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Sócrates dizia que o fim último da educaçãoera tornar as crianças inteligentes e boas.

Hoje a questão colocada na Escola é encon-trar, e para isso precisa procurar incessantemen-te, quais as estratégias, as novas formas, de con-seguir alcançar esse objectivo.

Tanto Freud como Ferenczi consideram o co-nhecimento como uma fonte central de progressoe de humanização, e a ignorância como uma fon-te da doença e da paixão irracional. Para eles oconhecimento equivalia à compreensão e o recal-camento à ignorância.

A realidade socio-económica e cultural dePortugal e do Mundo está definitivamente alte-rada.

O sistema de valores mudou radicalmente.Actualmente há uma enorme e generalizada

dificuldade em encontrar normas, padrões e mo-delos reguladores do comportamento. Poucosse arriscam a compromissos, por isso compro-metedores, que impliquem indicadores de acçãoe de pensamento que possam constituir-se comomodelos de referência, ainda mais, quando, po-derão ser apelidados de «não correctos social-mente» ou de «politicamente incorrectos».

Goffman, em 1975 dizia-nos que: «Na Amé-rica, existia apenas um tipo de homem adultoque não corava,

- O jovem pai de família, casado, branco, ci-tadino, nórdico, heterossexual, protestante,diplomado por uma Universidade, empre-gado a tempo inteiro, de boa saúde, comum bom peso, uma altura suficiente e pra-ticante de um desporto.»

Actualmente, no início deste 3.º milénio, exis-tem até palavras que os mais jovens têm pudorem referenciar. Palavras com «amor», «felicida-de», «amizade», «crer», «escolher», «acreditar»,ou «optar» são hoje consideradas palavras com-prometedoras e difusas no seu significado.

Só modificando atitudes, será possível, talvez,percorrer o caminho do desenvolvimento de for-ma mais consistente.

É neste contexto que me fará sentido tentaranalisar, a preocupação tida ao longo da História,dada ao atendimento às pessoas portadoras dedeficiência.

É com o Cristianismo que a pessoa se eleva auma categoria absoluta e, é também nesta épocaque se iniciam as tentativas de compreensão,diria o trabalho de dar significado à diferença.

Esta procura – dar significado à diferença –ainda hoje se mantêm como uma procura inces-sante.

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Análise Psicológica (2002), 3 (XX): 401-406

A Escola Inclusiva e a igualdade deoportunidades

PAULA ZÊZERE (*)

(*) Instituto Superior de Psicologia Aplicada, Lis-boa.

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Aquando do nascimento de uma criança defi-ciente no seu de uma família, a questão posta deimediato pelos pais é «Porquê a nós» «O que fi-zemos de errado para merecer tal punição?».

Existe um trabalho cognitivo e emocional in-tenso, no sentido de tentar perceber o que falhoue deu origem a esta «catástrofe humana».

Percorrendo a história da História também ve-rificamos que a preocupação tida no atendimentoà diferença é, em si mesma, operadora de mu-danças irreversíveis e que contribui, inequivoca-mente, para melhorar o atendimento a todos.

Quem se lembra, hoje, como e porquê foi in-ventado o isqueiro?

Afinal teve como objectivo, permitir aos mu-tilados, da 2.ª Guerra Mundial, poderem conti-nuar a acender os seus cigarros sem ajuda!

Os novos olhares sobre os velhos problemassão fonte de novas respostas, com base e susten-tadas na criatividade e na vontade de mudar.

Exemplo do que acabo de expor é o RelatórioWarnock, datado de 1978, que veio incrementar,definitivamente, mudanças sociais irreversíveis,no atendimento às crianças com necessidadeseducativas especiais.

Neste relatório enfatizam-se o tipo e o grau deproblemas de aprendizagem ao nível psicopeda-gógico e não ao nível médico, como até aí se fa-zia.

A mudança de paradigma poderá e virá, comcerteza, a transcender e a transpôr o seu âmbitode actuação, ou seja, não será apenas aplicável àscrianças com deficiências comprovadas ou não,mas sim a todas as crianças incluídas no sistemaregular de ensino, mais que não seja, a presençafísica de alunos com características especiaisobriga a alterações na forma e conteúdos progra-máticos de todo o Plano Educativo e, por isso, naprópria dinâmica da Escola.

A Escola passou a atender APENAS ALU-NOS e não crianças com determinadas caracte-rísticas, excluindo, por isso, outras.

Haverá algo mais injusto e desumano do querestringir a partilha entre pares?

A escolaridade obrigatória passou a abrangerTODOS os que tivessem idades compreendidasentre os 6 e os 14 anos de idade, independente-mente das suas competências ou limitações.

Esta determinação está consagrada sob a for-ma de Decreto-Lei no n.º 319/ 91, onde se pro-clama a «ESCOLA PARA TODOS».

Afinal todos nós, de uma forma ou de outra,apresentamos necessidades específicas ao longoda vida, tendo por base contextos e acessibilida-des na informação recebida, nos inputs, proces-samento e outputs que realizamos, fundamenta-dos num suporte afectivo mais ou menos con-tentor das angústias e dos medos, das alegrias edas paixões, poderia dizer da forma como viven-ciamos, aprendemos a experimentar e a sentir aVIDA.

Podemos então dizer que a Instituição Escolademorou, mas acabou finalmente por assumir,pelo menos no plano formal, aquilo a que se pro-pôs desde o início do século XX, ser ela a pro-motora da tão clamada «IGUALDADE DEOPORTUNIDADES».

A Constituição Portuguesa estabelece, no seuArtigo n.º 74 que:

«O ensino deve contribuir para a superação dedesigualdades económicas, sociais e culturais.»

Promover a igualdades de oportunidades nãoé, de facto, dar o mesmo a todos, mas antes, dara cada um aquilo que lhe faz falta.

Este termo, tão mal compreendido e tão malinterpretado, é um dos pilares fundamentais daconstrução do Estado que se quer Democrático,fundado em princípios consignados nos DireitosHumanos, Civis, Políticos, Religiosos e Sociais.

No Documento das Nações Unidas sobre aIGUALDADE DE OPORTUNIDADES PARAPESSOAS COM DEFICIÊNCIA, e datada de1998, define-se este conceito da seguinte forma:

- «Processo pelo qual os diversos sistemasda sociedade e o meio envolvente (servi-ços, actividades, informação, etc.) se tor-nem ACESSÍVEIS a todos.

- Implica ainda que as necessidades de todose de cada um tenham igual importância,que sejam essas necessidades a base de pla-neamento das sociedades e que todos os re-cursos sejam utilizados de forma a garantira cada pessoa uma igual oportunidade departicipação.

- As pessoas com deficiência, quando atin-gem a igualdade de oportunidades, passamtambém a ter iguais obrigações.

- À medida que os direitos forem atingidosas sociedades devem aumentar as suas ex-pectativas face às pessoas com deficiên-cia.»

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A tomada de consciência das noções funda-mentais contidas neste conceito obriga-nos aempreender esforços no sentido de tentarmosresponder, da forma mais eficaz possível e emtempo real (atempadamente), às necessidadesdos alunos abrangidos por esta medida.

Outra noção fundamental é o conceito deACESSIBILIDADE.

Hoje questionamos de forma, que consideropertinente as questões da acessibilidade.

Desde as questões arquitectónicas, as altera-ções programáticas, revistas sem conta e refor-madas sem tempo de serem avaliadas (!), dãoênfase ao processo de ensino-aprendizagem fun-damentando-o em processos onde aprendizagenssem significado e, por isso, mais facilmenteaprendidas e apreendidas, para serem reutiliza-das noutro contexto.

Se não servem este objectivo, então para queservem efectivamente?

Acessibilidade aos conteúdos programáticos,aos Serviços às actividades, aos locais e à infor-mação são premissas fundamentais para que aigualdade de oportunidades se incremente defini-tivamente, pelo menos, nunca seja esquecida noplano dos princípios.

O TEMPO outra noção fundamental.Questionado sobre o que era efectivamente o

TEMPO, Einstein dizia que:

- Tempo era aquilo que o relógio marcava.

A percepção do tempo está condicionada pordiferenças individuais e culturais, nos seus as-pectos quantitativos e qualitativos, na orientaçãodo passado, presente, futuro e, ainda, no ensinoda importância dada ao tempo na organização daexperiência.

Há sociedades em que a importância dada aotempo é insignificante, contrastando com outras,que se orgulham da pontualidade dos seus horá-rios e que programam actividades com grandeprecisão.

As crianças, por norma, olham o futuro, an-seiam «ser crescidos».

Os adultos gostam de olhar o passado, mas oadolescente típico, move-se à frente e activa-mente no tempo, interessado, principalmente, emviver o presente.

Sem consciência da continuidade e sucessãoordenada do tempo e do ritmo dos factos, a cri-ança faz poucas tentativas para utilizar o pas-

sado, para predizer, antecipar, planificar e orde-nar os factos de um futuro imediato e/ou distan-te.

As diferenças individuais de percepção tem-poral podem estar relacionadas com factoresfisiológicos (reguladores internos) e com facto-res psicológicos, estes relacionados com o fenó-meno da percepção de um aumento relativo, noaspecto qualitativo do tempo, com a diminuiçãoreal do intervalo de tempo, ou o fenómeno con-trário.

Se anteriormente falámos de acessibilidade,aqui o tempo é uma variável incontornável.

Hoje reconhecemos ritmos diferenciados nosprocessos de adaptação cognitiva, no desenvolvi-mento humano em geral e nos ritmos de aprendi-zagem.

Variáveis fundamentais quando preconizamospercursos «o menos restritivos possíveis».

O estudo sobre literacia em Portugal, coorde-nado por Ana Benavente e editado pela Funda-ção Calouste Gulbenkian em 1996 refere que oinsucesso prolongado e a renúncia à escolaridadeobrigatória constituem um dos correntes fenóme-nos de exclusão.

Por este motivo a preocupação em encontraras variáveis que tornam a Escola um local poucosugestivo e pouco agradável, tantas vezes refe-renciado como hostil e desinteressante, onde oprocesso de ensino-aprendizagem, que deveriaser de Descoberta constante e de encontro setransforma num deserto afectivo de onde é ne-cessário fugir a todo o custo!

Muitos pais e professores querem que os seusfilhos e alunos aprendam muito e depressa. Esteconvite à impulsividade, passagens rápidas àacção, relembrando Pedro Strecht, na pág. 149do seu livro, a propósito da violência:

«os comportamentos são essencialmentedescargas de pulsões relativamente primá-rias, isto é, o comboio que leva a agir nun-ca parou no apeadeiro do pensar.»

Sabemos que passagens ao acto e comporta-mentos impulsivos, são em larga escala factoresdeterminantes na origem do erro, promotores porisso do insucesso que se inicia, ou amplia na es-cola, transformando-se em insucesso pessoal eque se vai alastrar a vida profissional.

O conflito pode ser a origem, e por isso o pon-to de partida, da exclusão.

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A Escola deverá ser o local, de passagem éverdade, mas parte integrante de um percursopessoal e social que se quer o mais harmoniosopossível, para possa ser construído à semelhançadas expectativas individuais.

Para os jovens, trabalho deverá significaruma das portas de entrada na vida adulta e, con-sequentemente, a conquista da autonomiapessoal e social, afinal é para isso que se cresce!

A Escola, como a entendo, deveria ser um lo-cal de passagem, é verdade, mas, acima de tudoum local de VERDADE.

Por outro lado constatamos, segundo dadosoficiais, que o desemprego atinge fundamental-mente, preferencialmente e, diria, cirurgicamenteos grupos específicos de jovens e mulheres combaixas qualificações académicas ou baixas quali-ficações profissionais (ex. recém-licenciados),paradoxal, já que sendo detentores de altas quali-ficações académicas não lhes são reconhecidascompetências profissionais, então para que ser-vem os estudos superiores? Supostamente, ou se-rá tradicionalmente, as faculdades davam com-petência profissional...

Na companhia da falta de rendimentos, o de-semprego traz a frustração social e pessoal.

Os processos de exclusão ancoram nos elos decadeia de «negatividades», como por exemplo:

- Redes familiares fragilizadas- Insucesso escolar- Desemprego- Isolamento social- Dificuldades de acesso a bens de consumo.

Um ciclo difícil de quebrar mas ainda maisdifícil de suportar!

Outra noção fundamental é o conceito deNEE – Necessidade Educativa Especial.

A sua maior virtude é assentar sobre a funcio-nalidade do próprio conceito. Hoje importa, aci-ma de tudo, o ESTADO FUNCIONAL, reme-tendo a sua análise para aquilo que todos os alu-nos esperam do sistema educativo, enquantofrequentam a Escola, ou seja, que efectivamenteo atendimento pedagógico percepcionado tenhaem atenção as características e particularidades eque os apoios e serviços se organizem de forma achegarem onde são necessários.

Esperam que a Escola os reconheça indivi-dualmente, enquanto PESSOAS.

O Movimento preconizado pela Escola Inclu-siva tem como meta atingir, e alicerçar, a cons-trução de uma nova forma de Estar e Ser social,a Sociedade Inclusiva.

Uma sociedade que se quer mais justa e, porisso, obrigatoriamente mais solidária.

O percurso escolar, tal como o nome indica,só faz sentido enquanto uma fase, uma etapa,tem, por isso, de servir como instrumento pro-motor do desenvolvimento pessoal e social, logoo veículo facilitador da inserção social, servindoefectivamente para tornar mais acessível a tran-sição para a vida adulta, promovendo o senti-mento de competência, a eficácia, o bem-estar,ser um veículo promotor da efectiva melhoria daqualidade de vida.

Se não é esse um dos seus objectivos, entãopara que serve?

Pretende-se que o adulto, a PESSOA, seja de-tentora da sua vida e as possibilidades de opçãoexistam efectivamente.

Que a escola cumpra a sua missão, funcionecomo um «operador» da inserção social, a váriosníveis.

Por um lado promova a aquisição efectiva decompetências de literacia (ao nível da leitura, daescrita e do cálculo), mas também a capacitaçãoe definição de possibilidades de localização nomundo do trabalho, mais precisamente do em-prego e de acesso às hipóteses de ascenção declasse social.

Segundo Garcia (2000), outra constatação,«aterradora», digo eu, é verificarmos que a Es-cola acolhe melhor os que não precisam, do pon-to de vista social, de ser tão bem acolhidos eacolhe pior aqueles que mais precisariam de si.

Sabemos ainda que são os pais mais esclare-cidos, logo os que precisariam menos, os quemais vezes se deslocam e participam na vida es-colar, mas também os mais ouvidos.

São os professores mais atentos aqueles que,normalmente, procuram e solicitam mais infor-mação, enfim, um rol de constatações preocu-pantes, que nos obrigam a reflectir e a tentar per-ceber os porquês!

Também verificamos que são os alunos queapresentam padrões mais reguladores, tanto emtermos cognitivos como sociais os que da Escolarecebem maior gratificação.

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Diria que me sinto a «jogar» um jogo viciadoe por isso sem validade!

Assim não vale!Vou agora transcrever um texto que considero

magnífico e, que contem em si tudo aquilo quequero dizer.

O texto é de Pedro Strecht, conhecido pedo-psiquiatra que não precisa de apresentações.

Este texto pertence ao livro da sua autoria in-titulado «CRESCER VAZIO», 3.ª edição, 1998:

ALGUNS DIREITOS/MUITAS INGENUI-DADES

- Todas as crianças com mais de cinco anostêm direito a desabafar.

- Todas as crianças até aos onze ou dozeanos têm direito a andar grátis no Carrocelquando estão de férias.

- Todas as crianças que andam na Escola têmdireito a serem alegres, terem amigos e abrincarem com os outros. Têm direito a teruma Professora que não grite com elas.

- Todas as crianças têm direito a ver o marverdadeiro, especialmente em dia de marévazia.

- Todas as crianças têm direito a, pelo menosuma vez na vida, escolher um chocolateque lhes apeteça.

- Todas as crianças têm direito a terem or-gulho na sua existência.

- Todas as crianças têm direito a pensar e asentir como lhes manda o coração, até se-rem velhas, aí com uns vinte anos.

- Todas as crianças têm direito a terem emcasa o Pai e a Mãe, os irmãos, se houver, ecomida. Se o Pai e Mãe não conseguiremviver juntos têm direito a que cada um de-les respeite o outro.

- Todas as crianças têm direito a deitarem-seno chão para ver as nuvens passar, imagi-nando formas de todos os bichos do Mundocombinadas com as coisas que quiserem(por exemplo, um cão a andar de patins ouuma girafa de orelhas compridas).

- Todas as crianças têm direito a começaremuma colecção não interessa de quê.

- Todas as crianças têm direito a chupar odedo indicador que espetaram num boloacabado de fazer ou então lamber a colhercom que raparam a taça em que ele foifeito.

- Todas as crianças têm direito a tentaremmanter-se acordadas até tarde numa noitede Verão, na esperança de verem uma es-trela cadente e pedirem três desejos (a jus-tiça devia fazer acontecer sempre pelo me-nos um).

- Todas as crianças têm direito a escrever oua falar uma linguagem inventada por elas(ou que julgam inventada por elas), comopor exemplo a «linguagem dos pês»: «apalinpingupuapagempem dospos pêspês».

- Todas as crianças têm direito a imaginar oque vão querer fazer quando forem grandes(habitualmente coisas extravagantes) e aperguntar aos adultos «o que queres serquando fores pequenino?».

- Todas as crianças têm direito a dormir nu-ma cama sua, sentindo o cheiro da roupalavada, e a terem um espaço próprio na ca-sa, pelo menos a partir do ano de idade.

- Todas as crianças têm direito a passear narua tentando pisar apenas o empedradobranco (ou só o preto); em opção, têm di-reito a fazer uma viagem contando quantoscarros vermelhos passam na faixa contrária.

- Todas as crianças meninos têm direito a,pelo menos uma vez na vida, perguntar auma menina «queres ser a minha namora-da?» e todas as meninas têm direito a, pelomenos uma vez na vida, responder, «sim,quero».

- Todas as crianças têm direito a ouvir umadulto contar pelo menos uma destas histó-rias: Peter Pan, o Principezinho ou o Prín-cipe Feliz.

- Todas as crianças têm direito a ter alegriasuficiente para imaginar coisas boas antesde dormirem e depois, a sonhar com elas.

- Todas as crianças têm direito a ter um bo-neco de peluche preferido, especialmentequando velho, já lavado e mesmo com umolho a menos.

- Todas as crianças (especialmente se já ado-lescentes) têm direito a usar os ténis prefe-ridos, mesmo que rotos e com cheiro tóxi-co.

- Todas as crianças têm direito a poder tomarbanho sozinhas e a experimentar mergulharna banheira contando o tempo que aguen-tam sem respirar.

- Todas as crianças têm direito a jogar aos

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polícias e ladrões, preferindo inevitavel-mente serem ladrões.

- Todas as crianças têm direito a ter um coloonde se possam sentar, enroscar como nu-ma concha e receber mimos.

- Todas as crianças têm direito a nasceriguais em direitos.

- Todas as crianças têm direito a conhecer osítio onde nasceram e a visitá-lo livremen-te.

- Todas as crianças têm direito a não ficaremsozinhas a chorar.

- Todas as crianças têm direito a viver numPaís que tenha um Ministério da Infância eJuventude, que olhe verdadeiramente pelocrescimento afectivo e bem-estar interior(sem preconceitos adultocênticos ou hipo-crisias com ares de cromo abrilhantado).

- Todas as crianças têm direito a acreditarque têm um adulto que olha por elas e asama sem condição prévia (nem que sejaNosso Senhor).

- Todas as crianças têm direito a viver felizese a ter paz nos seus pensamentos e senti-mentos.

Pelo que apresentei, considero muito impor-tante tomar consciência que no plano formalmuito está feito.

A disparidade existe, fundamentalmente, noconfronto absurdo entre o que a Lei consagra e oque efectivamente se pratica, passando sistema-ticamente por cima de enunciados importantes,sem respeito, que pelos actos ninguém se respon-sabilize.

Habitualmente refiro, que a última invençãofoi a pólvora, hoje o importante é recriar mode-los, reinventar soluções, mudar pontos de refe-rência, confrontar pontos de vista e, talvez assim,encontrar novas respostas para velhos proble-mas.

Acreditar, crer, escolher melhor, saber dizersim e também não, ter convicções e não ser faná-tico, ter valores mesmo quando parecem ridí-culos, no fundo, creio, TORNARMO-NOS PES-SOAS.

Quero ainda aqui relembrar Bertolt Brecht(1930), que nos deixou, entre outras, estas reco-mendações essenciais:

«Devem desconfiar de tudoaté do mais pequeno pormenor,mesmo que lhes pareça insignificante.Procurem ver se está certo,principalmente se é como de costume!Pedimos expressamente que não achem natu-

ral!Aquilo que acontece sempre! (...)Devem estranhá-lo embora não seja estranho,achá-lo inexplicável embora seja usual,incompreensível embora seja a regra (...)»

UM VIVA À VIDA.

RESUMO

A autora faz uma reflexão sobre a nova ordem so-cio-económica e cultural e a sua influência sobre a ela-boração de normas, padrões e modelos que regulam oscomportamentos.

É feita referência às respostas acessíveis às pessoascom necessidades especiais nomeadamente nos planoslegal e educativo.

É ainda destacada a Escola Inclusiva, paradigmaque permitiu deslocar o enfoque da intervenção dodomínio estritamente médico para o âmbito psicopeda-gógico.

Palavras-chave: Pessoas com necessidades especi-ais, educação, Escola Inclusiva.

ABSTRACT

The author reflects on the new social-economic andcultural order and its influence on norms, patterns andmodels that regulate behaviours.

A reference is made to the answers available topeople with special needs, namely on the legal andeducational level.

Inclusive School, the paradigm that allowed inter-vention to move from the medical domain into the psy-chopedagogical domain, is emphasised.

Key words: People with special needs, education,Inclusive School.

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