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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ INSTITUTO DE CIÊNCIAS DO MAR LABOMAR CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS MARINHAS TROPICAIS NÍVEL: MESTRADO SUZANA SALES RIBEIRO CONECTIVIDADE ECOLÓGICA NO OCEANO ATLÂNTICO TROPICAL POR MEIO DE MODELAGEM NUMÉRICA FORTALEZA 2017

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ

INSTITUTO DE CIÊNCIAS DO MAR – LABOMAR

CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS MARINHAS TROPICAIS

NÍVEL: MESTRADO

SUZANA SALES RIBEIRO

CONECTIVIDADE ECOLÓGICA NO OCEANO ATLÂNTICO TROPICAL POR

MEIO DE MODELAGEM NUMÉRICA

FORTALEZA

2017

SUZANA SALES RIBEIRO

CONECTIVIDADE ECOLÓGICA NO OCEANO ATLÂNTICO TROPICAL POR MEIO

DE MODELAGEM NUMÉRICA

Dissertação submetida à coordenação do Curso

de Pós-Graduação em Ciências Marinhas

Tropicais da Universidade Federal do Ceará,

como requisito parcial para a obtenção do grau

de mestre em Ciências Marinhas Tropicais.

Linha de Pesquisa: Análise de impactos

ambientais na região oceânica e costeira.

Orientador: Prof. Dr. Carlos Eduardo Peres

Teixeira

Coorientador: Prof. Dr. Raúl Cruz Izquierdo

FORTALEZA

2017

SUZANA SALES RIBEIRO

CONECTIVIDADE ECOLÓGICA NO OCEANO ATLÂNTICO TROPICAL POR MEIO

DE MODELAGEM NUMÉRICA

Dissertação submetida à Coordenação do Curso

de Pós-Graduação em Ciências Marinhas

Tropicais da Universidade Federal do Ceará,

como requisito parcial para a obtenção do grau

de Mestre em Ciências Marinhas Tropicais.

Aprovada em __/__/__.

BANCA EXAMINADORA

____________________________________________

Prof. Dr. Carlos Eduardo Peres Teixeira (Orientador)

Universidade Federal do Ceará - UFC

__________________________________________

Prof. Dr. Luíz Ernesto Arruda Bezerra

Universidade Federal do Ceará - UFC

__________________________________________

Prof. Dr. Ana Paula Morais Krelling

Universidade Federal do Ceará - UFC

Dedico a todos que me apoiaram

durante esses dois anos de mestrado.

AGRADECIMENTOS

A Deus.

Aos meus pais. Amo esses dois.

Agradeço especialmente ao meu orientador Carlos Teixeira pela grande ajuda. Cara legal,

levo comigo tudo de bom que esse trabalho nos trouxe.

Ao meu coorientador, Raúl Cruz, por todo o auxílio na parte biológica do trabalho. Figuraça

que manja muito do assunto.

A Juliana Gaeta, que também me ajudou bastante.

Ao meu namorado, Matheus. Você me inspira, lindo!

Aos meus amigos. Poucos, porém cada um com seu lugarzinho especial no meu coração.

Aos meus companheiros de laboratório, Babi, Dayse, Edie, Rafa, Samuel, Victinho, pelas

experiências trocadas durante esses 2 anos. A Oceanografia é a Física. Ah, sim! Obrigada André

pelos artigos e rotinas iniciais que me ajudaram a sair do canto e obrigada, Erik, pela ajuda com

o abstract.

A professora Ana Paula Krelling, um anjo que caiu do céu dentro do Labomar, mais

precisamente dentro do LOF. Obrigada por me ajudar com a física do negócio e parabéns pelo

empenho com seus alunos.

Aos meus colegas da pós. Com muito carinho vos digo que foi muito bom ter conhecido

vocês.

À banca, pela disponibilidade e pela ajuda na melhoria do documento.

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES, pelo apoio

financeiro.

“Se deixou levar por sua convicção de que os seres humanos não nascem para sempre no dia

em que as mães os dão a luz, e sim que a vida os obriga outra vez e muitas outras vezes a se

parirem a si mesmos.”

(Gabriel García Marquéz)

RESUMO

O entendimento do recrutamento e conectividade de espécies marinhas que possuem fases

planctônicas é uma tarefa complexa e que necessita de um enfoque multidisciplinar. As lagostas

são um importante recurso pesqueiro para a região nordeste do Brasil que vem sendo sobre

explorado há anos. Estes organismos apresentam ciclo de vida complexo, com duração pelágica

larval de até um ano e com até 11 estágios larvais e um estágio puerulus, quando finalmente

adquire capacidade natatória para migrar do oceano para habitats costeiros. Por apresentarem

tão longa duração pelágica larval, essas larvas podem ser transportadas para locais distantes de

onde ocorreu a desova. Haja vista os indivíduos adultos serem bentônicos e não sobreviverem

a profundidades maiores que 200 m, uma das questões a ser respondida é a origem dos estoques

de lagosta encontrados no Arquipélago de São Pedro e São Paulo (ASPSP), no Arquipélago de

Fernando de Noronha (FN) e no Atol das Rocas (AR). Dados de circulação superficial entre

2002 e 2012 provenientes da rodada de reanálise do modelo global HYCOM/NCODA, com

resolução de espacial de 0.08°, foram incorporados ao Ichthyop, um Modelo Baseado no

Indivíduo, para estudar a dispersão das larvas de lagosta. O domínio do modelo abrange toda a

região do Atlântico Tropical entre as latitudes 30 N° e 25°S, onde estão inseridas as três regiões

insulares alvo desse estudo. As simulações foram realizadas de forma reversa (backward mode)

com lançamento inicial de larvas, aqui tratadas como partículas passivas, onde se localizam as

ilhas e acompanhadas durante 7 meses a partir de abril e setembro. ASPSP, FN, AR e a

plataforma continetal brasileira (PCB) apresentam conexão ecológica entre si, em que uma

região pode servir de trampolim ecológico e garantir fluxo gênico indireto com as demais

regiões. Desovas na PCB em fevereiro possibilitam maior conectividade. A Ilha de Ascenção

(IA) e Cabo Verde (CV) também podem ser fonte de larvas para ASPSP, AR e FN, embora em

menor grau. Nesse caso, a maior conectividade se dá com desovas ocorridas em setembro para

IA e fevereiro para CV. Embora a costa africana mostre maiores porcentagens de partículas

virtuais em conexão, não se pode esperar que essa região dê origem às lagostas das ilhas

brasileiras, pois não existem populações equivalentes na África. Existe grande variabilidade

interanual na conectividade entre as regiões. Os resultados aqui encontrados também podem ser

úteis em estudos de dispersão e advecção em superfície de materiais em geral e estudos de

conectividade para outras espécies com parte do ciclo de vida no plâncton.

Palavras-chave: Dispersão larval, Ichthyop, Oceano Atlântico Tropical

ABSTRACT

The understanding of the recruitment and conectivity of marine species that has planktonic

stages is a complex task and it needs a multidisciplinary approach. For example, the lobsters

are an important fishery resource for the Northeast region of Brazil that has been exploited for

many years. These organisms have a very complex life cicle, with the duration of a pelagic

larval stage of one year with up to 11 larval stages and a puerulus stage, in which it acquire the

ability to swim and migrate from the ocean to coastal habitats. For showing such a long pelagic

larval duration, this larvae can be transported to places far from where the spawn has occured.

Since the adult individuous are benthic and cannot survive to depths higher than 200 m, one of

the questions to be answered is the origin of the lobster stocks found in São Pedro e São Paulo

Archipelago (ASPSP), in the Fernando de Noronha Archipelago (FN) and in the Rocas Atoll

(AR). Surface circulation data, between 2002 and 2012, from the reanalysis of the

HYCOM/NCODA global model, with resolution of 0.08°, were incorporated to the Ichthyop,

a, Individuous Based Model, to study the lobster larvae dispersion. The model domain covers

the whole intertropical Atlantic region between the latitudes of 30° N and 25° S, where the three

target islands are in. The simulations were realized in backward mode with the initial release of

larvae, treated as passive particles, where the islands are situated and monitored for 7 months

starting from April and September. ASPSP, FN, AR and the brazilian continental shelf (PCB)

express a conexion where one region can be used as a ecological trampolines and guarantee the

indirect genetic flux within the regions. Spawns in the PCB in February ensure a larger

conectivity. The Ascension Island (IA) and Cape Verde (CV) can also be a source of larvae to

the islands, although in a much lower grade. In this case, the larger conectivity is given by the

September, to IA, and April, to CV, spawns. Even though the African coast shows highest

percentages of virtual particles in conexion, it cannot be expected that this region feeds the

brazilian islands with lobsters, for there are no equivalent populations in Africa. There is a large

interannual variability in the conectivity between these regions. The results here found can also

be useful in dispersion and surface advection of materials in general and conectivity studies to

other species with a planktonic stage in its life cicle.

Key words: Larval dispersion, Ichthyop, Tropical Atlantic Ocean.

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 - Diferentes fases do ciclo de vida das lagostas espinhosas: a) filossoma no seu oitavo

estágio, b) puerulus e c) indivíduo adulto................................................................................ 24

Figura 2 - Principais correntes em superfície encontradas no Oceano Atlântico Tropical no

outono boreal (à esquerda) e na primavera boreal (à direita). Os quadrados com “r” representam

áreas de ressurgência. Os pontos coloridos representam a localização aproximada de cada ilha:

em vermelho, ASPSP, em azul, AR e em verde FN. ................................................................ 25

Figura 3 - Representação dos polígonos de possível origem das larvas de lagosta que chegam

ao ASPSP, AR e FN. ................................................................................................................ 31

Figura 4 - Representação esquemática da estrutura dos derivadores lagrangeanos rastreados por

satélite, mostrando a vela que ameniza o arrasto da boia pelo vento. ...................................... 32

Figura 5 - Exemplos de trajetórias de derivadores lagrangeanos no Atlântico Tropical com o

tempo aproximado de duração do transporte. O “x” representa o local onde a boia foi lançada,

enquanto o “o” indica o posicionamento final da boia. Em todos os exemplos, os derivadores

percorrem menos de um ano de um ponto a outro do Atlântico. As cores indicam a velocidade

de deriva das boias. ................................................................................................................... 36

Figura 6 - Simulações a partir da trajetória da boia nº13, com lançamento (X) em 1 de janeiro

de 2002 e final (*) em 25 de setembro de 2002. Acima e a esquerda (a) com Ɛ = 10-9 m2/s3,

abaixo e a esquerda (b) com Ɛ = 10-7 m2/s3, acima e a direita (c) com Ɛ = 10-6 m2/s3, abaixo e a

direita (d) com Ɛ = 10-4 m2/s3. As cores da trajetória da bóia de deriva representam a velocidade

da corrente e em preto as trajetórias das 50 partículas. ............................................................ 38

Figura 7 - Simulações a partir da trajetória da boia nº 269, com lançamento (X) em 29 de maio

de 2006 e final (*) em 17 de março de 2007. Acima e a esquerda (a) com Ɛ = 10-9 m2/s3, abaixo

e a esquerda (b) com Ɛ = 10-7 m2/s3, acima e a direita (c) com Ɛ = 10-6 m2/s3, abaixo abaixo e a

direita (d) com Ɛ = 10-4 m2/s3. As cores da trajetória da bóia de deriva representam a velocidade

da corrente e em preto as trajetórias das 50 partículas. ............................................................ 39

Figura 8 - Simulações baseadas na trajetória da boia nº 493, com lançamento (X) no dia 1 de

maio de 2009 e final (*) no dia 31 de dezembro de 2009. Acima e a esquerda (a) com Ɛ = 10-9

m2/s3, abaixo e a esquerda (b) com Ɛ = 10-7 m2/s3, acima e a direita (c) com Ɛ = 10-6 m2/s3, ,

abaixo e a direita (d) com Ɛ = 10-4 m2/s3. As cores da trajetória da bóia de deriva representam a

velocidade da corrente e em preto as trajetórias das 50 partículas. .......................................... 40

Figura 9 - Trajetória reversa de larvas virtuais lançadas em 1/4/2003 a partir de AR, FN e

ASPSP com rastreamento de 210 dias. As cores mostram o tempo decorrido em dias a partir do

momento de lançamento. Os círculos indicam possíveis origem das larvas. ........................... 42

Figura 10 - Trajetória reversa de larvas virtuais lançadas em 1/4/2009 a partir de AR, FN e

ASPSP com rastreamento de 210 dias. As cores mostram o tempo decorrido em dias a partir do

local de lançamento. Os círculos indicam possíveis origem das larvas. .................................. 43

Figura 11 - Média trimestral entre janeiro e março de 2007 das correntes em superfície no

Oceano Atlântico Tropical. As siglas indicam o posicionamento médio de ASPSP, FN, AR e

IA. O círculo destaca a assinatura da SCE. .............................................................................. 44

Figura 12 - Porcentagem de partículas lançadas em 1 de abril entre os anos 2003 e 2012 a partir

de AR, FN e ASPSP que atingem a PCB e regiões adjacentes. ............................................... 45

Figura 13 - Trajetória reversa de larvas virtuais lançadas em 1/4/2004 a partir de AR, FN e

ASPSP com rastreamento de 210 dias. As cores mostram o tempo decorrido em dias a partir do

local de lançamento. Os círculos indicam possíveis origem das larvas. .................................. 46

Figura 14 - Médias trimestrais da circulação superficial no Oceano Atlântico Tropical nos dois

primeiros trimestres de 2004; (a) de janeiro a março e (b) de abril a junho. Os fluxos

responsáveis pelas conexões se encontram circulados. ............................................................ 47

Figura 15 - Médias trimestrais da circulação superficial no Oceano Atlântico Tropical nos dois

primeiros trimestres de 2006; (a) de janeiro a março e (b) de abril a junho. Os fluxos

responsáveis pelas conexões se encontram circulados. ............................................................ 48

Figura 16 - Porcentagem de partículas lançadas em 1 de abril (a) e 1 de setembro (b) entre os

anos 2003 e 2012 a partir de AR, FN e ASPSP que atingem a Ilha de Ascensão. ................... 49

Figura 17 - Trajetória reversa de larvas virtuais lançadas em 1/9/2011 a partir de AR, FN e

ASPSP com rastreamento de 210 dias. As cores mostram o tempo decorrido em dias a partir do

local de lançamento. Os círculos indicam possíveis origem das larvas. .................................. 50

Figura 18 - Porcentagem de partículas lançadas em 1 de abril (a) e 1 de setembro (b) entre os

anos 2003 e 2012 a partir de AR, FN e ASPSP que atingem a região de CV. ......................... 50

Figura 19 - Porcentagem de partículas lançadas em 1 de abril (a) e 1 de setembro (b) entre os

anos 2003 e 2012 a partir de AR, FN e ASPSP que atingem a região noroeste da África. ...... 52

Figura 20 - Porcentagem de partículas lançadas em 1 de abril (a) e 1 de setembro (b) entre os

anos 2003 e 2012 a partir de AR, FN e ASPSP que atingem a região oeste da África. ........... 53

Figura 21 - Trajetória reversa de larvas virtuais lançadas em 1/4/2005 (a) e 1/9/2005 (b) a partir

de AR, FN e ASPSP com rastreamento de 210 dias. As cores mostram o tempo decorrido em

dias a partir do local de lançamento. Os círculos indicam possíveis origem das larvas. ......... 54

Figura 22 - Médias trimestrais de circulação superficial no ano 2005. (a) de janeiro a março, (b)

de abril a junho; (c) de julho a setembro e (d) de outubro a dezembro. .................................. 55

Figura 23 - Trajetória reversa de larvas virtuais lançadas em 1/4/2010 (a) e 1/9/2010 (b) a partir

de AR, FN e ASPSP com rastreamento de 210 dias. As cores mostram o tempo decorrido em

dias a partir do local de lançamento. Os círculos indicam possíveis origem das larvas. ......... 56

Figura 24 - Trajetória reversa de larvas virtuais lançadas em 1/9/2008 a partir de AR, FN e

ASPSP com rastreamento de 210 dias. As cores mostram o tempo decorrido em dias a partir do

local de lançamento. Os círculos indicam possíveis origem das larvas. .................................. 57

LISTA DE TABELAS

Tabela 1: Coordenadas limites dos polígonos representantes de cada região insular onde foram

lançadas as partículas virtuais....................................................................................................29

Tabela 2: Quantidades mais relevantes de partículas virtuais que apresentam origem no

continente africano em 210 dias de rastreamento......................................................................51

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AR Atol das Rocas

ASPSP Arquipélago de São Pedro e São Paulo

AT Oceano Atlântico Tropical

CA Corrente de Angola

CB Corrente do Brasil

CG Corrente da Guiné

CCNE Contracorrente Norte Equatorial

cCSE Ramo central da Corrente Sul Equatorial

CFSR Climate Forecast System Reanalysis

CNB Corrente Norte do Brasil

CNE Corrente Norte Equatorial

CSE Corrente Sul Equatorial

DBPC Data Buoy Cooperation Panel

DPL Duração Pelágica Larval

FN Fernando de Noronha

GDP Global Drifters Program

GOOS Global Ocean Observing System

HN Hemisfério Norte

HS Hemisfério Sul

HYCOM Hybrid Coordinate Ocean Model

IA Ilha de Ascensão

MBI Modelo Baseado no Indivíduo

NCEP National Centers for Environmental Prediction

nCSE Ramo norte da Corrente Sul Equatorial

NCODA Navy Coupled Ocean Data Assimilation

NOAA National Oceanic and Atmospheric Administration

PCB Plataforma Continental Brasileira

SCE Subcorrente Equatorial

SCNB Subcorrente Norte do Brasil

SCNE Subcorrente Norte Equatorial

sCSE Ramo sul da Corrente Sul Equatorial

TSM Temperatura Superficial do Mar

ZCIT Zona de Convergência Intertropical

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 17

2 OBJETIVOS ........................................................................................................................ 21

2.1 Objetivo Geral ............................................................................................................... 21

2.2 Objetivos Específicos .................................................................................................... 21

3 LAGOSTAS ESPINHOSAS (FAMÍLIA PALINURIDAE) ............................................ 22

4 CIRCULAÇÃO SUPERFICIAL NO OCEANO ATLÂNTICO TROPICAL ............... 25

5 MATERIAL E MÉTODOS ................................................................................................ 28

5.1 Dados de reanálise HYCOM/NCODA ........................................................................ 28

5.2 Ichthyop ......................................................................................................................... 29

5.3 Bóias de Deriva .............................................................................................................. 32

5.3.1. Teste de hipótese ..................................................................................................... 33

5.3.2 Escolha da taxa de dissipação turbulenta e validação do Ichthyop ........................ 33

6 RESULTADOS E DISCUSSÃO......................................................................................... 35

6.1 Teste de hipótese ........................................................................................................... 35

6.2 Taxa de dissipação e validação do Ichthyop ............................................................... 37

6.3 Simulações ..................................................................................................................... 40

6.3.1 Conectividade entre ASPSP, AR e FN ..................................................................... 41

6.3.2. Conectividade do ASPS, AR e FN com outras regiões do AT ................................. 43

7 CONCLUSÃO ...................................................................................................................... 58

REFERÊNCIAS...................................................................................................................... 60

APÊNDICE A ......................................................................................................................... 63

17

1 INTRODUÇÃO

Muitas populações ocupam fragmentos de habitat e, embora isoladas espacialmente,

são conectadas por fluxos biológicos e a estas pode-se aplicar o conceito de metapopulação.

De maneira geral, uma metapopulação é um conjunto de subpopulações as quais se encontram

como manchas em uma determinada área, sendo delimitadas por regiões que não servem de

habitat para aqueles organismos e que se mantêm em rede por migração de alguns organismos,

de forma que isto vem a influenciar a dinâmica populacional daquela área, sendo até mesmo

possível a colonização e recolonização após extinção (HANSKI; SIMBERLOFF, 1997). No

ambiente marinho, as ilhas não funcionam como um sistema fechado e populações adultas

apresentam descontinuidade de habitat, por isso sua conectividade se torna restrita aos

movimentos de dispersão larval durante estágios ontogenéticos (POROBIĆ et al., 2013). Esse

raciocínio também pode ser aplicado ao se investigar como se dá a colonização inicial em uma

região insular. Segundo a teoria de biogeografia de ilhas de MacArthur & Wilson (1967), a taxa

de imigração de espécies para estes locais isolados espacialmente varia de acordo com o

tamanho e o isolamento da ilha: quanto menor a ilha e mais isolada, menor será a taxa

de imigração para este local. Se uma espécie é capaz de estabelecer população nesse fragmento

de habitat ou não, isso vai depender da extensão desse habitat em relação à configuração

espacial dessa interconexão e de características dessa espécie (HANSKI, 1998).

O conhecimento da troca larval entre populações de organismos marinhos é vital para o

estudo da dinâmica de populações marinhas, manejo dos estoques pesqueiros e o design de

reservas marinhas (COWEN et al., 2000; KOUGH et al., 2013). A variação no transporte larval

de uma região pode influenciar na abundância de uma espécie naquele habitat (XUE et al.,

2008) por mais que não seja o caso de um fluxo constante e portanto não se trate de uma

metapopulação propriamente dita. Por volta de 1950 até o início dos anos 1970, pesquisadores

especializados em meroplâncton, o qual é constituído por espécies cuja fase larval se dá dentro

do plâncton, já abordavam questionamentos a respeito do potencial de dispersão de organismos

e da colonização de novos habitats em mais largas escalas (MCCONAUGHA, 1992).

A dispersão larval no ambiente marinho é ditada pelas características biológicas da

espécie na sua fase pelágica e pela oceanografia física da região. Ao se tratar de dispersão larval

por correntes marinhas, saber apenas aspectos biológicos não é o suficiente para o completo

entendimento, sendo preciso saber os processos físicos que controlam processos biológicos

(FENNEL; NEUMANN, 2001; MCCONAUGHA, 1992). O movimento nos oceanos é

18

composto por diversos processos que atuam de forma concomitante e possuem ordens de

grandeza distintas em relação a suas escalas espaciais e temporais. As escalas espaciais

relevantes para o estudo da conectividade marinha através da dispersão larval vão da ordem de

milímetros, como interações presa-predador, a ordem de bacias oceânicas. Por sua vez, as

escalas temporais podem ser de menos de um dia até tempo geológico (MCCONAUGHA,

1992). Uma vez que a dispersão desde a fonte de organismos até o local de colonização pode

ser muito ampla devido a fortes correntes oceânicas, as populações marinhas são consideradas

como “abertas” ao longo de escalas de tempo ecológicas (COWEN et al., 2000).

Muitos organismos marinhos possuem um ciclo de vida complexo com longa fase larval,

permanecendo muito tempo na coluna d’água. É o caso, por exemplo, das lagostas, as quais,

além de apresentarem corpo achatado em formato de folha e pouca ou nenhuma capacidade

natatória (LIPCIUS; COBB, 1994), possuem duração pelágica larval (DPL) de até um ano

(ABRUNHOSA et al., 2008) e, com isso, maior probabilidade de dispersão para longe do seu

local de origem por correntes oceânicas durante o estágio de vida larval. Além disso, esses

organismos bentônicos apresentam baixa mobilidade na fase adulta, em comparação com a

capacidade de advecção da sua fase dispersiva, e são normalmente encontrados em

profundidades inferiores a 200 metros, o que permite afirmar que uma população de lagostas

naturalmente só se estabelece em uma região insular através da chegada de suas larvas a este

local.

A partir desse embasamento, surgiu o questionamento de como a espécie de lagosta

Panulirus echinatus (Smith, 1869) (Família Palinuridae) estabeleceu populações no

Arquipélago de São Pedro e São Paulo, no Arquipélago de Fernando de Noronha e no Atol das

Rocas, todas regiões insulares pertencentes ao território brasileiro. Acredita-se que é possível

que haja algum tipo de conectividade ecológica entre populações de lagostas encontradas em

regiões insulares do Brasil e outras regiões do Atlântico. Rudorff et al., (2009) realizaram

estudo semelhante porém com o objetivo de determinar se os estoques adultos de lagosta já

estabelecidos nessas ilhas apresentam conectividade com outras regiões. Para estudar tal

dispersão larval, eles usaram campos de correntes geostrófcas de superfície derivados de

satélites altímetros em um modelo simples de advecção-difusão. Seus resultados para as ilhas

brasileiras mostraram conectividade apenas com a plataforma continental brasileira. Já para as

larvas virtuais lançadas na Costa do Marfim, mesmo com um sistema de correntes na região

equatorial de forte componente zonal oeste, podendo alcançar quase 1 m/s, as larvas virtuais

foram transportadas pela Corrente da Guiné e ficaram retidas próximas ao local de lançamento,

no continente africano. Contudo, percebe-se que, ao se correlacionar estes campos de correntes

19

superficiais com velocidades obtidas de boias de deriva, as correntes parecem ser subestimadas

em até 50%, o que pode gerar equívocos no resultado da dispersão das larvas virtuais.

Infelizmente, não existem muitos estudos a respeito da longa fase larval das lagostas em

águas brasileiras e seu transporte por correntes oceânicas (CRUZ et al., 2015). No caso da

espécie P. echinatus as dificuldades do estudo aumentam tendo em vista que das cinco espécies

do gênero Panulirus encontradas no Atlântico, apenas P. echinatus não tem a descrição

morfológica do seu ciclo de vida pelágico (KONISHI et al., 2006). Contudo, as larvas

filossomas deste gênero são morfologicamente muito semelhantes e, no geral, a maioria das

lagostas apresenta longo ciclo de vida larval e distribuição espacial semelhantes (KONISHI et

al., 2006).

A espécie P. echinatus é encontrada em ilhas do Atlântico Sul, Cabo Verde e nas ilhas

canárias (HOLTHUIS, 1991). Porém, pouco se sabe a respeito da conectividade anfiatlântica

(RUDORFF et al., 2009). As células de circulação superficial oceânica que compõem os giros

subtropicais são da ordem de milhares de quilômetros e mantém sua conformação básica porém

com grande atividade de meso-escala (ex: vórtices, meandros, anéis). Paralelos a estes, existem

os movimentos turbulentos, que são turbilhões de escalas espacial e temporal bem menores e

de alta variabilidade.

A advecção de larvas somada ao seu tamanho diminuto torna a sua observação direta

um desafio (KOUGH, 2014) e com isso, surge a necessidade de se aplicar métodos alternativos

de estudo de dispersão larval aos estudos in situ. Para estes fins, os modelos biofísicos são uma

boa opção para se compreender tais cenários ecológicos, pois são ferramentas que acoplam

processos hidrodinâmicos atuantes no local e o comportamento da espécie (FENNEL;

NEUMANN, 2001). Recentes avanços em modelagem numérica geraram um crescente

interesse por dispersões a longas distâncias (KOUGH, 2014) e o desenvolvimento de novos

algoritmos tem permitido a implementação de detalhamentos biológicos (WERNER et al.,

2007). Cowen et al. (2000) mostrou que a alta conectividade entre populações que antes

considerava apenas a advecção por correntes pode cair de cinco a nove ordens de magnitude

quando adicionados parâmetros de difusividade horizontal e mortalidade, exemplos que fazem

caracterização do meio físico e biológico, respectivamente. Neste caso, os modelos biofísicos

desempenham esta e outras funções do gênero e por isso são ferramentas aconselhadas para

esse tipo de estudo.

O entendimento da dispersão das larvas de lagostas espinhosas presentes em ilhas

pertencentes ao território brasileiro é de suma importância não só para os estoques pesqueiros

dessa região, mas também internacionalmente. Esse tipo de investigação leva a um melhor

20

entendimento da dinâmica populacional dessas espécies dentro de escalas espaciais que

abrangem outras regiões do Oceano Atlântico, onde pode haver aporte de larvas e outras

populações. Da mesma forma, esse estudo também pode se estender a outros organismos que

possuem estágio larval dentro do plâncton, sendo meroplanctônicos ou não. As lagostas

espinhosas são abordadas aqui por serem um dos organismos marinhos de maior DPL, mas caso

existam outras espécies de longa DPL nessas ilhas, esse estudo pode ser aplicado a elas. A partir

da obtenção dessas informações é possível planejar estratégias de manejo sustentável desses

recursos de forma mais eficiente.

21

2 OBJETIVOS

2.1 Objetivo Geral

Determinar a possibilidade física de conectividade ecológica entre populações de

lagosta espinhosa encontradas em três regiões insulares do território brasileiro e outras regiões

do Oceano Atlântico Tropical.

2.2 Objetivos Específicos

Definir a origem das larvas que chegam à três regiões insulares do território brasileiro.

Definir as trajetórias da advecção de larvas que chegam à área de estudo de acordo com

a época do ano.

Definir a conectividade entre as três ilhas alvo deste estudo.

Estudar a influência dos processos de dispersão horizontal nos resultados.

Investigar a variabilidade interanual no processo de advecção das partículas virtuais.

22

3 LAGOSTAS ESPINHOSAS (FAMÍLIA PALINURIDAE)

A família Palinuridae, também denominadas vulgarmente por família das lagostas

espinhosas, é constituída por 12 gêneros e 57 espécies distribuídas nas mais diversas regiões

oceânicas e costeiras do planeta (CHAN, 2010; GIRALDES; SMYTH, 2016). Levando em

consideração estudos taxonômicos, genéticos e biogeográficos, essa família teve origem no

Oceano Pacífico Oeste, no Mioceno há cerca de 23 milhões de anos (GEORGE, 2005a).

Eventos paleo-oceanográficos como movimentos tectônicos e mudança no padrão

energético de sistemas costeiros e oceânicos, juntamente com mudanças climáticas, são

responsáveis pela alteração das propriedades da água, pela formação de novas correntes

oceânicas e pelo surgimento de novos ambientes de águas rasas, como a emergência de ilhas

oceânicas (GEORGE, 2005a). Tais modificações no ambiente foram responsáveis por

processos de especiação e demais mudanças biológicas, as quais foram importantes para a

ocupação de novos habitats pelas lagostas espinhosas (GEORGE, 2005b). Hoje, as lagostas da

família Palinuridae são encontradas em várias regiões como América Latina, América do

Norte, Austrália, Nova Zelândia, Oceano Índico, África e Mar Mediterrâneo (GÓES, 2006;

GEORGE, 2005a). Esta ampla distribuição geográfica é fruto do sucesso adaptativo e

capacidade de dispersão destes organismos (GÓES, 2006).

Das cinco espécies do gênero Panulirus que existem no Oceano Atlântico Tropical,

Panulirus meripurpuratus e Panulirus echinatus (Smith, 1869) ocupam o Arquipélago de

Fernando de Noronha, o Arquipélago de São Pedro e São Paulo e o Atol das Rocas, todas

regiões insulares pertencentes ao território brasileiro que são foco desse estudo, sendo esta

última a espécie mais abundante nessas regiões. Também existe população de Panulirus

laevicauda (Latreille, 1817) no Arquipélago de Fernando de Noronha e um exemplar dessa

mesma espécie já foi visto no Atol das Rocas.

A P. argus tem uma ampla distribuição geográfica, alcançando desde a costa leste dos

Estados Unidos, incluindo Bermudas, o Mar do Caribe e o Golfo do México. A P. argus

também é encontrada em Cabo Verde (FREITAS; CASTRO, 2005) e existem registros de

exemplares na Costa do Marfim (HOLTHUIS, 1991). A P. meripurpuratus é encontrada na

costa nordeste brasileira até o estado do Rio de Janeiro (GIRALDES; SMYTH, 2016), sendo

que daí em diante, até o do Rio Grande do Sul, não se tem observado agregações de lagostas

espinhosas na costa do Brasil (PAIVA, 1997). A P. laevicauda tem distribuição semelhante,

sendo encontradas populações em Bermudas, Flórida, Península de Iucatã, Mar do Caribe e

nordeste do Brasil (HOLTHUIS, 1991). A distribuição geográfica da P. echinatus, por sua vez,

23

se difere um pouco mais pois, além de possuir populações estabelecidas em toda a costa

nordeste do Brasil e nas ilhas foco desse estudo, essa espécie também é encontrada em outras

regiões insulares do Oceano Atlântico: Ilha da Trindade, Cabo Verde, Ilhas Canárias, Ascensão

e Santa Helena (HOLTHUIS, 1991; BUTLER et al., 2011).

É importante salientar que essas espécies aqui citadas são todas de importância

comercial. As populações brasileiras de lagostas espinhosas sustentam uma das maiores

pescarias comerciais que existem, mantendo o Brasil no terceiro lugar no ranking mundial na

produção de lagostas, ficando atrás apenas da Austrália e de Cuba (FONTELES-FILHO, 2005).

P argus, além de ser um predador chave no ecossistema bentônico (CRUZ et al., 2015), é a

espécie mais abundante comercialmente, seguida em ordem de importância por P laevicauda e

P echinatus (GÓES; CARVALHO, 2005).

Com excessão da P. echinatus, as duas demais espécies do gênero Panulirus aqui

destacadas são protegidas pela legislação. A biologia, ecologia e dinâmica do ciclo de vida da

P. argus é relativamente bem conhecida, o que não é o caso da P. echinatus, cujas informações

deste tipo não existem de forma satisfatória (BUTLER et al., 2011). Vários estudos ampliaram

o conhecimento das larvas filossomas, nome pelo qual se denominam as larvas de lagosta, e

seus vários estágios larvais transitórios. Porém, o ciclo de vida de larvas de lagosta é

normalmente estudado em laboratório, o que pode gerar diferenças ao real ciclo nos oceanos,

pois as condições de alimentação e qualidade da água in vitro afetam a cultura

das filossomas (ABRUNHOSA et al., 2008). Larvas cultivadas em laboratório

normalmente sub-optimizam as características morfológicas identificadas em larvas selvagens

(GOLDSTEIN et al., 2008). Ainda mais, por apresentarem ciclo de vida larval tão extenso, o

cultivo se torna um desafio e as larvas podem ser perdidas antes do final do estudo.

Diferentes espécies de lagosta apresentam estágios de vida semelhantes, podendo

apresentar algumas diferenças nos seus ciclos de vida. A lagosta espinhosa é um dos animais

marinhos de maior Duração Pelágica Larval (DPL). Goldstein e Butler IV (2009) afirmam que

essas larvas podem permanecer de 4 a 18 meses na coluna d’água. O período de 12 meses é

usado na comunidade científica (POLOVINA; MOFFITT, 1995; POROBIĆ et al., 2012;

RUDORFF et al., 2009). Um estudo realizado em cativeiro por Goldstein et al. (2008) estimou

um valor inferior para a DPL da P argus em aproximadamente 174 dias (6,5 meses). Porém,

um estudo realizado por Cruz et al. (2015) revela que, para as populações de P argus

encontradas na plataforma continental do Brasil, o período larval dura entre 6 e 7 meses,

dependendo da data da estação e de desova. Cruz e Bertelsen (2009) afirmam que fêmeas de P

argus da região do Caribe mostram uma fecundidade média superior a 1,9 milhões de ovos.

24

Essa espécie tem elevado potencial reprodutor, podendo desovar várias vezes ao ano, chegando

entre 3 a 6 milhões de ovos por ano. P. echinatus também apresenta características ecológicas

semelhantes, não precisando se agregar para desovar e apresentando alta fecundidade. Uma

fêmea de P. echinatus pode ter em média mais de 56 mil ovos, capacidade menor que a da P.

argus devido a seu menor tamanho.

Enquanto filossomas, as larvas apresentam o corpo achatado em formato de folha e sem

nenhuma capacidade natatória, o que faz com que seu deslocamento seja dependente das

correntes e movimentos oceânicos que ali atuam. Além disso, as larvas filossomas apresentam

migração nictimeral: durante a noite, elas estão mais próximas a superfície e durante o dia elas

se encontram em maiores profundidades, em média 100 metros da coluna d’água. Esse

comportamento representa uma estratégia de sobrevivência, tanto para escapar dos predadores,

quanto para se alimentar. As filossomas podem apresentar até 11 estágios até que enfim se

transforma em puerulus, quando ela não mais se alimenta, passando a utilizar a reserva

energética armazenada no período de filossoma para nadar em direção à costa e finalmente

assentar. Aí, sua fase pelágica se encerra, dando início à fase algal (de aproximadamente 5

meses), a fase juvenil, a fase pré-adulta e por fim tornar-se um indivíduo adulto, capaz de

reproduzir (FIGURA 1).

Figura 1 - Diferentes fases do ciclo de vida das lagostas espinhosas: a) filossoma no seu oitavo

estágio, b) puerulus e c) indivíduo adulto.

Fonte: Konishi et al. (2006); Góes (2006); cortesia de Juliana Gaeta.

Os mecanismos que induzem a metamorfose, a sobrevivência e o assentamento das

larvas de diversas espécies da família das lagostas espinhosas não são totalmente esclarecidos.

Sabe-se que as larvas podem desenvolver estratégias para acelerar o processo de metamorfose

e diminuir sua DPL, mas não se sabe ao certo como se dá esse processo. A distribuição e

a) b) c)

25

abundância das filossomas na plataforma continental brasileira e adjacências é difícil de ser

determinada por conta da falta de coletas in situ. É certo que o nível de assentamento de

puerulus está relacionado, dentre outros fatores, com a abundância de indivíduos, a estrutura

do habitat e o tipo de substrato, mas é importante salientar que o fluxo de correntes que

transportam esses pequenos organismos e os fazem penetrar na plataforma ou em regiões

insulares é de fundamental importância para a dinâmica da população que ali se estabelece e

ainda pouco conhecido.

4 CIRCULAÇÃO SUPERFICIAL NO OCEANO ATLÂNTICO TROPICAL

O Arquipélago de Fernando de Noronha (FN), o Arquipélago de São Pedro e São Paulo

(ASPSP) e o Atol das Rocas (AR) são as três regiões insulares alvo desse estudo, todas inseridas

no Oceano Atlântico Tropical (AT). Essa é uma região bastante dinâmica que está sob

influência de processos atmosféricos e oceânicos que causam variabilidade em escalas

intrasazonal, interanual e interdecadal das correntes superficiais oceânicas (SILVA DIAS;

MARENGO, 1999). As correntes superficiais que aí atuam são discriminadas na Figura 2.

Figura 2 - Principais correntes em superfície encontradas no Oceano Atlântico Tropical no

outono boreal (à esquerda) e na primavera boreal (à direita). Os quadrados com “r” representam

áreas de ressurgência. Os pontos coloridos representam a localização aproximada de cada ilha:

em vermelho, ASPSP, em azul, AR e em verde FN.

Fonte: Adaptado de Stramma e Schott (1999).

A circulação atmosférica nas camadas mais inferiores tem papel importante na

circulação oceânica, uma vez que o atrito do vento gera ondas e impulsiona o fluxo das correntes

26

superficiais, podendo influenciar também nas correntes subsuperficiais, dependendo da sua

intensidade, direção e tempo de atuação. O padrão de ventos nas camadas inferiores da

atmosfera que atua sobre o AT é representado pelos ventos alísios de sudeste no HS e de

nordeste no HN. A confluência dos alísios forma a Zona de Convergência Intertropical (ZCIT),

caracterizada por ventos fracos (zona de calmaria ou “doldrums”), altas temperaturas da

superfície do mar (TSM) e uma banda nebulosa com intensa precipitação. As correntes forçadas

pelos alísios e defletidas pelo transporte de Ekman, que atua para a esquerda no HS e para a

direita no HN, causam ainda divergência horizontal na zona equatorial, o que induz a

ressurgência equatorial.

A ZCIT apresenta deslocamento latitudinal ao longo do ano conforme a mudança no

padrão de aquecimento solar na região equatorial e na intensidade dos ventos alísios,

posicionando-se entre 0° e 10°N. Entre fevereiro e março, localiza-se mais a sul, devido à maior

TSM no Atlântico Sul durante o verão austral e à intensificação dos alísios de nordeste. Em

maio, a ZCIT começa sua migração para norte, ficando em posição mais setentrional durante

julho e agosto. Regiões abrangidas pelo deslocamento sazonal da ZCIT apresentam ventos e

correntes superficiais com sua maior variabilidade dentro de uma periodicidade anual

(CASTELLANOS et al., 2015).

A circulação superficial do Atlântico Tropical é caracterizada por fluxos zonais com

sentidos alternados (CASTELLANOS et al., 2015; LUMPKIN; GARZOLI, 2005;

STRAMMA; SCHOTT, 1999; URBANO et al., 2008), sendo delimitada pelas Corrente Norte

Equatorial (CNE) no HN e Corrente Sul Equatorial (CSE) no HS, ambas fronteiras dos giros

subtropicais presentes nos dois hemisférios.

A CSE, a principal responsável pelo fluxo predominante para oeste nessa região, é

dividida em 3 ramos: o ramo norte (nCSE), o ramo central (cCSE) e o ramo sul (sCSE). A sCSE

flui lentamente em uma vasta área entre 10°S-25°S a leste de 30°W , até sua porção mais a sul

colidir com a plataforma continental da América do Sul por volta de 14° S e bifurcar em

Corrente do Brasil (CB), que flui para sul, e Subcorrente Norte do Brasil (SCNB), que flui para

noroeste e apresenta núcleo em subsuperfície (200 m) (LUMPKIN; GARZOLI, 2005;

STRAMMA; SCHOTT, 1999; URBANO et al., 2008).

A nCSE e cCSE são separadas entre 0-2°S por uma faixa de velocidades médias para

sul e alimentadas na sua porção leste pela recirculação das Contra Corrente Norte Equatorial

(CCNE) e Corrente da Guiné (CG), no Golfo de Guiné. A leste de 5°W, os ramos equatoriais

da CSE são mais fracos e amplos. Em 30°W, esses jatos são distintamente separados: A nCSE

em 2°N e a cSEC em 4°S, separadas pela Subcorrente Equatorial (SCE), um fluxo médio para

27

leste em 1°S. Quando a cCSE chega à costa do Brasil, ela encontra-se com a SCNB, dando

origem a Corrente Norte do Brasil (CNB), a qual flui para noroeste em superfície. Se a nCSE

apresentar extensão entre 0-2°N, esta pode juntar-se a CNB. Geralmente, a nSEC recircula para

norte entre 30-40°W na CCNE (LUMPKIN; GARZOLI, 2005a).

A CNB cruza o equador, retroflete para leste por conservação de vorticidade e alimenta

a SCE, a CCNE e a Subcorrente Norte Equatorial (SCNE), que fluem nesse mesmo sentido em

vários níveis verticais (URBANO et al., 2008). Os anéis que surgem na retroflexão da CNB e

se propagam para noroeste ao longo da costa da Guiana são responsáveis por mais da metade

das trocas interhemisféricas de massa e calor (LUMPKIN; GARZOLI, 2005a). Devido suas

características meandrantes, é difícil definir os limites entre a CNB e a CCNE. Porém, estima-

se que a CCNE se encontra entre 5-8 °N na sua porção ocidental, estenda-se por toda a bacia

do Atlântico com sua constante componente zonal leste, até que próximo a 10-15°W ela se

encontra posicionada meridionalmente entre 2-4°N (LUMPKIN; GARZOLI, 2005a).

Na região da CG, extensão da CCNE, ao sul de Cabo Verde, existe uma circulação

ciclônica relacionada ao deslocamento das isotermas, sendo mais fraca no inverno boreal,

devido a mudanças na estrutura vertical, na extensão horizontal e na posição do Domo de Guiné

(URBANO et al., 2008). Análogo ao Dome de Guiné, existe o Domo de Angola em 10°S - 9°E,

com maior pronunciamento no verão austral (PETERSON; STRAMMA, 1991). Aí, atua a

Corrente de Angola (CA): um fluxo para leste em superfície em 5-10°S a leste de 5W, virando-

se para sul como um fluxo forte e estreito junto à costa africana (REID, 1989).

A mais eminente variabilidade temporal da circulação é encontrada na parte oeste da

CCNE (LUMPKIN; GARZOLI, 2005; STRAMMA; SCHOTT, 1999; URBANO et al., 2008)

e no jato equatorial da CSE, as quais são mais fortes durante o outono no HN (setembro a

novembro) e mais fracas na primavera (março-maio). Os meses de abril e novembro são os

extremos no ciclo sazonal da porção oeste da CCNE (LUMPKIN; GARZOLI, 2005a). Durante

o inverno boreal, a parte oeste da nCSE e a CCNE estão fracas, a CCNE podendo desaparecer

em fev-mar e até inverter no começo de abril. Na porção mais central do Atlântico (próximo a

5-6°N, 23-33°W), durante a primavera boreal, o fluxo para oeste sobrepõe a assinatura da

CCNE (URBANO et al., 2008), a qual aparece mais forte, juntamente com o ramo equatorial

da CSE, durante junho, julho e agosto.

Pode-se observar também forte sazonalidade na Corrente das Guianas, na CNB, e na

intensidade da sua retroflexão, as quais tem seu auge de junho a novembro. A Corrente das

Guianas atinge sua velocidade máxima no final de abril e sua velocidade mínima em meados

de agosto até fevereiro. No início de novembro, a maior parte das águas próximas a superfície

28

da CNB retroflete e flui para leste junto a CCNE. Não é vista evidência da migração sazonal

da latitude da retroflexão (LUMPKIN; GARZOLI, 2005a).

A SCE tem duas máximas no seu transporte ao longo do ano: uma durante o verão e

outono e a segunda, mais pronunciada perto do seu limite oeste, durante abril-maio. Em junho

e julho a SCE desaparece da superfície (URBANO et al., 2008). Por fim, a SCNB tem fraca

variabilidade interanual (SCHOTT et al., 2005).

5 MATERIAL E MÉTODOS

Nessa seção será descrita a metodologia adotada para realizar o estudo, bem como as

ferramentas utilizadas. Primeiramente, será apresentado o conjunto de dados hidrodinâmicos o

qual foi implementado ao modelo biofísico. O tópico 5.2 descreve o modelo biofísico utilizado,

bem como as configurações feitas nos experimentos. O tópico 5.3 faz referência aos dados de

derivadores adquiridos e suas várias finalidades e por fim, segue uma descrição geral da

metodologia utilizada.

5.1 Dados de reanálise HYCOM/NCODA

Foram adquiridos dados diários de circulação superficial de todo o Oceano Atlântico

Tropical compreendido entre as latitudes 30°N e 25°S, desde o ano 2002 até 2012 provenientes

da rodada de reanálise do modelo global HYCOM/NCODA, com resolução espacial de 0.08°

(espaçamento da grade de aproximadamente 8 km) e trinta e duas camadas verticais. A

batimetria utilizada nas simulações é proveniente dos dados GEBCO, que apresenta resolução

de 30 segundos de arco de grau. As forçantes de superfície (velocidade e stress do vento, fluxo

de calor e precipitação) são derivadas de dados horários do National Centers for Environmental

Prediction (NCEP) e Climate Forecast System Reanalysis (CFSR) com resolução horizontal de

0.3125°. A frequência temporal dos dados de entrada possibilita boa representação do ciclo

diurno. O sistema é configurado para o oceano global com o modelo dinâmico HYCOM 2.2 e

usa o Navy Coupled Ocean Data Assimilation (NCODA) para a assimilação de dados de

satélites altímetros, temperatura da superfície do mar, medições in situ de uma rede global de

XBTs, flutuadores Argo e bóias fixas. Portanto, o hindcast do HYCOM representa bem

processos em mesoescala que participam da circulação superficial oceânica tais como

meandramentos, aneis, vórtices, eddies, filamentos e frentes (CHASSIGNET et al., 2007). O

29

modelo HYCOM é validado para a região e representa bem o transporte do sistema de correntes

equatorias. Putman & He (2013) comprovaram que esse banco de dados hidrodinâmicos

apresenta alta qualidade ao realizar um estudo comparativo com boias de deriva no Oceano

Atlântico e encontrou diferenças menores que 5 cm/s para intensidade e 2 graus para direção.

Os dados do HYCOM/NCODA estão livremente disponibilizados em http://hycom.org.

5.2 Ichthyop

O Ichthyop 3.3 alpha foi o modelo usado nas simulações da dispersão das larvas. É uma

ferramenta escrita na linguagem Java, livremente disponível na internet e que permite que sejam

estudados fatores físicos e biológicos da dinâmica do ictioplâncton (http://ichthyop.org). O

Ichthyop é um Modelo Baseado no Indivíduo (MBI). Ele simula a advecção e dispersão de

partículas virtuais a partir de campos de velocidades adicionados à sua configuração e adiciona

a tais partículas vários parâmetros biológicos e ecológicos, tais como mortalidade, temperatura

letal e taxa de crescimento, para uma simulação mais realística do transporte larval (LETT et

al., 2008). Para executar as simulações no Ichthyop, foram introduzidos os dados de reanálise

obtidos do modelo global HYCOM/NCODA.

O Ichthyop já foi usado em uma série de estudos ao redor do globo. POROBIĆ et al.

(2012) utilizaram o Ichthyop para avaliar o grau de conectividade e retenção na metapopulação

de lagostas Jasus frontalis encontradas no arquipélago Juan Fernández e Ilhas Desventuradas,

territórios chilenos no Oceano Pacífico Leste. D’Agostini et al. (2015) utilizaram o Ichthyop

para estudar a conectividade de recifes de corais em Aréas Marinhas Protegidas da plataforma

leste do Brasil. Jouanneau et al. (2013) utilizaram o Ichthyop para estudar a circulação no Canal

da Mancha. Proietti et al. (2014) utilizaram dados de reanálise do HYCOM/NCODA no

Ichthyop para estudar o destino de filhotes de tartarugas híbridas das espécies tartaruga-de-

pente e tartaruga-cabeçuda encontradas na Bahia, Brasil. Putman et al. (2014) também

utilizaram os mesmos dados de reanálise no mesmo modelo biofísico para se estudar a origem

das tartarugas-de-pente juvenis encontradas na Ilha de Ascenção, que é uma região de

forrageamento localizada no Atlântico Tropical a milhares de quilômetros das praias onde

ocorre a incubação dos ovos dessa espécie.

O modelo foi executado em 2D e embora não se saiba ao certo até que profundidade as

larvas de Panulirus echinatus submergem durante o dia, foram feitas médias das correntes em

até 100 metros baseado nas informações disponíveis em Rimmer e Phillips (1979). Esse valor

se altera conforme os estágios larvais em que se encontram as filossomas e os puerulus

30

(BUTLER IV et al., 2011). Konishi et al. (2006) fez coletas de filossomas em 50 e em 100

metros. Sendo assim, a média de 100 metros possibilita melhor representação da migração

vertical diária das filossomas, da circulação superficial e portanto da advecção larval de acordo

com o transporte integrado na coluna d’água.

Embora as lagostas espinhosas desovem continuamente durante o ano, Cruz et al. (2015)

mostraram que existem dois picos de assentamento do puerulus de Panulirs argus (Latreille,

1804) na costa do Brasil entre 2003 e 2006, um em abril e outro em setembro. Portanto, como

se desejou saber a procedência das larvas, as simulações foram realizadas de forma reversa

(backward mode), ou seja, com lançamento inicial onde se localizam as ilhas (ASPSP, FN e

AR) e as trajetórias de origem acompanhadas durante 365 dias a partir de abril e setembro de

cada ano, representando de forma mais apropriada a época de maior assentamento do puerulus.

Porém, achou-se mais conveniente plotar nos mapas as trajetórias em apenas 210 dias, tempo

de DPL melhor estimado para a região do AT segundo Cruz et al. (2015).

As ilhas, pontos de inicialização das simulações, foram representadas por polígonos que

abrangiam cada região. Desse modo, a Tabela 1 mostra as latitudes e longitudes limites de cada

ilha inserida no seu respectivo polígono.

Tabela 1: Coordenadas limites dos polígonos representantes de cada região insular onde foram

lançadas as partículas virtuais.

Ilha Posição de Lançamento

ASPSP Entre as latitudes 1.1 – 0.9°N e longitudes 29.3-29.1°W

AR Entre as latitudes 3.7 – 4°W e longitudes 34.1-33.6°W

FN Entre as latitudes 3.7 –3.9°W e longitudes 32-32.6°W

Fonte: a autora (2017).

O método de integração espacial usado para controlar o processo de advecção foi o

Runge Kutta de quarta ordem, método amplamente utilizado na literatura do modelo Ichthyop.

Por exemplo, Butler IV et al. (2011) usaram este método ao estudar a influência da migração

vertical ontogenética na dispersão ou retenção de larvas de Panulirus argus. Vaz et al. (2007)

também utilizaram esse método no estudo de retenção de larvas de anchoita no sudeste do Brasil

em um MBI desenvolvido por eles mesmos.

Foram lançadas 75000 larvas em cada experimento, as quais o modelo se encarrega de

dividir igualmente para os três poligonos que representam cada ilha. Essa quantidade de

partículas é uma representação numérica de uma desova populacional já se considerando certa

31

mortalidade. As larvas foram tratadas como partículas passivas, ou seja, sem qualquer

caracterização biológica. O passo de tempo utilizado nas simulações foi de 1800 segundos.

Foram desenhados polígonos (FIGURA 3) abrangendo áreas costeiras a partir da isóbata

de 200 metros, distando em média 40 quilômetros da costa, como provável origem das larvas

de lagosta: Plataforma continental brasileira (PCB) e adjacências (referente a região mais a

norte, que tem influência da Corrente Norte do Brasil e seus vórtices em mesoescala), a região

de Cabo Verde, onde também são encontradas populações de lagostas espinhosas, região

costeira norte da África, região costeira oeste da África e Ilha de Ascensão (IA). Foi considerado

que, uma vez que a partícula virtual esteve dentro da área do polígono, dentro do período de

210 dias, pode haver possível conectividade com esse local, afinal, existem estudos que as

larvas de lagosta podem acelerar sua metamorfose durante sua fase larval para dar início ao

processo de assentamento e posterior recrutamento caso encontrem habitat com alimento

disponível. O puerulus de algumas espécies chegam a nadar até 100 km, atraídos pela costa

(GOLDSTEIN; BUTLER IV, 2009). Rudorff et al. (2009), nas suas simulações, consideraram

que as larvas de lagosta espinhosa situadas a 300 km a partir da quebra de plataforma já estariam

quantificadas como larvas viáveis para recompor os estoques brasileiros. Polovina et al. (1999)

assumiram que, após 365 dias de simulação, larvas dentro de um raio de 140 km de distância

da margem das porções de terra que compõem o Arquipélago Havaiano estariam disponíveis

para recrutamento ali.

Figura 3 - Representação dos polígonos de possível origem das larvas de lagosta que chegam

ao ASPSP, AR e FN.

Fonte: a autora.

32

Para se determinar a quantidade de larvas virtuais que estabelecem conexão com outras

regiões do AT, foram calculadas as porcentagens de partículas que entram nessas regiões com

o passar do tempo. Nesse cálculo, foram considerados todos os 365 dias de simulação com o

intuito de se estipular o quanto a conectividade aumentaria caso fosse estimado esse maior

tempo de DPL.

5.3 Bóias de Deriva

Foram obtidas trajetórias de boias de deriva lançadas no Oceano Atlântico Tropical para

se realizar alguns testes. O primeiro teste se trata de uma visão preliminar da afirmação da

hipótese levantada nesse trabalho. Em seguida, foram utilizadas as trajetórias para se determinar

a taxa de dissipação turbulenta mais adequada para se implementar nas simulações, ao mesmo

passo que se pôde validar os resultados do modelo.

As boias de deriva rastreadas por satélites utilizadas são do Global Drifter Program

(GDP), que é o principal componente do Global Surface Drifting Buoy Array, um ramo do

Global Ocean Observing System da National Oceanic and Atmospheric Administration

(GOOS/NOAA), e um projeto científico do Data Buoy Cooperation Panel (DBCP) livremente

disponíveis em: <http://www.aoml.noaa.gov/envids/InfoData.php?db=gld>. As boias

selecionadas foram aquelas que possuiam uma haste submersa acoplada (FIGURA 4), o que

garante que suas trajetórias sejam de acordo com a circulação superficial e não com o arraste

do vento.

Figura 4 - Representação esquemática da estrutura dos derivadores lagrangeanos rastreados por

satélite, mostrando a vela que ameniza o arrasto da boia pelo vento.

Fonte: <http://www.aoml.noaa.gov/phod/dac/gdp_information.php> acesso em 3 de maio de 2016.

33

Os dados brutos passam por um controle de qualidade e são interpolados em intervalos

regulares de um quarto de dia (de 6 em 6 horas).

5.3.1. Teste de hipótese

A hipótese que esse trabalho levanta é a existencia de conectividade ecológica a qual

deu origem aos estoques adultos de lagosta espinhosa (Palinuridae) existentes no Arquipélago

de São Pedro e São Paulo, no Arquipélago de Fernando de Noronha e no Atol das Rocas. Para

reforçar essa hipótese, foram conferidas trajetórias dessas boias de deriva na região do Atlântico

Tropical com a finalidade de saber se é fisicamente possível que tais objetos sejam advectados

a longas distâncias em períodos de tempo igual ou menores que um ano, tempo equivalente a

DPL das filossomas.

5.3.2 Escolha da taxa de dissipação turbulenta e validação do Ichthyop

O Ichthyop permite a adição de uma componente que represente processos de dispersão

horizontal. Uma vez que se habilita a opção de dispersão horizontal, o modelo passa a calcular

uma componente randômica na velocidade da partícula virtual a cada passo de tempo, que é

implementada segundo Peliz et al. (2007). Desse modo, a velocidade da partícula virtual (Uf)

pode ser representada pela seguinte equação:

Uf(x,y) = Ua(x,y) + Ur(x,y) (1)

Em que Ua é o vetor de velocidade 2D que no presente estudo é introduzido no modelo

pelo campo de velocidade do modelo HYCOM e representa o campo de advecção. Ur é o

componente randômico calculado pelo Ichthyop que representa o campo de dissipação

introduzido ao vetor de velocidade horizontal usando:

𝑈𝑟 = δ√2kh/∆t (2)

Onde δ é um número randômico uniforme real variando no intervalo [-1,1], e Kh é o

coeficiente lagrangeano de difusão horizontal descrito da seguinte forma:

34

Kh = Ɛ1/3 Ɩ4/3 (3)

Onde:

Ɛ = taxa de dissipação turbulenta (m2/s3);

Ɩ = tamanho de célula da grade (m);

A cada passo de tempo e em cada ponto do gride da área de estudo, Ur varia entre valores

randômicos positivos, nulos e negativos, os quais fazem o fluxo dissipativo turbulento tomar

diferentes direções e intensidades pois os valores calculados são resultados de um produto com

uma distribuição uniforme entre [-1,1].

Ɩ é determinado pelo modelo conforme os dados de entrada, enquanto o modelo sugere

um valor de Ɛ = 10-9 m2/s3.

Porém, este valor de Ɛ parece muito baixo. Para determinar qual seria o melhor valor de

Ɛ para se adotar, foram feitas várias simulações no Ichthyop tendo como base as trajetórias de

algumas boias do "Global Drifter Program". Uma vez que esses derivadores foram de fato

transportados de um canto a outro do Oceano Atlântico, essas trajetórias nos servem como base

de uma advecção realística. As simulações foram inicializadas na mesma hora e local de

lançamento das boias, duraram o mesmo tempo de transporte que a boia específica levou até

chegar ao seu posicionamento final, com o lançamento de 50 partículas e quatro valores

distintos de épsilon (10-9, 10-7, 10-6 e 10-4) foram testados para cada boia transportada. O

primeiro valor (10-9) foi utilizado por estar padronizado no próprio Ichthyop segundo Monin e

Ozmidov (1981). O valor de 10-4 foi adotado a partir do cálculo reverso de valores de Kh

encontrados por Góes (2006), que obteve valores do coeficiente de difusividade turbulenta para

algumas regiões do Atlântico Tropical. Os demais valores de Ɛ testados, 10-7 e 10-6, são valores

intermediários. Foram consideradas apenas as correntes superficiais até 20 metros,

profundidade equivalente à vela acoplada aos derivadores.

35

6 RESULTADOS E DISCUSSÃO

6.1 Teste de hipótese

Constatou-se que muitas das boias foram capazes de cruzar o Atlântico de leste a oeste

em períodos menores que 365 dias (FIGURA 5). Uma vez que a advecção de um objeto a longas

distâncias nessa região é real, pode-se dizer que é fisicamente possível a conectividade

ecológica de espécies de lagosta (DPL = igual ou menor que 365 dias) do continente africano,

ou de regiões tão longínquas quanto, com as ilhas brasileiras aqui abordadas.

Em médias, as boias demoraram de 6 a 11 meses para completarem a travessia, com o

tempo mínimo de 6 meses e 20 dias e o tempo máximo de 11 meses. Elas são lançadas em

porções leste do AT, próximas ao continente africano em sua maioria e quase sempre terminam

sua trajetória na PCB, entre 0° e 5°S, sempre orientadas pelo fluxo para oeste dominante nessa

região.

36

Figura 5 - Exemplos de trajetórias de derivadores lagrangeanos no Atlântico Tropical com o

tempo aproximado de duração do transporte. O “x” representa o local onde a boia foi lançada,

enquanto o “o” indica o posicionamento final da boia. Em todos os exemplos, os derivadores

percorrem menos de um ano de um ponto a outro do Atlântico. As cores indicam a velocidade

de deriva das boias.

Fonte: a autora (2017).

37

6.2 Taxa de dissipação e validação do Ichthyop

A trajetória das correntes oceânicas, apesar de suas flutuações sazonais e intrasazonais,

podem nos dar uma noção de como se dá o transporte de organismos passivos a tal arraste na

coluna d’água. Contudo, o efeito da difusão na advecção desses organismos reduz

significativamente a concentração de larvas que supostamente chegariam a outro local

(WERNER et al., 2007). Em um modelo advectivo-difusivo, mesmo quando um grande número

de partículas virtuais é lançado, o nível de conexão com outra região, onde supostamente

poderia haver conexão, pode se reduzir a próximo de zero quando implementados valores reais

de difusividade horizontal (COWEN et al., 2000).

Dos diversos testes realizados, foi constatado que não houve muita diferenciação nos

resultados na adoção dos quatro valores de épsilon implementados, embora tenha sido possível

identificar aquele valor que melhor aparentou a advecção real do derivador. Isso pode ser

devido a pequena ordem de grandeza que o épsilon representa na determinação de Ur. Mesmo

com o pequeno valor de épsilon na equação de determinação de Ur, as diferenças podem ser

grandes devido ao caráter randômico de δ.

Ao se observar as Figuras 6, 7, e 8, percebe-se que quando usados os valores Ɛ = 10-6

m2/s3 e Ɛ = 10-7 m2/s3 os resultados das particulas são mais coerentes com as trajetórias dos

derivadores. O valor de Ɛ = 10-4 m2/s3, calculado a partir de GÓES (2006) para região, não

representou bem a advecção de partículas em nenhum dos experimentos, mostrando que as

partículas apresentam trajetórias bastante espalhadas no Atlântico Tropical, muitas vezes saindo

do domínio do modelo.

38

Figura 6 - Simulações a partir da trajetória da boia nº13, com lançamento (X) em 1 de janeiro

de 2002 e final (*) em 25 de setembro de 2002. Acima e a esquerda (a) com Ɛ = 10-9 m2/s3,

abaixo e a esquerda (b) com Ɛ = 10-7 m2/s3, acima e a direita (c) com Ɛ = 10-6 m2/s3, abaixo e a

direita (d) com Ɛ = 10-4 m2/s3. As cores da trajetória da bóia de deriva representam a velocidade

da corrente e em preto as trajetórias das 50 partículas.

Fonte: a autora (2017).

a) c)

b) d)

39

Figura 7 - Simulações a partir da trajetória da boia nº 269, com lançamento (X) em 29 de maio

de 2006 e final (*) em 17 de março de 2007. Acima e a esquerda (a) com Ɛ = 10-9 m2/s3, abaixo

e a esquerda (b) com Ɛ = 10-7 m2/s3, acima e a direita (c) com Ɛ = 10-6 m2/s3, abaixo abaixo e a

direita (d) com Ɛ = 10-4 m2/s3. As cores da trajetória da bóia de deriva representam a velocidade

da corrente e em preto as trajetórias das 50 partículas.

Fonte: a autora (2017).

a) c)

b) d)

40

Figura 8 - Simulações baseadas na trajetória da boia nº 493, com lançamento (X) no dia 1 de

maio de 2009 e final (*) no dia 31 de dezembro de 2009. Acima e a esquerda (a) com Ɛ = 10-9

m2/s3, abaixo e a esquerda (b) com Ɛ = 10-7 m2/s3, acima e a direita (c) com Ɛ = 10-6 m2/s3, ,

abaixo e a direita (d) com Ɛ = 10-4 m2/s3. As cores da trajetória da bóia de deriva representam a

velocidade da corrente e em preto as trajetórias das 50 partículas.

Fonte: a autora (2017).

Embora em alguns experimentos as diferenças nas trajetórias com Ɛ = 10-6 m2/s3 e Ɛ =

10-7 m2/s3 sejam bem sutis, analisando todos os testes, pôde-se concluir que o valor de Ɛ = 10-6

m2/s3 foi o que fez com que as trajetórias das partículas virtuais mais se adequassem às

trajetórias dos derivadores (FIGURAS 6, 7 e 8) e esse foi o valor adotado nas simulações

realizadas nesse trabalho.

6.3 Simulações

Foram feitos dois experimentos por ano, iniciando em abril e em setembro de cada ano, de

2003 a 2012, totalizando 20 experimentos. As figuras das trajetórias das partículas mostram os

resultados das simulações em backward mode. Para o melhor entendimento dessas figuras,

deve-se lembrar do objetivo geral do trabalho: determinar de onde vem as lagostas das ilhas

a) c)

b) d)

41

brasileiras. Logo, o final da trajetória reversa é indicado em azul. O dia 0 se refere ao dia em

que as larvas foram supostamente desovadas. Se no dia 0 (em azul) a trajetória se apresenta em

oceano aberto, esse não pode ser um resultado válido, pois, na prática, não existiriam lagostas

que pudessem desovar nesse local. Mas se o dia 0 indicar área continental, essa possivelmente

pode ser um local que deu origem às populações de lagosta das ilhas brasileiras. Seguindo o

raciocínio do sentido real (foward mode), as larvas saem desse possível local de origem, são

transportadas por vários dias até que enfim (após 210 dias, que é representado pela cor

vermelha) chegam às ilhas. Algumas figuras com o conteúdo mais visível para exemplificar os

resultados foram adicionadas ao texto, contudo é possível encontrar todos os resultados dos 20

experimentos no Apêndice A.

Quanto aos gráficos, esses mostram o que aconteceria se o tempo das simulações fosse de

365 dias, como defendem alguns autores sobre a DPL das filossomas. Nas figuras, utilizou-se

210 dias, que é a informação mais precisa para uma espécie (Panulirus argus) que habita a

PCB, região próxima às ilhas aqui abordadas e no AT. Porém, estimar 365 dias talvez não seja

errôneo, uma vez que este trabalho leva em consideração a família Palinuridae como um todo,

existindo nestas ilhas mais duas espécies de desconhecido ciclo larval e DPL. Vê-se em todos

esses gráficos que a porcentagem de larvas em conexão tende a aumentar quando se estima

maior DPL.

6.3.1 Conectividade entre ASPSP, AR e FN

Em 100% das simulações, FN se mostra como uma fonte de larvas em potencial para AR

Devido ao fluxo constante do ramo central da CSE para oeste que faz com que exista sempre

essa conexão. As partículas virtuais lançadas e acompanhadas reversamente a partir de AR não

tardam um mês para chegar à região de FN. Isto pode ser visto em todas as figuras do Apêndice

A.

O contrário, no entanto, nem sempre ocorre. Dos 20 experimentos, 11 mostraram que as

larvas virtuais lançadas a partir de FN chegam ao AR, o que significa que aproximadamente

metade dos experimentos mostra que AR pode ser fornecedor de larvas para FN. Porém, a

conexão AR para FN não se dá de maneira direta como se dá vice-versa, uma vez que o fluxo

principal nessa região é para oeste e, por isso, os locais de origem das lagostas de FN parecem

estar mais a leste dessa ilha. Em alguns experimentos, as larvas são advectadas a longas

distâncias e demoram de 2 a 5 meses para chegar a AR. Analisando sazonalmente os resultados,

vê-se que os lançamentos em setembro são os mais propícios para que aconteça a conexão AR

42

para FN. Esse resultado foi visto nos anos de 2004, 2005, 2006, 2007, 2010, 2011 e 2012.

Contudo, os anos 2006, 2009, 2010 e 2012 mostraram que essa conexão também pode ocorrer

com lançamentos de 1 de abril. Os experimentos inicializados nos anos de 2003 e 2008 foram

os únicos que não apresentaram AR como possível fonte de larvas para FN nem com

lançamentos em abril, nem com lançamentos em setembro.

Para mostrar os resultados da conectividade que o ASPSP estabelece com as duas demais

ilhas, foi preciso tomá-las como sendo uma região só, AR/FN, devido à relativa proximidade

entre os dois pontos e suas praticamente equidistâncias até o ASPSP.

Dos 20 experimentos, 13 mostraram que as partículas virtuais lançadas de AR/FN

chegam a ASPSP em menos de 7 meses. Em outras palavras, o ASPSP pode ser uma fonte de

larvas de lagosta espinhosa para a região AR/FN. Nas simulações iniciadas em setembro dos

anos 2007, 2008 e 2012, as larvas de AR/FN chegam em ASPSP em um mês. Nas simulações

de abril/2003 (FIGURA 9), setembro/2006 e abril/2012, essa conexão se dá em menos de dois

meses. Já para as simulações inicializadas em abril dos anos 2004, 2006, 2007, 2010 e aquelas

inicializadas em setembro dos anos 2009, 2010 e 2011 o tempo que se levou para que houvesse

a conexão variou entre 3 e 7 meses. Essa conectividade não foi vista nos experimentos

setembro/2003, setembro/2004, abril e setembro/2005, abril/2008, abril/2009 e abril/2011, o

que caracteriza grande variabilidade intraanual e interanual.

Figura 9 - Trajetória reversa de larvas virtuais lançadas em 1/4/2003 a partir de AR, FN e

ASPSP com rastreamento de 210 dias. As cores mostram o tempo decorrido em dias a partir

do momento de lançamento. Os círculos indicam possíveis origem das larvas.

Fonte: a autora (2017).

43

No caso contrário, em que as partículas virtuais lançadas do ASPSP foram rastreadas

reversamente até chegarem em AR/FN, 14 dos 20 experimentos mostraram que essa conexão

ecológica é possível. Porém, embora o número de larvas não tenha sido quantificado com

exatidão, é certo que o aporte de larvas provenientes dos estoques de AR/FN em ASPSP é muito

inferior àquele da conectividade vice-versa. Em metade desses 14 experimentos, vê-se uma

quantidade muito pequena de larvas que mostram essa conexão, embora exista. Também não

foi possível distinguir em qual época (abril ou setembro) ocorre maior conectividade. Nas

simulações com início em setembro/2003, abril/2009 (FIGURA 10) e abril/2010, as larvas

virtuais chegaram em AR/FN em 3 meses. Já as simulações com início em abril/2003,

abril/2004, abril/2005, setembro/2005 e setembro/2012 mostraram conexão em 5 meses.

Portanto, a região de AR/FN pode ser fonte de larvas de lagosta para ASPSP, embora em menor

grau, e essa conexão se dá em períodos de tempo variados entre 2 e 7 meses.

Figura 10 - Trajetória reversa de larvas virtuais lançadas em 1/4/2009 a partir de AR, FN e

ASPSP com rastreamento de 210 dias. As cores mostram o tempo decorrido em dias a partir do

local de lançamento. Os círculos indicam possíveis origem das larvas.

Fonte: a autora (2017).

6.3.2. Conectividade do ASPS, AR e FN com outras regiões do AT

Segundo os experimentos, a partir de aproximadamente 20° S, todo o setor nordeste da PCB

e regiões adjacentes à norte são possíveis lugares de origem das larvas de lagosta espinhosa que

possuem populações estabelecidas em AR, ASPSP e FN. Já é conhecido que de fato existem

populações de lagosta espinhosa nessa região da PCB (CRUZ et al., 2011). Os experimentos

44

realizados em abril dos anos 2003, 2004, 2006, 2008, 2009 e 2010 apresentaram as maiores

porcentagens de conexão entre essas regiões em até 210 dias (0,4%, 0,15%, 0,2%, 0,75%, 0,5%

e 0,2%, respectivamente) (FIGURA 12). Se as lagostas desovam em meados de setembro na

PCB na área de atuação da SCNB/CNB, estas larvas são carreadas para noroeste junto à PCB e

um fluxo para leste se encarrega de transportá-las em direção ao AR e FN. Esse fluxo para leste

é a SCE, que no mês de março, antecessor ao assentamento das larvas nos arquipélagos,

apresenta núcleo mais próximo à superfície devido ao posicionamento da ZCIT no equador e

menor atuação dos ventos de leste (URBANO et al., 2008). Além disso, desovas em meados de

outubro correspondem a época de menor transporte da SCNB (RODRIGUES et al., 2007;

SCHOTT et al., 2008), garantindo menor transporte dessas larvas para noroeste e em posição

mais próxima às ilhas aqui abordadas.

Os anos de 2005 e 2007 mostraram 0% de conectividade entre PCB e as ilhas em destaque

em 210 dias (FIGURA 12). Ao analisar as correntes nos primeiros 100 m da coluna d’água

entre janeiro e março em 2005 e 2007 (Figura 22, no topo, e Figura 11), é possível observar a

assinatura para leste da SCE fraca ou inexistente nos mapas, o que explicaria a ausência de

transporte dessas larvas da PCB até as ilhas em desovas em meados de outubro destes anos.

Figura 11 - Média trimestral entre janeiro e março de 2007 das correntes em superfície no

Oceano Atlântico Tropical. As siglas indicam o posicionamento médio de ASPSP, FN, AR e

IA. O círculo destaca a assinatura da SCE.

Fonte: a autora (2017).

Nas simulações de abril de 2004 (FIGURA 13) e de 2010, foi possível identificar que apenas

o estoque de lagostas de ASPSP pode ter origem a partir de indivíduos adultos encontrados na

45

PCB e adjacências à norte. Se as lagostas da PCB desovam em setembro na área de atuação da

CNB, é suceptível que essas larvas sejam fortemente carreadas em sentido noroeste, sendo

retroflectidas para leste uma vez que esse sistema encontra-se com maior magnitude até

novembro (LUMPKIN; GARZOLI, 2005). Daí em diante, essas partículas chegam mais

facilmente a ASPSP, por esta ilha estar posicionada mais a norte em relação às duas outras. Se

a desova na PCB ocorre em meados de fevereiro (relativa aos experimentos reversos realizados

em setembro), a retroflexão não estará tão intensa e as larvas ficarão mais espalhadas sem

conseguir alcançar ASPSP.

Percebe-se, então, que as 3 ilhas e a PCB apresentam conexão entre si. Mesmo quando não

é estabelecida conexão direta entre duas regiões, é possível que uma terceira região intercepte

esse trajeto, funcionando como trampolim ecológico e dê suporte a uma conexão entre as duas

primeiras regiões de maneira indireta. Por exemplo, supõe-se que em algum ano as larvas

desovadas na PCB não alcançam AR/FN, mas alcançam ASPSP. Esses mesmos organismos

que chegam a ASPSP, ao se tornarem indivíduos adultos, podem estabelecer conexão com

AR/FN. Portanto, existe fluxo genético entre as regiões e pode-se afirmar que as populações de

lagosta espinhosa da PCB apresentam sim conectividade com AR/FN.

Figura 12 - Porcentagem de partículas lançadas em 1 de abril entre os anos 2003 e 2012 a

partir de AR, FN e ASPSP que atingem a PCB e regiões adjacentes.

Fonte: a autora (2017).

46

Figura 13 - Trajetória reversa de larvas virtuais lançadas em 1/4/2004 a partir de AR, FN e

ASPSP com rastreamento de 210 dias. As cores mostram o tempo decorrido em dias a partir do

local de lançamento. Os círculos indicam possíveis origem das larvas.

Fonte: a autora (2017).

Rudorff et al. (2009), procurando avaliar o processo de dispersão de larvas de lagosta no

Atlântico Tropical utilizando um modelo simples de advecção-difusão, afirmam que cerca de

80% das larvas de AR, FN e ASPSP lançadas em abril chegam na PCB em 10 meses, sendo

que 8,8% e 10% das larvas de FN e AR, respectivamente, chegam na PCB depois de 6 meses

e, quanto aos lançamentos em setembro, o tempo para alcançar a PCB é maior do que 12 meses.

Embora nesse trabalho sejam adotadas as mesmas épocas de lançamento de partículas virtuais,

é difícil estabelecer uma comparação, uma vez que aqui as simulações são feitas em backward

mode, o que faz com que o perído do ano em que se dá a advecção não seja o mesmo. Os

experimentos de Rudorff et al. (2009) inicializados em abril mostram que as partículas

estabelecem conexão em menor período de tempo que os experimentos inicializados em

setembro. Aqui é mostrado que os experimentos inicializados em abril mostram maiores

porcentagens de conexão em relação aos experimentos em setembro, para o mesmo período de

tempo (7 meses). Rudorff et al. (2009) também concluem que essas ilhas oceâncias representam

uma importante fonte de larvas para os estoques adultos de lagosta espinhosa no nordeste da

PCB, com menor tempo de conectividade nas simulações inicializadas em abril.

O presente trabalho, por sua vez, complementa essa informação, mostrando que a PCB é

fonte de larvas para as ilhas oceânicas abordadas, com maiores taxas de conectividade se

considerada a desova das lagostas presentes na PCB em setembro.

47

A população de lagostas espinhosas existentes na Ilha de Ascenção (IA) (7.96°S, 14.37°W)

também podem ser fonte de larvas que chegam às ilhas brasileiras aqui abordadas. Apenas os

experimentos inicializados em abril de 2003 e 2008 mostraram que essa conexão não foi

possível. Contudo, a quantidade de larvas que estabelecem essa conexão é inferior. As

simulações com maiores porcentagens de origem dessas larvas na IA foram em abril dos anos

2004, 2005, 2006, 2010 e 2011, com seus respectivos valores de 0,25%, 0,56%, 0,55%, 0,6% e

0,24% (FIGURA 16). Assim, desovas de lagostas espinhosas na IA em meados de setembro

tem maior probabilidade de estabelecer conexão com ASPSP, AR e FN. Contudo, os

experimentos de 2004, 2005 e 2006, mostraram que desovas em IA em meados de fevereiro

também apresentam essa conexão (0,18%, 0,17%, 0,2%, respectivamente). Ao investigar as

correntes superficiais (Figuras 14, 15 e 22), viu-se que em janeiro a março desses ano existe um

fluxo para noroeste logo a noroeste de IA e entre abril e junho, essa partículas estavam na área

onde um forte fluxo para oeste atuava, sendo capaz de levá-las às ilhas brasileiras até o mês de

setembro. Esse fluxo refere-se cSEC, que nesses anos apareceu um pouco mais deslocada para

sul, principalmente em 2004 e 2005.

Figura 14 - Médias trimestrais da circulação superficial no Oceano Atlântico Tropical nos dois

primeiros trimestres de 2004; (a) de janeiro a março e (b) de abril a junho. Os fluxos

responsáveis pelas conexões se encontram circulados.

Fonte: a autora (2017).

a)

b)

48

Figura 15 - Médias trimestrais da circulação superficial no Oceano Atlântico Tropical nos dois

primeiros trimestres de 2006; (a) de janeiro a março e (b) de abril a junho. Os fluxos

responsáveis pelas conexões se encontram circulados.

Fonte: a autora (2017).

Segundo Xue et al. (2008), um ano com baixo assentamento pode indicar uma influência

de larga escala no recrutamento. Embora os resultados aqui apresentados mostrem baixas

porcentagens de larvas virtuais em conexão, isso não quer dizer que esses números sejam

desprezíveis. A quantidade de partículas aqui determinada (25000 partículas para cada ilha,

totalizando 75000 partículas) é um número representativo de uma desova de uma população de

lagostas espinhosas com uma taxa de mortalidade das filossomas implícita devido a, por

exemplo, carência de alimento, diminuição de salinidade e predação. Mesmo com uma taxa de

mortalidade natural do puerulus de 98% (CRUZ et al., 2007), em um cálculo a grosso modo,

ainda restariam cerca de 500 indivíduos por ilha. Como já dito antes, uma única fêmea de

Panulirus echinatus pode comportar 56 mil de ovos de uma só vez enquanto a Panulirus argus

a)

b)

49

pode comportar 1,9 milhões de ovos, números que aumentariam a probabilidade das conexões

ecológicas. A partir da fase algal, conforme vão passando seus estágios de desenvolvimento, as

taxas de mortalidade tendem a reduzir para menos da metade (CRUZ et al., 2007).

Rudorff et al. (2009) observaram que nas simulações iniciadas em setembro, as partículas

virtuais lançadas a partir da IA, ao chegarem na banda equatorial, são fortemente carreadas para

oeste em relação às simulações de abril, período em que tal fluxo para oeste está mais fraco.

Por isso, nas simulações em setembro as larvas são capazes de chegar à região de atuação da

NBC, estabelecendo conexão não só com AR, FN e ASPSP, mas também com a PCB.

Figura 16 - Porcentagem de partículas lançadas em 1 de abril (a) e 1 de setembro (b) entre os

anos 2003 e 2012 a partir de AR, FN e ASPSP que atingem a Ilha de Ascensão.

Fonte: a autora (2017).

Ao saírem da IA, as partículas virtuais descrevem trajetórias em que sua chegada a AR/FN

é maior do que sua chegada em ASPSP, embora ambas sejam possíveis. Esses resulados são

coerentes com os resultados de Rudorff et al. (2009). Na investigação da origem de tartarugas-

de-pente encontradas na IA, as simulações reversas de Putman et al. (2014) mostraram que,

embora em menor quantidade, as correntes oceânicas também podem ser eficientes em trazer

partículas de ASPSP para IA em um período médio de um ano, o que corrobora os resultados

aqui encontrados.

Salvo os experimentos inicializados em setembro de 2009, 2011 e 2012 (FIGURA 17),

nenhum dos outros mostrou conexões com Cabo Verde (CV) em sete meses. Nos resultados

desses três experimentos, poucas unidades de larvas oriundas de CV chegam as ilhas oceanicas

brasileiras (FIGURA 18). Contudo, é necessário frisar essa informação pelo fato de existirem

a) b)

50

populações de lagosta espinhosa em CV e ressaltar que o número de particulas lançados nas

simulações é muito pequeno quando comparado com a realidade.

Figura 17 - Trajetória reversa de larvas virtuais lançadas em 1/9/2011 a partir de AR, FN e

ASPSP com rastreamento de 210 dias. As cores mostram o tempo decorrido em dias a partir do

local de lançamento. Os círculos indicam possíveis origem das larvas.

Fonte: a autora (2017).

Figura 18 - Porcentagem de partículas lançadas em 1 de abril (a) e 1 de setembro (b) entre os

anos 2003 e 2012 a partir de AR, FN e ASPSP que atingem a região de CV.

Fonte: a autora (2017).

a) b)

51

As lagostas espinhosas geralmente possuem desova aleatória e contínua durante o ano todo,

apresentando picos durante determinadas épocas. Se uma grande desova em CV ocorrer em um

período em que as correntes que favorecem a advecção desses ovos e larvas estiverem mais

fortes a probabilidade dessa conexão aumenta.

Os resultados das simulações realizadas por Putman & He (2013), tendo CV como ponto

de partida das partículas virtuais, mostraram que não existe possibilidade de conexão com

ASPSP, tampouco com nenhuma região no HS, pois todas as partículas ficam retidas na porção

norte do Atlântico. Porém, além dos autores terem rastreado um número de partículas bem

inferior (100 partículas), os mesmos não deixaram explícito se foi implementada a taxa de

dissipação turbulenta, diminuindo a probabilidade de partículas serem advectadas para regiões

no HS mais próximas às ilhas brasileiras.

As simulações de Rudorff et al. (2009) em CV mostram a componente meridional de

velocidade predominante para sul. Rudorff et al. (2009) mostram que não há conectividade

entre CV e as ilhas brasileiras e afirmam que eventos em larga e mesoescala, tais como a Zona

Frontal de Cabo Verde, situada entre a Corrente Norte Equatorial (CNE) e o ramo norte da

CCNE, aprisionam as larvas na própria região de CV e adjacências, podendo alcançar a Costa

do Marfim em experimentos inicializados em setembro devido ao fluxo para leste da CCNE.

Entretando, como já foi dito, os campos de velocidade utilizados por esses autores foram

subestimados em até 50% enquanto que as correntes aqui utilizadas mostraram boa

confiabilidade em Putman & He (2013).

As maiores porcentagens de larvas em conexão foram encontradas entre as ilhas brasileiras

e o continente africano. Para fins de melhor percepção dos resultados, a costa oeste africana foi

dividida aqui em parte noroeste (AN), abrangendo desde a região de Serra Leoa até Nigéria, e

parte oeste (AW), que abrange desde Camarões até Angola (FIGURA 3). As maiores

quantidade de partículas em conexão estão discriminadas na Tabela 2. As figuras 19 e 20

também auxiliam a visualisação desses resultados.

52

Tabela 2: Quantidades mais relevantes de partículas virtuais que apresentam origem no

continente africano em 210 dias de rastreamento.

AN AW

0,3% (set/2005) 3,3% (abr/2003)

0,05% (abr/2006) 3% (set/2003)

1% (set/2006) 0,3% (abr/2004)

0,6% (abr/2007) 2% (set/2004)

4% (set/2007) 3% (set/2005)

2,23% (set/2008) 0,4% (abr/2006)

3% (set/2009) 0,5% (set/2006)

0,5% (abr/2010) 13% (set/2007)

0,1% (set/2010) 3% (set/2008)

0,25% (abr/2011) 3,5% (set/2009)

1,5% (set/2011) 0,4% (set/2010)

1% (abr/2012) 10% (set/2011)

0,25% (set/2012) 0,8% (set/2012)

Fonte: a autora (2017).

Figura 19 - Porcentagem de partículas lançadas em 1 de abril (a) e 1 de setembro (b) entre os

anos 2003 e 2012 a partir de AR, FN e ASPSP que atingem a região noroeste da África.

Fonte: a autora (2017).

a) b)

53

Figura 20 - Porcentagem de partículas lançadas em 1 de abril (a) e 1 de setembro (b) entre os

anos 2003 e 2012 a partir de AR, FN e ASPSP que atingem a região oeste da África.

Fonte: a autora (2017).

As correntes na região africana favorecem mais as conexões quando supostamente as

partículas tem origem no continente africano em meados de fevereiro, representando assim seu

assentamento nas ilhas alvo no mês de setembro. A desova ocorrendo em fevereiro correspode

à época em que a CCNE começa a perder força, permanecendo mais fraca até o final de maio.

De maneira geral, o fluxo para oeste no Atlântico Tropical está mais intensificado entre abril e

junho. A nCSE é mais intensa próximo a 0°10°W e de junho a setembro, quando as larvas estão

prontas para assentar nas ilhas, a cSEC mostra-se mais intensa no centro da bacia, favorecendo

essa interconexão.

As simulações inicializadas em 1 de abril mostraram menor conectividade com a costa

africana (FIGURA 21) pois esse período em que as trajetórias foram simuladas (de 1 de abril

até 1 de setembro do ano anterior) coincide com a época em que as correntes na região

equatorial (CSE) apresentam menor magnitude (FIGURA 22). De maneira geral, o fluxo para

oeste no Atlântico Tropical se encontra mais fraco e com maior componente meridional entre

outubro e dezembro. De janeiro a março esse fluxo pode continuar fraco, porém começa a

ganhar mais intensidade e se unidirecionar para oeste.

a) b)

54

Figura 21 - Trajetória reversa de larvas virtuais lançadas em 1/4/2005 (a) e 1/9/2005 (b) a partir

de AR, FN e ASPSP com rastreamento de 210 dias. As cores mostram o tempo decorrido em

dias a partir do local de lançamento. Os círculos indicam possíveis origem das larvas.

Fonte: a autora (2017).

A quantidade de partículas em conexão com as ilhas alvo que saem de AW é bem superior

àquelas originarias de AN. Isso pode ser devido recirculações em mesoescala presentes no

Golfo de Guiné, que diminui a advecção das partículas para lugares mais distantes. Por sua vez,

a região de São Tomé e Príncipe, que pertence a AW e mostra grandes quantidades de larvas

em conexão, está situada em área de maior influência dos ramos equatoriais da CSE. Também

deve-se levar em consideração que o polígono de AW pode compreender área maior que o

polígono de AN.

Embora os números apresentem potencial probabilidade de que haja conexão, não se pode

assumir que as larvas realmente tem origem no continente africano, pois não existem registros

de populações de lagostas espinhosas semelhantes àquelas encontradas nas ilhas brasileiras em

toda a plataforma oeste africana dentro do domínio desse estudo. A espécie Panulirus argus

foge à regra por ter sido reportada duas vezes na Costa do Marfim (HOLTHUIS, 1991), mas

esses registros não caracterizam a existência de uma população ali.

a) b)

55

Figura 22 - Médias trimestrais de circulação superficial no ano 2005. (a) de janeiro a março, (b)

de abril a junho; (c) de julho a setembro e (d) de outubro a dezembro.

Fonte: a autora (2017).

a)

b)

c)

d)

56

Porém, esses resultados são importantes para afirmar que, se existe qualquer espécie com

DPL próximo a 7 meses que ocorra tanto no continente africano como nas regiões insulares

brasileiras, as populações das ilhas podem sim ter se originado da África. Esses resultados

também estão em concordância com as trajetórias das boias de deriva do Global Drifter

Program mostrados anteriormente. Por fim, esses resultados instigam a pesquisa in situ de

observação de espécimes adultas de lagosta espinhosa no limite leste da bacia do AT.

Em alguns experimentos é possível determinar alguns padrões nas trajetórias que as larvas

virtuais executam para finalmente chegar aos arquipélagos, embora muitas partículas tomem

rumos aleatórios. Para o ASPSP, que encontra-se em uma latitude mais a norte em relação a

AR/FN, foi possível identificar algumas peculiaridades. Os experimentos inicializados em abril

dos anos 2003 (FIGURA 9), 2011 e 2012 mostram que algumas partículas são transportadas

pela nCSE, retrofletem para sul próximo a 40°W e seguem pelo fluxo da SCE até chegarem a

ASPSP. Em 2010, os fluxos meridionais, tanto para norte quanto para sul, foram de importância

para que as partículas chegassem em ASPSP (FIGURA 23).

Figura 23 - Trajetória reversa de larvas virtuais lançadas em 1/4/2010 (a) e 1/9/2010 (b) a partir

de AR, FN e ASPSP com rastreamento de 210 dias. As cores mostram o tempo decorrido em

dias a partir do local de lançamento. Os círculos indicam possíveis origem das larvas.

Fonte: a autora (2017).

Nos anos 2006, 2007 e 2008 os jatos equatoriais da CSE são de suma importância para

carrear partículas de locais próximos ou na costa africana até o ASPSP. A Figura 24 exemplifica

isso: Não só a nCSE, que se posiciona em latitude mais próxima a de ASPSP e por isso tem

maior possibilidade de estabelecer conexões entre ASPSP e África, mas também a cCSE é

a) b)

57

responsável por um transporte, até que um fluxo para noroeste próximo a 24°W leva as

partículas até ASPSP.

Figura 24 - Trajetória reversa de larvas virtuais lançadas em 1/9/2008 a partir de AR, FN e

ASPSP com rastreamento de 210 dias. As cores mostram o tempo decorrido em dias a partir do

local de lançamento. Os círculos indicam possíveis origem das larvas.

Fonte: a autora (2017).

Esses jatos equatoriais da CSE são os principais responsáveis em transportar partículas até

AR e FN, o que faz sentido pois essas regiões estão próximas de 4°S, recebendo mais

diretamente a influência desses fluxos. Quando o começo da simulação indica que as larvas

virtuais estão vindo pelo lado oeste dessas ilhas, infere-se que o fluxo da SCE esteja mais forte

naquele período, agindo em conjunto com um fluxo de velocidades médias para sul entre a

nCSE e a cCSE, também evidente. Em alguns experimentos, também é possível notar que um

fluxo para norte em uma latitude logo abaixo de AR/FN traz as partículas para seu destino final.

Um exemplo disto pode ser visto na Figura 10. Esse fluxo deve-se a uma influência do

transporte da CNB.

58

7 CONCLUSÃO

De forma geral, ASPSP, FN, AR e a PCB apresentam conexão ecológica entre si, em que

uma região pode servir de trampolim ecológico e garantir fluxo gênico indireto com as demais

regiões.

A PCB e regiões adjacentes à norte apresentaram a maior probabilidade de serem origem

das populações de lagostas espinhosas estabelecidas em AR, ASPSP e FN. A maior

conectividade se dá com desovas ocorridas em meados de fevereiro.

As populações de lagostas espinhosas existentes na IA e CV também podem ser fonte de

larvas que chegam às ilhas brasileiras aqui abordadas, embora a quantidade de larvas que

estabelecem essa conexão seja menor. A maior conectividade neste caso se dá com desovas

ocorridas em setembro para IA e fevereiro para CV.

Embora as maiores porcentagens de partículas virtuais em conexão seja entre as ilhas e a

plataforma africana, não se pode dizer que a África é origem das lagostas das regiões insulares

aqui abordadas, pois não há registros de populações equivalentes estabelecidas no continente

africano.

Apesar de CV possuir populações estabelecidas de lagostas, sabe-se que estas estão em

decadência e, portanto, também não se pode assumir como fonte de renovação das populações

de lagosta das ilhas, apesar de poder ocorrer fluxo gênico.

As partículas que mostram origem das larvas de lagosta em oceano aberto, ou seja, que não

mostram conectividade entre as ilhas brasileiras e nenhum outro território são consideradas

como resultados inválidos. Essas partículas as vezes são advectadas para fora de um fluxo

principal, permanecendo a mercê de vários fluxos aleatórios, ou aprisionadas em vórtices e

demais eventos de mesoescala.

Se considerados DPL de 365 dias, como defendido por alguns autores, ao invés de 210 dias

considerados neste trabalho, todas as conexões, exceto com a IA, tendem a aumentar. Também

é importante ressaltar que existe grande variabilidade interanual na conectividade entre as

regiões.

A taxa de dissipação turbulenta, a qual representa processos de dispersão horizontal em

menor escala, com o valor de Ɛ = 10-6 m2/s3 resultou numa melhor representação das trajetórias

das bóias de deriva mostrando a importância inquestionável de se acionar tal componente

aleatória em estudos de dispersão de partículas.

Esse trabalho leva em conta a DPL de lagostas para se estudar conexão ecológica no AT,

porém é importante salientar que os resultados aqui encontrados também podem ser úteis em

59

estudos de conectividade de outras espécies e também para determinar a dispersão e advecção

em superfície de materiais em geral, como por exemplo resíduos sólidos.

60

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63

APÊNDICE A

2003

Abril Setembro

2004

Abril Setembro

64

2005

Abril Setembro

2006

Abril Setembro

2007

Abril Setembro

65

2008

Abril Setembro

2009

Abril Setembro

2010

Abril Setembro

66

2011

Abril Setembro

2012

Abril Setembro