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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ GABRIEL HENRIQUE REHME SANTOS A NOVA LEI SOBRE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA - LEI 12.850/2013 CURITIBA 2014

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

GABRIEL HENRIQUE REHME SANTOS

A NOVA LEI SOBRE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA - LEI 12.850/2013

CURITIBA

2014

GABRIEL HENRIQUE REHME SANTOS

A NOVA LEI SOBRE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA - LEI 12.850/2013

Trabalho de Conclusão de Curso apresentada ao Curso de Direito da Faculdade de Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito. Orientador: Prof. Dr. Daniel Ribeiro Surdi de Avelar

CURITIBA

2014

TERMO DE APROVAÇÃO

GABRIEL HENRIQUE REHME SANTOS

A NOVA LEI SOBRE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA – LEI 12.850/2013

Esta monografia foi julgada e aprovada para a obtenção do grau de Bacharelado no

Curso de Direito da Universidade Tuiuti do Paraná.

Curitiba, ___ de _____________ de 2014.

____________________________________________ Prof. Dr. Eduardo de Oliveira Leite

Coordenador do Núcleo de Monografia Universidade Tuiuti do Paraná

Orientador: ____________________________________________ Prof. Daniel Ribeiro Surdi de Avelar

Universidade Tuiuti do Paraná Curso de Direito

Prof. Dr.: _____________________________________________ Universidade Tuiuti do Paraná

Curso de Direito

Prof. Dr.:______________________________________________ Universidade Tuiuti do Paraná

Curso de Direito

Dedico esse Trabalho de Conclusão de Curso ao

meu pai, que sempre me incentivou a estudar e me

ensinou que por mais difícil que seja a situação

jamais desistir; também a minha mãe, in memoriam,

que de onde estiver está sempre me transmitindo

forças.

Agradeço primeiramente ao meu pai, pois sem ele a

realização desse sonho seria impossível, em

seguida, agradeço aos mestres que fizeram parte da

minha jornada e me ajudaram a completá-la. Por fim

agradeço a minha família, a minha namorada e

meus amigos por sempre acreditarem no meu

sucesso.

“Cuida de evitar os crimes, para que não sejas

obrigado a puni-los.”

Confúcio

“A justiça atrasada não é justiça; senão injustiça

qualificada e manifesta.”

Rui Barbosa

RESUMO No presente trabalho buscou-se uma abordagem geral acerca da nova Lei de organização criminosa, Lei 12.850 de 02 de agosto de 2013, analisando e demonstrando de maneira objetiva as inovações do novo texto legal; partindo de uma breve exposição da legislação antecessora, passando pela conceituação de organização criminosa, até então inexistente de maneira satisfatória, finalizando com o estudo do instituto da plea barganing (colaboração premiada no nosso ordenamento jurídico) e infiltração de agentes. Palavras-chave: Crime Organizado. Lei 12.850/2013. Colaboração Premiada. Infiltração de Agentes.

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO.................................................................................................08

2 RETROSPECTO LEGISLATIVO ....................................................................09

3 CONSIDERAÇÕES INICIAIS SOBRE A NOVA LEI ......................................14

4 DEFINIÇÂO E UNIFICAÇÃO CONCEITUAL DE ORGANIZAÇÃO

CRIMINOSA...............................................................................................................15

4.1 TIPO PENAL INCRIMINADOR........................................................................18

4.2 DIFERENÇA DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA DE ASSOCIAÇÃO

CRIMINOSA...............................................................................................................22

5 INSTITUTO DA PLEA BARGANING–COLABORAÇÃO PREMIADA...........26

5.1 REQUISITOS E RESULTADOS .....................................................................28

5.2 LEGITIMIDADE ATIVA PARA A PROPOSTA DE ACORDO .........................34

5.2.1 Legitimidade ativa do Delegado de Polícia .....................................................35

5.2.2 Legitimidade ativa do Ministério Público .........................................................37

5.3 PROCEDIMENTO ...........................................................................................38

5.4 DIREITOS DO COLABORADOR ....................................................................40

6 DA INVESTIGAÇÃO E DOS MEIOS DE OBTENÇÃO DA PROVA –

INFILTRAÇÃO DE AGENTES ..................................................................................42

6.1 REQUISITOS ..................................................................................................42

6.2 PROCEDIMENTOS E CONDUTA DO AGENTE ............................................44

7 CONCLUSÃO .................................................................................................46

BIBLIOGRAFIA...............................................................................................48

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1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho de conclusão de curso irá trazer uma pesquisa sobre as

características fundamentais da nova Lei de Organizações Criminosas, Lei nº

12.850/13, tema que está em atual ascensão em razão da publicação no ano

passado do referido instituto e também por conta das inovações que o mesmo

trouxe.

A razão da escolha do tema deve-se ao fato de que até o momento da

publicação da nova Lei, o legislador penal sequer tinha elaborado uma definição

legal clara do que seja crime organizado. Além do mais, a questão do crime

organizado em nosso país é pouco debatida no sentido de procurar métodos

eficientes para acabar com essa prática delituosa que movimenta enormes quantias

de dinheiro.

A principal intenção com tal estudo é demonstrar as inovações trazidas pela

nova Lei, de maneira objetiva, sem a intenção de realizar um esgotamento do

assunto, pois, tal feito seria impossível uma vez que por conta da recente alteração

legislativa, pensamentos e comentários estarão sendo apresentados e

fundamentados com o decorrer do tempo.

Procurou-se também realizar um estudo sobre o instituto da plea barganing,

amplamente utilizado nos Estados Unidos da América, no nosso ordenamento

conhecido como a colaboração premiada, seguindo as diretrizes trazidas pela nova

Lei.

E por fim, tratar-se-á a respeito da infiltração de agentes nas organizações

criminosas como meio de investigação e de produção de provas.

Conclui-se que o objetivo é elaborar uma pesquisa sobre a nova Lei de

Organizações Criminosas, buscando explicar de maneira objetiva os novos institutos

por ela trazidos. Tais novidades têm por finalidade acabar com a prática delituosa

das Organizações Criminosas, que, a cada dia que passa, desenvolvem e ampliam

suas atividades, ameaçando a sociedade e as instituições do Estado.

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2 RETROSPECTO LEGISLATIVO

Antes de começar a realizar o estudo da nova Lei de organizações

criminosas e para que se possa demonstrar as suas inovações é necessário que se

faça, de maneira breve, o conhecimento dos principais dispositivos legais que

tratavam sobre o mesmo tema e antecederam a atual Lei.

O primeiro dispositivo a tratar sobre o tema foi a Lei nº 9.034, de 03 de maio

de 1995. O Congresso Nacional discutia o assunto em razão de uma tendência

universal de repreensão ao crime organizado, tendência esta ainda evidente nos

dias de hoje, quando em 1989 foi elaborado o projeto de Lei pelo Deputado Miro

Teixeira e, posteriormente, em 03 de maio de 1995 houve a sanção presidencial da

Lei 9.034 que visava dispor sobre os meios operacionais para a prevenção e

repressão de ações praticadas por organizações criminosas.

Entretanto essa Lei é muito incoerente, incapaz de definir um conceito do

que é crime organizado ou uma organização criminosa. Em seu artigo 1º limitou-se a

conceituar o crime de quadrilha ou bando, assim segue: “Art. 1º Esta Lei define e

regula meios de prova e procedimentos investigatórios que versarem sobre crime

resultante de ações de quadrilha ou bando”.(BRASIL, 1995, p. Única).

Sobre tal fato comenta Cunha e Pinto: No ano de 1995 o Brasil editou a Lei 9.034 dispondo sobre a utilização de meios operacionais para a prevenção e repressão de ações praticadas por organizações criminosas. Apesar de louvável a iniciativa veio acompanhada de falhas, chamando atenção a ausência de definição do próprio objeto da Lei: Organização Criminosa. (2013, p.11).

Não podemos confundir organização criminosa com o que está disposto no

art. 288 do Código Penal Brasileiro que trata da ação delituosa de quadrilha ou

bando, haja vista que organização criminosa possui um modo de agir muito mais

complexo do que a simples associação de três ou mais pessoas com o fim de

praticar atos ilícitos.

A Lei nº 9.034 mostrou-se ineficaz e incoerente, sendo alvo de críticas de

inúmeros doutrinadores. Podemos observar nas palavras de Nucci:

[...] O Brasil, nesse rumo, editou a Lei 9.034/1995, com a finalidade de ingressar, aparelhado, no esforço legalizado de punir os integrantes dessa espécie de organização. Infelizmente, a referida Lei foi editada com várias

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falhas, dentre elas, a ausência de uma definição de organização criminosa [...] Por certo, foi de pouca valia nos últimos 18 anos.” ( 2013, p. 5).

O ordenamento jurídico brasileiro ficou sem um conceito de organização

criminosa desde a publicação da Lei nº. 9.034/95 até o momento em que entra em

vigor o Decreto nº 5.015 de 12 de Março de 2004, que promulgou a Convenção das

Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, conhecida como

Convenção de Palermo, adotada em Nova York em 15 de Novembro de 2000. A

Convenção entrou em vigor internacional, em 29 de setembro de 2003, e passou a

vigorar no Brasil, em 28 de fevereiro de 2004.

Tal Decreto, no seu art. 2º delimita um conceito para organização criminosa,

assim segue:

Art. 2º. Terminologia. Para efeitos da presente Convenção, entende-se por: a) "Grupo criminoso organizado" - grupo estruturado de três ou mais pessoas, existente há algum tempo e atuando concertadamente com o propósito de cometer uma ou mais infrações graves ou enunciadas na presente Convenção, com a intenção de obter, direta ou indiretamente, um benefício econômico ou outro benefício material. (BRASIL, 2004, P. ÙNICA).

De maneira insuficiente, a Convenção de Palermo passou a delimitar,

mesmo que de maneira ampla e genérica o conceito de organização criminosa para

nosso ordenamento jurídico; não escapando também de inúmeras críticas

doutrinárias. Como por exemplo, cito as feitas por Gomes:

1º) a definição de crime organizado contida na Convenção de Palermo é muito ampla, genérica, e viola a garantia da taxatividade (ou de certeza), que é uma das garantias emanadas do princípio da legalidade; 2º) a definição dada, caso seja superada a primeira censura acima exposta, vale para nossas relações com o direito internacional, não com o direito interno; de outro lado, é da essência dessa definição a natureza transnacional do delito (logo, delito interno, ainda que organizado, não se encaixa nessa definição). Note-se que a Convenção exige "(...) grupo estruturado de três ou mais pessoas, existente há algum tempo e atuando concertadamente com o propósito de cometer uma ou mais infrações graves ou enunciadas na Convenção, com a intenção de obter, direta ou indiretamente, um benefício econômico ou outro benefício material". Todas as infrações enunciadas na Convenção versam sobre a criminalidade transnacional. Logo, não é qualquer criminalidade organizada que se encaixa nessa definição. Sem a singularidade da transnacionalidade não há que se falar em adequação típica, do ponto de vista formal; 3º) definições dadas pelas convenções ou tratados internacionais jamais valem para reger nossas relações com o Direito penal interno em razão da exigência do princípio da democracia (ou garantia da lex populi) permanecendo atípica a conduta. (2009, p. Única).

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Posteriormente surge com a Lei nº. 12.694 de Julho de 2012 que dispõe

sobre o processo e o julgamento colegiado em primeiro grau de jurisdição de crimes

praticados por organizações criminosas, a primeira conceituação legislativa sobre

organização criminosa, demonstrado no art. 2º de tal dispositivo:

Art. 2º: Para os efeitos desta Lei, considera-se organização criminosa a associação, de 3 (três) ou mais pessoas, estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de crimes cuja pena máxima seja igual ou superior a 4 (quatro) anos ou que sejam de caráter transnacional.(BRASIL, 2012, p. Única).

Sobre o tema comenta Gomes:

Com o advento da Lei 12.694, de 24 de julho de 2012, que dispôs sobre o processo e o julgamento colegiado em primeiro grau de jurisdição de crimes praticados por organizações criminosas, alcançamos grande avanço com a definição da organização criminosa. Mas o legislador não cominou nenhuma pena. Logo, continuamos sem contar com o crime de organização criminosa. Só temos a sua definição, que é útil para fins processuais e investigativas. (2014, p. Única).

Ficou evidente que referido dispositivo legal tinha mero caráter processual e

é insuficiente na tentativa de conceituar o delito de crime organizado uma vez que o

legislador não cominou nenhuma pena para tal, então, logicamente, não existia até

então o crime de organização criminosa. Fundamentando, cito Gomes novamente:

“Esta Lei não cominou nenhum tipo de sanção penal, logo, não criou o crime

organizado. Deu o conceito de organização criminosa, para fins processuais, mas

não criou o crime respectivo”. ( 2014, p. Única).

Em tempo, vale demonstrar jurisprudência referente ao tema:

“‘HABEAS CORPUS’. LAVAGEM DE DINHEIRO. AUSÊNCIA DE DEFINIÇÃO LEGAL DO TERMO ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. INOCORRÊNCIA. CONVENÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS CONTRA O CRIME ORGANIZADO TRANSNACIONAL (CONVENÇÃO DE PALERMO). DECRETO LEGISLATIVO Nº 231, DE 29 DE MAIO DE 2003, E DECRETO N.º 5.015, DE 12 DE MARÇO DE 2004. DELITO DE LAVAGEM DE DINHEIRO PRATICADO POR ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA (ART. 1º, VII, DA LEI Nº 9.613/98). DESNECESSIDADE DE DESCRIÇÃO DO CRIME ANTECEDENTE. INÉPCIA DA DENÚNCIA NÃO VISLUMBRADA. ORDEM DENEGADA. 1. O conceito jurídico da expressão organização criminosa ficou estabelecido em nosso ordenamento com o Decreto n.º 5.015, de 12 de março de 2004, que promulgou o Decreto Legislativo nº 231, de 29 de maio de 2003, que ratificou a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional (Convenção de Palermo). Precedentes

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desta Corte e do Supremo Tribunal Federal. 2. A Lei nº 9.613/98 não só estabelece, em seu art. 1º, um rol de crimes antecedentes ao de lavagem, como também autoriza que outros delitos nela não especificados venham a constituir crimes antecedentes, desde que cometidos por organização criminosa. Assim, possível a imputação do crime de lavagem de capitais quando os recursos financeiros foram obtidos por organização criminosa, não havendo necessidade de se elencar quais seriam as supostas condutas por ela perpetradas a fim de se obter as vantagens econômicas indevidas. 3. O trancamento da ação em sede de ‘habeas corpus’ é medida excepcional que somente pode ser deferida quando se mostrar evidente a atipicidade do fato, a absoluta falta de indícios de materialidade e de autoria do delito ou quando presente alguma causa extintiva da punibilidade, hipóteses não encontradas no presente caso, pois foram apresentados na denúncia fatos que, pelo menos em tese, podem caracterizar a prática do crime de lavagem de capitais oriundos de recursos provenientes de delitos perpetrados por organização criminosa. 4. Dessa forma, a peça acusatória, tal como apresentada, preenche os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal, e atende as exigências trazidas pela Lei nº 9.613/98, uma vez que o delito de lavagem de capitais teria sido praticado por organização criminosa - o que dispensa a exigência de descrição do crime antecedente -, não havendo falar em encerramento prematuro do processo pela via do trancamento. 5. Ademais, o ‘parquet’ não só trouxe a descrição abrangente de como funcionava o esquema delituoso da organização criminosa, como também demonstrou a existência de indícios suficientes da ocorrência dos delitos de estelionato e formação de quadrilha em prejuízo do Poder Público, motivo pelo qual não se vislumbra qualquer irregularidade apta a tornar a denúncia inepta. 6. ‘Habeas corpus’ denegado. (...) (STF - HC: 111021 PE , Relator: Min. CELSO DE MELLO, Data de Julgamento: 11/10/2012, Data de Publicação: DJe-203 DIVULG 16/10/2012 PUBLIC 17/10/2012)”.

Com a finalidade de demonstrar a revogação da Lei 9.034/95 pela atual legislação, segue julgado:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL. NÃO CONHECIMENTO DO WRIT. REGIME FECHADO. SUBSTITUIÇÃO DA PENA. APLICAÇÃO DO ART. 10 DA LEI 9.034/95. FLAGRANTE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. OFENSA À INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA. DISPOSIÇÃO REVOGADA PELA LEI 12.850/13. ORDEM CONCEDIDA, DE OFÍCIO, COM EXTENSÃO AO CORRÉU. [...] 2. A imposição do regime inicial fechado, com fundamento no art. 10 da Lei 9.034/95, ofende a garantia da individualização da pena, prevista no art. 5º, XLVI, da CF. 3. A Lei 12.850/13, ao revogar expressamente o disposto na Lei 9.034/95, não mais previu a imposição de regime inicial fechado, conformando as disposições legais à sistemática constitucional. 4. Constitui flagrante constrangimento ilegal a negativa de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, com fundamento na sua incompatibidade executória com o regime inicial fechado, determinado pelo art. 10 da Lei 9.034/95. 5. Encontrando-se o corréu em situação fático-processual idêntica à do paciente, é de rigor a extensão da ordem, nos termos do art. 580 do CPP. 6. Ordem não conhecida. Habeas corpus concedido, de ofício, para que, afastada a obrigatoriedade de imposição do regime inicial fechado, o Tribunal a quo avalie a possibilidade de modificação do regime inicial de cumprimento de pena e de substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, à luz dos elementos concretos constantes dos autos, nos termos dos arts. 33, §§ 2º e 3º, e 44 e incisos, do CP, com extensão da ordem ao corréu.

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(STJ - HC: 189399 PR 2010/0202645-2, Relator: Ministro NEFI CORDEIRO, Data de Julgamento: 06/05/2014, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 16/05/2014)

Realizadas tais considerações podemos entrar efetivamente no tema

principal dessa pesquisa, as inovações trazidas pela Lei nº. 12.850/2013 – Nova Lei

de Organizações Criminosas.

14

3 CONSIDERAÇÕES INICIAIS SOBRE NOVA LEI

Diante das criticadas tentativas do legislador regulamentar a questão das

organizações criminosas era inevitável a criação de mais uma Lei sobre tal tema. A

Lei nº. 12.850 de 02 de Agosto de 2013 é positiva e tende a corrigir os defeitos da

legislação anterior.

Nas palavras de Nucci, “A edição da Lei 12.850 de 02 de Agosto de 2013 é

inequivocamente positiva, pois corrige vários defeitos da legislação anterior,

trazendo novidades nos campos penal e processual penal”. ( 2013, p. 05).

Os principais destaques da nova Lei são estabelecer um conceito de

organização criminosa, criar o tipo penal incriminador da organização criminosa,

disciplinar novos moldes para a colaboração premiada e infiltração de agentes,

dentre outros. Os principais serão aprofundados no decorrer deste trabalho.

Segundo Pacelli:

A nova legislação, de fato, traz muitas novidades. As mais importantes não constam de nosso catálogo jurídico-cultural, vindo importadas de outros horizontes. O que, por si só, jamais seria um problema. [...] A Lei 12.850/13, depois de muitos ensaios, inaugura – ou pretende inaugurar, se os oráculos constitucionais permitirem! – uma modalidade do conhecido plea barganing, tão em (péssimo) uso nos Estados Unidos da América. Ali 85% (oitenta e cinco por cento) dos casos penais são encerrados pelo plea barganing com claras e notórias intenções de reforçar a crença na suposta eficiência do sistema. ( 2013, p. 01).

Nucci acredita que todas as inserções feitas na nova Lei eram necessárias e

somente vêm aprimorar o sistema de combate legal ao crime organizado. Entre

acertos e desacertos a Lei nº. 12.850/13 comporta mais aspectos positivos.

Assim sendo passa-se a expor as mais significativas inovações introduzidas

pela nova legislação.

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4 DEFINIÇÃO E UNIFICAÇÃO CONCEITUAL DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA

Com a introdução da Lei nº 12.850/13 o legislador revê o conceito de

organização criminosa já no parágrafo primeiro do seu artigo inaugural, assim

segue:

§ 1o Considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional.(BRASIL, 2013, p. Única).

Finalmente o ordenamento jurídico brasileiro tipificou o crime de organização

criminosa, brevemente, sobre o tema, Pacelli:

O tema relativo às organizações criminosas sempre foi um tormento na práxis nacional, primeiro, por ausência de uma definição mais clara quanto aos diversos significados da expressão, e, segundo pela profusão de referências legislativas a ela, sem, contudo, esclarecer-se a sua eventual tipificação. Afinal, indagava-se, haveria ou não o crime de formar ou integrar organização criminosa? A resposta agora é positiva[...].(2013, p. 05).

A mesma indagação feita por Pacelli, no que se refere a existência ou não

de crime de formar ou integrar organização criminosa, foi realizada por outros

doutrinadores, restando-se evidente de que o antigo conceito tinha mero caráter

processual, não delimitava uma pena, logo, não se criou o tipo penal incriminador de

crime organizado.

Tal problemática foi resolvida no art. 2º da Lei nº. 12.850/2013 como mais á

frente se mostrará. No momento, percebemos que as mudanças trazidas pela nova

Lei são conceituais e tipológicas, sendo de evidente e substancial importância. A

primeira mudança que temos no conceito é a associação de quatro ou mais

pessoas, entretanto tal conceito já levanta polêmicas como demonstra Nucci:

Associação de quatro ou mais pessoas: o numero de associados, para configurar crime organizado, resulta de pura politica criminal, pois variável e discutível. Segundo entendemos, conforme o caso concreto, duas pessoas podem organizar-se, dividir tarefas e buscar um objetivo ilício comum. Por certo, não é comum que assim ocorra, embora não seja impossível [...] independente disso, optou o legislador pela ideia esboçada pela anterior redação do art. 288 do Código Penal, constitutiva da quadrilha ou bando, que é a reunião de mais de três pessoas, logo, quatro ou mais. (2013, p.14).

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Critica Nucci alegando que de maneira lamentável a nova legislação

permanece sem uniformidade, mantendo o número de duas pessoas na Lei de

Drogas Lei nº. 11.343/2006; cria-se o mínimo de três pessoas na associação

criminosa (modificação realizada pela Lei nº. 12.850/13 no art. 288 do Código Penal

que eliminou o título de quadrilha ou bando) e exigindo-se pelo menos quatro

pessoas para configurar crime de organização criminosa.

Embora fundamentada a crítica de Nucci resume-se no Brasil que a

organização criminosa somente pode validar-se com o número mínimo de quatro

integrantes.

A próxima informação que podemos extrair do tipo penal constante no

parágrafo primeiro se refere à estruturação da organização criminosa e sua

finalidade, segue parte do texto legal: “[...] estruturalmente ordenada e caracterizada

pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou

indiretamente, vantagem de qualquer natureza”.(BRASIL, 2013, p. Única).

Tal preceito continuou com a idêntica redação da legislação antecessora,

restando-se evidente de que para formação de uma organização criminosa é

necessário um conjunto de pessoas estabelecidas de maneira hierárquica, de modo

que cada um possua uma atribuição particular e responda por seu cargo. Não

haverá necessariamente uma divisão formal das tarefas prevalecendo o aspecto

informal. “O aspecto informal, nesse campo, prevalece, justamente por se tratar de

atividade criminosa, logo clandestina.” (NUCCI, 2013, p.15)

Continuando a análise “desmembrada” do artigo chegamos à expressão:

“[...] mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores

a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional”.(BRASIL, 2011, p. Única).

Nessa nova redação o legislador ao tratar de infrações penais se refere aos

crimes com penas máximas superiores a quatro anos e também as contravenções

penais cujas penas máximas excedam esse número ou que tenham caráter

transnacional, retirando da figura típica infrações que tenham pena máxima igual a

quatro anos. A questão sobre crimes de caráter transnacional foi mantida na

legislação atual, independentemente da pena a elas cominada, incluindo-se agora

os atos de terrorismo que assim sejam definidos pelas normas de direito

internacional.

Nucci acredita ser equivocada parte do artigo, como assim demonstra-se:

17

[...] este elemento também é fruto de política criminal, que, em nosso entendimento, é equivocada. Não há sentido em se limitar a configuração de uma organização criminosa, cuja atuação pode ser extremamente danosa à sociedade, à gravida abstrata de infrações penais. Em primeiro lugar, corretamente, o texto normativo menciona infração penal, em lugar de crime, podendo abranger, em tese, tanto os crimes quanto as contravenções penais. Entretanto, inexiste contravenção com pena máxima superior a quatro anos, tornando o conceito de organização criminosa, na prática, vinculado estreitamente aos delitos..(2013, p.16).

Acredito que o pensamento de Nucci esteja correto no que se refere ao

equívoco do legislador em limitar a configuração de organização criminosa. É

evidente que, por exemplo, pode existir uma organização criminosa que explore a

prática de jogos de azar, sendo assim, uma contravenção penal que tem como pena

máxima 1 (um) ano e 4 (quatro) meses contando com a causa de aumento de pena.

Deste modo não estaria configurado a figura típica de organização criminosa.

O legislador ao criar a Lei nº. 12.850/13 não se referiu à revogação parcial

da Lei nº. 12.694/12 no que se refere à definição de organização criminosa, assim

Pacelli comenta a respeito:

Embora a Lei 12.850/13 não se refira à eventual revogação parcial da Lei 12.694/12 precisamente no que respeita à definição de organização criminosa, pensamos não ser mais possível aceitar a superposição de conceitos em tema de tamanha magnitude. Do contrário, teríamos que conviver com um conceito de organização criminosa especificamente ligada à formação do Colegiado de primeiro grau (Lei 12.964/14), e com outro, da Lei 12.850/13, aplicável às demais situações. (2013, p. 06).

Gomes também trata do tema:

O conceito de organização criminosa dado pela Lei 12.694/12 continua válido? Não [...] O conceito dado pela Lei 12.694/12 visava a permitir o julgamento colegiado em primeira instância. Essa possibilidade (de julgamento colegiado em primeiro grau) continua. Mas, agora, o juiz tem que se valer do conceito de organização criminosa da Lei 12.850/13, pelo seguinte: é com esta nova Lei que veio, pela primeira vez no Brasil, o conceito de "crime" organizado. O processo (julgado por juiz singular ou por juiz colegiado) existe para tornar realidade a persecução de um crime (ele é o instrumento da persecutio criminis in iuditio). O julgamento colegiado em primeiro grau é instrumento, não a substância. É a forma, não a matéria. Se o instrumento processual existe para tornar realidade o material, o substancial (o essencial), claro que esse instrumento deve estar conectado ao principal. O acessório segue a sorte do principal. Quando os juízes se reúnem coletivamente é para apurar e julgar um "crime organizado". Eles não se reúnem para julgar a organização criminosa, isoladamente, que constitui apenas uma parte do crime organizado. O que importa para fins penais e processuais é o crime (não a parte dele). Se o conceito de crime organizado está dado pela nova Lei, aos juízes competem seguir a nova Lei, respeitando o seu conceito de crime organizado, que nada mais é que a soma dos requisitos típicos do art. 2 com a descrição de organização

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criminosa do art. 1. Em síntese: doravante, somente pode haver julgamento colegiado em primeira instância quando presentes os requisitos do crime organizado dado pela nova Lei (Lei 12.850/13). Desapareceu do ordenamento jurídico válido o conceito dado pela Lei 12.694/12 [...]. ( 2013, p. Única).

Também a respeito se manifesta Bitencourt:

No entanto, na nossa ótica, admitir-se a existência de “dois tipos de organização criminosa” constituiria grave ameaça à segurança jurídica, além de uma discriminação injustificada, propiciando tratamento diferenciado incompatível com um Estado Democrático de Direito, na persecução dos casos que envolvam organizações criminosas. Levando em consideração, por outro lado, o disposto no § 1º do art. 2º da Lei de introdução as normas do Direito Brasileiro (Decreto-Lei 4.657/1942), Lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a Lei anterior. Nesses termos, pode-se afirmar, com absoluta segurança, que o § 1º do art. 1º da Lei 12.850/2013 revogou, a partir de sua vigência, o art. 2º da Lei 12.694/2012, na medida em que regula inteiramente, e sem ressalvas, o conceito de organização criminosa. ( 2014, p. Única).

Assim sendo, percebe-se que a doutrina majoritária se posicionou a favor da

revogação parcial - mesmo esta não estando presente de maneira expressa na nova

legislação - do instituto anterior no que se refere ao conceito de organização

criminosa. Adotarmos dois conceitos sobre um mesmo tema só gera confusão, além

do mais, a nova Lei regulamentou o tema organização criminosa de maneira integral

(tipificou e penalizou o crime organizado), supriu por completo a insuficiência

legislativa anterior, deste modo, por regular inteiramente a respeito de organização

criminosa revogou-se a Lei anterior.

Em relação a essa possível problemática, já resolvida majoritariamente,

sobre a dupla conceituação de organização criminosa, finaliza-se com palavras de

Pacelli: “[...] com o objetivo de unificarmos o conceito de organização criminal na ordem jurídica

nacional, pensamos que deverá prevalecer, para quaisquer situações de sua aplicação, a definição

constante do art. 1º da Lei 12.850/13.” (2013, p. 06).

4.1 TIPO PENAL INCRIMINADOR

Percebemos que o legislador ao criar a Lei nº. 9.034/95 que trava de

organização criminosa, não tipificou claramente o delito de crime organizado,

apenas vinculou às infrações de quadrilha ou bando. Não podemos comparar uma

organização criminosa com uma quadrilha ou bando, também chamada de

“quadrilha de bagatela”.

19

Com a finalidade de solucionar tal problema o legislador, ao criar a Lei nº.

12.850/13, tomou o cuidado de tipificar no caput do art. 2º a conduta delituosa de

crime organizado, além de modificar o título do crime estabelecido no art. 288 do

Código Penal. Por hora ficaremos com a análise do art. 2º da Lei 12.850/13, que

assim transcrevo: “Art. 2º: Promover, constituir, financiar ou integrar, pessoalmente

ou por interposta pessoa, organização criminosa: Pena - reclusão, de 3 (três) a 8

(oito) anos, e multa, sem prejuízo das penas correspondentes às demais infrações

penais praticadas”.(BRASIL, 2013, p. Única).

Finalmente temos em nosso ordenamento jurídico o crime de organização

criminosa. A figura de organização criminosa deixou de ser uma maneira de se

praticar crimes para se tornar delito.

Analisando a estrutura do tipo percebemos que os verbos nucleares são

“promover”, “constituir”, “financiar” ou “integrar” tais verbos constituem um tipo penal

misto alternativo, ou seja, o agente pode praticar uma ou mais condutas descritas no

tipo penal para que se configure apenas um crime; sobre o assunto discorre Nucci:

“O tipo prevê as seguintes condutas alternativas: promover (gerar, originar algo ou

difundir, fomentar, cuidando-se de verbo de duplo sentido), constituir (formar,

organizar, compor), financiar (custear, dar sustento a algo) ou integrar (tomar parte,

juntar-se, completar)”.(2013, p. 20).

Pacelli também explica:

Anote-se, por primeiro, que as novas modalidades típicas do art. 1º constituem tipo penal de conteúdo variado ou misto alternativo, no sentido de que a prática de mais de uma conduta descrita no tipo não se somam umas às outras em concurso de crimes, restando punível um único delito. ( 2013, p. 07).

Percebe-se também que estamos diante de um tipo penal autônomo em

relação às infrações praticadas efetivamente pela organização criminosa, deste

modo, é possível que o criminoso seja punido pelo crime de organização criminosa e

também pelo delito que realizava por meio dela. Assim dita Pacelli: “[...] será

possível a punição pelo fato da organização criminosa e também pelo crime

praticado por meio dela.” ( 2013, p .07).

Temos como sujeito ativo qualquer pessoa, evidenciando que estamos

diante de um crime comum, onde não há a necessidade de alguma condição

20

específica do agente. A condição imposta, não se refere à pessoa do agente, mas

sim o “estado” em que ele se encontra, estando em associação de pelo menos

quatro pessoas, estruturado de maneira organizada e caracterizada pela divisão de

tarefas, com objetivo de obter vantagem de qualquer natureza mediante pratica de

infrações penais superiores a 4 anos.

Em resumo basta que qualquer pessoa realize qualquer dos verbos

nucleares do art. 2º estando subsumido no conceito de organização criminosa

preceituada no parágrafo primeiro do art. 1º para configurar crime de organização

criminosa.

Nucci leciona sobre o tema e realiza relevante consideração sobre a

integração de menores de idade:

O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, desde que se identifique, claramente, a associação de, pelo menos, quatro pessoas. Esse número mínimo pode ser constituído, inclusive, por menores de 18 anos, que, embora não tenham capacidade para responder pelo delito, são partes fundamentais para a configuração do grupo. Naturalmente, não está se falando de crianças ou adolescentes simplesmente utilizados como instrumentos para a prática de delitos diversos, mas, sim, de jovens com perfeita integração aos maiores de 18, tomando parte da divisão de tarefas e no escalonamento interno. Há certos casos concretos de menores de 18 anos que são líderes da quadrilha, enquanto maiores não passam de subordinados. (2013, p. 21).

Cunha e Pinto também tratam do assunto:

O crime, quanto ao sujeito ativo, é comum (dispensando qualidade ou condição especial do agente) plurissubjetivo (de concurso necessário) de condutas paralelas (umas auxiliando as outras), estabelecendo o tipo incriminador a presença de, no mínimo, quatro associados, computando-se eventuais inimputáveis ou pessoas não identificadas, bastando prova no sentido de que tomaram parte da divisão de tarefas estruturada dentro da organização. (2013, p.17).

Continuando a análise, temos como sujeito passivo do crime de organização

criminosa a sociedade, ficando claro que o bem jurídico tutelado é a paz pública.

Nucci discorre: “O sujeito passivo é a sociedade, pois o bem jurídico tutelado é a paz

publica. Cuida-se de delito de perigo abstrato, ou seja, a mera formação e

participação em organização criminosa coloca em risco a segurança da sociedade”.

(2013, p. 22).

21

Tal crime só se procede mediante dolo, não se admitindo forma culposa. É

imprescindível que o agente encontre-se associado com o fim de obter vantagem

ilícita de qualquer natureza.

Sobre o tema, Nucci: “O delito é doloso, não se admitindo a forma culposa.

Exige-se o elemento subjetivo específico implícito no próprio conceito de

organização criminosa: obter vantagem ilícita de qualquer natureza”. (2013, p. 22).

Também nas palavras de Cunha e Pinto:

O crime é punido a título de dolo, sendo imprescindível animus associativo, aliado ao fim específico de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza (não necessariamente econômica), mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 anos ou de caráter transnacional, não importando, nesse caso, a pena máxima em abstrato prevista no tipo. (2013, p.18).

Estamos tratando de um crime formal, isto é, aquele que não exige, para a

consumação do delito, o resultado pretendido pelo autor. De forma livre, que pode

ser cometido de qualquer meio do qual o agente venha a se utilizar. Comissivo, pois

os verbos nucleares do tipo só se referem a ações. Permanente, sua consumação

está diretamente ligada com o tempo que perdurar a organização criminosa,

podendo o agente ser preso em flagrante delito enquanto a organização criminosa

não for desfeita ou o mesmo abandoná-la.

Assim observa Nucci, Cunha e Pinto, respectivamente:

O crime é comum, podendo ser cometido por qualquer pessoa; formal, não exigindo para a consumação qualquer resultado naturalístico, consistente no efetivo cometimento dos delitos almejados; de forma livre, podendo ser cometido por qualquer meio eLeito pelo agente; comissivo, pois os verbos representam ações; permanente, cuja consumação se prolonga no tempo, enquanto perdurar a associação criminosa; de perigo abstrato, cuja potencialidade lesiva é presumida em Lei; plurissubjetivo, que demanda várias pessoas para a sua concretização; plurissubisistente, praticado em vários atos. (2013, p. 23). [...] Infração permanente, a sua consumação se protrai enquanto não cessada a permanência. Isso significa que o agente pode ser preso em flagrante delito enquanto não desfeita (ou abandonar) a associação [...] (CUNHA e PINTO, 2013, p.18).

22

Temos então que o crime de promover, constituir, financiar ou integrar

organização criminosa é comum, formal, doloso, de forma livre, comissivo,

permanente, de perigo abstrato, plurissubjetivo e plurissubsistente.

Não é admitida a modalidade tentada. Os atos intencionados a formar uma

organização criminosa pertencem ao “mundo das ideias” são de mero caráter

preparatório.

Assim pensa Nucci:

Não admite tentativa, pois o delito é condicionado à existência de estabilidade e durabilidade para se configurar. Portanto, enquanto não se vislumbrar tais elementos, cuida-se de irrelevante penal ou pode configurar outro crime, como a associação criminosa (art. 288, CP). ( 2013, p. 23).

E também Cunha e Pinto: “Não nos parece possível a tentativa. Os atos

praticados com a finalidade de formar a associação (anteriores à execução de

qualquer dos núcleos) são meramente preparatórios”. (2013, p.19)..

Visto e analisada a estrutura do tipo penal incriminador de organização

criminosa, analisaremos, de maneira breve, a alteração realizada no art. 288 do

Código Penal, que tratava de quadrilha ou bando, atualmente, pela nova redação,

associação criminosa.

4.2 DIFERENÇA ENTRE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA E ASSOCIAÇÃO

CRIMINOSA.

O artigo 24 da Lei nº. 12.850/13 alterou a redação do art. 288 do Código

Penal Brasileiro. O “Antigo art. 288, CP - Associarem-se mais de três pessoas, em

quadrilha ou bando, para o fim de cometer crimes”. E a “Nova redação do art. 288,

CP – Associarem-se três ou mais pessoas, para o fim específico de cometer

crimes”.(BRASIL, 2013, p. Única).

O legislador foi omisso e descuidado ao publicar a Lei nº. 9.034/95 ao não

conceituar organização criminosa e a esta vincular às infrações cometidas por

quadrilha ou bando. Em razão desse erro do legislador naquele tempo era muito

comum haver dificuldade para identificar quadrilha de organização criminosa.

Tal equívoco não é mais possível com a atual redação do art. 288 do Código

Penal. A antiga quadrilha ou bando passou a se chamar associação criminosa sendo

23

necessária a associação de três ou mais pessoas para o fim específico de cometer

delitos.

Percebamos que o legislador ao diminuir o número mínimo de integrantes da

atual associação criminosa de quatro, para três, tem por finalidade não gerar

confusão com o conceito de organização criminosa que é composta por no mínimo

quatro pessoas.

Assim, nas palavras de Cunha e Pinto:

Depois de conceituar organização criminosa como associação composta por quatro ou mais pessoas, o legislador, para não gerar confusão, alterou o número mínimo de agentes para configurar o crime do art. 288 do CP. Antes da nova Lei, 4 (por isso quadrilha). Agora, três (mudando o nomem iuris para a associação criminosa. (2013, p.145).

Assim também leciona Nucci: “A atual previsão do art. 288 do Código Penal

procura estabelecer uma diferença entre a organização criminosa e a associação

criminosa: o numero de integrantes. A primeira exige pelo menos quatro pessoas; a

segunda, três” (2013, p.107).

Com o avançar desse estudo pudemos perceber que a organização

criminosa não se caracteriza somente pelo número de agentes, mas também pela

divisão de tarefas e organização hierárquica, assim sendo, não seria necessário que

houvesse tal modificação para que possamos distinguir corretamente organização

criminosa de uma associação criminosa. Segundo Nucci: “Em nosso entendimento,

não vemos razão para isso, pois a organização criminosa não se caracteriza pelo

número de agentes, mas pela estrutura, hierarquia, divisão de tarefas, dentre outros

fatores. Logo, três ou quatro integrantes não altera o quadro”. (2013, p.107).

Além da alteração do nomem juris do delito e do número mínimo de agentes

para sua configuração houve uma alteração no elemento subjetivo, na antiga

redação tratava “para o fim de cometer crimes” a atual redação dispõe “para o fim

específico de cometer crimes”.

Para Nucci tal alteração não provoca nenhum efeito prático, assim

transcrevo seu ensinamento:

Inseriu-se, ainda, o termo especifico na finalidade (para o fim específico de cometer crimes). A alteração não provoca nenhum efeito prático, mas somente consolida a ideia de se demandar estabilidade e durabilidade para a associação, ou seja, não se pode considerar uma associação criminosa o mero concurso de pessoas para o cometimento de um crime. (2013, p.106).

24

Entretanto Pacelli não vê esta alteração com tanta indiferença quanto Nucci;

que assim leciona: “No entanto, enquanto a redação anterior se referia ao elemento

subjetivo para o fim de cometer crimes, a atual inseriu importante e perigosa

distinção, exigindo que a associação se dê para o fim ESPECÍFICO de cometer

crimes” (2013, p. 08).

Em um primeiro momento especula-se que esta alteração seria para

combater excessos de imputações feitas em acusações que demandam maior

técnica e cuidado. É obvio que ocorrido um crime dentro de uma atividade comercial,

ou qualquer outra atividade, não implicará necessariamente na formação de uma

associação criminosa.

Outra especulação realizada se refere à pretensão legislativa de se instituir

um impedimento legal de se encontrar em qualquer atividade econômica a prática de

associação criminosa; somente se caracterizaria o crime de associação criminosa se

a empresa tivesse sido criada com o intuito exclusivo, específico, de cometer crimes.

Sobre essa especulação comenta Pacelli: “Naturalmente, jamais constará de

qualquer contrato social ou estatuto empresarial a cláusula de objeto social voltado

para a prática de crimes” Risível, antes de trágica a observação”.(2013, p. 08).

A Leitura que devemos fazer da expressão específica se refere ao fato de

que tal modalidade delituosa só estará presente quando se puder comprovar que a

atividade econômica realizada teria como objetivo essencial e fundamental a pratica

de habituais condutas delituosas. Nesses termos a prática criminosa, isolada, de um

funcionário da empresa, por exemplo, não qualifica por si só crime de associação

criminosa, mesmo que referido ato criminoso tenha sido realizado por meio da

atividade econômica da qual faz parte.

Assim pensa Pacelli:

Pensamos que tal modalidade delituosa, quando no âmbito e no interior de atividade empresarial regularmente desenvolvida, somente estará presente quando se puder contatar – e provar – que a instituição e a origem da empresa teriam o objetivo essencial de mascaramento de práticas habituais criminosas. Não parece haver dúvidas quanto à existência de fachada de empreendimentos realizados unicamente para o fim de lavagem de dinheiro e de ativos. [...] Cumprirá investigar e esclarecer se a atividade declarada no objeto social é efetivamente realizada, a tanto não bastando, evidentemente, a realização esporádica e eventual de atos ilícitos. Uma coisa é a pratica de crime por empresa regularmente constituída; outra, a constituição regular de empresas para a prática mascarada de atividade ilícita”. (2013, p. 08).

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Interessante a perspectiva de Pacelli, ao tratar do fim específico da

associação criminosa, a meu ver, traçar contornos específicos para um fim de agir é

perigoso para o ordenamento jurídico, pois, é uma possível tese para defesa de um

eventual acusado.

Em resumo verifica-se atualmente a impossibilidade de confusão dos

institutos de associação criminosa e organização criminosa, seja a distinção

relacionada à definição dos tipos, seja quanto suas consequências penais –

organizações criminosas, pena de três a oito anos; associação criminosa pena de

um a três anos. Segundo Bitencourt:

Ademais, a diversidade dos dois crimes reflete-se diretamente na disparidade de punição de uma e outra infração penal, tanto que a gravidade e complexidade da participação em organização criminosa justifica, na ótica do legislador, a cominação de uma pena de reclusão de três a oito anos, na ótica do legislador, ao passo que a quadrilha ou bando, agora, associação criminosa, tem pena cominada de um a três anos de reclusão.( 2013, p. Única).

Tal mudança na nomenclatura trazida pela Lei 12.850/2013 já pode ser

observada em dispositivo jurisprudencial, assim segue:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL. NÃO CONHECIMENTO DO WRIT. CRIMES DE ROUBO MAJORADOS E FORMAÇÃO DE QUADRILHA (ATUAL ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA). TESE DE FRAGILIDADE DA PROVA. VIA IMPRÓPRIA. NECESSIDADE DE EXAME APROFUNDADO DA PROVA. DOSIMETRIA. PRETENSÃO DE REDUÇÃO DAS PENAS. ILEGALIDADE OU EXCESSO NÃO DEMONSTRADOS. PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 288 DO CP. NOVA REDAÇÃO PELA LEI N. 12/850/2013. LEX MITIOR. REDUÇÃO DO AUMENTO DO DOBRO PARA A METADE. TESE DE BIS IN IDEM, PELA APLICAÇÃO CONCOMITANTE DA MAJORANTE DO EMPREGO DE ARMA, NO CRIME DE ROUBO, COM A MAJORANTE DA QUADRILHA ARMADA, NO CRIME DE FORMAÇÃO DE QUADRILHA (ATUAL ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA). NÃO OCORRÊNCIA. CRIMES AUTÔNOMOS E INDEPENDENTES. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. CONCESSÃO DA ORDEM DE OFÍCIO. [...]3. Com o advento da Lei n. 12.850/2013, foi dada nova redação ao art. 288 do CP (formação de quadrilha), o qual passou a denominar- se crime de associação criminosa, reduzindo-se, ainda, o aumento do parágrafo único do dobro à metade, razão pela qual deve o novo regramento, mais benéfico, retroagir, para alcançar os delitos praticados anteriormente à sua vigência.[...] STJ - HC: 131838 SP 2009/0052117-3, Relator: Ministro NEFI CORDEIRO, Data de Julgamento: 10/06/2014, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 01/07/2014)”.

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5 INSTITUTO DA PLEA BARGANING – COLABORAÇÃO PREMIADA

A Plea Barganing é o sistema negocial utilizado nos Estados Unidos da América

para a justiça negociada, esse sistema consiste em um processo de negociação entre

acusação e réu com a presença de seu defensor, onde o réu pode confessar a sua culpa

ou não assumi-la, entretanto se não assumir a culpa declara que não quer discuti-la. Em

troca o Estado pode oferecer uma redução nas sanções que seriam aplicadas na

sentença caso o réu confesse culpado.

Para Pacelli é isso que a Lei nº. 12.850/13 pretende instituir, como demonstra:

A Lei 12.850/13, depois de muitos ensaios, inaugura – ou pretende inaugurar, se os oráculos constitucionais permitirem! – uma modalidade do conhecido plea

barganing, tão em (péssimo) uso nos Estados Unidos da América. Ali, 85% (oitenta e cinco por cento) dos casos penais são encerrados pelo plea

barganing, com claras e notórias intenções de reforçar a crença na suposta eficiência do sistema. (2013, p. 01).

A Lei nº 12.850/13 não se refere, ou trás, de maneira específica o instituto da

plea barganing para o nosso ordenamento jurídico, entretanto estabeleceu novos moldes

para o sistema da colaboração premiada, este por sua vez se não for idêntico ao

sistema da plea barganing se assemelha em grande parte.

A colaboração premiada, também chamada de delação premiada, não é algo

novo em nosso sistema de Leis, há vários dispositivos legais que cuidam do referido

instituto, impondo, de maneira geral, redução da pena ao colaborador e,

excepcionalmente, o perdão judicial. A aplicação da colaboração premiada sempre

estará vinculada a eficácia ou eficiência da contribuição do agente.

Tal medida é conceituada por Cunha e Pinto como:

A colaboração premiada poderia ser definida, já com base na Lei em exame, como a possibilidade que detém o autor do delito em obter o perdão judicial e a redução da pena (ou sua substituição), desde que, de forma eficaz e voluntária, auxilie na obtenção dos resultados previstos em Lei. (2013, p. 35).

Greco Filho também tece comentário sobre o tema:

A colaboração premiada, também chamada de delação premiada, já era prevista na Lei n. 9.034/95, revogada, e em outras Leis especiais, como a Lei n. 7.492/86 (Crimes contra o sistema financeiro) e a Lei de Drogas (Lei n. 11.343/06), cada uma com contornos próprios. A Lei comentada

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disciplinou-a com maior amplitude e pormenores e como qualquer instituto ainda incipiente no Brasil, tendo em vista que não se encontra assentado em nossa cultura processual penal, apresenta problemas que poderão, até, inviabilizar a sua aplicação e a sua utilidade no combate ao crime organizado.(2014, p. 39).

Encontra-se a colaboração premiada na Lei de Lavagem de Capitais (Lei

9.613/98); Lei de Drogas (Lei 11.343/06); Lei que estruturou o Sistema Brasileiro de

Defesa de Concorrência (Lei 12.529/11); Lei dos Crimes Contra o Sistema

Financeiro Nacional (Lei 7.492/86); dentre outros dispositivos.

Sobre o tema Pacelli:

[...] apenas a Lei 9.034/95 se reporta às infrações praticadas por meio de organizações criminosas. As demais se contentam com a colaboração ou delação feita por um dos agentes, quando se tratar de crimes praticados em concurso de agentes ou mediante qualquer forma de participação. (2013, p.13).

Até a publicação da Lei 12.850/13 não havia um regramento mais específico

e um roteiro mais detalhado que proporcionasse a efetividade da colaboração

premiada. Esta Lei pretende cuidar da forma e do conteúdo da referente medida,

prevendo regras claras para poder ser utilizada.

Assim demonstra Cunha e Pinto:

A Lei em exame altera sensivelmente esse panorama, cuidando da forma e do conteúdo da colaboração premiada, prevendo regras claras para sua adoção, indicando a legitimidade para formulação do pedido, enfim, permitindo, de um lado, maior eficácia na apuração e combate à criminalidade organizada, sem que, de outra parte, se arranhem direitos e garantais asseguradas ao delator..(2013, p. 34).

Pacelli também comenta:

[...] a referida Lei parece ser a única que efetivamente instituiu um modelo de procedimentos para a concretização da colaboração premiada, dispondo sobre a legitimidade ativa, sobre a fase procedimental em que será cabível a colaboração e, finalmente, acerta do papel e funções atribuídas ao juiz, à policia e ao Ministério Público nessas fases. (2013, p.13).

Deste modo, começaremos a análise do instituto pelos requisitos

necessários para a sua aplicação, posteriormente, trataremos da legitimidade ativa e

procedimento, e, por fim, sobre os direitos do colaborador.

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5.1 REQUISITOS E RESULTADOS

O art. 4º da Lei 12.850/13 estabelecem os requisitos/resultados necessários

para a aplicação dos benefícios da colaboração premiada, benefícios estes que

podemos extrair do caput mesmo artigo; assim subscrito:

Art. 4º: O juiz poderá, a requerimento das partes, conceder o perdão judicial, reduzir em até 2/3 (dois terços) a pena privativa de liberdade ou substituí-la por restritiva de direitos daquele que tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e com o processo criminal, desde que dessa colaboração advenha um ou mais dos seguintes resultados;(BRASIL, 2013, p. única).

Então, temos como benefício: a redução em até 2/3 da pena privativa de

liberdade, a substituição desta por uma pena restritiva de direito, e

excepcionalmente o perdão judicial.

Estamos diante de uma situação que contém um caráter objetivo, no que e

refere aos resultados necessários, efetividade e voluntariedade das informações

prestadas pelo agente, que será previamente tratado; e um caráter subjetivo, no que

se refere a personalidade do colaborador (art. 4º parágrafo primeiro), que será

tratado à posteriori, e que também é necessário levar em consideração antes de

aplicar os benefícios da colaboração premiada.

Assim podemos observar no que se refere à efetividade e voluntariedade do

agente em cooperar com a investigação e com o processo criminal – “daquele que

tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e com o processo

criminal” - em decorrência dessa atitude faz-se necessário que ocorram os

resultados expressos nos incisos do mesmo dispositivo legal, para que os benefícios

da colaboração premiada sejam possíveis.

Sobre a questão da voluntariedade, comenta Nucci: “Quanto a

voluntariedade, significa agir livre de qualquer coação física ou moral, embora não

se demande a espontaneidade (sinceridade ou arrependimento)”. (2013, p. 51).

A partir de então podemos analisar os resultados objetivos necessários para

que os benefícios da colaboração premiada possam ser aplicados, assim sendo,

temos no inciso primeiro do presente artigo em estudo o seguinte: “I - a identificação

29

dos demais coautores e partícipes da organização criminosa e das infrações penais

por eles praticadas.”(BRASIL, 2013, p. Única).

Sobre o tema comentam Cunha e Pinto: “Uma das formas mais

contundentes de colaboração é, sem dúvida, aquela que propicia ao colaborador a

possibilidade de delatar seus comparsas, bem como indicar as infrações penais que,

em concurso, cometeram.” (2013, p. 41).

Percebe-se que a Lei é extremamente rigorosa nesse aspecto, caso o

colaborador não possa identificar os demais coautores, ou mesmo se puder, não

conseguir demonstrar as infrações penais por eles praticados, não poderá o agente

se utilizar da colaboração premiada. Sobre o assunto palavras de Nucci:

Estabeleceu-se um rigor excessivo neste dispositivo, que não há na Lei 9.807/99, onde se menciona somente “a identificação dos demais coautores ou partícipes da ação criminosa” ou na Lei 9.613/98, onde há alternatividade. Demanda-se não somente a descoberta dos demais (todos) coautores e partícipes mas também das infrações penais cometidas. Se, porventura, o colaborador entregar os outros cumplices, mas não for capaz de apontar todos os delitos cometidos pela organização criminosa não poderá, segundo o estrito teor legal, beneficiar-se do instituto. (2013, p. 52).

Parece ser um rigor exagerado, pois em muitos casos, dependendo do

tamanho da organização criminosa, esta comete várias infrações que não são de

conhecimento de todos os integrantes.

Seguindo, no inciso segundo, temos: “ II - a revelação da estrutura

hierárquica e da divisão de tarefas da organização criminosa;”.(BRASIL, 2013, p.

Única). Por vezes a indicação dos coautores e suas infrações, como previsto no

inciso primeiro, não é suficiente para que se possa identificar toda a estrutura da

organização criminosa, deste modo, o inciso segundo previu a possibilidade do

agente colaborar e revelar a estrutura hierárquica da organização, a fim de ser

beneficiado pelo instituto da colaboração premiada.

Sobre o tema, Nucci: “denunciar a composição e o escalonamento da

organização pode ser útil ao Estado para apurar e descobrir a materialidade de

infrações penais e a autoria, verdadeiro objetivo da investigação”.(2013, p. 53).

Aqui surge o mesmo problema do inciso anterior, ou seja, dependendo do

tamanho da organização criminosa, e também do nível hierárquico ocupado pelo

referido colaborador, este, por vezes, não terá conhecimento de toda a estrutura

hierárquica ou da divisão de tarefas da organização criminosa.

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Cunha e Pinto fazem uma ponderação sobre o tema:

Sua estruturação piramidal (se referindo à organização criminosa) impede o acesso dos componentes da base aos mais graduados. Ainda que aponte somente parte dessa estrutura, mas desde que tal informação seja eficaz no desmantelamento da organização criminosa, merecerá, certamente, ver reconhecida sua colaboração. (2013, p. 44).

Continuando a análise dos requisitos, ou resultados necessários, temos o

disposto no inciso III, assim dispondo: “A prevenção de infrações penais decorrentes

das atividades da organização criminosa;” Fica evidente o caráter preventivo da

colaboração premiada nesse inciso.

Há certas pessoas contrárias ao instituto da colaboração premiada, e a

veem como uma prática antiética e de traição, pois o colaborador estaria violando

um código moral ao delatar seus comparsas e esquemas. Nesse inciso fica

demonstrado que a colaboração premiada tem um caráter positivo, pois presta a

prevenir que outros ilícitos aconteçam. Assim discorre Cunha e Pinto:

O caráter preventivo da colaboração é outro relevante motivo a justificar o instituto em estudo. É capaz, inclusive, de afastar a constante crítica daqueles que são contrários à delação, porque, segundo eles, antiética e impregnada de traição. Tem-se aqui um exemplo clássico do quanto pode ser positiva essa colaboração, quando se presta a prevenir a prática de outros crimes. (2013, p. 44).

De fato não é fácil identificar ou evitar por completo as atividades criminosas,

bem como, realizar a relação de determinado feito com o que foi dito pelo

colaborador, entretanto, se for possível perceber uma diminuição de determinada

atividade criminosa, comum na região, em razão das medidas de proteção utilizadas

à partir das informações prestadas pelo colaborador, é possível atribuir, em se

tratando de requisitos objetivos, os benefícios da colaboração premiada.

Prosseguindo o estudo dos requisitos, dispõe o inciso IV: “A recuperação

total ou parcial do produto ou do proveito das infrações penais praticadas pelas

organizações criminosas”.(BRASIL, 2013, p. Única). Recuperar a vantagem auferida

pela organização criminosa, não significa necessariamente a reparação do dano à

vítima, tanto que a Lei não exige isto pontualmente. É claro que retornar o que foi

tirado das vítimas é medida importante, todavia, por vezes, as organizações

criminosas tendem a agir contra o Estado, causando uma enorme perda para a

sociedade, sendo assim, é necessário uma valoração precisa sobre a cooperação

prestada, a fim de aplicar o benefício justo em razão do que foi recuperado.

31

Sobre o tema, Nucci:

Muitas vezes, age o crime organizado contra o Estado, invadindo cofres públicos, o que representa enorme perda para a sociedade. Tendo em vista que basta um dos requisitos para valer o prêmio ao colaborador, torna-se imprescindível valorar, com precisão, a cooperação dada, pois a restituição de valor baixo não pode gerar amplo beneficio. Ilustrando, se a delação permite a recuperação total do produto ou proveito do crime – o que termina auxiliando, também, na localização de autores e partícipes – pode-se até aplicar o perdão; mas se a recuperação é parcial – e de pouca monta – há de se partir para um redução mínima de pena, tal como um sexto. (2013, p. 53).

A fim de demonstrar a ação do crime organizado contra o Estado, bem

como, a grande quantidade de dinheiro envolvida, segue julgado:

HABEAS CORPUS LIBERATÓRIO. SONEGAÇÃO FISCAL, LAVAGEM DE DINHEIRO E FORMAÇÃO DE QUADRILHA. PRISÃO PREVENTIVA DECRETADA EM 04.12.07 NO ATO DE RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. GARANTIA DA ORDEM ECONÔMICA, CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO CRIMINAL, CESSAÇÃO DA ATIVIDADE CRIMINOSA. PACIENTE NÃO ENCONTRADO PARA SER CITADO. FUGA. MANUTENÇÃO DA CUSTÓDIA CAUTELAR JUSTIFICADA. LEGITIMIDADE DO MPF PARA CONDUZIR INVESTIGAÇÃO. PRECEDENTES DO STJ. PARECER DO MPF PELA DENEGAÇÃO DA ORDEM. ORDEM DENEGADA, CASSANDO-SE A LIMINAR ANTERIORMENTE CONCEDIDA. 1. Havendo indícios de autoria, auferidos a partir de extensa investigação feita pela própria Receita Federal e comprovada a materialidade do delito, já constituído definitivamente o crédito tributário, a prisão preventiva foi decretada no ato do recebimento da denúncia para preservação da ordem econômica, garantia da instrução criminal e cessação da atividade criminosa. 2. Segundo a denúncia, trata-se de sofisticada organização envolvendo empresas do ramo de cereais voltada para a prática de crimes de sonegação fiscal e lavagem de dinheiro, que, utilizando-se de esquemas previamente definidos e controlados por integrantes específicos da quadrilha, por meio de diversas operações ilícitas (utilização de laranjas, notas fiscais falsas, simulação de exportação, etc), causou prejuízo de R$ 241.000.000,00 (duzentos e quarenta e um milhões de reais) aos cofres públicos. 3. O fato de o paciente não ter sido encontrado para ser citado corrobora a necessidade da custódia cautelar para garantia da aplicação da lei penal. 4. Esta Corte assentou o entendimento de que, em princípio, são válidos os atos investigatórios realizados pelo Ministério Público, cabendo-lhe ainda requisitar informações e documentos, a fim de instruir os seus procedimentos administrativos, com vistas ao oferecimento da denúncia. 5. Parecer do MPF pela denegação da ordem. 6. Ordem denegada, cassando-se a liminar anteriormente concedida.

(STJ - HC: 113554 MG 2008/0180645-0, Relator: Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Data de Julgamento: 14/04/2009, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 01/06/2009)

Finalizando o que se refere aos requisitos objetivos, temos o disposto no

inciso V, assim segue: “a localização de eventual vítima com a sua integridade física

32

preservada”. A vida e a integridade física é o bem maior tutelado por nosso

ordenamento jurídico, sendo assim, seria ilógico não beneficiar o agente que

colaborou para a localização da vítima com sua integridade física preservada.

Estamos diante de um ponto cuja aplicação é específica, geralmente se dando em

crimes de sequestro ou extorsão mediante sequestro, assim diz Nucci:

[...] este é um ponto relevante, que merece de fato, o prêmio advindo da delação. Entretanto, é de aplicação específica, geralmente ao crime de extorsão mediante sequestro ou ao de sequestro. De todo modo, encontrar a vítima, no cativeiro, constitui, por si só, medida de extrema importância. (2013, p.54).

Mais uma vez o nosso legislador é rigoroso, e com razão, pois não basta

que a vítima seja encontrada no cativeiro para que se apliquem os prêmios da

colaboração, é necessário que a vítima esteja com sua integridade física

preservada; sendo assim não caberão os benefícios da colaboração caso a vítima

seja encontrada morta ou com sua integridade física não preservada, mesmo que o

colaborador imaginasse que ela estava viva e íntegra.

Assim demonstram Cunha e Pinto:

O bem maior a ser preservado, seja qual for a espécie de criminalidade que se pretenda combater, é a vida humana. Por isso que a colaboração deve ser admitida quando, através dela, for possível a localização da vítima, com sua integridade física preservada. Claro, outrossim, que o ato de delação, que propicie o encontro do cadáver da vítima, não contará com a eficácia exigida para a concessão do benefício, ainda que o colaborador a imaginasse viva. (2013, p. 45).

Vistos os requisitos/ resultados objetivos, passamos a estudar o requisito

que condicionam, de maneira subjetiva, a concessão ou não dos benefícios da

colaboração premiada, disposto no parágrafo primeiro do art. 4º da Lei em questão,

assim transcrito: “§ 1o Em qualquer caso, a concessão do benefício levará em conta

a personalidade do colaborador, a natureza, as circunstâncias, a gravidade e a

repercussão social do fato criminoso e a eficácia da colaboração. (BRASIL, 2013, p.

Única).

Sobre o tema, Cunha e Pinto: “Para que seja homologada a colaboração,

porém, não se exige apenas o preenchimento de um dos requisitos elencados nos

incisos I a V acima. É preciso que se verifique, além disso, os dados indicados neste

dispositivo, que dever ser sopesados conjuntamente”. (2013, p. 46).

33

Assim sendo, a colaboração e seus efeitos, não geram automaticamente o

direito ao benefício, eles estão condicionados a uma série de requisitos subjetivos;

tais como a personalidade do colaborador, que podemos entender como “a maneira

de ser do indivíduo”, Cunha e Pinto, citando Anibal Bruno, comentam:

Chamamos de personalidade a maneira de ser peculiar do indivíduo, de que depende a sua maneira de agira. Pode ser entendida como o conjunto de atributos psíquicos, particularmente como o caráter, mas o seu sentido anda mais largo. Abrange a maneira de ser total do indivíduo, antropológico-social-cultural, cujos aspectos se conjugam intimamente, sem que se possa entender qualquer deles porá da compreensão dos demais. (2013, p. 47).

Não prevê o legislador, referente a personalidade do colaborador, que este

seja primário ou de bons antecedentes; tal exigência poderia frustrar a concessão do

benefício no caso concreto, pois, na maior parte, um integrante de organização

criminosa não é réu primário e muito menos ostenta bons antecedentes.

Assim comenta Cunha e Pinto:

[...] pensamos que não seja necessário sua primariedade. A um, pois tal exigência poderia frustrar, em boa parte dos casos concretos, a concessão do benefício, vez que muitos dos evolvidos nessa espécie de criminalidade certamente não serão primários (e, tampouco, ostentarão bons antecedentes). (2013, p. 47).

Além da personalidade do agente, temos também “a natureza, as

circunstâncias, a gravidade e a repercussão social do fato criminoso” requisitos que

também deverão ser avaliados antes de se conceder os benefícios da colaboração.

Ao se referir a natureza o legislador nos remete à espécie de crime cometido, assim,

um crime que atente contra o bem mais precioso do ser humano, lê-se vida, é mais

grave, em teoria, do que um crime que atente contra a ordem econômica, que tem

por dano mero caráter fiscal. Deste modo o benefício concedido deverá ser

ponderado.

O legislador também se refere as circunstâncias em que o colaborador

cometeu os delitos, se a sua determinação era maior ou menor, se durante o ato

criminoso mostrou-se insensível, arrependido, indiferente, etc. Tudo isso deverá ser

valorado.

Também temos como fator condicionante a “gravidade e a repercussão

social do fato criminoso”; quanto à gravidade deve-se ponderar, por exemplo, em um

crime de sequestro, se a vítima foi morta; e sob a repercussão social ponderar-se-á,

34

mais uma vez utilizando o crime de sequestro como exemplo, se o sequestrado era

uma criança - fato que gera grande clamor popular.

Deste modo, podemos perceber que o instituto da colaboração premiada

não está condicionada tão somente à requisitos objetivos, ou seja, aos resultados

decorrentes da eficaz e voluntária colaboração do agente; mas também, a uma série

de requisitos subjetivos que irão variar e influenciar no benefício aplicado em razão

do caso concreto.

5.2 LEGITIMIDADE ATIVA PARA A PROPOSTA DE ACORDO

Visto os resultados necessários para a concessão do benefício da

colaboração premiada, passemos a estudar quem possui legitimidade ativa para

oferecer o acordo, assim sendo, demonstra o parágrafo segundo do art. 4º:

§ 2º: Considerando a relevância da colaboração prestada, o Ministério Público, a qualquer tempo, e o delegado de polícia, nos autos do inquérito policial, com a manifestação do Ministério Público, poderão requerer ou representar ao juiz pela concessão de perdão judicial ao colaborador, ainda que esse benefício não tenha sido previsto na proposta inicial, aplicando-se, no que couber, o art. 28 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941

(BRASIL, 2013, p. Única).

Temos então, como demonstra Nucci, que a delação pode dar-se tanto na

fase investigatória quanto em juízo. (2013, p. 55).

Antes de entrarmos efetivamente na questão da legitimidade é prudente que

observemos a colocação feita por Pacelli, assim subscrita:

Lamentavelmente, o Brasil vem se tornando refém de disputas institucionais e, por vezes, corporativas, que terminam afastando ou embaraçando a convivência pacífica e eficiente entre órgãos indispensáveis à administração da Justiça. Referido fenômeno vem atingindo e debilitando as relações entre Ministério Público e os Delegados de Polícia, responsáveis diretos pela efetividade da persecução penal. (2013, p.13).

Devemos deixar de lado tais disputas institucionais, seja referente à fase de

investigação ou à fase da ação penal, ambas as instituições são essenciais à

administração da Justiça criminal, por isso, devem trabalhar em conjunto para a

efetiva persecução penal. Veremos que a Lei 12.850/13 deu poderes ao Delegado

de Polícia para postular acordos de colaboração a serem homologados pelo juiz (o

35

que para Pacelli é inconstitucional)1, e, por outro lado, concedeu poderes ao parquet

para que a qualquer momento - fase investigatória ou instrução criminal - realizar os

referidos acordos.

5.2.1 Legitimidade Ativa do Delegado de Polícia

O disposto no parágrafo segundo do art. 4º da Lei em estudo, dá ao

delegado de polícia, em fase de investigação policial, percebendo que o agente tem

o interesse de colaborar, capacidade para postular representação ao juiz no sentido

de conceder o benefício da colaboração premiada. Todavia o acordo feito por

autoridade policial deve conter a manifestação do Ministério Público.

Sobre o tema Cunha e Pinto: “Assim, ao delegado de polícia que, durantes

as investigações, perceber que o agente demonstra interesse em colaborar, cabe

representar ao juiz no sentido da concessão do benefício.” (2013, p. 50).

Nucci também comenta:

Considerando-se a sua ocorrência (se referindo à delação) durante o inquérito, pode dar-se da seguinte forma: a) O delegado, nos autos do inquérito policial, com a manifestação do Ministério Público, representa pela aplicação do prêmio máximo, que é o perdão judicial, causador da extinção da punibilidade, cessando-se a persecução penal; b) o delegado, nos autos do inquérito, representa e, antes de seguir ao juiz, passa pelo Ministério Público para colher sua manifestação, seguindo-se o pLeito de perdão judicial [...] (2013, p. 55).

Para não ferir nenhum direito fundamental e garantias processuais, o agente

colaborador deve estar acompanhado de um defensor, que tem por finalidade

orientar seu cliente e buscar o melhor acordo.

Assim, discorre Greco Filho: “A fase de negociação e acordo, feita pela

autoridade policial, com a manifestação do Ministério Público e o investigado

acompanhado de defensor, ou entre o Ministério Público e o acusado sempre

presente o defensor.” (2014, p. 40).

1 A Lei 12.850/13 elegeu o Delegado de Polícia como autoridade com capacidade postulatória e com

legitimação ativa para firmar acordos de colaboração que serão homologados por sentença pelo juiz,

nesse sentido, PACELLI vê tal dispositivo como inconstitucional uma vez que, no Brasil, a única

nstituição com legitimidade ativa para a persecução penal em juízo é o Ministério Público. (PACELLI,

2013, p. 14).

36

A presença do advogado auxiliando seu cliente não é exclusividade do

acordo realizado pelo delegado de polícia, mas também, ao acordo proposto pelo

Ministério Público.

O Ministério Público poderá discordar ou acompanhar o acordo feito pelo

Delegado de Policia, se discordar, aplicar-se-á o mencionado no art. 28 do CPP.

Nesse caso o magistrado irá invocar a intervenção do Procurador-Geral de Justiça

remetendo o feito para sua apreciação. Se a chefia da instituição entender cabível o

acordo, delega-se a outro promotor a postulação de perdão oferecido pelo delegado,

ou, do contrário, continua a entender não cabível o perdão.

Sobre o tema, Cunha e Pinto: “Este pedido será apreciado pelo Ministério

Público que poderá, na análise do caso concreto, acompanhá-lo ou dele discordar”.

(2013, p. 50).

Nucci também se refere ao tema:

A menção ao art. 28 do Código de Processo Penal diz respeito, apenas, a não ter o membro do Ministério Público concordado em pedir o perdão judicial. Neste caso, o magistrado, invocando a intervenção do Procurador-Geral de Justiça, remete o feito à sua apreciação. Se a Chefia da instituição entender cabível, delega a outro promotor a postulação do perdão. Do contrário, insiste em não ser concedido o perdão. (2013, p. 55).

De qualquer modo o juiz poderá conceder a proposta de perdão judicial

apresentada pelo Delegado de Polícia, concordando ou não o Ministério Público, o

que ele não pode fazer é conceder o perdão de ofício.

Assim comenta Nucci: “O juiz não pode conceder o perdão de ofício. Logo,

se houver representação do delegado, concordando ou não o Ministério Público, o

magistrado pode concedê-lo.” (2013, p. 55).

Parte da doutrina, lê-se Pacelli, entende que dar tais poderes ao Delegado

de Polícia é manifestamente inconstitucional, este tem a sua função expressa na

Constituição Federal que se limita á fase investigatória, não teria, em seu

entendimento, capacidade para postular acordos, pois isso se trata de legitimação

ativa para persecução penal, logo, exclusiva do Ministério Público.

Assim, dita Pacelli:

[...] acreditamos perfeitamente válidas as normas processuais penais que concedem às autoridades policiais (delegados de polícia) a iniciativa de representação junto ao juiz criminal, para o fim de obtenção de provimentos

37

cautelares necessários à preservação da investigação (escutas telefônicas, busca e apreensões, prisão, etc.). Ainda que tais autoridades não detenham capacidade postulatória – conceito teórico – a Lei lhes autoriza capacidade equivalente, nos limites da investigação.(...) a função de titularidade da ação penal pública é privativa do Ministério Público. E não porque queiramos, mas por expressa determinação constitucional (art. 129, I, CF). [...] a única instituição pública no Brasil com legitimidade ativa para a persecução penal em juízo é o Ministério Público. [...] o que a citada legislação pretende fazer é de manifesta e evidente inconstitucionalidade!. ( 2013, p.14). [...] Assim, temos por absolutamente inconstitucional a instituição de capacidade postulatória e de legitimação ativa do delegado de polícia para encerrar qualquer modalidade de persecução penal, e menos ainda, para dar ensejo a redução ou substituição de pena e à extinção da punibilidade pelo cumprimento do acordo de colaboração. (2013, p.16).

Pacelli entende que o acordo proposto pelo Delegado de Policia deveria

estar condicionado à manifestação favorável do Ministério Público. Críticas á parte,

podemos afirmar resumidamente que a Lei 12.850/13 deu poderes ao delegado. Ele

pode juntamente com o promotor representar ao juiz, ou, poderá representar ao juiz

mesmo que contrária a manifestação do Ministério Público.

5.2.2 Legitimidade Ativa do Ministério Público.

O Ministério Público poderá propor acordo em qualquer tempo, isto é, da

investigação até a sentença. Ressalva-se o disposto no parágrafo quinto do art. 4º,

subscrito: “§ 5o Se a colaboração for posterior à sentença, a pena poderá ser

reduzida até a metade ou será admitida a progressão de regime ainda que ausentes

os requisitos objetivos.” ( fonte, ano, página).

Deste modo, após a condenação, não será mais possível conceder o perdão

judicial. A respeito discorre Nucci:

Vale ressaltar que o requerimento do Ministério Público pela aplicação do perdão judicial pode dar-se a qualquer tempo, entendendo-se o período que segue da investigação ao processo, até a sentença. Note-se que, após a decisão condenatória, a pena somente pode ser reduzida até a metade, sem mais se admitir o perdão (art. 4º, parágrafo quinto, Lei 12.850/2013). (2013, p. 56).

Também sobre a legitimação do Ministério Público para oferecer o acordo a

qualquer tempo comenta Cunha e Pinto:

Já o Ministério Público pode requerer o perdão em favor do colaborador na fase investigatória, o que, na prática, pressupões um anterior entendimento,

38

ainda que informal, entre ele e a autoridade responsável pelas investigações. Poderá fazê-lo ainda, quando já deflagrado o processo criminal [...]. (2013, p. 51).

Pudemos perceber que o legislador ao “aumentar” a capacidade postulatória

do Delegado de Polícia e também dar poderes ao Ministério Público para propor

acordos durante a investigação criminal, procurou harmonizar e fomentar o trabalho

em conjunto entre ambas instituições, a fim de, que seja realizada uma persecução

penal eficiente e correta.

5.3 PROCEDIMENTO

Passemos então à tratar, de como se dá o procedimento para a concessão

da colaboração premiada, não procurando exaurir todas as hipóteses e

consequências possíveis, mas sim, realizando uma abordagem resumida e objetiva

sobre o instituto.

Como visto, o acordo de colaboração poderá ser feito tanto na fase de

investigação, na fase processual e, inclusive, posterior à sentença (art. 4º, Parágrafo

Quinto) independente de qual fase seja proposta é necessário a atuação do juiz a

fim de homologar o acordo.

Vale ressaltar que o juiz não participará da fase de acordo, somente a

autoridade policial e/ou o Ministério Público, assim dita o art. 4º, parágrafo sexto:

Parágrafo sexto: O juiz não participará das negociações realizadas entre as partes para a formalização do acordo de colaboração, que ocorrerá entre o delegado de polícia, o investigado e o defensor, com a manifestação do Ministério Público, ou, conforme o case, entre o Ministério Público e o investigado ou acusado e seu defensor. (BRASIL, 2013, p. Única).

Após a fase de acordo será assinado um termo de colaboração, este termo

deverá conter o expresso no art. 6º da Lei em estudo:

art.6º: O termo de acordo da colaboração premiada deverá ser feito por escrito e conter: I – O relato da colaboração e seus possíveis resultados; II – as condições da proposta do Ministério Público; III – a declaração de aceitação do colaborador e de seu defensor; IV – as assinaturas do representante do Ministério Público ou do delegado de polícia, do colaborador e de seu defensor; V – a especificação das medidas de proteção ao colaborador e à sua família, quando necessário. (BRASIL, 2013, p. Única).

39

Este termo será encaminhado ao juiz que verificará se contém alguma

irregularidade ou ilegalidade, podendo, se necessário, ouvir o colaborador

sigilosamente na presença de seu defensor; podendo adequar a proposta de acordo

com o caso concreto, tendo como fundamento as circunstâncias pessoais do agente

e efetividade das medidas de colaboração.

A decisão que homologa o acordo é uma decisão interlocutória simples, isso

não produz coisa julgada e nem garante a concessão dos prêmios. Assim escreve

Greco Filho: “A decisão de homologação é uma interlocutória simples que não

produz efeito de coisa julgada nem assegura a concessão do benefício. Ela tem por

finalidade somente a de qualificar o investigado como colaborador [...]”. (2014, p.

41).

Reconhecido o agente como colaborador ele adquire direitos que têm por

finalidade assegurar sua integridade física e sigilo, tais direitos são previstos no art.

5º da Lei 12.850/13 e serão tratados, nesse estudo, posteriormente à fase

procedimental.

Devidas diligências realizadas é na fase da sentença de mérito que o

benefício será concedido ou não ao colaborador. O juiz levará em conta o

comportamento do colaborador após o acordo e sua homologação, se ele por acaso

recusou-se a depor, ou de qualquer outra forma, tentou inviabilizar a persecução

penal; tudo isso será ponderado a fim de conceder ou não os benefícios.

Sobre o tema Greco Filho:

A fase da sentença em que seu mérito será apreciado aplicando-se, ou não, o benefício e sua graduação, inclusive porque a concessão de eventual benefício depende do comportamento do colaborador após o acordo e sua homologação, como se frustrar os efeitos recusando-se a depor ou por qualquer outra forma inviabilizar a utilidade de sua colaboração. (2014, p. 41).

Importante mencionar que o acordo pode ser retratado, todavia, as provas

produzidas contra o colaborador em razão de sua delação não poderão ser

utilizadas exclusivamente em seu desfavor. Assim entende Greco Filho:

[...] as partes, no caso o Ministério Público e o investigado, poderão retratar-se do acordo, de como que perde ele essa qualidade, mas as provas produzidas contra ele em virtude do procedimento da colaboração não poderão ser utilizadas exclusivamente em seu desfavor. Na realidade, tendo em vista o principio nemo se detegere, nenhuma autoincriminação poderá ser levada em consideração contra ele. O mesmo será se o juiz da sentença

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entender infrutífera a colaboração e não quiser dar efeitos ao benefício do agente. (2014, p. 43).

Também se deve alertar ao fato de que nenhuma sentença condenatória

será proferida com fundamento apenas nas declarações do agente colaborador,

assim dita o parágrafo 16 da Lei 12.850/13, isto porque, estamos diante de um

interesse pessoal do colaborador, que poderá imputar falsa incriminação a outrem

com a finalidade de ter sua situação dentro da organização criminosa minorada e ter

seu benefício como colaborador ampliado por exemplo. O juiz ao proferir a sentença

condenatória deverá analisar todo o conjunto probatório não sendo possível ficar

restrito apenas as declarações prestadas pelo colaborador.

5.4 DIREITOS DO COLABORADOR

Como mencionado anteriormente, observemos então, os direitos que o

colaborador possui após o acordo ser homologado pelo juiz, tais direitos encontram-

se previstos no art. 5º da Lei 12.850/13, que assim descreve:

art. 5º: são direitos do colaborador: I – usufruir das medidas de proteção previstas na legislação específica; II – ter nome, qualificação, imagem e demais informações pessoais preservadas. III – ser conduzido, em juízo, separadamente dos demais coautores e partícipes; IV – participar das audiências sem contato visual com os outros acusados. V – não ter sua identidade revelada pelos meios de comunicação, nem ser fotografado ou filmado, sem sua prévia alteração por escrito; VI – cumprir pena em estabelecimento penal diverso dos demais corréus ou condenados. (BRASIL, 2013, p. Única).

Ao se referir sobre medidas de proteção previstas na legislação específica,

comenta Cunha e Pinto:

A ‘legislação específica’ de que trata o dispositivo, consiste na Lei nº 9.807/99, que possui um capítulo dedicada à proteção dos réus colaboradores (arts. 13, 14 e 15). Dentre tais medidas se inclui a possibilidade de alteração do nome e prenome do agente colaborador [...]. (2013, p. 78).

Se referindo às medidas protetivas, temos que fazer menção ao disposto no

inciso V do art. 6º, que estabelece que no momento em que for feito o termo do

acordo de colaboração deverá conter, se necessário, medidas de proteção ao

colaborador (por óbvio) e à sua família.

41

Sobre o assunto comenta Cunha e Pinto: “Saliente-se, ainda, que o art. 6º,

inc. V deste diploma determina que, do pedido de homologação do acordo de

colaboração premiada, deve constar ‘a especificação das medidas de proteção ao

colaborador e à sua família, quando necessários’”. (2013, p. 78).

O legislador é bem claro ao estabelecer tais direitos aos colaboradores.

Estamos diante de uma situação delicada pois se tratando de criminosos a delação,

nesse meio, é um crime pago com a vida, sendo assim, o legislador buscou

alternativas para diminuir o risco do colaborador, conjuntamente, fomentar a prática

da colaboração sobre a “afirmativa” de que ele estará seguro.

Sendo assim as diligências de trocar o nome do colaborador, ser conduzido

em juízo separado dos demais condenados, não ter a identidade física revelada na

mídia, dentre outras, tem por objetivo garantir a segurança, pelo menos em tese, do

colaborador.

Sobre o tema, comenta Cunha e Pinto:

A intenção do legislador é obvia. Por mais que se oculte (ou mesmo se altere) a identidade do colaborador, há sempre a possibilidade dela se revelar. A manutenção do colaborador, nesse caso, junto aos delatadas importa em verdadeira sentença de morte, já que o “código de ética” dos marginais não tolera essa espécie de comportamento. (2013, p. 81).

Nucci também comenta:

é sabido que a Lei do silêncio impera no campo da marginalidade, de modo que o delator se torna um inimigo geral dos delinquentes, podendo ser agredido e morto em qualquer lugar, até mesmo por um estranho. (...) Em verdade, ser delator é um fardo; traz benefícios penais, mas também muitas preocupações. O prêmio recebido deve ser muito bem ponderado para valer os sacrifícios que se seguirão após a colaboração presta. (2013, p. 68).

Percebemos então que o instituto da colaboração premiada traz benefícios a

certos custos; o Estado de maneira legislativa previu uma série de direitos que

tendem a proteger o colaborador, todavia, essa proteção é teoria e não é absoluta.

Resta então evidente a importância do advogado em auxiliar seu cliente à busca do

melhor acordo em relação aos riscos provenientes de sua colaboração.

42

6 DA INVESTIGAÇÃO E DOS MEIOS DE OBTENÇÃO DA PROVA –

INFILTRAÇÃO DE AGENTES

Assim como aconteceu com o instituto da colaboração premiada, a

infiltração de agentes, já era previsto em nosso ordenamento jurídico por força da

Lei 9.034/95, entretanto, padecia de critérios procedimentais, de um maior

detalhamento ou regulamentação. Assim discorre Pacelli

Inicialmente, a infiltração de agentes foi prevista na Lei 9.034/95 (antiga legislação das organizações criminosas, art. 2º, V, e na Lei 11.343/06 (tráfico de drogas, art. 53, I), do mesmo modo que a ação policial controlada. Rejeitávamos a validade da medida com base em considerações de ordem legal, dado que não se previa qualquer forma de procedimento nas aludidas legislações e menos ainda acerca das consequências jurídicas dos atos de infiltração. (2013, p. 33).

Tais falhas do legislador da época tendem a serem sanadas com o advento

da Lei 12.850/13. Como ponto de partida para o estudo do presente instituto

observemos o conceito/finalidade trazido por Nucci:

O instituto da infiltração de agentes destina-se justamente a garantir que agentes de polícia, em tarefas de investigação, possam ingressar, legalmente, no âmbito da organização criminosa, como integrantes, mantendo identidades falsas, acompanhando as suas atividades e conhecendo a sua estrutura, divisão de tarefas e hierarquia interna. (2013, p. 76).

Nos mesmos termos, Cunha e Pinto citando Denilson Feitoza:

infiltração é a introdução de agente público, dissimuladamente quanto à finalidade investigativa (provas e informações) e/ou operacional (“dado negado” ou de difícil acesso) em quadrilha, bando, organização criminosa ou associação criminosa (...) a fim de obter provas que possibilitem, eficazmente, prevenir, detectar, reprimir ou, enfim, combater a atividade criminosa deles. (2013, p. 95).

Podemos perceber então que a finalidade precípua da infiltração de agentes

é obtenção de provas, a fim de, posteriormente, possam ser tomadas as diligências

cabíveis para que se combata, reprima, previna, a atividade das organizações

criminosas.

6.1 REQUISITOS

43

Com o intuito de sanar as lacunas existentes no dispositivo legal antecessor,

o presente legislador, exigiu uma série de requisitos que deverão ser cumpridos para

que a infiltração de agentes seja cabível, um deles podemos extrair do caput do art.

10 da Lei 12.850, que assim subscreve-se:

Art. 10: A infiltração de agentes de polícia em tarefas de investigação, representada pelo delegado de polícia ou requerida pelo Ministério Público, após manifestação técnica do delegado de polícia quando solicitada no curso de inquérito policial, será precedida de circunstanciada, motivada e sigilosa autorização judicial, que estabelecerá seus limites.(BRASIL, 2013, p. Única).

Como primeiro requisito, podemos observar, é que a infiltração só poderá

ser realizada por agentes policiais, o dispositivo antecessor permitia que agentes de

inteligência de outros órgãos diversos da polícia poderiam atuar em tal circunstância.

Sobre o tema, Nucci: a anterior Lei 9.034/1995 permitia também a atuação

de agente de inteligência, advindos de órgãos diversos da polícia. Tal situação não é

mais admitida; somente agentes policiais, federais ou estaduais, podem infiltrar-se

em organizações criminosas”. (2013, p. 76).

Além da prerrogativa de função – ser policial – podemos notar a presença de

outro requisito ao se tratar de “em tarefas de investigação” isso quer dizer que não

se pode elaborar uma investigação de cunho informal, ainda mais se tratando de

infiltração de agentes. É necessária a instauração do competente inquérito policial,

garantindo-lhe o caráter sigiloso. Nestes termos discorre Nucci: “Estar em tarefa de

investigação demonstra a necessidade de não se elaborar investigação informal,

especialmente infiltrada. É fundamental a instauração de inquérito, em caráter

sigiloso, para que se faça a infiltração.” (2013, p. 76).

Outro requisito que vale observação, talvez o mais importante, encontra-se

previsto no art. 10, parágrafo segundo, assim subscrito: “§ 2o Será admitida a

infiltração se houver indícios de infração penal de que trata o art. 1o e se a prova não

puder ser produzida por outros meios disponíveis.”(BRASIL, 2013, p. Única).

Demonstra-se, neste parágrafo, a intenção do legislador em utilizar esse tipo de

meio de prova como meio subsidiário, ultima ratio, por conta da invasividade da

conduta, além disso, está condicionado a indícios de que se trate de crime de

organização criminosa. Sendo assim estamos diante de mais dois requisitos;

indícios da prática de crime de organização criminosa e impossibilidade de utilização

44

de outros meios de prova, ou, que primeiramente se utilizem de outros meios

probatórios.

A respeito comenta Nucci: “A infiltração de agentes somente pode dar-se

caso se comprove ao magistrado, para obter a autorização necessária, a prova

mínima da existência do crime de organização criminosa; ou, se demonstrada esta,

indícios de crimes por ela praticados”. (2013, p. 77).

Greco Filho também discorre sobre o tema: “A investigação mediante

infiltração deve ser excepcional e tem como pressuposto necessário indícios da

prática do crime de organização criminosa e é subsidiária, admitindo-se quando a

prova não puder ser produzida por outros meios disponíveis”. (2014, p. 58).

Ainda se tratando de requisitos, mas possibilitando um elo para o próximo

tópico que será sobre aspectos procedimentais, devemos observar o disposto no art.

11, subscrito:

Art. 11: O requerimento do Ministério Público ou a representação do delegado de polícia para a infiltração de agentes conterão a demonstração da necessidade da medida, o alcance das tarefas dos agentes e, quando possível, os nomes ou apelidos das pessoas investigadas e o local da infiltração. (BRASIL, 2013, p. Única).

O requerimento do parquet ou a representação do delegado conterão (lê-se

requisitos) a demonstração da necessidade da medida, isto é, demonstrar que a

infiltração de um agente no âmbito da organização criminosa é o único meio possível

para angariar de maneira eficaz alguma prova; o alcance das tarefas dos agentes,

se referindo o quão infiltrado o agente vai estar na intimidade alheia; nomes ou

apelidos das pessoas investigadas e local da infiltração quando possível. Havendo

ciência da identidade dos criminosos e local de atuação, por óbvio, para o bem da

persecução penal, deverão ser demonstrados.

6.2 PROCEDIMENTOS E CONDUTA DO AGENTE

Já pudemos observar no art. 10 e 11 da Lei 12.850/13 que o procedimento

da infiltração de agentes tem por sujeito ativo o delegado de polícia ou o Ministério

Público, passando pelo crivo do magistrado que julgará procedente ou não tal

pedido. Assim como na colaboração premiada o juiz não participa em nenhum

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momento da fase que antecede o requerimento ou a representação e não pode

decretar a infiltração de agente de ofício.

Esse pedido (requerimento ou representação), nos termos do art. 12 da Lei

12.850/13, será sigilosamente distribuído, por óbvio que determinada condição tem

por finalidade preservar a identidade do agente e garantir a efetividade do instituto.

Por fim, devemos observar o disposto no art. 13 da Lei 12.850/13, que se

refere sobre a conduta do agente;

Art. 13: O agente que não guardar, em sua atuação, a devida proporcionalidade com a finalidade da investigação, responderá pelos excessos praticados. Parágrafo único: Não é punível, no âmbito da infiltração, a prática de crime pelo agente infiltrado no curso da investigação, quando inexigível conduta diversa. (BRASIL, 2013, p. Única).

Nesse sentido comenta Nucci:

A infiltração de agentes policiais no crime organizado, permite, por razões obvias, que o referido infiltrado participe ou até mesmo pratique algumas infrações penais, seja para mostrar lealdade e confiança nos líderes, seja para acompanhar os demais. Constrói-se, então, a excludente capaz de imunizar o agente infiltrado pelo cometimento de algum delito: inexigibilidade de conduta diversa. (2013, p. 82).

Sendo assim, o agente infiltrado responderá se cometer excessos que não

são inerentes a finalidade da investigação, desde que, não seja possível/exigível

conduta diversa por parte do mesmo. Ao valorar tal situação deverá ser observado o

ponto de vista favorável ao agente, que mesmo tendo direito de recusar ou fazer

cessar a atuação infiltrada (art. 14, I, Lei nº. 12.850/13) está se arriscando para

angariar as provas.

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7 CONCLUSÃO

Após a conclusão do presente estudo pude perceber que embora a nova lei

sobre organização criminosa – lei 12.850/2013 – padeça de algumas críticas

doutrinárias não podemos deixar de constatar a significativa evolução normativa que

ela trouxe e, comparando com o dispositivo legal antecessor que tratava do tema,

perceber nitidamente seu aperfeiçoamento.

Finalmente temos no Brasil um conceito para Organização Criminosa e a

devida tipificação criminal para o citado delito não sendo mais possível a dúvida

causada pelo legislador passado quando comparava crime organização criminosa

como o de formação de quadrilha ou bando.

Também pude observar a evolução no sentido de proporcionar ao instituto

colaboração premiadas diretrizes mais delimitadas, um roteiro mais detalhado, que,

tende a oferecer aos operadores do direito uma segurança/efetividade maior ao se

valer dela ou, se tratando do colaborador, benefícios explícitos e a exigência da

presença do advogado fiscalizando o ato.

Outro ponto importante que merece considerações finais é a respeito da

legitimidade ativa do delegado de policia para a propositura de acordo da

colaboração premiada na fase da ação penal. Tal novidade é vista por alguns

doutrinadores como inconstitucional, em que pese o Ministério Público também ter

ganhado poderes para oferecer o acordo de colaboração mesmo em fase de

investigação criminal. Acredito que devemos deixar de lado tais disputas

institucionais, sejam referentes à fase de investigação ou à fase de ação penal,

ambas as instituições são essenciais à administração da Justiça Criminal, por isso,

devem trabalhar em conjunto para a efetiva, célere, e justa persecução penal.

Por fim, temos a investigação e produção de provas através da infiltração de

agentes. Tal dispositivo não é desconhecido do nosso ordenamento, todavia, não

delimitava especificamente critérios procedimentais, bem como sua própria

regulamentação. Com o advento da lei 12.850/2013 diversos requisitos devem ser

cumpridos para que a infiltração do agente possa acontecer; deste modo

preenchendo as deficiências do dispositivo antecessor.

Uma lei mais completa, com diretrizes e requisitos bem delimitados, garante

uma maior aceitabilidade por parte dos operadores do direito, e como dito acima,

garante uma maior segurança tanto à acusação quanto à defesa quando forem se

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valer dos “remodelados” institutos. Demais conclusões e o desenrolar fático dos

dispositivos trazidos pela lei 12.850/2013 ainda estão em construção devido a

prematuridade da norma, porém, o que se pode afirmar desde já, é que a nova lei é

um grande passo no combate ao crime organizado.

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REFERÊNCIAS

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_____. DECRETO nº 5.015 de 12 de Março de 2004). Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689.htm. Acesso em: 21 Jan. 2014.

_____. LEI nº 9.034 de 3 de Maio de 1995. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689.htm. Acesso em: 24 Jan. 2014.

_____. Lei nº 12.850 de 2 de Agosto de 2013). Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689.htm. Acesso em: 21 Jan. 2014.

CUNHA, Rogério Sanches; PINTO, Ronaldo Batista. Crime Organizado Comentários à nova lei sobre o Crime Organizado – Lei nº 12.850/2013. 1. ed. Bahia: Editora Juspodivm, 2013.

GOMES, Luiz Flávio. Definição de crime organizado e a Convenção de Palermo.Disponível.http://ww3.lfg.com.br/public_html/article.php?story=20090504104529281&mode=print. Acesso em: 22 Jan. 2014.

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GRECO FILHO, Vicente. Comentários à Lei de Organização Criminosa Lei nº 12.850/13. 1. Ed. São Paulo: Saraiva, 2014. NUCCI, Guilherme de Souza. Organização Criminosa Comentários à lei 12.850 de 02 de Agosto de 2013. 1.ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 2013. PACELLI, Eugênio. Comentários ao Código de Processo Penal e sua Jurisprudência. 5. Ed. São Paulo: Editora Atlas S.A, 2013.