO,  Nadir.  A  entrevista  e  seu  processo  de  construção:  reflexões  com  base  na experiência prática de pesquisa.  In: ZAGO, Nadir; CARVALHO, Marília Pinto de; VILELA, Rita  Amélia  Teixeira  (orgs).  Itinerários  de  pesquisa‐  perspectivas  qualitativas  em Sociologia da Educação. Rio de Janeiro:Editora DP&A, 2003.