vitor pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se...

36
uma pátria assim… such a homeland… miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:21 Page 1

Upload: others

Post on 17-Aug-2020

0 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Vitor Pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que

! " # $ % & $ ' ( %

uma pátria assim…

! " # $ % & $ ' ( %

such a homeland…

miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:21 Page 1

Page 2: Vitor Pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que

miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:21 Page 1

Page 3: Vitor Pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que

uma pátria assim…

! " # $ % & $ ' ( %

such a homeland…

miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:21 Page 2

Page 4: Vitor Pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que

5

Uma pátria assim…

São três as exposições realizadas entre Junho e Outubro2012, todas elas constituídas quase exclusivamente por pinturarecente (2006-2012).

Desta feita completa-se uma trilogia coroada por um tí-tulo que invoca uma visão abrangente da verdadeira pátria queé o quadro de referências em que nos apoiamos, e que semanifesta no conhecimento de si próprio que cada um per-segue. A desestabilização que não deixará de surgir nos mo-mentos de crise, pode levar à descoberta de valores profundossupostamente garantidos. Sabemos que são inúmeros os con-ceitos inquestionados que formam o palco em que evolui anossa passagem pela existência sempre misteriosa, inter-agindocom uma realidade de incalculáveis dimensões. O conheci-mento deste universo referencial pode dar lugar a um posi-cionamento lúcido perante as opções que constantementeactualizamos e que vão definindo a órbita em que cada umimperceptivelmente se situa. É este o sentido que transpirae transparece através dos diversos elementos conjugados natrilogia Uma pátria assim…

Os atributos do ar (14 de Junho a 30 de Julho, Galeria Bloco103, Lisboa), é dedicada a todas as culturas nativas, prenhes desabedoria e em profunda ligação com a natureza, toma o seutítulo de empréstimo a um texto do poeta peruano CésarCalvo que descreve a magia dos sons da floresta, por ondepodemos aceder a uma visão do mundo tanto mais real quantobem para além do senso comum.

Entre Julho e Setembro, sob o título Uma pátria assim…,uma série de 21 pinturas de grande formato, algumas consti-tuindo dípticos e trípticos, ocupa (5 Julho a 16 de Setembro)o grande espaço expositivo do Museu da Electricidade, Cen-tral Tejo, Lisboa. A 21 de Agosto, uma renovada montagempermite a substituição parcial dos quadros expostos e abre aoportunidade para um encontro (15 de Setembro) com a pro-fessora Raquel Henriques da Silva. Em complemento, um de-poimento em vídeo, de cerca de uma hora de duração, editadopara a exposição mas registado em 2009, procura esclarecero quadro de referências que suportam a prática criativa, po-sicionamento pessoal em relação ao processo criativo, bemcomo à função da cultura e sentido da existência em geral. É precedido por um curto documentário realizado em 1985

miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:21 Page 4

Page 5: Vitor Pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que

6 7

Vítor Pomar

Uma fileira erguida de bandeiras, corpos rasgados do vento,cores gastas do sol e da chuva, assinalam e chamam-nos aolugar de Vítor Pomar. Encontramos a sua casa-atelier num topode terreno seco. Em redor, em leve ondulado, as terras são umaenorme tela solta sobre o chão – sobre ela, os elementos sãodíspares e incertos – uma paisagem feita de restos mas ondepalpita, sem idílios nem outra poesia, a vida real do campo.

Hoje, estes pavilhões são um grande hangar: construçãoelementar, desabrigado e austero, o conjunto foi, em tempos,uma exploração pecuária. A maior parte do espaço é destinadoao trabalho de pintura. Tudo o que humaniza o lugar foi cons-truído pelo artista ou sob sua orientação: canalizações e ar-mários, portas e cortinados separadores dos espaços, estantese engenhosas grades para a suspensão e exposição das pintu-ras. Tapetes, mesas, cadeiras, almofadas e colchões, ídolos in-dianos mobilam estes volumes comunicantes; e o tempo poisasobre as coisas devagar, como se fosse apenas pó. A sala maisestimada é também a mais pequena: nela, o artista realiza osseus regulares exercícios de meditação.

No largo chão de cimento do atelier pode estar uma telaenorme ou apenas marcas desencontradas dos limites dasmuitas outras anteriormente pintadas sobre esse plano. Nessapossível tela, ainda em processo (ou dada já como acabada),surge um universo novo, organiza-se o acaso e a dispersão doselementos: cada pintura surge carregada de matéria, com a tintadisposta em gestos vigorosos que sobrepõem variadas cores.Ou, exatamente ao inverso, surge como ausência de tudo isso:esvaziamento de elementos que deixa a pintura nascer da pró-pria presença da tela crua. Em ambas as situações, Pomar pro-cura uma sobrecarga de sentidos capaz de o/nos conduzir dodesejo de libertação do desejo à própria superação dessa etapa(ainda/meramente) sensitiva.

Quase sempre, no vazio dos fundos ou no seu excesso,notamos o registo de uma frase curta, de uma palavra só: enig-mas que nos introduzem num universo de sabedoria orientaldominada pelo Zen. Podemos lê-las (em inglês e, mais rara-mente, em português) de modo a que se tornem num mantraque podemos repetir em exercícios individuais.

Ao percorrermos a tela eventualmente estendida no ci-mento, ao olharmos as que estão provisoriamente pregadas

mas só agora tornado acessível: “Portugal Revisitado, vencero bem e o mal” permite descobrir semelhanças profundas e uma certa continuidade com a situação que se vive actual-mente no país.

Finalmente, Karmamudra é a designação que convém àexposição que o Centro Cultural da Guarda acolhe entre Se-tembro e Outubro 2012, onde se invoca a dimensão simbólicaque está presente em toda a actividade humana e em parti-cular nos relacionamentos e união de energias .

Vítor Pomar   

miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:21 Page 6

Page 6: Vitor Pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que

8 9

ao longo da parede e ainda as que se suspendem nas gradescomo telões de cena, encontramos a vastidão do corpus detrabalho que permitiu selecionar as obras agora apresenta-das na Sala de Exposições do Museu da Electridade – CentralTejo, em Lisboa. Nas paredes, apenas pregadas ou já engra-dadas, e na zona de reserva, deslizando umas sobre as outras,muitas mais pinturas confirmam a pluralidade convergentedas vozes com que o artista se exprime nestas telas inéditas.De grandes e muito grandes dimensões, as obras cobrem umperíodo recente do trabalho de Vítor Pomar como pintor esurgem na continuidade da linguagem pictórica (abstrata egestual) que o definiu publicamente nos anos de regresso doseu exílio europeu, em meados da década de 1980. Referemtambém um percurso que não se fecha nem nas suas eviden-tes referências filosóficas nem nas mais reconhecíveis solu-ções plásticas. Esta libertação dos referentes acontece porcruzamento e fusão de universos: por um lado, o seu trabalhode pintor encontra-se cada vez mais longe do que o pode for-malmente ter influenciado na arte ocidental; por outro, usaessas formas reconhecíveis para comunicar com o exterior.

É evidente que a abstração expressionista e o gestualismoamericanos mantêm uma presença formal na obra de VítorPomar; mas é um diferente empenhamento do corpo e damente que preside ao seu desenvolvimento. É certo que houve,a partir de um certo momento ou mesmo no cerne da espe-cificidade e energia dos movimentos abstratos americanos,na Costa Oeste e também na Costa Leste, simpatia evidentee integração significativa de elementos formais e performati-vos (a escrita caligráfica), poéticos e ideológicos (o budismozen) das filosofias e artes orientais. Raramente esse contactoe essa influência passaram a integrar a totalidade das ações e opções de vida e a justificar a obra dos artistas, mas VítorPomar foi dos que radicalizou a relação. Porém, mantém asua obra à vista dos modelos ocidentais: trabalha no conhe-cimento da história da arte eurocêntrica, suas técnicas, for-matos e modelos de ruptura vanguardista. Ele sabe que só a partir desses pontos de referência pode ser avaliado pelopúblico e crítica generalista ou especializada, ignorantes dadensidade específica do vasto pensamento budista. Podemosassim dizer que, para além do núcleo de subjetividade quefecha qualquer a obra de arte à partilha total (e, ao mesmotempo, a torna aberta à pluralidade das interpretações indi-

viduais) há, para o trabalho de Vítor Pomar, um território adicional de desentendimento – mas também um territóriocrescente de liberdade.

O artista usa numerosos media: desenho e pintura, vídeo,fotografia e montagem fotográfica constituem modos diver-sos de um discurso que, do mesmo modo que pretende em-penhar corpo e mente, cada vez mais também procura fundiro verbal no visual (ou sustentar o visual no verbal). E ambi-ciona fazê-lo até um patamar ideal de anulação de graus e níveis de interpretação e intervenção. Esses níveis são simul-taneamente individuais (busca da perfeição interior) e públi-cos (pensados como alertas cívicos e políticos): Pomar buscasentidos para o individual e o colectivo. A inscrição de pala-vras-chave, mantras ou frases programáticas nas telas e osnumerosos textos de reflexão e intervenção que escreve edifunde, muitas vezes assumindo o carácter de manifestospolíticos, completam o perfil da produção de Vítor Pomar:abstrata e mental, intensamente física e gestual, cívica e es-piritual, assume as dimensões de verdadeiro programa depintura mural.

João Pinharanda

miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:21 Page 8

Page 7: Vitor Pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que

11

Assim mesmo

Uma pátria assim... não é uma pátria entre outras, pois é apátria sem dimensão nem conceito do entretecer da vida na pro-fusão de formas mutantes, que umas das outras germinam nasuperação do real pelo possível. Do mesmo modo esta não éuma exposição entre outras, pois o que nela perpassa e se mos-tra é a explosão do próprio real – e com ela, da arte e do artista –no súbito acordar da consciência numa liberdade sem apoios.Estes vinte e um quadros são a cintilação desse despertar cujaausência de referências e rotas não deixa de ser sugerida pelalinguagem da via com que o autor mais convive na exacta medidaem que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que se convencionou chamar budismo.

Em pinceladas cuja intensidade as apaga, numa pinturacom a dimensão sem-dimensões do espaço da mente que vêtudo, livre da fixação em alguma coisa (fig. 15, 19), Vítor Pomartransparece a não-dualidade dos opostos que redime de sécu-los de devaneio e reclusão no uno e no múltiplo. Esta exposi-ção é um convite a uma iniciação da consciência, a um trânsitoda diversidade das formas e dos elementos para o fundo semfundo que em todos se abre, como se assume nas palavras queacompanham o quadro “Sem título” (fig. 4). E isso vai do polí-tico ao espiritual, transgredindo todas as fronteiras, mediaçõese arquivos da experiência. É assim que tudo se comuta e trocade posição. A ordem rígida torna-se caótica e só a sublevaçãocontra ela a restaura, no quadro de um universo onde caos ecosmos se subvertem num caosmos, como sugere “Estado dedireito, estado de sítio” (fig. 1).

Mas a política do mundo é inseparável do puro gozo deexistir, que se escuta em “CHUAC!” (fig. 2), beijo que os amantes e as divindades tântricas dão de olhos nos olhos e cujo arqué-tipo é o Buda primordial, figurado nu em união íntima com asua par, símbolo da não separação entre vacuidade – ou espaçoaberto da consciência, livre de sujeito e objecto, identidade ealteridade – , clara aparição dos fenómenos e beatitude.

Este beijo é na verdade sem lábios, flor dessa transmuta-ção da paixão que a “Tulipa” (fig. 3) evoca, ela que segundo alenda persa nasceu das gotas de sangue derramado por umaamante. Toda a flor, como no Oriente o lótus, simboliza a ma-triz aberta da mulher, da consciência e do universo, funda,ampla e vazia como o espaço.

miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:21 Page 10

Page 8: Vitor Pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que

1312

É nessa matriz que todos os fluxos individuais de cons-ciência criam colectivamente os mundos que percepcionamcomo reais e que ilusoriamente supõem dotados de umaexistência inerente e objectiva, não reconhecendo a co-auto-ria disso que supõem exterior, como prestidigitadores es-quecidos de o ser. Nesse sentido “A realidade é mágica” (fig. 5),pois nela a cada instante se plasma o fundo informe do pos-sível nas formas sempre cambiantes que a mente lhe dá eque nunca se reificam como coisas sólidas, podendo a cadainstante metamorfosear-se pelo exercício poético da imagi-nação e desvanecer-se como entidades substanciais no sú-bito despertar da consciência. O que este quadro e toda aexposição praticam e propõem é na verdade um caminho domeio, equidistante da consideração do mundo como real ouirreal, como na visão búdica de um mundo desprovido de essência mas claramente aparente.

“O universo é uma anedota” (fig. 6). Na linha de Shakes-peare, em que a vida não é mais do que “um conto / Contadopor um idiota, cheio de som e fúria, / Que nada significa”(Macbeth), também aqui, no despertar da consciência para acomum vacuidade de si e do mundo, para a ausência de sujeitoe objecto, para a ficção de eu e não-eu, desaparece todo ofundamento dos juízos sobre o mundo e a vida que estrutu-ram as convenções morais e culturais, bem como a aparenteseriedade e normalidade da percepção da realidade e daspráticas individuais e sociais. Constatada a ausência de cen-tro e periferia, nada há a que se agarrar nem ninguém para seagarrar e, dissipado o medo do reconhecimento fruitivo dessaliberdade sem sujeito, um riso caósmico floresce espontanea-mente. Se o Buda Śakyamuni, o Buda histórico, sorri enigmati-camente, qual a Gioconda de Leonardo da Vinci, já Longchenpa,outro Buda tibetano, rebenta de riso ao reconhecer a nãoexistência de tudo o que se tem por absolutamente real, riabertamente ao contemplar a dissolução de si e de todos osfenómenos no “espaço vazio”: “Ah! Ah! Rebento de rir perantetamanha maravilha como esta !”1. Este riso ecoa o do próprioBuda primordial, que, n’O Tantra da Pilha de Jóias, “vendo omodo pelo qual todos os fenómenos emergem continuamenteao mesmo tempo que nada são em absoluto, se maravilhouperante si mesmo. As suas próprias grandes gargalhadas – pro-vocadas pelo seu divertimento consigo mesmo – surgiram na-turalmente da sua garganta”2.

“Moral da história” (fig. 7) ? Talvez a de que tudo seja umahistória, nem moral nem imoral. Como sabiamente diz VítorPomar, a história é “antologia da ilusão, sempre a reboque dosfactos e da memória”, sempre refém daquilo cuja realidadeaparente não resiste à análise que não lhe preserva qualquerrealidade inerente, pois os factos, como a palavra indica, sãona verdade feitos e ficcionados pela própria memória, funçãomental que recria os acontecimentos na versão que mais sa-tisfaz interesses presentes projectados no passado e no fu-turo e por isso mesmo alienados da única emergência real, a de cada instante.

Nada contradiz que, ao mesmo tempo, tudo isto seja ex-tremamente sério: “ISTO não é uma brincadeira” (fig. 10). Comoadverte o autor: “Cada momento é um instante de crise, emque tudo se ganha ou se perde e em que nada acontece”. O quea cada instante se ganha ou perde é a possibilidade de ver queem verdade não há nada nem ninguém para ganhar ou perdere que nada acontece em toda a maravilhosa aparição do mundo,o que a cada instante se ganha ou perde é a possibilidade delivrar as asas do riso do seu enclausuramento no denso e me-lancólico torpor da seriedade. ISTO não é efectivamente umabrincadeira, pois ISTO é o Despertar, desde que isto não sejaseparado de aquilo: “Isto e Aquilo” (fig. 16). Nada é em si e porsi mesmo, tudo entre-é, e nem sequer sabedoria e despertar[se] podem divorciar-SE da ignorância e sono/sonho da cons-ciência. A lógica disjuntiva de matriz aristotélica é transcen-dida no paradoxo que ao limite induz o silêncio. Como emNagarjuna, em que a redução ao absurdo de todas as possibi-lidades de juízo ontológico – é, não é, é e não é, nem é nemnão é – desemboca na pacificação dessa avidez mental que ali-menta miríades de doutrinas, impedindo a seriedade do(sor)riso libertador de toda a seriedade: “Abençoada a pacifica-ção de todo o gesto de apropriação, a pacificação da prolife-ração das palavras e das coisas”3.

Quando se pacifica essa apropriação deslocada da mãoque se fecha para a mente que agarra (cf. uma etimologia pos-sível de “conceito”, patente no Begriff alemão), emerge aquiloa que não se pode escapar: a “Glória” (fig. 8), “Uma dissoluçãona pura felicidade” (fig. 9) da consciência não-dual, que reco-nhece a cada instante o mundo como o jogo mágico de per-cepções/ aparições evanescentes sem interior nem exterior,a espontânea dança do intemporal Despertar de tudo, onde

miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:21 Page 12

Page 9: Vitor Pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que

14

criação, consciência lúcida e beatitude são inseparáveis. Po-demos aprender isto nos Tantras ou no Dzogchen tibetanos,mas melhor será experimentá-lo aqui e agora, nesta pinturainseparável do “Céu encarnado (!?)” (fig. 11) de uma paixão não--dual que, tal o amor camoniano, “é fogo que arde sem sever” e não consome senão a ignorância: esse não-reconheci-mento de que “Todas as coisas são completas e evidentes”(fig. 12) que se dissolve no preciso instante em que compren-demos que também ele integra a Grande Perfeição ou Com-pletude (Dzogchen) de tudo. O mais ínfimo fenómeno é oflorir da totalidade, que o contém e nele se contém, o infini-tamente grande é o infinitamente pequeno e vice-versa, o in-finito abre-se em cada poro da palma da mão (William Blake)e cada percepção é o próprio júbilo do Despertar: “EMAHO”(fig. 13), palavra sânscrita e exclamação tibetana que expressamaravilhamento e regozijo.

Consentida a morte do ego – “La mort consentie” (fig. 14)– , qual coágulo de ilusão no fluxo da vida ou bola de sabãona transparência do espaço, desvelam-se todos os “OutrosMundos” (fig. 17) da experiência não-dual e trans-cultural, cruza--se o “Impossível portão” (fig. 18) do não antes nem depois, donão ir nem vir, do não lá nem cá. A consciência chega a casa a cada instante, na tremenda simplicidade de nada conceber.Isso é “Aurora” (fig. 20), desvelamento do que não nasce nemmorre, ressurreição em vida de haver vida e morte, despertarde haver despertar e quem desperte.

Despidas todas as versões de si e das coisas, todas asfantasias do apego e da aversão, fica o tal qual. O sem tirarnem pôr. O mais óbvio e trivial.

O puro acontecer de tudo. Assim mesmo. Sem qualquertítulo. “Nada de especial” (fig. 21).

Paulo BorgesFilosofo, Poeta, Escritor, Activista

1 Cf. Longchen Rabjam, The Precious Treasury of the Basic Space of Phenomena,edição bilíngue tibetano-inglês, Junction City, Padma Publishing, 2001, p. 119.2 Cf. Id., A Treasure Trove of Scriptural Transmission. A commentary on The Precious Treasury of the Basic Space of Phenomena, Junction City, Padma Publishing, 2001, p. 342.3 Nagarjuna, Madhyamaka-Ka# rika# s, 25, 24.

uma pátria assim…

! " # $ % & $ ' ( %

such a homeland…

miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:21 Page 14

Page 10: Vitor Pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que

16

— ! —

Estado de direito, estado de sítioRule of law or state of siege

Qual é qual?O estado de Direito e o estado de sítio parecem confundir-se.O estado de direito é capaz das maiores atrocidades, sempre

invocando seus poderes para justificar acções que só podem ser classificadas como terrorismo de estado.

Por outro lado, aquilo a que se chama de estado de sítio pode sempre ser visto como uma manifestação

de vida e saúde das populações oprimidas.Mau será quando deixarem de haver expressões de revolta

e protesto contra a ordem estabelecida, sempre que esta ignora e oprime a maioria da população.

Which is which?Rule of law and state of siege seem to overlap.

Rule of law is capable of the greatest atrocities, and always invokes its powers to justify actions which can only

be classified as state terrorism.On the other hand, what is called state of siege can always be seen as a manifestation of the life and health of oppressed populations.

Woe be the day when there are no expressions of revolt and protest against an established order that ignores and oppresses

the majority of the population.

miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:21 Page 16

Page 11: Vitor Pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que

18

— " —

Chuac! para Inês N.Chuac! to Inês N.

Pode ser entendido como uma expressão de encantamento,regozijo e alegria pela pura existência, actividade esta que

pode constituir a principal ocupação do iogui.

It can be understood to be an expression of enchantment and rejoicing for pure existence.

This may well be the yogi’s main activity.

miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:21 Page 19

Page 12: Vitor Pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que

20

— # —

( tulipa )( tulip )

As flores simbolizam a grande aventura da consciência, capaz de reconhecer a sua própria natureza, entregar-se a horizontes desmedidos que o ego ignora e desconhece.

Toda a flor pode ser sentida como um convite a essa viagem que sempre nos espera para vir ao nosso verdadeiro,

último e primordial encontro.

Flowers symbolise the great adventure of consciousness, able to recognise their true nature and bask in the distant

horizons that the ego ignores and is unaware of.Every flower may be felt to be an invitation to the journey which

always awaits us for our true, ultimate and primordial encounter.

miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:21 Page 20

Page 13: Vitor Pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que

22

— $ —

Sem títuloUntitled

A utilização de elementos diversos que se combinam e relacionam, põe a questão da unidade que está para

além da diversidade aparente de todas as coisas.Diz-se que a não-dualidade nunca deixou de existir, apenas

perdemos a visão da realidade profunda dos fenómenos e da existência.O espectador é aqui convidado a fazer um exercício que consiste

em ver a unidade formada pelos dois elementos em presença, É uma visão dinâmica, que após ter saltado de um elemento

para outro, terá de reconhecer a peça como um todo.

The use of different elements which combine and relate poses the question of the unity which lies beyond the apparent diversity all things.

It is said that non-duality has never ceased to exist – we have just lost sight of the profound reality of phenomena and existence.

Here, the spectator is invited to an exercise of seeing the unity formed by the two elements which are present there.

It is a dynamic view which must recognise the piece as a whole once it has jumped from one element to another.

miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:21 Page 22

Page 14: Vitor Pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que

24

— % —

A realidade é mágica Magical display

O espaço bi-dimensional da pintura tem uma natureza que aponta directamente para além da diversidade e da dualidade.

A realidade, a nossa percepção do mundo, surge então como uma representação mágica,

mental mas não encapsulada no pensamento discursivo.Por sua vez, o mundo passa a ser reconhecido como

processo impermanente e em inter-dependência, donde resulta uma saudável alternativa à reificação

a que estamos constantemente expostos.

The nature of the two-dimensional space of painting, points directly beyond diversity and duality.

Reality, our perception of the world, then emerges as a magical display, which is mental but not encapsulated in discursive thought.

In its turn, from then on the world is recognised to be impermanent and interdependent,

resulting in a healthy alternative to the reification to which we are constantly exposed.

miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:21 Page 24

Page 15: Vitor Pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que

26

— & —

O universo é uma anedotaThis cosmic joke

Em que a ignorância e a sabedoria não são distintas mas partilham uma identidade profunda.

In which ignorance and wisdom are not separate entities, but share the same profound identity.

miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:21 Page 26

Page 16: Vitor Pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que

28

— ' —

Moral da HistóriaThe Moral of the Story

A história como antologia da ilusão, sempre a reboque dos factos e da memória.

De facto, as certezas são frágeis, os factos não têm existência própria e a memória troca-nos as voltas a toda a hora.

Ou melhor: nós não somos a nossa memória, nem sequer o nosso corpo, nem mesmo os pensamentos, sensações e emoções.

Somos uma consciência não-dual do universo, distraída na sua ilusão de existência.

History as an anthology of illusion, always coming after facts and memories.

In fact, all certainties are fragile, facts do not exist on their own and our memory is often misleading.

Or better said: we are not our memory, or even our body, and not at all our thoughts, sensations and emotions.

We are a non-dual consciousness of the universe – distracted in its illusion of existence.

miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:21 Page 28

Page 17: Vitor Pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que

30

— ( —

GlóriaGlory

Diz-se que a felicidade nos constitui, para além da superfície das coisas e do aparente desenrolar da existência.

É por isso que não lhe podemos escapar!

It is said that, we are essentially happiness which lies beyond both the surface of things and our apparently unfolding existence.

That’s why we can’t escape it!

miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:21 Page 30

Page 18: Vitor Pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que

32

— ) —

Uma dissolução na pura felicidade A totally joyful dissolution

A natureza da mente é pura criatividade, também chamada luz clara de gozo.

The nature of the mind is pure creativity – also called the clear light of bliss.

miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:21 Page 32

Page 19: Vitor Pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que

34

— !* —

Isto não é uma brincadeira! This is not a joke!

Cada instante é um instante de crise, em que tudo se ganha ou se perde e em que nada acontece.

Each instant is an instant of crisis in which everything is either won or lost and where nothing happens.

miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:21 Page 34

Page 20: Vitor Pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que

36

— !! —

Céu encarnadoRed Sky

Como um fogo que arde sem consumir, assim a nossa mente.

A fire that burns but does not consume – such is our mind.

miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:21 Page 36

Page 21: Vitor Pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que

38

— !" —

Todas as coisas são completas e evidentesEverything is self explanatory

Cada instante é um instante de plenitude.A turbulência que nos consome não tem direito de cidadania,

é necessáriamente passageira e inglória.

Each instant is an instant of plenitude.The turbulence which consumes us does not have the right to

citizenship – it is necessarily transitory and inglorious.

miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:21 Page 38

Page 22: Vitor Pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que

40

— !# —

Emaho!

Expressão de encantamento e regozijo diante do espectáculo do universo e da mente.

Expression of enchantment and rejoicing before the spectacle of the universe and the mind.

miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:21 Page 40

Page 23: Vitor Pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que

42

— !$ —

La mort consentie Consenting to death

Fazer amizade com a morte, a dor, a impermanência.O espaço luminoso da mente é o cenário único em que se produzem

todos os fenómenos com que nos confrontamos.Observados do ponto de vista dessa matriz essencial, são como nuvens, cuja natureza própria garante que se esfumarão a qualquer momento.

Making friends with death, with pain, with impermanence.The luminous space of the mind is the unique scenario in which

the very manifestation of all the phenomena we meet takes place.Observed from the point of view of this essential matrix, they are like clouds

whose very nature ensures that they will fade away at any moment.

miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:21 Page 42

Page 24: Vitor Pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que

44

— !% —

Se vês a pincelada, não vês (a pintura) IIIf you see the brush stroke, you don't see (the painting) II

É próprio do espelho reflectir todas as imagens sem interferência: desconhece apego e rejeição.

Assim é a natureza da mente que reconhece directamente todas as percepções, alheia a valores, permanece inalterável

na sua essência luminosa.

The nature of the mirror is to reflect every image without interference - it knows nothing of attachment and rejection.

Such is the nature of the mind, which directly recognises every perception, is alien to values and remains unchanged in its luminous essence.

miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:21 Page 44

Page 25: Vitor Pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que

46

— !& —

Isto e AquiloThis and That

Em que se assume que a ignorância e a sabedoria se passeiam de mão dada.

É por isso que "o caminho que nunca será percorrido, está sempre debaixo dos nossos pés".

In which we acknowledge that ignorance and wisdom go hand in hand.

That is why “the path that will never be trodden,is always under our feet".

miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:21 Page 46

Page 26: Vitor Pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que

48

— !' —

Outros Mundos (“A mente é um lago de nenúfares”) Other Worlds (“The lotus pond of the mind”)

Para além do pensamento discursivo.

Beyond discursive thought.

miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:21 Page 48

Page 27: Vitor Pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que

51

— !( —

Impossível portãoGateless gate

Em cada instante, a plenitude.

Each instant is plenitude.

miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:21 Page 51

Page 28: Vitor Pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que

52

— !) —

Se vês a pincelada, não vês (a pintura) IIf you see the brush stroke, you don't see (the painting) I

Ver é a iluminação do espírito que se reconhece como consciência não-dual do universo.

Seeing is the enlightenment of the mind which recognises itself as the non-dual awareness of the universe.

miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:22 Page 52

Page 29: Vitor Pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que

54

— "* —

Aurora

Chegar a casa.

Getting home.

miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:22 Page 55

Page 30: Vitor Pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que

56

— "! —

Nada de especialNothing special

O sorriso, aparentemente beatífico, que caracteriza a expressão atribuída aos ioguis realizados,

está longe de ser apenas uma expressão de bem aventurança ou mesmo indiferença pelo mundo 'real', habitado pelo comum dos mortais.

Ver as coisas 'como elas são': qual arco-iris, apenas produto duma conjugação de factores,

eles mesmos carentes de existência própria.Júbilo total, apenas denunciado pela doçura daquele sorriso.

The seemingly beatific smile, which is the characteristic expression of realised yogis,

is far from being a mere expression of bliss or even of indifference to the “real” world inhabited by mere mortals.

Seeing things “as they are”:just as a rainbow is produced by a combination

of factors which do not exist in themselves.Total jubilation, manifesting in the sweetness of that smile.

miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:22 Page 56

Page 31: Vitor Pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que

59

Such a Homeland…

Three exhibitions will be held between June and October2012, mainly showing recent paintings (2006-2012).

The title of such a trilogy invokes a broad vision of whatcould be a true homeland – the frame of reference that sup-ports us and is manifested in the self-knowledge sought byus all. The destabilization always present in moments of crisiscan lead to the discovery of profound values once taken forgranted. There are countless unquestioned concepts on whichwe stand, unknowingly forming the stage on which our passageevolves through an ever mysterious existence, interacting with areality of incalculable dimensions. Acknowledging this self-ref-erential universe should stimulate a lucid attitude towards theoptions we constantly actualize, thus driving the imperceptibleorbit that carries us. This is the meaning that transpires fromthe various elements combined in the trilogy Such a homeland…

The attributes of air (14th June to 30th July at the GaleriaBloco 103, Lisbon) is an exhibition dedicated to all native cul-tures, replete with wisdom and deeply connected to natureas they are. The title is borrowed from the text of a Peruvianpoet César Calvo, who describes the magical sounds of theforest through which we can attain a vision of the world asreal as it is beyond common sense.

Between July and September, under the title Such a home-land…, a series of 21 large format paintings, some of whichare diptychs and triptychs, will occupy the large exhibitionhall of the Museu da Electricidade, Central Tejo, Lisbon (be-tween 5th July and 16th September). On 21st August, the exhi-bition will be set up again, allowing some of the exhibitedpaintings to be substituted and offering the opportunity tomeet Professor Raquel Henriques da Silva on 15th September.The exhibition is complemented by a video statement of aboutone hour, edited for this occasion but originally recorded in2009. It seeks to explain the frames of reference supportingcreative practice, the artist’s personal attitude towards thecreative process, and also the function of culture and themean ing of existence in general. It is preceded by a short doc-umentary made in 1985 but only now available for the firsttime: “Portugal Revisited, overcoming good and evil”. Greatsimilarities and a certain connection with the situation cur-rently experienced in Portugal can be found in the film.

miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:22 Page 59

Page 32: Vitor Pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que

6160

Vítor Pomar

A row of raised flags, torn by the wind and faded by thesun and the rain, signal and call us to Vítor Pomar’s space. Wefind his studio-house at the top of a dry piece of land. In thesurrounding, slightly undulating terrain the land is an enor-mous canvas loose on the ground – with unrelated and un-certain elements: houses with no history or intimacy, roadsbuilt without care or design, old cars and old furniture, trailsof domestic rubbish and rubble, walls without purpose whichform the edges of sporadic cultivation – a landscape createdfrom waste, where the real life of the countryside is not idyl-lic or poetic, but pulsates with life.

Today, these pavilions are one large hangar: a simple, un-sheltered and austere collection of buildings which were oncepart of a cattle farm. Most of the space is used for Pomar’spainting work. Everything that humanises the place has beenbuilt by the artist or with his guidance: plumbing and cup-boards, doors and curtains which separate the differentspaces, shelves, and ingenious bars for hanging and exhibitingpaintings. Carpets, tables, chairs, cushions, mattresses and In-dian idols furnish these communicating spaces; and time set-tles slowly on everything as if it were just dust. The roomwhich is most cherished is also the smallest: it is in this roomthat the artist does his daily meditation exercises.

Lying on the wide cement floor of the atelier, may be anenormous canvas or just the random marks of the edges ofthe many others which were painted there before. A new uni-verse emerges on this possible canvas (still in progress or al-ready considered to be finished), and order is brought to therandom and the dispersal of elements: each painting emergescharged with material, and the paint is applied with vigorousgestures, with various colours painted over one another – orexactly the opposite happens, a painting emerges as a lack ofall this: an emptying of elements which allows the paintingto be created from the actual presence of the raw canvas it-self. In both situations Pomar seeks an sensory overload whichcan lead him or us from the desire to be free of desire to theactual overcoming of this (still/merely) sensitive stage.

In the emptiness of the backgrounds or in its excess, wealmost always notice the writing of a short phrase or of asingle word: enigmas which introduce us to a universe of

Finally, Karmamudra is the name of the exhibition to beheld at the Centro Cultural da Guarda between Septemberand October 2012. It invokes the symbolic dimension presentin every human activity and particularly in relationships andthe union of energies.

Vítor Pomar

miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:22 Page 60

Page 33: Vitor Pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que

6362

He knows that it is only from these points of reference thathe can be appraised by the public and generalist or specialisedcritics who are ignorant of the specific density of the vastbody of Buddhist thinking. We can say that, as well as thecore of subjectivity which prevents the total sharing of anywork of art (and at the same time, makes it open to a multi-ple individual interpretations), for Vítor Pomar’s work thereis an additional area of misunderstanding – but also a grow-ing area of freedom.

The artist uses numerous mediums: drawing and paint-ing, video, photography and photographic montage are thevaried means he uses for a discourse which, just as it seeks adedication of mind and body, also increasingly seeks a fusionof the verbal and the visual (or the support of the visual inthe verbal). His objective is to develop this up to an ideal levelat which degrees and levels of interpretation and interven-tion are neutralised. These levels are simultaneously individ-ual (the search for inner perfection) and public (intended ascivic and political warnings): Pomar seeks meanings for theindividual and the collective. The inscription of key words,mantras or programmatic phrases on the canvases, and thenumerous texts of reflection and intervention which he writesand publicises, which often assume the nature of politicalmanifestos, complete the description of the production ofVítor Pomar: abstract and mental, intensely physical andgestural, civic and spiritual, it assumes the dimensions of a true programme of mural painting.

Joao Pinharanda

Eastern wisdom called Zen. We can read them (in Englishand more rarely in Portuguese) and turn them into a mantrawhich we can repeat in individual exercises.

As we look over the canvas which may be stretched outon the cement, at those which have been nailed temporarilyalong the wall and those hanging from the bars like largescreen backdrops on a stage, we discover the vast body ofwork which made it possible for him to select the workspresented now in the Exhibition Hall of the Museu da Elec-tridade – Central Tejo, in Lisbon. On the walls, just nailedup, or in crates, in the storage area are many more paintingswhich slide across one and which confirm the convergingplurality of the voices with which the artist expresses him-self on these unique canvases. Either large or very large, hispaintings cover a recent period of Vítor Pomar’s work as apainter and come from a continuity of pictorial language(abstract and gestural), which defined him publically duringthe years after his return from exile in Europe, in the mid1980’s. They also show a path which is limited neither to hisobvious philosophical references nor to his more recognis-able painting methods. This freeing from references takesplace through a crossing and fusion of universes: on the onehand, his work as a painter is increasingly distant from whatmay have formally influenced him in Western art and, on theother hand, he uses these recognisable forms to communi-cate with the exterior.

It is clear that expressionist abstraction and Americangestualism are still formally present in the work of VítorPomar; but it is developed with a different dedication of bodyand mind. It is certain that from a certain moment or evenwithin the specific nature and energy of the American abstractmovements, on the West and East coasts of the United Statesthere was an obvious liking for and significant integration offormal and performative (the writing calligraphy) and poeticand ideological (Zen Buddhism) elements of the Easternphilosophies and arts. Artists have rarely embodied this con-tact and influence in their actions and options in life and inthe raison d’être of their work, but Vítor Pomar is one artistwho has developed a close relationship with this influence.He does keep his work within sight of Western models: heworks with the knowledge of a Eurocentric history of art, its techniques, formats and avant-garde models of rupture.

miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:22 Page 62

Page 34: Vitor Pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que

65

As It Is

Such a homeland… is not just one homeland among others,for it is the homeland that knows no dimension nor conceptof the entwining of life in the profusion of mutant formswhich germinate in the overcoming of the real by the possi-ble. In the same way, this is not one exhibition among others,for what runs through it and is shown here is the explosion ofreality itself – together with art and the artist – in the suddenawakening of consciousness in a freedom without a prop.These twenty-one pictures are a twinkle of this awakeningwhose absence of references and routes is nevertheless sug-gested by the language of the path on which the authortreads, just as much as he is released from it: the path of theBuddha, the path of the Awakening of consciousness whichdoes not submit to what is conventionally called Buddhism.

Brushstrokes erased by its own intensity, in a paintingwith the dimensionless dimension of the mind’s spaciousnesswhich sees everything, free from fixations on anything (fig. 15,19), Vítor Pomar shines out the non-duality of opposites whichredeems centuries of wandering and seclusion into the oneand the many. This exhibition is an invitation to an initiationof consciousness, to a transit from the diversity of forms andelements to the bo/omless bo/om opened up in everyone,as it is acknowledged by the commentary on the painting “Un-titled” (fig. 4). And that moves from the political to the spiri-tual, transgressing every boundary, mediations and archives ofexperience. This is the way everything is commuted and swapsposition. The rigid order becomes chaotic and it is only by ris-ing up against it that restores it in the framework of a universewhere chaos and cosmos are subverted into a chaosmos, assuggested by “Rule of law, state of siege” (fig. 1).

But the politics of the world are inseparable from the purebliss of existence which you can hear in “CHUAC!” (fig. 2), a kiss that lovers and Tantric divinities give face to face andwhose archetype is the primordial Buddha, figured naked in in-timate union with his partner, a symbol of the non-separationbetween emptiness – or the open space of consciousness, freeof subject and object, identity and alterity – and a clear appari-tion of phenomena and bliss.

This is actually a kiss without lips, a flower of this trans-mutation of passion that the “Tulip” (fig. 3) evokes, as in the

miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:22 Page 64

Page 35: Vitor Pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que

6766

phenomena emerge continually while at the same time theyare nothing in absolute, marveled for himself. His own laugh-ter – provoked by his amusement with himself – arose natu-rally from his throat”2.

“The Moral of the Story” (fig. 7) ? Perhaps that everythingis a story which is neither moral nor immoral. As Vítor Pomarwisely said, history is an “anthology of illusion, always takenin tow by facts and memories”, always taken hostage by thatwhich apparent reality does not resist analysis and preservesno inherent reality, for the facts, as the word indicates, aretruly made and fictionalized by the memory itself, a mentalfunction which recreates events in the version which mostsatisfies present interests, projected into the past and the fu-ture, and therefore alienated from the only real emergence,that of each instant.

Nothing contradicts the fact that all of this is, at the sametime, extremely serious: “This is not a joke” (fig. 10). As the au-thor warns us : “Each moment is an instant of crisis, in whichall is won or lost and where nothing happens”. What is gainedor lost in each instant is the possibility of seeing that, in truth,there is nothing and no-one to win or lose and that nothinghappens in the whole marvelous apparition of the world; whatis won or lost at every instant is the possibility of freeing ourwings of laughter from the confinement in the dense andmelancholic torpor of seriousness. THIS is e0ectively not ajoke, for THIS is the Awakening, as long as this is not separatedfrom that: “This and That” (fig. 16). Nothing is in and of itself,everything is inter-being, and not even wisdom and wakeningcan be divorced from ignorance and the sleep/dream of con-sciousness. The disjunctive logic of the aristotelian matrix istranscended in the paradox, which ultimately induces silence.As in Nāgārjuna, in which the reduction to the absurd of everypossibility of ontological judgment – is, is not, is and is not,neither is nor is not – leads to the pacification of that men-tal avidity which feeds myriads of doctrines, preventing theseriousness of the smile/laugh that liberates from all serious-ness: “Blessed be the pacification of every gesture of appropri-ation, the pacification of the proliferation of words and things”3.

When this misplaced appropriation of the hand, closedto the grasping mind, is pacified (cf. A possible etymology of“concept”, which is patent in the German Begriff ), somethingemerges that one cannot miss: “Glory” (fig. 8), “A totally

Persian legend it is born from the drops of blood spilled bya lover. Every flower, like the lotus in the East, symbolizesthe open matrix of woman, of consciousness and of the uni-verse – deep, ample and empty, like space.

It is in this matrix that all individual streams of conscious-ness collectively create the worlds which they perceive as realand which they deludedly suppose being endowed with an in-herent and objective existence, not recognizing the co-author-ship of that which they suppose to be exterior, like magiciansoblivious of its own being. In this sense, “Reality is a magicaldisplay”(5), for it is in this reality that each instant forms theformless depths of the possible in the ever changing formscreated by the mind which are never reified as solid things,and which can, at any instant, be metamorphosed by the po-etic exercise of the imagination and fade away as substantialentities in the sudden awakening of consciousness. What thispicture and the whole exhibition practices and proposes is actually a middle way, equidistant from the consideration ofthe world as real or unreal, as in the Buddhist view of a worlddevoid of essence, but clearly apparent.

“This cosmic joke” (fig. 6). The line from Shakespeare, inwhich life is nothing more than “a story / told by an idiot, fullof sound and fury, / signifying nothing” (Macbeth), also here,in the awakening of consciousness for the common empti-ness of oneself and of the world, for the absence and sub-ject and object, for the fiction of I and non-I, all foundationof judgments about the world and life which structure moraland cultural conventions disappear, just as do the apparentseriousness and normality of the perception of reality andindividual and social practices. Once noticed the lack of cen-tre and periphery, there is nothing to hold on to and no oneto grab, and once dissipated the fear of the fruitful recogni-tion of such freedom without subject, a chaosmic laughspontaneously flourishes. If Buddha Śākyamuni, the histori-cal Buddha, smiles enigmatically like Leonardo da Vinci’sGioconda, Longchenpa, another Tibetan Buddha, bursts intolaughter on recognising the non-existence of everything wetake as absolutely real, and he laughs openly on contemplat-ing himself and all phenomena dissolving into “empty space”:“Ah! Ah! I burst into laughter at such wonder as this one!”1.This laugh echoes the laugh of the primordial Buddha which,in the ’Tantra of the Heap of Jewels’, “seeing the way all

miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:22 Page 66

Page 36: Vitor Pomar€¦ · linguagem da via com que o autor mais convive na exacta medida em que dela se liberta: a via do Buda, a via do Despertar da cons-ciência, irredutível ao que

6968

joyful dissolution” (fig. 9) of non-dual consciousness, which,at every instant, recognizes the world as a magical display ofevanescent perceptions/apparitions with no interior and noexterior as the spontaneous dance of the intemporal Awak-ening of everything, where creation, lucid consciousness andbliss are inseparable. We can learn this from the Tantras orin Tibetan Dzogchen, but the best thing is to experience ithere and now in this painting inseparable from the “Red Sky”(fig. 11) of a non-dual passion which, as for Camões love is “thefire which burns but cannot be seen” and does not consumeexcept for ignorance: this non-recognition that “Everythingis self-explanatory” (fig. 12) dissolves in the precise instant thatwe understand that it also includes the Great Perfection orGreat Completeness (Dzogchen) of everything. The mostminute phenomenon is the blossoming of the totality whichcontains it and is contained in it, the infinitely big is the infi-nitely small and vice-versa, infinity opens in every pore of thehand (William Blake) and each perception is the very jubilationof the Awakening: “EMAHO” (fig. 13), a Sanskrit word and Ti-betan exclamation which expresses amazement and rejoicing.

As we consent to the death of the ego – “La mort con-sentie” (fig. 14) – , that coagulum of illusion in the flow of life or ball of soap in the transparency of space, those “OtherWorlds” (fig. 17) of the non-dual, trans-cultural experienceare unveiled, and we cross the “Gateless gate” (fig. 18) of thenot before nor after, of the not going nor coming, of the notthere nor here. Consciousness comes home at every instantin the tremendous simplicity of conceiving nothing. This is“Aurora” (fig. 20), the unveiling of what is not born and doesnot die, the living the resurrection of existing life and death,an awakening from the existence of an awakening as well asof the one who awakens.

Once stripped of all versions of self and of all things, ofall fantasies of a/achment and aversion, suchness remains.As it is. The most obvious and trivial.

The pure happening of everything. Just as it is. Withoutany title. “Nothing special” (fig. 21).

Paulo BorgesFilosofo, Poeta, Escritor, Activista

1 Cf. Longchen Rabjam, The Precious Treasury of the Basic Space of Phenomena,edição bilíngue tibetano-inglês, Junction City, Padma Publishing, 2001, p.119.2 Cf. Id., A Treasure Trove of Scriptural Transmission. A commentary on The Precious Treasury of the Basic Space of Phenomena, Junction City, Padma Publishing, 2001, p. 342.3 Nagarjuna, Madhyamaka-Ka# rika# s, 25, 24.

Translation by Be/ina Meyers and Vitor Pomar

miolo VPomar 1.e$S_Layout 1 20/06/12 14:22 Page 68