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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ CENTRO DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA MESTRADO EM GEOGRAFIA REJANE MARIA DE SOUZA O BENFICA DA EDUCAÇÃO: PAISAGEM E FOTOGRAFIA FORTALEZA - CEARÁ 2014

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ

CENTRO DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA

MESTRADO EM GEOGRAFIA

REJANE MARIA DE SOUZA

O BENFICA DA EDUCAÇÃO: PAISAGEM E FOTOGRAFIA

FORTALEZA - CEARÁ

2014

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REJANE MARIA DE SOUZA

O BENFICA DA EDUCAÇÃO: PAISAGEM E FOTOGRAFIA

Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado Acadêmico

em Geografia do Programa de Pós - Graduação em Geografia

do Centro de Ciências e Tecnologia da Universidade Estadual

do Ceará, como requisito parcial à obtenção do título de

mestre em Geografia. Área de concentração: Análise

Geoambiental e Ordenamento de Territórios de Regiões

Semiáridas e Litorâneas.

Orientador: Prof. Ph.D. Raimundo Elmo de Paula

Vasconcelos Júnior.

FORTALEZA - CEARÁ

2014

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A Deus, aos meus pais Cira e José, e todos

aqueles que contribuíram nessa jornada.

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AGRADECIMENTOS

Agradecer sempre é uma difícil tarefa, ainda mais nessa pesquisa, na qual diversas pessoas

tiveram importantes contribuições nesse momento gratificante e ao mesmo tempo bastante

delicado, necessitando de muito esforço e dedicação para a conclusão da tão merecida

dissertação.

Primeiramente desejo agradecer a Deus por ter me proporcionado a realização e a continuação

dos meus estudos, não me deixando em nenhum momento desamparada. Nos momentos mais

difíceis de angústia, ele me ajudou, dando-me forças para continuar essa jornada.

Merece destaque nesse momento a minha família, que me apoiou em todas as decisões e não

mediu esforços para que eu pudesse prosseguir na carreira acadêmica. Para os meus pais deixo

a minha eterna gratidão, pois apesar de todas as dificuldades nunca desacreditaram minha

capacidade, e me proporcionaram o melhor para que pudesse concluir essa importante etapa da

minha vida.

Uma pessoa a quem tenho muito a agradecer é meu orientador, professor Dr. Elmo

Vasconcelos, que desde o início da minha graduação sempre me incentivou, crendo no meu

potencial e me fazendo a cada dia acreditar que eu poderia melhorar nas minhas atitudes;

observando os meus erros e acertos, sem perder a seriedade de um orientador e a afabilidade de

um amigo.

Aos moradores e frequentadores do bairro, assim como aos estudantes, aos professores e aos

funcionários da Universidade Federal do Ceará (UFC), desejo agradecer profundamente pelas

importantes contribuições que deram à pesquisa. Sem vocês os resultados alcançados nessa

dissertação não seriam possíveis. Apesar de todos esses terem sua importância, gostaria de

destacar o apoio da funcionária da UFC, Mônica Monteiro Vasconcelos. Suas contribuições

foram de grande relevância no período das entrevistas e também durante a fase de pesquisa

sobre a história da Universidade.

Ainda desejo agradecer à minha turma de Mestrado, à Fundação Cearense de Apoio a Pesquisa

(FUNCAP) pelo apoio financeiro, ao Programa de Pós Graduação em Geografia (PROPGEO)

e à sua coordenadora Prof.ª. Drª Lucia Brito. Aos professores que contribuíram para o

desenvolvimento da pesquisa e o meu amadurecimento intelectual deixo os meus sinceros

agradecimentos. Não poderia deixar de lembrar das secretárias do Propgeo, Júlia e Adriana, que

sempre com sorrisos me recebiam quando necessitava resolver os assuntos burocráticos. À

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Aparecida, auxiliar de serviços gerais, agradeço pelo café, me ajudando quando as poucas horas

de sono eram insuficientes.

Aos professores que participaram da banca examinadora, Dr. Josier Ferreira da Silva e Drª Keila

Andrade Haiashida, desejo agradecer profundamente pelo tempo que disponibilizaram para a

participação desse tão importante momento.

“Cada pessoa que passa em nossa vida passa sozinha e não nos deixa só porque deixa um pouco

de si e leva um pouquinho de nós” (Charles Chaplin). Desejo agradecer ao Anderson por toda

a paciência nestes dois anos, ele sempre fez parte dos momentos de alegrias, assim como os de

tristeza e angústia. O Seu apoio foi de fundamental relevância para a conclusão da pesquisa,

pois sempre tive sua compreensão nos momentos mais difíceis.

Desejo falar a todos aos meus amigos o meu muito obrigada. Sempre levarei comigo os

momentos que vivemos juntos, não somente aqueles de boemia e diversão, mas também aqueles

mais complexos em que vocês me ajudaram. Recebam o meu abraço, Erica Pinheiro, William

Yanone, Kinsley, Jean Felipe, Heron Freire, Camila Dutra, João Vitor, Naiana Paula, Stanley

Braz, Rachel Facundo, Josué, Yara Castro, Sandra Gomes e Ana Maria Amaral.

Entre os amigos, alguns merecem destaque, por sua lealdade e companheirismo, como a Erica

Pinheiro. Sua companhia foi inquestionável em todo o meu percurso acadêmico, ou melhor,

desde o cursinho pré-universitário. Essa, além de me alegrar nos dias de esforço teórico na sala

de estudos do Propgeo, apoiou-me em todos os momentos difíceis durante todo o período do

mestrado.

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RESUMO

O bairro Benfica, localizado na cidade de Fortaleza, é um espaço que se destaca pelas diversas

instituições de educação do ensino básico e superior, dentre elas a Universidade Federal do

Ceará (UFC). Essa instituição, ao longo do tempo, alterou significativamente a paisagem do

bairro, principalmente com as diversas instalações administrativas e acadêmicas, assim como o

intenso fluxo de pessoas nesse espaço, que mantém constantes relações com o bairro e a

Universidade. A paisagem se destaca como um dos importantes conceitos da geografia. A partir

dela, são verificadas as práticas culturais refletidas no dia a dia pelos sujeitos do bairro Benfica:

moradores antigos, frequentadores, professores, alunos e funcionários da UFC. A pesquisa tem

como objetivo entender as alterações na paisagem do bairro Benfica após a criação da UFC

através da percepção das fotografias antigas pelos diferentes sujeitos que compõem o bairro.

Na análise, a fotografia foi selecionada como fonte principal. A partir dela, é possível analisar

as alterações na paisagem do bairro através da percepção dos sujeitos. Em virtude da

importância desses, e de suas percepções, a base teórica e metodológica é fundamentada na

abordagem realizada pela Nova Geografia Cultural e no método fenomenológico. Para o

desenvolvimento da pesquisa, foram necessários alguns procedimentos operacionais, tais como

a revisão bibliográfica, a elaboração de mapas e o trabalho de campo. Nesse, foram realizadas

entrevistas semiestruturadas com os sujeitos da pesquisa. Juntamente com as entrevistas, foram

mostradas diferentes fotografias antigas do bairro para os entrevistados. Com essas, foram

obtidos resultados pertinentes acerca da percepção dos sujeitos sobre a paisagem. Para eles, a

UFC possui grande relevância nas alterações na paisagem do Benfica, propiciando, ao mesmo

tempo, a preservação do patrimônio cultural do bairro. Os sujeitos demonstraram que as

relações que possuem com o bairro vão além de um simples lócus de trabalho, moradia, lazer e

estudo, revelando sentimento de pertencimento com o lugar a partir da análise da paisagem.

Palavras – chave: Paisagem. Benfica. Fotografia. Sujeitos.

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ABSTRACT

The Benfica district, located in the city of Fortaleza, is a space that is distinguished by the

different educational institutions of basic education and higher education, among them the

Federal University of Ceará (UFC). This institution, over time, significantly alter the landscape

of the neighborhood, especially with the various administrative and academic facilities, as well

as the intense flow of people in that space, which maintains constant relations with the

neighborhood and the University. The landscape stands as one of the important concepts of

geography. From it, are verified cultural practices reflected in everyday life by the subject of

the ancient dwellers Benfica: neighborhood regulars, teachers, students and employees of the

UFC. The research aims to understand the changes in the landscape of the Benfica

neighbourhood after the creation of the UFC through the perception of old photographs by

different subjects that make up the neighborhood. In the analysis, the photograph was selected

as primary source. From it, it is possible to analyze the changes in the landscape of the

neighborhood through the perception of the subject. In view of the importance of these, and of

their perceptions, the theoretical and methodological basis is based on the approach undertaken

by the New Cultural geography and the phenomenological method. For the development of

research, it took some operational procedures, such as the literature review, the preparation of

maps and fieldwork. In this, semi-structured interviews were conducted with the subjects of the

research. Along with the interviews, were shown different old photographs of the neighborhood

for respondents. With those relevant results were obtained concerning the subjects ' perception

about the landscape. For them, the UFC has great relevance in the changes in the landscape of

Benfica, providing, at the same time, the preservation of the cultural heritage of the

neighborhood. The subjects demonstrated that relationships that have with the neighborhood

go beyond a single locus of work, housing, leisure and study, revealing sense of belonging with

the place from the analysis of the landscape.

Keywords: Landscape. Benfica. Photo. Subject.

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LISTA DE FOTOGRAFIAS

Fotografia 1- Visita do Reitor Martins Filho à reforma da Reitoria e à construção da

ConchaAcústica...............................................................................................

59

Fotografia 2 - Visita do presidente Humberto de Alencar Castelo Branco à UFC para a

inauguração da residência estudantil universitária..........................................

61

Fotografia 3 - Avenida Visconde do Cauípe. ........................................................................ 78

Fotografia 4 - Ginásio Santa Cecília . ................................................................................... 79

Fotografia 5 - Ginásio Santa Cecília . ................................................................................... 80

Fotografia 6 - Escola Industrial.. ........................................................................................... 80

Fotografia 7 - Palacete João Gentil........................................................................................ 83

Fotografia 8 - Grupo Escolar Benfica.................................................................................... 84

Fotografia 9 - Palacete de José Gentil Alves de Carvalho..................................................... 85

Fotografia 10 - Casa de João Tomé de Sabóia e Silva............................................................ 85

Fotografia 11 - Giratório entre as Avenidas 13 de maio e Universidade................................ 86

Fotografia 12 - Portão do Palacete Gentil aproveitado por muito tempo como entrada

principal da Reitoria........................................................................................

87

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LISTA DE MAPAS

Mapa 1 - Localização da área de estudo............................................................................ 15

Mapa 2 - Ruas e limites do bairro Benfica......................................................................... 19

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ADAUFC Associação de Docentes Aposentados e Pensionas de Docentes

Aposentados da Universidade Federal do Ceará

CAEN Curso de Pós-Graduação em Economia

CEFET Centro Federal de Educação Tecnológica do Ceará

CETREDE Centro de Treinamento e Desenvolvimento Regional

CLEC Centro de Línguas Estrangeiras do CEFET-CE

CEPEP Centro de Estudo e Pesquisa em Eletrônica Profissional e Informática

Limitada

CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

CEU Clube dos Estudantes Universitários

CNPQ Conselho Nacional de Pesquisa

FACED Faculdade de Educação

FEAAC Faculdade de Economia, Administração, Atuária, Contabilidade e

Secretariado Executivo

FIEC Federação das Indústrias do Ceará

FUMDHAM Fundação Museu do Homem Americano

IFCE Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará

GEPECED Grupo de Pesquisa em Espaço, Cultura e Educação

GLBTT Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais

LABOMAR Instituto de Ciências do Mar

MAG Mestrado Acadêmico em Geografia

IPE Instituto de Pesquisas Econômicas

ICA Instituto de Cultura e Arte

OEA Organização dos Estados Americanos

PSD Partido Social Democrático

PROPGEO Programa de Pós Graduação em Geografia

SAL Sistema de Automação Universitária

SIGS Sistemas de Informações Geográficas

UECE Universidade Estadual do Ceará

UDN União Democrática Nacional

UFC Universidade Federal do Ceará

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO................................................................................. 14

2 OS CONCEITOS DE PAISAGEM E IMAGEM .......................... 31

2.1 APONTAMENTOS SOBRE O CONCEITO DE PAISAGEM NA

GEOGRAFIA....................................................................................

31

2.2 A IMAGEM FOTOGRÁFICA........................................................... 41

3 A EDUCAÇÃO NA PAISAGEM DO BENFICA DE ONTEM E

DE HOJE............................................................................................

52

3.1 UM POUCO DA HISTÓRIA DO BAIRRO ....................................... 52

3.2 A HISTÓRIA DA UFC...................................................................... 55

3.2.1 Primeiro período: A criação da UFC, a escolha do primeiro reitor,

e os doze primeiros anos de instituição.......................................

56

3.2.2 Segundo Período: Os principais feitos dos reitorados de 1967 até

os dias atuais.......................................................................................

63

3.3 A UFC E AS ALTERAÇÕES NA PAISAGEM DO BAIRRO

BENFICA.............................................................................................

67

4 A FOTOGRAFIA COMO POSSIBILIDADE DE LEITURA DA

PAISAGEM DO BENFICA..............................................................

75

4.1 A PAISAGEM DO BENFICA EXPRESSADA EM SUAS

FOTOGRAFIAS...................................................................................

75

4.2 A FOTOGRAFIA E O ESPECTADOR................................................ 88

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................. 95

REFERÊNCIAS.................................................................................. 98

APÊNDICES .......................................................................................

104

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1 INTRODUÇÃO

(...) qualquer paisagem é composta não apenas por aquilo que está à

frente dos nossos olhos, mas também por aquilo que se esconde em

nossas mentes (MEINIG, 2002, p. 35).

A presente dissertação está inserida nos estudos relacionados à paisagem, à

geografia e à fotografia. Nessa iremos analisar, através da percepção dos sujeitos que compõem,

o bairro Benfica - localizado na cidade de Fortaleza, no estado do Ceará (Mapa1) -, e as

alterações em sua paisagem a partir da criação de uma importante instituição de ensino, a

Universidade Federal do Ceará (UFC). Nessa abordagem, a fotografia está inserida

intrinsicamente, demostrando, através da percepção dos sujeitos sociais, o entendimento sobre

a paisagem do bairro.

Tendo por base as ideias de Charlot (2000), os sujeitos são seres humanos abertos

ao mundo. Esses possuem historicidades e são portadores de desejos, e são movido por eles. O

sujeito é um ser social que tem uma história e interpreta o mundo a partir de suas experiências

e vivências. Os sujeitos são ativos e, ao mesmo tempo que eles agem sobre o mundo, é

produzido um conjunto de relações sociais no qual eles se inserem.

A pesquisa a ser apresentada teve seu início nos estudos realizados na graduação

juntamente com o Grupo de Pesquisa em Espaço, Cultura e Educação (GEPECED), que tem

como coordenador o Prof. Dr. Raimundo Elmo de Paula Vasconcelos Júnior, meu orientador.

Os estudos desenvolvidos no GEPECED resultaram no trabalho para a conclusão

do curso de graduação em geografia, cujo título foi o seguinte: O Benfica da educação: uma

análise espacial do bairro enquanto lócus de instituições educacionais. Nesta pesquisa buscou-

se entender a relação entre as políticas educacionais e as modificações na dinâmica espacial.

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Mapa 1- Localização da área de estudo

Fonte: Salvador ,2014.

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A partir do trabalho de conclusão da graduação e no decorrer dos estudos

geográficos relacionados ao Benfica como espaço da educação, desenvolveu-se um olhar

peculiar referente às alterações que ocorreram, e que continuam acontecendo em sua paisagem

após a criação da UFC. Essa perspectiva foi de fundamental relevância para a elaboração do

projeto de pesquisa junto ao Mestrado Acadêmico em Geografia (MAG), originando

posteriormente essa dissertação.

O Benfica é um espaço privilegiado para os estudos das paisagens urbanas. Fatores

históricos e atuais fazem do bairro um lócus onde podemos desenvolver diversos estudos em

diferentes áreas do conhecimento, como a geografia, a nossa base para o estudo a ser

apresentado.

Esse bairro possui muitas referências históricas para a cidade de Fortaleza, dentre

elas as muitas famílias importantes do cenário social, político e econômico que residiam no

Benfica. Entre essas, é incontestável a significância da família Gentil, que tinha como patriarca

o comerciante e empresário José Gentil Alves de Carvalho. Suas raízes se encontram em Sobral,

município localizado na região norte do estado do Ceará.

Essa importante personalidade veio residir no Benfica, onde comprou uma chácara

para ser a sua residência. Essa passou por diversas reformas e, posteriormente no ano de 1959,

foi vendida para a UFC para ser a sede da reitoria (VASCONCELOS JÚNIOR, 1999).

A importância de José Gentil Alves de Carvalho está interligada à compra de

terrenos vizinhos a sua residência no Benfica, onde o mesmo construiu diversos tipos de

moradia para diferentes classes sociais que estavam se fixando na cidade de Fortaleza, como

profissionais liberais, professores, médicos e advogados. Essa área demarcada pelas residências

construídas pelo empresário ficou conhecida como Gentilândia. Com esta denominação,

podemos perceber a relevância do patriarca da família Gentil na história do bairro Benfica, pois

a Gentilândia se localizava dentro do bairro Benfica (VASCONCELOS JÚNIOR, 1999).

Continuando as abordagens ligadas à história do bairro, além das importantes

famílias que se localizavam nesse, como explicamos anteriormente, outros importantes fatores

locacionais, como a proximidade com o Centro da cidade e a Estrada de Arroches1, fizeram do

Benfica um bairro de destaque para a história de Fortaleza.

1 O Caminho de Arronches tem sua origem a Parangaba. Por essa passava o gado e os gêneros alimentícios para

abastecer a cidade de Fortaleza (COSTA, 2007).

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Assim como os fatores apresentados acima, outro importante fato para a história,

que se mantém firme na atualidade no Benfica, foi a criação e fixação da UFC no ano de 1955.

Vale ressaltar que, antes da criação da universidade, o ensino superior já se apresentava no

estado, com a Faculdade de Direito, Faculdade de medicina, Faculdade de Farmácia e

Odontologia e a Escola de Agronomia.

A criação da UFC consolidou o Benfica como espaço da educação. No entanto, o

bairro já possuía outras instituições de ensino, destacando-se o Ginásio Americano, o Colégio

Santa Cecília e o Ginásio Nossa Senhora das Graças. Ainda que essas instituições tenham

deixado suas contribuições para o contexto educacional do bairro, nenhuma delas alterou de

forma significativa a dinâmica social nesse espaço, como vem acontecendo após a criação da

Universidade (VASCONCELOS JÚNIOR,1999).

O Benfica, localizado ao sul do que se denomina Centro de Fortaleza, é hoje espaço

que concentra várias atividades, configurando-se como um bairro que vai além de espaço de

residências. Nos últimos cinquenta anos, o bairro vem concentrando inúmeras instituições de

ensino, provocando no mesmo diversas transformações. Uma das mudanças ocorridas foi a

concentração de estudantes, professores e funcionários da UFC. Ainda foram constatadas outras

relações propiciadas pela Universidade, como as manifestações de cunho artístico e cultural, o

lazer e a boemia.

As mudanças no Benfica podem ser observadas sob diversas perspectivas, dentre

elas, as alterações na paisagem do bairro. É importante esclarecermos que, mesmo antes da

criação da Universidade, os sujeitos sociais vêm alterando a paisagem de acordo com suas

necessidades. No entanto, acreditamos que após a criação da Instituição as alterações ocorreram

de forma mais acelerada, seja com a intensificação do fluxo de pessoas, ou com o aumento de

comércios, ou aquisição de imóveis para as instalações da principal instituição de ensino

superior do bairro.

A Educação é um referencial para quem conhece o Benfica, pois destacou-se como

um bairro universitário devido ao fato de possuir diversas instalações da UFC. Essa área onde

se encontram as instalações da Universidade no bairro é denominada Campus do Benfica. De

acordo com a entrevista realizada com o prefeito do campus, Murilo Holanda Dodt, em

dezembro de 2013, os limites do campus são diferentes dos limites do bairro (Mapa 2). Segundo

esse, o campus do Benfica tem início na Praça da Bandeira, na Rua Clarindo de Queiroz, onde

está localizada a Faculdade de Direito. O fim do campus está na direção da região sul, na Rua

Padre Francisco Pinto, com os anexos da reitoria. Esta informação será mostrada

posteriormente, no capítulo dois, com a apresentação do mapa do campus em análise.

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O Campus do Benfica, compõe uma área de 13 hectares. Nesse estão localizadas as

seguintes estruturas da UFC: Reitoria; Pró-reitora de Planejamento; Pró-reitora de

administração; Pró-reitora de Assuntos Estudantis; Centro de Humanidades; Faculdade de

Direito, Faculdade de Educação; Faculdade de Economia, Administração, Atuária e

Contabilidade (FEAAC), Curso de Arquitetura e equipamentos culturais.

Atualmente a UFC é composta por seis campi, denominados Campus do Pici,

Campus do Porangabuçu e o Campus do Benfica, apresentado anteriormente, todos localizados

no município de Fortaleza2. O Campus do Pici abrange uma área de 212 hectares, onde se

encontram o Centro de Ciências; o Centro de Ciências Agrárias; o Centro de Tecnologia; a Pró-

reitora de Graduação; a Pró-reitora de Pesquisa e Pós-Graduação; o Instituto de Cultura e Arte; o

Instituto de Educação Física e Esportes; o Instituto UFC Virtual; a Biblioteca Universitária;

a Secretaria de Tecnologia da Informação e núcleos e laboratórios diversos, além de área para

a prática de esportes.

Já o Campus do Porangabuçu, possui uma área menor, 8 hectares. Nesse estão

presentes a Faculdade de Farmácia, Odontologia e Enfermagem; a Faculdade de Medicina;

o complexo hospitalar (Hospital Universitário Walter Cantídio, Maternidade-Escola Assis

Chateaubriand e Farmácia-Escola) e laboratórios e clínicas.

2 As informações apresentadas referentes à estrutura dos campi da UFC de Fortaleza tiveram como referência o

seguinte site da instituição: www.ufc.br

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Mapa 2 - Ruas e limites do bairro Benfica

Fonte: Salvador, 2014,

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Além dos Campi de Fortaleza, a Universidade possui outras áreas no município,

dentre elas o sítio Alagadiço Novo, localizado no bairro Messejana. Esse abriga a Casa José de

Alencar3, as ruínas do primeiro engenho a vapor do Ceará, o Museu Arthur Ramos, a Pinacoteca

Floriano Teixeira, a Biblioteca Braga Montenegro e um restaurante. Outra área da UFC na

capital cearense é o Instituto de Ciências do Mar (LABOMAR), cuja localização é na Avenida

Beira Mar.

A instituição de ensino em questão também expandiu o ensino superior para o

interior do estado do Ceará e possui dois campi. O primeiro deles é localizado na cidade de

Sobral. Esse Campus possui os seguintes cursos de graduação: Ciências Econômicas,

Engenharia da Computação; Engenharia Elétrica; Finanças; Medicina; Licenciatura em Música;

Odontologia e Psicologia. O mesmo ainda conta com o curso de Administração em Gestão

Pública, na modalidade semipresencial, com o curso de Especialização em Coordenação

Pedagógica e com os mestrados nas áreas de Biotecnologia e Saúde da Família4.

O segundo campus da UFC no interior do estado se localiza na cidade de Quixadá.

Esse possui quatro cursos de graduação na área da informática: Sistemas de Informação, Redes

de Computadores, Engenharia de Software e Ciências da Computação5. O terceiro campus da

UFC no interior do estado se encontra na cidade de Iguatu. Esse foi criado recentemente no mês

de abril de 2014 (JORNAL O POVO, 2014).

No contexto sobre os campi da UFC no interior do estado, vale ressaltar que a

Universidade possuiu um campus localizado na Região do Cariri, nas cidade do Crato, Juazeiro

do Norte e Barbalha. No entanto, com a recente criação da Universidade Federal do Cariri

(UFCA), em junho de 2013, o campus avançado, que era mantido pela UFC, agora é pertencente

a UFCA6.

A partir das informações apresentadas, compreendemos a importância da UFC no

cenário educacional do estado e para cidade de Fortaleza. Dentro da relevância das diversas

localidades que compõem o campus da UFC se encontra o Benfica, bairro onde desenvolvemos

nossos estudos, afim de compreender a realidade desse a partir daqueles que mantém relações

constantes com esse espaço geográfico.

Em virtude dos aspectos históricos e das influências da UFC no bairro, o Benfica

se apresenta como um importante espaço para os estudos relacionados à paisagem. Portanto,

3 Casa onde nasceu o escritor cearense José de Alencar. 4 Em relação às informações sobre o Campus de Sobral, a referência é o seguinte site: www.campussobreal.ufc.br 5 A base das informações sobre o campus de Quixadá se encontra no seguinte endereço eletrônico:

www.quixada.ufc.br 6 A informação referente à criação da UFCA teve como fonte o site da Instituição, disponível em: www.ufca.edu.br

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apresentaremos adiante a estrutura da pesquisa que desenvolvemos sobre o Benfica e sua

paisagem, dividida entre objetivos, método, procedimentos operacionais, referencial teórico e

apresentação dos capítulos que compõem essa dissertação.

Como objetivo principal da pesquisa foi estabelecido o seguinte: entender as

alterações na paisagem do Benfica após a criação da UFC através da percepção das fotografias

antigas pelos diferentes sujeitos que compõem o bairro. A partir deste, foram desenvolvidos os

seguintes objetivos específicos: (i) analisar a evolução do conceito de paisagem na geografia;

(ii) compreender os principais usos e teorias da imagem fotográfica; (iii) entender o processo

de evolução histórica do bairro Benfica dentro do contexto urbano de Fortaleza; (iv) apresentar

fatos relacionados à criação e expansão da Universidade Federal do Ceará; (v) analisar como a

fotografia possibilita o estudo das alterações da paisagem do Benfica através das percepções

dos sujeitos que compõem o bairro.

Com o estabelecimento dos objetivos, buscou-se a escolha do método mais

adequando para obtenção dos resultados a serem alcançados que, em nosso caso, foi o

fenomenológico. Esse método busca entender a realidade através dos fenômenos, analisando os

aspectos vividos e as relações entre o sujeito e o objeto.

Estamos cientes das dificuldades do método fenomenológico, assim como os

fenômenos humanos, pois este é sensível, afetivo, valorativo e opinativo. A análise desses

fatores é difícil devido ao processo de observação, que pode ser de caráter externo e também

introspectivo. Tudo isso não deve ser empecilho para a pesquisa cientificamente embasada, haja

vista que o método tem como objetivo ajudar a compreensão, nos mais amplos termos

Pretendemos mostrar aqui a importância da fenomenologia, assim como algumas

de suas abordagens. Em nenhum momento temos como pretensão de mostrar todos os seus

usos, assim como as diversas teorias presentes no método fenomenológico, até porque este não

é o nosso objetivo.

Os estudos fenomenológicos na ciência geográfica são evidentes na abordagem da

nova geografia cultural, formulada a partir da década de 70. Nessa, o espaço geográfico é

analisado a partir da cultura, relacionando os aspectos vividos presente nos sujeitos. Estes são

analisados através das percepções com o lugar, entrando em discussões as crenças, as emoções,

a identidade, dentre outros.

A fenomenologia na nova geografia cultural é somada a múltiplas abordagens. O

método fenomenológico tornou-se presente nas análises geográficas a partir do surgimento da

nova perspectiva cultural na geografia, denominada como uma nova geografia cultural;

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geografia fenomenológica (Relph, 1971); geografia da percepção ou geografia humanística

(OLIVEIRA, 1983; HOLZER, 1992).

Vale ressaltar que os estudos culturais já possuíam importância na ciência

geográfica, na qual podemos citar as contribuições do geógrafo norte-americano Carl Sauer.

Para Sauer a cultura era vista como uma entidade supraorgânica, com suas próprias leis, em que

os indivíduos eram apenas mensageiros da cultura, que era concebida como algo exterior aos

indivíduos de um grupo social (SAUER, 1998).

Já a nova abordagem cultural na geografia parte do pressuposto que a cultura está

intrínseca aos sujeitos, através da qual podemos apreender costumes, hábitos, sentimentos,

representações simbólicas e experiências dos grupos sociais com o espaço geográfico, dentre

elas as análises referentes à paisagem.

Os estudos direcionados à análise da paisagem são remotos, diferindo entre

diversas abordagens e perspectivas teóricas e metodológicas. A importância do estudo desse

conceito na ciência geográfica ressurge com a nova abordagem cultural, na qual a paisagem é

vista além de sua morfologia, entrando em discussão os aspectos vividos e as experiências entre

aqueles que a experimentam no dia a dia.

Nessa perspectiva está calcada nossa análise, que busca entender como os diversos

sujeitos compõem o bairro Benfica e compreendem as alterações na paisagem. Nessa análise,

além dos aspectos cognitivos estão inseridos os sentimentos, afinal o homem é um ser repleto

de emoções, atribuindo valores e significados à paisagem.

Em virtude da importância da percepção dos sujeitos sobre a paisagem do bairro

que estamos estudando, a fenomenologia está inserida em nossa análise. Pensaremos os sujeitos

da pesquisa não como meros informantes dos dados necessários para os resultados a serem

alcançados, mas como autores, pois a experiência vivida por eles será a principal fonte de

interpretação de nossas reflexões. Desejamos, como fez Merleau Ponty, pensar que:

Todo universo da ciência é constituído sobre o mundo vivido, e se queremos pensar a

própria ciência com rigor, apreciar exatamente seu sentido e seu alcance, precisamos

primeiramente despertar essa experiência do mundo [...] (PONTY, 1996, p.01).

Baseado nesta visão de ciência é que olharemos os cidadãos do Benfica, sujeitos de

nossa pesquisa, analisando suas percepções sobre a paisagem como o conhecimento sobre elas.

Tentaremos interpretar as informações dos sujeitos tal como eles nos demonstrarão, e a

fenomenologia nos dá sustentação para isso, pois ela é a tentativa de uma descrição direta da

experiência tal como ela é.

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23

A fenomenologia busca aquilo que se apresenta como o princípio básico do

pensamento filosófico, que é ampliar incessantemente a compreensão da realidade, no sentido

de apreendê-la na sua totalidade, destacando a importância das percepções e da subjetividade

do pensamento, que, como um todo, constitui nosso mundo-vivido, o qual envolve as histórias,

os sentimentos, os valores e as emoções.

A fenomenologia é um método de investigação que tem o propósito de apreender o

fenômeno, “isto é, a aparição das coisas à consciência” (HUSSERL apud DARTIGUES, 1992,

p. 214). A origem dos estudos fenomenológicos se reporta ao filósofo alemão Edmund Husserl.

A filosofia husserliana traz consigo o método de investigação que irá exercer grande influência

no meio acadêmico, o que fará da fenomenologia um marco imprescindível na filosofia

contemporânea (DARTIGUES,1992)

O objetivo da análise fenomenológica não é negar a existência do mundo material,

mas compreender como o conhecimento acontece através das intencionalidades. Para Husserl

a palavra intencionalidade significa a característica geral da consciência de ser consciência de

alguma coisa. Eis o ponto de partida adotado pelo filósofo alemão na análise dos fenômenos no

âmbito da consciência, no intuito de se tentar apreender as coisas em si mesmas, isto é, como

elas são (DARTIGUES, 1992).

Baseado nas ideias de Husserl, o autor aborda a intencionalidade da seguinte

maneira:

(...) O princípio de intencionalidade é que a consciência é sempre ‘consciência de

alguma coisa’, que ela só é consciência estando dirigida a um objeto (sentido de

intentio). Por sua vez, o objeto só pode ser definido em sua relação à consciência, ele

é sempre objeto-para-um-sujeito. (...) Isto não quer dizer que o objeto está contido na

consciência como que dentro de uma caixa, mas que só tem seu sentido de objeto para

uma consciência (DARTIGUES, 1973 p. 212).

Buttimer (1985) corrobora com a temática afirmando que:

A noção fenomenológica da intencionalidade sugere que cada indivíduo é o foco de

seu próprio mundo, ainda que possa esquecer de si próprio como centro criativo

daquele mundo”. Lembrando Husserl, ressalta: “cada conhecedor deveria reconhecer-

se como um sujeito intencional, isto é, como um conhecedor que usa palavras com

significação intencional- para expor suas intuições objetivas e comunicáveis

(BUTTIMER, 1985, p. 168).

De acordo com Nogueira (2005), a partir do princípio da intencionalidade Husserl traçou o

da “Redução Fenomenológica”. Aqui ele percebe a realidade primeiramente como concebe o “senso

comum”, isto é, como existindo em si, independente de todo o ato de consciência ou como

ressaltava ainda “é um voltar às coisas mesmas” (HUSSERL apud DARTIGUES, 1992, p. 18).

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De acordo com Merleau-Ponty (1992) a redução fenomenológica é uma admiração

diante do mundo. Este princípio nos remete às experiências vividas por cada homem antes das

reflexões filosóficas e científicas sobre eles. A experiência aqui ressaltada é a dos homens que

a vivem, a que é resultado do envolvimento dele com e no mundo.

Além das abordagens fenomenológicas de Husserl, destacamos outros importantes

teóricos, como Sartre com a fenomenologia do existencialismo, Bachelard com a

fenomenologia da imaginação, Merleau-Ponty com a fenomenologia da percepção.

Entendemos que as diversas contribuições dos diferente teóricos sobre a

fenomenologia são relevantes para as pesquisas geográficas de cunho humanista. No entanto,

em nossa análise sobre a paisagem do Benfica, enfocaremos a abordagem realizada por

Merleau-Ponty. Este foi um discípulo de Husserl, que em seus estudos fenomenológicos aborda

o homem como o núcleo dos debates sobre o conhecimento intencional, baseando sua

construção teórica na maneira de se portar do corpo e na captação de impressões dos sentidos

(NOGUEIRA, 2005).

Uma das principais contribuições de Merleau-Ponty foi inserir o homem por meio

da percepção, experiência, sensibilidade e outras afecções somáticas no centro de diversas

contradições, com isso tornando o corpo perceptivo um mediador de tais antinomias, agora não

mais como termos inconciliáveis. É o caso da contradição entre sujeito e objeto, ser e aparência,

tempo e espaço, consciência e coisa, razão e sensibilidade, dentre algumas outras. Todavia,

estas dicotomias são passíveis de serem interpretadas como pares diferenciais que se

complementam (LIMA, 2007).

Outra temática discutida por Merleau-Ponty está relacionada ao uso da linguagem.

Essa dispõe de um certo número de signos fundamentais, composta por e ligada aos

significados. Ela, a linguagem, exprime significados, porque reconduz todas as nossas

experiências ao sistema de correspondências iniciais entre os signos e as significações de que

tomamos posse ao apreender a língua, “pois nenhum pensamento permanece na palavra e

nenhuma palavra no puro” (MERLEAU-PONTY, 1992, p. 23).

Vale ressaltar que o autor, em seus estudos sobre a linguagem, traz para a discussão

as abordagens referentes à arte e à paisagem. Merleau-Ponty defende o papel da arte na

representação do mundo, enfatizando a pintura. Ele mostra a importância do pintor, pois esse

primeiramente visualiza a paisagem e a exprime segundo sua visão de mundo, demostrando a

subjetividade entrelaçada na relação com imagem, representação e paisagem.

Merleau-Ponty analisa a paisagem através da pintura, todavia isso não quer dizer

que ele negue a paisagem fora das telas. Sua filosofia prioriza a percepção como o primeiro ato,

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através do corpo, para se valer como sujeito diante da paisagem, do mundo e do meio de

existência. Portanto, entendemos que a partir da análise da paisagem através da percepção pelos

sujeitos sociais, o autor, assim como a fenomenologia, nos fornecerá importantes contribuições

na análise da paisagem do Benfica (SOUZA, 2012).

Souza (2012), baseado nas ideias de Merleau-Ponty (1992), nos fala que, a partir

da análise sobre a paisagem, podemos verificar diversas relações existentes por intermédio de

uma linguagem indireta existente na mesma. Nesta abordagem há sempre que considerar a

perspectiva por parte daquele que direciona o seu olhar.

O olhar é de suma importância para a geografia, e consequentemente para a análise

da paisagem. Souza (2012), apud Fernandes (2009), nos fala que a subjetividade torna-se vital

para a apreensão do conceito geográfico de paisagem, tornando-se o olho uma ferramenta

indispensável para a análise dessa. Através do olhar podemos apreender a essência real da

paisagem; a partir dele vemos e, posteriormente, sentimos o que as paisagens representam no

sentido mais amplo: o mundo (SOUZA, 2012).

A partir da análise sobre a paisagem, Souza (2012) nos traz a seguinte passagem:

“Saber não é suficiente, é preciso compreender” (SOUZA, 2012 apud SODRÉ 1976, p. 07).

Isto nos remete às seguintes questões: O que a paisagem quer nos transmitir? O que a mesma

tem a nos oferecer?

As paisagens oferecem múltiplas perspectivas para analisar a realidade e

transmitem diversas percepções sobre o mundo, mostrando como o homem vem alterando o

espaço geográfico, através de suas experiências, vivências, intencionalidades e até mesmo para

a sua sobrevivência. Nesta abordagem, o homem torna-se como elemento primordial da

paisagem.

A partir do método, buscamos os procedimentos operacionais mais adequados para

a pesquisa. Primeiramente iniciamos uma revisão bibliográfica sobre os principais conceitos a

serem utilizados que, em nosso caso, foi o de paisagem no âmbito da geografia e o de imagem,

enfocando a fotografia no centro de nossa discussão. Posteriormente consultamos diversas

obras sobre os aspectos históricos do bairro Benfica, com o intuito de entender como ocorreu a

evolução do bairro dentro do contexto urbano de Fortaleza.

A partir da análise da história do Benfica, entendemos a importância de

conhecermos os principais fatos referente a criação e expansão da UFC, sendo possível através

de diversas leituras sobre a temática. Assim como a revisão de literatura, a internet foi de

fundamental relevância em nossa coleta de informações. Através dessa, utilizamos diversos

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artigos disponibilizados em periódicos eletrônicos, assim como informações em sites,

principalmente o endereço eletrônico da UFC7.

Após realizarmos a revisão de literatura, entendemos que seria necessário a

elaboração de mapas, mostrando a localização da área de estudo e as principais ruas e avenidas

do bairro. Realizada a revisão de literatura e a elaboração dos mapas, demos continuidade ao

trabalho de campo. Esse foi desenvolvido no decorrer do segundo ano da pesquisa, em 2013.

Coletamos fotografias antigas do bairro, destacando o arquivo do historiador, pesquisador e

jornalista Miguel Ângelo de Azevedo (NIREZ). Além desse arquivo, buscamos fotografias

sobre a UFC no arquivo ligado ao setor do memorial da Instituição de ensino. Esse nos forneceu

importantes imagens, retratando diversos períodos importantes para a história da Universidade.

No decorrer do trabalho de campo, realizamos diversas visitas à Universidade, afim

de coletar informações sobre a história, assim como os aspectos locacionais da instituição.

Nessa parte destacamos as entrevistas realizadas com a assistente social, Petrúcia Guimarães

dos Santos, o Prefeito do Campus do Benfica Murilo Holanda Dodt e a funcionária Monica

Monteiro Vasconcelos. Esta contribui de forma significativa para a pesquisa, mostrando

interesse em ajudar quando surgiam dúvidas.

Como falamos anteriormente, na análise sobre o método os diversos sujeitos que

fazem parte do bairro foram a base de nossa pesquisa. A partir deles alcançamos os resultados

pertinentes ao estudo. Por isso foram realizadas diversas entrevistas, afim de coletar

informações sobre a percepção desses.

Devido a análise estar concentrada nas alterações na paisagem após a criação da

Universidade, preferimos selecionar os entrevistados de acordo com as relações que eles

mantinham com o bairro e a instituição de ensino. Portanto, dividimos os entrevistados em

cinco grupos, realizando o número de dez entrevistas com cada grupo, totalizando cinquenta.

Os grupos de entrevistados foram divididos da seguinte maneira: moradores antigos,

frequentadores, Professores, alunos e funcionários da UFC.

As entrevistas que realizamos foram semiestruturadas8. Ressaltamos que nessa o

pesquisador elabora um roteiro principal de perguntas, podendo ser complementadas por outras

questões momentâneas (TRIVIÑOS, 1987). Com as entrevistas semiestruturadas tivemos a

7Endereço eletrônico da UFC: www.ufc.br 8 De acordo com Trivinõs (1987) a entrevista semiestruturada tem como característica questionamentos básicos

apoiados em teorias e hipóteses que se relacionam ao tema da pesquisa. Os questionamentos dariam novas

hipóteses surgidas a partir das respostas dos informantes. O autor afirma que a entrevista semiestruturada [...]

favorece não só a descrição dos fenômenos sociais, mas também sua explicação e a compreensão de sua totalidade

[...]” além de manter a presença consciente e atuante do pesquisador no processo de coleta de informações

(TRIVIÑOS, 1987, p. 152).

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pretensão de obter informações de maneira mais livre, deixando o entrevistando à vontade sobre

a temática, com o intuito de obter resultados significativos.

Essas foram iniciadas a partir de um roteiro, contendo diversas perguntas sobre a

UFC e o Benfica. Entendemos que cada pessoa possui uma percepção diferente sobre a

paisagem, assim como cada grupo selecionando, por isso, optamos por realizar roteiros

diferentes para cada grupo. Ressaltamos que muitas perguntas dos roteiros eram semelhantes,

por se tratar do mesmo objeto.

Além dos roteiros, selecionamos dez fotografias antigas do bairro, com o intuito

dessas “ajudarem” os sujeitos a perceberem as alterações na paisagem do Benfica, já que muitos

dos entrevistados não tinham nascido no período de criação da Universidade. Portanto, no final

das entrevistas, eram mostradas as fotografias selecionadas, tendo como objetivo apreender as

percepções dos diversos grupos que entrevistamos.

A fotografia foi a nossa fonte principal das alterações na paisagem do Benfica,

tornando-se relevante no momento das entrevistas, despertando interesse e aguçando a

percepção dos sujeitos. Essa análise das fotografias com a percepção do sujeitos será

apresentada posteriormente no terceiro capítulo da dissertação.

Antes de descrevermos como ocorreram as entrevistas, ressaltamos que, ao

iniciarmos as mesmas, não falávamos o objetivo principal da pesquisa, pois o nosso intuito era

apreender a essência da percepção dos sujeitos. No entanto, ao iniciar as entrevistas explicamos

que a temática dessas era em relação ao bairro Benfica. Em nenhum momento poderíamos

influenciar nas respostas fornecidas, por isso que optamos ter neutralidade, afim de alcançarmos

os resultados pela aplicação do método fenomenológico.

Quando iniciamos a escolha dos entrevistados, compreendemos a importância dos

moradores antigos, pois eles nos poderiam fornecer importantes informações através da

percepção e da vivência cotidianas no espaço do bairro. Além disso, ressaltamos que muitos

deles moram ou moraram no bairro antes do surgimento da UFC, portanto possuem uma

importante percepção frente às alterações na paisagem, já que eles acompanharam todo esse

processo.

As entrevistas foram iniciadas com os moradores antigos em novembro de 2013.

Algumas delas foram coletadas no grupo denominado Confraria da Gentilândia 9 e as demais

9 O Grupo Confraria da Gentilândia é composto por moradores do bairro Benfica. Esses Senhores se reúnem

semanalmente para conversar sobre diversos assuntos, dentre eles o Benfica, contribuindo para a vivacidade da

história e memória do bairro (VASCONCELOS JÚNIOR, 1999).

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foram através de visitas nas casas deles, onde a maioria foram solistas, entendendo a

importância da pesquisa

Os outros grupos também mantêm relações constantes com o bairro e a

Universidade, dentre eles os frequentadores. Optamos por entrevistá-los por fazerem parte da

dinâmica o bairro, frequentando o Benfica frequentemente e percebendo a importância da UFC.

Nessa análise, ressaltamos que muitos dos frequentadores já tiveram relações com a

Universidade e com o bairro, muitos deles moraram no Benfica e (ou) já estudaram na

Universidade.

Os professores da Universidade fazem parte do Benfica e frequentemente

estabelecem relações com a paisagem do bairro, assim como os alunos e os funcionários da

Instituição. Nessa análise ressaltamos que os mesmos estudam ou trabalham no campus do

Benfica, afinal nosso intuito é compreender as alterações na paisagem do bairro Benfica,

portanto os entrevistados foram todos pertencentes a esse campus.

As análises junto aos frequentadores foram a partir de encontros em momentos de

lazer, em restaurantes, lanchonetes, bares ou praças. Com os estudantes, as entrevistas foram

concretizadas, principalmente, na Faculdade de Educação (FACED) e no Centro de

Humanidades. Com os funcionários e os Professores da UFC, elas foram realizadas na Reitoria,

onde se encontra administração da Universidade, portanto nesse lócus, conseguimos entrevistas

com diferentes funcionários e docentes. Do mesmo modo, completamos a análise com os

professores na Associação de Docentes Aposentados e Pensionas de Docentes Aposentados da

Universidade Federal do Ceará (ADAUFC) e na FACED.

Apesar de termos realizado todas as entrevistas e alcançado resultados

significativos, muitas dificuldades foram encontradas no decorrer desse percurso. Ao

perguntarmos a algumas pessoas se elas poderiam responder perguntas sobre o Benfica, muitos

alegaram que não tinham tempo e outros demonstraram que não tinham interesse. Mas o que

nos chamou atenção nesse processo, foi o desinteresse de muitos professores, demostrando

dificuldade em responder as perguntas. Isso contradiz os princípios das pesquisas, já que muitos

deles realizaram trabalhos de cunho acadêmico.

Com os devidos procedimentos operacionais realizados, houve a continuação da

escrita da dissertação, composta pela presente introdução e três capítulos. O primeiro retrata as

orientações teóricas com os conceitos de paisagem e imagem. Sobre a paisagem, optamos por

abordar a temática através das evolução do conceito no âmbito da geografia, mostrando as

diversas contribuições de importantes geógrafos, formuladas ao longo do tempo. No entanto,

destacarei nessa análise, principalmente, as contribuições com base na Nova Geografia

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Cultural, formulada a partir da década de 70. O referencial teórico utilizado nessa parte destaca

as ideias de Duncan (1990), Cosgrove (1998; 2003), Melo (2003), Holzer (1999), Luchiari

(2001), Corrêa (1997; 1999; 2001; 2007; 2011).

Outra relevante base teórica para o desenvolvimento da pesquisa está calcada na

análise da fotografia. Para o entendimento aprofundado sobre a fotografia, mostraremos

importantes contribuições de diferentes autores e áreas do conhecimento, destacando as ideias

apresentadas por Aumont (2012), Barthes (1984), Dubois (1993; 1994), Joly (2007) e Kossoy

(2012).

Nessa parte inicial foi importante abordarmos além da imagem fotográfica,

revelando a perspectiva de diversos estudiosos sobre o conceito de imagem, assim como os

aspectos históricos e usos dessa no decorrer da história da humanidade. Tendo em vista a difícil

tarefa de analisar a imagem, pretendemos focar sobre a compreensão dessa pelos sujeitos

sociais.

Na tentativa de alcançar os objetivos da pesquisa, se faz necessário entender os

aspectos históricos do bairro e da UFC, mostrados no segundo capítulo, titulado Educação na

Paisagem do Benfica de Ontem e de Hoje. A estrutura desse capítulo é composta pelos seguintes

subitens: Um pouco da história do Benfica; A Criação da UFC e, por fim, a UFC e as Mudanças

na Paisagem do Benfica. O primeiro subitem retrata os principais aspectos históricos do bairro

e apresenta a evolução do mesmo dentro do contexto urbano de Fortaleza. Seguindo o percurso

a ser desenvolvido, analisamos o contexto em que foi criada a Universidade, mostrando como

ocorreu esse importante fato na história do Ceará, assim como os principais agentes envolvidos

nesse processo. Dividimos esse subitem em duas partes. A primeira retrata o período da criação

da Universidade, a escolha do primeiro reitor e os doze primeiros anos da universidade. A

segunda parte mostra os principais feitos divididos pelos mandatos dos reitores a partir de 1967

até aos dias atuais. Entendemos que existem múltiplos fatos que foram relevantes no decorrer

da história da Universidade, por isso nossa análise privilegiou a criação de cursos assim como

a expansão das áreas físicas, tendo como foco o campus do Benfica, objeto de estudo da

dissertação.

Para Finalizar o segundo capítulo, apresentaremos as alterações na paisagem do

bairro após a chegada da instituição de ensino, mostrando a importância dessa no processo de

desenvolvimento do bairro e, consequentemente, da sua paisagem. Mais uma vez destacamos a

importância dos sujeitos, pois nesse capítulo apresentamos suas diversas falas retratando a

percepção dos mesmos sobre os objetivos da pesquisa.

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O terceiro e último capítulo, titulado A fotografia como Possibilidade de Leitura da

Paisagem do Benfica, é divido em dois subitens. No primeiro, A paisagem do Benfica

Expressada em suas fotografias, apresentamos e descrevemos detalhadamente os aspectos

históricos e atuais sobre as dez fotografias antigas selecionadas do bairro. No segundo, A

fotografia e o Espectador, analisamos a relação dessa fonte com aqueles que a analisaram,

mostrando as diversas percepções dos sujeitos através de informações orais sobre as alterações

na paisagem do objeto de estudo dessa dissertação.

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2 OS CONCEITOS DE PAISAGEM E IMAGEM

2.1 APONTAMENTOS SOBRE O CONCEITO DE PAISAGEM NA GEOGRAFIA

A paisagem é constituída como uma importante temática que ao longo do tempo

tem atraído a atenção dos geógrafos. As abordagens referentes ao tema se reportam aos estudos

de geografia, iniciados no século XIX, na Europa. Nesses enfoques, a geografia, para muitos

desses estudiosos, era considerada a ciência das paisagens. (MELO, 2001).

Na análise da paisagem podemos apreender a cultura de determinados grupos

sociais, observando como estes acompanham as mudanças que ocorrem cotidianamente a seu

redor. Em virtude da importância desse conceito, não só para a geografia, pretendemos analisar,

como já falamos anteriormente, as alterações que ocorreram na paisagem do Benfica após a

criação da UFC. Para tanto, é necessário apresentar a trajetória deste conceito no âmbito da

Geografia, a fim de compreender o desenvolvimento da pesquisa.

Esse estudo tem por objetivo resgatar algumas das análises surgidas ao longo do

tempo sobre a paisagem apresentando sua evolução, porém, sem a pretensão de abranger todos

os momentos de discussão, já que este conceito teve e tem muitas definições e estudos. Aqui

seguirão momentos nos quais a mudança na percepção da paisagem foi mais marcante, dando

ênfase a sua construção dentro do contexto da nova geografia cultural.

A interpretação da paisagem diverge dentro de múltiplas abordagens, em que é

possível observar que existem certas tendências, mostrando que o entendimento do conceito

depende, e muito, das influências culturais, históricas e discursivas entre aqueles que a

analisam.

Tradicionalmente os geógrafos diferenciam a paisagem natural e a paisagem

cultural. A paisagem natural refere-se aos elementos combinados, como vegetação, solos, rios,

lagos, dentre outros fatores. Por sua vez, a paisagem cultural inclui todas as modificações feitas

pelo homem, como os espaços urbanos e rurais. De modo geral, o estudo da paisagem exige um

enfoque, onde são feitas avaliações que definem o conjunto dos elementos envolvidos, a escala

a ser considerada e a temporalidade na paisagem. Enfim, trata-se da apresentação do objeto em

seu contexto geográfico e histórico.

A partir do século XV a paisagem adquire finalidade estética, expressada através

de pintores e artistas que associaram a ela vínculos afetivos e emocionais. Para Cosgrove

(1998), a palavra paisagem para o mundo ocidental surgiu no Renascimento, indicando uma

nova relação entre os seres humanos e o meio ambiente.

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No mesmo período, a astronomia, a cartografia e a arquitetura, assim como as outras

ciências, estavam sendo revolucionadas pela aplicação de regras formais matemáticas e

geométricas, implicando diretamente na maneira de pensar e agir da sociedade. Em virtude

dessas mudanças ocorridas no momento histórico vigente, o homem intensificou o processo de

modificação da paisagem, pois na medida em que o mesmo se distancia da natureza e se

apropria das técnicas, começa a vê-la como algo possível de transformar. De acordo com Schier

(2003):

A partir deste momento a paisagem começa a ter um significado diferenciado,

deixando de ser apenas uma referência espacial ou um objeto de observação. Ela se

coloca num contexto cultural e discursivo, primeiramente nos discursos das artes e

pouco depois nas abordagens científicas que rompem com a ideia da Idade Média de

que o mundo inteiro seja a criação de Deus, e por isso santificado e indecifrável

(SCHIER, 2003 p. 81).

Observamos que o estudo da paisagem foi ganhando grande significância, tornando

necessário apresentar as principais ideias de alguns geógrafos clássicos, como Humboldt,

destacando sua visão holística da paisagem, associando elementos diversos da natureza e da

ação humana. Com Karl Ritter, a Geografia tornou-se, além do positivismo dinâmico e

histórico, uma ciência enciclopédica, organizando o conhecimento sobre determinados países e

regiões. A paisagem, no entanto, não era o seu principal objeto de estudo (ZANATTA, 2008).

Diferente de Humboldt, Friedrich Ratzel utilizou o conceito de paisagem levando

em conta os aspectos antropogênicos, demonstrando que ela é o resultado do distanciamento do

espírito humano e do seu meio natural. Dessa forma, descrevia os elementos fixos da paisagem

natural como o solo e os rios, passando, então, aos elementos culturais como as técnicas e

utensílios produzidos por uma determinada sociedade.

A cultura possui destaque na obra de Ratzel, no entanto ela era analisada da seguinte

forma:

Friedrich Ratzel, em seu livro Antropogeografia, de 1880, apresenta o conceito de

paisagem de forma diversa, porque inclui primordialmente a cultura na paisagem,

embora proponha uma concepção limitada da cultura (influência darwinista) ao

confundida com os artefatos utilizados pelos homens para dominar o espaço (Claval,

2001, p. 22)

Em Zanatta (2008), concluímos que:

O termo cultura foi introduzido pela primeira vez na geografia alemã, por meio do

livro Friedrich Ratzel, publicado em 1882, denominado Antropogeografia, obra em

que analisou os fundamentos culturais da diversidade das repartições dos homens e

das civilizações, adotando encaminhamento ora etnográfico, ora político (ZANATTA,

2008, p. 255).

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Assim como Ratzel, Vidal de La Blache contribuiu de forma significativa para a

sistematização da Geografia acadêmica na Europa, principalmente na França. O mesmo

buscava refletir sobre as relações que são estabelecidas entre seres os humanos e o meio,

elaborando o conceito de gênero de vida e permitindo organizar elementos para a análise das

diferentes paisagens modificadas pelo homem. No entendimento da cultura, La Blache possuía

visão semelhante à de Ratzel.

Para ele, a cultura pertinente deveria ser aquela que se apreende por intermédio dos

instrumentos, utensílios, técnicas e maneiras de habitar que as sociedades utilizam

para modelar a pertinente deveriam ser aquela que se apreende por intermédio dos

instrumentos, utensílios, técnicas e maneiras de habitar que as sociedades utilizam

para modelar a paisagem. Do seu ponto de vista, a noção de gênero de vida permitia

organizar estes elementos de tal forma que explicassem as diferentes paisagens

construídas (ZANNATA, 2008, p. 257).

Ainda que haja semelhança entre Ratzel e Vidal de La Blache em relação a

concepção de cultura, é relevante entendermos que na obra de Ratzel é evidente a influência do

evolucionismo, do darwinismo e do positivismo, enquanto que Vidal assume uma posição

fundamentada no historicismo e no espiritualismo (CAPEL, 1981).

Assim, na Geografia tradicional a materialidade da cultura é inquestionável na

análise da paisagem, estando exposta a objetivação analítica do tipo positivista, o que

comprometeu, durante muito tempo, uma explicação cultural mais aprimorada. No entanto, a

ciência geográfica foi evoluindo e, consequentemente, aqueles que a abordavam buscavam

novas formas de apreensão da realidade a partir de novas leituras, resultando em novos olhares,

em especial, influenciados agora, pelo neopositivismo, dominante nos estudos geográficos até

metade do século XX.

Após a Segunda Guerra Mundial, muitos pesquisadores perceberam que a posição

neopositivista não mais satisfazia os anseios para a análise da realidade, já que na tradição

neopositivista, a geografia apresentava, em seus estudos, amplos discursos sobre a natureza e o

funcionamento das sociedades. Destacando a primeira como detentora das possibilidades de

desenvolvimento da segunda (CLAVAL, 2001).

Nas primeiras décadas do século XX, à medida que a geografia humana progredia,

persistindo nas relações entre sociedade, ambiente natural e cultura, o conceito de paisagem

humanizada tornou-se objeto de investigação geográfica. Nesta época, na Alemanha, adquire

relevância o conceito de paisagem cultural elaborado por Otto Schulter. Esse dava ênfase às

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marcas que os homens produziam na paisagem, buscando apreender a organização e a

morfologia da paisagem cultural. (ZANATTA, 2008).

Otto Schulter teve como base para os seus estudos as influências de Kant, e Von

Richthofen. Schulter elaborou uma metodologia baseada na análise da paisagem, na qual a

morfologia deste conceito era em virtude das marcas que o homem deixava na superfície

terrestre (SEEMANN, 2004).

Em relação aos estudos sobre a paisagem cultural, ele pesquisou as obras humanas

que se inserem na superfície terrestre e que imprimem expressões e características. Em suas

análises, além das distinções entre a paisagem natural e cultural, também as classificou de

acordo com a intervenção humana. Nessa classificação, fez diferenciações entre a paisagem

original, que seria a paisagem antes da intervenção humana; a paisagem natural, que seria

quando todos os elementos antrópicos sumiriam e apenas as forças da natureza atuariam – para

essa ainda tem a paisagem antiga, que seria a paisagem no começo da intervenção humana,

quando foram abertas clareiras e drenados pântanos para a agricultura; e, por fim, a paisagem

cultural, que seria aquela que mostra as marcas das obras do homem. (SEEMANN, 2004).

A paisagem analisada a partir da cultura foi um dos primeiros temas desenvolvidos

pelos geógrafos alemães e franceses. Nesse enfoque, como foi apresentado anteriormente, era

privilegiado a análise morfológica da paisagem, sendo a cultura entendida através das técnicas

e dos utensílios, ou seja, dos aspectos materiais utilizados pelo homem, de forma a modificar o

ambiente natural, visando torná-lo mais produtivo. Tal abordagem é explicada pelo fato de que,

nessa época, a epistemologia da Geografia era de inspiração naturalista ou positivista.

Consequentemente, os geógrafos desse período não puderam dar à cultura seu devido papel na

explicação dos problemas geográficos.

As discussões sobre a dimensão cultural da paisagem estenderam-se aos Estados

Unidos da América no início do século XX, adquirindo expressividade a partir de 1925, ano em

que Carl Ortwin Sauer definiu a paisagem geográfica como resultado da ação da cultura sobre

a paisagem natural ao longo do tempo. Carl Sauer fundou a escola norte-americana de geografia

cultural, originando uma sólida tradição que, em parte, foi inspirada nos geógrafos europeus,

inclusive a ênfase na dimensão material da cultura (CORRÊA, 1999).

O principal objetivo dos estudos geográficos na visão de Sauer (1998) era analisar

as paisagens culturais, de modo que a morfologia física deveria ser vista como um meio

transformado pelo agente que é a cultura. Para Sauer a cultura era vista

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[...] como uma entidade supraorgânica, com suas próprias leis, pairando sobre os

indivíduos, considerados como mensageiros da cultura, sem autonomia. A cultura era

assim, concebida como algo exterior aos indivíduos de um grupo social; sua

internalização se faz por mecanismos de condicionamento, gerador de hábitos,

entendidos como cultura. [...] nesta visão não havia conflitos, predominando o

consenso e a homogeneidade cultural. (SAUER, 1998, p.45)

Apesar das críticas feitas à obra de Sauer, não há como negar sua grande

contribuição para o pensamento geográfico, reafirmando os estudos sobre a abordagem cultural

da paisagem. Para Holzer (1999), Sauer foi sem dúvida o mais importante difusor do conceito

geográfico de paisagem. Na medida que incorporou o termo da geografia alemã, o geógrafo

norte americano delineou suas características mais marcantes. O termo landscap, utilizado

pelos alemães, chegou a geografia norteamericana através de Sauer, que cuidadosamente

enfatizava a semelhança aos estudos alemães de formatar a terra, implicando uma associação

de formas físicas e culturais.

De acordo com a visão de Sauer, as paisagens não deviam ser definidas apenas

como uma cena que é vista pelo observador, já que tratam primordialmente das generalizações

derivadas da observação e de cenas individuais. Para ele, a individualidade da paisagem só é

reconhecida comparada a outras paisagens (SAUER, 1994).

Até a década de 40, o interesse da geografia cultural era principalmente pelas

marcas que a cultura imprimia na paisagem ou pela noção de gênero de vida. Apesar das

diferentes abordagens, ambas acentuavam a cultura material (artefatos, técnicas, utensílios,

habitat e instrumentos de trabalho), não acompanhando a evolução dos estudos antropológicos

que já davam destaque à cultura mental e aos aspectos psicológicos das sociedades

(ZANATTA, 2008). Claval (1997), corrobora com a temática transcorrendo que, no decorrer

desse período, os geógrafos valorizaram quatro temas associados ao estudo das relações entre

sociedade e natureza, tais como a análise das técnicas, os instrumentos de trabalho, a paisagem

cultural e os gêneros de vida.

A paisagem cultural, segundo uma ótica morfológica, perdurou até a década de 40.

Durante as décadas de 50 e 60, o estudo da temática não foi predominante, mas a partir da

década de 70 os geógrafos se reconciliam com a tradição que remonta ao passado, em que a

paisagem volta a ser um dos conceitos chave da Geografia. (CORRÊA, 1997).

Nessa perspectiva Zanatta (2008) nos fala que:

Assim, com base nas contribuições da geografia social marxista, da geografia

humanista e da filosofia dos significados, os conceitos de base da Geografia - espaço,

território, meio-ambiente, lugar e paisagem - foram reelaborados, tendo em vista a

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complexa rede simbólica que envolve sua construção cultural (ZANATTA, 2008,

p.254).

Nas contribuições de Claval (2001) entende-se que:

A modernização da Geografia Cultural delineia-se no final dos anos 1950 e no

decorrer da década seguinte. Os geógrafos deixaram de se considerar naturalistas. Não

mais hesitam em abordar as decisões humanas e a lógica que preside das escolhas que

delas precedem (CLAVAL, 2001, p. 36).

Continuando a abordagem acerca do conceito de paisagem, observamos que a

década de 70 foi de extrema relevância para ciência geográfica. Aqui irá se desenvolver a

Geografia Humanista Contemporânea e a Geografia Crítica. Na Geografia Crítica a paisagem

não foi abordada como conceito principal, em alguns estudos são privilegiadas as abordagens

sobre espaço e lugar. Já na Geografia Humanista, o conceito de paisagem é resgatado,

considerando os aspectos subjetivos pela análise dos significados (CLAVAL, 2001). Assim

como a paisagem, o espaço na abordagem humanista passa a ser concebido como espaço vivido,

ou seja, como lugar da vida, construído e representado por seus atores sociais. O território é

visto através das dimensões sociopolítica (controle, apropriação) e cultural (significado,

identidade). Além disso, temáticas relacionadas à religião, à percepção ambiental, às

representações sociais, à identidade espacial e à interpretação de textos (literatura, música,

pintura, cinema) destacam-se entre outras que foram retomadas ou emergiram diante das

transformações sociais, políticas, econômicas e culturais vivenciadas pela sociedade

contemporânea (ZANATTA, 2008).

Na Geografia Humanista, “o ambiente que envolve o homem, seja físico, social ou

imaginário, influencia sua conduta” (RISSO, 2001, p. 33). Os estudos referentes à percepção

da paisagem são fundamentais para analisar os valores, a imaginação e os sentimentos que a

sociedade possui com o lugar, onde a subjetividade contida na paisagem passa a ser estudada

com o intuito de compreender os significados que os indivíduos infligem ao espaço

(RISSO2003).

O processo de construção da paisagem pelo imaginário é configurado pela

representação das práticas sociais e, consequentemente, daqueles que a constroem. Quem forma

a paisagem é a ação humana, cujo conceito isoladamente é um vetor passivo quando não é

somado ao vetor social. É através das ações praticadas pela sociedade que podemos observar a

história, a cultura e outros fatores , na construção do universo subjetivo dos atores sociais

(LUCHIARI, 2001).

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A Geografia Humanista estuda o universo subjetivo, onde estão incluídos os

sentimentos em relação às paisagens, ou seja, experiências, valores, afetividade, representações,

identidades dentre outros tão relevantes como estes. As diferentes experiências que o indivíduo

ou os grupos sociais adquirem com determinadas paisagens reflete diversos comportamentos

em relação a mesma, pois para cada um a paisagem terá significados e valores distintos.

Os valores que atribuímos às Paisagens compreendem a relação estabelecida entre o

indivíduo e a Paisagem. Por sua vez, esta relação provém dos processos de percepção

e cognição ambiental, influenciado pelos aspectos culturais e pelo inconsciente, que

resultará em sentimentos e significados em relação a determinada Paisagem,

valorizando-a ou desvalorizando-a. Embora, ainda que inserido no contexto de uma

determinada Cultura, um indivíduo possa ter uma percepção diferente em relação ao

meio, geralmente são observáveis certos padrões de comportamento que ocorrem em

relação à Paisagem de uma cultura ( RISSO, 2003 p. 73).

No enfoque da nova abordagem cultural na geografia, todo o ambiente que envolve

o homem, seja físico, social ou imaginário, provoca influências no seu cotidiano. A realidade

apresentada é interpretada, onde os fatos são observados como parte de uma realidade mais

abrangente. Neste contexto, a paisagem é percebida pelo indivíduo não como uma soma de

objetos próximos, mas sim de forma simultânea, como um todo.

Nas discussões da paisagem geográfica de cunho humanista e existencialista, as

análises de Lowenthal foram de extrema relevância, pois esse geógrafo é um dos precursores

da Geografia Humanista, contribuindo para revitalizar a Geografia Cultural e Histórica.

Segundo Lowenthal um dos principais objetivos da Geografia era considerar o subjetivo da

relação homem-meio, não recusando o método científico, pois na sua concepção uma visão

puramente perceptiva do mundo seria defeituosa e falsa (LOWENTHAL, 1979 apud MELO,

2001).

Na Geografia Humanista enfatizada por Lowenthal, o homem seria a medida de

todas as coisas, pois toda a explicação só seria satisfatória baseada nos valores humanos. Nesse

sentido, o caráter da cultura seria baseado na percepção e subjetividade, o que a torna concebível

além dos aspectos materiais (LOWENTHAL, 1979 apud MELO, 2001).

Outra importante contribuição foi a de James Duncan, com destaque para seu

trabalho The City as Text. Nesse ele apresenta três objetivos para o estudo da paisagem

estabelecidos da seguinte forma: fornecer uma metodologia para a interpretação de paisagens;

mostrar como a paisagem, entendida como processo cultural, pode servir a reprodução e a

contestação do poder político, e analisar o relacionamento entre o poder político em um lugar e

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tempo determinado, na qual podemos dar como exemplos os estudos do autor em a capital real

do Kandy, no Sri Lanka (DUNCAN, 1990).

As abordagens apresentadas por Duncan representam uma ruptura com a geografia

tradicional. Tal fato diz respeito a alguns aspectos que não foram considerados pela geografia

cultural tradicional, como o papel da paisagem nos processos sociais e culturais, o diálogo

estabelecido entre os pesquisadores das ciências sociais e a importância da hermenêutica na

interpretação da paisagem (DUNCAN, 1990).

Na análise de Duncan, a paisagem é analisada como um texto, em um contexto de

intertextualidade, onde o contexto de um texto são outros textos (DUNCAN 1990). No contexto

em que as paisagens são produzidas e lidas podem ser textos escritos ou em outros meios, como

a fotografia. Em seus estudos, ao analisar as transformações de um meio para o outro, o autor

adota a concepção de cultura de Raymond Williams, na qual o mesmo considera a cultura como

um sistema significante, cujos elementos centrais dentro de um sistema cultural são

comunicados, experimentados e reproduzidos (WILLIAMS, 1969).

Nessa mesma perspectiva, Cosgrove (1998) nos fala que a Geografia Cultural

renovada considera a paisagem como um texto cultural, reconhecendo que os textos possuem

múltiplas possibilidades de interpretações e olhares, oferecendo leituras diferentes, simultâneas

e igualmente válidas.

A análise da paisagem na produção de Cosgrove (2003) e de Berque (2004) emerge

significados distintos. Berque (2004) fala da paisagem marca e da paisagem matriz, enquanto

Cosgrove identifica paisagens da cultura dominante e paisagens alternativas.

O conceito de paisagem adquiriu novas abordagens com o tempo, e diversos

teóricos de diferentes nacionalidades contribuíram para a evolução desse conceito,

acompanhando as trasnformações ocorridas na sociedade e, consequentemente, nas ciências. A

Geografia francesa também passou por uma evolução em relação aos estudos da paisagem,

cujo conceito foi abordado a partir de dois coletivos: enquanto espetáculo e espaço vivido (

HOLZER, 1999).

A análise que leva em conta a abordagem do espetáculo, se remente ao sentido

original que, nas palavras de Lacoste, é de ”[...] olhar para uma porção do espaço concreto, e

portanto espetáculo”(1977, p.72). Nessa perspectiva destacamos os trabalhos de Ronai (1977)

e Sautter (1979). O primeiro analisaria o seu surgimento renascentista e o outro relacionaria o

surgimento da paisagem ao interesse capitalista, afim de torná-la um objeto de mercado. Já na

investigação da paisagem enquanto espaço vivido, leva-se em conta os aspectos históricos,

abordando-a como um produto da prática entre indivíduos, analisando os aspectos cognitivos

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e perceptivos. Em relação a essa abordagem foram de extrema relevância as contribuições de

Bailly, Raffestin e Reymond (1980), Collot (1986) e Berque ( 1985) ( HOLZER, 1999).

Na análise da paisagem enquanto espaço vivido, os estudos de Bailly, Raffestin e

Reymond apontam que a paisagem é um produto da prática e da realidade material,

apresentando diversos aspectos frente aos processos históricos. Na perspectiva apresentada

pelos autores, para a realização de estudos sobre a paisagem, é necessária a análise do nível

perceptivel a patir do nível cognitivo e das intencionalidades (BAILLY, RAFFESTIN E

REYMOND , 1980.)

Os autores acima defendem a proposta de uma metodologia para os estudos

referentes à paisagem, que leve em conta a subjetividade pessoal assim como as semelhanças

existenciais e criadora.Umas das questões aprsentadas por eles é se podemos estudar os objetos

como eles são, ou se podemos analisá-los pelas forças não observávies, as subjetivas.

Na análise da paisagem em ralação aos aspectos perceptivos, Collot (1990) afirma

que a paisagem não é um objeto autonômo, supondo que para a sua condição de existência,

sejam necessárias as atividades constituintes dos sujeitos.

[...] A paisagem não é objeto autônomo em si, face do qual o sujeito poderia se situar

em uma relação de exterioridade; ela se revela numa experiência em que o sujeito e

objeto são inseparáveis, não somente porque o objeto espacial é constituído pelo

sujeito, mas também porque o sujeito, por sua vez, aí se acha envolvido pelo espaço

(COLLOT, 1990, p. 22).

Collot (1990) realiza diversas consideraçõe sobre a percepção da paisagem,

abordando a relação existente entre os sujeitos e a paisagem. Para ele, a paisagem é constituída

como uma totalidade coerente, formando um todo, em que tanto a coerência como os aspectos

contituitivos são elementos que tornam a paisagem apta a ter significações para aqueles que a

vivenciam. Ainda para o autor “a paisagem aprsenta-se como uma unidade de sentidos, ela fala

a quem olha” (COLLOT, 1990, p. 24). A ação de ver para ele é configurada a partir das relações

estabelecidas com o observador, não se limitando ao registrar os fluxos sensoriais, mas

organizando e interpretando de maneira a fazer as sensações estabelecidas uma mensagem.

A partir das análises dos diferentes autores e teóricos acima, entendemos que esses

foram de extrema relevância para a contrução do conceito de paisagem. Holzer (1999)

corrobora com essa ideia, mostrando que, assim como os geógrafos franceses, americanos e

alemães, os geógrafos culturais ingleses tiveram importantes contribuiçõees na análise da

temática, radicalizando as questões ontológicas e espistemológicas.

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Sobre a temática acima, Cosgrove (1998) nos fala que:

Os trabalhos incluídos na perspectiva de abordagem da nova geografia cultural foram

desenvolvidos principalmente pelos geógrafos anglo-saxões, que até então não

haviam demonstrado interesse pela geografia cultural, sendo os temas culturais

abordados no âmbito da geografia norte-americana (COSGROVE: 1998, p. 13).

Aliada às teorias dos diferentes teóricos apresentados, novas matrizes

epistemológicas, teóricas e metodológicas marcaram os estudos direcionados à paisagem a

partir da década de 70. De acordo com Corrêa (2001), paralelamente a Fenomenologia e a

Hermenêutica, matrizes contrastantes do materialismo histórico e dialético geraram,

primeiramente, o desenvolvimento da Geografia Humanista, liderada por Y-Fu Tuan, enquanto

a segunda parte desempenhou um importante papel na nova geografia cultural. Ou seja, as três

influenciaram na nova Geografia Cultural.

Para a consolidacao da nova Geografia Cultural buscou-se fundamentações teóricas

e metodológicas que pudessem atender os anseios para essa nova abordagem de investigação

geográfica. Meinig (1979) nos fala que, devido às mudanças metodológicas que estavam

ocorrendo, tornou-se necessário diferenciar alguns conceitos correlatados, que muitas vezes

eram usados pelos geógrafos indistintamente, como paisagem, natureza, cenário e ambiente.

Para Meining (1979), a paisagem é diferenciada da natureza pelo caráter unitário

que ela expressa em nossos sentidos, pois este conceito não se relaciona apenas aos aspectos

estéticos. Já em relação ao ambiente, ela é diferenciada pelo fato de não se tratar apenas de

nossa sustentabilidade enquanto seres vivos, havendo sentimentos que interferem na relação

entre as pessoas e a paisagem.

Ainda para Meining, (1979), a paisagem se diferencia de região e de área devido ao

sentido do simbólico. Em relação aos lugares, a diferença está que esse se refere aos indivíduos

e são nomeados, diferentemente da paisagem, que é uma superfície contínua, que não exige

foco de atenção.

A Geografia Cultural pós 1980 diversificou muito as conexões com outras áreas

do conhecimento. As fontes para emergir a nova Geografia Cultural foram de combinações

distintas, destacando a importância das Ciências Sociais e Interpretativas nesse processo, na

qual destacamos a Antropologia, a Linguística, a História da Arte e a Semiótica. Nas palavras

de (Duncan, 2000), “Trata-se da heterotopia, onde estão presentes, entre outros, Barthes,

Bourdieu, Eagleton, Eliade, Foucault, Geertz, Gombrich, Gramsci, Heidegger, Panofsky e

Williams” (DUNCAN, 2000).

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A paisagem apresenta-se como um conceito abrangente e impreciso, e, em nossa

opinião, assim deve permanecer, pois desse modo incita-nos a olhar para outros horizontes

disciplinares, a fim de ampliarmos e aprofundarmos a compreensão de sua natureza e

significado.

Na visão de Corrêa (2007), a paisagem cultural é o resultado da interação

complicada entre determinada comunidade humana, abrangendo certas preferências e

potenciais culturais. A paisagem está ligada a um conjunto particular de circunstâncias naturais,

sendo uma herança do período da evolução natural e de muitas gerações do esforço humano.

A paisagem cultural é multidimensional, apresentando dimensões morfológicas,

funcionais, espaciais e temporais. Ela une o passado e o presente de maneira dinâmica, servindo

como fonte documental para análise da realidade. Dessa forma, a paisagem cultural pode ser

interpretada como uma associação de aspectos naturais e socioculturais, em que na interação

desses fatores é formado o espaço a partir de manifestações simbólicas. Por essa razão, através

do patrimônio histórico, da memória local e das representações simbólicas, o estudo da

paisagem é consolidado como um excelente instrumento para a análise dos significados do lugar

(CORRÊA e ROSENDHAL, 1998).

Para Cosgrove (1998), revelar os significados da paisagem cultural exige habilidade

imaginativa de entrar no mundo dos outros de maneira autoconsciente, onde o conceito é

analisado com o intuito de mostrar os significados expostos e refletidos a partir das múltiplas

abordagens que o mesmo oferece.

Assim como apresentamos os diversos enfoques sobre o conceito de paisagem ao

longo do tempo, na segunda parte deste capítulo mostraremos a importância da imagem, dando

um enfoque mais aprimorado na imagem fotográfica, que é o um dos principais focos da

pesquisa que seguirá adiante.

2.2 A IMAGEM FOTOGRÁFICA

O termo imagem é bastante empregado, oferecendo diferentes tipos de enfoques e

significados. Torna-se uma tarefa complexa a definição que mostre todas as maneiras de

empregá-la. De acordo com Joly (1994), apesar dos significados dessa palavra, compreendemos

que ela designa algo que, embora não remetendo sempre para o visível, toma de empréstimo

alguns traços ao visual e, em todo o caso, depende da produção de um sujeito, tornando de

difícil compreensão a análise, seja ela imaginária ou concreta.

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O conceito de imagem parece, a uma primeira abordagem, de simples definição, e

revela-se após um estudo mais aprofundado, de difícil precisão. Desde os primórdios da história

do conhecimento, que filósofos e pensadores se debruçam sobre a complexa relação que une

imagem e realidade, bem como sobre as diversas definições.

Platão e Aristóteles vão defendê-la e combatê-la pelo mesmo motivo, imitadora

para alguns e enganadoras para outros. A imagem oferece diversas intepretações para aqueles

que a analisam, assim como educa, ela também pode enganar, tornando-se necessário

explicações mais profícuas para sua análise (JOLY, 1994).

Visualmente imitadora, pode enganar ou educar. Reflexo pode levar ao conhecimento.

A sobrevivência, o sagrado, a morte, o saber, a verdade, a arte, se tivermos um mínimo

de memória, são os campos que o simples termo imagem nos vincula. Consciente ou

não, essa história nos constitui e nos convida a abordar a imagem de uma maneira

complexa, a atribuir-lhe espontaneamente poderes mágicos vinculados a todos os

grandes mitos (JOLY, 1994, p. 19).

Os aspectos culturais estão fortemente presentes nas imagens desde os seus

primórdios. Além desses, Joly (1994) propõe reflexões entre a natureza e as imagens, dando

como exemplo umas das mais antigas definições de imagem realizada por Platão, na qual este

esclarece que as imagens, em primeiro lugar, são as sombras e, em segundo lugar, os reflexos

na água e as superfícies dos corpos opacos, polidos e brilhantes.

A qualquer lugar que frequentemos existem imagens, por todo o lado do mundo o

homem deixou registros de sua imaginação; nas rochas desde o tempo paleolítico até a época

moderna. (SILVA; ALVES, 2007). Completando esta abordagem, Joly (1994) afirma que as

imagens no paleolítico destinavam-se à comunicação, e muitas delas “foram as pré-

anunciadoras da escrita” (JOLY, 1994, p. 19).

Reafirmando os pensamentos de Joly (1994) e Silva e Alves (2007), Oliveira

(2008) nos fala que a história da imagem está presente de forma direta na análise da sociedade.

Muito antes do surgimento da escrita, as imagens já eram um meio de informação e

comunicação, onde o conhecimento da pré-história só foi possível através das inscrições

rupestres10 e outros sinais encontrados em locais onde o ser humano vivia (OLIVEIRA, 2008).

Em cada período da história humana, a imagem cumpre determinadas funções. No

início, essas funções tinham caráter ritual; não faltam exemplos nas civilizações antigas, como

10 Inscrições rupestres são pinturas e desenhos registrados no interior de cavernas, abrigos rochosos e ao ar livre.

São artes do período Paleolítico, também chamada de arte parietal. Informação disponível no endereço eletrônico

da Fundação Museu do Homem Americano (FUMDHAM). Disponível em: www.fumdham.org.br

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os Maias, os Astecas e os Incas que representaram tão bem seus cultos e sacrifícios. Ainda na

antiguidade destacaram-se as funções informativas e narrativas. Na Idade Média, predominou

a função didática que revelava detalhes da vida dos santos. Com o Renascimento, a história e a

realidade predominam nos signos imagéticos, cabendo essa mesma função à fotografia a partir

do século XIX (OLIVEIRA, 2008).

O desenvolvimento da imagem se confunde com a história da arte e da humanidade,

quando se verifica sua importância no contexto histórico, social político e econômico,

qual expressa valores de uma época. No Egito, a grandiosidade da civilização dos

faraós; na Grécia, a adoração à figura humana; na Idade Média, a hegemonia da

religião oferece ao homem a possibilidade de escapar às dimensões contingentes de

espaço e tempo em que vive, nos primórdios da Era Cristã, com a representação do

irrepresentável; na Renascença, a supremacia da racionalidade e a revalorização da

figura humana, haja vista que, nesse período surgiu a perspectiva, que deu uma nova

concepção de ser humano (SILVA; ALVES, 2007, p. 3).

Entendemos que a análise da imagem atualmente vem de períodos distantes,

atribuindo a ela diversos valores e significados. A imagem não surgiu com os meios de

comunicação contemporâneos, como a televisão, jornal e a internet. Suas raízes são bem mais

profundas, tornando necessário estudos profícuos a fim de conhecer sua gênese, assim como

seus usos.

Os usos das imagens são diversos, havendo diferentes possibilidades em relação às

perspectivas teóricas, metodológicas e técnicas. As imagens tornaram-se uma importante fonte

documental para as pesquisas em diversas áreas, como as Artes, a Comunicação, as Ciências

Sociais e a Geografia, como iremos abordar no decorrer dessa dissertação.

Desde sua origem, a Geografia esteve associada às imagens, fazendo parte da

tradição geográfica conceber as imagens como instrumentos de percepção e compreensão do

mundo. No entanto, de acordo com Gomes e Ribeiro (2013), nos últimos dez anos houve um

crescente interesse sobre as imagens por parte dos pesquisadores na Geografia, destacando-se

os estudos de “GODLEVSKA, 1999; ROSE, 2003, 2006; DRIVER, 2003; RYAN, 2003;

THORNES, 2004; GOMES, 2007, 2008a, 2008b, 2009, 2010; COSGROVE, 1993, 2008;

BERDOULAY e Saule-SORBÉ, 1998, 1999; BERDOULAY e GOMES, 2010; DANIELS et

al., 2011”. (GOMES; RIBEIRO, 2013: 28).

Gomes e Ribeiro (2013) afirmam que esse despertar a nível global mostra a

pretensão de estabelecer a maneira pela qual as imagens colaboram com a construção do

pensamento geográfico. Esse interesse é conduzido segundo duas principais orientações:

A primeira, quase absoluta em número, reagrupa os estudos nos quais são diretamente

procurados conteúdos geográficos nas imagens, tenham sido elas produzidas com esse

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fim ou não. Trata-se dos estudos que examinam pinturas, desenhos, fotografias,

filmes, mas também mapas, cartogramas, gráficos etc., e procuram reconhecer a

autoridade pedagógica e de comunicação desses instrumentos e meios (BESSE, 2003;

ROBIC, 1993, 2000; MENDIBIL, 1993, 1999, 2006) (GOMES; RIBEIRO 2013, p.

28).

A partir da citação acima, observamos que a maior parte desses casos não é

atribuído à ação de produzir imagens, provocando efeitos insuficientes sobre a produção do

conhecimento e restringindo o papel das imagens à função ilustrativa.

A segunda orientação parte do pressuposto de que as imagens participam

diretamente na construção do pensamento geográfico, tendo como principal finalidade

compreender como se desenvolve uma reflexão a partir das imagens ou junto a elas. “Dito

assim, parece que esse procedimento é original e inédito, mas, na verdade, é possível encontrar

fortes raízes dele na história do pensamento geográfico e, sobretudo, entre aqueles que se

notabilizaram como grandes intelectuais da Geografia” (GOMES; RIBEIRO, 2013: 28).

É notável a importância das imagens no conhecimento geográfico, sejam através de

mapas, de gráficos ou tabelas, assim como no plano do simbólico, com análises profícuas na

abordagem da nova Geografia Cultural, estudando os significados das pinturas, das fotografias

e do cinema.

Nos estudos geográficos as imagens ainda estão aliadas à ampliação da tecnologia.

Com o desenvolvimento do sensoriamento remoto, assistimos a Associação dos Bancos de

Dados com bases espaciais, gerando os Sistemas de Informações Geográficas – SIGS,

correspondendo a uma nova geração de sistemas para reunir informações geográficas (GOMES;

RIBEIRO, 2013).

Nas análises relacionando imagem e geografia, podemos destacar, dentre outros,

as pesquisas de Denis Cosgrove. Esse geógrafo estudava as imagens enquanto representações

iconográficas, cartográficas, por meio de pinturas, fotografias e imagens de satélite, assim como

nas abordagens da paisagem cultural, verdadeiras e ricas fontes de pesquisa e reflexão

(CORRÊA, 2011).

De acordo com Corrêa (2011), o interesse de Cosgrove pelas imagens teve início

na Inglaterra, manifestou-se na Veneza renascentista e ampliou-se na temporada que ele passou

na Califórnia. Para Cosgrove, as imagens são textos a serem decodificados necessitando de

análises, pois as imagens não são mensagens diretas de fácil apreensão.

Em virtude da importância da imagem para a Geografia e outras áreas do

conhecimento, a imagem fotográfica será uma fonte de grande relevância em nossa pesquisa.

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Com isso, destaca-se a importância de demostrar os principais conceitos, usos e temáticas da

imagem, mostradas a partir das perspectivas de diferentes autores.

Sabendo da complexidade de sua análise, concentramos nossos esforços,

principalmente, na abordagem da imagem fotográfica, a fim de dar suporte teórico para a

compreensão das fotografias antigas do bairro Benfica, analisadas no terceiro capítulo do

estudo.

Nessa análise é importante ressaltarmos que serão utilizadas diversas abordagens

no âmbito de várias áreas do conhecimento, tais como a Comunicação, as Artes e a História.

Apesar de apresentarmos diferentes percepções sobre a imagem, a ênfase desta pesquisa é

concentrada nos sujeitos que veem as fotografias, as analisam e as sentem. Nas palavras de

Aumont (2012), podemos chamá-los de sujeito espectador; Kossoy (2009) os designa como

receptor e Roland Barthes (1984) os analisa como Spectador.

A imagem fotográfica se apresenta de forma intrínseca na obra de Roland Barthes,

abordando a temática em uma de seus mais importantes livros, A Câmara Clara (1984). Nesse,

o autor analisa a fotografia como ponto de linguagem, questionando o método a seguir. A partir

disso, encontra-se em todas as fotografias por ele examinadas dois elementos essenciais à

imagem que terão denominações em latim, devido à falta de um correspondente em francês: o

studium e o punctum (BARTHES, 1984).

O studium é o referente visual que nos estimula, humana, cultural e moralmente.

Por outro lado, o punctum, na compreensão de Barthes, seria um elemento, um detalhe que salta

da fotografia e nos atinge como uma flecha. Punctum seria, então, uma picada, algo que nos

fere, que nos atinge. Nesse contexto, o punctum faz o personagem “sair da fotografia” e assumir

vida à parte, sendo, portanto, como se a imagem lançasse o desejo para além daquilo que ela dá

a ver. (BARTHES, 1984).

Barthes em sua obra realiza outra abordagem calcada na relação entre o Operador,

o Spectador e o Spectrum. O Operador é o Fotógrafo, o Spectator somos nós e o Spectrum é o

que é fotografado, o alvo, o referente. (BARTHES, 1984).

O operador, o fotógrafo, possui uma significativa relevância, pois é ele que capta a

imagem, selecionando e limitando na perspectiva que ele deseja. O Spectrum, a fotografia, é a

base para a análise, o objeto a ser olhando e captado. O Spectador, para o autor, seríamos nós

que vemos e sentimos as imagens.

Assim como Barthes, Kossoy (2009) analisa as diversas interpretações provocadas

pela imagem fotográfica. No entanto, diferente de Barthes, Kossoy chama de “receptor” aquele

que vê, sente e faz sua própria leitura do documento. A reconstituição histórica ou pessoal de

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uma imagem fotográfica implica em um processo de criação de realidades, pois é elaborada a

partir dos indicativos do receptor.

De acordo com Kossoy (2009), no mundo da representação fotográfica existem

duas realidades: a primeira realidade e a segunda realidade. A primeira é o próprio referente,

ou seja, o que será fotografado e também o seu processo de representação. A segunda é a própria

imagem fotográfica, resultado do registro da primeira realidade. Essa segunda realidade é

sujeita a diferentes interpretações, conforme a visão dos receptores.

Jaques Aumont realiza significativas abordagens sobre a temática em sua obra

titulada A imagem. Ele mostra que na compreensão e análise da mesma há dois tipos de sujeito:

o sujeito operador, que seria o fotógrafo, e o sujeito espectador, aquele que analisa e interpreta

as imagens. Para Aumont (2012), o sujeito espectador não é fácil definir, pois possui muitas

determinações contraditórias e muitas vezes de difícil compreensão. Além da capacidade da

interpretação, entra na análise dos sujeitos espectadores o aspecto subjetivo, que está intrínseco

nele.

Na obra que mencionamos anteriormente de Aumont, o mesmo afirma que o sujeito

espectador é a base dos modelos psicológicos para estudar e compreender a relação entre sujeito

e imagem. Ele, o sujeito espectador, exerce um papel na relação com a imagem, pois sem ele

a imagem não possuiria funções e finalidades. Baseado nas ideais de Gombrich, Aumont

demostra “o papel do espectador” (AUMONT, 2012, p. 86). Essa análise designa “o conjunto

de atos perceptivos e psíquicos, pelos quais, ao compreendê-la e percebê-la, o expectador faz

existir a imagem” (AUMONT, 2012: 86).

Gombrich em seus estudos sobre a percepção visual demostra que a imagem é um

processo quase experimental, implicando um sistema de expectativas para o espectador, nas

quais são emitidas hipóteses, que em seguida são verificadas ou anuladas. Esse sistema de

perspectivas é informado pelo conhecimento prévio que temos das imagens (GOMBRICH,

1971, apud AUMONT, 2012).

As imagens exercem funções que, no curso da história, foram de todas as produções

humanas. Como uma das principais funções da imagem é estabelecer uma relação com o

mundo, o autor mostra que dessa relação três modos principais são atestados: o modo simbólico,

o modo epistêmico e o modo estético (AUMONT, 2012).

No modo estético, a imagem tem como função agradar o espectador, oferecendo-

lhe sensações específicas. No epistêmico, a imagem traz informações visuais sobre o mundo

que pode ser reconhecido, podendo ter como exemplo os cartões postais, um mapa rodoviário

e um cartão de banco. Já no modo simbólico, entendemos que na história da humanidade as

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imagens serviram de símbolos, como os religiosos, vistos como capazes de dar acesso à esfera

do sagrado pela manifestação de uma presença divina. São inúmeros os exemplos de

iconografia religiosa, como as imagens de Zeus, Buda ou Cristo.

Na perspectiva de Aumont, a produção de imagens jamais é gratuita. Desde sempre

as imagens foram criadas para determinados usos e funções, sejam elas individuais ou coletivas.

A imagem demonstra, além de requintes técnicos, os aspetos psíquicos, vinculando, em geral,

a imagem com o domínio do simbólico, o que faz que ela esteja em situação de mediação entre

o espectador e a realidade.

Joly (2007) corrobora com os aspectos psíquicos empregados na imagem

apresentados na seguinte citação:

Empregamos ainda o termo imagem para falar decertas atividades psíquicas tais como

as representações mentais, o sonho, a linguagem pela imagem, etc.(...) A imagem

mental corresponde à impressão que temos quando, por exemplo, lemos ou ouvimos

a descrição de um lugar, a impressão de o ver quase como se lá estivéssemos. Uma

representação mental é elaborada de um modo quase alucinatório e parece pedir

emprestadas as suas características à visão (JOLY, 2007, p. 20).

Ainda podemos empregar o termo imagem para falar de outras atividades psíquicas,

como as representações mentais, os sonhos e as linguagens advindas dessa. A imagem que é

ligada ao subjetivo corresponde, por exemplo, quando escutamos uma música ou lembramo-

nos de uma determinada paisagem.

Embora a imagem se mostre como representação subjetiva de objetos que integram

a realidade externa, também podemos tomar como referência a imagem como uma síntese que

apresenta esboços, cores e alguns elementos visuais exibidos simultaneamente, com a

permissão de explorá-la por partes, até que chegue à sua totalidade ou como sistema de símbolo.

Continuando as abordagens realizadas por Joly (2007), sabemos que qualquer

sistema de símbolo é uma invenção do homem. Tais invenções ou refinamentos, que costumam

ser chamados de linguagem, foram em outros tempos provenientes da percepção do objeto

dentro de uma concepção de imagens.

As imagens oferecem diversas explicações, apesentando múltiplas interpretações

para aqueles que as veem e a analisam. Sabe-se que seu estudo remete a significados distintos,

ligado ao cultural, pois através das leituras das imagens podemos apreender a cultura de um

determinado grupo social.

As imagens revelam diferentes realidades, podendo ser analisadas através dos

aspectos cognitivos e simbólicos. Isso remete a leituras além dos aspectos visuais, entrando

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nesse estudo o plano do imaginário, revelando valores distintos, pois o universo subjetivo

reflete sensações intrínsecas ao observador.

Para ler uma imagem, deve-se ter em mente alguns objetivos, principalmente sobre o

que se quer ver/ler. Podem ser identificados na leitura de uma imagem os aspectos

referentes ao sentido e ao significado, que remetem ao plano do simbólico; pode-se

buscar também a origem, a explicação de determinada realidade, pois as imagens

guardam em si vestígios da realidade, caracterizando-se dessa forma como uma

narrativa que conduz o espectador pelos caminhos do imaginário, pois, ao representar

o real, cria-se uma nova realidade (COELHO, 2009, p. 5).

A produção de imagens sempre esteve ligada à história da humanidade com a

função de, muitas vezes, representar a realidade. Os diversos tipos de imagens, como as pinturas

e as esculturas, foram importantes para a construção de pensamentos e teorias sobre a mesma.

No entanto, a sua popularização ocorreu com o surgimento da fotografia. A invenção da

fotografia ocorreu na primeira metade do século XIX, por Josephe Nicéphore Niépce, porém

foi popularizada por Louis Jacques Mandé Daguerre. Sua popularização correu em 1839 na

França, tornando-se um símbolo de modernidade e técnica para a época (SILVA, 2001).

No Brasil, a fotografia chega em 1840, ano em que se antecipa a maioridade de D.

Pedro II. O surgimento da fotografia no Brasil coincide e necessariamente se confundirá com o

II Império, tendo o príncipe herdeiro um grande apreço pelas artes, incluindo a fotografia. Nesse

período, Dom Pedro II tornar-se-ia um dos primeiros fotógrafos brasileiro e, sem dúvida, um

grande colecionador de fotografias no Brasil até a atualidade (CHIARRELI, 2002).

O desenvolvimento da fotografia nesse período esteve ligado ao projeto da

implantação de uma “civilização” nos trópicos. Esse projeto tinha como objetivo a relação entre

civilização e natureza, tendo à frente o Estado monárquico, portador e impulsionador do projeto

civilizatório, e a natureza, como base territorial e material desse Estado. (KOSSOY, 2009).

O Imperador esteve à frente do processo civilizatório, patrocinando diversas

atividades, como no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. De acordo com Kossoy (2009),

Dom Pedro II era um homem culto e atento às manifestações artísticas, às descobertas

cientificas, aos avanços tecnológicos e às matrizes culturais, que geralmente eram engendradas

no continente europeu. Devido à importância da influência desse continente nos aspectos

culturais do Imperador, ele incentivaria e promoveria a ida de artistas brasileiros à Europa com

bolsas de estudo.

A fotografia esteve presente neste período apresentando, através da imagem, um

país e uma família real, contribuindo, no caso, para a construção da história nacional. Trata-se

de cenas do progresso material, enfatizando-se os avanços das técnicas, como a implantação

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das obras das estradas de ferro, dos progressos da agricultura e principalmente as

transformações urbanas (KOSSOY, 2009).

Nas ideias de Silva (2001), compreendemos que:

Na origem da utilização das fotografias enquanto documento histórico no Brasil

ressalta-se uma orientação ideológica voltada para a construção de uma história

nacional baseada nos parâmetros da modernidade técnica a exemplo das fotos que

acompanham as obras ferroviárias, portuárias, as reformas humanas, as instalações

industriais e outras [...] (Silva, 2001, p. 75).

Outras temáticas também se inserem no processo de construção da história

nacional, como os triunfos dos militares, tendo como exemplo o episódio de Canudos, a

exaltação da natureza, mostrando como símbolo da exuberância paisagística o Pão de Açúcar

e, também, as manifestações artísticas e culturais.

No processo de evolução da fotografia, o Brasil participou de importantes eventos

relacionados à temática, como a exposição internacional de Paris em 1855. Posteriormente,

houve no país a primeira exposição nacional de fotografia, que ocorreu no Rio de Janeiro em

1861 (SILVA, 2001). Na mesma cidade, em 1881, houve uma exposição na Biblioteca

Nacional, titulada a História do Brasil. Nessa podemos perceber a estreita relação da fotografia

com a análise da história, onde tal fonte aparecia ao lado de documentos manuscritos, mapas,

dentre outros. Esse fato nos mostra a importância da fotografia como parte do saber

especializado na busca da construção e da interpretação da realidade (SILVA, 2001).

Na análise da realidade brasileira, o século XX foi marcado por diversas conquistas

tecnológicas, implicando de forma direta a modificação das paisagens urbanas, os novos

modelos urbanísticos e a alteração dos padrões da percepção do mundo objetivo. Esse meio

urbano que vinha sendo desenvolvido influenciou de forma direta na percepção dos fotógrafos

e da sociedade de maneira geral.

A paisagem urbana brasileira foi passando por intensas transformações, numa

relação de transformação a cada novo modelo urbanístico criado. Temos como exemplo a

reforma realizada na cidade do Rio de Janeiro em 1903, projetada por Pereira Passos. As

características principais dessa reforma eram: a abertura de grandes avenidas, alargamentos de

ruas, programas de saneamento básico e construções de edifícios de grande porte. A partir do

plano de urbanização da cidade do Rio de Janeiro, muitas outras cidades brasileiras iniciaram

importantes mudanças em seu espaço, alterando não só a paisagem, mas também as funções e

o modo de vida da população (SILVA, 2001).

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Em virtude das mudanças que foram ocorrendo no espaço urbano, concentrando

população e atividades econômicas e políticas, as cidades brasileiras tornaram-se objeto de

estudo e análise de várias ciências. Sendo assim, a fotografia tornar-se-ia um recurso

imprescindível para o registro de tais mudanças. A fotografia passou a registar intensamente as

demolições e construções nas cidades, substituindo, muitas vezes, a memória urbana que não

conseguia acompanhar o intenso ritmo das mudanças que estavam acontecendo na paisagem

(SILVA, 2001).

As modificações que estavam ocorrendo na sociedade interferiram diretamente na

fotografia, pois, assim como a arte, a fotografia tinha como uma de suas principais

preocupações registrar as mudanças que estavam acontecendo na dinâmica vida moderna,

apresentando uma nova maneira de olhar para a cidade.

A fotografia como imagem de representação social e espacial possui elementos que

interagem com a perspectiva representada pelo espectador. Assim, a partir de sua interpretação,

é gerado de forma simbólica um discurso sobre o mundo (AUMONT, 2012). Assim, a imagem

fotográfica auxilia na compreensão da realidade, através do olhar que vai além dos aspectos

materiais, palpáveis e concretos.

A fotografia possibilita analisar a paisagem a partir da representação da realidade.

Podemos observar diversos aspectos relevantes do passado a partir das múltiplas interpretações.

A análise só é possível de ser realizada através de aspectos concretos da realidade. No entanto,

não podemos desconsiderar a análise subjetiva, na qual os espectadores encontram um

“universo” de possibilidades.

Uma fotografia traz mais do que a pretensão de nos mostrar uma genuína parcela

da realidade. Ela revela inúmeras versões, realizando um elo entre passado e presente. Para

Dubois (1993), o espaço fora da imagem faz parte do que está dentro, como imutável, congelado

e acessível no seu significado em qualquer tempo futuro.

Através do estudo das fotografias podemos entender os aspectos referentes ao

passado, e consequentemente compreender as mudanças ocorridas em uma determinada

sociedade. Nela encontramos marcas que mostram traços culturais, seja pela arquitetura de um

prédio, por uma paisagem natural ou até mesmo por um vestuário. A partir desses aspectos,

entendemos que o estudo da fotografia está intrinsicamente relacionado à cultura.

Os aspectos culturais são significantes nas fotografias, apesar de nem sempre em

sua leitura ela transmitir mensagens para todos, já que para alguns certas fotografias não

transmitem informações importantes. Já para outros, elas são carregadas de significados,

tornando-se uma parte do passado congelado, resgatando os sentimentos presentes na memória.

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A fotografia representa estruturas profundas ligadas ao exercício de uma

linguagem, assim como a vinculação a uma organização cultural e simbólica. Ela é também um

meio de comunicação e representação do mundo e, a partir do registro imagético de um lugar e

de um momento, possibilita constantes visitas ao “passado”.

A imagem fotográfica contém em si o registro de um fragmento selecionado do

real: o assunto “recorte espacial” congelado num determinado momento de sua ocorrência

“interrupção temporal”. Em toda fotografia há um “recorte espacial” e uma “interrupção

temporal”, fato que ocorre no instante do (ato) registro (KOSSOY, 2009:29).

Temos na imagem fotográfica um documento criado, construído, razão pelo qual a

relação entre o documento/representação/realidade é indissociável. A representação a partir da

fotografia oferece inúmeras interpretações, fornecendo diferentes leituras que cada receptor faz

dela em um determinado momento (KOSSOY, 2009).

Pode-se dizer que a foto realmente eterniza uma imagem, mesmo que esta

não corresponda à verdade absoluta, mas a uma verdade fabricada, aquela que se quer passar

adiante. O caráter subjetivo da fotografia não pode ser desprezado. A imagem retratada, ao

mesmo tempo em que apreende o real, reflete o ponto de vista de seu autor e a análise do

espectador, discussão que iremos aprofundar no terceiro capítulo.

A partir das abordagens realizadas neste capítulo, entendemos que a imagem

fotográfica é uma fonte indispensável para os estudos da realidade. Sabendo da sua importância

para análise da sociedade e do espaço geográfico, a fotografia fará parte de nossas análises,

assim como os sujeitos que compõem o bairro Benfica e a UFC.

Na busca de uma análise mais completa referente às mudanças que a Universidade

ocasionou e ainda ocasiona, se faz necessário conhecer e analisar os aspectos históricos

referentes ao Benfica e à instituição de ensino que estamos analisando, demonstrados no

decorrer do capítulo seguinte.

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3 A EDUCAÇÃO NA PAISAGEM DO BENFICA DE ONTEM E DE HOJE

3.1 UM POUCO DA HISTÓRIA DO BAIRRO

A partir das décadas iniciais do século XX, com a expansão urbana de Fortaleza, o

Benfica começou a se destacar por suas edificações, denominadas à época de chácaras e d

bangalôs, cujos principais proprietários eram personalidades da política, comerciantes e

profissionais liberais conhecidos da cidade.

O bairro se caracterizava, no final do século XIX e início do século XX, como uma

área destinada ao descanso. Raimundo Girão (1959) destaca o Benfica como local de chácaras

com extensos pomares e casas recuadas, marcando a paisagem da estrada que era usada para

abastecer a capital cearense com gêneros alimentícios trazidos do interior do estado.

De acordo com Pereira (2009), a formação do bairro possui uma relação com a

história econômica, cultural e educacional de Fortaleza. Com a recuperação da economia do

estado, afetada pela estiagem no final do século XIX, uma parte da elite econômica se deslocou

para o Benfica, se distanciando do centro da cidade e tornando- o um bairro domiciliar.

Esse movimento foi proporcionando por diversos fatores, como o sistema de

transportes público, destacando o bonde, que era um dos transportes mais modernos da época.

Ressaltamos que o bairro possuía duas linhas de bonde, a do Benfica e a do Prado, ambas

inauguradas no ano de 1913 (VASCONCELOS JÚNIOR, 1999). A evolução do transporte

público favoreceu ao bairro, pois, através desse, as pessoas poderiam se locomover para outras

áreas da cidade, principalmente para o centro de Fortaleza.

A localização geográfica foi outro fator relevante para a evolução do Benfica, de

onde podemos destacar algumas características, como o clima ameno, o verde proporcionado

por seus mangueirais, a lagoa do Tauape (aterrada na década de 40) e o riacho que corria por

trás do atual prédio da Reitoria em direção à referida lagoa. Outros pontos locacionais foram

importantes, como a proximidade com o centro da cidade, assim como a sua principal via de

acesso, denominada Visconde de Cauípe, e sua continuação à av. João Pessoa, conectando o

centro da cidade ao Distrito de Parangaba. Originalmente denominado de Arronches

(VASCONCELOS JÚNIOR, 1999)

Sobre a temática, Costa (2007), nos fala que:

Mais para o interior, na estrada dos Arronches, em zona arborizada, onde se

localizavam as fontes de água onde abasteceram Fortaleza durante a seca de 1877-79,

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começa a desenhar no final do século XIX, o Benfica com sobrados, bangalôs, e casas

recuadas com jardins. O bairro foi dotado de estrutura pelo prefeito Álvaro Wayne

(1930-35). Nos anos 30 era o bairro mais elegante da cidade de Fortaleza, atraindo a

população por sua paisagem, bosques, praça arborizada (Praça da Gentilândia),

clubes, Campo do prado (hoje CEFET) e a missa da Igreja dos Remédios [...]

(COSTA, 2007, p. 68).

Assim como a importância dos fatores apresentados acima, o lazer já possuía

destaque no bairro, haja vista os muitos eventos importantes até a década de 40, como as

corridas de cavalos no Prado, área ocupada atualmente pelo IFCE e o Estádio Presidente

Vargas. Nesse mesmo espaço aconteciam as partidas de futebol e eram localizadas as sedes

das primeiras associações futebolísticas da cidade, como o Gentilândia Esporte Clube, o

Ferroviário Esporte Clube, o Maguary Sporting Clube, o Fortaleza Esporte Clube, como

também o Ceará Sporting Club (BARROSO,2004).

Aos poucos o bairro foi crescendo e as mudanças ocorridas na paisagem do bairro

foram devido a diversos fatores, dentre eles o acelerado processo de urbanização do Brasil e o

fenômeno das migrações internas, que levaram ao aumento da população das principais

metrópoles brasileiras. De acordo com as ideias de Souza (2009), Fortaleza não ficou de fora

desse processo, pois o aumento da população da cidade trouxe diversas implicações de ordem

econômica e social, estabelecendo a necessidade de mais investimentos em infraestrutura social

e mais oportunidades de empregos.

A cidade foi crescendo, organizando e projetando vários planos urbanísticos para

atender às necessidades políticas, econômicas e sociais da população. Fortaleza crescia no

sentido do litoral para o interior, sendo acompanhada pela expansão de equipamentos urbanos,

inclusive das instituições de ensino (COSTA, 2007). Nesse contexto foram surgindo muitos

bairros novos, ampliando a área considerada mais antiga, compreendida pelo Centro, por

Jacarecanga e pelo Benfica.

Fortaleza, a capital do Estado do Ceará, se consolidava como centro comercial e de

serviços, fazendo emergir uma classe social de funcionários públicos, profissionais liberais e

pequenos e médios comerciantes que necessitavam de imóveis para as suas moradias. Nesse

período destacamos que a realidade dos imóveis era contraditória, com bangalôs, chácaras e

palacetes de um lado, e do outro, cortiços e casas de taipa.

Assim como ocorria o crescimento de Fortaleza, o Benfica ia evoluindo e,

consequentemente, houve o aumento de sua população com a fixação de muitas famílias

aristocráticas, dentre elas a família Gentil, que tinha à sua frente o patriarca José Gentil Alves

de Carvalho, banqueiro, comerciante e responsável pelo maior empreendimento imobiliário da

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época na cidade, a construção planejada de um conjunto de ruas e vilas com casas de vários

tamanhos, contendo o que havia de mais moderno em equipamentos urbanos: um sistema

coletivo de esgoto e água e energia elétrica. Esse espaço era denominado Vila Gentil, e

posteriormente de Gentilândia11, em sua homenagem (VASCONCELOS JÚNIOR, 1999).

Vasconcelos Júnior (1999) corrobora com a temática afirmando que:

O que torna o Benfica importante na abordagem em relação ao contexto urbano de

Fortaleza, é que desde o seu início, com a chegada de famílias importantes da cidade

como a do engenheiro João Thomé de Sabóia, os Mansos Valente e principalmente da

família Gentil, o bairro vai mudando o seu aspecto aristocrático de grandes mansões

circundadas por sítios ou extensas áreas ajardinadas, para abrigar ou inserir o moderno

da época (VASCONCELOS JÚNIOR, 1999 p. 48).

Para Vasconcelos Júnior (1999), o bairro foi progredindo e ganhando novas

características, com a formação de ruas e construção de muitos imóveis, tornando o Benfica um

espaço onde podia ser observado um misto de casas com características mais urbanas e casas

com muitos espaços no seu entorno, com aparência, como já dissemos, de bangalôs e chácaras.

Continuando as ideias do autor citado acima, a paisagem do Benfica se destacava

por diferentes tipos de residências. Além das mansões, havia moradias para a classe média que

ocupavam as vias principais. As vias secundárias eram compostas por vilas, com casas menores

destinadas à população menos favorecida. Encontramos em Barroso (2004) exemplos da

realidade apresentada, mencionando as seguintes vilas existentes ainda hoje: Vila Antônio de

Souza, Vila Demétrio, Vila Apertada Hora, Vila Campelo, Vila Alegre, Vila Arteiro e Vila

Gentil.

Diante do processo de modernização em Fortaleza, observamos que diversas

mudanças ocorreram na cidade. Residências localizadas no Benfica cederam lugar à construção

de condomínios, houve reformas em fachadas de algumas casas antigas e também a

intensificação de um maior número de estabelecimentos comerciais. Esses fatos nos mostram

que, nesse período, entre os anos de 50 e 60, o bairro passou por um processo de mudança

funcional, provocado, entre outros, pela especulação imobiliária que avançava na cidade.

Segundo Vasconcelos Júnior (1999), esse processo não foi maior por conta da

oportunidade que os antigos inquilinos das casas da Vila Gentil tiveram em adquirir, através de

contrato de compra e venda, suas residências. Muitas dessas famílias continuaram residindo no

11 Na planta da cidade de Fortaleza e subúrbios, organizada por Adolpho Herbster, de 1875, já se vislumbra a área

denominada Benfica. É neste bairro que o empresário José Gentil construirá sua residência e, posteriormente, na

área adjacente à sua residência, abrirá vilas e ruas e nelas construirá centenas de casas. Este espaço, com o tempo,

torna-se a Gentilândia, para muitos um bairro dentro de outro, o Benfica. A Gentilândia tornou-se bairro apenas

em 1999 por decreto municipal (VASCONELOS JÚNIOR,1999).

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bairro e esses imóveis foram, de certa forma, conservados.

A venda desses imóveis foi realizada pela imobiliária Frota Gentil, de propriedade

da família Gentil, pois a mesma possuía, além da Vila Gentil, muitas propriedades na cidade.

As vendas foram realizadas pelos herdeiros do empresário José Gentil. Muitos imóveis que

pertenciam à referida família foram adquiridos pela UFC, inclusive o Palacete Gentil, atual

prédio da Reitoria da referida universidade.

Com a criação da UFC, continuou ocorrendo a evolução do bairro. Essa

proporcionou no Benfica diversas transformações econômicas, políticas, sociais e culturais.

Com isso, o bairro adquiriu características modernas, ao mesmo que é preservado a sua história

através de muitos prédios antigos mantidos pela instituição de ensino em questão.

A presença da Universidade é incontestável no Benfica, provocando alterações na

paisagem do bairro, que são percebidas pelos diversos sujeitos que o compõem. Portanto, para

haver uma compreensão mais aprimorada, o próximo subitem demonstrará a história da

Universidade, mostrando os principais fatos do decorrer de sua história.

3.2 A HISTÓRIA DA UFC

A instalação da UFC solidificou o Benfica como espaço da educação, visto que o

bairro já vinha recebendo, antes da UFC, instituições educacionais de importância na cidade,

dentre elas o Ginásio Santa Cecília (atualmente instalado na Av. Virgílio Távora), o Ginásio

Nossa Senhora das Graças, que, ao se transferir para o bairro de Fátima, cedeu lugar ao Ginásio

Americano e, a mais importante destas instituições, a Escola Industrial, hoje Instituto Federal

de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE).

As edificações onde funcionaram as instituições educacionais acima mencionadas,

com exceção do IFCE, foram adquiridas com o tempo pela UFC, como resposta à necessidade

de novos espaços para os cursos que estavam sendo criados pela nova universidade.

A educação é uma das principais referências para a análise da paisagem do Benfica.

Em virtude do bairro ter se tornado lócus educacional, é necessário para essa análise

compreender uma discussão histórica sobre a evolução espacial e consequentemente de sua

paisagem.

Na análise, a UFC se destaca como instituição de ensino superior que provocou

intensas mudanças no bairro. Portanto, é necessário entender o processo histórico de sua criação

e expansão no Benfica. Para tanto, é necessário recorrermos a fatos importantes frente à

educação superior no Ceará, nos remetendo a períodos de criação de escolas de ensino superior

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e faculdades12.

Na abordagem frente ao processo de criação da instituição de ensino, iremos

mostrar os principais fatos referentes à história da UFC por períodos, a fim de detalhar e facilitar

a compreensão. Nessa, será focado o campus do Benfica como lócus de criação da

Universidade, assim como objeto que esta dissertação pretende elucidar.

Dividimos a história da Universidade em dois períodos. No primeiro analisaremos

a criação da Instituição, a escolha do primeiro reitor e os primeiros doze anos de funcionamento

da Instituição, mostrando a sua expansão através dos cursos que foram criados, assim como a

aquisição de muitos imóveis no campus do Benfica para as instalações da Universidade.

A temporalidade estabelecida para esse primeiro período é devido a importância

das primeiras instalações da Universidade e das bases educacionais que foram criadas através

de escolas e faculdades. Outro fator determinante para a escolha de analisar os doze primeiros

anos da instituição de ensino é devido à contribuição e importância do Professor Antônio

Martins filho para a UFC e o ensino superior no Ceará. Este foi o primeiro reitor da

Universidade, completando quatro mandatos consecutivos que se concentram entre os anos de

1955 e 1967.

No segundo período, iremos analisar a história da Universidade através dos

reitorados seguintes, analisando os principais fatos referentes à Universidade ao longo do

tempo. Para isso, foram analisados todos os reitorados após o ano de 1967 até aos dias atuais,

nos quais demonstraremos os principais feitos referente à criação de cursos, equipamentos

culturais e expansão das áreas físicas da Universidade.

3.2.1 Primeiro período: A criação da UFC, a escolha do primeiro reitor, e os doze

primeiros anos de Instituição

Antes da criação da UFC, o ensino superior já se apresentava no território cearense,

através da criação da Faculdade de Direito no ano de 1903, no centro de Fortaleza, nas

proximidades do bairro Benfica, da Faculdade de Farmácia e Odontologia no ano de 1916, da

Escola de Agronomia em 1918 e da Faculdade de Medicina no ano de 1948. Destacamos que

estas, juntamente à Faculdade Católica de Filosofia, foram incorporadas à Universidade no ano

12 Na abordagem realizada nesse subitem, utilizamos como fonte para as informações apresentadas as seguintes

obras do Prof. Antônio Martinho Filho: História Abreviada da UFC,1996; UFC & BNB: Educação para o

Desenvolvimento, 1994. Outra importante fonte que utilizamos neste capítulo, foi o site da Instituição, disponível

no seguinte endereço eletrônico: www.uf.br

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de 1955.

Para apresentarmos os fatos associados à criação da primeira universidade no

Ceará, consultamos as publicações de autoria do Prof. Antônio Martins Filho, primeiro reitor e

considerado, por muitos, o principal articulador da criação, implantação e consolidação da já

mencionada Universidade. Outra importante fonte foi o site13 da UFC, pois através desse

pudemos ter acesso a importantes datas referente à história da Universidade, como a criação de

cursos e os diversos equipamentos culturais mantidos pela instituição de ensino em questão.

De acordo com Martins Filho (1996), no ano de 1944 iniciaram-se as negociações

políticas nas esferas estadual e federal para a criação da uma universidade no Ceará. A primeira

iniciativa deu-se através do médico Dr. Antônio Xavier Oliveira, encaminhando ao Ministério

de Saúde e Educação um relatório sobre a federalização da Faculdade de Direito. Naquele

momento foi mencionada pela primeira vez a criação de uma universidade cuja sede seria na

cidade de Fortaleza. A ideia de uma universidade na capital cearense começou a ser tema de

diversos debates, pois a cidade estava crescendo e tinha condições suficientes de atender às

demandas que necessitavam para a criação e instalação de uma instituição superior pública de

ensino. Outra tentativa foi a de Antônio Martins Filho que, no ano de 1953, elaborou um

documento no qual especificava a necessidade da instalação de uma universidade no Ceará,

com sede em Fortaleza.

No momento em que decorria o debate sobre a criação da universidade, o ministro

da Educação e Saúde de Getúlio Vargas, Professor Clemente Mariano, visitou o Ceará. O

mesmo foi recepcionado pela Faculdade de Direito, na qual fez um importante pronunciamento

referente à necessidade da tão esperada universidade, enfocando também a solicitação do

alunado através de mais de 10 mil assinaturas solícitas à criação da instituição de ensino. O

pedido em relação à criação da universidade foi levado também ao governador do Ceará, àquela

época, o Desembargador Faustino de Albuquerque, que deu total apoio à causa pleiteada.

Nesse período, a morte do Presidente Getúlio Vargas em 1954 poderia ter se tornado

um empecilho. Essa fatalidade poderia desencadear um golpe militar, o Congresso poderia ser

fechado e, com isso, o processo de criação da universidade seria arquivado. No entanto, fatos

relacionados à posse do vice-presidente Café Filho, associados à vitória de Paulo Sarasate na

eleição ao governo do Ceará, fez surgir novas esperanças, por conta das boas relações políticas

entre o Executivo Federal e o recém-eleito para o Estado.

O pleito obteve êxito e, em 16 de dezembro de 1954, foi aprovada a lei que criava

13 Endereço eletrônico da UFC: www.ufc.br

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58

a Universidade do Ceará. Com a lei aprovada, uma das preocupações mais persistentes era quem

iria ser nomeado ao cargo de reitor. A lista era formada pelo deputado João Otávio Lobo e os

professores Renato Braga e Antônio Martins Filho. Um dos nomes mais citados para assumir a

reitoria era o do deputado João Otávio Lobo, sobre o qual a suspeita tendia a ser confirmada

com a visita do presidente Café Filho ao Ceará. A escolha do reitor era de muita preocupação

para o governador do estado, Paulo Sarasate, que era da União Democrática Nacional (UDN),

partido opositor ao governo de Vargas, pois João Otávio Lobo fazia parte do Partido Social

Democrático (PSD), remetendo à questão se, caso o mesmo assumisse a Reitoria, a Instituição

poderia tornar-se uma forte arma política.

Para a escolha do reitor foi formado um conselho com seis professores que iriam

votar nos três candidatos escolhendo o mais apto para coordenar a Universidade. Na votação, o

escolhido foi Antônio Martins Filho para compor o mais alto cargo da atual universidade. A

publicação de seu nome no Diário Oficial ocorreu em 18 de maio de 1955.

Com a escolha do reitor realizada e a incorporação de escolas e faculdades, agora a

principal preocupação era onde seria a sede da Reitoria. A primeira sede ficava localizada na

Rua Senador Pompeu, na Praça da Bandeira, há poucos metros da Faculdade de Direito. A

Reitoria permaneceu nessa sede pelo período de seis meses.

No ano de 1956 tornou-se possível adquirir, través da Imobiliária Frota Gentil, o

palacete que pertencia à referente família Gentil para sede da Reitoria da nova universidade. A

aquisição do prédio onde seria a nova Reitoria foi proveniente de recursos do Ministério da

Educação através de muitos esforços, pois no mesmo ano já havia sido adquirido o prédio da

Faculdade de Direito do Ceará, motivo que se poderia ter tornado um empecilho aos projetos

de novas aquisições pela recém-instalada Universidade do Ceará.

Sendo liberados os recursos necessários para a efetuação da compra do palacete, o

Reitor Martins Filho, efetivou a aquisição do imóvel pelo preço de cinco milhões de cruzeiros.

O palacete foi adquirido com os bens móveis, que se tornariam o mobiliário da nova Reitoria.

A inauguração ocorreria em 26 de junho de 1956.

A Reitoria foi ampliada várias vezes, não perdendo, por conta dessas reformas, o

seu estilo arquitetônico original neoclássico. Outras edificações foram construídas em seu

entorno, como a Concha Acústica com o seu auditório ao ar livre, ambas inaugurados em 1959.

O prédio significa mais do que uma sede administrativa da Universidade, ele é um símbolo

representativo da cultura e educação no Benfica para a cidade de Fortaleza.

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Fotografia 1 - Visita do Reitor Martins Filho à reforma da Reitoria e à construção da Concha

Acústica

-

Fonte: Arquivo UFC, 1958.

Outra aquisição importante da Universidade foi o prédio onde se localizava na Rua

Major Facundo a tipografia Lusitana. O imóvel foi adquirido pelo valor de 700.000.00 mil

cruzeiros. O seu proprietário, Clóvis Carvalho Pereira, tornar-se-ia, na aquisição, funcionário

da Instituição e o primeiro diretor da gráfica. A intenção em relação à compra do prédio era a

instalação da Imprensa Universitária no mesmo.

No decorrer do ano de 1956 houve a incorporação de vários imóveis, dentre eles

onde funcionariam a Faculdade de Ciências Econômicas do Ceará, que era mantida pelo

Governo do Estado, a Escola de Serviço Social do Instituto Social de Fortaleza e a Escola de

Enfermagem São Vicente de Paulo.

Observamos que em um curto período de tempo a Universidade ia se expandindo,

tornando-se em pouco tempo referência para o contexto do ensino público superior no Ceará.

A administração da UFC não só se preocupava com a parte estrutural da Universidade, mas

também com os assuntos estudantis. Frente às necessidades das questões dos estudantes, foi

criado o Clube dos Estudantes Universitários (CEU), passando a funcionar em 1957. O mesmo

tinha como objetivo agrupar todas as demandas dos estudantes e suas necessidades

assistenciais.

Outro ponto de extrema relevância na história do ensino superior no estado do Ceará

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60

foi a interiorização do ensino através da iniciativa do professor Antônio Martins Filho. Ele

articulou junto ao Ministério da Educação e Cultura e o Conselho Universitário a criação do

Instituto de Ensino Superior do Cariri. Com a criação desse, foi possível, em 1960, a instalação

da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras na cidade do Crato. Posteriormente, no ano de

1961, foi criada a Faculdade de Ciências Econômicas na mesma região.

Além da criação das Faculdades acima apresentadas na região Sul do estado, a

região Norte igualmente foi comtemplada por instituições de ensino superior, através da criação

da Faculdade de Filosofia Dom José, na cidade de Sobral no ano de 1961.

Em 1964 houve a implantação de um dos projetos de grande importância para a

Universidade, o Centro de Treinamento e Desenvolvimento Regional (CETREDE). Sua criação

esteve em convênio com a Faculdade do Arizona, com o Instituto de Pesquisas Econômicas

(IPE) e com a Organização dos Estados Americanos (OEA). O CETREDE tinha apoio de

órgãos como o Banco do Nordeste, em especial quando a sua presidência estava nas mãos de

Raul Barbosa.

Os planos referentes ao ensino na área da economia continuaram sua consolidação

com a criação do Centro de Aperfeiçoamento Econômico no Nordeste (CAEN), providenciando

cursos stricto sensu e lacto sensu, com o objetivo de qualificar o público da área em pós-

graduação, assim como desenvolver o crescimento regional.

Paralelo à ampliação das estruturas de ensino da UFC, iniciava-se a consolidação

de um projeto em benefício da arte e cultura cearense, a criação do Museu de Arte da UFC

(MAUC). O grande colaborador nesta empreitada foi o maranhense Floriano Teixeira,

convidado posteriormente para fazer parte do corpo de funcionários da Universidade. Ele tinha

a função de pesquisador, realizando viagens principalmente para alguns estados do Nordeste,

como Pernambuco e Maranhão, com a finalidade de adquirir material artístico para a

composição do museu. O MAUC foi inaugurado no dia 25 de junho de 1961.

Com o golpe militar em 1964, tem início no país um período de repressão. O ensino

em todos os níveis é reformado por atos institucionais e as universidades públicas pressionadas

por uma legislação de censura. Para Martins Filho (1996), aquele período político pelo qual o

país estava passando poderia interferir no desenvolvimento das questões estruturais e do ensino

frente à universidade. No entanto, com a nomeação do Marechal Humberto de Alencar Castelo

Branco, cearense, ao posto de Presidente da República, haveria certa comodidade, pois o

mesmo poderia interferir de uma maneira positiva frente às demandas de que a Universidade

necessitava.

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Fotografia 2 - Visita do presidente Humberto de Alencar Castelo Branco à UFC para a

inauguração da residência estudantil universitária .

Fonte: Arquivo UFC, 1966.

Em diversas ocasiões o Presidente Castelo Branco visitaria a UFC, acatando os

pleitos do Reitor Martins Filho. Em uma das viagens do Presidente ao Ceará, ele visitou a casa

onde tinha nascido o escritor e Romancista José de Alencar, localizada no Sítio Alagadiço

Novo. Devido às péssimas condições em que se encontrava esse local, o presidente incumbiu

ao Reitor a realização de reformas adequadas nesse local.

O Reitor Martins Filho acatou o pedido de Castelo Branco, tornando-se possível a

conclusão das obras em 1965. Nesse momento, a Universidade completaria dez anos de

existência, então o reitor sugeriu ao presidente a reimpressão do livro Iracema, a fim de

comemorar o centenário da obra, as reformas no Sitio Alagadiço Novo e o aniversário da

Universidade.

No ano de 1965, as medidas de controle das verbas e a excessiva centralização dos

órgãos do governo prejudicaram gradativamente o funcionamento das universidades federais.

No entanto, o mesmo ano para a Universidade foi bastante proveitoso, pois o projeto da reforma

da Casa José de Alencar, no sitio Alagadiço Novo, havia sido aprovado, assim como verbas

para a construção de uma biblioteca no mesmo espaço, galeria de arte, auditório, entre outros

benefícios. No mesmo ano foram realizadas reformas como: a parte esquerda da Reitoria; a

construção de três blocos destinados à Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras; o conjunto de

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edifícios destinados a institutos básicos, onde funcionavam os cursos de Química, Física e

Matemática; o prédio reservado ao Museu de Arte; a Residência Universitária; os edifícios

sedes para a Escola de Engenharia; o prédio onde iria funcionar a Escola de Arquitetura e

Urbanismo, criada no ano de 1964, e por fim, a edificação onde seria a nova sede da Imprensa

Universitária.

Outro importante feito nesta época foi a criação das Casas de Cultura. Essas são

continuadoras dos antigos Centros de Cultura Estrangeira, inauguradas pelo Prof. Pe. Francisco

Batista Luz, quando o mesmo era Diretor da antiga Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras.

Criados oficialmente por decisão do Conselho Universitário, os antigos Centros de

Cultura Estrangeira estão hoje como responsabilidade da Coordenadoria Geral das Casas de

Cultura Estrangeira, da direção do Centro de Humanidades e da Pró-reitora de Extensão. Seis

unidades foram inauguradas ao longo de sete anos. Foram elas em ordem cronológica: Centro

de Cultura Hispânica, 1961; Alemã, 1963; Italiana e Britânica, 1964; Portuguesa, 1964 e a

Francesa, em 1968. Mais tarde foram criados os Cursos de Esperanto e Russo.

Ainda no final dessa década inicial de criação da Universidade do Ceará, no ano de

1964 foi criado o curso de Biblioteconomia e o Teatro Universitário. Já em 1965 foram criados

a sede do Conservatório de Música, Alberto Nepomuceno, e o curso de Comunicação Social.

Quando foi criado esse curso ele, era polivalente, formando bacharéis na área. Foi somente no

ano de 1988 que foi implantada a habilitação para jornalismo e, dez anos mais tarde, a

habilitação para Publicidade e Propaganda. Atualmente o curso de Comunicação Social faz

parte do Instituto de Cultura e Arte – ICA –, concentrado no bairro do Benfica. No entanto, o

curso deve ser transferido futuramente para o campus do Pici.

Compreendemos que esses doze anos de universidade consolidaram as bases do

ensino superior para o estado do Ceará, percebidas através das palavras do grande articulador

desse projeto, o memorável Prof. Antônio Martins filho. Nas palavras desse no final do seu

mandato em 1966:

[...] estavam em pleno funcionamento nove Faculdades e Escolas incorporadas;

mantidas pelo Governo da União; oito Escolas e Faculdades agregadas, sendo três

com sede no interior do Estado; Três Intuitos Básicos e oito Institutos Aplicados;

cinco Centros de Cultura, um curso de Esperanto, o único no mundo pertencente a

uma instituição universitária; dez Programas Especiais com administração autônoma;

cinco Órgãos Suplementares- Casa José de Alencar, Museu de Arte, Imprensa

Universitária, curso de Arte Dramática e Coral Universitário, todos subordinados a

reitoria mais com administração própria. (MARTINS FILHO, 1996, p. 214).

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3.2.2 Segundo Período: Os principais feitos dos reitorados de 1967 até os dias atuais

Nas abordagens iniciais sobre esse segundo período, compreendemos que a

expansão da Universidade foi prejudicada devido à ditadura militar no Brasil entre os anos de

1964 e 1985. Nesse momento histórico, pelo qual o país estava passando, as diretrizes baixadas

pelo governo através do Ministério da Educação e Cultura foram bastante rígidas e criaram uma

série de obstáculos para a administração das universidades federais, como exemplo o fato de o

governo cercear o princípio da autonomia, condição de extrema relevância para o

desenvolvimento das instituições universitárias.

Além dos fatores apresentados acima, faltava para o reitor seguinte, o Prof.

Fernando Leite, que teve seu mandato entre os anos de 1967 e 1971, “promover articulações

com as lideranças na esfera estadual, federal e também com a administração anterior da

Universidade” (MARTINS FILHO, 1994, p. 76).

Foi no mandato do professor Fernando Leite que houve a Reforma Universitária a

nível federal no ano de 1968. De acordo com Veiga (1982), o contexto na qual estavam

inseridas as universidades federais era marcado pela repressão de um poder centralizador e

ditatorial. As mudanças processadas nas universidades brasileiras denotam a necessidade de

adequar essa instituição a um novo modelo de organização social, modelo esse que incentivou

a intensificação do ingresso de capital e de tecnologia estrangeira no Brasil.

Apesar das dificuldades que se apresentavam nesse período, observamos que a

expansão da UFC teve continuidade através da criação de diversos cursos no decorrer da década

de 70, dentre eles: Ciências Biológicas e Geologia. Todas essas inovações resultaram em

beneficio para a Instituição e, consequentemente, para a população e o mercado de trabalho

local e regional. .

No mandato do Prof. Fernando Leite, assistimos à implantação do Centro de

Humanidades, em 1969. Esse foi criado a partir da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras,

instituída no ano de 1961. Ao ser criado, o Centro de Humanidades passou a ser constituído

pelas Faculdades de Letras, Ciências Sociais, Filosofia e pela Faculdade de Artes e Arquitetura,

que hoje é tida como o curso de Arquitetura e Urbanismo, integrado ao Centro de Tecnologia.

Continuando a abordagem referente ao segundo período, apresentaremos o mandato

do professor Walter Moura Cândido estando à frente da administração da Universidade entre

os anos de 1971 e 1975. Uma das primeiras providências do seu reitorado foi a atualização do

sistema do concurso vestibular. Ainda coube ao presente mandato à incumbência da efetivação

da Reforma Universitária. Por outro lado, houve uma significante expansão da área física da

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UFC, notadamente no campus do Pici. Esse crescimento foi bastante significativo, havendo a

construção de 40 novos blocos. Além das atividades desenvolvidas no plano material,

acrescentam-se os programas de extensão universitária, assim como a continuidade da criação

de cursos de graduação, como o de Psicologia, no ano de 1974, integrado ao Centro de

Humanidades, localizado no campus do Benfica.

Além da criação de cursos, observamos que este período é marcado pela valorização

cultural, explicitado pela inauguração, no ano de 1971, da Casa Amarela Eusélio Oliveira. Essa

atualmente oferece cursos na área de cinema, fotografia, animação e audiovisual, buscando

difundir a memória do povo cearense através de curtas metragens relacionados à temática da

nossa história. Nela está presente um significativo acervo de filmes, vídeos e fotografias, e são

organizadas periodicamente exposições e mostra de filmes.

O mandato do Reitor Professor Pedro Teixeira Barroso ocorreu entre 1975 e 1979.

Esse recebeu a Universidade em condições favoráveis em relação à área física e às atividades

acadêmicas, científicas e técnicas. Esse período merece destaque, devido aos cursos criados,

junto com sua excelente administração e o pleno funcionamento dos mesmos. Mencionamos,

por exemplo, os de graduação em Administração de empresas, assim como os cursos de

mestrado em diversas áreas, dentre elas Tecnologia de Alimentos, Sociologia do

Desenvolvimento, Ciências do Solo, Engenharia de Pesca, Engenharia Agrícola, Física,

Química, Zootecnia, Educação, Direito Público e Farmacologia.

O reitorado seguinte, o do Prof. Paulo Elpídio Menezes Neto, entre 1979 e 1983, se

distinguiu dos outros reitores pelo conjunto de medidas que beneficiaram todas as áreas da

UFC. Nesse houve a implantação dos estágios supervisionados na graduação e a aproximação

da Universidade com a área empresarial, contando com a participação da Federação das

Indústrias Cearenses (FIEC).

Houve também a implantação de núcleos de pesquisas, pós-graduação e ênfase no

programa editorial, com a criação de periódicos em diversas áreas. Nesse destacamos os

convênios de cooperação com universidades francesas e alemãs, assim como a participação de

professores visitantes com o apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível

Superior (CAPES) e do Conselho Nacional de Pesquisa (CNPQ).

Outro ponto que merece destaque na administração do professor Elpídio, foi a

criação das Edições UFC, com a publicação de aproximadamente 90 título de escritores

cearenses e brasileiros, assim como traduções de obras estrangeiras.

O sexto reitorado da UFC, foi o do Professor José Anchieta Esmeraldo Barreto, que

ocorreu entre 1983 e 1987. Nessa gestão houve investimentos no Centro de Ciências Agrárias

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e Ciências da Saúde, bem como na Biblioteca Central Universitária. Nesse período houve

também uma significativa contribuição para especializações em diversas áreas, como a

Educação, a Engenharia de Pesca, a Economia, o Ensino de Português, dentre outras.

Nas áreas de extensão houve a execução de diversos projetos, como o I Festival de

Fortaleza do Cinema Nacional e o Projeto de Ação Comunitária da UFC fora de Fortaleza. Nas

áreas de Educação, Saúde e Cultura houve os Encontros Nordeste Musical de Corais e

Orquestras e a criação da Coleção Alagadiço Novo. Esta deu destaque à UFC na área de

editoração que para Martins Filho (1996) “Não há programa similar nas universidades

brasileiras, e para ter ideia nítida de sua importância, somente em 1997 foram impressos 48

títulos”. (MARTINS FILHO, 1996, p. 238).

O Sétimo reitor da UFC foi o Professor Raimundo Neto Leite, sua gestão foi entre

os anos de 1987 e 1991. Importantes feitos neste reitorado foram realizados, como a

implantação do Sistema de Automação Universitária (SAU), que deu início à rede de

computação da UFC. Além disso, esse reitor estabeleceu contratos com muitas universidades

estrangeiras, dentre elas as Universidades de Nova York, Califórnia, Boston e Virginia, assim

como a renovação do contrato com a Universidade do Arizona, uma das mais antigas parcerias

da UFC.

Destaca-se nesse reitorado incentivos a pós-graduação com a criação do Doutorado

em Física, Química Orgânica e Farmacologia, assim como cursos de Mestrado em Letras e

Patologia Tropical e mais de dez cursos de especialização distribuídos em diversas áreas.

Já no reitorado do Prof. Antônio de Albuquerque Sousa e Filho, que ocorreu entre

os anos 1991 e 1995, foi marcado pelos avanços tecnológicos na área da informática, tendo em

vista que o reitor adquiriu 1285 computadores e instalou 42 laboratórios de informática nos

diversos cursos da UFC. Além dos benefícios realizados no campo da informática, foi

estabelecido um verdadeiro mutirão de obras em toda a universidade, compreendendo a

recuperação e as reformas das bibliotecas setoriais, a melhoria das instalações dos

departamentos, a execução do laboratório de Física de Nuvens e as reformas no CETREDE, no

Museu de Arte, na Casa Amarela e nas Casas de Cultura Hispânica, Britânica e Italiana.

No reitorado seguinte, o Prof. Roberto Cláudio Frota Bezerra permaneceu como

reitor da Universidade por dois mandatos, o primeiro de 1995 a 1999, e o segundo de 1999 a

2003. Esse elegeu como ideia matriz de seus mandatos o avanço qualitativo da Instituição.

Dentro de uma nova concepção pedagógica, o reitor introduziu a norma de um único vestibular

por ano, tornando-o mais qualitativo e menos eliminatório.

Neste reitorado foram implantados novos cursos considerados estratégicos para a

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região do Ceará, tais como: Engenharia de Transportes, Zootecnia, Políticas Públicas e

Agricultura Irrigada. A criação desses buscava fortalecer o esforço do Estado para o

desenvolvimento regional, um dos principais temas e objetivos da Instituição em questão.

No ano de 2003 tivemos a posse de mais um reitor, o Prof. René Teixeira Barreira,

cujo mandato teve duração até ao ano de 2006. Neste reitorado houve continuidade com a

expansão de diversos cursos, como o de Engenharia de Teleinformática, no ano de 2003, e os

de Engenharia Metalúrgica, Educação Física e Música em 2005.

O mandato do Professor René Teixeira foi interrompido no ano de 2006, embora

ainda pudesse permanecer por mais um ano no reitorado. O Motivo da saída foi o fato de ele

ter que assumir a Secretaria de Ciências e Tecnologia do Governo do Estado do Ceará. Com a

saída do Reitor René Teixeira, o vice-reitor, Prof. Ícaro de Sousa Moreira, era para ter sido

empossado no mais alto cargo administrativo da UFC. No entanto, no ano de 2006 iria haver

eleições para reitor, e o Prof. Ícaro era um dos candidatos. Devido a esse fato, ele não pôde

assumir o cargo de reitor. Com isso, iria assumir a reitoria o mais velho Pró-reitor da presente

administração, o Prof. Luís Carlos Uchôa Saunders.

Nesse período, no mandato do Reitor Luís Carlos Uchôa Saunders, assistimos a

importantes avanços na Educação a Distância, com a criação de diversos cursos nesta

modalidade de ensino, na qual podemos explicitar Administração, Física, Letras, Pedagogia,

Química, dentre outros tão relevantes quanto esses. Na modalidade presencial houve a criação

do curso de Oceanografia.

O Mandato do Prof. Luís Carlos foi bem curto, entre os anos de 2006 e 2007,

passando o cargo para o Prof. Ícaro, que havia ganhado as eleições para reitor em 2007. No

entanto, houve uma grande tragédia que abalou toda a comunidade acadêmica da UFC, a morte

do recente reitor Ícaro de Sousa Oliveira, em 28 de março de 2008, tendo como causa do

falecimento, infarto (DIÁRIO DO NORDESTE, 2008).

Com a morte do Prof. Ícaro, o vice-reitor Prof. Jesualdo Pereira Farias assumiu o

cargo. O seu primeiro mandato foi entre os anos de 2008 e 2012, e o segundo, que ainda está

em vigor, teve início em 2012, com duração até 2016. Nos anos em que o Prof. Jesualdo esteve

à frente da administração da UFC, trouxe significativos avanços com a criação dos seguintes

cursos, nos respectivos anos de criação: Biotecnologia, Engenharia Ambiental, Engenharia do

Petróleo, Engenharia de Recursos Renováveis, Cinema e Audiovisual, Ciências Ambientais,

Fisioterapia, Sistema de Mídias Digitais, Finanças e Teatro, em 2009; Dança, em 2010, e

Design, em 2011.

Entendemos que todos os reitorados tiveram sua importância, seja na criação de

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curso de graduação e pós-graduação, seja na expansão de projetos de extensão, expansão das

áreas físicas da Universidade e continuidade do processo de interiorização do ensino superior

no estado. Com essas informações apresentadas, podemos entender como esta Instituição é de

grande relevância não somente para a cidade de Fortaleza, mas para todo o estado do Ceará.

Devido à criação e expansão dessa instituição de ensino, entendemos que a mesma

provocou constantes alterações na paisagem do território cearense, dentre elas a paisagem na

cidade de Fortaleza e no bairro Benfica. Portanto, para o entendimento das alterações da

paisagem cultural urbana, é necessário a realização de diversos estudos, como iremos fazer a

seguir, no final deste capítulo e no próximo desta dissertação.

3.3 A UFC E AS ALTERAÇÕES NA PAISAGEM DO BAIRRO BENFICA

Entendemos que o Benfica é um espaço privilegiado para o estudo das paisagens

urbanas e de suas representações simbólicas, percebidas a partir do domínio dos sentidos.

Segmentos sociais diversos entram nesse processo no dia a dia, moradores, alunos, professores,

servidores públicos, comerciários, administradores, gestores, planejadores urbanos, vendedores

de todo o tipo, comtemplando, mesmo que seja por um momento, os vários contextos

paisagísticos. Em relação a esse contexto, Cosgrove (1998) nos fala que a paisagem não surgiu

a partir de indivíduos ou pequenos grupos, ela é configurada a partir de um processo dialético

entre a produção cultural e as práticas sociais, em um determinado momento histórico.

A análise da paisagem do Benfica possibilita múltiplas possibilidades de enfoques,

permitindo analisar o bairro através de diferentes aspectos da relação homem-lugar. No

presente estudo, estão expressos vários momentos da ação da cultura e da acumulação de

tempos sobre o espaço, refletindo as práticas sociais que são estabelecidas nesse local.

Para Luchiari (2001), ao pensarmos a paisagem como ação da cultura, iremos

perceber que a passagem do tempo altera suas formas em múltiplas combinações. Se as formas

são alteradas pela ação do tempo sobre o espaço, as funções e os significados também se

transformam, fazendo com que a cidade esteja constantemente se refazendo. Ainda para a

autora, a paisagem contemporânea é híbrida, um palimpsesto que exige a convivência de vários

ritmos, percepções, escalas e perspectivas.

Na tarefa de estudar a paisagem, é necessário estar ciente do desafio de decifrar as

representações contidas na mesma, na qual é preciso desenvolver um olhar especial que permita

alcançar as diversas dimensões do espaço e do tempo, pois a paisagem traz marcas dos

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indivíduos que a construíram, sendo possível ver essa dinâmica no espaço transformado,

destruído e degastado pelo tempo (COELHO, 2009).

No decorrer do tempo, diversos momentos foram relevantes para a história do

Benfica. No entanto, com a presente pesquisa, apresentaremos a importância da UFC no

contexto das alterações da paisagem do bairro, onde é inquestionável a significância das

relações propiciadas pela Universidade no Benfica, podendo serem observadas nas análises das

fotografias antigas e nas observações, principalmente, daqueles que estão envolvidos nesse

processo.

Quando caminhamos pelo Benfica, principalmente na Avenida da Universidade,

percebemos que muitas construções refletem a intensa presença da Universidade nesse espaço.

Nessa artéria se visualiza inúmeros prédios que pertencem à UFC, destacando os Centros de

Humanidades 1 e 2, a Faculdade de Economia, Administração, Atuarias e Ciências Atuariais –

FEAAC –, a Imprensa Universitária, as Casas de Cultura, o Museu de Arte da UFC – MAUC

–, o Restaurante Universitário, o Conservatório de Música Alberto Nepomuceno e a Reitoria,

que é um símbolo arquitetônico para a cidade de Fortaleza.

No processo de criação e consolidação da Universidade, esses prédios passaram

por diversas reformas para a adequação da Instituição. A maioria dessas reformas foram

realizadas no espaço interno dos imóveis. Dessa forma, muitos prédios conservaram sua

fachada arquitetônica, propiciando ao observador uma viagem no tempo e uma percepção de

um estilo de morar e viver na cidade em décadas passadas.

Além dos aspectos materiais que envolvem a paisagem, é essencial levarmos em

conta a subjetividade que está contida na paisagem do Benfica, assim como as ações dos

sujeitos. As modificações realizadas na paisagem por esses, não são consequências somente dos

padrões de consumo impostos pela sociedade moderna, pois na mesma encontramos os

sentimentos e as simbologias.

São várias as abordagens realizadas sobre o conceito a ser estudado, estando no

centro do conflito diversas dicotomias, tais como: objetivo e subjetivo, sensível e factual, físico

e fenomenológico. Pensar a paisagem em toda a sua complexidade é estar ciente dessas

dicotomias, podendo ser explicitada na relação entre objeto e sujeito. Das palavras de Berque

(2004) se compreende que:

A paisagem não reside somente no objeto, nem somente no sujeito, mas na interação

complexa entre os dois termos. Esta relação coloca em jogo diversas escalas de tempo

e espaço, implica tanto a instituição mental da realidade quanto a constituição material

das coisas (BERQUE, 2004, p. 85).

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A paisagem cultural possui sentido através da construção coletiva da sociedade,

pois as práticas culturais realizadas no dia a dia dão sentido àquilo que os nossos olhos

conseguem captar. Mas a paisagem vai além do visual, pois nela está contida os sentimentos

daqueles, que a todo o momento a (re)constroem.

As mudanças na paisagem não são sentidas pelas pessoas somente no olhar as

edificações da UFC, mas através do ir e vir de inúmeros moradores, frequentadores estudantes,

professores e funcionários da Instituição que se apropriam destes espaços, inserindo novas

formas, uso e ocupação. Informação essa que pode ser observada nos grupos reunidos à sombra

das árvores, no entorno das cantinas, nos bares e lanchonetes próximos e nos pontos de ônibus,

onde ocorre um intenso fluxo de pessoas nas proximidades da Universidade.

Para muitos, o Benfica vai além de um simples bairro de Fortaleza, apresentando-

se como um lugar que simboliza “segurança”, acolhimento e liberdade. Essa observação pode

ser conferida nas manifestações de cunho político e ideológico realizadas no bairro, das quais

podemos explicitar como exemplo o movimento LGBTT14 e suas reivindicações. Assim, na

paisagem do Benfica, o bairro se mostra como palco de momentos singulares na cidade,

envolvendo diversos sujeitos na dinâmica da paisagem do bairro.

Devido à importância dos sujeitos que compõe o bairro, foi de extrema relevância

a análise com os mesmos. No presente estudo sobre as alterações na paisagem do bairro Benfica,

buscou-se realizar entrevistas com aqueles que dinamizam a paisagem do bairro no dia a dia.

Portanto, buscou-se a percepção daqueles que estão mais envolvidos na percepção da paisagem.

Para isto, foram realizadas entrevistas semiestruturadas sobre diversos aspectos frente ao

objetivo que se pretende alcançar com esta análise.

Na tentativa da melhor compreensão da análise da percepção dos sujeitos, optamos

por realizar entrevistas separadamente através de cinco grupos, divididos da seguinte forma:

moradores antigos, frequentadores do bairro, estudantes, professores e alunos da UFC, como já

foram apresentados anteriormente na introdução desta dissertação.

A relações que os sujeitos estabelecem com o Benfica vai além do estudo, trabalho

e moradia. Para muitos dos entrevistados o sentimento de pertença com o lugar é nítido,

demonstrando a afetividade e o sentindo de pertencimento com o bairro. Assim, sendo

14 Significado da sigla LGBTT – Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais.

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observadas estas características, perguntamos qual a importância do Benfica para eles, e muitas

das respostas se assemelham às seguintes citações abaixo:

A partir do Benfica eu comecei a perceber um novo mundo. Eu comecei a fazer

faculdade e eu percebi a quantidade de coisas que eu não conhecia e que eu tinha a

possibilidade de estar conhecendo, lugares diferentes e pessoas diferentes. Hoje em

dia o Benfica é um pedaço da minha vida, ele foi muito importante enquanto a minha

formação de ser humano (informação verbal).15

O Benfica é importante para mim devido ser o lugar da minha formação acadêmica,

sendo que ele vai muito além da minha graduação, pois todo cantinho do Benfica faz

parte de mim. Ele é muito acolhedor, aqui você se encontra de qualquer maneira, ele

parece um mundo além de fortaleza (informação verbal). 16

Além de ser funcionária, também sou moradora do bairro e estudei no bairro o ensino

médio e depois fiz a graduação. Aqui para mim foi um elo de muita coisa, de proposta

de trabalho, lazer e estudo. Por isso eu não posso sair do Benfica. Por que para mim

ele é completo. Eu atribuo todas essas questões, conhecimento, trabalho e lazer

(informação verbal). 17

Através das citações apresentadas acima, percebemos que para os sujeitos

envolvidos na construção e também nas alterações na paisagem do bairro, o sentimento que

esses possuem com o lugar é bastante perceptível nas falas, mostrando como o bairro é

importante para eles. O Benfica para os entrevistados é o lugar do acolhimento, da liberdade e

da valorização cultural, em que tal aspecto se torna raro frente às constantes mudanças que estão

ocorrendo em nossa sociedade.

Quando foram realizadas as entrevistas com os grupos, a cultura foi bastante

mencionada, mostrando que o aspecto cultural identifica bastante o bairro. Na fala dos

entrevistados a cultura se apresenta, principalmente, através da preservação da arquitetura do

bairro, das manifestações artísticas, como o grafite, através das festas que a Universidade

promove no bairro, como o Festival de Cultura da UFC e as calouradas.

Essa observação pode ser constatada na fala dos seguintes entrevistados:

O contexto mais importante é o cultural. Este foi o primeiro que eu me identifiquei,

pois eu fazia parte de um grupo de reisado que também se inseria no contexto do pré-

carnaval. Posteriormente a parte da Boemia, os amigos. Foi a partir da cultura que eu

pude conhecer meus amigos e interagir mais com o meio ambiente (informação

verbal).18

15 Cristiane Lima Mesquita, frequentadora do bairro. Entrevista realizada em Fortaleza, em novembro de 2013. 16 Naiana Viera da Cunha, estudante do curso de Letras. Entrevista realizada em Fortaleza, em novembro de 2013. 17 Diocleciana Paula da Silva, Professora da UFC. Entrevista realizada em Fortaleza, em novembro de 2013. 18 Cristiane de Mendonça Rodrigues, frequentadora do bairro. Entrevista realizada em Fortaleza, em novembro de

2013.

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Aspecto mais importante é o cultural, ligado à universidade. Embora os aspectos que

você citou sejam muito importantes, a universidade mudou o Benfica. Sempre que

chega um campus universitário no bairro há uma proliferação muito grande de Xerox,

papelaria, restaurantes e lanchonetes. Isso vai mudando o bairro, e a própria vida

acadêmica em torno do campus, através da sociabilidade, pois a dinâmica na

paisagem do Benfica modifica o espaço social. O Benfica potencializou isso tudo,

pois tem um sentimento de identidade muito forte, tem o movimento Quem é de

Benfica, que virou carnaval. Tem uma série de coisas que da identidade ao Benfica,

e os bairros estão perdendo identidade (informação verbal).19

A valorização da cultura foi persistente na análise com os entrevistados. Eles viram

esse ponto como positivo com a chegada da Universidade, afirmando que, se não fosse a UFC,

o Benfica não teria o aspecto cultural que o mesmo possui atualmente, seja pelos carnavais de

rua, pelos shows da concha acústica, seja pelo patrimônio cultural arquitetônico, através da

preservação de muitos prédios que se encontram no bairro e que pertencem à Universidade.

Junto com a cultura, o lazer e a boemia estão fortemente presentes na paisagem do

Benfica. O lazer se apresenta nas festas que acontecem no bairro, assim como a boemia se

apresenta através do grande número de bares e restaurantes, evidenciando outra possibilidade

do ir e vir de moradores e transeuntes nesse espaço. Esse fato é perceptível à noite caminhando

pelo bairro, na concentração de estudantes, professores, moradores, frequentadores e

funcionários da UFC. Podemos observar na informação verbal de um deles fatos relacionados

à temática que estamos apresentando: “Eu acho que o Benfica é um bairro de referência, em

termo cultural e divertimento. Eu, por exemplo, quando saio de casa para tomar uma cervejinha,

eu venho para esses lados de cá, então é uma referência” (José Carlos Vasconcelos Mendes,

funcionário da UFC há mais de 10 anos)

Vários fatores na dinâmica da paisagem do Benfica são referências para o bairro,

tanto nas rodas de conversa dos moradores antigos, nos grupos de estudantes e professores nos

bares nos finais das aulas, evidenciando o aspecto boêmio no bairro, como no aspecto

educacional, devido ao fato de muitos dos frequentadores do bairro, possuírem ou já terem

possuído alguma ligação com a Universidade.

Assim como o aspecto cultural, o lazer e a boemia, o aspecto educacional foi

evidenciando nas entrevistas. Quando perguntamos qual seria o aspecto mais relevante na

dinâmica espacial do bairro, muito responderam “o educacional”, tendo a UFC como a

instituição de ensino mais importante do bairro.

Ao indagarmos se a paisagem do Benfica tinha sido modificada com o tempo

através da instalação e fixação da Universidade, a maioria respondeu que sim, retratando que

19 Rui Martinho Rodrigues, professor da UFC. Entrevista realizada em Fortaleza, em dezembro de 2013.

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as mudanças ocasionadas pela instituição de ensino são percebidas devido aos prédios que

pertencem à UFC. No entanto, junto com as mudanças, a preservação do patrimônio cultural

foi apresentada com relevância, mostrando a evidência do aspecto cultural, como apresentamos

anteriormente.

Quando a universidade chega, qualquer universidade, principalmente as públicas elas

mudam a realidade social. Agora no caso da Universidade Federal do Ceará O Benfica

era um bairro pequeno e com sítios e em pouco tempo se transformou em um bairro

importante depois da expansão do centro, então teve um impacto muito forte e ao

mesmo tempo trouxe transformações eu acho que também deu uma importância a

tradição. Se formos prestar atenção o Benfica se transformou e ao mesmo tempo

respeitou a tradição (informação verbal).20

Outro fator que mostra as mudanças na paisagem é o intenso fluxo de pessoas nesse

lugar. Acreditamos que muitas das pessoas que frequentam o bairro, seja por lazer, trabalho ou

estudo, estejam interligadas à Universidade. Essa observação foi bastante corroborada pelos

entrevistados, constatando o argumento de que a paisagem vai além dos aspectos materiais.

Pelo que eu conheço da história, houve grandes mudanças mesmo. Mudanças que com

a chegada da universidade aproxima o bairro de outra realidade. Isto porque tem esse

trânsito de pessoas de outros bairros, pessoas que provavelmente não estariam aqui

senão fosse à universidade, pois a cara do bairro era outra, ele era mais um bairro de

descanso. Eu acho que paulatinamente ele vai se tornando mais cosmopolita com a

universidade e os estudantes (informação verbal).21

Continuando as abordagens referentes às alterações da paisagem do Benfica, o

comércio também possui significância no bairro. Aqui mais uma vez destacamos a sua relação

com a educação, pois muitos desses estabelecimentos comerciais têm como objetivo principal,

atender a demanda do público que reside e frequenta o bairro, destacando-se as papelarias,

livrarias, lanchonetes e lan houses. Outras edificações também possuem uma relação direta com

a educação, as quitinetes, moradias com preços acessíveis para os estudantes que vêm de outros

lugares do Brasil e do mundo.

A partir dos fatos apresentados neste capítulo, entendemos a importância do bairro

dentro do contexto urbano de Fortaleza, destacando a Universidade no processo de construção

da paisagem, fazendo-nos refletir que, apesar da paisagem urbana ser múltipla e diversificada,

em muitos lugares são encontrados significados e símbolos que refletem a cultura no espaço

urbano.

20 Raimundo Nonato de Lima, professor da UFC. Entrevista realizada em Fortaleza, em dezembro de 2013. 21 Roberto Augusto Leal Sacramento, estudante da UFC. Entrevista realizada em Fortaleza, em dezembro de

2013.

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Em relação a presente análise, Netto e Alves (2011) descrevem que:

A paisagem urbana pode ser vista, modificada, usada, destruída, consumida, vendida

e também pode causar prazer estético, sendo tratada, por vezes, apenas como um

“produto” sociocultural. Mais do que isto, ela é constitutiva das relações

socioculturais, pois é, ao mesmo tempo, estruturada e estruturante. Sendo assim,

paisagem é uma configuração de símbolos e signos socioculturais dispostos a

inúmeras interpretações e percepções subjetivas, principalmente diante dos

complexos processos urbanos da atualidade (NETO E ALVES, 2011, p. 15).

Nesse sentido, entendemos que a cidade é interpretada como sendo palco onde se

produzem e se revelam inúmeras transformações sociais e culturais, operando em diversas

direções numa intensa rede de relações. Dessa maneira, a paisagem urbana não pode ser

concebida como uma forma que se produz simplesmente pela quantidade de moradias ou pelo

adensamento populacional. É preciso assumir a perspectiva de uma construção coletiva que

envolve as representações e imaginações como estratégias para a compreensão das simbologias

da paisagem.

A paisagem cultural não pode ser vista como única, mas como múltipla. Nela

existem diversos olhares e vários fragmentos de diferentes realidades temporais que revelam a

relação do indivíduo e dos segmentos sociais com a paisagem, assim como os valores

dominantes nacionais e transacionais que influenciam esse processo.

A cidade de Fortaleza nesse contexto é resultante de processos históricos, sociais e

culturais. Esses foram associados à diferentes valores e definições, tornando a metrópole

cearense singular e complexa. As paisagens na cidade apresentam essas características,

podendo ser analisadas através dos seus prédios, avenidas, bairros e funcionalidades, que

representam tempos diversos, o ontem, o hoje, e projeção do que será o futuro, vislumbrado nas

novas construções, nas reformas e nas novas práticas culturais.

Compreendendo o ontem e o hoje no Benfica enquanto processo de acumulação, na

desconstrução e construção, o bairro concentrou instituições de ensino superior, tecnológico e

profissional. Não obstante, encontrarmos também escolas da Educação Básica, como o Colégio

Farias Brito, o Christus e o Colégio Adventista, de caráter privados, e escolas públicas de

Ensino Fundamental e Médio, como a do Centro dos Retalhistas, Figueiredo Corrêa e o Centro

de Educação de Jovens e Adultos. Também há no Benfica um centro de ensino técnico

profissionalizante, de caráter privado – o Centro de Estudo e Pesquisa em Eletrônica

Profissional e Informática Limitada (CEPEP) –, oferecendo cursos técnicos e

profissionalizantes.

A concentração de instituições educacionais no Benfica transformou o bairro,

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ampliando suas funções e propiciando novos olhares e novas temáticas para os estudiosos do

espaço urbano, em especial para aqueles que pesquisam as relações entre paisagem e

instituições de ensino.

Portanto, estudar a paisagem do Benfica é perceber as alterações no seu conjunto

arquitetônico e em sua dinâmica social, propiciada pelos estudantes, funcionários, professores,

frequentadores e moradores. Tais mudanças as apresentamos neste capítulo através da revisão

de literatura sobre o conceito estudado, dos aspectos históricos do bairro e da UFC, assim como

também as apresentamos na fala dos entrevistados expostos neste capítulo e que seguirão no

próximo acerca da percepção da paisagem através da análise das fotografias antigas do bairro.

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4 A FOTOGRAFIA COMO POSSIBILIDADE DE LEITURA DA PAISAGEM DO

BENFICA

4.1 A PAISAGEM DO BENFICA EXPRESSADA EM SUAS FOTOGRAFIAS

Na análise das alterações que ocorreram na paisagem do Benfica, as fotografias

antigas e as entrevistas serão os nossos principais suportes, enquanto registro de diferentes

períodos e testemunhos das modificações do espaço do bairro.

Portanto, no estudo da paisagem do Benfica, foram selecionadas dez fotografias

antigas de diferentes períodos da história do bairro. Com essas, buscou-se analisar as alterações

que ocorreram em sua paisagem. Além das análises, que seguem descrevendo cada uma delas

e surgem no decorrer deste capítulo, foram realizadas entrevistas com diversos grupos acerca

de suas próprias percepções sobre as mudanças na paisagem observadas nas fotografias.

A fotografia nesta pesquisa foi a fonte histórica documental mais importante. A

partir de sua análise, somos conduzidos a uma área do conhecimento que trata das criações e

produções deixadas pelo homem ao longo do tempo, refletidas através das experiências, dos

significados e das simbologias.

Na fotografia encontramos informações relevantes frente aos acontecimentos do

passado no qual, a partir das informações observadas na imagem, podemos entender as ações

do presente. Mauad (1997) aponta que, ao considerarmos as imagens como fontes históricas,

iremos perceber o contexto em que foram produzidas e as diferentes visões de mundo em torno

das relações sociais envolvidas. Assim, as fotografias mostram as marcas do passado.

As fotos não são meros registros do passado captados apenas por sorte ou

coincidência. São imagens produzidas com requintes técnicos, captadas por avanços na

tecnologia de gravação de imagens e que servem não só para a apreciação daqueles que as

visualizam, mas também podem servir para ilustrar e analisar momentos da vida social. Desta

forma, as fotografias podem servir como fonte avaliativa da sociedade, a partir da análise da

paisagem que está inserida em sua imagem.

As fotografias não se esgotam em si mesmas, elas são apenas o ponto de partida, a

pista na busca de desvendar o passado. Elas nos mostram um fragmento selecionado

das coisas, dos fatos, das pessoas, tal como foram congelados num dado momento de

sua existência/ocorrência. (KOSSOY, 2012, p.37).

Na imagem fotográfica estão indissociavelmente incorporados elementos materiais,

ou seja, os de ordem técnica, que são os ópticos, químicos, eletrônicos, indispensáveis para a

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materialização da fotografia, mas também estão presentes os elementos de ordem imaterial, que

são os imagéticos e os culturais. “Estes últimos se sobrepõem hierarquicamente aos primeiros

e, com eles, se articulam na mente e nas ações dos fotógrafos ao longo do tempo”. (KOSSOY,

2012, p.27).

Através das análises das imagens fotográficas podemos apreender a história de uma

determinada sociedade, assim como as práticas culturais. De acordo com Kossoy (2012), os

conteúdos das imagens sempre devem ser considerados como fontes históricas de abrangência

multidisciplinar, podendo tornar-se uma fonte decisiva nas diferentes vertentes da investigação

histórica.

A fotografia é uma representação a partir do real segundo o ponto de vista do seu

autor. Entretanto, levando em conta a materialidade registrada na imagem, a aparência de algo

que se passou na realidade concreta, em dado espaço e tempo, pode ser considerada, também,

como um documento do real, uma fonte histórica (KOSSOY, 2012).

Os registros deixados pelas fotografias nos revelam um campo de conhecimento

que trata das criações e produções humanas como uma experiência sensível do mundo,

oferecendo diversas leituras e significados. Para observar uma imagem é necessário ter em

mente alguns objetivos sobre o que se vê e lê. Podem ser identificados na leitura de imagens

aspectos referentes aos sentidos e aos significados, que remetem ao simbólico. Portanto, nas

imagens fotográficas encontramos explicações de diversas realidades, pois estas guardam com

elas vestígios do cotidiano e do imaginário popular (COELHO, 2009).

As fotografias projetam elementos culturais que mantêm o universo imaginário,

revelando sistemas de expressão que afetam e interferem na rede de possibilidades do

observador. Ela é um documento que transmite significados culturais envolvendo múltiplos

olhares na rede simbólica da paisagem, seja ela urbana ou rural.

Nela percebemos a interação indissociável entre elementos subjetivos e objetivos.

Quem a observa se depara com um mundo real projetado em um suporte material, sem descartar

o caráter imaginário estabelecido na dimensão perceptiva que vai além do senso comum.

Nas ideias de Reyes (2005) entendemos que:

O imaginário tem relevância indispensável na constituição da paisagem citadina,

desde que a sua concepção esteja fundamentada na experiência que cerca o real, ao

passo que essa “realidade” que se cria da/na cidade física não é tão sólida e rígida

quanto o senso comum acredita, ela é cada vez mais constituída de fluxos e de

movimentos constantes (Reyes, 2005, p. 157).

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Dubois (1993), por sua vez, ressalta que a fotografia não é um símbolo neutro,

possui codificações de diferentes temáticas no imaginário da sociedade e emerge quadros que

são determinados ou determinantes culturais. Para o autor, tudo que se impõe ao receptor é fruto

de uma concepção que necessita de um aprendizado, de um conhecimento que é representado

através da cultura e das experiências vividas.

Assim, Mauad (1997) apud Melo (2009) considera que:

O que está revelado na imagem, integra a materialização da experiência vivida, a doce

lembrança do passado, é a memória de uma trajetória de vida, e ou ainda uma

mensagem codificada em signos. O entendimento de uma fotografia perpassa o

desvelamento de uma intricada rede de significações culturais (MAUAD 1997 apud

MÉLO 2009: 61).

Aumont (2012) nos mostra a relação entre imagem fotográfica e paisagem, pois

para o autor a fotografia é ligada a multiplicidades de linhas graduadas na vida social, em que

o pano de fundo são as narrativas acerca da paisagem. De tal modo, entendemos que a paisagem

possui uma ligação direta com as imagens e suas formas de representação.

A paisagem é um reflexo aparente da sociedade, na qual a fotografia serve de fonte

para análise da mesma, nos mostrando os significados e simbolismos que perpassam o tempo.

A sua análise enfatiza diversas leituras fundamentadas na representação da realidade,

modeladas por estruturas profundas ligadas a um exercício de uma linguagem imagética

carregada de uma organização simbólica para os sujeitos envolvidos na rede de significados.

Nesse sentido, centramos em nossos esforços compreender as características

atribuídas à fotografia, no entendimento das representações, dos significados e das alterações

na paisagem do Benfica relacionadas à UFC, dentro do contexto de apropriações espaciais,

reformas e preservação de imóveis, objeto que esta dissertação objetivou compreender a partir

da análise das seguintes imagens:

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Fotografia 3 - Avenida Visconde do Cauípe

Fonte: Arquivo Nirez,1938.

A fotografia acima reflete um dos mais importantes pontos do Benfica, a Avenida

Visconde de Cauípe, atual Avenida da Universidade. A partir da Rua Paulino Nogueira em

direção ao centro da cidade, vê-se ao fundo o bonde na linha do Benfica. De propriedade da

Imobiliária Frota Gentil, do lado direito, podemos observar o muro da casa onde moraram o Sr.

Aziz Kalil, avô do Sr. Tasso Jereissati (três vezes governador do Ceará), posteriormente o Sr.

José Albuquerque Monteiro e por último o casal Heitor e Nancy de Albuquerque Gentil, período

em que o imóvel junto com outros dois desta quadra foram vendidos para a UFC. O muro

seguinte é o da casa de José Campos Paiva e Da. Beatriz Gentil Campos; o próximo é do

Palacete do Cel. José Gentil Alves de Carvalho. Do lado esquerdo, encontra-se o muro da

Chácara do Dr. Edgar Cavalcante de Arruda, atual CETREDE - UFC; o imóvel seguinte era a

chácara de propriedade de Manuel João Alpiniano Pombo. Com a venda da chácara para

Almerinda Albuquerque, seria instalado no local o Ginásio Santa Cecília, adquirido

posteriormente pelas Irmãs Damas da Instrução Cristã e finalmente adquirido pela UFC.

Atualmente no local funcionam o Curso de Arquitetura e o MAUC, Museu de Artes da UFC22.

22 A Informação teve como fonte o seguinte site: www.cepimar.org.br

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Fotografia 4 - Ginásio Santa Cecília

Fonte: Arquivo Nirez, 1952.

Percebemos que, na descrição da fotografia acima, muitos imóveis localizados na

Avenida Visconde de Cauípe, atual Avenida da Universidade, entre as ruas Padre Francisco

Pinto e Avenida Domingos Olímpio, foram adquiridos pela UFC, reforçando a importante

presença da Instituição no bairro. Como já discorremos na primeira foto, funcionava nesse

imóvel o Ginásio Santa Cecília; atualmente funciona no local o Curso de Arquitetura e o

MAUC.

Além dos imóveis acima, outra foto que retrata um importante símbolo para o bairro

e a cidade de Fortaleza é a da Casa de Cultura Germânica, onde é oferecido o curso de Língua

Alemã. Esse imóvel também pertence à Universidade, no entanto vale ressaltar que, antes de

ser adquirida pela UFC, essa casa pertencia ao Sr. Francisco Queiroz Pessoa (BARROSO,

2004).

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Fotografia 5 - Ginásio Santa Cecília

Fonte: Arquivo Nirez, 1952.

Fotografia 6- Escola Industrial

Fonte: Arquivo Nirez, 1952.

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O aspecto educacional no Benfica é relevante mesmo antes da criação da UFC,

como mostramos, anteriormente, na fotografia antiga do Ginásio Santa Cecília. A imagem

acima é da Escola Industrial, atual IFCE. Analisando a evolução23 do IFCE, vale ressaltar que

a sua história teve início em 23 de setembro, no ano de 1909, com a antiga Escola de Aprendizes

de Artífices, localizada na Avenida Alberto Nepomuceno. Houve mudança da localização de

sua sede, em 1914, para o imóvel que abrigava a milícia estadual em frente à praça Nogueira

Acioly, que atualmente integra o patrimônio do Teatro José de Alencar. Já no ano de 1932, a

escola passa a funcionar no prédio onde funcionaria a Escola de Aprendizes de Marinheiro, no

bairro Jacarecanga.

No ano de 1937, no governo de Getúlio Vargas, período popularmente conhecido

como Estado Novo, houve a promulgação do decreto-lei n° 378, que transformou a Escola em

Liceu Industrial do Ceará. A nova instituição funcionaria no prédio que atualmente é o Liceu

do Ceará.

Em 17 de janeiro de 1940, o Interventor do Ceará, Francisco Pimentel, fez a doação

de um terreno que se localizava no bairro do Prado, atualmente pertencente ao Benfica, para as

edificações da nova sede do chamado Liceu Industrial do Ceará.

Outras mudanças foram de extrema importância, como a que ocorreu no governo

dos militares, no período em que o Marechal Humberto de Alencar Castelo Branco se

encontrava no poder. O presidente acarretou mudanças em relação a instituição, que passou a

ser Escola Industrial Federal do Ceará. Ainda no governo dos militares, precisamente no do

Marechal Artur Costa e Silva, a escola passou a ofertar cursos técnicos de nível médio nas áreas

de Edificações, Estradas, Eletrotécnica, Mecânica, Química, Telecomunicações e Turismo.

Outro avanço de extrema importância foi no ano de 1994, no governo de Itamar Franco, pois a

Escola Industrial Federal do Ceará passou a atuar não somente no ensino, mas também na

pesquisa e na extensão, passando a ser um Centro Federal de Educação Tecnológica. Já no

governo de Fernando Henrique Cardoso, tornou-se a Escola Técnica Federal do Ceará.

No ano de 1998, o MEC protocolizou o processo para a transformação da Escola

Técnica em Centro Federal de Educação Tecnológica do Ceará(CEFET-CE). Já em 14 de

setembro de 2004, sob a presidência de Luís Inácio Lula da Silva, reconhece-se a vocação

institucional dos CEFETs para ministrar ensino superior, graduação e pós-graduação lato sensu

e stricto sensu.

O Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia (IFCE) atualmente atende

23 As informações referentes à evolução histórica do IFCE apresentadas neste capítulo têm como fonte o seguinte

site: www.ifce.edu.br

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45 municípios do estado do Ceará e conta com a participação de mais 14 mil estudantes por

meio da oferta de cursos regulares de formação técnica e tecnológica, nas modalidades

presenciais e a distância. São oferecidos cursos superiores tecnológicos, licenciaturas,

bacharelados, além de cursos de pós-graduação, mais precisamente especialização e mestrado.

O mesmo continua localizado com o seu principal campus no bairro Benfica, na Avenida 13 de

Maio.

Dando continuidade à apresentação de fotografias de imóveis adquiridos pela UFC,

onde funcionavam instituições educacionais, a fotografia abaixo apresenta o Palacete do

empresário João Gentil Alves de Carvalho, filho do patriarca José Gentil Alves de Carvalho,

proprietário da maioria dos imóveis que foram adquiridos pela UFC, na sua dinâmica

expansionista.

Após a morte do pai do empresário João Gentil, esse construiu uma mansão na

praia do Meireles. O imóvel retratado então foi alugado para ali funcionar, entre 1945 e 1950,

o Ginásio Nossa Senhora das Graças da Congregação das Filhas do Coração Imaculado de

Maria: as “Cordimarianas”. Com a construção de sede própria no bairro de Fátima, o imóvel

foi arrendado pela família Gracie, que instalou no local o Ginásio Americano, que funcionou

até 1954. O palacete foi adquirido pela UFC em 1958 e, antes de sua demolição, funcionou no

local o Instituto de Química. No lugar foi erigido o prédio onde funciona a Fundação Cearense

de Pesquisa e Cultura da UFC (FCPC), localizado na Av. da Universidade24.

24 As informações apresentadas teve como fonte o seguinte site: www.cepimar.org.br

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Fotografia 7 - Palacete do João Gentil

Fonte: Arquivo Nirez, 1952.

Assim como o Ginásio Americano, outra instituição de ensino que se destacava no

bairro era o Grupo Escolar Benfica. O prédio que abrigava a Instituição, localizado na Avenida

Visconde de Cauípe, ficou pronto e foi inaugurado em 02 de janeiro de 1923, como um projeto

do arquiteto José Gonçalves da Justa. Depois essa Instituição passou a denominar-se Grupo

Escolar Rodolfo Teófilo. Posteriormente, em 20 de agosto de 1956, o estabelecimento de ensino

foi transferido para outra rua nas proximidades, e no prédio passou a funcionar o Museu

Antropológico e o Instituto do Ceará. Dez anos depois foi feita uma permuta com a UFC: o

Instituto do Ceará passou a funcionar na Rua Barão do Rio Branco, na Praça do Carmo, onde

ainda se encontra, e o museu foi para uma casa na Avenida Barão de Studart. (SILVA, 2010).

Como podemos observar na fotografia abaixo, após a mudança, o prédio onde

funcionava o Grupo escolar Benfica passou a acolher a Faculdade de Ciências Econômicas do

Ceará, fundada pelo Professor Djacir Menezes, em novembro de 1938. A faculdade era uma

instituição privada, porém o Decreto Estadual n° 833, de 20 de novembro de 1957, encampou

a Faculdade de Ciências Econômicas e a Faculdade de Farmácia e Odontologia.

Depois das modificações, atualmente funciona no prédio os cursos de

Administração, Economia, Atuariais e Ciências Contábeis, a FEAAC, da Universidade Federal

do Ceará (SILVA, 2010).

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Fotografia 8 - Grupo Escolar Benfica

Fonte: Arquivo Nirez, 1942.

Como mostramos anteriormente, a instituição de ensino adquiriu diversas

residências importantes para as suas instalações. No entanto, a primeira aquisição e a mais

notável de todas foi o Palacete do José Gentil Alves de Carvalho, como podemos observar na

fotografia abaixo, que mostra a casa e a imagem de José Gentil, está no canto superior direito

(MARTINS FILHO, 1994; 1996).

José Gentil Alves de Carvalho adquiriu a chácara no ano de 1909, no entanto já

residia na cidade de Fortaleza. No ano de 1918 inaugurou um belíssimo palacete para ser a sua

residência, mas foi vendida no ano de 1956 pela imobiliária Frota Gentil para a UFC, tornando-

se a Reitoria da Universidade até os dias atuais (SILVA, 2010).

Apesar de ter passado por diversas reformas para atender a demanda da Instituição,

a Reitoria ainda permanece com o seu estilo arquitetônico original, tornando-se um símbolo

não só para o bairro Benfica, mas para toda a cidade de Fortaleza.

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Fotografia 9 - Palacete do José Gentil Alves de Carvalho

Fonte: Arquivo Nirez,1922.

Fotografia 10 - Casa do João Tomé de Sabóia e Silva

Fonte: Arquivo Nirez, 1932.

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A fotografia acima mostra a bela residência de uma importante personalidade da

história da construção civil no Ceará, o engenheiro, empresário e político João Tomé de Sabóia

e Silva. Assim como ressaltamos nas análises anteriores, essa casa também foi adquirida pela

UFC no seu processo de criação e expansão. No entanto, a mesma não foi preservada e sim

demolida para ceder lugar ao prédio onde está situado o Centro de Humanidades II, entre as

Avenidas 13 de maio e Avenida da Universidade, sede do curso de Comunicação Social.

(BARROSO, 2004).

Apesar de ter ocorrido a demolição da casa, podemos observar que ainda resta na

paisagem um pouco da história dessa residência. O dono da casa tinha nos fundos do imóvel

uma edificação semelhante a uma torre onde fazia suas pesquisas astronômicas; esse

observatório astronômico foi preservado e atualmente funciona o Centro Acadêmico do Curso

de Comunicação Social, e é o local mais conhecido pelos estudantes como “torrinha”.

Fotografia 11 - Giratório entre as Avenidas 13 de maio e Universidade

Fonte: Arquivo Nirez, 1968.

Esta fotografia mostra a rotatória erigida no cruzamento da Av. 13 de maio com

Av. da Universidade. Nessa rotatória foi instalada uma fonte ornamentada de cavalos que,

originalmente, estava localizada na Praça da Lagoinha, no centro de Fortaleza. Essa fonte

permaneceu por muito tempo na Praça da Lagoinha, atualmente ela se encontra na Praça do

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Banco do Nordeste do Brasil (BNB), localizada no centro da cidade de Fortaleza. Essa rotatória

e sua fonte ficaram no Benfica entre os anos de 1967 e 1970 (BARROSO, 2004).

Muitos dos moradores antigos, ao ver essa fotografia, mostraram indignação por

terem retirado a fonte desse local. Para esses, o motivo principal dessa mudança foi o aumento

do fluxo de carros nessa região, e a fonte era empecilho para a fluidez do trânsito local.

Fotografia 12- Portão do Palacete Gentil, aproveitado por muito tempo como entrada principal

da Reitoria

Fonte; Arquivo Nirez, 1958.

Por fim, a fotografia acima mostra o portão da casa do Palacete Gentil, de

propriedade do empresário José Gentil Alves de Carvalho, aproveitado por muito tempo como

entrada da reitoria pela UFC. Devido às reformas que ocorreram na Reitoria, o portão foi

retirado e a entrada modificada, o que mostra um pouco da história desse importante símbolo

arquitetônico.

A partir da análise das fotografias acima, podemos perceber um pouco da história

do bairro e algumas das mudanças que ocorreram em sua paisagem. No entanto, a paisagem só

existe através da análise e compreensão dos interesses dos diversos grupos sociais envolvidos

no processo de (re)construção, ampliação, demolição dessas paisagens.

Portanto, no próximo subitem analisaremos a relação entre a fotografia e o

espectador e mostraremos as diversas percepções dos diferentes sujeitos acerca das mudanças

que ocorreram e continuam acontecendo na paisagem do bairro Benfica, pela análise das

fotografias acima apresentadas.

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4.2 A FOTOGRAFIA E O ESPECTADOR

Na análise das fotografias, devemos considerar na imagem o que nela está inserido

e os diversos sujeitos que se apresentam na composição e na sua análise. Para Barthes (1984),

existem três sujeitos fotográficos: o sujeito-operador, o sujeito fotografado e o sujeito

espectador. No entanto, para a presente pesquisa concentraremos nossa atenção no sujeito

espectador, na perspectiva de entender como esses compreendem as mudanças na paisagem do

Benfica a partir da interpretação das fotografias do bairro.

O sujeito espectador é aquele que participa de forma efetiva na análise das imagens

e tenta compreender e também reconhecer o que nela está inserido. Para Barthes (1984), o

sujeito espectador “[...] somos todos nós que consultamos jornais, livros, álbuns e arquivos,

coleções de fotografias. E aquele ou aquilo que é fotografado? É o alvo, referente [...]”

(BARTHES, 1984: 17).

Na compreensão da fotografia pelo espectador são reveladas diversas

interpretações, pois para cada um a fotografia representará valores distintos, fazendo parte das

práticas culturais ali construídas pela história do lugar. Quando o espectador observa a imagem,

antes de analisar o caráter subjetivo, o mesmo reconhece aquilo que já foi projetado em sua

mente, havendo na fotografia uma relação entre aspectos cognitivos e subjetivos.

O espectador é um parceiro ativo da imagem, emocional e cognitivamente; o

espectador constrói a imagem e a imagem constrói o espectador (AUMONT, 2012). A relação

entre a fotografia e o espectador não é uma análise simples, muitas determinações diferentes e

até contraditórias entram no estudo. Além da capacidade interpretativa, entram na abordagem

os afetos, as crenças, as emoções que, por sua vez, são vinculadas a uma determinada cultura.

Apesar de na fotografia os sujeitos não serem os mesmos, os acontecimentos terem

mudado e a história tome outras conotações, mesmo assim a imagem permanece como um

dispositivo capaz de revelar a memória de uma paisagem em um duplo sentido: aquilo que

aparece e aquilo que permanece como um legado simbólico observado pelo espectador

(REYES, 2005).

O que o sujeito encontra na imagem nos revela estruturas profundas próprias da

mente humana, pois o mesmo faz existir a imagem a partir do conjunto dos atos perceptivos e

psíquicos. Tudo o que ele observa na imagem fotográfica resulta do conhecimento e da

consciência do ver e do saber. No entanto, quando analisamos as expectativas do espectador,

privilegiamos os aspectos cognitivos, embora saibamos que ele é, também, um sujeito de afetos,

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pulsões e emoções. Tais sentimentos intervêm consideravelmente na sua relação com a imagem

(AUMONT, 2012).

A compreensão da fotografia só é possível devido aos sujeitos que a constroem, em

que cada um desempenha um papel relevante, seja o fotógrafo que seleciona o ambiente e o

tempo, ou o espectador, que faz da fotografia uma das diversas possibilidades de analisar o

espaço geográfico, e consequentemente a paisagem, assim como é o principal objetivo desta

pesquisa.

Ao considerar a fotografia como ato também do espectador, encontramos as

descontinuidades entre um real inapreensível e uma realidade construída a partir das emoções

e dos aspectos culturais. A necessidade de criar uma nova sintaxe que acolha a desordem

causada pela apreensão da imagem fotográfica “nos leva a um jogo, no qual tanto observadores

como fotógrafos podem mexer as peças” (AUMONT, 2012: 45).

A imagem existe e é a partir da sua existência material que podemos estabelecer

essa negociação de causas e efeitos, seja sob a forma de análise técnica ou subjetiva. O que está

representado na imagem fotográfica reflete ações praticadas pela sociedade, indo além do

caráter técnico desse recurso, pois nela são revelados símbolos presentes na história da

humanidade.

Através da compreensão das imagens pelos espectadores, podemos analisar as

alterações na paisagem do Benfica, sobre as quais será inquestionável a importância da

percepção dos sujeitos que compõem o bairro e fazem parte das constantes mudanças que estão

ocorrendo.

Organizamos em cinco grupos os entrevistados: no primeiro estão os moradores

mais antigos do bairro; em segundo lugar, os frequentadores do bairro; em terceiro lugar, os

professores da UFC; em quarto lugar os alunos da UFC e, em quinto, os servidores dessa mesma

instituição.

Com as entrevistas buscou-se a percepção desses sobre as mudanças que ocorreram

na paisagem do bairro. Como intermédio entre a percepção dos sujeitos que compõem o Benfica

e as alterações em sua paisagem, foram analisadas junto aos entrevistados, fotografias de

diferentes períodos que compõem a história do bairro e da UFC. O intuito de mostrar as

fotografias foi o de entender como eles percebem as mudanças que ocorreram no bairro através

das análises das imagens apresentadas.

Nesse sentido, a leitura da paisagem do Benfica vincula-se a uma articulação entre

aqueles que integram a trama relacional da vida social. Como partes integrantes desse aspecto,

tem-se a cultura como agente, a área do bairro como meio e a paisagem como um conjunto de

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resultados, através dos quais a imagem fotográfica fornece orientações sobre a dinâmica sócio

espacial.

Na relação entre as alterações na paisagem, as fotografias antigas do bairro e os

grupos entrevistados, os moradores antigos nos revelaram um significativo saudosismo ao ver

as fotografias antigas do bairro. O sentimento de pertença e identidade com o bairro é muito

forte, pois ao perguntar se os moradores gostavam de morar nesse espaço, todos responderam

que sim, mostrando as vantagens de morar nesse lugar, assim como as suas peculiaridades frente

aos demais bairros de Fortaleza.

Quando iniciamos a análise através da percepção dos moradores antigos do bairro,

percebemos que, apesar das mudanças que tinham ocorrido em diversos espaços e na arquitetura

do bairro, muitos reconheciam os lugares apresentados na fotografia, lembrando com alegria

dos momentos vividos no bairro, como mostra a citação abaixo:

Eu adoro morar aqui. Daqui eu só saio para o Parque da Paz. Eu gosto de morar aqui

primeiro porque foi minha infância, ou seja, a minha vida toda, os primeiros bares, as

primeiras namoradas. O Benfica foi tudo para mim, a minha missão de vida

(informação verbal). 25

No entanto, ao contrário das lembranças de alegria dos momentos vividos em

alguns espaços do bairro, como ruas, praças e bares, muitos demonstraram melancolia devido

às mudanças que ocorreram na paisagem do Benfica. Para eles muitas coisas mudaram no

bairro, mas as mudanças nem sempre foram somente positivas. Fato que podemos observar na

fala do morador abaixo:

Muita coisa mudou, pois deu uma valorização no bairro muito importante. Muitos

prédios foram construídos e conservados, mas muitas árvores foram derrubadas e eu

sinto muita falta disto. E é importante também dizer que a UFC tem que dar uma

maior abertura para o bairro e interagir mais com a comunidade (informação verbal).26

A partir da fala do morador acima, entendemos que as mudanças que ocorreram na

paisagem do bairro foram positivas e negativas. Como exemplo dessas, ele citou a derrubada

de muitas árvores que cederam lugar para diversas construções no bairro. Além desse morador,

outros também mencionaram a questão abordada, explicitada nas seguintes citações:

25 Francisco Newton de Ferreira Miranda, morador do bairro há 65 anos. Entrevista realizada em Fortaleza, em

dezembro de 2013. 26 Silvio Mendes (Roberto Carlos), morador do bairro há 64 anos. Entrevista realizada em Fortaleza, em novembro

de 2013.

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A paisagem mudou muito, pois isso aqui era um mangueiral. Tinham muitas árvores

e depois foram derrubando. Era um bairro cheio de Mangueiras. Eu acho que aqui

nesta rua a única é essa da esquina, antes tinham muitas outras aqui na paisagem do

bairro (informação verbal).27

Mudou. Até o nome da avenida, que era visconde do Cauípe, mudou para a Avenida

da Universidade. E as mudanças podem ser percebidas através da retirada das árvores,

porque aqui era cheio de árvores antes da chegada da universidade (informação

verbal).28

Além dessa visão negativa dos moradores antigos, é importante ressaltar que os

mesmos acreditam que, com a criação e a expansão da Universidade no bairro, aumentou

significativamente a violência, pois muitas noites de conversas nas calçadas foram prejudicadas

e outras até mesmo extintas por ser perigoso permanecer durante a noite em frente das casas

conversando com vizinhos e amigos. Esta explicação está refletida na voz do morador Pedro

Gervásio Moreira Martins. Para ele “Mudou muita coisa, mas foram mudanças super negativas,

como o asfaltamento das ruas, o aumento do fluxo de carros e também da violência”.

A questão também foi abordada por alguns professores da UFC, observada neste

pronunciamento:

Ao ver as fotografias é uma Fortaleza bucólica ainda, mudou muito porque se você

comparar estas imagens com as imagens contemporâneas você irá ver uma fortaleza

contemporânea e urbanizada que também trouxe muita violência, o que é muito triste,

porque o Benfica é um bairro muito charmoso (informação verbal).29

Quando eram observadas as diversas fotografias antigas do Benfica, como a foto da

Casa de Cultura Germânica, a da Reitoria, a da FEAAC e a da Avenida da Universidade há

mais de 50 anos, grande parte dos que foram entrevistados falaram que, em relação ao aspecto

arquitetônico, pouca coisa foi modificada, havendo uma grande preservação do patrimônio

cultural. Para os entrevistados isso é devido ao fato de muitos prédios antigos que são

preservados pertencerem à UFC.

Essa informação pode ser observada na fala do seguinte morador antigo do bairro:

Muitos mais perceptíveis depois que eu vi as fotografias e eu acredito que foi a

Universidade que ainda preservou alguma coisa, senão fosse a Universidade isso

daqui estaria uma loucura. O que preservou muito o bairro foi a Universidade através

27 Pedro Gervásio Moreira Martins, morador do bairro há 46 anos. Entrevista realizada em Fortaleza, em novembro

de 2013. 28 João Batista de Aragão Viana, morador do bairro há 64 anos. Entrevista realizada em Fortaleza, em novembro

de 2013. 29 Eduardo Girão Santiago, professor da UFC. Entrevista realizada, em Fortaleza, em dezembro de 2013.

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da preservação de muitos prédios, como a reitoria e as casa de cultura (informação

verbal).30

Através da observação das fotografias, percebemos que muitos dos entrevistados

reconheciam muitas das fotos que estavam sendo mostradas, apesar de muitas datarem de mais

de 50 anos. Para eles, isso se deve ao fato de muitas paisagens estarem sendo mantidas e

preservadas pela UFC. A partir disso, entendemos que a instituição de ensino possui um papel

significativo na conservação da memória e da cultura no bairro.

Esta observação pode ser constatada na fala da entrevistada a seguir:

Claro que mudou, né. Eu não tenho dúvida, mas eu acredito que muita coisa foi

preservada, pois teoricamente poderia não ter sido, pois sem a presença da

universidade você acha que alguém ia preservar um prédio desse? Isto daqui é um

custo alto, é uma construção antiga, a própria reitoria, a própria casa de cultura alemã.

Enfim, todos esses prédios demandam uma manutenção constante e um custo muito

alto, e o que não é interesse de que não tem essa visão, os empresários por exemplo

(informação verbal). 31

Apesar de terem ocorrido significativas preservações de muitos prédios localizados

no bairro pela Universidade, constatamos que muitos foram derrubados e bastante modificados

pela instituição de ensino em questão, como a casa que pertencia ao engenheiro João Tomé de

Sabóia, que cedeu lugar a área que abrange o Centro de humanidades II e também uma

residência onde funcionava o Colégio Santa Cecília, onde posteriormente houve a construção

do Museu de Arte da UFC (MAUC).

Na fala do seguinte frequentador do bairro podemos entender a percepção dele

sobre a temática abordada no parágrafo anterior:

Depois de ver as fotografias com certeza mudou, resgatando a história e a memória

como aquele espaço se modificou, vendo hoje a gente que convive e passeia pelo

Benfica percebe estas mudanças. Eu fiquei supresso porque muitos prédios foram

derrubados. Fiquei pensando que poderia ter sido feito uma preservação melhor desta

memória (informação verbal). 32

Além da preservação e da destruição de alguns imóveis adquiridos pela UFC,

constatamos que alguns sofreram mudanças na parte interna, passando por muitas reformas

resultantes da necessidade da Instituição e até mesmo por motivos de segurança, pois muitas

30 Francisco Newton Ferreira de Miranda, morador do bairro há 65 anos. Entrevista realizada em Fortaleza, em

dezembro de 2013. 31 Gerda de Souza Holanda, funcionária da UFC. Entrevista realizada em Fortaleza, em dezembro de 2013. 32 Heronilson Pinto Freire, frequentador do bairro. Entrevista realizada em Fortaleza, em dezembro de 2013.

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possuíam estruturas antigas e necessitavam de investimentos para o adequado funcionamento.

Como exemplos citamos as reformas realizadas na Reitoria e na Casa de Cultura Germânica.

A pesar de muitas coisas terem mudado com a criação e permanência da

Universidade, para alguns dos entrevistados muitas das mudanças que ocorreram são

justificadas pelo crescimento das grandes cidades e pelas novas necessidades dos grupos sociais

envolvidos no processo de modificação da paisagem. No entanto, quando uma universidade

pública é criada e fixada em um determinado espaço, como foi o caso do bairro que estamos

estudando, ocorrem mudanças intensas, sejam elas no aumento do fluxo de pessoas, na

arquitetura, nos transportes, sejam nos estabelecimentos criados para atender o grande número

de estudantes, como as gráficas rápidas e as livrarias.

Quando realizamos as entrevistas e perguntamos sobre as mudanças que haviam

ocorrido no bairro antes da chegada da Universidade, muitos ficaram em dúvida e outros não

sabiam o que responder. Alguns não recordavam como era a paisagem do bairro antes da

fixação da Instituição devido à intensidade das mudanças que aconteceram e continuam

ocorrendo. Já outros, por não terem vivido o momento de criação da Universidade, mostraram

indiferença na resposta. No entanto, após verem e analisarem as fotografias, muitos deles

demonstraram que as imagens os fizeram entender as mudanças que tinham ocorrido no bairro

e também relembraram momentos de vivência nesse espaço.

Portanto, as análises das fotografias foram de fundamental relevância na realização

das entrevistas, mostrando a importância das mesmas para a pesquisa e para os entrevistados,

pois até mesmo aqueles que não possuíam a percepção sobre as mudanças que tinham ocorrido

na paisagem do bairro as perceberam através das imagens. Fato que podemos observar a partir

das citações abaixo:

Depois que eu vi as fotografias deu para perceber que muitas coisas foram mudadas

na paisagem do Benfica, como as casas, os prédios e também tem muito mais gente

andando nas ruas, muitos estudantes que estão aqui no bairro por causa da UFC

(informação verbal). 33

As fotografias demonstram, pode até achar que foi acelerada a presença da

Universidade estar aqui e atrair pessoas de todos os lugares da cidade de Fortaleza,

consequentemente isso mexe com a estrutura do bairro. Obviamente sem a presença

da universidade isso iria crescer, eu não sei se nessa dimensão ou nessa direção, mas

33 Mario Noelio (Lacerdinha), morador do bairro há 60 anos. Entrevista realizada em Fortaleza, em novembro de

2013.

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que a influência é forte, ela é. A universidade trouxe a Engenharia, a Faculdade de

Educação e o Museu de Arte (informação verbal). 34

Assim como os moradores antigos, os frequentadores, os professores e funcionários

da UFC e os estudantes da instituição que foram entrevistados durante a pesquisa de campo

mostraram um relativo interesse na análise das fotografias. Muitos dos estudantes relataram

que, apesar de estudar na UFC, não sabiam muita coisa sobre a história do bairro e da

Instituição.

Através das fotografias, eles relataram que puderam conhecer um pouco mais da

história do Benfica e analisar como a paisagem daquele entorno que eles vivenciam mudou.

Mas o que foi bastante significativo na análise com os estudantes, foi que alguns disseram que

depois dessa pesquisa estavam mais interessados em saber sobre a história do Benfica.

Através da percepção da seguinte estudante podemos nos certificar sobre essa

análise:

Depois que eu vi as fotografias eu percebi que o Benfica mudou muito, antes ele

parecia mais um bairro residencial. Estas mudanças podem ser percebidas em tudo,

com a chegada da universidade circula um público totalmente diferente dos que

frequentavam o bairro. Eu não sabia de muitas coisas sobre o bairro, agora eu vou

pesquisar mais [...] (informação verbal). 35

A partir da análise das fotografias, em todos os grupos que entrevistamos, as

mudanças para os entrevistados foram perceptíveis, e, como abordamos anteriormente, a

questão cultural e a preservação do patrimônio histórico do bairro foi relevante para os

entrevistados. Para esses, a presença da UFC propicia esta relação entre o moderno e o

tradicional. Moderno devido às contínuas pesquisas realizadas pela Instituição e àqueles que

frequentam o bairro; tradicional por apresentar arquitetura preservada nos prédios pertencentes

à Instituição.

Foi através das fotografias, que é uma representação do real, que pudemos

estabelecer esta relação entre as mudanças na paisagem do Benfica com a percepção dos

sujeitos. Ela propiciou importantes resultados diante dos objetivos a serem alcançados nesta

dissertação, pois sem elas os resultados não teriam sido tão pertinentes.

34 Carlos Cavalcante de Pereira Marques, funcionário da UFC. Entrevista realizada em Fortaleza, em dezembro de

2013. 35 Jessica Maria de Leite Lima, estudante da UFC. Entrevista realizada em Fortaleza, em dezembro de 2013.

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Quando sentimos a necessidade de uma discussão acerca do espaço geográfico, foi

na intenção de ampliar os olhares para a construção do mundo a nossa volta. Dessa forma,

pensamos como se vão constituindo as paisagens e as transformações nesse espaço, realizados

por todos nós. Assim, entendemos a importância dos estudos da paisagem no âmbito da

geografia, em que ela é analisada além dos aspectos materiais, estando as sensações humanas e

as práticas culturais no centro das discussões acerca desse importante conceito para a ciência

geográfica.

Compreendemos que, na análise da paisagem cultural, o homem se encontra no

centro das discussões. Portanto, nesse trabalho, foi de extrema relevância a análise com os

sujeitos que compõem o bairro Benfica. Eles nos mostraram resultados significativos a partir

de suas percepções, demostradas através dos sentidos e das vivências dos mesmos nesse

importante lócus para a cidade de Fortaleza.

Nas narrativas dos sujeitos sobre a paisagem, destacam-se elementos de diferentes

situações históricas e atuais, percebidas através das falas dos entrevistados em diferentes

momentos da pesquisa, demostrando, ao mesmo tempo, diferenças e semelhanças em suas

análises. Todavia, um aspecto foi significativo em quase todas as entrevistas: a inquestionável

presença da Universidade e as alterações propiciadas pela mesma no bairro.

Na análise com sujeitos do Benfica, os moradores antigos demostram significância

com o bairro, onde, apesar das mudanças negativas que o Benfica está passando, dentre elas o

aumento da violência, muitos deles permanecem no bairro, demostrando o sentimento de

pertencimento com esse lugar. O gostar do bairro foi evidenciado pelos outros grupos de

entrevistados, demostrado a partir da compreensão com os frequentadores, estudantes,

funcionários e professores da UFC. A partir dos estudos realizados com esses, compreendemos

que as relações estabelecidas com o local vão além de trabalho, estudo, e/ou simples lócus para

o lazer, entrando nessa discussão as emoções vivenciadas no dia a dia com a paisagem.

A partir disso, concluímos que as percepções sobre as alterações da paisagem do

bairro são constantemente analisadas por esses, pois, através do gostar do bairro, os sujeitos

preocupam-se com as modificações que ocorrem no lugar. Nessa perspectiva, compreendemos

que, para os entrevistados a UFC, alterou-se a paisagem de forma significativa, e ao mesmo

tempo que a instituição de ensino modificou, ela também preservou o património histórico do

bairro.

Dentre a preservação do patrimônio cultural no bairro, é interessante perceber que,

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mesmo sendo um símbolo de modernidade, a Universidade Federal do Ceará não destruiu o

Palacete Gentil. Pelo contrário, ao ampliá-lo transformando-o em sede da Reitoria, preservou o

modelo arquitetônico e, claro, outros importantes símbolos culturais, como a Casa de Cultura

Germânica.

Mesmo assim, a UFC poderia ter mudado de maneira absoluta e irreversível as

práticas do cotidiano dos sujeitos do bairro, pois a modernidade não se expressa somente no

fixo, ela vai muito além, sendo percebida principalmente nas práticas sociais que vão anexando

técnicas e novos movimentos ao cotidiano.

Ao mesmo tempo que a Universidade preservou, ela alterou e estabeleceu outras

relações profícuas no bairro, percebidas através da cultura, com a preservação do patrimônio

cultural, como falamos anteriormente: a boemia, através dos inúmeros bares que estão presentes

no bairro como ponto de encontros nos finais das aulas; o lazer, representado pelas calouradas,

e os aspectos educacionais, presente no Benfica mesmo antes da criação da UFC.

A Instalação da UFC, de início com a maioria de seus cursos no Benfica, preenche

uma lacuna na necessidade que Fortaleza e o estado possuíam na formação a nível superior. A

partir da criação da instituição de ensino novas relações se estabeleceram, principalmente no

lócus de sua criação, proporcionando novos olhares para os estudiosos em diversas áreas do

conhecimento, dentre elas a geografia, como foi o nosso caso

Percebemos que as relações entre sujeitos e paisagens são constituídas a partir das

práticas sociais inseridas no dia a dia, onde a UFC, como importante instituição de ensino do

bairro Benfica, proporciona um maior fluxo de pessoas, ocasionando alterações em diversos

aspectos, dentre eles, o aumento populacional, assim como a expansão das áreas físicas

pertencentes a Instituição. Com isso, ela proporciona alterações na paisagem, que são

percebidas por todos aqueles que vivenciam esse espaço.

Entendemos que a pesquisa nunca se esgota, que sempre irão surgir novos olhares

acerca da paisagem do Benfica. Portanto, com esse estudo, demostramos importantes aspectos

referentes à história do bairro e da UFC, assim como as alterações em sua paisagem. Em

nenhum momento dissemos verdades absolutas e irrefutáveis, afinal nossa análise sempre

esteve calcada na percepção dos sujeitos, mostrando em nossos resultados o modo como os

mesmos sentem e percebem a paisagem do Benfica.

Dentre os nossos objetivos, estabelecemos a mediação entre os sujeitos e o objeto,

demostrando as diversas relações estabelecidas e utilizando importantes fontes, como a

fotografia. Essa foi essencial em nossa pesquisa. Através dela, os sujeitos perceberam

relevantes aspectos históricos e atuais frente às alterações que ocorreram e continuam

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acontecendo na paisagem do Benfica com a criação e fixação da Universidade.

As pesquisas necessitam de múltiplas fontes de análises – como foi o nosso caso a

partir do estudo sobre a fotografia –, assim como de diversas perspectivas teóricas em diversas

áreas do conhecimento, nos utilizando da análise multidisciplinar que essa fonte nos oferece.

Foi necessário muitas vezes nos debruçarmos em autores da história, filosofia

comunicação e da antropologia, na perspectiva de ampliarmos o nosso referencial teórico,

buscando subsídios profundos, afim de abrirmos as possibilidades de estudos que oferece a

paisagem do Benfica. No entanto, em nenhum momento nos desvinculamos do nosso principal

objetivo, assim como da nossa base cientifica, a Geografia.

Estudar o Benfica é perceber as permanentes alterações em sua paisagem ao longo

do tempo, evidenciadas, em nosso caso, pela intensa presença da Universidade nesse espaço

geográfico. Entendemos que as alterações na paisagem não são percebidas somente no Benfica,

mas compreendemos que, devido a esse bairro possuir um intenso fluxo de pessoas como uma

intensa rede de relações, as alterações na paisagem são percebidas de maneira mais profícua,

mas ao mesmo tempo parecendo contraditório, pois muito foi preservado no bairro após a

instituição de ensino.

Para não concluir, acreditamos que assim como a nossa pesquisa, outras surgirão,

partindo da intensa busca pelo conhecimento, tão presente nos pesquisadores. Na tentativa de

entender o espaço geográfico, onde estão inseridas as paisagens culturais, os geógrafos estão

em constantes discussões acerca da complexidade que envolve os estudos sobre o espaço

urbano, entendendo que tal é múltiplo, possibilitando diversas abordagens sobre a sociedade,

afinal, o mundo, o espaço geográfico e a paisagem só possuem sentido, a partir dessa.

.

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REFERÊNCIAS

ARQUIVO NIREZ. Avenida Visconde do Cauípe. Fortaleza, fotografia: p&b, 1938.

_______________. Ginásio Santa Cecilia. Fortaleza, fotografia: p&b, 1952

________________. Chalé que pertenceu ao Sr. Francisco Queiroz Pessoa. Fortaleza,

fotografia: p&b, 1942.

_______________. Escola Industrial. Fortaleza, fotografia: p&b, 1952.

_______________. Palacete do João Gentil. Fortaleza, fotografia: p&b, 1952.

_______________. Grupo Escolar Benfica. Fortaleza, fotografia: p&b, 1942.

_______________. Palacete do José Gentil Alves de Carvalho. Fortaleza, fotografia: p&b,

1922.

______________. Casa do João Tomé de Sabóia e Silva. Fortaleza, fotografia: p&b, 1932.

______________. Giratório entre as Avenidas 13 de maio. Fortaleza, fotografia: p&b, 1968.

______________. Portão do Palacete Gentil aproveitado por muito tempo como entrada

principal da Reitoria. Fortaleza, fotografia: p&b, 1958.

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104

APÊNDICES

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APÊNDICE A – Perguntas norteadoras para as entrevistas com os moradores antigos

Nome

Idade

Quanto tempo vive no bairro?

O Senhor gosta de morar no Benfica?

Qual a importância que o bairro Benfica representa para o Sr.?

Percebemos que o Benfica se destaca dentro de vários contextos, como no lazer, no

cultural e no educacional. Em sua opinião, qual desses tem mais a “cara” do Benfica?

Para o Sr., qual instituição educacional é a mais importante?

O que mudou na paisagem do Benfica com a chegada da Universidade?

Como podemos perceber estas mudanças?

Mostrar fotografias e relacionar com a percepção dos mesmos sobre as mudanças nas

paisagens.

Autorizo a Srta. Rejane Maria de Souza utilizar minhas respostas acima, referentes às

perguntas a mim proferidas, sobre o bairro Benfica.

Fortaleza, 03 de dezembro de 2013.

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APÊNDICE B – Perguntas norteadoras para as entrevistas com os frequentadores

Nome

Bairro onde vive?

Já morou no Benfica?

Você frequenta o Benfica há quanto tempo? Em quais dias?

Quais s

ão os espaços que você frequenta no bairro?

Qual o principal atrativo que o bairro representa para você?

Você somente frequenta o bairro ou possui outro vínculo?

Qual a importância que o bairro Benfica representa para você?

Percebemos que o Benfica se destaca dentro de vários contextos, como no lazer, no

cultural e no educacional. Em sua opinião, qual desses tem mais a “cara” do Benfica?

Para você qual a instituição educacional localizada no bairro é a mais importante?

O que mudou na paisagem do Benfica com a chegada da Universidade Federal do Ceará?

Como podemos perceber estas mudanças?

Mostrar fotografias e relacionar com a percepção dos mesmos sobre as mudanças nas

paisagens.

Autorizo a Srta. Rejane Maria de Souza utilizar minhas respostas acima, referentes às

perguntas a mim proferidas, sobre o bairro Benfica.

Fortaleza, 03 de dezembro de 2013.

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Page 107: UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ CENTRO DE … · em Geografia do Programa de Pós - Graduação em Geografia do Centro de Ciências e Tecnologia da Universidade Estadual do Ceará,

107

APÊNDICE C – Perguntas norteadoras para as entrevistas com os estudantes da UFC

Nome

Idade

Bairro onde vive

Você é estudante da UFC?

Qual curso?

Você realiza algum curso no bairro além da graduação?

Você frequenta o bairro nos momentos de lazer? Em quais dias?

Qual a importância que o bairro Benfica representa para você?

Percebemos que o Benfica se destaca dentro de vários contextos, como no lazer, no

cultural e no educacional. Em sua opinião, qual desses tem mais a “cara” do

Benfica?

Para você qual instituição educacional localizada no bairro é a mais importante?

O que mudou na paisagem do Benfica com a chegada da Universidade?

Como podemos perceber estas mudanças?

Mostrar fotografias e relacionar com a percepção dos mesmos sobre as mudanças

nas paisagens.

Autorizo a Srta. Rejane Maria de Souza utilizar minhas respostas acima, referentes às

perguntas a mim proferidas, sobre o bairro Benfica.

Fortaleza, 03 de dezembro de 2013.

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Page 108: UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ CENTRO DE … · em Geografia do Programa de Pós - Graduação em Geografia do Centro de Ciências e Tecnologia da Universidade Estadual do Ceará,

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APÊNDICE D – Perguntas norteadoras para as entrevistas com os professores da UFC

Nome

Bairro onde vive

Em qual curso ministra as aulas?

Há quanto tempo trabalha na Instituição?

O vínculo que você mantém com o bairro é somente o empregatício?

Você frequenta o bairro nos momentos de lazer? Em quais dias?

Qual a importância que o bairro Benfica representa para você?

Percebemos que o Benfica se destaca dentro de vários contextos, como no lazer, no

cultural e no educacional. Em sua opinião, qual desses tem mais a “cara” do Benfica?

Para você qual instituição educacional localizada no bairro é a mais importante?

O que mudou na paisagem do Benfica com a chegada da Universidade?

Como podemos perceber estas mudanças?

Mostrar fotografias e relacionar com a percepção dos mesmos sobre as mudanças nas

paisagens.

Autorizo a Srta. Rejane Maria de Souza utilizar minhas respostas acima, referentes às

perguntas a mim proferidas, sobre o bairro Benfica.

Fortaleza, 03 de dezembro de 2013.

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Page 109: UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ CENTRO DE … · em Geografia do Programa de Pós - Graduação em Geografia do Centro de Ciências e Tecnologia da Universidade Estadual do Ceará,

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APÊNDICE E – Perguntas norteadoras para as entrevistas com os funcionários da UFC

Nome

Bairro onde vive

Já morou no Benfica?

Há quanto tempo trabalha na Instituição?

Em qual setor trabalha?

O vínculo que você mantém com o bairro é somente o empregatício?

Você frequenta o bairro nos momentos de lazer? Em quais dias?

Qual a importância que o bairro Benfica representa para você?

Percebemos que o Benfica se destaca dentro de vários contextos, como no lazer, no

cultural e no educacional. Em sua opinião, qual desses tem mais a “cara” do Benfica?

Para você qual instituição educacional localizada no bairro é a mais importante?

O que mudou na paisagem do Benfica com a chegada da Universidade?

Como podemos perceber estas mudanças?

Mostrar fotografias e relacionar com a percepção dos mesmos sobre as mudanças nas

paisagens.

Autorizo a Srta. Rejane Maria de Souza utilizar minhas respostas acima, referentes às

perguntas a mim proferidas, sobre o bairro Benfica.

Fortaleza, 03 de dezembro de 2013.

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APÊNDICE F – Casa de Cultura Alemã

Fonte: elaborada pela autora (2013).

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111

APÊNDICE G – FEAAC

Fonte: elaborada pela autora (2013).

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APÊNDICE H – Residência universitária localizada na praça da Gentilândia, na Rua Paulino

Nogueira

Fonte: elaborada pela autora (2013).

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113

APÊNDICE I – Centro de Humanidades área 1

Fonte: elaborada pela autora (2013).