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Educação no Campo e Desenvolvimento Sustentável Professor Organizador: Fábio Luis Quintal Carvalho EMENTA A disciplina de Educação no Campo e Desenvolvimento Sustentável aborda os conceitos relativos à sustentabilidade do meio ambiente bem como as relações entre a ocupação e a produtividade do campo e a conservação dos recursos naturais. Tópicos como os indicadores da sustentabilidade, a utilização desses conhecimentos na análise de área produtiva, dos ecossistemas presentes, o tratamento dos resíduos gerados durante o processo produtivo, os mecanismos de conservação dos recursos naturais serão abordados. CONTEÚDO PROGRAMÁTICO 1. Apresentação da disciplina e do professor; 2. Histórico da questão ambiental no mundo e no Brasil; 3. O conceito de desenvolvimento; 4. O conceito de desenvolvimento sustentável; 5. O conceito de planejamento ambiental; 6. Os conceitos de impactos e riscos ambientais; 7. A conservação dos recursos naturais: a água; 8. A conservação dos recursos naturais: o solo; 9. A conservação dos recursos naturais: a biodiversidade; 10. Os tipos de desenvolvimento sustentável; 11. A engenharia da sustentabilidade; 12. Os indicadores da sustentabilidade; 13. As ferramentas da sustentabilidade; 14. Os benefícios da adoção de um sistema de desenvolvimento sustentável. BIBLIOGRAFIA BÁSICA ALMEIDA, F. Os Desafios da Sustentabilidade . Editora Campus, São Paulo, 2007. BARBIERI, J. C. Desenvolvimento e Meio Ambiente . Vozes, Rio de Janeiro, 2001. 1

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Educação no Campo e Desenvolvimento Sustentável

Professor Organizador: Fábio Luis Quintal Carvalho

EMENTA

A disciplina de Educação no Campo e Desenvolvimento Sustentável aborda os conceitos relativos à sustentabilidade do meio ambiente bem como as relações entre a ocupação e a produtividade do campo e a conservação dos recursos naturais. Tópicos como os indicadores da sustentabilidade, a utilização desses conhecimentos na análise de área produtiva, dos ecossistemas presentes, o tratamento dos resíduos gerados durante o processo produtivo, os mecanismos de conservação dos recursos naturais serão abordados.

CONTEÚDO PROGRAMÁTICO

1. Apresentação da disciplina e do professor;2. Histórico da questão ambiental no mundo e no Brasil;3. O conceito de desenvolvimento;4. O conceito de desenvolvimento sustentável;5. O conceito de planejamento ambiental;6. Os conceitos de impactos e riscos ambientais;7. A conservação dos recursos naturais: a água;8. A conservação dos recursos naturais: o solo;9. A conservação dos recursos naturais: a biodiversidade;10.Os tipos de desenvolvimento sustentável;11.A engenharia da sustentabilidade;12.Os indicadores da sustentabilidade;13.As ferramentas da sustentabilidade;14.Os benefícios da adoção de um sistema de desenvolvimento sustentável.

BIBLIOGRAFIA BÁSICA

ALMEIDA, F. Os Desafios da Sustentabilidade. Editora Campus, São Paulo, 2007.

BARBIERI, J. C. Desenvolvimento e Meio Ambiente. Vozes, Rio de Janeiro, 2001.

BECKER, B., BUARQUE, C. & SACHS, I. Dilemas e Desafios do Desenvolvimento Sustentável, Garamond, São Paulo, 2007.

CARVALHO, I. C. M. Educação Ambiental: a formação do sujeito ecológico. Cortez, São Paulo, 2008.

DIAS, G. F. Educação Ambiental: princípios e práticas. Gaia, São Paulo, 2003.

SILVERSTEIN, M. A Revolução Ambiental. Nórdica, Rio de Janeiro, 1993.

VAN BELLEN, H. M. Indicadores de Sustentabilidade. Editora FGV, São Paulo, 2005.

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1. INTRODUÇÃO

Você já parou para pensar no que significa a palavra "progresso"? Pois então pense: estradas, indústrias, usinas, cidades, máquinas e muitas outras coisas que ainda estão por vir e que não conseguimos nem ao menos imaginar. Algumas partes desse processo todo são muito boas, pois melhoram a qualidade de vida dos seres humanos de uma forma ou de outra, como no transporte, comunicação, saúde, etc. Mas agora pense só: será que tudo isso de bom não tem nenhum preço? Será que para ter toda essa facilidade de vida nós, humanos, não pagamos nada?

Você já ouviu alguém dizer que para tudo na vida existe um preço? Pois é, nesse caso não é diferente. O progresso, da forma como vem sendo feito, acarreta danos ao ambiente ou, em outras palavras, provoca impactos no planeta Terra e na Natureza. Um estudioso do assunto disse uma vez que é mais difícil o mundo acabar devido a uma guerra nuclear ou a uma invasão extraterrestre (ou outra catástrofe qualquer) do que acabar pela destruição que nós, humanos, estamos provocando em nosso planeta. Você acha que isso tudo é um exagero? Então vamos trocar algumas ideias.

O atual modelo de crescimento econômico gerou enormes desequilíbrios; se, por um lado, nunca houve tanta riqueza e fartura no mundo, por outro lado, a miséria, a degradação ambiental e a poluição aumentam a cada dia. Diante desta constatação, surge a ideia do Desenvolvimento Sustentável (DS), buscando conciliar o desenvolvimento econômico com a conservação ambiental.

As pessoas que trabalharam na Agenda 21 escreveram a seguinte frase: "A humanidade de hoje tem a habilidade de desenvolver-se de uma forma sustentável, entretanto é preciso garantir as necessidades do presente sem comprometer as habilidades das futuras gerações em suprir suas próprias necessidades".

Não compreendeu o significado da frase? Tudo bem, vamos por partes. Essa frase pode ser resumida em poucas e simples palavras: desenvolver em harmonia com as limitações ecológicas do planeta, ou seja, sem destruir o ambiente, para que as gerações futuras tenham a chance de existir e viver bem, de acordo com as suas necessidades (melhoria da qualidade de vida e das condições de sobrevivência). Será que dá para fazer isso? Será que é possível conciliar tanto progresso e tecnologia com um ambiente saudável?

Acredita-se que isso tudo seja possível, e é exatamente o que propõem os estudiosos em Desenvolvimento Sustentável (DS), que pode ser definido como: "o equilíbrio entre tecnologia e ambiente, relevando-se os diversos grupos sociais de uma nação e também dos diferentes países na busca da equidade e justiça social".

Para alcançarmos o DS, a proteção do ambiente tem que ser entendida como parte integrante do processo de desenvolvimento e não pode ser considerada isoladamente; é aqui que entra uma questão sobre a qual talvez você nunca tenha pensado: qual a diferença entre crescimento e desenvolvimento?

A diferença é que o crescimento não conduz automaticamente à igualdade nem à justiça sociais, pois não leva em consideração nenhum outro aspecto da qualidade de vida a não ser o acúmulo de riquezas que se faz nas mãos de uma pequena parcela dos indivíduos da população.

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O desenvolvimento, por sua vez, preocupa-se com a geração de riquezas sim, mas tem o objetivo de distribuí-las, de melhorar a qualidade de vida de toda a população, levando em consideração, portanto, a qualidade ambiental do planeta.

O DS tem seis aspectos prioritários que podem ser entendidos como metas:

1. A satisfação das necessidades básicas da população (educação, alimentação, saúde, lazer);

2. A solidariedade para com as gerações futuras (preservar o ambiente de modo que elas tenham chance de viver);

3. A participação da população envolvida (todos devem se conscientizar da necessidade de conservar o ambiente e fazer cada um a parte que lhe cabe para tal);

4. A preservação dos recursos naturais (água, ar, solo, biodiversidade);5. A elaboração de um sistema social garantindo emprego, segurança social e

respeito a outras culturas (erradicação da miséria, do preconceito e do massacre de populações oprimidas);

6. A efetivação dos programas educativos, entre eles a Educação Ambiental.

2. BREVE HISTÓRICO DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

A preocupação da comunidade internacional com os limites do desenvolvimento do planeta data da década de 60, quando começaram as discussões sobre os riscos da degradação do meio ambiente. Tais discussões ganharam tanta intensidade que levaram a ONU a promover uma Conferência sobre o Meio Ambiente em Estocolmo (1972). No mesmo ano, Dennis Meadows e os pesquisadores do “Clube de Roma” publicaram o estudo Limites do Crescimento. O estudo concluía que, mantidos os níveis de industrialização, poluição, produção de alimentos e exploração dos recursos naturais, o limite de desenvolvimento do planeta seria atingido, no máximo, em 100 anos, provocando uma repentina diminuição da população mundial e da capacidade industrial.

O estudo recorria ao neomalthusianismo como solução para a iminente “catástrofe”. As reações vieram de intelectuais do Primeiro Mundo (para quem a tese de Meadows representaria o fim do crescimento da sociedade industrial) e dos países subdesenvolvidos (já que os países desenvolvidos queriam “fechar a porta” do desenvolvimento aos países pobres, com uma justificativa ecológica).

Em 1973, o canadense Maurice Strong lançou o conceito de ecodesenvolvimento, cujos princípios foram formulados por Ignacy Sachs. Os caminhos do desenvolvimento seriam seis: satisfação das necessidades básicas; solidariedade com as gerações futuras; participação da população envolvida; preservação dos recursos naturais e do meio ambiente; elaboração de um sistema social que garanta emprego, segurança social e respeito a outras culturas; programas de educação. Esta teoria referia-se principalmente às regiões subdesenvolvidas, envolvendo uma crítica à sociedade industrial. Foram os debates em torno do ecodesenvolvimento que abriram espaço ao conceito de desenvolvimento sustentável.

Outra contribuição à discussão veio com a Declaração de Cocoyok, das Nações Unidas. A declaração afirmava que a causa da explosão demográfica era a pobreza, que também gerava a destruição desenfreada dos recursos naturais.

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Os países industrializados contribuíam para esse quadro com altos índices de consumo. Para a ONU, não há apenas um limite mínimo de recursos para proporcionar bem-estar ao indivíduo; há também um máximo.

A ONU voltou a participar na elaboração de outro relatório, o Dag-Hammarskjöld, preparado pela fundação de mesmo nome, em 1975, com colaboração de políticos e pesquisadores de 48 países. O Relatório Dag-Hammarskjöld completa o de Cocoyok, afirmando que as potências coloniais concentraram as melhores terras das colônias nas mãos de uma minoria, forçando a população pobre a usar outros solos, promovendo a devastação ambiental. Os dois relatórios têm em comum a exigência de mudanças nas estruturas de propriedade do campo e a rejeição pelos governos dos países industrializados.

No ano de 1987, a Comissão Mundial da ONU sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (UNCED), presidida por Gro Harlem Brundtland e Mansour Khalid, apresentou um documento chamado Our Common Future, mais conhecido por relatório Brundtland. O relatório diz que “Desenvolvimento sustentável é desenvolvimento que satisfaz as necessidades do presente sem comprometer a capacidade de as futuras gerações satisfazerem suas próprias necessidades”. O relatório não apresenta as críticas à sociedade industrial que caracterizaram os documentos anteriores; demanda crescimento tanto em países industrializados como em subdesenvolvidos, inclusive ligando a superação da pobreza nestes últimos ao crescimento contínuo dos primeiros. Assim, foi bem aceito pela comunidade internacional.

A Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro, em 1992, mostrou um crescimento do interesse mundial pelo futuro do planeta; muitos países deixaram de ignorar as relações entre desenvolvimento socioeconômico e modificações no meio ambiente. Entretanto, as discussões foram ofuscadas pela delegação dos Estados Unidos, que forçou a retirada dos cronogramas para a eliminação da emissão de CO2 (que constavam do acordo sobre o clima) e não assinou a convenção sobre a biodiversidade.

3. AGENDA 21

A Agenda 21 é um documento oficializado por ocasião da “Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento” - ECO 92, ocorrida em 14 de junho de 1992, no Rio de Janeiro, quando seu texto foi oficialmente admitido pelos países ali representados.

A Agenda 21 está voltada para problemas atuais e tem como objetivo preparar o mundo para os desafios do próximo século. Ela prega a realização de mudanças e se representa um marco na solução das questões ambientais. É um documento da ONU, e como tal, somente goza de obrigatoriedade após ser reconhecido pela legislação de cada país. No Brasil, os Estados e Municípios poderão legislar a partir da Agenda 21, desde que seguindo a União e prevalecendo a legislação mais restritiva.

A Agenda 21 trata das questões do desenvolvimento econômico-social e suas dimensões, à conservação e administração de recursos para o desenvolvimento, ao papel dos grandes grupos sociais que atuam nesse processo. Prega a criação de projetos que visem ao desenvolvimento sustentável, preservando os recursos naturais e a qualidade ambiental.

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A Agenda 21 representa um avanço da consciência ambiental e o fortalecimento das instituições para o desenvolvimento sustentável. Apela para a consciência dos Poderes Públicos e para a sociedade, no sentido de criarem ou desenvolverem um ordenamento jurídico capaz de proteger o meio ambiente, a partir do desenvolvimento sustentável. A erradicação da pobreza, a proteção da saúde humana e a promoção de assentamentos humanos sustentáveis surgem como objetivos sociais da Agenda.

No Brasil, a agenda nacional dependerá das agendas estaduais, e estas, por sua vez, das agendas locais, quando cada autoridade iniciará o diálogo com seus cidadãos e organizações locais para a aprovação de uma Agenda 21. Para que o trabalho não fosse deixado de lado, previu-se uma avaliação dos resultados da Agenda 21 em 1997, a cargo da Assembleia Geral da ONU e da Comissão para o Desenvolvimento Sustentável.

A Agenda 21 consiste em um documento consensual para o qual contribuíram governos e instituições da sociedade civil de 179 países num processo que durou dois anos e culminou com a realização da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD), já mencionada no início desta exposição. Além da Agenda 21, resultaram desse processo cinco outros acordos: a Declaração do Rio, a Declaração de Princípios sobre o Uso das Florestas, o Convênio sobre a Diversidade Biológica e a Convenção sobre Mudanças Climáticas.

A Agenda 21 traduz em ações o conceito de desenvolvimento sustentável, alterando os padrões de desenvolvimento do próximo século. A Agenda 21 é, ainda, um processo de planejamento participativo que analisa a situação atual de um país, estado ou município, e planeja o futuro de forma sustentável, através de em planejamento acerca de todos os atores sociais e da formação de parcerias e compromissos para a solução dos problemas, a partir da análise de aspectos econômicos, sociais, ambientais e político-institucionais.

A Agenda considera, questões ligadas à geração de emprego e de renda, à diminuição das disparidades regionais e interpessoais de renda, às mudanças nos padrões de produção e consumo, à construção de cidades sustentáveis e à adoção de novos modelos e instrumentos de gestão.

O objetivo da Agenda 21 é subsidiar ações do Poder Público e da sociedade em prol do desenvolvimento sustentável, sendo necessário, para tanto, a criação de instrumentos e mecanismos legais internacionais.

Se os países envolvidos não oferecerem suporte à implementação da Agenda 21, através da elaboração de leis nacionais que visem ao desenvolvimento sustentável, o trabalho será esquecido.

Na esfera internacional, há a necessidade de instrumentação legal para a implementação de medidas indispensáveis a uma gestão ambiental no âmbito mundial.

Não só os países em via de desenvolvimento necessitam instrumentos e mecanismos legais, também os países desenvolvidos devem curvar-se a esta necessidade, caso contrário, as relações jamais surtirão efeitos, nem mesmo ante a ameaça de catástrofes mundiais.

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4. AGENDA 21 BRASILEIRA

A Agenda 21 Brasileira transformou-se em um processo de planejamento estratégico participativo, que foi conduzido pela Comissão de Políticas de Desenvolvimento Sustentável e da Agenda 21 Nacional.

No processo de elaboração da Agenda a realidade brasileira foi analisada a partir de diferentes focos, observando-se a independência entre o meio ambiental, economia, sociedade e instituições. Além disso, determina que o processo de elaboração e implementação deva estabelecer parcerias, entendendo que a Agenda 21 não é um documento de governo, mas um produto de consenso entre os diversos setores da sociedade brasileira, através da parceria entre governo, setor produtivo e sociedade civil.

Os planos definidos pela Agenda serviriam de base para a elaboração dos Planos Plurianuais do Governo, quando é definido o destino dos recursos públicos do país. Para o desenvolvimento das ideias o programa foi dividido seis eixos denominados de Agricultura Sustentável, Cidades Sustentáveis, Infraestrutura e Integração Regional, Gestão dos Recursos Naturais, Redução das Desigualdades Sociais e Ciência e Tecnologia para o Desenvolvimento Sustentável, permitindo discutir de forma ampla a sustentabilidade do desenvolvimento do Brasil, a partir da análise das diferenças sociais.

Após, encerrada a Agenda 21 Brasileira, o processo de elaboração tomou um novo rumo, através da pesquisa de aspectos estaduais, que visa refletir a diversidade entre as regiões que compõe o país. A Agenda 21 Brasileira é composta de dois documentos: “Agenda 21 Brasileira – Ações Prioritárias”, que estabelece os caminhos para a construção da sustentabilidade brasileira, e “Agenda 21 Brasileira – Resultado da Consulta Nacional”, produto das discussões realizadas em todo o território nacional.

A Agenda estabeleceu 21 pontos de ação, são eles:

1. Produção e consumo: promover uma campanha nacional contra o desperdício e restringir a produção de recicláveis.

2. Ecoeficiência e responsabilidade social: incentivar mecanismos de certificação nas empresas e procedimentos voluntários de monitoramento.

3. Planejamento estratégico: incorporar a dimensão ambiental dos eixos de desenvolvimento.

4. Energia renovável: reestruturar o Proálcool e desvinculá-lo dos interesses do velho setor sucroalcooleiro.

5. Informação e conhecimento: promover recursos financeiros para pesquisas na área do desenvolvimento sustentável e para a manutenção de pesquisadores no Brasil.

6. Educação permanente: combater o analfabetismo funcional e valorizar o ensino profissionalizante.

7. Promover a saúde: ampliar detecção precoce de hipertensão, diabetes, desnutrição e câncer, democratizando o SUS.

8. Inclusão social: baixar o índice de GINI, que mede a distribuição de renda, de 0,6 para 0,4.

9. Universalizar o saneamento ambiental: ampliar para 60% o tratamento secundário de esgotos na próxima década.

10.Gestão de espaço urbano: tornar o Estado promotor do desenvolvimento urbano sustentável. Promover elaboração de Planos Diretores.

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11.Desenvolvimento sustentável do Brasil Rural: promover o acesso a terra e à agricultura familiar.

12.Promoção da agricultura sustentável: incentivar o manejo de sistemas produtivos, adotando o princípio da precaução para transgênicos.

13.Promover a Agenda 21: elaborar indicadores de desenvolvimento sustentável.14. Implantar o transporte de massa: promover a descentralização das cidades e a

implementação de redes de metrô e trens rápidos.15.Preservar e melhorar bacias hidrográficas: assegurar a preservação dos

mananciais pelo estabelecimento de florestas protetoras e proteger margens de rios, recuperando suas matas ciliares.

16.Política florestal e controle de desmatamento: limitar a concessão de créditos para a expansão de fronteiras agrícola. Implantar corredores de biodiversidade em todos os biomas.

17.Descentralização do pacto federativo: fortalecer o federalismo e definir as competências entre União, estados e municípios.

18.Modernização do Estado: estabelecer termos de compromisso para a solução de passivos ambientais amparados por garantias bancárias.

19.Relações internacionais e governança global: fortalecer as Nações Unidas como organismo representativo.

20.Formação de capital social: expandir os incentivos fiscais ao terceiro setor, promover oportunidades para os negros, fortalecer o papel da mulher e proteger os indígenas da biopirataria.

21.Pedagogia da sustentabilidade: adotar o princípio da responsabilidade corporativa.

5. CONCEITO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

O desenvolvimento sustentável é aquele que atende às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem a suas próprias necessidades. Ele contém dois conceitos-chave: (1) o conceito de “necessidades”, sobretudo as necessidades essenciais dos pobres no mundo, que devem receber a máxima prioridade e (2) a noção das limitações que o estágio da tecnologia e da organização social impõe ao meio ambiente, impedindo-o de atender às necessidades presentes e futuras.

Em seu sentido mais amplo, a estratégia de desenvolvimento sustentável visa a promover a harmonia entre os seres humanos e entre a humanidade e a natureza. No contexto específico das crises do desenvolvimento e do meio ambiente surgidas nos anos 80 - que as atuais instituições políticas e econômicas nacionais e internacionais ainda não conseguiram e talvez não consigam superar-, a busca do desenvolvimento sustentável requer:

1. Um sistema político que assegure a efetiva participação dos cidadãos no processo decisório;

2. Um sistema econômico capaz de gerar excedentes e know-how técnico em bases confiáveis e constantes;

3. Um sistema social que possa resolver as tensões causadas por um desenvolvimento não equilibrado;

4. Um sistema de produção que respeite a obrigação de preservar a base ecológica do desenvolvimento;

5. Um sistema tecnológico que busque constantemente novas soluções;

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6. Um sistema internacional que estimule padrões sustentáveis de comércio e financiamento;

7. Um sistema administrativo flexível e capaz de autocorrigir-se.

A partir da definição de desenvolvimento sustentável pelo Relatório Brundtland, de 1987, pode-se perceber que tal conceito não diz respeito apenas ao impacto da atividade econômica no meio ambiente. Desenvolvimento sustentável se refere principalmente às consequências dessa relação na qualidade de vida e no bem-estar da sociedade, tanto presente quanto futura. Atividade econômica, meio ambiente e bem-estar da sociedade formam o tripé básico no qual se apoia a ideia de desenvolvimento sustentável. A aplicação do conceito à realidade requer, no entanto, uma série de medidas tanto por parte do poder público como da iniciativa privada, assim como exige um consenso internacional. É preciso frisar ainda a participação de movimentos sociais, constituídos principalmente na forma de ONGs (Organizações Não-Governamentais), na busca por melhores condições de vida associadas à preservação do meio ambiente e a uma condução da economia adequada a tais exigências.

Segundo o Relatório Brundtland, uma série de medidas devem ser tomadas pelos Estados nacionais: (1) limitação do crescimento populacional; (2) garantia de alimentação a longo prazo; (3) preservação da biodiversidade e dos ecossistemas; (4) diminuição do consumo de energia e desenvolvimento de tecnologias que admitem o uso de fontes energéticas renováveis; (5) aumento da produção industrial nos países não industrializados à base de tecnologias ecologicamente adaptadas; (6) controle da urbanização selvagem e integração entre campo e cidades menores; (7) as necessidades básicas devem ser satisfeitas. No nível internacional, as metas propostas pelo Relatório são as seguintes: (8) as organizações do desenvolvimento devem adotar a estratégia de desenvolvimento sustentável; (9) a comunidade internacional deve proteger os ecossistemas supranacionais como a Antártica, os oceanos, o espaço; j) guerras devem ser banidas; (10) a ONU deve implantar um programa de desenvolvimento sustentável.

No que tange ao privado, a ONG Roy F. Weston recomenda que o conceito de desenvolvimento sustentável, assim que é assimilado pelas lideranças de uma empresa e passa a ser almejado como uma nova forma de se produzir sem trazer prejuízos ao meio ambiente e, indiretamente, à sociedade em geral, deve se estender a todos os níveis da organização, para que depois seja formalizado um processo de identificação do impacto da produção da empresa no meio ambiente. Em seguida, é necessário que se crie, entre os membros da empresa, uma cultura que tenha os preceitos de desenvolvimento sustentável como base. O passo final é a execução de um projeto que alie produção e preservação ambiental, com uso de tecnologia adaptada a este preceito (como empresas que atingiram metas de aplicação de um projeto de desenvolvimento sustentável a ONG cita a 3M, o McDonald’s, a Dow, a DuPont, a Pepsi, a Coca-Cola e a Anheuser-Busch). A ONG prega que não se deve implementar estratégias de desenvolvimento sustentável de uma só vez, “como uma revolução, mas como uma evolução”, de forma gradual, passo a passo. É preciso ainda que haja uma integração entre indústria, comércio e comunidade, de forma que um programa de melhorias socioambientais numa região se dê de forma conjunta e harmoniosa. O poder público, tanto no âmbito municipal como nos âmbitos estadual e nacional, deve atuar de maneira a proporcionar adequadas condições para o cumprimento de um programa de tal proporção, desde a feitura de uma legislação apropriada ao desenvolvimento sustentável até a realização de obras de infraestrutura, como a instalação de um sistema de água e esgoto que prime pelo não desperdício e pelo tratamento dos dejetos.

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Algumas outras medidas providenciais para a implantação de um programa o mínimo adequado de desenvolvimento sustentável são: uso de novos materiais na construção; reestruturação da distribuição de zonas residenciais e industriais; aproveitamento e consumo de fontes alternativas de energia, como a solar, a eólica e a geotérmica; reciclagem de materiais aproveitáveis; não desperdício de água e de alimentos; menor uso de produtos químicos prejudiciais à saúde nos processos de produção alimentícia.

Realizar um programa de desenvolvimento sustentável exige, enfim, um alto nível de conscientização e de participação tanto do governo e da iniciativa privada como da sociedade. Para tanto, não se deve deixar que estratégias de tal porte e extensão fiquem à mercê do livre mercado, visto que os danos que se visam resolver são causados justamente pelos processos desencadeados por um modelo de capitalismo que aparenta ser cada vez mais selvagem e desenfreado. Ainda mais se levarmos em conta o fato de que um dos requisitos básicos do conceito de desenvolvimento sustentável é a satisfação das necessidades básicas da população, principalmente dos pobres.

6. COMO FUNCIONA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

Virou moda. O termo desenvolvimento sustentável está em tudo que é lugar. Nos relatórios das empresas, no discurso dos ambientalistas, nas teses científicas. É o novo paradigma para uma infinidade de discussões econômicas, políticas, ambientalistas e sociológicas. Mas afinal, o que é isso?

Uma das definições mais usadas para desenvolvimento sustentável é o desenvolvimento capaz de suprir as necessidades atuais da população, sem comprometer a capacidade de atender as necessidades das futuras gerações. Ou seja, a ideia é crescer sem destruir o ambiente e esgotar os recursos naturais.

Essa definição, no entanto, é considerada limitada por alguns cientistas já que não aborda outros aspectos como o político e o social. Para entender melhor o que é desenvolvimento sustentável é necessário conhecer um pouco da história de como foi entendido o desenvolvimento anteriormente, como surgiu o termo, as formas como ele pode ser medido e as teorias que ajudaram a criar a expressão. Vamos lá.

Nascido da consciência ambiental

Desde meados do século 19, a palavra progresso veio a resumir a forma de pensar e agir economicamente na sociedade contemporânea. Era o início da Revolução Industrial. O pensamento positivista, cujo principal mentor foi o sociólogo Augusto Comte, perpassa por essa postura. O progresso foi considerado a principal forma de desenvolvimento, regendo o mundo capitalista e também moldando parte das políticas dos países que adotaram o socialismo real.

Na prática, significou criar fábricas e mais fábricas, incentivar o consumo, construir infraestrutura para tal e descobrir as formas eficientes de explorar matéria-prima, retirando-a de todas as formas. Esses pressupostos foram adotados com voracidade pelas mais diversas sociedades. O resultado disso foi um impacto ambiental negativo nunca antes visto na Terra. Os problemas decorrentes são materializados por questões como o aquecimento global, efeito estufa, chuva ácida, poluição do solo e dos rios, inversão térmica, extinção de animais, entre outros.

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Desenvolvimento, então, era associado ao progresso a qualquer custo. A mudança de paradigma começou a ser formulada com a constatação pelos cientistas dos problemas e o início das discussões de alternativas que surgiram na baila do movimento pacifista, embrião do movimento ecologista, dos anos 60 tanto nos Estados Unidos quanto na Europa.

Oficialmente, essa nova visão apareceu, pela primeira vez, na Primeira Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, em Estocolmo, Suécia, em 1972. O termo fazia parte do arcabouço teórico desenvolvimento pelo economista polonês, naturalizado francês, Ignacy Sachs.

Em 1987, a Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento das Nações Unidas adotou o conceito no famoso relatório Brundtland, que discutia o futuro comum dos habitantes da Terra. Durante a Eco-92, Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, ocorrida no Rio de Janeiro (Brasil), o conceito tornou-se princípio fundamental e parâmetro para a Agenda 21, uma série de metas, aprovadas pelos mais de 160 países participantes. Em 2002, Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável, chamada também de Rio+10, ocorrida em Johanesburgo (África de Sul), ampliou ainda mais a discussão em cima do que seria o tripé da sustentabilidade ou triple bottom line. Esse sim, uma maneira mais sistemática de discutir o desenvolvimento sustentável, mesmo que ainda embrionário em vários aspectos. Entenda melhor o conceito.

O tripé da sustentabilidade

A imagem do tripé é perfeita para entender a sustentabilidade. No tripé estão contidos os aspectos econômicos, ambientais e sociais, que devem interagir, de forma holística, para satisfazer o conceito. Pelo parâmetro anterior, uma empresa era sustentável se tivesse economicamente saudável, ou seja, tivesse um bom patrimônio e um lucro sempre crescente, mesmo que houvesse dívidas. Para um país, o conceito incluía um viés social. Afinal, o desenvolvimento teria que incluir uma repartição da riqueza gerada pelo crescimento econômico, seja por meio de mais empregos criados, seja por mais serviços sociais para a população em geral. Esse critério, na maioria das vezes, é medido pelo Produto Interno Bruto (PIB) do país, o que para o novo conceito é uma medição limita. A perna ecológica do tripé trouxe, então, um problema e uma constatação. Se os empresários e os governantes não cuidassem do aspecto ambiental podiam ficar em maus lençóis sem matéria-prima e talvez, sem consumidor, além do fantasma de contribuir para a destruição do planeta Terra.

Assim, o tripé da sustentabilidade (em inglês, triple bottom line) ficou também conhecido como os 3 Ps (People, Planet and Profit, ou, em português, PPL - Pessoas, Planeta e Lucro). Vamos então detalhar o que significa cada um desses aspectos, levando em conta a administração de uma empresa, de uma cidade, estado ou país. É importante verificar que esses conceitos podem ser aplicados tanto de maneira macro, para um país ou próprio planeta, como micro, sua casa ou uma pequena vila agrária.

Pessoas – Refere-se ao tratamento do capital humano de uma empresa ou sociedade. Além de salários justos e estar adequado à legislação trabalhista, é preciso pensar em outros aspectos como o bem estar dos seus funcionários, propiciando, por exemplo, um ambiente de trabalho agradável, pensando na saúde do trabalhador e da sua família. Além disso, é imprescindível ver como a atividade econômica afeta as comunidades ao redor.

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Não adianta, por exemplo, uma mineradora pagar bem seus funcionários, se ela não presta nenhuma assistência para as pessoas que são afetadas indiretamente com a exploração como uma comunidade indígena que é vizinha do empreendimento e que é afetada social, econômica e culturalmente pela presença do empreendimento. Nesse item, está contido também problemas gerais da sociedade como educação, violência e até o lazer.

Planeta – Refere-se ao capital natural de uma empresa ou sociedade. É a perna ambiental do tripé. Aqui assim como nos outros itens, é importante pensar no pequeno, médio e longo prazo. A princípio, praticamente toda atividade econômica tem impacto ambiental negativo. Nesse aspecto, a empresa ou a sociedade deve pensar nas formas de amenizar esses impactos e compensar o que não é possível amenizar. Assim uma empresa que usa determinada matéria-prima deve planejar formas de repor os recursos ou, se não é possível, diminuir o máximo possível o uso desse material, assim como saber medir a pegada de carbono do seu processo produtivo, que, em outras palavras, quer dizer a quantidade de CO2 emitido pelas suas ações. Além disso, obviamente, deve ser levada em conta a adequação à legislação ambiental e a vários princípios discutidos atualmente como o Protocolo de Kyoto. Para uma determinada região geográfica, o conceito é o mesmo e pode ser adequado, por exemplo, com um sério zoneamento econômico da região.

Lucro – Trata-se do lucro. Não é muito difícil entender o que é o conceito. É resultado econômico positivo de uma empresa. Quando se leva em conta o triple bottom line, essa perna do tripé deve levar em conta os outros dois aspectos. Ou seja, não adianta lucrar devastando, por exemplo.

Para segurar o tripé

Além dos aspectos listados nos três Ps, o desenvolvimento sustentável deve ser pensando por meio de outros aspectos, digamos, mais subjetivos. Trata-se das questões políticas e culturais. Eles são importantes para qualquer tipo de análise do tripé já que leva em conta a premissa de que tudo está interligado. Os aspectos políticos têm a ver com a coerência entre o que é esperado do desenvolvimento sustentável e a prática adotada através das políticas adotadas seja por uma empresa ou por uma determinada sociedade. Assim, não dá para falar em adotar o tripé se a empresa, por exemplo, adota uma política inflexível de negociação com os funcionários ou não acompanha a legislação ambiental condizente.

Os aspectos culturais devem ser levadas em conta o tempo todo. Quando a empresa está inserida em uma determinada sociedade, ela deve saber as limitações e vantagens culturais da sociedade que a envolve. O exemplo mais gritante é o da empresa que não se relaciona harmoniosamente com a comunidade ao redor de sua área. Se ao lado de uma planta industrial existe uma favela, por exemplo, por que não absorver seus moradores na fábrica, ao invés de aumentar investimentos em segurança particular? Além disso, a cultura de determinada localidade pode ser útil para entender melhor a dinâmica da biodiversidade local, por exemplo.

7. COMO MEDIR O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

Os modelos tradicionais de medição econômica não conseguem abranger os aspectos do desenvolvimento sustentável.

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O exemplo mais claro é o Produto Interno Bruto (PIB), que mede a receita total de uma determinada região. Como leva em conta apenas os aspectos monetários, o PIB não consegue abranger outros aspectos como a divisão igualitária dessa riqueza na sociedade e os impactos negativos no meio ambiente.

Assim, ao longo dos últimos anos, começaram a surgir alguns métodos para tentar medir a sustentabilidade. O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), medido pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), não é exatamente um índice de sustentabilidade, mas ajudou dimensionar esses novos métodos. Um dos exemplos de novo método é o Indicador de Progresso Genuíno (GPI) que baseado no cálculo do PIB agrega outros dados que podem influenciar para cima ou para baixo o valor. O GPI é calculado pelas organizações não governamentais Redefining Progress, baseado em metodologia do Friends of the Earth. Nele, são medidos dados como:

1. Distribuição da receita – mede o quanto do PIB vai para as classes menos favorecidas.

2. Trabalho doméstico e voluntário – como o que a dona-de-casa faz não rende dinheiro, seu trabalho não entra nas estatísticas tradicionais. Aqui, ele conta. Assim como o trabalho voluntário.

3. Nível educacional – Quanto maior o nível educacional da população, maior o índice GPI.

4. Custo do crime – A violência contra o homem, a natureza e a propriedade privada é um grande desperdício de recursos de uma sociedade. Por isso, esse custo deve ser subtraído.

5. Exaustão de recursos – Ligado diretamente à questão ambiental, contabiliza perdas de recursos naturais ocorridas em casos como o do desmatamento ou a exploração de uma jazida mineral.

6. Poluição – Fumaça nas cidades, rios cheios de poluentes, barulho. Tudo isso gera custo, que vai impactar negativamente o índice.

7. Degradação ambiental a longo prazo – Mudanças climáticas, lixo nuclear, buraco na camada de ozônio. Os custos desses problemas contemporâneos são contabilizados.

8. Diminuição do tempo de lazer – Nas cidades grandes, o tempo para descansar e se divertir é cada vez mais escasso, ou seja, é importante saber o quanto a falta desse tempo de ócio pode custar para a vida das pessoas e do país.

9. Gastos defensivos – Esse item mede os custos de se defender contra vários problemas de ordem ambiental e/ou social, seja a erosão ou um acidente de carro.

10.Tempo de vida útil dos bens de consumo e da infraestrutura pública – Os índices tradicionais medem o investimento em infraestrutura e os gastos com consumo, mas não estimam o desgaste e a manutenção desses produtos. O GPI, sim.

11.Dependência de ativos externos – Nos cálculos tradicionais, como no PIB, a maioria dos empréstimos internacionais é considerada positiva. Já no GPI, quando o empréstimo é para investimentos, ele pode ser considerado positivo. Se o empréstimo é para o consumo, torna-se negativo.

Alguns dos critérios adotados por esses novos índices de sustentabilidade do mercado são:

1. Dimensão da natureza do produto – empresas que têm produtos que causam dependência física ou ameaçam a integridade do consumidor não podem participar.

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2. Governança corporativa – empresas que adotam o modelo de governança que basicamente amplia a transparência dos dados divulgados pela empresa.

3. Plano de contingência – as empresas devem estar preparadas para ocasionais problemas que cessem sua produção.

4. Dimensão ambiental – além de atender as exigências da legislação ambiental, é importante que as empresas pensem e procurem melhorias que ajudam a amenizar os impactos das suas ações.

5. Dimensão social – Além de atender às exigências da legislação trabalhista, as empresas devem incluir políticas de inclusão da diversidade social (como negros ou portadores de necessidades especiais), além de ter uma política para tentar inibir a corrupção.

Enfim, a sociedade contemporânea tem tentado medir a sustentabilidade para poder dimensionar melhor o problema e poder criar planos alternativos para as atuais e futuras gerações. A questão implica, no entanto, numa internacionalização dessas normatizações e a confiabilidade de dados, o que só poderia acontecer se todos adotassem as mesmas regras. De qualquer modo, esses modelos podem ajudar a discutir problemas do conceito de desenvolvimento sustentável, que recebe várias críticas.

8. CRÍTICAS AO MODELO

Há quem diga que é uma utopia inalcançável. Outros dizem que, da forma como vem sendo apresentado, o conceito pode tornar-se apenas uma maquiagem, mas não resolverá os problemas ambientais e sociais do planeta. Conheça alguns dos pontos levantados por quem critica o desenvolvimento sustentável.

Outro estilo de vida – Apesar de boa parte das pessoas que apoiam o novo paradigma procurar mudar seu estilo de vida, usando, por exemplo, menos carro, os críticos dizem que não adianta apenas amenizar os problemas e continuar usando o desenvolvimento (leia-se progresso) como parâmetro para a vida em sociedade. E que só novas formas de consumo, muito além do consumo consciente, poderiam amenizar o problema.

Ajuda a quem destrói – Uma das principais críticas ao modelo é que as medidas que têm sido adotadas em cima do conceito acabam apenas ajudando quem ganha dinheiro com a degradação ambiental. É o caso das empresas poluidoras que compram créditos de carbono para compensar suas emissões danosas ao ambiente.

Quem muito tem nada dá – Para os críticos, não há como o sistema capitalista tornar igualitária a distribuição de renda, já que o sistema parte do pressuposto do lucro. E quando essa distribuição acontece vem na forma de ações mais voltadas ao objetivo de conseguir adesão dos mais necessitados às políticas de quem os beneficia do que realmente a melhorias na qualidade de vida dos beneficiados.

Para inglês ver – Mais do que uma crítica ao conceito, há quem reclame que a proliferação de ações de desenvolvimento sustentável por empresas e governos é mais uma forma de propaganda do que uma mudança social e ambiental efetiva.

9. OS RECURSOS NATURAIS – A ÁGUA E SUA DEGRADAÇÃO

Quem mora em grandes cidades é testemunha dos rios que mais parecem esgotos. Um fedor forte, uma cor escura e nenhum sinal de ser vivo no seu leito ou nas suas margens. São rios mortos e extremamente perigosos para a saúde humana.

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A essa triste imagem, somam-se as praias inadequadas para o banho e os rios aparentemente saudáveis, normalmente localizados em áreas menos populosas, que podem esconder poluentes e substâncias tóxicas prejudiciais à saúde dos bichos, plantas e do próprio ser humano. Muitas são as formas de poluição de águas no mundo contemporâneo. As causas também variam bastante, mas é consenso que a maior parte delas é fruto da ação irresponsável e indiscriminada do homem.

Os ciclos materiais e energéticos são interligados em cadeias interagentes que tornam todos os seres vivos dependentes uns aos outros. É sob essa ótica que devemos analisar a água: como um material primordial para esses ciclos, sendo a alteração das suas quantidade e qualidade um impacto em cadeia. Todavia as alterações das condições do meio natural são constantes, sejam elas causadas pelo homem, por outros seres vivos ou através das dinâmicas naturais em diferentes escalas. Logo surge uma primeira distinção entre alteração e poluição, mas para compreendê-la é necessário ter em vista que a natureza se estabelece através do equilíbrio.

As práticas humanas tendem a romper esses equilíbrios com a introdução de elementos exógenos aos meios naturais (elementos que vêm de fora de um determinado meio natural), ou com elementos que pertencem ao meio e que são introduzidos de forma excessiva.

Sendo a produção de excedentes em massa uma das características da sociedade contemporânea, o desequilíbrio ecológico tem sido constantemente provocado pelo homem. Dessa forma chamamos de poluição o desequilíbrio ecológico, causado pela introdução de elementos que tornam um ambiente impróprio ou nocivo às formas de vida que nele se encontram.

A ideia de poluição nem sempre está atrelada à concepção de contaminação, pois a primeira determina a instabilidade do equilíbrio entre as populações que vivem em um dado ambiente, já a segunda discrimina o efeito de uma determinada substância presente em um ambiente sob um ou mais seres vivos.

A poluição aquática é um dos principais temas no estudo das poluições e impactos ambientais, por ser a água fundamental para a articulação da vida em cadeia através da sua circulação subterrânea, aérea, no solo (a subsuperfície) ou na superfície. Um mesmo material pode ser poluente aquático ou não, dependendo da capacidade da água e das suas populações de dissolver e decompor os elementos nela inseridos. O próprio esgoto doméstico, sem o devido tratamento, pode não ser considerado um poluente se for adicionado na água em quantidades adequadas ao ambiente; sendo, nesse caso, a poluição aquática é uma espécie de indigestão ambiental.

Parâmetros da poluição dos corpos d’água

No Brasil, os parâmetros de poluição e as unidades de monitoramento podem ser gerenciados pela União, Estados ou municípios. É importante, no entanto, analisar os parâmetros medidos e outros dados através da delimitação de bacias e regiões hidrográficas, pois é sob uma bacia hidrográfica que se estende a poluição de um rio e não sob uma divisão política (que, às vezes, pode coincidir com as bacias hidrográficas).

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O sentido da contaminação de um rio é sempre o da montante para a jusante, ou seja, uma poluição que atinge os pontos mais altos de um rio atingirá os pontos mais baixos da sua bacia.

Também é importante lembrar que o Índice de Qualidade da Água (IQA) é também

utilizado para a formulação dos dados de balneabilidade das praias, que são divulgados nos jornais com a finalidade de informar se as praias estão poluídas e próprias para banho ou não.

Os valores de IQA que são medidos pelos estados brasileiros são adaptados a partir do IQA dos Estados Unidos, elaborado em 1970 pela National Sanitation Foundation (NSF), havendo adaptações específicas entre os Estados brasileiros. Os IQAs brasileiros, em sua grande maioria, são uma média entre parâmetros de avaliação que possuem pesos diferentes na formulação dessa média, conforme demonstrado na tabela:

Tabela 1 - Parâmetros de IQA e Respectivos Pesos (%)Parâmetro PesosOxigênio dissolvido 0,17Coliformes fecais 0,15Potencial hidrogeniônico (pH) 0,12Demanda bioquímica de oxigênio 0,10Temperatura 0,10Nitrogênio Total 0,10Fósforo Total 0,10Turbidez 0,08Resíduo Total 0,08Fonte: ANA 2005

Água e agricultura

Os problemas relacionados à poluição das águas pela agricultura no Brasil também merecem um especial enfoque, por ser o Brasil um dos maiores produtores agropecuários do planeta.

A agricultura é a segunda maior fonte de poluição das águas brasileiras, perdendo apenas para a emissão de esgotos domésticos. Para a abordagem do tema é necessária uma distinção prévia, separando os danos causados por manejos agrícolas inadequados aos recursos hídricos brasileiros, das poluições decorrentes do uso inadequado de insumos agrícolas.

Os problemas relativos ao manejo inadequado são relacionados a práticas que diminuem a disponibilidade hídrica, como a devastação de matas ciliares que provoca o assoreamento de rios; a utilização de água subterrânea de forma insustentável, levando ao esvaziamento permanente do lençol freático; ou a utilização de práticas agrícolas que levam a compactação do solo, impossibilitando o acúmulo de água subsuperficial.

Esses manejos inadequados podem gerar poluição aquática ou não. Já as poluições geradas pela agricultura implicam na alteração dos ciclos de vidas dos seres

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vivos que vivem nos ambientes aquáticos, às vezes levando também a contaminação dos demais seres vivos que usufruem das suas águas.

Dentre os insumos agrícolas que mais causam poluição para as águas, os fertilizantes (químicos ou naturais) e os pesticidas (químicos) têm especial destaque pela larga utilização, sendo muito grande a dependência de insumos químicos pela agricultura atual.

O fósforo, a amônia e o potássio são os fertilizantes mais utilizados pela agricultura e quando utilizados em excesso costumam infiltrar-se no solo, seguindo para o lençol freático, infiltrando até as águas subterrâneas pela lixiviação do solo, ou atingindo os corpos d´água superficiais. O fósforo, pelas suas características químicas, tende a infiltrar menos e fica mais nas águas superficiais, que são também atingidas pelos demais nutrientes, ocorrendo a eutrofização da água e os desequilíbrios ecológicos decorrentes.A vinhaça ou vinhoto, um resíduo da produção de usinas de cana, é um dos principais agentes eutrofizante, mas de ser orgânica não sintética. Nela estão contidas grandes quantidades de potássio, sendo por isso utilizada como fertilizante natural em plantações e muitas vezes também despejada em corpos d´água.

Essa prática é proibida pela legislação ambiental brasileira, pois além da eutrofização, leva também a poluição térmica quando despejada ainda aquecida. Outro fertilizante natural eutrofizante muito utilizado na agricultura é o esterco proveniente da criação pecuária intensiva, que é uma rica fonte de amônia e de demais nitratos. Porém, os resíduos da pecuária intensiva muitas vezes não são tratados adequadamente, podendo levar a poluição de águas através do vazamento de fossas ou do despejo de dejetos em locais inapropriados que são lixiviados.

Os pesticidas químicos são outros insumos poluentes utilizados pela agricultura, não por serem eutrofizantes, mas por serem tóxicos e muitas vezes não biodegradáveis. O seu uso aumentou progressivamente no mundo a partir de 1920, mas foi entre os anos 50 e 70 que os pesticidas mais tóxicos como os DDTs passaram a ser utilizados em larga escala. Com o crescimento da agricultura brasileira nas últimas décadas, o Brasil se tornou um dos maiores consumidores mundiais de agrotóxicos do mundo, sendo que entre 1970 e o ano 2000 a quantidade de agrotóxicos vendidos no país cresceu 4,3 vezes. Por consequência, os impactos ao meio físico e particularmente aos corpos d´água também cresceram.

Na década de 90, o maior acréscimo da produção agrícola foi originado na cultura da soja, que se expandiu por extensas áreas do centro oeste e da região norte brasileira. Essa expansão veio acompanhada de um extenso uso de pesticidas muitos deles altamente tóxicos, como é o caso do Glifosato, que pode ser considerado altamente tóxico, conforme a sua marca e sua concentração. Outras culturas amparam-se no extenso uso de agrotóxicos, principalmente as culturas hortifrutigranjeiras, situadas principalmente nos cinturões verdes no entorno das grandes metrópoles brasileiras. Nas frutas e hortaliças, são aplicadas grandes cargas de agrotóxicos, por serem muito perecíveis e frágeis frente às variações climáticas. Os cinturões verdes acabam sendo fontes poluidoras de mananciais urbanos.

Impactos para o homem

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Entrar em contato com água poluída pode levar ao contágio com doenças de veiculação hídrica, sendo algumas dessas doenças transmitidas através da ingestão de água e de produtos agrícolas regados com água contaminada por coliformes fecais de seres humanos contaminados.

A cólera, a febre tifoide são doenças e a hepatite infecciosa tipo A são exemplos de doenças de contágio fecal-oral adquiridas desta forma. Entre as doenças através do contato da água contaminada com a pele, podem-se destacar a esquistossomose e a leptospirose. Existem ainda doenças que tem na água o habitat natural de vetores de transmissão de doenças, mas que não estão necessariamente ligadas à poluição das águas, como a dengue e a febre amarela.

Ingerir água contaminada por compostos orgânicos sintéticos não biodegradáveis e tóxicos, como os pesticidas agrícolas, detergentes ou metais pesados também pode causar doenças, sendo os efeitos variáveis, de pequenas dores de cabeça até a morte. Dados do Sinitox (Sistema Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas) demonstram que 17,3% dos casos de intoxicação catalogados nos hospitais brasileiros em 2003 foram gerados por contaminação de pesticidas (não sendo determinada a parcela de contaminação hídrica).

A poluição das águas pode levar a grandes epidemias e a contaminações em massa, mas também pode acarretar amplos impactos sociais pelo comprometimento do modo de vida de populações ribeirinhas e comunidades de pescadores, que dependem dos corpos d´água para extrativismos diversos.

Podemos utilizar como exemplo o interior do estado de São Paulo, onde era muito comum até os anos 70 a existência de populações que tinham na pesca dos rios da bacia do Paraná a base da sua sobrevivência. Atualmente esse modo de vida foi praticamente inviabilizado, devido, dentre outros motivos, à poluição dos rios. Hoje é muito comum a existência de comunidades de pescadores que vivem da pesca, mas que são comumente afetados por vazamentos de petróleo ou pela poluição originada por esgotos. Em 2000, um grande vazamento de petróleo na baia da Guanabara levou à impossibilidade temporária da atividade pesqueira na região.

A poluição de importantes cursos d´água também agrava a ausência de água nas grandes metrópoles brasileiras, como é o caso da poluição por resíduos industriais e esgoto doméstico no rio Tietê em São Paulo, obrigando a metrópole a ter que procurar fontes de abastecimento em mananciais distantes, alguns a mais de 350 quilômetros de distância da cidade, no estado de Minas Gerais. Para se bombear água de bacias hidrográficas distantes, são necessários enormes gastos, que encarecem o custo final da água, assim como o tratamento necessário à água que é consumida (encarecido proporcionalmente ao nível de poluição da água utilizada).

Muitas medidas podem ser tomadas para se evitar o contágio com águas poluídas como:

1. não beber água mineral, refrigerantes, água e cerveja diretamente de latas e garrafas;

2. ferver a água para cozinhar; 3. não ingerir água não tratada; 4. utilizar esterilizadores para a lavagem de verduras e legumes;

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5. não se banhar em lagos, rios, cachoeiras e mares sem o conhecimento prévio das condições ambientais do local;

6. evitar contato com águas de enchentes e usar botas impermeáveis de cano longo em áreas alagadiças.

10. A CONTAMINAÇÃO DOS SOLOS

"Uma nação que destrói o seu solo destrói a si mesma."Franklin D. Roosevelt (1937)

O solo é um recurso natural vital para o funcionamento do ecossistema terrestre e dos ciclos naturais. Apresenta inúmeras funções - uma delas é atuar como um filtro, graças a sua capacidade de depurar grande parte das impurezas nele depositadas; ele age também como um “tampão ambiental”, diminuindo e degradando compostos químicos prejudiciais ao meio ambiente. Essa capacidade de filtração e tamponamento, no entanto, é limitada, podendo ocorrer alteração da qualidade do solo em virtude do efeito acumulativo da deposição de poluentes atmosféricos, da aplicação de defensivos agrícolas e fertilizantes e da disposição de resíduos sólidos industriais, urbanos, materiais tóxicos e radioativos.

Os Estados Unidos foram um dos primeiros países a discutir possíveis efeitos dos defensivos agrícolas sobre o meio ambiente, em meados de 1944, mas somente em 1988, quase 44 anos depois, a partir de pesquisas comprovadas, os cientistas passaram a estar realmente cientes dos problemas de pesticidas no solo.

Antes de discutir a contaminação dos solos é necessário entender algumas denominações:

1. contaminante - produto encontrado em um determinado meio em uma concentração abaixo dos níveis toleráveis em relação a critérios adotados

2. poluente - produto encontrado em um determinado meio em concentração acima dos níveis toleráveis em relação a critérios adotados.

A preocupação com os processos de poluição do solo vem crescendo em todo o mundo dado aos graves efeitos que pode ocasionar sobre a humanidade. No que se refere à legislação, o Brasil tem a lei do Estado da Bahia, nº 3.858/80, Decreto nº 28.687/82, elaborada pelo Sistema Estadual de Administração dos Recursos Ambientais/Seara, criado a partir do Centro de Recursos Ambientais da Bahia, primeiro órgão ambiental brasileiro certificado pela ISO 9001.

O artigo 72 da lei diz que “Poluição do solo e do subsolo consiste na deposição, disposição, descarga, infiltração, acumulação, injeção ou enterramento no solo ou no subsolo de substâncias ou produtos poluentes, em estado sólido, líquido ou gasoso”.

Veremos a seguir quais são os principais contaminantes do solo, seus efeitos nos seres humanos, nos animais e no meio ambiente e quais medidas devem são tomadas para prevenir e corrigir a contaminação dos solos.

Valores de Referência para Contaminantes do Solo (Soil Guideline Values - SGV)

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No Brasil, realizaram-se alguns levantamentos dos teores de metais pesados e de contaminantes nos solos brasileiros, entretanto, ainda não se definiram seus níveis de referência para uma possível avaliação de contaminação. São Paulo é o primeiro estado brasileiro a dispor de valores de referência de qualidade próprios para a avaliação dos graus de poluição do solo e das águas subterrâneas.

A Companhia de Tecnologia e Saneamento Básico (Cetesb) do Estado de São Paulo, por meio de testes laboratoriais e pesquisas de campo, elaborou uma lista com critérios, valores e padrões orientadores para a concentração de determinados metais pesados e substâncias orgânicas no solo e nas águas subterrâneas.

Resumidamente, os valores são divididos nos seguintes grupos:

1. Valor de Referência de Qualidade (VRQ): é a concentração de determinada substância no solo ou na água subterrânea, que indica as condições de um solo considerado limpo ou de águas subterrâneas em seu estado natural. São valores de referência usados na prevenção e no controle da contaminação e para o monitoramento de áreas contaminadas.

2. Valor de Prevenção (VP): indica a qualidade de um solo capaz de sustentar as suas funções primárias, protegendo-se os seres humanos e os animais e a qualidade das águas subterrâneas. Indica uma possível alteração da qualidade natural dos solos. Quando este valor é excedido podem ocorrer alterações prejudiciais à qualidade do solo e das águas subterrâneas e devem ser usadas medidas preventivas de contaminação. Deve-se, também, exigir o monitoramento das águas subterrâneas, identificando-se e controlando-se as fontes de poluição.

3. Valor de Intervenção (VI): indica o limite de contaminação do solo e das águas subterrâneas acima do qual existem riscos potenciais, diretos ou indiretos, à saúde humana. Quando excedido, requer alguma forma de intervenção na área avaliada. Para o solo, foram estabelecidos três cenários de exposição à contaminação: agrícola (área de proteção máxima), residencial e industrial.

Essa lista é utilizada como referência para a identificação de áreas consideradas já contaminadas ou com suspeitas de contaminação, as quais venham a oferecer risco à saúde pública. A área será classificada como área contaminada sob investigação quando houver constatação da presença de contaminantes no solo ou na água subterrânea em concentrações acima dos valores de intervenção, indicando a necessidade de ações para proteger as pessoas, os animais e o meio ambiente e o seguimento dos procedimentos de gerenciamento de áreas contaminadas.

Contaminantes do solo: herbicidas

A contaminação ambiental causada pelo uso crescente e indiscriminado de agroquímicos, em especial os herbicidas, tem gerado preocupações quanto ao lançamento inadequado desses compostos no ambiente. Sendo os agroquímicos tóxicos ao homem e organismos vivos, devem ser tomadas precauções quanto a sua aplicação e, principalmente, quanto aos resíduos provenientes das mais diversas fontes e à disposição final adequada, sem comprometimento do meio ambiente como um todo e dos solos em particular. Os herbicidas são os pesticidas mais persistentes no ambiente, ou seja, são degradados mais lentamente que os outros agrotóxicos atuais.

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O 2-4D e vários outros POPs (poluentes orgânicos persistentes) em geral são exemplos de pesticidas bastante estáveis, e por isso, são encontrados até hoje no ambiente natural.

No Brasil, houve um aumento notável no consumo de agrotóxicos, principalmente dos herbicidas, em razão da expansão da fronteira agrícola e do aumento de terras onde é praticado o plantio direto. O comportamento do herbicida depende das propriedades físico-químicas e biológicas do solo, bem como de fatores climáticos. Os três processos básicos que podem ocorrer com os pesticidas no solo são retenção, transformação e transporte.

O processo de retenção tende a “segurar” a molécula de herbicida, impedindo-a de se mover. Pode ser reversível ou irreversível e afetar os processos de transformação e transporte do herbicida no ambiente. A transformação refere-se a mudanças na estrutura química das moléculas do herbicida e determina se e por quanto tempo tais moléculas podem permanecer intactas no ambiente. O processo de transporte, determinado pelo movimento das moléculas do herbicida no solo, é fortemente influenciado pela umidade, temperatura, densidade, características físico-químicas do solo e do herbicida. No caso de pesticidas, às vezes, apenas uma pequena porcentagem da quantidade aplicada atinge o objetivo desejado. Grande parte é transportada por ventos, chuvas e é aportada em outros reservatórios, como atmosfera e recursos hídricos.

Para um melhor entendimento da dinâmica do herbicida no ambiente, deve-se também conhecer o mecanismo de ação dos herbicidas na planta. Há diversos grupos com o mecanismo de ação diferentes, sendo que o principal objetivo é interromper ou inibir o metabolismo da planta, o que faz com que a planta diminua seu crescimento e consequentemente morra. A seguir estão listados alguns dos principais herbicidas utilizados na agricultura, seus respectivos mecanismos de ação na planta e alternativas menos poluentes para o ambiente.

Glifosato – cuja marca comercial é roundup WG, atua diretamente sobre uma enzima na planta chamada de EPSP (enol-piruvil-chiquimato-fosfato) que está ligada a biossíntese de produtos secundários da planta os quais possibilitam a planta armazenar energia. Em relação ao solo, é muito pouco lixiviável (capacidade de se infiltrar nos lençóis freáticos), isto é, apresenta pouca descida no perfil do solo, tendo alta persistência no solo (30 a 90 dias). O tempo para degradar metade da quantidade de herbicida utilizado gira em torno de quase um mês. É um tipo de herbicida que atua no controle total de vegetação sem seletividade de plantas.

2,4D – esse composto tem alta persistência no solo e apresenta grande mobilidade no solo, em outras palavras, quanto mais persistente no solo, mais essa molécula tende a se acumular e não lixiviar, diminuindo assim a contaminação. Esse composto atua diretamente no metabolismo da planta, em específico nos hormônio chamado auxina. Sua marca comercial é Capri.

Atrazina – sua marca comercial é Primoleo. Tem elevado persistência nos solos chegando a demorar cerca de sete meses para degradar. É de alta toxicidade, e pode estar presente em alta quantidade no solo. Estes herbicidas atuam em uma etapa do processo fotossintético da planta matando-a por falta de produtos da fotossíntese.

Fomesafen - atua na inibição de uma enzima chamada Protox que impede a síntese de clorofila, pigmento responsável pela fotossíntese. Sua marca comercial é Flex.

Metsulfuron-methyl – A degradação desse grupo é dependente de temperatura e pH do solo. Em temperaturas mais altas, a degradação é mais rápida. Têm alta persistência grande no solo, chegando até 180 dias. Sua marca comercial é Ally.

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Chlorimuron-ethyl – cuja marca comercial é Classic é um herbicida seletivo do grupo das sulfoniluréias. Apresenta a propriedade de inibir a enzima denominada de acetolactatosintase (ALS) que se encontra nos cloroplastos das plantas e é fundamental para a fotossíntese. Este composto possui concentração média nos solos devido ao pH, fator que influencia na sorção das partículas do solo. No Brasil, a maioria dos solos tem o pH mais ácido o que facilita e contribui para a contaminação dos solos pelo composto.

Para que ocorra uma diminuição da contaminação dos solos por herbicidas deve-se aplicar o produto corretamente levando-se em conta a dose, a frequência e a época a ser aplicado.

Além disso, o conhecimento sobre as características do herbicida, como também com os métodos naturais de degradação destes no solo são de fundamental importância para a redução considerável da contaminação nos solos. A biorremediação pode ser uma alternativa para diminuir a contaminação provocada pelos herbicidas no solo pois é um método natural e de bastante eficiência que está sendo vastamente estudado e que será abordado com mais ênfase nas próximas páginas.

Contaminantes do solo: pesticidas

Os pesticidas, também conhecidos como agrotóxicos, são defensivos agrícolas de ação tóxica que têm como ingredientes ativos compostos químicos formulados para controlar ou erradicar vetores de doenças animais, vegetais ou humanas, pragas (insetos, fungos, bactérias, ácaros) e ervas daninhas que competem com a cultura a ser comercializada. O seu uso se deve às necessidades de controle de pragas e doenças que atacam culturas de interesse agronômico onde o controle biológico ainda não é comercialmente viável. Este uso deveria ocorrer em condições controladas, isto é, que possibilitassem a produção agrícola e, ao mesmo tempo, mantivessem o ambiente preservado. Na maioria das vezes não é isso que ocorre e após aplicações diretas ou, indiretas (nas culturas), o solo pode ser contaminado não-intencionalmente provocando graves desequilíbrios ambientais e problemas para todos os seres vivos.

A contaminação do ambiente, animais e pessoas por agrotóxicos começou a ser detectada a partir da década de 40 quando o uso de pesticidas tornou-se intensivo. Sabe-se que os pesticidas têm efeitos primários, quando atuam contaminando diretamente a espécie levando muitos indivíduos à morte imediata, e efeitos secundários, quando quebram a cadeia alimentar impossibilitando a manutenção de populações de determinada espécie em uma região.

A figura a seguir ilustra o crescimento do uso de defensivos agrícolas no país, analisado a partir das vendas do ano de 1988 até o ano de 1998. Em dez anos, o consumo mais que dobrou.

Vendas de agrotóxicos no Brasil em KgClasse 1988 1991 1994 1998Inseticidas 256.897 222.007 300.246 581.693Fungicidas 183.215 147.112 211.080 436.235Herbicidas 506.224 533.591 775.762 1.368.723Total 946.336 902.710 1.287.088 2.386.651Fonte: Adaptado ANDEF, 2002

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Os principais pesticidas são os chamados Poluentes Orgânicos Persistentes (POPs), que estão numa lista de 12 substâncias altamente persistentes e tóxicas ao meio. Entre estas substâncias, estão presentes sete pesticidas, além do DDT: o Aldrin, Chlorordane, Dieldrin, Endrin, Heptaclhor, Mirex, Toxaphene. Outros dois são produtos químicos industriais: o Hexachlorobenzene (HCB) - também utilizado como fungicida – e o Polychlorinated Biphenyls (PCBs) – utilizado como óleo isolante em transformadores elétricos. Dois subprodutos que são formados da decomposição química de alguns compostos clorados ou então da fabricação de alguns herbicidas. São as Dioxinas e os Furanos, compostos altamente cancerígenos. Logo abaixo estão listados os principais 12 pesticidas e suas características no meio ambiente.

Tempo de persistência dos 12 POPs no meio ambienteRetirado do Conselho Internacional da Associação Química (ICCA) documento 7/97 (revisado em 29 de abril1998)

Substância meia vida no ar

meia vida na água

meia vida no solo

meia vida nos sedimentos

DDT 2 dias > 1 ano > 15 anos sem data Aldrin < 9.1 horas < 590 dias 5 anos sem dataDieldrin < 40.5 horas > 2 anos > 2 anos sem dataEndrin 1.45 horas > 112 dias até 12 anos -Chlordane < 51.7 horas > 4 anos 1 ano sem dataHeptachlor sem data < 1 dia 120-240 anos sem dataHCB < 4.3 anos > 100 anos > 2.7 anos -Mirex sem data > 10 horas > 600 anos > 600 anosToxaphene < 5 dias 20 dias 10 anos -PCBs 3-21 dias > 4.9 dias > 40 dias -Dioxins(2,3,7,8-And 1,2,3,4-TCDD) < 9 dias > 5 dias 10 anos > 1ano

Furans (2,3,7,8) 7 dias > 15.5 dias sem data sem dataFonte: http://www.worldwildlife.org/toxics/progareas/pop/priority.htm

Devido a sua utilização generalizada no passado e a sua persistência no meio ambiente, os inseticidas organoclorados, inclusive Clordano, Aldrin, Dieldrin, Heptacloro e o DDT e seus metabólitos, são alguns dos contaminantes mais frequentes do solo nas áreas urbanas.

Outros possíveis contaminantes do meio ambiente incluem o arsênico, o mercúrio, o chumbo, o cádmio e os PCBs. Os pesticidas de arsênico foram comumente utilizados na produção de frutas e hortaliças até que foram substituídos pelos organoclorados a partir da Segunda Guerra Mundial. Ainda podem ser encontrados altos índices de poluição por arsênico nos terrenos de alguns jardins e hortas. Também o mercúrio foi utilizado em pesticidas, porém é mais encontrado como contaminante do solo em áreas que foram utilizadas para armazenamento ou disposição final de certos tipos de baterias, pinturas, lâmpadas a vapor e interruptores elétricos.

O arseniato de chumbo foi bastante utilizado como pesticida antes da Segunda Guerra e contribuiu para os altos níveis de chumbo verificados nos solos de antigas hortas.

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No Brasil, vários dos pesticidas clorados foram proibidos desde 1985. Eles haviam sido banidos desde 1982 no estado do Rio Grande do Sul, por terem sido encontrados resíduos contaminantes destes produtos nas águas potáveis do Rio Guaíba.

Para minimizar os impactos ambientais, a aplicação de pesticidas deve sempre ser feita com orientação técnica agronômica, quanto aos cuidados durante a aplicação, dosagem necessária, época e condições climáticas favoráveis (chuvas, temperatura, umidade, evapotranspiração, irradiação solar, velocidade e direção do vento, etc).

Os produtos tóxicos podem permanecer ativos por longos anos, acumulando-se nos solos. As plantas cultivadas nestes terrenos contaminados podem absorver estes produtos tóxicos, inserindo-os na cadeia alimentar. Essa é uma das formas pela qual estes produtos incorporam-se nos nossos alimentos como os vegetais, o leite e a carne. Assim, a maior concentração dos produtos tóxicos acaba ficando no homem, pois é o organismo que se encontra no final das cadeias alimentares.

Há uma grande quantidade de produtos tóxicos que exercem efeitos indesejáveis sobre os seres vivos. Dentro dos estudos ecotoxicológicos dos pesticidas em geral, determinados pela Lei Federal 7802/89, o Brasil é pioneiro em solicitar informações do impacto desses sobre microrganismos do solo, algas, minhocas, abelhas, microcrustáceos e peixes. É de grande importância conhecermos os compostos liberados pela agricultura e pelas indústrias e o seu impacto no ambiente natural.

Efeitos dos produtos tóxicos nos seres humanos

Fonte Poluidora Produto Químico Efeitos

Inseticidas DDTBHC câncer, danos ao fígado e a embriões

Inseticida Clordano

câncer, doenças do fígado e do sangue, efeitos neurológicos cardiovasculares, respiratórios, gástricos e renais severos, problemas endócrinos e reprodutivos

Inseticida Toxafeno

exposição a elevadas concentrações está associada a disfunções renais, hepáticas, nervosas, debilidade do sistema imunológico, diminuição da esperança de vida, disfunção hormonal, diminuição da fertilidade e alterações comportamentais

Fungicida Hexaclorbenzenopode prejudicar o fígado, tireóide e rins, sistemas endócrino, imunológico, reprodutivo e nervoso e câncer

Inseticida Heptacloro disfunção reprodutiva e endócrina e câncer de bexiga

Pesticidas Bário (Ba)aumento transitório da pressão sanguínea e efeitos tóxicos sobre o coração, vasos e nervos

Pesticidas Cádmio (Cd) pressão alta, problemas renais,

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aterosclerose, inibição no crescimento, doenças crônicas em idosos e câncer

Fungicida e Pesticidas Cobre (Cu)irritação e corrosão da mucosa, problemas hepáticos e renais e irritação do sistema nervoso central seguido de depressão

Fonte: Manual Global de Ecologia

11. A AGRICULTURA ORGÂNICA

É cada vez maior o número de pessoas que estão buscando uma alimentação mais saudável, na tentativa de resgatar um tempo em que ainda era possível ter à mesa alimentos frescos, de boa qualidade biológica e sem a contaminação por agrotóxicos.Hoje em dia, esse tipo de alimento pode ser encontrado, com alguma facilidade - pelo menos nas grandes cidades - nos supermercados, lojas especializadas e feiras de produtores. São os “alimentos orgânicos”, produzidos segundo critérios rígidos de qualidade, por agricultores que fazem parte de associações de agricultura orgânica. Eles utilizam apenas métodos e práticas ecológicas em suas plantações.

Formam um grande movimento, bastante organizado, coordenado mundialmente pela IFOAM - International Federation of Organic Agricuture Movements (Federação Internacional dos Movimentos de Agricultura Orgânica), com sede na Inglaterra. O Instituto Biodinâmico - IBD, que há vinte anos atua no campo de pesquisa e desenvolvimento da agricultura orgânica e biodinâmica no Brasil, define, assim, um produto orgânico: “é muito mais que um produto sem agrotóxicos e sem aditivos químicos. É o resultado de um sistema de produção agrícola que busca manejar de forma equilibrada o solo e demais recursos naturais (água, plantas, animais, insetos e outros), conservando-os no longo prazo e mantendo a harmonia desses elementos entre si e com os seres humanos”.

Para ofertar ao consumidor alimentos saudáveis e nutritivos, o agricultor deve trabalhar em harmonia com a natureza, recorrendo aos conhecimentos de diversas ciências como a agronomia, ecologia, sociologia, economia e outras. “A produção orgânica obedece a normas rígidas de certificação que exigem, além da não utilização de agrotóxicos e drogas venenosas, cuidados com a conservação e preservação dos recursos naturais e condições adequadas de trabalho.”

E tanto o consumidor quanto o produtor tem visto a agricultura orgânica com bons olhos, uma vez que o mercado que cresce ano a ano. A quantidade de agricultores que estão optando por plantar seguindo o método orgânico cresce ano a ano. Comparando os dados obtidos no ano 2000 com os de 2006, vemos que a área plantada no mundo duplicou.

A FAO (Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação) realizou em Roma, entre 3 e 5 de maio de 2007, a Conferência Internacional sobre Agricultura Orgânica e Segurança Alimentar, ressaltando a importância da produção desse tipo de alimentos para o mundo. Segundo o documento que foi apresentado:

- “a agricultura orgânica não é mais um fenômeno apenas de países desenvolvidos, pois já é praticada atualmente em 120 países, representando 31 milhões de hectares e um mercado de U$ 40 bilhões de dólares em 2006“.

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Quando lavouras certificadas estão relacionadas a melhorias agroecológicas e aumento de renda de agricultores pobres, isto leva ao aumento da segurança alimentar e à revitalização da agricultura familiar. Esses modelos sugerem que a agricultura orgânica tem o potencial para assegurar o abastecimento global de alimentos, assim como a agricultura convencional faz hoje, mas com reduzido impacto ambiental. Segundo pesquisa da Universidade de Campinas (Unicamp), o mercado de produtos orgânicos cresceu, na década de 90, em média 50% ao ano, chegando a uma receita de US$ 150 milhões. O consumo interno respondeu por US$ 20 milhões apenas, o restante foi exportado para países como Alemanha, França, Japão e Estados Unidos.

O Brasil já é o segundo maior produtor de orgânicos do mundo e o setor tem 70% de suas vendas voltadas para o mercado externo. Com 800 mil hectares de área cultivada, envolvendo 15 mil produtores, dos quais 80% são pequenos produtores, o país fica atrás somente da Austrália. A produção certificada como orgânica é bastante extensa e diversificada. Inclui, além de frutas e verduras, laticínios, café, cachaça, açúcar, sucos, geleias, azeite de dendê, guaraná, cacau, mel, algodão, óleo de babaçu, soja, arroz, carne de gado, de frango, ovos, extratos vegetais, chás, camarão, cogumelos etc. Os maiores consumidores do mundo são: a Comunidade Europeia, Japão, Estados Unidos.

O expressivo crescimento do setor de alimentos orgânicos (o setor que mais cresce dentro do mercado de alimentos no mundo) levou os governos dos mais diversos países a criarem suas legislações específicas para esse tipo de produto e a estabelecer programas de incentivo e pesquisa. No Brasil, temos o programa “Pró-Orgânicos”, programa do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, atuando através de sua Comissão Nacional e das Comissões Estaduais. Nossa Legislação para o setor é a seguinte: a Instrução Normativa n0 007, de 17 de maio de 1999; a Instrução Normativa nº 016, de 11 de Junho de 2004; a Lei nº 10.831, de 23 de Dezembro de 2003 e a Portaria nº 158, de 08 de Julho de 2004.

História da agricultura orgânica

A história da agricultura orgânica é antiga. Começa no século 19 e chega aos dias de hoje, com final feliz. Vamos dividi-la em alguns momentos importantes, para que você entenda um pouco sobre as discussões que se travaram, ao longo dos anos, em torno do assunto.

Até os meados do século XIX, o descanso da terra e a utilização de esterco eram as únicas receitas conhecidas para a recuperação das áreas agrícolas, eram as maneiras que os agricultores utilizavam para recolocar o solo em condições de produzir. Foi quando um pesquisador alemão, Justus von Liebg, descobriu o efeito fertilizante do nitrogênio sobre as plantas, depois do potássio e do fósforo e de mais alguns micronutrientes. Foi uma revolução sem precedentes. Num terreno cansado, uns poucos quilos de adubos químicos podiam fazer aquilo que o descanso levaria anos para conseguir ou que exigiria toneladas de esterco ou de esforço humano. Mas nem todos concordaram com os novos métodos.

Alguns setores científicos rejeitaram a utilização dos adubos químicos, formando as escolas de agricultura orgânica que temos até hoje.

Na primeira metade do século 20, surgiram eminentes pesquisadores, médicos e filósofos, pesquisando e propondo métodos e práticas para o incremento da fertilidade dos solos de forma orgânica, rejeitando a utilização desses novos adubos químicos, que estavam sendo utilizados. Seus trabalhos renderam bons frutos. Cada qual atuou a seu

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modo, em seus diferentes países, surgiram os seguidores, criaram-se escolas e institutos, desenvolvendo a fundamentação científica que embasa as práticas atuais da agricultura orgânica.

Grandes vertentes de pensamento formaram-se: a da agricultura biodinâmica, a biológica, a orgânica, a natural. Todas se reúnem hoje, num só movimento, sob a denominação de agricultura orgânica. Em 1924, o filósofo austríaco, Rudolf Steiner, apresentou uma visão alternativa de agricultura, baseada na ciência espiritual da antroposofia, aos agricultores que se preocupavam com o rápido declínio das lavouras e criações submetidas às tecnologias modernas e à química, lançando os fundamentos do que seria a agricultura biodinâmica.

Nela, o agricultor procura fazer de sua propriedade um organismo integrado, com entrada mínima de recursos de fora da propriedade; utiliza preparados homeopáticos para vitalizar as plantas e estimular o seu crescimento. As ideias de Steiner foram difundidas para vários países do mundo, com a colaboração de outros pesquisadores. Nos dias atuais produtos biodinâmicos são comercializados com o selo da Associação Demeter, sediada na Alemanha e que é representada no Brasil pela Associação Biodinâmica.

Alguns anos mais tarde, nas décadas de 30 e 40 - o inglês Sir Albert Howard dá início a uma das mais difundidas correntes do movimento orgânico, a da agricultura orgânica. Sir Howard trabalhou com pesquisas na Índia durante 40 anos, publicando obras relevantes, defendendo a não utilização de adubos artificiais e, particularmente de adubos químicos, destacando a importância do uso de matéria orgânica na melhoria da fertilidade e vida do solo e que da fertilidade natural do solo dependia a resistência das plantas a pragas e doenças. No final da década de 40, nos Estados Unidos, Jerome Inving Rodale, influenciado pelas ideias de Howard, fundou um forte movimento em prol da agricultura orgânica. O Rodale Institute realiza pesquisa, extensão e ensino em agricultura orgânica até os dias de hoje.

Após os modelos criados por Steiner e Howard, também no início dos anos 30, outro biologista e homem político, Hans Muller, trabalhou na Suíça em estudos sobre fertilidade do solo e microbiologia, criando a agricultura biológica. Esse movimento fez numerosos adeptos, destacadamente na França (Fundação Nature & Progrès), na Alemanha (Associação Bioland) e na Suíça (Cooperativa Muller). Dentro dessa tendência, cabe destacar ainda a participação de dois pesquisadores franceses considerados como personagens-chaves no desenvolvimento científico da agricultura orgânica. O primeiro é o pesquisador Claude Aubert, que publicou L’Agriculture Biologique ou “A Agricultura Biológica”, em que destaca a importância de manter a saúde dos solos para melhorar a saúde das plantas e, em consequência melhorar a saúde do homem. O segundo personagem importante é Francis Chaboussou, que publicou em 1980, Les plantes malades des pesticides, traduzido para o português como “Plantas doentes pelo uso de agrotóxico: a teoria da trofobiose”. Sua obra mostra que uma planta em bom estado nutricional torna-se mais resistente ao ataque de pragas e doenças.

Outro ponto que o autor destaca é que o uso de agrotóxicos causa um desequilíbrio nutricional e metabólico à planta, deixando-a mais vulnerável e causando alterações na qualidade biológica do alimento.

Outra corrente importante do movimento orgânico é a da agricultura natural, surgida em meados da década de 1930, com o filósofo japonês Mokiti Okada que ensinava que a purificação do espírito deve ser acompanhada pela purificação do corpo, daí a necessidade de evitar os produtos tratados com substâncias tóxicas. Suas ideias

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foram reforçadas e difundidas internacionalmente pelas pesquisas de Masanobu Fukuoka, que defendia a ideia de artificializar o menos possível a produção, mantendo o sistema agrícola o mais próximo possível dos sistemas naturais. Na Austrália, essas ideias evoluíram nas mãos do Dr. Bill Mollison e deram origem a um novo método conhecido como permacultura.

O avanço desses movimentos de agricultura orgânica e das suas repercussões práticas foi barrado, a princípio, em função do forte lobby da agricultura química, ligada a interesses econômicos expressivos. Além dos adubos, outro tipo de produtos químicos, os “cidas” - inseticidas, fungicidas e herbicidas - que conseguem matar os insetos, os fungos e as ervas daninhas que incomodam os agricultores, haviam sido desenvolvidos e estavam sendo comercializados e utilizados por todos.

O que ocorreu é que as tecnologias que tinham sido desenvolvidas durante as Guerras Mundiais foram vistas como muito úteis para a produção agrícola. Por exemplo: o produto químico nitrato de amônio, que era usado como munição, se tornou um fertilizante eficaz; os organofosforados usados na fabricação de gás foram utilizados mais tarde como inseticida; a partir do agente laranja utilizado como desfolhante na Guerra do Vietnã, desenvolveram-se os herbicidas, que controlam as plantas invasoras das culturas. Abriu-se espaço para um novo e lucrativo mercado. Com esses recursos, as propriedades agrícolas começaram a obter produções incríveis. A química dava ao homem um poder imenso diante das adversidades da natureza que, por séculos, fizeram parte do dia-a-dia da vida no campo. Tudo muito fácil e muito simples: se a terra está cansada, não é preciso recuperá-la, basta aplicar adubo químico na planta; se a formiga aparece, você joga veneno na lavoura; se é doença de folha, aplica-se o fungicida. Esses produtos passaram a ser utilizados em larga escala, a agricultura tornou-se completamente dependente da indústria de agroquímicos.

A utilização de inseticidas se expandiu inicialmente nos países industrializados, já sendo corrente no final da década de 1950 nos EUA, na Europa Ocidental e no Japão. Ocupados esses mercados, a expansão foi orientada para os países pobres, sobretudo para aquelas culturas que pudessem pagá-los. No Brasil, a grande expansão do uso de inseticidas ocorreu apenas nos anos de 1970, vinculada ao crédito rural subsidiado, quando a liberação do crédito foi condicionada à utilização dos agrotóxicos.

A consciência ecológica

No início dos anos 1960, a publicação do livro Silent Spring, em português “Primavera Silenciosa”, de Rachel Carson, chamou a atenção da opinião pública para os danos que a utilização de inseticidas estava causando ao ambiente, inclusive a grandes distâncias das áreas de aplicação.

Nas décadas de 1970 e 1980, sucedem-se as constatações da poluição generalizada no planeta e as consequentes ameaça de extinção de vários animais como os ursos polares no Ártico e exaustão iminente das reservas de importantes recursos naturais. A poluição dos ecossistemas havia atingido tais proporções que ameaçava as bases de sustentação da vida.

A contaminação das águas doces e dos oceanos, a diminuição da camada de ozônio, o comprometimento das cadeias tróficas, os resíduos de agrotóxicos no leite materno e na água das chuvas, as chuvas ácidas, tudo isso não eram mais especulações ou alarmismo, mas fatos concretos e devidamente documentados. A agricultura, em

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particular, tornara-se a maior fonte de poluição difusa do planeta. A situação era claramente insustentável.

Para os organismos internacionais, especialmente as Nações Unidas, a postura predominante até o início dos anos 1970 era a de que toda a contestação ao modelo agrícola convencional era improcedente. Contudo, o acúmulo de evidências em contrário foi obrigando a uma mudança da postura oficial. Na sequência de Conferências da Organização das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, em 1972, 1982 e 1992, foi se tornando cada vez mais evidente que tanto o padrão industrial quanto o agrícola precisavam de mudanças urgentes. Com a consciência ecológica, nos anos 1980 e 1990, a proposta de uma agricultura sustentável ganha força, entre os produtores e os consumidores e governos. Para o grande público, até o final da década de 1970, o termo ecologia não existia. Com a crescente conscientização da magnitude dos problemas ambientais, o termo passou a ser reconhecido com facilidade, sempre associado à preservação ou recuperação do meio ambiente e à saúde das pessoas.

Os produtos orgânicos, por serem identificados como ecológicos, começaram a ser muito bem aceitos pelo mercado e as iniciativas de produção orgânica passaram a ser muito bem sucedidas.

No Brasil se diversificaram os setores interessados nos métodos orgânicos. Na década de 1970, eram quase que exclusivamente os alternativos. Na década de 1980, somaram-se os movimentos ligados à agricultura familiar, e, em parte, o movimento ambientalista. A partir de meados da década de 1990, o interesse mais evidente passou a vir do mundo empresarial, especialmente de supermercados e de produtores rurais mais capitalizados.

Como saber se um alimento é orgânico

O consumidor não conseguiria pessoalmente visitar as propriedades agrícolas para verificar se os alimentos que se dizem orgânicos foram produzidos segundo critérios realmente ecológicos. Para fazer isso, existem instituições chamadas de “certificadoras”, ligadas às Associações de Produtores.

As certificadoras orientam os produtores interessados para que tomem conhecimento das “normas” de produção orgânica. Seus inspetores visitam regularmente as propriedades agrícolas, verificando o cumprimento dessas normas e se constatarem que elas foram realmente cumpridas, autorizam aos produtores que utilizem na embalagem do seu produto o “selo de qualidade” da certificadora. Existe um contrato obrigando as duas partes: um lado cumpre as normas, o outro lado inspeciona e certifica. De maneira que não basta que estejam impressas numa embalagem as palavras Produto Orgânico, Produto Natural, Ecológico ou qualquer adjetivo semelhante, para garantir ao consumidor o que se está dizendo. A única certeza do consumidor são os selos das certificadoras, cujos inspetores de fato, acompanharam todo o processo produtivo daquela banana, alface, palmito, cacau, açúcar, café, geleia. Se você for comprar numa feira de produtores orgânicos, não é preciso procurar pelo selo da certificadora. Todos os produtores que estão ali vendendo os alimentos estão sendo inspecionados pela associação responsável pela organização da feira.Como se produz um alimento orgânico

Para a agricultura orgânica, a regra número um é a de não agredir a natureza, mas trabalhar em harmonia com ela. Isto porque a natureza é um sistema equilibrado, no qual

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tudo se relaciona, e, toda a vez que você mexe com ela, os problemas aparecem adiante, é meio como uma “bola de neve”, uma reação em cadeia. É muito fácil entender o que é um sistema equilibrado: é como o motor de um carro novo, zero quilômetro. Cada peça se relaciona com outra de maneira perfeita. É só sentar na direção, ligar o carro e vamos embora. Experimente tirar um parafuso e andar alguns quilômetros. Você vai perceber que algo não está funcionando bem, daqui a pouco o carro pode até parar até de funcionar.

Assim é a natureza. Nela tudo funciona em harmonia. Quando uma árvore velha morre e cai no meio de uma floresta, rapidamente começam a nascer plantinhas rasteiras que criam condições para sementes de árvores germinarem - as primeiras árvores criam condições para outras maiores, os bichinhos e os fungos decompõe a árvore que caiu e ela vira novamente terra, servindo de alimento para plantas que estão se desenvolvendo na área crescerem. Em alguns anos, a floresta se recompõe e, assim, sozinha, ela se autorregula.

Mesmo numa cidade, é fácil observar a ação da natureza. Em qualquer frestinha de chão de uma calçada, você percebe uma plantinha nascendo. É engraçado pensar assim, mas é a mais pura verdade: aquela plantinha mostra que a natureza está tentando fazer a cidade virar floresta de novo. Vamos utilizar um exemplo da agrônoma Ana Maria Primavesi, pioneira da agricultura ecológica no Brasil, explicando como se desequilibra um sistema vivo. Ela está contando para nós sobre o que acontece quando são derrubadas florestas para transformar a área em pastagens:

“... o clima da região amazônica equatorial úmida parece sobremaneira favorável à produção vegetal, sendo a prova a hileia (floresta). Mas esquece-se que o clima existe graças à mata, que, como um imenso termostato (aparelho que regula a temperatura), está evitando os extremos de temperatura. Pastagens não são termostatos e não se pode esperar a manutenção do clima amazônico após a modificação total da paisagem, trocando a mata por pastagens.”

“... Não há dúvida que a área amazônica pode ser transformada em uma paisagem cultural, porém com a conservação dos princípios ecológicos existentes! Cada modificação impensada significa uma diminuição das condições de um ecossistema extremamente delicado, muito mais delicado que o das planícies férteis, dos celeiros da antiga Grécia e Roma, que hoje estão transformados no deserto do Saara”.

Partindo desses princípios, para não incorrer no perigo de criar desertos, vamos ver que, numa propriedade orgânica, os recursos naturais estarão sempre protegidos - as nascentes, a vegetação do topo dos morros, as matas da beira dos rios e córregos (matas ciliares). Nunca serão utilizados os venenos, que matam os animais.

Para a proteção do solo será utilizado o preparo mínimo, isto é, revolvê-lo o menos possível e de maneira adequada, para não ocorrer perda do solo por erosão (caem as chuvas e não penetram no solo como seria o normal, mas escorrem em enxurradas levando a terra embora) e também será tomado o cuidado de mantê-lo sempre protegido do sol e da chuva, com palhadas (cobertura morta) ou , com plantas (cobertura viva).

As recomendações mais básicas são:

1. Utilize cultivos adaptados às condições locais de temperatura, chuvas, altitude e solo. As plantas vão crescer naturalmente mais fortes e vigorosas.

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2. Utilize culturas resistentes a pragas e doenças, porque você não vai poder usar veneno.

3. Faça policultivo, isto é, dois ou mais cultivos plantados na mesma área. O solo vai ficar mais protegido, e ocorrerá um controle natural de pragas (uma área muito grande com uma planta somente acaba estimulando a aumento da população dos insetos que gostam de se alimentar daquela planta. Na natureza a simplificação não ocorre).

4. Faça rotação de culturas, isto é, não plante sempre a mesma coisa no mesmo lugar e não deixe os solos vazios, expostos ao sol e à chuva. Essa prática vai controlar pragas, vai proteger os solos e seus nutrientes serão mais bem aproveitados.

5. Faça pousio. Na sequência de rotação de culturas, a área é simplesmente deixada sem cultivo, em descanso, para que se recupere naturalmente mediante o crescimento das ervas espontâneas pelo período de uma estação completa de plantio - verão e inverno.

6. Faça cercas vivas, plantando árvores ou arbustos em torno da área cultivada para protegê-la dos ventos. Também servem para diversificar o ambiente.

7. Faça áreas de refúgio, plantando espécies nativas com o objetivo de criar ambiente para a proliferação de inimigos naturais dos insetos nocivos. Conserve os fragmentos de floresta existentes na região.

8. Use adubação orgânica, nunca química. Podem ser utilizados, estercos, adubos verdes, restos culturais, compostagem, biofertilizantes, pós de rochas. Trata-se de fornecer à planta adubação equilibrada, contendo todos os elementos que ela exige, porém nas proporções adequadas às suas necessidades efetivas. Tanto o excesso como a carência de um ou mais elementos rompe o equilíbrio fisiológico normal da planta, levando ao processo de diminuição da sua resistência natural. Esses materiais também servirão para alimentar a microvida do solo, muito benéfica para as plantas, mantendo-o sempre fresco e protegido.

Assim, é produzido um alimento orgânico. Não é difícil, mas exige por parte do agricultor, bastante observação e cuidado.

O preço dos produtos orgânicos tende a ser maior que o dos convencionais. No Brasil, por exemplo, os produtos orgânicos são, em média, 40% mais caros que os convencionais. Já o trigo chega a custar 200% a mais e o açúcar, 170%. De acordo com o site da Food and Agriculture Organization das Nações Unidas (ONU), isto ocorre, no mundo inteiro, por que:

o fornecimento da comida orgânica é limitado se comparado à sua demanda; os custos da produção dos alimentos orgânicas, normalmente, são maiores devido

ao grande trabalho exigido e ao fato de que os fazendeiros não produzem o bastante, de um único produto, para baixar seu custo de forma abrangente;

o manuseio do período pós-colheita de quantidades relativamente pequenas resulta em altos custos;

A FAO também observa que os preços da comida orgânica incluem não só o custo da produção, mas também uma escala de outros fatores que não existem no preço da comida produzida em larga escala e com compostos químicos, como:

melhoria e proteção ambiental e o fato de evitar futuras despesas com o controle da poluição;

padrões melhores de bem-estar dos animais; 30

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prevenção de riscos contra a saúde dos fazendeiros devido ao manuseio inadequado de pesticidas, evitando futuras despesas médicas;

desenvolvimento rural, gerando mais empregos nas fazendas e garantindo um rendimento justo e suficiente para os produtores.

A FAO acredita que, conforme a demanda da comida e produtos orgânicos crescer, inovações tecnológicas e economia de escala reduzirão os custos da produção, processamento, distribuição e comercialização dos produtos orgânicos. De acordo com o engenheiro agrônomo Iniberto Hamerschmidt, coordenador estadual de agricultura orgânica da Instituto Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater - PR), “os preços ainda são distorcidos, quando o consumidor adquire produtos orgânicos, por exemplo, em supermercados, onde a diferença entre o preço recebido pelo produtor e o preço praticado varia de 100 a 300%. Em média o produtor recebe pelo produto 20 a 30% mais do que os produtos convencionais.

Daí a nossa recomendação de que o consumidor adquira os produtos orgânicos nas feiras de produtores, lojas especializadas em produtos orgânicos e cestas oferecidas pelo produtor diretamente ao consumidor.” E, defendendo a justeza do preço que se cobra, afirma: “gostaríamos de ressaltar que o produto orgânico à nível de produção não é caro, na verdade muitas vezes, é o produto convencional que é ofertado muito barato”. A discussão sobre preço leva a outra pergunta: seria possível alimentar o mundo somente com alimentos orgânicos?

Além do preço mais alto, há outra crítica à comida orgânica: a de que não é possível atender à fome do mundo somente com esse tipo de produção. Os níveis de produtividade alcançados, que são mais baixos do que os da agricultura convencional, não dariam conta de resolver o problema da fome no mundo. Então, infelizmente não dá para prescindir dos agroquímicos. O que se costuma dizer é que é melhor morrer intoxicado do que de fome. Nem uma coisa, nem outra.

Em seu livro, “A Reconstrução Ecológica da Agricultura”, Carlos Armênio Khatounian tenta clarear o debate, avaliando que nem a agricultura orgânica, nem a convencional têm, hoje, condições de suprir uma população humana crescente, visto que:

1. A agricultura baseada nos insumos industriais das grandes corporações está destruindo a base natural da produção - produtividades elevadas, mas fugazes, a abundância imediata do presente, à custa do futuro.

2. A agricultura ecológica é ainda uma proposta que, apesar de seus grandes avanços, apenas engatinha. Representa um esforço de reconstrução em outras bases, preservando os recursos naturais de que a humanidade necessita para produzir alimentos. Ela representa o melhor que até o momento se alcançou na busca da sustentabilidade. A busca de sustentabilidade continua, considera Khatounian, e a humanidade pode equacionar esses problemas conquanto difíceis sejam e colocá-los num cronograma de mudanças, desde que assim o deseje.

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