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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE ESCOLA DE ENFERMAGEM ANNA NERY COORDENAÇÃO GERAL DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA CURSO DE MESTRADO EM ENFERMAGEM NEUCIMAR DE OLIVEIRA DUARTE A PARTICIPAÇÃO DOS ENFERMEIROS DE SAÚDE DA FAMÍLIA NO CONTROLE SOCIAL EM SAÚDE: O CASO DE ANGRA DOS REIS Rio de Janeiro Julho/2010

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE

ESCOLA DE ENFERMAGEM ANNA NERY

COORDENAÇÃO GERAL DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA

CURSO DE MESTRADO EM ENFERMAGEM

NEUCIMAR DE OLIVEIRA DUARTE

A PARTICIPAÇÃO DOS ENFERMEIROS DE SAÚDE DA FAMÍLIA NO

CONTROLE SOCIAL EM SAÚDE: O CASO DE ANGRA DOS REIS

Rio de Janeiro Julho/2010

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UFRJ

A PARTICIPAÇÃO DOS ENFERMEIROS DE SAÚDE DA FAMÍLIA NO CONTROLE

SOCIAL EM SAÚDE: O CASO DE ANGRA DOS REIS

Neucimar de Oliveira Duarte

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, Escola de Enfermagem Anna Nery, Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Enfermagem.

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Ana Inês Sousa

Rio de Janeiro Julho/2010

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A PARTICIPAÇÃO DOS ENFERMEIROS DE SAÚDE DA FAMÍLIA NO

CONTROLE SOCIAL EM SAÚDE: O CASO DE ANGRA DOS REIS

Neucimar de Oliveira Duarte

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Ana Inês Sousa

Dissertação na Linha de Pesquisa “Políticas públicas e seu impacto na saúde da população: as políticas de saúde e a participação do enfermeiro”, do NUPENSC/DESP/EEAN, submetida ao corpo docente como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Enfermagem. Aprovada por: Prof.ª Dr.ª ANA INÊS SOUSA _________________________________________________ Prof.ª Dr.ª SONIA ACIOLI DE OLIVEIRA _______________________________________ Prof.ª Dr.ª ELISABETE PIMENTA ARAÚJO PAZ _________________________________ Prof.ª Dr.ª MARIA DE LOURDES T. CAVALCANTI _______________________________ (Suplente)

Prof.ª Dr.ª MARIA HELENA DO NASCIMENTO SOUZA ___________________________ (Suplente)

Rio de Janeiro Julho/2010

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AGRADECIMENTOS

Às comunidades, às instâncias colegiadas de controle social de saúde e aos profissionais de saúde do Município de Angra dos Reis pela oportunidade de aprendizado contínuo. Aos Prefeitos Fernando Jordão (2001-2004/2005-2008) e Tuca Jordão (2009-2012) pelo apoio institucional. Aos Gestores de Saúde João Domingos Rosa Machado (2005-2007), Gilberto Albernaz Machado (2007-2008) e Adilson Bernardo (2009-2010) pela compreensão e apoio setorial. À Escola de Enfermagem Anna Nery; agradeço a todos os professores e funcionários da Coordenação Geral de Pós-Graduação e Pesquisa, especialmente, à Prof.ª Drª Marléa Chagas Moreira, a Srª Sônia Maria Xavier e ao Sr. Jorge Anselmo pela compreensão e auxílio em momentos difíceis. À Prof.ª Drª Maria Helena do Nascimento Souza e à Prof.ª Drª Maria de Lourdes T. Cavalcanti pela colaboração como suplentes na banca examinadora. À Prof.ª Drª Sônia Acioli de Oliveira pelas relevantes contribuições para esta investigação. À Prof.ª Drª Elisabete Araújo Paz, que, nas diversas dificuldades para realização deste estudo, estendeu sua mão e sua visão. À Prof.ª Drª Ana Inês Sousa, minha orientadora, uma pessoa singular que contribuiu com seu valioso tempo para meu crescimento pessoal e profissional. A Antônio Paulino de Alencar, que tem sido mais que um amigo nesses últimos 10 anos. À minha família e, especialmente, ao Edson Silva dos Santos; sem sua colaboração e paciência não teria concluído este trabalho.

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DUARTE, Neucimar de Oliveira

A Participação dos Enfermeiros de Saúde da Família no Controle Social em Saúde: o caso de Angra dos Reis./ Neucimar de Oliveira Duarte. Rio de Janeiro: UFRJ / EEAN, 2010.

ix, 105 f. : il.; 31 cm. Orientadora: Ana Inês Sousa Dissertação (Mestrado) – UFRJ/ EEAN/ Programa de Pós-graduação em Enfermagem, 2010. Referências bibliográficas: f. 100-107 1. Enfermagem. 2. Participação Social. 3. Saúde da Família. I. Sousa, Inês Ana. II. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Escola de Enfermagem Anna Nery. III. Título.

CDD 610.73

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RESUMO

A PARTICIPAÇÃO DOS ENFERMEIROS DE SAÚDE DA FAMÍLIA NO CONTROLE SOCIAL EM SAÚDE: O CASO DE ANGRA DOS REIS

Neucimar de Oliveira Duarte

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Ana Inês Sousa

Resumo da Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-graduação em Enfermagem, Escola de Enfermagem Anna Nery da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Enfermagem. A partir de 2006 a Fundação de Saúde de Angra dos Reis instituiu um incentivo financeiro às equipes de Saúde da Família. Sua concessão envolve a avaliação da Associação de Moradores e autoavaliação da equipe. Realizou-se investigação com o objetivo de: analisar a participação dos enfermeiros de Saúde da Família no controle social em saúde a partir da concessão do incentivo e discutir como este, na perspectiva dos enfermeiros, incidiu no trabalho das equipes de saúde da família e na comunidade. Método: Estudo de caso do tipo múltiplo, de abordagem qualitativa. Realizaram-se entrevistas semiestruturadas com vinte enfermeiros de Saúde da Família. Utilizou-se análise de conteúdo na exploração dos depoimentos. Algumas mudanças a partir da concessão do incentivo foram reconhecidas pelos enfermeiros, como a redução de faltas dos profissionais; respostas mais imediatas às demandas dos usuários; adoção da autoavaliação e preocupação com as metas quantitativas. Também, reforçou o autoritarismo na relação cotidiana dos presidentes das Associações de Moradores com as equipes. Considerações Finais: A despeito das limitações, acreditamos que a qualificação do processo de concessão e do próprio incentivo poderá contribuir para a consolidação da Estratégia de Saúde da Família como um espaço de bem-estar social e de saúde. Palavras-chave: Enfermagem; Participação Social e Saúde da Família.

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ABSTRACT

PARTICIPATION OF THE FAMILY HEALTH NURSE IN SOCIAL CONTROL IN

HEALTH: THE CASE OF ANGRA DOS REIS

Neucimar de Oliveira Duarte

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Ana Inês Sousa Abstract da Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-graduação em Enfermagem, Escola de Enfermagem Anna Nery da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Enfermagem. From 2006 the Health Foundation of Angra dos Reis imposed a financial incentive to teams of Family Health. His concession involves the evaluation of the Association of Residents and self-assessment team. We performed research with the aim of: analyzing the participation of nurses in family health in social control in health from the granting of incentive and encouragement to discuss how, from the perspective of nurses, focused on the work of health teams and family in the community. Methods: A case study of multiple type of qualitative approach. There were semi-structured interviews with twenty nurses from Family Health. We used content analysis of statements on the farm. Some changes from the grant of incentive were recognized by nurses as to reduce shortages of professionals, more immediate responses to the demands of users; adoption of the self-evaluation and concern for quantitative targets. It also reinforced the authoritarianism in the daily relations of the presidents of neighborhood associations with the teams. Conclusion: Despite the limitations, we believe that the classification process of granting and own incentive could contribute to the consolidation of the Family Health Strategy as an area of social welfare and health. Keywords: Nursing, Consumer Participation and Family Health.

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RESUMEN

PARTICIPACIÓN DE LA ENFERMERA DE SALUD FAMILIAR EN EL CONTROL SOCIAL EN SALUD: EL CASO DE ANGRA DOS REIS

Neucimar de Oliveira Duarte

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Ana Inês Sousa

Resumen da Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-graduação em Enfermagem, Escola de Enfermagem Anna Nery da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Enfermagem.

A partir de 2006 la Fundación de Salud de Angra dos Reis, estableció un incentivo financiero a los equipos de Salud de la Familia. Su concesión implica la evaluación de la Asociación de Vecinos y el equipo de autoevaluación. Se llevó a cabo la investigación para: examinar la participación de las enfermeras en salud de la familia en el control social en la salud de la concesión de incentivos y estímulo para discutir cómo, desde la perspectiva de las enfermeras, se centró en la labor de los equipos de salud y la familia en la comunidad. Métodos: Estudio de casos y múltiple tipo de abordaje cualitativo. Hubo entrevistas semi-estructuradas con veinte enfermeras en salud de la familia. Se utilizó el análisis de contenido en la exploración de los depósitos. Algunos cambios de la concesión de incentivos han sido reconocidos por las enfermeras como de reducir la escasez de profesionales, más respuestas inmediatas a las demandas de los usuarios, la adopción de la autoevaluación y la preocupación por los objetivos cuantitativos. También reforzó el autoritarismo en las relaciones cotidianas de los presidentes de las asociaciones de vecinos con los equipos. Conclusión: A pesar de las limitaciones, creemos que el proceso de qualificación de la concesión y el incentivo propio podría contribuir a la consolidación de la Estrategia Salud de la Familia como un área de bienestar social y salud.

Palabras clave: Enfermería, Participación Comunitaria y Salud de la Familia.

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SUMÁRIO

Resumo ...................................................................................................................................................... vi

Abstract .................................................................................................................................................... vii

Resumen .................................................................................................................................................... viii

1. FORMULAÇÃO DO PROBLEMA ............................................................................................................. 10

1.1 Introdução ........................................................................................................................................... 10

1.2 Questões Norteadoras ........................................................................................................................ 15

1.3 Objetivos ............................................................................................................................................. 16

1.4 Delimitação do objeto de estudo ........................................................................................................ 16

1.5 Relevância e contribuições do estudo ................................................................................................. 16

2. REVISÃO DE LITERATURA ...................................................................................................................... 21

2.1 Participação e Controle Social em Saúde: a contribuição legal e normativa brasileira ....................... 21

2.2 Participação: os múltiplos sentidos ..................................................................................................... 34

2.3 O Controle Social em Saúde: experiência nos 21 anos de SUS ............................................................ 43

2.4 Enfermeiro de Saúde da Família, a Participação e o Controle Social: elementos para

reflexão......................................................................................................................................................

48

3. METODOLOGIA ..................................................................................................................................... 58

3.1 Tipo de Pesquisa .................................................................................................................................. 58

3.2 Cenário ................................................................................................................................................ 60

3.3 Sujeitos ................................................................................................................................................ 62

3.4 Unidade de análise .............................................................................................................................. 63

3.5 Coleta de dados ................................................................................................................................... 63

3.6 Organização e análise dos dados ......................................................................................................... 66

3.7 Aspectos éticos .................................................................................................................................... 71

3.8 Limitações do método ......................................................................................................................... 72

4. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS .................................................................................... 73

4.1 Perfil dos Enfermeiros Entrevistados .................................................................................................. 73

4.2 Concepções dos Enfermeiros sobre o Incentivo Financeiro para a Saúde da Família.......................... 73

4.2.1 Categoria 1 ....................................................................................................................................... 74

4.2.2 Categoria 2 ....................................................................................................................................... 79

4.2.3 Categoria 3 ....................................................................................................................................... 83

CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................................................... 89

RECOMENDAÇÕES..................................................................................................................................... 98

REFERÊNCIAS ............................................................................................................................................ 100

ANEXO A – Instrumento de coleta de dados.............................................................................................. 108

ANEXO B – Carta de Solicitação de Autorização à Instituição ................................................................... 109

ANEXO C – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ......................................................................... 110

ANEXO D – Aprovação do Comitê de Ética em pesquisa............................................................................ 112

ANEXO E – Ata do Conselho Municipal de Saúde de Angra dos Reis........................................................ 113

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1. FORMULAÇÃO DO PROBLEMA

1.1. Introdução

A questão central do presente estudo foi refletir sobre a participação e o controle social

em saúde no Município de Angra dos Reis a partir da concessão de incentivo financeiro para

os enfermeiros e demais membros das equipes de saúde da família do município.

Reconhecemos que a realidade é mais rica do que podemos capturar dela por meio de

nossas sínteses, porém “a síntese é a visão de conjunto que permite ao homem descobrir a

estrutura significativa da realidade com que se defronta numa situação dada”

(KONDER,1998, p.37). Para auxiliar na visão do conjunto, inicialmente, contextualizamos os

pressupostos do Sistema Único de Saúde (SUS), realçando os aspectos da participação e

controle social em saúde.

Desta forma, nosso ponto de partida é a reforma que o Brasil, à semelhança de outros

países, a partir das últimas duas décadas promoveu no seu sistema de saúde. O objetivo

principal dessa reforma foi elevar o acesso aos serviços e as ações de saúde como medida de

enfrentamento de um quadro sanitário bastante crítico. Essa mudança teve início no meio

acadêmico, na década de 70, como forma de oposição não somente política, mas também

técnica à ditadura militar, ganhando corpo na década de 80 pela adesão de diversos setores

sociais e pelo fim do regime militar em 1985 (BISPO JÚNIOR; GESTEIRA, 2004). Tal

movimento, tanto na prática como no escopo de suas ideias, teve como um dos seus principais

eixos a participação da população tanto na formulação das políticas públicas como em seu

controle.

Em 1998, com a Constituição Federal, a participação e o controle social na gestão do

sistema de saúde em nosso país passam, enquanto diretriz constitucional e princípio

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organizativo do SUS, a ser exercidos pelas Conferências e Conselhos de Saúde. Estes são

partes integrantes dos órgãos de gestão do SUS nas esferas: nacional, estadual e municipal,

garantindo-lhes legalmente um sistema participativo e democrático por meio da “formulação

de estratégias e no controle da execução da política de saúde, na instância correspondente,

inclusive nos aspectos econômicos e financeiros, cujas decisões serão homologadas pelo

chefe do poder legalmente constituído em cada esfera do governo”, como define a Lei nº

8.142 (BRASIL, 2007b, p.29).

Passados mais de vinte anos da promulgação da Constituição Federal de 1988 e das

Leis Orgânicas do SUS temos um cenário de importantes demandas para alcançarmos o SUS

que queremos, pois “há uma enorme distância entre o SUS constitucional, um sistema público

universal para todos os brasileiros, e o SUS real, um espaço público para os pobres que

convive com dois sistemas privados, o da atenção médica suplementar e o de desembolso

direto” (MENDES, 2004, p. 4).

Tem-se apostado na relação entre o Estado e a sociedade civil1 para ultrapassar os

obstáculos que se impõem à efetivação do direito constitucional à saúde. Nesse encontro, os

Conselhos de Gestão Participativa assumem, no âmbito das unidades de saúde, a

democratização no processo de gestão (BRASIL, 2006a); e os Conselhos de Saúde, a

responsabilidade de inserir as demandas sociais na área de saúde na agenda do executivo e

convertê-las em política pública (LABRA, 2007).

Os conselhos nascem com potencial transformador no campo das políticas de saúde,

pois participam de sua formulação, bem como do processo de gestão. Para Gohn (2007, p. 85)

“trata-se de um novo padrão de relações entre Estado e sociedade, porque eles viabilizam a

1 “[...] a esfera das relações entre indivíduos, entre grupos, entre classes sociais que se desenvolvem à margem das relações de poder que caracterizam as instituições estatais. Em outras palavras Sociedade civil é representada como conflitos econômicos, ideológicos, sociais e religiosos que o Estado tem a seu cargo resolver, intervindo como mediador ou suprimindo-os; como a base da qual partem as solicitações às quais o sistema político está chamado a responder; como o campo das várias formas de mobilização, de associação e de organização das forças sociais que impelem à conquista do poder político” (BOBBIO et al, 2007, p. 1210).

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participação de segmentos sociais na formulação de políticas sociais e possibilitam à

população o acesso aos espaços nos quais se tomam as decisões políticas”. A capacidade

potencial dos conselhos em concretizarem as demandas da sociedade nos levou a refletir sobre

o tema: O Controle Social em Saúde.

A legislação garante um caráter permanente e deliberativo para os Conselhos de Saúde

cuja composição deverá obrigatoriamente ter representantes do gestor de saúde, dos

profissionais de saúde, dos prestadores de serviço e dos usuários, sendo o quantitativo deste

segmento igual a 50% do total dos membros que o compõem. A paridade garantida por lei

entre o segmento dos usuários em relação aos demais segmentos (gestor, profissionais e

prestadores de serviço), segundo Carvalho (1977 apud GUIZARDI; PINHEIRO, 2006, p.

800) expressa uma “discriminação positiva dos grupos que dispõem de menor poder social,

por meio do qual se espera a transformação de seu exercício e distribuição por meio da prática

do controle social”.

A paridade enquanto uma estratégia de equidade social, entretanto, tem se mostrado

insuficiente, pois os representantes do Estado contam com um aparelhamento técnico e

administrativo, apoderando-se de um conjunto de saberes. Isto privilegia esses representantes

nas instâncias de controle social e, consequentemente, acarreta a minimização da capacidade

de defesa e conquista de direitos para a maioria da população. Neste sentido, Guizardi e

Pinheiro (2006, p. 801) ressaltam:

A falta de preparo para a função fica explícita na constatação de que quase todas as pessoas que participaram dos conselhos afirmaram não ter conseguido participar das discussões e questões trabalhadas nesse espaço. Esse aspecto nos indica como, dentro dos conselhos, a questão do saber rapidamente se afirma como relações assimétricas de poder, em que os representantes, principalmente dos usuários, se sentem desautorizados e desqualificados perante a argumentação técnica prevalecente, em função da qual o “conhecimento necessário” parece pertencer apenas ao poder executivo.

A qualificação dos conselheiros representa elemento fundamental, instrumentalizando-

os para a defesa e conquista do SUS constitucional. Eles devem buscar a reflexão sobre a sua

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realidade e, consequentemente, tornar-se mais conscientes e comprometidos com a sua

transformação, ou seja, sujeitos de sua própria educação (STRUCHINER e GIANNELLA,

2005). Neste sentido, os enfermeiros apresentam real possibilidade e, sobretudo,

responsabilidade legal.

A Lei N° 7.498 de 25 de junho de 1986, que dispõe sobre a regulamentação do

exercício da Enfermagem (Art. 11, Parágrafo II, letra J.), incumbe ao enfermeiro, como

integrante da equipe de saúde, a educação como estratégia de melhoria da saúde da população

(COFEN/COREN-RJ, 2005).

O Código de Ética dos profissionais de enfermagem (COFEN/COREN-RJ, 2005)

ressalta que “o aprimoramento do comportamento ético do profissional passa pelo processo de

construção de uma consciência individual e coletiva, pelo compromisso social e profissional

configurado pela responsabilidade no plano das relações de trabalho com reflexos no campo

científico e político”. O Código de Ética de Enfermagem imputa ao profissional de

enfermagem a defesa dos princípios da política de saúde e, dentre eles, a participação da

comunidade:

O profissional de enfermagem participa, como integrante da equipe de saúde, das ações que visem satisfazer as necessidades de saúde da população e da defesa dos princípios das políticas de saúde e ambientais, que garantam a universalidade de acesso aos serviços de saúde, integralidade da assistência, resolutividade, preservação da autonomia das pessoas, participação da comunidade, hierarquização e descentralização político-administrativa dos serviços de saúde (COFEN/COREN-RJ, 2005, p. 108).

A educação como estratégia de melhoria da saúde da população, o compromisso social

e as ações de defesa dos princípios das políticas públicas de saúde que garantam a

participação da comunidade são inerentes às enfermeiras. Entretanto, as enfermeiras

consideram que o despreparo da população para participar nos conselhos guarda relação com

o próprio despreparo e dos demais trabalhadores da saúde (ARANTES et al, 2007). Outros

fatores relacionados à cultura da população brasileira fragilizam, também, os canais de

participação instituídos:

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Baixíssima adesão dos brasileiros aos valores cívicos (...), reduzido engajamento dos cidadãos em atividades associativas (...) e a desigualdade e pobreza, já que comprometem a confiança na democracia e nas instituições, incidem no engajamento cívico em ações coletivas e afetam a simetria nas relações entre os participantes de arenas de deliberação (LABRA, 2007, p. 13).

Não obstante as dificuldades, os conselhos na área de saúde têm movido a sociedade

civil, mesmo que em um tempo diferente do que desejemos ou que necessitemos, na direção

de arranjos coletivos e na busca de consensos e, com isso, ajudam a elevar a participação e

cultura cívica1. Além do que, os conselhos de saúde, pela sua possibilidade potencial de

inclusão de demandas de participação da sociedade civil na estrutura do poder

estatal,materializam-se como instrumentos de participação social em uma política pública

nacional (LABRA, 2007).

Em 2006, a partir da perspectiva da política pública nacional de participação social em

saúde, temos no Pacto pela Saúde um novo incremento para mobilização da sociedade civil

para a inclusão de demandas no Sistema único de Saúde. No mesmo ano foi aprovada a

Política Nacional de Atenção Básica, que tem como um de seus princípios gerais e

fundamentais a participação social à participação social (BRASIL, 2006c).

Também em 2006, o município de Angra dos Reis instituiu um incentivo financeiro

para as equipes de Saúde da Família, Saúde Bucal e Agentes Comunitários de Saúde, o que

representa um valor de acréscimo financeiro à remuneração dos profissionais. Inicialmente,

foi denominado de incentivo resolutividade e, posteriormente, de incentivo de produtividade

sem que houvesse mudança no conteúdo ou no processo de concessão. Em virtude disto e da

incorporação do termo pelos enfermeiros entrevistados, optamos por adotar neste estudo a

denominação inicial.

1 “[...] preocupação pelos destinos da comunidade política e pela qualidade da democracia” [...]. “Desta forma, a cultura cívica pode ser vista como uma posição que recobre apenas parcialmente o espaço sociopolítico, enfatizando valores de participação, informação e fiscalização dos poderes constituídos, de experimentação coletiva, de respeito às diferenças e de solidariedade com os desprivilegiados e excluídos. No entanto, trata-se de uma parcialidade que demanda reconhecimento de outras perspectivas, instaura um contencioso a respeito da forma de organização da sociedade e, assim, politiza o espaço público” (BURITY, 1999, p. 238).

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A concessão do incentivo está condicionada a um processo de avaliação que envolve

a associação de moradores, os profissionais da equipe de saúde da família e agentes

comunitários de saúde. Ressalta-se o papel preponderante da enfermeira nesse processo, tendo

em vista que, além das funções assistenciais, ela é responsável pela gerência do módulo de

saúde da família. Com isso, a condução do processo de avaliação, dentro da equipe e na

interface com a associação de moradores, fica sob a responsabilidade das enfermeiras de

saúde da família (ANGRA DOS REIS, 2006).

Estas e as demais observações descritas instigaram a investigação sobre a atuação dos

enfermeiros enquanto agentes comprometidos com a participação e o controle social em

saúde. Para isso, partimos da formulação do seguinte problema: como se configurou a

participação dos enfermeiros de saúde da família no controle social em saúde a partir

concessão do incentivo de resolutividade em Angra dos Reis?

1.2. Questões Norteadoras

A partir das reflexões apresentadas, foram levantadas as seguintes questões

norteadoras:

• Como o incentivo de resolutividade incidiu sobre a participação dos enfermeiros

de Saúde da Família no controle social em saúde em Angra dos Reis?

• Como o incentivo de resolutividade incidiu no trabalho das equipes de Saúde da

Família e na comunidade de Angra dos Reis?

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Considerando-se as questões norteadoras, estabelecemos os seguintes objetivos:

1.3. Objetivos

• Analisar a participação dos enfermeiros de Saúde da Família no controle social em

saúde a partir da concessão do incentivo de resolutividade em Angra dos Reis.

• Discutir como o incentivo de resolutividade, na perspectiva dos enfermeiros,

incidiu no trabalho das equipes de Saúde da Família e na comunidade de Angra

dos Reis.

1.4. Delimitação do objeto de estudo

O objeto deste estudo foi a participação dos enfermeiros de saúde da família no

controle social em saúde a partir da concessão do incentivo de resolutividade em Angra

dos Reis.

1.5. Relevância e contribuições do estudo

O interesse nesta temática nasceu da minha participação no Conselho Municipal de

Saúde e em outras instâncias colegiadas de controle social no município de Angra dos Reis,

que teve início em 1993, como enfermeiro assistencial e, posteriormente, ocupando várias

funções e cargos de confiança na gestão municipal da saúde, tais como: Chefe de Seção do

Posto Distrital do Abraão; Chefe de Serviço de Coordenação do 5° Distrito Sanitário; Gerente

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de Divisão de Saúde; Gerente da Divisão de Atenção Primária e Diretor de Planejamento,

Controle, Avaliação e Auditoria.

As oportunidades gerenciais vivenciadas trouxeram importantes experiências

profissionais das quais cito: a coordenação da elaboração do Plano Municipal de Saúde do

período de 2002 a 2005 e a participação rotineira (quase que diária) nas discussões

relacionadas à saúde em diferentes formas de organização comunitária, bem como de várias

reuniões do Conselho Municipal de Saúde e outras instâncias de controle social em saúde na

qualidade de assessor técnico ou representante do gestor da saúde.

A instituição do controle social em saúde em Angra dos Reis, conforme a Lei n°

8.142/90, ocorreu paralelamente à reorganização administrativa da Secretaria Municipal de

Saúde, criando-se o Conselho Municipal de Saúde e demais instâncias de gestão participativa:

Conselhos Gestores das Unidades de Saúde, Conselhos Distritais e Conselho Gestor da Santa

Casa/Hospital e Maternidade Codrato de Vilhena (PINHEIRO, 1995).

Minha experiência em Angra dos Reis reconhece que somente o Conselho Municipal

de Saúde e alguns poucos Conselhos Gestores de Unidades de Saúde têm se reunido

regularmente. Nesses fóruns, por diversas vezes, presenciei, principalmente por parte dos

Conselheiros dos Usuários, queixas que apontavam para atuação do conselho apenas como

uma esfera de validação da política proposta pela gestão municipal, configurando um caráter

normativo deste conselho.

O caráter normativo é uma das questões que acarretam a diminuição da mobilização

social em torno da participação nos conselhos de saúde. Este cenário é diferente da época de

sua implantação, pois essas estruturas tinham “lugar de destaque no debate da

descentralização e democratização da saúde pública” (PINHEIRO, 1995, p. 43). Nesta

conjuntura torna-se necessário inserir os representantes das instâncias de controle social em

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saúde e, de forma geral, a sociedade civil em um movimento que retoma a defesa do SUS e

que reafirma a saúde como direito de cidadania.

A tentativa nacional de retomada da mobilização da sociedade para as questões de

saúde aconteceu mediante a aprovação das diretrizes operacionais do Pacto pela Saúde em

2006. Neste ano foi publicada a Portaria N° 648/GM que aprovou a Política Nacional de

Atenção Básica na qual o estímulo à participação social é recorrentemente descrito sob

diversas formas em seus múltiplos capítulos (BRASIL, 2006c).

No contexto municipal, no ano de 2006, foi implantado o incentivo de resolutividade

cujo valor está vinculado a dois instrumentos de avaliação com questões objetivas baseadas

no Documento Técnico de Avaliação da melhoria da Qualidade da Estratégia de Saúde da

Família. A pontuação é decorrente da avaliação da associação de moradores adscrita à área da

unidade de saúde da família ou de agentes comunitários de saúde e da autoavaliação das

equipes de profissionais.

A pontuação máxima é de cem pontos, sendo emitidos pela associação de moradores o

máximo de sessenta pontos e pela autoavaliação da equipe de profissionais o máximo de

quarenta pontos. O pagamento do incentivo tem ocorrido desde junho de 2006, não obstante a

ausência de regulamentação por legislação municipal, obedecendo à relação proporcional

estabelecida entre o valor do incentivo por categoria e a variação da pontuação final obtida

conforme tabela própria.

A despeito dos incentivos para a participação e o controle social em saúde contidos na

política nacional, a 13ª Conferência Nacional de Saúde que aconteceu no período de 14 a 18

de novembro de 2007 apontou, como atual, o desafio à efetivação do controle social na saúde,

propondo no seu III Eixo Temático “A participação da Sociedade na Efetivação do Direito

Humano à Saúde”:

1. Avaliação da autonomia e da capacidade de elaborar, influenciar, vetar políticas de saúde dos Conselhos e Conferências de Saúde e propostas para conferir ao controle social maior poder de definição sobre os rumos do SUS;

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2. Avaliação das condições materiais, técnicas e contextos políticos envolvidos com o funcionamento dos Conselhos e das Conferências de Saúde;

3. Análise das proposições sobre a criação dos conselhos gestores ou conselhos de gestão participativa e avaliação das relações entre esses conselhos e os conselhos e as conferências de saúde; 4. Propostas de reorganização e aprimoramento dos conselhos e conferências que integram o controle social do SUS;

5. Construção de caminhos para a integração das diversas instâncias de controle social das políticas sociais e econômicas que contribuam para a adoção de um modelo de desenvolvimento humano e sustentável (BRASIL, 2007d, p. 5).

Em 2008, o governo federal lançou o Programa de Aceleração do Crescimento da

Saúde (PAC da Saúde), representado pelo Programa Mais Saúde: Direito de Todos: 2008-

2011, injetando recursos financeiros para a expansão das ações destinadas à efetivação da

participação e controle social em saúde. O programa reconhece que essa prática, assim como

outras, configura um contexto ainda distante dos ditames legais e normativos que a regulam

(BRASIL, 2008).

Nesse mesmo ano, o Conselho Nacional da Associação Brasileira de Enfermagem

elegeu para a 69ª Semana Brasileira de Enfermagem o tema: “Saúde, Poder e Cidadania”,

buscando “oportunizar à Enfermagem, além de outros trabalhadores da saúde e segmentos

sociais interessados, uma reflexão aprofundada e crítica acerca de suas relações, enquanto

prática social” (ABEn, 2008, p. 11). Para isso, afirma que:

Será, portanto, fundamental promover a discussão sobre a Enfermagem e o exercício da cidadania; exercício da cidadania na prestação de serviços; o uso do poder profissional no atendimento ao usuário; postura profissional da Enfermagem frente a seus deveres e direitos, a intervenção da Enfermagem na política nacional de saúde; a Enfermagem na defesa dos direitos constitucionais; a Enfermagem no controle social das políticas públicas; a Enfermagem cidadã na assistência, ensino, pesquisa e gestão (ABEn, 2008, p. 11-12).

A partir das questões apresentadas, o estudo tornou-se relevante por abordar questões

contemporâneas do plano político-institucional, promovendo a reflexão sobre a prática da

Enfermagem e o fortalecimento da cidadania na direção da superação do descompasso entre o

SUS legal e o real. Desta forma, apresentou compatibilidade com a finalidade do Núcleo de

Pesquisa em Enfermagem de Saúde Coletiva, que é “promover pesquisas, estudos e

assessorias relacionados à enfermagem na área de saúde coletiva...” (UFRJ, 1999, p. 1), tendo

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em vista que se vinculou a linha de pesquisa sobre a Enfermagem no contexto da saúde

coletiva, englobando o campo das políticas públicas e sociais.

A pesquisa, também, veio ampliar o restrito universo de estudos realizados sobre o

tema na área de Enfermagem. Por meio de levantamento, nos meses de março e abril de 2008,

nas bases de dados (LILACS, SCIELO, BDENF, MINERVA e MEDLINE), utilizando-se os

descritores conselhos de saúde, participação social e termos correlatos, foram encontrados

dezenove artigos relacionados com a área de Enfermagem ou realizados por enfermeiros,

sendo a maioria da década de noventa. Ressaltamos, entretanto, que nenhum deles abordava a

questão relacionada ao objeto deste estudo. Com isso, acreditamos ter contribuído com:

• Os Usuários e Gestores, pois descreveu e explorou uma experiência

municipal de indução à participação e controle social nas equipes de Saúde da

Família que poderá ser replicada ou revitalizada.

• Os Enfermeiros, pois discutiu o baixo ânimo em participar de práticas

associativas, ressaltando as possibilidades dessas práticas em contribuírem para

o seu reconhecimento social.

• O ensino de Enfermagem, pois ressaltou a necessidade de promover a

reflexão sobre a inter-relação dos aspectos dos recortes históricos da dimensão

social, política e cultural que envolva a democracia, visando impactar nos

fatores que limitam a participação e o controle social em saúde para os

enfermeiros.

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2. REVISÃO DE LITERATURA

2.1. Participação e Controle Social em Saúde: a contribuição legal e

normativa brasileira

A Constituição Federal de 1988 representou uma reformulação da ação estatal na área

social, por meio da adoção de objetivos que caracterizam legalmente o Estado brasileiro

enquanto um instrumento de proteção social, quando em seu Título VIII (Da Ordem Social),

Capítulo II (Da Seguridade Social), Seção I (Disposições Gerais) define:

Art. 194. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.

Parágrafo único. Compete ao Poder Público, nos termos da lei, organizar a seguridade social, com base nos seguintes objetivos:

I - universalidade da cobertura e do atendimento;

II - uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais;

III - seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços;

IV - irredutibilidade do valor dos benefícios;

V - equidade na forma de participação no custeio;

VI - diversidade da base de financiamento;

VII - caráter democrático e descentralizado da administração, mediante gestão quadripartite, com participação dos trabalhadores, dos empregadores, dos aposentados e do Governo nos órgãos colegiados (BRASIL, 1988).

A saúde, como um dos elementos de proteção social, passa, também, a transparecer no

texto constitucional a compatibilidade com o modelo de seguridade social, garantindo a

configuração de um sistema de saúde baseado nas diretrizes de descentralização, de

atendimento integral e participação da comunidade:

Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes:

I - descentralização, com direção única em cada esfera de governo;

II - atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais;

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III - participação da comunidade (BRASIL, 2007b, p.07).

Assim, a participação da comunidade institucionaliza-se no Sistema de Saúde como

um dos aspectos centrais da estratégia de reestruturação do setor, por meio do texto

constitucional que estabelece as bases para a Lei Nº 8.080 de 19 de setembro de 1990 que

“regula, em todo o território nacional, as ações dos serviços de saúde, executados isolados ou

conjuntamente, em caráter permanente ou eventual, por pessoas naturais ou jurídicas de

direito público ou privado” (BRASIL, 2007b, p. 10). A Lei Nº 8.080 em seu Capítulo II (Dos

Princípios e Diretrizes) reafirma a participação da comunidade:

Art. 7º As ações e serviços públicos de saúde e os serviços privados contratados ou conveniados que integram o Sistema Único de Saúde - SUS são desenvolvidos de acordo com as diretrizes previstas no artigo 198 da Constituição Federal, obedecendo ainda aos seguintes princípios:

I - universalidade de acesso aos serviços de saúde em todos os níveis de assistência;

II - integralidade de assistência, entendida como um conjunto articulado e contínuo das ações e serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em todos os níveis de complexidade do sistema;

III - preservação da autonomia das pessoas na defesa de sua integridade física e moral;

IV - igualdade da assistência à saúde, sem preconceitos ou privilégios de qualquer espécie;

V - direito à informação, às pessoas assistidas, sobre sua saúde;

VI - divulgação de informações quanto ao potencial dos serviços de saúde e sua utilização pelo usuário;

VII - utilização da epidemiologia para o estabelecimento de prioridades, a alocação de recursos e a orientação programática;

VIII - participação da comunidade;

IX - descentralização política-administrativa, com direção única em cada esfera de governo:

a) ênfase na descentralização dos serviços para os municípios;

b) regionalização e hierarquização da rede de serviços de saúde;

X - integração, em nível executivo, das ações de saúde, meio ambiente e saneamento básico;

XI - conjugação dos recursos financeiros, tecnológicos, materiais e humanos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, na prestação de serviços de assistência à saúde da população;

XII - capacidade de resolução dos serviços em todos os níveis de assistência; e

XIII - organização dos serviços públicos de modo a evitar duplicidade de meios para fins idênticos (BRASIL, 2007b, p. 13-14).

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A Lei N° 8.080 sofreu alguns vetos importantes e, dentre eles, os relativos à forma de

organização da participação da comunidade; porém, em 28 de dezembro de 1990 a aprovação

da Lei Nº 8.142 resgata, em parte, os vetos sofridos como descreve Gonçalves (1999 apud

MACEDO, 2005, p. 34):

... A Lei 8.080 de 19 de setembro de 1990, Lei Orgânica de Saúde, traz do Capítulo II, Art 7º, item VIII, o dispositivo legal que permite a participação da comunidade, através dos Conselhos e Comissões de Saúde. Embora mencionando e permitindo a participação da comunidade, a LOS sofreu vetos significativos, entre eles os artigos que se referiam à forma de organização que seria possível. Porém, em dezembro deste mesmo ano, graças à pressão do Movimento Sanitário e ao empenho de parlamentares comprometidos com a proposta da Reforma Sanitária, foi promulgada a Lei 8.142, regulamentando a participação da sociedade, bem como definindo as diretrizes necessárias para a viabilização desses fóruns, recuperando, pelo menos em parte, o que havia sido vetado pelo então Presidente da República.

A Lei Nº 8.142 de 28 de dezembro de 1990 “dispõe sobre a participação da

comunidade na gestão do Sistema único de Saúde (SUS) e sobre as transferências

intergovernamentais de recursos financeiros na área da saúde e dá outras providências”

(BRASIL, 2007b, p. 29). Com esta Lei a participação da comunidade ganha materialidade no

processo de gestão do SUS:

Art. 1º - O Sistema Único de Saúde - SUS de que trata a Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, contará, em cada esfera de governo, sem prejuízo das funções do Poder Legislativo, com as seguintes instâncias colegiadas:

I - a Conferência de Saúde, e

II - o Conselho de Saúde.

§ 1º - A Conferência de Saúde reunir-se-á a cada 4 anos com a representação dos vários segmentos sociais, para avaliar a situação de saúde e propor as diretrizes para a formulação da política de saúde nos níveis correspondentes, convocada pelo Poder Executivo ou, extraordinariamente, por este ou pelo Conselho de Saúde.

§ 2º - O Conselho de Saúde, em caráter permanente e deliberativo, órgão colegiado composto por representantes do governo, prestadores de serviço, profissionais de saúde e usuários, atua na formulação de estratégias e no controle da execução da política de saúde na instância correspondente, inclusive nos aspectos econômicos e financeiros, cujas decisões serão homologadas pelo chefe do poder legalmente constituído em cada esfera do governo.

§ 3º- O Conselho Nacional de Secretários de Saúde - CONASS e o Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde CONASEMS terão representação no Conselho Nacional de Saúde.

§ 4º - A representação dos usuários nos Conselhos de Saúde e Conferências de Saúde será paritária em relação ao conjunto dos demais segmentos.

§ 5º - As Conferências de Saúde e os Conselhos de Saúde terão sua organização e normas de funcionamento definidas em regimento próprio aprovados pelo respectivo Conselho (BRASIL, 2007b, p. 29).

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A partir do tripé legalmente constituído pela Constituição Federal de 1988, pela Lei Nº

8.080 de 19 de setembro de 1990 e pela Lei Nº 8.142 de 28 de dezembro de 1990 (as duas

últimas são consideradas as Leis Orgânicas da Saúde – LOS), a participação e o controle

social no Sistema Único de Saúde (SUS) deslocam o usuário do papel exclusivo de receptor

de assistência à saúde para o papel de ator no elenco que debate, formula e fiscaliza a política

de saúde no Brasil.

Esse arcabouço jurídico norteia as subsequentes normatizações criadas com o objetivo

de aprofundar “o processo de descentralização da gestão do sistema e definir as relações entre

as três esferas do governo” (SOLLA, 2006, p. 334-335). São representadas pelas Normas

Operacionais editadas por meio de Portarias desde 1991 até 2002 (NOB-SUS 01/91, NOB-

SUS 01/92, NOB-SUS 01/93, NOB-SUS 01/96, NOAS-SUS 01/01 e NOAS-SUS 01/02). Em

seus textos atendem à diretriz constitucional e princípio do SUS de participação e controle

social. Para isso, imputam a necessidade de existência de Conselho de Saúde como um dos

requisitos para transferências intergovernamentais de recursos em cumprimento a Lei n°

8.142 (BRASIL, 2007b).

Em 2003 a Resolução CNS nº 333, de 4 de novembro, “aprova as diretrizes para a

criação, reformulação, estruturação e funcionamento dos Conselhos de Saúde”, revogando as

resoluções do Conselho Nacional de Saúde Nº 33/1992 e Nº 319/2002 (BRASIL, 2007b, p.

148). A resolução em sua quarta diretriz que trata da estrutura e funcionamento dos Conselhos

de Saúde resolve que “os governos garantirão a autonomia para o pleno funcionamento do

Conselho de Saúde, dotação orçamentária, secretaria executiva e estrutura administrativa”,

cabendo ao próprio Conselho gerenciar sua dotação orçamentária (BRASIL, 2007b, p. 151).

Os Conselhos de Saúde ainda poderão solicitar auditoria externa e independente para

as contas e atividades do gestor do SUS, desde que sejam justificados os motivos e com a

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aprovação do Ministério Público (BRASIL, 2007b). Na quinta diretriz, define as

competências dos conselhos:

I - Implementar a mobilização e articulação contínuas da sociedade, na defesa dos princípios constitucionais que fundamentam o SUS, para o controle social de Saúde.

II - Elaborar o Regimento Interno do Conselho e outras normas de funcionamento.

III - Discutir, elaborar e aprovar proposta de operacionalização das diretrizes aprovadas pelas Conferências de Saúde.

IV – Atuar na formulação e no controle da execução da política de saúde, incluindo os seus aspectos econômicos e financeiros e propor estratégias para a sua aplicação aos setores público e privado.

V - Definir diretrizes para elaboração dos planos de saúde e sobre eles deliberar, conforme as diversas situações epidemiológicas e a capacidade organizacional dos serviços.

VI - Estabelecer estratégias e procedimentos de acompanhamento da gestão do SUS, articulando-se com os demais colegiados como os de seguridade, meio ambiente, justiça, educação, trabalho, agricultura, idosos, criança e adolescente e outros.

VII - Proceder à revisão periódica dos planos de saúde.

VIII - Deliberar sobre os programas de saúde e aprovar projetos a serem encaminhados ao Poder Legislativo, propor a adoção de critérios definidores de qualidade e resolutividade, atualizando-os em face do processo de incorporação dos avanços científicos e tecnológicos, na área da Saúde.

IX - Estabelecer diretrizes e critérios operacionais relativos à localização e ao tipo de unidades prestadoras de serviços de saúde públicos e privados, no âmbito do SUS, tendo em vista o direito ao acesso universal às ações de promoção, proteção e recuperação da saúde em todos os níveis de complexidade dos serviços, sob a diretriz da hierarquização/regionalização da oferta e demanda de serviços, conforme o princípio da equidade.

X - Avaliar, explicitando os critérios utilizados, a organização e o funcionamento do Sistema Único de Saúde - SUS.

XI - Avaliar e deliberar sobre contratos e convênios, conforme as diretrizes dos Planos de Saúde Nacional, Estaduais, do Distrito Federal e Municipais.

XII – Aprovar a proposta orçamentária anual da saúde, tendo em vista as metas e prioridades estabelecidas na Lei de Diretrizes Orçamentárias (artigo 195, § 2º da Constituição Federal), observado o princípio do processo de planejamento e orçamentação ascendentes (artigo 36 da Lei nº 8.080/90).

XIII - Propor critérios para programação e execução financeira e orçamentária dos Fundos de Saúde e acompanhar a movimentação e destinação dos recursos.

XIV - Fiscalizar e controlar gastos e deliberar sobre critérios de movimentação de recursos da Saúde, incluindo o Fundo de Saúde e os transferidos e próprios do Município, Estado, Distrito Federal e da União.

XV - Analisar, discutir e aprovar o relatório de gestão, com a prestação de contas e informações financeiras, repassadas em tempo hábil aos conselheiros, acompanhado do devido assessoramento.

XVI - Fiscalizar e acompanhar o desenvolvimento das ações e dos serviços de saúde e encaminhar os indícios de denúncias aos respectivos órgãos, conforme legislação vigente.

XVII - Examinar propostas e denúncias de indícios de irregularidades, responder no seu âmbito a consultas sobre assuntos pertinentes às ações e aos serviços de saúde,

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bem como apreciar recursos a respeito de deliberações do Conselho, nas suas respectivas instâncias.

XVIII - Estabelecer critérios para a determinação de periodicidade das Conferências de Saúde, propor sua convocação, estruturar a comissão organizadora, submeter o respectivo regimento e programa ao Pleno do Conselho de Saúde correspondente, explicitando deveres e papéis dos conselheiros nas pré-conferências e conferências de saúde.

XIX - Estimular articulação e intercâmbio entre os Conselhos de Saúde e entidades governamentais e privadas, visando à promoção da Saúde.

XX - Estimular, apoiar e promover estudos e pesquisas sobre assuntos e temas na área de saúde pertinentes ao desenvolvimento do Sistema Único de Saúde (SUS).

XXI - Estabelecer ações de informação, educação e comunicação em saúde e divulgar as funções e competências do Conselho de Saúde, seus trabalhos e decisões por todos os meios de comunicação, incluindo informações sobre as agendas, datas e local das reuniões.

XXII - Apoiar e promover a educação para o controle social. Constarão do conteúdo programático os fundamentos teóricos da saúde, a situação epidemiológica, a organização do SUS, a situação real de funcionamento dos serviços do SUS, as atividades e competências do Conselho de Saúde, bem como a Legislação do SUS, suas políticas de saúde, orçamento e financiamento.

XXIII - Aprovar, encaminhar e avaliar a política para os Recursos Humanos do SUS.

XXIV - Acompanhar a implementação das deliberações constantes do relatório das plenárias dos conselhos de saúde (BRASIL, 2007b, p. 152-154).

A Portaria n° 399, de 22 de fevereiro de 2006, aprovou as Diretrizes Operacionais do

Pacto pela Saúde, porém não revogou a NOB-SUS 01/96 e a NOAS-SUS 01/02, mas

substituiu as Modalidades de Gestão pelo Termo de Compromisso de Gestão. Principalmente,

o pacto incrementa o processo de descentralização e de gestão no Sistema Único de Saúde.

Este pacto representa o compromisso assumido entre os gestores das três esferas do SUS para

a atenção à saúde da população. A participação e o Controle Social permeiam as três

dimensões do Pacto pela Saúde de formas diferentes na perspectiva de superação das

dificuldades atuais do sistema de saúde (BRASIL, 2006e).

Trazem na sua primeira dimensão o Pacto pela Vida, que destaca a participação social

na promoção da saúde como se percebe pela definição da Política Nacional de Promoção da

Saúde:

A promoção da saúde estreita sua relação com a vigilância em saúde, numa articulação que reforça a exigência de um movimento integrador na construção de consensos e sinergias, e na execução de agendas governamentais a fim de que as políticas públicas sejam cada vez mais favoráveis à saúde e à vida, e estimulem e fortaleçam o protagonismo dos cidadãos em sua colaboração e implementação, ratificando os preceitos constitucionais de participação social (BRASIL, 2006d, p. 11).

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Na segunda dimensão está o Pacto em Defesa do SUS, que destaca a retomada do

movimento de repolitização da saúde a partir de uma estratégia de participação social que

ultrapasse as dimensões do sistema de saúde e abranja a toda sociedade. Com o Pacto em

Defesa do SUS, a participação e o controle social manifestam-se como estratégia de

mobilização social:

A concretização deste pacto passa por um movimento de repolitização da saúde, com uma clara estratégia de mobilização social envolvendo o conjunto da sociedade brasileira, extrapolando os limites do setor e vinculada ao processo de instituição da saúde como direito de cidadania, tendo o financiamento público da saúde como um dos pontos centrais (BRASIL, 2006e, s. p.).

Na terceira dimensão, o Pacto de Gestão reforça a gestão compartilhada e solidária do

SUS, ressaltando a necessidade de avançar no processo de descentralização e de

regionalização a partir das regiões de saúde e dos colegiados de gestão regionais. O Pacto de

Gestão do SUS busca um processo de descentralização radical com uma diminuição da

burocracia nas normatizações, elucida o sistema de financiamento e resgata a importância da

participação e controle social, assumindo o compromisso para a sua qualificação (BRASIL,

2006d).

O Pacto pela Saúde define cinco blocos de financiamento: Atenção Básica; Atenção de

Média e Alta Complexidade; Vigilância em Saúde; Assistência Farmacêutica; e Gestão do

SUS. Este último bloco de financiamento garante o custeio das ações relacionadas à

participação e ao controle social:

O financiamento para a gestão destina-se ao custeio de ações específicas relacionadas com a organização dos serviços de saúde, acesso da população e aplicação dos recursos financeiros do SUS. Deverá apoiar iniciativas de fortalecimento da gestão, sendo composto pelos seguintes sub-blocos: Regulação, Controle, Avaliação e Auditoria; Planejamento e Orçamento; Programação; Regionalização; Participação e Controle Social; Gestão do Trabalho; Educação e Saúde e Incentivo à Implementação de Políticas Específicas (BRASIL, 2006e, s.p.).

Ainda em 2006, a Portaria n° 648/GM aprovou a Política Nacional de Atenção Básica,

reconhecendo a Saúde da Família como a estratégia prioritária para organização da Atenção

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Básica (BRASIL, 2006c). A participação social, as práticas democráticas e participativas

compõem o escopo de seus princípios gerais:

A Atenção Básica caracteriza-se por um conjunto de ações de saúde, no âmbito individual e coletivo, que abrangem a promoção e a proteção da saúde, a prevenção de agravos, o diagnóstico, o tratamento, a reabilitação e a manutenção da saúde. É desenvolvida por meio do exercício de práticas gerenciais e sanitárias democráticas e participativas, sob forma de trabalho em equipe, dirigidas a populações de territórios bem delimitados, pelas quais assume a responsabilidade sanitária, considerando a dinamicidade existente no território em que vivem essas populações. Utiliza tecnologias de elevada complexidade e baixa densidade, que devem resolver os problemas de saúde de maior frequência e relevância em seu território. É o contato preferencial dos usuários com os sistemas de saúde. Orienta-se pelos princípios da universalidade, da acessibilidade e da coordenação do cuidado, do vínculo e continuidade, da integralidade, da responsabilização, da humanização, da equidade e da participação social (BRASIL, 2006c, p. 10).

A portaria também elencou os fundamentos que constituem essa política, definindo “o

estímulo à participação popular e o controle social” como um de seus elementos (BRASIL,

2006c, p. 11). Ao tratar das especificidades da Estratégia de Saúde da Família imputa o dever

dessa prática constituir-se como “um espaço de construção de cidadania” (BRASIL, 2006c, p.

20). Quando descreveu o processo de trabalho das equipes de Saúde da Família, definiu como

uma de suas características a “promoção e estímulo à participação da comunidade no controle

social...” (BRASIL, 2006c, p. 26). Ainda, estabeleceu como atribuição comum a todos os

profissionais de saúde de família, dentre outras, a promoção da “mobilização e participação da

comunidade, buscando efetivar o controle social” (BRASIL, 2006c, p. 43).

O Programa Mais Saúde: Direito de Todos, lançado em 2008, é composto de 73

medidas e 165 metas estão distribuídas por sete eixos temáticos: Promoção da Saúde; Atenção

à Saúde; Complexo Industrial e Inovação em Saúde; Força de Trabalho em Saúde; Inovação

de Gestão; Participação e Controle Social; e, finalmente, como sétimo eixo, a Cooperação

entre os Países (BRASIL, 2008). O sexto eixo - Participação e Controle Social - é composto

por quatro medidas e cinco metas cujo valor total é de R$ 296 milhões, sendo 267 milhões

garantidos no Plano Plurianual e 29 milhões destinados à expansão das ações (BRASIL,

2008).

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O eixo é detalhado da seguinte forma: medida 6.1: Dotar os Conselhos de Saúde de

infraestrutura e apoio logístico para exercer seu papel de controle social/ Meta: Apoiar a

estruturação dos conselhos estaduais das 27 unidades federativas (UFs) e dos conselhos

municipais dos 5.562 municípios; medida 6.2: Apoiar a educação permanente de agentes e

conselheiros para o controle social e a ação participativa/ Meta: Realizar 700 cursos e

seminários, formando 270 mil atores sociais e capacitar 100 mil conselheiros em informática

e informação em saúde até 2011 (BRASIL, 2008).

O detalhamento continua com a medida 6.3: Implantar o Sistema Nacional de

Ouvidoria do SUS/ Meta: Implementar a Ouvidoria do SUS em 27 UFs e 40 municípios com

mais de 100 mil habitantes, 07 hospitais próprios, 27 hospitais universitários e 03 institutos

federais e viabilizar 10 milhões de atendimentos ao cidadão e usuários do SUS, via 0800;

medida 6.4: Expandir a divulgação e o uso pela população da Carta de Direitos do Usuário da

Saúde e implementar o Portal dos Direitos do Usuário dos Serviços de Saúde/ Meta 1:

Distribuir a Carta de Direitos dos Usuários da Saúde para instituições de saúde, educação e

controle social em 100% dos municípios e Meta 2: Dispor do Portal em funcionamento em

2008 (BRASIL, 2008).

É imperioso ressaltar que o Artigo 36 da Lei Nº 8.080 subordina o processo de

planejamento e orçamento no SUS aos seus órgãos deliberativos; entretanto, a aprovação dos

pactos pelo Conselho de Saúde não representa, necessariamente, um grande envolvimento em

seu controle e fiscalização como alerta Solla (2006, p. 344-345):

Outra preocupação sobre as proposições aprovadas para o Pacto de Gestão está relacionada à baixa permeabilidade dos Pactos ao controle social. Além da fragilidade de grande parte dos Conselhos de Saúde para efetivamente conseguirem influir neste processo, o fato de que a aprovação nos respectivos Conselhos de Saúde (municipal, estadual e nacional) é o ponto de partida para a homologação não garante por si só um envolvimento mais amplo em seu acompanhamento e fiscalização.

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Os Conselhos de Saúde enquanto órgãos de formulação e fiscalização contam com

instrumentos legais que garantam a transparência da gestão financeira traduzidos pela Lei

Complementar Nº 101 que ressalta a necessidade de incentivo à participação popular:

Art. 48. São instrumentos de transparência da gestão fiscal, aos quais será dada ampla divulgação, inclusive em meios eletrônicos de acesso público: os planos, orçamentos e leis de diretrizes orçamentárias; as prestações de contas e o respectivo parecer prévio; o Relatório Resumido da Execução Orçamentária e o Relatório de Gestão Fiscal; e as versões simplificadas desses documentos.

Parágrafo único. A transparência será assegurada também mediante incentivo à participação popular e realização de audiências públicas, durante os processos de elaboração e de discussão dos planos, lei de diretrizes orçamentárias e orçamentos.

Art. 49. As contas apresentadas pelo Chefe do Poder Executivo ficarão disponíveis, durante todo o exercício, no respectivo Poder Legislativo e no órgão técnico responsável pela sua elaboração, para consulta e apreciação pelos cidadãos e instituições da sociedade.

Parágrafo único. A prestação de contas da União conterá demonstrativos do Tesouro Nacional e das agências financeiras oficiais de fomento, incluído o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, especificando os empréstimos e financiamentos concedidos com recursos oriundos do orçamento fiscal e da seguridade social e, no caso das agências financeiras, avaliação circunstanciada do impacto fiscal de suas atividades no exercício (BRASIL, 2000).

Pelo Capítulo IV da Constituição Federal de 1988 em seu Artigo 31 que garante ao

cidadão ter acesso e questionar as contas do município:

Art. 31. A fiscalização do Município será exercida pelo Poder Legislativo Municipal, mediante controle externo, e pelos sistemas de controle interno do Poder Executivo Municipal, na forma da lei.

§ 1º - O controle externo da Câmara Municipal será exercido com o auxílio dos Tribunais de Contas dos Estados ou do Município ou dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios, onde houver.

§ 2º - O parecer prévio, emitido pelo órgão competente sobre as contas que o Prefeito deve anualmente prestar, só deixará de prevalecer por decisão de dois terços dos membros da Câmara Municipal.

§ 3º - As contas dos Municípios ficarão, durante sessenta dias, anualmente, à disposição de qualquer contribuinte, para exame e apreciação, o qual poderá questionar-lhes a legitimidade, nos termos da lei.

§ 4º - É vedada a criação de Tribunais, Conselhos ou órgãos de Contas Municipais (BRASIL, 1988).

Pela Lei Nº 8.666 de 21 de junho de 1993 que garante a publicidade mensal nos

processos de compras:

Art. 16. Será dada publicidade, mensalmente, em órgão de divulgação oficial ou em quadro de avisos de amplo acesso público, à relação de todas as compras feitas pela Administração direta ou indireta, de maneira a clarificar a identificação do bem comprado, seu preço unitário, a quantidade adquirida, o nome do vendedor e o valor

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total da operação, podendo ser aglutinadas por itens as compras feitas com dispensa e inexigibilidade de licitação.

Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica aos casos de dispensa de licitação previstos no inciso IX do art. 24 (BRASIL, 1993a).

A Lei Nº 8.669 de 27 de julho de 1993 responsabilizou o gestor de saúde em dar

publicidade trimestral à aplicação dos recursos, às auditorias e às ações e serviços de saúde

produzidos no SUS (BRASIL, 1993b):

Art. 12. O gestor do Sistema Único de Saúde em cada esfera de governo apresentará, trimestralmente, ao conselho de saúde correspondente e em audiência pública nas câmaras de vereadores e nas assembleias legislativas respectivas, para análise e ampla divulgação, relatório detalhado contendo, dentre outros, dados sobre o montante e a fonte de recursos aplicados, as auditorias concluídas ou iniciadas no período, bem como sobre a oferta e produção de serviços na rede assistencial própria, contratada ou conveniada.

Atualmente, encontra-se em processo de regulamentação a Emenda Constitucional n°

29 de 13/09/2000 (EC 29) que define os percentuais mínimos a serem aplicados em ações e

serviços de saúde pelos três níveis de governo. Após quatro anos da tramitação do Projeto de

Lei complementar 01/2003(PLC 01/2003), a proposta de regulamentação foi aprovada pela

Câmara dos Deputados em 2007 (BRASIL, 2006b). Com a extinção da Contribuição

Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), a proposta retorna ao Senado para nova

apreciação, tendo sido aprovada em 2008, sem que, no entanto, tenha ainda sido divulgado o

texto aprovado para que possam ser analisados os avanços ou retrocessos em relação ao texto

da proposta (BRASIL, 2007c).

O Conselho Nacional de Saúde (BRASIL, 2006b) nos chama a atenção para as

polêmicas que envolvem a aprovação do PLC 01/2003 que, de forma geral, são inerentes à

mudança do percentual mínimo a ser aplicado pelo nível Federal para 10% do Produto Interno

Bruto (PIB), já que para o nível Estadual e Municipal os percentuais mínimos foram mantidos

em 12% e 15%, respectivamente. Além disso, constituem-se como outros pontos polêmicos a

fonte de recursos, a base de cálculo e a definição de despesas em saúde conforme

estabelecidas pela Sexta Diretriz da Resolução CNS n° 322/2003:

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Atendido ao disposto na Lei 8.080/90, aos critérios da Quinta Diretriz e para efeito da aplicação da EC 29, consideram-se despesas com ações e serviços públicos de saúde as relativas à promoção, proteção, recuperação e reabilitação da saúde, incluindo:

I - vigilância epidemiológica e controle de doenças;

II - vigilância sanitária;

III - vigilância nutricional, controle de deficiências nutricionais, orientação alimentar, e a segurança alimentar promovida no âmbito do SUS;

IV - educação para a saúde;

V - saúde do trabalhador;

VI - assistência à saúde em todos os níveis de complexidade;

VII - assistência farmacêutica;

VIII - atenção à saúde dos povos indígenas;

IX - capacitação de recursos humanos do SUS;

X - pesquisa e desenvolvimento científico e tecnológico em saúde, promovidos por entidades do SUS;

XI - produção, aquisição e distribuição de insumos setoriais específicos, tais como medicamentos, imunobiológicos, sangue e hemoderivados, e equipamentos;

XII - saneamento básico e do meio ambiente, desde que associado diretamente ao controle de vetores, a ações próprias de pequenas comunidades ou em nível domiciliar, ou aos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI), e outras ações de saneamento a critério do Conselho Nacional de Saúde;

XIII - serviços de saúde penitenciários, desde que firmado Termo de Cooperação específico entre os órgãos de saúde e os órgãos responsáveis pela prestação dos referidos serviços.

XIV - atenção especial aos portadores de deficiência.

XV - ações administrativas realizadas pelos órgãos de saúde no âmbito do SUS e indispensáveis para a execução das ações indicadas nos itens anteriores;

§ 1° No caso da União, excepcionalmente, as despesas com ações e serviços públicos de saúde da União financiadas com receitas oriundas de operações de crédito contratadas para essa finalidade poderão integrar o montante considerado para o cálculo do percentual mínimo constitucionalmente exigido, no exercício em que ocorrerem. § 2° No caso dos Estados, Distrito Federal e Municípios, os pagamentos de juros e amortizações decorrentes de operações de crédito contratadas a partir de 1°.01.2000 para custear ações e serviços públicos de saúde, excepcionalmente, poderão integrar o

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montante considerado para o cálculo do percentual mínimo constitucionalmente exigido (BRASIL, 2007b, p. 145-146)

Na Sétima diretriz, a Resolução n° 322/2003 não considera como gasto em saúde as

ações relativas a:

I - pagamento de aposentadorias e pensões; II - assistência à saúde que não atenda ao princípio da universalidade (clientela fechada); III - merenda escolar; IV - saneamento básico, mesmo o previsto no inciso XII da Sexta Diretriz, realizado com recursos provenientes de taxas ou tarifas e do Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza, ainda que excepcionalmente executado pelo Ministério da Saúde, pela Secretaria de Saúde ou por entes a ela vinculados; V - limpeza urbana e remoção de resíduos sólidos (lixo); VI - preservação e correção do meio ambiente, realizadas pelos órgãos de meio ambiente dos entes federativos e por entidades não governamentais; VII - ações de assistência social não vinculadas diretamente a execução das ações e serviços referidos na Sexta Diretriz e não promovidas pelos órgãos de Saúde do SUS; VIII - ações e serviços públicos de saúde custeadas com recursos que não os especificados na base de cálculo definida na primeira diretriz. § 1° No caso da União, os pagamentos de juros e amortizações decorrentes de operações de crédito, contratadas para custear ações e serviços públicos de saúde, não integrarão o montante considerado para o cálculo do percentual mínimo constitucionalmente exigido. § 2° No caso dos Estados, Distrito Federal e Municípios, as despesas com ações e serviços públicos de saúde financiadas com receitas oriundas de operações de crédito contratadas para essa finalidade não integrarão o montante considerado para o cálculo do percentual mínimo constitucionalmente exigido, no exercício em que ocorrerem (BRASIL, 2007b, p. 146-147).

A regulamentação da emenda representa a diminuição da instabilidade do

financiamento das ações e serviços de saúde consequente ao não cumprimento da aplicação

dos 30% dos recursos do orçamento da seguridade social conforme definição da Constituição

Federal de 1988 (BRASIL, 2006b). É fundamental a Lei Complementar para a EC 29/2000, já

que esta estabeleceu as regras de financiamento para o período de 2000 a 2004 e sua não

revisão manteria os mesmos critérios adotados na época de sua edição (BRASIL, 2007b),

gerando algumas vezes entendimentos distorcidos sobre sua aplicação posteriormente ao

intervalo de tempo citado (BRASIL, 2006b).

As legislações e normatizações relacionadas à participação e ao controle social no

SUS representam uma conquista jurídica e institucional, possibilitando, a partir da

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Constituição Federal de 1988, a implantação das Conferências e Conselhos de Saúde em todo

o território nacional, bem como seu aprimoramento enquanto estruturas de formulação e

controle da política de saúde no Brasil. Porém, consideramos oportuna a reflexão que Moreira

(2008, p. 19) provoca quando discute a pesquisa de monitoramento e apoio à gestão

participativa do SUS, propondo que os conselhos devem constituir uma rede de controle:

Na pesquisa, constatamos que há Conselhos que, em suas reuniões, discutem, ainda que de forma ‘epidérmica’, questões como a do superfaturamento nas compras de ambulância, que tanto espaço ganhou na mídia. O problema é que, para produzir resultados como a descoberta de fraude, o que muitas vezes se cobra dos conselhos, os conselheiros seriam forçados a agir como detetives, tendo que descobrir no orçamento onde está ‘o furo’, onde está o desvio de verba, onde houve favorecimento nas licitações... E eles não têm condições de fazer isto. A pesquisa, no entanto, identificou 18 instituições – que chamamos de ‘atores-chave’ – cuja função é fiscalizar o uso dos recursos públicos. Nós defendemos que é fundamental mobilizar essas (e outras) instituições e estreitar a relação dos conselhos com elas. Nesse sentido, caberia aos conselhos identificar e encaminhar o problema à instituição competente, monitorar o processo de apuração e receber pareceres técnicos para que possam deliberar sobre o assunto, sem esquecer de comunicar à sociedade os resultados. O agir em Rede com essas instituições pode trazer um grande incremento à ação dos conselhos, ainda mais porque todas aquelas que foram identificadas pela pesquisa já possuem estratégias e ações para se aproximarem da sociedade, embora estas ainda sejam esparsas, não articuladas e pouco utilizadas.

Os conselhos devem agir de forma articulada com outras instituições públicas de

controle e fiscalização dos gastos públicos e, dessa forma, racionalizar os custos, minimizar a

personificação dos constrangimentos aos conselheiros e fortalecer todo o processo de controle

e fiscalização da política pública de saúde em um movimento de retroalimentação de

informações e sinergia de forças.

2.2. Participação: os múltiplos sentidos

O conceito de participação pode apresentar vários significados. Na abordagem

marxista, relaciona-se às lutas e aos movimentos sociais que visam à superação da opressão

política e das dificuldades econômicas. Na abordagem política. assume características de

inovações democráticas que se relacionam aos movimentos sociais, bem como uma ação

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solidária em diversas dimensões sociais que busca a manutenção ou modificação da estrutura

de poder (GOHN, 2007).

Na sociologia, o conceito de participação se expressa como uma medida de cidadania,

representando tanto uma possibilidade de integração como seu inverso, não participação, a

exclusão. Ainda nessa abordagem, a participação pode representar, também, o

desenvolvimento da autoestima, mudança na representação da autoimagem e da própria vida.

Assim, a participação é fruto da motivação decorrente das interações entre os indivíduos nas

múltiplas redes sociais. Na área da educação, principalmente, a partir da pedagogia da

autonomia, a participação está relacionada à ideia de força, já que deter conhecimento traduz-

se como detrimento de poder, fundamentalmente, o poder de transformar a realidade (GOHN,

2007).

A natureza política do homem demanda a cada indivíduo a noção de coletividade, pois

sua realização e propriedade são socialmente determinadas. Viver em sociedade requer o

entendimento de que, ao tratar de problemas, de natureza individual ou de grupo social, deve-

se refletir sobre os efeitos da concessão ou negação da proteção de benefícios sobre toda a

sociedade, evitando que haja privilégio ou discriminação (DALLARI, 2004). Para o autor:

Cada indivíduo sofre influência da sociedade em que vive, mas, ao mesmo tempo, exerce alguma influência sobre ela. O simples fato de existir, ocupando um espaço, sendo visto ou ouvido, precisando vestir-se e consumir alimentos, já é uma forma de influir. Por isso, todos os problemas relacionados à convivência social são problemas da coletividade, e as soluções devem ser buscadas em conjunto, levando em conta os interesses de toda a sociedade (DALLARI, 2004, p. 21).

O convívio humano é naturalmente conflituoso, já que tem que harmonizar interesses

individuais aos coletivos, e vice-versa. Sendo assim, é necessário que a forma de organização

social diminua a gravidade dos conflitos e traga soluções para as divergências, respeitando a

individualidade das pessoas. Desta maneira, busca-se uma sociedade justa, a despeito das

características de cada indivíduo, caminhando na direção de uma organização social mais

equânime em reconhecimento de que todos os homens são iguais por natureza. Em

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consequência, amplia-se progressivamente a parcela da sociedade que decide “sobre a

organização social e que tem respeitada sua individualidade” (DALLARI, 2004, p. 14-17).

A participação assume condição inerente à vida humana em uma sociedade

democrática. A ideia de participação objetiva evitar a dominação pelos grupos dominantes

que defendem seus interesses de forma privilegiada, colocando em risco a paz social, pois:

[...] sempre que só um pequeno grupo decide, é inevitável que esse grupo se corrompa, perdendo de vista sua responsabilidade social, e acabe dando preferência aos próprios interesses, gerando uma situação de injustiça, que impede a paz social, porque sempre existem pelo menos alguns que não aceitam passivamente as injustiças e lutam contra elas (DALLARI, 2004, p. 38).

Assim, a participação enquanto condição da democracia demanda de indivíduos

dotados de “autonomia moral, sem o que não são possíveis nem as deliberações nem as

escolhas conscientes e responsáveis. Por sua vez, essa autonomia moral demanda de um grau

razoável de independência e segurança econômica” (RIBEIRO, 2007, p. 541).

A conceituação dos sentidos da participação agrupa-se, pelos principais teóricos, sob a

ótica política que está associada à democracia ou às políticas sociais de controle social; sob a

ótica da prática social que representa a ação concreta dos movimentos sociais; e sob a ótica

conceptual que exibe um elevado grau de variação de conceitos dependentes do paradigma em

que são fundamentados. Na concepção do paradigma liberal, a participação tem como

objetivo fortalecer a sociedade civil, evitando ao máximo a intromissão do Estado nos

assuntos da sociedade (GOHN, 2007). Para a autora:

A interpretação liberal objetiva sempre reformar a estrutura da democracia representativa e melhorar a qualidade da democracia nos marcos das relações capitalistas. Neste paradigma, as principais ações devem se dirigir para evitar os obstáculos burocráticos à participação, desestimular a intervenção governamental e ampliar os canais de informação aos cidadãos de forma que eles possam manifestar suas preferências antes que as decisões sejam tomadas (GOHN, 2007, p. 15).

A concepção liberal apresenta duas derivativas, sendo uma denominada participação

corporativa e a outra, participação comunitária. Na corporativa, a razão em participar

encontra-se além dos interesses individuais, estando relacionada ao bem comum e vinculada

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às organizações sociais. Na comunitária, a participação está relacionada em termos de

integração entre órgãos representativos da sociedade e órgãos deliberativos do Estado,

caracterizando-se como uma forma institucionalizada e espontânea livre de distinções sociais,

políticas e étnicas (GOHN, 2007).

Já a concepção autoritária da participação materializa-se pelas políticas públicas em

que, verticalmente, o Estado estimula a promoção de programas que têm como finalidade a

diluição de conflitos na sociedade, ou seja, “algo centralizado nas mãos dos técnicos e na

burocracia governamental” (VALLA, 1998, p. 9). Assim, independente da forma de governo

ou regime a concepção autoritária pode estar presente, sendo:

[...] aquela orientada para a integração e o controle social da sociedade e da política. Ocorre em regimes políticos autoritários de massa de direita, como o fascismo, e de esquerda, como as grandes demonstrações de massa em celebrações e comemorações nos regimes socialistas. Poderá ocorrer ainda em regimes democráticos representativos como um derivativo, que é a participação de natureza cooptativa. Neste caso, a arena participativa são as políticas públicas, quando se estimula, de cima pra baixo, a promoção de programas que visam apenas diluir conflitos sociais (GOHN, 2007, p. 17).

Na concepção democrática, a soberania popular é o princípio que mantém certa

constância e controle no processo democrático. Neste processo, a participação dos cidadãos

em reuniões públicas deve subordinar-se ao princípio da pluralidade1, como o “único capaz de

assegurar a efetiva realização das liberdades privadas, civis e públicas” (ROSENFIELD,

2006, p. 49), pois “a multiplicação das associações livres pode constituir um estímulo e uma

contribuição para o alargamento da participação política” (BOBBIO et al, 2007, p. 928), ou

seja, elevar a influência nas decisões políticas.

Os movimentos sociais enquanto associações livres, entretanto, sofrem risco de

controle pela via do conhecimento, pela via financeira ou por ambas. Neste sentido, a

soberania popular é sabotada e o significado da participação popular faz uma distinção social

1 “Concepção que propõe como modelo a sociedade composta de vários grupos ou centros de poder, mesmo que em conflito entre si, aos quais é atribuída a função de limitar, controlar e contrastar até o ponto de o eliminar, o centro do poder dominante, historicamente identificado com o estado” (BOBBIO et al, 2007, p. 928).

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reforçando assimetrias de saber e poder. Tal fato visa à imposição de um modelo de sociedade

na qual:

A própria ideia de uma participação popular surge, justamente, para se distinguir de uma outra concepção de sociedade, onde quem tem estudo e recursos aponta o caminho “correto” para as classes populares. A ambiguidade do termo não vem somente das várias interpretações que poderiam resultar de seu uso, mas também do fato de que a tradição autoritária da América Latina, e do Brasil, contamina tanto os grupos conservadores como também os progressistas. Há uma busca de controle [...]. Controle com a finalidade de por em prática as suas concepções de como deve ser a sociedade brasileira (VALLA, 1998, p. 8).

Na concepção revolucionária, a participação acontece no sistema político e na

máquina estatal a partir dos grupos organizados. O objetivo é a divisão do poder político e a

transformação das relações de dominação, utilizando-se, principalmente, do sistema partidário

que promoverá a capacitação de seus filiados. As arenas de luta pela dominação e divisão do

poder político ocorrem na estrutura estatal e no sistema político da democracia representativa

(GOHN, 2007).

A democracia representativa caracteriza-se pela escolha, por meio do voto, de

cidadãos que assumirão o governo e a representação política na sociedade. Este processo

constitui o espaço público moderno de organização social, onde existe a distinção entre a

sociedade civil e o Estado, fazendo com que a política deixe de ser competência exclusiva dos

políticos e envolva toda a sociedade. Entretanto, o Estado democrático representativo gerou

empobrecimento do espaço público com intensificação da exclusão em decorrência da

profissionalização da política e atomização de grupos voltados para atendimento aos

interesses materiais (ROSENFIELD, 2006).

A reação à distorção emergente da democracia representativa proposta pelos teóricos

do paradigma democrático-radical é a transformação na relação da sociedade civil com o

Estado que será decorrente da “criação de contrainstituições e estruturas paralelas, como

forma de criar formas de experimentação social, questionar o poder dominante e deslegitimá-

lo” (GOHN, 2007, p. 18) e, assim, materializar a concepção democrático-radical.

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A concepção democrático-radical exalta o princípio da pluralidade e os seres que dão

vida e movimento aos processos participativos são percebidos como sujeitos sociais e os

indivíduos como cidadãos. O ideal nesta forma de participação é o deslocamento da

organização social baseada na democracia representativa para a democracia participativa.

Nesta dimensão, participar é assumir responsabilidades dentro da comunidade e do governo.

O objetivo é “fortalecer a sociedade civil para a construção de caminhos que apontem para

uma nova realidade social, sem injustiças, exclusões, desigualdades, discriminações etc”

(GOHN, 2007, p. 18-19).

Nesta forma, a participação se expressa pelas lutas da comunidade em assumir

responsabilidades permanentes dentro do governo. Para isso, é necessária a adoção de

estratégias que privilegiem “a constituição de uma linguagem democrática não excludente nos

espaços participativos criados ou existentes, o acesso dos cidadãos a todo tipo de informação

que lhe diga respeito e o estímulo à criação e desenvolvimento de meios democráticos de

comunicação” (GOHN, 2007, p. 19).

Assim, o desafio que se apresenta à democracia participativa é a publicização da

máquina estatal, a consolidação de processos participativos que ultrapassem as formas

eleitorais e, sobretudo, o seu autofortalecimento e autodesenvolvimento (JACOBI, 2002). Tal

desafio não é pequeno, pois estamos falando em alcançar por volta de “70% da população,

isto é, grande parcela da população que, se não tiver um trabalho diário remunerado, corre

risco de não satisfazer suas necessidades mínimas de moradia e alimentação, que permanece

muito distante de qualquer forma de realização profissional ou familiar” (VALLA, 2001. p.

02).

O histórico dos fóruns de participação social no Brasil evidencia que seu início esteve

atrelado à previdência social na década de 20, havendo supressão dessa participação de 1964 a

1985, período do regime da ditadura militar (CORTES, 2002). Nas décadas de 70 e 80, o

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Brasil vivia um intenso movimento de organização e mobilização social contra a ditadura

militar e a favor da conquista de direitos sociais, traduzindo-se “como importante resposta da

democracia e da participação face aos impactos do capitalismo contemporâneo” (FONSECA,

2007, p. 253).

No final da década de 70, o Movimento da Reforma Sanitária promoveu uma ampla

mobilização política na área da saúde, colocando-a na vanguarda da temática da participação

e controle social, tendo, no final dos anos 80, no contexto da abertura política, ganhado maior

expressão com a VIII Conferência Nacional de Saúde em 1986. Com isso, a participação e

controle social se institucionalizaram a partir de 1988 pela inclusão de dispositivos no novo

texto constitucional (CORREIA, 2006).

Este cenário coincidiu com o período da abertura política no país, em um contexto em

que a oposição ocupava diversos governos em diferentes estados da federação e as políticas

pautadas no bem-estar social figuravam na agenda política da época. Este contexto

proporcionou um ambiente favorável aos anseios de participação social, contrapondo-se a

uma realidade expressa desde a I Conferência Nacional de Saúde. Nela não era facultada a

participação da sociedade civil organizada nessas instâncias de participação social

(DOMINGUEZ, 2007).

As Conferências de Saúde expressam a participação social por meio da potencial

capacidade de formulação da política de saúde a partir da representação de segmentos sociais

em um movimento ascendente de discussão. Nem sempre há consenso em torno de um tema,

o que configura um processo majoritário de decisão, e, com isso, não raro, ocorre uma

polarização de forças que utilizam estratégias para diminuir e outras para reforçar o produto

das conferências - relatórios finais - como insumos para a formulação de políticas de saúde

(GUIZARDI et al, 2004).

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Inovando em relação às conferências ocorridas no período anterior a 1986, a VIII

Conferência Nacional de Saúde vinculou o direito à saúde à participação social. Esta é

entendida como um controle do processo de formulação, gestão e avaliação que transcende a

política de saúde, envolvendo a área social e econômica cuja concretização será resultante,

também, das demais políticas públicas do Estado. Por conseguinte, reafirma o conceito

ampliado de saúde e a conquista desse direito como consequência de um exercício de

cidadania, colocando a sociedade como personagem principal nesse processo (MACEDO,

2005).

Diferentemente da anterior, a IX Conferência Nacional de Saúde não vinculou a saúde

às demais políticas públicas, mas às políticas de seguridade social, restringindo o controle

social ao contexto da seguridade social. Também evidenciou a tendência de situar a

participação social externamente ao processo de formulação política, reduzindo-a ao controle

“Post factum”, ou seja, fiscalizador da execução da política de saúde. Apontou ainda para a

preocupação com o funcionamento dos conselhos, “daí o grande investimento em

determinações sobre o seu funcionamento, composição, atribuições, infraestrutura e etc.”

(GUIZARDI et al, 2004, p. 5-6).

Subsequentemente, a décima conferência detalhou a ação fiscalizadora dos conselhos

sobre os recursos da saúde. Traduziu a manutenção de uma atuação de caráter “Post factum”

como foi desenhada na nona, apontando para uma normatização dos conselhos de saúde e

capacitação de seus conselheiros. Com a XI Conferência Nacional de Saúde tivemos o resgate

do protagonismo da participação e controle social, reconhecendo as conquistas no SUS como

consequência da articulação da sociedade civil organizada, incluindo e transcendendo os

espaços organizados das conferências e conselhos de saúde. De certa forma, também resgatou

a amplitude do conceito de saúde na perspectiva das políticas públicas (GUIZARDI et al,

2004).

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Já a XII Conferência de Saúde, em relação à participação e controle social, propôs: o

cumprimento das deliberações das conferências; garantia de participação dos delegados das

três esferas nesses fóruns; capacitação permanente dos conselheiros de saúde; inclusão de

grupos étnicos e de grupos que representam minorias; vetar como representantes dos

segmentos as pessoas com vínculos não institucionais com o segmento do gestor; considerar

empresários como representantes do segmento dos prestadores de serviço; fazer eleição

bianual para eleger em assembleia os conselheiros de saúde cujo mandato não deve coincidir

com o período eleitoral; eleição para presidente dos conselhos de saúde; e que o conselheiro

de saúde não possa representar uma mesma entidade por mais de dois mandatos subsequentes

(CARVALHO e CORDOVIL, 2004).

A XIII Conferência Nacional de Saúde realizada no período de 14 a 18 de novembro

de 2007, cujo tema central foi “A SAÚDE E QUALIDADE DE VIDA: POLÍTICA DE

ESTADO E DESENVOLVIMENTO”, contemplou em seu regimento a definição de três

objetivos, dentre os quais a definição de “diretrizes que possibilitem o fortalecimento da

participação social na perspectiva da plena garantia da implementação do SUS”. Um dos seus

três eixos temáticos foi “a participação da sociedade na efetivação do direito humano à saúde”

(BRASIL, 2007d, p. 1-4).

Neste evento, entre outras temáticas, foi repensada a forma da organização das

conferências, a realização das conferências temáticas e a baixa alternância dos participantes.

Seu objetivo foi alcançar maior efetividade e dar continuidade ao processo de democratização

na saúde, contribuindo sobremaneira para o desenvolvimento do Sistema Único de Saúde

(DOMINGUEZ, 2007).

Da oitava à décima terceira Conferência Nacional de Saúde, inferimos da síntese

apresentada às tensões que se estabelecem na sociedade fruto da predominância de diferentes

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paradigmas democráticos no Estado brasileiro em cada período, variando de uma tendência

mais liberal a uma mais radical.

2.3. O Controle Social na Saúde: experiência em 21 anos de SUS

O controle social pode ser entendido como poder de dominação em uma abordagem

sociológica na qual cabe ao Estado dar limite à ação do indivíduo na sociedade por meio do

poder político, religioso, econômico, etc, submetendo “os indivíduos a determinados padrões

sociais e princípios morais” (CORREIA, 2005, p. 48) ou como direito público subjetivo de

fiscalização pela abordagem jurídica na qual cabe ao indivíduo o controle das ações do

Estado. A Constituição Federal admite as duas abordagens como alerta Siraque (2005, p. 105-

106):

Nossa Constituição admite o controle social no sentido de domínio e de fiscalização. Domínio, com o objetivo de manter a ordem pública e estabelecer o direito. Fiscalização, com a finalidade de garantir a soberania popular, a proteção do patrimônio público, a República e a submissão dos agentes do Estado ao ordenamento jurídico. Assim, o controle social é uma via de mão dupla; O Estado tem o poder político, mas esse poder político é limitado pela fiscalização da sociedade e pelos sistemas de controle institucional.

O autor ainda ressalta que os termos controle e participação social têm sido utilizados

como sinônimos por diversos segmentos da sociedade e, partindo da abordagem jurídica,

assim os diferencia:

O controle e a participação popular são irmãos siameses. Entretanto, o controle social é distinto da participação popular. Esta ocorre no momento da tomada de decisões, antes ou concomitante à elaboração do ato da Administração; é um poder político de elaboração de normas jurídicas. O controle social pode concretizar-se em dois momentos: 1) análise jurídica da norma estabelecida pela Administração Pública, como a relação de compatibilidade com outras normas de hierarquia superior; 2) fiscalização da execução ou aplicação dessas normas jurídicas ao caso concreto (SIRAQUE, 2005, p. 112).

Tomando-se essa abordagem jurídica, a Lei nº 8.142, em seu parágrafo primeiro,

imprime a Conferência de Saúde um aspecto de participação social por conferir-lhe a

capacidade de formulação de políticas, enquanto aos Conselhos de Saúde confere um caráter

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de participação e controle social quando em seu texto garante uma capacidade de formular

estratégias e controlar a política de saúde (BRASIL, 2007b).

A institucionalização dos Conselhos de Saúde traz consigo não somente o ideário, mas

também a possível materialidade de tornar o Estado coisa pública pelo efetivo exercício da

democracia. Para Valla (1998, p. 10), “os avanços legais, incluindo os Conselhos de Saúde,

no entanto, não têm levado a transformações efetivas na realidade dos serviços a não ser em

alguns casos isolados [...]”. Assim, não basta o controle social das ações e serviços de saúde.

É necessária, a apropriação das políticas e ações de saúde pela população (SPOSATI e

LOBO, 1992).

Normativamente, os Conselhos de Saúde são estruturas de formulação de estratégias e

controle da execução das políticas de saúde e participam da gestão do sistema de saúde em

caráter deliberativo e permanente. Nestes fóruns, as decisões ocorrem de forma majoritária,

expressando o entendimento dos segmentos nele representados e, principalmente, deverão

resultar de um processo negociado e consentido no plenário. Desta forma, independentemente

de homologação pelo executivo, poderão se tornar um fator de mobilização política e social.

Seu objetivo é:

Assegurar a construção de um modelo assistencial baseado nos direitos de cidadania de toda a população, intersetorial, em defesa da vida e da saúde, e com acesso universal e equitativo a todos os níveis de atenção integral à saúde, da coletividade, dos grupos populacionais expostos a riscos específicos e de cada indivíduo (BRASIL, 2003, p. 26).

Atender e esse objetivo tem sido um importante e difícil desafio, a despeito de sua

institucionalização e expansão no território nacional, pois, como alerta, o Conselho Nacional

de Saúde:

Sem clareza do que significa este objetivo e o consequente compromisso, o controle social, através dos Conselhos de Saúde, fica exposto a pressões estreitas de tendências e grupos, da sociedade e do governo, desviando-se da totalidade da sociedade e da cidadania. Fragiliza-se e descredibiliza-se (BRASIL, 2003, p. 26).

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É oportuno ressaltar que, desde sua criação, “os conselhos de saúde conseguiram se

organizar no Brasil, mas ainda enfrentam dificuldades relacionadas à estrutura física,

equipamentos e orçamento, o que limita sua autonomia” (DOMINGUEZ, 2007, p. 14). Nos

primórdios da institucionalização dos conselhos, foram identificadas algumas dificuldades na

esfera da defesa dos interesses da sociedade em relação aos interesses particulares, que ainda

hoje são recorrentes:

A alteridade1 cooptada é um deles e ocorre em dois sentidos: primeiro pela fragilidade da representação que não possui informação e capacidade argumentativa, e, portanto, pouco opina; segundo, pela prática da cumplicidade, que ao incluir o interesse restrito e imediato dos representantes populares, afasta-os da luta pela atenção mais ampla dos representados. Esta questão abre a necessidade de se instalar uma política de informação que não seja mera transmissora, mas polemizadora de questões, equivale dizer, capaz de problematizar, argumentar e formar opinião. A alteridade subalternizada, em que a relação é de deferência de quem tem o poder pela "visita que chega". O espaço não é do alter, mas dos "donos do poder". O grande risco é a infantilização, tratando os representantes populares como crianças do pré-primário. Reduzem-se os assuntos, é retirada a sua complexidade, desproblematizam-se as questões, pois “o povo não iria entender". Na verdade, é a reiteração da cultura elitista, na qual o "povo" é visto como ignorante, digno de comiseração. É claro que isto não significa o domínio popular da linguagem técnica dos "entendidos". Supõe esta perspectiva a decodificação dos temas em um modo de falar que não provoque o ocultamento das questões. Enfim, ter um programa que traduza para todos entenderem. A alteridade tutelada, uma variante da subalternidade. Esta forma é, em geral, exercida pela tecnoburocracia. Muitos segmentos técnicos que se entendem identificados com os interesses populares terminam por ocupar o espaço da interlocução para si, criando um vazio de alteridade popular por "advogar a causa" e tomar o lugar do "alter popular". Francisco de Oliveira (1990) salienta que os segmentos médios, através de suas organizações ou de ocupação de espaços nas organizações sindicais e sociais, tendem a se transformar no "superego", ou em um falso alter, do Estado, transformando a oposição menos ideológica e mais programática. Nesta redução burocrática, a vigilância é empobrecida para o controle do "cumprimento de medidas mensuradas pelo metro da competência técnica dos agentes técnicos da não esfera pública” (SPOSATI e LOBO, 1992, p. 373-374).

Há a necessidade de amadurecimento dos segmentos representativos dos conselhos em

priorizar a tomada de decisões em favor do desenvolvimento do SUS, mesmo que os

interesses do segmento que representam sejam atendidos de forma parcial e gradual. Sendo

assim, “as disputas dos vários projetos de Sociedade não podem nem devem trazer para

dentro dos Conselhos os confrontos (grifo do autor): Situação governamental x Oposição;

Um partido x Outro partido; Estado x Sociedade; Corporação x Corporação; Corporação x

1 “Estado ou qualidade que se constitui através de relações de contraste, distinção, diferença [...]” (HOUAISS, 2007, p. 169).

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Sociedade” (BRASIL, 2003, p. 14-15), sob pena de comprometer o projeto de um sistema de

saúde universal, equânime e integral.

Ressaltamos que a institucionalização dos conselhos de saúde representa um avanço

no sentido de constituir um fluxo de decisão na rotina da gestão pública em saúde. Porém, a

mobilização social não deve ser reduzida a uma peça da estrutura burocrática, sob pena de

comprometer a conquista de um Estado verdadeiramente democrático (SPOSATI e LOBO,

1992). Temos que atentar para sua capilaridade e permeabilidade enquanto estruturas de

controle social que deverão alcançar legitimação como representantes da sociedade para que

possam ter força política, não tendo ainda alcançado a necessária legitimação (CARVALHO,

2007, p. 19).

A questão da pouca capacidade de mobilização é um desafio para o qual não podemos

e não devemos desassociar “dos princípios do SUS e da composição democrática do

Conselho, por meio das entidades mais representativas dos quatro segmentos: Usuários,

Prestadores de Serviços, Profissionais e Gestores/Governo” (CARVALHO, 2007, p. 19),

garantindo que a composição do conselho represente o conjunto da sociedade de cada

localidade.

A superação desses desafios inicia-se no entendimento de sua atribuição que está

localizada na formulação de estratégias e no controle da execução da política de saúde não

devendo avançar na direção das competências próprias do gestor; entretanto, conhecer as

competências da gestão é condição indispensável para o exercício de suas funções na defesa

do interesse da coletividade (BRASIL, 2003, p. 12).

A formulação de comissões dentro dos Conselhos de Saúde pode ser uma importante

estratégia para a superação de alguns desafios. O assessoramento do plenário do conselho,

para respaldá-lo diante das necessidades de deliberações sobre as políticas de saúde, seja na

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formulação ou na execução (BRASIL, 2003, p. 19), pode configurar-se como importante

elemento de “tradução técnica” no ensejo do debate com elevado teor técnico.

Também, conseguir identificar parceiros dentro e fora da máquina estatal e reconhecer

seus limites e potencialidades pode ser um elemento de maximização do potencial dos

conselhos. Os conselhos devem ser capazes de alcançar o Ministério Público; os órgãos de

controle internos e externos da administração; os órgãos de defesa do consumidor; outros

órgãos de controle social; o legislativo, já que o “Poder Legislativo é historicamente, o mais

sensível à construção da Democracia e do Estado Democrático” perante a mobilização social

vigorosa e organizada (BRASIL, 2003, p. 21) e, principalmente, a sociedade que representa,

construindo a permeabilidade e capilaridade necessárias para o compromisso com o

desenvolvimento do SUS enquanto um projeto da sociedade brasileira.

A despeito das dificuldades, algumas novas e outras recorrentes, tais como a

persistência da precariedade de apoio administrativo, infraestrutura, orçamento e não

homologação das decisões do conselho pelo executivo, o panorama tem apresentado uma face

mais animadora na dimensão democrática, já que a maior parte dos conselhos realiza reuniões

abertas à população, conferindo-lhe direito à voz. Também, grande parte possui presidente

eleito pelos conselheiros (MOREIRA, 2008).

Os Conselhos de Saúde, da forma que são concebidos no Brasil, representam uma

típica expressão nacional. Após mais de 21 anos de SUS, estes não devem ser considerados

como uma experiência que fracassou. Pelo contrário, têm servido de inspiração de

democratização sanitária para muitos países do mundo, a despeito de suas imperfeições. Estas

deverão ser superadas no exercício da participação e do controle social em um movimento de

aprimoramento contínuo. Assim, o amadurecimento dos conselhos enquanto estrutura de

participação democrática, constitui-se uma real possibilidade de auxílio para a transformação

da nossa matriz cultural autoritária e conservadora (ESCOREL, 2008).

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2.4. Enfermeiro de Saúde da Família, a Participação e o Controle Social:

elementos para reflexão

No conceito ampliado de saúde está presente a dimensão ampliada do assistir, a

participação do cliente no cuidado e o trabalho em equipe. A dimensão ampliada do assistir

envolve a participação do indivíduo, família e comunidade no processo de promoção,

manutenção e recuperação da saúde. O trabalho em equipe trata da necessidade de inter-

relacionamento profissional para a ampliação da dimensão do cuidado (BRÊTAS e DUARTE,

2000). A participação do cliente no cuidado refere-se à decisão compartilhada entre o que o

profissional avalia e define como conduta e as possibilidades de execução desta pelo usuário.

Assim, a prática da enfermagem no processo saúde-doença envolve a necessidade de

participação em diferentes níveis (individual, familiar e comunitário) para sua maximização.

No Brasil, os enfermeiros vêm incluindo a família no processo do cuidado de

enfermagem desde seus primórdios. Historicamente, a prática da abordagem familiar pelos

enfermeiros é anterior à implantação da Estratégia de Saúde da Família (SANTOS e

KIRSCHBAUM, 2008; SOUZA et al, 2004); entretanto, o enfoque biologicista de

restabelecer a saúde pela cura da doença conduzia a abordagem da família sob o aspecto

individual, e não sob a ótica da unidade do cuidado (OLIVEIRA e MARCON, 2007), o que

reduzia a complexidade do processo saúde-doença.

O predomínio desta visão na atenção à saúde funda-se nos avanços da microbiologia,

da patologia e de outras ciências amparadas no positivismo1. A visão biológica, a despeito de

suas contribuições para a área da saúde, apresenta elevada utilidade para ideologias políticas

antidemocráticas. Nestas, as formas de participação ativa da população nos processos de

1 “[...] método empirista e quantitativo, pela defesa da experiência sensível como fonte principal do conhecimento, pela hostilidade em relação ao idealismo, e pela consideração das ciências empírico-formais como paradigmas de cientificidade” (JAPIASSÚ e MARCONDES, 2008, p. 222).

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formulação e decisão devem ser desencorajadas (SILVA, 2006). Assim, contiveram a

incorporação de fatores sociais como um dos determinantes do processo saúde-doença no

cotidiano do exercício da enfermagem (GALLEGUILLOS e OLIVEIRA, 2001).

A retomada do processo democrático no Brasil (e, especificamente, da saúde com a

Reforma Sanitária) e o entendimento global de que os fatores biológicos por si só não foram

suficientes para explicar a morbidade e a mortalidade na história das coletividades, promove

uma nova abordagem para o tema (SILVA, 2006). Sendo assim, o processo saúde-doença teve

sua dimensão ampliada para além das fronteiras biológicas:

[...] é um processo social caracterizado pelas relações dos homens com a natureza (meio ambiente, espaço, território) e com outros homens (através do trabalho e das relações sociais, culturais e políticas) num determinado espaço geográfico e num determinado tempo histórico (TANCREDI et al, 1998, p. 29).

A doença passa a ser entendida como “um objeto de síntese por excelência e deve ser

tratada como aspecto do sistema simbólico” (GUALDA e BERGAMASCO, 2004, p. 33); já a

saúde, como “um movimento de autotranscendência da pessoa em direção a uma expressão de

vida que supera a simples homeostase dos subsistemas do organismo humano” (VICINI,

2002, p. 74). Assim como o olhar sobre o processo de saúde-doença foi se ampliando, o

processo de organização da atenção à saúde no Brasil também foi incorporando criativamente

novas tecnologias para dar conta das demandas subsequentes dessa nova abordagem.

Neste sentido, a Estratégia de Saúde da Família constitui-se em uma dessas

tecnologias, que, a partir da reorganização da Atenção Básica, visa incorporar em sua prática

cotidiana as múltiplas dimensões do cuidado no processo saúde-doença. Com isso, cria-se a

possibilidade de ir além das práticas profissionais e de atenção à saúde centradas na visão

biológica para práticas que enfatizem a integralidade das ações, entendendo o indivíduo em

um contexto sociofamiliar (RONZANI, 2008).

A Estratégia de Saúde da Família avança na consolidação de mecanismos de

participação e controle social, reiterados em diferentes instrumentos legais e normativos;

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sobretudo no reconhecimento do espaço local de atenção como um “lócus privilegiado de

captação e formulação de demandas em saúde por parte da população” (ACIOLI, 2005,

p.293). Com isso, transcende a ideia de controle social vinculada exclusivamente à existência

de Conselhos de Saúde ao mesmo tempo em que materializa seu fortalecimento, pois estimula

a integração e a corresponsabilidade entre os envolvidos na atenção à saúde.

É fundamental o entendimento de que a Estratégia de Saúde da Família, para

promover as transformações, descritas anteriormente, deverá possuir profissionais capazes de

repensar o fazer, o saber e os valores democráticos que envolvem a atenção à saúde no

exercício diário de suas funções. Este horizonte é diretamente proporcional aos paradigmas

atuais que fundamentam a formação profissional em saúde. Seu alcance está intrinsecamente

relacionado à formação consoante com a possibilidade de construção de “significados para o

exercício profissional que se aproximem do cuidado integral, capazes de centrar-se no

usuário, em seu acolhimento, na responsabilidade com a saúde e desenvolvimento da

autonomia dos mesmos” (HENRIQUES, 2005, p. 151).

A ideia de autonomia aqui não reside em um ajuste à ideia de Estado mínimo,

ampliando progressivamente as responsabilidades do indivíduo, a partir da delegação de

tarefas e, consequente, retração do papel Estado, mas, sim, na ideia de “fortalecimento da

capacidade individual e coletiva para lidar com a multiplicidade dos conhecimentos da saúde”

(CZERESNIA e FREITAS, 2003, p. 47). Neste sentido, refere-se a qualificar a decisão do

indivíduo a partir do estímulo à consciência crítica.

A Estratégia de Saúde da Família amplia a complexidade da atenção á saúde, bem

como tem se configurado para os enfermeiros como “um espaço de trabalho com um perfil

bem mais delineado e um reconhecimento social que fortalece as aspirações identitárias

desses profissionais” (CZERESNIA e FREITAS, 2003, p. 42). As autoras ainda afirmam que:

O enfermeiro tem avançado no controle das suas atividades previstas tanto no Regulamento do Exercício Profissional como pelo Ministério da Saúde, apesar das reações surgidas por parte dos médicos. Atividades de planejamento, organização,

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execução e avaliação das ações, consulta de enfermagem, exame físico, diagnóstico de enfermagem, prescrição, são efetivamente atribuições que o enfermeiro vem assumindo no PSF (CZERESNIA e FREITAS, 2003, p. 42).

O avanço no reconhecimento social do enfermeiro tem encontrado reforço na

característica de corresponsabilidade e horizontalidade que a estratégia de Saúde da Família

apresenta no seu escopo normativo - Política Nacional de Atenção Básica. Esta política

(BRASIL, 2006c), ao destacar o desenvolvimento da estratégia “[...] por meio do exercício de

práticas gerenciais e sanitárias democráticas e participativas, sob forma do trabalho em equipe

[...]”, enseja ações de planejamento e atenção à saúde decorrentes da participação e

valorização de todos os envolvidos. Araújo (2005, p. 43) ressalta que a horizontalidade

proporcionada pela estratégia vem contribuindo para definir o “lugar” dos enfermeiros no

processo de trabalho em saúde:

Os enfermeiros, com uma formação historicamente direcionada para uma estrutura tradicionalmente hierarquizada e verticalizada, vêm, paulatinamente, transformando sua visão ao encararem a proposta do PSF como um poder partilhado. Veem neste programa não só um espaço de recriação do trabalho em saúde, mas, sobretudo, um espaço e uma forma de estabelecerem o seu “lugar” profissional até então difuso pela atomização das inserções e das atribuições.

A Estratégia de Saúde da Família tem sido, além de um potencial elemento de

transformação social, um relevante fator para o reconhecimento do enfermeiro como

profissional autônomo integrante de uma equipe multiprofissional. Isto se deve a

materialização de questões do plano conceitual, legal e ético do campo profissional da

enfermagem. Nesta perspectiva, a educação incorporada conceitualmente e definida como

obrigação legal e ética aos enfermeiros, expressa o próprio conceito de promoção da saúde

formulado pela Primeira Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde de Ottawa,

Canadá, em 1986:

Promoção da saúde é o nome dado ao processo de capacitação da comunidade para atuar na melhoria de sua qualidade de vida e saúde, incluindo uma maior participação no controle deste processo. Para atingir um estado de completo bem-estar físico, mental e social, os indivíduos e grupos devem saber identificar aspirações, satisfazer necessidades e modificar favoravelmente o meio ambiente. A saúde deve ser vista como um recurso para a vida, e não como objetivo de viver. Nesse sentido, a saúde é um conceito positivo, que enfatiza os recursos sociais e pessoais, bem como as

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capacidades físicas. Assim, a promoção da saúde não é responsabilidade exclusiva do setor saúde, e vai para além de um estilo de vida saudável, na direção de um bem-estar global (BRASIL, 2002, p. 19-20).

Tendo em vista que a promoção da saúde é uma das áreas estratégicas da Saúde da

Família (BRASIL, 2006c) e que ela deve integrar todas as atividades assistenciais, é fato que

os enfermeiros de saúde da família têm uma capacidade potencial de colaborar com o

empoderamento (CAMPOS e WENDHAUSEN, 2007, p. 272):

O empoderamento significa o aumento do poder, da autonomia pessoal e coletiva de indivíduos e grupos sociais nas relações interpessoais e institucionais, principalmente daqueles submetidos a relações de opressão, discriminação e dominação social. Um dos aspectos fundamentais do empoderamento diz respeito às possibilidades de que a ação local fomente a formação de alianças políticas capazes de ampliar o debate da opressão no sentido de contextualizá-la e favorecer sua compreensão como fenômeno histórico, estrutural e político.

O empoderamento dos indivíduos e comunidade é resultante, também, do caráter

educativo das práticas participativas institucionalizadas (Conferências e Conselhos de Saúde)

ou não institucionalizadas. Estas, para Campos e Wendhausen (2007, p. 272-273), “são as

possibilidades de participação em toda e qualquer atividade de saúde, desde as mais

individuais/assistenciais (p. ex., uma consulta) até as mais coletivas/educativas (p. ex., grupo

educativo de portadores de hipertensão arterial) ”.

A perspectiva ampliada da participação ainda é heterogênea entre os enfermeiros de

saúde da família. Ainda é possível identificar enfermeiros que mantêm uma prática de

promoção de saúde a partir de uma ação educativa tradicional centrada no modelo

biologicista. Assim, as ações de promoção de saúde revestem-se de caráter curativo

destituídas de estímulo à organização comunitária que promova o empoderamento

(OLIVEIRA e MARCON, 2007; JESUS et al, 2008). Esta prática segue na contramão das

diretrizes da Estratégia de Saúde da Família que preconizam o estímulo à participação e ao

controle social em saúde (BRASIL, 2006c).

Santos e Wendhausen (2003) apresentam algumas situações que podem estar na

origem de práticas limitantes à participação dos enfermeiros: despreparo profissional para o

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SUS; perfil pessoal individualista e de baixa capacidade de interação; sobrecarga de trabalho

geradora de falta de humanização e empatia; desconhecimento da realidade local; deflagração

de espaços de participação por demanda exclusiva da equipe e utilização dos espaços de

participação para autopromoção, principalmente, política.

Jesus et al. (2008), em estudo que discute os fatores que interferem na prática do

enfermeiro na educação em saúde, ampliam a discussão quanto à questão da capacitação dos

profissionais para o SUS. No estudo, constataram que os enfermeiros apresentaram respostas

coerentes com o arcabouço teórico do SUS, diferente do que foi constatado no exercício da

prática profissional, e que os enfermeiros, na prática profissional, mantêm comportamentos

tradicionais que não contribuem para a efetivação da participação ativa da população na

direção da constituição de uma consciência crítica. Assim, evidenciam que a capacitação não

é suficiente para dar conta de todas as dimensões que envolvem a questão da participação e

controle social em saúde.

O despreparo é identificado como um fator limitante (dentre outros fatores com maior

conteúdo de objetividade) à participação, porém a resposta objetiva (capacitação) a esta

limitação não é suficiente à incorporação dos sentidos de participação no trabalho diário do

enfermeiro. Com isso, sem desprezar a objetividade, devemos direcionar a atenção aos fatores

limitantes que guardam maior subjetividade intrínseca, buscando “estudar o problema dentro

do contexto do cuidado e por meio de um processo interativo” (SOUSA et al, 2008, p. 112).

Resgatando a cultura1 enquanto aspecto da subjetividade, Bonet (2005, p.288) remete

a reflexão sobre o indivíduo enquanto expressão cultural quando afirma que “se os

significados de qualquer ação dependem do contexto, e se este é sempre intersubjetivo, isto é,

cultural, os significados transmitidos através do corpo também são culturais”. Assim, defende

1 “[...] o conjunto de regras e comportamentos pelos quais as instituições adquirem um significado para os agentes sociais e através dos quais se encarnam em condutas mais ou menos codificadas” (JAPIASSÚ e MARCONDES, 2008, p. 63).

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que, ao olharmos para questões humanas, devemos situá-las em um contexto histórico-cultural

dinâmico o que, consequentemente, contribuirá para entendermos como as pessoas formam e

expressam suas emoções. Isso auxiliará na aproximação entre os profissionais e as populações

locais em um processo autêntico de empoderamento.

Arantes et al. (2007) apontam para a existência de fatores histórico-culturais que

contribuem para afastar os indivíduos da participação das organizações de controle social em

saúde. Neste sentido, o processo de ensino na enfermagem brasileira ocorre enfatizando o

atendimento individual, curativo e o espaço hospitalar. Seus objetivos estavam vinculados ao

modelo de desenvolvimento capitalista e a concepção individual, curativa e hierarquizada, e o

ensino da enfermagem moderna alinhava-se aos seus objetivos (GALLEGUILLOS e

OLIVEIRA, 2001).

Da década de vinte a década de setenta, a enfermagem tinha sua prática de ensino

calcada fortemente no modelo flexneriano. Essa concepção de ensino manteve-se hegemônica

no Brasil por longo período, perdendo espaço mais acentuadamente a partir da década de

setenta com o início da Reforma Sanitária. A partir da década de oitenta a reforma sanitária

ganhou corpo influenciando a atenção e o ensino na saúde, fazendo uma transição para os

outros modelos (SCHERER et al, 2005). Este movimento fez contraposição ao modelo

flexneriano1 a partir de modelos da medicina preventiva, da saúde comunitária, da saúde

coletiva e da promoção da saúde.

A partir 1986 fortaleceu-se acentuadamente o deslocamento do modelo de atenção à

saúde com a VIII Conferência Nacional de Saúde. Em 1988, a Constituição Federal

consolidou legalmente o SUS, tendo como base os pressupostos dessa conferência. O texto

1 “[...] concepção que subjaz ao relatório do educador americano Abraham Flexner”. “Tendo [...] o hospital como espaço da cura e eixo estruturante dos serviços e da formação, o privilégio da abordagem clínica/individual, a especialização intensiva e extensiva (primeiramente dirigida à formação do médico e, logo a seguir um dogma a ser seguido pelas demais profissões da área), o controle e a autorregulação do exercício profissional, a ênfase na pesquisa biológica, entre outras práticas hegemônicas, traduzem, de maneira inequívoca, a interpenetração da concepção flexneriana nos processos de formação e de assistência à saúde, até os dias atuais” (SANTANA e CHRISTÓFARO, 2001, p. 2).

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constitucional é solo fértil para a germinação de um novo modelo de atenção à saúde. Este

modelo deveria contemplar no dia-a-dia da população a integralidade das ações, a

universalidade da atenção á saúde e sua participação na formulação e controle da política de

saúde em todo o território nacional.

Em 1990 foi editada a lei que regulamenta os dispositivos constitucionais do SUS,

sendo revogados vários artigos que tratam da participação da comunidade na formulação e

controle da política de saúde. Isto demonstrou uma relevante e/ou articulada oposição das

ideias autoritárias e conservadoras às ideias democratizantes contidas nestes artigos. Por outro

lado, o movimento de apoio foi mais expressivo e recuperou em grande parte os artigos

revogados com uma nova lei que trataria especificamente do assunto. Porém, essa década no

Brasil foi o período de maior expressão da ideologia neoliberal, que destitui o caráter coletivo

e reforçou o individualismo (SOARES, 2002).

Além disso, é importante ressaltar que a sociabilidade das décadas de oitenta e noventa

foi marcada pelas lutas por direitos sociais. Estas lutas, a despeito de sua legitimidade,

trouxeram uma marcante separação entre o Estado (como local de todo o mal, do que se

queria negar) e a sociedade civil (como local de todo o bem). Então, a reação ao Estado

autoritário se estendia a qualquer forma de autoridade ou limite social. Lahuerta (1999, p. 2)

ainda afirma que:

O paradoxo é que, dentro do que se queria negar, foram colocados também às obrigações para com a comunidade. É por isso que nós vivemos a democracia, e o processo de democratização, como se representassem apenas o direito de fazer tudo o que se quer e não, também, a obrigação de ter compromisso com a coletividade, compromisso--no limite-- com o país. Talvez aí se encontre uma parte da explicação para este momento da história brasileira em que o comportamento geral está extremamente predatório. Momento no qual emerge uma incultura cívica generalizada [...] porque se ela é uma sociedade civil autoritária, nela vão se generalizar interesses muito pouco preocupados com a esfera pública, muito pouco permeados pela ideia de cultura cívica e, enquanto tais, interesses predatórios, interesses destrutivos, interesses particularistas, corporativistas de todos os tipos.

Tais contextos reforçaram uma ancestralidade de uma tendência à individualidade (tal

fato rouba o entusiasmo, de todas as formas, dos indivíduos em se organizarem

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coletivamente), ou seja, reforçaram uma característica da origem da cultura do povo brasileiro

(individualidade), herança daqueles que colonizaram essa terra (HOLANDA, 1995). Assim, o

Autor (1995, p. 32) ilustra:

[...] uma característica bem peculiar à gente da península Ibérica, uma característica que ela está longe de partilhar, pelo menos na mesma intensidade, com qualquer de seus vizinhos do continente. É que nenhum desses vizinhos soube desenvolver a tal extremo essa cultura da personalidade, que parece constituir o traço mais decisivo na evolução da gente hispânica, desde tempos imemoriais. Pode-se dizer, realmente, que pela importância particular que atribuem ao valor próprio da pessoa humana, à autonomia a cada um dos homens em relação aos semelhantes no tempo e no espaço, devem os espanhóis e portugueses muito de sua originalidade nacional. Para eles, o índice do valor de um homem infere-se, antes de tudo, da extensão em que não precise depender dos demais, em que não necessite de ninguém, em que se baste. Cada qual é filho de si mesmo, de seu esforço próprio, de suas virtudes [...]

Lahuerta (1999, p.1) compartilha da ideia da influência ibérica e colonização

portuguesa na cultura brasileira, porém ressalta que a escravidão foi potencializadora desse

passado e que a combinação da cultura ibérica/colonização portuguesa e a escravidão

dificultaram “bastante o advento de uma cultura democrática e o desenvolvimento dos

pressupostos mesmos de uma cultura liberal”.

Os recortes históricos da dimensão cultural apontam para a educação em enfermagem

como um elemento que se ajustou ao pensamento dominante de uma época

(GALLEGUILLOS e OLIVEIRA, 2001). Dos 85 anos do ensino da Enfermagem Moderna no

Brasil, os primeiros 50 anos, aproximadamente, foram influenciados fortemente pelo modelo

flexneriano que se ajusta a uma herança cultural individualista, autoritária e conservadora.

Nos 35 anos posteriores tivemos a educação em enfermagem sintonizada com a lógica

dos serviços de saúde, constituídos durante longo período de autoritarismo e desestímulo à

participação social vivenciado pela população brasileira (VASQUEZ et al, 2003).

Ressaltamos que, principalmente, a partir da década de noventa, a educação em enfermagem

começou a se articular com SUS e, consequentemente, em maior ou menor grau, passou a

incorporar seus princípios por meio de mudanças curriculares (DAVID, 2010).

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Em que pese o determinismo cultural sobrescrito na formação profissional, os

enfermeiros de saúde da família vêm acumulando experiências participativas que colocam em

curso uma nova subjetividade para a profissão. As tensões provocadas pelos elementos dessa

subjetividade agregam valor às demais forças que buscam a consolidação da Estratégia de

Saúde da Família como um modelo ético-político de caráter democrático.

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3. METODOLOGIA

3.1. Tipo de Pesquisa

O homem sempre buscou o conhecimento da realidade que o cerca e, para isso, utiliza

a religião, a filosofia, a poesia, a arte e a ciência. Em nossa sociedade, a ciência consolidou-se

como a “forma hegemônica de construção da realidade, considerada por muitos críticos como

um novo mito, por sua pretensão de único promotor e critério de verdade” (MINAYO et al,

2007, p. 9). Nessa busca sistematizada para responder a um problema de pesquisa, não existe

forma que prescinda sobre todas as outras, como afirmam Tobar e Yalour (2001, p. 19):

Ainda que pareça contraditório, a pesquisa científica constitui um empreendimento artesanal. Não há um caminho único para toda a pesquisa, existem múltiplos caminhos, existem múltiplos pontos de chegada. Pesquisar é viajar, partir em busca do conhecimento. Geralmente, quando se inicia a viagem, não se sabe com exatidão aonde se chegará. Por isso não se pode normatizar a pesquisa. Assim como nos ofícios artesanais, existem técnicas, existem métodos e existem insumos. Cada um deles apresenta vantagens e desvantagens que o artesão da informação deverá avaliar, tentando escolher o mais adequado.

O presente estudo caracterizou-se como um estudo de caso do tipo múltiplo,

descritivo-exploratório com abordagem qualitativa. O questionamento apontou para o estudo

de caso, em virtude da inexistência de controle sobre os eventos comportamentais e por

focalizar eventos contemporâneos dentro de seu contexto, cujos “limites entre o fenômeno e

contexto não estão claramente definidos” (YIN, 2005, p. 32).

Pope e Mays (2005, p. 62) chamam-nos a atenção para a adequação do estudo de caso

às investigações que pretendem analisar questões sobre a política e sua aplicação:

Estudos de caso são valiosos quando a mudança de política está ocorrendo em estabelecimentos desorganizados do mundo real, sendo importante compreender por que tais intervenções alcançam sucesso ou fracassam. O problema-chave é que a maneira pela qual as políticas são formuladas e promulgadas significa que os pesquisadores não têm controle sobre os eventos. Como resultado, designs experimentais tipicamente não são factíveis, e mesmo as oportunidades de comparação rigorosa usando designs observacionais podem ser limitadas. (...) Outra razão para considerar os estudos de caso é que as questões sobre política e prática tocam em política local e nacional de saúde.

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Constituiu-se como um estudo de casos múltiplos, já que cada unidade de saúde da

família adota uma estratégia para o exercício da política do controle social em saúde, que

representa um contexto de realidade gerado pela subjetividade na relação entre os enfermeiros

e as instâncias locais de controle social em saúde. Neste sentido, Yin (2005, p. 68) afirma:

O mesmo estudo pode conter mais de um caso único. Quando isso ocorrer, o estudo utilizou um projeto de casos múltiplos, e esses projetos aumentaram com muita frequência nos últimos anos. Um exemplo comum é o estudo de inovações feitas em uma escola (como o uso de novos currículos, horários de aula reorganizados ou novas tecnologias educacionais), na qual cada escola adota alguma inovação. Assim, cada escola é o objeto de um estudo de caso individual, mas o estudo como um todo abarca várias escolas e, dessa forma, usa um projeto de múltiplos casos.

Nos estudos de casos múltiplos, “cada caso deve ser cuidadosamente selecionado de

forma a prever resultados semelhantes (uma replicação literal) ou produzir resultados

contrastantes apenas por razões previsíveis (uma replicação teórica)”, conforme descreve Yin

(2005, p. 69). As evidências geradas pelos estudos de casos múltiplos são generalizáveis, mais

convincentes e apresentam benefícios analíticos (YIN, 2005).

Os estudos descritivos desejam conhecer a comunidade, seus traços característicos,

seus problemas etc, a partir da descrição aprofundada da realidade. Os estudos exploratórios

visam elevar a experiência em relação a determinado problema, delimitar ou manejar uma

teoria, elaborar um instrumento de pesquisa e levantar possíveis problemas de pesquisa

(TRIVIÑOS, 2008).

A abordagem qualitativa adotada neste estudo de caso teve como proposta descrever e

explorar o contexto da realidade representado pela participação dos enfermeiros de saúde da

família no controle social em saúde a partir da concessão do incentivo de resolutividade em

Angra dos Reis.

Para Minayo et al (2007, p. 21):

A pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares. Ela se ocupa, nas Ciências Sociais, com um nível de realidade que não pode ou não deveria ser quantificado. Ou seja, ela trabalha com o universo dos significados, dos motivos, das aspirações, dos valores e das atitudes. Esse conjunto de fenômenos humanos é entendido aqui como parte da realidade social, pois o ser humano se distingue não só

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por agir, mas por pensar sobre o que faz e por interpretar suas ações dentro e a partir da realidade vivida e partilhada com seus semelhantes.

A abordagem qualitativa é utilizada por diferentes métodos de pesquisa com o objetivo

de revelar ou acessar os processos ou áreas da vida social que não são alcançáveis pela

abordagem quantitativa. Na área de saúde, essa abordagem tem sido utilizada com maior

frequência para estudar as organizações e as políticas desse setor (POPE e MAYS, 2005).

3.2. Cenário

O cenário deste estudo foi o município de Angra dos Reis localizado na região da baía

da Ilha Grande (B.I.G.) que é composta pelos municípios de Angra dos Reis, Paraty e

Mangaratiba, totalizando 236.921 habitantes (BRASIL, 2010) distribuídos em 2.088 km². Esta

região de saúde estrutura-se em dois Módulos Assistenciais: B.I.G. I, que é composto por

Angra dos Reis e Paraty, sendo aquele a sede do módulo, e B.I.G. II composto por

Mangaratiba (ANGRA DOS REIS, 2010b).

Figura 1: Dados Cartográficos – Baia da Ilha Grande (GUIA COSTA VERDE, 2010).

Angra dos Reis possui área territorial de 800.430 km²; população de 168.666

habitantes (BRASIL, 2010), em sua maior parte distribuída em grande eixo geográfico

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longitudinal (incluindo área de sertões e ilhas) ao longo da rodovia Br-101, e 0,772 de Índice

de Desenvolvimento Humano (I.D.H.) em 2000. Sua topografia acidentada de encostas e

recortes do litoral concentra o núcleo urbano em uma estreita faixa entre a montanha e o mar,

com grande contingente populacional assentado em área de encosta. Faz limite com os

municípios de Bananal (SP), Cunha (SP), São José Barreiro (SP), Mangaratiba (RJ), Paraty

(RJ) e Rio Claro (RJ), distando da Capital 107 km (ANGRA DOS REIS, 2010b).

O município apresentou taxa estimada de crescimento no período de 2006 a 2009 de

5,4%; cobertura vacinal de BCG em 2009 de 96,3%; percentual de cesarianas em 2008 de

56,8%; percentual de mães na faixa etária de 10 a 14 anos, em 2008, de 0,7%; mortalidade

infantil em 2008 de 12,3 por mil nascidos vivos e aplicou em saúde no período de 2006 a

2008 percentuais superiores a 15% do orçamento próprio, sendo a média de 24,8% (BRASIL,

2010).

Seu Conselho de Saúde foi criado em 24 de janeiro de 1993 e, atualmente, possui 48

membros, sendo a metade titular e a outra metade suplente (BRASIL, 2007a). Possui sede

própria e realiza reuniões ordinárias mensais e extraordinárias quando necessário. Cabe

salientar que um de seus membros é enfermeiro, tendo sido indicado pelo COREN-RJ para

ocupar uma vaga no segmento dos profissionais de saúde.

O sistema de saúde municipal está organizado em cinco distritos sanitários, possuindo

dois hospitais conveniados, 53 unidades próprias e 2.011 profissionais de saúde, sendo 114

enfermeiros. Possui 36 equipes de saúde da família que atende 74.828 pessoas, representando

44,49% de cobertura populacional (ANGRA DOS REIS, 2010a). Além disso, possui uma

equipe de saúde indígena. A cobertura de PACS foi de 10,3% no ano de 2009 (BRASIL,

2010).

A Secretaria Municipal de Saúde de Angra do Reis, de 1988 a dezembro de 2004, era

responsável pela gestão do SUS no Município. Em janeiro de 2005, por meio da Lei

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Municipal nº1. 509 de 30 de dezembro de 2004, foi criada a Fundação de Saúde de Angra dos

Reis (FuSAR) que é uma fundação pública e responsabiliza-se pela administração dos

recursos do SUS. Ela busca, recebe e distribui as verbas federais e estaduais; contrata,

seleciona e faz tratamento de pessoal; compra e distribui medicamentos e equipamentos

necessários para a rede, além de fiscalizar e avaliar os serviços prestados. Em 2009 a

Secretaria de Saúde foi extinta, sendo suas funções incorporadas pela FuSAR.

3.3. Sujeitos

Os sujeitos da pesquisa foram os enfermeiros das equipes de saúde da família do

município de Angra dos Reis que representaram uma população de 35 sujeitos. Porém, a

aplicação dos critérios de inclusão e exclusão definiu os sujeitos que participaram do estudo.

Como critérios de inclusão foram considerados:

• Dispor-se, voluntariamente, a participar da pesquisa e assinar o Termo de

Consentimento Livre e Esclarecido.

• Atuar em equipe de saúde da família por pelo menos doze meses,

objetivando evitar distorções nos resultados causados pela adaptação inicial

ao modelo de atenção, a unidade de saúde da família e a comunidade.

Como critério de exclusão foi considerado:

• Atuar em unidade de saúde da família com equipe básica1 incompleta nos

últimos doze meses, em virtude de possíveis distorções para os resultados

ocasionados pela sobrecarga de responsabilidade do enfermeiro (a).

Desta forma, após a aplicação dos critérios de inclusão e exclusão 25 enfermeiros

compuseram o conjunto de sujeitos, sendo que, destes, 03 encontravam-se fora do município e

1 Representa um médico, um enfermeiro, um auxiliar ou técnico de enfermagem e até seis agentes comunitários de saúde para a população máxima de 4.000 habitantes (BRASIL, 2006c).

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02 optaram por não participar do estudo por razões de ordem pessoal. Assim, o conjunto de

sujeitos representados nesta pesquisa foram 20 enfermeiros, correspondendo a 57,1% do total

de enfermeiros das equipes de saúde da família do município.

3.4. Unidade de análise

A unidade de análise no estudo de caso está relacionada aos questionamentos

realizados inicialmente. Sua definição está intrinsecamente relacionada à definição do “caso”,

e, portanto, ao definir o “caso”, está se definindo a unidade de análise. A definição do “caso”

poderá ser reformulada em decorrência de descobertas resultantes da fase de coleta de dados

(YIN, 2005). Neste estudo, a unidade de análise foi representada pela participação dos

enfermeiros de Saúde da Família no controle social em saúde a partir da concessão do

incentivo de resolutividade em Angra dos Reis.

3.5. Coleta de dados

A coleta de dados foi realizada pelo próprio autor da pesquisa e ocorreu no período de

março a maio de 2009, utilizando a técnica de entrevista semiestruturada. A entrevista

semiestruturada apresenta questionamentos resultantes das teorias, das questões da pesquisa e

demais informações recolhidas do contexto social (TRIVIÑOS, 2008). As questões da

entrevista obedeceram a uma “formulação flexível, e a sequência e as minúcias ficaram por

conta do discurso dos sujeitos e da dinâmica que acontece naturalmente” (ROSA e

ARNOLDI, 2006, p. 31). Desta forma, “o entrevistado teve possibilidade de discorrer sobre o

tema em questão sem se prender à indagação formulada” (MINAYO et al, 2007, p. 64).

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Minayo et al. (2007, p. 66-67) alertam que, para a realização de entrevista, é

importante realizar: aproximação inicial; esclarecimentos sobre o estudo, ressaltando a

importância da participação do entrevistado; apresentação de credencial institucional e do

termo de Consentimento Livre e Esclarecido que foi assinado pelo entrevistado; explicação

dos motivos da pesquisa; justificativa da escolha do entrevistado e conversa de aquecimento,

objetivando criar um clima favorável ao desenvolvimento da pesquisa. Os autores ainda

afirmam que esse clima favorável:

No caso da pesquisa qualitativa, ao contrário do que muitos podem pensar, é fundamental para o envolvimento do entrevistado com o entrevistador. Em lugar dessa atitude se constituir numa falha ou num risco comprometedor da objetividade, ela é condição de aprofundamento da investigação e da própria objetividade. Em geral, os melhores trabalhos de campo são os mais simpáticos e que melhor se relacionam com os entrevistados. A inter-relação que contempla o afetivo, o existencial, o contexto do dia-a-dia, as experiências e a linguagem de senso comum no ato da entrevista é condição sine qua nom do êxito da pesquisa qualitativa (MINAYO et al, 2007, p. 67-68).

A entrevista foi conduzida por um roteiro de entrevista semiestruturado com perguntas

abertas, após aplicação do questionário de caracterização dos sujeitos (ANEXO A), mantendo

o sigilo em relação aos entrevistados. Para isso, a identificação destes ocorreu por

pseudônimo representado por meio de uma letra do alfabeto vigente, não coincidente com a

inicial do primeiro nome. As perguntas abertas visaram alcançar de forma mais profunda o

fenômeno do estudo.

A profundidade relacionou-se ao acesso aos “sentimentos, pensamentos e lembranças

do entrevistado, sua intensidade e intimidade” (MARCONI e LAKATOS, 2007, p. 203). Foi

realizado, também, um formulário para caracterizar os sujeitos da pesquisa, visando

identificar no perfil do coletivo dos sujeitos da pesquisa possíveis características que se

relacionem ao objeto do estudo.

O pré-teste do roteiro da entrevista semiestruturada e o questionário de caracterização

dos sujeitos foram realizados com os quatro enfermeiros que compunham o universo destes

profissionais da Estratégia de Agentes Comunitários de Saúde. A escolha deste grupo se deu

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por eles estarem submetidos juntos com os agentes comunitários de saúde ao processo de

concessão do incentivo. Obedecemos às etapas descritas anteriormente para realização da

entrevista. Não percebemos nesta simulação a necessidade de alterar o roteiro de entrevista

semiestruturada e questionário de caracterização dos sujeitos.

A entrevista com os enfermeiros de saúde da família teve agendamento prévio em

local e data para sua realização de acordo com a disponibilidade do entrevistado. Inicialmente,

as questões da entrevista foram lidas pelo entrevistador e, sequencialmente, foi dispensado

algum tempo para que o entrevistado pudesse refletir sobre as questões, visando envolver o

entrevistado no universo do estudo.

Observou-se que os entrevistados estavam bem à vontade e se sentiam seguros para

responder as questões. Este fato nos surpreendeu, pois acreditávamos que os diversos cargos

ocupados pelo pesquisador na gestão municipal da saúde pudessem inibir os entrevistados.

Acreditamos que o fato de o pesquisador estar afastado há algum tempo da gestão municipal

da saúde, incluindo o período da coleta de dados, tenha contribuído positivamente para o

ambiente da entrevista.

A duração da entrevista levou em conta as manifestações subjetivas e objetivas do

entrevistado, apresentando um tempo médio de 16 minutos. A entrevista aconteceu em

momento distinto da aproximação inicial, conforme sugestões de Minayo et al. (2007, p. 66-

67). A aproximação inicial foi o primeiro contato com o campo antes da coleta de dados e

aconteceu de janeiro a fevereiro de 2009, na tentativa de estabelecer maior confiança do

entrevistado com o entrevistador.

Os outros momentos da coleta de dados (explicação dos motivos da pesquisa;

justificativa da escolha do entrevistado e conversa de aquecimento) foram realizadas no dia da

entrevista, na qual foi solicitada autorização para gravação em meio digital. Com isto, tivemos

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o objetivo de captar a essência da fala do entrevistado na íntegra e ter maior facilidade no seu

registro.

Foi realizada a transcrição das entrevistas e, posteriormente, agendado novo encontro

com cada entrevistado para validação das transcrições pelos mesmos. Os entrevistados

validaram a entrevista. Todo o material coletado ficará sob a guarda do pesquisador por cinco

anos; após este período será incinerado.

3.6. Organização e análise dos dados

O início desta etapa não está restrito à fase de análise dos dados, já que “não há

fronteira nítida entre coleta das informações, início do processo de análise e a interpretação”

(MINAYO et al, 2007, p. 80-81). Assim devemos considerar dois pontos:

O primeiro deles diz respeito à ideia de que tanto a análise quanto a interpretação ocorrem ao longo de todo o processo. Já o segundo se refere ao fato de que, em pesquisa qualitativa, às vezes, ao chegarmos na fase final, descobrimos que necessitamos retomar as partes das fases anteriores. Assim, se as informações coletadas não são suficientes para produzir os dados a partir das questões da pesquisa, devemos voltar ao trabalho de campo para buscar mais informações pontuais e específicas. Ou, se não conseguimos produzir uma interpretação dos dados com as referências teóricas já trabalhadas na fase exploratória, pois as novidades surgidas em campo exigem outras análises, devemos acrescentar leituras para produzir uma cuidadosa compreensão e interpretação (MINAYO et al, 2007, p. 81).

Utilizamos a análise de conteúdo, objetivando desvelar o que se esconde por trás dos

conteúdos expressos nas entrevistas semiestruturadas. Com isso, esperamos captar “além das

aparências do que está sendo comunicado” (MINAYO et al, 2007, p. 84), dentre as diversas

formas de analisar conteúdos trabalhamos com a análise temática, pois nossa pretensão foi

descobrir “os núcleos de sentido” a partir da unidade de significação. Nesta pesquisa, a

unidade de significação foi representada pela participação dos enfermeiros de saúde da

família no controle social em saúde a partir da concessão do incentivo de resolutividade em

Angra dos Reis.

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A análise de conteúdo demandou da definição de unidades de registro e unidades de

contexto. A unidade de registro decorreu da decomposição do material coletado que foi

analisado. A unidade de contexto referiu-se à compreensão do contexto da mensagem que

analisamos (MINAYO et al., 2007). Foi obtida por meio do roteiro de entrevista

semiestruturado. Com isso, nossa pretensão foi alcançar a unidade de contexto pela

caracterização da amostra do estudo. Para Franco (2007, p. 47):

Podem ser obtidas mediante o recurso a dados que explicitem: a caracterização dos informantes; suas condições de subsistência; a especificidade de suas inserções em grupos sociais diversificados, seja na família de origem, no mercado de trabalho, em instituições consagradas e reconhecidas, sejam elas religiosas, beneméritas, concebidas para divulgação de programas voltados ao apoio pessoal, ligadas a organismos do sistema nacional ou direcionadas para o intercâmbio a ser efetuado junto a organismos internacionais, e assim por diante. [...] A unidade de contexto deve ser considerada e tratada como a unidade básica para a compreensão da codificação da unidade de registro e corresponde ao segmento da mensagem, cujas dimensões (superiores às da unidade de registro) são excelentes para a compreensão do significado exato da unidade de registro.

O caminho desenhado para desenvolver a análise desta pesquisa foi composto pela

pré-análise, exploração do material e tratamento dos resultados/inferência/interpretação,

conforme sugere Minayo et al. (2007). A pré-análise foi realizada desde a coleta de dados

quando as primeiras impressões foram registradas, ampliou com a transcrição e avançou com

a leitura flutuante. Esta representou o contato com os dados coletados registrados, facilitando

“conhecer os textos e as mensagens neles contidas, deixando-se invadir por impressões,

representações, emoções, conhecimentos e expectativas...” (FRANCO, 2007, p. 52). Nesta

etapa adotamos as recomendações de Minayo et al. (2007, p. 91):

Inicialmente procuramos fazer uma leitura compreensiva do conjunto do material selecionado, de forma exaustiva. Trata-se de uma leitura de primeiro plano para atingirmos níveis mais profundos. Nesse momento, deixamo-nos impregnar pelo conteúdo do material. Por meio dessa leitura buscamos: (a) ter uma visão de conjunto; (b) apreender as particularidades do conjunto do material a ser analisado; (c) elaborar pressupostos iniciais que servirão de baliza para análise e a interpretação do material; (d) escolher formas de classificação inicial; (e) determinar os conceitos teóricos que orientarão a análise.

Na etapa de exploração do material coletado, fizemos a distribuição segundo a

classificação obtida na fase de pré-análise. Em seguida, procedemos a uma leitura dialogada e

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a identificação dos núcleos de sentido, retomando o diálogo de acordo com os pressupostos

iniciais ou outros pressupostos.

Após análise dos núcleos de sentido, agrupamos as partes dos textos analisados em

eixos temáticos mais amplos. Com a constituição de eixos temáticos mais amplos realizamos

novo agrupamento por temas encontrados, “elaborando uma redação por tema, de modo a dar

conta dos sentidos dos textos e de sua articulação com o (s) conceito(s) teórico(s) que

orientarão a análise” (MINAYO et al, 2007, p. 92).

O resultado classificatório dos elementos constitutivos do conjunto de evidências

resultantes desta fase foi denominado categorização, e a análise de cada categoria não

incorporou os aspectos de quantificação. Identificamos três categorias: 1ª. O incentivo como

potencial elemento de ampliação democrática nas unidades de saúde da família; 2ª. O

incentivo como fator de mudança na prática das equipes de saúde da família e 3ª. O trabalho

dos enfermeiros de saúde da família a partir da concessão do incentivo.

Este procedimento obedeceu a algumas normas para sua validade qualitativa. Para

isso, a categorização foi obtida por meio de procedimentos padronizados, atendendo ao

princípio da homogeneidade, ou seja, a obtenção das categorias deve obedecer aos mesmos

princípios. Minayo et al. (2007, p. 89) ainda ressaltam que:

Além de respeitarmos o princípio da homogeneidade para fazer uma categorização, as categorias devem ser: (a) exaustivas (estas devem dar conta de todo o conjunto do material a ser analisado; se um determinado aspecto não se enquadrar nas categorias, devemos formular outra categorização); (b) exclusivas (isso significa que um aspecto do conteúdo do material analisado não pode ser classificado em mais de uma categoria); (c) concretas (não serem expressas por termos abstratos que trazem muitos significados); (d) adequadas (em outras palavras, a categorização deve ser adaptada ao conteúdo e ao objetivo a que se quer chegar).

Na última etapa da análise foram realizadas algumas inferências e interpretações do

material, objetivando “uma síntese interpretativa por meio de uma redação que pudesse

dialogar temas com objetivos, questões e pressupostos da pesquisa” (MINAYO et al, 2007, p.

92). A inferência esteve atrelada às premissas aceitas decorrentes de estudos anteriores que

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trataram do tema em análise. Também, o conhecimento do contexto do material analisado e

das experiências prévias com o assunto (MINAYO et al, 2007) foram relevantes.

Na interpretação, buscamos agregar um valor mais amplo à análise, consistindo em

relacionar as estruturas dos textos analisados com os determinantes de suas características.

Para isso, a abordagem qualitativa ancorou-se na fundamentação teórica para a interpretação

(MINAYO et al, 2007). A análise de conteúdo atendeu à análise das evidências do estudo de

caso baseada na estratégia das proposições teóricas que representaram um guia para análise do

estudo de caso. Para (Yin 2005, p. 140):

As proposições teóricas dariam forma ao plano da coleta de dados e, por conseguinte, estabeleceriam a prioridade às estratégias analíticas relevantes. [...] Evidentemente, a proposição ajuda a por em foco certos dados e ignorar outros...[...] Ela também ajuda a organizar todo o estudo de caso e a definir explanações alternativas a serem examinadas. Proposições teóricas sobre relações causais-respostas a questões do tipo “como” e “por quê” - podem ser muito úteis para orientar a análise do estudo de caso dessa maneira.

Esta estratégia iniciou antes da fase de análise propriamente dita, e, nesta fase,

demandou de uma técnica analítica específica como ferramenta de análise. A técnica

escolhida para o estudo de casos múltiplos foi a síntese de casos cruzados. Esta síntese foi

registrada conforme o quadro abaixo:

NÚCLEOS DE SENTIDO EIXO TEMÁTICO TEMA CATEGORIA

Nível local como protagonista do processo de democratização; população converte suas demandas de atenção à saúde; participação no sentido controle e fiscalização; reproduziu o modelo da democracia representativa; vícios da democracia representativa; baixo grau de amadurecimento no processo democrático; alteridade cooptada; empobrecimento do espaço criado pelo incentivo; permeabilidade e a capilaridade do processo de concessão do incentivo e desânimo dos profissionais.

Democracia.

Participação e controle social em

saúde.

01

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NÚCLEOS DE SENTIDO EIXO TEMÁTICO TEMA CATEGORIA

Dinâmica do processo de concessão do incentivo; discriminação positiva; rotina de avaliação; extrapolação e aproveitamento da dimensão do cuidado direto; saúde como um simples ato de consumo de qualquer outro gênero; concessão do incentivo impactou na equipe e forte senso de comprometimento dos auxiliares de enfermagem/agentes comunitários de saúde.

Incentivo de resolutividade

Processo de concessão do incentivo.

02

Não engajamento em atividades associativas; protagonismo dos enfermeiros no processo de concessão do incentivo; oportunidade de melhoria da dimensão do cuidado; sobrecarga de trabalho dos enfermeiros; mudanças no seu processo de trabalho; parece tabu avançar na direção do desenvolvimento da autonomia do indivíduo; saber técnico; estratégias de acessar a opinião das pessoas e atividades de grupos como estratégias de empoderamento.

Trabalho do Enfermeiro

Trabalho do Enfermeiro de Saúde de Família.

03

A síntese de casos cruzados ocorreu a partir dos casos individuais produzidos pelo

estudo. Sendo assim, “ela não se diferenciou de outras sínteses de pesquisa” (YIN, 2005, p.

163) e pôde “tratar questões mais amplas do que a simples análise de aspectos únicos” (YIN,

2005, p. 165).

Com isso, evidencia-se que a análise de conteúdo foi uma escolha adequada ao estudo

proposto, já que atendeu às exigências da análise do estudo de caso em examinar, categorizar

e recombinar as evidências qualitativas para tratar os questionamentos do estudo (YIN, 2005)

a partir da síntese de casos cruzados.

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3.7. Aspectos éticos

Este estudo foi submetido à avaliação do Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de

Enfermagem Anna Nery/Hospital Escola São Francisco de Assis - Universidade Federal do

Rio de Janeiro em atendimento à Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, sendo

aprovado na reunião do dia 16/12/2008 (ANEXO D) sob o protocolo nº 107/08. Também, foi

solicitada autorização escrita (ANEXO B) ao gestor municipal para a coleta de dados nas

unidades municipais de saúde da família. Posteriormente, o projeto foi apresentado em

reunião ordinária do Conselho Municipal de Saúde de Angra dos Reis com o objetivo de

apresentar o estudo aos Conselheiros de Saúde (ANEXO E).

Em conformidade com a Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, as

pesquisas devem, entre outros aspectos, atender à eticidade da pesquisa. Para isso, a resolução

faz, entre outras recomendações, que os pesquisadores obtenham autorização do(s) sujeito(s)

da pesquisa ou de seu representante legal a autorização para participação voluntária no estudo.

Esta foi a condição indispensável para a participação no estudo (BRASIL, 1996).

O Termo de Consentimento Livre esclarecido (ANEXO C) foi apresentado antes do

início da entrevista, e o pesquisador fez detalhadas orientações quanto ao estudo a ser

desenvolvido: natureza da pesquisa, objetivos, métodos, benefícios e riscos. Na oportunidade

frisamos que seriam mantidos o sigilo e confidencialidade dos sujeitos da pesquisa em relação

aos dados coletados. Assim como, que em qualquer fase do estudo o entrevistado poderia

desistir da participação na pesquisa.

O termo foi lido pelo entrevistador de forma audível e pausada para esclarecimento de

dúvidas quanto ao conteúdo do mesmo. Os sujeitos que concordaram em participar, assinaram

as duas vias do termo, ficando uma via em posse do entrevistado e a outra, do pesquisador.

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3.8. Limitações do método

Para os principais críticos dos estudos de casos, as limitações deste método estão

relacionadas à abordagem de uma realidade única e específica. Isto impediria qualquer tipo de

generalizações sobre o comportamento ou características da situação em análise. Entretanto,

Yin (2005, p. 29-30) afirma que:

[...] da mesma forma que os experimentos, são generalizáveis a proposições teóricas, e não a populações ou universos. Neste sentido, o estudo de caso, como o experimento, não representa uma amostragem, e, ao fazer isso, seu objetivo é expandir e generalizar teorias (generalizações analíticas) e não enumerar frequências (generalizações estatísticas).

As entrevistas, como procedimento de obtenção de informações, apresentam

limitações relacionadas ao maior tempo para realização e tratamento; a necessidade de

confiança e espontaneidade entre o entrevistador e entrevistado; falta de observação direta;

não fornece informação produzida na investigação de grupo e a informação:

Concretiza-se somente a partir da relação entrevistador-entrevistado, dependendo da situação da Entrevista tanto quanto das características da atuação do entrevistador e entrevistado. Qualquer deslize afeta a validação dos dados obtidos, tais como: a falta ou o excesso de questionamentos, excessivo direcionamento por parte do entrevistador, excesso de perspicácia de ambas as partes (ROSA; ARNOLDI, 2006, p. 88).

A análise de conteúdo em entrevistas semiestruturadas decompõe o texto em unidades

de significação que são classificadas segundo as categorias estabelecidas. Suas limitações se

referem: à análise isolada das unidades de significação; à classificação do conteúdo manifesto,

e não ao latente; e a quantificação não é representativa comparando-se a uma amostra

quantitativa clássica (FALCÃO, 2003). O conhecimento prévio das questões descritas acima

foi relevante para que o pesquisador/entrevistador buscasse se afastar das limitações.

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4. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS

4.1 Caracterização dos Enfermeiros Entrevistados

Constatamos que, dos 20 enfermeiros entrevistados 68,43%, estão na faixa etária

compreendida entre 25 e 35 anos; 15,78% na faixa etária compreendida entre 36 a 45 anos; e

15,78% têm mais de 45 anos.

Quanto à situação conjugal, maior parte desses enfermeiros estava casada à época da

entrevista ou em união estável (63,16%), com renda familiar variando entre 9 e 15 salários

mínimos; o número de dependentes variou entre 3 e 4 indivíduos.

Em relação às variáveis profissionais, a maioria dos enfermeiros (89,5%) tinha seis anos

ou mais de atuação na enfermagem; mediana de 6,8 anos de atuação em atenção básica e mediana

de 5 anos de atuação na mesma comunidade.

Em relação à vida associativa, identificamos que 19 dos 20 enfermeiros entrevistados não

participavam ou nunca participaram de nenhum tipo de vida associativa, sendo que o único

enfermeiro que refere participação em vida associativa faz alusão a um período de 12 meses que

frequentou o grupo de pais e amigos da escola do filho.

4.2 Concepções dos Enfermeiros sobre o Incentivo de Resolutividade

O desafio que se apresentou a partir das falas dos enfermeiros foi desvelar a realidade que

envolveu esses profissionais e a concessão do incentivo de resolutividade, ou seja, realizar uma

“transposição involuntária de relações sociais para o plano das ideias” (CHAUÍ, 2008, p. 13).

Temos certeza de que as ideias aqui apresentadas não são representativas para todas as

épocas e realidades (CHAUÍ, 2008), porém guardam a capacidade de contribuição para com o

movimento de transformação instituído a partir do incentivo de resolutividade. Neste sentido, a

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maior contribuição será a possibilidade de diálogo com outras experiências em outras realidades e

épocas, bem como, fundamentalmente, fomentar a continuidade do diálogo no contexto de Angra

dos Reis.

Identificamos na análise três categorias: 1ª. O incentivo como potencial elemento de

ampliação democrática nas unidades de saúde da família; 2ª. O incentivo como fator de mudança

na prática das equipes de saúde da família e 3ª. O trabalho dos enfermeiros de saúde da família a

partir da concessão do incentivo. Com o intuito de facilitar a captação dos núcleos de sentido e,

consequentemente, auxiliar a elaboração do arranjo mental da síntese de cada categoria,

negritaremos cada um deles.

4.2.1 Categoria 1. O incentivo como potencial elemento de ampliação

democrática nas unidades de saúde da família:

O incentivo configurou-se como mais uma estratégia do poder público municipal na área

de saúde para se articular com as comunidades por meio da equipe de saúde da família. Ainda que

de forma tímida, reforçou o nível local como protagonista do processo de democratização da

gestão (BRASIL, 2006).

“São dois questionários que a gente recebe, um é preenchido pela Associação de moradores, como representante da Comunidade e o outro, pelo Enfermeiro da Unidade que é relacionado às ações desenvolvidas dentro do módulo”. Enf. I

“Ele (presidente da Associação dos Moradores) senta com outros membros da Associação e junto com alguns (pausa) Não é geral, aberto pra Comunidade em si não! Ele pega as peças chaves da Comunidade, eles até chamam pra essa reunião, mas nem sempre vai todo mundo. Em cima desse trabalho eles dão o valor pra gente”. Enf. L

“[...] a Associação dos moradores, além de falar sobre a qualidade do atendimento, se refere também à estrutura do Módulo, à organização do Módulo, à parte de marcação de consulta, à demora das consultas, das referências [...]”. Enf. A

“Ele (presidente da Associação de Moradores) no dia a dia dele, ele mesmo responde o questionário junto com outros membros da Associação”. Enf. H

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Nota-se que o processo de concessão do incentivo possibilitou à população converter

suas demandas de atenção à saúde em ações concretas (LABRA, 2007).

“[...] a Comunidade exigia que também fosse tratada de uma maneira mais adequada, mais digna [...]”. Enf. A

“Mas mudou com relação até botar Associação de moradores junto do Posto, porque quando eles (comunidade) querem reclamar eles já vão ao presidente e falam. Então eles tiveram um poder maior de expor a opinião deles e de serem ouvidos. Mesmo que eles não tenham coragem de chegar aqui e falar direto pra mim, e eles não falam, eles vão lá e falam pra ele. Então isso intimida mais, eu acho. Eles sabem que intimida, porque mesmo que o presidente não fale quanto em dinheiro, eles sabem que é o presidente que avalia, então eles vão lá e passam pra ele”. Enf. O

“Eles já cobravam e passaram a cobrar mais ainda. Por estar no questionário, sabendo que muitas daquelas perguntas na verdade os beneficiavam mais. Quer dizer, de alguma forma, qualquer coisinha, minuciosa, a cobrança, eles dizem: Mas ali no questionário fala que eu faço aquele questionário junto com o presidente, então eu preciso de uma resposta logo e falam que vão dar nota baixa pra gente. De alguma forma é uma cobrança grande e a gente tinha que dar uma resposta rápida”. Enf. R

Entretanto, o significado de participação popular expressou-se mais intensamente no

sentido do controle sobre as ações desenvolvidas pelas unidades de saúde da família do que na

direção da definição do planejamento dessas ações. Isto ressalta muito mais a participação no

sentido controle e fiscalização que na definição da política de saúde (BRASIL, 2007b).

“Essa participação da Comunidade enquanto controladora trouxe pra dentro da Unidade uma outra realidade. Não era só o prestar serviço por prestar serviço [...]”. Enf. A

“[...] o presidente da Associação vem aqui e fala o que que aconteceu, não é? Porque aconteceu isso pra entender, mas a gente não teve nenhum problema com ele”. Enf. O

Também, o processo de democratização reproduziu o modelo da democracia

representativa. Isto se apresenta no distanciamento das comunidades adscritas às unidades de

saúde da família de uma organização social na qual os indivíduos assumam responsabilidades

dentro da comunidade e do governo, ou seja, a distância de “uma nova realidade social, sem

injustiças, exclusões, desigualdades, discriminações etc” (GOHN, 2007, p. 18-19).

“[...] o presidente da Associação, uma coisa que ele falava muito: As pessoas vêm reclamar comigo na rua, mas não participam na hora que a gente convida". Enf. I

“Seria um coletivo da Comunidade com o presidente da Associação dos Moradores, mas a gente sabe que isso não acontece. O presidente da Associação dos Moradores convoca algumas pessoas da Comunidade e responde ao questionário. Às vezes a gente percebe que ele não responde com ninguém, responde sozinho e entrega pra

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gente, e a gente tem que aceitar aquela avaliação que não foi uma maioria. A grande maioria das vezes ele não está com toda a Comunidade pra responder e ele responde sozinho ou com cinco a dez pessoas”. Enf. S

“Olha, por enquanto, que eu saiba, ele não chama a comunidade eu já pedi até várias vezes, tanto na gestão anterior como nessa gestão desse novo presidente da Associação de Moradores para reunir, para fazer com a Comunidade, mas na verdade não, é só ele que faz”. Enf. T

Identificou-se no processo de concessão do incentivo a ocorrência de alguns vícios da

democracia representativa. Observamos que, quando “só um pequeno grupo decide, é inevitável

que esse grupo se corrompa, perdendo de vista sua responsabilidade social, e acabe dando

preferência aos próprios interesses, gerando uma situação de injustiça [...]” (DALLARI, 2004, p.

38).

“[...] o presidente da Associação o tempo todo falava que a gente estava na mão dele. Que ele ia dar uma notinha maior porque a gente o tratou bem. Falava na nossa cara: Ah, eu vou melhorar a tua notinha”. Enf. B

“[...] ele (presidente da Associação de Moradores) colocava o que ele queria, porque eu não conseguia as coisas para ele. Quando eu consegui um médico para atendê-lo aí a minha nota melhorou <risos>. É, então tem de fazer conforme ele quer”. Enf. E

“E o que eu pude observar algumas das vezes é que o presidente da Associação aproveita desse momento pra fazer algumas barganhas como a gente. Ele defende alguns interesses de caráter pessoal e se não houver concessão por parte do Enfermeiro, ele chega o momento de fazer a cobrança concedendo nota baixa no seu critério de avaliação”. Enf. Q

“[...] Acho que o incentivo, ele é realmente pra incentivar e não é pra ser usado como uma arma pra poder ficar manipulando. A gente fica como refém na mão dos presidentes das Associações [...]”. Enf. Y

Outra distorção está relacionada ao baixo grau de amadurecimento no processo

democrático dos indivíduos, principalmente daqueles que detêm algum nível de poder dentro de

estruturas democrático-representativas. Neste sentido, revelaram-se conflitos de ordem individual

que interferem no processo de concessão do incentivo (BRASIL, 2003) e, consequentemente,

colocaram em risco a consolidação dos interesses da comunidade.

“[...] se ele tem algum problema com um funcionário do Posto, ele leva isso em conta para o questionário e acaba dando uma pontuação baixa, o que não era legal”. Enf. D

“Tem Associação dos moradores que o presidente da Associação é parente da Enfermeira, de alguém, do Médico. Então ele vai facilitar. Ele vê mais o lado pessoal. Às vezes aquele presidente da Associação não se dá com alguém, algum membro

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daquela equipe, não gosta. Ele acaba às vezes fazendo um ótimo trabalho, trabalhando o mês inteiro e não recebendo o que deveria”. Enf. H

“Por que eles agem muito por esse lado pessoal, não é? Se um belo dia você não deu bom dia, o teu serviço foi tudo por água abaixo, não é? E o teu incentivo também <risos>”. Enf. M

“[...] até problema pessoal da Equipe com ele, ele tira ponto, entendeu? Então eu não acho isso muito válido não. Ele está fazendo isso sozinho”. Enf. N

Assim, pode-se notar que, no processo de concessão do incentivo, a alteridade cooptada

esteve presente ao “incluir o interesse restrito e imediato dos representantes populares, afastando-

os da luta pela atenção à saúde mais ampla dos representados” (SPOSATI e LOBO, 1992).

“Por que eu vejo muito presidente de Associação tomando conta das coisas, eu não o vejo distribuindo, discutindo os interesses, de saúde, de transporte ou de vida da Comunidade [...] eu tenho visto o presidente da Associação como uma pessoa que se engaja para fazer algo para sua vida e pra sua família”. Enf. G

Ficou evidente o empobrecimento do espaço criado pelo incentivo em decorrência da

lacuna deixada pela comunidade adscrita às unidades de saúde da família ao não participar

ativamente nesse processo. Assim, ao abster-se, voluntariamente ou não, de participar

integralmente do processo de concessão do incentivo, ficando a responsabilidade com a

associação de Moradores, as comunidades não asseguraram a efetivação de suas liberdades

(ROSENFIELD, 2006), bem como não contribuíram para o alargamento da participação política

(BOBBIO et al., 2007). Desta forma, sua influência no processo decisório no âmbito das unidades

de saúde da família foi diminuída.

“Ele tentou uma vez com a Comunidade, mas a Comunidade não participou, ele desanimou e fez sozinho”. Enf. B

“[...] a Associação de Moradores de uma Microárea não participa. Não tem reuniões com frequência, são raras as reuniões”. Enf. E

“Você percebe que a Comunidade não tem conhecimento disso, não tem conhecimento desse questionário, como é que é”. Enf. F

“A comunidade hoje está muito despolitizada. Ela ainda busca uma assistência assistencialista, ela quer o Médico. E eu não vejo essa procura. Ela quer um atendimento melhor até, mas ela, ainda não caiu a ficha”. Enf. G

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“Se você parar pra perguntar a alguém da Comunidade, eles nem sabem que existe esse questionário. Você vê que eles mandam por ele (presidente da Associação) só . Eles fazem a avaliação por ele só”. Enf. M

“É! Esse é que é o problema. Alguns sabem, mas também não ligam. Não questionam. Porque quem resolve é o presidente da Associação de moradores que faz tudo sozinho. Ele não faz uma reunião pra fazer aquelas perguntas que têm da produtividade, do que tem no questionário. A Comunidade não participa”. Enf. N

A permeabilidade e a capilaridade, ou seja, a capacidade em alcançar os indivíduos que

compõe a comunidade e captar suas demandas individuais e coletivas, bem como compartilhar

informações e decisões, tornam-se necessárias para alcançar força política (CARVALHO, 2007).

Foi raro o relato de comportamentos que procurassem aumentar a permeabilidade e a

capilaridade do processo de concessão do incentivo por parte dos presidentes das Associações

de Moradores.

“Segundo o presidente da Associação (pausa), ele reúne algumas pessoas, não sei se ele está fazendo isso como ele deveria fazer? Reúne algumas pessoas e aí pergunta como é que está o atendimento no Posto, e, de acordo com o que as pessoas falam, é que ele dá a nota. E isso é o que ele fala. Tem umas até assinadas pelas pessoas, tudo direitinho, com o telefone”. Enf. J

Algumas falas dos enfermeiros sugerem que o conteúdo e a forma do processo de

concessão do incentivo podem estar contribuindo para o afastamento de muitas pessoas das

comunidades da avaliação instituída com o incentivo e, até mesmo, desânimo dos profissionais

por saberem que algumas questões estão fora de sua governabilidade direta.

“Mas eu acho que, com o passar do tempo, a Comunidade foi tendo algumas resistências, e aí começavam a apresentar na avaliação resultados não tão positivos como era esperado para o exercício do nosso trabalho, talvez até em função de questões como: avaliar a estrutura física, a estrutura física, por exemplo [...] isso foi desanimando um pouco a equipe”. Enf. A

“Bom, em relação ao incentivo, alguns itens que eu acho que devem ser mudados. Alguns tipos de perguntas ali eu acho que deveriam ser mudadas. São repetitivas e todos já sabem a resposta: tem sinalização, tem conforto, etc. Ninguém aguenta mais, acho que nem a comunidade”. Enf. C

A instituição do incentivo abalou o poder exclusivo dos profissionais sobre a forma de

prestar cuidados de saúde e ampliou esta responsabilidade para a comunidade por meio de

seus representantes (Associação de Moradores). Entretanto, nas falas descritas, notamos que

este espaço se reduziu significativamente na medida em que a participação não ultrapassou as

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formas tradicionais de representação (JACOBI, 2002), bem como a maioria dos indivíduos

não assumiu responsabilidades dentro de suas comunidades (GOHN, 2007) em relação à

atenção a saúde.

4.2.2 Categoria 2. O incentivo como fator de mudança na prática das equipes de

saúde da família:

A dinâmica do processo de concessão do incentivo de resolutividade implica a

autoavaliação da equipe e avaliação pela comunidade das ações desenvolvidas pelas unidades

de saúde da família.

“[...] tem o questionário direcionado a autoavaliação da equipe e o questionário para avaliação da comunidade feita pela Associação de Moradores [...]”. Enf. A

Existe diferença entre os valores da autoavaliação da equipe e da avaliação pela

comunidade, garantindo uma discriminação positiva que facilita o controle social das ações

de saúde (CARVALHO, 1977 apud GUIZARDI e PINHEIRO, 2006, p. 800). Assim, a

população detém o maior valor na pontuação no processo de concessão do incentivo de

resolutividade. As questões avaliadas pela comunidade representam 60% do valor financeiro

máximo destinado aos profissionais. Desta forma, a autoavaliação dos profissionais representa

40% do valor máximo.

“Tem um valor de 40 pontos, o da população tem de 60 pontos. A gente junta essas duas notas, obtém uma média e preenche o que a gente chama de Relatório de Incentivo de Produtividade”. Enf. F

“Esse incentivo que a gente recebe, é feita uma avaliação que são de dois tipos, uma da Associação de Moradores que vem uma pontuação de 60 pontos e a outra parte que é de 40 pontos da equipe do módulo de saúde da família”. Enf. N

“Olha, o incentivo é concedido a partir da avaliação do presidente da Associação dos moradores e a avaliação do Módulo também. Só que a maior parte da produção é ele que vai avaliar, que é 60% [...]”. Enf. O

“Na verdade, essa concessão se faz a partir de dois questionários: um feito pela presidente da Associação de moradores, é um questionário que vai de 0 a 60 pontos, e

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um questionário que o Enfermeiro preenche de 0 a 40 pontos; somados perfazem 100 pontos”. Enf. Q

“[...] sendo que a Comunidade como ela tem 60% da parte da produtividade, a gente fica na mão da Comunidade” [...]. Enf. S

“[...] foram pensados e instituídos dois questionários, um valendo 40% da nota que ficava a cargo de uma autoavaliação, que a Equipe sentava e fazia essa avaliação, e o outro é da responsabilidade da Presidência da Associação de moradores local, que deveria reunir com a Comunidade e perceber o que a Comunidade está sentindo, o que que ela acha e fazer uma avaliação; esse tem o peso de 60% da nota, e somando-se as duas avaliações a gente tem o valor que vamos receber de incentivo, que poderá ser 100% ou até não receber nada”. Enf. Y

Este processo levou as equipes à rotina de avaliação das ações desenvolvidas. Os

discursos apontam para um processo, ainda que incipiente, de construção de consensos. Fica

evidente a ausência de movimento que integre o processo de autoavaliação das equipes de

saúde da família à comunidade. Com isso, as equipes deixam escapar a oportunidade em

“estimular e fortalecer o protagonismo dos cidadãos em sua colaboração e implementação,

ratificando os preceitos constitucionais de participação social” (BRASIL, 2006d, p. 11).

“Este questionário da unidade é uma avaliação do módulo [...] como a gente produz, a respeito das consultas, a respeito das visitas dos ACS e junto com equipe a gente senta pra fazer toda essa avaliação [...]”. Enf. D

“Olha, pra se conseguir esse incentivo, a gente tem de preencher alguns questionários: Um é preenchido pela Equipe dentro da Unidade, numa reunião entre os profissionais, eles chegam a um consenso, respondem aquelas perguntas [...]”. Enf. F

“E como é feito o processo: aqui na Unidade a gente senta, faz uma reunião de equipe, onde a gente pontua cada item, a gente vai marcando e no final todos assinam”. Enf. H

“Primeiro eu vou falar do Módulo que é feito reunião de Equipe; a gente senta com os profissionais, Agente Comunitário, Enfermeiro, Médico, e a gente avalia o questionário dos profissionais”. Enf. L

“Internamente era feito uma reunião de Equipe e o preenchimento de todas as fichas, porque tinham que cumprir, e havia uma avaliação do cumprimento dessas metas, se foi boa, se não foi, se era necessário melhorar; e com isso havia discussão de caso [pausa] era bem produtivo”. Enf. O

A equipe de saúde da família sofre interferência no processo de concessão do

incentivo de fatores que acredita estar fora de sua governabilidade. Não identificamos nas

falas que as equipes extrapolaram e aproveitaram a dimensão do cuidado direto para

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avançarem, como sujeitos, na direção da mobilização social que envolva a comunidade “no

processo de instituição da saúde como direito de cidadania, tendo o financiamento público da

saúde como um dos pontos centrais” (BRASIL, 2006e, p. 02).

“[...] avaliar a estrutura física, por exemplo, a estrutura física era criticada e a Equipe não tinha como estar resolvendo esse problema [...]”. Enf. A

“[...] mas, eu acho, em relação ao questionário, que está meio arcaico, não é? Aquelas questões lá, você vem pensando, tem muitas coisas que não dependem da Equipe”. Enf M

A satisfação individual parece fechar a relação entre a equipe de saúde da família e a

comunidade, bem como fortalecer o papel da equipe mais para uma ação do cuidado

individual descolado da possibilidade de mobilização social. O indivíduo busca o serviço de

saúde a partir de um desejo ou necessidade de ação de saúde que se encerra em si mesmo, ou

seja, a saúde como um simples ato de consumo de qualquer outro gênero. Assim, não

percebemos a construção de uma relação de corresponsabilidade de caráter permanente com o

desenvolvimento da atenção à saúde enquanto um ato de construção de cidadania (LEFÉVRE,

1992).

“Acredito que sim! Ficaram mais atentos. Ficaram mais preocupados se estavam agradando a Comunidade ou desfazendo. Acho que sim. O perfil mudou um pouco do profissional, ficou mais envolvido com isso”. Enf. I

“Quando eles acham: Ah, eu queria ser consultado hoje! A gente aumenta a agenda <risos>. Aumenta a agenda. Tem de ter jogo de cintura para que eles saiam daqui satisfeitos” <risos>. Enf. M

“Melhorou, eu acho que melhorou. Nessa avaliação, teve paciente sim, que antes saía da consulta e reclamava: Ah, foi uma consulta muito rápida, a médica não me deu muita atenção! Agora não, agora diz que o Médico está dando mais atenção ao paciente”. Enf. N

A despeito disso, os enfermeiros consideram que a concessão do incentivo impactou

na equipe, principalmente, em relação ao número de faltas e em relação ao alcance das metas

quantitativas.

“Houve modificações sim. Cada categoria dentro da sua atividade, na verdade tinha até uma certa preocupação em relação a isso. Por exemplo, Agente Comunitário: Ah, se eu fizer mais visitas eu vou ter um incentivo aumentado. Vamos logo fazer minhas visitas. E aí tinha aquela preocupação de estar cumprindo o seu dever, mas também

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não garante que essas visitas tenham melhora na qualidade. Mas cada um dentro da sua função começava a se preocupar a fazer da melhor forma para que aquele incentivo chegasse no 100% no caso”. Enf. A

“Houve que o índice de faltas foi a praticamente zero. Atestados, zero. Todo mundo, ninguém mais levou atestado. Ninguém mais ficou doente, impressionante! E nem faltou”. Enf. B

“É, eu acho que melhorou de sentido de atestado, entendeu? Tinha caso de apresentar atestado com uma certa frequência que às vezes atrapalhava alguns profissionais, atrapalhava o funcionamento da Unidade, e agora não”. Enf. H

“Depois desse incentivo teve uma coisa boa, a falta diminuiu, os funcionários não faltam mais, não tem mais atestado médico, é raro ter um atestado médico, porque se você faltar ou tiver uma licença médica você perde aquela produtividade, perde a gratificação, então, praticamente, a gente não mais falta por licença médica”. Enf. N

“E, então, até as faltas diminuíram. Eu não vejo aquele servidor que não tem incentivo, que pode botar atestado. Eu já ouvi os funcionários falarem que é direito do funcionário botar atestado. E, realmente, a perícia é só a partir de 4 dias postos, então, é só colocar atestado e vai abonar a falta. Isso acontece muito, não é pouco e eu acho que só a produtividade melhorou um pouco”. Enf. O

Interessante é a constatação por meio de algumas falas, que os enfermeiros julgam

insuficiente o valor de acréscimo proporcionado pelo incentivo aos agentes comunitários de

saúde e auxiliares de enfermagem. Assim, consideram que existe um forte senso de

comprometimento dessas categorias.

“[...] mas a satisfação do Auxiliar de Enfermagem e dos Agentes Comunitários de Saúde, esse incentivo não era a questão, era mais o comprometimento dele com o serviço que a gente envolvia no trabalho do que o próprio incentivo financeiro. Porque era pequeno, então para eles não era muito válido, não acrescentava muito na vida deles, não é? Seria mais envolvimento no trabalho mesmo, mas agora como incentivo, não!” Enf. P

“Os agentes comunitários ganham muito pouquinho e não sei se faz diferença”. Enf. M

Não percebemos que o incentivo tenha sido um potente mobilizador das equipes de

saúde da família para aproximar o SUS real do SUS normativo (MENDES, 2004). Tendo em

vista que mesmo que tenha instituído uma relação parcial de subordinação das equipes de

saúde da família à comunidade, por meio de sua representação (Associação de Moradores), as

falas não demonstram que o incentivo foi suficiente para ampliar a democratização do

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processo de gestão (BRASIL, 2006a) na direção do paradigma democrático-radical (GOHN,

2007).

4.2.3 Categoria 3. O trabalho dos enfermeiros de saúde da família a partir da

concessão do incentivo.

Os enfermeiros de saúde da família entrevistados, maciçamente, não participavam ou

nunca participaram de vida associativa. Este não engajamento em atividades associativas é

um dos elementos apontados por Labra (2007), que fragiliza os canais de participação;

entretanto, o incentivo parece forçar um deslocamento destes profissionais na direção da

busca do diálogo coletivo.

“Então, por conta de a gente estar ali tendo que atender o que eles querem, porque tem por traz disso o incentivo, a gente imediatamente: ah!, vamos fazer uma reunião na terça”. Enf. A

“Então, a gente sempre falava: olha, quando tiver uma reunião com a comunidade chama a gente, que era uma das questões do questionário [...]”. Enf. B

“Porque no questionário é perguntado, não só uma pergunta, mais, se a gente participa de reuniões sempre na comunidade, se isso acontece, então esse incentivo acaba fazendo com que a gente possa ficar mais presente dentro da comunidade”. Enf. D

“Acaba tendo mais interesse pela Comunidade também. Por que você não sabe o que pode acontecer numa reunião, falar uma coisa do povo e você está ali próximo. Às vezes eles convidam. Eu acho que facilitou essa troca. Facilitou sim, com certeza”. Enf. H

“Para o meu trabalho, desde que foi implementado esse questionário a gente acabou ficando mais participativo”. Enf. I

Outra questão relevante é o protagonismo dos enfermeiros no processo de

concessão do incentivo. É manifesta em suas falas a centralidade que os enfermeiros têm na

organização do processo de concessão do incentivo.

“Olha, na realidade quem está de frente mesmo em relação ao fechamento disso é o enfermeiro”. Enf. C

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“Fica sob minha responsabilidade a organização dessa avaliação junto à equipe”. Enf. I

“Quem fica responsável por tudo isso sou eu”. Enf. J

A despeito desse protagonismo, observa-se que os enfermeiros se preocupam bastante

com a questão do cumprimento de metas e respostas às queixas individuais. Assim, existe

uma relevante oportunidade de melhoria da dimensão do cuidado (BRETAS e DUARTE,

2000), mesmo individual, para superação do enfoque exclusivamente biologicista

(OLIVEIRA e MARCON, 2007) e atuação mais ampla na complexidade do processo saúde-

doença que envolva o trabalho, as relações sociais, culturais, políticas e ambientais

(TANCREDI et al, 1998).

“Também, há a determinação em alcançar aquelas metas por conta do incentivo”. Enf. B

“Então, eu comecei a ver que eram queixas que eram assim muito fáceis de resolver. [...] Como vou mudar um pouco do percentual que não passa de 80% para 100%”. Enf. I

“Tento resolver o máximo de problemas para não deixar que eles reclamem”. Enf. N

Em algumas falas, percebemos que a centralidade no processo de concessão do

incentivo contribuiu para aumentar a sobrecarga de trabalho dos enfermeiros. A sobrecarga

de trabalho no estudo de Santos e Wendhausen (2003) foi apontada como um dos fatores

limitantes à ampliação das práticas de participação. Neste sentido, a Estratégia de Saúde da

Família, por ampliar a complexidade da atenção à saúde, trouxe, por um lado, mais

reconhecimento e um perfil bem mais delineado para o enfermeiro (CZERESNIA e

FREITAS, 2003), mas, por ouro lado, tem demonstrado que assumir funções assistenciais e

administrativas da equipe de saúde da família; inquestionavelmente, impõe sobrecarga de

trabalho.

“Agora quando você assume numa unidade duas funções, poxa, aqui eu vou prestar assistência e vou ser gestora da unidade [...] é uma responsabilidade muito grande que você tem [...] e mais o incentivo”. Enf. A

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“Eu considerei uma maior sobrecarga por conta da parte administrativa, porque na verdade o incentivo do Enfermeiro é atrelado à parte administrativa e não assistencial como a dos outros profissionais. Então, além da parte assistencial que a gente teve sempre que dar conta e atingir também as metas, a gente também tinha toda essa parte administrativa que a gente tinha que fazer sozinho”. Enf. B

“Olha, sobrecarregou realmente a parte administrativa, o enfermeiro acabou ficando bem sobrecarregado. Mas, de qualquer forma, eu acho que foi produtivo porque a autoavaliação é sempre produtiva, a gente cresce com isso”. Enf. P

A grande maioria dos enfermeiros reconhece claramente que o incentivo trouxe

mudanças no seu processo de trabalho no dia-a-dia da equipe de saúde da família; porém,

podemos identificar discursos que, inicialmente, negam a mudança, mas sequencialmente

reconhecem algum grau de modificação. As falas, entretanto, não sugerem claramente

grandes avanços na direção de uma prática de enfermagem que agregue valor ao

desenvolvimento da autonomia dos indivíduos (HENRIQUES, 2005).

“Para mim foi uma experiência nova no sentido não só da prática do enfermeiro, mas no conhecimento da comunidade, como conduzir, como planejar as ações e o controle das ações”. Enf. A

“Eu acho que uma dedicação maior [...]. Muita coisa eu já fazia antes, mas muita coisa eu passei a fazer por conta do incentivo”. Enf. B

“Em relação ao meu trabalho é um estímulo [...] que me ajudou a questionar o que eu estava faltando”. Enf. C

“A gente acaba ficando mais interessada”. Enf. D

“Não! Continuo funcionando na minha rotina normal [...]. Trouxe sim! Porque de repente um mês que você não tá muito a fim de cumprir com todas as metas, e aí você pensa na parte financeira [...] vou cumprir”. Enf. M

Para alguns enfermeiros, parece tabu avançar na direção do desenvolvimento da

autonomia do indivíduo por meio do desenvolvimento do estímulo à consciência crítica.

Aproveitar o processo de concessão do incentivo como abertura para adentrar no espaço local

de atenção à saúde individual ou coletiva como um “lócus privilegiado de captação e

formulação de demandas em saúde por parte da população” (ACIOLI, 2005, p.293) representa

risco para alguns enfermeiros.

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“Não! Nunca pensei em falar do incentivo não! Porque eu acho que é mexer em casa de marimbondo [risos]. Sabe! Eu não estou podendo me estressar não! Sou hipertensa! Vou comprar uma briga feia com presidente da Associação de Moradores”. Enf. M

“Eu explico do incentivo que eles têm que participar, mas a presidente da Associação não gosta e eu passo um bom bocado”. Enf. Y

Por um lado, os enfermeiros reconhecem a captura do poder comunitário pelo

presidente de Associações de Moradores. Por outro lado parecem não reconhecer que a

comunidade é capaz, também por meio do desenvolvimento das ações de saúde, de

desenvolver sua autonomia. O discurso cristaliza cada indivíduo, a comunidade e suas

lideranças numa esfera de menos valia em virtude do acesso ao ensino formal, expressando o

mito da produção do conhecimento a partir, exclusivamente, da formação superior (VALLA,

2001, p. 03).

Muitos profissionais apresentam dificuldades em entender seja a prática ou a fala dos

indivíduos que compõem as classes populares. Valla (2001, p. 02) afirma que “se trata da

dificuldade em aceitar que as pessoas “humildes, pobres, moradores da periferia” são capazes

de produzir conhecimento, de organizar e sistematizar pensamentos sobre a sociedade, e gerar

uma interpretação que contribui para a avaliação dessa sociedade”.

Nas falas dos enfermeiros entrevistados, o saber técnico cria um espaço entre os que

entendem de saúde e os que nada sabem e, consequentemente, não são habilitados a pensar e a

propor mudanças (GUIZARD e PINHEIRO, 2006).

“Eu acho que a Comunidade não tem a capacidade, o senso crítico, para julgar o profissional nas ações dele mesmo no trabalho, ele pode julgar o atendimento mas enquanto técnico ele não tem essa capacidade. Então acho que esse questionário poderia ter primeiro uma avaliação de uma corporação técnica, um conjunto de pessoas técnicas, da Fundação de Saúde, da Secretaria de Saúde, para que eles pudessem avaliar o profissional, se ele está produzindo, se não está, quantos atendimentos ele tem num mês”. Enf. D

“[...] tem muita gente analfabeto funcional, não entendem as perguntas, as respostas [...]”. Enf. M

“Olha, a gente se dá super bem com o presidente da Associação de Moradores, mas eu acho que tinha de ser uma outra forma de avaliação, nem que fosse com um enfermeiro supervisor, ou alguém que tivesse capacidade de avaliar realmente o que

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está acontecendo e não uma pessoa que às vezes não tem nem um segundo grau e quer ouvir e interpretar do jeito dele às vezes, não é” ? Enf. O

“[...] os presidentes das Associações de Moradores têm uma dificuldade muito grande em lidar com esse instrumento, com essa ferramenta de avaliação. Dificuldade mesmo por falta de escolaridade, escolaridade mesmo, propriamente dita”. Enf. Q

“[...] Presidentes das Associações que na maioria das vezes são pessoas muito leigas, semianalfabetas e não tem conhecimento de estrutura, de funcionamento, de saúde, do que é necessário [...]”. Enf. Y

Entretanto, observamos que alguns enfermeiros lançam mão de estratégias de acessar

a opinião das pessoas que buscam a unidade de saúde da família. Tal tática, mesmo que

focada na queixa e represente, inicialmente, uma redução do diálogo (pessoa-livro-

profissional), torna-se uma forma efetiva para mudança e, em alguns casos, recuperação do

diálogo pessoa-profissional.

“Nós colocamos à disposição da Comunidade um livro onde eles podiam fazer suas críticas e tivessem uma participação maior com relação à atividade da equipe de profissionais multidisciplinares. Foi uma ótima medida porque aí sim ela tem como fazer suas queixas e ter uma participação efetiva e que finaliza essa necessidade de melhoria e onde melhorar”. Enf. Q

“Ele (agente comunitário) começou a fazer o livro Ata e começou a trazer esses nomes pra mim, das pessoas que reclamavam, e eu comecei a chamar as pessoas aqui para saber o que tinha acontecido. Eram coisas mínimas pra eu resolver, entendeu?” Enf. I

Constatamos avanços, ainda que incipientes, na utilização dos espaços de cuidar e

educar para a saúde. As atividades de grupos como estratégias de empoderamento dos

participantes são factíveis na rotina das equipes de saúde da família (CAMPOS e

WENDHAUSEN, 2007) e ampliam a participação do enfermeiro na organização comunitária

(OLIVEIRA e MARCON, 2007; JESUS et al, 2008) pela experiência de oportunizar falas e

sugestões sobre as questões que envolvem a atenção à saúde.

“Mas, eu como gerente da Unidade, eu faço as reuniões periódicas para avaliação na Comunidade. A gente tem o grupo de hipertensos, o grupo de gestantes, o grupo de diabéticos, esses grupos eles também têm espaço para estarem falando e sugerindo as coisas”. Enf. Y

“O que a gente sempre fazia muito era Educação em Saúde na Igreja Católica e na Igreja da Assembleia. A gente tinha esse espaço, através dos próprios integrantes da Igreja que fornecia esse espaço pra gente. Então o nosso vínculo que a gente fazia com a Comunidade eram os grupos que a gente fazia muito. Educação em Saúde, palestras, Dia Internacional da Mulher, Dia da Criança, a gente aproveitava essas datas pra fazer

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Educação em Saúde e depois fazia uma confraternização e falava de tudo, era bem legal”. Enf. B

O incentivo fez com que os enfermeiros de saúde da família, no período do estudado,

tencionassem uma maior aproximação com a comunidade, em condição, entretanto, não só

apenas de cuidador-cuidado, mas de avaliado-avaliador. Com efeito, emergiu um novo

contexto repleto de novas possibilidades e conflitos que refletem os comportamentos dos

enfermeiros variando entre dois polos: ações mais focadas em queixas e demandas individuais

e ações que contribuem para elevar a capacidade de organização comunitária. É certo que,

voluntariamente ou não, os enfermeiros angrenses com o processo de concessão do incentivo,

assumem a centralidade dentro da equipe de saúde da família das ações de participação no

controle social em saúde no nível local.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao analisar o processo de concessão do incentivo, devemos considerar que o exercício

da participação e controle social na prática brasileira teve contornos de individualidade

lapidados por anos de colonização, de ditadura militar e forte influência da ideologia

neoliberal.

Tais aspectos devem ser considerados na análise da dificuldade de associação em

torno de causas coletivas, da baixa permeabilidade das instâncias de participação/controle

social e das práticas de gestão que não valorizam as decisões das instâncias de participação e

controle social, bem como sabotam sua ação pela estratégia de cooptação.

O processo de concessão do incentivo não transparece âncora ideológica ou uma

normativa mais ampla, a despeito de sua implantação ter acontecido no mesmo ano da edição

do Pacto pela Saúde. Este pacto busca retomar a mobilização da sociedade para o controle e

formulação da política de saúde (BRASIL, 2006e), e o incentivo conferiu poder decisório às

comunidades adscritas às unidades de saúde da família.

Assim, o incentivo representa um potente estímulo para a mobilização social em nível

local, atendendo ao Pacto pela Saúde. Contudo, nos parece precipitado afirmar que a

instituição do incentivo se relaciona à edição do pacto, em virtude da carência de elementos

característicos nas falas dos entrevistados.

Diante deste horizonte, emerge a necessidade de ampliar a discussão desta questão

com o intuito de conhecer com mais profundidade se esta experiência na gestão municipal se

refere à vontade política de consolidação da democracia participativa na saúde.

A partir deste ponto, pode-se definir estratégias que potencializem e integrem o

processo de concessão do incentivo a um conjunto de ações para o fortalecimento do controle

social em saúde no âmbito municipal. Uma das estratégias pode ser pensada a partir do

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próprio processo de concessão do incentivo, pois este envolve lideranças comunitárias,

profissionais e gerentes das unidades de saúde da família.

Com isso, o desafio que se apresenta à Política Municipal de Saúde é definir projeto

que qualifique e reúna essas forças (profissionais de saúde, representante dos gestores e

comunidade), coloque-as em espaço comum, discuta os problemas locais e institua consensos

deliberativos, respeite dissensos e, principalmente, amadureça o processo avaliativo instituído

pelo incentivo.

Algumas mudanças a partir do processo de concessão do incentivo foram reconhecidas

pelos enfermeiros, como a redução de faltas dos profissionais; respostas mais imediatas às

demandas dos usuários; adoção da autoavaliação e preocupação com as metas quantitativas.

Certamente, ao terem reconhecido o comprometimento dos auxiliares de enfermagem

e dos agentes comunitários de saúde e o baixo valor do incentivo pago a estas categorias, não

estavam reconhecendo, necessariamente, que o valor do incentivo fosse satisfatório para os

enfermeiros.

Ao mesmo tempo, pode se inferir que não existe uma relação diretamente proporcional

entre as três variáveis (valor do incentivo-comprometimento-satisfação). Diante disso, deve-se

alertar que o incentivo apresenta limites para o alargamento do comprometimento e da

satisfação profissional.

Consequentemente, devemos olhar para os profissionais dentro da dinamicidade do

contexto histórico e cultural, visando entender como eles formam e expressam suas emoções

(BONET, 2005) e adotar outras estratégias que incidam nas variáveis: comprometimento e

satisfação.

O processo de incentivo trouxe para as Associações de Moradores sua

institucionalização em nível local como estrutura efetiva de controle social em saúde;

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entretanto, expressou muito mais a consolidação das distorções da democracia representativa

do que a construção de caminhos para subversão ou aprimoramento desta relação.

A despeito disso, a experiência do processo de concessão do incentivo demonstrou a

força potencial deste tipo de estratégia para a ampliação da participação social, uma vez que

conferiu materialidade, mesmo que focada na queixa e nas necessidades individuais, às falas e

demandas dos indivíduos das comunidades adscritas às equipes de saúde da família.

O contexto expresso pela materialidade (“discriminação positiva”) do atendimento das

demandas individuais, por meio da “barganha” ou por meio da alteridade cooptada, presentes

em algumas equipes de saúde da família, deverá ser superado. Essa lógica não conseguiu

reproduzir, mesmo que por efeito somatório, a satisfação das necessidades de caráter coletivo,

pois não percebemos que tenha se revertido em desenvolvimento da atenção à saúde.

A existência do espaço “institucional” para opinar e deliberar dos indivíduos das

comunidades é ocupado pela Associação de Moradores. Essa apropriação é delegada,

entretanto delegar pode ser um ato decorrente da incapacidade de entendimento da

importância do processo de concessão do incentivo para a efetivação da saúde enquanto

direito de cidadania.

Com efeito, o ato de delegar pode ser decorrente de um déficit de educação (lato

sensu) para a cidadania, e não apenas um ato de vontade consciente, um ato de

irresponsabilidade com a comunidade ou de conformismo. Valla (2001, p. 03) alerta que

“aquilo que, frequentemente, para o profissional é conformismo, pode ser, para a população,

uma avaliação rigorosa dos limites de melhoria”.

Ainda, em relação à participação, não podemos desconsiderar a complexidade imposta

pela ocupação territorial, pelas dimensões populacionais, pelas relações de trabalho, pela

convivência familiar, pelas assimetrias de ter e poder, etc. Assim, a dimensão da história de

vida e de trabalho dos indivíduos, da complexidade do mundo moderno e do entorno devem

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ser consideradas pelas equipes, não só no sentido do cuidado, como também da participação e

controle social em saúde.

Também, a falta de interesse em participar pode estar relacionada à associação que a

população faz entre os profissionais e as autoridades. Muitas vezes, a descrença da população

nos governantes pode ser estendida aos profissionais por julgar que a proposta destes está

atrelada “às autoridades das quais ela, em geral, descrê” (VALLA, 2001, p. 03).

Considerar tais aspectos, efetivamente, contribuirá para identificar as diversas formas

de representações e visões de mundo, visando um diálogo e uma prática que permita a

ampliação da participação sob as diversas formas e nos diferentes espaços deliberativos.

Observamos que em muitos casos não é a Associação de Moradores que ocupa o

espaço de deliberação, mas o presidente da Associação de Moradores. Também, ficou

evidente que o incentivo reforçou a herança autoritária da cultura brasileira (HOLANDA,

1995; LAHUERTA, 1999) na relação cotidiana dos presidentes das Associações de

Moradores com as equipes de saúde da família.

O paradoxo é que o incentivo gerou comportamentos permeados por interesses

corporativos e, ao mesmo tempo, movimentou a equipe de saúde da família para maior

aproximação da comunidade, em virtude de esta ter acesso ao poder potencial de interferir na

remuneração dos profissionais da equipe.

O processo de concessão do incentivo transpareceu uma relação de consumo de ações

e serviços de saúde (LEFÉVRE, 1992) por parte dos indivíduos da comunidade e da equipe de

saúde da família. Desta forma, a participação dos indivíduos da comunidade, principalmente

na formulação da política municipal de saúde a partir do âmbito de cada unidade, parece ter

sido pouco expressiva.

A participação dos indivíduos da comunidade e da equipe, considerando as falas dos

enfermeiros, tendeu a se reduzir aos resultados do cuidado focado, principalmente no

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atendimento às queixas e necessidades individuais daqueles e cumprimento de metas por parte

desta. Desta forma, a concessão do incentivo parece minimizar o conflito entre a categoria

previsão e a categoria provisão.

A categoria previsão é prioritária para o profissional de Saúde da Família e desloca o

seu olhar para a ideia de prevenção e, consequentemente, para o futuro. A categoria provisão

está presente em parte da população na qual “a lembrança da fome e das dificuldades de

sobrevivência, enfrentadas no passado, faz com que o olhar esteja voltado para o passado e

preocupado em prover o dia de hoje” (VALLA, 2001, p. 03).

A conciliação entre essas duas categorias se dá em virtude de o processo de concessão

do incentivo financeiro fazer as equipes tencionarem o atendimento do hoje, ao mesmo tempo

em que contribui para os membros da equipe aumentarem sua capacidade de consumo. Assim,

as duas partes da relação (usuário-profissional de saúde) alcançam a satisfação de desejos

mais imediatos em relação às necessidades humanas mais elementares (fisiológicas e

segurança).

Entretanto, o que parece uma relação perfeita, na verdade, expressa uma focalização

que mantém ambas as partes no mesmo lugar, ou seja, um ciclo vicioso representado pela

função produção-consumo. Tal ciclo, mais que uma especificidade local, é a expressão de um

padrão social de consumo no qual tudo é mercadoria, caracterizado pelo exagero, alienação e

desigualdade.

Consequentemente, a focalização nas necessidades mais elementares e as

características ambientais (culturais, sociais e políticas) interferem na capacidade

motivacional do trabalho. Isto demonstra que é necessário avançar na escalada para a

satisfação de outras necessidades humanas: associativas, ego-status e autorreconhecimento

conforme demonstrado por Maslow (1954 apud SAMPAIO, 2009).

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Neste sentido, o trabalho em saúde pode contribuir. Assim, devemos agregar valor ao

padrão de socialização instituído pelo incentivo por meio da adoção de novas práticas de

planejar, avaliar e cuidar no âmbito das equipes de saúde da família, escapando tanto da

relação de consumo que reduz a saúde a um objeto como da focalização no atendimento às

necessidades mais básicas.

Neste cenário da focalização nas necessidades elementares e do padrão social de

consumo atual, a exclusividade do enfoque biológico apresenta maior aderência. Também,

essa exclusividade é orgânica aos ambientes com maior grau de distorção do sistema

democrático-representativo ou de sistemas antidemocráticos (SILVA, 2006;

GALLEGUILLOS e OLIVEIRA, 2001).

Atuar sobre a doença a partir, exclusivamente, do enfoque biológico apresenta

sintonia com o padrão de consumo atual e com a focalização do atendimento às necessidades

básicas, bem como risco desprezível para a elevação da consciência crítica.

Assim, alguns enfermeiros parecem se resguardar; ou seja, ao se restringir à execução

das atividades assistenciais e educativas que se afastam da reflexão social e política no

processo de saúde-doença, o profissional não desperta o incômodo das lideranças

comunitárias. Tal situação representa para a liderança o seu reconhecimento como a única

forma legítima de acessar a comunidade. Com isso, os enfermeiros evitam os possíveis

conflitos decorrentes de uma prática que contribua para a elevação da cidadania.

Outros enfermeiros, pelo contrário, ocupam os espaços do cuidado superando essa

lógica e avançam na direção do empoderamento das pessoas adscritas às unidades de saúde da

família e assumem os riscos. Desta forma, estão agindo sob a égide do Código de Ética da

Enfermagem por garantir a “[...] preservação da autonomia das pessoas [...]” no exercício de

sua prática (COFEN/COREN-RJ, 2005, p. 108).

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Evidencia-se, além daqueles enfermeiros que se protegem por meio de uma atuação

mais focada na resposta para uma doença e aqueles que tornam o espaço do cuidado um

ambiente de ampliação da consciência crítica, uma lacuna.

Esta lacuna refere-se àqueles que não identificamos em nenhum dos grupos. Para

todos, a reflexão sobre a inter-relação dos recortes históricos da dimensão social, política e

cultural do mundo, do país, das políticas de saúde e da enfermagem deve ser,

permanentemente, resgatada.

Neste sentido, a construção deste processo ensino-aprendizagem deverá acontecer a

partir do estudo do “problema dentro do contexto do cuidado e por meio de um processo

interativo” (SOUSA et al, 2008, p. 112). Assim, apresentará condições para a construção de

“significados para o exercício profissional que se aproximem do cuidado integral, capaz de

centrar-se no usuário, em seu acolhimento, na responsabilidade com a saúde e

desenvolvimento da sua autonomia” (HENRIQUES, 2005, p. 151).

A sobrecarga de trabalho faz parte da realidade dos enfermeiros de saúde da família

entrevistados. Queixam-se do acúmulo das responsabilidades administrativas das unidades

com as responsabilidades assistenciais do cargo de enfermeiro de saúde da família. Nesta

realidade, alguns enfermeiros apontam como mais um fator de sobrecarga a responsabilidade

pelo processo de concessão do incentivo dentro das equipes de saúde da família.

Tal situação deve ser oportunizada pelos enfermeiros no sentido de delinear seu papel

tanto na esfera administrativa como na área assistencial com o objetivo de fortalecimento da

identidade profissional no município (CZERESNIA e FREITAS, 2003).

Para isso, a força quantitativa do grupo deve ser percebida no cenário político local, e

a força identitária, reconhecida como prática assistencial autônoma de relevância pela

população; ou seja, é primordial um projeto político-assistencial dos enfermeiros angrenses.

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Além disso, a oportunização dos fóruns da saúde para propor o aumento do número de

profissionais de enfermagem para ampliação da equipe básica da estratégia de saúde da

família poderá impactar, não somente, na sobrecarga de trabalho do enfermeiro de saúde de

família, mas na qualidade da atenção à saúde.

Outra questão relevante para minimizar o problema da sobrecarga de trabalho são as

disposições contidas na Portaria GM/MS Nº 648 de 28 de março de 2006, tendo em vista que

esta normatização imputa às competências das categorias profissionais da equipe da Estratégia

de Saúde da Família e Saúde Bucal (BRASIL, 2006c).

No contexto instituído pelo processo de concessão do incentivo, desenvolveu-se uma

nova realidade para as relações que constituem a atenção à saúde da família em Angra dos

Reis. Neste cenário, o enfermeiro e a equipe de saúde da família são expostos às exigências e

condições de ampliação da comunicação e ao respeito mútuo com a comunidade.

Este é um aprendizado diário que alicerça a qualidade do cuidado e, progressivamente,

se configura em uma relevante experiência de participação para tornar esse espaço um “lócus

privilegiado de captação e formulação de demandas em saúde por parte da população”

(ACIOLI, 2005, p.293).

Em relação ao saber técnico, devemos ampliar o foco da questão quando a abordamos.

É certo que o saber técnico é utilizado para delimitar espaço no encontro e confronto com o

senso comum. Por outro lado, não devemos desprezar que os aspectos que envolvem a

avaliação de desempenho vão para além da prontidão do atendimento.

Assim, o saber técnico no contexto da realidade instituída com a concessão do

incentivo representa, também, uma forma de externar e preencher a necessidade de

valorização dos outros aspectos da avaliação de desempenho ausentes ou poucos expressivos

no processo de concessão do incentivo.

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Talvez, o ressentimento que os enfermeiros apresentaram nas falas fosse um clamor

para que os outros aspectos da avaliação do desempenho fossem igualmente valorados. Dentre

outros, a qualidade técnica, a capacidade de cuidar dentro das limitações do custo e a

capacidade de inovação tecnológica na atenção a saúde poderiam figurar como outros

aspectos na perspectiva dos enfermeiros. Desta forma, o processo de concessão e o próprio

incentivo poderiam ser qualificados.

A despeito das limitações que envolveram a comunidade, a equipe e os enfermeiros de

família, acreditamos que a qualificação do processo de concessão e do próprio incentivo

poderá contribuir para a consolidação da Estratégia de Saúde da Família como um espaço de

bem-estar social e de saúde.

Para isso, se faz necessário investir no diálogo ético e político que dê visibilidade à

realidade social das comunidades e relevância não só ao conceito ampliado de saúde

(TANCREDI et al, 1998), mas também à prática do enfermeiro e demais profissionais neste

contexto.

Finalmente, este estudo não tem a pretensão de concluir, mas auxiliar as discussões

sobre o incentivo de resolutividade adotado em Angra dos Reis. A despeito das intenções para

sua adoção, o incentivo se insere no movimento de consenso e dissenso, por conseguinte, no

processo democrático. Decerto, guardará algum grau de incompletude, pois “[...] um princípio

político, em toda época e em todo lugar, presta-se a interpretações diversas e só com a prática

adquire sentido preciso” (GLOTZ, 1980, p.111).

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RECOMENDAÇÕES

Para a gestão de saúde de Angra dos Reis

Definir projetos que qualifiquem a participação da população e do profissional para o

planejamento e avaliação das ações de saúde em nível local, visando a implantação e

efetividade dos Conselhos Gestores e, consequentemente, a melhoria da qualidade da atenção

à saúde por meio da gestão participativa.

Criar incentivo relacionado ao Pacto de Indicadores da Atenção Básica, com vistas a

promover inovações nos processos de gestão e alcançar maior efetividade, eficácia, eficiência

da Atenção Básica no âmbito municipal. Tal incentivo implica a valoração da qualidade

técnica, da inovação tecnológica e de outros aspectos da avaliação de desempenho.

Qualificar a avaliação de desempenho por meio da superação do incentivo em vigor,

utilizando, para, isso um Projeto de Humanização do Atendimento que envolva as

comunidades locais, os profissionais e o Conselho Municipal de Saúde. Esse novo incentivo

seria fruto da certificação periódica das unidades de saúde da família a partir de indicadores

amplamente discutidos e previamente definidos. Assim, instauraríamos na rede de saúde de

Angra dos Reis uma Política Municipal de Humanização e buscaríamos minimizar o viés

autoritário da cultura brasileira presente nas relações cotidianas no âmbito da gestão e das

unidades de saúde da família.

Para os enfermeiros

Valorizar as experiências participativas como uma possibilidade de desenvolvimento.

Tal necessidade, ao ser atendida, contribuirá não somente com a elevação da consciência

crítica da população para promover transformações na saúde, mas, principalmente, com o

projeto político-assistencial a ser desenvolvido pela categoria. Este movimento deve procurar

se integrar à prática de educação permanente fundada na discussão das causas dos problemas

a partir da realidade local.

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Para o ensino da enfermagem

Reforçar, nos cursos de graduação e pós-graduação, de forma não eletiva, a reflexão

sobre a inter-relação dos aspectos dos recortes históricos que envolvam a democracia.

Consequentemente, tratar os fatores limitantes à participação e ao controle social em saúde

para os enfermeiros.

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69. OLIVEIRA, R. G. e MARCON, S. S. Trabalhar com famílias no Programa de Saúde da

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70. PINHEIRO, R. Conselhos Municipais de Saúde: O Direito e o Avesso. 1995. Rio de

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71. POPE C. e MAYS N. Pesquisa qualitativa na atenção à saúde. 118 p. 2ª ed. Porto Alegre: Artmed, 2005.

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72. RIBEIRO, L. C. Q. Desafios da construção da cidadania na metrópole brasileira. Sociedade e Estado., 2007, vol.22, no.3, p.525-544. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/se/v22n3/03.pdf>. Acesso em: 20 jun 2010.

73. RONZANI, T. M. e SILVA, C. M. O Programa Saúde da Família: segundo profissionais

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79. SANTOS, F. R. R. e WENDHAUSEN, À. As práticas de participação popular na

estratégia de saúde da família (ESF): Fatores potencializadores e limitantes. Família, Saúde e Desenvolvimento. Farm. Saúde Desenv. V.5, n. 3, p. 185-192, set./dez. 2003. Disponível: <http://ojs.c3sl.ufpr.br/ojs2/index.php/refased/article/view/8086/5705>. Acesso em: 18 out. 2008.

80. SCHERER, M. D. A. et al. Rupturas e resoluções no modelo de atenção à saúde: reflexões sobre a estratégia de saúde da família com base nas categorias kuhnianas. Interface - Comunicação, Saúde, Educação, Botucatu, SP, v. 9, n. 16, p. 53-66, 2005.

81. SILVA. J. L. L. O processo saúde-doença e sua importância para a promoção da saúde. Informe-se em promoção da saúde, v. 2, n. 1, p. 03-05. 2006. Disponível: < http://www.uff.br/promocaodasaude/o%20process.pdf>. Acesso em: 8 out. 2008.

82. SIRAQUE, V. Controle social da função administrativa do Estado: possibilidade e limites na Constituição de 1998. 230 p. São Paulo: Saraiva, 2005.

83. SOARES, L. T. Os custos sociais do ajuste neoliberal na América Latina. 2ª ed. São

Paulo: Cortez, 2002. 84. SOLLA, J. J. S. P. Avanços e Limites da Descentralização no SUS e o “Pacto de Gestão”.

Revista Baiana de Saúde Pública / Secretaria da Saúde do Estado da Bahia. Salvador, v. 30, n. 02, p. 332-348, 2006.

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85. SOUSA, L. B. et al. Educação, cultura e participação popular: abordagem no contexto da educação em saúde. Rev. enferm. UERJ, jan./mar. 2008, v.16, n.1, p.107-112. Rio de Janeiro: 2008. Disponível em: <http://www.portalbvsenf.eerp.usp.br/pdf/reuerj/v16n1/v16n1a17.pdf>. Acesso em: 11 out. 2008.

86. SPOSATI, A. e LOBO, E. Controle social e políticas de saúde. Cadernos de Saúde

Pública. Rio de Janeiro, v.8, n.4, p. 366-378, out./dez. 1992. 87. STRUCHINER, M. e GIANNELLA, T. R. Aprendizagem e prática docente na área da

saúde: conceitos, paradigmas e inovações. Washington, D.C.: OPAS, 2005.

88. TANCREDI, F. B; BARRIOS, S. R. L e FERREIRA, J. H. G. Planejamento em saúde. São Paulo: Faculdade de Saúde Pública / Instituto para o Desenvolvimento da Saúde, 1998

89. TOBAR, F.; YALOUR, M. R. Como fazer teses em saúde pública: conselhos e idéias para formular projetos e redigir teses e informes de pesquisas. 172 p. 20ª ed. Rio de Janeiro: Editora FIOCRUZ, 2001.

90. TRIVIÑOS, A. N. S. Introdução à pesquisa em ciências sociais: a pesquisa qualitativa

em educação. São Paulo: Atlas. 2008.

91. UFRJ. Escola de Enfermagem Anna Nery. Regulamento do Núcleo de Pesquisa em Enfermagem de Saúde Coletiva. Rio de Janeiro, 1999.

92. VALLA, V. V. Sobre participação popular: uma questão de perspectiva. Cad. Saúde

Pública, 1998; v. 14, supl. 2. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-311X1998000600002&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 20 jun 2010.

93. ______. Controle Social ou Controle Público? In: I Conferência de Vigilância Sanitária.

Caderno de Textos-eixo III. Brasília: Agência Nacional de Vigilância Sanitária, 2001. Disponível em: < http://www.anvisa.gov.br/divulga/conavisa/cadernos/eixo3_texto11.pdf>. Acesso em: 23 junho 2010.

94. VASQUEZ, M. L. et al . Participação social nos serviços de saúde: concepções dos

usuários e líderes comunitários em dois municípios do Nordeste do Brasil. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 19, n. 2, p. 579-591, abr. 2003.

95. VICINI, G. Abraço afetuoso em corpo sofrido: saúde integral para idosos. São Paulo:

SENAC, 2002. 96. YIN, R. K. Estudo de caso: planejamento e métodos. 3ª ed. Porto Alegre: Bookman,

2005.

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ANEXO A UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO ESCOLA DE ENFERMAGEM ANNA NERY COORDENAÇÃO GERAL DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA NÚCLEO DE PESQUISA EM ENFERMAGEM DE SAÚDE COLETIVA

INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS I) QUESTIONÁRIO PARA CARACTERIZAÇÃO DOS SUJEITOS 1) Dados Pessoais: Pseudônimo: _____________ Idade: ______ Estado Conjugal: ( ) solteiro (a) ( ) casado (a) ( ) separado (a) ( ) união consensual ( ) divorciado (a) ( ) viúvo (a) Renda Familiar em Salários Mínimos: ( ) 1 a 2 ( ) 3 a 4 ( ) 5 a 6 ( ) 7 a 8 ( ) 9 a 10 ( ) 10 a 15 ( ) mais que 15 Número de pessoas dependentes da renda familiar: ______________ 2) Dados Profissionais: Ano de graduação: _________ Grau de instrução: ( ) especialização ( ) mestrado ( ) doutorado Tempo de Atuação na Enfermagem: _____________ Tempo de Atuação: em Atenção Básica: _________ em ESF________ na comunidade_______ 3) Vida associativa: Participa de algum tipo de associação: ( ) não ( ) sim: qual (is)?________________________ Frequenta regularmente: sim ( ) não ( ) Participou de algum tipo de associação: ( ) não ( ) sim: há quanto tempo?_________________ Qual (is)?_____________________________________________________________________ Frequentava regularmente: sim ( ) não ( ). II) ROTEIRO DE ENTREVISTA SEMIESTRUTURADO

1) Fale sobre a dinâmica do processo de concessão do incentivo de resolutividade.

2) Fale sobre os resultados objetivos e subjetivos do incentivo de resolutividade para:

a) O seu trabalho.

b) A comunidade.

b) A rotina de trabalho da equipe de saúde da família.

c) A sua participação em instâncias de controle social em saúde.

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ANEXO B

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO ESCOLA DE ENFERMAGEM ANNA NERY COORDENAÇÃO GERAL DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA NÚCLEO DE PESQUISA EM ENFERMAGEM DE SAÚDE COLETIVA

CARTA DE SOLICITAÇÃO DE AUTORIZAÇÃO À GESTÃO MUNICIPAL DE SAÚDE PARA REALIZAÇÃO DA COLETA DE DADOS

De: Neucimar de Oliveira Duarte1 Para:

Solicitamos a avaliação e autorização ao gestor municipal de Saúde para desenvolver uma das etapas da pesquisa intitulada: “A PARTICIPAÇÃO DOS ENFERMEIROS NO CONTROLE SOCIAL EM SAÚDE: O CASO DE ANGRA DOS REIS”.

Esta etapa constitui-se na coleta de dados que será realizada por meio de entrevista com os enfermeiros. A data para a realização da entrevista será agendada posteriormente, segundo a disponibilidade voluntária do entrevistado. A participação dos enfermeiros desta instituição é de grande valia, pois fornecerá dados fundamentais à pesquisa, que tem como objetivos: a) analisar a participação dos enfermeiros de saúde da família no controle social em saúde a partir da concessão do incentivo de resolutividade em Angra dos Reis e b) discutir como o incentivo de resolutividade, na perspectiva dos enfermeiros, incidiu nas equipes de saúde da família e na comunidade de Angra dos Reis.

O compromisso do estudo é com a apropriação popular da política e das ações de saúde. Os resultados serão disponibilizados para o município e Conselheiros de Saúde. Desde já, agradecemos sua compreensão e nos colocamos à disposição para maiores esclarecimentos.

Atenciosamente,

Drª Ana Inês Sousa²

(Orientadora)

Neucimar de Oliveira Duarte¹

(Pesquisador Principal)

1 Enfermeiro do Município de Angra dos Reis-RJ. Especialista em Gestão de Saúde. Mestrando, autor da Pesquisa. End: Rua Almirante Brasil, 49 –

Bairro: Balneária – Angra dos Reis/RJ – CEP: 23906-030. e-mail: [email protected] . Tel.: (24) 3377.58.59 e Cel.: (21) 7672-8310. 2 Professora Adjunto IV da Escola de Enfermagem Anna Nery, Universidade Federal do Rio de Janeiro. Doutora em Ciências - Instituto Fernandes

Figueira, Fundação Oswaldo Cruz. Orientadora da Pesquisa. Tel.: (21) 2293-8899, R. 121 e (21) 2293-8999.

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ANEXO C UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO ESCOLA DE ENFERMAGEM ANNA NERY COORDENAÇÃO GERAL DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA NÚCLEO DE PESQUISA EM ENFERMAGEM DE SAÚDE COLETIVA

TERMO CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO. RESOLUÇÃO 196/96 DO CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE

Você foi selecionado (a) e está sendo convidado (a) para participar da pesquisa intitulada

“A PARTICIPAÇÃO DOS ENFERMEIROS NO CONTROLE SOCIAL EM SAÚDE: O

CASO DE ANGRA DOS REIS”, que tem como objetivos: a) analisar a participação dos enfermeiros

de saúde da família no controle social em saúde a partir da concessão do incentivo de

resolutividade em Angra dos Reis e b) discutir como o incentivo de resolutividade, na perspectiva

dos enfermeiros, incidiu nas das equipes de saúde da família e na comunidade de Angra dos Reis.

A pesquisa terá duração de 02 anos.

Suas respostas serão tratadas de forma anônima e confidencial, isto é, em nenhum

momento será divulgado o seu nome em qualquer fase do estudo. Utilizaremos como pseudônimo

uma letra do alfabeto não coincidente com a primeira letra do seu nome. Os dados coletados serão

utilizados apenas nesta pesquisa, e os resultados, divulgados e publicados em eventos e/ou

revistas científicas. Todo o material coletado (questionários e entrevistas) ficará sob a guarda do

pesquisador por 05 anos, sendo incinerado após este período.

A sua participação é voluntária, isto é, a qualquer momento você pode se recusar a

responder qualquer pergunta ou desistir de participar e retirar seu consentimento. Sua recusa não

trará nenhum prejuízo em sua relação com o pesquisador ou com a instituição. Sua participação

nesta pesquisa consistirá em responder à entrevista. Você não terá nenhum custo ou quaisquer

compensações financeiras. O benefício deste estudo será descrever e explorar estratégias para a

apropriação popular da política e das ações de saúde em nível local. É válido ressaltar que não

vislumbramos risco de qualquer natureza para esta pesquisa.

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Você receberá uma cópia deste termo composto de duas folhas, sendo que na primeira

estão descritos os esclarecimentos sobre a pesquisa. Na segunda folha constam o telefone/e-mail e

o endereço para contato do pesquisador principal, com quem pode tirar suas dúvidas sobre a

pesquisa e sua participação, agora ou a qualquer momento.

____________________________________

Neucimar de Oliveira Duarte1

____________________________________

Dra Ana Inês Sousa2

Telefone de contato do Comitê de Ética em Pesquisa EEAN/HESFA – 2293-8148

Data, ______de _________________de_________.

Declaro estar ciente do inteiro teor deste TERMO DE CONSENTIMENTO e estou de

acordo em participar do estudo proposto, sabendo que dele poderei desistir a qualquer momento,

sem sofrer qualquer tipo de punição ou constrangimento.

_________________________________________

Sujeito da pesquisa

1 Enfermeiro do Município de Angra dos Reis-RJ. Especialista em Gestão de Saúde. Mestrando, autor da Pesquisa. End: Rua Almirante Brasil, 49 –

Bairro: Balneária – Angra dos Reis/RJ – CEP: 23906-030. e-mail: [email protected] . Tel.: (24) 3377.58.59 e Cel.: (21) 7672-8310.

2 Professora Adjunto IV da Escola de Enfermagem Anna Nery, Universidade Federal do Rio de Janeiro. Doutora em Ciências - Instituto Fernandes

Figueira, Fundação Oswaldo Cruz. Orientadora da Pesquisa. Tel.: (21) 2293-8899, R. 121 e (21) 2293-8999.

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ANEXO D

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ANEXO E

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