verdade formal - acódão stj

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Superior Tribunal de Justiça RECURSO ESPECIAL 1.374.778 - RS (2013/0039924-3) RELATOR : MINISTRO MOURA RIBEIRO RECORRENTE : R O ADVOGADO : LUCIDIO LUIZ CONZATTI E OUTRO(S) RECORRENTE : R A M ADVOGADO : VICTOR HUGO MURARO FILHO RECORRIDO : OS MESMOS RELATÓRIO O EXMO. SR. MINISTRO MOURA RIBEIRO (Relator): Trata-se de recursos especiais interpostos por R.O. e R.A.M. com fundamento no art. 105, III, a e c, da CF contra acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul que recebeu a seguinte ementa: APELAÇÃO CÍVEL E AGRAVO RETIDO INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE. COISA JULGADA. INOCORRENTE. PRESCRIÇÃO AFASTAMENTO. EXAME DE DNA CONCLUSIVO. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ CONFIGURADA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. REQUISITOS NÃO CONFIGURADOS. 1) Tendo em vista que na ação de investigação de paternidade anteriormente aforada não foi apreciado o mérito por parte do Poder Judiciário operou-se a coisa julgada formal unicamente. Logo, não há óbice a impedir o julgamento da presente demanda, com o enfrentamento da questão meritória, enquadrando-se a hipótese no que estabelece o art. 268 do CPC. Precedente do STJ. 2) A contagem do prazo prescricional do pleito indenizatório previsto no art. 206, V, do CC inicia-se do trânsito em julgado da decisão proferida na ação de investigação de paternidade, ocasião em que nasce a pretensão reparatória. 3) Resultado do exame de DNA que é conclusivo no sentido de afirmar a paternidade, nada aportando aos autos para inquinar a idoneidade do respectivo laudo. 4) Manutenção da sentença no ponto em que condenou o apelante nas penas por litigância de má-fé, porquanto resta evidenciado que alterou a verdade dos fatos, litigou de forma temerária e procrastinatória, além de ter feito afirmações desonrosas a respeito da genitor do apelado. Redução, contudo, da indenização fixada. 5) Consideradas as peculiaridades que permeiam o caso concreto, não resta evidenciada omissão voluntária quanto ao abandono moral e afetivo do autor, por parte do demandado. Afastamento da indenização concedida em primeira instância. PRELIMINAR REJEITADA E AGRAVO RETIDO DESPROVIDO, À UNANIMIDADE, APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA, POR MAIORIA (e-STJ, fl. 493). Documento: 48322091 - RELATÓRIO, EMENTA E VOTO - Site certificado Página 1 de 16

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Verdade Formal - Acódão STJ

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  • Superior Tribunal de Justia

    RECURSO ESPECIAL N 1.374.778 - RS (2013/0039924-3)RELATOR : MINISTRO MOURA RIBEIRORECORRENTE : R O ADVOGADO : LUCIDIO LUIZ CONZATTI E OUTRO(S)RECORRENTE : R A M ADVOGADO : VICTOR HUGO MURARO FILHO RECORRIDO : OS MESMOS

    RELATRIO

    O EXMO. SR. MINISTRO MOURA RIBEIRO (Relator):

    Trata-se de recursos especiais interpostos por R.O. e R.A.M. com fundamento no art. 105, III, a e c, da CF contra acrdo do Tribunal de Justia do Rio Grande do Sul que recebeu a seguinte ementa:

    APELAO CVEL E AGRAVO RETIDO INVESTIGAO DE PATERNIDADE. COISA JULGADA. INOCORRENTE. PRESCRIO AFASTAMENTO. EXAME DE DNA CONCLUSIVO. LITIGNCIA DE M-F CONFIGURADA. INDENIZAO POR DANOS MORAIS. REQUISITOS NO CONFIGURADOS. 1) Tendo em vista que na ao de investigao de paternidade anteriormente aforada no foi apreciado o mrito por parte do Poder Judicirio operou-se a coisa julgada formal unicamente. Logo, no h bice a impedir o julgamento da presente demanda, com o enfrentamento da questo meritria, enquadrando-se a hiptese no que estabelece o art. 268 do CPC. Precedente do STJ. 2) A contagem do prazo prescricional do pleito indenizatrio previsto no art. 206, V, do CC inicia-se do trnsito em julgado da deciso proferida na ao de investigao de paternidade, ocasio em que nasce a pretenso reparatria.3) Resultado do exame de DNA que conclusivo no sentido de afirmar a paternidade, nada aportando aos autos para inquinar a idoneidade do respectivo laudo.4) Manuteno da sentena no ponto em que condenou o apelante nas penas por litigncia de m-f, porquanto resta evidenciado que alterou a verdade dos fatos, litigou de forma temerria e procrastinatria, alm de ter feito afirmaes desonrosas a respeito da genitor do apelado. Reduo, contudo, da indenizao fixada.5) Consideradas as peculiaridades que permeiam o caso concreto, no resta evidenciada omisso voluntria quanto ao abandono morale afetivo do autor, por parte do demandado. Afastamento da indenizao concedida em primeira instncia.PRELIMINAR REJEITADA E AGRAVO RETIDO DESPROVIDO, UNANIMIDADE, APELAO PARCIALMENTE PROVIDA, POR MAIORIA (e-STJ, fl. 493).

    Documento: 48322091 - RELATRIO, EMENTA E VOTO - Site certificado Pgina 1 de 16

  • Superior Tribunal de Justia

    Opostos embargos de declarao, foram eles rejeitados (e-STJ, fls. 529/534 e 536/541).

    O investigante, R.O., alega ofensa aos arts. 1.634, 186 e 927 do CC/02 e 535 do CPC.

    Narra que ajuizou ao de investigao de paternidade contra seu pai, o investigado, e contra ele pediu indenizao por abandono afetivo. Acrescenta que o exame de DNA comprovou a filiao.

    Sustenta que o acrdo recorrido negou a prestao jurisdicional quando se recusou, no julgamento dos embargos de declarao, a se pronunciar sobre os arts. 1.634, 186 e 927 do CC/02.

    Alega que no pretende o reexame de fatos, mas que se considere o inqurito policial e a anterior ao de investigao de paternidade, pois eles evidenciaram a omisso afetiva do investigado.

    Argumenta, ainda, que, sabedor da gravidez de sua me, ao investigado incumbia adotar postura de afeto sob pena de cometer o ilcito previsto no art. 186 do CC/02, o qual passvel de indenizao.

    O investigado, R.A.M, alega ofensa aos arts. 535, I e II, 18, 2, e 301, VI, todos do CPC.

    Sustenta, em princpio, que o acrdo recorrido, mesmo provocado por embargos de declarao, no enfrentou o pedido de absolvio quanto a condenao da multa de 1% sobre o valor da causa, violando, assim, o disposto no art. 535 do CPC.

    Aduz que no alterou a verdade dos fatos e que no devida a aplicao da multa por litigncia de m-f. Diz, tambm, que a indenizao indevida porque no ficou demonstrado o prejuzo sofrido pelo investigado quanto a tramitao do feito ou a leso na sua esfera jurdica.

    Por ltimo, insiste na tese de ocorrncia da coisa julgada formal. Argumenta que contra si foi manejada outra ao de investigao de paternidade antes da atual, que abrangeu as mesmas partes e o mesmo pedido, que foi arquivada sem julgamento do mrito, devendo prevalecer o instituto da coisa julgada em detrimento do direito de R.O. conhecer sua origem.

    Contrarrazes dos recursos especiais (e-STJ, fls. 612/617 e 620/633).

    O Ministrio Pblico Federal opinou pelo no provimento dos recursos (e-STJ, fls. 718/726).

    o relatrio.

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  • Superior Tribunal de Justia

    RECURSO ESPECIAL N 1.374.778 - RS (2013/0039924-3)RELATOR : MINISTRO MOURA RIBEIRORECORRENTE : R O ADVOGADO : LUCIDIO LUIZ CONZATTI E OUTRO(S)RECORRENTE : R A M ADVOGADO : VICTOR HUGO MURARO FILHO RECORRIDO : OS MESMOS

    EMENTA

    CIVIL E FAMLIA. PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. INVESTIGAO DE PATERNIDADE. ALEGADA OFENSA AO ART. 535 DO CPC. INOCORRNCIA. PRETENSO DE ACOLHIMENTO DE ABANDONO AFETIVO POR OMISSO. NO CONFIGURAO. RECURSO ESPECIAL NO PROVIDO. 1.No h ofensa ao art. 535 do CPC quando os embargos de declarao so rejeitados pela inexistncia de omisso, contradio ou obscuridade, e o Tribunal a quo dirime a controvrsia de forma completa e fundamentada, embora de forma desfavorvel pretenso do recorrente. 2. O desconhecimento da paternidade e o abandono a anterior ao de investigao de paternidade por mais de vinte anos por parte do investigante e de seus representantes, sem nenhuma notcia ou contato buscando aproximao parental ou eventual auxlio material do investigado, no pode configurar abandono afetivo por negligncia. CIVIL E FAMLIA. PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. INVESTIGAO DE PATERNIDADE. ALEGADA OFENSA AO ART. 535 DO CPC. INOCORRNCIA. AFASTAMENTO DA MULTA DE LITIGNCIA DE M-F. IMPOSSIBILIDADE. MULTA DEVIDAMENTE APLICADA. PRETENSO DE PREVALNCIA DA COISA JULGADA FORMAL EM DETRIMENTO DO DIREITO DE PERSONALIDADE. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES. RECURSO ESPECIAL NO PROVIDO.1. No h ofensa ao art. 535 do CPC quando os embargos de declarao so rejeitados pela inexistncia de omisso, contradio ou obscuridade, e o Tribunal a quo dirime a controvrsia de forma completa e fundamentada, embora de forma desfavorvel pretenso do recorrente. 2. Demonstrada a indisfarcvel pretenso de se alterar a verdade dos fatos e a dificultao na busca da verdade real, justifica-se a aplicao da multa do por litigncia de m-f, na forma do inciso II do art. 17 do CPC.3. A jurisprudncia desta egrgia Corte Superior j proclamou que em aes de estado, como as de filiao, no se apresenta aconselhvel privilegiar a coisa julgada formal em detrimento do direito identidade, consagrada na CF como direito fundamental. Precedentes. Recursos especiais no providos.

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  • Superior Tribunal de Justia

    RECURSO ESPECIAL N 1.374.778 - RS (2013/0039924-3)RELATOR : MINISTRO MOURA RIBEIRORECORRENTE : R O ADVOGADO : LUCIDIO LUIZ CONZATTI E OUTRO(S)RECORRENTE : R A M ADVOGADO : VICTOR HUGO MURARO FILHO RECORRIDO : OS MESMOS

    VOTO

    O EXMO. SR. MINISTRO MOURA RIBEIRO (Relator):

    R.O. ajuizou ao de investigao de paternidade cumulada com danos morais contra R.A.M. para que fosse reconhecida e declarada a paternidade do investigado, bem como a sua condenao a ttulo de danos morais em razo do abandono afetivo (e-STJ, fls. 1/6).

    Narrou que sua me, em 1980, com apenas 15 anos de idade, engravidou do investigado e que este, mesmo ciente da gravidez, nunca quis saber dele, seu filho, o que lhe causou abalo emocional durante muitos anos.

    Os pedidos foram julgados procedentes pelo juzo de primeiro grau para (a) declarar o estado de filiao do autor como filho do ru; (b) condenar o investigado ao pagamento de indenizao por dano moral no valor equivalente a cem salrios mnimos da poca, o equivalente a R$ 54.500,00 (cinquenta e quatro mil e quinhentos reais), alm de 10% sobre o valor da causa por litigncia de m-f (e-STJ, fls. 399/409).

    Inconformado, o investigado interps recurso de apelao, na qual sustentou (a) a ocorrncia de coisa julgada, porquanto em 1981 foi alvo de outra investigatria; (b) que a pretenso indenizatria, cujo prazo de 3 anos, estava prescrita; (c) que o exame de DNA, sem lastro em outra prova, no comprova a paternidade; (d) que no houve abandono afetivo, pois desconhecia a paternidade; (e) que no alterou a verdade dos fatos (no negou que manteve relaes sexuais com a me do autor), de modo que no pode ser condenado por litigncia de m-f; (f) que, para a ocorrncia do abandono afetivo deve ser demonstrada a sua culpa, o que no ocorreu; (g) no pode ser condenado a ttulo de danos morais, pois a ao foi ajuizada quase trinta anos aps o nascimento do suposto filho, sendo que a genitora desse no teve interesse em prosseguir na ao anteriormente ajuizada; (h) que a sua situao financeira no lhe permite arcar com o valor excessivo da indenizao; e, (i) os honorrios advocatcios no foram devidamente distribudos.

    O Tribunal de Justia local deu parcial provimento ao recurso do investigado para reduzir o percentual da condenao por litigncia de m-f e afastar a Documento: 48322091 - RELATRIO, EMENTA E VOTO - Site certificado Pgina 4 de 16

  • Superior Tribunal de Justia

    indenizao por abandono afetivo (e-STJ, fls 491/513).

    O recorrente, R.O., sustenta que a hiptese de abandono efetivo, porque o investigado, seu pai, sabia da sua existncia e manteve postura omissa.

    Feitas essas consideraes, verifica-se que a controvrsia gira em torno da configurao ou no do abandono afetivo, no se exigindo, para a soluo, o reexame de provas, mas apenas a valorao dos fatos da causa.

    Os autos noticiam que o investigado, quando tinha 18 anos, em 1980, se relacionou com a me do investigante. Ela, que tinha 15 anos poca, engravidou.

    O av materno do investigante, diante da negativa do pai dele em assumir o filho, representaram criminalmente contra este, imputando-lhe a prtica do crime de seduo (e-STJ, fls. 13/14). O juzo criminal julgou improcedente a denncia e o absolveu (e-STJ, fls. 103/104).

    Aps, no ano de 1981, o av do investigante, representando a filha, ajuizaram ao de investigao de paternidade contra R.A.M (e-STJ, fls. 78/79), a qual no teve o seu mrito resolvido e foi arquivada em 1986 porque os autores estavam em lugar incerto e no sabido (e-STJ, fls. 119/120).

    Passados 26 anos do ajuizamento da ao de investigao de paternidade e 21 anos do seu abandono, o investigante ajuizou nova ao de investigao de paternidade, na qual sustentou, como visto, a configurao do abandono afetivo por parte de seu pai, buscando indenizao.

    Diante desse quadro, diferentemente do que concluiu o juzo de primeiro grau, o Tribunal a quo entendeu que no se configurou a hiptese de abandono afetivo imputvel ao genitor com os seguintes fundamentos:

    Extrai-se dos autos que, em julho de 1981, Francisco, pai de Nerosilda (que contava com 16 anos, fl. 12) e av de Rafael, representando este e assistindo aquela, ajuizou ao de investigao de paternidade, cumulada com alimentos contra Ronaldo (fls. 73/75).Aps ser contestada a ao (fls. 83/85), depreende-se do despacho da fl. 95, verso ('intime-se pessoalmente a parte a dar andamento no, feito em 48 h sob pena de extino)', que o feito no teve mais andamento por razes aqui no explicitadas e, em virtude de a genitora no ter sido localizada, isso j no ano de 1986, foi determinado o seu arquivamento (fl. 98).Paralelamente a isso, Ronaldo respondeu a processo criminal, ajuizado em 07.07.1980 (fl. 13), restando absolvido da acusao de ter praticado crime de seduo contra Nerosilda (fi. 89).Da em diante, at o dia em que ajuizada a presente demanda (vinte e sete anos depois, em 26.10.2007, fl. 2), no se tem

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  • Superior Tribunal de Justia

    informao alguma sobre os desdobramentos fticos que envolveram as partes.Inobstante tenha constado na exordial que o autor teria tentado, sem xito, aproximar-se do pai, absolutamente nada para comprovar tal alegao foi produzido durante a instruo processual.Infere-se, ento, que cada um foi para o seu lado, tomando o rumo de suas vidas e, somente no final do ano de 2007, quando o autor decidiu aforar esta ao, reencontraram-se.Se, por um lado, possvel cogitar que durante esse longo interregno poderia ter o demandado tentado esclarecer os fatos e, com isso, assumir a posio de pai, por outro, no h como ignorar que, diante a desistncia tcita de prosseguir com a ao promovida no ano de 1981 entendeu o apelante que, de fato, a verso na poca apresentada no passava de um embuste, visto que, se a imputao de paternidade efetivamente fosse verdadeira, era de todo o interesse da famlia materna de Rafael ver encerrado aquele processo com sentena de procedncia declarando-a.Ganha relevo, nesse panorama, o comportamento do av e da me de Rafael, que simplesmente abandonaram a causa ento instaurada no calor do momento em que a situao recm se instaurara, desistindo do intento.Nesse contexto, como exigir de um homem, que deixou de estar na posio de investigado, a atitude de buscar esclarecer algo que, pela sua convico pessoal, no se mostrava verdico e que, pela prpria postura de quem o acusava de ser pai, fez aumentar sua crena ante a desistncia de um processo judicial?No vislumbro, desse modo, razoabilidade em esperar um comportamento ativo de Ronaldo ante o abandono da causa por aqueles que sustentavam a paternidade que negava existir, sobretudo se levado em conta que, passados todos esses anos (dcadas a fio, realo), ningum o procurou para esclarecer esse episdio, o que acaba emprestando arrimo sua posio (aqui finalmente desvestida) de que no era o pai. Possvel presumir, portanto, que o silncio durante tantos anos embutiu a convico de que tudo no passou de um mal entendido.Seria plausvel cogitar de raciocnio em sentido diverso acaso o insucesso da demanda antiga houvesse decorrido de comportamento do investigado; se tivesse sido esclarecido o motivo por que naquele tempo a investigao de paternidade teve seu curso interrompido por inrcia do autor; ou se aqui viessem demonstradas as tentativas supostamente frustradas de aproximao por parte do filho, nus que lhe incumbia, j que a sim, diante de uma eventual resistncia insistncia de descortinar o que agora afirma-se como verdade inquestionvel, restaria configurada omisso voluntria ensejadora de abandono.Vale rememorar que o demandado restou absolvido do processo criminal, sendo legtimo crer que, a partir disso e com a paralisao

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    do processo cvel, e sem ser procurado pelos familiares de Rafael, tampouco por ele, para prosseguir com a apurao dos fatos, pensou no mais dever nada a ningum, colocando um ponto final na celeuma (isso sem nem valorar negativamente a meno de que a me relacionava-se com outros homens, aspecto que desborda dos limites desta lide, mas que justificaria a dvida em torno da paternidade).Destarte, no sendo possvel ter como voluntria a omisso do genitor durante todos esses anos, e sopesados os comportamentos da genitora e do filho, no h como responsabilizar materialmente o ru por um abandono que, como visto, ao cabo, terminou sendo ocasionado por fatos alheios sua vontade (e-STJ, fls. 508/510, sem destaque no original).

    Observa-se que o abandono da causa por mais de vinte anos por parte daqueles que sustentavam a paternidade, sem que o investigado fosse procurado por nenhum deles por longo perodo, foi determinante para a concluso de que no houve omisso voluntria dele, investigado.

    Para que seja apurada responsabilidade civil e por conseguinte haja reparao por abandono afetivo, contrariando a premissa da paternidade responsvel, deve ficar comprovado o liame entre a conduta voluntria omissiva ou comissiva por parte do pai e o abalo moral suportado pelo filho.

    No caso, a pretenso do investigante que R.A.M., seu pai, seja responsabilizado, porque tinha cincia da gravidez e sabia que R.O. supostamente seria seu filho e nada fez. Argumenta-se que foi negligente, pois no se preocupou em esclarecer se ele era seu filho.

    A reparao aqui pretendida - indenizao por dano moral decorrente de abandono afetivo por negligncia porque o investigado (suposto pai) no foi buscar saber se o investigante era seu filho - no habitualmente pedida no Judicirio!

    Normalmente, pretende-se reparao por abandono afetivo na hiptese em que o pai sabe da existncia do filho, mas omisso relativamente aos deveres de educao, cuidado, carinho, ateno, afeto e convivncia, principalmente nas hipteses de divrcio, dissoluo de unio estvel, ou separao litigiosa conturbada, entre outras hipteses.

    O pensamento do acrdo recorrido se afina mais com o meu sobre a matria trazida. Impressiona o fato de que, por mais de vinte anos, ningum procurou R.A.M. para que se reconhecesse a paternidade do investigante ou lhe prestasse algum auxlio material. Aquele, desde o incio, resistiu e negou a paternidade que lhe foi atribuda, depois, houve a desistncia sem razo justificada da primitiva ao investigatria. Numa palavra: os investigantes simplesmente sumiram e nada se buscou do investigado por Documento: 48322091 - RELATRIO, EMENTA E VOTO - Site certificado Pgina 7 de 16

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    mais vinte anos!

    No mais, no razovel se exigir do investigado que, aps responder processo criminal decorrente de representao do pai da genitora do investigando, do qual foi absolvido e de onde o juiz consignou na sentena que a prova testemunhal revelou que a ofendida no possua comportamento recatado e honesto (e-STJ, fl. 104), procurasse a famlia para saber do suposto filho. Por bvio, no havia boa relao entre eles. Somado a isso, com o sumio deles por mais de vinte anos no seria nenhum absurdo o investigado imaginar que no havia procedncia na paternidade que lhe foi imputada.

    A responsabilidade civil por abandono afetivo com base na ideia de culpa dificulta mais a sua configurao, notadamente aqui, em que se imputa a negligncia porque o investigado deveria saber que o investigando era seu filho, pois manteve relaes sexuais com sua me por ocasio da descoberta da gravidez.

    Como se fala em culpa, JOS DE AGUIAR DIAS, ao tratar do art. 186 do CC/02 em sua obra, leciona que a negligncia pode ser definida como omisso daquilo que razoavelmente se faz, ajustadas as condies emergentes s consideraes que regem a conduta normal dos negcios humanos ou a inobservncia das normas que nos ordenam a operar com ateno, capacidade, solicitude e discernimento (Da responsabilidade civil. 11 ed., atualizada de acordo com o Cdigo Civil de 2002 e aumentada por Rui Berford Dias. Rio de Janeiro: Ed. Renovar, 2006. p. 149).

    Acrescenta-se a isso que a culpa, como elemento essencial da responsabilidade civil e que possui, como sabido, o comportamento voluntrio do agente, a previsibilidade e a violao de um dever de cuidado objetivo como requisitos, deve ser demonstrada para configurao do ilcito. No caso, ela no est evidenciada, razo pela qual no h mesmo a obrigao de indenizar, como bem consignou o acrdo recorrido.

    A meu ver, s.m.j., no houve o descumprimento de um dever de cuidado objetivo que o investigado podia conhecer e devia observar, ou falta de diligncia na observncia de norma de conduta, o que desnatura a culpa.

    O abandono afetivo, entendido como a falta de cumprimento dos pais para com seus filhos com relao aos deveres inerentes ao poder familiar, no poderia se configurar em relao ao investigado, ainda que a ttulo de culpa, porque no tinha o dever legal de ir procurar saber da suposta filiao que lhe fora atribuda. Tambm, no campo da moral, que no sancionado pelo direito, no se podia exigir do investigado outro comportamento porque jamais teve plena certeza da filiao.

    Por fim, ALINE BIASUS SUARES KAROW, sobre o tema, afirma que no pode responder por abandono afetivo aquele sujeito que sequer tinha cincia da existncia do filho, exigindo-se, antes, o reconhecimento da paternidade. A autora acrescenta que

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    aquele que sabe ser pai, porm no registra o filho, dificilmente poder ser alvo da demanda, pois ningum pode ser condenado por ato ilcito, quando no se tem conscincia da potencialidade de tal ato, a no ser que reconhea publicamente a paternidade atravs de atos inerentes a sua funo , hiptese no configurada (Abandono afetivo - Valorao Jurdica do Afeto nas Relaes Paterno-Filiais. Curitiba: Ed. Juru, 2012. p. 223)

    Noutra parte, no merece prosperar o recurso em relao alegada ofensa ao art. 535, II, do CPC, porque os embargos declaratrios foram rejeitados pela inexistncia de omisso, contradio ou obscuridade, tendo o Tribunal a quo dirimido a controvrsia, embora de forma desfavorvel pretenso da recorrente, o que no importa ofensa referida regra processual.

    No mais, cedio que o julgador no est obrigado a responder a todos os questionamentos formulados pelas partes, cabendo-lhe, apenas, indicar a fundamentao adequada ao deslinde da controvrsia, observadas as peculiaridades do caso concreto, como ocorreu in casu .

    Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso especial do investigante.

    Passo a examinar o apelo especial do investigado, que, de incio, afirmou que o acrdo recorrido no sanou o vcio apontado nos embargos de declarao relativos aplicao da multa que sofreu por litigncia de m-f.

    No merece prosperar o recurso em relao alegada ofensa ao art. 535, II, do CPC, porque os embargos declaratrios foram rejeitados pela inexistncia de omisso, contradio ou obscuridade, tendo o Tribunal a quo dirimido a controvrsia, embora de forma desfavorvel pretenso da recorrente, o que no importa ofensa referida regra processual.

    Observa-se que os embargos de declarao manejados pelo investigado tiveram por escopo esclarecer se a condenao relativa ao percentual de 3% abrange a multa e a indenizao. Ele assim indagou ao Tribunal:

    Na sentena a condenao abrangeu dois itens: a) litigncia de m-f e multa de 1% sobre o valor da causa atualizado e b) indenizao de 10% sobre o valor da causa. Portanto, por litigncia de m-f, a condenao foi de 1% (multa) + 10% (indenizao).No acrdo a condenao foi diminuda para 3% a ttulo de indenizao por litigncia de m-f.Assim, mesmo que presumvel o entendimento, a fim de que no pairem dvidas quanto ao resultado do julgamento, se faz necessrio esclarecer se a condenao relativa ao percentual

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    de 3% abrange a multa e a indenizao , nada obstante a tudo dizer respeito a alegada litigncia de m-f (e-STJ, fl, 518, sem destaque no original).

    Esse questionamento foi respondido pelo Tribunal a quo nos seguintes termos:

    Cabe rememorar que o Colegiado decidiu 'que h certo exagero na condenao do ru a indenizar o autor equivalente a 10% do valor dado causa R$ 76.000,00, em outubro de 2007)... razo por que voto no sentido de diminuir essa condenao para 3% sobre aquele valor' (fls. 448, verso e 449).Como se v, esta 4 Cmara Cvel diminuiu o percentual devido ao autor a ttulo de indenizao por litigncia de m-f praticada pelo embargante (18, 2), sem, no entanto, nada dispor sobre a multa cominada com base no art. 18, caput, do CPC (1% sobre o valor da causa atualizado pelo IGPM), permanecendo, por conseguinte, inalterada a sentena no ponto (e-STJ, fl. 532).

    Ora, a dvida suscitada foi esclarecida pelo Tribunal a quo no julgamento dos embargos de declarao, que deixou claro que o percentual de 3% abrangeu somente a indenizao (art. 18, caput, segunda parte), de modo que no se sustenta a alegao de ofensa ao art. 535 do CPC. O embargante, repito, indagou, to somente, se os 3% abrangia a multa e a indenizao, nada mais!

    No mais, da transcrio das razes dos aclaratrios supracitada, observa-se que o recorrente, em nenhum momento, afirmou que o acrdo embargado foi omisso quanto ao pedido de absolvio da condenao na multa de 1% sobre o valor da causa. Sobre esta, a multa, o acrdo expressamente consignou que manteve a sentena no ponto. Se assim o fez, adotou os fundamentos do juiz de primeiro grau (e-STJ, fl. 408), no havendo se falar em omisso. Isso posto, no houve falta de prestao jurisdicional ou qualquer dos vcios do art. 535 do CPC.

    Noutra parte, o investigado se insurge contra a condenao por litigncia por m-f. Insiste na alegao de que nenhum momento de sua defesa alterou a verdade dos fatos ou ops resistncia injustificada ao andamento do processo.

    Sem razo o recorrente.

    O Tribunal a quo manteve a condenao por litigncia de m-f com os seguintes termos:

    Sustenta o apelante, nesse particular, que no alterou a verdade dos fatos, tampouco litigou de forma temerria ou procrastinatria, salientando ainda no ter desonrado a genitora do apelado.

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    A sentena hostilizada, neste ponto, assim ponderou:

    Por fim, destaco a m-f do requerido no processo, pois alterou desde o incio a verdade sobre os fatos, alegando que nunca teve relaes sexuais com a me do autor. Fato este desmentido atravs da prova tcnica e da prova testemunhal, que elucidou o namoro havido entre o requerido e Nerosilda. Assim, pois, verificada a hiptese descrita no art. 17, II, do CPC, at porque, o requerido foi alm, imputando desonra me do autor, de forma ignbil, visando esquivar-se de suas obrigaes de pai para com o autor. No fosse isso, ops resistncia injustificada, ao impugnar genericamente o exame pericial, alm de no comparecer em duas das oportunidades para a coleta do material gentico a fim de ser realizado o exame de DNA, numa delas sequer apresentando justificativa.Enfim, procedimento adotado pelo ru nos autos foi de extremada m-f, criando ao autor injustificveis embaraos para que ao final viesse a prova definitiva de sua paternidade, solucionando a controvrsia.Assim, deve o requerido ser condenado pela litigncia de m-f, devendo pagar a multa de 1% sobre o valor da causa atualizado pelo IGPM (art. 18, caput, do CPC), bem como indenizao ao autor no valor equivalente a 10% do valor dado causa, atualizado pelo IGPM, nos termos do art. 18, 2 do CPC.

    Com efeito, diversamente do aventado nas razes recursais, inquestionvel que, ao trazer para os presentes autos, primeiramente na contestao (fi. 61), depois nos memoriais (fi. 352) e aps na prpria apelao (fi. 396), a notcia de que nas aes que tramitaram anteriormente (de investigao de paternidade e a ao penal) alegou e provou que no manteve relao sexual com a me do autor, o demandado reiterou tal verso falaciosa, usando-a como uma de suas teses para eximir-se da obrigaes decorrentes da paternidade.Corroborando tal constatao, transcrevo a seguir os argumentos lanados pelo recorrente nas fls. 396/397, em que reprisou os argumentos das fls. 352/354:

    Conforme prova documental o apelado a praticamente 30 anos passados, ingressou, atravs da representao de sua genitora, com demanda judicial contra o apelante, buscando exatamente o reconhecimento da paternidade, cumulando o pedido com alimentos (processo autuado sob o n 3760/250 - 1 Vara da comarca de Lagoa Vermelha). A demanda foi extinta e o feito arquivado .Naquela oportunidade o ora apelante apresentou sua

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    defesa sustentando, primeiro, que no manteve reao sexual com a genitora do apelado; e, segundo, que essa mantinha tais relaes, apesar da pouca idade, com homens de idade muito superior a sua.Provou a alegao . Os documentos apresentados nos autos, extrados tambm do processo por crime de seduo, no qual o apelante foi absolvido . Porm, o que mais chama a ateno neste ponto que com a inicial no vieram todas as peas do feito criminal, especialmente deciso do processo. Houve a absolvio do apelante, inclusive a partir de pedido do ento Promotor de Justia .Somado a tais fatores, houve a produo da prova testemunhal .Entre as testemunhas, Jos Luiz Rech da Silva esclarece: que a me do requerente saia bastante com pessoas de idade: que saa para FAZER PROGRAMA. Portanto, Excelncias, dentro do contedo ltico produzido, soma-se a prova documental e a prova testemunhal, e a lgica diversa da lanada na inicial (sublinhado e grifos no original).

    A toda evidncia, no af de defender-se do processo contra si instaurado, o demandado trouxe para dentro deste feito afirmaes inverdicas, faltando com lealdade, pois que, em que pese lhe seja lcito apresentar a sua verso dos fatos, no lhe permitido, em total descompasso com a boa-f e a moral, deturpar os acontecimentos afastando-se da busca da verdade real e dificultando o trabalho do magistrado de chegar o mais prximo possvel desse desiderato .Ao fazer meno pretrita existncia da ao investigatria, 'Provou a alegao!' (fi. 352), e inclusive defendendo que mesmo o exame de DNA no se prestaria para provar a pretendida paternidade (ti. 354), habilmente reitera, ainda que de forma oblqua, aquilo que textualmente dissera naquela primeira ao (que no manteve relao sexual com a me do autor e ela era dada a relaes mltiplas) .E, se no bastasse isso, incontroverso que, por duas ocasies, o apelante no compareceu para realizar o exame de DNA, procrastinando sobremaneira o andamento do processo, trazendo, para alm disso, alegaes paralelas acerca de uma suposta conduta desabonatria da me de Rafael, que em nada colaboraram para o deslinde da causa.Por tudo isso, mantenho a condenao por litigncia de m-f (e-STJ, fls. 504/506, sem destaque no original).

    A transcrio supracitada demonstrou o indisfarcvel intuito de alterao da verdade dos fatos e de dificultao da busca da verdade real, o que justifica a aplicao

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    e a manuteno da multa por litigncia de m-f, na forma dos incisos II e IV do art. 17 do CPC. O investigado, sem dvida alguma, quis se valer do processo, sem se atentar para o fato de que a verdade e a boa-f devem reger toda relao processual.

    Como bem observou o acrdo recorrido, o investigado, com jogo de palavras, reiterou o que disse no processo que antecedeu o presente (ao de investigao de paternidade ajuizada aos 21/7/1981 (e-STJ, fls. 78/119), ou seja, que no manteve relaes sexuais com a me de R.O, como dito, alterando a verdade dos fatos.

    No s! Nas razes recursais, ele indaga: "onde foi que o recorrente disso isso em sua defesa? Absolutamente nunca!". Pois bem, nas seguintes passagens da contestao apresentada no presente feito, s.m.j., ele, expressamente, nega que teve relaes sexuais com a genitora do investigante e disse que ela mantinha relaes com outros homens. Seno vejamos:

    [...]Que em sua defesa, ocorrida a quase trs dcadas atrs, o requerido sustentou que no manteve relaes sexuais com a genitora do requerente e, ainda, que esta mantinha tais relaes, apesar de terna idade, com homens de idade muito superior a sua.A prova do alegado est na contestao e documento ora apresentados, sendo que esses ltimos extrados tambm de um processo crime de seduo, onde o requerente foi absolvido (e-STJ, fl. 66, sem destaque no original).

    Tem mais! Do recurso de apelao, se extrai:

    [...]Naquela oportunidade o ora apelante apresentou a sua defesa sustentando, primeiro, que no manteve relao sexual com a genitora do apelado; e, segundo, que essa mantinha tais relaes, apesar da pouca idade, com homens de idade muito superior a sua.Provou a alegao . Os documentos apresentados nos autos, extrados tambm de um processo por crime de seduo, no qual o apelante foi absolvido . (e-STJ, fl. 440, com destaque no original).

    Ora, eminentes Ministros, quando ele disse que provou a alegao, ele est reiterando o que disse na ao anterior investigatria de paternidade, ou seja, de que no manteve relao sexual com a genitora do investigante e que essa mantinha relaes sexuais com outros homens. Eis, no meu entender, onde o recorrente fez, no processo, tais afirmativas em sua defesa!

    De outra parte, o recorrente sustenta ofensa ao 2 do art. 18 do CPC, porque no ficou comprovado o prejuzo que a parte sofreu quanto a tramitao do feito ou Documento: 48322091 - RELATRIO, EMENTA E VOTO - Site certificado Pgina 13 de 16

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    a leso na sua esfera jurdica.

    Sobre a matria em debate, verifico que, no obstante, o tema ter sido arguido pelo investigado na apelao, o Tribunal a quo no enfrentou a matria, tendo se limitado a confirmar a multa por litigncia de m-f e a reduzir o valor da indenizao. Nada disse a respeito de comprovao do prejuzo suportado pelo investigado resultante da conduta processual do recorrente. Desse modo, como os embargos de declarao, consoante visto acima, no foram utilizados para provocar a discusso da matria, incide espcie o bice da Smula n 282 do STF, no podendo o STJ enfrentar a questo, em razo da ausncia do indispensvel prequestionamento.

    Finalmente, o recorrente insiste na tese de que a coisa julgada formal que se materializou na anterior ao de investigao de paternidade envolvendo as mesmas partes deve prevalecer para a segurana das relaes jurdicas.

    O acrdo recorrido, sobre o tema, consignou que, como no houve exame do mrito por parte do Judicirio da primeira ao de investigao de paternidade, operou-se apenas a coisa julgada formal, no havendo bice a impedir o julgamento do presente com o enfrentamento da questo meritria (e-STJ, fls. 497/498).

    No merece nenhum reparo o acrdo recorrido no ponto, pois o Tribunal a quo decidiu em perfeita harmonia com a jurisprudncia desta Corte sobre a matria, o que atrai a incidncia da Smula n 83 do STJ, que se aplica tambm aos recursos especiais interpostos com fundamento na alnea a do permissivo constitucional. A propsito, guardadas as devidas propores, os seguintes julgados:

    AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DIVERGNCIA EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO DE FAMLIA. EXAME DE DNA. COISA JULGADA. MITIGAO. POSSIBILIDADE. 1. Nas aes de estado, como as de filiao, deve-se dar prevalncia ao princpio da verdade real, admitindo-se a relativizao ou flexibilizao da coisa julgada. 2. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE n 363.889/DF, de relatoria do Ministro Dias Toffoli, DJe de 16/12/2011, reconheceu a repercusso geral da questo e, no mrito, consolidou o entendimento de que "deve ser relativizada a coisa julgada estabelecida em aes de investigao de paternidade em que no foi possvel determinar- se a efetiva existncia de vnculo gentico a unir as partes, em decorrncia da no realizao do exame de DNA, meio de prova que pode fornecer segurana quase absoluta quanto existncia de tal vnculo". 3. possvel, com base na Smula n 168/STJ, inadmitir embargos de divergncia quando a jurisprudncia da Corte estiver no mesmo sentido do acrdo embargado. 4. Agravo regimental no provido.

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    (AgRg no EREsp n 1.201.791/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BAS CUEVA, Segunda Seo, julgado aos 12/112014, DJe de 19/11/2014, sem destaque no original).

    CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. NEGATRIA DE PATERNIDADE. VNCULO DECLARADO EM ANTERIOR AO INVESTIGATRIA. FLEXIBILIZAO DA COISA JULGADA. POSSIBILIDADE. PECULIARIDADES DO CASO. VNCULO GENTICO AFASTADO POR EXAME DE DNA. PRINCPIO DA VERDADE REAL. PREVALNCIA. RECURSO DESPROVIDO. Nas aes de estado, como as de filiao, deve-se dar prevalncia ao princpio da verdade real, admitindo-se a relativizao ou flexibilizao da coisa julgada. Admite-se o processamento e julgamento de ao negatria de paternidade nos casos em que a filiao foi declarada por deciso j transitada em julgado, mas sem amparo em prova gentica (exame de DNA). Precedentes do STJ e do STF. Recurso especial desprovido.(REsp n 1.375.644/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, Rel. p. acrdo Ministro JOO OTVIO DE NORONHA, julgado aos 1/4/2014, DJe de 2/6/2014, sem destaque no original).

    AGRAVO REGIMENTAL EM EMBARGOS DE DECLARAO NO RECURSO ESPECIAL - AO DE INVESTIGAO DE PATERNIDADE C/C PETIO DE HERANA - FALTA DE INTERESSE DE AGIR - SMULA N. 7 DO STJ - COISA JULGADA - FLEXIBILIZAO - POSSIBILIDADE DE REPROPOSITURA DA AO. IRRESIGNAO DA R.[...]3. "No se deve perder de vista que a pretenso deduzida na investigao fundamenta-se no direito personalssimo, indisponvel e imprescritvel de conhecimento do estado biolgico de filiao, consubstanciado no princpio constitucional da dignidade da pessoa humana (CF, art. 1, III), encontrando apoio na busca da verdade real. Destarte, mxime em aes de estado, no se apresenta aconselhvel privilegiar a coisa julgada formal em detrimento do direito identidade gentica, consagrado na Constituio Federal como direito fundamental, relacionado personalidade ." "Descabe, assim, na espcie, recusar o ajuizamento da nova ao (CPC, art. 268), quando h apenas coisa julgada formal decorrente da extino do processo anterior e a ao posteriormente proposta atende aos pressupostos jurdicos e legais necessrios ao seu processamento." (REsp 1.215.189/RJ, Rel. Ministro RAUL ARAJO, QUARTA TURMA, julgado em 02/12/2010, DJe 01/02/2011)4. In casu, o egrgio Tribunal a quo asseverou que a demanda anteriormente ajuizada no fez uso do exame de DNA, sendo julgada improcedente por inexistir prova idnea da pretenso,

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    motivo pelo qual possvel flexibilizar a coisa julgada, em face do princpio da dignidade da pessoa humana. 5. Agravo regimental a que se nega provimento.(AgRg nos EDcl no REsp n 1.201.791/SP, Rel. Ministro MARCO BUZZI, Quarta Turma, julgado aos 21/5/2013, DJe de 3/6/2013, sem destaque no original).

    Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso especial do investigado.

    Nessas condies, por fim, pelo meu voto, NEGO PROVIMENTO aos recursos especiais.

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