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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO
DEPARTAMENTO DE PESQUISA
PROGRAMA INSTITUCIONAL DE BOLSAS DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA –
PIBIC CNPq e PIBIC UFPA
RELATÓRIO TÉCNICO - CIENTÍFICO
Período : Fevereiro/2010 a Agosto/2010
( ) PARCIAL
(X) FINAL
IDENTIFICAÇÃO DO PROJETO
Título do Projeto de Pesquisa:
“As Relações Raciais e a Escola no Estado Pará: análise dos processos escolares, no
âmbito dos novos marcos legais”.
Nome do Orientador: Wilma de Nazaré Baía Coelho
Titulação do Orientador: Doutorado
Faculdade de Ciências da Educação – Pedagogia.
Unidade: Instituto de Ciências da Educação – ICED.
Título do Plano de Trabalho: “A Educação Fundamental Privada e a formação para a
diversidade étnico-racial – representações de alunos de 7ª séries de duas escolas
privadas sobre o Brasil e a diversidade”
Nome do Bolsista: FELIPE LEONARDO TEIXEIRA DE ANDRADE
Tipo de Bolsa: (X) CNPq
( ) PIBIC/UFPA
( )PARD/UFPA – 2010 - Renovação
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Sumário
1. Introdução...........................................................................................3
2. Justificativa..........................................................................................4
3. Objetivos (geral e específicos)............................................................5
4. Materiais e métodos............................................................................6
5. Resultados............................................................................................8
6. Publicações..........................................................................................18
7. Conclusão............................................................................................19
8. Referências bibliográficas..................................................................21
9. Dificuldades.........................................................................................22
10. Parecer do orientador.........................................................................23
11. Anexo...................................................................................................24
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1. Introdução
Neste relatório final, na apresentação dos resultados, dá conta do objetivo geral
do plano de trabalho: investigar as representações que os alunos da 7ª série do Ensino
Fundamental, de duas escolas particulares da região metropolitana de Belém, as Escolas
A e B, têm sobre o Brasil e sua diversidade étnico-racial. Assim, retomamos, em linhas
gerais, os resultados apresentados no relatório parcial e os complementamos com os
avanços conseguidos neste relatório final. Aquele relatório preocupou-se em tratar do
planejamento escolar e a relação com a Lei nº 10.639/2003, a partir dos documentos
escolares das escolas investigadas, bem como levando em conta as atividades didáticas,
perceber quais as representações dos alunos da 7ª série sobre a diversidade étnico-racial
da sociedade brasileira. Neste relatório, apresenta-se o perfil sócio-econômico cultural
dos alunos e professores, com os dados obtidos por meio da aplicação do questionário
sócio-econômico, e a observação não-participante da prática pedagógica nas aulas de
História da Escola A1.
Ambas as escolas ficam localizadas na região metropolitana de Belém. A Escola
A no bairro do Distrito Industrial, localizado no município de Ananindeua, é uma região
periférica, marcada pela pouca oferta de serviços básicos como saneamento,
asfaltamento ou transporte público, com forte influência da criminalidade e da
violência. Enquanto que a Escola B, em Nazaré, no município de Belém, está alocada
no centro da cidade, em um bairro de classe média alta, no qual há o oferecimento de
forma adequada de todos os serviços públicos, do saneamento ao transporte, e a
violência e a criminalidade acabam tendo menor incidência por conta da maior oferta de
segurança pública e privada. Essas são basicamente as diferenças entre as duas escolas
particulares investigadas. Pesquisamos o lugar destas instituições nas avaliações oficiais
da Educação Básica, como IDEB, SAEB, Provinha Brasil e ENEM, mas não
encontramos qualquer dado relativo às escolas.
1 O processo de observações não-participantes da escola em questão foi realizado em conjunto com a
atividade disciplinar de “Prática de Ensino IV”, disciplina ministrada pela coordenadora da pesquisa em
uma turma de Licenciatura e Bacharelado em História da Universidade Federal do Pará. Por conta da
especificidade do trabalho realizado pelos alunos no que concerne ao direcionamento das atividades na
instituição à disciplina de História, não foi possível a realização das mesmas nas outras duas disciplinas
(Língua Portuguesa e Artes), as quais, no entanto, foram contempladas por meio dos outros instrumentos
da pesquisa. Enquanto que, na Escola B, as observações não foram procedidas por conta da
incompatibilidade do calendário escolar e o período de observação na escola, que recaiu nos momentos de
avaliação semestral e efemérides escolares.
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Desta maneira, com o fim de dar conta do objetivo deste plano de trabalho,
utilizamos como referenciais teóricos as formulações de Roger Chartier e Pierre
Bourdieu. De acordo com Chartier (1990; 1991), representação se constitui em uma
leitura, uma forma de ver a realidade, edificada a partir de um contexto sócio-histórico
marcado por contradições e conflitos, que busca construir identidades e distinções que
contribuam com a estigmatização e subalternidade de grupos marginalizados. Por outro
lado, conforme Pierre Bourdieu (1996; 1999; 2000), o campo educacional é uma
instância social estratégica que contribui, ao lado do direito e da mídia, por exemplo,
com a reprodução de uma determinada forma dominante de conceber as relações na
sociedade, o que ele chama de cultura dominante – a partir dessa formulação estrutural,
é que Bourdieu pensa a dinâmica desta cultura nas práticas sociais, a partir de suas
noções conceituais de dominação e violência simbólica.
Assim, este relatório pretende dar conta do objetivo geral do plano de trabalho,
bem como das atividades que ainda não tinham sido objeto de exposição no relatório
parcial, como a observação não-participante e perfil sócio-econômico cultural dos
alunos e professores.
2. Justificativa
As políticas públicas de Ações Afirmativas promovidas pelo Estado Brasileiro,
voltadas para a questão étnico-racial, datam das duas últimas décadas do século XX.
Entretanto, elas ocorreram por conta das pressões da sociedade civil organizada,
representadas, por um lado, pelo movimento negro, e por outro, pelos intelectuais
negros inseridos nas universidades. Quer pela produção acadêmica, quer pela
mobilização e protesto nas ruas, estes agentes apresentavam a mesma problemática: o
racismo estrutural que orienta as práticas sociais na sociedade brasileira. Requerendo a
mesma solução: políticas públicas que combatessem o racismo em setores estratégicos
da sociedade brasileira, como o mercado de trabalho e o campo educacional.
É nesse contexto que surge na presente década, o “conjunto jurídico”,
encabeçado pela Lei n° 10. 639/2003, que trata da questão étnico-racial no campo
educacional brasileiro. A Lei regulamenta, em linhas gerais, a veiculação de conteúdos
referentes a História da África e Cultura Afro-Brasileira, nos currículos de todas a
modalidades de ensino da educação brasileira, sobretudo, da Educação Básica, com o
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objetivo afirmar a contribuição africana e de seus descendentes para a construção da
História do Brasil
Nesse sentido, a contribuição desta pesquisa é precisamente avaliar até que
ponto essa legislação tem conseguido adentrar as práticas pedagógicas das escolas. Pois,
sua peculiaridade, reside em investigar as representações dos alunos da 7ª série2 do
Ensino Fundamental tem acerca do Brasil e sua diversidade. Assim, acaba por se
distanciar de outras pesquisas que se restringem a analisar as representações do livro
didático, dos professores, o perfil socioeconômico dos alunos, a violência das escolas e
a indisciplina escolar.
Outra inflexão da pesquisa consiste em não encarar possíveis manifestações de
preconceito, discriminação e racismo no universo escolar como problemáticas
relacionadas ao campo da moral e da ética, como parte da produção acadêmica faz. A
perspectiva adotada é vislumbrá-la com questão de formação, com a qual a escola tem
uma relação direta, bem como de reprodução de constructos ideológicos desfavoráveis
aos negros que estão disseminados no senso comum.
Assim, o que se pretende é considerar a produção/reprodução de determinadas
representações sobre o Brasil e sua diversidade no contexto escolar e quais as
influências que a legislação sobre a questão étnico-racial tem conseguido adentrar nas
práticas pedagógicas das escolas, já que estas são produtoras de representações,
produtoras de leituras sobre elementos que conformam a realidade social na qual as
crianças e adolescentes estão inseridos e com qual interagem.
3. Objetivos (geral e específicos)
Objetivo Geral:
Analisar as representações formuladas pelos alunos que cursam a Sétima Série
do Ensino Fundamental, de forma a avaliar o impacto das práticas instituídas
pela Lei nº. 10.639/03.
Objetivos Específicos:
2 A Lei n° 11.274, de 6 de fevereiro de 2006 altera conformação do tempo de estudo no Ensino
Fundamental, na qual os alunos adentram mais cedo as séries iniciais, assim que saibam ler e escrever, e
saem mais tarde, nas séries finais do Ensino Fundamental. Neste relatório, trataremos na nomenclatura
antiga.
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Identificar os alunos da Oitava Série do Ensino Fundamental, de duas Escolas da
Rede Privada do município de Belém;
Coletar dados relativos à Educação ofertada em cada uma das escolas
escolhidas, especialmente os concernentes à Educação para a Diversidade
Étnico-Racial;
Observar a prática pedagógica de professores de História e Língua Portuguesa,
das turmas escolhidas;
Aplicar instrumentos de recolhimento de representações formuladas pelos alunos
da Sétima Série do Ensino Fundamental;
Analisar os instrumentos aplicados, de modo a sopesar o impacto da Lei nº
10.639/03.
4. Materiais e métodos
No processo de coleta de dados, utilizaram-se quatro instrumentos de pesquisa:
observação não-participante, atividades didáticas, questionário socioeconômico e
levantamento dos documentos escolares. Discorremos sobre a utilização desses
instrumentos, porém, lembrando que o efetivamente aplicado, para os fins de resultado
deste relatório, foi o levantamento de documentos, os demais, estão em processo de
aplicação e análise dos dados coletados, que serão objeto de exposição no próximo
relatório. Lembramos, ainda, que o encaminhamento teórico-metodológico desta
pesquisa já fora apresentando na introdução deste relatório, a partir das formulações de
Roger Chartier e Pierre Bourdieu.
Desta forma, a observação não-participante é entendida como uma forma de
apreender as práticas educativas que se processam dentro e fora da sala de aula.
Observando-se a dinâmica das relações estabelecidas entre os alunos, os professores e o
corpo técnico, a fim de perceber formações de grupo, interações amistosas ou de
desentendimento, ou mesmo de inclusão e exclusão. Sendo, obviamente, os agentes
escolares esclarecidos previamente sobre o caráter da observação. E o observador não
participa em hipótese alguma das relações que são observadas, é como se fosse um
corpo ausente no campo de pesquisa, ele está lá, mas não participa ou opina nas
atividades e interações estabelecidas no universo escolar (VIANNA, 2003).
As atividades didáticas consistem em questionários abertos com perguntas
diretas, e outras menos lineares, porém, todas são abertas, em que os alunos precisam
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escrever por extenso suas respostas, cujo objetivo é coletar, por meio dessas respostas,
as representações que os estudantes apresentam acerca de raça, etnia, preconceito,
discriminação etc. que estão relacionados à idéia que eles têm do Brasil e sua
diversidade.
Por sua vez, o questionário socioeconômico nos possibilita formular o perfil dos
alunos das instituições pesquisadas. Tal perfil é de fundamental importância para as
pretensões desta pesquisa, pois nos da à oportunidade de saber qual o lugar social que
os alunos da escola ocupam, bem como perceber qual o seu nível econômico, a
escolaridade dos pais e seu acesso de bens culturais entre outras variáveis. Tais aspectos
se configuram como importantes, porque um dos nossos aportes, no caso, Pierre
Bourdieu (1996; 1999; 2000), que para a análise dos processos sociais que ocorrem na
escola, leva em consideração a trajetória e herança familiar, como base importante para
a veiculação de determinados constructos ideológicos e a fundamentação das
desigualdades na escola.
Em seguida, o levantamento dos documentos escolares cujo objetivo é saber
como as escolas planejam suas ações pedagógicas. Este levantamento foi à etapa
investigativa efetivamente concluída da pesquisa, sendo que, os resultados apresentados
mais adiante, se fundamentam nos documentos levantados. Conhecer a estruturação
destes documentos é de fundamental importância, porque são eles que orientam as
práticas pedagógicas da escola. Enquanto os demais instrumentos de pesquisa buscam
apreender essas práticas como processo social, os documentos nos demonstram como
elas foram pensadas previamente, no planejamento escolar.
Finalmente, como referência para o processo de sistematização e organização
dos dados, seguiu-se as orientações de Laurence Bardin (2000), que a partir da análise
do conteúdo, apresenta a categorização ferramenta importante de organização dos
dados, e sua, posterior análise.
5. Resultados
Inicialmente, de forma sumária, retomaremos dois pontos que foram discutidos no
relatório parcial: por um lado, o planejamento escolar e a Lei nº 10.639/2003 por meio
dos documentos escolares das escolas pesquisadas; e por outro, as representações dos
Alunos da 7ª série sobre a diversidade étnico-racial no Brasil, através das atividades
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didáticas. E posteriormente, apresentarmos o perfil sócio-econômico cultural dos alunos
e professores e as observações não-participantes das aulas de História da Escola A.
Em primeiro lugar, os documentos escolares das instituições particulares
investigadas. As escolas desconhecem a legislação que trata da diversidade étnico-racial
na Educação Básica, tendo em vista que este marco legal regulamenta a obrigatoriedade
da veiculação da História da África e da Cultura Afro-Brasileira nos currículos da
Educação Básica, a qual é competência das escolas em questão, por meio do Ensino
Fundamental e Médio. A questão da diversidade étnico-racial não seja uma questão de
relevância para as pretensões educacionais das instituições pesquisadas. O que nos
parece preocupante, porque estabelecimentos que se dedicam a formação de crianças e
adolescentes, não considerar no seu planejamento pedagógico questões relacionadas ao
preconceito, discriminação, racismo, bem como a cultura africana e afro-brasileira, é no
mínimo está subtraindo conteúdos fundamentais para se formar cidadãos que saibam
valorizar e respeitar a diversidade e a diferença presentes na sociedade na qual vivem.
É nesse sentido de formar cidadãos que saibam reconhecer, valorizar e respeitar
a diferença e a diversidade étnico-racial, quer dizer, uma concepção de cidadania que
ultrapasse o binômio direitos-deveres, ou ainda, de formar o cidadão crítico e
participativo, que não tenha conhecimentos e formação para o respeito e valorização da
diversidade cultural, é que os novos marcos legais procuram engendrar, de modo a fazer
com que a educação brasileira seja uma instância que de fato forme as novas gerações
para o respeito ao outro, pois só a partir de tais atributos, conseguiremos formar
cidadãos para uma sociedade efetivamente democrática.
Desse modo, podemos inferir que a representação, de acordo com as reflexões
de Roger Chartier (1990; 1991), que as Escolas A e B acerca do Brasil e de sua
diversidade, a partir dos seus documentos escolares, pauta-se por uma concepção de
cidadania que não vislumbra diversidade étnico-racial que conforma a sociedade
brasileira. Quer dizer, quando se indica como finalidade principal da educação ofertada
nessas instituições educativas, a formação de cidadãos críticos e participativos, não é
referido entre os elementos que constituem essa formação os conhecimentos acerca da
diversidade étnico-cultural na qual é construída a sociedade em que os estudantes
vivem. Por sua vez, o respeito à diversidade e a diferença não estão nos horizontes
formativos almejados pelas escolas pesquisadas, já que as qualificações deste cidadão
que se quer engendrar são pautadas por aspectos genéricos e generalistas, sem deixar
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muito claro, no que diz respeito à consideração adequada em suas práticas sociais da
diversidade cultural que define a sociedade brasileira.
Ao lado disso, não podemos perder de vista, uma pergunta premente: por que,
mesmo com cinco anos de promulgação da Lei 10.639/03, as escolas pesquisadas não
incluíram em seus documentos escolares a legislação que versa sobre a diversidade
étnico-racial na Educação Básica? Uma de nossas hipóteses foi lançada: o
desconhecimento acerca dessa legislação. No entanto, lançamos uma outra, que
consideramos está subjacente a esse processo de desconhecimento: não considerar que
questão da diversidade étnico-racial seja importante, porque já está sendo abordada nas
disciplinas escolares, ou porque não existe preconceito, discriminação e racismo no
contexto escolar.
Nesse sentido, não podemos deixar de aventar como razão explicativa de nossas
hipóteses: o mito da democracia racial3. A partir de uma concepção de cidadania que
não considere a diversidade étnico-racial, pois se considerando que vivemos em uma
sociedade mestiça, na qual todos são iguais, a discussão sobre a temática acaba por
perder o sentido. Ou ainda, que não existe racismo na escola. Ora, se não há essa
problemática na escola, qual seria a função da abordagem da temática, já que todos são
mestiços e, por conseguinte, não a racismo entre iguais. A ausência desta temática nos
documentos escolares pode nos indicar essas reflexões.
Em razão disso, do desconhecimento ou não consideração, os documentos que
organizam as práticas pedagógicas das escolas, segundo o nosso ver, acabam por
reproduzir a cultura dominante: o mito da democracia racial. Conforme as discussões de
Pierre Bourdieu (1996; 1999; 2000), na qual a educação, junto a outros campos sociais,
como o direito e mídia, com o objetivo de reproduzir os constructos ideológicos da
cultura dominante – esses constructos acabam por orientar práticas, se desdobrando em
dominação e violência simbólica, que buscaremos perscrutar por meio das outras etapas
da pesquisa, na aplicação dos instrumentos de pesquisa; por ora, queremos perceber
3 Tal construção ideológica consiste na explicação, fundada na compreensão dos trabalhos de Gilberto
Freyre, em especial, Casa Grande e Senzala (2006), da peculiaridade da formação social brasileira, no
conjunto das demais sociedades que viveram sob o regime da escravidão. Comparado ao caso
estadunidense, que é o caso de comparação clássica, o Brasil tendeu a integração ao invés da segregação
como procedeu nos Estados Unidos. Aliás, é nessa integração, que fora traduzido para a mestiçagem, a
figura de um país mestiço, que alcançou o status de identidade nacional, que se funda a peculiaridade
brasileira. E partir dessa identidade, que se formou a crença de que em um país mestiço não a
possibilidade da existência de racismo; ora, se todos não mestiços, não existem diferenças raciais e,
portanto, não há como cometer ações de preconceito e discriminação relacionadas ao critério racial. É
necessariamente isso que informa a ausência da temática étnico-racial nos documentos da escola.
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como a escola planeja suas ações pedagógicas. Assim, as representações das escolas,
observada em suas concepções de cidadania, acerca do Brasil e sua diversidade, pela
ausência de referências étnico-raciais e da legislação que trata dessa questão na
Educação Básica, acabam por reproduzir, reiteramos pela ausência, a cultura dominante:
uma identidade mestiça (COSTA, 2001; MUNANGA, 2004; SCHWARCZ, 1994).
Em segundo lugar, as atividades didáticas (gráficos 1 a 13). Inicialmente,
destacamos a permanência de uma visão eurocêntrica, já consolidada nas visões de
mundo construídas pelas crianças e adolescentes questionados. O elemento branco
ainda aparece como representação de valores a serem alcançados e/ou conquistados.
Conforme indica Edith Piza (2000), isto pode estar relacionado ao fato de que alguns
valores, assumidos como brancos, ainda constituem os ideais identitários de grande
parte da sociedade brasileira. A Escola e o Saber Escolar mostram-se inoperantes, no
entanto, no sentido de reverter tais expectativas – sugerindo que a tanto a literatura
didática quanto pedagogos e professores trabalham no sentido de reiterar as
compreensões cristalizadas – para o bem e para mal – sobre a sociedade e seus agentes.
Indício forte nesse sentido são as formulações apresentadas sobre as populações
indígenas. Os dados coletados indicam que alunos de uma escola na Amazônia, região
que congrega a maior população indígena do Brasil, concebem o Índio conforme um
conjunto de estereótipos construídos no processo de conquista e dominação daquelas
populações. O Saber Escolar parece não atuar no sentido de reverter essa compreensão
e desenvolver junto aos alunos uma visão que perceba nas populações indígenas agentes
históricos atuantes.
Conforme apontou análise realizada recentemente,
“De maneira geral, as populações indígenas são encaradas como sociedades quase perfeitas, as
quais foram vítimas do processo de civilização, são tomadas como detentores de valores
louváveis, o que evidencia uma visão idílica sobre as populações indígenas. Essas perspectiva
as apreende como vítimas que, ainda hoje, sofrem muitas violências e reclamam seus direitos.
O ser integro, inocente, incorruptível, quase perfeito, que aparece nos livros didáticos surge,
portanto, com um tom de piedade” (COELHO et all, 2010, p. 101).
Da mesma forma que a Escola e o Saber Escolar se mostram eficientes na
manutenção de visões informadas pela apropriação de paradigmas formulados com o
objetivo de tornar branca a população brasileira e ver extirpados os traços ameríndios e
africanos, ambas se mostram habilíssimas na perpetuação das visões que delegam o
Negro ao lugar da subalternidade. As construções discursivas dos alunos sobre o Negro,
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neste segundo instrumento de coleta de dados, evidenciam a compreensão de que o
Negro constitui uma não-referência.
Mesmo se considerássemos que à Escola e ao Saber Escolar não competem
tratar de tais questões, seria de esperar que uma e outra, ao menos, desenvolvessem nos
alunos a capacidade de pensar sobre o universo que os rodeia – e pensar criticamente,
relacionando fatos, formulando juízos e percebendo diferenças e discursos como
construções históricas, como formulações construídas em dado período, com objetivos
vinculados ao momento no qual surgiram. A consideração sobre as duas últimas
questões, finalmente, evidencia que a Escola abandonou este objetivo.
Desde as séries iniciais do Ensino Fundamental, os alunos são colocados em
contato com uma narrativa sobre o passado brasileiro, profundamente influenciada pela
matriz construída no século XIX, pelo Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro
(IHGB). Concebida desde a contribuição de Von Martius, ela se mantém mais ou menos
inalterada, em função da repetição de que é objeto há mais de um século. Evidência
maior desta repetição é o fato de que os alunos informantes da pesquisa em andamento
reproduziram as linhas gerais daquela formulação, ainda que maneira muito
simplificada.
O fizeram porque tomaram conhecimento dela, tanto pela literatura didática
quanto pela fala dos professores, como milhares de alunos espalhados pro esse Brasil
imenso. O mesmo não se deu, entre eles (e também não se dá com a maior parte dos
alunos do Ensino Fundamental) com as categorias Racismo e Preconceito. Essas foram
apreendidas por meio das falas dos adultos (professores inclusive), sem que tivessem se
constituído em Saber Escolar.
As representações dos alunos sobre Branco, Índio e Negro foram apreendidas
como Saber Escolar – está nos livros e no conteúdo expresso nas lousas. Racismo e
Preconceito não. Daí a dificuldade dos alunos em abordá-los. Frases evasivas e
raciocínios incompletos. Mais uma vez, a Escola e o Saber Escolar se mostraram
incapazes de levar os seus alunos a pensarem por si mesmos. Não lhes forneceram as
habilidades cognitivas necessárias para que pudessem refletir sobre um traço do
cotidiano (sim, porque nem o racismo nem o preconceito são experiências raras no
convívio brasileiro) e formular um juízo.
A partir dos resultados obtidos por meio das atividades didáticas, acabam por
sugerir um encaminhamento para a pesquisa: ao que tudo indica a permanência da
discriminação e do preconceito no universo escolar se deve ao fato de a Escola e o
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Saber Escolar serem os maiores responsáveis pela sua reprodução intra-muros; a
eliminação dos dois vícios depende, fundamentalmente, da qualidade da Educação
ofertada.
Neste momento, passemos à observação não-participante das aulas de História
na Escola A. Assim, quanto à organização dos dados da observação estabeleceram-se
algumas categorias analíticas – tais como: Relação aluno-aluno; Relação professor-
aluno; Relação professor-técnico; Assunto; Conteúdo desenvolvido; Metodologia;
Referências; Livro didático; Disciplina-indisciplina; e Adequação à Legislação – as
quais condensam informações de determinadas práticas escolares selecionadas
previamente (BARDIN, 2001). As observações não-participantes, em si, no caso, o
procedimento de coleta de dados, registrados em diário de campo, orientou-se de acordo
com as reflexões de Heraldo Vianna (2003). Nesse sentido, detemo-nos nos dados
colhidos pelas observações na prática escolar.
As 7ª séries foram apenas observadas pela parte da manhã. As categorias de
observação que mais avultaram estão relacionadas ao trabalho docente e ao caráter
relacional entre professores e alunos. Nas aulas, o conteúdo desenvolvido não condisse
com o proposto no Plano de Curso, por meio de aula expositiva, e sim, através de leitura
do livro didático durante os horários de aula. Nesta série há maior ocorrência de alunos
querendo a explicação do professor que ocorre de forma particular (teoricamente), todos
ao redor da mesa do professor, devido a este privilegiar a leitura do livro didático em
detrimento da aula expositiva.
O filme "O grande Ditador" de Charles Chaplin foi um dos recursos utilizados.
No entanto, o professor não deu a explicação necessária. Para os alunos o filme
simplesmente faz parte da matéria, utilizando-o como conteúdo, não sendo apresentado
como referência aos alunos, quando tão somente para explicitar que se tratava de uma
critica bem humorada ao regime Nazista. Como ficou observado, o Livro didático é
utilizado como suporte para as suas aulas apenas reproduzindo o seu conteúdo, na
utilização dos textos e atividades propostas, cabendo ao professor apenas algumas
explicações do que não foi compreendido.
No tocante a adequação à Legislação, fora a sua aplicação indireta a partir da
utilização do livro didático, não se notou nenhuma adequação das aulas às orientações
dos documentos curriculares oficiais. Sobretudo, no que diz respeito à legislação que
versa sobre a diversidade étnico-racial na sala de aula, a Lei nº 10. 639/2003. Quer
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dizer, o professor não pauta a sua prática pedagógica, a partir desta ausência, para uma
educação que valorize e respeito a diferença e a diversidade no universo escolar.
Quanto ao âmbito relacional, a relação professor-aluno, se configura que alunos
não vêem no professor alguém que possui uma autoridade, no caso, intelectual. A
postura do mesmo não ajuda nesta questão, pois ele senta-se na mesa, os alunos mexem
no celular, o professor usa a mesma linguagem que os alunos. Não há, nesta relação, um
distanciamento entre professor e aluno, a pessoalidade acaba sendo o tom dando a essa
relação. Não foi percebido qualquer tipo de preferência por parte do professor de grupos
de alunos que tivesse conotação étnico-racial.
No que se refere a relação aluno-aluno, durante o período observado, também
não foi constatada a separação de alunos segundo a cor/raça. Porém as características
físicas foram ponto de partida para que alguns recebessem apelidos, bem como, apelidos
fazendo analogia aos nomes. Por exemplo: Koala, orelha, nariz, Megaman e fígado (por
não gostar de comer fígado). É perceptível entre os alunos as preferências ou os
distanciamentos estarem relacionados a aspectos físicos e a sua estigmatização pela
brincadeira e pela piada. Sendo interessante perceber que no período observado, não foi
constatado qualquer tipo de brincadeira ou piada com contornos étnico-raciais.
No concernente a disciplina-indisciplina, a indisciplina é regra, conversas
paralelas e em voz alta, e a falta de controle do professor foram marcantes durante a
observação, além da utilização de celulares, mp3, e outros. E, por fim, na relação
professor-técnico, foi constatada a resistência do professor quanto a algumas indicações
didáticas e pedagógicas propostas pela equipe técnica, como a nota ser somada as
atividades feitas no caderno e o calendário da escola prejudicar o cumprimento dos
conteúdos no tempo previsto.
E por sua vez, finalmente, o perfil sócio-econômico cultural dos alunos e
professores das escolas pesquisadas. O perfil do corpo discente e docente do Ensino
Fundamental da Escola A, no caso, da 7ª Série, bem como de algumas considerações
acerca da dinâmica escolar de sala de aula, com ênfase no lugar e no tipo de
participação que estes alunos apresentam nesta instituição.
No que diz respeito aos professores da instituição, apresentamos o conteúdo dos
questionários aplicados, com os quais se pretendeu alcançar informações de caráter
acadêmico-profissional e cultural desses profissionais e, principalmente, suas demandas
com relação à escola, à sua formação continuada e às suas perspectivas de capacitação
docente. Os questionários apresentados aos professores tiveram o objetivo de verificar a
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dimensão acadêmico-profissional/cultural-informacional, com competências e recursos
juntamente às suas experiências desenvolvidas no espaço escolar. Para efetuar esta
análise do corpo docente/técnico da escola, levou-se em consideração questões sócio-
educacionais e o desdobramento das mesmas para a diagnose das possíveis deficiências.
As análises basearam-se nos resultados de seis questionários4, e, a partir disto,
pode-se inferir que os professores graduaram-se em instituições públicas (UFPA e
UEPA), um deles ainda não concluiu a graduação e três afirmam possuir o que
consideram ser pós-graduação. Verificou-se que a escola incentiva a prática de
formação continuada para os seus profissionais, e estes o fazem com participações em
fóruns, oficinas e mini-cursos. Para planejar as aulas os professores utilizam internet,
jornais e revistas. A metodologia não foi apresentada por nenhum dos professores
pesquisados, e, ainda que afirmem fazer planejamento das aulas, o tempo dedicado ao
preparo deste mostrou-se ineficaz para a elaboração de uma aula com objetivos bem
definidos. Os recursos utilizados são livros didáticos, paradidáticos e filmes. No
entanto, alguns professores alegam que os recursos oferecidos pela escola são
insuficientes.
De acordo com o resultado verificado, no que se refere à transposição didática
(MARANDINO, 2004; VADEMARIN, 1998), concepções teóricas e avaliativas, as
respostas foram incoerentes. Portanto, percebe-se carência de conhecimento dos termos
indagados; isso também vale para o conhecimento da legislação, pois não se observa a
aplicação específica das leis nos níveis de ensino em que atuam, e aquelas que versam
sobre a diversidade étnico-racial no campo educacional.
Quanto aos alunos, por meio da análise dos questionários, é possível
diagnosticar o capital cultural do aluno, o que serve como uma importante fonte de
informação sobre as variáveis que estão associadas com o próprio desempenho
educacional da clientela presente na instituição. Todos os dados dos questionários estão
organizados em gráficos e anexados ao final do trabalho. Desta forma, serão
examinados os dados mais representativos ao processo de ensino-aprendizagem,
levando-se em consideração a estrutura familiar e a estrutura da escola (física e
educacional), respondidos pelos alunos 7ª série da instituição investigada.
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Os questionários visavam a totalidade dos professores e técnicos ligados às séries do Ensino
Fundamental da instituição, no entanto, somente seis professores atenderam à essa solicitação. Nossas
conclusões restringem-se, então, a essa amostra dos profissionais.
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Um dos diagnósticos importantes na formação do aluno foi o expressivo número
de responsáveis com curso superior (gráfico 14) característica que pode favorecer um
maior interesse do aluno enquanto perspectiva de crescimento e conclusão dos mais
altos níveis de escolaridade. De acordo com Bourdieu (1996; 1999; 2000), o nível de
capital cultural dos pais acaba sendo legados aos filhos, favorecendo uma trajetória
escolar muito semelhante ou até melhor que a dos pais. Assim, é óbvio, que estes alunos
têm um ponto de partida muito melhor por conta da formação cultural de seus pais, e
com melhores perspectivas de ocupação de lugares sociais de prestígio.
Contudo, os dados de escolaridade não traduzem o índice de leitura dos pais
(gráfico 15), e este fator pode prejudicar o índice de leitura do alunado, o que acarreta
problemas no desempenho de algumas disciplinas que exijam um certo nível de leitura e
compreensão do aluno (gráfico 16). Pois, os alunos afirmam em sua maioria ter
dificuldades na disciplina de Geografia, cujo conteúdo necessita de leitura. Mas, como
se vê mais a frente, os alunos afirmam terem um nível razoável de leitura. De todo
modo, a formulação de Bourdieu se confirma, mesmo que os pais não tenham tanta
freqüência na leitura, a sua formação escolar acabaram por influenciar a preferência dos
filhos, no caso, os alunos pelo consumo de bens culturais, como livros, jornais e
revistas.
Apesar do alto índice de dificuldades em algumas disciplinas, a maioria desses
alunos, ainda sim, dedicam-se menos de uma hora por dia aos estudos fora da escola
(gráfico 17). Este é um dado interessante, pois os alunos apresentam condições
favoráveis para o sucesso escolar, mas tem dificuldades em algumas disciplinas, e ainda
assim, dedicam pouco tempo para o estudo fora da escola. Ao menos, percebemos uma
relação direta entre o bom desempenho das disciplinas escolares e o tempo dedicado ao
estudo fora da escola, quanto menor este tempo dedicado maior é a dificuldade no
entendimento do conteúdo das disciplinas.
Vislumbremos, ainda, outros elementos do perfil dos alunos pesquisados.
Construímos este perfil a partir de quatro variáveis: cor/raça; renda familiar;
escolaridade; e freqüência de leitura (jornais, revistas e livros). A maioria dos alunos se
autodeclararam “pardos” (54,16% - gráfico 18). Não responderam ou não sabiam a
renda familiar (55,55% - gráfico 19). A escolaridade entre os que cursaram a Educação
Infantil ficou entorno de 53,80% (gráfico 20), nunca abandonaram em 85% e nunca
16
repetiram na casa dos 81,20%. A freqüência de leitura: jornais (domingo – 24,82% -
gráfico 21); revistas (semanal – 31% - gráfico 22); e livros (40,81% - gráfico 23)5.
Inferimos que os alunos se consideram “pardos” de acordo com a identidade
dominante presente na sociedade brasileira, nos quadros do mito da democracia racial.
Os dados sobre a renda família dos alunos, não são conclusivos, assim não nos permite
assegurar posições sobre o status socioeconômico dos estudantes da escola pesquisada.
Pouco mais da metade dos alunos cursaram a Educação Infantil, sendo este o momento
inicial importante para a formação das crianças; porém, em relação às porcentagens de
abandono e repetência, os alunos transpareceram uma regularidade.
Após o advento da Lei de n° 9.394\96, o fenômeno da repetência não figura
como marcador na Educação Básica. Na escola pesquisada, também não. Uma vez que
não há registro de repetência e o número daqueles que nunca abandonaram chega aos
80%, até a sua série atual. E por fim, o índice de leitura dos alunos demonstra ser
razoável, não ultrapassando os 50%, e sendo surpreendentemente maior na leitura de
livros didáticos e secundariamente a de periódicos, como jornais e revistas.
Por sua vez, a Escola B e o perfil sócio-econômico cultural dos alunos e
professores6. Não foi possível abarcar as mesmas variáveis do perfil da Escola A em
razão da incipiência de respostas as perguntas que tinham haver com cor/raça, trajetória
escolar, o nível de escolaridade e o índice de leitura dos pais e o tempo de estudo fora
da escola. Entretanto, a renda familiar e a freqüência de leitura (jornais, revistas e
livros) foram pontos comuns nos dois perfis. E outras questões avultaram, como: se os
alunos já sofreram discriminação, qual foi a atitude diante desta situação e onde/local
ocorreu tal fato.
Quanto a renda familiar 38% dos alunos vivem com rendimentos entre 5 a 9
salários (gráfico 24),. Quer dizer, um número considerável de alunos vive com uma
faixa de renda bastante confortável e sendo isso bastante compatível com o nível de
receita de estudantes de estabelecimentos particulares de ensino. São alunos, portanto,
que desfrutam de um conforto material e todas as condições favoráveis para estudar,
seja por ter condições de freqüentar um bom colégio, com o mínimo de estrutura física e
5 Para mais informações consulte os gráficos em anexo, tanto para as atividades didáticas quanto ao perfil
dos alunos. As categorias que compõe os gráficos foram construídas a partir de informações que
apresentavam um núcleo comum de referência, como orienta Bardin (2000); essas categorias por
sistematizar os dados, possibilitaram a construção dos gráficos que facilitam a sua consulta. 6 Por conta da incompatibilidade de horários da escola e a indisposição dos professores, a aplicação dos
questionários na escola ficou impossibilitado. Assim, não tivemos dados para apresentar o perfil dos
professores da instituição.
17
pedagógica para um ensino de qualidade, seja por ter apoio dos pais que garantem
apenas estudar e não precisar ter outras ocupações que não estejam relacionadas ao
estudo.
Do ponto de vista da freqüência de leitura 28% dos alunos lêem o jornal (gráfico
25) raramente, 35% não responderam com que freqüência lê revista (gráfico 26) e 36%
lêem livros (gráfico 27) mensalmente. Esse é ponto importante para percebemos qual o
nível de leitura dos alunos. E nesse sentido, os estudantes parecem ser pouco
familiarizados com materiais de leitura periódicos, como jornais e revistas, e terem
maior preferência pela leitura de livros, os quais lêem todo o mês – para alunos do
Ensino Fundamental, é algo significativo. Assim, mesmo que menos da metade dos
alunos leiam livros mensalmente, consideramos que, de acordo com as suas respostas,
eles apresentam um nível de leitura bom para alunos do Ensino Fundamental. E isso de
alguma forma demonstra como o nível de renda influência no acesso a bens culturais,
no caso, livros, e a sua leitura com uma freqüência mensal.
No que se refere a questão da discriminação, se os alunos já sofreram
discriminação, 45% dos alunos afirmam nunca terem sofrido (gráfico 28). E sobre a sua
atitude frente a uma situação desse tipo, 45% não souberam dizer (gráfico 29). E por
fim, onde foi o local que sofreram o preconceito, 60% responderam “outro” (gráfico
30). As respostas dos alunos foram um tanto evasivas. E com porcentagens
significativas. É como se não houvesse casos de discriminação na escola. Se
considerarmos que a sociedade brasileira é profundamente racista, esse fenômeno não
tem ressonância na escola? Acreditamos que sim, sobretudo, quando vislumbramos as
representações que os alunos têm sobre a diversidade étnico-racial que marca o Brasil:
pautada ainda pela lógica da democracia racial. Desta forma, as respostas evasivas dos
alunos fazem sentido, eles não sofrem discriminação, não tem qualquer atitude frente a
uma ação desta natureza e não sabem o local onde isso acontece, porque acreditam o
Brasil é o país da mistura, da mestiçagem, e, portanto, é difícil identificar ações
discriminatórias entre iguais.
Em linhas gerais, percebe-se que o planejamento escolar acaba se confirmando
na prática pedagógica e nas representações dos alunos sobre o Brasil e sua diversidade
étnico-racial. Na verdade, a falta da discussão acerca da questão étnico-racial nos
documentos escolares das escolas investigadas repercute nas representações dos alunos
e na prática pedagógica da escola, sobretudo, na reprodução da lógica da democracia
racial, que em favor do elogio da mestiçagem, acaba obscurecendo a valorização e o
18
respeito à diversidade e a diferença, bem como escamoteando o racismo presente na
sociedade brasileira.
6. Publicações
No prelo:
REPRESENTAÇÕES DE ALUNOS ACERCA DE COR E RAÇA NO ENSINO
FUNDAMENTAL: análises iniciais.
Revista da Universidade Católica de Goiás.
Artigo completo em anais de evento:
Título: A Lei nº 10.639/2003 e os processos escolares no Ensino Fundamental
de duas escolas públicas e duas escolas privadas de Belém - PA.
Evento: Congresso Brasileiro de Pesquisadores Negros – 2010 – Afro-Diáspora,
Saberes Pós-Coloniais, Poderes e Movimentos Sociais
Autores:
Profa. Dra. Wilma de Nazaré Baía Coelho (UFPA/UNAMA)
Co-Autores:
Felipe Tavares de Moraes (UFPA)
Rafaela Paiva Costa (UFPA)
7. Conclusões
19
No relatório parcial chegamos à seguinte conclusão: os documentos escolares e
as atividades didáticas acabam por demonstrar uma concepção de cidadania que não
considera a diversidade étnico-racial no planejamento pedagógico das escolas
investigadas. Sobretudo, no que diz respeito as representações dos alunos da 7ª série dos
estabelecimentos pesquisados, que são pautadas pela lógica da democracia racial.
Com os resultados apresentados neste relatório final, a partir da observação não-
participante e o perfil dos alunos e professores das escolas particulares selecionadas, nos
complementamos os resultados do relatório anterior e alcançamos o objetivo geral do
plano de trabalho. A observação não-participante mostrou que as aulas observadas não
apresentavam a discussão étnico-racial, bem como não orientavam a seu planejamento
pela legislação que versa sobre a diversidade étnico-racial no campo educacional – a Lei
nº 10.639/2003. E o perfil dos alunos, para além das questões econômicas e culturais,
no que diz respeito à consideração da discriminação na escola, quer dizer, da não
consideração da discriminação e preconceito, que julgamos está relacionado às
representações que os alunos têm sobre a questão étnico-racial na sociedade brasileira,
sendo pautados pela democracia racial, os alunos não vêem ações discriminatórios como
tais, já que acreditam viver no país da mistura racial, da mestiçagem.
Nesse sentido, aquilo que é planejado acaba sendo praticado. A ausência dos
marcos legais, no caso, a Lei nº 10.639/2003, nos documentos escolares, que organizam
o planejamento pedagógico das escolas acabam por refletir na prática pedagógica e, por
sua vez, engendrando representações junto aos alunos sobre a realidade racial brasileira.
Tais representações, como bem demonstram as atividades didáticas, estão relacionadas à
democracia racial, no sentido da homogeneização cultural a partir da mestiçagem, bem
como a hierarquização das contribuições das matrizes raciais que formaram a sociedade
brasileira, no qual o branco é o valorizado e visto como modelo, e ao mesmo tempo,
negros e ameríndios são inferiorizados e estigmatizados.
A ausência desta discussão nos horizontes formativos das escolas investigadas
está invariavelmente relacionada à Formação de Professores. A professora Wilma
Coelho (2009a) demonstra a historicidade deste fenômeno, quando investiga a presença
do negro na formação de professores do Instituto de Educação do Estado do Pará (IEEP)
nas décadas de 1970-1980. Constata que nos processos formativos da instituição há uma
presença ausente, um não-lugar do negro tanto como sujeito quanto objeto do
conhecimento, o que, por sua vez, acaba reproduzindo a posição desigual que a
população afro-brasileira ocupa na sociedade brasileira.
20
Ao lado da historicidade deste fenômeno, professora Wilma Coelho (2010) em
pesquisas recentes demonstra que essa mesma ausência, ou mesmo a presença, na
atualidade está relacionada à lógica do improviso que consiste na falta de preparo
pedagógico para lidar com a diversidade e a diferença étnico-racial na prática
pedagógica por parte dos professores. Quer dizer, a professora Wilma Coelho, nos seus
estudos, demonstra que este fenômeno tem uma historicidade, e a forma como ele se
manifesta no tempo presente, mesmo que os tempos sejam distintos, um ponto é
comum: a ausência da discussão sobre a diversidade étnico-racial na formação de
professores tem as suas repercussões na prática pedagógica na sala de aula.
Os resultados do relatório final nos encaminham para essa compreensão: a
relação entre a formação de professores e o universo escolar. A formação tem uma
posição central, pois a falta de preparo para o trabalho com a temática é responsável
pela ausência da temática no universo escolar. No nosso caso, no planejamento
pedagógico das escolas investigadas que acaba por influenciar a prática pedagógica. E
ao mesmo tempo, engendrando representações nos alunos que desconsideram a
diversidade e a diferença em favor da lógica da democracia racial. Se a formação de
professores é responsável, ela também é a ferramenta de subversão desta situação, como
defendem Wilma Coelho (2009; 2010), Nilma Lino Gomes e Petronilha Gonçalves
(2006), e Eliane Cavalleiro (2001), para que de fato de tenha uma educação para as
relações étnico-raciais na Educação Básica, e a reformulação das representações dos
alunos para a valorização e respeito da diversidade e diferença que define a sociedade
brasileira.
9. Referências Bibliográficas
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nossa escola , Selo Negro/Summus, 2001.
21
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negro na formação de professores – Pará 1970-1989. 2 ed. Belo Horizonte: Mazza
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COSTA, Sérgio. A mestiçagem e seus contrários: nacionalidade e etnicidade no Brasil
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GOMES, Nilma Lino e SILVA; Petronilha Beatriz Gonçalves (Orgs). Experiências
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SCHWARCZ, Lilia. O espetáculo da miscigenação. Estudos Avançados, São Paulo, v.
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VIANNA, Heraldo Merelim. Pesquisa em educação: a observação. Brasília: Plano
Editora, 2003. PP. 16 – 29.
22
10. Dificuldades
Não houve qualquer dificuldade que seja digna de nota. A entrada na escola, o
levantamento dos documentos escolares e a aplicação dos instrumentos de pesquisa
foram procedidos com a ajuda dos agentes escolares, sempre solícitos e prestativos
quando requeridos. As observações apenas tiveram que obedecer a lógica do calendário
escolar das escolas. E dentre os documentos escolares solicitados, nem todos foram
oferecidos. Contudo, no geral, as atividades transcorreram dentro da normalidade nas
instituições pesquisadas. No que diz respeito as atividades formativas possibilitadas pela
bolsa de iniciação científica, elas possibilitaram a elevação do meu rendimento
acadêmico, seja leitura, seja na escrita, bem como, pela introdução ao meandros da
pesquisa e do processo investigativo.
11. Parecer do orientador:
O mesmo respondeu com eficiência, responsabilidade, disciplina e competência
em relação a todas as orientações a ele dirigidas ao longo da bolsa. Deste modo,
O bolsista em tela apresenta toda a competência que se espera para um
pesquisador iniciante, assim, seu desempenho foi Excelente!
12. Anexo
Gráfico 1 - Brasileiros mais bem-sucedidos.
Fonte: Pesquisa direta.
23
0
2
4
6
8
10
12
14
16
18
2019
17
1312
9 9
76
5 54
3 3 3
Sílvio Santos Lula Kaká Ronaldinho Xuxa
Roberto Justos Ronaldo Ivete Sangalo Gisele Büdchen Willian Bonner
Joelma (Calypso) Fafá de Belém Gugu Cláudia Leite
Gráfico 2 - Quem é a “cara” do Brasil.
Fonte: Pesquisa direta.
0
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10 9
2 2 2
1 1 1 1 1 1 1 1 1 1
Lula Ivete Sangalo Cazuza Djavan
Ronaldo Pelé Barack Obama Fafá de Belém
Tom Cavalcante Gilberto Gil Sílvio Santos Cláudia Leite
Maísa Marcelo D2
Gráfico 3 - O que identifica o povo brasileiro.
Fonte: Pesquisa direta.
24
0
2
4
6
8
10
12
14 13
4 4 4 4
2 2 2
1 1 1 1 1 1 1 1 1 1
A sua cultura O carnaval Samba
Comida Danças As raças
Preconceito e discriminação Música O futebol
Personalidade forte Praias Raça negra
Belas garotas brasileiras a felicidade para comemorar Cristo Redentor e Corcovado
Alegria MPB A bandeira verde e amarela
Gráfico 4 - Os povos que formaram o Brasil.
Fonte: Pesquisa direta.
* Os indígenas teriam contribuído com: a cultura, sociedade, turismo, educação, primeiros habitantes
do Brasil, conservação do Brasil.
** Segundo os alunos, os africanos contribuíram para a formação do Brasil com: danças, capoeira,
comidas, cor, força de lutar, o trabalho escravo, religiões, artes.
*** Os portugueses teriam contribuído com: língua, especiarias, a sociedade, fez o país crescer.
25
Gráfico 5 - As diferenças na Escola.
Fonte: Pesquisa direta.
Gráfico 6 - Tratamento pior ou melhor por ser diferente.
Fonte: Pesquisa direta.
Quadro 7 - O que é ser: branco, negro, indígena.
Fonte: Pesquisa direta
26
BRANCO NEGRO INDÍGENA
BRANCO NEGRO INDÍGENA
Gráfico 8 - O que é ser branco.
Fonte: Pesquisa direta.
Mais claro, mais
racista, ter mais
direitos, não sofrer
discriminação, ter
poder, ser
valorizado e
respeitado,
normal.
Ter a pele escura,
ser discriminado,
humilhado,
normal, invejoso,
boçal, também ser
racista, moreno,
trabalhador digno.
Ter cultura
diferente, viver na
mata, preservar a
natureza, ser bom,
saber pescar e
caçar, ter hábitos e
vida diferentes,
andar nu, viver
isolado.
27
Gráfico 9 - O que é ser índio.
Fonte: Pesquisa direta.
Gráfico 10 - O que é ser negro.
Fonte: Pesquisa direta.
28
Quadro 11 - O que é Racismo e Preconceito.
Fonte: Pesquisa direta (Atividades didáticas)
Racismo Preconceito
Tratar mal/desprezar por causa da
cor/raça; discriminar os negros; se
sentir diferente; um tipo de
preconceito; não gostar de negros;
sofrer diferenciações por ser negro
ou branco; ter preconceito racial; não
respeitar a cor de outra pessoa.
Algo que muitas pessoas sentem por
muitos motivos; discriminar; mesma
coisa que racismo; não gostar de
pessoas diferentes; não gostar de
gays; não gostar de pessoas por
serem diferentes, pela aparência.
Gráfico 12 - O que é racismo.
Fonte: Pesquisa direta. (Atividades didáticas)
29
Gráfico 13 - O que é preconceito.
Fonte: Pesquisa direta (Atividades didáticas)
30
Gráfico 14
Escolaridade dos pais do ensino
fundamental (particular)
12%
16%
6%
12%21%
15%
2%
2% 14%
ENS. FUND. INCOMPLETO ENS. MÉDIO INCOMPLETO
ENS. SUPERIOR INCOMPLETO ENS. FUND. COMPLETO
ENS. MÉDIO COMPLETO ENSINO SUPER. COMPLETO
PÓS GRADUAÇÃO CONCLUIDO
NÃO SOUBERAM
Gráfico 15
31
Índice de leitura dos pais do ensino
fundamental
23%
8%
9%6%
44%
10%
MENSAL BIMESTRAL SEMESTRAL
ANUAL NÃO LÊ NÃO SOUBERAM
Gráfico16
Disciplinas consideradas mais difíceis
7%14%
17%
30%
20%
2%3% 3%0% 4%
PORTUGUÊS MATEMÁTICA
HISTÓRIA GEOGRAFIA
LINGUA ESTRANGEIRA CIÊNCIAS BIOLÓGICAS
FÍSICA QUIMICA
OUTRAS MARCARAM 3 OPÇÕES SEM PREFERÊNCIA
Gráfico 17
32
Horas dedicadas ao estudo fora da escola
52%37%
2% 8% 1%
MENOS DE 01 HORA POR DIA 1 A 4 HORAS POR DIA
MAIS DE 4 HORAS POR DIA NÃO COSTUMA ESTUDAR EM CASA
NÃO RESPONDERAM
Gráfico 18
Cor/Raça
33
Gráfico 19
Renda familiar
Gráfico 20
Escolaridade
34
Gráfico 21
Freqüência de leitura – Jornais
Gráfico 22
Freqüência de leitura – Revista
Gráfico 23
Freqüência de leitura – Livro
35
Gráfico 24
Renda familiar
Gráfico 25
Frequência de leitura – Jornais
36
Gráfico 26
Freqüência de leitura – Revistas
37
Gráfico 27
Frequência de leitura – Livros
Gráfico 28
38
Gráfico 29
Gráfico 30
39