visÃo vida & viagens

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Magazine VISÃO Vida & Viagens Since March 2012 that I've been collaborate with the portuguese magazine Visão Vida & Viagens. Here you can see the PDF's of past numbers.

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Page 1: VISÃO Vida & Viagens
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#41 | março 2012

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VIDA & VIAGENS

12 razões para ir ao PortoBraga com guias locaisSegredo em LisboaAlgarve totalCores do AlentejoRoteiro de ar livre

Explorar o país pelos caminhos menos habituais

DESCOBRIR PORTUGAL

Page 3: VISÃO Vida & Viagens

março 2012 # 41

06 GEOGRAFIA DAS AMIZADES Crónica de Gonçalo Cadilhe,

lista +08 IDEIAS Sugestões para fugir

à rotina

nómada14 LUÍS SEPULVEDA O escritor

chileno está de regresso com Últimas Notícias do Sul

22 LUÍS SIMÕES Aos 32 anos vai percorrer os cinco continentes a desenhar

navegador26 DORMIR A Companhia das

Culturas, em Castro Marim, um projeto turístico diferente

36 DORMIR Casa Balthazar, um chalet situado no centro histó-rico de Lisboa

metropolis42 EXPOSIÇÃO Obras de Pau-

la Rego e Bruno Pacheco na Casa das Histórias

ILUSTRAÇÃO DA CAPA: LUÍS SIMÕES

46 REDUX & REMIX O ar dos tempos, por Ana Pereira da Silva

explorador52 AR LIVRE Uma primavera

cheia de emoções60 BRAGA Com seis bracarenses

de áreas e faixas etárias diver-sas, descobrimos várias caras da cidade

78 PONTOS DE VISTA Vida e fo-tografia, por Joel Santos

84 PORTO Ideias para um fim de semana a dois ou umas mini-férias em família

96 QUO VADIS Crónica de viagem de Tiago Salazar

60 BRAGA

84 PORTO

26 ALGARVE

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4 v&V visão vida & viagens março 2012

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HÁ HISTÓRIAS QUE, QUANDO AS OUVIMOS, nos inspiram e nos de-safiam. Depois, à medida que vamos pensando nelas, motivam-nos a alte-rar planos, a tentar outras soluções, a procurar novos caminhos. A escolha da ilustração da capa desta revista é o resultado de um desses processos, iniciado quase num momento de rotina no quotidiano de uma revista de viagens: ouvir alguém que nos quer contar o seu projeto de viagem, que ga-rante ser único e original. Raramente, apesar de toda a boa vontade, essas expectativas se confirmam. Mas não foi o caso quando Luís Simões chegou à redação, com uma mala cheia de cadernos repletos de ilustrações. E pronto para contar uma história: a de uma volta ao mundo, durante cin-co anos, completamente dedicada a desenhar os lugares por onde passar, conforme se pode ler um pouco mais à frente (pág. 22).

Perante tal proposta, confesso que ainda me dividi, nos primeiros mo-mentos, entre a estupefação e a inveja, mas depressa me rendi ao apoio incondicional. E à curiosidade imensa de querer ver esses esboços a preto e branco ou a aguarela que ele for desenhando por esse mundo fora. Por isso, o desafiei, depressa, a ir para a rua e mostrar como o seu olhar pode ser a capa de uma revista que, nesta edição, quer ajudar a descobrir Por-tugal - mesmo aquele que, por vezes, está bem à frente dos nossos olhos, mas nós não o conseguimos ver. Espero, em próximas edições, perceber como ele está a olhar para outras latitudes, pessoas e paisagens. Será essa a forma de todos podermos partilhar, no fundo, de uma viagem que, no seu caso, é acima de tudo um projeto de vida. Inspirador e corajoso, como é bem preciso nos dias que correm.

OLHAR A REALIDADE

por rui tavares guedes

DIRECTOR: Rui Tavares Guedes EDITORA: Ana Pereira da SilvaTEXTOS: Ana Pereira da Silva, Célia Pedroso, Gonçalo Cadilhe, João Nauman, Joana Fillol, Joana Loureiro, Joel Santos, Miguel Judas, Pedro Justino Alves, Pedro Miguel Santos, Petra Alves, Sara Belo Luís, Tiago SalazarFOTOGRAFIA: Adriana Morais, Constantino Leite, Filipe Pombo, Joel Santos, José Caria, José Carlos Carvalho, Lucília Monteiro, Luís Barra, Pedro Loureiro, Pedro Monteiro, Vasco Célio REVISÃO: Monteiro Luís e Rui Carvalho DESIGN: Pedro Tavares CAPA: Jonas RekerILUSTRAÇÕES: Marta Monteiro MARKETING: Mónica Balsemão (Diretora), Ana Paula Baltazar (Gestora

de Produto)PUBLICIDADE: Tel.: 214 698 228 Maria João Peixe Dias (Diretora Comercial), Maria João Costa (Diretora Coordenadora), Ângela Almeida (Diretora Coordenadora

Delegação Norte), Carlos Varão (Diretor), Luís Barata, Miguel Teixeira Diniz, Rita Cunha (Contatos), Elisabete Anacleto (Gestora de publicidade), Ilda Ribeiro, Miguel Aroso (Contatos Delegação Norte), José António Lopes, (Coordenadores de

Materiais)

PUBLISHER E DIRETOR: Pedro Camacho DIRETORES ADJUNTOS: Áurea Sampaio, Cláudia Lobo, Rui Tavares Guedes DIRETOR DE ARTE: Vasco Ferreira REDACÇÃO E PUBLICIDADE: Rua Calvet de Magalhães, 242, Laveiras, 2770-022 Paço de Arcos T. 21 4698000 PRODUÇÃO: Pedro GuilherminoIMPRESSÃO: Lisgráfica

www.visao.pt

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22 v&V visão vida & viagens março 2012

PINTAR O MUNDOAos 32 anos nunca é tarde para se mudar de vida. É até a idade ideal para se iniciar uma grande aventura: percorrer os cinco continentes a desenhar Rui Tavares Guedes

nómada pessoas com mundo

LUÍS SIMÕES

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março 2012 visão vida & viagens v&V 23

S empre que a tinta preta entra no papel branco, os traços saem precisos e geométricos. E risco após risco, a imagem começa a nascer na folha do caderno. De forma sincopada, ao

ritmo do olhar, encaixando as dimensões da paisagem num espaço delimitado, de proporções equilibradas, linhas de profundidade corretas e captando uma espécie de alma que escapa aos outros transeuntes. Depois, concluída a estrutura, junta-lhe aguarelas de cores suaves, irrepetíveis na natureza, mas harmoniosas no resultado final.

É nestes momentos, sentado no chão ou encostado a uma qualquer esquina de um qualquer beco de uma qualquer cidade, que Luís Simões se sente realizado. E com uma imensa vontade de não parar, de conhecer outros lugares, de aprender novas técnicas de desenho, de partilhar as suas visões e... mudar de vida. O seu sonho - a que chamou World Sketching Tour – está prestes a concretizar-se: dentro de algumas semanas, ele vai partir, de bagagem repleta de cadernos, lápis e tintas. Com um objetivo bem definido, mas um plano que irá construindo aos poucos: «A ideia é passar um ano em cada continente, portanto, dentro de

cinco anos posso regressar... ou talvez não.»Para poder partir com esse objetivo, Luís Simões

despediu-se do seu emprego confortável como motion designer na SIC, onde estava há quatro anos, e começou a contactar os muitos outros urban scketchers que existem pelo mundo, e que conhecia através da «troca de desenhos» na internet. O plano é simples: um pouco por todo

o lado, vai ficando alojado nas casas de outros desenhadores como ele, tentando perceber a identidade de cada local e, ao mesmo tempo, aprender novas técnicas. «Este projeto define-se em quatro palavras: viajar, conhecer, aprender e desenhar», diz, com uma convicção a toda a prova.

Percebe-se que há nele uma ânsia por partir e poder descobrir outras culturas, povos e estilos de vida. Sem receios de espécie alguma e apenas animado pelos desafios que pode encontrar: «Só o facto de saber que vou estar com pessoas que desenham melhor do que eu, que me podem mostrar outros caminhos e técnicas, é algo que me deixa completamente realizado.»

No fundo, tudo se resume a uma frase simples, que ele não se cansa de repetir: «A vida é boa demais para ficarmos sempre no mesmo sítio.»

A palavra sketching

(«esboço» em português) é

usada para definir os desenhos

rápidos do que se vê à nossa volta,

em cadernos, funcionando como

uma espécie de diário gráfico

«A vida é boa

demais para

ficarmos sempre

no mesmo sítio»

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24 v&V visão vida & viagens março 2012

nómada pessoas com mundo

Q uando andamos por lugares desco-nhecidos, parece que há uma espécie de energia extra que nos faz colar o olhar, para tudo o que se mexe à nossa volta. Existe uma necessidade

inconsciente que nos pede uma orientação para sa-ber por onde vamos. Porém, quando já conhecemos os sítios, a tendência é filtrar o que nos rodeia e se-guir caminho. Como nunca tive boa memória para decorar nomes, nomeadamente de ruas, a linha que separa o saber onde estou e na curva seguinte já não o saber, é mínima. O que a meu ver torna tudo muito mais interessante! No entanto, há uns anos arranjei uma solução para esse “problema”. Como

sempre gostei de desenhar, comecei a fazer sketches dos lugares que percorria. Passei a ter memórias visuais de viagens com desenhos e histórias das mi-nhas experiências.

Quando me aventuro de sketchbook e aguarelas na mão, pelas ruas do Bairro Alto, já sei que o risco de me perder no tempo e no espaço é enorme. Con-tudo, assim sigo, sem planos, em busca de um bom ponto de vista para registar em desenho. É graças a esses momentos de pura contemplação que tenho vindo a memorizar visualmente o Bairro Alto e in-felizmente, já não me perco assim tanto.

O que mais guardo é o seu bairrismo, que embora menos profundo, ainda é evidente nos dias hoje.

Uma tarde no Bairro AltoDos cadernos de Luís Simões

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março 2012 visão vida & viagens v&V 25

É fácil encontrar motivos para me sentar em qualquer lado

e começar a rabiscar o Bairro Alto

O acordar silencioso marcado por rasgos de sol entre as suas ruas labirínticas e estreitas. As emolduradas janelas, onde alguém nos observa de cotovelos es-palmados nas ombreiras. As roupas ao vento, em es-tendais desalinhados. A irregular calçada, salpicada por caixotes do lixo verdes e carros debruçados nas fachadas das casas, pintadas com cores soltas e gra-ffites. As varandas e candeeiros de cor verde.

É fácil encontrar motivos para me sentar em qualquer lado e começar a rabiscar o Bairro Alto. Este prazer de desenhar e conseguir contar uma história, à volta daquele momento vivido, acabam por ser experiências únicas e memórias que me vão acompanhar e ajudar a não me perder... tanto.

A viagem em diretoA volta ao mundo de Luís Simões vai poder ser seguida por todos. Para além do seu site pessoal – www.worldsketchingtour.com – Luís Simões vai também, de forma regular, mostrar o seu olhar do planeta nas páginas da VISÃO Vida & Viagens e no site da VISÃO: www.visao.pt/viagens

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por Luís Simões

Desenhar o mundo

As primeiras etapas da volta ao mundo, que pretende percorrer os cinco

continentes em cinco anos. Sempre a encher blocos de papel

CADERNOS DA GALIZA

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maio 2012 visão vida & viagens v&V 21

Deixei Lisboa e segui cami-nho em direção ao norte de Espanha para começar a World Sketching Tour. O tão desejado «sonho» que nos últimos meses me acompa-nhou é agora uma realidade,

que de tão inesperada torna a minha vida no que sempre desejei: uma aventura em desenho. Depois das breves paragens em Aveiro e Porto, cidades que me receberam de braços abertos, entro no país vi-zinho em direção a Vigo. Percorro toda a Galiza de caderno na mão, fazendo paragens para explorar e guardar os momentos em aguarelas.

Normalmente demoro duas semanas de habitua-ção até me sentir a pertencer ao local onde me en-contro, mas o acolhimento de quem me espera e as abordagens nas ruas, apressaram da melhor manei-ra a minha ligação com Espanha. Completamente desconhecedor destes lugares, rendo-me ao coração

de Santiago de Compostela e à companhia de Nan-da, também ela uma urban sketcher que a internet me ajudou a conhecer. Leva-me aos seus «lugares mágicos» para desenharmos, e terminamos o dia na Casa Pepe para confortar a barriga com uns bo-cadillos, guarnecidos com uma boa conversa.

Sigo para Corunha onde conheço um amigo autên-tico. David Pintor é ilustrador regular no jornal La Voz de Galicia e guarda, na sua estante de livros, uma boa coleção de contos infantis preenchidos com os seus traços e cores. Um contacto precioso que me faz descobrir a cidade com uns olhos únicos. Corunha é abraçada pelo mar e ventos do norte que nos refres-cam o corpo quando o calor aperta. As ruas enchem-se de gente de todas as idades festejando a amizade em torno de uma refeição e um par de cervejas. Foi numa dessas ocasiões, depois da apresentação de um dos livros de David, que ouvi a voz lindíssima de Cristina Otero. Triste, fiquei a saber que o seu talento estava longe de ser o seu principal sustento, já que era

Luís Simões, em Lisboa, no dia da sua

partida para dar a volta ao mundo a desenhar

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22 v&V visão vida & viagens maio 2012

Desenhar o mundo

obrigada trabalhar numa prisão. Confessa-me que adora cantar, mas que continua com muitas reservas em relação a apostar numa carreira artística. Incenti-vo-a para que não desista nas primeiras dificuldades: «Uma voz como a tua deixar qualquer um colado à tua alma. Será uma pena se não te libertares do medo de arriscar em querer voar mais alto.» Cabisbaixa e pensativa, promete-me que irá lutar e quem sabe, um dia, quando eu regressar a Portugal, a encontre a can-tar, numa casa de fado em Alfama.

Num dia desenhei Lugo. E de facto não é preciso muito mais para se conhecer a pequena e muralhada povoação. Lugo é salpicada de preservados monu-mentos históricos e é delicioso perdermo-nos pelas es-

treitas ruas que vão dar a praças e largos com vida ur-bana. De passagem, descubro um «artista de rua» a tocar guitarra, uma das minhas grandes paixões. Ali puxo de uma sandes, sento-me num degrau e almoço saboreando cada nota que se expande pela rua fora.

Chego a Ourense e à minha espera está a urban sketcher Isabell Seidel que se mudou para Espanha há menos de 2 anos. Fala fluentemente espanhol e dá aulas de alemão em Vigo. Num dos dias que saímos para desenhar, somos abordados por um homem que estava a recolher desenhos, num pequeno caderno, para futuramente oferecer à sua filha. Agradado com a ideia, pergunto-lhe: «O que queres que desenhe?»

«O que quiseres», responde. «Já houve um tipo que desenhou uma rua de Cuba!», diz-me, sorrin-

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maio 2012 visão vida & viagens v&V 23

Lugo é salpicada de preservados

monumentos históricos e é delicioso perdermo-nos

pelas estreitas ruas

A World Sketching Tour de Luís Simões pode ser acompanhada na internet em:www.worldsketchingtour.comwww.visao.sapo.pt/viagens

do, enquanto bafejava um cigarro. «Pronto, ora ai está. Vê lá se sabes onde é?», atirei-lhe, a testar a qualidade de meu desenho e o seu conhecimento geográfico. «É a rua da Bica em Lisboa!», respondeu ele, satisfeito. Um valente aperto de mãos e seguimos para mais uma rua, mais um desenho. Foram três dias fantásticos em que vivi literalmente em casa da Isabell e do Víctor, seu namorado. Deram-me cama, comida e uma amizade inesquecível. Até já!

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por Luís Simões

Desenhar o mundo

Impressões de Madrid, Toledo e Sevilha

A CAMINHO DO SUL

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junho 2012 visão vida & viagens v&V 13

Chegar à capital espanhola na épo-ca festiva da Semana Santa é tão fatal como visitar um centro co-mercial num domingo de chuva em vésperas do Natal. Foi assim que me meti a descobrir Madrid, uma cidade com muitos prédios

e muitos monumentos entre prédios. E com muitas pessoas entre os prédios e monumentos, no pouco espaço que sobra. Um caos para quem precisa de um mapa e um encanto para quem gosta de se per-der. As artérias principais acumulam todo o tipo de personagens que, por dinheiro, esforçam-se para cativar a atenção das centenas de turistas. Afasto-me do rebuliço e dos encontrões. Dizem-me que ali perto está o templo Debod. Dou por mim sentado na relva que protege o templo. Olho permanente-mente para um sem-abrigo que descansa em paz. Os pombos fazem-lhe companhia. O seu aspec-to maltratado realça uma pele envelhecida. Caem pétalas das árvores na mesma direção que os raios de sol. Uma imagem do além, pensei. Uma imagem que me fez recordar, não fosse o aspecto maltrata-do, o meu avô, de tão sereno que estava no último «até já» aos mortais. O templo está fechado e só lhe posso agradecer por isso. Madrid acaba por ter mais encantos do que as suas ruas e arquitetura.

Estou numa rua, de pouco movimento, com a me-lhor vista para a enorme catedral de Toledo. Não é a primeira vez, nem será a última, que pedem para tirar uma foto ao que estou a desenhar. Eu agradeço

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Desenhar o mundo

e recebo-o como um elogio generoso dos felizes de-savergonhados desta vida. Depois acabamos sempre por trocar mais do que um par de palavras para enri-quecer o conteúdo do retrato. Desta vez, três bonitas e bem-dispostas brasileiras de São Paulo, começam por falar comigo em espanhol. Terminamos a con-versa entre aguarelas, o projeto adicionado no tele-móvel de uma delas e um pedido de contacto para quando passar pelo Brasil. «Podes ficar em nossa casa o tempo que quiseres para desenhar», dizem-me. Passam carros, passam pessoas. Conheço um ca-sal de idade. Ela diz-me «Sou pintora e sempre que vejo alguém a desenhar fico curiosa.» Passam carros, passam pessoas. Aproxima-se uma família. Tiram-me fotografias e perguntam-me: «Tu és o tipo que anda a dar a volta ao mundo em desenho…?» Estava perante o efeito viral das redes sociais.

Aurora é uma urban sketcher de Sevilha e foi em casa dela que me mantive abrigado, com direito a pequeno-almoço, algumas refeições e uma amizade para a vida. Para chegar ao ponto mais alto da pla-na cidade de Sevilha, tenho que percorrer 40 minu-tos a pé desde a sua casa. Sabe bem percorrer cami-nhos que não conheço, enganar-me na rua, seguir em frente e logo se vê onde vou parar. Assim deixo-me ir, sem mapas e embalado pela intuição. Dou de caras com La Giralda e todas as dezenas de char-retes que vão satisfazendo os desejos de turistas endinheirados. Momento apreciado e desenhado com tempo. Que nem dei por ele passar. Continuo e ao fundo está Las Setas, na Plaza de la Encarnaci-ón. Uma cobertura monstruosa, geometricamente trabalhada, rodeada de casas habitacionais, uma igreja, pequenas árvores e uma estrada que a cor-ta ao meio. Pede que me sente e a contemple com detalhe. O sol, também ele, convida-me a ficar em manga curta. Seria um crime resistir a tanto apelo.

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A World Sketching Tour de Luís Simões pode ser acompanhada na internet em:www.worldsketchingtour.comwww.visao.sapo.pt/viagens

sa à minha frente, como uma história que se conta com mais ou menos detalhe. No fim, levanto-me e vou-me embora. Sigo para o próximo filme para o contar em desenhos.

Deixo-me ficar depois de escolher o melhor ângulo. Aprecia-se a vida urbana. O sol a mudar de dire-ção. Os casados, olham para os lados opostos. Os namorados, discutem. Os solteiros, aproveitam o sol e deitam-se no chão. Os putos, caem da bicicleta em busca de manobras mais radicais. Os pombos destemidos, sobem para a minha mochila e vão-me circulando. Uma vida à minha frente e ninguém sabe que eu estou aqui. Por vezes parece que estou sentado numa cadeira de cinema. Tudo o resto pas-

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